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XX Jornadas sobre Alternativas Religiosas na América Latina

9 a 13 de agosto de 2022 IFCS/UFRJ - Rio de Janeiro - RJ

GT 06: Espiritualidades ecológicas, religiões verdes: correntezas


analíticas de uma questão premente

O esverdeamento do catolicismo brasileiro: da Campanha da


Fraternidade de 1979 ao Sínodo da Amazônia

Renan William dos Santos


(USP/FFLCH)
(FAPESP- 17/24842-1)
Resumo
Em seu núcleo duro, no Vaticano, a Igreja Católica começou a tratar da pauta ecológica
em 1970, sobretudo para se contrapor às propostas de controle de natalidade em voga
à época. A Igreja Católica no Brasil, por sua vez, foi uma das primeiras a incorporar o
tema em suas discussões nacionais, incluindo-o como pauta central da Campanha da
Fraternidade “Preserve o que é de todos” (1979). Em vez de discussões sobre
natalidade, predominaram em terras brasileiras, nesse período, enquadramentos
religiosos da questão ambiental que enfatizavam a luta por justiça social. Diversos
fatores moldaram o subsequente desenvolvimento e, de certa forma, a hibernação
dessa ecologia católica brasileira. Dentre eles, a marginalização da teologia da
libertação, o afastamento de Leonardo Boff e o caráter mais conservador dos papados
de João Paulo II e Bento XVI. Porém, com a ascensão do papa Francisco, a estrutura
de oportunidades mostrou-se novamente aberta às “vozes do Sul” nas discussões
ambientais, como ilustra o recente Sínodo da Amazônia. Este trabalho busca mapear
sociologicamente essas transformações, relacionando-as com a dinâmica interna do
campo religioso e com o contexto social mais amplo.

Palavras-chave

Esverdeamento do catolicismo; Igreja Católica e ecologia; Ambientalismo religioso;


Ecoteologia católica no Brasil; Estratégias institucionais.

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Introdução

Este trabalho tem como objetivo analisar sociologicamente o “esverdeamento” do


catolicismo, isto é, a progressiva incorporação da pauta ecológica pela Igreja Católica
no Brasil, partindo da Campanha da Fraternidade “Preserve o que é de todos”, ocorrida
em 1979, até os dias atuais, marcados pelo papel significativo exercido pelos sacerdotes
brasileiros no Sínodo da Amazônia, ocorrido no ano de 2019. Em trabalhos anteriores,
delineei alguns dos principais aspectos da ecologia católica a partir de seu núcleo duro,
isto é, os discursos oficiais que circulam no Vaticano (SANTOS, 2016; 2017; 2019). Em
síntese, nas derivações feitas por esse círculo oficial, o pressuposto afirmado a todo
momento é o de que a crise ambiental “é um problema moral, é um problema
relacionado ao comportamento humano, que demanda muito mais do que a mera
expansão de proteções legais ao meio ambiente” (SANTOS, 2019, p. 91).
Aqui a ideia é usar esses achados como contraponto às características da
ecoteologia católica que se destacaram no contexto brasileiro ao longo das últimas
décadas. Mais do que delinear essas características, a intenção é entender suas
transformações de forma relacional. A análise envolve, ainda, não só as disputas,
hierarquias e correntes de pensamento oriundas do próprio campo católico, mas
também os embates, apropriações e vínculos com redes sociais extrarreligiosas,
sobretudo aquelas que foram acionadas no contexto atual, como a controvérsia entre a
Igreja Católica e o governo brasileiro acerca do Sínodo da Amazônia.

Materiais e métodos

O mapeamento proposto se vale de categorias teóricas e dados oriundos tanto de minha


pesquisa de mestrado já concluída (SANTOS, 2017) quanto da pesquisa de doutorado
em andamento. A primeira parte engloba o levantamento de discursos (textos
pontifícios, conferências, homilias, encíclicas, compêndios doutrinários etc.) sobre
ecologia hospedados no site do Vaticano. A segunda, que foca o contexto brasileiro,
envolveu a análise qualitativa dos manuais (nos quais constam as reflexões e atividades
propostas) das Campanhas da Fraternidade que trataram da questão ambiental no
Brasil: CF-1979 (“Preserve o que é de todos”); CF-2011 (“Fraternidade e a vida no
planeta”); CF-2016 (“Casa comum, nossa responsabilidade”); CF-2017 (“Cultivar e
guardar a criação”). Além desses manuais, foram objeto de análise as seguintes
publicações que registram discussões sobre o meio ambiente também logradas no
âmbito de influência da Conferência Nacional dos Bispos Brasileiros (CNBB): A Igreja e
a questão ecológica (CNBB, 1992); Profecia da terra (CNBB, 2009); Documento de
Aparecida (CELAM, 2007); Pastoral da ecologia e do meio ambiente (PEREIRA &

