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Num ermo, eu de âmago sedento,
Já me arrastava e, frente a mim,
Surgiu com seis asas ao vento,
Na encruzilhada, um serafim;
Ele me abriu, com dedos vagos
Qual sono, os olhos que, pressagos,
Tudo abarcaram com presteza
Que nem olhar de águia surpresa;
Ele tocou-me cada ouvido
E ambos se encheram de alarido:
Ouvi mover-se o firmamento,
Anjos cruzando o céu, rasteiras
Criaturas sob o mar e o lento
Crescer, no vale, das videiras.
Junto a meus lábios rasgou minha
Língua arrogante, que não tinha,
Salvo enganar, qualquer intuito
Da boca fria onde, depois,
Com mão sangrenta ele me pôs
Um aguilhão de ofídio arguto.
Vibrando o gládio com porfia,
Tirou-me o coração do peito
E colocou carvão que ardia
Dentro do meu tórax desfeito.
Jazendo eu hirto no deserto,
O Senhor disse-me: “Olho aberto,
De pé, profeta, e com teu verbo,
Cruzando as terras, os oceanos,
Cheio do meu afã soberbo,
Inflama os corações humanos!”.
Lista de imagens
Prefácio — Dostoiévski: um escritor em seu tempo
Agradecimentos
Fontes e transliteração
Nota da edição brasileira
Abreviações
PRIMEIRA PARTE: AS SEMENTES DA REVOLTA, 1821-1849
1. Prelúdio
2. A família
3. A formação religiosa e cultural
4. A Academia de Engenharia Militar
5. Os dois romantismos
6. O período Gógol
7. Gente pobre
8. Dostoiévski e a Plêiade
9. Bielínski e Dostoiévski: I
10. Folhetins e experimentos
11. Bielínski e Dostoiévski: II
12. Os círculos de Biéketov e Petrachévski
13. Dostoiévski e Spiéchniev
SEGUNDA PARTE: OS ANOS DE PROVAÇÃO, 1850-1859
14. A Fortaleza Pedro e Paulo
15. Kátorga
16. “Monstros em sua desgraça”
17. O soldado Dostoiévski
18. Um coração russo
19. As novelas siberianas
20. A volta ao lar
TERCEIRA PARTE: O IMPULSO DA LIBERTAÇÃO, 1860-1865
21. Entrando na briga
22. Uma estética da transcendência
23. Humilhados e ofendidos
24. A era das proclamações
25. Retrato de um niilista
26. Os últimos meses de O Tempo
27. Notas de inverno sobre impressões de verão
28. Uma mulher emancipada, um amante atormentado
29. A prisão da utopia
30. Memórias do subsolo
31. O fim de A Época
QUARTA PARTE: OS ANOS MILAGROSOS, 1865-1871
32. Khlestakov em Wiesbaden
33. De novela a romance
34. Crime e castigo
35. “Um pequeno diamante”
36. O jogador
37. Fuga e exílio
38. Em busca de um romance
39. Um pai inconsolável
40. O idiota
41. O panfleto e o poema
42. Pais, filhos e Stavróguin
43. Retorno do exílio
44. História e mito em Os demônios
45. O livro dos impostores
QUINTA PARTE: O MANTO DO PROFETA, 1871-1881
46. O Cidadão
47. Naródnitchestvo: o populismo russo
48. Bad Ems
49. O adolescente
50. Uma figura pública
51. Diário de um Escritor, 1876-1877
52. Um novo romance
53. O grande debate
54. A rebelião e o Grande Inquisidor
55. Terror e lei marcial
56. O Festival Púchkin
57. Controvérsias e conclusões
58. Os irmãos Karamázov, Livros 1-4
59. Os irmãos Karamázov, Livros 5-6
60. Os irmãos Karamázov, Livros 7-12
61. Morte e transfiguração
Nota da editora
Notas
Sobre o autor
Lista de imagens
a Antigo nome de uma rua de Londres onde moravam, no século XVIII, aspirantes
a escritores e poetas, ou escrevinhadores que punham suas penas a serviço de
quem lhes pagasse. (N. T.)
b O trecho entre aspas é de Nikolai Gógol, Almas mortas. Trad. de Rubens
Figueiredo. São Paulo: Editora 34, 2018. (N. E.)
7. Gente pobre
8. M. V. Butachévitch-Petrachévski
em 1840.
Longe de desiludir Petrachévski, esse episódio só o
convenceu de que era essencial um período preparatório de
esclarecimento intelectual para o progresso social; e assim,
dedicou-se ainda com mais fervor a disseminar as luzes em
todos os lugares possíveis, não só nas “sextas-feiras”
abertas de sua casa, mas também em vários clubes e
organizações em que entrou (como um curso de dança para
comerciantes e lojistas) com o objetivo específico de
conhecer o máximo possível de pessoas e semear o
fermento da insatisfação.
Apesar de sua ampla gama de conhecidos, Petrachévski
não tinha amigos íntimos. Sempre cortês com membros de
seu círculo, havia ainda alguma coisa de irritante em sua
personalidade que talvez adviesse do papel que se atribuíra
de agent provocateur intelectual. Dostoiévski, ao ser
questionado pela comissão de investigação após a prisão
em massa do círculo de Petrachévski, negou qualquer
intimidade com ele, mas acrescentou: “Sem dúvida, sempre
o respeitei como um ser humano digno e nobre”.22 Ademais,
a maioria de seus visitantes não podia deixar de nutrir
sentimentos contraditórios a respeito dele devido à sua
reputação de excêntrico e caprichoso. Havia uma infinidade
de histórias sobre seus problemas com os burocratas, a
quem constantemente provocava, insistindo que
obedecessem à risca as prescrições do código legal russo.
Algumas das lendas a seu respeito decorrem simplesmente
da individualidade marcante de sua aparência pessoal. Foi
acusado de ter ido à igreja vestido de mulher; em outra
ocasião, depois de receber ordem para cortar os cabelos,
chegou ao escritório com as madeixas luxuriantes de uma
peruca! É impossível saber quantos desses relatos são
apócrifos. Mas todos derivam, é evidente, de sua zombaria
dos inumeráveis regulamentos mesquinhos que regiam
todos os aspectos da vida cotidiana na Rússia e de sua
recusa obstinada e corajosa a se submeter docilmente a
eles. Não obstante, ganhou a reputação de ser um bobo da
corte, em vez de uma pessoa de bom senso e
responsabilidade, e era difícil, até mesmo para a maioria
dos membros de seu círculo, aceitá-lo sem reservas
interiores.
