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Disciplina – INTRODUÇÃO AO DIREITO ADMINISTRATIVO

UNIDADE III - PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO DIREITO


ADMINISTRATIVO

Fonte da imagem: https://tinyurl.com/bdhx4vz2

Conforme Celso Antônio Bandeira de Mello 1, o que torna o Direito


Administrativo um ramo autônomo do Direito é a existência de normas e
princípios próprios. Estes ocupam dois papeis fundamentais: assegurar a
“unidade do sistema” e a sua “coerência” – ou seja, garantir que o sistema forma
um conjunto normativo coeso e articulado, em que se perceba a ordem de suas
partes e que tenha meios de preencher lacunas e resolver antinomias. Estes
elementos se fazem presentes no conceito que o autor fornece de princípio
jurídico, qual seja:
Princípio – já averbamos alhures – é, por definição, mandamento
nuclear de um sistema, verdadeiro alicerce dele, disposição
fundamental que se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o
espírito e servindo de critério para sua exata compreensão e
inteligência, exatamente por definir a lógica e a racionalidade do
sistema normativo no que lhe confere a tônica e lhe dá sentido
harmônico 2.

Entre as várias potencialidades deste conceito, interessa, aqui, o


reconhecimento do seu caráter normativo, o que se mostra evidente, por
exemplo, pelas expressões “mandamento nuclear” e “disposição fundamental”,

1
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 36.
2
Ibid., p. 808.

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denotando o seu caráter de comando jurídico, de ordem. Isto se torna
mais evidente quando se recorda que os princípios do Direito Administrativo têm
sede constitucional, notadamente no caput, do artigo 37, que prescreve: “Art. 37
– A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de
legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte”.
Entretanto, ao contrário do que se poderia imaginar em um primeiro
momento, a menção ao caput, do artigo 37, da Constituição da República, não
significa que todos os princípios constitucionais do Direito Administrativo estejam
corporificados neste dispositivo. De um lado, há princípios constitucionais do
Direito Administrativo que são implícitos, isto é, eles não estão, textualmente,
escritos na Constituição, mas, podem ser apreendidos de própria sistemática do
Texto de 1988.
Lado outro, há princípios que, embora dispersos em outras partes da
Constituição, integram o Direito Administrativo. Nestes casos, em regra, é
possível estabelecer uma relação de pertença, em que: os princípios esparsos
poderão ser vistos como subprincípios daqueles que compõem o caput, do citado
artigo 37; isto, porém, não desconsidera que estes “subprincípios” terão uma
certa autonomia relativa face àqueles constantes do mencionado dispositivo.
Note-se, ainda, que todos estes princípios constitucionais –
apresentem-se de forma explícita ou implícita, constem do rol do artigo 37, da
Constituição, ou se localizem em outros dispositivos – não ficam restritos ao
Texto de 1988, mas, fazem-se presentes em textos normativos
infraconstitucionais – seja, ainda, na feição principiológica, seja como
fundamentos das diversas regras de conduta prescritas por tais textos. Este é o
caso, por exemplo, do artigo 5º, da Nova Lei de Licitações e Contratos
Administrativos – Lei n. 14.133, de 1º de abril de 2021 – que prescreve:
Art. 5º – Na aplicação desta Lei, serão observados os princípios da
legalidade, da impessoalidade, da moralidade, da publicidade, da
eficiência, do interesse público, da probidade administrativa, da
igualdade, do planejamento, da transparência, da eficácia, da
segregação de funções, da motivação, da vinculação ao edital, do
julgamento objetivo, da segurança jurídica, da razoabilidade, da
competitividade, da proporcionalidade, da celeridade, da

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economicidade e do desenvolvimento nacional
sustentável, assim como as disposições do Decreto-Lei n. 4.657, de 4
de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro). (Sem negrito no original)

Contudo, não basta a mera indicação da presença dos princípios


constitucionais em textos normativos inferiores à Constituição, fazendo-se
preciso compreender, ainda que, em linhas gerais, qual é o conteúdo normativo
de cada um deles. É isto que se passa a fazer.

3.1 Interesse Público

Tradicionalmente, o interesse público é compreendido como o


interesse geral, coletivo, o que denota que os Entes Públicos não são titulares
do interesse púbico, mas, são os seus gestores. Compreendido dessa forma, o
interesse público não é a mera soma dos interesses individuais, mas, talvez,
esteja na interseção deles, como um verdadeiro pressuposto destes interesses
particulares. Visto por este ângulo, o interesse público não se opõe, em abstrato,
aos interesses individuais, apesar de, em concreto, esta oposição poder se
realizar.
Tome-se, nesse sentido, o exemplo fornecido por Celso Antônio
Bandeira de Mello 3. Atualmente, concorda-se que cada indivíduo tem o interesse
de preservar a sua saúde, ainda que cada um tenha necessidades de saúde
específicas. Isto permite afirmar que a saúde se constitui em um interesse
coletivo, razão pela qual, ela foi erigida à categoria de direito fundamental, os
termos do artigo 6º, da Constituição da República. Para tanto, atribui-se ao
Estado o dever de gerir os serviços de saúde, o que pode exigir que se
construam equipamentos públicos voltados a prestar tais serviços, o que leva a
reconhecer que a construção de um hospital está em consonância ao interesse
público.
Para construir o citado hospital, o Ente Público precisa adquirir
imóveis para instalá-lo, o que pode se dar por meio de compra e venda e/ou
permuta. No entanto, eventualmente, o imóvel mais adequado para receber esta