3
BORBA, 2016). Por fim, também foram examinados alguns dos documentos produzidos
durante o Sínodo da Amazônia (SÍNODO DOS BISPOS, 2018, 2019a, 2019b;
FRANCISCO, 2020) e publicações emblemáticas dos movimentos religiosos
antiambientalistas, como o livro Psicose ambientalista (BRAGANÇA, 2012).
A análise desses materiais foi feita com base numa tipologia de ambientalismos
desenvolvida em trabalhos anteriores (SANTOS, 2017 e 2019) e complementada com
a tipologia elaborada por Kearns (2016). Dessa forma, o esquema tipológico
compreende: 1) o ambientalismo esotérico (ou místico), que assume que os problemas
ambientais se originam em desequilíbrios místicos, energias negativas que surgiram da
falha da humanidade em se comunicar com a natureza e seguir sua harmonia; 2) o
ambientalismo racionalista (ou pragmático), que se assenta em bases científicas e
dados objetivos provenientes de diversas áreas acadêmicas – como ecologia, geografia,
economia, química e biologia –, assumindo que os problemas ambientais têm causas e
soluções estritamente materiais, sobretudo relacionadas a uma melhor gestão de
recursos; 3) o ambientalismo moralista (ou valorativo), o qual sustenta que os problemas
ambientais são problemas morais, ou seja, é por causa da degradação de valores que
os diversos “ambientes” (o corpo, a família, a sociedade, a floresta, o ecossistema e
assim em diante) estão se degradando. Esse último tipo pode ser dividido em dois
subtipos: a) o intramundano, no qual o planeta em si mesmo é transformado num
portador de direitos, passível de injúrias das mais diversas, mas sem referências
metafísicas; b) o extramundano, no qual o planeta seria posse de um ser superior que,
como um mandamento religioso, uma lei divina, confiou o seu cuidado a nós.
Já os subtipos elaborados por Kearns (2016: 55-6) entraram como subdivisões
do Ambientalismo moralista extramundano, abarcando as éticas da “zeladoria”1, da
“ecojustiça” e a “espiritualidade da criação”. A ética da zeladoria afirma que o
mandamento da dominação foi mal interpretado ao longo da história do cristianismo,
uma vez que o plano original de Deus não significaria uma licença para a destruição,
mas sim uma delegação de poder que deveria ser exercida responsavelmente. A ética
da ecojustiça, por sua vez, fundamenta-se no dever cristão de cuidar dos pobres e
marginalizados, conectando essa obrigação à perspectiva ecológica, pois a degradação
ambiental afetaria, em primeiro lugar, os mais vulneráveis da sociedade. Finalmente, a
espiritualidade da criação (ou ecoespiritualidade) concentra-se em mitigar o

1 O termo “stewardship” é de difícil tradução. Seu significado desdobrado é algo próximo de


“gerenciamento responsável”. Nos escritos ecoteológicos brasileiros, costuma-se traduzir
“stewardship” para “mordomia” ou “zeladoria” para transmitir a ideia de que o ser humano ocupa
o papel de mordomo ou zelador da natureza, ou seja, é um empregado, um administrador, e não
o seu dono.

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antropocentrismo típico da cosmovisão cristã, propondo que a criação como um todo
configura uma grande corrente ou comunidade cósmica, na qual o ser humano é apenas
um elemento, cada elo tem um papel sagrado, e o foco da prática religiosa muda da
categoria “redenção” para a de “contemplação”.

A predominância do viés social nas primeiras discussões ecoteológicas católicas


em solo brasileiro

O pioneirismo das discussões ecoteológicas no Brasil teve como figura principal o então
frade Leonardo Boff. Já em 1975, Boff foi o responsável por defender Francisco de Assis
como modelo para o nascente engajamento ecológico da Igreja Católica (BOFF, 1975).
A ideia ganhou força na CF-1979, que utilizou amplamente a figura de São Francisco
como símbolo da proposta ambientalista católica, a qual se propunha como mais
“profunda” do que os “modismos” e os movimentos ecologistas então em curso (CNBB,
19782: 93-4).
No manual da CF-1979, vários trechos sinalizam um alinhamento com o
ambientalismo moralista e, dentro desse, com a perspectiva da ecojustiça, ainda que
conjugada com diretrizes mais “contemplativas”. Antecipando o estranhamento que a
abordagem do tema ambiental poderia causar, o manual já explica, em seu início, como
esse tema e a ação evangelizadora da Igreja estariam conectados. Nesse ponto, fica
explícito o pressuposto de que a degradação ambiental está conectada a uma
degradação de origem moral:

Não faltará quem pergunte: Por que a Igreja irá tratar da Ecologia, da poluição, da
preservação da natureza e do meio ambiente? A resposta não deveria deixar
dúvidas: é simplesmente porque o mundo entrou num processo acelerado de
desumanização que torna cada vez mais difícil a missão cristã de evangelizar
(CNBB, 1978, p. 10).
Contudo, diferentemente dos enquadramentos propostos pelo Vaticano à época
(SANTOS, 2019), na perspectiva que será elaborada ao longo do manual, a “poluição
moral” que causa a referida desumanização não tem a ver com práticas como uso de
contraceptivos, consumo de pornografia, eutanásia etc., mas sim com injustiças sociais.
O documento afirma, por exemplo, que “estão bem errados os que acham que a luta
pela ‘libertação ecológica’ é algo acidental e que desvia, distrai da luta principal, a
‘libertação do pobre’” (CNBB, 1978, p. 85). As duas coisas estariam conectadas, e o
modelo para reconciliar essas duas lutas estaria não só na Bíblia, mas nos modos de
vida das populações tradicionais: “o jeito de viver do povo da Bíblia é diferente do jeito
de viver que hoje produz o desmatamento e a especulação imobiliária. O jeito de viver

2Para evitar confusões, cabe registrar que, em geral, os manuais das CF’s são lançados no ano
anterior às Campanhas.

