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Alessandro Baratta

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Alessandro Baratta (Roma, 6 de outubro de 1933 — Saarbrücken, 25 de maio de 2002)


foi um filósofo, sociólogo e jurista italiano de grande influência nas décadas de 1970 a
1990 nos campos da filosofia do direito e sociologia jurídica, contribuindo principalmente
com críticas ao sistema penal e à criminologia tradicional.

É considerado um dos percursores da corrente da criminologia crítica, além de ter


impulsionado a teoria abolicionista e o garantismo penal – direito penal mínimo.

A criminologia crítica é um movimento heterogêneo do pensamento criminológico


contemporâneo que busca a construção de uma teoria materialista do conceito de desvio,
sendo influenciada por instrumentos e hipóteses elaboradas no âmbito marxista. Seus
estudos se colocam no campo de investigação desenvolvido pela sociologia liberal
contemporânea.

A criminalidade, inserida na criminologia tradicional, seria uma qualidade atribuída a


indivíduos ou grupos por meio de processos de definições. O processo de criminalização
teria caráter seletivo dos bens protegidos e dos indivíduos estigmatizados, tendo como
função a conservação e reprodução das relações de desigualdade na sociedade. Desse,
modo, rompe-se com o mito da igualdade no sistema penal.

Nesse sentido, a criminologia crítica propõe alteração do foco no processo de


criminalização do autor para as condições objetivas, estruturais e funcionais da própria
sociedade. Coloca como verdadeira conduta criminosa a disfuncionalidade das estruturas
sociais, as condutas das minorias privilegiadas e dominadoras em detrimento dos
dominados. Em consequência, defende uma política criminal alternativa, com garantias
jurídicas e respeito aos direitos humanos, no qual consiste em uma ampla política de
descriminalização e, a longo prazo, a superação do cárcere e do direito penal.

Alessandro Baratta, ao desenvolver a teoria da criminologia crítica, altera a percepção dos


conceitos de criminalidade e do sistema punitivo, abarcando-os em uma visão
macrossociológica do sistema capitalista tardio.

Sua teoria teve repercussão a nível global, com destaque para


a Alemanha, Itália, Espanha e América Latina.

Biografia[editar | editar código-fonte]

Foi protagonista em âmbito internacional no diálogo entre criminólogos, penalistas e


criminólogos críticos. Teve uma importância decisiva para o desenvolvimento da
Criminologia crítica europeia, latino-americana e brasileira. Na Europa, Baratta se
destacou na Alemanha, fazendo parte do processo de recepção do labeling approach em
torno da organizaçãoArbeistskreiss Junger Kriminologen (AJK), cujo órgão oficial de
divulgação era a revista Kriminologishes, fundados em 1969. Na Itália, teve papel central
na fundação e desenvolvimento da Escola de Bolonha de Direito penal e Criminologia.
Na América Latina participou da fundação e desenvolvimento do grupo de Criminologia
comparada da Universidade de Zulia, em 1974, Macaibo, Venezuela, em conjunto com o
Centro de Criminologia da Universidade de Montreal. No Brasil, diversos centros de
estudos e atores mantiveram contato e parceria com Baratta, como a Sociedade Brasileira
de Vitimologia, o Instituto Carioca de Criminologia (dirigido por Nilo Batista), o Instituto
Brasileiro de Ciências Criminais, de São Paulo, entre outros. Foi professor visitante, no
ano de 1995, no Curso de Pós-Graduação em Direito da Universidade Federal de Santa
Catarina, em Florianópolis.

Assim, Alessandro Baratta foi figura fundamental e polo irradiador de uma nova
criminologia por meio da manutenção do diálogo e de parcerias de recepção e
desenvolvimento crítico, simultaneamente, tanto nos países centrais como nos periféricos.
Foi “um processo sem colonizados nem colonizadores pontuais; um processo dialógico e
aberto [permitindo a demarcação] (...) de identidades e diferenças regionais e contextuais".
[1]

Estudos e pesquisa[editar | editar código-fonte]

Formou-se em Filosofia do direito na Università degli Studi di Roma (La Sapienza),


apresentando em 1957 uma tese sobre o pensamento jurídico de Gustav Radbruch – “Il
pensiero filosófico-giuridico di Gustav Radbruch” (O pensamento filosófico-jurídico de
Gustav Radbruch). Doutorou-se na mesma área de estudos também nesta universidade.
Estudou Ciências Jurídicas e Filosofia sob a orientação de Widar Cesarini Sforza, Emilio
Betti, Tulio Ascarelli e Carlo Antoni. Embora num primeiro momento Baratta tenha pensado
em trocar sua publicação, seu primeiro trabalho não foi impresso como tal, mas seus
principais resultados foram publicados dois anos depois, no artigo “Relativismus und
Naturrecht im Denken Gustav Radbruch” (Relativismo e Direito Natural em Gustav
Radbruch).

Pouco tempo depois, em 1959, fez sua estreia na Filosofia do Direito apresentando seu
importante trabalho intitulado “Natura del fato e diritto naturale” (Natureza do fato e direito
natural), trazendo grandes contribuições que atualmente são extremamente úteis na
reconstrução dos debates acerca do tema naquela época.

Seu primeiro livro foi publicado em 1963, intitulado “Antinomie giuridiche e conflitti di
conscienza” (Antinomias jurídicas e conflito de consciência). É uma contribuição crítica à
Filosofia do Direito Penal que em verdade foi uma contribuição à história da cultura
jurídica, sendo dedicado a uma exposição das doutrinas penalistas alemãs do início do
século XIX até o ano de 1933.

Seu segundo ensaio, complementar ao primeiro, é intitulado “Positivismo giuridico e


scienza del diritto penale” (Positivismo jurídico e ciência do direito penal) e foi publicado
em 1966, analisando a história do pensamento penal vigente na mesma época do trabalho
anterior, com a intenção de pôr em dúvida a responsabilidade do positivismo jurídico na
degeneração autoritária da organização jurídica alemã.

Em 1968, Baratta publica dois estudos – “Ricerche su ‘essere’ e ‘dover essere’


nell’esperienza normativa e nella scienza del diritto” (Pesquisa sobre ‘ser’ e ‘dever ser’ na
experiência normativa e na ciência do direito), o qual representa sua tentativa de se
aproximar criticamente da Escola Italiana Analítica e “Natura del fatto e giustizia materiale”
(Natureza do fato e justiça material), o qual completava sua pesquisa acerca do assunto.

No curso dos anos 70 e 80, modificando seus interesses sobre Filosofia e Sociologia do
Direito, Baratta trata do desenvolvimento de uma análise do desvio social e do processo
de criminalização feita a partir do ponto de vista da classe operária, pensamento que
representa a Criminologia Crítica. Baratta sugeriu, com base em uma política criminal
radicalmente alternativa, um direito penal mínimo, capaz de promover um processo
abrangente e gradual de descriminalização. Sua tese fundamental acerca do assunto é
intitulada “Criminologia crítica e crítica do direito penal”, de 1982, tendo ainda publicado
diversos artigos sobre o tema.

No curso dos anos 90, Baratta percebeu que o movimento havia entrado em crise, e
intentou redescobrir a questão a partir do enfoque nos direitos humanos e reinseri-lo
progressivamente em um discurso filosófico mais amplo, abarcando as necessidades e o
desenvolvimento humano.

No contexto do fim dos anos 90 e início dos anos 2000, Baratta levanta a teoria de um
Estado mestiço e de uma sociedade andrógina, desenvolvendo a ideia de um novo direito
para a infância, oferece alguns elementos para um novo constitucionalismo internacional e
ainda avança na ideia de uma nova aliança entre o homem e a natureza.

Carreira[editar | editar código-fonte]

Em 1969 torna-se professor na Università degli Studi di Camerino. Nos anos setenta,
tornou-se e foi por muito tempo professor de Filosofia do Direito na Albert-Ludwigs-
Universität, de Friburgo e na Georg-August Universität de Göttingen, Alemanha. Também
foi direitor do Institut für Rechts- und Sozialphilosophie da Universität des Saarlandes.
Teve magistério nas cátedras de Filosofia do direito, Doutrina do Estado e Direito
Constitucional na Universidade de Camerino, na Itálica. Foi docente em filosofia do direito
em universidades italianas, como naUniversità Degli Studi di Lecce, atualmente
denominada Università del Salento.

Juntamente com Franco Bricola, fundou a revista “La questione criminale” (A questão
criminal), que se torna uma das revistas jurídicas mais propagadas na Itália. Em 1983, a
iniciativa editorial é renovada, tornando-se “Dei Delitti e delle Pene” (Dos delitos e das
penas), figurando na posição de diretor. Depois de sua morte, a revista recuperou parte de
seu nome original, tornando-se “Studi sulla questione criminale: nuova série di dei delitti e
delle pene” (Estudo sobre a questão criminal: nova série dos delitos e das penas), sob a
direção dos discípulos de Baratta: Dario Melossi, Giuseppe Mosconi, Massimo Pavarini e
Tamar Pitch. A redação da revista, coordenada por Stanislaus Rinaldi, reúne uma
alavanca mais jovem dos criminalistas críticos e sociólogos do direito penal italiano como
Alessando De Giorgi, Alvise Sbraccia, Monia Giovannetti, Giuseppe Campesi, Stefania
Crocitti, Vincenzo Scalia, Francesca Vianello.Foi coordenador de diversos projetos de
investigação na Alemanha, na Itália e também na América Central.

Se dedicou muito a viajar para se encontrar com outras pessoas com quem pôde refletir e
ensinar temas de seu interesse. Se identificou muito com a América Latina, onde deixou
vários discípulos, participou como assessor para diversas reformas legislativas sobre
menores infratores e sistema penitenciário, assim como inspirou a formação do Círculo de
Estudos Sobre Criminologia Crítica da América Latina em 1985.

Na América Latina, a Criminologia de Baratta encontrou terreno particularmente fértil e


suas estadias a partir da metade dos anos setenta são inúmeras. Em torno da metade dos
anos setenta, sem deixar de ensinar Filosofia do Direito e Teoria Geral do Direito, deslocou
cada vez mais seus interesses teóricos sobre a Sociologia do Direito e em particular a
Sociologia Jurídico-Penal, chegando a desenvolver junto a Detlef Krauss e outros a
“Criminologia Crítica”, com a qual hoje costuma ser identificado.

Teoria Criminológica[editar | editar código-fonte]


Sociologia jurídica, sociologia jurídico-penal e sociologia
criminal[editar | editar código-fonte]
Antes de tudo é necessário diferenciar esses três campos de estudo.

