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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

Escola de Engenharia de São Carlos

I •I s s

Material didático para uso exclusivo dos alunos da EESC-USP.


Versão preliminar, de divulgação restrita.
©José Reynaldo A. Setti, 2000-2002, todos os direitos reservados.
Proibida a rêprodução total ou parcial. por quaisquer meios,
sem autorização por escrito do autor.
Conteúdo

1 Mecânica da locomoção de veículos ferroviários 1


1.1 Força de propulsão 2
1.2 Esforço trator em locomotivas diesel-elétricas . 4
1.3 Resistência ao movimento . 9
1.4 Determinação da velocidade de equilíbrio 18
1.5 Frenagem de composições ferroviárias 24
1.6 Comprimento máximo do trem 28
1.7 Consumo de combustível 32
Resumo 34
Para aprender mais . 34
Exercícios . 35

2 Mecânica da locomoção de veículos rodoviários 37


2.1 Introdução . 37
2.2 Força motriz em veículos rodoviários 38
2.3 Resistência ao movimento . 47
2.4 Determinação da velocidade de equilíbrio 50
2.5 Frenagem 54
2.6 Estabilidade lateral em curvas horizontais 66
Resumo 71
Para aprender mais . 72
Exercícios 73
11 CONTEÚDO

3 Fluxos de veículos e seu controle 77


3.1 Representação gráfica de fluxos de veículos . 78
3.2 Princípios fundamentais dos fluxos de veículos 80
3.3 Modelos macroscópicos para fluxos de tráfego 89
3.4 Modelos microscópicos de tráfego . . . . . . 95
3.5 Aplicações da teoria das filas na análise dos fluxos ininterruptos 98
3.6 Análise de pontos de estrangulamento em vias 110
3.7 Fluxos de tráfego interrompidos . 113
3.8 Controle de fluxos de veículos .. 116
3.9 Os sistemas de controle do tráfego rodoviário 117
3.1 O Os sistemas de controle do tráfego ferroviário . 119
Resumo . . . . . . 123
Para aprender mais . 124
Exercícios . . . . . 125

4 Fluxos de veículos em interseções 129


4.1 Interseções semaforizadas . . . . . . . . . . . . . . . . . . 130
4.2 Análise deterrninística.de interseções semaforizadas isoladas 131
4.3 Análise de cruzamentos semaforizados com chegadas aleatórias 141
4.4 Calibração de semáforos isolados pelo método de Webster 142
4.5 Sistemas de cruzamentos controlados por semáforos 148
4.6 Determinação do tempo de amarelo 150
4.7 Instalações semafóricas . . . . . . 153
4.8 Análise de interseções não semaforizadas 159
Resumo . . . . . . 161
Para aprender mais . 162
Exercícios . . . . . 162

5 Análise da capacidade e nível de serviço de vias 167


5.1 Capacidade de tráfego de vias férreas . . . . 169
5.2 O HCM: capacidade e nível de serviço de rodovias 178
5.3 Capacidade e nível de serviço de rodovias . . . . 181
5.4 Fatores que afetam a capacidade de uma rodovia 186
5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 190
Para aprender mais . 214.
Exercícios . . . . . 214
Capítulo 1

Mecânica da locomoção de
veículos ferroviários

Este capítulo trata dos princípios que governam a lqcomoção de comboios


ferroviários. Inicialmente, os conceitos de força de tração e de resistência
ao movimento são apresentados e discutidos. A seguir, enfocam-se a de-
terminação da velocidade de equihôrio de uma composição ferroviária, a
determinação do comprimento máximo do trem, a frenagem de comboios
ferroviários e o consumo de combustível de locomotivas diesel-elétricas.

O movimento de uma composição ferroviária depende das forças que atuam


sobre ela e das regras estabelecidas para operação para o trecho pelo qual o trem
viaja. As regras de operação servem para determinar a velocidade máxima per-
mitida ao longo do trecho e o condutor pode ser obrigado a reduzir a velocidade
do trem por causa de passagens de nível, curvas, estado da linha, zonas urbanas
etc. As forças que atuam sobre o trem, por outro lado, determinam a velocidade e
a aceleração em função de fatores como a potência dos motores da locomotiva, a
declividade da rampa, o peso da composição etc. Neste capítulo, a locomoção de
veículos ferroviários será estudada do ponto de vista das forças que atuam sobre o
trem.
Num trem, a força usada para locomover a composição é produzida por uma
unidade especial, a locomotiva, que é equipada para transmitir a força produzida
pelos seus motores para as rodas. As rodas que recebem a força de tração são
chamadas de rodas motrizes. Nas composições de .metrô, bondes e de outros
2 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

sistemas que não utilizam locomotivas, cada vagão é equipado com um ou mais
motores que produzem a força usada para locomover a composição.
As forças que atuam sobre uma locomotiva que está num trecho
plano estão representadas esquematicamente na Figura 1.1. No eixo
x, existe uma força F1 , que é usada para locomover o trem, e uma
força R, a resultante das forças que resistem ao movimento. No
eixo y, há uma força peso G e as forças normais N f e Nr. Como a
locomotiva está num trecho plano, se F1 - R > O, ela está acelerando;
Fig. 1.1: Forças que atuam sobre uma loco- se F1 -R < O, ela está desacelerando; e se F1 = R, ela está viajando
motiva em movimento a uma velocidade constante, chamada de velocidade de equilíbrio.
A força F1 chama-se força motriz ou força de propulsão, enquanto que R,
a resultante das forças contrárias ao movimento, é denominada resistência total.
As próximas seções deste capítulo discutem como determinar a força motriz, a
resistência total e a velocidade de equilíbrio.

1. 1 Força de propulsão

As locomotivas, como qualquer veículo, usam motores para transformar energia


em força que é então usada para propelir o trem - a força de propulsão ou força
motriz. Como o trabalho W produzido por uma força F é igual ao produto do
deslocamento pela compoRente da força ao longo do deslocamento, o trabalho
produzido por uma locomotiva capaz de manter uma força de propulsão Fr ao
longo de uma distância S pode ser expresso como:

W = F1 S, (1.1)

em que W: trabalho [N.m ou J];


F: força de propulsão [N]; e
S: distância [m].

Como a potência é a derivada do trabalho em função do tempo, pode-se calcular


potência P desta locomotiva pela expressão:
dW dS
P = -- = Ft - = Ft v, (1.2)
dt dt

em que P: potência [N.m.s- 1 ou W];


Fr: força de propulsão [N]; e
v: velocidade [m/s].
1.1 Força de propulsão 3

Ou seja, a potência de urna locomotiva é dada pelo produto da força de propulsão


e a velocidade por ela desenvolvidas.
Se a potência da locomotiva for dada em quilowatts [kW] e a velocidade em
quilômetros por hora [kmJh], a Equação 1.2 deve ser modificada para permitir
o cálculo da força motriz, em newtons, a partir da potência da locomotiva e da
velocidade na qual ela se move:
p
F1 = 3600 v· (1.3)

em que F1 : força motriz [N];


P: potência da locomotiva [kW]; e
V: velocidade [krnlh].

O leitor pode notar que 3.600 é a constante usada para a conversão de unidades, já
que a Equação 1.2 fornece a potência em watts [W], a partir da força em newtons [N]
e da velocidade em metros por segundo [rn/s].
Corno a potência de motores costuma também ser dada em horse-power [hp],
e visto que 1 hp = 745,7 W e 1 rn/s = 3, 6 krnlh, pode-se determinar urna nova
constante para calcular a força de propulsão de urna locomotiva:
p
F1 = 2685- (1.4)
v
em que F1 é a força de propulsão em newtons [N]; P é potência em horse-power[hp];
e V é a velocidade em quilômetros/hora [krnlh]. No Brasil, também é comum se
usar o cavalo-vapor [cv] como unidade de potência. Corno 1 cv = 735,5 W, a
Equação 1.3 toma-se então:
p
F1 = 2649- (1.5)
V
se a potência for expressa em cavalos-vapor [cv], ao invés de horse-power [hp].
Nem toda a potência do motor da locomotiva é usada para a locomoção do
trem. Uma parte da potência é usada para acionar os sistemas auxiliares (ilumi-
nação, compressores etc.) e uma outra parte é perdida por ineficiências inerentes
aos sistemas mecânicos e elétricos. A eficiência da transmissão indica a porção
da potência bruta do motor que é efetivamente transformada em força motriz.
Portanto, a Equação 1.3 deve ser escrita corno:
p
FI = T) 3600 v, (1.6)
4 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

onde 17 é a eficiência da transmissão. Como tipicamente a eficiência da transmissão


de locomotivas diesel-elétricas é 0,81, a Equação 1.6 pode ser modificada para

p
Fr = 2916-. (1.7)
v
Neste caso, Fr representa a força de propulsão desenvolvida por uma locomotiva
(ou conjunto de locomotivas) de potência P [kW], operando com força total, numa
velocidade V [km/h]. Esta força é chamada de esforço trator e é transmitida ao
resto do trem através do engate que liga a locomotiva aos vagões.
Para potência expressa em unidades tradicionais que não fazem parte do SI, a
Equação 1. 7 se transforma em

p
Fr = 2175-, (1.8)
v
com P em horse-power [hp] e V em quilômetros/hora [km/h], ou ainda

p
Fr = 2146-, (1.9)
v
na qual Pé dado em cavalo-vapor [cv] e V em quilômetros/hora [kmlh].

As Equações 1.7, 1.8 e 1.9 servem para ilustrar uma peculiaridade da En-
genharia de Transportes: a maioria das fórmulas tem coeficientes que já trazem
embutidos os fatores de conversão de unidades. Desta maneira, é necessário to-
mar o cuidado de verificar as unidades de cada parâmetro da fórmula antes de
utilizá-la. Além disso, em certas áreas da Engenharia de Transportes, as unidades
mais utilizadas não fazem parte do sistema métrico internacional (SI) sendo mais
comum falar em potência em horse-power ou cavalos-vapor (ao invés de watts) e
velocidade em quilômetros por hora, no lugar de metros por segundo.

1.2 Esforço trator em locomotivas diesel-elétricas

Nos primórdios do transp<X!e ferroviário, as máquinas usadas para produção da


força motriz nas locomotivas eram máquinas a vapor, nas quais a queima de com-
bustível (carvão ou lenha) servia para produzir vapor que era usado para impulsio-
nar as rodas motrizes. Após a I Guerra Mundial, essas locomotivas passaram a ser
substituídas por locomotivas elétricas ou diesel-elétricas que apresentam melhor
eficiência energética e menos interrupções de serviço para manutenção.
1.2 Esforço trator em locomotivas diesel-elétricas 5

Grelhas do
freio dinâmico

Fig. 1.2: Locomotiva diesel-elétrica Fig. 1.3: Compçmentes do sistema de tração das locomotivas diesel-
elétricas

As locomotivas elétricas e diesel-elétricas funcionam com o mesmo princípio,


o motor elétrico de tração. A diferença é que as locomotivas diesel-elétricas, como
a mostrada na foto da Figura 1.2, são auto-suficientes e capazes de gerar por si
mesmas a energia elétrica necessária para o acionamento dos motores elétricos de
tração. Nas locomotivas elétricas, a energia elétrica é gerada em usinas hidroelé-
tricas ou termoelétricas e é transmitida para o trem por meio de um terceiro trilho
(no caso do metrô) ou por um cabo localizado acima da via.
Numa locomotiva diesel, a força produzida pelo motor diesel é transferida
para as rodas motrizes por meio de uma transmissão. Essa transmissão pode ser
mecânica, hidraúlica ou elétrica. Nas locomotivas diesel-elétricas, a transmissão
da força gerada no motor diesel é feita por meio de um sistema elétrico, o que
explica a origem do nome diesel-elétrica.
Os componentes principais de uma locomotiva diesel-elétrica são mostrados
na Figura 1.3: o motor diesel aciona um gerador de corrente 'contínua que, por
sua vez, fornece eletricidade para os motores de tração, que são montados junto
aos eixos motrizes. Esses motores elétricos de tração funcionam com corrente
contínua e movem as rodas motrizes através de um éonjunto de engrenagens do
tipo "coroa e pinhão".
O uso da transmissão elétrica permite operar o motor diesel em rotação cons-
tante, de tal forma que o consumo de combustível é o menor possível. O controle
da velocidade do trem é feito variando-se a voltagem e a corrente elétrica aplicadas
aos motores de tração. Nas locomotivas modernas, isto é feito através de um siste-
ma de controle eletrônico, conhecido como chopper, que, permitindo uma variação
contínua da voltagem aplicada aos motores de tração, melhora o desempenho do
motor e reduz o consumo de energia elétrica. Esse sistema de controle permite
que o sistema motor diesel-gerador opere como uma fonte de energia de potência
6 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

P constante, qualquer que seja a velocidade da locomotiva.

As características fundamentais dos motores de tração elétricos usados em


locomotivas são mostradas nos diagramas da Figura 1.4. Num motor elétrico de
tração, a corrente elétrica na armadura do motor é inversamente proporcional à
velocidade de rotação e diretamente proporcional ao torque produzido no eixo do
motor. A velocidade de rotação do motor determina a velocidade da locomotiva e
o torque, a força motriz produzida para mover o trem.
Observando-se o diagrama torque vs. corrente, na parte inferior na Figura 1.4,
pode-se notar que o torque - e, por conseqüência, ó esforço trator - é diretamente
proporcional à corrente elétrica: quanto maior a corrente elétrica, maior o torque
e, por conseguinte, maior o esforço trator produzido. O diagrama da parte su-
perior mostra que a velocidade de rotação do motor é inversamente proporcional
à corrente elétrica na armadura do motor: uma corrente elétrica elevada implica
em baixa velocidade de rotação do eixo do motor e, por consequência, em baixa
Fig. 1.4: Características dos
motores elétricos de tração velocidade da locomotiva.
Os motores de tração possuem limites tanto quanto à corrente elétrica máxima
na armadura como quanto à velocidade de rotação do eixo. Esses limites influem
diretamente na operação das locomotivas diesel-elétricas, como se discute a seguir.

1.2.1 Limites de operação das locomotivas diesel-elétricas

Os motores de tração usados em locomotivas diesel-elétricas são projetados para


operar abaixo de uma correQte elétrica máxima e abaixo de uma voltagem máxima.
O efeito destes limites é ilustrado na Figura 1.5.
Na prática, os limites determinam o intervalo de velocidades em que a loco-
N
.i:: motiva pode ser operada sem que seus motores de tração sejam danificados. Em
õ baixa rotação, o motor de tração produz um torque alto, mas a corrente elétrica
E
na armadura do motor é também alta. Se a corrente for excessiva, ocorrerá um
super-aquecimento do motor que pode até causar a sua queima. Para evitar super-
aquecimento, o projetista do motor estabelece um limite máximo para a corrente
elétrica; este limite para a corrente elétrica estabelece a menor velocidade admissí-
Velocidade da locomotiva
vel de rotação do eixo do motor e, por conseqüência, a menor velocidade que a
Fig. 1.5: Limites para ope- locomotiva pode manter sem que seus motores sejam prejudicados.
ração de motores elétricos de
tração Quando o motor funciona em alta rotação, a velocidade do trem é alta, assim
como também é alta a diferença de potencial aplicada ao motor. Entretanto, existe
um limite para esta diferença de potencial, que é estabelecido pelas características
1.2 Esforço trator em locomotivas diesei-elétricas 7

do isolamento do motor. Assim, o limite de voltagem determina a maior velocidade


de rotação do eixo do motor e, por conseqüência, a maior velocidade em que a
locomotiva pode ser operada sem danos aos seus motores.
Se a potência P for mantida constante, a relação entre o esforço trator F;
e a velocidade V de uma locomotiva tem o formato hiperbólico, como indica a
Equação 1.8, aqui repetida para a conveniência do leitor:
p
F1 = 2175-.
v
Usando-se a Equação 1.8, pode-se construir um gráfico como o da Figura 1.5, que
mostra as características do esforço trator de uma locomotiva diesel-elétrica- a
relação entre a velocidade V e o esforço trator F1 para uma potência P constante.
Esta função hiperbólica é uma curva de potência constante (ou isopotência).
A existência de um limite para a corrente na armadura determina um valor
máximo para a força motriz gerada pelos motores da locomotiva, mostrado na
Figura 1.5 pela linha horizontal tracejada. Igualmente, a existência de um limite
para a voltagem faz com que a locomotiva não possa· ser operada acima de uma
p
certa velocidade, como mostra a Figura 1.5. Assim sendo, a região em que é
possível operar a locomotiva é a contida entre estes dois limites e a curva de
isopotência correspondente à potência máxima da locomotiva. Potências menores
que a máxima podem ser usadas e a função isopotência correspondente é uma
hipérbole contida no envelope da Figura 1.5, como mostram as curvas tracejadas.
Ao contrário de caminhões, as curvas de esforço trator CO'ltra velocidade para
locomotivas diesel-elétricas são contínuas para todas as Vt tocidades possíveis.
Isso se deve à utilização da transmissão elétrica de potênci ,, que permite que a
potência do motor seja contínua e que o motor diesel opere numa mesma velocidade
de rotação o tempo todo. Para controle da velocidade em carros e caminhões, é Fig. 1.6: Forças atuando nu-
necessário variar a velocidade de rotação do motor, por causa da transmissão ma roda motriz
mecânica. Essa variação na velocidade de rotação do motor implica em variações
na sua potência. Isso é discutido em maiores detalhes no C tpítulo 2, que aborda a
mecânica da locomoção de veículos rodoviários.

1.2.2 Tração por aderência

Nos veículos terrestres que usam rodas, a tração dá-se em função do atrito entre
as rodas e a via Sem esse atrito, o movimento não é ~ossível.
Seja uma roda de locomotiva como a mostrada na Figura 1.6, com raio r e que
suporta um peso P. O torque T, aplicado ao eixo conectado à roda corresponde a
8 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

um conjugado T =
F1 .r. Na zona de contato da roda com o trilho, surge uma força
Fa = N.f, que se opõe ao deslizamento da roda e é chamada de aderência. Esta
força é dada pelo produto da normal ao peso N e o coeficiente de atrito estático f,
chamado de coeficiente de aderência. O peso Pé denominado de peso aderente.
Quando uma roda motriz é submetida a um torque T é aplicado na roda motriz,
existem duas possibilidades: F 1 > Fa ou F 1 .:S Fa· Se Pr > Fa, o torque é tal a
força de atrito é insuficiente e a roda fica patinando, sem que a locomotiva saia do
lugar. Nesse caso, e o atrito passará a ser um atrito de deslizamento, menor que o
atrito estático. Se Fr .:s Fa, a força de atrito é suficiente para impedir que a roda
patine e então a locomotiva é capaz de se movimentar, sendo propelida por uma
força F1 •
A aderência, portanto, determina qual a maior força motriz que po-
de ser utilizada ·para movimentar o veículo. A limitação pela aderência
Tab. 1.1: Valores típicos do coeficiente de
é mais notada nas velocidades baixas, quando a locomotiva está ini-
aderência f
ciando o movimento. Em locomotivas modernas, existem sensores que
Estado do trilho Aderência monitoram as rodas motrizes e, se alguma delas começa a patinar, um
totalmente seco e limpo 0,33 dispositivo despeja-se automaticamente areia na interface de contato
lavado pela chuva 0,33 para, aumentando o coeficiente de aderência, impedir a patinagem.
seco e limpo 0,22
seco 0,20 O coeficiente de aderência f não é um valor constante, mas varia
molhado pela chuva 0,14 com as condições da superfície do trilho: seca, molhada, limpa, suja
úmido de orvalho 0,125 ~ de óleo ou com gelo (geada) como mostra a Tabela 1.1. No Brasil,
úmido e sujo 0,11 um valor médio comumente usado nos cálculos de tração 1 é 0,22. Um
sujo com óleo 0,10 trilho úmido de orvalho tem fator de aderência menor que um trilho
Fonte: Hay, W. (1982) Railroad Engineering. lavado pela chuva, pois a umidade espalha o filme de óleo normalmente
Wiley & Sons, New York, 2a edição. encontrado na superfície do trilho, aumentando seu efeito. No trilho .
lavado pela chuva, o óleo é totalmente carregado pela água da chuva, o que melhora
as condições de aderência.
A Figura 1. 7 mostra o efeito da limitação pela aderência. Sendo Td o peso
aderente total da locomotiva e f o coeficiente de aderência entre as rodas motrizes
e os trilhos, a maior força motriz Frma:x que pode ser exercida sem que as rodas
motrizes patinem pode ser ?eterminado pela expressão:

(1.1 O)

em que Frma:x: força motriz máxima [N];


1Brina, H.L. (1982). Estradas de Ferro. Livros Técnicos e Científicos Editora S.A., Rio de
Janeiro, v. 2, p. 6.
1.3 Resistência ao movimento

f: coeficiente de aderência; e
Td: peso aderente da locomotiva [N].

O peso aderente é peso que atua sobre as rodas motrizes da


locomotiva. O peso total de um veículo é a soma do peso aderente
,/Li;,;te da Corrente Elétrica
e do peso morto. O peso morto é o peso que atua sobre as rodas
não acopladas aos eixos tratores. Por isso, para melhor aprovei-
tamento do peso aderente, é interessante que todos os eixos das .9
locomotivas sejam eixos motrizes, já que quanto maior o peso ~
morto, menor a força motri.z máxima que pode ser desenvolvida
pela locomotiva. Nas locomotivas modernas, todos os eixos são ~
ª'
LJ.l
motrizes. Quaisquer combinações
de velocidade e esforço trator
A limitação por aderência é sempre menor que a limitação pela nesta região são possíveis com
potência menor que a máxima
corrente elétrica máxima, como uma forma de prevenir a queima
dos motores de tração por descuido do operador da máquina. As- Velocidade
sim sendo, a área cinza mostrada na Figura 1.7 representa todas
Fig. 1.7: Efeito da aderência na força motriz
as combinações de força motriz e velocidade possíveis de serem
obtidas com urna locomotiva. A envoltória representa a curva de
isopotência obtida com a potência máxima da locomotiva. Note-se que o limite da
aderência é sempre menor que o limite da corrente máxima, para maior proteção
do equipamento. A velocidade máxima que pode ser alcançada pela locomotiva
é determinada pelo limite da voltagem, mas as regras·de operação (determinadas
pelo projeto geométrico e pelo estado de conservação da via) normalmente fazem
com que a velocidade máxima seja menor que esse limite.

1.3 Resistência ao movimento

Quando um veículo terrestre encontra-se em movimento, surgem diversas forças


que se opõem ao movimento; a este conjunto de forças, dá-se o nome de resistên-
cia ao movimento. Como mostrado na Figura 1.8, a resistência ao movimento é
contrabalançada pela força motriz produzida pelo motor: se a força motriz F1 for
maior que a resistência R, o veículo é submetido a uma aceleração; se F1 < R,
o veículo está desacelerando; e se F1 = R, o veículo mantém uma velocidade
constante.
A resistência ao movimento de um trem possui quatro componentes princi-
pais: resistência de rolamento, resistência aerodinâmica, resistência de rampa e
resistência de curva. A resistência de rolamento é causada pela deformação da
10 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

roda e do trilho no seu ponto de contato; pelo atrito interno do motor; pelo atrito
entre eixos e mancais, rodas e trilhos; pelo balanço das rodas; pelos choques entre
as flanges das rodas e os trÍlhos etc.
A resistência do ar, também chamada resistência aerodinâmica ou
arrasto, surge em função do deslocamento da composição na atmosfera
terrestre, e depende de fatores tais como a a secção transversal frontal,
o comprimento, a forma e rugosidade da superfície externa das loco-
motivas e vagões, a velocidade com que a composição se desloca, a
velocidade e direção do vento etc.
A resistência de rampa é causada pela ação da gravidade terrestre
Fig. 1.8: Forças atuando sobre um trem sobre o trem, e é positiva (isto é, atua no sentido contrário ao do movi~
numa rampa mento) numa subida, ou negativa (isto é, atua no sentido do movimento)
numa descida. O leitor que já andou de bicicleta conhece intuitivamente
o efeito da resistência de rampa nas duas situações.
Além destes três componentes da resistência, existe um outro, a resistência de
curva, que é causada tanto pela força centrífuga que aumenta o atrito entre a roda
do trem e o trilho, como pelo fato de que as rodas externas do truque são arrastadas
numa curva, já que o conjunto formado pelo eixo e as rodas tem a geometria de
um cilindro.
Assim sendo, a resistência total ao movimento, R, de uma composição ferro-
viária é dada pela soma

R= Rr + Ra +Rg + Rc (l.ll)
"-...-'
Rr

em que R: resistência total ao movimento [N]


Rr: resistência de rolamento [N];
Ra: resistência aerodinâmica [N];
R1 : resistência inerente ao movimento [N];
Rg: resistência de rampa [N]; e
Rc: resistência de curva [N].

Os dois últimos termos da Equação 1.11 só existem, respectivamente, em


trechos inclinados e em curvas.
A soma da resistência de rolamento, Rn e da resistência do ar, Ra, tem um
significado especial. Esta parcela da resistência total é chamada de resistência
1.3 Resistência ao movimento 11

Fig. 1.9: Truque ferroviário Fig. 1.10: Componentes de um mancai de fricção

básica ou de resistência inerente ao movimento porque ela está presente toda vez
que um trem está em movimento, ao passo que as outras duas parcelas da resistência
só surgem quando o trem passa por uma rampa ou curva.

1.3.1 Resistência de rolamento

A resistência de rolamento está ligada à tecnologia de construção dos veículos


ferroviários. A foto da Figura 1.9 mostra um truque ferr.oviário, o conjunto formado
pelas rodas, eixos e a suspensão. A estrutura do vagão (chamada de caixa) apóia-se
em dois truques. No truque, ocorre a transferência do peso do vagão ou locomotiva
para os eixos. Como as cargas envolvidas são elevadas -cerca de 20 t em cada eixo
do truque - o atrito entre o eixo e o mancai é alto. Até recentemente, os truques
ferroviários eram equipados com um sistema de de manga e mancai, o chamado
manca! de fricção.
A Figura 1.10 mostra os componentes de um mancai de fricção. Nos mancais
de fricção, um mancai de bronze apóia-se na manga do eixo, que é feito de aço,
como mostra o esquema na parte direita da Figura 1.1 O. Para redução do atrito entre
a manga e o mancai, a superfície de contato entre essas duas peças é revestida por
uma fina película de óleo, que é espalhado por meio de uma mecha lubrificadora que
fica imersa em óleo lubrificante; o conjunto fica protegido pela caixa de graxa. A
manutenção das caixas de graxa é muito simples, limitando-se à reposição do nível
de óleo. Todavia, a falta de manutenção adequada ocasiona o superaquecimento da
caixa- "caixa quente", no jargão ferroviário-, que pode ser a causa de acidentes
graves.
Hoje em dia, os mancais de rolamento substituíram os mancais de fricção, já
que as limitações tecnológicas que impediam a fabricação de rolamentos capazes
de suportar os elevados níveis de tensão existentes fôram superados. Apesar de
requererem manutenção constante e mais custosa, os mancais de rolamento pro-
duzem um atrito menor que o existente num eixo apoiado em mancais de fricção.
12 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

Este atrito é um dos principais responsáveis pela resistência de rolamento.


Uma das diversas abordagens empíricas para estimar a resistência de rolamento
foi proposta por William S. Davis Jr., em 1926, e ficou conhecida como af6rmula
de Davis. Davis, usando os resultados de ensaios realizados em 1910 por Edward
C. Schmidt, na Illinois Central Railroad (EUA), procurou obter um modelo que
pudesse ser aplicado a qualquer composição ferroviária ou metroviária e que ser-
visse para estimar a resistência de rolamento a partir de parâmetros dos veículos
tais como peso, número de eixos etc. Em 1937, na mesma ICR, John K. Tuthill
repetiu os ensaios de Schmidt para velocidades mais altas e esses dados adicionais
possibilitaram uma revisão na fórmula original. Segundo a fórmula de Davis, a
resistência de rolamento pode ser calculada por:
CzX )
Rr= ( c1+G+c3V G, (1.12)

em que Rr: resistência de rolamento [N];


x: número de eixos da locomotiva ou vagão;
G: peso da locomotiva ou vagão [kN];
V: velocidade de operação [krnlh];
c1 : constante que incorpora o efeito da deformação da roda e do
trilho;
c2 : constante que incorpora o efeito do atrito nos mancais; e
c3 : constante que incorpora o efeito do atrito entre o friso das rodas e
o trilho.

O primeiro termo da fórmula de Davis, c1 .G, representa a resistência gerada


pela deformação da roda e do trilho, que é proporcional ao peso do veículo. O
valor típico da constante c 1 é 0,65. O segundo termo da fórmula representa a
resistência gerada pelo atrito nos mancais, que é função do número de eixos, x.
Para a constante c2 , costuma-se adotar o valor de 125. O terceiro termo da fórmula
reflete o efeito do balanço, choques e atrito nos frisos das rodas, e varia com a
velocidade do trem: quanto maior a velocidade, maior a resistência gerada por
esses fatores. Os valores normalmente adotados para a constante c3 são 0,009,
para vagões de passageiros e locomotivas, e 0,013, para vagões de carga.
Um cuidado especial deve ser tomado para garantir que as unidades das variá-
veis (velocidade, peso, etc.) usadas em fórmulas empíricas como a Equação 1.12
sejam as especificadas, já que os seus coeficientes incorporam os fatores para
conversão de unidades. Além disto, as constantes são apresentadas sem especi-
ficação das unidades, como é usual na literatura especializada em Engenharia de
1.3 Resistência ao movimento 13

Transportes. Portanto, antes de se realizar uma análise dimensional das fórmu-


las apresentadas aqui, é preciso determinar as unidades de cada constante, ou os
resultados da análise dimensional não serão confiáveis.
A resistência ao rolamento é um pouco maior no início do movimento; diz-se
também que ela aumenta com o tempo de repouso do veículo. Este fenômeno
explica-se pela ruptura da película de óleo que separa a manga do mancal, que é
restaurada quando o eixo reinicia o movimento. A deformação lenta do trilho sob
o peso óo -vagão, ainóa gue pequena, também contribui para essa maior resistênc'la
inicial.

1.3.2 Resistência aerodinâmica

A resistência aerodinâmica individual de um vagão ou locomotiva de um trem é


estimado pela expressão:
(1.13)

em que Ra: resistência aerodinâmica [N];


Ca: constante que reflete as características aerodinâmicas do vagão
ou locomotiva (veja Tabela 1.2);
A: área frontal do veículo (veja Tabela 1.2); e
V: velocidade de operação [km/h].

A Equação 1.13 é uma aproximação da resistência aerodinâ-


mica, já que ela depende do ângulo de ataque (a direção do vento
em relação ao trem), da velocidade do vento, do tipo de carro, da Tab. 1.2: Área frontal e Ca típicos para veí-
posição do carro no trem e do número de Reynolds, que é função do culos ferroviários
tipo de acabamento da superfície externa do carro e da forma das Veículo Área Ca
suas bordas e cantos. Ao se estimar a resistência do ar, é normal Locomotivas
admitir que a velocidade do vento é nula e aerodinâmicas 9-11m2 0,031
e normais 9-11m2 0,046
Os valores do coeficiente Ca para locomotivas indicados na Ta-
bela 1.2 são valores médios, que devem ser usados para todas as Vagões
e carga 7,5-8,5 m2 0,009
locomotivas de uma composição, apesar de a primeira locomoti-
e passageiros 10-11 m2 0,006
va enfrentar uma maior resistência do ar do que as d{;mais. Esta
aproximação não induz a erros significativos, pois a resistência do
ar, para as velocidades comumente observadas não é a força de
resistência ao movimento preponderante, como se verá a seguir.
14 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

1.3.3 Resistência inerente ao movimento

A resistência inerente ao movimento, que também pode ser chamada de resistência


básica, é a soma das parcelas da resistência total que correspodem à resistência
de rolamento e à resistência aerodinâmica. A resistência inerente ao movimento
de um vagão de carga cuja massa bruta é 100 toneladas (peso= 980,6 kN), área
frontal é 8 m2 , que se move a 60 km/h é:

Rr = Rr+Ra = 125.4 J
[ 0,65 + 980 ,_6 + 0,013. 60 980,6+0,009. 8. 60
2
= 2161 N.

Este cálculo mostra que a maior componente da resistência bá-


2,25
z sica é a resistência de rolamento e que a resistência aerodinâmica é
=- 2,00 significativamente menor que a de rolamento, representando apenas
·;n"'
t.l
1,75 Peso bruto cerca de 12% da resistência total. Se a velocidade do vagão passa
-ta

~
.Q
1,50 para 100 kmlh, a resistência aerodinâmica passa a ser responsável
"'
·c:;
c: -120t por 23% da resistência básica e cerca de 33% da resistência básica
<Q) 1,25 -100t
c;; se a velocidade for 140 km/h.
·;n 1,00
-80t
Q)
-60t
~
0,75 O gráfico da parte superior da Figura 1.11 exibe a variação da
o 20 40 60 80 100 resistência total de um vagão de carga em função da velocidade e da
Velocidade (kmlh)
3,00.,--------------, sua massa bruta. Pode-se notar que a inclinação das curvas aumenta
com a velocidade, refletindo o aumento não linear da resistência
-~"' ~ 2,50 do ar, que é função do quadrado da velocidade. Pode-se notar que
~~ a resistência também cresce se o peso bruto total do vagão crescer.
"'"'
o~ 2,00
=-
<Qlt.l
:!~
O gráfico da parte inferior da Figura 1.11 mostra como a uti-
~ ~ 1,50 lização de vagões de peso bruto total maior é vantajosa, do ponto
~
de vista da resistência básica. No gráfico, mostra-se a variação
1,00 +----+---+---+--+---t--~-1
o 20 40 60 80 100
da resistência básica específica (a razão Rr j G) com a velocidade.
Velocidade (km!h) Pode-se notar que o aumento da velocidade faz com que a resistên-
Fig. 1.11: Efeito do peso e da velocidade so- cia básica específica aumente de forma não linear, em função da
bre a resistência de um vagão resistência do ar.
Entretanto, observando-se as curvas daquele gráfico, pode-se
também perceber que um aumento no peso bruto total do vagão implica numa
redução da resistência básica específica, o que demonstra a existência de uma
economia de escala. Os operadores, percebendo esta característica da resistên-
cia específica, têm procurado utilizar vagões de maior peso bruto total visando a
obtenção de ganhos de produtividade.
1.3 Resistência ao movimento 15

Além das Equações 1.12 e 1.13, existem outras fórmulas para estimar a resistên-
cia básica. Essas fórmulas são usualmente estabelecidas com base em medições
experimentais, visando captar melhor as particularidades dos vagões e locomo-
tivas da frota de cada empresa. Um exemplo dessas outras fórmulas é a usada
pelo Metrô de Londres: R 1 = 2,7G + 0,88V 2 [N], em que G é o peso em qui-
lonewtons [kN]; V, a velocidade em quilômetros/hora [kmlh]; e R 1 , a resistência
básica em newtons [N].

1.3.4 Resistência de rampa

A resistência de rampa é causada pela componente da força peso que atua na


direção do movimento. Numa subida, a componente do peso atua no sentido
contrário ao do movimento, sendo, portanto, uma resistência; numa descida, por
.
atuar no mesmo sentido do movimento, ela não é uma resistência ao movimento
na acepção mais estrita do termo. Nas descidas, a força de frenagem deve ser
capaz de contrabalançar essa componente do peso, para evitar que o trem acelere
descontroladamente.
As rampas em ferrovias e rodovias são normalmente expressas em porcenta-
gem, ou seja, o aumento em elevação em metros por cem metros, o que corresponde
à tangente do ângulo que a rampa faz com a horizontaL As rampas de ferrovias
são sempre bem suaves - no trecho da Serra do Mar, entre São Paulo e Santos, a
rampa máxima é 2%, o que corresponde a uma variação de apenas 2 em na cota a
cada metro percorrido.
O diagrama da Figura 1.12 mostra as forças que atuam numa
locomotiva numa rampa. Seja P o peso total da locomotiva em
newtons [N]; a componente do peso que atua na direção do movimento
é P . sen a, sendo que a é o ângulo que a rampa faz com a horizontal.
Para ângulos pequenos, o seno e a tangente são praticamente iguais e,
admitindo-se que sen a = tan a,

i
Rg = Ptana = P100
- [N], (1.14)

em que i é a declividade da rampa em porcentagem [o/6) ou em metros Fig. 1.12: A resistência de rampa
por 100 metros [m/1 00 m] e tanto o peso como a resistência de rampa
são dados em newtons [N1.
A Equação 1.14 serve para estimar a resistência de rampa Rg em newtons [N],
a partir do peso P também em newtons [N1. No entanto, é mais usual que o peso
16 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

dos trens seja dado em quilonewtons [kN], em virtude da magnitude da força peso.
Se G for o peso em quilonéwtons [kN], vale a relação P = 1000 G, que pode ser
usada na Equação 1.14:

i i
R = P- = 1000 G - = 10 G i (1.15)
g 100 100

sendo que G é o peso da locomotiva ou vagão em quilonewtons [kN].


A resistência de rampa costuma ser a maior parcela da resistência ao movi-
mento. Seja o vagão de 100 t (G = 100. g = 980,6 kN), que viaja à 60 km/h,
usado para estudar a resistência básica no item 1.3.3, à página 14. Numa rampa de
0,5%, a resistência total, que é a resistência básica mais a resistência de rampa, é:

R= Rr + Rg = 2161 + 10. 980,6.0,5 = 7064 N.

Ou seja, a resistência de rampa é mais que o dobro da resistência inerente ao


movimento (69% da resistência total). Se a rampa fosse de 2%, a resistência de
rampa seria cerca de 90% da resistência total, o que demonstra claramente porque
rampas íngremes devem ser evitadas em ferrovias.

1.3.5 Resistência de curva ·

A Figura 1.13 mostra as forças que atuam num veículo que faz uma curva com
superelevação e. A resultante U da força centrífuga Fc e do peso G pode ser
decomposta em duas forças: a força T, que atua na direção perpendicular à via, e
a força Frc• que atua na direção do eixo. Idealmente, a superelevação e é tal que a
componente Frc é nula, mas nas curvas nas quais a superelevação não é a ideal, o
efeito da ação da força centrífuga serve para aumentar a resistência ao movimento.
Nas ferrovias, a força Frc comprime o friso das rodas contra a lateral do trilho,
causando uma componente de atrito adicional. Além disso, como os eixos aos quais
as rodas de um truque ferroviário conectam-se são fixos (isto é, não se movem em
curvas), existe uma tendência para as rodas externas serem arrastadas quando o
trem se move numa curva, já que o conjunto tem a geometria de um cilindro.
Fig. 1.13: Forças que atuam
num vagão em uma curva Nas ferrovias, a estimativa da resistência de curva é normalmente feita através
de fórmulas empíricas, já que sua determinação teórica depende de diversos parâ-
metros cuja influência ainda não é muito bem compreendida. AAREA2 recomenda
2American Railway Engineering Association
1.3 Resistência ao movimento 17

que a resistência de curva seja calculada de forma a ser inversamente proporcional


ao raio da curva, como na expressão:
G
Rc = 698-; (1.16)
r

resistência de curva [N];


peso da locomotiva ou vagão [kN]; e
r: raio da curva [m].

Como para a resistência básica, existem outras fórmulas para estimar a resistência
de curva e em todas elas a resistência de curva é inversamente proporcional ao
raio da curva. O leitor interessado deve consultar outras fontes 3 para obter essas
fórmulas.

Exemplo 1.1 Determinar a resistência adicional que atua sobre um vagão de carga de
peso bruto total de 100 t, ao entrar numa curva cujo raio é 500 m.

Solução: Usando-se a expressão 1.16, obtém-se que um vagão de carga de 100 ton,
passa a encontrar a seguinte resistência adicional ao entrar numa curva de 250 m
de raio:
980,6
Rc = 698. = 2378 N.
500

Compensação de rampas em curvas

Ainda que a resistência específica de curva não seja muito grande (no Exemplo 1.1
é 24 N/t), a resistência de curva pode prejudicar a operação de composições em
rampas íngremes, já que normalmente as composições são dimensionadas para
explorar ao máximo a potência das locomotivas. Por isso, costuma-se projetar a
ferrovia de tal forma que a inclinação da rampa é reduzida nas curvas, de forma
a compensar a resistência adicional causada pela curva. Assim, pode-se garantir
que a soma da resistência de curva e da resistência de rampa é menor ou igual à
resi"stência de rampa encontrada na rampa máxima do trecho:

(1.17)

Essas rampas compensadas garantem uma utilização mais eficiente da potência


disponível das locomotivas, porque evitam a necessidade de dar ao trem capacidade
adicional de tração que só seria utilizada em algumas curvas.
3Brina, H.L. (1982). Estradas de Ferro. Livros Técnicos e Científicos, Rio de Janeiro.
18 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

Exemplo 1.2 Determinar qual a redução na rampa necessária para compensar o efeito
da curva de 250m de raio, do Exemplo 1.1.

Solução: Para calcular a rampa compensada do trecho em curva, deve-se determinar


a rampa que provocaria uma resistência equivalente à causada pela curva. No caso
da curva de 250 m de raio, essa rampa equivalente pode ser calculada a partir do
valor da resistência de curva, 2378 N:
. 2378
Rc = Rg =} 2378 = 10. (980,6). i=} i = 9806 = 0,24%
No caso, se a rampa ao longo de uma curva de 250m de raio for reduzida em 0,24%,
o trem pode operar sem necessidade de aumentar sua capacidade de tração.

Só existe a necessidade de compensar a rampa se Rgmax < Rg(i) + Rc. Seja


imax a rampa máxima no trecho, pode-se determinar a rampa limite ÍJim, que é a
maior rampa que não precisa ser compensada:

10. G. Ímax = 10. G, ium + Rc =}


. . 69,8
lJim = lmax "- ~~ (1.18)
r
Portanto, se a rampa i numa curva for maior que ium, deve-se rebaixá-la para Í!im·

Exemplo 1.3 Supondo-se que a rampa máxima num trecho seja 1,2%, determinar qual a
rampa limite para curvas de 250m de raio.

Solução: Para uma curva de 250m de raio e rampa máxima de 1,2%, a rampa
limite, acima da qual deve-se reduzir a inclinação para evitar os efeitos deletérios
da resistência de curva,. pode ser calculada pela Equação 1.18:
. . 69,8 69,8
Zlim = lmax- - r - = 1,2- 250
= 0,92%
Ou seja, para não ser necessário aumentar a capacidade de tração da composição,
todas as curvas de 250 m de raio devem ter compensação de rampa se estiverem em
trechos onde a inclinação for maior que 0,92%.

1.4 Determinação da velocidade de equillbrio

Considere um trem que viaja ao longo de um trecho reto e plano. Esse trem
locomove-se sob a ação de uma força motriz Fr e de uma força R1 que é a resultante
das forças que resistem ao movimento.
1.4 Determinação da velocidade de equilíbrio 19

St·~
Se o trecho é reto e plano, a resultante R 1 é a soma da re-
sistência ao rolamento Rr e da resistência do ar Ra e é chamada
de resistência básica. Tanto a força motriz como a resistência bá-
sica atuam na mesma direção, a direção do movimento, porém em o"" o _o.,.u_o c. o. o :o
u.~.u a c c o o. o o c: o o o
~C·

sentidos contrários. O movimento do trem depende da resultante Fig. 1.14: Forças atuando na direção do movi-
dessas duas forças: se F 1 - R 1 f; O, a composição .está acele- mento
rando ou desacelerando; se F1 - R 1 = O, a velocidade do trem
mantém-se constante.
Quando F1 = R 1 , a velocidade à qual o trem viaja é chamada de velocidade
de equilíbrio. Uma vez alcançada a velocidade de equilíbrio, a velocidade em que
o trem movimenta-se mantém-se constante se a potência do motor for mantida
constante e se não surgirem outras componentes da resistência - que podem ser
geradas por uma cmva ou uma rampa.
A resistência inerente ao movimento varia com a velocidade e deve ser calcu-
lada em função do número de locomotivas e de vagões que formam o trem:

Rr - Rr + Ra
Rr nL RrL + nv Rrv + nL RaL + nv Rav (1.19)

em que resistência básica total;


RrL: resistência de rolamento de uma locomotiva;
Rrv: resistência de rolamento de um vagão;
RaL: resistência do ar de uma locomotiva;
Rav: resistência do ar de um vagão;
n L: número âe locomotivas; e
n v: número de vagões.

Como na velocidade de equilíbrio, a força motriz (Equação 1.8) é igual à re-


sistência total ao movimento, pode-se determinar o valor da velocidade de equilí-
brio igualando-se as Equações 1.8 e 1.19:

(1.20)

A Equação 1.20 é um polinômio do terceiro grau que pode ser resolvido com
uma certa facilidade. No entanto, a solução gráfica para determinação da veloci-
dade de equilíbrio é mais interessante, pois permite observar o comportamento do
trem sob diversas situações. Além disso, a solução gráfica facilita a determinação
de novas velocidades de equilíbrio em rampas ou curvas.
20 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

Graficamente, a determinação da velocidade de equihôrio consiste em estabe-


lecer, num gráfico cartesiai_lo, o ponto em que a função força motriz intercepta a
função resistência inerente ao movimento. O exemplo a seguir ilustra como obter
uma solução gráfica para a velocidade de equilíbrio.

Exemplo 1.4 Seja um trem que viaja num trecho reto e plano e é composto por 3 loco-
motivas de 3000 hp, com peso de 1300 kN cada, e 80 vagões de minério, com peso de
1100 kN cada. Sabe-se que a área frontal das locomotivas é de 10m2 , e a dos vagões,
8,5 m 2 ; tanto os vagões como as locomotivas têm quatro eixos, sendo que nas locomotivas
todos os eixos são eixos motrizes. A velocidade máxima das locomotivas é 105 km/h; a
mínima, 15 km/h; e a aderência, 0,2. Determinar a velocidade de equilíbrio desse trem.

Solução: Uma vez determinadas as curvas que mostram a variação da força m()triz e
da resistência básica em função da velocidade do trem, a solução é obtida plotando-
se as duas funções num gráfico força vs. velocidade, sendo que a velocidade de
equilíbrio é determinada em função do ponto onde as duas curvas interceptam-se.
Cálculo da força motriz: A função que mostra a variação do esforço trator com a
velocidade é dada pela Equação 1.8:
nL P 3. 3000 19575 kN]
F 1 = 2175 ---y- = 2175 V =-V- [ (1.21)

No entanto, a força motriz não pode ser maior que o limite da aderência. No caso,
f = 0,2, o que faz com que Frmax = f Td = 3(0,2. 1.300) = 780 kN- ou seja, se
a força motriz for maior que 780 kN, as rodas derrapam e o trem não se move.
Como a velocidade máxima do trem é 105 k:m/h, a força motriz é nula para velo-
cidades acima da máxima. O gráfico da Figura 1.15 mostra a função força motriz
para esta composição.
Cálculo da resistência inerente: O cálculo da resistência inerente requer a determi-
nação das várias parcelas da resistência para as locomotivas (RrL) e para os vagões
(Rrv)·
A resistência total de rolamento é calculada a partir da soma das resistências de
rolamento das locomotivas e dos vagões:
e Locomotivas:

= nL (CJ + c~:L +c3V) GL = 3 (o,65 +


125 4
·
1.300
+ o,oo9v) 1.300
4.035 + 35,1 V [N]
o Vagões:

Rrv = nv (c!+ c;;: + V) Gv


C3
125.4
80 ( 0,65 + l.lOO + 0,013V) 1.100
Rrv = 97.200 + 1.144 V [N]
1.4 Determinação da velocidade de equilíbrio 21

80Ó ~-------.

600
z
6
=
~ 400
o
u..
Resistência básica
200
~
Vequilfbrio

0~-+--+-~--~--~-+--~+-~----~-L~
O W ~ M ~ 100
Velocidade (km/h)

Fig. 1.15: Solução gráfica para a velocidade de equilíbrio

c Resistência total de rolamento:


Rr = RrL + Rrv = 101.235 + 1.179,1 V [N] (1.22)

A resistência aerodinâmica também deve ser calculada para locomotivas e vagões:


c Locomotivas:

RaL = nL (Ca AL V 2 ) = 3 (0,046. 10. V 2 ) = 1,38 V 2 [N]


411 Vagões:

Rav = nv (ca Av V 2 ) = 80 (0,009. 8,5: V 2 ) = 6,12 V 2 [N]


411 Resistência aerodinâmica total:

Ra =RaL +Rav = 1,38V 2 +6,12V 2 =7,5V 2 [N] (1.23)

Assim sendo, a resistência inerente ao movimento total é a soma das resistências


totais de rolamento (Equação 1.22) e do ar (Equação 1.23):
Rr = Rr + Ra = 101.235 + 1.179,1 V+ 7,5V 2 [N] (1.24)
A Figura 1.15 mostra a função resistência inerente plotada na mesma escala da
função força motriz4 . O leitor deve notar que o uso de uma planilha eletrônica
facilita bastante a plotagem dessas duas funções.
O ponto de interseção das duas curvas determina a velocidade de equilíbrio que,
conforme mostra o gráfico da Figura 1.15, é 80 krnlh para esta composição. Se a
Equação 1.20 for usada, o valor para a velocidade de equilíbrio é 80,2 krn!h, muito
próximo do obtido com a solução gráfica.
4 Note-se que as forças estão dadas em [kN], ao passo que a Eq. 1.24 fornece a resistência básica
em[N].
22 • Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

1.4.1 Efeito de rampas na velocidade de equilíbrio

A determinação gráfica da velocidade de equilíbrio de um trem que viaja num


trecho reto e plano permite determinar, com facilidade, a velocidade de equilíbrio
numa rampa, como se verá a seguir.
Conforme indica a Equação 1.24, a resistência básica do trem varia com a
sua velocidade; a resistência de rampa, entretanto, é uma força constante que
não depende da velocidade. Assim sendo, pode-se determinar a resistência total
R = Rr + Rg de um trem que viaja numa rampa de declividade i adicionando-se
uma parcela constante Rg = 10 G i à resistência inerente ao movimento. A nova
velocidade de equilíbrio da composição é a que corresponde ao novo ponto de
interseção entre a curva da força motriz e a curva da resistência total. O exemplo
a seguir mostra como proceder para determinar o efeito de rampas, uma vez que
as curvas força motriz e resistência básica vs. velocidade t~nham sido plotadas.

Exemplo 1.5 Suponha que o trem do Exemplo 1.4 passe a viajar num aclive de 0,65%. A
determinação da nova velocidade de equilíbrio do trem pode ser feita graficamente, como
mostrado a seguir. ·

Solução: Sabendo-se que a resistência de rampa é constante e não depende da


velocidade, pode-se determinar a resistência total R do trem na rampa adicionando-
se Rg = 10 G i à resistência total de rolamento. O peso G corresponde ao peso
total do trem, isto é, é a soma dos pesos das locomotivas e dos vagões: G =
nL GL + nv Gv = 3. 1.300 + 80. 1.100 = 91.900 kN.
A resistência total de rampa é:

Rg = lO(nL GL + nv Gv )i = 10.91.900. 0,65 = 597.350 N. (1.25)

Com isto, a resistência total do trem pode ser determinada a partir das Equações 1.24
e 1.25:
R= Rr + Rg = 698.585 + 1.179,1 V+ 7,5V 2 N. (1.26)
O gráfico da Figura 1.16 mostra a determinação gráfica da velocidade de equilíbrio
numa rampa de 0,65% que, como pode ser visto, é ligeiramente superior a 25 km/h
(a solução exata é 26,6 kmlh).

Numa descida, o trem não precisa utilizar a força motriz máxima. De fato,
pode-se supor que a potência utilizada numa descida é zero - isto é, os motores de
tração não são acionados para mover o trem 5.
5Na verdade, numa descida, os motores de tração são usados para frear dinamicamente o trem,
conforme discutido no item 1.5.
1.4 Determinação da velocidade de equilíbrio 23

600 de rampa
Rg(i =0,65%)
z-=.. 400
ai
~
o
1.1.. 200

o
-200

Fig. 1.16: Cálculo da velocidade de equilíbrio em rampas

Se P = O, a curva de força motriz é nula e coincide com o eixo x. O trem


move-se sob a ação da componente da força peso na direção do movimento, a
resistência de rampa, que numa descida é negativa. Nesse caso, a velocidade de
equilíbrio do trem seria aquela na qual a resistência básica iguala-se à resistência
de rampa. O exemplo a seguir mostra como determinar a velocidade de equilíbrio
para um trem que trafega num declive, que corresponde ao ponto em que a curva
de resistência total cruza o eixo x.

Exemplo 1.6 Suponha que o trem do Exemplo 1.4 passe a trafegar num declive de 0,25% e
os motores de tração não estão sendo usados para mover o trem. Determinar graficamente
a nova velocidade de equilíbrio.

Solução: Numa descida na qual a força motriz Ft = O, a única força que atua sobre
o trem é a resistência total

R= Rt + Rg = Rt + 10 G m.
Como a declividade m é negativa- isto é, o trem viaja num declive-, então Rg < O.
Isso faz com que a velocidade do trem atinja o equilíbrio quando Rt = Rg·
No caso deste exemplo, como a rampa m = -0,25%, então

Rg = -2,5(nL G L+ nv Gv) = -229.750 N.

Em sendo assim, a resistência total é dada por

R= -128.515 + 1.179,1 V+ 7,5V 2 [N].


24 . Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

O gráfico da Figura 1.16 mostra que a nova velocidade de equilíbrio é aproximada-


mente 75 kmJh (74,1 kmlh).

Os gráfico das Figuras 1.15 e 1.16 podem ser elaborados com o auxilio de uma
planilha eletrônica. De fato, o leitor é encorajado a usar uma planilha para analisar
o movimento do trem, já que é grande a facilidade de elaboração de gráficos de
funções nas planilhas eletrônicas. Além disso, a precisão obtida na solução gráfica
é mais que suficiente para as necessidades de planejamento e análise do movimento
de trens.

1.5 Frenagem de composições ferroviárias

Os trens dispõem tanto de sistemas mecânicos como de sistemas dinâmicos de


frenagem. Os freios mecânicos são sapatas que, ao serem comprimidas contra as
rodas, aplicam uma força de desaceleração na composição, desde que não ocorra
um deslizamento das rodas nos trilhos. Os freios dinâmicos utilizam-se da pro-
priedade de os motores de tração elétricos poderem atuar como geradores, quando
acionados sem alimentação elétrica. Desta forma, a corrente elétrica gerada pelo
movimento do trem na rampa produz resistência ao movimento e é dissipada como
calor por resistências resfriadas por ventiladores movidos por essa mesma corrente
elétrica (veja a ilustração da Figura 1.3 à página 5).
Nas locomotivas diesel-elétricas, toda energia elétrica gerada pela frenagem
dinâmica é dissipada pelas resistências das locomotivas; nos ramais eletrificados,
como nos metrôs, a energia elétrica gerada pela frenagem dinâmica pode ser devol-
vida para a linha de distribuição e usada para movimentar outros trens, reduzindo-se
assim o consumo total de eletricidade.
Até a I Guerra Mundial, os freios de cada vagão eram independentes e acio-
nados manualmente pelo guarda-freios. A frenagem era um processo complexo e
demorado, o que terminava por causar um grande número de acidentes. Hoje em
dia, os freios de todos os vagões são acionados simultaneamente por meio de ar
comprimido, num sistema inventado nos Estados Unidos por George Westinghou-
se, em tomo de 1860.
No sistema de frenagem mecânica a ar comprimido, cada roda possui uma
sapata de freio e cada vagão possui um reservatório de ar comprimido. Os vagões
são conectados entre si e ~ locomotiva por meio de mangueiras, formando um
conduto no qual a pressão do ar é de cerca de 80 psi (0,552 MPa). Cada vagão
possui uma válvula (válvula tríplice) para controlar os freios, que é acionada por
1.5 Frenagem de composições ferroviárias 25

diferenças de pressão. Se a pressão no conduto for igual à pressão no reservatório de


ar comprimido do vagão, as sapatas são mantidas afastadas das rodas; se a pressão
no conduto for menor que a pressão do reservatório, as sapatas são acionadas
enquanto a pressão do conduto for menor que a do reservatório. Restaurando-se a
pressão do conduto, as sapatas são afastadas das roda:s.
A intensidade da variação de pressão permite o controle da força de frenagem:
um pequeno decréscimo na pressão do conduto faz com que a válvula transmita
essa pequena diferença ao freio, que comprime levemente as sapa~as contra as
rodas; um grande decréscimo de pressão faz com que as sapatas seja..."'ll fortemente
comprimidas contra as rodas. Como a velocidade de propagação da diferença de
pressão no conduto de ar comprimido é de 200 m/s, pode-se frear toda a composição
quase que instantaneamente.
Além do reservatório de ar comprimido para o freio de serviço, um outro
reservatório é usado para acionar os freios em situações de emergência, tais como
se o conduto entre os vagões romper-se acidentalmente (como no caso de um vagão
desengatar-se do resto do trem).

1.5.1 Determinação da força limite de frenagem

Quando um trem está sendo freado, é importante que a força Q aplicada nas
sapatas de freio seja tal que a roda nunca pare de rodar durante o processo p
de frenagem. Se a roda travar (a chamada "calagem" da roda, no jargão fer-
roviário), haverá apenas um atrito de deslizamento da roda sobre o trilho,
Q
que é menor que o atrito da sapata sobre a roda. Com a roda em movimen-
to, haverá ainda a ação retardadora do atrito de rolamento, que favorece a
frenagem. Além disso, quando as rodas travam ocorre a formação de de-
formações - "calos" - no aro das rodas que causam trepidações e ruídos
incomôdos.
A Figura 1.17 mostra as forças que atuam numa roda de um trem que
está sendo freado num trecho plano. Chamando-se fs o coeficiente de atrito
entre a sapata do freio e a roda e Q a força que coinprimea· sapataçoi}tra Fig.l.l7: Frenagemdeumarodade
a roda, o conjugado retardador que atua sobre a roda é Q.fs.r. 'Apesar de trem
suprimido o esforço trator na roda, ela continua girando, pois está sendo
submetida a um conjugado P.j1 .r, sendo P o peso descarregado pela roda e fr
o atrito existente entre a roda e o trilho. Para que não ocorra a calagem e a roda
continue girando, o conjugado retar:~ador não pode ser maior que o conjugado
aplicado sobre a roda: Q.f~.r < P.fr.r ou seja, Q.fs < P.fs·
26 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários
---~

A força de frenagem limite, que é a maior força que pode ser usada para frear o
trem, depende do coeficiente de atrito entre as rodas e os trilhos e da força normal
nas rodas que são freadas. O coeficiente de atrito normalmente varia entre 0,2 para
velocidades baixas e O, 1 para velocidades altas, dependendo do estado do trilho
(úmido, seco, ou sujo). A força de frenagem limite que pode ser desenvolvida por
um trem num trecho plano·é a soma da força máxima de frenagem que pode ser
aplicada em cada roda do trem sem que haja calagem. Como existem sapatas de
freio em todas as rodas do trem, a força de frenagem limite é:

(1.27)

em que força limite de frenagem [N];


coeficiente de atrito entre o trilho e a roda;
nL: número de locomotivas;
NL: normal ao peso da locomotiva [N];
nv: número de vagões; e
N v: normal ao peso do vagão [N].

1.5.2 Força efetiva máxima de frenagem

Como os sistemas de frenagem não são perfeitos, a força de frenagem que efetiva-
mente pode ser usada é inferior à força limite de frenagem. A força de frenagem
que efetivamente pode ser obtida num trem qualquer é:

(1.28)

em que força de frenagem efetiva máxima [N];


fator de eficiência do sistema de frenagem; e

os demais parâmetros são os definidos para a Equação 1.27. A eficiência TJ dos


sistemas de frenagem é tipicamente da ordem de 30%.

Exemplo 1.7 Seja o trem do Exemplo 1.4, composto por 3 locomotivas (G L = 1300 kN)
e 80 vagões (Gv = 1100 kN). A força limite de frenagem e a força máxima de frenagem
que podem ser desenvolvidas por este trem num trecho plano podem ser calculadas como
se mostra a seguir.

