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ESTADO E SERVIÇO SOCIAL NO

BRASIL
Aula 3

Profª Carla Andréia Alves da Silva Marcelino


CONVERSA INICIAL

Olá, caro aluno!

Nesta terceira aula da disciplina de Estado e serviço social no Brasil conversaremos sobre o

Estado Liberal e o Welfare State, conhecido no Brasil como Estado de Bem-Estar Social. Esses

conteúdos são a continuação da nossa aula anterior, já que o Estado Liberal não deixa de ser a

consolidação ou a evolução das teses dos teóricos contratualistas já estudados, dentre eles Kant,
Hobbes e Locke (Rousseau enveredou mais para a senda do socialismo utópico do que para o

liberalismo).

Está preparado? Vamos lá!

Iniciaremos nossos estudos tratando do Estado Liberal – em que condições conjunturais se

originou e quais eram as suas principais premissas. Na sequência, falaremos brevemente sobre o

ideário liberal de “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”, fazendo a devida análise crítica de como

estes conceitos foram incorporados, já que até os dias atuais esse lema é utilizado erroneamente até

mesmo por alguns profissionais do Serviço Social.

Entraremos, então, em uma análise crítica do Welfare State, perpassando as condições de seu
surgimento em várias perspectivas, pela sua crise e desmonte e, por fim, por uma discussão sobre se

houve ou não Estado de Bem-Estar Social no Brasil.

Conhecer essa trajetória histórica é fundamental para os futuros assistentes sociais, pois vocês

atuarão numa realidade e num padrão de proteção social que é fruto dessa movimentação do Estado

conforme a conjuntura política e econômica das sociedades.

CONTEXTUALIZANDO
Leia a reportagem a seguir para que após nossos estudos sobre o Welfare State, tenhamos

condições de avaliar se as políticas trabalhistas de Getúlio Vargas podem ser consideradas como

resquícios de um Estado de Bem-Estar Social no Brasil ou não.

“Consolidação das Leis Trabalhistas, criada por Vargas, completa 70 anos” <https://age

ncia.fiocruz.br/consolida%C3%A7%C3%A3o-das-leis-trabalhistas-criada-por-vargas-completa-70

-anos>

PESQUISE

TEMA 1 - A FORMAÇÃO DO ESTADO LIBERAL

O Estado Liberal, de acordo com Moraes (2014), começou a ser desenhado por volta do século
XVII e seguiu transformando-se até o Século XX. Dessa forma, não é possível datar exatamente ou

estabelecer um marco ou um fato específico que seja o ponto inicial do liberalismo. O que se pode

afirmar com certeza é que o Estado Liberal surge junto com o movimento iluminista, em forte

oposição ao absolutismo, às monarquias absolutistas.

Embora haja um sem fim de definições e conceitos para o Estado Liberal, é consenso em quase

todas elas de que o liberalismo tem como principal pauta o exercício das liberdades individuais,
orientadas pela razão humana, ou seja, o direito de realização de ações próprias, livres e

racionalmente orientadas. Esta liberdade seria o centro para a satisfação das necessidades, interesse

e desejos humanos. Esta pretensa liberdade perpassaria pelo aspecto econômico, político e social.

No liberalismo, nem o Estado, nem a religião ou qualquer outro ente deveria influenciar a ação

humana diretamente, sendo livre o direito à propriedade privada, ao pensamento (ideologia) e a

atuação política. Alguns autores defendem que não apenas as liberdades individuais eram exaltadas,

mas também a liberdade dos povos como um todo e é neste contexto, advindo das teses liberais,

que surgem as primeiras discussões e declarações dos direitos humanos, como veremos nas

próximas aulas.

Podemos encontrar os primeiros escritos sobre o liberalismo na obra de Kant, que foi o primeiro

dos iluministas a levantar veementemente a questão da autonomia e do exercício da vontade

individual como algo ilimitado, orientado apenas pelos imperativos categóricos.


Chauí (2000) explica que é na teoria política de Locke que encontramos os traços mais claros do

liberalismo. A autora afirma que para Locke, diferentemente de Hobbes e Rousseau, a propriedade

privada é um direito natural do homem e não foi criada pelo Estado; o Estado é que foi criado para

preservá-la, mantê-la e legitimá-la. Isso porque as teses de Locke vinham ao encontro dos anseios da

burguesia ascendente na Europa do século XVII e início do século XVIII, a qual reivindicava o seu

direito de propriedade contra a nobreza e a realeza, que, por sua vez, defendiam a questão da

propriedade vinculados à hereditariedade e ao sangue nobre.

