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ALGUMAS CONSIDERAÇÕES SOBRE AS POSSIBILIDADES DE PENSAR AS QUESÕES

ALIMENTARES A PARTIR DA NOÇÃO DE INFÂNCIA E DO INFANTIL QUE CONSTITUEM O


SUJEITO

Maurício Lopes da Silva

Situar o campo da infância em psicanálise, nos proporciona retomar, mesmo já

nas estruturas decididas, algo da lógica do infantil que habita o sujeito. Este infantil

está totalmente descolado das concepções corriqueiras de acontecimentos da infância

considerados fixados e que não foram elaborados, mas sim, nos remete ao modo de

atualização, a partir de uma lógica constitutiva que se faz presente na vida adulta.

Nesse sentido está resenha toma enquanto enlace o corpo que serve como abertura

para o campo do Outro e demarca inscrições psíquicas em um primeiro momento da

vida.

Ao pensarmos o corpo, Freud, a partir do seu escrito: Três ensaios sobre a

teoria da sexualidade (1901-1905/2016d), subverte as noções de sexualidade, abrindo

espaço para discutir sobre a sexualidade infantil. Nos primórdios da vida infantil, o

corpo é reconhecido enquanto fundamentalmente autoerótico, encontrando seu

objeto em si mesmo. Situado pela obtenção de satisfação, o cuidado materno tem

papel primordial no empenho das pulsões parciais à realização do prazer.

No referido texto, Freud irá expressar a relevância das zonas erógenas,

conceituando-as enquanto “pele ou mucosa, em que estímulos de determinada

espécie provocam uma sensação de prazer de certa qualidade” (Freud, 1923/2011

p.87), somado a isso está a necessidade de repetição da sensação de prazer,

denunciando o caráter além do orgânico.


O corpo está localizado a partir de uma ordem pulsional, sendo a pulsão

conceito de fronteira “entre o anímico e o somático, como representante psíquico dos

estímulos oriundos do interior do corpo que alcançam a alma” (Freud, 1915/2017,

p.25), é ela que irá desdobrar as relações do sujeito com os objetos, situando o corpo a

partir de uma articulação dinâmica entre “o interior e exterior.”

Nesse sentido, o autoerotismo e a pulsão viabilizam organizar a marca inicial

do corpo em relação ao outro, onde o corpo ocupa o lugar que mediatiza as relações

primeiras. Porém, necessita haver outros acontecimentos para que o corpo, que se

satisfaz em si mesmo, possa lançar-se ao mundo externo.

Por meio da elaboração do conceito de narcisismo, encontra-se as

possibilidades de pensar o revestimento do Eu, acontecimento que irá dar forma a este

corpo e sua imagem, inicialmente, investido pelo cuidado materno. Freud aponta que

“uma unidade comparável ao Eu não existe desde o começo”, sendo assim “o Eu

preciso ser desenvolvido” (Freud, 1914/2010 p.35), nisto, as pulsões autoeróticas são

fundamentais.

Em Introdução ao Narcisismo (1914/2010), Freud ressalta que, as primeiras

satisfações sexuais autoeróticas são vivenciadas por meio das relações das funções

vitais de autoconservação. Estando as pulsões sexuais, em seu início, apoiadas nas

pulsões do Eu; posteriormente, tornam-se independentes. Ele distingue dois tipos de

busca de objeto, o de apoio, referenciado pelas bases do cuidado da mãe, sendo esta a

primeira referência de objeto sexual, e o tipo narcísico, que estaria referenciado na

busca de si mesmo enquanto objeto amoroso. Se, por um lado existe o modo do

cuidado primário, materno, enquanto modelo de uma busca de amor; por outro, existe

a referência a si mesmo que conduz à busca pelo objeto amado (Freud, 1914/20010).
Isto viabiliza pensar a construção do eu ideal e do ideal do eu. O primeiro irá se

dirigir ao amor a si mesmo, trazendo consigo os representantes do cuidado materno. O

ideal do eu, seria a instância secundária, efeito da entrada do Complexo de Édipo. Tem

a sua formação balizada pela consciência moral, situado a partir da criticidade dos pais,

professores e todos aqueles que possuem proximidade com a criança (Freud,

1914/2010). Esses conceitos se tornam fundamentais, pois estão articulados a

constituição do corpo, do eu e da formalização dos ideais que regem o desejo.

O Ideal do eu e o eu ideal, ainda que se desdobrem de forma processual, ao

longo da vida, coexistindo mutuamente. Isso viabiliza articular qual posição o sujeito

ocupa em relação aos ideais da cultura e qual o trabalho que vem sendo construído

para alcançar tais idealizações. Os transtornos podem estar situados entre estas

relações, sendo sintomas que demonstram a fragilidade de articular outra saída que

não no próprio corpo. Em uma relação onde o sujeito se formaliza mediado pelo olhar

e pela palavra do Outro, encontramos atravessamentos que demarcam um destoar da

imagem e do laço social.

Na infância se faz, não enquanto um diagnóstico que se precipita em nomear

aquele que ali se apresenta, mas sim pode vir tecer outros destinos ao olhar, ao

cuidado.

Referências
Freud, S. (2016d). Três ensaios sobre a teoria da sexualidade (1901-1905). São Paulo:

Companhia das Letras.

Freud, S. (2017). As pulsões e seus destinos. Obras incompletas. Belo Horizonte:

Autêntica.

Freud, S. (2016a). Introdução ao narcisismo (1914-1895). Obras completas. Companhia

das Letras.

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