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CONTEÚDO

Piquenique em Asgard. Escrito por: Jenny T. Colgan.

TRADUÇÃO POR: Marcela Gonçalves.

Mentes Suspeitas. Escrito por: Jacqueline Rayner.

TRADUÇÃO POR: Mariana Gonçalves.

Uma Aposta com o Tempo. Escrito por: Steve Lyons.

TRADUÇÃO POR: Luisa Duarte de Medeiros Machowski.

Morte em Nova Veneza. Escrito por: Guy Adams.

TRADUÇÃO POR: Vinícius Rodrigues Vianna.

Rios do Tempo. Escrito por: Andrew Lane.

TRADUÇÃO POR: Enio Junior.

PIQUENIQUE EM ASGARD.
Jenny T. Colgan.
Segunda-feira, 5 de maio de 5147.

Stormcage.

"Oi" foi a primeira coisa que eu escultei.

Isso foi um bom sinal. Definitivamente era um bom pressagio. Arrisquei


abrir uma pálpebra.

"O que diabos você pensa que está fazendo?"

Tentando não vomitar teria sido a resposta mais honesta.

Era o Saltador Temporal* (um tipo de manipulador de vórtex). Trocado com


Frodene nos chuveiros por noventa e cinco ratinhos de açúcar que tinham
inexplicavelmente e anonimamente chegado 4.600 anos após sua data de
validade; e uma sagrada relíquia protetora, incrivelmente rara que o Padre
Octavian me enviou anos atrás, com uma carta onde ele implorava que eu
guardasse sempre perto em minha busca pelo verdadeiro arrependimento.

Frodene gosta do brilho em sua calda.

O Saltador não consegue fazer você passar do campo de força Tesla, claro,
mas

- se você estiver feliz em ficar em um só lugar - funciona


surpreendentemente bem. Aqui estava eu, ainda na minha cela,
geograficamente perfeita; no mesmo dia que ela estava sendo construída. As
barras ainda nem tinham sido instaladas.

"De onde você surgiu?"

Notei que a voz surpresa do trabalhador soou um pouco abafada, então


percebi para a minha irritação que eu não conseguia respirar. Eles ainda não
tinham oxigenado a área. Irritante.
"Desculpe, preciso ir!" eu disse com uma voz ligeiramente estrangulada,
passando rapidamente por cima de suas ferramentas parando apenas para
pegar seu cartão de acesso e o suprimento de oxigênio.

Eu tenho quase cem por cento de certeza...talvez setenta e nove por cento de
certeza...que um de seus colegas vai chegar com um suprimento de oxigênio
reserva a tempo.

E depois disso nós dois precisaríamos de um dia de folga.

Asgard

Ele estava esperando, braços cruzados, encostado na TARDIS, fingindo que


não estava inquieto. Ele odeia esperar. Se ele não chegasse em cima da hora,
não valia a pena.

"Vamos lá" ele disse. "Já está aberto! Nós estamos perdendo!"

"Olá Docinho."

"Eu achei," ele disse descruzando os braços, "que você só chamava as


pessoas desse jeito quando não conseguia lembrar seus nomes."

"Não é verdade," respondi me livrando do capacete roubado. "Eu falo


também se eu não consigo lembrar o gênero deles. De qualquer forma, eu
tive que parar no mercado."

Ele olhou duvidosamente para a cesta que eu trouxe. "O que vamos comer?"

"Pare de ser exigente."

"Eu só quero..."

"Não," eu disse com firmeza. "Se você escolheu o local, eu escolho a


comida. E, por falar nisso, a localização é absurda!"

Ele se virou alegremente, os vastos portões dourados espalhados diante de


nós, brilhando no sol da manhã. "Não é?!"
ASGARD™. Um parque temático do tamanho de um planeta. É absurdo.
Muito mais do que absurdo. "Uma celebração de todas as coisas lendárias."
O céu era de um rosa ondulante, sempre com um raio de sol
estrategicamente posicionado; você podia participar de um grande funeral de
fogo, se juntar ao passeio no navio Beating Tunnel de 10,000 tambores; ou
voar em águias mecânicas através de emocionantes quedas rochosas. Eles
têm uma cachoeira de 5,000 metros com um hotel construído na caverna
logo atrás, que é inteiramente iluminado por prismas naturais.

"Esse lugar é tão cafona," eu disse enquanto nos encaminhávamos através


dos grandes e brilhantes portões em direção a Ponte de Arco-íris, com
milhares de outros turistas de aparência animada; crianças borbulhando de
emoção, usando seus capacetes alados, lançando seus martelos e então sendo
repreendidas por isso.

"Não irrite os Deuses!"

"Você vai se comportar assim o dia todo?"

Eu o cutuquei para olhar a família que estava perto. Eles eram Pharax. Azul,
claramente. Três pais, e um grupo de crianças em vários estágios, incluindo
um quase que totalmente crescido, e obviamente um adolescente. Suas
roupas

eram inadequadas e caídas, e ele se curvava tanto quanto seu exoesqueleto


permitia.

A expressão do rapaz mostrava claramente o quão irritado ele estava por ter
sido arrastado até aqui, mesmo com seus irmãos mais novos saltando e
pulando alegremente em volta de seus pés, apontando para coisas que eles
queriam comprar mais tarde. Ele continuava mexendo em um dispositivo
eletrônico que um de seus pais lhe dizia para guardar e ele faria uma
carranca e o guardaria com relutância.

"Adolescentes são iguais em todas as galáxias", eu disse.

"Eu sei" disse o Doutor sorrindo. "Brilhante."


Então houve uma pequena pausa. E eu disse a mim mesma que não ia falar
sobre isso agora.

"Certamente, senhor. Madame." o atendente na cabine estava dizendo,


enquanto o Doutor balançava seu papel psíquico. "É uma grande honra tê-los
aqui hoje. Deixe-me ter certeza que vocês terão passes VIP para tudo.
Coloca vocês na frente em todos os brinquedos.

"Oh," disse que Doutor, parecendo ferido. "Não, nós nunca furaríamos uma
fila."

"Doutor! Eu não vou esperar por horas para entrar nos brinquedos. Pegue os
ingressos!"

"Mas não é justo!" ele disse.

O atendente estava começando a ficar desconfiado, sempre foi um dos


efeitos do papel psíquico.

"Só pegue!" eu disse.

"E seus capacetes alados de cortesia!" ofereceu o atendente.

"Não obrigado," eu disse, exatamente no mesmo segundo em que o Doutor


disse, "Legal"

Então nos juntamos as hordas de excursionistas que corriam para a Ponte de


Arco-íris.

"Mas eu não vou furar filas." disse ele revoltado.

"Eu sei," eu disse. "Foi por isso que eu trouxe um livro."

Mas mesmo assim, você teria que ser muito bem grosseira do que eu - e ter
passado muito menos tempo encarando as paredes de tijolos - para não se
impressionar com a Ponte de Arco-íris.

Essa área do parque sempre foi de um deslumbrante amanhecer, dourado e


rosa, com o sol esquentando seus ombros; uma orquestra de 5.000 peças
tocava para você grandes ondas de música. Você podia vislumbrar a
cachoeira sem fim à distância, o rio abaixo era grande, profundo e claro,
parecia a coisa mais fria, deliciosa e refrescante de todas, como raios de sol
liquido. (Eles tinham garrafas disso sendo vendidas em barracas, então você
poderia descobrir se era isso mesmo, por um preço exorbitante.) Mas mesmo
assim, realmente parecia que você estava deixando um mundo diferente para
trás, e eu sorri, me sentindo animada.

"Eu não vou na mineração," eu o avisei.

"Vamos lá! Se junte à 5,000 trolls cavando ouro e diamantes nos tuneis de
uma montanha a meros águias de distância!" O Doutor leu do mapa. "O que
não parece divertido nisso?"

"Você deve estar se esquecendo que eu por pouco evitei as minas de trabalho
pesado..." eu comece a falar, mas ele já tinha saído dali. Eu olhei em volta. É

melhor ele não estar procurando por confusão. Esse não é o dia para isso.
Além disso eu preciso falar com ele sobre...

Eu o avistei do lado das pedras na ponte, ajoelhado na frente de uma criança


humanoide bem pequena, que estava chorando inconsolavelmente.

"Está tudo bem," ele estava dizendo. "Você não está perdido. Bom, não por
muito tempo. Ninguém pode ficar perdido por muito tempo. Não quando eu
estou por perto. Aqui, olhe isso."

Ele tirou sua Chave de Fenda Sônica e fez ela disparar pequenos fogos de
artifício no ar. Eu tinha achado um desperdício de espaço quando ele fez a
modificação, o que mostra o quanto eu entendo dessas coisas.

Os olhos da criança se arregalaram e ele estendeu sua pequena mão


pegajosa.

"Eu sei, é o meu favorito também," disse o Doutor. "Mas não toque. Qual o
nome da sua mãe? Você sabe?"

"Mamãe," disse a criança.


"Sim," disse o Doutor. "Bom começo. Você tem mais alguma coisa para
completar?"

"Eu quero a mamãe!"

"Deixe-me programar isso aqui para obter um traço de DNA"

A criança agarrou a Chave de Fenda Sônica com força e se recusou a soltar.

"O negócio é o seguinte, se você devolver pra mim eu vou poder encontrar
sua mamãe."

"Encontre a mamãe!" ordenou a criança. "Mostra as luzes, as luzes!

“Deixe-me apenas..." disse o Doutor desligando os fogos de artificio.

"BUAAAAA!!!" A criança gritou como se quisesse acordar os mortos.

De repente, uma pessoa imensa e desajeitada se aproximou e agarrou a


criança pela mão.

"Mure! Ai está você! Ei! O que diabos você pensa que está fazendo?"

Eu estava escultando muito isso hoje.

"Bem, seu filho estava perdido, eu estava..."

"Ele não estava perdido!"

"Mas eu estava..."

"EU QUERIA AS LUZES MAMAÃE!!!"

"De a ele as luzes então."

"Mas eu estava..."

"DÊ!"

"Se comporte..." disse o Doutor fracamente.


Eu dei um passo à frente. "Com licença," com um tom de voz que eu sei, é
capaz de obter excelentes resultados. "Vocês estavam planejando se juntar ao
ritual da pira funerária mais tarde? Porque se vocês não forem, eu ficaria
muito feliz em facilitar sua participação."

"River," disse o Doutor.

A mulher olhou para mim, me avaliando.

Eu dei um grande sorriso e puxei meu casaco para ela poder ter um rápido
vislumbre na minha tatuagem da prisão. (É temporária: Eu precisava ganhar
a confiança de Frodene. Bem, eu espero que seja temporária.) A mulher
parou e recuou. "Da pra ver quem dos dois usa as calças," ela cuspiu,
andando para longe. "Vamos, Mure."

"O que tem de errado com suar calças?" perguntou o Doutor, intrigado. Ele
disse adeus para a criança, que estava sendo arrastada com brutalidade, com
grandes poças de muco se acumulando em seu lábio superior.

"Quer luzes" o menino soluçou tristemente, olhando por cima do ombro,


enquanto sua mãe o sacudia com força, e então enfiou alguns doces em sua
boca.

Eu me perguntei. Agora? Devo fazer agora? Eu não conseguia parar de


pensar nisso. Esse seria o momento, eu sei. Para pedir pra ele. Pedi ao
Doutor conselhos sobre a minha vida pessoal. Caramba, eu já tive ideias
melhores.

A questão é que, normalmente eu adoro faze-lo rir quando eu faço coisas que
ele não faria. Mas eu nunca sou tão corajosa quanto eu finjo ser, e, na
verdade,

eu tenho uma teoria de que ele é, absolutamente, a única criatura no universo


que é tão corajoso.

Apesar de tudo: eu não conseguia suportar a ideia dele rindo de mim.

Eu não podia suportar. Afinal de contas, com a minha infância...imagine, eu.


A ideia de criar uma criança. Absurda. Quem deixaria uma criança com
alguém tão perigosa quanto eu? Como eu teria a menor ideia do que fazer:
eu que não sei absolutamente nada sobre maternidade. Como eu colocaria
uma criança na cama?

E se ele achou que eu estava pedindo? Isso seria ridículo. Completamente


estupido.

Afinal de contas, que tipo de pai ele daria? Ele vive no momento, apenas no
agora. É isso o que crianças fazem, não o que elas precisam. Elas precisam
de um tédio, total e repetitivo, dia após dia após dia, a vida é sempre a
mesma; uma grande rede de tédio: de um amor entediante e tabuadas e
legumes. Nada que nós pudéssemos fornecer.

Mas se não agora, quando? Porque eu não estou ficando mais nova.

Mas ele está.

Não que eu pense muito nisso.

"Ei!" eu disse, quando algo pousou no meu cabelo.

"Você parece distraída!"

"Isso não é uma razão para colocar um capacete em mim!"

"Relaxa, Brunilda1!" disse o Doutor. "Tinha uma garota..."

"Sabe os Vikings não usavam chifres em seus capacetes."

"Os míticos usavam," disse ele, andando, e então o momento se foi.

A praça principal de Asgard™ fervilhava; em todos os lugares haviam


edifícios de enxaimel2; uma forja que ainda funcionava - e era enorme -
onde você conseguia comprar armas moldadas ou joias; havia padarias
vendendo bolos de mel e obviamente barracas de Hidromel em todos os
lugares. O Doutor não conseguia ficar parado, andando de um lado para o
outro da praça, respondendo alegres "Olás" para as sorridentes pessoas que
obviamente estavam sendo pagas para dizer Olá, para ele era tudo a mesma
coisa.
"Começando rapidamente no Anfiteatro em Valhalla: os temíveis dragões de
guerra de Thor," veio um estrondo pelo auto falante. As multidões
começaram a se mover naquela direção.

1 Personagem Nórdica, cujo nome significa: Armada para Batalha.

2 Técnica de construção antiga.

"Oooh," disse o Doutor, olhando para mim com alguma expectativa.

"Como você pode querer assistir a um show de monstros animatrônicos


falsos?"

eu disse sem conseguir acreditar.

"Você está de brincadeira? Em algum lugar existem pessoas gritando com


um monstro e eu não tenho nada a ver com isso? Incrível! Gritem! Eu vou
colocar meus pés no assento da frente. A menos que eles me digam que eu
não posso."

E ele continuou, exuberantemente. Eu não diria isso a ele nem em um


milhão de anos, mas o capacete combinou com ele.

O vasto anfiteatro estava lotado com pessoas de toda a galáxia. Mas eu não
conseguia descobrir o que era a coisa estranha que eu estava sentindo; e
então eu percebi. Era normalidade. Ir a um parque temático. Por diversão.
Com alguém que você se importa. Sendo basicamente extorquidos pelo
Hidromel. Eu estava gostando de tudo isso.

Fomos conduzidos a assentos VIPs na frente e no centro de tudo.

"Os VIPs são uma merda!" gritou alguém atras de nós, ambos estávamos
envergonhados e concordamos. Eu olhei em volta. Era o adolescente mal-
humorado de antes. Um de seus TriPais estava tentando adverti-lo.

Eu o ouvi falando:" Se odeia isso tanto assim, você está mais do que
convidado a conseguir um trabalho, Tomith."
"Sim, e acabar como você?” o adolescente falou e enterrou a cara de volta no
dispositivo ignorando completamente o que estava acontecendo na frente
dele.

O que foi uma pena, devo admitir, eu já vi alguns pontos turísticos, mas o
show do Dragão de Asgard era o mais espetacular.

Primeiro a orquestra tocava sua música mais emocionante - e se você nunca


escultou 3,000 violinos tocando em harmonia, eu recomendo - e então,
devido a alguns ajustes atmosféricos inteligentes, o sol de repente se pôs
acima de nossas cabeças, brilhando em milhões de luzes com tons de rosa e
roxo.

Quando estrelas surgiram acima de nós, milhares e milhares de pequenas


velas se acenderam, até que o anfiteatro se transformou em um cintilante
reino das fadas e o "ual" coletivo pudesse ser ouvido da multidão.

Eu percebi que estávamos segurando as mãos, mas não estávamos correndo.

Um homem brandindo uma espada enorme correu até o meio do anfiteatro.


ele parecia minúsculo lá. Então atras dele vieram muito mais homens;
enquanto os tambores da orquestra tocavam, um exército inteiro surgiu,
estandartes erguidos, marchando em perfeito uníssono com a música; era
estranhamente emocionante, enquanto milhares deles se alinhavam, exibindo
suas habilidades.

Então a música mudou, e muitas mulheres apareceram, com tranças longas e


lindas vestimentas bordadas, e a arena inteira explodiu em uma dança de
guerra de vitória ao redor das fogueiras que surgiram repentinamente.

No momento em que estávamos embalados pela exibição, uma pessoa,


vestida com peles, caiu no chão. Ele poderia ter sido um intruso, exceto por
sua espada, e ele gritava alto sobre dragões, dragões vindos nessa direção,
nesse momento os atores pararam de dançar e formaram uma fila enorme;
eles tiraram suas armas que pareciam formar enormes linhas de chamas sob
suas cabeças, e a música mudou para algo sinistro e assustador.

Houve uma longa pausa e então um grande barulho, como se um enorme pé


de metal tivesse batido no chão.
"Ohhh!" disse o Doutor. "O que é isso?"

Então houve outro barulho, depois outro e depois outro próximo a entrada. A
equipe de artistas se encolheu, o público também. Foi quando aconteceu uma
explosão de chamas, todos saltaram. Foi algo imenso; podíamos sentir o
calor de onde estávamos.

"Whoa!" disse o Doutor.

E então BOOM, você podia ver, entrando na arena, uma garra de metal
enorme.

O chão tremeu. De novo e de novo; O Doutor me segurava com a emoção.


Em seguida uma enorme nuvem de fumaça tomou a arena e quando ela se
dissipou a criatura estava lá, tinha pelo menos quatro metros de altura; um
verdadeiro monstro de metal em forma de dragão, com enormes olhos
vermelhos brilhantes.

Ele abriu suas mandíbulas afiadas em direção ao céu, então um rugido


estrondoso, e chamas irromperam. A criatura se movia pelo chão do estádio,
fazendo com que os artistas se encolhessem de terror; ocasionalmente se
aproximando de um dos bancos da audiência. Em um ponto ele agarrou e
tirou o chapéu de alguém, recebendo muitos aplausos.

Então o clima mudou novamente; as pessoas no palco se encolheram, e em


uma outro nuvem de fumaça na entrada, um homem apareceu - um homem
enorme, cabelos e barba loira, incrivelmente musculoso (alguns podem
dizer), vestindo uma armadura e uma tanga, com um martelo quase do meu
tamanho, marchou até a arena e foi ovacionado pelo público.

"Porque isso nunca acontece comigo?" disse a voz a minha esquerda.

"sssh" eu disse. "Agora está ficando interessante. Ele está todo oleoso."

"Dragão poderoso e feroz!" Gritou Thor, sua voz sendo amplificada por toda
arena. "Enfrente-me em combate!"

O dragão se virou, piscou seus olhos vermelhos, fumaça saiu de suas narinas
gigantes. Com um rugido ele se preparou para atacar. Thor se manteve firme.
Parecia uma luta ridiculamente desigual, enquanto o dragão encurralava o
homem em um canto, Thor girava sua arma poderosamente, faíscas verdes
caíram nas primeiras fileiras. Ele girou o martelo e com algumas pirotecnias
desnecessárias acertou a cabeça do dragão, que cambaleou para traz, e então
se ergueu para ir em sua direção novamente. Agora, Thor fez um
movimento; girando e girando; aparentemente parecendo encurralado, então
ele rolou para

baixo da criatura; temporariamente perdendo sua espada, então ele decepou


uma das garras e lutou com a própria unha da criatura, etc. Era tudo muito
emocionante; o dragão desviou, não tão perigosamente perto da plateia; e no
último momento, as chamas quase que não conseguiram alcançá-lo,
enquanto isso o público gritava.

Thor estava se preparando para atacar; o público estava em frenesi. O dragão


tinha escapado da morte por várias vezes e a multidão estava pronta para o
golpe final. Ele então avançou lentamente até a besta animatrônica.

E então, algo estranho aconteceu. A calda do dragão passou pela barreira e


derrubou uma fileira inteira de assentos. E então ouviu-se um grande grito. A
criatura enorme oscilou e se balançou como se fosse tombar, o pânico tomou
a plateia nas arquibancadas. Nós ficamos observando de perto, não sabíamos
se aquilo fazia parte do teatro; talvez aquela parte da plateia fosse contratada
para fazer a experiência ser mais intensa. Então o Doutor agarrou meu braço.

"Olha" ele disse.

O dragão estava girado, seus membros robóticos estavam por todo o lugar, e
tinha acidentalmente pegado alguém da plateia. Era uma criança; a mesma
criança que tínhamos encontrado antes, vagando livremente sem os pais.

Claramente tinha acontecido de novo, e dessa vez estava indo por um


caminho muito perigoso. O dragão cambaleou segurando a criança - que
parecia ainda menor em suas garras - enquanto o público gritava.

"Rápido..." eu disse, mas é claro que o Doutor já não estava lá.

Devia ter uma sala de controle em algum lugar, porque o dragão cambaleou
para a esquerda e depois para a direita como se estivesse lutando para se
controlar.

E quando as pessoas começaram a se amontoar perigosamente em direção a


saída, e os atores desapareceram, eu vi uma figura esguia e solitária no chão
do anfiteatro, agitando os braços.

A criatura era um robô, claro, não pensava por si só, mas respondia ao
movimento e ao barulho. Eu desci os degraus em direção ao palco e pulei as
barreiras. A segurança também havia desaparecido, o que foi um pouco
decepcionante. Talvez todo o sorriso os tivesse cansado.

O doutor estava tentando chegar perto, mas toda vez que ele se aproximava,
o dragão abaixava a cabeça e fazia um barulho, que ele estava programado a
fazer para o Thor, que eu tinha percebido, agora estava em uma das entradas
laterais pressionado contra a parede, apavorado. Ele deixou seu martelo no
meio do palco.

"Vou distrai-lo" gritei, esperando que o martelo tivesse algum efeito no robô,
o que aconteceu. Eu não conseguia levanta-lo, mas conseguia balança-lo de
um lado para outro. O robô então virou a cabeça para na minha direção.

"De a ele um daqueles seus olhares," disse o Doutor, enquanto ele corria e
tentava agarra-lo pela cauda, que chicoteava furiosamente.

A criança estava gritando, mas parecia estar sendo segurada com segurança.

Eu não tinha esperança de conseguir alcançar lá, e queria ainda ter meu laço
de confiança. Em vez disso, olhei ao redor. Haviam pedras no chão,
cercando a fogueira. Eu peguei e tentei descobrir onde jogar para não atingir
a criança. Eu mirei no joelho, o que pareceu funcionar; a criatura começou a
se desiquilibrar.

"Mais uma vez!" gritou o Doutor.

Eu arremessei e a grande calda se abaixou, e foi tempo o suficiente para que


o Doutor pudesse se agarrar nela. Ele subiu, com cuidado, enquanto eu parei
de atacar pedras - não queria que a criatura caísse com os dois ainda lá, então
eu corri por baixo, tentando descobrir qual era o melhor local para se
posicionar se eu tivesse que pegar a criança.
O Doutor estava agora se içando pela parte inferior da cauda da criatura,
então parecia que ele estava pendurado em um galho gigante.

"Socorro!" a mulher gritava.

"PEGUE MEU BEBE!"

Eu observei o Doutor e o garoto ansiosamente, a adrenalina batendo forte,


então o Doutor gritou: "Certo! Na minha marca, River, fique pronta!"

Ele soltou as duas mãos, e ficou apenas com as pernas agarradas a cauda da
criatura, então ele se jogou para trás. A criatura cambaleou, a parte que eu
danifiquei estava agora se movendo no ar - então, crack, como o barulho de
um grande interruptor sendo acionado, e a enorme criatura congelou.

Assim como todas as pessoas que estavam tentando escapar pelas saídas.

Ocorreu um silencio momentâneo, mas que não durou muito. Houve um


rangido sinistro. Eu prendi minha respiração. A grande criatura de quatro
andares se contraio, apenas um pouco. A perna que eu havia quebrado com
as pedras começou a tremer. Era como ver uma arvore sendo cortada. As
pessoas começaram a tentar fugir novamente. Nós por outro lado não
podíamos fazer nada além de ficar ali parados e observar.

Eu respirei fundo e tentei parece o mais confiante possível. Então gritei para
a criança: 'Mure! Mure! Você pode pular?"

A criança me olhou, com olhos apavorados, balançando a cabeça com força.

"Pule na minha direção," eu disse. "Vamos querido. Você consegue."

Ele balançou a cabeça em silencio.

A perna da criatura tremeu novamente. Por dentro ouvia-se um ruido como


se o metal estivesse se estilhaçando. Algo estava terrivelmente errado.

"Você precisa pular!" eu disse. "Vamos lá Mure. Você tem que pular. Apenas
pule!"
Ele balançou a cabeça novamente.

"Pule!" eu gritei desesperadamente. "Vamos! Você consegue!"

O garotinho se aproximou da borda das grandes garras da criatura.

"Isso mesmo!" eu disse. "Vamos lá! Eu sei que você é muito corajoso, e eu
vou te pegar!"

Ele avançou um pouco mais para frente e eu sorri encorajadamente.

"Vamos lá!"

Ele estava pronto, com as mãos erguidas.

De repente sua mãe estava ao meu lado.

"MURE!" Ela gritou. "Desça! Desça já!"

Isso teve o efeito oposto. A criança se encolheu imediatamente.

"AGORA!"

Ele começou a balançar a cabeça de novo. Eu olhei para a criatura. Sim, o


rangido estava ficando mais alto.

A criatura estava começando a se inclinar mais e mais. Eu estendi minhas


mãos ainda mais alto para a criança.

"Mure. Por Favor," eu disse. Era uma grande queda, e ele era uma criança
tão pequena.

"River! Use isso!"

O Doutor estava deslizando pela cauda, o que no caso teve o efeito de


desequilibrar a criatura completamente. Ao se deslizar, ele lançou sua chave
de fenda sônica no ar, que voou para mim.

Eu agarrei com minha mão esquerda e a pressionei; os fogos de artificio


começaram a dançar no ar.
"Olhe, Mure!" eu disse. "Olhe!"

E a enorme criatura começou a cair, assim que o garotinho olhou para os


fogos de artificio e gritou "Luzes!", o Doutor saltou primeiro, e Mure pulou
nos meus braços, o robô caiu no chão da arena com um estrondo que sacudiu
a terra.

Mure pulou para os braços de sua mãe; ela agarrou a criança e o sufocou
com uma mistura de abraços e beijos. O robô estava imóvel e sem vida, meia
seção de assentos completamente esmagadas de baixo dele.

"Obrigado River e Doutor, por salvarem meu bebe," disse o Doutor


incisivamente.

"De nada, educados e atenciosos pais," eu disse, tirando a poeira de cima de


mim. "Sabe, acho que eu vou deixar com você a tarefa de recuperar a chave
de fenda sônica.

Lá fora, estavam as pessoas que gritavam e corriam para as saídas. Nós


andamos através delas, procurando pelo Centro de Comando. O encontramos
atrás de outra bela vila, com seus telhados de palha e loiras pitorescas
fazendo uma dança aparentemente tradicional que envolvia muito mais pele
exposta do que alguém poderia esperar em um planeta no hemisfério norte,
mas esse é um paraíso de fantasia pós-terrestre.

Se você olhar pela parte de trás da praça da cidade, existe um grande bosque,
onde você encontra uma grande variedade de biologia; e um pequeno
caminho, sem sinalização. Olhamos um para o outro e assentimos.

O Centro de Comando era um bunker cinza bem discreto, sem janelas, e com
vários painéis de controle no telhado. Havia um teclado ao lado da porta e
quando fomos nos aproximar várias pessoas de ternos escuros marcharam
abruptamente em direção a porta, então nós simplesmente nos esgueiramos
atras deles.

Na parte de dentro, após descer um lance de escada, havia um grande


espaço; devia se estender em baixo de todo o parque. O que fazia sentido. De
fato, quando olhei em volta do enorme centro de controle subterrâneo eu vi,
entre várias telas e computadores de trabalho - e uma grande imagem 3D do
Thor sorridente dizendo "LUTE COM UM SORRISO NO ROSTO!" -
longos tuneis, que davam para todos os lados, com pequenas cabines de
viagem que se moviam em uma velocidade notável, entregando Vikings,
dançarinas, faxineiros, o pessoal do restaurante, que esperavam pelo sistema
de metro como passageiros vestidos de maneira estranha, presumivelmente
para que ninguém tivesse que assistir o Thor pegando a fila para o banheiro.
Foi uma visão e tanto.

"Quem são vocês?" disse uma voz não muito amigável. Eu olhei para cima.
A voz pertencia a uma espécie que eu não conhecia, mas parecia um pouco
com um castor. Era do tamanho de um humanoide, e se apoiava em duas
pernas semelhantes a pernas de pau, ele parecia um pouco zangado e fofo ao
mesmo tempo.

"Olá!" disse o Doutor. Estamos no tour vip! Essa parte é incrível!"

"Não, não estão" disse o castor. Uma explosão de gritos aparecia nos
monitores.

"Saia, essa é uma área restrita."

Ele dobrou suas pequenas patas, nada muito impressionante, embora sua
expressão fosse seria, assim como a arma enfiada no bolso em seu
francamente adorável macacão de castor.

"Fora!"

A comoção ficou ainda mais alta.

"Está vendo esses caras na tela?" soou uma voz de uma criatura menor e
mais cinza - mais parecida com uma toupeira, embora tivesse os mesmos
membros aumentados. "Eles salvaram uma criança na multidão! Nós
deveríamos dar-lhes um prêmio ou algo assim. Na verdade, sabe o que mais
chefe, fazer um evento que quase termina terrivelmente errado e no último
minuto da tudo certo...essa pode ser uma ideia sabe. Poderia adicionar um
certo nível de perigo para a plateia..."

Sua voz falhou quando nos viu ali em frente dele.


"E aqui estão vocês!"

"Mundo pequeno não é mesmo" disse o Doutor.

"Muito bem, pessoal."

O Castor fez uma careta e revisou os monitores. "Aqueles ali eram vocês?"

"Salvamos o dia!" disse o Doutor. "Onde estavam os seguranças alias?"

O Castor franziu a testa. "Ajudando as pessoas nas saídas. Para que não
entrassem em pânico. Exatamente o que eles deveriam estar fazendo."

O castor, a toupeira e eu olhamos pela telas da caverna. As pessoas estavam


gritando e correndo.

"Fico feliz em ver que não tem mais pânico...Eu sou o Doutor a proposito."

"E eu sou a Professora," eu disse, sorrindo educadamente.

"Então, o que aconteceu com o seu dragão?" perguntou o Doutor.

O Castor fungou. "Eu sou Caius Rose. Diretor do parque" ele disse. "E isso
não é nada para se preocupar. Pequena falha mecânica. Tudo já está
consertado.”

ele olha pra mim. "Você é uma das Brunildas?"

"Já chega disso."

"Por que você parece muito como uma delas."

O Doutor olhou em volta. "Você vai fechar o parque?"

Caius balançou a cabeça. "Não, isso foi apenas um problema técnico.


Ninguém se machucou."

"Nós deveríamos fechar," disse a toupeira. "Verificar tudo novamente."

"Eu concordo," disse o Doutor.


Caius coçou a cabeça. "Não podemos," ele disse. "É a época em que ficamos
mais ocupados no ano. Se fecharmos o parque perdemos nossos lucros, aí
depois vão começar a falar que aqui é perigoso, e antes que você perceba,
ninguém mais aparece e nós fechamos."

"Talvez seja porque aqui é perigoso," eu disse.

"Foi apenas uma falha mecânica," murmurou Caius novamente.

"Deveríamos ser a prova de falhas," disse a toupeira.

Caius se virou para ele. "Postumus Fearne!" ele disse, exasperado.

"Só estou dizendo!" disse a Toupeira.

"Quantas crianças você tem em casa Postumus?"

"Onze" disse Postumus afetuosamente.

"Certo. E o que eles vão comer quando descobrirem que o papai perdeu o
emprego?" Caius se virou novamente. "Existem 76,000 pessoas trabalhando
na Asgard™".

Ele gesticulou em direção das longas filas de pessoas na fila para pegar os
trens, e então para outra horda de trabalhadores de aparência cansada
chegando.

"É uma importante fonte de emprego em uma parte muito abatida da galáxia.
E

eu sou responsável por eles."

"E por eles também," disse o Doutor, apontando as telas que cobriam todo o
parque. Em todos os lugares estavam jovens felizes passeando com suas
famílias; com balões em forma de chifre; bebês em carrinhos; pessoas tendo
dias incríveis ao sol.

"Isso mesmo" disse Caius. "E veja: não há pânico. Porque tudo está bem.
Vamos investigar a falha mecânica por isso tudo pode continuar como
antes."

Ele olhou ao redor.

"Eu tenho o melhor time da galáxia, Doutor." ele disse.

"Obrigado por sua ajuda, mas eu não vou fechar esse lugar e manda-los para
casa passar fome sem uma boa razão. Agora chega de vocês dois, eu peço
educadamente apenas uma vez."

Postumos nos mostrou a porta. Seus bigodes pareciam derrotados.

"Postumus... você acha que é apenas uma falha mecânica?" perguntou o


Doutor calmamente no caminho.

Postumus olhou ao redor. “Isso...não deveria acontecer," ele disse. "Quero


dizer, é a forma de tecnologia mais sofistica existente. Deveria ser
inquebrável. Quero dizer, não seria apenas um erro. Não seria." Ele tocou as
canetas no bolso de cima de seu macacão. "Não é como fazemos as coisas
em Asgard™" ele disse.

"Simplesmente não é. Este é o lugar mais feliz da galáxia."

O Doutor levantou uma sobrancelha. "Onde foi que eu já escultei isso


antes?"

Postumus nos acompanhou no caminho de volta, que dava na paisagem mais


sublime que o parque tinha. Piscamos no que era mais uma vez o forte sol do
meio da tarde. Acima de nós circulava grandes águias douradas e
preguiçosas, que podiam ser atreladas e montadas; a frente nos belos e
infinitos campos

Elísios ficavam os cavalos brancos alados das Valquírias, selados a noite


para o espetacular show de luzes que encerrava o dia no parque.

Haviam placas sinalizadoras que levavam para a “Floresta Encantada" e


eventualmente aos grandes salões de festa de Valhalla, que fornecia hidromel
e doces a qualquer hora do dia ou da noite.
O Doutor olhou para a pequena porta do Centro de Comando, que
desaparecia em meia as arvores.

"Aqueles metrôs...eles dão a volta no parque, certo?"

Postumus assentiu.

"Então se quiséssemos entrar e dar uma olhada no parque sem que Caius
soltasse os valentões peludos em cima da gente..."

Postumus parecia ainda mais preocupado. "Olha," ele é disse. "Caius, ele é
difícil, mas é um bom chefe. Eu não quero me meter em problemas."

"Não, não, eu sei disso," disse o Doutor. "Mas você acha que tem algo
errado, não acha?"

Postumus assentiu. "Tente ir nos grandes salões de festa de Valhalla," ele


sussurrou. "São tantos fornecedores e artistas saindo de lá toda hora, dia e
noite, eles mal notariam vocês. Principalmente você...." ele apontou para
mim. "Tudo o que você precisa é de uma armadura."

"Eu não me pareço..." eu comecei a falar, enquanto o Doutor sorria


triunfante, então eu desisti. Em vez disso, partimos para a Floresta
Encantada mais uma vez através de uma multidão alegre.

Seguir o caminho da floresta era curioso. Em primeiro lugar, não importa


quantas milhares de pessoas se aproximassem do caminho estreito de terra
ao mesmo tempo, assim que você entrava na floresta, todo mundo se
dispersava completamente então você não conseguia ver ninguém na frente
ou atras de você; você se sentia completamente sozinho.

Em segundo lugar, nós entramos na floresta no início do verão, um sol


quente e amarelo, passamos por folhas verdes, cachoeiras tilintando com o
derretimento da neve; filhotes tímidos correndo para fora do nosso caminho;
à medida que avançávamos, as folhas ficavam mais e mais verdes, e então
começavam a se enrolar em si mesmas; para então se transformarem em
brilhantes tons de amarelo, vermelho e laranja; então elas começavam a cair
das arvores, pássaros voavam no céu, e o ar ficou mais fresco, com o cheiro
de fogueiras no ar, o sol tornou-se suave e dourado, nevoas apareceram ao
longo da caminho agora coberto com folhas. Enquanto abríamos caminho
por elas, falamos sobre o que podia ter acontecido de errado no parque, isso
e aquilo, ele me ofereceu seu braço, e eu aceitei.

Vamos lá, eu falei para mim mesma, faça isso agora. Estamos
completamente sozinhos, e está perfeitamente pacifico. Eu percebi que as
folhas sob minhas

botas de couro haviam se transformado em um amontoado de neve, o ar de


repente era um crepúsculo, frio, os primeiros flocos de neve; eu me inclinei
para mais perto dele - ele nunca sente o frio. Apenas pergunte, eu disse para
mim mesma. Não é como se ele não estivesse acostumado com perguntas.

"Oh, olhe ali!" disse ele de repente, quando eu abri minha boca para falar.
Uma abertura tinha aparecido na arvore, eu pude ver as montanhas cobertas
de neve de Asgard ao norte - iluminadas e cheia de esquiadores alegres
descendo a montanha, gritando de empolgação.

"Eu sempre quis tentar isso. Acho que eu seria muito bom."

Eu comecei a rir. "Não seja tolo, seu centro de gravidade é muito alto. Você
iria parecer Crane, a cegonha perna fina. Em todo o caso," eu continuei.
"Olhe, tem uma coisa...uma coisa que eu preciso te perguntar, e eu nem sei
se é teoricamente possível, e nem mesmo é sobre você...provavelmente...,
mas se você achar que não, eu preciso saber, e se sim eu também preciso
saber, eu só preciso perguntar, apenas uma vez, e eu não tenho, mas ninguém
pra perguntar... Você acha que algum dia...quero dizer...algum tempo. Você
acha que nós...eu...eu posso...você acha que eu ..."

Então houve um pequeno sinal, como se eu tivesse piscado por um momento


a mais, e de repente ele estava tirando neve do seu ombro.

"Desculpe," ele disse. "Perdi a concentração por um segundo. O que você


estava dizendo?

