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Vários autores.
ISBN 978-65-981652-0
07 | Prefácio
Ação e mobilização no
combate à fome
no Brasil
A pobreza multidimensional e o
eterno desafio da intersetorialidade
em prol dos direitos das crianças e
dos adolescentes
REVISÃO DA TIPIFICAÇÃO
NACIONAL DOS SERVIÇOS
SOCIOASSISTÊNCIAIS
A relação e a integração
operacional entre o SUAS
e o sistema
Financiamento do SUAS
– A retomada do diálogo com os
entes federados e o
compromisso com fundo a fun-
do regular, automático
e democrático!
06 | Sumário
Roberta Aline/MDS
Wellington Dias
Ministro do Desenvolvimento e Assistência Social,
Família e Combate à Fome.
Roberta Aline/MDS
12 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
Agradeço ao Colegiado Nacional de Gestores Municipais de Assistência Social (CONGEMAS)
por este espaço na revista e pela oportunidade do diálogo federativo. Os municípios são atores
chave no funcionamento da gestão compartilhada, descentralizada e participativa do Sistema
Único de Assistência Social (SUAS).
É por intermédio da atuação cotidiana e coletiva de gestores (as), trabalhadores (as), conse-
lheiros (as), usuários (as), Entidades e Organizações de Assistência Social/OSC e instituições de
formação que a política de Assistência Social se materializa nos territórios e na vida das famílias
brasileiras.
Os municípios tiveram um papel preponderante na trajetória de implementação do SUAS no
Brasil. Após quase duas décadas de implantação, o SUAS está presente em praticamente todos
os municípios brasileiros, com uma rede de atendimento robusta e capilarizada.
Segundo dados do Censo SUAS 2022, são mais de 8,5 mil Centros de Referência de Assistência
Social (CRAS), mais de 2,8 mil Centros de Referência Especializado de Assistência Social (CRE-
AS), 237 Centros de Referência para População em Situação de Rua (Centro POP) e mais 6,5 mil
unidades de acolhimento.
O Cadastro Único para Programas Sociais do Governo Federal (CadÚnico), o Benefício de Pres-
tação Continuada (BPC) e o Programa Bolsa Família (PBF) são conquistas da sociedade brasi-
leira no campo das políticas públicas e exemplos mundiais de tecnologias sociais efetivas de
enfrentamento à pobreza e à fome, com impacto para os beneficiários e para a dinamização
das economias locais.
O CadÚnico funciona como o grande elo que permite conhecer as famílias de baixa renda e
integrar transferência de renda com acesso a serviços e direitos básicos.
13 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
Cerca de 47% da população brasileira está no 15,5%, atingindo cerca de 33 milhões de
CadÚnico, o que corresponde a mais de 96 mi- pessoas. Nesse contexto, em 2022, o Bra-
lhões de pessoas1 . Quase 56 milhões de pesso- sil, lamentavelmente, voltou para o Mapa
as são beneficiárias do Programa Bolsa Famí- da Fome, do qual havia saído em 2014.
lia (PBF)2 e quase 5,4 milhões são beneficiárias
do Benefício de Prestação Continuada (BPC)3.
Segundo dados do Registro Mensal
Estes resultados, que são fundamentais de Atendimento (RMA), no período de
para o enfrentamento da pobreza e da fome 2017 a 2022, os atendimentos individu-
no país, não teriam sido alcançados sem o alizados nos CRAS cresceram 86%, pas-
compromisso e o engajamento dos muni- sando de 21,5 milhões para 40 milhões.
cípios brasileiros na identificação e inclu-
são da população em situação de maior É notável o empenho dos municípios para
vulnerabilidade no CadÚnico e na promo- absorver o crescimento da demanda por
ção de seu acesso a benefícios e serviços. atendimento no SUAS, mesmo em um
contexto de retração dos repasses regu-
Nos últimos anos, os municípios desem- lares dos recursos do cofinanciamento
penharam, ainda, um papel de suma im- federal.
portância na sustentação do SUAS em
um contexto notadamente adverso, mar- Dados do RMA mostraram, ainda, que,
cado pela pandemia da COVID-19, pelo no segundo trimestre de 2020, a deman-
aumento da pobreza e da fome e, para- da por Benefícios Eventuais (BE) dobrou,
doxalmente, pela retração do cofinancia- passando de 14,3% para 28,9% do total
mento federal para a política de Assistên- de atendimentos realizados nos CRAS.
cia Social. Estudo do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada - IPEA (SOUZA; HE- Assim, no período analisado, a conces-
CKSHER; OSORIO, 2022) constatou que, são de Benefícios Eventuais pelos mu-
entre 2020 e 2021, o país atingiu seu nicípios - desconsiderando os Auxílios
maior patamar de pobreza desde 1990. por Natalidade e por Morte – também
aumentou, saltando de 852 benefícios
De acordo com estudo da Rede Brasileira concedidos no primeiro trimestre para
de Pesquisa em Soberania e Segurança 2.610 no segundo trimestre de 2020
Alimentar – Rede PENSSAN (2022), de 2018
para 2022, o percentual de brasileiros em
situação de insegurança alimentar gra-
ve quase triplicou, passando de 5,8% para
Waldemar Neto
2 Dados de Setembro/2023. Fonte: RI de Programas e Ações do MDS. Disponível em: https://olheparaafome.com.br/wp-content/uploads/2022/06/Relatorio-II-VIGISAN-2022.pdf Consultado em Dados
de Julho/2023.
3 Fonte: RI de Programas e Ações do MDS. Disponível em: http://blog.mds.gov.br/redesuas/sistemas/consultas-publicas/ Acesso em: 06.10.2023.
14 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
A população negra, as mulheres, as crianças, fícios da política de Assistência Social, em
os adolescentes e os Grupos Tradicionais e 2022, o orçamento destinado pelo governo
Populacionais Específicos - que abrangem, anterior na PLOA 2023 para serviços e pro-
por exemplo, as pessoas em situação de rua, gramas do SUAS foi reduzido ao patamar
os povos indígenas e os povos e as comunida- de R$ 50,7 milhões – o que representa me-
des tradicionais – estão entre os públicos mais nos de 4% da estimativa de recursos ne-
afetados pela pobreza e pela fome no Brasil. cessários para a manutenção destas ofer-
Segundo dados do Ministério do Desenvolvi- tas sem alteração do patamar de cobertura.
mento e Assistência Social, Família e Combate
à Fome (MDS), em março de 2023, 69% dos be- Para enfrentar esse quadro dramático, uma
neficiários do PBF eram negros e cerca de 45% das primeiras medidas adotadas pelo atual
eram crianças e adolescentes de até 17 anos. governo, ainda durante a transição, foi a ar-
ticulação com o Congresso Nacional, que re-
sultou na recomposição do orçamento da As-
Quase metade das famílias beneficiárias do sistência Social, por meio da PEC nº 32/2022.
PBF eram famílias chefiadas por mulheres
com filhos (47%). No caso do Benefício de
Prestação Continuada, 68% dos beneficiá-
rios com deficiência eram negros; e dentre
as pessoas idosas beneficiárias, 59% eram
negras e praticamente 60% eram mulheres.
Assim, de R$ 50,7 milhões na PLOA 2023, que possibilitou à União reestabelecer a re-
o orçamento da Assistência Social desti- gularidade dos repasses dos recursos federais
nado à manutenção dos programas e ser- aos municípios e honrar compromissos do
viços socioassistenciais foi elevado ao pa- governo federal com a gestão compartilhada
tamar de R$ 2,3 bilhões na LOA 2023. do SUAS e com a proteção das populações
Essa recomposição do orçamento por meio em situação de maior vulnerabilidade so-
da PEC nº 32/2022 foi uma primeira grande cial, mais afetadas pela pobreza e pela fome.
vitória no percurso de reconstrução do SUAS,
15 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
Outra medida estruturante para o enfrenta- de 2023 foram realizadas mais de 2 milhões de
mento do aumento da fome e da pobreza, novas concessões do PBF.
adotada no início da gestão do atual gover-
no, foi a retomada do Programa Bolsa Família, O fortalecimento do SUAS, a retomada e o
com a composição do benefício com valores aprimoramento do Programa Bolsa Famí-
per capta, ou seja, considerando o número de lia e o PROCADSUAS integram, ainda, outra
pessoas de cada família. importante estratégia adotada pelo gover-
no federal para o enfrentamento da pobreza
Essa lógica do cálculo do benefício está funda- e da fome no país: o Plano Brasil Sem Fome.
mentalmente atrelada à trajetória eficiente do
Programa no enfrentamento da pobreza, so-
Mídia Ninja
bretudo entre crianças e adolescentes, o que
lhe conferiu reconhecimento mundial. Com os
aprimoramentos realizados no PBF, nenhuma
família recebe menos do que R$ 600 e todas
as pessoas da família, independentemente da
idade, têm direito a uma renda mínima.
16 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
Roberta Aline/MDS
Hermes de Paula
17 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
No delineamento de estratégias de enfrenta- Progressiva recomposição do orçamento da
mento e alteração dessa realidade temos recor- União para a Assistência Social, para repasse
rido ao aprendizado acumulado, à abertura para de recursos aos entes condizente com: va-
a inovação e, ainda, ao diálogo interfederativo, lores pactuados de repasse do cofinancia-
à participação social e à transparência pública, mento federal; cobertura de serviços pres-
que são elementos salutares às democracias. tados e ainda não cofinanciados; demandas
de expansão de serviços socioassistenciais;
Para além do alcance de um patamar dig- e apoio a novos serviços tipificados;
no de sobrevivência à população brasilei-
Reordenamento do Programa Primeira In-
ra, nosso objetivo no combate à fome e à
fância no SUAS/ Programa Criança Feliz,
pobreza é enfrentar também as desigual-
com ampliação da cobertura de municípios
dades de renda, raciais, étnicas e de gêne-
e do público atendido;
ro, tendo como horizonte a defesa da jus-
tiça social, da equidade e da inclusão social. Revisão do Programa de Enfrentamento ao
Trabalho Infantil (PETI), com retomada do
Quero também ressaltar que, em 2023, os en- cofinanciamento federal;
contros regionais do CONGEMAS e do Fórum Apoio ao Plano Nacional de Convivência Fa-
Nacional de Secretários (as) de Estado de As- miliar e Comunitária, incluindo o estímulo
sistência Social (FONSEAS), as Conferências ao fortalecimento do Serviço de Acolhimen-
de Assistência Social Municipais, Estaduais to em Família Acolhedora e a novas modali-
e do Distrito Federal nos possibilitaram es- dades de acolhimento, como o acolhimento
paços privilegiados para o debate, a parti- conjunto mãe/filho (s);
cipação social e o exercício da democracia.
Reorganização do trabalho com a popula-
Após uma intensa participação da SNAS nes- ção de rua, em especial nas metrópoles e
tes espaços e de uma ampla escuta de diver- grandes cidades, em articulação com polí-
sos atores, quero aqui registrar alguns desafios ticas de Saúde, Habitação e Geração de Tra-
emergentes constatados e convidar a todos balho e Renda;
para a continuidade do debate, com vistas à Apoio à estruturação do SUAS Indígena e de
construção de uma agenda nacional de re- Povos e Comunidades Tradicionais;
construção do SUAS e de futuro para a política
Fortalecimento da integração entre SUAS e
de Assistência Social. Assim, dentre os desafios
Instituto Nacional do Seguro Social (INSS),
constatados, destaco os elencados a seguir:
buscando aprimorar procedimentos e facili-
tar o acesso ao Benefício de Prestação Con-
tinuada (BPC);
Melhoria da infraestrutura física dos equi-
pamentos do SUAS, com apoio à amplia-
ção, reforma e construção de CRAS, CREAS
e Centro POP, com projetos de construção
padronizados para atendimento mais hu-
manizado aos cidadãos;
Diagnóstico de demandas e ampliação da
mobilidade e conectividade (móvel e nos
equipamentos) do SUAS;
Fortalecimento do PROCAD/SUAS, das es-
tratégias de inclusão e atualização cadastral
e da busca ativa, com ampliação de equipes
volantes do SUAS;
18 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
Estruturação da Política de Promo- Articulação com o Congresso Nacional para
ção da Igualdade Racial do SUAS; convergência da destinação de emendas par-
lamentares individuais e de bancada impositi-
Atualização e ampliação do Serviço de Pro- vas com as prioridades estabelecidas no SUAS;
teção em Situações de Calamidades Pú-
blicas e de Emergências, visando consoli- Reavaliação e fortalecimento do Ser-
dar uma ampla proteção social adaptativa; viço de Proteção Social a Adolescen-
tes em Cumprimento de Medida Socio-
Aprimoramento da atenção aos migran- educativa de Liberdade Assistência e de
tes e refugiados no SUAS, em parce- Prestação de Serviços à Comunidade;
ria com outras políticas, Estados, Distri-
to Federal, Municípios e outros atores; Construção de estratégias para o for-
talecimento da vigilância socio-
Instituição de estratégias de proteção vol- assistencial no âmbito do SUAS;
tadas a crianças e adolescentes em si-
tuação de orfandade decorrente de Diálogo intersetorial e integração de es-
crimes violentos ou de contextos de pan- forços, sobretudo entre SUS e SUAS, para
demia, emergências ou calamidades; consolidar no país uma Política de Cuida-
dos e qualificar a atenção a pessoas que de-
Garantia da participação ativa do SUAS no pendem de cuidados e a seus cuidadores.
Plano Brasil sem Fome, com maior integra-
ção com o SISAN e o SUS para o enfrentamen-
to da insegurança alimentar e nutricional;
19 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
Panitan
Marcia Lopes
Ex-Ministra de Desenvolvimento Social e Combate à
Fome do Governo Lula, Consultora na área.
10
20| |Desafios
Desafiospara
paraaasuperação
superaçãoda
dapobreza
pobrezaeeda
dafome
fomeno
noBrasil:
Brasil:pacto
pactofederativo
federativoeeoopapel
papelestratégico
estratégicodo
doSUAS
SUAS
No Brasil, a fome sempre foi denunciada por
“A dor te dói pelo avesso, diferentes atores e em diversos momentos
históricos. Os protagonistas desta luta en-
Perdida nos teus escuros. frentaram bravamente o campo das dispu-
É como alguém que come tas pela terra, pela produção, pelos interes-
ses comerciais, por grandes corporações, por
Não o pão, mas a fome”. modalidades de legislações que defendem
a vida como negócio no campo e na cidade.
(Thiago de Mello, 1965) A fome, o não acesso ao direito humano à alimen-
tação e tudo o que se desdobra, foram apartados
de qualquer responsabilidade pública, estatal.
Os desafios para superar a Fome no Bra-
sil são muito antigos e reiteram as con- Assim, historicamente, a fome serviu como ob-
tradições de um modelo excludente e, jeto de bandeiras e ações ora de cunho político
portanto, de natureza estrutural, o que re- eleitoreiro, ora como missão voluntária, religio-
chaça a ideia de que a Fome se constitui sa, mesmo operada por setores da administra-
num fenômeno natural ou circunstancial. ção pública federal, estaduais e municipais.
A Fome é a consequência mais perversa das A adoção das conhecidas “cestas básicas”,
desigualdades aqui no Brasil e em todo o como “solução aos famintos” datam de séculos,
mundo. Aproximadamente, 1 bilhão de pes- imprimindo um caráter emergencial para uma
soas no mundo passam fome, dentre os 8 questão estrutural, que deveria ser uma das cen-
bilhões do planeta. E não se trata da falta tralidades das políticas econômicas e sociais.
de alimentos, nem em quantidade e nem
em qualidade, mas, porque nessa área, o ci- Com a Lei Orgânica de Assistência Social –
clo de produção até o acesso da população LOAS (Lei nº 8.742/93) e a implementação do
aos alimentos e a água não se completa. Sistema Único de Assistência Social - SUAS,
as cestas de alimentos passaram a integrar os
Há produção de alimentos suficien- benefícios eventuais, como direito, mas não
tes para atender as necessidades nu- como estratégia permanente de responder à
tricionais na quantidade e qualida- fome. Cada vez mais, articular e integrar po-
de para toda a população brasileira. líticas públicas intersetorialmente, respeitan-
E a meta deve ser a universalização de do os territórios tem sido um grande desafio.
acesso à segurança alimentar e nutricional.
21 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil: pacto federativo e o papel estratégico do SUAS
Sabemos o quanto no país, o processo de Sérgio Amaral / MDS
produção dos alimentos tem lado e interes-
ses explícitos, que não a prioridade de acabar
com a fome e com a insegurança alimentar e
nutricional. Por outro lado, o Brasil também
trilhou caminhos exitosos com experiências
consolidadas pelo estado e/ou pela socieda-
de civil provando que políticas públicas efeti-
vas resolvem a mazela da fome no país. Para
destacar dois exemplos, tem-se na década de
1990 a iniciativa da Ação da Cidadania Contra
a Fome e a Miséria protagonizada pelo que-
rido Betinho, uma iniciativa que persiste até
hoje. E a partir de 2003, a estratégia Fome
Zero no governo Lula, foi capaz de mobilizar
as forças políticas da sociedade, recursos pú-
blicos, programas e serviços de várias políti-
cas públicas que alavancaram a produção e
o acesso aos alimentos integrando Estado e
sociedade na construção de um Sistema Na-
cional de Segurança Alimentar e Nutricional,
normatizado no contexto de uma Rede de
SAN envolvendo todo o ciclo de produção,
abastecimento, comercialização e acesso
aos alimentos, com ênfase no fortalecimen-
to do pacto federativo e no controle social.
22 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil: pacto federativo e o papel estratégico do SUAS
Sérgio Amaral
Roberta / MDS
Aline / MDS
Viu-se o que foi de 2016 a 2022, quando tragicamente o executivo federal comanda e realiza um des-
monte de todas as políticas públicas jamais visto, com desfinanciamento em todas as áreas, ruptura
do pacto federativo, neste caso, que ocorreu a paralização e/ou extinção dos programas e projetos de
SAN e interrupção da implementação do SISAN no país, novamente com o fechamento do Consea.
A ameaça do Brasil voltar ao Mapa da Fome se concretizou e estudos e pesqui-
sas da rede PENSAN, que passou a divulgar números e as condições de vida da popu-
lação brasileira, e que muito rapidamente voltaram à condição de fome e inseguran-
ça alimentar. São 33 milhões de pessoas com fome, 119 milhões de pessoas que não se
alimentam adequadamente todos os dias, entre tantos dados assustadores e inaceitáveis.
