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A EDUCAÇÃO DO EMPREENDEDORISMO PARA INDIVÍDUOS DA TERCEIRA

IDADE: UMA ANÁLISE MULTIDIMENSIONAL

RESUMO

Este artigo trata da importância da educação do empreendedorismo para a estabilidade


econômica, para o sentimento de ser útil socialmente, para a ressignificação pessoal e
profissional para àqueles que chegaram terceira idade, bem como possíveis ações de apoio de
órgãos públicos e privados.

Palavras-chaves: empreendedorismo, terceira idade, ressignificação pessoal e profissional

ABSTRACT
This article deals with the importance of entrepreneurship education for economic stability,
for the feeling of being socially useful, for personal and professional redefinition for those
who have reached old age, as well as possible support actions by public and private agencies

Key-words: entrepreneurship, old age, personal and professional redefinition

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1. INTRODUÇÃO

O envelhecimento é hoje um dos principais temas sociais debatidos nos meios


governamentais, acadêmicos e econômicos à proporção que as pessoas estão vivendo mais na
escala do tempo, ativas socialmente e com melhor saúde. O incremento no número de pessoas
idosas tem algumas consequências, tais quais:
a. Aumento da pressão no orçamento da seguridade social levando os países
destinarem maiores montantes de recursos a um número maior de pessoas
cada vez mais, pois o número de aposentados aumenta ano a ano;
b. Surgimento de dificuldades financeiras nos orçamentos das famílias devido os
valores das aposentadorias não serem suficientes para atender suas
necessidades básicas de alimentação, medicamentos, moradia, lazer dentre
outros.
Logo, sob esse prisma de escassez, surge a necessidade para muitas pessoas na
terceira idade em desenvolverem alternativas profissionais para incremento da renda familiar,
sendo o empreendedorismo uma delas, a fim de compor e complementar o orçamento
familiar. Segundo a OCDE – Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico,
formada por 37 países, com sede em Paris, a qual tem o objetivo de construir políticas para
melhoria de vida das pessoas, está ocorrendo uma elevação na população de pessoas idosas
saudáveis, com capacidade intelectual, profissional, recursos financeiros e vontade de ter uma
atividade econômica calcadas nas suas habilidades profissionais incluindo empreendedorismo.
A seguir, o Quadro-1, apresentamos gráfico do Relatório Envelhecimento no
Século XXI: Celebração e Desafio que reflete a tendência mundial do aumento da população
idosa, elaborado pelo Fundo de população das Nações Unidas e Helpage International.

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Quadro-1 – Taxa de crescimento do envelhecimento populacional mundial

Segundo Mazzaferro e Bernhoeft (2016), o Brasil terá em 2050, 260 milhões de habitantes com
idade de 40 anos e expectativa de vida em torno de 81,3 anos e cerca de 14 milhões ultrapassando a barreira dos
80 anos, enquanto a Europa Ocidental manterá população elevada entre 40 e 60 anos, confirmando tendência
desde a Segunda Guerra Mundial.
O médico brasileiro Alexandre Kalache, o qual foi diretor do programa de
envelhecimento ativo da OMS- Organização Mundial da Saúde, afirma que para envelhecer
bem é preciso investir em quatro de tipo de capitais: capital financeiro, capital físico e mental
(saúde), capital social (amigos, família e relacionamentos) e em capital intelectual (trabalho,
estudos e atualizações). Em suma, aprender sobre empreendedorismo na terceira idade pode
auxiliar no desenvolvimento de habilidades cognitivas, estimular o cérebro e melhorar a
capacidade de tomada de decisão.
Nesse sentido, o Estado através de políticas públicas pode também contribuir,
incentivar e promover a disseminação da cultura do empreendedorismo e dos comportamentos
empreendedores através de parceiros, instituições de ensino e aprendizagem profissional,
agências governamentais de fomento ao desenvolvimento econômico e de novos
empreendedores, bem como através de entidades bancarias e financeiras que tenham
programas e linhas de crédito para incentivar pequenos negócios na fase inicial ou de
consolidação da maturidade dessas microempresas.
Segundo Relatório GEM – Global Entrepreunership Monitor, pesquisa anual
internacional a qual descreve diversos indicadores sobre a prática do empreendedorismo no
mundo, conduzida por entidades como o Babson College, Universidad del Desarrollo, London