Solução: A força limite de frenagem depende apenas do coeficiente de atrito e da


normal ao peso do trem. Supondo que o coeficiente de atrito seja igual a O, 1, a força
limite de frenagem seria:
FJiim =O, 1. (3. 1300 + 80. 1100) = 9190 kN.
1.5 Frenagem de composições ferroviárias 27

A força máxima de frenagem leva em conta a eficiência do sistema de freios, que


pode ser admitida como TJ =30%:

Ffmax = 0,3. Ü, 1. (3. 1300 + 80. 1100) = 2757 kN.

A resistência inerente ao movimento, por atuar sempre no sentido contrário ao


movimento, ajuda no processo de frenagem. Apesar disso, é costumeiro ignorar o
- efeito da resistência inerente sobre a frenagem, mesmo porque o valor da resistência
inerente depende da velocidade, o que torna mais complexa a solução do problema.
Num declive, a força efetiva máxima de frenagem deve ser maior que a componente
do peso que atua na direção do movimento (a resistência de rampa).

Exemplo 1.8 Suponha que o trem do Exemplo 1.4 esteja viajando num declive de 2%, no
qual a velocidade máxima permitida seja 70 km/h. A força de frenagem necessária para
manter o trem operando a 70 km/h pode ser determinada como mostra-se a seguir.

Solução: Se este trem estiver operando num declive de 2%, a força de frenagem
necessária para manter o trem operando à velocidade máxima permitida é a diferença
entre a força de propulsão que atua sobre o trem (que no caso é apenas a componente
da força da gravidade que atua na direção do movimento, já que num declive de tal
magnitude não se usa a força de propulsão dos motores de tração) e a resistência
básica do trem:

Ff = 10 G m- [Rr(V) + Ra(V)] =?
(80.1.100+3.1.300).10.2 [(V) ]
FJ = l.OOO - Rr + Ra(V) =?
Ff 1.838- [Rr(V) + Ra(V)] kN.

A força de frenagem efetiva máxima é F f = TJ fr N. A normal ao peso, numa


rampa de 2% é N = G cosa. Como uma rampa de 2% corresponde a um ân-
gulo de 1,145° e cos I, 145° = O, 9998, pode-se desprezar o efeito da rampa na
normal ao peso. Assim sendo, se a velocidade máxima permitida para o ramal é
Vmax = 70 km/h, a composição pode ser mantida nesta velocidade, já que a força
de frenagem necessária (Ff) é menor que a máxima efetiva, F fmax = 2757 kN.

1.5.3 Distância de frenagem

A distância total para frenagem do trem, d pode ser calculada a partir da desa-
celeração aplicada pelos freios, a, e das velocidades inicial ( v0 ) e final (v) do
trem:
1 ') ')
d = - ( v - - v-).
0
-2a
28 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

Desprezando-se o efeito da resistência inerente ao movimento, pode-se estimar a


distância total de frenagem com grande facilidade. Seja G o peso total do trem,
m sua massa total e g a aceleração da gravidade; como F1 = ma, F1 = ryG.ft e
G = mg, a desaceleração de frenagem é a = ryg.ft = 2,943fr e a distância total
de frenagem d é dada por:

v2 - vo2 v2 - v2
d = - o (1.29)
-2a -5,886.ft'
sendo que as velocidades v e vo são dadas em metros por segunqo. Se as velocidades
forem expressas em quilômetros por hora, a Equação 1.29 pode ser reescrita como:

v2- v,2 - v2- v~


d = o (1.30)
-3,62 . 5,886fr -76,28fr

em que d: distância total de frenagem [m];


V: velocidade final do trem [kmlh]
Vo: velocidade inicial do trem [kmlh]; e
.ft: coeficiente éle atrito roda-trilho.

Exemplo 1.9 Qual a distância necessária para o trem do Exemplo 1.4 parar completa-
mente quando estiver trafegando na velocidade de equilíbrio, num trecho reto e plano?

Solução: Num trecho reto e plano, a velocidade de equilíbrio é 80 km/h. Supondo-


se que fr =O, 15 pode-se usar a Equação 1.30 para cálculo da distância necessária
para a parada completa (V = 0):

d =
o- 802 = 559m.
-76,28. O, 15

1.6 Comprimento máximo do trem

O comprimento máximo de um trem, isto é, o número máximo de vagões que


podem ser rebocados pelo conjunto de locomotivas, é determinado por uma série
de fatores:

• a potência e o número de locomotivas;


• o peso bruto total dos vagões e das locomotivas;
• as características geométricas do trecho (declividade dos aclives e declives);
• a capacidade de carga dos engates; e
1.6 Comprimento máximo do trem 29

• a capacidade de reiniciar o movimento no aclive crítico, que depende da


aderência.

Como deseja-se aproveitar ao máximo a capacidade de tração das locomotivas, a


velocidade de operação no aclive crítico é bem próxima da velocidade mínima de
operação.

1.6.1 Capacidade de carga dos engates

As forças horizontais que atuam numa composição (o esforço trator e a resistên-


cia ao movimento) se concentram nos engates entre os vagões. O engate entre o
primeiro vagão e a última locomotiva tem que suportar a força necessária para mo-
vimentar todos os vagões do trem. Por conseguinte, o esforço trator desenvolvido
pelas locomotivas situadas na frente da composição é limitado pela capacidade de
carga no engate que conecta a última locomotiva aos vagões.
Os engates automáticos usados hoje em dia, como o mostrado na Figura 1.18,
foram inventados por Eli Janney por volta de 1860, em Virginia, nos Estados
Unidos. Os diagran:ias da Figura 1.19 ilustram o funcionamento dos engates.
Quando dois vagões se aproximam, as garras ou pegadores estão abertas; quando
os engates se juntam, as garras pivotantes encaixam-se. Nesse instante, um fecho
interno cai e impede qualquer movimento dos pegadores. Os engates não podem
ser soltos a menos que os fechos sejam puxados para cima por um guarda-freios,
usando uma alavanca que se estende para o lado do v<rgão.
Os engates automáticos e o freio a ar comprimido foram importantes desenvol-
vimentos no transporte ferroviário, na medida em que contribuíram para aumentar
a segurança na operação dos trens. No final do século passado, mais de 20.000
ferroviários morriam anualmente nos Estados Unidos em acidentes ferroviários,
um terço desse número por causa de acidentes durante a operação de engate e

Desengatado Engatado

Fig. 1.18: Engate automático Fig. 1.19: Esquema de funcionamento do engate automático
30 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

desengate das correntes e pinos que interconectavam os vagões. O uso de engates


automáticos, que não obriga os ferroviários a ficarem em pé entre os vagões durante
as manobras, foi um fator preponderante na melhoria da segurança do transporte
ferroviário 6 .
Os engates automáticos são projetados para suportar forças de 1.500 kN dentro
do seu limite de segurança. O engate que suporta a maior força de tração ou
compressão é o situado entre o primeiro vagão e a última locomotiva. Esta força
pode ser calculada pela expressão:

(1.31)

na qual Femax: força máxima no engate [kN];


Frmax: força motriz máxima [kN];
nL: número de locomotivas; e
RL: resistência total ao movimento da locomotiva [kN].

Isto é, a capacidade do engate deve ser maior ou igual à força motriz líquida
usada para movimentar os vagões. Por outro lado, como a resistência total das
locomotivas é pequena se comparada à força motriz máxima, basta verificar se a
capacidade do engate é maior que a força motriz máxima.
Quando forças motrizes maiores que a capacidade do engate são requeridas em
baixa velocidade, pode-se posicionar locomotivas operadas por controle remoto
na metade ou no último terço da composição, para reduzir as forças nos engates e
melhorar a eficiência dos freios do trem.

1.6.2 Capacidade de reiniciar o movimento num aclive

Na determinação do comprimento máximo do trem, a capacidade de reiniciar o


movimento no aclive mais. íngreme deve ser verificada. Do contrário, pode ser
que a composição fique impossibilitada de sair da rampa sem a ajuda de uma
locomotiva adicional.
Se um trem pára num aclive e tenta reiniciar o movimento, a aderência limita
a força motriz que efetivamente pode ser usada para mover a composição (veja a
Equação 1.10, à página 8):

6Apesar disso, os engates automáticos não são usados na Europa até hoje por falta de concordância
a respeito do tipo de engate a ser usado.
1.6 Comprimento máximo do trem 31

em que Frmax: força motriz efetiva máxima [kN];


nL: número de locomotivas;
f: aderência (veja o item 1.2.2, à página 7); e
Td: peso aderente da locomotiva [kN].

Essa força motriz efetiva máxima deve ser mai<Jr que a resistência total ao
movimento, para que o trem possa retomar o movimento. A resistência total,
quando o trem volta a se mover, é a soma da resistência inerente ao movimento e
da resistência de rampa. A resistência inerente ao movimento, para um trem que
reinicia o movimento, é pequena pois a velocidade do trem é baixa. A parcela mais
significativa da resistência total é a resistência de rampa. Portanto, a força motriz
efetiva máxima deve ser maior que a resistência de rampa para que o trem consiga
reiniciar o movimento.

Exemplo 1.10 Deseja-se determinar o mais longo trem que possa viajar num aclive de
1%. As locomotivas disponíveis são as do Exemplo 1.4 e sua velocidade mínima é 20 kmlh.
Os vagões são os do mesmo exemplo.

Solução: Pode-se determinar a capacidade de tração de uma loco,motiva na rampa e,


a partir daí, estabelecer o número máximo de vagões que uma locomotiva consegue
rebocar n~quela rampa. O comprimento máximo do trem pode ser encontrado a
partir da força máxima no engate.
A força motriz exercida pela locomotiva do Exemplo 1.4 a 20 km/h é:

p 3000
Fr = 2175-
v = 2175--
20
= 326,25 kN.
Supondo-se que a aderência f = 0,22, a força motriz efetiva máxima que pode ser
usada é Frmax = f Td = 0,22. 1.300 = 286 kN, sem que as rodas da locomotiva
patinem.
Conhecida a força motriz na rampa de 1%, pode-se determinar o número de vagões
que a locomotiva consegue rebocar a partir da resistência total da locomotiva e de
um único vagão pois, na velocidade de equilíbrio, a resistência total é igual à força
motriz:

A resistência total de uma locomotiva que viaja a 20 km!h pode ser calculada por
(confira o Exemplo 1.4):

RrL + RaL + RgL ::::}


1345 + 11,7. 20 + 0,46. 20 2 + 10. 1.300. 1 14.763 N.
32 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

A resistência total de um vagão, por sua vez, é:

Rv = Rrv + Rav + Rgv ~ .


Rv = 1215 + 14,3. 20 + 0,0765.20 2 + 10. 1.100. 1 = 12.532 N.

O número máximo de vagões n v que podem ser rebocados por uma locomotiva
num aclive de I% pode ser então calculado:

286- 14,763
nv = ,
12 531
= 21,6 ~ nv = 21 vagões
sem que o limite da aderência seja violado.
Supondo-se que a força máxima admissível no engate seja 1.200 kN, o compri-
mento máximo do trem pode ser calculado a partir da força máxima no engate e da
resistência total dos vagões:

Femax 1.200
Femax 2: nv Rv ~ n = - -
Rv
= -· -- = 95,7 vagões.
12,531
Ou seja, 95 vagões podem ser rebocados numa rampa de 1% sem que a restrição
da força máxima admissível no engate seja violada. Para rebocar 95 vagões são
necessárias 5 locomotivas (95/21,6 = 4,4).
Pode-se verificar se esse trem consegue reiniciar o movimento na rampa:

Fr = nL RL + nv Rv = 5.14,763 + 95. 12,531 = 1.264 kN.

A força motriz máxima não supera o limite de aderência Frmax = n L f Td =


5 . 286 = 1.430 kN e, por conseguinte, o trem pode trafegar pela rampa de 1%
sem necessidade de locomotivas auxiliares.

1. 7 Consumo de combustível

Em muitas tecnologias de transporte, bem como em outras aplicações nas quais se


utilizam motores de combustão interna para a geração de forças, observa-se que
o consumo de combustível é diretamente proporcional ao trabalho total realizado
pelo motor:
z= Wr (1.32)

em que z: combustível consumido [.€];


W: trabalho total realizado [N.m]; e
r: coeficiente de consumo de combustível [.e.N- 1.m- 1].
1. 7 Consumo de combustível 33

O coeficiente de consumo de combustível de locomotivas diesel-elétricas é de cerca


O,ll.e.kN- 1.km- 1.
O esforço trator desenvolvido por um trem viajando ao longo de um trecho
de via varia conforme as características da via (tais como declividade, raios de
curvatura, etc.) mudam. O trabalho total realizado numa viagem é dado por:

W = fod F (x) dx
1 (1.33)

em qu.e W: trabalho total realizado num trecho de comprimento d [N.m];


F1 (x): força de tração no ponto x [N]; e -'
d: distância total viajada pela composição [m].

Entretanto, como a determinação da função F 1 (x), na prática, é um tanto quanto


complexa, costuma-se usar a seguinte aproximação da expressão da Equação 1.33:
k

W = 'L,F1 (i)di (1.34)

em que W: trabalho total realizado num trecho de comprimento d [N.m];


F1 (i): força de tração no i-ésimo segmento do trecho viajado [N];
di: comprimento do i-ésimo segmento do trecho viajado [m]; e
k: número de segmentos no trecho.

Isto é, divide-se o trecho em questão em k segmentos tais que a força de tração


requerida em cada segmento seja constante e tais que

O consumo de combustível para cada seção pode ser calculado, e o somatório deles
é o consumo total de combustível.
Outra forma bastante comum, na Engenharia de Transportes, de determinar o
consumo de combustível é através da potência utilizada:

z =r' P t (1.35)

sendo que r': coeficiente de consumo de combustível [g.hp- 1.h- 1];


P: potência do motor [hp]; e
t: tempo de utilização do motor à potência P [h].
34 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

O coeficiente de consumo de combustível para locomotivas diesel-elétricas varia


entre 160 e 190 g.hp- 1.h- 1. Note-se que as Equações 1.32 e 1.35 são equivalentes,
pois o trabalho pode ser também expresso como o produto da potência pelo tempo.

Resumo

• O desempenho de um trem é estimado a partir do esforço trator gerado pelas loco-


motivas e a resistência ao movimento oriunda das locomotivas e vagões.
o Três fatores limitam a velocidade de uma locomotiva diesel-elétrica: a corrente
máxima, a voltagem máxima e a aderência.
o A resistência ao movimento possui quatro componentes principais: resistência ao
rolamento, resistência do ar, resistência de rampa e resistência de curva.
o A velocidade de equilíbrio de uma composição ferroviária é definida como a velo-
cidade na qual o esforço trator é igual à resistência total ao movimento. ·
e A força de frenagem lintite depende do coeficiente de atrito entre as rodas e os trilhos,
que normalmente varia de 0,2 para velocidades baixas a O, 1 para velocidades altas.
• O consumo de combustível de uma locomotiva diesel-elétrica é diretamente pro-
porcional ao trabalho realizado pelo motor.

Para aprender mais

Estradas de Ferro (vol. 2), H. L. Brina. Livros Técnicos e Científicos Editora, Rio de
Janeiro, 1982.
Discute os princípios básicos da tração, da frenagem e da lotação dos trens, bem
como discute e compara o funcionamento e a operação de diversos tipos de loco-
motivas nos capítulos 1 a 6.
Railroad Engineering (2a ed.), W. W. Hay. Wiley & Sons, Nova Iorque, 1982.
Trata com detalhes de praticamente todos os aspectos do transporte ferroviário.
Introduction to Transportation Engineering and Planning, E. K. Morlok. McGraw-
Hill, Nova Iorque, 1978.
Aborda de forma sistemática e comparativa todas os modos de transporte, apontando
similaridades e diferenças. No capítulo 4, trata da mecânica de locomoção dos
veículos.
An Introduction to Transportation Engineering (2a ed.), W. W. Hay. Wiley & Sons,
Nova Iorque, 1977.
Em 1961, em sua primeira edição, foi pioneiro em tratar de forma sistemática
os aspectos tecnológicos, operacionais e econômicos das várias modalidades de
Exercícios 35

transporte. A segunda parte, formada pelos capítulos 4 a 7, aborda as tecnologias


de transporte. O capítulo 5 trata da força motriz e da resistência ao movimento para
diversas modalidades de transporte.
Rodas, W. Owen e E. Bowen. Biblioteca Científica Life, Livraria José Olympio Editora,
Rio de Janeiro, 1982.
Um livro interessante e de fácil leitura que apresenta a evolução histórica das tec-
nologias de transporte sobre rodas, contendo excelentes descrições, explicações e
gráficos que mostram o funcionamento de locomotivas, freios, engates, etc.
Urban Public Transportation Systems and Technology, V R. Vuchic. 'Prentice-Hall,
New Jersey, 1981.
Uma obra clássica da literatura em Engenharia de Transportes, aborda aspectos
tecnológicos das diversas modalidades usadas no transporte público de passageiros,
de forma clara, bem organizada e altamente informativa. Os capítulos 3 e 5 tratam
das modalidades sobre trilhos.

Exercícios

Problema 1.1 Um trem composto de um certo número de locomotivas diesel-elétricas,


cuja potência é 3.000 hp, com 6 eixos (todos motrizes), 100 t de massa, 11 m2 de área
frontal, que rebocam 25 vagões de carga geral (4 eixos, 80 t de massa, área frontal de
8,5 m 2 ) deve ser capaz de subir um aclive de 1% com uma curva de 200 m de raio, a
25 km/h. Pergunta-se:
(a) Quantas locomotivas são necessárias para isto?
(b) Qual é a velocidade máxima deste trem num trecho plano?

Problema 1.2 Qual é o número máximo de vagões que podem ser adicionados à compo-
sição determinada no problema 1.1 de modo que:
(a) A velocidade no aclive do problema 1.1 não seja inferior a 15 krn!h?
( b) A força máxima no engate seja inferior a 900 kN?
(c) O trem possa reiniciar o movimento num aclive de 1%, com aderência de 0,21?
( d) As três condições acima sejam respeitadas simultaneamente?

Problema 1.3 Se o trem determinado no problema 1.1 estiver se locomovendo à veloci-


dade máxima possível num trecho plano, qual é a distância de frenagem necessária para
uma parada completa?

Problema 1.4 Suponha que o trem do problema 1.1 viaje ao longo de um trecho de 65 km,
composto por uma seção reta e em nível de 40 km, e de um aclive de 1% de 25 km de
comprimento. Determine o volume de combustível gasto nessa viagem.
36 Capítulo 1. Mecânica da locomoção de veículos ferroviários

Problema 1.5 Considere o trem do exemplo 1.10 (pág. 31).


(a) Qual deve ser a potência total máxima que pode ser utilizada no trecho plano para que
a velocidade do trem não seja maior que o limite de velocidade (70 km/h)?
( b) Qual deve ser a força de frenagem aplicada ao trem no trecho em declive (-0,5%) para
que a velocidade do trem não exceda 70 km/h?
Sugestão: use um gráfico como o da Figura 1.15 para uma solução gráfica para o problema
Use uma planilha eletrônica para elaborar o gráfico.

Problema 1.6 Considere o trem do exemplo 1.10 (pág. 31). Quantos vagões poderiam
ser adicionados ao trem se a força máxima no engate for 1.500 kN ao invés de 1.200 kN?

Problema 1.7 Determine um trem-tipo para ser utilizado no transporte de grãos entre um
porto localizado às margens do rio Tietê e o porto de Santos. A rampa máxima compensada
que o trem carregado deve subir é 2%. O volume diário a ser escoado é de 5.000 t de soja
ou farelo. As características das locomotivas e dos vagões são dadas a seguir.
(a) É possível transportar o volume previsto com um único trem diário?
( b) Quais mudanças poderiam ser feitas para aumentar a capacidade do trem tipo no caso
de um único trem não ser capaz de transportar a demanda diária? Justifique.

Locomotivas Vagões
Peso bruto total 925kN
Tara 27,7 t
Lotação 50,5 t
Potência 2.200 hp
Eixos 4* 4
Área frontal 9,5 m2 8,5m2
Velocidade máxima 105 kmJh
Velocidade mínima 22 kmJh
Capacidade do engate 1200kN
* Todos motrizes
Capítulo 2

Mecânica da locomoção de
veículos rodoviários

O objetivo deste capítulo é discutir as principais características da loco-


moção dos veículos rodoviários. O capítulo inicia-se com uma apresentação
de vários aspectos da mecânica de locomoção (esforço trator, resistência ao
movimento e velocidades de equiliôrio), traçando-se um paralelo entre loco-
motivas diesel-elétricas e caminhões diesel. A seguii:; apresentam-se alguns
pontos básicos sobre a frenagem de veículos rodoviários, e o processo de
frenagem de um caminhão unitário é estudado. Finalmente, o capítulo ter-
mina com uma discussão a respeito da estabilidade de veículos rodoviários
em curvas horizontais.

2. 1 Introdução

Ainda que existam diferenças tecnológicas significativas entre caminhões e trens,


os princípios básicos que regem a locomoção dos veículos terrestres que usam
rodas são os mesmos e, por isso, existem diversas similaridades na forma usada
para determinar as forças envolvidas no movimento de caminhões e de trens. As
diferenças nos modelos utilizados dão-se em função das peculiaridades de cada
tecnologia- por exemplo, o uso de transmissão mecânica nos veículos rodoviários
em lugar da transmissão elétrica usada nos trens.
Neste capítulo, estudam-se as características mais importantes relativas à loco-
moção dos veículos rodoviários. Ainda que toda a teoria desenvolvida seja válida
38 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

para automóveis, o foco de interesse deste capítulo são os caminhões porque são
eles os veículos críticos no que diz respeito ao desempenho em rampas, frenagem
e estabilidade lateral em curvas horizontais.

2.2 Força motriz em veícl!los rodoviários

A tração por aderência e os conceitos básicos da mecânica de locomoção de veículos


terrestres já foram estudados no Capítulo 1, que trata das locomotivas diesel-
elétricas. Conforme discutido naquele capítulo, existem dois fatores que limitam
o desempenho de veículos terrestres que usam rodas: a força motriz máxima que
a interface roda-via pode suportar e a força motriz máxima que pode ser obtida do
torque fornecido pelo motor, dadas as características da transmissão empregada.
A menor dessas duas forças irá determinar o desempenho potencial do veículo.

2.2.1 Características do motor ideal para veículos

O motor ideal para uso em um veículo deve fornecer uma potência constante ao
longo de toda a faixa de velocidades na qual pretende-se operar o veículo, como
é mostrado na Figura 2.1. Se a potência P do motor for constante, a força motriz
produzida pelo motor varia hiperbolicamente com a velocidade, como mostra-se
~ na Figura 2.1, já que P = Fr V. Assim, o motor ideal é capaz de produzir um
Potência
esforço trator elevado quando o veículo viaja em velocidades baixas, nas quais a
capacidade de tracionar cargas, subir rampas íngremes e acelerar fortemente são
muito importantes. Os motores elétricos de tração usados nas locomotivas têm
Velocidade características que se aproximam bastante das condições ideais, como visto no
Fig. 2.1: Características ide- Capítulo 1.
ais dos motores para veículos
Os motores de combustão interna, que são usados em automóveis, caminhões,
ônibus e outros tipos de veículos automotores, possuem características de desem-
penho menos favoráveis que as dos motores elétricos e só podem ser usados se
. acoplados a uma transmissão. A despeito dessa desvantagem, são amplamente uti-
lizados por causa da excelente relação entre a potência produzida e o peso do motor,
da economia de combustível, do seu baixo custo operacional e de manutenção e a
facilidade para iniciar o funcionamento do motor.
Os dois tipos mais comuns de motores de combustão interna são os motores a
gasolina e os motores diesel. A maioria dos motores a gasolina opera num ciclo de
quatro tempos: admissão de ar e combustível, compressão, ignição e exaustão dos
gases. A combustão ocorre nos cilindros que, acionando os pistões, movimentam
2.2 Força motriz em veículos rodoviários 39

o eixo do motor (ou árvore de manivelas). Quanto maior a pressão inicial e a


temperatura, mais eficiente é o motor, desde que haja uma redução na quantidade
de combustível injetada nas câmaras de combustão. De fato, se a compressão for
suficientemente grande, o combustível inflama-se sem a necessidade da centelha
elétrica gerada pelas velas. Esse é o princípio de funcionamento dos motores diesel
que, por serem mais leves e consumirem 25% menos combustível que um motor a
gasolina de potência equivalente, são normalmente usados nos caminhões.
A explosão do combustível dentro dos cilindros movimenta os pistões para
baixo e para cima, ritmadamente. Como os pistões estão conectados ao eixo de
manivelas, esse movimento para cima e para baixo é transformado num movimento
de rotação e, portanto, em um esforço de torção. Um volante conectado ao eixo
de manivelas serve para abrandar a aspereza do movimento rotativo causada pelo
rápido e brusco movimento dos pistões. O esforço de torção que pode ser obtido na
árvore de manivelas (ou virabrequim) é usado para fornecer a força de propulsão
do veículo.

2.2.2 Características dos motores diesel

Como visto no Capítulo 1, é possível determinar a velocidade do


veículo a partir de características do motor, tais como potência e tor- 500
a> I _I ! I I
::I~

que. Portanto, é conveniente analisar as características de potência, E"~ 400 ,Jf455Nm~ I --+---!---. I
o-
~"'
1400rpm
i 1)0 kJ., 8 L:
torque e consumo dos motores à combustão interna para facilitar a 300 ; 2800 rpm --r- 110
compreensão da forma como operam os veículos rodoviários. i -- I 1,........1--f- _
L.X . 90 d'
Um motor de combustão interna só funciona adequadamente A I ;;;
/ I --~- -- 70 ~
após alcançar uma velocidade mínima de rotação, a "marcha lenta". I 1. iii"
v
como pode ser visto no gráfico da Figura 2.2, a potência, o torque e /
I
I !I ri-~-
I T[-
50~
o consumo de combustível de um motor diesel típico variam com a I .,.. ' 30
velocidade de rotação do motor. Pode-se perceber na figura, que a
velocidade mínima de rotação do motor é 1.000 rpm e, na medida -~E
I c . li-~...+::""I
em que aumenta a rotação, o desempenho do motor melhora, no I
'
,---f-l --r-
'
1 I
'
que diz respeito à potência, ao torque e ao consumo específico de . 1600 2200 2800
Rotação do motor (rpm)
combustível.
Fig. 2.2: Potência, torque e consumo especí-
Num motor diesel típico, o torque atinge o máximo e o consumo fico do motor Maxion 4TPlus
de combustível é mínimo quando a velocidade de rotação do motor
está numa região intermediária entre o número mínimo e máximo
de rotações. Idealmente, o motor deve ser operado dentro dessa faixa de rotações.
Se a velocidade de rotação do motor continuar crescendo, a pressão média efetiva
40 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

na câmara de combustão reduz-se, causando uma diminuição no torque produzido.


A potência, entretanto, coniiiÍua a crescer até o ponto em que atinge o máximo. A
partir desse ponto, o torque produzido pelo motor começa a reduzir-se de forma
mais acentuada à medida em que a velocidade do motor aumenta, resultando num
declínio na potência fornecida.

Numa locomotiva, o motor de tração está conectado ao eixo motriz por meio
de uma redução fixa e a velocidade do trem depende da rotação do motor - se o
trem viaja em baixa velocidade, o motor trabalha em baixa rotação e vice-versa.
No caso dos caminhões e automóveis, a velocidade mínima de rotação do motor
é muito alta, o que inviabiliza o uso de uma redução fixa. Para compatibilizar a
velocidade de rotação do motor com a velocidade do veículo na via usa-se uma
transmissão que permite a utilização de potência elevada (motor trabalhando em
alta rotação) com velocidade baixa (roda motriz girando em baixa rotação), como
será discutido a seguir.

2.2.3 Características do sistema de transmissão dos veículos rodoviários

Apesar de os princípios básicos que regem a locomoção de veículos sobre rodas


serem válidos tanto para trens como para carros e caminhões, eles devem ser
adaptados para levar em consideração as diferenças tecnológicas entre as duas
modalidades de transporte. Uma das diferenças mais importantes diz respeito à
transmissão.
Numa locomotiva diesel-elétrica, o motor diesel é usado para gerar energia
elétrica que serve para acionar os motores elétricos de tração que produzem o
torque necessário para movimentar o trem. Na locomotiva, o motor diesel trabalha
em regime de rotação e potência constantes e a transmissão da força do motor
diesel para os eixos motrizes é feita por meio de eletricidade - formando uma
transmissão elétrica.
O grande peso dos componentes da transmissão elétrica (motor diesel, gerador
e motores de tração) é um dos inconvenientes que mais desencorajam seu uso em
veículos rodoviários 1 . Nos caminhões e automóveis, a força produzida no motor é
transmitida para os eixos motrizes por meio de um sistema de eixos e engrenagens,
que compõem um sistema chamado de transmissão mecânica.
1Um veículo rodoviário que usa transri:rissão elétrica é o ônibus elétrico (trolebus) que,
no entanto,
não produz a energia elétrica necessária para sua locomoção. Uma rede aérea de fios conduz a
eletricidade (em corrente contínua) necessária para mover o motor de tração instalado no veículo.
2.2 Força motriz em veículos rodoviários 41

A Figura 2.3 esquematiza os componen- Semi-eixos motrizes


transmitem torque do diferencial Caixa de câmbio
tes principais da transmissão de um caminhão. para as rodas motrizes tem conjuntos de
engrenagens para
O motor diesel fornece a potência necessária compatibilizar a
velocidade do motor
para locomoção do veículo. A combustão do com a velocidade
óleo diesel nos cilindros do motor faz com que ~ desejada para o veiculo

os pistões acionem o virabrequim, que é co-


nectado a um volante cujo peso ajuda a suavi-
zar a movimentação do motor. O torque pro-
duzido pelo motor no virabrequim (ou árvo-
re de manivelas) é transmitido ao eixo cardan
Diferencial
gira o torque 90 graus e
permite que um semi-eixo
. [)
gire mais rápido que o
através da caixa de câmbio. A caixa de câmbio outro em curvas Motor diesel
dispõe de uma série de conjuntos de engrena- fornece o torque necessário
para locomoção do veiculo
gens com reduções diferentes (as marchas), o
que possibilita compatibiliz~ a velocidade de Fig. 2.3: Componentes da transmissão de um caminhão
rotação do motor com a velocidade na qual se
deseja viajar.

Um caminhão pesado pode dispor de até 16 marchas, cada marcha correspon-


dendo a uma determinada redução. A embreagem permite que a troca de marchas
seja feita sem danificar as engrenagens. Cada marcha produz uma desmultipli-
cação na velocidade de rotação do eixo cardan, determinada pela relação entre o
número de dentes das duas engrenagens. Assim sendo, uma redução de 4:1 (ou
seja, a engrenagem conectada ao eixo cardan possui quatro vezes mais dentes que
a engrenagem do girabrequim) significa que o eixo cardan completa uma volta a
cada quatro rotações do virabrequim.

O torque transmitido pelo eixo cardan é conduzido aos semi-eixos motores


pelo diferencial, que aplica uma redução adicional na velocidade de rotação do
eixo cardan. Além disso, o diferencial tem a importante função de girar o fluxo de
potência produzido pelo motor num ângulo de 90°. O diferencial conecta-se aos
semi-eixos motrizes que, por sua vez, acionam as rodas tratoras do caminhão. O
uso de semi-eixos motrizes permite que uma roda gire em velocidade diferente da
outra, o que é necessário quando o caminhão faz uma curva- a roda externa deve
girar numa velocidade maior que a da roda interna- ou quando a força de tração
é diferente em cada roda.

A redução aplicada ao torque pelo diferencial é normalmente fixa em automó-


veis de passeio, mas pode ser variável em alguns modelos de caminhões e veículos
fora-da-estrada. Nesses veículos, o motorista pode acionar uma redução maior nas
situações em que um esforço trator maior é necessário.
42 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veícul'?s rodoviários

A redução do diferencial é aplicada ao eixo cardan; portanto, se a redução


do diferencial é de 5,9:1, isto significa que os semi-eixos motores dão uma volta
para cada 5,9 revoluções do eixo cardan. Como as reduções são em série, pode-
se facilmente determinar quantas revoluções do virabrequim são necessárias para
produzir um revolução das rodas motrizes: supondo-se que e a redução na caixa de
câmbio é 4:1, uma volta completa dos semi-eixos motores requer 23,6 revoluções
do eixo do motor, pois 4 x 5,9:::::: 23,6.

2.2.4 Determinação da força motriz de um caminhão

A força motriz produzida pelo motor de um caminhão pode ser determinada se a


potência do motor e a velocidade em que o veículo viaja forem conhecidas. Como
mostrado na Figura 2.2, a potência do motor depende da sua rotação. Como a
velocidade do veículo também depende da rotação do motor, é preciso determinar
como esses dois parâmetros variam em função da velocidade do motor para que
seja possível estabelecer a força motriz que propele o caminhão.

Determinação da velocidade do caminhão

Como discutido anteriormente, o motor opera em velocidades muito altas para ser
conectado diretamente às rodas motrizes. A transmissão, reduzindo o número de
rotações do eixo do motor, serve tanto para compatibilizar a velocidade de rotação
do motor com a velocidade desejada para o veículo como para aumentar o torque
entregue às rodas. A velocidade em que o caminhão viaja pode ser calculada a
partir do número de rotações do motor pela expressão:
60Nn: D
(2.1)

em que V: velocidade do veículo [krnlh];


N: número de revoluções por minuto do virabrequim [rpm];
D: diâmetro do pneu [m];
gt: fator de redução na caixa de câmbio; e
gd: fator de redução no diferencial.

O numerador calcula a distância percorrida (em metros) em uma hora, a uma velo-
cidade do motor de N rotações por minuto, encontrando o número de revoluções
em uma hora e multiplicando este valor pela circunferência da roda motriz. O de-
nominador converte a distânciá percorrida para quilômetros e converte as rotações
do motor em rotações do semi-eixo motor.
2.2 Força motriz em veículos rodoviários 43

Determinação do esforço trator

Conforme demonstrado no capítulo anterior, o esforço trator usado para a loco-


moção de um veículo é dado relação entre a potência do motor e a velocidade,
como mostra a a Equação 1.3, repetida aqui para a conveniência do leitor:
p
Fr = 1') 3.600-, (2.2)
v
em que força motriz [N];
eficiência da transmissão (cerca de 0,82);
potência do motor [kW] e
velocidade [krnlh].

De um gráfico como o Figura 2.2, que mostra a variação da potência em função


da rotação do motor, pode-se determinar um conjunto de pares ordenados [ rpm,
potência] dentro da faixa ótima de operação que, no caso do motor da Figura 2.2,
varia de 1.000 a 2.800 rpm. Usando-se as Equações 2.1 e 2.2 pode-se determinar
uma função que represente a variação do esforço trator em relação à velocidade de
operação, a partir desses pares ordenados [rpm, potência].
Note-se que o procedimento é um pouco mais complexo do que o usado para
determinar a curva de força motriz de uma locomotiva porque, num caminhão, a
potência do motor diesel varia com a velocidade do veículo, ao passo que, numa
locomotiva, o motor diesel opera com potência constante. O exemplo mostrado a
seguir explica como obter a curva de força motriz vs. velocidade.

Exemplo 2.1 Seja um caminhão de peso bruto total de 6.300 kg (I. 700 kg no eixo dianteiro
e 4.600 kg no traseiro, que é o eixo motriz), equipado com um motor diesel de potência
máxima de IIO kW (a 2.800 rpm), cuja curva de potência está mostrada na Figura2.2. Seu
câmbio dispõe de cinco marchas, cujas reduções g 1 são 6,36:I, 3,3I:I, 2,I4:I, I,4I:I e
I: I, respectivamente. Os pneus têm diâmetro de O, 73 m (caminhão carregado) e a redução
do diferencial (gd) é 3,9: I. Deseja-se obter a curva de esforço trator vs. velocidade para
esse caminhão.

Solução: Da curva de potência da Figura 2.2 têm-se que:


RPM 1200 2800
Potência (kW) 53 110
Para cada nível de rotação do motor deve-se determinar a velocidade correspon-
dente, em cada marcha. Usando-se essa velocidade e a potência do motor, pode-se
então determinar o esforço trator desenvolvido em cada nível de rotação do motor,
44 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

A. Planilha para cálculo das velocidades


Marcha 1'.1 2'.1 3'.1 4'.1 5'.1
Redução 6,36 3,31 2,14 1,41 1,0
Rotação Velocidade
(rpm) (kmlh)
1000 5,5 10,7 16,5 25,0 35,3
1200 6,7 12,8 19,8 30,0 42,3
1400 7,8 14,9 23,1 35,0 49,4
1600 8,9 17,1 26,4 40,0 56,5
1800 10,0 19,2 29,7 45,0 63,5
2000 11,1 21,3 33,0 50,0 70,6
2200 12,2 23,5 36,3 55,1 77,6
2400 13,3 25,6 39,6 60,1 84,7
2600 14,4 27,7 42,9 65,1 91,7
2800 15,5 29,8 46,2 70,1 98,8
B. Planilha para cálculo do esforço trator em cada velocidade e marcha
1'.1 Marcha 2'.!Marcha 3'.!Marcha 4'.!Marcha 5'.!Marcha
p v Fr v Fr v Fr v Fr v Fr
(kW) (kmlh) (kN) (kmlh) (kN) (kmlh) (kN) (km!h) (kN) (kmlh) (kN)
35 5,5 18,62 10,7 9,69 16,5 6,27 25,0 4,13 35,3 2,93
53 6,7 23,50 12,8 12,23 19,8 7,91 30,0 5,21 42,3 3,70
66 7,8 25,09 14,9 13,06 23,1 8,44 35,0 5,56 49,4 3,94
78 8,9 25,94 17,1 13,50 26,4 8,73 40,0 5,75 56,5 4,08
87 10,0 25,72 19,2 13,39 29,7 8,65 45,0 5,70 63,5 4,04
95 11,1 25,28 21,3 13,15 33,0 8,50 50,0 5,60 70,6 3,97
101 12.2 24,43 23,5 12,71 36,3 8,22 55,1 5,42 77,6 3,84
105 13,3 23,28 25,6 12,12 39,6 7,83 60,1 5,16 84,7 3,66
108 14,4 22,10 27,7 11,50 42,9 7,44 65,1 4,90 91,7 3,48
110 15,5 20,90 29,8 10,88 46,2 7,03 70,1 4,63 98,8 3,29

Fig. 2.4: Planilhas para cálculo do esforço trator de um caminhão

para cada uma das cinco marchas. As planilhas da Figura 2.4 mostram o procedi-
mento para obtenção das curvas de esforço trator vs. velocidade para o caminhão
em questão. Essas planilhas podem ser facilmente programadas num microcompu-
tador, por meio de uma planilha eletrônica como, por exemplo, o Excelfor Windows
ou um programa similar. Na planilha A da Figura 2.4 são calculadas as velocida-
des que o veículo desenvolve em cada marcha, em função da rotação do motor e da
redução na caixa do câmbio, utilizando-se a Equação 2.1:
60Nn D 60.1000.n .0,73
v-
- 1000g1 gd-
- -55km!h
1000.6,36.3,9 - ' .

A planilha B da Figura 2.4 é usada para cálculo do esforço trator desenvolvido pelo
caminhão em cada uma das velocidades determinadas na planilha da parte superior
da Figura 2.4. A determinação do esforço trator é feita através da Equação 2.2, na
2.2 Força motriz em veículos rodoviários 45

27
amarcha

z 18
6
N
24

21

·;:: 15
h
----

'''
'
'''
'
''
'''
'''
---~ça motriz máxima
(limite da aderência)

õ i ~~
2a marcha
E 12
Cll
~ :
E' : :
o ' '
u.. 9 ! I 3a marcha
i:~
' '
I : 1 4a marcha
6 1
i J
~ ~
: 1

3 ' "ii

::
ll

,,
Veloc~dade _..-
mfmma
l
~+-----------------~~~=--
i Ví 1 .d d
, e oct a e
Silmarcha

máxima
o :
1
:1
11 :
I~

o 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100 110
Velocidade (km/h)

Fig. 2.5: Variação da força motriz com a velocidade para um caminhão diesel

qual substitui-se V pelas velocidades calculadas na planilha A, e P pela potência


do motor correspondente àquela velocidade:

p 35
Fr = rJ 3,6- = 0,82. 3,6.- = 18,62 kN.
v 5,5

Os resultados são mostrados no gráfico da Figura 2.5. Como já discutido no capí-


tulo anterior, o coeficiente 3,6 incorpora os fatores de conversão de unidades; por
conseguinte, deve-se usar a velocidade e a potência nas unidades apropriadas para
obter um resultado correto. Ou seja, a velocidade deve ser expressa em quilôme-
tros/hora [km!h] e a potência em quilowatts [kW] para que o esforço trator calculado
seja realmente o valor correto, expresso em newtons [N].

Observando-se o gráfico da Figura 2.5, pode-se notar que a a função força mo-
triz dos caminhões não é contínua como no caso das locomotivas diesel-elétricas.
Cada marcha deve ser utilizada para um certo intervalo de velocidades, que é de-
terminado pela faixa de rotação do motor. Por exemplo, a velocidade mínima na
qual a terceira marcha do caminhão do Exemplo 2.1 pode ser usada é 16,5 km/h,
que é velocidade do caminhão se o motor funciona a 1000 rpm. Igualmente, a ve-
locidade máxima em que essa marcha pode ser usada é 46,2 km/h, correspondendo
à rotação máxima do motor, 2800 rpm.
46 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

As combinações possíveis de velocidade e força motriz que podem ser obti-


das numa dada marcha estão contidas na região sombreada que é delimitada pela
função esforço trator de cada marcha, pelas velocidades mínima e máxima e pelo
eixo x. Variando-se a pressão no pedal do acelerador, pode-se aumentar ou reduzir
a quantidade de combustível queimada no motor, o que determina a potência pro-
duzida. A função força-motriz calculada no Exemplo 2.1 usa a potência máxima
que é produzida pelo motor- ou seja, a potência obtida quando o pedal do acelera-
dor é pressionado até o máximo. Mantendo-se uma pressão menor no acelerador,
pode-se obter combinações de força motriz e velocidade menores que a máxima,
mas sempre dentro da área sombreada.
Pode-se também notar que existe uma superposição da faixa de utilização de
marchas adjacentes. A terceira marcha, por exemplo, pode ser usada numa faixa
de velocidades na qual a segunda, quarta e quinta marchas também poderiam ser
usadas, dependendo da força motriz necessária para propelir o caminhão.

2.2.5 Aderência

A locomoção dos veículos terrestres sobre rodas baseia-se na tração por aderência,
conforme discutido no capítulo que trata da locomoção de trens 2 . Assim sendo,
o esforço trator máximo que pode ser desenvolvido por um carro ou caminhão
depende do coeficiente de atrito entre o pneu e a superfície da via e do peso que
atua no eixo trator. Como já visto anteriormente, o esforço trator máximo que
pode ser transmitido à uma roda, sem que ela "patine", é dado por:
(2.3)

onde f é o coeficiente de aderência (ou atrito estático) e Td é o peso do eixo motriz,


também chamado de peso aderente.
O coeficiente de aderência, que corresponde ao coeficiente de atrito estático,
depende de quatro fatores básicos: o tipo de superfície sobre a qual rola o pneu;
do estado das superfícies de contato; das características do pneu; e da velocidade.
Alguns tipos superfície de rolamento, como o asfalto e o concreto, proporcionam
coeficientes de aderência mais elevados, conforme mostra a Tabela 2.1. O estado
do pavimento (seco ou molhado) e as condições das faces de contato (pneu gasto,
pavimento mal conservado) também influem no coeficiente de aderência. O tipo
de borracha e o desenho dos sulcos da banda de rodagem também influenciam, em
grau menor, o coeficiente de atrito. O aumento da velocidade também provoca um
ligeiro decréscimo no valor do coeficiente de aderência.
2 No item 1.2.2, página 7.
2.3 Resistência ao movimento 47

Portanto, a força máxima de tração que o caminhão do Exem-


plo 2.1 pode desenvolver sem que as rodas motrizes derrapem, de- Tab. 2.1: Coeficientes de aderência típicos
para pneus
pende do peso aderente. No caso, o peso máximo do eixo traseiro,
que é o eixo motriz, determinado pelo fabricante é 4.600 kg, o que Superfície Aderência
corresponde a um peso aderente máximo de 45.126 N. Numa pis- asfalto ou concreto seco 0,80-0,90
ta de asfalto molhado, esse caminhão pode desenvolver uma força concreto molhado 0,80
motriz máxima de asfalto molhado 0,50-0,70
pedrisco 0,60
Frmax = J Td = 0,50. 45.126 = 22.563 N. terra firme seca 0,70
terra solta seca 0,45
terra firme úmida 0,55
Se o caminhão não estiver carregado totalmente, o peso no eixo areia seca 0,20
traseiro será menor, causando uma redução na força motriz máxima areia úmida 0,40
que pode ser desenvolvida pelo veículo. neve 0,20
gelo 0,10

2.3 Resistência ao movimento

Para os veículos rodoviários, a resistência ao movimento é composta


por três parcelas, sendo que duas das quais sempre atuam no sentido
contrário ao movimento- a resistência de rolamento e a resistência do ar. A terceira
parcela só existe em rampas e pode atuar tanto contra como a favor do movimento:
nos aclives, ela atua contra o movimento; nos declives, a favor. A resistência total ao movi-
mento, R, é formada por três
A soma das duas primeiras parcelas da resistência ao movimento é chamada de parcelas:
resistência básica ou resistência inerente ao movimento, pois não existe situação
em que não atuem sobre o veículo em movimento. A resistência de rampa, que R = Rr + Ra + Rg (2.4)
é a componente do peso que atua na direção do movimento, só existe se o cami-
em que
nhão desloca-se numa rampa. Num aclive, a componente do peso atua no sentido
Rr: resistência de rola-
contrário ao do movimento, comportando-se como uma resistência; num declive, mento;
essa força atua no sentido do movimento, contrapondo-se ao efeito da resistência Ra: arrasto; e
básica. Rg: resistência de rampa.
Nota-se, portanto, que as forças que resistem ao movimento dos caminhões são
muito similares às forças que resistem ao movimento dos trens, considerando-se
as similaridades e diferenças na tecnologia dessas duas modalidades. A resistência
de curva, que pode ser significativa no caso dos trens, não é normalmente consi-
derada no cálculo da resistência ao movimento de caminhões, dada a sua pequena
magnitude. Isso se explica porque as rodas do caminhão, ao contrário das rodas
do trem, podem girar em velocidades diferentes quando o veículo percorre uma
trajetória curva.
48 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

2.3.1 Resistência de rolamento

Num-caminhão, a resistência de rolamento é devida a quatro fontes: (i) a defor-


mação elástica do pneumático na região de contato; (ii) penetração do pneumático
no solo; (iii) escorregamento adicional nas curvas; e (iv) circulação do ar dentro
do pneu e o efeito da ventilação externa. Desses, os dois primeiros fatores são os
mais significativos.

Quanto mais rígidos forem a roda e o pavimento, menor será a deformação


e penetração da roda no pavimento e, por conseguinte, menor a resistência de
rolamento. No caso dos caminhões, quanto mais duro o pavimento e quanto maior
a pressão interna do pneumático, menor a resistência de rolamento. No caso
dos trens, que usam rodas de aço sobre trilhos de aço, a resistência específica ao
rolamento é dez vezes menor que a de um caminhão num pavimento de concreto.

A resistência de rolamento para caminhões pode ser estimada pela expressão:

Rr =(c!+ Cz V) G, (2.5)

em que Rr: resistência de rolamento [N]


CJ: constante que reflete o efeito da deformação do pneu e da via;
cz: constante que reflete o efeito dos outros fatores na resistência de
rolamento;
V: velocidade do caminhão [km/h]; e
G: peso do veículo [kN].

A Tabela 2.2 fornece valores típicos de c 1 para diversas superfícies de


rolamento. Para pneumáticos em rodovias pavimentadas (asfalto ou concreto),
Tab. 2.2: Valores típicos para o pode-se adotar o valor de 7,6 para o coeficiente c . À guisa de comparação,
1
coeficiente CJ
o leitor pode verificar no capítulo anterior que o valor do coeficiente c1 para
Tipo de superfície CJ trens (rodas e trilhos de aço) é 0,65. Observando-se a Tabela 2.2, pode-se
Asfalto ou concreto 7,6 perceber que, quanto menos resistente a superfície de rolamento, maior o valor
Terra firme seca 30,0 do coeficiente c 1, o que significa que a resistência de rolamento é maior em
Terra solta seca 40,0 superfícies menos rígidas.
Areia solta seca 100,0
Terra mole úmida 160,0 Um valor comumente adotado para o coeficiente c 2 , que representa o efeito
dos outros fatores na resistência de rolamento, é 0,056. Essa parcela da re-
sistência, que é menor que a causada pela deformação do pneu e do pavimento,
cresce com o aumento da velocidade do veículo.
2.3 Resistência ao movimento 49

2.3.2 Resistência aerodinâmica

A resistência aerodinâmica, que também é chamada de arrasto, atua sobre qual-


quer veículo que se desloque na atmosfera terrestre, já que o movimento implica
no deslocamento de uma certa massa de ar. Na, resistência aerodinâmica, são im-
portantes a velocidade do veículo, a direção e a velocidade do vento, o tamanho e
a forma da carroceria do veículo, além de outros fatores de menor influência, tais
como o estado da superfície da carroceria, saliências e enfeites, a massa específica
do ar etc.
Como o efeito aerodinâmico do fluxo de ar no entorno de um veículo é muito
complexo, costuma-se usar modelos semi-empíricos para representar o efeito da
resistência do ar sobre os veículos. A resistência aerodinâmica pode ser estimada Tab. 2.3: Coeficientes de ar-
rasto C D típicos
pela expressão:
Modelo Cn
1 p 2 Sedã (1910) 0,85
Ra = --CDAV (2.6)
2g Sedã (1950) 0,50
"Pick-up" (1990) 0,45
em que Ra: resistência aerodinâmica; Sedã (1990) 0,32
p: densidade do ar;
g: aceleração da gravidade local;
CD: coeficiente de arrasto;
A: área frontal do veículo; e
V: velocidade relativa do veículo.

O coeficiente de arrasto C D é determinado empiricamente, num túnel de vento,


e depende da forma e tamanho do veículo. A Tabela 2.3 mostra coeficientes de
arrasto C D para certos tipos de automóveis.
A densidade do ar p varia com a pressão e temperatura; em condições normais
de temperatura e pressão, a massa específica do ar (pjg) é 1,225 kg/m 3 . No
estudo da dinâmica de veículos, costuma-se usar a massa específica do ar para
valores específicos da temperatura e pressão atmosférica. Para os propósitos deste
texto, pode-se ignorar os efeitos da temperatura e pressão do ar, supondo-se que
as condições existente sejam as normais. Assim, pode-se supor que o coeficiente
de penetração aerodinâmica Ca seja dado pela expressão:
1 p
Ca = - - CD
2g
e a Equação 2.6 pode ser reescrita como:
2
Ra = Ca A V (2.7)
50 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

em que Ra: resistência aerodinâmica [N];


Ca: coeficiente de penetração aerodinâmica (mostrado na Tab. 2.4);
A: área frontal do veículo [m2 ]; e
V: velocidade do veículo [km/h].

A Tabela 2.4 fornece valores típicos do coeficiente de pene-


tração aerodinâmica para autos, caminhões e ônibus, bem como
Tab. 2.4: Área frontal e coeficientes de pene- faixas de variação da área frontal desses veículos. O coeficiente
tração aerodinâmica para veículos rodoviários
de pen~tração aerodinâmica ca, mostrado na Tabela 2.4 e usado
Veículo Área frontal Ca na Equação 2. 7, não é adimensional e incorpora constantes para
Automóveis 2,5-3,5 m 2 0,020 a 0,025 conversão de unidades, tais que possibilitem o uso da veloci-
Ônibus 7,0-9,0 m 2 0,035 a 0,040 dade em quilômetros/hora [km/h] e da área frontal em metros
2
Caminhões 6,0-9,0 m 2 0,028 a 0,040 quadrados [m ].
Teoricamente, a velocidade V usada na Equação 2. 7 deve
ser a velocidade do veículo em relação ao ar e, portanto, dever-se-ia considerar a
velocidade do vento atmosférico. No entanto, a menos que existam razões fortes
para que o efeito do vento seja levado em consideração, costuma-se supor que sua
velocidade é nula, já que a direção do vento é aleatória.

2.3.3 Resistência de rampa

A resistência de rampa é a componente da força peso que atua na direção do mo-


vimento sempre que a trajetória do veículo não for horizontal. Esta resistência
independe da tecnologia da modalidade e atua sobre qualquer corpo que se mo-
vimente na superfície da Terra. Conforme demonstrado no capítulo anterior, para
rampas de pequena magnitude, a resistência de rampa pode ser calculada por:

Rg=lOGi (2.8)

em que Rg: resistência de rampa [N];


G: peso do veículo [kN]; e
i: declividade da rampa[% ou m/100 m].

2.4 Determinação da velocidade de equilfbrio

A velocidade de equilíbrio de um caminhão ou automóvel é aquele em que o


esforço trator é igual à resistência ao movimento. Se a velocidade for menor que a
velocidade de equilfbrio, o esforço trator é maior que a resistência ao movimento, e
2.4 Determinação da velocidade de equilíbrio 51

o caminhão é submetido a urna aceleração. Essa aceleração aumenta a velocidade


do caminhão, causando urna redução no esforço trator e um aumento nas forças que
resistem ao movimento, o que por sua vez provoca urna redução na aceleração. O
processo continua até que o esforço trator se iguale à resistência. Se a resistência
for maior que o esforço trator, o veículo desacelera, reduzindo a resistência e
aumentando o esforço trator, até essas duas forças se igualarem.
No caso dos veículos ferroviários, a determinação da velocidade
de equilíbrio tanto pode ser feita analiticamente corno graficamente.
Na solução analítica, a resultante das forças que atuam no sentido
do movimento do trem é um polinômio do terceiro grau no qual a
velocidade é a variável desconhecida. A solução gráfica, descrita no
item 1.4, é obtida plotando-se as curvas de força motriz e resistência
ao movimento num mesmo gráfico. O ponto de interseção das duas
funções indica a velocidade de equilíbrio do trem.
No caso dos caminhões, a determinação analítica da velocidade de
equihôrio é complexa porque as reduções no câmbio fazem com que a Fig. 2.6: Esquema simplificado das forças
função que representa a força motriz seja descontínua. A determinação que atuam num caminhão
gráfica da velocidade de equilíbrio, por outro lado, é muito simples e
pode ser feita rapidamente com o auxílio de urna planilha eletrônica.
Para determinar graficamente a velocidade de equilíbrio de um caminhão num
certo trecho, deve-se, inicialmente, determinar a curva de esforço trator para o
veículo, da forma demonstrada no item 2.2.4 e na Figura 2.5. A seguir, deve-se de-
terminar a curva de resistência básica para o caminhão. Corno visto anteriormente,
a resistência básica corresponde à sorna das parcelas da resistência de rolamento
e resistência aerodinâmica e são forças que sempre resistem ao movimento dos
veículos que usam rodas. Um caminhão que trafega num trecho reto e plano está
sujeito apenas à resistência básica; se o caminhão viaja num aclive ou declive, urna
parcela adicional de resistência, a resistência de rampa, passa a atuar sobre ele. Na velocidade de equilfbrio
a resultante das forças na di-
A velocidade de equilíbrio é aquela em que a aceleração é nula (R = F 1 ). Essa reção do movimento é nula:
situação é representada graficamente pela interseção entre a curva de resistência e
a curva de esforço trator. O Exemplo 2.2 demonstra o processo de determinação
da velocidade de equilíbrio.

Exemplo 2.2 Seja o caminhão do Exemplo 2.1, cujo peso bruto total é 6.300 kg. A
área frontal desse caminhão é 7,32 m2 e o seu coeficiente de penetração aerodinâmica é
Ca = 0,040. Deseja-se determinar a velocidade de equilíbrio para esse caminhão num
trecho reto e plano e num aclive de 5o/o.
52 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

'
v.---~--~--------~----------------~

F
marcha
24
'--· -
21 \...__ Ftm..
(limite da aderéncia)
18
z
6
lt!
~
o
LI..
15

12
rzrcha
9 ~marcha
r----_ R t + Rg R
6 / 4• ma-;;;;;, .; c;;!.--
l ~~~~~~!~c§:i~~IJ
:L? 5%4 ::? (i marc;>a i J
o 10 20 30 40 50 60V'oq 70 80 90 Voq 100 10 20 30 40 50 60 70 80 90 100
Velocidade (kmlh) Velocidade (kmih)

Fig. 2.7: Determinação da velocidade de equilíbrio do ca- Fig. 2.8: Velocidade de equilíbrio para potência menor
minhão que a máxima

Solução: A Figura 2.7 mostra como determinar as duas velocidades de equilíbrio


graficamente, combinando-se o gráfico da força motriz (Figura 2.5) com o gráfico
da resistência total ao movimento. O leitor deve consultar o Exemplo 2.1 para
verificar como o gráfico da força motriz é obtido.
A resistência total ao movimento é dada pela soma de três parcelas: a resistência
de rolamento (Equação 2.5), a resistência do ar (Equação 2.7) e a resistência de
rampa (Equação 2.8). Quando o caminhão viaja num trecho plano, apenas as duas
primeiras parcelas, que formam a resistência básica, atuam sobre ele. A resistência
básica Rt pode ser calculada somando-se as Equações 2.5 e 2.7:

= Rr + Ra = (CJ + C2 V)G + Ca A V 2
(7,6 + 0,056. V)61,803 + 0,040. 7,32 V
2

469,70 + 3,46 V+ 0,29 V [N].


2 (2.9)
=

O peso do caminhão é G = 6,3. 9,81 = 61,803 kN. Usando-se a Equação 2.9,


pode-se estabelecer valores para a velocidade V (em [kmlh]) e determinar a cur-
va de resistência básica mostrada na Figura 2.7. O ponto em que as duas curvas
interceptam-se corresponde à velocidade de equilíbrio Veq que, no caso, é aproxi-
madamente 94 km/h. Do gráfico, pode-se notar que a marcha usada é a quinta. A
rotação do motor nessa velocidade pode ser calculada pela Equação 2.1:

1000 v gt gd
N=
60rr D
1000 . 94 . 1'o . 3' 9
N
60.rr .0,73
2.4 Determinação da velocidade de equilíbrio 53

N = 2664rpm.
Quando o caminhão viaja por um aclive de 5%, também atua sobre ele a resistência
de rampa, que é a componente do peso na direção do movimento e que não varia
com a velocidade:

Rg = lOGi = 10.61,803.5 = 3090N.

A resistência total pode ser expressa por:

Rr = Rr + Ra + Rg = (CJ + c2 V)G + Ca A V 2 + 10 G i
R1 (7,6 + 0,056. V)61,803 + 0,040. 7,32 V 2 + 10.61,803. 5
R1 = 3.559,85 + 3,46 V+ 0,29 V 2 [N]. (2.10)

Plotando-se essa função no gráfico da Figura 2.7, obtém-se a nova velocidade de


equilíbrio v;q = 63 km/h, em quarta marcha, já que a quinta marcha não produz
uma força motriz suficiente para contrabalançar a resistência ao movimento. Nessa
velocidade, o motor trabalha a 2.518 rpm.

