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RESUMO: Cada vez mais, os ambientes aquáticos têm sofrido pressões tanto de origem
natural quanto antrópica. Por estes motivos os organismos que habitam estes ecossistemas
são forçados a se adaptar às novas condições ou poderão ser extintos. O estudo para
compreensão destas transformações ambientais pode ser feito por meio do uso de animais
indicadores, dentre os quais os peixes se destacam. Isto porque os peixes refletem as
modificações ocorridas no ambiente aquático por meio de respostas adaptativas tão variadas
quanto: (1) ajustes fisiológicos e bioquímicos quando peixes são expostos a diferentes
temperaturas e
(2) por alterações identificadas em peixes submetidos a baixas concentrações de oxigênio
dissolvido na água. Este estudo foi desenvolvido com o objetivo de avaliar de que maneira os
peixes podem ser utilizados como organismos indicadores das alterações ambientais
relacionadas à temperatura e à variação de oxigênio dissolvido e entender melhor a interação
destes animais com o ambiente.
Palavras-chave: ambiente aquático; hipóxia
ABSTRACT: Aquatic environments have been suffered several kinds of transformations both
natural and mainly anthropogenic origin. The organisms inhabiting these ecosystems are
forced to adapt to new conditions or these species will be extinct. The study to understand
these environmental changes can be done through the use of animals indicators, among
which the fish stand out. The fish reflect the changes in the aquatic environment through
adaptive responses as varied as: (1) physiological and biochemical adjustments when fish are
exposed to different temperatures and, (2) through alterations identified in fish subjected to
low concentrations of dissolved oxygen in the water. This study was carried out to evaluate
how the fish can be used as indicator organisms of environmental changes related to
variations in temperature and dissolved oxygen and to better understand the interaction of
these animals with the environment.
Key Words: aquatic environment; hypoxia
Recebido em 09/03/2015
Aprovado em 30/08/2016
2
Adaptive responses of fishes to environmental changes on temperature and dissolved oxygen
Carneiro (2002) comenta que a construção ambientes aquáticos estão, cada vez mais,
de barragens interrompe o fluxo natural do sendo submetidos a processos que levam à
curso d'água, acarretando em variações no alterações dos padrões locais ou regionais de
regime fluvial, transformando zonas de temperatura e de oxigênio dissolvido.
correntezas em ambientes lênticos. Além Nessa linha de pesquisa, na qual
dessas alterações drásticas dos padrões organismos aquáticos são afetados por
locais de circulação, isso também pode alterações ambientais diversos grupos tem
afetar a temperatura e, principalmente, a sido alvo de estudo, tais como: microalgas
concentração de oxigênio dissolvido em (Morais e Costa, 2008; Johnson et al., 2009;
ambientes aquáticos. Esta falta de circulação Lohbeck et al., 2012), macroinvertebrados
contribui para que ocorra a formação de (Johnson et al., 2009); anêmonas (Black et
termoclinas e oxiclinas. Fiorucci e Filho al., 1995; Choresh et al., 2001; Goldstone,
(2005) ainda comentam que a construção de 2008), moluscos bivalves (Clegg et al.,
represas sobre áreas de florestas podem 1998; Buckley et al., 2001; Lacoste et al,
resultar na formação de lagos com alta 2001; Brown et al., 2004; Fabbri et al.,
demanda bioquímica de oxigênio. Nessas 2008; Cho e Jeong, 2012), gastrópodes
represas, a grande quantidade de fitomassa (Tomanek, 2002; Tomanek e Sanford,
inundada, ao se decompor, gera elevados 2003), crustáceos (Ravaux et al., 2003;
déficits de oxigênio. Ravaux et al., 2007; Fernandes, 2010) e
Casagrande (2006) comenta que peixes (Iwama et al., 1998; Iwama et al.,
reduções na concentração de oxigênio 1999; Iwama et al., 2004; Breau et al.,
dissolvido em ambientes aquáticos podem 2007; Johnson et al., 2009).
ocorrer quando quantidades significativas de Segundo Al-sabti e Metcalfe (1995),
matéria orgânica são incorporadas a eles. além de geralmente apresentarem interesse
Essa situação ocorre normalmente com o econômico, o uso de peixes é frequente
lançamento de esgotos domésticos e de nesse tipo de estudo pois estes apresentam
efluentes industriais ricos em matéria respostas toxicológicas similares àquelas
orgânica nos corpos d’água. apresentadas pelos vertebrados superiores.
