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ESCOLHA DA PROFISSÃO...

ESCOLHA DA VIDA

Como orientar apropriadamente a


escolha profissional?
Eis o problema que poucos podem
evitar.
A sua importância é transcendente
pois o trabalho profissional promove
ou impede o desenvolvimento da per­
sonalidade. A êsse propósito o psicó­
logo e sociólogo alemão A. Fischer vê
na profissão, uma notável possibilida­
de para o homem, de encontrar-se a
si mesmo ou de se perder e, declara
textualmente: “não ter acertado na
escolha da profissão pode ser o co-
mêço do fim”.
0 consagrado autor suíço JEAN
UNGRICHT, por seus títulos e com­
provado mérito, credencia-se como ex-
cepcional orientador no preparo para
a vida profissional. Êste livro revela-
-se um repositório das mais modernas
teorias sobre o assunto e apresenta
quadros estatísticos que lhe imprimem
o cunho de veracidade indispensável.
Sua leitura torna-se obrigatória a
todos que possuam qualquer parcela
de responsabilidade na orientação do
porvir da juventude, sejam pais, mes­
tres, administradores, escritores, jor­
nalistas etc. pois o ato da escolha da
profissão é de valor essencial para a
cultura e para tôda a humanidade.
ESCOLHA DA PROFISSÃO...
ESCOLHA DA VIDA

Uma pesquisa sôbre a importância


da escolha profissional para o in­
divíduo e para a sociedade; os fatô-
res para escolher a profissão e as
bases da orientação profissional.
JEAN UNGRICHT

ESCOLHA DA PROFISSÃO
ESCOLHA DA VIDA
UM LIVRO IMPRESCINDÍVEL PARA MESTRES, PAIS,
ORIENTADORES E PSICÓLOGOS — ONDE SE
ESTUDA A IMPORTÂNCIA DA ESCOLHA DA
PROFISSÃO E SEU IMPACTO NO
INDIVÍDUO E NA SOCIEDADE

ITÔRA MESTRE JOU


SAO PAULO
Primeira edição em alemão ............... 1947
Primeira edição em português .............. 1966

Título original :
“Berufswahl — Lebensvvahl

Tradução de
JUAN ALFREDO CÉSAR MULLER
Psicólogo

Capa de:
WILSON TADEI

Copyright de Juris — Editôra, Zurique — Suíça


Direitos reservados para os países de língua portuguêsa pela

EDITÔRA MESTRE JOU


Rua Martins Fontes, 99
SAO PAULO
COMENTÁRIOS DO TRADUTOR

Êste livro é consagrado à análise do "destino” humano.


A idéia clara sôbre os problemas que a escolha da profissão traz
consigo, é agora fundamental para o Brasil, que afastando-se de uma
estrutura económica colonial expande-se numa fase moderna.
Agradecemos à D. Déa Esmeralda Hochgesandt, pela valiosa ajudá
que nos prestou, sem a qual êste trabalho não teria sido possível.
Se a tradução pudesse ter dedicatória, dedicá-la-íamos ao Sr. Fe-
licindo Ramos, mercê da inexcedível capacidade para entender o ho­
mem.

Jxjan Alfredo César Múller


PREFACIO

O presente livro serve* na Suíça, de primeira introdução aos pro­


blemas da orientação profissional e se encontra presentemente esgo­
tado. Para as futuras edições seria imprescindível a coleta de dados
referentes ao estado atual dos conhecimentos humanos, em vertiginosa
evolução. Todavia, o contexto da obra continua a ser exatamente o
mesmo e serve, convenientemente adaptado, para qualquer país. Onde
quer que a estrutura económica tenha atingido uma certa diferencia­
ção é a escolha certa da profissão a chave decisiva para um ótimo de­
senvolvimento da eficiência de um povo e da evolução do indivíduo.
O autor espera que o conhecimento das demonstradas relações en­
tre homem, profissão e socieãáde possa ser de alguma valia também
para o Brasil, pais que, embora apenas de passagem, êle conheceu e
muito apreciou. Disto também tem certeza o Snr. Alfredo Miiller, em
São Paulo, a quem muito agradece pelos esforços que dedicou à tra­
dução e ã publicação desta obra.

Zurique, 5 de outubro de 1965

Prof. Dr. J. Ungricht


JEAN UNGRICHT — Doutor em Farmácia.
— Doutor em Filosofia.
— Psicólogo.
— Ex-Diretor ão Serviço de Orien­
tação Profissional dos cursos mé­
dio e superior ão Instituto da Ju­
ventude da Secretaria da Edu­
cação ão Cantão de Zurique —
Suiça.
— Professor Catedrático de Psicolo­
gia na Universidade de St. Gal-
len, Suiça.
— Diretor ão Serviço de Psicologia
da Swissair.
— Diretor do Instituto de Pesquisas
Sociológicas para a América La­
tina da Faculdade de Ciências
da Administração de Emprêsas
da Universidade de St. Gallen.
9

NOTAS PRELIMINARES

Desde que Pestalozzi e outros grandes pedagogos alerta­


ram a consciência popular e despertaram o senso de respon­
sabilidade com referência à formação da juventude, nunca
mais se extinguiu o interêsse pela educação. As forças vivas
da Nação se dedicaram ao cumprimento do dever que lhes
era imposto. O setor Educação e Cultura recebeu novo im­
pulso, equiparando-se ao de outros países e verbas extraor­
dinárias são concedidas anualmente para conservação e me­
lhoria das escolas, demonstrando a compreensão das autori­
dades .
Deve-se notar, porém, que o interêsse pelo jovem extin­
gue-se assim que êle deixa os bancos escolares, como se todos
pensassem: já fizemos demais... que daqui por diante o di­
plomado procure sozinho o seu caminho.
Quem diz A devia também dizer B. Não é lógico se es­
forçar tanto, para depois omitir-se no preciso instante em
que o jovem deve fazer frutificar (socialmente falando) aquilo
que aprendeu. Resta dar mais um passo. Um só passo, de suma
importância para o indivíduo e para a coletividade, ou seja
passar da escola para a vida profissional. Apesar da boa
vontade demonstrada por todos, o traço de união entre escola-
-vida, continua sendo um sinal estranho. Aliás, esta mudan­
ça não é mais função da escola. O professor cumpriu
o seu dever, preparou conscienciosamente o aluno. A obriga­
ção e a responsabilidade, sem dúvida, cabem à família, tanto
quanto ao jovem. Não à escola, a nenhuma instituição, nem
aos Podêres Públicos.
A realidade, porém, é outra. A família não é mais capaz
com efeito, de cumprir sua missão e na maior parte das vêzes
soluciona mal o problema ou se afasta dêle, abandonando a
12 Jkan Ungrichi

tarefa às influências externas e ao acaso. Esta visível falha


numa questão essencial, exigia soluções novas como as que,
pela primeira vez, foram claramente enunciadas por Philipp
Emanuel Von Fellenberg.
*
* ★

Só depois da Primeira Guerra Mundial, entretanto, ini-


ciou-se na Suíça um movimento que passou quase desperce­
bido. Do trabalho de Bachmann-Êugster, Emmi Bloch, Fer-
dinand Bõhny, Christian Bruderer, Otto Graf, Emil Jucker, Al-
bert Míinch, Rosa Neuenschwander, Martha Niggli, James
Schwar, Heinrich Stauber, Otto Stocker e também do Institu­
to Jean Jacques Rousseau (sob a direção do Prof. F. Clapa-
rède) entre outros, nasceu uma organização cuja influência
se fêz sentir no país inteiro, em quase todos os setores da
vida cultural. Êste trabalho soluciona um problema educati­
vo-social-cultural, ainda não conhecido em toda a sua exten­
são por não aparecer à tona. Surge no momento decisivo da
esco ha da profissão, ato que determina o futuro do indivíduo
— a fase mais importante da sua existência. Hoje, após qua­
tro décadas de lenta evolução, os jovens recém-formados re­
cebem orientação profissional, sendo superada por êles a me­
tade das vagas existentes nas escolas profissionais (11.268 em
1943). Em alguns Cantões só agora principia a evolução, mas
em outras regiões êsses números se elevam bastante. Na ci­
dade de Zurique, por exemplo, registramos uma porcentagem
de 55% e no distrito de Hinwil de 70%. O desenvolvimento
atingiu uma porcentagem alta, mas não, ainda, o ápice. O nú­
mero dos que solicitaram orientação subiu de 21.137 em 1933
para 33.432 em 1944 e continua a subir. Inopinadamente, a
orientação profissional se destacou entre as medidas de con­
trole, por exercer uma influência de profundo alcance
social. Incumbe-lhe selecionar (para os grupos profis­
sionais e profissões isoladas) uma nova geração de traba­
lhadores, capaz ou incapaz, qualitativamente suficiente ou
não; cabe-lhe impedir ou favorecer o seu desenvolvimento,
revitalizá-la ou sufocá-la bem como regular a posição do país
no mercado mundial, equilibrar desigualdades sociais, exer­
cer influência sobre o elemento estrangeiro e modificar as si­
tuações que fomentam o desemprêgo, a fim de obter a esta­
Escolha da Profissão 13

bilidade social. Em poucas palavras: cooperar decisivamente


para a preservação da ordem social.

Por tudo isto, pareceu-me valer a pena acompanhar o de­


senvolvimento desta organização. Logo verifiquei, porém, que
ainda mais importante era estudar a sua problemática e de­
terminar claramente os princípios em que se baseia.
Impõe-se, logo de início, responder às seguintes perguntas:
1. ° — que importância tem a escolha profissional? Que
reação provoca e qual o seu efeito?
2. ° — quais são os fatores que determinam a escolha; em
que medida? Quando podem ser considerados fatôres ade­
quados ?
3. ° — como transformar fatôres inadequados em ade­
quados?
Resumindo: como orientar apropriadamente a escolha
profissional?
Antes de prosseguir seria conveniente esclarecer bem o
que se entende por profissão. Isto poderia, contudo, desenca­
dear novamente uma polêmica que ofereceu assunto para vá­
rios livros (V. obras de Búcher, Schmoller, Weber, Salz,
Herkner, Schwarz, Siemens, Dunkmann, Brentano, Joseph-
-Lussheimer, Fischer, Sombart, Holl, Liechti, Krier, Brink-
mann etc.).
Para o esclarecimento dos problemas aqui tratados é sufi­
ciente empregar a palavra profissão no sentido que a maioria
lhe atribui, isto é: "considerar como profissão a atividade que
constitui a base da nossa vida material e da qual vem a maior
parte do lucro ou então ocupa a maior parte do nosso tempo
(como as atividades domésticas de uma dona de casa ou os
estudos de um aprendiz).
Esta definição da palavra profissão não é completa. Sub­
meto-me, porém, a restrições naturais impostas pelo próprio
tema. A orientação profissional envolve questões pedagógicas,
psicológicas, sociais, económicas, jurídicas, políticas e médi­
cas. E. Jucker faz notar que enquanto instituição social-cul­
tural ela tira seus fundamentos, métodos e recursos de todos
os setores, para cumprir integralmente sua missão.
Partindo daí chega-se fàcilmente ao infinito. Por isso eu
abordo as questões sòmente na proporção exigida para o es­
14 Jean Vngricht

clarecimento de cada uma delas, ciente de que os limites po­


deriam ser outros.
A mesma dificuldade existe quanto à citação das obras
consultadas. A bibliografia relativa ao assunto é tão vasta
que daria um nôvo livro. Meus próprios trabalhos estão reu­
nidos em mais de 600 volumes e o catálogo da Biblioteca da
Liga de Orientação Profissional menciona outros 800. Como
está pronto para impressão um amplo índice de Obras sôbre
a Orientação Profissional, do Instituto Bibliográfico de Lu-
cerna, limito-me a indicar os livros a que me reportei direta­
mente no texto desta obra (fato que de nenhum modo se re­
laciona com a sua importância ou com a dos trabalhos não
citados).
. Sem o valiosíssimo apoio e a colaboração do ex-Secretá-
rio Central da Liga de Orientação Profissional, Sr. E. Jucker,
eu não teria realizado êste trabalho. A êle, que na Suíça é
considerado o expoente máximo das ciências sociais, quero ex­
pressar aqui o meu agradecimento. Também aos Srs. Pro­
fessor Stettbacher e P. D. Dr. R. Konig, da Universidade de
Zurique, assim como ao Sr. F. Bõhny, Diretor do Departa­
mento de Orientação Profissional da mesma cidade, devo os
maiores agradecimentos por suas preciosas sugestões.

Junho, 1945 Jean Ungricht


PRIMEIRA PARTE

A IMPORTÂNCIA DA ESCOLHA DA PROFISSÃO

A escolha de uma profissão — decisão que poucos podem evitar.


Que importância tem ela? Êste é o tema desta pesquisa.
•4:
O ato da escolha contém, antes de tudo, o impulso, o pro­
pósito, a vontade de aprender e executar exatamente deter­
minada profissão. Realizada essa escolha, encontra-se o
jovem num mundo novo. Acaba de deixar a proteção da escola,
cujas finalidades e métodos, talhados para êle, mostram alvos
próximos, resguardando aquilo que já conseguiu e propor­
cionando-lhe, passo a passo, uma formação completa, que não
deixa margem para decisões próprias. Abre-se agora, diante
dêle, o mundo do trabalho, da manutenção, o mundo dos
adultos em luta pela existência. O choque dêsses dois mun­
dos é rude, tão rude que se chega a falar de um choque da
profissão1.
Não é ainda, aqui, que devemos formular a pergunta: a
que condições sociais estão ligados êstes acontecimentos? Isto
será esclarecido mais adiante. Uma observação, no entanto,
pode ser feita: hoje, a escola (estática em sua organização)
deixa de lado, muitas vêzes, o propósito de preparar os jovens
para a realidade da vida, oferecendo-nos, com isso, ensejo
para uma crítica e, ao mesmo tempo, para sugerir uma nova
orientação12.
Não é sobre isto porém, que vamos falar. Não ressalta­
remos também, o significado do trabalho — em sentido geral
para o homem, ou o efeito educativo realizado, ao intro­
duzir o planejamento no trabalho profissional, sôbre o caso

1 Jucker, “Schule und Beruf” 79 pp. 32-49.


2 Entre o grande número de obras sôbre a reforma do ensino podemos mencionai:
Grisebach, "Schulung und Bildung” 58 pp. 158-178. Schohaus, "Schatten Uber der
Schule” 138. Frey, “Pãdagogische Besinnung” 52.
Jean Ungricht

isolado, tomando o aluno, relativamente cego em relação à


vida, um colaborador eficiente para a sociedade que produz,
envolvendo-o, como cidadão, em uma rêde de obrigações, há­
bitos e relações intelectuais e emocionais, na comunidade. In­
teressa muito mais, aqui, a escolha da profissão, quando se
manifesta como fator que determina o destino do indivíduo
em relação a si mesmo, bem como em relação à sociedade — e
principalmente à família, ao Estado e à humanidade.

I „ o QUE SIGNIFICA, PARA A VIDA DE CADA


INDIVÍDUO, A ESCOLHA DA PROFISSÃO
1. Efeito da escolha da profissão sôbre o desenvolvimento
espiritual.
"A profissão é o resultado da experiência de muitas ge­
rações. É um molde já desenvolvido e molda também os seus
portadores ” (H. Stettbacher3.).
Há de fato, com o início de um mister, reestruturação par­
cial no mundo interior do agente, bem como no seu mundo
exterior. Mais que a metade da sua vida consciente se desen­
rola, a partir dêsse momento, em um ambiente condicionado
à profissão. São-lhe dados determinado material, instrumen­
tos e outros meios de trabalho, além de um local e métodos
próprios para executá-lo. As mesmas ações ser^o repisadas
até a saciedade, processos e séries de trabalho deverão ser gra­
vados e tarefas iguais repetir-se-ão em sequências alternadas.
Outras, entretanto, nunca se realizam e as forças que para a
sua execução seriam necessárias deixam de ser usadas ou
exercidas.
Já Pestalozzi era de opinião que o homem é moldado prin-
cipalmente por aquilo que faz4. Muita coisa, de fato, desen-
> volve-se, no campo corporal e espiritual, apenas com o uso, o
! treinamento e a sua obrigatoriedade. Como a alma humana
: é um todo, êsse desenvolvimento nunca deixa de influir sô­
bre o todo, ou seja sôbre a própria personalidade do indivíduo.

3 Stettbacher, “Beruf ais Bestimmung und Schicksal” 142 p. 365.


4 Pestalozzi: “Para mim é claro e inconteste que o homem é verdadeiramente
formado por aquilo que faz, muito mais do que por aquilo que ouve”. (Citagão de
Spieler no prefácio da obra de Koch, Euer Sohn — Euere Tochter vor der Berufs-
wahl”, 85).
Escolha da Profissão 17

A influência da atividade profissional é mais forte que


outra qualquer, pois se exerce constante e ininterruptamente
e por mais tempo, com férrea obrigatoriedade, dia após dia,
ano após ano (moenda implacável que tritura e lança fora, co­
mo rebotalho, tudo o que não a quer acompanhar ou não
pode).
Essa influência tão contínua, não pode deixar de ser uma
fôrça poderosamente impregnadora.
Podemos distinguir nela, por assim dizer, duas camadas.
Uma impressão básica, resultante de todas as atividades pro­
fissionais (ou seja da profissão em si mesma). Está presente
em tôdas elas e não é específica de nenhuma. Por seu intermé­
dio se realiza o ajustamento ao trabalho e a integração e sub­
missão à comunidade. Sôbre isso falaremos mais adiante.
Temos, depois, fôrças específicas que só atuam em deter­
minada profissão. Tendo por objeto o homem, favorecem in­
clinações e suscitam certas atitudes. As exigências próprias
de um mister desenvolvem uma fôrça de sucção a que o ho­
mem em geral se. submete, da mesma maneira que a planta
se volta para luz. Assim como ela é atraída e cresce em di­
reção à luz, também o indivíduo recebe, através da sua pro­
fissão, constantes estímulos que o obrigam a evoluir e desen-
. volver-se em uma direção definida. Cada profissão possui,
com efeito, uma fôrça atrativa que provoca certas reações.
Em outras palavras: cada profissão exerce sôbre o indivíduo
uma influência peculiar, definida, unilateral, em relação ao
desenvolvimento da personalidade.
Não só em sentido ativo, mas também passivo. A pro­
fissão marca, não só por aquilo que exige, mas também pelo
que deixa de exigir. O organismo, que sob tantos aspectos rea­
ge facilmente, só o faz, entretanto, nos pontos em que é soli­
citado. Onde nada lhe é pedido, deixa de reagir. Por isso são
tão diferentes, entre si, as profissões. Umas fazem (ou dei­
xam de fazer) determinadas exigências e outras requerem (ou
não) coisas bem diversas. O sistema de atração ou estímulo
faz paralelo, por assim dizer, com o de "não estímulo”. Quan­
do existem certos fatores de incentivo, faltam outros. En­
quanto uns (material, direção e tempo, p. ex.) influem sôbre
o desenvolvimento espiritual, outros agem negativamente, isto
é, deixam de'agir sôbre determinadas faculdades, que não
18 Jean Ungricht

sendo postas em ação não se desenvolvem e perecem. Pode­


mos falar, nesse caso, em "cunhagem negativa" através da
profissão5.
Mesmo concordando com Pfãnder6, quando afirma que
o sentido da existência não está no desenvolvimento de tô-
das as possibilidades humanas, não desprezamos as que po­
dem ser aproveitadas. E como isto se resolve também pela
profissão,
devemos considerar o trabalho profissional como
um fator de primeira ordem para a formação da
personalidade; que determina, desde logo, o que
% será o indivíduo.
Em outras palavras: o trabalho profissional promove ou
impede o desenvolvimento da personalidade. Neste sentido
viu Fischer, na profissão, uma importante possibilidade para
o homem, de encontrar-se a si mesmo ou de se perder7.
A marca da profissão não se relaciona somente com as
habilidades físicas ( principalmente com o aparelho neuro-
-muscular), como a habilidade manual, onde sua influência
é, aliás, visível (compare-se a habilidade dos dedos de um
"virtuose” de piano ou a agilidade corporal de um acrobata
com as de um homem comum). Ela não se relaciona, ainda,
apenas com o desenvolvimento das capacidades sensoriais
(como se pode observar em profissões que exigem uma
adaptação extraordinária e uma sensibilidade especial dos
sentidos: provadores de chá e de vinho, mecânicos especia­

5 Para evitar mal-entendidos, precisamos esclarecer: sempre que falamos de sensa­


ção, pressupomos um organismo que reage. O resultado da reação depende da
sensação, como também daquele que reage. Poucas sensações são marcantes a ponto
de provocarem reações nítidas (como por ex. a reação do corpo humano a grandes
doses de veneno). Em geral a reação rápida iguala em importância a própria sensa­
ção, princípalmente em sentido psíquico. (Veja os resultados interessantes expostos
por Meng em *Psyche und Hormon*, 113 p. 78, onde se demonstra que o destino dos
hormôníos introduzidos no corpo é, em última instância, de alçada psíquica). Por
isso, a impregnação da personalidade pela profissão não deve ser considerada absoluta.
Existe um conjunto de sensações resultantes da profissão, mas a reação do indivíduo
depende grandemente dêle mesmo. Ê preciso precaver-se tanto de subestimar como
de superestimar o fato.
6 Pfãnder, *Die Seele des Menschen” 121 p. 217.
7 Fischer, "Ueber Beruf, Berufswahl und Berufsberatung..Z 46 p. 21. 44A profissão
dá ao homem uma possibilidade de voltar a si mesmo. Ê uma fôrça centrífuga
que nos ajuda nas dificuldades da vida. Não ter acertado na escolha da profissão
pode ser o comêço do fim0.
Escolha da Profissão 19

lizados, afinadores de piano). Não. Funções superiores, es­


pirituais, são também estimuladas, aperfeiçoadas, fortifica­
das pela profissão. Isto se dá com a memória, a inteligência
(e seus componentes), a vontade, a sensibilidade, a fanta­
sia, a capacidade de adaptação às pessoas, coisas e situações,
e ainda com muitos traços característicos (como a profundi­
dade, a correção, a firmeza, a exatidão e outros mais). Fi­
nalmente, peia profissão são decisivamente formados, definidos
os interêsses do homem, o seu valor pessoal e, sobretudo, atra­
vés dêle, grande parte de sua vida espiritual. Pode-se compro­
var8 que a profissão determina de modo surpreendente a
associação, assim como o volume e a qualidade do material
espiritual; sendo a consequência disto percebida até mesmo
na linguagem comum, pois o vocabulário dos homens reflete a
sua profissão. Gradativamente formam-se verdadeiras lingua­
gens profissionais, muitas vêzes incompreensíveis para pessoas
estranhas ao meio e, justamente por isso, testemunho vivo de
que cada profissão tem suas leis próprias9.
É certo que disto tudo resulta uma adaptação ao am­
biente ; no campo das relações humanas, de fato, desenvolve-se,
por influência da profissão, um processo especial. Na profis­
são o indivíduo não trabalha para si só. Êle entra em contato
íntimo com outros: colegas de trabalho, superiores, subalter­
nos, fornecedores, compradores, representantes de organiza­
ções e repartições públicas. Com todos êles tem relações
especiais, determinadas pela profissão. Portanto: aquêle que
exerce uma profissão deve aceitar certas imposições; não é
possível afastar-se demais delas sem ficar isolado. Tradição
e costumes o cercam, sua opinião se adapta. Caminha mais e
mais em determinada direção imposta pela ocupação contínua
com os mesmos materiais, instrumentos, métodos e problemas
e, mais ainda, pelo desejo de identificar-se com os seus cole­
gas, de ser reconhecido como um dêles. Lentamente os valores
e interêsses da profissão tornam-se seus (E. Jucker)10. À medi-
/da que se transforma de simples trabalhador em profissional,
'quanto mais vivos se tomam o seu interêsse, a sua dedicação
ao trabalho, mais êle se sente prêso à profissão, "atraído" por

8 Jucker, “Berufskundliche Vorlesungen”, 78.


9 Veja o curto Compêndio de Bach “Geschichte der deutsche Sprache” 5 pp. 148-147,
e a literatura ali citada.
10 E. Jucker, "Berufskundliche Vorlesungen"., 78.
20 Jean Ungrichi

ela: completa-se a identificação do profissional com a sua pro­


fissão .
Agora êle a vê como um sistema único, isolado, e os que
não fazem parte dela se tomam estranhos. Isto vai tão longe
que, por pertencer a determinada profissão, e em função dela,
pode dê~certa maneira oFmêsnio?^ipEIêrnas que"'
como. pai, ou como cidadão, resolveria de modo inteírãmente
diverso. Como se toma dependente em seus julgamentos e
avaliações, assim também é julgado e avaliado pelos outros:
muitas vêzes menos como homem que como profissional. (A
reputação é muito mais uma função da posição profissional e
social, do que das qualidades morais).
Esta fase da identificação profissional se desenrola no
subconsciente e o seu portador não se apercebe dela11. Esta­
mos aqui, por assim dizer, diante da matriz daquele "processo
individual primário” da criança que, emergindo lentamente
do sentimento comum de união, abafado e indefinido, da dua­
lidade de união mãe-filho, passa sôbre o sentimento coletivo
do ambiente em que vive, para finalmente chegar ao senti­
mento do ego e à consciência do ego. Assim como, surgindo
da torrente psíquica originalmente unificada e superpondo-se
ao ambiente psíquico, cujos sentimentos, avaliações e ambições
compartilha temporàriamente, o ser humano revela mais e
mais idéias, ambições e sentimentos próprios11 ; também, exa­
1213
tamente assim, se desenvolve no adulto — apenas de maneira
inversa —- o processo de fusão com a profissão. Avaliações e
julgamentos próprios são transformados e finalmente reinte*
grados para dar lugar aos da profissão. O ego submerge no
vamente numa torrente que arrasta — mas agora a da cole­
tividade profissional. Realizou-se afinal a identificação profis­

11 Destas circunstâncias resulta que as investigações profissionais são improdutivas


quando têm por objeto o profissional ativo. Êle mesmo não percebe o quanto está
emaranhado na profissão, nem que encara de um ângulo profissional o mundo e a
vida; nem tampouco que a profissão o reveste como uma segunda pele. Assim, não
devemos esperar, das pessoas que a exercem, informações positivas sôbre a profissão.
É preciso recorrer a um psicólogo abalizado, que vê através da ^personalidade pro­
fissional" na expressão de Jung, desfazendo o quadro inexato. Caso não consideremos
importante a identificação profissional, muitos dos resultados das pesquisas sôbre a
profissão perdem o valor e inquéritos sôbre troca de profissão e de aprendizagem não
podem ser convenientemente apreciados. Os inúmeros malogros nas tentativas de
mudança de profissão se devem a esta compreensível omissão.
13 Veja Scheler, “Zur Phãnomenologie und .Theoríe der Sympathíegefúhle” 134 p. 128.
Escoljia da Profissão 21

sional e o que é individual não mais se separa do adquirido.


O que era pessoal, "próprio”, está embutido, diluído; e o que
era "estranho” se tornou "próprio". Diante de nós está o ho­
mem "representante da sua profissão”.
Repetindo:
assim, através desta fusão, realiza-se primeiro a
verdadeira coordenação com a comunidade e por ela
uma ligação de mil fios com a vida profissional,
económica e civil, com tôdas as visões e possibilida­
des que daí resultam; ao mesmo tempo verifica-se
o desenvolvimento de determinadas capacidades,
forças e interêsses, mas também, por outro lado, uma
inegável restrição do horizonte e das possibilidades
de desenvolvimento (visivelmente expressa nesta
contração da personalidade com a "psique profissio­
nal”, constituindo uma deformação profissional de
tão infeliz aspecto).
Isto tudo, por assim dizer, acontece com o profissional
Ainda não fizemos a pergunta: como reage êle? A restrição
imposta pela profissão com as suas limitações (ou a acentua­
ção de tais limites) assim como a restrição das habilidades
que são exigidas e utilizadas (enquanto outras passam des­
percebidas) é para uns agradável, conveniente e natural, mas
para outros não.
Estas restrições e acentuação podem ser chamadas na­
turais quando confirmam o significado da palavra vocação,
isto é, quando as exigências da profissão estão em inteira con­
cordância com as tendências de desenvolvimento e as capa­
cidades pessoais do profissional. Neste caso êle sente que
está no seu verdadeiro elemento. Sente-se atraído, elevado
pela sua profissão, e que, através dela, se completa. Quando
o trabalho corresponde desta maneira aos impulsos íntimos,
toma-se fonte de satisfação e de alegria e o mais seguro
fundamento da felicidade. A vida tem sentido e o trabalho
é a sua complementação13.
Quando, porém, a profissão exige o constante exercício
de ações contrárias aos próprios desejos, nenhuma oportu-1

13 A atual estrutura económica tende a dar sempre menos trabalho ao homem.


Perduram, entretanto, as relações citadas.
22 Jean Ungbichi

nidade oferecendo para completa realização das mais íntimas


tendências do indivíduo, resultam tensões, muitas vêzes qua­
se insuportáveis. A profissão toma-se um fardo, o trabalho
um tormento. O futuro não tem sentido e a vida fica inu­
tilizada .
Engels chama um trabalho forçado de "a angústia mais
dura e degradante. Nada é pior que ser obrigado a fazer
todos os dias, da manhã à noite, alguma cousa que nos re­
pugna” 14.
Tal profissão toma-se fonte de desilusões, desânimo, des­
contentamento, amargura, resignação na rebeldia e envenena
a vida do indivíduo até as mais graves perturbações psíqui­
cas15.
Pode-se objetar que o trabalho é, finalmente, aquilo que
a pessoa faz dêle. Decerto a marca do homem pelo trabalho
e pela profissão não é um fato inevitável, que deva ser aceito
passivamente. Isso se .dá sempre com luta, e assim como a
profissão age sôbre o indivíduo, também o indivíduo age sô­
bre a profissão. Somente as personalidades fortes, porém,
são capazes de romper as cadeias da estrutura económica,
subdivisão do trabalho, tradições e mentalidade de suas pro­
fissões. A grande massa não enfrenta tal luta; adapta-se,
acomoda-se e muitos, que nem disto são capazes, falham. So­
mente a dependência económica consegue abafar, na maioria
dos casos, qualquer tentativa de emancipação. Segundo o
ponto de vista de Fr. W. Foerster — não existe profissão que
não possa ser espiritualizada pela maneira como o indivíduo
a encara em relação à única cousa que teria valor na vida,
isto é, a cultura do caráter. Sua opinião está teoricamente
certa, mas foge à realidade. Poderíamos opor-lhe a observa­
ção de Schleiermacher quando afirma que na verdade exis­
te somente uma infelicidade: viver num dilema entre a vo­
cação (sentimento íntimo) e a obrigação (imposição exte­
rior) 16. Neste caso as obrigações significam deveres profis­
sionais que não podemos sacudir fora, como se fôssem pingos

14 Engels, “Die Lage der arbeitenden Klassen in England" 2? edição, 44 pp. 121,
122, 179.
15 Os males psíquicos causados por trabalhos profissionais inadequados foram descri­
tos, pela primeira vez, por Janet em "Les obsessions et la psychasténie” 72. Casos típi­
cos (especialmente de neurose)'encontram-se na literatura psicanalítica. P. ex.: Boss,
"Kõrperliches Kranksein ais Folge seelischer Gleichgewichtsstõrungen” 30 pp. 46-49.
16 Krebs, "Mittel fiir eine rationelle Berufswahl im Mittelstand” 91 pp. 17-18.
Escolha da Profissão 23
. ... ..... JJ'"L—1-1 " "' " " . - - **“-■ ■■■»»
d’água sôbre uma pele oleosa; são cadeias de que, quase nun­
ca, nos podemos mais livrar. Fazendo estas restrições, con­
cordamos com o que diz Fischer17, — a atitude do homem
diante do trabalho está intimamente ligada à sua atitude
diante da vida. E para que a atitude do homem diante do
trabalho seja positiva, basta que êle encontre a “sua verda­
deira vocação”.
2. A escolha da profissão e a saúde
Quem escolhe uma profissão, escolhe com ela a sua futu­
ra doença. Decide muitas vêzes sôbre a duração da sua vida
e quase sempre sôbre a sua saúde, pois a profissão tem uma
profunda influência sôbre o desenvolvimento do corpo e so­
bre o estado de saúde. Mas tudo isto é raramente conside­
rado no momento da escolha. Há profissões que levam com
segurança à invalidez ou à morte prematura. Outras trazem,
fatalmente, a doença. Já outras influem patogênicamente
apenas em determinadas circunstâncias; finalmente outras
apresentam somente grandes probabilidades de acidentes e
doenças. Estas influências atuam, naturalmente, com maior
intensidade sôbre um organismo em desenvolvimento: aquilo
que fôr prejudicado nesse período, continua muitas vêzes as­
sim, para o resto da vida. “A influência do trabalho profissio­
nal sôbre o desenvolvimento corporal na puberdade é de uma
importância decisiva e sobrepuja tôdas as expectativas”
(Kaup)18. Quem conhece estas circunstâncias e as leva em
conta, no momento da escolha da profissão, estará resguar­
dando a sua saúde. Resumindo: Os métodos que possibilitam
uma compreensão mais clara destas circunstâncias são os
que enumeramos a seguir.
“Querendo estudar as circunstâncias de uma profissão,
a situação económica dos profissionais, sua atividade no
exercício da profissão e as condições higiénicas sob as quais
a profissão é exercida, podemos seguir dois caminhos. O pri­
meiro seria tomar por base observações individuais sôbre as
supracitadas circunstâncias, indagando, depois, se e como
a saúde do profissional é influenciada pela construção e dis­
posição das salas de trabalho, pela atitude no trabalho, pelo

17 Fischer “Ueber Beruf, Berufswahl und Beruísberatung* 46 p. 17.


18 Citado por Koeisch em “Handbuch der Berufskrankheiten” 81 p. 639.
24 JeanUngkicííi
MT “VL-' “rt- —~ LL-ltTlLL‘1

material de trabalho e fatôres semelhantes; mais ainda, qual


a influência do horário de trabalho e do salário (em sentido
económico e higiénico) sôbre a vida do profissional. Tais
observações são feitas em quase todos os setores da
atividade profissional, por numerosos pesquisadores, e nos
dão um quadro muito claro da vida profissional mo­
derna. Da soma destas observações individuais pode-se
então, perfeitamente, tirar conclusões sôbre a situação
social e a saúde dos trabalhadores. Sendo, porém, as
observações individuais mais ou menos subjetivas, é con­
veniente um controle e a êste nos leva o segundo caminho.
Com auxílio dos dados estatísticos existentes, fixaremos a
frequência das doenças, acidentes e mortes, nas diferentes
profissões; a média da duração da vida dos profissionais etc.
Comparando os resultados obtidos para as diversas profissões
com a média geral da população da mesma idade e sexo, po­
de-se então verificar se a profissão é favorável ou desfavorá­
vel. Êste exame, porém, deve abranger as primeiras seleções
feitas em cada profissão, por exemplo pelo exame médico obri­
gatório no início da atividade profissional, pelo qual, "a prio-
ri", são afastados indivíduos fisicamente inferiores. É ne­
cessário, também, ter à mão um vasto material estatístico,
e que se examinem as circunstâncias especiais porventura
existentes, para não cometer enganos. Por êstes dois cami­
nhos chegaremos ao conhecimento exato das desvantagens
da atividade profissional, para a saúde19.
Não me compete aprofundar-me neste terreno especial (já
de alçada da Medicina). Para êste efeito indicamos, além
de Chajes, as grandes coletâneas de Koelsch20, Loewy21,
Lauber 22.
Quero somente mencionar as mais importantes opiniões
e através delas demonstrar até que ponto se justificam as
afirmações acima.
Em primeiro lugar trataremos do risco de acidentes nas
diversas profissões e, para isto, a melhor fonte de informa­
ções é o vasto material estatístico pertencente ao Instituto de
Previdência. Imediatamente aparecem algumas profissões
com perigos maiores que outras, tanto para os indivíduos
19 Chajes, “Grundriss der Berufskunde und Berufshygiene” 40 pp. 15-16.
20 Koelsch. "Handbuch der Benafskrankheiten’* 87.
21 Loewy, “KHnik der Benrfskrankhelten” 102.
22 Lauber, "Handbuch der Arztlichen Berufsberatung” 96.
Escolha da Profissão 25

quanto para as agremiações profissionais23. Chajes compa­


ra o número de acidentes na indústria, no comércio e na
agricultura e conclui que os acidentes, no primeiro ramo, são
duplamente elevados. Segundo Chajes, os trabalhadores da
indústria estão duplamente sujeitos a serem acidentados, em
relação aos que escolheram a agricultura como profissão. Isto
é válido, tanto para as profissões isoladas, quanto para os
grupos profissionais24.
Para dar um exemplo de acidente profissional específico,
mencionamos o "Metzgerstich" do açougueiro, aquêle corte
no abdome ou na coxa, devido ao uso de uma faca afiadíssi-
ma, o qual muitas vezes causa a morte por hemorragia.
Um segundo ponto de vista tem por base o fato de di­
versas profissões apresentarem, em comparação com outras,
índices de doença, invalidez e mortalidade visivelmente ele­
vados. A valorização diversa das profissões em relação aos
acidentes e à doença, é revelada, portanto, não só nas esta­
tísticas de acidentes, mas também pela maior frequência de
acidentes e doenças. “Os caminhos que nos permitem obter
estas informações estatísticas são muitos. Podemos estudar
clínico-estatisticamente os grupos profissionais e nêles obser­
var principalmente a juventude operária ou os velhos traba­
lhadores das mais diversas profissões. Êstes exames em série
são feitos na maior parte das vêzes no próprio local de tra­
balho ou em hospitais vizinhos. Infelizmente esta forma de
exames é limitada ao número daqueles que se apresentam
23 Chajes, “Grundriss der Berufskunde und Berufshygiene” 40 p. 44.
24 Para ilustração damos alguns números dêsse tipo, extraídos de Chajes 40 p. 44.
A tabela mostra c número de acidentados e mortos, em alguns grupos profissionais
relacionados dentre 1 000 segurados.
Por 1 000 operários, nos anos
de 1909, 1924 = 1926 ........... 1 909 1924 1 925 1926
Indenizados Indenizados Indenizados
Ramo Profissional Feri­ Mor­ Feri­ Mor­ Feri­ Mor­ Feri­ Mor­
dos tos dos tos dos tos dos tos
Condutores de Veículos .... 19,96 2,00 10,87 1,53 12,07 1,41 11,17 1.32
Indústria do Tabaco .......... 0,52 0,02 0,45 0,03 0,67 0,06 1,04 0,02
Trabalhadores em Pedreiras 15,83 1,67 8,26 1,36 10,02 1,34 12,68 1,36
Tipógrafos e Impressores .. 2,96 0,06 1,95 0,05 1,82 0,05 2,52 0,11
Construções no Sub-solo ... 15,44 1,32 10,36 0,92 14,49 1,30 15,02 1,18
Indústria Têxtil ................ .. 2,00 0,05 1,06 0.05 1,5 0,05 2,44 0,06
Fabricação de Papei .......... 9,16 0,58 6,38 0,69 6,31 0,45 10,37 0 91
Indústria do Papel ............. 4,15 0,09 2,14 0,07 3,03 0,04 3,82 0,06
26 Jean Usíghicht

para êle e ao escasso tempo de que se dispõe para isso. Seria


preferível submeter cada indivíduo a uma observação clínica
feita por especialistas, num período de tempo determinado.
Os resultados exatos obtidos seriam, depois, trabalhados es­
tatisticamente na respectiva profissão, e comparados com ou-
tros grupos profissionais. A estreita colaboração do clínico
com aquêles que fazem a estatística promete, aqui, os melho­
res resultados. Os exames relativos às diversas profissões fei­
tos pelos peritos civis e militares, para a seleção do seguro de
invalidez etc., fornecem ainda outros dados. Podemos, final­
mente, examinar os assentamentos das Caixas de Previdência
e registros de óbito. A estatística das doenças e mortes —
nas diversas profissões — é justamente uma das mais impor­
tantes fontes de conhecimentos sôbre o trabalho, para a Me­
dicina. Ela nos garante uma visão ampla dos riscos profis­
sionais e principalmente do seu perigo para a saúde; do êxito
obtido pelas medidas de saneamento ou seu insucesso etc.
Aliás, deve ficar desde logo bem claro que a obtenção do mate­
rial (original e comparativo), assim como a interpretação dos
resultados> estão muitas vêzes sujeitos a enormes dificuldades.
Precisamos admitir, também, que estatísticas gerais nos dão
uma visão tôda especial e podem indicar a sobrecarga mais
ou menos aparente de um grupo profissional com um estado
de saúde precário ou elevado grau de mortalidade, ou ainda
com determinadas deficiências orgânicas. Um completo es­
clarecimento dêsses fatos, porém, só pode ser conseguido por
investigações especiais. Certos prejuízos existem sòmente em
alguns grupos profissionais, de maneira que, num exame com­
pleto de grupos maiores, essas particularidades desaparece­
riam. Encontramos então novas dificuldades com as subdi­
visões dos pequenos grupos, que não se subordinam à lei do
grande número.
Já dissemos acima, além disso, que saúde e doença, ati­
vidade e personalidade do indivíduo são bàsicamente deter­
minadas pela sua "constituição” e sofrem ainda a influência
do ambiente em que vive. A isto se juntam os perigos da pro­
fissão, de um modo geral e especial, porque também a in­
fluência da atividade profissional não é fator singular, mas
multiforme: inclui local de trabalho, riscos especiais de algu­
mas atividades ou materiais de trabalho. A soma destas par­
ticularidades, em relação com as características constitucio­
nais e a natural seleção daí resultante, deve orientar-nos na
Escolha da Profissão 27

interpretação de tôdas as pesquisas e estatísticas sôbre a pro­


fissão. Precisamos precaver-nos em querer atribuir tudo à
influência da profissão, sem considerar a constituição do in­
divíduo e o ambiente"25. Os resultados assim obtidos não
podem ser interpretados pormenorizadamente neste trabalho
(indicamos o capítulo citado por Koelsch)26.
O essencial é que desses dados resulta o que desde o iní­
cio afirmamos:
. o trabalho profissional determina exatamente como
será o desenvolvimento físico (e da saúde), quanto
tempo poderá durar a atividade e a capacidade pa-
■ ra o trabalho e que idade será alcançada pelo in-
I divíduo.
Em muitas profissões podem-se responsabilizar certas cir­
cunstâncias, claramente determinadas, por esta repercussão
sôbre a saúde do profissional. Neste caso podemos falar de
verdadeiras “doenças profissionais”, que são específicas de
determinadas profissões, isto é, nelas se manifestam com mui­
ta frequência. Em sentido geral tôda doença é uma doença
profissional, que se pode atribuir a uma ação mais prolon­
gada das circunstâncias da vida profissional sôbre o corpo
humano27.
Para esclarecimento mencionamos algumas das diversas
modalidades de doença pertencentes a êste grupo: a inchação
dos joelhos nos instaladores de lajes: o catarro agudo e cró­
nico dos afiadores; as afecções do ouvido nos moleiros (pó
de trigo e farinha); a febre dos fundidores, produzida pelos
vapôres de metais pesados, principalmente do óxido de zinco;
a coceira dos caldereiros; a “caisson" dos mergulhadores;
os graves prejuízos causados à saúde dos médicos e enfer­
meiras que trabalham com raios X; a “baceira” dos que tra­
balham com lã. Finalmente, os múltiplos envenenamentos e
doenças alérgicas (especialmente eczemas) daqueles que ma­
nipulam certas substâncias químicas usadas na indústria
(principalmente soluções orgânicas, tintas, vernizes, arga­

25 Koelsch, “Handbuch der Berufskrankheiten” 87 pp. 637-638.


26 Koelsch, “Handbuch der Berufskrankheiten” 87 pp. 637-638.
27 Desta definição excluiremos as doenças profissionais que por lei dão direito a
um seguro e sôbre as quais, segundo lista especial, têm influência primordial certos
materiais usados no exercício da profissão.
28 Jean Vngkicht

massas lubrificantes e outros meios de proteção contra a fer­


rugem etc.). Como uma das mais pérfidas doenças, temos ain­
da a silicose dos mineiros, dos sopradores de areia, dos que.
trabalham em pedreiras, dos canteiros, dos afiadores de metal,
doença produzida pela penetração do pó de quartzo nos te­
cidos pulmonares, que resiste a tôda terapia e leva muitas
vêzes à invalidez, quando não à morte.
Passemos agora ao terceiro ponto de vista: enquanto na
maior parte dessas doenças a ação patogênica é tão forte,
que se o profissional não souber precaver-se necessariamente
adoece, existem outras doenças profissionais que atuam ape­
nas sôbre certas constituições, com maior ou menor intensi­
dade (só podemos demarcar um limite exato em alguns casos,
como talvez na silicose). È o que se verifica, por exemplo,
no reumatismo dos ferroviários; nas frequentes alterações
do metabolismo e nervosismo dos vendedores e hoteleiros;
nas varizes dos que trabalham sempre de pé; e em muitas
idiossincrasias pelas matérias químicas (eczema dos industriá-
rios e asma dos farmacêuticos).
Quando existem certa propensão, debilidade constitucio­
nal, perturbações de saúde latentes ou manifestas, a doença
é provocada justamente pela escolha de uma profissão impró­
pria e poderia ser evitada ou pelo menos adiada, se fosse es­
colhida outra profissão menos nociva. Isto não vale só para
as moléstias orgânicas, mas também para as perturbações
psíquicas e desvios da conduta. Um homem com inclinação
para a bebedeira se transformará, com a profissão de hote­
leiro ou viajante, num bêbedo; e um epiléptico provàvelmente
morrerá pela queda do andaime, se trabalhar em constru­
ções. Assim também, se o indivíduo fôr inclinado à narco-
mania, a profissão de médico ou farmacêutico o exporá a
tentações e lhe dará a possibilidade de satisfazer o vício em
seu mais alto graú. Em tais casos deve-se considerar contra-
-indicado determinado trabalho ou ambiente profissional.
Lauber organizou, a respeito, uma tabela de profissões28.
Chegamos finalmente ao terceiro ponto de vista. Nos
casos supracitados, determinadas profissões precisam ser
evitadas, pois teriam influência desastrosa sôbre certas incli­
nações e constituições. Deveriam ser evitadas também por­
que inclinações, constituições ou obstáculos que surgem pos-

28 Laufcer, *Handbuch der àrztlichen Berutsberatung” 96 pp. 547-567.


Escolha da Profissão 29

teriormente, não admitem uma atividade satisfatória ou dão


pouca oportunidade de enfrentar, com sucesso, a luta pela
existência. Ê o que acontece aos que têm defeitos físicos,
como por exemplo, os cegos e aleijados passando por todos
os graus29: desde os defeitos graves (em que também os ór­
gãos internos podem ser afetados) até os mais leves. Em
geral, no momento da escolha da profissão os familiares do
futuro profissional consideram apenas os impedimentos mais
sérios. Falhas, porém, que muitas vêzes estão claras são des­
prezadas, até o momento em que termina a aprendizagem e
começa a luta pela existência. Quantas dificuldades, no en­
tanto, podem causar a um vendedor, com o decorrer dos
anos, os pés doloridos. Para um encadernador, mãos suadas
constituem enorme contratempo, assim como para um costu­
reiro ou desenhista, uma afecção da vista, que se manifesta
após certo tempo, talvez seja um obstáculo insuperável. Tais
manifestações, insignificantes a princípio, acarretam muitas
vêzes completa incapacidade para o trabalho; só resta, então,
mudar de profissão, o que raras vêzes se faz com sucesso, em
idade mais avançada. Devia ser normal uma orientação mé­
dica para a escolha da profissão. O Manual de Orientação
Profissional, de Lauber, dá uma idéia das falhas e erros que
poderiam ser evitados e das possibilidades que, apesar de
tudo, se ofereceriam aos portadores de defeitos físicos, se
eles ao menos as conhecessem. Sob este ponto de vista, tam­
bém é de grande importância o problema — escolha da pro­
fissão e saúde.

