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UNIVERSIDADE FEDERAL DE SERGIPE

NPPA/MESTRADO EM ANTROPOLOGIA
DISCIPLINA: MÉTODOS E TÉCNICAS DE PESQUISA EM ANTROPOLOGIA
PROF. DR. ULISSES NEVES RAFAEL
ALUNA: ELZA GUIMARÃES

DA MATTA, Roberto (2005). “Apresentação”. In: TURNER, Victor (2005). Floresta de


Símbolos: aspectos do ritual Ndembu. Niterói: EDUFF.

Publicado em 1967, Floresta de Símbolos trata-se de uma coletânea de artigos


contendo o resultado da experiência etnográfica realizada pelo antropólogo Victor Turner na
Zâmbia, país localizado no território centro-africano. Tais artigos demonstram diversos
aspectos da vida social dos Ndembu, focalizando os processos rituais presentes na dinâmica
de tal sociedade, inaugurando assim um novo modelo interpretativo sobre o simbolismo.

Quando de sua apresentação à obra de Victor Turner, Roberto Da Matta faz questão de
iniciar comentando ser este um dos grandes mestres que modificaram o rumo da antropologia
social ao longo do século XX. Sua admiração pelo grande intelectual, entusiasta de uma nova
antropologia do simbolismo, é evidente, e o antropólogo brasileiro destaca ser esta advinda,
principalmente, de seu contato pessoal com o mesmo.

Ele destaca sua predisposição a estudos de temas pouco abordados no seio acadêmico,
o que era o reflexo de sua criatividade reveladora, livre do “isolamento neurótico e elitista”,
desde que tais temas estivessem nas categorias de “(...) assuntos relevantes e vitais para a vida
social.” (p. 16)

Em seguida, o autor elucida a conturbada década de 60 do século XX, em face de sua


importância para a sociedade e a cultura americana. Muitos desses momentos haviam sido
presenciados por ele, “era um momento de desvario” (p. 22), onde aquela sociedade
presenciava muitos de seus modelos ruírem, sendo gradativamente alvo daquilo que Da Matta
chama de rebeliões, refletidas através do apelo às drogas, liberalização sexual e movimentos
pelos “direitos civis”.

Nesse contexto, a antropologia do período tenderia a ser pensada no sentido de


focalizar “o paradoxo, as contradições e os estados intermediários”. (p. 19) Para Turner, de
alguma maneira, uma nova maneira de lidar com os símbolos e os rituais constituía essa
espécie de paradoxo, seu desejo era ir além: “Nessa Floresta, (...) tudo o que existe no mundo
tem um sentido que está além e aquém do intelecto”. (p. 19)

Assim, o atenção dada ao paradoxo, a ambigüidade e aos estados intermediários


pretendidos por Turner, poderiam ser comparados aquele momento de mudança, rebelião,
transformação e revolução vivenciados na década de 60. O ritual exercerá nele verdadeira
fascinação, este, enquanto drama que serve para penetrar no modo de vida de uma dada
sociedade. Então ele descobre os “símbolos como instigadores moleculares de ação mística e
ritual (...) os símbolos fazem coisas e, com isso, transformam situações, estados e pessoas”.
(p. 26)

É o próprio Victor Turner que explica, ainda em sua introdução, alguns aspectos gerais
do sistema ritual dos Ndembu. Expõe uma das grandes preocupações do antropólogo, a qual
também serve para justificar a importância da pesquisa etnográfica, quando refere-se ao
desaparecimento “das antigas idéias e práticas religiosas dos africanos, em virtude do contato
com o homem branco e seus costumes”. (p. 29)

Ele apresenta os Ndembu quanto aos aspectos demográficos e geográficos, chegando à


própria organização das aldeias, às quais, na ausência de qualquer autoridade central e
organização militar, apresentam um aspecto fragmentário em que vivem pequenos grupos
independentes, sob a liderança de seus chefes.

Ele comenta a constante circulação dos indivíduos entre tais aldeias, no que ele
percebe problemas de dinâmica social e processos de ajustamento, adaptação e mudança. É aí
que o antropólogo vê a possibilidade maior de descoberta, inclusive dos aspectos rituais. Ele
comenta: “Foi uma experiência espantosa e enriquecedora ver o contraste entre a relativa
simplicidade e monotonia da economia e da vida doméstica desses caçadores e agricultores
ordenada e o simbolismo colorido de sua vida religiosa.” (p. 30)

Ainda no que concerne à estrutura da aldeia, há que se dizer que é influenciada pelo
casamento matrilinear e pelo casamento virilocal. Turner explica que, numa sociedade
matrilinear como é o caso dos Ndembu, é justo que a matrilinearidade interfira nos direitos à
residência, bem como na sucessão de cargos.

Sobre o que vem ser a virilocalidade unida a matrilinearidade que bem explicitam a
organização social da sociedade estudada, o autor justifica como “grupos móveis de
parentesco matrilinear masculino, mudando de locais de residência duas vezes a cada década
e em competição entre si por mulheres e crianças.” (p. 33) Destaca também o aspecto de
solidariedade presente entre pais, filhos e irmãos masculinos.

Embora o aspecto matrilinear seja decisivo e determine a maioria das relações sociais,
ao pai é dada importância fundamental nos aspectos rituais. Ele oferece como exemplo os
rituais de caça e, logo em seguida, relembra o casamento virilocal. Assim, “Caça e sexo para
os homens, sexo e maternidade para as mulheres parecem ser os valores mais claramente
ressaltados (...)” (p. 37)

Ainda na introdução, Victor Turner apresenta alguns tipos de ritual, discorrendo


brevemente sobre eles. Na descrição que dá dos rituais de crise de vida e a finalidade que
estes têm de marcar a transição de uma fase da vida ou do status social para outra, compara as
mudanças sociais pelas quais passam o indivíduo de sua própria sociedade, tais como o
batismo ou a formatura.

Tais cerimônias, destaca ele: “não dizem respeito apenas ao indivíduo que ocupa o
lugar central nelas, mas também marcam mudanças nas relações de todas as pessoas ligadas a
ele por laços de sangue, casamento, dinheiro, controle político e muitas outras formas”. (p.
36) O que o leva à conclusão de que tais mudanças não ocorrem somente para o indivíduo,
mas também para todos que estão à sua volta.

O autor prevê a importância para a estrutura social da realização do rito. Ao mencionar


o principal aspecto da cerimônia funerária, dimensiona que “os funerais têm mais a ver com
os vivos do que com os mortos (...) neste momento, um novo padrão de relações sociais deve
ser estabelecido” (p. 37)

Os rituais de aflição têm a ver com o apaziguamento e eliminação de espíritos que,


porventura, estejam causando problemas na caça, doenças ou mesmo problemas reprodutivos
femininos. Daí são delineados os cultos de caça e de fertilidade feminina.

Tudo para explicar, de forma clara e sucinta, que: “Cada tipo de ritual tem seu próprio
ritmo de tambores, sua própria “canção tema”, sua própria combinação de poções, seu próprio
comportamento estilizado, expresso em danças e gestos, e seu próprio tipo de santuário e
aparato ritual.” (p. 44)

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