E como nesse campo não há “meio prato feito”, não há fatores isolados que justifiquem a fome.
Será preciso novamente, vencer grandes desafios que ensejam a reconstrução de cada área, de
cada política pública, do fortalecimento do pacto federativo, da gestão pública comprometida e
descentralizada, da tomada de decisões que abram novos rumos para a consolidação de um Siste-
ma Público (SISAN), inovador, intersetorial, territorializado, cumprindo a CF/88 e a LOSAN de 2006.
Destacam-se, nesse sentido, alguns desafios para a superação da FOME, diante do novo contexto
político e institucional:
Assegurar a distribuição de renda de forma equitativa e mecanismos de acesso rápido aos alimen-
tos;
Criar políticas públicas para a geração de emprego e renda, respeitando o perfil da população em
sua diversidade nos territórios;
Ampliar a cobertura da proteção social, considerando o Cadúnico, com acesso aos serviços e bene-
23 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil: pacto federativo e o papel estratégico do SUAS
Ampliar a cobertura da proteção social, considerando o Cadúnico, com acesso aos serviços e
benefícios da Assistência Social, como a rede de CRAS, CREAS, Centros Pop, Acolhimentos,
priorizando a população em situação de extrema pobreza e maior vulnerabilidade;
Retomar, fortalecer e expandir programas como o PAA, o PNAE e equipamentos como os res-
taurantes populares, bancos de alimentos, cisternas, e acesso rápido aos alimentos nos casos
de emergências e calamidades;
Desenvolver ações para que o país produza mais, gastando menos, com prioridade aos peque-
nos produtores e iniciativas coletivas locais;
Conter a disparada dos preços dos alimentos, por meio do retorno e do fortalecimento dos
mercados reguladores e da Conab;
Criar as condições necessárias de recursos e gestão para consolidar o Sistema Nacional de Se-
gurança Alimentar- SISAN em todo o país.
Pacto federativo
e compromissos conjuntos
A partir dos desafios destacados, ressalta-se o A Constituição Federal de 1988 reitera o Pacto
papel de cada ente federado na implantação Federativo brasileiro, envolvendo as três esfe-
ao programa Brasil Sem Fome. O país pode ras de governo: união, estados e municípios,
ter um projeto comum na execução das po- com suas atribuições e responsabilidades.
líticas públicas, na articulação federativa e
na relação Estado e sociedade, respeitando a Tal tema foi ganhando complexidade consi-
grande diversidade socio territorial e regional. derando as novas legislações, a política fis-
cal e tributária, debates do fundo público,
O Brasil tem 203 milhões de habitantes vi- demandas da sociedade, das novas tecno-
vendo em 26 estados, mais o DF. São 5.570 logias, das conquistas por direitos, das exi-
municípios, sendo a grande maioria de até gências pela efetividade das gestões públi-
20.000 habitantes.São 5 grandes regiões cas, dos indicadores sociais, crescimento
(Norte -7 estados, Nordeste - 9, Centro Oes- das desigualdades, desmontes das políticas
te - 3, Sudeste - 4 e Sul - 3), com característi- sociais, crescimento das violências e pre-
cas muito próprias em termos geográficos, conceitos e o flagelo da Fome, entre outros.
culturais, econômicos, demográficos, sociais,
históricas, racial, étnica, de gênero e tan-
tas diversidades de seus povos originários.
24 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil: pacto federativo e o papel estratégico do SUAS
Embora existam entidades fortes represen- Uma agenda comum como essa de um “Brasil
tando as três esferas de governos, principal- Sem Fome” de fato pode ser um elo importante
mente as entidades municipalistas, cada ente pra além de um Programa, se houver real com-
tem atuações distintas e pode dar significa- promisso e disposição tática para implemen-
dos novos na construção de uma agenda co- tar as ações de combate e prevenção a fome.
mum que fortaleça o ente, a região, os terri-
tórios, assegurando identidade, a revelação O Documento Brasil Sem Fome evidencia as
de suas potencialidades, particularidades, possibilidades de serem executadas ações di-
construção de estratégias na implementação retas conforme as necessidades e indicadores.
das políticas públicas setoriais e intersetoriais. Nenhuma política pública se efetiva sem
um bom diagnóstico, planejamento, de-
No caso da Fome, cada ente continua com finição de metodologias, dimensões dos
suas atribuições, mas de modo especial a exe- investimentos, escala, ações continu-
cução de políticas, programas, financiamen- as, equipes, articulação, comunicação,
to, dos níveis nacional e estaduais recaem sistema de avaliação e monitoramento.
nos municípios porque ali está a população.
A experiência do Fome Zero mostrou que hortas comunitárias; abrir restaurantes popu-
apenas das 35 ações integrantes, a prio- lares; melhorar a qualidade da alimentação
ridade inicial em 4 ações com escala na- escolar; incentivar a construção de sistemas
cional, fez um movimento que deu for- sustentáveis de produção de alimentos; in-
ça e foi orientando os próximos passos. cluir a população em situação de rua e de vul-
Cada ente além de assumir o compromisso nerabilidade social nos programas de trans-
ético e político, foi se colocando como parcei- ferência de renda do governo federal, como
ro que integrou o projeto maior contra a fome. por exemplo o Bolsa Família; aproveitar as
estruturas e equipamentos existentes da As-
Do ponto de vista de perfil sócio econômico, o sistência Social para acompanhar a entrada
Cadastro Único registra informações de todas das pessoas nos programas e acompanhar
as famílias que atendem o critério de renda o desenvolvimento nutricional das crianças,
(1/2 salário mínimosalário-mínimo por pessoa mães e gestantes; incentivar organizações so-
da família ou até 3 salários mínimossalários- ciais locais que lutam para combater a fome;
-mínimos por família), totalizando hoje 44 incentivar a pesca artesanal, a alimentação
milhões de famílias e 96 milhões de pessoas. local; fazer busca ativa; campanhas sobre ali-
Importante saber que o Cadastro Único para mentação saudável e contra o desperdício.
Programas Sociais pode abarcar inúme- conjunto de medidas previstas no Brasil Sem
ros programas, das várias políticas públicas, Fome, entre elas: ampliar a renda dos peque-
assegurando acesso facilitado às famílias, nos produtores; criar hortas comunitárias; abrir
como: Bolsa Família, Tarifa Social de Ener- restaurantes populares; melhorar a qualidade
gia, Taxas de concurso, MCMV, entre outros. da alimentação escolar; incentivar a constru-
ção de sistemas sustentáveis de produção de Brasil
Agência
Assumir e integrar a agenda comum nacio- alimentos; incluir a população em situação de
nal sem dúvida é a melhor forma de atuar de rua e de vulnerabilidade social nos programas
modo propositivo para superar a fome e sair de transferência de renda do governo federal,
novamente do Mapa da Fome. Cada instância como por exemplo o Bolsa Família; aproveitar
federativa ganha relevância ao se apropriar as estruturas e equipamentos existentes da
de suas realidades e formular políticas públi- Assistência Social para acompanhar a entra-
cas que correspondam as demandas da popu- da das pessoas nos programas e acompanhar
lação, tendo em vista a perspectiva de gestão o desenvolvimento nutricional das crianças,
compartilhada e descentralizada, interseto- mães e gestantes; incentivar organizações so-
rial, territorializadas, envolvendo também as ciais locais que lutam para combater a fome;
instâncias de controle social nas três esferas. incentivar a pesca artesanal, a alimentação
local; fazer busca ativa; campanhas sobre ali-
É possível adotar um conjunto de medidas mentação saudável e contra o desperdício.
previstas no Brasil Sem Fome, entre elas: am-
pliar a renda dos pequenos produtores; criar
25 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil: pacto federativo e o papel estratégico do SUAS
crianças no trabalho infantil, vítimas de
O papel estratégico abuso sexual, violências contra a mulher,
idoso, pessoa com deficiência, famílias,
da Assistência Social pessoas e grupos em situação de risco e ví-
timas de todo tipo de abandono, discrimi-
na superação da fome nações, não acesso às necessidades básicas.
26 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil: pacto federativo e o papel estratégico do SUAS
principalmente os CRAS, tendo acesso ao
Léu Britto
Cadastro Único como base de inclusão em
inúmeros programas sociais; articulação ter-
ritorial e atuação em rede, explicitando as
desproteções e responsabilidades do Estado;
oferta de cestas de alimentos, como benefício
eventual; estímulo aos projetos locais de aces-
so à alimentação e a garantia de renda, possi-
bilitando aos usuários/as, o acesso à alimenta-
ção como segurança alimentar e nutricional.
27 | Desafios para a superação da pobreza e da fome no Brasil: pacto federativo e o papel estratégico do SUAS
Roberta Aline / MDS
Eliane Aquino
Secretária Nacional de Renda de Cidadania – SENARC/MDS.
Não se tem em vista exclusivamente a melhoria do desempenho na prestação dos serviços públicos.
Ainda que a questão do desempenho possa estar presente, a perspectiva torna-se mais abrangente e
se centra expressamente na solução do problema que se quer enfrentar, lembrando que se o proble-
ma é multicausal, a integração setorial pode melhorar sua abordagem integral. Isso significa que é a
procura da integralidade na abordagem de um determinado problema ou situação social que coloca
como central a questão da relação entre diferentes setores do governo... a intersetorialidade implica
não somente que os diversos setores do governo entreguem a um mesmo público específico os serviços
que são próprios de cada um, mas também, de maneira articulada, atendam às necessidades sociais,
ou previnam problemas que tenham na sua origem causas complexas, diversas e relacionadas entre si.
(BRASIL, 2016, 36)
34 | A pobreza multidimensional e o eterno desafio da intersetorialidade em prol dos direitos das crianças e adolescentes no Brasil
Pobreza infantil multidimensional
e seus usos para a política pública
A pobreza infantil pode ser entendida sob mui- der esta multidimensionalidade na pesquisa
tas perspectivas. Em verdade, as especificida- empírica dos últimos anos sobre o assunto.
des da infância e da adolescência demandam Em muitas das linhas de pesquisa exis-
que tenhamos perspectivas mais diversas tentes, busca-se compreender a intensi-
sobre as eventuais privações que interferem dade das privações, ou seja, o quão fre-
em seu desenvolvimento. Todos os marcos quentes e graves são as privações para as
normativos internacionais e nacionais deixam crianças, assim como as sobreposições de pri-
isso bem claro, ao estabelecerem que o úni- vações em prejuízo dos mesmos indivíduos.
co enfoque de direitos possível ao se tratar
da infância é o enfoque da proteção integral. Em muitas das linhas metodológicas, o enfo-
que dos direitos das crianças está presente
A tradução da doutrina da proteção integral na definição do que vem a ser pobreza não-
para o viés mais negativo da violação dos di- -monetária, quase sempre com um sentido de
reitos, portanto, demanda uma visão multi- acesso a serviços públicos. Nestes casos, tam-
dimensional. Uma das formas que o debate bém é muito comum que princípios de direitos
acadêmico e das políticas públicas concreti- humanos se imiscuam nos critérios de defini-
zaram tal visão se deu por meio do conceito ção da pobreza multidimensional, em espe-
de pobreza infantil multidimensional. Há dis- cial a indivisibilidade dos direitos humanos.
tintas formas de conceituar e de compreen-
Selma Bandeira
35 | A pobreza multidimensional e o eterno desafio da intersetorialidade em prol dos direitos das crianças e adolescentes no Brasil
Quando aplicado às medidas de pobreza multidimensional, tal princípio, especificamente,
indica que todas as dimensões são igualmente importantes, já que todos os direitos são re-
levantes para o pleno desenvolvimento nas diferentes etapas: primeira infância, crianças e
adolescentes. Tal decisão metodológica é bastante coerente com o próprio princípio da pro-
teção integral, tão forte no arcabouço normativo brasileiro, e significa que todas as violações
de direitos poderiam, em tese, compor um indicador de pobreza infantil multidimensional.
A principal limitação, nestes casos, é a existência de dados que expressem as violações dos va-
riados direitos.As aplicações práticas deste tipo de análise também podem ajudar a explicar as
distintas escolhas metodológicas. Para aplicações mais voltadas à identificação de beneficiários
de políticas públicas, a adoção de múltiplas dimensões como critério pode ser desafiadora para
a factibilidade da própria política pública, tendo em vista a própria dialética presento no movi-
mento das sociedades, logo, ao surgirem novas demandas surgem também novas necessidades.
Nestes casos, portanto, são muito comuns critérios monetários, à exemplo dos
programas de transferência de renda. Além desta explicação prática para a ado-
ção de linhas de pobreza monetária, há também uma explicação teórica, já que
a renda é uma dimensão diferenciada, na medida em que pode explicar mui-
tas outras dimensões, sendo uma proxy possível em nome dos aspectos práticos.
Mario Tama
Para outras aplicações, contudo, a perspectiva multidimensional se mostra bastante útil, não
apenas para compreender a realidade, mas também para auxiliar em sua transformação. Re-
ferimo-nos, por exemplo, à importância de se ter uma só régua coligada as reais necessidades
populacionais, não partindo do pressuposto do que se espera que fosse adequado, mas, atenta
aos reais significados dos fenômenos que afloram nas sociedades, para identificar e monitorar
prioridades para a autoridade central, para o centro de governo, ou para a função de planeja-
mento de um ente governamental. Uma metodologia de identificação da pobreza multidimen-
sional permite, portanto, que tais atores tenham um mapa de necessidades, que intuitivamen-
te pode se transformar em um critério para a definição de prioridades de políticas públicas.
36 | A pobreza multidimensional e o eterno desafio da intersetorialidade em prol dos direitos das crianças e adolescentes no Brasil
Se a realidade é multidimensional, é preci- debate mais propositivo do combate à po-
so que a política pública tenha ferramentas breza infantil em suas muitas dimensões.
para observar essa diversidade no planeja- Antes, porém, apresentam-se alguns dados
mento das soluções. Nesse sentido, medidas sobre o que estamos entendendo por po-
de pobreza infantil multidimensional fun- breza infantil multidimensional. Ao final, o
cionam como um mapa de necessidades texto levanta possibilidades e propostas de
que pode auxiliar na definição de um por- políticas públicas e ações governamentais.
tfólio de ofertas, sejam elas ofertas de or-
çamento público, novas políticas ou ajustes
nas existentes (de escopo, de cobertura etc.).
37 | A pobreza multidimensional e o eterno desafio da intersetorialidade em prol dos direitos das crianças e adolescentes no Brasil
Além de um olhar mais amplo sobre os direitos das crianças, e da quantida-
de delas em situação preocupante, o que os dados demonstram não são no-
vidades para o que os trabalhadores do SUAS estão acostumados a observar:
38 | A pobreza multidimensional e o eterno desafio da intersetorialidade em prol dos direitos das crianças e adolescentes no Brasil
Trata-se de um olhar amplo sobre a pobre- Um exemplo extremo: 40,3% das crianças
za infantil, olhar esse que mostra as espe- de sete anos em 2022 eram analfabetas, en-
cificidades de cada território, e fortalece a quanto em 2019 esse percentual era de 20,5% 4.
necessidade de uma atuação multiprofis-
sional e intersetorial para problemas de vida Do mesmo modo, enquanto mapa de deman-
que não são segmentados em setores. das sensível às prioridades de cada território,
O último relatório (UNICEF, 2023b) mostra, a pesquisa mostra que os desafios no estado
por exemplo, efeitos amplos do afastamento de São Paulo estão mais concentrados nos
prolongado de um grupo grande de crian- temas de moradia, renda e educação, que
ças e adolescentes do ambiente escolar. Vi- aqueles que enfrenta Rondônia, dominado
vemos atualmente uma crise de aprendi- pela privação na dimensão saneamento (60%
zagem que ainda levará algum tempo para das crianças sofrem com alguma privação
ser endereçada. nesta dimensão).
O SUAS e a intersetorialidade
Como toda metodologia, há nuanças nem sempre captadas por uma pesquisa em compara-
ção a outras. Neste caso emblemático, dados do SAEB recentemente apresentados pelo INEP
apontam que a crise de aprendizagem decorrente do fechamento das escolas nas crianças
do 2º ano do ensino fundamental (etapa de ensino em que crianças de sete anos são muito
frequentes), era muito maior do que captado pela PNAD, com percentuais de 39,7% em 2019 e
56,4% em 2021.
Como já mencionado, o SUAS foi criado para contribuir a lidar com os desafios da multidimen-
sionalidade da pobreza. Além disso, se a solução para o caráter multifacetado da pobreza é a
intersetorialidade, o SUAS está em posição de destaque, já que tal tipo de atuação está no DNA
do SUAS.
Para manter o paralelo, este “DNA” intersetorial do SUAS é composto por uma série de “nucleo-
tídeos”, já que o Sistema Único da Assistência Social promove a convergência e a coordenação
entre as diferentes políticas, seja por meio do apoio à operacionalização de uma série de outras
políticas públicas nos municípios, característica que acaba facilitando sua ação corrente de
referenciamento de seus beneficiários a outros serviços.
Aqui merece uma referência ao relevante papel do SUAS junto àquelas ofertas mais óbvias,
como o Cadastro Único, o Programa Bolsa Família (PBF) e o Benefício de Prestação Continua-
da (BPC), mas também propiciando as condições para facilitar o acesso de seus beneficiários
à educação, à saúde, às políticas de habitação e de alimentação, dentre outras. É de extrema
relevância também o apoio que o SUAS oferece à população para acesso à documentação, ao
credenciamento, e outros requisitos de políticas diversas, além das ações diárias de educação
em direitos para propiciar a que acessem programas e políticas de outros setores.
4 Como toda metodologia, há nuanças nem sempre captadas por uma pesquisa em comparação a outras. Neste
caso emblemático, dados do SAEB recentemente apresentados pelo INEP apontam que a crise de aprendizagem
decorrente do fechamento das escolas nas crianças do 2º ano do ensino fundamental (etapa de ensino em que
crianças de sete anos são muito frequentes), era muito maior do que captado pela PNAD, com percentuais de 39,7%
em 2019 e 56,4% em 2021.