Desta forma, seja por causas naturais Além disso, esses autores citam que os
ou antropogênicas, os peixes indicam o potencial de exposição de
populações humanas a
genotóxicos químicos e também estão entre durante as fases de ovos e larvas (Munday et
os maiores veículos de transferência de al., 2009).
contaminantes para humanos. Como os peixes são organismos ectotermos,
Este estudo foi realizado com o sua temperatura corpórea reflete a
objetivo de avaliar quais são os mecanismos temperatura do ambiente que o circunda
adaptativos dos peixes às alterações (Randall et al., 2000). Contudo, alguns
ambientais diretamente relacionadas à peixes conseguem reter calor em algumas
temperaturas e ao oxigênio dissolvido. partes do corpo (músculo, olhos, cérebro e
vísceras) (Pough et al, 2003). Esta
DESENVOLVIMENTO
capacidade de retenção de calor habilita as
1- ADAPTAÇÃO DE PEIXES A espécies que a possuem de desenvolver uma
VARIAÇÕES DE TEMPERATURA natação rápida e contínua, com uma eficiente
De acordo com Dong e Somero (2008) uma contração muscular. Além disso, estabiliza o
das alterações em escala global mais metabolismo e as funções sensoriais e
discutida atualmente, o aquecimento global, digestórias (Baldisserotto, 2009).
afetaria diretamente as Porém, mesmo nesses casos, assim
espécies e as comunidades de peixes. Assim, como naquelas espécies que não apresentam
é de suma importância entender como as qualquer mecanismo de retenção de calor, a
condições ambientais variam no espaço e no temperatura da água constitui-se no mais
tempo bem como de que maneira os importante fator para o controle dos
organismos respondem a estas variações processos fisiológicos em peixes (Brian et
(Tewkbury et al, 2008). al., 2008). Os limites de tolerância à
Mudanças de temperatura de alguns poucos temperatura para uma dada espécie,
graus Celsius podem influenciar os entretanto, não são fixos. A exposição a uma
principais processos fisiológicos dos peixes, temperatura próxima da letal frequentemente
tais como a taxa de crescimento, a induz a adaptação, de modo que uma
capacidade de natação e o desempenho temperatura anteriormente letal passe a ser
reprodutivo. Estes, por sua vez, parecem ser tolerada (Schmidt -Nielsen, 1999;
particularmente sensíveis à variação da Baldisserotto, 2009).
temperatura
Estudos realizados por Roots (1968 al., 2003). Exemplares de enguia americana
citado por Breer e Rahmann, 1976) com (Anguilla rostrata), em águas abaixo de
exemplares de goldfish (Carassius 8˚C, param de se alimentar e se enterram na
auratus) sugerem que ocorram lama. A maioria das espécies de peixe,
modificações nos fosfolipídios de membrana entretanto, não se enterra quando apresentam
quando os animais são expostos a torpor ao frio, apenas ficam imóveis para
temperaturas fora da faixa de conforto. reduzir o gasto energético (Baldisserotto,
Essas modificações permitiriam a 2009).
manutenção da fluidez e da permeabilidade Algumas alterações no metabolismo
das membranas, melhorando o celular podem fazer com que as substâncias
funcionamento do sistema nervoso destes de reserva mudem. Com uma redução de
animais. Hochachka e Somero (1973) temperatura, por exemplo, pode ocorrer um
também verificaram que a composição aumento nas reservas de glicogênio e uma
fosfolipídica das membranas celulares em diminuição dos triacilgliceróis no fígado de
tecidos nervosos de animais que vivem em trutas arco-iris (Oncorhynchus mykiss).
baixas temperaturas é mais insaturada do Neste caso, os lipídeos são usados para
que daqueles que vivem em altas fornecer energia e o glicogênio é
temperaturas. Essas mudanças, assim como armazenado (Baldisserotto, 2009).
as mencionadas por Roots (1968 citado por Schimidt-Nielsel (1999) explica que
Breer e Rahmann, 1976), são importantes os organismos que habitam regiões
para manter a viscosidade das membranas temperadas e polares podem desenvolver tal
celulares. tolerância ao frio a ponto de conseguirem
sobreviver ao congelamento prolongado e
1.2 Adaptações dos peixes frente a impedirem a formação de gelo em seu corpo.
baixas temperaturas A maioria das espécies, entretanto, podem
Quando a temperatura da água decai, ser tolerantes ao congelamento, mas morrem
os peixes imediatamente tendem a reduzir as se houver formação de gelo em seu sangue
suas taxas metabólicas, permitindo uma ou tecidos.
economia de reservas corporais em Pode-se considerar, portanto, que a
ambientes desfavoráveis, fator este ameaça à vida nas baixas temperaturas não
importante, pois em baixas temperaturas a é apenas o frio, mas
disponibilidade de alimento pode ser
reduzida (Pough et
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