A sociologia jurídica relaciona-se diretamente às estruturas normativas sociais e às


condições e efeitos das normas jurídicas. Tem como objeto de estudo tanto a relação entre
mecanismos de ordenação do direito e da comunidade quanto à relação entre o direito e
outros setores da ordem social.

A sociologia jurídico-penal estuda os comportamentos representativos da reação social


(institucional e não institucional) frente a uma conduta desviante, os fatores que
condicionam a reação e seus efeitos e as implicações funcionais da reação na estrutura
social.

Já a sociologia criminal estuda o comportamento desviante que tenha relevância penal,


sua gênese e sua função dentro da estrutura social.

A sociologia jurídico-penal e a sociologia criminal se sobrepõem necessariamente no que


diz respeito ao desvio e a reação social (institucional ou não) – seus pontos de encontro.

Microssociologia e macrossociologia[editar | editar código-fonte]


São dois tipos de perspectivas utilizadas no momento de se realizar uma análise.

A macrossociologia tem um discurso universalista, especulativo e apriorístico.


A microssociologia tem um discurso construído com base em dados empíricos,
metodologias experimentadas, acompanhados por uma função critica em face de
ideologias e da realidade social que se estuda.

A “nova criminologia” de Baratta tenta unir essas duas perspectivas, adotando a


microssociologia quanto ao objeto e a macrossociologia quanto à estrutura
socioeconômica, tendo como foco o fenômeno do desvio. Ela também tem a tarefa
fundamental de realizar a critica da realidade social, além de ser tributária a toda uma
tradição clássica de pensamento sociológico que foi evoluindo, e sobre o qual Baratta tece
suas críticas.

Crítica ao direito penal[editar | editar código-fonte]


Escola liberal clássica (séculos XVIII e XIX)[editar | editar código-fonte]

São os pioneiros da moderna criminologia, recebendo grande influencia da filosofia política


liberal clássica, como por exemplo, os conceitos de pacto social, Estado de direito, divisão
de poderes e o princípio utilitarista da máxima felicidade do maior número.

Foram os responsáveis pela construção da ciência penal por meio de formulações


pragmáticas. Diferenciam-se e substituem a pratica penal do Antigo Regime por uma
política criminal inspirada em princípios.

O delito é seu objeto de estudo enquanto violação de direito e ente juridicamente


qualificado. Em sua concepção, ele surge como uma livre vontade do indivíduo de acordo
com a ideia de responsabilidade moral. O fato do delito é abstraído do seu contexto
ontológico e da totalidade social e natural em que o delinquente se insere (“objetividade do
delito”). O delinquente não é visto como diferente do sujeito considerado normal.

Direito penal e pena seriam os mecanismos da defesa social, isto é, os instrumentos legais
para defender a sociedade do crime (dano social) de acordo com a necessidade e a
utilidade da pena.

Destacam-se autores como Cesare Beccaria e Francesco Carrara. Este último defendia
que a função da pena seria a defesa social e que o fim da pena não era a retribuição, mas
a eliminação do perigo social. A reeducação do condenado seria apenas um resultado
acessório e desejável, mas não essencial.

Criminologia positivista (séculos XIX e XX)[editar | editar código-fonte]

Corresponde a primeira fase do desenvolvimento da criminologia enquanto disciplina


autônoma. Foi influenciada pela filosofia e sociologia do positivismo-naturalismo.

Estuda as causas e os fatores da criminalidade enquanto paradigma etiológico a partir de


características biológicas e psicológicas, portanto, tem como base um rígido determinismo
(negação do livre arbítrio). Entende o fenômeno criminal como um dado ontológico pré-
constituído à reação social e ao direito penal. Tem a pretensão de individualizar “sinais”
antropológicos de criminalidade, ou seja, individualizar as causas e os fatores que
determinariam o comportamento criminoso e, por consequência, a individualização de
medidas adequadas para intervir sobre o sujeito (correcionalismo). Portanto, afirma que há
diferenças entre sujeitos “criminosos” e “normais”.

O conceito de delito, inicialmente, era o de um ente natural determinado por causas


biológicas. Depois ele foi ampliado para fatores antropológicos, fatores físicos e fatores
sociais. A responsabilidade moral é substituída pela responsabilidade “social” e a pena é
reafirmada como meio de defesa social.

Destacam-se a “Escola social” na Alemanha, de Franz von Liszt, a “Escola positivista” na


Itália e o autor Cesare Lombroso.

Criminologia contemporânea (dos anos 30 em diante)[editar | editar código-fonte]

Busca superar as teorias patológicas da criminalidade, o determinismo e a consideração


de que o delinquente seria um indivíduo diferente.

A ideologia da defesa social[editar | editar código-fonte]

Tanto na Escola liberal clássica quanto na Criminologia positivista verifica-se a presença


da ideologia da defesa social como o nó teórico e político fundamental do sistema
científico penal.[2]

Seu conteúdo passou a ser incorporado pela filosofia dominante na ciência jurídica, pelos
representantes do aparato penal penitenciário e também pelo homem comum. Em virtude
da sua aceitação acrítica, surge a sensação de que se está do lado justo e a favor de uma
ciência e práxis penal racional.

A defesa social pode ser traduzida em diversos princípios que fundaram a ciência e a
dogmática penal: princípio da legitimidade, princípio do bem e do mal, princípio da
culpabilidade, princípio da finalidade ou da prevenção, princípio da igualdade e princípio do
interesse social e do delito natural. Entre eles, destaca-se o princípio da culpabilidade,
relativo ao aspecto interior do delinquente, o qual adquire um significado moral-normativo
traduzido em desvalor e condenação moral, para Escola clássica, e em fatores
sociopsicológicos reveladores da periculosidade social, para a Criminologia positivista.

O princípio do interesse social e do delito natural fundamenta-se na premissa de que o


direito penal defende interesses comuns a todos os cidadãos. Para Baratta, essa
concepção é egoísta, vez que pressupõe que os tipos penais consistem em violações aos
interesses próprios de toda a coletividade, em uma perspectiva aistórica, além de supor
homogeneidade dos valores e dos interesses protegidos pelo direito penal. Desse modo, a
ideologia da defesa social representa um notável atraso em relação às teorias sociológicas
da criminalidade - cujo olhar critico e avançado sobre a ciência penal busca a superação
deste conceito.
Teorias sociológicas contemporâneas sobre a criminalidade [editar | editar código-
fonte]

As teorias sociológicas contemporâneas sobre a criminalidade estão inseridas,


basicamente, no campo da sociologia criminal burguesa, também denominadas teorias
“liberais”[3] , que, por sua vez, são distintas tanto das teorias da criminologia critica cuja
inspiração é, em parte, marxista, quanto das teorias liberais clássicas dos séculos
passados.

Caracterizam-se por serem racionalistas, reformistas e progressistas, pertencentes ao


pensamento burguês contemporâneo. São responsáveis por combater cada um dos
princípios oriundos da ideia de defesa social, como se verá nos tópicos seguintes.

Têm em comum a critica sobre o conceito de defesa social, defendendo que essa
ideologia corresponde a uma “concepção abstrata e aistórica de sociedade, entendida
como uma totalidade de valores”[3] , isto é, a um ideal de sociedade.

Por outro lado, falham ao não promover o diálogo entre seus conceitos e o contexto
histórico, econômico e social especifico, não os situando pontualmente. Assim, as teorias
“liberais” contemporâneas também acabaram se revelando universalizantes e aistóricas.

Teorias psicanalíticas da criminalidade e da sociedade punitiva como negação do Princípio


da legitimidade[editar | editar código-fonte]

 Princípio da legitimidade: o Estado, enquanto expressão da sociedade e de seus


valores, tem legitimidade para reprimir a criminalidade através de mecanismos oficiais
de controle social.

Podem ser dividas entre Teorias psicanalíticas da criminalidade e Teorias psicanalíticas da


sociedade punitiva. As primeiras tentam explicar o comportamento delituoso a partir da
teoria freudiana da neurose, ou seja, trata-se de uma explicação etiológica do
comportamento criminoso[4] . E afirma que com o comportamento delituoso o indivíduo
supera o sentimento de culpa e tem a tendência a confessar, o que representaria a
negação do conceito de culpabilidade e, portanto, do princípio da culpabilidade. As
segundas têm foco na pena de acordo com uma “interpretação funcional da reação
punitiva”[4] . Destacam o efeito catártico da pena em razão da identificação da sociedade
com o delinquente.

Apresenta a concepção retributiva e a concepção punitiva da pena, a qual não passaria de


uma racionalização de fenômenos psicológicos do inconsciente humano. Assim, colocam
em duvida o princípio da legitimidade e a própria legitimidade do direito penal.

No entanto, as teorias psicanalíticas da criminalidade revelaram-se insuficientes, pois não


conseguiram superar os limites da criminologia tradicional, apresentando-se até mesmo de
maneira semelhante às teorias de orientação positivista. Basicamente porque não foram
capazes dar à sua analise um significado dentro de um contexto historicizante necessário
das relações socioeconômicas, mantendo, de certa forma, a visão aistórica e
universalizante com que são interpretados conceitos meramente subjetivos e psicológicos
tanto do comportamento criminoso como da reação punitiva.

Teoria estrutural-funcionalista do desvio e da anomia como negação ao Princípio do bem e


do mal[editar | editar código-fonte]

 Princípio do bem e do mal: o delito é um dano social e o delinquente um elemento


negativo e disfuncional do sistema. Assim, delito está para o mal, enquanto a
sociedade está para o bem.

São efetivamente a primeira alternativa às teorias positivistas naturalistas de orientação


biopsicológica e antropológica. É nesse sentido que o princípio do bem e do mal, pautado
pela disfuncionalidade do delinquente, é contrariado.

Postulam que o desvio é um fenômeno normal de qualquer organização social, portanto,


inevitável, e que somente na situação de anomia ele seria prejudicial para a existência e
desenvolvimento da sociedade. Na verdade, o desvio seria um fator necessário e útil para
o equilíbrio e o desenvolvimento da sociedade, dentro de sua perspectiva funcional.

Anomia corresponde a um estado de desorganização e desproporção entre normas e fins


culturais de tal forma que todo sistema de regras de conduta perca seu valor na medida
em que um novo ainda não foi constituído.