Eu larguei seu braço e olhei pra ele. "O que você acabou de fazer?"

"Nada."
Algo brilhou dentro de sua jaqueta. Eu peguei.

"O que é isso?"

Era uma medalha de metal. Estava escrito 'Helsinque, 19521."

Eu olhei para ele por um longo tempo.

"O que você ia me perguntar?"

"Nada" eu disse. "Esqueça."

Eu sai pisando duro na neve.

"Espera ai River!" ele gritou. "Eu não posso correr meus joelhos estão
machucados."

Eu não "esperei" e já estava quase fora da floresta. E já podia ver as tochas


iluminando o caminho para o palácio de Valhalla, enviando suas chamas
altas noite adentro.

E eu podia ouvir gritos.

O Palacio de Valhalla parecia uma ilusão de ótica, e realmente era. Era torre
após torre, toda em granito cinza; parecia um grande órgão de uma catedral.

Centenas de janelas foram iluminadas por milhares de velas cintilantes; você


poderia entrar por qualquer uma das 540 portas de madeira.

Eu não conseguia descobrir de onde vinham os gritos. Um grande cheiro de


carne assada e hidromel veio em nossa direção. Eu não percebi no começo;
porque eu também estava lidando com a confirmação de algo que eu já
sabia: claro que nenhum de nós dois éramos remotamente adequados para a
paternidade. E eu fui uma idiota por pensar nisso, não aconteceria de novo.

Corremos ao longo do caminho coberto de gelo até a base de uma das torres.

Uma garota com uma couraça de metal estava deitada no chão; ainda
respirando. Ela usava o manto branco de uma das Valquírias; ela era muito
jovem e estava muito maquiada. Sua longa peruca estava caída na neve.

ajoelhei-me ao lado dela, enquanto eu fazia isso uma trupe de seguranças


correu com uma maca e ergueu uma tenda ao seu redor. "Saia do caminho,
por favor, ela está bem, está bem." disse uma criatura parecida com um rato,
bem mandão.

"Apenas um acidente. Nós avisamos as pessoas para não correr na beirada


do castelo."

Em pouco tempo ela foi levada, e desapareceu em uma das muitas portas nas
paredes.

"Outro acidente hein?" disse o Doutor. "Esse lugar parece muito


descuidado."

Nós os seguimos pela porta por onde eles tinham acabado de desaparecer;
mas nós encontramos em um enorme salão, com apenas uma porta.

Eu não conseguia entender como uma maca podia ter acabado de passar por
aqui: na parte de dentro, todos estava festejando. A sala era obviamente um
truque interdimensional: tinha uma grande mesa de madeira, e as linhas de
visão convergiam. Por todo o lugar haviam diferentes famílias e grupos de
pessoas, comendo, bebendo alegremente, rindo e claro, fazendo ótimos
brindes. Haviam enormes lareiras, acima das quais as carnes giravam no
espeto, cobertas de ervas. A equipe enchia as enormes taças com o
interminável hidromel.

"Ah," disse o Doutor.

Ele saiu e depois voltou.

"Porque você fez isso?"

"Não," ele disse, sombriamente. "Eu entrei por uma porta diferente. Tente."

Eu tentei e me encontrei exatamente onde eu estava antes.


"Uma extensão dimensional," ele disse. "De que outra forma você
alimentaria meio milhão de visitantes por hora, e fazer com que sintam que
estão no mesmo grande salão? Eles tem que ir todos juntos ao mesmo tempo.

Ele olhou em volta. "Algo aqui está muito errado. O que é? Deixe-me
pensar."

Ele ergueu uma taça de hidromel de uma bandeja que passava, bebeu de uma
só vez e fez uma careta.

"Beba alguma coisa que você não sabe se vai gostar!" eu disse irritada. Eu
estava para experimentar uma também quando uma das garçonetes veio
correndo na minha direção.

"Você deveria estar lá embaixo!" ela disse baixinho. "O segundo show está
para começar."

O Doutor ergueu a sobrancelha para mim.

"Tudo bem," eu disse, enquanto a garota pressionava uma rosa incrustada na


madeira perto da lareira, e uma porta despercebida se abriu da parede. Eu a
segui enquanto descíamos os degraus que davam para os corredores abaixo.

Na parte de baixo, tudo era um caos organizado. Milhares de garotas


vestidas de forma idêntica estavam pegando pratos de carne e enormes jarros
de hidromel de uma grande fonte de distribuição - eu meio que gostei disso -
era um padrão complexo, mas eficaz.

O lugar estava quente e barulhento, eu entrei em uma cozinha que parecia


não ter fim, cheia de trabalhadores de todas as faixas, gritando.

Eles mal olharam para mim, e então eu encontrei um camarim cheio de


Valquírias chorando, que levava para um estabulo subterrâneo, cheio de
cavalos.

As meninas me perguntaram se eu era a substituta de Calinth e eu disse que


sim, peguei a armadura e a espada que me deram - que parecia muito fina - e
então eu segui até chegar a uma porta lateral que dizia "Segurança", onde eu
vi uma maca vazia.
"Não, não, está tudo bem, Tullus," ele disse. "Ela está do nosso lado." Ele
olhou em volta. "Você desconectou as câmeras certo?"

"O que está acontecendo?

Postumus parecia desanimado. "É o calibrador dimensional," ele disse.


"Alguém está mexendo com ele."

"Mexendo como?" eu perguntei.

"Bom, ele é cuidadosamente calculado para que todos tenham sua


experiencia gastronômica em Valhalla, quando quiserem. Mas alguém
começou a dobrar as dimensões. Aquela pobre garota estava em uma sala
que de repente desapareceu. Ela caiu do nada."

Eu pisquei.

"Ela vai ficar bem," ele acrescentou.

"E você não sabe quem poderia ter feito isso?"

O rato chamado Tullus ergueu os olhos. "Nós amamos esse lugar," ele disse,
e os outros concordaram.

"Eu preciso do Doutor," eu disse.

Eu esperava que ele estivesse fazendo o que costuma fazer: ficando amigo
de todos e se tornando o centro das atenções enquanto fingia que esse tipo de
coisa não importava.

Ao invés disso ele estava sentada, de mau humor, empurrando comida pelo
prato.

Na frente do fogo um sujeito com uma armadura e uma enorme lança


brilhante rugia: "E então Odie, eu disse. Deixe-me falar Odie, uma coisa ou
duas sobre a pontes entre mundos. Quer dizer, meu irmão e eu brigamos!" e
a audiência estava ou caindo de risadas ou temendo cada palavra.

"Qual o seu problema?" eu perguntei.


"Ele não se parece nada comigo, pra começo de conversa," disse o Doutor
irritado.

"Porque ele pareceria?" perguntei surpresa.

"Ah, por nenhuma razão," ele disse. "Apenas, você sabe. A História do
Metamorfo mitológico da Terra Antiga? Tem muitos rostos? Faz truques?"

Eu olhei pra ele. "O ator está interpretando você? Você é o Loki?"

"Os créditos devem ser dados a quem merece, é tudo o que eu estou dizendo.

Eu estava lá. E ele está exagerando."

"Você é exagerado," eu observei. "Além disso, ele é muito bonito."

"Você acha mesmo?" disse o Doutor se animando.

"De qualquer forma esse não é o ponto," eu disse, e expliquei que alguém
tinha mexido om o Calibrador Dimensional.

Ele ficou pálido e levantou-se imediatamente.

"Isso é ruim?"

"Ruim? River...claro que isso é ruim. É como puxar um fio...você não pode
simplesmente mexer com um calibrador dimensional..."

E assim que ele disse isso algo começou a mudar. Algo pequeno, quase nada.

Se você piscasse perdia...e de repente, havia dois Lokis. E duas mesas. A


grande fogueira de repente se dividiu e se transformou em duas fogueiras,
pegando uma garçonete que passava, a manga de sua camisa pegou fogo. Ela
gritou. E então surgiram mais e mais meses, com mais pessoas.

"Nós temos que tira-los daqui!" gritou o Doutor, "Vai começar a se dobrar
em si mesmo."
Funcionários aterrorizados corriam de portas secretas por todos o lugar,
tentando fazer com que a multidão saísse pelas grandes portas. Eu fui até a
grande porta. Mas quando abriu eu vi que ela não se abria para a parte de
fora, mas para dentro de outa salão, com outro Loki e outro grupo de pessoas
aterrorizadas, tentando escapar por outra porta. Na outra porta a mesma
situação. Tudo tinha se tornado um infinito corredor de espelhos. Pior: o
fogo que tinha atingido a garçonete agora estava na tapeçaria. As chamas
estavam subindo pelas paredes. Não apenas em um salão, mas em todos os
salões.

"O salão irá colapsar," gritou o Doutor, "vai sobrar apenas o fogo! Nós
temos que tirar essas pessoas daqui!"

O fogo estava agora no telhado de palha do grande salão, as pessoas estavam


se encolhendo em baixo das mesas.

"Escudeira," disse o Doutor, olhando diretamente para mim.

Eu olhei para ele, assenti, e corri para a porta. Eu pressione a rosa de


madeira entalhada, e em seguida nós estávamos na parte de baixo, com
funcionários correndo por todo o canto em pânico.

Corremos direto para a cozinha onde o hidromel começava a borbulhar de


forma preocupante, e depois até o camarim.

"Irmãs Valquírias! eu gritei. As garotas estavam encolhidas no canto; seus


cavalos relinchando perigosamente. A dobra dimensional estava
acontecendo aqui também; os estábulos apareciam e desapareciam.

"Agora, vamos salvá-los!" eu gritei segurando a espada para cima.

Elas olharam para mim, surpresas e aterrorizadas.

O Doutor não perdeu tempo e montou no cavalo mais próximo. Eu o ouvi


sussurrar, "Qual o seu nome? Oh, me desculpe, eu esqueci que você é um
robô."

Então eu segui o exemplo. Eu me virei para as meninas.


"PORQUE SOMOS VERDADEIRAS VALQUIRIAS," eu gritei, "E
VOCÊS

SEGUIRAM SUA BRUNILDA!"

Surpreendentemente, elas montaram seus cavalos e nos seguiram.

E então partimos; passando pela cozinha; atravessando pela porta e entrando


no grande salão. Os cavalos sabiam o que estavam programados para fazer, e
naquele espaço grande, eles voaram, suas asas batendo. Foi uma sensação
surpreendente. Olhei para o Doutor que sorriu para mim; ele estava gostando
tanto quanto eu.

Nós circulamos o salão, e então ele atravessou pelo feno fumegante no teto
até a noite estrelada e eu o segui. Abaixo o grande palácio de Valhala agora
era uma cidade sem fim; cômodo dentro de cômodos que estavam dentro de
outros cômodos; Atras de nós outras Valquírias voavam pelos telhados;
ousadas, fortes e destemidas; e de todos os outros telhados de todas as outras
repetições saiam

fileiras de Valquírias; então todos nós nos inclinamos e voamos para baixo,
pegando as pessoas das nossas próprias versões do grande salão, uma por
uma, ou duas de uma vez, ou como no caso de uma pequena família de
Junveres, 17 de uma só vez; nós os colocamos nas costas dos nossos cavalos
alados, voávamos pelas chamas através do teto sob a grande lua branca de
inverno e os deixávamos nos grandes campos dourados de Freyr, a deusa da
colheita, sob as estrelas congelantes.

Assim que resgatamos a última pessoa do grande salão, o Doutor gritou, e eu


levantei minha espada para que todas parasse. Houve um silencio de todos
os cavalos no céu; até mesmo as pessoas nos campos de Freyr seguraram sua
respiração.

Então, um grande rangido, e mais um, e depois outro, então outro salão se
dobrou e desapareceu completamente, como uma casa de cartas, um atras do
outro até que todos colapsaram; todos se dobraram e desapareceram
completamente, sobrando apenas as redes de tuneis do metro de Asgard™.
A multidão aplaudiu quando pousamos o último dos resgatados e pulamos
dos cavalos, mas o Doutor não tinha tempo pra isso; ele estava examinando
os rostos.

"Quem fez isso?" ele exigia saber. "Quem? Porque as pessoas trabalham
muito para ter suas férias e vocês apenas... vocês estragaram tudo." Ele
encarou a multidão. “Vocês têm alguma ideia de quanto precisávamos dessas
férias? Eu viajo pelo universo e ela está na CADEIA."

Todo mundo me encarou e eu fingi estar muito ocupada e distraída.

"...e eu aposto que todos vocês se sentem do mesmo jeito. Apenas um dia.
Fugir da sua rotina. Para se lembrar do quanto você ama sua família. Para
escapar daquela sensação de que tudo está desabando sobre suas cabeças. E
então tudo desaba sobre a sua cabeça. E eu acho que alguém aqui é
responsável..."

De repete surgiu uma figura correndo; um grande flash azul surgiu na


direção onde os tuneis começava. Nós então corremos atrás. Postumus
também, ele tinha aparecido e se movia incrivelmente rápido. Nos tuneis,
tudo estava úmido e escuro. Seguimos algo que estava andando muito
rápido.

"Por aqui!" gritou Postumus, cuja orelhas estavam levantadas. Nós os


seguimos, os caminhos se curvavam e mudavam de direção e ficavam mais
profundos.

De repente eu bati em algo e quase tropecei. Minha perna ficou presa. "O
que é isso?"

"Oh, sim," bufou Postumus. "Esse é o monotrilho. Para as capsulas de


transporte."

"As o que?" eu disse. mas já era tarde demais. Eu já conseguia ver um raio
de luz a frente, quando um dos pequenos pods estava vindo na nossa direção.

"Vá para o lado River!" gritou o Doutor.

Mas eu tinha visto algo - algo logo afrente.


"É azul!" eu gritei "Pegue o cara! Ele é azul!"

Eu não conseguia mover minha perna. O trem estava cada vez mais perto.
Não parecia ter um motorista.

"Vá em frente," eu gritei. "Pegue ele!"

Mas o Doutor parou de correr e se virou para mim; os dois viraram. E os


dois, o Doutor e Postumos desistiram da perseguição e vieram na minha
direção, e com um, extremamente e pouco atraente, 1-2-3 PUXE,
rapidamente me tiram das minhas botas. O Doutor me levantou e em seguida
nos empurramos para o lado esquerdo; Postumus mergulhou para o lado
direito e para o nosso horror não chegou a tempo.

A capsula branca passou por cima dele e debaixo nós vimos uma pequena
pata, sem vida nos trilhos.

Nós andamos até ele. Postumus estava deitado de olhos fechados. Suas
pernas estavam horrivelmente mutiladas. Eu acariciei seus pelos. E então
olhei para cima. No final do corredor, havia uma figura humanoide alta azul,
delineada pelas luzes.

Eu me levantei e puxei minha espada. "E agora," eu gritei, "eu acredito que
você tenha machucado um amigo meu."

Eu caminhei pelo túnel, a espada apontada para seu peito. Ao me aproximar,


eu percebi uma coisa. A figura não estava tentando escapar ou atacar. E sim,
era alto: mas não era um homem. Era uma criança crescida; era o
adolescente que tínhamos notado mais cedo; seu dispositivo pendurado em
seus dedos. Ele estava chorando.

"Eu não queria," ele gritou, sua boca era em uma linha tremula.

"Eu não queria, mas...."

"Eu encontrei o pulso!" gritou o Doutor, enquanto eu conduzia o menino de


volta pelo túnel na ponta da minha espada.
"E eu encontrei um criminoso. Você fez boca a boca na toupeira?" eu
perguntei.

"Não é tão ruim depois que você se acostuma," disse o Doutor limpando os
lábios.

Os olhos do Postumus começaram a piscar.

"O que...o que aconteceu...?"

Acariciei seu nariz. "Está tudo bem," eu disse. "Você machucou suas pernas.

Mas nós vamos conseguir ajuda."

Ele assentiu. "Elas não doem," ele sussurrou, "Na verdade elas são pernas
aumentadas."

"Eu absolutamente não tinha percebido," eu sussurrei de volta, e ele sorriu.

E então, felizmente, uma ambulância chegou e nos transportou de volta a


base central.

Todas as luzes estavam acessas na sala de controle, as telas mostrando o


parque rapidamente sendo esvaziado. Postumus estava escorado. Caius
estava andando para cima e para baixo na frente do garoto, que
aparentemente se chamava Tomith, e de seus pais.

"No que você estava pensando?" ele gritava.

Para alguém que se parecia com um Castor, ele era realmente assustador.
"Você matou pessoas! Você quase matou pessoas da minha equipe! Você
poderia ter matado todo mundo naquele salão.

Tomith encarava o chão, tremendo. "Eu não quis fazer nenhum mal."

"Ah, você não quis fazer," disse Caius. "Você podia ter destruído esse lugar
para sempre, você sabe disso?"
"Eu estava apenas hackeando. Os seus sistemas de segurança são tão
simples."

"São os melhores do mercado!"

"Bom, eles ainda são terríveis," disse Tomith. "Mas eu não sabia...não sabia
que isso aconteceria se mexesse com o calibrador dimensional."

"Um pouco de conhecimento," disse o Caius.

"Você sabe qual a sentença nessa parte do mundo por hackear?"

Um dos três pais de Tomith começou a chorar.

Tomith tremia ainda mais. "Me desculpe. Eu tenho provas e tudo na Nurfer.
Eu estou muito, muito, arrependido, senhor."

"Você vai se sentir ainda mais arrependido quando estiver no corredor da


morte."

Os pais agora pareciam estar à beira de um colapso.

Lagrimas escorreram pelo rosto de Tomith. "Eu só queria brincar um pouco."

"Bom, você brincou com o parque temático errado."

"Quantos anos você tem?" perguntou o Doutor.

"Quinze", disse o garoto, ou foi a TARDIS traduzindo pra mim.

O Doutor ergueu suas mãos. "Ele é apenas uma criança Caius."

"Uma criança criminosa."

"Se eu fosse você eu daria um emprego para ele."

"O que?"

"Consertar suas falhas de segurança de uma vez por todas. Porque me parece
Caius, que você precisa de uma nova perspectiva."
"Mas ele vai ser processado..."

"Você tem filhos Caius?"

Caius encolheu os ombros. "Sim," ele disse.

"E como você acha que ele vai se sentir quando descobrir que seu pai perdeu
o emprego por deixar o parque ser destruído... Ou talvez tenha apenas
resistido a um grande incidente. E agora aprendeu como fazer do parque
verdadeiramente seguro."

"Eu poderia fazer isso." Tomith engoliu seco. "Eu poderia!"

Um dos três pais cutucou o outro. "Um trabalho!" eles disseram espantados.

O Doutor se aproximou de Caius. "Você poderia sentenciar um de seus filhos


a morte? Por quebrar as regras?"

"Eles não fariam nada como isso."

"E existe algo Caius? Que poderia fazer com que você sentenciasse eles?"

A sala ficou em silencio.

Então Caius balançou as patas em sinal de dispensa. "Tudo bem," ele disse.

"Postumus você pode lidar com isso? Se eu o promover a chefe de


segurança?"

"Quando eu conseguir minhas novas pernas, eu vou cuidar disso." disso


Postumus parecendo encantado.

Tomith mal podia acreditar na sua sorte. Um dos pais começou a cantar uma
música na língua dos Pharax de profunda gratidão que não era
particularmente convidativa. O Doutor olhou para Tomith.

"Coloque sua cabeça no lugar," disse ele severamente. "Não se atreva a


arranjar problemas novamente. Não desaponte seus pais desse jeito."
"Não vou," gaguejou Tomith, em lagrimas de alegria dessa vez. "Eu
prometo, não vou senhor. Me desculpe, eu estou arrependido."

E então ele desabou de novo, e Doutor bagunçou seu cabelo.

Oh isso me atingiu como um soco no estomago.

Não que fosse da minha conta. Mas era assim que ele seria como um pai.

E o que eu sei? Talvez ele já seja. Talvez eles existam e ele apareça toda
manhã para o café da manhã. Talvez ele volte no tempo e os coloque na
cama toda noite, um milissegundo atrasado as vezes ou quase na hora; rostos
diferentes; eles não se importariam.

Talvez ele seja o tio engraçado; ou talvez ele tenha espiado cada canto
escuro do universo e decidido que ele não poderia ser tão cruel a ponto de
trazer uma vida inocente para isso.

Quem sabe, talvez alguns deles sejam meus.

Embora você deva achar que ele teria mencionado isso.

Do lado de fora, havia um pequeno grupo de visitantes descontentes - todos


os outros já haviam ido pra casa, mas eles ainda estavam lá, gritando por
algum tipo de compensação e falando que tudo era horrível. Entre eles tinha
uma mulher grande, com o pequeno Mure, que estava sentado no chão,
chorando de exaustão, sendo ignorado pela sua mãe, que estava gritando
sobre seus direitos.

"River," disse o Doutor. "Me dá sua aspada."

"Não,' eu disse. "Eu gosto e eu quero ficar com ela."

"Me dá."

Eu entreguei a contragosto, ele retirou todo o corte da espada com a sonic.


Então ele programou algo e entregou para a criança. A espada agora cega
lançou seus próprios fogos de artificio. Ele entregou para Mure, que parou
de chorar e nós nos encaminhamos para o portão.
"Eu gostava da espada," eu disse.

"Sssh" disse o Doutor.

Chegamos à beira da ponte de arco-íris. Todos já tinham finalmente partido;


tínhamos todo o parque para a gente. O Doutor piscou para alguma coisa,
provavelmente uma câmera, e de repente, a noite desapareceu, e de repente,
estávamos em um amanhecer perfeitamente dourado, em uma campina, ao
lado da ponte vazia, flores silvestres por toda a parte com o sol quente em
nossos pescoços.

"Piquenique?"

Depois de comermos, ele se recostou, suspirando de alegria, sua cabeça no


meu colo, e começou a apontar a inconsistência no sistema do céu. Eu
poderia dizer que ele estava criticando uma réplica de uma atmosfera
imaginaria, mas não acho que ele se importaria.

Então ele parou no meio do caminho e estendeu a mão, um de seus dedos -


eles pareciam a cada interação anormalmente longos; dedos de senhores do
tempo entregavam tudo - se enrolando através dos cachos do meu cabelo.

"No que você está pensando?" ele disse. "Você parece triste. Eu odeio
tristeza.

Me dá coceiras."

Eu olhei pra ele. "Eu sei," eu disse, e acariciei sua bochecha. "Não é nada."

"Mesmo assim você ainda devia me contar River. Não deveria? Deveria? É
uma daquelas coisas que eu sempre entendo errado, como as flores que são
BONS

presentes, mas arvores NÃO SÃO presentes? É um mistério do universo."

"Mistério do Universo," eu disse, respirando e tentando deixar de lado a


ideia daquela coisa extraordinária pela qual eu ansiava; vida que refaz a vida
e assim por diante.
Não importa o que a ciência te diga, o fato que algo vivo pode crescer dentro
de você, algo novo e único - mesmo que tenha sido feito da mesma mistura
de poeira estelar e mel e esperanças como tudo que já viveu - é um mistério;
cada bebe é um pedaço de mágica.

"Você não acredita em magica, não é?" eu disse e ele riu.

"Não!"

Eu o empurrei e então levantei. "Bom, isso é uma pena porque o Grande


Wiagler vai fazer um show privado para a gente em cinco minutos, se você
quiser assistir."

"ooh! Eu quero," ele disse, lutando para ficar de pé. Então começamos a
andar na direção dos Meridianos da Colmeia.

"Ele atira bolas de fogo pelo céu?"

"Ele atira bolas de fogo pelo céu."

"Ele faz malabarismo com ovos de dragão?"

"Sim, mas eles são de origem ética."

"Ele vai me deixar escolher as cartas? Porque eu tenho um sistema, certo..."

E nós nos divertimos. Foi brilhante. Nós rimos e comemos demais, ele nem
reclamou muito da comida, nós ficamos acordados até tarde e dançamos com
póstumos e suas novas pernas na festa de celebração da equipe na floresta
sob as três luas e as luzes do norte; ele me trouxe de volta ontem à noite um
pouco antes de soarem os alarmes, eu me deitei no meu beliche de pedra fria,
sozinha e pensei, Asgard™ daria um ótimo lugar para um dia divertido em
família, ou poderia dar ou já deu, um dia.

Eles dizem que psicopatas não conseguem imaginar o mundo de outra


maneira que não seja da sua forma. Que sua versão da realidade é a única
que importa pra eles.

Eles estão errados sobre mim.


MENTES SUSPEITAS
Jaqueline Rayner.
Conheci o Elvis pela primeira vez na década de setenta. Claro, ele estava
disfarçado – ninguém deveria reconhecê-lo, pois isso poderia causar um
tumulto.

Mas eu o encontrei facilmente. Eu pude dizer, em uma olhada, que ele não
era só mais um na multidão, e isso me deixou encucada. Então eu decidi
naquele momento, que iria pegá-lo pra mim, de um jeito ou de outro.

Eu tive que esperar até que o museu fosse fechado a noite, mas assim que o
último faxineiro guardou o balde e o rodinho, eu baixei minha bandeja de
laranjas (Ah sim – troquei de lugar com uma atriz conhecida como Nell
Gwynn; Nós temos muitos gostos em comum, como cachos de cabelo
caídos, corpetes e vocês sabem que decotes vazados sempre foram meus
melhores amigos), caminhei até sua sessão e me inclinei com os braços
cruzados para uma estátua do Elton John, e apenas o encarei.

Eu dei uma chance ao Elvis, ele de algum jeito conseguiu me encarar de


volta por uma hora antes de piscar. Ai então, eu sabia que o tinha pego.

“O que um Auton legal como você, está fazendo num lugar como esse?”

Perguntei.

“Sabe como é, estou só dado uma volta.” Disse ele em com um sotaque
sulista, soando sedutoramente exótico na Londres do ‘Three-Days Week’
com marchas da frente nacional e campanhas de bombardeio no Irã. De
verdade, não foi uma boa época para uma visita. Eu só decidi aparecer,
porque ouvi por aí que nada mais do que três encarnações diferentes dele
mesmo, resolveram se juntar nessa época, e eu fiquei morrendo de vontade
de saber no que isso ia dar.

Aconteceu de ser bem decepcionante; a maior parte aconteceu em um


universo de antimatéria, e eu acabei perdendo tudo, e o Vovozinho (ainda
não encontrei nenhum deles que eu não gostasse da aparência, mas jesus, ele
parecia estar muito mal-humorado naquela época) quase não deu as caras. Se
não fosse pelo Elvis, eu teria considerado tudo isso um grande fracasso.

Nós conversamos durante a noite. Bom, não fizemos só isso. Mas a conversa
foi bem divertida também. Ele estava apenas “passeando” por um tempo,
desde uma tentativa fracassada de invasão Nestene e – Alerta universal! - foi
um certo homem que não é médico, mas é um grande conhecido meu, que
frustrou os planos dos alienígenas! Nós rimos muito sobre isso. A maioria
dos companheiros Autons do Elvis foram desativados quando a Consciência
Nestene deixou a terra, mas de alguma forma ele conseguiu manter sua
consciência, talvez, - e claro, essa é apenas minha teoria – porque ele
realmente queria ficar.

Aquele período curto de tempo na terra, entre a invasão e o impedimento, o


transformou em um humanófilo perfeito. Infelizmente para ele, ele não era
uma

das réplicas realmente precisas que poderia se passar por humano, então ele
foi forçado a ficar no único lugar onde ninguém o notaria – Madame
Tussauds.

Originalmente, como parte do plano ligeiramente complicado da consciência


Nestene, ele era um político obscuro, mas quando a exposição foi encerrada,
ele tentou vários rostos, até finalmente se decidir sobre Elvis Presley. Acho
que as lantejoulas influenciaram. Além claro, do fato de que ninguém iria
querer derreter o Elvis tão cedo.

Elvis adorava observar as pessoas, mas estava certamente grato por uma
interação pouco mais pessoal, e eu também me diverti muito, então não foi
muito difícil concordar em voltar e visitá-lo de tempos em tempos. Claro que
eu só consegui fazer isso de década em década, mas aproveitamos o máximo
de todas as oportunidades que tivemos.

Ele foi quase sempre o Elvis, exceto por um breve período nos anos 80,
quando ele experimentou ser o Jason Donovan, e depois dos tristes
acontecimentos de agosto de 1977, nós as vezes nos aventurávamos em
público (de noite, quando sua cara de plástico não chamava muita atenção),
pois não havia perigo de ninguém o confundir com o verdadeiro rei do rock.
Bom, vamos dizer assim, -

‘Elvis está vivo’ e imagens borradas, apareceram em jornais


sensacionalistas, mas a maioria das pessoas presumia que ele era tão real
quanto as filmagens do Pé Grande. (Não eu: Eu sabia que Elvis estava
morto, mas o Pé Grande era definitivamente real. Nós saímos algumas vezes.
O nome dela era Geraldine e ela se incomodava bastante quando os cineastas
a pegavam em um dia onde o cabelo dela estava ruim.)

Elvis e eu aprontamos pela cidade algumas vezes durante as décadas de 80 e


90 e tudo estava correndo perfeitamente bem até um dia em meados de 2000.

Eu entrei no museu com um grupo de turistas Búlgaros, acenei para o rei


enquanto passava, para que ele soubesse que aquela seria a noite, então
deslizei pelo Farthingale da Good Queen Bess (eu estava gradualmente
abrindo meu caminho através da história) para esperar a hora de fechar.

E então ele apareceu. ‘Fez’, gravata borboleta e o casaco de tweed. (Alguns


dos visitantes pensaram que ele era uma das peças de exposição interativa;
eu acabei ouvindo demais epercebi que ele estava tentando descobrir quem
ele deveria ser). Bom, eu não consegui resistir. Esperei até que ele se
aproximasse, me inclinei e sussurrei: “Olá docinho.”

Ele deu um pulo e tentou fingir que não havia caído como um flamingo
assustado. Então ele me olhou e balançou um dedo ossudo na minha cara.
“Ah, não, não, não. Não, não, não. Isso não está acontecendo.”

“Isso o que?” perguntei dando uma volta. (Os turistas búlgaros começaram a
aplaudir)

“Esposas, se vestindo como as outras esposas. Isso é meio...” Ele começou a


sorrir. Semicerrei os olhos e o encarei.

“Esse cara está te incomodando?” Era o Elvis vindo até nós. Os Búlgaros
aplaudiram novamente.

O Doutor olhou para cima e para baixo, e então sacou sua Sonic.
“River, Corra!”.

“O que? Nessa saia?”

“É um Auton! Eu seguro ele enquanto você... se afasta lentamente.”

Eu revirei os olhos e segurei as mãos do Elvis. “Doutor, esse é Elvis, o


Auton.

Elvis O Auton, esse é o Doutor. Somos todos amigos aqui.”

O Doutor parecia escandalizado. “Amiga? De um cérebro de plástico da


Consciência Nestene?”

“Quem você está chamando de cérebro de plástico?”

Eu coloquei a mão no peito de cada um e os afastei antes que punhos fossem


levantados. “Meninos, meninos, essa não é a hora nem o lugar (Eu não tinha
uma hora nem um lugar mais apropriado em mente, só estava usando minha
voz de professora.). “Doutor, o que você está fazendo aqui?”

Ele parecia envergonhado e começou a mexer na gravata borboleta.


Nenhuma resposta estava a caminho, mas eu podia ler seu rosto como um
livro. Tentei não rir, mas não consegui evitar. Eu já podia sentir um grande
sorriso se espalhando pelo meu rosto.

“Essa é outra forma de marcar pontos não ? Você vem, verifica a nova onda
de celebridades, e em seguida organiza reuniões com aqueles que você
nunca viu antes, para que possa falar sobre isso ocasionalmente. O Madame
Tussauds é basicamente sua check list.”

Ele mexeu mais uma vez na gravata borboleta.

“Elvis, quais são as peças mais recentes?”

O Auton pensou por alguns segundos. “Alguns meses atrás chegou o Posh e
a Becks – Oh, e os cachorrinhos do Andrex.”
“Aí está Doutor. É melhor você ir procurar os cachorrinhos do Andrex.
Leve-os para passear. Todos ficarão impressionados.”

“Melhor os cachorrinhos do Andrex do que... um... cão de caça.”

“Não seja cruel.” Eu disse. “Elvis é só um homem solitário.”

“Ele é o demônio disfarçado.”

“Você tem uma cabeça cheia de suspeitas.”

E você é uma mulher cabeça dura com um coração de madeira, que me


deixou todo engasgado.”

Eu suspirei. “A qualquer minuto você vai me acusar de pisar em seus sapatos


de camurça azul. Veja, tudo isso é muito divertido, mas talvez devêssemos
falar sobre isso em um lugar menos público...?”

Os turistas búlgaros ficaram extasiados com o nosso desempenho. Enquanto


saíamos da galeria, um casal se adiantou para colocar notas de 10 em nossas
mãos. Um homem até tentou colocar um punhado de notas no meu corpete,
notas que o Doutor rapidamente pegou de volta e devolveu com um
“Retorno ao remetente.”

Encontramos um lugar tranquilo na Câmara dos Horrores e eu arrastei o


Doutor para uma cela de prisão (admito que parecia um pouco demais com
um lar) enquanto o Elvis se empoleirava em uma guilhotina um pouco mais
afastado.

“Olha, o Elvis é um cara legal. Você vai gostar dele quando se conhecerem.”

“Quantas vezes essa frase foi dita na história do universo?”

Eu dei de ombros. “Não quer dizer que não seja verdade.”

“River, ouça. Fique longe dele.”

Bom. Isso não me desceu muito bem. A quanto tempo ele me conhece?
(Essa não é uma pergunta retórica, a propósito. Nós não estabelecemos onde
esse encontro se encaixa na nossa linha do tempo ainda.) Não importa o
tempo, ele sabe com certeza, desde a primeira vez que me viu, que não tem
que falar nada sobre as pessoas com quem escolho me associar. Mesmo que
ele ache que é para o eu próprio bem.

Mas espera aí. Existe uma pista que pode me dizer por quanto tempo ele me
conhece. “Você me chamou de esposa!” eu disse.

Os olhos deles arregalaram. (Eu amo os olhos dele. Verdes, a cor do


mistério.

Jovens e velhos ao mesmo tempo, e oh, eu poderia olhar para eles por horas.

Dias. Décadas.) “Estou, bem, sendo um pouco presunçoso...? E... bom,


totalmente nada a ver, mas você estaria com o seu diário...?”

Eu ri. “Tudo bem, acho que estamos na mesma página. Eu só quis dizer, que
bem, você me chamou de esposa. Então pra você – assim como pra mim –
isso já aconteceu.”

Ele relaxou visivelmente.

Eu continuei. “E sendo assim, você bem sabe que podem existir Autons do
bem.

Meu pai por exemplo.”

“Você não deveria se lembrar disso.” Ele disse.

“Não sei se eu deveria,” eu disse dando de ombros. “mas eu me lembro. E


você está ignorando o que estou tentando dizer.”

“River,” ele disse. “Me ouça com atenção.”

“Oh, eu achei mesmo que só estava prestando atenção em uma palavra a


cada três das que você fala.” Eu disse sorrindo, mas por dentro bastante
irritada. Eu sempre prestava atenção nele. Sempre. Poderia não concordar
com o que eu estava ouvindo, poderia não agir de acordo, mas ele sempre
terá minha total atenção.
“Não estou tentando parecer condescendente. Não estou bancando o marido
ciumento. Mas eu sei de algo que você provavelmente não sabe. Em algumas
semanas, os Nestene farão outra tentativa de invasão. Eu não posso fazer
nada sobre isso, porque eu já fiz algo sobre isso, E eu fico muito irritado
comigo mesmo, quando eu tento interferir em algo que eu estou fazendo.”

“E?”

“E que o seu amigão aqui, o Elvis, vai ser arrastado de volta para isso. Ele
pode ter sido capaz de resistir a uma pequena invasão ou duas no passado,
aquelas que os Nestene não foram tão longe, mas não a essa. Essa é um
problema. Ele não será capaz de manter sua autonomia, sem brincadeira, de
verdade, River, para de fazer essa cara. Ele se tornará um perigo. Rory – era
uma outra história.

Ele tinha uma personalidade forte em primeiro lugar, e uma motivação. As


regras não se aplicavam para ele. Mas vão para o Sr. Jailhouse rock aqui.”

Seria como uma morte. Elvis deixaria o prédio definitivamente.

“Eu tenho que contar pra ele,” disse, infelizmente.

Então bem ali, na câmara dos horrores, cercados por instrumentos de tortura
e imagens de matadores, eu expliquei ao Elvis que sua vida chegaria ao fim
em breve.

Um rosto de plástico não demonstra emoções. Ou assim eu achava, não até


agora.

“É, eu meio que adivinhei que isso aconteceria algum dia.” Ele disse. “Meus
velhos amigos, os Nestene, eles acham que esse planeta meio que é um
planeta legal. Eu achei melhor ficar esperando, do jeito que eu estava.”

“Eu não acho que isso vai acontecer.” Disse o Doutor, docemente. “Me
desculpe.”

“Tem mais uma coisa...” Eu olhei do Doutor para o Elvis e depois para o
Doutor de novo. “Nós poderíamos...” Eu continuei olhando para o Doutor.
“Poderíamos?”

Ele não precisou perguntar do que eu estava falando. “Eu... poderia. Se é tão
importante pra você.”

Elvis não compartilhava da nossa telepatia matrimonial. E ele tinha um


cérebro de plástico. Ele continuou olhando sem entender nada.

“O Doutor pode te tirar daqui.” Expliquei. “Te manter longe do alcance.”

Meu amigo Auton, ficou surpreso. “Ah não.” Ele disse. “Eu agradeço, mas
essa é a minha casa. Esse lugar, nesse tempo, nesse planeta.”

“Eu poderia te trazer de volta quando a invasão acabar.” Disse o Doutor.

“E então eu só fico aqui sentado esperando pela próxima vez? Não.” Ele se
ergueu até os dois metros de altura de Elvis. “Eu não vou embora – mas
também não vou me tornar uma máquina mortal de novo. Me diga a data em
que eles chegam, Doutor. Eu vou me desativar antes disso.”

“Você não pode.” Eu implorei.

Ele escolheu me entender literalmente. “Posso sim. Há uma grande fornalha


no porão.”

Eu me encolhi imaginando aquela feição amável derretendo.

“Você tem quatorze dias,” disse o Doutor. Eu percebi que ele mal podia
esperar para sair dali. Sabe? Grandes cenas dramáticas não o incomodam,
mas pequenos draminhas assim o deixam bastante desconfortável. Um
grande e pomposo discurso sobre o destino do universo? Aí tudo bem. O
olhar no rosto de uma criatura prestes a derreter em uma fornalha?
Desconfortável. Mas eu não iria deixar as coisas assim.