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Business School, Univeresidad Externado de Colombia, dentre outras, além do SEBRAE, da
Fundação Getúlio Vargas – FGV e IBQP como representantes brasileiras, existe o
empreendedorismo por oportunidade que significa preparar e qualificar conhecimentos
técnicos, comportamentais e de gestão para aquelas pessoas que desejam empreender de
forma planejada e eficaz e o empreendedorismo por necessidade, aquele que leva as pessoas
obrigatoriamente para atividades de comercialização de bens e serviços a fim de manter a
sobrevivência. No Brasil, segundo últimas pesquisas GEM, o empreendedor por oportunidade
representa apenas 15% dos que estão desenvolvendo o sonho de serem empreendedores.
Sendo assim, no objetivo primordial de tornar as pessoas idosas em
empreendedores por oportunidade, em um número cada vez maior com a finalidade de
qualificar melhor a jornada empreendedora, sob a perspectiva dessa “nova educação
profissional”, eis que pode ser criada e mantida por órgãos governamentais e privados uma
verdadeira Trilha Educativa Profissionalizante para operar não no aspecto cognitivo da pessoa
idosa, aprimorando conhecimentos técnicos dos assuntos relativos ao marketing, vendas,
controles financeiros, conhecimento mercado e do uso efetivo com resultados da mídias
sociais, como também contribui com outros objetivos da subjetividade humana, subjacentes
como o da importância social para valorização do sentimento de pertencimento, bem como a
importância de se sentir empoderado e realizado ao mesmo tempo, nesta etapa da vida.
Logo, a Trilha Educativa Profissionalizante voltada ao empreendedorismo na
Terceira Idade deve manifestar-se de forma sistêmica e orgânica, pois assim será capaz de
redirecionar e ressignificar sonhos, metas, resultados, planos pessoais e profissionais no
universo de quem ainda tem e pensa que tem muito a conquistar e alcançar.
Dessa forma, a educação do empreendedorismo para indivíduos acima de 50 anos
configura-se numa análise multidimensional de dois fatores basilares, os quais são:

a. Busca pelo equilíbrio do orçamento familiar gerando renda a mais;


b. Aumento da autoestima e da saúde mental pelo sentimento de
pertencimento e utilidade social, bem como pela realização de sonho
em empreender e assim sentir-se empoderado.

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2. BUSCA PELO EQUILÍBRIO DO ORÇAMENTO FAMILIAR GERANDO RENDA
A MAIS – O CAPITAL FINANCEIRO.
Com o aumento da expectativa de vida e o desafio de sustentar um padrão de vida
adequado após a aposentadoria, é fundamental que os indivíduos nessa fase da vida
busquem oportunidades de desenvolvimento e fontes alternativas de renda.
Com o aumento da expectativa de vida e o desafio de sustentar um padrão de vida
adequado após a aposentadoria, é fundamental que os indivíduos nessa fase da vida
busquem oportunidades de desenvolvimento e fontes alternativas de renda.
Além de fornecer conhecimentos técnicos, a educação empreendedora também
estimula o desenvolvimento de habilidades como criatividade, inovação e resiliência,
características fundamentais para enfrentar os desafios do mercado atual.
Através do empreendedorismo, as pessoas da terceira idade podem aproveitar suas
experiências de vida, conhecimentos acumulados e redes de contatos para identificar
oportunidades de negócios lucrativos.
Segundo Relatório GEM – Global Entrepreunership Monitor, pesquisa anual
internacional a qual descreve diversos indicadores conduzida pelo Babson College,
Universidad del Desarrollo, London Business School, Univeresidad Externado de
Colombia, dentre outras, além do SEBRAE e da Fundação Getúlio Vargas – FGV como
representantes brasileiras, empreendedorismo por oportunidade significa preparar e
qualificar conhecimentos técnicos, comportamentais e de gestão para aquelas pessoas que
desejam empreender de forma planejada e eficaz. No Brasil, segundo últimas pesquisas
GEM, o empreendedor por oportunidade representa apenas 15% dos que estão
desenvolvendo o sonho de serem empreendedores. Ainda segundo Pesquisa GEM, por
outro lado, as pessoas que empreendem apenas pela demanda de pagar as contas e
sobreviver são classificadas como empreendedores por necessidade.
Neste sentido, portanto, destaca-se a relevância econômica do empreendedorismo
para indivíduos acima de 50 anos. Através do empreendedorismo, eles podem encontrar
novas fontes de renda e diversificar suas atividades financeiras, o que contribui para o
orçamento familiar e a segurança financeira.
No contexto brasileiro, algumas experiências de sucesso com empreendedores da
terceira idade merecem destaque. O projeto "Empreendedorismo na Terceira Idade"
desenvolvido pela Universidade de São Paulo (USP) proporcionou treinamentos e
mentoria a aposentados interessados em iniciar seus próprios negócios. Através dessa