Essa foi a já famigerada personalidade que Dostoiévski
começou a frequentar na primavera de 1847. Ia à casa de
Petrachévski como teria ido a qualquer outra reunião social.
Não havia nada mais secreto ou conspiratório em relação às
sextas-feiras de Petrachévski do que havia em relação às
reuniões da Plêiade de Bielínski ou ao Círculo de Biéketov.
Afinal, as pessoas se reuniam para falar um pouco mais
livremente sobre os mesmos assuntos que estavam sendo
abordados nas revistas literárias. Acreditava-se em geral
que, desde que a conversa se realizasse a portas fechadas,
nada havia a temer da parte do governo. Um animado
jovem petersburguês, em carta datada do início de 1848,
arrola, entre as atrações da cidade, “os sermões de Nilson, a
propaganda de Petrachévski e as palestras públicas e os
folhetins de Pleschéiev”;23 tudo lhe parecia existir no
mesmo nível da diversão pública e da expressão de opinião
toleradas. Como veremos em breve, essa crença estava
errada.
9. N. A. Spiéchniev.
Mas, ao contrário de Bielínski, parece que Spiéchniev
nunca foi muito influenciado pelo humanitarismo
sentimental e pelo messianismo religioso-filosófico da
escola de Sand-Leroux. Em vez disso, foi atraído pelas
doutrinas disseminadas entre as sociedades secretas
francesas extremistas que pregavam a necessidade de
violência e cujo comunismo se combinava com uma filosofia
de materialismo, ateísmo e egoísmo utilitarista. Um dos
porta-vozes mais articulados dessa posição, que recebeu
um gesto de aprovação de Karl Marx em A sagrada família,
era Theodore Dézamy.4 Ele estava tão comprometido
quanto Cabet com um comunismo totalmente igualitário e
nivelador do tipo mais rude, mas acreditava que só poderia
ser alcançado pela aplicação implacável do terror para
esmagar todos os inimigos da nova ordem ideal. Um dos
livros de Dézamy, O jesuitismo vencido pelos socialistas, foi
encontrado nas buscas realizadas nos aposentos de
Spiéchniev depois de sua prisão.
Há também razões para crer que Spiéchniev, durante sua
estada em Paris, foi influenciado pelos próprios pais do
marxismo (ainda não marxistas, é claro). No outono de
1844, Engels escreveu uma carta para a Novo Mundo Moral,
uma revista owenista-comunista, em que afirmava
orgulhosamente que “estamos tendo muito sucesso entre
os russos que vivem em Paris. Há três ou quatro nobres e
proprietários de terras russos que se declaram comunistas e
ateus radicais”. V. I. Semióvski, um historiador com
conhecimento incomparável do radicalismo russo, acha que
“dificilmente podemos duvidar que um desses russos fosse
Spiéchniev”.5
O que sabemos sobre Spiéchniev provém, em grande
parte, do testemunho de outras pessoas e do resumo do seu
caso feito para Nicolau I, bem como dos rascunhos de duas
cartas escritas por ele em algum momento de 1847.
Presume-se que foram endereçadas a seu amigo polonês
Edmond Chojecki e oferecem uma confirmação notável das
características de Spiéchniev que tanto impressionaram
seus contemporâneos. Não se pode deixar de admirar sua
acessível erudição em questões filosóficas e
socioeconômicas e sua lucidez de espírito irônica e arguta.
As observações mais importantes são aquelas que mostram
o quanto ele estava sob a influência de Max Stirner.
Rejeitando todas as tentativas de estabelecer qualquer tipo
de sistema metafísico, Spiéchniev escreve: “O
antropoteísmo [a posição de Feuerbach] diviniza um objeto
novo e diferente, mas não há nada de novo no fato da
divinização. […] A diferença entre um Deus-homem e um
Homem-deus é tão grande assim?”. Ambos são abstrações,
diz ele, que não dizem respeito ao indivíduo de carne e osso
existente. “Eu sou, escrevendo para você agora, realmente
idêntico à humanidade ou ao ‘humano’?… Se não sou, então
a ‘humanidade’ e o ‘humano’ são […] autoridades alheias.”
Spiéchniev conclui que “categorias como beleza e feiura,
bom e mau, nobre e ignóbil, sempre foram e continuarão a
ser uma questão de gosto”.6
As afinidades entre as concepções de Spiéchniev e as
ideias que motivam o personagem de Stavróguin em Os
demônios são impressionantes. Spiéchniev falou sobre
religião de um ponto de vista “filosófico” numa das reuniões
noturnas na casa de Petrachévski, quando Dostoiévski pode
muito bem ter estado presente. Mas, mesmo que se
suponha que Dostoiévski inventou a motivação ideológica
de Stavróguin, isso apenas confirma a capacidade
surpreendente de sua imaginação, naquilo que pode
parecer seus voos mais desvairados, de interligar-se com
um pouco da realidade histórica da cultura russa. Pois a
“Confissão” de Stavróguin contém o seguinte trecho, que
apresenta a justificativa para seu comportamento: “Eu não
tenho o sentimento nem o conhecimento do bem e do mal,
e não só perdi o sentido do bem e do mal, mas o bem e o
mal na verdade não existem (e isso me agradou) e são
apenas um preconceito; eu posso ser livre de todos os
preconceitos…” (v. 12, p. 113).