Além da propriedade, Locke também defendeu a liberdade e a própria vida como direitos

naturais. Lembramos que o autor entendia a propriedade privada como fruto do trabalho e, para ele,

o trabalho era dom dado por deus aos homens e por isso, a propriedade privada advinda deste
trabalho seria um direito natural. Assim, no seu contrato social, o Estado surge para legislar e

defender esse direito natural, respaldando os interesses da burguesia.

Neste contexto, como já afirmamos, a burguesia utilizou-se da tese do direito natural à

propriedade privada para afrontar a nobreza da época, que mantinha a posse por hereditariedade.

Assim, segundo Chauí (2000), os burgueses reivindicavam seu direito à propriedade a qual foi

acumulada através do trabalho em detrimento a nobreza, a qual consideravam os parasitas da

sociedade. Porém, não era apenas da nobreza que o Estado Liberal deveria defender os burgueses,

mas também dos pobres, que eram considerados “perdulários” porque gastavam todo o seu salário e

não acumulavam recursos para adquirir posses.

Marilena Chauí explica que depois de Locke muitos outros autores vieram a aprimorar as teses

sobre o Estado Liberal, em especial após a Revolução Francesa, quando se defendeu, como afirma

Moraes (2014), o Estado como garantidor dos direitos dos indivíduos contra as arbitrariedades dos

governantes.

Chauí (2000) monta um esquema pautado nos escritos sobre o Estado Liberal do sociólogo Max

Weber, que, segundo ela, foi um dos maiores estudiosos deste tema após Locke e os teóricos da

Revolução Francesa. Nesse esquema, a autora conclui que seriam três as grandes funções do Estado

Liberal:

1. Garantir do direito natural de propriedade, por meio da legislação e, se necessário, do uso legal

da violência, sem interferir na vida econômica. Esta não-interferência é defendida pelo fato de
que se não foi o Estado que instituiu a propriedade privada, ele também não pode interferir
nela. Os proprietários privados têm o direito de fazer as suas regras e normas para reger as

atividades econômicas.

2. Arbitrar os conflitos entre os membros da sociedade civil. A sociedade civil é livre para

relacionar-se, cabendo ao Estado apenas dirimir conflitos, utilizando-se primeiramente das leis

e da força quando necessário.

3. Garantir a liberdade de consciência de todos os homens, sendo livre o pensamento e a

expressão – salvo quando esta manifestação puder causar dano ao Estado.

Assim, a partir destes três pressupostos, ao Estado competiria defender as liberdades individuais,

executar as leis para dirimir conflitos e legislar sobre tudo aquilo que é público, ou seja, legislar na

esfera daquilo que é do próprio Estado. É consenso entre muitos autores que o liberalismo se dava

em três dimensões: liberalismo econômico, liberalismo social e liberalismo político.

Até aqui fica mais que evidenciado que o Estado Liberal serviu para atender aos interesses da

burguesia, ajudou a acentuar as desigualdades sociais e, por isso mesmo, foi alvo da crítica e de

reações de correntes socialistas e comunistas. A crise do liberalismo, segundo Moraes (2014), teve

seu início após o final da Primeira Guerra Mundial, quando se viu em vários países estratégicos da

Europa o surgimento de regimes totalitaristas de Estado, tal como o fascismo na Itália.

O “fracasso” final do Estado Liberal veio após a Segunda Guerra Mundial, quando a crise

econômica fez acentuar ainda mais as desigualdades, gerando a demanda para o Estado de atender a

população, como veremos mais adiante sobre o Welfare State. O Estado apenas como garantidor das

liberdades já não dava mais conta das demandas da população, sendo necessário, portanto, expandir

suas funções, conforme afirma Soares (2013), para o próprio bem e continuidade do projeto

capitalista.