3
Ibid., p. 70.

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construção pode não estar disponível para aquisição, por exemplo, o
seu proprietário pode não querer realizar aliená-lo. Diante disso, as pessoas
concordariam que se adquirisse, compulsoriamente, este bem, desde que o
proprietário recebesse uma indenização prévia, justa e em dinheiro que lhe
permitisse adquirir outro imóvel em outro lugar. Isto significa que, a priori e em
abstrato, as pessoas, inclusive as proprietárias de imóveis que poderiam sofrer
a citada medida, reconhecem que a existência de um instituto que permita a
sobredita aquisição compulsória, ou seja a desapropriação, está em
consonância ao interesse público.
Todavia, se a situação descrita, hipoteticamente, acima for
concretizada, provavelmente, o proprietário do imóvel desapropriado afirmará
que a medida o prejudicará. Isto é, se, abstratamente, o interesse público não se
contrapunha ao interesse individual do proprietário que poderia, ele mesmo
beneficiar-se do hospital, tem-se que, concretamente, esta oposição poderá
operar-se, na medida em que ele se sentir impactado pela realização fática deste
interesse – a construção do hospital.
Esta ilustração permite reforçar os pontos já analisados e, também,
apontar novos elementos para a compreensão do interesse público. Por um lado,
percebe-se a inter-relação entre o interesse público e os interesses individuais.
Ademais, verifica-se que o adjetivo “público” designa que este interesse é do
público, do conjunto social e não do Estado, o qual, repita-se é responsável por
geri-lo, por realiza-lo. Assim, se é dado ao Ente Público o dever de realizar o dito
interesse, devem ser entregues a ele, os meios para conseguir cumprir esta
finalidade.
Por outro lado, tem-se que o interesse público, como interessa a todos
deve ser suportado igualmente por todos. Logo, se alguém suporta uma carga
maior que os demais na realização de algo que interesse a todos, ele deve
receber uma compensação, uma indenização, para reequilibrar estas cargas.
Isto denota que a realização do interesse público não se restringe à aquisição do
imóvel, mas, depende da sua aquisição e do pagamento da indenização, com a
futura construção do equipamento público de saúde.

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Outrossim, constata-se que o interesse público está
diretamente ligado ao interesse público, o que levou Marçal Justem Filho a
identificar o interesse público com a realização dos direitos fundamentais,
entre os quais, insere-se o desenvolvimento nacional sustentável 4. Apesar
desta identificação, deve-se reconhecer que, de fato, num primeiro momento, o
interesse público, ou a realização dos direitos fundamentais, é algo de difícil
definição, o que não significa que esta definição seja impossível. Afinal, conforme
se constatou pelo exemplo acima, à medida que a situação se torna cada vez
mais concreta, o interesse público vai, também, ganhando maior concretude.
Igualmente, constata-se que o interesse público não é estático, mas,
mutável no tempo e no espaço. Hoje, no Brasil, constituído como um Estado
Democrático de Direito, a desapropriação, com o pagamento da indenização
para a construção do hospital conforma o interesse público neste caso
específico. No Brasil do final do Século XIX e início do Século XX, talvez, estes
elementos não pudessem ser considerados como realizadores do interesse
público. No mesmo sentido, em outro lugar, em que a saúde não seja
considerada um direito fundamental de caráter universal, todos os processos
acima descritos, também, não atenderiam o interesse público.
Todas estas considerações apontam que o interesse público pode ser
extraído das fontes normativas, em algum caso, esta extração será mais fácil,
devido à sua explicitação, em outros, ela será mais trabalhosa, porque estará
implícita e demandará um exercício interpretativo. Consequentemente, os meios
para que o Estado realize o interesse público também estarão prescritos nas
aludidas fontes e deverão estar delineados de forma a possibilitar,
adequadamente, a sua realização.
Estas ilustrações denotam, portanto, que o interesse público é um
elemento central na própria conformação do Direito Administrativo. Nada
obstante, esta ideia nuclear não consta da Constituição como um princípio
explícito, mas, figura como um princípio implícito, cujo reconhecimento exige um
processo interpretativo realizado pela doutrina e pela jurisprudência. Na
realidade, somente em 1999, com a entrada em vigor da Lei n. 9.784, de 29 de

