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Leonardo Coimbra

Toda a sua filosofia é uma filosofia criacionista, aos mais diversos níveis do humano e
do conhecimento. “O Homem não é uma inutilidade no mundo feito, mas um obreiro no mundo
a fazer”. O Homem será bom, cumprirá o seu ser Humano, fazendo-o, criando.
É uma filosofia do conhecimento na medida em que o Homem só conseguirá cumprir o
seu papel se ascender de modo dialético no processo do conhecimento. O homem é sempre um
sujeito cognoscente. São conhecidas apenas as correntes da vida. É nas profundezas que
encontramos as raízes eternas das coisas.
A liberdade é o valor fundamental, por isso, a sua filosofia é também uma filosofia da
liberdade. Escreve-se consoante o pensamento flui.
O homem livre é o homem sem amarras que não vive preso à lei, nem à letra da lei. É o homem
que inventa, que se inventa. Que cria.

O grande ensinamento – tanto a evocação romântica dos seres e das coisas como o estilo
poético e retórico da sua prosa harmonizam-se na meditação filosófica.
Ao texto leonardino assiste a «alma na tentativa do voo e no assombro das alturas».
Desenvencilha-se das vestes da vulgaridade e constitui, por isso, um intemporal desafio
interpretativo, com a certeza de que, nele, o verdadeiro filósofo encontrará alimento para o
desassossego perene do filosofar. Consciência tinha o pensador de que o verdadeiro pensamento
filosófico não pode vulgarizar-se no sentido de ser posto ao alcance dos diligentes e dos
adormecidos.
O pensamento das altitudes – levado à ironia o significado comum de «vulgarização» -
se se vulgariza quando sobre «o vulto à altura do homem». «o que quero é saber interrogar, não
sou homem de afirmações e de certezas. Já reparou que a minha gramática é admirativa e
interrogativa?».
Leonardo Coimbra comunica o que sempre concebeu como sua filosofia; um idealismo
fecundo e ativo, e a sincera atitude das almas indagadoras e amantes do que possa dignificar a
vida.
Para este idealismo, desde os primeiros escritos guiado por uma razão que se quer crítica,
dialética, anti concetualista e antidogmática, a vida não é captável no planalto dos conceitos,
rarefeito de mistério em que a certeza pretensamente se substituiu à verdade ou é uma imagem
parcelar desta.
Verdade sempre mais além do homem e dos seus instrumentos de posse e de domínio, ela é um
símbolo de infinito, e mais do que um símbolo, e um apelo do ser e o próprio ser.
A certeza vale o que vale no plano limitado do saber positivo, mas, subindo a alma ao prumo da
medição metafísica, a sabedoria transmuda-se na sapiência que admira, interroga e compreende
para melhor compreender, interrogar e admirar. É o pensamento que bate à porta do ser, que se
depara com o seu excesso e que mergulha na visão do seu mistério. O grande ensinamento é,
pois, a irredutibilidade do ser «ao pensamento pensado» ou à realidade atingida, como dirá mais
tarde.
O pensamento define-se e justifica-se pela sua ação transitiva permanente, isto é, como
atividade construtora e organizante do real. a irredutibilidade do ser e o tema do pensamento
dinâmico exigem, no ponto de vista da compreensão, a noção de criacionismo.

“A filosofia, visto ter de abranger todo o real, não será um intelectualismo fossilizado, nem
um pragmatismo empírico, mas o que chamo criacionismo – criação de conceitos
científicos e símbolos artísticos que, sem nunca esgotarem o real, sempre o organizam sob
as mais altas aspirações do espirito”.
“A filosofia moderna será, pois, aquela que, admitindo a atividade criadora ou liberdade,
se serve dos conceitos feitos para exaltar e erguer a vida a novas riquezas económicas,
intelectuais e morais. É o que chamo criacionismo.”

Leonardo fez a sua estreia filosófica com o artigo «O homem livre o homem legar». Foi
anarquista na juventude, no sentido em que significava particularmente reforma, revolução,
justiça social, fraternidade, ilustração das inteligências. Não entrava, porém, de acordo com o
anarquismo revolucionário: porque se há liberdade, há responsabilidade. Somos responsáveis
com os outros. Era um anarquismo que não via incompatibilidade com o cristianismo.
Comungava justiça social, deus e liberdade.
A conceção reivindica-se do cristianismo puro, de que o catolicismo é a face dogmática e
degrada. As gerações futuras haveriam de olhar o legado do seu pensamento como um dos
monumentos especulativos mais valiosos da cultura filosófica portuguesa do século XX.

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