39 | A pobreza multidimensional e o eterno desafio da intersetorialidade em prol dos direitos das crianças e adolescentes no Brasil
O DNA intersetorial está tão presente no SUAS, Contudo, ainda que o SUAS tenha sido de-
que suas equipes e trabalhadores acabam por senhado com tais características, e cuja
conhecer as especificidades das diferentes po- operação local promova acessos a diversos
líticas no território, o que oferece oportunida- outros espaços de políticas públicas pela po-
des impares para construções de programas pulação mais vulnerabilizada, nem sempre
socias e políticas públicas de enfrentamento a relação entre o SUAS e os demais serviços
à questões que muitas vezes podem passar é flui, a e organizada por fluxos interseto-
despercebidas, contribuindo para a constru- riais desenhados, comunicados e funcionais.
ção de vínculos e pontos de contato sistemá-
tico com outros serviços, super importantes Por esse motivo, na atual edição 2021-2024
para que performem melhor a ação de refe- do Selo UNICEF, com 2.023 municípios da
renciamento, para dar apenas um exemplo. Amazônia Legal e Semiárido participando,
a metodologia da iniciativa foi proposta de
Em síntese, a atuação do SUAS pode ser ca- forma a abarcar ações intersetoriais em sete
paz de alcançar soluções a problemas de Resultados Sistêmicos, incluindo um resul-
déficit educacional motivados, por exem- tado específico para assistência social, “Pro-
plo, por desafios que perpassam áreas como teção Social e Atenção Integral para Famí-
saúde, habitação e insuficiência de renda. lias Vulneráveis via Serviços Intersetoriais”.
Além disso, sua visão ampla da pobreza e da
vulnerabilidade social também se traduz em João Ripper / UNICEF
atendimentos e ações de acompanhamento
familiar capazes de potencializar benefícios
de renda, como os providos pelo BPC e PBF,
uma associação comprovadamente efetiva
para o bem-estar geral das famílias (Bossu-
roy, et.al., 2022; Roelen et.al. 2017), além de
eficiente sob a ótica dos recursos públicos
aplicados vis-à-vis os resultados alcançados.
40 | A pobreza multidimensional e o eterno desafio da intersetorialidade em prol dos direitos das crianças e adolescentes no Brasil
Laís Abramo
Secretária Nacional de Cuidados e Família do Ministério
de Desenvolvimento e Assistência Social, Família e
Combate à Fome.
4131| Rumo
| A pobreza
à construção de umaePolítica
multidimensional o eternoNacional
desafio dade Cuidados no Brasil
intersetorialidade REVISTA
em prol dos CONGEMAS
direitos das crianças EDIÇÃO ESPECIAL
e adolescentes no Brasil
Todas as pessoas demandam cuidados ao longo da vida. Por isso, o cuidado deve ser entendido
como uma necessidade e um direito inerentes à condição humana. O cuidado é também um
bem público essencial para o funcionamento da sociedade, das empresas e das economias.
Na vida cotidiana a palavra cuidado tem muitos e diversos significados: “cuidar da casa”,
“cuidas das crianças”, “cuidar da saúde”, entre muitos outros. Neste artigo nos referimos ao
cuidado como um trabalho cotidiano de produção de bens e serviços necessários à repro-
dução e a sustentação da vida e das sociedades e à garantia do bem-estar das pessoas. Em
outras palavras, o trabalho de cuidado é aquele que possibilita que as necessidades materiais
e emocionais das pessoas sejam atendidas. Inclui, entre muitas outras, atividades como ninar,
dar banho e brincar com um bebê; apoiar uma pessoa idosa ou com deficiência a se alimen-
tar e trocar de roupa, caso não consiga fazê-lo sozinha; cozinhar, organizar e limpar a casa.
Esse trabalho pode ser exercido no espaço doméstico, de maneira não remunerada,
ou ofertado por trabalhadoras e trabalhadores remunerados, como trabalhadoras do-
mésticas, cuidadoras/es de pessoas idosas ou com deficiência e profissionais de diver-
sas áreas das políticas públicas (a exemplo da assistência social, educação e saúde).
42 | Rumo à construção de uma Política Nacional de Cuidados no Brasil REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
Com efeito, de acordo com a PNAD Contínua (PNAD-c) de 2021, o principal moti-
vo pelo qual 30% das mulheres de 14 anos e mais (e apenas 2% dos homens) não es-
tavam procurando emprego era justamente a necessidade de cuidar de crian-
ças e outros parentes ou da casa. Entre as mulheres com filhos/as de 0 a 3 anos essa
proporção chegava a 62%5. Esse é também o principal motivo pelo qual 21,6% das mulhe-
res de 15 anos ou mais que não estudam exclusivamente não tem rendimentos próprios6.
Mas, além de injusta e desigual, a atual orga- as crianças que permanecem sem supervisão
nização social dos cuidados no Brasil é insus- de adultos, cuidando de outras crianças, ex-
tentável. A transformação das dinâmicas de- postas ao trabalho infantil7, ou pessoas idosas
mográficas, culturais e econômicas impacta sem apoio para atividades cotidianas.
diretamente nas necessidades e capacidade
de provisão de cuidados das famílias, intensi- Torna-se assim crucial o investimento em
ficando uma verdadeira “crise dos cuidados”: políticas de cuidados que aumentem a dis-
por um lado o acelerado processo de envelhe- ponibilidade e a qualidade da sua prestação,
cimento populacional – e de feminização des- contribuindo para o bem-estar das pessoas.
se envelhecimento –- tem como consequên- E que, concomitantemente, liberem o tempo
cia um significativo aumento das demandas das mulheres, ampliando as possibilidades
de cuidados para as pessoas idosas; por outro, de conclusão de suas trajetórias educacionais
a queda nas taxas de fecundidade tem leva- e de formação profissional e de inserção no
do a uma redução no número de pessoas dis- mercado de trabalho e, ainda, de lazer e des-
poníveis nas famílias para ofertar o cuidado. canso. Trata-se de uma medida fundamental
Importante mencionar, ainda, que a consoli- para a igualdade no mundo do trabalho e a
dação da presença das mulheres no mercado autonomia econômica das mulheres, e, por-
de trabalho não resultou no maior comparti- tanto, para o aumento da renda das famílias,
lhamento dos trabalhos domésticos e de cui- com importantes efeitos sobre a redução da
dados não remunerados nas famílias com os pobreza e da fome.
homens ou, ainda, na maior oferta de bens e
serviços de cuidados pelo Estado ou pelas em- Compreendendo os desafios postos e com a
presas. clareza de que é necessário transformar essa
injusta, desigual e insustentável organização
Neste contexto, a ausência ou insuficiência dos social dos cuidados, o presidente da Repúbli-
serviços públicos de cuidados –- como educa- ca, Luiz Inácio Lula da Silva, instituiu um Gru-
ção infantil, escola integral, aqueles dirigidos po de Trabalho Interministerial (GTI)8, coorde-
a pessoas idosas e com deficiência, cozinhas nado conjuntamente pela Secretaria Nacional
solidárias e lavanderias coletivas –- reforça a de Políticas de Cuidados e Família do Minis-
sobrecarga de trabalho doméstico e de cuida- tério do Desenvolvimento e Assistência Social,
dos não remunerados exercido pelas mulhe- Família e Combate à Fome e pelo Ministério
res. Essa realidade penaliza principalmente as das Mulheres, cuja missão é formular um diag-
famílias em situação de pobreza, que, devido nóstico sobre a organização social dos cuida-
à impossibilidade de adquirirem tais serviços dos no Brasil (identificando as necessidades e
no mercado, precisam se apoiar em arranjos as ofertas de cuidados atualmente existentes)
informais e muitas vezes precários. Esses ar- e elaborar a proposta da Política e do Plano
ranjos também podem oferecer riscos para as Nacional de Cuidados.
pessoas que necessitam de cuidados, como
5 https://mds.gov.br/webarquivos/MDS/7_Orgaos/SNCF_Secretaria_Nacional_da_Politica_de_
Cuidados_e_Familia/Arquivos/Nota_Informativa/Nota_Informativa_N_1.pdf
7 https://mds.gov.br/webarquivos/MDS/7_Orgaos/SNCF_Secretaria_Nacional_da_Politica_de_
Cuidados_e_Familia/Arquivos/Nota_Informativa/Nota_Informativa_N_3.pdf.
44 | Rumo à construção de uma Política Nacional de Cuidados no Brasil REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
Mancio Lima
45 | Rumo à construção de uma Política Nacional de Cuidados no Brasil REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
Prefeitura de São Paulo
Deborah Akerman
Coordenadora Geral de Serviços e Programas de Proteção Social Básica
as Famílias- DPSB /SNAS/MDS. Psicóloga (UFMG). Especialista em
Gestão de Assistência Social (FJP). Mestre em Psicologia Social (UFSJ).
Desde a promulgação da Lei Orgânica da As- (...) com mais de 11 mil centros de referência em todo
sistência Social (LOAS) em 1993, que a Assis- o país, mas de 17 mil serviços tipificados, mas de 3
tência Social colabora com a oferta igualitária mil serviços de acolhimento e abrigamento para
de proteção. O Sistema Único de Assistência crianças, jovens e idosos em condições de extrema
vulnerabilidade, com mais de 160 mil vagas e com
Social (SUAS) desmercantiliza os seus serviços
uma rede de 420 mil trabalhadores do SUAS.
e benefícios ao proibir a cobrança do acesso
aos mesmos, inclusive de sua rede privada.
EBC
Segundo este Boletim, não só a oferta de ser- de renda e serviços, com a consequente am-
viços ampliou o acesso da população a Assis- pliação do orçamento da Assistência Social
tência Social, mas a segurança de renda, outro tiveram correlação direta na desigualdade
pilar do SUAS, por meio do Programas Bolsa de renda medida pelo índice de GINI. O re-
Família e o Benefício de Prestação Continu- ferido índice é um instrumento para medir o
ada (BPC), que também tiveram incremen- grau de concentração de renda em determi-
to expressivo, sendo que o Programa Bolsa nado grupo, apontando a diferença entre o
Família passou de 1,2 milhões de famílias em rendimento dos mais ricos e dos mais pobres.
2003 participando dos programas de trans- Foi constatado que as relações entre o volu-
ferência de renda antes de serem unificados me do gasto social, como indicador indireto
no Bolsa Família para 14 milhões em 2018. E da atenção dada às políticas sociais, e a de-
em relação ao BPC, considerando a expan- sigualdade de renda, evidenciaram a queda
são entre 2004 e 2018, esse número qua- no incide de GINI com o aumento de investi-
se que dobrou no período de 13 anos, totali- mento em gastos sociais (Fundação João Pi-
zando 4,7 milhões de beneficiários em 2019. nheiro; Conselho Regional de Economia, 2021).
A arquitetura da Proteção Social que combi-
nou aumento da cobertura de transferência
Em pesquisa realizada por ANDRADE; PEREIRA (2019) verificou-se que o público do CRAS é
constituído majoritariamente por mulheres negras que nunca participaram de ações relacio-
nadas às questões de gênero e raça. Para as autoras é imprescindível buscar a superação das
inserções desiguais das mulheres e pessoas negras, em especial das mulheres negras, integran-
do a temática dos eixos gêneros e raça na Assistência Social, de modo transversal e interseccio-
nal. O conceito sociológico de interseccionalidade aborda as interações e marcadores sociais
como gênero, raça, etnia e classe social entre outros, nas vidas das minorias e tem evidenciado
que os múltiplos sistemas de organização das relações de poder, configurados como opres-
sões que relacionam-se entre si, se sobrepõem e precisam ser enfrentados articuladamente.
Prefeitura de Itapevi
Letícia Bartholo
Secretária de Avaliação, Gestão da Informação e
Cadastro Único do Ministério de Desenvolvimento e
Assistência Social, Família e Combate à Fome.
52 | Por mais proteção no território: A importancia do cadastro único para vigilância socioassistencial
O direito à proteção social é garantido por meio de intervenções públicas orientadas por in-
formações, diagnósticos e planejamento. Superar a cultura do imediato e a atuação baseada
apenas em demandas emergenciais ou espontâneas é uma forma de qualificar o atendimen-
to à população, evitar vazios de proteção e organizar a oferta de serviços socioassistenciais.
Para isso, é necessário ter informações disponíveis e organizadas que possibilitem a leitura do ter-
ritório: a caracterização dos perfis das pessoas e famílias vulneráveis e a identificação das neces-
sidades da população. É a partir dessa ideia que gostaria de iniciar, nesta revista do CONGEMAS,
o diálogo com gestores (as), trabalhadores (as) e controle social do SUAS (Sistema Único de Assis-
tência Social) sobre a utilização do Cadastro Único como ferramenta de vigilância socioassistencial.
A Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS) traz, em seus artigos 6º e 2º, os objeti-
vos da Vigilância Socioassistencial e do Cadastro Único como instrumento de prote-
ção social. A integração entre as ações de vigilância socioassistencial e o Cadastro Úni-
co permite dimensionar as demandas sociais, qualificar a oferta dos serviços e benefícios e
garantir o acesso a programas sociais. Mas, para que tal possibilidade se concretize, é fun-
damental a importância de um triplo olhar vigilante, que seja amplo, analítico e atuante.
53 | Por mais proteção no território: A importancia do cadastro único para vigilância socioassistencial
em junho de 2023, por meio do povoamento dos dados de renda coletados no CNIS no
Cadastro Único. Essa iniciativa permitiu correções, evitou distorções e, principalmen-
te, facilitou o trabalho dos entrevistadores e a vida das pessoas e famílias cadastra-
das, pois elas não precisarão de deslocar aos Centros de Referência de Assistência Social
(CRAS) para prestar novamente informações que já são conhecidas pelo poder público.
O esforço de aproximar Cadastro Único e vigilância socioassistencial tem sido um dos pi-
lares da atuação da SAGICAD. Para isso, temos trabalhado no reforço das capacidades ins-
titucionais dos municípios e estados, seja via cofinanciamento efetuado pelo Procad-SUAS,
seja via ações de formação e capacitação para o exercício da gestão pública. Temos tam-
bém aprimorado e construído ferramentas informacionais que auxiliam a ação da Vigilân-
cia Socioassistencial, no que se destaca o lançamento do Observatório do Cadastro Único.
Gráfico 1: Percentual de CRAS, CREAS e Centro Pop com locais para atividades de operacionalização do Cadastro único
54 | Por mais proteção no território: A importancia do cadastro único para vigilância socioassistencial
Fábio Dias
Aldaíza Sposati
Professora titular sênior da PUCSP, pesquisadora do
CNPq e do NEPSAS/PUCSP, pesquisadora e analista
da política de assistência social desde 1984, militante
da Associação Rede Brasileira de Renda Básica- RBRB,
ativista na Luta pelo direito de proteção a orfandade de
crianças e adolescentes.
55 | Por mais proteção no território: A importancia do cadastro único para vigilância socioassistencial
A Tipificação Nacional dos Serviços Socioassis- to, é a de gerar garantias para que um direi-
tenciais – TNSS, promulgada em 11 de novembro to, no caso a proteção socioassistencial, seja
de 2009, por resolução do Conselho Nacional afiançado em nível quanti qualitativo onde e
de Assistência Social -CNAS, significouavanço quando demandado. É bastante equivocado
para a unidade de gestão dapolítica de as- nominar a parceria na gestão de um serviço
sistência social em todo o território brasileiro. socioassistencial como rede privada quando
resultante de um contrato com o órgão pú-
Esse avanço institucional garantiu, no Esta- blico para realizar uma dada atenção. Assim,
do brasileiro, a presença de atenções e cui- a terminologia correta é de gestão direta e/
dados provedores de direitos de seguridade ou gestão em parceria. Ao mesmo tempo, or-
social e preservadores da dignidade huma- ganizações da sociedade civil ainda podem
na de cidadãs e cidadãos brasileiros que, em operar serviços similares sob gestão privada
seu cotidiano, enfrentam fragilidades, es- e com recursos mobilizados da sociedade e
tigmatização e violências individuais, fami- não do orçamento público. Neste caso po-
liares e coletivas que precarizam seu viver. dem optar pelo vínculo SUAS não oneroso.
Há mais de uma década esses serviços so-
Essas precarizações constituem desprote- cioassistenciais foram caracterizados e por
ções sociais quequerem respostas protetivas isso, tipificados. Todavia, essa regulação não
de serviços socioassistenciais. A assistência significou a padronização de quantidade e
social, embora ainda mantenha em funcio- qualidade de atenções no patamar de direi-
namento construções históricas seculares, tos sociais. Com certeza o espalhamento do
que remontam a expressões filantrópicas Sistema Único de Assistência Social - SUAS
organizadas pela sociedade civil desde Brasil em todo o país, ao longo dos seus quase 20
Colônia, teve sua até então exclusiva gênese anos, tendeu a agir como catalisador de di-
privada, alterada pela Constituição de 1988. versidades de desproteções sociais que aca-
bam por exigir, em nome da equidade, da
Esta legalizou a assistência social como política justiça social e da democratização da gestão
de Estado e direito de cidadania, o que passou o alargamento do alcance de normas de co-
a exigir da gestão estatal a oferta de atenções bertura das atenções e cuidados face à di-
de proteção social distributiva, isto é, financia- versidade e implicações múltiplas do real.
das pelo orçamento público estatal ocupan-
do espaço de gestão na burocracia estatal. Após mais de uma década cabe a releitura
dessa tipificação face ao real. O Censo Suas
A presença no Estado brasileiro na pro- apresenta dados de execução do SUAS des-
visão da proteção social distributiva, in- de os 5.568 municípios, e neles distingue
cludente da assistência social e da saúde serviços socioassistenciais tipificados e não
como partes da seguridade social brasileira, tipificados. Muitas questões cercam esse de-
foi um grande avanço desmercadoriza- bate. Esta breve discussão pretende identi-
do e desfilantropizado afirmador do dever ficar alguns campos de questões e indicar
e da responsabilidade do Estado brasilei- referências para que seu debate, ao se apro-
ro com o direito a proteção social estatal. fundar, encontre bons e resolutivos caminhos.
Desse fato não pode ser concluído que tenha Os serviços socioassistenciais têm sido equa-
ocorrido a estatização ou a negação da filan- cionados sob a função de proteção social
tropia da sociedade civil. A cobertura estatal da política de assistência social (PNAS-04.
deve ser coletiva e para todos. A cobertura fi- Ocorre que, as duas outras funções, vigilân-
lantrópica mantém sua significativa impor- cia e defesa de direitos socioassistenciais,
tância, todavia nunca se ocupa da totalidade não têm recebido igual tratamento ocupan-
dos que demandam a cobertura de uma dada do lugar de procedimento complementar
desproteção/necessidade. A qualidade de um da função proteção social. Discutir serviços
serviço filantrópico, ao contrário do Estado, socioassistenciais próprios a essas funções
não reside na extensão de sua cobertura. A parece ser necessário para que se efetive a
responsabilidade do Estado, em contrapon- política pública estatal de proteção social.