O comparecimento de Spiéchniev nas sextas-feiras de
Petrachévski, no início de 1848, provocou naturalmente
interesse e entusiasmo, quando menos porque o visitante
muito viajado poderia fornecer informações em primeira
mão sobre os círculos socialistas da Europa. Mas sua
personalidade marcante também produziu efeito, muito
auxiliada por seu ar reticente e pela aura de mistério que
assumia — a de um homem perfeitamente equilibrado, que
sabia muito mais do que estava disposto a revelar aos não
iniciados. Raramente entrava na conversa em andamento,
passava a maior parte do tempo no estúdio do anfitrião
consultando sua biblioteca e só se dignava de vez em
quando a soltar uma palavra lacônica. Pelo que Spiéchniev
disse sobre si mesmo durante o inquérito, vemos que
cultivava deliberadamente essa postura para aumentar sua
autoridade e prestígio. Ele “era às vezes muito cortante na
fala, para impedir que os outros se escondessem dele, e
conseguia reconhecer todos os pensamentos ocultos, de
modo a saber com quem estava lidando”.7 A maneira como
era tratado por Petrachévski sugere que era suspeito de ser
o emissário de alguma organização revolucionária europeia.
Spiéchniev era de uma índole moral inteiramente diversa da
de Petrachévski, e os dois estavam, em termos ideológicos,
em polos opostos. Petrachévski depositava suas esperanças
numa evolução gradual, condenava as ações políticas
precipitadas e rejeitava o comunismo igualitário, que
considerava uma barbárie econômica. Spiéchniev dizia-se
abertamente comunista, acreditava na estatização de todos
os meios de produção nas mãos de um poder central forte e
achava que o passo inicial e mais importante devia ser a
tomada desse poder pelos revolucionários na primeira
oportunidade.
Sempre que falava, Spiéchniev injetava um novo tom de
férrea determinação na atmosfera volúvel das reuniões;
nelas, ninguém se expressava com tamanha brutalidade e
franqueza. Na conversa sobre religião, observou que, na
Rússia, só era possível propagandear ideias de boca a boca.
“E, portanto, senhores, uma vez que resta apenas a palavra
falada para nós, tenho a intenção de usá-la sem a menor
vergonha ou consciência, sem senso de desonra, a fim de
fazer propaganda do socialismo, ateísmo, terrorismo, de
tudo, tudo o que é bom no mundo. E aconselho vocês a
fazer o mesmo.”8
O SONHO DO TITIO
A trama de O sonho do titio pode ser resumida em poucas
palavras. O “titio” é um príncipe russo decrépito, mas rico,
quase senil, que um belo dia chega por acaso ao povoado
de Mordássov e logo cai na teia da “poderosa” das
redondezas, Maria Alieksándrovna Moskáleva. Ela maquina
o plano de casá-lo com Zina, sua filha solteira de 23 anos de
idade, moça bela e orgulhosa, e gasta um arsenal de
artifícios para concretizá-lo. Mas, para júbilo de suas
inúmeras rivais na supremacia social, acaba afinal derrotada
pelo ciúme do rejeitado pretendente de Zina, um jovem
burocrata de Petersburgo chamado Mozgliakov, que
convence o príncipe, seu parente distante, incapaz de
distinguir entre a vigília e o sono, de que a proposta de
casamento que ele fizera a Zina em estado de completa
embriaguez tinha sido apenas “um sonho”.
Dostoiévski dota esse relato de um estilo levemente
heroico-cômico e o apresenta como uma óbvia paródia da
História da grandeza e da decadência de César Birotteau,
de Balzac, ao defini-lo como “a história completa e notável
da ascensão, da glória e da queda solene de Maria
Alieksándrovna e toda a sua família” (v. 2, p. 516 [15]). A
história também tem como subtítulo “Das crônicas de
Mordássov” (v. 2, p. 296 [7]), e esse tom épico, é óbvio, só
ressalta a insignificância dos eventos (apenas um ou dois
anos antes, Saltikov-Schedrin havia usado o mesmo artifício
em suas Cenas provincianas, também narradas por um
bisbilhoteiro local). Esse novo tipo de narrador
dostoievskiano é um cronista de mexericos, tão (se não
mais) interessado em boatos e calúnias quanto no que é
capaz de verificar com seus próprios olhos e ouvidos; mas
ele nunca está realmente certo sobre como interpretar
aquilo que testemunha em primeira mão. Um narrador
desse tipo será usado mais tarde por Dostoiévski em outras
obras também ambientadas nas províncias russas, como Os
demônios e Os irmãos Karamázov, e ele transforma esse
artifício em um instrumento sutil para controlar o ponto de
vista de sua narrativa. Trata-se de um expediente deveras
valioso no sentido de permitir-lhe retratar suas principais
personagens contra o pano de fundo de boatos, opiniões e
difamações, que funciona como uma espécie de coro grego
em relação à ação central.17
O retrato que ele faz da vida provinciana, com suas
eternas fofocas, maledicências e implacáveis rusgas por
ninharias, proporciona o contexto em que as personagens
mais importantes da história se destacam em acentuado
relevo. E ninguém é mais importante em Mordássov do que
Maria Alieksándrovna — que chega a ser comparada com
Napoleão e é considerada até mesmo superior ao imperador
francês. Ela exibe abertamente uma vontade de dominar à
qual não tem direito por posição social ou fortuna. Trata-se
da primeira personagem com essa característica a aparecer
numa obra de Dostoiévski em que as convenções do
realismo são escrupulosamente respeitadas. O único
personagem anterior desse tipo tinha sido o fantástico e
fascinante Múrin, que domina todos os outros na
extremamente simbólica novela A senhoria. Até então,
Dostoiévski só havia concebido a psicologia desse tipo de
personagem em termos de hipérbole romântica. Agora,
porém, ele situa uma personalidade assim tão “forte” no
mais monótono cenário provinciano russo, dando assim seu
primeiro passo em direção à reabsorção do alcance e da
grandeza da temática romântica e sua fusão com a
realidade social russa, o que vai distinguir sua obra
posterior. Com efeito, por mais insignificante que seja a
forma assumida por essa “grandeza” na novela, o nome de
Napoleão é o suficiente para nos alertar para o que
Dostoiévski fará desse anseio de dominação no futuro.
