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A autorregulamentação do CONAR, Governo e Consumidores

Paper
Dirceu Martins Alves (19.09.2023)

O CONAR (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária) foi criado


em 1980, a partir de uma proposta de um empresário do setor. O conselho foi
criado seguindo um modelo de inspiração no modelo inglês.
Primeiro problema: Se o modelo de autorregulamentação funciona bem na
sociedade inglesa, funcionaria bem no modelo brasileiro?
O Conar é composto de

O Conar é o Conselho Nacional Brasileiro de Autorregulamentação


Publicitária. É uma organização sem fins lucrativos da sociedade civil que
regula a publicidade no Brasil por meio de códigos de conduta e princípios éticos.
A origem do CONAR
Em 1978 foi aprovado o Código Brasileiro de Autorregulamentação Publicitária.
Escrito por empresários do setor, auxiliados pelo eminente advogado Saulo
Ramos. O código previa condutas éticas para com os consumidores, e ética
comercial entre as empresas.
- O código foi aprovado no III Congresso Brasileiro de Propaganda, comandado
por Luiz Celso de Piratininga.
Passou-se então para a fase de tentativas para fazer o código funcionar. A
princípio pensaram na criação de um Conselho Federal, formado por 20
publicitários e 1 representante do Governo. As despesas de custeio sairiam de
verbas governamentais. Foram muitas idas de um grupo grande de empresários
da publicidade à Brasília para as tratativas.
- A sugestão de Roberto Marinho
Estavam nesse processo quando receberam uma sugestão do jornalista Roberto
Marinho para que esquecessem a ideia de um órgão misto com o Governo. A
sugestão consistia na observação de que tinham o código, tinham as pessoas
para trabalhar, então que fizessem eles mesmos, criando algo que mais tarde
seria chamado de ONG (Organização Não Governamental).
Roberto Marinho bancou os gastos dos primeiros meses de funcionamento, e
assim nasceu o CONAR em 1980.
Petrônio Cunha Corrêa (29/12/1928 – 1º/12/2013), foi considerado o fundador
do CONAR, por ter sido o principal articulador, mas trabalhou com muitos outros
empresários da publicidade nessa empreitada.

Composição do CONAR hoje


Hoje o CONAR é composto de várias partes, entre elas o Conselho de Ética.

Segundo o Site Meio & Mensagem: “Hoje, são oito câmaras do Conselho de
Ética estrategicamente localizadas no Brasil, em estados como São Paulo, Rio
de Janeiro e Recife e os conselheiros são todos voluntários”. E os conselheiros
são todos voluntários.
“De acordo com o próprio Conar, a criação do órgão foi uma resposta à ameaça
de censura na publicidade. À época, no final da década de 1970, o governo
federal considerou criar uma lei para avaliar, antecipadamente, o teor de
qualquer anúncio publicitário antes que ele fosse veiculado em algum meio de
comunicação.
Ou seja, nenhum anúncio de televisão, rádio, jornal, revista (ou qualquer outro
meio da época) poderia ser veiculado sem contar com um carimbo de “OK”.
Na teoria, essa determinação significaria um esforço burocrático para o Estado.
Já do ponto de vista do mercado publicitário, na prática, tal lei representaria
um retrocesso e a imposição de controle sobre o direito à liberdade de
expressão. ”
Petrônio Cunha Corrêa conta que o governo estava assinalando positivamente
para uma abertura do regime em relação à democracia, mas não se tinha certeza
de quão democrático seria esse futuro. Trabalharam com essa incerteza e
preocupação de garantias na liberdade de expressão na criação do CONAR.

Petrônio Corrêa diz que de repente se surpreenderam com o poder do CONAR


de aplicar a maior punição que uma empresa de publicidade pode receber: “Ficar
proibida de se comunicar com os seus clientes”.

Ressuscitar pessoas com IA fere a ética social?


Recentemente o CONAR julgou a peça publicitária “VW novo de novo”, no qual
a cantora Elis Regina, morta nos anos 80, ressurge através da inteligência
artificial. A denúncia teria partido de um advogado. O Conselho de Ética absolveu
a empresa de publicidade, e a propagando pode continuar no ar.
Campanha antiecológica
Outra peça publicitária da Volks Vagem (de décadas atrás), na qual um homem
aparece lavando o carro com uma mangueira de jardim, desperdiçando água e
incentivando a poluição das fábricas porque elas geram produtos, comércios e
trabalhos, e assim se pode ganhar dinheiro e comprar um Volks Vagem, foi
considerada antiecológica e proibida pelo CONAR. O Ministério público também
processou a empresa e aplicou uma multa de 10 milhões de reais por danos à
ecologia. A Volks Vagem retirou a peça do ar imediatamente e nunca mais a
veiculou.

