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1. INTRODUÇÃO

A presente pesquisa verifica a hipótese do Sistema Carcerário Brasileiro


como instrumento de opressão ao feminino. Tendo o patriarcado como ponto
de partida, a discussão, sem desconsiderá-lo em nenhum momento, vem tratar
de maneira interseccional considerações conjuntas referentes a gênero, classe
e raça como filtros do processo de seletividade e etiquetamento que aprofunda
a desigualdade social existente no Brasil.
A cultura patriarcal racista, classista e andocêntrica instalada desde o
processo de colonização da nação é a mantenedora da discriminação social
sofrida pela mulher negra periférica pobre que é o subsolo da pirâmide social
brasileira, bem como o rosto e corpo do cárcere feminino, que, tristemente,
havendo crescido alarmantemente na última década, ainda possui um aparato
completamente masculinizado em todos os sentidos. Assim, ante o exposto, o
estudo problematiza: Como o sistema carcerário feminino se caracteriza
instrumento de opressão e marginalização das mulheres?
O trabalho tem como objetivo geral estudar o sistema carcerário
brasileiro como instrumento de opressão ao feminino. Ademais, os objetivos
específicos são: discutir a formação patriarcal brasileira perpetuadora da
dominação dos espaços de poder tendo como etiquetas de marginalização
gênero, classe e raça; refletir sobre a o sistema carcerário brasileiro de maneira
crítica e problematizadora; e pensar a situação da mulher no cárcere como
objeto de flagrante violação de direitos.
Para um desenvolvimento estruturado da pesquisa, deve-se destacar
com rigor as características metodológicas do escrito. Deste modo, esse
estudo é classificado como uma pesquisa bibliográfica e explicativa. O método
utilizado foi o dedutivo e abordagem da pesquisa é a qualitativa. Os
conhecimentos utilizados diretamente foram o científico e filosófico, enquanto o
conhecimento empírico foi resgatado da obra ―Presos Que Menstruam‖ da
jornalista Nana Queiroz e de matérias jornalísticas específicas.
Esse estudo se justifica com veemência no valor maior da justiça, que é
a equidade, indispensável ao Estado Democrático de Direito. Além disso, faz-
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se imprescindível frente ao cenário carcerário atual marcado pela superlotação,


condições subhumanas e a estrutura masculinizada, que, além de ser
preparada para os marginalizados, soma a discriminação de gênero.
A presente pesquisa encontra-se organizada da seguinte forma: o
primeiro capítulo trata do patriarcado de forma geral, refletindo sobre o
processo de enculturação da mulher, localização social da mulher negra
brasileira e formação patriarcal das instituições de poder; o segundo, por sua
vez, de modo sintético, se constrói acerca da seletividade do processo de
encarceramento e crítica o sistema carcerário propondo o uso do minimalismo
penal com ponderação; e o terceiro, derradeiramente, discute as condições da
mulher no sistema carcerário e das flagrantes violações aos direitos
fundamentais inerentes a sua humanidade. Por fim, as considerações finais,
organizadamente, vêm amarrar as compreensões possíveis de cada capítulo e
do escrito como um todo, traçando um caminho inicial para a resolução da
problemática.
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2 OPRESSÃO AO FEMININO

2.1 O Patriarcado

Desde os primórdios do mundo civilizado a estrutura social disposta


infringiu à mulher um lugar de subordinação na estrutura familiar chefiada pelo
pai. Num lugar onde o pater é a base das constituições dos grupos sociais, o
feminino sempre foi visto sob dois aspectos extremos: a "porta para o céu‖,
quando em se tratando de sua fertilidade, delicadeza e servidão ou a ―porta
para o inferno‖, no tocante a sua "capacidade de sedução‖ a "tentar" o homem,
sendo a mulher responsável pelas quedas da carne masculina. Nesta
perspectiva é coerente trazer à tona a reflexão de Jessé Souza feita em sua
obra "A classe média no espelho":

Vimos que a hierarquia moral legada pelo cristianismo tem como eixo
principal a oposição entre o espírito e o corpo. Tudo que é associado
ao espírito passa a ser nobre e digno de admiração, e tudo o que tem
a ver com o corpo e suas funções é visto como, animal, banal e
inferior. (SOUZA, 2018, p. 32)

A igreja, ainda detentora do poder de forjar a moral, trazia essas duas


visões como parâmetro do lugar da mulher. Lugar este ligado a subordinação,
reprodução, satisfação dos desejos masculinos e ao pecado. O
desenvolvimento social, então, aconteceu em torno desses preceitos morais
fixados pela igreja. E apesar de não ser o tempo atual momento de império
canônico, a herança da concepção religiosa machista se manteve e se mantém
como fundo da formação social. Jessé Souza, na mesma obra, pondera: "Na
verdade, literalmente todas as questões existenciais e políticas atuais já
estavam presentes na compreensão religiosa e cristã do mundo‖. (SOUZA,
2018, p. 32)
Deste modo foi articulado, com iniciativa religiosa através da moral, o
espaço social da mulher num sistema sociopolítico em que o gênero masculino
e a heterossexualidade oprimem o feminino e a homossexualidade, ditando as
regras sociais impostas. Sistema qual, a partir dos anos sessenta e setenta,
recebeu o nome de patriarcado.
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O patriarcado, pois, domina a formação social, cultural e econômica, de


modo a oprimir as mulheres em todos os grupos sociais da sociedade
complexa contemporânea. A igreja, a escola, a família, o trabalho, são todos
ambientes dominados pelo patriarcado nos quais a mulher sente o peso de ser
mulher.
Na família, por exemplo, a mulher ainda quando criança é ensinada a
ser meiga, doce, frágil, e claro, muito bem prendada, para que possa atender
ao modelo bela, recatada e do lar. Durante a infância as meninas são
incentivadas a brincar de boneca, que é sua filha, de casinha, reproduzindo as
tarefas domésticas executadas pela mãe, de ciranda, uma brincadeira estática
e cheia de cantigas frágeis e ouvem histórias que reproduzem em sua
imaginação e brincadeiras, esperando pelo príncipe encantado de traços
europeus montado em seu cavalo branco. Chimamanda Ngozi Adichie em
―Para Educar Crianças Feministas‖ expressa uma observação oportuna:

Olhei a seção de brinquedos, também organizada por gênero. Os


brinquedos para meninos geralmente são ―ativos‖, pedindo algum tipo
de ―ação‖ — trens, carrinhos —, e os brinquedos para meninas
geralmente são ―passivos‖, sendo a imensa maioria bonecas. Fiquei
impressionada com isso. Eu não tinha percebido ainda como a
sociedade começa tão cedo a inventar a ideia do que deve ser um
menino e do que deve ser uma menina. Eu gostaria que os
brinquedos fossem divididos por tipo, não por gênero. (ADICHIE,
2017, p. 12)

Enquanto os garotos são ensinados a serem fortes, ativos, predadores,


as garotas são ensinadas a aspirar ao casamento, o mesmo não acontece com
os garotos, que são ensinados a desejarem a sua liberdade. Enquanto as
garotas são preparadas para serem impecáveis em seu casamento, os garotos
são preparados para o mercado de trabalho, para se defenderem como
―homens‖ têm que fazer. Chimamanda, em ―Sejamos Todos Feministas‖ diz:

Criamos nossas filhas para enxergar as outras mulheres como rivais


— não em questões de emprego ou realizações, o que, na minha
opinião, poderia até ser bom — mas como rivais da atenção
masculina. Ensinamos as meninas que elas não podem agir como
seres sexuais, do modo como agem os meninos. Se temos filhos
homens, não nos importamos em saber sobre suas namoradas. Mas
e os namorados das nossas filhas? Deus me livre! (Mas obviamente
esperamos que elas tragam pra casa o homem perfeito para casar,
na hora certa) Nós policiamos nossas meninas. Elogiamos a
virgindade delas, mas não a dos meninos (e me pergunto como isso
pode funcionar, já que a perda da virgindade é um processo que
normalmente envolve duas pessoas).(ADICHIE, 2014, p. 37)
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Quando os garotos são ensinados a serem sexualizados e as garotas