29 A tabela de Neumann mostra até onde, sob certas circunstâncias, pode estende r-
-se êste Impedimento. CBerufsberatung" 117 pp. 33-34). Dos 2 700 meninos que foram
orientados, de maio a dezembro de 1922, no Departamento Profissional de Viena,
mostravam:
5% falhas visuais
5% doenças pulmonares
2% afecções cardíacas
1% doenças nervosas
2% falhas da audição
3% moléstias internas
1% debilidade mental e imbecilidade.
Após o exame médico, sòmente de todos os meninos foi declarado fisicamente
capaz; »/< apresentava falhas físicas com forte impedimento para o exercício da pro­
fissão e, dêstes, 4% eram totalmente incapazes.
30 Jean Ungricht

3 As relações entre a escolha da profissão (


e as circunstâncias materiais
A dependência económica que o homem aceita obriga­
toriamente pela escolha da profissão, na maioria das vêzes
sem refletir, tem muito maior influência sôbre o seu destino
do que tudo o que mencionamos até agora. A maioria das pro­
fissões proporciona, é claro, meios de subsistência. Os contra­
tos de trabalho coletivo, porém, traçam normas intransigentes
para os salários. Essa dependência se manifesta claramente
no funcionalismo público, cujos vencimentos seguem escalas
rígidas. Assim sendo, a profissão e o emprêgo determinam o
ordenado e muito raramente se considera, para aumento de
salário, a competência ou elevada responsabilidade profissio­
nal. É o que se dá com os operários e empregados de em-
prêsas particulares. As estatísticas registram para os cargos
subalternos (na classe média) ordenados assustadoramente
baixos. Quem se conforma com uma posição destas, deve
compreender que nunca poderá fazer grandes despesas. A
grande, massa dos empregados subalternos deve sujeitar-se a
um padrão de vida modestíssimo, e nenhum esfôrço será
capaz de ampliar o quadro estreito de sua existência30.
A situação dos trabalhadores, que exercem profissões pa­
ra as quais não se preparam pela aprendizagem, apresenta,
mais ou menos, o mesmo aspecto desfavorável31.
Comparando os dados relativos às diversas profissões,
encontramos uma considerável diferença. Verificamos que,
em regra, o ordenado aumenta de acordo com a qualificação
30 Abaixo apresentamos ao acaso exemplos para ilustrarão. Exemplos que corv
firmam êstes fatos: segunda a “Volkswirtschaft* 165 (18? ano — 6? caderno — junho
de 1945) os salários mensais dos comerciários suíços, adultos, no mês de junho de 1938
eram os seguintes (em francas suíços):
H omen s Mulheres
Total ................................. ......................................... ..................... 378,— 225.—
Empregados qualificados, independentes, com aprendizagem pro­
fissional ou estudos já terminados ..................................... 465.— 276.—
Empregados dependentes, com aprendizagem profissional ou co­
nhecimentos especiais ... 325.— 218.—
Auxiliares ........... ................................... .......... 208.— 165.—
31 Os salários correspondentes, dos trabalhadores pagos por hora, na indústria
reiojoeira, eram:
Adultos do sexo masculino:
Com aprendizagem .................................... 1.69
Aprendizes .............................. 1.47
Sem aprendizagem ........ ................ >................ 1.19
Escolha da Profissão 31

do trabalho. De maneira que, pela escolha de uma profissão


mais qualificada (naturalmente se existir a indispensável ca­
pacidade), pode-se conseguir uma base material mais alta 32.
Ê necessário observar que em muitas profissões nunca é pos­
sível ultrapassar certo limite e, principalmente, quase impos­
sível reunir economias dignas de menção. Decide-se, assim,
outra importante questão: a da dependência ou independên­
cia profissional. Se já pela escolha de determinadas profis­

Adultos do sexo feminino .................................. —.91


Trabalhadores juvenis do sexo masculino .............. —.51
Trabalhadores juvenis do sexo feminino .............. —.42
Se considerarmos os ordenados (por dia e hora) dos trabalhadores acidentados, de
tddas as profissões, suíços, obteremos o seguinte quadro, relativo a 1943 (Informação
sôbre o Comércio e Indústria, da Suíça) 171, p. 31:
Ordenado médio
Por dia Por hora
Chefe, contra-mestre, capataz ............... 19.24 1.94
Trabalhadores com aprendizagem e aprendizes ..................... 16.03 1.78
Trabalhadores sem aprendizagem .................................... .......... 13.22 1.49
Mulheres maiores de 18 anos ................................................... 8.55 -*.99
Mulheres menores de 18 anos ......... ........................................ 6.91 —.93
Tiremos déstes ordenados (prlncipalmente se com êles fôr sustentada uma família)
as despesas de aluguel, alimento e vestuário e reflitamos sôbre o que resta para as
necessidades culturais. Teremos certamente» com tal restrição, um nível material e
cultural mais ou menos baixo.
N do T. Calcular a taxa de conversão CrJ 600 para l.-S.Fr. constatando a mesma
realidade para os grandes centros urbanos do Brasil.
32 Tomemos por base o salário mínimo, semanal, pago em Zuriche no ano de 1939.
Nas profissões abaixo indicadas os salários eram fixados por contratos coletivos de
trabalho, ou ordens especiais de pagamento.
1. Fornecedores semaprendizagem .................................... 36.—
2. Encadernadores ........................................................ 58.—
3. Eletrotécnicos ............... ................................................. 60.—
4. Ajudantes de pedreiro ................... 65.—
5. Tapeceiros ..................................................................... 72.—
6. Cocheiros .............. .................. ............. 73.—
7. Tipógrafos ..................................................................... 77.—
8. Motoristas ................... *................................................ 80. —
9. Pedreiros ..................................................................... SE­
IO. Padeiros ......................................................................... 85.—
11. Montadores de máquinas ...................................... 86.—
12. Oleiros .............................. 99.—
13. Instaladores de lajes ........................................................ 105.—
N. B. — As estatísticas mais recentes e completas são publicadas constantemente
naquela Revista (Resultado das Estatísticas sôbre salários, de outubro de 1944).
32 Jkan Ungricht

sões é excluída toda possibilidade de independência, porque


estão sujeitos a capacidades especiais ou exigem instalações
nos moldes de uma grande indústria (como p. ex. as de:
fundidor, marceneiro, desenhista de modas e alfaiate, de­
senhista de máquinas, modelista de calçados, fabricante de
cerveja, tintureiro de lã e sêda, laboratorista, radiotelegra-
físta e cartógrafo) outras pelo menos deixam em aberto a
possibilidade, quando mais não seja, de uma vida indepen­
dente. As profissões de pedreiro, por exemplo, açougueiro,
eletricista, carpinteiro, alfaiate, sapateiro etc. Quem escolher
uma das profissões incluídas no l.° grupo, terá de renunciar,
por tôda a vida, a uma colocação independente, um negócio
próprio. Dependerá sempre do empregador. Se escolher uma
profissão do 2? grupo, muda-se o aspecto da questão, pois
existirá ao menos a possibilidade de trabalhar por conta
própria. Está aberto o caminho para a independência, de­
pendendo ela, então, em alguns casos, apenas da existência
de capital. Nem sempre, pois, há profissões que exigem pe­
queno investimento (p. ex., as de gráfico, desenhista, dese­
nhista de modas, jornalista, decorador de vitrinas, ator, via­
jante, alfaiate, pintor, montador de rádio). Outras pedem
um capital modesto, que se pode conseguir com alguns anos
de trabalho em profissão dependente (p. ex. cabeleireiro,
tapeceiro, decorador, escultor, encadernador, sapateiro, esto­
fador e laqueador de carros, seleiro, eletricista). Outras, fi­
nalmente, reclamam desde o início um capital tão grande,
que a independência é irrealizável, baseada em economias
obtidas com o próprio trabalho (açougueiro, peleiro, impres­
sor, mecânico de precisão, relojoeiro, óptico). Em geral a
ampliação de um negócio exige capital cada vez maior. Se
fôr um engano do marxismo acreditar que o trabalho em
série, das fábricas, esmagaria ou absorveria em pouco tempo
a classe média independente, é também erróneo pensar que
um ofício pode render mais sem a ajuda de máquinas apro­
priadas. Máquinas, porém, são caras, e quem quiser enfrentar
a concorrência é obrigado a adquirir o equipamento necessá­
rio à produção por alguns milhares de francos, como p. ex.
os dentistas; até 50 000 — como os açougueiros; ou mais ain­
da, como os mecânicos de precisão e impressores. Há estrei­
ta correlação entre a elevação do capital e a modernização
da indústria. Sem outras fontes de renda, por conseguinte,
(uma herança, talvez) as oportunidades de independência são
Escolha da Profissão 33

mínimas. O mesmo se pode dizer de uma emprêsa mista (in­


dústria e comércio independente, pois exige, ao mesmo tem­
po, equipamejito e estoques de mercadoria (ópticos, relojoei­
ros, peleteiros, encadernadores).
Não é exagêro, por conseguinte, afirmar que a escolha
de uma profissão implica em dependência ou independência
de vida. E mais ainda desde o momento da escolha, o pro­
fissional fica sujeito a tôdas as imposições e conjunturas da
profissão, e às oscilações e depressões decorrentes do trabalho,
do tempo (épocas propícias ou não) e do desemprêgo. Estas
oscilações, porém, raramente atingem tôdas as profissões com
a mesma intensidade. Em algumas, elas são até periódicas e
possíveis de prever. Quem escolher a indústria de construções
ou a peleteria, deve saber que poderá ficar parte do ano sem
trabalho. O estudante de filologia não ignora que a proba­
bilidade de conseguir uma renda satisfatória, em tempo ra­
zoável, é bem pequena e chegar a uma posição estável, antes
dos 30 anos, é práticamente impossível. O indivíduo que se
decide ao contrário, pela profissão de laboratorista, químico,
engenheiro, p. ex., será aceito de braços abertos pela indústria
e um confeiteiro, um operário especializado, serão disputados.
Êste encadeamento com a parte material da profissão não é
decisivo, mas em todo caso a habilidade pessoal e as quali­
dades profissionais são de alta importância. A frase tão re­
petida: aquêle que é realmente habilidoso se impõe, pode ser
confirmada em qualquer tempo, com raras exceções. É tam­
bém de inegável importância encontrar a profissão na qual
podemos fazer o melhor.
Numa profissão acertadamente escolhida, entram em
jogo, ao lado dos conhecimentos técnicos, fatores de ordem
moral que podem aumentar decisivamente o sucesso profis­
sional. São êles (eu repito afirmações orais de E. Jucker)
o fortalecimento da confiança em si e a segurança que daí
resulta, a alegria de compreender e a iniciativa, consequên­
cias de uma escolha acertada. Automaticamente aumenta a
confiança dos colegas e dos fregueses. Estabelece-se uma at­
mosfera de camaradagem que por sua vez cria novas relações,
as quais agem também no sentido do sucesso económico.
Temos que afirmar ainda uma vez: aquêle que encontrou
a "sua” profissão entrega-se com alegria e intensidade bem
diferentes à aprendizagem e quer se aperfeiçoar sempre. Para
êle, a profissão não é só um meio de ganhar dinheiro, mas
34 Jean Ungricht

um gênero de vida que corresponde aos seus desejos. Êle


não a prejudica com possíveis distrações, pois ela é o centro
de sua vida e lhe agrada. Seu trabalho é disciplinado e por
isso êle o aproveita de maneira bem diferente daqueles que
o executam de má vontade. Quando finalmente, graças à ex­
periência, a sua atuação se toma automática, êle sente que
domina o seu trabalho, que não se sufoca nêle. A profissão
corre, por assim dizer, por si mesma. O profissional tem
cabeça e tempo livres para pesar com calma todos os seus
atos e aumentar o sucesso. Enfrenta com segurança, em
épocas desfavoráveis, os reveses e circunstâncias adversas.
Os obstáculos e até mesmo os golpes do destino são superados
mais fàcilmente, quando o trabalho tem sentido por si mes­
mo. Que fonte de força é a profissão acertadamente escolhi­
da 1 Que base segura para o sucesso material e quanta in­
fluência exerce sôbre nossas ações e pensamentos! Ela de­
termina, enfim, as nossas atitudes para com a vida, a famí­
lia, a pátria e a cultura.
Não se pode avaliar suficientemente tudo o que represen­
ta. Exercendo determinada profissão o indivíduo fica sujeito
às oscilações da sua ocupação (mudanças de cargo e até
mesmo o desemprego) mas também se beneficia quanto às
possibilidades de progresso nela existentes. Na maioria das
vezes esta participação determina desde logo o lucro realizável,
assim como a possibilidade de um futuro dependente ou in­
dependente. A escolha acertada constitui a verdadeira base
do sucesso ou insucesso material e moral na atividade pro­
fissional.
É essa escolha que abre caminho para a profissão certa
ou inadequada.
4. Trabalho e aprendizagem
O exercício da profissão (pela juventude civil), sem ou
com preparo prático, é terreno em que se entrelaçam o desen­
volvimento da personalidade e as questões materiais33. A
33 O enquadramento das profissões em trabalho com aprendizagem prévia ou sem
nenhum preparo, (de acôrdo com as estatísticas e o contrôle do trabalho profissional),
é feito de acôrdo com o seguinte:
1. Com aprendizagem ou preparo prévio:
a) com aprendizagem: uma aprendizagem mais longa, seja numa oficina par­
ticular ou numa fábrica.
b) com preparo prévio (na maioria das vêzes trabalhadores em máquinas/;
para a - aprendizagem basta quase sempre uma orientação, porém é necessá­
Escolha da Phofissâo 35

importância educativa do Ensino Profissional é tâo evidente


que a sua obrigatoriedade já foi muitas vêzes exigida34 (equi­
parando-o à Escola de Cadetes do Exército). Êsse é um de­
sejo compreensível, pois a passagem para a vida ativa, de­
pois da aprendizagem, é menos rude. Como parte de um
vasto plano, o aprendiz está sob a direção do mestre e sob
controle das escolas profissionais e da Comissão de Apren­
dizes do Estado. Recebe um preparo sistemático para o tra­
balho, que se consolida no curso de vários anos de aprendi­
zagem com a educação pela ordem, exatidão, profundidade,
paciência, responsabilidade e com inteira independência para
um julgamento e supervisão próprios. O aprendizado signifi­
ca mais: uma contínua relação com o trabalho, a educação
do espírito, olhos e mãos, que cria uma habilidade múltipla.
Significa aprender a trabalhar com exatidão e responsabilida-
de e a usar, com economia, tempo e material. Dá a oportuni­
dade de conhecer profundamente determinado campo de
trabalho e o conhecimento total da produção, desde o nasce­
douro, criando certa medida para a avaliação de outras
atividades e de tôda a vida prática35.
O ensino prático educa o pensamento, o caráter e disci­
plina a atividade, o que é da maior importância, não só por
causa da nossa situação económica especial (necessidade de
atingir, no trabalho, a mais alta qualidade) mas ainda por
vivermos numa democracia. Com referência à educação, o que
a escola iniciou só se amadurece verdadeiramente pela apren­
dizagem profissional. Quase todos aquêles que não fizeram
o aprendizado demonstram a falta destas influências positivas.
A isto junta-se, como fator dos mais desfavoráveis, a pos­
sibilidade de receber muito cedo grandes ordenados, o que
redunda em uma precoce equiparação financeira com os adul­
tos. Muitos jovens e mais ainda os seus pais, escolhem em

rio um tempo de prática mais longo (diversas semanas ou até mesmo meses)
para adquirir a necessária habilidade.
2. Sem nenhum preparo. Presume-se não possuírem uma formação especial» nem
conhecimentos especiais, ou nenhuma prática <empacotadores, office-boys etc.)
ou sòmente alguns dias de prática (trabalhadores em máquinas).
34 Por exemplo» por O. Graf, adjunto de departamento da Junta do Cantão de
zuncne, de 1920-30.
35 Veja Hdhn, "Ratschlãge zur Berufswahl" 69. StocKer, “Die erzíehensche und
volkswirtschaítliche Bedeutung der Berufslehre” 145. Hauser, *Die Berufsausbildung
in den Anstalten ftir schwererziehbare Jugendliche in der Schweiz” 63 pp. 7-9.
36 Jean UngricHl

geral uma profissão que não exige aprendizagem, porque é


possível receber (cedo demais) salários altos. Esta é, porém,
uma vantagem momentânea e ilusória. Terminada a aprendi­
zagem, o trabalhador que aprendeu ganha mais. Seu ordenado
é um têrço ou um quarto mais alto e o custo da aprendizagem
é compensado em poucos anos. A formação múltipla, na apren­
dizagem, confere ainda outras vantagens. Ela dá, em sua mais
alta medida, a possibilidade de progredir e torna imune às
crises (ficam desempregados em primeiro lugar aquêles qué
nãò têm aprendizagem). Permite alcançar mais cedo a inde­
pendência (o que é difícil sem aprendizagem). Possibilita
uma atividade mais variada, mais interessante e mais profun­
da; uma profissão — que aprendemos — contém por assim
dizer, uma dimensão a mais, o que se evidencia pela possibi­
lidade (caso seja necessário) de executar uma tarefa auxiliar
a qualquer momento, ao passo que o inverso não se dá. O
indivíduo que tem preparo chega, finalmente, muitas vêzes a
outra profissão, ou outra posição, apenas pelo fato de haver
completado a aprendizagem (policial, motorneiro, guarda). Ao
contrário, aquêle que não tem preparo depende de uma ativi­
dade estritamente limitada e sua vida terá uma base muito
menos sólida. Sua existência continua de pé ou cai com ela.
Às oscilações dessa limitada atividade (épocas menos propícias,
depressões, mudanças de local de trabalho, troca de ocupação
dentro do ramo de trabalho) em regra atingem-no em pri­
meiro lugar. O progresso lhe é recusado quase sempre. Uma
existência independente ou no exterior, quase impossível. É
de se compreender, por isso, que a tão lamentada falta de
sentido do trabalho e o descontentamento resultante se en­
contrem menos vêzes nas profissões com aprendizado do
que nas outras. Assim, também, sob êsse ponto de vista, a
escolha da profissão é decisão de vital importância para a
existência 36.

36 Se até agora discorremos longamente sôbre a dependência imposta pela profissão,


precisamos destacar» ainda que ràpídamente, os fatos que tomam estas cadeias supor­
táveis até que consignamos quebrá-las: são êles a satisfação profissional (composta
essencialmente pela possibilidade de satisfazer às inclinações pessoais e pela alegria
de obter um ganho) e a habilidade profissional, que repousa essencialmente sôbre a
capacidade para a profissão. Ambas estão estreitamente ligadas.
Escolha da Profissão 37

II — A IMPORTÂNCIA DA ESCOLHA DA PROFISSÃO


EM RELAÇÃO À SOCIEDADE
1. Problemas político-económicos
a) Rendimentos e bem-estar social
No terreno económico é grande a importância da escolha
da profissão, para a coletividade. Em linhas gerais, o bem-
-estar de nosso povo é paralelo aos seus rendimentos. Quanto
maiores forem as sobras, após as despesas com suas necessi­
dades, mais pode êle economizar para um padrão de vida ele­
vado e para fins culturais. A economia de um povo, porém,
está intimamente ligada à estrutura profissional, porque pro­
vém do trabalho. É consequência do rendimento do trabalho
individual. E o rendimento do trabalho está sujeito às possi­
bilidades de trabalho e de lucro. Estas possibilidades, por sua
vez derivam de um lado, do trabalho existente, e de outro,
do número e habilidade daqueles que são necessários para a
sua execução. O número, porém, e a qualidade dos trabalha­
dores nos diversos ramos profissionais e o seu rendimento
dependem, ainda e sempre, da escolha da profissão. Sob êste
aspecto, o problema da escolha da profissão, pelos novos, tor­
na-se assunto importantíssimo para um povo. Os dados sôbre
desemprêgo, mudança de profissão, falhas na profissão e
migrações, que adiante transcrevemos, vêm corroborar esta
assertiva. Vamos, contudo, primeiro lançar um olhar sôbre
a nossa situação, que é especial. Tendo a Suíça muito pouca
matéria-prima, é um país que nunca poderia alimentar sòzinho
os seus habitantes. Se quisesse fazer esta experiência teria
que renunciar a qualquer bem-estar. Os bens que o solo pobre
não fornece devem ser conseguidos, submetendo-se a matéria-
-prima importada a um processo de refinação, que a transfor­
ma em artigo desejado para os estrangeiros.
“Nossa ligação com os mercados mundiais nos permite
entrar na troca de objetos manufaturados de alto valor por
produtos industriais e agrários em quantidade e da melhor
qualidade que o exterior possui. Da nossa estatística comer­
cial, relativa a 1938, resulta que cada tonelada de produtos
importados pela Suíça representava, naquela época, um valor
- médio de mais ou menos 210 frs., enquanto cada tonelada de
mercadoria exportada pelo nosso país atingia um valor médio
de 2.140 frs. Êstes simples dados mostram, bem melhor que
exaustivos comentários, a peculiaridade da indústria suíça,
38 Jean Ungricht

que consiste em transformar a matéria-prima ainda bruta,


como ferro, bauxita, carvão, lã, algodão (com auxílio de um
aparelhamento técnico superior e de um pessoal excelente)
em mercadorias de alto valor, como por exemplo, relógios, má­
quinas, produtos químicos e tecidos.
A força produtiva da nossa indústria permitiu ao país
superar a falta de espaço arável e alimentar suficientemente
uma quantidade duas vêzes maior de habitantes, o que seria
impossível sem a troca de mercadorias. Normalmente pois,
a nossa agricultura produz apenas pouco mais de 50% dos
víveres de que o povo suíço necessita. Os outros 50% foram
conseguidos pela grande exportação de nossa indústria. Fa­
zendo o cálculo das despesas com alimentação (constituída
em 50% de produtos internos e 50% externos) chegaremos a
resultados mais notáveis.
Em 1938, 400000 trabalhadores (em números redondos)
estavam ocupados em assegurar a alimentação popular para
um período de exatamente 190 dias, com a criação de gado,
produção de leite, agricultura, vinicultura e fruticultura. Por
outro lado, 290 000 pessoas trabalhavam nas oficinas ou nos
escritórios de exportação e indústrias correlatas; não só para
garantir a alimentação nos demais 175 dias do ano, mas tam­
bém para pagar a matéria-prima importada (inclusive produtos
complementares e combustível) e ainda manufaturar um têr-
ço dessa matéria-prima. A atividade, porém, de apenas 120 000
trabalhadores no ramo de importação teria bastado, em 1938,
para assegurar o pagamento dos alimentos obtidos por meio
da importação. Em tempo de paz, portanto, 400 000 pessoas ga­
rantem a alimentação para 190 dias, e 120 000 para 175 dias.
Não é difícil deduzir sôbre qual lado está a maior produtivi­
dade. Êste é um fato paradoxal, mas comprovado: a indús­
tria de exportação (cálculos feitos por trabalhador e dia de
trabalho), presumindo-se condições normais de troca, contri­
bui três vêzes mais que a agricultura para proporcionar ali­
mentação ao povo suíço”1. A obtenção dêste bem-estar, de
nenhum modo natural, só é possível pelo trabalho. Trabalho
criador de valores que os adquirentes dos nossos produtos não
podem ou não querem criar. Em poucas palavras: é o traba­
lho de qualidade em tôdas as suas formas, que na falta de
outras importantes vantagens naturais da Suíça nos permite

1 Galenica Nachrichten, maio 1945 — 157 pp. 123-124.


Escolha da Profissão 39

alcançar a primazia, e com isto as condições de vida de um


povo culto. No momento em que a importância dês te “prin­
cípio da qualidade" fôr claramente reconhecida e suas regras
aplicadas também pelos outros países (como p. ex. pela Ale­
manha, após a Primeira Guerra Mundial) surgirá uma com­
petição de valores profissionais, cujo desfecho pode atingir
profundamente a vida de um povo, e certamente atingirá a Suí­
ça. Um trabalho de qualidade só pode ser executado por tra­
balhadores de qualidade, incluindo na palavra “trabalhadores”
todos aquêles que trabalham. E aquêle "optimum” em habili­
dade profissional, do qual nasce o trabalho de qualidade, só
pode ser alcançado a longo prazo, por pessoas que possuam
capacidade e também um grande interêsse pelo seu trabalho.
Sòmente por uma criteriosa escolha da profissão é possível
conseguir a formação sistemática de técnicos altamente qua­
lificados. Tal formação, afirma W. Luick, gera automatica­
mente melhora dos produtos e maior eficiência no trabalho.

“Com isto, a formação de técnicos da nova gera­


ção se transforma num dos mais graves problemas
da nossa política da produção"2.
Realmente, o trabalho é a mais importante “matéria-pri­
ma” e seria de interêsse geral aproveitá-la de modo intensivo.
Isso aconteceria, se já por ocasião da aprendizagem fôsse mi­
nistrada uma alta formação técnica e se as profissões, na Suíça,
exigissem dos profissionais — durante toda a sua vida — im­
portantes realizações.
Uma escolha anárquica ou inadequada, da profissão, cons­
titui grande empecilho para um aproveitamento extensivo da
matéria-prima—trabalho. Forma um contrapêso que consome
inutilmente muitas forças. Não devemos estranhar quando
se levanta uma verdadeira grita, clamando por uma orienta­
ção segura da nova geração profissional. Para obter sucesso,
quando deveria principiar essa orientação? Certamente no ins­
tante em que os caminhos de ingresso nas diversas profissões
se separam em quantidade e qualidade: na escolha da pro­
fissão .

2 Luick, “Der beruíliche Nachwuchs in der Schweiz" 107 p. 24.


40 Jean Ungricht

b) Desemprêgo, superlotação de determinadas


profissões, profissões inadequadas
Observando as relações existentes entre a escolha da pro­
fissão e o desemprego, tiramos importantes conclusões. O
desemprêgo e o excesso de material humano parecem, à pri­
meira vista, ter pouco a ver com a escolha da profissão. Em
primeiro lugar, são uma consequência da situação do mer­
cado, que por seu lado depende da situação económica e po­
lítica do próprio país e do mundo. Os países produtores e com­
pradores dependem da economia mundial, mas essa influên­
cia não atingirá, mesmo na pior hipótese, um grau tão des­
favorável que chegue a prejudicar a sua economia interna.
Inclinamo-nos, por isso, a tomar o desemprêgo como um
sintoma que deve ser atribuído antes à influência exercida
pela produção, sua distribuição, e a política financeira e co­
mercial. No entretanto existem também conexões com a es­
colha da profissão, que não devem ser menosprezadas.
Na introdução da lei federal sôbre a formação profissio­
nal, êstes dois sistemas vêm mencionados como segue: "Os
dados relativos ao trabalho na Suíça revelam uma sobrecarga
de trabalhadores sem aprendizagem e uma super-oferta de bra­
ços para algumas profissões, enquanto outras, pela falta dêles,
são exercidas por estrangeiros”3.
Primeiro, algumas palavras sôbre a situação dos trabalha­
dores sem aprendizagem. A conclusão a que chegamos, exa­
minando as estatísticas sôbre o desemprêgo, é que aquêles
que não fizeram o aprendizado são atingidos em primeiro lu­
gar, e formam o principal contigente de desempregados. Logi­
camente, para melhorar, devíamos tentar diminuir o número
de trabalhadores sem aprendizagem4.
Luick expõe o resultado de suas pesquisas, afirmando
que os esforços para diminuir o número de trabalhadores sem
aprendizagem e insuficientemente qualificados seriam impor­
tantíssimos, não só para sanear o mercado de trabalho,
dispensar o concurso estrangeiro e fomentar a nossa produção,
mas também para obter um aumento de renda e maior esta­
bilidade dos trabalhadores. Por onde e como devemos princi­
piar? Quando se pretende cortar o mal pela raiz não se devem
3 Bõschenstein und Kaufmann, “Bundesgesetz fiber die berufliche Ausbildung”
Nota 23 p. 13.
4 Luick, "Der berufliche Nachwuchs in der Schweiz” 107 pp. 63-60.
Escolha da Profissão 41

usar meias medidas o que significaria, neste caso, uma poste­


rior mudança de profissão. Não. Devemos fazê-lo no momento
de tomar uma decisão favorável ou desfavorável ao aprendi­
zado, isto é, no momento de escolher uma profissão. Seria
preciso cui.dar, por todos os meios, que os mais jovens se
interessassem pela aprendizagem e os menos jovens se'satis­
fizessem com profissões para as quais não é exigida. Portanto,
as considerações de ordem educativa ou meramente económicas
nos levam a uma mesma conclusão: a necessidade de incre­
mentar o ensino profissional, tomando-o tão intensivo quanto
possível. Objeta-se freqiientemente que sendo tão rápido o
desenvolvimento da técnica, mesmo o trabalhador que se
esforça por aprender mais e mais, em pouco tempo é afastado
pela máquina. Êste é um julgamento sentimental que não
resiste a um exame mais acurado dos fatos. Verifica-se exa­
tamente o contrário. Em lugar nenhum se comprova que a
racionalização torne supérfluo o trabalho altamente qualifi­
cado. Quando a máquina, em determinados casos, executa
trabalhos especializados, exige para isto novos trabalhos com­
plementares, realizando quando muito uma modificação. Ela
substitui, no verdadeiro sentido da palavra, a atividade auxi­
liar, a fôrça bruta, o trabalho não qualificado5.
Voltando ao assunto: o fato de conseguirmos um aumen­
to do número de aprendizes não resolve ainda o problema.
Seria preciso saber para que setor a escolha da profissão os
encaminha. Pois uma “terapia das causas” do desemprêgo
(supondo-se que dependa de nós) só pode ser aplicada com a
distribuição das fôrças de trabalho pelas diversas profissões,
na medida de suas verdadeiras necessidades e das necessida­
des da nova geração. Podemos objetar6, aqui, que uma
atitude sadia, realista, da própria população, levaria por si
mesma a uma regulamentação; as profissões já superlotadas e
mal remuneradas seriam evitadas, e. preferidas aquelas que
prometem mais. Tudo estaria em ordem, se esta regulamen­
tação que se faz por si mesma, baseada nas leis da oferta e
da procura, fosse realmente tão eficaz quanto seria de desejar.
Mas não é. Peca, em primeiro lugar, pela duração da apren­
dizagem que se prolonga por 3 a 4 anos, em média; e o

5 O trabalho sem aprendizagem nunca desaparecerá por completo, assim como nem
todos os jovens se submetem ao aprendizado.
ô Líeehti, •Probleme des Berufs...* 99 p. St.
42 Jean Ungricht

preceito, — acertado economicamente falando — segundo o


qual a juventude corre espontâneamente para onde se pedem
braços, é contrariado e anulado por muitos fatores (como por
exemplo as exigências da posição social e dos costumes).
A ação seletiva se processa de modo bem primário. Os
sintomas crónicos da superlotação das profissões e da escolha
de profissões inadequadas comprovam a ineficiência da adap­
tação automática, não orientada.
Em todos os tempos existiram e continuam existindo
profissões não somente, por assim dizer, incapazes de aceitar
novos braços, mas superlotadas, tão superlotadas que nenhu­
ma sobra de forças poderia ser nelas aproveitada. Em virtude
desta superlotação temos sempre um contingente de desem­
pregados .
Diz Bartholdi 7:
o desemprêgo crónico é uma das características
dessas profissões superlotadas, e nem mesmo em
épocas favoráveis desaparece.
A lei federal citada atrás, atribui um têrço do desemprêgo
a uma escolha profissional errada.
Porém não é só isso. Se a superlotação fôsse mais
ou menos igual em todas as profissões, teríamos
uma superoferta generalizada; porém, existe um
grupo de profissões que, mesmo nas fases de de­
pressão económica, luta com a falta de braços.
Está claro que uma compensação entre as profissões su­
perlotadas, e outras, poderia evitar, em grau considerável,
o desemprêgo. Mas, em consequência das circunstâncias rela­
tivamente rígidas que determinam a formação profissional e
o exercício da profissão em nosso país, muito poucas vêzes
se realiza esta compensação, depois de terminado o aprendi­
zado8. Devíamos adotar uma orientação diferente desde o iní­
cio, quer dizer já na escolha da profissão. Enquanto isto não
se der, as profissões inadequadamente escolhidas dependem
de trabalhadores estrangeiros, e as portas da Suíça se abrem
por si mesmas, para êles.

7 Bartholdi, "Die wirtsschaftlichen Grundlagen der Berufsberatung" 6 p. 58.


8 Ao contrário da América, onde não'existe uma rígida hierarquia profissional, sen­
do possível mudár de profissão sem dificuldade e depois retornar à anterior.
Escolha da Profissão 43

A palavra desemprêgo significa que o trabalho de um cer­


to número de pessoas não encontra mais emprego. Se estas
pessoas sabem realizar apenas trabalhos que não são mais
necessários, ficam desempregadas. E aqui mencionaremos
uma outra possibilidade: se souberem fazer outra coisa é pos­
sível que consigam uma nova ocupação. Daí os esforços do
Govêrno para restringir (em relação à indústria, ao comércio
e às demais atividades) as especializações, e favorecer as pro­
fissões básicas que facultam várias ocupações.
Ê. visível uma continuidade de crise nas profissões duplas,
como por exemplo as profissões relacionadas com a agricul­
tura. Aqueles que as exercem, chamados por F. Marbach9
“anfíbios sociais”, são capazes de mudar de ramo, quando
necessário.
Quem pretendesse objetar que as crises atingem geralmen­
te, não só determinados ramos de trabalho mas a economia
em sua totalidade, e que a mudança de profissão significaria
apenas aliviar uma delas, para sobrecarregar outra, deveria
lembrar-se das profissões inadequadas.
Para terminar, quero resumir algumas afirmações de
Bartholdi10. Êle é de opinião que o desemprêgo — na Suíça
— deve ser atribuído em parte muito pequena à situação eco­
nómica, e estaria (em 3/4) condicionado às circunstâncias se­
guintes: l.° dificuldades de compensação entre oferta e pro­
cura; 2.° oscilações do tempo (estações do ano); 3.° escolha
de uma profissão inadequada, pela nova geração. Uma orien­
tação profissional apropriada poderia atenuar em muito a in­
fluência dêstes fatôres desfavoráveis. A necessidade de uma
redistribuição entre as profissões com superlotação e as que
se ressentem da falta de braços, salta aos olhos. Mas nunca se
poderão evitar totalmente as profissões sujeitas às oscilações
do tempo, pois elas são de grande importância para a coleti­
vidade (construções, agricultura, indústria hoteleira). Porém,
se já por ocasião da escolha da profissão se cogitasse ,de com­
pletar a formação profissional por meio da aprendizagem de
uma profissão suplementar, seria possível superar com faci­
lidade a calmaria de certas estações, verdadeiro ponto morto
de determinadas atividades.

9 Marbach, “Theorie des Mittelstandes" 109 p. 175.


10 Bartholdi, “Die wirtschaftlichen Grundlagen der Berufsberatung* 6 pp. 4-9 (Bax
Choldí foi o primeiro chefe do Departamento Federal de Estatística do Trabalho)
44 Jean Ungricht
.. .

