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C OMP AR ATIVE LITE R ATU R E :

L O C A L H I S T O R I E S , G L O B A L Q U E S T I O N S

O Q U E FA Z E M O S C O M P A R AT I S TA S A O R E D O R D O
M U N D O ?

Prof. Vitor Cei


EOYANG, Eugene Chen; ZHOU, Gang (org.).
Dossier Comparative Literature: local histories,
global questions. Revista Brasileira de Literatura
Comparada, v. 18, n. 30, 2017. Disponível em:
<http://revista.abralic.org.br/index.php/revista/issue/
view/28>. Acesso em: 12 mar. 2018.
INTRODUÇÃO
• “O espaço de comparação hoje envolve comparações entre produções artísticas
usualmente estudadas por diferentes disciplinas; entre diversas construções culturais
daquelas disciplinas; entre tradições culturais ocidentais, tanto elevadas quanto
populares, e aquelas de culturas não-ocidentais; entre as produções culturais de povos
colonizados pré e pós-contato; entre construções de gênero definidas como femininas
e aquelas definidas como masculinas, ou entre orientações sexuais definidas como
convencionais e aquelas definidas como gay; entre modos raciais e étnicos de
significação; entre articulações hermenêuticas de sentido e análises materialistas de
seus modos de produção e circulação; e muito mais. Esses modos de contextualização
da literatura nos campos expandidos de discurso, cultura, ideologia, raça e gênero são
tão diferentes dos velhos modelos de estudo literário conforme autores, nações,
períodos e gêneros, que o termo ‘literatura’ não pode mais descrever adequadamente
nosso objeto de estudo”.
(BERNHEIMER et al, 1993, p. 41-42, apud ARAÚJO, p. 190).
PERCURSOS LOCAIS, ITINERÁRIOS GLOBAIS

Amilton Queiroz (UFAC) & Simone Lima (UFAC)


PERCURSOS LOCAIS, ITINERÁRIOS GLOBAIS

• “Desde seu nascimento, no século XIX, a Literatura Comparada tem atuado


como um campo heterogêneo de encontros interdisciplinares, incorporando à
sua metodologia os fluxos das correntes teóricas dos séculos XX e XXI.
Circunscrita nesses interstícios temporais, a Literatura Comparada tem
constituído via de mão de dupla para examinar o literário e suas geografias
locais nos mapas globais da diferença”.

• “Notabilizada pela errância, a Literatura Comparada move-se na órbita dos


imaginários intercontinentais, realçando os pontos nevrálgicos da diferença
entre contextos. Como espaço de contato friccional, ela está circunscrita
líquida e liminarmente à bifurcação de culturas, línguas e trânsitos, permitindo
o estudo dos rastros do alheio no próprio e vice-versa”.
PERCURSOS LOCAIS, ITINERÁRIOS GLOBAIS

• “O contínuo deslocamento da Literatura Comparada pelo território da inter,


multi e transdisciplinaridade reenergiza seu campo de atuação, conjugando o
elemento forâneo e o de dentro para mapear os intercâmbios como sua marca
de singularidade diversa de ler o literário”.
• Eurídice Figueiredo coloca o comparatista diante da necessidade de
reconhecer que “a clausura do/no nacional tem impedido a compreensão de
movimentos e tendências surgidos em país ou área linguística têm correlação
com outros muito mais amplos que atingem outras regiões, constituindo-se em
macro-regiões” (FIGUEIREDO, 2013, p.45).
PERCURSOS LOCAIS, ITINERÁRIOS GLOBAIS

• “Se a Literatura Comparada hoje vier a realizar a passagem do enfoque


tradicional estável das nacionalidades para o enfoque móvel e aberto à
diversidade e à relação, representado pela transculturalidade, então penso que
podemos continuar a considerarmos comparatistas” (BERND, 2013, p.220).
Para Bernd, é preciso afrontar as fronteiras da Literatura Comparada,
procurando investigar a passagem do nacional ao transnacional e da
transnacionalidade à transculturalidade. O estudo dessas relações transversais
remodela o estatuto do comparativismo através da busca, sobretudo, de flagrar
as marcas de convergência das múltiplas abordagens e alargamento das
fronteiras do literário.
PERCURSOS LOCAIS, ITINERÁRIOS GLOBAIS

• “verifica-se que os estudos comparatistas são dinâmicos. Ao reconhecer isso, Benjamim Abdala
Junior enfatiza que “as articulações comunitárias podem ser de múltiplas ordens e
politicamente nos parece importante revelar que o mundo atual é de fronteiras múltiplas e
identidades plurais, seja numa perspectiva individual, nacional ou de agrupamentos sociais”
(ABDALA JUNIOR, 2012, p. 35).
PERCURSOS LOCAIS, ITINERÁRIOS GLOBAIS

