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Literatura Comparada Obras

1. O que é a Literatura Comparada? De George Steiner

 Foi escrito pelo renomado crítico literário George Steiner. Publicado pela
primeira vez em 1967, a obra explora o campo da Literatura Comparada, que
se concentra na análise e comparação de literaturas de diferentes culturas e
idiomas.

 George Steiner acredita que a Literatura Comparada vai além da análise de


obras literárias individuais e busca entender as complexas relações entre
diferentes tradições literárias, culturas e idiomas.

 Steiner vê a Literatura Comparada como uma disciplina que examina como as


obras literárias são influenciadas por fatores culturais, históricos e linguísticos,
e como elas refletem as condições de suas origens.

 Acredita que a Literatura Comparada permite a exploração de temas


universais e humanos que transcenderam fronteiras geográficas e temporais.
Ele vê nessa disciplina a capacidade de revelar as semelhanças e contrastes
entre diferentes culturas e sociedades através da literatura.

 Ele explora a complexidade e os desafios da tradução, destacando como as


nuances e as conotações culturais muitas vezes se perdem no processo de
transposição de um idioma para outro. Steiner também discute o papel do
tradutor como um intermediário cultural e intérprete, e como isso influencia a
forma como uma obra é recebida em diferentes contextos linguísticos. Além
disso, o autor reflete sobre o potencial transformador da tradução, mostrando
como ela pode abrir portas para a compreensão e apreciação de culturas
diversas.

 Steiner destaca a importância do multilinguismo na formação e no


desenvolvimento da literatura. Ele argumenta que o conhecimento de
múltiplos idiomas é fundamental para os estudiosos de Literatura Comparada,
pois permite o acesso direto e aprofundado às obras literárias na língua
original, o que é crucial para uma compreensão completa das nuances e das
intenções dos autores.
Além disso, Steiner explora como o multilinguismo pode enriquecer a análise
comparativa, pois oferece a capacidade de examinar as convergências e
divergências entre diferentes tradições literárias de uma maneira mais precisa
e detalhada.
 Quanto às influências culturais na produção literária, Steiner argumenta que a
literatura é profundamente moldada pelas condições sociais, históricas e
culturais de sua origem. Ele examina como elementos como a política, a
religião, as normas sociais e os movimentos artísticos podem influenciar o
conteúdo e a forma das obras literárias.
Steiner também explora como os escritores são muitas vezes influenciados por
outras tradições literárias e culturais, e como essas influências podem ser
detectadas em seus próprios trabalhos. Ele destaca a interconectividade entre
diferentes culturas e a maneira como isso se reflete na produção literária
global.

 O autor aborda a natureza literária com uma perspetiva ampla e profunda. Ele
examina como a literatura transcende fronteiras linguísticas e culturais,
conectando pessoas de diferentes partes do mundo através da palavra escrita.
Steiner também analisa como a literatura é uma forma de arte que reflete a
condição humana, oferecendo insights profundos sobre a natureza da
existência, emoções, e questões universais.
Além disso, o autor considera a literatura como uma das maneiras mais
significativas de transmitir conhecimento e reflexão sobre a experiência
humana. Ele destaca como a literatura é capaz de capturar a complexidade e a
riqueza da vida de uma forma que outras formas de expressão podem não ser
capazes.
Steiner também explora as várias técnicas literárias, estilos e gêneros que
contribuem para a diversidade da produção literária ao redor do mundo. Ele
enfatiza como a linguagem é fundamental na criação de significado e na
transmissão de emoções e ideias.

 Steiner explora como a interpretação de textos é uma atividade essencial na


Literatura Comparada. Ele destaca a importância de considerar não apenas o
texto em si, mas também o contexto cultural, histórico e linguístico em que foi
criado.
Steiner examina como diferentes tradições literárias se relacionam entre si. Ele
destaca que a Literatura Comparada busca identificar padrões, influências e
interações entre as obras de diferentes culturas e idiomas. Steiner argumenta
que essa abordagem proporciona uma compreensão mais completa e
enriquecedora da literatura global.
O autor também enfatiza que a interpretação não é uma atividade estática,
mas sim um processo dinâmico que está sempre evoluindo à medida que
novas perspetivas e descobertas surgem. Ele encoraja os estudiosos a
abordarem os textos com mente aberta e a estarem cientes das
complexidades e desafios que a interpretação envolve.
Frases de Steiner:

 “Cada ato de receção de forma significativa, na linguagem, na arte, na música,


é comparativo”;

 “Aqui, o sentido jurídico deste termo é pertinente: um certo contrato de


eventual decifração, de avaliação informada, subscreve o encontro entre a
nossa sensibilidade e o texto ou obra de arte. Neste processo dinâmico,
denominado “hermenêutico” talvez em homenagem a Hermes, deus das
mensagens e ficções, a comparação está implícita.”

 “Na poética, como argumenta Coleridge na Biografia Literaria, tanto a


compreensão como o prazer derivam do desequilíbrio tenso entre o esperado
e o choque do novo, que é em si, no seu melhor, um choque de
reconhecimento, um dejá vu.”.

 “O processo semiântico é de diferenciação. Ler é comparar.”

 “Aquele que não conhece línguas estrangeiras, não sabe nada da sua própria
língua”.

2. Tradição e Talento Individual, T.S. ELIOT

 Eliot diz que os termos “crítica” e “tradição” são mal utilizados pela crítica da
poesia e, por isso, diz que merecem uma redesignação.
 A crítica é uma comparação das obras anteriores.
 O adjetivo de “tradicional”, no que diz respeito à avaliação de produção de um
poeta, implica uma falta de individualidade em relação às obras do passado.
 No momento de elogiar um poeta, foca-se o quanto ele menos se assemelha
aos outros, e neles se procurava achar a sua própria essência.
 O conceito de tradição para Eliot envolve um sentido histórico que implica a
perceção da presença do passado no presente. A obra de um poeta não tem
valor absoluto em si, a apreciação que temos dela constrói-se ao que ela
mantém com as obras precedentes.
 Eliot entende esta relação como uma “ordem ideal”. Ao surgir uma nova obra
de arte é reajustada a “ordem ideal”, a qual é realizada com base em valores e
sentidos, de forma a que haja harmonia. Se a nova obra não reajustar a ordem
não é uma nova obra.
 Para Eliot a crítica não se trata de julgar se a obra foi melhor ou pior que as
precedentes, mas de uma comparação com elas. O poeta deve poder se
apropriar do passado com uma certa capacidade crítica de seleção. A sua
originalidade reside na sua postura crítica e criativa, na maneira em que a sua
criação dialoga com as obras anteriores.
3. Reflexões sobre o Exílio de Edward Said

 Said explora a experiência de estar fora do seu país natal, Palestina, e como
isso influência a sua perspetiva do mundo.
Ele também analisa a relação entre os intelectuais e o poder político,
criticando a orientação muitas vezes distorcida dos discursos acadêmicos e
mediáticos. Ao longo da obra, Said enfatiza a importância de uma visão crítica
e autêntica na compreensão dos eventos globais e na construção de uma
sociedade mais justa.

Ideias de Said:

 Argumenta que a identidade não é algo fixo, mas sim multifacetada e


influenciada por fatores como a cultura, história e experiências individuais.
 O exílio pode ter um efeito profundo na perceção e na formação da identidade
de um indivíduo. Said fala sobre a sua experiência.
 O autor destaca a responsabilidade dos intelectuais de desafiar as narrativas
dominantes e promover uma compreensão mais justa e equitativa do mundo.

Relações da obra com Literatura Comparada

 Ambos exploram as diferenças culturais e as complexidades das tradições


culturais. A literatura comparada muitas vezes examina como obras de
diferentes culturas são traduzidas, interpretadas e reinterpretadas.
 Tanto a literatura comprada quanto Said desafiam as fronteiras tradicionais da
literatura, questionando as caracterizações rígidas e incentivando a exploração
de formas literárias e estilos de escrita diversos.

4. O Egito de Eça de Queirós

O orientalismo—Termo que se refere à representação estereotipada e muitas vezes


exótica do Oriente. O conceito estende-se na arte e na literatura, influenciando várias
áreas, incluindo política, economia e relações internacionais.