56 | Por mais proteção no território: A importancia do cadastro único para vigilância socioassistencial
Serviço
Socioassistencial
Serviço socioassistencial público é uma unidade de gestão democrática do SUAS, que mantem,
por meio de equipe interdisciplinar de trabalhadores, relação direta com cidadãs e cidadãos de
um dado território, ou com vivência de uma determinada situação de desproteção social, e nele
produz escuta, desenvolve atenções, e medidas de alcance de seguranças sociais mantendo re-
lação de complementaridade intersetorial e vínculo de cobertura em rede. Ele deve contar com
trabalhadores - gerais e especializados- para ofertar modalidades de atenções e cuidados a cidadã
e ao cidadão, independentemente de idade, sexo, etnia, para superação de desproteções sociais
vivenciadas. Operam por meio de processos e técnicas próprios ao campo psicossocial - estendido
ao domínio de conhecimentos das ciências humanas, sociais, da pedagogia e do direito - para pro-
visão de cuidados e atenções, valendo-se de meios e aquisições na garantia de segurança sociais.
Serviço é uma unidade operadora, com recursos de orçamento público, no âmbito de uma
política social pública. Refere-se ao lócus onde ocorre a atenção, cuidados e aquisições a uma
necessidade ou desproteção. A atenção prestada em um serviço de uma política social públi-
ca é um direito de cidadania. A concepção de serviço de uma política social pública é distin-
ta de uma ação social privada, filantrópica, de benemerência ou caritativa. O Serviço público
orienta-se pelo coletivo, não se limita a atender aos que a ele chegam, pois deve identificar a
demanda reprimida; deve manter trato transparente dos recursos públicos, a gestão democrá-
tica operada por um processo social que atribui direito à fala de trabalhadores e de usuários.
Raul Spinassé
57 | Por mais proteção no território: A importancia do cadastro único para vigilância socioassistencial
A condição de operação de um ser-
viço público em parceria com uma
Lógica adotada em 2009
organização da sociedade civil, não que preside a tipificação
significa a ruptura com a supres-
são do caráter público da atenção, dos serviços
nem a ausência do caráter de-
mocrático de gestão que implica
socioassistenciais
na defesa do direito de cidadania
e de manifestação democrática. A lógica de operação adotada em 2009 é presi-
dida pelo significado concreto da proteção so-
O vínculo SUAS na relação de par- cial que implica na certeza da/o cidadã/o contar
ceria precisa estar visível para que com. Isto é, proteção social é sempre algo rela-
a atenção ao usuário não leve a su- cional, uma exterioridade. Em outras palavras,
bentender que sua atenção seja algo que está fora de condições/capacidades
uma benesse privada e não de uma do próprio indivíduo ou de sua família e que,
parceria pela concretização de di- demanda ser suprido serviço socioassistencial
reitos. A ocultação da parceria para público.
os usuários, torna-se um modo de
fragilizar e de fragmentar o campo Tem ocorrido equívoco entre municípios que
democrático da gestão do SUAS. caracterizam como um novo tipo de serviço so-
cioassistencial o modo pelo qual abordam um
A tipificação distingue os campos indivíduo ou uma família, se na sede do serviço
de ação de cada serviço socioas- ou no seu domicílio. A presença do agente do
sistencial, reconhecendo institu- CRAS ou do CREAS no domicílio é um modo de
cionalmente a particularidade da abordagem do método do trabalho social, mas
desproteção social apresentada de não um outro serviço. Visitar uma família no
que se ocupa (seu objeto), e a se- seu domicílio por vezes permite maior conheci-
gurança social que deve afiançar mento das relações de convívio familiar. O ser-
como um direito a quem o procura viço de proteção à família, PAIF/PAEFI -Prote-
(seu objetivo) e os processos de atu- ção e Atenção Integral (especializada) à Família
ação e provisão que adota e conta. pode ser exercido na sede do Cras (ou do CRE-
AS quando especializado) ou no domicílio da fa-
Na construção da Política Nacio- mília. Como se declara na saúde, a diversidade
nal de Assistência Social de 200 4 está no campo da estratégia e não da finalidade.
(PNAS-04) foi consensuado que a
atenção a ser prestada implicaria Com certeza, se faz necessário entender que a
em identificar níveis de comple- rede pública não deve ter, por valor, a fragmen-
xidade da atenção requerida face tação, o que leva ria a uma multiplicidade de
ao agravo da desproteção social nomes de serviços. A direção é a construção de
– como estágio de insegurança, unidade com complementaridade pela exten-
abandono e isolamento, vitimiza- são da cobertura. Isto significa que a perspec-
ção, dependência- e as implica- tiva não é a de multiplicar nomenclaturas em
ções de complexidade da resposta. serviços similares mas sim, admitir modalida-
Embora seja muito difícil ocor- des no mesmo tipo de serviço. Nomes fantasia,
rer uma desproteção social de- customizados a interesses conjunturais, redu-
sembaraçada de outras si- zem densidade e o significado da presença da
tuações, foi adotada uma a rede pública de atenção. Deve-se estar atento
gradação entre um nível básico e para essa ocorrência em serviços sob parceria.
outro especial e este, distinto en-
tre média e alta complexidade9.
58 | Por mais proteção no território: A importancia do cadastro único para vigilância socioassistencial
Nota-se distorção no trato do serviço socioa- a provisão em um serviço. Tratam de modo
ssistencial operado como um direito de cida- a identificar necessidade com elegibilidade.
dania, não pode ter a renda do indivíduo ou Os serviços socioassistenciais são dirigidos a
de sua família como critério de elegibilida- desproteções sociais, por isso, são de seguridade
de da cidadã/ão a ser atendido em um servi- social. O que elege a atenção é a presença de des-
ço. Assim, como não se aplica ter CADÚnico proteção social e não o quanto ganha o cidadão.
para poder frequentar uma escola, ou uma
unidade de saúde, não cabe exigi-lo para O horizonte não é a gratuidade, mas a con-
estar num centro de convivência do SUAS. dição de acesso pelo direito à dignidade hu-
mana. É descabido obrigar a ter inscrição no
A justificativa dessa distorção nasce de uma Cadastro Único para que possa frequentar um
interpretação neoliberal pautada numa ilogici- serviço socioassistencial. Trata-se de um modo
dade, que ao referir a assistência social a uma de gerir orientado pela formação de um apar-
política social a quem dela necessitar, inter- theid e não, pela universalidade da cidadania.
preta que seu usuário tem que ser um neces-
sitado, ou alguém que não possui poder aqui- Escola, unidade de saúde não exigem Cadas-
sitivo de compra no mercado. Toda atenção tro Único de seus usuários que também utili-
em qualquer política social é para quem dela zam do SUAS.
necessitar, pois assim se diz ser universal. É a
necessidade que movimenta o cidadão para
59 | Por mais proteção no território: A importancia do cadastro único para vigilância socioassistencial
A lógica que preside a tipificação de serviços
socioassistenciais, pela PNAS- 04, inclui o vín-
Tipificação de serviços culo de cada serviço socioassistencial com
socioassistenciais uma unidade de referência ao nível de prote-
ção/desproteção social vivenciado entre básico
e porte populacional ou especial. Essa unidade de referência opera
uma mediação entre o requerente que busca
a proteção socioassistencial e a oferta dos ser-
viços existentes. Como se percebe é uma uni-
Ao que parece, o porte populacional de dade de referência para o requerente como
uma cidade pode exigir determinados para a gestão da oferta da atenção buscada.
serviços ou sua substituição. Essa é uma Essa condição das unidades de referência aca-
questão que está a merecer discussão e ba por exigir a concepção de referência como
levanta outra decisão como a de garan- uma segurança social, o que torna sem senti-
tir a homogeneidade de oferta de ser- do sua ação se confinada a um mero encami-
viços do SUAS em todos os entes fede- nhamento. Este devolve ao requerente a situa-
rativos, face às alterações populacionais ção que o levou à unidade, sem obter resposta.
ou mesmo, a características singulares.
Tipificação de serviços
socioassistenciais e cen-
tros de referência
60 | Por mais proteção no território: A importancia do cadastro único para vigilância socioassistencial
O Centro de Referência de Assistência Social – CRAS O CREAS não possui limite de abran-
é uma unidade pública estatal da Política de Assis- gência territorial e opera a organiza-
tência Social, de gestão municipal, com base terri- ção e coordenação da rede de ser-
torial determinada que procede acolhimento, escu- viços socioassistenciais de média
ta e gera referências e atenção para as demandas e alta complexidade. O CREAS não
de desproteção social da população de sua área de constou da PNAS-04, mas da lei nº
abrangência, na qual organiza e coordena a rede de 12435/2011. A mediação da gestão
serviços socioassistenciais de baixa complexidade. de serviços tipificados por níveis de
O Centro de Referência Especializado de Assistên- complexidade medidos por Cen-
cia Social-CREAS é uma unidade pública estatal da tros de Referência foi revisitada no
política de Assistência Social, de gestão municipal momento em que o CNAS aprovou
estadual ou regional, que procede acolhimento, a tipificação de serviços de média
complexidade para a população em
escuta e gera referências e atenção para as de-
situação de rua, incorporando: Ser-
mandas de pessoas ou famílias em situação de ris- viço de Acolhimento Institucional;
co social, vítimas de violência, discriminação e/ou Serviço de Acolhimento em Repú-
violação de direitoslias e indivíduos em situação blica; Serviço de Acolhimento em
de risco pessoal e social, por violação de direitos. Família Acolhedora; Serviço de Pro-
teção em Situações de Calamidades
Públicas e de Emergências em 2009
Diangela Menegazzi
e instituiu o Centro de Referência Es-
pecializado de População de Rua10.
61 | Por mais proteção no território: A importancia do cadastro único para vigilância socioassistencial
Junto às questões sobre a tipificação de serviços socioassistenciais tem se apresentado de-
mandas para ampliação de modalidades de centros de referência por segmentos da popula-
ção, um deles seria dirigido a idosos. Essa demanda exige que se faça uma distinção: serviços
tipificados devem estar presentes no SUAS em todas as cidades brasileiras? Qual é a exigên-
cia para instalação e funcionamento de um serviço socioassistencial do SUAS face ao porte
populacional do município? Quais critérios regem essa diversidade? Por sua vez, quanto aos
Centros de Referência, já é considerado como norma o fato de que em municípios de peque-
no porte até 20 mil habitantes não sejam instalados CREAS face a sua demanda rarefeita.
Os beneficiários, por sua vez, não contam com meios de escuta, comuni-
cação, presença, representação. Esta temática não incidiu na relação en-
tre benefícios e serviços ou no trato de beneficiários e usuários de serviços.
A literatura internacional sobre proteção social contém uma particularização sobre a re-
lação entre benefício monetário e prestação de cuidados ou prestação de serviços, sen-
do nominada tal relação de “Cash and Care” ou “Cash plus Care11”. É preciso entender que
a decisão entre fragmentar e/ou unificar a operação de cuidados e atenção proteti-
va articulada com auxílio monetário não se reduz a uma opinião quanto a um ou ou-
tro formato de burocracia institucional, e sim, à análise dos nexos entre as duas dimen-
sões fundados no conhecimento extraído da pesquisa sobre os efeitos mútuos que
produzem no enfrentamento das desproteções sociais agudizadas pela pauperiza-
ção social, sobretudo pós-pandemia acompanhada de desmanche de políticas sociais.
Com tudo isso não se pode deixar de se ter presente que a proteção so-
cial estatal deve ter por valor intrínseco a não distinção do outro pela racia-
lização, pelo gênero, pela religiosidade, pela subordinação, mas sim, guiar-
-se pelo valor do pertencimento como princípio organizador da proteção relacional.
11 Textos da Unicef, e da Organização Internacional “Save the Children”, apontam em base de experiências empíricas múlti-
plas, para a necessidade de combinar, de modo compassado, o suporte financeiro, a famílias ou crianças, com apoio di-
reto ou indireto a necessidades e a direitos que promovam a redução de impactos e minimização de riscos. (cf. UNI-
CEF, Learning from six government-led and UNICEF supported cash plus programmes in Eastern and Southern Africa,
março de 2023: https://www.unicef.org/esa/media/12516/file/Synthesis-SP-Nutrition-Case-Studies-2022.pdf; Save the Children
62 | Por mais proteção no território: A importancia do cadastro único para vigilância socioassistencial
Marcello Casal Jr
Clara Carolina de Sá
Diretora do Departamento de Gestão do SUAS da Secretaria
Nacional de Assistência Social, Advogada e Especialista em Gestão
Pública.
63 | Gestão do SUAS Agenda e instrumentos necesários para fortalecer a democracia e promover direitos
A implantação da Vigilância Socioassistencial e da Gestão do Trabalho e Educação Permanente
no SUAS estão previstas na LOAS e na NOBSUAS como responsabilidades dos entes (União, Es-
tados, Distrito Federal e Municípios). Para além da presença nos normativos, ambas as áreas são
estratégicas para garantir uma gestão mais democrática, participativa e para promover direitos a
usuários e trabalhadores. A qualidade dos serviços socioassistenciais disponibilizados à socieda-
de depende da estruturação do trabalho, da qualificação e valorização das(os) trabalhadoras(es)
atuantes no SUAS e de uma Vigilância, como área e como função da Política de Assistência Social.
64 | Gestão do SUAS Agenda e instrumentos necesários para fortalecer a democracia e promover direitos
Somados todos os equipamentos e a gestão, Mapeamento de competências: compreendido
são 342.961 trabalhadoras mulheres (78%) e como instrumento de gestão para aprimorar as
94.939 trabalhadores homens (22%) na Assis- ofertas do SUAS e alcance de suas finalidades,
tência Social. Quanto ao nível de escolaridade, considerando o conjunto de conhecimentos,
são 43% com nível superior, considerando gra- habilidades e atitudes requeridas pelos SUAS.
duação, especialização, mestrado e doutora-
do. Quanto à formação, lideram as categorias Produção de orientações e supervisão técnica.
de Assistente Social, com 14%, Psicólogo, com Escolas estaduais e nacional do SUAS: iden-
7%, e Pedagogo, com 6%. tificação, aproximação e apoio às escolas já
existentes e às que se pretendem instituir.
Uma das formas de qualificar as(os) traba-
lhadoras(es) é a educação permanente, cujos
Núcleos de educação permanente do
princípios e diretrizes encontram-se normati-
SUAS: importante entender o funcio-
zadas na Política Nacional de Educação Per-
namento dosnúcleos em andamen-
manente do SUAS – PNEP/SUAS.
to, e fortalecer as ações do NUNEP/SUAS.
Aprovada pelo Conselho Nacional de Assis-
tência Social – CNAS, por meio da Resolução dentificação de novas demandas e dese-
nº 04, de 13 de março de 2013, a PNEP/SUAS nho de novas ofertas de capacitação para o
representa uma grande contribuição ao pro- SUAS, considerando as novas complexida-
cesso de aprimoramento da gestão do SUAS. des vivenciadas pelas (os) trabalhadoras(es).
“Nos marcos da implementação da Gestão do Tra-
balho do SUAS, portanto, a adoção dessa política
se associa a um conjunto de iniciativas que con-
tribuem para a desprecarização das condições de
trabalho e para a valorização dos trabalhadores,
como forma de promover a profissionalização do
Sistema e a melhoria contínua da qualidade da
oferta e do provimento dos serviços e benefícios
socioassistenciais”.
(Brasil, 2013, pág. 31-32)
Na perspectiva da retomada da centralidade
da função estratégica da Gestão do Trabalho
e da Educação Permanente para o SUAS, re-
toma-se agendas fundamentais que foram
outrora interrompidas e retiradas da agenda
nacional. Por meio das instancias fundamen-
tais que operam os compromissos do pacto
federativo, reinicia-se e propõe-se um debate
amplo sobre fortalecimento e visibilidade da
área de gestão do trabalho, a partir de algu-
mas agendas centrais, tais como:
65 | Gestão do SUAS Agenda e instrumentos necesários para fortalecer a democracia e promover direitos
Para a Vigilância Socioassistencial, a implantação em todos os municípios é fun-
damental para transformar os dados que são produzidos no território em in-
formação e conhecimento. As informações analisadas pela Vigilância permi-
tem avaliar e monitorar as ofertas que estão sendo realizadas, compará-las com
riscos e vulnerabilidades de usuários (as) e verificar se existem falhas ou vazios de cobertura.
Segundo dados do Censo SUAS, o percentual de municípios que declarou possuir área de
Vigilância Socioassistencial instituída formal ou informalmente passou de 55%, em 2010,
para 70%, em 2013. Entretanto, a partir de 2013 o percentual de implantação da Vigilân-
cia se estabiliza, oscilando para baixo nos primeiros anos de mandato da gestão municipal,
e subindo ligeiramente nos últimos.
66 | Gestão do SUAS Agenda e instrumentos necesários para fortalecer a democracia e promover direitos
Dados do Censo SUAS apontam que em 61% dos municípios não havia ne-
nhum trabalhador exercendo atividades de Vigilância na gestão. Esse percentu-
al chega a 71% nos municípios de pequeno porte I e 46% nos de pequeno porte II.
Se considerarmos apenas aqueles municípios que dispunham de ao menos um técni-
co de Vigilância, outro problema constatado foi a rotatividade entre uma gestão e ou-
tra: 47% dos técnicos da Vigilância tinham vínculo estável com a gestão (servidor estatutá-
rio ou CLT), e mais de 80% deles permaneceram na função ano a ano. Entretanto, quando
muda a gestão municipal, o percentual daqueles que continuam na função cai para 58%.
A fim de avançarmos na superação dessas distorções e ausências, uma ação nacional fun-
damental no âmbito do SUAS passa por estimular a implantação da Vigilância Socioa-
ssistencial por meio do apoio técnico, conforme atribuições da Norma Operacional Bá-
sica, e da efetivação do desenho e implementação de financiamento específico para
área da gestão e Vigilância Socioassistencial, em articulação com os entes federados.