• Tania Carvalhal, refletindo sobre a Literatura Comparada, concebe-a como “prática intelectual,
que sem deixar de ter no literário o seu objeto central, confronta-o com outras formas de
expressão cultural” (CARVALHAL, 2003, p.48).
• “a Literatura Comparada continua transitando pelo texto literário, entretanto, tem alargado,
significativamente, seu espectro de compreensão em torno da inflexão do transcultural no
território do comparativismo praticado hoje, posicionado na emergência de novos paradigmas
epistemológicos”.
• Posicionada no jogo das trocas culturais, a Literatura Comparada analisa as diferenças, os
diálogos transterritoriais e as interações com outros saberes.
LITERATURA COMPARADA NA
NOVA ZELÂNDIA
Mark Williams
LC NA NOVA ZELÂNDIA

• Idiomas oficias: inglês, maori e língua de sinais neozelandesa.


• Code-switching (alternância de códigos linguísticos): quando um interlocutor
alterna entre diferentes línguas, ou variedades linguísticas de um mesmo
idioma, no contexto de um único discurso.
• Ênfase na mistura de Maori, Inglês e línguas do Pacífico. O argumento é que o
intercâmbio entre línguas ocidentais e indígenas progressivamente transformou
a prática da escrita literária na Nova Zelândia e que este 'entrelaçamento' de
elementos linguísticos constitui um distinto e significativo assunto para o
estudo comparativo contemporâneo.
LC NA NOVA ZELÂNDIA

• Destacam-se os Estudos Pós-Coloniais e Estudos Culturais.

• Anos 1940-1950: eurocentrismo tenta apagar a herança cultural maori.


• Anos 1970: Renascimento Maori e Biculturalismo.
• A partir dos anos 1980: Multiculturalismo.
LITERATURA COMPARADA NA
ALEMANHA

Análises e avaliações provisórias do estado de uma


disciplina multifacetada

Monika Schmitz-Emans
LC NA ALEMANHA

• Os campos de pesquisa atuais são numerosos e fortemente diferenciados.


• Questões de recepção, influência, definição de eras e modelos de história
literária, bem como problemas de tradução, performances e multilinguismo.
• Tópicos e assuntos na intersecção entre literatura, ciências sociais e
historiografia.
• Colonialismo, pós-colonialismo, migração e transculturação.
• Estudos Culturais, interculturais e multiculturalismo.
• Estudos Interartes e Intermidiáticos, Literatura e imagem, Literatura e música.
• Literatura mundial, o cânone e suas problematizações.
LC NA ALEMANHA

• Influências da Literatura Comparada francesa e americana


• Influências de paradigmas de outras disciplinas: ciências sociais, psicologia,
estudos culturais, estudos de mídia, cultura visual, estudos de gênero, Ecocrítica
e estudos pós-coloniais.
• Na Alemanha, a Literatura Comparada é "pequena", mas bem integrada a
outras áreas.
• Só se pode esperar, no entanto, que, dado as suas várias alianças, às vezes
estreitas, com outras disciplinas, e com orientação para novos paradigmas de
conhecimento e discursos atuais de conhecimento, ela permanecerá o que é:
um estudo da literatura.
LITERATURA COMPARADA NA
SUÉCIA

Anders Pettersson
LC NA SUÉCIA
• O sueco é uma língua falada por poucos e o estudo de línguas estrangeiras -
principalmente inglês, alemão e francês - tem uma importante posição no sistema
educacional sueco.
• O fato de que a Academia Sueca concede o Prêmio Nobel de Literatura também
pode ter suscitado algum interesse extra na literatura mundial e alguma demanda
extra por literatura com um amplo horizonte internacional.
• Ainda assim, a Literatura Comparada não é realmente uma disciplina acadêmica na
Suécia. Os estudos literários têm sido conduzidos de modo a englobar, em princípio
pelo menos, a história e a teoria da literatura de todas as culturas e épocas.
• O fato de não existir como disciplina acadêmica separada não impediu que os
estudiosos suecos às vezes se envolvessem no trabalho em "Literatura comparada“, se
entendermos - como farei aqui - o estudo da literatura de um ponto de vista
internacional, um estudo não limitado a uma nação específica, pessoas ou linguagem.
LITERATURA COMPARADA NOS
ESTADOS UNIDOS