O desemprêgo, oriundo da dificuldade de se fazer uma


redistribuição entre as regiões de trabalho, é problema seme­
lhante. A experiência mostra que os obstáculos são grandes
demais, para que se possa planejar a mudança em massa de
trabalhadores, das regiões com superlotação para as que apre­
sentam carência. E também aqui tuna segunda profissão ofe­
receria possibilidades de êxito. Em primeiro lugar seria útil
pensar na pequena agricultura (pequenas propriedades parti­
culares) ou pelo menos numa vasta cultura de hortas e jar­
dins, alargando o movimento já existente neste sentido.
De um modo geral devemos dar razão a Luick, quando
afirma:
Se a. orientação profissional da juventude que dei­
xa os bancos escolares pudesse ser tão bem con­
trolada, que resultasse numa distribuição perfeita
das atividades profissionais, esteio da economia
popular, teríamos a melhor arma para o combate
ao desemprêgo. Sua ação não seria temporária,
mas sim duradoura e radical. Ao mesmo tempo des­
truiríamos "uma das mais profundas causas da ne­
cessidade de assistência ao desemprêgo” u.
c) Emigração e imigração
Há uma ligação entre a escolha da profissão e a emigra­
ção. A preferência da nova geração por certas profissões,
que nem sempre são de utilidade básica, conduz a uma super-
-oferta de forças de trabalho, acarretando um desemprêgo par­
cial. Os indivíduos com mais iniciativa são forçados a procu­
rar uma saída, aproveitando os seus conhecimentos em outros
lugares onde mais necessários se fazem. Emigram. De 1920
a 1927, por exemplo, em uma época relativamente favorável do
ponto de vista económico, emigraram para além-mar quase
50 000 suíços dos quais 30000 profissionais. Mesmo levando
em conta o pendor inato dos suíços pela emigração, uma si­
tuação profissional insatisfatória continua sendo a causa
principal da sua partida. A curva da emigração baixa nas épo­
cas de florescência económica mas sobe durante as depressões.
Isso prova que os motivos essenciais da imigração são de
ordem económica.*

11 Luick, "Der berufiiche Nachwuchs in der Schweiz” 107 p. 29.


Escoi.ha:DaProfissão 45

Não me é possível avaliar as vantagens que resultam da


divulgação da nossa mentalidade e do nosso trabalho pelo
entrosamento de relações com os imigrantes, nem as desvan­
tagens da perda de forças hábeis, de campos de trabalho, de
conhecimentos especializados (com referência à indústria re-
lojoeira, por exemplo) que derivam da saída de suíços. Po­
demos considerar indispensável para o nosso país um certo
intercâmbio económico e cultural e aplaudi-lo. Devemos per­
guntar, porém: até que limite? Sem qualquer nacionalismo es­
treito e sem levar em conta as tristes experiências com a 5.a
coluna, nos últimos tempos, é preciso convir que uma média
razoável foi de muito ultrapassada. Consultando os últimos
recenseamentos e as obras de Stein12, Wyler13, Dõnhoff14,
Luick15, Bartholdi16 e Húrlimann17, concluímos que o equilí­
brio foi perturbado e que um desenvolvimento malsão tomou
o lugar. Sabemos que muitos suíços precisam emigrar, porque
exercendo profissões já superlotadas, não encontram trabalho
em sua pátria. Sabemos, também, que em outras profissões
existe uma carência crónica, de braços, e que esta falta só
pode ser preenchida pelos estrangeiros.
Há dezenas de anos (excetuando-se o período de guerra)
o número de imigrantes vem superando estranhamente o de
emigrantes. Se os estrangeiros que ganham o seu pão em nos­
so país superam em número os nacionais que emigram, con­
cluímos que, pressuposta uma equitativa distribuição das for­
ças produtoras, êstes últimos poderiam encontrar trabalho
em sua pátria (se quisessem). Daremos um exemplo anterior
à guerra. Nos 20 anos decorridos de 1890 a 1910, encontrava-
-se a Suíça em franco progresso económico. Podia dar ocupa­
ção, não só a todos os trabalhadores nacionais, mas necessita­
va, ainda, do concurso de estrangeiros. Nestes 20 anos o nú­
mero de pessoas que entraram na Suíça superou em 150 000 o
das que saíram. No mesmo período, entretanto, estando a
Suíça em condições de ocupar mais trabalhadores do que
possuía, somos forçados a anotar um excesso de emigrantes,
isto é, uma perda definitiva de 108 000 suíços, em números

12 Stein, “Das Uebervõlkerungsproblem" 146.


13 Wyler, “Die Demographie der Auslãnder in der Schweiz” 156.
14 Dõnhoff, “Das Arbeitsmarktproblem” 41.
15 Luick, “Der berufliche Nachwuchs in der Schweiz” 1G7.
16 Bartholdi, “Die wirtschaftlichen Grundlagen der Berufsberatung” 6.
17 fíttriixnann, “Die schweizerische Auswanderung und ihre Gesetzgebung” 70.
46 Jean Ungbicht

redondos. E grande parte destas pessoas emigrou porque


havia escolhido profissões nas quais a necessidade de bra­
ços já estava coberta. Nestes mesmos 20 anos entraram na
Suíça 261 000 estrangeiros. Portanto, tivemos antes da guerra,
nas épocas mais favoráveis, um excesso de emigrantes suíços,
e nas crises mais agudas um excedente de imigrantes estran­
geiros" 18.
Observando o que se passa atualmente, verificamos que
o quadro não se alterou essencialmente. Segundo o recensea­
mento de 1930, entraram na Suíça 219 315 trabalhadores es­
trangeiros e partiram 2 054 296 suíços, e na época em que o
desemprêgo aumentou, para cada suíço desempregado chega­
ram 2 a 3 estrangeiros que trabalhavam e ganhavam. A con­
sequência desta situação anómala é uma superemigração de
suíços. Ela atingiu em certas ocasiões uma tal amplidão, que
chegou a colocar o nosso país em primeiro lugar nas estatísti­
cas sôbre emigração19.

18 Bartholdi» “Die wirtschaftlichen Grundlagen der Berufsberatung" 6’pp. M0.


19 O número de estrangeiros residentes na Suíça era» segundo Dõnhoff, 41, pp. 72-73
(em comparação com países vizinhos, de acôrdo com estatísticas de.Wyler):
Anos Suíça França Alemanha Áustria Itália
% % % V» V»
1850 2,9
1860 4,6 — — MM*
1870 5,7 «MM*
1889 7,4 2,7 0,6 0,5 0,2
1900 11,6 2,7 1,4 0,6 02
1910 14,7 2,7 1,9 0,7 02
N. B. Por conseguinte, antes da 1? Guerra Mundial, cada 7? habitante da Suíça
era estrangeiro. Se em 1945 o número de estrangeiros caiu de 600 000 para 200 000,
mesmo assim continuamos superando de 3 a 11 vêzes a porcentagem dos outros países:
5,5% dos habitantes eram estrangeiros e, em Zurique, 7%. Pelo recenseamento de
1930, o número de estrangeiros era (porcentagem sôbre o total de habitantes de cada
pais):
Suécia ...................... 0,3 Noruega ..................... 1,2
Itália ............... ........ 0,3 Holanda .......... .......... 22
Inglaterra ....... ........ 0,5 Bélgica .......... ....... 3,9
Espanha .......... ........ 0,7
Hungria .......... ...... 0,9 Áustria .......... .......... 4,3
Dinamarca .... ........ 1,0 ..........5,9
' França ..........
Alemanha ...... ........ U Suíça ........... . .......... 8,7
N. B. a Suíça era, pois, também, antes da 2? Guerra Mundial, o país que abri­
gava mais estrangeiros, na Europa.
Escolha da Profissão 47

Quando observamos certas profissões, o fenômeno da emi­


gração salta aos olhos com mais fôrça. Por algum tempo os
estrangeiros monopolizaram certas profissões e ramos de tra­
balho20. A situação catastrófica criada com a partida desses
trabalhadores, em consequência da mobilização geral de 1914,
é que chamou a atenção de muitos para estas circunstâncias
especiais. E pela primeira vez surgiu o desejo intenso de dar
à nova geração de profissionais uma orientação adequada.
Veio daí, também, a compreensão da necessidade de uma

20 A participação de estrangeiros (segundo o recenseamento de 1905) atingia:

na indústria hoteleira .......... 23,7% na indústria .. 30,7%


no comércio -................... 24,4% na indústria de construções .. 55,6%
no turismo ............................. 26,3a/e •

A seguir observamos a porcentagem inacreditàvelmente alta de mestres, operários


aprendizes estrangeiros em Zurique, no ano de 1914.

Mestres Operários Aprendizes


% % %
Alfaiates ........... . ....... 67 84 75
Cabeleireiros ........................ ....... 63 81 50
Sapateiros .............................................. ....... 58 79 63
Fotógrafos .................. . ....................... . . ....... 53 38 45
Marceneiros ........ . ....................... . ....... ....... 50 67 47
Carpinteiros ........................................... ....... 49 56 75
Vidraceiros ........ . . ......... . ....... 47 66 33
Padeiros ..................... . ....... 44 71 37
Pintores ........... ....... 38 61 43
Seleiros e taneceíros . ... .......... ....... 38 56 28
Gravadores e cinzeladores ............ ....... 37 75 60
Ourives ....*............. . ......... ............ ....... 37 68
Pedreiros . .... ...... .......... ....... 34 90 60
FnníleiroR ... . ................ . ....... 26 54 36
TTerreiroR ... ...... .................. ....... 23 56
Carpinteiros de carroças ..................... ....... 22 61 —
Correeiros ............................................. — 84 87

Luick indica a quota de estrangeiros, em algumas profissões, no ano de 1920


(107 p. 52).

Músicos ........................... 55% Pintores .......................................... 24%


Calceteiros ..................................... 43% Vidraceiros ..................................... 24%
Pedreiros e ajudantes .................. 37% Fotógrafos ................. 23%
Cervejeiros ..................................... 32%
Trabalhadores em cimento e gésso 23%
Cabeleireiros ................................ 30%
Ourives :.......................................... 28% Sapateiros ...................................... 22%
Alfaiates ........................................ 27% Marceneiros ................................... 20%
48 JeanUngrichi

orientação profissional21. Luick não se engana, pois, apon­


tando como causas da imigração: em primeiro lugar uma
orientação profissional que não se adapta às exigências da
nossa economia e que conduz à superlotação de certas profis­
sões, ao desemprêgo e à emigração; em segundo lugar as
profissões inadequadamente escolhidas, que tomam necessá­
ria a entrada de substitutos estrangeiros, ou seja a imigração.
Êle cita Delaquis22:
“A errónea orientação profissional da nova geração
suíça é evidente. Ela acarreta uma superlotação do
mercado de trabalho com trabalhadores suíços sem
aprendizado, e outros que fizeram aprendizagem
mas exercem profissões já sobrecarregadas. A su­
perlotação leva os suíços ao estrangeiro e o vácuo
deixado por êles exige a vinda de trabalhadores es­
trangeiros. E imprescindível uma completa reor­
ganização da orientação profissional”.

Observações complementares:
Todos os problemas que acabamos de mencionar, relacio­
nados com a profissão, estão hoje agravados com a redução
da idade dos trabalhadores.
Atravessamos épocas pobres em nascimentos, o que acar­
retou, mais tarde, um déficit de forças de trabalho. De 1935
a 1944 o total de estudantes que se diplomaram diminuiu de
1 000 por ano23, em média. Muitas profissões ficaram pre­
judicadas desde então, pela falta de elementos jovens. O
completo aproveitamento das fôrças de trabalho existentes
passou a ter uma importância capital. Mais do que nunca
deve ser evitado o esbanjamento dessas fôrças, com a escolha

21 O grande público teve a sua atenção despertada pela primeira vez para êste fato,
pelo trabalho de O. Hõhn, “Die Berufswahl” 68.
22 Delaquis, em artigo publicado no dia 7 de maio de 1928, no "Bund”.
23 Segundo notas estatísticas, o total de jovens com 15 anos incompletos era:

1935 ........... ........... 72 386 1940 ........... ........... 66 711


1936 ........... ........... 72 836 1941 ........... ........... 66164
1937 ........... .......... 68 683 1942 ........... ........... 64188
1938 ........... ........... 69 047 1943 ........... ........... 64 309
1939 ........... ........... 67 469 1944 ........... ........... 62 599
Escolha da Profissão 49

de profissões inadequadas e mudanças de profissão. E ain­


da mais: a nova geração — pequena em quantidade — pre­
cisa superar-se qualitativamente, no trabalho. Isto presume
que cada jovem encontre, na vida económica, o lugar para o
qual possui, no mais alto sentido da palavra, maior capaci­
dade. Num momento em que deve ser realizada uma grande
obra social de “seguro contra a velhice”, a diminuição de
trabalhadores jovens é duplamente pesada. Pois somente
quando a camada que produz é capaz de produzir suficiente­
mente, pode-se retirar dos rendimentos do seu trabalho meios
bastante para os que não produzem mais.
Já demonstramos fartamente que de uma escolha acer­
tada da profissão depende a rentabilidade e a capacidade
mais — ou menos — duradoura do trabalho. Se fizermos um
retrospecto dos problemas aqui ventilados, (observando cui­
dadosamente as ligações entre a economia e a escolha da
profissão) tomar-se-á evidente que:
uma redistribuição das profissões, e sua chave, a
escolha da profissão, é de enorme importância para
o bem-estar material de um povo.
2. Conexões político — sociais
A conexão existente entre a escolha da profissão e a
participação do elemento estrangeiro no trabalho (questão
que abordamos há pouco) afastou-nos do terreno da economia
para o da política social, demonstrando que a conduta social de
um povo é também influenciada pela escolha profissional. Mas
êste é um tema que vale a pena analisar mais profundamente.
a) Observações sôbre a família
Nesta oportunidade é natural dar-se conta da importância
da escolha profissional, para a família. Porém, nenhum ponto
de vista novo surge aqui; quando o profissional constitui fa­
mília, as consequências da escolha da profissão recaem obri­
gatoriamente sôbre esta, mormente quando a esposa necessita
contribuir também para a manutenção do lar. A família so­
fre, enfim, todas as influências (de efeito coletivo, como as
garantias da Previdência Social), do desemprêgo, da partici­
pação do elemento estrangeiro no trabalho, da emigração e
da divisão de classes, há pouco citadas como dependentes da
50 Jean Ungricht

escolha profissional, além de outras mais (ainda não aborda­


das) que seria inútil estudar apenas em relação à família. Des­
tacaremos, porém, alguns pontos principais. Tendo verificado
que a situação material do chefe de família (que não possui
fortuna) é claramente determinada pela profissão, deduzimos
que o futuro da família (isto é sua situação material) se ba­
seia na escolha profissional por êle feita. O destino da família
depende da sua decisão, não só quanto à alimentação, mora­
dia, saúde, vestuário, mas também quanto às possibilidades de
educação e cultura 24* . A escolha feita pelo pai influencia a es­
26
colha dos filhos, como mais tarde provaremos. Toma-se um
centro magnético que atrai fortemente os jovens para a mes­
ma classe social do pai, para o mesmo ramo de atividade e
até para a mesma profissão. Na educação dos filhos, a orien­
tação e o exemplo dos pais são de importância capital. Porém,
como foi explicado, êstes fatores entrosam-se, mais intima-
mente do que se supõe, com a atitude profissional. Seria pos­
sível imaginar como modêlo educativo um pai que enfrenta
a profissão com alheamento e má vontade, que trabalha so­
mente por obrigação, com desgôsto, e traz o seu aborrecimen­
to para o seio da família ou procura compensações fora dela
nos esportes, cinemas, clube ou no álcool? Não queremos di­
zer com isto que se o chefe de família sabe tomar atitudes
positivas na profissão, saberá fazê-lo, também, com eficiência,
em relação à família e aos seus deveres de educador. É no en­
tanto bem provável que a sua atitude negativa, contagiando a
família tôda, crie um ambiente contrário a uma vida familiar
feliz e a uma educação acertada. Finalmente, algumas profis­
sões (como por exemplo as de viajante, ferroviário, chofer)
tornam impossível uma verdadeira vida de família ou a des­
troem, seja em consequência de um horário de trabalho tão
variável que não admite ordem, nem regularidade, ou porque

24 Ê um êrro perigoso afirmar que a educação» a cultura e o nível cultural nada


têm a ver com o dinheiro, não se relacionando com as circunstâncias materiais, t
quê estão à altura dos nossos esforços. Criado para tranquilizar a consciência social,
êsse sofisma é compreensível teòricamente, mas não se enquadra na realidade. De
onde deve uma família, obrigada a lutar pela subsistência, tirar os meios, o tempo e
a disposição para educar-se, beneficiando-se com os tesouros da cultura? (Um bom
livro, por exemplo, representa muitas vêzes uma despesa fora do seu alcance. Se não
íòsse assim, teria a Sociedade de Difusão do Livro alcançado tanto sucesso com seus
preços baixos? E teria podido elevar o número dos seus sócios de 6 000 em 1934 para
26 000 dez anos mais tarde, e finalmente para 87 000 em 1944?). É o caso de perguntar,
também, se em alguma época da história a cultura estendeu-se à classe pobre.
Escolha da Profissão 51

os membros da família jamais se reúnem em virtude do traba­


lho noturno (por exemplo os guardas-noturnos, guardas-civis
ou operários que trabalham em turnos), seja ainda por causa
de longas e repetidas ausências (engenheiros, montadores, em­
pregados em emprêsas de transporte e turismo). Em poucas
palavras: do sucesso material e moral do trabalho profissio­
nal do pai (eventualmente da mãe) dependem, embora não ex­
clusivamente, a saúde, a situação material, os costumes, o
nível cultural, físico, espiritual e de educação, da família25.
b) Profissão e educação cívica
A educação cívica é problema muito sério para qualqucr
nação, e vital para a democracia. Por isso, diversos pedagogos
exigiram, reiteradas vêzes, que esta missão fosse confiada à
escola. As muitas experiências feitas de uns tempos para cá,
neste terreno, atestam a importância atribuída à questão. A
escola é capaz de solucioná-la direta e eficazmente? Eis aí uma
pergunta que deve ser feita com algum cepticismo. A atitude
da mocidade para com os assuntos cívicos é de uma assusta­
dora passividade, certamente porque êstes assuntos estão afas­
tados demais dos seus interêsses diretos, porque tratam de
questões abstratas e surgem na idade escolar, quando o conta­
to com a vida não é ainda real. Simplesmente por isso não po­
dem ser ouvidos em toda a sua importância. Não poderíamos
— parece-nos — encontrar melhor apoio para êste ponto de
vista do que no judicioso enunciado de Pestalozzi: age educa­
cionalmente, antes de tudo, aquilo que está mais próximo, o
que é concreto. Kerschensteiner26, que coloca a educação cívica
no centro da missão escolar, escolheu o caminho acertado
quando considera a escola profissional o meio mais eficiente
para chegar ao fim que nos propomos: i.° pelo preparo que
a educação profissional confere ao indivíduo; 2.° pela morali­
zação educativa de âmbito individual, e em 3.° lugar (como
fruto desta) pela moralização coletiva.
Apesar disto — penso eu — não pode a escola fazer mais25 *

25 Aqui cabe uma observação. Se até agora salientamos a importância da pro­


fissão em diversos setores da vida» não queremos dizer com isto que, ao lado dela,
não se desenvolvam também outros fatôres. Apenas, nestas observações» êles não fo­
ram considerados.
2$ Kerschenstei. .ner» “Der Begriff der Arbeitsschule” 84 pp. 17-22.
52 Jean Úngricht

que um trabalho preparatório, unicamente porque o aluno, co­


mo tal, ainda não está preparado para a seriedade da ma­
téria27.
A verdadeira instrução não se adquire na escola mas na
vida ativa, no trabalho28.
Lá onde os mais diversos problemas económicos, sociais
e culturais são vividos em completo entrosamento e interde­
pendência, isto é, no trabalho, cristaliza-se aquele conjunto de
pensamentos e atos que fazem da profissão um trampolim pa­
ra o completo desenvolvimento das aptidões naturais e adqui­
ridas. Rauecker29 externa um pensamento semelhante, afirman­
do: com a ética profissional amadurecem aquelas fôrças ina­
tas sem as quais é impossível ao indivíduo integrar-se e firmar-
-se, seja no matrimónio, na família, na sociedade ou na pátria.
No Congresso Trabalhista de Montreux30 foi exposto por
H. Stettbacher o seguinte tema: "A profissão não deve pro­
porcionar ao profissional e à sua família apenas os meios de
subsistência; ela deve ajudá-lo a cumprir sua verdadeira mis­
são, e tomar-se um membro válido da sociedade. Pela profis­
são acertadamente escolhida e exercida de modo adequado, co­
loca-se o profissional em posição de bem servir à coletividade.
A profissão transforma-se em ponto de convergência do des­
tino pessoal e do destino da comunidade"31.
Pelas conhecidas reações que o desemprêgo provoca, com­
prova-se que a satisfação oriunda do exercício da profissão
acertada pode conduzir a uma atitude positiva para com a
pátria, e que, ao contrário, o descontentamento na profissão
atinge fàcilmente todos os valores da vida, envenena a socie­
dade e impossibilita totalmente um desenvolvimento sadio.
O trabalho profissional e de maneira especial o aprendiza­
do (tomados como veículos de formação para o trabalho co­
letivo) são uma alta escola de vida em comum e principalmen­
te de comunidade na nação.

27 O que não quer dizer que, mesmo assim, a escola não deva procurar novas
soluções.
28 Veja as observações sôbre o efeito educacional do ensino profissional, p. 33.
29 Rauecker, “Die Berufsfreude im moderrien Wirtschaftsleben” 127 p. 55.
30 Convocado e organizado em abril de 1942 por E. Buchmann, o idealizado r do
nôvo sistema escolar de orientação profissional.
31 Stettbacher, “Beruf ais Bestimmung und Schicksal* 142 p. 365.
Escolha da Profissão 53

c) Ã escolha da profissão e a criminalidade


Entre a escolha da profissão e a criminalidade existem es­
tranhas relações. Infelizmente são escassas e superficiais as
pesquisas relativas ao assunto. Nos trabalhos que pude com­
pulsar encontrei somente informações esparsas e nenhuma in­
vestigação sistemática.
Antes de tudo é interessante perguntar se há profissões
que são de preferência escolhidas por pessoas com inclinação
para o crime. E em seguida: até que ponto (se houver uma
escolha profissional adequada) tais inclinações podem ser
socializadas e utilizadas em benefício da coletividade, por in­
termédio da profissão. Citemos o exemplo dos açougueiros
(abatedores de animais) que podem satisfazer seus instintos
sádicos de maneira útil, socia mente falando. Para mim não
há dúvida que, se muitos dos portadores destas tendências
anti-sociais escolhessem profissões em que, pela natureza do
trabalho, pudessem expandi-las dentro dos limites das exigên­
cias sociais, nunca mais sentiriam a necessidade de externá-
-las de modo criminal, pois êstes instintos teriam um desafogo
através — por assim dizer — do arejamento do trabalho pro­
fissional.
Neste sentido as pesquisas de Szondi e seus colaboradores
são revolucionárias32. Não só porque espalham luz sôbre as
ligações entre instinto-profissão, mas porque fornecem elemen­
tos para a diagnose e uma relativa orientação para a escolha
da profissão. Demos, com elas, um passo de certa importân­
cia em direção à profilaxia do crime.
Perguntaremos ainda: em que proporção inclinações para
o crime podem ser despertadas e fomentadas, através de de­
terminadas profissões? Referimo-nos principalmente aos erros
e crimes provocados antes pelas circunstâncias de “ambiente
e posição social” cabendo ao desemprêgo um papel predo­
minante do que pelos instintos elementares daqueles que os
cometem.
Porém ainda não ficou estabelecida uma clara dependên­
cia entre a profissão e a criminalidade. “Sendo certo que ne­
nhuma profissão exercem os desocupados, seria impossível
apontar uma delas como causa da vadiagem” (H. W. Gruh-

32 Szondi, “Schicksalsanalyse” 146.


54 Jean Ungricht

le)33. L. Gervai confirma: “Nenhuma influência específica


sôbre a criminalidade se pode em geral atribuir à indústria e
profissões congéneres"34. Nas estatísticas criminais encontra­
mos alguns dados que parecem responsabilizar em parte algu­
mas profissões (por exemplo as de padeiro, cabeleireiro, fer­
reiro, vendedor de gado, açougueiro, hoteleiro e agente de
turismo). Computar o número de delinquentes em cada pro­
fissão pouco adiantará, se não compararmos esse total com o
número de trabalhadores existentes nesse mesmo ramo pro­
fissional. Infelizmente essa comparação é, via de regra, omi­
tida, ou se baseia em material comparativo muito restrito.
Se conseguíssemos realizar uma pesquisa da qual se pu­
dessem inferir (com ajuda de volumoso material) dados
concludentes, teríamos uma relação das profissões se­
gundo o “grau de criminalidade”. Mesmo assim essa lista
não esclareceria se a profissão em si tem influência sôbre a
criminalidade ou se ela, através de certas características, exer­
ce simplesmente uma atração especial sôbre indivíduos com
inclinação para o crime.
Se a profissão perverte o profissional, ou se o indivíduo
com tendências más escolhe a profissão que mais lhe convém
— ou ainda em que medida os dois fatôres se fundem, são
perguntas que não podemos responder fàcilmente. Com a
cautela exigida (pois não dispomos de elementos básicos sufi­
cientes ) diríamos que a criminalidade é menor entre os traba­
lhadores que desempenham funções subalternas e que ela cres­
ce se a ocupação apresentar fatôres de inconstância e de inse­
gurança. A criminalidade é maior entre os camponeses, tare­
feiros, ajudantes, mensageiros, entre aquêies que têm pouca
instrução35.
Stauber opina: “A criminalidade é visivelmente maior en­
tre os que não têm instrução ou profissão. Êles sucumbem
mais depressa às tentações, do que os instruídos, e durante
33 Gruhle, HDie Ursaehen der jugendlichen Verwahrlosung und Kriminalitãt”
60 p. 108.
34 Gervai, “Die Beziehungen des Kindes und Jugendlichen zum Verbrechen”
54 p. 108.
35 Ver as tabelas de: Jud, “Ursaehen der Verwahrlosung und Kriminalitãt der
Jugendlichen” 81 pp. 42-45. Wittig, “Die Kriminalitât der Jugendlichen bis zum Jahr
1912” (nach der Reichskriminalstatistik) 153 pp. 535-542. Gruhle, "Die Ursaehen der
Jugendlichen Verwahrlosung und Kriminalitãt 60 pp. 104-108. Lombroso, "Die Ursa-
chen und Bekàmpfung des Verbrechens” 104 pp. 173-180. Stauber, "Die Beziehungen
zwisenen Beruf und Kriminalitãt 139 pp. 194-203.
Escolha da Profissão 55

uma crise encontram no seu trabalho menos apoio para reer-


guer-se. As autoridades agem, por isso, no sentido de acen­
tuar o valor do aprendizado profissional e se empenham em
torná-lo facilmente acessível aos jovens da classe operária. As
despesas com as bolsas concedidas pelo Govêmo são règia-
mente compensadas no futuro, aliviando o pesado encargo das
autoridades judiciais e poupando a inúmeras famílias muitas
preocupações e sofrimentos”36.
Um grande número de profissões que não exigem apren­
dizado conta com elementos de pouco valor social, pois o mêdo
do trabalho, a fuga dos compromissos e responsabilidades da
profissão são características da maior parte dos criminosos.
Esta não é, porém, uma conclusão definitiva. Entre o indiví­
duo e a profissão existe uma relação mútua, e sob a influên­
cia da aprendizagem muitos inadaptados poderiam adquirir
aquela formação complementar que disciplina e confere a pro­
funda firmeza indispensável a uma vida regrada. Também é
certo que o progresso material obtido na profissão acertada
diminui os motivos externos para ações proibidas; que as
tentações são menos frequentes; e que os fatôres de repressão
funcionam com mais presteza.
Seria necessário, ainda, averiguar se uma situação eco­
nómica desfavorável tem influência sôbre a criminalidade, e
em que grau. Lombroso já provou "a importância completa­
mente ocasional da verdadeira miséria” sôbre os pequenos
delitos,37 (mas também que a fraudulência aumenta com a
riqueza). Das pesquisas que efetuou resulta: “o fator econó­
mico, situações económicas, têm grande influência sôbre a
criminalidade. A miséria não é, porém, a sua causa principal,
pois é sabido que dinheiro demasiado ou o enriquecimento
rápido demais aumentam também a criminalidade; que tanto
a riqueza, quanto a miséria, têm muitas vêzes a sua ação obs­
tada pelos fatôres clima e raça”3839 .
Um interessante embora antigo trabalho de Meyer 36, rea­
lizado no Cantão de Zurique, mostra uma concordância cho­
cante entre a curva da criminalidade e o rendimento da co­
lheita e preço dos víveres. Os crimes aumentam na proporção
36 Stauber, *Die Zeziehungen zwxschen Beruí und Kriminalitãt 139 P. 202.
37 Lombroso, “Die Ursachen und Bekâmpíung des Verbrechens" 104 p. 107.
38 Derselbe, 104 p. 122.
39 Meyer, “Die Verbrechen in ihrem Zusammenhang mit den wirtschaftlichen und
sozialen Verhãltnissen im Kanton Zilrich” 115 pp. 30-34.
56 Jean Ungricht

em que sobem os preços dos gêneros de primeira necessidade.


Êste fato indica que muitos delitos são cometidos essencial­
mente sob a influência da miséria, ponto de vista que se
robustece ao constatarmos um aumento de ações punitivas
nas épocas de desemprêgo. Das estatísticas do Departamen­
to do Trabalho, de Berlim (1922-1923), verifica-se por exem­
plo que a criminalidade entre a juventude conta com um
maior contingente de jovens desempregados sem aprendiza­
gem profissional. Lazarsfeld40 cita uma estatística criminal
de Sieringer, segundo a qual em 1924, entre 94 jovens delin­
quentes, 12 estavam ainda em idade escolar, 30 tinham pro­
fissão e os outros 52 eram desempregados.
Liebenberg diz 41: as ocorrências do último inverno (quan­
do por exemplo em Berlim, entre 4 jovens de 14 a 18 anos um
era desempregado, e no Juizado de Menores dobraram os
processos por assassínio, roubo, desordem e desrespeito à lei
e à autoridade), mostram como, durante uma crise de desem­
prêgo nas capitais, os jovens correm perigos de ordem moral
e são impelidos para o crime e o embrutecimento. O núme­
ro de tutelados da Assistência Social (especialmente do sexo
feminino) aumentou de 160% em relação ao ano anterior... ”
O Comando Policial de Zurique declarou que essas mesmas
ocorrências podiam ser transpostas para o nosso país.
Uma pesquisa que investigasse a ligação da criminalidade
com a escolha profissional desacertada seria muito instruti­
va. É claro: aquêles que não seguem o caminho certo, não
têm afinidade com o seu trabalho e consideram a própria vi­
da um fracasso, mais facilmente propendem para (ações ar­
riscadas, que de um golpe os libertem da penosa situação.
Os muitos exemplos encontrados nas estatísticas criminais,
e os poucos citados na literatura42 existente, não bastam para
estabelecer uma posição definitiva nesta questão. Tive que
contentar-me com consultas ao Departamento de Polícia. Re­
sumindo, pode-se dizer, por conseguinte, que uma determi­
nada porcentagem de todos os delitos cometidos têm a sua
origem nas seguintes circunstâncias: l.° — nas tentações e
atrações proporcionadas, “a priori”, por certas profissões; 2.° —
na situação económica e social muito baixa de indivíduos sem

40 Lazarsfeld, “Jugend und Beruf" 93 p. 77.


41 Liebenberg, "Berufsberatung” 97 p. 89.
42 For exemplo, de Tõbben, “Die Jugendverwahrlosung und ihre Bekâmpfung*
148 p. 344.
Escolha da Profissão 57

aprendizagem profissional (e consequente falta de uma edu­


cação para a vida coletiva, através da profissão); 3.° — no
desemprêgo e no trabalho irregular; 4.° — na escolha profis­
sional errada.
Nas páginas anteriores mostramos que, de nenhum modo
sofrem uma influência constante aquêles que não fizeram
aprendizagem, os desempregados ou os que escolhem profis­
sões inadequadas, mas que, em determinadas fases da escolha
profissional, podem ser consideràvelmente influenciados. Se
nos lembrarmos, também, que os indivíduos com propensão
para o crime podem ser afastados de profissões desfavorá­
veis, ou encaminhados para um trabalho que lhes permita
satisfazer parcialmente suas tendências criminais (de um mo­
do útil socialmente falando), não julgaremos pouco impor­
tante a escolha da profissão, em relação à criminalidade.
A escolha profissional acertadamente orientada aparece,
assim, como fator importante na prevenção e redução da
criminalidade.
d) Outras ligações entre profissão e estabilidade social
O homem sofre constantemente um impulso interno para
a ação. Êste impulso é tanto mais imperioso quanto mais inti-
mamente ligado aos sentimentos de defesa, poder e sexo. De
acôrdo com o modo de satisfazê-lo (que varia entre a mais
grosseira exteriorização do instinto e a sua mais alta sublima­
ção) êsse impulso obriga o indivíduo a cuidar da sua própria
conservação e desenvolvimento, a ocupar-se, a afirmar-se, a
agir e a realizar. Em grande parte isto tudo se torna possível
pelo trabalho. E se não o fosse, se, por exemplo, grande parte do
trabalho humano, substituído pela máquina, se tomasse um
dia supérfluo, desnecessário, sem que se criasse uma adequa­
da compensação, as consequências seriam imprevisíveis. Es­
ta perspectiva motivou a afirmação de K. Dunkmann: a
humanidade estaria em perigo e na iminência de uma catás­
trofe inimaginável43, se utilizando (por meio da técnica e das
ciências naturais) as energias cósmicas e as fôrças elementa­
res da natureza, tomasse desnecessário o trabalho de suas
mãos.
Porém, nem todos os trabalhos facultam a expansão dês-
ses impulsos e de outras tendências e aspirações. O trabalho

43 Dunkmann, “Soziologie der Arbeit” 43 p. 97.


58 Jean Un.01 icht

adequado é o que corresponde às características especiais do in­


divíduo. Quanto mais cedo e em maior número encontram os
homens um trabalho adequado, mais estáveis interiormente
se tornam êles, e ao mesmo tempo menos vulneráveis às in­
fluências que poderiam modificá-los.
A esta conclusão chega não somente o sociólogo, mas
também o psicólogo que se ocupa especialmente com a vida
interior do homem. Material interessante apresenta Szondi44,
que toma por base de suas pesquisas justamente a profissão
como meio de satisfação, derivação, socialização ou enobre­
cimento das necessidades naturais, que exercem seu efeito nas
camadas mais profundas da vida instintiva.
A profissão é o canal normal da atividade humana. Assim
sendo, quanto mais cedo conseguirem os homens ocupações
que correspondam às suas características pessoais, maiores
possibilidades de desenvolvimento proporcionarão as profis­
sões.
Têm valor, por isso, as palavras de E. Jucker,
quanto mais variadas forem as profissões exercidas,
mais estável será uma nação.
X
P. Hertli45 disse o mesmo, negativamente: quando os
homens não estão nos lugares certos, um povo enfraquece.
Esta observação sôbre a estabilidade psíquica de um povo
através da diferenciação profissional, se aplica também em
sentido económico (não nos referimos a um estado agrário,
que se mantém por si mesmo) pois se evitarmos a aglomera­
ção de certas profissões, os trabalhadores se espalharão por
um maior número de ramos profissionais e maior será a se­
gurança contra as crises e depressões económicas, sejam quais
forem as suas causas. Portanto: quanto mais vasta fôr a
diversidade profissional, mais estável será a economia e so­
bretudo a situação material de uma nação. Anàlogamente,
quanto mais variado fôr o sistema de vedação de um navio,
mais seguro estará êle46.
Esta estabilidade interna conferida ao trabalhador por
uma ocupação satisfatória (que só se torna possível se existir

44 tízondi, “Schicksaisanalyse" 146 pp. 185-267, 271.


45 Hertli, “Erziehung zur Beruíswahlreife” 65.
46 Esta comparação não é acertada, pois as diversas profissões têm entre ai muitas
ligações.
Escolha da Profissão 59

uma grande diversidade de profissões à sua escolha) é ainda


aumentada pela separação que ela estabelece. Dessa separação
nasce o sentimento de diferenciação, de individualidade, de
personalidade. Esta separação dificulta a formação de “ver­
dadeiras massas" e diminui a influência "por sugestão das
massas", (um dos temas básicos da História Universal). Movi­
mentos de massas e principalmente tendências demagógicas,
encontram poucos adeptos entre os indivíduos profissional­
mente estabilizados. Seria necessário provar que ação de
massas, correntes extremistas e revoluções são iniciadas e
alimentadas por insatisfeitos; e que tais movimentos nunca
se originam entre agricultores (protótipo do estabilizado pro­
fissional) ou são por êles fomentados? São exceções os casos
em que pressões externas, espoliando-os do lucro do seu tra­
balho, os impelem à revolta. Disto tudo podemos tirar con­
clusões sôbre a causa das guerras, excluindo-se a verdadeira
luta porque ela é sempre a reação a um ataque. Mas também
ela só é possível quando os convocados para defesa da Pátria
vão defender valores que justificam o sacrifício, o que, de
certo modo, tem ligações com um padrão de vida satisfatório
e, portanto, com a profissão.
Se numa guerra os atacantes têm muitos motivos para o
ataque, existe entretanto uma condição sem a qual êle nunca
se produziria: a prontidão das massas em responder ao
apêlo.
Rõpke mostrou, há pouco tempo47, até que ponto as con­
dições sociais são, ou não, um obstáculo para a guerra. Às de­
ficiências da vida em tempo de paz êle atribui a procura de
uma compensação por meio de movimentos militares. E a
insatisfação que êles revelam tem como causas, geralmente, a
dependência profissional, o trabalho monótono, as indústrias
gigantescas e a aglomeração dos grandes centros.
Da mesma forma E. Jucker acredita que a insatisfação
profissional é uma das ainda existentes causas da guerra. E
mais,
que através da escolha profissional, aliás, quase ex­
clusivamente através dela, é também determinada a
posição social.
Ela é definida pelas próprias circunstâncias materiais da

47 Rõpke, ”Warum Krieg?” 139.


60 Jean Ungricht

profissão, e mais ainda pelo seu espírito, suas exigências e a


organização e orientação do grupo profissional.
Em linhas gerais, pela escolha da profissão é delimitado
o número de cidadãos que integra cada classe de uma nação.
Os seus dirigentes não podem, por isso, olhar com indiferença
essa escolha, uma vez que cada classe tem sua atitude própria
para com o govêrno, com as consequências resultantes dela.
Aquêles que pertencem à classe capitalista dependem an­
tes da fortuna herdada, que da profissão escolhida. A escolha
profissional só tem influência se permitir a aquisição de ca­
pitais maiores, como acontece com os comerciantes e quase
sòmente com êles. O contrário se dá com o proletariado e a
classe média.
Se lançarmos um rápido olhar sôbre a história da luta
de classes, verificaremos que a coexistência de um proletariado
numeroso, em geral efervescente, com uma classe média
subdividida em duas correntes, uma delas dependente e a ou­
tra independente, conservadora e unida, tem um significado
decisivo para a nação.
Surge novamente, aqui, o problema da guerra e o da cul­
tura, desta vez em sua ligação com as classes sociais. Aristó-
teles já reconhecia, nesta associação, a importância de uma
classe média florescente48.
Marbach cita Herkner, e êste afirma que os períodos mais
positivos e construtivos da história da humanidade coinci­
dem com a existência de uma numerosa classe média 49. W.
Rõpke considera a ligação do proletariado das grandes capi­
tais com a tradição feudal da indústria pesada, o verdadeiro
solo produtor da guerra psicológica das massas. Os campo­
neses, enraizados, e a classe média, são menos acessíveis às
agitações militar-nacionalistas.
Assim, é construída uma larga ponte de ligação entre a
escolha profissional (nosso ponto de partida) e os aspectos

48 Aristóteles, “Politik” 4 (Livro IV, Cap. IX> ns. 6, 8, 9), em traduãç loameã).
“6. Numa nação deve existir, tanto quanto possível, perfeita igualdade para todos,
e esta condição é melhor preenchida pela ciasse média. Ê, pois, necessário propor­
cionar uma organização perfeita à classe que constitui a base natural da nação...
8. A sociedade burguesa constituída pela classe média é evidentemente a melhor,
e os países em que ela é mais numerosa e mais forte (possivelmente que ambas ou
que cada uma das duas outras classes) gozam de uma boa administração ...
9. Um país onde a classe média predomina está menos sujeito a revoltas, divisões
e lutas políticas.. .7
49 Marbach, “Theorie des Mittelstandes” 109 p. 62.
Escolha da Profissão 61

mais importantes da vida social do homem. Se existem entre


êles muitos fatôres que desempenham o seu próprio papel mais
ou menos importante, e que estão sujeitos às suas próprias
leis, uma cousa é certa:
o ato da escolha da profissão tem uma importân­
cia essencial para a cultura e para tôda a humani­
dade.
III — RESUMO
Podemos resumir da seguinte forma os resultados obtidos:
A escolha da profissão é ato importantíssimo para
o indivíduo; supera em importância qualquer outra
decisão, pois abrange ao mesmo tempo o ambiente
de vida, as possibilidades internas e externas de de­
senvolvimento, as circunstâncias materiais, as pro­
babilidades de progresso, o nível cultural, a duração
da saúde, as futuras circunstâncias familiares, a de­
pendência ou independência profissional, a posi­
ção social. A escolha da profissão determina o de­
senvolvimento da personalidade, e seus efeitos se
estendem a quase todos os setores da vida. A pro­
fissão é a base do bem-estar e fonte principal de
felicidade ou infelicidade, contentamento ou des­
contentamento. “A escolha da profissão é a esco­
lha da própria vida”50. E ainda mais: não é uma
questão afeta somente ao indivíduo e à sua fa­
mília, pois repercute profundamente na comunidade
e na sociedade das quais êle faz parte; tem ação
sôbre a vida económica e social em todos os seus
aspectos, principalmente em relação ao trabalho e
ganho, tanto nas profissões individuais como nas
coletivas, sôbre o desemprêgo, a imigração e a emi­
gração; finalmente sôbre a posição do país no mer­
cado mundial. A escolha profissional determina em
grau extenso a posição social do indivíduo, sua ati­
tude para com a sociedade e a pátria e constitui,
principalmente, o ponto de partida da sua integra­
ção na coletividade. Acima de tudo, a estabilidade
da nação está inteiramente ligada à escolha profis­
sional acertada.
SO B. Stora cita Wyenbergh em °8chule und Beruísberatung® 155 p. 10.
62 JeanUngricht

Questões vitais para a nação são decididas no momento


da escolha da profissão. Por isso ela se toma um centro de
reações que podem ser ativadas ou evitadas. Nós compreen­
demos Fellenberg, que afirmava (já na época de Pestalozzi):
"... todos os setores de desenvolvimento (de um povo) de­
pendem em grande parte da situação profissional...”51.
A escolha profissional desencadeia consequências de uma
profunda lógica, é um processo irreversível, que uma vez em
andamento se desenrola segundo leis próprias e um sistema
determinado. Dado um passo, não é possível retroceder, nem
no que diz respeito ao destino pessoal, nem quanto aos seus
efeitos sôbre a sociedade.
*
* *
A tríplice ligação que ela estabelece entre o indivíduo e
a sociedade é que confere ao fenômeno "profissão” uma tão
extraordinária importância sociológica.
Dentro e através da profissão, o indivíduo identifica-se
com o meio social, em três diferentes planos. Em primeiro
lugar no plano económico: o trabalho profissional é o cami­
nho para conquistar meios de vida, segurança e progresso.
Com poucas exceções, esta é uma regra geral para todos os
homens do nosso nível cultural. Citado ou não, vale o lema:
"quem não trabalha não deve também comer”. A profissão
continua sendo a base material da existência. Em "sentido
psicológico”, ela oferece ao indivíduo maiores possibilidades
de satisfazer um grande número de necessidades pessoais, que
de um modo ou de outro devem ser satisfeitas, e que pela pro­
fissão podem chegar à expansão de uma maneira acertada —
senão aceitável, socialmente falando.
Em geral, quanto maior fôr a ambição de progredir na
profissão, maior será o sucesso profissional, material e moral.
Na mesma medida a projeção e o enraizamento na sociedade.
O fato mais importante é que, através da profissão, tôdas
as aspirações podem ser satisfeitas, principalmente no que
diz respeito à capacidade individual pois o profissional está
em contato permanente com os colegas, cuja competência êle
pode e deve comparar com a sua.