5
do povo da Bíblia é muito semelhante ao do índio e do caboclo” (CNBB, 1978, p. 113).
Há espaço, ainda, para proposições de tipo mais contemplativas, alinhadas com a ética
da espiritualidade: “A terra e as criaturas não humanas têm valor intrínseco em si
mesmas [...]. Daí que além, muito além do ‘uso das coisas’ para sustento, confronto,
prazer do homem, há a necessidade de contemplar, acarinhar, preservar’, cada criatura”
(CNBB, 1978, p. 88).
Tanto a influência teológica de Boff como o equilíbrio de forças no interior da
Igreja Católica no Brasil (à época, mais permeável às chamadas “correntes
progressistas”), e ainda, o contexto sociopolítico de repressão (eram tempos de
ditadura) confluíram para moldar o caráter singular dessa ecoteologia católica que
nascia no Brasil no final da década de 1970. Singular porque, à mesma época, discursos
ecológicos oriundos do Vaticano demonstravam grande preocupação em evitar
derivações mais esotéricas da ecoteologia e priorizavam a conexão entre a degradação
ambiental e uma suposta degradação moral e comportamental do ser humano (expressa
sobretudo na esfera sexual), ao passo que os discursos ecológicos da Igreja Católica
no Brasil eram mais abertos a enquadramentos esotéricos e direcionavam-se mais à
crítica das injustiças sociais.
Nessa crítica social elaborada pela Igreja Católica brasileira em conexão com a
pauta ambiental, a sociedade moderna, capitalista e industrial, marcada por
desigualdades e opressões, passou a ser intrinsecamente identificada com a crise
ambiental ao mesmo tempo em que os oprimidos, isto é, figuras marginalizadas como
índios, trabalhadores, negros, seringueiros etc., personificavam os ícones da futura
revolução que deveria ser tanto social quanto ecológica (COSTA, 2015a e 2015b).
O foco na moral individual expresso nas discussões ecoteológicas vaticanas, por
sua vez, era derivado de uma associação entre a secularização (o avanço de uma
modernidade alheia aos constrangimentos éticos-religiosos pregados pelo catolicismo)
e o surgimento da crise ecológica. Tais discursos, vale ressaltar, não chegam nunca a
ponto de negar a legitimidade da preocupação com os problemas físicos advindos da
degradação ambiental, muito menos contestam sua realidade. Ocorre que mesmo esse
“aspecto material”, de gestão de recursos, também é transformado em uma questão
moral: “o respeito pelo meio ambiente natural e o uso correto e moderado dos recursos
da criação são uma parte, dentre outras, das obrigações morais de cada um” (JOÃO
PAULO II, 1993, p. 2, §3, tradução minha). Ou seja, não se trata de fazer o que é
racional, o que é útil, como seria em um ambientalismo racionalista, mas de fazer o que
é moralmente correto, o que é “bom” – por isso, trata-se de um ambientalismo moralista.

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Assim, o reconhecimento da importância e legitimidade da preocupação com
bens da natureza é, logo em seguida, na maioria dos casos, contraposto ao que deve
ser a preocupação principal de um católico ecologicamente engajado:

Estou certo de que vocês [...] estão preocupados com a poluição do ar e dos mares,
ou seja, o problema ecológico. Estão indignados com o mau uso dos recursos da
terra e a crescente destruição do meio ambiente. Vocês estão certos. Deve-se agir
de forma coordenada e responsável para mudar esta situação antes que nosso
planeta sofra danos irreversíveis. Mas [...] há também uma poluição das ideias e
dos costumes que também pode levar à destruição do homem (JOÃO PAULO II,
1989a, p. 5-6, §2.2, grifos meus, tradução minha).
Já a insistência dos discursos vaticanos em se opor ao ambientalismo esotérico
derivava de uma defesa da doutrina católica frente àquelas críticas ambientalistas que
colocam os valores cristãos na raiz dos comportamentos que levaram à crise ambiental
(WHITE JR., 1967). Como reconhece o documento elaborado por um dos órgãos
eclesiásticos que examinam as questões doutrinárias católicas, são amplamente
difundidas as ideias de que o cristianismo seria “em parte responsável pela crise
ambiental”, e de que para alcançar uma “sólida ética ecológica” seria preciso “voltar-se
para as religiões asiáticas e tradicionais” (COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL,
2004, § 72). O mesmo documento também admite que certas interpretações da teologia
cristã da criação e da imago Dei levaram “alguns a agirem de modo irresponsável em
face do ambiente natural”, mas isso seria resultado de uma “errônea maneira de
compreender esse ensinamento” (COMISSÃO TEOLÓGICA INTERNACIONAL, 2004,
§ 73). O problema, dessa forma, não estaria na doutrina em si, que coloca o “homem”
(sic, no masculino mesmo), mas no fato de essa doutrina não estar sendo compreendida
corretamente, no sentido de que o lugar privilegiado também significaria gerir
responsavelmente os que estão abaixo — perspectiva essa que, como deve estar claro,
segue na linha da “ética da zeladoria”.

Complexificações derivadas de novos contextos políticos e eclesiais

Com a progressiva marginalização e perseguição institucional da teologia da


libertação nas décadas seguintes no Brasil, a nascente crítica social católica
“esverdeada” acabaria sendo também escamoteada. O tema só voltaria a ser retomado
com alcance nacional no contexto da ECO-92, quando os tempos já eram outros, tanto
dentro da Igreja Católica no Brasil (Boff, por exemplo, já estava na iminência de deixar
o sacerdócio) quanto fora (a democracia voltara a se estabelecer e a Constituição cidadã
acabara de ser promulgada). Nesse novo contexto, ainda é possível identificar vários
enquadramentos da Igreja Católica brasileira que se aproximam do tipo da ecojustiça e
da espiritualidade da criação, porém há uma maior preocupação com a demarcação de

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barreiras políticas (em relação sobretudo ao socialismo) e teológicas (como a oposição
a um possível esoterismo).
Em relação às demarcações de ordem política, isso fica claro, por exemplo, num
trecho de A Igreja e a questão ecológica (1992) em que a crítica ao modelo de
desenvolvimento capitalista é imediatamente seguida de uma crítica ao socialismo
(numa dupla contraposição tipicamente exercitada pela doutrina social da Igreja):

A insustentabilidade social e ambiental do projeto desenvolvimentista vem nos


conduzindo a um impasse [...]. A história, por outro lado, tem demonstrado que
também as experiências de socialismo de Estado não superaram as práticas deste
desenvolvimento predatório, criando graves consequências ambientais [...]. [O]
socialismo de Estado, reproduzindo a lógica produtivista, não inovou em nada em
relação com o meio ambiente (CNBB, 1992, p. 20).
Já em relação às demarcações de ordem teológica, o seguinte trecho do mesmo
documento também é ilustrativo:

Deus não está distante, totalmente transcendente a essa sua criação. Ele habita
nela, na forma do Espírito vivificador. O Espírito tomou morada na criação e
permanece em relação com ela. Não se trata de ressacralizar a natureza. Mas a
natureza deve, a partir daí, ser entendida também como lugar da morada do próprio
Deus (CNBB, 1992, p. 41, grifos meus).
Ou seja, como mostra Boschi (1987, p. 15) ao discutir os influxos da estrutura
política – e o mesmo vale para os movimentos que procuram alterar as estruturas
religiosas –, nesse novo contexto, para não gerar um rompimento que implicaria perder
um aporte institucional fundamental à sua sobrevivência, os movimentos que
encampavam a pauta ecológica no interior do catolicismo precisaram abrir mão, em
certa medida, de seu potencial inovador e ou contestador. Repete-se, dessa forma, a
constatação de que “os católicos progressistas que desejem contribuir para a mudança
da instituição como um todo serão obrigados a fazer concessões no sentido de evitarem
tornar o movimento sectário” (MAINWARING, 2004, p. 17). Isso foi verdade para o
período em que a Igreja Católica brasileira conseguiu manter o ativismo da teologia da
libertação no interior de suas estruturas3, e também é verdade quando se leva em conta
suas iniciativas ecológicas.
Após a efervescência suscitada pela Eco-92, o próximo marco nacional da
ecologia católica brasileira foi a produção do documento conhecido como Profecia da
Terra, elaborado em 2009 pela CNNB. Nele, é possível notar sinais que apontam para
a demarcação de fronteiras mencionada anteriormente. A “sombra” da moldura

3Analisando a dinâmica institucional das comunidades eclesiais de base durante a década de


1970 no Brasil, Mainwaring afirma que, por um bom tempo, “os progressistas não foram
marginalizados dentro da instituição [Igreja Católica] em parte porque evitaram opções sectárias.
Por vezes, eles foram obrigados a acatar os limites impostos pela instituição, porém a opção pela
obediência eclesial e por uma mudança mais lenta permitiu que conquistassem um espaço maior
dentro da Igreja” (2004, p. 195).

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interpretativa defendida Boff continua fortemente presente, sobretudo na maior abertura
ao simbolismo místico-contemplativo e na conexão entre o “grito da Terra e o grito dos
pobres”, isto é, a conexão entre pautas inspiradas na teologia da libertação, pautas
ecológicas e metáforas esotéricas. A Igreja Católica no Brasil, contudo, procurava
incentivar as lutas sociais sem deixar de fazer apontamentos críticos ao socialismo e de
enfatizar que, por exemplo, “Deus é maior que sua criação”:

A crise financeira capitalista atual não se reduz aos desajustes financeiros mundiais
que, sob o pretexto de evitar a quebra da economia mundial, exige dos governos
socorro aos banqueiros, enquanto que aos pobres recaem os sacrifícios. Esta crise
tem tudo a ver com a crise ecológica e ética que se aprofunda em todos os âmbitos
da vida (CNBB, 2009, p. 7).
Não se pode esquecer que também os países que vivenciaram o chamado
socialismo real contribuíram muito para o aquecimento do planeta (CNBB, 2009, p.
22).
Vários setores da sociedade se articulam para construir outro mundo, outra
civilização, fundada em valores e formas de convivência, que defendem e
promovem todas as formas de vida, e que cuidam amorosamente da Terra, mãe da
vida, casa comum dos seres humanos. Essa nova atitude, proclamando a
esperança dos pobres e ecoando o grito da terra [...], anuncia a mística de um
mundo mais humano, fraterno, solidário e ecológico (CNBB, 2009, p. 8).
Deus criou o cosmos, portanto, também a Terra, a Pachamama, Gaia. [Mas] Ele é
maior que sua criação (CNBB, 2009, p. 63).
Na CF-2011, o caráter multifacetado da ecoteologia católica brasileira parece
atingir seu ápice, posto que nessa campanha ganham relevo diversos enquadramentos
do ser humano como “zelador” ou “mordomo”. À semelhança dos documentos
anteriores, é possível encontrar no manual desta campanha ecos da tradicional visão
da ecojustiça defendida desde a década de 1970 pelos sacerdotes brasileiros:
“aquecimento e miséria têm a mesma origem” (CNBB, 2010, p. 142). Trata-se mais uma
vez de propagar uma leitura fortemente crítica ao sistema capitalista que, segundo o
texto, “exilou a ética da responsabilidade e do cuidado do âmbito de várias dimensões
da vida” (CNBB, 2010, p. 53) – crítica essa que, como sempre, evoca a inspiração óbvia,
mas ocultada, de Leonardo Boff: “junto com o grito da Terra, é preciso escutar o grito
dos seus filhos e filhas” (CNBB, 2010, p. 143).
As metáforas da Terra como ser vivo, contudo, passam a dividir mais espaço
com os trechos que falam sobre a responsabilidade humana em face ao seu suposto
lugar privilegiado na criação:

É evidente que há uma diferença fundamental entre seres os humanos e os animais,


que é de ordem sobrenatural, pois os seres humanos foram criados à imagem e
semelhança de Deus (CNBB, 2010, p. 57)
Não obstante a radical diferença entre o ser do Criador e das criaturas existe o
âmbito para o diálogo e a comunhão, na liberdade de uma busca sincera, que deve
se caracterizar como encontro permeado pelo amor (CNBB, 2010, p. 83).