Sobre esse assunto, façamos a leitura do artigo “A evolução histórica do Estado Liberal ao

Estado Democrático de Direito e sua relação com o constitucionalismo dirigente”, de autoria de

Ricardo Quartim de Moraes. <http://www2.senado.leg.br/bdsf/bitstream/handle/id/509938/0010

32358.pdf?sequence=1>

TEMA 2 - LEMA DO LIBERALISMO: LIBERDADE, IGUALDADE E


FRATERNIDADE
Decidimos tratar brevemente sobre o tão falado lema do liberalismo, pois muito se confundem

as categorias deste lema com categorias das teorias críticas. A exemplo, o próprio Código de Ética do

Assistente Social em vigência (Resolução nº 273/1993 – CFESS), em seus princípios fundamentais, traz

alguns destes pressupostos em seu bojo. Confira: <https://www.legisweb.com.br/legislacao/?id=9558

0>

Alguns chamam de lema, outros de três direitos fundamentais, mas o fato é que este trinômio

Liberdade – Igualdade – Fraternidade surgiu no seio da Revolução Francesa, ocorrida em 1789. Esta
revolução, que se pretendia ser de parcelas mais empobrecidas e não proprietárias, acabou sendo

uma revolução que beneficiou a burguesia contra as monarquias e a nobreza.

A partir Revolução Francesa é que o ideário liberal ganha força, como citamos no tema anterior,
e é nessa revolução que surgiu o lema.

Liberdade: nele, a liberdade da qual se fala não é aquela mesma entendida pela teoria crítica de

Marx, a exemplo, mas sim aquela liberdade vinculada ao direito natural à propriedade e a fazer o que
bem entender dela. Nesse conceito de liberdade também está inserida a ideia da não interferência do

Estado na vida privada dos homens.

Igualdade: a igualdade, no contexto liberal, advém da ideia da não obtenção de privilégios de

uns sobre os outros no sentido da lei – a mesma lei deveria valer para todos.

Fraternidade: a fraternidade, por sua vez, era a solidariedade entre os homens, no sentido da
solidariedade política, para garantir a liberdade e a igualdade e a manutenção de uma pretensa

ordem coletiva, impondo limitações à ação de um para não prejudicar ao outro.

Assim, importante frisar aqui que esta liberdade nada tem com a não alienação pretensa na
teoria crítica; a igualdade não se refere à distribuição de bens, renda e acesso, mas sim à sujeição às

leis; e por fim, a fraternidade também não está relacionada com altruísmo ou qualquer coisa similar,
mas sim às condições de colaboração coletiva entre os homens para garantir os ideários liberais.

TEMA 3 - ORIGEM DO WELFARE STATE

O Welfare State foi um modelo de Estado implantado em quase todo o mundo a partir dos anos

de 1940, e é fruto, como já dissemos, da crise e do fracasso do Estado Liberal. Chauí (2010, p. 555) faz
um panorama histórico do surgimento deste Estado:

O Estado do Bem-Estar Social (Welfare State) foi implantado nos países capitalistas avançados do

hemisfério norte como defesa do capitalismo contra o perigo do retorno do nazifascismo e da


revolução comunista. A crise econômica gerada pela guerra, as críticas nazifascista e socialista ao

liberalismo, a imagem da sociedade socialista em construção na União Soviética e na China,


fazendo com que os trabalhadores encontrassem nelas (ignorando o que ali realmente se passava)

um contraponto para as desigualdades e injustiças do capitalismo, tudo isso levou a prática política

a afirmar a necessidade de alterar a ação do Estado, corrigindo os problemas econômicos e sociais.

Pela citação você já pode depreender que optamos por uma análise mais crítica do Welfare State,
como um modelo de Estado surgido a partir da demanda do próprio capitalismo e não para atender

as demandas dos trabalhadores ou das parcelas mais empobrecidas da população. Nesse contexto, o
Estado assume um caráter mais intervencionista de atuação, intervindo na economia, regulando os

mercados, criando empresas estatais e aparatos de direitos trabalhistas e de proteção ao trabalho,


assumindo para si a execução de serviços básicos como o de saúde, educação, moradia, previdência

social, dentre outros.

Apesar das várias vertentes de análise do Welfare State, Nogueira (2001) indica que em todas
elas a principal perspectiva de análise é a da oferta de padrões mínimos de sobrevivência, afiançados

pelo Estado, na condição de direito político, saindo da senda da caridade e da benevolência. Porém, a
crítica a ser feita é do porquê da oferta desses direitos sociais ou políticos ao cidadão.

Para a autora, existe uma explicação econômica e uma explicação política para o surgimento da

Welfare State. No bojo das explicações econômicas, podemos encontrar as de vertente durkeimiana e
a marxista:

Na explicação durkeimiana, o Welfare State nasce com a função de dar integração e coesão ao tecido social, uma vez que
os mecanismos tradicionais (tais como a família e as instituições tradicionais, como a igreja) que garantiam essa coesão já

não dão mais conta de fazê-lo.