4
JUSTEN FILHO, Marçal. Op. cit., p. 44.

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janeiro, que regulamentou o Processo Administrativo no âmbito da
Administração Pública Federal, foi que este princípio foi de fato explicitado em
um texto normativo, mediante a sua inscrição no caput, do artigo 2º.
Apesar disso, os autores de Direito Administrativo como, por exemplo,
Maria Sylvia Zanella Di Pietro 5 e Celso Antônio Bandeira de Mello 6,
reconheceram que o sistema jurídico de Direito Administrativo está construído
sobre o interesse público. Não somente porque o interesse público apontaria a
finalidade da função administrativa do Estado e a razão de ser deste próprio
ramo do Direito, mas, também, porque dele decorrem dois princípios: a
supremacia do interesse público sobre o privado; e a indisponibilidade,
pelo Poder Público, no exercício da função administrativa, dos interesses
públicos.
A supremacia do interesse público prescreve que este se sobrepõe
aos interesses individuais, o que, para o leitor desavisado, poderia indicar um
elemento de caráter autoritário, opinião que não se sustentaria, tendo em vista
que o interesse público não objetiva eliminar os interesses individuais. Recorde-
se que, no exemplo acima, o interesse público não significa a tomada do imóvel
do proprietário, mas, a substituição deste bem pelo seu valor em dinheiro, de
forma prévia e justa, o que não lhe geraria uma perda patrimonial.
Logo, a supremacia confere ao Estado, no exercício da função
administrativa, uma série de prerrogativas, de “poderes” que não encontrariam
um correlato nas relações jurídicas de direito privado. Todavia, estes poderes
não são ilimitados, pois, a definição do interesse público e dos meios de realiza-
lo são definidos pela lei, ou seja, tais prerrogativas já nascem delimitadas.
Esta supremacia atribuirá ao Poder Público, por exemplo, o poder de
impor dadas decisões e constituir relações jurídicas com os demais indivíduos
de forma unilateral, como se vê, por exemplo, no lançamento de tributos e na
desapropriação, acima comentada. Apesar disso, atualmente, constatam-se
diversas atenuações destes elementos impositivos, uma vez que o Estado tem
buscado, cada vez mais, meios consensuais para a realização do interesse

5
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit.., p. 103-104.
6
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 39-40.

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público e para a resolução de conflitos que envolvam o interesse
público e os interesses privados. Este é o caso, por exemplo, da Nova Lei de
Licitações e Contratos Administrativos – Lei n. 14.133, de 1º de abril de 2021 –
que, no Capítulo XII, do Título III, prescreverá que aos contratos regidos pela
citada lei, poder-se-ão empregar, nos termos do artigo 151, diversos “meios
alternativos de prevenção e resolução de controvérsias, notadamente a
conciliação, a mediação, o comitê de resolução de disputas e a arbitragem”.
Ela também permitirá que o Estado possa, unilateralmente, alterar
dadas situações de forma a adequá-las à mutabilidade do interesse público,
o que, repita-se, não é ilimitado, visto que estas alterações poderão infligir a
alguém uma maior carga para a realização do interesse público, cuja
consequência será a necessidade de reequilibrar a situação, em conformidade
à teoria da repartição das cargas, acima ilustrada.
Neste sentido, veja-se, por exemplo, o caput, o inciso I e o §2º, do
artigo 104, da Nova Lei de Licitações e Contratos Administrativos – Lei n. 14.133,
de 1º de abril de 2021. Tais dispositivos prescrevem que o “regime jurídico dos
contratos” regidos pela citada lei atribuem ao Estado, no exercício da função
administrativa, uma série de prerrogativas contratuais, como, por exemplo, o
poder de “modificá-los, unilateralmente, para melhor adequação às finalidades
de interesse público, respeitados os direitos do contratado”. Contudo, caso
ocorra a citada alteração unilateral, as “as cláusulas econômico-financeiras do
contrato deverão ser revistas para que se mantenha o equilíbrio contratual”.
A indisponibilidade do interesse público, por seu turno, partirá do
reconhecimento de que o interesse público não é um interesse do Ente Público
que, lembre-se, figura, apenas como seu gestor, mas, um interesse coletivo.
Assim, não poderia o Estado, enquanto gestor deste interesse, dispor, isto é,
transacionar, negociar, sobre o interesse público.
Percebe-se, portanto, que a indisponibilidade poria, a priori, um
grande problema quanto à possibilidade de o Estado empregar uma série de
institutos prescritos pelo ordenamento jurídico, por exemplo, valer-se de
contratos, pois, estes são, desde sua origem, instrumentos de negociação.
Encontra-se, aí, uma das razões para a existência dos procedimentos de seleção

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dos contratados – licitações e processos de dispensa e inexigibilidade
– pois, por meio deles impede-se que o Estado selecione livremente quem
celebrará tais negócios com o Ente Público.
Além disso, recorde-se o que se afirmou acima sobre a substituição
de meios unilaterais de atuação estatal, por meios consensuais, como seria o
caso dos contratos. Neste caso, os contratos não seriam meios de transacionar
sobre o interesse público, mas, buscar meios mais adequados e menos onerosos
de realiza-lo – ou seja, não se negocia sobre o interesse público, mas, se
transaciona para realiza-lo.

3.2 Princípio da Legalidade

Como se viu, o interesse público e os princípios que lhes são


correlatos, asseguram aos Entes Públicos, no exercício da função administrativa,
uma série de prerrogativas, porém, estas não são absolutas, mas, ao contrário,
já nascem limitadas pela lei. Isto denota que o princípio da legalidade se
apresenta como verdadeiro mecanismo de defesa e proteção dos administrados,
afinal, ele se apresenta como conformador e, ao mesmo tempo limitador, das
sobreditas prerrogativas, mediante o estabelecimento de diversas sujeições
ao Estado, no exercício da função administrativa 7.
Tem-se, assim, que o princípio da legalidade opera no Direito Público,
em geral, e, particularmente, no Direito Administrativo, em um sentido diverso
daquele que se dá no Direito Privado. Nos termos do inciso II, do artigo 5º, da
Constituição, a lei prescreve aos particulares, em suas relações interindividuais,
um rol de condutas que são proibidas, não sendo ninguém obrigado a praticar
qualquer ação, salvo se a lei assim o exigir. Porém, no Direito Público, a lei opera
em um sentido positivo, pois, os Entes Públicos somente deverão agir em
consonância àquilo que esteja prescrito em lei. Assim, enquanto nas relações
interindividuais vigeria a autonomia da vontade, no Direito Público se estaria
diante da estrita legalidade.