não, quando os garotos são instruídos a serem fortes e as garotas não, quando
os garotos são motivados a lutarem por oportunidades de emprego sem se
preocuparem com lavar, passar e cozinhar, os garotos estão, não sendo
ensinados a serem homens e as garotas a serem mulheres, sim ensinados a
serem os garotos opressores, senhores, e as garotas ensinadas a serem
oprimidas, servas. (TIBURI, 2018)
Os efeitos desse processo de enculturação são imensuravelmente
catastróficos, as terras reparadas para a vindoura formação familiar e social
dessas crianças são terras férteis para inúmeros problemas de gênero como
subordinação, falta de ocupação dos espaços de poder, objetificação,
marginalização, assédio sexual, assédio moral, desigualdade de gênero no
mercado de trabalho, violência doméstica, estupro coletivo, feminicídio e
problemas institucionais e estruturais, fazendo serem as instituições pensadas
pelos e para os homens.
Treinadas para aceitarem as imposições masculinas, tão androcêntricas,
a mulher se torna alvo de mazelas de cicatrizes devastadoras. A cada dois
minutos uma mulher é vítima de violência doméstica e mais de 50% das
vítimas têm até 13 anos de idade (AGUIAR, 2019), o que explicita tamanha
objetificação que os agressores veem suas companheiras e filhas como objetos
que podem ser usados e abusados, de maneira inescrupulosamente basilada
em ensinamentos patriarcais enraizados no processo de enculturação.
Não é exceção a regra o acontecimento dos estupros coletivos, por
exemplo. As mulheres são frequentemente abusadas e estupradas
coletivamente no mundo inteiro (SOLNT, 2017). Além de casos emblemáticos
como o da jovem de 16 anos estuprada por, pelo menos, 30 homens, numa
comunidade da Zona Oeste do Rio de Janeiro (G1, 2016), existem casos que
ocorrem dia após dia, semana após semana, que não repercutem tanto na
grande mídia, por serem, talvez, considerados ―menos terríveis‖ ou ―mais fora
da realidade‖, como se não fosse chocante uma mulher ser estuprada por três
homens, como aconteceu em São João do Miriti, no dia 17 de outubro de 2019
(G1, 2019), sim por 30.
As mulheres vítimas de estupro, as mulheres vítimas de feminicídio, não
são mulheres inventadas. No quinto país do mundo que mais mata mulheres,
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essas mulheres são mais do que estatísticas , são vidas ceifadas. Vidas
perdidas por efeito de um problema maior, estrutural e originário, o patriarcado
acolhido pela grande parte da população e alimentado pelos opressores.
Entretanto, mesmo frente a uma nítida sociedade doente, há aqueles
que despendem esforços para desacreditar os problemas de gênero
mencionados, para desacreditar o sofrimento de milhões de mulheres e a
propriedade das pesquisas realizadas. O machismo, irresponsável como
incondicionalmente é, agrava a invisibilidade que recai sobre a mulher. Como
se não suficiente fosse a mulher não ter sua história e feitos contados da
maneira devida, como se já não bastasse a invisibilidade sofrida dia após dia
de todos os problemas que as atingem, há uma luta declarada pela
invisibilidade e silenciamento de seus sofrimentos e bandeiras.
Apesar de não existir um único movimento feminista, mas feminismos, a
empregabilidade é uma das grandes bandeiras entre os feminismos,
evidentemente, com diferentes abordagens, adaptada às diferentes lutas com
um objetivo em comum, pois ―feminista é a pessoa que acredita na igualdade
social, política e econômica do sexos‖. (ADICHIE, 2014)
O acesso ao mercado de trabalho bem como a manutenção do emprego
em condições isonômicas que assegurem o tratamento paritário entre os
gêneros além de importância na economia como um todo, detém relevância na
economia familiar. Hoje, as mulheres são reais provedoras de renda familiar a
partir da inserção mercadológica. Ainda assim, sofrem com ego frágil
masculino, moldado para ser sempre o líder familiar, a desigualdade salarial e
a dupla ou até tripla jornada de trabalho, precisando trabalhar fora e cuidar da
casa e dos filhos para que não falhe em ser ―a mulher que da conta de tudo".
Abaixo está a senhorita Triggs, estampada em uma charge na obra ―Mulheres
e Poder – Um Manifesto", da professora de Cambridge, Mary Beard:
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Figura 01: Charge ―Sra Triggs‖

Fonte 01: Mulheres e Poder – Um Manifesto (2019).

A senhorita Trigs é silenciada por ―não ser homem o bastante‖ para a


fala, por ―não ser homem o bastante‖ para ocupar determinado cargo ou
exercer determinada função, ―não ser homem o bastante‖ para receber o
mesmo salário que os homens, ―não ser homem o bastante‖ para ter os
créditos de sua ideia, mas sem dúvidas terá que ser a famosa ―mulher que dá
conta de tudo", que além de trabalhar recebendo até 53% menos a depender
da área de atuação (esta estatística em específico corresponde a área jurídica),
por obrigação ainda terá a dupla jornada de trabalho, ou tripla, ou quarta, por
ter que cuidar da casa, filhos e marido, lavar, passar, cozinhar, lidar com os
horários. No final tudo recai sobre a pobre não homem Sra Trigs.
Essa é a característica do patriarcado contemporâneo, o acesso ao
mercado de trabalho deixa de ser um passo para o fim do patriarcado para se
tornar uma releitura deste. Uma releitura convencionada a partir do capitalismo
que precisa de mão de obra, que precisa de recursos humanos e claro,
convencionado pela crise, em que dinheiro em casa será sempre bem-vindo,
mas a divisão das funções domésticas continua a ser responsabilidade da
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agora mulher de negócios. Assim aconteceu na Revolução Industrial, assim


aconteceu na Segunda Grande Guerra quando a indústria bélica precisava da
mão de obra feminina, a partir daí nasce o slogan hoje ressignificado por
feminismos: ―We can do it!‖.1
E sendo uma ―não homem" a senhorita Trigs viverá à margem da
sociedade. Seja nas decisões políticas, no tratamento urbano ou doméstico, no
ambiente de trabalho, nas planícies ou nos morros, no discurso e ocupação
dos espaços de poder, a srta. Trigs será posta à margem e marginalizada
travará além das batalhas existentes para cada ser humano, outras dezenas de
desafios próprios dos oprimidos por sua classe e gênero.

2.2 A Mulher Negra no Brasil

O capitalismo, desde seu nascimento, é baseado em exploração.


Exploração de todos os jeitos possíveis. Seja da raça, da classe ou do gênero.
E ao contrário do que se pode pensar, não se debruça sobre cada filtro em sua
vez, mas sobre todos ao mesmo tempo. Sob está perspectiva, a discussão
acerca da condição da mulher negra no Brasil se faz indispensável para o
entendimento das questões carcerárias tratadas mais a frente. Bem, para tanto,
é necessário construir aqui uma lógica originária.
Com a expansão do comércio a partir do século XV e aquecimento no
século XVI acompanhados da chegada dos europeus ao "novo mundo" já
habitado pelos nativos, a intensificação da escravatura devastadora. Como
uma atividade rentável, o tráfico negreiro, a partir da costa africana, foi a maior
ferramenta de mão de obra barata dos tempos de colonização. Homens e
mulheres africanos foram sequestrados e vendidos como mercadorias nas
Américas. Um pano de fundo não tão discutido quando se é falado em
modernidade:

Há, no entanto, uma dimensão oculta dos eventos que


aconteciam ao mesmo tempo, tanto no ambito da economia como no

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Nós podemos fazer isso!
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do conhecimento: a dispensabilidade (ou descartabilidade) da vida


humana, e da vida em geral, desde a Revolução Industrial até o
século XXI. [...] Assim, ocultadas por trás da retórica da modernidade,
práticas econômicas dispensavam vidas humanas, e o conhecimento
justificava o racismo e a inferioridade de vidas humanas, que eram
naturalmente consideradas dispensáveis. Entre os dois cenários
descritos acima surgiu a ideia da ―modernidade‖. Apareceu primeiro
como uma colonização dupla, do tempo e do espaço. Estou também
argumentando que a colonização do espaço e do tempo são os dois
pilares da civilização ocidental. A colonização do tempo foi criada
pela invenção renascentista da Idade Média, e a colonização do
espaço foi criada pela colonização e conquista do Novo Mundo.
(MIGNOLO, 2017, p. 4)

A criação do Novo Mundo, possibilitou então o processo de apropriação


das Américas por Portugal e Espanha que deram início ao processo de
colonização sob argumentos religiosos. Fracassados na tentativa de
escravização dos nativos e presos ao discurso de catequização, buscaram nas
terras africanas os sem alma comercializáveis. Esses homens e mulheres
foram então explorados no cultivo de insumos como algodão, mais comum nos
Estados Unidos e cana de açúcar e café, mais comum no Brasil.
A mulher escrava é trazida para cumprir as mesmas atividades do
homem escravo, só utilizada de maneira diferente quando era do interesse de
seus senhores. Ângela Davis, em sua obra "Classe, Raça e Gênero" afirma:

No que dizia respeito ao trabalho, a força e a produtividade sob


ameaça do açoite eram mais relevantes do que as questões relativas
ao sexo. Nesse sentido, a opressão das mulheres era idêntica à dos
homens.
Mas as mulheres também sofriam de forma diferente, porque eram
vítimas de abuso sexual e outros maus-tratos bárbaros que só
poderiam ser infligidos a elas. A postura dos senhores em relação às
suas escravas era regida pela conveniência: quando era lucrativo
explorá-las como s fossem homens, eram vistas como desprovidas de
gênero; mas, quando podiam ser exploradas, punidas e reprimidas de
modo cabíveis apenas às mulheres, elas eram reduzidas
exclusivamente à sua condição de fêmeas. (DAVIS, 2016, p. 19)

