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FACULDADE DE LETRAS

UNIVERSIDADE DO PORTO

Aristóteles
O método científico Aristotélico
Aristóteles no âmbito da filosofia da ciência

Trabalho realizado no âmbito da UC: Filosofia das ciências

Abstract: Este trabalho propõe-se a expor o método científico Aristotélico e as suas


considerações. O trabalho é composto pelos temos do método indutivo-dedutivo, o
estádio indutivo, o estádio dedutivo, os requisitos empíricos para a interpretação
científica e o status necessário dos princípios primeiros. Este trabalho distingue a
filosofia da ciência feita por Aristóteles e como o seu método científico se processa,
visto que este autor é considerado o primeiro filósofo das ciências. Para além disso, o
trabalho analisa certos problemas que surgem em ligação com a interpretação científica.

Trabalho realizado por: Ana Ferraz de Liz Valente Vital

Licenciatura: Filosofia, 2º ano

UC: Filosofia das ciências I


Aristóteles considera que a ciência é um sistema de proposições obtidas por meio de
deduções e induções lógicas. Ao criar um conjunto de normas para o pensamento, com
o intuito de provar demostrações racionais da ciência. O projeto deste autor consiste na
formalização de um elemento seguro para a constituição da ciência.

.A primeira está relacionada com a indução de princípios explicativos dos fenómenos e


