Você está na página 1de 2

CAPÍTULO VIII - AS ANGÚSTIAS DO BOTICÁRIO

Morador 1: - Agora sim o déspota será punido! (Crispim vai passando nessa hora e escuta a
conversa)
Morador 2: - Verdade! Já fiquei sabendo que amanhã mesmo Porfírio irá prendê-lo!
Morador 3: Agora quero ver! A Casa Verde será destruída!
Crispim vai para casa de forma apressada.
Crispim: (Nessa cena caminhando de um lado para outro) —Vai prender Bacamarte. O que
farei?
Cesária: (aparece em cena) – Crispim, seu lugar é ao lado de Simão Bacamarte!
Crispim: - Não sei! Não me sinto bem! Vejo tudo escuro! Uma tontura! Estou doente! Vou-me
deitar! (e sai do palco).
Cesária (entra novamente no palco, como se tivesse se passado um dia): -Lá vai o Porfírio à
casa do Dr. Bacamarte; vai acompanhado de gente.
Crispim: —Vai prendê-lo! Vou sair!
Cesária: - Você não estava doente? Melhor ficar quieto!
Crispim sai de casa e se dirige ao Palácio do Governo (Câmara).
Na Câmara somente funcionários (uma mulher limpando, outros dois datilografando, pessoas
ocupadas.
Crispim: - Bom dia! Gostaria de falar com Porfírio – o barbeiro presidente.
Funcionário 1: - Bom dia! Ele não se encontra! Saiu para resolver situação importante!
Crispim: -Eu estive enfermo e, por isso, não vim antes prestar meu pleno apoio ao novo
governo!
Funcionário 2: Isso é muito importante, já que o Sr. é amigo muito chegado de Simão
Bacamarte! Poderá ser muito útil para nosso atual governo!
Funcionário 1: _- Por favor, sente-se aqui. O Sr. aceita uma água, um suco, enquanto aguarda
Porfírio? Ele não tardará.
Funcionário 2: - Sua atitude é digna de aplausos, vejo que o Sr. é um homem muito inteligente!

CAPÍTULO IX - DOIS LINDOS CASOS


Cena: Porfírio chega à residência de Bacamarte com outros dois policiais e é recebido pelo
médico.
Simão: -Não tenho meios de resistir, e estou prestes a obedecer. Só uma coisa lhe peço, que não
me obrigue a assistir pessoalmente à destruição da Casa Verde.
Porfírio: — Engana-se Vossa Senhoria, engana-se em atribuir ao governo intenções vandálicas.
Com razão ou sem ela, a opinião crê que a maior parte dos doidos ali metidos estão em seu perfeito juízo,
mas o governo reconhece que a questão é puramente científica e não cogita em resolver com posturas as
questões científicas.
Simão (com olhar assombrado): - Confesso que esperava outra coisa, o arrasamento do
hospício, a prisão dele, o desterro, tudo, menos a postura flexível do atual governo!
Porfírio: — O pasmo de Vossa Senhoria, vem de não atender à grave responsabilidade do
governo. O povo, tomado de uma cega piedade que lhe dá em tal caso legitima indignação, pode exigir
do governo certa ordem de atos; mas este, com a responsabilidade que lhe incumbe, não os deve praticar,
ao menos integralmente, e tal é a nossa situação. É matéria de ciência. Unamo-nos e o povo saberá
obedecer!
Narrador: O que Porfírio pedia ao médico era que de certa maneira dessem alguma satisfação
ao povo; que retirasse da Casa Verde aqueles enfermos que estivessem quase curados e bem assim os
maníacos de pouca monta, etc. Desse modo, sem grande perigo, mostrariam alguma tolerância e
benignidade.
Simão: —Quantos mortos e feridos houve ontem no conflito?
Porfírio: - Onze mortos e vinte e cinco feridos.
Simão: —Onze mortos e vinte e cinco feridos! (repetiu três vezes o alienista)
Simão: -Dentro de poucos dias lhe darei a resposta.
(Congela)
Narrador: - O barbeiro confessou que o novo governo não tinha ainda por si a confiança dos
principais da vila, mas o alienista podia fazer muito nesse ponto. O governo, concluiu o barbeiro, folgaria
se pudesse contar não já com a simpatia senão com a benevolência do mais alto espírito de Itaguaí e
seguramente do reino. Mas nada disso alterava a nobre e austera fisionomia daquele grande homem que
ouvia calado, sem desvanecimento nem modéstia, mas impassível como um deus de pedra.
Simão: —Onze mortos e vinte e cinco feridos. (repetiu o alienista depois de acompanhar o
barbeiro até a porta).
(Congela)
Narrador: Eis aí dois lindos casos de doença cerebral. Os sintomas de duplicidade e
descaramento deste barbeiro são positivos. Quanto à toleima dos que o aclamaram, não é preciso outra
prova além dos onze mortos e vinte e cinco feridos.—Dois lindos casos! (Pensou o médico)
Pessoas na frente da casa do médico—Viva o ilustre Porfírio! bradaram umas trinta pessoas que
aguardavam o barbeiro à porta.
Porfírio: —...porque eu velo, podeis estar certos disso, eu velo pela execução das vontades do
povo. Confiai em mim; e tudo se fará pela melhor maneira. Só vos recomendo ordem. E ordem, meus
amigos, é a base do governo...
Pessoas na frente da casa do médico: —Viva o ilustre Porfírio!
Saem de cena.
Narrador: Dois lindos casos! murmurou o alienista.

Você também pode gostar