Durkheim é um dos autores que se destaca. Para ele, “O delito faz parte, enquanto
elemento funcional, da fisiologia e não da patologia da vida social. Somente suas formas
anormais [...] podem ser consideradas patológicas” [5] . Além disso, o delito seria o
responsável por provocar e estimula a reação social, fortalecendo laços coletivos de
solidariedade, tornando possível a transformação e a renovação social. O delito também
teria um papel no desenvolvimento moral de uma sociedade: ele seria responsável pela
antecipação da moral futura.

Robert Merton é outro autor que se destaca. De acordo com seu modelo funcionalista, o
desvio é o fruto de uma contradição entre estrutura social e cultural. A desproporção entre
fins culturalmente validos e os meios institucionais legítimos que estão à disposição de
cada indivíduo de forma desigual na sociedade, de acordo com sua camada social, pode
ser a origem do comportamento delituoso. Assim, o indivíduos podem se portar de maneira
conformista ou desviante, de tal forma que aqueles que pertencem a um estrato social
inferior estão mais propensos ao comportamento desviante.

Contudo, Baratta critica a concepção de Merton trazendo para a discussão os crimes de


colarinho branco, isto é, aqueles cometidos por indivíduos das camadas sociais mais
abastadas e que dificilmente são pegos e punidos. Este tipo de crime contraria a teoria de
Merton, a qual também se revela superficial e insuficiente para explicar e analisar o
fenômeno da criminalidade. Seu erro também foi a falta de nexo com estruturas dos
processos de produção e de circulação do capital, assim como a falta de uma perspectiva
social critica, o que acaba propiciando a legitimação e consolidação da criminalidade como
própria do comportamento das camadas pobres da sociedade, reforçando a imagem
tradicional de delito.

Teoria das subculturas criminais e a negação do Princípio de


culpabilidade[editar | editar código-fonte]

“Princípio de culpabilidade: o delito é a expressão de uma atitude interior reprovável,


porque contraria aos valores e às normas, presentes na sociedade antes mesmo de serem
sancionadas pelo legislador”[6]

Percebe-se uma relação de compatibilidade e de integração entre a teoria funcionalista e a


teoria das subculturas criminais a partir do conceito de distribuição social das chances, isto
é, oportunidades de acesso aos meios legítimos para alcançar os fins culturais. Assim, as
subculturas criminais se desenvolveriam no âmbito de grupos marginalizados e minorias
desfavorecidas que tentam se adaptar dentro da sociedade frente as possibilidades
legitimas reduzidas de que dispõem, desenvolvendo, portanto, normas e modelos de
conduta próprios considerados desviantes em relação ao padrão oficial. As subculturas
surgiriam, então, como uma forma de exprimir e justificar a própria frustração social de
adaptação aos standards da cultura oficial a partir de mecanismos de aprendizagem e de
diferenciação dos contatos.

Esta teoria consegue tratar a questão dos crimes de colarinho branco com maior
propriedade pois eles seriam, em sua concepção, uma forma de delinquência sistemática
como qualquer outra e que, portanto, pode ser aprendida. Assim, tornar-se criminoso seria
determinado pelo grau de frequência e de intensidade das relações que se tem com esse
tipo de comportamento[7] (“teoria das associações diferenciais” de Edwin H. Sutherland).

A teoria das subculturas criminais se opõe ao princípio da culpabilidade uma vez que nega
que o delito seja uma ação contrária aos valores e as normas sociais gerais. Na verdade,
os valores e normas sociais positivados no direito penal são aqueles referentes a um
grupo social especifico: o dos legisladores, da magistratura, da policia, das instituições
penitenciárias. Assim, o direito penal é fruto de uma seleção e não de regras e valores
aceitos de forma unânime pela sociedade, já que não existe um único sistema de valores,
mas vários sistemas concorrentes ao institucionalizado pelo direito e pela moral “oficiais”.

Nesse sentido, ambas as teorias – funcionalista e das subculturas – contribuíram para a


relativização dos valores e regras previstos no direito penal, negando a suposta existência
de um mínimo ético - de uma responsabilidade ética individual -presentes na sociedade
antes mesmo de serem sancionadas pelo legislador, como consta no princípio da
culpabilidade. =====

 Uma correção da teoria das subculturas criminais: a teoria das técnicas de


neutralização
A teoria das subculturas foi corrigida pela chamada teoria das técnicas de neutralização,
isto é, por meio da racionalização e da justificação do comportamento desviante aprendido
consegue-se neutralizar, de certo modo, os valores e as normais sociais “oficiais” que,
apesar de tudo, o delinquente adere, ainda que parcialmente.

Ainda assim, a teoria das subculturas herdou um paradigma etiológico das teorias
estrutural-funcionalista. Ambas erraram ao aceitar acriticamente a condição de
criminalidade sem questionar as condições de desigualdade econômica e cultural e o
significado histórico do fenômeno da criminalidade.

Essas teorias restringem sua analise ao nível sociopsicológico das aprendizagens e das
reações de grupo, apenas pontuando de maneira muito vaga e descritiva as condições
econômicas em que as subculturas estão inseridas. Trata-se de uma teoria de médio
alcance, limitada a um quadro socioeconômico estrutural do qual parte e permanece,
ficando presa dentro de seus próprios limites e contexto explicativo. Parece aceitar tais
condições como limite ao mesmo tempo em que universaliza o fenômeno do delito e a
reação punitiva.

As teorias do “Labeling Approach”, ou teorias da “reação social”, como negação do


Princípio da finalidade ou da prevenção[editar | editar código-fonte]

 Princípio da finalidade ou da prevenção: a pena tem a função de retribuir, ressocializar


e prevenir o crime, de modo a criar uma contramotivação ao comportamento
criminoso.

O que distingue a nova sociologia criminal, onde as teorias do labeling approach estão
inscritas, da criminologia tradicional é a sua abordagem critica em relação a definição de
“criminalidade” e de “criminoso” que, em sua perspectiva, são construídos em torno do
conceito de processos de criminalização. Eles não são fixados como ponto de partida da
análise enquanto realidade dada, mas são considerados dentro de uma realidade social
que se constrói mediante processos de interação, ou seja, “uma realidade social que não
se coloca como pré-constituída”{{sfn|Baratta|1999|pp=86}.} Em razão dessa concepção,
olabeling approach é considerado um momento de ruptura dentro das ciências criminais,
ainda que a teoria ainda pertença a criminologia etiológica.

As teorias do labeling approach têm como foco central o problema da definição de delito a
partir de questionamentos como: quem é definido como desviante, quem define e como se
define o que é desvio, quais são os efeitos dessa definição para o desviante, etc. Assim, o
status social de delinquente que lhe é imputado pressupõe a reação de instâncias oficiais
e de agentes de controle social responsáveis pelo processo de criminalização,
etiquetamento e estigmatização do indivíduo.

Para lidar com isso, o labeling approach aponta para duas direções: uma voltada ao
estudo da formação da “identidade” do criminoso a partir do conceito de desvio secundário
(responsável pela aplicação da etiqueta de criminoso). A outra voltada a definição de
desvio como qualidade atribuída a comportamentos e indivíduos, o que, por consequência,
também gera a discussão sobre a distribuição do poder de definição, isto é, quais agentes
sociais detém o poder de definir e qualificar o que é crime. Assim, existe a dimensão da
definição e a dimensão do poder, ambas constitutivas do paradigma do controle.

Os processos de definição não se limitam àqueles oriundos das instâncias oficiais de


controle social, mas abrangem também os processos de definição do senso comum, isto é,
não oficiais, que se realizam antes mesmo da intervenção das instâncias oficiais. Ao lado
das normas sociais gerais (normas jurídicas e éticas, por exemplo) existem
normas/praticas interpretativas do senso comum responsáveis pelo processo de
qualificação do que é ou não um comportamento desviante e de atribuição de
responsabilidade moral ao criminoso. E, para desencadear tal reação social, o
comportamento desviante deve ser capaz de perturbar e infringir aquilo que se entende
como habitual, ou seja, deve gerar indignação moral, embaraço, irritação. Daí se conclui
que “o simples desvio objetivo em relação a um modelo, a uma norma, não é
suficiente”[6] para que o indivíduo seja etiquetado como criminoso. Dessa forma, cometer
um ato desviante não é condição para ser etiquetado como criminoso. A diferença entre os
criminosos e os não criminosos é justamente o etiquetamento.

Os efeitos da punição e da reação social são responsáveis por estigmatizar o indivíduo


qualificado como desviante, o qual tem a tendência a permanecer no papel social a que foi
introduzido pela estigmatização. Isso coloca em duvida o princípio da finalidade ou da
prevenção quanto a suposta função de ressocialização e reeducação da pena. Na
verdade, os efeitos da reação social e da intervenção do sistema penal determinam a
formação e consolidação da identidade desviante do sujeito (estigma) e o seu ingresso na
carreira criminosa.

Essas teorias, por outro lado, também se revelam teorias de médio alcance, uma vez que
reduzem sua análise aos efeitos das definições legais e dos mecanismos de
estigmatização/etiquetamento e de controle social. A análise das relações sociais e
econômicas, que são a chave para o desenvolvimento da questão criminal, é desenvolvida
de maneira insuficiente, superficial, sem adentrar no nível da lógica material. Portanto,
trata-se também de uma teoria limitada ao seu próprio contexto explicativo.

A recepção alemã do “Labeling approach” e a negação do Princípio de


igualdade[editar | editar código-fonte]

 Princípio da igualdade: a lei penal é igual para todos, portanto é aplicada de modo
igual aos agentes criminosos. A criminalidade é o comportamento dessa minoria
desviante.[7]

Diversos autores alemães tiveram contato com as teorias do labeling approach, como é o
caso do próprio Baratta, e passaram a contribuir modificando-as, corrigindo e adicionando
novas perspectivas.
Adotar a perspectiva macrossociológica foi fundamental para analisar a lógica das
relações de poder e da desigual distribuição de bens e de oportunidades entre os diversos
grupos sociais. A criminalidade aqui é entendida não como um comportamento, mas como
um “bem negativo”, o oposto de um privilégio, e como tal, é submetida a mecanismos de
distribuição análogos àqueles dos bens positivos e dos privilégios [8] . Por isso que há um
“processo de filtragem” da população criminal, o qual se concentra em torno dos
estereótipos da criminalidade, isto é, das classes inferiores mais prejudicadas pela lógica
funcional e material do capitalismo, mediante a influencia e orientação dos órgãos e
instituições oficiais responsáveis pela produção e manutenção de tal realidade. É nesse
sentido que é possível entender os crimes de colarinho branco, cujos atores pertencem a
uma camada social economicamente e socialmente privilegiada e que, por isso, estão
praticamente imunes aos processos de criminalização e estigmatização.