Resumo:
 O Oriente será, nesta obra, uma referência mítica e real.
 A rápida viagem até ao Egito vai mudar Eça completamente a sua vida
 Ao chegar ao Egito Eça impressiona-se perante a perspetiva de pôr o pé
naquele solo. Eça descreve o mundo oriental como algo que cria nos
espectadores curiosidade de forma a parecer um espetáculo. Eça é
influenciado imagens, pinturas sobre o oriente.
 O oriente sugere ao viajante ocidental fecundidade, sensualidade e desejo. É
frequente a apreensão do Oriente como uma atmosfera natural de
feminilidade, pois sempre houve imagens escritas e imagens pictóricas
(pinturas de mulheres)
 Eça revela um espírito original no vasto campo do orientalismo oitocentista e
concorda com Said quando diz que procurara um sentido na vida no Oriente
sendo- se habitante do Ocidente é não procurar nada --- Coloca a civilização
Ocidental superior
 Eça quando viajou para o Oriente encontrou o passado antigo, que estará
indelevelmente presente em ficções futuras, mas encontrou também uma
realidade dua contemporânea tão substancialmente diferente da que
conhecera até então. Eça partiu para o Oriente como um jovem impregnado
pelo romantismo, regressa um entusiasta do realismo.
 Eça sucumbiu para sempre ao fascínio evocado nas suas ficções sobre o
Oriental. Ao início vai ser portador de preconceitos e pouco a pouco vai
desfazendo essas ideias.
 No primeiro parágrafo há uma ideia de escuridão que vai sendo adjetivada de
uma determinada forma. Grande escuridão, ruas estreitas, há um julgamento
de valor associado à perigosidade
 No terceiro parágrafo é salientada a indominável curiosidade e o autor
aproxima-se o leitor dirigindo-se a ele como um ser também curioso. Há uma
idealização de que o Oriente é o harém (espaço onde viviam as mulheres de
um único homem)
 No quinto parágrafo há insistência da curiosidade da vontade de querer ver
como numa peça de teatro. Há uma referência à comédia (situações visíveis
como forma de educação “ridendo castigat mores), em que se cria uma
distanciação entre narrativa e o espectador

5. How do Literary Works Cross Borders (or Not)? De G. Sapiro

 Segundo G. Sapiro os fatores que funcionam como barreiras à circulação de


obras literárias para além das suas fronteiras geográficas podem ser
classificados em 4 categorias: políticos (maior foco por parte dos
historiadores), económicos, culturais (maior foco por parte dos estudiosos de
literatura) e sociais (maior foco por parte dos sociólogos de cultura).
 Aborda a temática da circulação de textos. Um texto pode enfrentar barreiras
linguísticas e sociais.
 Diz que as ideias não se propagam através da mente, por contágio, mas a
propagação é mediada por meios físicos como livros e jornais ou através da
oralidade em espaços públicos ou privados.
 A construção de bases de dados permite este estudo de propagação, porque
permite estudar que obras são traduzidas e quem as traduz, detetando
padrões e irregularidades.

Aspetos a favor da tradução (Aspeto político)


 A tradução pode servir como forma de espalhar uma doutrina. Exemplo: a
tradução da Bíblia
 A disseminação de um certo livro pode ser interrompida, numa certa
religião, através das restrições impostas na imprensa e da implementação
da censura nos livros publicados.
 A tradução pode surgir como dinâmica de poder entre países
 O apoio do estado para as traduções estrangeiras pode surgir como uma
tentativa de elevar um país ao nível internacional

Aspetos económicos
 O desenvolvimento capitalista dos editores de livros promoveu a
circulação dos mesmos, que foi bastante influenciada pela
industrialização do século 19 (Aspeto positivo)
 A falta de redes de distribuição de livros faz com que, por exemplo,
livros da língua árabe fossem pouco desenvolvidos. (Aspeto negativo)
 A lei do copyright regulou o mercado internacional de obras literárias
e a proteção do autor contra o plágio. Contudo, também se apresenta
como uma limitação, pois autores dos países mais pobres não podem
pagar pelos direitos de autor. (Aspeto negativo)
 Em países em que o mercado dos livros foi liberalizado, o livro é visto
como um objeto comercial, pelo que deve obedecer às leis do
mercado, de modo a que seja mais vendido.