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Se, [de um lado], o homem foi colocado como o zelador das coisas, de outro,
também é verdade que tudo lhe ficou à disposição. O problema está no uso
indiscriminado, na gastança desmedida (CNBB, 2010, p. 91).
Os seres humanos são criaturas juntamente com os demais elementos da criação.
Todos os elos da criação têm dignidade própria. Ao homem Deus conferiu dignidade
especial [...]. Até algum tempo atrás, era absolutamente comum dizer ou ouvir,
também na igreja, que o homem é o centro e o sentido de toda a criação. Isso
constitui a chamada concepção antropocêntrica. Hoje, essa afirmação vem caindo
em desuso, reforçando-se mais a noção também profundamente bíblica de que o
ser humano deve ser “mordomo da criação” (CNBB, 2010, p. 109).
Propostas de reflexão: “Você costuma conversar, ouvir a Mãe Terra?” (CNBB, 2010,
p. 142).
A Terra é irmã e mãe, demonstra a vida de São Francisco, e está em dores de parto,
revela Paulo apóstolo, sempre desejosa de gerar vida nova para toda a
sociobiodiversidade que existe nela. Por isso, é fundamental confiar-se a ela,
desejar seu carinho; e, por ser necessário, cuidar de sua saúde, enfrentando o que
a leva a viver em desequilíbrio febril” (p. 161)
Como é possível perceber, há vários sinais de certa forma dissonantes ao longo
desse manual. No início, expressões como “planeta terra” e “mãe terra” são sempre
grafadas com a inicial minúscula, segundo o costume mais “ortodoxo” adotado na
maioria dos textos vaticanos sobre ecologia (Santos, 2017). Já no meio do manual, as
mesmas palavras passam a aparecer com a inicial maiúscula – por exemplo, no
“diálogo” em que a “Mãe Terra” faz alertas e admoestações ao ser humano (CNBB,
2010, p. 139).
Seguindo para a próxima faceta que ganha mais nitidez nessa época, o manual
em questão também reproduz de forma bastante clara aquele raciocínio moralista
(relacionado à costumes) elaborado no núcleo duro do Vaticano e que, no Brasil, por
muito tempo, tinha sido deixado praticamente ignorado em favor de uma ênfase em
questões éticas de cunho sociopolítico. Assim, utilizando a categoria “vida” como eixo
articulador do conservadorismo católico e da ecoteologia, o manual da CF-2011 aponta
que:

Se hoje o planeta se encontra aviltado e demonstrando desequilíbrios como nas


mudanças climáticas, é porque o ser humano não tem cuidado devidamente da vida
e de suas fontes. Uma sociedade que trunca a vida irresponsavelmente com
contraceptivos e não valoriza a vida em sua gestação, também não será capaz de
cuidar devidamente da criação (CNBB, 2010, p. 309, grifos meus).
Por fim, vale mencionar uma novidade significativa desse manual, que vai
reaparecer de forma mais explícita nos documentos elaborados durante o Sínodo da
Amazônia: a mobilização da gramática ambiental como arma de disputa religiosa, mais
especificamente como forma de desqualificar a prática e a cosmologia de grupos
neopentecostais alinhados à teologia da prosperidade. Assim, o manual da CF-2011
argumenta que:

Outro problema bem visível em nosso tempo é o desejo de transformar o próprio


Deus em um mágico protetor que garante a prosperidade de seus devotos [...]. A

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tentação de usar Deus em benefício próprio é muito arraigada na religiosidade que
se difunde no contexto de nossa sociedade consumista. Em vez de servir a Deus,
com tudo o que isso implica, muitas pessoas querem que Deus esteja ao seu serviço
para satisfazer desejos e ambições individuais. Usa-se o nome de Deus até para
pedir coisas que o próprio Deus, certamente, não aprova, querendo sucesso em
tudo, mesmo quando esse “tudo” desrespeita o direito alheio ou quer justificar fontes
de lucro que agridem o planeta (CNBB, 2010, p. 72, grifos meus).

Os impactos do papado de Francisco

Desde o início do papado de Francisco, as relações entre a ecoteologia vaticana


e os discursos elaborados no contexto latino-americano ganharam um caráter de mão-
dupla. Diversos documentos e trabalhos citados nas notas da Laudato Si’ se originam
de episcopados locais, ou seja, foram elaborados fora do eixo central do Vaticano, o
que é muito simbólico em termos de descentralização (ALTEMEYER Jr., 2016, p. 54).
O simbolismo dos nomes que mesmo assim continuam sendo ocultados, porém, é tão
significativo quanto – mas isso dificilmente é explorado na maioria das análises4. Após
ter salientado a “descentralização simbólica” que deriva das citações da Laudato Si’, por
exemplo, Altemeyer Jr. afirma, embora sem desenvolvimento analítico, que o papa
Francisco “reforça sem citar o pensamento profético do teólogo brasileiro Leonardo Boff”
(ALTEMEYER Jr., 2016, p. 64). Já Maçaneiro exalta a ampla gama de autores e
documentos oriundos do Sul Global que compõem a bibliografia da encíclica, ao mesmo
tempo em que reconhece, sem problematizar, o uso de “fontes implícitas, nem sempre
referenciadas pelo papa”, limitando-se a oferecer apenas um exemplo: “a obra de
Leonardo Boff” (MAÇANEIRO, 2016, p. 717).
Boff não é, contudo, a única “voz do Sul” que vem ressoando nos atuais
discursos ecoteológicos elaborados no Vaticano. Outro importante texto latino-
americano, o Documento de Aparecida, relatado pelo então cardeal Bergoglio, também
ecoa fortemente na encíclica Laudato Si’, ainda que muitos dos enquadramentos lá
contidos sejam, por sua vez, reelaborações de discursos vaticanos. A famosa referência
ao planeta como “casa comum”, por exemplo, que aparece em destaque na Laudato Si’
e no Documento de Aparecida, já constava também em A Igreja e a questão ecológica
(1992, p. 45) e em alguns textos de Leonardo Boff sobre ecologia (BOFF, 1993). O
primeiro a utilizá-la, contudo, para se referir a todo o planeta, ou seja, à Terra, foi o papa
João Paulo II, num pronunciamento sobre a Quaresma de 1990 (JOÃO PAULO II,
1989b). Antes disso, ainda, “casa comum” já era usado como sinônimo de pátria, família,
e até mesmo de igreja em diversos outros documentos pontifícios.

4Como diz o famoso adágio atribuído ao compositor Claude Debussy, a música não está nas
notas, mas no silêncio entre elas.

