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Modelo psicodinâmico do

funcionamento psíquico
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Modelo Psicodinâmico do Funcionamento Psíquico
O modelo psicodinâmico é uma abordagem teórica que busca entender o funcionamento
psíquico a partir da interação entre diferentes instâncias mentais, como o consciente, o
pré-consciente e o inconsciente. Assim, a base psicanalítica proposta por Freud determina
que o comportamento é guiado por forças internas, chamadas pulsões, sobre as quais o
indivíduo não possui total controle.

Ainda de acordo com a teoria freudiana, o funcionamento psíquico é marcado a partir de


três pontos de vista distintos, sendo eles econômico, tópico e dinâmico. De acordo com
Bock; Furtado e Teixeira (2022), o viés econômico é marcado pela quantidade de energia
que “alimenta” os processos psíquicos, já no viés tópico, o aparelho psíquico é formado a
partir de um número de sistemas que são diferenciados quanto a sua natureza e modo de
funcionamento, sendo denominado de “lugar” psíquico e o viés dinâmico é o “local” em
que as forças existentes no psiquismo entram em conflito e estão sempre ativas, sendo
que a pulsão é responsável por originar essas forças.

Figura 1 - Sono, de Salvador Dalí (1937)

Sendo assim, para compreender os processos e fenômenos relacionados ao psiquismo, é


fundamental considerar os três vieses em funcionamento simultaneamente. A pulsão, de
acordo com os estudos freudianos, é formada dentro do indivíduo, não obedecendo uma
lógica externa. Freud (1996) afirmava que uma pulsão pode se satisfazer por meio de um
objeto, provocando prazer ou desprazer ou então pode retornar ao próprio Eu, sendo
recalcada, ou seja, omitida ou enaltecida.

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Freud (2011, p. 275) observa que as pulsões se dividem entre vida e morte, sendo que
Eros representa a primeira, que se relaciona diretamente às pulsões sexuais e instintos
libidinosos, tendo como objetivo formar “unidades cada vez maiores com a substância
viva e assim manter o prosseguimento da vida e levá-la a desenvolvimentos cada vez
mais altos”. Em contrapartida, a pulsão de morte, também chamada de Tânatos, pode ser
autodestrutiva ou mesmo estar dirigida a outrem, se tornando agressiva, violenta ou
mesmo destrutiva.

Logo, a vida consistiria nas manifestações conflituosas dessas duas pulsões, se


desenvolvendo na sublimação da pulsão de vida, na qual Eros se tornaria vitorioso
mediante a procriação, em detrimento do não vencimento da morte, seja do indivíduo ou
das ações dele que resultariam na morte ou violência de outrem (FREUD, 2011).

Desta maneira, é possível pensar que as manifestações e expressões desses conflitos


psíquicos são chamadas de sintomas, que de acordo com Bock; Furtado e Teixeira (2022)
resultam de um conflito psíquico entre os desejos e os mecanismos de defesa, sinalizando
e ao mesmo tempo encobrindo o conflito, substituindo-o pela satisfação do desejo.

Estágios do desenvolvimento psicossexual


Freud afirma que existem cinco estágios do desenvolvimento psicossexual, sendo elas a
fase oral, a fase anal, a fase fálica, a fase de latência e a fase genital e no começo da vida
dos indivíduos, a função sexual está ligada necessariamente à sobrevivência, desta forma,
o prazer é refletido no próprio corpo e mesmo o corpo infantil seria erotizado, algo que
gerou bastante comoção à época.

Na fase oral, a zona de erotização é a boca e conforme explica Freud (2016), o indivíduo
incorpora o objeto desejado, comendo-o, ainda que simbolicamente.

Já na fase anal, a zona de erotização é o ânus e ela se relaciona diretamente com o valor
simbólico das fezes projetado pelo indivíduo, que estabelece relações de projeção e
controle.

A fase fálica se desenvolve simultaneamente ao Complexo de Édipo, em que o indivíduo


percebe a diferença sexual e por isso o objeto de desejo ou erotização já se torna alheio
ao próprio corpo.

A fase ou período de latência se configura como uma quebra no desenvolvimento


sexual, aguardando a chegada da puberdade para que possa se manifestar novamente de
maneira significativa.

A última é a fase genital, que se configura pela consciência de que o objeto de desejo
não está realmente associado ao próprio corpo e agora se direciona ao outro,
correspondendo ao desenvolvimento humano que é socialmente esperado, visto que o
indivíduo começa a se relacionar com outros de maneira significativa.

É fundamental destacar ainda que existe o processo de fixação sexual, ou seja, quando
o indivíduo fixa a sua energia sexual em pessoas ou imagos, vislumbrando uma
possibilidade de satisfação sem adiamento ou acumulação (FREUD, 2016).

