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União Europeia

PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES -


MOÇAMBIQUE
Catalisando a transformação sustentável
e inclusiva dos sistemas alimentares

Moçambique
© Johnson/NASA (CC BY-NC 2.0)
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES -
MOÇAMBIQUE
Catalisando a transformação sustentável
e inclusiva dos sistemas alimentares

Publicado por
Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
Centro de Cooperação Internacional em Pesquisa Agronômica para o Desenvolvimento
e a União Europeia
Roma, Montpellier, Bruxelas. 2022
Citação obrigatória
FAO, União Europeia e CIRAD. 2022. Perfil de Sistemas Alimentares - Moçambique. Catalisando a transformação sustentável e
inclusiva dos sistemas alimentares. Roma, Bruxelas e Montpellier, França. https://doi.org/10.4060/cc0498pt

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ISBN 978-92-5-136506-9
© FAO, 2022

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PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES


MOÇAMBIQUE

Mensagens-chave
Nas últimas décadas, Moçambique fez progressos significativos em direção ao desenvolvimento
sustentável e inclusivo, mostrando que é possível reduzir sua insegurança alimentar crônica.

No entanto, provou-se difícil manter essas melhorias, uma vez que os principais desafios para alcançar
sistemas alimentares sustentáveis permanecem.

Atender às necessidades de uma população em crescimento e em processo de urbanização, com conflitos


internos, pobreza persistente, mudanças climáticas e choques climáticos apresenta barreiras substanciais
ao progresso.

Moçambique declarou a agricultura uma prioridade nacional e está empenhado em alocar 10 por cento do
seu orçamento nacional ao setor. Isso vai ao encontro com a «Declaração de Maputo para a fome zero».
No entanto, ainda tem algum caminho a percorrer para atingir esse objetivo.

A agricultura baseia-se principalmente na agricultura de subsistência, caracterizada por baixa produtividade,


volumes de produção reduzidos e falta de diversidade de culturas. Embora represente aproximadamente
70 por cento do emprego total em Moçambique, contribui apenas com cerca de 25 por cento do produto
interno bruto.

A baixa disponibilidade e o pouco acesso a alimentos nutritivos, saudáveis e diversificados contribui para
dietas de baixa qualidade, sendo que Moçambique carrega o triplo fardo da desnutrição crônica e aguda,
deficiências de micronutrientes e problemas crescentes de sobrepeso e obesidade.

As dificuldades socioeconômicas incluem a rápida urbanização à medida que as pessoas deixam as áreas
rurais em busca de meios de subsistência decentes. Alguns também buscaram refúgio, pois os conflitos
armados nas regiões Centro e Norte levaram ao deslocamento interno.

A taxa de desemprego é alta e a desigualdade de renda está aumentando. Existem também disparidades
substanciais de oportunidades entre áreas urbanas e rurais e entre diferentes regiões que, por sua vez,
contribuem para o ressurgimento de conflitos e tensões sociais.

Os sistemas alimentares também são afetados pela falta de coerência política e governança inclusiva. O
setor agroalimentar, em particular, carece de investimento público e privado e apoio institucional para
a transformação sustentável, com agricultores familiares e pequenas empresas encontrando pouca
assistência, apesar da intenção declarada de destinar mais recursos orçamentários à agricultura.

Moçambique depende de capital estrangeiro e os investimentos privados são insuficientes, sendo que os
esforços para superar estes desafios são dificultados por um modelo de desenvolvimento que visa princi-
palmente à agricultura em larga escala orientada para a exportação e a extração de combustíveis fósseis.

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ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

A integração do mercado é limitada e o setor privado e a agricultura familiar de pequena escala estão
fracamente conectados, com infraestrutura precária e cadeias de valor subdesenvolvidas, limitando os
retornos da agricultura e da pesca e comprometendo os meios de subsistência, particularmente nas áreas
rurais.

Moçambique é vulnerável às mudanças climáticas e aos eventos extremos relacionados com o clima, tais
como inundações, secas, tempestades tropicais e ciclones. Altos níveis de degradação da terra, rápido
desmatamento e perda de fertilidade do solo também contribuem para o aumento da vulnerabilidade das
pessoas carentes das áreas rurais.

A transformação sustentável dos sistemas alimentares pode se beneficiar do apoio aos pequenos
agricultores, incluindo jovens e mulheres, para diversificar a produção e promover uma agricultura
inteligente em termos de nutrição.
© Jeffrey Barbee/Thomson Reuters Foundation (CC BY-NC-ND 2.0)

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PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Análise de dados e alavancas sistêmicas


Este resumo é o resultado de uma colaboração mobilizando atores públicos, privados e da
entre o Governo de Moçambique, a Organização sociedade civil. A abordagem inclui entrevistas com
das Nações Unidas para a alimentação e a agricul- as principais partes interessadas e um workshop
tura (FAO) e a União Europeia em estreita colabo- de consulta para refinar a compreensão do
ração com especialistas da FAO. Foi colocado em sistema alimentar e discutir potenciais alavancas
prática em Moçambique durante os meses de junho para melhorar sua sustentabilidade. O processo
a setembro de 2021. A metodologia utilizada para de avaliação inicia assim a análise participativa
a elaboração deste resumo é resultado de uma ini- e a discussão com as partes interessadas sobre
ciativa global da União Europeia, FAO e CIRAD para as oportunidades e restrições estratégicas
apoiar a transformação sustentável e inclusiva dos para a transformação sustentável dos sistemas
sistemas alimentares. Essa metodologia de avalia- alimentares. A abordagem avalia os atores e suas
ção é descrita em detalhes na publicação conjunta atividades no centro do sistema, juntamente com
intitulada Estrutura conceitual e método para avalia- suas interações ao longo da cadeia alimentar, bem
ção nacional e territorial dos sistemas alimentares: como os ambientes que influenciam diretamente
Catalisando a transformação sustentável e inclusiva seu comportamento. Condicionados por motores
dos sistemas alimentares (David-Benz et al., 2022). de longo prazo, esses atores geram impactos em
diferentes dimensões que, por sua vez, influenciam
A avaliação integra a análise de dados qualitativos os motores por meio de vários ciclos de feedback
e quantitativos com processos participativos, (veja a figura n°1).

Figura n°1. Representação analítica de um sistema alimentar

Fluxos de produtos
alimentares Segmentos da cadeia Ambiente
Motores IMPACTOS Interligações entre
Fluxos de coprodutos de abastecimento direto motores / entre impactos
e resíduos

Motores de
Motores biofísicos Motores Motores políticos Motores Motores
infraestrutura
e ambientais territoriais e de governança socioeconômicos demográficos
e tecnologia

Determinantes
Setores não
Ambiente de produção e entrega Ambiente de consumo pessoais das
alimentícios
escolhas
alimentares
Influenciam Influenciam

Produção vegetal Transporte Efeitos do


Efeitos do
agregação feedback
feedback Processamento Distribuição Consumo
Produção animal armazenagem

Gestão de resíduos
Importação /
Sistema central Geram exportação de
alimentos

IMPACTOS IMPACTOS NO EQUILÍBRIO IMPACTOS SEGURANÇA ALIMENTAR,


AMBIENTAIS TERRITORIAL E NA EQUIDADE SOCIOECONÔMICOS NUTRIÇÃO E SAÚDE

Fonte: David-Benz, H., Sirdey, N., Deshons, A., Orbell C. & Herlant, P. 2022. Estrutura conceitual e método para avaliação nacional e territorial
dos sistemas alimentares: Catalisando a transformação sustentável e inclusiva dos sistemas alimentares. Rome, Brussels and Montpellier, France. FAO,
European Union and CIRAD.

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ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

A abordagem envolve uma compreensão deta- Esta abordagem foi concebida como uma
lhada dos principais desafios ao longo das quatro avaliação preliminar rápida para sistemas
dimensões de sistemas alimentares sustentáveis alimentares e pode ser colocada em prática
e inclusivos: (i) segurança alimentar, nutrição e durante um período de oito a 12 semanas.
saúde; (ii) crescimento econômico inclusivo, empre- A metodologia foi aplicada em mais de 50
gos e meios de subsistência; (iii) uso sustentável países como um primeiro passo para apoiar
dos recursos naturais e meio ambiente; e (iv) equilí- a transição para sistemas alimentares
brio e equidade territorial. sustentáveis.

Com o objetivo de identificar questões críticas que A avaliação baseia-se na pesquisa de sistemas
afetam a sustentabilidade e a inclusão dos sistemas alimentares realizada por uma equipe de
alimentares, seus desafios e principais dinâmicas consultores nacionais e internacionais.
são especificados na forma de Questões-chave Um workshop online de consulta às partes
de sustentabilidade (QCS), cujas respostas (ver interessadas foi realizado em Moçambique em
representações esquemáticas para todas as QCS) agosto de 2021 para compartilhar e refinar os
ajudam a identificar alavancas sistêmicas e áreas resultados e identificar as principais alavancas
de ações que são essenciais para trazer as transfor- sistêmicas que poderiam ser colocadas em ação
mações desejadas nos sistemas alimentares. para melhorar a sustentabilidade do sistema.

Dados básicos do contexto moçambicano


Indicadores Indicadores

31,3
População total (2020)1 Acesso a eletricidade (2019)1 29.6%
milhões

Taxa de crescimento populacional (2020)1 2,9% Assinaturas de celular (por 100 pessoas, 2019)1 49

Crescimento da população urbana (2020)1 4,4 Índice de desigualdade de gênero (2020)2 0.523

Taxa de alfabetização, total de adultos (proporção de


Índice Gini (2019)1 40 60.7%
pessoas com mais de 15 anos, 2017)1

PIB / PPC per capita (USD internacional atual, 2020)1 1 297 Emprego na agricultura (% do emprego total, 2019)1 70.2%

Contribuição da agricultura, silvicultura e pesca para Emprego na agricultura, feminino (% do emprego


26% 79.8%
o PIB (2019)1 feminino) (2019)1
Emprego na agricultura, masculino (% do emprego
Área de floresta (% da área terrestre, 2018)1 47,3 59.8%
masculino) (2019)1
Fome e desnutrição crônica em 2021 (Índice Global
31,3%
da Fome)3
0,456
Índice de Desenvolvimento Humano (2019)2 (posição)
181/189
Pobreza (2018)2 46%
Fontes: World Bank. 2022. World Development Indicators. Cited March 2022. https://datatopics.worldbank.org/world-development-indicators/;
1

2
UNDP. 2022. Mozambique. Human Development Reports. Cited March 2022. https://hdr.undp.org/en/countries/profiles/MOZ;
3
Global Hunger Index. 2021. Mozambique. Global Hunger Index 2021. Cited March 2022. www.globalhungerindex.org/mozambique.html.

