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SEMINÁRIO TEOLÓGICO PRESBITERIANO REVERENDO

JOSÉ MANOEL DA CONCEIÇÃO


JOHN HEBERT DOS SANTOS FIDELIS

UMA DEFESA DO DOMINGO COMO SENDO O SÁBADO


CRISTÃO

Trabalho apresentado atendendo as


exigências da matéria Lógica, Prof. Rev.
Ronaldo Bandeira.

São Paulo
2023
2

SUMÁRIO

SUMÁRIO.................................................................................................................... 2
1. INTRODUÇÃO ...................................................................................................... 3
2. DOMINGO, O SÁBADO CRISTÃO. ........................................................................ 4
2.1. A BÍBLIA E O DOMINGO ............................................................................... 4
2.1.1 Antigo Testamento (Sábado). ....................................................................... 4
2.1.2. Novo Testamento (Primeiro dia da semana). ............................................. 5
2.2. A TRADIÇÃO E O DOMINGO ........................................................................... 7
2.2.1 A igreja primitiva ........................................................................................... 7
2.3. OS REFORMADORES E O DOMINGO ............................................................ 9
2.3.1. Teologia dos Reformadores ........................................................................ 9
2.4. A CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER E O DOMINGO ......................... 11
2.4.1. A Confissão e o culto a Deus no domingo. .............................................. 11
2.5. OS PURITANOS E O DOMINGO .................................................................... 12
2.5.1. Uma marca dos puritanos. ........................................................................ 12
3. CONCLUSÃO ..................................................................................................... 14
4. BIBLIOGRAFIA ................................................................................................... 16
3

1. INTRODUÇÃO

O domingo, mesmo com as suas variações locais, é o dia em que milhares de


cristãos protestantes - e não protestantes - ao redor do mundo se reúnem em suas
igrejas para celebrar e louvar a Deus em comunhão.

No Brasil não é diferente. Apesar das diferenças teológicas e doutrinárias, os


encontros de adoração e celebração acontecem principalmente aos domingos.

Mas qual é a base bíblica para o domingo como o dia do Senhor? Quando e
onde começou? É possível defender o domingo como sendo o Dia do Senhor? Os
pais apostólicos guardavam o domingo como sendo o dia do Senhor? Os
reformadores foram defensores do domingo como sendo o sábado cristão? O correto
seria guardar o sábado e não o domingo como afirma alguns? Ou será que a Bíblia
não dá base para a guarda do domingo como afirma outros? Portanto, este breve
artigo tem o objetivo de responder a tais perguntas.
4

2. DOMINGO, O SÁBADO CRISTÃO.

Apesar de não encontramos explicitamente a palavra Domingo1 nas Escrituras


Sagradas, podemos inferir sem receios que há uma expressa ordem para que um dia
santo ao Senhor seja guardado. Este dia santo é comumente chamado de o Dia do
Senhor.

Veremos a seguir alguns pontos fundamentais de que o Sábado judaico se


tornou o Domingo cristão. Veremos de forma suscinta o que as Escrituras, os pais da
igreja, a igreja primitiva, os reformadores, alguns documentos confessionais e o que
os puritanos falaram sobre o assunto de forma clara e objetiva.

2.1. A BÍBLIA E O DOMINGO


2.1.1 Antigo Testamento (Sábado).
O Antigo Testamento fala sobre o sábado (heb. shabbat, “repouso”) como um
conceito de separar um dia de descanso e aplicado diretamente ao sétimo dia. Sua
origem é divina e está no relato da criação em Gênesis 2.2. Israel deveria observar
posteriormente (Êx 16.23-29; 20.8-11; 31.17) e o castigo por não guardar o sábado
era a morte (Êx 31.15; Nm 15.32-36).