“Uma última aventura,” sugeri. “Ver o mundo antes... bem. Antes. Existe
algum lugar que gostaria de ir?”

Milhões das coisas que poderiam ter saído da boca dele, não teriam me
surpreendido. Graceland, obviamente. Las Vegas. Havaí. Talvez até as luzes
brilhantes de Blackpool. Mas não. Eu fiquei surpresa quando ele perguntou:
“Já ouviu falar dos Campos?”

“Algum Campo em particular?” disse o Doutor. “Os campos de Karass Don


Slava?” Os Campos de Grantchester? Os campos do Shopping Center?”

Elvis balançou a cabeça. “Não senhor, acho que são apenas chamados de

‘Campos’. Ouvi alguns visitantes falando deles. O lugar mais bonito na terra,
ele disse, bastante exclusivo pelo que ele disse. Eu gostaria de ver o lugar
mais bonito na terra, mas eu acho – bem, que isso não seja possível. Um
pouco difícil, visto que eu nem sei onde fica.”

Bem, dizer que alguma coisa é impossível ou difícil demais, definitivamente


é um dos jeitos de fazer o Doutor tentar. Ele correu para fora, se desculpando
com o boneco do George Joseph Smith quando esbarrou nele, voltando em
minutos anunciando que havia encontrado o lugar – descoberto onde era, e –
Ta Dã –

arranjou uma visita para todos nós.

Eu peguei os ingressos das mãos dele. “Dr. John Smith, Dr. River Smith e
Dr.

Elvis Smith da aliança internacional dos besouros?”

“Bem, sim.”

“Aliança dos besouros?”

“Não vá incomodar os besouros. Só pra você saber, Onthophagus Taurus


pode levantar 1,141 vezes o seu próprio peso corporal.”

Essa não era realmente uma explicação. Como eu disse.

“Bem, esses campos são dos insetos. O Doutor estava certo, era tudo sobre
os insetos. Na verdade, ele estava próximo de fazer um discurso sobre os
insetos.
Sobre a importância deles e sobre como o homem foi perverso, em permitir
que certas coisas acontecessem. Eu me senti meio culpada em nome de toda
a raça humana antes de ler, e tentar entender quantas vezes na minha vida eu
matei uma mosca. Moscas demais, pela minha conta. Mas concordei com a
viajem para o paraíso dos insetos com os meus meninos.

Mesmo já tendo estado lá, eu não sei exatamente onde ficam esses campos.
Em algum lugar do mediterrâneo, eu diria, pela cor do céu - Acredite. Estou
começando a soar como um certo Senhor ‘é só molhar o dedo na água e
lamber pra saber exatamente a latitude e a longitude, pelo tanto de sal’ (e eu
sei que ele só faz isso depois de ter olhado em algum monitor da TARDIS).

Mas enfim, nós chegamos, onde quer que estivéssemos, e o sol brilhava, e o
céu estava limpo, e o ar era doce, e o lugar todo estava cercado por um
campo de força. Isso foi meio que uma surpresa, já que parecia avançado
demais para essa época. Eu sugeri que isso poderia ter algo a ver com um
provável envolvimento alienígena, então era melhor que entrássemos com
cautela, mas o Doutor me assegurou (aconteceu de ele estar certo), de que
aquela tecnologia já estava disponível na Terra naquela época, para aqueles
que podiam pagar, que tinham contato e a obsessão necessária.

Ficou claro no momento em que conhecemos a Melissa de que ela sabia


quais eram as últimas novidades no que se referia a espadas.

Melissa Tokana era baixinha e loira, e era difícil dizer sua idade. Não que
fosse particularmente suspeito. Tipo, olhe os três aqui. Eu não tenho certeza
de quantos anos eu tenho, pra começar. Aí tem o Doutor, que tem mais de
1000, mas ninguém dá mais de 30 para ele, e Elvis, que parece – e tem- mais
ou menos 30, o que não mudou desde que ele tinha uma semana de vida.

Melissa nos encontrou – e os outros visitantes, uns que chegaram por meios
mais convencionais do que naves Gallifreyanas – em pessoa e nos deu boas
vindas ao seu mundo.

“Porque os campos de força?” Eu perguntei. “Para impedir que as moscas


saiam pra fora?”
“Isso mesmo,” ela disse – para a minha surpresa, eu estava sendo meio
engraçadinha; obviamente eu acreditava que era para manter pessoas que
não era bem vindas do lado de fora. “Qual seria o propósito de alimentá-las
aqui e depois permitir que elas saíssem para um mundo que destrói sua
espécie lentamente?”

“Então o propósito desse mundo é a Conservaçã?” eu disse. “Vocês não


estão tentando mudar o mundo?”

“Oh, claro que estamos. Quando os homens acordarem e prestarem atenção


nos danos causados à Terra, meus insetos e eu estaremos aqui. Prontos.”

Claro, boa sorte com isso. Eu sou do século 51, e eu posso afirmar que os
humanos nunca vão acordar e perceber os danos que estão causando. Vocês
só dizem ‘ops’ e fazem de novo.

Nós fomos levados pelo campo de força em direção a um prédio que parecia
uma Colmeia, uma estrutura em formato de favo de mel que te desorientava
imediatamente. As portas levavam em todas as direções, e apesar dar
repartições serem feitas de vidro, a refração da luz do sol e das vistas
repartidas criavam um efeito de labirinto, um corredor de espelhos que não
te permitia ver se você ia para cima, para baixo, ou para os lados.

Melissa nos guiou em uma sala hexagonal que tinha várias formas quando
vista pelo lado de fora, mas tudo o que eu sabia com certeza, era que o lado
de fora era todo... verde. A coisa toda, verde, não era exatamente do que eu
gostava, mas estávamos fazendo isso pelo Elvis, não por mim – e de
qualquer jeito, deveria ser mais legal quando estivéssemos vendo a coisa
toda do lado de fora e não olhando por uma lente distorcida.

Não parecia que iríamos chegar tão cedo na parte de fora, entretanto.

Aparentemente, antes tínhamos que ouvir uma palestra sobre porque é bom
ser legal com mosquitos – ou alguma coisa assim – antes da Melissa decidir
que nós merecíamos ver os seus preciosos campos. Acho que eu não podia
culpa-la, de verdade. Era o trabalho da vida dela, um paraíso para insetos,
uma recriação meticulosa do ecossistema ideal para o florescimento de
muitas espécies. Ela não queria turistas andando por todos os lugares. (Ela
não ficou muito impressionada quando percebeu que o Doutor havia trazido
uma cesta de piquenique. Ele tentou esconder, mas ela acabou confiscando
mesmo assim.) Aceitando nosso destino, nós nos sentamos para ouvir a
apresentação antes da visita.

Melissa ficou em pé na nossa frente, com os olhos brilhando, falando com o


universo por meio de uma dúzia de humanos reunidos. “Os insetos. Tão
pequenos, tão insignificantes. Quem notaria se eles sumissem do mundo?”

Era obviamente uma pergunta retórica, mas o Doutor levantou as mãos


mesmo assim. “Eu notaria!”

Melissa se surpreendeu por ter alguém participando tão cedo da palestra,


mas sorriu de volta para ele. “Sim, isso mesmo. Os insetos podem ser
pequenos, mas a importância deles é enorme, em várias áreas diferentes.”

O Doutor levantou a mão de novo. “Eu, eu, eu!”

O sorriso dela não foi tão aberto dessa vez. “Sim?”

“Por exemplo, polinização.” O Doutor gritou para todos a sua volta. Ele
gosta de ser o centro das atenções.

Ela balançou a cabeça. “Polinização. Insetos são essenciais para polinização,


não só para plantas decorativas, mas para frutas e vegetais – uma fonte de
alimentos para ambos, humanos e animais.”

“Humanos são animais,” disse o Doutor, sem levantar as mãos.

Era só uma observação. Claro, eu sei que ele estava se referindo a sua
classificação taxonômica e não tentando ser rude, mas é mais divertido fingir
que fiquei ofendida: “Esposa humana, sentada bem do seu lado!” Eu apontei.

“E você vai negar, River, que as vezes você poder ser um pouco como um
animal?”

Ah, elogios abrem qualquer porta. Eu sorri pra ele. Melissa não ficou tão
impressionada e estava impaciente esperando que parássemos de
interromper.
“Claro, insetos também são parte da cadeia alimentar, como uma importante
fonte de comida para muitas criaturas – pássaros, répteis, mamíferos, entre
outros – que também são eles mesmos, parte da cadeia alimentar. Então sem
insetos, tanto as plantas – e carnívoros, morreriam de fome. Mas o papel dos
insetos na produção de comida vai além disso.”

Eu pude ver a raiva nos olhos dela quando o Doutor levantou a mão pela
terceira vez. Ela realmente não havia planejada uma palestra interativa.

“Sim.” Disse Melissa.

“Solo,” disse o Doutor presunçosamente.

“Sim, Solo. Você gostaria de elaborar?” as palavras saíram entre dentes. Mas
não a culpo, o Doutor tinha a capacidade de fazer professoras de crianças de
5

anos hiperativas perderem a paciência.

“Oh, não, não. Você é a expert.”

“Obrigado, bom – “

“E eu tenho certeza que você vai falar sobre o papel deles em airar o solo e
também sobre a importância na produção de estrume.”

“Eu vou, sim.”

“Que bom, que bom.” O Doutor sentou e cruzou os braços.

“Os insetos airam o solo,” disse Melissa. “Eles também ajudam na produção
de estrume.” Ela suspirou. Eu pude ver o Doutor se levantando de novo e ela
também, porque começou a falar mais rápido. “E não é só o estrume. Sem
eles, o planeta se afogaria sob o peso da matéria podre, animal e vegetal. As
lesmas por exemplo, são uma ferramenta essencial na gestão do desperdício,
consumindo carne apodrecida e vegetação.”

“E minha alface.” Disse um senhor na audiência. A mulher sentada perto


dele, deu risada.
Melissa não parecia interessada. “Insetos são essenciais para a vida, e
essências para lidar com a morte,” ela continuou.

“lesma são essenciais se você quiser manter seus repolhos!” Disse o mesmo
homem.

A palestra continuou. Eu coloquei um olhar educado e interessado no meu


rosto que ameaçava escapar a todos os momentos com a Melissa
continuando a listar as muitas, muitas maravilhas sobre insetos e sobre o
terrível, mais terrível, efeito da humanidade em sua população. Um dos
problemas com fanáticos é que suas paixões podem te afastar. Eu continuei a
ouvir pensando que a humanidade deveria ter mais cuidado com esses
amiguinhos de 6 pernas, mas depois do que pareceram horas da palestra da
Melissa, eu estava à beira de começar uma pequena destruição de habitats
naturais com alguns pesticidas.

Mas nem todos estavam tão empolgados quanto eu. Eu estava olhando entre
a Melissa (a normal educação humana) e o Doutor (fascinado com o que ele
podia fazer depois) e nem me preocupei com o Auton Elvis (apesar de eu ter
reparado antes que as pessoas estavam tentando não o encarar. Não é todo
dia que você se depara com uma réplica de plástico do Elvis que anda e
fala.) Mas agora, um certo tipo de admiração (impressionante, já que ele não
respira; Ele me contou que entre os anos de 1979 a 1980 ele tentou
aperfeiçoar as maneiras humanas.) Eu olhei pra ele e vi um olhar visionário
em seus sólidos olhos de plástico. Ele prestava atenção e assimilava cada
sílaba que ela pronunciava.

“Senhora?” ele disse. “Se eu entendi direito, você está dizendo que a
humanidade não poderia sobreviver sem os insetos?”

“É isso, resumindo, Dr Smith. E mesmo assim, tudo o que os insetos


precisam para sobreviver está desaparecendo. Florestas estão sendo
devastadas e destruídas. Pântanos drenados. Estradas e casas sendo
construídas em habitats insubstituíveis de insetos.”

Uma mulher com óculos exageradamente grande, se inclinou e disse: “Eu


me pergunto se você não está sendo meio ingênua. Sem ofensas.”
Bem, ela claramente ficou ofendida, pelo que eu vi nas expressões da
Melissa.

Mas a mulher ignorou e continuou mesmo assim.

“O progresso precisa continuar. Eu entendo o que você quer dizer, e eu sou


super a favor na preservação da vida selvagem. Mas eu também gosto de
casas, estradas e agricultura. Eu acho que é possível encontrar um meio
termo.”

Eu não achei que a Melissa era o tipo de mulher que encontrava o meio
termo.

A mulher de óculos balançou a mão e sorrio. “O que vocês fazem aqui é


ótimo.

Mas no final, não vai mudar nada. É só um zoológico de insetos.”

“Não! Ela está salvando a humanidade.!” Bom, isso foi uma surpresa. Elvis
se levantou, um novo discípulo devoto. “Você não consegue ver? Humanos
não podem sobreviver sem os insetos. Salvando os insetos aqui, essa mulher
está salvando a raça humana! Salvando os humanos deles mesmos!
Devolvendo a eles o lar que o homem tirou.”

Oh, a Melissa gostou disso. Ela sorriu para o Elvis. “Sim! Meus campos são
a recriação perfeita de um ecossistema para muitas espécies importantes. Lá
fora você encontrará variedades de borboletas e moscas, gafanhotos e grilo,
libélulas e claro, abelhas, pirilampos, besouros... Eu levaria horas para listar
todos.”

Eu respirei fundo. Não parecia impossível que ela resolvesse fazer isso. O
que seria mais uma hora ou duas ouvindo sobre espécies de insetos entre
amigos?

Para o meu alívio, ela não o fez.

Eu provavelmente já havia me dado conta do barulho pela sala antes de


conscientemente perceber que o barulho estava lá. Quase inaudível, de
verdade, e meu cérebro estava meio desligado tentando se distrair de toda a
falação da Melissa. Mesmo quando eu notei o barulho, eu não pensei muito
sobre ele.

Moscas não me incomodam (Uma vez eu passei um fim de semana adorável


com um cara Vespiano chamado Roderick) e nós estávamos, basicamente, na
entrada de um Shangri-La dos Insetos. Ter a criatura zumbindo pela sala era
irritante, mas fazer o que né?

E então um homem com um golpe acertou a mosca. De verdade, com um


livro.

Sem possibilidade de escapar. Panqueca de inseto.

A Melissa não disse nada. Mas as sobrancelhas dela se arquearam até a lua.
Se ela tivesse um livro de tamanho gigante com ela, eu não ficaria surpresa
se ela desse com ele na cabeça do homem que matou a mosca. Eu estava
tensa e pronta pra agir.

Mas nada aconteceu. O rosto da Melissa voltou ao normal, e eu relaxei.


Talvez eu tenha me mantido mais ou menos em alerta (minha mente suspeita
trabalhando de novo). E seria por isso que mais tarde eu notaria o que eu
notei.

A palestra finalmente estava se encaminhando para o final. Eu estava me


sentindo mal pelo Elvis. Só 14 dias para viver e ele teve que usar algumas de
suas preciosas horas (OK, alguns minutos; só pareceram horas) ouvindo uma
mulher baixinha e raivosa falando sobre piolho. Mas ele não parecia pensar
que foi um desperdício. Na verdade, quando a Melissa chegou em sua
conclusão apaixonada – “Vocês concordam? Concordam que a vida dos
insetos precisa ser preservada a todo custo?” – Elvis ficou em pé em um pulo
e disse: “ALELUIA, os insetos merecem viver, pela glória da raça humana!”
(O Doutor e eu – e a maior parte da audiência – optamos por concordar de
um jeito menos exagerado).

Bom, depois disso, nós finalmente fomos considerados dignos de entrar nos
campos. Fomos divididos em grupos menores de três ou quatro e seriamos
enviados a direções diferentes, com um pedido de não nos separarmos de
nossos grupos. Melissa de um jeito plausível explicou que muitas pessoas no
mesmo lugar seria perigoso para um ecossistema frágil, então ela nos
encorajou a ficarmos juntos. Sim, foi bem plausível. Nada suspeito. Exceto
pela parte em que eu notei que em um dos grupos estava o homem que
matou a mosca, a mulher que estava com ele (esposa?), que riu do que ela
estava falando, o homem que gostava de lesmas e a mulher de óculos. Eu
andei casualmente perto enquanto a Melissa falava com eles.

“Vocês já devem ter percebido que eu sou meio que um jardineiro,” disse o
homem das lesmas – baixo rosto vermelho, bigode cumprido – “e é
surpreendente como os seus campos crescem, assim sozinhos.”

“Bem, eles não crescem sozinhos,” disse Melissa. “Tem o 206.”

“E o que seria isso?” perguntou o homem. “Um protocolo para as plantas?”

“Um fertilizante,” ela respondeu. “Provavelmente o melhor fertilizante que


existe.”

Os olhos do homem com a cara vermelha se arregalaram. “Agora eu estou


bastante interessado em fertilizante,” ele disse. “Vocês usam algum tipo
orgânico eu presumo. O que é 206? Composto? Sangue ou ossos?”

“É a minha mistura especial.” Disse Melissa.

“E você não daria a uma dica a um parceiro jardineiro quanto a receita?”

“Bem, talvez,” disse Melissa. “Talvez eu possa te dar umas dicas. Já que
você é um parceiro jardineiro.”

Eu observei o rosto dela. Ela estava sorrindo, não havia nenhuma pista –

aborrecimento, provavelmente não era a palavra certa – que transparecesse


no rosto dela após o infeliz acidente com a mosca. Mas havia algo em sua
expressão... algo familiar... algo preocupante.

Estava na ponta da língua, mas eu não conseguia entender.

“River!” O Doutor estava chamando. Ele havia ficado inquieto durante toda
a palestra, e mal podia esperar para andar de novo. Eu esqueci do mistério na
expressão da Melissa e me juntei novamente ao Doutor e Elvis- nosso
pequeno grupo – e esperei que liberassem nossa saída.

Melissa começou a liberar um grupo por vez. Nós não passamos de uma
porta para os campos, nós fizemos um caminho desorientado pelo favo de
mel até uma saída. Eu olhei em volta, tentando enxergar onde o grupo do
cara das lemas e da mulher dos óculos fora, mas não havia mais nenhum
humano por ali.

Para ser honesta, eu fiquei tão impressionada pela nossa recepção, que os
outros grupos sumiram da minha mente quase que imediatamente. Eu
mencionei que campos verdes não eram a minha praia? Bom, talvez não,
mas ‘verde’ era só uma descrição desse caleidoscópio de vários tons, da
mesma forma que

‘várias notas’ era só uma descrição das Sinfonias de Beethoven. E também


não era como se só se visse verde. As planícies a frente formavam um arco
íris.

Papoulas vermelhas, falcões laranjas, amarelo prímula, urtigas verdes com


flores brancas, e o azul brilhante das centúrias mesclando com as ervilhas

índigos e belos tons de violeta. Parecia tão tranquilo que você assumia que
também era silencioso, até você se concentrar e perceber que havia um
zumbido constante de um milhão de insetos. O chilear dos grilos, o zumbido
amigável das abelhas. Gramas altas o suficiente para fazer cócegas no meu
queixo; pequenos ninhos na grama, com narizinhos de ratos despontando.
Pássaros voando, empoleirando-se, assobiando. Coelhos deslizaram sem
medo e uma cobra passou pelo sapato do Elvis, para seu total deleite.

E então tantos perfumes, tantas essências diferentes nos circularam para criar
um incrível cheiro adocicado. Se pudesse ser envazada, custaria uma
fortuna.

‘Campos por Calvin Klein’.

O Elvis havia escolhido certo. Esse era um planeta que traria paz e
tranquilidade para seus últimos dias. Nós andamos juntos, os três, sem falar,
indo cada vez mais fundo naquela selva, todos os nossos sentidos sendo
esmagados pela beleza a nossa volta, desejando que houvessem mais lugares
assim no mundo.

Ah, humanidade. Existe algum dos presentes que foi lhe dado que vocês não
destruíram? Eu sou uma de vocês, mas também sou filha do tempo e já
testemunhei tanta coisa. Eu me conheço bem e não planejo dar nenhuma
aula sobre guerras ou ódio, mas eu gostaria que vocês tivessem mais cuidado
com as pequenas coisas: Os pássaros e as abelhas e as flores. Esse tipo de
beleza é preciosa.

Oh, e como a Melissa bem lembrou, também é de extrema importância para


vocês, sabe, para a duração da Terra.

Pouco tempo por aqui e eu já tinha me convertido. De repente todo aquele


mal humor, pareceu justificável. Eu entendi porque a Melissa e aquela
mulher que preferia estradas jamais poderiam ser amigas.

Eu gosto de me vestir apropriadamente para o local, e havia me trocado


antes na TARDIS; agora eu iria fazer a minha melhor performance de uma
heroína romântica, caminhando descalça na grama com uma saia branca
balançado com o vento. Eu sabia que os meus dois heróis estavam olhando e
apreciando, mas eu não estava fazendo isso para eles. Eu tirei o crachá de
visitante do meu peito; não combinava com o resto da minha roupa. “Dr.
River Smith.” Isso mesmo.

E aí, eu congelei.

Smith.

O cara que matou a vespa, a mulher que gostava de casas. O homem que
gostava de lesmas. De repente, eu entendi de onde aquela expressão da
Melissa era familiar, aquele sorriso heroico e triunfante. Era a mesma
expressão do boneco de cera do George Joseph Smith, aquele que o Doutor
tropeçou no museu, na câmara de horrores. Smith, o homem que fez com
que suas esposas o colocassem no testamento e depois as afogava em suas
banheiras. Sim, eu tenho certeza. Aquele sorriso arrogante – aquele como
quem diz, “Você está a caminho de sua própria destruição, basta eu querer” –
foi reproduzido, em todas
as partes do rosto de Melissa. Minha antiga suspeita agora era a única coisa
em que eu conseguia pensar.

O Doutor havia encontrado um lugar onde a grama era baixa e macia, e


estava sentado de pernas cruzadas no chão, assoprando um dente de leão.
“Três horas da tarde!” ele anunciou. “Hora de um piquenique.”

“Eu achei que a Melissa havia confiscado seu piquenique.” Eu disse.

Ele tirou um sanduiche amassado do bolso, seguido de uma garrafa térmica


que não poderia caber naquele bolso. “Ah, ela pode ter confiscado meu
piquenique principal, mas eu consegui uma parte dele. Sanduiche?
Bolachinha?”

Eu recusei educadamente. Eu sei bem o que mais ele guarda nesses bolsos.

O Doutor tem um ‘detector de coisas maléficas’ no centro do seu grande


cérebro.

Se ele não percebeu nada ‘estranho’ na Melissa, então não deveria existir
nada com o que me preocupar. E ele parecia tão feliz esparramado na grama
nesse lugar maravilhoso. O Elvis também. Eu não queria estragar isso, para
nenhum dos dois, mas especialmente para quem iria morrer em breve. O
problema é que a expressão “esposas na banheira” estava me incomodando.

“Eu vou dar mais uma olhada,” eu disse. “Se eu ficar com fome, eu aviso.”

O Doutor apontou sua Sonic. “Alpha 2, 674,” ele disse. “Bússola.”

Não era uma ideia ruim. Eu sempre soube bem como me encontrar, mas esse
lugar era enorme e selvagem. Eu guardei no cós da minha saia.

Eu achei que para voltar para onde estávamos e calcular a direção, eu


precisaria andar com o outro grupo. Eu me virei e fui por aquele caminho.
Mas eu fiquei meio chocada – literalmente. Eu andei quase que meio
quilometro, quando dei de cara com uma parede invisível, eletricidade
passando por mim. Bem ali no meio dos campos, havia outro campo de
força.
Isso não foi mencionado né? Talvez fosse um meio de nos manter apenas em
certos lugares. Ou talvez fosse algo mais sinistro.

Eu andei pra lá e pra cá, na tentativa de entender até onde aquela barreira ia,
mas eu não consegui ver o final. Eu fiquei tentada a voltar para o Elvis e
para o Doutor e ridicularizar minha suspeita descabível, mas eu sou teimosa
e queria saber o que estava acontecendo. E eu tinha a Sonic Screwdriver
comigo! Não demorei muito tempo para conseguir desligar aquele campo de
força.

“Olá?” Chamei enquanto entrava, mas ninguém respondeu. Eu continuei


andando.

Como imaginado eu encontrei aquele perfume de flores e o zumbido de


insetos se tornando quase que hipnóticos, todos os meus sentidos se
acalmaram, um de cada vez.

Minha vida – eu não tive muita calma nessa vida, e era assim que eu
gostava.

Ser jogada de uma aventura mortal para a outra, era o que me mantinha viva.

Ocasionalmente eu acabava em lugares pacíficos com yoga (ser capaz de


colocar sua perna atrás da sua cabeça, te ajuda em vários aspectos na vida),
meditação, ou até mesmo esses livros de colorir para adultos que se tornaram
bizarramente virais em 2015, mas eu preferia a ação. Me impedia de pensar.

Pensar nas coisas que fiz ou no que eu sou. Ou sobre as coisas que eu
gostaria que terminassem de forma diferente, mas que não podem mais
mudar.

A paz nesse lugar, entretanto, mantinha o menor sinal de melancolia na parte


de fora da barreira. Talvez eu tivesse encontrado o único lugar no universo,
onde eu podia ser verdadeiramente feliz. Encontrar as outras pessoas não
parecia mais tão importante. Eu estava exagerando. Nada de mal poderia
acontecer em um lugar assim.

Me sentei no chão e comecei a fazer um colar de margaridas. Quando eu


juntei o suficiente, eu coloquei como uma coroa no meu cabelo; A coroa
mais linda de todas, que desbancaria qualquer coroa de rubi ou perolas da
Rainha Elisabeth.

Pensar nessas coisas me fez pensar no Doutor. Quem eu estava tentando


enganar? Tudo me fazia pensar no Doutor. Eu não tenho ciúmes de ele ter
tido uma vida antes de mim – ou depois de mim – ou durante (viajem no
tempo é uma coisa bem complicada) – e minha vida não foi vazia sem ele.
Mas as vezes eu me preocupo com o quanto do meu bem-estar está ligado a
esse homem. Ele plana sob a minha consciência constantemente. Ele ficaria
horrorizado se soubesse – na verdade, eu acho que ele sabe.

Eu deveria ter percebido que algo estava errado quando comecei a não
pensar nele.

Não como se houvesse uma fenda no tempo, não como se ele tivesse sido
apagado da minha memória, mas como se ele não fosse mais importante. O

Doutor não estar nos meus pensamentos era uma coisa nova pra mim, nunca
havia experimentado isso antes.

E mesmo assim, não me importei.

Eu podia senti-lo sumindo da minha mente, e eu não desejava que ele


ficasse, não me importava em implorar, ou mantê-lo ali.

Sem o Doutor eu poderia, talvez, receber toda essa paz.

Passei minhas mãos pelas flores, perturbando uma libélula. O cheiro de


maçã subiu vindo de um aglomerado de camomila, pólen salpicou minha
pele. Minha tiara de margaridas caiu do meu cabelo quando coloquei minha
cabeça em um travesseiro de prímulas.

Tanta calma.

Tanta felicidade.

Tanta paz.

NÃO!
Eu fiquei perturbada por um momento. Eu jamais esqueceria o Doutor
completamente. Talvez eu jamais pudesse estar em paz enquanto ele fosse
parte de mim. Mas eu sabia que jamais estaria em paz sem ele.

Eu estendi a mão, me debatendo como um bebê, agarrando-me


desesperadamente aquelas lembranças dele. Ele sempre estaria lá para me
pegar se eu caísse...

Meus dedos se entrelaçaram em suas mãos e fui preenchida com alívio.

Exceto que...

Os dedos deles eram magrelos, mas não tão magrelos.

Eu lutei contra aquela calma que me consumia, desesperadamente tentando


alcançar a superfície de novo. Eu sussurrei o nome dele, várias vezes, como
um mantra que me impedia de afundar. Seria mais fácil apenas desistir...

Apenas dormir.

Apenas paz.

Para sempre.

Meus olhos se abriram. Eu encarei a coisa que estava segurando. Uma mão
esquelética segurando a minha de carne e osso. Mais ossos o seguiam,
ligados a ele, uma armadura de ossos se formando em sua volta, se
arrastando no chão conforme eu larguei sua mão.

Ainda estava tentando não me render ao sono – Um descanso que eu agora


percebi que seria eterno – eu me arrastei pela grama. Conforme eu me
arrastava mais ossos apareciam - não espalhados, não aleatórios, como com
o primeiro que ainda tinha restos de tendões e do couro que os mantinham
juntos. Já foram humanos. Alguns brancos reluzentes, outros ainda envoltos
em massas negras de besouros e outros insetos.

Talvez fosse melhor se eu tivesse voltado para o Doutor e para o Elvis, mas
eu não conseguia penar direito. Minha cabeça estava voando, mas eu estava
usando todas as minhas forças para me manter com os pés no chão, porquê
agora eu sabia qual era o destino daquelas quatro pessoas que não
compartilhavam dos mesmos sonhos que a Melissa, de um mundo coberto
por insetos.

Minha blusa branca ficou verde de grama, enquanto eu me forçava a sair


dali.

Eu ainda não conseguia ficar em pé, e algumas vezes não conseguia ver para
onde estava indo quando a grama era alta. Simplesmente não conseguia. Ir
para frente, mãos e joelhos para frente, mantenha o ritmo e você vai
conseguir. Eu estava sonâmbula – não me arrastando dormindo – mas ainda
mantinha algum controle. Um pouco.

Encontrei a mulher de óculos primeiro. Um braço dos óculos de sol ainda


estava sobre a orelha, o outro totalmente dobrado e fora de forma, talvez
tenha se torcido quando ela se deitou. Não conseguia dizer se ela ainda
respirava; eu

inclinei minha cabeça para ouvir, então o peso e o cansaço tomaram conta de
mim de novo. Deitei ao lado dela, bem perto, perto o suficiente para sentir o
subir e descer de seu peito. Ela estava viva, mas não conseguia se mexer. Eu
não queria também. Aquela paz me puxou de volta e adicionou uma coisa
nova: Eu era uma criança agarrada ao seio de sua mãe, ouvindo a respiração
suave de uma mãe, um som que dizia 'Eu sempre protegerei você. Vou
mantê-la segura.

Você apenas tem que ficar comigo.’

Eu realmente atingi o fundo do poço! Mas o importante é que eu também


entendia que aquilo era uma mentira. Eu nunca fui aquela criança. Minha
mãe nunca me apertou perto de seu peito. Claro, ela queria, eu sei disso,
nada disso era sobre culpa ou sentir pena de mim mesma. Era sobre a
realidade. E a realidade me deu algo para me agarrar.

Eu arranquei aquela paz para fora da minha cabeça e substitui por raiva.
Raiva por ter sido tirada dos meus pais. Raiva pela vida que me foi roubada.
Raiva das pessoas que me tornaram o que eu sou. (Eu gostaria de dizer ‘o
que eu era’, mas eu nunca vou ter certeza.) Raiva do universo que permitiu
que isso acontecesse. Talvez até raiva do Doutor, porque amá-lo pode até
fazer sua vida melhor, mas também a torna muito, mas muito mais difícil.

Me apoiando na pura raiva, eu consegui ficar em pé. Eu fui tropeçando até o


outro lado e achei os outros três. Todos inconscientes, quase sem vida. Eu
queria ajudar, mas como?

O ar era mais pesado lá dentro. O cheiro doce que eu notei antes havia se
transformado em algo doentio e enjoativo. Toda vez que eu respirava uma
onda de sonolência me atingia. Algo no ar estava causando isso. Tentei, em
vão arrastar os corpos inconscientes para longe, mas o ar estava minando
minhas forças e quanto mais eu tentava, mais o sono ameaçava me dominar
novamente.

Tive que deixá-los para trás para buscar ajuda.

Eu precisava de alguém que não respirasse. E pra minha sorte eu sabia


exatamente onde encontrar essa pessoa.

Bom, sabia mais ou menos. Eu fiquei andando em círculos por alguns


minutos, antes de lembrar porque o Doutor havia me dado a Sonic
Screwdriver. No meu estado de confusão, eu não acho que teria os
encontrado sem isso.

Eu pisei em mais ossos no meu caminho de volta. Eu não sou o tipo


sentimental, mas talvez tenha sido o estado de sonho em que eu estava que
me impedia de parar de pensar em como aquelas pessoas eram quando
tinham carne e osso.

Aqueles ossos já tiveram um rosto e um sorriso, um sorriso que significava


tudo para seus pais, filhos e pessoas que os amavam. Tempo e morte, e a
Melissa, roubara aqueles sorrisos de alguém.

Depois de um tempo os ossos acabaram. Eu estava de volta ao começo dos


Campos. Aquele cheiro ainda estava no ar, mas era mais leve agora e eu
percebi que estava mais fácil de andar. Eu até tive energia o suficiente para
gritar o Doutor: “Doutor! Doutor!”
Ninguém respondeu, mas então eu vi o Elvis, acenando pra mim. Tive
dificuldades. Quando me aproximei, ele colocou o dedo nos meus lábios. “O

Doutor está tirando uma soneca” ele sussurrou, quando cheguei perto o
suficiente para ouvir. “Acho que salvar o universo todas as vezes é um
negócio bem cansativo.”

“NÃO!” Eu não tinha certeza se eu tinha gritado ou se aquilo foi apenas na


minha cabeça, até eu ver a expressão na cara do Elvis. Ali estava o Doutor,
ainda deitado no chão, onde eu o havia deixado, com um sorriso de completa
paz e contentamento no seu rosto. Eu me joguei pra cima dele e o acertei em
cheio.

“Acorda Doutor, Acorda!!”

Os olhos deles se abriram e seu sorriso cresceu, mas ele não conseguia focar.

“River? O que eu já te falei sobre entrar no meu quarto a noite,” ao que eu


respondi firmemente: “Eu preciso que você acorde. AGORA!”

A urgência na minha voz enfim penetrou e ele ficou de pé. “O que está
acontecendo?” Ele disse, sonolento, mas mais parecido com ele.

“Melissa está drogando as pessoas e as transformando em fertilizante,” eu


disse.

Eu estava montando a história na minha cabeça, conforme contava para ele.


“As pessoas que compartilham da visão dela, ganham toda essa paz e calma
e aí, quando elas vão embora dos campos, elas compartilham a ‘palavra’
sobre como aqui é lindo e sobre como conservação é essencial e todas essas
coisas. Mas ela não precisa daqueles que não vão compartilhar do plano
dela, separa eles dos grupos e dá a eles um tipo “descanse em paz
eternamente’.”

“Isso é... bastante interessante...” disse o Doutor arrastado, deitando-se


novamente e fechando os olhos. Eu bati nele mais forte dessa vez.

“Você não vai voltar dormir de novo! Olha, isso é minha culpa. Eu desliguei
o campo de força, e o gás, ou o que quer que seja, está se espalhando rápido
por aqui. Mas você é um Senhor do tempo! Ligue seu sistema de by-pass
respiratório ou algo assim! Há pessoas para salvar!

Esse era o tipo de papo que ele respondia. Em segundos ele estava sentado,
balançando a cabeça como se para dissipar o gás, e olhado para mim, agora
com os olhos alertas. “Não é bem assim que o sistema de by-pass
respiratório funciona,” ele disse. “Mas boa ideia, fisiologia Gallireyana, vai
me manter a salvo por um tempo.”

Nós nos preparamos. Elvis não estava feliz. A ilusão que ele tinha foi
destruída.

Eu vi o rosto dele e ele não parecia com raiva, parecia mais com um filhote
que não entendia porque seu amado dono o estava chutando. “Mas ela estava
fazendo isso para salvar os humanos,” ele disse, intrigado. “Por que ela os
mataria?”

Bom a resposta pra isso era clara. Eu já conheci muitas pessoas de “boas
intenções” nessa vida. Mas eu não sabia exatamente como iria explicar essas
complexidades para o Elvis, que era uma alma simples de coração de
plástico –

não de madeira

Eu estava usando o lenço de cetim do Elvis na minha boca e no meu nariz


como uma máscara de gás e o Doutor me ensinou algumas técnicas de
respiração que minimizaria a quantidade de gás inalado. Nenhum dos dois
era totalmente efetivo, mas significava que eu poderia continuar pelo tempo
necessário ou até encontrarmos as vítimas de Melissa.

Eu percebi que estávamos perto do lugar onde o gás estava maisforte porque
eu comecei a andar mais devagar. Sabe quando você está tentando correr em
um sonho, mas percebe que mal consegue se mover, como se tivesse colado
suas pernas? Era assim, mas de verdade. Pelo menos tínhamos o Elvis com a
gente, então caso eu ou o Doutor sucumbíssemos, ele estaria lá para nos
acordar. Aí eu percebi que definitivamente estávamos no lugar certo, quando
comecei a tropeçar em ossos de novo.
“Ainda está quente,” disse o Doutor, olhando para outro corpo. Que foi
quando eu percebi o completo horror daquela situação.

Melissa havia dito que ela devia todo o sucesso dos campos ao 206 – o seu
fertilizante especial. E eu percebi exatamente o que era.

Temos 206 ossos no corpo humano. Farinha de ossos é um dos tipos de


fertilizantes mais nutritivos. A Melissa não estava matando apenas as
pessoas que não compartilhavam de sua visão, ela estava construindo seu
império inseto dos corpos de seus inimigos, alimentando o solo com eles e
fazendo crescer os campos que seus insetos precisavam. O ciclo da vida,
criado pela morte.

Eu guiei o Doutor e o Elvis até os quatro dissidentes inconscientes, e o Elvis


ajudou um pouco, mas vamos dizer que eu e o Doutor os guiamos para fora
da zona de perigo. Então o Doutor pegou a Sonic screwdriver (eu devolvi, é
claro) e zip zap, colocou de volta a barreira de força para que o gás não
escapasse.

Mas na verdade ele não conseguiu.

“Você estourou como uma bolha.” Ele disse. “Não dá pra restaurar uma
bolha.”

“Bom, você não pode criar uma nova bolha?” eu perguntei.

O rosto dele virou um grande ‘hmmm’. “Não daqui, não posso. Devem
existir controles em algum lugar.”

Eu estava preocupada. “Sem o campo de força o gás vai continuar a se


espalhar.

Vai apagar todo mundo. Precisamos encontrar esses controles.”

