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Introdução ao Novo Testamento: a manjedoura, a cruz e a coroa toma seu

lugar entre as obras de referência nessa área. É simplesmente um excelente


trabalho. Sua pesquisa atualizada faz dela um recurso inestimável por si só.
Adicione a isso o seu estudo abrangente das questões cruciais relacionadas
aos estudos do Novo Testamento e você tem um livro bem apropriado para
o ensino acadêmico. Esse livro será amplamente utilizado e a igreja do
Senhor Jesus será abençoada pela instrução que oferece.
Daniel L. Akin, presidente do Southeastern Baptist Theological
Seminary, Wake Forest, Carolina do Norte.

Numa época em que se alegam tantas coisas espantosas e confusas sobre a


Bíblia, esse livro traz clareza e cuidado excepcionais aos estudos
acadêmicos do campo das introduções ao Novo Testamento. Os autores não
apenas fornecem ao leitor uma orientação sólida para cada livro, mas
também abordam, de forma direta, uma ampla gama de questões levantadas
por estudiosos. O resultado é um texto rico de informações, de fácil leitura e
extremamente útil. É com entusiasmo que recomendo esse livro a todos que
desejam compreender melhor o Novo Testamento.
Clinton E. Arnold, deão e professor de língua e literatura do Novo
Testamento, Talbot School of Theology, Biola University.

Esse livro é uma abrangente e informativa introdução ao Novo Testamento.


Composto a partir de uma perspectiva confessional evangélica, o texto
interage cuidadosamente com as questões mais atualizadas dos estudos
acadêmicos modernos. Muito bem escrita, por sinal, essa obra convida os
estudantes a compreenderem melhor o significado dos vários livros do
Novo Testamento em seus contextos histórico, religioso, político, cultural e

1
geográfico, oferecendo ideias teologicamente aplicáveis à mensagem do
Novo Testamento para os dias de hoje. Não tenho dúvida de que esse
excelente trabalho se tornará um recurso obrigatório para os anos
vindouros. Apresento minhas sinceras felicitações aos autores pela bela
publicação.
David S. Dockery, presidente, Trinity International University, Trinity
Evangelical Divinity School.

A produção de introduções ao Novo Testamento parece não ter fim, e seu


uso costuma se transformar em peso para os alunos. No entanto, de tempos
em tempos, surgem boas surpresas nesse campo de estudos, como é o caso
desse livro. Na obra, temos uma sólida e atualizada introdução ao Novo
Testamento para aqueles que se preparam para o ministério na igreja.
Embora com profundo conhecimento dos estudos do Novo Testamento em
geral, os autores se mantêm concentrados em seu público-alvo, usando
diagramas, perguntas de revisão e até mesmo dados devocionais visando a
um bom resultado. Informações dirigidas a iniciantes, a alunos de nível
intermediário e aos mais avançados demonstram uma preocupação com o
leque de habilidades encontradas em quase toda sala de aula. Esta
introdução será útil para professores e edificante para alunos por muitos
anos.
George H. Guthrie, professor de Bíblia, School of Theology and
Missions, R. C. Ryan Center for Biblical Studies, Union University.

Essa obra define um novo padrão de excelência entre os livros didáticos que
abordam a introdução ao Novo Testamento. Além das questões usuais
associadas à introdução geral e especial em relação à disciplina, esse livro

2
oferece uma verdadeira mina de ouro de informações encontradas somente
em outros textos. A exaustiva pesquisa dos autores em uma ampla gama de
fontes primárias e secundárias, além da criteriosa interação com várias
abordagens aos assuntos sob consideração, estão em evidência ao longo
desse trabalho.
Cuidadosamente concebido e organizado com o aluno em mente, cada livro
do Novo Testamento é sistematicamente examinado, de acordo com a
“tríade hermenêutica”, que consiste de dados históricos, literários e
teológicos. Além disso, o texto contém muitos quadros, tabelas e mapas
úteis, concebidos para o benefício do leitor, bem como metas para o
desenvolvimento pessoal, questões de estudo e uma bibliografia resumida
para cada seção. O resultado é um livro distintamente único que exibe não
somente estudo cuidadoso e equilibrado, mas é escrito com clareza e de
modo acessível.
Richard D. Patterson, professor emérito, Liberty University,
Lynchburg, VA.

Köstenberger, Kellum e Quarles escreveram uma introdução ao Novo


Testamento muito útil para os novos estudantes de seminários e faculdades
que fornece uma pesquisa atualizada de cada um dos livros do Novo
Testamento, bem como ensaios sucintos e úteis sobre a natureza da
Escritura (cânon, texto, inspiração), contextos (histórico, político e
religioso), a vida de Jesus (fontes, objetivos), a vida de Paulo, unidade e
diversidade, além de um glossário útil dos termos. O material é de fácil
leitura e compreensão e sem dúvida provará ser um texto popular entre
estudantes evangélicos.

3
Robert H. Stein, professor titular de Interpretação do Novo
Testamento, The Southern Baptist Theological Seminary, Louisville,
KY.

Introdução ao Novo Testamento é um excelente livro que deveria ser muito


bem recebido não somente pelos professores e alunos, mas por todo aquele
que deseja uma pesquisa atualizada, compreensiva e criteriosa do contexto
histórico, literário e teológico do Novo Testamento. Entre as características
desse volume favoráveis ao leitor estão objetivos claros para os diferentes
níveis de estudo, perguntas úteis para uma revisão, listas de leitura
recomendadas, numerosos quadros e tabelas, e um extensivo glossário.
Espero voltar a esse volume e recomendá-lo a outros nos próximos anos.
Justin Taylor, editor-chefe da Bíblia de Estudo ESV, blogueiro
(“Between two worlds”).

Esse livro situa-se entre os melhores estudos clássicos sobre introdução ao


Novo Testamento. Entre as características que o diferenciam dos demais,
estão: (1) atenção especial à teologia e à história da interpretação; (2)
extensa apresentação da história dos tempos do Novo Testamento e do
surgimento do cânon; (3) rigor adequado; (4) recursos visuais criativos; e
(5) clareza conceitual. Além disso, apresenta um impressionante resumo
dos estudos acadêmicos com um especial apelo à apropriação fiel da
mensagem do Novo Testamento. É uma obra escrita com convicção cristã
que deve ser largamente difundida entre as escolas de teologia, do nível
básico ao avançado.
Robert W. Yarbrough, professor de Novo Testamento, Covenant Theo-
logical Seminary.

4
INTRODUÇÃO AO NOVO
TESTAMENTO

5
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)

Angélica Ilacqua CRB-8/7057

Köstenberger, Andreas J.

Introdução ao Novo Testamento: a manjedoura, a cruz e a coroa / Andreas J. Köstenberger, L.

Scott Kellum, Charles L. Quarles; tradução de Carlos Lopes. — São Paulo: Vida Nova, 2022.

ePub3.

ISBN 978-65-86136-20-3

Título original: The cradle, the cross, and the crown: an introduction to the New Testament

1. Bíblia N.T. — Introduções I. Título II. Kellum, L. Scott III. Quarles, Charles L. IV. Lopes,

Carlos

20-1848 CDD-22504

Índice para catálogo sistemático

1. Bíblia N.T. — Introduções

6
7
©2009 por Andreas J. Köstenberger, L. Scott Kellum e Charles L. Quarles.

Título do original: The cradle, the cross, and the crown: an introduction to the New Testament,

edição publicada pela B&H Publishing Group (Nashville, Tennessee, EUA).

Todos os direitos em língua portuguesa reservados por

SOCIEDADE RELIGIOSA EDIÇÕES VIDA NOVA

Rua Antônio Carlos Tacconi, 63, São Paulo, SP, 04810-020

vidanova.com.br | vidanova@vidanova.com.br

1.ª edição: 2022

Proibida a reprodução por quaisquer meios, salvo em citações breves, com indicação da fonte.

Impresso no Brasil / Printed in Brazil

Todas as citações bíblicas foram extraídas da Almeida Século 21 (A21), salvo indicação em contrário.

Citações bíblicas com a sigla TA se referem a traduções feitas pelos autores.

DIREÇÃO EXECUTIVA

Kenneth Lee Davis

COORDENAÇÃO EDITORIAL

Jonas Madureira

EDIÇÃO DE TEXTO

Bruna Gomes Ribeiro

PREPARAÇÃO DE TEXTO

Robinson Malkomes

REVISÃO DE PROVAS

8
Eliel Vieira

Josiane de Almeida

COORDENAÇÃO DE PRODUÇÃO

Sérgio Siqueira Moura

DIAGRAMAÇÃO

Luciana Di Iorio

CAPA

Jonatas Belan

LIVRO DIGITAL

Lucas Camargo

9
SUMÁRIO

Reduções gráficas
Prefácio
Agradecimentos

PARTE 1: INTRODUÇÃO

Capítulo 1: A natureza e o escopo da Escritura


Capítulo 2: O contexto político e religioso do Novo Testamento

PARTE 2: JESUS E OS EVANGELHOS

Capítulo 3: Jesus e o relacionamento entre os Evangelhos


Capítulo 4: O Evangelho segundo Mateus
Capítulo 5: O Evangelho segundo Marcos
Capítulo 6: O Evangelho segundo Lucas
Capítulo 7: O Evangelho segundo João

PARTE 3: PAULO E A IGREJA PRIMITIVA

Capítulo 8: O livro de Atos


Capítulo 9: Paulo: o homem e sua mensagem
Capítulo 10: A carta de Paulo aos Gálatas

10
Capítulo 11: A correspondência de Paulo aos Tessalonicenses: 1 e
2Tessalonicenses
Capítulo 12: A correspondência de Paulo aos Coríntios: 1 e
2Coríntios
Capítulo 13: A carta de Paulo aos Romanos
Capítulo 14: As epístolas da prisão: Filipenses, Efésios,
Colossenses e Filemom
Capítulo 15: As epístolas pastorais: 1 e 2Timóteo e Tito

PARTE 4: AS EPÍSTOLAS GERAIS E O APOCALIPSE

Capítulo 16: A carta aos Hebreus


Capítulo 17: A carta de Tiago
Capítulo 18: As epístolas petrinas (1 e 2Pedro) e a carta de Judas
Capítulo 19: As epístolas joaninas: 1, 2 e 3João
Capítulo 20: O livro de Apocalipse

PARTE 5: CONCLUSÃO

Capítulo 21: Unidade e diversidade no Novo Testamento

Glossário
Índice de assuntos
Índice de nomes
Índice de passagens bíblicas
Mapas

11
12
REDUÇÕES GRÁFICAS

13
AB Anchor Bible
AnBib Analecta biblica
ABD Anchor Bible Dictionary
ABRL Anchor Bible Reference Library
ACCS Ancient Christian Commentary on Scripture
Arbeiten zur Geschichte des antiken Judentums und
AGJU
des Urchristentums
ANRW Aufstieg und Niedergang der römischen Welt
ASNU Acta seminarii neotestamentici upsaliensis
Andrews University Seminary Studies Doctoral
AUSSDDS
Dissertation Series
AUSS Andrews University Seminary Studies
BA Biblical Archaeologist
BAR Biblical Archaeology Review
BBC Blackwell Bible Commentaries
BBR Bulletin for Biblical Research
Bauer, W., F. W. Danker, W. F. Arndt e F. W.
Gingrich, Greek-English Lexicon of the New
BDAG
Testament and Other Early Christian Literature
(Chicago, 1961)
Baker Exegetical Commentary on the New
BECNT
Testament series
Bibliotheca ephemeridum theologicarum
BETL
lovaniensium
BGBE Beiträge zur Geschichte der biblischen Exegese
Bib Biblica
BibInt Biblical Interpretation
Bulletin of the John Rylands University Library of
BJRL
Manchester
BNTC Black’s New Testament Commentaries
BR Biblical Research
BSac Bibliotheca Sacra
BST The Bible Speaks Today
BT The Bible Translator
BTB Biblical Theology Bulletin
BTNT Biblical Theology of the New Testament
BWA(N)T Beiträge zur Wissenschaft vom Alten (und Neuen)

14
Testament
BZ Biblische Zeitschrift
Beihefte zur Zeitschrift für die neutestamentliche
BZNW
Wissenschaft
CBQ Catholic Biblical Quarterly
CGTC Cambridge Greek Testament Commentary
CJ Classical Journal
ConBNT Coniectanea biblica: New Testament Series
Compendia rerum iudaicarum ad Novum
CRINT
Testamentum
CTJ Calvin Theological Journal
CTR Criswell Theological Review
EB Echter Bibel
EBC The Expositor’s Bible Commentary
EBS Encountering Biblical Studies
ECC Eerdmans Critical Commentary
EDRL Encyclopedic Dictionary of Roman Law
Evangelisch-katholischer Kommentar zum Neuen
EKKNT
Testament
EMS Evangelical Missiological Society
Études préliminaires aux religions orientales dans
EROER
l’Empire romain
EstBib Estudios biblicos
ETL Ephemerides Theologicae Lovanienses
EvQ Evangelical Quarterly
ExpTim Expository Times
FFRS Foundations and Facets Reference Series
Die griechischen christlichen Schriftsteller der
GCS
ersten [drei] Jahrhunderte
HBT Horizons in Biblical Theology
HNT Handbuch zum Neuen Testament
HNTC Harper’s New Testament Commentaries
Herders theologischer Kommentar zum Neuen
HTKNT
Testament
HTR Harvard Theological Review
HTS Harvard Theological Studies
IBS Irish Biblical Studies

15
ICC International Critical Commentary
Int Interpretation
IRT Issues in Religion and Theology
IVPNTC InterVarsity Press New Testament Commentary
JAAR Journal of the American Academy of Religion
JBL Journal of Biblical Literature
JETS Journal of the Evangelical Theological Society
JQR Jewish Quarterly Review
JSNT Journal for the Study of the New Testament
Journal for the Study of the New Testament:
JSNTSup
Supplement Series
JSOT Journal for the Study of the Old Testament
Journal for the Study of the Old Testament:
JSOTSup
Supplement Series
JTS Journal of Theological Studies
KD Kerygma und Dogma
Kritisch-exegetischer Kommentar über das Neue
KEK
Testament
LEC Library of Early Christianity
LNTS Library of New Testament Studies
MBPS Mellen Biblical Press Series
MNTC Moffat New Testament Commentary
MSJ The Master’s Seminary Journal
The National Association of Baptist Professors of
NABPR
Religion
NAC New American Commentary
NCB New Century Bible
NCBC New Cambridge Bible Commentaries
Neot Neotestamentica
NHMS Nag Hammadi and Manichaean Studies
NHS Nag Hammadi Studies
NIB The New Interpreter’s Bible
NIBC New International Biblical Commentary
New International Biblical Commentary on the
NIBCNT
New Testament
New International Commentary on the New
NICNT
Testament

16
NIDNTT New International Dictionary of Old Testament
Theology and Exegesis. Editado por W. A.
VanGemeren. 5 vols. Grand Rapids, 1997
NIGTC New International Greek Testament Commentary
New International Version Application
NIVAC
Commentary
NovT Novum Testamentum
NovTSup Supplements to Novum Testamentum
NS New Series
NSBT New Studies in Biblical Theology
NTD Das Neue Testament Deutsch
NTL New Testament Library
NTS New Testament Studies
Patrologia graeca [= Patrologiae cursus completus:
PG Series graeca]. Organizado por J.-P. Migne. 162
vols. Paris, 1857–1886
Patrologia latina [= Patrologiae cursus completus:
PL Series graeca]. Organizado por J.-P. Migne. 217
vols. Paris, 1844–1864
PNTC Pillar New Testament Commentaries
PTMS Pittsburgh Theological Monograph Series
QD Quaestiones Disputatae
ResQ Restoration Quarterly
RevBib Revue biblique
RHR Revue de l’histoire des religions
RNT Regensburger Neues Testament
RTR Reformed Theological Review
SacPag Sacra Pagina
SANT Studien zum Alten und Neuen Testament
SBAB Stuttgarter biblische Aufsatzbände
SBEV Service Biblique Evangile et Vie
SBL Society of Biblical Literature
SBLDS Society of Biblical Literature Dissertation Series
SBLMS Society of Biblical Literature Monograph Series
Society of Biblical Literature Sources for Biblical
SBLSBS
Studies
SBLSP Society of Biblical Literature Seminar Papers

17
SBLSymS Society of Biblical Literature Symposium Series
SBT Studies in Biblical Theology
SC Sources chrétiennes. Paris: Cerf, 1943–
Scr Scripture
SE IV, TU Studia evangelica IV, Texte und Untersuchungen
Sem Semitica
SNT Studien zum Neuen Testament
Society for New Testament Studies Monograph
SNTSMS
Series
SR Studies in Religion
SUNT Studien zur Umwelt des Neuen Testaments
Texte und Arbeiten zum neutestamentlichen
TANZ
Zeitalter
TBT The Bible Today
Theological Dictionary of the New Testament.
Organizado por G. Kittel e G. Friedrich. Tradução
TDNT
de G. W. Bromiley. 10 vols. Grand Rapids, 1964–
1976
Them Themelios
Theol Theologica
Theologischer Handkommentar zum Neuen
THNT
Testament
TI Tradução em inglês
TNTC Tyndale New Testament Commentary
TrinJ Trinity Journal
TRu Theologische Rundschau
TSK Theologische Studien und Kritiken
TU Texte und Untersuchungen
TynBul Tyndale Bulletin
VC Vigiliae Christianae
WBC Word Biblical Commentary
WTJ Westminster Theological Journal
Wissenschaftliche Untersuchungen zum Neuen
WUNT
Testament
WW Word and World
ZAG Zeitschrift für alte Geschichte
ZAW Zeitschrift für die alttestamentliche Wissenschaft

18
ZCS Zondervan Church Source
Zeitschrift für die neutestamentliche Wissenschaft
ZNW
und die Kunde der älteren Kirche
ZRGG Zeitschrift für Religions und Geistesgeschichte
ZST Zeitschrift für systematische Theologie

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OBRAS DOS PAIS DA IGREJA
1 Apol. 1 Apologia, Justino
Ant. Antiguidades dos Judeus, Josefo
Apol. Apologeticum, Tertuliano
Barn. Epístola de Pseudo-Barnabé
C. Ap. Contra Ápion, Josefo
Cron. Crônica, Eusébio
Coment. Matt. Commentarium in evangelium Matthaei, Orígenes
Dial. Diálogo com Trifo, Justino Mártir
Ef. Aos Efésios, Inácio
Embaixada Da Embaixada a Gaio, Filo
G. J. Guerras dos Judeus, Josefo
Hist. Ecl. História Eclesiástica, Eusébio
Hom. Lc. Homilias em Lucas, Orígenes
Hom. Matt. Homilias em Mateus, João Crisóstomo
Marc. Contra Marcião, Tertuliano
Magn. Aos Magnésios, Inácio
Nat. Ad nationes, Tertuliano
Or. De oratione, Tertuliano
Paed. Paedagogus, Clemente de Alexandria
Pol. A Policarpo, Inácio
Praef. in Ioann. Prefácio a João, Teofilacto
Praescr. De praescriptione hareticorum, Tertuliano
Quis div. Quis dives salvetur, Clemente de Alexandria
Scorp. Scorpiace, Tertuliano
Trall. Aos Trálios, Inácio
Vir. ill. De viris illustribus, Jerônimo

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PREFÁCIO

Para os cristãos que olham para a Escritura como sua autoridade de fé e


prática, o NT, com seus 27 livros, apresenta tanto um maravilhoso tesouro
de ideias, dado por Deus, quanto um enorme desafio para sua interpretação
fiel e exata. Sem dúvida, “Toda a Escritura é divinamente inspirada e
proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em
justiça; a fim de que o homem de Deus tenha capacidade e pleno preparo
para realizar toda boa obra” (2Tm 3.16,17), mas para estar bem preparado,
todo aquele que estuda a Escritura deve seguir a exortação de Paulo:
“Procura apresentar-se aprovado diante de Deus, como obreiro que não tem
de que se envergonhar, que maneja bem a palavra da verdade” (2Tm 2.15).
Esse zelo exigido para um entendimento correto da “palavra da
verdade” de Deus envolve um conhecimento aprofundado dos aspectos
históricos, literários e teológicos dos vários escritos do NT. Um tanto
ironicamente, o estudo metódico desses fatores remonta suas origens
modernas ao Iluminismo. Dizemos “ironicamente” porque o Iluminismo foi
também caracterizado por um viés antissobrenaturalista e um espírito crítico
— até mesmo cético, com sua ênfase no estudo da Bíblia como qualquer
outro livro.1 É claro que para todo aquele que acredita que a Escritura é
mais do que apenas uma peça da literatura humana, essa abordagem é

21
inaceitável porque nega que ela seja produto de inspiração divina.2 No
entanto, embora a Escritura não deva ser reduzida a uma mera peça de
escrita humana, podemos nos beneficiar bastante ao dar especial atenção às
dimensões históricas, literárias e teológicas dos escritos bíblicos e, em
nosso caso específico, ao NT.

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TÍTULO E VISÃO DO CONTEÚDO
Título
Por essa razão, apresentamos a você, estudioso sério do NT, Introdução ao
Novo Testamento: a manjedoura, a cruz e a coroa. O título tenta captar a
essência da teologia do NT: (1) a manjedoura — isto é, o nascimento
virginal de Jesus e a encarnação, narrados no início do cânon do NT (Mt
1.18-25); (2) a cruz, relatada nas narrativas da Paixão nos Evangelhos e
explicada na literatura epistolar do NT; e (3) a coroa, isto é, a volta triunfal
de Cristo e nosso reinado eterno com ele. Dentro dessa estrutura,
defendemos uma leitura holística do NT e de todo o conjunto de textos da
Escritura, ao longo das linhas de um quadro histórico-salvífico que traça a
história da revelação progressiva de Deus e a provisão da redenção no
Messias e Filho de Deus prometido, o Senhor Jesus Cristo.

A Natureza da Escritura
A primeira parte deste livro tenta definir o cenário para o estudo a seguir
por meio de uma discussão das questões fundamentais e mais críticas para a
interpretação do NT: (1) a natureza e o escopo das Escrituras (cap. 1); e (2)
o contexto político e religioso do NT (cap. 2). É vital que todos os que
estudam a Escritura tenham uma boa compreensão de sua doutrina; por
isso, o capítulo 1 discute a formação do cânon do NT, sua inspiração e
inerrância, a preservação e transmissão da Bíblia ao longo dos séculos e
questões relativas à sua tradução.

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Infelizmente, esse tipo de instrução doutrinária é cada vez mais
negligenciada em muitas publicações sobre o tema em nossos dias.3 No
entanto, a consideramos absolutamente vital porque apenas através da
compreensão da Escritura como revelação divina, de conformidade com
suas próprias alegações, é que seremos capazes de continuar nosso estudo
até chegar ao objetivo pretendido: a aplicação da “palavra da verdade” à
nossa vida e aos nossos relacionamentos.4 Deus se revelou em sua palavra
inspirada e inerrante; portanto, como a Bíblia é a Palavra de Deus em forma
escrita, ela é isenta de erros, confiável, digna de crédito e exige obediência
e aplicação pessoal.5 Tiago deixa isso bem claro:

[…] recebei de boa vontade a palavra em vós implantada, poderosa para salvar a vossa vida.
Sede praticantes da palavra e não somente ouvintes, enganando a vós mesmos. Pois, se
alguém é ouvinte da palavra e não praticante, é semelhante a um homem que contempla o
próprio rosto no espelho; porque ele se contempla, vai embora e logo se esquece de como
era. Entretanto, aquele que atenta bem para a lei perfeita, a lei da liberdade, e nela persevera,
não sendo ouvinte esquecido, mas praticante zeloso, será abençoado no que fizer (1.21-25).

De fato, o propósito da Escritura é “instruir na justiça; a fim de que o


homem de Deus tenha capacidade e pleno preparo para realizar toda boa
obra” (2Tm 3.16,17).
Nesse sentido, nosso desejo é que este livro seja mais que uma
compilação árida e acadêmica de várias datas e fatos. Sem dúvida, o estudo
das Escrituras requer diligência — em outras palavras, trabalho! —, mas o
que deve motivar nossos esforços é a recompensa no final da nossa
pesquisa: uma melhor compreensão da história, literatura e teologia dos
escritos do NT com o propósito de cultivar, no poder do Espírito Santo,
uma vida espiritual mais profunda em nós mesmos, nossas famílias e nossas
igrejas. Isso, por sua vez, resultará em uma proclamação mais autêntica e

24
fidedigna da mensagem bíblica para que o reino de Deus possa avançar
neste mundo e para que a vida de outros possa ser submetida a seu reinado.

O Contexto do Novo Testamento


Ao abordar nosso estudo do NT, temos de adquirir conhecimento acerca do
contexto político e religioso do NT (o conteúdo do cap. 2). Esse é um
ingrediente nem sempre encontrado nas introduções-padrão do NT, uma
omissão que, no passado, quando lecionávamos cursos de Panorama do NT,
nos obrigou a procurar outros recursos para que pudéssemos preparar os
alunos nessa entrada para o mundo do NT. Neste capítulo, vamos abranger
o final da história do AT (os exílios de Israel e Judá, os últimos profetas), o
período entre os Testamentos (os gregos, os macabeus e os romanos) e o
ambiente político do ministério de Jesus (as seitas judaicas, a dinastia de
Herodes etc). Apresentamos também um panorama da literatura do período
do Segundo Templo e discutimos as questões teológicas e filosóficas mais
relevantes.

História, Literatura e Teologia


Uma vez lançado esse fundamento, analisamos cada livro do NT usando o
mesmo padrão, chamado “tríade hermenêutica” na obra de Köstenberger e
Patterson intitulada Invitation to Biblical Interpretation [Um convite à
interpretação da Bíblia]:6 (1) história (incluindo a autoria do livro, data,
origem, destinatários etc.); (2) literatura (gênero, plano literário, esboço,
discussão de unidade por unidade); e (3) teologia (temas teológicos, a
contribuição para o cânon). Em consonância com as três grandes divisões

25
do cânon do NT, o material deste livro é também organizado segundo as
três partes seguintes:

Parte 2: Jesus e os Evangelhos, que apresenta um capítulo sobre Jesus


e o relacionamento entre os quatro Evangelhos bem como introduções
a cada um deles.
Parte 3: Paulo e a igreja primitiva, que inclui capítulos sobre o livro
de Atos, o ministério e mensagem do apóstolo Paulo, e as 13 cartas
canônicas de sua autoria em provável ordem cronológica de
composição: Gálatas; 1 e 2Tessalonicenses; 1 e 2Coríntios, Romanos,
Epístolas da Prisão e Epístolas Pastorais.
Parte 4: As Epístolas Gerais e o Apocalipse, estudados na ordem
canônica (exceto Judas, que é mantido com as cartas de Pedro devido a
seu estreito relacionamento com 2Pedro): Hebreus, Tiago; 1 e 2Pedro;
Judas; 1, 2 e 3João e Apocalipse.

O livro termina com um capítulo sobre a unidade e diversidade no Novo


Testamento, e é encerrado do modo como começou: com uma ênfase na
leitura holística da Escritura.

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FUNDAMENTO LÓGICO E
PARTICULARIDADES
Fundamento Lógico
Nossa convicção, gerada por anos de ensino tanto em cursos de graduação
quanto de pós-graduação, é que o modelo de organização do material
anteriormente apresentado reflete melhor o desenvolvimento orgânico do
material do NT. Ele permite que o professor em sala de aula (1) abranja o
material de base, isto é, a doutrina da Escritura, o contexto do NT e Jesus e
os Evangelhos; e (2) utilize o modelo fornecido pelo livro de Atos como
base para um estudo do ministério e dos escritos do apóstolo Paulo e das
outras testemunhas do NT.
Embora o NT seja uma coleção de escritos — um corpus literário —
para ser apreciada na sequência em que se apresenta, ele também reflete um
plano histórico. Ele começa com Deus e sua promessa de um Salvador feita
no AT, passa pela vinda do Messias relatada nos Evangelhos, pelo
crescimento da igreja primitiva narrado no livro de Atos e nas cartas de
Paulo, e chega à consumação da história humana na volta de Cristo prevista
em Apocalipse.7
Apenas como exemplo, é bom que o aluno entenda que Paulo escreveu
a Carta aos Gálatas vários anos antes de sua Carta aos Romanos, de modo
que a “controvérsia judaizante” em torno da circuncisão (discutida em
Gálatas) pode ser vista como contexto da formulação mais geral e posterior
do evangelho na Carta aos Romanos. O que também pode ser útil é
relacionar Gálatas e Romanos aos eventos no livro de Atos e a outros
eventos do princípio da história cristã e do ministério de Paulo.

27
Particularidades
Com isso em mente, objetivamos produzir um texto com as seguintes
peculiaridades:

1. Fácil de usar. Nós escrevemos tendo em mente o professor e o aluno.


Este livro é acadêmico, mas acessível; é útil como livro-texto para
cursos de um ou dois semestres de Panorama do NT. Você pode fazer
uso de todo o material em um semestre ou tratar da introdução e de
Jesus e os Evangelhos no primeiro semestre, deixando para o segundo
semestre a igreja primitiva, Paulo e o restante do NT. Entre os recursos
que podem ser facilmente utilizados, encontram-se listas de
Conhecimento Básico, Intermediário e Avançado no início de cada
capítulo8 e Perguntas para Estudo e Recursos para Estudos
Complementares, que estão no final. No final do livro, encontra-se um
extenso glossário.
2. Abrangente. Esta obra abrange todo o cânon e contexto do NT, Jesus,
os Evangelhos, a igreja primitiva e os escritos de Paulo por ordem de
composição, as Epístolas Gerais e o Apocalipse, bem como a unidade
e diversidade do NT. Estudar as cartas de Paulo na ordem em que
foram escritas ajuda a integrá-las à estrutura histórica de Atos.
3. Conservador. Os três autores deste livro afirmam que os 27 livros no
NT foram escritos pelas pessoas a quem são atribuídos (os quatro
Evangelhos e as cartas). Incluímos uma sólida defesa da autoria
apostólica de Mateus e João e uma refutação à suposta autoria
pseudonímica dos escritos de Paulo e Pedro, especialmente as cartas de
Timóteo, Tito e 2Pedro.

28
4. Equilibrado. Tentamos seguir um procedimento hermenêutico sólido,
modelando o estudo de cada livro do NT em seu contexto histórico,
literário e teológico. Assim, esta obra é mais do que apenas uma
introdução ao NT que lida com questões introdutórias de autoria, data,
origem, destinatários e assim por diante.
5. Atualizado. Este livro inclui uma abrangente interação acadêmica tanto
com os estudos mais antigos quanto com os mais recentes,
concentrando-se em especial nas fontes de língua inglesa. Sempre que
adequado, baseamo-nos nos recentes avanços no estudo literário da
Escritura, seguindo uma abordagem de análise da narrativa ou do
discurso ao examinar o conteúdo de vários livros do NT.
6. Voltado ao crescimento espiritual e à aplicação. O estilo do texto tem
como objetivo nutrir a espiritualidade do aluno e incentivar a aplicação
do que foi estudado, em vez de se limitar a uma apresentação árida dos
fatos a serem apreendidos apenas em nível cognitivo. Isso se reflete
especialmente nas discussões de unidade por unidade, nas seções de
temas teológicos e nos quadros com Questões para Reflexão (um
ingrediente ímpar nas introduções ao NT).

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UMA BREVE HISTÓRIA DA INTRODUÇÃO
AO NOVO TESTAMENTO
Os Séculos XVII e XVIII
Antes de iniciar nosso estudo, precisamos definir o contexto mais amplo da
ciência da Introdução ao NT. Na verdade, os estudantes de NT nem sempre
podem perceber que esse campo de pesquisa tem uma história que abrange
vários séculos. Talvez a primeira introdução moderna ao NT tenha sido
produzida por um estudioso católico romano francês chamado Richard
Simon, que em 1689 escreveu A Critical History of the Text of the New
Testament [História Crítica do Novo Testamento].9
Várias décadas depois, Johann Bengel, um dos mais prolíficos
estudiosos pietistas, escreveu seu massivo Gnomon of the New Testament
[Gnômon do Novo Testamento], um trabalho de fôlego, embora tenha sido
escrito em estilo de comentário, e não no formato convencional de uma
introdução ao NT.10 Pouco depois, J. D. Michaelis (1717-1791), professor
na Universidade de Göttingen, produziu sua obra New Testament
introduction [Introdução do Novo Testamento], na qual ele questionava a
inspiração da literatura não apostólica do NT.11

Os Séculos XIX e XX
No século XIX, uma das mais influentes introduções ao NT foi a extensa
obra em dois volumes Introduction to the New Testament [Introdução ao
Novo Testamento], de Heinrich Holtzmann, na qual o autor deu expressão
ao consenso crítico emergente: a Hipótese das Duas Fontes, o caráter

30
teológico de João em vez do histórico, a confiabilidade questionável de
Atos, a autoria pseudonímica de Efésios e das cartas a Timóteo e Tito, a
problemática autoria das Epístolas Gerais e a importância dos contextos
helenísticos para Paulo e João.12
No início do século XX, foi publicada a obra de 1.100 páginas de
Theodor Zahn, Introduction to the New Testament [Introdução ao Novo
Testamento].13 Nesse livro, Zahn afirmou a autoria tradicional dos quatro
Evangelhos e redefiniu a ordem de composição das cartas do NT da
seguinte forma: Tiago, Gálatas, 1 e 2Tessalonicenses, 1 e 2Coríntios,
Romanos, Epístolas da Prisão e as Epístolas a Timóteo e Tito. Zahn
defendeu a autenticidade de 1 e 2Pedro e acreditava que o apóstolo João
escreveu não apenas o Evangelho e as três cartas, mas também o
Apocalipse. Assim, Zahn nos proporcionou um contraponto conservador a
Holtzmann e a outros que representam o consenso crítico, além de fixar um
importante ponto de referência para estudos conservadores posteriores nas
questões de introdução ao NT.

Contribuições Recentes
Mais recentemente, o acadêmico britânico Donald Guthrie (1990) e os
norte-americanos D. A. Carson e Douglas Moo (com Leon Morris, 1992)
produziram importantes introduções evangélicas ao NT que estabeleceram
um alto padrão de erudição, enquanto apresentam conclusões conservadoras
em relação a autoria, data e outros aspectos da literatura do NT.14 Menos
conservadora é a introdução ao NT de Raymond Brown, acadêmico da
Igreja Católica Romana (1997).15

31
CONCLUSÃO
Como vemos neste breve panorama da história das introduções ao NT,
nosso livro está situado em uma longa história de esforços de estudiosos
com uma variedade de perspectivas que vão de conservadoras a críticas.
Como já mencionado, isso reflete, em grande medida, os inúmeros
pressupostos de acadêmicos com respeito à natureza das Escrituras. Nós,
porém, acreditamos ser possível, pelo menos até certo ponto, encontrar o
denominador comum entre o texto bíblico e as fontes e evidências
disponíveis e participar de trabalhos e diálogos acadêmicos. O presente
livro, conforme ficará evidente, está mais próximo da tradição conservadora
de Zahn, Guthrie, Carson e Moo do que da inclinação mais crítica da
trajetória de Simon, Michaelis, Holtzmann e Brown.
Ao publicar esta obra, estamos bem cientes das limitações associadas à
produção de algo dessa natureza. Numa época de proliferação sem
precedentes de literatura acadêmica, quem tem capacidade para essa tarefa?
No entanto, acreditamos que vale a pena correr esse risco, uma vez que a
tarefa de ajudar a equipar outra geração de estudantes da Bíblia com uma
parcela do conhecimento “das Sagradas Escrituras, que podem fazer-te
sábio para a salvação, pela fé que há em Cristo Jesus” (2Tm 3.15), não deve
ser deixada de lado. Deste lado do céu, nosso conhecimento será,
necessariamente, preliminar e incompleto: “Porque agora vemos como por
um espelho”, e ansiamos pelo dia em que veremos Jesus “face a face” (1Co
13.12). Enquanto isso, convidamos o leitor a nos acompanhar na caminhada
em direção à plena maturidade cristã (Fp 3.12-14), à medida que crescemos
no conhecimento e na graça de nosso Senhor Jesus Cristo (2Pe 3.18). Que

32
Deus se agrade em usar esta obra como uma pequena ferramenta que nos
ajude a alcançar aquele digno e glorioso fim.

1
Veja especialmente W. Baird, History of New Testament Research, 2 vols. (Minneapolis:

Fortress, 1992, 2003).

2
Veja a referência a Escritura como “inspirada por Deus” em 2Timóteo 3.16.

3
A razão para isso, pelo menos em parte, pode ser a continuada hegemonia de uma abordagem

da Escritura que mantém a doutrina — incluindo a doutrina da Escritura — em suspenso e favorece

um modo de investigação primariamente histórico ou literário. Isso, porém, negligencia

indevidamente o terceiro componente fundamental da interpretação bíblica, isto é, a teologia. Veja A.

J. Köstenberger, Encountering John: The Gospel in Historical, Literary, and Theological

Perspective, EBS (Grand Rapids: Baker, 1999), p. 30-31.

4
Veja o artigo clássico de W. A. Grudem, “Scripture’s Self-Attestation and the Problem of

Formulating a Doctrine of Scripture”, em D. A. Carson; J. D. Woodbridge, orgs., Scripture and Truth

(Grand Rapids: Zondervan, 1983), p. 19-59.

5
Veja a base doutrinária da Evangelical Theological Society (ETS), reproduzida em

www.etsjets.org.

6
Veja A. J. Köstenberger; R. D. Patterson, Invitation to Biblical Interpretation (Grand Rapids:

Kregel, 2011); cf. N. T. Wright, The New Testament and the People of God, Christian Origins and the

Question of God 1 (Minneapolis: Fortress, 1992).

7
Veja o capítulo “Gospels, Acts, Epistles, and Apocalypse: The fulfilment of the Old Testament

in the New”, em: Köstenberger; Patterson, Invitation to biblical interpretation (Grand Rapids:

33
Kregel, 2011).

8
Recomendamos que para cursos de 1 semestre e em seminários, professores objetivem

transmitir (pelo menos) o que é identificado como Conhecimento Básico. Se o estudo do NT

abranger dois semestres, especialmente na maioria dos contextos de seminário, nossa recomendação

é fazer do Conhecimento Intermediário listado no início de cada capítulo o padrão de aprendizagem e

testes. O Conhecimento Avançado é fornecido para os alunos especialmente motivados, que em

alguns casos, podem ser convocados para prosseguir nos estudos ou, até mesmo, seguir uma carreira

acadêmica.

9
R. Simon, Histoire Critique du Texte du Nouveau Testament (Rotterdam: Reinier Leers, 1689).

Veja a discussão em Baird, History of New Testament Research, 1:17-25, que chamou Simon de “o

fundador da moderna crítica bíblica” (p. 17).

10
J. A. Bengel, Gnomon Novi Restamenti, 3. ed., editado por M. E. Bengel e J. Steudel

(Tübingen: L. F. Fues, 1850), 2 vols. Edição em inglês: Gnomon of the New Testament, tradução de J.

Bandinel e A. R. Fausset; A. R. Fausset, orgs., 5 vols. (Edinburgh: T&T Clark, 1866); reimpresso

como New Testament Commentary (Grand Rapids: Kregel, 1982), 2 vols. Veja a discussão em Baird,

History of New Testament Research, 1:69-80 (Minneapolis: Fortress, 1992, 2003).

11
J. D. Michaelis, Einleitung in die göttlichen Schriften des Neuen Bundes, 4. ed. rev. (Göttingen:

Vandenhoeck & Ruprecht, 1788), 2 vols. Edição em inglês: Introduction to the New Testament,

tradução de H. Marsh, 2. ed. (London: F. and C. Rivington, 1802), 4 vols. Veja a discussão em Baird,

History of New Testament Research, 1:127-138, (Minneapolis: Fortress, 1992, 2003), que chamou

Michaelis “[a]nother wunderkind [sic; alemão para “criança prodígio”] de Aufklärung” (alemão para

“Iluminismo”).

12
H. Holtzmann, Lehrbuch der historisch-kritischen Einleitung in das Neue Testament, 2. ed.

(Freiburg im Breisgau: Mohr Siebeck, 1886). Essa obra não foi traduzida para o inglês. Veja a

discussão em Baird, History of New Testament Research, 2:111-22 (Minneapolis: Fortress, 1992,

34
2003), que o considerou uma importante figura que move a pesquisa do NT “na direção do consenso

crítico” (título na p. 111).

13
T. Zahn, Einleitung in das Neue Testament (Leipzig: A. Deichert, 1897, 1899; reimpr.

Wuppertal: R. Brockhaus, 1994), 2 vols. Edição em inglês: Introduction to the New Testament,

tradução de Fellows and Scholars of Hartford Theological Seminary, edição de M. W. Jacobus, 2. ed.

(New York: Scribner’s Sons, 1917; reimpr. Edinburgh: T&T Clark, 1971), 3 vols. em 1. Veja a

discussão em Baird, History of New Testament Research, 2:367-73; veja a discussão do

contemporâneo (e parente) de Zahn, A. Schlatter em: ibid., p. 373-83. Embora Schlatter não tenha

escrito uma introdução ao NT como tal, sua obra de dois volumes New Testament Theology trouxe

uma importante contribuição ao entendimento da mensagem teológica do NT. Veja A. Schlatter, New

Testament Theology, tradução para o inglês de A. J. Köstenberger (Grand Rapids: Baker, 1997,

1999), 2 vols.; e A. J. Köstenberger, “T. Zahn, A. von Harnack, and A. Schlatter”, em: S. E. Porter e

S. A. Adams, orgs., Pillars in the History of New Testament Interpretation: Old and New.

14
D. Guthrie, New Testament Introduction, ed. rev. (Downers Grove: InterVarsity, 1990). D. A.

Carson; L. Morris; D. J. Moo, An introduction to the New Testament (Grand Rapids: Zondervan,

1992) [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução ao Novo Testamento.]; D. A.

Carson; D. J. Moo, An introduction to the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids: Zondervan, 2005).

15
R. E. Brown, An introduction to the New Testament, ABRL (New York: Doubleday, 1997).

35
AGRADECIMENTOS

Este livro é o produto da colaboração de três autores. Cada capítulo foi


atribuído a um de nós com contribuições dos outros dois. Andreas atuou
como editor geral e escreveu todas as “Questões para Reflexão”, e juntos
somos responsáveis pelo produto final. Por essa razão, seria
contraproducente identificar o autor de cada capítulo (embora,
naturalmente, os leitores possam arriscar alguns palpites!). Além disso,
gostaríamos de expressar nossa gratidão às seguintes pessoas que de várias
maneiras colaboraram para que esta obra se tornasse realidade: Alan Bandy,
Keith Campbell, Matt Lytle, Liz Mburu, Jason Meyer e Nate Ridelhoover.
Também somos gratos aos nossos alunos que deram feedbacks de partes
deste livro em várias fases do processo. Em particular, queremos agradecer
a vários alunos da turma de Panorama do NT do Southeastern Baptist
Theological Seminary que, no verão de 2007, cuidadosamente leram e
revisaram todo o manuscrito disponível naquele momento. Sua assistência e
espírito de servos foram um grande incentivo para nós. Nossos sinceros
agradecimentos também às nossas esposas e famílias, às nossas instituições
acadêmicas e a nossos alunos do passado, do presente e do futuro pelo
privilégio de afiarmos uns ao outros como “se afia o ferro com outro ferro”
(Pv 27.17).

36
Concluir nosso trabalho e liberá-lo ao público é uma iniciativa tomada
com humildade, pois estamos cientes de que muitos empreenderam escrever
introduções ao NT antes de nós. É provavelmente inevitável que alguns de
nossos colegas acadêmicos menos conservadores não aceitem as diferenças
relacionadas a determinadas posições aqui assumidas. Estaremos
recompensados se aqueles que estudam a Escritura com seriedade
encontrarem neste livro uma medida de riqueza espiritual à qual Jesus fez
alusão quando disse: “[…] todo escriba [estudioso] que aprendeu sobre o
reino do céu é semelhante a um chefe de família que tira do seu tesouro
coisas novas e velhas” (Mt 13.52). Soli Deo Gloria — somente a Deus seja
a glória!

ANDREAS J. KÖSTENBERGER e L. SCOTT KELLUM, Wake Forest, NC


CHARLES L. QUARLES, Pineville, LA
1 de julho de 2008

37
Parte 1

INTRODUÇÃO

Antes de investigar os Evangelhos e o restante do NT nas partes 2 a 4


deste volume, é conveniente estabelecer as bases para o estudo dos escritos
incluídos no cânon do NT, considerando a natureza e o escopo da Escritura
(cap. 1), bem como o levantamento do cenário político e religioso do
contexto do NT (cap. 2). Isso é apropriado, porque questões como a
extensão do cânon do NT, a inerrância e inspiração da Escritura, a tradução
do texto sagrado e sua transmissão textual (crítica textual) constituem
importantes questões preliminares que têm uma influência importante na
interpretação dos livros incluídos no NT.
A menos que essas questões sejam tratadas de forma adequada, a
introdução ao NT é interpretada sem o fundamento adequado, resultando
em um vácuo doutrinário que deixa o estudante em uma posição precária e
vulnerável quando confrontado com desafios à canonicidade de certos
livros do NT ou de uma elevada visão da Escritura e sua autoridade. Além
disso, os Evangelhos, o livro de Atos, as cartas do NT e o livro do
Apocalipse não aparecem em um vácuo. Por essa razão, é vital discutir os
contextos políticos e religiosos que formam o pano de fundo para o estudo

38
dos vários escritos do NT. Assim, a introdução ao NT corretamente começa
com tratamentos da natureza da Escritura e do relevante contexto do NT.

39
CAPÍTULO 1

A natureza e o escopo da Escritura

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os alunos deverão conhecer as principais questões
envolvidas na formação do cânon, as doutrinas da inerrância e inspiração, a
transmissão textual do NT e as traduções da Bíblia. Também deverão ter
uma compreensão básica dos principais personagens e documentos e das
questões abordadas, incluindo datas importantes.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo central
identificado nos Conhecimentos básicos, os alunos deverão ser capazes de
discutir mais profundamente o processo de canonização e os critérios de
canonicidade. Também deverão ser capazes de identificar evoluções na
coleção dos Evangelhos e das cartas paulinas, bem como ser capazes de
defender a confiabilidade da Bíblia com base em seus conhecimentos das
questões relevantes relativas à transmissão e à tradução da Escritura.
Conhecimentos avançados: além do domínio do conteúdo central
identificado nos tópicos anteriormente observados, os alunos deverão ser
capazes de fornecer definições de inerrância e inspiração com base nas
principais passagens do NT relacionadas ao assunto. Também deverão ser

40
capazes de fornecer uma visão geral da história da Bíblia e estar preparados
para discutir a equivalência formal e funcional na tradução da Escritura.

INTRODUÇÃO

Muito tempo atrás, B. F. Westcott observou que “um panorama da


história do cânon constitui uma parte necessária de uma introdução aos
escritos do Novo Testamento”.1 Para muitos estudantes, a discussão sobre o
cânon — a questão de quais livros devem estar incluídos na Bíblia —
parece irrelevante: o cânon está fechado e limitado aos livros ali
encontrados. Contudo, um estudo do cânon faz mais do que simplesmente
determinar os livros do AT e do NT ou fornecer material para o debate
acadêmico. Ele fornece uma orientação básica sobre como a Bíblia veio à
existência e, portanto, conecta estudantes mais firmemente aos fundamentos
de sua fé. No contexto da presente obra, este capítulo de abertura também
serve ao propósito de estabelecer uma estrutura básica para lidar mais
detalhadamente com cada livro do NT mais adiante.
Este capítulo começa uma jornada pelo NT. A própria ideia de um NT é
traçada ao longo das linhas do desenvolvimento histórico deste corpo de
literatura. Como no caso de cada livro individual do NT no restante deste
volume, a discussão sobre o cânon do NT no presente capítulo prossegue
sob as rubricas da história, da literatura e da teologia. Primeiro, a discussão
da história examina a fundo o processo de canonização para responder à
pergunta: “Por que esses 27 livros?”. Segundo, o tratamento da literatura
lida com a confiabilidade da Bíblia e visa definir a seguinte questão: “seria
a Bíblia de hoje a mesma que foi escrita originalmente?”. Por fim, o cânon
também é significativamente uma função da teologia da igreja. Por isso, o

41
capítulo termina com uma investigação sobre a questão: “Qual é a natureza
do cânon?”.

O CÂNON DO NOVO TESTAMENTO: POR


QUE ESSES 27 LIVROS?
A presente investigação sobre o escopo e a extensão do NT — o cânon do
NT — está preocupada não tanto com a produção desses escritos, mas com
o seu reconhecimento como Escritura cristã com a exclusão de todos os
outros possíveis candidatos. O que é um “cânon”? Colocado de forma
sucinta, a palavra cânon vem do grego kanōn, que, por sua vez, se deriva de
seu equivalente hebraico kaneh e significa “regra” ou “padrão”.2 O termo,
porém, acabou se referindo à coleção das Escrituras cristãs. O conceito
moderno de cânon é claramente comprovado no século IV. Até que ponto a
noção se estende de volta além deste, chegando até a séculos anteriores, é
objeto de vigoroso debate acadêmico.3
A própria composição de vários escritos do NT teve início no final da
década de 40 e prosseguiu até a segunda metade do primeiro século.
Subsequentemente, esses livros foram copiados e disseminados entre o
crescente número de congregações cristãs por todo o Império Romano,
como é atestado pela evidência dos manuscritos disponíveis. O fragmento
do papiro 52
contém João 18.31-33, 37,38 e muito provavelmente data da
primeira metade do segundo século.4 Sua descoberta no Egito, a muitas
milhas da origem do Evangelho na Ásia Menor e apenas algumas décadas
depois de o Evangelho ter sido escrito, dá testemunho significativo da
velocidade com que os primeiros escritos cristãos se espalharam para vários
locais por uma rede de igrejas que um escritor chamou de “internet santa”.5

42
Geralmente, o principal assunto do debate hoje não é se o cânon do NT
está fechado (isto é, fixo e, portanto, imutável).6 Antes, a discussão está
centrada nas questões de como e quando o fechamento do cânon se deu. O
amplo período de tempo durante o qual o processo de canonização ocorreu
se estende desde o período da igreja primitiva ao dos concílios eclesiásticos
dos séculos IV e V, que declararam fechado o cânon.7 Se o cânon foi
definido antes ou depois desse período, é discutido. A limitada evidência da
literatura patrística do segundo século e as diferentes suposições sobre a
natureza do cristianismo e do cânon cristão fazem da investigação sobre o
processo de canonização “um caminho estreito, acidentado e mal
iluminado”.8

O Testemunho do Novo Testamento


O cânon do NT pode ser visto tanto da perspectiva humana quanto da
divina. A perspectiva evangélica tradicional afirma a atividade de Deus na
formação do cânon. A partir desse ponto de vista privilegiado, pode-se dizer
que, pelo menos em certo sentido, o cânon do NT foi fechado no momento
em que o último livro do NT foi escrito. De acordo com esse ponto de vista,
Deus, através da agência do Espírito Santo e da instrumentalidade dos
escritores do NT, gerou a Sagrada Escritura (um fenômeno chamado
“inspiração”; veja mais a seguir); e a tarefa da igreja não era a criação do
cânon, mas apenas o reconhecimento das Escrituras que Deus previamente
escolheu inspirar. Isso, por sua vez, tem ramificações importantes no que
diz respeito à autoridade: se o papel da igreja é primariamente passivo na
determinação do cânon cristão, então esse papel é inspirado na Escritura, e
não na igreja, que está na posição final de autoridade.

43
Tradicionalmente, o segundo século tem sido visto como o período
crucial para o processo de canonização dos escritos do NT. No final desse
século, os livros do NT eram amplamente reconhecidos pelas igrejas. Nos
dois séculos seguintes, tudo o que restava era uma resolução final sobre a
canonicidade de livros menores ou contestados, como Tiago, 2Pedro, 2 e
3João, Judas e Apocalipse. Além disso, o fato de que a consciência
canônica da igreja parece ter deixado vestígios mesmo no próprio NT,
sugere que os escritores do NT estavam cientes de que Deus estava
inspirando novos documentos em sua época. Em duas passagens
importantes do NT, o termo “Escritura” (graphē), usado cerca de 50 vezes
no Novo Testamento para se referir ao AT,9 pode referir-se aos escritos
emergentes do NT.
A primeira dessas passagens é 1Timóteo 5.18: “Porque a Escritura diz:
‘Não amarre a boca do boi quando ele estiver debulhando’; e: ‘o
trabalhador é digno de seu salário’”. O texto usa a palavra “Escritura” com
referência a duas citações. A primeira, a proibição de amordaçar um boi, é
retirada de Deuteronômio 25.4. A segunda, “o trabalhador é digno do seu
salário”, é, na verdade, um exato paralelo verbal de Lucas 10.7.10 Enquanto
se debate se o Evangelho de Lucas foi a fonte para essa citação, fica claro
que (1) o autor utilizou uma fonte escrita (exigida pela palavra “Escritura”,
graphē); e (2) a fonte foi considerada digna de crédito juntamente com
Deuteronômio. Independente de qual seja a visão de alguém com respeito à
autoria paulina das Epístolas Pastorais, isso nos fornece um importante
fragmento de evidência acerca da consciência canônica emergente na época
do NT.
O mesmo é verdade acerca de 2Pedro 3.15,16. Com referência ao
apóstolo Paulo, Pedro escreve que “ele fala sobre estas coisas em todas as

44
suas cartas, nas quais há pontos difíceis de entender. Os ignorantes e
inconstantes distorcem, como fazem também com as demais Escrituras
para a sua própria destruição” (ênfase acrescentada). Por implicação, segue-
se que Pedro via as cartas de Paulo como “Escritura” em par com os
escritos do Antigo Testamento. Surpreendentemente, enquanto os escritos
do NT ainda estavam sendo produzidos, 2Pedro indica, assim, a aceitação
das cartas paulinas como Escritura e, portanto, igualmente dignas de crédito
como as Escrituras hebraicas.
Tendo em conta esse tipo de evidência do NT, a conclusão imediata é
que quase antes que a tinta secasse, os primeiros cristãos, incluindo as
figuras de liderança na igreja, como os apóstolos Paulo e Pedro,
consideravam documentos cristãos contemporâneos, como o Evangelho de
Lucas e as cartas paulinas, como Escritura no mesmo nível do AT. A partir
disso, não é muito difícil traçar a consciência canônica emergente no que
diz respeito à formação do Novo Testamento através dos escritos dos pais
da igreja no fim do primeiro século e início do segundo. Na verdade, antes
do ano 150, o único livro do NT que não havia sido nomeado como
autêntico ou que não havia sido inequivocamente citado como autoridade
nos escritos patrísticos existentes é 3João.11

O Testemunho dos Pais da Igreja Primitiva


Um levantamento da literatura patrística primitiva revela que os pais da
igreja primitiva não hesitavam em citar os vários livros do NT como
Escrituras. Quatro exemplos devem bastar. O autor de 1Clemente, o
primeiro documento cristão não bíblico existente (c. 96), tendia a citar a
Escritura organicamente (isto é, sem fórmulas introdutórias).12 Clemente

45
citou o AT e o NT igualmente dessa maneira. Ele se referia aos Evangelhos
canônicos, ao livro de Atos, 1Coríntios, Filipenses, Tito, Hebreus, 1Pedro e
talvez Tiago tanto quanto se referia ao AT. Muito provavelmente, a mais
antiga citação de uma passagem NT usando o termo “Escritura”, no período
subapostólico (o período após a era apostólica) é 2Clemente 2.4: “E outra
Escritura diz: ‘Eu não vim chamar os justos, mas os pecadores’”.13 Essa
referência inclui uma clara citação de uma passagem em um dos
Evangelhos canônicos, muito provavelmente Marcos 2.17, tão cedo quanto
no final do primeiro século.
Policarpo (c. 69-155), a quem Ireneu chamou de um discípulo do
apóstolo João, também se referiu frequentemente a vários escritos do NT
em sua Carta aos Filipenses. P. Hartog categorizou o uso que Policarpo fez
de documentos do NT de acordo com três níveis de exatidão: (1)
certamente Policarpo citou Romanos, 1Coríntios, Gálatas, Efésios,
Filipenses, 1Timóteo e 1Pedro; (2) provavelmente ele citou Mateus,
2Coríntios, 2Timóteo e 1João; (3) possivelmente ele citou Lucas, Atos e
2Tessalonicenses.14 B. Metzger acrescentou à lista uma alusão a Hebreus.15
Assim, Policarpo pode ter citado pelo menos 15 livros do NT. De longe, o
comentário mais intrigante de Policarpo vem em Filipenses 12.1: “Pois
estou convencido de que vocês são todos bem treinados nas Escrituras
sagradas […] Apenas como é dito nessas escrituras, ‘Irai-vos mas não
pequeis,’ e ‘não se ponha o sol sobre vossa ira’”.16 A implicação clara é que
havia um corpo de literatura chamado “Escrituras” do qual o livro de
Efésios era parte. Além disso, é mais do que provável que Policarpo visse
as cartas de Paulo na sua totalidade como Escritura.17
Papias (c. 60-130), um contemporâneo de Policarpo e discípulo
companheiro de João, escreveu cinco livros intitulados Expositions of the

46
Lord’s Sayings [Exposições dos Ditos do Senhor], que já não existem mais.
De citações em outros livros (“fragmentos”) e relatórios de escritores
antigos, é possível verificar que esses livros eram um comentário sobre as
palavras e os atos de Jesus dos Evangelhos canônicos.18 A partir desses
fragmentos, pode-se concluir que Papias aceitava Mateus, Marcos, Lucas,
João, Atos e Apocalipse. Ao que consta, ele também fez uso de 1Pedro e
1João.19 Uma vez que a palavra “ditos” ou “oráculos” (logia) é um
eufemismo de Paulo para as Escrituras do AT (cf. Rm 3.2), é provável que
Papias considerasse sua obra uma exposição da Escritura.
Decorre dessas observações que a maioria dos documentos do NT era
reconhecida como digna de crédito, até mesmo como Escritura, por volta do
final do primeiro século, ou pelo menos no final do segundo século era
cristã. Os quatro Evangelhos, o livro de Atos, as cartas de Paulo, 1Pedro e
1João eram universalmente reconhecidos. Com exceção de 3João, os pais
da igreja primitiva citavam todos os livros do NT como Escritura. Perto do
final do segundo século, os principais contornos do NT tinham claramente
emergido, estabelecendo a estrutura para a subsequente resolução final do
status canônico de vários livros remanescentes menores ou contestados.