A manifesta superioridade de Maria Alieksándrovna
transparece quando ela se depara com a tarefa de persuadir
Zina, sua filha orgulhosa e de princípios elevados que sente
apenas desprezo pelas ambições e maquinações da mãe, a
casar-se com o príncipe decrépito. É preciso explicar que
Zina está apaixonada por um jovem e pobre mestre-escola,
acometido pela tuberculose, e a mãe sabe que ela
prometeu não se casar enquanto ele estiver nos estertores
da morte. Para conseguir seu objetivo, Maria Alieksándrovna
percebe que deve oferecer alguma perspectiva de fato
tentadora, e depois de algumas manobras preliminares
vigorosas mas ineficazes, ela é forçada a recorrer a armas
de calibre mais pesado. Um casamento com o príncipe, ela
diz à filha, não seria de forma alguma um casamento de
verdade (“ele mesmo não é capaz de exigir tal amor”) e, de
qualquer modo, “o príncipe vai viver mais um ano, se muito
dois”. O jovem professor não poderia sentir ciúmes do
príncipe e, portanto, ela diz a Zina para refletir “que te
casando com o príncipe, tu o farás ressuscitar
espiritualmente, tu o deixarás contente!”. Mas Zina percebe
os sofismas da mãe e aponta sua estratégia com precisão
exasperada: “Eu a entendo, mamãe, entendo
perfeitamente. Nada faz a senhora deixar de apresentar
sentimentos nobres, nem mesmo num caso abominável” (v.
2, p. 325 [61-2]). Esses “sentimentos nobres” são a
“ideologia” de Maria Alieksándrovna, e ela os tira do
depósito de lugares-comuns acumulados pela literatura
romântica das décadas de 1820 e 1830, tanto na Rússia
como na Europa.
Percebendo que qualquer apelo ao egoísmo esclarecido
está fadado ao fracasso, Maria Alieksándrovna recorre a um
tom mais elevado: a abnegação. Por que não pensar no
casamento com o príncipe como um ato de devoção? “Onde
está o egoísmo, onde está a baixeza nisso?” Como fará
muitas vezes no futuro, Dostoiévski não tem medo de
zombar de ideias e de ideais nos quais ele mesmo acredita
quando, como nesse exemplo, estão sendo usados apenas
como encobrimento para o egoísmo e o egocentrismo. Maria
Alieksándrovna conclui dizendo a Zina que se a riqueza do
príncipe a incomoda, que renuncie a ela, dê tudo aos pobres
exceto o que precisar para as necessidades mais básicas, e
“ajuda, por exemplo, a ele, àquele infeliz no leito de morte”
(v. 2, p. 326 [63]).
Não há necessidade de detalhar aqui todos os sofismas de
Maria Alieksándrovna, mas ela finalmente acerta um veio de
ouro puro. Como comenta o narrador, “uma inspiração, uma
verdadeira inspiração se apoderou dela” ao perceber que
encontrou uma maneira de atingir o idealismo autêntico de
Zina: sacrificar-se com um casamento degradante para
ajudar seu amado moribundo. Nesse momento, Maria
Alieksándrovna apela para todas as armas:
Ele [o médico local] me disse com segurança que em outras circunstâncias,
sobretudo com mudança do clima e do ambiente, o paciente poderia curar-se.
Disse que na Espanha […] existe uma ilha inusitada, parece que Málaga —
numa palavra, parece que um tipo de vinho — onde não só doentes do peito,
mas até tísicos ficaram inteiramente curados só com o clima, e que para lá
vai gente com o propósito de curar-se.
A ALDEIA DE STEPÁNTCHIKOVO
a A tradução desse texto em português pode ser lida em Ivan Turguêniev, Pais e
filhos. Trad. de Rubens Figueiredo. São Paulo: Cosac Naify, 2004. (N. E.)
16. A casa de Mikhail Dostoiévski e
redação de O Tempo.
117. F. M. Dostoiévski
em 1861.
Apesar de sua carreira de publicista, Strákhov nutria um
desdém invencível pelas rivalidades jornalísticas. Ele
observa com orgulho que havia pertencido a um círculo
literário da década de 1840 para o qual “o ápice da cultura
era entender Hegel e conhecer Goethe de cor”.21 Esses dois
nomes (principalmente o último) haviam se tornado
símbolos de uma atitude sociocultural au-dessus de la
mêlée [acima da batalha], de uma preocupação com
questões “eternas”, muito distantes das disputas
mesquinhas do dia a dia da vida social; Strákhov ficou
chocado, em seu primeiro contato com o Círculo de
Miliukov, ao se ver exposto a um ponto de vista
inteiramente diverso. A tendência nesse círculo, ao qual
Dostoiévski aderira logo após seu retorno do exílio,
se formara sob a influência da literatura francesa. As questões políticas e
sociais estavam, portanto, em primeiro plano e engoliam os interesses
puramente artísticos. O artista, de acordo com essa concepção, devia
investigar a evolução da sociedade e tomar consciência do bem e do mal que
nascem em seu meio; em consequência, devia ser um professor, um
denunciante, um guia. Disso, se inferia quase diretamente que os interesses
eternos e gerais tinham de se subordinar aos transitórios e políticos. Fiódor
Mikháilovitch estava totalmente mergulhado nessa tendência publicista e
permaneceu fiel a ela até o fim de sua vida.22
Esse trecho pode muito bem ser visto como uma das
fontes que conduzem à dialética filosófico-psicológica da
primeira parte de Memórias do subsolo.
No entanto, apesar de toda a sua admiração pelo talento
de Poe, Dostoiévski não o considera à altura de outro
“fantasista”, E. T. A. Hoffmann, que lera com reverência
quando adolescente. O que dá vantagem a Hoffmann,
sustenta ele, é que em sua obra o sobrenatural e o estranho
se interpenetram e se fundem com o lugar-comum e o
verossímil. Às vezes Hoffmann “até busca seu ideal fora do
mundo terreno, numa espécie de mundo extraordinário que
aceita como superior, como se ele mesmo acreditasse na
existência desse mundo encantado e misterioso”. Poe é
inferior a Hoffmann como “poeta”, uma vez que o romântico
alemão instila constantemente em sua obra a aspiração a
“um ideal” — e nessa aspiração Dostoiévski localiza “a
pureza, e a beleza real, verdadeira que é inerente ao
homem” (v. 19, pp. 88-9). As melhores criações pós-
siberianas de Dostoiévski tentam alcançar um equilíbrio
entre os dois escritores, igualando-se a Poe na vivacidade e
verossimilhança, mas sem nunca perder o senso do
sobrenatural e transcendente de Hoffmann como força
controladora da vida humana.