objetos observados pelo cientista. Já na segunda etapa este deduz afirmações a partir de
premissas que incluem esses princípios. O processo de obtenção de conhecimento
começa com a experiência sensorial, progredindo para várias repetições da mesma, que
geram memórias. Através da intuição e da memória, podemos distinguir os atributos
gerais de coisas específicas e, finalmente, com base nessas definições gerais, podemos
obter uma compreensão do mundo por meio de argumentos dedutivos baseados na
lógica. Segundo John Losee “Aristóteles acreditava que a investigação começa com o
conhecimento de que certos eventos ocorrem ou de que certas propriedades coexistem.
A interpretação científica está terminada apenas quando as afirmações acerca destes
eventos ou propriedades são deduzidas dos princípios interpretativos.” (LOSEE, 1998,
pg.18). Posto isto, através da transição entre o conhecimento de um facto e o
conhecimento das razões para esse facto pode-se chegar a uma interpretação científica.
Um exemplo explicativo deste fenómeno é um cientista que observa o escurecimento
progressivo da superfície lunar e a partir disto induz princípios gerais como: a luz
propaga-se em linha reta, os corpos opacos produzem sombras e que uma determinada
configuração obtida a partir de dois corpos opacos próximos a um luminoso faz com
que a opacidade de um produza sombra sobre outro. De seguida, o cientista deduz
afirmações sobre o eclipse lunar a partir dos princípios gerais, supondo que a lua e a
terra são corpos opacos e que satisfazem condições favoráveis relativamente ao sol
luminoso. No estádio indutivo, segundo Aristóteles, cada coisa particular é uma
combinação de matéria e forma. Enquanto a matéria torna as coisas individuais, a forma
transforma-as membros de um grupo de coisas semelhantes. Aristóteles defende que é
por indução que as generalizações da forma se fazem a partir das experiências
sensoriais. Para este filósofo existem dois tipos de indução, sendo que a primeira
consiste na enumeração de afirmações ou episódios individuais que estão na base das
generalizações feitas sobre a espécie a que pertencem. Assim, considera que raciocinar
utilizando a indução significa partir de premissas particulares para chegar a uma
conclusão universal. Um exemplo pode ser: (1) Os cinco primeiros ovos da caixa
estavam podres (2) Todos os ovos da caixa têm o mesmo prazo de validade (3) Logo, o
sexto ovo também estará podre. Verificamos que partindo de duas premissas simples e
particulares se chega a uma conclusão feita a partir de generalização. Mesmo que os
primeiros cinco ovos estejam podres e todos os ovos da caixa tenham o mesmo prazo de
validade, não há garantia de que o sexto também esteja podre. É logicamente possível
que as premissas dessa inferência lógica sejam verdadeiras e a conclusão seja falsa. O
segundo tipo de indução é intuitivo, do qual os princípios gerais são intuídos
diretamente dos fenómenos. O cientista através dos sentidos tem a capacidade de captar
aquilo que é fulcral, exemplificando que este observando a face iluminada da lua em
diferentes ocasiões vê que esta está virada para o sol e, assim, conclui que a reflexão da
luz solar faz com que a lua brilhe. Segundo Losee (Losee, 1998, pg.20) a operação da
indução intuitiva é análoga à visão do taxonomista no sentido de que ele “vê mais” que
um indivíduo que não tem a visão treinada para esta atividade. No estádio dedutivo,
princípios explicativos e generalizações, alcançados através da indução, servem como
premissas para deduzir declarações explicativas sobre observações iniciais. Deste modo,
a etapa dedutiva consiste na constituição de argumentos cujas premissas obtêm-se por
meio de indução e a conclusão deduz-se dessas premissas. Neste sentido, a proposição é
verdadeira se aquilo que ela enuncia está em conformidade com o objeto a que se refere,
e é falsa se não há esta conformidade. A forma lógica proposicional compreende de um
lado a afirmação e a negação, e, de outro, a universalidade e a particularidade. Segundo
Aristóteles, declarações que servem de premissas e conclusão devem afirmar que uma
classe de coisas é incluída, ou excluída, de uma segunda classe. Exemplo: Se «S» e «P»
são as duas classes, as afirmações admitidas são: A: Todos S são P; E: Nenhum S é P; I:
Alguns S são P; O: Alguns S não são P. Aristóteles apresentou assim o silogismo no
paradigma da demostração científica, que consiste em: (Todo o M é P; Todo o S é M;
Logo, todo o S é P). Exemplo: Todos os homens (M) são seres vivos (P); Todos os seres
vivos (S) são homens (M); logo, todo os animais (S) são seres vivos (P). Se as
premissas forem verdadeiras a conclusão será necessariamente verdadeira, porém não
há garantia que as premissas sejam todas verdadeiras, não existindo uma explanação