1
“O primeiro dia da semana tem uma vinculação direta com a ideia de início, nascimento, vida. Por isso foi
dedicado ao Sol que, com a sua luz, remete ao início de um novo tempo que se inicia no domingo. O dia que
precede a segunda-feira já se chamou "primeira feira" (prima feria, em latim). Mas o imperador romano Flávio
Constantino (280-337 d.C), após se converter ao cristianismo, mudou o nome para Dominica Dies, que evoluiu
para Dominus Dei (=dia do senhor), que é a origem do domingo (em português e espanhol), Dimanche (francês)
e Domenica (italiano)”. Origem da palavra domingo. Dicionário etimológico. Disponível em:
<https://www.dicionarioetimologico.com.br/domingo/>. Acesso em: 07 de out. de 2023.
5

Tal observância se daria pelo descanso do trabalho (Êx 20.10); convocação de


uma assembleia santa (Nm 28.9-10; Lv 24.8); e dia de alegria (Nm 10.10; Os 2.11; Is
58.13) para Israel.

O sábado era uma total abnegação do indivíduo para uma completa dedicação
a Deus. Era um dia de descanso e atividade espiritual. O propósito de guardar o
sábado era de união e comunhão entre o povo de Deus. O povo da Aliança é chamado
a santificar o sábado em honra ao seu Deus, tendo em vista que o próprio Deus
abençoou este dia. Não só isso, tem como princípio servir de lembrete sobre o
descanso perpétuo na presença de Deus.

2.1.2. Novo Testamento (Primeiro dia da semana).


Qual é a ligação do sábado com o primeiro dia da semana? Assim como o
sábado comemora o descanso de Deus após a criação, o primeiro dia da semana
comemora a ressurreição de Cristo. O sétimo dia comemora a criação concluída, o
primeiro dia da semana comemora a redenção da criação consumada.

O Novo Testamento, portanto, afirma que o sábado como o Dia do Senhor, está
associada a nova criação e está diretamente relacionada com a ressurreição de
Cristo. Não significa que a igreja do Novo Testamento deixou de observar o sábado e
não se trata de um novo sábado – não existe um “sábado cristão - mas um sábado
associado à antiga aliança (Êx 28.8-11; 31.12-17; Hb 4.4).

Sendo assim, a prática de se guardar o primeiro dia da semana é uma prática


da igreja neotestamentária:

O domingo passou a marcar o início da semana como um dia de privilégio,


enquanto o sábado representa o fim da semana de trabalho, além de uma
ordem a ser cumprida sob o regime da lei. Entretanto, o Dia do Senhor não é
para todos, e não há justificativas para impor sua observância aos não salvos.
Conforme destacou Lewis Sperry Chafer: “Não há justificativas para se recorrer
às regras do sábado a fim de abstrair instruções para a observância do Dia do
Senhor. Na ocasião em que Cristo saiu da sepultura, disse a seus amigos:
“Regozijemo-nos’ (cf. Sl 118.24) e ‘Ide contar’ (Mt 28.9-10, trad. lit.), expressões
que podem ser consideradas orientação sábia a respeito da observância desse
dia. Ademais, o Dia do Senhor pode ser estendido a todos os dias, o que não
ocorre com o sábado (cf. Rm 14.5-6)”.2

2
UNGER, Merril F. Dicionário Bíblico Unger. Barueri, SP: Sociedade bíblica do Brasil, 2017, p. 328.
6

Conforme Cairns, na Igreja primitiva, a celebração do Dia do Senhor era


realizada no primeiro dia semana em dois cultos:

No primeiro século, dois cultos eram realizados no primeiro dia da semana,


adotado como o dia de culto por ter sido o dia em que Cristo ressuscitou dentre
os mortos (At 20.7; 1 Co 16.2; Ap 1.10). o culto da manhã muito provavelmente
incluía a leitura da Bíblia (Cl 3.16), a exortação pelo presbítero principal,
orações e cânticos (Ef 5.19).3