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Deixando de lado tais questões genealógicas, porém, é fato inconteste que o
papado de Francisco representou um rearranjo da hierarquia de enquadramentos
propostos e enfatizados pelo núcleo duro do Vaticano, o que acabou fornecendo maior
amparo simbólico a sacerdotes que, até então, muitas vezes, sentiam-se constrangidos
senão a abandonar, ao menos a não enfatizar tanto questões sociopolíticas em suas
iniciativas e discursos ecoteológicos. Nessa esteira as formulações de ambientalismo
moralista de cunho social ganharam mais relevo na esfera católica. O reflexo disso no
contexto brasileiro foi a volta da proeminência de enquadramentos da ecojustiça que
haviam sido matizados desde sua rompante “estreia” na CF-1979 – ainda que isso não
tenha implicado a retomada de discursos tão contestadores (teológica e politicamente)
quanto aqueles que circulavam durante a época áurea da teologia da libertação.
Por ter sido ecumênica, as atividades e discursos que circundaram a CF-2016
não refletem tão bem essa reorientação, e, de forma geral, o evento acabou mais
centrado em uma questão concreta (saneamento) (CONIC, 2015). Em paralelo à CF-
2016, porém, a CNBB também lançou a obra Pastoral da ecologia e do meio ambiente
(PEREIRA E BORBA, 2016), pensada como um aporte às iniciativas ecológicas nas
paróquias ao redor do país. Esse é um dos raros textos mais próximos do círculo oficial
católico que reconhece explicitamente a importância de Boff e seu pioneirismo na
discussão ecoteológica. Ainda assim, persistem as marcações de fronteiras: “a Pastoral
da Ecologia não é uma pastoral que se funda no panteísmo, mas na relação de Deus
com as obras de sua criação” (PEREIRA E BORBA, 2016, p. 22, 168). E ainda: “[deve-
se] evitar que a pastoral corra o risco de ser vista como uma ONG e não uma pastoral
paroquial” (ibid., p. 91). Assim, toda ação proposta no âmbito das pastorais, afirma-se,
“deve ter fundamentação bíblica”, pois “o que vai diferir essa ação de outros
procedimentos é o seu embasamento religioso” (ibid. 124). Por fim, num lampejo de
lucidez sociológica sobre a dinâmica competitiva do mercado religioso, o próprio texto
reconhece que “a temática ambiental, contemporânea e cotidiana, pode ser também um
bom ensejo para atrair mais pessoas para a Igreja” (PEREIRA E BORBA, 2016, p. 189).
O novo ímpeto político, contudo, fica mais claro na CF-2017, cujo manual
chegou até a ressaltar (de forma autoelogiosa), em sua introdução, o pioneirismo
“profético” da Igreja Brasileira nessa seara, estabelecendo uma ponta simbólica entre
as campanhas de 1979 e 2017 na tratativa das “temáticas socioambientais” (CNBB,
2016, p. 14-19). Comparativamente, o manual da CF-2017 é muito mais respaldado em
termos técnicos, e em alguns momentos se assemelha mais a uma cartilha secular
sobre ecologia do que a um documento religioso. Já as discussões que saem da esfera
da apresentação dos fatos para a sua discussão sob o ponto de vista ético-religioso são
fortemente marcadas pela referência à Laudato Si’ (um aporte do Vaticano de caráter

12
mais socioambiental, algo que não existia em 1979) e por uma crítica ao sistema
econômico, a qual não vem mais acompanhada de contrapontos críticos ao socialismo,
marxismo e afins. Em um dos subsídios aos encontros com jovens no manual da CF-
2017, por exemplo, consta o seguinte paralelo bíblico como crítica à desigualdade social
e à degradação ambiental causada pelos “poderosos”:

Não adiantaria dar ao povo uma terra ‘onde emana leite e mel’ se essa terra não
fosse bem preservada e se seus benefícios fossem explorados por alguns mais
poderosos, deixando desamparados os mais necessitados. Um projeto com
objetivos semelhantes conservaria nossos biomas e as culturas e direitos de nossos
povos [...]. A terra prometida precisava ser bem conservada e usada com o devido
respeito a Deus e ao próximo. A justiça e a sobrevivência digna de todos tem de
estar acima de qualquer desejo de lucro desmedido (CNBB, 2016, p. 200).
Esse manual enfatiza a todo momento os impactos degradantes (em termos
ecológicos e culturais) de atividades como mineração, pecuária, monocultura, pesca
predatória e afins que se guiariam unicamente pela busca do lucro sem qualquer tipo de
ponderação socioambiental. Como contraponto, mais uma vez repetindo o modelo da
CF-1979, são evocadas de forma sistemática as práticas e os costumes dos povos
originários ou comunidades tradicionais, com ênfase nas atividades e nos traços
ecológicos das culturas locais que predominam em cada bioma brasileiro. Já do ponto
de vista global, tais comunidades são plasmadas na figura do “pobre” e sua situação de
vulnerabilidade ao mesmo tempo social e ecológica: “Os pobres do mundo, embora
sejam menos responsáveis pelas mudanças climáticas, são os mais vulneráveis e já
sofrem os seus efeitos” (CNBB, 2016, p. 99).

O Sínodo da Amazônia num contexto político conservador

Se os ventos vindos do Vaticano atualmente se mostram favoráveis à retomada


de enquadramentos ecoteológicos mais “politizados”, abertamente críticos ao sistema
econômico, aos impactos sociais desiguais da crise ecológica e à (falta de)
regulamentação/fiscalização governamental em atividades que degradam o meio
ambiente, o contexto político brasileiro nunca se mostrou tão avesso à ecoteologia
católica e seus apoiadores, sobretudo no que diz respeito à valorização e proteção de
populações originárias ou tradicionais. Marcadamente conservador, o governo
comandado por Jair Bolsonaro chegou a enquadrar explicitamente as movimentações
em torno do Sínodo da Amazônia como parte de uma agenda de esquerda que estaria
ameaçando a soberania nacional (SANTOS, 2020). Nessa empreitada, o governo
contou ainda com o apoio do Instituto Plinio de Oliveira (IPCO), uma espécie de think
tank do integrismo católico brasileiro, herdeiro do grupo Tradição, Família e Propriedade
(TFP). O livro Psicose ambientalista (BRAGANÇA, 2012), editado pelo IPCO como