Referências
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Con-
selho Nacional de Assistência Social (CNAS). Resolução nº 269, de 13 de dezem-
bro de 2006. Aprova a Norma Operacional Básica de Recursos Humanos do Sis-
tema Único de Assistência Social – NOB-RH/SUAS. Brasília, DF: MDS; CNAS, 2006.
BRASIL. Lei nº 12.435, de 6 de julho de 2011. Altera a Lei nº 8.742, de 7 de dezem-
bro de 1993, que dispõe sobre a organização da Assistência Social. Brasília, DF: 2011.
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS). Conselho Na-
cional de Assistência Social (CNAS). Resolução nº 33, de 12 de julho de 2012. Aprova a Nor-
ma Operacional Básica da Assistência Social – NOB/SUAS. Brasília, DF: MDS; CNAS, 2012.
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome – MDS. Conselho Na-
cional de Assistência Social (CNAS). Resolução nº 04, de 13 de março de 2013. Aprova a Po-
lítica Nacional de Educação Permanente do SUAS – PNEP/SUAS. 1ª ed. Brasília: MDS, 2013.
67 | Gestão do SUAS Agenda e instrumentos necesários para fortalecer a democracia e promover direitos
Juliana bezerra
Não resta dúvida que é inquietante avaliar a Vigilância Socioassistencial sob esta perspectiva,
mas é essencial fazê-lo. E mais, é urgente. Este texto se propõe a trazer à tona alguns argu-
mentos, ainda que rapidamente, sobre o universo de tal disparidade: o reconhecimento da
importância e potência da função Vigilância Socioassistencial e sua ainda inexpressiva efeti-
vação no cotidiano do SUAS.
Trata-se de saber ler as estatísticas contidas em diversos bancos de dados infinitos, fazer o cruzamento
das informações e contextualizar a informação à luz da análise das dinâmicas, tensões e entraves dos
territórios e dos pressupostos teóricos que fundamentam o trabalho social. A produção de conhecimen-
tos para a gestão das políticas públicas não começa e termina na simples coleta de dados. A análise
contínua é o que insere o diferencial da ação, recombinando vários instrumentos, fases, referenciais,
sistematizações e reflexões críticas sobre os dados levantados.
(BRASIL, 2013)
Referências:
BRASIL, CapacitaSUAS - Caderno 3. Vigilância
Socioassistencial: Garantia do Caráter Público
da Política de Assistência Social / Ministério do
Desenvolvimento Social e Combate à Fome,
Centro de Estudos e Desenvolvimento de Pro-
jetos Especiais da Pontifícia e Universidade Ca-
tólica de São Paulo – 1 ed. – Brasília: MDS, 2013.
72 | A importância (e desafios) da efetivação da Vigilância Socioassistencial
Jorge William
Denise Colin
Assistente Social do Ministério Público do Paraná.
Ex-Secretária Nacional de Assistência Social.
iStock
Na vertente do SUAS, cabe a composição das equipes de referência que ainda não atendem
aos parâmetros da NOB-RH/2006; a superação de vínculos trabalhistas precarizados e da alta
rotatividade dos trabalhadores; a efetivação de programa de capacitação permanente para
a qualificação do trabalho social; a instituição de arranjos organizacionais para cobertura de
atendimento da proteção social especial nos municípios de pequeno porte; a equiparação da
atenção no meio urbano e rural; a universalização das ofertas; o aprimoramento de parâmetros
nacionais para o trabalho social com famílias e com adolescentes em cumprimento de medi-
das socioeducativas; o fortalecimento do trabalho em rede intersetorial e interinstitucional.
Régis Spindola
Diretor do Departamento de Proteção Social Especial do
Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Fa-
mília e Combate à Fome (MDS/SNAS), Advogado, Mestre
em Educação pela UFMG/FaE.
2016
Recomendação CNMP nº 33, de 5 de abril de 2016, que dispõe
sobre diretrizes para a implantação e estruturação das Pro-
motorias de Justiça da Infância e Juventude no âmbito do Mi-
nistério Público dos Estados e do Distrito Federal e Territórios.
Nota Técnica N.º 02/2016/SNAS/MDS que trata so-
bre a relação entre o Sistema Único de Assistên-
cia Social- SUAS e os órgãos do Sistema de Justiça;
2019
2019
Resolução nº 06/2019 do Conselho Federal de Psico-
logia (CFP), de 29 de março de 2019, que institui re-
gras para a elaboração de documentos escritos pro-
duzidos pela (o) psicóloga (o) no exercício profissional;
Resolução n.º 299/2019, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ),
que normatiza a oitiva de crianças e adolescentes vítimas e tes-
temunhas de violência sexual e violência doméstica, e a cria-
ção do Protocolo Brasileiro de Entrevista Forense com Crian-
ças e Adolescentes Vítimas ou Testemunhas de Violência;
2020
2023
2023
Resolução CNAS nº 119/2023 aprova parâmetros para
a atuação do SUAS na relação com o Sistema de Jus-
tiça e outros Órgãos de Defesa e Garantia de Direitos
Nota Técnica nº 02/2023 do Conselho Federal de Psico-
logia (CFP), de 06 de abril de 2023, que dispõe sobre as
demandas do Sistema de Justiça às psicólogas e aos
psicólogos que atuam em serviços do Sistema Único de As-
sistência Social (SUAS) e do Sistema Único de Saúde (SUS);
Assim, para uma relação harmônica nos municípios, é fundamental que a União e o Estados se
responsabilizem no fomento desta pauta, instituído espaços formais de diálogos institucionais,
construção de protocolos, fluxos, instruções operacionais e demais regulações que defendem
a integração operacional entre o SUAS e o Sistema de Justiça. Afinal, acreditamos que a oposi-
ção da pobreza não é a riqueza, mas a Justiça, e como disse Leonardo Boff, precisamos enten-
der que Justiça não é judicialização e que todos precisamos de Justiça (ALBUQUERQUE, 2010).
Referências Bibliográficas
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cional de Assistência Social. Norma Operacional Básica da Assistência Social (NOB-
SUAS). Brasília, MDS/SNAS, Resolução CNAS nº 33 de 12 de dezembro de 2012
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Nota Téc-
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co de Assistência Social – SUAS e os órgãos do Sistema de Justiça. Brasília, 2016.
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SPINDOLA, Regis Aparecido Andrade. A Dimensão Especializada da Proteção So-
cial Especial no SUAS: Da concepção à prática! E-book GESUAS, Belo Horizonte, 2022.
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TONELLI, Maria Luiza Quaresma. Judicialização da políti-
ca. Coleção o que saber? Fundação Perseu Abramo. São Paulo, 2016.
Nosso grande dilema enquanto política pública é a não previsão constitucional da obrigatorieda-
de de investimentos mínimos fixos no orçamento público para a gestão e serviços da Assistência
Social, o que impacta consequentemente na capilaridade de unidades púbicas que ofertam um
leque de serviços, programas, benefícios e projetos. Ao horizonte visualizamos a real necessidade
da aprovação da PEC 383/2017 que garante a aplicação de no mínimo 1% da Receita Corrente Liquida
para a gestão do SUAS e seus serviços. Essa é uma luz que pode garantir mais segurança no plane-
jamento e na entrega de serviços com maior eficiência e efetividade a população usuária do SUAS.
Com a retomada do diálogo com os entes federados, o FNAS, em conjunto com as ações es-
tratégicas da Secretaria Nacional de Assistência Social, tem se empenhado em assegurar e
pactuar saída para a melhor execução dos recursos fixados discricionariamente no orçamento
e ao mesmo tempo buscando recompor os valores de cofinanciamento pactuado na Comissão
Intergestora Tripartite - CIT e deliberado pelo Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS).
Para além da retomada do diálogo, ocorre uma articulação desde a transição entre novembro e
dezembro de 2022, onde o governo transitório buscou articular com o congresso a recomposi-
ção do orçamento do SUAS, tendo êxito com a obtenção de 83% dos recursos necessários para os
Blocos da Proteção Social Básica e Proteção Social Especial, devido ao governo anterior ter en-
caminhado Projeto de Lei Orçamentária Anual (PLOA) no valor de 66 milhões de reais aproxima-
damente, o que garantiria o financiamento para o SUAS por apenas 13 dias, 4 horas e 8 minutos.
Para apenas manter o SUAS funcionando com orçamento em 100% do Pactuado
No acumulado do ano de 2023 (janeiro a agosto12) os valores transferidos aos municípios, es-
tados e distritos federal já chegam à marca histórica de R$ 1.621.973.769,77 (um bilhão e seis-
centos e vinte e um milhões e novecentos entes federados comparados ao mesmo período de
2022.No mesmo mês, foi efetivamente pago a referência do mês de julho do Índice de Gestão
Decentralizada do Programa Bolsa Família (IGD-PBF) o valor de R$ 59.829.255,00. Essa trans-
ferência de recurso é realizada por meio do FNAS, parceria firmada entre Secretaria Nacional
de Assistência Social e Secretaria Nacional de Renda e Cidadania visando fortalecer a Gestão
do Programa junto aos entes federados. No acumulado de 2023, o volume de repasses do IGD-
-PBF chega ao total de R$ 519.748.317,30 distribuídos nos estados e municípios de todo o Brasil.
Referências Bibliográficas:
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ção, Atuária e Contabilidade, Curso de Bacharelado em Administração Pública, 2021.
SILVEIRA, Jucimeri Isolda. SUAS em números: projeto e realidade social no contexto de pan-
demia: vol. 1 / Jucimeri Isolda Silveira (organizadora). – 1.ed. – Curitiba, PR :NDH-PUCPR, 2022.
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cas sociais brasileiras: uma questão em análise. 12. ed. São Paulo: Cortez, 2014.
89 | Papel do SUAS na garantia dos serviços de prestação continuada REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
A Constituição Federal de 1988 marca o início Assistência Social deu largos passos para a
da construção do sistema de seguridade so- sua consolidação como política pública ga-
cial não contributiva. É a partir deste diploma rantidora de direitos sociais: a Lei nº 8.742, de
que o Estado brasileiro passa a reconhecer a 7 de dezembro de 1993 (Lei Orgânica da As-
proteção social enquanto um direito de todos, sistência Social – LOAS), a ratificou enquan-
independentemente de haver contribuição to uma política de proteção social, descen-
à Previdência Social. Com a promulgação da tralizada e participativa; foram realizadas
Carta Magna, edificou-se a Seguridade Social 12 Conferências Nacionais de Assistência So-
que, além da Previdência, é constituída por cial desde 1995; e foram aprovados os textos
outras duas políticas públicas: a Saúde, de da Política Nacional de Assistência Social de
caráter universal e a Assistência Social, des- 1998 (PNAS/1998), revisitado em 2004, e das
tinada a quem dela necessitar com a oferta Normas Operacionais Básicas (NOB), além
de seus serviços, programas, projetos e bene- de diversos Decretos, Portarias e Resoluções
fícios, incluindo a garantia de renda por meio que regulamentam os serviços, programas,
do Benefício de Prestação Continuada (BPC). projetos e benefícios da Assistência Social.
Inscrito entre os objetivos da Assistência So-
cial na Constituição Federal, o BPC é um be- A Assistência Social é uma política execu-
nefício assistencial que surge no contexto da tada por meio do Sistema Único de As-
Assembleia Constituinte, quando grupos liga- sistência Social – SUAS. Com o SUAS,
dos às pessoas com deficiência apresentaram reforçou-se a concepção da gestão da po-
a Emenda Popular nº 77, de 1987, fixando o lítica de Assistência Social como um sis-
pagamento mensal de um salário mínimosa- tema integrado no qual se faz imperativo
lário-mínimo assistencial às pessoas com de- a articulação das três esferas de governo.
ficiência incapazes de se manter. Ao tramitar Organizada de forma federativa e descentrali-
a proposta, o Poder Constituinte optou por in- zada, a Assistência Social contempla diversos
cluir também as pessoas idosas, considerando serviços, programas, projetos e benefícios, in-
o grande contingente de pessoas deste grupo cluindo a garantia de renda por meio do BPC.
que, assim como as pessoas com deficiência, Tais ofertas visam a proteção social dos indivídu-
não contavam com proteção no campo previ- os e famílias, além da vigilância socioassisten-
denciário. Ao final do processo, o texto consti- cial e da defesa de direitos, que são garantidos
tucional promulgado apresentou a seguinte no contexto das provisões socioassistenciais.
redação, que permanece até os dias atuais:
Voltado para garantir segurança de renda/
Art. 203. A assistência social será pres- sobrevivência juntamente com os benefícios
tada a quem dela necessitar, inde- eventuais (destinados a contingências em si-
pendentemente de contribuição à se- tuações de vulnerabilidade temporária, nas-
guridade social, e tem por objetivos: cimento, morte e calamidades), o BPC é um
(...) V - a garantia de um salário mínimosa- benefício individual e intransferível. O benefí-
lário-mínimo de benefício mensal à pes- cio tem seu reconhecimento enquanto direito
soa portadora de deficiência e ao idoso que atrelado à adoção de critérios de elegibilidade,
comprovem não possuir meios de prover quais sejam: as características individuais que
à própria manutenção ou de tê-la provi- provocam desvantagens na busca pela satis-
da por sua família, conforme dispõe a lei. fação das necessidades básicas, advindas do
ciclo de vida, no caso das pessoas idosas, com
Com a instituição do BPC, o Poder Públi- 65 anos ou mais; ou das limitações no desem-
co passou a ter o dever de garantir renda, penho de atividades e restrição na participa-
sem exigir contrapartidas, aquelas pessoas ção social, relativas às pessoas com deficiên-
com maior dificuldade de participação so- cia. Trata-se de um benefício não contributivo,
cial, especialmente no mundo do trabalho. com parcelas continuadas, orçamento defini-
O BPC materializa, portanto, o princípio da do e regras próprias, constituindo um direito so-
solidariedade social ao assegurar o paga- cial, que integra as Proteções Sociais do SUAS.
mento de uma renda mensal digna a dois
públicos prioritários da Assistência Social – Regulamentado pela LOAS e pelo De-
pessoas idosas e pessoas com deficiência. creto nº 6.214, de 26 de setembro de
A partir da Constituição Federal de 1988, a 2007, o BPC passou por diversas
90 | Papel do SUAS na garantia dos serviços de prestação continuada REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
alterações normativas desde a sua criação. tribui para o acesso ao BPC. Num mundo
Nesse período foram alterados, por exem- cada vez mais tecnológico, que demanda
plo, o corte de renda familiar per capita para fluência digital até para acesso às ofertas
acesso e manutenção do benefício, o con- públicas e onde as etapas de operaciona-
ceito de família, a definição de deficiência, a
lização do BPC são realizadas por meio
idade de acesso para as pessoas idosas, entre
de sítios e aplicativos eletrônicos, o papel
outros pontos. Destaca-se, também, o alcan-
ce do BPC, que conforme dados do Depar- dos técnicos de referência por meio da
tamento de Benefícios Assistenciais – DBA, orientação e apoio aos requerentes tem
em julho de 2023, o número de beneficiários sido fundamental para assegurar o aces-
totalizou 5.395.845, sendo 2.930.537 pessoas so daqueles que fazem jus ao benefício.
com deficiência e 2.465.308 pessoas idosas. Os trabalhadores do SUAS cotidianamen-
te realizam atendimentos de importân-
A gestão do BPC é realizada pelo Ministério cia fundamental para a proteção do pú-
do Desenvolvimento e Assistência Social, blico do BPC. São esses trabalhadores
Família e Combate à Fome - MDS, a quem que identificam usuários com perfil para
compete, nos termos do art. 2º do regula- acessar o benefício, orientam sobre os cri-
mento anexo ao Decreto nº 6.214, de 2007: térios de acesso, informam os documen-
tos necessários para o requerimento e
(...) a implementação, a coordenação- apoiam o preenchimento de formulários,
-geral, a regulação, o financiamento, o quando necessário. Nos CRAS os reque-
monitoramento e a avaliação da pres- rentes ou beneficiários do BPC são enca-
tação do benefício, sem prejuízo das ini- minhados para os serviços socioassisten-
ciativas compartilhadas com Estados, ciais da Política de Assistência Social e
Distrito Federal e Municípios, em conso- para outras políticas públicas e nos CRE-
nância com as diretrizes do SUAS e da AS são encaminhados e acompanhados
descentralização político administrativa. junto às Delegacias Especializadas, aos
Órgãos de Defesa de Direitos (Conselho
Já a operacionalização do BPC cor- Tutelar, Ministério Público, Poder Judici-
re a cargo do Instituto Nacional do ário, Defensoria Pública), entre outros.
Seguro Social – INSS, nos termos do
art. 3º deste mesmo regulamento.
O BPC pode ser uma porta de entrada para
o SUAS, à medida que seus beneficiários,
assim como os beneficiários do Programa
Bolsa Família, são públicos prioritários
para o atendimento e acompanhamento
familiar, conforme previsto no Protocolo
de Gestão Integrada de Serviços, Bene-
fícios e Transferência de Renda do SUAS
(Resolução CIT nº 7, de 10 de setembro de
2009). A partir da concessão do BPC, os be-
neficiários e suas famílias são visibilizados
para atendimento pelos serviços socioas-
sistenciais, com vistas a um atendimento
integral, voltado para garantir as segu-
ranças de acolhida, convívio e autonomia.
91 | Papel do SUAS na garantia dos serviços de prestação continuada REVISTA CONGEMAS EDIÇÃO ESPECIAL
Outro aspecto a ser pontuado é que o Cadas-
tro Único para Programas Sociais do Governo
Federal – CadÚnico é obrigatório para fins de
requerimento e manutenção do BPC desde
2016 e hoje quase a totalidade do cadastra-
mento é realizado pela Assistência Social mu-
nicipal e do DF. O CadÚnico também é uma
forma de visibilizar os beneficiários do BPC
para acesso não só à Assistência Social, mas
também para outras políticas públicas. Dados
referentes ao mês de julho de 2023 produzi-
dos pelo Departamento de Benefícios Assis-
tenciais (DBA/SNAS/MDS) apontam que, atu-
almente, 5.330.911 beneficiários do BPC estão
no CadÚnico, o que representa 98,8% do total.
