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A CULTURA DO CONHECIMENTO TÉCNICO NA MANUTENÇÃO.

O que é, e sua importância.


Introdução.
Esse é o primeiro de 3 artigos sobre esse tema, que são:
- O que é, e sua importância.
- A História da Manutenção Brasileira e seu efeito na Cultura do
Conhecimento Técnico na Manutenção.
- As Evidências de uma Cultura do Conhecimento Técnico na
Manutenção.
Neste artigo, trazemos um tema, que ao nosso ver, necessita ser
desenvolvido nas empresas, frente aos desafios cada vez maiores pela
busca de competitividade, menores custos e maior produtividade, que
exigem a exploração de detalhes, assim como de todas as oportunidades
de aprimoramento.
Este artigo se torna particularmente relevante, para:
- Grandes empresas, que possuem grande diversidade de
equipamentos, tanto pelas funções desempenhadas, quanto pelo aspecto
construtivo.
- Empresas, que possuem boa parte dos serviços de Manutenção
executados por terceirizadas.
- Empresas, que possuem importante rotatividade de pessoal na
Manutenção.
Estamos falando do tema “Cultura do Conhecimento Técnico na
Manutenção”.
Para falar desse tema, devemos abordar de forma introdutória dois
aspectos que são básicos para a compreensão.
Um aspecto particular da Manutenção frente a outras áreas da
empresa.
A Gestão da Manutenção é mais complexa que de outras áreas,
quando se trata de gerir o trabalho das pessoas em busca de qualidade na
execução.
Na área de Produção, por exemplo, um modelo por “Aspiração de
Recompensas” e “Receio de Consequências” pode produzir bons
resultados, já na Manutenção, essa abordagem não é suficiente para
garantir a qualidade dos serviços.
Problemas eventualmente criados por uma má manutenção
produzem, muita das vezes, “Efeitos Retardados”, e, em grande parte delas,
sem que se consiga estabelecer a exata origem dos eventos. Assim, pode
uma má manutenção não ser identificada por não ter gerado de imediato
o “efeito ruim”, e, quando ocorre, não se consegue estabelecer a relação
de causa-efeito. Assim, medidas para coibir reincidências não acontecem.
Por exemplo:
- Um rolamento lubrificado a graxa, em uma das rotinas de lubrificação
a cada 3 meses, a lubrificação não foi feita, por algum motivo, embora
tenha sido lançada como realizada.
O equipamento continua operando, pois continua com o lubrificante
que lá estava, já em início de deterioração.
Em função de deficiência de lubricidade, um pequeno pitting se forma
na pista do rolamento.
Passados 3 meses uma nova lubrificação é feita.
Passado mais 1 mês, o rolamento inicia ruído e tem de ser substituído.
Ora o pitting pode ocorrer em rolamentos naturalmente, sem que seja
por deficiência de lubrificação. Então, como se pode, por essa falha, induzir
que a lubrificação não foi feita?
E, vários outros casos semelhantes ou diversos desse podem ser
apresentados, como, por exemplo, uma situação em que determinada
melhoria, que reduziria falhas, poderia ter sido introduzida em um
equipamento, se o engenheiro da área tivesse um conhecimento técnico,
que é disponível nas literaturas, mas o mesmo não se dedicou a pesquisar
e aprender. Quem vai saber que existia a informação disponível, se fosse
procurada?
Mas, enfim, não vamos estender o artigo com exemplos.
Um aspecto sobre “Pessoas”.
As pessoas, no caso, os profissionais da Manutenção, executam suas
diversas tarefas por Motivação.
Essa Motivação pode ser criada pelo prazer, pela necessidade, pela
necessidade e prazer combinados, e, também é afetada pela preferência,
ou seja, aquela que oferece mais prazer ou melhor atende à necessidade.
Como necessidade podemos entender, por exemplo, a “necessidade do
emprego”.
Assim, o profissional melhor irá se dedicar à sua tarefa ou função, em
proporção à sua motivação.
Por exemplo:
- Um técnico de execução da manutenção, se gostar da sua
especialidade, seja mecânica ou elétrica, ou outra, e, percebe que sua
função, face ao conhecimento técnico exigido, é valorizada de forma tal
que, se buscar na mesma seu desenvolvimento, melhor irá atender suas
necessidades, será dedicado a ser o melhor no que faz. Em suas horas
disponíveis irá procurar sempre se aprimorar no Conhecimento Técnico.
- Um engenheiro que atua na parte técnica, recém formado, mesmo
que goste dessa parte, se perceber que a parte técnica não é valorizada na
empresa, poderá não se aprofundar em estudos, que lhe levariam a ser um
excelente engenheiro e solucionar inúmeros problemas técnicos, para se
dedicar a fazer cursos de gestão, desempenhando sua função técnica
aquém do que poderia, caso se aprofundasse em estudar as questões
técnicas.
Em resumo, o valor que o profissional percebe ter, para ele, a sua
função, é que determinará seu empenho em executa-la sempre melhor.