Já as explicações econômicas de origem marxista partem do pressuposto de que o Welfare State nasce para atender as

demandas do próprio capitalismo e das crises cíclicas pelas quais ele perpassou.

Neste sentido, Nogueira (2013, p. 91-92), parafraseando Francisco Oliveira, explica:

[...] Welfare State como um padrão de financiamento público da economia capitalista, em


consequência das políticas originalmente ancicíclicas da teorização keynisiana. O fundo público
financiaria, a partir de regras pactuadas em uma esfera pública, tanto a produção como a

reprodução da força de trabalho.

Em qualquer uma das duas explicações fica evidenciado não haver nenhuma intenção moral na
fundação do Welfare State. Ou seja, nem mesmo as análises mais conservadoras defendem que ele

tenha surgido por uma obrigação moral de minimizar as desigualdades sociais e garantir qualquer
direito humano.

Seguindo com Nogueira (2010), há também a explicação do surgimento do Welfare State a partir
dos argumentos políticos. Esse argumento traz em si uma noção de cidadania e garantia de direitos,

sendo estes direitos civis, políticos e sociais.

Os direitos civis corresponderiam às garantias de liberdades individuais, direito de ir e vir, de


pensar e se expressar livremente, de propriedade, de estabelecer contratos e acessar a justiça.

Os direitos políticos estariam consolidados no direito ao voto, meio pelo qual os cidadãos
participariam da política, votando e sendo votados; a autora lembra que foi neste período do

Welfare State que muitos segmentos conquistaram o direito de participação política, tais como
os trabalhadores não proprietários e as mulheres.

Os direitos sociais seriam aqueles que corresponderiam a um mínimo bem-estar dos


indivíduos. Os homens fazem um acordo, quase como um novo contrato social, no qual são

garantidos os seus direitos em troca da segurança e da redução das incertezas necessárias ao


desenvolvimento capitalista.

É consenso entre grande parte dos estudiosos que o Welfare State não se consolidou da mesma

forma em todos os países do mundo, sendo que foram criadas três categorias de implementação
deste Estado: o Liberal (ou Residual), o Conservador (ou Meritocrático) e o Social-Democrata.

Conheça cada uma dessas categorias de Estado assistindo à videoaula que está disponível no

material on-line!

Mas, será que o Welfare State perdurou ao longo do tempo? Será que o Estado e o capital

garantiriam para sempre as políticas de proteção social aos cidadãos?

A resposta é: não.

Sobre essa questão, façamos a leitura do artigo “Estado de Bem-Estar Social: origens e
desenvolvimento” de autoria de Vera Maria Ribeiro Nogueira. <https://periodicos.ufsc.br/index.php/k
atalysis/article/viewFile/5738/5260>

TEMA 4 - CRISE DO WELFARE STATE

É consenso entre os estudiosos do Estado e do Welfare State, que a crise deste modelo teve seu

apogeu na década de 1980. Seibel (2005) e Draibe e Henrique (1988) fazem uma análise das várias
vertentes que explicam essa crise, sendo a primeira delas a que vincula da crise do Welfare State à
crise do Estado-nação, destacando o fim da economia nacional como sendo o responsável pelo

fracasso deste modelo: “a tendência de mundialização da economia teria enfraquecido o poder de


regulação do Estado, privando a sociedade da garantia de seus direitos sociais” (Corazza, 2006, p. 2).

Uma segunda tendência de explicação para a crise do Welfare State, mais conservadora, afirma
que a crise se deve ao elevado gasto público causado pelo Estado de Bem-Estar Social, causando a

estagnação das economias ocidentais.

Seibel (2005) afirma que a partir do final dos anos de 1980 as concepções de políticas sociais
deixam de ter um caráter de proteção mais universalizante para ter uma concepção focada na

responsabilidade da família e nas reponsabilidades individuais. Junto com o declínio do modelo de


proteção social até então vigente, viu-se crescer a desregulação do trabalho, a queda do emprego e

da renda das famílias, com uma intervenção cada vez menor do Estado.