“Ou – “O Doutor girou preguiçosamente sobre os calcanhares e apontou em


uma direção aleatória – “nós desligamos o gás. E eu não me surpreenderia se
o controle do campo de força e do gás estiverem ambos no mesmo lugar.”

“Provavelmente pelo lugar que entramos.”


“Sim, provavelmente.” Ele respirou fundo.

“Apenas... checando... direções... do gás.” Ele disse, ligeiramente


envergonhado, ainda cambaleando no local. Depois de alguns minutos, ele
se recuperou e disse: “Por aqui!”

Nós decidimos deixar as pessoas inconscientes lá mesmo. Não só seria


difícil carrega-los, mas estávamos literalmente indo em direção a fonte de
gás (ou assim esperávamos), então era melhor que ficassem ali.

Eu não sei quanto tempo levamos para chegar até o local de onde viemos. Eu
passei metade do tempo de volta aquele mundo de sonhos. Tiveram
momentos onde eu teria desistido e caído no sono, não fosse o Doutor estar
lá para me acordar e dizer para continuar. O Elvis praticamente me carregou
pela metade do caminho. Bem, as vezes não tem problema ser uma donzela
em perigo. Faz bem para as pernas.

Eu reentrei o mundo da consciência e vi um homem careca parado na minha


frente. Meu processo de pensamento confuso foi ‘Sontaran?’, ‘Silencio?’,
‘Jean-Lu?’, até meus pensamentos clarearem e eu perceber que era o Elvis.

“Bem, precisávamos entupir esse bocal.” Disse o Doutor, indicando o topete


da marca registrada de Elvis, agora inserido em um buraco no meio da
parede.

“Ainda bem que o Madame Tussands não cola as perucas né?”

“O gás ainda está vazando,” eu disse. “Precisamos descobrir de onde vem e


desligar.”

Então os três de nós caminhamos em direção ao prédio de vidro: uma


abordagem proposital que poderia ter sido mais impressionante se nosso trio
não consistisse em um antigo Senhor do Tempo em uma gravata borboleta,
uma heroína de vestido esvoaçante e um alienígena careca de plástico que
parecia o Elvis Presley.

O Doutor havia registrado a localização do bocal e agora estava abrindo


caminho através do prédio de favo de mel para encontrar sua origem.
Passamos por sala após sala, rastreando-a cada vez mais perto. “Por aqui!”
Disse o Doutor eventualmente - e parou.

A porta da frente não era de vidro, era feita de algo preto e amarelo. Não –
era feita de vidro. Eu percebi que o preto e o amarelo estavam agora se
movendo.

Se arrastando. Voando. Do outro lado do vidro haviam vários insetos. Em


algum lugar no meio deles estavam os controles.

“O lugar está cheio de vespas!” Eu gritei.

O Doutor balançou a cabeça: “São muito grandes para Vespas. Vespas


gigantes talvez. As mais venenosas de todas. Bom, não podemos dizer isso,
não é uma boa defesa. Entre lá e será morto em minutos. Não sei nem se
meu sistema imunológico consegue combater algumas picadas.” Ele coçou o
nariz. “No mínimo, seria bem doloroso.”

“Mas não afetariam o Elvis,” eu disse, no exato momento em que o Elvis


disse,

“Elas não me machucariam.”

Olhamos um para o outro. “Então fechou.”

O Doutor entrou em ação. “Bom. River, você sai daqui.”

“É claro que não.” Eu disse.

“Sai sim.” Ele disse. Eu gosto de quando ele é mandão. “Quando o Elvis
abrir a porta, algumas delas vão acabar escapando,” ele elaborou. “Elas
podem ser vespas bem, mais bem amigáveis, que não vão picar ninguém,
mas no caso de elas terem saído da cama com o pé esquerdo, eu prefiro que
você não esteja aqui.”

“E você?”

“Eu vou ficar bem, contanto que não saiam várias delas. Eu preciso ficar
perto para instruir o Elvis sobre como desativar o sistema.”
Eu não gostei muito da ideia, mas eu concordei. Eu não fui longe, entretanto.

Graças as paredes de vidro eu pelo menos conseguia ter uma ideia do que
estava acontecendo, mesmo com a visão distorcida. Eu encontrei a cesta de
piquenique confiscada do Doutor embaixo de uma mesa e terminei um dos
sanduiches para passar o tempo.

A voz do Doutor conseguia passar pelas paredes algumas vezes. “Aumente


aquilo para 10! Agora aperte aquele botão. Corte o fio verde.”

E enquanto eu terminava o sanduiche e passava para o creme de milho, outra


voz se juntou a dele.

“O que está acontecendo aqui?”

Tinha um pouco de nervosismo na voz dela. Pelo vidro deformado, Melissa


– A pessoa que havia chegado, era a Melissa, claro – parecia ter trinta metros
de altura, e o Doutor uma formiga perto dela. Havia algo nas mãos dela;
poderia ser uma arma.

Eu me agachei perto da porta, tentando ser o mais discreta possível, caso ela
olhasse na minha direção. Sempre preserve o elemento surpresa, caso seja
necessário.

Ela viu o Elvis. “Como ele consegue sobreviver lá dentro?”

“Homem de plástico, nada com o que se preocupar.” Ouvi o Doutor dizer.


“Ele só está desligando o seu sistema de gás. Alguma forma de extrato de
ultra papoula, imagino? Poderia muito bem usar as plantas para tudo, depois
de tê-las fertilizado tão bem.”

“Você precisa impedi-lo.”

“Desculpa, mas não. É você quem precisa ser impedida.” O Doutor ergueu a
voz.

“Elvis continue por favor fazendo o que você está fazendo.”


Então ela levantou a mão. Sim definitivamente uma arma. “Faça- o parar ou
eu atiro.”

“Nada disso,” disse o Doutor. “Você provavelmente vai atirar de qualquer


jeito.

Não vai só me deixar ir e contar para as autoridades o que está acontecendo

aqui, quais são os ingredientes especiais do seu fertilizante. Mas se


conseguirmos sabotar sua máquina, tem uma chance de as outras pessoas
aqui conseguirem escapar. Continue Elvis.”

“Eu vou atirar!” Ela ameaçou, e eu acreditei nela. Eu abri a porta e joguei a
primeira coisa que encontrei. A cesta de piquenique.

Sabe como as pessoas costumam dizer ‘jogar como uma garota’ como
insulto?

Não seria um insulto se eles estivessem falando de mim. Porque eu jogo


como um demônio. Sim, a cesta distraiu a Melissa. Mas eu joguei tão forte e
tão rápido que quebrou o vidro atrás dela.

O Doutor correu pela porta em minha direção e eu cai atrás dele. Não
conseguia ver a Melissa pelo vidro, apenas uma cortina de insetos. o Doutor
instintivamente se virou, pronto para entrar de volta na briga, mas eu peguei
seu braço. “Elvis vai resolver isso.” eu disse.

E eventualmente lá estava ele, aqueles quadris mágicos avançando em nossa


direção, um pequeno corpo seguro em seus braços de cera. Abri a porta para
deixá-lo passar, fechando-a rapidamente antes que muitas vespas se
juntassem.

Algumas zumbiam desorientadas, mas não prestaram atenção em nós.

O Doutor olhou pra ela. “Me desculpe. Esse veneno é letal nessa quantidade

ela não teve chance.” Ele suspirou. “Vamos. Vamos sair daqui.”
Quando se trata de aventuras, o Doutor é do tipo ‘é-isso-obrigado’. Depois
disso, não vai vê-lo novamente.

“Nós não deveríamos...” Elvis começou, ele não tinha experiência em estar
por perto no final de uma das pequenas excursões do Doutor

“Eu balancei a cabeça. “Você parou o vazamento de gás, vamos poder


derrubar o campo de força que fica em volta desse lugar e todos vão acordar
e ir embora.

Vamos pra casa tomar chá e –“ Eu desabei. Acabei me lembrando do porquê


viemos aqui. O último passeio do Elvis.

“Eu vou ficar.” Ele disse.

“Eu sei que você queria passar seus últimos dias aqui...” Comecei a falar,
mas Elvis me parou.

“Não, não. Não é por isso que vou ficar. Essas coisas – “ Ele apontou para o
lugar em sua volta, o que significava que ele estava apontando para algumas
vespas e uma mulher morta coberta de geleia, mas entendi o que ele quis
dizer

– “é importante para a humanidade. Eu vou continuar.”

“Mas os Nestene...”

O Doutor começou a rir e deu um tapinha nas costas de Elvis. “Sim!


Brilhante!

Muito bem, Auton. Claro, se colocarmos o campo de força de volta neste


lugar, ele estará perfeitamente seguro. “

“...sobre o fertilizante...” comecei.

“Acho que vou encontrar uma nova fonte,” disse ele.

Eu evitei a próxima invasão Nestene - bem, tudo isso de ‘é uma mão? Não, é
uma arma!’ Fica entediante depois de um tempo - mas dei uma olhada rápida
para ver se Elvis estava intacto. Eu não precisava ficar preocupada. ‘Os “fãs”

foram a loucura pelo Elvis de plástico.’ Foi um dos títulos que eu li, e
acontece que os shows em ‘benefício das abelhas’ foram um grande sucesso.
Eu fui disfarçada em um e o vi (cantando enquanto as abelhas voavam em
sua volta).

Ele estava causando um grande impacto e eu nunca tinha visto seu rosto de
plástico tão feliz. Quando ele terminou com ‘Peace In The Valley’ e ‘This Is
My Heaven’, eu sabia que as coisas estavam bem.

Eu estava saindo do show (com a minha garrafa de “Money Honey” da


lojinha –

tudo para ajudar as abelhas) quando ouvi alguém limpar a garganta atrás de
mim. Eu me virei, e todo mundo fez o mesmo, quando Elvis o Auton
começou a cantar “Você está se sentindo sozinha essa noite?” com os olhos
presos em mim.

Eu ouvi, e percebi que ele havia tocado com aquele dedo de plástico de um
jeito inalterável na minha vida.

Independentemente do que aconteça, independente de com quem eu esteja,


sempre existia aquela sensação de que eu estava sozinha. Mas eu sabia que
seria assim e que poderia viver com isso.

Quando ele terminou, eu fui até ele e coloquei as mãos nas suas bochechas
lisas. “Estou arrepiada.” Eu disse pra ele. “É disso que eu gosto em você.”
Dei um beijo nele. “Pelos bons tempos.” Eu disse. Então eu sai.

River Song está deixado o ambiente.

UMA APOSTA COM O TEMPO.

Por: Steve Lyons

Era o verão de 2016, em uma cidade chamada Londres.

Isso fica na Terra, caso eu não tenha mencionado antes.


Naquela manhã de verão, Londres havia sido atingida por uma tempestade
elétrica.

O que me surpreendeu, conforme eu fazia meu caminho nas calçadas lotadas


de West End, foi quão pouco as pessoas se importavam. A maioria mantinha
suas cabeças baixas, apenas continuando com o ritmo diário da vida.

Ocasionalmente, alguém olhava para o céu vermelho sangue, atravessado


por tridentes de raios. Eles balançavam as cabeças e faziam barulho de
desaprovação e se perguntavam se realmente iria chover.

Não sei o que mais eu esperava.

Nesse ponto da história da terra, se eu dissesse para os cínicos Londrinos e


turistas ao meu redor que a tempestade era causada por intervenção
alienígena, que o universo e todo o tempo e espaço estava se despedaçando,
eles provavelmente teriam revirado seus olhos e suspirado, “De novo não!”.

Apenas uma pessoa além de mim, sabia a verdade.

Seu nome era Martin Flint. Ele era um vendedor de seguros de quarenta e
seis anos, vivendo sozinho em um apartamento de porão suburbano que mal
podia bancar.

Às dez daquela manhã, ele estava esperando a hora de abrir a porta da sua
agência de apostas local. Ele estava vestindo botas de couro marrom, sem
meias e uma jaqueta de terno amassada por cima de seus pijamas de hospital
listrados.

O apostador nem se importou. Já tinha visto pior.

O que lhe surpreendeu foi quando Martin apresentou um cartão de débito e


insistiu em apostar tudo que tinha na sua conta do banco - pouco menos de
mil e quinhentas libras - em um único cavalo, uma aposta por fora, para
ganhar.

Você deve estar se perguntando, Querido Diário, como eu sei disso.

Começou, como geralmente acontece, com o Doutor.


Ele apareceu na minha porta para me buscar. Eu lhe disse para parar de fazer
isso. Eu sou perfeitamente capaz de arranjar minhas próprias fugas.

Ele estava na sua encarnação de gravatas-borboleta-e-queixo-pontudo. Eu


descobriria depois que ele não havia ido ao “Lago Silêncio” ainda. Se
tivesse,

ele saberia porque mostrar seu rosto - qualquer um deles - em Stormcage era
uma péssima ideia.

Para ser justa, ele tinha vindo disfarçado.

Mas nem tanto, pois o disfarce era um capacete britânico do século XX. Ele
parecia achar que isso seria capaz de lhe deixar irreconhecível. Um quadrado
de papel psíquico e uma expressão idiota podem fazer milagres - para a sorte
dele.

Por trás das costas dos guardas, ele tirou o capacete e apontou para seu rosto
sorridente como se revelasse sua identidade para mim.

Os guardas concordaram, com certa desconfiança, em me entregar para ele -

contanto que nós fossemos algemados um ao outro. Eu certamente não tinha


um problema com isso. O Doutor tentou da melhor maneira que podia evitar
meu olhar enquanto colocava as algemas. Querido Diário, como eu adoro
deixar ele vermelho com apenas um olhar.

Nos aproximamos da saída com um ritmo medido, cientes dos olhos e lentes
de câmeras focados em nós. Conforme saímos do alcance da audição dos
guardas eu sussurrei de lado para o meu acompanhante: “Pulseiras legais.
Não me são estranhas”

“Você disse que iríamos encontrar um uso para elas.” ele sussurrou de volta
pra mim.

“Eu não te dou os melhores presentes de aniversário?”

“River.” O Doutor disse gravemente. “Eu preciso da sua ajuda.”


“Sempre né?”

“Eu perdi alguém. Uma pessoa humana. Eu preciso que você o encontre.

“Perder” é a palavra errada, na verdade. Ele foi extraviado. Eu sei onde ele
está, mas não posso chegar até lá. Sabe, tinha essa lesma alienígena verde e
gigante, e –“

Ele foi interrompido pelo uivo de um alarme.

Depois de muitas aventuras, nós aprendemos a correr primeiro e fazer


perguntas depois.

Isso nos deu uma vantagem quando o tiroteio começou. Não que tenha nos
ajudado muito. Com tiros se aproximando vindo de todas as direções, nós
entramos em um banheiro vazio. O Doutor derreteu a fechadura
sonicamente, o que nos rendeu um minuto ou dois.

Não havia outra maneira de sair, claro - exceto uma. O Doutor balançou sua
chave de fenda novamente e removeu nossas algemas. Ele enrolou um
dispositivo ao redor do meu pulso para substituí-las. Eu reconheci aquilo
como um Manipulador de Vórtex. Bem, eu seria capaz de reconhecer. Tinha
um igualzinho.

“Martin Flint,” ele disse alto, por cima do som de guardas batendo na porta.

“Quem?”

“No dia sete de julho de 2016, duas e trinta e oito da tarde, ele tropeçou em
uma fenda no Vórtex. Em um estacionamento perto da Rua Great Russell.”

“Isso foi descuidado.”

“Ele teria sido jogado de volta no tempo, não muito longe. Algo entre oito e
dez horas. Eu preciso que você o ache e fique de olho até que o tempo o
alcance.

Se certifique de que ele não faça nada estupido - como contatar seu eu mais
novo ou contar pra todo mundo o que acontece em Deal or No Deal ou –“
“Você quer que eu banque a babá pra você!” Eu levantei uma sobrancelha.

O Doutor concordou feliz com a cabeça. “Essencialmente falando, sim. Não


se preocupe, Martin teve um dia cansativo então provavelmente vai dormir o
tempo todo.”

Tinha ficado ameaçadoramente quieto do lado de fora.

Os guardas, eu imaginei, tinham pedido por um blaster sônico, que faria um


buraco quadrado na porta em questão de segundos. Está na minha lista de
natal.

O Doutor mirou sua chave de fenda no Manipulador de Vórtex, e eu percebi


que ele estava prestes a ativá-lo remotamente. “A gente perdeu a parte onde
eu concordo com isso?” Eu protestei.

“Eu achei que poderíamos pular ela, economizar tempo.”

“E você?” Perguntei a ele. ”Aqueles guardas vão atirar em você assim que te
acharem. Como vai sair daqui?”

Ele abriu um sorriso largo para mim. Ele ajustou seu capacete de policial
para um ângulo mais confiante. “River Song” ele disse, “Eu achei que você
me conhecesse.”

Ele apertou um botão em sua chave de fenda.

Seu emissor acendeu uma luz verde, o dispositivo em meu pulso zumbiu
quando foi ativado - e eu senti uma terrível sensação de estar sendo torcida
enquanto o banheiro, a Instalação Stormcage de Contenção e o século
cinquenta e dois A.D.

desapareceram ao meu redor.

A próxima coisa pela qual me dei conta foi tropeçar em uma superfície
pavimentada.

Viajar pelo Vórtex não é geralmente tão difícil - exceto para meu cabelo,
mas não me faça falar disso. Algo estava errado. Olhando para o céu, pude
confirmar isso.

“Ah, Doutor,” Eu gemi. “Você planeja as fugas mais românticas.”

Eu estava em um estacionamento minúsculo, entre os fundos de prédios de


escritórios. Tinha duas vagas - para o uso, de acordo com uma placa
brilhante, dos empregados da Dead Cert Investimentos - e um amontoado de
latas de lixo de várias cores. Ambas as vagas estavam vazias no momento.

Eu estava no lugar certo, ao que parecia, mas na hora errada.

Não eram quatro e trinta e oito da manhã. Estava claro demais para isso,
mesmo com a tempestade se formando acima. Eu podia escutar o barulho do
trânsito da hora de pico de ruas próximas. A tempestade deve ter me tirado
do curso. Eu não ousei tentar de novo.

Será que eu estava no dia certo?

Eu estava sendo observada.

Um homem tinha emergido de uma saída de incêndio em um canto. Ele


estava no topo de um lance de escadas curto, atrás de um corrimão. Ele
estava na meia idade, era baixo, acima do peso, usando um terno antiquado
com um colete e um relógio de bolso.

“Com licença,” eu disse. “Estou procurando por um… amigo. Suponho que
você o conheça. Martin Flint? Ele esteve aqui hoje de manhã.”

O homem continuou a me encarar com desdém, por detrás dos óculos


redondos.

Eu me perguntei há quanto tempo ele estava ali.

Querido Diário, você está na minha frente agora. Você sabe que esse homem
é mais do que ele parece, se não por que chamar atenção para ele? Eu não
tinha o benefício do prenúncio dramático, no entanto. Pedi desculpas
novamente e fui embora.
Fui em direção à estrada principal. Procurei nos bolsos do meu macacão
cinza de prisão enquanto caminhava. Eu tinha você, Querido Diário, uma
caneta e um tubo de batom alucinógeno, que eu estava guardando para uma
ocasião especial. Se eu soubesse que iria em uma aventura hoje, teria me
preparado melhor.

Teria pelo menos me vestido melhor.

Eu tinha que encontrar Martin Flint o mais rápido possível. Eu tinha que
descobrir o que ele havia feito para causar a tempestade temporal, e eu tinha
que consertar

- se pudesse.

Eu desejei que o Doutor tivesse me dito mais sobre ele – ou se não um


endereço, ou uma idade, uma ocupação, sua altura, a cor de seus olhos,
qualquer coisa.

Era difícil questionar os pedestres a respeito dele sem uma descrição.

Não tinha muita serventia pesquisar em listas telefônicas ou na internet,


conclui.

Se apenas seus pais tivessem sido mais criativos na hora de lhe dar um
nome…

Obtive minha primeira pista falando com o dono de uma banca.

Ele tinha aberto às sete. Uma ambulância tinha passado rápido por ele já que
ele tinha chegado quinze minutos mais cedo. Ele tinha certeza que tinha
saído da rua paralela que levava ao estacionamento. Eu fiz com que me
dissesse os nomes dos hospitais mais próximos.

Com um pouco de bajulação - e lágrimas de crocodilo por um “noivo


desaparecido” - eu o persuadi a me deixar usar seu telefone.

Trinta e sete minutos depois, deixei uma moto roubada em uma baía de
ambulância. Eu agradeci mentalmente o carteiro que tinha deixado o veículo
desatendido, completo com chaves e um capacete. Eu tenho certeza que se
tivesse mais tempo pra explicar o motivo pelo qual precisei da moto, ele
teria se importado menos. Ou ele teria me xingado menos.

Eu já tinha estabelecido que Martin Flint fora trazido para cá. Pedi por mais
detalhes na mesa de recepção. Em resposta me perguntaram se eu era parente
dele. Tendo familiaridade com esse tempo e lugar, eu tinha esperado por essa
pergunta e ensaiado uma mentira eficiente. “Sim, eu sou.” eu disse.

As horas de visita já tinham acabado, mas ninguém tentou me parar quando


entrei na ala em que Martin Flint se encontrava como se tivesse todo direito
de estar ali. Encontrei uma cama vazia com seu nome em um quadro branco
atrás dela. Um jornal estava espalhado nos lençóis. Peguei e chequei a data:
Quinta-Feira, 7 de julho 2016.

Com uma pontada de ansiedade, eu parei uma enfermeira que passava. Lhe
informei que um de seus pacientes estava desaparecido.

Ela não ficou preocupada demais a princípio. “Ele não pode ter ido muito
longe,”

ela insistiu animada. Ela indicou o armário entreaberto ao lado da cama. Um


par de calças cinzentas amassadas e uma camisa branca estavam dobradas
em sua prateleira. Uma maleta surrada de couro marrom ocupava o espaço
embaixo das roupas.

Me abaixei para olhar de perto.

“Ele estava se sentindo muito melhor, de qualquer forma. Ele tinha tido uma
espécie de desmaio, mas não conseguimos encontrar nada de errado com ele.

Vamos mandá-lo para um exame de tarde, mas ele provavelmente vai poder
ir para casa depois. Você é uma parente?”

“Sapatos,” eu disse, checando embaixo da cama. ”Aonde estão os sapatos?”

Bem, aí aconteceu uma pequena confusão.

Banheiros foram revistados e perguntas feitas. O paciente na cama ao lado


da de Martin testificou que algo no jornal tinha lhe deixado agitado. “Ele
ficou me perguntando que dia era, como se não pudesse lembrar, pobre
coitado.”

Outra pessoa tinha lhe visto sair de fininho, com uma jaqueta de terno
debaixo de seu braço. Suas mãos estavam tremendo. “Eu achei que ele ia só
fumar um cigarrinho.” Um porteiro foi enviado para checar, mas voltou de
mãos abanando.

Eu me aproveitei da estação de enfermeiras vazia, no meio tempo, para dar


uma olhada nos registros do computador. Alguém estava logado quando
foram rudemente distraídos. Levou apenas alguns cliques para encontrar o
endereço de Martin Flint.

Esperava que minha moto roubada não tivesse sido presa ou guinchada
ainda.

Martin morava mais ou menos no meio - e no andar de baixo - de uma fila


de sobrados vitorianos, com acabamento em estuque branco e assentos nas
janelas.

Eu estacionei do outro lado da rua às 10:44 da manhã. Meu timing


dificilmente poderia ter sido melhor. Alguém estava justamente saindo do
apartamento, tendo dificuldades com uma tranca. O próprio homem?
Poderia eu ter sido tão sortuda?

Esse homem estava do meio pro fim dos quarenta, idade que combinava com
o que eu tinha recolhido dos registros de Martin no hospital. Seus ombros
estavam curvados como se carregassem o peso do mundo. Ele vestia uma
jaqueta de terno cinza amassada e sapatos marrons - mas foi a maleta que
realmente lhe entregou.

Ele carregava uma maleta de couro marrom surrada, como a que eu tinha
visto no hospital. Não, eu pensei, não como a do hospital…

Eu tinha sim encontrado Martin Flint - mas o Martin Flint errado. Esse era o
modelo mais jovem - mais jovem por oito ou dez horas - aquele que
pertencia a esse momento. Ele estava caminhando com pressa e mantinha a
cabeça baixa, sentido norte na rua, em direção a estação de metrô virando a
esquina.
Eu estava dividida entre procurar por pistas do paradeiro de seu eu futuro no
apartamento ou segui-lo. A primeira opção, eu percebi, podia me deixar com
nada.

Decidi me segurar na minha única pista.

Eu saltei de minha moto e segui o passo do Flint-mais-novo. Nós não


tínhamos ido muito longe quando outra figura virou a esquina na nossa
frente.

Me corrigi de novo: a mesma figura.

Esse Martin Flint estava vestindo botas marrons, sem meias e uma jaqueta
de terno amassada por cima de pijamas de hospital listrados.

O Martin mais novo, prestando pouca atenção aos seus arredores, não tinha
notado seu eu mais velho ainda. Flint-mais-velho, no entanto, tropeçou e
parou diretamente em seu caminho. Ele estava encarando seu gêmeo menos
bagunçado com olhos arregalados.

Eu apertei meu passo - não o suficiente, esperei, para que o Martin mais
jovem me notasse enquanto eu lhe ultrapassava. Me enfiei entre os dois,
abrindo meus braços para bloquear a visão um do outro. “Querido!” eu
elevei a voz. Corri para o Martin mais velho, lhe abracei com força e prendi
seus lábios nos meus.

O Martin mais novo olhou quando passou pela gente, mas não reconheceu a
traseira de sua própria cabeça. Eu segurei o beijo até que ele tivesse virado a
esquina, nesse ponto ele se afastou de mim.

“O que você está fazendo?” Ele balbuciou. “Quem é você?” Para registro,
Querido Diário, quando eu beijo um completo estranho, costumo receber
reações muito melhores.

Olhei para Martin Flint com confiança, um olhar que demonstrava saber
mais do que eu sabia. “O Doutor me mandou –“

“Ah, quem? Eu não acho que conheço nenhum –“


“- e eu posso perceber pelo seu olhar de coelho assustado que sabe
exatamente de quem estou falando, então nem tente mentir pra mim.” Eu
indiquei a esquina ao redor da qual Martin-mais-novo tinha desaparecido.
“Para onde ele está indo?”

“Eu… Ele… Eu tinha que ir para o escritório por umas duas horas. Então eu
tinha uma… uma entrevista na cidade hoje de tarde, só que eu…” Seus
ombros caíram. Ele esfregou seus olhos vermelhos e inchados com seus
polegares. Ele não tinha nem tomado banho nem feito a barba.

“Eu estava em um… Eu estava em um estacionamento? Eu vi uma… uma…

“Uma lesma alienígena gigante e verde?” Eu ofereci as palavras de maneira


prestativa.

“E um homem, tinha um homem lá, com um-“

“Queixo. Então seu apartamento deve ficar vazio pelo resto do dia”

Martin piscou para mim. “Como você sabia que eu moro sozinho?”

“Querido, por onde você quer que eu comece?” Eu disse.

“Eu não... eu não estou ficando louco, estou?” Martin Flint me perguntou.

“Você seria mais capaz de julgar isso do que eu.”

“Mas… hoje é quinta-feira, não? Quinta…”

“Sete de julho.”

Ele afundou em um sofá de aparência usada, com molas rangendo e manchas


velhas no tecido. “Mas eu… Eu já-“

“-já viveu essa quinta-feira, sete de julho, uma vez. Eu sei. Eu acabei de ver
você fazendo isso, lembra? Bem vindo de volta.”

Eu andei por uma pequena cozinha cheia de coisas. Tirei dois copos limpos
de uma pilha de tralha no escorredor e os enchi com água da torneira.
Podia ver Martin pela abertura na partição dos ambientes, apesar de suas
costas estarem viradas para mim. Ele estava encarquilhado, ainda tentando
entender o ininteligível.

“Então, você… Como você sabe sobre-?”

“Seu futuro? Ah, Martin, você sabe como são os dias de hoje. Spoilers para
todos os lugares que você olha, não dá para evita-los. Eu culpo a internet -
por isso e por fazer gatos acreditarem que vão dominr o mundo.”

Eu coloquei um copo de água fria em suas mãos. Ele pegou de mim, mas
não olhou para o objeto. “Você… voltou no tempo também? Você me seguiu
até aqui?”

“Bem, alguém tinha que fazer isso.” Eu declarei. “Você sabe o que teria
acontecido se eu não tivesse te impedido de conhecer a si mesmo?”

“Não, o que teria acontecido?”

“Bom, Isso… depende. Qualquer coisa desde um caso incurável de deja-vu


até a destruição do espaço tempo contínuo. Agora eu estou seriamente
convencida da segunda opção - ou será que você não viu o céu lá fora?”

“A tempestade?” Martin fez careta como se o esforço para lembrar lhe


machucasse. “Você quer dizer que eu…? Não, não pode ser, porque seu
amigo Doutor, eu me lembro dele dizer que a tempestade era causada pelo…
monstro.”

Eu sentei ao seu lado. “A tempestade aconteceu ontem também?” Quer


dizer, hoje? Você tem lembranças da tempestade de hoje, da primeira vez
que viveu esse dia?”

“Sim, sim, é isso que eu quero dizer. Pode ser que… Eu não tenho certeza,
mas pode ser que esteja um pouco pior dessa vez… Isso é possível? Como
isso é possível”

Eu tomei um gole de água. Deixei que o líquido ficasse em minha boca


enquanto pensava.
Então o Doutor estava envolvido no pequeno “acidente” de Martin.

Mas isso não precisava nem ser dito, precisava? Por que outro motivo ele
mesmo não poderia voltar aqui? Ele pode ser um verdadeiro chato com suas
Leis do Tempo - quando lhe convém. Ter dois Martin Flints em Londres no
mesmo dia já era ruim o suficiente. Imagina adicionar dois Doutores em
cima disso…

Com licença, Querido Diário, enquanto eu conjuro essa imagem por um


momento.

Eu pedi que Martin me contasse tudo, desde o começo. “Pensando bem,” eu


disse, “esquece o começo. Vá direto para hoje de manhã.”

“Você quer dizer hoje de manhã pela primeira vez ou…?”

“Depois que você caiu na fenda. Você acordou e …?”

“O estacionamento. Eu ainda estava no estacionamento, só que… O sol


estava nascendo. Eu achei que devia ter ficado lá a noite toda. Estava frio,
tão frio e eu não conseguia me lembrar… só flashes de… Eu devo ter
desmaiado de novo. A próxima coisa da qual me lembro é de estar
quentinho, em uma cama de hospital. As enfermeiras me disseram que tinha
sorte por alguém ter me encontrado quando me encontraram. Tinha um rádio
tocando por perto, e foi…

foi assim que eu soube…”

“Que era quinta de manhã de novo.”

“Eu achei que estava ficando louco.”

“Eu consigo imaginar.”

“E os jornais também… Eu estava tão confuso. Eu tinha que sair de lá. Eu


tinha que voltar para… para o mundo real, para algum lugar que eu
conhecesse. Eu me liberei.”

“Escapou, você quer dizer.”


“Eu peguei minha jaqueta e meus sapatos e sai de fininho quando ninguém
estava olhando. Encontrei o caminho até o metrô. Vim para casa. Eu não sei
o que esperava encontrar aqui.”

“Oh, confie em mim, você deu sorte - se é que eu posso opinar.”

“Eu só quero… Eu não sei, ir dormir e acordar amanhã, sexta de manhã,


quando não tiver “outro” de mim por ai e tudo fizer sentido de novo.”

“E isso é tudo?”

“O que você quer dizer?”

Eu lhe mirei com os olhos entreabertos. “Você não tem mais nada para me
contar?”

“Não.” Martin insistiu, mas não olhou em meus olhos.

“Então você veio direto para casa do hospital. Não fez nenhum desvio?”

“Eu já disse que não.”

Olhei para o relógio de mesa na estante acima da lareira. Me disse que a hora
era 11:03. Eu tinha saído do hospital depois dele, mas chego antes em casa.

Nós tínhamos usado diferentes meios de transporte, no entanto. Ele poderia


estar me dizendo a verdade.

Todos os meus instintos me diziam o contrário.

“Martin, me escute, isso é importante. Você não deveria estar aqui, sabe
disso.

Todas as decisões que tomar no passado tem consequências, e elas podem-”

“Mas e você?” ele me interrompeu, com um pico de beligerância. “Você não


deveria estar aqui também, deveria?”
“Não,” Eu confessei. “Eu não deveria, mas eu sei o que estou fazendo. Eu
sei em quais borboletas não pisar - e Martin, eu não estou cruzando a minha
própria linha do tempo. Já ouviu falar do paradoxo do avô?”

“Não tenho certeza. Esse é aquele no qual-?”

“Você tem que ter visto De Volta Para O Futuro.”

Seus olhos se arregalaram. “É… É com isso que você está preocupada? Mas
você viu tudo o que aconteceu. Eu não falei com ele. O outro eu, ele não me
viu.

Quer dizer, eu nem me vi. Ele não. eu não vou…”

Seu cenho franziu da maneira característica de um viajante no tempo


confuso com tempos verbais e pronomes. Eu tinha que admitir, no entanto,
que ele tinha um ponto. Ele não tinha interagido com si mesmo. Eu o tinha
tirado de cena antes que pudesse. Então, o que quer que Martin Flint
estivesse escondendo de mim

- e eu sabia que havia algo - quão importante podia ser?

Eu me levantei e cruzei o ambiente, até uma janela nos fundos. Tinha vista
para um quintal austero com poucas flores murchando em canteiros. A
construção devia ser em um declive, pois o quintal - e o beco atrás dele -
estavam no mesmo nível da sala de estar de Martin. Degraus descem até o
mencionado anteriormente vindos do apartamento de cima.

Se eu dobrasse meu pescoço, podia ver um pedaço de um turbulento céu


vermelho. A tempestade estava ficando pior, eu imaginei?

A melhor coisa provavelmente seria deixar Martin dormir, como o mesmo


queria.

Ficar de vigia por pouco mais de três horas e meia, e então sair de fininho.

Confiar que, o que quer que estivesse acontecendo lá fora, o Doutor cuidaria
de tudo - sim, já estava sob controle. Um simples trabalho de babá, então,
conforme o anunciado.
Eu virei de volta para Martin. Ele estava abraçando seus joelhos, olhando
desfocado para a frente. “Conte-me sobre o doutor e a lesma alienígena
verde gigante,” eu disse. “Me diz o que aconteceu no estacionamento.”

Uma sombra passou pela janela da frente, conforme alguém descia os


degraus até a porta de Martin. Um zumbido repentino assustou Martin, que
pulou de onde estava sentado.

“Não atenda a porta,” lhe adverti. “Martin Flint não está em casa, lembra?”
Ele está sentado em um trem a caminho do escritório, então ele tem-”

Não é necessário dizer que minhas palavras caíram em ouvidos surdos.

“é o Senhor Smith!” Martin gritou, olhando através de uma cortina de rede


suja.

“Quem?”

“é o Senhor… O que ele está fazendo aqui? Isso poderia ser importante. Eu
tenho que… “

Ele se enfiou no pequeno corredor antes que eu pudesse pará-lo. Ele abriu a
porta. Escutei sua voz e outra - suave e rouca - trocando amenidades. Então
Martin voltou, com seu visitante lhe seguindo. “Senhor Smith, essa é, uh… “

“River,” Eu disse. “River Song.”

Nenhum de nós se prontificou a iniciar um aperto de mãos. Nós olhamos


com reconhecimento - e suspeita - em nossos olhos enquanto Martin
continuou a falar, desatento.

“E esse é, ah, Senhor Smith. Eu tinha… Eu tenho uma entrevista com ele
hoje de tarde, lembra que eu mencionei? Uma segunda entrevista. Ele cuida
de um negócio na cidade chamado-”

“- Dead Cert Investimentos,” Eu deduzi.

Querido Diário, mas é claro que era o homem com óculos do


estacionamento.
Martin olhou para seus pijamas do hospital auto conscientemente. “Ah, sim.
Eu deveria provavelmente ir e… sinta-se em casa, Senhor Smith, eu vou
demorar só um…“ Ele se apressou para atravessar o corredor e entrar no -
que eu assumi ser - seu quarto.

No meio tempo, ‘Senhor Smith’ e eu avaliamos um ao outro com cuidado.

“Então você encontrou seu ‘amigo’, Senhorita Song. Fico feliz por você.”

“Sim, encontrei, obrigada.”

Seus lábios se contorceram em um sorriso, que não alcançava seus severos


olhos cinzentos. “Eu pensei que deveria dar uma checada no Senhor Flint,
ver se tudo estava… como deveria.”

“Quão gentil da sua parte. Diga-me, Senhor Smith,” eu disse friamente, “O


que exatamente a Dead Cert Investimentos faz? Não, deixe-me adivinhar -
vocês lidam com futuros.”

“Isso seria uma área de interesse para você, eu assumo?”

“Pode-se dizer que eu já me envolvi nisso.”

“Talvez você devesse marcar uma entrevista para si mesma. Isso é, se seus
empregadores atuais não tiverem objeções?”

“Oh, eu não trabalho para - Ah.” Senhor Smith estava encarando meu pulso
direito incisivamente. Minha manga tinha ficado presa acima do
Manipulador de Vórtex.

Sua expressão não deixou dúvidas em mim de que ele reconheceu o objeto
pelo que era.

Sua mão foi para seu quadril. Eu já estava pulando para o abrigo atrás do
sofá.

De repente, ele tinha uma arma, como se tirada de um coldre invisível. Era
um blaster branco cheio de rebites que certamente não tinha sido produzido
nesse mundo ou nesse ano. Ele atirou um raio de energia, que queimou
acima da minha cabeça e transformou um espelho na parede em gosma.

Ele tropeçou ao redor do sofá e atirou de novo.

Um buraco circular foi queimado no tapete de Martin.

Eu já tinha me mexido para fora de seu caminho. Peguei um cinzeiro da


mesa de centro e joguei como se fosse um disco. Atingiu meu agressor na
testa, desalinhando seu próximo tiro, que destruiu a janela da frente. Me
joguei atrás do cinzeiro. Derrubei o Senhor Smith no chão enquanto ele
estava confuso.

