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PROF.

LUIZ FELIPE GOMES MARTINS


PROBLEMATIZANDO:

(HOLLANDA, Chico Buarque de. Construção. In: Construção. Rio de Janeiro:


Phonogram, 1971.)

Almoço no topo de um arranha- -céu (1932), Nova York,


foto de Charles Clyde Ebbets.
PROBLEMATIZANDO:
A foto do fotógrafo estadunidense Charles Clyde Ebbets,
choca por retratar onze homens almoçando a mais de duzentos
metros de altura, sem que fizessem uso de qualquer
equipamento de segurança. Sentados sobre uma viga no topo
do Rockefeller Center, em Nova York, esses operários parecem
tranquilos, como se o risco fizesse parte do curso cotidiano da
vida.
PROBLEMATIZANDO
Ao lado da denúncia de acidentes de trabalho fatais, as metáforas da canção
podem ser interpretadas como a morte simbólica: quando o trabalho deixa de ser
condição humanizadora devido à exploração do trabalhador e ao risco de
alienação. Como a canção foi composta durante a ditadura, pode simbolizar a
morte dos que lutaram contra ela e cujo destino trágico era ignorado ou visto com
indiferença pela população envolvida pela ideologia dominante.
O CONCEITO:
Trabalho é toda atividade na qual o ser humano utiliza suas energias para
satisfazer uma necessidade ou atingir determinado objetivo, individual ou coletivo.
Do trabalho surgem instituições, como a família, o Estado, a escola; e obras de
pensamento, como o mito, a ciência, a arte, a filosofia.
Podemos dizer que o ser humano se faz pelo trabalho, porque, ao mesmo tempo
que produz coisas, torna-se humano, constrói a própria subjetividade.
Ao se relacionar com os demais, aprende a enfrentar conflitos e a exigir de si
mesmo a superação de dificuldades.
O trabalho modifica e enriquece a percepção do mundo e de si próprio.
KARL MARX (1818-1883)
“Uma aranha executa operações semelhantes às do tecelão, e a
abelha supera mais de um arquiteto ao construir sua colmeia. Mas o
que distingue o pior arquiteto da melhor abelha é que ele figura na
mente sua construção antes de transformá-la em realidade. No fim do
processo do trabalho aparece um resultado que já existia antes
idealmente na imaginação do trabalhador. Ele não transforma apenas
o material sobre o qual opera; ele imprime ao material o projeto que
tinha conscientemente em mira, o qual constitui a lei determinante do
seu modo de operar e ao qual tem de subordinar sua vontade. E essa
subordinação não é um ato fortuito. Além do esforço dos órgãos que
trabalham, é mister a vontade adequada que se manifesta através da
atenção durante todo o curso do trabalho.”
(Marx, O capital, seção III, cap. V.)
PAPÉIS DO TRABALHO
INDIVIDUAIS: Expressão e
transformação de si.

SOCIAIS: Desenvolvimento
coletivo.
NA VISÃO DE MARX
Na interpretação de Marx, ao longo da história, a dominação de uma classe social
sobre outra desviou o trabalho de sua função positiva. Em vez de servir ao bem
comum, o trabalho passou a ser utilizado para o enriquecimento de alguns.
De ato de criação virou rotina de reprodução.
De recompensa pela liberdade transformou-se em castigo.
Enfim, em vez de constituir um elemento de realização de nossas potencialidades,
converteu-se em instrumento de alienação.
VISÕES AMBÍGUAS DO TRABALHO
Enquanto para alguns representa um desafio instigante e prazeroso, para outros não
passa de uma obrigação a que prefeririam não dedicar tanto tempo.
ETIMOLOGIA
O termo trabalho vem do latim tripalium, nome
de um instrumento constituído de três paus e que
era utilizado antigamente em diversas tarefas no
campo e na cidade, mas que também foi usado
para sujeitar e torturar pessoas. Próprio para
atar os condenados ou para manter presos os
animais difíceis de ferrar.
Não há exagero em afirmar que, em diversas
situações sociais, o trabalho atuou e atua de
maneira semelhante, servindo para torturar e
triturar o trabalhador.
FILOSOFANDO
Se a vida humana depende do trabalho, que causa
tanto desprazer, poderíamos concluir que, no contexto
do trabalho como tortura, o ser humano estaria
condenado à infelicidade.
Essas duas concepções trazem um impasse: o trabalho
é tortura ou emancipação? Se voltarmos nosso olhar à
história para ver como as pessoas trabalham e o que
pensam sobre essa atividade, teremos uma percepção
mais clara dessa contradição.
PARA REFLETIR:
Para se emancipar, a mulher precisou ter
amplo acesso ao mercado de trabalho, não só
para garantir sua autonomia financeira em
relação ao homem – pai ou marido –, mas
também para construir uma nova identidade e
tornar-se mais livre em suas escolhas. Com os
seus colegas, procure exemplos que indiquem
se essa mudança ocorre – ou não – no
ambiente em que vivem.
INDICAÇÕES:

Chaplin “passeia” pela paisagem moderna, da indústria O dia a dia de uma empregada doméstica
moderna. Mostra-nos a submissão do ser humano à máquina
e a substituição do trabalho humano pelo trabalho que trabalha e mora com os patrões, em
mecânico, o que leva ao desemprego e à miséria. Mas nos história sobre as relações de trabalho e as
mostra também a solidariedade e a capacidade de
gentileza e alegria que resiste à opressão do trabalho. desigualdades sociais no brasil.
MEU TRABALHO
Que profissão você gostaria de ter?
Esse trabalho daria a você uma perspectiva de autoconstrução, alegria e
liberdade? Como?
O que você precisa fazer para realizar esse projeto?
PRODUÇÃO DE TEXTO:
Dignidade versus escravidão “O trabalho dignifica o ser humano” versus “O trabalho
escraviza as pessoas”. Interprete e produza um texto sobre essa contradição.
ENTREVISTA:
•1 – Qual sua profissão?
•2 – O que te levou a escolher essa profissão?
•3 – Quais os desafios você enfrentou para chegar até aqui?
•4 – Você gosta da sua profissão? Por que?
•5 – Quais as dificuldades você encontra nessa profissão?
•6 – Sua profissão é valorizada? Por que?
•7 – O que te motiva a continuar nessa profissão?
•8 – Você sempre quis ter essa profissão?
•9 – O que te faria desistir dela?
•10 – O que você falaria para as pessoas que pensam em seguir essa mesma profissão?
TRABALHO COMO MERCADORIA: ALIENAÇÃO
No século XIX, o conceito de alienação foi utilizado por Karl Marx (1818-1883) ao
analisar a exploração dos operários nas fábricas criadas a partir da Revolução
Industrial. As condições de extensas jornadas de trabalho, em péssimas instalações,
os salários baixos e a arregimentação de crianças e mulheres como mão de obra
mais barata denunciavam uma grave questão social. Esse esta o e coisas
desencadeou os movimentos socialistas e anarquistas.
TRABALHO COMO MERCADORIA: ALIENAÇÃO
Nesse panorama, Marx reforçou a temática do trabalho como condição de
liberdade: é pelo trabalho que o ser humano se confronta com as forças da natureza
e, ao mesmo tempo que as modifica, transforma a si mesmo, humaniza-se. Em
contrapartida, negou que a nova ordem econômica do capitalismo fosse capaz de
possibilitar a igualdade entre as partes, porque o trabalhador perde mais do que
ganha, já que produz para outro: a posse do produto lhe escapa.
TRABALHO COMO MERCADORIA: ALIENAÇÃO
Nesse caso, é ele próprio que deixa de ser o centro
de si mesmo. Não escolhe o salário – embora isso lhe
apareça ficticiamente como o resultado de um
contrato livre –, não escolhe o horário nem o ritmo de
trabalho e é comandado de fora, por forças que não
mais controla. O resultado é que o trabalhador torna-
se “estranho”, “alheio” a si próprio: trata-se do
fenômeno da alienação.
TRABALHO COMO MERCADORIA: ALIENAÇÃO
Para Marx, portanto, a alienação não é
puramente teórica. Como na economia
capitalista prevalece a lógica do mercado,
tudo tem um preço, ou seja, ao vender sua
força de trabalho mediante salário, o
operário também se transforma em
mercadoria.
DISCIPLINA: O OLHAR VIGILANTE
Pensadores contemporâneos investigaram as
mudanças decorrentes do capitalismo e do nascimento
das fábricas, analisando-as sob outro ângulo, o da
instauração da era da disciplina. Conforme Michel
Foucault, um novo tipo de disciplina facilitou a
dominação mediante a “docilização” do corpo.
MICHEL FOUCAULT (1926-1984),
Filósofo francês, desenvolveu um método de investigação
histórica e filosófica que chamou de genealogia.
Examinou a mudança dos comportamentos no início da
Idade Moderna, sobretudo nas instituições prisionais e
nos hospícios. Ele buscava compreender os processos de
produção dos saberes que tornaram possível o controle
por meio do que chamou de microfísica do poder. Suas