Fica evidente, portanto, que o Dia do Senhor, não é uma mera substituição do
sábado judeu, mas um lembrete e comemoração da obra completa de Cristo na cruz.
O primeiro dia da semana é o dia do povo da aliança comemorar e se regozijar no
Senhor. Pois assim como a Páscoa foi substituída pela Ceia e a circuncisão pelo
Batismo, o sétimo dia pelo primeiro dia da semana. Sobre isso comenta Bruce Waltke
citado por Danilo Romagna:

O dia de descanso faz sentido para os cristãos, pois é uma necessidade prática
para a igreja escolher um determinado dia para a adoração comum. Entretanto,
assim como a Páscoa foi substituída pela ceia do Senhor e a circuncisão pelo
batismo, as funções do sétimo dia se cumprem no primeiro dia da semana,
quando comemoramos a ressurreição de Cristo dentre os mortos. No NT, a
celebração da ceia do Senhor no primeiro dia da semana traz à lembrança dos
cristãos seu relacionamento especial com Deus. Assim como a ceia do Senhor
substituiu a Páscoa e o batismo substituiu a circuncisão, os crentes no Senhor
Jesus Cristo ressurreto reuniam-se no primeiro dia da semana, o Dia do Senhor
(Ap. 1.10). Eles o faziam para partir o pão e ler, ensinar e estudar as Escrituras
(Jo 20.1,19-23; At 20.7; 1Co 16.1) e comemorar a ressurreição de seu Senhor
naquele dia.4

Se não considerarmos e não nos atentarmos para tais substituições, a igreja


neotestamentária ainda estaria promovendo os ritos judaicos do Antigo Testamento. E
conforme podemos observar nos escritos do Novo Testamento, não é o que acontece5.

3
CAIRNS, Earle Edwin. O cristianismo através dos séculos: uma história da igreja cristã. 3ª edição. São Paulo:
Vida Nova, 2008, p. 70,71.
4
WALTKE, Bruce K. Teologia do antigo testamento. São Paulo: editora vida nova. 1º ed. 2016. p. 479, Apud
Romagna, Danilo. O Dia da Feira da Alma: Um estudo sobre o Sábado Cristão. Sua História, Teologia e Prática.
(Locais do Kindle 324-325). UNKNOWN. Edição do Kindle.
5
Logicamente não podemos nos esquecer que a igreja do primeiro século estava deixando as velhas práticas do
Antigo Testamento bem como a filosofia grega. A mudança não ocorreu de forma abrupta, mas de forma
progressiva. Cairns destaca que: “Os convertidos à fé cristã vieram ou do legalismo judaico ou d ambiente
intelectual da filosofia grega. Muitos desses convertidos, antes que a Igreja os instruísse corretamente, tinham a
tendência de levar suas velhas idéias para seu novo ambiente”. CAIRNS, Earle Edwin. O cristianismo através dos
séculos: uma história da igreja cristã. 3ª edição. São Paulo: Vida Nova, 2008, p. 82.
7

Aqueles que afirmam que o Domingo do Senhor não é o Sábado Cristão, para
ser mais coerente, portanto, deveria observar a circuncisão de acordo com Gênesis
17.23-25 e não o batismo neotestamentário de acordo com Mateus 3.11-15; 28.19 e
Marcos 16.16 e de acordo com Atos 2.38 foi praticado pelos apóstolos. Ainda mais,
deveria observar a Páscoa conforme Êxodo 12.1-13 e não conforme Mateus 26.17.
Se assim fosse, não seriamos a Igreja do Novo Testamento e sim uma continuação
do judaísmo.

