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PSICANÁLISE DE FREUD

LICENCIATURA EM ESTUDOS DA FILOSOFIA E CULTURA CONTÊMPORANEA

FILOSOFIA E PSICANÁLISE
2022/2023

Docente: Ângelo Milhano


Discente: Inês Santos (54706)
Sigmund Freud nasceu a 6 de maio de 1856, em Freiberg, na Morávia (atual República
Checa). Filho de Jacob Freud, pequeno comerciante, e de Amalie Nathanson, de origem
judaica, foi o primogénito de sete irmãos. A família mudou-se para Viena de Áustria
quando ele tinha 4 anos. Desde pequeno, Freud sempre demonstrou capacidades
intelectuais brilhantes, revelando-se um aluno excelente. Formou-se em Medicina, na
Universidade de Viena, em 1881, e desenvolveu trabalhos experimentais de biologia e
fisiologia. Paralelamente, interessava-se pelos clássicos gregos e latinos e pela literatura
europeia.
De 1876 a 1882, Freud concentrou-se em pesquisas sobre a histologia do sistema
nervoso, mas as dificuldades económicas e o facto de ser judeu levaram-no a exercer
clínica privada como neurologista. Durante cerca de um ano (1885-1886) estudou em
Paris, com o professor Jean Charcot, que recorria à hipnose para tratar a histeria. Na
época dominava a convicção de que a histeria (do grego hystéra, que significa útero) era
uma perturbação exclusivamente feminina. Manifestava-se por um conjunto de sintomas
orgânicos, como paralisias, desmaios, perdas de memórias, da fala, cegueira, entre
outros, mas que não tinham origem no sistema nervoso. São as experiências com
Charcot que levam Freud a pôr a hipótese da existência do inconsciente, isto é, de uma
instância do psiquismo que se desconhece. Segundo Laplanche e Pontalis (2001), ‘’ o
inconsciente designa um dos sistemas definidos por Freud no quadro da sua primeira
teoria do aparelho psíquico: é constituído por conteúdos recalcados aos quais foi
recusado o acesso ao sistema pré-consciente-consciente pela ação do recalcamento’’.
Para se compreender o ser humano, tem que se admitir a existência do inconsciente, que
define como uma zona do psiquismo constituída por desejos, pulsões, tendências e
recordações recalcadas, fundamentalmente de carácter sexual.
Freud apresenta em dois momentos duas interpretações do psiquismo da mente humana:
a primeira e a segunda tópica. Este, distingue no nosso psiquismo instâncias, isto é,
estruturas organizadas que incluem sistemas. Na primeira tópica, recorre à imagem do
icebergue: o consciente corresponde à parte visível, enquanto que o inconsciente,
corresponde à parte visível, submersa, do icebergue. O inconsciente é uma zona do
psiquismo muito maior, por comparação com o consciente, e exerce uma forte
influência no comportamento. Ao consciente, constituído por imagens, ideias,
recordações, pensamentos, é possível aceder através da introspeção. Os materiais
inconscientes, que não são acessíveis através da autoanálise, tendem a tornar-se
conscientes. Contudo, há uma censura que impede este acesso às pulsões e desejos
inconscientes, recalcando-os. Segundo Laplanche e Pontalis (2001), ‘’ o termo
«recalcamento» é muitas vezes tomado por Freud numa aceção que o aproxima de
«defesa»’’, que devolve ao inconsciente os materiais que procuram tornar-se
conscientes.
Contextualizando, a primeira tópica, o aparelho psíquico é dividido em três estâncias: o
inconsciente, pré-consciente, consciente. De 1920 a 1923, Sigmund Freud reformulou a
sua teoria devido às limitações que o antigo modelo possuía. Esta segunda teoria é
constituída por três estâncias: id, ego e superego.
O Id é a zona inconsciente, primitiva, instintiva, a partir da qual se formam o Ego e o
Superego. Existe desde o nascimento e é constituído por pulsões, instintos e desejos
completamente desconhecidos. Está desligado do real, não se orientando, portanto, por
normas ou princípios morais, sociais ou lógicos. ‘’O id desconhece o julgamento de
valores, o bem e o mal, a moralidade’’, (Freud, s/d.). Rege-se pelo princípio do prazer,
que tem como objetivo a realização, a satisfação imediata dos desejos e pulsões. Grande
parte destes desejos é de natureza sexual. O Id é o reservatório da libido, energia das
pulsões sexuais.
O Ego é a zona fundamentalmente consciente, que se forma a partir do Id. Rege-se pelo
princípio da realidade, orientando-se por princípios lógicos e decidindo quais os desejos
