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Trabalho desenvolvido no âmbito da

disciplina de Direito da União Europeia

2.º ano, TAN – Turma 5

Christiana Lameiro – n.º 65878

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1. A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia não vincula os
Estados-membros em todas as situações.

A versão originária dos tratados não continha um catálogo de direitos


fundamentais elencados, mas desde cedo que as comunidades sentiram a necessidade de
que existisse um elenco de normas que protegessem os direitos fundamentais das
comunidades e dos seus integrantes, uma vez que sem essa protecção seria mais fácil a
violação dos direitos das pessoas e das comunidades. Para além de que as comunidades
começaram a sentir falta de uma protecção a nível comunitária e não somente a nível
nacional de cada Estado-Membro. Apesar de tudo apenas com o Tratado de Lisboa
existiu a introdução de um conjunto de alterações no que aos direitos fundamentais diz
respeito, nomeadamente com a equiparação do valor jurídico da Carta dos Direitos
Fundamentais da União Europeia ao dos Tratados que ocorre através do art.º 6.º n.º 1 do
TUE, e bem assim com a atribuição da competência à União Europeia para aderir à
Convenção Europeia dos Direitos do Homem prevista no art.º 6.º n.º 2 do TUE. A
União Europeia passou assim, a dispor de um catálogo de direitos fundamentais que
pode ser invocado nos Tribunais da União Europeia e nos Tribunais nacionais nos
termos do art.º 51.º n.º 1 da CDFUE.1

O art.º 51.º da CDFUE diz-nos que as disposições da carta têm como


destinatários as instituições, os órgãos e os organismos da união, bem como os Estado-
Membros apenas quando apliquem o direito da União, ou seja, a carta não vincula os
Estados-Membros em todas as situações, apenas os vinculando quando apliquem Direito
da União Europeia, altura em que a Carta lhes permite recorrer aos Tribunal dos países
membros ou aos Tribunais da União Europeia.

2. Nem todos os direitos de que gozam os cidadãos da União da Europeia


são exclusivos destes.

Os cidadãos da União Europeia enquanto cidadãos têm direitos e deveres por


terem esse estatuto de cidadania, nomeadamente o direito de viajar, estudar, trabalhar,
residir, o direito de voto, o direito à protecção diplomática em países terceiros, o direito
de petição junto do Parlamento Europeu, entre tantos outros direitos. No entanto estes
direitos não são exclusivos dos cidadãos da União Europeia. Estendem-se a cidadãos de

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V. ANA MARIA GUERRA MARTINS, “Manual de Direito da União Europeia”, 2018, p. 206 a 268

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países terceiros em diversas ocasiões, como por exemplo, quando se encontram na
Europa enquanto turistas e onde adquirem temporariamente o direito à livre circulação
enquanto se encontrarem na União Europeia. Os não cidadãos podem adquirir uma
infinidade de direitos por exemplo quando adquirem um vínculo de emprego na União
Europeia que lhes poderá dar direitos ao nível de residência, ao nível de saúde,
educação, sendo este último, o direito à educação ou o direito a estudar em escolas da
União Europeia por parte de não residentes talvez um dos direitos mais visíveis,
nomeadamente através de protocolos com países e Universidades de países terceiros que
permite não só aos estudantes cidadãos da União Europeia estudar em outras
Universidades da UE através do programa ERASMUS ou ERASMUS+, ou de
estudantes de países terceiros poderem estudar na UE através de protocolos com as
Universidades.

A título de exemplo podemos ter em linha de conta a Diretiva 2003/86/CE2 que


nos fala do direito de reagrupamento familiar onde a pessoas não cidadãs poderá ser
reconhecido o direito à residência junto dos seus familiares cidadãos da EU. Ou a
Diretiva (UE) 2016/8013 relativa às condições de entrada e de residência de nacionais de
países terceiros para efeitos de investigação, de estudos, de formação, de voluntariado,
de programas de intercâmbio de estudantes, de projetos educativos e de colocação au
pair.

3. A Carta dos Direitos Fundamentais da União Europeia e os Tratados


Constitutivos têm exactamente o mesmo valor.

A União Europeia é uma organização baseada em Tratados que são acordos


vinculativos e que são adoptados por todos os Estados-Membros. Nos tratados são
definidos os objectivos da UE, as regras de funcionamento das instituições da UE, o
processo de tomada de decisões e a relação entre a União Europeia e os Estados-
Membros. Os tratados vão sendo alterados de forma a tornar o funcionamento da EU
mais eficaz e transparente, preparar a adesão de novos Estados-Membros e estabelecer
novos domínios de cooperação. A União Europeia no momento tem contemplados
tratados constitutivos, tratados de adesão e outros tratados e protocolos. Os tratados
constitutivos da UE são o Tratado que instituiu a Comunidade Europeia do Carvão e do

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Ver: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:32003L0086&from=HU
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Ver: https://eur-lex.europa.eu/legal-content/PT/TXT/PDF/?uri=CELEX:32016L0801&from=LT

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Aço em 1951, o Tratado que institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica em
1957, o Tratado que institui a Comunidade Económica Europeia em 1957 e o Tratado
da União Europeia em 1992. Destes tratados apenas continuam em vigor o Tratado que
institui a Comunidade Europeia da Energia Atómica, o Tratado da União Europeia, ao
lado do Tratado sobre o Funcionamento da União Europeia e neste momento a Carta
dos Direitos Fundamentais da União Europeia.