A Cultura do Conhecimento Técnico na Manutenção.


Os aspectos que salientamos na introdução, o fizemos para reforçar a
importância da “Cultura do Conhecimento Técnico na Manutenção”.
Para que a empresa garanta a qualidade da Manutenção, além de
treinamentos e boas práticas de Gestão terá de criar em sua equipe a
“Cultura do Conhecimento Técnico na Manutenção”, ou seja, o sentimento
natural e moral dos profissionais em querer aprimorar e executar bem suas
funções técnicas, pela plena consciência de sua importância, e, obviamente,
com responsabilidade, visando sempre os interesses da empresa.
Da mesma forma que ao longo dos anos, as empresas desenvolveram
em seus funcionários a Cultura pela Segurança e a Cultura pela Preservação
Ambiental, deverá desenvolver a “Cultura do Conhecimento Técnico na
Manutenção”. O que deverá efetuar através de valorizar, incentivar e dar
exemplos, que demonstrem estar a empresa, efetivamente, considerando
o Conhecimento Técnico um de seus valores fundamentais.
A “Cultura do Conhecimento Técnico na Manutenção”, não somente
leva à aplicação correta do Conhecimento Técnico, mas, agrega
conhecimentos aumentando esse precioso Know how, e, traz como efeito
uma surpreendente redução de falhas e uma natural redução de custos.
No caso particular da redução de custos, não tem sido raro se observar
na Manutenção um fluxo inverso do que deveria ser, ou seja, a alta direção
determina a redução de custos, e a Manutenção se perde em busca dessa
meta, por não saber como fazer, trazendo muitas das vezes consequências
danosas aos ativos, que ficam sem algumas manutenções necessárias,
sendo que o Conhecimento Técnico da Manutenção é que deveria propiciar
aos profissionais da Manutenção elaborarem proposições de alternativas
de redução de custo factíveis e que não representem uma inaceitável
disponibilidade dos Ativos para o próximo período.

O que é o Conhecimento Técnico da Manutenção.


Necessário se faz estabelecer alguns conceitos novos, para reconstruir
o entendimento do que é de fato o Conhecimento Técnico, que produz
resultados na Manutenção.

Usualmente, quando se fala em Conhecimento Técnico em


Manutenção, se entende como o conhecimento que um indivíduo possui
para executar uma tarefa, ou o conhecimento que um indivíduo tem sobre
um determinado assunto técnico, normalmente adquirido através de
treinamentos. No entanto o conhecimento técnico útil para a empresa é
muito mais complexo que apenas esse conhecimento individual. Vamos
denomina-lo por “Conhecimento Técnico da Manutenção”.
A figura do diagrama abaixo ilustra a aplicação do Conhecimento
Técnico da Manutenção.

Um aspecto interessante para reflexão é que usualmente, quando se


pensa em Conhecimento Técnico, se pensa nos treinamentos, que são
aqueles sobre os equipamentos ou sobre as técnicas, que são ministrados
por fontes externas ou instrutores internos. E, raramente se pensa nos
treinamentos sobre a aprendizagem com os problemas vividos, e, que são
absolutamente efetivos para os resultados. Isso tem uma relação direta
com uma “Cultura do Conhecimento Técnico na Manutenção”, que
naturalmente promoveria essa atualização do conhecimento.

O “Conhecimento Técnico da Manutenção”, que se deve buscar em


uma empresa é, na verdade, a interação dos seguintes conhecimentos e
habilidades:
Habilidade Analítica:

Representa a capacidade da pessoa em estabelecer relações lógicas,


descobrir o funcionamento das coisas, prever efeitos, selecionar
probabilidades, enfim, habilidade em resolver e prevenir problemas. Essa
habilidade é fortemente ensinada e desenvolvida nos cursos de Engenharia,
seja através das matérias técnicas, seja por qualquer outra matéria que
demande solução de diversos problemas de maior complexidade.

Entendimento conceitual do funcionamento de equipamentos,


sistemas e mecanismos:

Esse é um tipo de conhecimento melhor ensinado nos cursos de


engenharia, e, superficialmente em alguns cursos técnicos.

Conhecimento de variedades construtivas de sistemas e


equipamentos, e, suas peculiaridades de desgaste:

Esse conhecimento é parcialmente ensinado nos cursos de engenharia


(A parte construtiva), um pouco menos nos cursos técnicos, e sua aquisição
se faz por oportunidades nas empresas da realização de uma análise crítica
de causa e efeito, pesquisas junto a fornecedores, e, estudos de literaturas
e artigos diversos.