Ele era mais forte do que parecia, conseguiu me tirar de cima dele. Ele
tentou se arrastar até sua arma caída e eu peguei em seu cinto, pelo menos
achei que sim. Tentei arrastá-lo de volta em minha direção, mas algo saiu em
minha mão ao invés disso. No mesmo momento, houve um flash de luz
verde e a aparência do Senhor Smith… mudou.

Eu segurava um objeto esférico pequeno, com um painel de controle e uma


pequena lente embutida: um projetor holográfico.

Eu estava olhando para um monstro verde e gordo, seu tecido macio


brilhando com umidade. Não sabia qual era a espécie, mas a descrição
certamente era familiar.

A criatura se levantou sobre sua cauda, com um som de sucção, ficando


muito mais alta que eu. Um par de antenas inquietas brotaram de sua cabeça,
com olhos queimando em vermelho nas pontas. O monstro vestia um manto
mecânico, do qual se estendia um par de braços cibernéticos. Um deles
segurava o blaster, do qual um tubo branco serpenteava até se juntar ao
manto.

Mergulhei para a segurança da pequena cozinha, enquanto a lesma gigante


bombardeava o ambiente atrás de mim.

Eu procurei por uma arma: uma faca, qualquer coisa que eu pudesse usar.
Tinha que ser o Doutor para me mandar para uma situação perigosa
desarmada! Eu juro, amo aquele homem, mas as vezes quero bater nele.
Escutei uma voz assustada do ambiente de fora, então uma briga e um
guincho estrangulado.

Martin tinha voltado e, é claro, a lesma gigante lhe pegara.

Dei uma espiada pela janela de serviço, vestido em um terno e camisa


exatamente iguais aos anteriores. Pelo menos ele vestia meias agora.

“Saia daí, Agente do tempo.” o monstro sibilou. Sua voz, que parecia com a
do Senhor Smith, emergia de uma grade em seu manto enquanto seus olhos
em suas antenas piscavam furiosamente em suas antenas. A criatura
segurava Martin com um braço mecânico ao redor de sua garganta e
pressionava a arma em sua cabeça. “Ou me assista matar seu amigo.”

“Era você.” Martin choramingou. “Senhor Smith, você era o monstro do


tempo -”

“Ah, eu não sou uma Agente do Tempo,” eu disse com pressa, me


sobrepondo a sua voz. “Mas sou eu quem deveria estar fazendo ameaças. Eu
tenho…” Eu não tinha nada. O que eu precisava era de inspiração. Olhei ao
redor em procura de algo. Uma lesma gigante, eu pensei, e eu estou em uma
cozinha. Por que não? “Eu tenho um grande saco de sal e não tenho medo
de usá-lo.”

Um arrepio convulsionou o corpo da lesma das antenas até a cauda.

Eu agarrei a oportunidade. “Olha,” eu disse, “Senhor… na verdade, do que


eu te chamo agora? Você não parece muito com um “Smith” para mim.”

“Gharjhax,” a criatura parecia sugar o ar. “Eu sou Gharjhax, príncipe em


exílio do Poderoso Império Jardim da Aliança Gastrópodica, e eu-”

“Mas com certeza - e eu sou apenas uma mulher louca com um Manipulador
de Vórtex, que apareceu em seu estacionamento quando eu apareci apenas
por acidente. Então você tem feito um pouco de viagem no tempo por conta
própria?

Eu dificilmente poderia criticar, e eu não vim até aqui para colocar um fim
nisso.”
Até agora era tudo verdade.

“E eu… eu não quis…” Martin interrompeu. “Eu fui para a minha entrevista,
te vi lutando com aquele tal de Doutor no estacionamento e eu-”

Eu o interrompi de novo. “Que tal isso?” sugeri. “Você solta o Martin, eu te


devolvo seu projetor holográfico. Você descobriria ser bem difícil comandar
um negócio sem ele. Seus clientes ficariam encarando. Faremos a troca e nós
três saímos daqui andando, sem ninguém atirar em ninguém. Vamos seguir
nossos próprios caminhos e nunca mais-”

“Concordo,” Gharjhax disse - rápido demais, eu pensei.

Fizemos a troca mesmo assim.

Joguei o projetor para Gharjhax, deliberadamente alto demais. Ele empurrou


seu refém para longe de si enquanto tentava pegar o dispositivo. Martin
tropeçou para dentro da cozinha, tremendo. Eu já estava na porta dos fundos,
lutando com a tranca. Arrastei Martin para o quintal antes que pudesse dizer
uma palavra e lhe disse para correr.

Gharjhax apareceu atrás de mim com seu blaster em posição. Eu sabia que
não podia confiar nele. “Na verdade-” ele começou. Eu tenho certeza que
teria sido uma fala perfeitamente vigorosa. Eu também não queria escutar.
Não tinha encontrado um saco cheio de sal, mas tinha visto um pote pela
metade em um dos balcões. Sacudi isso na direção da lesma.

Ele guinchou - mais de medo do que de dor eu acho, poucos grãos poderiam
ter lhe atingido - e seu tiro saiu pela culatra. Atingiu uma das lâmpadas
compridas no teto, precipitando uma chuva de eletricidade entre nós.

Eu corri atrás de Martin, através do quintal. Ele me esperava atrás do portão


e eu colidi com ele. “Continue correndo, seu idiota!” Eu gritei para ele - e
nós corremos.

Martin queria voltar para seu apartamento.

Ele se preocupou com a porta dos fundos aberta e a janela derretida. Disse
que haviam acontecido assaltos na área. Eu lhe disse que, se Gharjhax
colocasse os olhos nele de novo, ele perderia mais que suas posses.

“É você quem ele quer matar.” ele respondeu taciturnamente.

Querido Diário, ele não estava errado.

Já tive a ideia de não pisar em borboletas. Eu sabia agora que Gharjhax tinha
visto ou detectado minha chegada em 2016 - enquanto eu o tinha dado o
nome de Martin Flint e, portanto, lhe dito exatamente onde me encontrar
mais tarde.

Bem, como eu deveria saber que ele teria o endereço de Martin no arquivo?

O tom vermelho sangue do céu tinha definitivamente escurecido, enquanto


raios atingem com maior frequência e mais violento do que antes. Um trovão
rugiu ameaçadoramente na distância. “Gharjhax tem um horário com o
Doutor essa tarde,” eu disse meio para mim mesma. “Se ele perder isso por
minha culpa… “

Outro pensamento, ainda pior, me atingiu.

Eu agarrei a mão de Martin e comecei a correr de novo, ignorando seu uivo


de protesto. Arrastei ele em direção à estação de metrô. “Nós vamos para seu
escritório.”

“Mas meu… meu outro eu está lá, e você disse-”

“Eu sei o que eu disse, Martin. Isso é sobre o que você disse.”

“O que você quer dizer? Eu não… “

“Você poderia muito bem ter previsto o futuro de Gharjhax para ele lá atrás.
Você lhe avisou que algo ruim está prestes a acontecer com ele - e que você,
sua versão mais nova, estará envolvida. O que você faria, armado com essa
informação, se fosse uma lesma alienígena gigante, verde, homicida e que
viaja no tempo?”

“Eu… Eu…“ Martin ficou pálido.


Alcançamos a estação de trem. Persuadi meu companheiro atordoado a me
comprar um cartão de metrô, e fomos esperar em uma plataforma ao ar livre.

“Eu deveria ligar para ele.” Martin disse de repente. “Eu. Eu deveria me
avisar sobre...“ Ele estremeceu enquanto apalpava seus bolsos. “Meu
telefone. Eu deixei na minha maleta no hospital. Será que tem um telefone
público por aqui?

Você consegue ver um?”

“Ligar para si mesmo não é nunca uma boa ideia,” Eu lhe aconselhei. “Só
imagina por um segundo como essa conversa seria - e de qualquer forma
nosso trem chegou.”

Estava apenas parando, com um ruído estridente. Nessa hora do dia, a essa
distância do centro da cidade, seus vagões estavam praticamente vazios.

Perguntei para Martin quanto tempo a jornada levaria. “Em um dia bom, três
quartos de hora,” foi sua resposta.

Poderia Gharjhax chegar lá mais rápido? Eu imaginei. Primeiro ele teria que
juntar os pontos, então encontrar o endereço do trabalho de Martin - a não
ser que já tivesse - e o estacionamento atrás de seu escritório estava vazio, eu
me lembrei.

Me ocorreu que ele poderia estar no trem conosco, em um novo disfarce


holográfico.

Os próximos quarenta e cinco minutos passaram em uma lenta agonia.

Martin trabalhava no quarto andar de um prédio de concreto e vidro, não


muito longe do Barbican Centre. Nos aproximamos correndo e vimos um
carro de polícia e uma ambulância estacionados do lado de fora. Isso pode
significar qualquer coisa, eu disse para mim mesma.

Meu coração afundou com a visão de uma familiar moto jogada do lado de
fora das portas.

Eu escolhi não esperar pelo elevador.


Quando finalmente superamos as escadas, Martin estava ofegante e suando.
Eu vi isso como algo bom, pois significava que não poderia falar muito. Seu
escritório era um centro de atividade - havia paramédicos e alguns policiais
presentes - então a última coisa da qual eu precisava era ele falando algo que
não deveria sem querer.

Gharjhax havia deixado sua marca aqui. Haviam marcas de queimadura nas
paredes e um cheiro ionizado no ar. Monitores de computador e teclados
haviam sido derretidos em novas e interessantes formas. Cadeiras tinham
sido derrubadas.

Trabalhadores em choque sentavam em pequenos grupos. Alguns deles


estavam recebendo atenção médica, mas nenhum parecia ter ferimentos
graves.

Ou Gharjhax era um péssimo atirador - e eu não posso descartar essa


possibilidade - ou ele não estava atirando para matar.

Um funcionário estava notavelmente desaparecido.

“Estou procurando por Martin Flint,” anunciei. “Onde ele está?”

Um adolescente com a cara pálida em um terno mal ajustado piscou para


mim.

“é ele, bem ali. Ele está bem atrás de você.”

“Sim. Claro. Obviamente. O que eu quis dizer era-”

“Martin!”

O grito veio de duas direções ao mesmo tempo, e ecoou ao nosso redor


como um sussurro: “Martin… Martin… Martin…“ De repente, éramos o
centro das

atenções - e as pessoas convergiam em nós, transbordando perguntas. Martin


está bem? Onde ele estava? O que ele sabia sobre o monstro que tinha
invadido suas vidas?
“Estavam procurando por você,” alguém explicou de maneira prestativa.

“Chamou pelo seu nome! O que raios está acontecendo, Martin?”

Eu improvisei. “Ele não pode falar. Ele está em choque. O que o monstro fez
com ele?” Eu não tinha visto um corpo, ainda bem. “Levou ele como refém?
Pareceu em algum momento que - sei lá - ele foi desintegrado?

Martin soltou um grunhido estrangulado.

“Ele não estava aqui,” o adolescente pálido ofereceu. “Foi por isso que o
monstro atirou no lugar todo. Disse que se não disséssemos onde ele estava
-”

“Não estava aqui?” Martin havia encontrado sua voz. “Mas isso é
impossível.

Eu…

“O que disseram para o monstro?” Eu perguntei.

“Não tivemos escolha. Desculpa, Martin, mas aquilo teria matado todos
nós.”

“Kath contou sobre sua ligação,” outra pessoa interrompeu, “do banco. Ela
disse que você tinha ido resolver algumas coisas - mas ela não sabia para
qual banco você tinha ido, não exatamente. Nenhum de nós sabia. Então -”

Eu virei para Martin. “Qual banco?”

“Tem uma filial perto do meu apartamento, mas eu nunca… “

Eu dei uma olhada para procurar um relógio de parede não derretido. Era
12:34.

“Está na hora de fazermos aquela ligação,” Eu decidi. Recuperei um telefone


de mesa do chão, chequei se ainda estava funcionando e enfiei ele nas mãos
de Martin, segurando no receptor. Lhe instrui que discasse.
Eu escutei o toque do retorno, imaginando o que eu diria para Martin Flint
quando ele atendesse. Acontece que eu não tinha que me preocupar com
isso.

Escutei uma pequena versão de uma música pop dos anos 80, abafada, mas
crescendo em volume conforme a fonte se aproximava de mim. Uma jovem
mulher vestida perfeitamente bem com os cabelos bagunçados estava
carregando uma maleta conhecida.

“Você saiu com tanta pressa que se esqueceu de levar isso com você. Eu
tentei te alcançar, mas…” Ela levou a maleta para Martin, que remexeu no
conteúdo por trás de uma aba de couro maltratado, achando um telefone
móvel tocando e me dando um olhar desamparado.

Mais policiais estavam chegando, fazendo perguntas, rabiscando em


caderninhos. Levei Martin para longe dali, antes que pudessem nos arrastar
para dentro da investigação. Escapamos por uma porta lateral que não era
vigiada.

Conforme nos arrastamos para descer quatro lances de escada juntos, eu


avisei meu acompanhante, “Você tem muitas explicações para fazer.”

“Eu fiz besteira, não fiz?” Disse Martin desamparado. “Mudei meu próprio
passado. De volta para o futuro. O que acontece agora? Eu vou começar a…

desaparecer?” Ele apertou os olhos e se concentrou nas próprias mãos,


virando-as à sua frente, balançando os dedos.

“Esse pode ser o menor de nossos problemas,” Eu murmurei.

Estávamos apoiados em uma parede baixa do lado de fora da Estação da Rua


Liverpool, com corrimões atrás da gente. Eu tinha feito os cálculos. Não
poderíamos chegar ao banco, achar Martin Flint-mais-jovem e levá-lo para
sua entrevista de emprego a tempo.

Se Martin não chegasse na entrevista, ele não cairia na fenda do vórtex e


retornaria para hoje de manhã. Tudo voltaria para como era. Martin
apareceria para sua entrevista e cairia na fenda de novo, amarrando a história
em um nó.
“Ele vai conseguir.” Martin Flint-mais-velho insistiu. “Ele vai. Eu realmente
queria aquele trabalho. Significaria mais dinheiro, muito mais, e minha
primeira entrevista foi muito boa, eu realmente pensei que tinha uma chance.
Então qualquer que seja o problema no banco, tenho certeza que-”

“Qual é o problema no banco? Martin?”

“Eu não sei. Como poderia saber?”

“O que você fez? A verdade, dessa vez. Eu sei que tem alguma coisa.”

Ele se mexeu desconfortavelmente. “Às vezes, eu suponho, o banco me liga


sobre… o que eles chamam de “atividade incomum” na minha conta.”

“Como por exemplo?”

“Eu posso ter… Eu fiz… Eu fiz uma aposta. Uma aposta pequena. Talvez
não tão pequena… “

Ele me deu um olhar de canto de olho. Deve ter visto a reprovação em meus
olhos porque ficou na defensiva. “Bem, como eu deveria saber…? Eu
chequei os resultados da corrida antes de sair do escritório. No hospital,
lembrei do ganhador do 12:30, chances de 16-para-um… e eu não merecia
algo depois de…?

“Você apostou todo seu dinheiro em um cavalo,” Eu resumi.

“Sim.”

“Um apostador te deixou fazer isso?”

Martin deu de ombros. “Foi preciso um pouco de persuasão, mas Geof. me


conhece - e ele já pegou o suficiente de mim no passado. Ele já vai ter
repassado a maior parte para os superiores, de qualquer forma, então não é
como se ele fosse perder… quer dizer, não é como se eu realmente…”

“Pegasse algo que não te pertence?”


Olha só, Querido Diário, eu em meu pedestal! A verdade é, eu não estou
nem aí se Martin Flint - ou uma centena de lesmas alienígenas gigantes e
verdes diga-se de passagem - enriquecer usando viagem no tempo, contanto
que sejam cuidadosos. Contanto que não tentem pegar coisas demais. Toda
ação que você toma no passado tem consequências…

“Empresas assim,” Martin resmungou, estudando seus sapatos, “algumas


milhares de libras não são nada, realmente nada, para eles. Não vão nem dar
falta.”

Os raios brilharam diretamente acima de nós. A trovoada mais feroz até


agora abafou o ruído do trânsito. Nós dois olhamos para cima
apreensivamente. “Não,”

eu concordei com Martin, “Você provavelmente está certo sobre isso. Eles
provavelmente não vão dar falta.”

“Você, um, disse algo de manhã, sobre… destruição?”

“A destruição do tempo contínuo. Sim.”

“Isso seria… ruim, não seria?” Eu não senti necessidade de responder aquela
pergunta. “Tem algo que a gente poderia, você sabe, fazer a respeito disso?”

Eu desviei meu olhar do céu vermelho sangue. Me concentrei no momento.


“Há sempre algo,” Eu mantive, “especialmente quando o Doutor está
envolvido.”

“O Doutor?”

“Eu não fui completamente honesta com você também. Eu já pisoteei


algumas borboletas no meu tempo. Algumas borboletas bem grandes.” Lago
Silêncio, por exemplo, eu pensei. “Mas o Doutor encontrou um jeito de
consertar as coisas.

Ele sempre encontra.”

Martin Flint disse “Ah.”


Eu fiz uma cara de desaprovação para ele. “Agora qual é o problema?”

“é só que, eu acho… Eu posso ter salvo a vida dele. No estacionamento. O

monstro estava prestes a… e eu… então se eu nunca estive lá… “

Eu respirei fundo. Me disse para não entrar em pânico. Meus ouvidos


estavam cheios do barulho do trovão. Estávamos ficando sem opções.

Retornamos para o lugar onde - se você puder perdoar meus tempos verbais
bagunçados, Querido Diário - tudo estava prestes a começar.

Dead Cert Investimentos ocupava um escritório acima de uma sala comercial


vazia na rua Great Russell. Era tão comum visto de frente quanto dos
fundos.

Tínhamos tempo para matar. Era 1:52 da tarde. Tínhamos chegado cedo.

“Me conta o que aconteceu de novo.” Eu exigi.

Martin aquiesceu. “Eu cheguei aqui… vou chegar aqui às 2:20. Interfonei e
interfonei, mas ninguém me atendeu. Ele indicou um sistema de controle de
entrada com três botões. “Pensei que talvez tivesse chegado muito cedo.
Esperei até meia hora depois do meu horário marcado, mas ninguém veio.
Comecei a me perguntar se tinha errado a hora ou o dia ou… “

“Então você decidiu…?” Eu lhe dei um empurrãozinho.

“Dar uma olhada nos fundos do prédio, ver se tinha outra porta lá.”

“E tinha,” Me lembrei. Com um passo rápido, levei Martin por uma familiar
viela em direção ao conhecido estacionamento pavimentado.

“Então foi aqui que você os viu: Gharjhax e o Doutor.”

Martin concordou com a cabeça. “Eu escutei os dois gritando pra começo de
conversa, e vi umas luzes estranhas piscando. Eu virei a esquina daquele
prédio ali, e o - Doutor? - estava no topo daqueles degraus perto da porta,
enquanto o monstro -”
“A porta. Estava fechada ou aberta?” Eu perguntei.

O cenho de Martin se franziu. “Estava… aberta, eu acho. Não, fechada. A


porta estava fechada. A porta definitivamente estava fechada.”

Eu subi os degraus até a saída de incêndio, onde tinha visto “Senhor Smith”

naquela manhã. Me abaixei para examiná-la. Não havia como abri-la por
esse lado. Tentei empurrá-la experimentalmente. A porta não se rendeu.
Uma chave de fenda sônica abriria ela em um segundo, é claro - desde que o
dono tivesse um segundo.

“E Gharjhax,” perguntei. “Onde ele estava?”

“Ele estava aqui,” disse Martin, atrás de mim. “Ele estava bem aqui no pé
das escadas. Será que isso…? Isso ajuda?”

“Pode ser que sim.” Considerei.

Pus a mão no meu bolso e tirei o batom alucinógeno. Considerando o que


tinha me custado, não era assim que eu imaginava usar ele. A necessidade é
a mãe da invenção.

Rabisquei uma mensagem breve, apenas quatro palavras, em letras com mais
ou menos trinta centímetros de altura, na porta da saída de incêndio. Eu
adicionei três beijos na parte de baixo ao invés de uma assinatura. Me
levantei para admirar meu trabalho.

“E o que fazemos agora?” Martin perguntou.

“Esperamos,” eu respondi. “E observamos.”

“Ah. Isso é tudo?”

“Se formos muito espetacularmente sortudos, pode ser que sim.”

Encontramos um lugar para nos escondermos atrás das latas de lixo, o que
nos deu uma visão perfeita da prospectiva arena. Nós ficamos agachados em
um silêncio nervoso e escutamos a tempestade.
Martin começou a se mexer. Lhe dei uma bronca em um forte sussurro. Ele
estava com câimbra na perna, choramingou. Ele se esqueceu disso rápido o
suficiente quando ouvimos uma tossida suave e um barulho se aproximando
que não parecia nada com passos.

Uma figura curta e arredondada, vestida por um terno, apareceu na entrada


do estacionamento.

Ele observou o espaço asfaltado através de seus óculos arredondados. Ele


checou seu relógio de bolso e acenou com a cabeça para si mesmo com
satisfação. Então se virou e foi para a rua, fora de nosso campo de visão.

“Era… Era ele.” Martin sussurrou desnecessariamente. “Senhor Smith.”

Eu abri a aba da maleta dele para checar a hora em seu celular. Eram 2:16.
“Ele está adiantado.”

“O que isso quer dizer?” Isso é ruim?”

“Quer dizer que ele está aqui. Quer dizer que um membro do nosso elenco
está a postos aguardando sua deixa. Faltam apenas dois. Quer dizer que
temos uma chance.”

A História, como o Doutor sempre diz, é notavelmente resiliente. Apenas


esperava que se mostrasse resiliente o suficiente.

Falando nele, o Doutor foi a nossa próxima chegada.

Ele entrou passeando na cena com suas mãos atrás das costas, assobiando.

Ele chutava pedras imaginárias enquanto caminhava, enquanto sua cabeça se


virava em todas as direções menos a porta dos fundos da Dead Cert
Investimentos. Ele poderia estar interpretando “inocência casual” em um
show de mímica.

Sua cabeça se inclinou como se ouvisse um som suspeito. Ele levantou um


dedo até seu queixo em um estudo de contemplação. Eu acho que ele
murmurou algo para si mesmo.
Quem ele pensava que lhe assistia, de qualquer forma? Além de Martin e eu,
quer dizer. Ah, e claro que a lesma alienígena.

“Aha!” o Doutor exclamou. Ele deu uma virada, jogando um braço em um


gesto dramático, apontando para a porta como se fosse uma seta. Ele
endireitou suas costas. Ele enfiou a mão em seu bolso interno para pegar a
chave de fenda sônica, e agora a sua expressão estava mortalmente séria.

A performance tinha acabado.

Ele subiu os degraus até a porta. Conforme fazia isso, Martin segurou meu
braço, enfiando suas unhas em minha pele. Eu segui seu olhar apavorado.
“Senhor

Smith” tinha retornado. Ele se arrastou para atravessar o minúsculo


estacionamento. Ele tinha seu blaster pronto para atirar e estava mirando nas
costas de seu alvo desatento.

Martin se tensionou, preparado para sair do esconderijo. Coloquei minha


mão firmemente em seu ombro, balançando minha cabeça. Orei para que
estivesse fazendo a coisa certa.

“Senhor Smith” estava bem atrás do Doutor agora. Pensei em todas as


lembranças que não criaríamos se ele morresse aqui hoje. Ele tinha chegado
na porta da saída de incêndio, no entanto. Não tinha como não ver a minha
mensagem escrita em batom para ele: OLHE ATRÁS DE VOCÊ.

Ele girou rapidamente.

A arma de Gharjhax desapareceu para dentro de seu campo holográfico.

“Você deve ser o proprietário,” disse o Doutor, “Senhor…?”

“Smith,” respondeu o alien disfarçado.

O Doutor abriu um sorriso largo em reconhecimento. “Ooh, eu uso esse


nome falso também. Poderíamos ser parentes de mentirinha. Vejamos.
Projetor holográfico montado em um cyber-manto? O som de arrasto que
entrega tudo quando você se mexe. Eu-”
“Eu sei quem você é - Doutor!”

Os olhos do Doutor se apertaram por um momento. Então ele continuou com


animação: “Então agora que já nos apresentamos -”

“Você não é o primeiro Agente do Tempo a tentar me parar!” Gharjhax


sibilou.

“Eu não sou um Agente do Tempo,” disse o Doutor.

“Isso foi o que o último disse”

“Mas eu vou parar você.”

“Isso não vai acontecer.” “Senhor Smith” sorriu seu sorriso contorcido
novamente e de repente sua arma tinha voltado. “Eu vi o futuro.” Ele apertou
o gatilho.

Ao mesmo tempo, o Doutor ativou sua chave de fenda sônica - e a


verdadeira forma de Gharjhax foi revelada em uma nojenta luz verde.

Seu manto cibernético estava danificado. Chiava, cuspia, soltava faíscas - e


eletricidade crepitava ao longo do tubo flexível que conectava o manto ao
blaster.

A arma explodiu, levando a mão direita mecânica de Gharjhax junto.

Ele cambaleou horrorizado. “O que você fez?”

“Erro de design no Manto 5000,” disse o Doutor, quase soando sentido.


“Solte os parafusos certos e você pode causar um curto na placa de controle,
o que -”

Ele perdeu o fio da meada quando Gharjhax soltou um uivo arrepiante e se


jogou em sua direção. Ele deixou uma trilha de aparência pegajosa e
brilhante no asfalto atrás de si.

Os degraus até a saída do incêndio lhe desaceleraram. O Doutor subiu


rapidamente no corrimão e estava prestes a pular quando, repentinamente,
uma segunda lesma gigante apareceu diretamente abaixo dele. seu manto
estava crepitando também. Estava sem uma mão.

“Senhor Smith, qualquer que seja seu nome, me escuta,” O Doutor berrou,
virando de uma lesma gigante para a outra. “Eu não percebi - deveria ter
percebido - mas seu manipulador de vórtex está acoplado ao seu manto. É-”

A primeira lesma lhe empurrou com força contra a parede atrás dele, lhe
tirando a respiração. O Doutor lutou desesperadamente contra ela, mas
estava preso pelo tronco transparente do monstro.

Então, de repente, o monstro desapareceu - para reaparecer, eu assumi, a


alguns passos de distância e alguns segundos atrás - e o Doutor estava livre,
respirando ofegante.

O Gharjhax que sobrara também estava ofegante.

Seu manto estava cercado por uma energia reluzente, que claramente lhe
causava dor. Também gerava descargas em formato de raio em todas as
direções. Martin e eu recuamos quando um atingiu uma lixeira azul bem na
nossa frente, lhe apagando da existência - pelo menos da existência no
presente - e, Querido Diário, essa não foi nem a pior parte.

A energia estava fazendo buracos no próprio ar. As fendas se abriam por um


ou dois segundos, e através delas eu podia ver pedaços do próprio vórtex e
tive que virar meu rosto para longe disso. “Onde está você, Martin?”
murmurei.

Eu escutei o Doutor implorando: “Você tem que me deixar chegar perto o


suficiente para consertar-”

“Não, se afaste de mim!”

“Você não entende o que -”

“Você fez isso comigo! Você!” rugiu Gharjhax.

“A tempestade. Você deve ter notado a tempestade. Estava em fúria antes


mesmo de eu aparecer. Você fez isso. Indo ao futuro e voltando apenas para
obter lucro - perfurou o espaço tempo contínuo como se fosse um escorredor
de macarrão. Eu posso consertar isso, se você -”

“Morra, Doutor, morra!”

“Eu escutei isso,” Martin Flint - o que estava ao meu lado, o errado -
respirou. Eu não entendi o que ele quis dizer a princípio. “Eu estava aqui,”
ele disse com mais urgência, “quando disseram tudo isso - pela primeira vez.
Eu estava aqui.”

Foi aí, Querido Diário, que meu coração parou.

Nós tentamos olhar para além das rajadas de energia do vórtex e dos rasgos
no ar para a entrada do estacionamento - a entrada vazia do estacionamento.
“Eu deveria estar aqui,” insistiu Martin. “Eu deveria estar em pé bem ali.
Onde é que eu fui parar?”

O Doutor tinha pulado o corrimão, caindo no asfalto.

Ele dançou ao redor de seu inimigo. Estava tentando chegar mais perto dele,
mas era repetidamente repelido por raios de energia ou braços mecânicos
fazendo movimentos erráticos.

Ele viu uma abertura - ou acho que tinha visto - e se jogou. A mão
cybertronica restante de Gharjhax lhe pegou pela garganta. O Doutor ficou
de joelhos, tentando desesperadamente falar, apenas sendo capaz de soltar
chiados e sílabas soltas. Os olhos vermelhos da lesma gigante se projetavam
de suas antenas conforme seus dedos de metal ficavam cada vez mais
apertados.

“Vai matar ele,” Martin guinchou. “Você tem que fazer algo!”

Levou todo meu autocontrole para negar com a cabeça. “Queria poder,
Martin,”

disse, “Mas não posso. Não pode ser eu.”

O Doutor tinha me mandado para cá. Ele não tinha ousado cruzar sua própria
linha do tempo. Se eu interferisse diretamente em seu passado, no entanto -
isso seria tão ruim quanto. Como Martin, eu estaria alterando os eventos que
me trouxeram aqui em primeiro lugar.

Se eu precisasse, eu faria e danem-se as consequências!

Eu tinha uma ideia melhor, no entanto. Querido Diário, não era uma ideia
muito legal…

Me virei para encarar Martin. Coloquei minhas mãos em seus ombros


curvados.

“Martin Flint salvou a vida do Doutor,” Lhe lembrei. Foi assim que
aconteceu - e é assim que deve acontecer, se temos alguma esperança de
reparar a história.”

“Mas ele… ele não está aqui!” Martin protestou.

Eu lhe olhei firmemente nos olhos. “Sim, Martin, ele está.”

Demorou um segundo para a compreensão cair sobre ele. Uma sucessão de


emoções cruzou os olhos de Martin Flint em um segundo. Horror veio
primeiro, então medo, aí veio a resignação e finalmente - mais rápido do que
eu esperava para seu crédito - resolução.

Martin olhou de volta para a luta desesperada.

Ele assistia e esperava por seu momento, o momento certo - o mesmo


momento.

Tudo tinha que estar exatamente como estava antes.

Será que ele realmente entendia o que estava prestes a fazer? Eu ainda
imagino se sim.

Um homem normal já teria morrido de asfixia.

A face do Doutor estava vermelha e seus olhos tinham desfocado.


Martin Flint fez a sua parte. Ele saiu correndo do esconderijo e deu com o
ombro em Gharjhax, sua maleta de couro surrado levantada entre os dois
como se fosse um escudo. Isso lhe fez perder o aperto mortal no doutor e lhe
fez cambalear.

Gharjhax colidiu com a parede dos fundos do próprio prédio. Isso deve ter
deslocado algo em seu manto - pois, com um estouro final e uma baforada
de fumaça, o manto morreu. A Lesma gigante foi ao chão, inconsciente ou
morta.

Martin estava cambaleando também. O último rasgo no universo estava


escancarado ao seu lado, faminto, e ele não podendo evitar, tropeçou para
dentro. Em um momento, ele tinha desaparecido e o rasgo se selado atrás
dele

- como se nenhum dos dois tivesse existido.

O Doutor já tinha ficado em pé novamente, com chave de fenda na mão.

“Não.” Ele lamentou para si mesmo. “Não, não, não, não.” Ele se ajoelhou
ao lado do Gharjhax caído e lhe escaneou. Respirou profundamente e lhe
deixou sair.

“Você pode sair agora.” Ele disse quietamente.

Eu sai detrás das latas de lixo. “Olá, querido.”

“River Song. Porque é que, sempre que existe uma ameaça existencial ao
universo do tempo e espaço, você sempre parece estar envolvida?”

“Na verdade, eu acabei de lhe fazer um enorme favor. Como ele está?”

“Vai viver. Vou dar uma ligada para a UNIT. Eles podem mandar um time
para coletar ele em quinze minutos. Então, se eu ligar dez minutos atrás…”

O Doutor ficou em pé e se virou para me olhar. “Estou mais preocupado com


seu amigo - qual era o nome dele? Ele acabou de cair em -”
“- uma fenda no Vórtex. Sim. Ele teria sido jogado de volta no tempo. Algo
entre oito e dez horas. Alguém deveria encontrá-lo.”

Ele me deu uma olhada inquisitiva. Respondi levantando meu dedo para
meus lábios. Ele saberia o que aquilo queria dizer. Pela segunda vez hoje, no
entanto, o dispositivo em meu pulso me traiu. “Pulseira legal,” disse o
Doutor. “Parece familiar.”

“Rapaz esperto.”

“Suponho que temos um encontro, então.”

“Suponho que sim.”

“Posso te oferecer uma carona?”

Eu balancei minha cabeça. “Tenho que amarrar minhas próprias pontas


soltas -

mas uma vez que tiver acabado, temos mesmo um encontro. Em Temple
Beach.”

Sua face se contorceu em desânimo. “Eu não concordei com isso - vou
concordar?”

“Eu achei que poderíamos pular essa parte, economizar tempo.” Eu sorri
docemente. “Eu mencionei que era um favor muito grande?”

O Doutor olhou para o céu turbulento. A tempestade elétrica ainda rugia e


relampejava, a todo vapor. “Ah, okay, tá bom.” ele aquiesceu de má vontade,

“mas já vou te dizendo que não vou usar um fio dental - de novo.”

Ele se virou para ir embora - e nós dois congelamos o passo.

Uma figura tinha aparecido na entrada do estacionamento: um homem do


meio pro fim dos quarenta anos, ombros caídos. Ele vestia um terno cinza e
carregava uma maleta de couro marrom surrado. O Doutor fez uma careta
para ele. “Aquele lá não é…?”
Eu me apressei para alcançar o recém chegado. “Martin Flint.”

Ele pegou minha mão estendida sem muita certeza, ainda tentando olhar para
além de mim, em direção ao monstro adormecido no pavimento. “Um, sim,
eu…

eu estou aqui para uma entrevista com o Senhor Smith, mas estou atrasado
uns minutos, teve um problema no -”

Eu passei meu braço ao redor de seus ombros. Lhe virei firmemente, de


volta em direção à rua.

“Martin, temo ter algumas notícias ruins para lhe contar.”

Então, foi assim que aconteceu no final.

Martin Flint saiu de seu apartamento no subúrbio de Londres às 10:45 da


manhã.

Ele tinha que ir ao seu escritório por algumas horas. Naquela tarde, ele tinha
uma entrevista com um negócio novo, mas promissor baseado na rua Great
Russell.

No escritório, ele recebeu uma ligação do seu banco, lhe dizendo que sua
conta havia sido esvaziada. Agitado, ele saiu para lidar com o problema.

Eu imaginei que isso levou a uma longa reunião com seu gerente do banco
ou representante de serviço ao consumidor. Sem dúvidas, lhe foi prometida
uma profunda investigação. Suas economias de uma vida, no entanto - quase
mil e quinhentas libras - podem ter sido perdidas para sempre.

Não é de se admirar que ele tenha perdido a passagem do tempo!

Ele chegou atrasado para sua entrevista e ninguém atendeu a porta. Ele deu a
volta até os fundos, onde encontrou um par de estranhos. Eles lhe
informaram que a Dead Cert Investimentos tinha sido inesperadamente
liquidada. O contato de Martin ali - um Senhor Smith - tinha deixado o país.
Ele também notou uma lesma alienígena verde e gigante, dormindo no
estacionamento. Eu esperei que ele não tentasse pensar muito a respeito
disso.

Ele tinha deixado sua maleta no trabalho. Outro choque lhe esperava quando
foi colocá-la. Uma lesma alienígena verde e gigante tinha ameaçado seus
colegas de trabalho, à sua procura. Mais desconcertante ainda deve ter sido
seus colegas insistindo que Martin tinha estado ali logo depois do ataque - e
levado sua maleta junto.

Nesse ponto ele já deveria estar se preocupando com sua saúde mental.

Voltando para casa, ele encontrou seu apartamento em uma terrível bagunça.

As únicas coisas sumidas, no entanto, eram algumas roupas de seu armário -

em troca das quais um par de pijamas listrados de hospital tinham sido


deixados em sua cama.

Dois homens da Força Tarefa Unificada de Inteligência estavam esperando


para falar com ele. Ele passou a maior parte da noite tentando responder suas
perguntas, provavelmente não descobrindo nada sobre ele mesmo.

Então, essa foi a Quinta-Feira, sete de julho de 2016. Um ensolarado e


quente dia de verão com céus limpos e cristalinos. Um péssimo dia para
Martin Flint.

Sexta foi bem melhor.

Na Sexta de manhã, Martin encontrou sua maleta no lado de fora de sua


porta da frente. Sua camisa desaparecida, calças do terno e meias estavam
dobradas em cima dela. Seus arquivos de papelada vital para o trabalho
estavam intocados em seus compartimentos, junto de seu telefone - e algo
mais. Uma ficha de aposta, preenchida em sua própria escrita.

Ele entregou a ficha em sua casa de aposta local, hesitante, temendo uma
pegadinha - e se encontrou vinte mil libras mais rico. Ele tinha dinheiro o
suficiente para consertar seu apartamento e mais.
Você está certo, Querido Diário, o Doutor provavelmente não aprovaria. Em
contrapartida, quem é que vai contar para ele? De qualquer forma, eu sei que
ele se apropriou de alguns prêmios de loteria ele mesmo. Como eu disse -
um verdadeiro certinho quando lhe vem a calhar.

Martin merecia o dinheiro.

Ele merecia porque, em algum lugar, em algum tempo, outro Martin Flint - e
não me pergunte de onde ele saiu, pois não há resposta simples pra essa
pergunta

- está preso em um loop temporal perpétuo.

Todos os dias para ele são Quinta-Feira, sete de julho. Toda manhã, ele
acorda com frio em um estacionamento, sua memória em frangalhos. Todas
as tardes, ele tropeça para dentro de uma fenda temporal, que lhe manda de
volta para o começo.

MORTE EM NOVA VENEZA.


Por Guy Adams.
1

Você tem que amar Veneza, é a lei.

Claro, depende do ano. Se você cometer o erro de visitar durante o final do


século XX ou início do século XXI, terá que apertar os olhos um pouco. As
multidões, as enchentes, os turistas corpulentos tirando selfies com
violinistas cantando ... Os Gondoleiros, cantando qualquer velha besteira ao
estilo italiano para apaziguar casais cuja abordagem do romance é jogar
dinheiro e clichê.

