Quando o faço, tento consumir a obra no menor tempo
possível. Talvez seja por isso que dificilmente eu me animo em acompanhar uma obra em andamento, embora nas últimas vezes (The Man in the High Castle e Breaking Bad) eu acabei abandonado já na metade do enredo. Por ser uma obra acabada, quis assistir a animação de 1997. É uma adaptação de um arco do mangá, o “Arco da Era Dourada”. Nele, somos apresentados às origens dos personagens principais: Guts, o Espadachim Negro; Griffith e Casca. O enredo prossegue na busca desses dois por seus propósitos e ambições, que faz deles palcos para a exposição da cosmovisão da obra. O Arco está contextualizado num mundo medieval inspirado na Europa, onde dois reinos, Tudor e Midland estão em guerra há mais de cem anos, até que a entrada do Bando do Falcão, liderado por Griffith e com decisiva participação de Guts, vira a guerra a favor de Midland, subindo em prestígio e popularidade até eventualmente caírem em desgraça. Embora a maior parte da série narre “banalidades históricas” (a guerra entre duas cortes), à medida que nos aproximamos do fim, os conceitos e elementos sobrenaturais (que já haviam aparecido desde o primeiro episódio e também no meio da temporada) emergem com força no final. De fato, há uma aceleração do enredo ao longo dos últimos episódios, incluindo um salto de um ano para em seguida tudo se passar em menos de um dia. Ao longo dos episódios, discute-se frequentemente concepções sobre destino e vontade. A premissa é de que as pessoas estão presas às condicionais de suas vidas, tendo que se resignar. Isso só não vale para algumas poucas pessoas, quase que escolhidas por forças divinas para seguirem algum objetivo, um sonho. O próprio Griffith, de origem humilde, luta pelo seu sonho, de ser rei e ter a própria nação, arrastando junto o Bando do Falcão e fazendo o que for necessário para superar obstáculos e destruir inimigos. Outros personagens, reconhecendo o carisma do líder, assumem que em vez de perseguir seus próprios sonhos, deveriam ajudar aqueles fortes capazes de realizarem seus sonhos. Essa é a relação entre Casca (que se vê como espada do líder), Judeau e alguns outros colegas mercenários. Guts, por outro lado, nunca se viu em situação reflexiva, para pensar nos seus sonhos. Nascido e criado em bando mercenário, suas únicas referências eram sua espada e as batalhas. Ao se inconformar com a possibilidade ser só um instrumento para a realização do objetivo de outrem, desperta para a sua própria busca. A problemática de como os fins (sonhos) justificam os meios acaba sendo frequente na obra. Griffith, Guts e o bando não só soldados lutando guerras e ganhando dinheiro, eles também aceitam promover e participar de conspirações, assassinatos e seduções para alcançarem seus objetivos. A grande justificativa de Griffith, que o acompanha ao longo de toda a sua caminhada e se apresenta como tentação para a sua corrupção final é justamente a de que todas as mortes das quais ele e seu sonho foram responsáveis (companheiros e inimigos de batalha) precisavam ser compensadas de modo que só seria possível não pelo arrependimento ou por qualquer redenção, mas pela realização desse sonho particular cuja persecução dera início a tudo. Assim, na vida de Griffith, um abismo atraiu outro abismo. Em nome de “seu sonho”, ele subiu (ou melhor, desceu) a níveis cada vez mais abomináveis de corrupção. Tudo em Berserk é então trágico e macabro. Os pontos luminosos da série (a camaradagem entre o Bando do Falcão, a abertura de Guts à amizade, seu relacionamento com Casca) são soterrados num final violento. Enfim, é uma história interessante. Chamou minha atenção para acompanhar o que acontece depois, que só é conhecido no Mangá.