Como já discutido no item 2.2.4, as curvas de força motriz mostradas na Figu-


ra 2. 7 representam o esforço trator obtido com o motor funcionando na sua potência
máxima- isto é, com o pedal do acelerador pressionado ao máximo. No entanto,
o caminhão pode operar usando uma potência menor que a máxima, como pode
ser visto na Figura 2. 8.
Suponha-se que o caminhão do Exemplo 2.2 passe a viajar em um aclive de
8%. A nova curv~ de resistência total ao movimento (R = Rr + Rg) é mostrada
no gráfico. Nem a quarta, nem a quinta marcha podem ser usadas, pois as curvas
de força motriz correspondentes não cruzam a curva de resistência. O motorista
deve usar uma das outras marchas nessa rampa.
A zona sombreada mostra a região em que a terceira marcha pode ser usada,
com velocidades entre 16,5 e 46,2 kmlh. Pode-se também perceber que a curva
de resistência total não cruza a curva de força motriz relativa à tercei~a marcha.
Isso significa que, se o motorista usar toda a potência do motor, o caminhão irá
acelerar (F1 > R). Alternativamente, o motorista pode aliviar o acelerador e,
usando uma potência menor que a máxima, ajustar a força motriz produzida pelo
motor à resistência ao movimento. Isto é mostrado na Figura 2.8, na qual a curva
tracejada mostra a força produzida usando-se apenas 77% da potência disponível.
Como essa nova curva de força motriz intercepta a curva de resistência em dois
pontos, existem duas velocidades de equilíbrio: uma, a 18 kmlh, e outra a 40 krn/h.
A 18 kmlh, o motor estará trabalhando a 1092 rpm, enquanto que a 40 kmlh, o
motor estará trabalhando em 2426 rpm.
54 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

2.5 Frenagem

Do ponto de vista do engenheiro de transportes, a frenagem é um dos aspectos mais


importantes do desempenho veicular. O comportamento dos veículos durante
a frenagem é crítico para a determinação de diversos parâmetros do projeto de
rodovias, tais como a distância de visibilidade de frenagem (usada no projeto de
curvas verticais), a escolha dos materiais mais adequados para a superfície de
rolamento, o projeto de interseções etc. Por conseguinte, faz-se necessária uma
discussão básica dos princípios envolvidos na frenagem de veículos.

2.5.1 Modelo simplificado de frenagem

No projeto de rodovias, usa-se tradicionalmente um modelo simplificado de fre-


nagem, que é também adotado pela AASHTO para a elaboração de normas de
projeto 3 de rodovias.
O diagrama da Figura 2.9(a) mostra as forças que atuam sobre um veículo cujos
freios estão sendo acionados num trecho em nível. Supondo-se que o veículo
esteja trafegando a uma velocidade vo quando os freios são acionados, pode-se
determinar a distância de frenagem, d, a partir das forças que atuam sobre o
veículo na horizontal:
M. a - (Fb 1 + Fb,) = O (2.11)
'--.-"
Fb

em que M: massa do veículo [kg];


a: desaceleração de frenagem [m/s 2];
Fb 1: força de frenagem no eixo dianteiro [N];
Fb,: força de frenagem no eixo traseiro [N]; e
Fb: força de frenagem [N].

Admitindo-se que todas as forças atuam sobre o centro de gravidade do veículo,


têm-se que Fb = Fb 1 + Fb,. A força de frenagem máxima Fbmax = G. f é limitada
pelo coeficiente de aderência existente na superfície de contato pneu-pavimento e
é o produto entre o peso do veículo G e o fator de aderência f.

3A Policy on Geometric Design ofHighway and Streets. American Association of State Highway
and Transportation Officials, Washington, D.C., E.U.A., 1984.
2.5 Frenagem 55

(a) (b) (c)

Fig. 2.9: Forças que atuam sobre um veículo sendo freado

A desaceleração máxima de frenagem amax pode ser obtida utilizando-se a


Equação 2.11:

(2.12)

A distância mínima de frenagem drnin pode ser calculada conhecendo-se a veloci-


dade inicial do veículo voe a desaceleração máxima de frenagem amax:

dmin
1
= --vo2 võ
= _....:___ (2.13)
2amax 2.g.f

em que dmin: distância mínima de frenagem [m];


vo: velocidade inicial do veículo [rnls];
g: aceleração da gravidade [m/s2 ]; e
f: coeficiente de aderência na interface pneu-solo.

Essa formulação ignora o efeito da resistência de rolamento e da resistência do


ar, já que essas duas forças produzem desacelerações muito menores que a gerada
pelos freios. Todavia, como tanto a resistência de rolamento como a resistência
do· ar diminuem com a redução da velocidade, essa simplificação não tem maiores
consequências.
A Equação 2.13 pode ser modificada para possibilitar a determinação da distân-
cia de frenagem D, em metros [m], a partir da velocidade V em quilômetros por
hora [kmlh], que são unidades mais comuns quando se trata de projeto de rodovias.
Dessa forma, a Equação 2.13 transforma-se em:

y2
(2.14)
254. f
56 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

em que D: distância de frenagem [m];


V: velocidade inicial do veículo [km!h); e
f: coeficiente de aderência na interface pneu-pavimento.

Se o veículo trafega num aclive, como mostram as Figuras 2.9(b) e (c), uma
componente do peso passa a atuar na direção do movimento e a Equação 2.11
toma-se:
M. a+ G. sen a- Fb =O (declive)
{ M. a - G. sen a- Fb = O (aclive) (2.15)

em que G é peso do veículo [N]; e a é o ângulo da rampa com a horizontal. Como


a força de frenagem Fb = G.f. cosa, a desaceleração de frenagem é:

1
a = M (G . f. cos a ± G . sen a) = g (f. cos a ± sen a) (2.16)

Como os ângulos que as rampas de rodovias formam com a horizontal são sempre
muito pequenos, pode-se considerar que cosa= 1 e que sena = tana. Como
têm-se que tana = 0,01 m, em quem é a inclinação da rampa expressa em
[m/100 m] ou[%], a Equação 2.16 toma-se:

a= { g(f + 0,01 m) num aclive, (2.17)


g(f- 0,01 m) num declive.

A fórmula para cálculo da distância de frenagem (Equação 2.14) pode então


ser expandida para ser usada num local onde existe uma rampa m:

vz
D=~---------- (2.18)
254(/ ± 0,01 m)

A Equação 2.18 é usada no processo proposto pela AASHTO para determi-


nação da distância mínima de visibilidade, um parâmetro importante no projeto
geométrico de rodovias, pois assegura que os veículos conseguirão parar em segu-
rança ao avistar um objeto na pista.
NanormadaAASHTO, os valores de f para utilização na Equação 2.18 foram
determinados experimentalmente. Numa rampa, diversos veículos que estão em
velocidade constante são freados até pararem completamente. Conhecendo-se
a velocidade inicial, a declividade da rampa e a distância de frenagem, pode-se
determinar o valor do coeficiente de aderência f, usando-se a Equação 2.18.
2.5 Frenagem 57

Na realidade, os valores de f determinados por esse método levam em con-


sideração os efeitos da resistência aerodinâmica, da resistência de rolamento, Tab. 2.5: Coeficientes de ade-
rência para cômputo da distân-
do coeficiente de aderência (com as rodas travadas) e da inércia (transferên-
cia de frenagem pelo método da
cia de peso do eixo traseiro para o dianteiro durante a frenagem). Assim, os AASHTO
coeficientes f apresentados na Tabela 2.5 são função do nível tecnológico dos
Velocidade Aderência
veículos usados no experimento e devem ser revistos periodicament~. inicial (kmlh) (f)
Os valores de f propostos pela AASHTO para serem usados no projeto 35 0,40
de rodovias são estabelecidos a partir de estimativas conservadoras baseadas 40 0,38
na suposição de que é grande a possibilidade de ocorrer uma combinação 50 0,34
de motorista pouco habilidoso com via, pneus e veículo em mau estado de 55 0,32
conservação. Por outro lado, a utilização de valores baixos para a aderência 65 0,31
f fazem com que a distância de frenagem calculada seja maior, reduzindo os 70 0,30
80 0,30
efeitos negativos que poderiam ser causados pelas simplificações do modelo.
90 0,29
95 0,29
Exemplo 2.3 Suponha que um caminhão esteja a I 00 kmlh. Determine a distância
105 0,29
de frenagem para este veículo num trecho plano e num declive de 3%.
110 0,28

Solução: Através da Equação 2.18, pode-se calcular qual a distância de frena-


gem no trecho em nível, adotando-se um valor de 0,29 para f:

1002
D = =136m.
254.0,29
A distância de frenagem, num declive de 3%, seria 15m mais longa:

1002
d = =151m.
254 (0,29- 0,01. 3)

2.5.2 Modelo detalhado de frenagem *

A Equação 2.18 pressupõe que a eficiência do sistema de freios é perfeita, que a


força de atrito que atua entre os pneus e o pavimento em cada roda é a máxima
e que não existe transferência de peso do eixo traseiro para o dianteiro durante
a frenagem. A suposição de que a eficiência de frenagem seja máxima, implica
na suposição de que não ocorre travamento prematuro de nenhuma das rodas do
veículo.
Entretanto, esta suposição é por demais otimista, já que não é incomum que
uma das rodas trave. Esta seção apresenta um modelo que permite a determinação
*O material apresentado nesta seção e nas seguintes é mais indicado para um curso de pós-
graduação, mas pode ser facilmente compreendido por alunos de graduação.
58 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

da distância de frenagem de um caminhão em função das forças que o sistema de


frenagem produz ao se comprimir o pedal do freio, capaz de considerar o efeito da
inércia durante o processo de frenagem.
A Figura 2.1 Omostra o diagrama das forças que atuam numa roda sendo freada.
O sistema de frenagem de um caminhão ou automóvel é tal que, ao se pisar no
pedal de freio, as sapatas são comprimidas contra o tambor ou disco de freio. A
pressão nas sapatas varia em função da pressão aplicada no pedal: quanto mais se
aperta o pedal, maior a pressão aplicada nas sapatas.
Chamando a força aplicada às sapatas de B, e o coeficiente de atrito entre as
sapatas e o tambor ou disco de freio de fb, a força de atrito que atua entre o tambor
e as sapatas é B .fb·
A reação à força de frenagem gerada na interface do tambor com a sapata
é a força de atrito entre o pneu e o pavimento, que é dada pelo produto entre a
normal ao peso do eixo, Fz e o coeficiente de atrito pneu-pavimento, f. Se o raio
do pneu for R, e o raio do tambor de freio for r, o torque gerado pelo sistema
de frenagem, B.fb.r, deve ser contrabalançado pelo torque gerado pela força de
atrito na interface pneu-pavimento, F2 • f. R. Portanto, quando uma roda está sendo
freada, existem três situações possíveis:

• B.fb.r = F2 .j.R, a situação ideal, onde o torque do freio, B.fb.r, é igual ao


torque da força de atrito do pneu com o pavimento, F2 .f.R, o que permite
a utilização de toda a força de atrito que pode ser mobilizada na interface
pneu-pavimento.

• B.fb.r < F2 .j.R, o que significa que o veículo não utiliza toda a força de
atrito do pneu com o solo e, portanto as rodas nunca travarão. Isto pode ser
observado em veículos que transportam cargas muito pesadas e densas- por
ex., pedra britada.
Pavimento Fz
• B.fb.r > F2 .j.R, o torque do freio é maior que o torque da força de atrito na
interface pneu-pavimento, o que provoca travamento de roda e consequente
Fig. 2.10: Forças que atuam perda de controle direcional do veículo devido à falta de rotação nas rodas.
sobre uma roda sendo freada
Um motorista experiente sabe que a aplicação dos freios deve ser gradual para
evitar o travamento das rodas. Para evitar que a terceira condição ocorra com
freqüência, os carros e caminhões são equipados com sistemas de freios ABS, que,
monitorando a rotação das rodas, liberam os freios caso as rodas travem prematu-
ramente, mesmo que o pedal de freio continue pressionado. No Brasil, como na
2.5 Frenagem 59

América do Norte, freios ABS não são comumente utilizados em caminhões pesa-
dos; na Europa, entretanto, todo caminhão fabricado a partir de 1992 é equipado
com esse sistema de freios para aumentar a segurança viária.
A situação ideal para frenagem é quando têm-se B.fb.r = Fz.f.R em cada
roda, já que todo o atrito disponível entre cada pneu e a via está sendo utilizado e,
por conseguinte, a desaceleração é máxima. O modelo simplificado de frenagem,
discutido no item anterior, pressupõe a ocorrência dessa condição. É interessante
ressaltar que o sistema de freios ABS não reduz a distância de frenagem, já que
não existe dispositivo capaz de aumentar a força de atrito existente entre o pneu e
o pavimento. A maior vantagem da utilização de freios ABS é a manutenção do
controle direcional do veículo durante todo o processo de frenagem, o que só é
possível se as rodas estiverem girando.

Um fator importante com relação ao desempenho de caminhões na frenagem é


a transferência de peso do eixo traseiro para o eixo dianteiro do veículo em função
da inércia- um fenômeno que o leitor certamente teve oportunidade de investigar
pessoalmente enquanto aprendia a andar de bicicleta.
Nos caminhões sem freios ABS, essa redução de peso no eixo traseiro pode
afetar significativamente o desempenho na frenagem, dependendo das condições
de carregamento do veículo. Como a força aplicada nas sapatas de freio é fixa
e não pode ser ajustada em função das forças normais que atuam em cada roda,
pode ocorrer o travamento prematuro da roda se a redução de peso no eixo for
acentuada. O efeito da inércia na frenagem é discutido a seguir.

2.5.3 Frenagem de caminhões unitários

A Figura 2.11 exibe o diagrama de forças de um caminhão unitário (isto é, rígido)


sendo freado. As forças que atuam em cada roda do eixo tandem traseiro são
representadas pela suas resultantes. O peso do caminhão, G, atua no seu centro
de gravidade, que se situa a uma distância bf para trás do eixo dianteiro e a uma
altura h do solo.
Sabe-se que G = Fz 1 + Fz2 , isto é, o peso é igual a soma das normais no eixo
dianteiro e traseiro. Para simplificação dos cálculos, pode-se supor que a normal
no eixo traseiro Fz 2 é a resultante das normais em cada um dos dois pneus do eixo
tandem.

Igualmente, tem-se queM. a= F!I +Fh, isto é, o produto entre a massa do


caminhão e a desaceleração é igual à soma das forças de atrito do pneu com o solo
60' Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

nas rodas de cada eixo. O problema pode ser simplificado supondo-se que a força
de atrito do pneu com o solo no eixo traseiro é a resultante das forças de atrito em
cada pneu do eixo tandem.
As seguintes equações podem ser obtidas do diagrama de forças da Figura 2.11:

Ff1 +Fh
a - (2.19)
M
(G.bf- M.a.h)
FZ2 - (2.20)
b
FZJ - G~ FZ2 (2.21)

em que a: desaceleração do caminhão [rn!s 2 ];


Ff 1 : força de frenagem no eixo dianteiro [N];
Fh: força de frenagem no eixo traseiro [N];
M: massa do caminhão [kg];
G: peso do caminhão [N];
Fz 1 : força normal no eixo dianteiro [N];
Fz 2 : força normal no eixo traseiro [N];
b f: coordenada horizontal do centro de massa [m];
g: aceleração da gravidade [rn!s 2 ];
h: coordenada vertical do centro de massa [m]; e
b: distância entre eixos do caminhão [m].

Deve-se notar que, por simplificação, o equacionamente é


b
f "I
feito em apenas duas dimensões, o que significa que as forças
num eixo são as resultantes das forças aplicadas nas rodas direita
e esquerda daquele eixo.
A Equação 2.19 calcula, pela segunda lei de Newton, a de-
saceleração causada pela frenagem, que é a razão entre a força
total de frenagem (Ff1 + Fh) pela massa do veículo (M). Os
pesos dinâmicos, que são função da desaceleração aplicada ao
caminhão, são calculados pelas Equações 2.20 e 2.21. A nor-
mal no eixo traseiro é obtida pela Equação 2.20, calculando-se
Fig. 2.11: Forças que atuam num caminhão unitá-
rio sendo freado o
momento das forças que atuam sobre o caminhão em relação
ao ponto de contato das rodas do eixo dianteiro com o solo. A
Equação 2.21 calcula, por equilíbrio de forças na vertical, a força normal do eixo
dianteiro em função do peso do caminhão e da normal no eixo traseiro.
2.5 Frenagem 61

Conhecidas as forças normais nos eixos dianteiro (Fz 1 ) e traseiro (F2 J, pode-
se calcular os coeficientes de aderência necessários para produzir as forças de
frenagem F11 e F12 que são responsáveis pela desaceleração a:

F fi
fi - (2.22)
FZI
Fh
h (2.23)
FZ2

emque fi: coeficiente de aderência mínimo no eixo dianteiro; e


h: coeficiente de aderência mínimo no eixo traseiro.

Se f 1 e h forem menores ou iguais ao coeficiente de aderência f da interface


pneu-pavimento, isto significa que a força de frenagem no eixo é menor ou igual à
força máxima de frenagem que pode ser mobilizada na interface entre o pneu e o
asfalto e, por conseguinte, as rodas não travam e a desaceleração a correspondente
pode ser aplicada sem comprometer a segurança da manobra de frenagem.
Se fi ou h for maior que f, as rodas do eixo correspondente irão travar, pois o
torque produzido no sistema de freio é maior que o torque da força de atrito pneu-
pavimento. Isso significa que a aceleração a correspondente é maior que a máxima
desaceleração que pode ser usada com segurança para frenagem do caminhão.
O sistema composto pelas Equações 2.19, 2.20 e 2.21 deve ser resolvido para
diversos níveis da desaceleração de frenagem a, já que quando a cresce, aumenta
a transferência de peso do eixo traseiro para o dianteiro. Do ponto de vista do
motorista, a pressão no pedal de freio é que controla a aplicação da desaceleração
a. Quando ele aperta o pedal com mais força, a força B na sapata de freio aumenta,
fazendo com o to rque do freio B. !b .r também aumente. Um motorista experiente
(ou um freio ABS) consegue perceber se a pressão aplicada ao pedal do freio é
excessiva e, aliviando a força de frenagem, é capaz de evitar que as rodas travem.
Portanto, deve-se resolver o sistema de equações para diversos níveis de força de
frenagem, como mostra o exemplo a seguir, que determina a maior desaceleração
de frenagem que pode ser usada com segurança para frear um caminhão unitário.

Exemplo 2.4 Admita-se que o caminhão da Figura 2.11 tenhaM = 23.500 kg e esteja
viajando a 80 kmlh. Admita-se também que a posição do centro de gravidade do caminhão
carregado é tal que h= 1,60 m, b = 5,10 m, e bJ = 3,69 m. Com base em informações
do fabricante do veículo, determinou-se cinco níveis de frenagem, correspondendo a di-
ferentes níveis de pressão no pedal de freio (de nenhuma pressão à pressão máxima).
Determinar qual a distância mínima de frenagem para esse veículo numa rodovia em que
62 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

o coeficiente de atrito máximo é f = O, 7, sabendo-se que as forças de frenagem obtidas


com esses níveis de pressão no pedal são:

Nível de pressão no pedal do freio


Força de frenagem (N) o I 2 3 4
Rodas dianteiras o 6.809 15.219 21.627 29.237
Rodas traseiras o 24.831 72.090 89.712 105.732

Solução: Para calcular a distância mínima de frenagem é preciso determinar a


desaceleração máxima de frenagem. Isso é feito resolvendo-se o sistema composto
pelas Equações 2.19 a 2.21 para os cinco níveis de força total de frenagem. A
solução do sistema é mostrada na planilha de cálculo mostrada a seguir, que pode
ser facilmente programada em MS-Excel ou outro programa similar.

Nível de frenagem
o 1 2 3 4
Forças de frenagem
Ff1 (N) o 6.809 15.219 21.627 29.237
Fh (N) o 24.831 72.090 89.712 105.732
Cálculo da desaceleração
2
a (rnls ) 0,00 1,35 3,72 4,74 5,74
Cálculo do. força normal
FZl (N) 63.736 73.662 91.127 98.666 106.079
F22 (N) 166.799 156.873 139.408 131.869 124.456
Cálculo dos coeficientes de atrito mínimos
/1 o 0,092 0,167 0,219 0,276
h o 0,158 0,517 0,680 0,850

O topo da planilha de cálculo, intitulado Forças de frenagem, exibe a magnitude das


forças de frenagem que podem ser obtidas em cada eixo para os vários estágios de
pressão no pedal do freio. Essas forças de frenagem são características de projeto
do caminhão.
Conhecidas as forças de frenagem FJ1 e Fh, pode-se calcular a desaceleração de
frenagem a, usando-se a Equação 2.19, o que é feito na parte da planilha intitu-
lada Cálculo da desaceleração. Por exemplo, no nível 1 de pressão no pedal, a
2.5 Frenagem 63

desaceleração é:

a= FJ1 +Fh = 6809 + 24831 = 1 35 rnJs 2 _


A1 23500 ,
Uma vez determinados os valores da desaceleração a, pode-se calcular a força
normal no eixo traseiro F h, substituindo-se o valor de a na Equação 2.20. A força
normal no eixo dianteiro Ff1 é calculada fazendo-se o equilíbrio das forças que
atuam na vertical (Equação 2.21). Como G = 23500.9,81 = 230535 N, para o
nível 1 de pressão no pedal do freio, tem-se:

(G.bJ- M.a.h) 230535.3,69-23500.1,35.1,60


= 156873 N
b 5,10
= G - FZ2 = 230535 - 156873 = 73662N.

O coeficiente mínimo de atrito na interface pneu-asfalto, necessário para que as


forças de frenagem F J1 e F h possam ser aplicadas sem que as rodas travem, é
calculado pela razão entre Ff; e Fz;, como mostram as Equações 2.22 e 2.22. No
caso em questão,

FJ1 6809
!I 73662
0,092 e
FZ1
Fh 24831
h
FZ2
= 156873 = O, 158.

Como o coeficiente de atrito existente é 0,7, a desaceleração de 1,35 rnls 2 pode ser
obtida sem que haja travamento de rodas.
Observando-se a planilha, pode-se perceber que a maior desaceleração que pode ser
obtida a partir das forças de frenagem Ff1 e Fh é 5,74 rnls 2 , que é a desaceleração
obtida se o pedal de freio for pressionado até o finaL Para que seja possível aplicar
essa desaceleração ao caminhão, o coeficiente de aderência deve ser maior ou igual a
0,850, ou as rodas traseiras irão se travar quando esse torque de frenagem for usado.
Assim sendo, fica claro que não é possível utilizar 100% da força de frenagem capaz
de ser produzida pelo sistema de freios se o coeficiente de atrito do pavimento for
0,7.
É necessário, portanto, determinar a desaceleração que corresponde a um coeficiente
de atrito h = 0,7. Idealmente, isso é conseguido subdividindo-se os níveis de
frenagem, de tal modo que se possa obter um nível de pressão no pedal do freio
que produza uma força de frenagem compatível com o coeficiente de atrito da
rodovia. Isso é um processo trabalhoso e complexo mas, para simplificá-lo, pode-
se usar calcular a desaceleração máxima de forma aproximada, a partir de uma
interpolação linear.
Para determinar a desaceleração obtida com h = 0,7, pode-se interpolar o valor
da desaceleração, supondo-se que sua variação seja linear no intervalo em que h
64 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

varia de 0,675 a 0,855:

- 0,7-0,680 2
a- 0,
850
_ 0,
680
(5,74- 4,74) + 4,74 = 4,85 rn!s .

Ou seja, a maior desaceleração possível é 4,85 rnfs 2 se o coeficiente de atrito for O, 7.


Qualquer tentativa de obter uma maior desaceleração através da aplicação de um
maior torque de frenagem implica no travamento das rodas traseiras do caminhão.
Se o caminhão viaja a 80 km/h (22,23 rn!s), a distância mínima de frenagem é:

v2 22 23 2
d =-
2a
= ___.:.__
2.4,85
= 50,95 m.

2.5.4 Eficiência de frenagem

Como discutido no Exemplo 2.4, só é possível utilizar 100% da capacidade de


frenagem do caminhão com segurança se o coeficiente de aderência for suficien-
temente alto. O gráfico da Figura 2.12 mostra valores do coeficiente de aderên-
cia medidos experimentalmente em rodovias na América do Norté para diversas
1,0
condições climáticas, incluindo gelo e neve compacta sobre o asfalto. Nessas
.9
·.::: 0,8 medições, foram usados pneus gastos (mas não "carecas") e pavimentos com su-
iií perfícies desgastadas.
<ll
"'C 0,6
<ll
c 0,4 Pode-se perceber que se o pavimento estiver seco, a aderência pode atingir
..!!!
(J
r::
valores altos (entre 0,8 e 1,0) para velocidades variando entre 20 e 80 kmlh. Se o
~ 0,2 pavimento estiver molhado, a aderência dimuinui com o aumento da velocidade,
u
variando entre 0,4 e 0,8 (para velocidade de 20 kmlh) e entre 0,6 e 0,2, se a
20 40 60 80 velocidade for 80 km!h 5 .
Velocidade (km/h)

Fig. 2.12: Resultados de me-


Conhecida a desaceleração máxima capaz de ser obtida sem que haja trava-
didas experimentais do coe- mento das rodas numa rodovia de aderência f, é possível determinar a eficiência
ficiente de atrito de frenagem de um caminhão, a partir da relação entre a desaceleração a (deter-
minada como no Exemplo 2.4) e desaceleração máxima que poderia ser alcançada
4 Hutchinson, B.G. e Parker, D.J. (1989). Parametric analysis of large truck braking efficiencies.
Canadianloumal ofCivil Engineering, v. 16, p. 105-112.
5 Não se deve confundir os coeficientes de aderência mostrados na Figura 2.12 com os mostrados
na Tabela 2.5. Os coeficientes f da AASHTO foram estabelecidos para refletir condições médias
e reduzir os efeitos negativos das simplificações do modelo usado. Os coeficientes da Figura 2.12,
por sua vez, foram medidos experimentalmente e representam observações isoladas. Portanto, ao se
aplicar o modelo simplificado de frenagem, deve-se usar os coeficientes da Tabela 2.5; ao se aplicar
o modelo detalhado de frenagem, pode-se usar os valores da Figura 2.12 ou outros valores obtidos
experimentalmente.
2.5 Frenagem 65

se toda a força de frenagem pudesse ser utilizada (Equação 2.12):


a
1Jj = -- (2.24)
g.f

em que ru: eficiência de frenagem;


a: desaceleração máxima sem travamento de rodas
g: aceleração da gravidade; e
f: coeficiente de aderência pneu-pavimento.

Pode-se notar que a eficiência de frenagem determinada pela Equação 2.24 poderia
ser também obtida pela razão entre as distâncias de frenagem calculadas para a
desaceleração a e com a Equação 2.13, como demonstra-se no Exemplo 2.5.

Exemplo 2.5 Determinar a eficiência de frenagem do caminhão do Exemplo 2.4 num


trecho plano e reto onde o coeficiente de aderência é O, 7 e o caminhão trafega a 80 kmlh.

Solução: A desaceleração máxima sem travamento de rodas para um trecho em nível


onde a aderência é 0,7 foi determinada no Exemplo 2.4 e é 4,85 rn!s 2 . Usando-se
a Equação 2.24, pode-se calcular a eficiência de frenagem:
a 4,85
T/j = -- = = 70,6%.
g. f 9,81. 0,7
Usando-se as distâncias de frenagem calculadas pela Equação 2.18 (do modelo

I
simplificado da AASHTO) e usando a desaceleração máxima de 4,85 rn!s 2 , a de-
terminação da eficiência de frenagem seria:

D = v2 = 802 = 35 99 m
254(f±O,Olm) 254.0,7 ' 35 99
'T] f = - '- = 70 6%
v2
22 23 2 so, 95 '
d = - = - ' - =50,95m
2a 2 .4,85
Ou seja, a distância de frenagem real é cerca de 40% mais longa que a calculada
pelo modelo simplificado da AASHTO, se o coeficiente de atrito pneu-pavimento
disponível for 0,7.

De fato, o nível de eficiência de frenagem calculado no Exemplo 2.5 (apro-


ximadamente 70%) é habitualmente encontrado para caminhões carregados. Ca-
minhões articulados descarregados ou parcialmente carregados têm eficiência de
frenagem ainda menor, variando entre 40% e 50% de acordo com Hutchinson e
Parker (1989), para caminhões, pneus e pavimentos em bom estado de conser-
vação. Pneus e pavimentos muito desgastados reduzem ainda mais a eficiência do
sistema de frenagem, aumentando as distâncias mínimas de frenagem.
66 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

2.6 Estabilidade lateral em curvas horizontais*

A forma mais simples para se analisar a estabilidade lateral de veículos em curvas


horizontais (tombamento e escorregamento) é considerar o equilíbrio de forças que
atuam sobre um veículo rígido que descreve um movimento circular uniforme.
O diagrama da Figura 2.13 mostra as forças que atuam sobre um caminhão que
descreve um movimento circular uniforme numa pista sem superelevação lateral.
A força centrífuga (M . ac) deve ser contrabalançada pelas forças de atrito laterais
F_v; (roda interna) e F_v, (roda externa), que atuam na interface entre os pneus e o
pavimento. A aceleração centrífuga depende do raio R da curva e da velocidade v
do caminhão (ac = v 2 j R).
Num trecho reto, as reações Fz; e Fz, são iguais e equivalem à metade do
peso. Numa curva, a força centrífuga aplica um momento em torno da roda
externa do veículo, o que faz com que haja uma transferência de peso da roda
interna para a externa - isto é, quanto maior a força centrífuga, menor a reação
Fz; e maior a reação Fz,. Dois tipos de instabilidade lateral podem ocorrer numa
curva: o escorregamento lateral ("derrapagem") e o tombamento ("capotagem").
O fator que determina o que vai acontecer primeiro é o coeficiente de atrito lateral
na interface pneu-pavimento: se ele for pequeno, o veículo escorrega antes de
tombar; se ele for suficientemente grande, o tombamento pode ocorrer antes do
escorregamento:

Fig. 2.13: Forças que atuam e SeM. ac < F_v; + Fv,• isto é, se o coeficiente de atrito lateral for tal que a
no veículo numa curva sem
força centrífuga seja menor que a força de atrito lateral, a roda interna do
superelevação lateral
caminhão pode levantar-se da pista (Fzi =O e Fz, = G). Se isso ocorrer, o
caminhão tomba, já que passa a existir uma situação de instabilidade.

e Se M . ac > F_Y; + Fy,, isto é, se a força de atrito lateral for menor que a
força centrífuga, o caminhão escorrega para fora da pista antes de tombar.

2.6.1 Escorregamento

Para analisar a condição de escorregamento, faz-se o equilíbrio das forças que


atuam no plano da pista. No caso da Figura 2.13,

M. ac - Fy. - Fy = O =} ac = Fy; + F_ve = -


G ·f
-= g. f (2.25)
·' .e M M
-----------------------
*O material apresentado nesta seção é mais indicado para um curso de pós-graduação, mas pode
ser facilmente compreendido por alunos de graduação.
2.6 Estabilidade lateral em curvas horizontais 67

Ou seja, a aceleração centrífuga deve ser menor ou igual ao produto g . f.


O uso de uma superelevação lateral cp, como mostrado na Figura 2.14, reduz o
efeito da força centrífuga sobre o escorregamento, pois surge uma componente do
peso (G sen cp) que atua junto com as forças de atrito lateral para contrabalançar o
efeito da força centrífuga. Nesse caso, a Equação 2.25 toma-se:

M . ac . cos cp - G . sen cp - Fyi - F'_v, = O :::}


G . sen cp + G . f . cos cp ( sen cp + f . c os cp)
ac = = g :::}
M . cos cp cos cp
ac = g (tan cp 4- f). (2.26)

Chamando a superelevação lateral e = tan cp, têm-se que a máxima aceleração


centrífuga admissível é
ac = g (e+ f). (2.27)

No projeto de uma rodovia, pode-se usar a relação da Equação 2.27 para


determinar o raio mínimo da curva a partir da velocidade de projeto, do coefi-
ciente de atrito lateral e da superelevação lateral, pois sabe-se que ac = v 2 f R:
v2 v2
R = g (e + f) :::} Rmin = g (e + f) (2.28)

Como a velocidade de projeto é normalmente expressa em quilômetros por


hora [km/h] e o raio das curvas horizontais, em metros [m], a Equação 2.28,
com a inclusão de uma constante para transformação de unidades ([m/s] em
[kmlh]) multiplicada pelo valor de g (9,81 m/s), pode ser reescrita como:
y2
R.----- (2.29)
mm - 127 (e + f) Fig. 2.14: Forças que atuam no
caminhão numa curva com su-
em que Rrnin: raio mínimo da curva horizontal [m]; perelevação lateral
V: velocidade de projeto [kmlh];
e: superelevação lateral [rn/m]; e
f: coeficiente de atrito lateral.

A fórmula da Equação 2.29 é a estabelecida pelas normas de projeto geométrico


de rodovias da AASHTO. Os valores de f para utilização nessa fórmula variam
com a velocidade e são mostrados na Tabela 2. 6. Esses valores são menores
que a aderência pneu-asfalto, para minimizar a probabilidade de capotagens ou
derrapagens.
68 ·Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

Tab. 2.6: Coeficiente de atrito lateral f em função da velocidade de projeto V


v (kmlh) 40 50 60 70 80 90 100 110 120 130
f 0,17 0,16 0,15 0,15 0,14 0,13 0,13 0,12 0,12 0,11
Fonte: Geometric Design Standards for Canadian Highways. Transportation Association o f Canada,
Montreal, Canadá, 1986.

Exemplo 2.6 Determinar qual o raio mínimo das curvas horizontais numa rodovia para
a qual a velocidade de projeto é 11 Okm/h e a superelevação transversal máxima é 6%.

Solução: Para a solução, deve-se aplicar a Equação 2.29, adotando-se o valor f


dado na Tab. 2.6:
v2 1102
R · = = 127 (0,06 +O, 12) = 529 ' 3 m.
nun 127 (e+ f)
Portanto, o raio mínimo para essa rodovia deve ser 530 m.

2.6.2 Tombamento

A Figura 2.15 mostra as forças que atuam num veículo que descreve um movimento
circular uniforme de raio R, numa pista sem superelevação lateral. Para analisar a
estabilidade quanto ao tombamento, pode-se calcular o momento de tombamento,
que atua no ponto de contato da roda externa:

R~
t
M. ac . h - GZ + Fz; . t = O (2.30)