No contexto brasileiro, a preocupação com a presença de pessoas vivendo nas ruas das ci-
dades emerge a partir de década de 1930 proporcionando a elaboração de um modelo ins-
titucional que visava responder ao fenômeno em destaque. Contudo, é somente a par-
tir do final da década de 1980 que se percebe o crescimento do debate acadêmico e de
novas respostas governamentais sobre as pessoas que vivem e sobrevivem nas ruas, ini-
cialmente nas principais metrópoles do país, mas tornando-se visível no contexto das cida-
des médias e tomando novos direcionamentos nos anos 2000, como aponta Oliveira (2012).
Rivaldo Gomes
Como resultados das mudanças empreendidas por parte do Estado brasileiro, destacaram-
-se: 1) a I Pesquisa Nacional da População em Situação de Rua, realizada entre os anos de
2007 e 2008, que estimou um total 50 mil pessoas vivendo nas ruas da cidades brasileiras
acima de 300 mil habitantes; 2) a realização do II Encontro Nacional da população em situ-
ação de rua, no ano de 2009, que proporcionou um debate entre pessoas em situação de
rua, gestores, pesquisadores, movimentos sociais sobre a importância de uma política nacio-
nal; 3) o Decreto que instituiu a Política Nacional para a População em Situação de Rua e
seu comitê assinado no dia 23/12/2009 no encontro anual entre a população em situação de
rua e o Presidente Lula. Como pontos fundamentais apresentados pelo referido Decreto, res-
salta-se: o Estado brasileiro reconhece o segmento social da população em situação de rua
como sujeitos de direito à proteção social pública; para o enfrentamento dessa situação de
extrema violação de direitos é necessário respostas articuladas entre as diferentes políticas
públicas; a criação do Comitê Intersetorial de Acompanhamento e Monitoramento da Polí-
tica para a População em Situação de Rua como mediador dessa nova proposta de gestão.
Mediante o contexto exposto e os novos elementos instituídos pelo Sistema Único de Assis-
tência Social, destaca-se aprovação da Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais
(Resolução nº 109 CNAS de 11 de novembro de 2009) que apresentou uma nova modelagem
para as ofertas dos serviços socioassistenciais voltados a atenção à população em situação
de rua, organizados segundo os níveis de proteção, sendo: 1) Proteção social especial de mé-
dia complexidade: Serviço Especializado em Abordagem Social e Serviço Especializado para
Pessoas em Situação de rua (ofertado no Centro Pop ou CREAS); 2) Proteção social especial
de alta complexidade: Serviços de Acolhimento para Adultos e Famílias (modalidades Casa
de Passagem e Abrigo Institucional) e Repúblicas (processo de saída da situação de rua). Des-
sa maneira, o campo de atuação da Proteção Social Especial foi instituído para garantir as
seguranças socioassistenciais15 às famílias e indivíduos em situações de violação de direitos.
O Serviço Especializado em Abordagem Social pode ser ofertado nos CREAS, Centros
Pops ou outras Unidades referenciadas, tem como direcionamento o trabalho planeja-
do de aproximação, escuta qualificada e construção de vínculos de confiança com pes-
soas e famílias em situação de violação de direitos que utilizam os espaços públicos como
forma de moradia e sobrevivência. Para o desenvolvimento das ações, a metodologia pro-
posta, fundamentada na Educação Social de Rua, deve considerar os aspectos basila-
res do serviço: a identificação das situações, o estabelecimento de vínculos de confian-
ça e a articulação com a rede de atenção socioassistencial e demais políticas públicas.
De acordo com a Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais (BRASIL, 2009), os Servi-
ços de Acolhimento Institucional (Abrigos Institucionais e Casas de Passagem) e as Repúblicas
integram a proteção social especial de alta complexidade do Sistema Único de Assistência
Social - SUAS. A especificidade desses serviços está na oferta de atendimento integral, com vis-
tas a garantir condições de estadia com qualidade, convívio, endereço de referência para aco-
lher, com privacidade, pessoas em situação de rua e as situações de desabrigo por abandono,
migração, ausência de residência ou pessoas em trânsito e sem condições de autossustento.
Mediante a descrição dos serviços socioassistenciais para os adultos em situação de rua, apresen-
ta-se a oferta dos serviços nas regiões brasileiras, conforme pode-se observar no quadro abaixo:
Por fim, ao observar a distribuição da rede de atenção socioassistencial, torna-se urgente a ex-
pansão dos serviços em todas das regiões do país, para isso é primordial a garantia do orçamento
fixo, de no mínimo 1% da receita corrente líquida dos orçamentos federal, estadual e municipal
para o SUAS. E, aliado ao processo de expansão da rede de atenção à população em situação de
rua, considerando o seu aprimoramento, é urgente afastar-se das velhas práticas (conforme apre-
sentado ao longo do texto), avaliar os serviços (novas modalidades e metodologias) e processos
de trabalho (efetivação da educação permanente no SUAS) e ressaltar a potencialidade do mo-
delo proposto pelo SUAS que, complementado com as ações das demais políticas públicas, con-
tribuirá para a garantia da dignidade das pessoas que vivem e sobrevivem nas ruas, promovendo
possibilidades de superação dessa situação de extrema vulnerabilidade e de violação de direitos.
Referências bibliográficas:
BARROS, Joana S. Moradores de rua – pobreza e trabalho: interrogações sobre a
exceção e a experiência política brasileira. 2004. Dissertação (Mestrado em So-
ciologia) - Programa de Pós-Graduação em Sociologia da Faculdade de Filoso-
fia, Letras e Ciências Humanas da Universidade de São Paulo, São Paulo, 2004.
MARTINS,SílviaH.Z.Artíficesdoócio:mendigosevadiosemSãoPaulo(1933-1942).Londrina:Eduel,1998.
OLIVEIRA, Luciano Márcio Freitas. Circulação e Fixação: o dispositivo de gerencia-
mento dos moradores de rua de São Carlos e a emergência de uma população. 2012.
148 p. Dissertação (Mestrado em Sociologia). Programa de Pós-Graduação em So-
ciologia, Centro de Ciências Humanas da Universidade Federal de São Carlos, 2012.
;O Alcance da Proteção Social à População em Situação de Rua: a fuga do para-
digma do direito. 310 p. Tese (Doutorado em Serviço Social e Política Social) – Pro-
grama de Pós-Graduação em Serviço Social e Política Social do Centro de Es-
tudos Sociais Aplicados da Universidade Estadual de Londrina. Londrina, 2017.
VIEIRA, Maria Antonieta Costa; ROSA, Cleisa Moreno Maffei. Popula-
ção de rua: quem é, como vive, como é vista. São Paulo: Hucitec, 1997.
Ao trabalhar a Assistência Social enquanto direito, deve-se compreender que migrantes e re-
fugiados têm direito a acesso pleno à política pública de assistência social. Dentro desta dinâ-
mica, a definição de qual nível de complexidade de proteção social, serviço, benefício ou estra-
tégia de ação esses indivíduos deverão acessar dependerá da análise da situação específica e
das demandas apresentadas.
Nesta lógica, se faz primordial a incorpora- A LOAS delineia a responsabilidade dos en-
ção de aspectos socioculturais no atendi- tes. À União, estados e municípios cabe o
mento e na valorização destes povos. O tra- cofinanciamento. Já à União e estados cabe
balho social com a população migrante e também o apoio técnico. E a execução de ser-
refugiada deve contemplar o entendimento viços é de responsabilidade de estados e mu-
de que esses grupos passaram por ruptu- nicípios. Entretanto, situações de emergên-
ras profundas em múltiplos vínculos (com o cia demandam soluções urgentes de curto,
seu país, seu pertencimento a um local, sua médio e longo prazo, com avaliação e revisão
rede de apoio) e cabe à assistência social constantes. Grandes fluxos migratórios por
contribuir para a reestruturação de trajetó- crise humanitária contemplam um cenário
rias de vida, a reconstrução de vínculos (ago- de vulnerabilidades, riscos e violações de di-
ra com um novo território, com uma nova reito. São necessários arranjos complexos para
rede de apoio, com uma nova comunidade). respostas adequadas e efetivas: intersetoriais,
O encaminhamento e acesso a políti- corresponsáveis, integradas e horizontais.
cas públicas locais, a inserção em espa-
ços de proteção e convívio comunitário No fluxo Venezuelano, denota-se que o Minis-
possibilitam essa reconstrução e o al- tério do Desenvolvimento e Assistência Social,
cance da autonomia e protagonismo. Família e Combate à Fome (MDS) tem acom-
panhado a demanda específica da chegada
Outro aspecto importante do trabalho social desse grupo desde 2016, quando os primei-
com famílias migrantes é o reconhecimento ros indígenas (da etnia Warao) começaram
das oportunidades que esta população traz. a ficar em situação de rua em Pacaraima e
São indivíduos que tem consigo conhecimen- em Boa Vista, em Roraima. A situação foi se
tos, culturas, vivências, habilidades técnicas e complexificando com grupos cada vez maio-
linguísticas de seus países de origem, e que res nas ruas das cidades, em alojamentos ou
vem ensinar e se integrar às práticas culturais, ocupações espontâneas, com aumento pro-
sociais e econômicas brasileiras. Relembran- gressivo de situações de violações de direitos.
do que o Brasil e toda sua riqueza cultural foi
constituída por esta multiplicidade de origens.
Dentro desta dinâmica, as Ações da Operação Acolhida estão organizadas em 3 eixos: Orde-
namento da fronteira, abrigamento e interiorização. O Ordenamento da fronteira, contempla a
estruturação de Postos de Recepção, Identificação e Triagem nos municípios de Pacaraima e
Boa Vista, em RR. Nesses locais, os migrantes que cruzam a fronteira têm acesso a procedimen-
tos de regularização migratória: autorização de residência ou protocolo de refúgio; emissão
de documentos como o CPF e a carteirinha do SUS; inserção no Cadastro Único; imunização;
atendimento de casos específicos de proteção; encaminhamento para a rede local de serviços
e para acolhimento emergencial. O eixo de acolhimento é coordenado pelo MDS que atua
em parceria com Agências das Nações Unidas e organizações da Sociedade Civil. O abriga-
mento de refugiados e imigrantes é uma das principais demandas locais. A oferta de espaços
seguros, com equipe de referência preparada para o atendimento especializado e articulação
com outras políticas públicas é ação fundamental para a garantia de direitos dos diferentes
grupos que chegam ao Brasil. Em setembro de 2023, são mais de 10 mil pessoas acolhidas em
7 abrigos federalizados e alojamentos de pernoite na região19. Nos primeiros meses de 2023, o
aprimoramento e a integração do Cadastro Único para Programas Sociais à Operação Acolhida
foram priorizados, facilitando o rápido acesso de refugiados e migrantes ao Programa Bolsa
Família e demais programas sociais
Já o eixo interiorização, também coordena- sociedade civil, entidades socioassistenciais e
do pelo MDS, implica no deslocamento vo- Agências das NaçõesUnidas são partes funda-
luntário de refugiados e imigrantes a outros mentais da estratégia. O foco da Interiorização
estados e municípios brasileiros. Esse des-lo- é proporcionar a autonomia dos refugiados e
camento é realizado por meio de diferentes imigrantes venezuelanos de modo a fomen-
modalidades que vão desde a estruturação de tar sua inserção social no território brasileiro, o
abrigos em municípios parceiros, como por painel com as informações sobre a interioriza-
meio de vaga de emprego sinalizada e reuni- ção está disponível para consultas públicas20.
fi-cação familiar e social, contribuindo para re-
dução da sobrecarga da rede local de Roraima. A abordagem do Brasil ao fluxo de refugiados
e migrantes da Venezuela está estruturada,
A Interiorização implica num processo de atu- organizada e ganhou reconhecimento inter-
ação que demanda a articulação com gesto- nacional. No entanto, esse fluxo para o Brasil
-res dos estados e municípios de destino em não diminuiu, não apresenta perspectivas de
diferentes áreas de atuação além da Assis- diminuição futura e a vulnerabilidade dessas
tência Social. Parcerias com organizações da
19 https://hcr.pages.gitlab.cartong.org/opsmap/opsmap-brazil/
20 http://aplicacoes.mds.gov.br/snas/painel-interiorizacao/
Regis Spíndola
Advogado, Mestre em Educação, Especialista em Práticas Socioeducativas,
Diretor do Departamento de Proteção Social Especial da Secretaria Nacional de
Assistência Social (SNAS/MDS).
21 https://legislacao.presidencia.gov.br/atos/?tipo=LEI&numero=12608&ano=2012&ato=cf8ETRU1kMVpWT18a
Ações assistenciais
de caráter de emergência
Art. 12. Compete à União: III - atender, em conjunto com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios,
às ações assistenciais de caráter de emergência. (Lei Orgânica de Assistência Social, art.12).
Nesse cenário, cada vez mais se torna necessário ampliar a capacidade do SUAS no enfrenta-
mento dessas situações, com prioridade para a constituição de uma atuação conjunta de todos
os atores envolvidos.
Este documento sinaliza que o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) não pode se eximir de sua
responsabilidade nos contextos de desastres e emergências diversas e que, atuando junto a outras polí-
ticas e setores, deve resguardar a sua especificidade. (Diretrizes para Atuação da Assistência Social em
contexto de Emergência Socioassistencial, p.17)
Atualmente em revisão, as “Diretrizes para Atuação da Assistência Social em contexto de
Emergência Socioassistencial” já trazem elementos significativos a fim de aprofundar o enten-
dimento sobre qual o papel da Assistência Social nas emergências, apresentando um conjunto
de ações a ser empreendido antes, durante e após contextos de emergência, considerando-se
as especificidades e competências de cada ente nas três esferas de governo.
Entes Federados
Convém observar que a Lei Orgânica de Assistência Social – LOAS, em seu artigo 12, prevê
uma atuação integrada e compartilhada entre União, estados, Distrito Federal e municí-
pios. A responsabilidade compartilhada entre as três esferas de governo, além de advir das
diretrizes do SUAS, decorre da natureza complexa das situações críticas e emergenciais
que demandam esforço conjunto para prevenção e enfrentamento dos danos sofridos pe-
las populações atingidas. Cabe à União, aos Estados e Municípios assegurarem as con-
dições para prevenir tais situações e garantir que indivíduos e famílias, quando atingi-
dos por emergências, recebam a proteção necessária e tenham seus direitos assegurados.
Rovena Rosa
Proteção Integral
Eixos de atuação
Segundo a Childhood Brasil22, pesquisas apontam que meninos e meninas eram ouvidos (as),
muitas vezes ao longo de um processo judicial, repetindo e revivendo a situação de violência para
diversos órgãos da rede de proteção, investigação e responsabilização. A repetição traz prejuí-
zos para o desenvolvimento da criança e do adolescente, pois reproduz sofrimentos e é danoso
para a consecução do processo judicial, em razão do risco de indução, produção de falsas me-
mórias, entre outros. Desse modo, em 2017, a Lei nº13.431 é aprovada com o objetivo de enfrentar
um problema social relevante: a proteção de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas
de violência e evitar a revitimização. Para isso, estabelece novos procedimentos e responsabi-
lidades para os atores do Sistema de Garantia de Direitos da Criança e do Adolescente (SGD)23.
120 | A Lei 13.431/2017 e suas implicações para a proteção de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas
de violência do âmbito do SUAS
na inquirição de crianças e adolescentes em razão de violência sexual, que gerava forte revitimi-
zação. É evidente que havia a necessidade de modificar a maneira como crianças e adolescentes
eram atendidos diante de uma situação de violência e são inegáveis os esforços trazidos pela Lei
13.431/2017 nesse sentido. Entretanto, sua implementação traz desafios, dúvidas, interpretações
divergentes, explicitando conflitos, sobreposições e ausências que já estavam presentes no SGD.
No caso específico do SUAS, que possui objetivos e forma própria de atuação, é neces-
sário todo um investimento em capacitações e articulações para incorporar novas me-
todologias, fluxos e protocolos intersetoriais para corresponder às demandas de prote-
ção e evitar a revitimização. Além disso, exige um amplo conhecimento técnico, ético
e metodológico das equipes de referência e comprometimentos dos(as) gestores(as)
para cumprir sua finalidade, sem assumir atribuições que não são do campo protetivo.
Cabe lembrar que, no Brasil, o modelo de atenção às crianças e adolescentes passou por diferentes
concepções, sendo modificado ao longo do tempo. Partindo da total omissão do Estado brasileiro,
perpassando a concepção que segregava crianças e adolescentes - especialmente aqueles que
os pobres, até chegar a Constituição Federal de 1988, em que houve a reconfiguração da atenção
a esse público. A CF 88 e algumas outras legislações protetivas surgiram em um contexto de forte
mobilização da sociedade civil organizada e dos organismos internacionais de direitos humanos.
Na esteira das diretrizes da Convenção Internacional sobre os Direitos da Criança (1989) surgiu
o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA, Lei nº 8.069/1990), que deu origem ao Sistema
de Garantia de Direitos e que instituiu uma nova doutrina, onde crianças e adolescentes são
considerados sujeitos de direitos. Portanto, uma mudança de paradigma saindo da doutrina
da situação irregular, cujos “menores” eram objeto das ações de caridade, ou de correção e
repressão, passando para a doutrina da proteção integral, cujas crianças e adolescentes são
sujeitos de direito que devem ser considerados e respeitados pelo seu valor presente. Portan-
to, uma mudança de concepção que veio reorientar a atenção à infância e à adolescência no
Brasil e que segue sendo aprimorada com a incorporação de novas legislações e metodologias.
Assim, no âmbito do SGD surge a Lei nº 13.431/2017 que altera o ECA para estabelecer mecanismos
para prevenir e coibir as situações de violência contra crianças e definir as medidas de proteção e
assistência aplicáveis para as vítimas ou testemunhas de violência, ou seja, estabelece direitos es-
pecíficos para crianças e adolescentes em situação de violência e aplica-se a crianças e adolescen-
tes de 0 a 17 anos, sendo facultativa para as vítimas e testemunhas de violência entre 18 e 21 anos.
