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A ORIGEM DO DIREITO DO TRABALHO

Rafael Kushida Schilling


Publicado em 07/2019.

O objetivo desta pesquisa será demonstrar aspectos sociais,


culturais, jurídicos e históricos da origem do direito do trabalho
e como ele contribuiu para o desenvolvimento humano.
INTRODUÇÃO

O que é o trabalho? Seria um castigo divino, um motivo de


orgulho e prestigio social ou apenas uma forma de sobreviver
em um mundo inóspito? A bíblia já o considerou um castigo no
velho testamente, como ensinam Gonzalez e Octaviano
comentando Genesis 3:19 “com a expulsão de Adão e Eva do
paraíso terrestre, Deus cominou para o homem a pena do
trabalho, como forma essencial de subsistência.” E nesse
mesmo sentido os autores comentam a segunda Carta de Paulo
aos Tessalonicenses 3:10 “O trabalho é forma essencial de
subsistência humana; ninguém ofereça sustento ao vadio.”[1].

A filosofia grega considerava o trabalho uma atividade


produtiva mundana e material e portanto, indigna. Platão
considerava os escravos (a força de trabalho de sua época)
seres sem alma e sem essência humana, um meio caminho
entre animais e pessoas. Aristóteles louvava o ócio como
condição fundamental da filosofia [2], afirmando que “o escravo
é escravo porque tem alma de escravo, é essencialmente
escravo, sendo destituído por completo de alma não ética, a
parte da alma capaz de fazer ciência e filosofia” [3]. Sócrates,
considerava uma missão divina ser um “vagabundo loquaz” [4].
Cabe aqui, entretanto, cabe mencionar Hesíodo, poeta da
alvorada da civilização grega, que escreveu, Trabalho e Dias,
onde descreve a vida como o trabalho no decorrer do tempo
[5].

A origem da palavra trabalho vem de algo penoso ao


homem. Na língua grega, a execução do trabalho era
expressada por ponos, grande esforço, kámatos, uma
ocupação exigindo capacidade e esforço especial ou
ainda kopos, esforço corporal e extenuante. [6] No Latim,
vem de tripalium, instrumento de tortura composto de três
paus, a partir do qual a ideia de sofrer veio à de se esforçar,
lutar e por fim de trabalhar [7]. No francês, sua etimologia vem
de travail, o que faz sofrer, no alemão, arbeit, que
antigamente designava moléstia[8].

Predominava a escravidão, o trabalhador era apenas um


objeto, não um sujeito de direito. Não mudou sua situação com
a servidão, embora tivesse proteção política e militar do seu
senhor, os trabalhadores não tinham condição livre, não podiam
exercer seu pleno direito nem tinham instancias superiores a
recorrer [9].

Isto posto, veremos como o conceito de trabalho vai se


transformar pelo pensamento através da história pois é por
meio do trabalho que o homem busca suas necessidades
materiais e até espirituais [10].

1. O TRABALHO GANHA SEU


RECONHECIMENTO, MAS VEM A EXPLORAÇÃO.

O trabalho começa a ganhar seu reconhecimento, não


reconhecimento legal ou jurídico, mas sim social, deixando de
ser um castigo ou uma praga contra a humanidade. No
renascimento se inicia uma visão do trabalho como um valor a
ser buscado, concebendo os frutos do trabalho como algo
positivo para a humanidade [11]. Inicia-se a partir daí uma
valorização do trabalho, de não ser mais visto como um castigo,
mas um valor a ser perseguido e que traria suas recompensas.
Locke acredita que todos os homens são iguais com direito a
propriedade, que seria adquirido pelas transformações da coisa,
através do trabalho [12]. Smith afirma “Um homem deve
sempre viver por seu trabalho, e seus ganhos devem, pelo
menos ser suficientes para sua manutenção. [13]”

Os teólogos passam a conceituar trabalho


como forma de moldar o mundo à imagem e semelhança de
Deus [14]. Calvino chegou a ensinar que o trabalho e a
poupança seriam as únicas virtudes do indivíduo, associando a
salvação do homem à economia e a diligência [15]. Começam
a surgir ditados como coma bem ou durma bem – o católico
prefere sossegado e o protestante comer bem [16] e “o diabo
acha trabalho para mãos desocupadas” [17] O calvinismo trouxe
a ideia de comprovar a fé do indivíduo pelas atividades
seculares [18]. Weber menciona o surgimento de uma ética
burguesa, onde abençoado, o empreendedor burguês pode,
dentro dos limites de conduta moral, enriquecer. Até as divisões
sociais segundo Calvino seriam um plano divino, para que a
classe dos trabalhadores se mantivesse obediente a Deus [19].
Huberman explica: “Esse é o espirito capitalista. Para o
calvinista, tal ensinamento não era um conselho, no sentido
comum, mas um ideal da conduta cristã. A melhor forma de
trabalhar para a glória de Deus era colocá-lo em prática. [20]”