51 Fehenberg, “Der dreimonatige BHdungskurs” 186 p. 176, citado por Schmied


em “Phílipp Emanuel von Fellenberg\
Escolha da Profissão 63

Finalmente estas relações materiais e psíquicas criam (so-


ciològicamente) múltiplas ligações, em parte forçadas, em par­
te livremente escolhidas, com a comunidade.
Êste conjunto de relações forma um conglomerado impe­
netrável de ligações sentimentais e intelectuais. O profissio­
nal é envolvido numa rêde de malhas invisíveis e "arrastado
pela coletividade”. Que êle seja dêste modo arrebatado pela
profissão, é bom. As outras formas sociais que podem igual­
mente prender (família, igreja, comunidade etc.) com a cres­
cente e generalizada desintegração da cultura, perdem cada
vez mais a sua capacidade de apoio, principalmente porque o
gradual afastamento do homem, das leis básicas da vida,
agrava o desenraizamento da existência. O fato de pertencer
à profissão acertada pode ajudá-lo, muito mais do que se su­
põe, a superar êsse sentimento de desamparo.
Sob qualquer um destes três aspectos a profissão se revela
um fator de importância incomum para a vida social; pelas
múltiplas relações citadas, o indivíduo é ligado à sociedade,
enraizado nela com uma intensidade que não se verifica em
nenhuma outra circunstância. Além disto estas diversas liga­
ções se entrosam, se fundem, o que faz da profissão um caso
singular. Se já por êles mesmos os laços sociais são nor­
malmente múltiplos, atráves do entrosamento desta tríplice
identificação cria-se uma forma de relação incrivelmente
densa, uma rêde de malhas multidirecionais que liga o indi­
víduo à sociedade com a firmeza de uma âncora; êste rico
e complexo entrosamento iniciado e completado pela profis­
são, faz dela um verdadeiro fenômeno social, e da escolha
profissional uma genuína isca, cuja importância não se pode
calcular com exatidão.
SEGUNDA PARTE

FATÔRES PERIFÉRICOS DA ESCOLHA


PROFISSIONAL

As vastas consequências da escolha profissional e sua ex­


traordinária importância para o indivíduo e para a sociedade,
levam-nos a indagar quais são os fatores que influenciam esta
decisão, em que grau o fazem, e quais são os mais favoráveis
a ela.

Devemos averiguar, pois, até que ponto a escolha da


profissão depende de um exame judicioso do pro­
blema?
É difícil responder. Onde encontraremos provas para o
julgamento e qual o valor delas? Tentaremos alguns dos di­
versos métodos de pesquisa e dos resultados obtidos desta­
caremos em primeiro lugar os fatores que sofrem influên­
cia externa1, em seguida os que podem ser alterados. São,
por isso, chamados “fatores periféricos da escolha profissional”,
nal".

I — MATERIAL E MÉTODOS DE PESQUISA


1. Levantamentos sistemáticos
a) Inquirição direta de aprendizes e trabalhadores em
atividade
Pode-se fazer aos aprendizes e profissionais a seguinte
pergunta: por quê escolheu a sua profissão? Êste método pa­
rece ser o melhor, supondo-se que o interrogado tenha uma

1 o papel da hereditariedade, por exemplo, cuja influência certamente é grande e


não pode ser desprezada, não cabe aqui mas deve ser objeto de um exame especial.
5
66 Jean Ungricht

verdadeira e não suposta compreensão das causas da esco­


lha. Mas isto raramente acontece. A escolha profissional é
uma decisão tão complexa, que devemos ter grande capaci­
dade de análise e percepção muito aguda, para penetrar a uma
profundidade razoável nêsse emaranhado, decidindo depois
não apenas com base em fatores superficiais.
Em primeiro lugar o indivíduo sofre influências das
quais não tem consciência. Escolhas são sempre instintiva­
mente condicionadas e pelo menos uma das causas da es­
colha é fundamentada no instinto. Quem escolhe reconhece
êste fato? Dificilmente. Na psicanálise os seus motivos se­
riam tidos como contrários à razão. Raras vêzes são também
reconhecidos os efeitos da tradição, das avaliações e valo­
res hereditários, a surda pressão do meio social, a influên­
cia de sugestões de tôda espécie. Aquêle que é bem sucedido
muito raramente atribui o fato a circunstâncias externas.
São sempre as suas qualidades a causa do sucesso. Num
retrospecto êle se persuadirá que a boa escolha profissional
teve por motivc^a própria capacidade, seu amor pela profis­
são e coisas semelhantes. A culpa do fracasso, ao contrário,
cabe às circunstâncias materiais ou a situações desfavoráveis.
O homem .raras vêzes é bastante objetivo e capaz de respon­
sabilizar-se pelas suas falhas 2.
O mecanismo de identificação, projeção e sobretudo de
participação do inconsciente nas respostas, invalida em par­
te êsses inquéritos. Seria necessário anular a desfiguração
dos resultados obtidos, por um trabalho posterior. Não há
nenhuma probabilidade disso nos inquéritos respondidos por
escrito. A correção por meio de um interrogatório oral po­
deria alcançar algum sucesso, pressuposta a indispensável
competência do pesquisador. Embora seja o único caminho
acertado para responder à pergunta focalizada neste capítulo,
não sei de nenhuma pesquisa (naturalmente demorada) nesse
sentido. Somente quando — por qualquer motivo como por
exemplo "mudança de profissão” — o trabalhador procura
o especialista, seja êle médico, psicólogo, psicanalista ou
orientador profissional, é que se dá, espontâneamente, a opor­
tunidade para uma averiguação exata, na qual todos os fato­
res externos e internos que . pesaram na escolha da profissão
são analisados conjuntamente. Porém, nenhum estudo com­
pleto, realizado desta maneira foi ainda publicado porque:
2 V. Pulver, “Person, Charakter, Schicksal” 126 pp. 17-26, 87-103.
Escolha da Profissão 67

o interrogatório direto, sem a oportunidade de uma


análise mais profunda, não dá informação segura
sobre os fatores que realmente influenciam a es­
colha profissional;
pode, no máximo, mostrar o efeito dêstes fatores sobre a
consciência do analisado. Todavia, adequadamente estudado,
êsse material fornecerá importantes resultados indiretos (V.
adiante o "método indireto”).
A posição intermediária entre os interrogatórios escrito
e oral é o "diário” (anotações feitas diariamente pelo próprio
paciente), método desenvolvido por Ch. Bíihler3 para a pes­
quisa entre os jovens. Êste método dá ao pesquisador com­
petente uma visão mais ampla. Fica, porém, na dependência
da produção espontânea do paciente, que pode falhar. Seria,
em todo caso, um auxílio de valor para o nosso trabalho. In-
felizmente, uma pesquisa desta espécie, embora prometida, não
foi posta ao meu alcance. Terá ficado só em promessa?4
b) Motivos diretos da escolha profissional de estudantes
0 interrogatório de estudantes oferece mais uma possi­
bilidade de pesquisa; (pergunta: o que gostaria de ser e
porque?).
Muito pouco se pode obter dêstes inquéritos. Êles deixa­
riam maiores dúvidas que os precedentes, diz P. Lazarsfeid5,
sem levar em conta a grande dificuldade de aproveitar um
material de tão vastas proporções, que poderia ser classifica­
do sob as mais diversas rubricas, resultando em deformação.
Pois muitos colegiais não conseguem ainda expressar clara­
mente os seus desejos, na maior parte das vêzes superficiais,
tão frágeis e passageiros que, embora interessantes, não se­
riam bastante convincentes para justificar uma escolha pro­
fissional definitiva. Mesmo entre aquêles que tendo sofrido
as mais rudes desilusões da puberdade alcançaram uma pre­
coce maturidade, em vez de responsabilidade para consigo
mesmo e um alto grau de compreensão, encontramos desejos

3 Buhler, “Zwei Knabentagebiicher. Einleitung uber die Bedeutung des Tagebucher


fur die Jugendpsychologie” 38.
Veja-se a seguir o estudo em seu vasto diário,
4 Berger, "Der Beruf im Tagebuch” 16.
5 Lazarsfeid “Jugend und Beruf” 93 pp. 21-24.
68 Jean Ungricht

confusos e vacilantes. E contudo sua escolha se limita ao


círculo restrito das disciplinas acadêmicas6.
Um volumoso material desta espécie (27 000 extensos re­
latórios de escolares entre 11 e 14 anos) foi aproveitado por
Th. Friedrich, W.P. Voigt e colaboradores, de diversas ma­
neiras7. A êste, como a todos os outros trabalhos semelhantes,
aplicam-se as mesmas restrições:
com referência à futura profissão, nenhuma infor­
mação positiva se obtém do interrogatório de esco­
lares, quando os resultados desse inquérito são apro­
veitados diretamente, sem uma análise mais pro­
funda .
São, portanto, dispensáveis outros comentários sobre o as­
sunto .
c) Um método indireto: procura uma relação entre a es­
colha profissional e fatores externos, objetivos
Um outro meio (além da auto-análise) para chegar ao
conhecimento dos motivos da escolha profissional, é a
valorização indireta dos dados conseguidos através
de inquéritos em que se procura, com ajuda da es­
tatística, relacionar com fatores externos a escolha
profissional já efetuada, para descobrir dependên­
cias porventura existentes.
O mesmo pode ser feito, também, com a indicação dos
motivos da escolha. Porém, assim, tomaremos conhecimen­
to apenas dos fatos que despertaram o desejo de escolher
uma determinada profissão. A escolha, propriamente, só se
confirmará mais tarde, se corresponder a êsses motivos.
As pesquisas já citadas, feitas por Lazarsfeld e colabo­
radores 8, são exemplares e devem, por isso, ser amplamente
aproveitadas aqui. Delas e de outros trabalhos citamos os
resultados mais importantes.

6 A respeito dessas influências externas, Lazarsfeld cita P. Haas, que inquiriu 117
aprendizes de DUsseldorf sôbre os seus planos relativos à profissão, recebendo respostas
diferentes numa porcentagem de 27%. - Depois de assentada a escolha definitiva veri­
ficou-se uma alteração para 46%, 93 p. 14. A instabilidade na escolha não poderia
ser mais impressionante.
7 Friedrich e Voigt, “Berufswiinsche und Zukunftsplãne.53.
8 Lazarsfeld, "Jugend und Beruf” 93.
Escolha da Profissão 69

Nas pesquisas efetuadas com a colaboração de Furtmúl-


ler, Lazarsfeid concluiu que em relação à escolha da profis­
são as preferências da juventude, nos grandes centros, refle­
tem claramente a situação económica dessas cidades e sofrem
flutuações quase constantes, correspondentes a atrações e re­
pulsões condicionadas ao desenvolvimento psicológico.
Em consequência, deduzimos que os pronunciamentos es­
pontâneos dos jovens são essencialmente um reflexo do am­
biente económico-profissional9. Esta constatação prova que a
assim chamada “livre escolha” profissional é fortemente mo­
dificada pelas circunstâncias económicas, o que pode ser em
parte tomado como uma sadia adaptação à realidade .A in­
fluência exercida pela posição social do indivíduo, e em me­
nor escala pela profissão paterna, confirma esta assertiva.
Lazarsfeid1011verificou que 10% de todos os jovens diplomados
de 14 anos de idade seguem a profissão do pai. Depois dêle,
chegaram ao mesmo resultado: Skubich (material: 8 000
aprendizes de Magdeburg); F. Baumgarten (material: crian­
ças de 235 escolas públicas de Berlim); Menne (material:
4 800 jovens que aguardavam trabalho, em Munique) en­
quanto que Kretschmar indica uma média de 3%, apenas.
Dividindo-se o material coletado por Skubich em grupos pro­
fissionais, obtém-se para os ajudantes de trabalhadores uma
média de 31%. E. Bernays11 prova que 12,7% dos interroga­
dos escolhera a sua profissão somente porque seus pais ou
irmãos a exerciam também. Considerando-se o grupo profis­
sional em vez da profissão isolada, foi encontrada uma con­
cordância de 25% entre as profissões de pais e filhos.
Skubich fala, neste caso, de profissões tradicionais, isto
é: os filhos, por tradição, escolhem muitas vêzes a profissão
do pai (coeficiente: 25 a 28%); e de profissões sem tradição:
os pais daqueles que as escolheram exerciam outras profis­
sões, (coeficiente: 0 a 8%). Baseando-se nos resultados de
suas próprias pesquisas, Lazarsfeid chega à sua conhecida
conclusão: "Quanto mais um grupo é oprimido socialmente,
menos ampla e desde logo mais modesta é a escolha profis­

9 Lazarsfeid e Furtmuller, “Die Berufswahl der Lehrlinge in deutschen Stâdten”


95 p. 7.
19 Lazarsfeid, “Jugend und Beruf” 93 pp. 16-20.
11 Bernays, “Auslese und Anpassung der Arbeiterschaft in der geschlossenen Gros-
sindustrie” 17 p. 105.
70 Jean Ungricht

sional de seus filhos"12. Dificuldades materiais acarretam,


sem dúvida, um estreitamento da visão.
F. Baumgarten confirma esta regra, tomando por base
as pesquisas que efetuou entre alunos de escolas públicas de
Berlim13. Ela (a regra) diz ela, confirma seguramente que
esta estreiteza de vistas é apenas uma consequência da si­
tuação material; geralmente a necessidade de renunciar à
profissão escolhida tem por causa motivos financeiros (e po­
demos imaginar, embora sem comprová-lo, quantas voca­
ções profissionais são sufocadas ainda em germe). Uma li­
mitação semelhante se verifica até mesmo entre os filhos de
professores acadêmicos e determina a escolha de médicos e
juristas, que muitas vêzes sucedem a seus pais e o fazem
somente, ou principalmente, na expectativa de uma segura fon­
te de renda. (Aqui não está em jôgo apenas este motivo de
ordem financeira. Quem se ocupa com a escolha profissio­
nal daqueles que já têm maturidade observará que os pre­
conceitos sociais opõem-se como forte obstáculo às profissões
não acadêmicas. Outras possibilidades, além do estudo, sim­
plesmente não entram em cogitação).
Nas pesquisas conjuntas de Lazarsfeld aparece um tra­
balho de K. Reininger1415 que investiga as aspirações profissio­
nais de alunos do curso primário (973 meninos e 1 274 me­
ninas de 12 a 14 anos). Êle verificou que 8% dos meninos
segue a profissão do pai, e 30% o mesmo grupo profissional..
Se nesta pesquisa se mencionassem também grupos profis­
sionais, e não só profissão dos pais, a porcentagem de 30%
teria sido confirmada ou superada. Pelas tabelas de P.
Buchner13, na Suíça 23% dos professôres de ginásio são fi­
lhos de professôres; 36%, filhos de professôres acadêmicos.
Em uma outra classificação, os pais dos professôres de gi­
násio são em 42% funcionários.
P. Hoffmann16 apresenta um bonito quadro que escla­
rece a relação entre a escolha profissional e a profissão pa­
terna. 46% dos filhos de comerciantes tornam-se comercian­
tes; 40% dos funcionários são filhos de funcionários. Os fu­
turos comerciantes descendem, em 37%, de famílias de co­

12 Lazarsfeld, “Jugend und Beruf" 93 p. 19.


13 Baumgarten, "Berufswunsche und Lieblingsfàcher... 9 pp. 64-73.
14 Lazarsfeld, “Jugend und Beruf” 93 pp. 101-130.
15 Buchner, “Dér Nachwuchs der Gymnasiallehrer in der Schweiz” 33 p. 34.
16 Hoffmann, “Die Berufsentscheidung beim 16-Jàhrigen" 67 p. 295.
Escolha da Profissão 71

merciantes e os futuros funcionários pertencem, em 36%, a


famílias de funcionários. (Base de comparação: 26% de to­
dos os inquiridos escolheram a profissão de negociante e 21%
a carreira de funcionário).
Do levantamento especial feito em 1935 pelo Departa­
mento de Estatística entre os estudantes de escolas superio­
res da Suíça, resulta "que existe uma decidida propensão dos
filhos pelas matérias estudadas por seus pais ou por outras
semelhantes”. Vemos isso, distintamente, entre os químicos,
professores, tabeliães, médicos, dentistas, farmacêuticos, en­
genheiros, arquitetos e geômetros. Em números redondos:
um terço ou a metade dos estudantes que vêm dêsses círcu­
los fazem estudos correspondentes à profissão do pai17.
Th. Neumann18 apresenta alguns dados (ainda não men­
cionados aqui) sôbre as aspirações de aproximádamente 4 000
jovens que estiveram no Departamento de Orientação Profis­
sional de Viena (entre os meses de maio a dezembro de 1922)
para serem orientados. Mostram claramente quão forte é a
influência da situação económica da família sôbre a esco­
lha dos estudos, e desta sôbre a escolha profissional; portan­
to, a vocação profissional é influenciada antes de nascer e
não se pode falar em verdadeira liberdade de escolha.
*
* 4c

Números e experiências semelhantes poderiam ser co­


lhidos ad libitum em todos os Departamentos de Orientação
Profissional. Os resultados talvez não coincidissem dada a
diversidade de região e época. Mas em um ponto concorda­
riam, sem dúvida. Diriam que:
sôbre a escolha da profissão têm influência decisi­
va a situação económica da família e a profissão
paterna.
Os exemplos citados são suficientes para justificar as se­
guintes afirmações de alguns autores que escolhemos dentre
muitos: K. Búcher19 acha que o homem é atraído, não para

17 Eidg.stat.Amt, “Die Studierenden an schweiz. Hochschulen” 162 p. 22.


18 Neumann, “Berulsberatung” 117 pp. 2-4, 45-47.
19 Bíicher, “Die Entstehung der Volkswirtschaft" 35 p. 157.
72 Jean Ungricht

uma determinada profissão, mas para a classe profissional de


que sua família faz parte, e que a decantada liberdade de es­
colha é muito limitada.
Em explanação digna de leitura, afirma P. Lotmar20 : so­
mente uma pequena parte dos indivíduos poderia fazer livre­
mente essa escolha; a grande maioria seria incapaz de esco­
lher, baseando-se no seu talento e inclinação.
W. Luick21 conclui que a maior parte dos homens tem
de aprender a exercer uma profissão, sem liberdade de escolha,
mas este fator só poderia ser confirmado se existisse realmen­
te a possibilidade de escolher.
A. Liechti 22 acompanha W. Luick, quando diz que a pres­
são económica do capitalismo impede a livre escolha da pro­
fissão, direito assegurado a todos, politicamente falando. Ela
pode realizar-se no máximo dentro da classe social a que per­
tence o candidato a emprêgo; e aqui nos defrontamos com
uma injustiça que não se justifica nos tempos de hoje.
Se um Governo pretende ser (mais que “de direi­
to”) um Govêmo social, terá de resolver o proble­
ma, garantindo a todos os cidadãos a livre escolha
de sua futura profissão, não só “de direito” mas
também “de fato”.
2. Experiências dos orientadores profissionais
• > ' r1 * >
O exame das causas e dos resultados da escolha profis­
sional ficaria incompleto se não levássemos em conta as ex­
periências dos orientadores profissionais. Êles se incluem
geralmente entre os práticos, que por excesso de trabalho
quase não dispõem de tempo para estatísticas ou anotações
científicas. Porém em quantidade nem sempre são necessários
números; o essencial pode ser demonstrado com um único
exemplo. Quando certas experiências se repetem sempre em
épocas e lugares diversos, e são sempre constatadas por pessoas
diferentes, pode-se tirar conclusões baseadas na frequência
dessas ocorrências.

20 Lotmar, “Die Freiheít der Berufswahl” 105 p. 30.


21 Luick, “Der berufliche Nachwuchs in der Schweiz” 107 p. 18 (citamos também
aqui Biicher e Lotmar).
22 Liechti, “Probleme des Berufs” 99 pp. 55-56.
Escolha da Profissão 73

O material de que dispõem os orientadores profissionais


é único em sua categoria. Ninguém mais pode (e deve!)
acompanhar com tanta exatidão o nascimento e a mudança
das aspirações profissionais, estudá-las na fonte e discriminar,
tanto quanto possível, os seus fatores. A consulta proporciona
ao orientador o contato pessoal com o consulente e lhe dá a
oportunidade (postas de lado as desfigurações de julgamento
dos candidatos) de examinar os fatores encontrados segundo
o seu valor, avaliando também a sua autenticidade e a sua
utilidade. Realiza-se, pois, nessa ocasião, uma análise parcial
da personalidade que pode dar, acima de tudo, uma clara
visão do problema. Constatamos, assim, o valor essencial das
experiências do orientador profissional, ainda que raras vêzes
sejam expressas sistemàticamente ou cientificamente. O mes­
mo diremos das informações dos médicos, psicólogos, pedago­
gos, que adotando métodos práticos e científicos, se preocupam
com a escolha profissional de seus clientes, alunos e outras
pessoas que lhes pedem conselhos. A estas informações deve­
mos atribuir maior importância que a todos os inquéritos e
levantamentos similares, pois êstes, por sua própria natureza,
ficam à superfície e não permitem um aprofundamento. As
exposições que vêm a seguir têm apoio em leituras, informa­
ções, e na própria experiência.
a) Valorização da profissão em relação à posição social
e ao progresso material
A valorização da profissão é de suma importância. Cada
indivíduo vê a profissão de maneira pessoal e diferente. Para
uns a imagem é bem clara; para outros, mais vaga; e difere
sempre, de profissão para profissão. Há casos em que nem se
pode falar de imagem, mas antes de uma idéia imprecisa, que
raramente se baseia num conhecimento concreto e profundo.
Com frequência, avaliações superficiais e parciais levam a um
falso julgamento. Quando existem algumas noções mais cla­
ras elas se referem a circunstâncias de tempos idos, que há
muito foram esquecidas e substituídas em consequência do
desenvolvimento técnico e económico. Os jovens e seus pais
raramente estão em condições de avaliar as circunstâncias
económicas em relação ao futuro. Julgam a profissão "favo­
rável" ou "desfavorável” relacionando-a quase exclusivamente
com a situação do momento, esquecendo que antes de exercê-
-la efetivamente terão que fazer um aprendizado ou estudos
74 JE AN U NGRICHT

mais ou menos prolongados, e que nesse lapso de tempo a si­


tuação económica pode modificar-se por completo. Esquecem
facilmente que aprendizado e trabalho não são coisas idên­
ticas. Mais comum ainda é uma valorização sentimental da
profissão. Mesmo existindo um conhecimento verdadeiro, é
difícil escapar aos preconceitos tradicionais que envolvem a
profissão numa nuvem de irrealidade. Quanto menos a ava­
liação se basear nos próprios conhecimentos, menos objetiva,
mais vaga será ela.
Estas idéias antiquadas, da época das primitivas profis­
sões e do trabalho escravo, depois de impostas pela tradição
transformaram-se em costume e hábito, sendo aceitas automa­
ticamente sem passar pelo crivo do raciocínio. Conserva-se
assim, tenazmente, uma hierarquia profissional: no tôpo dela
estão talvez o rei, o sacerdote, o médico e depois aqueles que
exercem profissões liberais; no meio da escala encontram-se
o funcionário, o comerciante, o industrial e mais abaixo o em­
pregado, o operário; finalmente, o lavrador.
Tentando representar figuradamente êste sistema de ava­
liação (relacionando a importância social da profissão com a
sua importância material) resulta uma pirâmide de valôres,
em cuja base estão os camponeses e no cimo aquêles que exer­
cem profissões intelectuais (liberais). Com outras palavras:
quanto mais afastada estiver a profissão da cobertura das ne­
cessidades materiais, mais alto se colocará na escala social
(E. Jucker) 23.
Isto só vale a grosso modo. Naturalmente esta hierarquia
tem bases diferentes nos diversos círculos culturais e dentro
de um mesmo círculo é, muitas vêzes, quebrada 24. Para o nos­
so inquérito não tem importância. Importa sòmente o fato
de existir uma tal hierarquia e de partirem dela impulsos que
influenciam a escolha profissional, quando põem em jôgo ques­
tões de reputação, de classe, de importância social. Muitos são
forçados, ainda hoje, a aceitar uma profissão para a qual não
sentem inclinação, nem têm habilidade, apenas para satisfazer
um indefinido sentimento de respeito à posição social dos
pais. Mesmo quando a escolha é feita com aparente liberdade,
o indivíduo nem sempre é capaz de perceber a fôrça dessas

23 Jucker, “BerufskundHche Vorlesungen" 78.


24 isso acontece. Os empregados em geral creem estar um degrau acima dos ope­
rários, mas, para o industrial, não raras vêzes o operário qualificado tem mais valor.
'Escolha da Profissão 75

influências já aceitas tradicionalmente, e muito menos de eli­


miná-las .
Há ocasiões em que a profissão tem de servir consciente­
mente aos interêsses de posição social e de progresso. Para
êsses casos especiais abrimos uma exceção. Certamente esses
interêsses não podem ser ignorados; ao contrário, devem ser
respeitados. Se, porém, não forem examinados com objetivi­
dade, podem acarretar erros graves, por exemplo quando fa­
zem tábula rasa ou se afastam demais dos desejos e da capaci­
dade do candidato a profissão; e também quando deixam de
observar, acertadamente ou não, as circunstâncias do mer­
cado de trabalho.
A profissão pode,tomar-sç um meio de adquirir ou con­
servar uma determinada posição social; ela pode representar
a ânsia de progresso, mas também o mêdo de regredir, que se
encontra frequentemente entre as pessoas mais cultas. Por
êste motivo, quantas vêzes os filhos de professores acadêmicos
são, custe o que custar, forçados a estudar25.

b) Motivos financeiros
Dissemos acima que obstáculos dificilmente superáveis e
circunstâncias materiais desfavoráveis opõem-se à livre esco­
lha profissional. Querer ignorar que a subsistência de muitas
famílias depende do ordenado dos mais jovens, seria fechar
os olhos diante de fatos desagradáveis. A ajuda modesta ofe­
recida pelas bolsas de estudos e outros auxílios oficiais não
é suficiente, e nem há grande interêsse por êles. Uma orienta­
ção adequada abriria portas que de outro modo permanecem
fechadas. Ê, mais do que se pensa, simples questão de orga­
nização. A necessidade de auxílio e a da instalação de locais
de orientação é visível.
Nestes casos, a escolha profissional sofre a influência de
uma falta de meios. Outras vêzes ela é determinada pelo de­
sejo de aproveitar maiores meios 26. Os filhos querem continuar
o negócio do pai, enraizar-se nos empreendimentos de paren­
tes e conhecidos numa posição estável; encontrar uma pro-

25 Ver Vida, "Das Problem des Aufstieges" 150.


26 Por êste motivo a escolha profissional do chefe de família é tudo menos livre,
e a tendência para um trabalho que dispense aprendizagem se transforma em obri­
gação- Esta é, também, a causa principal do excesso de trabalhadores sem aprendi­
zagem, Ver também: “Hauptwurzel des Ueberflusses an Urgelernten”.
76 Jean U Remem

fissão que prometa, possivelmente, lucros altos. É frequente,


igualmente, a ânsia por um ordenado garantido e pela aposen.
tadorla, que a seu tempo virá 27. Daí a superlotação dos ery.
pregos públicos. Por força das circunstâncias a ética é de$.
prezada c a profissão passa a ser considerada um meio de ly.
cro. Como consequência inevitável, porém, o jovem candidato a
emprêgo toma-se vítima da ambição de seus pais, ou da pró.
pria ambição, se a escolha profissional não respeitar a sua ca.
pacidade e inclinações.

c) Trabalho e aprendizado, escola e moradia


A situação do mercado de trabalho e aprendizado exerce
uma pressão semelhante à da situação financeira, ê evidente
que nenhuma aspiração profissional se concretiza, quando a
situação económica do lar é empecilho intransponível, quando
o local de aprendizagem fica distante demais e não existem
meios para alimentação, moradia, nem para transporte, e quan-
do os mestres só admitem aprendizes de uma determinada
região. Neste caso, os mais prejudicados são os habitantes
dos Cantões Montanhêses, onde são escassas as indústrias e
outras possibilidades relacionadas com a profissão.
O que dissemos sôbre o mercado de aprendizado, aplica-se
também às escolas técnicas e superiores. Os dados relativos à
matrícula nas escolas técnicas, secundárias e superiores, pro.
vam sobejamente que a frequência depende em alto grau db
distância entre a escola e o local de moradia. E dessa sujeição
se origina uma outra, a saber: a escolha profissional dependt
do tipo de escolas frequentadas. Muitos são obrigados a renun­
ciar às profissões para as quais têm capacidade, porque na
região onde vivem não poderiam fazer a aprendizagem.
Portanto, a situação desfavorável do lar (em relação eco
nómica e geográfica) impede a realização de muitas voca­
ções profissionais.
(A isto tudo acrescentaremos: pelo aproveitamento ado
quado dos meios existentes, já se pode hoje em dia eliminar
muitas injustiças. Por exemplo, organizando uma lista com­
pleta dos locais de aprendizagem, que seria divulgada sisro-
mãticamente. Por um itiicrcâmbio entre as emprêsas e as
escolas de aprendizes, d < om a sua medição, êstes fatôres ne­
gativos da escolha proÕasional seriam considerávelmente ate-
3F7 V*r tunMtn Ackermt&a, Hrmfawahl* 1 pp. Ml*
KlCOLH* Bi Piorissío 17

nuados. Repetimos: é questão de organização. Contudo, nesr


te caso deve ser restabelecido um perfeito equilíbrio social, e
a cada indivíduo devem ser facultadas as mesmas condições
de vida. São necessários esforços gigantescos, e esta missão
$ó poderá ser desempenhada com sucesso por organismos que
a ela se dediquem integralmente. Boa vontade existe* mas não
capitais suficientes. Seria preciso substituir a dispersão por
um trabalho planejado).

d) Sugestão e obrigação
Sugestões para a escolha de uma determinada profissão
não faltam. Em primeiro lugar está a sempre presente suges­
tão do ambiente. O ambiente do campo cria a propensão para
o trabalho agrário; a região industrial, para a técnica; o co­
mércio, para os negóciqs. Em grande parte, atrás disto está
uma sadia adaptação às circunstâncias. Ela vai longe demais,
porém, quando toma grande parte da população de regiões
inteiras dependente de uma única indústria28.
Sugestões poderosas vêm também das grandes firmas e
suas marcas famosas. O jovem não quer tornar-se mecânico,
mas sim trabalhar para Brown-Boveri, Sulzer, Búhler; já se
sente apoiado e honrado pela simples participação em um
grande empreendimento.
Sugestões idênticas podem vir do professor, do sacerdote,
do Chufe de Escoteiros, e de outros nobres exemplos. E.
Jucker29 cita diversas vêzes o mesmo fato: anualmente, numa
classe de escola secundária, grande parte dos alunos seguia a
carreira de gêometro, porque o professor, em sua juventude
desejara ser gêometro. B. Biegeleisen30 fala de sugestões em
massa das alunas da última série da Escola Primária de
Krakau, onde de 1413 meninas, 669 queriam ser profes­
soras. Numa outra classe, 19 das 20 alunas desejavam tomar-
se contadoras.
Chegamos agora às "profissões em moda". Em ondas pe­
riódicas e passageiras os jovens se inflamam como fogo de
palha por algumas profissões, sem motivo plausível. Na Suíça,
antes da 1 ,a Guerra Mundial eram disputadas as profissões de
2B Por exemplo: a catastrófica queda da indústria d® bordados de St. G&ller, entre
as duas guerras mundiais.
29 E. Jucker, 'Berufskundliche Vorleeungen* 1B.
M Biegeleisen, "Berufswílnsche der Jugeud ta Krrtífttl* 1B 93 p. 138.
78 Jean Ungbicht

professor, negociante, escrivão, maquinista. Depois da guerra,


principalmente as de vendedora, "nurse”, "chauffeur", mecâ­
nico, e as que pertencem ao ramo da eletricidade (eletricista).
A seguir, as profissões de laboratorista, químico, rádio-tele­
grafista, aviador, assistente-médico e desenhista de modas.
Hoje em dia, as profissões de gráfico, repórter, marceneiro.
Ocasionalmente, e sem o menor fundamento, surgem verda­
deiras epidemias de entusiasmo por determinadas profissões.
O contrário também se verifica: algumas profissões são sim­
plesmente evitadas, quando nada de concreto se opõe a elas.
Ainda recentemente eram evitados pelos rapazes os ofícios de
fundidor, ferreiro, vidraceiro, chapeleiro; e pelas jovens, os
de bordadeira, modista, “nurse”3132 .
Do ambiente escolar vêm também fortes sugestões. Mas
é dificil dizer se são inclinações antigas que determinam a es­
colha dos estudos ou se é a escola que provoca essas tendên­
cias. Aliás, minha experiência com alunos do curso secundá­
rio me permite afirmar: todos aquêles que se dedicam à ma­
temática e ciências técnicas dificilmente podem adotar uma
atitude não condizente com os seus estudos, mesmo quando
solicitados por interêsses profundos. Após uma convivência
de anos com colegas dedicados à técnica, quaisquer outras
ocupações parecem fora de lugar, e são facilmente afastadas.
Só as fortes personalidades podem conservar interêsses estra­
nhos à escola.
O desejo de identificar-se com um professor venerado
pode também encobrir ou alterar a verdadeira vocação. O
mesmo se dá em sentido negativo: com o professor é rejeitada
a matéria que êle ensina. E assim, por motivos sentimentais,
31 Ilustramos êste fato com os dados colhidos pelas Agências de Colocação da
Associação de Enfermeiras especializadas em puericultura (Boletim n? 203 da Con­
ferencia dos Orientadores Profissionais — Seção de Berna):
Chamados feitos em 1944 .................................. 1 337
Recusados por falta de enfermeiras ............... 488
Atendidos ........................... 498
Não atendidos por falta de pessoal auxiliar .. 351
32 Há pouco tempo pude observar o seguinte: a mútua antipatia entre alunos e
professor de línguas se transmite a estas; ao mesmo tempo, uma viva afeição pelo
mestre de matemática dá origem ao amor pelos cálculos e pelo desenho técnico, e,
em conseqíiência disto, o aluno passa a freqúentar uma escola técnica. Depois de
algum tempo, decresce a aplicação e desaparece o interêsse pela técnica; surge um
crescente mal-estar e o sentimento de haver fracassado. Verifica-se, então, que exis­
tem inclinações e talento para as línguas e não para a matemática. Operou-se urna
Escolha da Profissão 79

é para muitos vedado o acesso a um campo de ação em que


suas habilidades teriam desenvolvimento pleno32.
Outras sugestões vêm de determinadas matérias de estu­
do. Por exemplo quando — depois de muitos anos de aceita­
ção passiva — surge “alguma coisa" que dá ensejo a expe­
riências e corresponde aos desejos dos pesquisadores e cons­
trutores: a química e a física. O mesmo sucede com a apor-
tunidade de criar, em todas as suas formas. A possibilidade
de construir pode fornecer valiosos pontos de apoio para a
escolha profissional; pode igualmente apontar caminhos er­
rados, por substituições ilusórias ou uma superestimação de
êxitos passageiros. Muitas vêzes é a satisfação proporcionada
pela atividade em si que encobre o interêsse verdadeiro (por
exemplo no desenho, na mecânica, na química, na entalhação)
e muitas vêzes, também, a alegria proporcionada por um tra-/
balho bem sucedido, para a realização do qual surgiu uma
oportunidade ocasional. O fato se repete com outras ocupa­
ções das horas de lazer.
Das matérias prediletas vêm inúmeros impulsos para a
escolha profissional, embora nem sempre traduzam inclina­
ções verdadeiras e constantes. F. Baumgarten33, entre ou­
tros, informa, baseando-se em pesquisas que realizou entre
crianças de Berlim, que a matéria preferida não tem influên­
cia decisiva e pràticamente nenhuma ligação com a escolha
da futura profissão.
Dificilmente poderemos fazer uma demarcação de limi­
tes entre sugestão, influência voluntária e obrigação. A coa­
ção, todavia, é frequente34. Parte quase sempre dos pais, que
forçados pelas circunstâncias ou simplesmente por incompre­
ensão obrigam os filhos a aceitar uma certa profissão ou a
frequentar uma determinada escola. A escolha: dos menos
abastados se resume, quando muito, em optar por uma pro­

verdadeira transmutação de inclinações provocada pelas relações afetivas. Com a


cessação destas relações, ressurgem as tendências originais, comprovando-se o êrro
da escolha.
33 Baumgarten, “Berufswúnsche und Lieblingsfàcher” 9 pp. 36-51.
Baumgarten, “Der Jugendliche und das Berufsleben" 8 p. 29.
34 Conforme W. Voigt em “Berufswunsche und Zukunftsplãne” 53 pp. 184-190, de
14 000 jovens, 28% escolhe uma profissão que não desejava. No 1? ano secundário,
a não concordância da escolha com a verdadeira vocação profissional sobe a 42%;
39% dos jovens sente uma singular coação; 7% compreende por si mesmo a necessii
dade de uma mudança, mas 33% não se liberta do estranho jugo. E 3% segue a
profissão do pai, contra a vontade.
80 JsanUngricht

fissão com aprendizagem ou sem ela; e neste caso a coação


exercida pela família é ainda compreensível. Mas se por mo­
tivos de somenos os pais não respeitam os desejos e a capa­
cidade de seus filhos, cometem um verdadeiro crime no sen­
tido moral e transgridem a lei35. Dizem freqúentemente: "não
nos perguntaram... ” Numerosos são os casos em que os pais,
inconscientemente, esperam ver realizados pelos filhos os
seus próprios sonhos juvenis. Supomos que pensam estar
agindo no interêsse dos filhos, mas esquecem que o bem-es­
tar dos adolescentes não precisa, necessariamente, coincidir
com o seu próprio bem-estar. Decerto foi isto que o legisla­
dor teve em mira, ao determinar que os pais considerassem
(em relação à escolha profissional) a capacidade e as incli­
nações dos filhos.
e) Outros fatores
Já indicamos os fatores mais importantes. Mencionare­
mos agora mais alguns. A decisão pode depender de deter­
minados pontos de vista, ou de probabilidades. Avulta a pers-
pectiva de uma profissão favorável ou relativamente desfavo­
rável; depois seguem-se inúmeras outras aparentando ofere­
cer certas vantagens como: poder trabalhar ao ar livre, ou
exatamente o contrário; conservar as mãos limpas; usar um
uniforme vistoso; escapar a certos perigos e doenças profis­
sionais; poder alcançar a independência; trabalhar no lo­
cal dos seus sonhos (palco) etc. 36 O exemplo de um suces­
so na profissão é, comumente, generalizado. O -livro de

35 O Z.G.B. exige, em relação à escolha profissional (Z.G.B. § 5? art. 276):


“Os pais precisam respeitar, tanto quanto possível, a capacidade física e espiritual
e a inclinação de seus filhos”.
36 Fara mencionar ao menos um exemplo, indico aqui, resumidamente, os fatôres
que, segundo Schohaus ("Schatten Uber der Schule” 138 pp. 64-66) levaram futuros
proíessôres primários à escolha da profissão de professor (resultado de composições
sôbre o tema: “Como cheguei ao Curso de Formação de Proíessôres”). Os professo
randos indicam os motivos seguintes: respeito pela posição social do professor; o
desejo de se movimentar numa certa esfera social; desejo de segurança económica
e principaimente da aposentadoria que o funcionalismo oferece; pendor para a como­
didade; esperança de longa folga depois do trabalho; férias prolongadas; pouco es-
fôrço físico; consciência da incapacidade para a agricultura e os trabalhos pesados e
relativamente boa capacidade para os trabalhos escolares; perplexidade dos pais em
relação à educação dos filhos — que têm relativa facilidade para os estudos; identifi­
cação com um professor venerado; forte pendor para o mando; desejo de desem­
penhar um papel dominador; ligação sentimental com a atmosfera escolar; inexpe­
riência da vida e memória extraordinária.
Escolha da Profissão 81

J. Kay37, que pretende mostrar as possibilidades profissio


naís na América do Norte, é típico. Outros escolhem a pro-
. fissão para a quai acreditam possuir um talento especial. (A
fé no próprio talento é decisiva; a realidade, porém, quase
nunca é bem aceita). Finalmente, outros deixam de escolher
a profissão desejada por uma suposta incapacidade (por
exemplo um estado doentio).
Tais ponderações valem quando têm por base um julga­
mento acertado da própria capacidade e das exigências da
profissão. Mas, na maior parte das vêzes não é isto o que
se dá. A avaliação da própria capacidade liga-se a uma de­
terminada fase de desenvolvimento e por certo logo sofrerá
modificações. Completando êste julgamento pode existir um
certo conhecimento objetivo do próprio valor, mas também
uma certa atração instintiva (uma espécie de faro) por aqui­
lo que bem gostaríamos de conseguir. Atraído para que, po­
rém? Como pode o jovem saber onde serão satisfeitas as suas
necessidades, seus desejos realizados? Não conhece as pro­
fissões suficientemente. Não pode conhecê-las, e quando es­
colhe não o faz fundamentado na realidade, mas sim numa
idéia preconcebida da profissão. As profissões são o que êle
desejaria que fossem (F. Bõhny)'3839. É grotesco ver como os
mais absurdos motivos podem determinar a escolha de uma
profissão para a vida. Um simples detalhe, não raro existen­
te apenas na fantasia, é valorizado, generalizado, e sôbre êle
se constrói uma profissão. Em consequência, vê-se de re­
pente o jovem num mundo nôvo que, obedecendo inexora­
velmente às suas próprias leis — de nenhum modo condiz
com os seus sonhos e só lhe inspira sentimentos de indife­
rença ou repúdio, onde se sente um estranho e ao qual não
pode escapar. Muitos conseguem adaptar-se; outros não, e en­
tão se transformam em amargurados e desajustados09.
37 Kay, *Wie wirst du reieh in V.S-A." 82.
38 Bõhny, “Vorlesungen iiber Berufsberatung” 2C
39 Um exemplo vivido por mim: um mecânico de automóveis, depois de terminados
os estudos, escolheu sua profissão únicamente por lhe terem feito crer, quando
menino, que por êste meio (trabalho com motores) poderia tornar-se aviador. O que
é realmente a profissão de mecânico de automóveis êle não sabia e nunca encontrou
a mais leve ligação com ela, sentindo-se desde o primeiro dia tora de lugar. Até hoje
não consegue conformar-se, rebela-se e agora, rapaz de 20 anos, tenta sair desta situa­
ção falsa por melo de ações impulsivas (entre outras uma fuga malograda para o
serviço militar estrangeiro), E assim se agrava cada vez mais a situação sem saída
em que se colocou.
82 Jean Ungricht

Motivos inconscientes exercem igualmente forte influen­


cia sôbre a escolha profissional. Conflitos entre pais e filhos,
princípalmente. Por exemplo: desejos de vingança, teimosia,
vaidade, culpa, repreensões e castigos; e a ligação casual de
demonstrações de afeto, positivas ou negativas, com uma de­
terminada profissão (eco de uma forte impressão). Sôbre a
importância das reações que provocam, nenhuma informação
se pode conseguir, porque depende de uma análise mais pro­
funda para a qual o orientador profissional não tem tempo
e nem os médicos interêsse. Somente pela psicanálise pode­
riam ser explicadas muitas incompreensíveis escolhas profis­
sionais. Stekel40, Giese41, Griinbaum-Sachs42, Bramesfeld4',
Haberlin44, Schneider45, Pfisíer46, trataram do tema, mas sem
aprofundar-se. Na literatura psicanalítica encontramos ca;
sos individuais esparsos. Esta falha de pesquisa deveria ser
corrigida, porém.
Finalmente, não devemos esquecer que o acaso determi­
na muitas vêzes a carreira a seguir. A leitura casual de um
anúncio, a descoberta de um local de aprendizagem, os estí­
mulos e incitações de jornais e revistas, entusiasmo insufla­
do pela leitura de um livro, o encontro com certas persona­
lidades. Em poucas palávras: condições acidentais, externas,
podem abalar resoluções bem alicerçadas. O acaso também
tem força sôbre os indecisos, os inativos, os que não têm
interêsses, os desanimados e ainda sôbre os super-dotados,
que entre tantas possibilidades não sabem qual escolher.
No acervo literário que pude consultar, nada encontrei
sôbre: a importância do acaso na escolha da profissão.

