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e
Psicose
Infantil
Autismo x Psicose Infantil
Mantém-se viva a discussão acerca
da etiologia psicogênica e
organogênica, não existindo ainda
um consenso entre os autores
01 02 03
Defensores de uma Autismo estrutura Autismo a-estrutura
unidade estrutural subjetiva diferente
(Rocha, 2002)
Defensores de uma unidade estrutural
Identidade estrutural entre autismo e psicose e o mecanismo psíquico posto em jogo
(não se inscreve o elemento terceiro para estabilizar a relação imaginária)
Metáfora paterna impossibilitada
Criança encarna no real a posição de objeto a no fantasma materno
Está passivamente na linguagem, onde apresentaria um Outro absoluto, porém não
poria em jogo sua falta
Entre os que defendem, existem desarmonias e uma vacilação entre incluir o autismo
como um subtipo caracterizado ou como um estado (uma forma que um dos subtipos
de psicose poderia assumir)
(Rocha, 2002)
Autismo como estrutura subjetiva diferente
(Rocha, 2002)
A defesa da existência de uma estrutura diferente no autismo, em geral, se
baseia na tese de que aqui falha a captação primeira do sujeito no significante,
que deveria ser promovida pelo Outro primordial (materno). (Rocha, 2002)
(Rocha, 2002)
Podemos apontar pontos de convergência
01 02
Seja pelo mecanismo de Afirmação de que Autismo - tempo
foraclusão ou não, não há nada aproxima nem prévio da psicose
inscrição do significante
Nome-do-Pai e, desse o psicótico nem o (antecede à
modo, de uma medida autista de um sujeito esquizofrenia ou à
fálica do desejo, do paranoia; aquém da
inconsciente, de um alienação
sujeito dividido ante significante;
a falta do Outro variação da etapa
mais primeva da
A entrada do pai como significante organização libidinal
de uma função permite a inserção - narcisismo
da criança no universo simbólico,
promovendo seu afastamento da
primário, auto-
sujeição à mãe, propiciando-lhe o erotismo…)
lugar de sujeito desejante.
(Rocha, 2002; Vanoli & Bernardino, 2008) )
A psicose infantil
"Na psicose infantil está em jogo uma palavra absoluta que oferece à criança um
sentido único. A criança psicótica não consegue simbolizar, não faz metáfora,
permanecendo numa posição de alienação, prisioneira de uma palavra que é lei."
Segundo Mannoni (1980) - criança psicótica é efeito de um discurso coletivo,
reduzida ao estado de um objeto parcial sem poder jamais assumir qualquer
identidade
"As condições para a cura de uma criança psicótica segundo a autora só são
operantes a partir de transformações que deverão ocorrer no âmbito da palavra
da criança, que deverá se separar do discurso dos pais, ao qual ela estava
alienada."
Calligaris (1989) e Jerusalinsky (2002) - só se pode falar de psicose infantil depois
que tenha se produzido uma inscrição definitiva na constituição subjetiva da
criança (período de latência ou adolescência)
Bernardino (2002) - psicoses no tempo da infância são não-decididas, sendo
necessário tempo de escuta para confirmar que é uma estrutura e não
sintomatologia
Para Winnicot (1986) "A encontrar realmente aquilo que ele cria, e a criar e vincular isso
com o que é real. [...] se aquilo que está sendo criado precisa ser realizado
concretamente, alguém tem que estar lá. Se ninguém estiver lá para fazer isso, então,
num extremo, a criança é autista - criativa no espaço - e tediosamente submissa em seus
relacionamentos"
(Lacan, 1998)
(Winnicot, 1986)
Alienação e Separação
A causação - ou seja, o ponto originário a partir do qual o sujeito se constitui - será, portanto, situada na
linguagem: "o efeito de linguagem é a causa introduzida no sujeito
Não se trata do que pertence a ambos os conjuntos, mas do que falta a ambos. O que eles têm em
comum é a falta, uma falta que os põe em relação. Nesse ponto de falta, Lacan localiza a causa do desejo,
o objeto a.
Reforça o autismo como uma estrutura separada a psicose, já que não participa da alienação e separação
Segundo relato dos pais, Mateus não tolera perdas e frustrações. Percebi os pais
atrapalhados, não sabendo lidar com os acessos de agressividade e de instabilidade do filho,
muitas vezes respondendo também de forma agressiva, o que agravava ainda mais o que eles
chamam de “crises”. Mas ambos se mostraram preocupados e muito interessado em ajudá-lo.