Quando a burguesia capitalista se sobrepôs ao sistema


feudal, o trabalho livre triunfou sobre a servidão, assim o
trabalhador passou a vender sua força de trabalho a quem
melhor pagasse [21]. Claro que isso é uma visão do “dever ser”,
a falta de qualquer tipo de legislação levou a ambição
dos industriais a evidente situação de exploração. Assim, não
havia mais espaço para a mendicância ou o ócio. O trabalhador
que cumpria suas funções como um chamado divino passou a
ser o pensamento comum para a classe trabalhadora [22].

Nas sociedades tribais, o trabalho era dividido por


critérios biológicos. Por exemplo, a idade, o sexo, a força física.
Após algum tempo, passaram prevalecer a divisão entre
agricultura e indústria. [23]. Assim, com o advento da primeira
revolução industrial, as forças humanas e animais deixam de
ser a principal fonte de energia do processo produtivo devido a
mecanização e a máquina a vapor, assim sendo artesãos,
camponesas, mulheres e crianças, todos vão para as fábricas
[24], houve uma quebra da divisão de trabalho, todos eram
“iguais”, mas isso não teve um efeito benéfico, pois foram todos
jogados na vala da exploração. A acumulação de capital e a
existência de uma classe trabalhadora sem propriedades
traziam o início do capitalismo industrial [25].

Começa o fenômeno do fechamento das antigas


propriedades agrícolas, transformadas pelos grandes
latifundiários em pastos, expulsando os camponeses, criando
uma classe de mendigos, ladrões e desocupados nas estradas,
uma classe pronta a ser explorada nas novas fábricas [26].
Esses fechamentos ou eclosures representavam uma tragédia
para os camponeses expropriados ao mesmo tempo que
criavam essa nova classe de trabalhadores urbanos. Ao mesmo
tempo os artesãos arruinados pela competição com as
industrias se juntavam aos camponeses na nova classe
proletária. [27] As cidades são inchadas com a nova classe
proletária, completamente desamparada de proteção legal.
Thomas Malthus escreve em seu Ensaio sobre o princípio da
população, que a solução para a pobreza crescente é negar aos
pobres toda a assistência e aconselhá-los a abstenção sexual
[28] Tais condições aliadas a um parlamento focado na defesa
da propriedade privada, onde a classe trabalhadora não era
representada criam as condições para tornar a Inglaterra a
“Oficina do Mundo” [29].

Adam Smith trouxe a ideia de que a riqueza das nações


não repousava no acumulo de bens, mas sim nos frutos do
trabalho [30]. A fonte de toda riqueza viria do trabalho [31]. Ele
ensinava que o trabalho diferenciava nações selvagens das
prósperas. Onde da classe mais pobre poderia gozar de bens
com uma quota maior que qualquer selvagem. Desta forma,
acreditava que o desenvolvimento das indústrias aumentaria o
ganho dos empregados pela procura da mão-de-obra, mas a
mecanização maciça acabou por desvalorizar o elemento
humano [32].

Huberman ensina:

“Os capitalistas achavam que podiam fazer como bem


entendesse com as coisas que lhes pertenciam. Não
distinguiam entre suas mãos e as máquinas. Não era bem assim
– como as máquinas representavam um investimento, e os
homens não, preocupavam-se mais com o bem-estar das
primeiras. Pagavam os menores salários possíveis. Buscam o
máximo da força de trabalho com o mínimo necessário para
pagá-las. Como mulheres e crianças podiam cuidar das
máquinas e receber menos que os homens, deram-lhes
trabalho, enquanto homem ficava em casa, frequentemente sem
ocupação. A princípio, os donos de fábricas comparavam o
trabalho das crianças pobres, nos orfanatos; mais tarde, como
os salários do pai operário e da mãe operária não eram
suficientes para manter a família, também as crianças que
tinham casa foram obrigadas a trabalhar nas fábricas e minas.
[33]”

Ricardo convenceu-se que a substituição do trabalho


humano por máquinas acabou sendo prejudicial à classe dos
trabalhadores e que mesmo um aumento do rendimento líquido
de um país pode deteriorar a condição de vida dos
trabalhadores [34].