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PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Produção e comércio de alimentos

Os alimentos são produzidos principalmente Figura n°2. Valor da produção agrícola (mil USD, 2018)
através da agricultura de subsistência, caracteri- 329 422
31 536
zada por baixa produtividade e pequenos volumes,
diversidade de culturas limitada e vulnerabilidade 665 844 1 162 251

à seca e às inundações. A pecuária e a pesca são 79 868


cada vez mais importantes. Ainda há uma alta 141 083

dependência de alimentos importados, enquanto


as políticas nacionais tendem a se concentrar na
agricultura comercial orientada para o mercado.
1 711 173 1 297 565
Moçambique tem muitas terras aráveis,
recursos hídricos abundantes e um vasto
litoral. A agricultura é, no entanto, praticada Cereais Frutas e vegetais
Itens não alimentícios Carne
Raízes e tubérculos
Milk & eggs
Oleaginosas
Outros
em menos de 16 por cento das terras aráveis
predominantemente por agricultores de Fonte: FAOSTAT, Value of Agricultural Production, https://www.fao.org/
faostat/en/#data/QV.
subsistência. As culturas alimentares com raízes
e tubérculos (mandioca, batata-doce) são as mais A produção agrícola apresentou uma tendência
importantes, seguidas dos cereais (milho, arroz), ligeiramente ascendente entre 1980 e 2018 para
frutas e legumes. Juntas, essas culturas dominantes cereais, raízes (mandioca) e tubérculos (batata-
representaram 77 por cento da produção total -doce), embora com uma volatilidade conside-
em valor em 2018, aproximadamente USD 4 171 rável (figura n°3). Os volumes de produção de
bilhões. Carne, leite e ovos representaram 18 por cana-de-açúcar, frutas e hortaliças aumentaram
cento do total, ou USD 995 milhões. O restante desde 2002. A volatilidade na produção de cultu-
—oleaginosas, outros produtos alimentícios ras básicas, no entanto, afeta a disponibilidade
(agrupamento de cana-de-açúcar, leguminosas, geral de alimentos para o consumo doméstico, e a
nozes e mel) e itens não alimentícios— representou sazonalidade na produção de alimentos também
cerca de 5 por cento da produção agrícola total, ou tem impacto na segurança alimentar e na autossu-
USD 252 milhões (figura n°2). ficiência de pequenos produtores familiares.
© Jeffrey Barbee/Reuters Foundation (CC BY-NC-ND 2.0)

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ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

Figura n°3. Evolução da produção dos principais produtos agrícolas (volume em toneladas)

8 000 000

7 000 000

6 000 000
Produção (toneladas)

5 000 000

4 000 000

3 000 000

2 000 000

1 000 000

0
80 82 84 86 88 90 92 94 96 98 00 02 04 06 08 10 12 14 16 18
19 19 19 19 19 19 19 19 19 19 20 20 20 20 20 20 20 20 20 20

Cereais, total Oleaginosas Leguminosas, total Raízes e tubérculos, total Culturas para produção de açúcar Frutas e vegetais

Fonte: FAOSTAT, Suite of Food Security Indicators, http://www.fao.org/faostat/en/#data/FS.

Os dados da FAO de 2021 também sugerem carne bovina (carne vermelha) diminuiu um pouco
fortes diferenças regionais. Enquanto se prevê a partir de 1990, antes de mostrar uma pequena
que a produção de cereais nas províncias da tendência de aumento desde 2014. Enquanto isso,
região do Centro e do Sul esteja em níveis médios a produção de carne ovina e caprina estagnou
ou acima da média, espera-se que a produção (figura n°4) (FAOSTAT; MADER, 2021).
nas províncias do Norte, particularmente Cabo
Delgado, caia, refletindo o impacto negativo A produção de peixe é dominada pelo setor
do clima adverso e dos conflitos na plantação familiar, que representa 90 por cento da
e nos rendimentos das colheitas (FAO - GIEWS, pesca artesanal. A produção anual global vem
sem data). Após estagnação por mais de aumentando de forma constante, tendo triplicado
duas décadas, a produção de leite aumentou entre 2006 e 2017 de aproximadamente 102 000
fortemente no início dos anos noventa (figura toneladas para 340 000 toneladas (MIMAIP, 2019).
n°4) como resultado do aumento do investimento A pesca artesanal consiste em várias práticas de
por fazendas leiteiras privadas, cooperativas e pesca de pequena escala, baixa tecnologia e baixo
instalações de processamento, especialmente capital, realizadas por famílias de pescadores
nas províncias de Manica e Sofala. Consideradas individuais, muitas das quais pertencem a grupos
as principais bacias leiteiras, essas províncias étnicos costeiros ou insulares. A aquicultura
fornecem 66,4 por cento do leite produzido no continua limitada, enfrentando desafios como
país para os mercados local, regional e nacional falta de acesso a insumos, serviços financeiros e
(O’Donovan, 2021). Embora a produção de ovos e investimentos essenciais em cadeias de frio (IFAD,
aves tenha aumentado desde 2000, a produção de 2020a; MIMAIP, 2019).
© credits

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PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Figura n°4. Evolução na produção de produtos de origem animal (volume em toneladas)

120 000 1 000 000

900 000

100 000
800 000

700 000
80 000

Toneladas de leite
600 000
Toneladas

60 000 500 000

400 000

40 000
300 000

200 000
20 000

100 000

0 0
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01
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Carne bovina e de búfalo Produção primária de ovos Carne, aves Carne de ovelha e de cabra Leite, total

Fonte: Compilado a partir de dados da FAOSTAT de 2020.

A produção alimentar vem aumentando da África Austral, a maior parte importada da


ligeiramente, mas Moçambique continua Ásia (CCARDESA, 2021).
a enfrentar défices internos significativos.
O déficit é compensado por alimentos Embora as importações de alimentos como pro-
importados, que representaram 19 por cento porção das importações totais tenham flutuado
do valor das importações em 2020 (World amplamente no período de 1980 a 2019 (figura
Bank, 2021c). Isso é mais que o dobro da n°5), elas geralmente têm tendência de queda
média global de importações de alimentos desde 1998, aproximadamente a mesma duração
para países de baixa renda. Com a produção do aumento da produção nacional de alimentos
de cereais e cana-de-açúcar aumentando no pós-guerra civil (1977 a 1992) (figura n°3).
(figura n°3), o país reduziu sua dependência
de importação de 57,6 por cento entre 2015 As estatísticas nacionais (INE, 2019) mostram que
e 2017 para 39 por cento em 2019 (FAO, Suite Moçambique teve um déficit comercial em 2019
of Food security indicators, sem data), mas de USD 2,76 bilhões e os produtos alimentares
continua importando cereais e cozinhando representaram apenas 5 por cento dos valores
óleo e açúcar. Moçambique também tem o das exportações, sendo os mais significativos a
terceiro maior consumo de arroz entre os castanha de caju, o camarão, a banana, a cana-
países da Comunidade de desenvolvimento de-açúcar e a lagosta.

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ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

Figura n°5. Importação de alimentos e dependência de importação (em valor e %)

1 600 000 45%

40%
1 400 000

35%
1 200 000

30%
1 000 000
1 000 USD

25%

800 000

20%

600 000
15%

400 000
10%

200 000 5%

0 0%
04
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02
03
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19
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19
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20
20
20

Preparações à base de cereais Outros alimentos (exceto cereais e peixes) Alimentos importados (% do total de importações)

Fonte: Compilado a partir de dados da FAOSTAT de 2020.

Tendências do consumo alimentar

Aproximadamente dois terços da população urbanas consomem alimentos baseados


moçambicana vivem em áreas rurais e a principalmente em milho e trigo importado.
maioria faz a sua subsistência da agricultura,
silvicultura e pesca. Eles consomem cerca de As pessoas que vivem em áreas rurais
90 por cento de sua produção e fazem uso dos também precisam comprar alimentos em
mercados apenas de forma muito limitada. No períodos de escassez ou quando afetadas
entanto, ainda há uma grande dependência por desastres naturais, aprofundando o
nacional de alimentos importados, uma déficit alimentar doméstico. A figura n°6
vez que a produção local não acompanhou mostra as culturas básicas (cereais, raízes e
o crescimento populacional e os hábitos tubérculos) que representam 72 por cento dos
alimentares vêm mudando, principalmente alimentos disponíveis (em calorias), seguidos
nas áreas urbanas. por oleaginosas (14 por cento) e açúcar e
adoçantes (6 por cento). Os demais grupos de
As dietas baseiam-se principalmente na alimentos —incluindo carne, peixe e frutos do
mandioca no norte do país e no milho mar, frutas e legumes— juntos representam
nas regiões Centro e Sul. As famílias apenas 8 por cento.
© credits

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PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Figura n°6. Estrutura de disponibilidade de alimentos por Figura n°7. Fornecimento diário de hortaliças, frutas,
grupo de produtos (% de calorias/capita, 2018) leguminosas, carnes, peixes, ovos e leite (gramas/pessoa)
80

74
Cereais 37%

69
Outros 1% 70
Outros produtos animais 1%
Peixes, frutos do mar 1% 60

g/pessoa/dia
Carne 3% 50
Frutas e vegetais 2%

40
40

33
30
30

26
Açucar e adoçantes 6%

24
16
20

16
14
13

2
10

5.

8
4.
Oleaginosas e 0

0
óleos vegetais 14%

as

xe

ite
ai

vo
ut

rn
os

Le
t

Pe
Fr

O
Ca
ge

in
Ve

m
Raízes amiláceas,

gu
Le
leguminosas e nozes 35% 2000 2018

Fonte: Compilado a partir de dados da FAOSTAT de 2020. Fonte: FAOSTAT. Folha de balanços alimentares.

O Banco de dados de consumo global (World Existem disparidades alimentares substanciais


Bank, 2021a) mostra que em 2010 o consumo entre pessoas com diferentes meios de subsistên-
de alimentos ricos em proteínas (carne e peixe) cia. Dados do Estudo de base de segurança alimen-
era de apenas 17 por cento. O boletim estatístico tar e nutricional, realizado em 2013 (SETSAN 2014),
da pesca e aquicultura em Moçambique de 2006 mostram (figura n°8) que as pessoas que ganham
a 2017 mostra um aumento do consumo per salários, ou vivem de remessas ou pensões (grupo
capita de 4,6 kg/ano para 14 kg/ano, que ainda é n°5), têm acesso a alimentos de melhor qualidade.
a média considerando as recomendações da OMS Logo em seguida vêm as pessoas do grupo n°2,
(MIMAIP, 2019). As leguminosas (grão-de-bico, que inclui aquelas que prestam serviços, trabalham
feijão-mungo, feijão-fradinho e feijão-guandu) são, por conta própria ou estão envolvidas no proces-
portanto, a fonte mais importante de proteína na samento ou comércio tradicional de alimentos. O
dieta. As províncias de Tete e Sofala são as prin- grupo n°3 e o grupo n°1, respectivamente, apresen-
cipais fontes de leguminosas, com 90 por cento tam as dietas mais pobres e a maior incidência de
produzidas por pequenos agricultores. A oferta dietas moderadas1, considerando que agrupam as
diária de hortaliças, frutas, leguminosas, peixes pessoas mais vulneráveis – como os que vivem de
e ovos apresentou aumentos substanciais entre assistência alimentar– e produtores e agricultores
2000 e 2018 (figura n°7). de alimentos de subsistência.

Figura n°8. Qualidade da dieta por meios de subsistência


Grupo 1 Grupo 2 Grupo 3 Grupo 4 Grupo 5
100
13 8 10 8 6
% de núcleos familiares

12
80 18 22
29 28

60
82
40 73 70
58 63
20

0
Produção ou venda Serviços de auto-emprego, Biscate ou ganho-ganho, Pesca, aquicultura Salários, pensões
de produtos agrícolas processamento tradicional, assistência alimentar, e remessas
e/ou pecuários comércio mendicância: pelo menos
80% da renda total Adequate Moderate Poor

Nota: O grupo n°3 inclui o «win-win» ou «ganho-ganho», que se refere ao trabalho ocasional feito para renda adicional. Fonte: Secretariado Técni-
co de Segurança Alimentar e Nutricional. 2014. Relatório do Estudo de Base de Segurança Alimentar e Nutricional 2013. Maputo, Moçambique.

1
A qualidade da dieta (ruim, moderada, adequada) é derivada dos Escores de consumo alimentar (FCS). Quando a pontuação está entre 0 e 21 é
considerada pobre ou ruim, entre 21,5 e 35 é limítrofe ou moderada e acima de 35 é aceitável ou adequada (SETSAN, comunicação pessoal).