A primeira impressão que tive de Mateus é de que ele é uma criança diferente. Ficou
surpreso ao perceber que podia falar comigo sobre a vovó assassina, já que em casa e com a
antiga terapeuta este era um assunto proibido. Entendi que a vovó assassina se tornou
receptáculo de toda a sua destrutividade. Pedi que ele a desenhasse para que eu pudesse
conhecê-la. Em um primeiro momento ele disse que não desenharia, pois “ela é muito
assustadora”. Só se propôs a desenhar quando eu disse que não tinha medo dela, o que
significou comunicar a ele que eu não tinha medo dos impulsos agressivos dele próprio.
Nesse primeiro encontro, observei que, muitas vezes, não me olhava nos olhos, não escutava
o que eu dizia como se, por alguns instantes, se ausentasse. Percebi uma criança bem
regredida, com evidente dificuldade de simbolização e uma agressividade que não conseguia
conter. Começamos a jogar. Quando Mateus percebeu que eu estava ganhando, tentou de
várias formas burlar as regras do jogo para se beneficiar, mas eu não permiti. Isso fez com
que ele entrasse em profundo estado de angústia e começasse a se bater no peito e no rosto,
repetindo que era “um menino ruim, bobo, idiota e que merecia morrer”. [...]
(Fochesatto, 2020)
Mateus se vinculou a mim facilmente, me chama de mãe diversas vezes ao longo das sessões.
Numa ocasião em que nos encontramos por acaso fora do consultório, Mateus me
apresentou a um colega e se referiu a mim como “é ela que me cuida”. Quando questionado
na sessão do porquê me chamar tantas vezes de mãe, ele diz “eu queria que tu fosse minha
mãe”. Entendi que esse desejo se deve ao fato de eu suportar seus impulsos agressivos sem
entrar em desespero, como muitas vezes já ocorreu com sua mãe. Digo a ele,
frequentemente, que pode sentir raiva de quem ama, que sua raiva não tem o poder de
destruir e que não vou abandoná-lo se ele sentir raiva de mim. Em duas ocasiões, no início do
tratamento, fez menção de me bater. Não tolerava quando a sessão acabava. Disse a ele que,
se me batesse, ele me machucaria e depois se sentiria muito mal, então propus que
‘brigássemos’ utilizando os bonecos de brinquedo do consultório. A partir daí tenho a
impressão de que inauguramos um espaço no registro simbólico. Concomitantemente a isso,
ao longo das sessões com Mateus e das sessões de supervisão, construímos uma metáfora
que passei a utilizar com ele de forma exitosa. Quando via que a raiva estava prestes a ser
atuada contra mim ou contra ele próprio, eu dizia que a raiva poderia sair pela boca em
forma de palavras. Assim, as brincadeiras de Mateus versavam em torno da vovó assassina
representada por bonecos. Ele podia matá-la simbolicamente diversas vezes. Podíamos
brigar e, mesmo assim, seríamos ‘amigos’. Melanie Klein descreve a posição
esquizoparanoide caracterizada por uma ansiedade persecutória que, no caso de Mateus,
aparece colocada na personagem da vovó assassina. Ou seja, há um medo de aniquilação a
partir de dentro, que, devido ao temor da malignidade, é projetado para fora, em fantasia.
Observo que Mateus, quando chegou até mim, funcionava predominantemente na
posição esquizoparanoide, onde existem objetos parciais: bom e mau encontram-se cindidos.
Segundo Spillius (2007), a onipotência de pensamento é característica dessa posição, que
ficava evidente quando Mateus sentia raiva e na sua fantasia a raiva destruiria tudo e todos
a sua volta.
Três meses após iniciarmos os atendimentos, ocorreu uma situação que agravou seu estado
emocional já primitivo. Ele e a mãe estavam saindo de casa e, acidentalmente, a mãe
atropelou e matou o cachorro da vizinha. Mateus entrou em crise, passou a dizer que
merecia morrer, pois havia matado o cachorro. Foi um período difícil, pois repetia esse
discurso constantemente deixando professora, colegas e familiares muito assustados. A
partir disso, eu o encaminhei a um psiquiatra infantil, conduta que já estava sendo cogitada.
Segundo ele, Mateus “tem um transtorno do neurodesenvolvimento não especificado” e,
apesar de não fechar formalmente critérios para autismo, entra no extremo mais leve do
espectro, prescrevendo fluoxetina e mais adiante, substituindo a fluoxetina pela
risperidona. [...]
Segundo a percepção dos pais, Mateus foi um bebê que conseguia manter contato visual e
participava ativamente de eventuais brincadeiras, não apresentando nenhum indício de
autismo precocemente. O único comportamento que chamava mais a atenção era o sono
agitado e as poucas horas que ele dormia.