A miséria dos trabalhadores da época foi retratada nos


livros de Charles Dickens e Emile Zola, com homens e mulheres
trabalhando até dezesseis horas por dia. O Deputado Inglês
John Roebuck após visitar um cotonifício, disse ter saído
“gelado”, “é um lugar cheio de mulheres, todas jovens, algumas
gravidas, obrigadas a ficar de pé durante doze horas. Trabalham
das 5 da manhã às 7 da noite, com apenas meia hora de
descanso. Em certas salas o calor é sufocante e o cheiro
desagradabilíssimo.” [35]

Adam Smith em sua obra Riqueza das Nações, relata que


as manifestações dos trabalhadores são severamente
reprimidas pelos magistrados civis, resultando em nada, senão
apenas em punição [36].

2. SURGE O DIREITO DO TRABALHO

Tal situação, mostra como as leis podiam ser na


verdade, um instrumento de opressão. É neste cenário sombrio
que a classe operária começa a se mobilizar, bem como o
pensamento da época começa a mudar para buscar algo mais
equilibrado entre capital e trabalho, entre a classe patronal e
operária.

Essa situação de penumbra obviamente causava revolta


nos trabalhadores. A Europa estava em ebulição, com as
revoluções de 1848/primavera dos povos, a queda de Luís
Felipe, as jornadas de julho. Começava a surgir a ideologia
Marxista, com a fundação da liga dos comunistas em Bruxelas,
e já no segundo congresso da liga, Marx e Engels preparavam o
Manifesto Comunista, com análise da luta de classes e
convocando os operários a união. Reduzidos a uma pobreza
crescendo, conforme a sociedade se tornava mais rica, os
operários sonhavam com a sociedade sem classes. O manifesto
comunista trazia a necessidade dos operários se apropriarem
dos meios de produção, atingindo pela raiz o funcionamento do
modo de produção capitalista. Nesse ano de 1848, o rei
Leopoldo da Bélgica respondia à agitação popular dissolvendo
toda associação operaria no país. [37]
Em Colônia, Marx funda a Nova Gazeta Renana, onde
escreve numerosos artigos em favor dos operários.[38] Marx,
em 1867 em Londres escreve sua obra mais significativa, O
Capital, onde expos as principais críticas à sociedade
capitalista e suas contradições [39].

O Marxismo visava fazer da classe operária a classe


predominante na sociedade existente, pelos meios possíveis na
democracia para depois apoderar-se do poder político [40].
acabou por classificar o capital como a propriedade que garante
o capitalista explorar o trabalho alheio [41] e o capitalismo
como movimento baseado na exploração do trabalho [42]. O
Marxismo teve na comuna de Paris (1871) seu exemplo de
organização política e social. Valentin descreve a comuna: “A
feição socialista era nova. O governo provisório comprometeu-
se por meio de decretos a garantir a existência dos
trabalhadores pelo trabalho e proporcionar trabalho a todos os
cidadãos.” [43] o qual foi combatida e derrotada pelas forças da
burguesia, houve 10 mil mortes sendo que catorze mil foram
enviados ao exilio [44].

Na Inglaterra aparece o movimento dos luditas, que lutam


contra as máquinas, que seriam as responsáveis pela opressão
do trabalhador, buscando então a destruição das mesmas. O
parlamento inglês respondeu transformando em 1812, a
destruição de máquinas como crime passível de pena de morte
[45].

Na mesma época surge o movimento cartista em que a


classe trabalhadora reivindica: O sufrágio universal, o
pagamento aos membros eleitos na câmara (para que não
apenas os ricos pudessem exercer a atividade parlamentar),
parlamentos anuais, o fim da restrição de propriedades para os
candidatos (também para evitar que apenas os ricos fossem
parlamentares), sufrágio secreto para evitar intimidações dos
patrões, igualdade dos distritos eleitorais. O cartismo
desapareceu lentamente conforme suas reinvindicações foram
sendo aceitas, tendo sido um movimento de origem da classe
trabalhadora [46].

Neste contexto, nasce a ideia de justiça social apoiado


pelo Marxismo (hoje confundindo com a defesa do socialismo),
que vai encontrar um contraponto na doutrina social da igreja
[47], quando em Roma, o Papa Leão XIII, preocupa-se com a
questão operária desenvolvendo com as nações industriais da
época uma política de conciliação entre patrões e
trabalhadores. [48]