Aspetos culturais

 As editoras dos diferentes países imitam-se umas às outras. Este


aspeto dá origem ao isomorfismo das publicações
 As obras mais traduzidas tornam-se o novo cânone da literatura
mundial, substituindo lentamente o cânone Greco-latino, limitado à
literatura europeia.
 Começa a haver uma procura de textos de outros países, como forma
de educação sobre a cultura destes

Aspetos Sociais

 A propagação e a circulação dos livros está associada a relações de


poder entre grupos sociais
 O cânone era composto maioritariamente por homens, brancos e
ocidentais.
Poema de Petrarca CXXXIV

 O sujeito poético está a sofrer por amor


 Descrição de sentimentos contrários (antíteses)
 Só sabemos o motivo dos sentimentos contraditórios no final do poema
 Sentimentos contraditórios muito fortes “Paz não encontro e nem quer a guerra”
 O poema abrange os seus sentimentos e os da outra pessoa. “Quem me prende não
larga nem encerra / Nem me quer vivo nem quer meu trespasso”
 Representação de um amor platônico (referência de um amor inatingível). A poesia
amorosa deixa de ser algo somente espiritual, mas também lhe causa sensações
físicas. Para além disso deixa de haver a relação de vassalagem que existia nas cantigas
de amor e passa a haver uma relação e um estado amoroso mais próximo entre as
duas partes. A sua poesia também apresenta uma autoinspeção, reconhece o seu
estado antitético na forma como se sente.
 O poema de Camões “Tanto de meu estado acho incerto” imita o poema de Petrarca

As aventuras de Robinson, Daniel Foe

 Numa das viagens que tem de fazer entre o continente e o Brasil acaba por
sofrer um naufrágio
 Obra escrita por Daniel Defoe e considera-se esta obra o primeiro romance
inglês.
 Esta obra escreve-se no romanesco por meio da narrativa de uma história
fictícia, que envolve personagens e situações imaginárias. O romanesco é um
género literário caracterizado pela narrativa de romances, ou seja, histórias
extensas e fictícias que exploram diversas situações e eventos. Nesse sentido,
a obra de Daniel Defoe encaixa-se perfeitamente nesse género, uma vez que é
um romance que conta as desventuras do protagonista Robinson, que após
um naufrágio, é deixada sozinha numa ilha deserta. Também explora questões
emocionais como a solidão, a sobrevivência, a relação com os animais e a luta
contra os elementos da natureza. É uma obra que cativa o leitor ao levá-lo
para um mundo imaginário repleto de aventuras e desafios
 Há muitas reflexões ligadas à religião durante a obra. Por esta razão o seu
escravo (sexta-feira) tem um nom não cristão, pois ele não era batizado.
 O autor ao descrever o Sexta-feira usa muito, “mas” para mostrar que o Sexta-
feira não é assim tão diferente dos europeus. “A cor da sua pele não era negra,
mas sim morena” — tenta tornar a personagem menos estranha para o autor.
 Na maneira como o sujeito descreve a forma do Sexta-feira se inclinar e ser
submisso é uma maneira de justificar a colonização. A obra surge como
justificativa da colonização sendo que a mensagem que passa é que se acha
que os indígenas precisam de ser ajudados, ou seja, colonizados.
 Robinson é um herói que passa pelas peripécias sozinho.
 Do ponto de vista comparatista é interessante ver que esta obra vai ser
reescritas adaptando a um tipo de público ou a um momento da história.
 Descrição do Sexta-feira como uma pessoa que não era assim tão “má”. O sujeito tem
uma visão eurocêntrica e então para ele todas as pessoas que não têm aspeto europeu
parecem estranhas. O sujeito descreve o Sexta-feira como um intermédio entre o
europeu e as outras raças, dizendo que “não era assim tão mau”

 O nome Sexta-feira surge, pois, o escravo foi “salvo” numa sexta-feira e o sujeito
pensou que não lhe poderia dar um nome cristão, porque ele não tinha sido batizado.