e impulsos do id que podem ser realizados. É o mediador entre as pulsões inconscientes
e as exigências do meio, do mundo real. Tem de gerir as pressões que recebe do Id e as
que recebe do Superego. Forma-se durante o primeiro ano de vida.
O Superego é a zona do psiquismo que corresponde à interiorização das normas, dos
valores sociais e morais, é ‘’o defensor da luta em busca da perfeição – o superego é,
resumindo, o máximo assimilado psicologicamente pelo indivíduo do que é considerado
o lado superior da vida humana’’ (Freud s/d). Resulta do processo de socialização, da
interiorização de modelos como os pais, professores e outros adultos. É a componente
ética e moral do psiquismo. Pressiona o Ego para controlar o Id. O Superego forma-se
entre os 3 e os 5 anos.
Inicialmente, Freud acreditava que a sexualidade da criança, era determinada por o meio
de um estímulo precoce, vinda de um adulto, “Cada vez mais me parece que o ponto
essencial da histeria é que ela resulta de perversão por parte do sedutor, e mais e mais
me parece que a hereditariedade é a sedução pelo pai” (FREUD, 1889, p. 179). Mas
rapidamente abandonou a ideia ao observar que “É evidente que não se requer a
sedução para despertar a vida sexual da criança, que esse despertar também pode
ocorrer espontaneamente, por causas internas” (FREUD, 1905, p. 73) Na visão de
Laplanche e Pontalis ‘’ Nas experiências e na teoria psicanalítica, ‘sexualidade’ não
designa apenas as atividades e o prazer que dependem do funcionamento do aparelho
genital, mas toda uma série de excitações e de atividades presentes desde a infância que
proporcionam um prazer irredutível à satisfação de uma necessidade fisiológica
fundamental (respiração, fome, função de excreção etc.) e que se encontram a título de
componentes na chamada forma normal do amor sexual.’’. Na análise que desenvolveu
com os seus doentes, Freud concluiu que muitos dos sintomas por eles apresentados
eram manifestações de conflitos psíquicos relacionados com a sexualidade, sujeita à
repressão. Muitos desses conflitos remetiam para experiências traumáticas vividas na
infância e recalcadas no inconsciente. O reconhecimento da importância da sexualidade
na vida psíquica humana e a afirmação da existência de uma sexualidade infantil
provocaram um enorme escândalo. Freud foi considerado uma pessoa de mente má e
obscena, pois a existência de uma sexualidade infantil era uma conceção contrária à do
final do século XIX, na qual o sexo era definido pela consumação do ato sexual entre
um homem e uma mulher, com propósito reprodutivo. Este, esclareceu que a
sexualidade não podia ser associada à genitalidade, mas sim ao prazer que tem origem
no corpo e que suprime a tensão (libido).
Para o fundador da psicanálise, o desenvolvimento da personalidade processava-se
numa sequência de estádios psicossexuais que decorriam desde o nascimento até à
adolescência.
A cada estado psicossexual corresponde uma determinada zona erógena. Freud (1901-
1905/2016) enfatiza que as chamadas “zonas erógenas” fazem parte de todas as partes
do corpo, e não apenas as zonas genitais: “[Nota acrescentada em 1915]: Reflexões
subsequentes e a utilização de outras observações nos levam a atribuir a propriedade
da erogenidade a todas as partes do corpo e todos os órgãos internos”. (p. 89) Aos
diferentes estádios de desenvolvimento correspondem conflitos psicossexuais
específicos, sendo estes o estádio oral, o estádio anal, o estádio fálico, o estádio de
latência e o estádio genital.
O estádio oral decorre desde o nascimento até cerca dos 12/18 meses. A zona erógena é
a boca: o bebé obtém prazer ao mamar, ao levar objetos à boca, bem como através de
estimulações corporais. A sexualidade é autoerótica. O desmame corresponde a um dos
primeiros conflitos vividos.
Enquanto o id, que é a herança biológica do ser humano, é orientado pelo princípio do
prazer, o ego rege-se pelo princípio da realidade, que corresponde às normas e às
exigências da vida em sociedade. É neste estádio que o ego se forma.
O estádio anal decorre dos 12/18 meses aos 2/3 anos, e a zona erógena é a região anal. A
criança obtém prazer pela estimulação do ânus ao reter e expulsar as fezes. O controlo
da defecação gera, simultaneamente, sentimentos de prazer e de dor. É nesta fase que se
faz a educação para a higiene, relativamente à qual a criança ou cede ou se opõe ao