Buscando um acordo entre capital e trabalho, dentro dos


quadros do cristianismo, ele estimula a criação de círculos
operários, para se dedicarem a estudos, conferencias,
publicações etc. Dentre esses se destacou a “União de
Friburgo” que analisa os problemas sociais da classe operária e
conclui que eles são solucionáveis pela fé cristã. Em 15 de maio
de 1891, com a encíclica Rerum Novarum, a igreja católica dá
a sua posição oficial em relação aos problemas dos
trabalhadores. Busca entre outras coisas, a dignificação da
condição do trabalhador, um salário digno, suficiente para
manter as necessidades de sua família, rejeita a teoria marxista
de inimizade entre as classes e orienta os ricos a não tratar o
operário como escravo. Ela define o trabalho como “...uma
honra, não uma vergonha, constituindo um nobre meio de
sustentar a vida...”. A Rerum Novarum é uma resposta ao
marxismo, crescente devido a opressão dos trabalhadores,
ensinando “o socialismo, longe de ser capaz de por termo ao
conflito, prejudicará o operário, se for posto em prática: viola os
direitos legítimos dos proprietários, vicia as funções do Estado
e tende a subverter completamente o edifício social.” A
encíclica foi muito importante pois orienta patrões e
empregados a formarem organizações de ajuda mutua, para
auxiliar os operários em caso de doença ou acidente e limitar o
trabalho, além de um repouso semanal. Assim, a Rerum
Novarum e a doutrina social da igreja são tentativas de
conciliar pela fé patrões e empregados. [49]

Surgiram os sindicatos, que lutavam por


melhoras condições de trabalho. Diante de tais demandas
começaram a surgir as primeiras leis limitando as horas de
trabalho e coibindo o trabalho infantil. Começaram a surgir os
primeiros fundos destinados a auxiliar os desempregados e os
patrões passaram a assumir a responsabilidade por acidentes
de trabalho, pagando indenizações. Assim, os sindicatos
adquiriram influencias política para alterar as leis em favor dos
trabalhadores. Na Inglaterra as Trade-Unions realizaram seu
primeiro congresso em 1868, com outras grandes organizações
de trabalhadores legalizadas em 1871, conseguindo o direito de
greve em 1875 [50]. Sobre o sindicalismo Friendrich Engels
escreve em 1844: “Se a centralização da população estimula e
desenvolve a classe dos proprietários, força também o
desenvolvimento dos trabalhadores, ainda mais rapidamente.

Os trabalhadores começaram a se sentir como uma


classe, como um todo; começaram a perceber que, embora
fracos como indivíduos, formam um poder quando unidos. Sua
separação da burguesia, a formação de ideias peculiares aos
trabalhadores e correspondentes à sua situação na vida, são
estimulados, desperta a consciência da opressão, e eles
atingem a importância social e política. As grandes cidades são
o berço dos movimentos trabalhistas; nelas, os trabalhadores
começam a refletir sobre sua condição, e a lutar contra ela;
nelas a oposição entre proletariado e burguesia se manifestou
inicialmente; delas saíram o sindicalismo, o cartismo e o
socialismo.” [51]

Pode-se dizer que o surgimento do sindicalismo


contribuiu para o direito do trabalho e foi motivado pela
urgência de coibir os abusos contra os operários, e a
exploração de mulheres e crianças. Destaca-se na Inglaterra
o factory act (Lei das Fábricas) de 1819 que estabelecia a
idade mínima do trabalhador assalariado em 9 anos [52] e a “lei
de Peel” de 1802, limitando a jornada de trabalho de menores a
12 horas, na França a proibição do trabalho de menores de 8
anos (1814), na Alemanha a lei proibindo o trabalho de menores
de 9 anos (1939) e as leis socias de Bismarch em 1833 e na
Itália as leis de proteção ao trabalho das mulheres e dos
menores [53]. A Rerum Novarum teve papel importante, haja
vista que muitas leis surgiram inspiradas em seu texto, em
quase todos os países o Estado passou a fixar horas de
trabalho, salário mínimo, férias, seguro social. Igreja, capital e
Estado entraram em acordo para executar alguma justiça
social em troca de não haver mudanças radicais na estrutura da
sociedade [54] como proposto pelo socialismo. Assim sendo,
podemos dizer que o nascimento do direito do trabalho foi uma
resposta da sociedade para evitar um rompimento profundo do
tecido social.

Biavischi relata:

“Na Grande Indústria Inglesa do século XIX em tempos de


capitalismo constituído e da venda assalariada da força de
trabalho preponderante, estavam dadas as condições materiais
para o nascimento de um novo ramo do Direito, que viria mais
tarde, fundado em princípios forjados no campo das lutas
sociais e em um cenário em que a natureza do Estado foi sendo
modificada, passando a intervir nas relações econômicas e
sociais, produzindo normas.[55]”

Segundo Huberman, os pobres ingleses


seguem o conselho dos padres e pastores, não tomando a
fortuna dos ricos, mas desejar um melhoramento gradual e
progressivo, buscando por exemplo a redução da jornada de
trabalho para 10 horas diárias [56]. A redução da jornada de
trabalho acabou por permitir a classe operária a adquirir
cultura e se instruir para se elevar socialmente, formando um
proletariado consciente, levando muitos operários a se
aburguesar, evitando o colapso do capitalismo e o
esgarçamento do tecido social [57], entretanto tal redução
apenas veio com muita luta dos trabalhadores, pela qual o
direito do trabalho foi sendo forjado. Assim no início do século
XX, o direito do trabalho ganha status constitucional e leis que
verdadeiramente visam equilibrar sua relação com os seus
empregadores.

