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Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro – UNIRIO

Centro de Ciências Jurídicas e Políticas – CCJP


Tópicos Interdisciplinares
Professor: Álvaro Reinaldo de Souza
Aluna: Jacqueline da Silva Cerqueira (MAT.: 20182361076)

1ª Avaliação do Período Emergencial - 2021.1

Fichamento da Aula do dia 12/07 com Participação do Professor Willis Santiago Guerra
Filho

Democracia Liberal

Para melhor entendimento, é necessário pensar a democracia com relação aos direitos. O
professor Willis esclarece que os direitos fundamentais são uma denominação de tradição alemã,
já que foram eles os pioneiros nesse conceito; e que liberdades públicas vem do conceito
originário da democracia liberal. Inclusive, é importante sabermos do desenvolvimento da história
constitucional alemã pois ela se torna paradigmática na 2ª metade do século XX, já que ali se
iniciaria um novo momento do constitucionalismo, o neoconstitucionalismo, assim como um novo
momento da teoria do direito e política.

No caso, o surgimento da democracia liberal ocorre no constitucionalismo clássico (e não


no neoconstitucionalismo). A referida democracia liberal é fruto do constitucionalismo clássico,
oriundo das revolução burguesas (demoliberais) — Revolução Gloriosa, no séc XVII; depois a
Independência Norte-americana, no séc XVIII, e a Revolução Francesa, no final do também séc
XVIII.

O professor compartilha conosco o conhecimento sobre um debate, no fim do séc XIX,


entre um francês, chamado Doutny, e um alemão, o filósofo Georg Jellinek, versando sobre quem
teria prioridade na afirmação desse ideário, que compõe a democracia liberal, que implica
principalmente nos direitos e nas liberdades públicas (“liberte publique”, na França). Neste debate,
nem consideram a Inglaterra, já que refletiam especialmente sobre o possuidor dessa prioridade
os EUA ou a França. Jellinek diz que seriam os EUA pelo critério cronológico, porém, ressalta que
o ideário, a fórmula política, não foi criada nos EUA, sendo uma criação muito mais europeia e
sendo levada posteriormente aos EUA, onde plantaram aquele ideal.
No entanto, vale constar que foi na Inglaterra que se afirmou, pioneiramente, o HC; “talvez
a mãe da liberdade de garantias”, ainda do período medieval.

A democracia liberal é uma "fórmula política" (termo do constitucionalista espanhol


contemporâneo, Pablo Lucas Verdú); e ela começa a ser forjada na Inglaterra, por exemplo no
evento do Rei Franco da Inglaterra, onde de fato houve um acordo dos exércitos, os barões
ingleses, para apoiar o rei e em contrapartida, ele deu a esses barões garantias, sendo a mais
destacada o HC. Ou seja, existia esse precedente ainda não universalizado

Tendo em vista o início da democracia ocorrer na Inglaterra, entre os aristocratas, é


evidente que quem vai universalizar e postular a democracia de outro modo, no caso a liberal, são
essas revoluções demoliberais, sobretudo a americana e a francesa.

Outrossim, o professor Willis diz que deve-se reconhecer a preocupação que os EUA
tiveram com a institucionalização das garantias, sobretudo na forma do judiciário, já que teve força
judiciária a ponto de constituir a Suprema Corte Americana, para julgar a constitucionalidade.
Trata-se de uma Constituição sucinta, com a famosa cláusula do “direito ao devido processo
legal”. No caso, essa institucionalização judicial teve o pioneirismo dos EUA.

Por outro lado, a França tinha muita desconfiança com o judiciário, já que o judiciário da
época era intimamente ligado à nobreza da França, tendo juízes corruptos e antipopulares, do
antigo regime; pois lá existia um interesse de deixar o judiciário sob controle. Vale constar que a
Constituição da França era destinada ao cidadão e ao homem, ou seja, eles se propuseram a
legistrar não só para França mas também para o mundo; sendo certo que isso não tornou muito
efetiva a defesa de direitos.

O professor ressalta também que o chamado Estado de Direito é uma noção de origem
alemã, mecanismo instituído ainda na monarquia. Mesmo sendo de acordo com a vontade do Rei,
ela é vinculante, ela gera direitos, garantias aos súditos. A partir daí, surge a lembrança no
professor de que devemos a França pela abolição violenta da monarquia.

Assim, observamos que a democracia liberal é um movimento Europeu, que chegou aqui
nas Américas. No nordeste brasileiro tivemos a Confederação do Equador, como tentativa de
trazer o ideário liberal, mas que foi vencido na época pelas forças portuguesas (isso antes de os
próprios portugueses fazerem a nossa independência). A inconfidência mineira também foi uma
tentativa de implantar aqui esse ideal democrata, liberal, republicano, de instituições de garantias
e direitos numa perspectiva mais individual.

Nos EUA ocorreu a crise da democracia liberal, ou seja, do capitalismo, tanto é que as
duas guerras, especialmente a segunda, são os efeitos dessa crise. Na situação, a democracia
liberal foi considerada inefetiva, pois não garantiu o maior acesso aos benefícios da sociedade
moderna ao maior número de pessoas, pois terminavam sendo apropriados e usufruídos por uma
minoria, cada vez menor; isso de acordo com a própria lógica do capitalismo.

Nos primórdios do âmbito da democracia liberal, capitalista, a pessoa que não era rica
morria de fome ou morria de tanto trabalhar. Isso caracteriza a flagrante hipocrisia e ineficiência,
pois essa liberdade não atinge esses trabalhadores, que precisavam se sujeitar a contratos
absurdos com pagamento miseráveis se quisessem ter o que comer.
Um Estado passivo e omisso caracteriza o Estado de concepção clássica da democracia
liberal. O truque de dizer que “você é livre”, diferente da idade média e do regime monárquico.
Ocorre que a tal liberdade só funcionava para que os detentores dos meios de produção
explorassem os trabalhadores, os proletários, que no caso só tinham a sua prole como bem.