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iniciativa, diversos empreendedores obtiveram sucesso ao abrir pequenas empresas ou
prestarem serviços autônomos, gerando renda adicional para suas famílias.
No Brasil, esse movimento de promoção do empreendedorismo deve ir além das
entidades como SEBRAE, SENAC, SENAI, SENAR e das Salas dos Empreendedores
mantidas por Prefeituras, atendendo à Lei 123/2006 – Estatuto das Micros e Pequenas
Empresas e do Microempreendedor Individual – MEI. Esta seria uma maneira de
espalharem-se por mais municípios através de programas de Extensão nas Escolas
Estaduais, Municipais, pelas Associações de Moradores, ONGs etc, com o objetivo maior
de preparar profissionalmente mais pessoas idosas para atividades econômicas e para o
empreendedorismo por oportunidade de forma qualificada.
Em 2017 o SEBRAE-PE, criou a solução educacional inédita e de forma pioneira
dentre todos outros SEBRAE do Brasil, denominada: Gestão Empreendedora na
Aposentadoria. Esta trilha educacional contemplava as seguintes atividades e conteúdos:
1. Elaboração do Plano Pessoal e Profissional para os próximos dez anos; 2. Introdução
ao empreendedorismo; 3. Pensando no tipo e no plano de negócio; 4. Reeducação
financeira e controle do dinheiro; 5. Vendas e atendimento; e 6. Mentoria personalizada
aos participantes. O livro Aposentar e Empreender – enxergando novas oportunidades e
ganhando mais significância social, Broxado (2016), lançado pela Editora Bagaço, serviu
como base de elaboração da Trilha dos aposentados desenvolvido pelo SEBRAE-PE.
É importante conhecer e buscar inspiração em políticas públicas e ensino sobre
empreendedorismo específico para pessoas acima de 50 anos que ocorrem em diversos
lugares que têm implantado estratégias e programas voltados para apoiar e capacitar
empreendedores mais velhos.
A seguir relacionamos alguns programas de incentivo ao ensino em geral e ao
empreendedorismo na terceira idade em outros países:
i. Portugal: RUTIS – Rede de Universidades da Terceira Idade é
uma Instituição Particular de Solidariedade Social (IPSS) e de Utilidade Pública
de apoio à comunidade e aos seniores. É uma iniciativa cuja missão é promover o
envelhecimento ativo e a inclusão social das pessoas idosas, defender, representar
e dinamizar as Universidades Seniores; e incentivar a participação social dos
mais velhos, de âmbito nacional e internacional, com sede em Almeirim, criada
em 2005. A RUTIS tem atualmente 305 UTIs – Universidade da Terceira Idad e