A mulher negra escravizada além de ferramenta de produção, era


também objetificada sexualmente. Inumana demais para ser tratada como ser
com integridade em qualquer aspecto, não era digna de cidadania, mas útil
para satisfação de seus senhores.
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Só em 1888, já após a proibição do tráfico negreiro, os escravos vieram


a ser abolidos no Brasil, o último país a praticar o feito. Com uma cultura já
suprimida pelo colonialismo, a população africana e afrodescendente, assim
como a nativa, sofreu com a eugenia dos povos e quando já era insustentável a
manutenção das senzalas, foram, aos poucos, libertados da condição de
escravos. Entretanto, mesmo libertos, encontravam -se presos em sua
realidade social. (COSTA; AZEVEDO, 2016)
Longe de seu país de origem, a população afro e seus descendentes
paulatinamente foram sendo "agraciados" com os efeitos da lei áurea, ainda
longe do que seria a cidadania brasileira. Sem qualquer finanças e com a Lei
das Terras que veio, de uma vez por todas, manter o status dos senhores
donos de terra, delimitando a aquisição de terras através da compra e venda
com alto valor, os recém-libertos não tinham condições mínimas para se
tornarem seus próprios senhores. Tendo que para não perecerem em miséria
maior que a já vivida, voltar para as fazendas para exercer um trabalho de
baixíssimo custo, escravo.
Os que se aventuraram a permanecer distantes dos seus antigos donos,
partiram rumo aos quilombos e cortiços, estes, casarões dos centros das
cidades abandonados por famílias falidas. Mais a frente, com a urbanização, a
população afro buscou habitação em terras afastadas em que as prefeituras
não detinham controle. O movimento de urbanização tem cor, classe e direção.
De dentro para fora, quanto mais distantes eram as comunidades, mais pobres
e escuros, são os seus habitantes. (COSTA; AZEVEDO, 2016)
Assim nasceram as favelas, isoladas em morros com realidade
completamente distinta dos centros e arredores urbanos. Os habitantes dos
aglomerados periféricos subhumanos, viveram e vivem até hoje uma abolição
inacabada, sem a efetivação do direito à cidade. Nesse contexto, se encontra a
mulher negra, pobre e periférica brasileira. Numa situação ainda pior do que a
dos homens negros, e claro, mulheres brancas, pois sendo os problemas
sociais interseccionais, quanto mais etiquetas sociais recebe o indivíduo, mais
profunda será sua posição de oprimido.
O direito à cidade que envolve questões de acessibilidade social e
geográfica como emprego, educação, transporte, saúde, cultura, não só não é
materializado, como se torna, para essas mulheres, formas de o Estado e dos
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filhos, netos e bisnetos dos senhores, hoje chefes capitalistas, controlá-las,


podendo tanto mantê-las em seu nível social, através das oportunidades de
emprego oferecidas, ou até matá-las, como é com a criminalização do aborto.
Que serve apenas para definir quais mulheres irão morrer através de práticas
abortivas de risco e quais irão sobreviver por ter acesso a práticas abortivas
seguras.
As mulheres que antes eram escravas, hoje são empregadas
domésticas de famílias ou empresas. Enquanto a mulher branca pleiteava
através de seu espaço de fala a entrada no mercado de trabalho, a mulher
negra já trabalhava para sustentar sua família, enfrentando uma dupla ou tripla
jornada de trabalho, bem como a violência doméstica, feminicídio, racismo,
assédio de seus patrões e outros destratos mais.
Preocupadas em trabalhar para subexistirem junto a suas famílias e
morando distante dos centros urbanos, sem acesso devido ao transporte, as
mulheres negras têm devido às condições de sua classe, uma série de
barreiras impeditivas de acesso à educação e consequentemente aos espaços
de poder. As cotas são, num país como o Brasil, repleto de desigualdade,
completamente justificáveis. Uma música, que muito mais parece uma poesia
social trágica, canta "Cota não é esmola":

Existe muita coisa que não te disseram na escola.


Cota não é esmola!
Experimenta nascer preto na favela pra você ver!
O que rola com preto e pobre não aparece na TV
Opressão, humilhação, preconceito
A gente sabe como termina, quando começa desse jeito
Desde pequena fazendo o corre pra ajudar os pais
Cuida de criança, limpa casa, outras coisas mais
Deu meio dia, toma banho vai pra escola a pé
Não tem dinheiro pro busão
Sua mãe usou mais cedo pra poder comprar o pão
E já que tá cansada quer carona no busão
Mas como é preta e pobre, o motorista grita: não!
E essa é só a primeira porta que se fecha
Não tem busão, já tá cansada, mas se apressa
Chega na escola, outro portão se fecha
Você demorou, não vai entrar na aula de história
Espera, senta aí, já já dá 1 hora
Espera mais um pouco e entra na segunda aula
E vê se não atrasa de novo! A diretora fala
Chega na sala, agora o sono vai batendo
E ela não vai dormir, devagarinho vai aprendendo que
Se a passagem é 3,80 e você tem 3 na mão
Ela interrompe a professora e diz, 'então não vai ter pão'
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E os amigos que riem dela todo dia


Riem mais e a humilham mais, o que você faria?
Ela cansou da humilhação e não quer mais escola
E no natal ela chorou, porque não ganhou uma bola
O tempo foi passando e ela foi crescendo
Agora la na rua ela é a preta do suvaco fedorento
Que alisa o cabelo pra se sentir aceita
Mas não adianta nada, todo mundo a rejeita
Agora ela cresceu, quer muito estudar
Termina a escola, a apostila, ainda tem vestibular
E a boca seca, seca, nem um cuspe
Vai pagar a faculdade, porque preto e pobre não vai pra USP
Foi o que disse a professora que ensinava lá na escola
Que todos são iguais e que cota é esmola
Cansada de esmolas e sem o dim da faculdade
Ela ainda acorda cedo e limpa três apê no centro da cidade
Experimenta nascer preto, pobre na comunidade
Cê vai ver como são diferentes as oportunidades
E nem venha me dizer que isso é vitimismo
Não bota a culpa em mim pra encobrir o seu racismo!
[...] São nações escravizadas
E culturas assassinadas
É a voz que ecoa do tambor
Chega junto, venha cá
Você também pode lutar, ei!
E aprender a respeitar
Porque o povo preto veio para revolucionar
Não deixe calar a nossa voz não!
Não deixe calar a nossa voz não!
Não deixe calar a nossa voz não!
Revolução [...]. (FERREIRA, 2018)

Por que os cursos elitistas das grandes federais como medicina e


odontologia não tem ocupação expressiva, mas a maioria da população
carcerária feminina é negra e pobre? Será que não há nesta nação mulher
negra que queira ser médica ou dentista ? Ser senadora ou juíza? Será que a
vontade das mulheres negras é estar em espaços sem qualquer dignidade?
Esta é na verdade a marca histórica cravada nas costas de quem tanto levou
chicote, é a herança do estigma, da marginalização.
Por isso a existência de um feminismo negro, para que haja um
movimento específico que dê voz a essas mulheres. Voz não apenas acerca de
temáticas voltadas para a negritude, sim voz sobre as questões sociais em que
a mulher negra é impedida de opinar. Tanto pela igualdade, quanto na
economia, tanto pela liberdade, quanto sobre planejamento, tanto para políticas
afirmativas, quanto para outras políticas públicas. A mulher negra precisa ser
ouvida de maneira transversal e as pastas governamentais não devem ser
isoladas por secretaria ou ministérios das discussões de gênero, classe e raça,
mas ser interseccional.
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Respeitar o direito de ser ouvida da mulher negra é respeitar seu espaço


de fala, sua luta, sua dor e ao contrário do que muitos acreditam, ter outros
espaços de fala na discussão não significa ser abusivo, racista ou machista.
Significa dizer que a mulher negra não pode dialogar sozinha, pois é de
extrema importância que as mulheres e homens brancos heterossexuais
também conversem sobre os problemas da mulher negra lésbica, por exemplo.
Em Pedagogia do Oprimido o Professor Paulo Freire compartilha: ―ninguém
liberta ninguém, ninguém se liberta sozinho, todos se libertam em comunhão‖.
(FREIRE, 2007, p. 29)
Num diálogo, numa discussão, todos tem um espaço de fala que não
pode servir para calar, sim para reconhecer o espaço social que cada um
ocupa. No feminismo negro, é essencial que haja o reconhecimento do espaço
social experimentado, vivido, pelo oprimido. Ou seja, que se reconheça o
posicionamento da mulher negra como vítima das etiquetas sociais e por isso
principal a gente do discurso. Ao mesmo tempo que se reconheça o espaço de
fala nele, da mulher branca, que saber ser privilegiada, que fala sobre
branquitjde e os efeitos dela na sociedade em que vivemos.
Só a partir da democratização dos espaços de fala em toda a sociedade,
as instituição poderão ser efetivamente retiradas do contexto de assédio de
seus direitos e integridades. Podendo a mulher negra participar da resolução
dos problemas sociais e dos demais problemas humanos e econômicos.

