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Rio de Janeiro
jan./mar. 2014
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Resumo: Abstract:
Este trabalho, inserindo-se nas celebrações do This paper is inserted in the celebrations of
tricentenário do congresso que conduziu à “Paz the tricentennial of the Congress which led
de Utrecht” no início do sec. XVIII, pretende to “Peace in Utrecht” at the beginning of the
destacar o papel do diplomata português D. Luis XVIIIth Century. It will give special attention
da Cunha (1662-1749) nas negociações preli- to the role of the Portuguese diplomat, D. Luis
minares de Portugal com Inglaterra, com vista da Cunha (1662-1749), during the preliminary
às negociações dos tratados de Utrecht (1713- negotiations with England aiming at further
1715). Nele pretendemos analisar a incidência negotiations of the Utrecht treaty (1713-1715).
dos assuntos econômicos e políticos no conjun- We intend to analyze the presence of economic
to das negociações desenvolvidas por D. Luís and political issues during those negotiations
da Cunha, salientando o papel que o Brasil viria carried out by D. Luis da Cunha, focusing on
a assumir, num contexto em que as recentes no- the role of Brazil, when the recent news of the
tícias da descoberta do ouro davam uma nova discovery of gold gave more importance to the
importância aos domínios coloniais portugue- Portuguese colonies at a time when the Europe-
ses, num tempo em que os Estados europeus de- an States started to draw their future strategies
lineavam as suas futuras estratégias de expansão for colonial expansion.
colonial.
Palavras-chave: História de Portugal; Período Keywords: History of Portugal; Colonial Pe-
colonial (Brasil); Paz de Utrecht; Europa sec. riod (Brazil); Peace of Utrecht; Europe XVIIIth
XVIII; D. Luís da Cunha; Abílio Diniz Silva. Century; D.Luis da Cunha; Abílio Diniz Silva.
2 – CUNHA, D. Luís da, ofº de 22.11.1700, pª Lisboa, ANTT, MNE, Livro 776, p.79.
3 – Idem, ibidem.
O “Oráculo da Política”
O sobrenome de “oráculo da política” que lhe atribuíram tem a ver
com a imagem que na época corria a seu respeito. Ele próprio a ela se
referiu, com a ironia que lhe era peculiar, em carta a Marco António de
Azevedo Coutinho, escrita da Haia, a 5 de junho de 1736, ao comentar
com tristeza a recente morte do secretário de Estado Diogo de Mendonça
Corte Real, e a hipótese de D. João V o convidar para assumir o cargo de
ministro principal:
7 – CUNHA, D. Luís da, carta para Marco Antº Azevedo Coutinho, de Haia, 5.7.1736,
Lisboa, ANTT, MNE, Caixa 789.
8 – Todas estas instruções têm data de 2.10.1696, e estão no Ms. 282 A da Biblioteca da
Academia das Ciências de Lisboa.
9 – Cf. FRANCIS, A.D., The Methuens and Portugal, Cambridge, at the University
Press. 1966, pp. 196 e sgs.
seu dinheiro, pois com o receio que ainda desçam mais, todos querem
vender as suas ações por muito menos do que lhe custaram.16
El Rey N.S. [...] me dera as suas reais ordens pª procurar nesta Corte
um milhão de cruzados, sobre as grandes somas que os EE GG lhe
estavam devendo, [...], eu tenho quem avance o dinheiro, e de Amster-
dão vos irá falar certo mercador inglês, com o qual podereis consultar
o negócio, porque [...] logo passará a esses Países uma pessoa de todo
22 – ANTT, MNE, Livro 778, fº 87 : ofício de 8.04.1704.
23 – ANTT, MNE, Livro 778, ffº 178vº-179 : ofício de 10.06.1704.
Por isso alertou Lisboa para a gravidade da situação, tal como era
apreendida no estrangeiro pelos círculos financeiros de Londres e Ams-
terdã, num notável, premonitório, e corajoso ofício para Roque Monteiro
Paim, datado de 24.06.1704, ao prever as consequências do inevitável
aumento dos impostos:
A vexação que esses povos sofrerão com a Décima é inigualável, onde
além de pagar-se das terras e casas, 4 em 20, pagam os que morrem,
24 – ANTT, MNE, Livro 783, fº 278.
Conclusão
Todos os exemplos que acabamos de referir mostram o potencial
de informação que possuía D. Luís da Cunha. O próprio D. João V já no
final da sua vida o reconheceu e lhe fez um sincero elogio numa carta para
sua filha Bárbara de Bragança, rainha de Espanha, datada 28 de julho de
1746:
Mas para além das “notícias mais puras”, há que salientar a impor-
tância do papel que desempenhou não só antes, como aqui evidenciamos,
mas também durante e após as negociações da Paz em Utrecht, ao pers-
pectivar os acontecimentos, prever as consequências e aconselhar o mo-
narca na condução política do Reino, nesse período tão decisivo. E nesse
sentido ele foi um verdadeiro “oráculo” da política.