Tendo em vista a crise da democracia liberal, passou a se pensar num processo de


aperfeiçoamento da democracia liberal, incluindo especialmente a justiça social. O intuito era
incluir ideias de igualdade, e não apenas de liberdade. Sendo assim, se torna necessária a
formulação de outras formas políticas, sociais ou socialistas, que almejam um Estado ativo,
interventor, que intervenha nas relações de trabalho, para que os trabalhadores não sejam
explorados, e que intervenha inclusive na economia, para que haja crescimento.

O professor esclarece que nos EUA este processo demorou. Foi o presidente Franklin
Roosevelt quem, finalmente, para tirar os EUA da grande depressão, inclui 3 novos membros na
suprema corte para poder mudar essa compreensão do contrato de trabalho como um contrato
civil e para incluir cláusulas no contrato que eram inegociáveis; 1 salário mínimo, por exemplo.
Essas foram conquistas do chamado Estado Social. Em outros lugares, as conquistas do Estado
Social foram mais radicais, tanto à direita quanto à esquerda.

Existiu um confronto de um socialismo que realmente se propõe a ser de esquerda, no


caso eram os herdeiros dos jacobinos, da Revolução Francesa (inclusive a ideia de esquerda e
direita surge aí; os jacobinos sentavam à esquerda do centro da mesa diretora dos trabalhos, e os
girondinos à direita). Por fim, os girondinos acabaram se impondo, e o ideal democrata liberal está
ligado aos girondinos. Eles transformaram uma Revolução em nome da soberania popular, como
foi a Revolução Francesa, numa revolução em nome da soberania nacional, sendo o povo
representado no parlamento pelos deputados, ou seja, a ideia de democracia representativa, que
também é própria da democracia liberal.

Com o avanço das ideias sociais e socialistas, temos também um avanço da ideia da
democracia participativa. Nesse caso, os direitos não são apenas aos que o estado se omite, mas
serão direitos que o Estado deverá prestar, fornecer ao cidadão, como saúde, educação e direitos
sociais em geral.

Além disso, o professor Willis desmente a ignorância do atual presidente brasileiro em


dizer que o nazismo era de esquerda. Na verdade, o nazismo era socialista, mas era de
ultradireita, nacionalista; e no caso, o socialismo de esquerda é mundialista.Ressalta-se que a
exemplar estrutura de seguridade alemã veio do nazismo. O problema é que eram racistas, anti
universalistas, nacionalistas e de ultra direita.

A Alemanha foi o epicentro de disputas bélicas que ocorreram na metade do séc XX. No
entanto, quando ela se reconstrói, após a 2ª guerra, ela oferta o melhor exemplo possível, o que
veio a se chamar no Brasil, 40 anos depois, de Estado Democratico de Direito (nome que demos
aqui a uma fórmula política que foi desenvolvida, sobretudo, a partir do constitucionalismo alemão,
o neoconstitucionalismo).

O professor nos esclarece que surge, no final dos anos 70, o neoliberalismo; e ele se
constitui na principal ameaça à democracia liberal. Estudiosos começaram a refletir sobre o tema
e até mesmo Foucault, no final de sua vida, fez contribuições sobre os problemas do
neoliberalismo no livro “O nascimento da biopolítica”. Essa idéia de "biopolítica" ele pode estudar
a partir do neoliberalismo nascente, que começou na Áustria e se difundiu nos EUA e Inglaterra
(Ronald Wilson Reagan e Margaret Hilda Thatcher).

Infelizmente, esse ainda é o nosso problema atual, pois se retorna a um contexto muito
semelhante ao vivido a cerca de 100 anos atrás, na época em que surgiram os originais fascistas
e nazistas (e integralistas, aqui no Brasil). Essa direita sempre existiu muito forte no Brasil, a partir
do surgimento na Europa, evidentemente. Só que na conjuntura atual ela renasce, junto da
extrema exploração do capitalismo que conseguiu novamente se disfarçar na forma do
neoliberalismo (mais precisamente libertárianos, como os norte-americanos chamam os grupos de
indivíduos que adotam perspectivas radicalmente anti sociais e ultra individualistas).

A ameaça do neoliberalismo é ao mundo, mas no Brasil tem sido muito mais alarmante.

Por fim, vale fazer constar a emocionante colocação do professor Álvaro, que viu como a
ditadura militar no Brasil começou e terminou, e presenciou a ocasião de o poder civil de repente
ser totalmente contestado; assim como trabalhou para ter as liberdades democráticas que temos
hoje, e que infelizmente estão sendo colocadas em xeque por conta da escolha presidencial
brasileira em 2018, por um político que não aceita o processo eleitoral democrático.

BIBLIOGRAFIA

SARLET, Ingo Wolfgang. GODOY, Arnaldo Sampaio de Moraes. História do Direito


Constitucional Alemão - Da Constituição da Igreja de São Paulo à Lei Fundamental. Porto
Alegre: Editora Fundação Fênix, 2021. Disponível em:
<https://891aac48-381e-4192-adf5-96afc8de6326.filesusr.com/ugd/9b34d5_14e06293b2fd40029
71a65e204225c58.pdf>. Acesso em: 31/07/2021.

VITA, Álvaro de. Justiça liberal: Argumentos liberais contra o neoliberalismo. Editora Paz e
Terra, 1993.

CASARA, Rubens. Contra a Miséria Neoliberal. Editora Autonomia Literária, 2021.

FOUCAULT, Michel. O Nascimento da Biopolítica. Curso ministrado por Foucault no Collège de


France, em 1979.

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