r ~

rf
1f l\
em que M: massa do caminhão [kg];
~ ll C.G. ~j
M.ac ~ ac: aceleração centrífuga [rn!s 2 ]
~~~ ~)f/ h: altura do centro de gravidade [m];
h CC co
G: peso do caminhão [N];
'h.. =:::J ,.( t: bitola do caminhão [m]; e
lW:J u:u
F~ teFz.
!., I t
FYe
Fz e
Fz; : normal na roda interna do caminhão [N].

A Equação 2.30 pode ser usada para determinar a aceleração centrífuga ac em


Fig. 2.15: Forças que atuam função da bitola, da altura do centro de gravidade e da relação entre a reação na
no tombamento numa curva roda interna e o peso:
sem superelevação lateral t
M. ac . h = GZ - Fz; . t h-G) =}

ac =~(i-~; r). (2.31)


2.6 Estabilidade lateral em curvas horizontais 69

Se o caminhão viaja por um trecho reto e plano, a aceleração centrífuga é nula


e Fz; = Fz, = G j2. Num movimento circular uniforme, a situação limite para
o tombamento é quando Fz; = O e, por conseguinte, Fz, = G- ou seja, a roda
- interna está prestes a levantar-se da pista e todo o peso do caminhão está sendo
suportado pela roda externa. Nesse caso, a Equação 2.31 toma-se:
g. t t
aCmax = 2h = 2h g. (2.32)

A exemplo do escorregamento em curvas horizontais, a utilização de supere-


levação transversal nos trechos em curva reduz os efeitos da aceleração lateral,
evitando o tombamento precoce do caminhão. A FÍgura 2.16 mostra as forças que
atuam num caminhão que descreve um movimento circular uniforme de raio R,
numa pista com superelevação lateral e = tan <p.
Numa curva com superelevação, a Equação 2.30 deve ser modificada para
incluir as componentes do peso que atuam na perpendicular à pista ( G . cos <p)
e paralelamente à pista (G . sen <p ):

M. ac. h. cos <p- G. sen<p. h+


t
+Fw t . cos <p - G . cos <p . 2 = O (2.33)

Como os ângulos de superelevação lateral <p são normalmente pequenos, pode-


se admitir que sen <p = tan <p = e e que cos <p = 1, e a Equação 2.33 toma-se:
t
M . ac . h - G . e . h + Fz; . t - G 2= O. (2.34)

Da Equação 2.34 pode-se obter a expressão para a aceleração centrífuga:


, Fig. 2.16: Esquema de forças que
(2.35) atuam no tombamento numa cur-
va com superelevação lateral
Como a situação ideal é aquela em que Fz; = G j2, pode-se então determi-
nar a superelevação e ideal para a curva, em termos da aceleração centrífuga ac,
substituindo-se esse valor para Fz; na Equação 2.34:

ac = *(~ +e . h - 2~ t) g ~ e = ~. (2.36)

A aceleração centrífuga é função da velocidade v do caminhão e do raio R da


curva:
(2.37)
70 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

com a velocidade dada em metros/segundo [m/s] e o raio da curva em metros [m].


No projeto de rodovias, procura-se determinar a superelevação e de tal forma que
a aceleração lateral não seja superior a O, 1 g, dado o raio R da curva e a velocidade
v de projeto da rodovia. Denomina-se de velocidade neutra a velocidade para a
qual a aceleração lateral é nula numa dada curva com superelevação lateral.
A relação mostrada na Equação 2.32, que depende apenas da bitolado caminhão
e da altura do seu centro de gravidade, serve para avaliar a resistência de um
caminhão ao tombamento. Quanto menor a aceleração lateral máxima, maior a
tendência ao tombamento do caminhão. Um estudo 6 conduzido no Instituto de
Pesquisas em Transporte da Universidade de Michigan (UMTRI) usa essa relação
para determinar a aceleração lateral máxima que pode ser aplicada a um caminhão
sem que o limite de tombamento seja ultrapassado.
Esse estudo conclui que, para caminhões médios, a aceleração lateral máxima
varia entre 0,3 g e 0,4 g, dado que a bitola tipicamente varia entre 1,14 me 1,40 m
e a altura do centro de gravidade, entre 1,65 me 1,90 m. Para caminhões de grande
porte, cuja bitola varia entre 1,78 me 1,83 me a altura do centro de gravidade
situa-se entre 1,52 me 2,16 m, a aceleração lateral máxima fica entre 0,4 g e 0,6 g.
À guisa de comparação, a aceleração lateral máxima para carros esporte varia entre
1, 2 g e 1, 7 g; para carros compactos, entre 1, 1 g e 1, 5 g; e para limusines e carros
de luxo, entre 1,2 g e 1,6 g.
Caminhões articulados podem ter uma aceleração lateral limite menor, como
indicado na Tabela 2.7, dependendo do tipo de caminhão, da densidade da carga e
do nível de carregamento. As acelerações laterais máximas mostradas na Tabela 2.7
foram determinadas em estudos realizados no Canadá e podem chegar a apenas
0,24 g, pois a posição do centro de gravidade é mais elevada que a observada nos
caminhões estudados por Gillespie e Ervin.

Exemplo 2.7 No Exemplo 2.6, o raio mínimo determinado para as curvas horizontais foi
530 m. Admitindo uma superelevação máxima de 6%, determine se um caminhão baú
carregado pode passar por essa curva a 11 Okmlh sem tombar:.

Solução: A aceleração lateral a que o caminhão é submetido ao trafegar a 11 Okmlh


numa curva de 530 m de raio é:
2 2
v (110) 1
ac =R= 3,6 530 = 1,76 m/s 2 .
-------------------------
6Gillespie, T. D. e R. D. Ervin (1983) Comparative study of vehicle rol! stability. Report UMTRl-
83-25, The University o f Michigan Transportation Research Institute, Ann Arbor, MI, EUA. 42 p.
Resumo 71

Tab. 2.7: Aceleração lateral limite para caminhões articulados


Tipo Altura do CG Limite de tombamento
Baú (meia carga) 2,12m 0,34g
Baú (carga total) 2,67m 0,24g
Tanque (secção elíptica) 2,25m 0,32g
Tanque (secção circular) 2,54m 0,26g
Fonte: Hutchinson, B.G. (1993) An Introduction to Transport Planning and
Engineering. University ofWaterloo, Canadá.

Pode-se notar que ac = g (e + f), com e = 0,06 e f = O, 12 (obtido da


Tab. 2.6). Essa aceleração corresponde a O, 18 g, e é inferior à aceleração la-
teral limite para tombamento de um caminhão baú completamente ca,.--regado é
0,24g = 0,24.9,81 = 2,35m/s2 .
A maior velocidade que um caminhão baú carregado pode manter, sem correr risco
de tombamento nessa curva é:

v= .Jac. R= .)2,35 .530 = 35,3 m/s 2 ,

ou seja, 127 kmlh. Para que o limite de tombamento seja atingido, basta que o
coeficiente de atrito lateral seja superior a O, 18 e o caminhão tombará antes de
escorregar. Esse valor de coeficiente de atrito não é raro, já que f pode chegar até
a 0,8, em pista seca, com pneus e pavimento em boas condições.

Resumo

• Os mesmos princípios usados no estudo da mecânica de locomoção de veículos


ferroviários podem ser aplicados ao estudo da mecânica de locomoção dos veí-
culos rodoviários, desde que eles sejam adaptados para levar em consideração as
características da transmissão dos veículos rodoviários.
.. A velocidade de um veículo rodoviário é função do número de rotações do motor,
do diâmetro das rodas tratoras, e das reduções na caixa de câmbio e no diferencial.
• A função força motriz vs. velocidade, para um caminhão, não é contínua como a
de uma locomotiva diesel-elétrica. Dadas as características de potência vs. rotação
dos motores de combustão interna, é necessário utilizar uma caixa de câmbio, com
várias relações de marcha, e cada marcha só pode ser usada dentro de um intervalo
de variação da velocidade.
• O esforço trator máximo que pode ser desenvolvido por um caminhão é função do
peso que atua sobre o eixo trator e da aderência entre as rodas e o solo, tal qual para
uma locomotiva.
72 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

e A resistência ao movimento de um veículo rodoviário é composta de uma parcela


de resistência de rolamento, uma parcela de resistência do ar e uma parcela de
resistência de rampa. A resistência de. curva, que é importante para trens, não é
significativa para caminhões.
• Tal como para um trem, a velocidade de equilíbrio de um caminhão é determinada
pela interseção das funções força motriz e resistência ao movimento.
• A distância de frenagem de um caminhão, de acordo com as normas de projeto geo-
métrico da AASHTO, depende da velocidade de projeto, do coeficiente de atrito
entre os pneus e o pavimento e do greide. Este cálculo pressupõe eficiência de
frenagem igual a l 00%, ou seja, que toda a força de atrito disponível entre os pneus
e o pavimento pode ser mobilizada em cada roda e que não ocorre travamento
prematuro de nenhuma roda.
• Quando uma roda está sendo freada o torque do freio pode ser menor, igual ou
maior que o torque da força de atrito na interface pneu-pavimento. No primeiro
caso as rodas nunca param de rodar e, por conseguinte, não se utiliza a força de atrito
máxima; no segundo caso, que é a situação ideal, toda a força de atrito é usada na
frenagem; e, no último caso, as rodas travam prematuramente, o que causa a perda
do controle direcional do veículo.
e A eficiência de frenagem é definida como a razão entre a desaceleração do veículo,
medida em g's, e o coeficiente de atrito pneu-pavimento.
e~ O raio mínimo de uma curva horizontal é função da velocidade de projeto, da
superelevação e do coeficiente de atrito lateral do pneu com o pavimento.

Para aprender mais

Motor Truck Engineering Handbook (4a ed.), James W. Fitch. Society of Automotive
Engineers, Warrendale, PA, EUA, 1994.
Discute praticamente todos os aspectos do desempenho operacional de caminhões
no Capítulo 3.
Fundamentais ofVehide Dynamics, Thomas D. Gillespie. Society of Automotive En-
gineers, Warrendale, PA, EUA, 1992.
Ainda que mais direcionado a automóveis, trata em detalhes dos componentes da
resistência ao movimento e de fatores que afetam o desempenho de veículos auto-
mores.
Automobilística - Dinâmica e Desempenho, Antônio Carlos Canale. Livros Érica Edi-
tora, São Paulo, 1989.
Discute as forças de resistência ao movimento, a dinâmica de frenagem e a estabi-
lidade de veículos automotores de forma objetiva e clara. O autor é professor do
Departamento de Engenharia Mecânica da EESC-USP.
Exercícios 73

Introduction to Transportation Engineering and Planning, E. K. Morlok. McGraw-


Hill, Nova Iorque, 1978.
No capítulo 4, trata da mecânica de locomoção dos veículos, comparando todas as
modalidades de transporte.
An lntroduction to Transportation Engineering (2a ed.), William W. Hay. John Wi-
ley & Sons, Nova Iorque, 1977.
A segunda parte, formada pelos capítulos 4 a 7, aborda as tecnologias de transporte.
O capítulo 5 trata da força motriz e da resistência ao movimento para diversas
modalidades de transporte.
Rodas, Wilfred Owen e Ezra Bowen. Biblioteca Científica Life, Livraria José Olympio
Editora, Rio de Janeiro, 1982.
Um livro interessante e de fácil leitura que apresenta a evolução histórica das tec-
nologias de transporte sobre rodas, contendo excelentes descrições, explicações e
gráficos que mostram o funcionamento de motores, câmbios etc. de automóveis e
caminhões.

Além dessas referências, fabricantes de caminhões costumam produzir folhetos e livretos


que explicam a mecânica de locomoção dos caminhões em linguagem simples e direta.

Exercícios

Problema 2.1 Um caminhão semi-reboque, com peso bruto total de 430 kN, é equipado
com um motor diesel que tem a curva de desempenho mostrada abaixo. O caminhão tem
uma redução de 5,9:1 no diferencial e as reduções em cada marcha estão mostradas na
tabela a seguir.

300 Marcha Redução


294kW
280 10,0
260 2 7.9
~1!1 240
3 5,8
"i:) 4 4,3
c 220 5 3,2
<<1>
õ0.. 6 2,5
200
7 1,9
180 8 1,4
9 1,2
160
10 0,9
1000 1400 1800 2200
Rotação do motor (rpm)

(a) Calcule e plote a função força motriz vs. velocidade para este veículo. Faça as
suposições que forem necessárias, usando as informações do texto.
74 Capítulo 2. Mecânica da locomoção de veículos rodoviários

( b) Calcule e plote a função resistência ao movimento vs. velocidade para este veículo
em aclives de 0,6%, 2,6% e 5,4%.
(c) Qual seria a velocidade de equilíbrio desse caminhão numa estrada de terra seca?
Explique o porque da diferença de velocidade da rodovia asfaltada para a estrada de
terra, com base nas equações de resistência ao movimento.
( d) Usando as funções desenvolvidas nos itens anteriores, calcule a velocidade de equilí-
brio e a marcha utilizada numa seção tangente horizontal e num greide de 5,4%.
Suponha que o motor esteja trabalhando a 1500 rpm.

Problema 2.2 Uma abordagem simplificada para a determinação da velocidade de equilí-


brio de caminhões consiste em supor que o motor trabalha sempre com uma potência
constante (como num ônibus elétrico ou numa locomotiva) e ignorar o efeito das marchas,
pressupondo-se que o motorista é capaz de explorar a potência máxima do motor em todas
as situações. Refaça o exercício anterior, admitindo que a potência do motor seja a máxima
e discuta as possíveis diferenças encontradas nos resultados.

Problema 2.3 De acordo com as normas de projeto geométrico de rodovias daAASHTO,


as rampas não devem ser maiores que 6%. Na fórmula da AASHTO para determinação
da distância de frenagem, a desaceleração é aproximada por a = g(f ± m) ao invés de
a = g(j. cose ± sen 8). Discuta o efeito dessa simplificação a partir da distância de
frenagem para um veículo que trafega numa rampa de 3%. As conclusões são válidas para
rampas de 6%, 12% e 24%?

Problema 2.4 Um caminhão de três eixos tem tara de 8.200 kg e carga paga de 15.100kg.
O centro de massa do caminhão carregado está situado a 272 em para trás do eixo dianteiro
e à 131 em acima do nível do solo. A distância entre o eixo dianteiro e o primeiro eixo
do tandem é de 3,05 me os eixos do tandem são separados de 1,55 m. A tabela a seguir
mostra a força de frenagem para cada estágio de pressão no pedal do freio.
Estágio O 1 2 3 4
Eixo dianteiro (kN) O 7,5 17 24 33
Eixo traseiro (kN) O 28 80 100 120

(a) Qual o coeficiente de atrito mínimo para que se possa utilizar toda a força de frenagem
disponível na interface pneu-pavimento?
(b) Qual é a distância de frenagem necessária para este veículo se f = 0,31 e V =
80 kmJh? Esta distância é compatível com a estabelecida nas normas de projeto
geométrico daAASHTO (a velocidade de operação de 80 kmJh corresponde à veloci-
dade de projeto de 80 kmlh)? Qual é a eficiência de frenagem deste veículo?
(c) Com o veículo vazio, o centro de massa passa a se situar a b f = 201 em e h =
172 em; neste caso, qual a desaceleração máxima de frenagem que o caminhão pode
ser submetido sem que haja travamento de rodas se a sua velocidade é 80 kmlh? Qual
a eficiência de frenagem a 80 kmlh? (Dica: uma normal negativa significa que o peso
dinâmico do eixo é negativo- isto é, ergue-se do solo).
Exercícios 75

Problema 2.5 Um caminhão tanque articulado tem uma aceleração lateral limite (a ace-
leração que levanta as rodas internas numa curva) de 0,265 g.
(a) Qual deve ser a superelevação transversal numa curva de 250m de raio numa rodovia
com velocidade de projeto de 90 krn!h?
(b) Qual a velocidade máxima que este veículo pode desenvolver, com segurança, numa
curva de um dispositivo de entroncamento com raio de 125 m e superelevação de
5,2%, sem tombar?

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- í ,-
Capítulo 3

Fluxos de veículos e seu


controle

Neste capítulo estudam-se os fluxos de veículos numa via e as formas de


controlá-los. O capítulo inicia-se com o diagrama espaço-tempo, que pode
ser usado para representar graficamente a progressão de veículos ao longo
de um segmento de via. Os três parâmetros fundamentais para o estudo ma-
croscópico do fluxo de veículos, o volume, a velocidade e a densidade, são
definidos, e apresenta-se, a seguir, uma discussão dos modelos macroscó-
picos e microscópicos para representação dos fluxos rodoviários e das apli-
cações dos modelos determinísticos de filas para a análise de fluxos contínuos
e interrompidos. Por fim, o capítulo discute o controle dos fluxos de tráfego
em rodovias e ferrovias.

Como visto nos capítulos anteriores, a mecânica da locomoção determina os


·limites de desempenho dos veículos- ou seja, como ele se movimenta numa via em
função das suas características e das características da via. Um bom conhecimento
dos limites de desempenho permite, entre outras coisas, escolher o veículo mais
adequado para o serviço de transporte ou ainda, projetar e construir uma estrada
na qual os veículos existentes podem trafegar sem problemas.
Por outro lado, existem situações em que o movimento do veículo não é de-
terminado pelos seus limites de desempenho, mas sim pela presença de outros
veículos na via. Essa é uma situação comum, experimentada por todo motorista.
78 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

Quando o número de veículos que compartilham uma via cresce, a velocidade de


cada um deles passa a ser determinada pela corrente de tráfego e o desempenho
individual pode ficar abaixo dos limites impostos pela mecânica da locomoção.
Um fenômeno percebido facilmente em vias que se congestionam com freqüên-
cia é a deterioração da qualidade do serviço de transporte com o aumento do volume
de tráfego: à medida em que aumenta o número de veículos na via, a velocidade
média reduz-se. Em situações em que ocorre um congestionamento, a velocidade
dos veículos é quase nula. Neste capítulo, discutem-se as leis que regem o fluxo
de veículos e que permitem estudar esse tipo de fenômeno.

3. 1 Representação gráfica de fluxos de veículos

Uma das ferramentas mais úteis para a análise de fluxos de veículos é o diagrama
espaço-tempo, que foi inventando originalmente como uma forma de visualizar a
movimentação de trens e controlar o tráfego em trechos entre pátios de manobra.
O diagrama espaço-tempo é nada mais que um gráfico que ex-
pressa a relação entre a posição de cada veículo da corrente de
tráfego e o tempo, à medida em que os veículos deslocam-se ao
da longo de uma via. Normalmente, usa-se o eixo das abscissas pa-
ra representar o tempo e o eixo das ordenadas para representar a
posição do veículo na via, por meio da distância até uma origem
Ê
6 preestabelecida.
o"'c:
O diagrama espaço-tempo ilustrado na Figura 3.1 mostra as
~
rn trajetórias de cinco trens que trafegam por um certo trecho. Pode-
õ
se perceber que, no instante t = O, os trens 1 e 2 já se encontravam
dA dentro do trecho estudado e que os trens 3, 4 e 5 chegam ao início
do trecho em tempos ti >O.
Ainda no diagrama espaço-tempo da Figura 3.1, pode-se de-
Tempo (min) terminar dois parâmetros que estão relacionados à intensidade dos
fluxos de veículos: o espaçamento e o headway. Esses parâmetros
Fig. 3.1: Diagrama espaço-tempo
servem para representar a separação que existe entre veículos su-
cessivos numa corrente de tráfego e, indiretamente, a caracterizam
a seqüência de veículos que forma uma corrente de tráfego.
O headway é definido como sendo o intervalo de tempo que decorre entre a
passagem de dois veículos sucessivos por uma seção de controle e é normalmente
medido em função da passagem da roda dianteira ou do pára-choque dianteiro
3.1 Representação gráfica de fluxos de veículos 79

dos veículos por ponto preestabelecido. Num diagrama espaço-tempo, como o da


Figura 3.1, o headway é a separação horizontal entre as curvas que representam o
movimento de trens sucessivos. Note-se que o headway depende das velocidades
dos trens e varia ao longo de um trecho, se as velocidades não forem constantes.
O espaçamento é a distância entre veículos sucessivos num certo instante,
medida a partir de um ponto de referência comum nos veículos, normalmente a
frente ou as rodas dianteiras. Nos diagramas espaço-tempo, é a separação vertical
entre as curvas que representam veículos sucessivos. O espaçamento também
depende da variação das velocidades dos veículos e varia ao longo do tempo, se
essas velocidades não forem constantes.
A separação vertical entre trajetórias num dado instante (por exemplo, tA)
mostra a distância entre veículos sucessivos, ou seja, o espaçamento. A separação
horizontal entre trajetórias sucessivas num determinado ponto (por exemplo, dA)
indica o intervalo de tempo entre um veículo e outro, que é o headway.
Além de ser usado para representar graficamente fluxos de veículos, um diagra-
ma espaço-tempo permite determinar a velocidade média de um veículo ao longo
de um trecho ou sua velocidade instantânea em cada ponto da trajetória.

Exemplo 3.1 Usando o diagrama espaço-tempo da Figura 3.1, determine a velocidade


média do trem 3 entre as estações A e B, localizadas respectivamente a dA e ds km do
início do trecho.

Solução: Observando-se o diagrama espaço-tempo, percebe-se que o trem 3 passa


pela estação A no instante tA e pela estação B em t 8 . Como essas duas estações
estão separadas de ds -dA km, a velocidade média do trem é:

que equivale ao coeficiente angular da reta que liga os pontos (tA, dA) e (ts, ds).

O Exemplo 3.1 mostra que, como a velocidade média é a relação entre o


comprimento do trecho e do tempo necessário para percorrê-lo, ela pode ser obtida
do diagrama espaço-tempo determinando-se a declividade da reta que une os pontos
correspondentes aos instantes de passagem por dois pontos da via.
O diagrama espaço-tempo também permite determinar a velocidade instantâ-
nea dos veículos, que é a tangente à curva num dado ponto. No diagrama espaço-
tempo da Figura 3.1, a velocidade instantânea do trem, ao passar pela estação A, é
a tàngente à curva naquele ponto, como pode ser visto no gráfico. Pode-se também
80 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

perceber que, se o trem tivesse mantido essa velocidade durante todo o trecho entre
as duas estações, ele teria gasto um tempo bem menor para chegar à estação B.
Se um veículo viaja em velocidade constante, a tangente (ou seja, a derivada
da função) é constante. Por conseguinte, a curva que representa o movimento
desse veículo no diagrama espaço-tempo é uma reta, como as que representam o
movimentos dos trens 4 e 5 na Figura 3 .1. Pode-se também perceber que o trem 4
pára por algum tempo a meio caminho entre as estações A e B, pois a declividade
da reta torna-se nula.

3.2 Princípios fundamentais dos fluxos de veículos

O fluxo de veículos é um fenômeno complexo que, em função da importância


econômica do transporte rodoviário, deve ser muito bem compreendido pelos en-
genheiros de transporte. Algumas observações casuais num trecho em que existe
um grande volume de veículos permitem perceber que, se a intensidade do tráfego
aumenta, a velocidade dos veículos diminui. É importante analisar os princípios
que regem o comportamento das correntes de tráfego para melhor entender os
fluxos de veículos.
Existem duas formas de se estudar os fluxos de veículos, macroscópicamente e
microscópicamente. Os modelos macroscópicos consideram a corrente de tráfego
como um todo, sem se interessar com o que ocorre com cada veículo que a forma.
Normalmente os modelos macroscópicos pressupõem que a corrente de tráfego é
formada por veículos e condutores com características semelhantes e se prestam
melhor para estudar situações em que as condições do fluxo são constantes - o que
se chama de estado de equilíbrio ou 'steady state'.
Os modelos microscópicos, por outro lado, procuram descrever o comporta-
mento da corrente de tráfego a partir das respostas individuais de cada veículo. É
comum o uso de modelos microscópicos para estudar situações em que existem
variações aleatórias nas características dos veículos e de seus condutores, ou seja,
naquelas situações em que o fenômeno é tratado com um processo estocástico.
O fluxo de uma corrente de tráfego numa rodovia pode ser contínuo ou inter-
rompido. Um .fluxo de tráfego contínuo é aquele em que não existem interrupções
periódicas na corrente de tráfego - o tipo de fluxo encontrado em auto-estradas
e outras vias com acesso limitado, onde não existem semáforos, sinais de parada
obrigatória ou de preferencial à frente e nem interseções em nível. Pode-se admi-
tir o fluxo contínuo em trechos de rodovias onde as interseções em nível estejam
separadas por distâncias consideráveis.
3.2 Princípios fundamentais dos fluxos de veículos 81

Os fluxos de tráfego interrompidos são encontrados nos trechos de vias onde


existem dispositivos que interrompem o fluxo de veículo periodicamente. O fluxo
de veículos, neste caso, não depende apenas da interação entre os veículos, mas
também do intervalo entre as interrupções do tráfego, como será visto mais adiante.
Os parâmetros que caracterizam uma corrente de tráfego podem ser divididos
em duas categorias: parâmetros macroscópicos e microscópicos. Os parâmetros
macroscópicos representam características do fluxo de veículos como um todo; os
parâmetros microscópicos caracterizam o comportamento de veículos individuais
dentro do fluxo, em relação aos outros veículos que compõem a corrente 1. Os
parâmetros macroscópicos que descrevem um fluxo de tráfego são três: o volume,
a velocidade e a densidade.

3.2. 1 Volume de tráfego

O volume de tráfego numa certa via é definido como o número de veículos passando
por ponto durante um intervalo de tempo. Quando o intervalo de tempo é uma
hora, a unidade de volume é [veic/h] e refere-se ao volume como volume horário.
Se o período for um dia, o volume é dado em [veic/dia] e denominado volume
diário. Se o volume referir-se a um período de um ano, diz-se que é um volume
anual e sua unidade é [veic/ano].
A taxa de fluxo horário é o volume horário equivalente, obtido a partir de um
intervalo de observação menor que uma hora. Esta distinção é importante pois a
taxa de fluxo horário pode ser diferente do volume que seria obtido se o intervalo
de observação fosse de uma hora.
O volume é medido através de uma contagem, que pode ser manual ou au-
tomática (feita por meio de aparelhos colocados sob ou sobre a via). A contagem
pode se referir a uma única faixa de tráfego ou a todas as faixas de tráfego; pode
dizer respeito a um único sentido de tráfego ou aos dois sentidos de tráfego.
É interessante perceber que existe uma relação entre os headways e o volume
de tráfego. Suponha-se que n veículos foram contados durante um período b..t e
que os seus headways hi foram registrados. Sabe-se que:
n

b..t= 'L:hi· (3.1)


i=l
1 McShane, W. R. e Roess, R. P. (1990). Traffic Engineering. Prentice-Hall, Englewood Cliffs,
NJ, EUA.
82 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

O volume q é a relação entre o número de veículos n e o período de contagem !lt.


Substituindo-se o valor de tlt pela Equação 3.1, tem-se que
n
q = "'n
L..-i=! hi
.
Corno o headway médio, fi, é dado por

pode-se ver que o volume pode ser também expresso corno o inverso do headway
médio:
1
q = -:=-. (3.2)
h

Volumes e taxas de fluxo de tráfego: definições ·e usos

Muitas vezes, os volumes de tráfego são expressos em veículos por dia, principal-
mente quando são usados para planejamento de sistemas rodoviários ou na análise
de tendências de crescimento. As projeções de tráfego são rotineiramente basea-
das em contagens diárias, que muitas vezes são determinadas a partir do volume
anual, que é o número de veículos que passam por um trecho de uma via durante
um ano e é expresso em [veic/ano]. O volume anual é usado para análise de aciden-
tes, estudos econômicos para a implantação de pedágios, e também para estudar
as tendências futuras de variação do volume de tráfego. Os volumes diários de
tráfego mais usados são:

e Volume diário médio anual (VDMA): é definido o volume anual dividido


por 365. Representa o volume médio correspondente a um período de 24 ho-
ras e é expresso em [veic/dia].

e Volume diário médio (VDM): é o volume médio referente a 24 horas num


certo local, com referência a um período inferior a um ano. Enquanto que o
VDMA refere-se a um ano, o VDM pode ser obtido com volumes semestrais,
mensais, semanais ou até mesmo com contagens de apenas dois dias de
duração. O VDM só é válido para o período ao longo do qual foi medido.

Normalmente, os volumes diários referem-se aos dois sentidos do tráfego, e não a


cada uma das direções.
3.2 Princípios fundamentais dos fluxos de veículos 83

Apesar de os volumes diários serem úteis para fins de planejamento, eles não
devem ser usados em análises operacionais ou no projeto de componentes do
sistema viário, já que o tráfego pode variar consideravelmente ao longo do dia,
sendo comum a existência de dois ou três períodos de pico. A hora do dia que
apresenta o maior volume de tráfego é chamada de hora pico e é a hora que
interessa para o projeto e análise operacional do sistema. As rodovias devem ser
projetadas para serem capazes de suportar o volume da hora pico, na direção de
maior movimento. Como o tráfego geralmente viaja numa direção no período da
manhã e na direção oposta no período da tarde, a diferença entre os volumes das
horas pico da manhã e da tarde é pequena e as duas direções são projetadas para o
mesmo volume.
No projeto de componentes do sistema rodoviário, os volumes de hora pico
na direção mais congestionada são, muitas vezes, estimados a partir de projeções
do volume diário, a partir de um coeficiente que indica a proporção do VDMA que
ocorre durante a hora pico e é conhecido como fator K:

VPj = VDMA. Kj. D (3.3)

em que VP{ volume direcional da j-ésima hora mais congestionada [veic/h];


VDMA: volume médio diário anual [veic/dia];
K{ fator K; e
D: coeficiente de divisão direcional do tráfego.

O fator Kj corresponde à fração do volume diário médio anual


que ocorre durante a j-ésima hora mais congestionada do ano, se
todas as horas do ano foram classificadas em ordem decrescente de Tab. 3.1: Faixas gerais de variação dos fa-
tores K e D
volume. No projeto de rodovias, costuma-se utilizar K 30 , que produz
o volume da trigésima hora mais congestionada do ano; enquanto que Tipo de via K D
no projeto de vias urbanas pode-se utilizar o volume correspondente Rural 0,15-0,25 0,65-0,80
à qüinquagésima hora mais congestionada, obtido através de K 50 . Suburbana 0,12-0,15 0,55-0,65
Urbana 0,07-0,12 0,55-0,60
Os fatores K j e D devem ser computados a partir dos dados
Fonte: McShane. W. c Roess. R. (1990). Traffic Engineuing.
de volume de tráfego da região. Por exemplo, um estudo realizado Prenticc-Hall. Englcwood CliiTs. NJ. EUA.

pela DERSA2 , no estado de São Paulo, determinou um valor de


O,??? para K3o no sistema Anchieta-Imigrantes e O,??? para K 30
no sistema Anhangüera-Bandeirantes. Em geral, K é maior se a rodovia tem
uso sazonal recreativo e está localizada longe dos centros urbanos. Em áreas
2 Conseguir referência com Ion de Freitas.
84 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

densamente povoadas, existe mais tráfego fora dos períodos de pico e os trechos
com capacidade insuficiente tendem a aumentar a duração dos períodos de pico.
O coeficiente de divisão direcional D varia entre zero e um e tem uma varia-
bilidade maior, já que existem mais fatores que influenciam a divisão direcional
do tráfego tais como a densidade populacional, a distribuição espacial dos pólos
geradores e atratores de tráfego, etc. A Tabela 3.1 mostra a gama usual de variação
desses valores, a título de ilustração.
Mesmo dentro da hora pico, existem variações no fluxo de tráfego que são de
grande interesse para o engenheiro de transportes. Um componente do sistema
pode ter sido projetado para o volume da hora pico mas, se a variação do fluxo
dentro do pico for muito grande, a demanda pode exceder a capacidade. Os
volumes observados para períodos de duração inferior a uma hora são normalmente
expressos em termos de uma taxa de fluxo horário equivalente. Por exemplo, se
contam-se 300 veículos durante um período de 10 minutos de duração, a taxa de
fluxo horário equivalente é 300 (60/10) = 1.800 veic/h. Se a contagem tivesse
sido conduzida por um período de uma hora, com certeza o volume obtido não
seria 1.800 veic/h. O Exemplo 3.2 ilustra melhor o conceito.

Exemplo 3.2 Observando-se um trecho de rodovia de 17:00-17:15, foram contados


1.000 veículos; de 17:15-17:30, 1.100 veículos; de 17:30-17:45, 1.200 veículos; e de
17:45-18:00, 900 veículos. Determine as taxas de fluxo horário equivalente em cada um
dos períodos de 15 minutos e compare esse valor com o volume horário observado.

Solução: O cálculo das taxas de fluxo horário equivalente pode ser feito a partir
das contagens parciais:

Intervalo Contagem (veic) Taxa de fluxo (veic/h)


17:00-17:15 1.000 4.000
17:15-17:30 1.100 4.400
17:30-17:45 1.200 4.800
17:45-18:00 900 3.600

Das 17:00 às 18:00, foram observados um total de 4.200 veic, o que fornece um
volume horário de 4.200 veic/h, ficando clara a variação do fluxo de tráfego dentro
do período de observação.

A relação entre a maior taxa de fluxo horário equivalente e o volume horário


define o fator de pico horário:

(3.4)
3.2 Princípios fundamentais dos fluxos de veículos 85

em que FHP: fator de pico horário;


VH: volume horário [veic/h];
t: duração do período de fluxo [min]; e
V1 : taxa de fluxo horário equivalente [veic/h].

Para períodos de fluxo de 15 minutos de duração (t = 15 min), pode-se perceber


que FHP varia entre 1 -quando os volumes em cada intervalo de 15 minutos são
iguais -e 0,25, que corresponde à situação em que todo o tráfego concentra-se
num único período de 15 minutos. A faixa de variação normal do fator de pico
horário está entre O, 70 e 0,98, com valores menores indicando uma maior variação
do fluxo de tráfego durante a hora pico.

3.2.2 Densidade de uma corrente de tráfego

A densidade ou concentração de uma corrente tráfego reflete a intensidade da


corrente, atingindo seu máximo quando o tráfego encontra-se completamente con-
gestionado. A concentração ou densidade k é definida como o número de veículos
que ocupam um trecho de via num determinado instante. A unidade mais usual
para a densidade é [veic!km], mas como se a concentração referir-se a apenas uma
das faixas de tráfego, a unidade deve ser [veic/(km.faixa)]. Pode-se perceber.que
a densidade depende do comprimento médio dos veículos, pois quanto maior for
esse valor, menor será o número de veículo por quilômetro de via.
Dos três parâmetros que caracterizam uma corrente de tráfego, a densidade é
o de maior importância, por estar diretamente relacionada à demanda. Embora
a demanda seja normalmente indicada como uma taxa de fluxo de tráfego, ela
corresponde, na realidade, ao número de viagens realizadas. A demanda é criada
nos pólos geradores de viagens em função do tipo e intensidade de utilização do
solo (residencial, comercial e industrial) e o destino dessas viagens é determinado
pelos pólos atratores, também um função do tipo e intensidade do uso do solo.
Esse mecanismo de geração/atração de viagens determina o número de pessoas e,
por conseguinte, de veículos que pretendem usar determinadas partes do sistema
viário. A relação entre o número de veículos e a extensão dessas vias produz
uma densidade de tráfego que, por sua vez, determina o volume e a velocidade da
corrente de tráfego.
A concentração ou densidade é também uma medida importante da qualida-
de do fluxo de tráfego, já que reflete a proximidade dos veículos, um fator que
que influencia a liberdade de manobras dentro da corrente e o grau de conforto
psicológico dos motoristas.
86 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle .

3.2.3 Velocidade média de uma corrente de tráfego

A velocidade é a relação entre a distâncja percorrida e o tempo gasto para per-


correr essa distância. As unidades mais usuais para a velocidade são [krnlh] e
[rn!s]. Numa corrente de tráfego, cada veículo viaja a uma velocidade diferen-
te e em conseqüência, a corrente não tem uma velocidade única e fixa, mas sim
uma distribuição de velocidades individuais. Essa distribuição de velocidades dos
veículos na corrente de tráfego pode ser descrita por uma média. Portanto, a velo-
cidade média de uma corrente de tráfego é definida como a média das velocidades
dos veículos que compõem o fluxo. Existem duas formas diferentes de calcular
a velocidade média para uma corrente de tráfego, cada uma delas fornecendo um
valor diferente e possuindo um significado físico diferente: a velocidade média no
tempo e a velocidade média no espaço.
A velocidade média no tempo, ü 1 , é a média aritmética das velocidades instantâ-
neas de veículos individuais, medidas em um certo ponto da via. Se as velocidades
dos veículos forem medidas ao longo de um trecho de comprimento d, por meio
de tempo ti que cada veículo gasta para percorrer esse trecho, pode-se determinar
A velocidade média no es- que
paço é uma medida referen-
te a um segmento de via; a (3.5)
velocidade média no tem-
po é uma medida pontual, re-
ferente a um único ponto na
em que Ü1 : velocidade média no tempo;
via.
n: número de veículos;
ui: velocidade instantânea do i -ésimo veículo;
d: comprimento do trecho; e
ti: tempo gasto pelo i -ésimo veículo para percorrer o trecho.

A velocidade média no espaço, Üs é a média harmônica das velocidades in-


dividuais dos veículos que passam por um certo ponto durante um período. Ela
pode ser calculada pela relação entre a distância total viajada pelos veículos 'que
passam por um trecho de via e o tempo total gasto por esses veículos para viajar ao
longo do trecho. Se ti é o tempo necessário para um veículo passar por um trecho
de•comprimento d, a velocidade média no espaço é:

n.d n
Us=--=---. (3.6)
n n l
I>i :L;.-
i=l i=l I
3.2 Princípios fundamentais dos fluxos de veículos 87

A velocidade média no espaço é a utilizada nas relações volume-densidade.


Wardrop 3 encontrou a seguinte relação entre a velocidade média no tempo e a
velocidade média no espaço:

em que CJ 2 é a variância das velocidades instantâneas dos veículos. Se todos os


veículos estiverem na mesma velocidade, CJ 2 = O e, portanto, Ü1 = Üs.

Exemplo 3.3 Seja um trecho de rodovia com 300m de extensão. Os tempos gastos para
trafegar por esse segmento foram observados para seis carros. Deseja-se determinar a
velocidade média no tempo e no espaço para a corrente de tráfego da qual esses veículos
fazem parte.

Solução: A velocidade média no espaço é determinada a partir da média das ve-


locidades de cada veículo, ao passo que a velocidade média no espaço é calculada
usando-se o tempo médio gasto pelos veículos para viajar no trecho. O quadro a
seguir mostra o cômputo dessas velocidades:

Veículo Distância (m) Tempo (s) Velocidade (mls)


300 18 16,67
2 300 24 12,50
3 300 20 15,00
4 300 16 18,75
5 300 19 15,79
6 300 20 15,00
Total 1.800 117 93,71

A velocidade média no tempo é a média das velocidades, ou seja, Ü1 = 93.71/6 =


15,62 rnls (56,22 kmlh). A velocidade média no espaço é:
1.800
Üs = ~ = 15,38 rnls ou 55,38 km/h.

Velocidades: definições e usos

Além da velocidade média no espaço e da velocidade média no tempo, existem


outras definições de velocidade que são amplamente usadas na Engenharia de
Tráfego, como se verá nesta seção.
3 Ger1ough. D. L. e Huber, M. J. (1975). Traffi.cfiow theory: a monograph. Special Report 165,
Transportation Research Board, U.S. National Research Counci1, Washington, DC, EUA.
88 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

A velocidade média de percurso 4 e a velocidade média em movimento 5 são


duas formas da velocidade média no espaço que são frequentemente utilizadas em
estudos de Engenharia de Tráfego. Ambas são computadas como a relação entre a
distância percorrida e o tempo médio gasto para percorrê-la e diferem apenas nos
componentes do tempo que são incluídos no cômputo da velocidade.
O tempo de percurso é definido como o tempo total gasto para percorrer um
segmento de via; o tempo em movimento é o tempo total durante o qual o veículo
esteve em movimento ao percorrer o trecho. O tempo de percurso é a soma do
tempo em movimento com o tempo total durante o qual o veículo esteve parado
ao percorrer o trecho. Esse tempo em que o veículo fica parado é chamado de
retardamento ou atraso. A velocidade média de percurso é baseada no tempo
médio de percurso, ao passo que a velocidade média em movimento é baseada no
tempo médio em movimento.

Exemplo 3.4 Considere um trecho de 1,5 km de extensão, no qual o tempo médio gasto
por um veículo para percorrê-lo é 3 minutos, sendo que 1 minuto é o tempo médio parado
nos cruzamentos semaforizados existentes ao longo do trecho. Determine a velocidade
média de percurso e a velocidade média em movimento.

Solução: Se o tempo.inédio de percurso é 3 minutos, então a velocidade média de


percurso é i

~ 15km
Vp = -'-- 60 minlh = 30 kmJh
3min
e a velocidade média em movimento é 45 km!h.

A diferença entre as duas velocidades está relacionada aos atrasos sofridos no


percurso. Se esses atrasos forem inexistentes, as duas velocidades serão iguais.
Embora as velocidades médias sejam importantes para caracterização das cor-
rentes de tráfego, existem outras definições de velocidade que são importantes para
a Engenharia de Tráfego·. Uma delas é a velocidade de projeto, que é a velocidade
usada para o projeto da via, em função da qual determinam-se diversos parâme-
tros importantes para o projeto geométrico, tais como raio de curvatura mínimo,
distância de visibilidade, etc.
A velocidade de operação é definida como a velocidade máxima que um veícu-
lo pode ser conduzido com segurança numa dada corrente de tráfego, sem exceder
a velocidade de projeto da via. Essa velocidade é difícil de ser medida na prática,
4 Em inglês, 'average trave! time'.
5Em inglês, 'average running speed'.
3.3 Modelos macroscópicos para fluxos de tráfego 89

pois requer que um veículo seja conduzido de forma consistente com sua defi-
nição. Como a determinação de qual seja a velocidade máxima segura depende
de julgamento de valor, existe uma ampla gama de variação na sua determinação
empírica. A velocidade de operação é normalmente aproximada pela velocidade
correspondente ao 85° percentil, V85 , que corresponde à uma velocidade tal que
85% dos veículos do fluxo viajam numa velocidade menor ou igual a ela- ou,
por outro lado, é uma velocidade tal que apenas 15% dos veículos na corrente de
tráfego estão viajando em velocidade superior a ela.
De modo similar, pode-se definir uma velocidade que corresponde ao 15° per-
centil, que seria a menor velocidade razoável para veículos na corrente de tráfego.
Essa velocidade corresponde àquela abaixo da qual apenas 15% dos veículos tra-
fegam.

3.3 Modelos macroscópicos para fluxos de tráfego

A abordagem macroscópica preocupa-se com a corrente de tráfego propriamente


dita e procurar determinar modelos matemáticos que traduzam adequadamente as
relações entre o volume, a densidade e velocidade média no espaço. Uma grande
vantagem dos modelos macroscópicos reside na facilidade de calibração de tais
modelos, que é feita por análise de regressão, um método relativamente simples.
O modelo macroscópico mais comum (e também o mais simples) é o proposto por
Bruce D. Greenshields, um dos pesquisadores pioneiros da Engenharia de Tráfego,
que trabalhou nos Estados Unidos entre 1925 e 1950.

3.3.1 Relações volume-densidade para fluxos de tráfego contínuos

Correntes de veículos trafegando por auto-estradas ou vias expressas com poucas


interrupções são usualmente tratadas como fluxos contínuos de tráfego. Para a
descrição do comportamento de um fluxo contínuo de veículos, a relação básica
entre volume, velocidade (média no espaço) e densidade é dada por:

q = Üsk (3.7)

em que q: volume de tráfego [veic/h];


us: velocidade média no espaço [kmlh]; e
k: densidade de tráfego (ou concentração) [veic/km].
90 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

A Equação 3. 7 é chamada de relação fundamental do tráfego. A partir dela, pode-se


determinar as relações entre o volume e a velocidade, entre o volume e a densidade
e entre a velocidade e a densidade, como se verá a seguir.
Para a determinação dessas relações entre volume, velocidade e densidade,
além da Equação 3.7, é preciso conhecer a relação entre duas das variáveis- por
exemplo, como a velocidade varia em relação à densidade ou em relação ao volume.

3.3.2 A relação entre a velocidade média e a densidade

A relação que existe entre a densidade e velocidade média de um fluxo de tráfego


é relativamente simples e permite iniciar o desenvolvimento de um modelo básico
que represente o fluxo contínuo de veículos.
Qualquer motorista percebe que a velocidade diminui conforme o número
(densidade) de veículos na via aumenta. De fato, à medida em que a a densidade
cresce, as velocidades de operação de cada veículo diminuem, já que a presença
de mais veículos impede algumas manobras e exige maior cautela por parte dos
motoristas. Se o número de veículos na via continuar crescendo, ela se tornará tão
congestionada que o tráfego irá parar (Üs = O) e a densidade será determinada pelo
comprimento físico dos veículos e dos espaços deixados entre eles. Esta condição
de concentração máxima é chamada de densidade de congestionamento, kj·
O outro extremo corresponde à situação em que a densidade é muito baixa,
próxima de zero. Nesse caso, um veículo pode viajar à velocidade que seu mo-
torista desejar, possivelmente a velocidade máxima permitida. Convencionou-se
chamar essa velocidade de velocidade de fluxo livre, u f, já que representa uma
situação em que as velocidades de operação não são afetadas pela presença de
outros veículos.
Greenshields foi um dos primeiros pesquisadores a estudar a relação entre a
velocidade e a densidade. Em 1934, ele propôs um modelo linear6 para explicar
Densidade kj esse fenômeno. A representação matemática do modelo de Greenshields, que está
ilustrado no gráfico da Figura 3.2, é
Fig. 3.2: O modelo linear de
Greenshields
(3.8)

em que us: velocidade média no espaço da corrente de tráfego [kmlh];


6 Greenshields, B. D. (1934). A Study of Highway Capacity. Proceedings of the Highway
Research Board, v. 14.
3.3 Modelos macroscópicos para fluxos de tráfego 91

u t= velocidade de fluxo livre [km/h];


k: concentração [veic/km]; e
k 1 : densidade de congestionamento [veic!km].

Como mostra a Figura 3.2, para densidades de tráfego muito baixas (k ~ 0), a
velocidade média do fluxo é u = u f. Para concentrações próximas da densidade
de congestionamento (k ~ k 1), a velocidade média do fluxo de tráfego tende a
zero, u = O. O modelo de Greenshields aplica-se bem a situações em que o fluxo
é contínuo e não sofre interferências de manobras de entrada e saída da corrente de
tráfego, como acontece em trechos afastados das interseções em rodovias de pista
dupla e acesso controlado.
O modelo linear de Greenshields não é o único que procura explicar a relação
entre a densidade e a velocidade média no espaço. H. Greenberg, um outro pioneiro
da Engenharia de Tráfego, propôs um modelo não linear que se presta bem para
analisar situações em que o tráfego é muito intenso. No modelo de Greenberg7 , a
relação entre a velocidade e a densidade é feita por meio de uma função logarítmica:
k
Üs = c In kj. (3.9)

Para os propósitos de um texto introdutório como este, o modelo linear produz


representações matemáticas das interações entre velocidade, densidade e volume
que são muito intuitivas. Assim sendo, fica para o leitor interessado usar o modelo
de Greenberg para determinar as relações entre o volume e a densidade e entre o
volume e a velocidade, que são discutidas a seguir.

3.3.3 A relação entre o volume e a densidade

A partir do modelo linear para representar a relação entre velocidade e concen-


tração, pode-se obter um modelo para a relação entre o volume e a densidade de
uma corrente de tráfego substituindo-se a Equação 3.8 na Equação 3.7:

q = Uj (k- ~:) (3.10)

em que q: volume de tráfego [veiclh];


u1 : velocidade de fluxo livre [kmlh];
k: concentração [veic/km]; e
ki: densidade de congestionamento [veiclkm].

7 Greenberg. H. (1959). An Analysis ofTraffic Flow. Transportation Research, v. 7.


92 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

I A Equação 3.10 é uma função do segundo grau, cujo gráfi-


co é uma parábola, como mostra a Figura 3.3. O ponto de que
corresponde ao fluxo máximo, qm, representa o maior volume de
tráfego que pode ser suportado pela via. Este volume é chamado
de capacidade da via

O fluxo máximo qm está relacionada a uma concentração km,


chamada de densidade crítica, e a uma velocidade um, chamada
de velocidade crítica. Os valores correspondentes a qm, km e Um
para uma dada corrente de tráfego podem ser obtidos a partir da
km derivada da Equação 3.10. Sabe-se que no ponto em que q = qm,
Densidade
Fig. 3.3: A relação entre volume e .densidade dq
-=UJ ( 1-
2km)
- =0=}k =kj
- (3.11)
dk kj m 2

pois a velocidade de fluxo livre u 1 não é nula quando q = qm. A


Equação 3.11 mostra que a densidade crítica é a metade da densidade de conges-
tionamento.

Substituindo-se a Equação 3.11 na Equação 3.8, tem-se que

k· ) Uf
Um=Uf ( 1- 2 ~j =2, (3.12)

ou seja, a velocidade crítica é a metade da velocidade de fluxo livre.


A capacidade pode ser calculada a partir da relação fundamental do tráfego,
q = Üs . k, e da densidade e velocidade críticas (Equações 3.11 e 3.12):

(3.13)

A velocidade média do fluxo de tráfego na capacidade pode ser determinada a


partir da inclinação da reta que liga o ponto de máximo na parábola à origem, como
mostrado na Figura 3.3. Isso equivale a usar a relação fundamental (Equação 3. 7),
já que Um = qmf km·

Exemplo 3.5 Um trecho de auto-estrada tem velocidade livre de 11 O kmlh e uma densi-
dade de congestionamento de 230 veic/km. Utilizando um modelo linear para a relação
entre a velocidade e a densidade, determine a capacidade bem como a densidade e a
velocidade que correspondem a esse volume de tráfego.
3.3 Modelos macroscópicos para fluxos de tráfego 93

Solução: Se a relação entre a densidade e a velocidade é linear, a densidade crítica,


que é a densidade da corrente de tráfego quando o fluxo é máximo, corresponde à
metade da densidade de congestionamento, como mostrado na Equação 3.11, ou
seja, km = 210/2 = 105 veic!J.<m.
Igualmente, a velocidade crítica, que é a velocidade média no espaço da corrente
de tráfego quando o volume é máximo, é a metade da velocidade livre, como
demonstrado na Equação3.12. Então, Vm = 11 Oj2 = 55 km/h.
Da relação fundamental do tráfego, sabe-se que o volume na capacidade é dado
pelo produto da velocidade crítica pela densidade crítica. Portanto, o volume que
corresponde à capacidade do trecho em questão é qm = 105.55 = 5.775 veiclh.
Ou seja, na capacidade, passam 5.775 veiclh, numa velocidade média de 55 km/h
e cada quilômetro de via contém 105 veículos.

Uma característica importante desta relação é que para cada


volume correspondem duas concentrações diferentes, como pode
ser visto no gráfico da Figura 3.4. Pode-se notar que para qualquer Fluxo livre

outro volume, que não o volume máximo, correspondem dois valo-


res de concentração: um menor que km e outro maior que km· Isso
significa que uma certa via pode operar a um volume de tráfego q 1 , (I)
q1
menor que a capacidade em duas situações: uma onde o volume E
::I
passando pela seção de controle é pequeno devido ao baixo núme- ~
ro de veículos, e outra onde o volume passando pela via é baixo
devido ao congestionamento existente.
No primeiro caso, a densidade é baixa e a velocidade média
da corrente de tráfego é alta (u; > um), pois os motoristas têm k1 km f<1 kj
liberdade para escolherem a velocidade de operação dos seus carros Densidade
sem que a presença dos demais veículos interfira com isso. Por Fig. 3.4: Volume, densidade e velocidade de
conseguinte, denomina-se essa região do gráfico na qual k < km uma corrente de tráfego
de região de fluxo livre, pois a via está operando com um volume
abaixo da sua capacidade.
No segundo caso, na região da parábola em que k > km, a densidade da
corrente é alta e, em conseqüência disso, a velocidade é baixa (u'{ < um) pois a
alta concentração da corrente força os motoristas a reduzirem a velocidade. Essa
região é chamada de região de fluxo congestionado, pois a via está operando além
da sua capacidade e encontra-se congestionada.
Quando q = O, existem também dois estados possíveis para a corrente de
tráfego. Se k for igual a zero, a velocidade da corrente é a velocidade livre, que
94 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

é a tangente à parábola na origem; se k = k 1, a velocidade é nula porque a via


encontra-se completamente congestionada.
Com isso, fica claro que a suposição de que uma função linear expresse cor-
retamente a relação velocidade-densidade permite construir um modelo capaz de
explicar adequadamente o fenômeno do fluxo de veículos numa via de tráfego
ininterrupto, como uma auto-estrada ou uma via expressa.

Exemplo 3.6 No caso do trecho do Exemplo 3.5, determine a concentração e a velocidade


da corrente de tráfego quando o volume for igual a 4.200 veiclh.

Solução: A relação fundamental estabelece que q = Üs . k; por conseguinte, têm-se


que:
- q 4.200
q = Us. k::::} Us = k = -k-.
Essa expressão para a velocidade pode ser substituída na relação entre a densidade
e a velocidade que, para o trecho em questão, é

Ü
s
= Uj (1- ~)
kj
= 110 (1- ~)::::}
210
4.200 110 110 ?
- k
- = 110- -k::::} - k - -110k+4200 =o
210 210
A solução dessa equação do segundo grau fornece dois valores para a densida-
de, k 1 = 50,17 veiclkrn e k2 = 159,83 veiclkrn. Substituindo-se esses dois
valores na relação fundamental para o volume igual a 4.200 veic/h, têm-se que
u 1 = 83,72 krnlh e uz = 26,28 kmlh.

3.3.4 A relação entre volume e velocidade

A expressão matemática da relação entre a velocidade média e o volume da corrente


de tráfego pode ser obtida de forma similar à usada para deduzir o modelo volume-
concentração. A Equação 3.8 pode ser rearranjada de tal forma que

(3.14)

Substituindo-se o valor de k da Equação 3.14 na relação fundamental do tráfego,


obtém-se o modelo que expressa a variação do volume com a velocidade média da
corrente:
(3.15)
3.4 Modelos microscópicos de tráfego 95

-------~-------------------
Ffuxq
congf!Stionado

.,
...___ _ _::-;k-m--""7""~~-------;

u,
I

I Uf --------L--------~---------
------------J/------~---------
FfUXO : I

livre :
/ I

/ I

k'1.(___________ _ : 1 Um
-------- --------T---------
1 Flux'o
congestionado

q1 km
Volume Densidade Volume
Fig. 3.5: A relação entre velocidade e volume Fig. 3.6: Relações entre velocidade, volume e densidade nu-
ma corrente de tráfego sem interrupções

Esta também é uma função parabólica, que é ilustrada na Figura 3.5. Note-se
que, tradicionalmente, a representação gráfica desse modelo é feita com os eixos
trocados: a velocidade é representada no eixo vertical e o volume, no horizontal.
Como no modelo volume-concentração, existe uma região de fluxo livre e outra
de fluxo congestionado. Na região de fluxo livre, o volume é alcançado com uma
velocidade maior que a velocidade crítica (Üs > um) e a densidade é baixa. Na
região de fluxo congestionado, a densidade é alta e a velocidade é menor que a
crítica (Üs < Um).
A velocidade média da corrente pode variar de zero à velocidade livre u f e o
volume é nulo para essas duas condições. O volume é máximo quando a velocidade
é igual à metade da velocidade livre u f e, nessa situação, a densidade é a metade
da densidade de congestionamento kj·
A Figura 3.6 exibe graficamente as relações entre velocidade, volume e con-
centração e suas interações.

3.4 Modelos microscópicos de tráfego

Como visto nas seções anteriores, os modelos macroscópicos tratam da corrente


de tráfego como um todo. A abordagem microscópica, por outro lado, procura
96 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

estabelecer modelos matemáticos capazes de explicar as características dos fluxos


de tráfego a partir dos veículos que compõem a corrente. Neste tipo de abordagem,
os fluxos são estudados através de modelos capazes de determinar os intervalos
entre chegadas sucessivas de veículos - as distribuições de headways.
O modelo mais simples para a modelagem de chegadas de veículos a um ponto
na via baseia-se na suposição de que os intervalos entre passagens de veículos
sucessivos pela seção de controle são constantes. Este padrão de chegadas é
chamado determinístico ou uniforme. De acordo com essa suposição, se o volume
de tráfego for, por exemplo, 360 veiclh, o número de veículos que passa por uma
seção de controle num intervalo de 5 minutos é 30 e o headway entre dois veículos
sucessivos quaisquer é 10 segundos, pois como visto na Equação 3.2 (pág. 82), o
headway médio é o inverso do volume.
Os modelos determinísticos, apesar de simplistas, têm aplicações práticas im-
portantes e servem para representar bem algumas situações de grande importância
para a Engenharia de Tráfego. A suposição de headways uniformes aplica-se bem
aos headways entre os veículos que partem de uma fila formada num semáforo,
por exemplo.
Em outras situações, tais como fluxos em trechos longos entre interseções
semaforizadas, uma rápida observação mostra que a hipótese de chegadas unifor-
memente espa~adas é apenas uma aproximação do fenômeno real pois percebe-se
que os headways não são constantes e variam de forma aleatória. Um modelo
estocástico de chegadas, que trata os headways como uma variável aleatória, re-
presenta mais fielmente o processo de passagem de veículos por esse ponto de
observação. Se esta variável aleatória puder ser ajustada a uma função densidade
de probabilidade, o problema passa a ser determinar qual distribuição estatística é
a mais adequada para representar os headways observados.
Já que é mais simples contar o número de veículos que passa por um pon-
to durante um certo intervalo de tempo do que medir headways, e como a taxa
média de chegadas corresponde ao inverso do headway médio, diversos modelos
microscópicos são baseados na taxa média de chegadas. Um desses modelos, usa
a distribuição de Poisson para representar chegadas de veículos numa corrente de
tráfego e é expresso por:
(Àt)ne-Àt
P(n)=~-~ (3.16)
n!

em que P(n): probabilidade de n veículos chegarem durante um intervalo de


duração t;
3.4 Modelos microscópicos de tráfego 97

t: intervalo de observação [s]; e


À: taxa de fluxo média no intervalo de tempo observado, também
chamado de taxa média de chegadas [veic/s].

Exemplo 3.7 Considere um trecho de uma auto-estrada onde observa-se um fluxo médio
de 360 veic/h. Supondo-se que as chegadas de veículos sejam distribuídas de acordo com
uma distribuição de Poisson, estimar a probabilidade de se ter O, I, 2, 3, 4 e 5 ou mais
veículos passando por um posto de polícia rodoviária num intervalo de 20 segundos.

Solução: Neste caso, a taxa de chegadas é À = 360/3600 =O, I veic/s. Usando-se


a Equação 3.16, tem-se que as probabilidades de ocorrerem O, 1, 2, 3 e 4 chegadas
num intervalo de 20 segundos são:
(0, 1 . 20)0 e-CO. I. 20)
P(n =O) = = 0,135
O!
(0, 1 . 20) I e-(0, 1. 20)
P(n =I) = 0,27I
1!
(0,1.20) e-C0.1. 20)
2
P(n = 2) 0,271
2!
(0, 1 . 20)3 e-(0, 1. 20)
P(n = 3) O, 180
3!
(0,1.20)4e.-(0,1.20)
P(n = 4) = = 0,090
4!
A probabilidade de ocorrem 5 ou mais chegadas em 20 segundos pode ser calculada
sabendo-se que a probabilidade da ocorrência de um evento complementar à de A
é P(Ã) = 1- P(A), ou seja,

P(n:::: 5) = 1- [P(O) + P(1) + P(2) + P(3) + P(4)] =}

P(n ::::5) = 1- [0,135 +0,271 +0,271 +0,180+0,09] =}

P(n :::: 5) 0,053

A suposição de que as chegadas de veículos sejam distribuídas de acordo com


uma distribuição de Poisson implica em que os headways entre veículos sucessi-
vos sejam distribuídos de acordo com uma distribuição exponencial. Isso pode ser
facilmente demonstrado, considerando-se que um headway de duração t é equiva-
lente a um intervalo de tempo t durante o qual não ocorre chegada alguma.
Seja a taxa média de chegadas À [veic!s]. A probabilidade de não serem
observadas chegadas durante um intervalo de tempo de duração t é
(Àt)ne-Àt
P(n =Ü) = - - - (3.17)
n!
98 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

que é a expressão da distribuição exponencial. Ou seja, numa corrente de tráfego


com taxa média de chegadas À, a probabilidade P (n = O) de não haver chegadas
durante um intervalo de tempo t é igual a probabilidade P(h 2:: t) de ocorrer um
headway de duração t. Portanto, pode-se tanto modelar a corrente do ponto de
vista da distribuição do número observado de chegadas em intervalos de tempo t
como do ponto de vista da distribuição observada de headways.

Exemplo 3.8 No trecho do Exemplo 3. 7, determinar a probabilidade de o headway entre


_ dois veículos sucessivos ser mel}Or que 8 segundos.
~~~, ~'.~ ~ - ~ '· ~\S.->)
Solução: Como visto no E'X~~plo -3.7, a taxa média de chegadas é 0,1 veic/s.
Sabe-se que P(h < t) = 1 - P(h ?: t). Portanto, usando-se a Equação 3.17,
tem-se:
P(h < 8 s) = 1- e-Àt = 1- e-O,l.S = 0,551.

Observações empíricas mostram que a hipótese de chegadas regidas por uma


distribuição de Poisson é realística para uma ampla gama de condições de tráfe-
go não congestionadas. À medida em que os volumes aumentam ou semáforos
causem distúrbios cíclicos na corrente de tráfego, outras distribuições passam a
ser mais apropriadas para descrever o processo de chegadas. Não faz parte dos
objetivos deste texto discutir outras distribuições ou modelos de fluxo de tráfego.
O leitor interessado pode consultar o Traffic Engineering Handbook 8 ou o Special
Report 1659 .

3.5 Aplicações da teoria das filas na análise dos fluxos ininterrup-


tos

A formação de filas em interseções e outros pontos do sistema viário é um fenômeno


facilmente observável que, com certeza, o leitor já deve ter experimentado pes-
soalmente. Essas filas ou congestionamentos são um dos problemas mais comuns
encontrados pelos engenheiros de transportes. O tempo gasto em filas representa
uma parcela considerável do tempo total de viagem, além de também ser um dos
fatores preponderantes na redução do nível de serviço das vias.
A formação de filas não é uma exclusividade dos sistemas de transporte, como
qualquer pessoa que vive numa sociedade moderna sabe: pode-se encontrar filas
8Pline, J. L, ed. (1992). Traffic Engineering Handbook. Prentice-Hall, Englewood Cliffs, NJ,
EUA
9 Gerlough, D. L e Huber, M. J. (1975) Traffic ftow theory: a monograph. Special Report 165,
Transportation Research Board, Washington, DC, EUA
3.5 Aplicações da teoria das filas na análise dos fluxos ininterruptos 99

em bancos, linhas de fabricação e montagem, sistemas de computadores, hospitais,


centrais telefônicas, etc. Os sistemas de filas têm sido exaustivamente estudados
com o objetivo de mitigar os problemas inerentes a eles, o que levou à criação
de um corpo de conhecimento considerável, conhecido como Teoria das Filas.
Os modelos de fluxo de veículos apresentados no item anterior podem ser usados
em associação com a Teoria das Filas para analisar o comportamento dos fluxos
de veículos nos pontos de estrangulamento, permitindo avaliar a eficiência dos
dispositivos e alterações projetados.
Um modelo de filas serve para calcular medidas de desempenho do sistema (tais
como tempo médio de espera na fila, tempo médio total no sistema, comprimento
médio da fila, etc.) e é determinado pelos seguintes parâmetros:
Fig. 3.7: Uma fila, ou con-
gestionamento, numa via
• O padrão de chegadas, que representa como os veículos chegam à fila;
e O padrão de partidas, que representa a forma como os veículos deixam a
fila, ao chegar sua vez de sair da fila;
• O número de canais de serviço, que corresponde ao número de veículos que
podem deixar a fila simultaneamente; e
• A disciplina da fila, ou seja, a ordem em que os veículos da fila são atendidos.

Dois modelos que representam o padrão de chegadas já foram discutidos an-


teriormente: o modelo de chegadas uniformes (ou determinísticas) e o modelo
de chegadas aleatórias - no caso, chegadas de acordo com uma distribuição de
Poisson. Se as chegadas ocorrem de forma determinística, os headways entre
veículos são sempre iguais. Se as chegadas forem poissonianas, os headways são
distribuídos de acordo com uma distribuição exponencial negativa (Equação 3.17).
O padrão de partidas mostra como os veículos saem da seção de controle -
por ex., os headways entre veículos que passam por um semáforo. Os padrões de
partidas mais comuns são o determinístico (headways constantes) e o exponencial
negativo (headways aleatórios, distribuídos de acordo com uma exponencial).
Um terceiro aspecto importante para os modelos de filas é o número de canais
de serviço ou canais de atendimento - por exemplo, numa praça de pedágio,
o número de cabines em funcionamento. Nos sistemas de filas em interseções
rodoviárias ou em trechos de vias, o número de canais é quase sempre unitário,
representando uma faixa de tráfego ou um conjunto de faixas de tráfego. Contudo,
pode-se encontrar várias situações onde o número de canais é maior que um, como
é o caso de uma praça de pedágio.
100 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

O último fator que define um sistema de filas é a disciplina da fila. Quando os


clientes são atendidos na ordem em que chegam ao sistema, diz-se que a disciplina
é PEPS (Primeiro que Entra, Primeiro que Sai) ou FIFO (do inglês 'First In, First
Out'). Se os os fregueses são atendidos na ordem inversa das chegadas, isto é, o
último que chega é o primeiro a ser atendido, a disciplina é chamada UEPS ou, em
inglês, LIFO ('Last In, First Out'). Para os sistemas de filas encontrados no tráfego
rodoviário, a disciplina PEPS é a mais comum.
Tradicionalmente, o sistema de notação dos modelos de fila é composto por
duas letras e um número, separados por barras, que indicam respectivamente o
processo de chegadas (X), o processo de atendimento (Y) e o número de canais (z):
XIY/z.

A letra D é usada para representar processos determinísticos de chegada e de

---------
partida- ou seja:-l}eãàWãys-urufõiJi1eS'entre os veículos que chegam ou que partem.
--~------------
Portanto, uma fila em que os veículos chegam ao final da fila a int~rvalos iguais e

-------
constantes e partem da fila um de cada vez------
-----
(um único canal) em intervalos iguais
e constantes, é representada pela notação D/D/1. Note que a notação D/D/1 não
implica que o headway médio de chegada seja igual ao headway médio de partida.
Para os casos onde os headways são distribuídos exponencialmente, usa-se a
letra M. A notação de uma fila na qual tanto os headways de chegada como os de
partida seguem uma distribuição exponencial negativa e existe apenas um canal
de atendimento é MIM/I. Usa-se a notação M/D/1 para indicar uma fila em· que
os headways de chegada se distribuem exponencialmente, os headways de partida
são uniformes e há um único canal de atendimento.
Apenas os modelos D/D/1, M/D/1 e M/M/1 serão discutidos no texto. O leitor
interessado deve consultar, por exemplo, Novaes 10 ou Newell 11 , que contêm vários
exemplos aplicativos do uso de modelos estocásticos mais complexos para a análise
de problemas de filas em Engenharia de Transportes.

3.5.1 Modelos determinísticos de filas para análise de fluxos de tráfego

Uma fila onde tanto os headways entre os veículos que chegam ao sistema como
os headways entre os veículos que partem do sistema são constantes e onde existe
um único canal de atendimento serve bem para demonstrar os conceitos básicos
lONovaes, A. G. (1975). Pesquisa Operacional e Transportes: Modelos Probabilísticos.
EDUSP/McGraw-Hill do Brasil, S. Paulo.
11 Newell, G. F. (1982). Applications of Queueing Theory (2a ed.). Chapman & Hall, Londres.

~
/./,';/ v:S'
/V /0\
/........ \,
J~ s·hl: . C/)\
~~ lv 1C"Ceca oJ
\~ _fl!/
3.5 Aplicações da teoria das filas na análise dos fluxos ininterruptos 101

ligados à Teoria das Filas, pois tanto a solução analítica como a solução gráfica do
problema podem ser facilmente compreendidas.

Solução para um modelo D/D/1

Ainda que a solução analítica para uma fila D/D/1 seja fácil de ser obtido por um
aluno de Engenharia Civil, o leitor deve se esforçar em resolver estes modelos gra-
ficamente, pois só assim obterá uma maior familiaridade com os modelos de filas,
o que lhe será de grande valia na análise de sistemas como terminais (rodoviários,
portuários, aéreos, etc.), vias, etc. O Exemplo 3.9 serve para ilustrar a obtenção
da solução gráfica para uma fila D/D/1.

Exemplo 3.9 Seja um centro comercial cujo estacionamento abre às 9:00. Nesse instante,
veículos começam a chegar ao portão do estacionamento a uma taxa de 480 veiclh. Depois
de 20 minutos, o fluxo de veículos que chegam se reduz para 120 veiclh, e se mantém
constante até o final do dia. No portão de entrada existe um controle de estacionamento
que requer que a placa de cada veículo seja anotada e um comprovante seja dado ao
motorista. O tempo necessário para esta operação é constante e igual a 15 segundos.
Construa um gráfico que represente a operação da entrada do estacionamento.

Solução: Pressupondo-se que tanto o processo de chegadas corno o processo de


partidas são determinísticos - isto é, os headways entre as chegadas e entre as
partidas são constantes -, pode-se usar um modelo de filas D/D/1 para estudar o
congestionamento que aparece na entrada do estacionamento.
Para tanto, é preciso determinar a taxa média de chegadas e a taxa média de partidas,
que também pode ser chamada de taxa média de atendimento. Conhecidas esses
dois parâmetros, pode-se então determinar a curva de chegadas acumuladas e a
curva de partidas acumuladas.
Taxa média de chegadas e curva,_cl«_ chegadas acumuladas: Chamando-se de À a
taxa de chegadas, o número aélt:rnuladO de chegadas após um intervalo de tempo t
pode ser calculado por:
C(t)=Àt. (3.18)
Se a taxa de chegadas À for constante, a função C (t) será urna reta.
No exemplo, durante os primeiros 20 minutos de funcionamento do estacionamento,
a taxa média de chegadas À é 480 veic/h, ou 8 veic/rnin. A curva acumulada de
chegadas, nesse intervalo de O a 20 minutos, pode ser representada por:

C(t) =À t = 8t

Após 20 rnin, terão chegado C(20) = 160 veículos. No gráfico da Figura 3.8, esse
trecho da curva de chegadas acumuladas é o segmento de reta OA. A inclinação da
102 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

til Desaparecimento
~ 250 ----------------------------------------q§_fiJ§_~B
(,)
Qi
: 200 C(t)
"Q (Chegadas)
o -------~---A
] 150
:I
E
i3 100
111
e
C!l 50
E
•:I
z
o 10 20 30 40 50 60 70
Tempo (min)

Fig. 3.8: Representação gráfica de uma fila D/D/1

reta OA corresponde ao fluxo de chegadas 8 veic/min e o ponto A tem coordenadas


(20 min, 160 veic).
Após 20 min, o fluxo de chegadas passa a ser 120 veic/h ou 2 veic/min e a curva
de chegadas a partir daí passa a ser C(t) = 2 t, para t ::: 20 minutos. No gráp.co,
essa trecho da curva acumulada de chegadas é indicado pelo segmento AB. Pode-se
notar que a inclinação da retaAB é menor que a da reta OA, já que a taxa de chegadas
diminui a partir de t = 20 min. Matematicamente, a curva de chegadas C(t) para
o modelo D/D/1 pode ser expressa por:

~~ü + 2(t- 20),


para t < 20 min e
C(t) = { para t ::: 20 min.

Taxa de partidas e curva de partidas acumuladas: Chamando-se de J.l a taxa de


partidas, o número acumulado de partidas após um intervalo t, D(t), pode ser
calculado por:
D(t) = J.L t. (3.19)
Se, no caso do exemplo, cada veículo que chega ao portão do estacionamento leva
15 segundos para partir, os headways entre partidas são 15 s. Portanto, o maior
fluxo que pode entrar no estacionamento é J.l = 4 veic/min ou 240 veic/h.
O tempo gasto para atender cada veículo é constante ao longo do dia e a taxa de
atendimento máxima reflete a capacidade de atendimento (número de cabines) e o
tempo médio de atendimento de cada freguês:
60
J.lmax = - - (3.20)
tar C

em que J.lmax é a taxa máxima de atendimento [veic/min]; tar é o tempo gasto para
atender um veículo [s/veic]; e c é o número de guichês em operação.
3.5 Aplicações da teoria das filas na análise dos fluxos ininterruptos 103

A taxa de atendimento não se mantém igual à máxima (/L = 4 t) ao longo de todo o


tempo; na verdade, a taxa de atendimento só pode ser maior que a taxa de chegadas
se existir uma fila. Se não houver veículos esperando para entrar no estacionamento,
a taxa de atendimento é menor que a máxima, pois não há como atender fregueses
que ainda não chegaram à entrada do estacionamento. A curva de partidas acumula-
Supondo-se que o primeiro veículo que chega ao edifício o faz exatamente no
das deve estar sempre à direi-
instante em que o estacionamento se abre, pode-se desenhar a curva de partidas
ta da curva de chegadas acu-
do portão, a reta OB, cuja inclinação corresponde ao fluxo de 4 veic/min. Pode-se
muladas- ou seja, só se pode
notar que o ponto B tem coordenadas (60 min, 240 veic). De maneira similar à
sair da fila depois de chegar
curva C(t), a curva de partidas D(t), pode ser expressa por: a ela.

D(t) = f.-Lt = 4t.

Observando-se o gráfico da Figura 3.8 pode-se perceber que a inclinação da curva


D(t) (que corresponde à taxa de atendimento) reduz-se após o ponto B, quando a
fila desapar~. A partir de B, a taxa de atendimento passa a ser igual à taxa de
chegadas (/L = À). Portanto, a função:

~lü + 2(t -
para t < 60 min e
D(t) = { 240), para t =::: 20 min

descreve melhor a curva de partidas acumuladas ao longo do tempo.

As curvas de chegada e partida representam grafica.'llente o sistema de filas


estudado; observando-se o gráfico da Figura 3.8 pode-se ver como a fila cresce até
um máximo e depois diminui até desaparecer completamente.

Grau de congestionamento

Um parâmetro importante para caracterização de uma fila é o grau de congestio-


namento ou taxa de congestionamento do sistema, p, que é definido como a razão
entre a taxa de chegadas (Ã) e o produto da taxa de partidas relativa a um canal de
atendimento (tJ-) e do número de canais de serviço (c):

À
p=-. (3.21)
{J-C

Se p = 1, o sistema opera na sua capacidade - isto é, a taxa máxima de partidas


é igual à taxa de chegadas. Numa analogia com um caixa d'água, o fluxo que sai
da caixa é igual ao fluxo que entra na caixa. O fluxo de saída é a taxa máxima de
partidas e o fluxo de entrada é a taxa de chegadas. Nesse caso, é fácil perceber que
104 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

o tamanho da fila fica inalterado, pois as chegadas à fila são iguais às partidas da
fila por intervalo de tempo.
Se p < 1, têm-se que a taxa máxima de partidas é menor que a taxa de chegadas
e, caso exista uma fila, ela diminui até desaparecer completamente pois o número
de veículos que saem da fila é maior que o número de veículos que chegam a ela,
por intervalo de tempo. Isso corresponde ao caso em que o fluxo de saída da caixa
d'água é maior que o fluxo de entrada e o reservatório, depois de um certo tempo,
esvazia-se completamente.

Se p :::: 1, diz-se que o sistema está supersaturado, ou seja, chegam mais


veículos do que é possível atender, o que faz com que a fila cresça enquanto
a situação mantiver-se inalterada. Na analogia com a caixa d'água, esse caso
corresponde à situação em que o fluxo de entrada é maior que o de saída e o
volume de água no reservatório aumenta.
Como o leitor já deve ter observado, o grau de congestionamento de uma via
varia ao longo do dia. Nos períodos de pico, p pode ser igual ou até mesmo
maior que a unidade. Um congestionamento surge quando p > 1 durante um
certo período de tempo; o congestionamento começa a reduzir-se quando p torna-
se menor que um. Essa é uma situação comum em Engenharia de Transportes,
não só com relação aos fluxos de veículos, mas também em terminais, interseções
semaforizadas, etc. e será estudado mais adiante (item 3.6).

Medidas de desempenho

As medidas de desempenho de uma fila servem para avaliar a performance do


sistema e podem ser obtidas a partir do modelo D/D/1. As medidas de desempenho
mais comuns incluem: a fila média, o tempo médio de espera na fila, a fila máxima,
o tempo máximo de espera na fila, etc.
O número de veículos na fila, ou o comprimento da fila, num determinado
instante t é dado pela distância vertical entre a curva de chegadas acumuladas
C(t) e a curva de partidas acumuladas D(t). O gráfico da Figura 3.9 mostra o
comprimento da fila no instante t = 1O min, que pode ser medido no gráfico
e é igual a 40 veículos. Para este modelo, pode-se determinar analiticamente o
comprimento da fila num instante t qualquer através de:

L(t) = C(t)- D(t) (3.22)

sendo que L(t) é o tamanho da fila [veic].


3.5 Aplicações da teoria das filas na análise dos fluxos ininterruptos 105

Observando-se o gráfico, percebe-se que quando t = O, o número de veí-


culos na fila é nulo, mas a partir daí a fila cresce até atingir um máximo quando
t = 20 min. A partir desse instante, a fila passa a diminuir até desaparecer comple-
tamente quando t = 60 min. Pode-se também observar no gráfico que o instante
em que a fila atinge o máximo corresponde ao tempo em que uma paralela à reta
D(t) intercepta a curva C(t) em apenas um único ponto.

Pode-se determinar a fila máxima tanto


graficamente como analiticamente. No pri-
meiro caso, a fila máxima é a maior distância :;:g 250
Duração da fila
vertical entre C(t) e D(t), que pode ser me- t.l
~ 200 ~
dida no gráfico e é igual a 80 veic. Analitica- 'OGl
o
""""'3"''
mente, a fila máxima é "'"'
-g
:;
150
.. _
't:ld

E .,3-"'
L(t)max = 8. 20- 4. 20 = 80 veic. s 100 "O<>
o.

~!
lll
Tempo de espera do
~ 1oo• verculo que chega :::g
É fácil perceber intituitivamente uma proprie-
dade importante das filas que passam por um z
Cl
E
•::I
50
Tamanho da fila
"'õ .
quando t= 10 min
período de supersaturação: a fila atinge o seu
o 10 20 30 40 50 60 70
máximo no instante em que a taxa de chega- Tempo (min)
das passa a ser igual ou menor que a taxa de
Fig. 3.9: Medidas de desempenho de uma fila D/D/1
partidas,

O instante em que a fila termina pode ser obtido tanto graficamente como ana-
liticamente. A Figura 3.9 mostra que a fila termina no ponto B, de coordenadas
(60 min, 240 veic); ou seja, a fila desaparece no instante t = 60 min, após 240 veí-
culos terem sido atendidos. Pode-se calcular o instante t f em que a fila termina
igualando-se
D(tf) C(tf) ==?-
4tf 160 + 2(tf- 20) ==?-
tf - 60 min.

Conhecido tf, pode-se determinar outra medida de desempenho impOJ;tante, a


duração da fila ou duração do congestionamento.

O número total de veículos que passam pelo congestionamento é uma outra


medid~ do desempenho da fila que também está indicada no gráfico da Figura 3.9.
Analiticamente, o número total de veículos na fila é N = C (t f).

Uma outra medida de desempenho importante das filas é o tempo de espera na


fila. O tempo que o n-ésimo veículo gasta na fila pode ser determinado diretamente
106 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

do gráfico, medindo-se a distância horizontal entre as curvas C(t) e D(t) corres-


pondente à ordenada y = n veic. Na Figura 3.9, mostra-se o tempo de espera do
centésimo veículo, que é W10o = 12,5 minutos.
A determinação gráfica do tempo máximo de espera na fila é simples e cor-
responde á espera do veículo que chega no instante em que a fila atinge o seu
máximo. No caso, a espera máxima é Wmax = 20 minutos. O desenvolvimento
de expressões analíticas para o cálculo do tempo de espera na fila é simples e é
deixado como exercício para o leitor.
Outras duas medidas de desempenho importantes são a fila média e o tempo
médio de esper:a na fila, que podem ser determinados a partir da espera total, a
área hachurada no gráfico da Figura 3.9. A espera total corresponde ao tempo total
gasto na fila por todos os veículos que passaram pelo congestionamento e pode ser
calculado determinando-se a área compreendida entre a curva de chegadas acu-
muladas e a curva de partidas acumuladas. A espera total no caso do Exemplo 3.9
é
(80 . 20) (80. 40) . .
W,otal =
2
+ 2
= 2.400 ve1c.mm

O tempo médio de espera na fila é a razão entre duas outras medidas de desem-
penho, a espera total e o número total de veículos na fila. A espera média durante
os 60 minutos em que a fila existiu é W = 2.400/240 = 10 min/veic, já que 240
veículos passaram pelo guichê durante os 60 minutos de duração da fila.
A fila média é também derivada de duas outras medidas de desempenho, a
espera total e o tempo total de duração da fila. É calculada de modo similar,
dividindo-se a espera total pelo tempo de duração da fila. No caso, a fila média é
i= 2.400/60 = 40 veículos.

3.5.2 Modelos estocásticos de filas

Um modelo estocástico de filas fornece expressões analíticas para determinação


das medidas de desempenho, em função das distribuições estatísticas que repre-
sentam as distribuições de headways para os veículos que chegam e para os que
partem. Os parâmetros usados nessas expressões são, normalmente, a média, a
variância (ou o desvio padrão) da distribuição, o número de canais de atendimento
ou combinações dessas variáveis (como o grau de congestionamento). Neste tex-
to, apenas os modelos M/D/1 e M!M/1 serão apresentados. Outros modelos mais
·complexos podem ser encontrandos em referências como Novaes ou Newell (vide
notas de rodapé à página 100).
3.5 Aplicações da teoria das filas na análise dos fluxos ininterruptos 107

O modelo M/D/1

Como discutido no item 3.5, a suposição de que os intervalos de tempo entre


chegadas de veículos sucessivos sejam distribuídos exponencialmente resulta, em
diversas situações, numa representação mais realística do fluxo de tráfego que
a obtida supondo-se que os headways sejam constantes. Por conseguinte, a fila
M/D/1 tem aplicações importantes no estudo dos fluxos de veículos.
A representação gráfica de uma fila M/D/1 é bem complicada, mas as soluções
matemáticas para as medidas de desempenho são bem simples, desde que o sistema
esteja em equilíbrio. Numa fila M/D/1, isso significa que a taxa média de chegadas
deve ser constante, pelo menos durante o tempo em que deseja estudar a fila. Ao
contrário do que ocorre nos modelos D/D/1 (reveja o Exemplo 3.9), a formação e
a destruição da fila deve-se à variação aleatória dos headways e não à variação da
taxa de chegadas.
Como indica a Equação 3.21, o grau de congestionamento ou intensidade do
tráfego é:
p=-,
/-L
em que À é a taxa média de chegadas [veic/min] e !-L é a taxa média de par-
tidas [veic/min]. Pode-se provar 12 que a fila média Q pode ser calculada pela
expressão:
- 2p- p2
Q = -2(_1___p_) (3.23)

A partir da Equação 3.23 pode-se perceber uma característica importante das


filas estocásticas: a capacidade da via deve ser maior que a taxa de chegadas para
que o sistema não entre em colapso - ou seja, p deve ser sempre menor que a
unidade. Analisando-se a Equação 3.23, pode-se notar que, à medida em que o
valor de p aproxima-se de um, a fila média tende para infinito. Igualmente, se
p > 1, a fila média assume um valor negativo, o que é uma impossibilidade.

O tempo médio de espera no congestionamento (ou fila), uma outra medida de


desempenho do sistema, pode ser calculado através de:

- p
W=----- (3.24)
2!-L(l-p)
12 Foge do escopo deste texto introdutório apresentar a dedução dessas expressões. O leitor
interessado pode consultar, por exemplo, Novaes (1975).
108 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

e o tempo médio gasto no sis,tema, que é o tempo médio na fila mais o tempo de
atendimento (que é constante no modelo M/D/1) é
- - 1 2-p
t=w+-= . (3.25)
f..l 2 f..l (1- p)

O Exemplo 3.1 Oilustra a utilização do modelo M/D/1 e o cálculo das medidas


de desempenho da fila.

Exemplo 3.10 Seja uma praça de pedágio numa rodovia pela qual passam 180 veic!h
durante uma longa parte da noite. Nesse período funciona apenas uma cabine de pedágio
e o tempo gasto no atendimento de cada veículo é constante e igual a 15 segundos. Planeja-
se introduzir inovações tecnológicas no sistema de cobrança que devem reduzir o tempo
de atendimento para 8 segundos por veículo. Determine o impacto dessas mudanças em
termos das medidas de desempenho da fila.

