Você está na página 1de 3

Um estudo sobre a imagem, feminino e solidão.

Cartelizante: Ligia Maria Torres da Silva


Mais um: Patricia Bichara

Questão: Como a imagem participa da solidão do feminino em nossa época?

Freud em 1905, se interessou na questão da satisfação da criança com o


objeto do seio materno, esta seria a mais primitiva satisfação sexual que estava
ainda vinculada a nutrição. Segundo Freud: "Só mais tarde vem a perder o seio,
talvez na mesma época que a criança consegue formar para si uma representação
global da pessoa a quem pertence o órgão que lhe dispensava satisfação”.1

Lacan em “O estádio do espelho como formador da função do eu” (1949),


discorre sobre o bebê humano, prematuro fisiologicamente em seu nascimento, que
está numa situação constitutiva de desamparo, e a imagem de si provoca-lhe um
júbilo. Este júbilo ocorre porque a forma de seu corpo refletida no espelho é
demasiadamente completa para o que conseguiu atingir. Nesse sentido, a imagem
é a sua, mas ao mesmo tempo de um Outro, devido ao déficit com relação a ela.

Há então uma identificação com essa imagem, a identificação com a imagem


de um Outro, que é por onde o ser humano se constitui, e seu desenvolvimento é
composto por identificações ideais.2
Lacan no seminário, livro 11 (1964), explicita “O Outro é o lugar em que se
situa a cadeia do significante que comanda tudo que vai poder presentificar-se do
sujeito, é o campo desse vivo onde o sujeito tem que aparecer.”3

Nesse sentido, a partir do momento que o sujeito concede com a castração -


operação da metáfora paterna em que há a substituição da dimensão do desejo
(materno) pela dimensão da lei (paterna) - ele vai extraindo do mundo externo os
significantes que se identifica e que “seriam capazes de recobrir a sua falta
imaginária”.4
1
FREUD, S. Três Ensaios sobre a Sexualidade: Edição Standard Brasileira das
Obras Psicológicas Completas de Sigmund Freud. V. 3. Rio de Janeiro: Imago,
p.210.
2
MILLER, Jacques-Alain. Percurso de Lacan (Campo Freudiano no Brasil) . Zahar.
Edição do Kindle, p. 203 (e-book)
3
LACAN, O Seminário Livro 11 Os Quatro Conceitos Fundamentais da Psicanálise:
Edição 2 Jorge Zahar. Rio de Janeiro: Zahar, p.200, 1964.
4
ZENONI, Alfredo. Versões do Pai na psicanálise lacaniana: o percurso do
ensinamento de Lacan sobre a questão do pai. Psicol. rev. (Belo Horizonte), Belo
Horizonte , v. 13, n. 1, p. 15-26, jun. 2007.
Marie-Hèlène Brousse em “Mulheres e Discursos” (2019), nos elucida sobre
os corpos no geral e em específico o feminino:
“Não há corpo que escape a significantização (...) O corpo entra em função
pelo corpo do significante, ou seja, pelo conjunto dos significantes que recortam a
imagem conforme os imperativos da demanda”.5
Brousse elucida que durante muito tempo Lacan considerou a relação
homem-mulher definida pela oposição ser e ter o falo, mas que não se trata do
enigma da imagem, nem do enigma da linguagem; o que é enigmático é as duas
coexistirem.
Nesse sentido, parte da fala de Brousse se refere a questão do corpo das
mulheres do lado do Nome-do-Pai, apesar de vivermos atualmente uma evaporação
do Nome-do-Pai em decorrência do discurso da ciências, o Nome-do-Pai ainda é
presente em vários aspectos sociais.
“Há uma atenção voltada para todas as instâncias ligadas ao corpo. Pode-se
dizer que há uma polícia do corpo, em particular para as mulheres. Logo, em Lacan,
há esse caminho do corpo que passa pela imagem ao passar pelo corpo significante
e inscreve um sentido sexual”6
A solidão do feminino, e poderíamos muito bem dizer de todos os seres
humanos em certa medida, vem do desejo ou da tentativa de ser Um, o
aprisionamento do corpo se dá através dessa ‘polícia do corpo’ sinalizada por
Brousse, de ideais muitas vezes impossíveis de serem atingidos.
Poderíamos ainda pensar nessa ”polícia do corpo” como a ciência atual que
impõe uma série de normas para os corpos estarem de acordo com a excelência em
relação ao “bem-estar”.
“O corpo é também o desejo de ser Um, mesmo no estádio do espelho, a
partir do qual há esse desejo que define o corpo para o falasser como Um, quando
estamos diante do desmembramento, do despedaçamento anterior à imagem.

5
BROUSSE, M. H. Mulheres e discursos ; tradução de Ana Paula Sartori Lorenzi…
[et al]; - Rio de Janeiro : Contra Capa, 2019. (pag 22)
6
BROUSSE, M. H. Mulheres e discursos ; tradução de Ana Paula Sartori Lorenzi…
[et al]; - Rio de Janeiro : Contra Capa, 2019.(pag 23)
Nesses termos, ser um corpo unificado é um sonho que implica esperança de
uma satisfação sexual que abraçaria esse Um, que permitiria alcançá-lo ao menos
no parceiro. Logo, não existe conjunto, o corpo não funciona como um conjunto”.7
Para finalizar, deixo aqui a minha questão: Como a sociedade atual da
transparência contribui ainda mais com essa dinâmica?

7
BROUSSE, M. H. Mulheres e discursos ; tradução de Ana Paula Sartori Lorenzi…
[et al]; - Rio de Janeiro : Contra Capa, 2019. (pag 25)

Você também pode gostar