13
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

Em termos de consumo alimentar e de variedade Nos quintis mais pobres, que constituem 60
nutricional, 67 por cento das famílias têm uma por cento da população, mais da metade de
alimentação adequada, 23 por cento têm uma seus gastos são com alimentos. Dos gastos
alimentação moderada e 10 por cento têm uma mensais das famílias na compra de alimentos,
alimentação pobre (SETSAN, 2014). As provín- 47 por cento são para a compra de cereais e
cias do Norte, Zambézia e Tete, na zona Central, produtos de panificação, 20,3 por cento para
concentram a maior proporção de famílias que legumes, batatas e outros tubérculos, 5,6 por
consomem dietas pobres e moderadas. Em geral, cento para frutas, 11 por cento para peixes e
as dietas consumidas nas áreas rurais são nutricio- apenas 1,1 por cento para a compra de ovos,
nalmente mais pobres do que as consumidas nas leite e seus derivados (INE, 2015). Finalmente,
áreas urbanas. (SETSAN, 2014). a oferta de proteína por pessoa foi em média
de 50 g/dia, com contagem de proteína animal
Em média, mais de um terço (35,6 por cento) das de apenas 8,3 g/dia (FAOSTAT Suite of Food
despesas das famílias moçambicanas são em security indicators, sem data), sugerindo uma
alimentos e bebidas não alcoólicas, sendo a pro- dieta desequilibrada e contribuindo para
porção substancialmente mais elevada nas zonas maus resultados nutricionais e deficiências
rurais representando 53 por cento, e menor nas de micronutrientes, especialmente para as
áreas urbanas representando 20,7 por cento. famílias mais pobres.

Atores é atividades dominantes


De acordo com o Inquérito agrícola integrado 2020 têm acesso limitado ao mercado devido à falta
(IAI 2020), existiam 4 167 702 pequenos estabele- de transporte, o que pode significar que eles não
cimentos agrícolas2, 93 183 médias e 873 grandes obtêm o melhor preço de mercado para seus pro-
(MADER/DPP, 2021). A agricultura é praticada em dutos. As famílias de pequenos produtores muitas
menos de 16 por cento das terras aráveis e prin- vezes não têm poupança e possuem acesso muito
cipalmente em áreas propensas a inundações limitado a créditos em caso de emergência, e ainda
e secas. A agricultura familiar caracteriza-se por não têm seguro ou qualquer outra forma de miti-
sistemas de produção com poucos insumos, pouca gar o risco (CGAP, 2016).
tecnologia e agricultura de sequeiro, utilizando
muito poucos insumos melhorados (semen- A maioria das mulheres de áreas rurais
tes, fertilizantes) e com dificuldades de acesso desempenha um papel crucial no cultivo de
a mercados e serviços financeiros. Isso a torna alimentos e na geração de renda para suas
particularmente vulnerável a choques. As parcelas famílias. No entanto, elas têm pouco acesso a
agrícolas são geralmente pequenas: as famílias dos recursos produtivos ou controle sobre eles (IFAD,
agricultores cultivam uma média de 1,4 hectares sem data). Geralmente, os homens podem limpar
(tabela n°1). O sistema alimentar dos pequenos a terra e participar da colheita, mas as tarefas
produtores é muito informal, e estes pequenos das mulheres incluem semear, plantar, capinar
produtores se envolvem em grande parte na e irrigar. Apenas 20 por cento das mulheres
agricultura (produção agrícola e pecuária ou pesca) cultivam mais de 2 hectares e 65 por cento das
com pouca ou nenhuma conexão com uma cadeia famílias chefiadas por mulheres cultivam menos
de valor ou fornecedores formais. O envolvimento de 1,5 hectares. Isso se compara a 47 por cento
com compradores ou revendedores costuma ser das famílias chefiadas por homens. O número
igualmente informal, no contexto de cadeias de de mulheres chefes de família aumentou de 23
valor pouco estruturadas. Os agricultores também por cento em 1980 para 30 por cento em 1997

2
A pesquisa definiu os estabelecimentos como unidades econômicas existentes de forma independente e classificadas como (i) estabelecimentos
agrícolas, se focadas na produção de culturas, (ii) explorações pecuárias, se dedicadas à criação animal, ou (iii) como uma combinação das duas.
(MADER/DPP, 2021).

14
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

(FAO, 2021). As mulheres são particularmente portanto, menos habilidades do que os homens.
desfavorecidas nas comunidades rurais, tendo Os cuidados de saúde são inadequados e a morte
consideravelmente menos acesso à educação e, no parto é comum (IFAD, sem data).

Tabela n°1. Tamanho médio da propriedade e cultivo total dos agricultores familiares nos núcleos familiares (hectares)

Área total
Área média
Área total cultivada Área total cultivada cultivada por
Área média por cultivada por núcleo
Província – 1o plantio anual – 2o plantio anual pequenos e médios
núcleo familiar (ha) familiar –1o plantio
(ha) (ha) estabelecimentos
anual (ha)
agrícolas (ha)

Niassa 1,7 1,5 228 964 14 573 243 537

Cabo Delgado 1,4 1,2 386 567 24 078 410 645

Nampula 1,2 1,1 778 154 80 606 858 760

Zambézia 1,4 1,2 949 894 121 836 1 071 730

Tete 1,5 1,4 844 240 54 968 899 208

Manica 2 1,7 405 692 43 315 449 007

Sofala 1,6 1,5 645 245 143 400 788 645

Inhambane 1,2 0,9 156 074 52 060 208 134

Gaza 1,2 1,0 314 246 194 226 508 472

Maputo Province 0,7 0,6 119 245 21 735 140 980

Nacional 1,4 1,2 4 828 318 750 798 5 579 116

Fonte: Ministry of Agriculture and Rural Development, Directorate of Planning and Policies. 2021. Integrated Agricultural Survey: Statistical
Framework, Maputo, Mozambique. https://www.agricultura.gov.mz/wp-content/uploads/2021/06/MADER_Inquerito_Agrario_2020.pdf.

Os proprietários de gado podem ser melhor gestão animal e saúde, por exemplo, atra-
classificados em familiares ou privados. Os vés da contratação de serviços veterinários. Na
agricultores familiares constituem a maioria produção de frangos e ovos, os avicultores tam-
–aproximadamente 85 por cento de todos bém são classificados em três grupos: (i) peque-
os pecuaristas– e, embora sejam os maiores nos (menos de 5 000 aves), (ii) médios (5 000 a
detentores de rebanho, não são orientados 10 000) e (iii) grandes (mais de 10 000 aves). Esses
para o mercado (MADER, 2021). Eles geralmente avicultores também são totalmente orientados
© Malcolm Manners/African Silk Farm (CC BY 2.0)

também não investem em insumos melhorados para o mercado e usam insumos melhorados,
(pastagens, vacinas e banhos) e são dependentes incluindo vacinas e rações (MADER, 2021).
de pastagens naturais. As fazendas familiares
tendem a manter os animais para consumo As cadeias de valor alimentar são geralmente
doméstico, prestígio pessoal e para venda em curtas e envolvem poucos atores. Nas áreas
caso de necessidade urgente de dinheiro. rurais, podem simplesmente seguir as ligações
produtor-atacadista a intermediário-varejista
Os criadores privados de gado, que representam e consumidor final, mas tornam-se mais com-
os outros 15 por cento, são orientados para o plexas nas áreas urbanas, combinando-se com
mercado e investem em melhoramento genético, alimentos processados de origem internacional

15
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

(em particular da África do Sul) ou com arroz na fazenda. Outros atores importantes nos siste-
importado principalmente da Ásia. Nas áreas mas alimentares são instituições governamentais
rurais, os operadores informais (não regulamen- a nível nacional ou regional, setor privado, acade-
tados) de pequena escala se envolvem na agre- mia, ONGs e parceiros de desenvolvimento.
gação, transporte, armazenamento e distribuição
usando mercados locais, informais e tradicionais. A tabela n°2 apresenta alguns dados sobre atores
Esses mercados tendem a ser mal organizados, e atividades dos sistemas alimentares acessados
em termos de segurança alimentar. Os produtos no país tais como os produtores, as unidades de
agrícolas também são comercializados e vendidos negócios e outros.

Tabela n°2. Número de estabelecimentos agrícolas e atores nos sistemas alimentares em Moçambique

Estabelecimentos agrícolas1 4,3 milhões (total)

Pequenos estabelecimentos agrícolas (agricultores do setor familiar) 1 4 167 702 (97,8%)

Estabelecimentos agrícolas médios1 93 183 (2%)

Estabelecimentos agrícolas grandes1 873 (<1%)

Número de empresas nas atividades de agricultura, produção animal, caça e serviços relacionados2 471

Número de empresas na prática da silvicultura e afins2 80

Número de empresas em atividades de pesca e aquicultura 98

Número de indústrias de processamento de alimentos 2


1 322

Número de indústrias de fabricação de bebidas 2


66

Número de empresas de coleta, tratamento e distribuição de água, saneamento, gestão de resíduos


213
e tratamento de poluição2

Número de empresas de restauração e similares2 3 350

Número acumulado de barcos de pesca industrial licenciados de 2009 a 2017 – frota nacional3 730

Número acumulado de barcos de pesca industrial licenciados de 2009 a 2017 - frota estrangeira3 563

Número acumulado de barcos de pesca semi-industrial licenciados de 2009 a 2017 3


2.899

Número acumulado de artes de pesca artesanal (pescadores do setor familiar) licenciadas de 2009 a
177 511
2017 (incluindo artes licenciadas em 2012)3

Licenciamento sanitário de unidades de produção (nacional)3 2 802

Número de parceiros do Instituto moçambicano de cereais que realizam comercialização agrícola e


75
agroprocessamento4

Número de processadores e cooperativas de leite produzidos localmente no centro do país5 15/5

Unidades de armazenamento e pesagem de cereais e feijão em silos da Bolsa de mercadorias de


Moçambique: Lichinga na província de Niassa, Nhamatanda e Gorongosa em Sofala; Nanjua em
Cabo Delgado, Malema em Nampula, Mugema na província da Zambézia e Ulóngue em Tete6

Fontes: 1 MADER/DPP (Ministry of Agriculture and Rural Development & Directorate of Planning and Policies). 2021. Integrated Agricultural
Survey 2020: Statistical Framework. Maputo, Moçambique. https://www.agricultura.gov.mz/wp-content/uploads/2021/06/MADER_
Inquerito_Agrario_2020.pdf
2
Instituto Nacional de Estatística (INE). 2017. Empresas em Moçambique: Resultados do Segundo Censo Nacional (2014–2015).
http://mozdata.microdatahub.com/index.php/catalog/20
3
Calculations based on information from MIMAIP (Ministry of the Sea, Inland Waters and Fisheries). 2019. Fisheries and Aquaculture Statistical
Bulletin 2006–2017. Maputo, Moçambique. http://www.mimaip.gov.mz/wp-content/uploads/2019/06/AF_Boletim-Estatistico-Miolo-
2006-2017-Final-em-usoFev2019.pdf
4
Calculations based on data available at https://icm.gov.mz/.
© credits

5
O’Donovan, F. 2021. Shaping the Future of Mozambique’s Dairy Sector, Agrilinks, 17 de Março 2021. https://agrilinks.org/post/shaping-future-
mozambiques-dairy-sector
6
https://www.bmm.co.mz/index.html acessado em 19 de agosto, 2021.

16
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Quatro questões-chave de sustentabilidade


Questão-chave de sustentabilidade n°1: Por que o sistema alimentar não fornece
alimentos nutritivos suficientes para a população moçambicana?

A produção agrícola é baseada principalmente juntamente com alguma quantidade de gado.


na subsistência, caracterizada por baixa As dietas, portanto, têm valor nutricional
produtividade e pequenos volumes, utilizando insuficiente. A desnutrição crônica e a
ferramentas tradicionais e poucos insumos desnutrição aguda são generalizadas e os
melhorados. Está focada em alguns alimentos indicadores de segurança alimentar estão
básicos (particularmente mandioca e milho) melhorando muito lentamente.