 O sujeito fez o sexta-feira crer que tinha sido salvo por ele e deu-o a entender que
tinha de ser seu servo, dizendo-lhe que o seu nome era “Amo” —Visão de quem é a
favor do colonialismo

 Grande crítica ao canibalismo. Robinson irrita-se com o Sexta-feira, porque ele sugeriu
cometer canibalismo com duas pessoas.

 No final, o sujeito percebe que Sexta-feira apesar de ser diferente, se fosse instruído
de maneira correta agiria de forma correta também, pois Deus deu a todos os
humanos os mesmos valores.

A ilha de Coetzee

No romance de Coetzee há uma referência direta à obra de Daniel de Foe, mas


transforma-o numa história do ponto de vista de uma mulher, que não existia na obra
de Foe,no entanto tem semelhanças. Por exemplo, a ilha é narrada pela mulher. Este
facto é interessante, pois dá lugar à mulher para falar em vez de ser falada.
Susan não fica à espera do “homem” como era de costume e, na obra.
O romance vai refletir sobre a própria narrativa (visão que a Susan dá do que viveu na
ilha) não é a mesma visão de Daniel Defoe
O conto está dividido em 4 partes. A última é breve, que se torna ambígua, porque
não se sabe quem é o narrador (Susan e a , Friday ainda agora aprendeu as letras) há
uma outra voz narrativa que o leitor não sabe quem é o que deixa em suspenso tudo o
que se pode ter passado.
 Esta reescrita de Coetzee é uma paródia (conceito de Linda Hutcheon, que vai
perceber que a reconstrução de algo tradicional é uma paródia).
Sexta-feira ou vida selvagem de Michel Turnier

 Numa relação de paratextualidade, o título vai mostrar que nesta obra é Sexta-feira a
personagem principal, no entanto a imagem da capa continua a mostrar a submissão
de Sexta-feira
 Neste texto, é Sexta-feira que vai ensinar Robinson a divertir-se, entreter com a
natureza …
 É visível no texto uma evolução do Sexta-feira, evolução esta que ressoltou do
trabalho/colonialismo de Robinson.
 Apesar de que Sexta-feira e Robinson têm uma relação de entreajuda é referido no
texto que Sexta-feira trabalhava arduamente e Robinson reinava como um senhor.
 Sexta-feira não entendia as regras e os ideais ocidentais que eram ensinadas por
Robinson, mas tentava aplica-las, no entanto caía na “asneira” --- Ideal de
superioridade dos ideais do Ocidente comparativamente com outros

A gata borralheira, Sophia de Mello Breyner Andersen

 O incipit da obra é o primeiro parágrafo e é falada a noite é descrita “Como uma


rapariga descalça a noite caminhava leve e lenta sobre a relva do jardim.”. Esta
expressão compara a noite a Lúcia (gata borralheira) e é como que um presságio, pois
ao dizer “descalça a noite” vai remeter para o momento em que a gata borralheira fica
descalça.

 Lúcia, personagem principal, jovem de 18 anos, vai ao seu primeiro baile e fica
perplexa com aquele cenário glamoroso. Pouco tempo depois Lúcia juntou-se à filha
da dona da casa e ao seu grupo, mas acabou por ficar excluída. Ela não conseguia
acompanhar as conversas, fez uma pergunta e ninguém lhe respondeu e quando
foram todos dançar, Júlia ficou sozinha, ninguém a convidou para dançar. De seguida,
duas meninas olharam para Lúcia com ar de desdenho, como se quisessem abandonar
a festa.

 Lúcia passa por um espelho e recorda o momento em que conseguiu o vestuário para
a festa. Lúcia não gostava do vestido, achava-o feio, mas foi o único que a madrinha
lhe deu, o mesmo aconteceu com os sapatos encontrados no sótão. Lúcia tinha de ir
ao baile e, por isso, estava disposta a ir de qualquer forma, mas quando se deparou
com o espelho percebeu que não se enquadrava naquele ambiente e referiu que não
deveria ter ido.
 Lúcia voltou a ver-se ao espelho e vendo que estava pálida concluiu que precisava de
maquilhagem. Este aspeto salienta o quanto ela queria parecer “normal” entre as
outras pessoas. O facto de estar pálida é algo natural da tristeza que passava sobre ela,
no entanto ela queria estar inserida na alegria que pairava na festa. De seguida, saiu o
sapato a Lúcia e ela aterrorizada pensou que alguém tivesse visto que aquele era o seu
sapato (não queriam que soubessem que ela era de uma classe inferior). Foi ao quarto
de vestir e deparou-se com uma conversa de 3 meninas que falavam mal dela, na qual
se conclui que Lúcia seria mais bonita se estivesse vestida de maneira mais adequada.