3. O DIREITO DO TRABALHO MODERNO

A constituição mexicana de 1917 é a primeira no mundo


a disciplinar sobre direito do trabalho, estabelecendo limites a
jornada de trabalho, trabalho infantil e organizando o direito
sindical. Em seguida a Constituição Alemã de 1919
(Constituição de Weimar), trouxe base para a social
democracia, disciplinando a participação dos trabalhadores
nas empresas, criando um direito unitário do trabalho e um
sistema de seguridade social. Outro momento marcante do
direito do trabalho moderno foi a carta del lavoro, na Itália em
1927. Ela disciplinou fortemente a intervenção do Estado na
economia e na organização. Entretanto isso também
influenciou negativamente os sindicatos uma vez que os
submeteu à atuação política do Estado [58].

No ano de 1931, o Papa PIO XI, sucessor de Leão XIII,


publica a encíclica Quadragéssimo Anno, aprofundando os
temas trabalhistas da Rerum Novarum a luz do século XX,
insiste no “valor eterno da propriedade” porém afirmando “A lei
da justiça social proíbe que uma classe exclua a outra da
participação nos lucros” Ela estimula debates entra patrões e
operários ao mesmo tempo que proíbe que os últimos se
utilizem de métodos “violentos” [59], como a greve. O Papa
João XXIII publica a Mater of Magistra em 1961, tendo como
baluarte a justiça social. Continua tendo a propriedade privada
como bem natural, mas pede mais atenção as massas
trabalhadoras. O Papa Paulo VI publica em 1967 a Populorum
Progressio, inspiração contemporânea da doutrina social da
igreja, o papa define como aspiração dos homens: “Serem
libertados da miséria; encontrarem com mais segurança a
subsistência, a saúde, o emprego estável, terem maior
participação nas responsabilidades, excluindo qualquer
opressão ou situações que ofendam sua dignidade de homem;
terem mais instrução – numa palavra, realizarem, conhecerem e
possuírem mais, para serem mais.” [60]

A Organização Internacional do Trabalho foi fundada em


1919, tornando o Direito do Trabalho o primeiro direito a
internacionaliza-se, conforme o Preambulo da Constituição da
OIT. (...Considerando que a não adoção, por parte de qualquer
nação, de um regime de trabalho realmente humano se torna um
obstáculo aos esforços de outras nações empenhadas em
melhorar o futuro dos trabalhadores nos seus próprios
países; ...) não sendo mais apenas internacional, mas sim
universal, pois são direitos humanos reconhecidos
internacionalmente [61]. A mesma OIT na Declaração de
Filadélfia, estabelece e, 1944 que o trabalho humano não pode
ser considerado mercadoria [62].

Isto posto, o Direito do Trabalho surge como grande arma


da renovação social, pela sua identificação com as
necessidades e aspirações do homem, trazendo a intervenção
jurídica para melhor relacionamento entre o homem que
trabalha e o homem a quem o trabalho é destinado, sendo
assim, a mais legitima manifestação da ordem jurídica voltada
para o homem [63]. O Direito do Trabalho é, portanto, um
direito com vocação na realidade, com vocação de atuar na vida
das pessoas de carne e osso [64]. Assim, o Direito do Trabalho
sempre está na vanguarda, seja para acompanhar as
transformações sociais, seja para promovê-las.

4. O DIREITO DO TRABALHO NO BRASIL

No Brasil, podemos afirmar que o direito do trabalho


segue a mesma lógica do resto do mundo, ou seja o
protecionismo do trabalhador [65] e podemos listar como
influências externas a elaboração das leis trabalhistas as
transformações vindas da Europa, as crescentes elaborações
legislativas de proteção aos trabalhadores e o ingresso do
Brasil na Organização Internacional do Trabalho criada pelo
Tratado de Versalhes (1919). Já as influências internas foram o
movimento operário de imigrantes com inspirações anarquistas,
o surto industrial efeito da primeira guerra mundial e a política
trabalhista de Vargas [66].

Entretanto podemos afirmar que a construção do


capitalismo no Brasil foi tardia, com a Lei Áurea criando uma
acumulação de “homens livres, “banzeiros”, “marginais” além
da uma política de imigração que inchava as cidades [67], a
exemplo da Inglaterra da revolução industrial, dando as
condições para o nascimento da nova classe proletária.