Figura n°9. Representação sistêmica da Questão-chave de sustentabilidade n°1

Altas taxas de analfabetismo Política com foco limitado na


Baixo investimento em principalmente entre as mulheres educação nutricional (por exemplo,
Produção agrícola Infraestrutura
tecnologias, pesquisas e nas áreas rurais sem orientações dietéticas)
altamente rodoviária fraca
e inovações
dependente de
chuvas irregulares Tabus e crenças culturais que
exacerbadas pelos Serviços de Pouca consciência/informação
extensão limitados inibem o consumo de certos
impactos das Estruturas alimentos (especialmente sobre o valor nutricional dos
e inadequados aos Poucas e precárias
mudanças inadequa- entre mulheres em áreas alimentos e sua importância
produtores de infraestruturas
climáticas das/práticas rurais) na saúde e qualidade de vida
alimentos para o processa-
(secas/inundações) rudimentares de
(pequenos mento local de
alimentos armazenamento e
agricultores e
conservação de
pescadores) Baixa demanda e oferta de Aumento da
alimentos
alimentos com alto valor nutricional urbanização

Baixa diversidade Baixa qualidade Redução da competitividade Marginalização de


Deficiente fluxo de Altas perdas e
da produção de dos produtos no mercado de alimentos alimentos nativos
produtos alimentícios das desperdícios
Baixa produção alimentos alimentares locais em comparação com de alto valor
áreas de maior produção de alimentos
e produtividade agrícolas locais os importados nutricional
para os potenciais
doméstica de mercados consumidores
alimentos
Dietas alimentares de
Estímulo para mudanças de hábitos má qualidade e
Preços nominais Redução do poder de alimentares mais saudáveis (alimentos desequilibradas
Alta dependência de
elevados dos compra dos consumido- naturais frescos) para alimentos (geralmente compostas
importações de
alimentos res/famílias mais pobres altamente processados, especialmente por cereais e mandioca)
alimentos
em áreas urbanas

(Baixa disponibilidade (e consumo) de alimentos com alto valor nutricional)

Pequenos Aumento das Tendência crescente de Aumento de surtos de Altas taxas de


agricultores e desigualdades e urbanização e desemprego devido Aumento da excesso de peso e baixa estatura Altas taxas de
pescadores empobrecimento ao êxodo rural principalmente da insegurança doenças crônicas não e com maior deficiências de
artesanais com das pessoas mais população jovem em busca de alimentar transmissíveis incidência em micronutrientes
renda estagnada vulneráveis melhores condições de vida crônica relacionadas a dietas áreas rurais

Fonte: Autores.

A desnutrição tem sido o desafio de familiares conseguem manter as suas reservas


desenvolvimento humano mais importante alimentares autoproduzidas por mais de dez
em Moçambique durante décadas, sob a meses (SETSAN, 2014). A falta de variedade e
forma de baixa estatura e deficiências de diversidade limita o acesso a alimentos ricos em
micronutrientes. Com a produção de alimentos micronutrientes, embora os vegetais folhosos
insuficiente para atender às necessidades geralmente acompanhem os alimentos básicos. As
do país, aproximadamente 46 por cento da deficiências de micronutrientes (iodo, ferro, zinco
população enfrenta dificuldades para garantir e vitamina A) são muito altas, principalmente para
alimentos suficientes em algum momento crianças menores de cinco anos e mulheres em
do ano. Apenas 31 por cento dos núcleos idade fértil (tabela n°3).

17
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

Por outro lado, o sobrepeso e a obesidade acordo com o Relatório de nutrição global,
estão se tornando uma preocupação e, embora o país tenha feito algum progresso,
embora ainda baixos em comparação com as enfrenta desafios substanciais para cumprir
médias regionais, significam que Moçambique os objetivos globais de nutrição (Relatório de
carrega o triplo fardo da desnutrição. De nutrição global, 2021).

Tabela n°3. Principais indicadores nutricionais e prevalência de doenças associadas

Desnutrição aguda em crianças < 5 anos (2015)1 4,4%

Desnutrição crônica (baixa estatura) em crianças < 5 anos (2013)2 42,3 %

Deficiência de vitamina A em crianças < 5 anos (2012)3 68%

Anemia (deficiência de ferro) em crianças < 5 anos (2019)4 68,2%

Baixo peso em crianças < 5 anos (2015)5 15,6%

Excesso de peso em crianças < 5 anos (2015)1 7%

Anemia em mulheres em idade reprodutiva de 15 a 49 anos (2016)6 51,1%

Deficiência de vitamina A em mulheres7 68,8%

Excesso de peso em adultos (2016)8 23,1%

6,2% das mulheres e 6,6%


Prevalência de diabetes em adultos9
dos homens

7,2% (10,5% das mulheres


Prevalência de obesidade na população adulta > 18 anos1
e 3,3% dos homens)

Proporção energética dos cereais na dieta1 72% de kcal

Consumo médio de proteína animal per capita (2015–2017)1 8,3 g/dia

Nota: As cores referem-se à posição em relação à gravidade do indicador. Verde representa uma situação mais favorável, amarelo/laranja
= preocupante e vermelho = grave.

Fontes: 1 Global Nutrition Report. 2021. Country Nutrition Profile – Mozambique: The burden of malnutrition at a glance – Mozambique. Cited
10 March 2022. https://globalnutritionreport.org/resources/nutrition-profiles/africa/eastern-africa/mozambique/
2
SETSAN (Secretariado Técnico de Segurança Alimentar e Nutricional). 2014. Relatório do Estudo de Base de Segurança Alimentar e Nutricional 2013
(Food Security and Nutrition Baseline Study 2013). Maputo, Moçambique..
3
INE (National Institute of Statistics). 2013. Mozambique – Demographic and Health Survey 2011, Maputo, Mozambique, March 2013.
https://dhsprogram.com/pubs/pdf/fr266/fr266.pdf
4
WHO (World Health Organization). Undated. Anaemia in children aged <5 years – estimates by country. In Global Health Observatory Data reposi-
tory. Geneva, WHO. www.who.int/data/gho
5
WHO (World Health Organization). Undated. Children aged <5 years underweight, country survey results – data by country. In Global Health
Observatory Data repository. Geneva, WHO. www.who.int/data/gho
6
FAOSTAT. Suite of Food Security Indicators. http://www.fao.org/faostat/en/#data/FS
7
FAO. 2021. Mozambique: General Introduction. In Gender and Land Rights Database. Rome Cited 10 March 2022. www.fao.org/gender-landrights-
-database/country-profiles/countries-list/general-introduction/en/?country_iso3=MOZ
8
WHO (World Health Organization). Undated. Prevalence of overweight among adults, BMI>25, crude – estimates by country. In Global Health
Observatory Data repository. Geneva, WHO. www.who.int/data/gho
© credits

9
UNICEF. Undated. Nutrition Situation in Mozambique. Cited 10 March 2022. https://www.unicef.org/mozambique/en/nutrition

18
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Embora as importações compensem alguns para perdas e desperdícios consideráveis de


volumes de produção baixos, a prevalência de alimentos, com a falta de refrigeração estável
insegurança alimentar grave na população total contribuindo para a deterioração e reduzindo
ao longo dos anos 2018 a 2020 foi de 40,5 por ainda mais a quantidade e a qualidade dos
cento, enquanto a prevalência de insegurança alimentos disponíveis.
alimentar moderada e grave combinada foi de
71,1 por cento no mesmo período (Indicadores Os problemas de infraestrutura inadequada
de segurança alimentar da FAOSTAT). aumentam o custo de transporte de alimentos
para os mercados, diminuindo a renda dos
A pesquisa do UNICEF mostra que apenas 13 por produtores e aumentando os preços para os
cento das crianças com idade entre 6 e 23 meses consumidores de baixa renda. Além disso, há
receberam uma dieta mínima aceitável. (UNICEF, uma perda de qualidade no seu transporte,
sem data-b). Além disso, apenas 41 por cento resultante da má gestão do produto,
das crianças menores de cinco anos tinham a armazenamento inadequado e capacidade
frequência mínima de refeições e apenas 28 por de refrigeração. Mesmo quando os alimentos
cento a diversidade alimentar mínima (UNICEF, perecíveis chegam ao mercado, muitas vezes
sem data-a). No que diz respeito à água potável são armazenados, manuseados ou vendidos em
segura e ao saneamento básico, apenas 56 por condições insalubres, degradando ainda mais sua
cento da população tem acesso a serviços básicos qualidade nutricional.
de água e apenas 29 por cento podem utilizar os
serviços de saneamento básico (OMS, sem data). Outro obstáculo é a falta de informação,
conhecimento e conscientização dos produtores
Principais motores e consumidores sobre os valores nutricionais,
limitando a demanda por alimentos de maior
Os fatores que contribuem para a baixa produção qualidade e mais nutritivos. A influência da
e disponibilidade de alimentos incluem a depen- tradição, tabus e cultura também pode favorecer
dência da agricultura de sequeiro e o agravamento alimentos em detrimento de produtos mais
dos impactos das mudanças climáticas (como nutritivos, juntamente com fatores como altos
chuvas irregulares). As restrições à melhoria da índices de analfabetismo e desemprego.
produtividade e da segurança alimentar incluem
altos custos de insumos (por exemplo, fertilizantes A desnutrição tem um custo humano elevado em
e controle de pragas) e a ausência de infraestru- Moçambique, estando diretamente associada
tura para processamento, preservação, armaze- a 25,6 por cento de mortalidade infantil em
namento e dispersão de alimentos, especialmente 2011 e 2015. A mortalidade infantil associada à
para produtos mais perecíveis, como peixes, vege- desnutrição reduz a força de trabalho do país em
tais e frutas. Além disso, os produtores familiares 10 por cento e aproximadamente 19 por cento
de pequena escala muitas vezes não têm acesso a dos insucessos escolares estão associados à
serviços de extensão e financiamento (ver também desnutrição crônica, que também tem um impacto
Questão-chave de sustentabilidade n°2). econômico muito negativo (SETSAN, 2017).