Portanto, o conceito de criminalidade é corrigido ao apontar que não se trata de um


comportamento restrito a uma minoria, mas sim um comportamento difundido e presente
em todos os estratos sociais. É por esse motivo que o princípio da igualdade também é
posto em cheque, uma vez que essa atribuição de status por parte daqueles que detém o
poder de criar e aplicar a lei penal, mediante mecanismos seletivos, nada mais é do que o
reflexo de uma estrutura e funcionamento da estratificação social e da desigual distribuição
dos meios de produção e de oportunidades.

Contudo, a critica de Baratta persiste: esta teoria tem a pretensão de analisar as condições
da realidade e da estrutura socioeconômica presentes no fenômeno do controle social, no
entanto, seu conteúdo é vazio, meramente teórico e descritivo. Trata-se, novamente, de
uma teoria de médio alcance em que falta a indicação de caminhos objetivos e
estratégicos para a transformação da estrutura lógica e material presente.

Teoria do conflito acerca da criminalidade[editar | editar código-


fonte]

Baseadas na sociologia do conflito, com as obras de Dahrendorf e Coser, as teorias da


conflitualidade negam o princípio do interesse social e do delito natural afirmando que os
interesses tutelados na elaboração e aplicação do direito penal são os interesses dos
grupos que têm o poder de influir sobre os processos de criminalização. Nesse sentido, a
criminalidade e o direito penal têm natureza política, uma vez que são realidades criadas
através dos processos de criminalização. Desenvolve-se em um horizonte
macrossociológico possibilitado por meio da sociologia do conflito, que critica o modelo
estrutural-funcionalista (ênfase na estabilização e conservação do sistema). Segundo esta
sociologia, é preciso entender o conflito não como um desvio de um sistema equilibrado,
mas como algo normal em todas as sociedades, já que estas não se encontram unidas por
consenso, mas por coação. Este modelo sociológico é formado, pois, por mudança,
conflito e domínio. Os conflitos surgem não pela disputa nas relações materiais, e sim
como resultado de uma relação política de domínio. Para Dahrendorf a relação de domínio
cria o conflito, que cria uma mudança social. Em um sentido formal, seria a base do
domínio que estaria em disputa dentro do conflito social. O ponto de partida do conflito
seria a esfera política, sendo o conflito consequência das relações políticas de domínio.
Para Coser, o conflito é funcional, posto que gera a mudança social e também porque
contribui para a integração e conservação do grupo social. O poder seria um dos objetos
de conflito, dentre outros bens. Temos, pois, como elementos principais da criminologia do
conflito: precedência do processo de criminalização sobre o comportamento criminoso;
relação entre comportamento criminoso e interesses e atividades dos grupos sociais em
conflito e caráter político de todo o fenômeno criminal.

Baratta assevera que esta análise, em certo sentido, considera somente os elementos que
agem no momento de formação da lei, desconsiderando a (não menos importante)
seletividade no momento de sua aplicação. Apresenta, além disso, caráter conformista,
tomando por iguais mudanças de estrutura e mudanças de governo. Em terceiro lugar, as
teorias de Dahrendorf e Coser mantêm o modelo de equilíbrio, uma vez que o conflito é
uma integração deste. Há, na verdade, uma integração entre conflito e equilíbrio.

As variáveis consideradas nessa teoria são: o grau de organização, o grau de refinamento


e o grau de interiorização das normas (consenso). Assim, “a questão criminal acaba por
assemelhar-se a uma partida de xadrez entre jogadores mais ou menos “refinados”, com
lances mais ou menos “realistas”"[9] . Esta teoria não vai além de uma descrição simples de
que o sistema penal é seletivo. Não enxerga a relação entre o processo de criminalização
e o processo de acumulação, com consequente formação de zonas de desocupação e
subocupação. O papel do Estado e do direito na determinação do conflito faz com que este
seja institucionalizado. Deste modo, a parcela da sociedade cujas lutas não encontraram
mediação política permanecem encobertas.

A criminologia liberal e sua superação[editar | editar código-fonte]


As teorias analisadas acima pertencem à corrente da criminologia liberal e foram
especialmente importantes por substituir uma compreensão biopsicológica do crime (da
criminologia tradicional, positivista) pela análise de diversos outros fatores, tais como: o
caráter funcional da criminalidade, sua dependência de mecanismos de socialização e a
seletividade do sistema penal e a estigmatização de indivíduos. Todas combateram
apenas algumas das facetas da problemática do delito natural; a criminologia crítica surge,
pois, para combatê-la por inteiro e se dirige, principalmente, para a refutação da tese da
universalidade do delito.

As teorias liberais descortinaram que as políticas criminais adotadas correspondem às


exigências do capital monopolista e possuem as seguintes características: máximo
controle sobre os desvios disfuncionais ao sistema de acumulação capitalista (daí a ênfase
nos crimes patrimoniais) combinado à mínima transformação do sistema e imunização dos
comportamentos danosos socialmente ilícitos que exprimem apenas contradições dos
grupos hegemônicos (como os delitos econômicos concorrenciais, por exemplo). Assim,
verifica-se o atraso da dogmática penal em face do desenvolvimento da sociologia
criminal. Isso, em parte, se deve ao fato de que o papel dos juristas perde relevo no atual
sistema de controle social do desvio. Isso porque se enfatizam mecanismos de controle
não penais (sanções administrativas; assistência social considerada em seu âmbito de
controle etc) e também não jurídicos (a propaganda, o mass media e a publicidade, que
tem o papel de regular as atitudes e as ideias).

Seria esse atraso do direito penal em relação às ciências sociais recuperável? A tese do
autor é de que não. Não é possível reconstruir um modelo de ciência penal fundado no
caráter auxiliar das ciências sociais. A ciência jurídica formal não tem condições de
superar sua própria ideologia – de essência conservadora. Assim, Baratta sustenta que a
relação entre ciência social e o discurso dos juristas não deve ser vista como interação
entre duas ciências, mas entre ciência e técnica. A técnica jurídica consistiria na
elaboração de instrumentos legislativos, interpretativos e dogmáticos em vista de ações
político-criminais. Isto não significa a redução do jurista a técnico da sociedade. Será
cientista, e não técnico, na medida em que seu saber científico estará calcado nas ciências
sociais. Assim, a compreensão das ciências sociais poderá sustentar sua obra de técnico.

Que tipo de ciência social pode assumir esse papel crítico e reconstrutivo? Uma ciência
comprometida com a transformação da realidade, no sentido de resolução das
contradições que constituem a lógica do modo capitalista de produção. Assim, o interesse
pela transformação deve guiar a ciência na construção das próprias hipóteses e dos
próprios instrumentos conceituais, desenvolvendo a consciência das contradições
materiais. Para o autor: “isto significa que, em uma ciência dialeticamente comprometida
no movimento de transformação da realidade, o ponto de partida, o interesse prático por
este movimento, e o ponto de chegada, a práxis transformadora, estão situados não só na
mente dos operadores científicos, mas principalmente nos grupos sociais portadores do
interesse e da força necessária para a transformação emancipadora”. [10] . Isto porque na
atual fase capitalista, o interesse das classes subalternas é o ponto de vista a partir do
qual se coloca uma teoria social comprometida.

Teoria funcionalista sistêmica[editar | editar código-fonte]


Baratta estende sua crítica à teoria funcionalista sistêmica de Günther Jakobs, a qual parte
da teoria dos sistemas sociais de Niklas Luhmann. Jakobs sustenta que a pena não possui
a função de prevenir delitos (prevenção negativa), mas sim de garantir a vigência da
norma (prevenção positiva). Desta maneira, a norma é colocada como centro dos
interesses, fato que acaba por excluir a tutela de bens jurídicos, visto que,
independentemente do bem jurídico violado, a violação resultará sempre em uma lesão à
própria norma.

Na visão crítica de Baratta, neste sistema a pena obedece uma função de prevenção-
integração, pois sua função primária é exercitar o reconhecimento da norma e a fidelidade
ao Direito pelos membros da sociedade. Tal processo acarreta uma despersonalização do
indivíduo, uma vez que deixa de ser o centro dos interesses do sistema penal. Para
Baratta, a teoria de Jakobs funda uma nova ideologia para fundamentar e legitimar a pena,
sem levar em consideração a repercussão dos efeitos negativos que esta provoca ao
infrator, não trazendo a possibilidade de solução dos conflitos através de alternativas mais
funcionais do que a pena.

Processo Penal[editar | editar código-fonte]


Sendo o Direito uma espécie de linguagem técnica científica, este apresenta uma estrutura
altamente especializada que corresponde às suas operações práticas. O Direito faz uma
construção dos comportamentos dos indivíduos em linguagem jurídica. Esta construção
traz artificialidade abstração ao mundo jurídico, uma vez que este reconstrói os fatos da
realidade e os significados dos fatos, provocando um distanciamento entre abstrato e
concreto. Isto se evidencia no processo penal, no qual se trata do conflito e se inserem
personagens como o juiz e o representante do Ministério Público.

Para Baratta, os conflitos privados tornam-se interesse público, não há qualquer


possibilidade de conciliação entre vítima e acusado e a aplicação da pena acaba com
qualquer possibilidade de reparação e recuperação do acusado. No processo penal, o
conhecimento dos conflitos se reduz ao conhecimento de seus sintomas visíveis, e tais
conflitos não são resolvidos, apenas reprimidos.

No entanto, deve ser mantida a prática na qual se isola uma ação voluntária do acusado e
se concentra nela a aplicação da pena. Isto porque é uma técnica indispensável para a
limitação da responsabilidade penal. Entretanto, neste processo, o jurista e o juiz devem
estar conscientes da distância que existe entre o modo de interpretação do conflito e a
realidade dos fatos, agregando uma interpretação acerca do contexto no qual se deu o fato
e das condições sociais do acusado. Baratta chama isto de “opção crítica”, na qual se
desenvolve uma consciência adequada sobre a distância entre abstrato e concreto. O juiz
ainda precisa fugir de preconceitos e estereótipos derivados do senso comum.

Política criminal e segurança[editar | editar código-fonte]


Anteriormente a política criminal tinha por finalidade o controle do crime, ou seja, reduzir o
número de infrações penais. Hoje, engloba também o controle das consequências do
crime e sua prevenção. Este conceito possui grande dificuldade de definição teórica na
medida em que pode variar muito seu campo de atuação conforme seu grau de
elaboração.