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como membros, 45.000 alunos seniores e 5.000 professores voluntários nas
universidades seniores.
ii. México: Secretaria de Economia (SE) y el Instituto
Nacional del Empreendedor criaram vários programas de apoio aos
empreendedores, tais quais: Centros (México Empreende) de apoio com
salas, equipamentos e assessorias de especialistas em empreendedorismo,
plano de negócio, incubadoras para desenvolver aqueles projetos de
empresas com alta chance de escalar e crescer, além do programa nacional
de empreendedorismo com uma série de eventos, cursos e consultorias
àqueles que iniciaram ou ainda irão iniciar seus desafios empreendedores.
iii. Austrália: O SeniorPreneurs é uma iniciativa criada para
incentivar e apoiar pessoas acima de 50 anos que desejam iniciar seu próprio
negócio ou empreendimento. O programa reconhece que os indivíduos mais
velhos têm uma riqueza de experiência e conhecimento que podem ser aplicados
no mundo dos negócios. O SeniorPreneurs oferece uma variedade de recursos e
suporte para ajudar os empreendedores da terceira idade a transformarem suas
ideias em negócios viáveis. Isso inclui orientação e aconselhamento
personalizados, workshops e seminários sobre tópicos relevantes para o
empreendedorismo, acesso a redes de contatos e mentores experientes, além de
assistência na busca de financiamento e recursos para o desenvolvimento do
negócio. O programa também promove a conscientização sobre os benefícios do
empreendedorismo para os idosos, incentivando a sociedade a valorizar e apoiar
essa população em sua busca por oportunidades de negócios. O SeniorPreneurs
destaca os empreendedores da terceira idade como ativos valiosos para a
economia e como fontes de inovação e inspiração para outras gerações.

3. AUMENTO DA AUTOESTIMA E DA SAÚDE MENTAL PELO


SENTIMENTO DE PERTENCIMENTO E UTILIDADE SOCIAL, BEM COMO
PELA REALIZAÇÃO DE SONHO EM EMPREENDER E ASSIM SENTIR-SE
EMPODERADO – CAPITAL FÍSICO E MENTAL (SAÚDE), CAPITAL
SOCIAL (AMIGOS, FAMÍLIA E RELACIONAMENTOS).
A aposentadoria muitas vezes representa uma transição desafiadora para
muitos indivíduos, pois pode levar à perda de identidade profissional e à falta de

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propósito. O empreendedorismo surge como uma oportunidade de escrever novamente a
carreira após a aposentação, permitindo que essas pessoas aplique suas habilidades e
conhecimentos adquiridos ao longo da vida de maneira mais produtiva.
De acordo com as ideias de Zigmunt Bauman, através da sua obra denominada
Identidade sobre a sociedade líquida moderna, o sentimento de pertencimento é um fator
essencial para o bem-estar e a qualidade de vida. Neste sentido, ao se envolverem em
atividades empreendedoras, as pessoas acima de 50 anos podem encontrar um novo
propósito social, estabelecer conexões com a comunidade e combater a solidão e o
isolamento social, impactando diretamente na saúde física e mental.
Segundo o médico espanhol Enrique Rojas, a felicidade é uma experiência que
sea poia em dois pilares: 1. Encontrar-se a si mesmo; e 2. Ter um Projeto de vida coerente.
A partir de Rojas, o novo projeto de “pertencimento”, deve ser teu o Eu como o maior
protagonista, deve responder as inquietudes, desejos e aspirações particulares, mas com o
compromisso de orientado para o social para que todas as manifestações ou objetivos e
resvalem como um bem e atinjam positivamente outras pessoas. Ou seja, subjetividades
individuais, planos e ações atingindo a realidade social de outras pessoas.
Para Mara Luquet, jornalista em economia e assuntos do mercado financeiro,
autora do livro O Futuro É, a vida após os 50 anos deve ser encarada sob o prisma da
longevidade e não do envelhecimento, levando-se em consideração que as pessoas
nascidas entre os anos de 1945 e 1964 é uma geração numerosa do pós Segunda Guerra
Mundial, a qual mais experimentou os frutos da qualidade do avanço científico voltados à
saúde e bem-estar nunca visto antes na linha do tempo da civilização humana. Resultado
disso tudo: os “seniorlescentes”, ou seja, aquelas pessoas com 50 ou 60 anos nos dias de
hoje, estão também “transitando” de fase, como na primeira, segunda infância e
adolescência, e por isso precisam construir aprendizados e conhecimentos novos para
alcançarem novas conquistas pessoais e profissionais.
Mazzaferro e Bernhoft (2016), discorrem sobre relatório da OMS –
Organização Mundial da Saúde, órgão da ONU – Organizações das Nações Unidas, o qual
aborda que o envelhecimento atual da população mundial obriga um adiamento da
aposentação ou o prolongamento da vida profissional devido tanto a problemas de falta de
dinheiro no orçamento dos governos para pagar a massa crescente e volumosa de pessoas
aposentadas, fato que coloca em risco econômico muitas famílias estritamente
dependentes do pagamento das pensões e aposentadorias, além de necessidade de