Solução: A taxa média de chegadas é).. = 3 veic/min e a taxa de atendimento atual


é f.LI = 4 veic/min; portanto, o grau de congestionamento do sistema é:
3
p =- = 0,75.
4

Para determinação da fila média na praça de pedágio, usa-se a Equação 3.23:

- 2.0,75-0,75 2 8 5 .
Q = = 1, 7 ve1c.
2 (1- 0,75)
Através das Equações 3.24 e 3.25 pode-se determinar o tempo médio de espera na
fila e o tempo médio no sistema:
0,75
ÜJ = = 0,375 mine
2.4 (1.- 0,75)
2-0,75
t = 0,625 rnin.
2.4(1-0,75)

A nova taxa de congestionamento P2 pode ser determinada a partir da nova taxa de


atendimento f.L2

=~
60
f.L2 =
8
= 7,5 veic/min =? P2
7,5
= 0,4
O leitor pode aplicar as Equações 3.23 a 3.25 para calcular as novas medidas de
desempenho. O novo valor para a fila média é 0,533 veic; o tempo médio de espera
~ <~- na fila é 0,044 mine o atraso médio total na praça de pedágio é O, 178 min. Portanto,
o novo sistema proporcionará uma redução de 1,342 veic na fila média, 0,331 rnin
no tempo médio de espera na fila e de 0,447 min no tempo médio total gasto no
pedágio.
3.5 Aplicações da teoria das filas na análise dos fluxos ininterruptos 109

O modelo MM/1

Nem sempre a suposição de que os headways entre partidas dos veículos são
uniformes pode ser aplicada. Imagine-se, por exemplo, a cabine de pedágio do
Exemplo 3.10: é razoável admitir que alguns motoristas pagam a tarifa entregando
a quantia exata e são processados rapidamente enquanto que outros são forçados
a esperar pelo troco. Os headways de partida seriam então aleatórios, distribuídos
em torno de um valor médio. Neste tipo de situação, é comum que a distribuição
exponencial possa ser usada para representar a distribuição dos headways de partida
e o modelo MIM/1 pode ser usado para estudar a fila.
Numa filaM/Mil, seja À a taxa média de chegadas e f.Jv, a taxa média de partidas.
Se a taxa de congestionamento p = Àj fJv < 1, pode-se provar que a fila média é:
~
- p-
0=--· (3.26)
- 1- p'

a espera média na fila é:


- À
W= ' (3.27)
fJv (JJv- À)

o tempo total médio no sistema é:

- 1
t=--· (3.28)
JJv-À'

e a probabilidade de ter esperado um tempo inferior ou igual a t na fila é

P(w:::; t) = 1- p e-(1-p)fJ-r. (3.29)

O Exemplo 3.11 ilustra a utilização do modelo MIM/1 e o cálculo das medidas


de desempenho da fila.

Exemplo 3.11 Determine as medidas de desempenho para a praça de pedágio do Exem-


plo 3. I Osupondo que os tempos de atendimento sejam distribuídos exponencialmente com
média I 5 segundos. Determine também a probabilidade de um veículo ter que esperar até
15 s para ser atendido.

Solução: Como visto no Exemplo 3.10, À = 3 veic/min, f-L = 4 veic/min e p =


0,75. Sabendo-se que 15 s = 0,25 min, pode-se usar as Equações 3.26 a 3.29 para
110 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

calcular as medidas de desempenho do sistema:

0,75 2
Q = 1-0,75
2,25 veic,
3
ÜJ = 4 (4- 3) = 0,75 min,
1
t 1 mine
4-3
P(w :S 0,25) 1 _ 0 ,75 . e-(1-0,75)4.0,25 = 0,4159.

A solução do Exemplo 3.11 mostra uma característica importante das filas: a


aleatoriedade dos tempos de atendimento faz com que o desempenho do sistema
seja pior que no caso em que os tempos de atendimento são uniformes.

3.6 Análise de pontos de estrangulamento em vias

A Teoria das Filas pode também ser usada para analisar os fluxos de tráfego nos
congestionamentos gerados por estrangulamentos nas vias, um problema frequen-
temente encontrados por engenheiros de transportes.
Um estrangulamento é um ponto onde a capacidade da via é inferior à capa-
cidade da seção imediatamente à montante. A capacidade de um trecho de via
pode ser reduzida por um grande número de fatores, entre os quais os mais comuns
estão: a diminuição do número e da largura das faixas de tráfego, a redução da
largura dos acostamentos e a presença de interseções. Um estrangulamento pode
ser incidental ou recorrente. Os estrangulamentos recorrentes são causados por
limitações de capacidade impostas pela própria via, tais como um trecho onde o
número de faixas de rolamento é menor, onde existe uma obra, etc. Estes locais se
tomam pontos de estrangulamento recorrentes quando os fluxos de tráfego típica
e periodicamente excedem a capacidade da via nesse locaL
Os estrangulamentos incidentais são causados por incidentes de tráfego, que
podem ser causados por uma série de fatores, entre os quais um acidente de trânsito,
um veículo"parado na faixa de tráfego, etc., que restringem o fluxo de tráfego na
via por um período relativamente curto. A diferença básica entre os dois tipos de
estrangula.J.1.1entos é que, enquanto se pode prever os congestionamentos causados
por gargalos recorrentes, é impossível prever onde os gargalos incidentais vão
ocorrer. Além do mais, a capacidade da via ao longo de uma restrição incidental
costuma variar com o tempo. Por exemplo, um acidente pode inicialmente bloquear
todas as faixas de uma via; conforme os veículos envolvidos vão sendo removidos,
3.6 Análise de pontos de estrangulamento em vias 111

as faixas de tráfego vão sendo liberadas paulatinamente, restaurando a capacidade


da via ao seu nível pré-incidente.

3.6.1 Análise de incidentes pela teoria das filas

Os modelos determinísticos de filas podem ser usados para estudar situações em o


congestionamento é produzido por um aumento na taxa de chegadas(a demanda)
que, durante um certo período, fica maior que a taxa de partidas (a capacidade do
sistema), como mostrado no Exemplo 3.9. Nos congestionamentos causados por
incidentes, a taxa de chegadas (demanda) mantém-se constante e há uma redução
temporária da taxa de partidas (a capacidade da via); durante esse período de
tempo em que a taxa de chegadas é maior que a taxa de partidas, forma-se uma fila
que começa a ser dissipada quando a taxa de partidas voltar ao seu valor normal,
maior que a taxa de chegadas. Um modelo D/D/1 pode ser utilizado para analisar
o comportamento do tráfego num incidente de forma simples e intuitiva, como
mostra-se no Exemplo 3.12.

Exemplo 3.12 Suponha-se uma via com duas faixas de tráfego no mesmo sentido, na qual
a capacidade é 4.000 veic!h. Num determinado período do dia, o volume de tráfego é de
2.900 veic!h. Num certo instante (t = 0), ocorre um acidente que obstrui completamente
a via por 12 minutos até que uma das faixas é liberada para o tráfego, com capacidade
reduzida a 2.000 veic!h. A capacidade da via volta ao seu valor inicial em t = 31 min,
quando os veículos são removidos do local. Usando um modelo D/D/1, determine a du-
ração do congestionamento causado pelo incidente, o atraso médio sofrido pelos veículos
que passam pelo trecho congestionado, o número médio de veículos no congestionamento,
o número de veículos que estão no congestionamento quando este atinge seu máximo e o
atraso máximo sofrido pelos veículos.

Solução: A taxa de chegadas (À), no caso, é definida pelo volume de tráfego, que
é constante ao longo de todo o período: À = 2900/60 = 48,33 veic/min. A taxa
de atendimento (J,L) é determinada pela capacidade da via, que varia ao longo do
tempo:

~.000/60 = 33,33 veic/min,


paraO~ t < 12 min
J,L(t) ={ para 12 ~ t < 31 min
4.000/60 = 66,67 veic/min, para t :::: 31 min, se Q > O.

A taxa de partidas correspondente à capacidade da rodovia, JL =66,67 veic/min


só é atingida durante o tempo em que a via está congestionada. Uma vez que a fila
desapareça, a taxa de partidas torna-se igual à taxa de chegadas (/h = À), pois os
veículos não podem partir antes de terem chegado.
112 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

Ul
.Q 4000
:::1
u
~
-8 3000 :::>c.
z
o o 3
(") (!)
"C
ca go
=E 2000
::l
u
Atraso máximo no
congestionamento

~§I
O o_
:::> (!)
ca
e 1000 ~ê5
Cll ã§'
E Número máximo de veículos
0
[
•:;!
z no congestionamento

o 10 20 30 40 50 60 70 80
Tempo (min)

Fig. 3.10: Modelo D/D/1 para análise de um incidente

Assim sendo, função que descreve o número acumulado de chegadas é C(t)


48,33t, e a curva de partidas acumuladas é:

o para O < t :::; 12 rnin


D(t) = 33,33(t- 12) veic para 12 < t :s 31 rnin
{ 633,3 + 66,67(t- 31) veic parat > 31 rnin, se Q >O.

Embora a solução analítica deste problema seja simples, solução gráfica é obtida
facilmente e tem a vantagem de permitir a visualização do comportamento do tráfego
durante o incidente, corno mostra o gráfico da Figura 3.10.
Para obtenção da solução gráfica, constrói-se a curva de chegadas acumuladas C (t),
que tem início na origem e que passa pelo ponto (60 rnin, 2.900 veic). A seguir
constrói-se D(t), a curva de partidas acumuladas, composta por quatro segmentos
de reta:

• Um segmento entre as coordenadas (0, O) e (12 rnin, 0), que corresponde aos
12 minutos durante os quais a passagem pela via está impedida;
• Um segmento entre as coordenadas (12 rnin, 0) e (31 rnin, 633,3 veic), que
representa o número acumulado de partidas ao longo dos 19 minutos em que
apenas urna faixa está livre e durante os quais /J-1 = 2.000 veic/h;
• Um segmento que se inicia no ponto (31 rnin, 633,3 veic) e têm coeficiente
angular fJ.-2 = 4.000 veic/h e continua até encontrar a curva C(t); e
• Urna semi-reta que inicia-se no ponto em que o terceiro segmento intercepta
a curva C(t) e é coincidente com C(t).

O ponto em que as curvas C(t) e D(t) encontram-se define o instante em que o


incidente termina, que corresponde exatamente a t = 78, 16 minutos. Este valor
3.7 Fluxos de tráfego interrompidos 113

pode ser determinado analiticamente fazendo-se C(t) = D(t) mas a precisão da


solução gráfica é suficiente, na maioria das vezes.
O gráfico permite também determinar qual o tamanho máximo do congestiona-
mento e o instante em que ele ocorre: em t = 31 rnin, 865 veículos formam o
congestionamento. A área hachurada mostra a espera total gerada pelo conges-
tionamento. A forma mais simples de se determinar urna área gráficarnente (se as
curvas estiverem desenhadas em papel milimetrado) é a contagem de quadradinhos.
Neste exemplo, a forma mais simples é calcular a área hachurada, que corresponde
a wtotal = 37.604,2 veic.rnin.
Essa espera total corresponde a um único veículo sendo detido por 26,11 dias num
congestionamento, com seu motor funcionando continuamente. Daí é possível
perceber os impactos econômicos e ambientais causados por um congestionamento
de curta duração e imaginar a magnitude dos custos totais dos congestionamentos
diários de uma metrópole como São Paulo.

3. 7 Fluxos de tráfego interrompidos

Os fluxos de veículos que sofrem interrupções periódicas, como as causadas por um


semáforo, têm um comportamento diferente do apresentado pelos fluxos contínuos
e os modelos desenvolvidos para o estudo dos fluxos contínuos não servem para
explicar o comportamento das correntes descontínuas de tráfego.

3.7.1 Fluxo de veículos em interseções semaforizadas

Considere-se, por exemplo, uma fila de veículos criada por um sinal vermelho,
como mostra-se na Figura 3.11. Quando o sinal abre, a fila começa a se movimentar.
Se os headways entre os veículos que deixam a fila forem registrados, observa-se
um fenômeno interessante. Supondo-se que o primeiro headway, que é definido
como o tempo que passa entre o sinal ficar verde e o pára-choque dianteiro do
primeiro veículo da fila passar pela faixa de retenção, e que os headways sucessivos
são o tempo até o pára-choque dianteiro do veículo seguinte cruzar a faixa de
retenção, pode-se perceber que o primeiro headway é maior que o segundo, que
é maior que o terceiro, etc. e que o valor dos headways tende para um valor
constante, a partir de algum ponto entre o quarto e o sexto veículos.
O headway do primeiro veículo é comparativamente mais longo porque o
primeiro motorista, ao ver a indicação semafórica passar para verde, leva um
certo tempo para reagir, engatando a primeira e acelerando seu carro. O tempo
perdido pelo primeiro motorista está indicado no gráfico da Figura 3.11 como
114 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

t 1 . O headway do segundo carro é menor, porque o tempo de reação do segundo


motorista superpõe-se ao tempo de reação do primeiro motorista. Isso também
acontece para os motoristas seguintes, fazendo com que o tempo perdido t; fique
cada vez menor, à medida em que os veículos que entram no cruzamento já cheguem
à faixa de retenção na sua velocidade normal.
Esse headway constante que é alcançado uma vez que a fila atinge um esta-
do estável de movimentação através do cruzamento é chamado de headway de
saturação. Se cada veículo entra na interseção h segundos após o veículo que o
antecede, então o número de veículos que pode passar pela interseção por uma
faixa de tráfego pode ser determinado pela expressão:

3.600
S=-- (3.30)
h

em que s: fluxo de saturação [veic/(hora de verde.faixa)] e


h: headway de saturação [s/veic].

O fluxo de saturação, s, representa o número de veículos


que podem passar pelo cruzamento por uma única faixa de trá-
J fego se o sinal estiver sempre verde e se a fila de veículos no
semáforo nunca terminar. Esse é um valor teórico que é útil para
quantificar o fluxo numa interseção semaforizada em relação às
l características de cada uma das suas aproximações e determi-
na o volume máximo que pode ser acomodado pela via, o que
corresponde à capacidade numa via de fluxo contínuo.
As correntes de tráfego que passam por interseções semafo-
t,
rizadas, no entanto, sofrem interrupções periódicas. Quando o

~··~·~·~•-+•--·­
headwayde
fluxo reinicia-se, os veículos no início da fila gastam um tempo
maior que h s/veic. Esse tempo adicional é chamado de tem-
saturação po perdido no início do tempo de verde e estão representados no
123456789···
gráfico da Figura 3.11 por t;, que é o tempo perdido pelo i -ésimo
Veículo na fila veículo na fila. Assim sendo,
Fig. 3.11: Headways numa interrupção de fluxo n
(3.31)

em que p 1: tempo perdido no início do ciclo [s] e


t;: tempo perdido pelo i-ésimo veículo na fila [s].
3.7 Fluxos de tráfego interrompidos 115

Quando o sinal muda de verde para vermelho, existe um outro tempo perdido que
é o intervalo entre a passagem do último veículo da fila e o início do verde para
a outra aproximação da interseção. Esse tempo é chamado de tempo perdido no
final do verde e costuma ser representado por p 2 . O Exemplo 3.13 ilustra o efeito
dos tempos perdidos na capacidade da aproximação.

Exemplo 3.13 Considere uma aproximação de um cruzamento que possui apenas uma
faixa de tráfego. Nessa aproximação existe um semáforo dá 27 segundos de verde, 3 se-
gundos de amarelo e 30 segundos de vermelho. Supondo que o headway de saturação seja
2 segundos e que os tempos perdidos no início e no final do verde sejam, respectivamente,
Pl = 2 se P2 = 11 s, determine a capacidade da aproximação.

Solução: Como o tempo de ciclo é c = 27 + 3 + 30 = 60 s, a cada 60 segundos,


os veículos dessa aproximação podem entrar na interseção durante 30 segundos (a
soma dos tempos de verde e amarelo). Assim sendo, durante uma hora, o tempo
disponível para essa aproximação é 3. 600 . (30 j 60) = 1. 800 segundos.
Como .existe um total de Pl + P2 = 2 + 1 = 3 segundos de tempo perdido a cada
60 segundos, o tempo perdido total por hora na aproximação é 3600. (3/60) =
180 segundos. Por conseguinte, o tempo total disponível para ser usado pelos
veículos que chegam ao cruzamento por essa aproximação é 1800-180 = 1620 slh.
Como o headway de saturação é 2 s/veic, a capacidade da aproximação é 1620/2 =
810 veic!h.

O Exemplo 3.13 mostra que a capacidade de uma aproximação num cruzamen-


to semaforizado depende do número de faixas de tráfego, do fluxo de saturação,
dos tempos perdidos e da duração dos tempos de verde, amarelo e vermelho. O
fluxo de saturação varia bastante de interseção para interseção e depende de fatores
tais como: composição do tráfego, geometria e localização do cruzamento, etc.

3.7.2 Medidas de desempenho para fluxos interrompidos

Numa corrente de tráfego sujeita a interrupções periódicas, causadas por sinais


luminosos, variáveis tais como velocidade e densidade não são suficientes para
descrever adequadamente a qualidade do serviço oferecido aos usuários da via.
Nessas situações, o número e a duração de tais interrupções são úteis para descrever
o desempenho da corrente de tráfego.
O tempo de espera 13 , também chamado de retardamento ou atraso, é uma
variável frequentemente usada para avaliar a performance de vias com tráfego
interrompido. Existem dois tipos de atraso: o atraso parado e o atraso no percurso.
13 Em inglês, 'delay'.
116 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

O atraso parado 14 é o tempo total gasto por um veículo em paradas em semá-


foros e sinais PARE ao longo de um segmento de via. O atraso no percurso 15 é
a diferença entre um tempo de viagem preestabelecido para o trecho que é consi-
derado ótimo e o tempo real de viagem. Esse atraso inclui as paradas e o tempo
adicional gasto para cruzar o segmento de via causado por uma velocidade inferior
à ideal.

Como o atraso no percurso envolve a definição de uma velocidade ideal, ele é


usado menos frequentemente que o atraso parado, que é simples de ser identificado
e cuja medição não envolve grandes complicações.

3.8 Controle de fluxos de veículos

O controle dos fluxos de tráfego visa assegurar que o movimento dos veículos
nas vias se dê de fonna organizada e previsível, para que seja possível reduzir a
probabilidade da ocorrência de acidentes a níveis suficientemente baixos. Uma das
formas mais simples de reduzir a probabilidade de ocorrência de acidentes entre
veículos é aumentar o headway entre eles. No entanto, um aumento do headway
médio causa uma redução no volume de tráfego, reduzindo a eficiência do sistema
de transportes. Os sistemas de controle de tráfego são estabelecidos de tal forma
que seja possível reduzir ao máximo os headways entre os veículos sem que o risco
de acidentes aumente.
As técnicas para controle de tráfego foram desenvolvidas especificamente para
cada tecnologia de transportes: o sistema usado para controle do fluxo de trens
metropolitanos é diferente do utilizado para controle de aeronaves ou do usado
para controle de veículos rodoviários. No entanto, pode-se notar que existem
algumas similaridades entre os métodos usados para controle de fluxos de tráfego
de modalidades diferentes, como se discute a seguir.

3.8. 1 Canalizações~ limites de velocidade e tabelas de horários

Três sistemas de controle de fluxos utilizados em várias modalidades de transporte


são a canalização de fluxos, a limitação da velocidade e as tabelas de horário.
A canalização é, provavelmente, a forma mais comum de controlar o fluxo de
veículos. A idéia básica é segregar o fluxo de veículos em correntes definidas,
14Em inglês, 'stopped-time delay'.
15Em inglês, 'travei-time delay'.
3.9 Os sistemas de controle do tráfego rodoviário 117

de forma tal que cada corrente seja constituída de veículos com movimentos tão
semelhantes quanto possível.
Os fluxos de veículos rodoviários são canalizados: numa via com pista dupla, os
veículos que viajam numa mesma direção são separados dos que viajam na direção
oposta; numa via com pista simples e mão dupla, os veículos devem manter-se à
direita da via. No transporte aéreo, o sistema de aerovias baseia-se na canalização
dos fluxos, por meio do estabelecimento de níveis de vôo em altitudes diferentes. A
canalização também é usada para separar fluxos de tipos diferentes, para aumentar
a segurança, como é o caso das calçadas que separam os pedestres dos automóveis
e das ciclovias, que separam as bicicletas dos pedestres e automóveis.
Uma outra forma de controle muito comum é o estabelecimento de limites de
velocidade, que podem ser instituídos em função de limitações geométricas da via
ou de limitações tecnológicas dos veículos. Limites de velocidade, contudo, são
também impostos quando não é possível segregar fluxos distintos em canais, ao
mesmo tempo em que é preciso estabelecer uma forma de compatibilizar o uso
seguro de trajetórias comuns. Decorrem daí os limites de velocidade em rodovias
urbanas e rurais, os limites de velocidade de operação de aeronaves na aproximação
das pistas de pouso e decolagem e os limites de velocidade para embarcações em
locais de forte concentração de tráfego.
As tabelas de horário são utilizadas para fazer com que os veículos se cruzem
apenas em locais pré-determinados, evitando acidentes. Nos primórdios do trans-
porte ferroviário, as tabelas de horário eram usadas para organizar o fluxo de trens
em linhas com tráfego nas duas direções. Os fusos horários foram criados com
base na proposta de um engenheiro ferroviário, Sanford Fleming, que procurava
uma forma de uniformizar os horários de uma ferrovia canadense que ligava o
Atlântico ao Pacífico. Ainda hoje, diversos sistemas de transporte são baseados
em tabelas de horário, como por exemplo, o sistema de transporte de passageiros
por ônibus, o transporte aéreo regular, etc.

3.9 Os sistemas de controle do tráfego rodoviário

No transporte ferroviário e no transporte aéreo, há um rígido controle sobre as


trajetórias dos veículos, que são estabelecidas pela via (no caso dos trens) ou
monitoradas por sistemas de radares, como no caso dos aviões. No transporte
rodoviário, fica a cargo dos motoristas decidir a trajetória e a velocidade do seu
veículo e o sistema de controle baseia-se em placas e outros dispositivos de controle
de tráfego. A obediência à sinalização é obtida por meio da fiscalização de trânsito,
118 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

que pode utilizar aparelhos móveis ou fixos (tais como radares fotográficos) para
melhorar sua eficiência.
Placas, marcas no pavimento e outros dispositivos de controle instalados ao
longo das vias transmitem aos motoristas informações a respeito das condições
da via (por exemplo, curvas acentuadas, pavimento escorregadio, restrições de
altura e peso, etc.), do seu direito de passagem e de restrições de velocidade. Para
uma maior eficiência do sistema, essas informações devem ser transmitidas através
R-1: Parada
obrigatória
R-19: Velocidade
máxima permitida
de sinais previamente convencionados e que sejam do conhecimento de todos os
Placas de regulamentação motoristas. As cores, o formato e os símbolos usados nos dispositivos de controle
devem ser uniformizados para garantir que a mensagem transmitida seja clara e
entendida por todos os motoristas.
O Código Nacional de Trânsito define os sinais, placas e marcas que podem ser
usados para transmitir informação aos motoristas, o seu significado e as regras às
A-1 a: Curva A..S: Cruzamento
acentuada à direita de vias
quais os motoristas estãos sujeitos. Essas placas, sinais e regras devem respeitar
Placas de advertência acordos internacionais, dos quais o Brasil é signatário, de tal forma que exista
Fig. 3.12: Placas de sinali- um uniformidade internacional entre os dispositivos de controle de tráfego. Para
zação rodoviária facilitar a aplicação dessas regras de controle de tráfego rodoviário, o Conselho
Nacional de Trânsito, o DNER e os DERs publicam Manuais de Sinalização que
determinam como deve ser feita a sinalização horizontal (marcas no pavimento) e
vertical (semáforos e placas).
As placas são os dispositivos de controle de tráfego mais comuns e dividem em
três categorias: placas de regulamentação, que estabelecem regras que devem ser
respeitadas por todos os motoristas (por exemplo, parada obrigatória, a velocidade
máxima permitida, etc.); placas de advertência, que procuram alertar os motoristas
para as condições da via (por exemplo, curvas, cruzamentos, estreitamento da pista,
etc.) e placas de informações, que servem para transmitir informações diversas
aos motoristas, como orientação para destinos, distâncias, serviços auxiliares, etc.
A Figura 3.12 mostra exemplos de placas de regulamentação e advertência.
As marcas no pavimento são usada para complementar a sinalização vertical
(as placas e os semáforos) e serve para canalizar o tráfego, definir e separar as
correntes de veículos, demarcar os trechos em que a ultrapassagem é proibida,
etc. Os semáforos são usados para alternar a preferência entre correntes de tráfego
conflitantes em cruzamentos em níveL Ainda que o estudo detalhado dos processos
de controle de tráfego rodoviário fuja dos objetivos deste texto, em virtude da sua
complexidade, o Capítulo 4 discute os conceitos básicos do controle de tráfego
rodoviário em interseções. O estudo detalhado dos métodos para projeto e operação
de dispositivos de controle de tráfego rodoviário é estudado nas disciplinas de
3.10 Os sistemas de controle do tráfego ferroviário 119

Engenharia de Tráfego, tanto na graduação como na pós-graduação.

3. 1O Os sistemas de controle do tráfego ferroviário

A circulação de trens se reveste de um caráter peculiar, por estarem os trens sujeitos


à via, sem que haja a possibilidade de se desviarem uns dos outros em qualquer
ponto do percurso, como acontece com outras modalidades de transporte. Em
virtude dessa particularidade, existem normas operacionais rígidas para regular a
movimentação dos trens e eliminar o risco de colisões e abalroamentos. Uma das
formas de controlar o movimento dos trens é a tabela de horários. Os horários são
fixados de modo que os trens só se cruzem nos trechos de via dupla, que existem
nas estações e nos desvios. Como a tabela de horários por si só não é suficiente
para garantir a segurança da operação, foram criadas regras para disciplinar a
movimentação das composições. As ferrovias dispõem de centrais de controle de
tráfego que supervisionam o movimento dos trens e supervisionam a aplicação das
regras de tráfego.
O controle do movimento dos trens é feito através do licenciamento, que pode
ser realizado através de ordens escritas ou sinais. A autorização dada ao maquinista
para prosseguir viagem é chamada de licença. Os licenciamentos são sempre reali-
zados com base numa distância mínima de separação entre os trens. Esta distância
mínima, sempre maior que a distância necessária para a frenagem segura de um
trem, pode ser garantida pela existência de duas estações (ou postos de licencia-
mento), guarnecidos por um agente, ou pela existência de dois sinais luminosos,
que bloqueiem um determinado segmento de via.
Várias tecnologias para controle do tráfego ferroviário foram desenvolvidas ao
longo do tempo. Hoje em dia, existem desde sistemas totalmente automatizados
(ATO, 'automatic train operation') até sistemas desenvolvidos no final do século
passado, como o staff elétrico. O licenciamento pelo 'staff' elétrico requer uma
estação ou posto de licenciamento em cada extremidade do trecho, cada qual equi-
pada com porta-bastões interligados entre si. Esse aparelho, que é uma máquina
eletromecânica controlada remotamente, é usado para licenciar o trem. Suponha
que exista um trem na estação A que deseja viajar para a estação B. O agente da
estação A entra em contato telefônico com o agente da estação B, que é quem
autoriza o trem a viajar, acionado remotamente o porta-bastões da estação A para
que ela libere um 'staff'- um bastão metálico que se encaixa na máquina. O ma-
quinista recebe o 'staff' e levá-o consigo até a estação B, onde entrega-o ao agente.
Enquanto o bastão estiver fora dos aparelhos, não é possível liberar um segundo
120 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

bastão. Só a colocação desse 'staff' no aparelho da estação B faz com que os dois
aparelhos interligados fiquem em condições de permitir um novo licenciamento.
Apesar de muito seguro, o licenciamento pelo 'staff' elétrico é relativamente ine-
ficiente, pois um trecho entre duas estações só pode ser ocupado por um trem de
cada vez. O aumento do número de estações poderia aumentar o volume de trens
circulando, mas representaria um grande aumento nos custos de pessoal.
Os sistemas mais modernos permitem um melhor controle do fluxo de trens,
podendo-se assim reduzir os headways e, em conseqüência, aumentar a capacidade
do sistema. O sistema de sinalização por blocos é a base desses sistemas, nos quais
o controle é feito a partir de um centro de operações a partir do qual se controla
os aparelhos de mudança de via e onde pode-se ver o progresso dos trens em
monitores de computador ou em displays especialmente construídos para mostrar
a posição dos trens nas vias.

3.1 0.1 O sistema de sinalização por blocos

Comboios ferroviários de carga trafegando em velocidades normais de operação


necessitam de longas distâncias para frear com segurança.. Em função disto, re-
sultam critérios rigorosos para a separação mínima entre comboios sucessivos. O
tráfego ferroviário é controlado por um sistema de sinais luminosos chamado sis-
tema de sinalização por blocos. A Figura 3.13 ilustra o funcionamento do sistema
de sinalização por blocos para dois tipos de sistema: o sistema CTC ('centralized
train control', ou controle de tráfego centralizado), que é usado em ramais normais,
e o sistema ATO ('automatic train operation', operação automática de trens), que é
o sistema usado nos trens de metrô. No sistema CTC, o maquinista conduz o trem
de acordo com as indicações dos sinais; no sistema ATO, a ação (e às vezes até
mesmo a presença física) do maquinista é dispensada.
No sistema de sinalização por blocos, a linha férrea é dividida em trechos -
blocos, cujo comprimento é sempre maior que a distância necessária para frear os
trens. Um sistema de bloqueio automático detecta a presença de um trem no bloco
por meio de sensores, que acionam a luz vermelha no sinal existente na entrada do
bloco, como é mostrado na Figura 3.13. Um sinal vermelho significa que o bloco
em frente já está ocupado por um outro trem e que o maquinista deve esperar até
que seja autorizado a prosseguir.
Essa autorização para prosseguir pode ser dada por um sinal verde ou por
um sinal amarelo. O sinal amarelo significa que o bloco está livre e trem pode
prosseguir, com velocidade reduzida, pois o bloco seguinte está ocupado e o trem
3.10 Os sistemas de controle do tráfego ferroviário 121

Trem 1 Trem2

1. Sistema de dois blocos com ~rês fases

®Vermelho
[JJTTQJ ~
f Bloco

Verde
,..
@Amarelo
IÕ)Vennelho IH)
~ mpw~ \ffVerde

---~ .
Direção do movimento Separação mfnima:
dois blocos livres
2. Sistema de três blocos e três fases
Bloco
® Vermelho
~~
@ Verde
tmarel§ermelh,Vennelho
~~
@
. Verde

Separação mínima:
três blocos livres

Fig. 3.13: Sistema de sinalização por blocos Fig. 3.14: Diagrama espaço-tempo para siste-
ma de sinalização de blocos

deve preparar-se para parar. O sinal verde significa que o trem pode prosseguir em
velocidade normal, pois há mais de um bloco livre à sua frente. No sistema CTC,
um sinal verde significa que existem dois blocos livres, enquanto que no sistema
ATO são necessários três blocos livres para o sinal ficar verde.
Como existem neste esquema três fases diferentes (vermelho, amarelo, e verde)
e dois blocos entre um bloco ocupado e um sinal de "prossiga", este sistema é
denominado de sistema de dois blocos com três fases.
Existem diversas variações do sistema de sinalização por blocos, sendo que o
utilizado em sistemas de metrôs e pré-metrôs em áreas urbanas (Fig. 3.13) funciona
de tal modo que o trem é freado automaticamente caso um sinal vermelho não seja
respeitado. Esse sistema é conhecido como ATO, já que a operação do trem é
automática e fica condicionada à sinalização. No entanto, para que seja possível
parar automaticamente um trem que avance um sinal vermelho, é necessário que
exista um bloco adicional, fato que leva o sistema a ser denominado de sistema de
três blocos com três fases.
A base do sistema de bloqueio automático é o chamado circuito de via, que
usa os trilhos para formar um circuito elétrico que é isolado dos blocos vizinhos
por meio de juntas isolantes. O circuito é percorrido por uma corrente de baixa
voltagem (1 a 2 volts). Se o trecho estiver vazio, essa corrente elétrica aciona um
relé que, por sua vez, mantém a luz verde acesa. Se um trem entra no trecho, a
corrente elétrica é derivada pelas rodas e eixos do trem, cortando a corrente que
passa pelo relé que, não sendo acionado, apaga a luz verde e faz com que a luz
vermelha seja ligada, bloqueando o trecho. Uma vantagem do sistema de bloqueio
122 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

automático é a redução do risco de acidentes, já que o trecho fica automaticamente


bloqueado se um vagão se soltar do trem e ficar na linha ou mesmo se um trilho se
romper.
A Figura 3.14 ilustra o funcionamento dos sinais por meio de um diagrama
espaço-tempo que indica o movimento de dois trens que viajam na mesma direção
ao longo de um ramal controlado por um sistema de sinalização de blocos. Neste
exemplo, o segundo trem está seguindo o primeiro com uma pequena folga.
Pode-se notar que o gráfico mostra as trajetórias da frente e da traseira dos
trens, por meio de duas linhas separadas entre si verticalmente pelo comprimento
da composição. O comprimento dos blocos é maior que o comprimento do trem.
Quando a frente do primeiro trem entra no primeiro bloco, o semáforo muda
automaticamente de verde para vermelho, indicando que o bloco está ocupado.
Este bloco se mantém ocupado até o instante em que a traseira do trem passa pela
divisa com o próximo bloco, quando o semáforo muda para amarelo, o que significa
que o bloco está livre o bloco seguinte está ocupado. O segundo trem poderia entrar
no bloco, mas com velocidade reduzida pois deverá parar no próximo sinal.
O sinal muda de amarelo para verde no instante em que a traseira do primeiro
trem sai do segundo bloco, pois os dois blocos seguintes passam a estar livres e o
segundo trem pode entrar no bloco sem que seja necessário reduzir a velocidade,
pois o bloco seguinte está livre.
Pode-se perceber que a folga entre os dois trens pode ser reduzida até desapa-
recer que segundo trem não será obrigado a reduzir a ·marcha, enquanto o primeiro
trem continuar trafegando. Se o headway entre os dois trens ficar menor que o
headway mínimo mostrado no gráfico, o segundo trem deve reduzir a velocidade
ao entrar no bloco cujo sinal indica amarelo.

3.1 0.2 Diferenças entre os processos de licenciamento de trens

É importante notar as diferenças entre os sistemas de controle de tráfego ferroviá-


rio descritas nesta seção. O licenciamento é sempre baseado no conceito de um
segmento de via sendo ocupado por um único trem. O licenciamento pelo 'staff'
elétrico requer postos de licenciamento nas extremidades do trecho que autorizam
o trem a entrar no segmento, depois de verificar se ele está livre. Como o custo de
manutenção e operação de uma estação é significativo, as estações estão separadas
de algumas dezenas de quilômetros e a densidade de trens é sempre muito baixa.
No sistema de sinalização por blocos, o licenciamento é realizado a partir de
um único ponto, o centro de controle, dispensando-se os postos de licenciamento.
Resumo 123

O controlador de tráfego no centro de controle é capaz de acionar Jà distância os


aparelhos de mudança de via nos pátios de. manobra ao longo da via e observa
o progresso dos trens num painel ou display de computador, que também mostra
as indicações dos sinais e o estado dos aparelhos de mudança de via. Esse siste-
ma é conhecido por CTC (controle de tráfego centralizado) e permite uma maior
densidade de trens na via, já qp.e o comprimento dos blocos é de apenas alguns
quilômetros e entre duas estações podem existir diversos blocos.
O sistema ATO (operação automática dos trens), que é usado no controle de
trens de metrô, é mais evoluído que o CTC, pois o mecanismo de controle do trem
recebe indicações diretamente do computador do centro de controle, dispensando
a intervenção do condutor, permitindo maiores velocidades e menores separações
entre os trens. No metrô de São Paulo, o sistema de controle permite separação
mínima entre os trens de apenas 90 segundos, se a operação for automática. A
separação é maior quando os trens estão sendo operados pelos condutores, apesar
da monitoração constante do sistema pelos computadores do centro de controle
operacional, que impede erros humanos.

Resumo

e O diagrama espaço-tempo permite representar graficamente fluxos de veículos ao


longo de um segmento de via. A velocidade instantânea dos veículos pode ser
determinada através da declividade da curva que representa seu progresso ao longo
do trecho, enquanto que a velocidade média num trecho qualquer é a declividade
da reta que liga os pontos inicial e final do trecho.
o Os fluxos de tráfego rodoviário podem ser contínuos, como os que existem num
trecho entre interseções numa rodovia, ou interrompidos, como os que existem
em vias arteriais urbanas nas quais a corrente sofre interrupções periódicas nos
cruzamentos semaforizados.
o Existem dois tipos básicos de modelos para correntes de tráfego: os modelos ma-
croscópicos, que consideram a corrente como um todo, e os modelos microscópi-
cos, que procuram representar a corrente de tráfego a partir de respostas individuais
de cada veículo. Os modelos macroscópicos são mais usados para representar
situações em que existe um equilíbrio na corrente, enquar"lto que os modelos mi-
croscópicos permitem incluir variações aleatórias nas características dos veículos e
seus condutores.
o Os parâmetros macroscópicos que descrevem uma corrente de tráfego ininterrupta
são três: o volume q, a velocidade média Üs e a densidade k. A relação fundamental
do tráfego q = Üs . k estabele a relação entre essas três variáveis. Modelos para
representar as relações entre volume, velocidade média e densidade podem ser
124 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

estabelecidos a partir da relação fundamental e da relação entre a densidade e a


velocidade. O modelo mais simples pode ser obtido pressupondo-se uma relação
linear entre a velocidade média e a densidade.

e As correntes de tráfego podem estudadas peh~ teoria das filas. Uma fila é caracteriza-
da pelo padrão de chegadas (a distribuição de headways entre chegadas sucessivas),
pelo padrão de partidas (a distribuição de headways entre partidas sucessivas), pelo
número de canais de atendimento e pela disciplina da fila. No estudo dos fl.uxos de
tráfego, a disciplina é sempre PIFO, ou seja, os veículos partem na ordem em que
chegam ao sistema.

e Os modelos de fila podem ser determinísticos ou estocásticos. Nos modelos deter-


minísticos, os headways são constantes enquanto que nos estocásticos, os headways
são variáveis aleatórias. Nos modelos determinísticos, pode-se representar o fenô-
meno por meio de um gráfico que mostre a variação no número acumulado de
chegadas e de partidas em função do tempo decorrido. Diversas medidas de de-
sempenho - fila média, tempo médio de espera, etc. - podem ser obtidas desse
gráfico. Nos modelos estocásticos, usam-se fórmulas para determinação dos va-
lores das medidas de desempenho, que são baseadas nas distribuições estatísticas
usadas para representar os processos de chegada e de partida.

e Os fl.uxos de tráfego interrompidos são observados em locais onde periodicamente


a corrente é interrompida, como num semáforo. O fl.uxo de saturação corresponde
à taxa de fl.uxo máxima que pode ser verificada no cruzamento durante a descarga
da fila que se forma durante o vermelho. O fluxo de saturação e o tempo de verde
que efetivamente pode ser usado para descarga da fila determinam a capacidade da
aproximação.

e O controle do tráfego rodoviário é feito por meio de placas, sinais luminosos e mar-
cas no pavimento. O controle do tráfego ferroviário é feito através do licenciamento
dos trens, que pode ser feito através de ordens escritas ou sinais. Para controle de
tráfego ferroviário, pode-se usar o "staff" elétrico, através do qual os trens são li-
cenciados para circular de uma estação para outra, ou o sistema de sinalização por
blocos, em que os trens são licenciados para trafegar de bloco para bloco. O sistema
de sinalização por blocos permite um melhor aproveitamento do sistema, já que as
separações entre trens são menores.

Para aprender mais

Traf:fic and Highway Engineering, N. J. Garber e L. A. Hoel. West Publishing Compa-


ny, St. Paul, MN, EUA, 1988.
No capítulo 5 trata do fl.uxó de tráfego rodoviário e da aplicação de modelos de filas
no estudo do tráfego rodoviário.
Exercícios 125

Transportation Engineering- An Introduction, C. J. Khisty. Prentice-Hall, Englewo-


od Cliffs, NJ, EUA, 1990.
Os fluxos de veículos em rodovias são discutidos no capítulo 5, que trata principal-
mente de modelos macroscópicos de tráfego.

Principies of Highway Engineering and Traffic Analysis, F. L. Mannering and W. P.


Kilareski. John Wiley & Sons, Nova York, 1990.
Seu capítulo 5 trata do tráfego rodoviário, incluindo modelos de filas.

Introduction to Transportation Engineering and Planning, E. K. Morlok. McGraw-


Hill, Nova York, 1978.
No capítulo 5, trata dos fluxos de veículos rodoviários e ferroviários e do seu
controle. A parte do capítulo 5 que trata da capacidade e nível de serviço está
completamente desatualizada e não deve ser levada em consideração.

Estradas de Ferro (vol. 2), H. L. Brina. Livros Técnicos e Científicos Editora, Rio de
Janeiro, 1982.
Discute o licenciamento dos trens no capítulo 9, em que explica os princípios de
funcionamento do "staff'' elétrico e do sistema de sinalização por blocos.

Exercícios

Problema 3.1 Observações conduzidas numa faixa de rolamento de uma rodovia produ-
ziram os seguintes dados sobre a velocidade média no espaço e a densidade da corrente de
tráfego:

Velocidade (kmlh) 97 65 34 si
7
106 57 15 55
Concentração (veic/km) 7 39 64 /27 3,5 45 85 50

Usando a hipótese de Greenshields,


(a) qual a densidade de congestionamento?
(b) qual a velocidade de fluxo livre?
(c) qual o volume máximo que pode trafegar pela via?
(d) qual o headway médio e o espaçamento médio quando a velocidade for 60 km/h?
(e) desenhe as curvas velocidade vs. densidade, volume vs. densidade e velocidade vs.
volume, indicando os valores observados e os calculados nos itens anteriores (assuma
que a relação fundamental é válida).

[Opcional] Compare as respostas com os resultados que seriam obtidos se a hipótese de


Greenberg fosse adotada.
126 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

Problema 3.2 Uma medida dos tempos de percurso para um trecho de 3,2 km de rodovia
forneceu os resultados abaixo. Compare velocidade média no tempo com a velocidade
média no espaço. Por que a velocidade média no espaço é sempre menor que a velocidade
média no tempo? Calcule a variância da velocidade média no tempo e verifique se a
hipótese de Wardrop é válida para estas observações.

Veículo 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12
Tempo (min) 2,6 2,4 2,4 2,8 2,2 2,1 1,9 2,7 2,5 2,3 2,0 2,7

Problema 3.3 Uma das regras de direção defensiva sugere que a distância mínima que
deve ser mantida entre seu carro e o carro que vai à sua frente deve ser de um comprimento
de automóvel para cada 10 kmJh de velocidade. Usando um comprimento médio para
os automóveis de 6 m e supondo que a hipótese de Greenshields é válida, determine a
velocidade livre, a densidade de congestionamento e a capacidade de uma faixa de tráfego
para o caso de todos os veículos seguirem essa regra.

Problema 3.4 Compare a capacidade da faixa de tráfego do Exercício 3.3 (em veic/h),
que é usada apenas por automóveis, com a capacidade de uma faixa similar, que seja usada
apenas por ônibus. Adote um comprimento médio de 12m para os ôriibus.
Considerando que um carro transporta em média 1,8 pessoas e que um ônibus tem
um carregamento médio de 40 passageiros, compare a capacidade de transporte da faixa
exclusiva de ônibus com uma faixa usada apenas por automóveis.

Problema 3.5 Um grupo de veículos foi observado ao longo de um trecho de 300 m


de extensão de uma via de mão única. Os instantes de entrada e saída do trecho foram
anotados e são dados a seguir:

Veículo 2 3 4 5 6
Entrada (s) O 2 3 5 6 8
Saída (s) 35 37 39 42 44 48

(a) Desenhe o diagrama espaço-tempo que represente a corrente de tráfego observada.


( b) Calcule o volume médio, a densidade média e a velocidade média para a corrente na
entrada do trecho, usando como intervalo de observação os 1O segundos iniciais.

Problema 3.6 Numa rodovia com baixa intensidade de tráfego, um estudante de Enge-
nharia de Transportes observa que 60% dos headways têm duração igual ou maior que
13 segundos. Se o estudante resolve contar quantos veículos passam pela via em inter-
valos de 30 segundos, estime a probabilidade de, durante um desses intervalos, passarem
exatamente 4 carros.

Problema 3. 7 Observando a entrada de um estacionamento pago, o estudante do exercício


anterior percebe que as chegadas de veículos dão-se de acordo com uma distribuição de
Exercícios 127

Poisson, cuja média é 4 veic/min. O estacionamento tem um único atendente, que é capaz
de atender até 5 veic/min.
(a) Determine o comprimento médio da fila no guichê de entrada, bem como o tempo
médio gasto para entrar no estacionamento e o tempo médio de espera para ser atendido.
(b) Se o tempo de atendimento passar a ser distribuído exponencialmente, determine os
novos valores para as medidas de mérito calculadas anteriormente.

Problema 3.8 Um grupo de amigos do estudante do exercício 3.6 decide comprar um


posto de gasolina, localizado numa área residenciaL Para aumentar a freguesia, o estudante
sugere a seus amigos que vendam gasolina com desconto durante uma hora por dia, das
7:00 (quando o posto abre) às 8:00. Os freguese começam a chegar ao posto às 6:45, à
uma taxa constante de chegadas de 4 veic/min, que se mantém nesse nível até às 8:15,
quando a taxa de chegadas passa a ser 8 veic/min.
(a) Se o estudante atrasa-se para abrir o posto, chegando às 7:45 e é capaz de atender
a 11 veic/min, determine a espera total, o comprimento máximo da fila e o tempo
máximo de espera, supondo que o atendimento faz-se sob uma disciplina FIFO.
(b) Faça um gráfico da variação do número acumulado de chegadas e partidas ao longo
do tempo e indique neles as medidas de desempenho calculadas no item anterior.
(c) As filas que passam a se formar toda manhã terminam por irritar os vizinhos. Os
donos do posto, procurando acalmar os ânimos da vizinhança, prometem que a fila
será eliminada até às 8:45. Qual deve ser a nova taxa de atendimento para que isso
seja possível? (Suponha que todas as outras condições mantenham-se inalteradas).

Problema 3.9 Numa praça de pedágio, os veículos chegam a uma das cabines a uma taxa
média de 2 veic/min. O operador atende veículos a uma taxa média de um carro a cada
20 segundos. Determine as medidas de desempenho do sistema supondo que:
(a) As chegadas são poissonianas e o tempo de atendimento é exponencialmente distri-
buído.
(b) As chegadas seguem uma distribuição de Poisson e o tempo de atendimento é constante.
(c) Discuta as diferenças entre as duas situações.

Problema 3.10 Seja um trecho de via expressa urbana com duas faixas de tráfego em
cada sentido. No período de pico da manhã, o volumes de tráfego observado é de 1.200
veículos/hora. Por causa de um acidente, a via fica completamente fechada por 5 minutos
e tem uma faixa de tráfego interrompida por 45 minutos. Usando um modelo de filas
determinístico, calcule:
(a) a duração do congestionamento causado pelo conserto,
( b) a espera total no congestionamento,
(c) o atraso médio causado aos motoristas pelo congestionamento e
( d) o comprimento do congestionamento.
128 Capítulo 3. Fluxos de veículos e seu controle

Suponha que a capacidade de cada faixa de tráfego desta via expressa seja de 1.000
veic/hora. Opcionalmente, obtenha uma solução gráfica para o problema.

Problema 3.11 Seja um trecho de via expressa urbana com duas faixas de tráfego em
cada sentido. Os volumes de tráfego observados são os mostrados na tabela a seguir:

Período 6:00-7:00 7:00-8:00 8:00-16:00


Volume (veic/h) 900 2.500 1.500

Por causa de um problema na rede de água, uma das faixas desta via expressa têm
que ser fechada ao tráfego durante um dia, para consertos. Se a capacidade de cada faixa
de tráfego desta via expressa for de 1.800 veic/hora, calcule as seguintes medidas de
mérito:
(a) a duração do congestionamento causado pelo conserto,
( b) a espera total no congestionamento,
(c) o atraso médio causado aos motoristas pelo congestionamento e
( d) o comprimento do congestionamento.

Faça um gráfico que indique a variação do número acumulado de chegadas e partidas ao


longo do tempo.

Problema 3.12 A travessia de certo canal é realizada por meio de uma balsa. No atraca-
douro dessa balsa existe uma baia com capacidade para 30 automóveis. A balsa é operada
de tal forma que a taxa de atendimento é constante e igual a 4 veic/min. Se a balsa começa
a funcionar quando a baia está cheia e a fila dissipa-se após 30 minutos, qual é a taxa
média de chegadas? Suponha que o processo de chegada é determinístico. Demonstre
que a solução obtida pode ser também conseguida por meio de um gráfico que indique a
variação do número acumulado de chegadas e partidas ao longo do tempo. Usando esse
gráfico, calcule a espera média e a fila média.
Capítulo 4

Fluxos de veículos em
interseções

Este capítulo discute a teoria do fluxo de tráfego em interseções. Inicialmen-


te, apresentam-se as formas de controle de tráfego em interseções previstas
no Código Nacional de Trânsito. A seguir, estuda-se o fluxo de veículos em
cruzamentos por meio de um modelo determinístico de filas do tipo D!D/1,
que pode também ser usado para análise de situações em que a demanda- o
volume de tráfego- temporariamente excede a oferta, ou seja, a capacidade
da aproximação. O uso de modelos estocásticos para a análise de cruzamen-
tos semaforizados isolados também é discutido, e o método de Webster para
calibração de semáforos é apresentado. Faz-se, a seguir, uma discussão dos
principais conceitos envolvidos na análise de redes de semáforos e apresenta-
se um método para análise dos sistemas de progressão semafórica. Estuda-se
a determinação adequada do intervalo entre verdes e discutem-se os critérios
para determinação da necessidade de instalação de semáforos. O capítulo
encerra-se apresentando um modelo para análise de interseções não sema-
forizadas.

O controle dos :fluxos de tráfego rodoviário é feito nas interseções e ao longo


dos trechos que conectam interseções. Enquanto que ao longo de um segmento
entre cruzamentos de via o controle basicamente trata de estabelecer limites de
velocidade, mãos de direção e proibições de ultrapassagem através de placas, nos
130 Capítulo 4. Fluxos de veículo~ em interseções

pontos em que os fluxos de tráfego se cruzam é necessário estabelecer os direitos


de passagem para reduzir o risco de acidentes.
As interseções são pontos críticos no sistema viário, pois possuem um grande
potencial para causar congestionamentos que vão afetar o desempenho global do
sistema de forma significativa. As interseções podem ser divididas em: controladas
por semáforos; controladas por sinal PARE ou dê a preferência; e não controladas.
Nas interseções com semáforo, o direito de passagem é alternado entre os fluxos
se cruzam. Nas interseções controladas por sinal PARE, o direito de passagem é da
via preferencial. Nas interseções não controladas, o capítulo que trata das regras
gerais da circulação no Código Nacional de Trânsito define o direito de passagem:
"quando veículos, transitando por direções que se cruzem, se aproximarem de
local não sinalizado, terá preferência de passagem o que vier da direita" (art. 13,
item IV).
A definição do tipo de controle mais adequado para cada interseção, ainda que
de grande importância, está além dos objetivos deste texto. O leitor interessado
neste assunto pode consultar manuais como Traffic Engineering Handbook 1 e o
Manual de Semáforos do DENATRAN2 , ou livros de Engenharia de Tráfego, como
McShane e Roess 3 , entre outros.

4.1 Interseções semaforizadas

O primeiro semáforo que utilizou luzes coloridas para controlar o fluxo de veí-
culos foi instalado em Londres, na Inglaterra, em 1868. Com a popularização
do automóvel, a partir do início da fabricação do Modelo T pela Ford, aumentou
a importância e a necessidade de controlar fluxos de veículos em cruzamentos.
James Hoge inventou o semáforo elétrico em 1913 nos EUA, sendo que Cleveland
foi a primeira cidade a instalar essa invenção. Este dispositivo foi o precursor do
semáforo de três cores, que se tornou popular durante a década de 20 nos Estados
Unidos. A partir do invento de Hoge, os sinais luminosos passaram a ser cada
vez mais usados: Salt Lake City teve a primeira instalação de semáforos inter-
conectados em 1917; o sistema de progressão semafórica foi proposto em 1922
1 Pline, J. L., ed. (1992). Traffic Engineering Handbook. Prentice-Hall, Englewood Cliffs, NJ,
EUA.
2 DENATRAN (1979). Manual de Semáforos. Departamento Nacional de Trânsito, Conselho
Nacional de Trânsito, Ministério da Justiça, Brasília, DF.
3McShane, W R. e Roess, R. P. (1990). Traffic Engineering.Prentice-Hall, Englewood Cliffs,
NJ, EUA.
4.2 Análise determinística de interseções semaforizadas isoladas 131

e os primeiros semáforos atuados pelo tráfego foram instalados em New Haven,


East Norfolk e Baltimore em 1928. Hoje em dia, a micro-informática também
faz avanços no campo do controle de tráfego e os semáforos são equipados com
micro-controladores e se comunicam com um computador central via modems ou
linhas dedicadas.
As interseções semaforizadas podem ser isoladas, isto é, localizadas a uma tal
distância umas das outras que um semáforo não interfere na operação do semáforo
seguinte, ou, caso estejam próximas umas das outras, podem estar controladas
como um sistema, em que os semáforos são operados de forma coordenada.

4.2 Análise determinística de interseções semaforizadas isoladas

O estudo das interseções semaforizadas pode ser feito usando-se a Teoria das Filas,
através de um modelo de filas determinístico (D/D/1). Ainda que modelos mais
complexos possam ser usados, a abordagem determinística serve para ilustrar os
conceitos envolvidos de forma clara e facilita a compreensão do fenômeno.

4.2. 1 Modelo DID/1 para cruzamentos semaforizados isolados

Para estudar o fluxo de veículos numa interseção isolada, imagine-se um cruza-


mento de duas vias de mão única, controlado por semáforo, como o mostrado na
Figura 4.1.Como já discutido anteriormente, a capacidade de uma aproximação é -;:;----r"
""~
L
~~
·x
c= s ~o (4.1) 2
c ~---~-o-o~o~l ~--~soo
em que C:
s:
capacidade da aproximação [veic/h];
fluxo de saturação [veiclh];
t lQj

g: tempo de verde efetivo [s]; e Aproximação 2

c: comprimento do ciclo [s]. Fig. 4.1: Interseção de duas


vias, controlada por sinal lu-
O fluxo de saturação, s, já foi discutido e é o volume máximo que pode passar mmoso
pela interseção, a partir daquela aproximação, se o semáforo permanecesse con-
tinuamente aberto para esses veículos e se a fila para entrar na interseção nunca
terminasse. O fluxo de saturação é o volume que corresponde ao headway míni-
mo observado entre os veículos que partem da fila formada por um semáforo, o
headway de saturação.
132 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

O comprimento do ciclo semafórico, c, é o intervalo de tempo necessário para


completar um ciclo, que é uma sequência completa de indicações semafóricas -
vermelho, verde e amarelo- para todas as aproximações. O tempo de verde efetivo
é o tempo efetivamente disponível para os veículos atravessarem a interseção. O
tempo de verde efetivo é dado por

g=G+A-p (4.2)

em que G: tempo durante o qual a luz verde está acesa [s];


A: tempo durante o qual a luz amarela está acesa [s]; e
p: tempo perdido no início do verde e no final do amarelo [s].

O tempo perdido total em cada ciclo, p, é causado pela demora de os motoristas


reagirem à mudança da indicação semafórica e o tempo necessário para os veículos
que estão no cruzamento liberarem completamente a interseção. Estes tempos
podem ser medidos no local e sua soma costuma ser da ordem de 4 segundos.
O tempo de vermelho efetivo, r, é o tempo em que os carros vindos pela
aproximação em estudo não podem cruzar a interseção e pode ser calculado por

r= c- g, (4.3)

ou seja, é a diferença entre o tempo de ciclo (c) e o tempo de verde efetivo (g).
A relação volume/capacidade é a razão entre o volume de uma aproximação,
V, e a sua capacidade, C. Se a relação V I C = 1, a aproximação opera na
capacidade; se V I C > 1 diz-se que a aproximação está saturada (o que a uma fila
com p > 1). No caso em que V I C > 1, se o volume na aproximação se mantiver,
o comprimento da fila cresce continuamente.
Na maior parte dos casos V I C :=:: 1 só ocorre esporadic:amente, durante alguns
minutos; a capacidade de uma aproximação é sempre maior que o volume, na maior
parte do tempo. Se um modelo D/D/1 for usado, a operação da aproximação do
cruzamento da Figura 4.1 pode ser representada graficamente conforme mostrado
na Figura 4.2, sendo que

À: taxa média de chegadas [veic/s];


w taxa média de partidas ou de atendimento [veic/s];
t: tempo total decorrido [s];
t 0 : tempo necessário para dissipação da fila formada durante o vermelho, após
o início do verde efetivo [s];
4.2 Análise determinística de interseções semaforizadas isoladas 133

g: tempo de verde efetivo [s];


r: tempo de vermelho efetivo [s]; e·
c: duração do ciclo [s].

Durante um ciclo de comprimento c, o número de veículos que chegam à


interseção é À c; a capacidade da aproximação é fL g. O gráfico da Figura 4.2
mostra que fL g > À c para todos os ciclos, o que equivale a dizer que não existe
fila no início do Ciclo, pois a fila se dissipa antes do final do verde efetivo.
Tomando-se o início do ciclo como o instante em que se
inicia o vermelho efetivo, nota-se que não existe fila inicial, pois _2
:::1
a curva de chegadas coincide com a curva de partidas. Como .;
a luz do sinal é vermelha, a taxa de partidas é nula (nenhum ~
"C
veículo entra na interseção) e a curva de p<U.-tidas é uma linha o
"C
horizontal de comprimento r, a duração do tempo de vermelho 3
efetivo. O sinal fechado não impede, entretanto, que veículos §
tl
continuem chega..'l.do ao cruzamento a uma taxa À: a fila tem 1'::1
À r veículos ao final do vermelho efetivo. A fila atinge seu
ea>
E
comprimento máximo, Qmax, no instante em que o sinal muda ~
do vermelho para o verde:
Fig. 4.2: Modelo D/D/1 para um semáforo
Qmax =À r. (4.4)

É fácil notar que neste instante também ocorre a maior espera no sistema, Wmax,
que é
Wmax =r. • (4.5)
No instante em que a indicação de fase muda de vermelho para verde, os veículos
que estão na fila do semáforo começam a se movimentar, partindo à uma taxa
fL > À. Como partem mais veículos que chegam, a fila irá se dissipar após um
certo período de tempo t0 :

Àr
JLto =À (r+ to) ::::} to= - - . (4.6)
JL-À

Se definirmos y, a taxa de ocupação da aproximação, como a razão entre a taxa


de chegadas e a taxa de atendimento, y = :k.
Como k, o número de canais de
atendimento é 1 no modelo D/D/1, y =À/ fL. Substituindo-se À/ fL da Equação 4.6
por y, tem-se que:
yr
to=--- (4.7)
(1- y)
134 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

Ao final de to, a fila deixa de existir e a curva de chegadas volta a ser coincidente
com a curva de partidas, até o final do ciclo. A parcela do ciclo onde existe fila,
Pq, pode ser determinada por:
r+ to
Pq=-- (4.8)
c

Note-se que a curva de partidas nunca pode ficar à esquerda da curva de


chegadas, pois isto significaria que alguns carros partiriam do semáforo antes de
terem chegado ao cruzamento. A duas curvas são coincidentes após t0 , o que
significa que os veículos que chegam ao cruzamento após to não são afetados pelo
semáforo.
A espera total num ciclo (WrotaJ) pode ser calculada pela área entre a curva de
chegadas e a curva de partidas, como se mostra na Figura 4.2:
À (r+ to)(r +to) À (r+ to)to
Wroral - 2 - 2 :::}
(r+ to)
Wrotal =
2
[À (r + to) - À to] :::}
Àr
Wrotal - -(r+ to) (4.9)
2
Substituindo-se a Equação 4.6 na Equação 4.9, tem-se que:

Wtotal À r (r+~):::}
2 f.J.--À

Wrotal Àr
2
2
(l +_À_).
f.J.--À
(4.10)

Como À = y f.J.-, a Equação 4.1 O pode ser reescrita como:

Wrotal = Àr
2
2
(1 + Yf.J.- ) ·
f.J.--Yf.J.-
(4.11)

A Equação 4.11 pode ser simplificada e reescrita como


Àr 2
Wroral = (veic.s]. (4.12)
2(1- y)

A espera média por veículo, por ciclo, CW) é o quociente entre a espera total e
o número total de veículos que passam pela aproximação durante o ciclo, ou seja,
Wrotal À r2 1
w = ÀC 2(1- y) À c
:::}
4.2 Análise determinística de interseções semaforizadas isoladas 135

w -----S.
2c(1-y)
(4.13)

A proporção de veículos que param no cruzamento é


À(r +to)
P, = . (4.14)
. ÀC

A fila média pode ser determinada pelo quociente entre a espera total no ciclo e o
comprimento do ciclo:
- Wwtal
q=--. (4.15)
c
Note o leitor que esta formulação só se aplica a ciclos onde a capacidade supera o
volume de tráfego da aproximação analisada, ou seja, onde o índice de congestio-
namento p = 1:.f.
jlg
< 1. Urna solução para os casos em que p é temporariamente
maior que a unidade será apresentada a seguir.