satisfatória pois há a possibilidade da conclusão não ser verdadeira. O silogismo acima é
válido, mas existem erros. Quando dizemos que todos os planetas estão próximos da
Terra porque não cintilam, existe um erro pois o facto de não cintilarem não é causa da
proximidade. A cintilação é o fenómeno em que as estrelas que observamos piscam.
Assim a causa da cintilação está relacionada com a proximidade em relação à Terra. Ou
seja, a causa da não cintilação é a proximidade com a Terra, e não o contrário, conforme
sugerido pelo silogismo. Aristóteles demostrou que este tipo de silogismo é válido, pois
se é verdade que todos os animais são homens (Todo o S está incluído em M) e que
todos os homens são seres vivos (todo o M está incluído em P), então também é
verdadeira a afirmação de que todos os animais são seres vivos (todo o S está incluído
em P). Assim, Aristóteles conclui que a validade de um argumento se determina pela
relação entre as premissas e a conclusão. O cientista pode presumir conclusões através
deste silogismo, avançando para o conhecimento da causa dos acontecimentos.
Aristóteles insistiu na importância da verdade das premissas numa interpretação
satisfatória de um determinado argumento, excluindo os silogismos válidos que têm
conclusões verdadeiras, mas que o conteúdo de uma das suas premissas é falso. Os
requisitos impostos por Aristóteles para que a explanação científica seja forte é a
verdade das premissas, a sua indemonstrabilidade, estas serem bem mais conhecidas
que a conclusão e serem a causa da atribuição feita na conclusão. Ao definir o
silogismo, Aristóteles elabora nos “Primeiros Analíticos” a noção de implicação ou de
consequência lógica, a conclusão decorre necessariamente das premissas. Assim,
defende que um argumento dedutivo contém a informação principal nas suas premissas
e que os princípios primeiros eram tão evidentes como as suas conclusões. A relação
causal é essencial para que haja a formalização de um argumento válido, pois “é
possível construir silogismos válidos com premissas verdadeiras, mas, de tal modo, que
as premissas falhem no estabelecimento da causa do atributo que surge na conclusão”
(Losee, 1998, pg.22). Consideremos este argumento: Saturno é um planeta (S) que gira
à volta do sol (M). Todos os planetas que giram à volta do sol (M), giram à volta da
terra (P). Logo, Saturno (S) gira à volta da terra (P). O sujeito da conclusão (S) é o
termo menor e o predicado da conclusão (P) é o termo maior. O termo que aparece
apenas nas premissas (M) é o termo médio. Constitui um silogismo válido, ou seja, se as
premissas foram verdadeiras, a conclusão será necessariamente verdadeira, porém não
há garantia que as premissas sejam todas verdadeiras, não existindo uma explanação
satisfatória. Quando dizemos que todos os planetas que giram à volta do sol, giram à
volta da terra, estamos em contacto com uma premissa falsa. O correto seria dizer que
todos os planetas que estão próximos da terra giram à volta do sol. Para termos uma
explanação satisfatória o argumento teria de estar formulado da seguinte maneira:
Saturno é um planeta que gira à volta do sol. Todos os planetas que giram à volta do sol
estão próximos da terra. Logo, Saturno é um planeta que está próximo da terra.
Aristóteles distingue dois tipos de silogismo, o silogismo de facto, no qual as premissas
não estabelecem a causa de conclusão, podendo esta ter uma relação lógica com as
premissas ou estabelecer-se por mera coincidência e o silogismo de facto raciocinado,
no qual as premissas estabelecem a causa da conclusão. “Torna-se, então necessário um
critério que permita distinguir as correlações causais das acidentais. Aristóteles
reconheceu esta necessidade, em qualquer circunstância do sujeito, seja verdade para o
sujeito em causa e não para o todo a que ele pertence e seja «essencial» ao sujeito.”
(Losee, 1998, pg.23). Aristóteles considera que cada ciência possui distintos géneros de
sujeitos e diferentes conjuntos de atributos. Por exemplo, a física distingue-se da
biologia porque o género de sujeito da biologia é a vida e os organismos e a sua relação
com o ambiente e a física considera que determinados objetos são uma classe de casos
em que os corpos mudam de posição no espaço, sendo que os atributos próprios desta
ciência são “«posição», «velocidade» e «resistência»” (Losee, 1998, pg.24). Uma
explicação científica para um fenómeno particular deve usar atributos da ciência à qual
o fenómeno pertence. Se a interpretação do movimento de um projétil fosse feita através
do crescimento e desenvolvimento, seria inadequado pois esses são atributos biológicos.
Assim, várias ciências específicas, sejam elas teoréticas, poéticas ou produtivas, contêm
uma série de afirmações organizadas dedutivamente. O objetivo da ciência não