(Certa vez, vi um gondoleiro martelar canções de Tom Jones, com o rosto


vazio, seus clientes em transe, como se ‘Delilah’ pudesse, talvez, ter sido
escrita por Verdi.)

Esses são os momentos fast-food. Os compromissos. É o que acontece


quando um lugar é forçado a vender um pedaço de sua alma para manter o
dinheiro entrando. Afinal, é preciso manter as luzes de alguma forma.

Uma das principais vantagens da viagem no tempo é que você pode fazer
compras. Pegue o final do século XV, por exemplo: cheira mal, mas tem
classe.

Ele também tem uma atitude bastante libertária (amo uma atitude libertária).

Quero dizer, sim, depois de alguns dias adoráveis trabalhando, acabei sendo
perseguida pelos guardas do Doge, nada mais justo, eu havia invadido o
palácio, então eles estavam apenas fazendo seu trabalho.

Mas claro, eu também estava apenas fazendo meu trabalho, algo que eu
precisava explicar a Docherty, aparentemente diariamente.

—Professora Song— ele dizia —por favor, apenas faça o seu trabalho.

Vamos falar sobre ele mais tarde.


Então, sim, eu tive que olhar mais de perto o Palácio do Doge, porque ...

Bem, vamos falar sobre isso mais tarde também.

De qualquer forma, eu estava me divertindo muito, vagando pelos


corredores, olhando as pinturas, fazendo uma degustação nas adegas, tudo
em nome da pesquisa honesta. E sim, devo admitir que ser pega no quarto do
Doge foi estranho para todos os envolvidos, mas eu simplesmente tive que
experimentar seus lençóis e, dê-me um pouco de crédito, eu já fiz pior, pelo
menos o Doge não estava no quarto no momento.

E sim, tentar juntar minhas roupas enquanto os soldados estavam balançando


as espadas para mim foi irritante (mas você simplesmente não aprecia um
bom

algodão, a menos que o sinta próximo à pele). E sim, acho que o Capitão da
Guarda estava exagerando um pouco quando tentou me enganar com um
machado decorativo, mas, viva e deixe viver, foram surpreendentes cinco
minutos para todos nós e tenho certeza que ele provavelmente é um boneco
quando não está sendo jogado para o ar por uma mulher parcialmente
vestida.

Eu mantive minha calma e não deixei a situação me distrair da minha


pesquisa.

Até parei para apreciar e memorizar o encantador vitral que dava para o
Grande Canal.

Devo admitir que o esmaguei com o machado decorativo acima mencionado,


mas quando uma garota precisa de uma saída, ela faz o que tem que fazer.

Houve um pôr do sol simplesmente espetacular naquela noite, notei


enquanto deixava a gravidade ter seu jeito perverso comigo. Lembro-me de
pensar que mais pessoas deveriam estar olhando para ele, mas acho que uma
mulher voando pode acabar te distraindo bastante.

Existe apenas uma perspectiva verdadeiramente aceitável para apreciar o


Grande Canal: estar do lado de fora dele. Eu tomei banho quatro vezes desde
aquele mergulho e ainda sinto o cheiro de todas as coisas que você não
gostaria de sentir que podem ser encontradas nos canais. São momentos
como este que me fazem pensar se a DreamInc está me pagando o suficiente.

DreamInc, sim, vamos falar um pouco sobre eles, certo? Afinal, todo mundo
fala.

Estabelecido no final do século vinte e sete (Terra Padrão) por um par de


jovens benignos, hippies espaciais, eles eram feitos de quinoa e barbas, era
para ser a empresa de viagens ética e socialmente consciente. Férias de baixo
impacto ecológico para o profissional bem pago que queria um complemento
extra de satisfação com as férias. Era doce, à sua maneira, e não tenho
dúvidas de que seus fundadores originais tinham boas intenções, até que lhes
foi oferecido uma quantia pela empresa que rivalizaria com o PIB da maioria
dos planetas. Nesse ponto eles rasparam as barbas, acumularam o dinheiro e
se retiraram para um canto particularmente brilhante do universo para gastá-
lo de maneiras emocionantes e exaustivas.

O atual proprietário da empresa é uma corporação gerida por Krellane, o


planeta úmido e cheio de crustáceos mais famoso por sua fabricação de
armas. Vocês já sabem, é a vida e eu não vou adicionar à considerável reação
jornalística que já existe. Hippies se vendem, o dinheiro fala. Nada de novo
...

Além disso, eles são meus atuais empregadores, e a seção 87, parágrafo 112

do meu contrato estipula que se eu levantar uma sobrancelha sarcástica


quanto à integridade da empresa, estarei em violação dos termos e, por mais
que eu ame levantar sobrancelhas, sarcasticamente ou não, não vou gastar
quatro milhões de créditos nisso, mesmo aqui em um diário particular.

Felizmente, meu contrato não faz tal estipulação quando se trata de discutir
os funcionários da empresa, então deixe-me deixar registrado: o gerente
executivo da DreamInc com quem tenho lidado, Milton Docherty, é um
canalha, e apenas olhar para ele faz meus órgãos reprodutivos esconder-se à
esquerda dos meus

rins com medo de permitir que acidentalmente seu DNA se propague. Isso
nunca aconteceria, eles deveriam confiar em mim, mas posso entender sua
recusa em assumir riscos desnecessários.

Em algum momento, alguém uma vez disse a ele que um rabo de cavalo era
atraente, possivelmente como uma piada. Não conseguindo ver o lado
engraçado, ele teve um transplantado e o resultado enrola-se em seu pescoço
de uma forma que só seria aceitável se o estrangulasse.

Ele usa ternos feitos daquela horrenda seda strackiana que muda de cor para
complementar o ambiente. Como ele atualmente está gastando muito do seu
tempo em um canteiro de obras, isso significa que ele está vagando por aí
usando meio milhão de sacos de crédito de cimento.

Ele tem duas maneiras de apertar a mão das pessoas. Se você é um homem,
ele o ataca, desesperado para provar o quão forte é seu controle. Se você é
mulher, ele fica parado, como se esperasse que você se esquecesse de
compilar seu corpo corretamente naquela manhã e você acidentalmente
colocou uma parte muito mais frutada de si mesmo onde suas palmas
deveriam estar.

Basicamente: ele é simplesmente horrível.

Talvez eu esteja sendo injusto, deve haver algo bom que posso dizer sobre
ele.

Ah, sim, ele teve o bom senso de me contratar. Talvez ele apenas goste de
apertar minha mão.

Ele está trabalhando nos estágios finais do novo empreendimento comercial


da DreamInc, um projeto habitacional exclusivo chamado Nova Veneza.
Quando terminar (o que será em questão de algumas semanas), será uma
comunidade planetária fechada voltada para o tipo de pessoas que são tão
ricas que mal se darão ao trabalho de viver lá, assim como não fazem em
todas as suas outras casas exclusivas. Uma coleção meio vazia e brilhante de
casas tão tecnologicamente avançadas que estão a apenas alguns toques de
distância da consciência. Vai ser horrível, mas ser contratado para ajudar a
projetá-lo terá pagado minhas contas no futuro próximo, então eu não me
importo nem um pouco. Não sou um árbitro do bom gosto universal, deixe-
os fazer o que quiserem.
O trunfo do DreamInc é uma nova invenção chamada WishCrete (ah, como
eu gostaria que eles parassem de trocar palavras, só é encantador quando
você é alemão). É ... espere ... onde está o folheto ...?

“Uma inovação na tecnologia de construção psíquica ativa, uma substância


de construção amorfa e flexível inicialmente programável por meio de input
mental focado que continuará a mudar a longo prazo uma vez que reflete os
desejos e pensamentos das pessoas próximas a ele. " O que é uma maneira
um tanto exagerada de dizer que você pensa que está em forma. Uma casa
que pode alterar sua estrutura dependendo dos desejos de seus residentes.
Porque isso não pode dar errado, pode? Estou ansiosa para a primeira
discussão doméstica aqui em Nova Veneza e o comunicado de imprensa
resultante que explica

precisamente por que uma cozinha espancando seus habitantes até virar
polpa não era responsabilidade legal da DreamInc.

O WishCrete também é onde eu entro e por que tenho feito tantas viagens
divertidas para Veneza ao longo dos tempos, absorvendo a atmosfera em
geral e a arquitetura em particular. Cada manhã, estou conectado ao hub de
programação central WishCrete e o que aprendi é absorvido em sua estrutura
central. Claro, DreamInc não sabe que estou obtendo minhas informações
por realmente ir para Veneza, eles só pensam que sou terrivelmente
inteligente e bem informada. O que eu sou, então, se este diário cair em suas
mãos, também gostaria de salientar que, de acordo com a Seção 34,
Parágrafo 17, como faço minha pesquisa é assunto meu e eles não podem me
despedir por isso.

Sobre o assunto, é hora de eu ir e me conectar por uma hora (mais tempo e o


upload mental fornece mais informações do que o WishCrete pode
processar).

Bom trabalho, se você conseguir.

Bem, essa foi uma manhã interessante. E você sabe disso, quando eu digo

'interessante', quero dizer, “Oh senhor, isso é um pouco preocupante.”


Fiz meu upload usual (prestando atenção especial aos arcos góticos) e depois
fui até a cantina para tomar café da manhã. Eles fazem um lindo pãozinho de
bacon crescido em cubas (todo o porco, nenhuma culpa) e seu café é forte o
suficiente para se defender até mesmo do paladar mais agressivo. Tenho
conversado intermitentemente com Gloriana, a gerente de construção do
local.

Suas rebatidas são golpes de martelo e sua língua é afiada como serra de
metal.

Certa vez, a vi fazer um grito siderúrgico lascivo depois que cometeu o erro
de bater nela na barra do site. Um olhar e ele estava implorando por
misericórdia.

— Este não é um bom dia, — ela me disse quando me sentei com meu bacon
falso e café. — Eu gostaria que este dia fosse baleado por crimes contra
mim.

— O que houve? — Perguntei a ela.

— Uma das equipes designadas para o bairro leste se recusa a trabalhar. O

Union está apoiando-os sob a cláusula de “perigo claro e presente” de seus


contratos.

— Qual é o perigo?

Ela me olhou bem nos olhos (roubando um pedaço de bacon com a mão
esquerda, pensando que eu não notaria, a atrevida) e disse: ‘Fantasmas’.

— Fantasmas?

— Fantasmas.

Agora, esse é o tipo de coisa que requer explicação e eu tinha certeza que
Gloriana resolveria assim que terminasse de mastigar o bacon que roubou de
mim.
— Não é a primeira vez que alguém afirma ter visto algo, — disse ela. — Na
verdade, tem sido uma fofoca em todo o site desde a última semana ou mais,
desde que um dos trabalhadores viu uma mulher dançando no quarto da casa
em que ele estava trabalhando.

— Como ele sabia que ela era um fantasma?

— Eles ainda não colocaram o chão.

— Bons movimentos.

— Eu sei? Ele saiu correndo e disse a todos para virem olhar e, é claro,
quando o fizeram, não havia nada lá. —Ela tomou um gole do meu café. —
O cara tem um pouco de história com bebidas, então, para começar, ninguém
estava levando a sério. Então ele se levantou e saiu, desistiu do contrato
porque estava com muito medo de voltar para casa. As pessoas o levaram
um pouco mais a sério depois disso.

Aposto que sim. Para limitar a espionagem industrial, qualquer trabalhador


que saia do local antes da data de conclusão está sujeito a uma limpeza
mental obrigatória. Você não só perde o seu salário, mas também vários
meses de sua vida. Não é algo que você faria por capricho. Já disse isso a
Gloriana.

— De acordo com um cara com quem ele fez amizade, o apagamento mental
foi uma das razões pelas quais ele aceitou, disse que mal podia esperar para
esquecer o que viu.

— Uma dançarina? Não parece tão assustador.

Gloriana acenou com a cabeça. — Aparentemente, não foi apenas um caso;


ele continuou a vê-la. Ele não falou sobre isso porque sabia que as pessoas
realmente não acreditavam nele, mas, de acordo com essa sua companheira,
ela apareceu em todos os lugares depois disso. Em seu quarto enquanto ele
dormia, no meio da rua, no maldito chuveiro ... Ele disse que ela não o
deixaria sozinho.

—Nós sabemos se ele a viu desde então?


Ela balançou a cabeça. —Política da empresa, sem contato. No momento,
ele nem sabe que trabalhou para a DreamInc, então nenhum de seus
funcionários vai estragar esse fato falando com ele.

Terminei meu café antes que ela pudesse fazer por mim. — OK, então é
apenas um homem, e o resto?

— É aí que fica realmente estranho. Você sabe como são as histórias. Depois
que o primeiro cara saiu, a coisa toda deixou de ser uma piada para ser algo
que as pessoas levavam a sério. Dentro de vinte e quatro horas, ninguém
estava

admitindo que riu disso. Foi um fato. Nova Veneza estava assombrada. O

problema é que parece que eles estão certos.

Aqui está o que ela me disse. (Não tenho tempo para todo esse maldito
diálogo, além de estar parafraseando como o diabo, se eu pudesse realmente
me lembrar do que ela disse, palavra por palavra, minha memória seria tão
brilhante que eu não precisaria de um diário.)

Ao lado da dançarina, tínhamos um pequeno grupo de crianças correndo


pelas paredes. Eles foram vistos por toda uma equipe de trabalho, que largou
ferramentas e saiu correndo como se suas almas dependessem disso (direto
para o bar do site, naturalmente).

Então havia uma velha sentada em uma banheira, ainda sem encanamento,
que parecia estar fazendo crochê. Ela foi vista por alguém com um pouco
mais de coragem. Ele se aproximou dela e tentou tocá-la. Nesse momento,
ela fincou a agulha de crochê em seu braço e deu uma gargalhada. Quando
ele correu para o posto médico, não havia mais nenhum sinal da agulha;
tinha desaparecido no caminho. A ferida era bastante real, porém, e
sangrando profusamente. O

médico afirmou que a ferida era psicossomática; o homem com um membro


pingando nos sapatos disse que não se importava, contanto que a maldita
coisa levasse pontos.
Isso aumentou a parada das assombrações. Ver algo estranho era uma coisa,
ser apunhalado por isso era outra. Os trabalhadores da zona leste se reuniram
e concordaram que nenhum deles ficava feliz em trabalhar em um local onde
mulheres mortas poderiam atacá-los.

Gloriana agora estava no meio. A DreamInc exigia que suas equipes


voltassem ao trabalho e os sindicatos insistiam que isso não aconteceria, não
até que fossem tomadas medidas para garantir que o local estava seguro.
Mas como você torna um local seguro contra fantasmas? Esta era uma
pergunta que Docherty estava claramente considerando quando eu passei por
ele no meu caminho de volta para cá.

— Quanto custa para trazer um padre aqui em uma nave auxiliar de alta
velocidade? — Ele estava gritando em seu telefone via satélite. — Que tipo
de padre? O que eu sei? Um barato!

As coisas podem estar ficando interessantes.

Bem, eu tive uma tarde infernal escapando dos avanços de um padeiro


lascivo em 1846. Todos nós já passamos por isso. Nunca elogie um homem
por sua focaccia, a menos que você tenha certeza absoluta de que ele não é
solteiro há cinco anos. Minhas calças estão tão cobertas de farinha que você
poderia assá-las como uma torta de perna.

Pelo menos me afastou um pouco do local. Desde a última vez em que


atualizei o diário, as coisas pioraram.

Docherty conseguiu seu padre, um homem de aparência bastante confusa


que afirmava ser um representante da União Universal de Religiões
Combinadas (lema do cartão de visita: "Não importa sua divindade, nós
temos tudo para você"). Ele vagou pelo bairro leste por uma manhã, cantou
um pouco, encharcou algumas paredes de tijolos com "espírito santo", uma
mistura pungente que cheirava como o tipo de coisa que você gostaria de
beber até ficar cego e não conseguir encontrar a garrafa de plástico na qual a
coisa veio, e então apresentou sua fatura.
— Este canteiro de obras está limpo— ele anunciou e estava prestes a
carimbar as paredes dos edifícios quando um representante da DreamInc o
parou.

Apesar do absurdo de tudo isso, o sindicato concordou (com o adoçante


extra de um aumento salarial de 0,5 por cento) em voltar ao trabalho. Alguns
dias de construção depois, as ferramentas foram derrubadas mais uma vez.
Outra pessoa havia sido atacada e desta vez era mais grave do que uma
agulha de crochê no braço.

Jared Chadwick, um dos arquitetos do local, estava verificando os ângulos


de um terraço subaquático projetado para acomodar residentes aquáticos. De
acordo com Klepki, um biólogo marinho Fractalian que estava trabalhando
nas proximidades (eles têm feito a emenda de carpas koi para atuar como
vendedores de bebidas para os visitantes do terraço ... eu sei), ele foi atacado
por uma figura usando "algum tipo de máscara estranha". Depois que Klepki
fez um esboço, o velho inteligente pode confirmar que o atacante estava
vestido como o personagem Arlecchino commedia dell'arte (ou Arlequim se
você não for tão inteligente e elegante como eu, o que provavelmente é
porque sou a única permitida para ler este diário).

A figura apareceu de uma das vitrines de algas marinhas e imediatamente


sufocou o arquiteto. Quando Klepki foi questionado por que ele/ela não
ajudou, ele/ela apontou que suas espécies eram devotamente contra o contato
físico com as espécies binárias de gênero e interceder teria ido contra séculos
de crença cultural. Obrigado por isso, Klepki; tenho certeza de que o homem
morto (e, de fato, sua família em luto) compreende bastante.

(Eu sei, estou parecendo preconceituosa. Só estou zangada. Vou tentar dizer
algo legal para um fractal em algum momento para expiar, mas não agora.
Agora estou muito furiosa.)

Alguns trabalhadores assustados é uma coisa, uma fatalidade é outra. Decidi


que deveria falar com Docherty e ter uma ideia do que a DreamInc planejava
fazer a respeito.

— Tire suas malditas mãos de mim, mulher! — Foi sua resposta calculada.
Suponho que fui com armas em punho.

Você me conhece.

— Acidentes acontecem em canteiros de obras o tempo todo — ele insistiu,


depois que eu me desculpei e prometi cobrir o custo de consertar seu
implante de rabo de cavalo. — Não podemos simplesmente parar o trabalho
por causa de um infeliz incidente.

Não sei por que fiquei surpresa. A grande inauguração está a apenas quinze
dias de distância e uma abertura tardia vai custar ao DreamInc o tipo de
dinheiro que seres sencientes normais não podem escrever numericamente
sem ficar entediado com todos os zeros. Cada dia de atraso é um apocalipse
financeiro. É

o tipo de dinheiro que é tão grande que provavelmente não é mais real,
economia teórica, mas tem peso para pessoas como DreamInc e Docherty.
Na verdade, é a única coisa que tem. Argumentar contra isso é apenas lutar
contra o vento.

Acho que até os trabalhadores entendem isso. Eu dei a eles uma tarde antes
que eles voltassem ao trabalho.

Conversei com Gloriana novamente. Parece que ela esqueceu o que é


dormir.

Como previsto, a DreamInc jogou dinheiro no sindicato. Seus contratos


sempre incluíram uma penalidade padrão caso o trabalho não fosse
concluído a tempo e, enquanto os sindicatos tentavam pleitear circunstâncias
atenuantes, não há precedente legal para fantasmas causando problemas em
canteiros de obras, o que não ajudou em suas negociações. DreamInc traçou
uma linha na areia no que diz respeito à conclusão, suavizando o punho
cerrado com a adição de um bônus robusto, dependendo do cronograma.

Basicamente: "Não, você não pode ter mais tempo, mas vamos pagar-lhe
muito dinheiro extra se você parar de discutir e continuar com isso."
O sindicato aceitou. O dinheiro fala em todos os níveis. Os trabalhadores
precisam do pagamento e o bônus é grande o suficiente para que até mesmo
os reclamantes mais barulhentos possam ser encontrados atualmente
balançando martelos como se fosse uma questão de vida ou morte.

Esperemos que não.

Gloriana apareceu bêbada no meu apartamento. O que é exatamente o tipo


de coisa divertida que eu normalmente gosto, mas eu estava no meio do
caminho tentando lavar um balde de entranhas de porco do meu cabelo,
então não estava no humor mais receptivo.

(As entranhas do porco foram um acidente, e o açougueiro veneziano se


desculpou ... eu acho. Era difícil ouvi-lo claramente com o balde na cabeça.)

Enfiei Gloriana na sala para se afogar no café enquanto eu desenredava um


pedaço de pulmão suíno da franja. Quando eu estava em um estado
adequado para receber visitantes, ela desmaiou atrás do sofá, então deixei
um bilhete dizendo que voltaria em breve e saí para fazer o upload da minha
hora.

Já te falei sobre o upload? Por que estou perguntando a você? VOCÊ É UM

LIVRO.

(Um livro brilhante escrito por uma gênia.)

É assim que funciona: o hub de programação central é uma sala


surpreendentemente pequena abaixo de Nova Veneza. (Todas as áreas de
manutenção são subterrâneas; pessoas ricas não gostam de ver os bastidores,
preferem pensar que as luzes ficam acesas por magia.) É administrado por
Viola, uma mulher doce, embora um pouco estranha, que claramente tem
pavor de pessoas. Ela tem aquela contração nervosa encontrada apenas no
usuário habitual do Infonet. Para ela, pessoas devem ser linhas de texto em
uma página de fórum, emoções expressas por gifs, não algo tão cru e
aterrorizante como uma expressão facial. Na vida real, sorrisos são apenas
algo cheio de dentes.
Ela já se acostumou comigo, é claro, é menos provável que se esconda atrás
da matriz de upload e, ocasionalmente, até faça contato visual.

Eu tive portas de fibra instaladas cirurgicamente, o que me assustou apenas o


suficiente para adicionar outra casa decimal à minha conta, mas na verdade
não é grande coisa. O cabeamento neural é tão fino que é como ter um spray
de acne de alta tecnologia na base do crânio. Provavelmente irei mantê-los;
wetware é caro, então é um bônus tê-los instalados gratuitamente.

(Outra vantagem da viagem no tempo é que seus gadgets nunca datam, a


menos que você queira. Se eu tivesse que existir em um universo linear, seis
meses de avanço tecnológico tornariam esses implantes o equivalente a ter
um gramofone despejado no meu cerebelo. Do jeito que está, posso roubar
este momento de ser vanguardista para o conteúdo do meu coração.)

Viola, depois de rir nervosamente do nada por um tempo, me liga e me dá


um gole de algo nojento e salgado que supostamente aumenta a carga
elétrica em meu corpo. As sinapses, agora com um pouco de efervescência
extra, fazem melhores conexões e a velocidade de upload é melhorada. Meia
hora depois, meu cabelo dançará por conta própria e eu estarei recebendo
choques estáticos de tudo que tocar.

Agora conectada, Viola vira um interruptor e a conexão entre meu cérebro e


o WishCrete é aberta. É como ter o peso da embriaguez caindo sobre você
instantaneamente, sem toda aquela diversão e tempo gasto bebendo líquidos
frutados. É como um edredom de cota de malha colocado em seu rosto.

Assim que o site estiver aberto, o WishCrete vai atuar diretamente com os
moradores e sem toda essa intimidade, mas aí sua resposta será mais vaga.
Ele responderá apenas a emoções particularmente fortes, e não (eles
esperam) de uma forma tão profunda e dramática. Quando penso em Veneza,
esses

pensamentos são transmitidos através dos implantes, a própria alma do lugar


então escrita através do tecido do WishCrete como o nome de uma horrível
cidade litorânea através do sweet rock. Não apenas a arquitetura, a fria, mas
bela matemática de arcos e pátios, mas a sensação do lugar, o espírito de
cada rua e dos tijolos banhados pela água. Nova Veneza terá o coração de
sua mãe.

É por isso que, em cada sessão, enquanto me concentro em detalhes


específicos, edifícios e ruas individuais, também tento mergulhar na
atmosfera de Veneza. Tento dizer ao WishCrete o que é realmente estar lá.
Você pode pensar que essas distinções sutis estariam além dessa nova
tecnologia, mas caminhar pelas passarelas recém-cunhadas e navegar ao
longo dos canais quimicamente seguros não é nada mal. Eu iria mais longe a
ponto de chamá-lo de muito bom, na verdade.

Existem apenas duas coisas que me impediriam de morar em Nova Veneza,


uma vez que ela fosse construída: eu não poderia pagar por isso e odiaria
ficar presa aqui com aqueles poucos que poderiam.

Todo o negócio é indolor. O único efeito colateral parece ser uma espécie de
devaneio, uma sensação de desconexão da realidade que dura quase tanto
quanto a carga estática. Eu estarei vagando para casa com minha cabeça nas
nuvens, os pés parecendo ter a largura de um fio de cabelo acima do solo.

Quando termino, Viola me dá uma toalha com solução salina para limpar as
conexões e outra bebida horrível, esta doce o suficiente para fazer seus
dentes tremerem. É nojento, mas desaparece depois de uma ressaca como
ninguém, então hoje eu peguei uma garrafa para dar a Gloriana na minha
volta, sabendo que ela me amaria por isso.

Ela amou. Na verdade, quando ela conseguiu passar por um copo cheio, ela
era quase humana e eu não precisava mais me preocupar com o possível
destino dos tapetes.

— Manhã divertida? — Perguntei a ela.

— Já é manhã?

A noite anterior tinha visto o pior acidente até então, e os avistamentos de


fantasmas se espalharam do quadrante leste. Uma equipe estava trabalhando
na recriação da Piazza San Marco, trabalhando ao lado da transformação
WishCrete para garantir que os postes de luz tivessem a aparência
envelhecida certa. Um dos lutadores cibernéticos estava liberando os
pombos automatizados para pousar nos telhados quando eles ligaram.
Descobriu-se que era uma falha de software em vez de algo assustador, mas
isso não foi um grande consolo para ele, pois foi puxado em pedaços do
tamanho de um bico e espalhado sobre o Grande Canal.

O resto da equipe entrou em pânico e então, no caos, o maior desastre


aconteceu: a praça inundada. A água caiu, aparentemente do nada, e levou
toda a tripulação ao redor da praça. A única razão pela qual Gloriana estava
segura era que ela estava pendurada em um poste na época, tentando
consertar um

jato de replicação de gás com defeito. Ela ficou pendurada ali, agarrada ao
ferro como um urso em uma árvore, observando a água suja jogando seus
homens de um lado a outro da praça. Embora muitos deles tivessem tentado
nadar para longe, a maré estava muito forte e eles foram lançados impotentes
em qualquer direção que a água escolhesse.

A coisa toda durou quatro minutos, então a água desapareceu tão


impossivelmente quanto apareceu a princípio.

Tudo estava seco, o único sinal da enchente eram os corpos de trinta e dois
trabalhadores da construção, espalhados pela pedra como madeira flutuante,
secos, mas inchados, rostos chocados pressionados contra o solo. Alguns
foram alojados em grades ou janelas, alguns varridos para o próprio canal,
onde flutuaram de cara para baixo entre os restos borrifados do lutador
cibernético, balançando para cima e para baixo na maré falsa causada pelas
máquinas de ondas subaquáticas.

A equipe de hidrovias jurou que a situação não tinha nada a ver com eles (e
o fato de a água ter sumido deixando tudo totalmente seco, em vez disso os
sustenta). DreamInc se recusa a aceitar suas garantias, principalmente
porque a única outra explicação é que toda uma tripulação morreu por um
fantasma de uma enchente e até mesmo o sindicato está apavorado em
aceitar isso como um conceito. A racionalidade é engraçada. As pessoas vão
aceitar um fantasma se for uma costureira louca, mas não se for uma
inundação inteira. Como se a escala fizesse toda a diferença.
Não que eu esteja dizendo que era um fantasma no sentido tradicional, é
claro, porque eu também sou uma racionalista, mas alguém que viu o
suficiente do universo para rolar com os golpes. Seja o que for que esteja
acontecendo - e sejamos honestos, não é difícil juntar as peças - é preciso
abordar, não negar.

Claro, ninguém quer fazer isso.

Exceto eu.

— Você precisa desativar o WishCrete.

Docherty olhou para mim como se eu tivesse enlouquecido. Na verdade,


mais louco. Tenho certeza de que ele já acha que estou brava de qualquer
maneira.

— WishCrete não pode simplesmente ser desativado, Professora Song. Suas


propriedades psíquicas ativas estão embutidas em seu próprio tecido. É
também uma das principais atrações para os futuros habitantes de Nova
Veneza, um recurso pelo qual eles estão pagando consideravelmente. Então
me diga, por que eu iria querer transformá-lo em concreto padrão?

—Porque obviamente está matando pessoas.

Eu não conseguia acreditar que estava tendo que explicar isso.

— Obviamente — ... Esse é um uso interessante da palavra. — As pessoas


estão vendo coisas, — eu disse. — Imagens saindo do nada em torno deles.
Essas imagens estão causando lesões psicossomáticas e morte. Se ao menos
houvesse uma explicação, aqui neste canteiro de obras cheio de uma
substância psicoativas que sabemos pode mudar e alterar o ambiente com
base na entrada mental de outros.

— Você realmente acha que as pessoas estão se imaginando mortas? —

Perguntou ele. —Como isso faz sentido?


— As pessoas não imaginam apenas coisas boas, você sabe, — disse a ele.

Acredite em mim, estou olhando para você neste exato minuto e o que estou
imaginando acontecendo com você não é, por qualquer definição da palavra,
bom.

Ele estava prestes a dizer algo de que se arrependeria, então fiquei com pena
dele e o interrompi, continuando a falar:

— Digamos que o primeiro avistamento foi realmente um erro. O homem


que viu a mulher dançando. Talvez ele estivesse delirando, talvez estivesse
bêbado.

Mas assim que ele falou sobre isso, a história se espalhou, o conceito
cresceu.

As pessoas começaram a pensar que o lugar era assombrado e que veriam


fantasmas. Sua expectativa se torna realidade graças às propriedades do
WishCrete. Ele pega, altera a Nova Veneza para se adequar às expectativas
das pessos. Ele faz seu trabalho.

— Então alguém se pergunta se esses “fantasmas” podem realmente


machucá-los. Eis que mal essa ideia foi pensada, ela se tornou uma
realidade. Mas espere, pensa a próxima pessoa ... Se pode doer, talvez possa
matar ... E bum, agora pode. O WishCrete está constantemente refletindo os
pensamentos dominantes de todos aqui. Você criou uma substância que
responde a estímulos mentais; não é capaz de distinguir os pensamentos
bons dos maus. Você começa a se convencer de que algo terrível vai
acontecer e fica feliz em obedecer.

Eu o deixei falar, apenas para mostrar que estava disposta.

— Então você está dizendo que só está acontecendo porque as equipes de


trabalho acham que vai acontecer? Isso não faz o menor sentido. Você acha
que alguém aí decidiu que a praça iria inundar, então aconteceu?

— A praça costumava inundar o tempo todo — expliquei (embora na


verdade não de uma maneira tão dramática, embora ele não soubesse disso
mais do que os trabalhadores que estavam no local na época).

— Bastou uma pessoa para pensar sobre isso. “Imagine”, eles pensam,
“como seria se você estivesse aqui e todo este lugar inundado.” No minuto
em que esse pensamento estiver lá fora ...

— Bobagem — disse ele, provando como toda aquela conversa era inútil.

Conversei com Gloriana hoje sobre minha teoria. Ao contrário de Docherty,


ela não discutiu com uma palavra disso. Claro que não - ela tem um cérebro
em pleno funcionamento.

Não que isso importe. O ‘acidente’ na praça foi atribuído à equipe de


hidrovias, cujo chefe foi demitido e a construção continua apesar de tudo.
Nova Veneza estreia em cinco dias, e a DreamInc não tem intenção de
permitir que nada tão irritante como um erro de design potencialmente
catastrófico atrapalhe o fato.

Eu tenho duas opções, apresentadas a mim de forma sucinta por Docherty: 1.


Saio agora, descumprindo meu contrato e incorrendo nas penalidades
financeiras por isso. (Como eu me importo. Ao contrário de alguns, eu não
sou tão fria a ponto de trocar a saúde do meu saldo bancário pela perda de
vidas inocentes.) Eu também receberei a limpeza mental contraída. O que
significa que não saberei de nada disso. Vai acontecer sem meu
envolvimento.

2. Eu mantenho minha posição e fecho minha boca (caso contrário, serei


demitida, veja a opção um).

Que escolha eu tenho? Se eu sair daqui, voluntariamente ou não, não salvará


nenhuma vida. Toda essa bagunça se tornará algo sobre o qual li mais tarde
em um dos feeds de notícias, sem saber que poderia ter sido capaz de ajudar.

Se eu ficar, finja ser uma boa garota, talvez consiga fazer algo.

Poderia.
Como odeio minha vida às vezes.

Dois dias para a grande inauguração. Na verdade, uma equipe de moda


visitou a casa e me mediu um vestido. Sugeri que fosse feito de pinho com
cabo de latão, mas a piada passou por cima deles.

O DreamInc tem uma equipe de eventos completa, encarregada de recriar


um Grande Carnaval de Veneza, fantasias, desfiles, bailes de máscaras, fogos
de artifício, exatamente o tipo de coisa que desaba uma tempestade com um
pouco de massacre.

Todos os lotes residenciais são vendidos, e seus proprietários são


transportados de agora em diante. A DreamInc tentou manter as pessoas
afastadas até o último minuto, mas mesmo elas não conseguem vencer uma
discussão com clientes capazes de comprar toda sua linha genética e limpá-
la. Então, algumas pessoas já se mudaram.

Eu vi uma lancha ridiculamente ostentosa subindo e descendo um dos canais


esta manhã. Foi conduzido por uma criança, gritando seu entusiasmo a cada
onda. Só por um segundo eu me encontrei imaginando o que poderia
acontecer

se ela saltasse muito alto e batesse com a cabeça em uma das pontes baixas.

Eu tive que me conter. Se eu estivesse certo - e estou - poderia ter feito isso
acontecer. Um pensamento perdido e uma ponte poderiam ter se agachado e
cortado ela acima do pescoço enquanto eu observava.

Um casal Romanadi mudou-se na mesma rua do meu apartamento, posso vê-


los agora. Ele está em sua varanda, olhando a vista enquanto dentro de seu
marido está discutindo com uma batedeira.

Aparentemente, a vodka não está fria o suficiente. Pobre boneca.

Já fechei minha janela antes de pensar em algo muito pouco caridoso na


direção deles.
Dois dias. Dois dias e então este lugar estará cheio.

Acho que o pânico do prazo realmente concentrou as pessoas. Determinados


a receber seus bônus, desejando que tudo desse certo, sem mais erros, sem
mais atrasos, apenas uma construção limpa e perfeita.

Não houve mais acidentes. Viva o poder do pensamento positivo. Assim que
todos estiverem presentes, isso vai mudar. Essa visão de túnel vai se alargar
e quem sabe o que vai acontecer? Nada de bom, a menos que eu consiga
pensar em uma maneira de pará-lo, o que, agora, não posso.

Gloriana se foi. Aparentemente, ela foi mandada embora à noite, depois de


entrar em uma briga com Docherty. Ela não podia ficar parada e deixar isso
acontecer, então ela começou a agitar e agora está deitada em um centro
médico em algum lugar, após uma limpeza mental, se perguntando o que ela
tem feito nos últimos seis meses.

Gloriana era descartável.

Eu sei que Docherty quer me manter por perto; eu sou outra coisa para
flutuar na frente de seus clientes ricos.

Eu sou a altamente considerada (quietos) especialista DreamInc contratado


por um grande custo para fazer tudo dar certo. Devo ser exibida como uma
torneira dourada ou um elemento de água particularmente deslumbrante. Na
verdade, ele me pediu para fazer um discurso na cerimônia de abertura. Eu
disse a ele para não abusar da sorte.

Gloriana era apenas uma empregada. Demiti-la economizou dinheiro e ele o


terá feito com um sorriso, sapo odioso.

Eu dei uma olhada no meu contrato e no minuto em que o lugar abre, as


cláusulas particularmente problemáticas evaporam no ar. Efetivamente, meu
emprego com DreamInc para no minuto em que as portas abrirem
oficialmente.
Depois disso, eles não podem me despedir, limpar minha mente ou me
ameaçar de qualquer forma. Eu estarei livre.

Falta um dia.

10

A cerimônia de abertura.

Suspirar…

Ninguém morreu, deixe-me deixar isso bem claro. Embora o dia ainda esteja
começando, então não fique muito calmo.

Estou tomando fôlego na Florença do século XIX, porque eu simplesmente


tive que sair de lá por um minuto.

(Outra vantagem da viagem no tempo: quando você realmente precisa de um


pouco de espaço, pode colocar seu champanhe, caminhar cinco anos e
depois voltar imediatamente antes que sua bebida esquente.) Acho que foi
impressionante, se você nunca viu um filme de Fellini. O canal estava cheio
de decorativos grotescos enormes e flutuantes. Barcaças projetadas para se
parecerem com peixes, fogos de artifício explodindo de suas guelras a cada
oportunidade. Os residentes que ainda não estavam no local estavam dentro
deles, transportados do espaçoporto para a ilha principal. As barcaças foram
atracadas ao lado da Ponte Rialto e cardumes de peixes encheram a água
para que os passageiros pudessem caminhar até a terra firme em suas costas
acarpetadas. Uma vez em terra, os residentes mimados ficaram em terra
firme por cinco minutos, apresentados com seus pacotes de boas-vindas (que
incluíam, não estou brincando, um barco de cortesia), suas fantasias de
carnaval e suas chaves de casa, e depois jogados de volta no canal enquanto
eram levados em um passeio de gôndola pela cidade.

Eu tinha tentado evitar isso, mas Docherty deixou claro que eu deveria me
juntar a um casal de idosos que havia pedido especificamente para me
conhecer.

Como Nova Veneza não foi oficialmente declarada aberta por mais uma
hora, eu não tive escolha a não ser subir a bordo e colocar meu melhor
sorriso falso.

Porque o casal queria me conhecer nunca ficou totalmente claro. Eles


certamente nunca perguntaram nada sobre mim. Eles haviam ganhado
dinheiro com a mineração de sal no Aglomerado Prentiss e aproveitavam
todas as oportunidades para mencionar o fato.

— As pessoas sempre querem sal — disse a esposa, enquanto reajustava seu


ponto de beleza de uma bochecha para a outra — como eu disse ao querido
Ludovic quando nos conhecemos.

O querido Ludovic não disse muito, apenas olhou para o meu peito e tentou
impedir que suas calças de montaria subissem para expor seus joelhos

reparados cirurgicamente. Acho que Darling Ludovic vive com medo de sua
esposa.