Exemplo 4.1 Considere uma aproximação de um cruzamento equipado com um semá-


foro de tempo fixo, cujo tempo de ciclo é 80 segundos. A indicação de verde para esta
aproximação tem 25 s; o tempo de amarelo é 3 s e o tempo perdido total por ciclo é 4 s.
Sabendo-se que o fluxo de saturação é 1.400 veic!(hora de verde.faixa), que a aproxi-
mação tem duas faixas de tráfego e que o volume é de 600 veiclh, determinar as medidas
de desempenho para essa aproximação usando um modelo D/D/1.

Solução: O tempo de verde efetivo pode ser determinado a partir da Equação 4.2:

g = G +A - p => g = 25 + 3 - 4 => g = 24 S.

O tempo de vermelho efetivo para esta aproximação é r = C - g = 56 s.


Como o fluxo de saturação da aproximação é 2.800 veic/h e o volume de tráfego
observado é de 600 veic/h e dado que os tempos de verde e vermelho efetivos
são sempre da ordem de segundos, é interessante utilizar as unidades das taxas de
chegada e partida em [veic/s]. A taxa média de chegadas, À, é

600 .
À= - - =O 167 ve1c/s·
3.600 , ,
a taxa média de de partidas (ou de atendimento), fJ.-, é
2.800
11 = - - = O 778 veic/s·
"" 3.600 ' '
e taxa de ocupação é
À 0,167
y = -fJ- = --
0,778
=o ' 215.
136 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

Com essas taxas de chegadas e atendimento, o número de veículos que chegam à


interseção durante um ciclo semafórico é). c= O, 167. 80 = 13,33 veic e o número
de veículos que podempassarporelaemcadacicloé ,u g =O, 778.24 = 18,67 veic.
Daí têm-se que o grau de congestionamento é p = 13,33 j 18,67 = O, 71 < I e as
equações obtidas anteriormente são válidas.
O tempo to necessário para a fila formada durante o vermelho se dissipar é (Eq. 4.7):
0,215.56
to= (1- 0,215) = 15,33 s;

a proporção do ciclo onde existe fila é (Eq. 4.8):

p =56+ 15,33 =o 89·


q 80 ' '
a fila máxima observada é (Eq. 4.4):

Qmax = 0,167.56 = 9,35 veic;

e o tempo máximo de espera é Wmax = 56 s (Eq. 4.5). A espera total por ciclo é
(Eq. 4.12):
0,167.56 2 .
Wtotal = ( _ 0, ) = 333,57 ve1c.s
2 1 215
e a espera média por veículo é (Eq. 4.13):
- 333,57
W= =24,97s.
0,167.80
A proporção de veículos que param no cruzamento é (Eq. 4.14 ):

p = O, 167(56 + 15,33) =O _
89
s 0,167.80 ' '
e a fila média observada é (Eq. 4.15):
333,57
q = ---go- = 4, 17 veic.

4.2.2 Análise determinística de ciclos saturados em interseções isoladas

Como o leitor já deve ter percebido, a ocorrência de ciclos saturados em cruza-


mentos semaforizados é um fenômeno comum. Um ciclo saturado é aquele onde
o volume de chegadas é maior que o volume de partidas - ou seja, p > 1. Se
p > 1, então À c > ,u g e a fila não vai se dissipar totalmente durante o ciclo, o
que faz com que alguns veículos da fila sejam obrigados a esperar pelo verde do
ciclo seguinte para partir.
4.2 Análise determinística de interseções semaforizadas isoladas 137

Estritamente falando, um ciclo saturado representa uma falha transitória do


sistema, durante o qual a demanda (os veículos que chegam ao cruzamento) é
maior que a oferta (o número de veículos que pode passar pelo sinal durante o
tempo de verde). Se o número de ciclos saturados for muito grande, a fila na apro-
ximação aumenta continuamente, o que significa que o sistema não foi projetado
adequadamente. Se o número de ciclos saturados for pequeno, o sistema pode ser
recuperar, dissipando o congestionamento durante os ciclos em que a demanda é
menor que a oferta A ocorrência de ciclos saturados durante pequenos períodos
de tempo é inevitável em interseções semaforizadas equipadas com controladores
não atuados pelo tráfego e não implica em falha geral do sistema, ainda que seja
interessante reduzir ao máximo a ocorrência de ciclos saturados.
A formulação desenvolvida anteriormente (item 4.2) só pode ser aplicada
a ciclos onde a capacidade é maior que o volume registrado na aproximação
(V j C < 1). Não obstante, um modelo D/D/1 também pode ser usado para analisar
períodos saturados de pequena duração, como mostra o Exemplo 4.2, que trata de
um pequeno período. de saturação com duração de três ciclos.

Exemplo 4.2 Suponha-se que uma aproximação de um cruzamento controlado por um


semáforo de tempo fixo tenha fluxo de saturação igual a 1.440 veic/h. O semáforo é
acionado por um controlador de tempo fixo, regulado para um ciclo de 60 segundos de
duração, sendo que a aproximação em questão tem um tempo de vermelho efetivo de
40 segundos. Se o fluxo de veículos durante três ciclos consecutivos for 12, 7 e 5 veículos
em cada ciclo, determine as medidas de desempenho do sistema usando um modelo D/D/1.

Solução: A taxa de atendimento (ou de partidas) no semáforo é J.L = 1440/3.600 =


0,4 veic/s. Se o tempo de vermelho efetivo é de 40 s num ciclo de 60 s, então o
tempo de verde efetivo para esta aproximação é g = c - r = 60 - 40 = 20 s e
o número máximo de veículos que podem atravessar o cruzamento a partir desta
aproximação é f.L g = 20. 0,4 = 8 veic/ciclo.
Se durante os três ciclos chegaram ao cruzamento 12, 7 e 5 veículos respectivamente,
pode-se construir a curva de chegadas C(t), que é mostrada na Figura 4.3. O início
do primeiro ciclo observado coincide com o início do tempo de vermelho efetivo
para a aproximação em estudo. Como o número máximo de veículos que podem
atravessar a interseção durante um ciclo é 8, restaram 12- 8 = 4 carros na fila
do semáforo no começo do segundo ciclo. Ao final do segundo ciclo, 12 + 7 =
19 veículos terão chegado ao semáforo mas apenas 16 carros terão partido, sobrando
uma fila com 3 automóveis para o terceiro ciclo. Durante o terceiro ciclo mais
5 carros chegam ao semáforo, perfazendo um total de 24 chegadas.
O número máximo de carros que poderia passar pelo semáforo em nc ciclos é
nc J.L g = 3. 0,4. 20 = 24 veículos em 3 ciclos e o congestionamento desaparece
138 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

ciclo 1. ciclo2. ciclo3.

1/)
o
~ 20
-~
.g 16
o
"C

=ta

E
:::1
12 ... ·:······· .... ···········-:······--·· -~--

(J
ta ' '
' '
----------~-------------------·-·r··--------:--
'
e
Gl
E
•:::1 4
z
0~~~~4---4---~--~--~--~---+--~
o 20 40 60 80 100 120 140 160 180
Tempo (segundos)

Fig. 4.3: Modelo D/D/1 análise de ciclos saturados

no final do terceiro ciclo, como mostra a Figura 4.3. Chamando-se A o número total
de chegadas durante o período de estudo (3 ciclos neste exemplG), deve-se notar
que o número de ciclos no período de estudo (nc) deve ser tal que nc f.J- g 2: A, para
que a fila se dissipe totalmente durante os ciclos analisados.
Observando-se a Figura 4.3, pode-se deteflll:inar as esperas totais em cada ciclo:

0,5 (12. 60) - 0,5 (8. 20) = 280 veic.s;


0,5 [(4 + 11). 60]- 0,5 (8. 20) 370 veic.s; e
0,5 [(3 + 8). 60] - 0,5 (8. 20) 250 veic.s.

Aesperatotalduranteos três ciclos é Wtotal = Wt 1 + Wt 2 + Wt3 = 280+370+250 =


900 veic.s.
A espera média por veículo é W = Wtotar! N, com N sendo o número total de carros
que chegam à interseção durante os três ciclos, ou seja, N = 24: W = 900/24 =
37,5 s/veic. A fila média pode ser calculada pela razão entre a espera total e o
comprimento do período de observação: ij = 900/(3. 60) = 5 veic.

4.2.3 Determinação do verde efetivo ótimo num cruzamento isolado

Como discutido nas seções precedentes, usando-se um modelo D/D/1 é possível


determinar a espera total por ciclo numa aproximação de um cruzamento sema-
forizado. A soma das esperas totais em cada aproximação fornece a espera total
no cruzamento. Se o comprimento do ciclo for conhecido, pode-se determinar os
4.2 Análise determinística de interseções semaforizadas isoladas 139

tempos de verde efetivo em cada aproximação de tal forma que a espera total no
cruzamento seja a menor possível.
Seja si o fluxo de saturação (em [veic/h]) e Ài a taxa de chegadas (em [veic/s]
Aproximação 4
) na aproximação i da interseção esquematizada na Figura 4.4. A taxa de aten-
dimento na i -ésima aproximação é f.Li = si /3600 veic/s. A taxa de ocupação em
cada aproximação é Yi = Ãi/ f.Li.
A espera veicular total no sistema, Wwtal, é a soma das esperas totais em cada
_w !

m"
ro o
aproximação (Equação 4.12):

Wtotal -

(4.16)
t m
Wwtal - Aproximação 2

Fig. 4.4: Esquema da inter-


Supondo-se que conversões à esquerda não sejam permitidas e que haja apenas seção
duas fases, uma para as aproximações 1 e 3 e outra para as aproximações 2 e 4,
têm-se que r1 = r3 e r 2 = r 4. A Equação 4.16 se transforma em:

(4.17)

Se o tempo de ciclo (c) for previamente definido, tem-se que

(4.18)

já que existem apenas duas fases. SubstitUindo-se, na Equação 4.18, o valor de r 2


encontrado na Equação 4.17, tem-se

ÀJrf À2(C- r1) 2 À3r? À4(C- r1) 2


Wtotal - ----''--- + + + :::}
2(1 - YJ) 2(1 - Y2) 2(1 - Y3) 2(1 - Y4)
1
AJr 2 1 ( ~ 2 2) 1 2
1 + /\.2 c-- cr1 + r 1 + /\.3r 1 +
Wtotal
2(1 - YJ) 2(1 - Y2) 2(1 - Y3)
2
À4(c - 2crl + rr)
+ . (4.19)
2(1- Y4)

Chamando-se ki = 2 c(~Yi l, a Equação 4.19 pode ser reescrita como:


2
Wrotal - k1rf + k2(c - 2crl + rf) + k3rf + k4(c 2 2crJ +r?)==>-
-

Wwtal (k1 + k2 + k3 + k4)rf- 2c(k2 + k4)r1 + (k2 + k4)c 2 (4.20)


140 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

O valor de r 1 que minimíza a espera veicular total pode ser calculado derivando-se
a expressão 4.20:
dWtotal
- - = 2(kl + k2 + k3 + k4)r1 - 2c(k2 + k4) (4.21)
dr 1

O ponto de mínimo é aquele onde ~~ =O, portanto

o - 2(ki + k2 + k3 + k4)r1 - 2c(k2 + k4)


c(k2 + k4)
(4.22)
kl + k2 + k3 + k4
onde ki = 20~Yi l. A Equação 4.22 só vale para cruzamentos onde existem apenas
duas fases, sem conversões à esquerda, aos quais possa se aplicar o modelo D/D/1.
O exemplo a seguir ilustra a aplicação do método.

Exemplo 4.3 O cruzamento esquematizado na Figura 4.4 é controlado por um semáforo


de tempo fixo. Não são permitidas conversões à esquerda; as duas vias têm mão dupla
de direção e o semáforo tem duas fases. As aproximações 1 (volume = 720 veiclh) e
3 (volume = 828 veiclh) compartilham a mesma fase; as aproximações 2 (volume =
432 veiclh) e 4 (volume= 252 veiclh) compartilham a outra fase. O tempo perdido em
cada ciclo pode ser suposto nulo e o fluxo de saturação em todas as aproximações pode
ser considerado 1.800 veiclh. Partindo-se do pressuposto que o ciclo deve ter 80 segundos
de duração, determinar os tempos de verde e vermelho efetivos que devem ser alocados a
cada fase para que a espera veicular total na interseção seja mínima.

Solução: As taxas de chegada para cada aproximação são:

À] 720/3600 = 0,20 veic/s


À3 828/3600 = 0,23 veic/s
À2 432/3600 O, 12 veic/s
À4 252/3600 = 0,07 veic/s.

A taxa de atendimento é a mesma para todas as aproximações: f.L = 1800j3600 =


0,5 veic/s; o grau de congestionamento para cada aproximação pode ser então
determinado:
Yl = 0,20j0,5 0,4
Y3 = 0,23/0,5 0,46
Y2 0,12/0,5 = 0,24
Y4 0,07 j0,5 = O, 14.

A espera veicular total Wtotal é a soma da espera total em cada aproximação:


4.3 Análise de cruzamentos semaforizados com chegadas aleatórias 141

2 2 2
À1r 1 À2T~
----''-- + - + À3r3 + À4r4 ===>
2(1- Yl) 2(1- Y2) 2(1 - Y3) 2(1 - Y4)
0,20r[ 0,23r} O, 12r} 0,07r}
= 2(1- 0,4) + 2(1- 0,46) + 2(1- 0,24) + 2(1- 0,14) ===>
= O, 1667r? + 0,213ürl + 0,0789ri + 0,0407rl
Como T! = r3, r2 = r4 e r2 = g- r1 = 80- TJ, tem-se que:
Wtotal + 0,0789(80- TJ) 2 + 0,2130rf + 0,0407(80- TJ) 2 ===>
O, 1667rf
Wtotal = 0,4993rf- 19, 136rl + 765,44

Para achar o mínimo da função acima deve-se usar a sua derivada:


dWtotal
- -- o
dr1
o = 0,9986rl - 19,136
19,136
T]
0.9986
TJ = 19,16s

Portanto, r1 = 19 s e r2 = 80 - 19 = 61 s, o que significa que a fase 1 do semáforo


deverá alocar 61 s de verde efetivo e 19 s de vermelho efetivo às aproximações 1
e 3. A fase 2 deverá alocar 19 s de verde efetivo e 61 s de vermelho efetivo às
aproximações 2 e 4.

4.3 Análise de cruzamentos semaforizados com chegadas aleató-


rias

O uso de modelos determinísticos de filas para estudo de cruzamentos semafori-


zados pressupõe que tanto o padrão de chegadas e como o padrão de de partidas
sejam determinísticos- ou seja, que os headways entre os veículos que chegam
ao cruzamento sejam constantes e que os headways entre os veículos que saem da
fila no semáforo também sejam constantes, ainda que menores que os headways
de chegada Ainda que seja possível estudar um grande número de cruzamentos
usando tal suposição, em outros casos o efeito da aleatoriedade no processo de che-
gadas não pode ser ignorado, sob pena de não se obter um bom dimensionamento
para o semáforo.
Um dos métodos que levam em consideração a aleatoriedade do processo de
chegadas para a determinação dos tempos de verde e vermelho em cada aproxi-
mação é o método proposto por Webster para a calibração de semáforos isolados,
que é bastante usado no Brasil.
142 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

4.4 Calíbração de semáforos isolados pelo método de Webster

Um cruzamento isolado é aquele em que o semáforo opera de forma completa-


mente independente dos semáforos das interseções mais próximas. Além disso, a
distância entre esse semáforo e os demais deve ser tal que seja possível ocorrer uma
razoável dispersão dos pelotões formados nos semáforos à montante. O processo
de dipersão de um pelotão que parte de um semáforo dá-se ao longo da via, e quanto
maior a separação entre os dois sinais, maior a dispersão do pelotão. Ao partir do
sinal à montante, os headways entre os veículos do pelotão são praticamente iguais.
Ao viajar pelo trecho entre os dois sinais, esses headways começam a alterar-se,
pois alguns veículos são mais rápidos e outros mais lentos. Se a distância entre os
dois sinais for pequena, da ordem de um quarteirão, o pelotão praticamente não
se altera; se for superior a 400 m, já se toma difícil perceber a existência de um
pelotão.
Os modelos determinísticos, como o discutido no item 4.2, aplicam-se bem ao
estudo de interseções pouco espaçadas, pois nesse caso, o padrão de chegadas é
determinado pelo padrão de partidas do sinal à montante. Nos casos em que as
interseções estão muito espaçadas, é melhor usar o método de Webster, pois as
chegadas são aleatórias.
É conveniente definir uma nomenclatura relativa à calibração de semáforos
antes de apresentar o método de Webster. Os termos mais comuns incluem:

e Controlador: é um dispositivo que aciona as luzes do semáforo para cada


aproximação de tempo, em intervalos determinados de acordo com um plano
preestabelecido.
• Aproximação: os trechos de via que convergem para a interseção.
e Movimento: são os fluxos de veículos e pedestres que existem na interseção.
O diagrama da Figura 4.5 mostra os movimentos de veículos numa interseção
de quatro aproximações. Os movimentos que se cruzam são chamados
movimentos conflitantes; os movimentos convergentes têm origens diferentes
e mesmo destino, enquanto que os movimentos divergentes têm a mesma
origem e destinos diferentes.
• Ciclo: é o tempo necessário para a repetição de uma seqüência de cores
numa aproximação.
• Fase: é a parte do ciclo alocada a uma corrente de tráfego (ou combinação
de duas ou mais correntes de tráfego) que tem o direito de passagem durante
4.4 Calibração de semáforos isolados pelo método de Webster 143