7
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit.., p. 103-104.

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Contudo, nos termos apontados quando se analisaram as
fontes do Direito Administrativo, a centralidade da Constituição de 1988 e dos
seus princípios, no ordenamento jurídico brasileiro, gerou o redirecionamento do
princípio da legalidade que passou a ser visto como princípio da juridicidade.
Esta evolução apresenta uma série de consequências, entre elas, tem-se, por
exemplo, a compreensão de que o descumprimento de princípios constitucionais
se configura como um ato ilícito, nos termos do artigo 11, da Lei n. 8.429, de 02
de junho de 1992.
Outro exemplo, pode ser encontrado na ideia de que os Entes
Públicos, no exercício das funções administrativas, devem respeitar os textos
normativos que eles mesmos editaram, independentemente destes textos serem
gerais e abstratos ou serem individualizados ou concretos. Assim, no exercício
da função administrativa, os Entes Públicos devem se sujeitar a um Decreto
Regulamentar, a uma portaria e se mostram vinculados ao edital de uma
licitação ou aos comandos contidos em um contrato.
Decorrem do princípio da legalidade diversos subprincípios. São eles:
a presunção de legitimidade e a presunção de veracidade; o princípio da
hierarquia e, com ele, o princípio da autotutela; o princípio da especialidade
e, com ele, o princípio da tutela.
A presunção de legitimidade prescreve que as ações
administrativas – ações materiais, atos administrativos etc. – presumem-se
consentâneas ao Direito, ao passo que, a presunção de veracidade prescreve
que se presumem verdadeiros os fatos alegados e que serviram de motivo para
a prática das citadas ações. No entanto, esta presunção se constitui como
relativa, pois, admite prova em contrário, a qual deverá ser produzida,
geralmente, por aquele que se opõe à presunção. Isto é, opera-se a inversão do
ônus da prova, segundo o qual não é o Estado, no exercício da função
administrativa, que deve comprovar que agiu conforme a lei e que os fatos
narrados aconteceram, mas, é o particular que devem demonstrar a
contrariedade à lei ou a inexistência dos fatos – o que será afastada em
situações específicas, por exemplo, se os meios de prova necessários estiverem
em poder do Ente Público.

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O princípio da hierarquia prescreve que o desenho
organizacional da estrutura administrativa estatal – a Administração Direta –
estará prescrita em uma lei, que definirá os diversos escalões hierárquicos e as
cadeias de comando, também estabelecidas de forma hierarquizada. Dessa
forma, este desenho, ao criar diversas relações hierárquicas, permitirá que se
estabeleça: quais são os órgãos e os agentes responsáveis por realizar cada
uma das ações que foram atribuídas à sobredita estrutura; quais órgãos e
agentes controlarão a execução das mencionadas ações; quem poderá avocar
ou delegar competências, nas hipóteses em que isto for juridicamente
admissível; quem e como será exercido o dever-poder disciplinar etc.
Apesar de todas estas consequências, talvez, a mais relevante seja o
princípio da autotutela, cujo conteúdo normativo pode ser extraído do próprio
sentido do vocábulo, pois, o prefixo “auto” significa próprio, ao passo que “tutela”
se liga à ideia de proteção. Nesta lógica tem-se que: como o Estado, no exercício
da função administrativa, deve agir consoante a lei e ao Direito, é dado a ele
verificar se os seus atos estão em conformidade e, caso não estejam, ele poderá
corrigi-los sem que se faça necessária a manifestação jurisdicional para tanto.
Isto é, o agente público que exarou o ato tem competência para
controlar tal ato, anulando-o em caso de ilegalidade, ou revogando-o no caso de
atos administrativos discricionários que se tornaram inconvenientes e/ou
inoportunos. Esta competência de anulação do ato também será atribuída ao seu
superior hierárquico e, eventualmente, este poderá deter a atribuição de revogá-
lo, desde que isto conste da lei que criou tais cargos e estabeleceu a sua
organização. Este é o conteúdo das Súmulas 346 e 473, ambas do Supremo
Tribunal Federal, pois reconhecem à Administração e ao Poder Judiciário a
competência para anular os atos ilegais, restringindo a revogação somente à
Administração.
Por seu turno, o princípio da especialidade prescreve que o Estado,
no exercício da função administrativa, poderá criar entes descentralizados que
integrarão a Administração Indireta. A criação destes entes se liga à
especificidade das funções administrativas que eles exercerão, especificidade
esta que constará da própria finalidade institucional deles. Tais entes serão