No ano de 1934, a Constituição Brasileira trouxe pela


primeira vez o direito do trabalho, instituindo a Justiça do
Trabalho em seu artigo 122 [68]:

“Art. 122 - Para dirimir questões entre empregadores e


empregados, regidas pela legislação social, fica instituída a
Justiça do Trabalho, à qual não se aplica o disposto no Capítulo
IV do Título I.”

Na constituição de 1937, no chamado Estado Novo,


existe a limitação do direito de greve [69], essencial
para manifestação democrática dos operários. Em seguida
temos a criação da Consolidação Geral das Leis do Trabalho
(CLT), sendo que a mesma marca a inclusão do trabalho em um
projeto de nação, migrando da econômica agrícola para
industrial [70]. A CLT conta com forte influência da já
citada Carta del Lavoro. Durante os anos Vargas houve uma
“fúria legiferante” na tentativa de organizar o trabalho no Brasil
e criar um grande mercado consumidor, o qual Vargas percebeu
que passaria pela existência de uma criação de uma classe
trabalhadora minimamente respeitada e valorizada [71].

Em 1945 a democratização se solidifica como


instrumento de inclusão social e econômica de milhões de
brasileiros emergentes a uma sociedade urbanizada e
industrializada, embora a constituição de 1967 traga uma
redução das conquistas coletivas dos trabalhadores, com um
regime autoritário [72].
Finalmente, em 1988, a Constituição Cidadã traz grandes
avanços para o direito do trabalho [73], sendo a mesma
nitidamente econômica e social, garantindo os direitos sociais,
como o direito ao trabalho, previdência, e a assistência aos
desamparados, o Fundo de Garantia do Tempo de serviço,
seguro contra acidentes, aposentadoria, salário mínimo,
limitação da jornada, descanso semanal, seguro desemprego
entre outros. Somente no art. 22 encontramos a expressão
“Direito do Trabalho” [74] mas em toda Constituição de
88 encontramos seu espírito. Pode-se dizer que a Constituição
de 88 elevou o Direito do Trabalho à categoria de direito social
fundamental [75]. Ou seja, ao reconhecer o trabalho como valor
fundamental, a Constituição Cidadã atua como bússola
pautando novas formas de viver e trabalhar, com novas formas
de proteção das relações de trabalho [76].

Portanto, o Direito do Trabalho, na Constituição de 1988,


propõe pedagogicamente o refazimento do tecido social
brasileiro, com a construção de uma nova sociedade solidária e
fraternal, reiniciando a sociedade com novos valores [77]. É o
Direito do Trabalho ajudando a moldar a sociedade e a evoluir a
humanidade.

CONCLUSÃO E PERSPECTIVAS

Isto posto, concluísse que o direito do trabalho foi


crescendo conforme o pensamento do homem sobre o trabalho
e as relações de trabalho foi evoluindo, Émile Durkheim ao
estudar considerou que a divisão do trabalho cria entre todos os
homens um sistema de direitos e deveres que os liga de forma
duradoura, criando profundos vínculos sociais [78]. Portanto o
trabalho é parte importantíssima do tecido social e ajunta
todos os homens.

Cezar Britto considera que o Direito do Trabalho é uma


forma de rebelião contra as opressões [79]. É uma trincheira de
luta das massas contra os poderosos. Os debates no Brasil e no
mundo, sobre a terceirização, o trabalho em condições
insalubres, o direito dos deficientes ao trabalho, a questão
salarial da mulher, tudo vem do debate político e intelectual que
o mundo vive na atualidade.

Assim sendo, o direito do trabalho não apenas mantém


seu objetivo de proteger o trabalhador, mas também de
coordenar e pacificar as relações entre capital e trabalho [80],
evitando o rompimento do tecido e da ordem social. Mais do
que nunca a proteção da mão de obra humana é necessária,
com as perspectivas de substituição da mesma pelo software
[81] e pela robótica. A automação, os aplicativos, o trabalho via
internet, tudo isso traz novos desafios aos pensadores, aos
legisladores e, principalmente aos trabalhadores. Ao redor do
mundo todo os direitos sociais sucumbem perante à força
bruta do capital e as políticas de ajuste financeiro [82].

Com o advento da globalização, neoliberalismo, capital


cada vez mais volátil, o Estado Fiscalizador não consegue
conter as mazelas do desemprego, com os Estados cada vez
mais tentando atrair o capital, através de flexibilização dos
direitos dos trabalhadores, portanto mais do que nunca os
juristas devem estar sintonizados com as possibilidades
políticas do mundo, com visão das tendências ideológicas e
das estruturas constitucionais [83].