Esse conhecimento através de pesquisas e estudos é, em geral, melhor


conduzido por um profissional de engenharia do que por um profissional de
curso técnico.

Conhecimento de Técnicas e Recursos de Execução de Manutenção:

Esse conhecimento é abordado de forma muito superficial em cursos


de engenharia, sendo mais bem abordado em Cursos Técnicos e SENAI.
Contudo a abordagem, tanto nos cursos técnicos, quanto nos cursos do
SENAI, são extremamente insuficientes para atendimento às necessidades
da empresa. Cabe aqui comentar que tanto nossos Cursos Técnicos quanto
os cursos do SENAI, não possuem, atualmente, para o ensino da
Manutenção, a mesma eficiência que possuem para outros ensinos. Na
categoria de Mecânica, por exemplo, o ensino de Fabricação por Processos
de Conformação de Metais é muito mais próximo da realidade das
empresas que o ensino de Manutenção. Inexiste nessas unidades de ensino,
um conhecimento e mesmo um laboratório que consiga cobrir a variedade
de equipamentos existentes na indústria. Esse conhecimento é adquirido
em sua plenitude necessária na atividade empresarial, pela experiência
(Oportunidades de aprendizagem e experimentação) e atualização
tecnológica. É um conhecimento dependente do investimento da empresa
e interesse do profissional.

Conhecimento dos procedimentos técnicos de execução de Tarefas:

É o conhecimento de como executar as atividades desde as mais


simples às mais complexas, identificar o passo a passo de cada uma e as
aferições necessárias. Isso não é ensinado nos cursos de formação do SENAI
e Cursos Técnicos, salvo situações extremamente básicas, e, muito menos
em cursos de engenharia, com algumas poucas exceções. Essa
aprendizagem se dá pela aquisição do conhecimento na empresa, seja por
repasse de informações corretas (Que nem sempre o são), por manuais de
fabricantes, fornecedores, ou por literaturas técnicas. Além disso, é
necessária a adequada crítica e adaptação das informações técnicas obtidas
às condições específicas das instalações. Esse é um conhecimento
altamente dependente da dedicação e interesse da gerência e dos
profissionais.

Habilidade na execução das Tarefas de Manutenção:

Os Cursos Técnicos e de SENAI, não possuem um laboratório que


permita simular as tarefas de manutenção necessárias em uma empresa, se
limitando a tarefas muito básicas. A habilidade é adquirida durante a
vivência do profissional na empresa, em função das oportunidades de
execução das tarefas. Depende, portanto do interesse do profissional e da
gerência, para a formação e controle desse conhecimento.
A “Cultura do Conhecimento Técnico na Manutenção” como
fator de garantia de eficácia na interação dos diversos
conhecimentos.

Imaginemos uma estrutura organizacional da Manutenção, como na


figura abaixo, que representa a maioria das situações, seja essa estrutura
formal ou informal.

Quando falamos dos diversos conhecimentos e habilidades, assim


como no diagrama apresentado da aplicação do Conhecimento Técnico na
Manutenção, percebe-se que existem aqueles conhecimentos mais afeitos
a engenheiros e aqueles mais afeitos a técnicos.

E, pela estrutura organizacional apresentada, vemos que existem


diferentes funções para os engenheiros e para os técnicos, e, cada uma tem
sua desejada combinação dos conhecimentos apresentados, sendo que
algumas demandam mais de um determinado tipo de conhecimento e
outras de outro.

E, para que o processo de Manutenção se desenvolva


adequadamente, as diversas funções apresentadas necessitam se
relacionar tecnicamente.
Essa interação de Conhecimentos Técnicos entre as diversas funções,
somente ocorre de forma produtiva e confiável se houver intersecção de
conhecimentos, ou seja, se existirem conhecimentos que sejam, comuns às
duas funções, que irão interagir, para, assim, promover o entendimento por
ambas as partes.

Na figura ilustramos, apenas hipoteticamente a intersecção dos


conhecimentos.

Se dessa forma não o for, haverá prejuízos, como podemos ver por
simples exemplos abaixo:

- Um engenheiro de Manutenção vai estabelecer a Estratégia de


Manutenção de determinado equipamento. O engenheiro ainda não
conhece esse equipamento. Sabe qual a função do mesmo, tem uma noção
conceitual de seu funcionamento, mas não sabe dos detalhes internos,
sobre como os diversos Mecanismos de Falha se desenvolvem, não conhece
sobre as técnicas de preditiva, nem mesmo de como se executam algumas
outras tarefas importantes.