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criados por lei específica, caso detenham personalidade jurídica
de direito público, ou terão sua criação autorizada por lei específica, caso
detenham personalidade jurídica de direito privado, nos termos dos incisos
XIX e XX, do artigo 37, da Constituição.
Veja-se, no caso da Administração Indireta estar-se-á diante de duas
situações. Por um lado, dentro do próprio ente descentralizado haverá relações
de hierarquia, as quais estarão prescritas nas respectivas leis criadoras, no
caso das pessoas jurídicas de direito púbico – hipótese em que esta definição
será realizada de forma pormenorizada –– ou nas leis que autorizam a criação,
nos casos das pessoas jurídicas de direito privado – caso, em que esta definição
se realizará, normalmente, de forma geral.
Todavia, não há uma relação hierárquica entre o Ente Público criador
e as suas criaturas – os entes da Administração Indireta – mas, uma relação de
vinculação, fundada no princípio da tutela. Este atribui ao Ente Público criador
o poder de controlar, nos limites expressos nas respectivas leis criadoras ou
autorizativas da criação, as ações dos entes descentralizados, de forma a
impedir que estes se afastem das finalidades institucionais que justificaram a
própria criação destas entidades.

3.3 Princípio da Impessoalidade

O princípio da impessoalidade é uma decorrência do princípio da


igualdade e, conforme Celso Antônio Bandeira de Mello 8, ele apresenta duas
acepções. De um lado, tem-se a impessoalidade como finalidade pública e, de
outro, tem-se a isonomia.
Enquanto finalidade pública, a impessoalidade se liga ao interesse
ao público: a ação administrativa deve se guiar pelo interesse público,
voltando-se a realiza-lo. Isto significa que tais ações não podem objetivar a
promoção individual dos agentes públicos, nos termos, por exemplo, do §1º, do
artigo 37, da Constituição, que prescreve que a “publicidade dos atos,
programas, obras, serviços e campanhas dos órgãos públicos deverá ter caráter

8
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 94.

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educativo, informativo ou de orientação social, dela não podendo
constar nomes, símbolos ou imagens que caracterizem promoção pessoal de
autoridades ou servidores públicos”.
Por sua vez, a impessoalidade, compreendida como isonomia,
relaciona-se, a priori, com a ideia de igualdade formal, isto é, a igualdade de
todos perante a lei, buscando analisar ou julgar suas situações de forma
objetiva. Logo, a determinação para a igualdade de tratamento aos
administrados, significa que se dará igual tratamento àqueles que estejam na
mesma situação jurídica, admitindo-se, contudo, um tratamento diferenciado
àqueles que estejam em situações jurídicas distintas, desde que isto seja
determinante no caso concreto, nos termos constantes no regramento da
matéria.

3.4 Princípio da Moralidade

A moralidade administrativa não se confunde com moralismo, mas,


foi desenvolvido como um mecanismo de abertura do sistema jurídico a padrões
ético-comportamentais, extraídos da “disciplina interna” da atividade
administrativa, a qual se liga à realização do interesse público. Isto é, o princípio
da moralidade impõe que na interpretação e na aplicação da lei não se fique
preso à “frieza do seu texto”, mas, busque-se cumpri o seu espírito. Logo, a
atividade administrativa deve-se orientar “pelos princípios do Direito e da moral,
para que ao legal se ajuste o honesto e o conveniente aos interesses sociais“ 9.
O princípio da moralidade nasce como um meio para o controle dos
atos discricionários – para verificar a análise de conveniência e oportunidade
realizada pelo agente público que expediu o ato – o que se intensificou a partir
do final da Segunda Guerra Mundial. Contundo, esta tentativa de abertura do
sistema jurídico a padrões morais, muitas vezes não explicitados em lei, foi
considerado como geradora de insegurança jurídica. Por esta razão, tem-se
verificado, atualmente, um processo de explicitação legal de padrões de
moralidade e, principalmente, dos casos de imoralidade. Dessa forma, os atos

9
MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 83-85.

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imorais se tornam, também, ilegais, o que aumenta a segurança
jurídica, apesar de reduzir a abrangência do princípio da moralidade 10.
Não obstante este processo de aproximação entre moralidade e
legalidade, percebe-se do conceito acima que o cerne do princípio da moralidade
é a honestidade, tomada em um sentido geral, para abarcar os mais diversos
setores e funções administrativas. Esta ideia central autoriza afirmar que a
moralidade administrativa se constitui como um verdadeiro direito fundamental,
ao qual se atribui uma garantia constitucional fundamental, apta a protege-la,
qual seja, a ação popular, nos termos do inciso LXXIII, do artigo 5º, da
Constituição.
Todavia, quando a ideia de honestidade se centra nos recursos
públicos, está-se diante de uma especificação do princípio da moralidade, qual
seja: o subprincípio da probidade, nos termos do artigo 37, §4º, da
Constituição. Este prescreve as consequências dos atos de improbidade, quais
sejam: “a suspensão dos direitos políticos, a perda da função pública, a
indisponibilidade dos bens e o ressarcimento ao erário, na forma e gradação
previstas em lei, sem prejuízo da ação penal cabível” – tais gradações, os casos
de improbidade e demais aspectos envolvidos estão prescritos pela Lei n. 8.429,
de 02 de junho de 1992, com as alterações trazidas pela Lei n. 14.230, de 25 de
outubro de 2021.
Conforme José dos Santos Carvalho Filho 11, a moralidade
administrativa, em sua feição de probidade, constitui-se como verdadeiro dever
dos agentes públicos, sujeitando-os a figurarem, por exemplo, como réus em
diversas ações judiciais, como a sobredita ação popular, além da ação civil
pública e da ação de improbidade administrativa. Além deste dever, tem-se,
ainda, o dever de prestar contas, já que os gestores públicos devem comprovar
que geriram, adequadamente, os recursos públicos que estão sob sua
administração, nos termos dos artigos 71 e 84, XXIV, da Constituição da
República.

