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Terezinha Oliveira
Doutora em História pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (1997). Realizou, em
2005, estágio de Pós-Doutorado em História e Filosofia da Educação, na Faculdade de Educação da USP.
Publicou 46 artigos em periódicos especializados. Possui 14 Livros publicados e 39 capítulos. Atualmente é
professora associada nível C da Universidade Estadual de Maringá. Tem experiência na área de Educação,
com ênfase em Fundamentos da Educação, especialmente em Filosofia e História da Educação, atuando
principalmente nos seguintes temas: transformação social, história da educação na Idade Média, escolástica,
filosofia da educação na Idade Média, Intelectuais e Instituiçoes Educacionais na Idade Média e formação
de professores.
bibliotecas etc. O discurso da autora nos nativos. Outras cenas que destacadas como
remete a Michelet, quando, no século XIX, recorrentes nas imagens do Brasil são as
afirmou, ao adentrar em um arquivo, que que retratam episódios nos quais as três
os documentos falam e têm vida. A imagem raças são reproduzidas, o branco, o índio e
também tem vida e linguagem própria e cabe o negro. Contudo, Marliz de Christo salienta
a nós, historiadores, saber apreendê-la. que a figura mais exposta no período é a do
O quarto capítulo, de Marliz de Castro indígena. Ela nos chama a atenção para o
Vieira Christo, ‘Representações oitocentistas fato de que este personagem é retratado com
dos índios no Brasil’, elabora sua análise por melancolia, apatia e, por vezes, uma imagem
meio de imagens de artistas que retrataram morta. Para Castro, as imagens do período
o período colonial brasileiro, especialmente colonial, particularmente as do século XIX,
as figura dos nativos, da natureza e dos explicitam a ideia que se pretendia construir
colonizadores. Sobre estas reproduções, dos índios, dos colonizadores, em suma, do
destaca a recorrência com que as imagens Brasil. Elas tinham como finalidade forjar uma
dos indígenas, da natureza (flora, fauna), identidade. Essa deve ser uma das razões
foram reproduzidas na Europa, inclusive em pelas quais a autora afirma que “A pintura
objetos de uso cotidiano, como em louças. histórica foi até o final do século XIX o gênero
Segundo a autora, logo após a descoberta, artístico mais valorizado” (p. 83).
houve um uso, em profusão, de imagens Um último aspecto do texto sobre as
que retratassem o novo continente. Um imagens do Brasil, no século XIX, deve ser
dos seus focos de reflexão são os desenhos destacado: as considerações da autora sobre
feitos por viajantes, no século XIX, quando a forma como os bandeirantes são retratados
de suas passagens pelo país. Marliz de na pintura de Bernadelli. Segundo Christo,
Christo apresenta algumas hipóteses que são este artista apresenta um bandeirante
bastante interessantes para a (re) construção ‘animalizado’, diferente daquele apresentado
da história do Brasil no período. Uma delas pela historiografia do período. Ao trazer à
vincula-se à possibilidade destas imagens tona e valorizar esta imagem, ela explicita sua
reproduzirem imagens idealizadas que posição de historiadora comprometida com
estão, de certo modo, comprometidas com as mudanças no fazer da história: voltar-se
a maneira como os europeus viam o novo para o povo e para as minorias, por meio da
continente. Neste sentido, estas imagens utilização da imagem.
estariam eivadas de estereótipos que, em O quinto texto da Coletânea, de Ana
última instância, não retratavam os nativos, Heloisa Molina, ‘Da marcenaria de uma
mas o que se concebeu, a priori, ser o nativo. pintura: elementos de análise de um quadro
Ao longo do texto, são analisadas diferentes em uma aula de História’, propõe-se a analisar
imagens e as respectivas funções que elas as estruturas internas de uma imagem em
ocuparam nos discursos do período colonial. aula. A autora se dispõe a fazer este estudo
Marliz de Christo observa que uma das minucioso de uma pintura tendo como
imagens mais usadas para retratar o período referenciais ilustrações em livros didáticos
colonial brasileiro foi a da primeira missa. entre os anos de 2000 a 2007. Ainda que
Segundo ela, as inúmeras representações Ana Molina observe que não é “[...] sua
deste episódio serviram para explicitar o intenção nesse texto eleger o livro didático
processo de conquista e catequização dos como instrumental de análise [...]” (p. 112),
ela o toma como referência por reconhecer um universo, o da sala de aula, no qual há o
que o (a) professor (a), na maioria das vezes, predomínio constante da linguagem escrita e
só tem as imagens do livro didático para usar oral, o uso da linguagem imagética é muito
como pintura na sala de aula. importante, mas o (a) professor (a) precisa
Para Ana Molina, ao tornar uma imagem estar atento (a) para que, no ensino, a imagem
objeto de ensino de história, é preciso não seja
considerar todas as particularidades que
envolvem tal ação. No âmbito da imagem [...] somente para motivar e envolver, mas,
ressignificar e organizar conceitos, retomando
é preciso considerar inúmeros aspectos. Em e recolocando esse documento como um
primeiro lugar, não há uma uniformidade, nas lugar privilegiado para perceber intercâmbios
pinturas reproduzidas nos livros didáticos, das experiências e sensibilidades humanas,
construídas historicamente (p. 121).