Draibe e Henrique (apud Dror, 1981), esclarecem:

A performance de baixo crescimento com aceleração inflacionária e desequilíbrios financeiros dos

Estados parece ter gerado um conflito entre política econômica e política social destruindo aquele

“círculo virtuoso do pós-guerra”. Mais ainda, parece ter sido definitivamente abalado o consenso
quanto à possibilidade de se assegurar o crescimento econômico conjugado com a tentativa de

contra-restar a tendência à desigualdade e injustiça sociais através de transferências de renda e


gastos de governos. Do mesmo modo, pareceria ter diminuído a crença na capacidade de

gerenciamento, pelo Estado, dos vários desequilíbrios, dado o declínio mesmo da capacidade de

governar, seja por envelhecimento dos mecanismos de política, seja pela profunda crise de
confiança que afeta a relação governantes-governados.

Os mesmos autores vinculam a crise do Welfare State à crise do modo capitalista de reprodução
da riqueza pautado na produção, vivenciada nos anos de 1980 e início dos anos 1990. O Estado não

arrecadaria mais o suficiente para manter os gastos sociais, gerando déficits públicos, e assim
também não poderia investir para acelerar a economia e o desenvolvimento do capital.
Outras vertentes defensoras do fim do Welfare State chegaram a afirmar, de forma mais
conservadora ainda, que este modelo de Estado desestimulou os cidadãos ao trabalho, caindo, assim,

a produção. Outro argumento na mesma linha era a grande crítica ao modelo porque ele passou a
onerar a todos os cidadãos e em especial as empresas privadas com alta carga de impostos para

poder manter as políticas sociais.

Assim, a partir da crise do capitalismo, da transnacionalização da economia, da crise do petróleo


(no final da década de 1970 como fruto da Guerra Fria e da retração da economia), abrem-se as

portas para o fortalecimento das teses neoliberais, que têm como fundamento o chamado Estado
mínimo, que será estudado em momento oportuno.

Sobre o assunto deste tema, há o texto “Welfare State, crise e gestão da crise: um balanço da

literatura internacional” de autoria de Sônia Draibe e Wilnês Henrique.

TEMA 5 - ESTADO DE BEM-ESTAR SOCIAL NO BRASIL

Para esta seção, utilizaremos como base a dissertação de mestrado, de tema análogo, escrita e
defendida por Benevides (2011). Para analisar o Estado de Bem-Estar Social no Brasil, é necessário,

segundo a autora, levar em consideração que:

[...] a configuração do Estado de Bem-Estar Social em cada país é determinada pelo padrão e o nível

de industrialização, a capacidade de mobilização dos trabalhadores, a cultura política de uma

nação, a estrutura de coalizões políticas e a autonomia da máquina burocrática em relação ao


governo. Assim, podem-se compreender as características estruturais de cada sistema de proteção

social sem se recorrer a uma concepção linear de desenvolvimento das políticas sociais. O caso
brasileiro, sob esse ponto de vista, torna-se um padrão, dentre os vários existentes, de intervenção

e regulação social do Estado. Ou seja, a intervenção do Estado Brasileiro é específica, mas preserva

características de tendências gerais.

Considerando que dos anos 1930 até por volta de 1970 o Brasil foi caracterizado pelo

desenvolvimento da economia capitalista industrial e urbana, a autora afirma que o Estado,


acompanhando esse processo, se modernizou, estendendo o seu papel regulador e os mecanismos
de intervenção. Porém, do ponto de vista social essa intervenção ficou focada na relação entre capital

e trabalho, não havendo, num primeiro momento, uma perspectiva de proteção social mais geral de
garantia de direitos.
Os alicerces do sistema de proteção social brasileiro são constituídos nesse mesmo período, tendo

o autoritarismo como uma de suas principais marcas, visando regular aspectos concernentes à
organização dos trabalhadores assalariados dos setores mais modernos da economia, utilizando-se

da antecipação de algumas necessidades, de modo a reduzir a legitimidade das lideranças


trabalhistas em suas reivindicações. (BENEVIDES, 2011, p. 62)

No sentido dessa proteção social mais conservadora, focada na relação capital e trabalho,
surgem no Brasil, a partir da década de 1930, uma série de políticas trabalhistas, de previdência

social, de proteção ao trabalho e ao trabalhador, dentre eles a criação do primeiro Ministério do


Trabalho, no Governo de Getúlio Vargas (período chamado de Estado Novo).