O Testemunho do “Cânon de Muratori”


Muito provavelmente no final do segundo século, um escritor desconhecido
compôs uma defesa dos livros do NT que parece corroborar a conclusão de
que a maioria dos escritos do NT foram reconhecidos como Escritura por
volta dessa época. O escritor se referiu a esses escritos como “considerados
sagrados”, e ele afirmava que trabalhos sob pseudônimo não poderiam ser
“recebidos” na igreja, porque “fel não deveria ser misturado com mel”.20 No

47
mínimo, o escritor via os livros listados como um cânon fixado. O Cânon de
Muratori, que foi nomeado pelo historiador e teólogo italiano do século
XVIII que o descobriu, enumera pelo menos 22 dos 27 livros no cânon do
NT.21
Essas obras incluíam os quatro Evangelhos, pelo menos duas cartas de
João (e possivelmente a terceira), Atos dos Apóstolos, 13 cartas de Paulo,
Judas e Apocalipse. Os livros não estavam em uma ordem específica, e o
manuscrito é fragmentário no início e, muito provavelmente, no final.
Outros livros podem muito bem ter sido incluídos no cânon da igreja na
época em que o Cânon de Muratori foi escrito, como Hebreus, as Cartas de
Pedro, ou a Carta de Tiago.
Do século III ao V, o reconhecimento final do restante das Epístolas
Gerais e do livro de Apocalipse ocorreu. Durante esse período, as últimas
questões a respeito do cânon do NT foram resolvidas.
Nós consideramos o testemunho do NT e dos pais da igreja primitiva,
bem como o testemunho do Cânon de Muratori, que provavelmente é a
mais antiga lista canônica existente que, com toda probabilidade,
documenta a existência do conceito de cânon já perto do fim do segundo
século.

Estímulos para a Canonização e Critérios de


Canonicidade
Estímulos para canonização
Provavelmente houve uma série de fatores que contribuíram para a
canonização do NT. O tratamento de N. Geisler e W. Nix é representativo

48
ao sugerir cinco importantes estímulos para a determinação do cânon do
22
NT feito pela igreja. São eles:

1. A natureza profética dos livros do NT. Os próprios livros do NT eram


proféticos, intrinsecamente valiosos e dignos de preservação.
2. A necessidade da igreja por Escrituras dignas de crédito. A demanda
por livros que se conformassem com o ensino apostólico para serem
lidos nas igrejas (veja 1Ts 5.27; 1Tm 4.13) exigia um processo de
seleção.
3. Desafios heréticos. Em cerca de 140, o herege Marcião declarou, em
Roma, um Evangelho de Lucas editado e apenas dez cartas de Paulo
como úteis, enquanto todas as outras obras apostólicas foram
rejeitadas, o que exigiu uma resposta daqueles pertencentes à principal
corrente apostólica do cristianismo.
4. Expansão missionária. Como a Bíblia começou a ser traduzida para o
siríaco e o latim por volta da primeira metade do segundo século, a
determinação do cânon do NT foi importante para decidir quais os
livros deveriam ser traduzidos.
5. Perseguição. Quando o Édito de Diocleciano, em 303, ordenou que
todos os livros sagrados dos cristãos fossem queimados (um fato que
pode, pelo menos em parte, explicar a relativa escassez de manuscritos
do NT antes de 300 d.C.), isso exigiu que os fiéis fossem obrigados a
escolher quais livros fariam parte da Escritura e, portanto, seriam mais
dignos de preservação.

QUADRO 1.1: OS PSEUDEPÍGRAFOS NA


IGREJA PRIMITIVA

49
Não há exemplo conhecido de um único livro que alegue falsamente
ter sido escrito por um apóstolo, (uma “obra pseudepigráfica”),
ortodoxo ou não, que tenha sido aceito pela igreja primitiva como
canônico. Serapião, bispo de Antioquia (falecido em 211), declarou,
em relação ao espúrio Evangelho de Pedro: “De nossa parte, irmãos,
nós recebemos tanto a Pedro quanto aos outros apóstolos como Cristo,
mas os escritos que falsamente trazem seus nomes nós rejeitamos,
1
como homens experientes, sabendo que não foram entregues a nós”.
Tertuliano (c. 160-225) registrou a exoneração de um presbítero da
Ásia, observando que “Na Ásia, o presbítero que compôs aquele
escrito [isto é, Atos de Paulo e 3Coríntios], como se estivesse
aumentando a fama de Paulo por sua própria iniciativa, depois de ser
condenado, e de ter confessado que ele tinha feito isso por amor ao
apóstolo, foi removido de seu ofício”.2 Assim, quando um livro no
cânon afirma ter sido escrito por determinado autor, pode-se supor que
a igreja primitiva acreditou que o mesmo era autêntico.

1
Eusébio, Hist. Ec. 5.22.1.
2
Tertuliano, Sobre o Batismo 17, em: A. Roberts; T. L. Donaldson; A. C. Coxe; A.

Menzies, orgs., Ante-Nicene Fathers: The Writings of the Fathers Down to A.D. 325

(Peabody: Hendrickson, 1994), vol. 3: Tertullian, p. 677. Veja também a declaração de

Eusébio em relação às obras apócrifas: “para que possamos conhecê-las e aos escritos

apresentados pelos heréticos sob o nome dos apóstolos contendo evangelhos como os de

Pedro, Tomé, Matias e alguns outros, ou Atos como os de André e João e de outros apóstolos.

Quem quer que tenha pertencido à sucessão dos ortodoxos jamais considerou correto fazer

referência, em seus escritos, a nenhuma dessas obras. Além disso, o tipo de fraseologia difere

do estilo apostólico, e a opinião e tendência de seus conteúdos são bem dissonantes da

50
verdadeira ortodoxia, o que mostra claramente que eles foram forjados pelos hereges” (Hist.

Ec. 3.25).

Critérios de canonicidade
Quando a igreja primitiva compilou o cânon, ela reconheceu quais escritos
apresentavam o selo da inspiração divina. Quatro critérios principais foram
utilizados nesse processo.23 O primeiro foi a apostolicidade, isto é, a
associação direta ou indireta de determinada obra com um apóstolo. Esse
critério foi cumprido por Mateus, João e Pedro, todos os quais pertenceram
aos Doze (Mt 10.2,3), assim como Paulo, um apóstolo comissionado pelo
Cristo ressuscitado na estrada de Damasco (At 9.1-9). Esse critério também
foi satisfeito por Tiago e Judas, meios-irmãos de Jesus (Mt 13.55, Mc 6.3;
veja Tg 1.1; Jd 1.1). Indiretamente, o critério foi também satisfeito por
Marcos, um colaborador próximo de Pedro (1Pe 5.13) e Paulo (2Tm 4.11),
e Lucas, um companheiro de viagem de Paulo em algumas de suas viagens
missionárias (veja especialmente o “nós” nas passagens no livro de Atos).
O segundo critério de canonicidade foi a ortodoxia de um livro, ou seja,
se um dado escrito se conformava às “regras de fé” da igreja (Lat. regula
fidei). Esse critério permitiu que livros como Hebreus fossem considerados,
embora pareça que sua atribuição a Paulo ou a um membro do “círculo
paulino” também havia desempenhado um papel importante na aceitação de
Hebreus no cânon. A questão abordada sob essa rubrica é se o ensino de
determinado livro se conformava ao ensino apostólico ou não (cf. At 2.42).
O terceiro critério foi o da antiguidade do livro, ou seja, se uma
determinada peça escrita foi produzida durante a era apostólica. Isso servia
para corroborar os dois critérios anteriores e excluía as literaturas apócrifas

51
e pseudepigráficas dos séculos II e III (como o Evangelho de Tomé) que
imitavam os documentos apostólicos autênticos. Ele também descartou
documentos como o Didaquê ou o Pastor de Hermas, que foram
produzidos após a era apostólica. Alguns desses escritos antigos refletiam a
prática da igreja primitiva e eram lidos com proveito pelos primeiros
cristãos. No final, porém, eles não foram incluídos no cânon porque não
conseguiram cumprir os critérios da apostolicidade e da antiguidade.

QUADRO 1.2: A CARTA PASCAL DE


ATÁNASIO DE 367 d.C.
Atanásio, em sua carta pascal datada de 367, lista exatamente o
mesmo cânon de hoje. “Não pode haver qualquer hesitação ao se
afirmar novamente os [livros] do Novo Testamento; pois são estes:
quatro Evangelhos: segundo Mateus, segundo Marcos, segundo
Lucas e segundo João. Além disso, após esses, também [os] Atos dos
Apóstolos, e as sete chamadas Epístolas Católicas dos Apóstolos,
como se segue: uma de Tiago, mas duas de Pedro, então, três de
João, e após essas, uma de Judas. Além dessas, há quatorze Epístolas
do apóstolo Paulo colocadas na seguinte ordem: a primeira aos
Romanos, em seguida duas aos Coríntios e, após essas, [a carta] aos
Gálatas, e em seguida a Epístola aos Efésios; além disso, [as cartas]
aos Filipenses e aos Colossenses e duas aos Tessalonicenses, e a
[Carta] aos Hebreus. E após duas [Cartas] a Timóteo, mas apenas
uma a Tito, [sendo] a última a única a Filemom. Além disso, há
também o Apocalipse de João”.

52
O quarto, último e principal critério de canonicidade foi o do uso
eclesiástico, isto é, se determinado documento já foi amplamente utilizado
na igreja primitiva. Tal como nos critérios anteriores, esse padrão foi
utilizado em conjunto com os outros critérios mencionados, e somente os
documentos que atendiam a todos os quatro critérios foram incluídos.24

Debates Eclesiásticos Quanto à Canonicidade de


Livros Individuais
A história eclesiástica de Eusébio e as várias
opiniões no Ocidente e no Oriente
De modo geral, esses foram os principais critérios utilizados pela igreja
primitiva para determinar a canonicidade de determinada peça de escrita.
No entanto, nem todos concordaram em todos os casos específicos. O
historiador e pai da igreja Eusébio (c. 260–340), bispo de Cesareia,
forneceu uma reflexão valiosa da discussão atual em sua História
Eclesiástica. Eusébio agrupou os livros do NT em três categorias. Na
primeira estavam os livros geralmente reconhecidos, isto é, aqueles escritos
que foram amplamente reconhecidos como canônicos. Esses documentos
incluíam os quatro Evangelhos, Atos, as cartas de Paulo, 1João, 1Pedro e
Apocalipse. Na segunda categoria estavam os livros discutidos e
questionados por alguns, “mas”, como Eusébio observou, “não obstante
conhecidos [isto é, reconhecidos como autênticos e, portanto, canônicos]
pela maioria”. Esses escritos incluíam Tiago, Judas, 2Pedro e 2 e 3João. No
terceiro grupo estavam os livros espúrios, que designavam as obras que
imediatamente tinham sido recebidas por alguns, mas que agora foram

53
rejeitadas. Esses escritos incluíam os Atos de Paulo, o Pastor de Hermas, o
Apocalipse de Pedro e a (Pseudo) Epístola de Barnabé.25
Assim como o Império Romano foi dividido em ocidental e oriental, as
opiniões sobre certos livros do NT. Também foram, de certo modo,
divididas assim. No Ocidente (Itália/Roma, Norte da África, Gália etc.),
dúvidas pareceram persistir em relação a Hebreus, Tiago, 2Pedro, 3João e
Judas. No entanto, essas opiniões não eram universais uma vez que cada um
desses livros tinha seus defensores.26 No Oriente (Grécia, Ásia Menor, Síria,
Palestina e Egito), o status de Tiago, 2Pedro, 2 e 3João, Judas e Apocalipse
continuava a ser debatido.27 Novamente, porém, essa não era uma opinião
universal. Por exemplo, Atanásio, bispo de Alexandria (c. 296-373),
publicou sua trigésima nona Carta Pascal em 367, na qual ele prescrevia o
mesmo cânon do NT com 27 livros, hoje ainda confirmados pela vasta
maioria dos cristãos.28
A igreja da Síria (cristãos de língua aramaica no Oriente) hesitou em
receber as Epístolas Gerais e o Apocalipse. A tradução síria do NT
(chamada “Peshitta”) defende um cânon com 22 livros. Somente na revisão
de Filoxeno (c. 500) é que os demais livros do NT foram adicionados ao
cânon da igreja.
Por um tempo, certos livros ortodoxos assumiram status canônico em
segmentos específicos da igreja ou pelo menos na opinião de alguns dos
seus representantes.29 No todo, esses escritos raramente eram considerados
como parte das Escrituras, mas eram vistos como úteis para a instrução de
novos cristãos, embora não fossem lidos durante o culto de adoração das
igrejas. Quando, mais tarde, alguns foram incluídos nos códices completos
(como o Códice Sinaítico, do século IV, e o Códice Alexandrino, do século
V), eles foram sempre colocados após o livro de Apocalipse. Isso sugere

54
que a igreja considerava esses escritos como úteis para a edificação dos
fiéis, mas não divinamente inspirados.30 Assim, esses códices, muito
grandes e volumosos para uso pessoal, serviam, entre outras coisas, como
“edições de referência” da Bíblia.31

Primeiros concílios da igreja primitiva


Apenas três dos primeiros concílios da igreja primitiva oficialmente
discutiram o cânon da Escritura.32 O primeiro, o Concílio de Laodiceia, foi
um encontro local de bispos, e ocorreu por volta de 363. A lista de livros
específicos incluídos nos documentos existentes provavelmente foi
adicionada em um momento posterior. A lista continha os atuais livros do
NT menos o livro do Apocalipse. É difícil saber exatamente o resultado das
deliberações desse encontro no que diz respeito ao cânon do NT com base
nas evidências disponíveis. O segundo foi o Concílio de Hipona Régia, na
África do Norte (393), que se reuniu e afirmou os atuais 27 livros do NT. O
terceiro, foi o Terceiro Concílio de Cartago (397), que leu as afirmações
anteriores e as confirmou.33 Em nenhum sentido essas listas foram o
resultado do debate. Os documentos conciliares simplesmente confirmaram
os livros do AT e do NT e acrescentaram a seguinte nota: “Que este seja
enviado para o nosso irmão e bispo companheiro, Bonifácio, e para os
outros bispos daquelas regiões, para que possam confirmar este cânon, pois
estas são as coisas que nós recebemos de nossos pais, para serem lidas na
igreja”.34 Em vez de entrarem em um debate duradouro ou um processo de
triagem, “a igreja”, como P. Balla observou, “reconheceu como Escritura,
no século IV, aqueles escritos que nortearam a sua vida, pelo menos em
algumas regiões, nos séculos anteriores”.35

55
No século seguinte, o Oriente veio a receber Apocalipse e o restante das
Epístolas Gerais. Assim, pelo fim do século V, praticamente todas as
questões relativas à extensão do cânon do NT foram fechadas na mente da
maioria.
Para resumir, os fatos mais salientes em relação ao reconhecimento do
cânon do NT, até agora, são os seguintes:

primeiro, a maior parte dos livros do atual cânon do NT é encontrada


em todos os testemunhos a um cânon na antiguidade. Quase
imediatamente, 20 dos 27 livros foram universalmente recebidos; a
maior parte aceitou um cânon com pelo menos 22 livros;
segundo, nenhum livro no cânon atual tinha sido universalmente
rejeitado pelas igrejas primitivas. Não há nenhuma descoberta, após o
segundo século, de algum livro do NT que não tivesse apoio antigo;
terceiro, nenhum livro tido como um pseudônimo jamais foi recebido
no cânon NT;36
por fim, nenhum concílio subjetivamente selecionou ou rejeitou os
livros do cânon. Em vez disso, após um período de triagem e seleção, a
igreja reconheceu a inspiração divina dos livros incluídos no cânon do
NT e se recusou a aceitar as reivindicações de canonicidade de
quaisquer obras concorrentes com base em que eles não conseguiram
cumprir os critérios de canonicidade aqui listados — incluindo a
apostolicidade, a ortodoxia, a antiguidade e o uso eclesiástico.

Os Desenvolvimentos Recentes nos Estudos Sobre


o Cânon do NT

56
A supracitada pesquisa das principais obras e figuras constitui a estrutura
básica para o estudo do cânon do NT. Os fatos básicos e dados relativos ao
processo de canonização do NT não são amplamente contestados. O que
tem sido objeto de considerável recente debate, no entanto, é a interpretação
desses dados no que diz respeito à questão da formação do cânon cristão.
Na verdade, alguns estudiosos, como Sundberg, apelaram por uma “revisão
histórica do cânon do NT”.37 O debate teve seu ponto de partida da
definição do cânon do NT como “uma lista fechada de livros dignos de
crédito”. Uma vez que essa terminologia não é encontrada, pelo menos
explicitamente, até os séculos III ou IV, esses escritores argumentaram que
a caracterização das deliberações da igreja primitiva no segundo século
como determinantes do status “canônico” de determinado livro foi uma
falácia do anacronismo. Segundo esses escritores, nesse estágio inicial do
processo canônico, uma obra em particular poderia ter sido vista como
“Escritura” (isto é, uma parte da escrita sagrada), mas não como
“canônica”, pois esse tipo de consciência canônica e o sentido de uma
“coleção fechada” de livros do NT surgiram apenas nos séculos III e IV.
O que pode ser dito em resposta a essas reivindicações? Primeiro, como
mencionado, com base no pressuposto de que o Cânon de Muratori deve ser
datado do final do segundo século, isso iria contradizer tais objeções, pois
evidencia claramente esse tipo de consciência canônica e apresenta uma
lista dos livros canônicos. Essa possível contraprova prejudicial foi
reconhecida pelos proponentes desse ponto de vista. Consequentemente,
estudiosos como Sundberg ou Hahneman têm desafiado a datação do Cânon
de Muratori como sendo do segundo século, propondo, em vez disso, uma
data no século IV.38 No entanto, muitos estudiosos continuam a acreditar

57
que o segundo século é, de fato, a data mais provável para o Cânon de
Muratori.39
Um outro aspecto problemático da tese de Sundberg é que a igreja
primitiva com toda a probabilidade não apenas evidenciou um conceito de
cânon, mas na verdade já tinha um cânon estabelecido: o AT. Novamente,
Sundberg e outros estudiosos desafiaram a noção de um cânon fechado do
AT nos primeiros dois séculos, sustentando que o cânon do AT não foi
concluído até pelo menos o século IV e que a igreja primitiva recebeu o
cânon do AT antes de o judaísmo determinar os limites canônicos das
Escrituras hebraicas. Segundo esses estudiosos, a coleção das Escrituras foi
um processo fluido.40
Em resposta, Sundberg e seus seguidores colocaram indevidamente o
foco no fechamento do cânon pela igreja enquanto fracassaram em dar a
atenção adequada, em primeiro lugar, à atividade de Deus de inspirar os
escritos do NT.41 Assim, esses escritores baseiam sua avaliação
principalmente em pronunciamentos eclesiásticos definitivos sobre o cânon
do NT. Uma vez que esse tipo de resolução final não ocorre até o século IV,
isso é entendido como prova de que “cânon” não foi um conceito operante
durante os estágios anteriores do processo de canonização. Tal raciocínio é
pouco convincente, pois coloca ênfase indevida no papel da igreja na
determinação da canonicidade. Além disso, é negligente em reconhecer que
já no final do segundo século a maioria dos livros do NT era reconhecida
como parte do cânon das Sagradas Escrituras da igreja.
Ver a fixação do cânon da igreja, constituído de livros inspirados,
revestidos de autoridade, acima de tudo da perspectiva de uma “realização
patrística”42 coloca o debate ao longo de duas possíveis opções: aceitação
indiscriminada ou avaliação crítica. Sundberg prefere a primeira alternativa.

58
Uma das implicações dessa completa aceitação do que a igreja do século IV
determinou a respeito do cânon é a inclusão dos apócrifos do AT no cânon
da Escritura baseado do fato de que os concílios que enumeraram os 27
livros do cânon do NT livro também incluíram os apócrifos do AT.43 Do
mesmo modo, C. D. Allert parece sugerir que a resposta apropriada da
igreja é a submissão a essa decisão patrística. Ao fazê-lo, ele tentou afirmar
inspiração e inerrância, mas apenas através das lentes de interpretação da
igreja, não como uma função do próprio testemunho da Bíblia sobre si
mesma.44
Por outro lado, enquanto concorda em grande parte com Sundberg, L.
McDonald concluiu seu livro com a seguinte lista de sete perguntas que
sugere que ele preferiria avaliar, em vez de simplesmente aceitar, a
“realização patrística” ao delinear o cânon do NT.45 Ele perguntou:

1. Seria a noção do cânon em si uma ideia cristã? Em seu ponto de vista,


os primeiros cristãos não tinham o conceito de cânon. Então, por que
os cristãos de hoje deveriam aceitar tal noção?
2. Deveria a igreja contemporânea aderir a um cânon que legitima
práticas odiosas, como a escravidão ou a subjugação das mulheres?46
3. Um movimento em direção a um cânon fechado limitaria a presença e
o poder do Espírito Santo na igreja?
4. A igreja deveria ser limitada a um cânon do AT ao qual Jesus e seus
primeiros discípulos claramente não estavam confinados?
5. A igreja deveria continuar a reconhecer a literatura não apostólica?
Aqui, McDonald afirma o critério da apostolicidade mas rejeita a
autoria das Epístolas Pastorais, 2Pedro e Judas.
6. É apropriado ligar a igreja moderna a um cânon que emergiu das
circunstâncias históricas entre os séculos II e V?

59
7. Será que o mesmo Espírito que inspirou os documentos escritos das
Escrituras não falaria ainda hoje?

McDonald não defendia a substituição da Bíblia cristã, e reconheceu


que nenhum outro documento antigo, em geral, é mais confiável do que a
Escritura na sua configuração atual. No entanto, ele procurou, sim, ouvir
outras vozes que lhe falassem sobre o Senhor Jesus Cristo. Segundo
McDonald, as agrapha (histórias supostamente verdadeiras de Jesus que
não foram incluídas nos Evangelhos canônicos), os apócrifos, as
pseudepígrafos e outros textos cristãos primitivos são valiosos como fontes
de informação para a fé da igreja. Enquanto as questões levantadas por
McDonald são certamente dignas de reflexão e discussão adicionais, o
obscurecimento que ele faz dos limites do cânon é de mérito duvidoso.

Crítica
Como as várias contribuições dos estudos recentes sobre o cânon do NT
deveriam ser avaliadas? Para começar, como observado anteriormente, a
alegação de que o Cânon de Muratori foi uma composição do século IV foi
decisivamente refutada. Além disso, grande parte dos estudos recentes
sobre o cânon do NT é assolada por uma série de problemas metodológicos.
Uma das dificuldades é que a disponibilidade de evidências relevantes é
muitas vezes julgada como “não existente”, o que necessariamente significa
“nunca existiu”. Por exemplo, algumas vezes é dito que a primeira vez que
os 27 livros do cânon do NT foram listados como tal foi na lista de
Atanásio.47 A verdade, porém, é que nós temos poucas evidências valiosas
dos séculos anteriores sobre qualquer assunto. Seria essa a primeira lista

60
completa dos livros canônicos do NT já compilada ou a primeira lista tal
como existe hoje?
O mesmo se aplica em relação às discussões terminológicas. Por
exemplo, a respeito do termo cânon, Gamble afirmou: “É importante
observar que a palavra ‘cânon’ não começou a ser aplicada a escritos
cristãos até meados do século IV”.48 Isso é problemático pelas seguintes
razões: Argumentar que não havia nenhum conceito de cânon nos séculos
anteriores em função da presença ou ausência da palavra cânon é um
argumento do silêncio notoriamente difícil de ser provado. Na verdade, o
argumento constitui um exemplo de uma falácia semântica que deixa de
considerar a possibilidade de que outra expressão ou conjunto de termos
possa ter sido usado para comunicar o conceito que mais tarde foi chamado
de “cânon”.49
Um terceiro problema surge com relação à importância depositada em
vozes discordantes. Qual deve ser o peso daqueles que receberam um livro
em oposição àqueles que o rejeitaram ou, na verdade, à simples notação de
que alguns rejeitaram ou, mais frequentemente, contestaram a canonicidade
de determinado livro? Deve-se extrapolar a partir dessas discussões uma
coleção das Escrituras não concluída? Se vozes discordantes neutralizam o
consenso geral difundido, ainda não haveria um cânon hoje, nem nunca
houve um cânon bíblico, seja do AT ou do NT. Alguém em algum lugar
sempre contestou e sempre contestará determinado livro frequentemente
por menos do que razões convincentes.50 Se unanimidade, ao invés de
consenso, for exigida, então não há esperança de alguma vez se ter um
cânon das Escrituras.
Assim, estudos recentes têm sido úteis para levantar questões
importantes sobre o cânon do NT, mas parecem ter se dirigido em grande

61
parte na direção errada, concentrando-se na determinação final e no
fechamento do cânon do NT pelos concílios da igreja, enquanto diminuíam
indevidamente a importância dos desenvolvimentos anteriores no processo
de canonização. Por essa razão, o entendimento evangélico convencional
continua a ser preferido. Na verdade, uma análise mais aprofundada sugere
que a visão tradicional pode conceder até mais do que o necessário ao situar
o fechamento do cânon em uma data posterior à que pode ser justificada
pela evidência disponível. Como veremos a seguir, há boas razões para
acreditar que o cerne do cânon do NT foi estabelecido pelo menos em
meados do segundo século, se não antes.51

A Evidência de um Cânon Primitivo dos Livros


Centrais do NT
O Evangelho quádruplo
Mesmo antes de os Evangelhos serem escritos, houve um intenso interesse
pelas palavras e pelos feitos de Jesus por parte da igreja. J. D. G. Dunn
argumentou que as tradições orais pré-evangélicas já estavam funcionando
como cânon no primeiro século.52 Ele certamente estava correto quando
afirmou que “foi a autoridade que ela [a tradição do Evangelho] já tinha o
que assegurou que ele fosse relatado”.53 Sua conclusão foi que “o processo
canônico começou com o impacto provocado pelo próprio Jesus”.54
Não foi muito tempo depois do ministério terreno de Jesus que os
Evangelhos Sinóticos foram escritos (provavelmente, todos foram escritos
antes da queda de Jerusalém em 70 d.C.). Originalmente, os quatro
Evangelhos se disseminaram de forma independente um do outro. Seus
status individuais como Escritura normalmente não são discutidos. Se a

62
coleção de Evangelhos deveria ser limitada a esses quatro ou não, é outra
questão. Há cerca de trinta evangelhos conhecidos que apareceram antes do
ano 600,55 mas nenhum foi tão popular quanto os Evangelhos canônicos.56
Somente esses quatro foram reconhecidos porque, como Serapião (falecido
em 211) e outros disseram, eles foram “legados” à igreja.57 Os outros
Evangelhos foram rejeitados com o argumento de que eles não
concordavam com os quatro Evangelhos canônicos comumente aceitos. Isso
implica não apenas antiguidade, mas também a autoridade dos
transmissores.58
A coleção dos Evangelhos, e até mesmo toda a ideia de um cânon, é
frequentemente atribuída a uma reação à rejeição de Marcião de todos os
Evangelhos do NT, exceto Lucas.59 Hoje, a maioria não está tão certa que
Marcião é digno de tanto crédito, mas muitos ainda veem o seu cânon como
uma influência importante na formação do NT.60 Mais importante, o cânon
de Marcião muito provavelmente pressupunha uma grande porção do
presente cânon.61 Ferguson observou que o contemporâneo de Marcião, o
professor gnóstico Basílides (c. 117-138), “é o nosso testemunho completo
mais antigo do Novo Testamento como escritura, mas a maneira espontânea
pela qual fala mostra que ele não foi o primeiro a fazer isso e estava
refletindo o uso comum”.62 Um contemporâneo ortodoxo de Marcião,
Justino Mártir (c. 100-165), escreveu sobre os Evangelhos (“as memórias
dos apóstolos”) sendo lidos nas igrejas ao lado dos Profetas.63 Essa
referência tem um impacto não só sobre o culto de adoração na igreja
primitiva, mas também indica o status conferido aos quatro Evangelhos.64
Eles eram Escrituras no mesmo nível do AT.
Nesse contexto, a questão do formato assume significado especial.
Quando determinado grupo de documentos semelhantes é reunido, as obras

63
incluídas, por definição, constituem os limites da coleção. No que diz
respeito aos Evangelhos, a criação do códice quádruplo do Evangelho diz
tanto sobre os limites do cânon do Evangelho quanto sobre os Evangelhos
escolhidos para inclusão. Em vez de atribuir a data da coleção do
Evangelho ao final do segundo século, pode muito bem ser que os
Evangelhos canônicos estivessem circulando como uma unidade desde o
início do século II.
Não se sabe se os Evangelhos de Justino estavam unidos em um único
códice, mas esses quatro Evangelhos apostólicos estavam sendo lidos nas
igrejas.65 O que se sabe é que ao final do segundo século, o quádruplo
códice do Evangelho era comum.66 Ireneu (c. 130-200) talvez seja o nosso
mais forte testemunho patrístico do Evangelho quádruplo. Para ele, os
Evangelhos formavam uma unidade quádrupla. Na verdade, Ireneu preferiu
o singular “Evangelho” ao plural “Evangelhos”.67 Embora essa seja sem
dúvida uma convicção teológica, pode muito bem ser refletida no arranjo
familiar físico para o teólogo. Ireneu declarou que os Evangelhos são
precisamente quatro em número, comparando-os com os quatro ventos, as
quatro criaturas angélicas de Ezequiel e as quatro alianças de Deus (Contra
Heresias 3.11.8).
Seu argumento é frequentemente entendido como limitando o número
de Evangelhos a apenas “estes quatro e nenhum mais”,68 mas isso é apenas
parte do que Ireneu estava procurando estabelecer. O ponto de Ireneu era
que havia quatro Evangelhos canônicos — nem mais nem menos. Ele
castigou os ebionitas por usarem apenas Mateus; os docetistas por usarem
apenas Marcos; os marcionitas por usarem apenas Lucas, e os valentinianos
por preferirem João e audaciosamente criarem um Evangelho da Verdade.
Na verdade, Ireneu escreveu mais sobre aqueles que reduziam o número de

64
Evangelhos no cânon do que sobre aqueles que aumentavam o seu número,
o que pressupõe uma coleção fixa dos Evangelhos em ambas as direções.
T. C. Skeat persuasivamente argumentou que a comparação de Ireneu às
quatro criaturas de Ezequiel é tanto uma citação de uma obra anterior
quanto uma discussão sobre a ordem dos Evangelhos. Se assim for, ele
acertadamente chegou à seguinte conclusão: “Qualquer questão sobre a
ordem dos Evangelhos somente faz sentido quando os quatro são reunidos
em um único volume, que deve ser um códice, uma vez que nenhum rolo,
por mais econômica que seja sua escrita, poderia conter todos os quatro
Evangelhos”.69 Como mencionado, Ireneu se refere a um códice de quatro
Evangelho. Assim, é mais do que apenas um ponto abstrato quando ele
declarou que o Evangelho era, em sua própria essência, “quádruplo”.70
Além disso, ele concluiu: “Agora, essas coisas sendo assim, todos estes
[homens] são vãos, ignorantes e, além disso, também audaciosos — estes
que destroem a forma do evangelho,71 e [supondo] mais ou menos do que
foi dito, alteram a aparência dos evangelhos”72 (grifo nosso). Ao dizer isso,
ele estava se referindo não apenas aos Evangelhos apostólicos, mas muito
provavelmente a um códice quádruplo que era conhecido e bem
estabelecido na época em que ele escreveu.73 Assim, essa coleção de
Evangelhos provavelmente teve um arquétipo muito antigo, possivelmente
meio século antes de Ireneu.
Há ampla evidência manuscrita de uma coleção quádrupla Evangelhos
do século III em diante.74 Todos esses têm diferentes ancestrais, o que
parece sugerir uma origem de pelo menos meados do segundo século.75 Na
verdade, pode haver evidências para esse efeito do final do século II. Skeat
argumentou que 4
, 64
e 67
(datados de c. 200) eram todos originalmente
do mesmo códice, e que esse códice deve ter tido um arquétipo nos

65
primórdios do segundo século.76 Ele, nas outras partes da obra, propôs que
esse códice de quatro Evangelhos foi a razão pela qual os primeiros cristãos
preferiram o códice, e não o rolo. Se assim for, a escolha pelo códice foi
uma decisão teologicamente orientada. Embora fosse possível incluir esses
quatro Evangelhos em um códice, colocá-los no mesmo rolo teria sido
impossível.77 Essa é uma das mais intrigantes e plausíveis peças de
evidências que mostram a preferência cristã pelo códice nos primeiros dias
da igreja.
Embora uma dúzia ou mais de “Evangelhos” heréticos pudesse estar
circulando no segundo século, a evidência do manuscrito está dizendo, em
relação a esses Evangelhos, quais a igreja considerou canônicos. Primeiro,
sempre que há evidências de manuscrito de mais de um Evangelho que
inclui um Evangelho canônico, o outro Evangelho era canônico também.
Isso significa que nenhum Evangelho não canônico aparece ligado a um
evangelho canônico, portanto, não há evidência para Mateus-Tomé ou
Lucas-Pedro, por exemplo. Isso poderia indicar, de modo geral, que a
questão de outros Evangelhos terem o mesmo status de Escrituras era um
ponto de discussão entre os ortodoxos.78 Segundo, as evidências de
manuscritos para os Evangelhos não canônicos são incrivelmente escassas
quando comparadas ao número de manuscritos gregos dos Evangelhos
canônicos. Por exemplo, conhece-se apenas uma cópia completa do
Evangelho de Tomé (e dois fragmentos de outras edições). As evidências
apontam para o fato de que os Evangelhos apócrifos nunca tiveram um
grande público entre os ortodoxos ou rapidamente caíram em desuso.
Não se sabe exatamente quando os quatro Evangelhos foram
organizados pela primeira vez da forma como os conhecemos. No entanto,
os limites externos podem ser deduzidos. A metade do segundo século

66
parece ser a última data possível, dadas as evidências patrísticas e de
manuscritos. Por outro lado, o limite é definido pela composição do último
Evangelho, muito provavelmente o de João (datado na década de 80 ou 90).
Assim, algum tempo entre a produção do Evangelho de João e meados do
segundo século, o status desses Evangelhos estava tão arraigado que eram
unidos e divulgados em conjunto. Isso, de todo modo, deve ser entendido
como prova do reconhecimento da igreja de que o número dos Evangelhos
foi fixado e fechado no início, ou pelo menos na metade do século II.

A coleção das cartas paulinas


Sabe-se também que as cartas de Paulo circularam juntas como uma
coleção unitária. A questão que se coloca é: Como essa coleção se
originou? Kümmel é o representante da principal linha acadêmica ao
assumir que as cartas de Paulo eram uma coleção e (até certo ponto) uma
produção do final do primeiro século, visto que as cartas eram
gradualmente reunidas em uma coleção.79 Porter astutamente observou:
“Não se pode deixar de pensar que a teoria da coleção gradual […] é uma
conveniência, projetada para tecer uma narrativa em torno das diferentes
evidências dos primeiros quatro séculos, mas sem uma base sólida
estabelecida para a forma como esse processo realmente ocorreu”.80
Além disso, o tempo entre a morte de Paulo (entre o meio e o final dos
anos 60) e as referências históricas a essa coleção é curto demais para ser
explicado por uma coleção gradual. Quando da produção de 2Pedro
(meados dos anos 60?), é provável que havia pelo menos o começo de uma
coleção das cartas de Paulo. Por volta de 96, Clemente de Roma observou
que Paulo escreveu “verdadeiramente sob a inspiração do Espírito”

67
(1Clemente 47.3). Policarpo (c. 69-155) citou com base em um conjunto de
textos das Escrituras que deve ter incluído a coleção de cartas paulinas.
Finalmente, Marcião, na primeira metade do segundo século, ao formular
seu truncado cânon, editou uma estabelecida coleção de cartas paulinas.
Quaisquer que sejam as circunstâncias, pode ser demonstrado que a forma
básica da coleção circulou rapidamente nas igrejas como Escritura. Além
disso, a evidência dos manuscritos parece mostrar que, se houve “coleções
locais”, a coleção completa foi rapidamente preferida.
Então, como tal coleção veio a existir? Há uma série de “teorias de
envolvimento pessoal” (termo de Porter), para explicar as origens dessa
coleção. Quer Onésimo, Marcião, Lucas, Timóteo ou uma “escola paulina”
sejam creditados com a compilação de uma coleção de cartas paulinas, o
envolvimento pessoal é o denominador comum. A maioria dessas hipóteses,
no entanto, é baseada em julgamentos especulativos e muitas vezes
questionáveis.81 Não obstante, parece inquestionável que uma personalidade
estivesse envolvida pela própria natureza do que resultou: uma coleção.82
Hoje, muitos estudiosos sugerem que essa pessoa não poderia ter sido
ninguém menos que o próprio Paulo. Pelo que se conhece das antigas
coleções de cartas, o autor muito provavelmente teria feito uma cópia da
carta de imediato, guardado uma cópia para si mesmo e enviado uma cópia
ao destinatário. Tanto as coleções de cartas de Cícero quanto de Inácio
começaram dessa maneira.83 Essa não só era uma prática conhecida, mas é
pouco provável que Paulo teria enviado uma carta sem guardar uma cópia
para si mesmo.84
Trobisch defendeu três estágios de desenvolvimento da coleção de
cartas antigas, com o autor se envolvendo apenas na primeira fase. A
segunda e terceira fases foram sendo progressivamente removidas do

68
autor.85 Como Porter demonstrou, entretanto, essa não é uma conclusão
necessária.86 Embora possa haver evidência de alguma edição e arranjo da
edição (principalmente nos títulos e na ordem das cartas), parece provável
que a coleção tenha se originado das cópias retidas por Paulo. A coleção de
cartas, ou pelo menos o início dela, pode ser mencionada em 2Tm 4.13,
onde Paulo escreveu a Timóteo: “Quando vieres, traze-me a capa que deixei
em Trôade, na casa de Carpo, e os livros, principalmente os pergaminhos”.
A palavra traduzida como “pergaminhos” (membrana) é, na verdade, uma
palavra latina transliterada em grego e pode indicar um códice de
pergaminho.87 Uma vez que a coleção de cartas paulinas não caberia em um
rolo, é provável que a coleção de cartas estivesse no formato de códice.88
A decisão de publicá-la envolvia organizar as cartas e atribuir títulos a
elas. Trobisch bem observou que a coleção paulina regular e
invariavelmente intitulava as cartas “Aos Romanos”, “Primeira aos
Coríntios”, “Segunda aos Coríntios” e assim por diante.89 Essa foi muito
provavelmente uma decisão editorial tomada quando as cartas foram
coletadas — talvez até mesmo pelo próprio Paulo. Além disso, o arranjo é
principalmente consistente nos manuscritos, na ordem básica na qual as
cartas de Paulo encontram-se hoje no NT. Mais uma vez, essa foi
provavelmente uma decisão editorial. O fato de que as cartas circularam
amplamente nesse arranjo pareceria sugerir que a edição foi feita com a
publicação em mente.
Então, quem foi esse editor? Poderia ter sido o próprio Paulo, uma
possibilidade nem requerida e nem falsificada pelas limitadas evidências
disponíveis. Outra possibilidade é que o editor tenha sido um dos
colaboradores mais próximos do apóstolo e provavelmente teria tido acesso
a cópias retidas por ele. Muito provavelmente, a contribuição do editor para

69
o conteúdo das cartas foi mínima, e a coleção, publicada pouco depois da
morte de Paulo, teve rápida aceitação em todas as igrejas. Assim, há todas
as razões para se acreditar que as cartas de Paulo alcançaram status
canônico o mais tardar no último quarto do primeiro século.
Embora não seja possível aqui identificar todos os indivíduos e detalhar
todas as fases da produção, a evidência até agora sugere um
reconhecimento precoce da parte principal do cânon do NT. Um cenário
como o seguinte parece viável. Os Evangelhos Sinóticos foram escritos e
receberam rápida aceitação nas igrejas como a fonte digna de crédito das
palavras de Cristo. De modo geral contemporânea a eles, as cartas de Paulo
começaram a circular como uma coleção, provavelmente logo após a morte
de Paulo. Essas cartas foram recebidas imediatamente e dispunham, de fato,
de status canônico.90 Pouco tempo depois da redação do Evangelho de João,
os Evangelhos foram reunidos e publicados como um cânon quádruplo do
Evangelho.91

QUADRO 1.3: A “EDIÇÃO CANÔNICA” DO


NOVO TESTAMENTO
D. Trobisch desenvolveu uma teoria fascinante em relação ao cânon
do NT. Em essência, Trobisch entende o NT como um livro publicado
no mais tardar na metade do segundo século. Trobisch primeiramente
atribuiu essa “edição canônica” do NT a “editores” anônimos, no
início do século II.1 Mais tarde, ele a atribuiu a Policarpo em algum
momento entre 156 e 168.2 Isso, naturalmente, deve datar a “edição
canônica” do NT um pouco mais tarde.3 Embora a evidência interna
que Trobisch reúne seja frequentemente menos do que convincente

70
4
devido à natureza precária de alguns de seus pressupostos, o elemento
mais convincente da proposta Trobisch é a evidência empírica do
manuscrito.
Trobisch observou seis fenômenos nos manuscritos que apontam
para um antigo arquétipo. Talvez os mais atrativos sejam os dois
primeiros. Se estiver correto, isso se referiria a duas das mais
incômodas perguntas sobre a transmissão da Bíblia que ainda não
receberam uma resposta plenamente satisfatória. Primeiro, a maioria
dos manuscritos bíblicos exibe os nomina sacra, abreviações dos
nomes divinos. Essas abreviações consistem geralmente na primeira e
última letras da palavra equivalente a Deus (theos), Jesus (Iēsous), ou
o Espírito (pneuma) com uma linha acima delas para indicar a
abreviação. Esses nomina sacra são encontrados até mesmo nos
manuscritos mais antigos.5 Ninguém explicou sua existência difundida
de forma satisfatória. Como essas abreviaturas dos nomes divinos se
tornaram tão difundidas nos manuscritos mais antigos, se não havia
nenhum mecanismo religioso para controlar a cópia e nenhum
arquétipo original? A resposta de Trobisch é que os nomina sacra
foram resultado de uma decisão editorial tomada na primeira edição.
Essa “edição canônica”, então, era tão popular que se tornou
rapidamente o padrão no mundo cristão.
A segunda pergunta sem resposta abordada pela proposta de
Trobisch pertence ao surpreendente uso do formato códice pelos
primeiros cristãos. Já foi observado que várias teorias foram propostas
para o uso do códice na literatura cristã primitiva. Nenhuma dessas
teorias, porém, recebeu aceitação universal. A resposta de Trobisch é
que o códice foi a escolha dos editores da edição canônica

71
presumivelmente por causa de uma variedade de benefícios
concedidos pelo códice, sendo o mais óbvio o de fornecer o espaço
necessário para acomodar mais facilmente essa grande coleção de
escritos.
A terceira peça de evidência para uma edição canônica é a própria
circulação das unidades. Há uma surpreendente conformidade dos
manuscritos até o século VII, em matéria de conteúdo e ordem. O NT
circulava em quatro volumes menores: o códice do Evangelho
quádruplo, Atos e as Epístolas Gerais; as cartas de Paulo (incluindo
Hebreus); e Apocalipse. Essa ordem pode ser vista nos manuscritos
mais antigos (i. e., antes dos concílios da igreja nos séculos IV e V).
Quarto, os títulos dos livros nas coleções são incrivelmente
uniformes. Essa uniformidade visual também sugere algum tipo de
ação coordenada desde cedo no processo canônico. A uniformidade de
títulos e arranjos das cartas de Paulo já foi notada acima. De modo
semelhante, os títulos dos Evangelhos são sempre alguma forma de
“Segundo Mateus”, “Segundo Marcos” e assim por diante. “Os Atos
dos Apóstolos” apropriadamente capturam a essência desse livro. Os
títulos das Epístolas Gerais são diferentes dos das cartas de Paulo,
embora também exibam um notável grau de uniformidade, seguindo o
formato “Primeira de João”, “Segunda de João”, “Terceira de João”,
“Primeira de Pedro” e assim por diante. O fato de que essas cartas
foram escritas por vários autores diferentes torna provável que a
coleção e atribuição de títulos deles tenha sido resultado de uma
decisão editorial.
Finalmente, o título de toda a coleção é “A Nova Aliança”. Esse é
o termo para a coleção usado por Ireneu (c. 130–c. 200); Clemente de

72
Alexandria (c. 150–c. 215); Tertuliano (c. 160–c. 225); e Orígenes (c.
185–c. 254). Talvez a afirmação mais convincente seja do sócio
desconhecido de Apolinário (séc. II): “Eu estava um pouco relutante,
não por qualquer falta de habilidade para refutar a mentira e testificar a
verdade, mas pela timidez e escrúpulos, temendo que eu pudesse
parecer a alguém como que adicionando aos escritos ou injunções da
palavra da nova aliança do evangelho, ao qual ninguém que tenha
escolhido viver de acordo com o próprio evangelho pode adicionar e
do qual nada pode tirar”.6 Dessa citação, é aparente que esse presbítero
no segundo século tinha um cânon fechado que ele chamava de “os
escritos da nova aliança do Evangelho”.
Como mencionado, as reconstruções internas de Trobisch com
relação ao propósito e à produção do NT são muito menos
convincentes. Para ele, o NT é, de modo geral, o resultado do conflito
da igreja com Marcião. Assim, os editores incluíram a LXX;
adicionaram as Epístolas Gerais e incluíram Atos com o objetivo de
reabilitar Pedro e Paulo. A ideia de que Marcião assume posição
central é o calcanhar de Aquiles dessa teoria. Como discutido acima, a
influência de Marcião no cânon do NT muito provavelmente foi
menos pronunciada do que se costuma supor e é quase certo que não
afetou os contornos específicos de qualquer coleção de escritos do NT.
A identificação de Policarpo como o editor da edição canônica,
também é problemática. A citação de grande parte do NT — incluindo
as Epístolas Pastorais — como Escritura em sua carta aos Filipenses
trinta anos antes de Marcião torna improvável que a edição canônica
fosse sua criação. Surge também a questão de saber se Policarpo
poderia ter tido a autoridade eclesiástica para publicar uma obra que

73
substituía todas as cópias anteriores dos escritos do NT. Isso é bastante
improvável. Por exemplo, Policarpo não poderia fazer a igreja em
Roma celebrar a Páscoa cristã na Páscoa judaica.
Em última análise, Trobisch não respondeu definitivamente à
questão da formação do cânon do NT. No entanto, ele fez uma
importante contribuição para a compreensão do antigo processo de
canonização. O formato de códice, a presença constante dos nomina
sacra e os títulos quase uniformes dos escritos pelo menos sugerem
uma tendência de convenção que se originou em algum lugar. Não é
necessário concluir que essa convenção foi devida a uma edição
canônica. Ela pode muito bem ter começado com uma coleção e pode
ter sido rapidamente introduzida em outras coleções.
Há mais um argumento defendido por Trobisch que vale a pena
considerar. Muitas vezes se afirmou que o cânon estava em processo
até o século IV, quando foi amplamente estabelecido. A lista de
Eusébio em sua obra História Eclesiástica reconhece algumas dúvidas
em relação a determinados livros no cânon do NT. Essa lista é
frequentemente citada como evidência de um estado de contínua
turbulência desde o início. Mas seria necessariamente esse o caso?
Poderia ser que as perguntas não fossem sobre quais livros deveriam
ser incluídos no cânon, mas sim sobre quais os livros foram
primeiramente colocados no cânon? Em outras palavras, a discussão
de Eusébio a respeito dos diferentes livros incluídos no cânon do NT
pode constituir uma discussão do século IV, em vez de indicar um
fluxo contínuo de dúvidas do século I ou II em diante. Na verdade,
alguns dos reformadores do século XVI tinham questões semelhantes
sobre o cânon.7

74
1
D. Trobisch, The First Edition of the New Testament (Oxford: University Press, 2000), p.

5-6.
2
D. Trobisch, “Who Published the New Testament?” Free Inquiry 28 (dez. 2007/jan.

2008), p. 33.
3
Manifestamente, evidência para os livros do NT que Trobisch considera como forjadas

na época da publicação (a saber, as Epístolas Pastorais) pré-datam essa proposição. Tentativas

de descrever essas citações como fragmentos pré-literários têm o sinal de alegação especial e

são, portanto, improváveis.


4
Veja L. S. Kellum, “Review of D. Trobisch, The First Edition of the New Testament”,

Faith & Mission 18/2 (2001), p. 84-87.


5 52
L. W. Hurtado, “ (P. Rylands Gk. 457) and the Nomina Sacra: Method and

Probability,” TynBul 54 (2003), p. 13. Hurtado sugeriu que os nomina sacra muito
52
provavelmente apareceram em nosso mais antigo manuscrito existente do NT, o

mencionado acima.
6
Eusébio, Hist. Ec. 5.16.3.
7
W. Walden, “Luther: The One Who Shaped the Canon,” ResQ 49 (2007), p. 1-10.

Em relação à maneira pela qual Atos e as Epístolas Gerais foram


reunidas e publicadas, e por quem, menos pode ser dito com confiança. No
entanto, é provável que a coleção desses livros estivesse de alguma forma
relacionada ao códice do Evangelho quádruplo, pois foi nesse ponto que
Lucas e Atos foram muito provavelmente separados.92 É possível (embora
extremamente incerto) que a mesma pessoa ou pessoas tenha(m) sido
responsável(is) pela coleção desses vários textos. Finalmente, o Livro de
Apocalipse, escrito entre meados e o fim dos anos 90 pelo envelhecido
apóstolo João, circulou de forma independente do restante, provavelmente
devido à sua produção tardia. Essa reconstrução, propositadamente pintada

75
com grosseiras pinceladas, tem seu ponto de partida no inegável fato da
precoce recepção dos documentos do NT.

A ordem atual dos livros do NT


A coleção dos Evangelhos canônicos e das cartas paulinas, bem como o
agrupamento de Atos e as Epístolas Gerais e a circulação separada do livro
de Apocalipse, foram discutidas anteriormente. A questão final que precisa
ser brevemente abordada é a atual ordem dos livros do NT. Como a ordem
existente ocorreu, e qual, se é que há alguma, a importância teológica e
interpretativa da ordem atual dos escritos do NT?
Uma tese poderia ser defendida para a ordem encontrada na Carta
Pascal de Atanásio (também conhecida como a ordem grega ou oriental),
como Trobisch e outros fazem.93 Essa ordem pode muito bem refletir as
unidades da antiga coleção. Contudo, mesmo entre as unidades da coleção
houve certo grau de fluidez. Os manuscritos do códice do Evangelho
quádruplo existem em ordens diferentes. Outro caso em questão é a
colocação do livro de Hebreus, que parece “viajar” pelos manuscritos, com
a maioria deles colocando-o entre as cartas para as igrejas e as cartas a
indivíduos (ou seja, entre 2Tessalonicenses e 1Timóteo). No entanto, o
manuscrito mais antigo contendo a coleção de cartas de Paulo ( ) coloca
46

Hebreus imediatamente após Romanos. Isso não é inesperado em uma


antologia como a do NT, sendo copiada a mão. Cada copista pode ter
sentido certo grau de liberdade para organizar seu exemplar como bem
entendesse. Isso é ainda mais provável no caso de cópias pessoais.
A ordem dos livros do NT em nossas bíblias atuais reflete a ordem
ocidental encontrada na Vulgata (traduzida por Jerônimo), mas têm

76
precursores que remontam à antiga tradução italiana.94 Em essência, ela
difere da ordem oriental apenas na questão da colocação das Epístolas
Gerais após a coleção das cartas de Paulo e Hebreus entre as duas coleções.
Muitos manuscritos gregos do final do período bizantino seguem essa
ordem também. Lutero partiu dessa ordem, colocando Tiago e Hebreus no
final da Bíblia (e assim, concedendo-lhes status inferior, o que implica um
cânon dentro do cânon), juntamente com Judas e Apocalipse. Tyndale fez o
mesmo — embora possivelmente não pelas mesmas razões — em sua
versão inglesa, assim como Coverdale, Bíblia de Matthew e outros. No
entanto, quando a Grande Bíblia de 1539 foi impressa, a ordem ocidental
foi restaurada.95 Ela tem sido a ordem básica para as bíblias que surgiram
desde então.96
Os Evangelhos no início do NT fazem a transição do AT de uma forma
bem sutil. Essa localização dos Evangelhos na Bíblia indica sua natureza
fundamental. Praticamente nenhum arranjo do NT começa em outros locais.
A localização de Mateus como o primeiro entre os Evangelhos é, muito
provavelmente, pelo menos em parte, em função da abertura do livro com a
genealogia de Jesus, que oferece uma introdução natural à apresentação de
Cristo nos quatro Evangelhos canônicos como um todo. O Evangelho de
Lucas, embora apresente uma genealogia em 3.23-37, coloca-a
imediatamente antes do início do ministério público de Jesus, em vez de no
início do livro.
Além disso, não há razão para supor que a ordem dos Evangelhos
Sinóticos (Mateus, Marcos, Lucas) é uma indicação necessária da ordem de
sua composição, assim como a ordem das cartas paulinas (Romanos,
1Coríntios, 2Coríntios, Gálatas etc.) manifestamente não é uma função da
sequência cronológica de sua composição, como é universalmente

77
reconhecido. Por outro lado, é provável que a colocação do Evangelho de
João, o último entre os quatro Evangelhos canônicos, indique sua
composição mais tardia. Mais importante ainda, o final do Evangelho de
João certamente fornece uma conclusão adequada, não só para o Evangelho
de João, mas para os quatro Evangelhos canônicos, na sua totalidade (veja
21.24,25).97
Atos certamente preenche a lacuna entre os Evangelhos e as Cartas.
Como uma continuação de Lucas, ele continua a narrativa das realizações
de Cristo (cf. At 1.1) e fornece a base para uma compreensão básica de
Paulo e de suas correspondências. Qualquer um que estude as cartas sem
um conhecimento do livro de Atos estaria em falta de uma estrutura
adequada para interpretação. Quem é esse Paulo que escreveu essas cartas?
Quando Tiago se tornou um líder na igreja de Jerusalém? Quando o
evangelho se espalhou para os gentios? Essas e outras perguntas são
respondidas quando se lê Atos primeiro. Seu lugar sempre foi entre os
Evangelhos e as Cartas.
No que diz respeito à ordem das cartas paulinas, parece que ao invés da
ordem cronológica de escrita, foi a extensão do documento, para a maior
parte, que se revelou decisiva na colocação pela igreja dessas cartas em
ordem canônica.98 Isso leva a uma dinâmica interessante na interpretação.
Romanos, lido na ordem do cânon, precede Gálatas e assim é, do ponto de
vista canônico, fundamental para esta. Cronologicamente, no entanto,
Gálatas precedeu Romanos e cristalizou as questões em um estágio anterior
ao desenvolvimento da igreja primitiva, questões essas que continuaram a
ser abordadas numa fase posterior do ministério de Paulo.
Mas não é preciso escolher entre as duas dinâmicas da história e do
cânon. Ambas são importantes no que diz respeito à nossa abordagem da

78
Bíblia. O leitor que conhece ambas as dinâmicas compreendem, por
exemplo, a importância cronológica de Gálatas e canônica de Romanos.
Gálatas é a primeira das cartas de Paulo, o que mostra que sua teologia
cristã, longe de evoluir e mudar, foi basicamente a mesma desde a primeira
99
até a última carta. O fato de Romanos se encontrar no início das cartas
paulinas começa a terceira seção do NT (as Cartas) com a mais prolongadas
e claras exposições do evangelho de Deus em todo o NT. Sua posição aqui
certamente faz sentido. Tendo em conta que Paulo pode muito bem ter sido
o primeiro a reunir suas próprias cartas, é mesmo possível que essa ordem
reflita a sequência escolhida pelo próprio apóstolo.
Quanto à ordem das Epístolas Gerais, parece que Hebreus deve o seu
lugar, a primeira nessa coleção e em proximidade imediata às cartas
paulinas à tradicional atribuição da autoria de Paulo ou de um membro do
“círculo paulino”. Naturalmente, 1 e 2Pedro são agrupados, como são 1, 2 e
3João. Além disso, é incerto o que historicamente levou os compiladores a
colocar os escritos na ordem Tiago, 1 e 2Pedro, 1 e 3João e Judas. No
entanto, esse arranjo é consistente nos manuscritos desde o início.

QUADRO 1.4: E SE UMA DAS CARTAS


PERDIDAS DE PAULO AOS CORÍNTIOS
FOSSE ENCONTRADA HOJE?
Um conjunto de perguntas que às vezes é feito é: E se uma das
cartas perdidas de Paulo aos coríntios fosse encontrada hoje? Deveria
a igreja acrescentá-la ao cânon do NT? Baseada em que essa decisão
deveria ser tomada? Enquanto uma forte argumentação pode ser feita
contra a inclusão de documentos não apostólicos (como o Evangelho

79
de Tomé) no cânon da Escritura, e se o documento em questão fosse
um autêntico documento apostólico? Ele não deveria ser incluído no
cânon? Em suma, pode-se fazer uma argumentação tão forte que até
mesmo em um cenário hipotético como esse a resposta correta seria
não.
Sem dúvida, seria apropriado guardar esse documento como
historicamente importante, e certamente seria apropriado usá-lo para
ajudar a interpretar os documentos do NT existentes. Uma série de
questões historicamente importantes poderia ser respondida se
tivéssemos a “carta anterior” de 1Coríntios 5.9 ou a “carta dolorosa”
de 2Coríntios 7.8. Isso também ajudaria a decidir a origem de várias
teorias de crítica da fonte ou de rearranjo sobre 1 e 2Coríntios.1
Contudo, ainda há boas razões do porquê essas cartas, se descobertas,
não deveriam ser acrescentadas ao cânon do NT.
Primeiro, como Grudem destaca, o fato de essas cartas, ou
quaisquer outros documentos apostólicos perdidos agora, estarem
ausentes da coleção do cânon desde o início sugere que, por alguma
razão, os apóstolos — e, em última instância, Deus o Espírito Santo —
não julgaram adequado preservar esses documentos.2 Isso é
especialmente verdade se for o caso em que o próprio apóstolo Paulo
está por trás da produção de sua coleção de cartas. Se esse documento
tivesse sido preservado, ele teria sobrevivido — não pelo intento
apostólico, mas porque alguém mais o preservou quando os apóstolos
não o fizeram.
Segundo, a soberania de Deus na formação do NT deve ser
reconhecida. Se ele não considerou adequado fornecer a carta em dois
mil anos de história cristã, por que alguém suporia que uma nova carta

80
deve ser adicionada ao cânon das Escrituras agora? Ainda mais, em
certo sentido, o acréscimo de outro documento poderia minar a
confiança dos fiéis na suficiência das Escrituras. Em tal caso, o cânon
não estaria realmente fechado, mas apenas provisoriamente fechado.
Na medida em que a determinação do cânon foi um processo histórico
que está ligado aos primeiros séculos da igreja, essa era está para
sempre no passado.
Finalmente, a discussão acima assumiu, por causa do argumento,
que tal documento poderia ser verificado, mas, na verdade, isso é
altamente improvável. Com toda probabilidade sempre haveria
questões intermináveis em torno da autenticidade de tal documento.3
Não é difícil imaginar que haveria uma gama de opiniões, dissertações
e monografias defendendo a autenticidade ou a não autenticidade de
tais documentos, além da discussão continuada em revistas
acadêmicas. Se os estudiosos não conseguem chegar a um consenso
sobre o livro de Efésios, que faz parte do cânon do NT existente, é
improvável que eles chegassem a um consenso sobre um “novo” livro
apostólico.4
Por razões como essas, não é apenas altamente improvável que tal
documento jamais será encontrado, mas mesmo que ele fosse
descoberto, há vários argumentos de peso contra sua inclusão no
cânon da Escritura. Esse documento deveria ser avaliado e poderia
certamente ser usado com proveito, mas não a ponto de expandir o
cânon existente da Escritura. A Bíblia é completa como está, e o cânon
está fechado e não precisaria ser reaberto, mesmo que uma das cartas
perdidas de Paulo aos coríntios ou qualquer outro documento escrito
por um dos apóstolos fosse encontrado hoje ou amanhã.