quanto à representação de um mesmo
episódio histórico. Logo, é preciso considerar
a pintura à luz da imaginação do artista, O sexto texto, ‘Ensaios sobre distâncias
do seu conhecimento do retratado, da – imagem e sujeito’, de Maria Bernardete
concepção que ele tem do acontecimento, Ramos Flores e Ana Lúcia Vilela, traz à luz uma
das dimensões que esta imagem está bela análise sobre a imagem apresentada no
reproduzida, do espaço, da luz, das posições retrato. As autoras constroem suas reflexões
da imagem, do estilo do artista, dentre outros a partir do distanciamento existente entre a
aspectos. imagem que é registrada em uma foto, em
Um segundo aspecto, acerca do uso da uma pintura, em uma cena fílmica e o sujeito,
pintura como recurso na sala de aula, diz em tese real, que é representado. O texto, a
respeito à própria atenção que se deve ter em partir de cenas de filmes, de romances, de
relação à reprodução da imagem no livro. Sob fotos, de pinturas, trabalha as diferenças e
este momento da aprendizagem, a autora separações no âmbito da materialidade da
salienta alguns cuidados que se deve ter imagem que é representada e o sujeito real.
para a leitura das reproduções. Nas imagens Dentre as inúmeras situações analisadas
utilizadas por Ana Molina, destaca-se o fato pelas autoras, destacamos um exemplo que
de que poucas são as informações sobre julgamos importante para compreender a
a pintura, não há descrições, por exemplo, dimensão e atualidade do estudo destas,
de seu contexto e do estilo do autor. Além pois é uma situação na qual vivenciamos,
da ausência de informações sobre a origem com radicalidade, a ausência do sujeito na
da obra e do artista, outro problema ronda imagem de si mesmo, ou seja, a imagem não
as imagens que são os seus subtítulos. Para está separada, o sujeito da imagem não existe.
a autora, essas duas situações exigem uma Trata-se dos reality shows. “Cada participante
percepção muito atenta do (a) professor (a), representa a si mesmo nas situações criadas
pois, a ausência de informação, de um lado, pelo jogo. Do que estão desprovidos é
e o destaque (pelo autor do livro didático) justamente da imagem de si que o Outro
para uma dada informação, por outro lado, deveria oferecer, e somente oferece em
podem levar a interpretações equivocadas momentos esporádicos e limites como o
da história. momento do paredão” (p. 135). Ramos
Em virtude destas situações, Molina Flores e Vilela explicitam tal sensibilidade nas
chama a atenção para o fato de que em suas reflexões sobre a imagem, que apontam
para uma perspectiva da história que muito No oitavo texto, ‘Cinema na pesquisa
nos aproxima da subjetividade da psicanálise. e no ensino da história: dos dilemas às
Assim, mais uma vez, nesta Coletânea, o possibilidades’, Ana Paula Spini reflete sobre
fazer da história é aliado a outros campos do as influências das novas mídias no ensino,
conhecimento, o que seria impensável antes seja na escola, seja na universidade. A autora
da história cultural. destaca o fato de que não se pode mais
O sétimo capítulo, ‘Imagens desconsiderar a linguagem fílmica, a internet
contemporâneas: experiências fotográficas e os diferentes recursos de áudio existentes.