40 Stekel, “Berufswahl und Kriminalitât” 141.


41 Giese, “Psychoanalytische Psychotechník” 55.
42 Grunbaum-Sachs, “Tiefenpsychologie und Berufsberatung” 59.
43 Bramesfeld, “Berufswahl, Berufsberatung und Berufserfolg ais tieíenpsychologis-
che Probleme” 31.
44 Hãberlin, “Motive der Berufswahl* 61.
45 Schneider em “Psy choanalytischen Volksbuch* 45 pp. 369-373.
46 Pfister, “Die Berufsneigung im Lichte der Psychoanalyse* 122.
Escolha da Profissão 83

II — RESULTADOS GERAIS E COMPLEMENTARES


Apresentamos aqui — após uma visão de conjunto dos
fatôres que determinam a escolha profissional e da maneira
como agem — um resumo das conclusões a que chegamos.
A escolha profissional depende: em primeiro lu­
gar da estrutura económica do ambiente familiar, da
distância entre os locais de moradia e aprendizagem,
do mercado de trabalho, da pressão das conjunturas
económicas. Além desta dependência direta das
circunstâncias económicas, aparece ainda uma ou­
tra, istoé: a escolha profissional nem sempre de­
pende da situação económica real, mas do reflexo
dela na mente de pais e filhos; as decisões são en­
tão tomadas não com base em circunstâncias obje­
tivas, mas firmando-se em pontos de vista, opiniões
e representações imaginosas destas circunstâncias1.
Depende ainda da situação económica e social dos
pais, tanto que a assim chamada “liberdade” de es­
colha é mais teórica que real.
Têm também grande importância: a valorização
das profissões, preconceitos sociais antiquados, cuja
característica principal é o menosprêzo pelo trabalho
manual; sugestões oriundas da mentalidade pecu­
liar à época, do ambiente industrial, comercial e es­
piritual; de algumas firmas, dos pais, professores,
sacerdotes, guias, exemplos, colegas; do tipo de es­
tudos, de algumas matérias estudadas, de sucessos
reconhecidos e das profissões em moda.
Decisivos são, igualmente, determinados pontos
de vista sôbre as próprias necessidade e capacidade e
sôbre as vantagens ou desvantagens das diversas
profissões. Êstes pontos de vista baseiam-se mais
em manifestações do instinto, sentimento e fantasia,
do que em reflexões sensatas; em preconceitos, mais
que em julgamentos. Raras vêzes correspondem à
realidade.
Encontramos, ainda, fatôres que agindo no sub­
consciente, já por sua natureza nem sequer são co-1
1 Sendo geral a ignorância a respeito dos problemas sociais da atualidade, nâo
poderíamos esperar pontos de vista realistas e objetivos.
84 Jean Ungricht

nhecidos daqueles cujas causas determinam. Sua


influência priva a escolha profissional de qualquer
ligação com a realidade.
Surge afinal o acaso, cuja participação na.; de­
liberações relativas à escolha profissional é incom­
preensível, mas nem por isso deve ser menosprezada.
*
* *
Alguns dos autores mencionados nesta obra tentaram de­
terminar a participação, na escolha profissional, de numerosos
fatores especiais. Os resultados seriam, instrutivos para cer­
tos inquéritos psicológicos, sociológicos. Formam, principal­
mente, uma base valiosa para a organização de escolas e pro­
gramas didáticos, assim como para a orientação profissional,
mas sòmente nas regiões onde foram obtidos, porque, se hou­
vessem sido feitos em lugares e épocas diferentes, as suas
conclusões também seriam outras2. Ademais, particularidades
não têm efeito decisivo: decisiva é a verdade que elas enco­
brem, ou seja:
a escolha profissional é dominada, em grande parte,
por fatores sem objetividade. Com outras palavras:
a escolha profissional não se baseia, ordinariamente,
em observações cuidadosas, objetivamente corretas,
que corresponderiam à extraordinária importância
dessa decisão3.
Se esta afirmação é verdadeira, verifiquemos quais são
as suas consequências. Não vamos repetir tudo o que disse­
mos no capítulo relativo à importância da escolha profissio­
nal. Do que foi dito deduz-se que à escolha profissional na
maior parte das vêzes falta objetividade, em virtude das cir­
cunstâncias económicas desfavoráveis indicadas naquele, ca­
pítulo. Profissões constantemente superlotadas de um lado,
falta crónica de braços, de outro; excesso de trabalhadores

2 A xnoda, de um lado» e a situação comercial e industrial das diversas regiões»


também exercem grande influência.
3 Fischer, “Beruf, Berufswahl und Berufsberatung" 46 p. 31. "Está em desacôrdo
com a grande importância da profissão, a leviandade, por assim dizer, com que ê
feita a escolha profissional*.
Escolha da Profissão 85

sem preparo e carência de pessoal habilitado; invasão do


elemento estrangeiro e imigração contínua.
Prosseguindo nesta análise, verificamos quanto descon­
tentamento social e económico, quanta perda de dinheiro,
tempo e energia, quantos '‘emplastros" dispendiosos (associa­
ções de assistência aos alcoólatras, doentes, mendigos e de­
sempregados) deixariam de existir com uma orientação pro­
fissional acertada.
Também pela generalizada insatisfação profissional se
comprova que as escolhas mal feitas são muito frequentes.
Temos de convir que êste descontentamento é, em parte, uma
projeção da humana insatisfação; além do mais, em qual­
quer trabalho existem motivos de descontentamento que não
podem ser eliminados pela escolha de outra profissão. Apesar
de tudo, da maior parte dos inquéritos se conclui que muitos
dos fatôres de insatisfação se relacionam com uma escolha
profissional mal feita. Assim conclui também H. Bues4, de­
pois de inquirir 3 523 jovens sôbre as causas principais da
insatisfação profissional. Deixando de lado as relações do
aprendiz com seus superiores, organizou uma lista de tarefas
(diferentes para cada profissão) consideradas desagradáveis.
Os mesmos trabalhos, no entanto, foram classificados por ou­
tros aprendizes como divertidos. Isto não pode deixar de sig­
nificar que os queixosos exerciam atividades inadequadas.
Quer dizer que não estavam na profissão "certa”. Vieram,
a seguir, queixas sôbre variaçõeç da temperatura, ar viciado
da oficina, ordenado muito pequeno, períodos de trabalho
muito longos, trabalhos muito pesados, riscos do trabalho
com máquinas, esfôrço excessivo de alguns membros, traba­
lho prejudicial à saúde, perspectivas desfavoráveis para o fu­
turo, ^strago do vestuário, algumas peculiaridades da profis­
são, trabalho do qual não pode se orgulhar, trabalho rotinei­
ro. Devemos reconhecer que estas circunstâncias não cons­
tituem reveses profissionais, mas dificuldades às quais alguns
reagem de má vontade e outros até com prazer (por exem­
plo trabalhos pesados, imobilidade, esfôrço de determinados
membros, trabalho com máquinas). Muitas destas ocorrên­
cias desfavoráveis seriam evitadas se fôssem conhecidas an­
tes da escolha da profissão, como por exemplo os períodos de
trabalho muito longos, nenhuma perspectiva de progresso, lo­

4. Bues, "Die Stellung des Jugendlichen zum Beruf und zur Arbeit” 37,
86 Jean Ungricht

cal de trabalho inadequado. Poderíamos objetar que, então,


muitas profissões deixariam de ser escolhidas pela juventude,
o que estaria certo. Não poderiam contar com a nova gera­
ção, enquanto não corrigissem essas deficiências, fato que se
transformarem impulso para o saneamento das profissões5.
Examinando estatísticas apresentadas por O. F. Kanitz,
Chefe da Juventude Operária de Viena, P. Lazarsfeid6 observa
que um grande desânimo pode resultar de uma situação pro­
fissional inadequada, pois somente a metade dos jovens ope­
rários incluídos naquela "enquête" (875 homens e 283 mulhe­
res) achava suportável a profissão. Os precursores de Lazars-
feld — Soffner, Stockhaus e Kupky — declaram que apenas
metade dos trabalhadores chega por preferência, à sua pro­
fissão em média até mesmo só 25%. Lazarsfeid fala em
13,5% 7. Idênticas são as conclusões de F. Baumgarten8, que
inquirindo aprendizes suíços classificou em primeiro lugar
as queixas sôbre a monotonia do trabalho. Mas a monotonia
não age sôbre todos, de modo deprimente,
* ela é bem suporta­
da por muitos e até apreciada por alguns, e pode ser in­
dispensável à execução de muitas tarefas9. As constantes
mudanças de profissão são também sintomáticas, mas infeliz­
mente ainda não se fizeram, na Suíça, pesquisas comprovan­
tes. Repetimos aqui, citações de alguns dos autores:
No seu trabalho supra mencionado, F. Baumgarten10 enu­
mera alguns motivos de mudanças frequentes: insatisfação
por sentir-se capaz de exercer profissão mais elevada; deses­
perança de progredir na profissão escolhida; falta de possi­
bilidade de aperfeiçoar-se na profissão; debilidade física. Fri­
samos mais uma vez que tôdas estas circunstâncias (exce­
tuando-se a debilidade orgânica, quando não tem por causa
o trabalho profissional) são consequências da escolha uma
5 Eu me refiro aos sucessos obtidos por orientadores profissionais, Ligas Profis­
sionais e peio BI GA, no saneamento ou renovação das profissões de pedreiro, agri­
cultor, cosinheira, vendedora e na redução de graves falhas das profissões de cabe­
leireiro e padeiro.
6 Lazarsfeid, "Jugend und Beruf” 93 pp. 157-174.
7 Ver Anm. 6.
8 Baumgarten, “Der Jugendliche und das Beruísleben” 8 p. 44.
9 Sôbre a questão da monotonia, ver os trabalhos de:
Bucher, “Arbeit und Rhythmus” 34 pp. 106 e 115.
Winkler, “Monotonie der Arbeit” 151. *
Wunderlich, “Die Einwirkung einfõrmiger zwangslàufiger Arbeit auf die Persõnli-
chkeitsstruktur” 154.
Sachs, “Das Monotonieproblem*' 130,
10 Baumgarten, "Der Jugendliche und das Berufsleben” 8 pp. 92-95.
Escolha da Profissão
......... ............... .............. ...

profissão inadequada. Uma publicação da Liga Alemã para


a Política Social11 mostra a extraordinária frequência da mu­
dança de profissão. Dos operários inquiridos 30% já havia
trocado de profissão: 33% dos jovens de 14 a 20 anos, de 18 em
18 meses, em média; apenas 50% das mulheres entre 21 e
30 anos mantinha a mesma profissão; e para os homens da
mesma idade a média baixava a 38%. Rauecker11 12 diz que de­
pois da l.a Guerra Mundial mais de 4 000000 de trabalhado­
res da indústria alemã, de mais de 30 anos, trocaram de
profissão; dêstes, 3 000 000 mudaram uma segunda vez e 3/4
de milhão repetiram a mudança três vêzes. No comércio a
proporção deve ter sido bem maior. Sabemos, porém, que na­
quela época a situação económica era muito desfavorável. Re­
sultaria daí uma outra prova indireta da frequente má escolha
da profissão, pois devemos lembrar-nos que todas estas cir­
cunstâncias desfavoráveis para o indivíduo e para a econo­
mia de um país poderiam ser eliminadas por uma influência
adequada. A êste respeito preciso citar o sucesso da orienta­
ção profissional na nova organização para o desenvolvimen­
to das profissões. Uma importante confirmação nos é dada,
também, pelo bom êxito dos Centros de Orientação Profissional
mantidos pelo Govêmo Federal para a indústria e o comércio.
Logo que os Centros começaram a ocupar-se com a orientação
profissional — que deve justamente levar a uma boa escolha
da profissão — a porcentagem de contratos de aprendizagem
cancelados diminuiu.
Podemos surpreender-nos com a afirmação estereotipada
de quase todos os pedagogos e economistas que se ocupam
com o problema? Êles nos asseveram que a escolha profissio­
nal é, em geral, feita ao acaso sem uma ponderação objetiva.
Fischer13, como pedagogo, chama a escolha profissional de
uma espécie de loteria, um jogo de azar; já Pascal14 externou
sua opinião, dizendo: “La chose la plus importante de la vie
est le choix du métier; le hasard en dispose”. E. Bartholdi15,
como economista, resume suas experiências numa sentença la­
cónica : “A orientação profissional da nova geração é, em pro­
porção assustadora, qualitativa e quantitativamente falha.”
11 Bernays, "Auslese und Anpassung der Arbeiterschaft in der geschlossenen Gros-
sindustrie” 17 pp. 139-142.
12 Rauecker, "Die Berufsfreude im modemen Wirtschaftsleben” 127 p. 11.
13 Fischer, “Ueber Beruf/Berufswahl und Berufsberatung” 46 p. 126.
14 Pascal, "Pensées” Ed. Brunschvicg p. 90.
15 Bartholdi, "Die wirtschaftlichen Grundlagen der Berufsberatung" 6 p. 8.
88 Jean Ungricht
til* .... ... .......... .............

III — CONSIDERAÇÕES SÔBRE OS DOIS PRINCIPAIS


MOTIVOS DE UMA ESCOLHA PROFISSIONAL
IMPRÓPRIA
Depois de tudo, perguntamos como é possível que tantos
fatôres sem objetividade, casuais, externos, periféricos, pos­
sam ter ação decisiva sôbre a escolha profissional, cuja im­
portância os jovens e seus pais não desconhecem. Para isto
devem existir motivos mais profundos que a comodidade e a
negligência; motivos que expliquem por quê os jovens e seus
pais não estão em condições de resolver acertadamente o pro­
blema. Estas perguntas nos recolocam diante das duas cau­
sas fundamentais, já por nós apontadas: o desconhecimento
de si mesmo (que é normal num jovem), e da realidade pro­
fissional.

1. Desconhecimento de si mesmo
"Dos 14 aos 19 anos, mais ou menos, deve o jovem to­
mar decisões da maior importância para toda a sua existência,
sem que tenha o imprescindível conhecimento de si mesmo
e do aspecto objetivo da vida” (Lazarsfeld1).
Em relação ao "amadurecimento”12 da vocação profissio­
nal distinguem-se, em geral, três fases. Segundo Schãfer, são
elas: a profissão no sentido de brincadeira, na primeira infân­
cia; a profissão como desejo de aventuras, da juventude; a
época da verdadeira escolha profissional. Segundo Spranger:
profissão — sonho infantil; profissão — plano juvenil; expe­
riência concreta da profissão. Segundo Fischer: indiferença
pela profissão; experiência profissional; amadurecimento pro­
fissional. Ponto de transição: dos 10 aos 16 anos3.
De acordo com a idade do indivíduo, a profissão é enca­
rada de maneira bem diferente. M. Frank e H. Hetzer4, ten­
do interrogado 480 crianças de 3 a 10 anos, informam que as
crianças, desde pequenas, pensam na profissão e — o que é
mais importante — externam a respeito dela desejos inspira­
dos principalmente pelo trabalho manual. O prazer de traba­
lhar parece ser aqui o motor. "O pequerrucho de 3 a 5 anos

1 Lazarsfeld, “Jugend und Beruf” 93 p. 4.


2 Um conceito que ainda não foi suficientemente debatido.
3 Exposição e discussão na obra de Lazarsfeld, "Jugend und Beruf” 93 pp. 37-49.
4 Lazarsfeld, "Jugend und Beruf” 93 pp. 88-100.
Escolha da Profissão 89

entende, ainda, a profissão, como um brinquedo que lhe traria


especial alegria... Aos 6 anos parece compreender que ter
uma profissão significa fazer um trabalho, produzir alguma
coisa. Isto, porém, com referência ao trabalho manual. As
profissões intelectuais são, para êle, como o foram as ativida­
des manuais para as crianças menores, um trabalho que se
faz por gôsto. O menino de 10 anos não adquiriu definitiva­
mente a compreensão do trabalho intelectual e das profissões
correspondentes ".
K. Reininger5 mostra que entre os meninos de 12 a 14
anos a imagem da profissão não é moldada sôbre a realidade,
mas segundo o desejo e a fantasia. Que a maioria dêles não
tem uma ideia concreta da profissão e da escolha profissional
e que a sua atitude para com a profissão é inteiramente ima­
tura. A ideia que faz da profissão é formada em parte pelas
próprias observações, em parte pelas informações de terceiros.
Dentre as profissões são destacados alguns trabalhos escolhi­
dos livremente. Profissão ainda significa: prática de determi­
nadas atividades que gostaria de exercer, sem outras conside­
rações mais aprofundadas e coerentes.
A capacidade — tomada como motivo principal — apa­
rece numa média de 2,4% somente, entre os meninos, e de
4,8% entre as meninas. Mas 80% das respostas são ainda tão
vagas que o próprio autor duvida que elas signifiquem algu­
ma coisa mais que simples palavras.
Segundo B. Biegeleisen apenas 20% das crianças pensa
na própria capacidade, e ainda assim nada diz sôbre o acêrto
da sua decisão. Para as 80% restantes, nem mesmo as inclina­
ções têm importânçia (por isso Hellpach não fala de aspira­
ções, mas de apetites profissionais).
Aos 16 anos, aproximadamente, o comportamento prin­
cipia a modificar-se. A profissão começa a significar não mais
uma brincadeira, mas uma possibilidade de realizar, de criar
alguma coisa "útil”. Não o divertimento apenas, sem nenhu­
ma utilidade, mas o trabalho, a realização em si. Só agora é
possível ao jovem avaliar o mundo profissional tal como êle
é na realidade. Só agora êle pode ver na situação profissio
nal e na profissão individual, bem mais do que somente aquilo
que um certo grau de desenvolvimento revela.
Destas observações resulta que,

5 LazarsfeS, -‘Jugend und Beruf” 99 pp. 105-129


90 Jean Ungricht

forçada a julgar-se a si mesma em relação à escolha


profissional, a criança (ou o jovem) defronta-se
com um problema que ultrapassa as suas forças.
Isto se verifica em qualquer uma das mencionadas
fases de desenvolvimento6.

A probabilidade de chegar a um maior conhecimento de


si mesmo pela auto-análise é pequena, e a de avaliar a própria
capacidade para uma determinada atividade profissional está
fora de cogitação. Resta-nos pois o exame das tendências ou
inclinações. Já mostramos o quanto dependem da idade: ra­
ramente ultrapassam a puberdade e muito raramente perdu­
ram. Todavia isto pode acontecer e, neste caso, o jovem sente
aquêle forte impulso que o guia "instintivamente” para a pro­
fissão desejada. Se o talento corresponder à predisposição, é
presumível que se encontre a solução satisfatória. Mas, frisa­
mos, êstes casos são excepcionais. A maior parte dos que pro­
curam uma profissão não tem capacidade para um autojulga­
mento objetivo. Não tem ainda o conhecimento verdadeiro
de si mesmo e da realidade profissional, para fazer o indis­
pensável confronto. Só o conseguirá quando atingir a fase
de autocrítica. Se isto se der antes da puberdade, estaremos
diante de um desvio, provavelmente patológico, do desenvol­
vimento normal. A puberdade também não favorece o conhe­
cimento próprio. Ela se caracteriza por um constante dese­
quilíbrio, oscilação entre extremos, disposições de ânimo pas­
sageiras, maior propensão a se deixar influenciar, criando
grandes dificuldades. Portanto, a puberdade e as fases que a
precedem e seguem, são inteiramente desfavoráveis à escolha
profissional.
A passagem para a terceira fase — ou seja a do desejo
de realização, das experiências profissionais concretas e de
uma atitude objetiva para consigo mesmo — se efetua quando
a decisão relativa à escolha da profissão já foi tomada. Ê
muito importante recordar que a escolha profissional se rea­
liza numa idade (14, 15, 16 anos) em que a habilidade, a ca­
pacidade, a estrutura da personalidade e o caráter se acham
ainda fortemente condicionados ao desenvolvimento.
O jovem toma, pois, importantes decisões relativas

6 Ver também Lohbauer, “Die Entwicklung der Fãhigkeit zur Selbstwahrnehmung


im Kindesalter” 103.
Escolha da Profissão 91

ao seu futuro num momento extremamente desfa­


vorável .
Acresce que êle não percebe, ainda, o alcance da sua deci
são. Êle não sabe o que significa exercer, anos seguidos, uma
atividade. As exigências de Lazarsfeld, a êste respeito, são
razoáveis. Êle prescreve que a escolha profissional se efe­
tue somente aos 16 anos e que até essa idade a aprendizagem,
o preparo profissional se façam em profundidade e extensão.
Chajes7, como médico, sem preocupações psicológicas ou pe­
dagógicas, puramente pelo critério somático, chega ao mes­
mo ponto: uma decisão de importância vital, como a escolha
da profissão, não deve ser tomada antes dos 16 anos, se qui­
sermos respeitar os fatores de desenvolvimento de um corpo
jovem (o que é absolutamente indispensável). Esta exigên­
cia nunca é observada voluntàriamente. Na Suíça a lei tor­
nou-a obrigatória, aumentando para 15 anos a idade mínima
exigida para o início da aprendizagem profissional.
Sem ajuda externa (que saiba ver e eliminar os fa­
tores relacionados com o desenvolvimento), uma
escolha profissional acertada é quase impossível.
Essa é a conclusão a que chegamos, observando a
psicologia do desenvolvimento do jovem e do ama­
durecimento profissional.
Um exame dos conhecimentos profissionais dos jovens
desta idade confirma a nossa constatação.
A
2. Desconhecimento da realidade profissional
Na Alemanha de 1882, existiam 1 674 "ramos profissio­
nais" no comércio, viação e indústria hoteleira, e 4 785 na in­
dústria, segundo estatísticas de Búcher8. Isto é: 6 000 ramos
profissionais independentes. Computando as profissões liberais
especializadas, estimava Búcher em 10 000 as várias "ativida­
des humanas, sendo que cada uma delas pode transformar-se
em verdadeira vocação e subjugar-nos inteiramente."
Estatísticas do ano de 1907 relacionavam 14 000 profissões,
que foram distribuídas em 218 espécies diferentes, 26 grupos

7 Chajes, “Grundriss der Berufskunde und Berufshygiene" 40 pp. 341-342. Ver tam­
bém a observação de Kaup p. 20,
8 Búcher, “Die Entstehung der Volkswirtschaít” 35 p. 146.
92 . . JEAN UNGBICtí'1
•—“* ■ . .............. .. , „

profissionais e 6 divisões profissionais. Uma lista preparada


para o recenseamento britânico de 1921, chegou a 35 000 sub­
títulos9.
A Suíça é um dos países que apresenta maior variedade
de profissões; a estatística ali organizada, porém, tende a re­
sumir e não a desdobrar.
Mesmo assim 1011 enumera 249 ocupações diferentes e sob
a rubrica "profissão independente” aparecem 249 títulos. O
esquema traçado para o recenseamento suíço, de 1920 men­
ciona 1 160 profissões masculinas e 800 profissões femininas.
No indicador profissional publicado em 1924 pelo Depar­
tamento do Trabalho aparecem exatamente 4 130 profissões
masculinas e 1 160 femininas11. O índice das profissões mas­
culinas do Departamento de Orientação Profissional da ci­
dade de Zurique12 abrange, dentre as profissões masculinas
que exigem aprendizagem, somente as mais importantes, as­
sim como as da administração pública, de educador profissio­
nal, técnicas superiores e científicas. Embora êste índice ex­
clua as profissões especiais, as que dispensam e as que não
dispensam a aprendizagem, alcança um total de mais de 200
profissões, para os homens. O número de profissões femininas,
indicado pelo Secretariado Feminino da Suíça, sobe a 13013.
Em "Juventus Helvetica”, numa breve supervisão da di­
visão profissional da Suíça, E. Jucker14 menciona também,
somente as profissões mais importantes e chega a mais de
400. O esquema das profissões individuais15 que serviu de
base ao recenseamento suíço de 1941, do qual constam mais
ou menos 350 profissões principais e mais de 1 000 secundárias,
mostra uma vez mais que a diversidade da estrutura' profissio­
nal suíça é incrivelmente grande16.
Nem de nome,'um adulto e muito menos um jovem, po­
deria conhecê-las todas. O que podem, então, saber das suas
peculiaridades? Mesmo que agrupássemos as profissões se­
melhantes, para reduzir o total a poucas centenas, seria im­

9 Vex *Die Methoden der Klassifikation der Erwerbszweige und Berufe" 157.
10 “Schweizerische Statlstische Mitteilungen" 164.
11 *Berufsverzeichnis fú die Arbettsnachweísstatistik" 159.
12 “Verzeichnis der mãnnlíchen Berufe" 160.
13 "Frauenberuíe" 161.
14 Jucker, “Die Erzlehung zum Beruf" in Juventus Helvetica 76 pp. 274-2W.
15 Departamento de Estatística da Suíça, "Schema der persónlichen Berufe" 1943, 153.
16 Conforme dados fornecidos pelo Escritório Suíço para organização do recensea­
mento, Genebra.
Escolha da Profissão 93

possível chegar ao conhecimento mais aprofundado exigido


para uma escolha profissional consciente. É necessário saber
alguma coisa a respeito dos instrumentos, ferramentas, uten­
sílios, local, qualidade do trabalho e suas exigências, ordena­
do e possibilidades de progresso, meios de aprendizado e aper­
feiçoamento. Onde obter essas informações? Antigamente,
quando a Economia era ainda relativamente simples, o traba­
lho não especializado, a vida menos complexa e as profissões
menos numerosas, existia pelo menos a possibilidade de infor­
mar-se. Hoje em dia, os processos que provocaram um veloz
aumento das profissões (a divisão da produção, a análise do
trabalho, a especialização profissional e a renovação profissio­
nal17) progrediram ao máximo. As profissões se ramificaram:
um grande número de atividades especializadas separaram-se
das básicas, novas profissões nasceram, antigos ofícios desa­
pareceram. Não devemos esperar uma pausa neste desenvol­
vimento, mas antes um recrudescimento18.
A diferenciação, a especialização e a subdivisão exagera­
da do trabalho não provocaram somente o grande aumento
das profissões: as possibilidades de conhecê-las melhor di­
minuiu. O trabalho retirou-se para trás dos muros das fábri­
cas e escritórios. Muitas vêzes nada se sabe sôbre as ocupa­
ções do vizinho mais próximo. Não se tem mais tempo, na
passagem pelas oficinas a caminho da escola, de conversar
com os que trabalham. Quem trabalha como deve, não pode
perder tempo observando o trabalho alheio. Com a subdivi­
são, os diferentes ramos de atividade se separaram e perde­
ram contato com a vida e o labor da coletividade. A sepa­
ração dos locais de moradia e trabalho, e a fuga para as ci­
dades, fizeram o resto. Resumindo :já se foi o tempo em que,
sem esfôrço, pela simples observação, era estabelecido conta­
to com o trabalho do próximo. Infelizmente também as es­
colas nada fazem no sentido de preparar os seus alunos para
a vida futura. Fatos históricos, datas, nomes de reis e ba­
talhas continuam sendo mais importantes que o conhecimen­
to do inundo social em que o jovem deve viver. Deixam a seu
cargo — por meio de uma única decisão que nenhuma ga­
rantia oferece, e de uma escolha para a qual não possui for­
mação suficiente — a entrada nesse mundo nôvo.

17 Bticher, “Die Entstehung der Volkswlrtschaft’ 35 pp. 127-128, 1? edÍQ&o.


18 Pelo menos no setor âas "mais novas profissões".
94 Jean Ungricht

Não é de admirar que todos os trabalhos sobre êste tema


culminem na afirmação, sempre repetida: o conhecimento
que os jovens possuem da vida profissional e das profissões
individuais é extraordinariamente superficial, assustadora­
mente restrito. A. Fischer, cujas observações devem figurar
aqui, foi o primeiro que chamou a atenção geral para o fato.
À escolha profissional — diz êle — não é atribuída tôda a
importância que realmente tem. Mostra que o desconheci­
mento das profissões generalizou-se; que a sua avaliação é
falha, tanto nas camadas altas da população quanto nas bai­
xas ; que a juventude não tem das profissões um conhecimento
suficiente; e que falta, principalmente, uma exata noção das
exigências da profissão e das perspectivas de futuro que elas
oferecem. Entre o grande número de fatôres da escolha pro­
fissional, que êle analisa, figura em primeiro lugar, còmo fa­
tor decisivo, uma negação: o desconhecimento das profis­
sões19.
Reininger20 afirma que no máximo 15% dos candidatos
tem uma idéia objetiva da profissão e B. Biegeleisen21 asse­
vera que 61% da juventude masculina faz a sua escolha com
um conhecimento mais ou menos claro da vida profissional;
e que 65% das môças não tem da profissão uma noção con­
creta. O que estes autores entendem por idéia concreta da
profissão, não se deduz claramente das suas exposições. Se
a porcentagem restante compreende aquêles que escolhem a
profissão ou grupo profissional de seus pais, então êsses alga­
rismos podem estar certos. F. Baumgarten provou que os
filhos de operários conhecem relativamente bem a profissão
de seus pais. Se, porém, refletirmos sôbre a quantidade de
profissões que os jovens deveriam conhecer para fazer uma
escolha realmente livre, êsse total não iria muito além de 1%.
Uma experiência com alunos de cursos especiais de orienta­
ção profissional demonstrou que todos os alunos de uma das
classes, reunidos, não conheciam mais que umas 100 profis­
sões e das demais ignoravam até mesmo o nome. Se quisés­
semos penetrar mais a fundo, obteríamos resultados ainda
menos satisfatórios. Parece incrível que nem mesmo os que
já têm maturidade saibam dizer mais sôbre as pouco nume­

19 Fischer, “Ueber Beruf, Berufswahl und Beruísberatung” 46 pp. 114-116, 125-126.


20 Lazarsfeld, "Jugend und Beruf“ 93 p. 126.
21 O mesmo, 93 p. 139.
Escolha da Profissão 95

rosas profissões acadêmicas, entre as quais têm de escolher


a sua. Chegamos, assim, a êste resultado: o conhecimento
das profissões não é somente pouco profundo, mas quase ine­
xistente. Liebenberg pôde afirmar, sem exagêro, “que a mo­
cidade das cidades mostra um desconhecimento impressio­
nante da vida profissional". Se perguntarmos ocasionalmen­
te a alguns jovens: “o que sabem vocês sôbre a profissão que
vão escolher e sôbre as suas exigências?" a resposta, na
maior parte das vêzes, será lamentável. Nada sabem sôbre
ela e nem seus pais se incomodam com isso22.
*
* *
Portanto, também do ponto de vista do conhecimento da
profissão, não se pode falar em verdadeira liberdade de es­
colha. Como poderia ser livre, se a liberdade de uma decisão
depende da visão clara de tôdas as condições da escolha?
Os problemas postos aqui se afirmam claramente, se con­
siderarmos a escolha profissional em toda a sua extensão:
não isoladamente, como uma questão individual, mas como
um todo, em conjunto com o desenvolvimento da sociedade
moderna. A problemática da escolha profissional toma, en­
tão, o aspecto de um fenômeno parcial que envolve proble­
mas de interêsse social e geral. Compreendemos que os jo­
vens têm a parcela menor de culpa, frente ao dilema da
escolha profissional. Esta situação é antes, e sobretudo, uma
consequência inevitável do desenvolvimento social. O moti­
vo básico dêsse desenvolvimento é o “total desdobramento
da primitiva cultura em uma multiplicidade de setores cultu­
rais (técnica, economia, direito, política, religião, filosofia,
arte e finalmente também a família). Nós nos encontramos
aqui diante de um paradoxo insolúvel: a plenitude, em rela­
ção material e moral, só é conseguida pelo desabrochar da
vida em múltiplas facetas. Porém essa multiplicidade, justa­
mente, dificulta de modo extraordinário o desenvolvimento
de uma cultura unificada, e a impossibilita até. No decurso
dêsse processo toma-se visível que os diversos setores da cul­
tura de nenhum modo se desenvolvem num mesmo ritmo, de
maneira qúe para a sincronização do processo social surgem
os maiores obstáculos; êfes se exprimem pelas dificuldades
de adaptação da personalidade social-cultural do indivíduo ao
22 Liebenberg, “Beruísberatung, Methode und Technik” 97 pp. 21-22.
96 Jean Ungricht

seu ambiente social, o que corresponde à constante indivi­


dualização do moderno estilo de vida” (Kõnig23).
Justamente porque o processo de desenvolvimento não é
uniforme, surgem tensões e falhas que se manifestam em for­
ma de perturbações da adaptação, com graves prejuízos para
a estrutura social, se não aparecerem mecanismos de ajusta­
mento que restabeleçam a ligação.
Em situação idêntica está o jovem que procura uma pro­
fissão. Vê-se diante de uma tal variedade de circunstâncias
económicas e sociais (tal como se dá com as profissões) que
fica desorientado. No limite entre a vida escolar e profissio
nal surgiu um obstáculo que, crescendo sempre, cria uma
discrepância: a necessidade de escolher por si mesmo uma
profissão e a impossibilidade de fazê-lo. Em alguns casos
mais felizes, o indivíduo é capaz de encontrar uma solução,
sem auxílio de terceiros. A maior parte dos jovens que ter­
minaram seus estudos assemelha-se ao cego que sentindo for­
tes impulsos interiores não pode distinguir a ocasião propícia
à sua realização. Uma impenetrável escuridão envolve as cir­
cunstâncias cujo conhecimento fundamentaria a escolha. Uma
escuridão que de longe em longe se ilumina vagamente. A
escolha profissional realiza-se, por assim dizer, no vazio. Não
é de admirar que exterioridadés e o próprio acaso tenham
fôrça decisiva, sôbre ela.
Agora se compreende a observação feita na introdução
dêste livro; o jovem se encontra, à saída da escola, num “mun­
do novo" completamente diverso do mundo escolar. E o brusco
encontro dêsses dois mundos pode causar um verdadeiro cho­
que. Isso se dá, porém, quando o novo mundo lhe é totalmente
estranho. Enquanto a profissão era determinada pela família, a
realidade profissional significava apenas um alargamento e o
jovem se iniciava na profissão pràticamente “brincando”. Com
a extraordinária mobilidade da sociedade moderna a situação
tornou-se outra e se sobrepõe aos antigos hábitos familiares.
Nestas condições, pode a família ajudar? Não, pois todas as
experiências comprovam que ela não está menos desorientada
em face do problema, que o próprio jovem, e que ficou, em
relação a muitas de suas atribuições, numa posição qui não
condiz com a moderna estrutura social. Se não pode nem

23 KOníg, uZwei Grundbegrifíe der Familiensoziologie0 88 p. 533.


Escolha da Profissão 97

mesmo preencher as suas funções educativas, como poderia


orientar na escolha profissional? Não é sem motivo que foi
obrigada a transferir muitas de suas funções a outros órgãos
da sociedade. Kõnig frisa, justamente, que “a família tem
as mais extraordinárias dificuldades em adaptar-se aos pro­
cessos rápidos do moderno desenvolvimento económico. Ela
está sujeita à lei sociológica segundo a qual nossas opiniões
sobrevivem, quando a realidade de há muito se modificou.
Neste sentido, inclinamo-nos fàcilmente a esperar dela reali­
zações para as quais já não tem capacidade. Continua do­
minada por um retardamento específico, ao passo que os di­
versos setores sociais transformam-se, num ritmo bem dife­
rente. Assim, temos de contar com um hiato inevitável entre
o desenvolvimento da família e o da sociedade. Nos dois ca­
sos, verifica-se uma dificuldade de adaptação de natureza tô-
da especial"24. Em correspondência com o princípio socioló­
gico, o coeficiente de rapidez da vida é sempre maior que o
do sistema ideológico25, as idéias e as avaliações da família
com referência ao mundo profissional atrasam-se de mais ou
menos duas décadas, e quanto mais rápido é o desenvolvi­
mento da sociedade, maior se torna o abismo que as separa.
Devemos admitir, pois, que a família será cada vez menos
capaz de avaliar a importância da escolha profissional e que
se a adaptação do jovem aos ambientes social e profissional
deve ser restabelecida adequadamente, faz-se mister a inter­
venção de um mediador, reintegrando de novo os dois mun­
dos mais ou menos separados.
IV — RESUMO
A pergunta: por que fatores é dominada a escolha profis­
sional e que importância têm êles não pôde, até hoje, ser
respondida de modo completo e científico. O estudo da ques­
tão não se aprofundou ainda bastante, e o método d? pesquisa
não está suficientemente desenvolvido. Mesmo assim os co­
nhecimentos atuais já nos podem facultar uma compreensão
básica, que podemos comparar a uma nota musical dominante,
sobrepondo-se às oscilações da melodia:

24 Kõnig, “Zwei Grundbegnffe der Familiensoziologie” 88 p. 523.


25 Kõnig, “Von der Notwendígkeit einer Familiensoziologie>> 89 p. 61.
98 Jean Ungricht

a escolha profissional depende em medida espanto­


samente alta de exterioridades e acasos, de ideias
e julgamentos falsos, de circunstâncias interiores e
exteriores que dificultam a avaliação conveniente
dos fatôres objetivos adequados. Disso resulta uma
frequente escolha profissional “errada”, distancian-
do-se em todos os graus da profissão realmente
“acertada”, com tôdas as graves consequências que
a acompanham e atingem tanto o próprio indivíduo
quanto a coletividade.
As causas principais deste fenômeno são duas: na época
em que deve fazer a escolha profissional, o jovem não pode
ainda conhecer, em suas reais proporções, as próprias necessi­
dades, desejos e inclinações, nem é capaz de avaliá-los objeti­
vamente. O mesmo se dá com referência à sua capacidade e à
qualidade do seu trabalho; se, apesar de tudo, êle pudesse ana­
lisar-se claramente, não ganharia muito com isso, pois não pos­
sui um conhecimento verdadeiro da realidade profissional. Não
conhece as profissões porque a especialização, a diferenciação
que acompanharam o desenvolvimento económico e técnico
do mundo profissional tomaram tais proporções, que nem se­
quer uma visão de conjunto pode o indivíduo ter delas.
Nenhum esfôrço, da parte do jovem, seria suficiente para
suprimir a linha divisória que separa o mundo da família do
mundo económico. E, lamentavelmente, a família não é mais
capaz de restabelecer a ligação. O desdobramento da cultura
atingiu uma tal amplitude que essa readaptação — tão impor­
tante para o indivíduo quanto para a sociedade — não se pode,
fazer adequadamente, sem ajuda. Toma-se indispensável uma
nova instância capaz de restabelecer a ligação entre o grau
de desenvolvimento do indivíduo e o desenvolvimento da so­
ciedade. Esta instância é a “orientação profissional organiza­
da ”, mal necessário, para falar como E. Bõhny.
TERCEIRA PARTE