A ideologia penal, aqui num sentido negativo, como um “programa de ação penal”, coloca
obstáculos ao conhecimento das implicações reais das políticas e à criação de políticas
alternativas na medida em que se baseia em clichês e ao invés de criticar legitima a
realidade social. A Crítica ideológica e participação da sociedade civil são pressupostos
necessários para a transformação da política de controle de infrações delitivas e da
criminalização. Grande exemplo disso foi o Direito Penal da América do Sul nos anos 70 e
80 que, com base numa ideia de defesa da segurança nacional, se tornou um direito penal
do inimigo, além da criação de um direito penal paralelo, sanguinário, que era verdadeira
forma de realizar terrorismo de Estado.

A própria ideia de segurança engloba apenas determinados delitos (contra a vida e


patrimônio principalmente) e são esses que causam o medo da criminalidade. Resulta
numa divisão social dos respeitáveis (as vítimas) e perigosos (os pobres, delinquentes), As
agressões às mulheres no ambiente doméstico, a limitação de direitos econômicos que
sofre o grupo dos perigosos não entra no cálculo da segurança pública (assim como
corrupção, delitos ecológicos, econômicos, etc.). Em matéria de política, tanto criminal
quanto pública, o conceito de segurança deve ser encarado de maneira objetiva (ter seus
direitos assegurados) e não subjetiva (sentir-se seguro). A segurança é um bem público e
não privado o que quer dizer que não há um direito a segurança e sim a segurança dos
direitos.

As políticas públicas atuais têm como finalidade a satisfação do grupo das “vítimas”, isto é,
a redução da criminalidade que subtrai seus direitos, e como objeto a ação dos
“perigosos”. Garantem-se direitos à classe delinquente somente com a intenção de que
estas não se rebelem por meio da criminalidade e, consequentemente, restrinjam os
direitos da classe vítima.

Além disso, se observa hoje um aumento da ideia de eficientismo penal criando o direito
penal da emergência. A crise do sistema econômico social e dos partidos do sistema
representativo levaram a uma pretensão de abandono da subsidiaridade e virada para a
primeira forma de resolução de qualquer problema social. Deseja-se uma resposta mais
punitiva e mais rápida para os conflitos sociais e para isso exige-se uma mitigação do
garantismo. Em nome da segurança subjetiva se diminui a segurança objetiva e a busca
incansável desta primeira ignora o fato de que o Direito Penal é incapaz de resolver os
conflitos de maneira real e que a fragmentação dos interesses que devem ser defendidos
e a seletividade repressiva fazem com que o sistema cumpra sua função em, no máximo,
5% dos casos.

Sistema penal e violência institucional[editar | editar código-fonte]


Todo o indivíduo é portador de necessidades reais, este entendido como potencialidades
de existência e qualidade de vida, os quais correspondem a um determinado grau de
desenvolvimento da capacidade de produção econômica e cultural.

A verdadeira violência seria a repressão das necessidades reais. Como elas estão
asseguradas através dos direitos humanos no ordenamento jurídico, é certo afirmar que a
violência seria a violação desses direitos. No direito penal, entretanto, a violência que ele
propõe combater é uma construção social, sendo a violência criminal uma parcela das
demais violências existentes, como a estrutural, a individual, internacional, etc.

Ademais, o sistema penal provou-se incapaz de garantir a segurança já que a pena,


principal instrumento de prevenção da criminalidade, falha completamente em sua função
preventiva negativa geral e positiva especial e este só intervém sobre os efeitos, sobre os
resultados e não sobre as causas do conflito social; atua contra pessoas e não contra
situações e, através da culpabilidade, diz que as pessoas não são dependentes da
situação social em que estão inseridas; tem atuação reativa e não preventiva. Não apaga a
ofensa, funciona simbolicamente como forma de vingança e protege mais que às vitimas a
validade da norma. A pena seria uma repressão aos direitos humanos, sendo notório a sua
aplicação aos grupos marginalizados desde o primeiro contato com a polícia.

Desse modo, entende-se o sistema punitivo como um sistema de violência institucional,


cuja lógica de imunidade/criminalização é um reflexo da desigualdade nas relações de
propriedade e poder.

Criminalidade[editar | editar código-fonte]


O conceito de criminalidade é resultado do processo subjetivo de definições e atribuições
valorativo e da esfera material da realidade. Este último dá ensejo a três questões,
condições estruturais do processo, o referente material e os seus efeitos na reprodução
lógica da sociedade. Destaque para o referente material ou comportamento socialmente
negativo que consiste na ameaça a satisfação de necessidades reais dos seres humanos.

Os efeitos latentes da criminalidade, em sentido comum, devem ser analisados sobre o


prisma de sua relação com os demais problemas sociais. A primeira função é a
de manegement, que se subdivide em relação de parcialidade e relação de substituição.

A primeira consiste no fato de que o processo de criminalização seleciona, dentro de uma


gama de problemas com o mesmo referente material, aqueles aos quais será aplicada a
etiqueta da criminalidade. Esse processo seletivo de referentes materiais como
criminalidade tem o efeito ideológico de alienar a consciência comum aos demais
problemas sociais, deixando de fora da opinião pública a maior parte das violências, que
não são abarcadas pela violência criminal, exercidas por homens a outros homens e do
Estado sobre os indivíduos. A segunda seria a influência que a criminalidade desempenha
na hierarquia de gravidade dos problemas sociais. A partir de uma construção social, a
criminalidade estaria em um posto relativamente alto na escala subjetiva dos problemas
sociais, o que permite às elites detentoras do poder distrair os demais grupos dos
problemas sociais, que poderiam ameaçar colocar em crise o equilíbrio que as possibilitam
permanecerem em seus postos, junto com seus privilégios.

A segunda função seria a de legitimação, fracionada em função de conservação e


reprodução da estrutura material e em função de estabilização social. Na função de
conservação e reprodução, o estereótipo de criminoso seria o reflexo da imagem do sujeito
pertencente às camadas marginalizadas, a criminalidade tem um papel importante no
mecanismo de produção das relações sociais de desigualdade. A função de estabilização
social parte de dois efeitos da pena: a estigmatização do desviado, ao “etiquetá-lo” como
delinquente, reforçando o consenso dos grupos, tidos como “homens corretos”, no poder,
e também do distanciamento sócia aos indivíduos, vítimas do sistema, reduzindo a
solidariedade entre os sujeitos criminalizados e aqueles que não são atingidos pelo
processo de criminalização. Esse dois efeitos podem ser considerados como um
contribuição importante para o isolamento de uma parte da população e concentram neles
toda a negatividade da sociedade, reforçando a estrutura ideológica que divide as classes
subalternas ao instituir um limite artificial entre cidadãos conforme e grupos
marginalizados.

Cárcere e marginalidade social[editar | editar código-fonte]


Baratta acredita que a própria estrutura do cárcere impossibilita que este sirva de estímulo
à reeducação e reintegração social. Nesse sentido, as inovações legislativas não parecem
destinadas a transformar de fato a natureza das instituições carcerárias. O cárcere não
reeduca e nem poderia reeducar porque:

 Educação pressupõe individualidade e respeito ao indivíduo. No cárcere, toda


individualidade é aniquilada: há padrões de vestuário, de linguagem e comportamento.
A vida no cárcere tem caráter repressivo e uniformizador.
 Há um processo de aculturação, i.e, desadaptação à vida em liberdade, pois há
diminuição da força de vontade e perda do senso de autorresponsabilidade e
formação de imagem ilusória da realidade do mundo externo; e um processo de
aculturação, ou seja, de assunção dos valores do cárcere, baseados na educação
para ser criminoso (exemplo do poder das facções na moldagem comportamental) e
para ser bom preso (adaptação às normas internas, tanto as formais quanto informais,
do cárcere). Aliás, é nesse último aspecto que consiste o objetivo da instituição: formar
bons presos. Nesse jogo não há lugar para efetiva reeducação. Quando iniciativas
nesse sentido são tomadas, favorecem a formação de processos de conformismo e
oportunismo.

A relação entre preso e sociedade é aquela entre quem exclui e quem é excluído e não se
pode ao mesmo excluir e incluir.“ A verdadeira reeducação deveria começar pela
sociedade, antes que pelo condenado: antes de querer modificar os excluídos, é preciso
modificar a sociedade excludente, atingindo, assim, a raiz do mecanismo de exclusão”. [11]

Embora seja notadamente abolicionista, o autor reconhece que há alguns avanços na


novo modelo de cárcere implantados na Itália e Alemanha, quais sejam:

 Trabalho carcerário equiparado ao trabalho desenvolvido fora do cárcere;


 Abertura à presença externa no cárcere (embora ainda em fase de engatinhar).

Seriam esses dois elementos indícios de uma transformação no sistema? Em primeiro


lugar, temos que considerar que, embora o momento de elaboração da lei seja distinto do
momento de sua aplicação, estes não são totalmente separáveis. Desse modo, o jurista
deve se ater a eficácia da aplicação da norma. Assim, desencontros entre teoria e prática
não devem ser vistos como infortúnios eventuais, mas talvez como algo querido pelo
próprio sistema. Em segundo lugar, os estudos sobre criminalidade tem deixado
importantes aspectos de lado, isso porque têm sido baseados em três elementos:
participação em uma subcultura diferente em relação à dos outros grupos sociais;
definição dominante desta diferença cultural na sociedade e a correspondente reação
social em relação ao grupo respectivo; consciência do sujeito da própria posição marginal
e auto-identificação com os papéis correspondentes.

Por conseguinte, a análise se concentra no momento de distribuição da renda e do status,


deixando de fora as raízes econômicas de tal distribuição e sua ligação com o tipo de
produção, como se os estratos fossem elásticos e permitissem a reinserção dos
criminosos. Nas palavras de Baratta: “a marginalização criminal revela o caráter impuro da
acumulação capitalista, que implica necessariamente os mecanismos econômicos e
políticos do parasitismo e da renda. A esperança de socializar, através do trabalho de
setores de marginalização criminal, se choca com a lógica da acumulação capitalista, que
tem necessidade de manter em pé setores marginais do sistema e mecanismos de renda e
parasitismo.”[12]

Valendo-se dos trabalhos de Rusche, Kirchheimer e Foucault (excluídas as peculiaridades


de cada um), consolida duas teses centrais a respeito da história da prisão:

 para definir a realidade do cárcere é preciso ter em conta sua real função cumprida no
seio da sociedade e
 para que a análise i seja possível, devemos nos atentar para os tipos determinados de
sociedade em que o cárcere apareceu e se desenvolveu como instituição penal.