cumprimento das regras. A ambivalência está, assim, presente nas interações que
estabelece com a mãe ou outros cuidadores.
O estádio fálico decorre dos 3 anos aos 5/6 anos. A zona erógena é a região genital: os
órgãos sexuais são estimulados pela criança, que assim obtém prazer. A curiosidade
sobre as diferenças sexuais é grande.
É neste estádio que surge o Completo de Édipo, que consiste na atração da criança pelo
progenitor do sexo oposto e a agressividade para com o progenitor do mesmo sexo. É
com este, que surge o modelo, que ela se vai identificar. A identificação leva a criança a
adotar os seus comportamentos, valores e atitudes. É a sua interiorização que conduz à
formação do superego. É através do processo de identificação que se supera o complexo
de Édipo.
O estádio de latência ocorre dos 5/6 anos até à puberdade. Este período é caracterizado
por uma aparente atenuação da atividade sexual. Seria neste estádio que ocorreria a
amnésia infantil: a criança reprime no inconsciente as experiências que a perturbaram
no estádio fálico. A criança investe a sua energia nas atividades escolares, ganhando
especial importância as relações que estabelece entre os colegas e os professores.
A partir da puberdade, a zona erógena é a região genital. É o último estádio de
desenvolvimento da personalidade, em que há uma ativação da sexualidade que esteve
latente no período anterior. Apesar de os investimentos afetivos se desenrolarem fora da
família, há uma reativação do completo de Édipo. O processo de autonomia
relativamente aos pais passa por os encarar de forma mais realista. O prazer sexual
envolve todo o corpo, integrando todas as zonas erógenas.
Depois de ter abandonado a hipnose como meio de explorar o inconsciente, Freud
considerou a necessidade de constituir um método próprio. Aplicando o método clínico,
adaptou um conjunto de técnicas de permitiram trazer ao consciente as causas não
conhecidas, inconscientes, dos problemas e conflitos dos pacientes. O psicanalista
recorreu a alguns procedimentos ou técnicas próprias: associações livres, interpretação
dos sonhos, análise do processo de transferência e análise dos atos falhados.
Na técnica de associações livres, o psicanalista pedia ao analisado que dissesse tudo o
que sentia e pensava, sem qualquer omissão. Foi no decorrer deste procedimento que se
manifestavam resistências, desejos, recordações e recalcamentos inconscientes, que o
analista procuraria identificar ou interpretar.
Na interpretação dos sonhos, o psicanalista pedia ao analisado que lhe relatasse os
sonhos. Segundo Freud, o sonho seria a realização simbólica (disfarçada) de desejos
recalcados. Freud distinguiu o conteúdo manifesto do sonho (o que é lembrado, o que é
consciente) e o conteúdo latente (os desejos, medos, recalcamentos que estão
subjacentes). Cabia ao analista dar-lhe um sentido, interpretando os sonhos.
Na análise de transferência, o psicanalista analisava e interpretava os dados do processo
de transferência. A transferência era um processo em que o analisado transferia para o
psicanalista os sentimentos de amor/ódio vividos na infância.
Na análise dos atos falhados, o psicanalista procurava interpretar os esquecimentos,
lapsos e erros de linguagem, leitura ou audição do analisado. Segundo Freud, estes erros
involuntários manifestariam desejos recalcados no inconsciente e que irromperiam na
vida quotidiana. Freud dedicou aos estudos destes lapsos uma obra: A Psicopatologia da
Vida Quotidiana.
Concluindo, com Freud abriu-se uma nova perspetiva que toma como centro a
consciência, ou que reduz o ser humano a uma fórmula simplista de comportamento
estímulo-resposta. É um novo conceito de ser humano, dominado desde o nascimento
por pulsões, sobretudo de carácter sexual. Um dos legados mais importantes foi o
reconhecimento da importância da vida afetiva, sobretudo da infância, no
desenvolvimento cognitivo e social, bem como na personalidade do indivíduo.

Bibliografia

FREUD, S. (1974), Psicopatologia da Vida Quotidiana, Lisboa, Estúdios Cor.

FREUD, S. (1991), Esquecimento e Fantasia, Lisboa, Assírio e Alvim.

FREUD, S. (s/d), Três Ensaios sobre a Teoria da Sexualidade, Lisboa, Livros do Brasil.
LAPLANCHE, PONTALIS (2001), Vocabulário da Psicanálise, São Paulo, Martins
Fontes.

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