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continuar a trabalhar por razões individuais e sociais. O Planejamento financeiro tem sido
tema de debates por órgãos de governo, bancos, seguradoras, empresas de previdências e
institutos de pesquisas, bem como universidades, a fim de orientar melhor à sociedade
tanto no sentido financeiro quanto no da saúde mental e física, incentivando novos
padrões de comportamento mais empreendedor, “latu sensu” perante a vida. Ficar idoso
deve ser um caminho de longevidade e não de tristeza pela escassez do tempo restante de
vida ou de resignação no enfrentamento da morte.
Nessa direção, OLIVA-AUGUSTO (1994) corrobora com a ideia de que
ocorreu nos últimos cem anos uma mudança de paradigma sobre o significado da morte.
OLIVA-AUGUSTO, 1994 afirma: “A morte deixa de ser o momento da passagem para
outra existência, onde se terá o retorno - positivo ou negativo - da vida que se teve, e
adquire o sentido de fim inexorável. O reconhecimento desse marco contrapõe a ideia de
eternidade, que norteava a vivência anterior, à constatação da finitude humana. Da mesma
forma, faz ressaltar a noção do tempo como dimensão irreversível em oposição à sua
percepção como repetição cíclica de situações, presente anteriormente. A perspectiva
desse limite, que aponta para a necessidade de vivência integral do momento presente,
visto que é irrepetível, torna urgente o aproveitamento máximo do tempo disponível, no
sentido de preenchê-lo com acontecimentos e obras”.
Continuando, OLIVA-AUGUSTO (1994) declara: “estar vivo converte-se em
utilizar o tempo disponível de forma a extrair dele em realizações o quanto seja possível
(OLIVA-AUGUSTO, 1994, p.06).
Finalmente, Max Weber, validando esse processo, tratou da existência humana
sob a perspectiva de que, no mundo atual, os seres humanos podem sentir-se fartos,
esgotados ou cansados da vida, nunca plenos dela (Weber, 1958, p. 140). Nesse sentido, a
relação com a morte expressa a maneira como é assumida a relação com a vida, tanto
quanto seu significado (OLIVA-AUGUSTO, 1994, p.06). Entretanto, a transição para o
mundo novo, universo da terceira idade, de menos “correria” para um indivíduo produtivo
não é fácil. Não basta “vestir” uma capa de pessoa valente, forte que vai migrar de um
lado para outro sem dificuldades e traumas.
Como exemplo da dificuldade da transição, cito episódios que ocorreram com
dois amigos os quais ao se aposentarem tiveram enormes dificuldades de adaptação ao
novo momento de vida. Sônia, pedagoga, que tinha sido funcionária de uma grande
empresa por mais de 20 anos, ao se aposentar, ainda ficou durante uns 15 dias acordando