81
1
Veja a discussão no capítulo 12.
2
W. Grudem, Systematic Theology: An Introduction To Biblical Doctrine (Grand Rapids:

Zondervan, 1994), p. 68 (o número de páginas é o mesmo na edição de 2000).


3
Ibid.
4
Há outra questão relacionada: “Quem tomaria a decisão de incluir, por exemplo,

3Coríntios no cânon do NT?” É difícil enxergar como poderia ser encontrado. um mecanismo

pelo qual todos os cristãos (ou pelo menos uma maioria considerável de cristãos) tomariam

uma decisão tão importante.

Sem ser dogmático, certas observações podem ser feitas. O próprio livro
judaico de Tiago se ajusta muito bem ao lado do livro de Hebreus, enquanto
1, 2 e 3João sustentam certa quantidade de intertextualidade com as cartas
para as igrejas no livro de Apocalipse. Finalmente, Judas, com suas
referências apocalípticas, certamente prepara bem o leitor para o
Apocalipse.
O livro de Apocalipse é uma conclusão adequada para toda a Bíblia, e
não apenas para o NT.100 O assunto do retorno de Cristo e o triunfo do
Cordeiro sobre todo o mal não é apenas apropriado como a mensagem final
do NT, mas há um belo inclusio com Gênesis também. O estado final,
conforme registrado em Apocalipse, é em muitos aspectos um retorno ao
Éden (veja Ap 22.1-5). Há cura para as nações. Não existe mais uma
maldição sobre a terra e seus habitantes. A árvore da vida está uma vez
mais à vista dos seres humanos, embora não haja nenhuma árvore do
conhecimento do bem e do mal. Em Apocalipse, “o Éden não foi apenas
restaurado, mas foi elevado e ampliado para o povo de Deus na
eternidade”.101

82
Assim, há uma dupla dinâmica para se entender o NT. É importante ler
cada livro individualmente em seu próprio contexto e padrão de referência.
Nesse sentido, as questões críticas de autor, data, propósito e assim por
diante (o arranjo padrão para Introduções do NT) são importantes questões
fundacionais na interpretação do NT. No entanto, o livro também deve ser
lido dentro de sua estrutura canônica mais ampla. Dessa forma, a atenção
pode ser dada a todos os principais elementos de determinada parte de
escrita: (1) o conjunto inédito de circunstâncias históricas que ocasionou
determinado livro, (2) o desenvolvimento de sua própria narrativa ou
fluidez da argumentação; (3) temas teológicos significantes e (4) a maneira
pela qual um documento do NT particular mantém uma variedade de inter-
relacionamentos históricos, literários e teológicos com outros livros
incluídos no cânon bíblico.102

O Novo Testamento como uma coleção de


documentos da Nova Aliança
Como é que os primeiros cristãos tão prontamente receberam os novos
documentos como Escritura — na verdade, toda uma nova coleção de
materiais? Algumas das ideias de M. Kline são úteis aqui.103 Com a nova
aliança tendo sido instituída, esses fiéis podem ter ficado esperando os
documentos da Nova Aliança. O “Antigo Testamento” foi claramente
considerado como baseado em documentos da Aliança, e porções dele eram
chamadas de “o livro da Aliança” (cf. Êx 24.7; Dt 29.20; 31.9,26; 2Rs
23.2,21; 2Cr 34.30). A mesma descrição pode ser encontrada na literatura
judaica do Segundo Templo. Quando Antíoco IV tentou eliminar o
judaísmo, ele tentou destruir os livros do Antigo Testamento. Primeiro

83
Macabeus 1.56,57 relata essa tentativa: “Os livros da Lei que fossem
descobertos, eles os rasgavam e lançavam ao fogo. Onde quer que fosse
encontrado um livro da Aliança, numa casa, ou se alguém estivesse
seguindo a Lei, o decreto do rei condenava-o à morte” (grifo nosso). Assim,
tanto o próprio AT quanto os judeus posteriores consideravam o AT ou
porções dele como “livro(s) da Aliança”.
Uma vez que o estabelecimento da antiga Aliança foi acompanhado por
documentos da Aliança, pareceria ter sido razoável a expectativa de que
houvesse documentos da Nova Aliança da instituição da Nova Aliança.
Essa expectativa não só explicaria a rápida aceitação dos escritos do NT nas
igrejas, mas também o reconhecimento de que esses documentos eram
Escrituras ao mesmo nível do AT em documentos praticamente
contemporâneos (1Tm 5.18; 2Pe 3.16). Se essa avaliação for precisa, a ideia
de um cânon do NT não era a ideia de alguns cristãos do século IV, ou até
mesmo o produto de uma reação do segundo século ao truncado cânon de
Marcião. Antes, o conceito de um Novo Testamento flui organicamente do
estabelecimento de uma Nova Aliança, predito pelos profetas do AT e
instituído pelo próprio Senhor Jesus Cristo, que assim se tornou a própria
fonte não só de todas as bênçãos da salvação cristã, mas também do cânon
do NT.

Conclusão
O cânon da Escritura está, portanto, fechado. Em certo sentido, ele foi
fechado por volta de 95, quando o livro do Apocalipse foi escrito como o
último livro a ser incluído no cânon do NT. Adequadamente concebida, a
tarefa da igreja foi reconhecer o cânon dos escritos inspirados e proclamar

84
as verdades que ele continha. Isso foi o que a igreja fez e continua a fazer.
Além disso, como demonstrado, esse reconhecimento dos livros canônicos
do NT se deu muito cedo, mais cedo do que muitos estão dispostos a
reconhecer, e as diferenças de opinião com relação a livros individuais do
NT foram resolvidas através de um processo de deliberação até que se
encontrasse um consenso prático sobre o conteúdo do cânon do NT, no
século IV.

QUADRO 1.5: SERÁ QUE OS ESCRITORES


DO NOVO TESTAMENTO TINHAM
NOÇÃO DE QUE ESTAVAM REDIGINDO
AS ESCRITURAS?1
Alguns estudiosos sugeriram que os Evangelhos foram compostos
para serem lidos nas igrejas como parte de um ciclo litúrgico.2 Se
assim for, é difícil negar o ponto de vista de que eles foram destinados
a serem utilizados como Escritura, uma vez que o AT já estava sendo
lido nas igrejas dessa forma. Além disso, tanto Mateus quanto Lucas
viam a si mesmos como dando continuidade à história bíblica do AT.3
Por extensão, isso se aplica também ao livro de Atos porque Lucas e
Atos foram concebidos como uma obra em dois volumes (veja At 1.1).
Também é muito provável que João entendesse o Apocalipse como
Escritura. As visões diretas de Deus, o mandamento para que aqueles
que têm ouvidos ouvissem e a advertência de nem tirar nem
acrescentar à profecia desse livro, tudo soa como injunções
apropriadas à Escritura.

85
O fato de que todos os Evangelhos declaravam o cumprimento das
promessas do AT em Cristo também suporta a ideia de que os
escritores do NT viam a si mesmos como escrevendo a Escritura.4
Como os Evangelhos, as cartas de Paulo também deviam ser lidas nas
igrejas de acordo com a instrução explícita de Paulo (como em Cl
4.16). Parece que pelo menos Paulo considerava suas cartas como
dignas de crédito para a igreja. Embora eles possam não ter previsto o
corpo inteiro de escritos do NT, os escritores dos diversos documentos
do NT muito provavelmente entendiam suas obras dentro da acepção
mais ampla de Escritura. Assim, a expectativa por documentos da
Nova Aliança pode ter desempenhado um papel na produção do NT.

1
Para uma resposta afirmativa em relação ao Evangelho, veja D. M. Smith, “When did the

Gospels Become Scripture?” JBL 119 (2000), p. 3-20 (discurso presidencial na SBL, 1999).
2
Para Mateus, veja G. D. Kilpatrick, The Origins of the Gospel According to St. Matthew

(Oxford: Clarendon, 1950); e M. D. Goulder, Midrash and Lection in Matthew (London:

SPCK, 1974); para Marcos, veja P. Carrington, The Primitive Christian Calendar: A Study in

the Making of the Marcan Gospel (Cambridge: University Press, 1952). Para uma defesa mais

recente, veja Hengel, Four Gospels, p. 116.


3
Smith, “When did the Gospels Become Scripture?”, p. 8-10.
4
Ibid., p. 13.

A TRANSMISSÃO E TRADUÇÃO DO NOVO


TESTAMENTO: SERÁ QUE A BÍBLIA DE
HOJE É IGUAL À ORIGINAL?

86
A Bíblia foi originalmente escrita em línguas que estavam em uso na época.
O AT foi escrito em hebraico e aramaico, e o NT, em grego. As bíblias
usadas hoje são traduções das línguas originais para o português ou outras
línguas. Jesus muito provavelmente ensinou em aramaico — embora ele
provavelmente também soubesse hebraico e grego —, de modo que o
próprio NT grego representa, em sua maior parte, uma tradução dos ensinos
de Jesus do aramaico para o grego.104
A pergunta “Será que a Bíblia de hoje é igual à original?” envolve duas
questões importantes. Primeira, será que os manuscritos disponíveis da
Bíblia são representações precisas dos manuscritos originais (os autógrafos
das Escrituras) dos respectivos livros da Bíblia? Essa é uma questão de
transmissão textual. Segunda, seriam as traduções disponíveis
representações fiéis da Bíblia nas línguas originais? Essa é uma questão de
tradução.

87
Transmissão Textual: Os Manuscritos Disponíveis
são Precisos e Confiáveis?
Com relação à primeira questão, não existem autógrafos originais de
nenhum dos textos bíblicos; somente cópias estão disponíveis. A palavra
manuscrito é utilizada para designar qualquer coisa escrita à mão, em vez
de cópias feitas por máquinas impressoras.105 A evidência textual constitui
qualquer coisa escrita em tábuas de argila, pedra, osso, madeira, metais
diversos, cacos de vasos (óstracos), mas sobretudo papiros e pergaminhos
(peles de animais, também chamados velino).106
Os livros mais antigos eram compilados e, em seguida, enrolados
formando rolos.107 Uma vez que um rolo de papiro raramente ultrapassava
11 metros de comprimento, os autores antigos dividiam uma obra literária
longa em vários “livros” (p. ex., o Evangelho de Lucas e Atos dos
Apóstolos consistiam de um conjunto de dois volumes compostos por
Lucas).108 Esses foram publicados tanto por indivíduos para uso privado
quanto por profissionais para a venda. Em ambos os casos, os livros eram
copiados laboriosamente à mão.
Um dos mistérios da literatura cristã é a preferência pelo códice em vez
do rolo. Mesmo quando apenas uma página de um livro antigo é
encontrada, pode-se facilmente determinar se pertencia a um códice ou a
um rolo: o códice era escrito em ambos os lados da página. O rolo era
considerado a forma mais literária para os livros. É provável que o NT
tenha sempre circulado como um códice. A origem dessa preferência foi
sugerida por Skeat como sendo o códice do Evangelho quádruplo109 e por
Gamble, a coleção paulina.110 Em ambos os casos, a publicação de livros

88
sagrados em forma de códice foi, muito provavelmente, uma inovação
cristã.
Os livros normalmente acabam sucumbindo à ação do tempo. É comum
que eles se desgastem ou se deteriorem. Essa ação do tempo se estendeu
também aos escritos originais que compõem o NT. Embora os autógrafos
não estejam mais disponíveis, os textos originais estão preservados em
milhares de cópias. Às vezes, os críticos alegam que a perda dos autógrafos
das Escrituras constitui um grave problema para aqueles que defendem a
confiabilidade da Bíblia. No entanto, isso realmente não acontece. No
início, a falta de autógrafos ajuda a direcionar a atenção para onde é devido:
para o conteúdo da Escritura, e não para os objetos físicos nos quais
primeiramente foi registrado.111
Mais importante, a evidência de manuscritos existentes instila um alto
grau de confiança no texto da Bíblia.112 Tanto o AT quanto o NT são
atestados por um grande número de manuscritos em uma variedade de
formas, abrangendo muitos séculos.113 Os textos do NT permanecem como
os documentos mais bem atestados no mundo antigo. Os testemunhos do
NT são divididos em três grandes categorias: os manuscritos gregos, as
traduções antigas (versões) em outras línguas; e as citações do NT
encontradas nos autores eclesiásticos primitivos (os pais da igreja).114 Os
manuscritos gregos incluem fragmentos de papiros, escrita uncial (escritos
completamente com letras maiúsculas, sem espaços e pontuação), e
minúsculas (escrita cursiva pequena).115
Os papiros formam o grupo mais significativo, uma vez que a data de
sua edição implica que eles são cronologicamente os que mais se
aproximam dos autógrafos originais. Por exemplo: 52
(contendo Jo 18.31-

89
33,37,38) e 90
(Jo 18.36 a 19.7) são provavelmente datados entre o período
de 30 a 50 anos depois dos escritos originais.116
Os unciais seguem os papiros em importância cronológica. O Códice
Sinaítico, um uncial escrito por volta de 350, é a cópia mais antiga de todo
o NT.117 Outros unciais como o Códice Vaticano, Alexandrino, Efraimita e
Beza, também constituem importantes testemunhos. Os minúsculos
constituem o maior grupo de manuscritos gregos e são datados
consideravelmente mais tarde.
Finalmente, as traduções das Escrituras para outras línguas preparadas
durante os primeiros séculos da igreja e as citações de textos bíblicos nos
escritos dos pais da igreja fornecem informações que podem ajudar os
estudiosos na reconstrução das leituras originais mais plausíveis. O total de
5.760 manuscritos gregos, mais de 10 mil manuscritos latinos da Vulgata e
mais de 9.300 versões antigas resultam em mais de 25 mil testemunhos do
texto do NT.118 Quando esta é comparada com outras obras da antiguidade,
nenhum outro livro chega sequer perto. Não é necessário dizer que os
estudiosos clássicos e os historiadores adorariam trabalhar com livros tão
bem atestados como o NT.

90
Tabela 1.1: Cópias Existentes de Obras Antigas
Ilíada, de Homero: 643 cópias.
As Guerras da Gália, de Júlio César: 10 cópias, das quais a mais antiga
data de 1.000 depois de ser escrita.
Lívio escreveu 142 livros sobre a história romana, dos quais apenas 142
livros sobreviveram em apenas 20 manuscritos, apenas um dos quais é do
século IV, e sobreviveu apenas porque tinha uma cópia de Hebreus escrita
na parte de trás!
Histórias e Anais de Tácito: 2 cópias (séculos IX e X).
A História de Tucídides: 8 cópias (século X).
As Histórias de Heródoto: a mais antiga é datada 1.300 anos após a
original.
Os escritos de Platão: 7 cópias.
Os Contos da Cantuária, de Chaucer: 80 manuscritos.
Beowulf: 1 cópia.

Se há más notícias no que diz respeito a essas ocorrências, é que com a


simples multiplicidade de manuscritos aparecem algumas variações no
texto.119 Porque eles foram copiados à mão, é altamente improvável que
haja dois manuscritos exatamente iguais. Milhares de leituras variantes (a
maioria delas mínimas e inconsequentes) existem entre os manuscritos.
Embora os escribas tivessem grande cuidado em seu esforço para
reproduzir uma cópia exata,120 eles não estavam imunes a erros humanos.
Os erros dos escribas podem assumir a forma de erros intencionais e não
intencionais.121 Os erros não intencionais ou involuntários são a causa da
maioria das variantes textuais.122 Esses geralmente incluem os erros dos
olhos (por exemplo, saltando as palavras ou perdendo o local de uma delas
no texto), os erros das mãos (falhas da pena ou anotações nas margens); os

91
erros de ouvido (confusão do som de palavras semelhantes ou o mau
entendimento de uma palavra).123 Os erros intencionais aconteciam quando
os escribas tentavam corrigir um erro percebido no texto ou alteravam o
texto pelo bem da doutrina e da harmonização.124
A presença de variantes tem sido muitas vezes utilizada para
enfraquecer tanto a inspiração quanto a confiabilidade do NT. No entanto,
esses esforços são regularmente afetados por pressupostos subjacentes
falhos. Primeiro, o próprio objeto da investigação não é “Seria o Novo
Testamento inspirado?” e sim “O que é o Novo Testamento?”. Segundo, a
confiabilidade do NT não é materialmente afetada pela existência de
variantes, que dizem respeito a apenas uma pequena porção do NT. Na
verdade, 94% do seu conteúdo é exatamente o mesmo em praticamente
todos os manuscritos existentes.125
Dos 6% restantes, 3% constituem leituras despropositadas que
evidentemente não são de originais, mas o resultado de vários erros dos
escribas. Assim, apenas cerca de 3% do texto é propriamente o objeto de
investigação. Além disso, variações entre os manuscritos disponíveis não
deveriam causar nenhuma dúvida de que a leitura correta pode ser
encontrada. Não há praticamente nenhuma possibilidade de que, dentre os
milhares de manuscritos que existem hoje, uma leitura original tenha se
perdido. A leitura correta existe; a tarefa que permanece é identificar qual
das leituras variantes mais provavelmente reflete a original.
No que diz respeito à classificação de leituras existentes, todos os
manuscritos gregos apresentam traços que habilitam os estudiosos a agrupá-
los em famílias de textos (Alexandrino, Ocidental ou Bizantino) baseados
na origem geográfica, estilo do grego e data. Através de análises
comparativas realizadas pelos praticantes de uma ciência chamada crítica

92
textual, os estudiosos examinam cuidadosamente todos os manuscritos
existentes de modo a reproduzir a leitura mais plausível dos autógrafos
originais em cada caso individual.126
Os críticos textuais decidem entre as leituras através de critérios
rigorosos, tais como datação, tipo de texto (distribuição geográfica), leituras
atestadas (quantos manuscritos têm determinada leitura) e as possíveis
razões para variantes (como a atenuação de uma leitura teológica difícil).
Além da análise dos manuscritos gregos, os críticos textuais também
consideram todos os outros testemunhos relevantes, como as versões e os
Pais da Igreja.
Embora a crítica textual seja muito complexa e às vezes uma ciência
controversa, ela fornece aos estudantes da Escritura pelo menos dois
resultados garantidos. Primeiro, nenhuma das leituras variantes (incluindo
omissões) afeta a mensagem central ou o conteúdo teológico das Escrituras.
Segundo, ela pode confiantemente afirmar que o texto da Bíblia hoje é uma
representação exata e fiel dos autógrafos.

Tradução: As Traduções Disponíveis são Fiéis?


A segunda questão, ou seja, a da tradução, segue como um corolário
natural, uma vez que a questão da transmissão esteja resolvida. Para avaliar
a fidelidade e a exatidão da Bíblia hoje em comparação com os textos
originais, deve-se investigar as questões de teoria da tradução e da história
da Bíblia. A tarefa de traduzir a Bíblia de suas línguas de origem (hebraico,
aramaico e grego) para uma língua alvo (no caso, o inglês) envolve uma
multiplicidade de questões relacionadas com a natureza da linguagem e da
comunicação. Seria o significado da palavra encontrado em alguma forma

93
fixada de significado inerente, ou o significado é determinado pelo uso
contextual? O significado está nas características formais da gramática
original ou na função das palavras na gramática? Essas são apenas algumas
das questões relativas à teoria da tradução.
Alguns tradutores sustentam que uma tradução exata exige uma
abordagem do tipo palavra por palavra de equivalência formal (KJV, NKJV,
NASB, ESV, HCSB).127 Outros afirmam que a construção de uma
correlação direta de um para um entre duas línguas na verdade distorce o
significado.128 Esses tradutores empregam uma abordagem do tipo sentença
por sentença129 de equivalência dinâmica ou funcional (NRSV, NIV, CEV,
NLT, TNIV).130 O objetivo de todos os tradutores, não importa qual teoria
da tradução empreguem, é a produção de uma versão que seja uma
interpretação precisa do texto escrito, de tal forma que a Bíblia mantenha
sua beleza literária, grandeza teológica e, mais importante, sua mensagem
espiritual.131

Tabela 1.2: Continuum da Tradução

Esse continuum mostra como as diferentes traduções da Bíblia se encaixam nas filosofias de tradução
dos tipos palavra por palavra e pensamento por pensamento.

A boa notícia é que há traduções fiéis da Bíblia disponíveis para uma


ampla variedade de leitores. Quer determinada pessoa precise de uma
versão com um vocabulário limitado e sintaxe simples, quer prefira um

94
estilo mais elevado e excelência na linguagem, sempre haverá uma tradução
fiel para cada caso.
A história da Bíblia dá provas satisfatórias de que a Bíblia de hoje na
verdade representa fielmente as Escrituras em suas línguas originais.
Durante séculos, a única Bíblia disponível aos povos ocidentais foi a
Vulgata Latina preparada por Jerônimo (c. 345-420), que foi comissionado
pelo bispo Dâmaso por volta do final do século IV.132 A Vulgata serviu
como versão bíblica oficial em toda a Europa Medieval e estava restrita ao
clero, às ordens monásticas e aos estudiosos.133
Um sacerdote britânico e estudioso de Oxford, John Wycliff (1330-
1384), foi o primeiro a tornar toda a Bíblia acessível ao povo simples de
língua inglesa.134 Sua tradução foi baseada na Vulgata, e não no hebraico ou
no grego.135 William Tyndale publicou o primeiro NT na língua inglesa com
base no texto grego em 1526.136 Dois colaboradores próximos de Tyndale,
Miles Coverdale e John Rogers, terminaram seu trabalho ao publicarem
suas próprias respectivas traduções de toda a Bíblia: a Bíblia Coverdale
(1535) e a Bíblia de Matthew (1537).137 A Bíblia de Genebra de 1560
forneceu uma tradução da Bíblia totalmente a partir das línguas originais.138
Esse fato preparou o caminho para o rei James I publicar uma tradução que
iria corrigir a natureza facciosa da Bíblia de Genebra.139 Assim, em 1611, a
tão celebrada Versão Autorizada (AV ou KJV), em grande parte baseada na
obra de Tyndale, tornou-se a tradução inglesa, sem rival, por
aproximadamente 270 anos.140
O século XX deu origem a uma série de novas traduções. Tendo seu
ponto de partida na revisada Versão Autorizada na Inglaterra em 1885, a
American Standard Version (ASV) apareceu em 1901. Em 1952, a Revised
Standard Version (RSV) foi introduzida. Uma tradução católica romana, a

95
Bíblia de Jerusalém, foi lançada em 1966. A New English Bible (NEB), a
New American Bible (NAB) e a New American Standard Bible (NASB)
estavam concluídas em 1970. A Good News Bible (GNB) ou Today’s
English Version (TEV) foi produzida em 1978, ano que também assistiu à
publicação da New International Version (NIV).
Com a década de 1980 vieram a New King James Version (NKJV,
1982), a New Century Version (NCV, 1987) e a New Revised Standard
Version (NRSV, 1989). O ritmo não desacelerou na década de 1990, que
assistiu o lançamento da Contemporary English Version (CEV, 1995) e da
New Living Translation (NLT, 1996). O novo milênio testemunhou
traduções adicionais significativas como a English Standard Version (ESV,
2001), a Holman Christian Standard Bible (HCSB, 2004), e Today’s New
International Version (TNIV, 2005).
A atualização e produção de novas traduções foram necessárias devido
à descoberta de novos manuscritos, às mudanças na língua inglesa e ao
avanço da linguística moderna. Hoje, quando as pessoas abrem qualquer
bíblia em inglês, elas podem saber que gerações de estudiosos fiéis
conseguiram preservar e proteger o texto sagrado do mesmo modo que ele
nos foi originalmente dado.
Como o autor de Hebreus afirma, “No passado, por meio dos profetas,
Deus falou aos pais muitas vezes e de muitas maneiras; nestes últimos dias,
porém, ele nos falou pelo Filho, a quem designou herdeiro de todas as
coisas e por meio de quem também fez o universo” (Hb 1.1,2). Com esse
tipo de revelação, não há necessidade de esperar por uma revelação
diferente e ainda maior, mas sim de estudar, evangelizar, pregar e ensinar a
Palavra de Deus. O cânon é a fonte dessa informação — inspirada,

96
iluminada e aplicada pelo Espírito Santo. Verdadeiramente, como um
escritor afirmou, o cânon da Escritura é “o ar que respiramos”.141

INSPIRAÇÃO E INERRÂNCIA: QUAL É A


NATUREZA DO CÂNON?
O tópico final para a discussão no presente capítulo diz respeito à teologia,
isto é, à doutrina da Escritura e, em particular, ao testemunho da Bíblia a
respeito de si mesma. Essa consideração da dimensão teológica da Escritura
é necessária para equilibrar seu desenvolvimento histórico e a inclusão de
determinados livros no cânon do NT. Essa discussão trata do testemunho da
Escritura sobre si mesma no AT; o uso e a abordagem da Escritura do AT
feitos por Jesus e pela igreja primitiva; as referências do NT à Escritura
como “inspirada” (2Tm 3.16) e como derivada de “homens movidos pelo
Espírito Santo” (2Pe 1.21); e inerrância (a doutrina de que a Escritura é
livre de erro) e hermenêutica (interpretação bíblica).

A Noção mais Ampla de “Inspiração” nos Pais da


Igreja Primitiva
Na discussão dos critérios de canonicidade apresentados, observamos que
quando a antiga igreja compilou o cânon, sua tarefa essencial
historicamente foi reconhecer quais escritos apresentavam o selo da
inspiração divina. Muitos dos estudos recentes sobre o cânon do NT, no
entanto, rejeitam a noção teológica de “inspiração” como um critério de
canonicidade.142 Embora seja difícil negar que a inspiração é um atributo da
Escritura, alguns desses estudiosos argumentam que a inspiração não é uma

97
prerrogativa exclusiva da Escritura. Sundberg, por exemplo, concluiu não
apenas que os pais da igreja não incluíram “inspirado” em seus critérios de
canonicidade, mas que empregaram a linguagem “inspirado” versus “não
inspirados” em debates polêmicos com movimentos heréticos.143 Segundo
esses estudiosos, a terminologia “inspiração” não foi utilizada apenas com
referência às Escrituras, mas também no que diz respeito aos seus próprios
escritos. Assim, Clemente disse que Paulo escreveu com “inspiração
verdadeira” (1Clem. 47.3) e que a sua própria (de Clemente) carta também
o foi “através do Espírito Santo” (1Clem. 63.2). Linguagem semelhante é
utilizada em outros escritos patrísticos.
Sundberg alegou ainda que a doutrina da inspiração exclusiva da
Escritura não é de forma alguma uma doutrina cristã, mas antes uma noção
judaica que surgiu depois de o cristianismo ter recebido as Escrituras
judaicas e rompido com o judaísmo. Posteriormente, de acordo com
Sundberg, essa doutrina da inspiração foi aproveitada por Lutero nos
debates polêmicos de sua época a fim de excluir os Apócrifos.144 Sundberg,
por sua vez, afirmou que tudo o que concorda com a Bíblia é inspirado
como a Bíblia. Ele declarou:

Assim, ao formar o cânon, a igreja reconheceu e estabeleceu a Bíblia como a medida ou


padrão de inspiração para a igreja, não a totalidade dela […]. A inspiração cristã é análoga à
inspiração bíblica, complementando-a e abrindo todas as eras cristãs à verossimilhança
teológica, como os livros da Bíblia e os períodos em que foram escritos são verossímeis.145

Isso, naturalmente, cria algumas dificuldades para os fiéis acostumados


a entender inspirada como “de Deus” e, portanto, digna de crédito. Se
houvesse documentos antigos ou contemporâneos que fossem igualmente
inspirados como os escritos canônicos, isso exigiria uma definição mais
ampla de “Escritura”. Mas isso levanta várias questões importantes. Por

98
exemplo, é legítimo considerar uma declaração ou documento não canônico
como inspirado e portador de autoridade se for além das Escrituras
canônicas e acrescentar novos conteúdos reveladores? Tais documentos
deveriam ser acrescentados ao cânon existente? Mesmo Sundberg diria que
não, porque o cânon, estabelecido no século IV, é a regra pela qual todas as
outras obras devem ser julgadas. Assim o cânon tem um lugar especial entre
os escritos inspirados. No entanto, Sundberg não apresentou uma boa base
bíblica para excluir os livros não inspirados e não canônicos.
O ponto mais importante a esse respeito é que o uso que os Pais da
Igreja fazem da terminologia da inspiração não é obrigatório para a igreja
hoje. Embora eles tenham prestado uma contribuição indispensável para
nossa compreensão dos primórdios da igreja, o que é digno de crédito é o
próprio testemunho da Escritura e a doutrina das Escrituras. Além disso, o
papel da igreja é mais bem entendido não como a aceitação de determinado
grupo de escritos com base em critérios e deliberações humanos, mas como
o reconhecimento dos livros transmitidos à igreja que apresentam a marca
de autenticação da inspiração divina.
Por essa razão, deve-se concluir que a tese de Sundberg é construída
sobre pressuposições errôneas. A utilização da terminologia inspiração nos
pais da igreja é não refinada e geralmente genérica, amplamente usada para
se referir à participação do Espírito Santo em suas vidas e escritos. Os Pais
da Igreja não deveriam ser culpados por não utilizar uma construção
teológica moderna elaborada a partir de séculos de discussão dos textos
bíblicos. Por essa razão, em vez de tomar os escritos dos Pais da Igreja
como ponto de partida, seria mais apropriado iniciar com o testemunho da
Escritura sobre si mesma.

99
Inevitavelmente, muitas das referências relevantes pertencem às
Escrituras do AT. Contudo, se o NT é a coleção de documentos da Nova
Aliança em analogia com o AT sendo a coleção de documentos da antiga
Aliança, seria razoável que os escritos do NT exibissem os mesmos tipos de
características que os livros do AT. Assim, quando Pedro declarou os
escritos de Paulo como estando no mesmo nível que as Escrituras e quando
Paulo, como é provável, afirmou o Evangelho de Lucas como Escritura no
mesmo nível que Deuteronômio, então ambos os escritores do NT estavam
atribuindo ao NT (ou pelo menos às cartas de Paulo e aos Evangelhos) as
mesmas características que aquelas encontradas nos livros do AT.
O Deus retratado no AT é um Deus comunicativo. Ele fala aos seus
filhos, e assim o faz através de seus servos, os profetas (daí o profético
“Assim diz o Senhor”). Porque é Deus que fala para e através de seus
servos, ele exige fé e obediência a essas declarações. Assim o rei Josafá
convocou aos israelitas: “Crede no Senhor vosso Deus, e estareis seguros;
crede nos seus profetas, e sereis bem-sucedidos” (2Cr 20.20), e o próprio
Deus é representado como se dirigindo à geração do deserto com as
seguintes palavras:

Ouvi agora as minhas palavras: se houver um profeta entre vós, eu, o SENHOR, me revelarei a
ele em visão e falarei com ele em sonhos. Mas não é assim com o meu servo Moisés, que é
fiel em toda a minha casa. Falo com ele frente a frente, claramente e não por enigmas, pois
ele contempla a forma do Senhor. Por que, então, não temestes falar contra o meu servo
Moisés? (Nm 12.6-8).146

Esperava-se que a palavra de Deus a seus servos fosse crida e obedecida


assim como Deus deveria ser crido e obedecido.

100
O Testemunho da Escritura a Respeito de Si
Mesma: o Antigo Testamento
Mas o que deveria ser dito sobre a Palavra escrita? A própria Escritura
contém informações quanto à escrita da Escritura. Essas, como W. Grudem
observou, são “relatos de homens escrevendo as palavras que Deus lhes
disse que escrevessem, palavras que, então, são entendidas como palavras
de Deus”.147 Êxodo 17.14 afirma, “Então o Senhor disse a Moisés: Escreve
isto para memorial num livro e confirma a Josué”. Nas gerações
subsequentes, ações deveriam ser realizadas em consonância com o que
estava escrito na Lei de Moisés. Isso estava explicitamente ordenado em
passagens como Deuteronômio 28.58,59. Consequentemente, a ordem a
Josué estava relacionada a esse livro da lei: “Não afastes de tua boca o livro
desta lei, antes medita nele dia e noite, para que tenhas cuidado de obedecer
a tudo que nele está escrito; assim farás prosperar o teu caminho e serás
bem-sucedido” (Js 1.8). Josué também copiou a lei de Moisés na sua
ratificação (Js 8.32). Sua última palavra para Israel foi “Esforçai-vos para
guardar e cumprir tudo quanto está escrito no livro da lei de Moisés, para
que dela não vos desvieis nem para a direita nem para a esquerda” (Js 23.6).
Claramente, a lei escrita de Moisés, como a Palavra de Deus, foi entendida
como digna de crédito e como o caminho de bênção para Israel. Nas
gerações posteriores, essa continuou a ser a declaração do AT (cf. 1Rs 2.3).
Significativamente, após um tempo de declínio espiritual em Israel, o
sacerdote Hilquias encontrou “o livro da lei” no Templo do Senhor (2Rs
22.8; 2Cr 34.14). Quando o livro da lei foi lido para o jovem Josias, este se
tornou uma fonte de tristeza para ele, pois “grande é o furor do Senhor, que
se acendeu contra nós, pois nossos pais não obedeceram às palavras deste
livro, para cumprirem tudo quanto está escrito a nosso respeito” (2Rs

101
22.13). As subsequentes reformas de Josias constituíram um movimento de
“retorno à Bíblia”. Uma coisa semelhante aconteceu após o retorno do
cativeiro babilônico, quando Esdras leu o livro da lei “que o Senhor dera a
Israel” para os clãs reunidos de Israel (Ne 8.1).148
A inclusão do restante do AT está diretamente relacionada ao ofício de
profeta que era central para a fidelidade religiosa de Israel. O papel de
profeta estava diretamente ligado ao relacionamento da aliança entre Israel
e Deus. Os profetas não foram chamados para ser simples videntes, mas
para constantemente lembrar Israel de suas obrigações na aliança. É melhor
compreender o seu papel como “fiscais da aliança”. O que eles dizem é “a
palavra do Senhor”. O chamado de Jeremias torna esse fato explícito:
“Então o SENHOR estendeu a mão, tocou-me a boca e me disse: Ponho as
minhas palavras na tua boca” (Jr 1.9). Assim como Deus ordenou que
Moisés escrevesse suas palavras, assim também muitos dos profetas
escritores foram ordenados a escrever as palavras de Deus (cf. Jr 36.28; Ez
43.11; Hc 2.2). O reconhecimento de um livro do AT como canônico
também parece estar diretamente relacionado ao fato de ter sido escrito por
aquele com o dom da profecia.149 R. L. Harris declarou: “Parece que a
profecia era a única instituição em Israel para transmitir nova revelação da
Palavra de Deus”.150 Essas obras eram consideradas dignas de crédito quase
de imediato. Daniel, por exemplo, leu e recebeu o livro de Jeremias como
“a palavra do SENHOR” (Dn 9.2; cf. Ed 1.1; 2Cr 36.22).
O caráter desses escritos está diretamente relacionado à sua origem, isto
é, Deus. Dois salmos são particularmente explícitos em seu reconhecimento
das palavras de Deus na Escritura. O Salmo 19 afirma que as Escrituras são
“do SENHOR.” Assim, elas são perfeitas e fidedignas (v. 7), retas e puras (v.
8), e “verdadeiras e inteiramente justas” (v. 9). O capítulo mais longo de

102
toda a Bíblia, o Salmo 119, é dedicado na sua totalidade ao louvor da
palavra de Deus. O salmista descreve a palavra como vinda de Deus, e,
portanto, como a “palavra da verdade” (v. 43,142) na sua totalidade, (v.
86,151,160) e como totalmente justa (v. 172). Uma vez que é Deus que está
falando de várias formas e através de vários profetas, há algumas claras
suposições sobre a veracidade e autoridade dessas palavras. Uma vez que
Deus não pode mentir (Nm 23.19; 1Sm 15.29; Pv 8.8; Sl 89.35), sua
palavra é a verdadeira (cf. a afirmação semelhante de Jesus em Jo 17.17). E
posto que Deus nunca falha (Sf 3.5), a sua palavra também não falha.
Além disso, a palavra de Deus, como entregue aos profetas, era
inviolável. Ela não poderia ser editada.151 Isso foi explicitado por Moisés,
que disse: “Não acrescentareis nada à palavra que ele vos ordena, nem
diminuireis nada, para que guardeis os mandamentos do SENHOR vosso
Deus, que eu vos ordeno” (Dt 4.2; cf. 12.32). Além disso, o escritor de
Provérbios 30.5, 6 estendeu o princípio para além da lei para cada palavra
de Deus: “Toda palavra de Deus é pura; ele é um escudo para os que nele
confiam. Nada acrescentes às suas palavras, para que ele não te repreenda e
sejas tido por mentiroso”.
Assim, embora os livros AT abranjam uma grande variedade de
gêneros, retratem diferentes formas retórica e representem a obra de
diferentes profetas, todos eles compartilham como o seu principal elemento
comum a origem divina de suas palavras. Como Grudem afirmou: “As
palavras escritas são vistas como as palavras de Deus em todas as formas
que os discursos diretos de Deus e os discursos de Deus através da boca das
pessoas são vistos como palavras de Deus. A forma de comunicação difere,
mas o caráter, autoridade e status verdadeiro das palavras não”.152

103
Sem dúvida, essas observações gerais representam uma necessidade
preliminar, uma vez que é impossível para o AT proclamar com relação a si
próprio e na sua totalidade algo que, por definição, teve de aguardar a
conclusão de todo o seu corpo de escritos.153 O NT olha para o AT e registra
algumas informações importantes quanto a ele e, por extensão, também
quanto a si mesmo.

O Uso e a Abordagem que Jesus Fez da Escritura


do Antigo Testamento
Primeiro, é instrutivo considerar as afirmações de Jesus a respeito da
Escritura do AT. De acordo com Jesus e seus contemporâneos, as Escrituras
do AT eram a autoridade da qual a doutrina e prática deveriam derivar.
Assim, Jesus desafiou seus adversários a entender as Escrituras: “Nunca
lestes nas Escrituras?” (Mt 21.42 // Mc 12.10). Do mesmo modo, Jesus
afirmou que a ignorância em relação às Escrituras do AT foi a razão de seus
oponentes estarem errados: “Este é o vosso erro, não conheceis as
Escrituras nem o poder de Deus” (Mt 22.29 // Mc 12.24). Em outra ocasião,
Jesus julgou uma questão prática: “Quem é meu próximo?” — com um
apelo a Escritura: “O que está escrito na lei? Como lês?” (Lc 10.26). Em
João 5.39, Jesus observou a respeito dos judeus: “examinais as Escrituras,
pois julgais ter nelas a vida eterna; e são elas que dão testemunho de mim”.
Uma série de outras citações Evangelho descrevem a Palavra de Deus, as
Escrituras, a Lei e os Profetas como o guia para vida.154 É claro que Jesus e
seus ouvintes consideravam o AT como Palavra e a autoridade de Deus e
como digno de crédito. A isso podem ser acrescentadas as citações de
cumprimento nos Evangelhos — citações do AT introduzidas com uma

104
fórmula como “Tudo isso aconteceu para que se cumprisse o que foi dito da
parte do Senhor, pelo profeta”, ocorrendo especialmente em Mateus e João
— que pressupõem que os leitores tiveram o maior respeito pela Escrituras
do AT.155
Significantemente, nas referências dos Evangelhos não há distinção
entre as palavras humanas das Escrituras e as palavras de Deus. Homens
que falaram no AT são descritos nos Evangelhos como Deus falando. Por
exemplo, as palavras de Isaías em Isaías 7.14 são descritas por Mateus 1.22
como o “que o Senhor havia declarado pelo profeta”, o que revela que a
Escritura em sua totalidade era considerada como a Palavra de Deus.156 No
entanto, essa não era apenas uma crença dos escritores do Evangelho, era
também o ponto de vista do próprio Jesus. O relato de Lucas do encontro no
caminho para Emaús registra a afirmação de Jesus de que os discípulos
deveriam ter sido rápidos em acreditar no que foi escrito sobre Jesus em
“todos os profetas” (Lc 24.27). Alguns versículos depois, a referência é a
“todas as Escrituras”, “a Lei de Moisés” e aos “Profetas e aos Salmos” (Lc
24.44).157
As Escrituras do AT não apenas eram a Palavra de Deus na sua
totalidade, mas Jesus também afirmou sua natureza especial. Em João
10.35,36, Jesus rebateu a acusação de blasfêmia com um argumento do
menor para o maior: “Se a lei chamou deuses àqueles a quem a palavra de
Deus foi dirigida e a Escritura não pode ser anulada, por que, então, dizeis
‘tu blasfemas’ àquele a quem o Pai santificou e enviou ao mundo; por eu ter
dito: Sou Filho de Deus?”.158 O lembrete de que a Escritura não pode ser
anulada é um reconhecimento tácito do seu status como Palavra de Deus.
Assim, o argumento é que a Escritura não pode ser acusada de erro ou seria
anulada — isto é, rejeitada como a Palavra de Deus.

105
Jesus muito sucintamente disse algo semelhante em João 17.17: “A tua
palavra é a verdade”. Mas até mesmo aqui pode haver uma ligação com os
documentos da nova aliança. Assim, quando Jesus afirmou “Eu lhes dei a
tua palavra” (17.14), ele pode ter implicado mais do que meramente
“Ensinei-lhes a Bíblia”. No Evangelho de João, a afirmação está
relacionada com o conceito de verdade. Jesus, que é “a verdade” (14.6), dá
o “Espírito da verdade” (14.17; 15.26; 16.13), que conduz os fiéis “a toda a
verdade” (16.13).159 E essa verdade é “sua [de Deus] Palavra”. Isso indicava
o que serviria como base para os documentos da Nova Aliança: as palavras
de Jesus como as palavras de Deus. Enquanto isso implica uma conexão ao
NT como Escritura, outras passagens apontam claramente para o status
revelador das palavras de Cristo. Por exemplo, a afirmação de que Jesus
falou a palavra de Deus repousa no cerne do pronunciamento em João
3.33,34: “Mas o que aceita o seu testemunho, esse confirma que Deus é
verdadeiro. Pois aquele que Deus enviou fala as palavras de Deus; porque
Deus dá o Espírito sem restrição”.
Uma das passagens mais marcantes relacionadas ao uso e abordagem de
Jesus da Escritura do AT é encontrada em Mateus 5.18, onde Jesus afirmou
que ele não destruiria a lei: “Pois em verdade vos digo: Antes que o céu e a
terra passem, de modo nenhum passará uma só letra ou um só traço da Lei,
até que tudo se cumpra”.160 O apelo aqui é à menor letra (iota, em hebraico
o yodh) ou um traço (keraia, literalmente “um chifre”, muito provavelmente
um traço, uma marca ornamental acima de uma letra hebraica, ou uma
serifa), sendo absolutamente firme. Descendo até os mínimos elementos de
uma palavra escrita individual, Jesus afirmou a autoridade duradoura do
AT.161 A declaração semelhante em Mateus 24.35 aponta para o status
semelhante das palavras de Jesus: “Céu e terra passarão, mas as minhas

106
palavras nunca”. Em ambos os versículos, Jesus afirmou a dissolução do
céu e da terra e fez uma declaração relativa à natureza permanente das
palavras de Deus: no primeiro, o pronunciamento pertence às Escrituras do
AT; no segundo, às palavras de Jesus. Embora o contexto imediato seja o
Discurso do Monte das Oliveiras, o paralelismo é muito forte para apenas
sugerir que a afirmação é limitada a esse único discurso. As palavras de
Jesus são as palavras de Deus no mesmo nível que a Lei e os Profetas e,
consequentemente, igualmente permanentes e dignas de crédito.162
O próprio uso que Jesus fez das Escrituras também abre o caminho para
o NT. A postura de Cristo em relação às Escrituras foi marcante em duas
frentes. Primeira, Jesus se submeteu às Escrituras como qualquer ser
humano faria. Isto pode ser visto no relato da tentação de Jesus pelo Diabo
(Mt 4.1-11; Lc 4.1-13). Quando confrontado com essas várias tentações, ele
não reivindicou privilégio divino, mas simplesmente afirmou e obedeceu a
palavra de Deus. Como Bengel declarou há muito tempo, “Jesus não apela
para a Voz do céu: Ele não responde aos argumentos do Tentador: contra
esses argumentos ele emprega somente as Escrituras, e simplesmente cita
suas afirmações”.163 Em outras passagens, Jesus alegou ser o cumprimento
da Escritura, como em seu discurso na sinagoga de Nazaré (Lc 4.18-21).
Ele usou a Escritura em sua argumentação com os opositores religiosos (Mt
21.13; Mc 7.6) e a empregou em seu ensino (Mc 9.13) e na sua descrição de
si mesmo (Mc 14.21,27). Ao mesmo tempo, ele ensinava com autoridade
incomum, não como um dos escribas (Mt 7.29; Mc 1.22). O que foi
chocante para os ouvintes de Jesus foi que o foco de sua interpretação era
cristológico. Jesus viu os contornos de todo o seu ministério no AT.164
Assim ele se tornou o cumprimento dos propósitos e das promessas de Deus
a Israel.165

107
O Uso e a Abordagem que a Igreja Primitiva fez
da Escritura do AT
Jesus transmitiu sua abordagem da Escritura a seus discípulos.166 Dessa
forma, seu método de interpretação e de ensino “fornece as bases para a
autenticação de Jesus do Novo Testamento”.167 O próprio Jesus prometeu
aos seus discípulos que o Espírito Santo “ensinará todas as coisas e vos fará
lembrar de tudo o que eu vos tenho dito” (Jo 14.26). Da perspectiva de
João, escrevendo nos anos 80 ou início dos anos 90, essa promessa
provavelmente serviu também como uma afirmação de, pelo menos, suas
memórias das palavras de Jesus (se não das memórias de todos os
apóstolos) registrada no(s) Evangelho(s).
Os apóstolos e seus seguidores continuaram a usar as Escrituras do AT
como Jesus fez, a saber, como sua autoridade para a vida e doutrina.168 Isso
pode ser visto em uma variedade de contextos, tanto em citações da
Escritura como em declarações explícitas sobre a natureza das Escrituras. A
Escritura prevê o duplo mandato para a substituição de Judas (At 1.20).
Uma citação do AT ajuda a decidir a questão da inclusão dos gentios na
igreja do NT no Concílio de Jerusalém (At 15.16,17). As Escrituras eram o
padrão pelo qual os de Bereia julgaram as alegações de Paulo sobre Cristo
(At 17.11). Passagens-chave do AT fornecem a base para o ensino de Paulo
em Romanos sobre a justificação pela fé (Rm 1.17; 4.3), sobre o pecado de
toda a humanidade (Rm 3.10-18) e sobre a eleição (Rm 9.6-18). O mesmo é
verdadeiro para outras cartas de Paulo e para as Epístolas Gerais.169 Pedro
viu uma continuidade entre o AT e a palavra do Senhor que declarou o
evangelho aos seus ouvintes (1Pe 1.23-25).
O livro do Apocalipse fornece um estudo fascinante e único sobre o uso
do AT. Ele não caracteriza nem uma única citação de um livro do AT pelo

108
nome. No entanto, o está repleto de alusões e referências contextuais ao AT,
o que requer que os leitores estejam familiarizados com o AT. Claramente o
AT — particularmente os livros proféticos, como Ezequiel ou Daniel — é a
chave para revelar as imagens apocalípticas encontradas em todo o livro.170
Os apóstolos e escritores do NT, no entanto, foram além da mera
afirmação e utilização do AT. Eles continuaram a valorizar os escritos
proféticos, mas também estavam profundamente interessados nas palavras
de Cristo. Atos 11.16 indica que Pedro confirmou a direta conversão
gentílico-cristã porque ele lembrou da “palavra do Senhor” (uma referência
a um dito de Jesus). Paulo também citou outro dito não escrito de Jesus
(chamado um agraphon): “Dar é mais bem-aventurado que receber” (At
20.35). E também ordenou aos casados — “não eu, mas o Senhor” (1Co
7.10) — e mais tarde entregou o que ele “receb[eu] do Senhor”, ou seja, a
instituição da Ceia do Senhor (1Co 11.23,24). A Carta de Tiago muitas
vezes ecoa os ensinamentos de Jesus (cf. Tg 1.22 e Mt 7.24).
Os escritores do NT também colocaram suas lembranças de Jesus no
mesmo nível que o AT.171 Um caso em destaque é a declaração em 2Pedro
3.2, onde Pedro afirmou que ele escreveu “para que vos recordeis das
palavras ditas anteriormente pelos santos profetas e do mandamento do
Senhor e Salvador, dado por meio de vossos apóstolos”. O fato de que
Paulo não tinha uma palavra direta do Senhor sobre como lidar com os que
não eram casados (1Co 7.12) fornece evidência indireta de que as palavras
de Cristo eram valorizadas como revestidas de autoridade. Não está claro se
Paulo tinha em mente uma espécie da hierarquia, mas ele claramente
esperava que suas palavras sobre o assunto fossem obedecidas como se
fossem palavras do Senhor. Mais adiante no livro, o apóstolo deixa isso
claro: “Se alguém se considera profeta ou espiritual, reconheça que as

109
coisas que vos escrevo são mandamentos do Senhor. Mas, se alguém não
reconhece isso, tal pessoa não será reconhecida” (1Co 14:37,38).
O escritor de Hebreus declarou a continuidade entre a revelação de
Deus no AT e no NT: “No passado, por meio dos profetas, Deus falou aos
pais muitas vezes e de muitas maneiras; nestes últimos dias, porém, ele nos
falou pelo Filho, a quem designou herdeiro de todas as coisas e por meio de
quem também fez o universo” (Hb 1.1,2). A comunicação da palavra de
Deus é continuada em Hebreus 2.3: “Essa salvação, tendo sido anunciada
inicialmente pelo Senhor, foi depois confirmada a nós pelos que a
ouviram”. A natureza do testemunho ocular dos apóstolos faz deles os
fiadores dignos de crédito da mensagem do evangelho (cf. 1Jo 1.1-5).172 Sua
mensagem é a própria palavra de Deus (1Ts 2.13). O que eles falam — a
mensagem do evangelho — é também chamada de “a palavra de Deus”.173
Claramente, Paulo e os outros apóstolos entenderam que sua missão e
mensagem procedia de Deus com tudo os que se seguiu a partir dessa
convicção.
Foi mencionado no início que duas passagens do NT citam outros livros
do NT como “Escritura” no mesmo nível que a Escritura do AT. Primeira
Timóteo 5.18 muito provavelmente cita o Evangelho de Lucas como
Escritura ao lado de Deuteronômio, e Pedro se refere às cartas de Paulo
como “Escritura” em um nível equivalente ao AT (2Pe 3.16). O livro de
Apocalipse também tem um caráter de autocomprovação. O autor
apresentou o livro como profético (Ap 1.3) e como uma mensagem do
Senhor, transmitindo as palavras de Jesus (cf. a primeira visão e as cartas
para as igrejas em Ap 1.9 a 3.22). Além do mais, o livro contém a mesma
prescrição contra o acréscimo ou supressão das coisas nele contidas que o
Antigo Testamento apresenta com relação à lei (Ap 22.18,19; cf. Dt 4.2;

110
12.32; Pv 30.6). Essa injunção, por sua vez, era comum nos antigos tratados
do Oriente Próximo, que sugere implicações pactuais.174 Ao utilizar essa
fórmula, o escritor muito provavelmente considerou o livro merecedor do
mesmo respeito que o AT.175 Isso é ainda apoiado pela possibilidade de que
foi o próprio Jesus quem proferiu a advertência de Apocalipse 22.18.176 É
preciso ser cuidadoso para não ler muitas coisas mais na fórmula, mas
certamente o escritor considerou que este livro tinha, pelo menos, o status
de Escritura.177
Isso coloca a autoatestação do NT no mesmo nível da autoatestação do
AT.178 Os contornos básicos da Palavra de Deus são estabelecidos pelo
ensino de Jesus. Isso é estendido ainda ao ensino dos apóstolos e a vários
escritores do NT. Além disso, alguns dos livros do NT são reconhecidos
como Escritura em outros lugares do NT. Como a Palavra de Deus, o NT,
bem como o AT, é de Deus e, portanto, verdadeiro, digno de crédito,
irrevogável e insubstituível. Além disso, há uma compreensão e uma
expectativa de que, acompanhando a instituição da nova aliança, novos
documentos das escrituras seriam inspirados.

A Escritura como “Inspirada”: Deus, a Fonte da


Escritura (2Tm 3.16,17)
A passagem do NT que aborda a questão da inspiração da Escritura mais
diretamente é 2Timóteo 3.16,17: “Toda a Escritura é divinamente inspirada
e proveitosa para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em
justiça; a fim de que o homem de Deus tenha capacidade e pleno preparo
para realizar toda boa obra”. Esses versículos levantam várias questões

111
interpretativas importantes; somente os pontos mais salientes podem ser
observados aqui.179 São eles:

1. O termo “toda” (pasa) é singular e poderia ser traduzido como “cada


[passagem individual da] Escritura”. No entanto, embora a inspiração
de passagens individuais da Escritura possa estar implícita, é melhor
pensar sobre “Escritura” no presente caso como um coletivo singular
com a Escritura sendo vista em sua totalidade.
2. A palavra “Escritura” (graphē) no contexto original refere-se ao AT.
3. A expressão “toda Escritura” no contexto imediato se refere à
totalidade do AT, e a lógica do versículo se aplica, por extensão,
também ao NT (cf. 1Tm 5.18, onde Paulo com toda a probabilidade
usou o termo graphē com referência ao Evangelho de Lucas). Isso até
mesmo inclui potencialmente aqueles livros do NT como o
Apocalipse, que ainda estavam para ser escritos na época em que
Paulo escreveu 2Timóteo.
4. O termo “inspirada” (theopneustos; lit., “soprada por Deus”) designa a
fonte da Escritura — Deus — em vez de elaborar sobre o processo de
inspiração (mas cf. mais adiante). Assim, a lógica do versículo sugere
que, devido à Escritura ter Deus como sua fonte, ela é verdadeira.
Além disso, porque a Escritura é verdadeira, ela é, portanto, valiosa
para ensinar, para repreender, para corrigir, para instruir em justiça.
5. Em parte devido à ausência de uma forma do verbo “ser” em 2Timóteo
3.16, surge a questão se theopneustos é um adjetivo atributivo, caso em
que a tradução apropriada da oração seria “toda a Escritura inspirada é
também proveitosa”, que pode sugerir que existem dois tipos de
Escrituras, uma que é inspirada por Deus e outra que não é — ou um
adjetivo predicativo (produzindo a tradução “toda Escritura é inspirada

112
por Deus e proveitosa”). Dessas alternativas, a última deve ser
preferida, ainda que por nenhuma outra razão que não por ser
inconcebível que Paulo teria feito distinção entre Escritura inspirada e
não inspirada.

Essas observações, entre outras razões, sugerem que a afirmação em


2Timóteo 3.16 é que “toda Escritura é inspirada por Deus e [portanto]
proveitosa”.180 O que isso significa é que a Escritura tem Deus como sua
fonte, e que por essa razão é proveitosa para uma variedade de usos para
equipar o “homem de Deus […] para realizar toda boa obra” (2Tm 3.17).
Isso se encaixa na exortação anterior de Paulo a Timóteo para que ele fosse
diligente para se apresentar aprovado diante de Deus como um obreiro
ensina corretamente “a palavra da verdade” (2Tm 2.15).

Homens “Conduzidos pelo Espírito Santo”: Deus


como Dirigente da Redação da Escritura (2Pe
1.19-21)
Embora o termo theopneustos em 2Timóteo 3.16 foque na fonte das
Escrituras, em vez de no modo de inspiração, isso não significa que o NT
seja omisso quanto a este último. Segunda Pedro 1.19-21 afirma: “Assim,
temos ainda mais firme a palavra profética. […] Saibam antes de tudo que
nenhuma profecia das Escrituras é de interpretação particular. Pois a
profecia nunca foi produzida por vontade humana, mas homens falaram da
parte de Deus, conduzidos pelo Espírito Santo”.
Que a referência é à Escritura e não a uma profecia falada fica claro
pela designação “profecia da Escritura”. A expressão “interpretação
particular” (idias epilysis) pode ser melhor traduzida como “de sua própria

113
imaginação” e pode ser entendida como se referindo à recepção e
interpretação de uma profecia de Deus. A passagem, portanto, afirma que a
Escritura não é meramente humana em origem, mas sim o produto do
181
Espírito Santo, conduzindo os seres humanos a falar a palavra de Deus.
A descrição de homens “conduzidos pelo Espírito Santo” sugere que
este tomou a nobre iniciativa na composição das Escrituras, enquanto seres
humanos colaboraram com o Espírito no que B. B. Warfield denominou
182
“operação concursiva”. Nesse processo, os escritores humanos redigiram
livremente as palavras que Deus desejava que eles utilizassem. Se a redação
das Escrituras envolveu o uso de fontes, a recepção de uma mensagem
profética diretamente de Deus ou por algum outro mecanismo, o produto
final foi inspirado pelo Espírito Santo.