2.2. A TRADIÇÃO E O DOMINGO


2.2.1 A igreja primitiva
Vejamos alguns exemplos sobre o que os pais apostólicos falaram sobre o Dia
do Senhor.

Inácio (ca 35 – ca 107) bispo de Antioquia da Síria que foi martirizado em Roma
durante o reinado de Trajano (98-117) em sua carta aos magnésios, chegou a instruir
tais crentes sobre o engano do judaísmo. E uma de suas instruções era não mais
observar o sábado, mas o dia do Senhor:

Aqueles que viviam na antiga ordem de coisas chegaram à nova esperança, e


não observam mais o sábado, mas o dia do Senhor, em que a nossa vida se
levantou por meio dele e da sua morte. Alguns negam isso, mas é por meio
desse mistério que recebemos a fé e no qual perseveramos para ser discípulos
de Jesus Cristo, nosso único Mestre. Como podemos viver sem aquele que até
os profetas, seus discípulos em espírito, esperavam como Mestre? Foi
precisamente aquele que justamente esperavam, quem ao chegar, os
ressuscitou dos mortos.6

Conforme o comentário de Inácio, o dia do Senhor estava intimamente ligada à


ressurreição de Cristo.

Na carta de Barnabé (séc II) encontramos uma instrução similar a de Inácio


bispo de Antioquia. Ao tratar sobre o sábado de Deus, num primeiro momento Barnabé
comenta sobre o sábado descrito no Decálogo. Num segundo momento, Barnabé diz
que os sábados atuais não era mais agradável:

Ele finalmente lhes disse: “Não suporto vossas neomênias e vossos sábados”.
Vede como ele diz: não são os sábados atuais que me agradam, mas aquele
que eu fiz e no qual, depois de ter levado todas as coisas ao repouso, farei o

6
APOSTÓLICOS, padres. São Paulo: Paulus, 1995, p. 94.
8

início o oitavo dia, isto é, o começo de outro mundo. Eis por que celebramos
como festa alegre o oitavo dia, no qual Jesus ressuscitou dos mortos e, depois
de se manifestar, subiu aos céus.7

Barnabé, portanto, diz que as festas são celebradas no oitavo dia em que Jesus
ressuscitou dos mortos.

De igual modo podemos encontrar na Didaquê ou ensino dos doze apóstolos


instruções sobre a celebração dominical. Tal documento diz que os crentes deveriam
se reunir “no dia do Senhor para partir o pão e agradecer, depois de ter confessado
os pecados, para que o sacrifício de vocês seja puro” (Padres apostólicos, 1995).

Por fim, e não menos importante, Justo González no seu livro Uma breve
história das doutrinas cristãs comenta que:

Por essa razão é que a Igreja se reunia no domingo de manhã, o “dia do


Senhor”, o dia de sua ressurreição. Os serviços eucarísticos mais antigos que
conhecemos não eram de lamentação ou de arrependimento, mas de
celebração.8

Conforme Justo González, a igreja primitiva se reunia no domingo de manhã,


não para lamento, mas para celebração.

A prática de se reunir no primeiro dia da semana era comum para a igreja


primitiva e não passou a ocorrer simplesmente após o édito de Constantino no ano
321 d. C. Conforme veremos a seguir no artigo do professor Richard Abreu9 no site
Histórias da atualidade, onde o professor fala sobre o édito de Constantino que
consagrou o domingo como um dia de descanso, e não apenas descanso, mas
também como sendo o dia do rito cristão, tal explanação resume o conceito ou ideia
daqueles que defendem que a origem do Dia do Senhor é simplesmente pagã e não
bíblica. Veja o que o professor Richard diz:

As raízes do domingo como dia de descanso remontam a um édito publicado


pelo Imperador Flávio Constantino, no ano de 321 d.C. Em seu famoso édito,
Constantino estabelecia que “todos os juízes, todos os habitantes da cidade, e
todos os mercadores e artífices descansem no venerável dia do Sol”. Os
trabalhadores do campo, no entanto, podiam fazer uso do domingo como dia
útil, conforme concluía a sentença: “Não obstante, atentem os lavradores com
plena liberdade ao cultivo dos campos: visto acontecer com frequência que
nenhum outro dia é tão adequado à semeadura do grão ou ao plantio da vinha,