Uma rede rodoviária precária limita a distribuição O estudo do custo da fome em Moçambique
de alimentos das principais áreas de produção estimou que o país perdeu aproximadamente
aos mercados consumidores, bem como as USD 1,7 bilhão como resultado da desnutrição
conexões entre produtores menores e mercados infantil em 2015 (Nutrition modeling consortium,
locais ou centros urbanos. Além disso, a 2015). Essas perdas representam o impacto
distribuição de energia não confiável contribui cumulativo da desnutrição na saúde, educação e

19
© Peter Fredenburg/Tilapias (CC BY-NC-ND 2.0)

ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

produtividade e equivaleriam a aproximadamente colheita aprimoradas), juntamente com investimento


11 por cento do PIB em 2015. É importante público em infraestrutura rodoviária para reduzir
ressaltar que a maior parte desse custo foi perdas de alimentos, aumentar a disponibilidade
derivada da perda de (potencial) produtividade de alimentos, e estabilidade de acesso. Isso seria
resultante da mortalidade relacionada à associado ao desenvolvimento de capacidades e à
desnutrição –pessoas que teriam sido adultos conscientização sobre a importância da segurança
produtivos em 2015, mas morreram de doenças alimentar e nutricional. Os esforços podem incluir
relacionadas à desnutrição quando crianças. programas de treinamento e comunicação focados
na preservação e processamento de alimentos,
Identificação de alavancas sistêmicas orientações alimentares, hábitos culturais e como
eles podem prejudicar a nutrição, desigualdades de
Duas alavancas foram identificadas durante as gênero, e revisão do currículo nacional de educação
consultas sobre a avaliação dos sistemas alimen- para incentivar dietas mais variadas e saudáveis.
tares de Moçambique, relacionadas com o for-
necimento adequado de alimentos nutritivos. O O fortalecimento da agricultura familiar (com
primeiro visa melhorar o acesso a alimentos diver- foco nas mulheres) pode contribuir para
sificados em esforços que podem ser combinados quebrar os ciclos viciosos da pobreza, bem como
com programas de apoio às famílias no aumento melhorar a segurança alimentar, os meios de
da demanda por alimentos nutritivos. O segundo subsistência e a saúde das famílias rurais. Apoiar
visa promover o investimento em infraestrutura os investimentos no processamento de alimentos
de armazenamento e conservação de alimentos, e ao mesmo tempo conscientizar o público sobre
aliado à capacitação em manuseio e conservação a importância de dietas nutritivas e saudáveis
de alimentos para melhorar a segurança e reduzir podem aumentar a demanda e desenvolver
o desperdício. As alavancas discutidas e refinadas novas oportunidades de mercado.
durante as discussões do workshop foram:
Riscos e barreiras
○ Apoiar a agricultura familiar, incluindo mulheres
e jovens, na diversificação da produção. Isso seria As dificuldades potenciais incluem baixas aloca-
feito em conjunto com programas de proteção ções orçamentárias do governo para infraestrutura
social robustos, apoiados por parceiros de de transporte, a ocorrência de conflitos armados
desenvolvimento e do setor privado e atores da nas zonas Centro e Norte, a falta de financiamento
sociedade civil. e eficiência do sistema e corrupção na alocação
dos já escassos recursos, e o favorecimento de
○ Promover parcerias público-privadas para investir alguns territórios em detrimento de outros. O
em infraestrutura essencial de processamento de sucesso exigiria paz no país, maior eficiência do
alimentos, como armazenamento a frio (e apoiar programa e o desenvolvimento de pacotes educa-
pequenos agricultores a desenvolver técnicas pós- cionais apropriados.
© credits

20
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Questão-chave de sustentabilidade n°2: Por que as cadeias de valor domésticas são


subdesenvolvidas e incapazes de gerar oportunidades de subsistência sustentável em
Moçambique?

A comercialização da agricultura familiar é um por problemas relacionados à produção, acesso


elemento importante da estratégia do país para limitado ao financiamento e falta de mercados
aumentar o crescimento econômico equitativo funcionais. A falta de habilidades de negociação
nas áreas rurais e diversificar a produção para nas organizações de agricultores vem dificultando
melhorar os meios de subsistência. As cadeias de o desenvolvimento de parcerias sustentáveis com
valor integradas são muito rudimentares, travadas atores que estão à frente da cadeia produtiva.

Figura n°10. Representação sistêmica da Questão-chave de sustentabilidade n°2

Mudanças climáticas (seca, Instituições e sistemas Mercados e sistemas


ciclones, inundações) regulatórios e políticas fracas de informação de Conflitos
(falta de ambiente propício) mercado ineficientes

Baixas densidades
Investimentos públicos Assistência técnica fraca
populacionais e áreas
limitados e baixa disponibilida- Recursos financeiros (pesquisa e extensão)
remotas
de de serviços (crédito) insuficientes

Ausência e inacessibilidade de
insumos de qualidade (sementes, Inadequate infrastructure Consciência e conhecimento limitados
fertilizantes, etc) e equipamentos (roads, transport, electricity) sobre a qualidade do produto

Scattered production,
Uso e adoção limitados traditional crops/animals
de tecnologias with low diversity Organizações de agricultores limitadas

Baixa produção e
produtividade (falta
de confiabilidade)
Problemas com Altas perdas Pequeno setor privado e atores,
agregação/ pós-colheita e baixa relações fracas entre os
armazenamento qualidade do produto agricultores familiares e o setor
privado, processadores, etc.

Baixo desempenho do sistema alimentar, integração de mercados e desenvolvimento de cadeias de valor limitados

Armadilha da pobreza, oportunidades Aumento da dependência, reduzindo a


de emprego perdidas competitividade com produtos importados

Fonte: Autores.

A agricultura e a pesca estão entre as principais fon- Os mercados agrícolas moçambicanos são geral-
tes de renda das comunidades rurais. A produção mente precários, pouco competitivos, carentes
agrícola primária é dominada por pequenos pro- de serviços de apoio, investimentos de capital,
dutores familiares, com estabelecimentos agrícolas técnicas de comercialização e acesso a tecnologias
de 0,5 hectares a 1,5 hectares, embora também de informação. Eles são caracterizados por altos
existam algumas empresas maiores envolvidas na custos de transação que podem incluir riscos de
produção e no agro-processamento. Agricultores e preço, transporte, riscos climáticos, perdas e
pescadores geralmente ganham o suficiente para roubos (IFAD, 2020b).
atender às necessidades básicas de alimentos de
suas famílias e, em alguns casos (menos de 10 por As cadeias de valor domésticas permanecem
cento das famílias), geram um pequeno excedente altamente fragmentadas e relativamente curtas,
para venda no mercado. A maioria da população com intermediários aumentando os custos, mas
rural subsiste com muito pouca renda. contribuindo de forma limitada com o valor

21
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

agregado. Isso cria uma base instável para o O armazenamento precário aliado à infraestru-
sucesso das empresas de processamento, depen- tura limitada (estradas, energia elétrica, armazéns
dentes de fluxos regulares e confiáveis de maté- e instalações de processamento) e altos custos
rias-primas de qualidade conhecida (IFAD, 2020b). de transação resultam em um ambiente pouco
propício ao desenvolvimento de cadeias de valor.
Motores principais Outras barreiras são o limitado poder de barganha
e as limitadas habilidades de negociação ao lidar
A produção de subsistência, com pouco valor com comerciantes ou intermediários do mercado,
agregado aos produtos primários, caracteriza-se baixo nível de organização, distância e falta de
por baixos níveis de habilidade técnica, com uso informação. Apenas cerca de 10 por cento das
limitado de insumos e equipamentos melhorados famílias rurais são membros de organizações de
(ver tabela n°4). Os produtores também enfren- agricultores (IFAD, 2019). A maioria desses grupos
tam dificuldades como falta de serviços de apoio, é caracterizada por má gestão e poucas habilida-
incluindo extensão rural (tabela n°5), ou acesso des de negócios, foco limitado na prestação de
a financiamento. As instituições financeiras têm serviços e falta de conhecimento dos aspectos
alcance limitado nas áreas rurais, cobram taxas pós-colheita e comercialização. A falta de coorde-
de juros inacessíveis e exigem garantias e outras nação na produção ou comercialização permite
condições que efetivamente excluem os peque- que os intermediários pressionem os pequenos
nos agricultores de obter crédito (IFAD, 2019). agricultores a vender parte de sua produção na
Apenas 0,6 por cento da população tem acesso ao própria fazenda e imediatamente após a colheita
crédito (ver tabela n°6). por preços muito baixos.

Tabela n°4. Estabelecimentos agrícolas que utilizaram Tabela n°5. Acesso a extensão rural
tecnologias aprimoradas (insumos), pequenas e médias
técnicas de campo (%)

propriedades

técnicas de campo

técnicas de campo
Coloca em prática

receberam visitas

receberam visitas
Número total de
de homens que
Recebeu visitas

mulheres que
Número total
recebidos (%)
os conselhos
herbicidas (%)
pesticidas (%)
químicos (%)
Irrigação (%)

fertilizantes

esterco (%)

Província
Usou

Usou

Usou

Usou

Província

Niassa 2,9 7,6 6,7 2 4,1 Niassa 6,1 91,1 9 874 6 989

Cabo Delgado 7,1 7,9 13,7 5,2 6,2 Cabo Delgado 6,2 85,8 18 584 12 793

Nampula 4,8 3,9 5,6 1,9 3,5 Nampula 4,4 85,7 30 532 17 384

Zambézia 2,1 1,7 1,5 0,2 10,9 Zambézia 3,6 79,8 23 351 18 804

Tete 14,8 29,4 9,6 1,6 14,2 Tete 6,2 88,5 36 045 19 671

Manica 10,5 3,7 1,8 0,9 5,4 Manica 7,8 80,9 18 597 16 593

Sofala 6,2 1,9 4,5 2,2 5,2 Sofala 23,9 89,1 88 877 90 768

Inhambane 6,3 3,8 2,7 1,6 10,1 Inhambane 3,3 79 5 257 4 692

Gaza 24,9 6,3 3,9 2,2 14,4 Gaza 4,8 89 8 316 18 159

Maputo Province 25,2 7,1 6,4 3,5 13,6 Maputo Province 2,4 83,4 4 573 6 144

National 9,1 7,8 5,5 1,8 8,8 National 6,9 86,6 244 006 211 997

Fonte: Ministry of Agriculture and Rural Development, Directorate Fonte: Ministry of Agriculture and Rural Development, Directorate
of Planning and Policies. 2021. Integrated Agricultural Survey: Statistical of Planning and Policies. 2021. Integrated Agricultural Survey: Statistical
Framework, Maputo, Moçambique. https://www.agricultura.gov.mz/ Framework, Maputo, Moçambique. https://www.agricultura.gov.mz/
© credits

wp-content/uploads/2021/06/MADER_Inquerito_Agrario_2020.pdf wp-content/uploads/2021/06/MADER_Inquerito_Agrario_2020.pdf

22
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Tabela n°6. Acesso ao crédito rural (pequenas e médias propriedades)

Número de pessoas que receberam crédito agrícola (N)


Empréstimo e
crédito recebido
Província
para fins
agrícolas (%) Homens jovens Mulheres jovens
Homens adultos Mulheres adultas
(18 a 35 anos) (18 a 35 anos)

Niassa 1,2 1 770 72 826 50

Cabo Delgado 0,6 1 886 92 294 0

Nampula 0,4 2 493 621 615 121

Zambézia 0,6 4 433 899 1 899 302

Tete 0,8 4 506 345 3 190 345

Manica 1,2 2 021 1 103 287 95

Sofala 0,4 384 1 504 0 755

Inhambane 0,1 42 69 0 0

Gaza 0,3 941 216 177 177

Maputo Province 0,4 465 661 0 0

Nacional 0,6 18 941 5 582 7 287 1 845

Fonte: Ministry of Agriculture and Rural Development, Directorate of Planning and Policies. 2021. Integrated Agricultural Survey: Statistical
Framework, Maputo, Moçambique. https://www.agricultura.gov.mz/wp-content/uploads/2021/06/MADER_Inquerito_Agrario_2020.pdf

Os serviços de extensão pública distritais têm No comércio de gado, intermediários ou comer-


poucos recursos e, mesmo quando disponíveis, ciantes podem comprar animais de produtores
podem concentrar-se na produção de culturas familiares, muitas vezes para agregá-los e vendê-
básicas, em vez de explorar as possibilidades -los às transportadoras de animais, produtores
oferecidas pelas culturas de rendimento, de ração animal, incubatórios, processadores de
comercialização, gestão e fortalecimento das carne (matadouros e açougues) e processadores
organizações de agricultores. Novos atores, como de couro (MADER, 2021).
fornecedores de insumos, começaram a prestar
serviços de consultoria, mas as ligações gerais Identificação de alavancas sistêmicas
entre pesquisa e extensão continuam muito fracas.
Uma primeira alavanca promoveria cadeias de
Atores de pequena escala dominam o comércio valor inclusivas e sustentáveis, melhorando o
de produtos agrícolas e geralmente operam acesso ao mercado para produtores e apoiando
informalmente, permitindo que eles concorram outros atores (por exemplo, processadores de ali-
deslealmente com comerciantes devidamente mentos) para integrar ainda mais a cadeia de valor3.
autorizados (MADER, 2021). Ela abordaria as principais restrições de

3
Algumas organizações (e.g., IFAD, FAO) implementaram com sucesso projetos de cadeia de valor com foco em capacitar grupos de produtores
(incluindo grupos de mulheres) e facilitar a ligação de pequenos agricultores com agricultores comerciais para acelerar a implementação e uso de
tecnologias melhoradas, aumentar a produção e as quantidades comercializadas e, consequentemente, a renda dos agricultores (FIDA , 2019).