Seguindo com a mesma autora, nas décadas de 1950 e 1960, o Brasil apresenta políticas de

cunho social fragmentadas, grande parte delas voltadas ao trabalhador, com discretos avanços com a
criação do Instituto Nacional de Previdência Social – INPS (1966) que unificou os sistemas de

previdência social e os benefícios concedidos aos trabalhadores, permanecendo excluídos deste


sistema de proteção social aqueles que estavam à margem do mercado de trabalho;

“[...] ocorreu, no período, ampliação de serviços e programas, porém com uma maior seletividade

do público beneficiário, pulverização das ações e segmentação do usuário por faixas etárias,
necessidades e problemas” (BENEVIDES, 2011, p. 65).

Naquele sentido, apesar de se dizer universal, essas políticas de proteção social acabavam por

não beneficiar a classe média trabalhadora, a qual se deslocou cada vez mais para o atendimento de

suas necessidades na área privada, em especial na área de saúde e de educação. Até aí se destacava

o papel centralizador da esfera federal na execução e no financiamento dessas políticas, com ofertas
fragmentadas e sem nenhum caráter de redistribuição de renda.

Com a promulgação da chamada Constituição Cidadã, em 1988, uma série de direitos sociais

foram assegurados na carta magna.

“O direito social foi visto como o fundamento da política, com um comprometimento do governo
com o sistema de proteção, projetando um acentuado grau de provisão do Estado, cabendo ao

setor privado um papel complementar” (Draibe, apud Benevides, 2011, p. 66).

Com a instituição da Seguridade Social, amplia-se a atuação estatal para além do caráter

contributivo do trabalhador, gerando direitos sociais também àqueles que não estão no mundo do

trabalho. Assim, na análise de Benevides (2011), somente quando o Welfare State estava já em sua

crise mundial é que no Brasil ele consegue se estabelecer, já que a autora não considera as décadas
que antecederam ao final dos anos de 1980 como sendo de Estado de Bem-Estar Social consolidado,
pois as políticas eram fragmentadas, não universais e restritas à relação capital e trabalho.

Mesmo com as garantias constitucionais, os níveis de proteção social atingidos, segundo a


autora, são muito baixos, o que deixa a dúvida se de fato houve um Estado de Bem-Estar Social no

Brasil.

[...] vários aspectos do ainda insatisfatório nível de bem-estar social no Brasil suscitam o debate

se existiria ou não um Welfare State no país, tais como as altas taxas de pobreza e desigualdade, a

cobertura insuficiente e a qualidade baixa nos serviços prestados na saúde e educação, a taxa elevada
de trabalhadores no mercado informal, dentre outros. (Idem, p. 81)

Conheça o trabalho integral de Cláudia Maria Benevides: “Um Estado de Bem-Estar Social no

Brasil?”

TROCANDO IDEIAS

A partir do que você acabou de aprender sobre o Welfare State e observando as políticas sociais

brasileiras implementadas a partir da década de 1930, responda:

Houve ou não a consolidação de um Estado de Bem-Estar Social no Brasil?

Discuta a respeito com seus colegas e poste suas considerações no fórum disponível no AVA!

NA PRÁTICA

Primeiramente, assista à videoaula que está no material on-line para conhecer a questão que

proporemos a você.

Leia o artigo “O Programa Bolsa Família no contexto das políticas de proteção dos estados

de bem-estar social: apontamentos para discussão”, de André Pires.

Já fez a leitura do artigo? Então, agora você deverá:


Pesquisar na Internet sobre o Programa Bolsa Família: critérios de inclusão, condicionalidades,

valores recebidos pelas famílias.


Refletir sobre a natureza e a característica do Programa Bolsa Família e os preceitos do Estado

de Bem-Estar Social: em que medida se aproximam e/ou se distanciam.

Agora, confira as considerações da professora Carla sobre essa questão assistindo à videoaula

disponível no material on-line!

SÍNTESE

Nesta aula, como prosseguimento da evolução histórica da aula anterior, vimos a formação do

Estado Liberal, demarcado pela não influência e a baixa intervenção do Estado na economia e na vida
social, assegurando o direito às liberdades individuais, dentre elas (e principalmente) a liberdade

econômica, dando ao Estado um papel de legislador e executor de leis, devendo intervir apenas

quando as relações entre a sociedade civil estiverem em conflito, demarcando claramente a esfera do

público e do privado, sendo a esfera pública aquela de atuação do Estado.