7
APOSTÓLICOS, p. 310.
8
GONZÁLEZ, Justo L. Uma breve história das doutrinas cristãs. São Paulo: Hagnos, 2015, p. 149.
9
Professor de História.
9

daí o não perder o tempo oportuno dos benefícios concedidos pelo céu”. Desde
então, no mundo ocidental, forte tributário da cultura greco-romana, o domingo
passou a ser um dia reservado ao descanso e ao culto religioso [...] Quando o
cristianismo suplantou o paganismo, em número e em importância política no
Império Romano, pouco a pouco, o culto dedicado, inicialmente, ao deus pagão
Solis Invictus, foi direcionado pela Igreja, para o dogma cristão, fazendo do
domingo o dia das práticas e ritos devotados a Jesus Cristo.10

Obviamente, a etimologia da palavra Domingo e a que conceito a palavra


estava relacionado em sua origem é discutível. Entretanto, mesmo que seja um édito
ou decreto, Constantino o fez senão movido por uma forte convicção de que isso era
um preceito bíblico e claramente que este édito não estava relacionado a adoração
ao deus Sol, mas ao Deus que criou o sol e tudo o que existe. Vale ressaltar que,
conforme os exemplos citados acima dos pais apostólicos, demonstra que a igreja
primitiva no primeiro e segundo século já se reunia no primeiro dia da semana, ou
seja, em um dia especial e santo ao Senhor, de forma alegre e espontânea, antes
mesmo do édito de Constantino. Posteriormente, Agostinho responde ao maniqueu
Fausto que o que eles chamavam de Dia do Sol os cristãos chamam de Dia do Senhor.

É fato que os exemplos citados não são extensos. Entretanto, naturalmente


devemos nos atentar ao fato de que o culto na igreja primitiva estava diretamente
ligado à ressurreição de Cristo bem como de seu prometido retorno. E por
conseguinte, devido ao fato de a reunião da igreja primitiva estar intimamente ligada
à ressurreição de Cristo, as reuniões se davam no primeiro dia da semana, pois
conforme o Novo Testamento, foi no primeiro dia da semana que Cristo ressuscitou.

2.3. OS REFORMADORES E O DOMINGO


2.3.1. Teologia dos Reformadores
Os Reformadores também deixaram a sua contribuição para o assunto.
Entretanto será citado apenas dois dos principais expoentes da geração dos
reformadores. Da primeira geração Ulrich Zuínglio e da segunda geração João
Calvino.

10
ABREU, Richard. O édito de Constantino que consagrou o domingo como um dia de descanso. História e
atualidades, 2023. Disponível em: <O édito de Constantino que consagrou o domingo como um dia de descanso.
– História & Atualidades (historiaeatualidades.com.br)>. Acesso em: 07 de out. de 2023.
10

Em sua missão de purificar a igreja de usos supersticiosos, Zuínglio (1484-


1531) conhecido por ser “o reformador mais importante da primeira geração da
Reforma na Suíça e fundador da tradição reformada dentro do protestantismo”
(GONZÁLEZ, 2008), tinha como meta a simplificação do culto de domingo:

Embora, como outros reformadores, ele rejeitasse os entendimentos medievais


sobre a ordenação como um sacramento, Zuínglio insistia em pastores
chamados e treinados como parte necessária da igreja, e considerava a
pregação da Palavra de Deus a tarefa principal deles. A meta de Zuínglio de
purificar a igreja de usos supersticiosos exigia a simplificação do culto matinal
de domingo aos elementos básicos de ouvir a Palavra de Deus, oração e
louvor.11

Para Zuínglio, o culto matinal de domingo deveria se limitar a correta pregação


da Palavra de Deus, oração e louvor.