Paulo Hebmuller
121 | A Lei 13.431/2017 e suas implicações para a proteção de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas
de violência do âmbito do SUAS
O Decreto nº 9.603/2018, que regulamenta a a seguir, pois consegue descrever mais
Lei nº 13.431/2017, conceitua a revitimização detalhadamente cada procedimen-
como “discurso ou prática institucional que to, quem os realiza e com que objetivos:
submeta crianças e adolescentes a procedi-
mentos desnecessários, repetitivos, invasivos,
que levem as vítimas ou testemunhas a revi- Depoimento especial Escuta especializada
ver a situação de violência ou outras situações
que gerem sofrimento, estigmatização ou
exposição de sua imagem” (Brasil, 2018, art. Procedimento
realizado pelos
5º). Ou seja, a revitimização reitera as práticas
Procedimento de órgãos da rede de
anteriores ao ECA, em que crianças e adoles- oitiva da criança e do proteção nos
centes não eram sujeitos de direitos e seus in- adolescente perante campos da educação,
teresses não eram atendidos prioritariamente. autoridade policial ou da saúde, da
judiciária. assistência social, da
O histórico do atendimento de crianças e segurança pública e
adolescentes revela que havia muita revitimi- dos direitos humanos.
zação de crianças e adolescentes e essa era
resultante da baixa qualidade dos serviços Com o objetivo
em razão de limitação de recursos financei- de assegurar o
Visa a acompanhamento da
ros, estruturais e humanos; ausência de flu-
responsabilização vítima ou da
xos formalmente instituídos e dificuldades de judicial do suposto testemunha de violên-
estabelecer ações articuladas e colaborativas autor da violência. cia, para a superação
entre as políticas do SGD; ausência de capa- das consequências da
citação dos profissionais; não responsabili- violação sofrida.
zação dos autores de violência; entre outros.
122 | A Lei 13.431/2017 e suas implicações para a proteção de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas
de violência do âmbito do SUAS
Desde modo, depreende-se que a escuta es- processo efetivamente protetivo, demanda
pecializada é procedimento ou mesmo um uma mudança de paradigma, onde a voz da
conjunto de interações com a criança e ao criança é considerada e também seu silên-
adolescente, vítima ou testemunha de violên- cio. Uma escuta protegida deve ser baseada
cia, perante a rede de proteção, com o objetivo na atenção inclusive ao não dito, uma postu-
de obter informações para a acolhida e o pro- ra de atenção e corresponsabilidade de todas
vimento de cuidados e proteção. A escuta es- os(as) profissionais de todas as políticas que
pecializada não tem conotação investigativa e atendem a esse público. Tanto na revelação
não busca coletar provas contra os agressores, espontânea, quanto na identificação de si-
mas visa proteger as vítimas ou testemunhas, nais e indícios, é fundamental que se ado-
que relatam apenas o necessário para que os tem as providências necessárias, incluindo
profissionais entendam o que ocorreu e as- a notificação ao Conselho Tutelar, conforme
sim possam fornecer os cuidados necessários. fluxo e protocolo previstos em seu âmbito.
Além do mais, sempre que possível, a busca
por informações deve ser prioritariamente jun- Mukunda
to aos familiares ou responsáveis protetivos.
123 | A Lei 13.431/2017 e suas implicações para a proteção de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas
de violência do âmbito do SUAS
e acompanhamento, não se restringin- de trabalho, com foco na interdisciplinarida-
do a busca de qualquer confirmação da de, para o enfrentamento e prevenção as si-
violência. Conforme previsão pelo Decre- tuações de violência. Esse é o desafio a ser en-
to 9.603/2018, no âmbito do SUAS, poderão frentado pelo SUAS e pelas demais políticas.
ser adotados os seguintes procedimentos:
Cabe ressaltar que a violência é um proble-
I - elaboração de plano individual e familiar de ma social multifacetado, com raízes histó-
atendimento, valorizando a participação da crian- ricas, culturais, sociais, ambientais, estrutu-
ça e do adolescente e, sempre que possível, a pre- rais. É, portanto, uma questão complexa, cuja
servação dos vínculos familiares; II - atenção à compreensão precisa extrapolar o contexto
vulnerabilidade indireta dos demais membros da
individual ou familiar. É preciso intervir na
família decorrente da situação de violência, e so-
licitação, quando necessário, aos órgãos compe- questão dos determinantes e consequên-
tentes, de inclusão da vítima ou testemunha e de cias da violência e não apenas no trabalho
suas famílias nas políticas, programas e serviços individualizado com as famílias e indivíduos.
existentes; III - avaliação e atenção às situações de Ou seja, pressupõe compreender que as si-
intimidação, ameaça, constrangimento ou discri- tuações vividas no âmbito familiar têm rela-
minação decorrentes da vitimização, inclusive du- ção com o contexto social mais amplo, con-
rante o trâmite do processo judicial, as quais deve- siderando as dimensões: estrutural, como a
rão ser comunicadas imediatamente à autoridade desigualdade social e macrossocial como o
judicial para tomada de providências; e IV - repre- sistema político, ordem econômica, entre ou-
sentação ao Ministério Público, nos casos de falta
tras. Atuar para enfrentar vulnerabilidades
de responsável legal com capacidade protetiva
em razão da situação de violência, para colocação do campo relacional impõe ir além do senso
da criança ou do adolescente sob os cuidados da comum, sob pena de sobrecarregar, culpa-
família extensa, de família substituta ou de serviço bilizar, invisibilizar os indivíduos, seja por sua
de acolhimento familiar ou, em sua falta, institu- faixa etária, classe, ou gênero, entre outros.
cional. (BRASIL, 2018).
Assim, a violência, além de complexa é um
fenômeno que não tem fronteiras e atinge
Na Assistência Social, o principal instrumen-
crianças e adolescentes independentemen-
to de sua operacionalização são os profissio-
te de classe, sexo, idade, religião, raça ou et-
nais que atuam no atendimento direto aos
nia. Há uma grande diversidade de situa-
(às) usuários (as), em uma relação marcada
ções de violação e de públicos atendidos, e,
pela proximidade, constituição de vínculos
portanto, toda essa complexidade requer
e subjetividade em que a implementação é
conhecimento teórico-metodológico, habi-
extremamente relevante e precisa ser vista,
lidades de articulação, diálogo e construção
não como um processo linear, mas algo em
de parcerias, além de compromisso ético
constante processo de construção e aprendi-
em prol da proteção integral das crianças e
zados. A existência de Orientações Técnicas
adolescentes, com o estabelecimento de flu-
e processos de capacitação e formação con-
xos e processos de trabalho diferenciados,
tinuados são necessários para que os atores
considerando inclusive a gravidade e urgên-
que compõem as diferentes serviços e insti-
cia das situações, para evitar que a violên-
tuições do SUAS compreendam a lógica da
cia se perpetue e ou até mesmo se agrave.
garantia de direitos que deve pautar a sua
atuação, abstendo-se de julgamentos morais,
O reconhecimento de que a prevenção e o
ou atendimentos baseados nas lógicas da ca-
enfrentamento da violência são direitos hu-
ridade e do assistencialismo. A Assistência So-
manos e requerem um processo amplo, que
cial deve articular seus serviços internamen-
envolve diversas políticas públicas, ou seja, a
te, entre todos os seus níveis, garantindo a
compreensão interdisciplinar do problema
referência e a contrarreferência, e articulação
público da violência é pré-requisito para que
com outras políticas públicas, a fim de asse-
haja medidas mais efetivas de enfrentamento.
gurar um amplo conjunto de direitos sociais
somente possíveis com a atuação conjunta
de vários profissionais das equipes dos CRAS,
CREAS e outros equipamentos, de modo que
consigam desenvolver métodos integrados
124 | A Lei 13.431/2017 e suas implicações para a proteção de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas
de violência do âmbito do SUAS
Portanto, para que haja uma prática efetivamente não-revitimizante, todos os ato-
res do SGD devem ser agentes de proteção, mesmo aqueles implicados na responsa-
bilização dos autores de violência. Inclusive, a principal mudança proposta na Lei n°
13.431/2017 reside justamente na necessidade de que a proteção de crianças e adoles-
cente seja considerada em todas as intervenções, de todos os trabalhadores do SGD, inde-
pendentemente de seu cargo ou local de lotação. Nesse sentido, as intervenções devem:
permitir que crianças e adolescentes se expressem livremente nos assuntos que lhes dizem
respeito e também respeitem o seu silêncio;
garantir acessibilidade.
Bruno Itan
125 | A Lei 13.431/2017 e suas implicações para a proteção de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas
de violência do âmbito do SUAS
Em resumo, as intervenções devem sempre blicaFederativadoBrasil.Brasília/DF:Senado,1988;
considerar o superior interesse da criança e do BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente: Lei
adolescente, compreendendo suas necessida- Federalnº8069,de13dejulhode1990:Brasília,1990;
des de forma integral. Logo, é preciso fazer com BRASIL, Presidência da República. Lei Or-
que instituições distintas, com objetivos especí- gânica da Assistência Social: Lei nº 8.742,
ficos, modos de atuar diferentes e até mesmo de 7 de dezembro de 1993, publica-
de diferentes poderes consigam atuar de ma- da no DOU de 8 de dezembro de 1993;
neira integrada, complementar, ágil e efetiva. BRASIL. Tipificação Nacional de Serviços
A efetivação da Lei 13.431/2017 demanda que Socioassistenciais (reimpressão 2014). Re-
as instituições e atores envolvidos sejam dota- solução CNAS nº 109/2009, de 11 de no-
dos de novas capacidades, formas de atuação vembro de 2009. Brasília: MDS, 2014;
e comunicação, devendo ser criados mecanis- BRASIL. Estabelece o Sistema de Garan-
mos institucionalizados de coordenação, como: tia de Direitos da Criança e do Adoles-
comitês de gestão colegiada, fóruns, grupos de cente Vítima ou Testemunha de Violên-
trabalho intersetoriais para o estabelecimento cia. Lei nº 13.431/2017, de 4 de abril de 2017;
de planejamento, monitoramento, fluxos, pro- BRASIL. Decreto 9.603, de 10 de de-
tocolos e formas de comunicação entre a rede, zembro de 2018. Brasília: 2018;
onde a superposição de tarefas seja evitada; a BRASIL. Ministério da Cidadania. Parâme-
cooperação entre os órgãos, os serviços, os pro- tros de Atuação do Sistema Único de Assis-
gramas seja priorizada; os mecanismos de com- tência Social (SUAS) no Sistema de Garan-
partilhamento das informações sejam estabe- tia de Direitos da Criança e do Adolescente
lecidos; e o papel de cada instância ou serviço Vítima ou Testemunha de Violência. Brasí-
e o profissional de referência esteja definido. lia: 2020. Disponível em: http://blog.mds.gov.
br/redesuas/wpcontent/uploads/2020/03/
Em âmbito federal há um esforço de integração SUAS_garantia_direitos_crian%C3%A7as_ado-
intersetorial que precisa ser retomado e fortale- lescentes_vitimas_testemunhas_violencia;
cido, com a implementação do Fluxo Geral da BRASIL. Fluxo Geral na Lei Nº 13.431/2017: Es-
Escuta Protegida e seu respectivo guia24, onde cuta Especializada e do Depoimento Especial
são definidas ações integradas junto aos órgãos no Atendimento a Crianças e Adolescentes
responsáveis pelos serviços de atendimento. Vítimas ou Testemunhas de Violência e Guia
Além dessa iniciativa, a SNAS também partici- para sua Implantação. 2022. Disponível em: ht-
pa da Comissão Intersetorial de Enfrentamento tps://www.gov.br/mj/pt-br/assuntos/seus-direi-
as Violências contra Crianças e Adolescentes. tos/politicas-de-justica/EJUS/fluxo-geral-lei-
Em âmbito setorial, a SNAS, em colaboração -13-431-de-2017-atualizado-em-26_10_2022.pdf;
com outras instâncias do SUAS, elaborou e dis- Childhood Brasil, Secretaria Nacional dos Direitos
ponibilizou orientações técnicas25 e um Curso da Criança e do adolescente – Ministério dos Di-
EAD sobre Atenção no SUAS a Crianças e Ado- reitos Humanos e da Cidadania (MDHC). Guia de
lescentes Vítimas ou Testemunhas de Violên- Escuta Especializada: conceitos e procedimen-
cia26. São iniciativas importantes, mas ainda é tos éticos e protocolares/Benedito Rodrigues dos
preciso avançar, pois, apesar de o Brasil ter uma Santos, Itamar Batista Gonçalves – São Paulo, Bra-
legislação protetiva dos direitos das crianças sília: Childhood Brasil: SNDCA:, 2022 – 2023, 127.
e adolescentes considerada avançada, ainda Disponível em: phttps://www.gov.br/mdh/pt-br/
existe muito a ser realizado para que os direitos navegue-por-temas/crianca-e-adolescente/aco-
sejam verdadeiramente efetivados: um cami- es-e-programas/GuiaEscutaEspecializada_Con-
nho permeado de desafios, mas um caminho ceitoseProcedimentosticoseProtocolares.pdf
possível e necessário, para que crianças e ado- VIANA, Márcia Pádua. Escuta protegi-
lescentes possam crescer livres da violência. da de crianças e adolescentes pelo CRE-
AS: proteção ou revitimização? Disser-
Referências Bibliográficas: tação (mestrado). Brasília: IPEA, 2020.
BRASIL.Constituição(1988).ConstituiçãodaRepú-
24 Iniciativa que reuniu diversos órgãos do Poder Executivo, Poder Judiciário, Polícia Civil, Ministério Público e De-
fensoria Pública com vistas a garantir a adequada implementação das novas legislações sobre a escuta protegida.
25 Parâmetros de Atuação do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) no Sistema de Garantia de Direitos da
Criança e do Adolescente Vítima ou Testemunha de Violência. Brasília: 2020. Disponível em: http://blog.mds.gov.
br/redesuas/wpcontent/uploads/2020/03/SUAS_garantia_direitos_crian%C3%A7as_adolescentes_vitimas_testemu-
nhas_violencia.
26 https://moodle.cidadania.gov.br/ead/course/index.php?categoryid=164
126 | A Lei 13.431/2017 e suas implicações para a proteção de crianças e adolescentes vítimas ou testemunhas
de violência do âmbito do SUAS
Jucimeri Isolda Silveira
Professora do Programa de Pós-Graduação em Direitos
Humanos e Políticas Públicas (strito senso) e do Curso de
Serviço Social; Assessora Técnica do Colegiado Nacional
de Gestoras/es de Municipais de Assistência Social.
127 | CENÁRIO SOCIOECONÔMICO, VIOLÊNCIAS, PANORAMA DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA E A AGENDA CONS-
TRUÍDA NOS ENCONTROS DO CONGEMAS
O tema do 23º Encontro Nacional do CONGE- de fundos públicos, e organização da política
MAS, “Reconstrução do Sistema Único de As- nas três esferas de governo, é potencializada
sistência Social: o desafio coletivo na elimina- pelo marco fundamental da constituição de
ção da fome e da pobreza, na ampliação da um sistema continuado e unificado: o SUAS.
proteção social no Brasil”, parte da retomada
e da qualificação das bases estruturantes do Seguindo as diretivas da Constituição Fede-
SUAS, do pacto federativo, o que implica, ne- ral e da LOAS, o SUAS é um sistema público
cessariamente, o desenvolvimento urgente não-contributivo, descentralizado e partici-
da capacidade de o Estado brasileiro garan- pativo que tem como finalidade primordial a
tir condições institucionais para enfrentar as gestão do conteúdo específico da assistên-
consequências das desigualdades, agravadas cia social no campo da proteção social bra-
no contexto de pandemia de Covid19, e re- sileira, como definido na Norma Operacional
estruturar um amplo e universal sistema de do Sistema Único de Assistência Social edi-
proteção social, com atuação estratégica da tada em 2005 (NOB/SUAS/05) e atualizada
política de Assistência Social, integrada com em 2012 (NOB/SUAS/12). Como sistema es-
demais políticas sociais e econômicas. Assim, tatal, possibilita uma nova dinâmica de go-
para “ampliar a proteção social e fortalecer a vernança democrática, tendo com diretriz
democracia, por um Brasil humanamente di- primordial o a universalização da cobertu-
verso e socialmente justo”, lema do Encontro ra de serviços e ações no âmbito local, com
Nacional, é fundamental considerar as múl- priorização de territórios mais desiguais.
tiplas vozes do SUAS, o projeto de recosntru-
çãoreconstrução produzido no período de
resistência e fragilização do sistema, as diver-
sidades e demandas por novas estratégias.
Motin
É fundamental demarcar que o sistema protetivo não contributivo é composto por políti-
cas sociais setoriais, particularmente o Sistema Único de Saúde - SUS, o SUAS e o Sistema
Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional – SISAN. Este conjunto de sistemas se inte-
gram com as políticas de garantia e defesa de direitos, produzidas a partir das lutas em di-
reitos humanos, protagonizadas por sujeitos coletivos e de direitos, como mulheres, pes-
soas idosas, juventude, pessoas com deficiência, povos indígenas, pessoas LGBTQIA+,
povo negro, povos tradicionais; por movimentos sociais, organizações da sociedade civil.
Desse modo, as políticas setoriais demandam forte articulação de pautas advindas das lu-
tas sociais pela dignidade humana, pela efetivação de condições de real igualdade e liber-
dades plenas. Daí a importância da reconstrução das políticas sociais e do Estado, diante
da distribuição recente e das desproteções, impulsionar medidas e políticas que enfrentem
as consequências da colonolialidade, do modelo moderno-colonial-patriarcal, para efe-
tivamente reduzir as desigualdades (SILVEIRA et al, 2021; SILVEIRA in COSTA et al, 2022).
É possível observar que ocorreu um crescimento real (além da inflação) da renda média brasilei-
ra de menos de 50% entre 1990 e 2022 (32 anos). Observa-se um crescimento econômico maior
entre 2004 e 2013. Destaca-se, nesse sentido, que o baixo dinamismo econômico impacta dire-
tamente na renda e na pobreza, assim como as políticas econômicas e as condições políticas e
institucionais na provisão de serviços e benefícios sociais, ou seja, na materialização dos direitos.
A desocupação possui muita relação com políticas econômicas federais, mas também esta-
duais. Ocorre uma redução nas taxas a partir de 2021, atingindo níveis de 2014 em 2022, mas
ainda assim são desafiadoras tendo em vista a relação entre desemprego e ocupações pre-
carizadas com o aumento da pobreza, da fome e demais expressões da desigualdade social.
As taxas de insegurança alimentar grave são mais elevadas no Norte e Nordeste, redu-
zem até 2013, aumentam substancialmente já em 2018, antes da pandemia, dobram
ou triplicam com a pandemia. Destaca-se que 58,7% dos domicílios brasileiros em al-
gum grau de insegurança alimentar – 59,5% Centro-Oeste, 68% Nordeste, 71,6% Norte,
64,6% Sudeste e 48,2% Sul. A fome atinge um quarto dos nortistas e mais de um quinto
dos nordestinos em 2022, sendo um problema em todo o Brasil e que deve ser priorizado.