principais obras são: História da loucura na Idade
Clássica; As palavras e as coisas; História da
sexualidade; Vigiar e punir e Microfísica do poder.
DISCIPLINA: O OLHAR VIGILANTE
Para exemplificar, vamos recuar até a França do século XVIII. A historiadora
francesa contemporânea Michelle Perrot retoma o relato de um inspetor de
manufaturas, no qual ele descreve uma oficina têxtil com cerca de 100 metros de
comprimento, pavimentada por lajes e iluminada por cinquenta janelas com tela
branca:
“No meio dessa sala [em] um canal coberto com lajes entreabertas cada fiandeira vai,
em silêncio tirar a água de que precisa [para a fiação]. Essa oficina, à primeira vista,
surpreende o visitante pela quantidade de pessoas aí empregadas, pela ordem pela
limpeza e pela extrema subordinação que aí reina... Contamos 50 rocas duplas [...]
ocupadas por 100 fiandeiras e o mesmo tanto de dobradeiras, tão disciplinadas como
tropas.”
PERROT, Michelle. Os excluídos da história: operários, mulheres e prisioneiros. Rio de
Janeiro: Paz e Terra, 1988. p. 57-58.
DISCIPLINA: O OLHAR VIGILANTE
A historiadora destaca em itálico a nova maneira de trabalhar, representada por
dois modelos disciplinares: o religioso (silêncio) e o militar (hierarquia, disposição em
fileiras). A disciplina é mantida pelos supervisores, que avaliam a qualidade do
serviço, evitam brigas e fazem cumprir os severos regulamentos por meio de
proibições (não falar alto, não dizer palavrões, não cantar), regras de horários
(começa a “tirania” do relógio para entrada, saída e intervalos) e ainda
penalidades, como multas, advertências, suspensões, demissões, de acordo com a
gravidade da “falta”.
DISCIPLINA: O OLHAR VIGILANTE
Na nova estrutura, o “olhar vigilante” sobressai de maneira decisiva. A organização
do tempo e do espaço imposta na fábrica não é, porém, um fenômeno isolado. Para
Foucalt, nos séculos XVII e XVIII, formava-se a “sociedade disciplinar”, com a criação
de instituições fechadas, voltadas para o controle social, como prisões, orfanatos,
reformatórios, asilos de miseráveis e “vagabundos”, hospícios, quartéis e escolas.
DISCIPLINA: O OLHAR VIGILANTE
Esses métodos que permitem o controle minucioso das operações do corpo, que realizam a
sujeição constante de suas forças e lhes impõem uma relação e docilidade-utilidade, são o que
podemos chamar as “disciplinas”. Muitos processos disciplinares existiam há muito tempo [...]. Mas
as disciplinas se tornaram no decorrer dos séculos XVII e XVIII fórmulas gerais de dominação. [...]
O momento histórico das disciplinas é o momento em que nasce uma arte do corpo humano, que
visa não unicamente o aumento de suas habilidades, nem tampouco aprofundar sua sujeição, mas
a formação de uma relação que no mesmo mecanismo o torna tanto mais obediente quanto é mais
útil, e inversamente. [...] A disciplina fabrica assim corpos submissos e exercitados, corpos
“dóceis”. A disciplina aumenta as forças do corpo (em termos econômicos de utilidade) e diminui
essas mesmas forças (em termos políticos de obediência).
FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: história da violência nas prisões. Petrópolis: Vozes, 1987. p.
126-127
PANOPTICON
Para descrever os mecanismos disciplinares, Foucault retomou a descrição que o
jurista Jeremy Bentham (1748-1832) fez de um projeto denominado Panopticon
(literalmente, “ver tudo”), em que imagina uma construção de vidro, em anel, para
alojar loucos, doentes, prisioneiros, estudantes ou operários. Controlados de uma
torre central com absoluta visibilidade, o resultado é a interiorização do olhar que
vigia, de modo que cada um não tenha consciência da própria sujeição.

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