13
forma de cartilha antiecológica, passou a ser amplamente citado pelos integrantes do
círculo governamental (SANTOS, 2020).
Em relação ao contexto político, o Sínodo da Amazônia estava, portanto, sujeito
à uma dupla inflexão: do ponto de vista internacional, a sua realização era celebrada e
havia a expectativa de que o encontro funcionasse como um dinamizador (na sociedade
civil) para iniciativas de proteção ambiental. Isso foi captado pela sede vaticana,
resultando em um forte investimento simbólico num evento que, a princípio, não deveria
ter tantas repercussões extrarreligiosas. Por outro lado, também houve significativa
oposição política local, que se expressou tanto discursivamente quando
institucionalmente por parte do aparato estatal brasileiro, no qual se encontra a maior
parte do território amazônico.
As várias controvérsias políticas em torno da realização desse evento, contudo,
acabaram por gerar a errônea impressão de que as discussões que vinham se
desenhando desde o início do processo de escuta sinodal tinham a ver com temas como
soberania ou críticas à ação do governo da região. Na verdade, a preocupação mais
ressaltada nesse evento estava muito mais ligada aos interesses religiosos do que de
inserção política da instituição católica: a progressiva perda de fiéis na região, sobretudo
para igrejas evangélicas. Esse fenômeno de mudança religiosa vem ocorrendo em toda
a América Latina nas últimas décadas, mas é ainda mais acelerado na região
amazônica. Basta lembrar que quatro entre os seis estados brasileiros com maior
contingente de evangélicos ficam na região amazônica: Rondônia, Roraima, Acre e
Amazonas (IBGE, 2010).
Na avaliação da própria Igreja Católica, sua fraqueza na Amazônia deriva de
“uma presença precária” na região (SÍNODO DOS BISPOS, 2018, p. 19). O crônico
problema católico do baixo número de sacerdotes é ainda mais agudo no território
amazônico – e isso é algo recorrentemente afirmado (e lamentado) pelos sacerdotes
em todas as etapas do Sínodo. Para reverter essa debilidade, o documento preparatório
do Sínodo (SÍNODO DOS BISPOS, 2018, p. 20-1) apresentava três propostas
principais: 1) a possibilidade de ministros não celibatários celebrarem a eucaristia; 2) a
autorização do diaconato feminino; e 3) o aprofundamento da “inculturação”, um termo
“de ordem teológica, mas de inspiração etnológica” (PIERUCCI, 2005) que, no caso,
significa usar o estoque cultural autóctone para efetuar a evangelização, a qual se
espera que ocorra gradualmente, sem grande rompimentos com a comunidade.
Conforme a justificativa apresentada pelos organizadores do Sínodo, tais
preocupações catequéticas não derivariam de um interesse apenas religioso, mas de
uma preocupação mais nobre, de ordem ecológica:

14
Na hora de se promover essa transformação radical de que a Amazônia e o planeta
necessitam, os processos de evangelização têm muito a contribuir, sobretudo pela
profundidade com que o Espírito de Deus atinge a natureza e os corações das
pessoas e dos povos (SÍNODO DOS BISPOS, 2018, p. 14).
Desse ponto de vista, a Igreja Católica estaria preocupada não só com a sua
autopreservação, mas também com a preservação da Amazônia:

A Igreja, com a sua longa experiência espiritual, a sua consciência renovada sobre
o valor da criação, a sua preocupação com a justiça, a sua opção pelos últimos, a
sua tradição educativa e a sua história de encarnação em culturas tão diferentes de
todo o mundo, deseja, por sua vez, prestar a sua contribuição para o cuidado e o
crescimento da Amazônia (FRANCISCO, 2020, p. 18, §60).
Como mais um sinal da presença mais forte daquelas “vozes do Sul” no entorno
das iniciativas ecoteológicas vaticanas, praticamente todos os documentos derivados
do Sínodo relacionaram em algum momento essa preocupação sociambiental da Igreja
com a já citada fórmula criada por Boff: “grito da terra, grito dos pobres”. Em seu discurso
introdutório ao Sínodo, por exemplo, o cardeal Cláudio Hummes disse que “o grito da
terra e o grito dos pobres na região é o mesmo grito” (HUMMES, 2019, p. 3). Já a
segunda parte do Instrumentum laboris intitula-se “Ecologia integral: o clamor da terra e
dos pobres” (SÍNODO DOS BISPOS, 2019a). Dentre as diversas passagens do mesmo
documento que trazem essas mesmas referências, vale destacar uma que conjuga a
ênfase na justiça social com uma abertura mais esotérica, dizendo ser necessário “ouvir
o clamor da ‘Mãe Terra’, agredida e gravemente ferida pelo modelo econômico de
desenvolvimento predador e ecocida” (SÍNODO DOS BISPOS, 2019a, p. 54, §146).
O documento final do encontro, por sua vez, também conta com um tópico
denominado “O clamor da terra e o grito dos pobres” (SÍNODO DOS BISPOS, 2019b,
p. 6), além de apresentar inúmeras variações dessa mesma fórmula ao longo do texto.
Por fim, a exortação apostólica publicada por Francisco ao final dos trabalhos contém
um tópico denominado “grito da Amazônia”, no qual ele afirma que “a chamada por Deus
exige uma escuta atenta do grito dos pobres e ao mesmo tempo da terra” (FRANCISCO,
2020, p. 16, §52). Vale notar que, nessa frase, Francisco cita como referência sua
Laudato Si’, e não Boff – que, ao que parece, mesmo tendo feitos seguidas declarações
de apoio ao atual papa, seguirá na condição de interlocutor oculto.
Ao lado das aberturas mais esotéricas e das formulações sobre justiça social,
porém, também consta nos documentos sinodais o uso do repertório ecológico numa
chave moralista conservadora. Isso fica claro no seguinte trecho do documento final do
Sínodo, que fala ao mesmo tempo da proteção da vida oriunda dos rios e florestas e da
proteção da “vida em sua integralidade”, que na “novilíngua” da moldura interpretativa
católica significa a rejeição ao mesmo tempo ao aborto, às práticas contraceptivas
artificiais, à pesquisa com células embrionárias e à eutanásia:

15
Reafirmamos o nosso compromisso na defesa da vida em sua integralidade, desde
a concepção até seu ocaso e a dignidade de todas as pessoas. A Igreja esteve e
está ao lado das comunidades indígenas para salvaguardar o direito de terem uma
vida própria e em paz, respeitando os valores de suas tradições, costumes e
culturas, a preservação dos rios e florestas, que são espaços sagrados, fonte de
vida e sabedoria. Apoiamos os esforços de tantos que corajosamente defendem a
vida em todas suas formas e etapas (SÍNODO DOS BISPOS, 2019b, p. 21, §80,
grifos meus).
A instrumentalização da gramática ecológica com propósitos de evangelização
também marca presença na exortação apostólica de Francisco, a qual deixa claro que,
apesar do apoio eclesial às ações sociais voltadas a sanar as “necessidades e
angústias” dos povos amazônicos, a Igreja Católica não pode se contentar

com uma mensagem social. Se dermos a vida por eles, pela justiça e a dignidade
que merecem, não podemos ocultar-lhes que o fazemos porque reconhecemos
Cristo neles [...]. Eles têm direito ao anúncio do Evangelho [...]. Sem este anúncio
apaixonado, cada estrutura eclesial transformar-se-á em mais uma ONG
(FRANCISCO, 2020, p. 19, §63-4, grifos meus).

Considerações finais

Ao realçar o intuito evangelizador das propostas ecológicas da Igreja, Francisco,


tal como ocorre em certa medida em todos os movimentos ambientalistas religiosos,
está buscando “estimular respostas morais” aos problemas ecológicos, ocupando assim
o vácuo deixado pela burocratização do ativismo ecológico mainstream (KEARNS,
2007, p. 307). Contudo, ainda que exista no papado de Francisco um maior espaço para
que essas respostas morais sigam numa trilha de crítica estrutural às desigualdades
sociais, os enquadramentos elaborados sob maior influência do Vaticano tendem
sempre a incluir aspectos comportamentais ou mais distintivamente religiosos nos seus
chamados à “conversão ecológica”.
É significativo, nesse sentido, o fato de que frames mais conservadores e
distintivamente religiosos constem de forma mais explícita no documento final e na
exortação apostólica do que nas demais produções do Sínodo, pois a ordem de
elaboração dos documentos é proporcional à proximidade do núcleo institucional
católico. Ou seja, os primeiros documentos foram produzidos por lideranças locais (no
caso, sacerdotes latino-americanos, sobretudo brasileiros), mais próximas das
comunidades tradicionais, enquanto os documentos intermediários contaram com a
participação mais ativa da Santa Sé e o último é assinado pelo próprio papa. Assim, o
fortalecimento progressivo da distintividade religiosa e de frames voltados para
questões como aborto e eutanásia revela, mais uma vez, como o Vaticano tem
mobilizado a pauta ecológica de forma estratégica, como uma “arma simbólica” voltada
à revitalização da mensagem religiosa no seio das sociedades contemporâneas.

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Seja com um caráter mais moralista, ou mais voltado às questões sociais, todas
as iniciativas ecoteológicas católicas aqui analisadas identificam a crise ecológica como
uma oportunidade para tentar recuperar certa relevância para as religiões no mundo
moderno. Especificamente em relação ao catolicismo, a cosmologia segundo a qual
tudo está interligado é especialmente útil nesse sentido, pois ela legitima a reivindicação
de que seria preciso contar com a “ação da instituição católica nos mais diversos planos
da vida social” (ESQUIVEL e MALLIMACI, 2016, p. 78). O próprio Instrumentum laboris
do Sínodo chega a explicitar que: “a crise socioambiental abre novas oportunidades
para apresentar Cristo” (SÍNODO DOS BISPOS, 2019a, p. 9, §7). Ou seja, o
enfrentamento das questões ambientais permite “que o catolicismo divulgue sua
presença na sociedade e conserve um espaço no plano da produção de sentidos que
circulam na vida coletiva”, sempre com o objetivo último de “restaurar a integridade da
mensagem religiosa no seio das sociedades secularizadas e pós-secularizadas”
(ESQUIVEL e MALLIMACI, 2016, p. 84).
Não à toa, um dos principais motes do Sínodo, afirmado e respaldado do primeiro
ao último documento, foi o de inculturação – conceito que, ao que tudo indica, deve se
consolidar como um dos principais frames da ecoteológica católica daqui para a frente.
De um ponto de vista mais abstrato, isso indica também que a Igreja Católica continua
firme no propósito de mudar culturas, em vez de converter indivíduos (PRANDI, 2008).
Isto é, o catolicismo segue identificando seu declínio como um problema cultural, e,
sendo assim, considera que é na cultura que deve atuar para resolvê-lo – e, nas
estratégias atualmente traçadas pela instituição católica, a porta de entrada para essa
influência cultural parece ser, justamente, a abordagem do tema ecológico em conexão
com as lutas sociais.
Está em curso, portanto, uma espécie de novo aggiornamento da estratégia de
ação social empregada pela Igreja Católica em vários países da América Latina,
sobretudo durante as décadas de 1970 e 1980 (CAMARGO, 1973). À época, diante da
competição religiosa que começava a ganhar força e a desafiar o monopólio católico, a
Igreja já havia aprendido que poderia aumentar sua popularidade e fidelização ao dotar
de sentido religioso o ativismo social e político de seus membros, posicionando-se
simbolicamente como legítima representante dos interesses de setores marginalizados
(a “igreja popular”) (CASANOVA 1994, p.126-33; GILL, 1994; PRANDI e SANTOS,
2015). Se conseguir, no contexto atual, reciclar e atualizar essa estratégia com uma
nova dimensão ecológica, a instituição católica poderá, em suma, abordar um leque
mais amplo de questões — agora também em favor de áreas ecologicamente
ameaçadas e pessoas que sofrem injustiças ambientais —, utilizando o capital simbólico
extra resultante em suas disputas religiosas.

17
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