(Fochesatto, 2020)
Nas nossas sessões, gradativamente, a brincadeira da vovó assassina foi substituída pela do
Titanic. Construía o navio de lego e o fazia afundar batendo em um iceberg e partindo ao
meio. Me contou que assistia aos vídeos sobre o Titanic e que, em um deles, soube que a
verdadeira causa de ele ter afundado seria a existência de fogo na casa de máquinas do
navio, fato que acabou deixando o casco muito vulnerável. Seria o fogo uma referência à
própria destrutividade que o consome? Digo a ele que o nosso trabalho é falar sobre o “fogo”
que existe dentro dele, para que ele não o afunde, como fez com o Titanic. A partir disso ele
passa a construir botes salva-vidas para os passageiros do Titanic durante nossa brincadeira.
[...]
Segundo Vasconcelos, o papel do psicanalista, de acordo com Lazmik, é intervir para que se
instaurem as estruturas que suportam o funcionamento do inconsciente. A autora considera
que a síndrome autística é consequência de uma falha no estabelecimento dos laços pais-
criança. Então, há que intervir nesse laço."
(Fochesatto, 2020)
Considerações finais da autora
"Percebo que, através da relação
transferencial na análise, Mateus vem
reconstruindo as relações de objeto e segue
rumo ao movimento de internalizar o objeto
bom.
Segundo Spillius (2007), o resultado favorável da posição
depressiva é a internalização segura do objeto bom, que, na visão
de Klein, se torna o “núcleo do ego”, a base da segurança e do
autorrespeito. A futura saúde mental do indivíduo e a capacidade
de amar dependem dessa internalização."
(Fochesatto, 2020)
Intervenções e tratamento
A psicanálise leva em conta a relação do autista com seus objetos, com seus interesses
específicos, com sua linguagem e com seu ‘pensar em imagens’, além de extrair, das inúmeras
formas de apresentação clínica, o que há de constante na estrutura autística.
(Castro, 2018)
Autismo & Psicose Nos
Manuais
DSM-IV
Exponencial aumento nos diagnósticos para TEA foi percebido após a publicação do DSM-V
23% de 2006 a 2018, 78% de 2002 a 2008
Potencial surgimento de uma "epidemia artificial", causada por mudanças nos parâmetros
diagnósticos
(Kupfer, 2014)
CRÍTICA: DSM V e noção de espectro
(Kupfer, 2014)
Níveis de gravidade para TEA: tabela
(APA, 2014)
"Se a noção de espectro abriga a dimensão de um continuum de manifestações que podem
evoluir dentro de uma mesma categoria, ela não se propõe a explicar a especificidade da vida
psíquica no autismo, devido, precisamente, às suas referências epistemológicas. Essa
investigação, da qual se ocupa a psicanálise, vem proporcionando um outro olhar para o autismo
concebido com base na hipótese de uma estrutura clínica distinta." (p.1239)
(Barroso, 2019)
Referências
CASTRO, B. R. D. A psicanálise pode contribuir para o tratamento de autistas. Opção Lacaniana on-line.
Ano, 9.
Diagnostic and Statistical Manual of Mental Disorders, Fifth Edition (DSM-V). Arlington, VA: American
Psychiatric Association, 2013.).
Fochesatto, W. P. F. (2020). "A vovó assassina" e o menino dos olhos verdes: fragmentos de um caso clínico
e as contribuições da psicanálise. Estudos de Psicanálise, 53, 65-70. Recuperado a partir de
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0100-34372020000100008
Kupfer, M. C. (2015). O impacto do autismo no mundo contemporâneo. In Kamers, M., Marioto, R. M. M. &
Voltolini, R. (Orgs.). Por uma (nova) psicopatologia da infância e da adolescência. (pp. 169-183). São Paulo:
Escuta
Referências
Lacan, J. (1998). Conferência em Genebra sobre o sintoma. Opção Lacaniana, Revista Brasileira Internacional
de Psicanálise, 23, 6-16.
Quinet, A. (1999). A psicopatología da esquizofrenia: Bleuler com Freud e Lacan. In S. Alberti (Org.),
Autismo e esquizofrenia na clínica da esquize. (pp. 79-107). Rio de Janeiro: Rios Ambiciosos.
Vanoli, E. V. & Bernardino, L. F. (2008). Psicose infantil - uma reflexão sobre a relevância da intervenção
psicanalítica. Estilos da clínica, 13(25), 250-267. Recuperado a partir de
http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1415-
71282008000200015#:~:text=Em%20seu%20Manual%20de%20Psiquiatria%20Infantil%20s%C3%A3o%20lis
tadas,fala%20nas%20habilidades%20especiais%2C%20e%20conduta%20social%20embara%C3%A7osa.
Zanola, P. C., & Lustoza, R. Z. (2019). Alienação e separação no Seminário 11 de Lacan: uma proposta de
interpretação. Tempo psicanalitico, 51(2), 121-139.