2.3 O Patriarcado Institucional

A construção institucional de uma nação é o espelho do povo no que diz


respeito ao perfil de seus governantes. Como as instituições e espaços de
poder serão integrados definirá o tratamento de diversas questões, inclusive as
carcerárias, se fazendo imprescindível refletir acerca da composição política
como um todo.
O livro ―Mulheres e Poder – Um Manifesto‖ (2018) investe de maneira
emblemática na reflexão sobre a relação entre as candidaturas políticas da
última eleição presidencial Norte Americana, na qual estava Hillary Diane
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Rodham Clinton de um lado e Donald John Trump do outro, e o sexismo


evidente fincado na cultura dos Estados Unidos, aludindo às origens ocidentais
clássicas. O raciocínio toma forma a partir da análise da campanha de Donald
contra Hillary, que tinha como recurso gráfico a reprodução da cabeça de
Medusa nas mãos de Perseu, herói grego que decapitou a temida mulher
monstro dos cabelos de cobra.
Indiscutivelmente a escolha do tema para a campanha eleitoral de
Trump possuía um caráter sexista por definir bem a construção social do
patriarcado para posição da mulher, não apenas na política, mas no poder
como um todo. A cabeça arrancada de Medusa com rosto de Hillary nas mãos
de Perseu com rosto de Trump, remetem a ideia de triunfo do homem forte,
guerreiro, valente, sobre a mulher poderosa que, na verdade, se torna
destrutiva justamente pelo poder que lhe é dado, mulher destrutiva por ser
―pouco objetiva‖, ―instável‖, ou seja, a visão expressa é que mulher e poder são
dois componentes heterogêneos, que não devem jamais se misturar, mesmo
que essa mulher use terninhos e tenha cabelo curto, como Hillary.
É nessa ótica que para a parcela machista e androcêntrica de seu
eleitorado, Trump torna-se a personificação de Perseu, o herói vilanizador da
Hillary Medusa, que não aponta apenas para Hillary em sua individualidade,
mas sim a unificação da personalidade feminina como incabível no mundo
político. Uma aceitação que não é de cunho separadamente político e
momentâneo, mas cultural e imortalizado, assim como a horrenda medusa
revivida pela arte em suas várias dimensões.
Com a força cultural da campanha, não é espantoso que a mesma tenha
atingido um nível doméstico, estampado em canetas, camisas, quadros,
fazendo parte da decoração de inúmeros lares americanos, demonstrando a
naturalidade do ato de reduzir a mulher a pouco ou quase nada ou levá-la ao
extremo de Medusa, instrumento de destruição da boa política masculina.
Uma situação dotada de tamanha naturalidade não surgiria do nada, não
entraria em casas por entrar, isso acontece por uma sistematização do
patriarcado, que propicia a popularização do duelo Hillary x Trump, de modo
que, toda mulher que almeja o poder
e luta, por ele enfrenta esse sistema opressor. O cenário político nada
mais faz do que expor, como corroborador, a conduta já existente do homem
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que se sobrepõe a mulher que tentar inserir a si em meios de domínio


masculino.
No Brasil o contexto político não apresenta disparidade quanto à cultura
patriarcal ocidental. Além de também eleger um presidente representante fiel
do patriarcado, machismo, homofobia e racismo, possui uma
representatividade feminina baixíssima, contando inclusive com candidatas
laranja para cumprimento da cota do mínimo de mulheres em partidos políticos
e recebimento do investimento de 30% do fundo de campanha para
candidaturas femininas, como está sendo investigado pela Polícia Federal no
caso do PSL – Minas Gerais.
Continuando no âmbito político, constata-se que após as eleições de
2018 apenas 15% da totalidade da Câmara e 13% do Senado são formados
por mulheres, o que é contraditório, já que o eleitorado brasileiro feminino
corresponde hoje a 52% do eleitorado total (BRASIL, 2018). Os dados
confirmam o despertencimento feminino a causas que lhe deveriam ser caras,
pois mulheres também são tocadas pelo machismo e acreditam na sua
inferioridade. Heleieth Saffiot pondera em ―O Poder do Macho‖:

A força desta ideologia da "inferioridade" da mulher é tão grande que


até as mulheres que trabalham na enxada, apresentando maior
produtividade que os homens, admitem sua "fraqueza". Estão de tal
maneira imbuída desta ideia de sua ―inferioridade‖, que se assumem
como seres inferiores aos homens. (SAFFIOT, 2001, p.12)

A citação além de indicar uma das causas do despertencimento, ainda


ilustra que o poder como elemento do labor, não se restringe ao âmbito político,
é parte da atividade de trabalho em outras áreas, em outras escalas sociais e
nessas outras também há a sensação de inferioridade que resultam tanto na
perseguição de gênero quanto na não reação a essa perseguição, pela crença
que ela seja natural e devida.
Mulheres sofrem perseguição de gênero pelo poder implicado pela
função, pela estigmatização da profissão escolhida, pela vontade de ascender
em determinada carreira, por qualquer fator que não se enquadre na
determinação social. Desde sempre a maioria dos cargos de poder são
ocupados por homens que fabricaram e moldaram a posição de poder a sua
maneira, fazendo com que esse espaço se tornasse característico da figura
masculina.
24

É com essa premissa que ―Mulheres e Poder – Um Manifesto‖


desenvolve um pensamento a cerca do que é o poder e como participar dele já
que a mulher é vista como uma invasora da mansão elitista e sexista do poder.
Os reis em seu castelinho decidem por suas súditas como, quando e até que
andar do castelo as plebeias chegarão, ou se permanecerão abandonadas na
masmorra que não foi elaborada para elas, como os presídios brasileiros.
Destarte, não apenas a expressão do poder é patriarcal, mas toda a
estrutura que o cerca, incentivando a visão da mulher como estranha a essa
estrutura, não como igual, legítima. É tão natural expelir a mulher da estrutura
construída que até sua inserção é corrompida por esse pensamento, pois
quando se fala na participação feminina, se fala em quebra de barreiras, queda
de muros, o que pressupõe um movimento de fora para dentro.
Além da dificuldade de acesso ao poder, quando esse acesso ocorre é
direcionado as questões femininas, questões quais são determinadas a partir
da construção social patriarcal. É como dizer que uma mulher deve apenas
administrar problemas diretamente ligados a outros grupos de mulheres, e não
da sociedade como um todo, ou dizer que se recebe poder será, por exemplo,
na área da educação, não nas finanças. Um grande exemplo disso é o cargo
de Ministro da Fazenda, que foi ocupado por uma mulher apenas uma vez,
durante o governo Collor, Zélia Cardoso de Mello, ministra de 15 de março de
1990 até 15 de maio de 1991.
Com uma ocupação dos espaços políticos e de poder tão dominada pelo
patriarcado, a adequação das estruturas às mulheres fica comprometida.
homens brancos e heteronormativos falam em nome das mulheres sem
conhecerem o mínimo do que é preciso a estas e pensam as estruturas para
estas a partir de seu ponto de vista do mundo. Um ponto irracional no qual as
mulheres nada importam. A população carcerária feminina não tem suas
carências ouvidas porque sequer tem quem fale por ela.
25

Figura 02: Morro de Favela

Fonte 02: Cultura Genial (2016)

Morro da Favela pertence ao período Pau-Brasil. Retrata uma favela


com casinhas coloridas, árvores e pessoas.
É um obra de denúncia social, pois nessa época a população pobre
foi obrigada a ceder espaço nos grandes centros e se deslocar para
zonas periféricas. Foi nesse momento que houve um grande aumento
das favelas no país.
Apesar da crítica, Tarsila consegue retratar essa realidade de
maneira leve, sugerindo harmonia uma idealização do morro como
um lugar idílico. A composição data de 1924, tem 64 x 76 cm e
pertence a uma coleção particular. (MATÉRIA, 2017)
26

3 O SISTEMA CARCERÁRIO BRASILEIRO

3.1 Seletividade do Encarceramento

Para que se chegue ao entendimento da seletividade existente em


nosso país, se faz necessário, antes de tudo, analisar alguns dados essenciais
ao debate, para que seja, então, comprovadamente ilustrado o perfil da
população carcerária brasileira.
O Sistema Carcerário Brasileiro é o 4º (quarto) maior sistema carcerário
do mundo. A CNJ (Comissão Nacinal de Justiça) registrou em 2019 a
ultrapassagem de 800 mil presos, estimando a existência de 812 mil
encarcerados, e desse total, aproximadamente 41% desses presos são
provisórios, ou seja, ainda aguardam julgamento. (BARBIÉRI, 2019)
Quando a população carcerária era de 700 mil, marca ultrapassada em
2016, a população carcerária era formada por 61,7% de pessoas pretas ou
pardas. (BRASIL, 2018) Com o sistema carcerário feminino não poderia ser
diferente.
O Brasil, igualmente ocupa o 4º (quarto) lugar de país que mais prende
mulheres no mundo, tendo até 2016 mais de 42 mil mulheres presas, atrás
apenas dos Estados Unidos, China e Rússia. Da população carcerária feminina
mencionada, 62% das mulheres são negras. (INFOPEN, 2018)
Essas estatísticas, apesar de parecerem apenas números, são, na
verdade, a representação da construção histórica, social e econômica
brasileira. Como discutido no capítulo anterior há uma marginalização da
população afrodescendente, sobretudo, das mulheres negras que continuam a
ocupar o subsolo da pirâmide social erguida desde a colonização e perpetuada
até os dias de hoje. Das mulheres encarceradas, 27% tem de 18 a 24 anos
(INFOPEN, 2018), o que demonstra a renovação da marginalização das
gerações pelas instituições de poder. Entretanto, de maneira intigrante, ainda
assim:

Quem foi ao exterior e se definiu como brasileiro, ou quem conversou


com estrangeiros em visita ao nosso país, com certeza jáe deparou
27

com uma espécie de versões alentoradas desta terra tropical. O


suposto é que esta seria uma nação avessa a conflitos, pacífica na
sua índole, democrática no que se refere à convivência de gêneros,
raças e etnias, em suma: uma espécie de ―paraíso da tolerância‖ em
meio a um mundo inclemente.
Essas definições generalizantes não sobrevivem, porém, a um
enfrentamento no campo, a uma batida da polícia nas cidades, a uma
discussão entre políticos, a um assalto à mão armada, a uma briga no
trânsito, a um censo étnico que revela a desigualdade estrutural que
persiste por aqui. (NAIM, 2019, p. 207)

Essas instituições, já elucidadas anteriormente como racistas, patriarcais


e classistas, formadas por homens brancos heteronormativos, tendo uma
precisão de olhar iterseccional, usam, pois, mecanismos de controle da
sociedade, a fim de manter marginalizada a população negra, em específico,
como dito, a população negra feminina.
Objetivamente, na presente pesquisa, um desses mecanismos para a
marginalização, controle e afastamento dos espaços de poder é o sistema
carcerário, que funciona como um ―caminhão de lixo‖ do qual as forças policiais
são os garis que coletam o lixo social. Sendo a mulher negra, o mais
decomposto dele. Afinal, o acesso dessas mulheres encarceradas a
materialização de direitos é, basicamente, inexistente por não serem
consideradas como cidadãs no sentido substancial da palavra, por sua
localização periférica, que se liga diretamente com a raça.
O Levantamento Nacional do Infopen (2018) traz as taxas de
escolaridade das detentas, corroborando com o não cumprimento de direitos
fundamentais básicos como o da educação:

Figura 03: Escolaridade das mulheres privadas de liberdade no Brasil

Fonte 03: Levantamento de Informações Penitenciárias - INFOPEN, Junho/2016.


28

Ademais,o encarceramento em massa injustificado é evidente ao ponto


que são observadas as estatísticas referentes aos tipos penais que mais levam
a restrição da liberdade. A lei 11.343/06 deixa grande inexatidão, uma
verdadeira textura aberta para o enquadramento dos flagranteados e
condenados na qualidade de usuário ou traficante. Não coincidentemente, o
―tráfico´‖ é o maior delito cometido, representando 62% da totalidade, como
demonstra o seguinte gráfico:

Figura 04: Distribuição dos crimes tentados/consumados entre os registros das mulheres
privadas de liberdade, por tipo penal.

Fonte 04: Levantamento de Informações Penitenciárias - INFOPEN, Junho/2016.

Resta inequívoco o caráter seletivo do Sistema Carcerário Brasileiro que


é um reflexo das desigualdades da nação, apresentadas por Naím (2018,
p.126-127):

O fenômeno da desigualdade é tão enraizado entre nós que se


apresenta a partir de várias fazes: a desigualdade ecnômica e de
renda, a desigualdade de oportunidades, a desigualdade racial, a
desigualdade regional, a desigualdade de gênero, a desigualdade de
geração e a desigualdade social, presente nos diferentes acessos à
saúde, educação, à moradia, ao transporte e ao lazer.
A desigualdade social é especialmente aguda, e tende sempre a
aumentar, em países que oferecem poucas oportunidades de
emprego, apresentam investimento discreto nas áreas sociais e não
estimulam o consumo de bens culturais. Não por coincidência, a
desigualdade afeta, vigorosamente, os países periféricos e de
passado colonial, onde se percebe a preservação de um robusto gap
social no padrão de vida dos habitantes.

É um verdadeiro mecanismo de manutenção do poder do qual o sistema


carcerário, seletivo como o é, é instrumento indispensável para as instituições
29

integradas pelos gênero, raça e classe dominantes, usado de maneira violenta


e desumana. Figurando o poder exercido de maneira tão brutal que persiste
mesmo quando não se justifica (NAIM, 2019).

3.2 Crítica ao Sistema Carcerário Brasileiro

Antes de serem debatidos os problemas do sistema carcerário feminino,


faz-se imprescindível, de maneira crítica e problematizadora, entender os
problemas do sistema carcerário como um todo, por óbvio, que também serão
problemas do sistema carcerário feminino, entretanto, acrescidos do ser
mulher.
A já citada superlotação é um dos maiores problemas do sistema
carcerário brasileiro. Graças à cultura do encarceramento, a restrição da
liberdade foge de seu fim, impossibilitando a reintegração e banalizando o uso
do Direito Penal.
O punitivismo leva a um caminho quase sem volta de superlotação, falta
de oportunidades, reincidência, precarização dos estabelecimentos prisionais,
violação de direitos, que em tese, são invioláveis e aumento da sede por
vingança, que é sinônimo da erosão da cultura de paz.
A realidade carcerária brasileira é uma realidade subhumana deplorável
e infernal para aqueles que acreditam em inferno. A falta de qualquer traço de
dignidade humana em celas que comportam 70% mais pessoas (G1, 2019) que
sua capacidade normal é inevitável. Há no país presos aguardando algemados
em viaturas em frente a delegacias no Rio Grande do Sul por falta de vagas.
(G1, 2019)
Enquanto ao cumprimento do princípio da presunção da inocência, a
realidade é bem mais profunda do que a consideração da prisão em segunda
instância, um discurso que se limita a essa reflexão é por si só vazio, visto que
o acesso a primeira instância para aqueles que são o alvo da seleção
sistemática de aprisionamento muitas vezes nem acontece. Como mostra o
Monitor da Violência (G1, 2019), 37, 6% dos presos são presos provisórios e
30

desse total 37% são considerados inocentes no fim de seus processos. São
anos perdidos no abandono e sofrimento irreparáveis até que o Estado
reconheça sua inocência. Mas de nada adianta realizar uma crítica ao sistema
carcerário brasileiro, sem se pensar em um meio concreto e viável de combate
ao punitivismo que o toma a nação.
Para não cometer tal erro, em busca de uma saída para a catástrofe em
acontecimento, traz-se uma brilhante passagem do ―AS PLANTAS DO JARDIM
DE HULSMAN: DISCUTINDO O ABOLICIONISMO PENAL E O
ABOLICIONISMO CARCERÁRIO‖, do Professor Luciano Oliveira:

Como se vê, abolir a ―pena tal qual é concebida e aplicada‖ por


nossos sistemas penais, ―não significa necessariamente rejeitar
qualquer medida coercitiva‖. Mas ―em que condições determinados
constrangimentos‖ constituiriam o que Hulsman nomeia de ―pena
legítima‖? Ele cita, além da ―obrigação de reparar e restituir‖, hipótese
que estaria de acordo com a ideia abolicionista, possibilidades que
parecem não estar de acordo com ela, como ―a internação‖ (itálico
meu). Noutras palavras, Hulsman introduz a possibilidade da prisão!
Excepcionalmente e com outro nome, vá lá. Mas ela está lá, no seu
texto. É claro que, em se tratando de uma figura humana como
Hulsman, a hipótese só é imaginada na medida em que apresente
―alguma possibilidade de desempenhar um papel de reativação
pacífica do tecido social‖, sem a qual constituiria ―uma intolerável
violência na vida das pessoas‖ (Idem, p. 87). Noutros termos, ele
continua fiel ao princípio abolicionista da superação da ―antítese
vítima-agressor‖. Trata-se de uma postura antes normativa que
sociológica – terreno onde, como realcei no início, estou colocado.
Nesse plano, retorno a uma evidência que se impõe: nenhuma
sociedade vive sem interditos e, portanto, sem sanção. A questão é:
que tipo de interdito, e que tipo de sanção.