Nesse relance histórico, os juristas têm se voltado a um enfoque idealista, ao invés de um


materialista-histórico. É assim que surgem as teorias dos fins da pena como retribuição ou
intimidação. Todavia, para avaliar a verdadeira natureza dos interesses em jogo, não
podemos nos esquecer dos elementos estruturais característicos do atual desenvolvimento
do sistema tardio-capitalista. Assim se entende que, para esse sistema, há maior exigência
de disciplina e repressão, com fins de conter a massa marginalizada. Nesse sentido, a
imagem de uma crise de ordem pública transmitida pelos veículos midiáticos esconde uma
estratégia capitalista que tende a produzir uma deterioração do Estado de Direito e formar
condições para uma gestão autoritária do processo produtivo e da própria sociedade.

A passagem para a criminologia crítica[editar | editar código-fonte]


Por meio das teorias conflituais e do labelling approach tem lugar a passagem da
criminologia liberal para a criminologia crítica. Embora não seja homogênea, a criminologia
crítica apresenta como traço principal a construção de uma teoria materialista do desvio e
da criminalização. A base teórica marxista se combina com vasto trabalho de observação
empírica, a fim de que a criminologia se construa a partir do ponto de vista das classes
subalternas. Contrapondo o enfoque biopsicológico ao macrossociológico, esta
criminologia analisa a realidade comportamental do desvio a partir do contexto histórico
em que este se insere. Isso permite a apreciação da relação funcional ou disfuncional do
desvio com as estruturas sociais e com o desenvolvimento das relações de produção e de
distribuição.

Na visão da criminologia crítica, a criminalidade é um status atribuído a certos indivíduos,


mediante dupla seleção: dos bens protegidos penalmente e do comportamento ofensivo
destes bens e dos indivíduos estigmatizados.

O direito penal, por sua vez, é concebido como dinâmico e apresenta três fases: o de
produção das normas, o de aplicação das normas e o de execução da pena ou da medida
de segurança. A análise empírica destes três momentos permitiu que houvesse a
desmistificação do direito penal como direito igual:

 O direito penal não defende todos e somente os bens essenciais, nos quais estão
igualmente interessados todos os cidadãos, e quando pune as ofensas aos bens
essenciais o faz com intensidade desigual e de modo fragmentário;
 A lei penal não é igual para todos, o status de criminoso é distribuído de modo
desigual pelos indivíduos
 O grau efetivo de tutela e a distribuição do status de criminoso é independente da
danosidade social das ações e da gravidade das infrações à lei, no sentido de que
estas não constituem a variável principal da reação criminalizador e da sua
intensidade.

Com isso, “a crítica se dirige, portanto, ao mito do direito penal como direito igual por
excelência. Ela mostra que o direito penal não é menos desigual do que os outros ramos
do direito burguês, e que, contrariamente a toda aparência, é o direito desigual por
excelência”.[13]

Criminologia crítica e política criminal alternativa [editar | editar


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As principais tarefas da criminologia crítica são construir uma teoria materialista do desvio,
dos comportamentos socialmente negativos e da criminalização, e elaborar as linhas de
uma política criminal alternativa, uma política das classes subalternas no setor do desvio.

O autor defende que a criminologia deve se construir a partir do ponto de vista das classes
subalternas. Para isso, elenca quatro alternativas:

Necessidade de interpretação separada dos fenômenos de comportamento socialmente


negativo que se encontram nas classes subalternas do que se encontram nas classes
dominantes (como criminalidade econômica, grande criminalidade organizada). Diferencia-
se política penal (poder repressivo do Estado) de política criminal (transformação social e
institucional). Uma política criminal alternativa escolhe esse segundo viés. Como as
contradições internas do capitalismo são estruturais, não basta uma política meramente
reformista ou humanitária.
É preciso dirigir os mecanismos de repressão institucional para o confronto da
criminalidade econômica. Com isso, devemos ter o cuidado de evitar cair em uma mera
expansão do direito penal; é preciso também obra radical e corajosa de despenalização de
inumeráveis setores que enchem os códigos (como o aborto, delitos contra a moralidade
etc). Isso com fins a se aliviar a pressão negativa sobre as classes subalternas. Essa
despenalização levaria, também, à adoção de sanções não estigmatizantes, abrindo
espaço para maior aceitação social do desvio.

Abolição da instituição carcerária[editar | editar código-fonte]

Há diversas etapas para aproximação deste objetivo: alargamento do sistema de medidas


alternativas, ampliação das formas de suspensão condicional da pena e da liberdade
condicional, introdução de formas de execução da pena detentiva em regime de semi-
liberdade, extensão dos regimes das permissões. Em especial, deve haver uma abertura
do cárcere para a sociedade, mediante a colaboração das entidades locais e, sobretudo,
dos presos e de suas associações com as organizações do movimento operário, com fins
a minimizar as consequências que tem o cárcere sobre a divisão de classes. Reeducar,
assim, significa consciência e ação política dentro do movimento de classe, ao invés de
uma expiação da culpa.

É preciso atenção para a função da opinião pública e dos processos ideológicos e


psicológicos que sustentam e legitimam o direito penal desigual. Isso porque a opinião
pública é portadora da ideologia dominante, que perpetua a imagem fictícia da igualdade.
Transmitem a imagem de alarme social que, em certos momentos de crise do sistema de
poder, são manipulados pelas forças políticas interessadas em campanhas de “lei e
ordem”, obscurecendo a consciência de classe e produzindo a falsa representação de
solidariedade que unifica todos os cidadãos na luta de um “inimigo interno” comum.

De todo exposto, resta claro que a função última de uma política criminal alternativa seria a
própria superação do direito penal. Isto, claro, significa a superação da pena, antes de ser
a superação do direito que regula seu exercício. De outro modo, dar-se-ia margem a
arbitrariedades e supressões de garantias fundamentais. Isto também não significa negar
a exigência de medidas alternativas de controle; contudo, há que se evitar a repressão
autoritária. Esta é importante no regime capitalista, pois, como foi dito, procura uniformizar
comportamentos. Em um regime socialista, as exigências de repressão diminuem, pois as
desigualdades diminuem. Para Baratta, substituir o direito penal por qualquer coisa melhor
somente poderá ocorrer quando substituirmos a sociedade por uma sociedade melhor.

Princípio geral de prevenção e controle social [editar | editar código-fonte]

A criminologia crítica parte do pressuposto que a criminalidade atual é uma qualidade


atribuída a sujeitos por meio de processos de definições. Entretanto, os seus defensores
reconhecem a necessidade de estratégias de controle social justa e eficaz frente a
verdadeiras situações de “referente material”, mas eles propõem um controle alternativo.:
 Controle baseado em estratégia global, abarcando todas as formas de violência.
 Controle baseado nos princípios da igualdade e legalidade
 Controle eficaz e não simbólico, com três consequências: deve se dirigir as causas do
conflito, ter por objeto as situações e não negar formas de compensação e de
restituição das vítimas quando possível.
 Controle social ativo. Correspondendo a um princípio geral de prevenção.

O princípio geral de prevenção, modo de contenção da violência, seria uma estratégia de


controle por vias democráticas, o que significa a inserção dos portadores de necessidades
reais na produção e articulação dos seus próprios direitos, satisfações de suas
necessidades e de defesa autônomas daqueles que atuam efetivamente em seu favor. O
exercício público seria, então, a expressão da vontade popular e dos interesses gerais.

Direito penal mínimo[editar | editar código-fonte]


O princípio do direito penal mínimo seria uma política alternativa, a curto e médio prazo,
em relação à questão dos requisitos mínimos para alcançar a concretude dos direitos
humanos na lei penal. O conceito histórico social dos direitos humanos é considerado uma
ferramenta adequada para a estratégia da máxima contenção da violência punitiva, tendo
como função negativa limitar a intervenção penal e como positiva, constituir-se como
possível objeto de tutela do direito penal.

Os princípios que se articulam com a ideia da mínima intervenção penal são agrupados
entre os princípios intrassistemáticos (ponto de vista interno), que indicam requisitos para
a introdução e manutenção de figuras delitivas na lei, e princípios extrassistemáticos
(ponto de vista externo), que se referem a critérios políticos e metodológicos para a
descriminalização e construção dos conflitos e problemas sociais.

Os princípios intrassistemáticos são divididos em:

 Princípios de limitação formal


 Princípio da reserva da lei ou princípio da legalidade em sentido estrito: ao
falar de função punitiva e de sistema penal, identificamos esses conceitos com a
área de aplicação do D. Penal. Mas, se adotarmos uma definição sociológica da
pena, como repressão das necessidades reais fundamentais geralmente
reconhecidas como direitos de uma sociedade, podemos dar-nos conta de que
boa parte da função punitiva se realiza fora do direito (torturas, excesso não ações
ilegais da polícia, etc.). O primeiro elemento de um programa de limitação formal
da violência punitiva consiste, então, em restringi-la ao âmbito e sob o controle da
lei.
 Princípio da taxatividade: tal princípio exclui a aplicação analógica da lei penal.
Isso impõe uma técnica legislativa que permita a maior objetividade no processo
de concretização judicial de figuras delitivas, e a limitação das cláusulas gerais e
dos elementos típicos normativos por meio de reenvios a valorações sociais e a
normas cuja existência e cujo conteúdo sejam empiricamente comprováveis.
 Princípio da irretroatividade: tal princípio exclui a aplicação de penas, ou de
qualquer condição que agrave a situação do imputado, que não tenha sido
prevista pela lei com anterioridade ao fato. Sua função é a de assegurar a
previsibilidade das consequências jurídicas negativas do comportamento
individual.
 O princípio do primado da lei penal substancial: tal princípio tem o propósito de
assegurar a extensão das garantias contidas no princípio da legalidade à situação
do indivíduo em cada um dos subsistemas em que pode ser subdividido o sistema
penal. As limitações dos direitos do indivíduo, em cada um dos subsistemas da
administração da justiça penal, não podem superar as restrições previstas
taxativamente pela lei penal para os delitos de que pode ser suspeito. Tal princípio
exclui a introdução, de fato ou de direito, de medidas restritivas dos direitos do
indivíduo, no regramento e na prática dos órgãos da polícia, do processo e da
execução, que não sejam estritamente necessárias aos fins da correta e segura
aplicação da lei penal substancial.
 O princípio da representação popular: impõe o respeito dos requisitos mínimos
do Estado de direito no que concerne a representatividade da assembleia
legislativa e ao seu funcionamento regular (participação popular na formação da
vontade legislativa mediante eleições livres e secretas e a livre organização dos
partidos e dos movimentos políticos).