Se esse engenheiro não se dedicar a estudar e aprender sobre esses


conhecimentos, terá de busca-los junto a um técnico de execução da
manutenção. E, para adquirir esses conhecimentos específicos, necessita
de um bom conhecimento técnico de embasamento.

Daí alguns aspectos dificultam a eficaz aplicação do Conhecimento


Técnico na Estratégia de Manutenção, por exemplo: Um ocorre se o
engenheiro, simplesmente considerar como verdadeiro o que o técnico diz,
por não ter conhecimento algum, o que impede ao engenheiro de aplicar
sua habilidade analítica crítica para detectar pontos incorretos, que
porventura existam no entendimento do técnico. Isso conduz a uma
Estratégia de Manutenção ineficaz. Outro seria o caso do engenheiro tentar
buscar do técnico uma aula sobre o que ele não sabe, o que gera tempo
excessivo, comparado ao tempo que seria necessário, caso ele tivesse uma
base de conhecimento.

O engenheiro de Manutenção deve possuir um volume de


conhecimento do equipamento e das técnicas, que lhe propicie fazer
consultas objetivas ao técnico sobre particularidades, que somente o
técnico possui, pela sua experiência e alguns treinamentos específicos
sobre o equipamento. A partir daí ele elabora a Estratégia de Manutenção
associando os conhecimentos do técnico com os seus e com outras
variáveis, que um engenheiro administra com mais naturalidade que um
técnico.

- O Técnico de execução, necessita conhecer de conceitos que estão


por trás de algumas determinações, para que possa nelas crer e executa-
las, sem ceder à tentação de simplificar, pensando que é um exagero. Por
exemplo, considere que os fixadores dos mancais de um motor de
combustão possuem uma recomendação de não reaproveitamento. No
momento da substituição, dos mancais, não se tem todos os fixadores
novos, e, o técnico observando estar o fixador visualmente íntegro, e, por
ter experiência em outras máquinas do reaproveitamento sem problemas
decide reaproveitar. Esse técnico, se tivesse estudado, ou pesquisado, ou
recebido um treinamento sobre torque de fixadores, mais aprofundado do
que aprendeu na escola, saberia que alguns fixadores são sujeitos a torque
chamado TTY (Torque to yeld), que é um torque que vai no limite de
escoamento do material, diferentemente dos fixadores normais que
usualmente são levados a 60-70% do limite de escoamento, e, esses
fixadores não são reaproveitados, por risco de não mais garantirem a
fixação.

No caso, a falta de um conhecimento mais esclarecedor de uma tarefa


que o mesmo executa, termina por introduzir uma falha potencial.

- Um engenheiro de Manutenção quando for efetuar uma Análise de


Falhas de um determinado equipamento, necessita conhecer como o
mesmo funciona, e, também quais são as manutenções e as técnicas
aplicadas, conhecimento que é de domínio usual do técnico. Sem esse
conhecimento o engenheiro não poderá analisar uma das possíveis causas,
que seria um erro de Manutenção. Obviamente o engenheiro não precisa
conhecer de todos os equipamentos, mas das manutenções básicas e das
técnicas que são usadas, em um nível que lhe permita aprender o que é
necessário no caso específico, e, assim, conversar com o executante, para
compreender e julgar o que foi feito.

- Da mesma forma, um gerente ou um supervisor de Manutenção, sem


conhecimentos técnicos básicos, que lhe permita aprofundar em um
assunto técnico, gera dificuldade em avaliar o desempenho dos técnicos,
assim como em avaliar a gravidade de problemas que os mesmos lhe
relatam. Se aqueles que ocupam cargo de comando se despreocuparem da
parte técnica, terminam por serem guiados pelos subordinados, devido ao
desconhecimento e insegurança para tomar decisões técnicas.

Enfim, qualquer uma dessas indesejadas situações, dentre muitas


outras, são decorrência da ausência de uma “Cultura do Conhecimento
Técnico na Manutenção”, que, em existindo, eleva a importância do
conhecimento técnico a todos os níveis e funções da Manutenção.

Concluindo.

Podemos afirmar que por mais atual que seja um modelo de gestão de
Manutenção de uma empresa, por mais que se busque motivar as pessoas,
(Quer seja por prêmios ou pela expectativa das consequências), sem o
“Conhecimento Técnico” e a “Cultura do Conhecimento Técnico na
Manutenção”, que promove a existência do primeiro de forma eficaz, a
empresa se verá envolvida em um volume enorme de controles e sub
controles, itens de controle, itens de verificação, cobranças, relatórios,
reuniões, reincidência de falhas, e uma dedicação de Hh anormal nas
atividades da Manutenção.

José Augusto Alvim – Consultor de Manutenção

Jose.alvim@decomconsultoria.com.br

(31)99450-2303

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