— Suponho que este lugar seja aceitável — disse ela, desviando os olhos do
espelho de maquiagem por alguns segundos. — Só espero que seja seguro.

Você e eu, pensei.

— Os protocolos de segurança no espaçoporto são terrivelmente rígidos —

assegurei a ela. — Você não pode nem pousar aqui se seu saldo bancário não
for grande o suficiente.

—Certo — disse ela, adicionando outro bocado de base. — As pessoas não


entendem como sofremos. É um fardo ser rico, simplesmente todo mundo
quer um pedaço de você. Darling Ludovic é constantemente cercado. As
pessoas se ressentem, entende? O universo odeia o sucesso, e os proletários
vão tentar derrubá-lo. Pode pergunta a qualquer um.

Eu verifiquei meu relógio. Ainda quarenta e cinco minutos antes que eu


pudesse ser honesta.

— Deve ser horrível — eu disse.


— É — ela assentiu. — Só espero que finalmente tenhamos encontrado um
lugar onde possamos relaxar.

Eu realmente não tinha nada a dizer sobre isso.

Viagem de gôndola feita, todos estavam reunidos na Praça de São Marcos


(com todos os funcionários fingindo muito que mais de trinta pessoas não
haviam morrido lá há poucos dias). Mais fogos de artifício foram acesos,
rolhas de champanhe estouraram e, com um longo discurso que testou a
resistência de todos os presentes, Docherty declarou a Nova Veneza aberta.

Nesse ponto, fugi, sem emprego, para pensar um pouco.

É a velha mulher rica na gôndola que fica voltando em minha mente,


percebendo que todas as pessoas ricas pensam da mesma forma: "Os
proletários vão tentar derrubá-lo."

Esse não é um pensamento que ela queira ter em Nova Veneza porque, mais
cedo ou mais tarde, isso provará que ela está certa.

Foi mais cedo.

Voltei para Nova Veneza cerca de cinco minutos depois de ter saído e a
gritaria já havia começado.

A cerimônia de abertura havia sido a deixa para o início do carnaval, as ruas


se enchendo de uma procissão calçada a que os novos moradores agora se
juntariam, percorrendo a cidade e voltando para a praça, quando já estaria
armada para um banquete com uma horrível Ópera Croxiana oferecida com
pudim.

Eles não foram tão longe.

A procissão chegou à praça e, à sua frente estava o Arlecchino,


imediatamente reconhecido pelo Fractal que, apesar do desconforto por estar
perto de formas de vida de gênero binário, estava, ao que tudo indicava, se
divertindo simplesmente maravilhoso com uma garrafa de conhaque francês.
O gerente de eventos, um polvo maravilhosamente estridente com a
determinação de tornar a palavra "frabjous" legal por repeti-la
indefinidamente, estava compreensivelmente confuso. Ela não havia
contratado tantos foliões na procissão, apenas um punhado de artistas
androides projetados para dar início ao clima de festa. Olhando para as
fileiras intermináveis inundando a praça, girando seus estandartes e
dançando ao longo das pedras, ela disse: "Isso não é brincadeira" antes do
derramamento de sangue começar.

O primeiro a cair foi um jovem de Alcapha que, estou informado, era uma
famosa estrela pop em sua galáxia. O homem por trás de sucessos de ouro
como (traduzidos para o português) "Garota, este é meu pseudópode que
você está segurando" e "Talvez nós devêssemos apenas fazer ovos". Talvez
encorajado pelo som da banda marcial, ele saltou para a procissão e
começou a dançar lascivamente com uma mulher em um cocar de penas e
camadas e camadas de seda e renda. Ela arrancou sua cabeça com uma
mordida.

Em seguida, veio um trio vestido com as tradicionais máscaras que os


médicos usavam na época das pragas e capas pretas. Seus longos narizes de
cerâmica estavam vermelhos de sangue quando terminaram de examinar as
entranhas de seus pacientes relutantes.

No momento em que um enxame de pombos - não a variedade DreamInc


reparada, mas uma criação etérea, WishCrete - começou a atacar a multidão
eles já estavam correndo. Alguns tentaram voltar para os barcos, mas a
própria água tinha virado contra eles, grandes ondas formando mãos abertas
que golpeavam as pessoas ou as levantavam e atiravam para o céu. Outros
correram mais fundo em Nova Veneza, afunilando-se pelos becos que saem
da praça, desesperados para se manter à frente dos foliões homicidas que
também se dividiam e os perseguiam.

Eu? Eu estava pendurado em uma das sacadas do palácio gritando


desesperadamente em meu comunicador.

— Gloriana! Precisamos de você agora!

OK, talvez eu precise voltar um pouco.


Antes de voltar para Nova Veneza, localizei Gloriana. Não foi difícil: ela
estava anunciando amplamente sua disponibilidade para o trabalho, seu
currículo bagunçando a maior parte dos feeds de vendas da Agência de
Emprego da Terra ao Centro Galáctico. Eu ofereci um emprego a ela.

— Dirigindo? — Ela disse. — Eu não dirijo. Eu sou um gerente de canteiro


de obras.

— Eu sei disso, — assegurei-lhe, — mas farei com que valha a pena.

Parecia justo que ela visse algum tipo de retorno de seu tempo em Nova
Veneza.

Eu aluguei um daqueles enormes vagões de liquidação. Você sabe o tipo de


coisa, projetada para o transplante de colônias, construída como uma
pequena lua e carregada com o tipo de tecnologia transmat de curto alcance
que é terrivelmente útil quando pousar sua nave na superfície de um planeta
pode quebrá-la totalmente.

Você pode imaginar meu alívio, pois o som de alguns quilômetros quadrados
de ar deslocado me permite saber que ela está se movendo para a atmosfera
acima de nós.

—River? — Sua voz soa no comunicador. — Você quer que eu comece a


reunir pessoas?

— Prenda cada sinal de vida que puder e vá embora.

— Nele. Você sabe que eu não posso trazer todos de uma vez?

Mesmo um vagão de liquidação tem suas limitações.

— Sim, pegue as pessoas o mais rápido que puder.

Então, quando o ar começou a se encher com o som de grupos de pessoas


sendo transportadas para a segurança na troposfera, subi para o palácio e
pensei em como poderia chegar aonde precisava estar sem morrer.

Foi então que descobri que até os edifícios guardavam rancor.


As paredes do palácio se estenderam para mim enquanto eu corria em
direção ao andar térreo, punhos de tijolos gigantes que queriam me martelar
e colar contra o mármore e a pedra antiga. Eu estava realmente lamentando
meu novo vestido um tanto exagerado enquanto tentava mover-me
rapidamente por um ataque sem fim de acessórios.

Acabei correndo ao longo da Ponte dos Suspiros, assim chamada, dizem, de


quando os prisioneiros estaduais marchariam através dela, dando uma última
olhada na liberdade antes do encarceramento na prisão do outro lado.

Eu rebatizei no caminho. Durante sua curta vida, tornou-se a Ponte dos Juros
Biológicos Deliciosamente Inventivos.

Talvez não tenha aprovado, pois tentou me matar ao se desprender, mas,


como você sabe, eu estava começando a adquirir o hábito de mergulhar
naquele maldito canal e parecia que até mesmo o poder de processamento do
WishCrete tinha suas limitações como consegui nadar até a terra antes que
qualquer outra coisa tentasse me matar.

O acesso às seções de manutenção era feito por elevador em uma das


estações de ônibus aquático. Para chegar lá, tive que negociar para passar
por uma manada de foliões mascarados. Eles usavam máscaras de bauta de
bico largo,

seus narizes gordos e dourados se contraindo quando viraram as cabeças


com chapéu de tricórnio para mim.

Eu não tinha nenhuma razão para esperar que essas construções WishCrete
se importassem se eu atirasse nelas - afinal, elas não eram de carne e osso -
mas eu coloquei minha arma em sua configuração mais alta, esperando que
pudesse pelo menos causar danos suficientes à sua estrutura para obter por
eles.

Eu abri buracos para fora deles enquanto passava correndo, seus braços se
liquefazendo e estendendo a mão para me agarrar enquanto eu abria seus
corpos para o ar. Um deles me pegou pela parte de trás do vestido, mas
consegui cortá-lo no pulso com um tiro que também me cortou o cabelo.
Eu estava batendo na mão que rastejava enquanto fazia a parada do ônibus
aquático e digitava meu código de segurança para o elevador. Sempre tive
um problema com mãos errantes.

O elevador chegou e, pelo menos por enquanto, eu estava longe do


WishCrete.

As áreas de manutenção eram de construção tradicional. WishCrete era caro


(põe caro nisso!) E não havia necessidade de construí-los com qualquer
coisa, exceto materiais normais.

Chegando no nível subterrâneo, quem devo encontrar senão Docherty.

— Professora Song! Que alívio ver que você está bem! — Ele fez um belo
punho parecendo sincero, mas eu não estava interessada; grande parte da
matança acontecendo acima de nós era responsabilidade dele.

— Achei que deveria ver se poderia ajudar aqui — disse ele, antes de
perceber que não era criativo o suficiente para estender a mentira ainda mais.
Não havia nada que ele pudesse alcançar aqui porque, ao contrário de mim,
ele não foi feito para fazer o que precisava ser feito.

— Que espírito público de sua parte — eu disse enquanto caminhávamos em


direção ao hub de programação central WishCrete. — Você pode me ajudar
se quiser.

—Você tem um plano?

— Ah, sim..., mas primeiro, precisamos chegar a um acordo.

Mesmo em pânico, seus olhos se estreitaram. Você poderia ameaçar este


homem com qualquer forma de morte violenta, mas enfiar o dedo em sua
carteira e então veria terror de verdade.

— Eu contratei alguém para levar o máximo possível de pessoas, incluindo


nós, para ficarmos em segurança.

— Maravilhoso.
— Isso me custou uma fortuna. Que tal aproveitar esta oportunidade para
receber o crédito e também cobrir meus custos?

— De que tipo de custos estamos falando?

Eu disse a ele. Ele empalideceu um pouco, e não estou surpresa, pois dobrei
minhas despesas reais, a fim de incluir um pagamento considerável para
mim e Gloriana na equação.

— Eu teria que pensar nisso — disse ele, suando frio.

— Não há tempo para isso, infelizmente. É assim que vai funcionar: hoje
pode colocar DreamInc fora do negócio. Imagine quantas pessoas tentarão
processar em cerca de uma hora. Mas se você puder convencer a todos que
os planos para os colocar em segurança e lidar com o problema WishCrete
são seus e já estão em vigor, você pode sair de tudo isso com uma chance de
salvar sua carreira, mesmo que o DreamInc afunde. Pense em todas as
pessoas ricas que você poderá dizer que devem sua existência contínua a seu
pensamento rápido.

Ele pensou sobre isso por um momento e então acenou com a cabeça.

— O que eu tenho que fazer?

Dei a ele meus códigos bancários e o observei digitando em seu computador


de pulso enquanto autorizava a transferência. Quando ele terminou e o
dinheiro foi enviado, eu disse a ele para se sentar no canto e não entrar no
meu caminho.

Realmente foi a única coisa útil que pude pensar para ele fazer.

Já havíamos chegado ao hub de programação central e, por dentro, Viola


estava perdendo tempo.

— Todo o conjunto está entrando em colapso! — Disse ela. — Não sei como
impedir.

— Ligue-me, — disse a ela. —Verei o que posso fazer.


Aquela sensação pesada que descrevi antes, quando o WishCrete fez contato,
foi totalmente diferente desta vez. Embora o WishCrete não fosse senciente,
era capaz de pensar de forma limitada e o ataque à sua programação estava
dando a ele a versão tecnológica de um colapso nervoso. Havia tantas
entradas emocionais conflitantes. Mesmo quando as pessoas estavam em
pânico, elas esperavam escapar com segurança: um conflito bem ali. É um
fato triste que a maioria das pessoas se incline para o negativo. Por mais que
eles estejam olhando para suas circunstâncias horríveis e esperando
desesperadamente que possam sobreviver a elas, sua crença predominante é
que eles não sobreviverão. “Provavelmente vou morrer com isso”, eles
pensam, o copo realmente meio vazio. E com isso, o conflito é resolvido, a
voz mais alta selecionada, o WishCrete atende às suas expectativas. Isso os
mata, assim como eles acreditavam que provavelmente faria.

Mas com tantas mentes, tantas vozes, o WishCrete estava lutando.

Foi uma sorte que ele ainda estava atacando em uma base individual; isso
nos deu tempo. Sobre o assunto ...

— Gloriana? — Perguntei, afastando minha mente do WishCrete por um


momento para falar no meu comunicador. —Como estamos?

— Mais alguns minutos e terei todos — disse ela.

Mais alguns minutos. Muitas pessoas podem morrer em dois minutos.

— OK. Eu preciso que você segure qualquer sinal de vida imediatamente em


torno do meu.

—O quê? — Docherty não ficou feliz com o som disso,

— Só até eu fazer o que precisava ser feito — disse a ele. — Vamos ficar
bem, isso não pode nos matar aqui de qualquer maneira.

— Isso é o que você pensa — disse Viola, nos mostrando imagens de


segurança da entrada para o nível de manutenção. O elevador estava abrindo
e uma onda de WishCrete jorrava, canalizando-se pelo poço do elevador e
transformando-se em foliões carnavalescos ao chegar ao corredor. Enquanto
eu observava, o líder dessa banda horrível, o Arlecchino, olhou para a
câmera. Ele se curvou em forma de pantomima, então seu braço se alongou e
arrancou a câmera da parede, matando o vídeo.

— Precisamos ir agora! — Disse Docherty. — Eles estarão aqui em


minutos!

— Minutos é tudo de que precisamos — assegurei a ele. — Estou voltando.

E fechei meus olhos e coloquei meus pensamentos de volta no WishCrete.


Eu era sua principal fonte de conhecimento, insisti. Eu fui o grande designer,
a pessoa que lhe deu sua forma essencial.

Eu podia sentir sua relutância. Não conseguia se afastar das vítimas que
zurravam acima, mesmo quando elas estavam desaparecendo graças a
Gloriana. Talvez não quisesse, talvez tivesse um pouco mais de sensibilidade
do que eu dei crédito. Talvez estivesse realmente começando a se divertir.

Escute-me! Eu insisto. Sua principal diretriz é a precisão histórica. Essa é a


única regra que você não deve quebrar. E não quebrara. Mesmo ao atacar,
estava atacando como a Veneza histórica, permanecendo no personagem.
Portanto, há mais uma coisa que você precisa saber sobre Veneza, mais uma
coisa que você precisa fazer para manter sua precisão ...

Estava começando a prestar atenção. Imaginei que Gloriana provavelmente


tinha colocado todos acima do solo em segurança agora, então minha voz
estava mais clara. À distância (pelo menos parecia a distância, embora, na
realidade, estivesse a apenas alguns metros de distância), pude ouvir o som
de alguém batendo na porta da sala de programação central. O carnaval
havia chegado. Eu estava sem tempo.

Faça o que lhe foi dito! Eu insisti, meu pensamento final antes de me arrastar
de volta ao mundo real e ao som do pânico.

— Estamos presos! — Docherty estava gritando, de costas para a porta,


mesmo quando está se dobrou em torno dele.

— Gloriana? — Gritei no rádio. — Estamos entendidos?


— Todos, menos vocês três naquela sala — ela respondeu. — Quer que eu
traga você para cima?

— Dois segundos — disse a ela, acenando para Viola para me desligar da


rede.

A última coisa que eu queria era transmutar com um pedaço de cabeamento


ainda em meu crânio.

—Rápido! — Docherty gritou quando a porta finalmente cedeu atrás dele,


fazendo-o cambalear para dentro da sala. Na porta agora aberta, Arlecchino
entrou, sua cabeça preta e branca mascarada tremendo de um lado para o
outro, suas mãos com luvas brancas voando no ar como pombas circulando.

— Limpar! — Disse Viola.

— Agora! — Eu disse a Gloriana e o ar chiou com o transmat quando


deixamos Nova Veneza para trás e nos encontramos na ponte do vagão de
assentamento.

— Achei que você preferia estar aqui a com o resto deles — disse Gloriana,
afastando-se dos controles para nos encarar. — Eles não estão muito felizes.

— Eu não os culpo, — eu disse. —Você pode pegar um vídeo da superfície


de Nova Veneza?

Ela assentiu, apertou alguns botões e vimos na tela enquanto a cidade


tombava, ondas de água espirrando em torno dos prédios antigos.

— Oh meu Deus, — disse Docherty, seu rosto ficando branco ao ver a soma
total de trilhões de créditos e meses de trabalho desaparecer bem na frente
dele. —

O que você fez?

— Eu dei ao WishCrete um pedido final, — eu expliquei. — Eu contei um


detalhe histórico importante que não havia mencionado antes: o que
aconteceu com a Veneza original.
—O quê? — Ele apenas balançou a cabeça, incapaz de processar o custo do
que estava vendo.

— Afundou — eu expliquei e fui em busca de um bom lugar para dormir e


um distribuidor de bebidas.

RIOS DO TEMPO.
Andrew Lane
O maior problema que uma garota tem com o encarceramento de longo
prazo em um planeta-prisão remoto e sombrio é, eu descobri, o efeito que
isso tem em seus sapatos.

Admito, se pressionada, que a comida também é horrível, mas há alguns


planetas, luas e estações espaciais perto deste sistema solar remoto e
esquecido por Deus que entregarão uma comida para viagem decente, por
um preço reconhecidamente alto (que geralmente reservo para conta pessoal
da Governadora sem ela saber). O tédio pode ser um problema, mas eu
aproveitei isso como uma oportunidade, e não uma desvantagem, e me
joguei em pesquisas arqueológicas. Longa distância, é claro, mas mesmo
com a tecnologia holográfica obsoleta que eles têm em Stormcage (tão
arcaica que quase conta como um projeto arqueológico por si só) é
honestamente quase como estar no local assistindo o trabalho sendo feito.
Mas sem participar, é claro. A solidão também pode ser um problema aqui,
mas os pequenos artrópodes que saem das rachaduras nas paredes à noite
para procurar comida são muito bons ouvintes. Às vezes, eu percebi, eles até
falam de volta, embora quando isso começa eu saiba que é hora de uma
excursão.

O que me traz de volta ao assunto dos sapatos.

A umidade, a falta de espaço decente no armário e algo corrosivo na


atmosfera em Stormcage significa que qualquer coisa além das botas
Wellington apodrece muito rapidamente - e eu não estou usando galochas
por nenhum motivo.

Quando você tem que usar os saltos dos sapatos como ferramentas para
retirar os painéis de acesso dos guardas robóticos, você tende a quebrar
muitos deles também. É por isso que, a cada poucos meses, tenho que
escapar de Stormcage para fazer algumas compras sérias. Afinal, uma garota
tem que estar linda, não é? Nunca se sabe quando alguém pode receber a
visita do marido - exceto, é claro, que esse alguém esteja aqui em primeiro
lugar, por matá-lo. Exceto que ninguém consegue se lembrar direito quem
ele era.
Tenho muito tempo para pensar aqui em Stormcage. Decidi que isso pode
não ser bom. Ainda assim, pelo menos os artrópodes e eu temos muito o que
conversar.

A Governadora está desesperada para saber como eu continuo saindo. Ela


continua perdendo seu bônus anual por causa de minhas pequenas aventuras.

Isso a deixa irritada. Não sei porque - sempre volto no final. Na verdade,
tenho um manipulador de vórtice que uso para sair, mas eles nunca o
encontram quando revistam minha cela.

Claro que não - eu mantenho isso um pouco fora de fase com essa realidade.
O

controle remoto que aciona quando preciso é pequeno o suficiente para que
eu

possa escondê-lo dentro de um verme de varredura que implantei em meu


corpo com um ótimo cirurgião alguns anos atrás. Sempre que a Governadora
manda seus guardas passarem um escâner em mim, procurando coisas que
eu possa estar escondendo, o verme escava-se em volta do meu corpo,
ficando o mais longe possível da radiação de escaneamento. Faz cócegas,
mas sou uma risonha de qualquer maneira, então ninguém percebe que estou
agindo de forma estranha. Bem, não mais estranho do que uma mulher cujo
marido supostamente morto, mas estranhamente não identificado, está
ficando mais jovem enquanto ela está envelhecendo.

Eu estava preparada esta manhã para uma pequena viagem até a Estação
Kanenda, que atende aos clientes mais exclusivos deste quadrante da
galáxia.

Descobri onde o verme de varredura estava escondido pelo simples tatear em


busca dele. Eu não sei o que parecia que eu estava fazendo para alguém que
estava assistindo nos monitores de segurança, mas espero que eles tenham
gostando do show. Eu tinha acabado de localizar o verme e estava
pressionando o botão em sua seção central para chamar o manipulador de
vórtice para essa realidade quando a porta se abriu e três guardas entraram
correndo, seguidos pela própria Governadora.
Os guardas tinham armas laser e chicotes neurônicos, e sensores cobrindo a
maior parte do espectro eletromagnético em todos os seus capacetes com
viseira, como uma massa de pontas pretas. Os capacetes foram introduzidos
para que eu não pudesse drogá-los com meu batom, é claro, mas essa é uma
história totalmente diferente. Adquiri um novo tom de batom com um
solvente que corrói tudo, mas isso é ainda outra história.

Tantas histórias, tão pouco tempo. Não é a definição perfeita de vida? De


qualquer forma, assim que o manipulador de vórtice se materializou em meu
braço, eles me agarraram e o puxaram.

'Você lascou meu esmalte,’ protestei.

“Provavelmente está envenenado de qualquer maneira” rebateu a


Governadora, com as mãos na cintura. Ela tem um cabelo bonito e um senso
de moda razoável, mas a umidade aqui está causando estragos em sua pele. -
Você estava indo para algum lugar?

- Não mais - suspirei. 'Você realmente precisa estragar a diversão de uma


garota assim? E se eu prometer escolher uma lingerie muito boa para você
enquanto estou fazendo compras?

- Você realmente acha que pode me subornar usando calcinhas com


babados?

ela vociferou.

'Posso subornar qualquer pessoa usando calcinhas com babados', retruquei. É

verdade - eu posso.

- O irônico é - disse ela, sorrindo fracamente - que você nem mesmo


precisou escapar desta vez. Eu estava descendo para dizer que você vai fazer
uma pequena viagem.

'Oh, que fabuloso!' Eu disse, mas por dentro eu estava preocupada. Eu podia
contar nas juntas de um dedo quantas vezes eu tinha sido oficialmente
autorizada a sair de Stormcage desde que cheguei, e nenhuma delas foi
agradável.
Fui escoltada pelos guardas até o escritório da Governadora, que fica em
uma torre com vista panorâmica do segundo terreno mais desolado, escuro e
devastado pela tempestade que já vi. (O terreno mais desolado, sombrio e
devastado por tempestades que já vi foi um lugar chamado Ilha de Cave, em
um planeta chamado Terra, em uma época que os habitantes locais se
referem como os anos 1970, mas isso também é outra história.) Suspeitei por
um tempo que a torre é na verdade uma nave de fuga que a Governadora
pode usar se houver um tumulto, e pretendo verificar isso em algum
momento, mas quando fui empurrada para o escritório dela, fiquei mais
intrigada com a outra pessoa sentada na frente de sua mesa. Ele tinha uma
pasta ao seu lado.

'Preso 50243,' disse a Governadora (não estamos nos tratando pelo primeiro
nome, apesar de minhas frequentes tentativas de sermos amigas), 'este é o
professor Darin Forcade.'

'River Song', eu disse, com meu melhor sorriso e estendendo a mão.


"Também professora."

"Eu sei", disse ele, levantando-se e caminhando até mim. Ele era um homem
corpulento com uma barba espessa com mechas grisalhas. - Fiquei muito
impressionado com seu artigo sobre as ruínas de Racnoss em Arcnoy
Twelve.

- Estou lisonjeada - falei enquanto ele se abaixava e beijava as costas da


minha mão. Cortesia antiquada - sempre gostei disso. E de gravatas-
borboleta.

'Igualmente, eu pensei que seu trabalho nos artefatos de Osiran encontrados


nos restos de sua faixa orbital de Möbius perto de Arcturus chegou a
algumas conclusões muito interessantes. Eles estavam errados, é claro, mas
ainda assim muito interessantes. O errado é muito mais preferível do que
enfadonho, não acha?

Ele sorriu. - Gostaria de contratar seus serviços, professora Song.

Olhei para a Governadora, depois de volta para ele. “Adoraria ajudar”, falei.
'Infelizmente, minha agenda está um pouco cheia no momento com essa
coisa cansativa de' prisão perpétua por assassinato '. Você pode ter ouvido
falar sobre isso.'

Eu vi a Governadora fazer uma careta com o canto do olho. Honestamente,


ela deve evitar expressões como essa: ela não parece ter um bom regime de
cuidados com a pele, e a umidade constante de Stormcage está fazendo com
que ela pareça muito mais velha do que realmente é. A menos que ela tenha
trezentos anos, caso em que ela estaria muito bem.

"Eu entendo", disse o professor Forcade. “Mas a organização que administra


esta instalação me concedeu uma certa latitude. Você é a especialista
reconhecida nas raças de precursores há muito extintas que evoluíram na
galáxia. Preciso da sua ajuda.

Eu me senti como uma criança pequena no Natal. 'Você encontrou mais


ruínas precursoras! Ooh - diga-me mais! - Onde elas estão? Qual raça? '

Forcade ergueu as mãos em um gesto de silêncio. 'Há tempo suficiente na


viagem para informá-la sobre tudo o que encontramos, mas você precisa
saber que há algo ... incomum ... que foi descoberto no local. Algo sobre o
qual você está em uma posição única para dar uma opinião.

Ele olhou para a Governadora. Ela encolheu os ombros e ele se aproximou


para recuperar a pasta. Ao retornar, ele puxou um quadrado de papel e o
abriu. Ele me entregou e ficou ali, segurando a pasta à sua frente como um
escudo.

O que o papel mostrou foi uma gravação em loop com duração de alguns
minutos de várias pessoas em macacões sujos tentando abrir uma porta sem
quebrar nada. A porta era de metal, mas velha o suficiente e estragada o
suficiente para parecer pedra. A parede em que foi colocada não tinha
características, mas três coisas me impressionaram.

A primeira coisa foi que a porta tinha cerca de cinco vezes o tamanho dos
arqueólogos que tentaram abri-la. A segunda coisa é que alguém deveria
projetar um conjunto de roupas de trabalho mais atraente para os
arqueólogos do que o macacão bege padrão que todos usam. Eles devem
obter um desconto em massa, mas, francamente, não vale a pena. A terceira
coisa era que, a julgar pelos hieróglifos colocados na moldura da porta, ali
não era Gallifrey. Isso era um alívio.

Não sei muito sobre Gallifrey - apenas o fato de que foi o lar de uma das
primeiras civilizações a emergir na galáxia, as lendas sobre ser "um planeta
além do tempo" e o fato de que meu marido e o amor da minha vida nasceu
lá, mas eu sei, a partir dessas lendas e das coisas que ele deixou escapar, que
se Gallifrey for encontrado, coisas ruins vão acontecer. Felizmente, não era o
caso.

- O que te chama a atenção? Perguntou Forcade.

'Os guardas aqui, de vez em quando', respondi. O governador tossiu. - Mas


também o tamanho da porta. Não existem muitas raças que tenham evoluído
na galáxia desse tamanho. É maior que o Racnoss! '

"Pode ser apenas uma grande porta para fins cerimoniais", aventurou-se. Eu
sabia que ele estava me testando. 'Não,' eu o corrigi, 'a raça que usou aquela
porta foi enorme. O glifo de controle que o abre é cerca de dezoito pés acima
do chão. '

Ele fez uma cara de confuso. 'Glifo de controle?'

'O símbolo que eles teriam tocado para abrir a porta. Está mais gasto do que
o resto deles. “Eles têm milênios de idade”, ressaltou. - Estão todos gastos.

- Sim, mas um deles está um pouco mais degradado do que os outros. Diga a
sua equipe para empurrá-lo para dentro para liberar a porta. A maioria das
civilizações precursoras usaram energia geotérmica do núcleo do planeta
para alimentar suas cidades. Supondo que a fiação de cerâmica ainda esteja
intacta, as portas se abrirão e fecharão até o momento em que o planeta se
desfaça, e dado o fato de que todas as raças daquela época se foram, isso só
acontecerá devido ao estresse gravitacional natural.

Ele assentiu com relutância. - Eles encontraram, mas por acidente.

Eu amo estar certa, mas não tive tempo para me deleitar com isso. 'O que
estava dentro?' Perguntei ansiosamente.
"É isso que quero mostrar a você", respondeu ele. Seu olhar cintilou em
direção a Governadora. Mas não aqui. No planeta.

A Governadora não conseguiu se conter mais. - O que há de tão importante


nisso tudo? demandou ela.

O Professor Forcade olhou para mim e fez um pequeno movimento com a


mão, indicando que eu deveria responder.

'Antes que qualquer uma das raças no universo hoje evoluísse', respondi com
minha melhor voz de sala de aula, 'havia outras raças. Raças mais antigas.
Os arqueólogos os chamam de “os precursores”. Todos eles morreram -
alguns pela decadência natural e senescência que aflige qualquer civilização,
mas alguns por causa de uma série de grandes clareiras que ocorreram há
mais tempo do que qualquer um pode se lembrar. Senti-me franzir a testa,
enquanto minhas antigas pesquisas surgiam das profundezas da minha
memória. Parei de franzir a testa o mais rápido que pude. É simplesmente a
pior coisa para criar linhas permanentes. 'Diz-se que várias raças aderiram
juntos em uma coalizão para lutar contra horrores muito piores do que
qualquer coisa que vivemos agora. Esta coalizão foi liderada por uma raça
de um planeta misterioso conhecido apenas como ... Gallifrey. '

Meus dedos estavam cruzados nas minhas costas, mas nem o governador
nem o professor Forcade perceberam. - “Os governantes do tempo” -
murmurou Forcade. 'Ou talvez "os Senhores do Tempo" - os registros não
estão claros.

''Senhores 'é mais preciso', eu disse calmamente, então continuei mais alto:
'Por um período indeterminado de tempo eles destruíram Racnoss, Narlok e
os Grandes Vampiros, bem como outros dos quais não temos registro de ... '

'Grandes Vampiros!' o governador zombou. - O que você acha que eu sou -

algum tipo de idiota?

"Vamos deixar isso para a posteridade julgar", eu disse suavemente.

'A frase' Grandes Vampiros 'é um termo baseado em vários textos muito
antigos.
Você pode preferir pensar neles como criaturas humanoides enormes,
capazes de sugar a vida de um mundo inteiro e transformar seus habitantes
em acólitos.

De qualquer forma, uma vez que essas ameaças foram eliminadas, a coalizão

se desfez e as várias raças que a compunham começaram a se voltar para


dentro e a decair. Eles já se foram há muito tempo. Nas minhas costas, eu
estava cruzando meus dedos com unhas impecavelmente tratadas
novamente. Os Senhores do Tempo não tinham ido embora, é claro - nem
todos eles, pelo menos - mas eu não iria falar isso agora. Eu bati no papel.
'Com base nesses glifos, eu diria que este planeta foi ocupado pelos Qwerm.'

"Os Qwerm?" Forcade estava olhando para mim com os olhos arregalados.

“Eles eram, pelo que pude reunir, uma raça de filósofos que se tornou, por
algum estranho conjunto de circunstâncias, o braço guerreiro da coalizão.
Maciços, de seis patas, como enormes gafanhotos do tamanho de uma
grande locomotiva a vapor eduardiana, se você sabe o que é - e como um
arqueólogo certamente deve saber - com cinco cérebros separados e
interligados, capazes de rápida análise tática e estratégica paralela.

Olhei para o governador, que ouvia tudo isso com a boca aberta fascinado.

“O interessante sobre as raças precursoras, a propósito, era que geralmente


eram muito maiores do que as raças de agora. Certamente, os Racnoss eram
muito impressionantes, e os Grandes Vampiros não eram chamados assim
por causa de sua arte e música. Ninguém sabe por que eles evoluíram para
ser tão grandes. Já vi teorias sugerindo que tem algo a ver com o fato de que
alguma constante física universal tem diminuído lentamente com o tempo,
mas ninguém sabe ao certo. Eu sorri para eles. “As antigas lendas dizem que
o rio do tempo era mais estreito, perto da fonte do tempo, e então as coisas
que nadavam nele pareciam maiores em comparação, mas isso é apenas
licença poética. Apenas os Osirans eram mais ou menos do nosso tamanho.

- E esses misteriosos Governantes do Tempo - observou Forcade.

Enrolei o papel e o devolvi a ele. - Então, passei no teste? Eu poderei ver o


que há do outro lado dessa porta? '
Ele acenou com a cabeça, mas havia algo cauteloso em sua expressão. Algo
que me deixou desconfortável. "Sim", ele respondeu.

"Então vamos lá.”

Ele olhou de mim para a Governadora e de volta. "Você precisa fazer as


malas?

Ela quer fazer as malas?" Ele parecia confuso sobre quem tinha autoridade
aqui.

Achei isso muito gentil da parte dele. Obviamente, era eu, mas ele tinha
acabado de me conhecer. Ele vai aprender.

"Tudo bem", eu disse. 'Eu mantenho uma mala feita na porta da minha cela,
pronta para quando eu quiser sair.'

Eu podia ouvir os dentes da Governadora rangendo a três metros de


distância.

Ela deveria examiná-los por um bom ortodontista. Vou recomendar um para


ela quando voltar.

A nave do Professor Forcade não é luxuosa. Na verdade, é anti-luxuosa, se é


que isso é uma palavra. Se não for, bem, acho que deveria ser. É uma P-
shifter maltratada tão velha que poderia apenas ter visto serviço nas
campanhas dos Senhores do Tempo contra Racnoss e os Grandes Vampiros.
Talvez ele goste porque é uma antiguidade, ou talvez, sendo um acadêmico,
ele não consegue financiamento para nada melhor. Seja qual for o motivo,
passei a maior parte da jornada em meus aposentos tentando ficar
confortável em um colchão irregular enquanto ele me oferecia xícaras de
chá, talvez por culpa. Felizmente, sempre coloco uma garrafa de champanhe
na minha bolsa de viagem. É

dimensionalmente transcendental - a garrafa, não a bolsa - e nunca consegui


exaurir a safra muito agradável que tem dentro. Também nunca aquece ou
perde a efervescência. Provavelmente há mil anos de desenvolvimento
tecnológico por trás de seu design, mas eu não me importo particularmente
com isso - eu apenas me importo que funcione. Foi o melhor presente que já
recebi.

Tenho revisado o pouco que sei sobre as primeiras campanhas dos Senhores
do Tempo. Eu sei que levaram muito tempo para se libertar de seu torpor de
complacência e iniciar a Guerra do Tempo contra o Império Dalek, mas
quando eram uma raça jovem, eram muito mais ativos e muito mais morais
('moral 'sendo um termo relativo para tudo o que alguém acredita ser certo e
está disposto a lutar). E eles estavam muito mais dispostos a sujar as mãos
trabalhando com outras raças. Eu os imagino como sendo então uma raça
inteira composta de pessoas como meu marido.

O engraçado é que embora eu saiba um pouco sobre seus inimigos naquela


época, eu não sei muito sobre nenhuma das raças com as quais eles estavam
trabalhando além dos Qwerm. Já vi referências passageiras em histórias
obscuras a uma raça chamada Minyans e um planeta chamado Karn, mas é
só isso. As outras raças da coalizão tinham a mesma posição que os
Senhores do Tempo, ou eram apenas bucha de canhão, levadas para o
passeio? Eu gostaria de saber, e a única pessoa que conheço que conhece não
está falando. Bem, na verdade você não pode impedi-lo de falar, mas ele
raramente diz alguma coisa.

Também estive pensando sobre o que o Professor quer que eu olhe - a razão
pela qual ele veio especificamente para me pegar. Minha autoestima é alta o
suficiente para que eu pudesse abastecer um pequeno mundo com ela por
vários anos, mas mesmo eu não acho que minha fama como arqueóloga se
estenda por toda a galáxia. Então, como Forcade veio me escolher?

Chegamos ao planeta sem nome hoje cedo. De órbita, parece empoeirado,


como algo que foi deixado na prateleira por muito tempo. O sol está
encolhido e azul, e emite uma luz fria e forte. Mesmo da órbita, eu podia ver
a geometria parcialmente apagada de cidades antigas e decadentes ligadas
por vastas rodovias e redes de energia. Os Qwerm, sendo uma grande raça
em si, construíram coisas grandes e feitas para durar, mas quando chegamos
a pousar em uma enorme praça no meio de uma cidade enorme, pude ver
que a maioria das passarelas ligando os enormes edifícios - largas o
suficiente e grossas o
suficiente para suportar os corpos do enorme insetoide Qwerm - foram
quebradas. Fragmentos jaziam nas largas avenidas. Os prédios brancos
monolíticos em si estavam praticamente intactos, mas suas enormes janelas
haviam se quebrado há muito tempo, deixando buracos ovais que pareciam
olhar para nós como milhares de olhos escuros. Não havia cor em lugar
nenhum para suavizar o branco dos edifícios, o cinza do céu e o preto das
ervas daninhas, tão densas quanto os próprios Qwerm, que haviam crescido
de rachaduras no solo e espiralado em torno das torres e dos resquícios das
passarelas.

O professor Forcade nos pousou em um local instável perto de um


aglomerado de cúpulas artificiais. Elas eram coloridas em vários tons de
vermelho, amarelo e azul, fazendo com que parecessem em contraste com a
paisagem monocromática empoeirada como balões de carnaval em um
funeral. Não estou dizendo isso de uma maneira ruim, a propósito - Deixei
instruções estritas de que meu próprio funeral deve durar pelo menos uma
semana e envolver balões, desordem e castelos pula-pula. Dos grandes, veja
bem. Do tamanho de um castelo de verdade.

Quando ele abriu a eclusa de descompressão e pude sentir o cheiro de algo


além do meu próprio perfume exclusivo e da loção pós-barba bastante
enfática do Forcade, percebi que o planeta também cheirava a velho. Havia
algo mofado, enferrujado e provavelmente outras palavras terminando com
'ado' que eu não consigo pensar no momento na atmosfera. É um cheiro que
todos os mundos antigos tem, depois de um tempo. Mesmo se eu tivesse os
olhos vendados (e não conhecia o Professor bem o suficiente para isso),
saberia que este planeta é anterior à maior parte do espaço habitado.