Caso não tenha ficado claro, a vitória contra as iniquidades do Sistema


Carcerário Brasileiro não está na disponibilização de mais vagas no sistema
prisional, ainda mais quando as novas vagas criadas são menos do quantitativo
de novos presos anuais - respectivamente aproximadamente 8 mil novas vagas
para aproximadamente 17 mil novos detentos (G1, 2019) -, mas sim na criação
de meios alternativos de resolução de conflitos que primem pela construção da
cultura de paz e abandono do sentimento de vingança.
31

Figura 05: A Negra

Fonte 05: Cultura Genial (2016)

No trabalho A Negra, Tarsila expõe a figura de uma mulher com


traços bem marcados, mãos e pés grandes e cabeça pequena. Além
disso, a artista explora elementos cubistas ao fundo.
Nessa obra, podemos perceber a representação da mulher negra
como um ser que carrega uma pesada carga social, o que se pode
notar pelo olhar melancólico e pelo seio caído à mostra.
A mama que pende do corpo faz referência à prática das amas de
leite na época da escravatura, na qual as escravizadas
amamentavam e cuidavam dos filhos das mulheres brancas da elite.
O quadro é um óleo sobre tela feito em 1923 - um ano depois da
Semana de Arte Moderna - e mede 100 x 80 cm. Pertence à Coleção
Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo, em
São Paulo. (MATÉRIA, 2015)
32

4. O SISTEMA CARCERÁRIO FEMININO

4.1 A Mulher no Cárcere

Assim como as estruturas sociais da nação brasileira, a estrutura


prisional foi pensada por homens e para homens. As mulheres, sempre
excluídas do planejamento social não são fazedoras, nem alvos dessas
estruturas, a não ser, claro, se estas forem relacionadas às atividades que lhe
são determinadas pelo gênero.
As prisões brasileiras possuem estruturas masculinizadas, que não se
adéquam às necessidades femininas, sem a especificidade necessária para
aprimorar as instalações para a habitação feminina digna. O gênero masculino
não só domina os espaços de poder de prestígio, como também impera nos
espaços marginalizados, estando o gênero feminino socialmente colocado em
posição inferior a essa margem. Reafirmando que ―a imbricação existente entre
sexo, raça e classe são estruturantes da dinâmica capitalista e permanece nas
suas configurações particulares atuais‖. (BEZERRA, 2013, 173)
O levantamento (2018) do Infopen, já trazido nesse trabalho, mostra que
de 1.418 estabelecimentos prisionais, apenas 7% são considerados
exclusivamente femininos e 17% são caracterizados como mistos. Esses
estabelecimentos mistos foram criados, originalmente, como cadeias
masculinas, que, ao longo do tempo, tiveram criadas alas femininas.

Figura 06: Destinação dos estabelecimentos penais de acordo com o gênero.

Fonte 06: Levantamento de Informações Penitenciárias - INFOPEN, Junho/2016.


33

Como mencionado, a população carcerária feminina é de mais de 42 mil


mulheres, sendo que em 2000 essa população era de 5,6 mil mulheres,
havendo um aumento de 656% da ocupação carcerária feminina. O que é, no
mínimo, contraditório a quantidade estabelecimento reservados às mulheres,
deixando clara a superlotação que intensifica a precariedade das instalações:

Figura 07: Evolução das mulheres privadas de liberdade (em mil) entre 2000 e 2016

Fonte 07: Infopen Mulheres 2018.

O sistema carcerário brasileiro como um todo é precário e não se


preocupa em atender um mínimo existencial digno, o que se agrava no caso
das mulheres, que possuem mais marcador de marginalização e exclusão, o
gênero. Inseridas num contexto de subcidadania, as internadas passam
diariamente por situações degradantes para o ―ser mulher‖ que compreende,
entre outras coisas menstruar, por vezes engravidar, amamentar e conviver de
com seus filhos de maneira saudável à maternidade.
Frente aos dados trazidos, é inquestionável que o próprio
encarceramento é um problema, devendo este ser combatido. Entretanto, o
encarceramento existente precisa receber a assistência material e estrutural
cabível, como aponta a Lei de Execução Penal, definidora das assistências a
serem prestadas: ―Art. 11. A assistência será: I - material; II - à saúde; III -
jurídica; IV - educacional; V - social; VI - religiosa‖. (BRASIL, 1984)
As assistências prestadas, não são disponibilizadas sem um fim
específico, ao contrário, são prestadas com um objetivo constitucional:
promover a manutenção da habitação digna. Infelizmente, a consideração ora
realizada caminha apenas pelo campo idealista, não acontece na prática. A
assistência material de higiene, por exemplo, é insuficiente, aquém do carecido
34

pelas internadas. A jornalista Nana Queiroz investigou as condições de vários


estabelecimentos prisionais através de detentas e carcereiras que se tornaram
personagens da obra que resultou da pesquisa realizada, ―Presos Que
Menstruam‖. Dentre os depoimentos trazidos, está este que especificamente
fala sobre produtos de higiene como papel higiênico e absorvente:

Em geral, cada mulher recebe por mês dois papéis higiênicos (o que
pode ser suficiente para um homem, mas jamais para uma mulher,
que o usa para duas necessidades distintas) e dois pacotes com oito
absorventes cada. Ou seja, uma mulher com um período menstrual
de quatro dias tem que se virar com dois absorventes ao dia; uma
mulher com um período de cinco, com menos que isso. — Todo mês
eles dão um kit. No Butantã, dão dois papel higiênico, um sabonete,
uma pasta de dente da pior qualidade e um (pacote de) absorvente.
Falta, né? E ninguém dá nada de graça pra ninguém — conta
Gardênia. Itens de higiene se tornam mercadoria de troca para quem
não tem visita. Algumas fazem faxina, lavam roupa ou oferecem
serviços de manicure para barganhar xampu, absorvente, sabão e
peças de roupa. No regime semiaberto, só recebem o kit aquelas que
não têm visita. Para evitar que as trocas gerem uma espécie de elite
de cadeia, as penitenciárias limitam o número de produtos que as
detentas podem trazer das ―saidinhas‖. (QUEIROZ, 2015, p. 103)

As necessidades femininas são ignoradas num sistema pensado por


homens e para homens. A formação fisiológica da mulher é desconsiderada,
como dito na citação feita. O aumento assombroso do encarceramento
feminino deveria ter sido evitado através da criação de oportunidades
equitativas de emprego, educação, saúde para todas as mulheres
independentemente de orientação, classe, raça ou zona urbana, e, tendo
acontecido, esse aumento, então, deveria ter alertado para a necessidade de
repensar as estrutura prisional nacional, antes do acontecimento de episódios
tão degradantes.
As condições de péssima habitação além de afetar as mulheres
encarceradas, atingem seus filhos. Se para as não gestantes a estrutura já é
desfavorável, para as gestantes é ainda mais. As mães que têm seus filhos
durante o período de encarceramento sofrem por ver seus bebês vivendo no
mesmo cenário catastrófico que elas, durante o período de amamentação e
convivência necessária. A pena passa a ser transferida para os recém-
nascidos e crianças de pouca idade, desrespeitando a princípio da
instranscendência da pena previsto no artigo 5º, inciso XLV da CF/88:

Art. 5°, XLV: nenhuma pena passará da pessoa do condenado,


podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do
perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos
35

sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do


patrimônio. (BRASIL, 1988)

Desde a gravidez a experiência da maternidade para as presas, não é


como para as outras mães sinônimo de alegria, mas de frustração. Leiam com
atenção o relato integral de ―Gardênia‖, ouvida por Nana Queiroz, que apesar
de extenso para o trabalho, não se compara em tamanho com a dor sofrida,
merecedora de atenção ainda maior:

Quando a polícia finalmente pôs as mãos em Gardênia, ela estava já


com a gravidez avançada. Não que isso, em momento algum, tenha
lhe rendido tratamento especial. Quando foi detida, Gardênia foi
jogada com violência dentro da viatura e teve uma bolsa pesada
atirada contra sua barriga. — Aiiii! — Tá reclamando do quê? Isso é
só outro vagabundinho que vem vindo no mundo aí! Quatro dias
depois de chegar à delegacia, a pressão emocional e as más
condições adiantaram o parto em dois meses. Começou a sentir as
contrações e pedir ajuda, mas os policiais alegaram que não havia
viatura disponível para levá-la ao hospital. Dor, dor, dor. E foi só
quando ela entrou mesmo em desespero e começou a gritar, a
incomodar, que encontraram uma viatura para ela. A agonia era tanta
que Gardênia até rasgou a farda do policial que a transportou até o
carro. Entre uma contração e outra, ela foi observando a rua, as
pessoas que olhavam o carro com medo, com curiosidade, com
hipocrisia. A ninguém importava Gardênia ou o bebê que carregava.
Eles eram o resto do prato daquela sociedade. O que ninguém quis
comer. E seu filho já nascia como sobra. A dor foi esquecida por um
momento quando Gardênia chegou ao hospital e, já na maca,
conheceu a dra. Dariane. Ela se aproximou com seu jaleco branco e
rostinho de menina ―que nem parecia de uma médica, mas de uma
estudante‖. Pediu que retirassem as algemas de Gardênia, perguntou
se ela precisava de mais anestésico e disse que poderia ter o quanto
quisesse. Fazia tempo que ela não era tratada assim que nem gente
— principalmente por alguém que não ―tirava cadeia‖ 1 também. —
Ela me tratou bem. Eu sentia dor, porque conforme dá os ponto dói,
né? E eu: ―ai dotora, tá doendo‖, e ela dava outra anestesia. Se desse
uma pontada, ela dava outra. Dava anestesia sem dó. Sem
economizar. Então, quer dizer, eu achei que ela me tratou bem
porque geralmente eles dão ponto a cru, né? Lembro dela: era
branquinha, do cabelo bem lisinho, assim, comprido. Um amorzinho.
Os cabelos loiros, os olhos pretos. Era bonita, uma cara de menina
bem novinha. Eu ia até pôr o nome da minha filha em homenagem à
médica: Dariane. Não pôs. Mais tarde, por medo de perder a guarda
da filha, pediu que a irmã corresse para registrá-la. Como a irmã não
sabia que nome a mãe havia escolhido, colocou Ketelyn mesmo, que
era um de que ela gostava. — Fiquei triste porque eu queria esse
outro nome, né? Tanto é que eu fiquei chamando ela um tempão de
Dariane. Dei todas as vacinas nela como Dariane antes de registrar,
na carteirinha, o nome é Dariane. Aí depois que registrou começou a
chamar ela de Ketelyn. Mas tá bom, já acostumei Ketelyn mesmo.
Tem que acostumar, né, fazer o quê? A pequena Dariane-Ketelyn
veio ao mundo com pressa. Foi um nascimento prematuro, um parto
rápido, e uma saída-relâmpago da sala — quase como se fosse um
apêndice retirado. Não se deu ao luxo de descansar do esforço de
nascer no colo da mãe. Não deixaram nem que Gardênia segurasse
a filha. Só conseguiu, de relance, conferir que era menina, como
havia anunciado a médica. ―Até nisso é diferente a gente presa do
36

que a gente solta. Solta, você pega seu filho, vê. E eu nem consegui
olhar os dedos da mão e do pé, pra ver se não tava faltando
nenhum‖, ficou se repetindo. Logo depois dessa inspecionada rápida,
Gardênia foi algemada à cama novamente. O procedimento é comum
para presas que dão à luz. (QUEIROZ, 2015, p. 41)

A distância sentida no momento do parto, com o tempo só aumenta.


Pois ao contrário do que acontece com os detentos do sexo masculino, com os
quais as esposas continuam casadas e a famílias criam uma constância na
visitação, as detentas, muitas vezes, são abandonadas, esquecidas e ficam
afastadas dos seus filhos por anos.

Despejou o leite devagarinho no copo de café, curtindo cada gota que


caía com aquela satisfação que as pessoas sentem quando veem o
mar pela primeira vez, conhecem o amor de suas vidas ou
descobrem que se curaram de uma doença grave. Depois de quase
seis anos, era a primeira vez que Safira podia fazer o café da manhã
dos dois filhos — um de seus desejos imediatos na sua primeira
saída do presídio no regime semiaberto. Colocou os copos na mesa,
sorridente. Um dos meninos olhou aquilo com estranheza. — Mas
você não sabe, mãe, que a gente não toma café, só toma Toddy? A
frase caiu sobre ela com o peso dos anos perdidos. Em sete anos de
prisão, chegara a ficar três sem vê-los. Perdeu o primeiro dia de aula,
a primeira vez que andaram de bicicleta. O mais velho, de 13 anos, já
tinha até uma namorada. ―Eu não conheço meus filhos. Eu sou assim:
eles sabem que eu sou a mãe deles, mas praticamente sou uma
desconhecida. Além de eu ter que me adaptar às coisas que eu perdi
todo esse período que estive presa, eu tenho que aprender a
conhecer os MEUS filhos‖, pensou. (QUEIROZ, 2015, p. 12)

Sobre o contato com o recém-nascido Nana Queiroz ainda pondera:

Ketelyn nasceu há dezessete anos e até pouco tempo atrás centenas


de mulheres tiveram a mesma despedida fria e relâmpago de seus
filhos. Só em 28 de maio de 2009, o então presidente Luiz Inácio Lula
da Silva sancionou a Lei 11.942, que assegurava às presidiárias o
direito de um período de amamentação de no mínimo seis meses e
cuidados médicos aos bebês e a elas. A lei não foi, no entanto,
acompanhada de meios para seu cumprimento. Existem apenas
cerca de sessenta berçários e creches em todo o sistema carcerário
feminino brasileiro. Quando não há vagas nesses locais, o
procedimento é enviar as lactantes para berçários improvisados nas
penitenciárias, onde elas podem ficar com o filho e amamentá-lo, mas
não têm acesso a cuidados médicos específicos. O benefício não é
estendido a todas as mulheres, sobretudo não às que cumprem pena
em locais impróprios e precisam sujeitar os recém-nascidos às
mesmas condições subumanas em que vivem. (QUEIROZ, 2015,
p.43)

Dados do Ministério da Justiça (BRASIL, 2007), apontam que em 2008,


1,24% das mulheres brasileira presas encontravam-se grávidas, 1,04% das
internadas ficavam presas com seus filhos e 0,91% de mulheres encarceradas
se encontravam em período de amamentação. Neste momento a população
carcerária feminina era de 27.000 mulheres.
37

Vale destacar que o tempo de permanência com a mãe no


estabelecimento prisional variava entre 4 meses a 7 anos de idade. 58,09%
das prisões autoriza a habitação de crianças até os 6 meses, 12,9% até 4
meses, 9,7% durante a amamentação e 6,5% até dois anos de idade. Das
cadeias femininas, apenas 19,61% possuem berçários ou estruturas apartadas
dos pavilhões prisionais. Ainda é preciso frisar que 51,61% dos
estabelecimentos prisionais têm locais improvisados para as crianças, em
grande parte, restritos à própria cela. Celas estas que nem dão conta das
próprias presas:

Em visita à Colônia Penal Feminina de Abreu e Lima, a promotora


de Execuções Penais Rosa Maria de Andrade constatou um cenário
de caos e total falta de políticas públicas para a ressocialização das
presas. Segundo a promotora, há várias celas com mais de 20
mulheres aglomeradas. A capacidade é de até cinco.
(PERNAMBUCO, 2019)

Como somatório às péssimas condições da estrutura prisional dos


estabelecimentos voltados para o cárcere feminino as presas passam também
por maus tratos por parte dos agentes penitenciários: ―A promotora explicou
que as denúncias de maus-tratos na unidade são constantes. A mais recente
aponta que pelo menos duas detentas foram gravemente espancadas por
dois agentes. A motivação ainda não foi descoberta‖. (PERNAMBUCO, 2019)

4.2 A Constituição Federal de 1988 e as Mulheres Encarceradas

Num estado Democrático de Direito toda voz deve ser ouvida e o espaço
de discurso é democrático, todas as classes devem se expressar e ouvir, sem
qualquer distinção. Num estado Democrático de Direito a fala é um direito de
todos, inclusive, das mulheres encarceradas, indivíduos sociais indistintos.
Cumpre, então, a esse modelo de Estado a existência de elementos
principiológicos:

a) princípio da constitucionalidade, que exprime, em primeiro lugar,


que o Estado
38

democrático de Direito se funda na legitimidade de uma Constituição


rígida, emanada da vontade popular, que, dotada de supremacia,
vincule todos os poderes e os atos deles provenientes, com as
garantias de atuação livre da jurisdição constitucional;
b) princípio democrático que, nos termos da Constituição, há de
constituir uma democracia representativa e participativa, pluralista, e
que seja a garantia geral da vigência e eficácia dos direitos
fundamentais (art. 1º);
c) sistema de direitos fundamentais individuais, coletivos, sociais e
culturais (Títulos 11, VII e VIII);
d) princípio da justiça social, referido no art. 176, caput, no art. 198,
como princípio da ordem econômica e da ordem social; como
disssemos a Constituição não prometeu a transição para o socialismo
mediante a realização da democracia econômica, social e cultural e o
aprofundamento da democracia participativa, como o faz a
Constituição
portuguesa, mas abre-se ela, também, para a realização da
democracia social e cultural, embora não avance significativamente
rumo à democracia econômica;
e) princípio da igualdade (art. 5º, caput, e inciso I);
f) princípio da divisão de poderes (art. 2º) e da independência do juiz
(art. 100);
g) princípio da legalidade (art. 5º, II);
h) princípio da segurança jurídica (art. 5º, XXXVI a LXXIII). (SILVA,
1988, p. 24)

Esta democracia a qual deve-se compromisso não se limita a


democracia formal que diz respeito a expressão cidadã pelo voto, diz respeito a
democracia substancial que vai além, transcende a própria concepção
democrática, pois se dirige aos valores que vêm a formar o estado social,
constitucional, político, de direito.
A democracia substancial prima pelo cumprimento dos direitos e
garantias fundamentais que possibilitam o alcance da participação efetiva e
estado de bem-estar social como uma realidade material para toda a sociedade
sem qualquer distinção, com repercussão nos três poderes. Nesse sentido
democrático, as mulheres encarceradas são respeitadas e reconhecidos como
participantes humanos da nação, objetos também da dignidade da pessoa
humana. Os demais por sua vez, também protegidos, devem, junto às forças
revolucionárias, buscar a deixa do patriarcado, retirando dos ombros o peso de
serem opressores no sistema e simultaneamente oprimidos pelo sistema, de
modo a comporem a saga por justiça.
Na obra ―A Revolta dos Bichos‖ George Orwell faz um chamamento
conveniente às lutas por revolução social, que cabe perfeitamente:

Bichos da Inglaterra e da Irlanda


Daqui, dali, de acolá,
Escutai a alvissareira
39

Novidade que virá.