23
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

produção, processamento e comercialização, com de valor. Isso melhoraria o desenvolvimento da


o objetivo de melhorar a capacidade dos agricul- cadeia de valor por meio de um melhor acesso
tores de fornecer as qualidades e quantidades ao financiamento rural e produtos financeiros
necessárias. Isso lhes permitiria responder às apropriados, melhoria da infraestrutura (incluindo
oportunidades de mercado sem comprometer a eletricidade, estradas rurais) e desenvolvimento
segurança alimentar das famílias, melhorar a lucra- de serviços de transporte para todos os atores das
tividade da agricultura e fortalecer sua posição na cadeias de valor.
governança da cadeia de valor, por meio de uma
melhor capacidade de negociação. O fortalecimento das atividades em cadeias de
valor específicas e em todos os sistemas alimen-
Isso envolveria: (i) fomentar associações e coope- tares também ajudaria a promover uma gama
rativas de comercialização agrícola (na agricultura, mais diversificada de meios de subsistência para
pecuária e pesca e aquicultura) para aumentar a população rural. Fomentar habilidades e capaci-
suas habilidades e capacidades de agregar produ- dades empresariais, apoio empresarial e parcerias
tos de agricultores de subsistência e de pequena com o setor privado seria crucial, juntamente com
escala, pastores e pescadores; (ii) apoiar os agricul- abordagens direcionadas para garantir a inclusão
tores para aumentarem a sua produção de forma de mulheres e jovens nas áreas rurais.
sustentável tanto em volume como em qualidade.
Ações específicas podem incluir a exploração de Riscos e barreiras
oportunidades para sistemas de produção agrícola
orgânica e também a exploração de alternativas Os maiores riscos e barreiras para a
científicas inteligentes que facilitem a adaptação às transformação agrícola sustentável foram
mudanças climáticas (ver também Questão-chave identificados como falta de política alimentar,
de sustentabilidade n°3); (iii) abordar as principais choques climáticos, degradação dos recursos
restrições do mercado (armazenamento de produ- naturais, baixos preços e altos custos dos
tos hortícolas, processamento ecológico da man- insumos. A crescente agitação civil no Centro e
dioca, incentivos de qualidade e capital de giro dos no Norte do país pode resultar em aumento dos
comerciantes para pecuária). gastos militares e impactar o comércio. Os pré-
requisitos para o sucesso são a paz no país, o
Uma segunda alavanca seria o desenvolvimento desenvolvimento de capacidades e educação, em
de serviços públicos e privados adequados em particular nas organizações de produtores, e o
apoio ao desenvolvimento inclusivo da cadeia aumento da eficiência do programa.
© Jeffrey Barbee (CC BY-NC-ND 2.0)

24
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Questão-chave de sustentabilidade n°3: Por que os sistemas alimentares atuais estão


acelerando a degradação e o esgotamento dos recursos naturais (florestais, marinhos
e costeiros)?
Os atuais sistemas de produção de alimentos marinhos pela pesca ilegal generalizada. Essas
contribuem para a degradação da terra e o ameaças diretas aos recursos produtivos
esgotamento dos recursos naturais. Os solos são aumentam a pobreza e afetam a qualidade de
degradados pela erosão e salinização, as florestas vida das pessoas. Elas também comprometem a
pelo desmatamento e invasão, e os ecossistemas sustentabilidade futura dos sistemas alimentares.

Figura n°11. Representação sistêmica da Questão-chave de sustentabilidade n°3

Incentivos econômicos

Aumento da frequência Fraca capacidade de


de eventos climáticos coordenação intra e Crescimento
interinstitucional Fraca capacidade de implementar e populacional e
supervisionar políticas, leis e regulamentos urbanização
relativos à conservação de recursos naturais

Aumento da Mineração
Baixos níveis de exploração ilegal
desenvolvimento Aumento da pressão e sobre-exploração artesanal como
de recursos fonte alternativa
da produção e dos recursos naturais
naturais de renda
Uso continuado produtividade • Redução de 30% na capacidade de
de práticas agrícola captura de recursos pesqueiros
agrícolas • Taxa de desmatamento médio anual de
tradicionais 0,79% - 267 000 ha/ano
• 71,5% do território com variação na Uso intensivo de agroquímicos
produtividade do solo e práticas prejudiciais ao meio
ambiente

da população 14% Aumento da erosão e


nacional exposta a Aumento de pessoas
salinização dos solos
eventos cíclicos como Redução da capacidade deslocadas e da mobilidade
enchentes, secas e de geração de renda da população
tempestades tropicais para subsistência
Insegurança da posse da
terra e aumento dos
conflitos

Fonte: Autores.

Embora Moçambique tenha recursos naturais A área florestal foi estimada em 34 milhões de
abundantes, suas áreas florestais e ecossistemas hectares em 2016 –47 por cento do território
marinhos estão sob pressão substancial de nacional (National Forest Inventory, 2017). Desse
práticas insustentáveis e de sobreexploração, total, a área de floresta produtiva foi estimada
bem como ameaçadas pelas mudanças em 17 milhões de hectares. A taxa anual de
climáticas. desmatamento foi estimada em 0,79 por cento
em média entre 2003 e 2016, correspondendo a
Práticas agrícolas insustentáveis, como métodos aproximadamente 267 000 hectares de floresta
de cultivo itinerante de corte e queima, são uma derrubados a cada ano.
das principais causas do desmatamento e degra-
dação das florestas, sendo que Moçambique O desmatamento pode ter impactos ambientais
registrou uma queda acentuada na área florestal de longo alcance e efeitos indiretos, incluindo
produtiva entre 2007 e 2018 (figura n°12). maior degradação da terra, inundações

25
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

exacerbadas, erosão costeira (principalmente


pela perda de manguezais) e sedimentação. A

© Jeffrey Barbee (CC BY-NC-ND 2.0)


perda de florestas também afeta diretamente as
comunidades que vivem da disponibilidade de
produtos florestais não madeireiros (por exemplo,
frutas e cogumelos).

Figura n°12. Mudança na área florestal produtiva (2007–2018)


7 000 000
Área florestal produtiva (ha)

6 000 000

5 000 000

4 000 000

3 000 000 Figura n°13. Rendimento médio por hora da pesca industrial
2 000 000 100

1 000 000
Rendimento médio / hora

0 75
ne
o

la

la

o
a

ica

zia

te

a
az
ut

ss
ad
fa

pu
Te
ba


an
ap

ia
G

So

lg
am
m

N
M

De
M

ha

Za

bo
In

Ca

50
Província
2007 (Marzoli, 2007) 2018

Fonte: Magalhães, T. 2018. Inventário Florestal Nacional (National


25
Forest Inventory). Direcção Nacional de Florestas, Ministério da Terra,
Ambiente e Desenvolvimento Rural. Maputo, Moçambique. 118pp.

0
Da mesma forma, o setor pesqueiro –que fornece 77 79 81 83 85 87 89 91 93 95 97 99 01 03 05 07 09 11 13
19 19 19 19 19 19 19 19 19 19 19 19 20 20 20 20 20 20 20
meios de subsistência para cerca de 60 por cento Ano

da população costeira– registou uma diminuição de Fonte: Instituto Nacional de Investigação Pesqueira. 2016. Estado
de Exploração dos Recursos Pesqueiros de Moçambique 2014–2015.
cerca de 30 por cento na capacidade de captura nos www.iip.gov.mz/images/pdfs/eerp/eerp2016.pdf
últimos 25 anos (ver figura n°13) (Raro, sem data),
causado principalmente pela sobrepesca e técnicas Motores principais
de pesca destrutivas.
Além do esgotamento das florestas e dos ecossis-
O setor pesqueiro poderia se tornar uma fonte de temas marinhos, a aceleração da degradação do
renda e emprego ainda mais importante, além de solo é uma questão muito significativa que afeta a
contribuir para melhorar a alimentação das famí- sustentabilidade. Entre 2000 e 2016, mais de um
lias, fornecendo proteína relativamente barata na quarto (25,3 por cento) da terra em Moçambique
forma de peixe. No entanto, o setor pesqueiro –e a (equivalente a 2,49 milhões de hectares) mostrou
saúde dos ecossistemas oceânicos de Moçambique uma diminuição acentuada na produtividade
(economia azul)– não estão apenas ameaçados do solo, conforme medido pelas diminuições do
pela sobreexploração, mas também enfrentarão Índice de vegetação por diferença normalizada
novos desafios na próxima década. Espera-se que (IVDN) (figura n°14, figura n°15) (Monfort et al.,
as receitas das indústrias extrativas, especialmente 2020). Isso resulta em rendimentos mais baixos,
a exploração de gás offshore, cresçam substancial- resiliência reduzida das comunidades rurais e
mente. Embora tenham o potencial de transformar perdas econômicas, e pode ser remontado desde
a economia, a expansão industrial e os corredores as práticas agrícolas insustentáveis, como o mono-
de transporte marítimos serão um desafio para o cultivo de milho, que prejudica a saúde do solo e
frágil ambiente costeiro (World Bank, 2020). reduz a produtividade futura.
© credits

26
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Figura n°14. Mudança anual na produtividade da terra Figura n°15. Distribuição espacial dos principais fatores de
queda da produtividade da terra

CABO CABO
DELGADO DELGADO
NIASSA NIASSA

TETE TETE

NAMPULA NAMPULA

ZAMBEZIA ZAMBEZIA

MANICA MANICA

SOFALA SOFALA

GAZA GAZA

INHAMBANE INHAMBANE

MAPUTO

MAPUTO Províncias
Áreas de conservação
Fatores potenciais de diminuição da produtividade da terra (2000–2016)

Províncias Clima + humano


Clima
Produtividade anual da terra (2000–2016)
Desmatamento
Diminuição Degradação florestal
Aumento Queda da produtividade agrícola
Inalterado Queda de produtividade das pastagens
Degradação ou desmatamento de manguezais
Expansão ou adensamento urbano
Fonte: Adaptado de Montfort et al., (2020): Montfort, F., Bégué, Outros (múltiplos fatores indiferenciados)
Tendência de mudança insignificante
A., Leroux, L., Blanc, L., Gond, V., Cambule, A.H., Remane, I.A.D.,
Grinand, C., 2020. From land productivity trends to land degradation
assessment in Mozambique: Effects of climate, human activities and Fonte: As áreas de conservação foram obtidas de: UNEP-WCMC and
stakeholder definitions. Land Degrad Dev.; 32: 49– 65. https://doi. IUCN (2022), Protected Planet: The World Database on Protected
org/10.1002/ldr.3704. Os limites e nomes mostrados e as designações Areas (WDPA) and World Database on Other Effective Area-based
usadas neste mapa não implicam em endosso ou aceitação oficial pelas Conservation Measures (WD-OECM) [Online], Março 2022, Cambridge,
Nações Unidas. UK: UNEP-WCMC and IUCN. Disponível em: www.protectedplanet.net.

27
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

Os recursos naturais também estão ameaçados degradação dos recursos naturais e a perda de
pelo rápido crescimento populacional e pela biodiversidade são as mudanças climáticas (secas,
exploração em larga escala de madeira, incluindo ciclones, tempestades tropicais, etc.) (figura n°16),
madeira associada à sua extração ilegal (EIA, 2021). incêndios descontrolados, produção de carvão para
Além disso, outros fatores-chave que aceleram a combustível e agricultura itinerante (CIMMYT, 2019).