João Calvino (1509-1564) “principal teólogo protestante da segunda geração”


(GONZÁLEZ, 2008) conforme as Ordenanças Eclesiásticas de 1561 que delinearam
a organização das igrejas reformadas na Europa, sobre a ministração da Ceia do
Senhor diz o seguinte:

A ceia foi instituída por nosso Senhor para que seja usada com maior
frequência e, também, que ela foi assim observada na Igreja antiga, até que o
diabo em tudo a subvertesse, organizando a missa em seu lugar. A sua rara
celebração é uma falha que deve ser corrigida. Para o presente tempo, no
entanto, aconselhamos e ordenamos que ela seja administrada quatro vezes
por ano, somando o próximo domingo de Natal, Páscoa, Pentecostes e o
primeiro domingo de setembro, no outono.12

A declaração das Ordenanças Eclesiásticas de 1561 demonstra a preocupação


com que frequência bem como o dia em que a celebração da Ceia do Senhor deveria
ser ministrada, sendo, portanto, aos domingos.

A Ordem da Igreja do Sínodo de Dordt ao expressar sua preocupação quanto


a observância do Natal, Páscoa e Pentecostes disse que “as congregações devem
observar, além do domingo”13, tais datas citadas acima. Ou seja, a observância do

11
BARRETT, Matthew. Teologia da Reforma. Rio de Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2017, p. 514.
12
Documentos da Tradição das Igrejas Reformadas: segundo a forma de governo e a doutrina dos ofícios da Igreja
de Genebra, do Sínodo de Dordt e da Assembleia de Westminster / tradução, introduções e notas por Ewerton
B. Tokashiki. Eusébio: Editora Peregrino, 2020, p. 55.
13
Documentos da Tradição das Igrejas Reformadas: segundo a forma de governo e a doutrina dos ofícios da Igreja
de Genebra, do Sínodo de Dordt e da Assembleia de Westminster, p. 108.
11

domingo como o Dia do Senhor era algo comum e natural para as igrejas dos países
baixos unidos em Dordtrecht.

Em suma, os Reformadores observavam a guarda do domingo como


continuidade da igreja neotestamentária e primitiva.

2.4. A CONFISSÃO DE FÉ DE WESTMINSTER E O DOMINGO


2.4.1. A Confissão e o culto a Deus no domingo.
A Confissão de Fé de Westminster foi um importante documento do século XVI.
Foi usado apenas a Confissão de Fé de Westminster como argumento porque os
demais documentos confessionais, mesmo com as suas variações, seguem o modelo
reformado da assembleia de Westminster.

Neste importante documento para a igreja, no capítulo XXI do culto religioso e


do domingo do parágrafo I ao VI, nos mostra que o próprio Deus que é soberano,
instituiu por meio da Escritura o modo de o adorar e servir. Já no parágrafo VII a
Confissão diz:

Como é lei da natureza que, em geral, uma devida proporção seja destinada
ao culto a Deus, assim também, em sua Palavra, por um preceito positivo,
moral e perpétuo, preceito que obriga a todos os homens, em todas as épocas,
Deus designou particularmente um dia em sete para ser um sábado (descanso)
santificado por ele; desde o princípio do mundo até à ressurreição de Cristo
esses dia foi o último da semana; e desde a ressurreição de Cristo foi mudado
para o primeiro dia da semana, dia que na Escritura é chamado dia do Senhor
(domingo), e que há de continuar até o fim do mundo como o sábado cristão. 14

Portanto, conforme a Confissão, o Senhor estabeleceu um dia para que o


homem descanse de suas obras para o servir e o adorar. Um dia entre sete seria
santificado ao Senhor, este dia é chamado de sábado. E desde a ressurreição de
Cristo esse dia foi mudado para o primeiro dia da semana, chamado na Escritura de
domingo. Sobre este ponto Chad Van Dixhoorn comenta:

O primeiro tipo de sábado na Escritura era especial, quase sempre dando início
a um tempo festivo e quase sempre no primeiro dia da semana do primeiro dia
de uma festa [...] Levítico 23 é uma dessas passagens na Escritura que
menciona os sábados do primeiro dia e as festas que eles inauguravam [...]
esses sábados no primeiro dia eram especiais, mas o ponto alto de todos esses
sábados do Antigo Testamento era um ano, e não um dia [...] esse sábado
acima de todos os sábados retratava descanso e redenção [...] o segundo tipo

14
CFW. Capítulo XXI, parágrafo VII.
12

de sábado era um sábado do último dia, o sábado semanal que é familiar à


maioria dos leitores da Bíblia. Esse dia geralmente é mencionado no singular,
e é chamado de “Shabat”. Esse dia foi o dia de descanso que marcou o término
da obra da criação (Gn 2.2-3). Ele era um dia que o Senhor escolheu honrar.15

Conforme o comentário de Dixhoorn, a Escritura claramente nos mostra dois


tipos de sábados, o sábado anual e o sábado semanal. Todavia, foi o sábado semanal
que:

A assembleia tinha em vista quando escreveu “desde o princípio do mundo até


a ressurreição de Cristo” esse sábado “foi o último da semana”. Esse padrão
definiu não somente a primeira semana, mas todas as semanas. Contudo, os
cristãos também creem que “desde a ressurreição de Cristo” esse dia “foi
mudado para o primeiro dia da semana”. Os cristãos há muito perceberam que
não por acaso que aquele que habitou que “habitou entre nós” (Jo 1.14), aquele
que era as primícias de uma grande colheita (1Co 15.23), aquele que chamou
a si mesmo de o pão da vida (Jo 6.35), aquele que irá retornar ao mundo com
o som de trombetas do céu - que aquele que foi o cumprimento de toda
celebração e de todos os sábados do Antigo Testamento – foi ressuscitado dos
mortos no primeiro dia da semana. Esse é o motivo porque os cristãos
começaram a adorar no “primeiro dia da semana”. 16

Dessa forma, pode-se observar que a Confissão de Fé de Westminster é clara


em sua defesa do domingo como sendo o sábado cristão. E “esse dia de descanso,
sendo parte da lei moral que não admite nenhuma mudança, continua “até o fim do
mundo como o sábado cristão””.17

2.5. OS PURITANOS E O DOMINGO


2.5.1. Uma marca dos puritanos.
A observância do domingo é uma marca do culto puritano. Tal observância era
religioso, político e social. Guardar o domingo era um ato religioso e uma forma de
ação social. Os puritanos forneceram bases teológicas solidificas nas Escrituras para
o Dia do Senhor:

Os Puritanos formularam uma base bíblica múltipla para a observância do


domingo. Descansar num dia da semana era um memorial à criação do mundo
por Deus e (com base em Gênesis 2:1-3) uma exigência da criação. O quarto
mandamento do Decálogo tornou a santificação de um dia entre sete uma
ordem moral. O Dia do Senhor do Novo Testamento torna o domingo um
memorial à ressurreição de Cristo e responde pela mudança do sétimo (o

15
DIXHOORN, Chad Von. Guia de estudos da confissão de fé de westminster. São Paulo: Cultura Cristã, 2017, pp.
299,300.
16
DIXHOORN, Chad Von. Guia de estudos da confissão de fé de westminster. pp. 300,301.
17
IBIDEM, p. 301.
13

sábado judeu) para o primeiro dia da semana. Porque domingo é um dia de


cessação do labor terreno e um tempo de culto, é uma experiência que
prefigura a eterna felicidade do crente no céu. 18

Devemos entender, portanto, que para os puritanos não significa a


descontinuidade do Antigo Testamento. Eles apenas fizeram uma distinção do Sábado
do Velho Testamento de uma lei cerimonial do princípio moral. Ou seja, conforme o
Novo testamento, a lei cerimonial do sábado foi abolida com a vinda de Cristo,
entretanto, o princípio moral de um dia entre sete permanece. Nesse sentido, a
observância do domingo como sendo o sábado cristão é uma experiência que
prefigura a eterna felicidade do crente no céu.