 Lúcia voltou a ver-se ao espelho, estava mais pálida do que antes rapidamente voltou
a colocar maquilhagem, mas, entretanto, surgiu a 3º menina da casa de banho, que lhe
disse que aqueles espelhos eram como as pessoas más e não mostravam a verdade
sobre ela. Lúcia sentiu-se muito confusa com a simpatia da menina, mas ao mesmo
tempo pareceu-lhe que a menina a queria proteger de um perigo que ela não via

 Lúcia debruçou-se sobre uma janela e viu a filha da dona da casa a dançar com um
rapaz que se depois foi falar com Lúcia e até pediu para dançarem. Estava tudo muito
encantador, pois Lúcia encontrou uma pessoa que a pudesse ascender socialmente,
mas quando deu por si estava no meio do salão a dançar. Entretanto o seu sapato saiu
e Lúcia viu-se obrigada a ignorar que aquele sapato era seu para não se sentir
injuriada. Quando a música parou a dona da casa disse a um empregado para retirar o
sapato, o qual foi levado com o auxílio de pinças. Este aspeto realça o desprezo que
aquelas pessoas tinham pela classe mais baixa.

 Lúcia encontrou outro espelho numa salinha e decidiu tentar fugir da sua imagem, mas
não conseguia, ela sempre a encontrava. Viu o rapaz com quem dançara sentado num
banco à espera dela, mas não conseguiu ir ter com ele com a vergonha que tinha por
achar que ele sabia que o sapato era dela. Lúcia reflete que precisa de ir viver com a
sua madrinha e fê-lo, porque pensava que a vida com a madrinha iria fazer com que
ela pertencesse àquele mundo e na realidade ela teve tudo o que queria a partir desse
momento, tinha tudo sem se esforçar muito, no entanto Lúcia guardava o seu vestido
antigo, dizia que o queria queimar, mas não chegava a fazê-lo, pois algo dentro dela
dizia-lhe que aquela era a sua verdadeira identidade.

 Lúcia foi convidada para um novo baile na mesma casa onde tinha acontecido um
passado, mas desta vez Lúcia sentia-se bem. Ela chegou ao baile com um vestido
adequado e sapatos que eram de invejar. Os espelhos da casa diziam que ela era mais
bonita daquele baile, até que Lúcia decidiu ir à salinha que tinha estado à 20 anos
atrás, pois queria que aquele espelho dissesse que ela era a mais bonita, no entanto o
espelho gelou-lhe a alma e ela viu-se com o vestido que usou no último baile naquela
casa. Entretanto encontrou o rapaz com que tinha conversado e ele recordou-a da
noite em que se conheceram e que nessa noite ela tinha os sapatos feios e obriga-a a
calçar um dos sapatos. Lúcia quer fugir dessa realidade, mas o seu corpo está
imobilizado. Ela vê tudo o que conseguiu conquistar a ser desfeito. No dia a seguir ela
é encontrada sem vida por uma síncope cardíaca. As pessoas que a viram morta nunca
chegaram a perceber como é que ela tinha morrido com um sapato de brilho e o outro
todo roto. As pessoas falaram muito da sua morte durante algum tempo, mas depois
Lúcia foi esquecida.

NOTAS IMPORTANTES: Não adiantava mudar a sua vida, ela seria lembrada pela sua vida
anterior. Lúcia acaba por desaparecer de vez para aquele meio social. Depois da sua morte foi
esquecida, mas a sua imagem no espelho permaneceu. Ela morre, mas a história da gata
borralheira permanece. A sua vontade de ter uma vida glamorosa não adiantou de nada.

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