A descoberta do outro e a génese das ciências humanas
A «descoberta» antropológica tem ganho importância na construção moderna das
Ciências Humanas, uma vez que oferece uma perspectiva sobre o humano e suas relações com o outro que escapa às determinações do julgamento hegemônico e universalista que caracteriza as ciências ocidentais. A antropologia parte da investigação elaborada pelo próprio objeto tendo em consideração o ser particular que estabelece uma relação entre o observado e o observador. É desta forma que a antropologia pode ser considerada um conhecer construído com a humanidade tendo em conta as suas diversas formas e experiências de vida. A construção de conhecimento de nós mesmos parte da percepção da diversidade da existência de um “outro” numa organização social. A noção da existência da diferença é então a ferramenta básica do pensamento antropológico e o principal legado que esta imprime às Ciências Humanas e Sociais. A descoberta de novos territórios está intimamente ligada ao pensamento antropológico pois foi aí que se fez a descoberta de novos agrupamentos humanos existentes pela terra, descoberta esta, proveniente do período da colonização. São os relatos dos presentes nas explorações dos colonizadores que a antropologia se deve como o seu objeto de estudo, encontrando as ditas sociedades primitivas e/ou selvagens descobrindo assim um contraste das sociedades europeias civilizadas. Tendo consciência que esta diversidade humana não existe só nas sociedades não ocidentais mas sim em toda a parte fez com que a antropologia amadurecesse como ciência, caracterizando-se pelo olhar que imprime aos fenômenos sociais. Sendo assim, a ciência da antropologia é dinâmica pois acompanha as mudanças da humanidade estabelecendo uma relação dialógica, intersubjetiva, relacionada no encontro entre o observador e o observado.
No século XVI, quando os europeus começaram a época dos descobrimentos, surgiram
os primeiros registros etnográficos trazendo um desenvolvimento na ciência da antropologia (e mesmo das ciências humanas), surgindo então nesta época duas ideologias inversas uma da outra: o mau selvagem e o bom civilizado. Estas ideologias trazem uma perspectiva primeiramente da percepção da inferioridade daqueles povos desconhecidos e com hábitos tão diferentes dos europeus e que se tornou uma atração pelo estranho, percebendo que as sociedades primitivas são munidas com uma inocência vivendo num paraíso.
Sabendo destes opostos, da representação do mau selvagem e do bom civilizado, pode
se salientar que estes constituem a base da estrutura de pensamento das Ciências Humanas. A descoberta do saber da inferioridade do “outro” em relação aos europeus, a evolução que via a sociedade como estágios dos primeiros seres da humanidade são igualmente alicerces da antropologia. Foi o olhar o “outro” que o fez refletir sobre si mesmo. O povo que via os indígenas como um povo não desenvolvido, ingênuo e mesmo sem capacidades cognitivas, comparado com os cidadãos europeus, acabam por ser estes (no estudo e observação de seres diferentes) a evoluir e construir assim as modernas Ciências Humanas.
Neste contexo, da percepção da existência de seres “diferentes”, auxilia a compreensão
do desenvolvimento do saber antropológico nos últimos anos e que por sua vez levou à gêneses das Ciências Humanas e que deste modo conseguiu ultrapassá-las propondo novas perspectivas sobre o “outro” mesmo que ainda hoje se verifiquem alguns estereótipos que turvam a perspetiva sobre o “outro”, sobre o não ocidental, que estes tendam a desaparecer.