Vimos também que apesar de o liberalismo pregar a liberdade e a igualdade, esses termos
ficaram apenas no âmbito da sujeição dos homens às mesmas leis, já que o Estado Liberal e sua

desregulação da economia só fizeram crescer as desigualdades sociais por todo o mundo, fazendo

crescer também os levantes de trabalhadores e reivindicações sociais, colocando em risco o próprio

projeto capitalista de acumulação.

É neste sentido que vimos então a eclosão do Welfare State – conhecido no Brasil como Estado
de Bem-Estar Social – que se caracterizou por uma forte intervenção estatal (em especial na área

social), com políticas de amparo ao trabalhador e de proteção à população mais empobrecida, com a

finalidade de garantir o desenvolvimento econômico e a expansão do capital, financiados pela esfera

pública.

Estudamos a crise do Welfare State, a qual para a maioria dos autores está vinculada também à

crise do capitalismo focado na produção e ao alto nível de gastos públicos, o que acabou onerando a
iniciativa privada com altos impostos para a sua manutenção.

Por fim, vimos sobre o Estado de Bem-Estar Social no Brasil, apontando elementos para

pensarmos se este modelo de intervenção chegou ou não a consolidar-se em nosso país, concluindo
que dos anos de 1930 até a década de 1980 as políticas de proteção eram fragmentadas e voltadas

apenas para os trabalhadores, sendo que mais tarde passaram a ter um caráter extremamente

seletivo, sendo alvo destas políticas de proteção apenas os efetivamente mais necessitados,
passando, posteriormente, a um novo padrão assistencial a partir da Constituição Federal de 1988,

com a universalização dos direitos, não mais restritos ao caráter contributivo com a implementação

das políticas de Seguridade Social.

REFERÊNCIAS

BENEVIDES, C. M. Um Estado de Bem-Estar Social no Brasil? Dissertação. Rio de Janeiro:


fevereiro de 2011. Dissertação de Mestrado defendida no Programa de Pós-Graduação em Economia

da Universidade Federal Fluminense. Disponível em

http://www.proac.uff.br/cede/sites/default/files/EBES_no_Brasil__2_dissertacao_benevides.pdf. Acesso

em 10/03/2016.

CHAUÍ, M. Convite à filosofia. São Paulo: Ática, 2000.

CORAZZA, G. Economia nacional e capitalismo: um enfoque histórico-metodológico. Revista

Economia. Brasília: v. 7, n. 1, jan / jul 2006, p. 133–162. Disponível em


http://www.anpec.org.br/encontro2004/artigos/A04A010.pdf. Acesso em 23/03/2016.

DRAIBE, S.; HENRIQUE, W. Welfare State, crise e gestão da crise: um balanço da literatura

internacional. Revista Brasileira de Ciências Sociais. São Paulo, v. 2, n. 6, fev. 1988, p. 1-23. Disponível

em http://www.anpocs.org.br/portal/publicacoes/rbcs_00_06/rbcs06_04.htm. Acesso em 20/03/2016.

MORAES, R. Q. A evolução histórica do Estado Liberal ao Estado Democrático de Direito e

sua relação com o constitucionalismo dirigente. Revista de Informação Legislativa. Brasília, v. 51, n.

204, p. 269-285, out/dez 2014.

NOGUEIRA, V. M. R. Estado de Bem-Estar Social: origens e desenvolvimento. Revista Katálysis.


Florianópolis, n. 5, jul/dez 2001, p. 89-103.

SEIBEL, E. J. O declínio do Welfare State e a emergência do estado prisional: tempos de um

novo puritanismo? Revista Civitas. Porto Alegre, v. 5, n. 1, jan/jul 2005, p. 93-107.


SOARES, P. F. Do Estado Liberal ao Estado Regulador: aspectos político-jurídicos. 2013.

Disponível em http://www.egov.ufsc.br/portal/conteudo/do-estado-liberal-ao-estado-regulador-

aspectos-pol%C3%ADtico-jur%C3%ADdicos. Acesso em 15/03/2016.

VICENTE, M. M. A crise do Estado de Bem-Estar Social e a globalização: um balanço. In:

História e comunicação na ordem internacional [on-line]. São Paulo: UNESP; São Paulo: Cultura
Acadêmica, 2009. Disponível em http://books.scielo.org/id/b3rzk/pdf/vicente-9788598605968-08.pdf.

Acesso em 10/03/2016.

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