Desse modo, Dostoiévski tentou ser ao mesmo tempo um
escritor como Poe e um poeta como Hoffmann; para ele,
esses dois aspectos da literatura jamais deviam ser
separados. Com efeito, a necessidade de manter os dois
unidos era uma questão muito presente em seu espírito
naquele momento, e continuou a preocupar seu
pensamento sobre a arte e a vida, pois a função mais
importante da arte, acreditava ele, era inspirar o homem,
oferecendo-lhe um ideal de transcendência ao qual poderia
para sempre aspirar. Foi essa a posição que afirmou,
quando, no segundo número de O Tempo, lançou seu
primeiro ataque aberto ao campo radical.
PARTE I
1. A dialética do determinismo
O primeiro segmento de Memórias do subsolo se estende
do capítulo 1 ao capítulo 6, e sua famosa diatribe de
abertura nos dá uma imagem inesquecível do homem do
subsolo enfurnado em seu “cantinho” de Petersburgo a
ruminar as peculiaridades de seu caráter e de sua vida:
“Sou um homem doente… Um homem mau. Um homem
desagradável. Creio que sofro do fígado”. Ele está doente,
mas se recusa a procurar um médico, embora respeite a
medicina: “Ademais, sou supersticioso ao extremo; bem, ao
menos o bastante para respeitar a medicina”. A medicina, é
evidente, se tornou a ciência depois de Bazárov, Lopukhov e
Kirsánov, mas o homem do subsolo rotula sarcasticamente
o respeito excessivo pela medicina de simples superstição
irracional. Sabe que deve ir ao médico, mas de algum modo
— na verdade, por nenhuma boa razão, apenas por raiva —
prefere ficar em casa, sem tratamento. Por quê?
“Certamente não compreendeis isso”, diz ele. “Ora, eu
compreendo” (v. 5, p. 99 [15]). Seja qual for a explicação,
há um claro conflito entre um curso racional de
comportamento e algum sentimento obscuro rotulado de
“raiva”.
Ficamos sabendo, então, que o homem do subsolo é um
ex-funcionário público agora aposentado, que no passado se
envolvera em batalhas incessantes para tiranizar os
humildes solicitantes que atravessavam seu caminho no
curso dos negócios. Mas, embora gostasse desse suborno
de seu ego, confessa que “minha boca espumava, mas, se
alguém me trouxesse alguma bonequinha, me desse
chazinho com açúcar, é possível que me acalmasse”. A
natureza do homem do subsolo não é cruel e maldosa em
nenhuma medida; ele é mais do que sensível a qualquer
manifestação de amizade, mas essas reações são
cuidadosamente contidas, por mais fortes que possam ser:
“A todo o momento constatava em mim a existência de
muitos e muitos elementos contrários a isso [a raiva]. […]
Sabia que eles haviam fervilhado a vida toda e que pediam
para sair, mas eu não deixava. Não deixava, de propósito
não os deixava extravasar” (v. 5, p. 100 [16]).
O homem do subsolo aparece enredado num conflito
entre os aspectos egoístas de seu caráter e os aspectos
solidários e sociáveis que também possui, mas estes
últimos são continuamente reprimidos em favor dos
primeiros. Nós o vemos dilacerado por uma dissonância
interna que o impede de comportar-se de um modo que
poderia ser considerado “normal” — isto é, agindo em
termos de egoísmo e “razão” na primeira parte, em que o
homem do subsolo fala para si mesmo ou a um interlocutor
imaginário, ou dando irrestrita expressão aos seus impulsos
altruístas (ou pelo menos amigavelmente sociais) na
segunda parte, em que está vivendo em sociedade em
relação com outros indivíduos. O que o impede de fazer isso
é exatamente o que Dostoiévski deseja esclarecer e
analisar.
A natureza desses impedimentos só fica clara aos poucos
na primeira parte, à medida que o homem do subsolo
continua a expor todos os seus defeitos à contemplação
desdenhosa de seu presumido leitor, pois descobre-se que
os impulsos contraditórios que lutam dentro dele
paralisaram seu caráter. “Não consegui chegar a nada, nem
mesmo tornar-me mau: nem bom nem canalha nem
honrado nem herói nem inseto conseguia ficar rancoroso”,
diz ele. O único consolo do homem do subsolo é que “um
homem inteligente do século XIX precisa e está moralmente
obrigado a ser uma criatura eminentemente sem caráter”, e
é com orgulho que ele atribui sua falta de caráter ao fato de
ter uma “grande consciência”. Em consequência, “era capaz
de melhor apreciar todas as sutilezas do ‘belo e sublime’,
como outrora [anos 1840] se dizia entre nós”. Mas “quanto
mais consciência eu tinha do bem e de tudo o que é ‘belo e
sublime’, tanto mais me afundava em meu lodo, e tanto
mais capaz me tornava de imergir nele por completo” (v. 5,
p. 100, 102 [17, 19]).
Esse estranho estado de impotência moral, que o homem
do subsolo ao mesmo tempo defende e despreza, é
complicado ainda mais pela admissão de que de fato sente
prazer na experiência de sua própria degradação. Ele
confessa:
chegava ao ponto de sentir certo prazerzinho secreto, anormal, ignobilzinho
quando às vezes, em alguma horrível noite de Petersburgo, regressava ao
meu cantinho e me punha a lembrar com esforço que, naquele dia, tornara a
cometer uma ignomínia e que era impossível voltar atrás. Remordia-me então
em segredo, dilacerava-me, rasgava-me e sugava-me, até que o amargor se
transformasse, finalmente, em certa doçura vil, maldita, e, depois, num
prazer sério, decisivo! (v. 5, p. 102 [19-20])
PARTE II
I. JORNALISMO
II. NARRATIVAS
2. A FAMÍLIA
1. DW (jan. 1877); ver também, para a comparação com Tolstói, F. M.
Dostoevsky, The Notebooks for A Raw Youth. Org. de Edward Wasiolek. Trad. de
Victor Terras. Chicago, 1969, pp. 425, 544-5.