10
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit.., p. 119-121.
11
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 57-59.

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3.5 Princípio da Publicidade

Conforme José dos Santos Carvalho Filho 12, o princípio da


publicidade prescreve que “atos da Administração devem merecer a mais ampla
divulgação possível entre os administrados, e isso porque constitui fundamento
do princípio propiciar-lhes a possibilidade de controlar a legitimidade da conduta
dos agentes administrativos”, pois, reconhece o autor, que somente “com a
transparência dessa conduta é que poderão os indivíduos aquilatar a
legalidade ou não dos atos e o grau de eficiência de que se revestem”. O
princípio objetiva proteger o acesso à informação, o que é tão importante que
encontra lastro no rol dos direitos e garantias fundamentais, como se faz ver no
direito à obtenção de certidões e no Habeas Data, nos termos constantes do
artigo 5º, incisos XXXIV e LXXII, da Constituição.
Este princípio guarda ampla relação com o princípio do
contraditório e da ampla defesa, já que o primeiro pode ser compreendido com
base no binômio informação/possibilidade de reação, isto é, o indivíduo é
informado e, portanto, pode reagir para defender o seu direito e/ou interesse. Em
outras palavras, por meio da publicidade dos atos e atuações da Administração,
o administrado toma ciência destas medidas e pode verificar se elas estão em
conformidade ao Direito e, caso considere que não estejam, poderá realizar
ações de controle. Estas ações poderão envolver manifestações sociais,
requerimentos à própria Administração, ou a provocação dos demais órgãos
públicos – por exemplo, o Ministério Público, o Tribunal de Contas, os Poderes
Judiciário e Legislativo etc.
Estas afirmações denotam a vinculação do princípio da publicidade
com a própria ideia de Democracia, pois, a participação social e a participação
individual conscientes dependem de os participantes estarem munidos de
informações suficientes e compreensíveis que lhes permita agir. Porém, esta
vinculação não significa que o princípio da publicidade seja absoluto, isto é, não
admita exceções, porquanto, não há que se falar em divulgação de informações
que possam, por exemplo, comprometer a segurança pública ou que maculem

12
Ibid., p. 21.

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direitos de terceiros, como é o caso dos direitos à intimidade e à
privacidade, nos termos do artigo 5º, caput e inciso X, da Constituição.
Juarez Freitas 13 compreenderá que a motivação se apresenta como
um subprincípio da publicidade. A motivação pode ser encontrada no inciso X,
do artigo 93, da Constituição, que prescreve que o “Estatuto da Magistratura”
terá a natureza de “lei complementar, de iniciativa do Supremo Tribunal Federal”,
e deverá prescrever que as “decisões administrativas dos tribunais serão
motivadas e em sessão pública”. Evidentemente, que não é o fato de tais
decisões serem proferidas pelos Tribunais que obrigam que elas sejam
motivadas, mas, é o fato de serem decisões estatais, especificamente tomadas
no âmbito do Direito Administrativo, que impõe este dever.
Celso Antônio Bandeira de Mello 14 compreende que a motivação
impõe aos Entes Públicos, no exercício da função administrativa, “o dever de
justificar seus atos”, o que, significa que esta justificativa deve ser prévia ou
concomitante ao ato, mas, nunca, posterior a ele. Isto é, devem-se apontar “os
fundamentos de direito e de fato, assim como a correlação lógica entre os
eventos e situações que deu por existentes e a providencia tomada, nos casos
em que este último aclaramento seja necessário para aferir-se a consonância da
conduta administrativa com a lei que lhe serviu de arrimo”.
O conceito apresentado por Celso Antônio Bandeira de Mello deixa
ver que a motivação é a exposição das razões fáticas e jurídicas que levaram à
prática de um dado ato, ou à tomada de uma determinada decisão. Aí se
encontra, portanto, a razão da identificação da motivação como um subprincípio
da publicidade. Todavia, conforme Reshad Tawfeiq 15, esta relação de pertença
não se mostra adequada, pois, até mesmo nos casos em que o princípio da
publicidade é afastado, impõe-se ao Poder Público o dever de justificar as razões
fáticas e jurídicas que levaram àquelas ações, atos e decisões administrativas.

13
FREITAS, Juarez. O controle dos atos administrativos e os princípios fundamentais. 5. ed. São Paulo:
Malheiros, 2010.
14
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 94.
15
TAWFEIQ, Reshad. A autonomia do princípio da motivação em relação ao princípio da publicidade.
Âmbito jurídico, São Paulo, v. 95, p. 1-10, 2011. Disponível em:
<https://ambitojuridico.com.br/cadernos/direito-administrativo/a-autonomia-do-principio-da-motivacao-
em-relacao-ao-principio-da-publicidade/>. Acesso em: 01 ago. 2023.