Fase1 Fase2
Diagrama de tempos

Vennelho Verde

~~~~~~~ Fase2

Estágio 1 Estágio 2

Fig. 4.5: Fases e movimentos num cruzamento com quatro aproximações

um ou mais intervalos. A Figura 4.5 mostra uma interseção com duas fases
e os movimentos que têm direito de passagem em cada fase.
• Intervalo ou estágio: é uma parte do ciclo durante a qual as indicações
luminosas não se alteram.
o Período entreverdes: é o tempo decorrido entre o fim do verde de uma fase,
que está perdendo o direito de passagem, e o início do verde de outra fase.
No Brasil, normalmente, o período entreverdes é igual ao tempo de amarelo;
em alguns casos, se existir também um período de vennelho geral, que é
usado para dar maior segurança na limpeza dos veículos do cruzamento, o
tempo de entreverdes é o tempo de amarelo mais o tempo de vermelho geral.

4.4. 1 Diagramas de estágios e de tempos

Para facilitar a visualização da operação de um cruzamento semaforizado, costuma-


se representar graficamente a seqüência de movimentos permitidos e proibidos em
cada estágio, através de um diagrama de estágios. A seqüência de indicações de
cores e a duração de cada fase são representadas graficamente através do diagrama
de tempos, que associa os instantes de mudança dos estágios com a seqüência de
indicações de cores e com a duração das fases.
Considere-se, por exemplo, a interseção mostrada na Figura 4.5. A interseção,
da forma como mostrada na figura, opera com dois estágios e duas fases. Os
diagramas de estágios e de tempos correspondentes a essa forma de operação
também estão mostrados na mesma figura. Por outro lado, uma outra forma de
operação dessa interseção poderia ser, por exemplo, de tal forma que existam
quatro estágios, para evitar movimentos conflitantes no mesmo estágio- tais como
144 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseçõeF
./

Estágio 1 Etrtlltglo2 os movimento 1 e 5 e os movimento 2 e 6 no primeiro estágio. O diagrama de

~i>--
estágios para essa outra forma de operação é mostrado na Figura 4.6. O leitor deve
l f- tentar criar o diagrama de tempos correspondente.
~1 T
11
Outra forma de operação seria usar quatro estágios, da forma como se mostra
3 T 7
na Figura 4.6, mas permitindo-se conversões à direita que não sejam conflitan-

2+t- "f:
Estáglo3 Estáglo4

l 8 tes com os movimentos permitidos. Na verdade, seria até possível manter uma
continuidade nos movimentos de conversão à direita. O leitor pode tentar montar
--i6 -i 10 o diagrama de estágios correspondentes, devendo notar que os movimentos de
T conversão à direita seriam permitidos num estágio e no estágio seguinte: o mo-
vimento 9 seria permitido nos estágios 1 e 2; o movimento 4, nos estágios 2 e 3;
Fig. 4.6: Diagrama de está- o 1O, nos estágios 3 e 4. O movimento 3 também seria permitido em dois estágios
gios
consecutivos, que são o estágio 4 e o estágio 1.

4.4.2 O método de Webster

Os semáforos instalados para controle do tráfego em interseções isoladas podem


ser de tempo fixo, semi-atuados ou totalmente atuados pelo tráfego. Enquanto que
nos semáforos semi-atuados e atuados o comprimento do ciclo varia de ciclo para
ciclo, nos semáforos de tempo fixo existe um ciclo preestabelecido que se mantém
constante durante um certo período ou até mesmo durante todo o dia.
Webster4 propôs um método para calibração de semáforos isolados com base
na suposição de que as chegadas ao cruzamento são independentes e aleatórias. A
partir de uma fórmula para determinação do atraso médio sofrido pelos veículos no
cruzamento que se tomou clássica, Webster foi capaz de obter uma expressão para
determinar um tempo de ciclo tal que o atraso médio total seja o menor possível.
A influência de Webster no desenvolvimento da Engenharia de Tráfego é inegável
e deve-se a ele, por exemplo, os conceitos de fluxo de saturação e tempo perdido.
A partir de dados experimentais coletados em diversas interseções semaforiza-
das e de simulações, Webster propôs uma expressão para determinação do atraso
médio sofrido pelos veículos numa aproximação de um cruzamento com semáforo:

d=
C(l- ef +
2(1 -ex)
x
2

2q(1 - x)
- ,O65 (C)
-:;-
q-
X
2+5e (4.23)

em que d: atraso médio por veículo na aproximação [s];


4 Webster, F. V. e Cobbe, B. M. (1962) Traffic Signals. Road Research Technical Paper 56.
HMSO, Londres.
4.4 Calibração de semáforos isolados pelo método de Webster 145

C: tempo de ciclo [s];


e: a relação entre o verde efetivo e o tempo de ciclo para a
aproximação (e = gjC);
q: volume observado na aproximação [veic/s];
s: fluxo de saturação [veic/(s.faixa)]; e
x: grau de saturação, ou seja, a relação entre o volume observado e
a capacidade da aproximação (x = q ;e s).

Para facilitar a utilização do método, Webster reescreveu a Equação 4.23 como:


B
d=CA+--D (4.24)
q
e calculou e tabulou os valores dos parâmetros A, B e D. Numa época em que
praticamente não existiam calculadoras e computadores, a aplicação do método
tornava-se muito mais simples com o uso de valores tabulados.
Webster procurou determinar o ciclo ótimo, ou seja, o valor de C para o qual
o atraso total numa interseção é minímo, diferenciando a expressão que fornecia o
somatório do atraso médio nas aproximações de um cruzamento. Para uma ampla
gama de condições, Webster determinou que o atraso sofrido pelos veículos numa
interseção controlada por um semáforo é mínimo quando o ciclo é calculado pela
expressão
C - 1,5 L+ 5_ (4.25)
o -r 1 _ "'! y.
\. L.,L=l l
/ .
""- ~
em que C0 : comprimento ótimo do ciclo [s];
L: tempo perdido total por ciclo [s];
Yi: relação volume/fluxo de saturação para a aproximação crítica
para a fase i; e
n: número de fases.

Esse ciclo ótimo é aquele que fornece a maior razão entre volume e fluxo de
saturação. Webster também concluiu_q.Qe_o,atraso total não varia muito para tempos
de ciclo no intervalo entr~0,75ê; e1_,_5 Ca_:: O processo é, contudo, sensível a erros
nas estimativas dos fluxos-de saturação e dos volumes nas aproximações.
Para um cruzamento com duas fases, o tempo total de verde efetivo gy é
n
gy =c- L =c- L li (4.26)
i=l
146 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

em que C: tempo de ciclo [s];


L: tempo perdido total por ciclo [s];
l( tempo perdido na fase i; e
n: número de fases.

O tempo perdido na fase i, li, é dado por:

(4.27)

em que li: tempo perdido na fase i;


/: entreverdes, ou seja, ta+ tr;
ta: tempo de amarelo;
tr: tempo de vermelho geral; e
Pi: tempo perdido.

Como no Brasil quase nunca se usa o vermelho geral, o tempo de entreverdes é,


quase sempre, o tempo de amarelo e li = Pi. Usando-se o vermelho geral, o tempo
perdido na fase i passa a ser li = tr + Pi.
Definindo-se a aproximação crítica em cada fase como a que tem a maior
relação entre o volume (a demanda) e o fluxo de saturação (a oferta), a distribuição
de tempo de verde para cada fase é proporcional aos volumes das aproximações
críticas em cada fase. Ou seja, o tempo de verde efetivo da fase_ i, gi pode ser
calculado por:
(4.28)

em que gi: tempo de verde efetivo para a fase i [s].


O tempo de luz verde para cada fase pode ser determinado por

(4.29)

em que G( tempo de indicação de verde para a fase i [s];


gi: tempo de verde efetivo para a fase i[s];
li: tempo perdido na fase i [s]; e
Ai: tempo de luz amarela na fase i [s].

Os passos necessários para a calibração de um sinal com duas fases, sem faixas
ou fases exclusivas para conversão, são os seguintes:
4.4 Calibração de semáforos isolados pelo método de Webster 147

1. Para cada aproximação, estabeleça o fluxo de saturação s;.

2. Para cada aproximação, determine o volume da hora-pifo, qi.


3. Para cada aproximação, calcule a relação q;/s;. Para cada rua, escolha o
maior q;/ s; entre os calculados para as suas aproximações. Se os volumes
forem dados por faixa de tráfego, o procedimento é o mesmo.

4. Determine o tempo perdido para cadá fase.

5. Determine o tempo de duração do ciclo ótimo.

6. Calcule o tempo total de verde efetivo e distribua esse tempo entre as duas
fases.

7. Construa uma tabela ou gráfico com os tempos de luz verde, amarela e


vermelha para cada fase, de acordo com as seguintes regras:

(a) O tempo mínimo de qualquer indicação de verde é 15 s, se não houver


fluxo significativo de pedestres.
(b) O tempo de ciclo deve ser ajustado para um múltiplo de 5 s (para
C < 90 s) ou 1O s (para C > 90 s).
(c) Todos os intervalos devem ser arrendondados para serem múltiplos de
um segundo.

O Exemplo 4.4 a seguir ilustra a aplicação do método de Webster.

Exemplo 4.4 Considere-se um cruzamento, no qual pretende-se instalar um semáforo de


tempo fixo, com duas fases, mostradas no diagrama de estágios mostrado na Figura 4. 7.
O tempo de amarelo deve ser igual a 3 segundos e deve existir um período de 1 segundo de
vermelho geral. O tempo perdido em cada aproximação, p;, pode ser considerado como
sendo 2 segundos. Os volumes e os fluxos de saturação nas quatro aproximações estão
dados na Figura 4. 7. Faça a calibração do semáforo usando o método de Webster.

Solução: Como o tempo de amarelo é 3 segundos e o tempo de vermelho geral é


1 segundo, o período de entreverdes é 4 segundos. As taxas de ocupação, ou seja,
as relações entre o volume e o fluxo de saturação para cada aproximação, podem
ser calculadas:
yl 1.200/3.000 = 0,4
y2 600/2.000 = 0,3
y3 900/3.000 = 0,3
y4 = 800/2.400 = 0,333
148 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

Aproximação Volume Fluxo de saturação


4
.J__i_3
1rr :1t:
1.200 veic/h 3.000 veic/htv*
2 600 veic/h 2.000 veic/htv
3 900 veic/h 3.000 veic/htv
2 4 800 veic/h 2.400 veic/htv
Estágio 1 Estágio 2
• veículos/hora de tempo verde

Fig. 4.7: Diagrama de estágios, volumes e fluxos de saturação

Como Y1 > Y3 e Y4 > Y2, as aproximações críticas são as aproximações 1 e 4 e o


somatório das taxas de ocupação críticas de cada fase é Y = Y1 + Y4 = O, 733. O
tempo perdido em cada fase é:

li = (I -ta)+ Pi = (4- 3) + 2 = 3 S.
Dessa forma, o tempo perdido por ciclo é L = 6 s, já que existem duas fases.
O cálculo do tempo de ciclo ótimo pode ser feito usando-se a Equação 4.25:

1,5. 6 + 5
Co= l _ 0,
733
= 52,4 s.
Adotando-se o tempo de ciclo como 55 segundos, o tempo de verde efetivo total é
gr = C - L = 55 - 6 = 49 s. Pode-se distribuir esse tempo total de verde efetivo
entre as duas fases (Eq. 4.28):

0,4
g] --49 26,7s;e
0,733
0,333
g2 = --49 = 22,3 S.
0,733
Ou seja, g 1 = 27 segundos e g2 = 22 segundos. Os tempos de luz verde podem
ser determinados usando-se a Equação 4.29:

G1 = 27 + 3 - 3 27 segundos e
G2 22 + 3 - 3 = 22 segundos.

Fica para o leitor elaborar o diagrama de tempos correspondente.

4.5 Sistemas de cruzamentos controlados por semáforos

Num trecho no qual os semáforos estão separados por distâncias relativamente


curtas, o padrão de saídas da fila de um sinal afeta o processo de chegadas à
fila do sinal seguinte, já que a distância entre os dois sinais é insuficiente para
4.5 Sistemas de cruzamentos controlados por semáforos 149

uma completa dissipação do pelotão formado pelo fechamento e abertura do sinal.


Nesse caso, o conjunto de interseções semaforizadas deve ser tratado como um
sistema. A otimização de sistemas de interseções semaforizadas é um assunto por
demais complexo para os objetivos deste texto; no entanto, os conceitos gerais de
operação de semáforos sincronizados são relativamente simples e ilustram bem a
importância das redes de interseções semaforizadas.
Observando-se uma via onde existem dois semáfo-
toffo
ros não muito distantes um do outro, pode-se perceber J L ~

Y[D ~
que os carros que partem de um semáforo têm headways
praticamente iguais e movem-se num pelotão, que se
dco
desloca ao longo da via. Esse pelotão tende a desa-
parecer à medida em que se afasta do sinal, já que os l][ c J'
/

veículos de melhor desempenho ou conduzidos por mo- dac.


toristas mais agressivos têm velocidade maior. Se a
distância entre os dois semáforos for pequena, o efei-
to desse fenômeno é irrelevante e os carros chegam ao
segundo sinal ainda formando um grupo compacto.
Idealmente o segundo semáforo deveria ser operado
dAa

*"
lo~A
Semáforos

Fig. 4.8: Diagrama espaço-tempo para uma via de mão


de tal maneira que o tempo de verde efetivo estivesse se
única
iniciando no instante em que o líder do pelotão estiver
chegando ao cruzamento, de tal forma que o progresso
do pelotão não fosse interrompido ao longo da via. Desta forma, um carro trafe-
gando pela via teoricamente nunca teria que parar após encontrar um sinal verde.
Este processo é denominado "onda verde" ou, mais corretamente, de sistema pro-
gressivo de coordenação de semáforos .
. Um sistema progressivo é conseguido através de "offsets", ou defasagens, entre
o início do verde do primeiro sinal e o início do verde do n-ésimo semáforo na
via arterial. A determinação do offset de cada semáforo é feita conhecendo-se a
velocidade da corrente de tráfego e da distância que separa os dois sinais:
D·1
toff = 3,6- (4.30)
v
em que t 0 ff: offset [s];
D( distância entre os semáforos [m]; e
V: velocidade de progressão [km/h].

A Figura 4.8 serve para ilustrar o conceito de sistema progressivo. O tempo


de ciclo, c, é pré-determinado e deve ser o mesmo para todas as interseções. Nor-

I
150 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

malmente, define-se uma velocidade de progressão V tal que ela seja compatível
com o uso do solo adjacente. Note-se que se o offset for maior que o tempo de
ciclo c, como é o caso do offset do cruzamento D, pode-se dizer que o offset é
toff = toff- c. O exemplo a seguir ilustra como deve ser feita a determinação dos
offsets.

Exemplo 4.5 Considere-se o trecho mostrado na Figura 4.8, em que as distâncias dAs =
135m, dsc = 200m e dcD =280m. A via tem mão única no sentido de A para D.
Adotando-se um ciclo de 50s, com 30 s de verde efetivo para a via principal, determinar
os defasagens apropriadas para os sinais B, C, e D para que a velocidade de progressão
seja de 40 km/h.

Solução: Se c = 60 s e a velocidade de progressão é 40 km/h, a defasagem do


semáforo B em relação ao semáforo A é

135
toffs = 3,6 = 12,15 S.
40
Os offsets dos semáforos C e D podem ser determinados de maneira similar e são,
respectivamente, foffc = 30,15 se toffo = 55,35 s. Como c < t 0 ff0 , a defasagem
é toffo = 55,35 - 50 = 5, 35 s. Todos as defasagens são medidas a partir do início
do ciclo do semáforo A.

O método aqui apresentado pressupõe o uso de um ciclo igual em todas as


interseções. O Manual de Semáforos do Departamento Nacional de Trânsito 5
sugere o uso do ciclo da interseção mais crítica.

4.6 Determinação do tempo de amarelo

A função principal da indicação de amarelo depois do verde num sinal luminoso


é alertar os motoristas para o iminente surgimento da indicação de vermelho e,
assim, permitir que os que já estejam próximos da interseção possam cruzá-la com
segurança. Um má escolha do tempo de amarelo (também chamado de intervalo
entre verdes) pode provocar o aparecimento cie uma zona de dilema, que é uma área
próxima à interseção na qual um veículo não pode nem parar com segurança antes
de chegar no cruzamento e nem sair do cruzamento antes do início do vermelho
sem exceder a velocidade de aproximação.
5DENATRAN (1979). Manual de Semáforos. Departamento Nacional de Trânsito, Conselho
Nacional de Trânsito, Ministério da Justiça, Brasília, DF.
4.6 Determínação do tempo de amarelo 151

O esquema 111ostraclo na Figura 4.9 mostra como determinar a w L


existência ele uma zona ele dilema. O retângulo hachuraclo da parte
superior indica a região dentro da qual um veículo não é capaz de
parar COtn segurança sem entrar no cruzamento. 0 cornpri mento m '~''T77:7ffl'7771~~~,~ Zona de
desta zona é X 1, medido a partir do meio-fio ela via transversal. d/lema

O retângulo da parte inferior indica o limite a partir elo qual um


veículo não consegue cruzar a interseção e percorrer uma clistânci a
igual ao seu comprimento, sem aumentar sua velocidade, antes elo Fig. 4.9: Zona de clilerna num cruzamento
sinal fechar. Esse limite está localizado a uma distância X2 elo sernaforizaclo
meio-fio da transversal.
Para que a zona de di lema não exista, é preciso que esses dois limites coincidam,
ou seja, que X 1 =X 2 • Chamando o tempo mínimo de ;nnarelo ele rl)l;,, têm-se que

(4.31)

em que X 1: limite de passagem [ m];


u0 : velocidade de aproximação [m/s];
T 111 ;n: tempo mínimo de múarelo [sj;
W: largura total da transversal [m]; e
L: comprimento do veículo [mj.

Para o veículo ser capaz de parar antes ele chegar~~ interse(;ão,

(4.32)

em que X 2: limite de frenagem f 11t ];


o: tempo de percepção c reação do motorista [si; e
a: desaceleraçilo máxima de frenagem com segurança fm/s 2 ].

Para a eliminaçilo da zona de dilema num trecho plano, Ln deve ser zero, ou
seja, Lu= X1•- X2 =O. Portatlto,
)


"o<')+--
2a
W +L llo
ô+----+-. (4.33)
11(1 2(/
A literatura especializncla<í recomenda que o tempo de reaçilo adotado seja 1 se-
gundo e que a desaceleração máxima de frenagem seja 0,31 g (ou seja, 31% da
hl'line, .1. L. ( 1992). 1/·aflic F·nfiÍIII'cring flnndhook ITF/I'rcnlicc-ll:dl, Fnglewood Clills, N.l,
E liA.
152 Capítulo 11. Fluxos de veículos em interseções

i.lcelcração da gravidade ou :1,05 m/s 2 ), que é él desaceleração máxima confortável


num veículo. O valor recomendado para o comprimento médio elo veículo é 6, I 111.

Intervalos de entre verdes inferiores a :l segundos nunca são usados, para ga-
rantir a segurança viária. Por outro lado, para velocidades normais de aproximação
em zonas urbanas, não se usam intervalos entre verdes maiores que .'i segundos,
para evitar que os motoristas desrespeitem o sinal amarelo. Quando intervalos en-
tre verdes mais longos são necessários (em cruz.amentos em zonas rura~s ou com
muitos pedestres), é costumeiro usar o que se chama de "vermelho geral" além elo
tempo ele amarelo. Nesse caso, o tempo de amarelo y deve ser:

11()
.v=8+-
2a

e o tempo de vermelho total r deve ser:

,. W-t-L
llo

Exemplo 4.6 Determinar o inten•oln entre l'erdes mínimo numa arterial com l'fiocidade
de 50 kmlh. q11e é cm7arla (Jnr mas co/11 /2,5 111 dP lnrg11m.

Solução: Uma vclocicladc cl~.: .'iO km/h equival~.: a 11,89 m/s. Usm1do a expressão
da FqwH,;iío 4.1.\ pode-se calcular o tempo mínimo entre verdes:

12 . .'i+G.I 11,89
Trni 11 =I+
ll,8lJ
+- --
2.l,O.'i
= 4,G S.

Para cruzamentos em desnível, o ITE 7 propõe que a Equação 4.33 seja modi-
ficada para:
W +L llo
Trnill =r')-j- · + 2o±2gm , (4.34)
li()

em que o·
.~.
aceleração ela gravidade [9,R I m/s 2 ]; e
m: grau de declividade da r;unpa [ m/1 00 111 ].

7tTE ( 19R'1). /)erermining Vehir-11' ( "honge ln/nl'(f/s. l'roposed Rccommcndcd Prr~clicc. lnstitu!c
ofTrnnspor!alion Engincns. W:1shinglon. ll(', E\ li\.
4.7 Instalações semafóricas 153

4.7 Instalações semafóricas

Os semáforos são instalados pelas autoridades responsáveis pela operação e fisca-


lização do sistema de trânsito, conforme estabelecido pelo Código Brasileiro de
Trânsito. A decisão de instalar um semáforo deve ser sempre bem avaliada, pois
existem vantagens e desvantagens associadas ao seu uso. Quando necessário, bem
projetado, bem instalado e devidamente conservado, um semáforo pode:

• reduzir a freqüência de determinados tipos de acidentes, especialmente co-


lisões transversais;
e dar fluidez e ordem ao tráfego de veículos;
• permitir o fluxo contínuo de pelotões ao longo de uma via arterial, através
da operação coordenada de sinais luminosos;
e permitir que veículos e pedestres cruzem com segurança uma corrente de
tráfego pesado; e
e controlar o trânsito de forma mais econômica e eficiente.

Por outro lado, um semáforo desnecessário, mal projetado, mal instalado e mal
conservado pode:

e aumentar a freqüência de acidentes;


• causar atrasos excessivos e, conseqüentemente aumentar os efeitos da po-
luição atmosférica causada pelos veículos automotores;
• incentivar os motoristas a não respeitar a sinalização; e
e incentivar o uso de rotas alternativas, mais longas e que possivelmente, por
cruzarem áreas residencias, provoquem uma deterioração da qualidade de
vida em certas zonas urbanas.

Ao contrário do que comumente se diz, os semáforos nem sempre reduzem


atrasos e melhoram a segurança viária. Ainda que a instalação de sinais luminosos
seja capaz de reduzir o número de colisões em ângulo reto nos cruzamentos, um
aumento no número de colisões traseiras costuma acontecer logo após a instalação
do novo sinal, ainda que, com o passar do tempo, essas colisões tornem-se menos
freqüentes à medida em que os motoristas acostumem-se com a existência do
novo semáforo - desde que a instalação tenha sido feita com uma distância de
visibilidade suficiente. Além disso, a instalação de semáforos pode não apenas
aumentar o atraso total, mas também reduzir a capacidade da interseção. Assim
154 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

sendo, é fundamental que a instalação de um semáforo seja precedida de um estudo


técnico que verifique sua real necessidade, realizado por um técnico devidamente
habilitado. O engenheiro responsável deve pressupor que a instalação só deve ser
feita se o efeito final (benefícios vs. desvantagens) for melhorar a segurança e a
operação do cruzamento.

4. 7. 1 Estudos necessários

A decisão sobre a instalação de um semáforo deve ser baseada numa investigação


detalhada das condições físicas e de tráfego da interseção. Essa investigação deve
fornecer não os dados necessários para a utilização dos critérios que determinam
a necessidade do uso do sinal luminoso, mas também para o projeto da instalação.
Os estudos necessários 8 para a obtenção desses dados incluem:

• Levantamento de volumes de tráfego: contagens de veículos e pedestres


nas aproximações durante um período representativo das diversas condições
operacionais encontradas.
e Estudo de velocidade: determinação das distribuições de velocidades ins-
tantâneas nas aproximações.
e Levantamento plani-altimétrico: que indique a geometria e condições físicas
do cruzamento, incluindo canalizações, greides, restrições de visibilidade,
pontos de ônibus, estacionamento, entradas de veículos, etc.
• Estudo de acidentes: levantamento do número e tipos de acidentes registra-
dos no cruzamento durante pelo menos um ano e análise dos dados obtidos.
e Análise de gaps: para determinar o número e o tamanho dos gaps na via
preferencial e determinação da capacidade da via secundária, conforme dis-
cutido no item 4.8.
• Estudo de retardamento: para determinação do atraso ao longo da via prin-
cipal.

4.7.2 Critérios para verificação da necessidade de instalação

O processo para estabelecimento da necessidade (ou não) da instalação de um


semáforo num dado local é extremamente complexo e, por conseqüência, sujeito
à julgamentos não objetivos. Para facilitar o processo decisório, decidiu-se criar
Spoge do escopo deste texto a discussão dos estudos relacionados. O leitor interessado deve con-
sultar, por exemplo, o Boletim Técnico 31 da CET-SP, que indica como realizar esses levantamentos.
4.7 Instalações semafóricas 155

Tab. 4.1: Volumes mínimos para os critérios do MUTCD


Número de faixas Critério 1 Critério 2
Principal Secundária Principal 1 Secundária2 Principal 1 Secundária2
1 1 500 150 750 75
2 ou mais 600 150 900 75
2 ou mais 2 ou mais 600 200 900 100
2 ou mais 500 200 750 100
1 Total nos dois sentidos
2 No sentido mais movimentado em cada hora

Fonte: FHWA (1988). Manual on Uniform Traffic Contrai Devicesfor Streets andHighways. DcpL ofTransportation. Washington. DC. EUA

um conjunto de critérios se a instalação de um semáforo faz-se necessária. Esse


conjunto de critérios (em inglês, 'signal warrants') está descrito no Manual on
Uniform Traffic Control Devices for Streets and Highways 9 , que é mais conhecido
pela sigla MUTCD.
No Brasil, esses critérios são aplicados diretamente e o Manual de Semáforos
do DENATRAN contém uma tradução dos oito critérios estabelecidos pela edição
de 1978 do MUTCD. A edição de 1988 do MUTCD contém onze critérios, que
de acordo com o próprio MUTCD, devem ser considerados como indicativos da
necessidade de instalação. Posto de outra forma, os critérios devem ser usados de
fonna que, se nenhum dos critérios for satisfeito, certamente não existe necessidade
de instalação do semáforo; mas, a satisfação de pelo menos um critério indica que
o semáforo poderia ser instalado, se esta for a melhor alternativa disponível de
ação. Experiência profissional deve complementar o uso dos critérios que incluem
os seguintes fatores:

1. Volume veicular mínimo: esse critério deve ser aplicado quando a razão
principal para a instalação do semáforo é o volume de tráfego. O critério
é definido em função dos volumes na via principal (bidirecional) e na via
secundária (unidirecional) e do número de faixas. Se os volumes observados
forem maiores que o estabelecido para pelo menos oito das horas do dia, o
sinal pode ser instalado. A Tabela 4.1 fornece os volumes mínimos para o
critério.

2. Interrupção de fluxo contínuo: deve ser usado quando o tráfego da via


9FHWA (1988). Manual on Uniform Traffic Control Devices for Streets and Highways. U.S.
Department ofTransportation, Federal Highway Administration, Washington, DC, EUA.
156 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

secundária tem dificuldades para cruzar ou entrar no fluxo da via preferencial.


Como no caso do critério anterior, o sinal pode ser instalado se, pelo menos
em oito das horas do dia, os volumes da via preferencial (bidirecional) e da
via secundária (unidirecional) forem maiores que o valor estabelecido em
função do número de faixas de tráfego nas vias. A Tabela 4.1 fornece os
volumes mínimos para este critério.

3. Volume mínimo de pedestres: deve ser aplicado quando a razão para ins-
talação· do sinal é o volume de pedestres. O semáforo pode ser instalado
se o volume de pedestres que cruza a via principal for igual ou maior que
100 pedlh durante pelo menos quatro das horas do dia ou igual ou maior a
190 pedlh durante a hora pico. Esses limites podem ser reduzidos à metade
se os usuários da travessia forem idosos ou deficientes físicos. Além desses
limites mínimos, o número de 'gaps' adequados para cruzamento da via de-
ve ser inferior a 60 'gaps' por hora durante as horas em que os volumes de
pedestres excedem o mínimo. Se a via dispuser de um canteiro central capaz
de servir de refúgio para a travessia, a análise da distribuição e tamanho dos
'gaps' deve ser feita para cada direção separadamente 10 .

4. Cruzamento de escolares: no caso de uma travessia usada por escolares,


o critério estabelece que deve ser realizada uma análise do tamanho e da
freqüência de 'gaps' 11 . Se, durante o período em que o cruzamento é usado
pelos escolares o número de 'gaps' adequados para uma travessia segura for
menos que um por minuto, o sinal pode ser instalado. Nesse caso, deve-se
instalar uma botoeira de acionamento do sinal e o estacionamento deve ser
proibido antes e depois da travessia de pedestres.

5. Sistema de progressão semafórica: esse critério justifica a instalação de


semáforos em cruzamentos nos quais eles não seriam necessários, se a razão
para a instalação for um sistema de progressão semafórica (onda verde).

6. Histórico de acidentes de trânsito: deve ser aplicado nos casos em que uma
análise do histórico de acidentes indica que a instalação de um sinal pode
reduzir a freqüência dos acidentes observados no cruzamento. A instalação
de um sinal sob esse critério só se justifica se outras formas de controle
de acidentes (canalização, fiscalização, iluminação, sinalização, etc.) já
tiverem sido usadas sem sucesso no local.
1°Conforme discutido no item 4.8.
11 Conforme discutido no item 4.8.
4.71nstalações semafóricas 157

O critério pode ser considerado satisfeito se, nos doze meses anteriores,
ocorreram pelo menos cinco acidentes com vítimas ou danos de monta, que
poderiam ter sido evitados por um sinal luminoso e se pelo menos um dos
três primeiros critérios for satisfeito para 80% dos limites estabelecidos.

7. Sistemas (cruzamento de vias arteriais): é o critério que se aplica quando


a razão para instalação do semáforo é o cruzamento de duas vias arteriais
ou uma interseção complexa, com cinco ou mais aproximações. De acordo
com este critério, o semáforo pode ser instalado se o volume· que chega ao
cruzamento durante a hora pico num dia útil for superior a 1.000 veic/h
ou durante pelo menos cinco das 48 horas do final de semana (sábado e
domingo).

8. Combinação de critérios: caso nenhuma dos critérios anteriores seja satis-


feito, a instalação do semáforo pode ainda ser justificada se os dois critérios
iniciais sejam satisfeitos se os limites forem reduzidos para 80% dos pata-
mares mínimos.

9. Volume de quatro horas: esse critério requer o uso de gráficos fornecidos


no MUTCD, que estão mostrados na Figura 4.1 O. Deve-se obter os volumes
de tráfego das quatro horas mais movimentadas do dia (não necessariamente
consecutivas). Se o ponto obtido com o volume total dos dois sentidos da via
principal e o volume da aproximação mais congestionada da via secundária
ficar acima da curva apropriada, o critério pode ser considerado satisfeito.
Note-se que, em sendo a velocidade correspondente ao 85°percentil superior
a 60 km/h, ou estando o cruzamento situado em uma aglqmeração urbana
isolada com menos de 10.000 habitantes, as curvas usadas são diferentes e
estão mostradas no gráfico da direita na Figura 4.10.

10. Espera na hora pico: deve ser aplicado quando a razão para instalação do
sinal são esperas excessivas no cruzamento de uma via preferencial. Para
tanto, é necessário determinar os volumes na via secundária e preferencial
e o atraso total sofrido pelos veículos da via secundária durante uma hora
(quatro períodos consecutivos de 15 minutos de duração ao longo do dia).
Se a via secundária tiver apenas uma faixa de tráfego, o semáforo pode ser
instalado se a espera total for maior que 4 veic.h, o volume na aproximação
secundário for superior a 100 veic/h e o volume total que entra no cruzamento
for superior a 800 veic/h (para cruzamentos com quatro aproximações) ou
650 veic/h, para cruzamentos com três aproximações. Se existirem duas
158 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

500
v85 acima de 60 kmlh na via principal
ou
...."'
-.::
"C- 400 400 população inferior a 10.000 hab
c:ãi
::!C:
g.§
"'.ê 300 300
"'""

~r§ 200 200
E!
::1
;g 100 100

o+-~--~--r--+--~--~-+--+-~~-r--+4~ 0+---~--~--r-~--~--~---+---+~
3oo 400 soa soa 7oo 8oo soo 1000 1100 1200 1300 1400 200 400 600 800 1000
Volume da via principal Volume da via principal
(veiclh, bidirecional) (vele/h, bldlreclonal)

Fig. 4.10: Curvas para critério do volume de quatro horas

600
V85 acima de 60 kmlh na via principal
"'
;::
:§- 500
ou
população inferior a 10.000 hab
<:ro
"'c:
g ·g 400
., ~

cu'õ
>§ 300 2 ou mais faixas e
1 faixa
~:g
E~ 2oo
"'~
;g 100

o 0~~~--+-~~--+-~~--+-~~
400 600 800 1000 1200 1400 1600 1800 300 500 700 900 1100 1300
Volume da via principal Volume da via principal
(vele/h, bldlreclonal) (vele/h, bldlrecional)

Fig. 4.11: Curvas para critério do volume da hora pico

ou mais faixas de tráfego na secundária, o atraso total deve ser superior a


5 veic.h e o volume mínimo deve ser 150 veic/h.

11. Volume na hora pico: esse critério pode ser usado para verificar a necessi-
dade de instalação de semáforo em cruzamentos nos quais as condições de
tráfego durante a hora mais congestionada do dia fazem com que os veículos
da via secundária sejam submetidos a esperas excessivas para cruzar a pre-
ferencial. O processo é semelhante ao usado no critério do volume de quatro
horas, devendo-se situar os volumes observados durante a hora pico em re-
lação às curvas mostradas naFigura4.11. Note-se que existe um gráfico para
situações em que a velocidade correspondente ao 85° percentil for maior que
60 km/h ou a população da cidade for menor que 10.000 habitantes.
4.8 Análise de interseções não semaforizadas 159

4.8 Análise de interseções não semaforizadas

Num cruzamento de uma via principal com uma via secundária onde não exista
um semáforo, os veículos da via principal têm a preferência enquanto que os
veículos que chegam ao cruzamento pela via principal devem esperar por intervalos
adequados para entrar ou cruzar o fluxo preferencial. Esse tipo de cruzamento
só pode ser analisado através de modelos estocásticos, porque os intervalos entre
veículos são uma variável aleatória e devem ser representados por uma distribuição
estatística.
Considere uma alça de acesso a uma rodovia, onde veículos devem esperar um
intervalo adequado para entrar no fluxo de tráfego da rodovia. Pode-se supor que
existe um intervalo de tempo r, que é o menor intervalo entre veículos na rodovia
que permite que um veículo do acesso entre no fluxo preferencial. Esse intervalo é
denominado de intervalo crítico. Se existir uma fila de veículos desejando entrar
na rodovia por aquele acesso, toda vez que o intervalo t na corrente prioritária
satisfizer a condição t ::: r, um veículo pode entrar na rodovia.
Supondo-se que as chegadas de veículos do fluxo preferencial se dá de acordo
com uma distribuição de Poisson, a probabilidade de ocorrência de um headway
de comprimento t é igual à probabilidade de não ocorrer nenhuma chegada durante
um intervalo de tempo t:
(J....t)ne-M (J....t)Oe-M
P(n) = =} P(n =O)= = e-Àt (4.35)
n! O!

em que n: número de chegadas;


J....: taxa de chegadas [veic/s];
t: duração do intervalo [s]; e
P(n): probabilidade de ocorrência de n chegadas durante t segundos.

Como já discutido anteriormente (item 3.4), a Equação 4.35 representa a dis-


tribuição exponencial e pode ser usada para determinar o número de intervalos
adequados para manobras de entrada no fluxo principal ou de cruzamento numa
interseção não semaforizada que surgem durante um determinado período de tempo
T.
Supondo-se que T = 1 hora, e que o volume de veículos no fluxo principal seja
V, ao longo de uma hora, irão ocorrer (V - 1) intervalos entre veículos sucessivos
na corrente de tráfego principal. O número de intervalos maiores que r é dado por:
E(h::: t) =(V- l)e-À' (4.36)
160 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

e o número de intervalos menores que r é

E(h < t) = (V- 1)(1 - e-~.r). (4.37)

Exemplo 4.7 Considere-se uma rodovia cujo volume na hora pico seja 1.800 veic/h. Se
as chegadas de veículos na rodovia puderem ser representada por uma distribuição de
Poisson, e se o intervalo crítico para veículos que entram na rodovia for 3,5 segundos,
determinar o volume máximo horário de veículos que podem entrar na rodovia.

Solução: Ataxadechegadasnarodoviaé).. = 1.800/3.600 = 0,5veic/seonúmero


de intervalos maiores que 3,5 s numa hora pode ser calculado pela Equação 4.36:

E(h::: 3,5) = (1800- l)e- 0•5 · 3•5 = 1799e- 1· 75 = 312.

Este modelo para tratamento de interseções não semaforizadas tem suas limi-
tações, entre as quais pode-se citar 12 :

1. O modelo pressupõe que o intervalo crítico permanece constante ao longo


do tempo que um veículo espera para cruzar a preferencial, ao passo que ob-
servações de campo mostram que este intervalo decresce conforme aumenta
o tempo que o motorista espera na via secundária.

2. A composição do tráfego da via secundária não é levada em consideração,


já que o método pressupõe que todos os veículos necessitam do mesmo
intervalo mínimo para cruzar a via principal.

3. O método pressupõe que o tráfego na via principal não é afetado pelo tráfego
da via secundária; em muitos casos isto não é verdade, pois os motoristas tra-
fegando pela via secundária podem forçar a passagem, obrigando os veículos
da via principal a parar ou reduzir sua velocidade.

4. O modelo supõe que as chegadas na via preferencial sejam aleatórias e


que a distribuição dos intervalos entre veículos reflita esta aleatoriedade.
Na maior parte das vezes, esta suposição não é verdadeira, pois as vias
preferenciais são equipadas com semáforos que pelotizam o tráfego. Neste
caso, a existência de pelotões de veículos faz que com a distribuição de
intervalos seja substancialmente diferente da obtida através da hipótese de
chegadas aleatórias.
12 Khisty, C. J. (1990). TransportEngineering -An Introduction. Prentice Hall, Englewood Cliffs,
NJ,EUA.
Resumo 161

Resumo

e O controle de tráfego em interseções pode ser feito através de três formas: por
semáforos, por placas PARE ou DÊ A PREFERÊNCIA, ou pelas regras gerais
de circulação definidas no Código Nacional de Trânsito, que estabelecem que a
preferência, num cruzamento sem sinalização, é do veículo que vier pela direita.
e Os cruzamentos controlados por semáforos podem ser operados de forma isolada ou
coordenada. A operação é feita de forma coordenada quando interseções localizam-
se a distâncias relativamente curtas umas das outras. Nesse caso, é interessante
coordenadar os instantes de abertura e fechamento dos sinais, para melhorar a
eficiência do sistema. Interseções isoladas, isto é, distantes dos demais semáforos,
são operadas de forma independente sem que haja prejuízos para a eficiência do
sistema.
e A capacidade de urna aproximação num cruzamento sernaforizado é função do fluxo
de saturação e da proporção do tempo de verde efetivo alocada à aproximação. O
fluxo de saturação é a taxa de fluxo máxima que pode ser obtida na descarga da fila
na aproximação e o tempo de verde efetivo é a parte do ciclo que efetivamente é
usada para descarga da fila que se forma na aproximação.
e Um modelo D/D/1 pode ser usado para estudar aproximações de cruzamentos se-
rnaforizados por meio de urna abordagem determinística. As medidas de mérito,
tais corno a fila média, o tempo médio de espera e a espera total por ciclo, podem ser
usadas para estabelecer a eficiência do sistema. Numa interseção de quatro apro-
ximações, para a qual se conhece o tempo de ciclo, pode-se determinar os tempos
ótimos de verde minimizando-se a espera total na interseção, que é a sorna da espera
total por ciclo em cada aproximação. Situações em que a demanda é temporaria-
mente maior que a capacidade da aproximação também podem ser estudadas por
modelos de fila do tipo D/D/1.
e Quando se deseja tratar o cruzamento sernaforizado por meio de uma abordagem
estocástica, o método de Webster permite determinar o ciclo ótimo e os tempos
de verde efetivo que devem ser alocados a cada aproximação. O ciclo ótimo, no
método de Webster, é aquele para o qual a espera total na interseção é mínima.
e A operação coordenada de de cruzamentos sernaforizados é feita determinando-se
o "offset" (ou defasagem) na abertura dos semáforos. Dessa forma, os veículos que
viajam na velocidade estipulada só são obrigados a parar num único semáforo, já
que a velocidade de progressão do pelotão é tal que, ao chegar nos cruzamentos à
jusante, ele encontra sempre O sinal verde.
• Num cruzamento não sernaforizado, a capacidade da aproximação da via secundária
depende da ocorrência de "gaps" adequados na corrente de tráfego preferencial. É
necessário que ocorra um intervalo suficientemente longo para que um veículo da
via secundária possa cruzar ou entrar na corrente preferencial. Pode-se usar urna
distribuição exponencial para determinar a probabilidade de ocorrência de "gaps"
162 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

maiores ou iguais ao mínimo admissível e, a partir daí, determinar-se a capacidade


da aproximação.

Para aprender mais

Traffic and Highway Engineering, N. J. Garber e L. A. Hoel. West Publishing Compa-


ny, St. Paul, MN, EUA, 1988.
No capítulo 5 pode-se encontrar uma discussão sobre "gaps" e o processo de acei-
tação de "gaps"; o capítulo 6 trata, de forma clara, abrangente e detalhada, do
controle de tráfego em interseções.
Transportation Engineering - An Introduction, C. J otin Khisty. Prentice-Hall, Engle-
wood Cliffs, NJ, EUA, 1990.
O controle de fluxos em interseções é discutido no capítulo 8, de forma abrangente
e detalhada.
Principies of Highway Engineering and Traffic Analysis, F. L. Mannering and W. P.
Kilareski. John Wiley & Sons, Nova York, 1990.
Seu capítulo 5 trata do controle de tráfego em interseções semaforizadas por modelos
determinísticos de filas.
Manual de Semáforos, DENATRAN. Ministério da Justiça, Brasília, DF, 1979.
Apesar de bem antigo e de algumas imprecisões, é uma das poucas referências na
língua portuguesa que pode ser obtida com uma certa facilidade. Escrito de forma
bem didática, contém diversos exemplos e pode servir para aprender mais sobre
calibração e operação de semáforos.

Exercícios

Problema 4.1 Uma aproximação num cruzamento semaforizado tem mão única e um
volume de 900 veic/h. O fluxo de saturação é 1.440 veic/hora de verde. O tempo de ver-
melho efetivo é de 24 segundos. Usando um modelo D/D/1 para analisar essa aproximação,
pede-se:
(a) Determinar o tempo de ciclo para que a capacidade da aproximação seja igual à deman-
da (volume observado). Construa um gráfico que indique a operação da interseção,
mostrando o número acumulado de chegadas e partidas ao longo de um ciclo.
( b) Para essa condição de capacidade igual à demanda, determinar a fila máxima e média
e o tempo médio de espera sofrido pelos veículos que chegam ao cruzamento por essa
aproximação.

Problema 4.2 Na aproximação do problema anterior, optou-se por um ciclo de 75 segun-


dos, com 25 segundos de vermelho efetivo. Usando um modelo D/D/1 para analisar a
aproximação:
Exercícios 163

(a) Qual a capacidade da aproximação?


( b) Se ao final de um período de verde restar uma fila com 5 veículos, quantos ciclos
serão necessários para a operação da interseção voltar ao normal- isto é, sem que haja
transferência de fila de um ciclo para o seguinte?
(c) Demonstre graficamente que a solução obtida é a correta.

Problema 4.3 Seja um cruzamento de duas vias de mão única, controlado por um sinal
luminoso, cujo ciclo tem duração de 60 segundos. Uma das aproximações tem fluxo
de saturação de 1.500 veic/hora de verde e o volume observado nessa aproximação é de
800 veic/h. O critério usado pelo engenheiro de tráfego da prefeitura local para dimen-
sionamento de ciclos é que todas a fila formada durante o vermelho efetivo do ciclo deve
desaparecer completamente 10 segundos antes do final do verde efetivo. Supondo que a
capacidade deve ser maior que a demanda (chegadas),
(a) Use um modelo D/D/1 para determinar o maior tempo de vermelho efetivo que pode
ser usado sem que o critério seja violado e construa o gráfico de chegadas e partidas
acumuladas que represente a operação dessa aproximação.
(b) Qual é o maior volume que poderia ser atendido nessa aproximação?

Problema 4.4 Uma aluna de Engenharia Civil observa uma interseção semaforizada da
janela do seu apartamento e nota que o número máximo de veículos na fila é 8. Supondo
que o fluxo de saturação seja 1.440 veic/hora de verde e que a duração do vermelho efetivo
seja 40 segundos, use um modelo D/D/1 para determinar o ciclo mínimo necessário para
o cruzamento em questão.

Problema 4.5 Seja um cruzamento de duas vias de mão única, a principal com duas
faixas de tráfego e a secundária com uma única faixa de tráfego. Os fluxos são controlados
por um semáforo de tempo fixo, com duas fases, uma para a via principal e outra para
a secundária. Não são permitidas conversões à esquerda. O volume observado na via
principal é de 900 veic/h e na secundária, de 450 veic/h. O fluxo de saturação foi medido
no local e é 1.440 veic/hora de verde para cada faixa de tráfego. Usando um modelo
D/D/1,
(a) Calcule o grau de congestionamento para cada aproximação. Qual o significado dessa
medida de desempenho?
(b) Determine a espera total no cruzamento para ciclos de 60, 70 80 e 90 segundos de
duração. [Dica: reveja o Exemplo 4.3].
(c) Determine o tempo de verde ótimo para cada duração de ciclo.

Problema 4.6 No início de um período de vermelho, a taxa de chegadas numa aproxi-


mação de um cruzamento semaforizado é de 500 veic/h e existe uma fila de 16 veículos
que não puderam ser atendidos no ciclo anterior. Em função do final de uma partida de
futebol, o fluxo de veículos na aproximação, no entanto, cresce continuamente a uma taxa
de 100 veic/h/min- isto é, o volume é 600 veic/h depois de 1 minuto, 700 veic/h depois
164 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

de 2 minutos e assim por diante. A duração do ciclo é 60 s e o verde efetivo tem 40 s.


Usando um modelo D/D/1, determine o atraso total sofrido pelos veículos até a dissipação
da fila inicial, sabendo que o fluxo de saturação da aproximação é 1800 veiclh de verde.

Problema 4.7 O esquema a seguir mostra um cruzamento de duas avenidas, que é con-
trolado por um semáforo de tempo fixo. Deseja-se semaforizar a interseção de tal modo
que existam quatro estágios, como mostrado no esquema anterior. Os volumes observados
são os seguintes

Faixa Volume (veiclh) Faixa Volume (veiclh) Faixa Volume (veiclh)


1 499 3 499 5 335
2 338 4 338 6 189
7 79 9 115 11 37
8 105 10 217 12 519

Aproximação 2

O fluxo de saturação (por faixa) é 2.000 veiclh de verde e o tempo perdido em cada
fase é 3,5 segundos. Usando o método de Webster,
(a) determine o tempo ótimo de ciclo;
(b) determine o tempo de verde efetivo;
(c) faça a alocação do verde efetivo entre os estágios; e
( d) prepare um diagrama de tempos que mostre as indicações de cores e a duração de cada
intervalo.

Problema 4.8 Verifique se o tempo perdido usado no Problema 4.7 é razoável, analisando
o intervalo mínimo entre verdes para o cruzamento. Suponha que as faixas de rolamento
têm 3,3 m de largura, que o canteiro central tem 1 m de largura e que a velocidade nas
aproximações é 60 km/h.

Problema 4.9 Seja um cruzamento de duas arteriais de mão dupla, no qual existem faixas
exclusivas para conversões à direita e à esquerda em todas as aproximações. Nas aproxi-
mações Norte e Sul, o fluxo de saturação é de 1.440 veic/h de verde e nas aproximações
Exercícios 165

Leste e Oeste é 1.800 veic/h de verde; para os movimentos de conversão à esquerda, o


fluxo de saturação é 1.200 veic/h de verde. O tempo perdido em cada fase é 3,5 s. Os
volumes observados no período de pico são dados na tabela a seguir:

Aproximação
Movimento Norte Sul Leste Oeste
Conversões à esquerda 133 73 168 134
Em frente 420 373 563 516
Conversões à direita 140 135 169 178

Fazendo as suposições que você achar necessárias e usando o método de Webster,


(a) determine uma forma adequada de operação de um semáforo de tempo fixo no cruza-
mento, indicando as fases e os estágios;
(b) determine os intervalos entre verdes, supondo que as faixas de tráfego têm 3,5 m de
largura e que a velocidade nas aproximações Norte e Sul é 50 kmlh e nas aproximações
Leste e Oeste é 65 km!h;
(c) calibre o semáforo de acordo com essa forma de operação;
( d) calcule o atraso total para a solução proposta.

Problema 4.10 Uma via arterial unidirecional tem semáforos de tempo fixo localizados
em três cruzamentos A, B e C. Esses três sinais foram coordenados de acordo com os dados
mostrados na tabela a seguir:

Interseção Verde Amarelo Vermelho Offset Distância de A


A 40 s 5s 35 s Os
B 50s 5s 25 s 40 s 600m
c 35 s 5s 40 s 10 s 1.500 m

Se a velocidade de progressão desejada é 50 km/h, pede-se:

(a) Determinar a largura da banda verde existente, considerando o efeito da utilização


ou não do tempo de amarelo. Usar um diagrama espaço-tempo para demonstrar as
soluções obtidas.
(b) Para o sistema unidirecional, determinar se é possível aumentar a largura da banda
verde alterando os offsets de O, 40 e 1Os para 1O, 60 e 20 s, respectivamente. Construa
um diagrama espaço-tempo que represente a nova forma de operação do sistema.

Problema 4.11 Usando um programa como o MS-Excel, construa uma planilha eletrônica
que calcule a largura da banda verde a partir de dados como o número de cruzamentos,
a distância entre cruzamentos, os offsets, os tempos de verde, amarelo e vermelho e a
velocidade da corrente.
166 Capítulo 4. Fluxos de veículos em interseções

Problema 4.12 Ao longo de trecho de 2,4 km de uma via arterial, os cruzamentos estão
separados de 300 m, medidos a partir do centro da interseção. Admitindo-se uma velo-
cidade de progressão de 50 km/h, pede-se determinar os offsets para cada cruzamento,
supondo que a via tenha mão única.
Capítulo 5

Análise da capacidade e nível


de serviço de vias

Este capítulo apresenta os principais conceitos ligados à capacidade e ao


nível de serviço de vias de transporte. Enquanto a capacidade de um compo-
nente do sistema de transporte reflete sua capacidade de acomodar tráfego,
o nível de serviço indica a qualidade do fluxo. Discute-se inicialmente a
importância e as aplicações da análise de capacidade e nível de serviço. A
seguir, apresenta-se uma discussão da capacidade de tráfego de ferrovias e
os fatores que mais influem sobre ela. O Highway Capacity Manual (HCM),
que estabelece os procedimentos para análise de capacidade e nível de ser-
viço de rodovias, é apresentado e discute-se a concepção geral do processo
de análise de capacidade e nível de serviço nele propostos. O capítulo ter-
mina discutindo a aplicação do método do HCM para análise da capacidade
e nível de serviço de auto-estradas.

A capacidade de um componente do sistema de transporte reflete sua capaci-


dade de acomodar uma corrente de pessoas ou veículos e pode ser encarada como
uma medida da oferta. O nível de serviço é uma medida da qualidade do fluxo.
Normalmente, quanto menor o fluxo de veículos ou pessoas, melhor o nível de
serviço; à medida em que o fluxo aumenta, o nível de serviço diminui. Estimativas
de capacidade e nível de serviço são necessárias para o J>lanejamento, projeto e
administração dos sistemas de transporte. A análise da capacidade e do nível de
serviço de instalações e componentes do sistema de transporte permite responder
questões tais como:
168 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

e Qual a qualidade de serviço nos períodos de pico e qual o nível de crescimento


do tráfego que pode ser suportado pelo sistema nas condições atuais?
e Qual o nível de oferta necessário para acomodação de um determinado nível
de fluxo de veículos ou pessoas?
• Quantas faixas de tráfego são necessárias para atender aos volumes médios
diários de tráfego numa auto-estrada ou via arterial?
• Qual o tipo de rodovia ou via urbana atende satisfatoriamente a demanda
gerada por um novo empreendimento imobiliário?
e Quantos veículos são precisos para transportar o :fluxo de passageiros na
direção de pico, no ponto de carregamento máximo, e será que as vias e
estações existentes são capazes de suportar esse volume de veículos?

Fundamentalmente, a análise de capacidade e nível de serviço fornece subsídios


para quatro tipos diferentes de atividade relacionadas à Engenharia de Transportes:

1. A determinação da oferta, ou seja, do dimensionamento da capacidade do


sistema, quando se planeja a construção de novas instalações ou componen-
tes do sistema de transporte ou quando se planeja a expansão das instalações
ou componentes já existentes.
2. As características operacionais e o nível de serviço de instalações ou com-
ponentes já existentes devem ser avaliados quando se pretende implementar
melhorias no sistema, seja por meio da construção de novas instalações ou
pela alteração de procedimentos operacionais.
3. Quando se faz análise dos impactos ambientais de novos empreendimentos
imobiliários, a análise de capacidade e nível de serviço serve para identificar
os impactos no trânsito e no sistema de transporte público, bem como ajuda
a determinar a responsabilidades pelos custos associados à mitigação desses
impactos.
4. Estudos rotineiros de capacidade e nível de serviço servem para caracterizar
as condições de operação do sistema de transporte e fornecem subsídios
para o desenvolvimento de políticas de transporte e para a determinação de
tarifas, consumo de combustível, emissões de poluentes, níveis de ruído, etc.

Ainda que a análise de capacidade e nível de serviço seja imprescindível em qual-


quer modalidade de transporte, o transporte rodoviário é o que dispõe de metodo-
logia mais sofisticada para tanto. Os procedimentos para estimação da capacidade
5.1 Capacidade de tráfego de vias férreas 169

e nível de serviço de rodovias estão reunidos num manual publicado pelo Trans-
portation Research Board, o Highway Capacity Manual 1 , mais conhecido pela
sigla HCM. Em virtude das limitações de espaço e dos objetivos deste texto, serão
abordados apenas os métodos para a determinação da capacidade e nível de serviço
de ferrovias e rodovias de pista dupla.

5. 1 Capacidade de tráfego de vias férreas

Entende-se por capacidade de tráfego de um segmento de uma ferrovia o número


de trens que podem circular pelo segmento num determinado intervalo de tempo -
normalmente, 24 horas. A capacidade de um trecho de ferrovia é determinada, na
maior parte das vezes, a partir do diagrama espaço-tempo, que pode ser construído
tanto a partir dos tempos reais de viagem como estimado a partir das velocidades
de equilíbrio do trem em cada trecho.
No regime de licenciamento a intervalos de espaço, como é o caso dos sistemas
de 'staff' elétrico ou de sinalização por blocos, um trem não pode partir de uma
estação (ou sinal) antes que o precedente tenha atingido a estação ou sinal de
bloqueio seguinte, pois dois trens nunca podem ocupar simultaneamente o mesmo
trecho ou bloco. Por conseguinte, a capacidade de um segmento depende do tempo
gasto para percorrer cada bloco ou trecho entre estações.

5.1.1 Capacidade de vias férreas com tráfego unidirecional

A capacidade de uma via férrea com tráfego num único sentido, como a mostrada
na Figura 5.1 é calculada a partir do intervalo mínimo entre trens, o headway
mínimo. Como visto no item 3.102 , num trecho unidirecional, a separação mínima
entre dois trens consecutivos é dois blocos, nos ramais ferroviários normais, ou três
blocos, nos metrôs. A Figura 5.1 mostra dois trens viajando com a menor separação
possível- no caso, dois blocos. Quando os trens estão operando à menor separação
permitida, não é possível aumentar o volume de tráfego sem infringir as regras de
operação. Esta condição corresponde à capacidade do trecho.
O headway mínimo entre trens que operam num trecho onde o comprimento
dos blocos e a velocidade dos trens são constantes, depende do comprimento
dos blocos, do tamanho da composição, da velocidade de operação e da folga
1TRB (2000). HCM2000: Highway Capacity Manual. Transportation Research Board, National
Research Council, Washington, DC, EUA.
2Veja pág. 119.
170 Capítulo 5~ Análise da capacidade e nível de serviço de vias

Trem1 Trem2

fs t4
Tempo

Fig. 5.1: Diagrama espaço-tempo para tráfego Fig. 5.2: Distância limitativa num trecho
ferroviário unidirecional unidirecional de ferrovia

para garantir a segurança da operação. Essa folga é determinada pela distância


percorrida pelo trem enquanto o condutor decide se deve continuar ou acionar os
freios, já que o trem deve ser freado se o sinal estiver fechado ou se o condutor não
conseguir enxergar um sinal aberto ao passar pelo ponto de decisão. O headway
mínimo pode ser calculado pela expressão:

hml
·n = 2ds +L +dt
V X 60, (5.1)

em que hmin: headway mínimo de tempo [min];


d8 : comprimento do bloco [km];
L: comprimento da composição [km];
d1 : distância de decisão [km]; e
V: velocidade de operação [kmlh].

Observando-se o diagrama espaço-tempo da Figura 5.1, pode-se perceber como a


Equação 5.1 foi obtida. Sabendo-se que um trem só pode entrar num bloco quando
a traseira do trem precedente sai do segundo bloco a sua frente, o espaçamento
mínimo entre dois trens é a soma dos comprimentos dos dois blocos (d8 ), do
comprimento do trem (L) e da distância mínima de segurança d1 . O 'headway'
mínimo pode ser calculado dividindo-se o espaçamento mínimo pela velocidade.
5.1 Capacidade de tráfego de vias férreas 171

A capacidade téorica da linha pode então ser calculada po~:


60
Cr = TJ-h. ; (5.2)
mm

em que c1 : capacidade teórica da via [trens/h];


hmin: 'headway' mínimo [min]; e
rr coeficiente de redução, que varia entre 0,6 e 0,8, de acordo com
a eficiência da empresa.

Num trecho onde o licenciamento é feito pelo 'staff' elétrico e a distância


entre estações não é constante, o 'headway' mínimo é determinado pela maior
distância entre estações, a distância limitativa do trecho, como mostra o diagrama
espaço-tempo da Figura 5.2. Pode-se notar que as distâncias entre os postos de
licenciamento A, B e C são diferentes. Considerando-se que o trem 1 passa pelo
posto A no instante t 1 e pressunpondo-se que todos os trens trafeguem na mesma
velocidade, o trem 2 poderia deixar a estação A no instante t2 , mas, chegando em
B, seria forçado a esperar até t4 , quando o trem 1 chega em C, liberando o trecho.
Isso demonstra que, apesar de o trem 2 poder partir a qualquer instante entre t2
e t 3 , a capacidade do trecho é função da distância limitativa d2 . Nesse caso, o
'headway' mínimo é:
d
hmin = -; (5.3)
v
em que d: distância limitativa [km]; e
V: velocidade [kmlh].

A capacidade teórica do trecho, em termos do número de trens que podem trafegar


pela seção em um dia, pode ser calculada por:
24 v
C1 = TJ - - = 24 TJ - , (5.4)
hmin d
emqueacapacidadetéoricaédadaem [trens/dia]. As Equações 5.1 e5.2 podem ser
facilmente modificadas pelo leitor para refletir a situação em que o comprimento
dos blocos não é constante.

Exemplo 5.1 Determinar a capacidade teórica de um trecho unidirecional no qual ope-


ram trens de 500 m de comprimento médio, a uma velocidade constante e igual a 45 kmlh,
e onde os blocos têm 4 km de extensão.
3Brina, H. L. (1982) Estradas de Ferro. Livros Técnicos e Científicos Editora, Rio de Janeiro,
v. 2, p. 198.
172 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

Solução:Se a distância mínima de decisão for de 200 m, o headway mínimo é:


2 X 4 + 0,5 + 0,2 X
h min = 60 ::::}
45
hmin = 11,6min.
Adotando-se um fator de eficiência de 0,7, a capacidade teórica do trecho seria:
60
cr = 0,7-- = 3,62 trens/hora
11, 6
ou cerca de 86 trens/dia.

Dessas considerações, pode-se concluir que a capacidade de um trecho pode ser


melhorada aumentando-se a velocidade dos trens ou reduzindo-se o comprimento
dos segmentos entre os pontos de licenciamento. Disso, pode-se deduzir que
é vantajoso criar segmentos cujo tempo de percurso seja, além de constante, o
menor possível.
Com relação ao tempo de percurso constante, viu-se que o 'headway' mínimo
é determinado pelo tempo gasto para percorrer o maior segmeJJto. Na verdade,
como a velocidade não é constante, mas depende do perfil longitudinal da linha,
os segmentos devem ter comprimentos tais que o tempo de percurso em todos eles
seja constante. Ou seja, num trecho onde exista uma rampa íngreme, que obrigue
uma redução na velocidade dos trens, o segmento deve ter comprimento menor,
para que o tempo de percurso não seja maior que nos demais segmentos do trecho.
Com relação ao efeito da redução do tempo de percurso sobre a capacidade,
pode-se perceber o aumento na capacidade que a utilização do sistema de sina-
lização por blocos traz, em função da redução do comprimento dos segmentos
entre pontos de licenciamento. Num trecho no qual o licenciamento é feito pe-
lo 'staff' elétrico, os trens viajam de uma estação para a seguinte, e as estações
são espaçadas de algumas dezenas de quilômetros, já que o custo de operação
de uma estação é relativamente alto. Num trecho em que o licenciamento se faz
por meio de sinalização por blocos, o comprimento médio dos blocos é de apenas
alguns quilômetros, já é possível subdividir o trecho entre duas estações em diver-
sos blocos, pela instalação de sinais luminosos. Veja que se a distância entre as
estações B e C, na Figura 5.2, for dividida pela metade, com a instalação de um
sinal de bloqueio, a capacidade do trecho dobra.

Efeito de trens com velocidades diferentes sobre a capacidade

Um pressuposto básico usado na determinação da capacidade teórica pelas Equa-


ções 5.1 e 5.2 é que a velocidade de todos os trens é constante. Se o trecho é usado
5.1 Capacidade de tráfego de vias férreas 173

1. Trem veloz aproxima-se do trem lento Direção do movimento


~~veJ ~::nk'--....,.:;d:-' Desvio F bloco ==1
2. Trem lento pára no desvio Trem veloz em movimento
I I k::/EientoparnJ

Tempo

Fig. 5.3: Demonstração esquemática da manobra de ultrapassagem Fig. 5.4: Diagrama espaço-tempo da
manobra de ultrapassagem

por trens que operam em velocidades diferentes, isso causa uma grande redução
na capacidade de tráfego, em função das manobras de ultrapassagem.
Na Figura 5.3, faz-se uma representação esquemática da manobra de ultrapas-
sagem de um trem. mais lento (por exemplo, um trem de carga) por um trem mais
rápido, como um trem de passageiros. Para que isso seja possível, é preciso que
existam desvios ou pátios ao longo da linha, nos quais o trem mais lento entra e
espera até ser ultrapassado pelo trem mais veloz. No primeiro esquema da Figu-
ra 5.3, têm-se o trem mais lento à frente do trem mais veloz; para que seja possível
a ultrapassagem, o trem mais lento entra no desvio e espera pela passagem do trem
mais veloz, como mostrado no segundo esquema da figura. Após a passagem do
trem mais veloz, o trem mais lento volta para a linha e prossegue sua viagem, como
indica o terceiro esquema da Figura 5.3.
Numa manobra de ultrapassagem, o trem mais lento sempre é submetido a um
atraso, que inclui o tempo para entrar e sair do desvio e o tempo gasto parado, à
espera da passagem do trem mais veloz. Esse atraso pode ser visto no diagrama
espaço-tempo da Figura 5.4, que representa graficamente a manobra de ultrapas-
sagem. O Exemplo 5.2 discute o efeito da operação de trens com velocidades
diferentes sobre a capacidade de um trecho, como pode ser visto nos diagramas
espaço-tempo da Figura 5.5.

Exemplo 5.2 Seja um trecho de ferrovia com linha dupla e tráfego unidirecional, no qual
trafegam trens de carga, que viajam a 60 kmlh, e trens de passageiros, que viajam a 90 km/h.
No trecho, existem desvios espaçados de 10 km, que podem ser usados para as manobras
de ultrapassagem. Determinar, inicialmente, qual a capacidade da linha supondo que ela
só seja usada por trens de carga. Segundo as regras de operação da empresa, os trens
sendo ultrapassados entram no desvio 5 minutos antes da ultrapassagem e saem do desvio
174 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

ISO~~~~~~~~~~~~~~~
..
~ 60~~~~~~~~~~~~~~~~
.,
:5
õ 40~~~~~~~~~~~~~~~~

~ ~ ~ 120
Tempo (min) Tempo (min)
Fig. 5.5: Efeito da diferença nas velocidades dos trens sobre a capacidade (Ex. 5.2)

5 minutos depois da ultrapassagem. Admitindo que exista um trem de passageiros por


hora e que os trens de passageiro têm prioridade sobre os de carga, determinar a redução
da capacidade causada pela operação mista.

Solução: A capacidade teórica do trecho, para trens viajando a 60 km/h, pode ser
calculada a partir do headway mínimo. No caso, se a velocidade é 60 km/h e os
desvios estão espaçados de 10 km, o headway mínimo é 10 minutos. A capacidade
teórica, supondo que apenas trens de carga usem o trecho é:

60 60
Ct = 17-- = - = 6 trens/h,
hmin 10

admitindo-se, por simplicidade, que 17 = 1. O diagrama espaço-tempo da esquerda


da Figura 5.5 mostra o trecho operando na sua capacidade teórica.

A partir do diagrama espaço-tempo da operação na capacidade teórica, pode-se


construir o diagrama espaço-tempo da operação mista, que é mostrado à direita, na
Figura 5.5. Pode-se notar que existe uma redução de 6 para 5 no número de trens
de carga por hora. Essa redução fica maior, se a diferença entre as velocidades dos
dois tipos de trem aumentar.

Como ilustra o Exemplo 5.2, a operação de trens de velocidades diferentes pro-


voca uma redução considerável na capacidade, sendo que, quanto maior a diferença
entre velocidades, maior a redução na capacidade de tráfego do trecho.
5.1 Capacidade de tráfego de vias férreas 175

5. 1.2 Capacidade de vias férreas com tráfego bidirecional

Para que seja possível operar trens nos dois sentidos num trecho ferroviário de
linha singela, é preciso que existam desvios ou pátios de manobra ao longo da
linha para que possa ocorrer o cruzamento de trens. Esses desvios são trechos de
linha dupla, conectados à linha principal por aparelhos de mudança de via.
Corno pode ser visto na Figura 5.6, os desvios possibilitam a solução de confli-
tos entre trens que viajam em direções opostas, já que o trem de menor prioridade
pode ser retirado da linha para permitir a passagem do trem de maior prioridade.
Na maioria dos troncos ferroviários, os desvios são espaçados entre 10 e 15 km e
têm uma extensão tal que possam acomodar pelo menos um comboio.
A Figura 5. 7 mostra um esquema da operação de uma
ferrovia de linha única com trânsito nas duas direções. No
primeiro diagrama, todos os trens estão em movimento; na
o
segunda parte, os trens movendo na direção de menor priori- ;r
c.
dade (no caso, de leste para oeste) entram nos desvios e espe- ~
ram pela passagem dos trens de maior prioridade; no terceiro
diagrama, todo os trens voltam a mover-se.
Corno pode ser visto no diagrama espaço-tempo da Figu- Fig. 5.6: Solução de conflito entre trens por mano-
ra 5.6, o trem que entra nos desvios é submetido a atrasos por brade cruzamento
causa da baixa velocidade de manobra e do tempo de espe-
ra para liberação da linha pelo trem prioritário. No entanto, comparando-se os
diagramas espaço-tempo das Figuras 5.4 e 5. 7, pode-se perceber que os atrasos de-
vidos às manobras de cruzamento são sempre menores que os atrasos sofridos em

1. Todos os trens estão em movimento


+ ~ Trem3... ~ ...

I~1, 1! ek._-:::----1~~~\. . ____71 ~k------~1~ I


"'-.....----. desvio~
2. Trens pares entram nos desvios e esperam
Trem5+

k=/1
Trem2 Trem4
3. Todos os trens estão em movimento
+ ...
Ie 1, 1! ~ k.______71 ~ k. . .____71 e
~ ~ ~

1\. . .___,71 ~ 1
Fig. 5.7: Esquema de operação de um trecho ferroviário com tráfego bidirecional
176 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

Estação
B

Tempo
Fig. 5.8: Trecho com tráfego bidirecional operando na capacidade

manobras de ultrapassagem, o que serve para ressaltar o impacto que a diferença


de velocidade entre os trens tem sobre a capacidade do trecho.
O diagrama espaço-tempo da Figura 5.8 mostra a operação de um trecho de
ferrovia com tráfego bidirecional que opera com o maior número possível de trens,
o que é feito de acordo com o esquema mostrado na Figura 5.7. O leitor pode
notar que existem pares de trens cruzando-se em desvios alternados, e que não é
possível incluir mais nenhum trem entre dois trens consecutivos sem que ocorra
um conflito que só poderia ser resolvido com um dos trens retomando para um
desvio.
A cons~ção de um diagrama espaço-tempo, como o da Figura 5.8, é feita
com base nas prioridades de cada trem, que são estabelecidas pelos operadores do
sistema. As prioridades levam em conta fatores corno o tipo de trem, as carac-
terísticas da linha, etc. Numa ferrovia como a Estrada de Ferro Carajás, os trens
carregados, que viajam da mina para o porto, têm prioridade sobre os trens vazios.
É comum que os trens mais rápidos tenham prioridade sobre os trens mais lentos,
e que trens de passageiro tenham prioridade sobre trens de carga.
Para a construção do gráfico, inicialmente colocam-se os trens de maior priori-
dade que, na Figura 5.8, têm numeração ímpar. Como a linha opera na capacidade,
o 'headway' entre dois trens consecutivos que viajam de A para B corresponde ao
tempo necessário para viajar a separação mínima que, no caso, é dois blocos, co-
mo pode ser percebido observando-se a segunda parte da Figura 5.7. Uma vez
colocados os trens de maior prioridade, os trens de menor prioridade podem ser
colocados no gráfico. No caso do gráfico da Figura 5.8, a velocidade desses trens
é ligeiramente superior à velocidade dos trens de maior prioridade; essas veloci-
dades foram determinadas pela mecânica da locomoção dos trens. Pode-se notar
que existe um intervalo entre a chegada de um trem a uma estação e a partida do
5.1 Capacidade de tráfego de vias férreas 177

trem seguinte e que o mesmo ocorre num desvio; esse intervalo é estabelecido para
aumentar a segurança do sistema e é usado para operações tais como a conferência
da cauda, mudança de chaves, etc. Nos desvios, o trem de prioridade menor deve
chegar ao desvio um certo tempo antes da passagem do trem de maior prioridade
e só retoma para a linha um certo tempo depois da passagem do outro trem.
A capacidade do trecho corresponde ao inverso do 'headway' mínimo entre
trens viajando na mesma direção. Observando-se a Figura 5.8, pode-se notar que
o 'headway' mínimo é a soma do tempo necessário para um trem ímpar viajar
entre dois desvios, mais o tempo necessário para um trem par viajar entre os dois
desvios, mais um tempo de folga Ou seja, a capacidade teórica de um trecho com

~
operação nos dois sentidos é:

(5 5) Thm~

·~-···-
~
.

em que capacidade teórica numa direção [trens/hora]; !

t--···-
"T~m?O
tempo de viagem entre desvios na direção prioritária [h]; 3. Redução de velocidade e

tP: tempo de viagem entre desvios na outra direção [h]; e


!7~
e-.. .
t1 : tempo total de folga nos cruzamentos de trens [h].
Tompo
4. Redução de velocidade. Jncapacltação de
A Equação 5.5 revela uma característica importante da capacidade de trechos
~- ~~~
!~
ferroviários com linha singela: a capacidade da linha é inversamente proporcional
ao tempo de viagem entre desvios. Se for preciso aumentar o número máximo
de trens, é necessário reduzir o tempo total de viagem entre desvios. Mais ainda, Tempo

pode-se perceber que é possível identificar os trechos de estrangulamento na linha, Fig. 5.9: Efeito da falta de
que são aqueles para os quais a soma dos tempos de viagem nos dois sentidos e manutenção da via sobre a ca-
do tempo total de folga é máxima Pode-se também notar que qualquer redução pacidade
da velocidade dos trens afeta a capacidade do ramal, como será visto a seguir.

5.1.3 A manutenção da via permanente e a capacidade

Num trecho de linha singela saturado, isto é, que opera na capacidade, têm.:se pares
de trens se cruzando em desvios alternados, como se mostra no primeiro diagrama
espaço-tempo da Figura 5.9. A partir desse diagrama, pode-se analisar o efeito
que a qualidade da manutenção da via permanente tem sobre a capacidade de um
trecho ferroviário.
A deterioração da via, por falta de manutenção apropriada, força a emissão
de uma ordem temporária de redução de velocidade, para evitar a ocorrência de
178 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

descarrilamentos. Supondo-se que isso ocorra para o bloco central do trecho


representado na Figura5.9, o segundo diagrama espaço-tempo mostra a redução
no fluxo de trens que é causada pela ordem de redução de velocidade.
Se, além da redução de velocidade, um dos desvios fica incapacitado tempora-
riamente em razão da falta de manutenção preventiva, o efeito sobre a capacidade
do trecho é. ainda maior, como se mostra no terceiro diagrama espaço-tempo da
Figura 5.9. Pode-se notar que a impossibilidade de usar o segundo desvio causa
urna redução adicional no número de trens. Finalmente, pode-se perceber o efeito
de urna interrupção temporária da linha sobre a capacidade.

5.2 O HCM: capacidade e nível de serviço de rodovias

Numa ferrovia, o fator preponderante para a determinação da capacidade é o 'head-


way' mínimo entre veículos que, por sua vez, depende dos tempos de viagem.
Isso acontece porque, em função do sistema de controle de tráfego usado nas
ferrovias, os trens raramente trafegam próximos uns dos outros e a sua velocidade
depende exclusivamente das características da via e do trem. No caso do transporte
rodoviário, a velocidade dos veículos é afetada pela densidade da corrente de
tráfego, conforme estudado no Capítulo 3. Por isso, além da capacidade, que
é a maior taxa de fluxo de tráfego que pode ser suportada pela via, é também
importante determinar o nível de serviço, ou seja, as condições encontradas pelos
usuários.
Os conceitos de capacidade e nível de serviço estão descritos no Highway
Capacity Manual 4 ou, para maior simplicidade, o HCM, que poderia ser traduzido
para português corno Manual de Capacidade Rodoviária. O HCM é a referência
básica para o estudo da capacidade e do nível de serviço de componentes do sistema
de transporte rodoviário. Elaborado para ser usado ao estudo da capacidade e nível
de serviço de rodovias dos EUA, o HCM tem ampla aceitação em todo o mundo,
apesar de existirem outros manuais que também fornecem procedimentos válidos
para a análise de componentes específicos do sistema viário, tais corno os manuais
canadense5 e australiano 6 para análise e calibração de semáforos. A utilidade e a
facilidade para usar os procedimentos que aparecem no HCM tomaram-no, sem a
4 TRB (2000). HCM2000: Highway Capacity Manual. Transportation Research Board, National
Research Council, Washington, DC, EUA.
5 Teply, S. ( 1984). Canadian Capacity Guide for Signalized lntersections. University o f Alberta
and Canadian Institute ofTransportation Engineers. Edmonton, Alberta, Canadá.
6Akcelik, R. (1981 ). Traffic Signals: Capacity and Timing Analysis. ARR Report 123, Australian
Road Research Board. Victoria, Austrália
5.2 O HCM: capacidade e nível de serviço de rodovias 179

menor dúvida, o maior best-seller no campo da Engenharia de Transportes, tendo


sido traduzido para diversas línguas.

5.2. 1 A evolução do Híghway Capacíty Manual

A primeira edição do HCM foi publicada nos EUA em 1950, fruto de um esforço
conjunto do Comitê de Capacidade Rodoviária do Highway Research Board, um
órgão de pesquisas mantido pelo National Research Council dos EUA, e do Bu-
reau of Public Roads, um órgão da administração federal americana. A edição de
1950 do HCM teve origem em dois artigos publicados na revista Public Roads7 e
apresentava definições de termos-chave, uma compilação de fluxos máximos ob-
servados e procedimentos para análise de trechos com fluxo contínuo, interseções
semaforizadas, áreas de entrelaçamento ('weaving areas') e pontos de acesso a
rodovias ('ramps').
A segunda edição do HCM8 foi editada em 1965, pelo HRB. Na edição de
1965, que trouxe alterações significativas em relação à de 1950, o manual tomou
a forma atual e introduziu o conceito de nível de serviço.
Em 1985, a terceira edição do HCM foi publicada pelo Transportation Research
Board (sucessor do HRB) e introduziu procedimentos para análise de componentes
do sistema de transporte rodoviário que não rodovias e ruas, bem como refinamen-
tos no conceito de nível de serviço. Junto com o manual impresso, foi também
publicada uma implementação dos procedimentos propostos num software para
microcomputadores, o HCS ('Highway Capacity Software'). A edição de 1985 do
HCM passou por duas revisões significativas: em 1994, quando 8 dos 14 capítulos
do manual foram atualizados, e em 1997, quando foram feitas revisões em 9 dos
seus 14 capítulos.
A edição de 2000 do HCM, que substitui todas as anteriores, representa uma
expansão e revisão significativa do manual. O HCM2000 contém 31 capítulos,
dividos em cinco partes: (I) Visão Geral, (II) Conceitos, (III) Métodos, (IV) Aná-
lise de corredores e áreas, e (V) Simulação e outros modelos. A primeira parte
introduz conceitos de fluxo de veículos inerentes à análise de nível de serviço e
capacidade e discute como o HCM e os resultados de sua aplicação devem ser
usados. A Parte II apresenta os conceitos usados e valores básicos adotados para
7Normann, O. K. e Walker, W. (1949). Highway capacity: practical applications of research.
Public Roads, v. 25, n. 10, p. 201-234e v. 25, n. 11, p. 237-277.
8HRB (1965). Highway Capacity Manual. Special Report 87, Highway Research Board, Natio-
nal Research Council, Washington, DC, EUA.
180 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

o desenvolvimento dos métodos mostrados na Parte ill. A Parte ill apresenta os


métodos usados para avaliação do desempenho, da capacidade e do nível de serviço
para os diversos componentes, conforme mostra a Tabela 5.1. A Parte N fornece
indicações e técnicas para a análise de sistemas mais amplos, que incorporam di-
versos componentes viários, tais corno corredores viários. A Parte V discute o uso
de outros modelos para estudos mais detalhados de desempenho, nível de serviço
e capacidade. Urna novidade lançada com a edição de 2000 do HCM é a versão
em CD-ROM, que inclui tutoriais e videoclipes para melhorar a compreensão de
alguns dos conceitos e elos de hipertexto conectando o texto e o glossário.
Ao longo das suas quatro edições e mais de 50 anos de idade, O HCM tem
acompanhado a evolução do conhecimento sobre capacidade de rodovias. Baseado