esclarece unicamente o significado das palavras, mas define como as coisas funcionam,
define “o ser enquanto ser”, através de hipóteses metafísicas. Enunciar a essência de um
objeto é definir tudo aquilo que é essencial e necessário para a existência dele, por
exemplo, ao definir homem enquanto animal racional dizemos que este ser está ligado a
um género, e distingue-se dos animais irracionais. Os princípios primeiros aplicáveis a
qualquer argumento dedutivo seja qual for a demostração são os princípios da
identidade, da não-contradição e do terceiro excluído, sendo que nos níveis seguintes de
generalidade se definem os princípios da ciência tratada. As explicações científicas
devem envolver quatro aspetos de causação, que são as causas formal, material,
eficiente e final. A mudança de cor na pele de um camaleão que se desloque de uma
folha verde par um tronco cinzento, pode ser analisado através da causa formal que
indica as condições presentes na mudança de cor efetuada, a causa material que indica
que as substâncias da pele do camaleão sofrem uma mudança, a causa eficiente explica
que a transição da folha para o tronco é acompanhada por uma mudança na luz refletida
que faz com que a cor mude e causa final que corresponde ao objetivo do camaleão
conseguir passar despercebido e assim proteger-se dos seus predadores. Destaca-se a
insistência de que em qualquer explicação tem de haver uma causa final (telos), o que
equivale a uma explicação teleológica, que tem o objetivo salientar a expressão “com o
fim de”. Aristóteles sustentou que as interpretações teleológicas deviam fazer parte do
desenvolvimento dos seres vivos e dos objetos inanimados. A causa final do movimento
do fogo é atingir o seu “lugar natural”, que se encontra acima dos seres vivos. A causa
final está ligada àquilo em vista de quê ou o fim para o qual algo vem a ser. Explica
porque é que as formas dos organismos determinam as condições necessárias para que o
animal adquira a faculdade que o torna apto à sensação: os animais possuem sensação a
fim do proteger-se de predadores, de conseguir alimentos, de evitar a dor e procurar o
prazer. Para Aristóteles, a caracterização dos processos naturais de tipo teleológico não
supõe a ideia de um antropocentrismo, pois não é preciso supor que haja deliberação
envolvida na natureza, mesmo que nela esteja presente a premissa “em vista de quê”. É
importante salientarmos a noção de causa primeira, pois constitui um dos elementos
fundamentais na filosofia aristotélica. O princípio da causalidade está na base do
determinismo, então tudo possui uma causa, o que significa que a sequência causal é
infinita, sendo que nada acontece sem um precedente A noção de primeira causa, ao
invés, é exatamente a noção de um ser que relativamente à sequência causal é uma
causa, sem, por sua vez, ter sido causada por outra, fazendo com que a cadeia não seja
infinita. Estas interpretações criticavam os atomistas pela sua tentativa de explicar a
mudança apenas em termos de causas materiais e eficientes, negligenciando a causa
final. Criticava também o destaque que os pitagóricos davam à matemática, dizendo que
tinham uma preocupação exclusiva com as causas formais. No ramo da física,
Aristóteles constatou a importância das relações numéricas e geométricas,
acrescentando que existiam ciências compostas (astronomia, ótica, harmonia, mecânica)
cuja causa final era estabelecer relações matemáticas entre os corpos materiais. Os
primeiros princípios da ciência concebidos corretamente e as suas sequências dedutivas
nada mais podem ser que a verdade. Aristóteles apoiou-se nas seguintes teses: “(1)
Certas propriedades são essencialmente inerentes a indivíduos de certas classes; um
indivíduo não será membro de certa classe se não possuir as propriedades em questão.
(2) Em certos casos, há uma identidade de estrutura entre afirmações universais que
estipulam atributos para uma classe e a inerência não verbal da correspondente
propriedade nos membros da classe. (3) É possível ao cientista intuir corretamente este
isomorfismo entre linguagem e realidade.” (Losee, 1998. pg. 27) de ser falíveis ou
falsos. Ele postulou que as leis científicas estabelecem verdades necessárias, que
influenciou muito a história da ciência.

Bibliografia
John Losee 1972, 1980- Introdução Histórica à Filosofia das Ciências, tradução: Carlos Lains, edição:
Terramar , Outubro de 1998

Algumas considerações sobre lógica, Amauri Paulo Cervo1

O ideal axiomático da ciência: A filosofia da ciência de Aristóteles como fundamento para o modelo
clássico da ciência, Mateus Romanini

Método Científico em Aristóteles, Osvaldo Pessoa Jr. – 2010

O Método Científico, António C. Roque

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