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Introdução
1
Abreviaturas utilizadas: ANTT (Arquivo Nacional da Torre do Tombo), BNP (Biblioteca Nacional de
Por (...)
Carvalho e Melo, marquês de Pombal, influenciaram, em maior ou menor grau, as
decisões régias como privados ou validos de seus reis.2
2
Elliott, John H. & Laurence Brockliss (eds) (2000), The world of the favourite, Yale University Pre (...)
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Menezes, Luís de, conde de Ericeira (1945), História de Portugal Restaurado, Porto, Livraria Civili (...)
Em 1661, ano em que Castelo Melhor ingressou na casa real, a regente D.
Luísa de Gusmão e os seus conselheiros mais próximos tomavam medidas para conter a
influência do valido Antonio Conti Vintimiglia sobre o rei D. Afonso VI. Entre 1656 e
1662, Conti tinha passado de tendeiro do pátio da capela real a fidalgo e conselheiro 4.
Com o desterro de Conti em Junho de 1662, o monarca e os condes de Atouguia e
Castelo Melhor tomaram o poder anunciando a formação de um novo governo. Pouco
tempo depois, Castelo Melhor conquistava a privança do soberano. No mesmo ano, era
nomeado para o ofício de escrivão da puridade, tornando-se o mais importante ministro
da monarquia 5.
4
Sobre as mercês concedidas durante o valimento de Conti, veja-se o pioneiro artigo de Gastão de Mel
(...)
5
«Carta Patente Instaura o ofício de Escrivão da puridade, e nomeia para ele o Conde de Castelo Melh
(...)
6
Como sabemos, tais mudanças não significaram a extinção do valimento. Cf. Bérenger, Jean, «La supre
(...)
7
Acerca do «modelo» de privança de Luís de Haro e da influência do governo «pessoal» de Luís XIV no
(...)
a Portugal em 1685 e faleceu como um dos conselheiros de Estado de D. João V em
Agosto de 1720. Apesar de sua curta experiência como favorito (1662-1667), o
valimento de Castelo Melhor foi fundamental para os debates sobre as formas de
governo no Portugal da segunda metade do século XVII e no XVIII.
8
Ao longo do século XIX diversos literatos se ocuparam com o estudo do reinado de Afonso VI. Como
ex (...)
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Fernando Palha, O conde de Castel Melhor no exílio. Ensaio biográphico, Lisboa, Imprensa Nacional,
(...)
período de desterro do conde 10. Na década de 1930, Prestage voltou ao tema a partir da
perspectiva das relações internacionais. Destacando a importância da correspondência
diplomática para o entendimento do reinado de D. Afonso VI (1662-1667), Prestage
chamava a atenção para a inexistência de um estudo específico sobre a acção
governativa do conde Castelo Melhor. O autor situou o reinado afonsino no contexto
mais alargado do jogo político entre as monarquias européias do século XVII,
sublinhando a pressão exercida pelos franceses na corte lisboeta. De acordo com
Prestage, os interesses franceses, personificados na princesa Maria Francisca Isabel de
Sabóia e no representante de Luís XIV na corte portuguesa Saint Romain, foram
determinantes para a queda de Castelo Melhor. Nesse sentido, o conde não teria sido
derrubado somente por uma conspiração palaciana, mas também pelos agentes de Luís
XIV 11.
10
Edgar Prestage, «O conde de Castelo Melhor e a retrocessão de Tánger a Portugal» in Separata do Bol
(...)
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Prestage, Edgar (1930), «Castel Melhor e a rainha D. Maria Francisca» in Miscelânea de Estudos em h
(...)