inicialmente nos resultados dos estudos pioneiros de O. K. Normann e William
Walker, na década de 40, as edições e revisões mais recentes passaram a incorporar
descobertas e resultados de pesquisas obtidos por pesquisadores espalhados pelo
mundo, o que pode explicar sua grande aceitação e uso fora dos EUA.

5.2.2 Objetivos e organização do HCM

Os procedimentos apresentados no HCM servem para a estimação da capacidade


e da qualidade do serviço encontrada em elementos individuais do sistema de
transporte rodoviário e foram estabelecidos com base em estudos conduzidos nos
últimos 50 anos, refletindo basicamente a experiência norte-americana. O manual
divide os procedimentos para a análise da capacidade em diversos níveis, chamados
de operacional, de projeto e de planejamento, para rodovias e vias urbanas, para
sistemas de transporte público de passageiros, e para vias de pedestres e bicicletas.
O HCM classifica os componentes do sistema de transporte rodoviário em
dois tipos: os que apresentam fluxo contínuo de tráfego e os que apresentam
fluxo interrompido. Fluxo contínuo de tráfego implica que não existe dispositivos
(tais como semáforos) que interrompem periodicamente a corrente de veículos no
componente e as condições de tráfego apresentadas são resultantes das interações
entre os veículos na corrente de tráfego e as características geométricas e ambientais
da via. Nos componentes que apresentam :fluxo interrompido, existem dispositivos
de controle (tais como semáforos, sinais de parada obrigatória, etc.), que forçam a
parada completa ou urna redução significativa na velocidade da corrente de tráfego,
a despeito da intensidade do tráfego.
Fluxo contínuo e fluxo interrompido descrevem o tipo de fluxo de tráfego
encontrado no componente, e não a qualidade do :fluxo num dado instante. Assim
5.3 Capacidade e nível de serviço de rodovias 181

sendo, uma auto-estrada na qual existe um grave congestionamento que força a


interrupção do fluxo de veículos continua sendo um componente de fluxo contínuo,
pois o congestionamento é devido à intensidade do fluxo de tráfego.
As 'freeways'- isto é, auto-estradas com acesso controla-
do e limitado- apresentam a forma mais pura de fluxo contí-
nuo; as rodovias de pista dupla e pista simples também apre- Tab. 5.1: Os capítulos da Parte III (Métodos) do
HCM2000
sentam fluxos contínuos se existem trechos longos (pelo me-
nos 3 km) entre interseções e semáforos; se os trechos entre Cap. Assunto
semáforos tiverem menos de 3 km, deve-se usar o procedi- 15 Ruas e vias urbanas
mento para análise de vias urbanas, nas quais os fluxos são 16 Interseções semaforizadas
interrompidos. 17 Interseções não semaforizadas
18 Pedestres
A Tabela5.1 mostra os capítulosdaParteilldoHCM2000, 19 Bicicletas
que estabelecem os procedimentos para avaliação do desem- 20 Rodovias de pista simples
penho, do nível de serviço e da capacidade. A estrutura bá- 21 Rodovias de pista dupla
22 Componentes de 'freeways'
sica desses capítulos compreende quatro partes: introdução,
23 Segmentos básicos de 'freeways'
metodologia, procedimentos para aplicação e exemplos de 24 Zonas de entrelaçamento de 'freeways'
cálculo. A introdução descreve as características do compo- 25 Alças de acesso e saída
nente e os conceitos e a filosofia do procedimento usado; a 26 Conexões de 'freeways' com arteriais·
metodologia apresenta os componentes do procedimento, in- 27 Transporte público
cluindo equações, tabelas e gráficos usados para os cálculos. Fonte: HCM2000: Highway Capaciry Manual. TRB. NRC. Washington. DC.
Os procedimentos para aplicação apresentam instruções para EUA. 2000.

aplicação, passo a passo, do procedimento para análise da ca-


pacidade e nível de serviço. Os exemplos de cálculo incluem
situações que exploram a aplicação dos procedimentos, mostrando todos os cál-
culos necessários e discutindo e interpretando os resultados obtidos. A estrutura
dos capítulos foi estabelecida de modo a facilitar o uso do manual, permitindo que
seus usuários aprendam rapidamente a utilizá-lo de modo eficiente. Infelizmente,
ainda não existe uma versão do HCM em português e adaptada para as condições
brasileiras, o que exige que a versão original, em inglês, seja usada.

5.3 Capacidade e nível de serviço de rodovias

A análise de capacidade e nível de serviço visa estimar os fluxos de tráfego que um


componente viário pode suportar dentro de uma gama predefinida de condições
operacionais, por meio da aplicação de um conjunto de procedimentos claramente
estabelecidos. O objetivo principal de uma análise de capacidade é estimar a
taxa de fluxo máxima de pessoas ou veículos que pode ser suportada por um
182 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

trecho de rodovia. Entretanto, visto que as condições operacionais que ocorrem


próximo da capacidade são muito ruins, nunca se planeja que a rodovia opere nessa
situação por mais do que algumas poucas horas por ano; assim sendo, a análise de
capacidade também serve para estimar a taxa de fluxo máxima dentro de condições
operacionais preestabelecidas, consideradas suportáveis pelos usuários.

5.3. 1 Capacidade veicular de uma via

A capacidade pode ser definida tanto em termos de veículos como de pessoas.


Capacidade veicular é a taxa de fluxo horário que pode ser suportada por um dado
ponto ou segmento uniforme da via, sob condições predominantes de tráfego,
controle e da via, supondo-se que o trecho a jusante do ponto ou segmento esteja
livre e não exista nenhum impedimento para o fluxo de tráfego. Alguns pontos
desta definição são importantes e devem ser ressaltados:

1. A capacidade é definida para condições predominantes de tráfego, controle e


da via, que devem ser razoavelmente constantes para o segmento estudado,
pois qualquer alteração no tráfego, no sistema de controle dos fluxos ou
na via resultarão em alterações na capacidade. A definição pressupõe que
essas condições incluem tempo bom, pavimento em bom estado e nenhum
incidente de tráfego (obstruções temporárias do fluxo).
2. A estimativa de capacidade refere-se a um ponto da via ou a um segmento
de características uniformes com relação à geometria da via, ao tráfego e às
condições de controle do fluxo de tráfego. Em função de diferenças nessas
condições, cada segmento da via pode ter capacidade diferente e a capacidade
do sistema pode ser inferida a partir da capacidade de seus componentes,
sendo que o ponto ou segmento de piores condições operacionais determina
o nível de serviço do sistema.
3. A capacidade é expressa em termos de uma taxa de fluxo de veículos ou de
pessoas, que normalmente se refere aos 15 minutos mais congestionados da
hora. Reconhece-se assim que pode existir uma grande variação no fluxo ao
longo de uma hora e, por conseguinte, a análise deve ser feita considerando
o período de maior fluxo dentro da hora pico.
4. A capacidade é definida em termos de uma expectativa razoável de ocorrên-
cia, ou seja, que a capacidade estimada para o segmento seja uma taxa de
fluxo de tráfego que possa ser obtida com razoável freqüência todas as vezes
que a demanda for suficientemente alta e que também tenha sido observa-
da em segmentos de características similares em outros locais. Portanto,
5.3 Capacidade e nível de serviço de rodovias 183

ocasionalmente pode-se observar taxas de fluxo maiores que a capacidade


mas, normalmente, essas taxas de fluxo não se repetem ou não duram muito
tempo.

5.3.2 Nível de serviço e taxas de fluxo de serviço

A avaliação da qualidade do serviço numa rodovia requer o uso de medidas quanti-


tativas para caracterizar as condições operacionais da corrente de tráfego. O nível
de serviço é uma medida da qualidade das condições operacionais na corrente de
tráfego, que pode ser avaliado em termos de medidas de desempenho que incluem
a velocidade e o tempo de viagem, a facilidade de manobras dentro da corren-
te de tráfego, o tempo de retardamento (interrupções no tráfego) e o conforto e
conveniência.
O HCM estabelece seis níveis de serviço, designados por letras variando de A
a F, sendo que A é o melhor nível de serviço e F, o pior. Cada nível de serviço
representa uma gama de condições operacionais e a percepção dos usuários dessas
condições operacionais. A segurança de trânsito não está incluída nas medidas
quantitativas usadas para estabelecer os níveis de serviço.
O nível de serviço E corresponde à capacidade da via, já que normalmente se
considera que a taxa de fluxo de tráfego que se pode conseguir nas condições de
congestionamento do nível de serviço F é menor que a taxa máxima de fluxo de
·tráfego. No entanto, costuma-se usar os níveis de serviço C ou D para a maioria
das aplicações, já que esses níveis de serviço estabelecem condições operacionais
mais aceitáveis para os usuários. O HCM contém descrições detalhadas dos níveis
de serviço para cada tipo de rodovia ou de componente de rodovia, que podem ser A taxa. de fluxo é o flu-
encontradas nos capítulos pertinentes. xo horário equivalente obti-
do observando-se o tráfego
Associados aos níveis de serviços são definidos as taxas de fluxo de serviço, num período inferior a uma
que são as máximas taxas de fluxo de tráfego que podem ser obtidas dentro de hora, normalmente 15 minu-
cada nível de serviço. As taxas de fluxo de serviço determinam a fronteira entre os tos.
níveis de serviço e são estabelecidos em função das taxas de fluxo correspondentes
aos 15 minutos mais movimentados da hora pico.

5.3.3 Medidas de desempenho

O HCM define os níveis de serviço em termos de medidas de desempenho, que


são os parâmetros escolhidos para caracterizar quantitativamente as condições
operacionais na corrente de tráfego. As medidas de desempenho adotadas no
184 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

HCM para componentes que apresentam fluxo não interrompido estão mostradas
na Tabela 5.2. Para 'freeways', as medidas de desempenho são, básicamente, a
densidade e a velocidade da corrente de tráfego; para as rodovias de pista dupla, a
medida de desempenho é a densidade; para as rodovias de pista simples, as medidas
são a velocidade e a porcentagem do tempo que se viaja num pelotão.
A densidade descreve a proximidade dos veículos
na corrente e reflete tanto a facilidade com que se po-
Tab. 5.2: Medidas de desempenho para tráfego sem inter-
de realizar manobras dentro do fluxo como o nível de
rupções
conforto psicológico dos usuários. A densidade é a me-
Componente Medida de desempenho dida de desempenho escolhida para segmentos básicos
'Freeways' de 'freeways' e para rodovias de pista dupla: quanto
segmentos básicos densidade [veic.km- 1 .faixa- 1 ) maior a densidade, pior a qualidade do serviço; quan-
áreas de entrelaçamento velocidade [kmlh]
to menor a densidade, melhor a qualidade do serviço.
junções densidade [veic.km- 1 .faixa- 1]
Rodovias Em rodovias de pista simples, os usuários são particu-
pista dupla densidade [veic.km- .faixa- ]1 1 larmente sensíveis a duas variáveis: a velocidade e a
pista simples velocidade [kmlh] porcentagem do tempo viajando em pelotões, ou seja,
o/o tempo em pelotões a porcentagem do tempo que o usuário é obrigado a
Adaptado d<: HCM2000. TRB. NRC. Washington. DC. EUA. 2000. Exh. 3-1. p. 3-2. viajar numa velocidade menor que a desejada por não
poder ultrapassar um veículo mais lento. Pode-se per-
ceber facilmente que, numa rodovia de pista simples, quanto maior a velocidade,
melhor é a qualidade do serviço e que, quanto maior a porcentagem do tempo
viajando em pelotões, pior a qualidade do serviço.

5.3.4 A relação v j c e seu uso

As medidas de desempenho usadas pelo HCM podem ser facilmente discernidos


pelos usuários, tais como densidade, velocidade, tempo de viagem, etc. pois são
parâmetros que estão relacionados com um trecho de via. Um outro parâmetro
importante da corrente de tráfego é o fluxo de tráfego, que não pode ser percebido
por um motorista por estar relacionado com um ponto da via. Além dessa carac-
terística, a taxa de fluxo, isoladamente, não é um parâmetro capaz de descrever
bem as condições operacionais na corrente de tráfego. Uma dada taxa de fluxo de
tráfego (que não seja a que corresponde à capacidade) pode ocorrer sob condições
muito diversas: com velocidade alta e densidade baixa ou com velocidade baixa e
densidade alta. Essas duas condições fornecem o mesmo fluxo, mas em níveis de
serviço totalmente diferentes.
Apesar de suas limitações, a taxa de fluxo de tráfego é o parâmetro que descreve
a demanda, por isso, a relação v f c é um parâmetro de muita importância na análise
5.3 Capacidade e nível de serviço de rodovias 185

de capacidade e nível de serviço:

taxa de fluxo de tráfego


vlc = . . (5.6)
capacidade

A taxa de fluxo de tráfego representa uma previsão da demanda ou o nível existente


de demanda- se a rodovia não estiver congestionada. A capacidade, por sua vez,
dever ser estimada com base nas condições dominantes do tráfego, controle e da
via, no trecho sendo estudado, e representa o fluxo máximo que pode ser suportado
pela via.
Por isso, a relação vI c é uma medida da relação entre a demanda
(v) e a oferta (c). Se vi c > 1,00, a demanda (existente ou prevista) Região de
fluxo estável
Região de
fluxo instável
excede a capacidade estimada da via, indicando, assim, uma clara SFE 1------=-..,

necessidade de ampliação da oferta. Uma relação v 1c = O, 90 indi-


SF0 r - - - - / ;:--..."c\
ca que o componente pode suportar um aumento de apenas 10% na
demanda.
No HCM, os níveis de serviço são definidos em termos das me-
didas de desempenho (tais como densidade, atraso médio, etc.) mas
seus procedimentos de análise usam a relação v1c para estimação das
taxas de fluxo de serviço. Isso é feito por meio de correlações ma-
temáticas como a mostrada na Figura 5.1 O, que ilustra a determinação Densidade (veiclkm.faixa)
de fluxos de serviço SFi para rodovias de pista dupla. Conhecidos os
Fig. 5.10: Níveis de serviço para trechos
SFi, pode-se determinar as relações v I Ci correspondentes para cada
de fluxo contínuo
nível de serviço:
SFi
vlci = - - - - (5.7)
capacidade
Para o nível de serviço E, que corresponde à capacidade, têm-se sempre que v 1c E =
1, 00, ao passo que, para os níveis de serviço de A a D, a relação v I c varia entre O
e 1,00.

5.3.5 Capacidade básica sob condições ideais

O HCM fornece valores para a capacidade de componentes do sistema viário em


condições ideais. Condições ideais pressupõem tempo bom, pavimento em bom
estado, usuários familiarizados com a via e ausência de incidentes que possam
bloquear faixas ou, de alguma forma, afetar o fluxo de veículos. Os valores da
capacidade básica sob condições ideais para rodovias são expressos em termos da
taxa máxima de fluxo de tráfego observada durante 15 minutos.
186 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

A unidade para capacidade e taxa de fluxo de serviço usada no HCM é 'passen-


ger car equivalem per hour per lane' [pcephpl]. Neste texto, esse termo foi traduzi-
do como carros de passeio equivalentes por hora porfaixa de tráfego [cpe/(h.faixa)
ou cpe.h -l.faixa-1]. Ao longo do texto, os termos "carros de passeio" e "automó-
veis" são usados como sinônimos.

A Tabela 5.3 fornece a capacidade básica, sob condições ideais,


para componentes onde existe fluxo contínuo. Pode-se perceber
Tab. 5.3: Capacidades básicas sob condições
que, numa 'freeway', o maior fluxo de tráfego que uma faixa de
ideais, componentes com fluxo contínuo
rolamento pode suportar, se existirem condições ideais, é 2.400 au-
Componente Capacidade básica tomóveis/hora. A capacidade básica de uma faixa de tráfego é de
'Freeways' 2.200 cpe/h numa rodovia de pista dupla- que difere de uma 'free-
segmentos básicos 2.400 cpe.h- 1 .faixa- 1 way' na medida em que, na 'freeway', a entrada e saída de veículos
Rodovias
ocorre apenas através de dispositivos onde existem faixas de acele-
pista dupla 2.200 cpe.h - 1.faixa- 1
pista simples 3.200 cpe.h- 1.faixa- 1 ração ou de desaceleração. Numa rodovia de pista dupla, a entrada
e saída de veículos pode ser feita em qualquer ponto ao longo da
HCM2000. TRB. NRC. Washington. DC. EUA. 2000.
rodovia.

A capacidade básica total de uma rodovia de pista simples é


estabelecida para o tráfego nas duas direções, para refletir o impacto que o fluxo no
sentido contrário tem sobre as oportunidades de ultrapassagem e, por conseguinte,
na capacidade de se preencher, de modo eficiente, os vazios na corrente de tráfego.
Esse fenômeno reduz a capacidade dos 2.200 cpe/(h.faixa) observados em rodovias
de pista dupla para apenas 3.200 cpe/h para as duas direções.

5.4 Fatores que afetam a capacidade de uma rodovia

Na definição de capacidade que aparece no HCM, faz-se referência a "condições


predominantes do tráfego, do controle e da via", que são representativas do meio-
ambiente viário do segmento sendo analisado. A capacidade básica, conforme
mostra a Tabela 5.3, é fornecida em termos de condições ideais. Normalmen-
te, vê-se que as condições reais do segmento sendo analisado não correspondem
às condições ideais e, portanto, o cálculo da capacidade deve incluir fatores de
correção para incorporar o efeito dessas condições inferiores às ideais. O HCM
categoriza as condições predominantes da via em três classes: as relativas à via,
as relativas ao tráfego e as relativas ao sistema de controle de tráfego.
5.4 Fatores que afetam a capacidade de uma rodovia 187

5.4. 1 Fatores relacionados à via

Os fatores relativos à via que interferem na capacidade são elementos do projeto


geométrico e da zona lindeira à via. Tanto podem influir diretamente na capacidade,
como podem influir numa medida de desempenho (a velocidade, por exemplo) sem
afetar muito a taxa máxima de fluxo que pode ser suportada pelo componente. Os
fatores da via listados no HCM para vias com tráfego contínuo incluem:
e O tipo de componente e o tipo de uso do solo da região em que está cons-
truído;
e A largura das faixas de tráfego;
e A largura dos acostamentos e a distância entre a borda das faixas de rolamento
e as obstruções laterais (muros, postes, defensas, etc.);
e A velocidade de projeto; e
e O alinhamento horizontal e vertical da via.

O tipo de via é um dos fatores críticos para estabelecimento da capacidade.


A existência de fluxo contínuo, a presença de separação física entre as pistas, o
controle de acessos, etc. afetam de forma significativa o fluxo de veículos na via e,
por conseqüência, a capacidade. O tipo de uso do solo lindeiro (rural ou urbano;
residencial, comercial ou industrial; etc.) também influencia o desempenho de
vias e interseções.

Fig. 5.11: Efeito da largura insuficiente das faixas de trá- Fig. 5.12: Faixas de tráfego com largura suficiente não
fego sobre o fluxo (fonte: HCM-19971 afetam o fluxo (Fonte: HCM-1997)
188 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

A largura das faixas de tráfego e dos acostamentos pode ter um impacto sig-
nificativo no fluxo de tráfego. Faixas de tráfego estreitas (como as mostradas na
Figura 5.11) fazem com que a separação lateral entre veículos seja menor do que
a maioria dos motoristas desejaria. Uma separação lateral inferior à ideal reduz
a capacidade e a taxa de fluxo, pois os motoristas reduzem a velocidade ou au-
mentam a separação longitudinal para uma dada velocidade, fazendo com que os
veículos fiquem dispostos na via como que num tabuleiro de xadrez. Isso não
ocorre quando as faixas têm largura ideal, como mostra a foto da Figura 5.12.
O mesmo fenômeno ocorre quando os acostamentos têm largura insuficiente:
os motoristas afastam-se das obstruções laterais, reduzindo a separação lateral
entre veículos, provocando um efeito comparável ao de faixas de tráfego estreitas.
Os elementos do alinhamentos vertical e horizontal da via são estabelecidos
em função da velocidade de projeto e da topografia da região na qual a via foi cons-
truída. Curvas fechadas, rampas íngremes e longas e quaisquer outras condições
que forcem a redução da velocidade são fatores que influem na capacidade.

5.4.2 Fatores relativos ao tráfego

As condições do tráfego que interferem na capacidade e nível de serviço são os


tipos de veículos que formam a corrente de tráfego e a distribuição da corrente de
veículos por direção e pelas faixas de tráfego. Os procedimentos apresentados no
HCM pressupõem que os motoristas estão familiarizados com a via.
Quando a corrente de tráfego é formada por outros tipos de veículos além de
automóveis, ocorre uma redução na capacidade. O HCM define como veículos
pesados aqueles que possuem mais de quatro pneus; os veículos pesados afetam
adversamente a corrente de tráfego de duas formas principais: ocupando mais
espaço na via, porque são mais longos que os automóveis, e possuindo caracterís-
ticas de desempenho (tais como aceleração, frenagem e capacidade de manter a
velocidade em subidas) inferiores às dos automóveis.
A segunda razão é a mais crítica, porque os veículos pesados, não podendo
acompanhar os automóveis em diversas situações, causam a formação de vazios
na corrente de tráfego que são difíceis de serem preenchidos por manobras de ul-
trapassagem, como ilustra a foto da Figura 5.13. Esse efeito é maior em rampas
íngremes e longas, nas quais as diferenças no desempenho veicular são mais pro-
nunciadas, e em rodovias de pista simples, nas quais a manobra de ultrapassagem
é feita usando-se os intervalos no fluxo oposto.
5.4 Fatores que afetam a capacidade de uma rodovia 189

O HCM categoriza os veículos pesados em caminhões, ônibus e


veículos de recreação, que são trailers autopropelidos (usualmente
montados em plataformas de caminhonetes) ou automóveis rebo-
cando trailers, barcos, etc. Os veículos de recreação quase sempre
são dirigidos por motoristas amadores, o que acentua os impactos
causados pelas suas deficiências de desempenho. Normalmente, o
HCM não faz distinção entre os diversos tipos de caminhões que são
encontrados na corrente de tráfego, mas alguns dos procedimentos
permitem escolher o tipo predominante de caminhão encontrado na
corrente de tráfego. O efeito dos veículos pesados é incorporado
na análise através do uso do fator de equivalência veicular, que é o
número de automóveis que produz o mesmo efeito que um veículo
pesado sobre a corrente de tráfego, dadas as características do trecho
estudado. Fig. 5.13: Formação de vazios na frente de
caminhões numa corrente de tráfego (Fonte:
A distribuição direcional do tráfego influencia dramaticamente HCM- 1997l
. a capacidade de rodovias de pista simples. As condições ideais ocor-
rem quando o fluxo é distribuído igualmente entre as duas direções e a capacidade
declina acentuadamente com o aumento do desequilíbrio dos fluxos em cada sen-
tido. Em rodovias de pista dupla e em 'freeways', a análise é feita separadamente
para cada sentido, analisando-se os fluxos de pico de cada um, que podem ocorrer
em horários diferentes do dia- o pico da manhã e o pico da tarde tendem a ocorrer
em sentidos opostos.
A distribuição da corrente pelas faixas de tráfego é um fator que afeta apenas
as 'freeways' e as rodovias de pista dupla já que, tipicamente, a faixa da direita tem
uma densidade menor que as demais faixas. Os procedimentos estabelecidos no
HCM pressupõem uma distribuição por faixas típica da encontrada em rodovias
americanas.

5.4.3 Condições de controle de tráfego

As condições de controle de tráfego são preponderantes nos segmentos onde ocorre


fluxo interrompido, nos quais o tempo disponível para a movimentação de cada
fluxo de tráfego determina a capacidade, as taxas de fluxo de serviço e os níveis
de serviço. Dos dispositivos de controle de tráfego, os semáforos são os mais
críticos, já que determinam o tempo disponível para cada fluxo de tráfego nas
interseções. O efeito dos sinais de parada obrigatória são muito menores, já que
eles apenas estabelecem a preferência e os motoristas no fluxo secundário cruzam
a via preferencial nos intervalos da corrente principal.
190 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

Outros dispositivos de controle de tráfego também exercem alguma influência


sobre a capacidade e o nível de serviço. A proibição de estacionamento pode
aumentar a largura ou o número das faixas de tráfego; as proibições de conversões
podem evitar conflitos em cruzamentos; o controle do uso de faixas de tráfego
pode evitar conflitos entre movimentos e entre automóveis e veículos pesados;
e, finalmente, vias de mão única eliminam os conflitos que podem ocorrer entre
veículos que fazem conversões à esquerda e os veículos que viajam na direção
oposta.

5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas

Os procedimentos para análise da capacidade e nível de serviço de auto-estradas


(em inglês, 'freeways') estão nos capítulos 3 a 6 do HCM. Uma auto-estrada9
ou 'freeway' é uma rodovia, urbana ou rural, com acesso controlado e limitado,
com duas ou mais faixas de tráfego em cada sentido. Numa 'freeway', o fluxo
de tráfego é contínuo e não existem interseções ou retornos em nível. O acesso
de propriedades lindeiras à via é proibido e existe um canteiro, defensa ou outro
tipo de separação física entre os fluxos de tráfego em sentidos opostos. Em muitas
'freeways' cobra-se pedágio em alguns pontos ao longo da via. De acordo com o
HCM, ainda que a existência de uma praça de pedágio implique em interrupções
no fluxo de veículos, isso não impede que ela seja tratada como uma 'freeway' na
análise de capacidade e nível de serviço.
De acordo com o HCM2000, existem quatro tipos básicos de elementos numa
'freeway':

• Segmentos básicos de 'jreeways ': os trechos em que não existem áreas de en-
trelaçamento ou pontos de acesso. São tratados no capítulo 23 do HCM2000.
e Áreas de entrelaçamento ('weaving areas'): são os trechos ao longo dos
quais dois fluxos de veículos devem cruzar-se, como mostra a Figura 5.14.
Aparecem nos locais em que um ponto de acesso localiza-se a montante de
um ponto de saída. As áreas de entrelaçamento são tratadas no capítulo 24
doHCM2000.
e Junções ('ramps and ramp junctions '): trechos em que uma faixa de entrada
ou saída junta-se à 'freeway', como mostrado na Figura 5.14. As junções
são tratadas no capítulo 25 do HCM2000.
9Neste texto, os termos "auto-estrada" e "freeway" serão usados com o mesmo significado.
5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 191

Área de entrelaçamento Junções

-
~----------=-+
-------------- - - ~- - -- - - - - -
=-=.:,.- - - - - - - - - --=-i=
~~
-
-~

divergente ~

Fig. 5.14: Componentes de auto-estradas: áreas de entrelaçamentos e junções

• Conexões de 'freeways' com arteriais' ('interchange ramp terminais'): sãos


os dispositivos de entrocamento de 'freeways' com vias arteriais, particular-
mente os do tipo "diamante" ('diamond interchanges') e "pardo" ('partial
cloverleaf'), que são formados por duas interseções semaforizadas, através
das quais se controla o acesso e saída da 'freeway'. O método para aná-
lise de nível de serviço e capacidade destes dispositivos ainda está sendo
desenvolvido e o capítulo 26 do HCM2000 discute os conceitos envolvidos.

Os elementos que compõem uma 'freeway' devem ser considerados isoladamente


no estudo da capacidade e nível de serviço, pois podem apresentar capacidades
diferentes. O capítulo 22 do HCM2000 explica como analisar 'freeways' como
um sistema formado por segmentos básicos, áreas de entrelaçamento e junções.

5.5.1 Características do fluxo de veículos em auto-estradas

Conforme discutido no Capítulo 3, os fluxos de tráfego contínuos obedecem à


relação fundamental do tráfego (Equação 3.7, pág. 89):

fluxo = velocidade x densidade.

Como também visto naquele capítulo, pode-se estudar o fluxo de veículos em


auto-estradas por meio de modelos macroscópicos. O HCM também usa uma
relação macroscópica para 'freeways' que, por ser baseada em dados empíricos 10 ,
coletados em diversas 'freeways' norte-americanas, difere ligeiramente do modelo
de Greenshields.
Em 'freeways', as características as condições do fluxo podem ser altamente
variáveis, dependendo das condições a jus ante e a montante de pontos de estrangu-
lamento, que podem ser causados por áreas de entrelaçamento, rampas de acesso,
10 Schoen, J.; May, A.; Reilly, W. e Urbanik, T. (1995). Speed-Flow Relationships for Basic
Freeway Sections. Final Report, NCHRP Project 3-45, JHK & Associates, Tucson, Ariz., EUA.
192 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

redução do número de faixas de tráfego, atividades de construção ou manutenção,


acidentes ou objetos na pista. Um incidente não precisa bloquear uma faixa pa-
ra causar o aparecimento de um ponto de estrangulamento; veículos parados no
acostamento ou no canteiro central podem afetar o fluxo nas faixas de tráfego.
Num segmento de freeway, o fluxo de veículos pode ser
100t-------~-------------
categorizado em três regimes que ocorrem em condições dife-
Regime de
fluxo livre Reg/mede , rentes de tráfego, como ilustrado na Figura 5.15. O regime de
descarg~ fluxo livre representa o tráfego quando não é influenciado por
da fila ,

_.. _....,.; congestionamento ajusante ou a montante da seção e é defi-


nido dentro de uma faixa de variação de velocidades que varia
Regime de fluxo ..Ali!. __.._..
congestiona~_..
entre 90 a 130 km/h, para taxas de fluxo mais baixas, e entre
_......... 70 e 110 km/h, para taxas de fluxo mais altas. A velocidade de
_.. .......
0~--~---+----r---4-~-+----~ fluxo livre corresponde, na prática, ao que Greenshields definiu
o 400 800 1200 1600 2000 2400
Volume de tráfego teoricamente como a velocidade livre, que seria a velocidade
[ cpeí(h.faixa)] média da corrente quando o fluxo tende a zero.
Fig. 5.15: Regimes de fluxo em 'freeways' O regime de descarga da fila representa o tráfego que acaba
de passar por um ponto de estrangulamento e está acelerando
para retomar à velocidade de fluxo livre da 'freeway'. A taxa de fluxo no regime de
descarga da fila é constante, desde que não haja a influência de um outro ponto de
estrangulamento a jusante. Este tipo de regime é definido por uma faixa relativa-
mente estreita de fluxos, de 2.000 a 2.300 veic/(h.faixa), com velocidades variando
entre 60 km/h e a velocidade de fluxo livre do segmento, com as velocidades mais
baixas sendo observadas imediatamente a jus ante do ponto em que a fila está se
dissipando. A velocidade média do fluxo de descarga da fila alcança a velocidade
livre do segmento mais ou menos 1 km a jusante do ponto de estrangulamento,
dependendo do alinhamento vertical e horizontal da 'freeway'. O HCM afirma
que existem evidências empíricas que o fluxo de descarga da fila é cerca de 5%
menor que o fluxo máximo observado antes da formação do congestionamento.
O regime de fluxo congestionado ocorre num trecho a montante de um ponto
de estrangulamento, ou seja, na fila formada no congestionamento, que pode se
estender por centenas de metros a jusante do ponto de estrangulamento. As taxas
de fluxo e a velocidade variam dentro de uma ampla faixa, dependendo do grau de
obstrução. Deve-se ressaltar que as filas, numa 'freeway', não são estáticas como
num cruzamento semaforizado, mas os veículos movem-se lentamente ao longo
da fila, alternando períodos de parada com períodos de movimento.
Os níveis de serviço A a E estão dentro do regime de fluxo livre, os outros
dois regimes estão dentro do nível de serviço F. O procedimento para análise de
5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 193

capacidade e nível de serviço do HCM trata apenas das situações em que existe
um regime de fluxo livre.

Condições ideais para freeways

A relação fluxo-velocidade que descreve o tráfego num segmento de 'freeway'


depende das condições locais, que podem ser inferiores às condições ideais esti-
puladas no HCM. As condições ideais para 'freeways' incluem:

• Faixas de tráfego com 3,6 m (12 pés) de largura;


• Uma distância livre de 1,8 m (6 pés) entre a borda das faixas de rolamento e
as obstruções ou objetos mais próximos no lado do acostamento e de 0,6 m
(2 pés) no lado do canteiro central;
• Velocidade de projeto de 120 kmlh (70 mph);
• Motoristas familiarizados com a via, isto é, apenas usuários regulares;
e Para 'freeways', pelo menos 1O faixas de tráfego nos trechos situados em
zonas urbanas
e Distância mínima de 3 km entre dispositivos de acesso;
• Corrente de tráfego formada apenas por automóveis; e
e Relevo plano (rampas inferiores a 2%).

Uma freeway nessas condições apresenta velocidade de fluxo livre de 120 km!h ou
mais e representa as melhores condições possíveis com relação ao fluxo de tráfego.

A relação fluxo-velocidade para freeways

Todos os estudos mais recentes indicam que a velocidade, numa 'freeway', não
varia em função do fluxo, se a taxa de fluxo for baixa ou moderada. Isto pode
ser verificado na Figura 5.16, que mostra a relação fluxo-velocidade adotada pelo
HCM para 'freeways'. Para 'freeways' com velocidade de fluxo livre de 120 kmlh,
a velocidade não é afetada pelo fluxo até que taxas de fluxo maiores ou iguais a
1.300 veic/(h.faixa) ocorram. Para 'freeways' com velocidades livres menores,
essa taxa crítica cresce, chegando até 1.750 veic/(h.faixa) para as com velocidade
de fluxo livre de 90 km/h. A capacidade de uma faixa de tráfego varia com a
velocidade de fluxo livre, sendo maior onde a velocidade é mais alta, como mostra
a Tabela 5 .4.
194 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

Tab. 5.4: Taxas máximas de fluxo


para 'freeways'
Velocidade
de fluxo livre Capacidade
(krnlh) . (cpe.h- 1 .faixa-l)

120 2.400
110 2.350
100 2.300
90 2.250

Taxa de fluxo de tráfego


[ cpe/{h.faixa)]

Fig. 5.16: Relação fluxo-velocidade para 'freeways'

O gráfico da Figura 5.16 trata apenas do regime de fluxo livre, dentro do qual
se situam os níveis de serviço A a E. Os outros dois regimes de fluxo, que corres-
pendem ao fluxo congestionado e ao regime de descarga da fila, correspondem ao
nível de serviço F e, por conseguinte, não são considerados no procedimento de
análise de capacidade e nível de serviço.
O HCM estipula que a velocidade de fluxo livre deve ser medida no local,
como a velocidade média dos automóveis quando a taxa de fluxo for inferior a
1300 veic/(h.faixa). A velocidade de fluxo livre pode ser obtida medindo-se a
velocidade num ponto ou fazendo-se uma pesquisa de tempo de viagem.
O HCM também ressalta que, embora apenas quatro curvas sejam mostradas na
Figura 5 .16, pode-se obter uma relação fluxo-velocidade para qualquer velocidade
de fluxo livre no intervalo entre 90 e 130 kmlh fazendo uma interpolação entre as
curvas da Figura 5.16.
Outro aspecto que pode ser notado na Figura 5.16 é a velocidade média dos
automóveis na capacidade. Pode-se perceber que a queda na velocidade média é
maior para 'freeways' com maior velocidade de fluxo livre. A velocidade média
na capacidade é 85 kmlh para uma 'freeway' com velocidade de fluxo livre de
120 km/h e 80 km/h para uma com velocidade de fluxo livre de 90 km/h.
Os fatores que influenciam a velocidade de fluxo livre, de acordo com o HCM,
são:
5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 195

e Largura das faixas de tráfego e do acostamento: faixas de tráfego com


menos de 3,6 me acostamentos com menos de 1,8 m (no lado direito da
pista) e 0,6 m (no lado esquerdo da pista) causam redução da velocidade de
fluxo livre.

e Número de faixas de tráfego: conforme o número de faixas aumenta, os


motoristas podem se posicionar melhor para evitar os efeitos dos veículos
mais lentos, que costumam se posicionar nas faixas mais à direita. Assim
sendo, numa 'freeway' de 6, 8 ou 10 faixas, os veículos lentos tem um efeito
menor que numa de 4 faixas.

e Densidade de dispositivos de acesso: as manobras de entrelaçamento as-


sociadas com trevos afetam o fluxo de tráfego e 'freeways' com entradas e
saídas pouco espaçadas (normalmente situadas em zonas densamente urba-
nizadas) operam com velocidades de fluxo livre inferiores às encontradas
em 'freewa~s' suburbanas ou rurais. O espaçamento ideal entre dispositivos
de acesso é 3 km ou mais; o espaçamento mínimo recomendado no HCM
para 'freeways' é de 800 m.

e Outros fatores: velocidade de projeto e os alinhamentos vertical e horizontal


podem interferir na velocidade de fluxo livre. O HCM sugere que, nos casos
em que se suspeita que esses fatores possam influir na velocidade de fluxo
livre, deve-se fazer um estudo da distribuição de velocidades dos automóveis
em fluxos baixos, evitando-se o uso do método para estimação da velocidade
livre proposto no seu Capítulo 3.

Fatores de equivalência veicular

A presença de caminhões e outros veículos pesados na corrente de tráfego provo-


ca uma deterioração nas condições operacionais, já que esses veículos, por terem
desempenho inferior ao dos automóveis, provocam o aparecimento de 'gaps' ex-
cessivos na corrente de tráfego. Além disso, esses veículos ocupam um espaço,
na faixa de tráfego, que corresponde ao ocupado por dois ou três automóveis. No
método adotado pelo HCM, cada veículo pesado é convertido num número equi-
valente de automóveis, a fim de que o método possa usar uma medida de fluxo
baseada em automóveis. O fator de conversão usado depende da porcentagem de
veículos pesados no fluxo, no comprimento e na inclinação da rampa (aclive ou
declive).
196 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

5.5.2 Medidas de desempenho para freeways

São três as medidas de desempenho usadas para a análise de 'freeways': a densi-


dade [cpe.km- 1 .faixa- 1], a velocidade média dos automóveis [kmlh], e a relação
v j c (fluxo/capacidade). A medida de desempenho primária para estabelecimento
do nível de serviço é a densidade.

A Tabela 5.5 mostra as faixas de variação da densidade para os níveis de serviço.


O HCM ressalta que, embora a especificação da densidade máxima para os níveis
de serviço de A a D tenha sido baseada no julgamento dos membros do Comitê
de Capacidade e Qualidade de Serviço do TRB, o limite máximo para o nível
de serviço E, 28 cpe/(km.faixa), foi estabelecido a partir da densidade máxima
observada na qual o regime de fluxo livre pode ser mantido numa 'freeway'.
A Figura 5.17 ilustra as faixas de variação da densidade para cada nível de
serviço; a velocidade e o fluxo são os correspondentes aos valores da densidade
em condições ideais. A Tabela 5.6 fornece os critérios para estabelecimento dos
níveis de serviço para 'freeways'. O HCM ressalta que as velocidades e taxas de
fluxo de serviço são parâmetros secundários estabelecimento do nível de serviço
em 'freeways' e que o parâmetro fundamental é a densidade. Os valores tabelados
da velocidade e do taxa de fluxo são apenas indicativos dos que devem ocorrer com
a densidade máxima para cada nível de serviço e variações nesses valores podem
ser esperadas, se as condições da 'freeway' forem diferentes das ideais.

····;······:······:······:······:······:······:······:······:······:······:······.
I Tab. 5.5: Critério para estabele-
~

; ; ; ; ; 1300 ; __ .;_ _____ ~-----~-----~-----~


120
cimento dos níveis de serviço pa-
lll

~ 100 ra 'freeways'

'"'ª
~ 80
{I)
o
Nível de
serviço
Densidade
[veic/(km.faixa)]
"C

"' 60 A O<k-::::7

-Ql
E B 7<k-sll
., 40 c ll<k-::::16
"C
"'
"C
õ D 16 < k-:::: 22
o 20
~ E 22 < k-:::: 28
F 28 < k
o o
o 400 800 1200 1600 2000 24
Fonte: HCM2000: Highway Capaciry ManuaL
Taxa de fluxo de tráfego [ cpe/(h.faíxa)] TRB.NRC. Washington. DC. EUA. 2000. p. 23-
3.
Fig. 5.17: Critérios para determinação do nível de serviço para 'freeways'
5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 197

Observando-se a Tabela 5.6 pode-se notar que, para um mesmo nível de serviço,
a relação v f c diminui, à medida em que a velocidade de fluxo livre reduz-se. Isso
pode ser explicado porque uma redução na velocidade de fluxo livre é causada
por condições geométricas (tais como rampas máximas, raios mínimos de curva,
largura de faixas de tráfego e de acostamentos, etc.) menos favoráveis e, numa
rodovia de projeto geométrico inferior, o limite do nível de serviço é alcançado
com uma taxa de fluxo menor. Usando como exemplo a Rodovia dos Bandeirantes

Tab. 5.6: Critérios para determinação do nível de serviço em 'freeways'


Velocidade Taxa de fluxo Relação
Nível de Densidade mínima máxima vjc
serviço [veic/(km.faixa)] (kmlh) [cpe/(h.faixa)] máxima
Velocidade de fluxo livre= 120 km/h
A 0<k::;:.7 120,0 840 0,35
B 7<k::;:.ll 120,0 1.320 0,55
c 11 < k::::. 16 114,6 1.840 0,77
D 16 < k ::::. 22 99,6 2.200 0,92
E 22 < k::::. 28 85,7 2.400 1,00
Velocidade de fluxo livre= 110 km/h
A 0<k::;:.7 110,0 770 0,33
B 7<k::;:.ll 110,0 1.210 0,51
c 11 < k::::. 16 108,5 1.740 0,74
D 16 < k::::. 22 97,2 2.135 0,91
E 22 < k::::. 28 83,9 2.350 1,00
Velocidade de fluxo livre= 100 km/h
A 0<k::;:.7 100,0 700 0,30
B 7<k::;:.11 100,0 1.100 0,48
c 11 < k::::. 16 100,0 1.600 0,70
D 16 < k ::::. 22 93,8 2.065 0,90
E 22 < k::::. 28 82,1 2.300 1,00
Velocidade de fluxo livre= 90 km/h
A 0<k::;:.7 90,0 630 0,28
B 7<k::;:.11 90,0 990 0,44
c 11 < k::::. 16 90,0 1.440 0,64
D 16 < k ::::. 22 89,1 1.955 0,87
E 22 < k::::. 28 '80,4 2.250 1,00
Fonte: HCM2000: Highway Capaciry Marwal. TRB. NRC. Washington. DC. EUA. 2000. p. 23·3.
198 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

e a Via Anhangüera, no estado de São Paulo, a primeira consegue operar no mesmo


nível de serviço da segunda com fluxos bem maiores, já que seu projeto geométrico
possui características muito superiores, como rampas menos íngremes, curvas com
raios maiores, distâncias de visibilidade maiores, canteiro central e acostamentos
mais largos, etc.
Ainda que o parâmetro primordial para a determinação do nível de serviço seja
a densidade, o HCM fornece descrições das condições operacionais em cada nível
de serviço e um conjunto de fotos para ilustrá-los. Essas fotos são mostradas nas
Figuras 5.18 a 5.23 que ilustram os níveis de serviço para a pista da esquerda. As
descrições dos níveis de serviço são as seguintes:
Nível de serviço A: corresponde à operação em regime de fluxo livre, no qual a
velocidade média da corrente é a velocidade de fluxo livre. Os veículos
têm liberdade completa de manobra dentro da corrente, podendo viajar na
velocidade escolhida pelos motoristas. Mesmo na densidade máxima para o
NS A, o espaçamento médio entre veículos é mais de 160 rn (26 comprimen-
tos médios de automóveis), o que garante um excelente nível de conforto.
psicológico para os usuários e faz com que os efeitos de incidentes e estran-
gulamentos locais sejam irrelevantes.
Nível de serviço B: a operação ainda ocorre dentro do regime de fluxo 'livre e a
velocidade de fluxo livre ainda é mantida. O espaçamento médio mínimo
entre veículos é cerca de 100 rn, ou 17 carros, o que garante facilidade de
manobra na corrente e um alto nível de conforto psicológico para os usuários,
ao mesmo tempo em que os efeitos de incidentes e restrições ao fluxo são
absorvidos sem impactos no regime de fluxo.
Nível de serviço C: a velocidade média da corrente é igual ou muito próxima à
velocidade de fluxo livre. O espaçamento médio varia entre 67 e 100 rn
(11 a 17 comprimentos de automóvel), o que significa que a facilidade de
manobra dentro da corrente é bem menor e as que as mudanças de faixa
exigem atenção e cuidado. Pequenos incidentes ainda são absorvidos sem
a formação de congestionamentos, mas qualquer bloqueio de faixas causa a
formação de pequenas filas.
Nível de serviço D: a velocidade média da corrente começa a diminuir com o
aumento do fluxo de tráfego e a densidade, a aumentar mais rapidamente
à medida em que o fluxo cresce. A liberdade de manobra na corrente é
limitada e os usuários começam a experimentar um certo grau de desconforto
psicológico. Corno o espaçamento médio varia entre 11 e 8 comprimentos
de automóvel (67 a 50 rn), qualquer incidente provoca o aparecimento de
filas, que podem degradar ainda mais o nível de serviço.
5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 199

Fig. 5.18: Nível de serviço A Fig. 5.19: Nível de serviço B Fig. 5.20: Nível de serviço C

Fig. 5.21: Nível de serviço D Fig. 5.22: Nível de serviço E Fig. 5.23: Nível de serviço F

Nível de serviço E: no limite superior da densidade, 28 cpe/(km.faixa), corres-


pende à operação na capacidade da 'freeway' e qualquer ocorrência pode
causar a mudança do regime de operação do tráfego. Como os veículos
estão muito próximos (entre 6 e 8 comprimentos médios de automóveis, ou
seja, de 37 a 50 m) e a velocidade média da corrente é superior a 80 kmlh, o
fluxo é altamente instável. Próximo da capacidade, qualquer distúrbio, até
mesmo veículos entrando na corrente ou mudando de faixa, causa uma onda
de choque que se propaga pela corrente de tráfego a montante podendo gerar
um congestionamento. Como os veículos viajam muito próximos uns dos
outros, a liberdade de manobra e de escolha da velocidade é muito pequena
e o nível de conforto dos usuários é muito baixo.
Nível de serviço F: é usado para descrever um colapso no fluxo de veículos, quan-
do a demanda (taxa de fluxo de tráfego) excede a oferta (capacidade da via).
O congestionamento pode se estender por distâncias significativas e o pro-
gresso dos veículos ao longo da fila dá-se de forma descontínua. Imediata-
mente após o ponto de estrangulamento, a taxa de fluxo de descarga da fila é
próxima da capacidade e as condições de fluxo melhoram à medida em que
os veículos distanciam-se do congestionamento.
200 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

5.5.3 Determinação dos parâmetros para análise

A determinação do nível de serviço para um segmento de freeway envolve três


parâmetros: a taxa de fluxo, a velocidade de fluxo livre e o nível de serviço. O
HCM estipula como determinar os valores desses parâmetros, como mostrado a
seguir.

Determinação da taxa de fluxo de tráfego

A taxa de fluxo de tráfego reflete os efeitos dos veículos pesados, a variação tempo-
ral do tráfego durante a hora pico e as características dos motoristas, transformando
os fluxos horários obtidos de contagens de tráfego (veiclh) em taxas de fluxo equi-
valentes (em cpe/h). Essa transformação é feita pela expressão:

Vp=-------
v (5.8)
PHF. N. fHv . JP

em que Vp: taxa de fluxo equivalente [cpe/(h.faixa)];


V: fluxo horário (veic/h);
PHF: fator de hora pico;
N: número de faixas de tráfego;
!H v: fator de ajuste para veículos pesados; e
fp: fator de ajuste para tipo de motorista.

O fator de hora pico representa a variação do fluxo de tráfego durante uma


hora, indicando a relação entre a taxa de fluxo do período de 15 minutos mais
movimentados dentro da hora pico e o fluxo total da hora pico. Na falta de dados
específicos para a 'freeway' sendo analisada, o HCM aponta que o PHF costuma
variar entre 0,80 e 0,95, com os valores menores sendo encontrados em 'freeways'
rurais e os maiores, em 'freeways' urbanas. O HCM recomenda adotar valores do
PHF de 0,85 para 'freeways' rurais e 0,92 para 'freeways' urbanas.

Fator de ajuste para ve{culos pesados

Três tipos de veículos pesados são considerados na análise de capacidade e nível


de serviço de 'freeways': ônibus, caminhões e veículos de recreação. Caminhões
e ônibus são tratados identicamente pois, de acordo com o manual, não existem
evidências que indiquem diferenças entre as características de desempenho desses
dois tipos de veículos em 'freeways'. O HCM também ressalta que, nos EUA,
5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 201

os caminhões e ônibus que trafegam em 'freeways' tipicamente têm relação mas-


sa/potência variando entre 75 e 90 kg/kW, enquanto que essa relação é 36 kg/kW
para os veículos de recreação.
O processo de determinação do fator de ajuste para veículos pesados é feito em
duas etapas. Inicialmente, determina-se o fator de equivalência para ônibus, cami-
nhões e veículos de recreação para o trecho em estudo. Os fatores de equivalência
Er (para caminhões e ônibus) e ER (para veículos de recreação), representam o
número de automóveis que usam a mesma parcela da capacidade da rodovia que
um veículo pesado, sob as condições locais de tráfego e da via. A segunda etapa
consiste em determinar o fator de ajuste fsv em função das porcentagens de veí-
culos pesados (Pr, para caminhões e ônibus, e PR, para veículos de recreação) e
dos fatores de equivalência Er e ER:
1
!Hv = - - - - - - - - - - - (5.9)
1 + Pr(Er- 1) + PR(ER- 1)'

emquy !Hv: fator de ajuste para veículos pesados;


Pr: porcentagem de caminhões e ônibus na corrente de tráfego;
E r: fator de equivalência para caminhões e ônibus;
PR: porcentagem de veículos de recreação; e
ER: fator de equivalência para veículos de recreação.

O efeito dos veículos pesados sobre a capacidade, que é medido pelo fator de
equivalência veicular, depende tanto das rampas como da composição do tráfego.
O HCM prevê três condições de análise do efeito dos veículos pesados sobre
a capacidade e o nível de serviço: análise para segmentos longos, análise para
aclives e análise para declives.
Segundo o manual, a análise para segmentos longos é realizada quando não
existem rampas de comprimento ou declividade significativa ao longo de um trecho
de vários quilômetros de extensão. Mais especificamente, o HCM aponta que, se
não existirem rampas maiores que 400 m (para greides de 3% ou mais) ou rampas
maiores que 800 m nas quais o greide é menor que 3%, a análise para segmentos
longos poderia ser usada. Uma outra situação na qual pode-se usar a análise
para segmentos longos é quando a rodovia ainda está em fase de projeto e, por
conseguinte, ainda não se dispõe do projeto geométrico final.
Rampas de menos de 3% cujo comprimento seja superior a 800 m ou rampas
de mais de 3% com comprimento maior que 400 m devem ser analisadas como um
segmento específico por causa do impacto que causam sobre o fluxo de tráfego. A
análise deve ser feita tanto para o aclive como para o declive.
202 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

Análise para segmentos longos: fatores de equivalência

Quando se usa a análise para segmentos longos, o relevo topográfico da região


na qual situa-se a 'freeway' deve ser classificado em um dos três tipos previstos
no HCM: plano, ondulado e montanhoso. Os fatores de equivalência veicular são
fornecidos para cada uma dessas classes.
Por relevo plano, o HCM considera aquele no qual os veículos
pesados podem manter uma velocidade igual à dos automóveis,
Tab. 5.7: Fatores de equivalência para uso em
isto é, não existem rampas longas com mais de 2%. O relevo
análise de segmentos longos
ondulado é aquele no qual existem rampas nas quais a velocidade
Tipo de relevo dos caminhões é significativamente inferior à dos automóveis, sem
Fator Plano Ondulado Montanhoso que os caminhões operem em velocidades baixas por períodos
Er 1,5 2,5 4,5 muito longos. Numa região com relevo montanhoso, existem
ER 1,2 2,0 4,0 extensas rampas nas quais os caminhões operam com velocidade
baixa por longos períodos.
Fonte: HCM2000: Highway Capacity Manual. TRB. NRC. Washing-
ton. DC. EUA. 2000. p. 23-9.
A Tabela 5. 7 fornece os valores dos fatores de equivalência
E r, para caminhões e ônibus, e E R' para veículos de recreação. O
HCM ressalta que os equivalentes para relevo ondulado e montanhoso devem ser
usados apenas para estudos em nível de planejamento, quando o projeto geométrico
ainda não está disponível, já que é praticamente impossível aplicar a análise para
segmentos longos a esse tipo de terreno sem violar a orientação para uso de análise
para aclives e declives (rampas de 3% maiores que 500 m). O exemplo a seguir
mostra como calcular o fator de ajuste para veículos pesados para aplicação em
análise de segmentos longos.

Exemplo 5.3 Uma nova 'freeway' ligando São Paulo ao litoral será construída numa
região onde existem trechos de relevo plano, ondulado e montanhoso. Determinar os
fatores de ajuste para caminhões, considerando que as projeções de tráfego incluem 14%
de caminhões, 3% de ônibus e 1 o/o de veículos de recreação.

Solução: Como ainda não se dispõe do projeto geométrico definitivo, os fatores


devem ser calculados para análise de trechos longos. Para o trecho plano, E r = 1,5
(caminhões e ônibus) e ER = 1,2; paraoondu1ado, Er = 3,0eER = 2,0; e parao
montanhoso, Er = 6,0 e ER = 4,0. Como a porcentagem de caminhões e ônibus
é Pr =O, 17 e a porcentagem de automóveis com reboque é PR = 0,01, os fatores
de ajuste são:

fHv = 1 + Pr(Er- 1)1 + PR(ER- 1) ===}


5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 203

1
!Hv = 1'+ O, 17(1,5- 1) + 0,01(1,2- 1) =O ' 920 (plano)
1
!Hv = 1 +O, 17(3,0- 1) + 0,01(2,0- 1) =O ' 741 (ondulado)
1
!Hv = 1 +O, l7( 6 ,0 _ 1) + 0,0 1(4 ,0 _ 1) = 0,532 (montanhoso).

Análise para aclives e declives isolados: fatores de equivalência

O HCM estipula que aclives de até 3%, com mais de 1.000 m, ou de mais de 3%,
com mais de 500 m, devem ser analisados à parte, dado seu impacto sobre o fluxo
de veículos. Para isso, são fornecidos fatores de equivalência para caminhões e
veículos de recreação (automóveis com reboques ou trailers autopropelidos) que
estão mostrados nas Tabelas 5.8 e 5.9.

Como pode ser observado, os valores máximos de Er e ER ocorrem quando


existem poucos veículos pesados na corrente de tráfego. Os fatores de equivalência
decrescem à medida em que aumenta o número de veículos pesados na corrente
de tráfego, porque esses veículos tendem a se agrupar em pelotões nos quais as
características de desempenho que são mais uniformes que nos pelotões formados
por carros e caminhões.

Se o comprimento da rampa coincidir com o limite de um intervalo de com-


primentos, deve-se usar o intervalo de comprimentos mais longos. O fator de
equivalência pode ser obtido usando-se interpolação linear para valores da decli-
vidade ou porcentagem de caminhões e ônibus que não apareçam nas tabelas.
Na Tabela 5.10 podem ser encontrados os fatores de equivalência veiculares
para caminhões e ônibus, para uso na análise de declives. Em declives acentuados
e longos, os veículos pesados também interferem com o fluxo de tráfego pois
são obrigados a usar o freio-motor e viajam em velocidades baixas. Uma rampa
pouco acentuada, na qual os caminhões não sejam obrigados a recorrer ao uso do
freio-motor, deve ser considerada como um trecho plano, adotando-se um fator
de equivalência Er = 1,5. Se o declive não tiver pelo menos 4% e 6,4 km de
extensão, os caminhões e ônibus devem ser tratados como se o trecho fosse plano,
isto é, o fator de equivalência deve ser Er = 1,5.
Em declives de qualquer intensidade, os veículos de recreação devem ser tra-
tados como nos trechos planos (ER = 1,2), já que não sofrem uma redução de
velocidade tão grande quanto a dos caminhões e ônibus.
204 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

Tab. 5.8: Fatores de equivalência ET para caminhões e ônibus em aclives


Porcentagem de caminhões e ônibus
Rampa(%) Extensão (km) 2% 5% 10% 15% 20% 25%
<2 qualquer 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5
;:::2-3 0,0- 1,2 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5
> 1,2-1,6 2 2 1,5 1,5 1,5 1,5
> 1,6-2,4 2,5 2,5 2 2 2 2
>2,4 3 2,5 2 2 2 2
>3-4 0,0-0,4 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5
> 0,4-0,8 2 2 2 1,5 1,5 1,5
> 0,8- 1,2 2,5 2 2 2 2 2
> 1,2- 1,6 3 2,5 2,5 2 2 2
> 1,6-2,4 3,5 3 3 2,5 2,5 2,5
> 2,4 4 3 3 2,5 2,5 3
>4-5 0,0-0,4 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5
> 0,4-0,8 3 2,5 2 2 2 2
> 0,8-1,2 3,5 3 2,5 2,5 2,5 2,5
>1,2-1,6 4 3,5 3 3 3 3
> 1,6 5 4 3,5 3 3 3
>5-6 0,0-0,4 2 1,5 1,5 1,5 1,5 1,5
> 0,4-0,5 4 2,5 2 2 2 2
> 0,5-0,8 4,5 3,5 2,5 2,5 2,5 2,5
>0,8-1,2 5 4 3 3 3 3
> 1,2-1,6 5,5 4,5 3 3 3 3
> 1,6 6 5 3,5 3,5 3,5 3,5
>6 0,0-0,4 4 2,5 2,5 2 2 2
> 0,4-0,5 4,5 3,5 3 2,5 2,5 2,5
> 0,5-0,8 5 4 3 2,5 2,5 2,5
>0,8-1,2 5,5 4,5 3,5 3 3 3
> 1,2-1,6 6 5 4 3,5 3,5 3,5
> 1,6 7 5,5 4,5 4 4 4
Fonte: HCM2000: Highway Capacity Manual. TRB. NRC. Washington. DC. EUA. 2000. p. 23-10.

Exemplo 5.4 Determinar o fator de equivalência E T para um aclive de I, 6 km de extensão


e 5,75%, no qual há 5% de caminhões e 3,5% de ônibus.

Solução: A porcentagem de veículos pesados é PT = 0,05 + 0,035 = 0,085, ou


seja, 8,5%. Portanto, será necessário interpelar o valor de ET, já que a Tabela 5.8
não fornece valores do equivalente veicular para 8,5% de veículos pesados. Da
Tabela 5.8, têm-se que, para rampas de comprimento até 1,6 km com declividade
entre5 e6%, ET = 4,5 (5%deveículos pesados) e ET = 3,0,para lO% de veículos
5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 205

Tab. 5.9: Fatores de equivalência E R para veículos de recreação em aclives


Porcentagem de veículos de recreação
Rampa(%) Extensão (km) 2% 5% 10% 15% 20% 25%
::;2 qualquer 1,2 1,2 1,2 1,2 1,2 1,2
>2-3 0,0-0,8 1,2 1,2 1,2 1,2 1,2 1,2
>0,8 3 1,5 1,5 1,2 1,2 1,2
>3-4 0,0-0,4 1,2 1,2 1,2 1,2 1,2 1,2
>0,4-0,8 2,5 2 2 1,5 1,5 1,5
>0,8 3 2,5 2 2 1,5 1,5
>4-5 0,0-0,4 2,5 2 1,5 1,5 1,5 1,5
> 0,4-0,8 4 3 2,5 2 2 2
> 0,8 4,5 3 2,5 2,5 2 2
>5 0,0-0,4 4 2,5 2 2 2 1,5
> 0,4-0,8 6 4 3 2,5 2,5 2
> 0,8 6 4 3 3 2,5 2
Fonte: HCM2000: Highwa:y Capaciry Manual. TRB. NRC. Washington. DC. EUA. 2000. p. 23-10.

Tab. 5.10: Fatores de equivalência ET para caminhões e ônibus em declives


Veículos pesados
Rampa(%) Extensão (km) 5% 10% 15% 20%
até 4 qualquer 1,5 1,5 1,5 1,5
4 até 6,4 1,5 1,5 1,5 1,5
mais de 6,4 2 2 2 1,5
5 até 6,4 1,5 1,5 1,5 1,5
mais de 6,4 5,5 4 4 3
6 até 6,4 1,5 1,5 1,5 1,5
mais de 6,4 7,5 6 5,5 4,5
Fonte: HCM2000: Highway Capaciry MfJJtual. TRB. NRC. Washington. DC. EUA. 2000. p. 23-ll.

pesados. Então, para uma rampa de 5,75% com 8,5% de caminhões e ônibus, o
fator de equivalência é ET = 3,45.

Na análise de aclives, o ponto crítico é normalmente o final da rampa, onde os


veículos pesados causam o maior impacto no fluxo de tráfego. Como uma rodovia
é uma sucessão contínua de greides, greides compostos são comuns. Nesses casos,
o HCM recomenda que se use a rampa média equivalente. Assim, se existe uma
rampa de 2% com 400 m seguida por outra de 4% e 600 m, a rampa média pode
206 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

ser obtida da relação entre a diferença total de cotas e a extensão total da rampa:

. 0,02. 400 + 0,04. 600


l
rn
éd"
Ia -
-
400 + 600 --3 ' 2% ·

Uma vez determinados os fatores de equivalência para caminhões e veículos


de recreação, o cálculo do fator de ajuste para a presença de veículos pesados na
corrente de tráfego, fHv, é feita usando-se a Equação5.9:

1
!Hv = -----------
1 + Pr(Er- 1) + PR(ER- 1)
O exemplo a seguir ilustra o procedimento.

Exemplo 5.5 Calcular o fator de ajuste f HV para um aclive de 5, 75%, cujo comprimento
é 1,6 km e está localizado numa 'freeway' onde existe 5% de caminhões e 3,5% de ônibus.

Solução: O fator de equivalência E r já foi computado no Exemplo 5.4 e vale 3,45.


Como não existem veículos de recreação, o fator de ajuste é:

1 1
fHv = = =O 828
1 + Pr(Er- 1) 1 + 0,085 (3,45- 1) ' ·

Fator de ajuste para tipo de motorista

O fator de ajuste /p, que trata da influência da familiaridade dos motoristas com a
via, varia entre 0,85 e 1,00. O HCM recomenda adotar o valor 1,00, a menos que
existam fortes indícios de que haja uma redução da capacidade por causa da falta
de familiaridade dos motoristas com a via- como seria o caso de uma 'freeway'
com maior movimento em feriados.

Determinação da velocidade de fluxo livre

O HCM recomenda que a velocidade de fluxo livre seja medida no trecho, a


partir de um estudo de velocidades de automóveis quando o fluxo for inferior
a 1.300 veic/(h.faixa). Caso isso não seja possível, pode-se aplicar um método
para estimar a velocidade de fluxo livre, que é baseado na expressão:

FFS = FFSi- fLw- fLc- fN- !JD (5.10)


5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 207

em que FFS: velocidade de fluxo livre [km!h]; Tab. 5.11: Ajuste para largura de faixas
FFSi: velocidade ideal de fluxo livre (120 ou 130 km/h); de tráfego
!Lw: ajuste para largura das faixas de tráfego [km/h]; Largura da faixa (m) fL w (km/h)
!Lc: ajuste para largura de acostamentos [km/h];
fN: ajuste para número de faixas de tráfego [km/h]; e 3,0 10,6
3,2 5.6
fio: ajuste para densidade de trevos [km/h].
3,4 2.1
3,6 0,0
O processo parte de uma velocidade de fluxo livre ideal, que o HCM
fonte: HCM2000: High»·ay CapaciN Mcmual. TRB. NRC.
sugere ser 130 km!h para 'freeways rurais' e 120 km!h para 'freeways' Washington. DC. EUA. 2000. p. 23-5.

urbanas. Dessa velocidade ideal são deduzidos os efeitos, expressos


em kmlh, de restrições presentes na 'freeway' com relação à largura Tab. 5.12: Ajuste para número de faixas
de faixas, largura de acostamentos, número de faixas e distância média de tráfego
entre trevos. Número de faixas fN (km/h)
A largura ideal das faixas de tráfego é 3,6 m (12 pés); quando a 2 7,3
largura média das faixas de tráfego for inferior a 3,6 m, a velocidade 3 4,8
de fluxo livre deve ser ajustada. O ajuste para largura das faixas de 4 2.4
tráfego, !L w, varia entre O km/h, para faixas de 3,60 m de largura, a 2::5 0,0
10,6 km/h para faixas de 3,0 m, como mostra a Tabela 5.11. Fonte: HCM2000: Highway Capacirv Manual. TRB. NRC.
Washington. DC. EUA. 2000. p. 23-6.
O número de faixas de tráfego também tem importância, pois numa
'freeway' com mais faixas, os motoristas podem posicionar-se melhor Tab. 5.13: Fatores de ajuste para densida-
para ultrapassar veículos mais lentos. As condições ideais estipulam de de entroncamentos, !I D
cinco faixas de tráfego; quando existem menos faixas, a velocidade Entroncamentos!km fi D (km!h)
de fluxo livre deve ser ajustada para refletir esse desvio das condições
0,3 0,0
ideais. O ajuste para número de faixas de tráfego varia entre 0,0 (5 fai-
0,5 2,1
xas) e 7,3 km/h (2 faixas), conforme mostrado na Tabela 5.12.
0,6 2,5
O HCM estipula que o fator de ajuste para o número de faixas de 0,8 6,0
tráfego não deve ser levado em consideração quando uma 'freeway' 0,9 8,1
1,1 10,2
situada em uma zona rural estiver sendo analisada e, nesses casos, fN
1,2 12,1
deve ser zero.
Fonte: HCM2000: Highway Capaciry Manual. TKB. NRC.
O espaçamento ideal entre dispositivos de acesso é 3,2 km (2 mi- Washington. DC. EUA. 2000. p. 23-7.

lhas), já que as entradas, saídas e áreas de entrelaçamento existentes


em trevos afetam significativamente o fluxo de veículos. Assim sendo,
a densidade mínima ideal é 0,3 entroncamentos/km e valores supe-
riores implicam em ajuste à velocidade de fluxo livre. O HCM considera que
o espaçamento mínimo aceitável entre entroncamentos numa 'freeway' é 800 m.
A densidade de entroncamentos deve ser calculada considerando-se o número de
trevos ao longo de um trecho de 10 km (5 km antes e 5 km depois do ponto de
208 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

interesse para a análise). O ajuste para densidade de entroncamentos varia en-


tre 0,0 (para 0,3 entroncamentos/km) e 12,1 km/h, para 1,2 entroncamentos/km,
conforme pode ser visto na Tabela 5.13.
O espaço livre nas laterais também interfere com o :fluxo de
tráfego. As condições ideais estipulam uma largura livre de pe-
Tab. 5.14: Ajuste para largura do acostamento
lo menos 0,6 m ao longo do acostamento do lado do canteiro
livre
central e de pelo menos I ,8 m ao longo do lado direito da pis-
Fator fLc (kmlh)
ta. Essa largura deve estar livre de obstruções tais como postes,
Número de faixas muros, guias, etc. O ajuste para a largura dos acostamentos é
Acostamento (m) 2 3 4 ;:::5 feito considerando-se apenas a largura livre do lado direito da
0.0 5,8 3,9 1,9 1,3 pista. O fator de ajuste é determinado em função do número
0.3 4,8 3.2 1,6 1,1 de faixas, já que o efeito é menor se existirem mais faixas de
0.6 3,9 2,6 1,3 0,8 tráfego. Larguras livres maiores que 1,8 m devem ser conside-
0.9 2,9 1,9 1,0 0,6
radas como sendo iguais a esse valor. O ajuste para largura dos
1.2 1,9 1,3 0,7 0,4
1.5 1,0 0.7 0,3 0,2 acostamentos depende da largura do acostamento e do número
1.8 0,0 0.0 0,0 0,0 de faixas de tráfego e varia entre 0,0 e 5,8 kmJh (apenas 2 faixas,
Fome: HCM2000: Highway Capacity Manual. TRB. NRC. Washington.·
sem acostamento), como mostrado na Tabela 5.14.
DC. EUA. 2000. p. 23·6.
A aplicação do método é bem simples, como mostra o exem-
plo a seguir, bastando obter os ajustes para cada fator e calcular
a velocidade de :fluxo livre. Deve-se usar interpolação linear para obter fatores de
ajuste para valores não tabelados.

Exemplo 5.6 Num trecho urbano de uma 'freeway ', existem 2 faixas de tráfego em cada
sentido. A largura média das faixas é 3,5 m e o acostamento do lado direito tem uma
largura livre média de 1,0 m. No trecho, a distância média entre cruzamentos é 1.250 m.
Estimar a velocidade de fluxo livre.

Solução: Como a 'freeway' está situada em zona urbana, a velocidade de :fluxo


livre ideal é 120 km/h. Os fatores de ajuste podem ser obtidos das Tabelas 5.11
a 5 .14, usando-se interpolação linear, se necessário. ·
Os ajustes necessários são !Lw = 1,03 kmJh (faixas de 3,5 m); fN = 7,3 kmJh (2
faixas por sentido); fi D = 6,0 kmJh (0,8 entroncamentos/km); e fLc = 2,57 kmJh
(largura livre de 1,0 m no acostamento). Assim, a velocidade de fluxo livre é:
FFS = 120- 1,03-2,75 -7,3-6,0 = 102,92 km!h.

5.5.4 Determinação do nivel de serviço

O procedimento para determinação do nível de serviço de uma 'freeway' tem quatro


passos:
5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 209

Passo 1: Dividir a 'freeway' em segmentos de características uniformes.


Passo 2: Construir a curva fluxo-velocidade apropriada para cada segmento, a
partir das curvas da Figura 5.17 e da velocidade de fluxo livre FFS que foi
medida no local ou estimada pelo procedimento descrito anteriormente. A
função fluxo-velocidade deve cruzar o eixo y na velocidade de fluxo livre
FFS do segmento.
Passo 3: Determinar a taxa de fluxo vP e, a partir dela, determinar, na curva vo-
lume-velocidade obtida no passo anterior, a velocidade S da corrente de
tráfego e o nível de serviço correspondente.
Passo 4: Determinar a densidade D usando a relação D = v p/ S. O nível de
serviço também pode ser determinado a partir das faixas de densidade for-
necidas na Tabela 5.6.

O HCM estabelece quatro tipos de aplicação para a análise de capacidade e


nível de serviço de 'freeways', sendo que cada serve para situações diferentes. O
HCM chama esses quatros tipos de análises tipo I a tipo IV As análises do tipo I
servem para responder a questões como Qual o nível de serviço da 'freeway' ?,
usando como parâmetros de entrada a taxa de fluxo horário v P e a velocidade de
fluxo livre FFS, fornecendo como resposta a densidade De o nível de serviço.
As análises do tipo II produzem uma estimativa de velocidade média da corrente
S como resultado, usando como parâmetros de entrada a taxa de fluxo vp e a
velocidade de fluxo livre FFS. Este tipo de análise deve ser usada quando se deseja
conhecer o tempo médio de viagem, como em estudos de viabilidade econômica
ou ainda em estudos de impacto ambiental (ruído e emissão de poluentes), que
dependem da velocidade média no segmento.
As análises do tipo III fornecem como resultado uma estimativa do fluxo de
tráfego, em cpe/(h.faixa), a partir do nível de serviço desejado e da velocidade de
fluxo livre FFS. Uma aplicação típica para este tipo de análise é a determinação da
época em que se deve investir na ampliação da capacidade da via, pela comparação
de taxas de fluxo de serviço com estimativas da demanda para os anos futuros.
As análises do tipo IV fornecem como resultado o número de faixas N que
fornecem um certo nível de serviço, a partir da taxa de fluxo vp, da velocidade de
fluxo livre FFS e do nível de serviço desejado. Este é o tipo de análise usada para
projeto de vias, quando se deseja determinar o número de faixas necessárias para
suportar um certo tráfego diário médio anual (TDMA), que é obtido de estimativas
do tráfego. Os exemplos a seguir, adaptados do HCM, explicitam como aplicar
210 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

esses quatro tipos de análise a problemas comumente encontrados na operação de


rodovias.

Exemplo 5.7 Qual o nível de serviço na hora pico de uma 'freeway' urbana, com severas
restrições geométricas, na qual o limite de velocidade é 110 km/h? A 'jreeway' tem 4
faixas (2 em cada direção) de 3,30 m de largura, acostamentos direito e esquerdo de
0,6 m, tráfego na hora pico de 2.000 veic!h (unidirecional), 5% de caminhões e ônibus
no tráfego na hora pico, fator de hora pico de 0,92, distância média entre dispositivos de
acesso de 1, 67 km e tráfego formado por motoristas habituados à via. A região tem relevo
ondulado.

Solução: Como todos os parâmetros necessários são conhecidos, não é preciso


adotar nenhum valor predefinido no manual. Deve-se calcular a taxa de fluxo v P
em cpe/(h.faixa) e estimar a velocidade de fluxo livre FFS para, a partir desses dois
parâmetros, determinar a densidade D, numa análise do tipo L
A demanda v P pode ser calculada a partir do fluxo observado na hora pico. Assim,

Vp=-------
v 2000
PHF .N -fHv -fp 0, 92 . 2 . f H V . 1, 0
Usando a Tabela 5.7 (pág. 202), pode-se encontrar o fator de equivalência E r = 3,
para Pr = 5% de caminhões e ônibus. Como não existem veículos de recreação
na corrente (PR = 0),
1 1
fHv = = =O 930 e então
1 + Pr(Er- 1) 1 + 0,05 (2,5- 1) '
2000 2000
vP = = = 1169 cpe/(h.faixa).
0,92. 2. fHv. 1,0 0,92. 2. 0,930. 1,0

A velocidade de fluxo livre pode ser calculada a partir da velocidade máxima per-
mitida, 110 km/h, que seria a velocidade de fluxo livre ideal, e dos valores de
ajuste:

!
largura das faixas: !Lw = 3,1 kmlh(Tab.5.1l,pág.207);
largura dos acostamentos: !L c = 3,9 km/h (Tab. 5.14, pág. 208);
número de faixas: fN 7,3kmlh (Tab. 5.12, pág. 207); e
densidade de entroncamentos: fiD = 3,9kmlh (Tab. 5.13, pág. 207).

Assim, a velocidade de fluxo livre da 'freeway' é

FFS = FFS;- fLw- fLc- fN- fiD = 110-3,1-3,9-7,3-3,9 = 91,8 kmlh.


Com a taxa de fluxo de tráfego vP = 1170 cpe/(h.faixa) e com a velocidade FFS =
92 km/h, pode-se verificar, no gráfico da Figura 5.17 (pág. 196), que o nível de
serviço é C.
5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 211

Ou, pode-se calcular a densidade De, pela Tabela 5 .6, determinar o nível de serviço
correspondente. Para urna 'freeway' de velocidade de fluxo livre de 92 kmlh, a taxa
de fluxo a partir da qual a velocidade da corrente passa a diminuir é cerca de
1700 cpe/(h.faixa). Corno v P = 1169 cpe/(h.faixa) é menor que essa taxa de fluxo,
a densidade pode ser calculada por

v 1169
D = _P_ =- - = 12 7 cpe/(krn.faixa).
FFS 91,8 '

Consultando-se a Tabela 5.5 (pág. 196), pode-se verificar que essa densidade cor-
responde ao nível de serviço C.

Exemplo 5.8 Quantas faixas de tráfego são necessárias para garantir nível de serviço
D na hora pico para uma nova 'freeway' suburbana que está sendo projetada? Prevê-
se um fluxo na hora pico de 4.000 veiclh (unidirecional), 15% de caminhões, 3% de
veículos de recreação, o fator de hora pico é 0,85. A densidade de entroncamentos é de
O, 9 entroncamentos/km, as faixas e acostamentos terão a largura ideal indicada no H CM
e o relevo é plano.

Solução: A análise é do tipo IV; segundo o HCM. Deve-se calcular a taxa de fluxo v P
em cpe/(h.faixa) para o nível de serviço D, supondo-se 2, 3 e 4 faixas de rolamento
em cada sentido, e comparar o valor calculado com a demanda.

Quantos aos parâmetros necessários para a análise, será preciso usar valores pre-
definidos para a velocidade de fluxo livre e para o fator de ajuste para o tipo de
motorista, já que essas informações não estão disponíveis. Corno a freeway é su-
burbana, pode-se admitir que a FFS seja 110 kmlh e adotar fp = 1,0, já que os
motoristas devem estar habituados à via. As etapas da solução são:

1. Converter o tráfego V [veic/h] para vp [cpe/(h.faixa)]:

Vp =
v =
v Ç;.
cpe/(h.1a1xa).
PHF. N. fHv. fp 0,85. N. fHv. 1,0

2. Calcular fHv, usando Er = 1,5 e ER = 1,2, que foram obtidos da Tab. 5.7
(pág. 202), terreno plano:

fHv = 1 + Pr(Er- 1) + PR(ER- 1)


1
!H v = 1 +O, 15(1,5- 1) + 0,03(1,2- 1)
!H v = 0,925.
212 Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

3. Determinar a taxa de fluxo vp para 2, 3 e 4 faixas de tráfego:

v
0,85.N.fHv.1,0
=>

4000
O, . . O, . , = 2.544 cpe/(h.faixa), para 2 faixas;
85 2 925 1 0
4000
vP O, . . O, . , = 1.696 cpe/(h.faixa), para 3 faixas; e
85 3 925 1 0

4000
O, . . O, . , = 1.272 cpe/(h.faixa), para 4 faixas.
85 4 925 1 0

4. Como 2.544 cpe/(h.faixa) é mais que a capacidade de uma faixa de tráfego


numa 'freeway', 2.400 cpe/(h.faixa), a opção com duas pistas é inviável.
5. Computar a velocidade de fluxo livre para as opções com 3 e 4 faixas, usando
os fatores de correção para o número de faixas, fN (Tab. 5.12, pág. 207), e
para a densidade de entroncamentos, fi D (Tab. 5.13, pág. 5.13). Os fatores
de correção para a largura das faixas de tráfego e dos acostamentos são zero,
pois as faixas e acostamentos terão a largura ideal. A velocidade de fluxo
livre para 3 e 4 faixas é:

FFS FFSi- fLw- fLc- fN- fiD =>


110- O- O- 4,8- 8,1 = 97,1 km/h, para 3 faixas; e
FFS { 110- O- O- 2,4-8,1 = 99,5 km/h, para4 faixas.

6. Pode-se calcular a densidade D para cada uma das duas opções e determinar
a densidade, usando-se a Tabela 5.5:
Vp
D = FFS =>
1.696
- ~
- = 17,5 cpe/(km.1aixa), ~ .
N S D (3 1ruxas); e
97,1
D
1.272
{ - ~ .
- = 12,8 cpe/(km.1aixa), NS C (4 fruxas).
99,5

Ou seja, a opção de construir uma 'freeway' com 3 faixas de tráfego em cada sentido
fornecerá nível de serviço D na hora pico.

Exemplo 5.9 Qual o nível de serviço, na hora pico, na subida e na descida de uma rampa
localizada numa 'freeway' rural com 2 faixas de tráfego em cada direção? A rampa é
5.5 Capacidade e nível de serviço de auto-estradas 213

composta por dois trechos de inclinação diferente: um aclive inicial de 300m e 3%, ao
qual se segue um aclive de 800 m com 5% de inclinação. O tráfego unidirecional de pico
é de 2.300 veiclh, com 15% de caminhões. O fator de hora pico é 0,90 e a velocidade de
fluxo livre foi medida no local e é 115 kmlh no aclive e 120 kmlh no declive.

Solução: Como a extensão total da rampa é menor que 1,2 km, a rampa composta
deve ser transformada numa rampa equivalente, através da diferença total de cotas
e do comprimento total da rampa:

i = 0,03. 300 + 0,05. 800 o 0445


1100 = ' .

A demanda deve ser transformada em cpe.h- 1 .faixa- 1 e o nível de serviço é deter-


minado a partir da velocidade de fluxo livre e da taxa de fluxo de tráfego, por meio
do uso do gráficodaFigura5.17. Pode-se supor que fp = 0,95,jáque os motoristas
não devem estar muito familiarizados com a 'freeway' por ela localizar-se em zona
rural. Os passos para a solução são:

1. Encontrar o fator de ajuste fHv para o aclive e o declive:


e Para um aclive de 4,45% e 1,1 km de comprimento, com 15% de cami-
nhões, Er = 3 (Tabela 5.8) e

1 1
0 769
fHv = 1 + Pr(Er- 1) = 1 +O, 15(3- 1) = · ·

e Para um declive de 4,45% e 1,1 km de comprimento, com 15% de


caminhões, Er = 1,5 (Tabela5.10)e

1 1
fHv - - = O 930.
- 1 + Pr(Er - 1) - 1 +O, 15(1,5- 1) '

2. Converter o tráfego observado V no aclive para taxa de fluxo v P que ocorre


nos 15 min mais congestionados da hora pico:

vp =
v =
2300
= 1.749 cpe.h- 1.faixa- 1 .
FHP. N. fHv. fp 0,90. 2. 0,769. 0,95

3. Determinar vp no declive:

v 2300 -1 . -1
Vp = --------------
FHP. N. fHv . fp
- - - - - - - - = 1.446 cpe.h .fmxa .
0,90. 2. 0,930. 0,95

4. Por meio do gráfico da Figura 5.17, determinar os níveis de serviço para o


aclive e o declive:
214. Capítulo 5. Análise da capacidade e nível de serviço de vias

..... ..... ·:· ..... ·:· ..... ..... ':' ..... ·:· ·:· ..... ·: ..... ·: ..... ':' ..... ·: ..... ':
i..
·~ ·~ ·1~~·0·

120 ---.:..-----:------:------:------:
. . . .
]100~---~--~--~.~~--~:~/~~~~~~~
E / / : 1 O

o 400 800 1200 2000 24 o


Taxa de fluxo de tráfego [ cpe/(h.faixa)]

Pode-se notar que o NS é C, tanto para o aclive (FFS = 115 krn!h) como para
o declive, onde FFS = 120 krn!h.

Para aprender mais

HCM2000: Highway Capacity Manual, Transportation Research Board, U.S. National


Research Council, Washington, DC, EUA, 2000.
É a fonte primordial da análise de capacidade e nível de serviço de rodovias, e esta-
belece os procedimentos para os estudos de capacidade. É revisto periodicamente,
para incorporar os avanços obtidos nessa área do conhecimento.

Exercícios

Problema 5.1 Qual o nível de serviço, na hora pico, numa 'freeway' com 6 faixas de
tráfego (nos dois sentidos) e tráfego unidirecional de pico de 5.000 veic/h? Qual o nível
de serviço daqui a 3 anos, quando o tráfego deverá ser 5.600 veic/h no período de pico?
Se a taxa de crescimento da demanda é 4% ao ano, quando deverá ser construída uma
faixa adicional? O relevo é plano; a 'freeway' está numa área urbana; existem 10% de
caminhões na corrente; o fator de hora pico é 0,95; e a velocidade de fluxo livre é 11 Okrn!h,
~ medida por um estudo de v~locidades.
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