No Brasil, em 2017, o Presidente Michel Temer,


pressionado pela crise econômica o Presidente Michel Temer
promulgou a reforma trabalhista (Lei 13.467/2017), alterando
diversos dispositivos da CLT sem se preocupar com a
efetividade do direito fundamental a justiça do trabalho,
exigente que os juízes e operadores do direito utilizem técnicas
de hermenêutica constitucional para garantir os direitos dos
cidadãos mais humildes e vulneráveis que tem na Justiça do
Trabalho a última trincheira para reivindicar seus direitos [84].
Cabe aos profissionais do direito realizar exercício criativo e
interpretativo para evitar injustiças sociais [85] e assim garantir
a pacificação da sociedade e a prosperidade da humanidade.

O homem e sua história, estão como vimos,


intrinsicamente ligados à valorização da força do trabalho
humano [86]. Esperamos, portanto que, da evolução do
pensamento dos filósofos greco-romanos, a reforma
protestante, a doutrina social da igreja, ao cartismo, marxismo,
sindicalismo e outras manifestações intelectuais e sociais, que
o trabalho possa ser uma fonte de alegria e dignidade para a
pessoa humana, como está escrito na Santa Bíblia: “e também
que todo homem coma e beba e goza do bem de todo o seu
trabalho. Isso é dom de Deus.” [87]
[1] GONZALEZ, Atila J. e OCTAVIANO, Ernomar. Citações
Jurídicas na BÍBLIA, p. 97-98

[2] ENCICLOPEDIA Abril. P. 148 v. 12.

[3] FLORIDO, Janice (coord.). Aristóteles – Vida e Obra. P.


27

[4] FLORIDO, Janice (coord.). Sócrates – Vida e Obra. P. 6.

[5] DRUCKER, Peter Ferdinand. A arte da administração


total. P.199. V. 1

[6] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito


do Trabalho. P.3

[7] ENCICLOPEDIA Larousse Cultural. P. 5725. V.23

[8] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito


do Trabalho. P.3

[9] NASCIMENTO, Amauri e NASCIMENTO, Sonia


Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. P. 49

[10] ENCICLOPEDIA Abril. P. 148 v. 12.

[11] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito


do Trabalho. P.5

[12] ENCICLOPEDIA Abril. P. 314-315 v. 7

[13] SMITH, Adam. Riqueza das Nações : edição


condensada. P. 55

[14] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito


do Trabalho. P.6

[15] ENCICLOPEDIA Abril. P. 303-304 v. 10.

[16] WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do


capitalismo. P. 41

[17] DRUCKER, Peter Ferdinand. A arte da administração


total. P.204. V. 1
[18] WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do
capitalismo. P. 94

[19] Ibid.,p. 132

[20] HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. P.


181

[21] ENCICLOPEDIA Abril. P. 148 v. 12.

[22] WEBER, Max. A ética protestante e o espírito do


capitalismo. P. 132, 133

[23] ENCICLOPEDIA Larousse Cultural. P. 5726. V.23

[24] ENCICLOPEDIA Abril. P. 376 v. 1.

[25] HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. P.


182.

[26] Ibid.,p. 175.

[27] RICARDO, David. Princípios da economia política e


tributação. P. 11, 12

[28] ENCICLOPEDIA Larousse Cultural. P. 3761. V.15

[29] BIAVISCH, Magda Barros. A construção dos


fundamentos do Direito do Trabalho no Brasil. P. 179

[30] SINGER, Paul. Adam Smith – Vida e Obra. P 13.

[31] ENCICLOPEDIA Larousse Cultural. P. 5424. V.22

[32] SMITH, Adam. Riqueza das Nações: edição


condensada. P. 16, 17

[33] HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. P.


190.

[34] RICARDO, David. Princípios da economia política e


tributação. P. 262

[35] ENCICLOPEDIA Abril. P.8 v. 7


[36] SMITH, Adam. Riqueza das Nações: edição
condensada. P. 54

[37] GIANNOTTI, José Arthur. Marx- Vida e Obra. P.12-13

[38] ENCICLOPEDIA Larousse Cultural. P. 3848. V.16

[39] ENCICLOPEDIA Abril. P. 8 v. 17

[40] VALENTIM, Veit. História Universal. P. 202 T. 5

[41] GIANNOTTI, José Arthur. Marx- Vida e Obra. P.16

[42] HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. P.


226

[43] VALENTIM, Veit. História Universal. P. 88 T. 5

[44] Ibid.,p.89 T. 5

[45] HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. P.


199

[46] Ibid.,p.201-202

[47] NASCIMENTO, Amauri e NASCIMENTO, Sonia


Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. P. 51

[48] ENCICLOPEDIA Larousse Cultural. P. 3528. V.15

[49] ENCICLOPEDIA Abril. P. 320-321 v. 6

[50] Ibid.,p.9 v. 7

[51] HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. P.