2. ZT, p. 21.
3. A. M. Dostoiévski, Vospominánia. Leningrado, 1930, pp. 17-18.
4. DVS, v. 1, p. 44.
5. DW (1873, n. 1), p. 6.
6. Pisma, v. 2, p. 549, 16 ago. 1839.
7. V. S. Nietcháieva, V semé i ussadbe Dostoiévskikh. Moscou, 1939, p. 109.
8. Ibid., p. 5.
9. DVS, v. 1, p. 76.
10. Nietcháieva, V semé, p. 77.
11. DVS, v. 1, p. 87.
12. Nietcháieva, V semé, p. 81.
13. Ibid., p. 99.
14. Ibid., p. 106.
15. Ibid.
16. Ibid., p. 109.
17. Ibid., p. III.
18. DVS, 1, pp. 55, 57.
19. Ibid., p. 57.
20. DJP, p. 33.
21. DVS, v. 1, p. 64.
22. Nietcháieva, V semé, p. 83.
23. DVS, v. 1, p. 209. O segundo filho de Tolstói, Iliá, nascido em 1866,
escreve em suas memórias: “O mundo estava dividido em duas partes, uma
composta de nós e a outra, de todos os outros. Nós éramos pessoas especiais e
os outros não eram iguais a nós. […] Era principalmente maman, é claro, a
culpada por nutrir essas noções, mas papa também evitava ciumentamente
nosso contato com as crianças da aldeia. Ele foi responsável, em grau
considerável, pela arrogância e autoestima sem fundamento que essa criação
inculcou em nós, e das quais é tão difícil eu me libertar”. Edward Crankshaw,
Tolstoy: The Making of a Novelist. Nova York, 1974, p. 253.
24. DW (jul.-ago. 1877), p. 752.
25. DVS, v. 1, p. 72.
26. Ibid., p. 76.
27. Ibid.
28. Ibid., p. 75.
29. DJP, p. 26.
30. DVS, v. 1, p. 82.
31. Ibid., pp. 83-8.
32. Ibid., 84.
33. Pisma, v. 1, p. 52, 31 out. 1838.
34. DVS, v. 1, p. 59.
5. OS DOIS ROMANTISMOS
1. Pisma, v. 4, p. 242, 5 maio 1839.
2. DVS, v. 2, p. 191.
3. Pisma, v. 1, p. 56, 1o jan. 1840.
4. Ibid.
5. Ibid, p. 51, 31 out. 1838.
6. Cit. em G. Prochorov, “Die Brüder Dosyojewski und Shidlovski”, Zeitschrift
für Slavische Philologie 7 (1930), p. 320.
7. Ibid.
8. Cit. em V. G. Bielínski, Selected Philosophical Works. Moscou, 1948, p. 14.
9. Pisma, v. 1, p. 56, 1o jan. 1840.
10. M. H. Abrams, Natural Supernaturalism. Nova York, 1971, p. 65.
11. Ibid., p. 66.
12. “Em Adam Smith ele buscou sua educação/ E não era um economista
medíocre;/ Ou seja, era capaz de explicar/ Como os estados prosperam e
permanecem saudáveis/ Sem o benefício de ouro,/ O segredo sendo que, tudo
dito, são os produtos básicos que os tornam ricos./ Seu pai não conseguiu
entender isso,/ E hipotecou a terra ancestral” (1.7). Trad. para o inglês de Walter
Arndt. Nova York, 1963.
13. Pisma, v. 1, p. 47, 9 ago. 1838.
14. P. V. Annenkov, The Extraordinary Decade. Org. de Arthur P. Mendel. Trad.
de Irwin R. Titunik. Ann Arbor, MI, 1968, p. 13.
15. Pisma, v. 1, p. 46, 9 ago. 1838.
16. Ibid., p. 50, 31 out. 1838.
17. Erich Auerbach, Mimesis. Trad. de Willard Trask. Princeton, NJ, 1968, p.
440.
18. Cit. em Benno von Wiese, Friedrich Schiller. Stuttgart, 1959, p. 448.
19. Pisma, v. 1, p. 47, 9 ago. 1838.
20. Ibid.
21. The Gates of Horn. Nova York, 1963, p. 191.
22. Cit. em David Owen Evans, Social Romanticism in France, 1830-1848.
Oxford, 1951, p. 81.
23. “Em livro, com o drama, em prosa, em verso,/ Defendi a causa dos fracos
e miseráveis;/ Suplicando aos felizes e implacáveis;/ Reabilitei o palhaço, o
comediante,/ Todos os seres humanos condenados, Triboulet, Marion,/ O lacaio,
o forçado e a prostituta.” Victor Hugo, Oeuvres complètes. Paris, 1882, v. 6, p.
91.
24. Pisma, v. 1, p. 58, 1o jan. 1840.
25. Ver D. G. Charlton, Social Religions in France, 1815-1870. Londres, 1963,
p. 84.
6. O PERÍODO GÓGOL
1. Pisma, v. 1, p. 76, 24 mar. (fev.) 1845.
2. A. I. Riesenkampf, “Vospominánia o F. M. Dostoiévskom”, LN 86, Moscou,
1973, p. 325.
3. Ibid., p. 330.
4. Ibid., p. 331.
5. Ibid.
6. DVS, v. 1, p. 95.
7. Pisma, v. 1, p. 65, 23 dez. 1841.
8. Ibid., v. 4, p. 450, 5 set. 1844.
9. É provável que Dostoiévski tenha conseguido seus mil rublos. Ele contou à
comissão que investigava o caso Petrachévski que renunciara aos direitos à
propriedade de seus pais em 1845 em troca do pagamento imediato de uma
quantia de dinheiro. N. F. Biéltchikov, Dostoiévski v protsiesse Petrachévtsev.
Moscou, 1971, p. 123.
10. Victor Brombert, Stendhal: Fiction and the Themes of Freedom. Nova York,
p. 1968, p. 29.
11. “A equivalência entre amor e ódio, um incessantemente nascido do outro
[…] está no centro da psicologia raciniana do amor.” Paul Bénichou, Morales du
grand siècle. Paris, 1967, p. 223.