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Matos, Gastão de Melo de (1935), «A Anticatastrophe: estudo crítico», in Separata do 2.° Volume do
(...)
que iria «celebrisar-se». Uma opinião contrária à de Silva foi exposta em um artigo do
médico e filósofo Eduardo Burnay (1853-1924). Em seu estudo sobre as relações entre
Castelo Melhor e um suposto grupo de envenenadores do duque de Sabóia, Burnay
afirmava que Castelo Melhor foi um homem «sem grande alma, que em certo momento
13
assumiria aventurosamente um papel à altura do qual se não mostrou» . Outros
exemplos desta dicotomia são os trabalhos dos historiadores Ângelo Ribeiro (1886-
1936) e Mario Sampayo Ribeiro (1898- -1966). Se o primeiro, em um capítulo de um
volume da História de Portugal dirigido em conjunto com Damião Peres (1889-1976),
advogou em favor de Castelo Melhor, o segundo associou-se com o partido oposto 14.
13
Silva, César da (1922), O conde de Castelo Melhor. Chronica episódica do reinado de D. Afonso VI, L
(...)
14
Ribeiro, Ângelo (1937) «A organização da vitória» in Damião Peres & Ângelo Ribeiro (orgs), História
(...)
15
Gastão de Melo de Matos (1944),, «O sentido da crise política de 1667», Anais da Academia Portugues
(...)
historiadores costumavam tomar partido contra ou a favor do valido, impedindo assim
um estudo rigoroso da sua ação. No seu entender, pouco se sabia ainda sobre a sua
biografia e as suas ideias 16.
Para que algumas das questões colocadas por Macedo fossem respondidas,
foi necessário um conhecimento mais aprofundado dos primeiros anos do Portugal dos
Bragança e da figura do valido em sua acepção institucional. Nesse sentido, um dos
trabalhos mais importantes foi escrito pelo historiador português Luís Reis Torgal. Em
seu livro Ideologia política e teoria do Estado na Restauração, Torgal estudou as idéias
políticas que fundamentaram o governo dos primeiros anos da dinastia dos Bragança.
Entretanto, diferente da análise de Gastão de Melo de Matos, a interpretação de Torgal
afastou-se das teses nacionalistas sobre a Restauração portuguesa. Sobre o reinado de D.
Afonso VI, o autor considerou a ascensão de Castelo Melhor como uma simples troca
17
de poderes entre sectores dominantes . De acordo com Torgal, apesar dos muitos
escritos políticos do Portugal do século XVII, poucos autores debruçaram-se sobre a
questão do valimento, o que sugeria a importância periférica da figura do valido no
contexto português 18.
16
Macedo, Jorge Borges de (1961), «O conde de Castel-Melhor. Ensaio biográfico», in Os grandes portug
(...)
17
Torgal, Luís Reis (1981 [1978]), Ideologia política e teoria do Estado na Restauração, Coimbra, Imp
(...)
18
Torgal (1981 [1978]), Ideologia política…, v. 1, p. 162.
observação. Esta mudança foi influenciada pelo diálogo entre a historiografia política
modernista portuguesa e outras tradições historiográficas 19.
19
Entre os trabalhos fundamentais nesse processo de revisão historiográfica: Albuquerque, Martim de (
(...)
20
Black, Maria Luísa de Bivar (1996), Um escrivão da puridade no poder. O conde de Castelo Melhor. 16
(...)
21
Além dos já citados trabalhos «O governo dos Áustrias…» e As vésperas do Leviathan…, veja-se do
mes (...)
22
Cardim, Pedro (1998), Cortes e cultura política no Portugal do Antigo Regime, Lisboa, Cosmos, p. 31
23
qualquer projecto político ou idéias previamente definidas . Em outro texto sobre a
casa real portuguesa, Cardim lembrou o desequilíbrio engendrado pela privança de
Castelo Melhor na distribuição de ofícios e cargos palacianos. Assim, com a
acumulação dos processos de decisão política e com o seu monopólio dos mecanismos
de distribuição das honras e mercês da coroa, o valido de Afonso VI despertou a
oposição aristocrática 24.
28
Valladares, Rafael (1998), La rebelión de Portugal (1640-1680). Guerra, conflicto y poderes en la M
(...)