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na hora de costume, se aprontando e tomando café com fosse ainda trabalhar. O ápice
dessa “não-aceitação” inconsciente se materializou quando em um desses dias ela chegou
a dirigir até a empresa como fosse trabalhar. O outro amigo, Carlos, engenheiro
agrônomo, ao se dirigir à agência do INSS – Instituto nacional da Seguridade Social para
definir seu processo de aposentação, ficou por uns 15 minutos na frente da servidora do
INSS, reticente, na dúvida pensando que a partir daquela entrada de dados no teclado do
computador “as coisas” não seriam mais como antes definitivamente. E Ele confessou: foi
a primeira sensação de “estar fora da vida”, em seguida uma sensação na qual de fato a
fase do envelhecimento chegou.
Segundo Mazzaferro e Bernhoeft (2016), uma das maiores dificuldades da
transição é alcançar a sensação plena física e mental de integração social e assim
encontrar um novo sentido na vida (Mazzaferro, Bernhoeft, 2016, p. 151). Mazzaferro e
Bernhoft (2016) afirmam que esse processo exige uma prolongada fase de reeducação que
direcione as energias e capacidades a fim de sincronizar tempo destinado anteriormente a
um tipo de vida produtiva e profissional para outro tempo de atividades não-produtivas,
mas que ao mesmo tempo sejam atividades capazes de integrar indivíduos
transformadores em empreendedores de suas próprias histórias.
Nesse sentido, no Brasil o estatuto do idoso, lei 10.741 de 1º de outubro de
2003, no seu artigo 28, determina que empresas e identidades governamentais possam
incentivar programas sociais em favor do idoso que sejam voltados para a
profissionalização especializada, bem como lhe confira assistência preparatória para sua
aposentadoria e também que lhe traga incentivo à inserção no trabalho formal, quando a
necessidade deste requeira tal medida. A seguir, o artigo 28, do Estatuto do Idoso na
íntegra para elucidação e afirmação desse conjunto de direitos e obrigações na sociedade
brasileira:
Art. 28. O Poder Público criará e estimulará programas de:I – profissionalização
especializada para as pessoas idosas, aproveitando seus potenciais e habilidades para
atividades regulares e remune-radas; II – preparação dos trabalhadores para a
aposentadoria, com antecedência mínima de 1 (um) ano, por meio de estímulo a
novos projetos sociais, conforme seus interesses, e de esclarecimento sobre os
direitos sociais e de cidadania; III – estímulo às empresas privadas para admissão de
pessoas idosas ao trabalho. (LEI 10.741 DE 1 OUTUBRO DE 2003)
Nessa direção, podemos destacar a importância dos Conselhos Municipais e
Estaduais da pessoa idosa como instrumento muito importante de integração dos anseios e
necessidade da população nesta faixa etária para a definição de políticas públicas e
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programas voltados a atividades intelectuais, físicas, sociais, culturais para o
desenvolvimento integral das pessoas idosas e ainda por cima capacitá-las em negócios
empresariais e empreendedorismo.
Nos conselhos municipais, por exemplo, pode-se observar as seguintes
características de atuação: acompanhar e implantar a política pública municipal de inclusão
social, promoção e defesa dos direitos da pessoa idosa (art.1º), bem como formular
diretrizes e supervisionar a execução das políticas públicas dirigidas a pessoa idosa, em
defesa da inclusão social e no enfrentamento a qualquer forma de violência e
discriminação, no âmbito do município. Todavia, é preciso que a população perceba essas
políticas públicas como prioritárias, perenes, firmes e não sazonais ou de importância
maior ou menor, dependendo do perfil de gestão de cada governante.
A sociedade em geral não ver ainda uma atuação de impacto nos conselhos dos
municípios nem dos estados, apesar de muitos terem um portfólio de ações e programas
bem estruturados e operantes, mas não obstante, precisam melhorar a comunicabilidade
desses direitos e inovações que de fato explicite com vigor e força o valor dessas ações às
populações da terceira idade e para com a sociedade no seu dia a dia.
Como práticas exitosas no Brasil podemos identificar diversos órgãos públicos
focados na transição, tais quais:
i. Centros de Convivência da Terceira Idade (ou das Pessoas Idosas):
Ainda são poucos os municípios que possuem como politica pública madura e
consolidada a criação e manutenção desses Centros. Uma lacuna gigante em políticas
sociais em todas as esferas de governo, municipal, estadual e federal. Contudo, a
Prefeitura do Município de Vitória no Espírito Santo, há mais de 30 anos é exemplar e
referência no Brasil com seus atuais cinco Centros de Convivência (localizados em
diversos bairros: Jardim da Penha, Jardim Camburi, Centro, Maria Ortiz e o Carlos
Moura) os quais surgiram de mobilizações comunitárias e tem como objetivo principal
fortalecer a autonomia, as relações familiares e comunitárias das pessoas idosas da
cidade de Vitória, favorecendo assim momentos de socialização, valorização da vida,
da melhoria da saúde física e mental, da autoestima e da afirmação dos direitos. As
atividades são formativas, culturais, esportivas e de lazer. A estrutura física dos
Centros de Convivência de Vitória-ES é constituída de salas de aulas bem estruturadas
e confortáveis, piscina para atividades aquáticas, academia e salão de dança, área
externa coberta para atividades como cursos de artesanato, exposição e feiras.