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Quando se desenvolve um tratamento psicanalítico com a criança, inevitavelmente as
histórias de seus cuidadores, sejam pais ou apenas responsáveis, também virão à tona,
revelando assim, as inseguranças e sofrimentos deles. Desta maneira, quando o adulto
responsável também passa pelo processo de análise, existe uma possibilidade de sua
relação consigo mesmo melhorar e consequentemente, melhorar os cuidados em relação
à criança, favorecendo a relação entre eles.

Ainda assim, é papel do analista tentar compreender a criança enquanto um indivíduo


autônomo, vendo-o em sua subjetividade no papel que ocupa dentro da constituição
familiar, para que assim, ele possa ajudar desenvolver características próprias de sua
personalidade e constituir laços sociais com aqueles que o cercam.

O modelo psicodinâmico de desenvolvimento: seus


desdobramentos, fundamentos e estudiosos
O modelo psicodinâmico de desenvolvimento, assim como a psicanálise, se originou com
os trabalhos de Sigmund Freud e continuou a ser ampliado e modificado ao longo dos
anos por outros teóricos pós-freudianos como Melanie Klein, Wilfred Bion, Sándor Ferenci,
Donald Woods Winnicott, entre outros da nossa contemporaneidade.

Nessa perspectiva, o aparelho psíquico é formado parelho psíquico é composto de


“diferentes” áreas da mente em diferentes “territórios” regido por diferentes processos,
chamadas estruturas clínicas freudianas, que são: neurose, perversão e a psicose.
Por meio desses conceitos, podemos explicar a manifestação de conflitos e traumas,
traduzidos muitas vezes como doenças psíquicas como depressão, fobias em geral e
comportamentos compulsivos.

Pastore (2018) explica que na neurose, os sintomas revelam, ainda que de maneira
simbólica, os processos de recalque, chamado de "Verdrängung", ou seja, mandando para
o inconsciente quaisquer experiências que pudessem causar algum dolo para o indivíduo,
atuando como uma estratégia de defesa. Freud definiu a neurose como um distúrbio
psicológico que surge de conflitos internos não resolvidos entre os desejos inconscientes e
os mecanismos de defesa do ego. Esses conflitos podem resultar em sintomas neuróticos,
como ansiedade, fobias, obsessões, compulsões e distúrbios do sono. Segundo Freud, a
neurose é uma tentativa de evitar o confronto direto com desejos e pensamentos
inaceitáveis ou dolorosos, reprimindo-os no inconsciente.

Um exemplo clássico de neurose em Freud está no caso do “Homem dos Ratos”, onde o
mesmo apresentava a idéia obsessiva de que se visse uma mulher nua, seu pai teria que
morrer. Desta forma, a representação do desejo da morte do pai obsessiva, que fora
recalcada, retorna na forma de sintoma e expressa bem sua estrutura edípica, ou seja,
proibição de ver uma mulher nua, ligada ao pai.

A perversão, de acordo com Netto (1999, p. 157), se liga aos "instintos e apontam para
os desvios, aberrações e inversões na função biológica", por isso nesse processo psíquico
não há o recalque das pulsões e sim sua livre manifestação. Portanto, há o desmentido de
tal Castração. Freud usava o termo "perversão" de uma maneira específica e diferente do
seu uso popular. Para ele, a perversão se referia a padrões sexuais atípicos que envolvem

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a busca de prazer em objetos, atividades ou fantasias considerados socialmente
inaceitáveis ou desviantes. No entanto, Freud não via a perversão como uma patologia em
si mesma, mas como uma variação das formas normais de funcionamento sexual. Ele
acreditava que as perversões se originavam de experiências e conflitos específicos na
infância e se desenvolviam como formas alternativas de satisfação sexual.

Já a psicose é representada por Freud como um conflito do ego com uma realidade
externa e de acordo com Silva e Castro (2018), ela é explicitada a partir do momento em
que o ego rejeita qualquer manifestação contrária à sua intenção, ignorando-a, sendo um
mecanismo de defesa contra rejeições e frustrações. Na psicose, não há o reconhecimento
de tal Castração, o retorno aponta “a relação de exterioridade do sujeito com o
significante”, aparecendo nos distúrbios de linguagem, como as vozes alucinadas. Aqui, a
realidade a qual esta representação pertence, também é aniquilada do ego, fazendo com
que esta instância psíquica fique com um furo, um vazio, sendo que é a partir da
percepção de tal “buraco” que surge as alucinações, que não deixam de ser realidade.

Mendonça et. al (2021, p. 11) resume bem esses conceitos:

"De forma geral, em Freud, o recalque original [Urverdrängung] aconteceria inicialmente


para todos os indivíduos. Entretanto, o recalque propriamente dito [Verdrängung] perdura
apenas na neurose, ao passo de que o desmentido [Verleugnung] prevalece nas demais
entidades. Temos, assim, a neurose de um lado e as psicoses e perversões do outro,
sendo que nas últimas “teríamos uma contestação desta realidade, mais especificamente,
da realidade da castração”. Na psicose ainda haveria um tipo de recalque mais severo, no
qual o sujeito rejeita a realidade como um todo, denominado Verwerfung. As alucinações
seriam justamente o retorno desse conteúdo rejeitado".