Figura n°16. Frequência de eventos climáticos adversos 1980–2020

7
Número de eventos

0
75

80

85

90

95

00

05

10

15

20
19

19

19

19

19

20

20

20

20

20
Anos

Secas Inundações Ciclones tropicais Epidemias

Fonte: República de Moçambique, Conselho de Ministros (2017). Plano Director para a Redução do Risco de Desastres 2017–2030.
www.preventionweb.net/files/64564_planodirectorparareducaodoriscodede.pdf

As mudanças climáticas e o crescimento e exportação ilegal de recursos florestais, com


populacional são importantes contribuintes para mais de 90 por cento do produto destinado à
a degradação dos recursos naturais, juntamente China (Macqueen et al., 2018), em um mercado
com as dinâmicas estruturais que permitiram a dominado principalmente por pequenas empresas
sobreexploração e o esgotamento desenfreado onde a informalidade prospera.
dos recursos. Por exemplo, a capacidade do
governo de fazer cumprir a legislação existente Nos recursos marinhos, a pesca ilegal ao longo dos
de gestão de recursos naturais tem sido mais de 2 500 km de costa do país tem um impacto
desigual à tarefa de conter a extração ilegal de muito elevado nos peixes demersais (peixes de
madeira e a exploração de recursos marinhos. fundo), camarões de águas rasas, peixes de linha e
O governo também não foi capaz de garantir a lagostas de águas profundas. A pesca ilegal envolve
implementação e o cumprimento de regulamentos pescadores licenciados que violam as regras sobre
sobre projetos de investimento de grande escala tamanhos de captura, bem como indivíduos,
na agricultura, produção de biocombustíveis, grupos ou empresas que transportam espécies
exploração de madeira e plantações florestais. Na para as quais eles não são licenciados (FCWC,
extração de madeira, por exemplo, as medidas não 2019). A falta de gestão marinha e o aumento do
conseguiram impedir o aumento da exploração número de pescadores artesanais e comerciais são
© credits

28
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

parcialmente culpados por esta sobreexploração, ○ Fortalecer as práticas de gestão comunitária de


mas uma preocupação particular é a pesca ilegal recursos hídricos, florestas e biodiversidade,
generalizada por frotas de pesca estrangeiras (The em combinação com o apoio a sistemas agrícolas
New Humanitarian, 2008). Para além do impacto nas sustentáveis. Ações específicas podem incluir
unidades populacionais de peixe e na sustentabili- a exploração de oportunidades para sistemas
dade do recurso, Moçambique perde anualmente de produção agroecológica e para práticas e
cerca de 56 milhões de dólares em receitas fiscais tecnologias agrícolas inteligentes em relação ao
devido à pesca ilegal (FCWC, 2019). clima (ver Questões-chave de sustentabilidade
n°1 e n°2). Esses esforços podem ser combinados
Impactos na economia e na sociedade com a transferência dos direitos do uso da terra, o
fortalecimento das organizações comunitárias e a
É notório que as comunidades agrícolas e pesquei- garantia de agregação de valor em nível local, por
ras locais sofrem mais com a degradação da terra exemplo, para a madeira, produtos florestais não
e o esgotamento dos recursos naturais, e a ausên- madeireiros e peixes.
cia de mecanismos de responsabilização exigíveis
significa que há pouca pressão ou incentivo para Essas alavancas contribuiriam para harmonizar
garantir práticas sustentáveis de gestão de recur- a implementação de políticas e regulamentações
sos, inclusive pelo setor privado. destinadas a reduzir a sobreexploração dos
recursos naturais, ao mesmo tempo em que
Práticas agrícolas insustentáveis, sobreexploração contribuiriam para o emprego e integração dos
de recursos naturais –e a correspondente perda de produtores rurais nas cadeias de valor locais e
resiliência em ecossistemas, como fertilidade do solo nos sistemas agroalimentares.
e biodiversidade– prejudicam a sustentabilidade
dos sistemas alimentares e da renda, aumentando Riscos e barreiras
a probabilidade de pobreza, insegurança alimentar,
instabilidade socioeconômica, conflito e migração. As maiores barreiras se concentram no
compromisso político com a organização
Identificação de alavancas sistêmicas dos sistemas de governança institucional e a
responsabilização na implementação de políticas
As principais alavancas para lidar com a sobreex- e regulamentações de recursos naturais. Seria
ploração e o esgotamento dos recursos naturais essencial garantir esse compromisso e disposição
estão alinhadas com a necessidade de um sistema para adaptar as políticas de gestão de recursos
de governança de recursos baseado em políticas naturais e reorganizar os sistemas de governança
e estratégias intersetoriais. Também é necessário e projetar mecanismos de responsabilização,
gerar informações baseadas em evidências para contando com princípios comunitários para a
melhor engajar os diversos atores da cadeia de gestão desses recursos. Além disso, os planos
gestão dos recursos naturais. As duas alavancas a integrados de gestão do uso da terra ainda
seguir podem ser eficazes: estão subdesenvolvidos e falta a infraestrutura
necessária (por exemplo, sistemas de irrigação,
○ Fortalecer os mecanismos de governança de recur- eletricidade, processamento e capacidade técnica)
sos naturais nos níveis provincial e distrital para para o desenvolvimento sustentável de sistemas
facilitar a implementação de instrumentos regulató- agroalimentares mais resilientes. Finalmente,
rios que lidam com a sobreexploração (como leis de a limitada disponibilidade de fundos para
conservação, ferramentas para impedir o tráfico ilegal financiar a implementação e monitoramento dos
de vida selvagem e madeira, pesca ilegal e incêndios diversos instrumentos regulatórios aprovados
florestais descontrolados), bem como práticas agríco- como estratégias nacionais de desenvolvimento
las insustentáveis. também é uma barreira.

29
©
© credits
Stevie Mann/ILRI (CC BY-NC-ND 2.0)

30
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Questão-chave de sustentabilidade n°4: Por que tais diferenças regionais permanecem


no desenvolvimento de sistemas alimentares em Moçambique?

Os sistemas alimentares são caracterizados por Uma representação esquemática (figura n°17)
disparidades socioeconômicas e geográficas mostra as ligações entre os motores
entre as regiões Norte, Centro e Sul. O Sul identificados e os impactos relacionados
apresenta uma concentração de capital com as diferenças regionais nos sistemas
econômico, institucional e intelectual, mas seus alimentares em Moçambique.
solos pobres e chuvas irregulares limitam a
produção agrícola. As regiões Norte e Centro têm Moçambique é um dos países mais pobres
uma enorme capacidade de produção agrícola, do mundo, com rendimento per capita de
mas a disfuncionalidade governamental limita cerca de USD 460 por ano (World Bank,
o crescimento do setor agroalimentar, que é 2021b). Essa baixa renda, aliada à crescente
maioritariamente composto por pequenos desigualdade entre as diversas classes
produtores. A política econômica de longo prazo sociais e regiões, caracteriza uma situação
tem favorecido investimentos em agroindústria socioeconômica que representa um grande
em grande escala e exportações de combustíveis desafio ao desenvolvimento inclusivo e
fósseis, em vez de apoiar a produtividade agrícola. integrado (figura n°18).

Figura n°17. Representação sistemática da Questão-chave de sustentabilidade n°4

Fraco Ineficiências na
Pouca cobertura de Infraestrutura Dispersão populacional
desenvolvimento alocação de recursos
serviços públicos pouco (baixa densidade por km2)
do setor produtivo (viés político/regional)
essenciais desenvolvida
local

Acesso limitado ao
Assimetrias no Aumento da desigualdade econômica entre as capital para
acesso à informação regiões, dentro das regiões e nos centros urbanos investimento local
• 52% da população sem eletricidade;
12% da população urbana sem água potável
(51% da população rural)
• 60% da população excluída dos serviços financeiros
Falta de incentivos ao Prestação
• Baixa densidade rodoviária (37/1 000 km2
investimento privado inadequada de
da área do território nacional)
nas zonas rurais serviços básicos
• 40% de cobertura da rede telefônica (celular)

Altos níveis de pobreza nas


Altos níveis de áreas rurais e urbanas
Fraca capacidade Dependência de
desemprego
competitiva nos importação dos principais
mercados regionais bens e produtos Aumento da migração
rural–urbana e desigualdades
inter-regionais

Fonte: Autores.

A desigualdade socioeconômica vem enquanto o décimo mais rico representava


aumentando nas últimas décadas devido ao 45,5 por cento da renda nacional total
modelo de governança e desenvolvimento (World Bank, 2021d). E enquanto a capital e a
escolhido. As taxas de pobreza total em 2014 Província de Maputo no Sul registaram grandes
mostravam 63,7 por cento da população diminuições na taxa de pobreza nas últimas
vivendo com menos de USD 1,90 por dia, décadas, a taxa manteve-se muito elevada nas

31
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

províncias do Centro e Norte, representadas O produto interno bruto (PIB) gerado pela
na figura n°18 pela Zambézia e Nampula, região Sul do país é, além disso, metade do
respetivamente (ver também figura n°19). total nacional (OMR, 2021).

Figura n°18. Evolução da taxa de pobreza por região (desde 1996-1997)

100
0
10

90

.6
83
80

.3
82
70

60

50

40

.8
28
30

.6
20

24
10

0
7

5
99

00

00

01
–1

–2

–2

–2
96

02

08

14
19

20

20

20
Nampula Zampezia Maputo province Maputo City

Nota: O eixo Y é um índice para a taxa de pobreza (1996-1997 = 100). Fonte: Mozambican Ministry of Economy and Finance, cited in Baez, J. E.
and Olinto, P. 2016. Accelerating Poverty Reduction in Mozambique : Challenges and Opportunities. World Bank Group, Washington, DC. https://www.
worldbank.org/en/country/mozambique/publication/accelerating- poverty-reduction-in-mozambique-challenges-and-opportunities

Motores principais particular nas regiões Norte e Centro —as


províncias com maior potencial agrícola. Além
A disfuncionalidade dos sistemas de disso, as comunidades costeiras geralmente
governação em matéria de ordenamento apresentam níveis de desenvolvimento
do território, a falta de acesso aos serviços significativamente mais altos em comparação
financeiros e às tecnologias de comunicação com as do interior, onde há níveis mais baixos
e informação limitam o crescimento e a de infraestrutura básica, como eletricidade
competitividade do setor agroalimentar, em (figuras n°19 e n°20).
© Marcos Villalta (CC BY-NC-ND 2.0)

32
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Figura n°19. Incidência da pobreza em Moçambique Figura n°20. Penetração da rede de distribuição elétrica

G O
O
EL B
AD
D CA

G O
O
EL AB
AD
C
A
SS

A
SS

D
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IA
N

N
LA
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TE

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FA

ZA
AN

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E
N
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A

BA
AZ

AM

AM
G

AZ
H

H
G
IN

IN
TO

TO
U
AP

U
M

AP
M

Províncias

Linhas de transmissão de energia


Províncias Média
Incidência da pobreza Alta
Menos de 20% Centrais hidroeléctricas (MW)
De 20% a 50% 10 – 100
De 50% a 60% > 100
De 60% a 70% Centrais térmicas (MW)
10 – 100

Fonte: Adaptado de AfDB (2018): AfDB. 2018. Mozambique Country


Strategy Paper 2018-2022: Supporting Mozambique towards the
High5s. Disponível em: https://www.afdb.org/fileadmin/uploads/afdb/
Documents/Boards-Documents/MOZAMBIQUE_-_CSP_2018-2022__ Fonte: Autore (2022). Power plants and electricity transmission net-
Final_.pdf. Os limites e nomes mostrados e as designações usadas nes- works data were obtained from: EnergyData.info. Os limites e nomes
te mapa não implicam em endosso ou aceitação oficial pelas Nações mostrados e as designações usadas neste mapa não implicam em
Unidas. endosso ou aceitação oficial pelas Nações Unidas.