Dorothy Figueira

University of Georgia
LC NOS EUA
• A Literatura Comparada, ao contrário de outras disciplinas, não é dogmática, nem
excludente. Pode-se estudar o que quiser, desde que o faça com seriedade.
• Promiscuidade teórica causa embaraço no diálogo com especialistas.
• A partir dos anos 1970 o cânone literário passou a ser considerado elitista e
excludente: burguês, machista, racista, homofóbico. Advento do Multiculturalismo e
dos estudos étnicos e de gênero: Identity Studies, Black Studies, Women’s Studies e
outras minorias: Hispanic, Native-American and Asian-American.
• Os Estudos Culturais tentam substituir os Estudos de Literatura Comparada.
• Imperialismo: os estudos de minorias são feitos em inglês, por uma elite intelectual.
• “É claro que os estudantes do século XXI precisam ser capazes de experimentar e
interrogar a totalidade das literaturas do mundo, não apenas o produto restrito e
diluído embalado e comercializado pela gerentes autônomos das universidades
americanas”.
LITERATURA COMPARADA NA
GEORGIA

Irma Ratiani
LC NA GEORGIA

• Idiomas: georgiano (oficial), abcázio e osseto.


• Durante os 70 anos de União Soviética na Georgia (1921-1990), a Literatura
Comparada (que expandiria as fronteiras da pesquisa além dos países soviéticos e
socialistas) foi substituída pelos “Estudos Literários Histórico-Comparativos”, com
foco nas relações literárias entre os países soviéticos e socialistas.
• Os estudos de LC tiveram início nos anos 1990 e se consolidaram em 2006, com a
criação da primeira disciplina de Teoria Literária e Literatura Comparada, na
Universidade Estatal de Tbilisi.
• 2008: fundação da Georgian Comparative Literature Association (GCLA).
• Problemas: número reduzido de pesquisadores qualificados, pouco conhecimento de
línguas estrangeiras e pouca tradução do/para o georgiano.
LITERATURA COMPARADA NA
ÍNDIA

Harish Trivedi
LC NA ÍNDIA
• Multilinguismo e diversidade linguística: hindi, urdu, inglês e 22 línguas regionais
oficiais, além 400 dialetos.
• O escritor Premchand (1880– 1936) marcou a história da literatura indiana por
consolidar o romance moderno nos dois idiomas principais: urdu e hindi.
• Comparative Literature Department da Jadavpur University in Calcutta foi criado em
1956.
• 1981: criação da Comparative Indian Literature Association (CILA).
• 1982: criação da Indian National Comparative Literature Association (INCLA).
• 1987: fundação da The Comparative Literature Association of India (CLAI), a partir da
fusão de INCLA e CILA.
• Ênfase nos estudos comparados das literaturas de línguas indianas.
LC NA ÍNDIA

• Quando o escritor e comparatista indiano Sisir Das conheceu René Wellek, ele
perguntou ao americano por que os comparatistas ocidentais como ele prestavam
pouca atenção nas literaturas não-ocidentais (japonesa, chinesa, persa, sânscrita).
Wellek respondeu:“cada um faz o que pode”.
• O episódio teria livrado Das e os outros comparatistas indianos da suposta obrigação
de seguir o modelo ocidental de Literatura Comparada. Considerando que a Índia
tem muitos idiomas clássicos e modernos, cada um com uma rica história literária, o
seu estudo deve ser suficiente para os indianos, assim como o estudo das literaturas
da Europa é suficiente para os europeus e americanos.
LITERATURA COMPARADA NO
JAPÃO

Kyo Cho (Meiji University)


LC NO JAPÃO
• Iniciou durante a Era Meiji (1868-1912), com cursos universitários e artigos em
periódicos.
• A Japan Comparative Literature Association (JCLA) foi fundada em maio de 1943.
• Ainda hoje predomina a ênfase nos estudos de “fontes e influências”, especialmente da
influência ocidental na literatura japonesa.
• Ênfase na comparação da literatura japonesa com as literaturas europeias e norte-
americanas.
• Também destacam-se os estudos comparados com a literatura clássica chinesa, pois
autores japoneses da antiguidade escreveram em chinês.
• Mais recentemente, tem ganhado força a comparação da literatura japonesa com
outras literaturas asiáticas.
• Outra tendência: relação da literatura com outras artes.
LITERATURA COMPARADA NA
TURQUIA
Sibel Irzik & Jale Parla
LC NA TURQUIA

• Início no século XIX, com tentativa de padronização da língua otomona (dividida


entre o padrão da corte e o padrão popular), visando a integração com a
modernidade europeia.
• Durante a 2ª Guerra, universidades turcas contrataram muitos judeus. Após a guerra,
contrataram nazistas exilados ou fugitivos.
• Temas atuais: ocidentalização da Turquia, nacionalismo turco, exílio, alteridade,
orfandade, linguística comparada.
• O turco europeizado é tratado como objeto de sátira literária.
LITERATURA COMPARADA NO
IRÃ
Behnam Mirzababazadeh Fomeshi
LC NO IRÃ

• Diálogo (conflituoso) entre civilizações: o islã (superior) contra o ocidente (inferior).