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3.6 Princípio da Eficiência

O princípio da eficiência já figurava no ordenamento jurídico


brasileiro como um princípio infraconstitucional, cuja incidência se dava sobre
diversas ações administrativas, com especial ênfase nos serviços públicos.
Todavia, foi com a Emenda Constitucional n. 19, de 04 de junho de 1998, que o
princípio foi, finalmente, inscrito no caput, do artigo 37, da Constituição. Assim,
esta explicitação se ligava à Reforma Gerencial do Estado brasileiro, inspirada
por ideais neoliberais, o que parecia restringir o seu significado à economicidade.
Não obstante esta visão reducionista, a doutrina ampliou o seu
sentido, de forma a, sem desmerecer a ideia de redução de custos, considerar
outros elementos relevantes na sua carga normativa. Isto se faz notar, por
exemplo, já em Hely Lopes Meirelles 16, para quem o princípio exigiria “que a
atividade administrativa seja exercida com presteza, perfeição e rendimento
funcional”. Logo, a atuação da Administração Pública não deveria “ser
desempenhada apenas com legalidade, exigindo resultados positivos para o
serviço público e satisfatório atendimento das necessidades da comunidade e
de seus membros”.
Ainda a título ilustrativo podem-se mencionar os conceitos de José
dos Santos Carvalho Filho e de Maria Sylvia Zanella Di Pietro. Para o primeiro
autor, o “núcleo do princípio é a procura de produtividade e economicidade e, o
que é mais importante, a exigência de reduzir os desperdícios de dinheiro
público”, impondo que a atividade administrativa seja exercida em conformidade
aos parâmetros definidos por Hely Lopes Meirelles. Neste sentido, José dos
Santos Carvalho Filho afirma que vários aspectos devem ser considerados
quando se fala no princípio da eficiência, por exemplo: “a produtividade e
economicidade, qualidade, celeridade e presteza e desburocratização e
flexibilização”, entre outros 17.

16
MEIRELLES, Hely Lopes. Op. cit., p. 90.
17
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Op. cit., p. 25.

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Por sua vez, Maria Sylvia Zanella Di Pietro compreende
que o princípio “apresenta, na realidade, dois aspectos”, trazidos em negrito pela
própria autora em seu texto. Por um lado, ele se refere “ao modo de atuação
do agente público, do qual se espera o melhor desempenho possível de suas
atribuições, para lograr os melhores resultados”. Por outro lado, ele se refere “ao
modo de organizar, estruturar, disciplinar a Administração Pública, também
com o mesmo objetivo de alcançar os melhores resultados na prestação do
serviço público” 18.
De fato, restringir o princípio da eficiência ao seu caráter econômico
seria por demais reducionista, afinal, afinal, a própria Constituição já prescrevia
no caput, do artigo 70, o qual se mantém inalterado desde a promulgação do
Texto, em 1988, que o controle contábil, financeira e orçamentária do Poder
Público deverá observar a “economicidade” das ações públicas. Ao mesmo
tempo, desconsiderar este aspecto, seria desmerecer um dos sentidos mais
importantes deste vocábulo.
Neste sentido, uma possível chave de compreensão do princípio seja
retomar suas origens extrajurídicas nas Ciências Econômicas e na Ciência da
Administração Pública. Assim, a eficiência poderia ser vista em um sentido amplo
que abarcaria os conceitos acima e compreenderia três subprincípios: a
eficácia, a eficiência em sentido estrito e a efetividade.
A eficácia se ligaria à produção de efeitos intrassistêmicos, ou seja,
à produção de efeitos jurídicos, ou seja, se uma dada lei ou ação administrativa
está apta a produzir efeitos no mundo do Direito. Isto imporia que se perquirisse
da validade jurídica destas leis e ações administrativas – por exemplo, se a lei
está em conformidade com as normas que lhes são superiores, se a atuação
administrativa está em consonância com as bases normativas (legais e
constitucionais). Ademais, isto imporia que se verificasse se o desenho de
processos administrativos e do funcionamento das estruturas administrativas
estão adequados para que a atuação administrativa seja exitosa. Isto impõe que
as funções e ações a serem exercidas estejam devidamente segregadas –

18
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit.., p. 125.

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ou seja, identificadas e reconhecíveis como autônomas – e
coordenadas, porquanto elas integram toda uma cadeia procedimental.
A eficiência em sentido estrito se ligaria à relação custo/benefício
e, portanto, teria um sentido próximo da economicidade. Neste caso, buscar-se-
iam os meios menos onerosos para realizar as atuações administrativas,
buscando maximizar os resultados com um menor dispêndio financeiro, o que
exige o planejamento das ações públicas e pode significar, por exemplo, o uso
de mecanismos de mercado, como a competitividade, para realizar aquisições
menos onerosas. Obviamente que isto não poderia significar a realização de um
cálculo econômico que desconsiderasse parâmetros como, por exemplo, os
demais princípios e regras jurídicas, ou que não levasse em conta os resultados
produzidos. Logo, a eficiência em sentido estrito não significa, simplesmente,
escolher a opção mais barata, mas, a opção que, obedecendo aos sobreditos
parâmetros se mostrasse a mais econômica.
Enfim, tem-se a efetividade que se ligaria à relação causa/efeito, em
que a lei e/ou ação administrativa deve ser uma das causas para uma alteração
da realidade fática, mudança esta em conformidade à finalidade que levou à
criação da referida lei e/ou ação administrativa. Assim, a efetividade de uma
dada medida administrativa exige que ela seja eficaz, pois, para mudar a
realidade, esta medida precisa produzir efeitos. Ao mesmo tempo, é a produção
de efeitos que serve de base para selecionar a opção economicamente mais
viável.
Todos estes elementos permitem perceber que o princípio da
eficiência fornece novas bases ao princípio da continuidade dos serviços
públicos. Isto porque, a conjugação de ambas as normas passa a indicar que as
ações estatais, em geral, e os serviços públicos, em específico, devem estar em
constante progresso quantitativo e qualitativo, de forma a modificarem a
realidade e, assim, realizar o interesse público.