Inerrância e Hermenêutica
A discussão apresentada tentou demonstrar que produzir a autoatestação da
Escritura primeiramente conduz inexoravelmente à conclusão de que a
Escritura é inspirada e inerrante. Isso decorre tanto das referências
escriturais específicas sobre a natureza das Escrituras como totalmente
confiável quanto também é exigido pelo caráter de Deus como a suprema
fonte da Escritura.

QUADRO 1.6: AUTOATESTAÇÕES DA


ESCRITURA: PRINCIPAIS ATRIBUTOS DA
ESCRITURA INSPIRADA

114
A Bíblia ensina as seguintes verdades sobre si mesma. Primeira, a
1
Escritura é a inerrante Palavra de Deus. Em acordo com o atributo
divino da veracidade (Sl 19.7), a Escritura, como a Palavra de Deus, é
totalmente fidedigna e, portanto, de modo contrário, não possui erros.
Segunda, “a Palavra de Deus” refere-se a cada palavra até a mais
ínfima parte — por menor que seja a letra, ela não desaparecerá (Mt
5.18). A inspiração bíblica, portanto, é verbal, isto é, pertence às
2
próprias palavras, não apenas aos conceitos gerais ou ideias.
Terceira, não há nenhuma indicação de que qualquer porção das
Escrituras é “mais inspirada” do que outra: “Toda a Escritura é
inspirada por Deus” (2Tm 3.16). A inspiração da Escritura é, portanto,
considerada plenária, isto é, “plena” ou “completa”.
Quarta, as Escrituras são invioláveis, ou seja, elas não podem ser
completadas nem editadas por seres humanos quanto ao seu conteúdo,
como indica a advertência bíblica para que nada se adicione ou se tire
da Escritura (Ap 22.18,19; cf. Dt 4.2; 12.32).
Quinta, a Escritura, sendo a Palavra de Deus, é a única fonte digna
de crédito para a igreja no que diz respeito à doutrina e, portanto,
norma para a vida e prática do povo de Deus (“proveitosa para ensinar,
para repreender, para corrigir, para instruir em justiça” 2Tm 3.16).

1
Veja N. L. Geisler, org., Inerrancy (Grand Rapids: Zondervan, 1980); Veja

especialmente a clássica definição de inerrância de P. Feinberg (p. 294) citada abaixo com

uma discussão complementar.


2
Contra N. T. Wright, The Last Word: Beyond the Bible Wars to a New Understanding of

the Authority of Scripture (San Francisco: HarperCollins, 2005), que diz que apenas a linha

narrativa das Escrituras é inspirada, e não as próprias palavras em si.

115
Alguns podem alegar que esse é um raciocínio essencialmente circular e
que constitui um uso impróprio da dedução. O argumento é circular,
segundo esses autores podem alegar, pelo fato de as Escrituras serem
tomadas ao pé da letra como testemunho de si mesmas, e não como
alegações bíblicas submetidas à avaliação crítica dos estudiosos modernos.
É dedutivo porque, em essência, o argumento continua pelas linhas do
seguinte silogismo: (1) a Bíblia é a Palavra de Deus (2); Deus é verdadeiro
e não erra; (3) portanto, a Bíblia é verdadeira e inerrante.
Três respostas podem ser dadas com relação a essas preocupações.
Primeira, embora não se possa negar certa quantidade de circularidade no
argumento apresentado, deve-se observar que esse fato não significa
necessariamente tornar o argumento inválido ou impróprio. Certamente
parece não haver boa razão para negar um lugar à Escritura, até mesmo um
lugar principal, ao atestar à sua própria natureza. Ao contrário, se de fato a
Escritura fosse encontrada inerrante, inexoravelmente seguiria que ela fala a
respeito de sua própria natureza inerrante. Nesse caso, não haveria nada de
errado em aceitar essas alegações das Escrituras a respeito de si mesma.
Segunda, o caráter de Deus é propriamente um fator na avaliação da
natureza da Escritura à luz das suas afirmações sobre si mesma. Na
verdade, pode-se apresentar o contra-argumento de que qualquer coisa
menos do que uma Escritura inerrante seria algo inconcebível como
revelação de um Deus representado em toda a Bíblia como verdadeiro. Em
vez disso, o ônus da prova deve pesar sobre os estudiosos da crítica no
sentido de explicar como uma Escritura que não seja inerrante pode
significativamente funcionar como guia autoritativo para a vida da igreja e
de cada cristão. Os juízos mutuamente contraditórios desses críticos são de

116
fato superiores à aceitação da consistente autoafirmação que as próprias
Escrituras fazem com respeito à sua natureza?
Em terceiro lugar, colocando peso principalmente nas afirmações da
Escritura sobre si mesma, independentemente de ser uma implicação
necessária do princípio da Sola Scriptura da Reforma, em nada elimina a
necessidade de uma hermenêutica e do processo interpretativo. Pelo
contrário, isso é claramente indicado pela definição clássica de inerrância
de P. Feinberg, que escreveu: “Inerrância significa que quando todos os
fatos são conhecidos, as Escrituras em seus autógrafos originais e
devidamente interpretados se mostrarão totalmente verdadeiros em tudo
que eles afirmam, quer isso tenha a ver com a doutrina ou moralidade, ou
com as ciências sociais, físicas ou da vida” (grifo nosso).183
Essa definição reconhece tacitamente a realidade das aparentes
contradições que devem ser submetidas a harmonização apropriada como
parte da necessidade de lidar satisfatoriamente com os fenômenos atuais da
Escritura.184 Assim, as abordagens indutivas que tratam, por meio da
exegese, de questões levantadas por textos individuais em sua relação com
outros textos bíblicos devem completar a afirmação dedutiva e pressuposta
de que a Escritura é a Palavra de Deus e, portanto, inerrante.185
Como a definição apresentada deixa claro, a Escritura ainda requer
interpretação, e apenas quando “devidamente interpretada” os obstáculos à
compreensão serão transpostos e as aparentes contradições serão removidas.
Além disso, “todos os fatos” podem nem sempre ser conhecidos, de modo
que às vezes pode ser necessário suspender o julgamento, no caso de
questões particularmente controversas.186 No entanto, mesmo nesses casos,
os intérpretes criteriosos não apressarão o julgamento, mas com humildade
reconhecerão suas próprias limitações e continuarão a procurar uma solução

117
adequada para as aparentes incongruências, não tendo pressa em assumir
que uma aparente contradição representa necessariamente uma contradição
real.
Na verdade, a declaração na definição exposta, “se mostrarão totalmente
verdadeiras”, francamente reconhece que encontrar a Escritura livre de
contradições reais frequentemente envolverá um processo interpretativo que
pesa cuidadosamente todas as questões relevantes antes de chegar às
conclusões experimentais a respeito da interpretação de passagens bíblicas
individuais.187 Ao mesmo tempo, expressa a confiança de que quando todos
os fatos são conhecidos, as Escrituras serão de fato encontradas
“completamente verdadeiras em tudo o que elas afirmam”.
A última afirmação (“em tudo o que elas afirmam”), por sua vez, limita
o escopo da inerrância à intencionalidade autoral. O intérprete não deve
deturpar as intenções de um dado autor bíblico, mas sim ser justo em sua
manipulação da evidência da Escritura.188 Isso inclui a permissão de
paráfrases em citações, arredondamentos numéricos, acomodações de,
linguagem fenomenológica e assim por diante.189 Também inclui o
reconhecimento de que inerrância, entendida corretamente, é reivindicada
apenas para os autógrafos das escrituras, que, embora já não mais
existentes, são bem atestados pelo grande número de cópias dos
manuscritos disponíveis.190
Tudo isso para dizer que a inspiração e a inerrância das Escrituras não
são apenas os produtos do raciocínio circular ou da dedução imprópria do
caráter de Deus. Essas também podem ser demonstradas por indução a
partir dos próprios fenômenos escriturais, apesar de exigirem hermenêutica
e harmonização ocasional. Portanto, os esforços doutrinários e exegéticos

118
devem trabalhar em conjunto, e ambos são essenciais para que a Escritura
seja devidamente apreciada interpretada.191
Quando o bem conhecido estudioso conservador do século XX, A.
Schlatter foi considerado para ocupar uma cadeira na Universidade de
Berlim, ele foi questionado por um clérigo membro da comissão se, em seu
trabalho acadêmico, ele “permanecia na Bíblia”. A resposta de Schlatter:
“Não, eu mantenho sob a Bíblia!”.192 Essa resposta capta bem a postura
adequada do intérprete bíblico. Uma prontidão para obedecer e para ordenar
a própria vida com base na Escritura é um pré-requisito indispensável e
predisposição para uma adequada apreensão e apropriação da mensagem
bíblica. Em vez de elevar-se como um crítico supostamente neutro das
Escrituras — e alegar ser totalmente objetivo —, o estudante da Bíblia deve
tomar o seu lugar “abaixo da Escritura” como alguém dirigido por ela e que
pretende ser modificado pela Palavra de Deus “viva e eficaz” (Hb 4.12).

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Qual é a posição evangélica tradicional com relação ao cânon?
2. Qual a data apontada por Sundberg para o fechamento do cânon?
3. O que é a teoria das origens do cânon bíblico de D. Trobisch?
4. Qual era o status do cânon do AT no primeiro século, de acordo com
Sundberg?
5. Quais as evidências físicas que apontam para uma recepção inicial do
cânon com quatro Evangelhos?
6. Alguma vez um evangelho apócrifo circulou com um Evangelho
canônico?
7. Quando, segundo a perspectiva divina, o cânon do NT foi fechado?

119
8. Quais livros do NT demoraram mais para ser universalmente
recebidos?
9. Quais livros no presente cânon do NT foram universalmente rejeitados
no século II?
10. Quais livros do NT são chamados de “Escritura” no NT?
11. O que é “equivalência formal”?
12. O que é “equivalência dinâmica”?
13. O que é um “autógrafo”?
14. Qual é uma das vantagens resultantes da perda dos autógrafos das
Escrituras?
15. Quem foi o primeiro a traduzir a Bíblia completa para a língua
inglesa?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


Referência geral
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127
Tabela 1.3: Datas dos Pais da Igreja, Obras Patrísticas e Listas
Canônicas
Pais da igreja, obras
Data (s) (Datas são
patrísticas, listas Principais Obras
d.C.)*
canônicas
Anfilóquio de Icônio c. 340-395 Jambos para Seleuco
Prólogos Século IV; Prólogo a Carta Pascal de 367
Antimarcionitas Lucas: c. 160-180
Atanásio de Alexandria c. 296-373 Súplica
Atenágoras de Atenas c. 180 Harmonia dos
Evangelhos;
Confissões; Cidade de
Deus
Agostinho de Hipona 354-430 Sobre o Espírito Santo
Basílio de Cesareia c. 330-379 O Instrutor
(Paedagogus);
Miscelâneas
(Stromateis); Quem é o
Homem Rico que Será
Salvo (Quis dives
salvetur?)
Clemente de c. 150-215 1Clemente
Alexandria
Clemente de Roma c. 96 Catequeses
Cirilo de Jerusalém c. 315-387 Compilado por Taciano
Diatessaron c. 150-160?
Didaquê Segunda metade do
primeiro século ou
início do século II
* As datas geralmente seguem F. L. Cross; E. A. Linvingstone, orgs., The Oxford dictionary of
the Christian church, 3. ed. (Oxford/New York: Oxford University Press, 1977). O ponto de
interrogação indica que a data é discutível. A data fornecida reflete o ponto de vista do autor.

128
Pais da igreja, obras
Data (s) (Datas são
patrísticas, listas Principais Obras
d.C.)*
canônicas
Epifânio de Salamina c. 315-403 Refutação de Todas as
Heresias = Panarion
Epístola de Pseudo- c. 135?
Barnabé
Epístola a Diogneto Século II ou III
Eusébio de Cesareia c. 260-340 História Eclesiástica
Gregório de Nazianzo 329-390 Cinco Orações
Teológicas, Filocalia
Hegésipo c. 110-180 Memórias (citada por
Eusébio)
Hipólito de Roma c. 170-236 Refutação de Todas as
Heresias; Anticristo
Inácio de Antioquia c. 35-110 Aos Efésios; Aos
Magnésios; Aos
Filadelfos; A Policarpo;
Aos Trálios; Aos
Esmirniotas
Ireneu de Lião c. 130-200 Contra as Heresias
Jerônimo c. 345-420 Vulgata; Comentários;
Sobre Homens Ilustres
(De Viris Illustribus)
João Crisóstomo c. 347-407 Homílias
Justino Mártir c. 100-165 Diálogo com Trifo;
Primeira Apologia
Marcião de Sinope Morto c. 160 Apostolicon

* As datas geralmente seguem F. L. Cross; E. A. Linvingstone, orgs., The Oxford dictionary of


the Christian church, 3. ed. (Oxford/New York: Oxford University Press, 1977). O ponto de
interrogação indica que a data é discutível. A data fornecida reflete o ponto de vista do autor.

129
Pais da igreja, obras
Data (s) (Datas são
patrísticas, listas Principais Obras
d.C.)*
canônicas
Melito de Sardes Morto c. 190 Citado por Eusébio et
al.
Prólogos Monárquicos Final do século IV ou
início do século V?
Cânon de Muratori Final do século II?
Orígenes c. 185-254 Contra Celso;
Comentários
Orósio c. 385-420 Sete Livros de História
Contra os Romanos
Panteno Morto c. 190 Mencionado por
Eusébio
Papias de Hierápolis c. 60-130 Exposições dos Ditos do
Senhor
Filipe de Side Início do século V História Cristã
Policarpo de Esmirna c. 69-155 Aos Filipenses
Serapião de Antioquia Morto 211 Citado por Eusébio
Pastor de Hermas Início do século II?
Tertuliano c. 160-225 Contra Marcião;
Apologia; Sobre o
Batismo
Teófilo de Antioquia Final do século II Três Livros a Autólico
* As datas geralmente seguem F. L. Cross; E. A. Linvingstone, orgs., The Oxford dictionary of
the Christian church, 3. ed. (Oxford/New York: Oxford University Press, 1977). O ponto de
interrogação indica que a data é discutível. A data fornecida reflete o ponto de vista do autor.

130
1
B. F. Westcott, A General Survey of the History of the Canon of the New Testament (London:

Macmillan, 1896), p. 1. Westcott define canôn como “a coleção de livros que constituem a regra

original escrita da fé cristã” (ibid., n. 1).

2
Veja L. M. McDonald, The Biblical Canon: Its Origin, Transmission, and Authority, 3. ed.

(Peabody: Hendrickson, 2007), p. 38-39; e B. M. Metzger, The Canon of the New Testament: Its

Origin, Development, and Significance (Oxford: Clarendon, 1987), p. 289-93.

3
Para estudos úteis, veja D. G. Dunbar, “The Biblical Canon”, em: D. A. Carson; J. D.

Woodbridge, orgs., Hermeneutics, Authority, and Canon (Grand Rapids: Zondervan, 1986), p. 297-

360, 424-46; e “The New Testament Canon” em: D. A. Carson; D. J. Moo, orgs., An Introduction to

the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids: Zondervan, 2005), p. 726-43 [publicado em português por

Vida Nova sob o título Introdução ao Novo Testamento]. Veja discussão adicional a seguir.

4
K. and B. Aland, The Text of the New Testament, ed. rev. e ampliada, tradução para o inglês de

E. F. Rhodes (Grand Rapids: Eerdmans, 1988), p. 85; B. M. Metzger; B. D. Ehrman, The Text of the

New Testament: Its Transmission, Corruption, and Restoration, 4. ed. (New York/Oxford: Oxford

University Press, 2005), p. 55-56.

5
M. B. Thompson, “The Holy Internet: Communication Between Churches in the First Christian

Generation”, em: R. Bauckham, org., The Gospels for all Christians: Rethinking the Gospel

Audiences (Grand Rapids: Eerdmans, 1998), p. 49-70.

6
Alguns estudiosos tentaram reabrir essa questão; veja R. W. Funk, “The Once and Future New

Testament”, em: L. M. McDonald; J. A. Sanders, orgs., The Canon Debate, 2. ed. (Peabody:

Hendrickson, 2002), p. 541-57; e a discussão das propostas reformistas feministas de E. S. Fiorenza,

R. R. Ruether e outros em: M. E. Köstenberger, Jesus and the Feminists: Who Do They Say That He

Is? (Wheaton: Crossway, 2008). McDonald (Biblical Canon, p. 427) questionou os contornos do

cânon do NT, particularmente em relação a 2Pedro, as Pastorais e outros livros “não apostólicos”.

Historicamente, certos grupos cristãos têm tido um NT diferente. As igrejas nestorianas do leste da

131
Síria ainda defendem um NT com 22 livros (B. M. Metzger, The Bible in translation [Grand Rapids:

Baker, 2001], p. 25-29; Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 735). Os evangélicos e

os católicos romanos continuam a diferir em relação ao conteúdo do cânon do AT (veja a discussão

dos Apócrifos do AT no capítulo 2 a seguir).

7
J. Barton, Holy Writings, Sacred Text: The Canon in Early Christianity (Louisville: Westminster

John Knox, 1997), p. 1.

8
W. R. Farmer; D. M. Farkasfalvy; H. W. Attridge. The Formation of the New Testament Canon:

An Ecumenical Approach, Theological Inquiries (New York: Paulist, 1983), p. 125.

9
Por exemplo, Lucas 4.21; 2Timóteo 3.16; 2Pedro 1.20.

10
I. H. Marshall, The International Critical Commentary on the Pastoral Epistles, ICC

(Edinburgh: T&T Clark, 1999), p. 615. Ele observou que alguns estudiosos tentam diminuir a

implicação da declaração (1) ao fazerem referência à graphē aplicando apenas a primeira citação; (2)

por um livre entendimento da palavra; ou (3) pela alegação de que o termo é uma expressão inexata.

No entanto, como Marshall corretamente disse: “De qualquer modo, para o autor, a segunda citação

tinha a mesma autoridade que o AT” (ibid.).

11
Esse silêncio pode ser explicado pela (1) falta de registros completos (3João ter sido citado em

antigos escritos patrísticos que agora estão perdidos); (2) a brevidade da carta (apenas 14 versículos);

e (3) o fato de que a referência a 3João pode não ter sido tão essencial na proclamação, defesa da fé

ou controvérsias teológicas da igreja primitiva quanto aos escritos de maior peso do NT. Mas veja C.

E. Hill, The Johannine Corpus in the Early Church (New York: Oxford University Press, 2004), pp.

99 e 369. Hill observou que o autor da Epistula Apostolorum usou a expressão “andar em verdade”,

um possível eco de 3João 3-4, e que Ireneu (Contra Heresias 4.26.3) pode aludir a 3João 9 quando se

refere aos presbíteros que “conduzem a si mesmos com desprezo pelos outros, e se enchem de

orgulho por ocupar o assento principal”. Hill também teorizou que o códice Beza, do século V ou VI,

pode ter originalmente incluído João, Apocalipse e 1, 2 e 3João na ordem sucessiva, que sugeriria

132
uma considerável pré-história bem como um “corpus joanino” (ibid., 455). Dado o tamanho e

conteúdo de 3João, a questão que se levanta é como um manuscrito poderia ter sobrevivido a não ser

que ele tivesse ligado a um ou vários manuscritos maiores (pelo menos 1 e 2João).

12
Geralmente, Clemente usava graphē para se referir ao AT, exceto por 2Clemente 23.3, onde ele

citou um escrito desconhecido (veja também 2Clemente 11.2-4 para a mesma citação). Há alguma

conexão desse escrito desconhecido com Tiago.

13
M. W. Holmes, The Apostolic Fathers, 3. ed. (Grand Rapids: Baker, 2007), p. 141: “Este

parece ser o primeiro exemplo de uma passagem do NT sendo citada como Escritura” (ênfase

original). Holmes sugeriu que a passagem citada é de Mateus 9.13 ou Marcos 2.17.

14
P. Hartog, Polycarp and the New Testament, WUNT 2/134 (Tübingen: Mohr-Siebeck, 2002), p.

195.

15
Metzger (Canon, p. 61) afirmou: “Policarpo quase que certamente conhece a Epístola aos

Hebreus; ele se refere a Cristo como ‘eterno sumo sacerdote’ (12.2; veja Hb 6.20; 7.3) e parece ecoar

Hebreus 12.8 (‘vamos servi-lo com temor e toda reverência,’ 6.3)”.

16
A citação é de Efésios 4.26, citando o Salmo 4.5. Holmes, Apostolic Fathers, p. 295.

17
Policarpo ainda parecia tão enamorado de 1Clemente que regularmente utilizava a palavra

traduzida “meditar sobre” (egkyptō) para se referir ao estudo das Escrituras do AT. No entanto,

Policarpo, por sua vez, usou o termo favorito de Clemente, não com referência ao AT, mas às cartas

paulinas (Fp 3.2). Policarpo claramente entendia a coleção de cartas paulinas com Escritura. Ele

certamente tinha acesso a Romanos, 1 e 2Coríntios, Gálatas, Efésios, Filipenses e 1 e 2Timóteo, e

possivelmente 2Tessalonicenses (Hartog, Polycarp and the NT, p. 195-97). Dada essa lista, é

improvável que a coleção de Policarpo das cartas de Paulo não contivesse o restante de suas cartas

(veja mais adiante sobre a natureza das antigas coleções de cartas).

18
C. E. Hill, “Papias of Hierapolis”, Exp Tim 117 (2006) p. 312.

133
19
Ibid.

20
Veja Metzger, Canon, p. 305-7, citando o Cânon de Muratori, p. 60, 66-67.

21
Veja a discussão em ibid., p. 191-201.

22
N. L. Geisler; W. E. Nix, A General Introduction to the Bible, ed. rev. e exp., (Chicago:

Moody, 1986), p. 277-78 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução geral à

Bíblia].

23
Para tratamentos úteis na formação do cânon cristão, incluído critérios para canonicidade, veja

Carson e Moo, Introduction to the New Testament, p. 726-43 (esp. p. 736-37); e L. M. McDonald,

“Canon”, em: R. Martin; P. H. Davids, orgs., Dictionary of the Later New Testament and its

Development (Downers Grove: InterVarsity, 1997), p. 134-44 (para antigas referências relacionadas

aos critérios de canonicidade, veja p. 135).

24
A lista apresentada não deve ser entendida como sugestão de que a igreja primitiva usou

exatamente esses critérios para chegar ao cânon do NT. Antes, esses quatro critérios, usados em

conjunto um com o outro, adequadamente sumarizam os tipos de considerações levadas a julgamento

pela igreja primitiva acerca de livros individuais para possível inclusão no cânon.

25
Eusébio, Hist. Ec. 3.25. Eusébio adicionou o livro de Apocalipse a este porque ele não poderia

reconciliar os mil anos de Apocalipse 20.2-7 com sua própria posição antiquiliasta, embora isso

pareça ter sido, pelo menos até certo ponto, uma função de sua própria tendência, em vez de refletir a

difundida rejeição de Apocalipse pela igreja como um todo.

26
Hilário de Poitiers (c. 315-367/68) recebeu Hebreus e Tiago; Filástrio, bispo da Brescia (m. c.

397), recebeu as sete Epístolas Gerais e Hebreus; Rufino (c. 345-411) recebeu todos os 27 livros do

NT, como o fez seu amigo e contemporâneo Jerônimo (c. 345-420). Agostinho (354-430) os

acompanhou (veja Metzger, Canon, p. 232-37).

134
27
Apocalipse foi o único livro rejeitado por Cirilo, bispo de Jerusalém (c. 315-387) e Gregório de

Nazianzo (c. 329/30-389/90); Anfilóquio de Icônio (c. 340-395) afirmou que a maioria rejeitou

Apocalipse.

28
Assim também o fez Epifânio de Salamina (c. 315-403). Veja F. F. Bruce, The Canon of

Scripture (Downers Grove: InterVarsity, 1988), p. 210-14.

29
Entre esses escritos estavam o Pastor de Hermas (recebido por Ireneu, respeitado no Egito,

mas não por Clemente de Alexandria ou Orígenes), Sabedoria de Salomão e o Apocalipse de Pedro

(incluído no Cânon de Muratori). Primeira Clemente também foi recebida como Escritura por alguns

(por exemplo, Clemente de Alexandria). A Epístola de Barnabé foi considerada canônica por um

breve período no Egito. A Didaquê também foi considerada em algum momento Escritura no Egito,

segundo Clemente de Alexandria e Orígenes. Veja H. Y. Gamble, The New Testament Canon: Its

Making and Meaning, Guides to Biblical Scholarship (Philadelphia: Fortress, 1985), p. 48-49.

30
Observe que tanto o Cânon de Muratori quanto Eusébio discutem os livros do NT nessas

categorias, assim como fizeram muitos outros escritores patrísticos.

31
Westcott (Canon, p. 439) observou com referência ao Códice Sinaítico e Pastor de Hermas que

“o arranjo do material exibe [sic] que o Pastor, assim como 4Macabeus no Antigo Testamento, foi

tratado como uma seção separada do volume, e, portanto, talvez como um apêndice aos livros

recebidos de forma mais geral”.

32
D. Brown (The Da Vinci Code [New York: Doubleday, 2003], p. 234), em um romance popular

bem difundido, sugeriu que o cânon foi determinado — e ainda mais, significativamente reformado

— no Concílio de Niceia (325). Na verdade, o Concílio jamais discutiu o assunto. Em vez disso, esse

primeiro concílio ecumênico pressupôs as Escrituras do NT, incluindo os quatro Evangelhos

canônicos, como árbitro de todas as discussões (veja Westcott, Canon, p. 438).

33
Veja Metzger, Canon, p. 314-15; Westcott, Canon, p. 448-49.

135
34
P. Schaff , org., The Seven Ecumenical Councils: Nicene and Post-Nicene Fathers, Série 2, vol.

14 (Edinburgh: T&T Clark, s.d.), p. 454.

35
P. Balla, “Evidence for an Early Christian Canon (Second and Third Century)”, em: Canon

Debate, p. 385.

36
Isso será abordado, mais adiante, na discussão sobre pseudonímia; veja especialmente as

discussões no capítulo 15 (Pastorais) e capítulo 18 (2Pedro).

37
Veja A. C. Sundberg Jr., “Toward a Revised History of the New Testament Canon”, SE IV, TU

102 (Berlin: Akademie, 1968), p. 452-61; id., “Canon Muratori: A Fourth-Century List”, HTR 66

(1973), p. 1-41.

38
Veja Sundberg, “Canon Muratori”; G. M. Hahneman, The Muratorian Fragment and the

Development of the Canon, Oxford Theological Monographs (Oxford: Clarendon, 1992); e

McDonald, Biblical Canon, p. 369-79. Sobre o Cânon de Muratori, veja agora o breve sumário

anterior neste capítulo e a discussão em Metzger (Canon, p. 191-201).

39
E. Ferguson, “Canon Muratori: Provenance and Date”, Studia Patristica 18 (1982), p. 677-83.

Os argumentos de Hahneman são solidamente refutados por C. E. Hill, “The Debate over the

Muratorian Fragment and the Development of the Canon”, WTJ 57 (1995), p. 437-52 (veja esp. p.

440). Veja também E. Ferguson, “Review of G. M. Hahneman, The Muratorian Fragment and the

Development of the Canon”, JTS 57 (1993), p. 696. Para uma discussão útil sobre a data do Pastor de

Hermas, veja Holmes (Apostolic Fathers, p. 447), que sugere que o escrito possa ser um documento

composto.

40
Veja A. C. Sundberg, “The Bible Canon and the Christian Doctrine of Inspiration”, Int 29

(1975), p. 352-71.

41
Veja, mais adiante neste capítulo, a discussão sobre inspiração.

136
42
C. D. Allert, A High View of Scripture? The Authority of the Bible and the Formation of the

New Testament Canon, Evangelical Resourcement: Ancient Sources for the Church’s Future (Grand

Rapids: Baker, 2007), p. 175.

43
A. C. Sundberg, “Protestant Old Testament Canon: Should It Be Re-Examined?” CBQ 28

(1966), p. 194-203; e id., “The ‘Old Testament’: A Christian Canon”, CBQ 30 (1968), p. 143-55.

44
Allert, High View of Scripture, p. 175.

45
McDonald, Biblical Canon, p. 426-27.

46
Essa questão aborda, pelo menos, duas grandes questões. Primeiro, há a questão da exegese

adequada: o NT não endossa nem a escravidão e nem a subjugação das mulheres, apesar de restringir

certas funções eclesiásticas aos homens (veja R.W. Yarbrough, “Progressive and Historic:

Hermeneutics of 1 Timothy 2.9-15”, em: A. J. Köstenberger; T. R. Schreiner, orgs., Women in the

Church: An Analysis and Application of 1 Timothy 2.9-15, [Grand Rapids: Baker, 2005], p. 121-48).

Segundo, há a questão do relacionamento entre a revelação bíblica e a cultura contemporânea.

Especialmente uma vez que a cultura está sempre em estado de fluxo, se não de entropia (um caso

em relação à defesa de alguns, mesmo na igreja, da admissão da homossexualidade hoje, que está em

conflito com a condenação universal que a Bíblia faz dessa prática), a cultura não deve ser utilizada

para julgar a adequabilidade do ensino bíblico. Em vez disso, as Escrituras deveriam constituir o

padrão pelo qual a moralidade da cultura dominante é avaliada.

47
Por exemplo, Allert, A High View of Scripture, p. 141; Barton, Holy Writing, Sacred Text, p.

10; e Metzger, Canon, p. 212.

48
Gamble, New Testament Canon, p. 17.

49
Por exemplo, M. G. Kline, The Structure of Biblical Authority, 2. ed. (Eugene: Wipf & Stock,

1997 [1987]), p. 75, que sugere que a natureza pactual do cânon levou os escritores da igreja

primitiva a empregar o termo “pactual” ao invés de “cânon”.

137
50
Por exemplo, E. Evanson tentou reduzir o cânon cristão por razões teológicas (Dissonance of

the Four Generally Received Evangelists and the Evidence of Their Respective Authenticity,

Examined with That of Some Other Scriptures Deemed Canonical [Gloucester: Walker, 1805], p.

340-41).

51
Veja C. E. Hill, “The New Testament Canon: Deconstrucio ad absurdum?” JETS 52 (2009).

52
J. D. G. Dunn, “How the New Testament Began”, em: W. Brackney; C. Evans, orgs., From

Biblical Criticism to Biblical Faith: Essays in Honor of Lee Martin McDonald (Macon: Mercer Univ.

Press, 2007), p. 128. Veja também id., Jesus Remembered, Christianity in the Making 1 (Grand

Rapids: Eerdmans, 2003).

53
Dunn, “How the New Testament Began”, p. 127.

54
Ibid., p. 128.

55
Se limitado aos primeiros poucos séculos da era cristã, o número é ainda menor. B. D. Ehrman,

Lost Scriptures: Books That Did Not Make It Into The New Testament (New York: Oxford University

Press, 2003), inclui apenas 17 Evangelhos não canônicos, incluindo o discutido Evangelho Secreto de

Marcos (veja cap. 3 adiante). J. K. Elliott (The Apocryphal New Testament [Oxford: Clarendon,

1993]) forneceu uma lista mais completa, mas uma leitura cuidadosa dos Evangelhos apresentados

em seu livro mostra que muitos deles (1) são fragmentários, tardios e dependentes dos Evangelhos

canônicos; (2) incluem conteúdo duvidoso; ou (3) são por outro lado transparentemente inferiores aos

Evangelhos canônicos.

56
Somente a evidência do manuscrito sugere que os quatro Evangelhos canônicos eram bem

mais populares que os demais. O Evangelho de Tomé tem um manuscrito completo (e três pequenos

fragmentos); restaram do Evangelho de Pedro apenas três pequenos fragmentos; do Evangelho

Egerton, apenas dois pequenos fragmentos; do Evangelho de Hebreus, apenas citações (G. Stanton,

The Gospels and Jesus, 2. ed. [Oxford: Oxford University Press, 2002], p. 122-35).

138
57
Veja Eusébio, Hist. Ec. 6.12.

58
Veja especialmente R. Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses: The Gospels as Eyewitness

Testimony (Grand Rapids: Eerdmans, 2006). Ele enfatizou o caráter de testemunho ocular dos

Evangelhos e argumentou que os Doze serviram como um “colegiado digno de crédito” na

preservação do testemunho ocular do evangelho a respeito de Jesus nos Evangelhos.

59
Ver A. von Harnack, Marcion: Das Evangelium vom fremden Gott: Eine Monographie zur

Geschichte der Grundlegung der katholischen Kirche, Bibliothek klassischer Texte (Darmstadt:

Wissenschaftliche Buchgesellschaft, 1996; reimpr. da ed. de 1924), p. 357; H. von Campenhausen,

The Formation of the Christian Bible (Philadelphia: Fortress, 1972), p. 148; e J. Knox, Marcion and

the New Testament (Chicago: University Press, 1942), p. 31, que escreveu que “Marcião é o principal

responsável pela ideia do Novo Testamento”.

60
Veja a discussão do estímulo para canonização mais acima. Veja Metzger, Canon, p. 99; e T.

von Zahn, Geschichte des neutestamentlichen Kanons I (Erlangen/Leipzig: A. Deichert, 1888), p.

586.

61
A observação de Tertuliano de que Marcião tinha “roído os evangelhos aos pedaços” sugere

que a separação de Lucas dos demais Evangelhos por Marcião foi uma quebra em uma coleção já

existente (Against Marcion, em: A. Roberts; J. Donaldson, orgs., The Ante-Nicene Fathers [Grand

Rapids: Eerdmans, 1986], vol. 3: Latin christianity: Its Founder, Tertullian, p. 272). Tertuliano ainda

observou que a rejeição dos demais Evangelhos por Marcião era puramente uma inovação, não um

movimento de restauração, indicando que ele certamente conhecia os outros Evangelhos (Against

Marcion, Livro IV, caps. III-IV, em: ibid., p. 348-49).

62
E. Ferguson, “Factors Leading to the Selection and Closure of the New Testament Canon”, em:

Canon Debate, p. 313.

139
63
Veja Justino, 1Apol. 67: “E no dia chamado domingo, todos os que vivem nas cidades ou no

campo se reúnem em um único lugar, e as memórias dos apóstolos ou os escritos dos profetas são

lidos, enquanto o tempo permitir; então, quando o leitor termina, o presidente verbalmente instrui e

exorta à imitação dessas coisas boas” (A. Roberts; J. Donaldson, orgs., The Ante-Nicene Fathers

[Grand Rapids: Eerdmans,1987], vol. 1: The Apostolic Fathers — Justin Martyr — Irenaeus, p. 186).

64
Contra von Campenhausen (Formation of the Christian Bible, p. 103), que sustentava que “É

comum falar de um cânon dos quatro Evangelhos’, um ‘cânon’ das Epístolas Paulinas e um cânon

‘apocalíptico’ até mesmo antes da época de Marcião. Nossas fontes certamente nada fazem para

justificar essas ideias”.

65
Taciano, aluno de Justino, criou o Diatessaron (“através dos quatro”), uma contínua harmonia

dos Evangelhos.

66
G. N. Stanton, “The Fourfold Gospel”, NTS 43 (1997), p. 316-46.

67
M. Hengel, The Four Gospels and One Gospel of Jesus Christ (Harrisburg: Trinity

International, 2000), p. 10.

68
Por exemplo, McDonald (Biblical Canon, p. 290) argumenta que Ireneu foi um inovador aqui.

69
T. C. Skeat, “Irenaeus and the Four-Gospel Canon”, NovT 34 (1992), p. 198-99.

70
Ireneu, Contra Heresias 3.11.8 (Migne, PG 7.1, p. 889). O argumento de Ireneu é que o único

evangelho é, literalmente, “quadruplamente formado” (tetramorphē).

71
idean tou euangeliou (grifo nosso).

72
Grifo nosso; prosōpon, lat. personas; lit. “face” ou “máscara”. Ireneu, Contra Heresias 3.11.9

(Migne, PG 7.1, p. 890).

73
Observe também as palavras finais de Ireneu: “Uma vez que Deus fez todas as coisas em

ordem e de forma alinhada, também foi adequado para a aparência externa do Evangelho ser bem

140
organizado [lat., bene compositam] e bem conectado [lat., bene compaginatam]. Portanto, tendo

examinado a opinião dos homens que transmitiram o Evangelho até nós, desde o seu início, voltemo-

nos também para os apóstolos restantes” (Contra Heresias 3.11.9 [PG 71, 894]).

74 45
Os manuscritos mais antigos são: , contendo todos os quatro Evangelhos e Atos (século
75
III); , que contém Lucas e João, tornando-o passível de originalmente ter contido os quatro
53
Evangelhos (c. 200); possivelmente (contendo os quatro Evangelhos e Atos; c. 260); e Uncial

0171 (c. 300). Veja Metzger e Ehrman, Text of the New Testament, p. 53-61.

75
Ferguson, “Factors Leading to the Selection and Closure of the New Testament Canon”, p.

303.

76
T. C. Skeat, “The Oldest Manuscript of the Four Gospels?” NTS 43 (1997), p. 1-34. Veja

também P.W. Comfort, “Exploring the Common Identification of Three New Testament Manuscripts:
4 64 67
, , and ”, TynBul 46 (1995), p. 43-54. Essa identificação foi recentemente questionada por P.
4 64 67
M. Head, “Is , , and the Oldest Manuscript of the Four Gospels? A Response to T. C.

Skeat”, NTS 51 (2005), p. 450-57. Embora C. P. Thiede tenha alegado uma data próxima ao ano 100
67 64
para , ele não conseguiu muitos seguidores (“Papyrus Magdalen Greek 17 [Gregory-Aland ]:

A Reappraisal”, TynBul 46 [1995], p. 29-42).

77
C. H. Roberts; T. C. Skeat, The Birth of the Codex (London: British Academy, 1983), p. 65.

78
J. K. Elliott, “Manuscripts, the Codex, and the Canon”, JSNT 63 (1996), p. 107.

79
W. G. Kümmel; P. Fein; J. Behm, Introduction to the New Testament (Nashville: Abingdon,

1966), p. 480-81. Veja também Aland e Aland, Text of the New Testament, p. 49.

80
S. E. Porter, “When and How was the Pauline Canon Compiled? An Assessment of Theories”,

em: S. E. Porter, org., The Pauline Canon, (Boston: Brill, 2004), p. 103.

81
Alguns estudiosos sugerem que houve um grande período de negligência de Paulo porque o

julgamento antecedente sobre a data do Evangelho mais antigo — pós 70 — significava que esses

141
Evangelhos não tinham conhecimento de Paulo. Assim, alguém — talvez lendo o inspirador relato de

Atos — ficasse motivado a recolher as cartas uns trinta anos depois da morte de Paulo (veja E. J.

Goodspeed, How Came the Bible? [Nashville: Cokesbury, 1940], p. 59-63); Goodspeed em várias

partes sugeriu que a pessoa responsável foi Onésimo, o escravo fugitivo mencionado no livro de

Filemom. Veja id., New Solutions to New Testament Problems [Chicago: University Press, 1927], p.

1-64; e seu estudante J. Knox, Philemon Among the Letters of Paul [London: Collins, 1960]).

Entretanto, Dunn (“How the New Testament Began”, p. 133) corretamente observou que “aquelas

[cartas] foram preservadas porque eram valorizadas, lidas com frequência, copiadas e postas em

circulação”.

82
Porter, “When and How Was the Pauline Canon Compiled”, p. 109-13.

83
Para Cicero, veja Att. 1.17; 3.9; para as cartas de Inácio, veja Pol. 13:1 (A carta de Policarpo é

em resposta ao pedido dos filipenses por cartas de Inácio). E. R. Richards (Paul and First-Century

Letter Writing: Secretaries, Composition and Collection [Downers Grove: InterVarsity, 2004], p.

156) citou Cícero e um papiro encontrado (PZen 10) e corretamente concluiu que essa era “uma

prática suficientemente comum”.

84
H. Gamble, Books and Readers in the Early Church: A History of Early Christian Texts (New

Haven: Yale University Press, 1995), p. 100-101.

85
D. Trobisch, Paul’s Letter Collection: Tracing the Origins (Minneapolis: Fortress, 2000

[1994]), p. 50. Primeiro, o próprio autor preparou algumas cartas para publicação (Trobisch

argumentou por Romanos, 1 e 2Coríntios e Gálatas em um primeiro nível). Segundo, após a morte do

autor, essas edições foram expandidas e outras edições foram publicadas de cartas conhecidas do

autor. Terceiro, no final, todas as edições foram combinadas em uma edição abrangente. Uma das

razões para essa separação é que Gálatas é mais curta que Efésios, e ainda assim anterior a esta no

arranjo canônico. Trobisch viu isso como evidência do final da coleção de cartas carta original. No

entanto, J. Murphy-O’Connor (Paul the Letter Writer: His World, His Options, His Skills

142
[Collegeville: Liturgical Press, 1995], p. 120-30) corretamente observou que havia maneiras

mensuração disponíveis aos escribas que não o número de caracteres (tal como o número de linhas)

que mostram extensões semelhantes em Gálatas, Efésios, Colossenses e Filipenses, respectivamente.

86
Porter, Pauline Canon, p. 115-21.

87
Gamble, Books and Readers, p. 51-52.

88
Gamble (ibid., p. 62-65) chegou até mesmo a promover a ideia de que a coleção de cartas

paulinas na verdade provocou a preferência cristã pelo formato de códice. Ele é seguido, até certo

ponto, por Richards (Paul and First-Century Letter Writing, p. 223).

89
Trobisch, Paul’s Letter Collection, p. 22-24.

90
Dunn, “How the New Testament Began”, p. 137: “O cânon de fato de Jesus e Paulo,

Evangelhos e Epístolas, já estava funcionando com efeito nos primeiros trinta anos de existência do

cristianismo”.

91
Afirmava-se que João conhecia os outros Evangelhos. Veja Eusébio (Hist. Ec. 3.24.7) —

identificado por C. E. Hill (“What Papias Said About John (and Luke): A ‘New’ Papian Fragment,”

JTS 2 [1998], p. 582-629) como um fragmento de Papias — que escreveu: “João acolheu bem os

outros três Evangelhos anteriores, que haviam sido distribuídos a todos, incluindo ele mesmo, e

testificou sua veracidade, notando que eles omitiram o primeiro ministério”. Outra lenda a respeito de

João é encontrada em um fragmento de Orígenes que ele alegava ter vindo de um “antigo escrito”.

Comentando sobre o prefácio de Lucas, ele relata que “João coletou os Evangelhos escritos em sua

própria época, no reinado de Nero, e aprovou e reconheceu aqueles dos quais o engano do diabo não

havia tomado posse, mas recusou e rejeitou aqueles que achou não serem verdadeiros” (Orígenes,

Hom. Lc 1 fr. 9).

92
Ferguson, “Factors Leading to the Selection and Closure of the New Testament Canon”, p.

304.

143
93
Trobisch, First Edition, p. 103. Outros incluem C. R. Gregory, Canon and Text of the New

Testament (New York: Charles Scribner’s Sons, 1907), p. 467-68.

94
Essa ordem é essencialmente encontrada no Cânon de Muratori e Eusébio. Veja R. Bauckham,

James: Wisdom of James, Disciple of Jesus the Sage, New Testament Readings (London/New York:

Routledge, 1999), p. 115-16.

95
Bruce, Canon, p. 243-46.

96
A Sociedade Bíblica Internacional editou uma versão da TNIV chamada “os livros da Bíblia”

que radicalmente arranja o NT de uma nova forma. Em um movimento ousado, o comitê removeu o

capítulo e a divisão de versículos de Robert Estienne (também conhecido como Stephanus), que os

introduziu na quarta edição de seu NT grego em 1551 (veja P. D. Wegner, The Journey from Texts to

Translations:The Origin and Development of the Bible [Grand Rapids: Baker, 1999], p. 269). Apenas

a extensão é indicada no final da página. O NT começa com Lucas-Atos, seguidos por um curioso

arranjo das cartas Paulinas; Mateus é o próximo e depois vem Hebreus e Tiago; Marcos é seguido por

1 e 2Pedro e Judas; depois João é seguido de 1, 2 e 3João e Apocalipse.

97
Veja Trobisch, First Edition, p. 97-98.

98
“Extensão” pode não ser necessariamente uma função da contagem de palavras, mas pode se

referir ao número de linhas ou outra forma de medida (Porter, “Pauline Canon”, p. 115).

99
A respeito da questão do desenvolvimento na teologia paulina, veja o capítulo 21 mais adiante.

100
Veja R. Bauckham, The Theology of the Book of Revelation, New Testament Theology

(Cambridge: University Press, 1993), p. 144: “É uma obra de profecia cristã que entende a si mesma

como o clímax de toda tradição bíblica cristã”.

101
G.R. Osborne, Revelation, BECNT (Grand Rapids: Baker, 2002), p. 768 [publicado em

português por Vida Nova sob o título Apocalipse: comentário exegético].

144
102
As observações anteriores explicam o porquê do modo como tratamos o material no restante

deste volume (observe especialmente que o livro segue uma ordem cronológica, em vez de uma

ordem canônica, das cartas de Paulo). As presentes observações também fornecem a base para o

capítulo final sobre o tema da unidade e diversidade do NT.

103
Kline, Structure of Biblical Authority.

104
Veja N. Turner, “The Language of Jesus and His Disciples,” em: S. E. Porter, org., The

Language of the New Testament: Classic Essays, JSNTSup 60 (Sheffield: JSOT, 1991), p. 174-90; J.

Fitzmyer, “The Languages of Palestine in the First Century A.D.,” CBQ 32 (1970), p. 501-31; S. E.

Porter, The Criteria for Authenticity in Historical-Jesus Research: Previous Discussion and New

Proposals, JSNTSup 191 (Sheffield: Academic Press, 2000), p. 126-80; e id., “Greek of the New

Testament”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 426-35, especialmente p. 433-4.

105
N. R. Lightfoot, How We Got the Bible, 3. ed. (New York: MJF, 2003), p. 33.

106
Metzger and Ehrman, Text of the New Testament, p. 4.

107
Ibid., p. 5.

108
Ibid.

109
Elliott, “Manuscripts, the Codex, and the Canon”, p. 107.

110
Gamble, Books and Readers, p. 58.

111
Um caso em questão é a serpente de bronze que Moisés esculpiu no deserto (Nm 21.9), que

mais tarde foi adorada sob o nome de “Nehushtan” e acabou destruída como parte da reforma de

Ezequias. Semelhantemente, a tumba de Ireneu sobreviveu até a época da Reforma, quando foi

destruída pelos calvinistas franceses porque os católicos a estavam adorando. Veja G. W. Kitchin,

History of France, 3. ed. rev. (Oxford: Clarendon, 1896), vol. 2: A.D. 1453–1624, p. 321.

145
112
Contra B. D. Ehrman, Misquoting Jesus: The Story Behind Who Changed the Bible and Why

(San Francisco: Harper, 2005). Veja D. B. Wallace, “The Gospel According to Bart: A Review

Article of Misquoting Jesus by Bart Ehrman”, JETS 49 (2006), p. 327-49.

113
Os principais testemunhos do AT pertencem ao Texto Massorético (os massoretas eram

escribas judeus), preservado no Cairo Geniza (895), no Códice Leningrado (916), no Códice

Petropolitano Babilônico (1008), no Códice Alepo (c. 900), no Códice do Museu Britânico (950) e no

Códice Reuchlin (1105). Veja M. R. Norton, “Texts and Manuscripts of the Old Testament,” em: P.W.

Comfort, org. The Origin of the Bible (Wheaton: Tyndale, 1992), p. 154-55. O Códice Leningrado

continua sendo o mais antigo manuscrito completo e serve como a principal fonte para o texto

hebraico. Veja Wegner, Journey from Texts to Translations, p. 194. Entretanto, uma vez que o mais

antigo desses manuscritos data do século IX, eles são removidos dos autógrafos originais por um

considerável período de tempo. Outros testemunhos incluem o Talmude (traduções e comentários

aramaicos), a Septuaginta (ou LXX, a tradução grega do AT), o Pentateuco Samaritano e os

Manuscritos do Mar Morto (MMM). Os MMM, descobertos durante os anos de 1940 e 1950,

fornecem aos estudiosos testemunhos do AT que podem ser datados entre 250 e 100 a.C. A caverna

Quatro (4Q), por exemplo, revelou cerca de 40 mil fragmentos de 400 manuscritos diferentes, 100

dos quais são bíblicos, representando cada livro do AT, exceto Ester. Notavelmente, uma comparação

dos Manuscritos do Mar Morto com os textos massoréticos revela um número razoavelmente

pequeno de discrepâncias. Assim, a evidência dos manuscritos do AT firmemente demonstra que os

textos originais do AT foram cuidadosamente preservados e corretamente representados em nossa

Bíblia moderna.

114
Metzger e Ehrman, Text of the New Testament, p. 52.

115
P.W. Comfort, “Textual Criticism,” em Dictionary of the Later New Testament and Its

Developments, p. 1171.

146
116
P.W. Comfort, “Texts and Manuscripts of the New Testament”, em: Origin of the Bible, p.
52
179. Veja a descrição de em: Aland; Aland, orgs., Text of the New Testament, p. 84.

117
P.W. Comfort, “Texts and Manuscripts of the New Testament”, p. 183.

118
Veja Metzger e Ehrman (Text of the New Testament, p. 52), que afirmam que há

“aproximadamente 5.700 manuscritos gregos que contêm todo ou partes do Novo Testamento”. D. B.

Wallace, “Challenges in New Testament Textual Criticism for the Twenty-First Century”, JETS 52

(2009), p. 96, coloca o atualmente conhecido número dos manuscritos gregos do NT em 5760. Todo

o artigo de Wallace fornece uma pesquisa útil do corrente estado da crítica textual e habilmente

delineia os desafios e as tarefas remanescentes pela frente.

119
G. D. Fee, “Textual Criticism”, em: J. B. Green; S. McKnight; I. H. Marshall, orgs.,

Dictionary of Jesus and the Gospels (Downers Grove: InterVarsity, 1992), p. 828.

120
Metzger e Ehrman, Text of the New Testament, p. 16-33. Veja Comfort, “Textual Criticism”, p.

1172.

121
Lightfoot, How We Got the Bible, p. 61.

122
Para esquemas úteis descrevendo os tipos de erros dos escribas, veja Wegner, Journey from

Texts to Translations, p. 225-36.

123
Lightfoot, How We Got the Bible, p. 61.

124
Comfort, “Textual Criticism”, p. 1172.

125
P. D. Wegner, A Student’s Guide to Textual Criticism of The Bible: Its History, Methods, and

Results (Downers Grove: InterVarsity, 2004), p. 298.

126
Veja Aland; Aland, Text of the New Testament, especialmente p. 275-77.

147
127
V. S. Poythress; W. A. Grudem, The Gender-Neutral Bible Controversy: Muting the

Masculinity of God’s Words (Nashville: B&H, 2000). Veja L. Ryken, The Word of God in English:

Criteria for Excellence in Bible Translation (Wheaton: Crossway, 2002).

128
D. A. Carson, The Inclusive Language Debate: A Plea for Realism (Grand Rapids: Baker,

1998), p. 47-76. Veja M. Silva, “Are Translators Traitors? Some Personal Reflections”, em: G. G.

Scrogie; M. L. Strauss; S. M. Voth, orgs., The Challenge of Bible Translation (Grand Rapids:

Zondervan, 2002), p. 37-44.

129
J. R. Kohlenberger III, “Inclusive Language in Bible Translation”, em: Perspectives on the

TNIV from Leading Scholars and Pastors (Grand Rapids: Zondervan, 2004), p. 11.

130
D. A. Carson, “The Limits of Functional Equivalence in Bible Translation — and Other

Limits, Too”, em: Challenge of Bible Translation, p. 65-113; K. L. Barker, “Bible Translation

Philosophy with Special Reference to the New International Version”, em: Challenge of Bible

Translation, p. 51–63. Veja M. L. Strauss, Distorting Scripture? (Downers Grove: InterVarsity,

1998).

131
G. G. Scorgie, “Introduction and Overview”, em: Challenge of Bible Translation, p. 25. A

tabela a seguir foi extraída de “About Bible Translations”, www.zondervan.com.

132
D. France, “The Bible in English: An Overview”, em: Challenge of Bible Translation, p. 177.

133
Ibid., p. 179.

134
A. E. McGrath, In the Beginning: The Story of the King James Bible and How It Changed a

Nation, a Language, and a Culture (New York: Doubleday, 2001), p. 19-23.

135
France, “Bible in English”, p. 181. Compare J. W. Bright, The Gospel of Saint John in West-

Saxon (Boston/London: D. C. Heath, 1906), que apresenta a primeira versão inglesa do Evangelho de

João que precede a tradução de Wycliff em 400 anos.

148
136
D. Daniell, org., Tyndale’s New Testament (New Haven/London: Yale University Press, 1995

[1989]).

137
Ibid.

138
McGrath, In the Beginning, p. 113-29.

139
Ibid., p. 139-48.

140
France, “Bible in English”, p. 184.

141
S. J. Mikolaski, “Canon as the Air We Breathe”, em: From Biblical Criticism to Biblical

Faith, p. 146-63.

142
Por exemplo, A. G. Patzia, The Making of the New Testament: Origin, Collection, Text and

Canon (Downers Grove: InterVarsity, 1995), p. 105.

143
Uma forma modificada deste ponto de vista também é encontrada também em Metzger

(Canon, 256), embora ele claramente reconhecesse a diferença entre uma definição moderna de

inspiração bíblica e o uso da palavra de certa forma a esmo na antiguidade.

144
Sundberg, “Bible Canon”, p. 371. Veja Walden (“Luther: The One Who Shaped the Canon”,

p. 1-10) para um ponto de vista ligeiramente diferente.

145
Sundberg, “Bible Canon”, p. 371. Há certa ironia no fato de que aqueles que negam a conexão

entre inspiração e canonicidade são compelidos a discuti-la.

146
Não é preciso ver uma desvalorização da visão profética. O argumento é do menor para o

maior (comum no judaísmo). Em essência a lógica se apresenta da seguinte maneira: “Se a palavra

profética deve ser obedecida, a palavra que dirijo diretamente a Moisés deveria fazer com que

temêsseis difamá-lo”.

149
147
W. A. Grudem, “Scripture’s Self-Attestation and the Problem of Formulating a Doctrine of

Scripture”, em: D. A. Carson; J. D. Woodbridge, orgs., Scripture and Truth (Grand Rapids:

Zondervan, 1983), p. 25.

148
Obviamente é um rolo muito grande, pois eram necessárias seis horas para se ler apenas

algumas partes selecionadas do Pentateuco (Esdras “leu nele” Hb. wayyiqrā<-bô, sugerindo que o

todo não foi lido). Veja M. Breneman, Ezra, Nehemiah, Esther, NAC (Nashville: B&H, 1993), p.

224.

149
Veja R. L. Harris, Inspiration and Canonicity of the Scriptures (Grand Rapids: Zondervan,

1969), p. 154-77; Bruce, Canon of Scripture, p. 255-69. Contra E. J. Young, Introduction to the Old

Testament, 2ª ed. (Grand Rapids: Eerdmans, 1950), p. 41-42 (embora Young reconheça a diferença

entre o dom da profecia e o ofício de profeta).

150
Harris, Inspiration and Canonicity, p. 163; veja R. H. Pfeiffer, The Books of the Old

Testament (New York: Harper, 1957), p.13.

151
Isso não sugere que a coleção em um cânon foi imprópria. Cf. M. Grisanti, “Inspiration,

Inerrancy, and the OT Canon: The Place of Textual Updating in an Inerrant View of Scripture”, JETS

44 (2001), p. 577-98.

152
Grudem, “Scripture’s Self-Attestation”, p. 27.

153
Ibid., p. 28.

154
Por exemplo, Mateus 4.4; 12.5; 15.6; 22.40; 23.23; Lucas 2.23,24; 4.17; 8.21; 11.28;

16.29,31; 24.25; João 7.19,23,49,51; 8.17; 10.34; 18.31; 19.7.

155
Cf. Mateus 1.22; 2.5,15,17,23; 3.3; 4.14; 5.17; 8.17; 11.13; 12.17; 13.35; 21.4; 24.15; 26.54;

26.56; 27.9; Marcos 1.2; Lucas 1.70; 3.4; 4.21; 18.31; 24.27,32,44,45; João 1.23,45; 2.22; 6.45;

7.38,42,52; 12.38; 13.18; 15.25; 17.12; 19.24,28,36,37; 20.9.

150
156
Grudem, “Scripture’s Self-Attestation”, p. 38.

157
A atribuição mais comum do AT é “a lei e os profetas”. Isso de nenhuma maneira confirma a

suspeita sobre a terceira divisão da Bíblia Hebraica. Essa expressão e algumas vezes apenas “a lei”

são formas abreviadas de se referir a todo o AT. Veja João 10.34, onde Jesus cita “a Lei”, mas na

verdade cita o Salmo 82.6, e Mateus 13.35, onde “profeta” introduz a citação, mas a referência é aos

Escritos.

158
Ênfase acrescentada. Para um estudo do uso do AT em João 10.34-36, veja A. J.

Köstenberger, “John”, em: G. K. Beale; D. A. Carson, orgs., Commentary on the New Testament Use

of the Old Testament (Grand Rapids: Baker, 2007), p. 464-67 [publicado em português por Vida

Nova sob o título Comentário do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento].

159
A. J. Köstenberger, John, BECNT (Grand Rapids: Baker, 2004), p. 496.

160
Veja Lucas 16.17: “Todavia, é mais fácil o céu e a terra passarem do que cair um pequeno

ponto da lei”.

161
Veja L. Morris, The Gospel According to Matthew, PNTC (Grand Rapids: Eerdmans, 1992),

p. 109-10.

162
R. Gundry, Matthew: A Commentary on his Handbook for a Mixed Church Under

Persecution, 2. ed. (Grand Rapids: Eerdmans, 1994), p. 80.

163
J. A. Bengel, Gnomon of the New Testament, tradução para o inglês de A. R. Fausset

(Edinburgh: T&T Clark, 1857-1858), vol. 1, p. 149.

164
Veja especialmente R. T. France, Jesus and the Old Testament: His Application of Old

Testament Passages to Himself and his Mission (London: Tyndale, 1971).

165
D. Dockery, Christian Scripture: An Evangelical Perspective on Inspiration, Authority, and

Interpretation (Nashville: B&H, 1995), p. 28.

151
166
Veja especialmente R. N. Longenecker, Biblical Exegesis in the Apostolic Period, 2. ed.