• Ênfase na influência da literatura do Oriente Médio em geral e da literatura persa em
particular na literatura ocidental.
• Influência do islamismo e da tradução do Alcorão no Ocidente.
• Comparação entre a literatura persa e a literatura árabe: influência de uma na outra e
vice-versa.
• Ignora a interdisciplinaridade.
LITERATURA COMPARADA NOS
PAÍSES DO CONSELHO DE
COOPERAÇÃO DOS ESTADOS
ÁRABES DO GOLFO

Arábia Saudita, Bahrein, Emirados


Árabes Unidos, Kuwait, Qatar e Omã

Alaaeldin Mahmoud (The American College of the


Middle East, Kuwait)
SOBRE O CCG
• O CCG é uma união militar, política e socioeconômica de seis países do Golfo
Pérsico (Arábia Saudita, Kuwait, Omã, Bahrain, Emirados Árabes Unidos e Qatar) que
ocorreu em 1981, época marcada pela ascensão de Aiatolá Khomeini no Irã e Saddam
Hussein no Iraque.
• Força militar unificada dependente de armamento e treinamento externos vindos dos
EUA, visando facilitar a defesa dos seis países contra potenciais ataques iranianos.
• Organização política em monarquias tribais hereditárias, com as mesmas famílias
governando há aproximadamente duzentos anos.
• O Qatar é a sede da Al-Jazeera
• Subcultura khaleeji (palavra árabe para golfo): árabe, com influência dos nômades
beduínos, da Pérsia, do sul da Ásia e do norte da África. Dialeto próprio.
CARVALHO PINTO, Vânia. A revolução que não começou: as particularidades da
Primavera Khaleeji. Cienc. Cult., São Paulo , v. 64, n. 4, p. 30-33, Dez. 2012 .
LC NO CCG

• Influência da Literatura Comparada árabe, que começou no Cairo em 1904, com duas
publicações: um livro de LC (comparando literatura árabe com a francesa) e a
primeira tradução da Ilíada para o árabe.
• O primeiro curso de LC no CCG foi criado em 1975, na Universidade do Kwait, com
os professores Nazik Al-Malaika (iraquiano) e Ibrahim ‘Abd Al-Rahman Muhammad
(egípcio).
• A maioria dos departamentos e PPG são de Língua e Literatura Árabe ou Inglesa.
• Predomina a influência das “escolas” francesas e americanas, com ênfase na
comparação entre as literaturas de língua árabe e inglesa.
• Alguns pesquisadores trabalham com Intermidialidade, transculturação, estudos pós-
coloniais e tradução.
LITERATURA COMPARADA NO
MARROCOS

Touria Nakkouch
MULTILINGUISMO NO MARROCOS

• Árabe: idioma oficial. O árabe coloquial marroquino (Darija) é o conjunto de


variedades do árabe dialetal faladas no país.
• Berbere: idioma oficial. Falado em três dialetos: Tarifit, Tashelhit e Tamazight.
Sistematicamente excluída dos Estudos Literários.
• Francês: idioma não-oficial, mas ensinado como língua obrigatória em todas as escolas.
• Espanhol: falado por cerca de 5 milhões de marroquinos, especialmente na região
norte, onde os marroquinos assistem à televisão espanhola.
• Holandês: idioma de Hafid Bouazza, Abdelkader Benali e Said El Hajji, escritores
marroquinos em diáspora.
LC NO MARROCOS

• 1963 – 1979: confronto entre o biculturalismo do paradigma francófono e o


monoculturalismo do paradigma árabe. Ênfase: afinidades e influências entre a
literatura árabe e as literaturas da Europa e Oriente Médio.
• 1981 – 2010: Fundação da Associação Marroquina de Literatura Comparada em 1981.
Ênfase: Estudos Culturais e Estudos de Tradução.
• 2010 – hoje: por um lado, rigorosa distinção acadêmica entre as diferentes disciplinas.
Por outro, ênfase na interdisciplinaridade: Literatura em suas interfaces com filologia,
religião, artes plásticas, filosofia, política, direitos humanos e estudos de gênero. Início
da Ecocrítica, dos Estudos Pós-Coloniais e dos Estudos da Diáspora.
• Preocupação geral: o lugar da literatura marroquina na literatura mundial.
LITERATURA COMPARADA NO
BRASIL