Mais hoje, mais amanhã,
O Tirano vem ao chão,
E os campos da Inglaterra
Só os bichos pisarão.
Não mais argolas nas ventas,
Dorsos livres dos arreios,
Freio e espora enferrujando
E relhos em cantos alheios.
Riqueza incomensurável,
Terra boa, muito grão,
Trigo, cevada e aveia,
Pastagem, feno e feijão.
Lindos campos da Inglaterra,
Ribeiros com águas puras,
Brisas leves circulando,
Liberdade nas alturas.
Lutemos por esse dia
Mesmo que nos custe a vida
Gansos, vacas, cavalos,
Todos unidos na lida.
Bichos da Inglaterra e da Irlanda,
Daqui, dali, dacolá,
Levai esta minha mensagem
E o futuro sorrirá. (ORWELL, 2017, p. 16-17)

A Constituição Federal de 1988 foi batizada como Constituição Cidadã


devido sua exaltação do valor democrático e as ferramentas de limitação do
estado, qual deveria se pautar nos direitos e garantias fundamentais. Seria
errado dizer que a Carta Magna não representa um marco constitucional
incomparável, dotado de respaldo para inúmeros brasileiros lutarem por seus
direitos, entretanto, seria ingênuo afirmar que sua promulgação resolveu os
problemas sociais brasileiros.
A Constituição mudou, mas a cultura das concepções populares sobre
as perspectivas de gênero, raça e classe não. Muito menos as concepções das
casas legislativas, quais deveriam dar suporte aos valores de uma constituição
dirigente que vislumbra uma materialização futura, e não o fazem, o que
representa um problema que nos atrasa em anos.
A igualdade prevista no artigo 5, tanto em seu caput, quanto em seu
primeiro inciso: "Art. 5º, I: homens e mulheres são iguais em direitos e
obrigações, nos termos desta Constituição." (BRASIL, 1988) Encontra-se em
constante descumprimento, pois, a estrutura prisional brasileira como
demonstrado é desigual para as mulheres, que ao contrário dos homens, que
possuem um aparato pensado para eles, sofrem sem qualquer atendimento às
necessidades de seu sexo.
40

O artigo supracitado nos coloca diante não apenas do texto normativo


maior, mas também diante de um dos maiores valores da Constituição Cidadã
de 1988. O valor da igualdade é um norteador determinante para as
constituições revolucionárias. A Carta Magna figura exatamente o contrário de
tudo que seja intolerante, racista e preconceituoso. Defende expressamente a
pluralidade, sem que haja distinção de qualquer tipo, defende que todas as
pessoas devem ser tratadas de forma paritária. Assim, o Estado deve apoiar
todo seu corpo no jus imperium dos direitos fundamentais.
Todos esses fatores, bem como o desrespeito a integridade física,
psicológica e emocional, acarretam numa impossibilidade inegável da
possibilidade de materialização da Cidadania em seu sentido mais amplo e da
Dignidade da Pessoa Humana, quais se apresentam no texto constitucional
como fundamentos da República Federativa do Brasil:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união


indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-
se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos:
II - a cidadania
III - a dignidade da pessoa humana; (BRASIL,2018)

Observando tais fundamentos como colunas indispensáveis para a


sustentação da própria existência, percebe-se que o sopro da vida por si só
não é suficiente. Há a carência de instrumentalização efetiva de cada suspiro
dado, fazendo com que o Estado, mesmo que constitucionalmente impedido,
pratique a pena de morte. Uma morte lenta frente ao abandono em meio a
doenças, falta de higiene, desrespeito à integridade física, psicológica e
emocional e à ligação entre mãe e filhx. É flagrante a desvalorização do
sentimento constitucional.

A expressão sentimento constitucional, designa comportamento


psicológico e sociológico do existencialismo político. a consciência
solidarizante da comunidade que integra os detentores e os
destinatários do poder na Constituição. O sentimento constitucional,
que envolve a valorização sentimental da Constituição, é incompatível
com a indiferença popular em relação à Constituição. O
desconhecimento, a ignorância, o desprezo e o desrespeito
sistemático à Constituição negam o sentimento constitucional e fazem
da Constituição uma "folha de papel" que se agita na direção do
vento. Essa conduta negativa opera a substituição da estabilidade
pela fragilidade da Constituição. (HORTA, 1992, p.17)

Citar o Sentimento Constitucional é um dever ético-poético que


transcende a normatividade e a razão, e que de todo modo, é este sentimento
41

uno à própria condição de ser humano provido de emoção. As mulheres


encarceradas, assim como todas as outras mulheres, não merecem ser
oprimidas a ponto de terem que se frustrarem pelo que nela a de feminino, se
frustrarem por serem mulheres, tendo partos traumáticos, higiene negada,
sendo esquecidas e marginalizadas. Traumatizadas a ponto de terem medo da
liberdade. (FREIRE, 2017)
42

Figura 08: Maternidade

Fonte 08: Enciclopédia Itaú Cultural (2019)

A última tela de Tarsila do Amaral, propositalmente, permanecerá sem


descrição para instigar à reflexão,
43

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

O primeiro capítulo, claramente, fez emergir a profundidade da


problemática dessa pesquisa. Apesar de o encarceramento feminino, com sua
superlotação, conhecido como é hoje, ser uma questão contemporânea, as
raízes dos problema remontam a colonização brasileira e estão fincadas no
racismo e exploração, tanto de classe quanto de gênero. Pois o próprio
processo de enculturação da mulher no patriarcado é sinônimo de servidão.
É notável que a pirâmide social brasileira tem seus níveis baseados em
etiquetas sociais conjuntas, formando a necessidade de observação
interseccional dos problemas de gênero, classe e raça. E num sistema como
esse, a mulher negra, pobre e periférica representa o subsolo dessa pirâmide,
o solado do sapato de grife daqueles que dominam através de sistemas como
o patriarcado e capitalismo as instituições de poder da nação, redutos elitistas,
racistas e machistas que usam inúmeros instrumentos de opressão, dentre eles
o sistema carcerário.
O segundo capítulo, então, elucidou de maneira inegável, a seletividade
do processo de encarceramento. A população carcerária tem cor, é preta e
parda. Ser preto ou pardo no Brasil significa ter uma propensão maior a
restrição da liberdade por parte do Estado, que provavelmente irá perpetrar
essa restrição através de uma legislação feita para que a classificação do crime
cometido seja de livre discricionariedade do magistrado homem branco de elite,
que em nome da sociedade será o herói, que com o martelo de Thor (um deus
branco de traços europeus cheio de virilidade) irá arrebatar a liberdade
daquelas que esperando pelo fim punitivista já passaram anos de sua vida
esperando como presas provisórias.
Por fim, mas não menos importante, o terceiro capítulo do estudo não
permite restar dúvidas quanto à opressão ao feminino característica de uma
estrutura pensada por homens para homens. Nem em se tratando da
colocação de seu corpo, mente e direitos em um local já esquecido, tem o
respeito mínimo da condição de ser mulher. Suas necessidades, dignidade,
sentimentos, são abandonadas sem qualquer traço de compaixão.
44

Ser mulher, a maternidade, a manutenção da própria higiene se tornam


experiências frustrantes horríveis, havendo a precisão de repensar o mínimo
disponível para atingimento da Dignidade da Pessoa Humana e Equidade
necessária ao tratamento paritário. Entretanto, essa é apenas uma parte do
problema, que deve ter seu centro o combate ao encarceramento que
aumentou de maneira gritante nos últimos anos.
Para tanto, o trabalho traz como solução o pensamento o analista do
minimalismo, que não se confunde com abolição impensada do sistema
carcerário, mas sim no uso ponderado do que deve ser o último instrumento a
ser utilizados em casos específicos. As situações problemáticas devem ser,
primeira e primordialmente, objeto de métodos alternativos de solução, como a
composição entre os envolvidos para construção da cultura de paz,
indispensável a uma nação Democrática. Assim, as práticas pacificadoras
poderão dar lugar a oportunidade de efetiva reintegração social.
45

6. REFERÊNCIAS

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Manifesto. São Paulo: Companhia das Letras, 2017. Tradução de: Denise
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48

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