33
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

Tabela n°7. Estabelecimentos agrícolas cujos membros caju, algodão, açúcar, copra e chá e incluindo
tiveram acesso a serviços bancários e financeiros, algumas ligações estabelecidas com indústrias
pequenas e médias propriedades de processamento básico, mas negligenciando o
desenvolvimento de um forte setor agroalimentar
Possui uma conta Utiliza conta de
Província (Carrilho et al., 2021; Weimer e Carrilho, 2017).
bancária (%) celular (%)

Niassa 11,3 3,1 O modelo de desenvolvimento adotado nas


Cabo Delgado 13,3 2,5 últimas décadas reforçou essas tendências
com investimentos direcionados à produção
Nampula 7 2,1
agrícola em grande escala (principalmente para
Zambézia 5,9 2,7
biocombustíveis) —o programa ProSAVANA
Tete 7,8 1,7 sendo o mais proeminente— e projetos de
Manica 17,2 2,6
desenvolvimento de combustíveis fósseis (gás)
voltados para mercados de exportação. Embora
Sofala 23,2 4,3
essa abordagem à agricultura tenha se tornado
Inhambane 24,8 5,6 um pouco menos evidente nos últimos dez anos
Gaza 20,7 4,3 (Di Matteo e Schoneveld, 2016), a parcela do
orçamento do Estado alocada para alimentação e
Província de Maputo 57 18,6
agricultura tem sido consistentemente baixa, em
Moçambique 15,0 3,8 aproximadamente 4 por cento no período entre
Fonte: Ministry of Agriculture and Rural Development, Directorate 2004 e 2018. Também fluiu mais para o Sul —onde
of Planning and Policies. 2021. Integrated Agricultural Survey: Statistical se concentra o poder político e econômico— do
Framework, Maputo, Moçambique. https://www.agricultura.gov.mz/ que para as regiões Centro e Norte (Pernechele
wp-content/uploads/2021/06/MADER_Inquerito_Agrario_2020.pdf
et al., 2021). Embora os gastos tenham sido
A economia política de Moçambique tem sido insuficientemente direcionados aos produtores
caracterizada por um alto grau de centralização familiares de pequena escala, também não foram
política, uma alta dependência do capital estran- usados para gerar novas oportunidades de
geiro principalmente interessado na produção de emprego e nem melhores serviços, por exemplo
culturas de rendimento e combustíveis fósseis para em serviços de apoio agrícola, bancário ou
exportação, um baixo nível de organização coletiva financeiro (tabela n°7) (Deininger e Xia, 2016).
das comunidades rurais e pequenos produtores,
e conflitos recorrentes nas regiões Centro e Norte. As razões para a adoção desse modelo de
Com a independência em 1975 e após a guerra civil desenvolvimento podem ser atribuídas à excessiva
de 1977 a 1992, Moçambique herdou uma econo- centralização do poder decisório e político (Carrilho
mia distorcida caracterizada por: et al., 2021), bem como à alta dependência de
investimentos estrangeiros, à relativa debilidade da
○ Fraca integração econômica com os países vizinhos, sociedade civil e das cooperativas de agricultores,
onde Moçambique fornecia essencialmente mão- a falta de infraestrutura produtiva e a concorrência
de-obra migrante (por exemplo, para as minas na da produção de cereais sul-africana (Sitko et al.,
África do Sul) ao mesmo tempo em que prestava 2017). Assim, os desenvolvimentos regionais e o
serviços de transporte (por exemplo, ferrovias) aos desempenho dos sistemas alimentares locais e
países vizinhos para exportar produtos através dos nacionais foram influenciados negativamente pelo
seus portos. foco em um sistema agroalimentar agroindustrial
e exportador, bem como pela instabilidade política
○ Bases econômicas limitadas, principalmente e violência, resultantes dos desafios colocados à
para a produção e exportação de castanha de legitimidade do Estado.

34
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

Impactos na economia e na sociedade Identificação de alavancas sistêmicas

As desigualdades econômicas entre as regiões de O apoio contínuo à descentralização será funda-


Moçambique foram exacerbadas por políticas con- mental para mitigar o impacto negativo dos sis-
centradas em intervenções na região Sul e, embora temas alimentares orientados para a exportação,
o governo tenha feito esforços para mitigar o numa perspetiva de desenvolvimento territorial.
desenvolvimento territorial desequilibrado através
de reformas do setor público e de um processo Potenciais alavancas sistêmicas procurarão:
de descentralização, a política geral sofreu com a
falta de coerência. Permanecem as desigualdades ○ Fortalecer os mecanismos de governança territorial
socioeconômicas e espaciais, como se observa no para mobilizar financiamento público para infraestru-
acesso precário aos serviços de saúde, na valori- tura rural estratégica e serviços básicos (estradas, ele-
zação limitada do potencial agrícola local diante tricidade, água e saneamento, educação e saúde) para
da falta de um setor produtivo local, e da reduzida atrair investimentos privados (especificamente para
competitividade nos mercados locais e regionais. zonas subdesenvolvidas nas regiões Norte e Centro).
Essas desigualdades exacerbam a pobreza rural,
desencadeando tensões políticas e processos ○ Fomentar e promover investimentos em sistemas
de migração urbana. Recentemente, os sistemas alimentares locais sustentáveis que aumentem a
alimentares também têm estado sujeitos a riscos disponibilidade de alimentos nutritivos e melhorem
e impactos associados à pandemia de covid-19, os meios de subsistência rurais enquanto aumentam
como a limitação da circulação de produtos e pes- a resiliência das comunidades aos choques relaciona-
soas a nível nacional e internacional e interrupções dos ao clima. Os alvos principais seriam as comunida-
nos programas educacionais, aumento do desem- des rurais, incluindo pescadores, mulheres e jovens, e
prego e diminuição da renda (IOM, 2020). cidades intermediárias. As políticas devem, portanto,
© Marcos Villalta/Save the Children (CC BY-NC-ND 2.0)

35
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

também apoiar a transformação da agricultura fami- Riscos e barreiras


liar em unidades comerciais. Para que isso acon-
teça, as políticas devem, por exemplo, promover a Os riscos incluem instituições públicas
integração de pequenos agricultores em cadeias de frágeis e disfuncionais, incluindo
valor diversificadas com alto potencial de mercado, estruturas organizacionais e a atribuição
ao mesmo tempo em que fortalecem suas capaci- de responsabilidades nos vários
dades (por exemplo, por meio de organizações de níveis de governança. Falta também
produtores aprimoradas). Isso permitiria que eles inovação e conhecimento para a
participassem e negociassem sua integração nas implantação de tecnologias adequadas
cadeias de abastecimento locais de forma a aumen- ao desenvolvimento dos sistemas
tar sua renda e melhorar as condições de vida (ver alimentares, que promovam vantagens
Questão-chave de sustentabilidade n°2). competitivas a nível regional.

Potencial para a transformação dos sistemas alimentares

Moçambique tem potencial para transformar os Outros elementos e atores nos subsistemas
seus sistemas alimentares, mesmo enfrentando alimentares, como cadeias de abastecimento,
novos desafios nos próximos anos para garantir ambientes alimentares e comportamento do
a segurança alimentar e uma melhor nutrição, consumidor, também podem ajudar a abordar
melhores meios de subsistência e oportunidades fatores como mudanças climáticas, urbanização,
para as pessoas em todas as suas regiões. A globalização, liberalização do comércio,
sustentabilidade ambiental também apresentará crescimento e distribuição de renda, contexto
maiores desafios à medida que o país busca sociocultural, liderança e políticas.
expandir sua economia por meio do aumento das
receitas das indústrias extrativas. Além disso, também são necessários investimen-
tos em infraestrutura básica, como abastecimento
Melhorar o acesso a terras férteis e aráveis, de água potável, eletricidade e irrigação, assim
investir em infraestrutura básica, coordenar como a melhoria do acesso aos serviços de saúde
políticas e abordagens coerentes e tomar medidas e, igualmente importante, a necessidade de paz e
para restaurar a paz contribuiriam para melhorar segurança. As partes interessadas no processo de
a sustentabilidade dos sistemas alimentares. A consulta dos sistemas alimentares também iden-
transformação inclusiva também exigiria um maior tificaram o potencial dos investimentos públicos e
empoderamento de mulheres e jovens, além de privados nas cadeias de abastecimento alimentar
ampliar o acesso a tecnologias e inovação. como uma alavanca importante.

Uma abordagem sistêmica traria a necessária O atual Programa quinquenal do Governo (PQG
alavancagem da agricultura, como base da 2020–2024), que se traduz em planos econômicos
disponibilidade alimentar, dado o alcance da e sociais anuais nacionais e territoriais, vê como
produção agrícola nas regiões Centro e Norte prioridades aumentar a produção agrícola,
e a produção pecuária na região Sul, com uma investir em infraestrutura econômica e social,
proporção relativamente pequena de terras férteis fortalecer a pesca e a aquicultura, e mitigar
e aráveis atualmente em cultivo. A silvicultura, a as mudanças climáticas (Ministério da terra,
pesca e a aquicultura também têm abrangência ambiente e desenvolvimento rural, República de
em todo o país. Moçambique, 2020).
© credits

36
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES
© Jeffrey Barbee. Reuters Foundation/Rice plot (CC BY-NC-ND 2.0)

Embora esses pilares apoiem a transformação dos de agricultura, saúde, educação, meio ambiente e
sistemas alimentares para se tornarem mais sus- indústrias extrativas. O impacto desejado também
tentáveis, inclusivos e resilientes, seria necessária precisaria de envolvimento em vários níveis de
uma melhor coordenação e integração de políticas ministérios e departamentos administrativos,
e abordagens para o impacto desejado. órgãos regionais, atores do setor privado e ONGs,
bem como produtores e consumidores.
O vasto escopo dos sistemas alimentares oferece
vários pontos de entrada para a transformação As conclusões desta avaliação servem como os
sustentável, entre eles melhorar e diversificar primeiros passos para pensar a transição e as
a produção e a produtividade dos pequenos transformações necessárias para os sistemas
agricultores por meio de práticas sustentáveis, alimentares sustentáveis no país. Mais pesquisas
como agricultura inteligente em clima e ajudarão a detalhar melhor os desafios e seus
nutrição, fortalecimento de cadeias de valor impactos na sustentabilidade dos sistemas
e de pequenas e médias empresas, além de alimentares, bem como refinar as alavancas e
aprimorar a condução de políticas e cooperação ações necessárias para o impacto desejado. As
interministerial, governança e descentralização. inovações institucionais podem ajudar a garantir
que as vozes de todas as partes interessadas,
Em termos práticos, a transformação exigiria especialmente as camadas mais vulneráveis da
uma estreita colaboração entre as partes sociedade, sejam refletidas nos planos e nas
interessadas nas áreas rurais e urbanas, nas áreas atividades.

37
© Jeffrey Barbee/Thomson Reuters Foundation (CC BY-NC-ND 2.0)

© credits

38
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE
PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

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41
ÁFRICA - MOÇAMBIQUE

Para esta nota contribuíram as seguintes pessoas: Lígia Mutemba, António Inguane (consultores nacionais),
Alexandre Hobeika (CIRAD), Adriano Spinelli, Jacques de Graaf (FAO, consultores internacionais).

Apoio técnico: Juan Sepúlveda Alonso, Meeta Punjabi Mehta e Patrick Herlant (FAO) e Isabel Sitoe (FAO
Moçambique).

Apoio logístico: Julio Rejis (FAO, consultor internacional)

Edição e formatação: Rex Merrifield, Paul Nagle, Guilherme Coscarella, Antonio de la Fuente e Polly Butowsky.
© credits

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© J Barbee/Thomson Reuters Foundation (CC BY-NC-ND 2.0)

PERFIL DE SISTEMAS ALIMENTARES

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CC0498PT/1/06.22

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