(Grand Rapids: Eerdmans, 1999).

167
Dockery, Christian Scripture, p. 28.

168
Para um tratamento completo do uso do AT no NT, veja Beale; Carson, Commentary on the

New Testament Use of the Old Testament. Cf. também D. A. Carson; H. G. M. Williamson, It is

Written: Scripture Citing Scripture (Cambridge: University Press, 1988), que também inclui

discussões sobre o uso de referências anteriores do AT em livros posteriores do AT e a útil coleção de

ensaios em: S. E. Porter, org., Hearing the Old Testament in the New Testament (Grand Rapids:

Eerdmans, 2006).

169
Veja Gálatas 3.22; 4.22,27,30; Tiago 2.8; 4.5; 1Pe 1.16.

170
Veja G. K. Beale, “The Purpose of Symbolism in the Book of Revelation”, CTJ 41 (2006), p.

53-66.

171
Grudem, “Scripture’s Self-Attestation”, p. 46.

172
Essa é a tese central defendida por Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses.

173
Veja Atos 4.31; 6.7; 8.14; 11.1; 12.24; 13.5, 7, 46; 17.13; 18.11; 19.10; 1Coríntios 14.37;

2Coríntios 2.17; 4.2; Colossenses 1.25; 1Tessalonicenses 1.8; 2Timóteo 2.9; 1Pedro 1.23.

174
Kline, Structure of Biblical Authority, p. 27-38.

175
Contra D. Aune (Revelation 17–22, WBC 52C [Nashville: Thomas Nelson, 1998], p. 1231),

que argumentou que essa nem constituía uma “fórmula de canonização” e nem pretendia colocar

Apocalipse no mesmo nível que o AT. Ele afirmou, no entanto, que “ele considerava seu livro como o

registro de uma revelação divina que era tanto completa (e assim inalterável) quanto sagrada”.

176
G. R. Osborne, Revelation, BECNT (Grand Rapids: Baker, 2002), p. 794.

152
177
Veja R. Thomas (“The Spiritual Gift of Prophecy in Rev 22:18”, JETS 32 [1989], p. 201-16),

que alegou que isso marca o fechamento oficial do cânon como também a cessação da profecia.

Nenhuma discussão está afirmada de maneira explícita no próprio texto.

178
Grudem, “Scripture’s Self-Attestation”, p. 45.

179
Veja especialmente o tratamento útil por W. D. Mounce, The Pastoral Epistles, WBC

(Nashville: Thomas Nelson, 2000), p. 565-70; cf. A. J. Köstenberger, “1–2 Timothy, Titus,” em:

Ephesians–Philemon, Expositor’s Bible Commentary, ed. rev., (Grand Rapids: Zondervan, 2005),

vol. 12, p. 591.

180
Veja outra análise em W. D. Mounce, Pastoral Epistles, WBC (Nashville: Thomas Nelson,

2000), p. 565-70 (com referências bibliográficas adicionais).

181
Veja a discussão em R. Bauckham, Jude, 2 Peter, WBC (Waco: Word, 1983), p. 228-35.

182
B. B. Warfield, “Revelation”, em: J. Orr, org. geral, The International Standard Bible

Encyclopedia (Chicago: Howard-Severance, 1915), 4.2580a.

183
Feinberg, “The Meaning of Inerrancy”, em: Inerrancy, p. 294.

184
Cf. especialmente C. L. Blomberg, “The Legitimacy and Limits of Harmonization”, em: D. A.

Carson; J. D. Woodbridge, orgs., Hermeneutics, Authority, and Canon (Grand Rapids: Zondervan,

1986), p. 135-74. Cf. também id., The Historical Reliability of the Gospels, 2. ed. (Downers Grove:

InterVarsity, 2007); e id., The Historical Reliability of John’s Gospel (Downers Grove: InterVarsity,

2001).

185
Isso pressupõe, por causa do argumento, que tal procedimento é de fato dedutivo. Na verdade,

muitos estudiosos argumentariam que sua doutrina de uma Escritura inerrante é o resultado do estudo

contínuo das Escrituras em vez de uma pressuposição dogmática trazida à Escritura (embora isso

possa servir como um não negociável funcional para eles). O conceito de G. Osborne de uma “espiral

hermenêutica” pode ser útil aqui (A Espiral Hermenêutica, passim). De fato, a interpretação bíblica

153
exige humildade e abertura aos dados reais por parte do intérprete; um reconhecimento de que a

interpretação, como uma iniciativa humana, tem a necessidade de lidar com probabilidade e não com

a certeza absoluta; e de um processo dialético, transformador e repetido de aplicar-se ao estudo das

Escrituras, enquanto ao mesmo tempo, é referido e impactado pela Escritura.

186
Para ajuda nessa área, veja G. L. Archer Jr., New international encyclopedia of Bible

difficulties (Grand Rapids: Zondervan, 2001); e W. C. Kaiser Jr., org., Hard sayings of the Bible

(Downers Grove: InterVarsity, 1996).

187
Hoje, os intérpretes têm uma quantidade sem precedentes de recursos à sua disposição,

incluindo uma variedade de ferramentas de referência, como dicionários bíblicos, concordâncias,

bíblias de estudo, comentários acadêmicos e monografias. Para recursos recomendados, veja o

apêndice em A. J. Köstenberger e R. D. Patterson, Invitation to biblical interpretation (Grand Rapids:

Kregel, 2011).

188
Veja P. Stuhlmacher, Vom Verstehen des Neuen Testaments: Eine Hermeneutik, Grundrisse

zum Neuen Testament 6, 2. ed. (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1986), especialmente p. 222-

42, que defende uma “hermenêutica do consentimento”. Essa abordagem contrasta com uma

“hermenêutica da suspeita”, frequentemente empregada por feministas como E. S. Fiorenza (In

Memory of Her: A Feminist Theological Reconstruction of Christian Origins [New York: Crossroad,

1983]). N. T. Wright (The New Testament and the People of God, Christian Origins and the Question

of God 1 [Minneapolis: Fortress, 1992], p. 64) foi ainda mais longe, apelando para uma

“hermenêutica do amor” como parte de um realismo crítico, que trata de forma inteligente, mas com

simpatia, e com fé em vez de dúvida, passagens difíceis nas Escrituras, em reconhecimento ao fato de

que o entendimento de “coisas espirituais” requer “pessoas espirituais” (1Co 2.13). A importância da

fé na interpretação bíblica é também apoiada por G. Maier, Biblical Hermeneutics, tradução para o

inglês de R. W. Yarbrough (Wheaton: Crossway, 1994; cf. cap. 14), que propõe o uso de um método

“bíblico-histórico” no lugar de um método “histórico-crítico” e A. Schlatter, “Apêndice D: Adolf

Schlatter on Atheistic Methods in Theology”, em: W. Neuer, Adolf Schlatter: a Biography of

154
Germany’s Premier Biblical Theologian, tradução para o inglês de R. W. Yarbrough (Grand Rapids:

Baker, 1995), p. 211-25.

189
Com relação às paráfrases nas citações, compare Mateus 5.3 (“Bem-aventurados os pobres em

espírito”) com Lucas 6.20 (“Bem-aventurados sois vós, os pobres”). Com relação ao arredondamento

de números, compare a referência à “70 pessoas” em Gênesis 46.27 com a menção de “75 pessoas”

em Atos 7.14. Com relação à linguagem antropomórfica, veja as referências a Deus “se

arrependendo”, “mudando de ideia” ou “se compadecendo” (cf. Gn 6.6; Êx 32.14; Jn 3.10). Com

relação à linguagem fenomenológica, cf. Mateus 5.45 (“Ele faz nascer o sol”).

190
Veja a discussão a seguir.

191
Para um tratamento útil, veja D. A. Carson, “The Role of Exegesis in Systematic Theology”,

em: J. D. Woodbridge; T. E. McComiskey, orgs., Doing Theology in Today’s World: Essays in Honor

of Kenneth S. Kantzer (Grand Rapids: Zondervan, 1991), p. 39-76.

192
Veja W. W. Gasque, “The Promise of Adolf Schlatter”, Crux 15/2 (Junho 1979), p. 8 (um

artigo reimpresso em Evangelical Theological Review 4 [1980], p. 20-30).

155
CAPÍTULO 2

O contexto político e religioso do Novo


Testamento

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os alunos devem conhecer os oito períodos de
controle sobre a Palestina na época do Segundo Templo. Eles devem ter
uma compreensão básica dos principais personagens e governantes e devem
estar familiarizados com outras características importantes desse período,
incluindo as datas-chave, os nomes de obras importantes e os principais
grupos e instituições cuja origem remonta a esse período.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo central
identificado nos Conhecimentos básicos, os estudantes devem ter uma
compreensão mais profunda da dinâmica operante na transição de um
império para o outro. Eles também devem ser capazes de discernir e
descrever as principais crises na história judaica que confrontaram a nação.
Conhecimentos avançados: além do domínio do conteúdo central
identificado nos Conhecimentos Básicos e Intermediários, os estudantes
devem ter um conhecimento profundo da história intertestamentária,
incluindo detalhes relacionados aos principais conflitos, datas específicas e

156
nomes de governantes. Eles devem ser capazes de identificar as várias obras
comumente identificadas como literatura do Segundo Templo e ser capazes
de demonstrar como as diversas características descritas neste capítulo
constituem uma base importante para a interpretação do NT.

INTRODUÇÃO

Quando a era do AT terminou, o Império Persa estava no controle de


Jerusalém e da Judeia. Quando começou a era do NT, Roma estava no
controle. Para se obter uma compreensão do contexto político e religioso do
NT, temos que obter pelo menos uma compreensão superficial dos
acontecimentos e eventos que levaram ao estado de coisas que estava em
vigência na época do NT.1 Como não houve voz profética em Israel entre
Malaquias e o ministério de João Batista, o intervalo de tempo que se
estendeu de cerca de 400 a.C. até a era cristã tem sido chamado de “anos de
silêncio”. Isso sublinha a ausência da revelação divina através dos profetas
durante esse período, mas o intervalo foi marcado por muitas coisas, menos
pelo silêncio, como veremos ao longo deste capítulo.

157
Tabela 2.1: Da Babilônia a Roma: O Período do Segundo Templo
Período Intervalo de Tempo
Período Babilônico 606-539 a.C.
Período Persa 539-331 a.C.
Período Grego 331-167 a.C.
Alexandre, o Grande 331-320 a.C.
Período Ptolomaico 320-198 a.C.
Período Sírio 198-167 a.C.
Autogoverno judeu 167-63 a.C.
Período Macabeu 167-142 a.C.
Período Asmoneu 142-63 a.C.
Período Romano 63 a.C.-70 d.C.

Antigamente chamado de “período intertestamentário”, a maioria dos


estudiosos atualmente prefere o termo “período do Segundo Templo” para a
época que vai da construção do segundo Templo em 515 a.C. por Zorobabel
até sua destruição pelos romanos em 70 d.C., incluindo a época de Jesus e
da igreja primitiva. Assim, os estudiosos estão reconhecendo tanto o corpo
considerável de literatura (maior do que a Bíblia cristã) quanto sua
importância para a interpretação do NT. O seguinte levantamento histórico
dessa época e de sua literatura e teologia destina-se a servir de pano de
fundo para o estudo de Jesus e os Evangelhos e dos outros escritos do NT.2
De forma simples, a partir do ponto de vista privilegiado de Israel e da
história bíblica, o período do Segundo Templo é compreendido por cinco
eras demarcadas por uma série de forças de ocupação na Palestina e
pontuado por cinco principais crises para o povo judeu.3 Durante grande
parte desse período, a Judeia foi um “estado-templo” sob controle imediato

158
dos sacerdotes que estavam, eles próprios, sob a autoridade de
governadores ou monarcas estrangeiros.4 O seguinte levantamento do
período do Segundo Templo começa com a primeira grande crise, o
reinado do rei da Babilônia, Nabucodonosor, e a destruição do templo
construído por Salomão, resultando na perda da soberania nacional dos
judeus.

159
Tabela 2.2: O Período do Segundo Templo: Acontecimentos
Importantes
I. Fim da História do AT: Os Períodos Babilônico e Persa
A. Período Babilônico (606-539 a.C.)
606/5 A conquista da Judeia por Nabucodonosor.
a.C.
587/86 Jerusalém, templo destruído; Judá vai para o Exílio; origem da
a.C. sinagoga.
539 Babilônia cai diante de Ciro, o Grande, da Pérsia; permissão aos
a.C. exilados para retornarem a Israel.
I. Fim da História do AT: Os Períodos Babilônico e Persa
B. Período Persa (539-331 a.C.)
515 Segundo templo dedicado (Zorobabel, Ageu, Zacarias)
a.C.
c. 400 Último profeta do AT, Malaquias: João Batista profetizado
a.C.
II. Entre os Testamentos: Domínio Grego, Autogoverno Judaico,
Domínio Romano
A. Período grego (331-167 a.C.)
1. Alexandre, o Grande, e suas conquistas (331-320 a.C.)
334/333 Alexandre derrota os persas nas batalhas de Grânico, Isso
a.C.
331 Alexandre derrota Dario II em Arbela, que faz dele o controlador
a.C. do Oriente Médio (incluindo Israel); começa a helenização
(disseminação do modo de vida grego)
323 Morte de Alexandre; reino dividido em quatro partes
a.C.

** Veja a discussão sobre a data do livro de Apocalipse no capítulo 20.


*Cf. a discussão sobre a cronologia da vida de Jesus no capítulo 3.

160
c. de Israel cai diante dos ptolomeus no Egito
320
a.C.
2. Período Ptolomaico (320-198 a.C.)
320- A dinastia dos ptolomeus governa a Palestina desde Alexandria,
198 no Egito; a Septuaginta (a LXX, tradução grega do AT) é
a.C. produzida
198 Antíoco Selêucida III derrota Ptolomeu V em Paneas (próximo
a.C. ao monte Hermon) e toma o controle da Palestina
3. Período Selêucida ou Sírio (198-167 a.C.)
198- Selêucidas, centrados em Antioquia da Síria, governam a
167 Palestina. Dois partidos são criados entre os judeus: “a casa de
a.C. Onias” (pró-Egito) e a “casa de Tobias” (pró-Síria)
168 Antíoco IV (175-163 a.C.): tipo do anticristo; substituiu o sumo
a.C. sacerdote judeu Onias III pelo irmão deste, Jasom, helenizante;
invade Jerusalém, sacrifica porcos no altar (“abominação da
desolação”; Dn 9.27; 11.31; 12.11; cf. Mt 24.15 e paralelos); o
sacerdote chamado Matatias dá início à revolta dos macabeus em
Modein
B. Autogoverno Judaico: Os Macabeus e Asmoneus (167-63 a.C.)
1. Os Macabeus (165-135 a.C.)
165/4 A adoração no Templo é restaurada; Festa da Dedicação (veja Jo
a.C. 10.22)
164- Judas
161
a.C.
161- Jônatas
143/2
a.C.

** Veja a discussão sobre a data do livro de Apocalipse no capítulo 20.


*Cf. a discussão sobre a cronologia da vida de Jesus no capítulo 3.

161
143/2- Simão
135/4
II. Entre os Testamentos: Domínio Grego, Autogoverno Judaico,
Domínio Romano
2. Os Asmoneus (135-63 a.C.)
135/4- João Hircano I
104
a.C.
104- Aristóbulo I
103
a.C.
103-76 Alexandre Janeu
a.C.
76-67 Salomé Alexandra
a.C.
67-63 Aristóbulo II
a.C.
C. Período Romano (63 a.C.-70 d.C.)
63 a.C. General Pompeu entra em Jerusalém e estabelece o domínio
romano
44 a.C. Júlio César assassinado no Senado por Brutus e outros; “César”
se torna título para imperadores
40 a.C. Herodes é nomeado rei da Judeia pelo Senado Romano
37 a.C. Herodes rejeita os partos para assumir o reino
31 a.C. Otaviano (“Augusto”) vence a guerra civil contra Marco Antônio
e Cleópatra (m. 30 a.C.); “Era de Ouro” de Roma, lei e ordem
romanas, pax Romana (“Paz Romana”), culto ao imperador
c. 5 Jesus nasce em Belém (Mt 1.18 a 2.12; Lc 2.1-20)*
a.C.
** Veja a discussão sobre a data do livro de Apocalipse no capítulo 20.
*Cf. a discussão sobre a cronologia da vida de Jesus no capítulo 3.

162
4 a.C. Herodes morre, Arquelau herda o trono
6 d.C. Arquelau substituído por prefeitos romanos
26 d.C. Pôncio Pilatos se torna governador da Judeia
33 d.C. Jesus é crucificado*
34 d.C. Conversão de Paulo
III. O Contexto de Jesus e da Igreja Primitiva
A. Imperadores romanos
31 a.C. Augusto: nascimento de Jesus; Era de Ouro (Lc 2.1)
- d.C.
14
14-37 Tibério: os ministérios de João Batista e de Jesus aconteceram
durante seu reinado (Lc 3.1,2,21)
37-41 Calígula
III. O Contexto de Jesus e da Igreja Primitiva
41-54 Cláudio: expulsa os judeus de Roma (At 18.2)
54-68 Nero: põe fogo em Roma (64); martírio de Pedro e de Paulo
(65/66)
68-69 Galba, Otão e Vitélio
69-79 Vespasiano
81-96 Domiciano: perseguição aos cristãos (Apocalipse)**
B. Revoltas judaicas
66-73 Primeira revolta judaica
70 Tito destrói Jerusalém e o Templo (cf. Mt 24.1,2 e paralelos)
132- Revolta de Bar Kokhba: judeus exilados até os tempos modernos
135
C. A dinastia herodiana

** Veja a discussão sobre a data do livro de Apocalipse no capítulo 20.


*Cf. a discussão sobre a cronologia da vida de Jesus no capítulo 3.

163
40/37-4 Herodes, o Grande: governante-vassalo edomita governa a
a.C. Palestina matança de crianças em Belém (Lc 2.16); três filhos:
4 a.C. - Herodes Filipe: tetrarca das províncias do norte, Itureia,
33 d.C. Traconites, Gaulanites, Auranites e Bataneia
4 a.C. - Herodes Antipas: tetrarca da Galileia e Pereia: decapitou João
39 d.C. Batista (Mt 14.3-12; Mc 6.17-29); Jesus o chamou de “aquela
Raposa” (Lc 13.32) e depois enfrentou julgamento diante dele
(Lc 23.7-12)
4 a.C. - Arquelau: etnarca da Judeia e Samaria (banido por Augusto em 6
6 d.C. d.C.); má administração forçou José, Maria e Jesus a se
estabelecerem em Nazaré após retornarem do Egito (Mt 2.21-
23); após 6 d.C., Galileia governada pelos governadores romanos
(prefeitos ou procuradores)
41-44 Herodes Agripa I: neto de Herodes o Grande; governou como rei
sobre a Judeia e toda a Palestina; executou Tiago, o apóstolo e
filho de Zebedeu e prendeu Pedro (At 12.1-3)
50-? Herodes Agripa II: bisneto de Herodes o Grande; ouviu a defesa
de Paulo (At 25 e 26)
** Veja a discussão sobre a data do livro de Apocalipse no capítulo 20.
*Cf. a discussão sobre a cronologia da vida de Jesus no capítulo 3.

HISTÓRIA
O Período Babilônico (606-539 a.C.)
O relato da ocupação de Israel pela Babilônia está incluído no AT.5 O
período babilônico começou em 606/5 a.C. com a conquista de
Nabucodonosor da Judeia; o Reino do Norte de Israel já havia caído para os
assírios em 722 a.C. (cf. 2Rs 24.12). O elemento da política externa de
Nabucodonosor que mais impactou o destino de Judá foi a deportação das
classes mais elevadas para a Babilônia. Nabucodonosor instituiu essa

164
política para Judá (incluindo Daniel e Ezequiel) e colocou Matanias, tio de
Joaquim, como rei de Judá, rebatizando-o de Zedequias (2Rs 24.17). O
flerte de Zedequias com o Egito forçou a Babilônia a sitiar Jerusalém até o
“nono dia do [quarto] mês” de 586 a.C.6 No final, perseguido e capturado, a
última coisa que Zedequias viu antes de ser cegado foi a execução de seus
filhos (2Rs 25.7). O pró-babilônico Gedalias foi nomeado em seu lugar,
mas foi assassinado pouco tempo depois (2Rs 25.22-26).
Essa deportação criou uma crise teológica para os judeus na dispersão.
A dissolução da monarquia, a perda do santuário central e a proximidade
com os gentios criaram problemas morais e cerimoniais para aqueles que
viviam fora da Judeia.7 Os profetas tinham denunciado Israel e Judá por
enfatizarem mais o aspecto cerimonial do que os aspectos éticos da sua
aliança com Deus. Na dispersão, ficou evidente que, na ausência do
santuário central, os judeus foram levados a colocar seu foco na dimensão
moral da Lei de Deus. Com o elemento cerimonial permanecendo apenas
uma persistente esperança para os judeus exilados, a observância da lei
temporariamente tomou o lugar do ritual do templo e do sacrifício de
animais.
Sem um lugar central de encontro e de culto (o templo), os cativos com
toda a probabilidade estabeleceram a sinagoga como um local onde
pudessem se reunir para estudar e discutir a lei. A sinagoga é uma
instituição bem estabelecida na época do NT. Pode ser surpreendente
descobrir que o surgimento da sinagoga não é mencionado no AT. Muito
provavelmente, a sinagoga teve suas origens no Exílio.8
Um outro desenvolvimento durante o Exílio foi a renúncia definitiva a
idolatria entre os judeus. Idolatria, a adoração de outros deuses que não o
Senhor, tinha sido uma das principais causas para o Exílio. Durante o

165
cativeiro da Babilônia, no entanto, a idolatria perdeu completamente o seu
encanto, como o livro apócrifo de Judite exemplifica: “É verdade que não
houve nas nossas gerações, nem há nos dias de hoje nenhuma de nossas
tribos ou famílias, nenhum dos povos ou cidades que adorem deuses feitos
pelas mãos do homem, como aconteceu outrora, o que foi a causa de nossos
pais serem entregues à espada e à pilhagem e caírem miseravelmente diante
de seus inimigos.” (8.18,19, BJ). A principal lição que Israel aprendeu no
Exílio foi que Deus não tolerará que Israel adore outros deuses.

O Período Persa (539-331 a.C.)


No devido tempo, a Babilônia sofreu ataques de um reino que havia
crescido repentinamente: o Império Persa.9 Quando Ciro, da Pérsia, um
antigo vassalo da Média (c. 550 a.C.), atacou Opis (uma cidade afastada),
Nabonido, rei babilônio, estava ocupado sufocando uma sangrenta revolta
na Babilônia. Depois que Sippar (outra cidade sob controle Medo) caiu
frente ao exército persa, os babilônios se renderam pacificamente. Isso
provavelmente devido ao desvio do rio Eufrates por Ciro, o que permitiu
que seus soldados marchassem para a cidade em terreno seco. Em 29 de
outubro de 539 a.C., Ciro entrou na Babilônia e se proclamou “Rei da
Babilônia”, iniciando, assim, uma nova dinastia no Oriente Médio.
Vários livros do AT descrevem os eventos durante o período persa,
incluindo 2Crônicas, Esdras, Neemias, Ester, Salmos selecionados, Daniel,
Ageu, Zacarias, Malaquias e talvez o mais famoso, Isaías (44 e 45). A
política externa de Ciro (ao contrário da política externa da Babilônia), foi
permitir que os povos conquistados mantivessem seus costumes e religiões
locais em suas pátrias. Assim, quando Esdras pediu a Ciro que permitisse o

166
retorno à Judeia, ele concordou (Ed 1.1-4). Posteriormente, a Pérsia se
tornou uma superpotência real, com uma sequência de reis que expandiram
seu domínio “da Índia a Cuxe” (i. e., da Etiópia; Et 1.1). À luz da postura
conciliadora do Império Persa para com os judeus e em cumprimento da
profecia bíblica (Is 44.28 a 45.13), Ciro permitiu que judeus voltassem à
sua terra natal (cf. Ed 1.1-4). Assim, sob o domínio persa, os cativos
voltaram, e com eles, o mobiliário do templo e as provisões para a
reconstrução de Jerusalém, apesar de isso não ter acontecido de forma
imediata.
Os persas dominaram a Palestina por mais de 200 anos. O império
acabou caindo frente às campanhas expansionistas dos gregos. Estes,
primeiro, tomaram conhecimento das fraquezas internas dos sucessores de
Ciro, quando mercenários gregos foram contratados por Ciro, o Jovem
(nenhum parentesco) para derrubar o rei que estava no trono, Artaxerxes II
(404-358 a.C.). A história desses mercenários está relatada na obra
Anabasis, do historiador grego Xenofonte; as divisões internas e os pontos
fracos do Império Persa deram esperança aos gregos de que a superpotência
oriental estava pronta para ser conquistada.
Os gregos tinham expandido seu território para além da Acaia muito
antes das famosas campanhas de Alexandre, o Grande.10 A Pérsia tinha
subjugado as cidades-estados da Anatólia, mas em 500-494 a.C. elas se
revoltaram. Atenas enviou sua marinha para ajudar e incendiar Sardes,
enquanto a Pérsia enviou uma expedição punitiva à península grega. Atenas
derrotou os persas em Maratona, o que fez com que o rei persa, Xerxes
(marido de Ester), respondesse com uma invasão em larga escala. Os
atenienses fizeram uma aliança com cidades-estados independentes para
resistir à invasão. No entanto, enquanto os espartanos conseguiram segurar

167
os persas, a marinha ateniense ganhou o dia. Enquanto os persas
queimavam a Acrópole em Atenas, a marinha vencia a batalha decisiva na
baía de Salamina. A batalha naval foi seguida por uma decisiva batalha
terrestre em Plateia, em 479 a.C., na qual os persas se retiraram, embora
ainda dominassem algumas cidades gregas.
O século V a.C., foi caracterizado pela era de ouro da democracia
ateniense como o ideal de uma grande aliança de cidades-estados (na
verdade, um império governado por uma cidade). Gregos e persas
permaneceram em um tipo de guerra fria com batalhas ocasionais, que
gradativamente enfraqueceram os persas. A Judeia relativamente não foi
afetada pelas guerras greco-persas, mas a influência grega pôde ser sentida
na Palestina. No entanto, como havia sido profetizado em Daniel, a Grécia
cresceu tornando-se um império importante.11

O Período Grego (331-167 a.C.)


O período grego pode ser dividido em três fases: (1) as conquistas de
Alexandre, o Grande (331-320 a.C.); (2) o Período Ptolomeu (320-198
a.C.), e (3) o Período Selêucida ou Sírio (198-167 a.C.). Além disso, a
influência grega foi sentida na Palestina muito tempo depois do período
grego, devido ao impacto generalizado da cultura grega chamado
“Helenização”.

Alexandre, o Grande, e suas conquistas (331-320


a.C.)
O período grego oficialmente começou com a conquista da Palestina por
Alexandre, o Grande.12 A Macedônia, localizada no norte da península

168
grega, tinha sido governado por Filipe da Macedônia, pai de Alexandre, que
a transformou em uma feroz máquina militar. Filipe subjugou as cidades-
estados gregas, exigindo tributos delas. Ele foi assassinado por Pausânias
em 336 a.C., fato que abriu a porta para a ascensão de Alexandre ao trono.13
Após Alexandre subjugar as cidades-estados gregas que não se curvaram
imediatamente à sua vontade, ele voltou sua atenção para a Pérsia.14 Como
predito pelo profeta Daniel, a conquista de Alexandre foi brutalmente
eficiente.
O investimento de Filipe na educação militar e acadêmica de Alexandre
— ele contratou Aristóteles para ser o tutor de Alexandre quando o menino
tinha 13 anos de idade — teria ramificações bem após a vida de Filipe.
Alexandre herdou de Filipe uma atitude agressiva e uma aguçada habilidade
militar: sua educação lhe proporcionou um profundo apreço por ideais
helenísticos e seu treinamento militar lhe deu a coragem e as habilidades
para conquistar o império diante dele. A vitória de Alexandre sobre a Pérsia
foi de fato rápida. Quando o Egito se rebelou contra a Pérsia, Dario III teve
que restabelecer seus domínios. Em 14 de janeiro de 334 a.C., ele foi
aclamado rei do Egito, mas teve que fixar a maior parte de suas forças
militares ali. Essa foi a oportunidade de que Alexandre precisava. Com as
forças de Dario fixadas no Egito, Alexandre cruzou o Helesponto chegando
à Ásia Menor e derrotou as forças persas em Grânico.15 Uma rápida vitória
nas batalhas de Isso (perto de Tarso, 333 a.C.) e Arbela (331 a.C.) colocou
Dario III, que havia liderado o próprio exército, em fuga.
Em seguida, Alexandre voltou-se para o sul, destruindo Tiro da
Fenícia16 e Gaza em seu caminho para o Egito. Segundo Josefo, Jerusalém
deu as boas-vindas a Alexandre, mostrando-lhe o livro de Daniel.17 Os
egípcios, que nunca haviam tolerado o domínio persa, renderam-se

169
pacificamente,18 assim Alexandre se voltou para o norte e perseguiu Dario
através da Síria e da Pérsia. A derrota de Dario na batalha de Gaugamela
(331 a.C.) selou seu destino e o forçou ao cativeiro por seus próprios
nobres. Embora Alexandre tentasse resgatá-lo, Dario foi morto. Sem
nenhum herdeiro persa para reclamar o trono, Alexandre foi declarado o
novo imperador do mundo.19
Alexandre voltou-se para o leste até o rio Indo, onde suas tropas se
recusaram a avançar. Então, ele voltou para a Pérsia, onde assumiu o estilo
de vida de um déspota oriental, uma escolha bastante curiosa para um
homem que valorizava os ideais gregos. Pouco tempo depois, ele teve uma
febre e morreu com a idade de 33 anos, tendo conquistado o seu império em
apenas 13 anos.
O colapso do império persa, com sua atitude tolerante em relação à
autoidentidade e à liberdade religiosa, constituiu a segunda grande crise
para a nação judaica. Agora, os judeus teriam de lidar com uma série de reis
gregos que tinham uma forte crença em sua superioridade cultural e
pretendiam implantar firmemente essa cultura em sua totalidade em todas
as terras que eles ocupavam.20
Na visão de Daniel, o grande chifre do bode é subitamente quebrado e
quatro chifres menores crescem em quatro direções (Dn 8.8). Após a morte
de Alexandre, seus generais, sem muito entusiasmo, tentaram manter o
império unido através do infante filho de Alexandre (Alexandre IV) de uma
princesa oriental, Roxane, e depois através do impotente meio-irmão de
Alexandre (Filipe Arrideu).21 Nas décadas subsequentes, guerras pela
supremacia ocorreram entre os generais até 301 a.C. Na batalha de Ipso (na
Frígia), o último defensor da consolidação (Antígono Monoftalmo) perdeu
sua vida,22 após o qual o Império se manteve dividido entre os generais de

170
23
Alexandre chamados de Diádocos. Dos sucessores originais ao reino de
Alexandre, apenas Ptolomeu I Soter formou um reino bem-sucedido. Foi-
lhe concedido o Egito e ele o manteve; a Síria ficou sob o controle dos
selêucidas; Lisímaco ficou com a Ásia Menor (ele acabou perdendo muito
de seu território para a Síria), e Cassandro governou a Grécia. A Palestina
primeiro ficou sob a competência do governante egípcio Ptolomeu por volta
24
de 320 a.C.

O período ptolomaico (320-198 a.C.)


Ptolomeu instalou-se como o progenitor de uma dinastia dominante. Todo
governante do Egito até 30 d.C. recebeu o nome de “Ptolomeu”,
independentemente de sua ascendência.25 A maior contribuição dos
ptolomeus para a história tardia foi a cidade de Alexandria, a maior
metrópole do mundo mediterrânico em 200 a.C. (apenas Roma viria a
ultrapassá-la mais tarde). A famosa biblioteca e museu (uma academia
dedicada às musas) ajudaram a fazer de Alexandria o centro intelectual e
espiritual do mundo grego.
Sob o reinado de Ptolomeu, a Judeia permaneceu na obscuridade. De
acordo com as poucas fontes confiáveis que sobreviveram, ela
evidentemente continuou a se autogovernar como um tipo de estado-templo
sob o comando do sumo sacerdote. O governo ptolomaico estava
especialmente interessado na taxação agressiva (por meio de impostos
agrícolas) e na garantia das rotas comerciais na Transjordânia.26

QUADRO 2.1: A SEPTUAGINTA (LXX)

171
Segundo a tradição (Epístola de Arísteas; Filo, Vida de Moisés, 2.26-
42), o AT foi traduzido para o grego por determinação de Ptolomeu II
Filadelfo (285-246 a.C.).1 Diz a lenda que Filadelfo comissionou 70 ou
72 estudiosos para que traduzissem a Bíblia hebraica. Por isso, a
versão foi chamada de “Septuaginta” (grego para 70; abreviado pelo
numeral romano LXX). A tradução foi preparada no Egito e se
destinava aos judeus que entendiam melhor o grego do que o hebraico,
um testemunho do sucesso do programa de helenização de Alexandre.
A LXX, embora com uma qualidade irregular, mostrou-se
amplamente útil. Ela serviu como a Bíblia dos primeiros cristãos.
Muitas citações do AT no NT são retiradas da LXX. Há algumas
passagens onde o texto da LXX difere do Texto Massorético hebraico
(TM), mas mesmo nesses casos, a tradução da LXX não deveria ser
descartada muito depressa. A LXX é um dos testemunhos mais antigos
da Bíblia hebraica, e algumas das variantes são atestadas nos
manuscritos hebraicos encontrados em Qumran. Hoje, o estudo da
LXX continua a ser um vibrante campo de pesquisa acadêmica.2

1
Veja Barrett, New Testament Background, cap. 12, especialmente p. 292-98; cf. A.

Wasserstein; D. J. Wasserstein, The Legend of the Septuagint: From Classical Antiquity to

Today (Cambridge: University Press, 2006).


2
Veja S. Jellicoe, The Septuagint and Modern Study (Winona Lake: Eisenbrauns, 1989);

K. H. Jobes; M. Silva, Invitation to the Septuagint (Grand Rapids: Baker, 2005); e M. Hengel,

The Septuagint as Christian Scripture: Its Prehistory and the Problem of Its Canon, tradução

para o inglês de M. E. Biddle (Edinburgh/New York: T&T Clark, 2002).

172
O destino dos judeus no Egito variou. Eles foram primeiramente
deportados para Alexandria por Ptolomeu I. Josefo descreveu que a invasão
de Jerusalém, por Ptolomeu I, foi no sábado, levando cativos para
Alexandria 120 mil judeus, onde permaneceram até que o filho de
Ptolomeu, Filadelfo (Ptolomeu II), os libertou. Sua difusão por todo o
Mediterrâneo trouxe prosperidade a muitos deles.27
Enquanto os ptolomeus tinham obtido o controle do Egito, outra
dinastia grega, os selêucidas, alcançavam a supremacia na Babilônia.
Seleuco I Nicator, filho do macedônio Antíoco, foi o primeiro dos
governantes (diádocos) a governar Síria.28 Seus herdeiros expandiram o
território a leste e a oeste.29 Sua influência cobriu parte da Ásia Menor
(atual Turquia), da Palestina e partes da Mesopotâmia. No princípio, a
Selêucia tinha três centros nervosos: Jônia (Sardes, na Ásia Menor), Síria
(Antioquia) e Babilônia. No final, o reino foi reduzido somente à Síria. Os
selêucidas e os ptolomeus envolveram-se em batalhas constantes pela
Palestina. No final, Ptolomeu V perdeu Israel em 198 a.C. em Paneas para
Antíoco III da Síria. Depois dessa batalha, o controle da Palestina passou
dos egípcios para os sírios, para nunca mais voltar.

O período selêucida ou sírio (198-167 a.C.)


O controle sírio sobre a Palestina durou apenas 31 anos.30 A natureza frágil
desse controle é vista em sua derrota para os romanos em Magnésia. Aqui,
Antíoco III tinha “tomado uma péssima decisão e feito um terrível
inimigo”.31 Não apenas foi promulgado um pesado tributo mensal, mas seu
filho, Antíoco IV, foi enviado a Roma como refém. Os romanos impuseram
um tributo mensal exorbitante, o que explica parcialmente a liderança de

173
Antíoco IV sobre a região quando ele assumiu o império de seu irmão mais
velho, Seleuco IV.32 A enorme carga tributária impactou a maneira pela qual
Antíoco escolheu o sumo sacerdote judeu em Jerusalém, aceitando
subornos em troca da atribuição do cargo.
Antíoco IV se autodenominou “Epifânio” — “o Glorioso” —
implicando que ele era a encarnação de Zeus na terra. Os judeus, porém,
cunharam um jogo de palavras e o apelidaram de “Epimânio” — “O
Louco”. Seu programa agressivo de helenização revoltou os judeus.33 O
desejo pela difusão da cultura grega e a necessidade de grandes quantidades
de dinheiro para pagar Roma levaram Antíoco IV a olhar para os tesouros
do Templo de Jerusalém com crescente cobiça.34 Esse desejo de expansão
cultural e a necessidade de recursos financeiros adicionais apresentaram
uma oportunidade para Jasom — o irmão do sumo sacerdote Onias III, que
era possivelmente pró-egípcios e também um teológico conservador — a
sugerir a remoção de Onias da função de sumo sacerdote. Jasom prometeu a
Antíoco cerca de 440 talentos de prata e se ofereceu para ajudar na
helenização de Israel através da construção de um ginásio e na concessão de
cidadania aos homens de Israel como cidadãos de Antioquia (2Mac 4.7-13).
Três anos depois, agora como sumo sacerdote, Jasom enviou Menelau
com o tributo anual a Antioquia, e este aproveitou a oportunidade para
aumentar o suborno em 300 talentos de prata, tomando o sumo sacerdócio
de Jasom. Vender o sacerdócio para Jasom tinha sido um ato injusto, mas
vendê-lo para o não zadoquita Menelau mostrou um flagrante desrespeito
aos costumes dos judeus. Consequentemente, revoltas, violência e
assassinatos caracterizaram o reinado de Menelau.
Antíoco tentou anexar o Egito com algum sucesso inicial. No entanto,
em 168 a.C. os ptolomeus conquistaram o apoio de uma futura nova

174
potência mundial: Roma. Enfrentando Antíoco fora de Alexandria, o
Legado Romano Popílio Lenas insistiu que Antíoco recuasse ou enfrentasse
a ira de Roma. Antíoco concordou em considerar o pedido, mas Lenas
desenhou um círculo em torno do monarca sírio e, em essência, disse:
“Leve todo o tempo que você precisar, mas você deve responder antes de
sair desse círculo”. Antíoco se retirou, humilhado (Políbio, Hist. 6.36).
Quando Antíoco havia ido embora, Jasom — que pensou que Antíoco
estivesse morto — sumariamente depôs Menelau. Antíoco, de maneira
selvagem, esmagou a tentativa — em um sábado — matando homens,
mulheres e crianças. Ele confiscou os utensílios de ouro do templo (talvez
planejando outra tentativa de proteção do Egito), construiu uma fortaleza no
monte ocidental de Jerusalém e ocupou-o com suas tropas leais. Não menos
ultrajante que suas ações foi sua admissão de um gentio (Antíoco) no
templo.
Antíoco, talvez vendo a piedade como principal fonte de oposição,
reprimiu as práticas cultuais de Israel.35 Sua tentativa de proibir o judaísmo
representou a terceira grande crise que afetou os judeus e indelevelmente
marcou-o na consciência social e religiosa do judaísmo. Ao instituir a
proibição, ele vetou a posse da Torá, a circuncisão, os festivais e as ofertas
ao Senhor. Talvez a mais devastadora de todas as medidas de Antíoco tenha
sido a dedicação do Templo de Jerusalém a Zeus, o chefe do panteão grego.
Ao fazê-lo, Antíoco construiu uma estátua de Zeus no templo e sacrificou
um porco no altar.
As famílias que resistiram e se agarraram ao judaísmo foram tratadas de
forma horrível. Homens e mulheres foram espancados com varas. Mães que
circuncidavam seus filhos foram crucificadas com seus bebês pendurados
em seus pescoços, os livros sagrados foram confiscados e aqueles que os

175
mantinham foram executados (Josefo, Ant. 12.250-56; 1Mac 1.61). Essas
atrocidades claramente indignaram os judeus piedosos.
O conflito atingiu seu clímax quando um emissário de Antíoco chegou à
vila de Modein para ganhar a lealdade de seus cidadãos (Josefo, Ant.
12.265-78). Foi oferecido a um velho sacerdote, chamado Matatias, o
privilégio de ser amigo do rei, além de ouro e prata se ele oferecesse
sacrifícios aos deuses.36 Matatias recusou. Quando outro judeu se ofereceu
para fazer o sacrifício em troca do dinheiro, Matatias o matou, e também ao
enviado, e em seguida fugiu para o deserto, dando início a um movimento
de resistência judaica (1Mac 2.15-28).

Autogoverno Judaico (167-63 a.C.)


Os macabeus (167-135 a.C.)
O período macabeu recebeu seu nome do terceiro filho de Matatias, Judas.37
Apelidado de “Macabeu”, “o martelo”,38 ele liderou uma guerrilha contra os
selêucidas. Embora Judas fosse um brilhante estrategista, líder e diplomata,
o sucesso macabeu deveu-se tanto aos problemas da Síria com o Império
Parto Oriental quanto à liderança de Judas. Os macabeus, em última
instância, se ergueram de um sacerdócio nacional para subjugar a
aristocracia metropolitana e para, no final, substitui-la por sua própria
aristocracia.39
Devido aos esforços de Judas Macabeu, em 165 a.C., Lísias, o
representante de Antíoco, revogou a proibição do judaísmo. No ano
seguinte, Judas liderou uma purificação do templo, comemorado esse dia
como a Festa das Luzes de dezembro, oito dias de festa conhecida como
Hanucá, comemorada no final de dezembro. No entanto, Menelau ainda era

176
o sumo sacerdote, e a condição para a restauração foi a contínua lealdade ao
Império Sírio (2Mac 11.16-21).
No entanto, os macabeus desejavam autonomia nacional. Quando
Antíoco morreu, em 163 a.C., a luta pelo seu reino ajudou a busca dos
judeus pela independência. Lísias, regente de Antíoco V, estava muito
distraído com rivais na frente interna para eliminar com sucesso o exército
de Judas. Demétrio I assumiu o controle da Síria logo depois.40 Judas
acabou retomando o estado das coisas antes que Antíoco IV assumisse o
trono, mas morreu em batalha em 160 a.C. nas mãos de Nicanor, um dos
coronéis de Demétrio.
O irmão de Judas, Jônatas, obteve mais liberdade dos sírios em 157 a.C.
Ele trabalhou com mestria as artimanhas do jogo político para garantir uma
melhor posição para Israel. No entanto, em violação aos mandamentos das
Escrituras, ele aceitou o cargo de sumo sacerdote de um dos outros
pretendentes ao trono da Síria em 153/52 a.C. Não há registro de oposição
local a essa irregularidade, embora muitos acreditem que a ação de Jônatas
motivou o êxodo do grupo que formou a comunidade de Qumran para uma
área próxima ao mar Morto.41 Na luta contínua, Jônatas foi capturado por
Trífon e executado em 143 a.C., embora um resgate tenha sido pago (1Mac
13.23).
O mais novo e o único irmão sobrevivente de Jônatas, Simão, continuou
a resistência e obteve o marco da autonomia nacional. O teatro político foi a
Síria ter continuado a agir em favor dos asmoneus (nome inspirado em
Asmon, bisavô de Matatias).42 Para garantir seu apoio, Simão exigiu a
liberação dos tributos (impostos) de Demétrio II em troca de apoio militar
contra os outros pretendentes. Demétrio, desesperado por ajuda, concordou.
Em 142 a.C., após assegurar as zonas suburbanas da cidade, Simão

177
capturou a cidadela síria em Jerusalém (chamada Acra). Esse fato marca o
início da autonomia nacional de Israel.
A nação judaica deu a Simão o sumo sacerdócio e lhe conferiu
privilégios militares, religiosos e executivos. A instalação de Simão nas
áreas religiosas e executivas do governo (um afastamento dos ensinos
bíblicos) marcou o deslize para o despotismo. A partir daí, os descendentes
dos macabeus decaíram até se tornarem um grupo egoísta de déspotas
helenizantes. Após um reinado caracterizado pela prosperidade econômica e
relativa paz, Simão e dois de seus filhos foram assassinados por seu genro
Ptolomeu. O filho sobrevivente, Hircano, escapou e derrotou Ptolomeu
(Josefo, Ant. 20.240; Guerras Judaicas 1.54).

Os asmoneus (135-63 a.C.)


Apesar da revolução de Simão, os anos entre 142 e 135 a.C. continuaram a
ser instáveis. João Hircano (135/34-104 a.C.) foi o primeiro dos
governantes asmoneus. Por um curto período de tempo (4 ou 5 anos), os
sírios obtiveram o controle de algumas cidades costeiras, mas acabaram
sendo expulsos. Hircano liderou uma expansão dos territórios da Judeia em
Moabe e na Idumeia. Ele forçou a circuncisão dos idumeus e, assim,
preparou o caminho para Herodes, o Grande, dos tempos do NT. Embora
Hircano seja geralmente considerado um teólogo conservador, ele se
afastou dos fariseus e se associou aos saduceus (Josefo, Ant. 13.296).
Com a morte de Hircano I, seu filho Aristóbulo I (104-103 a.C.)
proclamou-se rei, tornando-se o primeiro dos governantes asmoneus com
esse título. Ele conquistou a Galileia e fundou ali colônias judaicas.
Aristóbulo morreu de uma doença desconhecida depois de apenas 1 ano de

178
governo (Josefo, Ant. 13.301-17). Com a morte repentina de Aristóbulo em
103 a.C., sua viúva, Salomé Alexandra, nomeou Alexandre Janeu, irmão
mais velho de Aristóbulo, sumo sacerdote e rei, e casou-se com ele em
seguida.
Alexandre Janeu (103-76 a.C.) governou como um rei helenista.43 Ele
expandiu o país a proporções salomônicas com o uso de mercenários
estrangeiros, mas não se importou com as funções espirituais de um sumo
sacerdote. Ele alienou a população e teve de reprimir uma rebelião popular
com o uso de mercenários estrangeiros. Os rebeldes, ironicamente,
apelaram para Demétrio III (um rei da Síria!) para ajudá-los contra o
governante asmoneu. Alexandre estava prestes a ser derrotado, mas na
última hora, por razões desconhecidas, 6 mil judeus passaram para o lado
de Alexandre e ajudaram a evitar o destino certo.44 Alexandre se vingou de
forma terrível de seus adversários. Enquanto estava festejando com suas
concubinas, oitocentos de seus adversários mais obstinados foram
crucificados, ao passo que a garganta das respectivas esposas e filhos era
cortada a seus pés.45 Alexandre continuou suas políticas expansionistas até
morrer de uma doença induzida pelo álcool. Após sua morte, o trono passou
para a sua esposa Salomé Alexandra, que reinou de 76 a 67 a.C. (Josefo,
Ant. 13.407).
Salomé Alexandra foi a única rainha da linhagem dos asmoneus. Ela
nomeou seu filho mais velho, Hircano II, como sumo sacerdote e seu filho
mais novo, Aristóbulo II, comandou os exércitos. Ela reparou o
relacionamento com os fariseus, que durante seu reinado dominaram o
Sinédrio. Salomé Alexandra reinou de forma relativamente pacífica durante
nove anos. Após sua morte, em 67 a.C., seus herdeiros disputaram o reino.

179
A princípio, a disputa foi entre Hircano II e Aristóbulo. Aristóbulo, o
mais ambicioso, conseguiu a rendição de seu irmão. Hircano II estava
disposto a se aposentar, mas Antípatro, governador idumeu, e os judeus
ricos que ele influenciou, garantiram ajuda ao reino nabateu e convenceram
Hircano II a se rebelar. Ele chegou a ser bem-sucedido por um breve
período, perseguindo Aristóbulo II, que se refugiou no templo.

QUADRO 2.2: AS ORIGENS DOS


FARISEUS E SADUCEUS
Algum tempo durante o reinado dos macabeus/asmoneus, os fariseus
alcançaram proeminência. Eles foram “o grupo mais claramente
reconhecível e socialmente ativo durante todo o período de tempo”.1
Não se sabe exatamente quando os fariseus e os saduceus surgiram.2
Josefo mencionou-os pela primeira vez como grupos estabelecidos
durante o reinado de Jônatas, mas não explica suas origens (Ant.
13.171-73). Na época do reinado de Hircano, os dois grupos eram
claramente opostos. Politicamente, os fariseus eram líderes leigos que
constituíam o poder intermediário entre as massas e a aristocracia.
Eles eram escrupulosos em relação à lei e viam-se como separados
daqueles que eram negligentes em cumpri-la.3
Os saduceus estão ainda mais envolvidos em mistério. A derivação
do nome saduceu é incerta. É possível que se trate do nome de
Zadoque, mas isso está longe de ser garantido; outros remontam o
nome ao termo tsedek, “justiça”. Eles estavam mais ligados à
aristocracia e observavam apenas o Pentateuco. Josefo atribuía a eles
uma negação da soberania divina. A principal discussão no NT

180
envolvendo os saduceus girava em torno da ressurreição, a qual eles
negavam (Mt 22.23-33 e paralelos; At 23.6-8). Não se tem notícia da
existência de nenhum documento saduceu. Os saduceus foram os
principais apoiadores da dinastia dos asmoneus.
Os assideus, por outro lado, grupo de judeus piedosos que
inicialmente haviam sido favoráveis aos asmoneus, acabaram se
voltando contra eles. Eles se separaram em dois principais grupos: os
fariseus, que permaneceram em Jerusalém, e os essênios, que se
retiraram e muito provavelmente produziram a literatura sectária de
Qumran conhecida como os Manuscritos do Mar Morto.4 Exceto pelo
reinado de Salomé Alexandra (veja a seguir), nenhum dos asmoneus
gostava do apoio dos fariseus.

1
R. Deines, “The Pharisees Between ‘Judaisms’ and ‘Common Judaism’”, em: D. A.

Carson; P. T. O’Brien; M. A. Seifrid, orgs., Justification and Variegated Nomism. Grand

Rapids: Baker, 2001, vol. 1: The Complexities of Second Temple Judaism, p. 447.
2
Tanto que, em um livro recente sobre os fariseus, a questão não é abordada em detalhe:

veja J. Neusner; B. D. Chilton, orgs., In Quest of the Historical Pharisees (Waco: Baylor

University Press, 2007).


3
Veja S. Mason, “Pharisees”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 786.
4
Veja mais adiante.

Entretanto, os exércitos romanos, sob a liderança de representantes de


Pompeu, subjugaram o sempre instável reino selêucida. Os dois irmãos
apelaram para Roma, mas Pompeu acabou apoiando Hircano II. Aristóbulo
II e seu grupo novamente se abrigaram no templo. Pompeu derrotou
Aristóbulo (e no fim o levou cativo para Roma), entrou no Santo dos

181
Santos, colocou Hircano como sumo sacerdote, mas não como rei, e tornou
a Judeia um reino servil sob a regência de um governador imperial na Síria.
O estado judeu independente tinha chegado ao fim e Roma estava agora no
comando da Palestina. Os judeus tiveram que lidar com a quarta grande
crise em sua identidade nacional: a vida sob o domínio romano.

Tabela 2.3: As Cinco Grandes Crises dos Judeus no Período do


Segundo Templo
A destruição de Jerusalém e do Primeiro Templo.
Colapso do Império Persa em consequência da invasão de Alexandre, o
Grande.
Perseguição por Antíoco IV Epifânio.
Dominação de Roma.
A destruição romana do estado judeu e o Segundo Templo.

O Período Romano (63 a.C. a 70 d.C.)


A história romana e a conquista da Palestina
Segundo a tradição, Roma foi fundada em 753 a.C. por Rômulo e Remo.46
No século V a.C., Roma se tornou uma república. Vários séculos mais
tarde, Roma prevaleceu sobre Cartago, a cidade rival norte-africana (146
a.C.). Em 63 a.C., Pompeu estendeu o domínio romano à Palestina. A
princípio, o domínio romano não deve ter parecido nem um pouco diferente
do domínio sírio para a população local. Vários homens estavam disputando
o poder — Antígono (o herdeiro de Aristóbulo II), Hircano II Antípatro (o
idumeu), e Fasael e Herodes, os filhos de Antípatro.

182
Hircano II não era um líder particularmente forte. Sua incapacidade de
agir de forma decisiva na ocasião levou o governador romano a redesenhar
as linhas políticas e as funções do sumo sacerdote. Ele deixaria de ser o
principal líder político de Jerusalém. Em essência, o estado do templo tinha
chegado ao fim (Josefo, Guerra Judaica 1.169). Herodes tinha recebido a
Galileia, e Fasael, a Judeia. Antígono, filho de Aristóbulo II (40-37 a.C.),
não desistiria facilmente. Em uma aliança com o Império Parto, ele
sequestrou e matou Fasael. Antígono capturou Hircano II e Josefo relatou
que Antígono arrancou as orelhas de Hircano com uma mordida para que
ele não pudesse mais ser o sumo sacerdote (Guerra Judaica 1.270).
Antígono, em seguida, tomou o título de “rei e sumo sacerdote” por três
anos e foi o último dos asmoneus.

A dinastia herodiana
Enquanto isso, Herodes havia fugido para Roma, onde foi nomeado “rei da
Judeia” pelo Senado romano em 40 a.C.47 Para ele, porém, ser nomeado rei
e assumir o controle de seu território eram duas coisas diferentes. Apesar de
ter assumido o governo em 40 a.C., Herodes não recebeu de fato o seu reino
até 37 a.C., quando depôs Antígono com a ajuda de Antônio, que executou
brutalmente Antígono, amarrando-o a uma cruz, açoitando-o e depois o
matando. Segundo Dião Cássio, essa foi “uma punição que nenhum outro
rei tinha sofrido nas mãos dos romanos”.48
Tecnicamente, Herodes era um rei servil sob a autoridade de Roma;
assim, ele foi considerado “um amigo e aliado do povo romano”. Ele era
um administrador capaz, mas também era cruel e paranoico. Sua capacidade
é vista nos empreendimentos agrícolas e comerciais que iniciou e que

183
trouxeram prosperidade para a região. Além disso, Herodes utilizou sua
riqueza em muitas obras públicas e programas de construção, como a
ampliação do templo, que foi considerado uma das oito maravilhas do
49
mundo antigo. No entanto, Herodes também era brutal e profundamente
desconfiado, o que fez com que ele tomasse medidas sanguinárias. Sua
esposa Mariane (uma princesa asmoneia, neta de Hircano e de Aristóbulo),
por quem ele tinha verdadeira afeição, lhe deu vários filhos e filhas. Apesar
disso, quando ele suspeitou que alguns de seus filhos estavam planejando
tomar o reino, não só matou seus filhos através de Mariane, mas também se
convenceu de que ela mesma estava envolvida e, por isso, a matou. A
reputação de crueldade e paranoia de Herodes estava bem estabelecida. Foi
relatado que César Augusto disse que era melhor ser o porco de Herodes do
que ser seu filho.50

QUADRO 2.3: AS ESPOSAS DE HERODES,


O GRANDE
Herodes, o Grande teve pelo menos cinco esposas, e elas estão listadas
aqui juntamente com seus filhos:

1. Dóris se tornou a mãe de Antípatro.


2. Mariane, a princesa asmoneia, deu à luz quatro filhos: dois
meninos, Aristóbulo (por meio de quem nasceram Herodes
Agripa I e II) e Alexandre, e duas filhas, Salimpsio e Cypros.
3. Outra Mariane, filha de Simão, o sumo sacerdote, deu à luz
Herodes Filipe (Mc 6.17).

184
4. Maltrácia deu à luz Arquelau (Mt 2.22), que foi deposto como
etnarca da Judeia em 6 d.C.; e Herodes Antipas (Mc 6.14; Lc
23.7), o tetrarca da Galileia.
1
5. Cleópatra era a mãe de Filipe, que se tornou tetrarca da Itureia.

1
Scott, Jewish Backgrounds, p. 98.

Herodes sofria de demência e teve uma morte horrível. Fiel ao ritual, no


entanto, ele procurou garantir o luto em Jerusalém por sua morte. Como sua
morte se aproximava, ele fez com que cidadãos proeminentes fossem presos
e ordenou que fossem executados após a sua morte. Em vez disso, ao
contrário de suas instruções, eles foram liberados. Embora as histórias
particulares de Herodes no NT (cf. Mt 2) não sejam corroboradas por fontes
externas, a descrição cruel e paranoica retratada ali está em consonância
com o que sabemos do caráter de Herodes através de outras fontes.51
De forma sumária, os filhos de Herodes receberam posições de governo.
Arquelau foi nomeado etnarca na Judeia, Samaria e Idumeia, que incluía
Jerusalém (4 a.C.). Roma o destituiu em 6 d.C. por causa de sua
incompetência. Arquelau não era um administrador hábil como o seu pai,
mas era cruel e paranoico como ele. Em última análise, o mais significativo
resultado do governo de Arquelau foi que Jerusalém foi colocada sob o
controle direto dos romanos.
Também em 4 a.C., Filipe, que se casou com Salomé, filha de seu meio-
irmão Herodes Filipe, foi feito tetrarca da Itureia e Traconites (áreas a
nordeste do mar da Galileia). Em todo caso, Filipe foi um governante capaz
e consciente.

185
Um dos outros filhos de Herodes, e aquele considerado o mais capaz e
astuto, Herodes Antipas, foi feito tetrarca da Galileia e Pereia (4 a.C.).52 Ele
se divorciou de sua esposa (filha do rei nabateu Aretas IV) para se casar
com a mulher de seu meio-irmão, Herodes Filipe (não o Filipe mencionado
acima), e martirizou João Batista por ter condenado esse casamento (Mc
6.14-29 e paralelos). Posteriormente, Aretas (cf. 2Co 11.32) infligiu uma
pesada derrota sobre Herodes Antipas.