CONCEITOS BÁSICOS DA ORIENTAÇÃO


PROFISSIONAL

I — NOÇÕES PRELIMINARES
Como mostramos no capítulo anterior, com o rápido de­
senvolvimento da cultura, da ciência, da economia, da técni­
ca, é impossível que o indivíduo tenha, quando mais não
seja, uma visão de conjunto das profissões. Não podendo,
também, fazer uma idéia clara de si mesmo, o jovem sente
crescer a sua insegurança ante a escolha profissional, passo
decisivo de sua existência. Não pode deixar de enfrentá-la,
e sendo a escolha profissional uma das funções primordiais
da família, é natural que os familiares, os conhecidos, pro­
fessôres, conselheiros, companheiros de escola e todos os que
estão em contato com a juventude, dêem seus conselhos. A
tôdas estas tentativas de influência chamaremos — orienta­
ção profissional — e neste sentido ela sempre existiu. Então:
orientação profissional, no sentido mais vasto, é to­
da medida direta ou indireta, destinada a exercer
influência sôbre a escolha da profissão e a carreira
profissional1.
Aquêle que aconselha tem em vista, certamente, o bem do
orientado. Porém, hoje em dia, não dispõe de meios suficien­
tes para suprir as lacunas já mencionadas. Mesmo que co­
nheça bem as características pessoais daquele que procura sua
profissão (e, paradoxalmente, êste não é, em geral, o caso dos
pais12), não conhece suficientemente as profissões, requisito

1 Mais acertada seria a expressão: “orientação da escolha profissional”, porém foi


aceita por todos a abreviação “orientação profissional”.
2 Ver Nietzsche, "Os maiores erros de julgamento são cometidos pelos próprios
país”... ("Menschlichen, Allzumenschliches” 1, 1. Início p. 423).
100 Jean Ungricht

indispensável para uma orientação objetiva. A sua ajuda po­


de atenuar, mas nunca solucionar o impasse. Êle não provém
da indiferença ou incapacidade dos pais para desempenhar
funções que, no fundo, só a êles competem, mas sim de um
desenvolvimento social que não é possível anular e nem mes­
mo lamentar. Do mesmo modo não podemos lamentar que,
hoje, o comerciante não dirija mais o seu negócio sòzinho e
sim com a colaboração de um técnico; que um contador faça
a escrita comercial, um especialista resolva as questões de
impostos e o arranjo das vitrinas esteja a cargo de um de­
corador competente. Quando a complexidade da vida econó­
mica atinge um determinado grau, os próprios recursos não
são mais suficientes para o desempenho dos deveres habi­
tuais e o técnico especialmente instruido é chamado.
Em relação ao problema da escolha profissional, êste grau
de desenvolvimento foi alcançado muito antes da l.° Guer­
ra Mundial. Porém, ainda eram necessários novos impulsos
para ampliá-lo ainda mais, a ponto de exigir a assistência de
um técnico e, consequentemente, a criação de uma nova pro­
fissão. Não quero alongar-me mais; por enquanto basta sa­
ber que no decurso dêsse desenvolvimento deviam surgir, co­
mo surgiram, necessidades e aspirações impondo a solução do
problema em bases mais amplas. Só então apareceu também
a expressão "orientação profissional”, que não é equivalente
à que hoje se usa. Atualmente, entende-se por “orientação
profissional” no sentido exato, o conjunto de medidas que, em
larga escala, com métodos especiais e segundo determinados
princípios, tem em mira uma influência planejada sôbre a es­
colha profissional e a sua concretização.
Confrontando-a com a “espontânea, natural, selvagem”
orientação profissional (na expressão de O. Stocker3), pode­
mos denominá-la “orientação profissional organizada". As­
sume uma posição mediana, equilibrada, acessível a todas as
possíveis transformações, e a sua aplicação interessa prin­
cipalmente à futura geração, em algumas emprêsas, profissões
e grupos profissionais.
De agora em diante, quando usarmos a expressão orien­
tação profissional, queremos referir-nos, segundo o significa­
do corrente da língua, a uma organização, instituição. Esta

3 Stocker foi secretário da Liga para a Orientação Profissional e Assistência aos


Aprendizes, até 1932.
Escolha da Profissão 101

instituição exerce suas funções — como já dissemos atrás —


em um setor da organização social, comparável ao ponto ex­
tremo de uma alavanca, onde forças mínimas provocam rea­
ções extraordinárias. Um trabalho tão rico em consequências
deve ser empregado como regulador da adaptação em concor­
dância com as reais exigências da sociedade, sem nunca correr
o risco, como tantas outras instituições, de transformar-se num
fim em si mesmo.
Examinaremos agora as suas bases e diretrizes. Ques­
tões históricas, metódicas e de organização não devem ser
levantadas aqui, pois não é esta a finalidade dêste exame.
II — HIPÓTESES
Por quê se tomou necessária uma orientação profissio­
nal? Supondo que todos os homens fossem igualmente aptos
para o trabalho, que todos êles se dedicassem à sua tarefa com
a mesma disposição, e ainda que nenhuma circunstância ex­
terior se opusesse ao seu desempenho, teríamos uma perfeita
identificação de cada indivíduo com o seu trabalho e a orien­
tação profissional seria completamente dispensável.
Isto, porém, não se dá. Os homens são diferentes e con­
tinuarão assim. Parece ocioso mencionar a natural desigual­
dade em relação a determinadas atividades ou profissões e
mesmo assim há sempre quem a negue, afirmando que não
importa o que o homem faz, mas como o faz. Esta assertiva
baseada na verdadeira (e não apenas justa) igualdade, con­
tradiz tôda experiência e supõe que o indivíduo possa mol­
dar as circunstâncias (inclusive as que dizem respeito ao seu
trabalho) a seu bei prazer, apenas com a fôrça do seu pensa­
mento. Quem apregoa hoje a igualdade dos homens, passa
por cima, não só das experiências, mas também dos resul­
tados obtidos pela psicologia diferencial em sua aplicação
prática; desconhece simplesmente um terreno já pesquisado,
relativamente nôvo mas largamente firmado.
Portanto: os homens são diferentes, tanto,em relação à
capacidade, quanto às necessidades e às circunstâncias ex­
teriores da vida. Se apenas um dêstes fatores fosse variável,
a escolha profissional já seria problemática. Ê ainda mais
difícil quando todos os três variam, chegando o momento
em que o indivíduo não consegue mais avaliar corretamente
a situação4. Grandes podem ser as variações de cada fator
e as reações que elas provocam, criando-se uma verdadeira
102 Jean Ungricht

perplexidade, mormente quando as possibilidades oferecidas


pelo mundo profissional são também numerosas. Nas regiões
(por exemplo entre os esquimós) em que o trabalho está ain­
da na fase primitiva, dadas as circunstâncias geográficas,
climatéricas e outras, ou em virtude da exploração unilateral
de determinados ramos de comércio (por exemplo gado), ou
da indústria (por exemplo bordados), todas as fôrças de pro­
dução são orientadas para algumas profissões sòmente, não
existindo grandes problemas de escolha. O aspecto é outro
quando a subdivisão do trabalho multiplica os ramos profis­
sionais .
Do ponto de vista histórico quando, pois, se criou esta
situação? Entre os povos cultos (mesmo entre os mais anti­
gos) sempre existiu uma certa subdivisão do trabalho, o que
nos faz crer que ela é inerente ao desenvolvimento cultural45.
A divisão do trabalho iniciou-se nos primórdios da ci­
vilização. As primeiras profissões, as profissões de origem
(como por exemplo as dos colecionadores, pescadores, caça­
dores, agricultores, pastores, sacerdotes, médicos, cantores, te­
celões, oleiros, ferreiros, marinheiros, pedreiros, carpinteiros),
já eram completamente diferentes uma das outras, embora
houvessem surgido para atender às primeiras necessidades do
homem. O seu número reduzido não criava problemas de es­
colha. Nem existia ainda êsse problema na Antiguidade,
quando se cristalizavam, com a formação dos povos, algumas
profissões fundamentais (as dos serralheiros, marceneiros,
canteiros, seleiros, ourives, torneiros, tintureiros, curtidores).
O trabalho autárquico dos conventos, no início da Idade
Média, quase não enriqueceu a lista de profissões. Os mon­

4 uoloquemo-nos na situação de um menino que cresceu numa aldeia de camponê-


ses na montanha. Na escola, destaca-se por uma extraordinária inclinação para o de­
senho. Inclinação: como pode êste menino, que só conhece o ambiente camponês,
saber quais as profissões em que o seu gôsto pelo desenho pode ser aproveitado?
Aptidão: como pode êle julgar se possui um verdadeiro talento e se vale a pena esco­
lher a profissão de desenhista? Circunstâncias exteriores: e onde fazer a aprendi­
zagem? Como conseguir os meios (seus pais não são ricos) para um aperfeiçoamento
fora da sua pequena aldeia? Como pode êle saber onde conseguir um daqueles 1000
lugares estipendiados pelo Govêmo e a quem se dirigir? Não podemos esperar que
normal mente tais perguntas sejam respondidas pelos próprios interessados.
5 Pelo menos enquanto o desenvolvimento cultural se relaciona com as condições
da vida material. Pois se as pesquisas de D.L.R. e E.O. Lorimer sôbre o povo
Hunsa, recentemente publicadas por R. Bircher, se confirmarem, temos ai um fenô­
meno singular. (Bircher, “Hunsa, das Volk, das keine Krankheit kennt” 20).
Escolha da Profissão 103

ges certamente não enfrentavam problemas de escolha, pois


o trabalho não obedecia ainda a uma disciplina rígida, ao
passo que uma orientação segura lhes era dada pelas regras
conventuais, sempre rigidamente observadas6.
O florescimento da cultura nas cidades e a aceitação das
ciências árabes, a invenção da pólvora, o aparecimento do
papel e a penetração dos produtos coloniais, não chegaram a
ampliar muito o quadro das profissões. A dificuldade de se­
lecionar uma delas continuava inexistente.
Com o desenvolvimento industrial iniciou-se a transfor­
mação decisiva. O trabalho manual foi substituído pelo da
máquina; novas profissões se formaram; pela Revolução
Francesa, a economia foi libertada das restrições que a cons­
tituição das Corporações lhe impusera; desenvolveram-se a
indústria e o comércio; surgiu o trabalho nas fábricas e à me­
dida que o sistema capitalista se impunha decrescia a inse­
gurança económica (em relação às necessidades de lucro e
de garantir a alimentação). Disto tudo resultou um explo­
sivo desenvolvimento da hierarquia profissional. Finalmen­
te — após a queda de todas as barreiras — quando a popu­
lação do campo e das cidades correu para as fábricas e ofici­
nas, e a liberdade de estabelecer-se foi garantida; quando o

6 Ainda não foi escrita uma verdadeira história da profissão, nem a história com­
pleta das profissões. Podem ser encontrados dados históricos sôbre algumas profissões
e principalmente uma bibliografia muito rica sôbre as circunstâncias económicas e
sociais de algumas épocas e de alguns países. Infelizmente, em sua maior parte se­
guem pontos de vista diversos e apresentam material pobre em relação à profissão
prôpriamente dita. O profissional vê-se obrigado a efetuar a busca por si mesmo,
valendo-se da volumosa literatura, histórica, económica e social, principalmente com
referência a épocas passadas:
BQchsenschtitz, "Besitz und Erwerb im griechlschen Altertum” 36.
Francotte, *L'industrie dans la grèce anclenne" 47.
Glotz, “Le travail dans la grèce ancienne* 56»
Frank and Others, *An Economic Survey of Ancient Rome” 48
Louis, *Le travail dans le monde Romain" 106.
Heichelheim, "Wirtschaftsgeschichte des Altertums” (mit reichhaltigem Komen-
tar) 64.
BlUmner, “Technologie und Terminologie der Gewerbe und Ktinste bei Griechen
und Rõmern* 22.
Neurath, “Antike Wirtschaftsgeschichte” 118.
Reinhardt, "Helvetien unter den Rõmern” 128,
Schaube, "Handelsgeschichte der rõmischen Võlker des Mittelmeergebietes” 132.
Kõtzschke, “Allgemeine Wirtschaftsgeschichte des Mittelalters” 90.
Kulischer, “Allgemeine Wirtschaftsgeschichte des Mittelalters und der Neuzeit” 92.
Canevascini, “Die menschliche Arbeit durch die Jahrhunderte” 39.
104 JeanUngricht

crédito se desenvolveu e o inventor viu-se, enfim, livre de


restrições — nasceu a grande indústria. Com ela teve início
uma vasta industrialização, cujas principais características,
um constante e progressivo desdobramento e a análise dos
métodos de trabalho, elevaram o número de profissões para
a casa dos milhares. O burguês médio desconhece estas inu­
meráveis e novíssimas profissões. Não as conhece nem de no­
me, quanto mais p*Io conteúdo. Ignora também quais os ca­
minhos que conduzem a elas, as possibilidades que oferecem,
suas vantagens e desvantagens e suas dificuldades. Agora já
existe o problema da escolha profissional. Êste é o solo no
qual a orientação profissional pode e deve medrar e a justi­
ficação de sua existência.
Em poucas palavras: a existência de uma sociedade cu­
jas atividades se ramificam em um grande número de profis­
sões diferentes, criou a necessidade de uma orientação profis­
sional que pudesse substituir adequadamente aquela que a fa­
mília (a quem cabe por natureza essa função), não é mais
capaz de ministrar.
A maior justificativa da necessidade de uma orientação
profissional é a liberdade de escolha. Quando não existe li­
berdade de escolha, a orientação não tem sentido. Ela só po­
de existir nos países onde esta liberdade é garantida.
Na Antiguidade, fortes preconceitos de classe restrin­
giam muito a livre escolha da profissão. Aos gregos e ro­
manos (homens livres) estavam abertas talvez uma dúzia de
profissões, quase exclusivamente aquelas que se relacionavam
com a direção do país. Todo o resto era trabalho de escravos,
cuja escolha profissional náda tinha de livre. A época das
Corporações marcou a florescência do artesanato, ou mais
precisamente o de sua predominância. A organização das Cor­
porações apoiava-se totalmente na economia industrial. A
produção e a troca de produtos eram controláveis. Restrin­
giam-se aos limitados mercados locais cujas necessidades,
bem conhecidas, eram também estáveis. A constância da pro­
dução gerava a regularidade do trabalho. Uma e outra po­
diam ser controladas e qualquer conjuntura futura prevista
com exatidão. Toda tentativa de alteração era prontamente
sufocada. O poder económico e político estava condicionado
à participação na Corporação, tinha continuidade no agru­
pamento e na família. Pràticamente não existia liberdade de
escolha profissional, pois ela já era determinada pela des­
cendência. Mas não só essas questões estavam tão bem re­
Escolha da Profissão 105

gulamentadas naquela época; cada detalhe do exercício da


profissão também, e de tal forma que, com o tempo, a orga­
nização destruiu-se a si própria, por desnecessária. O que sig­
nificava segurança transformou-se em sujeição. As prescrições
rígidas impediam as Corporações de seguir a passo com o pro­
gresso e essa hipertrofia as sufocou7.
Mas só em 1791 anunciou-se no Parlamento Francês
que as Corporações não mais existiam. Tiveram ainda um re-
crudescimentõ na Suíça, nas épocas da Mediação e da Res­
tauração, mas a liberdade de escolha impunha-se cada vez
mais e a livre indústria, garantida pela Constituição Federal
de 1874, também. Tôdas as barreiras tinham ruído, e com
elas tudo o que as Corporações haviam feito pela instrução e
o aperfeiçoamento das novas gerações. O indivíduo conquis­
tara a liberdade de ser o que desejava e como desejava. Ne­
nhuma prescrição ou diretriz facilitou a transição. Com isto
implantou-se uma verdadeira anarquia profissional, a que se
seguiu uma rápida degenerescência. Os representantes da
Suíça verificaram com apreensão, nas exposições mundiais de
Paris (1867) e de Viena (1878) a que ponto sua indústria ti­
nha descido, em comparação com a de outras nações8. Ve­
rificou-se uma forte reação. Os Cantões iniciaram-na e a Fe­
deração fêz o resto. As primeiras iniciativas partiram de par­
ticulares, que compreenderam logo a seriedade da situação,
e culminaram posteriormente na orientação profissional9.
Hoje a liberdade de escolha é um direito inconsciente. Atra­
vés do estudo dos fatores da escolha profissional, temos cons­
tatado, porém, que ela sofre ainda muitas limitações10.
* ¥ *
Podemos supor, finalmente, que exista o desejo de solu­
cionar a questão da escolha profissional, seja pela compreen­
são e prontidão em deixar-se orientar (da parte daqueles que
desejam escolher uma profissão), seja pela aceitação dêsse
dever, por parte da sociedade.
As duas hipóteses são viáveis. Entretanto, não bastavam
7 Ver» talvez, Schnyder e Nabholz, “Quellen zur Zurcher Zunftgeschichte” 137.
8Ver as observações resumidas que H. Stettbacher faz em “Das Pestalozzianum ín
Zílrich* 143 p. 7.
9 Fraueníelder, “Geschichte der gewerblichen Berufsbildung in der Schweiz" 49.
10 Ver Lotmar, “Die Freiheit der Berufswahl” 105.
e Dunkmann, “Die Lehre vom Beruf” 42 pp. 275-281.
106 Jean Ungbicht

para que se criasse a orientação profissional. Supondo que


se houvesse atingido um grau de desenvolvimento económico
que tornasse impossível uma “solução natural” da escolha
profissional; supondo que existisse o direito de escolher li­
vremente uma profissão, era preciso também reconhecer que
nem tôda profissão serve para cada indivíduo e que nem to­
dos os indivíduos se sentem inclinados a exercer qualquer
profissão; supondo que já existisse um conhecimento da pro­
fissão e houvesse sido feita uma diagnose da personalidade
daquele que escolhe, isto tudo não resultaria ainda em orien­
tação profissional.
Ela só poderia surgir quando se reconhecesse a necessi­
dade de uma solução mais acertada: no interêsse dos aspi­
rantes a profissão, que a solicitariam voluntàriamente; em
benefício da coletividade, resultando na criação, pelo Gover­
no, independentemente de solicitação individual, de órgãos de
orientação profissional que seriam aproveitados conveniente­
mente, sob fiscalização oficial, a exemplo do que se verifica
com o ensino primário.
A formação e a educação eram também deveres intrín­
secos à família. Chegou o momento, porém, em que ela não
pôde mais desempenhá-los na medida desejável. O desenvol­
vimento cultural forçou então uma solução em bases
mais amplas, fora do âmbito familiar. Não foi por acaso que
a instalação de escolas públicas fêz paralelo ao desenvolvi­
mento económico, anteriormente citado. A nova situação
exigia uma nova formação, e o Govêmo criou as escolas pú­
blicas. Quando o interêsse público está em jogo, surge inevi-
tàvelmente a tendência para a imposição e a obrigação. O
mesmo se dá com a orientação profissional. Novas vozes le-
vantam-se constantemente, exigindo uma obrigatoriedade
compreensível quando se reconhece a importância dessa orien­
tação . A instrução obrigatória acarreta uma elevação do ní­
vel intelectual que não deixa de repercutir sôbre a vida eco­
nómica da coletividade. Mas não leva a uma transformação
estrutural direta. A orientação profissional obrigatória, ao
contrário, não pode existir por si mesma, mas desencadeia
uma corrente de reações que provocam transformações bá­
sicas na vida económica da nação. Se o Govêrno impuser a
cada cidadão o dever de submeter-se à orientação profissio­
nal, deve dar a cada um a possibilidade de preparar-se para
a profissão escolhida, ou essa orientação será apenas uma far­
sa sem sentido; é preciso, ainda, que depois da aprendizagem
Escolha da Profissão 107

lhe seja garantida uma colocação. E isto é impossível, sem


uma economia dirigida e um plano global de distribuição das
forças de trabalho.
E. Jucker, principalmente, adverte, há muito, que a obri­
gatoriedade da orientação profissional leva forçosamente a
uma economia dirigida11. Se pretendemos conservar o nos­
so atual sistema económico, não poderemos impor a orienta­
ção profissional. A Liga de Orientação Profissional e Assis­
tência aos Aprendizes, sustenta, por isso, que ela deve ser
voluntária. Não nos cabe opinar, aqui, sôbre esta questão que
ainda está sendo debatida em vários paises1112.
III — OS DOIS TIPOS BÁSICOS DE ORIENTAÇÃO
PROFISSIONAL
Se as hipóteses aventadas atrás fôssem aceitas, e com
elas a orientação profissional, duas atitudes opostas seriam
admissíveis na sua aplicação. É fácil identificá-las, pergun­
tando: a serviço de quem ou de que está a orientação pro­
fissional?
O trabalho profissional não é uma atividade qualquer,
mas sim trabalho nos moldes de uma sociedade. Na profis­
são o indivíduo trabalha para si e ao mesmo tempo para
outros, a quem está ligado por fôrça da situação profissional.
Com isto nos são dados os dois pólos extremos: a orientação
pode preocupar-se exclusivamente com o indivíduo, ou tam­
bém com o interêsse da coletividade. No primeiro caso ela
representa um individualismo, e no segundo um eudemonis-
mo social. Se quisermos considerá-la trabalho educativo, en­
tão ela aparece como divisão especial da pedagogia individual
ou da pedagogia social.
1. O tipo individual eudemonístico
Seria uma forma extrema ou solipsística, se pudesse exis­
tir. Mas nem sequer podemos fazer dêle uma idéia, posto

11 Ver debates de diversos autores: “Dem Obligatorium entgegen?" 170.


12 Sôbre êste desenvolvimento ver:
Fraunfelder, “Geschichte der gewerblichen Berufsbildung der Schweiz” 49.
pp. 166-177.
Liechti, “Probleme des Berufs ...” 99 pp. 106-143.
Stocker, “Festschrift zur Feier des 25 jàhrigen Bestehens des Verbandes ftir
Berufsberatung und Lehrlingsftlrsorge” 169 pp. 20-72 e nessa mesma obra, diversos
outros autores 169 pp. 195-244.
108 Jean Ungbicht

que o indivíduo ocupado exclusivamente consigo mesmo não


poderia ter uma profissão. Profissão se relaciona com socie­
dade. Abordaremos, portanto, a questão sob êste aspecto: o
indivíduo é o centro, seus interêsses são exclusivos, seu bem-
-estar está em jogo, sua felicidade é pretendida. Critérios es­
tranhos à personalidade são apreciados somente quando êle
o deseja ou o seu bem-estar o exige.
Mas o que é bem-estar? Ê a capacidade de gozar serena­
mente, de realizar; significa o desenvolvimento da personali­
dade, a harmonização de tôdas as fôrças, o desabrochar de
aptidões especiais ou do conjunto de aptidões, a individua­
ção, segundo Jung; aquilo que Pfãnder chama de "nascimen­
to da personalidade”13, ou desenvolvimento espiritual.
A resposta seria certamente diferente, se fosse dada pelo
Sacro Colégio da Igreja Católica ou por um adepto das teo­
rias de Marx. Depende inteiramente do ponto de vista filo­
sófico daquele que responde, especialmente do que êle consi­
dera "o sentido da vida” e do significado que atribui à pa­
lavra “homem”.
A orientação é dada, portanto, (como de resto tôda lição
educativa) em função da "visão do mundo” que está por de­
trás dela e a penetra, seja consciente ou inconscientemente.
Não é de pouca importância considerar claramente êste pon­
to, para não cair no êrro de acreditar que exista uma orienta­
ção profissional completamente independente, puramente ob­
jetiva, neutra.
É necessário que o orientador conheça bem as condições
sob as quais deve exercer sua atividade e as diretrizes que
deve seguir, pois se assim não fôr aplicará, infalivelmente,
métodos estranhos à personalidade. Não há dois caminhos
para a orientação do tipo individual eudemonístico. Deve-se
renunciar aos pontos de vista metafísicos em favor de um
único, puramente subjetivo, a felicidade daquele que é orien­
tado. Deixando de lado as opiniões, o que nos dá realmente
a medida da felicidade de um homem é a “sua própria expe­
riência de uma vida feliz". A orientação profissional torna-se,
assim, um problema psicológico e a indagação principal pas­
sa a ser: que profissão pode assegurar a êste indivíduo — con­

13 Ver explanação sôbre “Urtrieb” em Pfãnder, “Die menschliche Seele” 121 pp.
214-279.
Escolha da Profissão 109

siderando-se as circunstâncias em que vive — um máximo


de felicidade pessoal?
Devemos mencionar aqui a rçlação existente entre orien­
tação profissional e educação. Toda medida educativa tem
em mira o homem, o mundo, a vida e o sentido da existência,
expressos nos ideais de educação e cultura. De acordo com
êles tenta-se formar a criança desde os primeiros dias da
sua existência; a influência dêsses ideais se estende pela vi­
da a fora. Sua influência é, por isto, extraordinária. Come­
ça muito cedo e dura para sempre, permitindo que um deter­
minado desenvolvimento seja forjado e modelado, dentro
dos limites das inclinações individuais, ou evitado quando
indesejável.
A orientação profissional é diferente. Temos diante de
nós um homem: seu caráter já está formado, sua visão do
mundo mais ou menos firmada, suas exigências e necessida­
des fixadas. A influência que a orientação exerce sôbre êle é
temporária e limitada. Não pode, nem deve transformar o
terreno já preparado pela educação (excluídos alguns casos
excepcionais). Sua tarefa consiste em tornar fértil aquilo que
a educação preparou. A orientação profissional e a educação
não estão, pois, em oposição, mas se completam.
Disto tudo resulta que a orientação profissional devia
acautelar-se contra o apêgo a critérios próprios. Seu papel é
complementar e dependente. Deve tomar como base para o
seu trabalho aquilo que a educação plasmou durante anos,
e arrematar, pôr os pontos nos ii14, por assim dizer. Parece-
-me justificado o seu emprêgo, enquanto fôr individual, eude-
monística e responsabilizar-se pela felicidade do indivíduo.
A felicidade é uma resultante de tendências individuais, in­
fluências da educação e experiências pessoais feitas no de­
correr da existência. Varia de indivíduo para indivíduo. A
tarefa da orientação profissional individual, eudemonística,
é descobrir quais as necessidades que deverão ser satisfeitas
mais tarde, para garantir ao indivíduo tôda a felicidade pos­
sível em relação à profissão, e quais os caminhos certos para
atingir essa finalidade. Aliás qualquer escolha profissional

14 Mesmo assim sua tarefa é educativa. Estimula a autoformaçâo, por uma visão
objetiva de si mesmo e a acareação com a realidade. Para a maioria das pessoas
êste confronto é feito pela primeira e única vez na vida por ocasião da escolha
profissional,
110 Jean Ungricht

tende ao mesmo fim. Ninguém escolhe sua profissão por in-


terêsses político-económicos.
A orientação (quer seja ministrada por estabelecimento
especializado ou pelos pais) deve procurar sempre o bem do
orientado. Afastando-se demais dêsse propósito, não inspi­
rará confiança, nem será procurada.
As profissões, porém, só existem em sociedades organi­
zadas e se cada indivíduo busca apenas a “sua profissão”,
seu destino, a realização de sua vocação, podemos indagar:
onde nos levará isto? Haverá lugar para tantas individualida­
des altamente cultivadas?
A orientação seria absurda se considerasse unicamente
o bem do indivíduo, esquecendo as necessidades inegáveis e
reais da sociedade, que devem constituir um limite, uma fron­
teira respeitada.
2. O tipo social-eudemonístico
Como a atividade só é considerada trabalho profissional
quando exercida em plano social, êste tipo de orientação deve
estar ao alcance de todos os grupos sociais de interêsse para
a sociedade. Assim, em qualquer ramo de atividade, a exis­
tência de uma nova geração numerosa e de um nível qualita­
tivo satisfatório tem importância vital. Também para a pró­
pria nação, como já dissemos atrás, é importante em muitos
sentidos. Se a sociedade tivesse plena consciência dêsse fato,
poderia esforçar-se para exercer maior influência sôbre a ju­
ventude. Mas, até então, cuidava-se apenas de interesses eco­
nómicos ou políticos, sem dar maior atenção ao bem-estar
dos jovens, a não ser em benefício próprio.
Historicamente falando, o Corporativismo elaborou os
primeiros regulamentos da geração nova. E a indústria pri­
vada seguiu-lhe os passos, tentando atrair a juventude pela
propaganda e selecionando os elementos mais capacitados.
Os demais que se arranjassem... não se tratava de orienta­
ção profissional, mas de recrutamento da nova geração. Isto
era feito quase exclusivamente por meio de certificados, re­
comendações ou uma boa apresentação pessoal, com a única
finalidade de excluir os incapazes para determinada profissão
(isto é, os que acarretariam despesas prejudiciais). Sob a in­
fluência de Taylor, Múnsterberg e dos psicotécnicos que os
seguiram, em primeiro lugar na América, depois na Alemanha
e em outros países, essa seleção passou a servir às emprêsas..
Escolha da Profissão 111

O objeto da orientação era, não o candidato, mas a emprêsa15.


Originàriamente toda a psicotécnica estava a serviço desta
orientação, que poderíamos chamar acertadamente de orien­
tação da emprêsa ou das forças de trabalho16. A orientação
era utilizada somente para obter do indivíduo o máximo de
produção, em proveito do empregador. As Ligas Profissio­
nais, sob pressão de grandes grupos económicos, escolhiam
ou rejeitavam os candidatos, sem considerar as reações in­
dividuais e o seu efeito sôbre a economia nacional.
Quando a liberdade de trabalho é ilimitada, cada grupo
profissional quer aplicar — em relação à nova geração de
trabalhadores — as medidas que mais lhe convêm. Se, com
isto, o indivíduo se sente feliz ou infeliz, e outros ramos da
economia são privados de forças valiosas, não interessa a
ninguém.
Para assegurar a verdadeira liberdade económica, era pre­
ciso solucionar o problema da nova geração. Até o início do
século, porém, nada se fêz nêsse sentido. Medidas oficiais
tiveram que ser tomadas por fôrça da necessidade, quando
as indesejáveis consequências da "livre” escolha profissional
baseada em interêsses económicos anárquicos, se tornaram vi­
síveis. Mas foram pontos de vista puramente económicos e
não sociológicos ou educativos que as inspiraram. O indiví­
duo era importante na medida em que se constituía em obs­
táculo ou impulso para o desenvolvimento económico. A ati­
tude de Hische17 é típica. Êle diz: "eu entendo do seguinte
modo a "economia humana". A escola e a profissão devem
valorizar e desenvolver as capacidades físicas e psíquicas do
indivíduo, pelo tempo e com a intensidade requeridos para
que produzam o máximo efeito, economicamente falando. Do
trabalho decisivo da escola e dos departamentos profissionais
depende a acertada distribuição dessas forças pelos diversos
ramos económicos: agricultura, indústria e comércio; final­
lõ Sôbre êste desenvolvimento ver:
Taylor, “The Principies of Scientific Management" 147.
Munsterberg, “Fsychologie und Wirtschaftsleben” 116.
Piorkowskí, “Die psychologische Methodologie der wirtschaítlichen Beruíseig-
nung” 123.
16 Sôbre organização e orientação profissional nos diversos países:
Keller and Viteles, “Vocational Guidance Throughout The World” 83 e sôbre o
desenvolvimento especial na América, desde 1920: “Occupations, The Vocational Gui­
dance Magazine” 168.
17 Hische, “Das Eignungsprinzip" 66 p. 43.
112 Jean Ungricht

mente, delas depende o seu emprêgo racional, com o fim de


obter o máximo de rendimento em quantidade e qualidade".
O homem é transformado numa máquina da qual se de­
ve tirar, com ajuda da orientação profissional, um rendimen­
to máximo. As necessidades económicas dizem a última pa
lavra. A orientação profissional passa a significar indicação
profissional.
Na Suíça, Luick18 é atualmente o defensor dêsse ponto
de vista. Êle afirma que as questões económicas devem ter
primazia. A orientação profissional constituiria um setor es­
pecial da política económico-social, principalmente política do
trabalho. Fala numa política profissional que perduraria,
abrangendo todas as medidas necessárias ao desenvolvimen­
to da nova geração profissional, inclusive a orientação das
massas de acordo com as conveniências da profissão. Eco­
nomia profissional significaria então "política profissional go­
vernamental, considerada sob o ponto de vista das necessida­
des futuras, quantitativas, de forças de trabalho, das diversas
profissões". Obedeceria às injunções das Ligas Profissionais
e grupos económicos e se ocuparia em distribuir equilibrada-
mente as forças de trabalho, pelos diferentes ramos profis­
sionais19.
Caracteriza-se, assim, êste segundo tipo básico de orien­
tação profissional. Defendem-no principalmente os economis­
tas políticos e o próprio Govêmo, passando de uma concep­
ção liberal da economia para a economia dirigida. No Es­
tado totalitário êste é tudo e o indivíduo nada. Muito antes
do Terceiro Reich, a idéia já tomava forma. D. Dunkmann
(entre outros) afirma que o bem-estar individual tem que se
submeter ao bem-estar geral. Não podem existir opiniões di­
vergentes. Não entra em questão o indivíduo, mas sim o todo,
e se na guerra cada cidadão sacrifica a sua vida pela pátria,
por que, então, não poderá fazer, na paz, o sacrifício de suas
inclinações e aptidões?20

18 Luick, “Der beruf liche Nachwuchs in der Schweiz" 107 p. 139.


19 Nem sequer deve ser mencionada uma economia profissional que não tenha por
objeto o indivíduo, os grupos sociais, a nação e a humanidade em geral. Por en­
quanto, formam ainda as nações e as unidades económicas menores, a moldura real
para todos os tipos de orientação profissional (Ver observações de Liechti, “Probleme
des Berufs" 99 pp. 58-61).
20 Dunkmann, “Die Lehre vom Beruf” 42 p. 283.
Escolha da Profissão 113

Qual das duas modalidades ou que outra solução con­


viria melhor à Suíça? É bom verificar, primeiro, de que for­
ma é feito o recrutamento dos candidatos a profissão.
IV — NORMAS DE JULGAMENTO
Tôdas as ponderações sôbre a escolha profissional devem
culminar numa decisão — a de seguir uma determinada pro­
fissão. Para que não seja obra do acaso, esta resolução deve
fundamentar-se no exame objetivo e na avaliação acertada
de numerosos fatores, que variam de caso para caso, não só
em número mas também em importância. Por isto pouco adi­
antaria fazer uma lista e estudá-la ponto por ponto. Seria
aconselhável dividi-los em grupos homogéneos criando, as­
sim, certas normas básicas de comparação e julgamento, cuja
importância poderia, sobretudo, ser discutida. H. Bogen di-
vide-os em dois grandes grupos: fatores internos e externos;
E. Joseph-Lussheimer segue-o, citando grupos de fatores en­
dógenos e exógenos. O primeiro grupo subdivide-se, por sua
vez, em dois. De um lado prazer... amor... isto é, aspira­
ções, necessidades; do outro, habilidade, dons, conhecimentos,
ou seja, capacidade. Os três pontos principais a examinar
são, pois, l.° — capacidade; 2.° — inclinações; 3.° — ambiente
de vida e relações familiares e sociais (fatores externos).
1. Capacidade
Quando um indivíduo escolhe uma profissão, exige-se em
primeiro lugar, que êle seja capaz de exercê-la. A capacidade
é, portanto, um dos pontos básicos da orientação profissional.
Avaliar a capacidade é difícil: primeiro, por se ter generaliza­
do a convicção de que todo indivíduo sadio pode exercer qual­
quer profissão com o mesmo sucesso, mais ou menos; segun­
do, devido a uma valorização exagerada da capacidade.
Sôbre o primeiro item temos a observar o seguinte: a ex­
periência diária comprova que o sucesso profissional não de­
pende somente de circunstâncias exteriores (como por exem­
plo a situação do local de trabalho, relações etc.) mas igual­
mente do valor profissional. O sucesso de profissionais que
trabalham em condições idênticas não é igual. O motivo do
sucesso está, pois, nêles próprios, ou seja: nem todos os indi­
víduos são igualmente dotados para cada profissão. O fato
é tão evidente que dispensa comentários. Assim, o músico
114 Jean Ungricht

necessita de um talento especial. O cartógrafo deve saber de­


senhar com perícia. As profissões liberais pressupõem um cer­
to grau de inteligência. Um carregador deve possuir grande
força física. Um daltónico nunca poderia ser sinaleiro de
estrada de ferro e, sem habilidade manual, ninguém se dis­
tinguiria como artesão. Èstes são exemplos banais, compro­
vando que o sucesso na profissão está, sem dúvida ligado a
certos atributos pessoais. Mas nem há, hoje em dia, trabalho
profissional para o qual não se possa escolher, dentre um
certo número de candidatos, os mais capazes. Se assim não
fosse, o ordenado e o contrato de trabalho não teriam razão
de ser. Nem esse sistema se teria implantado se não se apoias­
se em bases muito reais. Dizem alguns que a nivelação do
trabalho pelo sistema da produção em série toma supérflua
a capacidade profissional. Esta objeção se destrói por si mes­
ma. Em primeiro lugar, apenas uma pequena parte dos ope­
rários trabalha ininterruptamente; e o trabalho em série de­
pende justamente da habilidade do indivíduo. Se êle não ti­
ver capacidade de reação e um certo grau de agilidade, não
acompanhará o ritmo do trabalho. A "mesa rolante * não dis­
pensa a capacidade, exige-a” (Hische x).
Portanto, a experiência diária já não deixa dúvidas
quanto à importância da capacidade profissional. A pesquisa
científica completou o trabalho de esclarecimento. Taylor2 e
Munsterberg3 foram os responsáveis por êsse desenvolvimen­
to4 apoiado em rica bibliografia, e que ainda hoje continua5.
Segundo Híscht6, a capacidade tem uma importân­
cia indiscutível, porque “todo e qualquer trabalho
executado com çu sem aprendizagem prévia, exige
um certo grau de predisposição e capacidades físicas
e espirituais (psicofísicas)”.
Na escolha profissional, a capacidade é considerada um
'atributo natural e necessário. Até que ponto, indagaremos?