 Princípios de limitação funcional


 Princípio da resposta não contingente: propõe que a lei penal não pode ser
uma resposta imediata da natureza administrativa, como é na prática. Os
problemas que se devem enfrentar têm que estar suficientemente decantados
antes da resposta penal. Trata-se de uma proliferação descontrolada e não
planejada de normas penais que somente constituem elementos secundários e
complementares no âmbito das leis penais.
 Princípio da proporcionalidade abstrata: somente graves violações aos direitos
humanos podem ser objetos de sanções penais. As penas devem ser
proporcionais ao dano causado pela violação.
 Princípio da idoneidade: tal princípio assinala outras condições que reduzem o
espaço reservado a lei penal. Ele obriga o legislador a realizar um atento estudo
dos efeitos socialmente úteis que cabe esperar da pena: só subsistem as
condições para sua introdução se aparece provado algum efeito útil na relação
das situações em que se pressupõe uma grave ameaça aos direitos humanos.
 Princípio da subsidiariedade: uma pena pode ser aplicada somente se provar-se
que não existem modos não penais de intervenção aptos para responder a
situações nas quais se acham ameaçados os direitos humanos. A resposta penal
não deve ser só idônea, mas também resposta de menor custo social.
 Princípio da proporcionalidade: existem casos muito evidentes nos quais a
introdução de medidas penais produz problemas novos e mais graves que aqueles
que a pena pretende resolver. A violência penal pode agravar e reproduzir os
conflitos nas áreas específicas em que ela intervém. O problema do custo social
da intervenção penal tem também grande importância se se consideram os efeitos
desiguais da pena sobre os condenados e sobre o seu âmbito familiar e social,
efeitos estes que dependem igualmente do diferente status social de ditos
condenados. Tal princípio como guia da lei penal deve também ter em conta a sua
aplicabilidade e sujeitos provenientes de diversos estratos sociais. Dele deriva a
exigência de introduzir critérios dirigidos a compensar e a limitar as desigualdades
dos efeitos da pena nos condenados e em seu ambiente social. Nesse sentido,
esse princípio imprime aos critérios programáticos que devem guiar o juiz na
discricionariedade que lhe é atribuída, na aplicação da pena e na concessão de
atenuantes e de benefícios, numa direção oposta àquela que, na prática atual,
assumem as decisões judiciais quando estão orientadas por valorações como a da
prognose da criminalidade, as quais, como é sabido, aumentam as desvantagens
dos indivíduos pertencentes aos estratos sociais mais baixos.
 Princípio de implementação administrativa da lei: a justiça penal se apresenta
como uma organização que somente pode funcionar seletivamente, isto é,
dirigindo as sanções contra uma parte mínima de seis potenciais clientes. O
desigual funcionamento da justiça encontra, pois, a discrepância entre os recursos
administrativos e o programa legislativo, uma causa estrutural. Se não se quer
aceitar essa cifra obscura de criminalidade e a realização da função punitiva por
meio de bodes expiatórios, resultam somente duas possibilidades: adequar os
recursos aos programas de ação legislativos, ou redimensionar os programas de
ação sobre a base dos recursos disponíveis no e para o sistema. A primeira
alternativa deve ser excluída claramente. Permanecendo, pois, a possibilidade que
consiste na adequação dos programas aos recursos existentes. A aplicação
correta do princípio da implementação administrativa da lei bastaria por si mesmo
para reduzir drasticamente ao mínimo a área de intervenção da lei penal.
 Princípio do respeito pelas autonomias culturais: tem-se o problema da
“colonização” do “mundo da vida” de grupos sociais diferentes, por parte do
sistema, e que existe uma diferente percepção da realidade, das normas e dos
valores sociais, parcialmente condicionada por parte dos grupos dominantes e de
sua cultura hegemônica. Deriva um ulterior limite funcional da lei penal, que pode
ser enunciado como a falta de uma condição necessária para a criminalização de
certos comportamentos, quando esses podem ser considerados como normais em
subculturas bem delimitadas. Esse limite é consequência do princípio da mínima
intervenção penal, o qual, desse ponto vista, inscreve-se em uma concepção da
sociedade não somente igualitária, senão também antitotalitarista, concepção na
qual se concede ao desvio o máximo espaço compatível com as exigências da
ordem nas relações sociais.
 Princípio do primado da vítima: o sistema penal tutela interesses gerais que vão
além dos da vítima. Tem se denominado de “privatização dos conflitos” um
caminho para o qual se pode orientar com êxito uma estratégia de
descriminalização que abarque boa parte dos conflitos sobre os quais incide a lei
penal. Substituir, em parte, o direito punitivo pelo restitutivo de maneira quem
possam estar em condições de restabelecer o contato perturbado pelo delito
(indenização é um exemplo, por exemplo), para, assim, lograr diminuir os custos
sociais da pena.

 Princípios de limitação pessoal ou de limitação da responsabilidade penal


 Princípio da imputação pessoal ou princípio da personalidade: o princípio da
imputação pessoal se refere as pessoas físicas e exclui, por isso mesmo, toda
forma de responsabilidade de pessoas jurídicas e de entes morais. Impondo esse
limite ao sistema penal, renuncia-se a defesa diante das violações, inclusive
graves, dos direitos humanos, que derivam de ações de complexos organizados.
 Princípio da responsabilidade pelo fato: enunciando esse princípio se afasta
toda forma de direito penal do autor e se mantém somente o direito penal do ato.
Tal princípio se estende a todo o direito penal concebido em sentido amplo,
incluindo o direito penal do menor e o regime de medidas de segurança para os
adultos. A consequência perversa que se apresenta é que, com respeito às
garantias jurídicas que todos do sistema penal têm, são precisamente os menores
e os adultos não imputáveis os sujeitos com menos garantias, por serem
considerados como pessoas menos responsáveis e não responsáveis, enquanto
que o regime de internação a que são submetidos apresenta os mesmos, senão
maiores, efeitos repressivos e estigmatizantes que as medidas privativas de
liberdade, às quais são submetidos os adultos imputáveis. Além do mais, a atual
discussão, psiquiatra e psicologicamente, indica que os fundamentos sobre os
quais se constroem os dogmáticos conceitos de autor imputável, inimputável e
semi-imputável sofre uma profunda crise. Impõe-se, então, uma nova tarefa de
redefinir um conceito de responsabilidade penal útil. Construir um conceito unitário
de responsabilidade que reserve a incapacidade penal de direito aos sujeitos de
idade inferior à mínima não pode significar estender o âmbito da aplicação da lei
penal a comportamentos que integrem figuras delitivas, porém que não podem ser
consideradas como atos cometidos com capacidade de entender seu sentido
social. Significa, ao contrário, coloca-los em um sistema primitivo paralelo
destinado aos sujeitos que apresentam transtornos psíquicos. Trata-se, pois, de
substituir o atual sistema punitivo paralelo, mediante a extensão a eles da
disciplina jurídica normal, elaborada segundo concepções modernas e
progressistas, fora de qualquer implicação com o poder punitivo do Estado, e com
o mais amplo respeito pelas nossas pessoas e as máximas garantias para seus
direitos. Os “manicômios criminais” são instituições verdadeiramente anacrônicas
e ainda mais repressivas e destrutivas que o próprio cárcere. Da mesma maneira
deve ser eliminado o sistema punitivo paralelo para os menores. A eles aplicar-se-
á a disciplina jurídica normal que deve regular, de acordo com os mais modernos
princípios pedagógicos e, no marco do maior respeito à pessoa do menor, os seus
direitos e o sistema de educação pública e de assistência aos menores.
 Princípio da exigibilidade social do comportamento conforme a lei: indica-se
a exigência de definir, em um amplo plano rigorosamente técnico-jurídico, os
requisitos normativos apropriados para regular a verificação judicial daquela
condição ulterior para a atribuição da responsabilidade penal que corresponde, na
dogmática do delito, ao conceito de culpabilidade. Em uma construção dogmática,
baseada no contexto situacional da ação, mas que em um “elemento interior”, tão
dificilmente operacional, como demonstra a experiência teórico-prática, teriam que
definir-se as seguintes séries de requisitos normativos:
 Causas de não-exigibilidade social do comportamento, conforme a lei e os
critérios para a sua verificação em relação ao contexto situacional da ação e
aos papéis sociais ou institucionais cobertos pelo sujeito na situação
problemática.
 Critérios de avaliação do espaço de alternativas comportamentais à
disposição do sujeito na situação problemática em que se levou a cabo a
ação.

Os princípios extrassistemáticos, por sua vez, são subdivididos em:

 Princípios extrassistemáticos de descriminação


 Princípio da não-intervenção útil: indica que a alternativa a criminalização nem
sempre é representada por outra forma de controle social. Um princípio geral de
política alternativa é aquele que designa o mais amplo espaço de liberdade a
diversidade, no que seja compatível com as exigências mínimas de uma ordem
justa, conduzindo a uma sociedade igualitária e livre e emancipando os indivíduos
e grupos.
 Princípio da privatização dos conflitos: Trata-se da estratégia de
“reapropriação dos conflitos”, que considera as possibilidades de substituir
parcialmente a intervenção penal por meio de formas de direito restitutivo e
acordos entre as partes no marco das instancias públicas e comunitárias de
reconciliação.
 Princípio da politização dos conflitos: esse princípio toma em consideração
uma característica fundamental do sistema penal: seu modo de intervir nos
conflitos. O sistema penal geralmente reprime conflitos e propicia sua construção
no âmbito técnico que os priva de suas reais conotações políticas. Imaginem-se
âmbitos maiores como da corrupção administrativa. Trata-se, antes de tudo, de
restituir aos conflitos a dimensão política que lhes é própria e, sem segundo lugar,
de considerar, como alternativa para o seu tratamento penal, formas de
intervenção institucional confiáveis não somente aos órgãos administrativos,
senão, também e sobretudo, àqueles pertencentes à representação política,
assegurando, desse modo, a participação e o controle popular na gestão das
contradições mais relevantes do sistema político.
 Princípio da preservação das garantias formais: tal princípio exige que, em
caso de deslocamento dos conflitos fora do campo da intervenção penal para
outras áreas de controle social institucional ou comunitário, a posição dos sujeitos
não seja reconduzida a um regime de menores garantias em relação aquele
fortemente previsto pelo direito penal.