29
Antunes, José Carlos Janela (2003), Le Portugal de la «Restauração». La politique du comte de Caste
(...)
30
Sobre os rendimentos da casa de Castelo Melhor durante o governo do valido. Cf. Salvado, João Paulo
(...)
31
Lourenço, Maria Paula Marçal (2007), D. Pedro II. O pacífico (1648-1706), Rio do Mouro, Círculo de
(...)
período do governo de Castelo Melhor. Chegamos à conclusão de que, apesar da
inexistência de uma extensa literatura de «espelhos de favoritos» em Portugal, a questão
do valimento parece ter sido uma preocupação constante dos autores que reflectiram
sobre as questões políticas da coroa portuguesa 32.
32
Dantas, Vinícius Orlando de Carvalho (2009), O conde de Castelo Melhor: Valimento e razões de
Estad (...)
33
Mello, Evaldo Cabral de (2003 [1995] ), A fronda dos mazombos: nobres contra mascates,
Pernambuco, (...)
governo de Castelo Melhor ficou marcado pela entrega de Bombaim aos ingleses em
1665, como parte do dote da rainha Catarina de Bragança 34. Esta tese de um descaso da
coroa portuguesa com a Índia durante o valimento de Castelo Melhor, foi desenvolvida
pelo historiador norte-americano Glenn J. Ames. De acordo com Ames, durante o
governo do conde a coroa portuguesa não tomou medidas que fortalecessem a
autoridade régia no Estado da Índia. Na opinião de Ames, esse desinteresse era
consequência directa das opções políticas de Castelo Melhor, pois as preocupações do
valido se limitavam aos assuntos continentais. Absorvido pelos problemas da Guerra da
Restauração, pelos assuntos diplomáticos e pela luta política na corte, Castelo Melhor
não dedicou a atenção necessária às questões do Estado da Índia 35.
Conclusão
34
Subrahmanyam, Sanjay (1993), O império asiático português, 1500-1700. Uma história política e econô
(...)
35
Ames, Glenn J. (2000), Renascent Empire? The House of Braganza and the Quest for Stability in Portu
(...)
36
Apesar de uma acusação comum aos reis que governaram com validos, no caso de D. Afonso VI, a
«incap (...)
permitiu importantes vitórias militares que determinaram o fim da Guerra da
Restauração e a paz com a Monarquia Hispânica em 1668. De outro lado, a imagem de
um vitorioso estadista que só agia em função dos interesses da monarquia carrega
consigo boa dose ingenuidade. Tal concepção não atenta para o facto de que, seguindo o
exemplo de outros validos, Castelo Melhor pôs em prática estratégias para a
conservação da sua privança e para a consecução dos seus próprios interesses.
Esta oposição parece ter sido o resultado de uma separação entre o governo
e o valimento de Castelo Melhor. Neste sentido, apesar da existência de uma ténue linha
de demarcação dos diferentes «papéis sociais» exercidos pelo ministro, estes só poderão
ser entendidos em suas relações intrínsecas. É necessário situar a experiência de Castelo
Melhor no contexto das práticas políticas da Europa do século XVII, aproximando-o de
outros validos que governaram no período. Na recente historiografia sobre os validos
encontramos numerosos estudos que partem deste princípio, oferecendo diversas
possibilidades de investigação para o estudo dos favoritos no governo e nas cortes 37.
Referencia en papel
Vinicius Dantas, « A privança no Portugal restaurado », Ler História, 64 | 2013,
201-214.
Referencia electrónica
Vinicius Dantas, « A privança no Portugal restaurado », Ler História [En línea],
64 | 2013, Puesto en línea el 11 noviembre 2014, consultado el 04 mayo 2016. URL :
http://lerhistoria.revues.org/263 ; DOI : 10.4000/lerhistoria.263
37
A bibliografia sobre o valimento é vastíssima. Listamos aqui alguns trabalhos essenciais: Tomás y V
(...)