* Wandertich, em alemão, corresponde às esteiras transportadoras que levam o


material ao encontro do operário. (N. do E.).
1 Hische, “Das Eignungsprinzip” 66 p. 19.
2 Taylor, “The principies of scientific management” 147.
3 Mtinsterberg, “Psychologie und Wirtschaftsleben” 116.
4 Também já Platão, Kant, Huerta, Maray, Imbert e outros.
5 Por exemplo com Baumgarten em “Die Berufseignungspriifung" 11.
6 Hische, “Das Eignungsprinzip” 66 p. 29.
Escolha da Profissão 115

Para responder é preciso, antes de tudo, conhecer as exigências


das diversas profissões.
As informações indispensáveis nos são dadas pela
psicologia da profissão e, dentro dela, pelas pesqui­
sas sôbre a capacidade profissional. Devemos in­
vestigar quais são as qualidades psicofísicas exigi­
das para o desempenho das atividades profissionais,
e em que grau devem existir para uma boa execução
(quantitativa e qualitativa) do trabalho7.
Por intermédio da pesquisa seria estabelecida uma rela­
ção adequada entre homem e trabalho, evitando-se o exercí­
cio de atividades que não correspondessem às qualidades na­
turais, físicas e psíquicas, do agente. A finalidade da pesquisa
é, portanto, verdadeiramente, uma “economia humana”, isto
é, uma distribuição científica das forças de trabalho, que só
pode ser conseguida pela diferenciação. Para isso, os velhos
padrões de escolha seriam substituídos por novos. 0 teste
de capacidade é o veículo de seleção nos moldes acima, e
atuais.
Hoje em dia já é possível pesquisar a capacidade do
homem para determinadas profissões, até mesmo
em relação a profissões que ainda não foram su­
ficientemente experimentadas8.
O teste — instrumento à disposição do pesquisador para
avaliação da capacidade — nem sempre é usado acertadamen-
te. Objeções se levantam, por isso, contra a maneira de empre­
gá-lo, nunca contra o seu emprêgo. A comprovação da capa­
cidade revelada pelo teste só pode ser feita pelo exercício da
profissão e, assim, dela não se cogita ainda no momento da
escolha profissional. Examinaremos agora algumas dessas ob­
jeções.
Lembraremos, primeiro, que o teste de capacidade não te­
ve origem na teoria, mas sim na prática. A economia exigia
da psicologia uma ajuda adequada e muitas vêzes não era pos­
sível aguardar que os diferentes métodos fôssem suficiente­
7 Hisehe, “Das Eignungsprinzip” 66 p. 31.
8 Da volumosa bibliografia relativa ao assunto, destacamos as grandes obras de
síntese de
Baumgarten, “Die BerufseignungsprUfungen" (com rica bibliografia) 11,
Meili, “Psychologische Diagnostik" 111,
Baumgarten, "Psychotechnik und Berufsberatung” 12.
116 Jean Ungric ht

mente desenvolvidos, cientificamente fundamentados e com­


provados. Por isso muitos testes parecem ingénuos e primiti­
vos. A maior parte não foi bem aferida e poucos dêles re­
examinados e controlados sistematicamente, o que deu motivo
a críticas. Porém, isto não depõe contra o sistema propriamen­
te dito, e, assim, maiores comentários são desnecessários.
Muito mais importante é o cunho bem determinado atribuído,
então, ao teste de capacidade. Ficou patente que o seu campo
de ação era a indústria, onde passou a substituir os velhos
métodos de seleção (referências, recomendações etc.) inefi­
cazes ante as exigências crescentes da economia. O teste pre­
enche funções de seleção, escolhendo os candidatos mais ca­
pazes e afastando os outros. Está a serviço da concorrência-
-seletiva, visando o aproveitamento máximo das forças de pro­
dução, o que explica a atitude rigorosa demais daqueles que
o aplicam. Na verdade, muitos aprofundam ao extremo a
aná ise, selecionando trabalhadores de um padrão técnico tão
alto, que talvez interessem a determinadas indústrias, mas
nunca a todas. Nem todos os trabalhadores devem realizar
recordes. A média de capacidade não é, nem precisa ser tão
elevada. A existência das profissões é assegurada pelo traba­
lho comum da grande massa e não pelas funções especiais exer­
cidas por alguns. As realizações excepcionais são necessárias
para a formação dos ideais profissionais, servem de estímulo
e fazem respeitar a profissão. Em nenhum caso, porém, po­
dem servir de base para o teste de capacidade.
E. Jucker observou o seguinte: sempre que em uma pro­
fissão se pretende alcançar um padrão excessivamente alto,
êste não se mantém por muito tempo e acaba por destruir
o primitivo molde9. Além disto, se adotássemos por muito
tempo um nível de seleção exagerado, as profissões desapa­
receriam1011em curto prazo, porque não existem tantos can­
didatos tão perfeitos. O próprio Hische11, decidido defensor
do teste de capacidade, aponta o perigo de se chegar a ex­
tremos de modo e grau, na análise psicológica. Êle acha que
sutilezas extremas são importantes em casos excepcionais.
Mas todos os ramos profissionais necessitam sobretudo de

9 Jucker, "Berufskundliche Vorlesungen” 78.


10 Sob êste ponto de vista, considera-se interessante, teòricamente, a análise psico­
lógica. M. Ulrich, “Die psychologische Analyse der hõheren Berufe" 149.
11 Hische, "Das Eignungsprinzip” 66 p. 32:
Escolha da Profissão 117

capacidades médias, para as numerosas funções que não exi­


gem um tão alto grau de competência. E observa — afastan­
do-se da exigência estrita da capacidade — que um forte pen­
dor e uma vontade firme podem compensar a carência de ap­
tidão; e que até mesmo a falta de um ou outro requisito não
é motivo para a rejeição do candidato. Êste ponto de vista é
seguido por F. Bõhny12 e também eu gostaria de apoiá-lo in­
condicionalmente .
Todavia é compreensível que uma emprêsa dê pouca aten­
ção a estas ponderações, e dentre um grupo de aspirantes pro­
cure escolher os melhores por meio de testes. Mas é possível
que com o tempo a organização se prejudique a si mesma, por
atrair colaboradores cuja inteligência e capacidade ultrapas­
sam as exigências das funções que desempenham. Essa é a
causa provável do desânimo profissional, tão difundido hoje.
Apesar disso, devemos considerar a capacidade como fator
principal de seleção. A tendência é fazer-se a concorrência se­
letiva por meio do teste de capacidade.
Para as emprêsas só uma cousa importa: que o candidato
tenha realmente ótimas qualidades, em grau conveniente. Não
lhes interessa que possua maiores aptidões para uma outra
profissão ou que, aproveitando-as, pudesse obter um sucesso
pessoal muito maior. A maneira de encarar estas duas hipó­
teses determina a diferença básica entre a concorrência sele­
tiva e a orientação profissional. Se não podemos negar a cada
emprêsa o direito de selecionar os seus novos empregados,
também não rejeitaremos a orientação profissional, (a não
ser em casos excepcionais); esta não se preocupa com a em­
prêsa (que seleciona) mas com as necessidades económico-so­
ciais e com o indivíduo, a quem deve indicar a profissão conve­
niente13. A seleção não é, aqui, tão importante, e a capacidade
pura e simples passa a exercer função secundária, pois não in­
teressa muito ao orientado nem à coletividade que ela desempe­
nhe o papel principal na orientação. W. Foppelreuter14 compro­
va a assertiva com as suas observações sôbre importantes pro-

12 Bõhny, “Die Zusammenarbeit von Berufsberatung und Berufsverb&nden bei der


Auslese des berufHchen Nachwuchses” 26 p. 143.
13 Lxpmann, “Wirtschaítspsychologie und praktxsche Berufsberatung” 101 p. 13.
14 Poppelreuter, “Allgemeine psychologische Richtlinien der praktischpsychologis*
chen Begutachtung 124 p. 59.
118 Jean Ungricht

mas psicológicos 15. Também Hische chega à mesma conclusão,


dizendo:
“Na orientação profissional deve-se recusar o teste
de capacidade em forma de concorrência seletiva”16.
A antiga psicologia experimental atribuia um valor gran­
de demais às aptidões do indivíduo (vista, habilidade manual,
capacidade de reação, memória etc.) partindo de uma su­
posição fictícia, ou seja: a capacidade para uma determina­
da profissão resultaria claramente de certas habilidades in­
dividuais . Tentava-se erroneamente isolar e determinar
quantitativamente essas capacidades, esquecendo que certas
qualidades isoladas não decidem, mas sim o conjunto har­
monioso delas. Na personalidade humana, cada predicado
tem valor subordinado e proporcional à posição que ocupa em
relação aos demais (por exemplo, existem débeis mentais que
possuem memória excepcional; porém ela nada representa,
pois não está ligada a uma capacidade de pensamento normal,
assemelhando-se a uma roda que gira automàticamente, de
modo acertados, sem nenhum proveito).
Em resumo: a importância de cada capacidade resulta
da sua posição de conjunto, de sua ligação com as demais.
O conjunto de capacidades é decisivo, e não cada uma delas,
isoladamente17.
Continuemos: entretanto, o conjunto em si ainda signi­
fica muito pouco. É como um instrumento que depende do
intérprete para revelar tôda a sua perfeição. Do intérprete
depende a revelação parcial ou total da potência e das qua­
lidades do instrumento. Os fatôres básicos da personalidade
— temperamento, caráter, mentalidade, têm por isto uma im­
portância maior que as aptidões. Com outras palavras: para
o sucesso no trabalho e na profissão não são decisivas as
qualidades periféricas mensuráveis, como presumia o antigo
teste de capacidade. Como, em que medida agem, e que valor
têm, isto é determinado pelo solo em que medram, o fundo
que lhes dá relêvo. O temperamento, o caráter, a personali­

15 Ver notas complementares do livro acima.


16 Hische, “Das Eigsnungsprinzip” 66 pp. 33-34.
17 Ver a conclusão desses manuscritos publicada por Meili, “Psychologie der Berufs-
beratung" 112 pp. 13-15.
Escolha da Profissão 119

dade, enfim, é que decidem18. Que valor terá a mais extra­


ordinária habilidade manual, se aquêle que a possuir fôr le­
viano e desorganizado? Não interessaria a nenhuma emprêsa
um desenhista-mecânico de excepcional capacidade, que não
suportasse o ruído das máquinas, na sala de desenho. E
ainda menos um contador excelente, mas desonesto.
No conjunto de capacidades, um caráter harmonioso dá
o último toque, mas neste caso, justamente, a seleção e a
orientação profissional são dispensáveis.
Não há dúvida que o “antigo teste de capacidade” devia
ser completado, ou melhor, fundamentado por um exame ca-
racterológico. Esta teoria ganhou terreno também na psi­
cotécnica, determinando a substituição dos antigos instru­
mentos de avaliação, com suas medidas, pela observação e
descrição caracterológicas, sendo muito aplicada nos testes
de capacidade para a aviação militar. Na Suíça, o Centro
Médico de Aviação abandonou quase por completo os diver­
sos exames psicotécnicos e não se apóia mais, hoje, na aná­
lise da capacidade, mas exclusivamente nos resultados do
exame caracterológico19. K. Koch, que observou cuidadosa­
mente o trabalho de operários inválidos (como se verifica
de várias exposições suas) e todos aquêles que sabem do
“record-crawl” batido pelo nadador Vial, mutilado de uma das
pernas, em Casablanca, não podem mais duvidar: as quali­
dades isoladas nada significam, e mesmo as mais graves fa­
lhas podem ser superadas, com sucesso incrível.
P. Hãberlin pronunciou-se muito cedo contra a análise
unilateral da capacidade e demonstrou com exemplos em que
medida’influem decisivamente outros fatores bem diferentes
(por exemplo o caráter)20. Para considerá-los de modo ade­
quado, não é mais suficiente testar certas capacidades. Faz-
-se necessária uma apreciação ampla, um exame completo da
personalidade. E isto não é tão fácil, pois o campo de pes­
quisa tornou-se mais complexo e extenso e os métodos de
análise do caráter são mais difíceis de manejar. Esta amplia­
ção do exame de capacidade só com o tempo será avaliada

Meili, "Psychologie der Berufsberatung” 112 p. 15: "... isto significa que para a
determinação da capacidade é preciso retroceder à estrutura global psicofísica. A
personalidade decide”.
19 Ver Meier-Muller, médico chefe dos Aviadores Suíços, “Die psychophysischen
Anforderungen des Fliegerberufes” 110 pp. 299-323.
20 Hãberlin, “Motive der Berufswahl” 61.
120 JEAN U N-G R I C H T

totalmente21. Adotando uma atitude metódica, esquemática


uma técnica de avaliação acertada, determinaremos com se­
gurança quase absoluta a capacidade de trabalho de um ho­
mem e a seleção pode fazer-se sem obstáculos. Para a verda­
deira orientação profissional, ao contrário, as dificuldades
aumentam, pois: nunca se deve esquecer que — frente ao tra­
balho — a profissão é multiforme, complexa, incluindo certos
pormenores que ocasionalmente desviam o profissional da
verdadeira natureza do seu trabalho. O farmacêutico, por
exemplo, não pode limitar-se a aviar receitas. Precisa admi­
nistrar a farmácia, fazer compras com acêrto, calcular obje­
tivamente, decorar vitrinas etc. Para o profissional indepen­
dente, é tão importante ser bom técnico quanto bom comer­
ciante. Para muitos (como por exemplo cabeleireiros, alfaia­
tes etc.) o sucesso depende da capacidade de tratar com a
freguesia. E também da facilidade de adaptar-se, de subme­
ter-se, de inspirar confiança, de perseverar, e de muitas ou­
tras qualidades que às vêzes nada têm a ver com os conhe­
cimentos técnicos. Temos que considerar também, aqui, a
hipótese da existência de capacidade apenas para a técnica;
a profissão, por seu turno, tem grande influência sôbre aquê-
le que a exerce. Certos traços característicos, certas habilida­
des, podem, com o tempo, modificar-se, desenvolver-se ou atro­
fiar-se. Muitas vêzes surgem impulsos novos, falhas são com­
pensadas, obstáculos aplainam-se. Um trabalho profissional
continuado pode modificar a personalidade. É preciso, por
isso, levar sempre em conta o que a futura profissão fará de
um homem. Ou, pelo menos, pensar nisso.
Muitas profissões possuem uma certa elasticidade, sendo
possível adaptá-las à nossa própria natureza. Pela acentuação
de determinados ângulos podemos chegar à especialização,
criando um desvio para setor mais conveniente, dentro da
mesma profissão. Nas profissões liberais isto se verifica fre­
quentemente: assim, não existe o jurista, mas um juriscon­
sulto como juiz, advogado, promotor, administrador, fiscal
de impostos etc. e igualmente não existe o médico, mas o
médico cirurgião, higienista, oftalmologista, bacteriologista,
professor, diretor de hospital etc... Para cada tipo humano
é possível encontrar — com estas variantes — o lugar con­
veniente .
Esquecendo estas possibilidades, vem o teste de capaci-
21 Baumgarten, “Die Charakterpríifung der Berufsanwárter” 14.
Escolha da Profissão 121

dade — ainda sob o domínio de idéias estreitas a respeito


da profissão — impor uma situação profissional limitada, à
qual o examinado talvez nunca se adaptasse. Não tem senti­
do um teste que, deste modo, seguindo padrões rígidos, for­
jasse um tipo profissional fictício.
* ¥ *
À luz dêstes esclarecimentos, que importância tem o teste
de capacidade?
Piorkowski e Lipmann como todos os partidários do tes­
te, esperavam encontrar para cada indivíduo a profissão a
que está destinado por suas aptidões. Fazemos notar, desde
já, que a predestinação para uma única profissão é muito ra­
ra. Só acontece com talentos excepcionais e êstes não preci­
sam de orientação. Fischer diz que nestes casos a orientação
profissional pode, quando muito, remover obstáculos do ca­
minho — o que já a justifica. A maior parte dos jovens, en­
tretanto, tem capacidade para diversas profissões. Mais da
metade dos orientados, calcula Liebenberg, e esta quota pode
ser aumentada, seguramente.
Examinemos agora a relação existente entre a prova de
capacidade na seleção das emprêsas e o teste de capacidade
na orientação profissional. A primeira se relaciona sempre
com uma determinada profissão e investiga até que ponto
o candidato está habilitado para ela. Na orientação profis­
sional devemos determinar a capacidade do orientado, não
para uma única profissão, mas em relação a tôdas as possí­
veis soluções. Vê-se logo que isto é normalmente impraticável.
Voltaremos ao assunto22, mas queremos frisar que o “exame
global” que esta prova exigiria tem duplo significado — se­
ria um exame da estrutura psicofísica do indivíduo (pesquisa
total e não parcial da personalidade), e estudo da relação
entre homem e profissão, ou melhor, entre o orientado e
tôdas as profissões.
Lipmann23 acreditava que com a aplicação do teste de
capacidade teríamos a revitalização da economia, pois seria
possível encontrar os homens certos para os lugares certos.
Largos círculos económicos (patrões e empregados) também
contavam com uma reorganização renovadora da vida econô-

22 Ver exemplos citados por Meili em “Psychologie der Berufsberatung” 112 pp. 14-15.
23 Lipmann, “Psychologische Berufsberatung” 100.
122 Jean Ungricht

mica. Esperavam todos que o teste de capacidade abolisse de


um golpe o protecionismo e as injustas preferências no preen­
chimento de vagas, dando a muitos a possibilidade de pro­
gresso, e restabelecendo o equilíbrio social. Simon, colaborador
de Binet, chegou a afirmar que a adoção do teste causaria en­
tre os povos uma revolução maior que a introdução das máqui­
nas. Como se vê, grandes esperanças eram depositadas nes­
te nôvo instrumento de progresso social. Realmente, não se
deve subestimar a sua importância. Deviam adotá-lo, princi­
palmente os países que dependem da "qualidade” do seu
trabalho. Pois não resta dúvida24 que somente um trabalha­
dor capacitado atingirá os mais altos níveis de qualidade e
quantidade.
Por isto tudo Hische afirma que o teste de capacidade
é o único meio verdadeiro de seleção para a distribuição do
trabalho, e ao mesmo tempo o mais justo, porque oferece ao
trabalhador certas vantagens25. Quanto mais se aplica o pla­
nejamento, mais necessário se torna o teste. No Estado to­
talitário, onde as necessidades da coletividade valem tudo e
as do indivíduo nada, existe forçosamente a tendência de
transformar o teste de capacidade em princípio geral de se­
leção. Vemos isto na Rússia, onde nem a profissão’ nem o
local de trabalho podem ser escolhidos e a exoneração volun­
tária de trabalhadores e empregados de emprêsas e institui­
ções26 é proibida.
Ao indivíduo interessa encontrar uma profissão que lhe
ofereça possibilidades de aperfeiçoamento, satisfação e lucro.
Pois a alegria da vida não depende somente de uma boa co­
locação e do lucro compensador, mas sobretudo da satisfa­
ção de realizar uma tarefa que agrade.
As exigências do trabalho, porém, são outras. O homem
é considerado um simples instrumento para o qual só o tra­
balho deve ter valor. Se lhe agrada ou não funcionar de certa
24 O trabalhador capaz economiza fôrças, adapta-se mais depressa e transforma-se
logo em colaborador eficiente; não provocará agitação ou desordens e estará menos
sujeito a acidentes. Em poucas palavras: o rendimento do seu trabalho é, em todos
os sentidos, maior.
25 Hische, “Das Eignungsprinzip” 66 p. 37.
26 Prokopovicz, "Russlands Voikswirtschaft unter den Sowjets” 125.
White, “Ein amerikanischer Reisebericht aus Russland” 152.
Basseches, “Die Russen und ihre AUiierten” 7.
Keiler and Viteles, “Vocational Guidance Throughout The World" 83 pp. 200-260.
Baumgarten, "Arbeitswissenschaft u. Psychotechník in Russland" 15.
Escolha da Profissão 123

maneira, em lugar prefixado e com determinado material,


não interessa. Nos países onde êle tem direitos como indi­
víduo, não é considerado uma máquina ou um animal de
carga (ao qual não importa que lhe tirem o leite neste ou na­
quele estábulo) a lei da capacidade não pode e não deve
predominar e a liberdade de realizar-se a seu modo deve exis­
tir. É compreensível, portanto, que se defina a “capacidade
profissional” como "capacidade técnica de realizar”, pura e
simplesmente, excluindo as inclinações27. Liechti2829 ampliou
êste conceito: a disposição para um determinado trabalho fa­
ria parte integrante da verdadeira capacidade (como impul­
so mais forte). Todavia é melhor ater-se à definição habitual,
pois em todas as obras relativas ao assunto capacidade e in­
clinação são rigorosamente separadas. H. Bogen39 entende
por capacidade profissional “aquela qualidade ou aquêle con­
junto de qualidades que, em relação à capacidade para o
exercício de uma determinada profissão ou determinadas ati­
vidades distingue uma pessoa de outra,” Nesta definição já
não figura a exigência do "máximo em qualidade”.
Ela abandona o terreno da seleção, da concorrência e não
se preocupa mais com as exigências da emprêsa ou da pro­
fissão, mas com aquêle que procura uma profissão. Segue em
direção da coordenação profissional, tentando encaminhar um
determinado indivíduo com certas qualidades, para a ocupa­
ção que lhe dê maior chance de aplicá-las.
Afirma: cada indivíduo se presta mais para determina­
das atividades que para outras, e a escolha da profissão acon­
selhável não depende da capacidade em seu grau mais eleva­
do30 (existem diversos graus de capacidade) mas de outros
fatôres também.
Portanto, outros pontos de vista começam a firmar-se. A
exigência da capacidade absoluta perde terreno. Segundo
Poppelreuter: “ela situa-se, agora, em um ponto da escala de
capacidade31”. Concordo com a definição de Liechti.
27 Ver definição de Lahy, citada por Baumgarten (11, pp. 39-40): por capacidade
profissional entende-se uma "natural disposição que se externa nas respostas equili­
bradas, espontâneas e inteligentes; em determinadas idéias típicas de um traba­
lhador de categoria”.
28 Ver p. 71.
29 Bogen, "Psychologische Grundlegung der praktischen Berufsberatung” 23, p. 141.
30 Koch, "Euer Sohn, eure Tochter vor der Berufswahr 85, p. 32.
31 Poppelreuter, “Allgemeine methodische Rlchtlinien der praktischpsychologischen
Begutachtung” 124 p. 71.
124 Jean Ungricht

Êle diz que a capacidade se define interna e exter­


namente, e que um homem está capacitado para a
sua profissão quando existe um harmonioso entro-
sarnento dos seguintes fatôres: escolha e inclina­
ção; capacidade psicológica e capacidade em sen­
tido estrito; ambiente social e ambiente profissio­
nal ; caráter e exigências da profissão escolhida. Su­
posta a existência de preparo adequado, capacidade
significa uma tão boa adaptação do indivíduo à
sua profissão, que êle possa encontrar nela a feli­
cidade profissional. (Liechti)33.
Resumo:
Como nem todos têm a mesma capacidade para tô­
das as profissões, é básica a importância da capaci­
dade na escolha dos profissionais, pois para as
emprêsas escolha significa seleção dos mais capazes.
Para a orientação profissional, porém, a capacidade
não é o único critério de julgamento; a escolha não
significa concorrência nem seleção da capacidade
mais alta.
Uma acertada definição da capacidade vai situá-la
entre dois pólos numa extensa escala onde o limite
superior é determinado pelo grau mais alto de pro­
dução e o inferior por uma capacidade de produção
ainda aceitável. A média entre os dois extremos
depende de outros fatôres também.
A lei da capacidade tem como instrumento o teste
de capacidade profissional. Quando bem compre­
endido e empregado êle é útil e valioso e exige —
se usado para a orientação profissional — um in­
quérito vastíssimo, em dois sentidos: exame da per­
sonalidade (capacidades físicas e espirituais) e re­
petição do mesmo exame em relação a tôdas as
profissões que poderiam interessar.

32 Liechtl, “Probleme des Berufs ...” 9$ p. 153.


Escolha da Profissão 125

2. Inclinações'
Para avaliar a capacidade, indagamos de que seria o in­
divíduo capaz e para que seria útil; estudando as inclinações
precisamos saber o que êle desejaria e gostaria de fazer. No
primeiro caso, o critério de julgamento se baseia nas qualida­
des do indivíduo e, no segundo, nos seus desejos.
A primeira pergunta a formular, aqui, é a mesma que es­
pontaneamente fazem os pais, desejando ver seu filho feliz
na profissão e pela profissão. Procuram a ocupação que lhe
proporcione uma satisfação duradoura, aquela que escolheria
sem pensar em lucro, ou seja, antes um “hobby” que uma
profissão. Quando o talento se une ao dever e ao trabalho
cria-se um sentimento de "vocação". Só assim a palavra pro­
fissão ganha sentido completo e elevado. O mundo ocidental
atribui ao trabalho e à capacidade para o trabalho um vlor
superior. E somente a cegueira materialista pode considerar
apenas o lucro e conceber a profissão como um meio de lucrar.
Podemos sentir, nos romances de Goethe e Stifter33, a diferença
em toda a sua plenitude. Aqui o homem é um mundo, que
busca e obtém, em muitos anos de esforço e amadurecimento,
a vitoriosa realização de uma determinação interior profun­
damente sentida. Um mundo, no qual inclinações, aptidões e
circunstâncias exteriores se unem harmoniosamente.
Capacidade significa ser capaz de realizar; neste caso a
orientação deve basear-se em fatôres externos, como por exem­
plo a prática. Inclinação quer dizer ter vontade de... e aqui
os meios de orientação pertencem ao mundo interior. Entre o
“campo das realizações" orientado pelo mundo exterior e o
"campo das necessidades”, que se guia por fatôres internos,
há um abismo. Entre êles existe a tensão própria da natureza
humana, idêntica ao princípio de atração e repulsa, que Freud34
descreveu tãò agudamente em sua forma psicológica. Sacri­
ficar os desejos pela realidade é, talvez, o dever mais difícil
confiado ao homem — ao indivíduo como a tôda a espécie. O
problema capacidade-inclinações é apenas um aspecto parcial
dêste antagonismo básico da natureza humana. Desde o nas­
cimento, pràticamente o homem tem de realizar o seu desen­
volvimento, contra o princípio da realidade. Indicar o cami­
nho, estimular êste desenvolvimento, eis o dever precípuo da

33 “Wilhelm Meister" und •Nachsommer”.


34 Freud, “Formuiierung ttber die zwei Prínzipien des psychischen Geschesens”
126 Jean Ungricht

educação. Somente realizando esta mudança, sòmente com


esta metamorfose êle pode elevar-se do estado "animalesco”
para o "moral”, ultrapassando o "social" (Pestalozzi) 35.
A capacidade pertence ao mundo da realidade. Manifes­
ta-se concreta, objetivamente. Escapa à esfera biológica. Só
tem valor quando precedida de um longo trabalho educacional,
que a humanidade tôda realiza pressionada pelas exigências
da vida e que recomeça em cada indivíduo.
Na origem do desenvolvimento (filogenético e ontogenéti-
co) encontra-se o homem, não como ser racional em sua rela­
ção com o mundo real, o homo-faber, o homo-sapiens, mas o
ser humano com seus desejos e necessidades naturais, que
exigem satisfação. Necessidades que brotam daquela fonte
primitiva denominada por Scheler36 “impulso vital", fôrça de
vida comum a todos os sêres, que só mais tarde se diferencia,
canalizada parcialmente pelos instintos. Os instintos impelem
o homem para o mundo concreto, objetivo, determinando o que
é desejável e o que é suportável. Os objetos valem na medida
de sua utilidade ou inutilidade face aos instintos, e com isto
nascem as primitivas formas de reação — simpatia e antipatia
— constrói-se todo o sistema de preferência e repulsa, de
amor e ódio, o "ordo amoris" do homem37.
O que atrai o homem, o que êle procura sempre, o que
êle deseja — é determinado pelo "ordo amoris". Daí derivam
suas inclinações e interêsses. Com as constantes transmuta­
ções das necessidades interiores e do ambiente, as aspirações
cristalizam-se. Sofrem em primeiro lugar a influência das
próprias aspirações; o ambiente, as pessoas que nos rodeiam
são, por assim dizer, um pretexto para a sua manifestação;
têm participação decisiva as afeições humanas (relações afe­
tivas da primeira infância, sobretudo), que dão sentido, en­
tonação e colorido aos impulsos originais ainda não "revela­
dos”, fixando-os.

Assim, até a idade da escolha profissional, o círcu­


lo de inclinações e interêsses é limitado pelas ten­
dências herdadas; modificado pelas impressões de­

35 Pestalozzi, “Meine Nachíorschungen íiber den Gang der Natur in der Entwicklung
des Menschengeschlechts” 119.
36 Scheler, "Die Stellung des Menschen im Kosmos" 135 p. 17.
37 Scheler, “Ordo amoris" 133 p. 229.
Escôlxa da Profissão 127

cisivas da idade infantil e, finalmente, fixado pela


influência global das impressões internas e externas
(ambiente).
*

Qual a relação entre a inclinação propriamente dita e a


•‘inclinação profissional"? Partindo do geral para o particular,
podemos entender por “inclinação profissional" aquela ten­
dência especial do indivíduo para um trabalho profissional
Digo especial porque, para a escolha profissional, tôdas as ten­
dências do indivíduo são importantes, embora não no mesmo
grau. Bogen descreve a “inclinação profissional" como uma
diretriz que vem do íntimo e se manifesta desde cedo, na ma­
neira pela qual o indivíduo procura desempenhar-se dos seus
deveres.Ela é uma tendência inata no homem livre. Forte­
mente instintiva, destina-se a equilibrar as tensões internas
através da reação agradável que provoca. Liga-se estreitamen­
te à conduta do indivíduo, mas a sua estrutura não está de­
terminada claramente38.
Falamos demais da maneira pela qual as tendências se
externam. Tratemos agora do seu conteúdo; suponhamos,
por exemplo, que exista uma inclinação primária para o conta­
to com a madeira e, ao lado dela, o desejo de trabalhar com a
madeira justamente assim e não de modo diverso (cortar, en­
talhar, dar forma etc.) ou a inclinação para um contato com as
pessoas (ensinar, organizar, dirigir, servir ou ajudar etc.).
F. Baumgarten vê a inclinação profissional como “uma
tendência primária (não explicável) para atividades específi­
cas". Tem sua origem na constituição psicofísica do homem,
impelindo-o à satisfação deste desejo"39. Observa que a
criança já revela inclinação para determinadas atividades e
procura satisfazê-la a seu modo.
Necessidades vitais elementares devem constituir o fun­
damento do trabalho profissional.
Uma escolha profissional que não se baseie firme­
mente nestas necessidades, uma profissão que não
ofereça possibilidades para a expansão de muitas

38 Bogen, “Psychologische Grundlegung der Beruísberatung” 33 pp. 127-128.


39 Baumgarten, “Der Jugendliche und das Berufsleben” 8 p. 27.
128 JeanUngricht

(pelo menos as mais fortes) tendências individuais,


foi mal escolhida.
As necessidades são, como observou Pestalozzi, o funda­
mento da profissão e somente na profissão existe aquela pron­
tidão de esforço indispensável ao desempenho satisfatório da
atividade profissional40.
* * *
É compreensível a exigência de Bogen: "devemos anali­
sar a inclinação". Esta seria uma das mais elevadas tarefas dos
psicólogos e orientadores profissionais;
a análise da capacidade (na orientação profissional)
é fator secundário, em relação à análise das incli­
nações 41.
É compreensível que um orientador profissional tão ex­
perimentado quanto F. Bõhny fosse o introdutor do siste­
ma que atribui a maior importância à pesquisa das inclina­
ções. Bogen afirma, porém, que essa pesquisa continua sendo
a “enteada" da psicologia. Em relação à capacidade multi­
plicam-se os trabalhos, enquanto que sôbre as inclinações
existem apenas modestos ensaios. A sua origem está ainda
no escuro, os métodos de pesquisa não ultrapassaram os pri­
meiros passos42; em suma, diante do pesquisador estende-se
um vasto campo quase vazio. Há motivo para isso. A psico­

40 Pestalozzi, “Die Methode” 120 p. 104.


41 Bogen, “Psycnologische Grundlegung der praktischen Berufsberatung” 23 pp. 123*131.
42 Ver também:
Ackermann, “Die Berufsneigung im Rahmen der psychologischen Eignungsun-
tersuchung” 2.
Adler, “Berulseignung und Berufsneigung” 3.
Baumgarten, “Les inclinations professionnelies" 10, “Die Berufseignungsprtifun-
gen° U pp. 55-61. “Der Jugendliche und das Berufsleben” 8 pp. 16-28, “Die Arbelt
des Menschen” 13 pp. 20-31.
Bogen, "Ueber das Wesen der Berufsneigung” 23 pp. 122-140.
Bõhny, “Die Bedeutung der Berutsneígungsfarsehung und eine Methode zur
Erkennung unbewusster Berufsneigung” 25, e
“Berufsneigung im Rahmeri der Berufsberatung” 28.
Hauck, “Nelgung und Beruf” 62 pp. 209-214.
. Kocn, “Zeicnnung und Neigung” 86.
Pfister, “Die Berufsneigung im Lichte der Psychoanalyse” 122.
Sch&fer, “Die Entwicklung der Berufsneigung” 131 pp. 322-358.
Szondl, “Berufswahl ais Schicksal” 146.
Escolha da Profissão 129

logia não aprofundou bastante o conhecimento dos instintos,


dos desejos e da sua avaliação, dadas as dificuldades que en­
contra. As experiências de Klages, Freud, Hãberlin, Szondi e
alguns fenomenólogos, assentam-se em pontos de vista diver­
gentes, impossibilitando o estabelecimento de uma base co­
mum de pesquisa e o problema das inclinações continua a ser
tratado como fenômeno superficial.
A maior parte dos autores limita o têrmo inclinação pro­
fissional, defínindo-a como inclinação já cristalizada no obje­
to, isto é, já manifestada sob uma forma qualquer. Tomando
as inclinações profissionais, por assim dizer, como desejo de
contato com o seu objeto, êles a equiparam (em relação ao
objeto) com o conhecimento da profissão (em relação ao tra­
balho).
Esta é uma atitude diferente daquela em que se baseia a
pesquisa no conjunto das tendências sem objeto.
As inclinações profissionais neste sentido limitado, são
produto de um contato do mundo exterior com o valor pes­
soal de cada indivíduo. Comete-se frequentemente o êrro de
considerar idênticos os dois têrmos: inclinação profissional
= desejo profissional. As inclinações podem existir indepen­
dentemente de objeto, veladamente, ao passo que o desejo ten­
de a um fim determinado, tem significação bem clara e ob­
jetiva, é formado por um conjunto de fatôres, entre os quais
as inclinações podem ocupar um lugar importante, mas nem
sempre. O desejo de exercer determinada profissão pode re­
sultar muito mais da influência de terceiros ou das profissões
com as quais o interessado entra em contato, do que das in­
clinações pessoais. Estas fazem parte das camadas mais pro­
fundas da personalidade, pouco acessíveis à introspeção e à
manifestação43. Fundir as inclinações com uma profissão à
qual realmente se adaptem não é tarefa fácil para a técnica
psicológica44, observa Bogen. Podemos comparar a análise da
capacidade com um corte horizontal e a das inclinações com
um corte vertical, que atinge o âmago da personalidade. Não
se trata aqui de determinar a capacidade e as possibilidades
de desenvolvê-la, mas as linhas diretrizes da conduta, que so­
mente com um retrospecto da vida inteira se tornam visí­
veis. A "Diagnose do Instinto”, de Szondi, pode ajudar mui­
to. Eu estou convencido da importância do diagnóstico feito
43 Bogen, “Psychologische Grundlegung der praktischen Berufsberatung” 23 p. 134.
44 Bogen, idem 23 p. 134.
130 JeanUngricht
. . . . .... ,_ ___ .___ .
por êste pesquisador45 e espero muito da sua próxima obra
"Experimentelle Triebdiagnostik”, assim como do trabalho
publicado pelo seu colaborador, F. Mérei, "Trieb und
Beruf" 46.
Se quisermos verificar a influência dos fatores externos
sôbre as tendências profissionais, (principalmente daqueles que
agem sôbre a psique infantil) devemos apelar para a psicaná­
lise. Infelizmente pesquisas sistemáticas não foram até agora
realizadas, ou pelo menos não publicadas. Algumas publica­
ções esporádicas dão conta, apenas, das observações parcela­
das de alguns psicanalistas.
A psicanálise pode obter conhecimentos gerais pelo exa­
me de casos particulares, mas a orientação profissional não;
e por duas razões: a demora e o alto custo de uma análise.
Para a orientação profissional, o meio mais acertado de
analisar as inclinações ainda é chegar a elas pelo exame das
circunstâncias externas (ambiente e modo de vida do orien­
tado). A estas exteriorizações pode-se acrescentar a tendência
ou tendências para determinada profissão, separando aquelas
que têm base concreta. Não podemos esquecer que as inclina­
ções podem provir de diversas camadas e podem ser: fortemen­
te enraizadas ou não, encobertas, reprimidas, falsas, sugeridas,
contrariadas, inconvenientes. Existem também muitos indiví­
duos sem inclinação alguma47. Finalmente, ao lado das incli­
nações existem sempre aversões. Ainda mais: nem todas as
inclinações são importantes em relação ao indivíduo, e diferem
quanto à intensidade.
A análise dos motivos da tendência para uma certa pro­
fissão é inseparável da análise das inclinações (segundo exi­
gência de P. Hãberlin)48. Pois mesmo quando uma tendência
concreta para determinada profissão se revela, é preciso des­
lindar o emaranhado de motivos que está por detrás dela,
para ter certeza que a escolha não foi determinada por fato­
res estranhos 49.
A indicação de meios especiais para o exame das inclina­
ções não cabe aqui. Preciso limitar-mç a afirmar que hoje é
possível descobrir e apreciar (talvez ainda não suficientemen-

45 Szondi, '‘Sehicksalsanalyse” 146.


46 Mérei, “Erbkreise und Berufskreise” 146.
47 Koch, “Euer Sohn, eure Tochter vor der Berufswahl’* 85 pp. 27-28.
48 Hãberlin» Motive der Berufswahl” 61-
49 Meílí» “Psychologie der Berufsberatung” 112 pp. 9-13.
Escolha da Profissão 131

te) as inclinações importantes para a escolha profissional.


Acompanho Bogen em sua convicção: a análise das inclinações
de um jovem que enfrenta a escolha profissional é factível.
Fischer acha que é problema de solução difícil, porém mais
importante que a análise da capacidade50. Estou convencido
que êle tem razão. Quando a escolha se baseia numa verda­
deira inclinação, pode proporcionar um contentamento per­
manente. “Uma inclinação pronunciada para a profissão é
capaz de muito. Confere ao trabalho um valor especial, por­
que o fazemos com alegria. A concordância das tendências
interiores com a atividade exercida aquece-a com um calor
próprio e abre caminho para o sucesso" (Krebs)51. E casos
frequentes atestam que é muito difícil exercer uma profissão
indesejada, contrariando legítimas inclinações. F. Baumgar­
ten afirma que “proibir um trabalho desejado é atingir o ho­
mem em seus mais sagrados direitos”. Sabendo que inclina­
ções verdadeiras provêm muitas vêzes de um talento unilate­
ral, pode-se imaginar tudo o que será sacrificado por uma in­
sensata opressão. Deve ser um consolo para muitos verificar
que, apesar disto, muitas inclinações conseguem abrir cami­
nho, mais tarde; que muito talento se forjou na necessidade
e muitos valores nasceram da pobreza. Porém, ninguém co­
nhece o número daqueles que pereceram na miséria, cujo ta­
lento nunca pôde revelar-se; ninguém sabe quantos poderiam
ter contribuído para maior felicidade dos homens, enriquecido
a ciência, não fôra a necessidade premente e odiosa de apli­
car-se a um trabalho lucrativo. Está por ser escrita a história
dos que não puderam realizar — tão pouco a dos que foram
rebaixados. Breve e raro é o belo em sua delicadeza e vulne­
rabilidade, diz Scheler 52. Êste belo conceito aplica-se, também,
ao embrião tão frágil do talento, à esperança e aos desejos ín­
timos, muitas vêzes destruídos antes de desabrochar. Escu­
temos o poeta: é triste que não se possa escolher facilmente o
caminho, aquêle que seria o melhor em cada existência. Repito
o que muitas vêzes já disse ... cada homem devia escolher
seu caminho por si mesmo, para a sua completa realização.
Assim, serviria à coletividade como só êle pode servir. Esco­
lher o caminho exclusivamente para tornar-se útil à humani­
dade é um crime; significa renunciar a si mesmo, anular-se.
50 Bogen, “Psychologische Grundlegung der praktíschen Berufsberatung” 23 p. 137.
51 Krebs, “Mittel íiir eine rationelle Berufswahl im Mittelstand" 91 p. 69.
52 Scheler, “Die Stellung des Menschen im Kosmos” 135 p. 77.
132 JeanUngricht

É o que acontece com a escolha profissional. A satisfação de


nossas necessidades materiais exige grandes despesas... e os
jovens, antes de terem consciência disso, são encaminhados
>ara as atividades mais lucrativas. Isto é mau, muito mau. A
lumanidadè assemelha-se cada vez mais a um rebanho.
Sendo a escolha possível e o lucro dispensável, é necessá­
rio conhecer perfeitamente a sua força, antes de empregá-la
em um determinado campo de trabalho. Mas a ordem é es­
colher o quanto antes... porque depois será tarde demais!
E pode a juventude discernir com segurança aquilo de que é
capaz? Dificilmente. Por isso, aquêles a quem compete fazê-lo,
devem velar para que não cometa leviandades." (A. Stifter)53.
Qual o papel da orientação profissional? Quando os pais
se omitem, não devia ela fazer-se advogada dos adolescentes?
Sua existência já estaria justificada, se ela não fizesse mais
que valorizar adequadamente as inclinações, evitando, pelo
menos, escolhas manifestamente desacertadas.

Resumindo:
De acordo com suas inclinações, o homem procura
uma profissão que, possivelmente, satisfaça as suas
tendências morais e físicas, inatas ou adquiridas.
O conjunto de valores formado pelos seus interês­
ses e suas inclinações é a base dessa escolha. As
exigências da profissão escolhida devem harmonizar-
-se com as tendências do indivíduo, ou seja: aqui­
lo que a profissão lhe dá a oportunidade de reali­
zar é justamente o que êle desejava realizar. As
inclinações devem ligar-se adequadamente à capa­
cidade e aos fatores externos para passar, por assim
dizer, do irreal para a realidade. Ambas — a incli­
nação e a capacidade — têm importância básica na
r escolha profissional. Unidas, elas transformam a
profissão em “vocação” no verdadeiro sentido, fa­
zendo do profissional um voluntário ativo e não
um homem condenado a trabalhos forçados. Só
quando a profissão corresponde às mais íntimas ten­
dências é que o indivíduo sente estar sendo “cha­
mado" e o trabalho tem sentido.

53 Stifter, “Der Nachsommer” 144 p. 443.


Escolha da Profissão 133

Conclusão:
Conclui-se que o homem quer trabalhar. Que êle, em ge­
ral, procura uma profissão com as qualidades mencionadas,
mas não o faz naturalmente e sim por ter nascido num mun­
do onde o trabalho impera — o mundo ocidental. E se êle
está convencido da necessidade ,de trabalhar — seja pela
pressão da miséria, pela sugestão de que o trabalho é o sen­
tido da vida, ou por imposição social, parece acertado pro­
curar a profissão que se coadune melhor com a sua perso­
nalidade e contrarie o menos possível as suas exigências in­
teriores. Dizemos o menos possível, porque tôda profissão
tem sempre o seu lado desagradável, que só aceitamos por
hábito, por dever e pela necessidade de lutar pela existência.
Que pelo menos aquêle campo limitado onde as inclinações e
as exigências pessoais podem encontrar satisfação e a pos­
sibilidade de desenvolver-se livremente seja, tanto quanto pos­
sível, ampliado.