O art.º 6.º n.º 1 do TUE procedeu à equiparação do valor jurídico da CDFUE ao


dos Tratados. Quando a União Europeia elaborou a CDFUE tinha como objectivo
conferir-lhe carácter vinculativo através da sua inserção no TUE o que não obteve
consenso, e por isso até ao Tratado de Lisboa a CDFUE não tinha vinculação. Com o
Tratado de Lisboa a União Europeia reconhece os direitos, liberdades e princípios
contidos na Carta e o seu valor jurídico idêntico ao dos Tratados, passando a União a
dispor de um catálogo de direitos fundamentais.4

Podemos afirmar perante o art.º 6.º n.º 1 da TUE que a CDFUE tem o mesmo
valor que os Tratados da União Europeia em vigor e não com os constitutivos, uma vez
que grande parte deles já não se encontra em vigor.

4. Já existia protecção dos direitos fundamentais no quadro da União


Europeia antes da Carta dos Direitos Fundamentais da União e nada muito
substancial se alterou quando lhe atribuíram efeito jurídico vinculativo.

Sim. Antes da criação da CDFUE os Estados-Membros encontravam-se


vinculados à protecção dos direitos fundamentais consagrados nas suas constituições,
ainda aos Tratados internacionais e por conseguinte ainda pela Convenção Europeia dos
Direitos Humanos. E mesmo depois da atribuição do vínculo jurídico à CDFUE nada de
muito substancial se alterou uma vez que esta não confere novas responsabilidades à
União Europeia nem obriga os Estados-Membros a alterar as suas constituições, sendo
por isso mais um mecanismo de protecção dos direitos fundamentais a par dos que já
existiam.

Quanto ao facto de saber se depois da carta algo de substancial se alterou, parte


da doutrina acredita que não, afirmando mesmo que a União não necessitaria da
adopção de um novo catálogo de direitos fundamentais sendo que os esclarecimentos da

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V. ANA MARIA GUERRA MARTINS, “Manual de Direito da União Europeia”, 2018 p. 267 e 268

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jurisprudência do Tribunal de Justiça seriam suficientes. E olhando para os direitos que
a Carta em si encerra percebemos que a mesma não teve o intuito de criar novos
direitos, o objectivo da mesma foi sobretudo o de reforçar a legitimidade da União,
tornando mais fácil aos indivíduos a percepção de quais os seus direitos fundamentais
no contexto da União Europeia. Esta ideia é comprovada pelo preâmbulo da Carta onde
diz "… esta reafirma, no respeito pelas atribuições e competências da União e na
Observância do princípio da subsidiariedade, os direitos que decorrem, nomeadamente,
das tradições constitucionais e das obrigações internacionais comuns aos Estados-
Membros...", pelo art.º 6.º n.º 1 do TUE segundo o qual o disposto na Carta não pode
alargar as competências da União tal como definidas nos Tratados, e o art.º 51.º n.º 2 da
Carta quando afirma que o âmbito de aplicação do direito da União extensivo a
competências que não sejam as da União. No fundo, a CDFUE teve como objectivo
consolidar e estender a política europeia da protecção dos direitos fundamentais
contribuindo para a sua clarificação e coerência e para o incentivo ao seu uso pelos
Tribunais da União nomeadamente quando fiscalizam a aplicação e interpretação do
direito da União.5

5. A CDFUE não estabelece um critério válido para determinar quais as


normas garantidoras que terão eficácia directa e aquelas que não passam de
princípios orientadores para o Legislador.

Nos termos do art.º 52.º n.º 5 da CDFUE "… as disposições da presente Carta
que contenham princípios podem ser aplicadas através de actos legislativos e executivos
tomados pelas instituições, órgãos e organismos da União e por actos dos Estados-
Membros quando estes apliquem o direito da União, no exercício das respectivas
competências. Só serão invocadas perante o juíz tendo em vista a interpretação desses
actos e a fiscalização da sua legalidade".

A CDFUE faz a distinção entre a aplicação de princípios e de normas. Diz-nos


que quando a Carta estabelece princípios estes podem orientar a interpretação dos
tribunais, mas não podem ser invocados nesses mesmos tribunais, nem pode o particular
exigir um comportamento por parte da União ou dos Estados-Membros. Já as normas

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V. SOFIA OLIVEIRA PAIS, “Estudos de Direito da União Europeia”, 2017

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que consagrem direitos podem ser invocadas judicialmente pelos particulares sem
necessidade de as mesmas estarem implementadas em leis.

No entanto a solução adoptada pela Carta não é pacífica. Há quem entenda que a
dicotomia entre direitos e princípios tem a vantagem de evitar a solução da medida que
serve para tudo, uma vez que os tribunais nem sempre seriam capazes de decidir sobre a
violação de certas disposições. Também por outro lado, a Carta nem sempre faz a
distinção de forma clara se a disposição em causa é um direito ou um princípio, criando
uma insegurança jurídica. Sofia Oliveira Pais diz no seu livro "A protecção dos direitos
fundamentais na União Europeia" que "o Comissário Vitorino entendia que quando a
disposição da Carta designasse claramente o titular estaríamos perante um direito, e que
seria um princípio se a disposição estabelecesse que a União devia respeitar ou
reconhecer um valor específico como a saúde, ambiente ou a protecção dos
consumidores", ou seja, que esta diferença no fundo seria consolidada pela prática e
pela jurisprudência do Tribunal de Justiça.6

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V. ANA MARIA GUERRA MARTINS, “Manual de Direito da União Europeia”, 2018

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