Assim, a neurose não seria o negativo da perversão; estas estariam juntas em contraponto
à psicose - estrutura de maior destaque na obra lacaniana. A nosologia freudiana pode ser
resumida por meio do esquema a seguir:

Figura 2 - Esquema simplificado da nosologia freudiana

Fonte: Mendonça, 2021, p. 11.

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Vale ressaltar que a psicose é uma estrutura da personalidade que prejudica a percepção
e o pensamento da pessoa, afetando sua capacidade de julgamento. Diferentemente do
neurótico, o psicótico não reconhece as regras ou mesmo que as reconheça se sente
indiferente a elas, nem respeita as normas estabelecidas.

A prática clínica a partir do modelo psicodinâmico


Na prática clínica, o analista busca mostrar ao individuo como acessar e compreender
seus sentimentos, pensamentos e comportamentos dos inconscientes, utilizando técnicas
como a associação livre, que nada mais é que falar o que vier a mente, a interpretação
dos sonhos e a análise da transferência e da contratransferência.

Assim, o analista ajuda o indivíduo a desenvolver uma consciência maior de si mesmo, de


seus relacionamentos interpessoais e do mundo ao seu redor, a fim de promover
mudanças significativas em sua vida.

O terapeuta trabalha com o indivíduo para explorar suas experiências passadas, seus
desejos inconscientes e seus padrões comportamentais para ajudá-lo a entender melhor a
origem de seus problemas emocionais.

Por isso, é fundamental destacar que o objetivo da terapia psicodinâmica é auxiliar o


indivíduo a entender e resolver os seus conflitos e seus traumas, promovendo, assim, um
crescimento uma melhoria no seu convívio com a sociedade.

Os atos falhos

Na psicanálise, os atos falhos, também conhecidos como lapsos de linguagem, são


considerados como manifestações de conteúdos inconscientes que emergem de forma
não intencional através de erros, esquecimentos ou deslizes na fala, na escrita ou em
ações cotidianas. Esses atos falhos podem incluir coisas como lapsos de memória, trocas
de palavras, erros de pronúncia, lapsos de escrita, lapsos de leitura, entre outros.

Para Sigmund Freud, os atos falhos eram vistos como revelações simbólicas do
inconsciente. Freud acreditava que os desejos, pensamentos reprimidos ou conflitos
psicológicos não resolvidos poderiam emergir na forma de atos falhos, escapando do
controle consciente. Esses erros ou falhas eram vistos como uma manifestação dos
conteúdos inconscientes que buscavam encontrar uma saída. Por exemplo, alguém pode
se enganar ao nomear uma pessoa, substituindo o nome correto por outro nome que
tenha significância emocional para a pessoa, indicando que sentimentos não resolvidos
estão relacionados a essa relação. Ou pode ocorrer um lapso de linguagem em que uma
palavra com um significado diferente é usada no lugar de outra, revelando uma
associação inconsciente.

Os atos falhos são considerados pela psicanálise como uma forma de revelação do
inconsciente e são analisados como pistas para compreender os conteúdos reprimidos, os
conflitos psíquicos e os desejos ocultos de uma pessoa. Eles são considerados importantes
na investigação psicanalítica, pois podem fornecer insights sobre questões não
conscientes que afetam a vida mental e emocional de um indivíduo.

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Referências
BOCK, Ana Mercês Bahia; FURTADO, Odair; TEIXEIRA, Maria de Lourdes Trassi.
PSICOLOGIAS: uma introdução ao estudo de psicologia. São Paulo: Editora Saraiva, 2001.
492 p.

FREUD, Sigmund. UMA DIFICULDADE DA PSICANÁLISE. São Paulo: Companhia das


Letras, 2013. 311 p.

FREUD, Sigmund. Freud (1901-1905) - Obras completas Volume 6: três ensaios sobre a
teoria da sexualidade, análise fragmentária de uma histeria ("o caso dora") e outros
textos. São Paulo: Companhia das Letras, 2016. 408 p.

MENDONÇA, Roberto Lopes et al. A neurose como negativo da perversão: um estudo das
perversões em Freud. Psicologia: Ciência e Profissão, v. 41, 2021.

NETTO, Geraldino Alves Ferreira. PERVERSÕES OU PERVERSÃO. Estilos da Clínica, São


Paulo, v. 4, n. 6, p. 156-164, jul. 1999.

PASTORE, Bruna Amoroso. A constituição do sujeito e as estruturas clínicas: uma


reflexão acerca da prática clínica com crianças. 2012. 58 f. TCC (Graduação) - Curso de
Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2012.

SILVA, Beatriz de S.; CASTRO, Júlio Eduardo de. A construção do conceito de psicose de
Freud a Lacan e suas implicações na prática clínica. Analytica: Revista de Psicanálise,
São João Del-Re, v. 7, n. 13, p. 145-160, dez. 2018.

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