Tabela 2.4: Governadores Romanos na Judeia (Nota: Lista Parcial;


Todas as datas são d.C.)
6-10 Copônio
10-13 M. Ambívio
13-15 Ânio Rufo
15-26 Valério Grato
26-36 Pôncio Pilatos (Mt 27 e paralelos; Jo 18.28 a 19.42)
44-46 Fado
46-48 Tibério Júlio Alexandre
48-52 Cumano
52-59 Antônio Félix (At 23.24 a 24.27)
59-61 Pórcio Festo (At 24.27 a 26.32)
62-64 Albino
64-66 Géssio Floro (sua provocação deu início à rebelião
judaica em 66)

Depois de 6 d.C., a Judeia foi feita uma província romana e, como tal,
estava sob o domínio dos governadores imperiais romanos (até Cláudio,
prefeitos; depois, procuradores).53 Os governadores viviam em Cesareia e

186
só subiam a Jerusalém nos dias de festa. No entanto, eles mantinham uma
forte presença militar na Judeia. Eles também construíram a fortaleza de
Antônia, em frente ao templo e alta o suficiente para vigiar os campos
abertos.
Os judeus estavam isentos de muitas das principais exigências dos
reinos servis. Eles foram autorizados a cunhar moedas sem imagens
ofensivas, contendo apenas nomes sem atribuições de divindade. Um
sacrifício a Yahweh em nome do governo romano tomou lugar do sacrifício
exigido aos deuses. Eles também tinham uma autonomia limitada pela regra
do Sinédrio, o qual o sumo sacerdote presidia.

Os imperadores e os governadores romanos da


Palestina
Como mencionado, Roma foi constituída uma república no século V a.C.,
com o Senado romano dirigindo os assuntos da nação. Os séculos II e I a.C.
assistiram os romanos assumirem a supremacia mundial. No período
anterior à era do NT, Júlio César foi assassinado no Senado Romano por
Brutus — cujo ato de traição se tornaria proverbial (“brutal”, “brutalidade”)
— e outros senadores em 44 a.C. O nome César tornou-se, então, o título
para todos os imperadores romanos.54 Posteriormente, Otaviano (depois
conhecido como César Augusto) derrotou seu rival Antônio e a rainha
ptolomaica Cleópatra em uma batalha naval ao largo da costa de Áccio, na
Grécia, em 31 a.C., e se tornou o primeiro imperador romano.
Isso marcou o início da “Era de Ouro” (assim chamada pelo poeta
romano Virgílio) de Roma sob Augusto, que governou de 31 a.C. até 14
d.C. Esse período foi caracterizado pelo regime da lei romana, que lhe

187
proporcionou estabilidade; a “paz romana” (pax Romana), que produziu um
clima propício para a construção de estradas e a unificação do Império; e
prosperidade e fartura geral. Tibério (14-37) sucedeu a Augusto e reinou
durante a época de Jesus e de João Batista (Lc 3.1).55

Na época do ministério de Cristo, o governador romano da Palestina foi


Pôncio Pilatos.56 Seu governo foi caracterizado por subornos, insultos,
execuções sem julgamentos e severa crueldade. A carreira inicial de Pilatos
foi marcada pela arrogância e pela vontade de atacar os judeus,
provavelmente facilitada pelo apoio recebido de Sejano, seu poderoso
patrono em Roma, prefeito da guarda pretoriana de Tibério. Esse Sejano
administrava o império para Tibério, enquanto o segundo ficava na ilha de
Capri. De acordo com Filo, Sejano tinham uma antipatia especial pelos
judeus e pela nação judaica, e Pilatos pode ter posto em prática a política de
Sejano em relação à Judeia.57
Contudo, depois que Sejano foi executado no ano 31 por traição contra
Tibério, Pilatos já não tinha o poderoso patrono ao seu lado. Assim, a
atitude conciliatória de Pilatos para com os Judeus na crucificação de Jesus
provavelmente deveu-se à remoção de Sejano.58 Depois de uma série de
gafes por parte de Pilatos, o governador romano da Síria removeu Pilatos no
ano 36 e o mandou de volta à Roma para responder a Tibério, que,
felizmente para Pilatos, morreu antes de sua chegada. Nada mais se ouviu
de Pilatos depois de seu retorno a Roma, mas Eusébio (c. 260-340)
registrou que ele cometeu suicídio.59
Em Roma, Tibério foi sucedido por uma série de imperadores
conhecidos por suas crueldades e imoralidades: Calígula (37-41), Cláudio
(41-54), que expulsou os judeus de Roma (At 18.2; cf. Suetônio, Claudius
25); Nero (54-68), autor de atos selvagens contra os cristãos e o responsável

188
pelo incêndio de Roma no ano 64 (Tácito, Anais 15.44) e os martírios de
Pedro e Paulo (65 ou 66), Galba, Oto e Vitélio (68-69); Vespasiano (69-79)
e Domiciano (81-96; Suetônio, Domiciano, 12-13), durante cujo reinado o
livro de Apocalipse foi provavelmente escrito.60
Após a morte de Pilatos, a Palestina foi governada por procuradores
romanos, incluindo Félix (52-59) e Festo (59-61). Finalmente, a invasão e o
ato de pirataria de Floro contra o tesouro do templo deu início a uma revolta
judaica em 66, que culminou com a destruição de Jerusalém e do templo
em 70, precipitando a quinta grande crise para o povo judeu. Com a
destruição do santuário central, o culto no templo e o sistema sacrifical
cessaram. Como um substituto, os rabinos judeus estabeleceram uma escola
em Jâmnia para estudar a Torá (a lei do AT). Sob Adriano (117-138), os
judeus se rebelaram novamente, naquela que ficou conhecida como a
revolta de “Bar Kokhba” (132-135). Essa revolta também foi esmagada
pelos romanos, resultando no fim temporário do estado judeu até 1948.
Desde o tempo do Cativeiro da Babilônia até a destruição de Jerusalém
e do Templo no ano 70, a nação judaica foi submetida a uma série de forças
de ocupação com apenas um breve interlúdio de autogoverno durante a era
dos macabeus. Quando Jesus nasceu e, mais tarde, começou seu ministério
público, as expectativas messiânicas estavam difundidas, e a esperança
judaica de libertação — embora construída principalmente em termos
políticos e nacionalistas — estava borbulhando.

A “Plenitude dos Tempos”


Em sua Carta aos Gálatas, Paulo afirmou que o Senhor Jesus veio “na
plenitude dos tempos” (Gl 4.4). Entre outras coisas, a expressão “plenitude

189
dos tempos” (to plērōma tou chronou) transmite a ideia de que Jesus veio
“no momento certo”. Mas o que fez do tempo da vinda de Cristo o
“momento certo”?61
No contexto, a referência de Paulo à “plenitude do tempo” em Gl 4.4
refere-se à adoção dos fiéis como filhos através da obra redentora de Cristo
(cf. v. 5-7). Esse fato marcou uma nova fase na história da salvação
posterior ao período durante o qual a lei serviu como o principal ponto de
referência (cf. Gl 3.16-26). A noção de cumprimento em Jesus é alcançada
pelo próprio Cristo e pelos os evangelistas, especialmente Mateus e João.62
R. Longenecker declarou: “Estabelecida no contexto de um tema de
cumprimento, a declaração nos diz que Jesus, Filho de Deus por excelência,
é o clímax e foco de toda a atividade redentora de Deus para a
humanidade”.63
Além desse ponto de referência histórico da salvação da expressão
“plenitude do tempo”, que deve permanecer como principal, as condições
eram realmente ideais para a vinda de Jesus devido a fatores como: (1) a
paz romana; (2) estradas romanas; (3) a língua grega; e (4) expectativas
messiânicas judaicas.
Primeiro, os 200 anos de paz (embora militarmente impostos) sem
precedentes conhecidos como a pax Romana proporcionaram o “momento
certo” para o aparecimento de Jesus.64 Essa paz permitiu a propagação do
evangelho cristão durante os dias da igreja primitiva subsequentes à sua
crucificação.
Segundo, havia uma rede de estradas que os romanos haviam construído
por todo o império. Na linguagem coloquial, “Todos os caminhos levam a
Roma”, proporcionando viagens relativamente fáceis. Assim, pela
providência de Deus, as estradas construídas pelos romanos abriram o

190
caminho para a propagação do evangelho de Jesus Cristo de Jerusalém, por
todos os caminhos, a Roma (cf. o livro de Atos, especialmente 1.8; 2.14-
31).
Terceiro, as conquistas de Alexandre, o Grande fizeram do grego a
língua comercial em todo o Império Romano. O resultado foi um idioma
comum que proporcionava um veículo universal para a propagação do
evangelho. Na verdade, a língua tornou-se tão influente que o AT foi
traduzido para o grego (a LXX) e o NT foi escrito em grego.65
Quarto, as várias vertentes do judaísmo do primeiro século, cada uma à
sua maneira, sustentavam uma vibrante, apesar de diversa, esperança por
um Messias.66 Sem dúvida, muitos construíram essa esperança messiânica
em termos nacionalistas e políticos. No entanto, quando Jesus veio
afirmando ser o Messias, ele entrou em um mundo no qual muitos já
estavam esperando tal figura. Desse modo, a partir da perspectiva da
história da salvação, Jesus veio de fato “no momento certo”.

LITERATURA
Embora a produção de escritos canônicos tenha cessado no período
intertestamentário, isso não significa que não há literatura existente que date
desse período. Ao contrário, um grande corpo de literatura que lança luz
sobre o contexto do NT está disponível. O propósito da breve pesquisa que
se segue sobre a literatura do Segundo Templo é familiarizar o estudante
com a vasta gama de fontes de materiais relevantes para o estudo dessa
era.67 O próprio AT está disponível em três versões: (1) no hebraico
original; (2) na tradução grega (a Septuaginta ou LXX); e (3) paráfrase em
aramaico (os Targuns).68 Além disso, a literatura judaica do Segundo

191
Templo inclui os seguintes três corpos de escritos: (1) os Apócrifos; (2) os
Pseudepígrafos; e (3) os escritos de Qumran, ou os Manuscritos do Mar
Morto (MMM).

192
Tabela 2.5: Literatura Judaica do Segundo Templo
I. Apócrifos
1 e 2Esdras (2Esdras = 4Esdras)
Tobias
Judite
Adições a Ester
Sabedoria de Salomão
Siraque (Eclesiástico)
Baruque
Epístola de Jeremias
Oração de Azarias e o Cântico dos Três Moços
I. Apócrifos
Suzana
Bel e o Dragão
Oração de Manassés
1 e 2Macabeus*
II. Pseudepígrafos (obras selecionadas)**
1 e 2Enoque
2 e 3Baruque (2Baruque = Apocalipse de Baruque)
Oráculos Sibilinos
O Testamento dos Doze Patriarcas
* Além disso, alguns cânones que incluem os Apócrifos também contêm 3 e 4Macabeus e o
Salmo 151 (veja o Cânon Ortodoxo Grego), mas esses livros são geralmente classificados como
pseudepigráficos (cf. mais adiante). Veja C. A. Evans, Ancient Texts for New Testament Studies: A
Guide to the Background Literature (Peabody: Hendrickson, 2005), p. 341.
** Veja a lista mais completa em Evans, Ancient Texts for New Testament Studies, p. 26-27; e o
material de J. H. Charlesworth, org., The Old Testament Pseudepigrapha, 2 vols. (Garden City:
Doubleday, 1983, 1985).
*** Veja lista mais completa em Evans, Ancient Texts for New Testament Studies, p. 76-80.

193
Assunção de Moisés
Martírio e Ascensão de Isaías
Jubileus
Salmos de Salomão
Carta de Arísteas
José e Asenate
3 e 4Macabeus
III. Literatura de Qumran (Manuscritos do Mar Morto; obras
selecionadas)***
CD (Documento de Damasco ou Zadoquita)
1QS (1QRegra da Comunidade ou Manual de Disciplina)
1QM (1QRolo da Guerra)
11QTemple (11QTemplo)
1QpHab (1QPesher de Habacuque e outros pesharim ou comentários)
* Além disso, alguns cânones que incluem os Apócrifos também contêm 3 e 4Macabeus e o
Salmo 151 (veja o Cânon Ortodoxo Grego), mas esses livros são geralmente classificados como
pseudepigráficos (cf. mais adiante). Veja C. A. Evans, Ancient Texts for New Testament Studies: A
Guide to the Background Literature (Peabody: Hendrickson, 2005), p. 341.
** Veja a lista mais completa em Evans, Ancient Texts for New Testament Studies, p. 26-27; e o
material de J. H. Charlesworth, org., The Old Testament Pseudepigrapha, 2 vols. (Garden City:
Doubleday, 1983, 1985).
*** Veja lista mais completa em Evans, Ancient Texts for New Testament Studies, p. 76-80.

Os Apócrifos
A palavra grega apocrypha originalmente significava “coisas escondidas”.69
A designação apócrifos também pode se referir à natureza misteriosa ou
esotérica de alguns conteúdos desses livros ou sua natureza espúria ou
herética (ou ambas). Os católicos romanos empregam o rótulo de

194
“deuterocanônico”, pelo qual eles querem dizer que os livros Apócrifos
foram acrescentados ao cânon em um momento posterior. No entanto,
consideram os Apócrifos como canônicos, em vez de Apócrifos.
Os escritos que compõem os Apócrifos do AT incluídos nessa categoria
representam vários gêneros diferentes:

1. Escritos históricos (1Esdras, 1-2Macabeus)


2. Romances moralistas (Tobias, Judite, Suzana, Bel e o Dragão)
3. Literatura de sabedoria ou devocional (Sabedoria de Salomão, Siraque,
também chamado Eclesiástico; Oração de Manassés; Oração de
Azarias; Cântico dos Três Moços)
4. Carta pseudônima (Carta de Jeremias)
5. Literatura apocalíptica (2Esdras)

Com exceção de 2Esdras, esses escritos são encontrados na Septuaginta.


Os Apócrifos também estão incluídos na Vulgata (a tradução latina da
Bíblia preparada no século IV por Jerônimo), como parte do AT ou como
um apêndice, mas não são parte das Escrituras canônicas.70 Por causa de sua
inclusão na Vulgata, os Apócrifos foram considerados parte das Escrituras
pela igreja medieval. Em 1546, o Concílio de Trento os declarou canônicos,
exceto por 1 e 2Esdras e Oração de Manassés.71
Os protestantes tradicionalmente fazem uma distinção entre as
Escrituras Hebraicas e os Apócrifos, incluindo apenas aqueles em seu cânon
do AT, enquanto colocam estes numa categoria à parte. Na tradução alemã
da Bíblia feita por Lutero em 1534, os Apócrifos são impressos entre o AT e
o NT com o seguinte sobrescrito: “Apócrifos, isto é, livros que não são
considerados iguais aos das Sagradas Escrituras, e, no entanto, são úteis e

195
de leitura recomendável”. A versão King James de 1611 também incluiu os
Apócrifos.
Os Trinta e Nove Artigos da Igreja da Inglaterra (1571) declaram que os
Apócrifos, embora úteis para a instrução, não devem ser usados “para o
estabelecimento de qualquer doutrina”, e a Confissão de Westminster
(1648) estipula que os Apócrifos, “não sendo de inspiração divina, não
fazem parte do cânon das Escrituras e, portanto, não têm qualquer
autoridade na igreja de Deus, nem devem ser aprovados, ou usados, de
outra forma que não como quaisquer outros escritos humanos”. O texto dos
Apócrifos disponível é baseado principalmente em três grandes códices
(livros antigos): Vaticano, Sinaítico (ambos do século IV) e Alexandrino
(séc. V).
Além dos Apócrifos do AT do período do Segundo Templo, há também
os Apócrifos do NT que surgiram no século II e subsequentes da era cristã,
72
consistindo dos Evangelhos, Atos, e os Apocalipses espúrios. Muitos
desses escritos têm em comum a motivação subjacente de preencher
lacunas percebidas nas Escrituras, muitas vezes resultando em
ensinamentos heterodoxos (falsos). A especulação dos escritores apócrifos
sobre o que poderia ter sido dito ou o que pode ter ocorrido nas lacunas
literárias da Escritura deu origem a uma imaginativa “leitura das
entrelinhas” que levou a um corpo de literatura na qual falta verdadeira
inspiração divina, mas que usa o material canônico bíblico familiar como
ponto de partida para seu exercício da imaginação criativa. Esse é o caso
tanto com os escritos comumente agrupados como Apócrifos quanto com
outras literaturas judaicas do Segundo Templo reunidas sob a rubrica
amorfa de Pseudepígrafos.73

196
Os pseudepígrafos
Os pseudepígrafos (de pseudos, “falso”, e graphein, “escrever”) englobam
os seguintes tipos de literatura (obras escolhidas):

1. Literatura Apocalíptica e relacionada (1-2 Enoque; 2-3 Baruque, 4


Esdras, Oráculos Sibilinos)
2. Testamentos (Testamento dos Doze Patriarcas)
3. Epístola pseudônima (Carta de Arísteas)
4. Sabedoria ou literatura devocional (Salmos de Salomão, Odes de
Salomão, Salmo 151)
5. Expansões do material do AT (Jubileu; José e Asenate; Janes e
Jambres; Assunção de Moisés, Martírio e Ascensão de Isaías)
6. Romances religiosos e tratados filosóficos (3-4 Macabeus)74

A avaliação da literatura do Segundo Templo tem sido alternadamente


positiva e negativa. Positivamente, as informações históricas fornecidas por
livros como 1Macabeus foram notadas como uma fonte indispensável para
esse período particular na história judaica. Além disso, embora não
inspirados ou não autoritativos, muitos desses escritos refletem as várias
crenças religiosas do povo judeu no período intertestamentário e, assim,
fornecem uma base útil informações para o estudo do NT.
Negativamente, os estudiosos têm enfatizado que alguns dos
ensinamentos desses escritos são heterodoxos, isto é, não estão em
conformidade com as doutrinas afirmadas nos livros canônicos. Por
exemplo, 2Macabeus ensina que se deve orar pelos mortos, e Tobias contém
elementos de magia e sincretismo. Isso exige certo discernimento e uma
demarcação clara entre os escritos do AT e os Apócrifos e Pseudepígrafos.75
Um elemento acrescentado que requer julgamento é a possível referência a

197
dois textos não canônicos no livro de Judas, conforme discussão no capítulo
18.

Os manuscritos do Mar Morto


A descoberta dos Manuscritos do Mar Morto (MMM) começou em 1947,
constituiu a principal descoberta arqueológica do século XX e afetou
profundamente os estudos bíblicos e judaicos.76 Essa descoberta incluiu
tanto os manuscritos bíblicos, mais ou menos mil anos anteriores aos
documentos do AT mais antigos, quanto os escritos da seita. O primeiro
inclui todos os livros do AT, com exceção de Ester, e o último é composto
de textos, como o Documento de Damasco (CD), a 1QRegra da
Comunidade ou Manual de Disciplina (1QS); Hinos de Ação de Graças
(1QH), o 1QRolo Da Guerra (1QM); o 1QPesher de Habacuque (1QpHab),
77
e o 11QTemplo (11QTemple). Os documentos bíblicos descobertos em
Qumran, incluindo o famoso Rolo de Isaías, equipou os estudiosos com
leituras antigas da Escritura hebraica, o que lhes permitiu fazer progresso na
verificação da leitura original de determinadas passagens do AT.
Além disso, os Manuscritos do Mar Morto fornecem uma visão
fascinante sobre a vida de uma seita judaica que provavelmente surgiu na
época dos macabeus em meados do século II a.C. e continuou com a
primeira revolta judaica em 66-73 d.C.78 A identidade precisa do grupo
responsável pela literatura de Qumran permanece incerta. Muito
provavelmente, o estímulo inicial para a partida do grupo de Jerusalém e
sua retirada para a região do mar Morto foi a corrupção do sacerdócio de
Jerusalém durante o período macabeu. É muito provável que o sumo
sacerdote judeu na época da formação da comunidade seja mencionado na

198
literatura de Qumran como “Sacerdote Ímpio” em contraste com o “Mestre
da Justiça” (veja 1QpHab 1.13; 2.2; 8.7; 11.4,5), que presumivelmente foi o
fundador da comunidade.79
É importante notar que os Manuscritos do Mar Morto não retratam a
principal tendência do judaísmo ou as atitudes judaicas durante essa época.
Essa comunidade isolada foi uma seita que se definia em oposição ao
estabelecimento de Jerusalém e que se engajava em suas próprias distinções
religiosas e práticas comunitárias. Essas incluíam um método particular de
interpretação da Escritura, o método pesher, que apropriava material bíblico
com referência à situação contemporânea da comunidade (p. ex., o
“1QPesher de Habacuque”).80 Além disso, não há nenhuma referência ao
NT ou a Jesus nos Manuscritos do Mar Morto. Assim, os Manuscritos do
Mar Morto devem ser considerados como escritos judeus, e não cristãos.81
A postura crítica da comunidade em relação ao corrupto sacerdócio de
Jerusalém, portanto, fornece um antecedente para o desafio de Jesus da
corrupção do ritual do templo de Jerusalém durante seu ministério (Mt
21.12-17 e paralelos; Jo 2.13-22). O uso da Escritura pela comunidade
também fornece um precedente fascinante para autoidentificação de João
Batista como “a voz que clama no deserto” (extraído de Is 40.3). A
comunidade do mar Morto também se apropriou da mesma passagem da
Escritura com referência a si mesma.82 A comunidade e os Manuscritos do
Mar Morto fornecem um contexto útil para a compreensão do NT em geral,
e para figuras importantes como João Batista e Jesus.83

TEOLOGIA

199
Os capítulos sobre os vários livros do NT investigam o contexto específico
relevante para cada livro. Nessa fase, seria útil fornecer um cenário geral do
primeiro século judaico e do mundo greco-romano, a fim de transmitir uma
compreensão geral do ambiente em que Jesus e a igreja primitiva viveram.
O NT não surgiu em um vácuo, mas teve suas raízes em determinado
contexto histórico, cultural e religioso, e a compreensão desse contexto,
pelo menos em um sentido geral, coloca o estudo do NT em uma
perspectiva adequada desde o princípio. A discussão a seguir apresenta as
questões contextuais mais significativas para o estudo do NT: (1)
paganismo; (2) culto ao imperador; (3) religiões de mistério;(4) superstição
e sincretismo; (5) gnosticismo; (6) filosofia; e (7) judaísmo.

Paganismo
As pessoas do mundo antigo eram profundamente religiosas, quer
abraçassem a religião de Israel ou o cristianismo.84 Assim, quando Paulo
curou um homem coxo em Listra, a multidão exclamou: “‘Os deuses
desceram até nós sob a forma de homens’. A Barnabé chamavam Zeus, e a
Paulo, Hermes, pois era ele quem dirigia a palavra. O sacerdote de Zeus,
cujo templo ficava de frente para a cidade, trouxe para as portas touros e
coroas de flores, e juntamente com as multidões, queria oferecer-lhes
sacrifícios (At 14.11-13)”.
A mitologia grega apresentava Zeus como o chefe da hierarquia dos
deuses. Apolo, filho de Zeus, era caracterizado como aquele que inspirava
poetas e profetas. A religião romana se apropriou de muito do panteão
grego, identificando deuses romanos com os gregos (Júpiter = Zeus; Vênus

200
= Afrodite etc.) O próprio imperador romano serviu como sumo sacerdote
(pontifex maximus), fundindo os campos político e religioso.

Culto ao Imperador
Seguindo a prática comum de atribuir divindade a governantes,85 o Senado
romano instituiu o culto ao imperador ao deificar Augusto (31 a.C. a 14
d.C.) e os subsequentes imperadores após sua morte. Calígula (37-41), Nero
(54-68) e Domiciano (81-96) reivindicaram divindade enquanto ainda
vivos. Vespasiano (69-79) tratou o culto imperial levianamente, e até
mesmo brincou quando estava morrendo, “acho que estou me tornando um
deus” (Suetônio, Vespasiano 23).86 Domiciano, por outro lado, reivindicou o
título dominus et deus (“senhor e deus”), a quê o quarto evangelista pode ter
feito alusão na sua citação da confissão de Tomé de Jesus como “Senhor
87
meu e Deus meu” (Jo 20.28). O culto ao imperador fornece contexto
especialmente importante para o livro de Apocalipse, que muito
provavelmente foi escrito durante a perseguição de cristãos sob o governo
de Nero ou Domiciano.88

Religiões de Mistério
O mundo antigo nos primeiros séculos da era cristã estava repleto de
“religiões de mistério”, vários cultos que concebiam o coração da religião
como união mística com o divino.89 Havia religiões de mistério gregas,
egípcias e orientais, incluindo os cultos a Elêusis, Mitra, Ísis, Dionísio,
Cibele e outros cultos locais. Rituais de iniciação secretos envolviam
purificações cerimoniais, refeições sagradas, intoxicação e frenesis
emocionais. O propósito desses rituais era entrar em união com a divindade.

201
Um de seus adoradores foi Apuleio, um convertido ao culto de Mitras. O
trecho a seguir ilustra a natureza desses antigos cultos de mistério:

Em uma noite escura, ela apareceu para mim em uma visão, declarando em palavras não
obscuras que o dia que eu tanto ansiei havia cegado […] Quando eu ouvi esses e os outros
mandamentos divinos da deusa altíssima, muito me alegrei, e me levantei antes do dia
amanhecer para falar com o grande sacerdote, a quem eu aventurei a espiar enquanto saia de
seus aposentos […]
Então o velho homem me pegou pela mão e me levou com cortesia para o portão do
grande templo, onde, depois de ter sido religiosamente aberto, ele fez um solene celebração
e, depois que os sacrifícios matinais foram encerrados, ele tirou do lugar secreto do templo
certos livros escritos com caracteres desconhecidos […] Então, ele me levou, quando achou
que já era hora, à próxima sala de banhos, acompanhado de toda a sorte de atos religiosos e,
exigindo o perdão dos deuses, lavou-me e purificou meu corpo segundo o costume; depois
disso, quando dois terços do dia haviam se passado, ele me levou novamente para o templo e
apresentou-me aos pés da deusa, acusando-me de certas coisas secretas impróprias de serem
pronunciadas […]
Quando amanheceu e as solenidades haviam sido concluídas, eu saí santificado com doze
estolas e em um hábito religioso […] Na minha mão direita eu carregava uma tocha acesa, e
uma grinalda de flores estava sobre minha cabeça, com folhas de palmeira branca brotando
por todos os lados como raios; assim, eu estava adornado como alguém diante do sol, e feito
semelhante a uma imagem, quando as cortinas foram afastadas e todas as pessoas me
cercaram para me contemplar […] [Depois disso, o iniciado recita uma longa oração à
deusa.]
Quando terminei minha oração para a grande deusa, fui abraçar o grande sacerdote
Mitras, agora meu pai espiritual, agarrando-me ao seu pescoço e beijando-o muitas vezes e
pedindo o seu perdão, considerando que eu era incapaz de recompensar o bem que ele fizera
por mim: e depois de muita fala e muitas saudações e agradecimentos, afastei-me dele e fui
direto visitar meus pais e amigos, de quem eu havia estado afastado por tanto tempo […] [O
iniciado viaja para Roma.] Meu maior desejo lá era orar diariamente a soberana deusa Ísis
que, em razão do lugar onde seu templo foi construído, era chamada Campense e
continuamente é adorada pelo povo de Roma: seu ministro e adorador era eu, um estranho
para sua igreja, mas não desconhecido para sua religião.90

No início do século XX, a escola da história das religiões procurou


estabelecer paralelos entre esses cultos de mistério e o cristianismo
primitivo, alegando que o último tomou emprestado elementos-chave da

202
91
sua religião do mundo greco-romano mais amplo. Por exemplo, alguns
estudiosos argumentaram que o batismo era um ritual de iniciação cristão
moldado de acordo com cerimônias de iniciação pagãs, e que a Ceia do
Senhor era o equivalente às refeições sagradas pagãs. Além disso, as
crenças cristãs às vezes parecem assemelhar-se a elementos encontrados nas
religiões pagãs. No entanto, há pouca ou nenhuma evidência de que as
práticas cristãs são derivadas de outras religiões.92

Superstição e Sincretismo
O mundo antigo estava permeado com superstição e sincretismo, uma
mistura eclética de práticas religiosas.93 Essas práticas incluíam mágica,
horóscopos, oráculos e augúrio (previsão de eventos futuros pela
observação dos padrões de voo das aves). Muitas casas tinham ídolos
domésticos com imagens de deuses. Uma carta dirigida por um pai aflito a
um oráculo ilustra o clima supersticioso desse período (Papiros de
Oxirrinco, século I d.C.):

Ó Senhor Sarápis Hélios, o beneficente. [Diz] se é adequado que Fânias meu filho e sua
esposa não concordem agora comigo, seu pai, mas se oponham a mim e não façam um
contrato. Diga-me isso verdadeiramente. Adeus.94

O livro de Atos apresenta numerosos exemplos de superstição e


sincretismo no mundo do primeiro século. Em Samaria, Simão, o mágico,
que havia praticado magia, ofereceu dinheiro aos apóstolos para que ele
também pudesse conceder o Espírito Santo aos outros (At 8.9-24). Na ilha
de Chipre, Elimas, o mago, opôs-se a Barnabé e Paulo (At 13.7). Em Éfeso,
alguns que haviam praticado artes mágicas publicamente queimaram seus
livros (At 19.19). Em Malta, quando as pessoas viram uma víbora

203
pendurada na mão de Paulo, especularam que ele era um assassino, mas
quando ele lançou a cobra sobre o fogo e saiu ileso, eles mudaram de ideia
e concluíram que ele era um Deus (At 28.3-6).

Gnosticismo
Gnosticismo (do grego gnōsis, “conhecimento”) tem suas raízes no
dualismo platônico que nitidamente fazia distinção entre o mundo invisível
das ideias e o mundo visível da matéria.95 Geralmente, essa cosmovisão
igualava matéria ao mal e via apenas o reino espiritual como bom. É
importante notar que a era do NT apenas documenta uma forma incipiente
de gnosticismo. O gnosticismo pleno não emergiu até o século II e,
portanto, é de data posterior ao cristianismo.96

QUADRO 2.4: RELIGIÕES DE MISTÉRIO E


A ABORDAGEM DA HISTÓRIA DAS
RELIGIÕES
A abordagem da história das religiões se baseia em um modelo
evolutivo que vê a história principalmente como o desenvolvimento da
consciência religiosa humana, e não como a resposta humana à real
revelação divina. Se a possibilidade da revelação divina for descartada
logo de início ao nível das pressuposições, não é de admirar que o
cristianismo é interpretado em termos horizontais em uma escala
comparativa de religiões. Além do mais, a questão não é apenas saber
se existem algumas semelhanças superficiais entre o cristianismo e as

204
religiões não cristãs, mas em que direção o empréstimo provavelmente
aconteceu.
Cuidado com relação aos paralelos aparentes também é necessário,
uma vez que as semelhanças são, muitas vezes, mais aparentes do que
reais. Por exemplo, enquanto há mitos de deuses que morrem e
erguem-se nas religiões pagãs que podem parecer semelhantes ao
ensino do NT de que Jesus morreu e ressuscitou dos mortos, apenas
Jesus trouxe redenção; somente ele foi uma figura histórica recente; e
só ele morreu em uma cruz e ressuscitou corporalmente. Além disso,
as religiões de mistério eram altamente sincréticas e ecléticas,
incorporando uma variedade de elementos das religiões ao redor,
enquanto o cristianismo era exclusivista, de modo que é muito mais
provável que as religiões de mistério tenham incorporado certas
características cristãs do que o cristianismo ter incorporado as
características das religiões pagãs.
Por razões como essas é muito mais provável que o cristianismo
estivesse baseado no solo da religião de Israel como testemunhado
pelo AT, não em religiões helenísticas de mistério.1 Isso é fortemente
sugerido pelo uso extensivo do AT por Jesus e por muitos dos
escritores do NT (incluindo Paulo), tanto no que diz respeito a termos
de citações explícitas quanto em relação a alusões e ecos do AT.2 Além
do mais, toda a mensagem de Jesus e a teologia do NT são construídas
sobre a subestrutura da teologia do AT, unindo os Testamentos a um
continuum histórico da salvação, no qual Jesus serve como ponto
central de ligação como o Messias e como o cumprimento de
previsões e tipologias do AT.

1
Veja ainda discussão sobre o judaísmo mais adiante.

205
2
Veja especialmente Beale; Carson, Commentary on the New Testament Use of the Old

Testament; veja também Longenecker, Biblical Exegesis in the Apostolic Period; e D. A.

Carson; H. G. M. Williamson, orgs., It Is Written: Scripture Citing Scripture (Cambridge:

University Press, 1988). Sobre ecos, veja R. B. Hays, Echoes of Scripture in the Letters of

Paul (New Haven: Yale University Press, 1989).

O pensamento gnóstico, mais bem atestado na Biblioteca de Nag


Hammadi (incluindo o Evangelho de Tomé), descoberta na década de 1940
no Egito, levou aos seguintes fenômenos opostos: (1) ascetismo, a
supressão das paixões do corpo devido à sua ligação com a matéria má; (2)
libertinagem, a satisfação das paixões do corpo por causa da insignificância
da matéria. Alguns argumentaram que se as coisas feitas no corpo não
importam, então a implicação é de que o corpo e suas atividades deveriam
ser suprimidos, enquanto a vida do espírito é nutrida. Outros, no outro lado
do espectro, acreditavam que um estilo de vida imoral poderia ser
perseguido enquanto uma pessoa, ao mesmo tempo, alegava ser espiritual.
Desde o seu início, o gnosticismo constituiu a primeira séria ameaça
herética ao cristianismo. Como resultado da dicotomização gnóstica entre
matéria e espírito, a noção de uma ressurreição corporal era abominável
para os gnósticos, pois a matéria era considerada como o mal. Em vez
disso, a imortalidade da alma era mais desejável e foi perseguida através do
conhecimento e prática de atividades religiosas secretas. Além disso, como
resultado dessa dicotomização, a pecaminosidade humana era negada e,
assim, a necessidade de redenção tornava-se irrelevante.
Embora o que hoje conhecemos por gnosticismo não existisse no
primeiro século, vestígios de um gnosticismo incipiente são possivelmente
encontrados, mais tarde, no NT. Em uma possível referência ao tipo de

206
pensamento gnóstico, Paulo advertiu Timóteo a que evitasse “as conversas
insignificantes e profanas, e as objeções do que falsamente se chama
‘conhecimento’ [gnōsis]” (1Tm 6.20). Paulo também denunciou os falsos
mestres, que proibiam o casamento e exigiam a abstinência de certos
alimentos, alegando que, ao contrário, tudo o que Deus criou é bom (1Tm
4.1-5; veja 1Tm 2.15). Ele também condenou a heresia dos colossenses que
defendiam o falso ascetismo e o legalismo (Cl 2.4-23; veja 1Tm 4.7,8),
embora esta tenha sido uma forma singular de sincretismo.

Filosofia
A filosofia grega também permeou o mundo mediterrâneo do primeiro
século.97 As três filosofias mais populares foram (1) o epicurismo, (2) o
estoicismo e (3) o cinismo. O epicurismo ensinava que o prazer (no sentido
de felicidade, não necessariamente prazer sensual) era a maior virtude da
vida.98 Isso conduzia a uma defesa do “hedonismo”, a busca do prazer como
uma questão de princípio ético: “Comamos e bebamos porque amanhã
morreremos” (1Co 15.32; veja Is 22.13).
O estoicismo ensinava a aceitação obediente do próprio destino — uma
forma de fatalismo — como se este fosse determinado por uma razão
impessoal que governa o universo.99 As pessoas eram intimadas a aceitar o
próprio destino “estoicamente”, isto é, sem emoção. Em Atenas, Paulo
encontrou filósofos tanto epicuristas quanto estoicos (At 17.18), que
arrogantemente o consideravam um pseudointelectual. Esses filósofos
equivocadamente pensaram que Paulo acreditava que a “ressurreição” seria
uma “divindade estrangeira”, indicando quão estrangeiro o ensino cristão da

207
ressurreição corporal de Jesus soava para aqueles mergulhados na filosofia
grega.
Os defensores do cinismo100 eram pregadores itinerantes que haviam
abandonado interesses mundanos. Eles ensinavam que a simplicidade era a
suprema virtude da vida e que as pessoas deveriam cultivá-la em vez de se
preocuparem com as atividades populares. Em essência, eles defendiam
uma renovada descoberta dos prazeres de uma vida simples, embora, na
realidade, a superstição e o sincretismo largamente prevalecessem entre as
massas populares.101 Alguns, como John Dominic Crossan e os defensores
do “Seminário de Jesus”, mantinham com base em semelhanças superficiais
(tais como estilo de vida simples de Jesus e seu ministério itinerante) que
Jesus era um cínico.102 Isso, porém, é improvável, ainda que por nenhuma
outra razão que não o fato de o cinismo não ser atestado na Palestina do
primeiro século.
A discussão anterior ilustra que as pessoas no primeiro século aderiam a
várias cosmovisões que os primeiros cristãos procuravam combater.
Semelhantemente, muitos se apegam ainda hoje a essas filosofias de vida,
embora de outras formas. Um conhecimento básico dessas filosofias e
ideias sobre como os primeiros cristãos as confrontavam com o evangelho
é, portanto, útil não só para a interpretação dos documentos do NT, mas
também para as maneiras pelas quais a igreja poderia combater as filosofias
“epicurista”, “estoica” e “cínica” modernas.

Judaísmo
À luz da importância do judaísmo como o contexto para o estudo do NT, o
seguinte tratamento do judaísmo é mais extenso do que nas seções

208
anteriores. Esta seção inclui o monoteísmo, a sinagoga, o templo, o
calendário religioso, as escolas rabínicas, os prosélitos e os tementes a
Deus, o messianismo e as seitas e instituições judaicas.103

Monoteísmo
O último — e de muitas maneiras, o mais importante — elemento do
contexto do NT é o judaísmo, que fez diversas contribuições importantes
para o cristianismo primitivo. Primeiro, o judaísmo pressupunha
monoteísmo, um firme compromisso de crer em um único Deus como
ensinado no AT e proclamado no Shemá (hebr., “ouve”): “Ouve, ó Israel: O
SENHOR nosso Deus é o único SENHOR” (Dt 6.4).104 Os dois primeiros dos
Dez Mandamentos (o Decálogo) proibiam os israelitas de adorar outros
deuses (Êx 20.2-6; Dt 5.6-10).
O monoteísmo separava Israel das crenças e práticas politeístas de seus
vizinhos pagãos, incluindo o panteão greco-romano. Esse compromisso se
tornou uma importante característica distintiva da religião judaica em um
ambiente politeísta e foi reconhecido como uma marca da fé judaica por
historiadores greco-romanos como Tácito, que escreveu: “Os judeus
concebem um único Deus” (Hist. 5.5).

A sinagoga
Embora as origens da Sinagoga sejam incertas, sua importância para a vida
judaica e para a igreja primitiva é indiscutível.105 A estrutura de liturgia e
liderança da sinagoga, com suas orações, salmos, leituras da Escritura,
sermões e bênçãos — e a direção da sinagoga, conselho de anciãos, e
membros serviram de padrão para a igreja primitiva para o estabelecimento

209
de práticas litúrgicas cristãs e estruturas de liderança.106 Para Jesus, Paulo, e
para a missão cristã primitiva, a Sinagoga fornecia um paradigma natural
para a proclamação da salvação pela fé em Jesus como o Messias (Lc 4.16-
30, Jo 6.30-59; 18.20; At 13.13-52). A Sinagoga foi também de crucial
importância para os judeus na Diáspora (dispersão), especialmente após a
destruição do templo em 70 d.C.

O templo
Outra característica importante do judaísmo era o Templo de Jerusalém,107
que servia como um símbolo fundamental da unidade nacional e religiosa.
O templo original construído por Salomão (1Rs 5 a 8) foi destruído pelos
babilônios no século VI a.C. Depois do Exílio, um novo templo foi
construído por Zorobabel (Ed 3; Ag 1 a 2; Zc 4). A área e o edifício do
templo incluíam pátios externos e internos e várias salas, incluindo o Santo
dos Santos. Mais tarde ele foi reformado e ampliado por Herodes, o Grande,
com a restauração do edifício sendo concluída em 18 a.C. e a dos pátios
externos, em 64 d.C.
No século I o templo era conhecido por sua aparência magnífica (Mt
24.1,2 e paralelos; Josefo, Guerra Judaica 5.222-24; veja b. B. Bat. 4a).
Rodeado por pórticos, o templo consistia de um pátio exterior (o Pátio dos
Gentios) e um templo interno, constituído do Pátio de Mulheres a leste e do
Pátio Interno a oeste. O primeiro ambiente era o “Lugar Santo”, que era
separado do ambiente externo por um pesado véu. A sala mais íntima, o
“Santo dos Santos”, era separado do Lugar Santo por outro pesado véu. O
sumo sacerdote entrava ali apenas uma vez por ano, no Dia da Expiação.

210
Nos dias de Jesus, o templo, que fora o símbolo glorioso da habitação
de Deus com seu povo, tinha se degenerado em um local de comércio e
ritual superficial (Jo 2.14-16). Com a destruição do templo no ano 70, o
judaísmo foi forçado a ajustar suas práticas sacrificiais e litúrgicas, porque o
elemento central de todo o seu sistema de adoração tinha sido removido.
Em resposta à perda do templo, os fariseus fundaram uma escola rabínica
em Javneh (Jâmnia), enquanto os saduceus desapareceram de cena, assim
como os essênios e os zelotes.

211
Tabela 2.6: Festivais Judaicos
O calendário religioso judaico começava em março/abril e incluía os
seguintes festivais:
1. Páscoa (Êx 12.1-14; Lv 23.5; Nm 9.1-14; 28.16; Dt 16.1-7)
2. Pães sem Fermento (Êx 12.15-20; 13.3-10; 23.15; 34.18; Lv 23.6-8; Nm
28.17-25; Dt 16.3-4, 8), ambos celebrados no início da colheita do trigo
(março/abril) e comemorando libertação de Israel por 3. Deus na época do
Êxodo
3. A Festa dos Primeiros Frutos (Lv 23.9-14)
4. A Festa das Semanas ou Pentecostes (Êx 23.16; 34.22; Lv 23.15-21;
Nm 28.26-31; Dt 16.9-12), comemorado o final da colheita do trigo
(maio/junho)
5. Trombetas ou Rosh Hashaná (Lv 23.23-25; Nm 29.1-6), comemorando
o início do ano civil (setembro/outubro)
6. O Dia da Expiação ou Yom Kippur (Lv 16; 23.26-32; Nm 29.7-11), um
dia nacional de arrependimento (setembro/outubro; tecnicamente não é
uma festa)
7. Festa dos Tabernáculos ou Cabanas (Êx 23.16; 34.22; Lv 23.33-36, 39-
43; Nm 29.12-34; Dt 16.13-15; Zc 14.16-19), em comemoração à vida dos
israelitas em tendas no deserto após o Êxodo (setembro/outubro)
8. Luzes ou Dedicação ou Hanucá (Jo 12.22), celebrando a dedicação do
templo por Judas Macabeu em 165 ou 164 a.C. (25 de dezembro), após o
templo ter sido profanado por Antíoco Epifânio
9. Purim (Et 9.18-32), comemorando a libertação dos judeus na época de
Ester (Fevereiro/Março).

O calendário religioso
O calendário religioso judaico do AT constitui um importante pano de
fundo para o relato do NT da vida de Jesus e para a adoração da igreja
primitiva.108 A instituição de muitos dias sagrados importantes na vida de

212
Israel — incluindo o sábado, a Páscoa, o Dia da Expiação — é registrada
em Levítico 23, e referências a esses festivais permeiam todo o AT. Esses
festivais dominavam a vida religiosa dos judeus praticantes por todo o
período do Segundo Templo e além.

Escolas rabínicas
Outro elemento importante do contexto judaico para o estudo do ministério
de Jesus é aquele das inúmeras escolas rabínicas que existiam na Palestina
do primeiro século. Os rabinos nessas escolas procuravam interpretar o AT
e como resultado criaram um grande corpo de tradição oral.109 Eles
sustentavam que a lei oral pode ser reconstruída de volta até Moisés no
Monte Sinai e que ela substituía o próprio o AT. Jesus, que os acusou de
revogarem a palavra de Deus por causa de sua tradição (Mt 15.6), criticava-
os por isso:

Os escribas e fariseus se assentam na cadeira de Moisés. Portanto, fazei e guardai tudo o que
eles vos disserem; mas não lhes imiteis as obras, pois não praticam o que dizem. Atam fardos
pesados e difíceis de carregar e os colocam sobre os ombros dos homens; mas eles mesmos
nem com o dedo querem movê-los. Praticam todas suas obras para serem vistos pelos
homens, alargam seus filactérios e aumentam as franjas de seus mantos; gostam do primeiro
lugar nos banquetes e dos primeiros assentos nas sinagogas, de serem cumprimentados em
público e chamados Rabi pelos homens (Mt 23.1-7).

A Mishná, uma compilação de cerca de 200 ensinamentos judaicos,


atesta as famosas escolas da interpretação rabínica do AT no século I e
subsequentes.110 Entender esse contexto mostra-se útil, por exemplo,
quando se lê a seguinte pergunta feita pelos fariseus a Jesus: “É permitido
ao homem divorciar-se de sua mulher por qualquer motivo?” (Mt 19.3). A
discussão rabínica, nesse caso, girava em torno da interpretação correta da

213
referência a “coisa vergonhosa” em Deuteronômio 24.1, lidando com
motivos legítimos para o divórcio. A escola rabínica mais estrita limitava
essa ofensa a indecência sexual, enquanto a escola mais liberal a estendia
também a uma variedade de infrações menores. Em resposta, Jesus
confirmou a manutenção do casamento com base em Gênesis 2.24.111

Os prosélitos e os tementes a Deus


O judaísmo atraía um grande número de prosélitos (plenamente convertidos
ao judaísmo que observavam o sábado, as leis alimentares e circuncidavam
todos os homens) e os tementes a Deus (que só aceitavam os ensinos morais
e as práticas religiosas gerais do judaísmo sem se submeter à
circuncisão).112 Esses convertidos eram atraídos ao monoteísmo e
ensinamento moral judaicos, deixando para trás a idolatria pagã e
alinhando-se com a religião e o modo de vida judaicos, embora com
diferentes graus de conformidade.
O NT, especialmente os Evangelhos e o livro de Atos, faz repetidas
referências aos prosélitos e aos tementes a Deus.113 Entre os tementes a
Deus que se aproximaram de Jesus a fim de realizar curas estavam o
centurião romano (Mt 8.5-13 e paralelos) e o oficial real (Jo 4.46-54). Um
relato original envolvendo um temente a Deus é o de Cornélio (At 10). A
inclusão dos gentios em igualdade de condições com os judeus na nova
comunidade messiânica era um conceito revolucionário para muitos judeus
do primeiro século, incluindo muitos dos primeiros cristãos (At 10.9-16;
veja 1Co 12.13; Gl 2.11-21; 3.28).

Teologia judaica

214
Não há nenhuma “teologia sistemática” do judaísmo existente, apenas
indicações das crenças judaicas sobre diferentes temas na Mishná e nos
Talmudes.114 A teologia judaica teve seu ponto de partida não na mitologia,
no misticismo ou em especulação filosófica, mas nos atos de Deus na
história registrados nas Escrituras hebraicas (o AT). Muitas crenças judaicas
são significativas como pano de fundo do NT, incluindo aquelas sobre o
final dos tempos, sobre a natureza do homem e sobre a vinda do Messias.
Com relação ao final dos tempos, os judeus normalmente abraçavam a
doutrina das “duas eras”, segundo a qual “a presente era (má)” precedia os
“dias do Messias” ou o “Dia do Senhor”, inaugurando “a era por vir”. Isso é
claramente visível nos Evangelhos.115 Paradoxalmente os Evangelhos
indicam que, com a vinda de Jesus, a “era por vir” já começou. Por isso
Jesus ensinou que o reino de Deus já estava presente (Lc 17.21), e aqueles
que cressem nele já tinham a vida eterna (Jo 3.16; 10.10).
Outra crença característica entre os judeus, inferida de Gênesis 2.7, era
a de que Deus criou o homem com um impulso “bom” e outro “mal” (yetzer
tov e yetzer ra). O primeiro era visto como a consciência moral, a voz
interior que lembrava uma pessoa da Lei de Deus quando ele ou ela
desejava participar do que era proibido, e o último era essencialmente
entendido como egocentrismo.

Messianismo
Um dos aspectos mais importantes da teologia judaica era o messianismo,
isto é, várias crenças a respeito da vinda de uma figura chamada de
“Messias” ou “Ungido”. A maioria dos judeus estava procurando por um e,
em alguns casos, por vários Messias.116 As expectativas messiânicas eram

215
tudo exceto uniformes, como o NT e a literatura do Segundo Templo
atestam.117 Alguns acreditavam, com base em Miqueias 5.2, que o Messias
haveria de nascer em Belém (Mt 2.5,6; veja Jo 7.41,42); outros defendiam
que as origens do Messias seriam envoltas em mistério (Jo 7.27; veja Dn
7.13).
A comunidade do mar Morto aparentemente esperava por dois Messias
diferentes, um sacerdotal e um real (1QS 9.11).118 Poucos (se é quem
existiram) esperavam que o Messias teria que sofrer (embora isso fosse
claramente ensinado em Is 52.13 a 53.12; veja Mt 16.21-23 e paralelos; Jo
12.34).119 A maioria concebia o Messias em termos nacionalistas, esperando
que ele estabelecesse um reino terreno com Israel em seu centro e que
libertasse os judeus de seus opressores estrangeiros (veja Jo 1.49; 6.14;
12.12,13).

Seitas judaicas e outros grupos de pessoas


Várias seitas judaicas proeminentes que aparecem nos Evangelhos têm sua
origem no período dos macabeus (meados do século II a.C.).120 Entre os
principais partidos estavam (1) os fariseus, (2) os saduceus, (3) os essênios
e (4) os zelotes.121 Os fariseus, os principais antagonistas de Jesus,
provavelmente se originaram do grupo assideu de tementes a Deus, que
praticava uma forma de justiça que observava um complexo sistema de
tradições orais em um esforço de completar as implicações dos
mandamentos das Escrituras para a vida diária.122 Ao contrário dos
saduceus, os fariseus acreditavam na ressurreição e nos anjos (At 23.8).
As origens dos saduceus remontam ao período dos asmoneus (final do
século II a.C.; Josefo, Guerra Judaica 2.404-15).123 Seu desaparecimento

216
ocorreu com a destruição do Templo de Jerusalém no ano 70 d.C.124 Como a
aristocracia governante em Jerusalém, eles tinham um interesse velado em
manter o status quo e de se arranjarem com os senhores estrangeiros na
Palestina. Eles constituíam a maioria no Sinédrio, o conselho dirigente
judeu, aceitavam apenas o Pentateuco como Escritura, negavam a futura
ressurreição e se abstinham da crença nos anjos (At 23.8). Os saduceus
estavam aliados aos fariseus para crucificar Jesus.
Os essênios, como os fariseus, provavelmente se originaram com os
assideus, de quem depois se separaram (1Mac 2.42; 7.13; Josefo, Guerra
Judaica 2.555-97).125 Eles eram um grupo de judeus piedosos e zelosos que
participou com o macabeus de uma revolta contra os selêucidas, porém
mais tarde rejeitaram a corrupção dos macabeus do sacerdócio de Jerusalém
e do sistema do templo.126 Eles podem ter formado o núcleo da comunidade
do mar Morto que se retirou de Jerusalém para o deserto a fim de praticar
uma forma de vida comunal e devotada observância religiosa. Eles se
engajaram no estudo das Escrituras, nos banhos e lavagens rituais e na
adoração litúrgica; acreditavam que eram a comunidade escolhida do final
dos tempos; e alguns de seus membros se abstinham do casamento. Os
essênios não são mencionados no NT.
Os zelotes são atestados pela primeira vez durante o reinado de
Herodes, o Grande (c. 6 a.C., Josefo, Guerra Judaica 2.598-606).127 Eles
deixaram de existir como um movimento após a queda de Massada, uma
fortaleza judaica próxima ao mar Morto, no final da primeira revolta
judaica no ano 73. Os zelotes resistiram à ocupação estrangeira da Palestina
pelos romanos e se opuseram ao pagamento de tributos ou taxas aos
imperadores pagãos, pois defendiam que esses eram devidos somente a
Deus. Eles eram extremamente fiéis às tradições judaicas e se opunham a

217
qualquer influência estrangeira na Palestina. Entre eles pode ter estado o
sicarii, um grupo de combatentes da resistência que ocultava pequenos
punhais sob seus mantos e assassinava pessoas em um esforço para
desestabilizar o clima político na Terra Santa.128 Um dos seguidores de
Jesus parece ter sido um zelote (Simão, o Zelote; Mt 10.4).
O povo comum da Palestina é mencionado algumas vezes nos
Evangelhos como o “povo da terra” (hebr., am haarets). Eles eram
desprezados pelos líderes religiosos que os consideravam ignorantes em
relação às complexidades de sua tradição oral e inadequadamente
preocupados com o ritual religioso e com a observância da Lei. Típica é a
atitude dos fariseus transmitida pela declaração no Evangelho de João:
“Mas essa escória, que nada sabe da Lei, é maldita” (7.49). Também é
importante observar o grande número de judeus na Diáspora fora da
Palestina (Jo 7.35). Eles adoravam nas sinagogas e atraíam um número
considerável de prosélitos e de tementes a Deus.129

O Sinédrio
O Sinédrio, também chamado “Conselho”, “os dirigentes”, “principais
sacerdotes, anciãos, e escribas”, ou uma combinação desses no NT, era o
supremo conselho judaico em todas as questões religiosas e políticas.130
Idealmente, era constituído de 70 membros sobre o precedente dos anciãos
designados por Moisés conforme o conselho de Jetro, seu sogro (Êx 18),
embora talvez esse nem sempre tenha sido o número de seus membros. O
Sinédrio era convocado pelo sumo sacerdote.131 Enquanto a Palestina foi
dirigida pelo governador romano que se reportava ao imperador em Roma,

218
os judeus desfrutaram de um considerável grau de autonomia religiosa e
política nos dias de Jesus.

CONCLUSÃO
O propósito deste capítulo foi estabelecer a base para o estudo do NT no
restante deste volume. Ao adquirir um entendimento básico dos
desenvolvimentos históricos e políticos anteriores ao período do NT como
também familiaridade com a literatura do Segundo Templo e as correntes
teológicas e filosóficas predominantes, os estudantes estarão equipados para
lidar com cada escrito do NT, um estudo que ocupa o restante deste volume.

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Qual é a importância dos seguintes eventos ou livros para o NT?
a. O Exílio assírio de Israel (o Reino do Norte)
b. O Exílio babilônico Judá (o Reino do Sul)
c. O livro de Malaquias
d. As conquistas de Alexandre, o Grande
2. Quais foram as duas casas gregas no controle da Palestina 320-167
a.C.?
3. Qual era o nome do governante grego que ergueu uma estátua de Zeus
no Templo em Jerusalém, e quando esse evento aconteceu?
4. Qual era o nome do partido judaico de apoio aos macabeus?
5. Qual era o nome da dinastia que se seguiu aos macabeus?
6. Quais os dois partidos resultantes da divisão dos assideus?
7. Em que ano cada um destes imperadores romanos reinou?

219
a. Augusto
b. Tibério
c. Nero
d. Domiciano
8. Quando os romanos destruíram o Templo de Jerusalém?
9. Quem foram os três filhos de Herodes, o Grande, que governaram
partes da Palestina, e quais as províncias ou regiões que eles
governaram?
10. Quais são os nomes de pelo menos cinco livros apócrifos,
pseudepígrafos, e três escritos da literatura de Qumran (Manuscritos
do Mar Morto)?
11. Quais foram as quatro principais seitas judaicas ativas no judaísmo do
primeiro século?
12. Qual era o nome do Supremo Conselho judaico?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


História
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225
1
As principais fontes primárias deste período incluem 1 e 2Macabeus, Josefo, Filo e a Carta de

Arísteas. Veja também C. K. Barrett, org., The New Testament Background: Selected Documents, ed.

rev. e exp. (São Francisco: Harper, 1989), especialmente cap. 1 (The Roman empire), 7 (Jewish

History), 9 (Qumran), 10 (Philo) e 11 (Josephus). Informações adicionais são encontradas em E.

Schürer, The History of the Jewish People in the Age of Jesus Christ, edição revisada de G. Vermes;

F. Millar; M. Black (Edinburgh: T & T Clark, 1973, 1979, 1986, 1987), 3 vols. em 4; e S. Safrai, org.,

The Jewish People in the First Century, CRINT 1/1 (Assen: Van Gorcum/Philadelphia: Fortress,

1974).

2
Veja L. R. Helyer, “The Necessity, Problems and Promise of Second Temple Judaism for

Discussions of New Testament Eschatology”, JETS 47 (2004), p. 97-115.

3
L. R. Helyer (Exploring Jewish Literature of the Second Temple Period: A Guide for New

Testament Students [Downers Grove: InterVarsity, 2002], p. 18-24) enumerou as crises como: (1)

destruição da Primeira comunidade e do primeiro Templo; (2) colapso do Império Persa em face da

invasão de Alexandre, o Grande, (3) perseguição por Antíoco Epifânio IV; (4) dominação por Roma;

e (5) destruição romana do estado e Templo judaicos.

4
R. A. Horsley, Scribes, Visionaries, and the Politics of Second Temple Judea (Louisville:

Westminster John Knox, 2007), p. 16-22; cf. M. Hengel, Judaism and Hellenism: Studies in Their

Encounter in Palestine During the Early Hellenistic Period, tradução para o inglês de J. Bowden

(Philadelphia: Fortress, 1974), vol. 1, p. 25-27.

5
Veja 2Reis 24 e 25; 2Crônicas 36.5-21; e partes de Jeremias, Daniel e Ezequiel.

6
2Reis 25.3; cf. Jeremias 39.2: “No nono dia do quarto mês do décimo primeiro ano de

Zedequias abriram uma brecha no muro da cidade” (i.e., 18 de julho, 586 a.C.).

7
J. J. Scott Jr., Jewish Backgrounds of the New Testament (Grand Rapids: Baker, 2000), p. 108-

12.

226
8
Isso não passa de uma conjectura por parte dos acadêmicos. A rigor, ninguém sabe onde e

quando a sinagoga começou. Parece que ela não existia antes do Exílio, e a necessidade de um local

de encontro para a oração e para o estudo da Torá no Exílio torna o Exílio um tempo provável para a

sua origem. Sabe-se que a sinagoga teve início na Dispersão e forjou seu caminho de volta para a

Palestina. Cf. J. D. Newsome, Greeks, Romans, Jews: Currents of Culture and Belief in the New

Testament World (Philadelphia: Trinity Press International, 1992), p. 128; cf. a discussão mais adiante

neste capítulo.