2. Violências e demandas
As taxas de insegurança alimentar grave são grau de insegurança alimentar – 59,5% Cen-
mais elevadas no Norte e Nordeste, redu- tro-Oeste, 68% Nordeste, 71,6% Norte, 64,6%
zem até 2013, aumentam substancialmente Sudeste e 48,2% Sul. A fome atinge um quar-
já em 2018, antes da pandemia, dobram ou to dos nortistas e mais de um quinto dos
triplicam com a pandemia. Destaca-se que nordestinos em 2022, sendo um problema
58,7% dos domicílios brasileiros em algum em todo o Brasil e que deve ser priorizado.
Observa-se uma tendência preocupante de redução dos recursos, principalmente, para a pro-
teção social básica, o que ensejou diversas ações de mobilização dos atores do SUAS. A insta-
bilidade nas execuções se observa na proteção especial, uma redução expressiva para gestão
e um aumento em programas, principalmente para o Criança Feliz, e emendas parlamentares.
Quanto aos recursos estaduais destaca-se que em 2022, segundo estudos do Fonse-
as, que o país acumulou R$ 3,55 bilhões nos FEAS das unidades federativas. A lideran-
ça, como esperado, é do Sudeste, seguido do Nordeste, Norte, Centro e Sul, com va-
lor reduzido. No gráfico a seguir, é possível identificar a tendência das execuções.
Percebe-se uma baixa execução no cofinanciamento de serviços, com maior execução da Pro-
teção Social Básica no nordeste e da Proteção Social Especial nas regiões Sul e Sudeste. Ocorre
um baixo cofinanciamento de Benefícios Eventuais e de serviços no Centro Oeste e Norte, e
elevada execução em programas intersetoriais.
A análise comparada entre as pesquisas de 2019 e 2022 apontam algumas tendências que
possuem relação com a pandemia e o desfinanciamento federal: Benefício Eventual em 2019
era de 24 milhões, em 2022 foi para 243,6; Proteção Social Especial passou de 415 milhões em
2019, para 716,6 milhões em 2022 - só o sul registrou 310 mi; a Proteção Social Básica passou de
323 milhões em 2019, para 523,4 - só o nordeste 300 mi; Gestão passou de 174 milhões em 2019,
para 516,4 – Centro Oeste registrou 466 mi; Programas Intersetoriais passou de 51 milhões para
1,2 bilhão – só Nordeste registrou 780 milhões.
A alocação de recursos próprios pelas esferas de governo (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios) destinados à assistência social;
A garantia das transferências fundo-a-fundo entre as esferas de governo para a efetivação do
cofinanciamento de forma regular e automática;
A gestão orçamentária e financeira coerente com as demandas da sociedade, com comando
único e controle social.
O SUAS adota mecanismos que garantem a continuidade dos serviços, expansões progressivas
e sustentabilidade orçamentária e financeira, tendo como regras elementares:
Por isso existem emergências orçamentárias e regulatórias no SUAS que precisam ser solu-
cionadas. É preciso alcançar o patamar de aproximadamente 8 bilhões para manter as pac-
tuações e expandir. É necessário garantir revisão de custos, revitalizar as unidades públicas,
absolutamente sucateadas nos últimos anos. É necessário regularizar o cofinanciamento
pactado em 2015 e iniciar um novo pacto de aprimoramento; ampliar, garantir regularidade
nos repasses e aprimorar critérios dos incentivos de Gestão do SUAS e do Programa Bolsa
Família. Nesse sentido, é imprescindível regulamentar a vinculação de recursos nas três esfe-
ras de governo, seja pela aprovação da PEC 383/17, ou na imediata construção de uma inicia-
tiva do governo federal que viabilize a vinculação de recursos e a sustentabilidade do SUAS.
Ao mesmo tempo, é fundamental a adoção de medidas que avancem na regulamentação da
necessária desvinculação dos recursos orçamentários relativos à assistência social das restrições
de gastos, conforme definição no arcabouço fiscal, e sobre a necessária alteração legislativa do
percentual de gastos com pessoal previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complemen-
tar nº 101/2000), na qual a assistência social é reconhecida como serviço essencial. Outras pautas
urgentes, estão relacionadas à revogação da Emenda Constitucional nº 95/16 e a interdição de
todos os projetos que buscam reduzir o papel do Estado e subordinar os direitos ao ajuste fiscal.
É preciso reconhecer que desde a transição de governos e das primeiras e urgentes respostas,
ocorreram esforços do Ministério de Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Comba-
te à Fome, em promover condições políticas e institucionais, para a reconstrução coletiva do
SUAS, do desenho do Bolsa Família, com garantia de uma renda família permanente, da rápi-
da reorganização do Cadastro Único, do diálogo interfederativo. No campo do financiamento
a imediata recuperação de mais de 2 bilhões sem dúvidas se coloca como grande avanço e
concretização de um compromisso do governo federal com a Assistência Social. Mas é preciso
avançar mais e rapidamente, diante da realidade social, das demandas por proteção social, por
direitos. Por isso a importância de uma análise panorâmica da cobertura de serviços e benefí-
cios no Brasil. Com relação à cobertura de famílias e grupos específicos cadastrados e bene-
fícios é possível constatar:
Importante observar que o percentual de gru- terior do que em capitais – 66,58% dos novos
pos sociais específicos no cadastro único e no habitantes se concentraram em regiões fora
programa bolsa família justificam a adoção desses grandes centros urbanos;
de dispositivos que qualifiquem e induzam 5% das cidades brasileiras concentram 56%
busca ativa e políticas específicas, a exemplo população do país. Ao todo, 115,6 milhões de
da pactuação na região Nordeste no âmbito pessoas, ou 56,95% da população, vivem em
da Câmara Temática da Assistência Social no apenas 319 cidades;
Consórcio Nordeste, visando esforços conjun- a média de moradores por domicílio caiu de
tos para identificação e inclusão de povos indí- 3,31 para 2,79.
genas e comunidades tradicionais.
Os dados preliminares do Censo 202228, quan- O processo de transição demográfica do Brasil
do as mudanças demográficas, possibilitam a acompanha a influência das sociedades urba-
identificação de novos desafios, como a cons- no industriais, justamente pela passagem de
trução de novos critérios para a territorializa- um comportamento de altas taxas de mor-
ção de serviços. Alguns dados são sinais de talidade e fecundidade/natalidade para um
alerta para a construção de novos pactos: cenário em que ambas as taxas se situam em
a população brasileira registrou um aumen- níveis relativamente mais baixos. Além de al-
to de 6,45% em relação à edição anterior da terar as taxas de crescimento da população
pesquisa, em 2010, que havia contabilizado a transição demográfica acarreta uma alte-
190.755.799 de pessoas; ração da estrutura etária, quando diminui a
em números absolutos, houve um cresci- proporção de crianças ao tempo em que há
mento de 12.262.757 habitantes; uma elevação no percentual de idosos da po-
a taxa de crescimento nesses 12 anos foi de pulação. Embora o fenômeno das mudanças
0,52% ao ano, o menor nível da série histórica; populacionais seja generalizado no país, ele
as regiões Sul e Sudeste registraram puxa- não acontece ao mesmo tempo em todas as
ram o crescimento da população brasileira. O regiões do país, sendo necessário considerar
Sudeste ganhou 4.482.777 pessoas, e o Sul, as diversidades e particularidades regionais e
2.546.424; locais, especialmente para a definição de po-
líticas que reduzam desigualdade socioespa-
dos 5.570 municípios do Brasil, 3.168 ganha-
ciais.
ram habitantes entre 2010 e 2012 – isso repre-
senta 56,9% do total;
dos 5.570 municípios do Brasil, 2.399 perde-
ram habitantes entre 2010 e 2022 – isso repre-
senta 43% do total;
a cidade mais populosa do país, São Paulo
tem 11.451.245 habitantes, seguida de Rio de
Janeiro e Brasília;
o Brasil tem três cidades com menos de mil
habitantes – Serra da Saudade (MG), com 833
habitantes; Borá (SP), com 907; e Anhanguera
(GO), com 924;
o crescimento populacional foi maior no in-
28 https://censo2022.ibge.gov.br/
Os dados sociais territoriais devem orientar pactuações como expansão de Centros e Serviços
de Convivência e Fortalecimento de Vínculos, considerando a tendência de aumento da popu-
lação idosa; fomento de trabalho decente para jovens de famílias prioritárias; unidades públicas
e serviços mais integrados em município de menor porte; serviços híbridos (assistência social
e saúde) e mais abrangentes; desenhos de redes intersetoriais; novos critérios de expansão de
serviços que acompanhem a dinâmica da cidade e do campo, entre outros fatores.
Com relação ao Benefício de Prestação Continuada e ao Programa Bolsa Família algumas ten-
dências podem ser destacadas:
Fonte: Portal Assistência Social nos Municípios. Fonte: Portal Assistência Social nos Municípios.
Destaca-se o número de unidades de CRAS e CREAS nas regiões Nordeste e Sudeste. Mas
certamente, as demandas por proteção agravadas pela pandemia e a ausência de ex-
pansões exigem um diagnóstico atualizado das desproteções sociais no SUAS e o pla-
nejamento da retomada da ampliação de serviços/unidades. Os dados da saúde, segu-
rança pública e direitos humanos indicam tendências de aumento das violências nas
últimas décadas. No entanto, a cobertura de CREAS é baixa observando-se os dados. Com
relação ao Centro Pop esta realidade também se repete, considerando a baixa cobertura.
A quantidade de acolhimentos totaliza 7.360, com maior concentração na Região Sudeste, se-
guida das Regiões Sul e Nordeste. São mais de 150 mil pessoas acolhidas no momento do le-
vantamento pelo Censo Suas, como pode ser contatado na tabela a seguir:
São várias as questões a serem pautadas com relação à proteção social de alta complexidade,
especialmente diante da necessidade de implementação de novas modalidades, como família
acolhedora, guarda subsidiada e hotel social. Em 2015 foram realizadas pactuações que per-
mitiram importantes reordenamentos e a regionalização que segue incompleta. Daí a impor-
tância da retomada desta agenda, tanto de revisão de valores de referência, tendo em vista os
custos, como regionalização, o que implica os estados, e implantação de novas modalidades
de proteção social de alta complexidade. A indicação da necessidade de implantação de novas
unidades/modalidades fica mais evidente quando da apuração da atual cobertura:
Tabela 10 – Tipos de Acolhimento Institucional.
Observa-se uma queda de novas famílias e públicos prioritários para acompanhamento no PAIF.
O número de atendimentos particularizados e de benefícios eventuais se mantiveram altos, dada
a situação de choque e emergência. Já em 2022 observa-se uma tendência de normalização de
acompanhamento do PAIF e de encaminhamentos, mas, ainda assim, ocorre percebe-se uma
baixa capacidade para atendimento planejados e sistemáticos.
Tabela 13 – Relação entre Pobreza, PBF e CRAS
A análise da relação entre pobreza, volume de bolsa família e volume de CRAS, permite consta-
tar que em geral, estados com maiores taxas de pobreza tiveram maior taxa de PBF, a exemplo
do Maranhão, já estados com menores taxas de pobreza extrema tiveram menor taxa de PBF,
como Santa Catarina. Em todos os estados a taxa de CRAS é baixa considerando a demanda
potencial para Cadastramento, acompanhamento e acesso a serviços.
148 | CENÁRIO SOCIOECONÔMICO, VIOLÊNCIAS, PANORAMA DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA
E A AGENDA CONSTRUÍDA NOS ENCONTROS DO CONGEMAS
Tabela 14 – Atendimentos - CREAS
A totalização dos atendimentos realizados nos CREAS permite identificar um número significa-
tivo de atendimentos psicossociais particulares realizados, novos casos de situação de violên-
cia no PAEFI e de abordagens, mas existe uma tendência de baixa capacidade de atendimento
de novas demandas e de acesso da população aos serviços do CREAS, especialmente em situ-
ações de trabalho infantil.
Wesley Morau
Observa-se uma tendência de queda nos
atendimentos e acompanhamentos nos
CREAS, o que se mantém em 2022, com
exceção de novos atendimentos de pesso-
as vítimas de violência e atendimentos psi-
cossociais realizados, que totalizou 3.571.671
milhões.
Uma análise comparativa entre os atendi-
mentos no CREAS e casos de violência per-
mite identificar os seguintes resultados:
As regiões mais populosas tenderam a ter mais pessoas em situação de rua, com um número relati-
vamente elevado na região Sul dada sua população e baixo na região Norte. Destaca-se, ainda, o bai-
xo número de atendimentos no Centro POP para cada pessoa em situação de rua na região Norte.
Com relação aos acolhimentos são mais de 30 mil pessoas com trajetória de rua acolhidas no
Brasil, sendo mais da metade na região Sudeste. Entretanto, as demandas indicadas no Cadas-
tro Único revelam uma disparidade grande entre capacidade de atendimento e pessoas em
situação de rua com Cadastro Único, como analisado a seguir.
Tabela 20 - Pandemia e atendimento nos Centros Pop
Fonte: RMA
Observa-se que 2020, contexto de pandemia, ocorreu uma moderada redução nos atendimentos nas
regiões Sul e Sudeste, nas demais regiões do país houve um aumento. Importante observar que a
quantidade de Centros Especializados de Atendimento à População em Situação de Rua não acom-
panha a tendência de aumento de pessoas em situação de rua, especialmente durante a pandemia.
Com relação à população em situação de rua outros dados merecem destaque. Em 2022, havia
236.400 pessoas em situação de rua inscritas no Cadastro Único para Programas Sociais (Cadas-
tro Único), ou seja, 1 em cada 1.000 pessoas no Brasil estava vivendo em situação de rua. Quanto
à distribuição no território, 3.354 dos municípios brasileiros tinham pelo menos uma pessoa em
situação de rua cadastrada em dezembro 2022, o que corresponde a 64% do total de municípios
151 | CENÁRIO SOCIOECONÔMICO, VIOLÊNCIAS, PANORAMA DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA
E A AGENDA CONSTRUÍDA NOS ENCONTROS DO CONGEMAS
do país. Os 10 municípios com maior número de Humanos e Cidadania, Saúde e Ministério das
PSR concentram juntos 48% da população em Cidades, sejam acionados para no tempo deter-
situação de rua do país. São eles: São Paulo, Rio minado apresentarem planos emergenciais para
de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Salvador, For- as respostas relativas a cada política pública. Ou-
taleza, Curitiba, Porto Alegre, Campinas e Floria- tro ponto essencial, é que todas as intervenções
nópolis (BRASIL, 2023). e serviços a serem implantados sejam seguidos
de cofinanciamento federal e estadual, observan-
A cobertura de serviços para população em situ-
do-se, inclusive, o modelo federativo das políticas
ação de rua é absolutamente insuficiente. Rea-
sociais pós Constituição Federal de 1988.
lidade que gerou a determinação do Supremo
Tribunal Federal, por meio do Ministro Alexandre A situação de rua é uma violação e direitos que
de Moraes, em 25 de julho, que o governo federal releva uma grave crise nos laços de convivência
elabore, em até 120 dias, um plano de ação e de familiar e comunitária, sendo determinada por
monitoramento para que seja implementado no múltiplos fatores. Trata-se de uma expressão da
país a Política Nacional para a População em Si- questão social, o que demanda atuação de mais
tuação de Rua29. de uma política setorial, notadamente a assistên-
cia social, a saúde, a saúde mental, a habitação,
O plano deverá contemplar a elaboração de um
o trabalho e emprego. É indispensável que todas
diagnóstico atual da população em situação de
as etapas do processo, desde o diagnóstico, até
rua, com identificação do perfil, procedência e
a implementação das ações, haja envolvimento
de suas principais necessidades. Deverá conter,
e corresponsabilidade do conjunto das políticas
ainda, mecanismos para mapear a população
públicas, nas três esferas de governo, podendo,
em situação de rua no Censo do IBGE, meios de
deste modo, ser criado uma comissão interseto-
fiscalização de processos de despejo e de reinte-
rial com a responsabilidade de formular propos-
gração de posse no país e a elaboração de medi-
tas a serem submetidas às respectivas instâncias.
das para garantir “padrões mínimos de qualida-
No caso da Assistência Social recursos precisam
de nos centros de acolhimento”.
ser ampliados, modalidades e expansões devida-
Os municípios defendem, por meio do Conge- mente pactuadas para a ampliação e qualifica-
mas, os respectivos Ministérios, notadamente de ção dos serviços.
Desenvolvimento e Assistência Social, Direitos
4. Agenda do SUAS
reafirmada nos Encontros
Regionais do Congemas
A Região Norte é a maior entre as cinco regiões do país, ela abriga a maior parte da Flores-
ta Amazônica, sendo cortada por uma complexa rede fluvial, que desempenham um papel
fundamental na vida das comunidades locais, no transporte e na economia regional. No en-
tanto, enfrenta desafios ambientais e territoriais significativos. As particularidades territoriais
precisam ser consideradas para a viabilização das provisões, o que inclui a revisão de crité-
rios de cofinanciamento e territorialização de serviços. Ainda, a Região Norte abriga nume-
rosas comunidades indígenas, com importante diversidade e potencialidades socioeco-
nômicas. A diversidade humana exige um SUAS igualmente diverso e com capacidade de
adaptar serviços e benefícios considerando as diversidades e expressões da desigualdade.
A maioria das provisões no âmbito do SUAS são garantidas pelos municípios. São os municípios que
mantém os serviços sem necessariamente contar com recursos e recursos suficientes para cobrir
os custos do que está instalado. Daí a importância de avanços em estudo de custos, na realização
de um diagnóstico da atual cobertura e das desproteções, visando estabelecer novos patamares
e critérios de pactuação e expansão, que, inclusive considere as particularidades regionais/locais,
as diversidades, como a realidade de municípios do Semi Árido, da Amazônia Legal, de fronteiras.
É fundamental rever algumas corresponsabilidades e fortalecer o papel dos estados na re-
lação interfederativa. É uma prioridade para os municípios que o ente estado assuma for-
temente seu papel no SUAS, sem programas paralelos e pontuais. A regularidade no finan-
ciamento e princípio das corresponsabilidades, também é uma exigência para os estados.