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3.7 Princípios da Razoabilidade e da Proporcionalidade

Os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade não


constam, explicitamente, do texto constitucional e, por isso, são considerados
princípios implícitos. Não obstante, a sua inscrição explícita num texto normativo
de Direito Administrativo somente se deu por meio do caput e do inciso VI, do
artigo 2º, da Lei n. 9.784, de 29 de janeiro de 1999, que regulamenta o Processo
Administrativo, em âmbito federal.
A razoabilidade se liga à ideia daquilo que é aceitável com base em
critérios racionais, o que exige que as ações estatais sejam analisadas face à
realidade social e, notadamente, às especificidades dos casos concretos. A
proporcionalidade exige que os meios administrativos empregados sejam
adequados para atender a finalidade buscada, isto é, que tais meios não sejam
demasiados duros ou brandos para realizar o citado objetivo.
Celso Antônio Bandeira de Mello 19 e Maria Sylvia Zanella Di Pietro 20
considerarão a proporcionalidade como uma faceta ou subprincípio da
razoabilidade, ao passo que outros autores considerarão estes princípios como
autônomos, aplicando-se a situações distintas. Apesar destas divergências,
verifica-se que, ambos os princípios se ligam à aplicação das normas jurídicas 21.

3.8 Outros Princípios

Atualmente, tem-se reconhecido que alguns princípios gerais de


Direito ou que têm sede legal, também, encontram uma sede constitucional,
embora não explícita. Este é o caso dos princípios da segurança jurídica, da
proteção da confiança legítima e da boa-fé do administrado, vistos, muitas
vezes, como princípios intensamente vinculados.

19
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Op. cit., p. 91-94.
20
DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Op. cit.., p. 121-123.
21
Neste sentido, tem-se, por exemplo, Humberto Ávila, para quem ambos os princípios se caracterizam
como postulados de aplicação de outras normas jurídicas: a razoabilidade se voltaria à aplicação de regras
jurídicas – por exemplo, leis e atos normativos exarados pelo Poder Público, no exercício da função
administrativa; enquanto a proporcionalidade seria adotada como critério para a aplicação de princípios,
mediante um raciocínio de ponderação de interesses. (ÁVILA, Humberto. Teoria dos princípios: da
definição à aplicação. 11. ed. São Paulo: Malheiros, 2010.)

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Estes princípios teriam como base constitucional, por
exemplo, o caput e o inciso XXXVI, do artigo 5º, da Constituição da República.
Isto porque, a Constituição prescreve que a “segurança” é um direito de todos,
“sem distinção de qualquer natureza” – note-se que o vocábulo segurança não
é adjetivado, o que significa que está abarcado seja a segurança física, mas,
também a segurança jurídica. Esta exegese se justifica, ainda, pelo sobredito
inciso que, textualmente, prescreve que “a lei não prejudicará o direito adquirido,
o ato jurídico perfeito e a coisa julgada”.
Os citados princípios não se voltam a conservar situações jurídicas já
constituídas de futuras alterações legislativas, mas, garantir que aqueles que
agiram de forma consentânea a uma dada interpretação da lei sejam protegidos
de alterações dessa interpretação. Veja-se, isto não impede que o Poder Público,
no exercício da função administrativa, modifique seu posicionamento, o que se
busca é obstar que tais alterações atinjam aqueles que se pautaram em
conformidade com os posicionamentos que se aplicavam no momento em que
eles agiram. Dessa forma, tem-se que a previsibilidade, a estabilidade etc. são
os elementos tutelados por estes princípios.
Neste sentido, tem-se que a segurança jurídica se liga a elementos
objetivos, relacionados à estabilidade das relações jurídicas, nos termos do
inciso XIII, do artigo 2º, da Lei de Processos Administrativos federais, que
prescreve que a norma administrativa será interpretada “da forma que melhor
garanta o atendimento do fim público a que se dirige, vedada aplicação retroativa
de nova interpretação”. A proteção da confiança legítima, por sua vez, refere-
se a elementos subjetivos, ou seja, aos administrados, pois, trata da
possibilidade de que eles possam prever quais serão os resultados de suas
ações. Enfim, a boa-fé do administrado se relaciona à confiança dos
destinatários das ações administrativas de que as condutas dos sujeitos de
Direito Administrativo estarão em consonância ao Direito.
Vê-se, em todos estes casos a relação dos mencionados princípios
com o princípio da legalidade. Afinal, os Entes Públicos, no exercício das
funções administrativas, devem respeitar os textos normativos que eles mesmos
criaram – como ilustraria, por exemplo, a vinculação ao edital de uma licitação

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– na medida em que a sujeição a tais normas, apresenta-se como
uma forma a garantir a segurança jurídica, a confiança legítima dos
administrados e em respeito à boa-fé deles.

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