9
Veja L. L. Grabbe, “Jewish History: Persian Period”, em: Dictionary of New Testament

Background, p. 574-76. Esse período costuma ser chamado “medo-persa”, mas quando a Babilônia

foi derrotada, o Império Medo não tinha sido completamente erradicado por Ciro.

10
H. Koester, History, Culture, and Religion of the Hellenistic Age, 2. ed. (New York: W. de

Gruyter, 1995), p. 1.

11
Veja Daniel 8.5-8. A visão é de um bode macho que, de forma maldosa, destrói um carneiro

com dois chifres assimétricos. O carneiro é identificado em Daniel 8.20 como o Império Medo-Persa,

que avança a noroeste e ao sul. O bode macho com um chifre proeminente é Alexandre, o Grande, rei

da Grécia (veja Dn 8.21). Ele avança a oeste com grande intensidade e velocidade. O fim do reino de

Alexandre também é apresentado. O reino é dividido em quatro chifres, e um chifre pequeno

(provavelmente Antíoco IV) persegue a Judeia.

12
Veja L. L. Grabbe, “Jewish History: Greek Period”, em: Dictionary of New Testament

Background, p. 570-74. Para uma ampla descrição da era, incluindo uma grande quantidade de

evidências arqueológicas, veja A. M. Berlin, “Between Large Forces: Palestine in the Hellenistic

Period”, BA 60 (1997), p. 3-43. A influência grega permaneceu constante durante os períodos das

dinastias ptolomaica e selêucida e até a época do Novo Testamento e ainda depois.

13
Pausânias também foi imediatamente assassinado, deixando especulações sobre seus motivos.

Entre os suspeitos estão os persas, Olímpia (a ex-esposa de Filipe) e o próprio Alexandre

227
(possivelmente conspirando com sua mãe, Olímpia). Veja Newsome, Greeks, Romans, Jews, p. 4.

14
Ibid.

15
J. L. Berquist, Judaism in Persia’s Shadow: A Social and Historical Approach (Philadelphia:

Fortress, 1995), p. 125.

16
O porto de suprimento da marinha persa; veja R. D. Milns, “Alexander the Great”, ABD 1.147.

17
Josefo, Ant. 11.337. Muitos, no entanto, acreditam que seja uma fantasia da parte de Josefo ou

de suas fontes, pois Alexandre estava com sua cabeça voltada para as riquezas do Egito e não teria

tido interesse em Jerusalém. Veja Newsome, Greeks, Romans, Jews, p. 6; e A. J. Tomasino, Judaism

Before Jesus: The Events and Ideas That Shaped the New Testament World (Downers Grove:

InterVarsity, 2003), p. 108. Tomasino também negou a veracidade da viagem como um “desvio

insignificante”.

18
Milns, “Alexander”, p. 147.

19
Tomasino, Judaism Before Jesus, p. 109.

20
Helyer, Exploring Jewish Literature, p. 19, 75-76.

21
Milns, “Alexander”, p. 149. Nem o jovem Alexandre nem o meio irmão Filipe sobreviveram à

luta pela supremacia.

22
Koester, History, Culture, and Religion of the Hellenistic Age, p. 15.

23
Grego para “sucessores”. Veja G. L. Thompson, “Diadochi”, em: Dictionary of New Testament

Background, C. A. Evans; S. E. Porter orgs., (Downers Grove: InterVarsity, 2000), p. 278-81.

24
D. B. Sandy, “Ptolemies”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 870-73.

25
Após Ptolemeu XI, ninguém estava na linha sucessória de Ptolemeu I. Mesmo Júlio César foi

saudado como Ptolomeu XV, devido à sua relação com Cleópatra VII, a famosa rainha. Essa

228
Cleópatra — completamente grega, apesar da forma de Hollywood retratá-la — era a última da linha

ptolomaica. Ela preferiu suicidar-se ao permitir ser picada por uma víbora a se submeter a Otaviano.

26
Veja Tomasino, Judaism Before Jesus, p. 116-7; e Horsley, Scribes, Visionaries, and the

Politics of Second Temple Judea, p. 37-41.

27
Josefo (Ant. 12.1-153) conectou a libertação dos escravos ao desejo de Filadelfo de adquirir as

leis dos judeus e traduzi-las para o grego para a biblioteca de Alexandria. Arísteas, o sumo sacerdote

em Jerusalém, com o pedido da lei, atendeu à solicitação de libertar os escravos egípcios,

concedendo-lhes cidadania.

28
Daí a alternação dos nomes “Seleuco” e “Antíoco” durante a dinastia Selêucida.

29
Scott, Jewish Backgrounds, p. 80.

30
Para uma introdução útil, veja D. W. J. Gill, “Seleucids and Antiochids”, em: Dictionary of

New Testament Background, p. 1092-93.

31
Tomasino, Judaism Before Jesus, p. 127.

32
B. Witherington III, New Testament History: A Narrative Account (Grand Rapids: Baker,

2001), p. 39.

33
Para um tratamento completo da história judaica começando com as crises religiosas e a

revolução em 175-164 a.C. e concluindo com a revolta dos judeus contra Adriano em 132-135 d.C.,

veja Schürer, Jewish History in the Age of Jesus Christ, 1:125-557.

34
Frequentemente, os templos eram os centros financeiros do mundo antigo, como também os

locais de adoração. Os ricos geralmente guardavam grandes somas de dinheiro no templo na

esperança que os ladrões não ousassem invocar a ira da deidade. Veja J. R. C. Cousland, “Temples,

Greco-Roman”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 1186-88.

229
35
A prática da perseguição religiosa era praticamente desconhecida no mundo antigo. Assim, o

programa de Antíoco provocou uma boa dose de especulação sobre sua causa e seu propósito. Ao

final do dia, a única certeza é que a tentativa de acabar com o judaísmo, uma religião diferente de

todas as outras religiões do mundo, realmente ocorreu. Veja S. J. D. Cohen, From the Maccabees to

the Mishnah, 2. ed. (Louisville: Westminster John Knox, 2006), p. 22.

36
Segundo Josefo (Ant. 12.265), Matatias era bisneto dos asmoneus. Tomasino, Judaism Before

Jesus, p. 140, sugere que ele era um gentio fazendeiro vivendo à custa de seu salário sacerdotal e que

estava migrando para Jerusalém para as duas semanas de culto e, então, retornando para casa.

37
Para uma seleção de leituras nas fontes primárias, veja Barrett, New Testament Background,

cap. 7.

38
Provavelmente da palavra hebraica maqqebeth, que significa “martelo”.

39
Cohen, From the Maccabees to the Mishnah, p. 22-23.

40
Demétrio era o filho de Seleuco IV (irmão de Antíoco) que havia tomado o lugar de Antíoco

como refém em Roma. Veja B. Reicke, The New Testament Era: The World of the Bible from 500

B.C. to A.D. 100, tradução para o inglês de D. E. Green (Philadelphia: Fortress, 1968), p. 59.

41
Também Schürer (Jewish History in the Age of Jesus Christ, 2:587), que sugeriu que Jônatas

foi a pessoa chamada de “Sacerdote ímpio” nos Manuscritos do Mar Morto.

42
Veja J. Sievers, “Hasmoneans”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 438-42.

43
Josefo o chamou de fileleno, isto é, “amante dos gregos” (Ant. 13.318).

44
Josefo (Ant. 13.379) atribuiu a troca da fidelidade à compaixão.

45
A resposta foi tão brutal que anos depois o autor de um dos Manuscritos do Mar Morto a

interpretou como sendo as profecias de Naum (4QpNah 3.4 i 2). Cf. D. Flusser, “Pharisees,

230
Sadducees, and Essenes in Pesher Nahum”, em: Judaism of the Second Temple Period, tradução para

o inglês de A. Yadin. Grand Rapids: Eerdmans, 2007, vol. 1: Qumran and Apocalypticism, p. 223.

46
Para uma pesquisa sobre o período romano, cf. L. L. Grabbe, “Jewish History: Roman Period”,

em: Dictionary of New Testament Background, p. 576-80.

47
Para proveitosas fontes de material primário, veja Barrett, New Testament Background, p. 148-

55; cf. H. W. Hoehner, “Herodian Dynasty”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 485-

94..

48
Dião Cássio, História Romana 49.2: “Estes povos Antônio encarregou a certo Herodes para

que governasse; mas a Antígono ele crucificou e açoitou — uma punição que nenhum outro rei

sofreu nas mãos dos romanos — e depois ele o matou”.

49
Veja T. Mueller, “Herod: The Holy Land’s Visionary Builder”, National Geographic 214/6

(Dezembro 2008), p. 34-59, que também narra a descoberta do Heródio, a elaborada tumba de

Herodes. Ele também construiu templos para seus súditos gentios.

50
Macróbio, Saturnais 2.4. Um trocadilho para as palavras gregas “porco” (hus) e “filho”

(huios).

51
Veja P. L. Maier, “Herod and the Infants of Bethlehem”, em: E. J. Vardaman, org., Chronos,

Kairos, Christos II: Chronology, Nativity, and Religious Studies in Memory of Ray Summers (Macon:

Mercer University Press, 1998), p. 169-90.

52
Sobre Herodes Antipas, veja H. W. Hoehner, Herod Antipas, SNTSMS 17 (Cambridge:

University Press, 1972); e M. H. Jensen, Herod Antipas in Galilee: The Literary and Sources on the

Reign of Herod Antipas and Its Socio-Economic Impact on Galilee, WUNT 2/215 (Tübingen: Mohr

Siebeck, 2006).

53
Veja Barrett, New Testament Background, p. 155.

231
54
Veja Mateus 22.21: “Dai a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus”; Lucas 2.1:

“César Augusto”; Lucas 3.1: “Tibério César”.

55
Veja J. E. Bowley, “Pax Romana”, em Dictionary of New Testament Background, p. 771-75.

Esse é o caso de saber se a crucificação de Jesus é datada do ano 30 ou 33, as duas principais opções

para se datar a crucificação. Veja a discussão sobre a cronologia da vida de Jesus no capítulo 3.

56
Mateus 27.1-65; Marcos 15.1-44; Lucas 3.1; 13.1; 23.1-52; João 18.29 a 19.38; Atos 3.13;

4.27; 13.28; 1Timóteo 6.13. Na famosa “Inscrição de Pilatos” descoberta em 1961, em Cesareia, lê-

se:

TIBERIEUM (“Para Tibério”)

[PON]TIUS PILATUS (“De Pôncio Pilatos”)

[PRAEF]ECTUS IUDA[EA]E (“Governador da Judeia”)

veja Barrett, New Testament Background, 155–56; Schürer, History of the Jewish People, 1:358;

e C. A. Evans, “Pilate Inscription”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 803-4.

57
Veja Filo, In flaccum 1.1; id., De Legatione ad Gaium 24; e Eusébio, Hist. Ec. 2.5, citado em P.

L. Maier, “Sejanus, Pilate, and the Date of the Crucifixion”, Church History 37 (1968), p. 3-13.

58
Veja Maier (“Sejanus, Pilate, and the Date of the Crucifixion”) para uma descrição e uma

explicação das ofensas de Pilatos contra sensibilidades judaicas. Veja também a discussão e

referências adicionais em A. J. Köstenberger, John, BECNT (Grand Rapids: Baker, 2004), p. 524-25.

59
Eusébio, Hist. Ec. 2.7. Mas Orígenes (Contra Celso 2.34) — e aparentemente seu adversário

Celso — não sabia desse relatório.

60
Para informações adicionais sobre esses e outros imperadores romanos, cf. E. Ferguson,

Backgrounds of Early Christianity, ed. rev. (Grand Rapids: Eerdmans, 1993), p. 25-38; e Barrett,

New Testament Background, cap. 1. Cf. também cap. 20 sobre o livro do Apocalipse.

232
61
Para tratamentos úteis veja H. N. Ridderbos, When the Time Had Fully Come (Grand Rapids:

Eerdmans, 1957); F. F. Bruce, Commentary on Galatians, NIGTC (Grand Rapids: Eerdmans, 1982),

p. 194; e R. N. Longenecker, Galatians, WBC (Dallas: Word, 1990), p. 166–70. Longenecker (ibid.,

p. 167) observou que alguns estudiosos veem os v. 4, 5 como representando uma confissão pré-

paulina baseada na proclamação da igreja primitiva.

62
A respeito de Jesus, cf. Marcos 1.15; 12.6; Lucas 1.21. A respeito de Pedro e da pregação da

igreja primitiva, cf. Atos 2.16-36; 3.18. A respeito das citações de cumprimento de Mateus e João,

veja a discussão no cap. 1. A respeito de Paulo, cf. também Atos 13.27; Romanos 3.26, 5.6; Efésios

1.10.

63
Longenecker, Galatians, 170; cf. João 1.18; Hebreus 1.1-3.

64
Veja D. Guthrie, Galatians, NCBC (Grand Rapids: Eerdmans, 1974), p. 113.

65
Veja a discussão acima.

66
Veja Scott, Jewish Backgrounds, p. 307-23; veja A discussão adicional sobre o messianismo

sob o título “Teologia”.

67
Veja especialmente D. W. Chapman; A. J. Köstenberger, “Jewish Intertestamental and Early

Rabbinic Literature: An Annotated Bibliographic Resource”, JETS 43 (2000), p. 577–618 (postado

em www.biblicalfoundations.org).

68
Sobre Tragums, veja B.D. Chilton, “Riabbinic Literature: Targumim”, em: Dictionary of New

Testament Background, p. 902-9.

69
D. A. deSilva, “Apocrypha and Pseudepigrapha”, em: Dictionary of New Testament

Background, p. 58; veja toda a entrada nas p. 58-64, incluindo referências bibliográficas adicionais.

70
A seguinte pesquisa é devida a B. M. Metzger, “Introduction to the Apocrypha”, em: B. M.

Metzger, org., The Oxford Annotated Apocrypha, ed. rev. e exp. (New York: Oxford Univ. Press,

233
1977), xi-xxii. Veja também Evans, Ancient Texts for New Testament study, p. 1-8.

71
Sobre questões relacionadas à canonicidade dos Apócrifos e Pseudepígrafos do AT, veja N. L.

Geisler; W. E. Nix, A General Introduction to the Bible, ed. rev. e exp. (Chicago: Moody, 1986), cap.

15.

72
Veja especialmente J. K. Elliott, The Apocryphal New Testament (New York: Oxford

University Press, 2005); e W. Schneemelcher, org., New Testament Apocrypha, tradução para o inglês

de R. M. Wilson (Louisville/London: Westminster John Knox, 2003), 2 vols. Contrário a B. D.

Ehrman (Lost Scriptures [New York: Oxford University Press, 2005] e Lost Christianities [New

York: Oxford University Press, 2005]) que seguiu W. Bauer (Rechtgläubigkeit und Ketzerei im

ältesten Christentum [Tübingen: Mohr, 1934]; Edição em inglês: R. A. Kraft; G. Krodel, orgs.,

Orthodoxy and Heresy in Earliest Christianity [Philadelphia: Fortress, 1971]), os Apócrifos do NT

não foram por um tempo colocados ao lado dos escritos canônicos do NT e somente mais tarde

desqualificados pela igreja Católica primitiva. Veja especialmente D. L. Bock, The Missing Gospels:

Unearthing the Truth Behind Alternative Christianities (Nashville: Nelson, 2006); C. A. Blaising,

“Faithfulness: A Prescription for Theology”, JETS 49 (2006), p. 6-9; P. Trebilco, “Christian

Communities in Western Asia Minor into the Early Second Century: Ignatius and Others as

Witnesses against Bauer”, JETS 49 (2006), p. 17-44; e A. J. Köstenberger; M. J. Kruger, The Heresy

of Orthodoxy (Wheaton: Crossway, 2010).

73
Veja Charlesworth, Old Testament Pseudepigrapha; B. N. Fisk, “Rewritten Bible in

Pseudepigrapha and Qumran”, em: Dictionary of New Testament background, p. 947-53.

74
Não é possível nem necessário repetir o conteúdo da literatura apócrifa e pseudepigráfica aqui.

Sobre os Apócrifos, veja as introduções em Metzger, Annotated Apocrypha; cf. Evans, Ancient Texts

for New Testament Studies, cap. 1; D. A. deSilva, Introducing the Apocrypha: Message, Context, and

Significance (Grand Rapids: Baker, 2002). Sobre os Pseudepígrafos, veja as introduções em

Charlesworth, Old Testament Pseudepigrapha; e Evans, Ancient Texts for New Testament Studies,

234
cap. 2. Sobre Apócrifos e Pseudepígrafos, veja M. E. Stone, org., Jewish Writings of the Second

Temple Period, CRINT 2 (Assen: Van Gorcum/Philadelphia: Fortress, 1984); G. W. E. Nickelsburg,

Jewish Literature Between the Bible and the Mishnah (Philadelphia: Fortress, 1981); Schürer,

History of the Jewish People 3.1; deSilva, “Apocrypha and Pseudepigrapha”; e as seções relevantes

em Helyer, Exploring Jewish Literature.

75
Veja capítulo 1.

76
Veja especialmente J. C. Trever, The Dead Sea Scrolls: A Personal Account (Grand Rapids:

Eerdmans, 1977). Outras obras úteis incluem G. Vermes, The Dead Sea Scrolls: Qumran in

Perspective, ed. rev. (Philadelphia: Fortress, 1977); J. C. VanderKam, The Dead Sea Scrolls Today

(Grand Rapids: Eerdmans, 1994); e F. G. Martínez; J. T. Barrera, The People of the Dead Sea Scrolls:

Their Writings, Beliefs and Practices, tradução para o inglês de W. G. E. Watson (Leiden: Brill,

1995); excertos selecionados em Barrett, New Testament Background, cap. 9; e M. O. Wise, “Dead

Sea Scrolls: General Introduction”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 252-66.

77
Veja F. G. Martínez, The Dead Sea Scrolls Study Edition (Grand Rapids: Eerdmans, 2000), 2

vols.; J. C. VanderKam, An Introduction to Early Judaism (Grand Rapids: Eerdmans, 2000); L. H.

Schiffman; J. C. VanderKam, orgs., Encyclopedia of the Dead Sea Scrolls (Oxford: University Press,

2000), 2 vols.; J. H. Charlesworth, org., The Bible and the Dead Sea Scrolls (Waco: Baylor

University Press, 2006), 3 vols.; R. A. Kugler; E. M. Schuller, The Dead Sea Scrolls at Fifty (Atlanta:

Scholars Press, 1999); Schürer, History of the Jewish People, p. 380-469; Evans, Ancient Texts for

New Testament Studies, cap. 3; e entradas relevantes em Dictionary of New Testament Background.

78
Veja história apresentada.

79
Como mencionado, Schürer (Jewish History in the Age of Jesus Christ, 2:587), por exemplo,

sugere que o sumo sacerdote judeu Jonathas era a pessoa chamada de “Sacerdote ímpio” nos

Manuscritos do Mar Morto.

235
80
Veja R. N. Longenecker, Biblical Exegesis in the Apostolic Period, 2. ed. (Grand Rapids:

Eerdmans, 1999), p. 24-30.

81
Contra alegações errôneas nos tabloides e na literatura popular como D. Brown (The Da Vinci

Code [New York: Doubleday, 2003], p. 245), que alegou que os Manuscritos do Mar Morto estavam

entre “os registros cristãos mais antigos”.

82
Veja A. J. Köstenberger, “John”, em: G. K. Beale; D. A. Carson, orgs., Commentary on the

New Testament use of the Old Testament (Grand Rapids: Baker, 2007), p. 421, 425-28.

83
Veja J. Charlesworth, org., John and the Dead Sea Scrolls (New York: Crossroad, 1990);

Kugler; Schuller, Dead Sea Scrolls at Fifty; Charlesworth, Bible and the Dead Sea Scrolls; e a útil

discussão em Evans, Ancient Texts for New Testament Studies, p. 3-6.

84
N. C. Croy, “Religion, Personal”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 926-31,

que discutiu oráculos, sonhos, divinação, oração, mágica, milagres, cura, superstição e astrologia,

entre outros tópicos. Compare J. D. Charles, “Pagan Sources in the New Testament”, em: Dictionary

of New Testament Background, p. 756-63.

85
Veja D. A. deSilva, “Ruler Cult”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 1026-30.

86
Veja Ferguson, Backgrounds of Early Christianity, p. 35.

87
Ibid.

88
Veja a discussão do culto ao imperador no capítulo 20.

89
Veja Barrett, New Testament Background, cap. 6; Ferguson, Backgrounds of Early Christianity,

p. 235-82; e M. Meyer, “Mysteries”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 720-25; cf. A.

J. Köstenberger, “The Mystery of Christ and the Church: Head and Body, ‘One Flesh’”, TrinJ 12 NS

(1991), p. 80-81.

90
A seleção é de Barrett, New Testament Background, p. 127-29.

236
91
Veja W. Bousset, Kyrios Christos, tradução para o inglês de J. E. Steely (Nashville: Abingdon,

1970 [1913]); e R. Reitzenstein, Hellenistic Mystery-Religions, tradução para o inglês de J. E. Steely

(Pittsburgh: Pickwick, 1978 [1910]). Compare a discussão em S. Neill; N. T. Wright, The

Interpretation of the New Testament 1861-1986, 2. ed. (Oxford/New York: Oxford University Press,

1988), p. 165-85; e o Quadro 2.4.

92
Veja ainda a discussão sobre Gnosticismo a seguir.

93
Veja B. W. R. Pearson, “Domestic Religion and Practices”, em: Dictionary of New Testament

Background, p. 298-302.

94
Ibid., p. 33.

95
Veja Ferguson, Backgrounds of Early Christianity, p. 282-93; Neill; Wright, Interpretation of

the New Testament, p. 185-95.

96
O tratamento clássico é de E. Yamauchi, Pre-Christian Gnosticism: A Survey of the Proposed

Evidences, 2. ed. (Grand Rapids: Eerdmans, 1983 [1973]). Veja também id., “Gnosticism”, em:

Dictionary of New Testament Background, p. 414-18; C. B. Smith, No Longer Jews: The Search for

Christian Origins (Peabody: Hendrickson, 2004); e Barrett, New Testament Background, cap. 5.

97
Veja J. M. Dillon, “Philosophy”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 793-96.

98
Veja Barrett, New Testament Background, p. 78-81; Ferguson, Backgrounds of Early

Christianity, p. 348-56; e N. C. Croy, “Epicureanism”, em: Dictionary of New Testament

Background, p. 324-27.

99
Veja Barrett, New Testament Background, p. 65-77; Ferguson, Backgrounds of Early

Christianity, p. 333-47; e J. C. Thom, “Stoicism”, em: Dictionary of New Testament Background, p.

113942.

237
100
Veja Barrett, New Testament background, p. 81-91; Ferguson, Backgrounds of Early

Christianity, p. 327-33; e B. Fiore, “Cynicism and Skepticism”, em: Dictionary of New Testament

Background, p. 242-45.

101
Veja a discussão sobre superstição acima.

102
Veja a discussão da proposta de um “Jesus cínico” no cap. 3.

103
Para pesquisas gerais e fontes adicionais sobre o judaísmo, veja B. D. Chilton, “Judaism and

the New Testament”, p. 603-61; P. R. Trebilco; C. A. Evans, “Diaspora Judaism”, p. 281-96, e W. T.

Wilson, “Hellenistic Judaism”, p. 47782, em Dictionary of New Testament Background.

104
Veja A. J. Köstenberger; S. R. Swain, Father, Son and Spirit: The Trinity and John’s Gospel,

NSBT 24 (Downers Grove: InterVarsity, 2008), cap. 1; C. J. H. Wright, The Mission of God:

Unlocking the Bible’s Grand Narrative (Downers Grove: InterVarsity, 2006), “Part II: the God of

Mission”, especialmente p. 71-4 (com referências bibliográficas suplementares).

105
Veja B. Chilton; E. Yamauchi, “Synagogues”, em: Dictionary of New Testament Background,

p. 1145-53.

106
Veja Schürer, History of the Jewish People, 2:415-63; Ferguson, Backgrounds of Early

Christianity, p. 539-46.

107
Veja Schürer, History of the Jewish People, 2:237-313; Ferguson, Backgrounds of Early

Christianity, p. 527-33; B. Chilton; P.W. Comfort; M. O. Wise, “Temple, Jewish”, em: Dictionary of

New Testament Background, p. 1167-83; e A. J. Köstenberger, “John”, em: C. E. Arnold, org.,

Zondervan Illustrated Bible Backgrounds Commentary (Grand Rapids: Zondervan, 2002), 2:30-31.

108
Veja Schürer, History of the Jewish People, 2:521-27; B. D. Chilton, “Festivals and Holy

Days: Jewish”, p. 371-78; e S. Westerholm; C. A. Evans, “Sabbath”, p. 1031-35, ambos em

Dictionary of New Testament Background.

238
109
Veja Barrett, New Testament Background, cap. 8; e B. D. Chilton, “Rabbis”, em: Dictionary of

New Testament Background, p. 914-16. Compare H. L. Strack; G. Stemberger, Introduction to the

Talmud and Midrash, tradução para o inglês de M. Bockmuehl (Minneapolis: Fortress, 1992); e

Schürer, History of the Jewish People, 2:314-80.

110
Veja J. Neusner, “Rabbinic Literature: Mishnah and Tosefta”, em: Dictionary of New

Testament Background, p. 893-97.

111
Veja A. J. Köstenberger (com D. W. Jones), God, Marriage, and Family: Rebuilding the

Biblical Foundation (Wheaton: Crossway, 2004), cap. 11, especialmente p. 228-29 [publicado em

português por Vida Nova sob o título Deus, Casamento e família: reconstruindo o fundamento

bíblico].

112
Veja Ferguson, Backgrounds of Early Christianity, p. 512-17; S. McKnight, “Proselytism and

Godfearers”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 835-47.

113
A palavra theosebēs (“temente a Deus” ou “adorador de Deus”) ocorre em Atos 10.2,22, 35;

13.16,26; o termo relacionado sebomenoi (“adorador[es] de Deus”) é encontrado em Atos 13.43,50;

16.14; 17.4,17; 18.7.

114
Veja Ferguson (Backgrounds of early Christianity, p. 502-27), que discutiu as crenças judaicas

em um único Deus; Israel, o povo escolhido; Torá, tradição e Escritura; misticismo judaico;

prosélitos e tementes a Deus; messianismo; vida após a morte; festivais e dias sagrados; e devoções

diárias. Compare J. Neusner, “Rabbinic Literature: Mishnah and Tosefta”, p. 893-97; e H. Maccoby,

“Rabbinic Literature: Talmud”, p. 897-902, ambas em Dictionary of New Testament Background.

115
Veja G. E. Ladd, A Theology of the New Testament, ed. rev. (Grand Rapids: Eerdmans, 1993),

p. 54-67.

116
Veja especialmente W. Horbury, Jewish Messianism and the Cult of Christ (London: SCM,

1998); J. H. Charlesworth, org., The Messiah: Developments in Earliest Judaism and Christianity

239
(Minneapolis: Fortress, 1987); J. Neusner; W. S. Green; E. Frerichs, Judaisms and Their Messiahs at

the Turn of the Christian Era (Cambridge: University Press, 1988); S. E. Porter, org., The Messiah in

the Old and New Testaments (Grand Rapids: Eerdmans, 2007); e C. A. Evans, “Messianism”, em:

Dictionary of New Testament Background, p. 698-707.

117
Veja Schürer, History of the Jewish People, 2:488-545; Ferguson, Backgrounds of Early

Christianity, p. 517-19.

118
Veja C. Evans; P. W. Flint, Eschatology, Messianism, and the Dead Sea Scrolls (Grand

Rapids: Eerdmans, 1997); Schürer, History of the Jewish People, 2:550-54.

119
Veja B. Janowski; P. Stuhlmacher, orgs., The Suffering Servant: Isaiah 53 in Jewish and

Christian Sources, tradução para o inglês de D. P. Bailey (Grand Rapids: Eerdmans, 2004); Schürer,

History of the Jewish People, 2:547-49.

120
Veja “História” acima; cf. S. Mason, “Theologies and Sects, Jewish”, em: Dictionary of New

Testament Background, p. 1221-30.

121
Josefo (Guerra Judaica 2.119-20) se referiu aos três primeiros desses: “A filosofia judaica, de

fato, assume três formas. Os seguidores da primeira escola são chamados fariseus, os da segunda,

saduceus, e os da terceira, essênios”. Ele também mencionou uma quarta filosofia (Guerra Judaica

2.108; Ant. 18.23), muito provavelmente os zelotes. Veja Schürer, History of the Jewish People,

2:599; Barrett, New Testament Background, p. 158–59; e Ferguson, Backgrounds of Early

Christianity, p. 480-502, que também mencionou os herodianos e os samaritanos.

122
Veja “História” acima; cf. Schürer, History of the Jewish People, 2:388-403; e S. Mason,

“Pharisees”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 782-87.

123
Veja G. G. Porton, “Sadducees”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 1050-52.

124
Como resultado, eles não são mencionados no Evangelho de João, que muito provavelmente

foi escrito depois de 70 d.C. Veja cap. 7 deste livro.

240
125
Veja Schürer, History of the Jewish People, 2:585–95; T. Beall, “Essenes”, em: Dictionary of

New Testament Background, p. 342-48.

126
Veja a pesquisa histórica do período do Segundo Templo neste capítulo.

127
Veja M. Hengel, The Zealots, 2. ed. (Edinburgh: T&T Clark, 1977); cf. W. J. Heard; C. A.

Evans, “Revolutionary Movements, Jewish”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 936–

47, especialmente p. 945-46.

128
Veja Heard; Evans, “Revolutionary Movements”, p. 944-45.

129
Veja a discussão apresentada.

130
Veja especialmente Schürer, History of the Jewish People, 2:199-226; Ferguson, Backgrounds

of Early Christianity, p. 533-36; e G. H. Twelftree, “Sanhedrin”, em: Dictionary of New Testament

Background, p. 1061-65. O nome “Sinédrio” vem de synēdrion, “reunião”.

131
Para uma discussão detalhada sobre os sumos sacerdotes nomeados por Herodes, o Grande e

seus sucessores, veja Schürer, History of the Jewish People, 2:229-36.

241
Parte 2

JESUS E OS EVANGELHOS

A Parte 1 deste livro procurou estabelecer uma base adequada para esta
introdução abrangente ao NT, ao discutir a natureza e o escopo da Escritura
(cap. 1) e ao pesquisar o contexto político e religioso do NT (cap. 2). A
Parte 2 fornece discussões sobre Jesus e os Evangelhos (cap. 3), bem como
tratamentos da história, literatura e teologia de cada um deles: Mateus,
Marcos, Lucas e João, na ordem canônica (caps. 4-7). Diferentemente da
Parte 3, que segue uma ordem cronológica e não canônica para
correlacionar as cartas de Paulo de forma mais íntima com o livro de Atos,
o tratamento dos Evangelhos segue uma ordem canônica a fim de evitar o
julgamento antecipado da solução que alguém possa propor ao Problema
Sinótico, a saber, a presumida ordem de escrita e interdependência de
Mateus, Marcos e Lucas.
A relação entre os Evangelhos, especialmente aquela entre Mateus,
Marcos, e Lucas, assim como com Jesus, o personagem principal nos quatro
Evangelhos, é o tema do capítulo introdutório para a Parte dois. Os
capítulos sobre cada Evangelho em particular consideram cada um deles à
sua própria luz, discutindo as questões introdutórias de costume para cada

242
Evangelho, bem como seu plano literário, esboço, temas teológicos e
contribuição para o cânon. Conquanto o mais provável é que tenham sido
escritos após as primeiras cartas de Paulo, é apropriado tratarmos os
Evangelhos primordialmente pelo fato de terem sido colocados em primeiro
lugar no cânon do NT, e também por sua natureza fundacional como
apresentações de Jesus como Messias, Salvador e Senhor.

243
CAPÍTULO 3

Jesus e o relacionamento entre os


Evangelhos

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os alunos deverão ser capazes de identificar
referências-chave a Jesus em materiais extrabíblicos judaicos e romanos e
descrever e criticar os desafios contemporâneos à descrição de Jesus no NT.
Também devem conhecer dados importantes da vida de Jesus, incluindo a
data de seu nascimento, a duração do seu ministério, bem como a data da
crucificação.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo central
identificado nos Conhecimentos básicos, os alunos deverão ser capazes de
discutir os fundamentos filosóficos do moderno estudo dos Evangelhos e
definir e avaliar os principais critérios de autenticidade aplicados ao
material sobre Jesus nesses escritos. Eles também deverão estar
familiarizados com os principais pontos de vista sobre a relação entre os
Evangelhos Sinóticos.
Conhecimentos avançados: além de dominar o conteúdo essencial
identificado nos Conhecimentos básicos e intermediários, os alunos deverão

244
ser capazes de citar outras referências extrabíblicas a Jesus e avaliar o valor
dos “Evangelhos perdidos” não canônicos. Também deverão ser capazes de
narrar as quatro principais “buscas do Jesus histórico”, bem como
apresentar uma descrição completa das várias teorias sinóticas e ilustrar
essas opções com exemplos dos paralelos sinóticos.

INTRODUÇÃO

Para o cristão, nenhum estudo pode ser mais importante do que o estudo
de Jesus e os Evangelhos. Jesus de Nazaré é o foco da fé cristã. Não é por
acaso que os primeiros concílios cristãos foram convocados e credos foram
escritos para abordar as questões em torno da natureza e identidade de
Jesus. A igreja primitiva reconhecia que uma compreensão da identidade de
Jesus é essencial ao cristianismo genuíno e um pré-requisito para se
vivenciar a salvação e desfrutar de um relacionamento com Deus.
Embora o AT tenha previsto a vinda de Jesus e partes mais tardias do
NT frequentemente tenham se referido a ele, a descrição mais completa da
vida e ensinamentos de Jesus está nos quatro Evangelhos Canônicos,
adequadamente intitulados “Evangelho Segundo Mateus” e assim por
diante. Esses títulos antigos capturam o importante fato de que, embora
existam quatro Evangelhos Canônicos, há somente um evangelho de Jesus
Cristo e, portanto, os Evangelhos Canônicos, devidamente entendidos, não
são quatro apresentações distintas, independentes de Jesus Cristo, mas
quatro perspectivas ou versões complementares do único evangelho de
Jesus Cristo.
O estudo dos Evangelhos é agradável, e até mesmo emocionante, mas
não é tarefa fácil. A busca por entender quem Jesus realmente foi e a

245
determinação da sua importância envolve muito trabalho árduo. Aqueles
que estudam os Evangelhos precisam estar preparados para responder à
alegação de que Jesus nunca existiu ou de que outras antigas descrições da
vida de Jesus são muito mais precisas do que os documentos do NT. Eles
devem avaliar cuidadosamente as descrições contemporâneas de Jesus.
Também devem lidar com questões relacionadas a assuntos como a
confiabilidade histórica dos Evangelhos, as fontes usadas pelos evangelistas
e a relação dos Evangelhos entre si. O objetivo desta seção é prepará-lo
para o longo estudo dos quatro Evangelhos ao abordar essas questões e
enfrentar esses desafios.

REFERÊNCIAS A JESUS FORA DOS


EVANGELHOS
Os não cristãos muitas vezes desafiam a fé cristã ao afirmar que Jesus
nunca existiu. Eles, por vezes incorretamente, afirmam que nenhum texto
antigo fora do NT jamais se referiu a Jesus. Mesmo que nenhum texto fora
do NT o tenha mencionado, isso não seria um motivo razoável para negar a
sua existência. O NT não deve ser considerado como uma única fonte, uma
vez que ele é composto de 27 livros escritos por, pelo menos, oito autores
diferentes. O NT, portanto, fornece várias confirmações independentes da
existência, da vida, dos ensinamentos, dos milagres, e da morte e
ressurreição de Jesus. Outros escritos cristãos primitivos dos pais
apostólicos e dos pais da igreja primitiva oferecem provas adicionais a
respeito da existência de Jesus.1 Em adição, vários textos não cristãos
extrabíblicos, judeus e pagãos mencionam Jesus de Nazaré e oferecem

246
breves descrições dele. Esta seção examina as referências extrabíblicas não
cristãs.2

Referências a Jesus em Textos Judaicos


Três extensas fontes judaicas do primeiro século foram preservadas: (1) os
escritos de Josefo (c. 35-100 d.C.), (2) os escritos de Filo (c. 20 a.C-50
d.C.) e (3) os Manuscritos do Mar Morto. Nem Filo e nem os Manuscritos
do Mar Morto mencionam explicitamente Jesus de Nazaré. A ausência de
uma referência a Jesus em Filo é esperada, uma vez que ele escreveu de
Alexandria, no Egito, e raramente mencionou acontecimentos
contemporâneos na Palestina.3 A falta de uma referência a Jesus nos
Manuscritos do Mar Morto também é esperada, uma vez que as referências
a figuras históricas neles são geralmente obscuras a figuras importantes
durante o período do Segundo Templo, e uma vez que os Manuscritos do
Mar Morto são documentos judaicos pré-cristãos que não mostram nenhum
vestígio de influência de fontes cristãs.4
As coisas são diferentes com o historiador judeu Flávio Josefo. Duas
referências a Jesus de Nazaré aparecem em uma de suas obras,
Antiguidades Judaicas. Josefo brevemente menciona Jesus em uma
discussão sobre a identidade de seu irmão, Tiago (Ant. 20.9.1 §§ 200-203):

Ele [Ananias, o sumo sacerdote] reuniu os juízes do Conselho Sinédrio e depois que os
apresentou o irmão de Jesus, que era chamado de Messias, o homem cujo nome era Tiago, e
alguns outros, e os acusou de terem transgredido a Lei, ele os entregou para que fossem
apedrejados.5

A passagem atesta a existência de Jesus de Nazaré como uma pessoa


histórica e o seu relacionamento com Tiago. Ela também confirma que

247
alguns dos contemporâneos de Jesus o reconheciam como o Messias.6 Tal
afirmação é consistente com a gramática de Josefo em outras partes de sua
obra. A referência não implica, porém, que Josefo considerava Jesus como
o Messias e, portanto, não é invalidada pela fé judaica do autor. Em outras
partes de sua obra, por exemplo, Josefo mencionou que Antíoco foi
chamado de “deus” pelos gregos (Ant. 12.3.2 §125), mas isso não implica
que ele aceitava essa alegação.
J. Meier assinalou ser altamente improvável que essa passagem seja
uma interpolação cristã. Primeiro, o NT e antigos textos cristãos referem-se
a Tiago usando os títulos de “irmão do Senhor” e “irmão do Salvador”, em
vez de “irmão de Jesus”. Segundo, esse relato da morte de Tiago é
significativamente diferente dos antigos relatos cristãos que aparecem nas
obras de Hegésipo (c. 110-180) e Eusébio (c. 260-340). Terceiro, seria
esperado que um escriba cristão oferecesse uma descrição mais completa de
Tiago e de Jesus. No entanto, estes são mencionados de forma breve e
apenas para confirmar o comportamento ilegal de Ananias.
Consequentemente, poucos estudiosos seriamente duvidam da autenticidade
dessa passagem.7
Josefo faz uma referência mais completa a Jesus em uma passagem
conhecida como a Testimonium Flavianum (Ant. 18.3.3 §§ 63-64).
Manuscritos gregos desse texto trazem o seguinte relato:

Nesse tempo, veio Jesus. Ele era um homem sábio, se é que realmente é apropriado chamá-lo
de homem, porque ele era uma pessoa que fazia obras incríveis, um mestre para aquelas
pessoas que com prazer recebiam a verdade. Ele ganhou muitos dos judeus e muitos dos
gentios. Ele era o Messias. E quando Pilatos o condenou à cruz com base em evidências de
homens de alta posição entre nós, os que o amavam no início não abandonaram seu amor por
ele, porque no terceiro dia ele apareceu vivo para eles. E essas e mil outras coisas
maravilhosas tinham sido ditas sobre ele pelos profetas divinos. E a tribo, chamada de
“cristãos”, não desapareceu até este dia.8

248
A autenticidade de partes dessa passagem é duvidosa por várias razões. Em
primeiro lugar, nenhum documento cristão nos três primeiros séculos da
igreja cita essa passagem, embora tivesse sido útil para eles, em alguns de
seus debates com os não cristãos, apelar para a fé “cristã” de Josefo. Em
segundo lugar, Orígenes (c. 185-254) alegou que Josefo não considerava
Jesus como o Messias.9 Em terceiro lugar, de acordo com o próprio
testemunho de Josefo em Guerra Judaica (3.8.8-9 §§ 392-408), ele
considerava Vespasiano como o Messias de Judá.10
No entanto, apesar de partes do Testimonium Flavianum provavelmente
serem interpolações cristãs, fortes evidências sugerem que pelo menos
alguns elementos dessa declaração são autênticos.11 Primeiro, a brevidade
da referência a Jesus posteriormente em Guerra Judaica (2.9.1 §§ 200-203)
sugere que Josefo já havia introduzido Jesus de Nazaré anteriormente em
sua narrativa. O Testimonium Flavianum é a única referência anterior
preservada em manuscritos gregos.12 Segundo, a versão árabe do
Testimonium Flavianum na História de Agápio carece de elementos
distintamente cristãos:

Nessa época, havia um homem sábio que era chamado de Jesus. E sua conduta era boa e ele
era conhecido por ser virtuoso. E muitas pessoas dentre os judeus e de outras nações se
tornaram seus discípulos. Pilatos o condenou a ser crucificado e a morrer. E aqueles que
haviam se tornado seus discípulos não abandonaram seu discipulado. Eles relataram que ele
lhes tinha aparecido três dias após sua crucificação e que ele estava vivo; assim ele era,
talvez, o Messias de quem os profetas contaram maravilhas.13

Muitos estudiosos acreditam que a versão árabe reflete o estado do texto


antes de os escribas cristãos acrescentarem suas interpelações. Terceiro, a
passagem está saturada com um vocabulário comum nos escritos de Josefo
e é geralmente consistente com seu estilo.14 Quarto, a passagem contém
afirmações que contradizem o Evangelho e, portanto, é improvável que

249
tenha sido composta por um escriba cristão. Tais declarações contraditórias
incluem a alegação de que Jesus tinha um grande número de seguidores
gentios durante seu ministério público. É pouco provável que essas
alegações tenham sido interpoladas no texto por um escriba cristão
familiarizado com os Evangelhos. É muito mais provável que sejam
alegações de um judeu do primeiro século que queria inocentar os judeus e
culpar os romanos pela morte de Jesus e que assumiu que Jesus tinha um
grande número de seguidores gentios durante seu ministério público
simplesmente porque um grande número de cristãos era gentio na época do
escritor.15
J. Meier resumiu o significado do Testimonium Flavianum da seguinte
forma:

Independente dos quatro Evangelhos, confirmando ainda a sua apresentação básica, um


escrito judaico no ano de 93-94 nos diz que durante o governo de Pôncio Pilatos (o contexto
mais amplo de “durante este tempo”) — portanto, entre 26 e 36 d.C. — apareceu no cenário
religioso da Palestina um homem chamado Jesus. Ele tinha a reputação pela sabedoria que
ele mesmo apresentava em obras milagrosas e ensinamentos. Ele ganhou um grande número
de seguidores, mas (ou por isso?) os líderes judeus o acusaram diante de Pilatos. Pôncio
Pilatos o crucificou, mas seus seguidores fervorosos se recusaram a abandonar a sua devoção
a ele, apesar de sua morte vergonhosa. Chamados de cristãos por causa desse Jesus (que é
chamado Cristo), eles continuaram a existir até os dias de Josefo. O tom neutro, ou ambíguo,
ou talvez de certo repúdio do Testimonium é provavelmente a razão pela qual os escritores
cristãos primitivos (especialmente os apologistas do segundo século) silenciaram-se sobre
isso, porquê Orígenes se queixou que Josefo não acreditava que Jesus fosse o Cristo e porquê
alguns interpoladores no final do século III adicionaram interpolações cristãs.16

O testemunho de Josefo constitui o mais importante testemunho antigo


sobre Jesus de Nazaré fora da Bíblia.
O Talmude Babilônico é uma coleção de ensinamentos rabínicos que foi
finalizado no século VI. Esse documento se refere a Jesus de Nazaré várias
vezes. No entanto, a maioria dessas referências é de pouco valor histórico,

250
uma vez que são relativamente tardias, refletem o conhecimento de segunda
mão dos Evangelhos e são produtos da polêmica entre judeus e cristãos.
Outra literatura rabínica — como a Mishnah, a Toseftá, o Midrash e o
Talmude de Jerusalém — também podem ser reações às alegações cristãs e,
assim, referir-se a Jesus.17
O Talmude desafia a afirmação cristã de que Jesus foi concebido por
uma virgem, argumentando que Maria, “que era descendente de príncipes e
governadores, se prostituiu com carpinteiros”.18 Um relato
cronologicamente confuso alega que Jesus fugiu para o Egito para escapar
do massacre dos rabinos pelo rei Janeu em 87 a.C. No Egito, Jesus foi
excomungado e condenado por adorar um ídolo.19 O Talmude nomeia cinco
discípulos de Jesus e afirma que “Jesus, o Nazareno, praticava magia e
levou Israel a se perder”.20 Embora dois dos nomes sejam semelhantes aos
de Mateus e Tadeu, a semelhança pode ser apenas mera coincidência, pois
os nomes dos discípulos no Talmude servem de base para trocadilhos e não
parecem ser sérias tentativas de registrar os nomes verdadeiros dos
seguidores de Jesus. A acusação de que Jesus praticava magia é
significativa, uma vez que é paralela à acusação dos adversários de Jesus,
nos Evangelhos, de que Jesus praticava o exorcismo através do poder de
Satanás (veja Mc 3.22). A literatura rabínica alega que Jesus ensinava
heresia,21 e isso se opunha especialmente à alegação de ele ser Deus, o Filho
de Deus, o Filho do Homem, o novo Moisés e Servo do Senhor.22
Uma das referências mais importantes a Jesus no Talmude Babilônico
afirma:

Na véspera da Páscoa eles penduraram Jesus, o nazareno. E um arauto saiu diante dele,
durante quarenta dias, dizendo: “Ele será apedrejado, porque ele praticou bruxaria e seduziu
e levou Israel à perdição. Quem quer que saiba algo em seu favor, venha e clame em seu

251
nome”. Mas, não tendo encontrado nada em seu favor, eles o penduraram na véspera da
Páscoa.23

A passagem é importante por várias razões. Primeira, ela é identificada


como uma baraita, tradição que surgiu durante o Período Tanaítico (70-200
d.C.). Assim, a referência provavelmente preserva uma tradição mais antiga
do que muitas das outras referências a Jesus no Talmude. Segunda, a
passagem provavelmente enfatizava um período de 40 dias de espera antes
da execução de Jesus, em resposta às alegações cristãs de que os líderes
judeus não seguiram os procedimentos adequados nas apressadas
audiências que levaram à condenação de Jesus. Terceira, a execução de
Jesus na véspera da Páscoa está de acordo com a cronologia da Paixão de
Jesus no Evangelho de João (Jo 18—19).
O Talmude Babilônico também contém uma clara e uma provável
referência à ressurreição de Jesus. Um manuscrito do Talmude afirma:
“Então ele foi e ressuscitou a Jesus por meio de encantamento”.24 Outro
texto diz: “ai daquele que se faz vivo pelo nome de Deus”.25 Vários textos
também se referem aos discípulos de Jesus curando os outros de forma
milagrosa, em nome de Jesus. Eles proibiram os judeus de curar ou receber
a cura em nome de Jesus.26
Várias conclusões podem ser tiradas dessas referências rabínicas.
Primeiro, Jesus de Nazaré não é um mito ou uma lenda. Ele foi uma pessoa
histórica real. Como R. T. França observou:

Mesmo não sendo nada lisonjeiras, como de fato não são, essas referências são no mínimo
uma evidência, ainda que de forma distorcida, do impacto que os milagres e os ensinamentos
de Jesus tiveram. A conclusão de que é totalmente dependente das alegações cristãs e de que
“os judeus no século II adotaram sem questionar a suposição cristã de que ele tinha
realmente vivido” é, seguramente, apenas ditada por um ceticismo dogmático. É muito
pouco provável que essa polêmica, que muitas vezes utiliza “fatos” completamente distintos

252
daquilo que os cristãos acreditavam, tenha surgido em um período de menos de um século
em torno de uma figura inexistente.27

Segundo, Jesus realizou obras que só poderiam ser descritas como feitos
sobrenaturais. É significativo o fato de que a literatura rabínica não nega a
ressurreição de Jesus, seus milagres, ou as curas realizadas em seu nome.
Em vez disso, a literatura atribui esses eventos à magia ou feitiçaria. Essas
acusações são idênticas às alegações judaicas no século II e início do século
III preservadas nos escritos dos pais da igreja, como Justino Mártir (c. 100-
c. 165) e Orígenes (c. 185-c. 254).28 Essa estratégia de rejeitar as
implicações das obras sobrenaturais de Jesus sugere que tanto os cristãos
como os oponentes judeus do segundo século reconheciam que ninguém
poderia, de forma razoável, discutir os milagres de Jesus. As evidências
para esses atos eram demasiadamente convincentes.
Em vez disso, os oponentes do cristianismo no século II deram
continuidade à estratégia dos adversários anteriores de Jesus (Mt 12.24; Mc
3.22; Lc 11.15; Jo 10.19-21) e atribuíram seus milagres ao poder de
Satanás, alegando que ele obteve tal poder através de magia ou feitiçaria. A
admissão em fontes não cristãs de que Jesus realizou obras sobrenaturais
constitui evidência convincente não só para a existência histórica de Cristo,
mas também para a historicidade do seu ministério de feitos milagrosos.
Embora o testemunho rabínico seja questionável e claramente muitas vezes
seja imaginação criativa dos oponentes da fé cristã, o cerne das descrições
de Jesus nos Evangelhos do NT é confirmado por esse testemunho rabínico.

Referências a Jesus Pelos Escritores Romanos

253
Os escritores pagãos geralmente demonstraram pouco interesse em Jesus de
Nazaré. Em um mundo repleto de uma multiplicidade de religiões, o
cristianismo e seu fundador eram vistos apenas como mais uma fé bizarra
dificilmente digna de menção. No entanto, dois historiadores romanos, um
oficial político, um cronista, um satirista e um pai mencionam Jesus em
seus escritos.
O historiador romano Tácito (c. 56 - depois de 113) escreveu sua obra
Anais no início do século II. Seu trabalho abrangeu primeiramente a história
de Roma (14-68 d.C.). Infelizmente, alguns dos livros dos Anais foram
perdidos, incluindo a seção que abordava os anos 29-32. Assim, se Jesus foi
crucificado no ano 30, como muitos acreditam, a seção que poderia ter
descrito esses eventos já não existe.29
No entanto, Tácito discutiu o grande incêndio de Roma, pelo qual Nero
culpou os cristãos para desviar a atenção de sua própria participação no
incêndio. Ele escreveu:

Portanto, para silenciar o rumor, Nero criou bodes expiatórios e infligiu as mais refinadas
torturas àqueles a quem o povo simples chamava de “cristãos”, [um grupo] odiado por seus
crimes abomináveis. Seu nome vem de Cristo, que, durante o reinado de Tibério, havia sido
executado pelo procurador Pôncio Pilatos. Reprimida no momento, a superstição mortal
eclodiu novamente não só na Judeia, a terra que deu origem a esse mal, mas também na
cidade de Roma, onde todos os tipos de práticas horrendas e vergonhosas de todas as partes
do mundo convergem e são fervorosamente cultivadas. (Anais 15.44)

Além de ser presente em todos os manuscritos dos Anais, essa passagem faz
uma descrição muito negativa do cristianismo para ter vindo da pena de um
escriba cristão. Logo, pôde-se dizer que ela é claramente autêntica. A
declaração de Tácito é compatível com a alegação dos Evangelhos de que
Jesus foi executado durante o reinado de Tibério (14-37) e sob o governo de
Pôncio Pilatos (26-36). Embora seja possível que Tácito tenha obtido suas

254
informações a respeito de Jesus de Josefo, importantes diferenças entre os
relatos de Tácito e Josefo sugerem que Tácito era dependente de outra
fonte. Por exemplo, embora Josefo tenha identificado o fundador da tribo
dos cristãos como Jesus, Tácito identificou-o como “Cresto” e,
evidentemente, interpretou de forma equivocada o título “Cristo” como um
nome próprio. Tácito pode ter obtido sua informação do conhecimento
comum sobre os cristãos no mundo romano do século II ou dos arquivos
romanos.
Outro historiador romano que se referiu a Jesus foi Suetônio (c. 120),
que relatou que “Cláudio expulsou os judeus de Roma, que, instigados por
Cresto, nunca deixaram de causar agitação”.30 Essa expulsão é
provavelmente a expulsão do ano 49 mencionada em Atos 18.2. Suetônio
parece ter confundido o nome “Cresto” (muito comum entre os escravos
romanos), com “Cristo”, um título messiânico com o qual ele não estava
familiarizado. Suetônio também supôs que na época da expulsão dos
judeus, Jesus estava vivo e em Roma. Ele provavelmente fez essa suposição
porque era bem incomum que as pessoas tivessem esse tipo de devoção a
uma figura que estivesse morta ou distante que os cristãos nos meados do
primeiro século em Roma expressavam a Cristo. A agitação a que Suetônio
se refere foi provavelmente a tensão entre judeus e cristãos judeus por causa
das alegações do evangelho cristão.
Em uma carta a seu filho que comparava Sócrates, Pitágoras e Jesus,
Mara bar Serapião (c. 73 d.C.) perguntou: “Qual a vantagem que […] os
judeus obtiveram com a morte de seu sábio rei?”. A carta acrescenta que foi
só após a execução do seu sábio rei que o reino dos judeus foi abolido e que
eles foram arruinados e expulsos de suas terras. A carta também afirmava:
“Nem o rei sábio morrera definitivamente; ele vivia nos ensinamentos que

255
havia transmitido”. A carta descreve a execução de Jesus por instigação dos
judeus em uma época não muito antes da queda de Jerusalém.
Em uma carta ao imperador Trajano, Plínio, o Jovem (c. 110), procônsul
da província da Bitínia, na Ásia Menor, procurou a aprovação do imperador
de seu tratamento com os cristãos. Ele mencionou que os cristãos se
reuniam antes do amanhecer em determinado dia especial para cantar hinos
“a Cristo como a um deus” e para participar de uma refeição comunitária
(Ep. 10.96).
Embora seu trabalho já não exista mais, Talo, que escreveu uma história
do mundo a leste do Mediterrâneo por volta de 52 d.C., foi citado por Júlio
Africano (c. 230) como alegando que a escuridão que acompanhou a
crucificação de Jesus estava relacionada a um eclipse solar. Africano
rejeitou a explicação de Talo, uma vez que a Páscoa ocorre na época da lua
cheia e um eclipse solar nesse período é impossível.31 Supondo que
Africano representou corretamente sua fonte, Talo ofereceu verificação
preliminar independente do fenômeno da escuridão durante a crucificação
de Jesus.
Finalmente, Luciano de Samósata (c. 115-200) escreveu uma sátira
intitulada A Passagem do Peregrino, um relato sobre um convertido ao
cristianismo que acabou abandonando a fé cristã. A sátira refere-se à
“adoração” dos cristãos ao “homem que foi crucificado na Palestina por
introduzir esse novo culto em todo o mundo”. Luciano descreveu mais tarde
os cristãos como “adorando o sofista que fora crucificado e vivendo sob
suas leis”.32 As referências reconhecem a morte de Jesus por crucificação,
sua origem palestina e sua fundação de uma nova fé.33
Alguns estudiosos veem essas descrições de Jesus nos escritos romanos
como de pouca ajuda para a compreensão de Jesus de Nazaré ou a

256
confirmação dos relatos do NT. Em geral, esses relatos parecem refletir
conhecimento secundário de Cristo que poderia ter sido obtido a partir dos
Evangelhos, dos oponentes do cristianismo ou dos cristãos contemporâneos.
No entanto, pelo menos essas referências demonstram que Jesus era
considerado pelos romanos como uma pessoa histórica que advogava
ensinamentos controversos e que foi executado por crucificação.

Resumo
As antigas referências não cristãs a Jesus devem ser consideradas como
testemunhos sobre Jesus vindos de testemunhas hostis. No entanto, e
significativamente, esse testemunho em alguns momentos confirma os
relatos da vida de Jesus escritos por seus próprios seguidores. Esses
testemunhos corroborantes oferecem fortes evidências da historicidade dos
contornos gerais da vida de Jesus tal como descrita no NT. Embora as
referências não cristãs nada acrescentem de novo ao conhecimento sobre
Jesus extraído dos Evangelhos, eles comprovam o NT em pontos
importantes.