 Princípios metodológicos da construção alternativa dos conflitos e dos


problemas sociais
 Princípio da subtração metodológica dos conceitos de criminalidade e de
pena: tal princípio propõe o uso de um experimento metodológico: a subtração
hipotética de determinados conceitos de um arsenal preestabelecido, ou a
suspensão de sua validez. Recomenda-se aos atores que atuam na interpretação
dos conflitos e dos problemas e na busca de soluções, realizar tal experimento,
abstraindo, por certo tempo, do emprego dos conceitos de criminalidade e de
pena, a fim de que se possa verificar se e como poderiam construir as respostas
dos conflitos de uma ótica distinta da punitiva.
 Princípio de não especificação dos conflitos e dos problemas: tal princípio
toma em consideração o fato de que o sistema penal interpretado como um
aglomerado de heterogêneos que só têm em comum o fato de estarem sujeitos a
respostas punitivas. Delitos tão diferentes entre si (ex.: pequenos furtos e infração
ecológica) são aglomerados no sistema penal, o qual responde com os mesmos
instrumentos e os mesmos procedimentos a conflitos de tão vasta
heterogeneidade.
 Princípio geral de prevenção: trata-se de deslocar cada vez mais a ênfase posta
nas formas de controle repressivo para formas de controle preventivo. Nesse
sentido, a política da justiça social, a realização dos direitos humanos e a
satisfação das necessidades reais dos indivíduos representam muito mais que
uma política criminal alternativa: constituem a verdadeira alternativa democrática a
política criminal.
 Princípio da articulação autônoma dos conflitos e das necessidades reais: a
articulação autônoma da percepção e da consciência dos conflitos, das
necessidades reais e dos direitos humanos, por parte de seus próprios portadores,
em uma comunicação não condicionada pelo poder, e a ideia de democracia e da
soberania popular são os princípios-guia para a transformação do Estado, não
somente para um modelo formal de Estado de Direito, senão, também, para um
modelo substancial do Estado dos direitos humanos. São, também, esses os
princípios-guia para a transformação e a superação do sistema penal tradicional,
passando para um sistema penal de defesa e garantia dos direitos humanos.

O direito penal mínimo é, portanto, uma forma de contenção da violência punitiva por meio
do direito, garantindo a obediência aos direitos humanos, estes vinculados à satisfação
das necessidades reais fundamentais.

Reintegração social[editar | editar código-fonte]


Na criminologia crítica, reconhece-se que o cárcere não cumpre a sua função idealista de
ressocialização do condenado. A pesar disso, é precisa que a finalidade de reintegração
permaneça em seu horizonte, todavia readaptada e reconstruída sobre base diversa.

Primeiramente, é preferível o termo reintegração social aos termos tratamento e


ressocialização, pois, enquanto estes pressupõem um papel passivo do detento e um ativo
das instituições, a reintegração pressupõe um processo de comunicação, em que os
indivíduos encarcerados se reconheçam na sociedade e vice-versa. Dessa forma, a
redefinição dos conceitos tradicionais em exercícios dos direitos dos indivíduos constitui
núcleo importante para a construção da teoria da reintegração social, bem com o
desenvolvimento de estratégias prática se eficazes de desencarceramento, visando a
realização de condições que permitam o esvaziamento da função do cárcere.

Essa construção é articulada em um programa com dez pontos, de aplicação coerente do


princípio da independência funcional de penal-disciplina (práticas que submetem o detento
como objeto) e reintegração (serviços e oportunidades que se oferecem ao detento, visto
como sujeito, dependendo de suas necessidades e demandas):

 Simetria funcional dos programas destinados a detentos e ex-detentos e programas


destinados ao ambiente e estrutura social ao qual eles regressam.
 Presunção de normalidade do detento: deve-se abandonar a concepção patológica do
detento, devendo considerar a condição social ao qual ele se encontra para a
elaboração dos programas e serviços.
 Exclusividade do critério objetivo da conduta na determinação do nível disciplinaria e
concessão dos benefícios da diminuição da pena e semiaberto. Irrelevância da
suposta verificação do grau de ressocialização e periculosidade.
 Critérios de reagrupamento e diferenciação dos programas independentes e das
classificações tradicionais de diagnóstico “criminológicas” de extração positivista. Os
critérios teriam o objetivo de facilitar a interação do detento com a sua família e seu
ambiente; reduzir as assimetrias das relações entre os detentos; otimizar as relações
pessoais e permitir uma diferenciação racional dos programas, com base nas
necessidades de cada um.
 Extensão simultânea dos programas a toda população carcerária, independência da
classificação entre condenados e detentos em espera.
 Extensão diacrônica dos programas. Continuidade das fases carcerárias e pós
carcerárias.
 Relação de simetria entre os papéis na interação entre os sujeitos: a relação usuário-
poder deve se desenvolver a partir de uma interação entre sujeitos.
 Reciprocidade e rotação dos papéis.
 Cárcere como oportunidade geral de conhecimentos e tomada de consciência da
condição humana e das contradições da sociedade.
 Valor absoluto e relativo dos papéis profissionais. Valorização dos papéis técnicos e
“destecnificação”, enquanto extensão potencialmente universal das competências e
dos atores, da questão carcerária.
Dimensões, interdisciplinaridade e controle [editar | editar código-
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A criminologia assumiu funções próprias da teoria e sociologia do Direito Penal. Devido à


mudança do paradigma proposto, as definições do delito produzidas pelo sistema penal
(integram o sistema leis, dogmática, jurisprudência, polícia e senso comum) não são
pontos de partida, mas problemas que são analisados e estudados em contexto amplo de
história e estrutura social.

Também é devido ao novo paradigma que traz grandes diferenças epistemológicas e


resulta num emprego de modelo integrado que é realizado através da interdisciplinaridade
interna. Esta se dá quando um conjunto de disciplinas converge em um objeto
homogêneo. Este método representa uma forma de controle sobre o Direito Penal
denominada Controle Interno e este corresponde à crítica sobre os métodos e efeitos da
prática repressiva e os princípios do Direito Penal Moderno.

Existe também um controle externo do Direito Penal, que é ligado às questões de justiça
material e seus critérios, levando em conta os efeitos externos do sistema como a
seletividade e as consequências da proteção aos bens jurídicos não levando em conta um
objeto homogêneo, mas um universo de eventos heterogêneos que tem como ponto em
comum serem, em determinado tempo e determinada sociedade, vistos como intervenção
do sistema. Em suma, é o cálculo do custo social da intervenção penal.

A dificuldade de definição científica do universo de situações e comportamentos criminais


que nos impõe o atual sistema de justiça criminal condiciona o debate sobre o futuro da
criminologia e faz surgir diversos problemas epistemológicos que inserem a criminologia
crítica numa grande crise que se manifesta e, outra dimensão chamada dimensão
comportamental.

Nesta dimensão o objeto da criminologia não é o próprio sistema de justiça criminal, mas o
“referente material” das definições de criminalidade atual ou potencial e situações
problemáticas criadas pelo comportamento de indivíduos. A problemática se dá pois estas
definições não apresentam limites estáveis nem homogeneidade (por exemplo há imensa
diferença entre lesões patrimoniais e físicas e danos ecológicos). Assim, esta dimensão se
dá pelo controle externo que é ligado a interdisciplinaridade externa que seria a
convergência de disciplinas científicas e saberes especiais com competências
equivalentes. Desta forma há a perda de autonomia e competência da criminologia uma
vez que necessita de uma convergência de disciplinas em que nenhuma delas seja
hegemônica ou invada o âmbito de competência da outra.

Defende-se que a criminologia não terá futuro se quiser se manter única e fechar dentro de
seus próprios saberes todas as dimensão comportamental. Se faz necessária a criação de
um Sujeito Coletivo que seria integrado pelas diversas comunidades científicas e negaria a
criminologia como ciência natural de comportamentos e indivíduos infratores. Somente
este novo sujeito poderia mudar a questão criminal e criar uma política criminal alternativa.

Na medida em que a Criminologia Crítica propõe não só analisar o comportamento


desviante mas as discrepâncias entre as funções que a teoria do Direito Penal a este
atribui e o real papel que este exerce, a dizer seus impactos na sociedade, por meio da
análise do comportamento dos agentes do Direito Penal (através dos processos de
criminalização primários e secundários) e também da opinião pública se faz necessário um
modelo integrado de disciplinas que contribuem para o melhor entendimento da realidade
social. Esta de dinâmica é dívida pelo professor em duas:

 Interdisciplinaridade Interna: esta se dá quando um conjunto de disciplinas converge


em um objeto. Este método representa uma forma de controle sobre o Direito Penal
denominada Controle Interno e este corresponde à crítica sobre os métodos e efeitos
da prática repressiva e os princípios do Direito Penal Moderno

 Interdisciplinaridade Externa: seria a convergência de disciplinas científicas e


saberes especiais com competências equivalentes. Esta influencia o controle externo
do Direito Penal, que é ligado às questões de justiça material e seus critérios, levando
em conta os efeitos externos do sistema como a seletividade e as consequências da
proteção aos bens jurídicos. Em suma, é o cálculo do custo social da intervenção
penal.
Estado Mestiço[editar | editar código-fonte]
Concepção de um Estado mestiço, que contém uma pluralidade de cidadanias e onde os
antigos estrangeiros se tornaram vítimas e excluídos.

Os ensinamentos tradicionais das teorias contratualistas não demonstram o caráter


seletivo e marginalizante do projeto político moderno que tem o monopólio da violência e o
direito como características inerentes ao Estado e a qualquer sociedade civilizada.
Entretanto, as promessas de paz dessas teorias que não foram cumpridas levaram a uma
crise que tem como expoente o pensamento pós-moderno.
Para sair dessa crise seria necessário rever o aparato conceitual em que o Estado é
fundado, de maneira que não se pense tanto nas partes do contrato mas nas vitimas
sociais (excluídos); o policentrismo da natureza e o respeito devido a esta por parte dos
homens que não é o seu centro nem o seu dominador; o outro não como estranho, nem
como estrangeiro, mas como parte de nós mesmos; ao invés de contrato social, uma
aliança.

Esta aliança seria entre todas as vítimas excluídas do contrato e do homem com a própria
natureza. O entendimento de uma cidadania plural, tendo visto que o estado é mestiço, no
qual não há estrangeiros, mas sim vítimas e excluídos. Dentro desse Estado seria possível
ir além da fronteira dos direitos das diversas cidadanias e entender as diferenças e chegar
a uma maneira mais eficiente de resolução de conflitos e alcançar uma civilização superior
ao “Estado de Direito” onde se encontre uma maneira não violenta de superação da
violência.

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