18
RYKEN, Leland. Santos no mundo: os puritanos como realmente eram. São José dos Campos, SP: Editora Fiel,
2013, p. 221.
14

3. CONCLUSÃO

Alguns argumentam que não é possível identificar a origem do culto no dia de


domingo. Entretanto, podemos observar que o Dia do Senhor se inicia após a morte
e ressurreição de Cristo. Assim os discípulos de Cristo fizeram com alegria e singeleza
de coração.

Outros argumentam que a mudança de sábado para o domingo se deu devido


à perseguição do Imperador. Entretanto, a mudança do sábado para o primeiro dia
semana não estava ligada a repressão do Imperador, mas diretamente à Cristo.

O apóstolo Paulo chegou a aconselhar a igreja de Colossos que não eram mais
necessárias a observância das festas judaicas. Tal repreensão a igreja de Colossos
não se deu por qualquer pressão de algum Imperador da época, mas devido a correta
aplicação da obra do Filho de Deus na vida da igreja.

Infelizmente, atualmente o Dia do Senhor é visto como algo desnecessário e


pesado. Existem aqueles que ponderam dizendo que todos os dias é o dia do Senhor.
De fato, isso é verdade. Todavia, estes que argumentam que todos os dias é o dia do
Senhor, acabam não guardando nenhum dia. Danilo Romagna observa que:

A igreja de modo geral passou a visualizar aquela antiga forma de guardar o


Quarto Mandamento como um peso desnecessário e algo exagerado para seu
tempo. Se vivemos em um período em que o amor pela Pregação da Palavra
de Deus, pela comunhão da igreja e pela vida de santidade fora abandonado,
a maneira como o Quarto Mandamento tem sido observado, ou não,
caracteriza bem esse período e o Sábado Cristão como fora esboçado antes
acaba por se tornar “uma experiência lúgubre e triste”, e a sociedade que assim
o vê representa, portanto, a “caricatura de uma época irreligiosa”, como
considera Leland Ryken.19

19
Romagna, Danilo. O Dia da Feira da Alma: Um estudo sobre o Sábado Cristão. Sua História, Teologia e Prática.
(Locais do Kindle 894-896). UNKNOWN. Edição do Kindle.
15

Entretanto, o Dia do Senhor, o primeiro dia da semana deve ser guardado como
um dia especial. Como um dia de comemoração da ressurreição de Cristo. Como um
dia de comunhão e louvor a Deus. É o dia em que deixamos nossos interesses
pessoais para buscar o interesse d’Aquele que um dia nos salvou. É a demonstração
de que as belezas e encantos deste mundo não são maiores que a busca pelo Reino
dos céus. Domingo é o dia da feira da alma. O Dia do Senhor, o Sábado cristão, é um
dia para lembramos que existe um dia separado para o povo da Aliança, um dia em
que estaremos eternamente na presença do Senhor que nos salvou.
16

4. BIBLIOGRAFIA

ABREU, Richard. O édito de Constantino que consagrou o domingo como um dia de


descanso. 31 de julho de 2022.
https://historiaeatualidades.com.br/2022/07/31/o-edito-de-constantino-que-
consagrou-o-domingo-como-um-dia-de-
descanso/#:~:text=As%20ra%C3%ADzes%20do%20domingo%20como%20di
a%20de%20descanso,e%20art%C3%ADfices%20descansem%20no%20ven
er%C3%A1vel%20dia%20do%20S (acesso em 07 de Outubro de 2023).
BARRETT, Matthew. Teologia da Reforma. 1. Tradução: Francisco Nunes. Rio de
Janeiro: Thomas Nelson Brasil, 2017.
DIXHOORN, Chad Van. Guia de estudos da confissão de fé de westminster. Tradução:
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