202-203

[52] ENCICLOPEDIA Abril. P. 151 v. 9.

[53] NASCIMENTO, Amauri e Sonia Mascara. Iniciação ao


Direito do Trabalho. P. 52

[54] ENCICLOPEDIA Abril. P. 322 v. 6


[55] BIAVISCH, Magda Barros. A construção dos
fundamentos do Direito do Trabalho no Brasil. P. 179

[56] HUBERMAN, Leo. História da riqueza do homem. P.


196

[57] VALENTIM, Veit. História Universal. P. 204 T.5

[58] NASCIMENTO, Amauri e Sonia Mascara. Iniciação ao


Direito do Trabalho. P. 52

[59] ENCICLOPEDIA Abril. P. 321-322 v. 6

[60] Ibid.,p.322 v. 6

[61] URIARTE, Oscar Ermida. Aplicação das normas


internacionais de trabalho. P. 142

[62] ANTUNES, Daniela Muradas, RODRIGUES, Adriana


Lamounier e PINTO, Carolina Pereira. A mercantilização do
trabalhador na reforma trabalhista. P. 55.

[63] NASCIMENTO, Amauri Mascaro. Iniciação ao Direito


do Trabalho. P.8

[64] URIARTE, Oscar Ermida. Aplicação das normas


internacionais de trabalho. P. 142

[65] GONÇALVES, Antônio Fabrício de Matos e KNEIP,


Bruno Burgareli Albergari. Restruturação produtiva,
globalização e neoliberalismo: reflexos no modelo brasileiro e
suas consequências na legislação trabalhista. P. 27

[66] NASCIMENTO, Amauri e NASCIMENTO Sonia


Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. P. 56

[67] BIAVISCH, Magda Barros. A construção dos


fundamentos do Direito do Trabalho no Brasil. P. 179183-184

[68] GONÇALVES, Antônio Fabrício de Matos e KNEIP,


Bruno Burgareli Albergari. Restruturação produtiva,
globalização e neoliberalismo: reflexos no modelo brasileiro e
suas consequências na legislação trabalhista. P. 27

[69] Ibid.,p.26
[70] SIQUEIRA NETO, José Francisco. O poder normativo
da Justiça do Trabalho e seu contexto. P. 156

[71] Ibid.,p.155

[72] DELGADO, Mauricio Godinho e DELGADO, Gabriela


Neves. Sete décadas da Justiça do Trabalho nos 70 anos da
CLT. P. 209

[73] GONÇALVES, Antônio Fabrício de Matos e KNEIP,


Bruno Burgareli Albergari. Restruturação produtiva,
globalização e neoliberalismo: reflexos no modelo brasileiro e
suas consequências na legislação trabalhista. P. 27

[74] BELTRAN, Ari Possidonio. Setenta Anos de CLT e a


lembrança de Cesarino Jr. . P.40

[75] BIAVISCH, Magda Barros. A construção dos


fundamentos do Direito do Trabalho no Brasil. P. 184

[76] GEMIGNAMI, Tereza Aparecida Asta. Terceirização,


grupo econômico e meio ambiente de trabalho na reforma
trabalhista. P. 168

[77] DELGADO, Mauricio Godinho e DELGADO, Gabriela


Neves. Sete décadas da Justiça do Trabalho nos 70 anos da
CLT. P. 226

[78] DURKHEIM, Émile. Da divisão do trabalho social.


P.429

[79] BRITO, Cezar. Uma história consolidada nos


conflitos. P. 46

[80] NASCIMENTO, Amauri e NASCIMENTO Sonia


Mascaro. Iniciação ao Direito do Trabalho. P. 53

[81] Ibid., p.53

[82] BIAVISCH, Magda Barros. A construção dos


fundamentos do Direito do Trabalho no Brasil. P. 84

[83] GONÇALVES, Antônio Fabrício de Matos e KNEIP,


Bruno Burgareli Albergari. Restruturação produtiva,
globalização e neoliberalismo: reflexos no modelo brasileiro e
suas consequências na legislação trabalhista. P. 19-23

[84] Leite, Carlos Henrique Bezerra. A reforma trabalhista


(Lei n. 13.467/2017) e a desconstitucionalização do acesso à
Justiça do Trabalho). P. 40-50.

[85] ANTUNES, Daniela Muradas, RODRIGUES, Adriana


Lamounier e PINTO, Carolina Pereira. A mercantilização do
trabalhador na reforma trabalhista. P. 57.

[86] CARNIO, Henrique Garbellini. Questões político-


sociológicas da reforma trabalhista: quem vai nos salvar da
bondade dos bons? P. 67

[87] BIBLIA SAGRADA, tradução Almeida, revista e


corrigida Ec 3:13

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