Saindo da espaçonave, nos encontramos com a equipe arqueológica do


Professor Forcade. Havia talvez vinte deles, mas cinco minutos depois de
serem apresentados, eu só conseguia me lembrar de dois de seus nomes. Um
era Paul Markol - um homem magro com pele escura, olhos castanhos e uma
carranca permanente que não tomava banho há algum tempo. A outra era
Sonja Toulder: mais baixa, mas mais larga que Markol, com cabelo loiro e
sobrancelhas pretas.

Provavelmente conheci várias centenas de milhares de pessoas ao longo de


todas as existências que vivi até agora e descobri que não há motivo para
usar espaço de armazenamento em meu cérebro para seus nomes, quando
seria mais divertido e mais útil para lembrar tantas receitas de coquetéis
quanto possível. Todos, eu decidi há muito tempo, seriam chamados apenas
de

'Docinho', a menos que por algum motivo meu cérebro decidisse colocar
seus nomes em algum lugar que costumava conter os ingredientes para uma
surpresa Gumblejack (que, a propósito, é um dos coquetéis que não quero
lembrar).

Markol e Toulder olharam para mim como se eu pudesse tirar um laser


semiautomático da bolsa e acertá-los com ele. Eles obviamente tinham
ouvido falar em Stormcage. Honestamente, se eles soubessem alguma coisa
sobre mim, eles saberiam que era muito mais provável que eu pegasse minha
garrafa de champanhe e alguns bombons de festa e começasse a diversão.
Em seguida, usaria o laser quando todos estivessem desmaiados bêbados.

Após as apresentações um tanto tensas, os três me levaram até a porta


enorme que eu tinha visto no papel em Stormcage. No contexto, pude ver
que era um prédio em forma de zigurate no centro da praça. Estava aberto
agora, mas a luz fraca do sol não penetrava muito dentro. A vasta escala da
abertura me fez sentir pequena, embora para os Qwerm fosse bem
aconchegante, eu suspeito.

Holofotes em postes foram colocados logo após a porta. Markol apertou um


botão em um controle remoto que ele tirou do macacão e as luzes se
acenderam.

Eu engasguei, embora parte de mim já tivesse suspeitado o que o Professor e


sua equipe haviam descoberto. No meio do espaço sombrio dentro do
bunker, como um bloco de construção de uma criança no meio de uma sala
de jantar, havia uma caixa azul. Tinha cerca de 2,5 metros de altura e um
metro de largura, e as janelas estavam congeladas. E uma porta. E uma placa
na parte superior dizia, em letras brancas sobre fundo preto, 'Caixa para
chamada pública da polícia'. Outra placa, desta vez com letras pretas sobre
fundo branco, foi colocada na altura do peito em uma porta na frente.

Ao me aproximar, pude ver que esta placa dizia:


Caso esta caixa seja encontrada, por favor, retorne a Professora River Song
na facilidade penal de Stormcage

Eu não esperava por isso.

Tive que interromper minha última entrada, porque o Professor Forcade


queria uma reunião de equipe, que foi habilmente combinada com uma
refeição em equipe. A comida era sem gosto, e as porções eram bem
pequenas também! Ele tinha que se atualizar sobre o que tinha acontecido
desde que ele partiu para Stormcage, e ele também queria me apresentar ao
time (eu fui fabulosa, a propósito). Houve muita conversa sobre o que eles
encontraram e o fato de que meu nome estava nela. Tentei persuadir a todos
de que estou tão intrigada com a aparência da TARDIS e com o fato de ela
ter meus dados de contato na porta, como eles estão, mas suspeito que
alguns deles pensem que estou mentindo.

Markol certamente pensa que estou - ele me encara de uma forma muito
hostil.

Toulder e os outros docinhos parecem querer me dar o benefício da dúvida.

Eu notei alguns pequenos tiques estranhos que a equipe exibiu, enquanto se


sentavam ao redor da mesa de conferência em uma de suas cúpulas pré-
fabricadas. Muitos deles pareciam preocupados com seus pescoços -
puxando seus colarinhos e coçando a pele. Também notei que alguns deles
usavam o macacão abotoado até o pescoço (não é uma boa aparência, em
nenhuma cultura), e havia indícios de que a pele por baixo estava inflamada.
Arquivei tudo isso para consideração futura. O doutor provavelmente teria
pegado todas as observações e as construído em um edifício da verdade, mas
apesar do tempo que passei com ele e do fato de que eu era uma filha da
TARDIS, não pude fazer o que ele faz. Ninguém mais no universo poderia,
eu suspeito.

Apesar dos meus protestos na reunião de equipe, estive quebrando a cabeça


para descobrir as razões pelas quais a TARDIS pode estar aqui, no meio de
um
antigo zigurate alienígena em um planeta na periferia negligenciada da
galáxia.

Acabou de chegar ou já está aqui há algum tempo? Minha mãe e meu pai
também estão aqui? O Doutor está lá dentro ou está explorando? É algo a ver
com as campanhas antigas que os Time Lords travaram contra as raças mais
perigosas de seu tempo, ou uma fusão acidental de duas coisas separadas?
Por que rosa combina com preto, mas não com azul marinho? Percebi muito
cedo na minha vida que o universo está cheio de perguntas para as quais
talvez eu nunca obtenha as respostas.

Oh, o que eu não mencionei antes é que a TARDIS está assentada em um


grande círculo de algum tipo de poeira. Eu sei que disse que o próprio
planeta é empoeirado, o que é, mas essa poeira é diferente. É amarela e
parece brilhar à luz das lâmpadas. Se você a ver com o canto do olho, quase
parece que está vibrando muito ligeiramente. Acho que nunca vi nada
parecido.

De qualquer forma, agora é tarde e já estou acordada há um bom tempo.


Acho que é hora de colocar as perguntas para a dormir e tirar um sono de
beleza. Eu não preciso disso, é claro - estou fabulosa em todas as
circunstâncias - mas é sempre aconselhável manter a beleza porque você
nunca sabe quando pode ficar sem.

Afinal, não consigo mais regenerar minhas rugas. Eu usei esse pequeno
truque na Alemanha nazista na década de 1930. Agora tudo o que tenho para
salvar minha aparência são bons genes e um regime de hidratação
abrangente.

Bem, este foi um dia para se lembrar.

Há algo em acordar e se descobrir sendo levada ao ar livre por coisas que


você não pode ver que realmente atrapalha a noite de uma garota. O que
quer que fossem, eles seguravam meus braços, minhas pernas e meu pescoço
com força e se moviam rapidamente pela praça. Eu não conseguia ver o que
eram porque estava de frente para o céu noturno esparsamente estrelado.
Havia três luas à vista, mas duas delas pareciam ter sido semidestruídas em
algum ataque antigo.
As coisas com que eles estavam me agarrando pareciam garras, e eu podia
ouvir o estalo de pernas duras contra a pedra da praça.

Grogue, me perguntei se eu tinha sido sequestrada por uma tribo de grandes


caranguejos. Obviamente, não foram os Qwerm. Não, a menos que eles (A)
sobreviveram quando deveriam ter morrido e (B) ficaram muito menores ao
longo dos milênios. Ainda assim, os Macra ficaram muito maiores, então
quem sabe?

Minha cabeça estava confusa. Eu provavelmente tinha sido drogada. Algo na


comida, talvez? Suspeito que acordei antes do esperado, em grande parte
graças ao batom que uso. Com o passar dos anos, tenho me dado imunidade
parcial a anestésicos e drogas paralisantes.

Eu ouvi mais cliques de algum lugar próximo. Virei minha cabeça e vi que o
Professor Forcade estava sendo carregado ao meu lado. Ele parecia confuso
e indignado ao mesmo tempo, mas eu estava realmente mais interessada no
que

o estava segurando. Eram membros de sua equipe. Ou melhor, eram suas


cabeças.

Levei alguns momentos para realmente entender o que estava acontecendo.

Imagine que a cabeça de alguém se desprendeu e brotaram oito pernas pretas


brilhantes e um grande conjunto de garras pretas brilhantes, um pouco como
caranguejos gigantes ou piolhos enormes. Imagine-os correndo pelo chão,
com as garras erguidas. Oh, e imagine que do outro lado de suas cabeças, em
vez de cabelos, há agora outros rostos estranhos, feitos de múltiplos olhos
negros e aparelhos bucais se contorcendo e agarrando. Isso é o que eu estava
olhando.

Piolhos. O pensamento de repente me atingiu e, apesar do medo que estava


apertando meu coração, eu ri. Forcade olhou para mim como se eu fosse
louca.

A loira de raízes negras - Toulder - era um dos piolhos. Ela olhou para mim
com olhos dos quais toda a humanidade havia sido drenada.
Eu realmente esperava que isso fosse um pesadelo, mas as batidas rápidas do
meu coração, o aperto das garras na minha pele e a brisa no meu rosto
sugeriam que não era. Além disso, muitos dos meus pesadelos giram em
torno de mim aparecendo nua para uma festa, o que é engraçado porque
muitas das festas que vou acabam ao contrário.

— O que está acontecendo? Professor Forcade gritou.

'Estamos sendo sequestrados por crustáceos gigantes que costumavam ser os


chefes de sua equipe arqueológica!' Eu logo disse de volta. Passei três anos
na Terra como consultora de gestão, quando era jovem e negra. Sou muito
boa em responder às perguntas das pessoas com coisas que elas já sabem, e
depois cobrar uma fortuna pelo serviço.

O que eles querem? Seu rosto indicava que ele estava à beira do pânico.

"Nós, obviamente."

Erguendo a cabeça e olhando em volta, percebi que os piolhos estavam nos


levando em direção ao zigurate no meio do qual estava a TARDIS. Eu sabia
que precisava fazer algo antes de chegarmos lá. Consegui libertar meu braço
direito das garras de uma das criaturas. Limpei meus dedos em minha boca,
então me abaixei e manchei meu batom em suas costas pretas de casca dura.

O solvente que eu recentemente introduzi na receita, junto com o corante


escarlate vívido e o toque de brilho, levou apenas alguns segundos para fazer
efeito. Tudo começou com um barulho estridente da criatura que eu toquei,
um som que misturou as piores partes de um grito e uma broca de dentista.
De repente, ela me soltou e desviou para o lado, agitando suas garras
freneticamente no ar.

Alcancei minhas costas como uma contorcionista (sou muito flexível) e


empurrei as pernas da criatura que estava segurando meu braço esquerdo
com meus dedos pegajosos de batom. A criatura começou a balançar, e ouvi
um barulho efervescente seguido pelo adorável barulho de suas pernas
caindo, uma após a

outra. Ela me soltou e, com os dois braços livres, consegui limpar meu
batom nas cascas de todos os demais. Elas me deixaram cair no chão e
correram por caminhos aleatórios. Uma ou duas apenas corriam em círculos.
O batom vermelho ('Pecado Escarlate', acho que se chamava) borbulhava e
borbulhava em suas embalagens de metal. Suas cabeças humanas estavam
fixas em expressões de agonia, e seus olhos de lentes pretas pareciam estar
olhando com horror.

Fui resgatar o Professor, mas os piolhos que o carregavam o jogaram no


chão e fugiram.

"Obrigado!" ele ofegou.

'Eles deveriam se considerar sortudos por eu não ter nenhum blush comigo',
respondi. Agarrando seu braço, comecei a correr em direção ao zigurate.

'É para lá que eles estavam nos levando!' ele gritou, se afastando.

"Eu sei", disse eu, "mas é defensável e, além disso ... você não quer ver o
que eles estavam nos levando para fazer?"

Ele estava olhando por cima do ombro em estado de choque. "Eu não
entendo nada que está acontecendo!" O que aconteceu com eles? O que eles
querem de nós? '

- Prioridades, professor - as respostas podem vir depois da sobrevivência -


disse eu com firmeza - e ainda não garantimos nossa sobrevivência. Agora
venha.

Corremos para as sombras, em direção à TARDIS. Eu me virei e olhei para


os hieróglifos esculpidos na moldura da porta do lado de dentro. Lá, a cerca
de seis metros do chão, estava aquele que fechou a porta. Eu me arrastei,
usando os glifos inferiores descomunais como saliências para minhas mãos e
pés, e joguei meu peso contra o controle. Ela deslizou alguns centímetros e
se iluminou com uma luz laranja piscante, e a porta se fechou pesadamente,
deixando-nos na escuridão.

Eu encontrei meu caminho de memória para onde a TARDIS estava. Quando


cheguei mais perto, a luz no topo piscou hesitantemente em vida. Ela me
conhecia.
Empurrei a porta e ela se abriu com um rangido.

O Professor Forcade apareceu no meu ombro. Ele olhou para o interior da


TARDIS com admiração e terror.

A primeira coisa que percebi foi que aquela não era a TARDIS do Doutor,
apesar da aparência externa deslocada e da placa na porta. Ele muda o visual
com a mesma frequência que eu mudo meu penteado, e pelas mesmas
razões, mas ele tem um certo estilo taciturno e gótico e eu poderia dizer que
esse não era um de seus designs.

A entrada dava para uma escada que subia, passando pelo espaço também
ocupado pela cobertura e pela luz azul. As escadas eram de mármore branco

com inclusões rosadas: um estilo clássico que nunca parece velho, descobri.
O

Professor Forcade começou a gaguejar. Eu apertei sua mão para o


tranquilizar.

"Eu sei - é impossível", eu disse enquanto fechava a porta atrás de nós para
manter os piolhos do lado de fora. — Supere.

Havia dezessete degraus que levavam a uma abertura no chão de ... alguma
coisa. Quando saímos da abertura, percebi que estávamos apenas fora do
centro na base de uma esfera branca tão grande que provavelmente poderia
caber uma pequena lua dentro, ou mesmo minha coleção completa de
sapatos.

O interior dimensionalmente transcendente desta TARDIS aparentemente foi


reconfigurado em um único espaço. O ponto que marca a base exata da
esfera era o próprio console: uma forma hexagonal de cogumelo que parecia
ter sido esculpida em mármore branco também.

Esta é... uma Tecnologia precursora? ' o professor perguntou. - Passamos por
algum tipo de portal para um espaço diferente?

"Não totalmente." Dei de ombros. 'Tem tudo a ver com compressão


dimensional, foi o que me contaram.'
Se a vasta esfera branca do interior da TARDIS estivesse realmente vazia, eu
teria sido capaz de fazer uma estimativa muito melhor de seu tamanho real,
mas ela não estava vazia. Estava cheio de formas oblongas brancas difusas
que eram amarradas juntas por teias de aranha tão grossas quanto uma
pessoa. O branco dos objetos contra o branco do interior da TARDIS tornava
difícil dizer o quão grande eles eram, mas me pareceu que eles eram tão
grandes quanto a nave do Professor Forcade. Eles estavam pendurados em
todas as orientações -

vertical, horizontal, diagonal - mas a teia de aranha parecia ligá-los por suas
extremidades. Na verdade, havia longos fios dessas coisas cruzando o vazio,
como bizarras decorações de Natal amarradas em linhas impossivelmente
longas.

"O que são?" Forcade respirou.

"Estou com uma sensação horrível", disse eu.

'Eles se parecem com ... crisálidas gigantes,' ele continuou. Honestamente,


algumas pessoas simplesmente não sabem quando deixar as coisas em paz.

"Sim", eu disse. 'Essa foi a minha sensação horrível.'

Ele coçou o pescoço. 'Mas como poderia-'

- Sshhh - falei, levando um dedo aos lábios dele. Ele parou de falar e eu ouvi
atentamente. Como os grandes motores de tempo desta TARDIS ficaram em
silêncio por um milhão de anos, não deveria haver nenhum barulho lá, mas
eu podia ouvir um farfalhar, muito longe. Parecia que o vento soprava
através de pilhas de folhas secas, mas suspeitei que fosse de uma fonte muito
mais desagradável. Suspeitei que algumas dessas crisálidas estavam perto de
eclodir, mas como isso poderia ser verdade depois de tanto tempo? Havia
coisas aqui que eu simplesmente não entendia.

Já vi coisas que me assustaram antes. Já enfrentei Weeping Angels e os


Silêncios; eu enfrentei Daleks e Cybermen e os Crimson Revenants. Eu sei o
que é o medo, e eu sei como não demonstrar, porque se você mostrar as
coisas das quais tem medo, então isso lhes dá mais poder (certamente
verdade no caso dos Crimson Revenants, que comem medo e excretam puro
terror em troca).

Principalmente, posso controlar meus sentimentos, seja porque estou com


pessoas em quem confio ou porque vejo uma saída óbvia. Mas aqui e agora
...

a escala do que eu estava olhando me apavorava. Milhões de crisálidas


Qwerm, prontas para eclodir. Milhões deles e uma de mim. O que mais eu
poderia fazer?

Afastei-me do Professor Forcade para que ele não pudesse ver o pânico que
eu podia sentir no meu rosto. Eu me vi olhando para o console na base da
esfera -

que agora eu estava pensando como um cruzamento entre um antigo berçário


gigante e uma colmeia gigante - mas peguei um lampejo de algo diferente
por trás de alguns dos casulos que estavam perto do chão. Eu cautelosamente
conduzi o caminho, manobrando para passar por suas superfícies de algodão,
que se erguiam ao nosso redor como rochedos suavemente curvos e um tanto
lanosos. A teia de aranha que os unia e os sustentava parecia frágil, mas fiz o
possível para não a tocar. Certa vez, vi um homem tentar abrir caminho
através de uma teia de fibras monomoleculares (não vamos falar sobre onde
ou por que agora). Tudo, desde a ponta dos dedos até os cotovelos, de
repente se transformou em algo parecido com salame picado. Não era
agradável e eu não queria que a mesma coisa acontecesse comigo.

Em um espaço claro entre os casulos, encontramos o corpo de um Qwerm.


Eu nunca tinha visto um antes, mas não havia dúvidas sobre o que era. Como
dizem as lendas, era longo e parecido com um gafanhoto, e grande o
suficiente para ocupar o espaço de cinco ou seis lojas em qualquer rua
principal que você queira nomear. O que eu não esperava era que sua pele
externa rígida fosse preta e brilhasse como metal oleado. Ele havia puxado
as pernas para baixo quando morreu. Tudo lá dentro deveria ter apodrecido
ou secado ao longo dos milênios, mas parecia que poderia se esticar e se
mover a qualquer momento.

Professor Forcade parecia chocado em silêncio. Isso era uma coisa boa.
Tagarelice nunca fica bem em um homem.

Eu me movi para a frente do Qwerm. Sua cabeça era do mesmo tamanho do


Mini Cooper que eu dirigia, quando era jovem, quando meus pais eram meus
melhores amigos e eu só tinha um objetivo na vida - matar o Doutor. Seus
olhos eram como pedras preciosas de obsidiana enormes e facetadas, mas
não havia brilho de vida neles. Os vários aparelhos bucais complicados - que
eu suspeito que também teriam dobrado como manipuladores, como mãos
ou tentáculos em outras espécies, pendiam frouxamente de sua boca.

Eles ainda tinham vestígios de fluido biológico neles. Isso não era um bom
sinal.

- O que ... o que o matou? Forcade sussurrou.

'Como milhões de mulheres humanas ao longo da história', respondi,


olhando para as crisálidas penduradas em uma disposição quase infinita
acima de nós,

'ele morreu no parto.'

Forcade aproximou-se da casca seca do Qwerm. Eu estava prestes a avisá-lo


para não o tocar, mas ele se inclinou para frente, com as mãos atrás das
costas, e olhou de perto para algo entre duas das placas metálicas que
formavam seu corpo. De repente, ele saltou para trás, as mãos levantadas em
defesa.

- Eles nos encontraram de novo! — ele gritou.

Aproximei-me com cautela. É algo que aprendi com o Doutor: sempre vá em


direção ao perigo, em vez de se afastar dele - é a última coisa que eles
esperam.

Eu costumava perguntar a ele quem eram 'eles', mas ele apenas olhava para
mim exasperado e dizia: 'É um “eles” metafórico. “Eles” como “a
personificação de tudo o que está causando o perigo”. '

'Mas por que' eles '?' Eu o pressionaria. 'Por que não "ele" ou "ela" ou
"isso"?'
“Porque o perigo sempre vem com reforços”, ele dizia.

O que Forcade havia encontrado parecia inicialmente algum tipo de


crescimento ou protusão dos tecidos moles dentro da casca, mas quando
cheguei mais perto percebi que se parecia muito com os piolhos que tinham
nos sequestrados do lado de fora, na superfície do planeta: uma concha do
tamanho aproximado de um crânio humano, oito pernas orgânicas de concha
dura e duas pinças. As pernas e as pinças estavam enroladas sob ele agora, e
a concha não era realmente uma cabeça - apenas do mesmo tamanho de uma.
Tinha olhos que pareciam lentes pretas inseridas em coisas que pareciam
óculos de proteção orgânicos e vários aparelhos bucais, como o Qwerm.

'— O que é?' Forcade perguntou nervosamente. - Algum tipo de parasita?

"Mais como um parceiro mutuamente benéfico", arrisquei. Olhando por


cima do maciço volume negro do Qwerm, vi outras quatro ou cinco criaturas
iguais, aninhadas entre suas placas. “Suspeito que essas coisas puxaram e
carregaram muito para o Qwerm. Não tenho certeza do que eles receberam
em troca, no entanto - talvez algum tipo de secreção do corpo do Qwerm que
eles usaram como alimento? '

Forcade olhou nervosamente para as escadas. - Mas por que parecem aquelas

... coisas ... nas quais minha equipe se transformou?

"Não sei", respondi, "mas não acho que seja uma coincidência."

'Quando o Qwerm não tem servos,' uma voz seca e sussurrante disse, 'eles
devem fazer novos.' O som foi chocante no silêncio denso criado pelos
casulos e as teias de aranha. Nós dois nos viramos. Acho que o professor
pode ter molhado as calças um pouco.

A voz vinha do console da TARDIS. Movemos com cautela em torno do


Qwerm morto e as várias crisálidas no chão até que pudéssemos ver
corretamente.

Eu engasguei, e o professor fez um barulho sufocado.


Eu não tinha notado antes, mas a parte central do console - o rotor de tempo,
como o doutor costumava chamá-lo - havia sido removida. Protuberando
dela estavam a cabeça e o peito de ... bem, eu não tinha certeza. Tinha que
ser um Senhor do Tempo, mas parecia alguém que tinha sido
impossivelmente pego no meio de uma regeneração. O lado esquerdo era
uma mulher idosa com cabelos prateados bem curtos, um olho azul e rugas
profundas no rosto, mas o lado direito era uma menina, talvez com 10 anos
de idade, com longos cabelos castanhos e um olho verde. As duas metades
da cabeça eram do mesmo tamanho, mais ou menos, com uma espécie de
linha divisória áspera e protuberante entre elas, como se o incrível
metabolismo do Time Lord do corpo tivesse tentado tirar o melhor proveito
de um trabalho ruim, mas não muito bem.

Fios de teia de aranha envolviam seu corpo e levavam para o vasto espaço da
TAR-DIS. Era como se ela estivesse presa às crisálidas pelos antigos
fantasmas de cabos e fios.

- Olá - falei, tentando manter a voz firme. — Quem é você?

- Não vou dizer meu nome verdadeiro - respondeu ela baixinho -, mas
algumas pessoas costumavam me chamar de Rocinante. A voz dela começou
velha e rachada, mas gradualmente mudou para algo mais jovem e mais
hesitante enquanto ela falava.

Há quanto tempo você está aqui?" Perguntou Forcade. Seus olhos estavam
arregalados. Eu não tinha certeza de quanto mais disso ele poderia aguentar.
E

se chegasse a esse ponto, eu não tinha certeza de quanto mais eu poderia


aguentar.

"Para mim, algumas semanas", disse ela. Seus olhos eram castanhos e seu
cabelo era claro, apenas ligeiramente mais escuro do que as teias de aranha.

“Para o universo lá fora, não sei. Talvez um milhão de anos. '

"Ah", eu disse, percebendo. 'Um campo temporal.'


Ela balançou a cabeça. 'Os Qwerm me fizeram ligá-lo depois que eles
encheram a TARDIS com suas larvas.' — É claro. Balancei a cabeça. É tão
óbvio.

- Não para mim - protestou Forcade. Ele estava puxando a gola do macacão
para longe da pele como se algo por baixo o irritasse.

"Tudo tem a ver com as antigas alianças", expliquei na minha melhor voz de
palestrante. 'Os Senhores do Tempo se aliaram aos Qwerm e outros para
lutar contra os Racnoss, os Grandes Vampiros e quaisquer outras raças que
quisessem varrer o universo como uma praga e destruir tudo, mas assim que
as alianças acabaram os Senhores do Tempo olharam em volta e perceberam
que eles criaram uma nova geração de problemas. Raças como os Qwerm
haviam se militarizado e não podiam voltar. Sem mais nada para lutar, o que
eles fariam?

'

"Os Qwerm eram incrivelmente inteligentes", sussurrou a garota pálida.


'Cinco cérebros, todos operando em paralelo. Eles sabiam que seriam os
próximos na lista, então elaboraram um plano. Eles capturariam uma
TARDIS de um de seus conselheiros Senhores do Tempo, colocariam
bilhões de ovos dentro dessa TARDIS, então a deixariam escondida em um
campo temporal até que o universo se acalmasse e se pacificasse, até que os
Senhores do Tempo afundassem na complacência que afeta todos os grandes
impérios, e eles poderiam eclodir e varrer o universo. Para os vencedores, os
espólios. Essa foi a atitude deles. Eles sentiram que haviam conquistado o
direito ao universo. ' Ela sorriu, mas de um lado do rosto parecia amargo e o
outro radiante.

'Este é aquele TARDIS,' eu disse, 'e você é aquele conselheiro, o Senhor do


Tempo.'

Ela olhou ao redor para as teias de aranha - ou energia Qwerm e conduítes de


dados, como eu agora percebi que eram - que a amarraram. Eu segui os
cabos com meus olhos. Eles a ligaram não a qualquer tecnologia Qwerm que
eu pudesse ver, mas aos próprios casulos. Eu olhei para ela e vi que ela
estava olhando para mim pensativamente.
- Os Racnoss nascem com fome - disse ela calmamente. "Isso é o que eles
dizem. Ou diziam, de qualquer maneira. Em contraste, os Qwerm nascem
pensando. Mesmo em suas crisálidas, eles estão planejando, considerando e
peneirando evidências. E estou ligada a eles agora. Parte deles. Posso sentir
seus pensamentos e intenções, e eles podem me forçar a fazer coisas por
eles.

' Ela hesitou, balançando a cabeça ligeiramente. O cabelo do lado mais


jovem de seu rosto balançou na frente de seus olhos.

'E sobre…' Fiz um gesto para os dois lados do corpo dela, para o braço velho
e esquelético de um lado, como uma raiz retorcida de árvore e o galho jovem
do outro.

'A dor do que eles fizeram, usando-me como uma interface entre minha
TARDIS

e eles próprios, me forçando a configurar o campo temporal pelo peso de


suas mentes, me fez regenerar', ela continuou tristemente, 'mas o campo
temporal ligou enquanto eu estava no meio de uma mudança. Metade do
meu corpo mudou e metade ficou como estava. Quando a equipe de
arqueologia do Professor descobriu minha TARDIS, ela acordou, o campo
temporal entrou em colapso e eu me vi assim - nem uma coisa nem outra.
Presa entre dois corpos diferentes.

O rosto do Professor Forcade estava branco e tenso. Ele ainda estava


puxando o colarinho. 'Está tudo muito bem, mas o que isso tem a ver com o
que aconteceu lá fora?' ele perguntou, acenando vagamente para as escadas.
'Suponho que posso aceitar que os Qwerm tenham deixado suas larvas
congeladas em um campo temporal por um milênio, mas como isso afetou
minha equipe?'

"E eu", indiquei. 'Não que eu queira fazer com que tudo seja sobre mim,
embora seja, mas por que meu nome estava na capa desta TARDIS, e por
que parecia

...?' Hesitei, deixando as palavras 'TARDIS do Doutor' não ditas.


"Alguém precisava abrir a porta da frente", disse ela. 'A última coisa que
consegui fazer por minha própria vontade antes que o campo do tempo fosse
estabelecido foi acionar os protocolos de guerra de emergência,
estabelecidos no caso de comprometimento de uma TARDIS ou de um
Senhor do Tempo. Não importava que, eventualmente, o campo temporal
entraria em colapso: minha TARDIS foi lacrada e só poderia ser aberta por
outro de minha raça. ' Ela sorriu para mim docemente. - Ou o filho de uma
TAR-DIS. Isso eu não previ. Você foi atraída aqui. Assim que minha
TARDIS reconheceu a marca do Vórtice do Tempo em seu DNA, ela se
desbloqueou para você.

'Atraída como?' Fiquei fascinado pela história de Rocinante, mas ao mesmo


tempo estava ciente de que o farfalhar alto acima de nós estava ficando mais
intenso.

'Uma vez que esta TARDIS foi descoberta pela equipe de arqueologia do
Professor, o campo temporal entrou em colapso e minha TARDIS foi
liberada.

Ela poderia se conectar a qualquer sistema de comunicação ao alcance. Ela


pode se conectar a outras TARDIS no fuso horário atual, onde quer que
estejam no universo, e desviar o que sabem.

'TARDIS não podem fazer isso,' eu apontei.

- Elas costumavam poder. Tínhamos algo que chamamos de Teia Vortex. Ele
conectava todas as nossas TARDIS para fins de planejamento tático e
comunicação. A capacidade ainda está lá, mas aparentemente ninguém a usa
mais. ' Ela sorriu timidamente na metade do rosto. 'Foi assim que as larvas
de Qwerm, ligada através de mim à minha TARDIS, descobriram sobre essa
pessoa fascinante chamada Doutor, e sobre você. Ela preparou uma
armadilha. A Teia usou o circuito camaleão para alterar a parte externa da
minha TAR-DIS para se parecer com a TARDIS quebrada deste Doutor, e o
recado na frente para ter certeza de que era você, e não ele, que seria atraído
aqui. A mente-colmeia larval dos Qwerm decidiu que você seria menos
perigosa do que ele. Ela inclinou a cabeça para o lado e fez uma careta. —
Me desculpe. Essa foi a avaliação deles, não minha.
- E a equipe arqueológica?

- A mente-colmeia larval Qwerm precisava de servos para encontrá-la e


trazê-la aqui. Minha TARDIS estava cercada por robôs dormentes do
tamanho de um micróbio. '

'O pó amarelo', eu disse baixinho, me chutando por não ter percebido antes.

'Eles se infiltraram nos corpos da equipe através de suas passagens de ar e


seus pulmões e os ajustaram ... reconstruíram ... para uma forma que era
mais familiar para os Qwerm, semelhante a seus antigos servos de centenas
de bilhões de anos atrás. Como eu disse, quando os Qwerm não têm servos,
eles devem fazer mais servos. '

E agora? perguntei. - Os Senhores do Tempo não morreram, sabia? Eles


ainda estão por aí e não vão tolerar isso. Foi bravata, mas eu esperava que
Rocinante

e, mais importante, as larvas de Qwerm que nos ouviam por seus ouvidos
não percebessem.

Eu estava errada.

“De acordo com a história que minha TARDIS baixou da Teia Vortex”, disse
ela,

“os Senhores do Tempo estão velhos e decrépitos agora. Seu tempo acabou.

Sua única chance de se redimir e recapturar suas antigas glórias nesta Guerra
do Tempo falhou, e eles se esconderam em outra dimensão em algum lugar.

Eles não vão nos parar. '

"Nos parar?" Eu perguntei.

"Os Qwerm", ela se corrigiu, franzindo a testa. 'Na verdade, uma vez que os
Qwerm tomem o controle do universo, como é seu direito, eles podem muito
bem convidar os Senhores do Tempo para se juntarem a eles. Como sócios
juniores, é claro. Em nome dos velhos tempos.'
"Que fofo", eu disse.

Rocinante abriu a boca para dizer algo, mas houve um estrondo repentino
próximo. Virei-me para ver uma das crisálidas caindo no fundo da esfera do
interior da TARDIS, ricocheteando na teia que cruzava o espaço enquanto
passava. A crisálida tinha um longo rasgo na lateral, por onde algo havia
escorregado.

E, acima de nossas cabeças, pensei ver algo oleoso e preto movendo-se


confuso, agarrando-se à teia para se apoiar com garras do tamanho de todo o
meu corpo.

- Eles estão incubando - sussurrou Rocinante. Metade de seu rosto estava


contorcido de terror, mas a outra metade estava olhando para cima em
exultação.

Outra crisálida desabou, quase cobrindo a escada por onde havíamos entrado
e que era nossa única chance de sair.

Ou será que não?

Lembrei-me de algo que o Doutor uma vez deixou escapar. Se a Regra Um é


que o Doutor mente, então a Regra Dois é que ele costuma dizer coisas que
não são verdadeiras apenas para fins cômicos e a Regra Três é que mesmo
quando ele não está mentindo e não está brincando, ele está frequentemente
errado, mas era a nossa única chance. A única coisa que poderia impedir um
exército de gafanhotos gigantescos e superinteligentes de devastar o
universo.

Um terceiro casulo vazio caiu em direção ao console, terminando preso em


um berço de teia três metros acima da cabeça de Rocinante. Ela mal pareceu
notar.

Metade dela estava paralisada de medo; metade ficou paralisada em um


êxtase quase religioso.

Eu olhei para o Professor Forcade. Minha boca estava se abrindo para dizer:
'Vou precisar da sua ajuda com isso', quando percebi que ele estava me
olhando

de forma estranha. Sem expressão, como se ele não me reconhecesse. E


então toda a sua cabeça se ergueu do pescoço, sustentada por oito pernas de
concha dura, enquanto duas garras se desdobravam sob sua mandíbula.

Eu sabia que era apenas uma questão de tempo antes que os nano robôs
Qwerm conseguissem infectá-lo. Eles provavelmente me infectaram
também, exceto que eu esperava que minha herança genética como uma filha
da TARDIS

os impedisse de funcionar.

O corpo de Forcade caiu no chão curvo enquanto sua cabeça deu um salto
para os fios de teia mais próximos e fugiu, estalando suas garras em mim e
olhando malignamente através de aglomerados de olhos para o que tinha
sido a parte de trás de sua cabeça. Eu não receberia nenhuma ajuda dele
também.

Eu me movi rapidamente para o console. Eu assisti o Doutor o suficiente


para saber o que fazer e o que não fazer - o que geralmente era o oposto do
que ele fazia e do que não fazia. Rapidamente, quase instintivamente,
minhas mãos piscaram nos controles.

O que está fazendo? Rocinante perguntou em uma voz que oscilava


desconcertantemente entre a velhice e a juventude.

'O Doutor uma vez me disse,' eu disse, ainda trabalhando freneticamente,


'que todas as TARDIS não têm apenas uma porta da frente, mas também uma
porta dos fundos, para uso em emergências.'

Eu olhei para cima. Várias formas pretas enormes e iridescentes estavam se


movendo em minha direção de diferentes direções.

“O que estou fazendo”, continuei, “é conectar a porta da frente à porta dos


fundos em algo chamada garrafa de Klein infinita. Qualquer pessoa ou
qualquer coisa que saia pela porta da frente se verá entrando pela porta da
frente. Esta TARDIS
se tornará um sistema selado. '

Os casulos estavam se dividindo por toda a extensão astronômica do espaço


interno da TARDIS agora.

Milhares, talvez dezenas de milhares de Qwerm estavam nascendo enquanto


eu observava.

- Você ficará presa aqui - disse Rocinante ofegante.

'Minha intenção original era que o professor pressionasse o botão final assim
que eu passasse pelas portas,' eu disse severamente, 'o que teria sido bom
para mim e para o universo, mas não tão bom para o professor. Isso não vai
funcionar agora. Eu nunca pensei que seria assim que eu iria acabar, mas ei!
Todos nós temos que morrer alguma hora. '

A parte antiga do rosto de Rocinante olhou para mim de forma assassina,


mas os lábios do lado infantil se curvaram em um sorriso infantil. "Corra",
disse ela. -

Deixe-me cuidar dessa mudança final.

— Tem certeza?

"Tenho certeza." Ela soltou o braço do aperto da teia e se abaixou em direção


ao console.

— Obrigado — falei.

Corri para as escadas o mais rápido que pude. Eu caí nelas e rolei pelas
portas abertas. Quando elas se fecharam atrás de mim, vi, apenas por um
momento, todo o espaço interno se embrulhar de volta.

Eu ainda tinha que passar pelos piolhos antes de encontrar refúgio seguro na
espaçonave do Professor Forcade, é claro, mas comparado ao que eu já havia
feito, isso era brincadeira de criança. Eles não pareciam saber o que estava
acontecendo, e chutá-los enquanto eu corria produzia um som de trituração
satisfatório. Estragou meus sapatos, mas podem ser facilmente consertados.
Eu tinha passado por uma experiência infernal, mas a única terapia de que
precisava era de compras.

Estação Kanenda, aí vou eu.

Voltei para Stormcage no final, é claro. Não era como se eu realmente


tivesse escolha. A Governadora ainda tem meu manipulador de vórtice em
sua posse, e se eu quiser ver minha mãe, meu pai e meu marido mais, vou
precisar pegar de volta. Então, após uma longa farra de compras e várias
festas, pilotei a espaçonave do Professor de volta ao planeta sombrio e
chuvoso que passei a considerar meu lar.

Acho que a Governadora não gostou de me ver, apesar de eu ter voltado por
conta própria. Ela queria saber o que tinha acontecido com o Professor
Forcade, mas eu não queria compartilhar essa história particularmente, então
fiquei quieta (o que não costumo fazer). Ela retirou todos os meus
privilégios e tirou da minha cela todos os livros e fotos que eu havia
acumulado ao longo do meu encarceramento. Ela também me proibiu de ver
ou falar com qualquer outra pessoa, incluindo os guardas.

Então, aqui estou eu, memorizando minhas próprias anotações de diário para
que eu possa anotá-las corretamente quando receber meu diário de volta.
Isso não importa. Ter tempo para mim mesmo para pensar é bom. Ter muito
tempo para mim mesmo significa que posso pensar muito.

Os artrópodes que vivem nas fendas das paredes de minhas células tiveram
algumas ideias interessantes para recuperar meu manipulador de vórtices.

Assim que resolvermos todas as dificuldades, colocaremos o plano em


prática.

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