Comercial comparativo – cerveja Kaiser


No Brasil não são permitidos os comerciais comparativos.
Mesmo assim a cerveja Kaiser fez um comercial com um ator da Rede Globo,
no qual a Kaiser era comparada com outras tantas cervejas, na qual se supunha
uma pesquisa de aferição do gosto das pessoas. A Kaiser vencia a pesquisa,
segundo o comercial.
A Ambev entrou com denúncia contra o comercial, o CONAR puniu mandando
tirar do ar, mas a Kaiser recorreu ao Tribunal de Justiça de São Paulo que
derrubou a liminar do CONAR. O processo voltou a ser analisado pelo CONAR,
mas com ele ainda aberto a Kaiser desistiu do comercial.

Casos de omissão do CONAR


Um dos casos mais omissos, ou pelo menos demorado para receber atenção é
a campanha da Danone: “Danoninho vale por um bifinho”
Veiculada com crianças (meninos e meninas).
https://www.youtube.com/results?search_query=Danoninho+vale+por+um+bifin
ho
A campanha foi proibida por ser considerada propaganda enganosa. Um
Danoninho nunca tem as proteínas de um bife. (e isso trouxe má informação
para os país por décadas).
Considerações

Talvez por ter sido um órgão criado pelo próprio setor da publicidade tenha-se
demorado a punir ou suspender peças publicitárias que ficaram anos ou décadas
no ar, em todos os veículos, propagando conteúdos enganosos, como a
campanha do Danoninho, que circulou em 1989, 1996, sempre se renovando,
mostrando crianças se alimentando “bem” e felizes. Até que finalmente os
comerciais foram proibidos.
É certo que a entidade CONAR foi criada pelo setor da comunicação, na qual
participaram publicitários, agências de publicidade, veículos de Comunicação,
associações de imprensa etc., mas sem a participação do governo. O espírito do
tempo era de que um órgão do governo poderia significar censura para a
comunicação publicitária. Para o momento foi algo acertado, porque se fosse o
Governo o responsável por tudo não estaríamos mais próximo da censura e do
autoritarismo na publicidade, como era no regime da Ditadura Militar? Temos
problemas na falta do governo na regulamentação de setores da sociedade, mas
temos problemas também se o Governo assume um poder maior que a
sociedade. Pelo menos se o desejo é caminhar para um regime democrático,
com liberdade de imprensa e liberdade de expressão.
O modelo inglês, que inspirou a criação do CONAR no Brasil, funcionava bem
para a sociedade inglesa. Mas a pergunta se ele funcionaria bem para a
sociedade brasileira deve ser respondida com outra pergunta: Seria melhor ele
ou um órgão fiscalizador do governo militar? De algum modo a sociedade
brasileira correu o risco, ficando exposta aos abusos das empresas de
publicidade brasileiras.
Mas hoje parece que o CONAR funciona bem, a sociedade amadureceu política
e socialmente. Qualquer cidadão, entidade de classe, ONG, Movimentos sociais,
Ministério público e a justiça, em geral, podem denunciar os abusos na
publicidade. Particularmente, me parece interessante que hajam setores da
sociedade que se organizam, se autorregulamentam para o bom funcionamento
comercial e social, sem verbas do governo. Mas que o governo possa intervir
quando seja necessária sua intervenção.

Referências
BEZERRA, Glícia Maria Pontes. Antecedentes do Conar: contexto histórico e político
da organização corporativa do setor publicitário brasileiro. INTERCOM. XXXVIII
Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação – Rio de Janeiro, RJ – 4 a
7/9/2015. Disponível em:
Chrome
extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://repositorio.ufc.br/bitstream/riufc/3
0246/1/2015_eve_gmpbezerra.pdf – Acesso em 18 set. 2023.
CONAR
http://www.conar.org.br/ - Acesso em: 15.09.2023.

Meio & Mensagem


https://www.meioemensagem.com.br/comunicacao/conar#:~:text=Conar%20%C3%A9
%20o%20Conselho%20Nacional,de%20conduta%20e%20princ%C3%ADpios%20%C
3%A9ticos. – Acesso em 14.set.2023.

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