José Luís Jobim & João Cezar de Castro Rocha


(UERJ)

Nabil Araújo (UERJ)


LC NO BRASIL

• “Não há dúvida que uma literatura, sobretudo uma literatura nascente, deve
principalmente alimentar-se dos assuntos que lhe oferece a sua região; mas não
estabeleçamos doutrinas tão absolutas que a empobreçam. O que se deve exigir do
escritor antes de tudo, é certo sentimento íntimo, que o torne homem do seu tempo
e do seu país, ainda quando trate de assuntos remotos no tempo e no espaço”.
Machado de Assis
Instinto de Nacionalidade
LC NO BRASIL
• “No Brasil do século XIX, um certo viés do comparatismo baseava-se em uma visão
que comparava e contrastava nações. Isto pode ser comprovado no mais famoso
poema nacionalista do século, a “Canção do exílio” de Gonçalves Dias. Neste poema,
ele compara o Brasil à sua antiga metrópole, Portugal. No entanto, em 1873, Machado
de Assis produziu uma série de argumentos contra a onda nacionalista e antecipou
questões que só seriam tratadas mais tarde por Hugo Meltzl (1846-1908), o fundador
da primeira publicação dedicada à Literatura Comparada: Acta Comparationis
Litterarum Universarum [1877-1888]. Mesmo no ambiente interdisciplinar do século
XX, deve-se notar que as associações de Literatura Comparada são organizadas por
nacionalidade até hoje, a despeito da existência da Associação Internacional de
Literatura Comparada. No caso da Associação Brasileira de Literatura Comparada, ela
surgiu nos anos oitenta e foi definida por Antonio Candido como uma “entidade que
representa uma fase nova da disciplina em nosso meio”.
LC NO BRASIL

• Institucionalizada em 1988, em Porto Alegre, no 1º Congresso da ABRALIC.


• Busca de legitimação da literatura brasileira: o velho problema de escrever e ler
literatura num país situado na periferia econômica e cultural do mundo capitalista.
• “Epistemologia da distância”: pesquisadores brasileiros saem do país para estudá-lo no
exterior. Ex: Sergio Buarque de Holanda começou a escrever Raízes do Brasil na
Alemanha. Gilberto Freyre escreveu a versão final de Casa-Grande & Senzala nos
EUA, na Stanford University. Inúmeros professores e estudantes fazem doutorado e
doutorado sanduíche na Europa e na América do Norte.
• Assim como Machado de Assis, dá continuidade à tradição ocidental, mas almeja a
diferenciação que somente pode ser dada pelo "sentimento íntimo“.
A QUERELA COMPARATISTA: BRASIL

• Se 1993, ano da submissão do fatídico Bernheimer Report à ACLA e das primeiras e


imediatas reações a ele, acabou por se converter no ano-chave do conflito que se diz
ter dividido o campo comparatista norte-americano em duas grandes frentes rivais e
aparentemente irreconciliáveis, no Brasil essa distinção coube ao ano de 1996, quando
realizou-se o 5º Congresso Internacional da ABRALIC, no Rio de Janeiro, sob o tema
“Cânones e Contextos”, no qual “delineou-se” – para reproduzir os termos da
memória oficial da ABRALIC – “o debate entre duas vertentes de abordagem dentro
do campo comparatista no Brasil: a centralidade da própria literatura nos estudos
contemporâneos e a abertura para enfoques culturais.
A VIRADA LATINO-AMERICANA

• Na contramão do isolacionismo e do autocentramento que, ao longo décadas,


pareceram ditar o foco na questão da “identidade nacional” tão característico do
ensaísmo e da produção acadêmica no âmbito dos estudos sociais, históricos e
literários entre nós, desde o inicio dos anos 1990, que um forte interesse na “América
Latina” – para todos os efeitos motivado por um forte desejo de integração
transnacional – tem caracterizado parcela significativa da produção nos estudos
literários no Brasil, mais especificamente no campo da Literatura Comparada.
• O risco de uma homogeneização assujeitadora (sob o rótulo do “latino-americano”)
que parece necessariamente correr em qualquer iniciativa dessa natureza veio a ser
enfrentado pela estrutura deliberadamente dialógica das iniciativas, com “diálogos
cruzados”.

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