12. Pisma, v. 1, pp. 58-9, 1o jan. 1840.
13. Ibid., p. 69; e meados de jan. 1844.
14. V. G. Bielínski, Izbrannye filossófskie sotchiniénia. Moscou, 1950, v. 1, p.
215. 2 v.
15. I. I. Panáiev, Sobránie sotchiniénii. Moscou, 1912, v. 6, p. 212. 6 v.
16. Cit. em Yu. Oksman, Liétopis jizn i tvórtchestvo V. G. Bielínskovo. Moscou,
1958, p. 195.
17. Panáiev, SS, v. 6, p. 273.
18. V. G. Bielínski, Selected Philosophical Works. Moscou, 1948, p. 159.
19. Ibid., pp. 164-5.
20. P. V. Ánnenkov, The Extraordinary Decade. Org. de Arthur P. Mendel. Trad.
de Irwin R. Titunik. Ann Arbor, MI, 1968, p. 112.
21. Os nomes mais conhecidos da Plêiade eram o próprio Panáiev e K. D.
Kaviélin. Entre 1843 e 1848, ela ampliou-se para incluir Nekrássov, Turguêniev,
Dostoiévski, Gontcharóv e Saltikov-Schedrin. Herzen e Ogariov também
participavam ocasionalmente quando iam a Petersburgo.
22. Ver N. V. Gógol v Rússkoi krítike. Moscou, 1953, p. 122.
23. Ánnenkov, Decade, p. 112.
24. Bielínski, IFS, v. 1, p. 432.
25. Uma citação de Almas mortas. Bielínski, Works, pp. 192-3.
26. DVS, v. 1, p. 129.
27. D. V. Grigoróvitch, Pólnoie sobránie sotchiniénii. São Petersburgo, 1896, v.
12, p. 266. 12 v.
28. DVS,1, p. 114.
29. Bielínski, Works, p. 323.
30. Harold March, Frédéric Soulié. New Haven, 1931, p. 177.
31. George Sand, The Last of the Aldinis. Trad. George Burnham Ives.
Filadélfia, 1900, pp. 359-60.
32. DW (jun. 1876), p. 346.
33. Citado em M. Poliakov, Vissárion Bielínski. Moscou, 1960, p. 325.
34. Dostoiévski leu L’Uscoque, que foi publicado na Revue des Deux Mondes
em 1838. Spiridion começou a sair na mesma publicação no mesmo ano, e a
eminente e respeitável revista estava disponível na biblioteca francesa da qual
Dostoiévski era assinante.
35. DVS, v. 1, pp. 112-3.
36. DW (jun. 1876), p. 349.
37. Pisma, v. 1, p. 73, 30 set. 1844.
38. Ibid., p. 76, 24 mar. (fev.) 1845.
39. Essa aproximação foi proposta por K. K. Istómin e A. L. Bem. Para um
aprofundamento da discussão, ver o sugestivo artigo de Bem “Piérvye chágui
Dostoiévskovo”, Slávia 12 (1933-4), pp. 134-61.
40. Honoré de Balzac, “Eugénie Grandet”, La comédie humaine. Org. de
Marcel Bouteron. Paris, 1947, v. 3, p. 599.
7. GENTE POBRE
1. DW (jan. 1877), 584.
2. Pisma, v. 1, p. 75, 24 mar. (fev.) 1845.
3. P. V. Ánnenkov, The Extraordinary Decade. Org. de Arthur P. Mendel. Trad.
de Irwin R. Titunik. Ann Arbor, MI, 1968, p. 150.
4. Pisma, v. 1, p. 82, 8 out. 1845.
5. Ambos os nomes têm ecos alegóricos. Diévuchkin evoca diévuchka, que
significa moça ou donzela. A incongruência desse nome é tocante e engraçada,
mas transmite um pouco do caráter de Diévuchkin. Dobrossiélova é uma
combinação das palavras russas que designam “bom” e “aldeia rural”.
6. O artigo de Bielínski está reproduzido em DRK, p. 24.
7. V. V. Vinográdov, Evoliútsia Rússkovo naturalizma. Leningrado, 1929, pp.
311-38. Trata-se da segunda parte do estudo clássico de Vinográdov sobre
Gente pobre.
8. Seu nome deriva da palavra russa para “cocô”, káki.
9. Victor Terras, The Young Dostoevsky. 1846-1849. Haia, 1969, pp. 14-5; para
discussões da paródia, ver Wido Hempel, “Parodie, travestie und pastiche”,
Germanische-Romanische Monatsschrift, v. 46 (abr.1965), pp. 150-75, e Iúri
Tiniánov, “Dostoiévski i Gógol (K teórii paródii)”. In: Jurij Striedter, Texte der
Russischen Formalisten. Munique, 1969, v. 1, pp. 301-71.
10. Cit. em V. L Kulechov, Naturálnaia chkola v literature XIX vieka. Moscou,
1965, p. 256.
11. Vinográdov, Evoliútsia, p. 390.
8. DOSTOIÉVSKI E A PLÊIADE
1. Citado em DJP, p. 121.
2. Ivan Turguêniev, Literary Reminiscences. Trad. de David Magarshack. Nova
York, 1958, p. 148.
3. Pisma, v. 1, pp. 84-5, 16 nov. 1845.
4. Ibid.
5. Ibid., p. 84.
6. DVS, v. 1, p. 140.
7. Ibid., p. 141.
8. Ibid.
9. Ibid., p. 142.
10. Ibid., pp. 142-3.
11. Pisma, p. 1, p. 102, 26 nov. 1846.
12. Ibid., p. 90, 26 abr. 1846.
13. Ver DVS, v. 1, pp. 154-7.
14. DVS, v. 2, p. 191.
15. Está reproduzido em DJP, pp. 121-2.
16. Pisma, p. 1, pp. 107-8, jan.-fev. 1847.
9. BIELÍNSKI E DOSTOIÉVSKI: I
1. DW (jan. 1877), pp. 587-8.
2. Pisma, v. 1, pp. 86-7, 8 out. 1845.
3. P. V. Ánnenkov, The Extraordinary Decade. Org. de Arthur P. Mendel. Trad.
de Irwin R. Titunik. Ann Arbor, MI, 1968, p. 151.