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ii. Programa Preparação Pós-Carreira do TJ-PE: O objetivo desse
Programa do Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco é orientar servidores para o
momento da aposentação e assim desenvolver uma série de atividades, oficinas e
cursos no segmento da saúde física, emocional e mental, sobre equilíbrio das finanças
pessoais, desenvolvimento de novas relações sociais e do desenvolver de novas
atividades profissionais dentre elas o empreendedorismo. O Programa atinge os
servidores de todas as Comarcas em fase de transição para aposentadoria e é gerido
pela Secretaria de Gestão de Pessoas - SGP.
iii. UNATI-UFPE: A Universidade Aberta à Terceira Idade – UnATI é um
programa de extensão vinculado ao Programa do Idoso (PROIDOSO), da Pró-Reitoria
de Extensão e Cultura (PROExC) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE).
UnATI tem como objetivo a promoção e o incentivo de ações para melhoria da
qualidade de vida das pessoas idosas, mediante a realização de cursos que facilitem a
aquisição de novos conhecimentos e integração na sociedade contemporânea. A
UnATI vai além da comunidade externa, pois mobiliza a comunidade interna de
docentes, técnicos, voluntários externos à Instituição e alunos de pós-graduação e
graduação para a realização de cursos e outras atividades dirigidas ao segmento idoso.
iv. UFSC – Universidade Federal de Santa Catarina: desenvolve curso de
empreendedorismo à comunidade no seu programa de extensão através do NETI
Núcleo de Estudos da Terceira Idade, oferecendo cursos como de alemão, italiano,
biodanza, terapia do riso, Storytelling dentre outros.
v. PUC – RS: Projeto de Incentivo à Atividade Física para
Idosos (PIAFI). Uma parceira com o Conselho Municipal do Idoso de Porto Alegre
(COMUI) e com o objetivo de recepcionar em torno de 500 pessoas idosas ao longo
de 2023. O projeto é liderado pelo Instituto de Geriatria e Gerontologia (IGG) da
PUCRS e pela Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação busca prestar assistência
gratuita para idosos em vulnerabilidade social por meio de atividades físicas.
vi. Vida Ativa: Programa gerido pela FUNAPE - Fundação de Previdência
e Pensão dos Servidores do Estado de PE, com objetivo de gerar relacionamentos e
atividades em áreas como de saúde e bem-estar com módulos de dança de salão,
pilates, yoga. Entretenimento com aulas de músicas, canto, coral, artes plásticas e
fotografia. No roteiro de outras ações também comemorava datas festivas tradicionais,
executava-se pacotes de viagens, lazer e cultura. Além destas atividades pontuais e

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programadas o Vida Ativa serviu como ponto de encontro, bate papo e happy-hour,
onde os aposentados frequentadores, ex-servidores do Estado de Pernambuco
simplesmente iam lá para fazer novas amizades e conviver ou tomar um cafezinho.
Muitas novas amizades foram criadas, novos grupos de convívio desenvolvidos. No
momento, o Programa “Vida Ativa” passa por uma reformulação, haja vista que a
pandemia causou uma série de dificuldades ao Programa.
Em consulta bibliográfica no site do SEBRAE sobre personagens e
experiências empreendedoras, identificamos os seguintes cases abaixo listados,
mostrando que é possível empreender e ser feliz após os 50 anos:
- Morar.com.vc: A plataforma Morar.com.vc é uma iniciativa das empreendedoras
Marta Monteiro de 64 anos e Veronique Farat de 61. É uma empresa iniciante no
seguimento de moradia compartilhada para terceira idade. Por meio de programa de
computador o sistema encontra a possível companhia, a partir de uma análise
minuciosa dos perfis para repartir despesa de moradia, mas que tenham bastante
afinidade nos hábitos e questões pessoais; Onebuy: Os empreendedores Luiz
Fernando Figueredo, 51 anos e Leo do Amaral, 69 criaram a Onebuy para facilitar o
cadastramento uma só vez para aquelas pessoas que compram por sites, facilitando o
processo de aquisição; Maturi (antiga Maturijobs): A plataforma oferta vagas de
emprego para pessoas idosas e oferece também oportunidades de capacitação e no
apoio a empreendedores seniores com eventos para incrementar rede de
relacionamentos e de oportunidades. Instituto de Longevidade: Fundado pela
Seguradora Mongeral Aegon em 2015 com objetivo de valorizar, incentivar, informar,
transferir conhecimentos em diversas áreas desde saúde a finanças pessoais até direitos
das pessoas idosas.

4. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Aprender sobre empreendedorismo, portanto, pode ter um impacto significativo na
saúde mental e na autoestima de pessoas idosas e aposentadas. A busca por conhecimento
nessa área pode proporcionar uma sensação de propósito, autonomia e realização pessoal,
promovendo uma melhor qualidade de vida. Diversos autores e especialistas reconhecem a
importância desse processo de aprendizagem empreendedora para a população mais madura.
Mazzaferro e Bernhoeft (2016), por exemplo citam as diversas etapas nas vidas das pessoas
como ciclos que abrem e fecham.

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Empreender na terceira idade pode trazer um senso de empoderamento e realização
pessoal. Ao criar e gerir seu próprio negócio, as pessoas acima de 50 anos podem
experimentar um senso renovado de autonomia, relevância e satisfação, desafiando
estereótipos relacionados à idade.
O ato de adquirir conhecimentos sobre empreendedorismo também pode ser uma
forma de manter a mente ativa e estimulada, auxiliando na prevenção de problemas de saúde
mental, como o declínio cognitivo e a depressão. Além disso, a educação empreendedora
pode fortalecer a autoestima e a autoconfiança das pessoas idosas e aposentadas. Ao adquirir
novas habilidades e conhecimentos, elas se sentem empoderadas capazes de realizar projetos e
empreendimentos, o que pode gerar um senso de valor pessoal e conquistas.
Conclui-se, nessa análise multidimensional da importância da educação
empreendedora para a terceira idade, que é vital refletir sobre os três fatores abaixo
destacados, formando uma tríade inexorável, para que o mundo do meta verso e dos
problemas reais possa enfrentar o período de maior longevidade das sociedades:
i. Aumentar com força e consistência a expansão do conhecimento sobre o
empreendedorismo como alternativa para que as pessoas da terceira idade
possam melhorar seu orçamento familiar e ter uma atividade social. Criando-se
assim um movimento caudaloso e constante na sociedade com a implantação de
parcerias em maior quantidade com instituições governamentais e não
governamentais que desenvolvam cursos, incubadoras, financiamentos, oficinas,
seminários, fóruns e congressos sobre a força do empreendedorismo, como a
RUTIS atuante em Portugal e na Comunidade Europeia, sem aguardar apenas
pela “boa vontade” de entidades como o SEBRAE, SENAC, SENAR, SENAI ou
salas de empreendedores ligadas às prefeituras, cujo propósito, funcionamento e
resultados deixam muito a desejar.
ii. Gerar, no curto prazo, movimento social de mobilização para que cada gestor de
estado e município se sensibilize com a questão do fenômeno do envelhecimento
da população e crie soluções imediatas que atendam famílias, valorizando e
implantando programas que contemplem maior quantidade possível de pessoas
da terceira idade como apoio mais efetivo dos conselhos municipais e estaduais
criando mais centros ou núcleos de convivência da Terceira Idade. Os conselhos
municipais e estaduais precisam de maior força, protagonismo, presença, ação e
voz nas questões de valorização dos programas e políticas voltadas ao pessoal da

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melhor idade dentro de todas as comunidades ou regiões políticas e
administrativas.
iii. Gerar, no médio prazo, maior quantidade de políticas públicas como parte
estratégica dentro da elaboração orçamentária dos Planos Plurianuais dos
governos municipais, estaduais e federal, contemplando a criação de centros de
desenvolvimento do conhecimento do empreendedorismo para a terceira idade,
bem como a construção e criação de maior número de Centros de Convivência da
Terceira Idade, como os de Vitória-ES, ligados ainda apenas a algumas raras e
efetivas prefeituras de gestão plenamente cidadã.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
BAUMAN, Z. Modernidade líquida. Rio de Janeiro: Zahar, 2001.

BROXADO, S. Aposentar e Empreender – como enxergar novas oportunidades e ganhar


mais significância social. Recife: Bagaço, 2016.

Centro de Convivência da Terceira Idade. Disponível em:


https://www.vitoria.es.gov.br/noticias/idosos-conhecem-o-projeto-da-nova-unidade-do-ccti-
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