e memória no século XX’, de Ana Maria O problema, do seu ponto de vista, é que
Mauad, apresenta uma análise sobre as muitos destes instrumentos continuam
complexas e dialógicas relações existentes sendo considerados como acessórios e não
entre as imagens e as demais linguagens da como passíveis de interagir diretamente
história. Esse diálogo complexo preencheu as na produção de novos saberes, de novos
arestas que existiam entre os discursos visuais, modos de ensino. O objeto de análise da
escritos, orais, fílmicos, tornando ambiência autora é o filme, portanto, o apresenta como
da história todos os múltiplos discursos. Essa uma das possibilidades de produção do
amplidão do diálogo possibilita ao historiador conhecimento e, por conseguinte, também
compreender, elaborar, construir e interpretar do fazer da história. Spini está atenta às
as redes sociais que compõem o todo da dificuldades inerentes ao ensino nacional
sociedade. Diante deste cenário, a imagem e explicita que a escola está enfrentando
adquire característica de sujeito no fazer grandes dificuldades diante das mudanças
história. É em virtude deste novo status da que estão ocorrendo no cotidiano social. Em
imagem que a autora afirma que face disso, a autora apresenta o filme como
um dos caminhos viáveis para o ensino e para
Não se busca mais apenas a história por detrás a pesquisa. De acordo com Spini, em virtude
das imagens, mas a história das imagens e dos
sujeitos que, atentos às transformações do
da beleza, da sensibilidade, da sonoridade,
mundo, produziram estas mesmas imagens do enredo, das cenas, o filme deixa de ser um
(p. 145). recurso ilustrativo e transforma-se em uma
possibilidade de ressignificação da história
No cenário do texto, a fotografia “[...] de ferramenta, o cinema passa a ser
transforma-se, como imagem que é, em tratado como linguagem [...]” (p. 167). Sob
objeto da história e o ator principal na esta perspectiva, a autora apresenta e analisa
produção desta imagem, o fotógrafo, passa algumas situações nas quais a linguagem
a ser um sujeito da e na história. Tendo fílmica é um caminho para o saber histórico,
como parâmetro esta percepção da história particularmente quanto à construção da
e da fotografia, Mauad constrói seu texto memória. Um dos exemplos considerados
explicitando diferentes perspectivas da por ela são os filmes produzidos a partir
fotografia no século XX, brinda-nos com uma dos anos 1980 e 1990 sobre a guerra do
bela narrativa acerca de grandes nomes da Vietnã, nos quais as narrativas de veteranos
fotografia do período e, nesta tela, evidencia possibilitam outros cenários da guerra. Desse
como estes fotógrafos-sujeitos tornaram-se modo, Spini constrói uma leitura da história
importantes personagens para a história. que perpassa diretamente pela linguagem/
imagem fílmica.
O nono texto, ‘Moscou, ensaios e cenas de [...] advento da história cultural, ou seja, o
Tchekhov: os impasses de um documentário’, reconhecimento de uma outra dimensão ou
característica inerente à realidade histórica: a
de Eduardo Escorel, é uma análise crítica do dimensão cultural” (FALCON, 2006, p. 332).
filme/documentário Moscou, baseado na
peça “As Três Irmãs”, de Eduardo Coutinho. Por fim, que os leitores saibam apreciar
Assim, ao apresentarmos os textos e apropriar-se destas múltiplas linguagens e
que compõem a obra História e Imagens, olhares que teceram os escritos desta obra,
procuramos explicitar que esta Coletânea que amalgamaram a história e a imagem.
aponta um caminhar para a história e
para imagem: o profundo estreitamento
existente entre ambas. Este caminhar não Referências
seria possível se não existisse uma sintonia
entre as diferentes leituras que aqui foram FALCON, F. J. C. História Cultural e história da
apresentadas pelos autores. Como um Educação. Revista Brasileira de Educação, v. 11, n.
32, p. 328-339.
grande e belo mosaico bizantino, cada um
dos autores apresentou suas reflexões sobre SCHMITT, Jean-Claude. Imagens. In: LE GOFF,
Jacques e SCHMITT, Jean-Claude (Coord.).
a história e a imagem, conscientes ou não, Dicionário temático do Ocidente Medieval. Bauru/
mostrando que “As imagens são inseparáveis SP: EDUSC; São Paulo/SP: Imprensa Oficial do
de seus usos” (SCHMITT, 2002, p. 598), bem Estado, 2002, v. I., p. 591-605.
como, apropriaram do
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apresentado entre sinais < >, precedido da expressão “disponível em” - e a data de acesso
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