4. Ibid.
5. DRK, p. 27.
6. Ibid., p. 28.
7. Pisma, v. 1, p. 89, 1o abr. 1846.
8. Ibid., p. 102, 26 nov. 1846.
9. V. G. Bielínski, Selected Philosophical Works. Moscou, 1948, p. 385.
10. Pisma, v. 1, p. 103, 26 nov. 1846.
11. Bielínski, Works, p. 385.
12. Pisma, v. 1, p. 100; fim out. 1846.
13. Bielínski, Works, p. 478.
14. Pisma, v. 1, p. 78, 4 maio 1845.
15. Cit. em A. L. Bem, U istókov tvórtchestva Dostoiévskovo. Praga, 1936, p.
143.
16. Pisma, v. 1, p. 81, 1o fev. 1846. Dostoiévski evoca essa ligação no
subtítulo original, As aventuras do sr. Golyádkin, que lembra o subtítulo de
Almas mortas, de Gógol: As aventuras de Tchítchikov. Assim como Gógol
escrevera um relato falso-heroico das “aventuras” de Tchítchikov tentando subir
na vida, Dostoiévski fazia o mesmo com o sr. Golyádkin.
17. Esse argumento está bem desenvolvido em F. Evnin, “Ob odnói istóriko-
lireratúrnoi leguéndy”, Russkaia Literatura 2 (1965), pp. 3-26.
18. V. G. Bielínski, “Petersbúrgski sbórnik”, em DRK, p. 27.
19. Id., Izbrannye pisma. Moscou, 1955, v. 2, p. 388. 2 v.
20. P. V. Ánnenkov, Vospominánia i kritítcheskie otchérkie. São Petersburgo,
1879, v. 2, p. 23. 3 v.
15. KÁTORGA
1. Pisma, v. 1, p. 134, 22 fev. 1854.
2. Ibid., p. 135.
3. Miller, Biográfia, p. 126.
4. Ibid.
5. Ibid., pp. 126-7.
6. DW (1873), p. 9.
7. M. D. Frantsiéieva, “Vospominánia”, Istorítcheskie Viéstnik 6 (1886), pp.
628-9.
8. ZT, p. 66.
9. Pisma, v. 1, pp. 135-7.
10. Ibid., pp. 138-9.
11. Ibid., p. 135.
12. Ibid.
13. P. K. Martíanov, “V perelome veika”, Istorítcheskie Viéstnik 10-1 (1895), v.
11, p. 453.
14. Szymon Tokarzewski, Siedem lat katorgui. Varsóvia, 1907, p. 127.
15. Pisma, v. 1, p. 166, 13 jan. 1856.
16. A carta se encontra em um artigo de V. Liubimova-Dorotovskaia,
“Dostoiévski v Sibérii”, Ogoniek 46-7 (1946), pp. 27-8.
36. O JOGADOR
1. PSS, v. 28/Livro 2, pp. 50-1.
40. O IDIOTA
1. PSS, v. 29/Livro 2, p. 139, 14 fev. 1877.
2. Max Scheler, The Nature of Sympathy. Trad. de Peter Heath. Londres, 1954,
cap. 2.
3. Kenosis (cenose) é um termo teológico, definido no Webster’s como “a
ação de Cristo de “esvaziar-se” ao tornar-se homem, humilhando-se até sofrer a
morte”. Um dos aspectos distintivos da tradição religiosa russa, conforme
definido pelo seu maior historiador moderno, G. P. Fedótov, é a ênfase no Cristo
sofredor e humilhado que está no cerne da espiritualidade russa. Escrevendo
sobre os primeiros santos russos martirizados, os príncipes Boris e Gleb, Fedótov
compara sua aceitação humilde do destino com os ensinamentos do monge
Teodósio, o fundador da tradição cenótica russa. “Boris e Gleb, com suas mortes
sacrificiais, seguiram Cristo — o clímax de Sua cenose — tal como Teodósio o fez
em relação à Sua pobreza e Suas humilhações. […] Visto de fora, isso deve dar a
impressão de fraqueza, assim como a pobreza de Teodósio deve parecer
loucura. Fraco e louco — assim é Cristo em sua cenose aos olhos de um
Nietzsche, assim como era aos olhos do mundo pagão antigo.” Ver G. P. Fedótov,
The Russian Religious Mind. Nova York, 1946, v. 1, p. 130, e cap. 4 (“Russian
Kenoticism”). Há uma boa razão para acreditar que Nietzsche conhecia O idiota
e que o romance de Dostoiévski ajudou a definir toda a sua interpretação do
cristianismo, Ver Ernst Benz, Nietzsches Ideen zur Geschichte des Christentums
und der Kirche. Leiden, 1956, pp. 92-103.
4. O famoso livro de Albert Schweitzer, Em busca do Jesus histórico (1906),
foi o primeiro a chamar a atenção para a importância dessas expectativas
escatológicas como fonte da ética cristã do amor. Desde então, essa teoria foi
submetida a uma enxurrada de críticas, sem ser abalada como base psicológica
para compreender os aspectos mais extremados da doutrina cristã do amor (ou
ágape).
49. O ADOLESCENTE
1. As anotações do caderno de Dostoiévski relativas a esse mundo camponês
são muito mais amplas do que o quadro mais limitado que aparece na obra
acabada. Em uma delas, demonstra sua familiaridade com a teologia dos Velhos
Crentes. Outras notas contêm textos extensos sobre a “fétida Lizavieta”, que é
desenvolvida aqui com muito mais vivacidade do que em Os irmãos Karamázov.
Não é apenas uma imbecil inarticulada, mas é consumida pelo fogo imolador de
uma fé apaixonada. “Fétida Lizavieta. ‘Não me mande, aquela fedorenta, para
seu paraíso luminoso, mas me mande para as trevas totais, de modo que
mesmo ali, no fogo e na dor, eu possa elevar minha voz a Ti: “Santo, santo és
Tu” e não tenho nenhum outro amor’” (v. 16, p. 138).
2. PSS, v. 29/Livro 1, p. 216, n. 21, 2-14 dez. 1870.
3. Cit. em PSS, v. 17, p. 347.