3. Fatôres externos
Que a última palavra na orientação profissional caiba à
capacidade e à inclinação, unidas, é tão aconselhável quanto
impraticável. Capacidade e inclinações se sobrepõem por sua
própria essência ao indivíduo. Ambas manifestam-se e desen­
volvem-se em relação ao seu objeto. Temos inclinação e ca­
pacidade "para alguma coisa”. As inclinações pedem satis­
fação e a capacidade é utilizada. Ambas pressupõem um ob­
jetivo.
Isto vale também para as inclinações e a capacidade pro­
fissional que têm por objetivo comum o mundo econômico-
-profissional, no qual se manifestam concretamenté. É pre­
ciso que essa relação entre o indivíduo e o mundo profissio­
nal se estabeleça de forma clara, duradoura e abandone a es­
fera do irreal (simples desejos, esperanças, opiniões etc.). Pois
a escolha profissional é um ato baseado numa decisão que de­
ve ser concretizada. Isto quer dizer que as inclinações e a capa­
cidade podem ser consideradas somente dentro do molde real
das oportunidades existentes. Não faz sentido (para a orien­
tação profissional) cultivar inclinações que não serão satis­
feitas e valorizar habilidades que nunca terão aplicação. A
escolha profissional deve ser concreta, objetiva e sensata, ba­
seando-se na realidade imediata.
134 JeanUngricht

A orientação é trabalho nos moldes do possível. Dentre


os fatos concretos em que se apoia destacam-se em primeira
linha as oportunidades de formação; a possibilidade de fazer
o aprendizado é fator decisivo; em seguida deve ser estudado
o mercado de trabalho, pois seria uma insensatez preparar
cuidadosamente o orientado para a escolha de determinada
profissão, quando não há possibilidade de exercê-la. Hische
diz : a orientação profissional que não oferece esta garantia é
uma farsa54; e Liebenberg chama de inútil a orientação, se
não existirem vagas para a formação profissional55. Eu
acrescento: não só é inútil como prejudicial. Para o orienta­
do, que adquiriu a convicção de haver encontrado "agora sua
profissão”, (esta convicção tem que existir quando a orien­
tação correu bem) é um rude golpe descobrir logo depois que
não se pode preparar para exercê-la, por falta de vaga nas es­
colas profissionais. Sentir-se-á rejeitado pela sociedade e po­
derá lançar sôbre ela a culpa do seu insucesso na vida. A
experiência mostra também que é muito difícil reconduzir al­
guém ao caminho anteriormente escolhido. Esta observação
é útil para a orientação profissional. Afim de evitar a ocor­
rência acima, deve ser proposto ao orientado um grupo de
profissões e nunca uma só.
Consequência prática: se não existe possibilidade de
aprender a profissão, não pode existir orientação profissional.
Indicar e fornecer informações sôbre os centros de apren­
dizagem é parte importante do trabalho de orientação, assim
como exercer o controle dessas escolas e dar completa assis­
tência ao aprendiz (êstes são problemas técnicos sôbre os
quais não podemos nos estender aqui). Naturalmente es­
ta difícil tarefa exige uma vasta organização, uma orientação
profissional organizada 56.
O indivíduo não é um ser isolado, em completa liberdade
para realizar-se a seu modo. Está antes "comprimido” em seu
ambiente, em relação estreita com êle, num intercâmbio cons­
tante com pessoas e cousas. Destas relações podem resultar
progresso e retrocesso. Na prática verificamos que os obstá­
culos desempenham papel importante. Êles impulsionam
aquêles fatôres externos inadequados, muitas vêzes rotula­

54 Hische, “Das Eignungsprinzip” 66 p. 8.


55 Liebenberg, “Richtlinien fúr die Praxis der Berufsberatung” 98.
56 Dunkmann, “Die Lehre vem Beruf” 42 pp. 390-293.
Escolhada Profissão 135

dos de acaso. Se pudéssemos anular a sua influência, a esco­


lha profissional seria realmente objetiva. Mas nem sempre é
possível. A vida em sociedade obriga a certas limitações que
em geral impedem a livre orientação da capacidade e das in­
clinações. Podemos, quando muito, diminuir o efeito delas e
isto deve ser tentado sempre, pois a experiência nos ensina
que com pouco esforço pode-se muitas vêzes fazer obra deci­
siva .
Quais são os fatores mais importantes a considerar na
escolha da profissão? É impossível responder. Existe sempre
todo um conjunto de fatores que variam de caso para caso.
Centenas de pontos de vista podem apresentar-se. O orienta­
dor usará tôda a perícia para avaliar a importância dêsses
fatores, fazer a sua triagem e esclarecer até que ponto podem
ser aproveitados. Distinguem-se os seguintes grupos de fato­
res: 1.° grupo — os que se relacionam com a situação finan­
ceira da família; nunca será demais repetir que o dinheiro
(existente ou não) é fator decisivo na escolha profissional.
Quem depende do ordenado dos filhos, por exemplo, não po­
de mantê-los na escola por muito tempo e nem custear o
aprendizado; é necessário que exerçam — o mais cedo possí­
vel — uma profissão lucrativa. Outras vêzes, do concurso dos
familiares depende a instalação de uma loja própria ou de
uma indústria, a aquisição ou desenvolvimento de uma
propriedade agrícola etc. Assim, considerações financei­
ras têm, freqúentemente, grande influência sôbre a escolha
profissional. Poderíamos citar muitos exemplos, o que seria
ocioso. Comprovaremos melhor o fato observando que entre
os alunos de escolas superiores figuram bem poucos filhos de
operários. E quem afirmar que qualquer um pode escolher
livremente a profissão preferida, nega a evidência. Certamen­
te podemos encontrar pessoas que partindo de uma situação
muito precária chegaram a atingir, trabalhando, posições in­
vejáveis. Mas não devemos generalizar: são casos excepcio­
nais, quase sempre resultantes de circunstâncias favoráveis,
como sejam um verdadeiro talento, energia extraordinária, e
não raras vêzes estudos e aperfeiçoamento, que a renúncia de
irmãos mais velhos ou mais jovens tornaram possíveis. A
verdade é que o aprendizado e muitas profissões estão fora
de cogitação para a maioria, apesar dos auxílios particulares
e oficiais (aliás insuficientes).
Esta constatação é desonrosa para um país civilizado.
136 JeanUngricht
... ■ — ■ ■■ . -- —
Tais situações existem, mas é certo que não devem continuar
existindo. Países de nova formação social são, nesse parti­
cular, um exemplo a imitar. Ali constitui um dever de grande
importância dar a todos as mesmas possibilidades. Porém,
até que isto aconteça muita água correrá pelo Reno e a orien­
tação profissional deve tentar suprir a lacuna, o que não é fá­
cil. Com o melhor aproveitamento das bolsas e outras opor-'
tunidades que se oferecem, muitos poderão ser ajudados.
Existem na Suíça 1 200 bolsas de estudo, num valor aproxima­
do de 40000 000 de frs. suíços, com juros anuais de 1 400 000
francos, acrescidos de 700 000 francos doados pelo Govêrno.
Mas a distribuição dêstes estipêndios é complicada, difícil de
supervisionar; aquêle que não estiver bem informado perde-
-se num verdadeiro emaranhado. Incrivelmente grandes opor­
tunidades passam desapercebidas e uma considerável parte
(exatamente 300 000 francos por ano) daquela verdadeira for­
tuna não é aproveitada57. A Liga de Orientação Profissional
e Assistência aos Aprendizes faz esforços, há anos, para con­
seguir uma reforma saneadora. F. Bõhny e E. Jucker orga­
nizaram, como primeira e importante contribuição, um índice
dos Estipêndios da Suíça58. A seguir, H. Gnehm59 estudou
em profundidade o assunto e esperamos que o seu trabalho
provoque a revisão geral das leis e regulamentos vigentes na
Suíça60. Em diversos Cantões já se esboça um movimento
neste sentido. Seria também muito útil a criação do seguro
de aprendizagem profissional. *
Para que realmente produzam frutos, tôdas estas formas
de auxílio pressupõem a prévia comprovação de que o aspi­
rante está realmente em condições de aproveitá-lo. Nenhum
estipêndio, nenhum empréstimo devia ser concedido sem
um exame da capacidade e das inclinações do aspirante. Es­
ta norma irrevogável acarretaria o reconhecimento oficial da
orientação profissional, necessidade cada vez mais premente.
Finalmente, lembramos que os ordenados dos aprendizes
variam. Há profissões em que o aprendiz, desde o início, ga-
57 A causa não está só no desconhecimento da existência de estipêndios, mas
também nas disposições antiquadas, já ultrapassadas, que regem a sua distribuição.
58 “Schweizerisches Stipendienverzeichnis" 163.
59 Gnehm, “Berufslehrstipendien und ihre Wirkung auf die berufliche Ausbildungb 57.
60 Ver também:
Bõhny, “Zur Reform des Berufslehrstipendfenwesens* 27.
Jucker, "Richtlinlen der Stipendienpolitik” 74.
Jucker, “Fõrdem Stipendien die berufliche Ausbildung?” 74.
• Poderiam as nossas autoridades aproveitar também esta sugestão pois o proble­
ma é o mesmo; porém num país com população 20 vêzes maior... (N. do T.).
Escolha da Profissão 137

nha suficientemente para os seus gastos pessoais; outras,


ainda, nas quais percebe um modesto ordenado e, por último,
aquelas que exigem do aprendiz uma contribuição. O desco­
nhecimento destas possibilidades (que poderiam beneficiar
até os mais pobres) faz parte daquele geral desconhecimento
das profissões, de que já falamos.
O 2.° grupo abrange os fatôres geográficos. Do local de
residência da família depende a escolha da escola, e a loca­
lização desta, provàvelmente induzirá o estudante a escolher
um determinado emprêgo. Deixa-se de frequentar a escola
secundária, distante demais, cortando automaticamente o
acesso a muitas profissões, pela dificuldade de custear o trans­
porte. Assim, só porque a família reside aqui e não lá e a
condução é cara ou difícil, vai-se restringindo o círculo de pro­
fissões a escolher, a ponto de não ser mais possível usar o
termo “escolha” (como por exemplo no caso do camponês
que, por habitar no campo, só poderia escolher uma profissão
— a sua).
O 3.° grupo compreende os fatôres ligados à vida social,
isto é os preconceitos, que têm origem na tradição e no dese­
jo de obter prestígio; na ambição de galgar os degraus da
escala social; na necessidade de segurança material dos pais
e parentes. A pressão exercida pelo ambiente passa, muitas
vêzes, desapercebida61, e sôbre isto já nos estendemos sufi­
cientemente62.
*
*
O orientador profissional não pode ignorar, simplesmen­
te, êstes obstáculos e muito menos a vontade dos pais. Êles
têm existência concreta e devem ser aceitos e respeitados pe­
la sua posição. Não pode afastar, sem consideração, as cir­
cunstâncias que criaram o problema. O jovem que procura o
orientador não é um adulto, com inteira liberdade de deci­
são. Êle depende, ainda, psíquica e materialmente dos geni­
tores e não deve quebrar (pelo menos não totalmente) os la­
ços que o ligam ao meio familiar. Para isto talvez seja preci­
so renunciar à “melhor solução”, em relação à profissão. Mas
é preferível fazê-lo e evitar que o jovem entre em conflito

61 A intensidade desta pressão evidencia-se quando os pais procuram encaminhar


para os estudos um filho visivelmente incapaz, cegos pelo desejo de prestigio e de­
monstrando total incompreensão da verdadeira situação.
62 Ver estudo dos fatôres da escolha profissional.
138 Jean Ungricht

com a família, transformando a melhor solução em má de­


cisão.
É evidente que capacidade e inclinação podem, então,
sofrer fortes modificações e talvez sejam totalmente anula­
das. A escolha profissional estará oscilando entre conside­
rações materiais e esperanças e desejos irreais puramente
subjetivos, que E. Bleuler criticou tão excelentemente63. Nes­
te ponto o orientador necessita de uma boa dose de resig­
nação. Respeitará, tanto quanto possível, as circunstâncias.
Mas às vêzes enfrenta opiniões irredutíveis da família, não
podendo responsabilizar-se pela orientação. Deve recuar, lem-
brando-se do velho ditado: “Des Menschen Wille ist sein
.
Himmelreich"
* Argumentação e habilidade pedagógica são
as únicas armas a usar neste combate e quase sempre se re­
velam ineficientes, pois sonhos irrealizados, dos pais, ques­
tões de honra, tradição, religião e complexos semelhantes
abafam a voz da razão64. Os clientes de um orientador pro­
fissional confirmam, com muita frequência, a frase pessimis­
ta de Freud: "o homem é um ser pouco inteligente, dominado
pelos instintos”65.
Êstes fatores externos restringem bastante a liberdade de
escolha. São obstáculos a enfrentar resignadamente e a eli­
minar, tanto no interêsse do indivíduo quanto no da socie­
dade.
De um modo geral,
com referência à escolha da profissão observamos
que: a influência das circunstâncias materiais,
geográficas e sociais é decisiva e não deve ser me­
nosprezada ; convém evitar soluções inaplicáveis,
sem base concreta, não perdendo de vista a neces­
sidade de ater-se ao número de lugares disponíveis
nas escolas e nos centros de formação de aprendizes
4. Bases de julgamento
Qual a relação existente entre capacidade, inclinação e
fatores externos? Que papel desempenham 41a escolha profis­

* “A vontade do Homem é seu Reino Celeste" (N. do E.).


63 Bleuler, "Das autistisch-undisziplinierte Denken in der Medizin und seine
Ueberwindung” 21.
64 Pode ainda alguém acreditar, hoje em dia, que a "confissão” sirva de meio para
obter um lugar de aprendiz?
65 Freud, "Die Zukunft eíner lllusion” 51 p. 79.
Escolha da Profissão 139

sional a capacidade, as inclinações e os fatôres externos? Qual


dos três fatôres deve ter primazia?
Perguntas complexas, de resposta difícil.
Os três fatôres têm exigências bem fundadas. "Como em
tantas outras ocasiões, não podemos responder de modo ge­
ral pois, na orientação profissional, cada caso constitui um
todo" (Bogen)66.
Os motivos da escolha variam, também, de indiví­
duo. Só podemos afirmar que os três fatôres devem
ser examinados com a mesma atenção. Tentaremos,
porém, estudar melhor a questão.
As inclinações: os defensores da orientação profissional
individual eudemonística colocam o fator inclinação em pri­
meiro lugar; preocupam-se apenas com as necessidades do
indivíduo, buscando uma profissão que as satisfaça inteira­
mente. Mas, indiretamente, a sociedade é beneficiada, pois
quando o trabalho profissional corresponde às inclinações
daquele que o realiza, ganha novo impulso e proporciona sa­
tisfação. Trabalhando assim o indivíduo está em harmonia
com a sociedade e seus ditames, tem boa vontade, tranquili­
dade, alegria, é um elemento social “estável". Em conse­
quência, produz muito mais. Do ponto de vista económico a
orientação profissional eudemonística é, portanto, defensável.
Justamente porque uma produção constante, estável, dificil­
mente é obtida sem a cooperação daquele que produz. Ora,
quando existe boa vontade e satisfação, qualquer trabalho
é muito mais eficiente do que se executado apenas por obriga­
ção. Um indivíduo de capacidade média, porém satisfeito
com seu trabalho, será mais útil para o coletividade do que
um trabalhador insatisfeito, embora muito capaz.
Limites do fator inclinação: quando a escolha profissio­
nal, considerando apenas as tendências individuais, não leva
em conta as necessidades do mercado de trabalho, foge à rea­
lidade e poderia ser comparada a um beco sem saída. Ne­
nhuma oportunidade de realização existe; defronta-se ela com
uma limitação total e definitiva, imposta por fatôres exter­
nos ligados ao mundo profissional.
Circunstâncias sociais podem, também, impor restrições.
Por exemplo: quando as inclinações (profissionais) estão em

66 Bogen» "Psychologische Grundlagen der praktischen Berufsberatung” 23 p, 140.


140 JeanUngrcht

desarmonia com o ambiente, principalmente familiar67;


quando o jovem se afasta demais do seu ambiente de origem,
podem surgir conflitos graves. Renunciando em parte a es­
sas inclinações, suas próprias dificuldades seriam talvez, me­
nores. É uma limitação que se deve levar em conta. Poderia
ser contornada pela alteração das circunstâncias inibitivas ex­
teriores . Se a tentativa não fôr bem sucedida, resta adaptar-se
e renunciar. A terceira limitação tem por origem a capaci­
dade. Diz-se que a escolha é acertada quando existe possibi­
lidade de exercer a profissão escolhida, e o futuro profissio­
nal tem capacidade para exercê-la. Se o orientado escolheu a
profissão para a qual tem maior inclinação, mas lhe falta a
capacidade mínima para o bom desempenho dela, com o tem­
po o interesse pelo trabalho, desaparece, e o lucro forçosa­
mente insuficiente destrói os últimos resquícios de satisfação
profissional. Neste caso, a única solução seria despertar o
interesse do jovem por outra ocupação que correspondesse
melhor à sua capacidade. E nas horas de lazer poderia satis­
fazer as suas inclinações, dedicando-se a outras atividades.
*
¥ *
Fatôres externos: A exigência básica na escolha de uma
profissão é que ela possa ser exercida. Em relação aos fa­
tôres externos, isto pressupõe: l.° — que obstáculos econó­
micos ou geográficos não se oponham à aprendizagem e ao
exercício da profissão. Êstes pontos devem ser devidamente
estudados, conforme já dissemos atrás; 2? — que existam,
com referência à profissão escolhida, vagas a serem preen­
chidas pela nova geração de trabalhadores.
Há profissões que caíram em desuso. A necessidade de
renovação das forças económicas exige que a escolha da pro­
fissão seja feita criteriosamente68. O orientador profissional
que se esquecesse disto prestaria um mau serviço ao orienta­
do e à coletividade. Talvez, em alguns casos, pudesse servir
ao indivíduo, mas em geral desserviria o organismo econô-
mico-social. Seria, então, preferível voltar ao antigo método
da oferta e procura. "Profissões rendosas, que ofereçam se­
gurança, estão vinculadas a uma economia político-social
67 Por exemplo: nos melhores círculos sociais ouve-se, com frequência dizer que,
para uma môça, a profissão de cabeleireira não é “conveniente” e que o filho de um
professor acadêmico não poderia aprender um ofício sem ofender as tradições da
família.
68 Dunkmann^ “Die Lehre vom Beruf” 43 pp. 282-390.
Escolha da Profissão 141

próspera. A tarefa da orientação profissional, na Suíça, é,


pois, respeitar as inclinações e a capacidade do indivíduo,
mas também as necessidades do mercado de trabalho, esta­
belecendo uma ligação fértil entre as exigências político-eco­
nómicas” (E. Jucker)69.
É possível imaginar uma economia social utópica, que
deixando de lado as necessidades económicas considerasse
apenas as inclinações do indivíduo e as exigências do mer­
cado de trabalho (Proposta de Neurath)70. Por enquanto, a
orientação profissional deve movimentar-se dentro da moldu­
ra existente, cooperando para uma transformação da estru­
tura económica71.
É acertado, pois, combater a orientação profissional uni­
lateral7273
. As diretrizes da Liga de Orientação Profissional e
Assistência aos Aprendizes, bem como numerosos ensaios e
artigos por ela publicados, provam que as necessidades da
economia foram sempre respeitadas. De outro modo não po­
deria a orientação profissional contar com a aprovação e a
confiança das autoridades e das organizações sócio-econômi-
cas, em tão grande escala como é o caso.
* ♦ ♦
Dizemos que a escolha profissional foi acertada quando
a profissão escolhida pode realmente ser exercida e o orien­
tado tem a capacidade mínima para o bom desempenho das
suas funções. Subestimar o grau de capacidade é um erro
a evitar. Não devemos esquecer que a maioria das profissões
exige apenas uma capacidade média; e que, assim sendo, ca­
da homem sadio e normal pode aprender e exercer satisfa­
toriamente mais de uma profissão78.
Isso mesmo afirma E. Jucker: o homem tem capacidade,
na maior parte das vêzes, para várias profissões. Exemplifi­
cando: os professores universitários têm, sem dúvida, capaci­
dade para o exercício de muitas outras profissões. Sua inte­
ligência, sua formação intelectual e moral lhes serviria em
todos os setores de atividade. Poderiam ser extraordinários

69 Jucker, “Aufgabenkreis, Arbeitsmittel und Mitarbeiterstab der Berufsberatung” 71,


70 Jucker, “Die sokratísche Methode ín der Berufswahiberatung" 80 p. 6.
71 Dúnkmann, “Die Lehre vom Beruf* 42 p. 284.
72 Luick, “Der berufliche Nachwuchs in der Schweiz” 107 p. 138.
73 Na época das Corporações, por exemplo, a profissão era determinadas pela “des­
cendência” e não pelas inclinações ou pela capacidade.
142 JeanUngricht

varredores de rua, condutores de veículos, limpadores de ja­


nelas, hoteleiros etc., executando sua tarefa de maneira su­
perior. Neste caso, se déssemos valor unicamente à capaci­
dade, êles deveriam ter escolhido uma das mencionadas pro­
fissões (que poderiam exercer com perfeição) e não a de pro­
fessor, em que talvez não ultrapassem a média. Vemos a que
absurdos podemos chegar considerando apenas a capacidade
— em seu grau mais alto. Esta seleção contraria o verdadeiro
espírito da orientação profissional e se justifica apenas do
ponto de vista das emprêsas que a rotulam de concorrência
seletiva. Objeta-se que, por trabalho mais perfeito se deve­
ria entender não o trabalho melhor executado, em compara­
ção ao dos outros trabalhadores que exercem a mesma ativi­
dade, mas esfôrço máximo de um homem e o total emprêgo
de sua capacidade.
Qual o sentido destas considerações? Se lhes fôssem da­
dos orientação, ambiente e impulso adequados, a maior parte
dos homens não seria capaz de exercer outras tarefas além
das habituais? Sem dúvida. Prova-o claramente o espantoso
aguçamento de certas faculdades, em situações psicológicas
excepcionais como na hipnose, por exemplo7475 .
Mas como reconhecer o grau de capacidade necessária
em cada caso: altíssima, alta, média, abaixo da média, sufi­
ciente ou apenas aceitável? Qual delas escolher como padrão
de julgamento? O fator capacidade (seja qual fôr a maneira
de encará-lo) não oferece suficiente garantia para ser aceito
como único critério de escolha da profissão.
Em resumo: a capacidade não pode constituir a única
norma de seleção. l.° — porque a maior parte das profissões
pode ser exercida pela maioria dos homens sadios, normais;
2.° — porque, com raras exceções, não existe predestinação
para uma única profissão> em referência à capacidade73.
Que valor tem, então, o critério da capacidade, para a
escolha profissional? Para a prática de cada profissão é ne­
cessária uma certa capacidade mínima e o sucesso na profis­
são (moral e material) está fortemente ligado à capacidade.
Isto é: quanto mais o profissional se aperfeiçoa, quanto mais

74 Jacoby, “Muss es Unmusikalische geben?” 71 e suas outras pesquisas.


75 Nenhum grande talento significa predestinação em si. é mesmo raro que um
grande talento se alie às inclinações. Há pessoas que ignoram possuir talentos la­
tentes; e como descobri’lo se nunca foram despertados? Outras lhes atribuem impor­
tância secundária e não se preocupam em aproveitá-los devidamente.
Escolha da Profissão 143

capacidade demonstra, maior é a possibilidade de progredir,


de lucrar e de encontrar satisfação no trabalho. Devemos
lembrar-nos, também, que o organismo económico necessita
de forças capazes, de trabalhadores de valor. O orientado
tem, pois, interêsse em eleger a profissão na qual sua capaci­
dade possa manifestar-se integralmente. Mas não devemos
esperar que o fator capacidade indique uma completa integra­
ção do homem com uma determinada profissão. Êle sele­
ciona, antes limitando que determinando; exclui várias pro­
fissões para as quais não existe capacidade suficiente; indica
as atividades cujas exigências o orientado poderia satisfazer,
e finalmente destaca aquelas em que obteria pleno sucesso.
O fator capacidade delimita, pois, um campo vasto de profis­
sões. Raras vêzes existe capacidade para uma única profis­
são; poderá acontecer excepcionalmente, com indivíduos fisi­
camente incapacitados ou em virtude de uma vocação toda
especial. Devido ao seu entrelaçamento, é difícil averiguar
qual dos três fatôres (inclinações, capacidade, circunstâncias
exteriores) tem primazia; separá-los, estudá-los em sua com­
plexidade, avaliar a sua importância, é tarefa que exige do
orientador uma visão criadora, um verdadeiro talento. Além
disso, o problema pode ser encarado de modo diferente e so­
lucionado de diversas maneiras. Baseando-me em minha pró­
pria experiência, eu abordaria a questão dêste modo: na orien­
tação de indivíduos normais sadios, é difícil tomar como pon­
to de partida a capacidade, pois ela abrange um campo vasto
demais. É mais simples basear-se nas inclinações, com o fito
de encontrar a profissão que proporcione ao orientado o má­
ximo de satisfaçqo. A região delimitada pelas inclinações
é ainda restringida pelos fatôres externos que determinarão
desde logo a exclusão de muitas atividades. Em certos ca­
sos, será até melhor partir dos fatôres externos, e dentre as
profissões "possíveis" selecionar algumas que correspondem
às inclinações individuais, para finalmente eleger aquelas pa­
ra as quais existe capacidade.
Quando o orientado é portador de defeitos físicos ou ta­
lento excepcional, torna-se ncessário considerar a capacidade
como meio hábil de seleção. O orientador decidirá, em cada
caso, qual o melhor caminho a seguir.
*
¥ *
144 Jean Ungricht

Em geral, convém que a orientação se apóie tanto na ca­


pacidade, quanto nas inclinações, evitando o mais possível
afastar-se desta diretriz. R. Liebenberg76 aconselha:
a escolha profissional é sustentada por dois pila­
res: capacidade e inclinações.
Só quando existe equilíbrio entre êles podemos ter certe­
za que a estrutura resistirá aos maiores abalos. Por isto, pa­
ra a orientação é boa norma fixar em primeiro lugar as bases
do trabalho, determinando as inclinações e a capacidade, sem
esquecer que é preciso considerar também os fatôres externos,
sobretudo os que dizem respeito às necessidades econômico-
-sociais.
V — CARACTERÍSTICAS DA ORIENTAÇÃO PROFIS­
SIONAL NA SUÍÇA
Verifiquemos agora, em face das circunstâncias econó­
micas da Suíça, o caráter da orientação profissional, relacio­
nado com os interêsses do Estado.
1. Observações sôbre as relações do indivíduo com a so­
ciedade e a profissão
A Nação Suíça existe em função dos seus habitantes. Pro­
cura atingir um plano ideal em relação à liberdade, autode­
terminação e autodesenvolvimento do indivíduo, preservando
tanto quanto possível a unidade nacional. A liberdade indi­
vidual cessa no instante em que contende com a liberdade
alheia, resultando daí uma renúncia voluntária, parcial, do in­
divíduo, como por exemplo se verifica nas Comunidades e
nos Cantões. As conveniências individuais estão intimamen-
te relacionadas com as da Comunidade e o lema "todos por
um — um por todos" exprime bem a natureza dessas relações.
Esta harmoniosa dependência faz a fôrça da Nação Helvética,
e lhe confere aquela extraordinária firmeza demonstrada so­
bretudo em épocas difíceis. A moderna Federação se distan­
cia tanto da primitiva forma de coletivismo, quanto do indivi­
dualismo extremado. É “comunidade com liberdade e liberda­
de em comunidade" (E. Brunner*1). “Tende para o estado

76 Liebenberg, “Berufsberatung, Methode und Technik” 97 p. 17.


1 Brunner, “Gerechtigkeit” 32 p. 99.
E soolh a da Profissão 145

ideal, ou seja a concordância harmónica e tácita da unidade


social e da diversidade individual... A cultura verdadeira con­
siste, não em contentar altemativamente o Eu e o monstro
coletivo, mas em ajustar as conveniências individuais aos in­
terêsses da coletividade, definidos não muito claramente co­
mo bem público” (Marbach2). Êsse compromisso constitui a
grandeza daquele modo de viver que só por si nos oferece
a garantia de simultâneo respeito pelos legítimos interêsses
dó indivíduo e da coletividade.
É notável que idênticos conceitos hajam sido expressos
por Fischer, o pioneiro da orientação profissional na Alema­
nha: "indivíduo e coletividade estão diante de nós como
contrastes que se excluem mutuamente; o individualismo exal­
ta o indivíduo, colocando tudo o mais — coletividade, socieda­
de e Nação, a serviço dêle. O coletivismo inverte os papéis,
atribuindo à coletividade o valor máximo. Uma análise mais
profunda do homem e da sociedade nos mostra a recíproca
dependência de ambos e condena tanto a valorização absoluta
(estética e abstrata) do indivíduo, quanto a supremacia (co­
letivista e utilitarista) da Nação”3.
Êsse harmonioso entrelaçamento devia reger tôdas as
ações que interessam ao mesmo tempo à coletividade e ao in­
divíduo ; e a profissão é, sem dúvida, o setor em que por ex­
celência se revela a ligação indissolúvel dêsses direitos. O ho­
mem precisa escolher uma profissão para o seu progresso pes­
soal e para colaborar no desenvolvimento da sociedade. For­
má-lo para que possa sentir-se feliz e respeitado como profis­
sional é uma exigência básica da educação. À profissão é im­
portante, não somente para a economia privada, como meio
de vida e garantia de segurança material, mas também para
a economia nacional. O profissional tem o dever de olhar
(além de si e de suas necessidades pessoais) pelos interêsses
da coletividade4.
Em que setores se desenvolvem estas relações mútuas;
que reações a escolha profissional provoca no indivíduo e na
coletividade? Já o esclarecemos no capítulo sôbre a escolha
profissional, frisando que o indivíduo não pode fazer a sua
escolha sem se preocupar com as necessidades da coletividade,
nem esta considera a orientação profissional somente como
2 Marbach, “Theorie des Mittelstandes” 109 pp. 23-24.
3 Fischer, "Beruf, Berufswahl, Berufsberatung" 46 pp. 7-8.
4 Fischer, “Ueber Beruf, Berufswahl und Berufsberatung” 46 pp. 13-14; 25.
146 JeànUngricht
.......... .... .

instrumento de defesa dos setis próprios direitos. O indivíduo


só pode prosperar quando o todo prospera, e vice-versa.
Não é possível, portanto, rejeitar uma organização como
a orientação profissional/de tanta importância para a edifi­
cação social e económica de uma Nação.

Na sua aplicação, é indispensável respeitar as necessida­


des do indivíduo, bem como os interêsses da sociedade. Mes­
mo que pretendêssemos ignorar problemas éticos, políticos e
ideológicos, esta exigência devia ficar de pé, pois: a orienta­
ção baseada exclusivamente nas aspirações do indivíduo, é
impraticável; jamais encontraríamos vagas suficientes^ para
satisfazer a todos os candidatos e consegui-lo seTia precipitar
a economia num caos; se a orientação atentar apenas para
as exigências económicas, nunca poderá satisfazer os desejos
do indivíduo, deixando de ser procurada voluntariamente e
torná-la obrigatória — único recurso neste caso — significa­
ria estabelecer um sistema económico apoiado em imposições
totalitárias.
2. Encargos e finalidade da orientação profissional
Em consequência destas observações sôbre a posição que
a profissão deve ocupar, como medianeira entre o indivíduo
e a coletividade, a finalidade da orientação profissional devia
ser, como já preconizava em 1912 W. Krebs, num seu traba­
lho premiado, sôbre os problemas da classe média:
“dar a cada cidadão a oportunidade de exercer uma
atividade lucrativa correspondente às suas inclina­
ções e capacidade, e, ao mesmo tempo, fornecer a
cada profissão viável um número de recrutas capa­
zes, em correspondência com o seu desenvolvimen­
to” 5. '
Isto é possível? A estrutura económica comporta um tão
harmonioso entrelaçamento de interêsses individuais e cole­
tivos? Hische afirma que não. Ê impossível, diz êle, harmo­
nizar as necessidades do mercado de trabalho com os inte­
rêsses dos jovens, e a missão do orientaãor se transforma

5 Krebs, “Mittel ítir eine rationelle Berufswahl im Mittelstand” 91 p. 49. «


Escolha da Profissão 14?

numa tragédia6. Esta afirmação nos parece um pouco pre­


cipitada. Pode corresponder à realidade nos países pouco
desenvolvidos economicamente, ou nas regiões em que poucas
profissões se desenvolveram, ou ainda quando, em virtude de
um extremo desenvolvimento, os setores da indústria absor­
vem todos os trabalhadores disponíveis. Na Suíça a situação
é outra. E. Jucker analisou-a.
Já vimos que, apesar das restrições impostas pelos fato­
res inclinação, capacidade e circunstâncias externas, o nú­
mero de profissões a selecionar não é tão pequeno.
Por outro lado (eu cito E. Jucker)7 “a extraordinária di­
versidade de profissões é uma característica da Suíça. Não
há, sem dúvida, outro país que em relação ao número de ha­
bitantes apresente uma tal quantidade de profissões básicas,
com suas variantes. O povo suíço teve que compensar a po­
breza do solo fazendo do desdobramento profissional, da vas­
tíssima subdivisão das profissões, a verdadeira riqueza eco­
nómica da Nação. A árvore das profissões tem, na Suíça, mi­
lhares de finas mas resistentes raízes que vitalizam o solo
pouco fértil até o último centímetro”.
0 futuro profissional tem, portanto, um vastíssimo cam­
po de escolha, ainda ampliável por algumas variações e com­
binações, de modo que aquêle desejado entrosamento dos in­
terêsses individuais e coletivos é realmente possível8.
Estas reflexões teóricas são confirmadas na prática. As
experiências de orientação profissional suíça datam de três
décadas e confirmam:
pela escolha cuidadosa e esclarecida é sempre pos­
sível encontrar para cada orientado uma profissão
que corresponda largamente às suas inclinações e
capacidade; que se harmonize com as circunstân­
cias de sua vida particular e com as necessidades
sócio-económicas do país9.
ir
ic ir

6 Hische, “Das Eignungsprinzip 66 p. 5


7 Jucker, “Die sokratische Methode in der Berufswahl-Beratung" 80 p. 7.
8 Jucker, idem, idem.
9 Isto devia ser possível até para a maior parte dos anormais. Por exemplo débeis
mentais, desajustados, psicopatas, aleijados, epilépticos etc.
148 JeanUngricht

Estas experiências peculiares caracterizam um novo tipo


básico de orientação profissional que poderíamos chamar de
"suíço" e que conduz a resultados satisfatórios. Encontra­
mos, pois, para a palavra “profissão” uma nova definição
ideal; deixei de citá-la no início dêste trabalho para não me­
lindrar quem quer que seja:
Nas palavras de Liechti:
“profissão é a dedicação (consciente de seus deve­
res e de sua finalidade) a um trabalho organizado
e constante, tanto quanto possível compatível com
as inclinações e a capacidade do indivíduo integra­
do na coletividade"1011
.
Por orientação profissional entende-se: “o emprêgo de
um conjunto de medidas com a finalidade de encontrar uma
profissão conveniente e de ajudar o orientado a exercê-la de
maneira útil (para si mesmo e para a coletividade)”.
Ainda citando Liechti11:
“orientação profissional significa o encaminha­
mento planejado e a introdução da juventude (e
dos adultos que querem ou necessitam mudar de
profissão) na vida profissional. Ela se baseia no co­
nhecimento do indivíduo que deve ser orientado (in­
clusive suas tendências, capacidade profissional e
ambiente social) e no conhecimento da sua situação
financeira e das possibilidades económicas que ofe­
recem as profissões a escolher. Procura encaminhar
o orientado para profissões que lhe proporcionem
sálario conveniente e satisfação moral e material,
na mais alta medida”.
*
* *
Indicamos, em linhas gerais, as finalidades e os deveres
da orientação profissional. Vamos repetir: a orientação pro­
fissional originou-se da necessidade de restabelecer o equilí­
brio entre o mundo familiar e o mundo económico. O indiví­

10 Liechti, “Probleme des Berufs...* 09 p. 16.


11 Liechti, idem, pp. 104-105.
Escolha da Profissão 149

duo que escolhe sua profissão deve aproximar-se do grau de


desenvolvimento da sociedade. Levando o jovem a confrontar-
-se com a realidade profissional, a orientação fundamentada
na psicologia e devidamente esclarecida a respeito das profis­
sões, tenta restaurar a perdida harmonia. No decorrer dêste
processo de amadurecimento, aprende o orientado a conhe­
cer-se melhor e às suas necessidades, qualidades, situação so­
cial ; descobre a relação acertada com o mundo profissional.
A orientação profissional desempenha o papel de um catalisa­
dor que mantém êste processo em movimento, sustenta-o e di­
rige-o até seu ponto culminante — a escolha profissional defi­
nitiva. O orientador às vêzes adota novas diretrizes para anu­
lar os fatôres inadequados, sem objetividade, que influenciam
a escolha — entre êles o acaso. Só então o orientado pode
julgar com segurança e deixa de ser conduzido para resolver
por si mesmo, o que constitui a garantia de uma decisão acer­
tada.
O orientador profissional não pretende, nem tem necessi­
dade de influenciar o orientado e de forçar uma decisão. Ao
final da orientação, êle é capaz de tomar a sua decisão livre­
mente. A responsabilidade é colocada inteiramente nas mãos
do jovem e de sua família, já agora perfeitamente capazes de
assumi-la com tôdas as suas consequências. Assim, o privilé­
gio de todo cidadão livre, de poder resolver livremente os seus
problemas, de nenhum modo é limitado pela orientação pro­
fissional. Ao contrário, ela atinge sua verdadeira finalidade
quando — pelo seu esfôrço — consegue assegurar ao futuro
cidadão a preciosa conquista dessa liberdade de escolha e, ao
mesmo tempo, lhe dá a possibilidade de orientar com acêrto a
sua vida.
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148 Tõbben H.» “Die Jugendverwahrlosung und ihre Bekàmpfung”, 1927, Aschen-
dorff, Mtinster i. W.
149 Ulrich M., “Die psychologische Analyse der hôheren Berufe ais Grundlage
einer kúnftigcn Berufsberatung", caderno 5 der Schriften zur Psychologie des
Wirtschaftslebens und der Berufseignung, 1918, Barth, Leipzig.
159 Vida J., “Das Problem des Aufstiegs”, 1933, Oldenburg, Munique-Berlim .
151 Winkler H., “Die Monotonie der Arbeit”, Schriften zur Psychologie der
Berufseignung und des Wirtschaftslebens, caderno 19, 1922, Barth, Leípzig.
152 Withe W. C., “Ein amerikanischef Reisebrlcht aus Russland”, NZZ de 23,
março 1945, fòlha 2.
153 Wíttig, “Die Kriminalitãt der Jugendlichen bis zum Jahre 1912”, 1915, Zeit­
schrift fur èínderforrschung, volume XX, ano 20.
154 Wunderlich A., “Die Einwirkung einfõrmiger zwangslãufíger Arbeit auf die
Persõnlichkeitsstruktur”, Schriften zur Psychologie der Berufseignung und des
Wirtschaftslebens, caderno 31, 1925, Barth, Leipzig.
155 Wy enbergh J. van, “Schule und Berufsberatung”, 1927, Editôra Ferd,
Schõni n gh, P ade rb orn.
156 Wyler J., “Die Demographie der Auslãnder in der Schweiz”, 1920, Zeitschrift
ftir Schweiz, Statistik und Volkswirtschaft, caderno I e 3.
157 “Die Methoden der Kiassifikation der Erwerbszweige und Berufe”, 1923, Studien
und Berichte des Internationalen Arbeltsamtes, Reihe N, Nr. 1.
153 “Schcma der persõnlichen Berufe”, 1943, Eidg. statistisches Amt.
159 “Berufsverzeichnis ftlr die Arbeitsnachweisstatistik herausgegeben vom Eidg.
Arbeitsamt, * 1924.
169 “Verzeichnis der mãnnlichen Berufe”, Blãtter zur Berufswahl und Berufsberatung,
18. Jahrgang. NY. 4/6, 1942, herausgegeben vom Jugendamt III der Stôdt
Ztirich.
161 “Frauenberufe”, 1945, Schweiz. Frauensekretariat, Zurique.
162 “Die Studierenden an schweizerischen Hochschulen", Eidg. Statistisches Amt.
Sonderausgabe 1936, Beítrãge zur schweiz. Estatística, caderno 7.
163 “Schweizerisches Stípendíenverzeichnís”, 3. Edição, 1940, VBLF, Zurique.
164 "Sohwelzerische Statistísche Mitteilungen”, ano VI, 1924 caderno 7 (Berufe-
stanstlk).
158 Jean Ungricht

165 “Die Volkswirtschaít’', wirtschaftliche und socialstatitische *


Mitteílungen ’, heraus-
gegeben, vom Eidg. Volkswirtschaftsdepartement, Monatsschrift.
166 "Béricht tiber die Arbeitslagung der schweizerischen Stiftung ftlr Psychotechnik"
em Luzerna, de 24, março 1944, Vervieifâltigung der Schweiz. Stiftung ftir
Psychotechnik, 1944.
167 “Aussenhandel und Volkswohlstand”, in “Galenica Nachrichten", Revista da Ga-
lencla Bem, maio 1945.
168 "Occupations, The Vocational Guídance Magazine”, Monatsschrift, New York,
National Vocational Guidance Assoziation.
169 “Festschrift zur Feier des 25jãhrigen Bestandes des Verbandes fdr Berufsberatung
und LehrlingsfUrsorge” 1927, Baumgartner Burgdorf, VBLF.
170 “Dem Obligatorlum entgegen?". (versch.. Autores), em "Berufsberatung und
Berufsbildung", caderno 2/3, fevereiro/março 1934, 1934, Burgdorf, VBLF.
171 "Bericht íiber Handel und Industrie der Schweiz im Jahre 1943”, 1944, Vorort des
Schweizerischen Handels- und Industrievereins.
te

ÍNDICE

Primeira Parte

Notas preliminares .................................................................... 11


A IMPORTÂNCIA DA ESCOLHA DA PROFISSÃO ......... 15
I — O que significa, para a vida de cada indivíduo, o escolha
da profissão ........................................................................ 16
%
1. Efeito da escolha da profissão sôbre o desenvolvi­
mento espiritual ..................................................... 16
2. A escolha da profissão e a saúde ................. 23
3. As relações entre a escolha da profissão e as circuns­
tâncias materiais ......................................................... 30
4. Trabalho e aprendizagem ................................................ 34

II — A importância da escolha da profissão em relação à so­


ciedade ....................................................................................... 37

1. Problemas político-económicos ................................. 37

a) Problemas político-económicos ................................ 37


b) Desemprêgo, superlotação de determinadas profis­
sões, profissões inadequadas ............................ 40
c) Emigração e imigração .............................................. 44
2. Conexões político-sociais .................................................... 49

a) Observações sôbre a família ..................................... 49


b) Profissão e educação cívica ................... 51
c) A escolha da profissão é a criminalidade .............. 53
d) Outras ligações entre profissão e estabilidade social 57

III — Resumo ........................................................................................ 61

Segunda Parte

FATORES PERIFÉRICOS DA ESCOLHA PROFISSIONAL 65


I — Material e métodos de pesquisa ................... 65

1. Levantamentos sistemáticos ......... ................................... 65


160 Jsan Ungricht

a) Inquirição direta de aprendizes e trabalhadores


em atividade ................................................................ 65
b) Motivos diretos da escolha profissional de estu­
dantes .................................................................... 67
c) Um método indireto: procura uma relação entre a
escolha profissional e fatôres externos, objetivos 68

2. Experiências dos orientadores profissionais ......... 72

a) Valorização da profissão em relação à posição so­


cial e ao progresso material ............................... 73
b) Motivos financeiros .................................................... 75
c) Trabalho e aprendizado, escola e moradia ............. 76
d) Sugestão e obrigação .................................. 77
e) Outros fatôres ............................................................... 80

II — Resultados gerais e complementares ...................................... 83


III — Considerações sôbre os dois principais motivos de uma
escolha profissional imprópria ................................................ 83

1. Desconhecimento de si mesmo ......................................... 88


2. Desconhecimento da realidade profissional .................... 91

IV — Resumo ......................................................... :............................ 97

Terceira Parte

CONCEITOS BÁSICOS DA ORIENTAÇÃO PROFISSIONAL 99

I — Noções preliminares ................................... 99


II — Hipóteses ............... 101
III -r- Os dois tipos básicos de orientação profissional .......... .... 107

1. O tipo individual eudemonístico ................ 107


2. O tipo social-eudemonístico ............................................. 110

IV — Normas de julgamento................................. 113

1. Capacidade ............ ...:.............. 113


2. Inclinações ......................................................................... 125
3. Fatôres externos .................................. 133
Escõj-HA da Profissão 161
... .......***■■■••■■

4. Bases de julgamento ......................................................... 138


V — Características da orientação profissional na Suíça .......... 144

1. Observações sôbre as relações do indivíduo com a


sociedade e a profissão ........................................ 144
2. Encargos e finalidade da orientaçãoprofissional ........ 14ó

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................ 151

ÍNDICE ...................................................................................................... 159


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