AS BUSCAS PELO JESUS HISTÓRICO


Antes da ascensão do Iluminismo — durante a era “pré-crítica” — a
investigação histórico-gramatical dominou o estudo de Jesus. Era
amplamente aceito que o Jesus apresentado na Bíblia foi o homem que
viveu e morreu — e ressuscitou — na Palestina no primeiro século. Assim,
estudar Jesus era estudar o que a Bíblia tinha a dizer sobre Jesus. Mas o
clima intelectual do final dos anos 1700 pôs em marcha uma série de
movimentos que colocaram em questão essa abordagem do estudo de Jesus,

257
dando início ao que geralmente é chamado de “busca do Jesus histórico”.
Essa busca do pós-Iluminismo, que se desdobrou em uma série de buscas
sucessivas, foi caracterizada por quatro configurações básicas.34

A Primeira Busca
A primeira busca (1778-1906) foi gerada com a publicação póstuma do
livro de H. S. Reimarus lançado em uma série de volumes intitulada The
Wolfenbüttel Fragments.35 Reimarus discutiu a conexão entre o “Jesus da
história” e o “Cristo da fé”. Ele propôs um Jesus radicalmente diferente,
que não era senão um revolucionário judeu, mas que foi tornado o centro de
sua nova religião, “o cristianismo”, pelos apóstolos.36 O bombardeio que se
seguiu a partir da publicação dessa série de livros propiciou o lançamento
de uma série de obras com o título “Vida de Jesus”, o mais infame sendo o
de D. F. Strauss Das Leben Jesu (alemão para “A vida de Jesus”).37
Praticamente todos os exemplares iniciais da primeira busca
empenharam-se em mostrar que o cristianismo estava em contradição com a
realidade histórica e buscaram trazer uma nova liberdade para a
humanidade.38 As obras posteriores dessa primeira busca tipicamente
propagaram um Jesus que em essência constituía uma expressão da teologia
protestante liberal.39 A teologia liberal, com suas raízes no deísmo, defendia
uma religião que era derivada somente da razão. Essa teologia, por sua vez,
necessariamente implicava uma tendência contrária ao sobrenatural.
Segundo esse tipo de mentalidade “iluminada”, milagres simplesmente
não acontecem. Portanto, os Evangelhos, que eram completamente
impregnados de milagres, devem ser despojados desse conteúdo introduzido
de modo a torná-los palatáveis para uma abordagem de interpretação mais

258
“razoável”. Esse ponto de vista, então, deu à luz várias metodologias
histórico-críticas. Uma dessas metodologias foi fonte de críticas através das
quais os estudiosos bíblicos esperavam ser capazes de determinar as partes
mais antigas do material do Evangelho. Isso foi feito em um esforço para se
descobrir o “Jesus histórico” — quem ele realmente foi antes de a igreja
primitiva transformá-lo em um fragmento de sua própria imaginação, o
“Cristo da fé”.40
O resultado inevitável da primeira busca foi que Jesus se parecia mais
com aqueles que o buscavam do que o Jesus judeu do primeiro século foi.
De acordo com muitos dos primeiros investigadores, o próprio Jesus
ensinou a fraternidade do homem e a paternidade de Deus, promulgou a
ética do reino e morreu uma morte exemplar em sua natureza sacrificial, de
autodoação, em vez de realmente redentora. Assim, para os primeiros
inquiridores, o desafio não era tanto o de ter fé em Jesus, mas o de recuperar
a fé de Jesus.41

A Busca Abandonada
A primeira busca chegou ao fim na primeira década do século XX. Uma
série de obras fez com que os estudiosos de Jesus olhassem em direções
diferentes. A principal dentre essas foi The Quest of the Historical Jesus42
de A. Schweitzer. Esse período é comumente chamado de “a Busca
Abandonada” (1906-1953). Segundo esses estudiosos, muitos dos quais
eram existencialistas, praticamente nada do Jesus histórico poderia ser
conhecido. Essa, porém, não foi uma perda importante, uma vez que não foi
o “Jesus histórico”, mas sim o “Cristo da fé”, que havia impactado o

259
mundo.43 Como resultado, praticamente nenhuma obra importante sobre a
“vida de Jesus” foi escrita entre os anos de 1900 e 1950.44
Assim, o Jesus histórico tornou-se irrelevante para a investigação
teológica. Em vez disso, os estudiosos empregaram a crítica da forma para
investigar a igreja primitiva que tinha preservado e adaptado as histórias de
Jesus. Para figuras como R. Bultmann, a tarefa importante era
demitologizar as histórias da igreja primitiva sobre Jesus, a fim de isolar o
núcleo de verdade que elas continham para a fé cristã. Como Tatum bem
resumiu, para Bultmann, uma “fé que precisasse de apoios externos da
pesquisa histórica sobre a vida de Jesus simplesmente não era fé. Para
Bultmann, portanto, tanto a natureza dos Evangelhos quanto a natureza da
fé tornavam qualquer obra sobre a vida de Jesus impossível e ilegítima”.45

A Segunda Busca
A segunda busca começou em 1954 e foi, ironicamente, gerada pelos
estudantes de R. Bultmann (veja “A Busca Abandonada”). Um dos
estudantes de Bultmann, E. Käsemann, em uma reunião de ex-alunos de
Bultmann, apresentou um artigo no qual alegava que algo do Jesus histórico
poderia e deveria ser recuperado através dos métodos de Bultmann.
Käsemann propôs que o Cristo divorciado da história poderia ser invocado
para dar apoio a praticamente qualquer agenda teológica ou política. Muitos
dos que fizeram parte dessa segunda busca tinham assistido, de forma muito
brusca, às consequências de um Cristo separado de seus laços históricos à
medida que a Alemanha nazista de antes da Segunda Guerra criava “um
Cristo em grande parte não judeu”.46

260
Assim, uma nova ou segunda busca foi rapidamente posta em
andamento. Esses estudiosos defendiam que Jesus devia estar conectado de
alguma forma ao cristianismo primitivo e que a pregação da igreja podia
fornecer informações sobre esse Jesus.47 A segunda busca se afastou da
proclamação canônica do evangelho e colocou um valor maior em outras
fontes antigas, como o Evangelho de Tomé, o Evangelho dos Hebreus e
outros fragmentos não canônicos dos Evangelhos. No final, montou-se uma
imagem de Jesus a partir de vislumbres da proclamação da igreja primitiva
— um empreendimento que Bultmann teria repudiado.
Apesar de uma terceira busca ter sido lançada (veja no item a seguir), a
segunda busca não saiu de cena. Os defensores modernos de seus métodos e
conclusões ainda estão trabalhando no assunto, embora os limites entre
aqueles que trabalham na segunda e terceira buscas não sejam bem nítidos.
O controverso Seminário de Jesus é, em essência, uma manifestação da
“segunda busca”. As principais figuras do Seminário de Jesus, B. Mack e J.
D. Crossan, ilustram bem as direções tomadas pela segunda busca. Mack
promoveu um Jesus que é um cínico, não apocalíptica, cultural e
socialmente subversivo e que defendia um experimento social percebido
como transformação.48
Para Mack, o cristianismo mais primitivo não defendia a divindade de
Cristo nem via Cristo como Salvador; antes o considerava um reformador
social. Os epítetos “divindade” e “Salvador” foram acrescentados mais
tarde pelos primeiros cristãos representados pelos escritores dos
Evangelhos. De modo semelhante, J. D. Crossan também defendia que
Jesus era um cínico, mas ao mesmo tempo ele via Jesus como um camponês
judeu. O objetivo de Jesus era fazer com que todos confiassem em Deus,
destruindo assim o sistema patrono-cliente de sua época, anunciando o que

261
Crossan chama de “reino de Deus sem agentes intermediários”.49 Os
defensores modernos da segunda busca ainda têm de conquistar a maioria
dos estudiosos, mas hoje eles continuam sendo voz minoritária nos estudos
sobre Jesus.50

A Terceira Busca
A terceira busca51 teve precursores desde 1965, com Jesus and the Jewish
Nation52 [Jesus e a Nação Judaica], de G. B. Caird. Essa busca é
caracterizada por um desejo de colocar Jesus no contexto do primeiro
século, o judaísmo do Segundo Templo. À medida que embarcam em um
diferente tipo de busca, os estudiosos que representam essa terceira busca
têm, em essência, construído sobre a pesquisa anterior acerca de Cristo. O
desejo deles é se engajar em séria pesquisa histórica sobre o judaísmo do
primeiro século e colocar Jesus nesse contexto cultural. Para muitos, a
diferença é que essa investigação é separada da cristologia; isto é, ela é
conduzida à parte das confissões tradicionais a respeito de Jesus pela igreja
histórica. Em vez disso, o objetivo da pesquisa histórica na terceira busca é
localizar Jesus como uma figura histórica real.53 N. T. Wright, um defensor
ativo da terceira busca, fornece a seguinte descrição útil:

A Antiga [Primeira] Busca estava certa de que Jesus deveria parecer o mínimo possível com
um judeu do primeiro século. Bultmann estava certo de que, embora Jesus fosse
historicamente um judeu do primeiro século, seu judaísmo do primeiro século não era
precisamente o local onde a sua “importância” repousava. A renovada “Nova Busca”,
seguindo essa linha, muitas vezes minimizou as características judaicas específicas de Jesus,
enfatizando, em vez disso, aquelas que ele pode ter compartilhado com outras culturas do
Mediterrâneo; ela também minimizou em grande medida o significado da morte de Jesus,
salientando que sabemos muito pouco sobre ela e sugerindo que os primeiros cristãos não
estavam particularmente interessados nela […] A atual “Terceira Busca”, de modo geral, não
terá nada disso. Jesus deve ser entendido como um compreensível e ainda crucificável, por

262
assim dizer, judeu do primeiro século, sejam quais forem as consequências teológicas e
hermenêuticas.54

Duas ressalvas devem ser registradas aqui. Primeiro, se alguém alegasse


estar simplesmente seguindo as evidências, isso seria o mesmo que afirmar
ser possível assumir uma postura verdadeiramente neutra e objetiva como
pesquisador. No entanto, estudos hermenêuticos do século passado
mostraram que exegese sem pressupostos e até mesmo a investigação
histórica imparcial são, na verdade, em si mesmas, mitos.55 Ninguém está
completamente livre de ter noções preconcebidas a respeito de quem foi
Jesus, e afirmar o contrário é ignorância ou ingenuidade. Isso exige cautela
na avaliação das alegações daqueles engajados nas pesquisas sobre Jesus.
Segundo, a ideia de que Jesus deve ser entendido em harmonia com o
seu ambiente do primeiro século não é original da terceira (ou qualquer)
busca do Jesus histórico. Estudiosos conservadores em geral procuraram
compreender Jesus dessa forma como uma consequência da sua convicção
de que a descrição que os Evangelhos fazem de Jesus é historicamente
precisa. Na verdade, este é o motivo pelo qual alguns estudiosos
evangélicos são atraídos para a terceira busca em primeiro lugar. Isso não
quer dizer que os defensores da terceira busca são, em geral, exegetas
conservadores. Eles não o são. Muitos desses autores têm diferentes
agendas políticas e teológicas com opiniões muito divergentes sobre o
judaísmo do primeiro século e sobre Jesus.
Wright identifica cinco perguntas cruciais que os defensores da terceira
busca procuram responder: (1) Como Jesus se encaixa no judaísmo?; (2)
Quais eram os objetivos de Jesus?; (3) Por que Jesus morreu?; (4) Como e
por que a igreja primitiva começou?; (5) Por que os Evangelhos são o que
são?56 A resposta a essas perguntas determina a visão que se tem de Jesus, e

263
os defensores da terceira busca divergem a esse respeito. G. Vermes
descreveu Jesus como um hasid, um judeu santo; E. P. Sanders e M. Casey,
um profeta apocalíptico; B. Witherington, um sábio, a personificação da
sabedoria; J. P. Meier, um judeu “marginalizado”; Brandon, um judeu
revolucionário; e outros, como P. Stuhlmacher, defendem que Jesus se
considerava o Messias de Israel.57

Tabela 3.1: As Buscas Pelo Jesus Histórico*

* Adaptado de Tantum, In Quest for Jesus, p. 109.


** Veja a discussão de alguns desses vários métodos mais adiante neste capítulo; cf. cap. 1 e 2 em:
Carson; Moo, Introduction to the New Testament.

DESAFIOS CONTEMPORÂNEOS À
DESCRIÇÃO DO NOVO TESTAMENTO
ACERCA DE JESUS
Introdução

264
Descrições sensacionalistas e heterodoxas do histórico Jesus de Nazaré
tornaram-se lugar-comum no século XXI. Todos os dias, uma nova
abordagem da vida do “verdadeiro Jesus” está chegando às prateleiras das
livrarias e gerando uma polêmica que rapidamente ganha a lucrativa
atenção da mídia.58 Embora sejam muitas vezes baseadas em evidências
escassas, logo essas descrições de Jesus se tornam uma parte de lendas
urbanas sobre a identidade de Jesus propagadas por desinformados. Muitos
norte-americanos, cujo conhecimento de Jesus por vezes não vai além da
mais recente teoria da conspiração sobre a qual eles leram no jornal ou num
recente Best-seller que assume que Jesus era casado com Maria Madalena,
deixou uma linhagem real que ainda existe hoje e que viveu
temporariamente na Europa Ocidental.59
Descrições não bíblicas de Jesus não são apenas o trabalho de
romancistas e de teóricos da conspiração. Muitos estudiosos que se dedicam
à pesquisa séria sobre o Jesus histórico propuseram reconstruções da vida e
dos ensinamentos de Jesus muito diferentes das descrições de Jesus no NT.
Os pontos de vista sobre Jesus afirmados por vários estudiosos são quase
tão diversos quanto os estudiosos que os afirmam. Esta seção explora
brevemente alguns dos recentes desafios da descrição do NT acerca de
Jesus.60 O que várias dessas caracterizações de Jesus têm em comum é que
os Evangelhos canônicos são excluídos como fontes históricas primárias em
favor de outros escritos supostamente menos corrompidos — e, portanto,
mais autênticos — mais comumente um ou vários dos Evangelhos
gnósticos. Assim, não deve causar espanto o fato de que esses escritores
cheguem a descrições de Jesus que divergem dos Evangelhos do NT.

O Filósofo Cínico Errante

265
Estudiosos como F. G. Downing, B. Mack, e J. D. Crossan têm retratado
Jesus como um filósofo cínico errante.61 Crossan, em particular, argumentou
em grande detalhe que Jesus pregou e praticou um igualitarismo radical que
aboliu todas as hierarquias e distinções sociais.62 Mantendo-se estritamente
de acordo com esse igualitarismo radical, Jesus ensinou que o reino de Deus
não tinha um intermediário humano e que um relacionamento com Deus
não exigia nenhum mediador humano. Todas as pessoas tinham o mesmo
acesso direto a Deus. Para Crossan, a morte de Jesus não alcançou a
expiação do pecado. Jesus foi tragicamente crucificado por ter ameaçado
destruir o templo que ele via como a sede da autoridade hierárquica judaica,
símbolo da desigualdade humana que ele passou a desprezar. Assim, a
agenda de Jesus era social, em vez de espiritual, e seus ensinamentos
consistiam de algumas palavras sábias e parábolas que ensinavam muito
mais sobre a igualdade humana do que sobre o pecado, julgamento, perdão,
ou sobre a sua própria identidade.
Como mencionado, Crossan somente poderia pintar esse retrato de
Jesus descartando grande quantidade de material sobre Jesus nos
Evangelhos canônicos e preferindo materiais de fontes não canônicas. No
entanto, sua reconstrução da vida de Jesus é tão boa quanto as fontes que
ele usou. Como mostrado a seguir, a preferência de Crossan pelas fontes
não canônicas não se justifica, uma vez que as suas fontes favoritas são
revisões finais do material dos Evangelhos canônicos, especulações sobre o
Jesus a partir dos cristãos do segundo século ou as mais completas
invencionices.

O Carismático Operador de Milagres

266
M. Borg e G. Vermes retrataram Jesus como uma figura carismática que
teve experiências visionárias ou místicas de Deus e de alguma forma
funcionou como um canal do poder de Deus para outros.63 Muito embora
esses retratos representem uma melhoria das visões que negam qualquer
tipo de atividade sobrenatural por parte de Jesus em decorrência de
pressupostos do modernismo, tanto um quanto outro não são compatíveis
com a imagem mais completa de Jesus, apresentada no NT.
O Jesus de Borg teve muita compaixão dos outros para que deles
exigisse pureza moral. Além disso, o “deus” que esse Jesus mediava
também era uma força mais impessoal do que uma divindade pessoal. Borg
afirmou:

Deus não se refere a um ser sobrenatural “lá fora” […] Deus se refere ao sagrado no centro
da existência, ao santo mistério que nos cerca e que está dentro de nós. Deus é a base, a fonte
e a presença imaterial na qual […] “vivemos, nos movemos e temos o nosso ser”.64

O Jesus de Vermes era um homem galileu santo (hebr. hasid) que realizou
milagres e operou fora dos canais apropriados da autoridade religiosa
normal. Vermes comparou Jesus a dois homens santos semelhantes
descritos nos Talmudes: Hanina ben Dosa e Honi, o Desenhador de
Círculos.65 Assim como esses homens realizaram milagres, Jesus curou os
enfermos e conquistou as forças do mal nos indivíduos.
No entanto, Vermes cometeu o erro de enfatizar semelhanças entre Jesus
e essas figuras e ignorar algumas diferenças importantes. Por exemplo, de
acordo com Vermes, as marcas de um hasid incluíam o uso da oração para
produzir curas para os enfermos e para chamar a chuva. Os Evangelhos,
porém, nunca descrevem Jesus fazendo chover. Eles o retratam como
aquele que foi mais do que apenas um poderoso homem de oração e como
alguém que tinha o poder pessoal para curar diretamente.

267
O Profeta Apocalíptico
E. P. Sanders e M. Casey escreveram abordagens de Jesus nas quais alegam
que Jesus era um profeta apocalíptico que esperava o clímax da história
humana durante a sua vida ou pouco depois de sua morte. Sanders alegou
que Jesus antecipou “a iminente intervenção direta de Deus na história, a
eliminação do mal e dos malfeitores, a construção do novo e glorioso
Templo e a reunião de Israel com ele e seus discípulos como figuras de
destaque nela”.66 Jesus preparou o terreno para o julgamento de Deus no
Templo e a restauração de seu povo oferecendo o perdão incondicional até
mesmo ao mais obstinado dos judeus. Jesus ofereceu esse perdão sem exigir
arrependimento. Sanders evitou os títulos atribuídos a Jesus nos
Evangelhos, mas identificou Jesus como o último enviado de Deus. Ele
tendia a rejeitar os milagres de Jesus alegando que eles eram a cura de
doenças psicossomáticas, enganos intencionais e, em alguns casos,
misteriosas manipulações de causas naturais que não são atualmente
compreendidas pela ciência. Sanders negou que Jesus experimentou
qualquer conflito grave com os fariseus.67
M. Casey afirmou que Jesus via a si mesmo como o cumprimento da
profecia de João Batista sobre Aquele que viria. Jesus acreditava que o
clímax da história ocorreria durante sua vida e exortou as ovelhas perdidas
de Israel a que se preparassem para o juízo final ao se arrependerem de seus
pecados. Ao contrário do Jesus de Sanders, o Jesus de Casey experimentou
sérios conflitos com os fariseus por causa de suas tentativas de impor
regulamentos de estrita pureza sobre os judeus da Galileia. Isso
essencialmente teria excluído judeus galileus, especialmente artesãos e
camponeses, do povo de Deus. Segundo Casey, Jesus anteviu sua própria
morte e a considerou como um ato que alcançaria a expiação que iria

268
redimir Israel. Isso, porém, não significava que Jesus era uma figura
messiânica; antes, ele simplesmente via sua morte como tendo a mesma
importância que as mortes dos mártires macabeus.
A pesquisa de Sanders e Casey corretamente coloca Jesus em um
contexto judaico do primeiro século e, neste ponto, as suas opiniões são
superiores a tratamentos tais como os de Crossan e Mack. Mas Sanders e
Casey não conseguiram captar a essência do Jesus do NT ao suprimirem ou
negarem muitos dos dados dos Evangelhos. Além do mais, o Jesus de
Sanders era tão semelhante a outros judeus contemporâneos que é difícil
explicar por que ele foi rejeitado e crucificado. Semelhante a outras
descrições contemporâneas de Jesus, incluindo as de Jesus como um
filósofo cínico errante e como um carismático operador de milagres, essa e
outras descrições de Jesus falharam primeiramente e antes de tudo ao não
apresentar uma fundamentação suficiente, ou mesmo convincente, do
motivo pelo qual Jesus foi crucificado. Por contraste, os Evangelhos
canônicos deixam claro que, em última instância, a crucificação foi
provocada por motivos religiosos e que Jesus foi acusado de blasfêmia por
causa de sua reivindicação de divindade (Mt 26.63-65; Jo 19.7).

O Reformador Social
Estudiosos como G. Theissen, R. A. Horsley e R. D. Kaylor alegaram que
Jesus foi mais um reformador social do que um profeta apocalíptico.68
Theissen, cujos pontos de vista foram o ponto de partida para o trabalho
posterior de Crossan, Horsley e outros, via Jesus como um pregador
carismático radical. Os comprometidos seguidores de Jesus o
acompanharam em seu ministério itinerante e adotaram um estilo de vida

269
que renunciava posses e laços familiares e se sujeitaram a não ter onde
morar. Jesus fundou um partido pacífico que buscava extinguir o espírito
fervente de revolta e violência populares nos vários movimentos de reforma
judaica de sua época. Ele e seus seguidores encorajavam o compromisso
com uma ética de não retaliação. A recusa deles em se defender exigia que
estivessem constantemente em movimento para fugirem das agressões.
Jesus chamou indivíduos para esse estilo de vida radical porque ele estava
convencido de que o fim estava próximo. Quando o reino de Deus fosse
estabelecido, os pobres se tornariam ricos; os fracos, fortes; e os menores,
os maiores.
Influenciado pelas teorias de Theissen, R. Horsley argumentou que
Jesus foi um revolucionário social que pretendia reestruturar a vida da
aldeia da Galileia a fim de estabelecer a igualdade entre homens e mulheres,
entre os pobres e os ricos e entre os oprimidos e os poderosos. R. D. Kaylor
também via Jesus como um reformador social, mas ele argumentou ainda
que o desejo de Jesus por reformas foi motivado por um desejo de retornar
ao igualitarismo que supostamente caracterizava as comunidades judaicas
agrícolas antes da primeira monarquia de Israel.
Embora Jesus certamente estivesse preocupado com a opressão e os
maus-tratos humanos, as teorias de Theissen, Horsley e em menor extensão
Kaylor de modo geral ignoraram a dimensão espiritual dos ensinamentos de
Jesus. Evidências abundantes no NT mostram que Jesus via a si mesmo
como uma figura messiânica ou real. Essa autocompreensão de Jesus
impede interpretações de Jesus como estando comprometido com um
igualitarismo radical que abole todas as distinções entre os indivíduos e
desafia todas as estruturas de autoridade. Enquanto Jesus claramente
denunciou o sistema corrupto judaico (como a purificação do templo, cf. Jo

270
2.13-22), a simples reforma social ou religiosa não era o que principalmente
impulsionava sua missão. Como o próprio Jesus disse, “meu reino não é
deste mundo” (Jo 18.36). Por isso, qualquer esforço para compreender Jesus
predominantemente ou exclusivamente em termos humanos, políticos, ou
socioeconômicos não é suficiente para capturar a essência da vocação e da
identidade de Jesus.

O Jesus Feminista
E. S. Fiorenza, a principal defensora dos estudos feministas, via Jesus como
um reformador radical que pretendia libertar as mulheres e outras pessoas
marginalizadas das estruturas sociais machistas e do imperialismo romano.69
Ela alegou também que Jesus vislumbrava e adorava a Deus como Sofia,
uma imagem feminina da divindade. Fiorenza propôs a teoria de que
Provérbios 1 a 9 integrou linguagem sobre deusas egípcias em sua reflexão
de Yahweh. Em sintonia com essa tradição da sabedoria, Jesus concebeu a
divindade em termos femininos e adorou a Deus como Sofia, e não como
Pai ou Abba.
O retrato que Fiorenza faz de Jesus é guiado mais pela agenda social de
defesa dos direitos femininos do que pelos reais dados dos Evangelhos. A
alegação que ela faz de que Jesus adorava a Sofia é em grande parte
baseada na sua questionável interpretação de Provérbios 1 a 9, a forma
ainda mais questionável como ela trata o texto de Mateus 11.19 (cf. Lc
7.35), e sua casual desconsideração de inúmeros textos nos quais Jesus
descreve a Deus como seu Pai. Os seus argumentos nunca explicaram de
forma adequada por que um igualitário radical que pretendia abolir todas as
distinções entre homens e mulheres nomearia doze homens como seus

271
discípulos e escolheria três dentre esses como parte de seu círculo mais
íntimo.70
Outro representante principal dos estudos feministas é R. R. Ruether.
Em 1998, Ruether propôs sua tese de que Jesus era “uma pessoa religiosa
em busca de Deus” e que foi, a princípio, atraído pela mensagem
apocalíptica de arrependimento proclamada por João Batista.71 Depois, ele
rompeu com Batista, inspirado numa visão de Satanás caindo do céu como
um raio (Lc 10.18), e concluiu que ele não precisava mais esperar por
futuras intervenções de Deus, mas que o poder de Satanás já tinha sido
quebrado. Por volta do ano 30, ele se convenceu de que sua visão do reino
estava prestes a ser cumprida. Então, reuniu seus seguidores, partiu para
Jerusalém e foi preso e crucificado. No entanto, alguns de seus discípulos
estavam convencidos de que Jesus não estava morto, mas vivo e presente
entre eles “no Espírito”. Assim a igreja primitiva nasceu, com as mulheres
desempenhando um papel importante.

O Sábio
B. Witherington sugeriu que Jesus poderia ser melhor entendido como um
mestre da sabedoria ou o sábio que se considerava como a personificação
ou encarnação da Sabedoria de Deus.72 Witherington demonstrou que
inúmeros ditos de Jesus têm semelhanças notáveis com as descrições da
Sabedoria divina no AT, nos Apócrifos e nos Pseudepígrafos. Essa
sabedoria era frequentemente personificada em textos antigos, como
Provérbios 8, para retratar Sabedoria como agente de Deus que foi enviado
com uma comissão, tinha o espírito e a vontade de Deus e os revelava a
outros.

272
À medida em que Witherington desenvolvia essa tese em seu trabalho
posterior,73 sua visão de Jesus como a personificação da Sabedoria explica a
elevada cristologia de João 1 e dos antiquíssimos hinos cristológicos que
aparecem em Colossenses 1 e Filipenses 2 retratando Jesus como a
encarnação da divindade. Essa antiga cristologia estava enraizada em textos
como Provérbios 1, 8 e 9 e Sirácida 24, que descrevem a Sabedoria como
uma personificação de Deus que preexistia, assistiu na criação, veio à terra,
chamou o povo de Deus ao arrependimento, salvou alguns mas foi rejeitada
por outros e voltou para a direita de Deus.74
A proposta de Witherington tem muitos pontos louváveis. A crítica que
lhe é feita não afirma primordialmente que ela é incorreta, mas sim que ela
é em si inadequada.75 O próprio Witherington admitiu isso e reconheceu que
nenhum título pode descrever plenamente Jesus.76 Ele reconheceu que Jesus
não era apenas a encarnação da Sabedoria e um sábio, mas que ele também
tinha o poder de curar, era uma figura profética e via a si mesmo como o
Messias.77 Como o próprio Witherington reconheceria, embora o
entendimento de Jesus como um sábio e como a personificação da
Sabedoria explicasse aspectos de sua consciência messiânica, esse
entendimento deve ser complementado por outras abordagens e
perspectivas.

Um Judeu Marginal
J. P. Meier sugeriu que o Jesus histórico seria melhor visto como um judeu
marginal.78 Jesus era marginal foi por várias razões. Em primeiro lugar, ele
se marginalizou ao abandonar a sua vida como carpinteiro e empreender um
ministério profético itinerante que exigia que ele dependesse da

273
generosidade dos outros e, assim, provocava a aversão de muitos judeus que
eram trabalhadores comuns. Segundo, os ensinamentos e as práticas de
Jesus eram marginais porque não eram condizentes com as opiniões e
práticas das principais seitas judaicas de sua época. Exemplos do estilo de
vida e dos ensinos radicais de Jesus incluem a proibição do divórcio, sua
rejeição ao jejum e seu celibato voluntário. A rejeição que Jesus fez das
convicções ordinárias judaicas era vista como particularmente audaciosa
uma vez que ele não tinha recebido formação rabínica formal. Terceiro, a
execução vergonhosa e brutal de Jesus mostra que ele tinha sido empurrado
para as margens da sociedade pelas autoridades políticas e religiosas da
Palestina.
A descrição de Jesus como um judeu marginal é inadequada. Em
primeiro lugar, a categoria não expressa adequadamente a visão que Meier
tem dos ensinamentos e atos de Jesus que podem ser verificados
historicamente. O trabalho de Meier afirma que Jesus realizou o que ele e
outros consideraram como milagres e exorcismos, que Jesus era um profeta
escatológico judeu que proclamava a vinda do reino de Deus e que Jesus
mediou a experiência da alegria da salvação. Esses aspectos do ministério
de Jesus não estão implícitos no rótulo “judeu marginal”. Em segundo
lugar, o propósito de Meier em sua pesquisa foi apenas descrever o Jesus
que pode ser recuperado e reconstruído por meio de uma séria pesquisa
histórica, e não descrever o Jesus que realmente viveu e já não é
recuperável. Ele queria desenvolver um retrato de Jesus que satisfizesse
qualquer historiador honesto, independentemente de seus compromissos
religiosos ou filosóficos. Para isso, foi necessário que ele eliminasse de sua
reconstrução da vida de Jesus o material que ele considerava como
provável. Apesar dessas e outras deficiências do trabalho de Meier, seu

274
retrato de Jesus é muito mais cuidadosa e razoavelmente sustentável que a
maioria dos retratos contemporâneos.

O Messias Ressurreto
Um dos retratos mais biblicamente fiéis de Jesus nos últimos anos veio da
pena de N. T. Wright. Seus três primeiros volumes de uma obra proposta
em seis volumes retratam Jesus como uma figura messiânica divina que
ressuscitou da morte.79 O retrato que Wright faz de Jesus não é uma mera
repetição do ponto de vista tradicional padrão, mas um retrato que inova de
várias maneiras. De acordo com Wright, o Israel do primeiro século via a si
mesmo como ainda abatido no Exílio devido à dominação romana da
Palestina. Israel desesperadamente ansiava que Deus voltasse para libertar o
seu povo. Jesus era um profeta escatológico que veio para anunciar que
Deus iria voltar para Sião para habitar com seu povo novamente. Quando
ele o fizesse, iria derrotar os inimigos de Israel e libertar seu povo do seu
exílio.
Jesus prometeu essa libertação vindoura em palavras e atos. Seus
milagres e exorcismos serviam como sinais proféticos que demonstravam
que Deus já estava a trabalho restaurando Israel e derrotando Satanás, o
maior inimigo da nação. Sua comunhão à mesa com os rejeitados pelas
autoridades religiosas de Israel demonstrava a oferta de Jesus de perdoar os
pecadores e inclui-los na Israel restaurada.
Jesus também substituiu a adesão ao culto do Templo e a fidelidade à
Lei do AT pela fidelidade a si mesmo. Ele acreditava que sua própria morte
envolveria sofrimento representativo por Israel, no qual ele sacrificialmente
suportou os ais escatológicos que eram um necessário prelúdio para o fim

275
do Exílio de Israel. Jesus não só proclamou o retorno de Yahweh a Israel;
ele representou, simbolizou e personificou esse retorno. Ele reconheceu a si
mesmo como a própria encarnação do retorno do Senhor a Israel. Jesus
“acreditava que tinha que fazer e ser, por Israel e pelo mundo, aquilo que
segundo as Escrituras apenas o próprio YHWH poderia fazer e ser”.80
Finalmente, Wright argumentou de forma convincente e detalhadamente
que Jesus ressuscitou dos mortos. Ele fez uma crítica devastadora à
alegação de que Jesus experimentou uma simples ressurreição espiritual,
uma alegação apresentada por estudiosos como J. D. Crossan e B. Chilton.
Ele insistiu em que tanto as descrições judaicas de ressurreição quanto os
relatos do NT da ressurreição de Jesus demonstram que Jesus experimentou
uma ressurreição corporal. Essa ressurreição confirma a crença da igreja
primitiva de que Jesus é Senhor e Cristo.
De modo geral, Wright ofereceu um retrato de Jesus que acomoda mais
dos dados bíblicos do que qualquer outro ponto de vista contemporâneo
discutido anteriormente. Nos pontos em que ele se afasta da visão
tradicional cristã de Jesus e de seus ensinamentos, a visão tradicional é
geralmente superior. Wright, porém, conseguiu conquistar uma audiência,
mais uma vez, para uma elevada visão de Jesus que o considera como o
Senhor ressuscitado. Além do mais, a defesa franca e sincera que Wright
faz dos ensinamentos bíblicos sobre a ressurreição de Jesus o separa dos
líderes do Seminário de Jesus, tais como J. D. Crossan, que não aceitam o
testemunho das Escrituras a esse respeito.

276
Tabela 3.2: Retratos Contemporâneos de Jesus
Retrato Proponentes Descrição
Filosofo Cínico J. D. Crossan, F. G. Jesus pregava e praticava um
Errante Downing igualitarismo radical que
abolia as hierarquias e as
distinções sociais
O Carismático M. Borg, G. Vermes Jesus como uma figura
Operador de carismática, com
Milagres experiências visionárias e
místicas de Deus, que
funcionava como canal do
poder de Deus aos outros
Profeta Apocalíptico E. P. Sanders, M. Jesus como profeta que
Casey esperava que o clímax da
história humana ocorresse na
época de sua vida ou logo
após sua morte
Reformador Social G. Theissen, R. A. Jesus como pregador
Horsley itinerante que renunciou a
posses, vínculos familiares e
revoltas violentas,
convocando a um retorno ao
igualitarismo e renunciando
ao sistema de classes sociais
Jesus Feminista E. S. Fiorenza, R. R Jesus como libertador das
Ruether mulheres e dos
marginalizados do domínio
machista das estruturas
sociais romanas
Sábio B. Witherington Mestre de sabedoria que via
a si mesmo como a
personificação da Sabedoria
de Deus

277
Retrato Proponentes Descrição
Judeu Marginal J. P. Meier Jesus renunciou sua vida
como carpinteiro e não viveu
pelas regras do judaísmo de
sua época
Messias Ressurreto N. T. Wright Jesus como o Messias
ressuscitado que liberta
Israel do Exílio

Resumo
A. Schweitzer, em The Quest of the Historical Jesus [A questão do Jesus
histórico], sua famosa investigação da moderna pesquisa sobre Jesus,
observou há mais de um século que em muitos casos uma descrição que um
estudioso faz de Jesus estranhamente lembra o estudioso responsável por tal
descrição.81 Como observou A. Loisy há muito tempo, muitas reconstruções
de Jesus parecem ser pálidos reflexos do próprio pesquisador.82 Mais
recentemente, J. D. Crossan observou que “é impossível evitar a suspeita de
que a pesquisa sobre o Jesus histórico é um lugar muito seguro para fazer
teologia e chamá-la de história; para fazer autobiografia e chamá-la de
biografia”.83 As feministas descobrem um Jesus feminista nos Evangelhos;
os protestantes liberais tendem a encontrar um Jesus liberal, e assim por
diante. O próprio Crossan foi objeto de uma crítica criativa e inteligente de
N.T. Wright, que expõe os questionáveis critérios e fontes subjacentes à
obra de Crossan sob a forma de uma divertida paródia.84
Essas tendências demonstram a poderosa influência que os pressupostos
de um estudioso podem exercer sobre suas pesquisas e conclusões. Assim, é
importante procurar compreender e avaliar os pressupostos e os
engajamentos filosóficos dos acadêmicos que podem impactar a

278
reconstrução da identidade e dos ensinamentos de Jesus. Em particular, as
fontes e métodos utilizados pelos estudiosos envolvidos na pesquisa do
Jesus histórico podem exercer uma influência em suas conclusões tão forte
quanto os seus pressupostos. Não é de surpreender que a dependência de
fontes não canônicas na visão que se tem de Jesus geralmente resulta em
um retrato de Jesus muito diferente da visão cristã tradicional. A próxima
seção, portanto, analisa brevemente algumas dessas fontes não canônicas e
avalia sua utilidade para a compreensão de Jesus.

DEPENDÊNCIA DE EVANGELHOS NÃO


CANÔNICOS PARA UMA COMPREENSÃO DE
JESUS
Introdução
No final do século XX e início do século XXI, a América do Norte
testemunhou um enorme aumento de interesse nos chamados Evangelhos
perdidos, relatos da vida e dos ensinamentos de Jesus excluídos do cânon
do NT por várias razões.85 Alguns estudiosos chegaram até mesmo a
afirmar que literalmente milhares de relatos escritos da vida de Jesus
existiam na igreja primitiva. Segundo esses autores, embora os Evangelhos
canônicos distorçam a verdadeira história de Cristo por causa de agendas
políticas e teológicas, a verdade sobre Jesus de Nazaré ainda é preservada
nessas obras apócrifas, tais como o Evangelho de Filipe e o Evangelho de
Maria Madalena. Um desses autores utilizou esses Evangelhos não
canônicos para argumentar que a divindade de Jesus foi uma invenção de
um imperador romano politicamente motivado e que Jesus foi casado com
Maria Madalena.86

279
Outros, escrevendo para uma audiência de acadêmicos, também
preferiram obras não canônicas a Mateus, Marcos, Lucas e João. Por
exemplo, em sua obra Four Other Gospels [Os Quatro Outros Evangelhos],
J. D. Crossan argumentou que o Evangelho de Tomé, um antigo estrato do
Evangelho de Pedro e o Evangelho Secreto de Marcos eram mais antigos
do que os Evangelhos canônicos e foram utilizados pelos evangelistas
quando estes escreveram seus próprios Evangelhos.87 Em sua obra
Historical Jesus [Jesus Histórico], Crossan colocou essas três fontes
juntamente com Q em seu primeiro estrato de fontes e as utilizou para
retratar Jesus como um filósofo cínico errante.88 Claramente, a escolha das
fontes na pesquisa do Jesus histórico tem impacto significativo sobre a
reconstrução da vida e de ensinamentos de Jesus. Retratos de Jesus que
tomam como ponto de referência os Evangelhos canônicos são
significativamente diferentes dos retratos de Jesus derivados de Evangelhos
alternativos.
Nesta seção, nós discutimos se esses Evangelhos alternativos são
recursos úteis para a compreensão de quem Jesus realmente foi. Nós
examinaremos brevemente três dos Evangelhos perdidos nos quais alguns
estudiosos do Jesus histórico se baseiam: o Evangel`ho de Tomé, o
Evangelho de Pedro e o Evangelho Secreto de Marcos. Nós sugerimos que
esses Evangelhos alternativos são muito tardios para refletir um testemunho
crível sobre o Jesus da história. Também defendemos que os Evangelhos
canônicos permanecem como nosso recurso mais útil para a compreensão
da vida de Jesus de Nazaré, não apenas por serem canônicos, mas porque
são nossas fontes mais antigas e refletem testemunhos oculares a respeito da
vida e dos ensinamentos de Jesus.

280
O Evangelho de Tomé
Alguns dos pais da igreja primitiva dos séculos III e IV se referem a um
Evangelho associado ao nome Tomé.89 Fragmentos desse Evangelho
perdido foram descobertos entre os Papiros de Oxirrinco nos anos de
1890,90 mas esses fragmentos não foram positivamente identificados como
pertencentes ao Evangelho de Tomé até a descoberta dos códices de Nag
Hammadi, 13 livros com capa de couro escritos na língua copta e
descobertos no Egito em 1945. O segundo códice encontrado em Nag
91
Hammadi continha o texto integral do Evangelho de Tomé.
Os últimos 25 anos viram o Evangelho de Tomé ocupar um papel cada
vez mais central nas tentativas de reconstruir a vida e os ensinamentos de
Jesus de Nazaré. Dos estudiosos que se apoiam confiantemente no
Evangelho de Tomé ao fornecer um retrato do Jesus histórico, poucos foram
mais prolíficos e influentes do que J. D. Crossan. Crossan listou o
Evangelho de Tomé I (material de Tomé semelhante ao dos Evangelhos
canônicos) em seu primeiro estrato de fontes para a tradição de Jesus. De
acordo com Crossan, essa primeira camada de tradição em Tomé “foi
composta por volta dos anos 50 e.c. (era comum), possivelmente em
92
Jerusalém, sob a égide da autoridade de Tiago (veja Evang. Tomé 12)”. De
acordo com Crossan, o Evangelho de Tomé é anterior aos Evangelhos
canônicos e preservou tradições mais confiáveis dos ditos de Jesus. Porém,
essa audaciosa afirmação de Crossan negligencia consideráveis evidências
que sustentam a visão mais antiga, cujo consenso entende que o Evangelho
de Tomé foi escrito em meados do século II ou em data posterior.
Primeiro, comparações cuidadosas das tendências teológicas, das
estatísticas de vocabulário e da preferência gramatical dos Evangelhos
canônicos e Tomé sugerem fortemente que Tomé dependeu dos Evangelhos

281
canônicos e, portanto, é posterior a eles, e não o contrário. W. Schrage
analisou cuidadosamente cada dito no Evangelho de Tomé que tem um
paralelo nos Evangelhos Sinóticos. Ele concluiu que a evidência suporta
melhor a dependência que Tomé tem dos Sinóticos.93 Publicações mais
recentes têm demonstrado que os próprios paralelos aos quais alguns
estudiosos apelaram como prova de prioridade e independência do
Evangelho de Tomé seriam melhor explicados se Tomé dependesse dos
Evangelhos Sinóticos.94 R. Bauckham observou recentemente que o
Evangelho de Tomé 13 afirma uma autoridade superior àquela dos
Evangelhos de Marcos e Mateus e, assim, claramente pós-data à
composição e distribuição desses Evangelhos.95
A análise da história da composição de Tomé que H. M. Schenke
apresentou para o Seminário de Jesus em 1991 concluiu que o Evangelho
de Tomé foi extraído de um comentário de ditos de Jesus, provavelmente
“Exposição dos ditos do Senhor”, de Papias de Hierápolis. Isso sugere uma
data de composição por volta do ano 140. Schenke salientou que essa data
coincide com evidências no dito 68 que ele traduziu, “e eles (ou seja, seus
próprios perseguidores) não mais encontrarão lugar (de habitação) ali onde
vos perseguiram”. Schenke argumentou que essa afirmação se refere
claramente à revolta de Bar Kochba em 132-135, que resultou na expulsão
dos judeus de Jerusalém pelas autoridades romanas. Consequentemente, o
dito 68 fornece uma data mais próxima possível para a composição de
Tomé. Schenke, que mais cedo se identificou como um membro “da escola
de pensamento Koester”, que data o Evangelho de Tomé na segunda metade
do primeiro século, argumentou que a evidência do dito 68 exige “um novo
abandono da datação anterior, fruto de uma tentativa da escola de
Koester”.96

282
S. J. Patterson se juntou a S. Davies, H. Koester, J. D. Crossan e ao
Seminário de Jesus ao datar o Evangelho de Tomé na metade do primeiro
século.97 Patterson, porém, admitiu que algumas partes de Tomé, assim
como o dito 7, foram compostas e adicionadas à coleção apenas no século
III ou IV. O dito 7 lê: “Jesus disse: ‘bem-aventurado o leão que se torna
homem quando consumido pelo homem; maldito o homem que o leão
consome, e o leão torna-se homem’”.98 Apelando para a pesquisa de H.
Jackson, Patterson argumentou que o texto expressa uma imagem comum
entre os monges ascetas do Alto Egito começando no século II, na qual o
leão simboliza as paixões carnais que os ascetas procuravam suprimir.
Patterson sugeriu que o dito foi acrescentado à coleção após esta chegar ao
Egito e foi adotado por esses ascetas.99 É claro, se o dito é original do
Evangelho, então Tomé pertenceria ao século II, como se pensava
anteriormente.
H. J. W. Drijvers, R. Schippers e N. Perrin dataram o Evangelho de
Tomé próximo a 200. Perrin argumentou que as semelhanças entre o
Evangelho de Tomé e o Diatessaron de Taciano, que levaram Quispel a
sugerir que Taciano tinha usado Tomé como um quinto Evangelho em sua
harmonia, eram na verdade o resultado da dependência que Tomé tinha de
Taciano. Consequentemente, o Evangelho de Tomé tem data posterior ao
Diatessaron, que mais provavelmente foi produzido por volta de 150-160.
Perrin deduziu a dependência que Tomé teve de Taciano usando quatro
passos: (1) o Evangelho de Tomé foi primeiramente composto em siríaco,
uma hipótese que Perrin defende convincente mostrando que vários lemas
que ligam os ditos de Tomé dependem de um original siríaco; (2) o
Evangelho de Tomé mostra unidade literária e reflete o trabalho de um
único autor; (3) devido à unidade e estratégia da composição por trás do

283
Evangelho de Tomé, o autor provavelmente se baseou em fontes siríacas
escritas para o seu conhecimento da tradição sinótica; e (4) o Diatessaron
de Taciano é o único texto siríaco da tradição sinótica que poderia ter estado
disponível para Tomé.100
Uma vez que evidências convincentes de uma datação posterior do
Evangelho de Tomé estão levando até mesmo estudiosos anteriormente
comprometidos com uma datação anterior a abandonar esta última hipótese,
preferir o Evangelho de Tomé em lugar dos Evangelhos canônicos na
reconstrução da vida e dos ensinamentos de Jesus é algo inadequado.
Embora alguns estudiosos sejam atraídos para o Evangelho de Tomé porque
ele não apresenta milagres, nem narrativa da Paixão e da ressurreição de
Jesus, Tomé parece ter sido composto tarde demais para que se espere que
ele seja mais confiável que os Evangelhos canônicos.

O Evangelho de Pedro
O historiador da igreja Eusébio de Cesareia (c. 260-340) mencionou várias
vezes um Evangelho herético associado com o apóstolo Pedro.101 A
narrativa do julgamento, da crucificação e da ressurreição de Jesus que foi
descoberta em escavações em Akhmim no Egito em 1886-1887 foi
identificada, talvez de forma incorreta, como o Evangelho perdido de
Pedro.102 Na pesquisa sobre o Jesus histórico, o estudioso que faz o uso
mais extensivo do Evangelho de Pedro é J. D. Crossan.103 Após uma
comparação detalhada entre o Evangelho de Pedro e os Evangelhos
canônicos, Crossan concluiu que o estrato mais antigo no Evangelho de
Pedro foi o hipotético Evangelho da Cruz.104 Ele argumentou que essa
antiga narrativa foi utilizada pelos escritores sinóticos e por João, e serviu

284
como a única fonte dos evangelistas canônicos para a narrativa da Paixão.105
Fortes evidências sugerem que o Evangelho de Pedro não preserva
confiável tradição independente sobre a morte e ressurreição de Jesus. Em
vez disso, o documento era uma revisão dos Evangelhos canônicos
ornamentada com lendas do século II.
Na narrativa do guarda no sepulcro, o conteúdo e o vocabulário do
Evangelho de Pedro sugerem uma estreita relação com Mateus.106 Crossan
observou um paralelo verbal continuado em Mateus e no Evangelho de
Pedro, que indicava que um documento foi dependente do outro: “Para não
acontecer que, vindo os discípulos, roubem o corpo” (mēpote elthontes hoi
mathētai autou klepsōsin auton; Mt 27.64; Ev. Pedro 8.30). A melhor
explicação para o paralelismo continuado é a dependência de um Evangelho
com relação ao outro.107 Embora L. Vaganay já tenha argumentado
anteriormente que o Evangelho de Pedro 8.30 era dependente de Mateus
27.64b, Crossan propôs que na verdade, Mateus era dependente do
Evangelho de Pedro.108
Uma análise das características especiais comuns ao Evangelho de
Pedro ou Mateus nas palavras compartilhadas oferece o meio mais objetivo
de determinar a direção da dependência. O vocabulário e a gramática
sugerem fortemente a dependência do Evangelho de Pedro em relação a
Mateus. R. Gundry descreveu as palavras como uma “série de
mateanismos”.109 A análise de J. P. Meier o levou à conclusão de que
“quando se trata de quem é dependente de quem, todos os sinais apontam
para a prioridade de Mateus […] A oração é um tecido do vocabulário e do
estilo de Mateus, um vocabulário e estilo quase totalmente ausentes do resto
do Evangelho de Pedro”.110 Uma vez que as séries compartilhadas contêm

285
vários mateanismos proeminentes, parece mais provável que o Evangelho
de Pedro tenha sido dependente de Mateus, e não o contrário.111
As estratégias de composição do Evangelho de Pedro sugerem que ele é
uma obra do século II e dependente dos Evangelhos canônicos. O autor
projetou material das narrativas descrevendo a vida e os ensinamentos
iniciais de Jesus em sua narrativa da Paixão, utilizando uma estratégia de
composição também encontrada nas obras do século II, como o
Protoevangelho de Tiago.112 Além disso, o autor tendia a multiplicar
milagres e introduzir novos detalhes na narrativa, em uma tentativa de
defender as afirmações cristãs de uma forma que melhor correspondesse às
tendências da literatura do século II.
Alguns detalhes do Evangelho de Pedro também traem sua origem
comparativamente tardia. A pergunta do anjo do céu para a cruz no
momento da ressurreição de Jesus, “você pregou para aqueles que
dormem?” no Evangelho de Pedro 9.38 (veja abaixo), revela o
conhecimento do autor da antiga doutrina da descida de Jesus ao Hades
entre a sua morte e ressurreição para pregar aos crentes ali detidos. Os
estudiosos nos últimos anos têm questionado se essa doutrina é ensinada no
NT.113 É duvidoso que a doutrina tenha surgido antes da época de Justino
Mártir (c. 100-165). A primeira clara referência à doutrina aparece nos
escritos de Ireneu no final do século II (Contra Heresias, 4.27.2). Assim, a
referência no Evangelho de Pedro a pregar para aqueles que dormem sugere
que o documento foi composto não antes do primeiro quarto do século II.
Mateus e o Evangelho de Pedro diferem ligeiramente em suas
descrições da selagem do sepulcro de Jesus. Mateus diz simplesmente que o
túmulo foi selado (Mt 27.66). O Evangelho de Pedro acrescenta que foi
selado com sete selos (Ev. Pedro 8.33). A referência aos sete selos sugere

286
que o autor do Evangelho de Pedro embelezou Mateus nesse ponto em
função de preocupações apologéticas e provavelmente à luz de Apocalipse
5.1.114 Isso sugere que esse livro foi escrito após o Apocalipse e que
provavelmente é uma obra do século II.
O uso da expressão “dia do Senhor” pode ser particularmente
importante para a datação do Evangelho de Pedro.115 Os primeiros
documentos cristãos a usarem essa expressão são Apocalipse 1.10, Didaquê
14.1 e Inácio (Aos Magnésios 9.1). A expressão “primeiro dia da semana”
(veja as narrativas sinóticas da Paixão; Jo 20.1,19,26; At 20.7; 1Co 16.2) é
a forma mais primitiva de se referir ao dia da ressurreição de Jesus, que era
comum na igreja primitiva em meados e final do primeiro século. A
ausência de referências ao “dia do Senhor” nos antigos documentos do NT,
juntamente com a presença do termo em Apocalipse e na Didaquê (segunda
metade do século I ou início do século II), sugere que a expressão tornou-se
popular nas décadas finais do primeiro século (alternativamente, João
cunhou a frase em Ap 1.10). O uso do “dia do Senhor”, especialmente na
sua forma abreviada, sugere uma data do século II para o Evangelho da
Cruz.116
Finalmente, a descrição bizarra da ressurreição de Jesus no Evangelho
de Pedro é notavelmente semelhante à literatura do século II. O Evangelho
de Pedro 9.38 afirma que no momento da ressurreição de Jesus um grande
som ou voz veio do céu. O céu se abriu e dois homens cercados por uma luz
brilhante desceram pela abertura no céu. As duas figuras celestes entraram
no túmulo para acompanhar Jesus em sua saída. Quando as três figuras
saíram da tumba, as cabeças dos seres angélicos alcançaram o céu, mas a
cabeça de Jesus se estendeu acima do céu (Ev. Pedro 10.39,40). Enquanto
os anjos e Jesus saíam da tumba, uma cruz aparentemente flutuando no ar

287
seguia atrás deles.117 Uma voz celestial perguntou: “você pregou para
aqueles que estão dormindo?” E a cruz respondeu: “sim” (Ev. Pedro 10.39-
42).
A literatura apócrifa do século II foi marcada por várias das
características observadas acima. Outros textos do século II também falam
de cruzes que se movem de forma independente e atribuem ao Cristo
ressurreto uma estatura sobrenatural.118 Consequentemente, as descrições da
estatura de Jesus e das cruzes que se movem no Evangelho de Pedro
sugerem uma data de composição no século II.
A data do Evangelho de Pedro e sua relação literária com os
Evangelhos canônicos é uma questão de grande importância que tem um
enorme impacto sobre a reconstrução que alguém faz dos acontecimentos
em torno da Paixão e ressurreição de Jesus. O Evangelho de Pedro é
claramente um produto da criativa imaginação literária do autor, em vez de
uma tentativa séria de preservar os testemunhos oculares dos eventos reais.
Assim, se o Evangelho de Pedro é a única fonte para os relatos da Paixão e
ressurreição nos Evangelhos do NT, como Crossan afirmou, os Evangelhos
canônicos são revisões não confiáveis de uma imaginativa tradição. Mas
uma análise detalhada do Evangelho de Pedro indica que o autor foi
dependente dos Evangelhos canônicos e o escreveu no século II muito
tempo depois de os Evangelhos canônicos terem sido escritos e de as
testemunhas oculares do ministério de Jesus já terem saído de cena.

O Evangelho Secreto de Marcos


Em 1958, Morton Smith, professor assistente de história na Universidade de
Columbia, visitou o mosteiro de Mar Sabá, perto de Jerusalém, e fotografou

288
fragmentos de textos da biblioteca do mosteiro. Nos documentos finais de
uma edição das cartas de Inácio impressa em 1646, Smith encontrou uma
carta manuscrita atribuída a Clemente de Alexandria (c. 150-215) escrita
em um grego semelhante à escrita comum do século XVIII. Na carta,
Clemente alegava ter conhecido três versões do Evangelho de Marcos: a
versão canônica utilizada no culto público, uma versão mais tardia na qual
Marcos adicionou tradições secretas a seu texto anterior para ser usada em
rituais secretos de iniciados, e uma versão ainda mais tardia, contendo
adições de um grupo gnóstico. Clemente citou duas adições da segunda
versão que Smith identificou como o Evangelho Secreto de Marcos. A
citação mais extensa descrevia a ressurreição de um personagem inominado
que mais tarde veio a Jesus vestindo apenas um pano de linho. O homem
passou a noite com Jesus, e Jesus lhe ensinou o mistério do reino de Deus.
O relato parece ter sido modelado no relato de João da ressurreição de
119
Lázaro, expresso na terminologia de Marcos.
Com uma margem de dois anos da publicação de Smith de seus
achados, os estudiosos começaram a contestar a autenticidade do texto. Q.
Quesnell sugeriu que se tratava de uma falsificação.120 Suspeitas cercaram o
texto, em parte, porque depois de ter sido fotografado por Smith em 1958 e,
em seguida, por uma equipe de estudiosos em 1972, ele desapareceu
misteriosamente, tornando impossível sua submissão aos testes necessários
para autenticá-lo até mesmo como uma produção do século XVIII.121 O
texto, porém, ainda tem seus defensores. H. Koester sustentou que a carta
atribuída a Clemente era “provavelmente genuína” e, cautelosamente,
sugeriu que o Evangelho canônico era dependente dessa versão anterior de
Marcos.122 Mais recentemente, estudiosos como B. Metzger e B. Ehrman
questionaram a autenticidade do Evangelho Secreto de Marcos e o papel de

289
Smith na sua descoberta.123 Apesar dessas questões, J. D. Crossan defendeu
tanto a autenticidade do Evangelho Secreto de Marcos quanto sua
prioridade sobre o Evangelho canônico.124 Crossan colocou o Evangelho
Secreto de Marcos em seu primeiro estrato de fontes para a pesquisa sobre o
Jesus histórico.
S. C. Carlson escreveu recentemente a análise mais extensa da
autenticidade da carta de Clemente e produziu evidências convincentes que
suportam a suspeita de que M. Smith criou o texto como parte de uma
fraude acadêmica.125 Primeiro, o relato de Smith acerca da descoberta do
Evangelho Secreto de Marcos tem vários paralelos interessantes com um
intrigante livro primeiramente publicado em 1940, intitulado The Mystery
of Mar Saba [O Mistério de Mar Sabá]. Esses paralelos podem ser indícios
intencionais que mostram que o Evangelho Secreto de Marcos é uma farsa,
bem como o Evangelho de Nicodemos, que é o foco do livro. B. Ehrman
destacou que a página oposta do Evangelho Secreto de Marcos na edição de
Inácio de 1646 manifestava desprezo pelos “companheiros impudentes” que
“interpolaram” passagens em textos antigos com “todo tipo de bobagem”. A
colocação da cópia da carta clementina no livro pode ser outro indício que
expressa a verdadeira natureza da carta.
Segundo, certas características da escrita da epístola de Clemente
sugerem que se trata de uma falsificação do século XX. (1) A escrita
ostenta sinais de hesitação nos traços da pena que não são naturais e que são
consistentes com o tremor da mão de um falsificador, bem como
interrupções e sinais de retoque, sugerindo que as letras foram desenhadas,
e não escritas. A formação das letras também apresenta traços
inconsistentes de formação. (2) A escrita é diferente em vários aspectos da
de outros manuscritos do século XVIII produzidos em Mar Sabá. Ela é mais

290
parecida com as que aparecem nos manuscritos no Ocidente do que as dos
manuscritos orientais gregos do período. Causa estranheza a escrita ser
ocidental se o manuscrito foi produzido em Mar Sabá. Devido à sua
pesquisa anterior, Smith era muito mais familiarizado com a escrita do
Ocidente. (3) A escrita é idêntica àquela de outro manuscrito de Mar Sabá,
o manuscrito 22, que o próprio Smith dizia ter sido produzido por uma
pessoa do século XX, a quem ele identificou como M. Madiotes. Embora o
sufixo grego dê ao nome a aparência de um nome grego, ele não é um nome
grego propriamente dito, mas um pseudônimo que significa “careca” e com
um significado secundário figurativo de “trapaceiro”. A abreviatura “M.”
pode muito bem significar “Morton”. Além disso, Smith concluiu a partir
do manuscrito que o escriba da carta clementina foi um escritor experiente e
estudioso com interesse nos estudos patrísticos e da crítica ocidental,
conclusões que não são de forma alguma suportadas pelas evidências do
achado, a não ser que o escriba fosse o próprio Smith e sua descrição seja
autobiográfica.
Terceiro, o catálogo de livros de 1910 da biblioteca de Mar Sabá não
contém qualquer menção dessa cópia das obras de Inácio. Isso permite a
possibilidade de que o livro tenha sido contrabandeado para a biblioteca
após a falsificação já ter sido produzida. O levantamento feito pelo próprio
Smith do conteúdo da biblioteca demonstra que dos dez livros publicados
na coleção, todos foram produzidos em Veneza exceto a edição Voss de
Inácio, que foi impressa em Amsterdã. Além disso, a edição Voss é o único
texto em latim e grego encontrado na biblioteca.
Quarto, parece um pouco suspeito que a descoberta de Smith
corroborava as alegações na sua obra acadêmica anterior. Em sua
dissertação, Tannaitic Parallels to the Gospels [Paralelos Tanaíticos aos

291
Evangelhos], Smith associou Marcos 4.11 ao sigilo sobre relacionamentos
sexuais proibidos.126 O Evangelho Secreto de Marcos sugere uma relação
sexual proibida entre Jesus e o jovem vestido com pano de linho. O achado
também confirmou sua insistência em que uma fonte com características
joaninas estivesse por trás dos relatos de milagres no Evangelho de
Marcos.127
Quinto, como acontece muitas vezes nas fraudes acadêmicas, Smith
parece ter deixado pistas que o identificavam como o verdadeiro autor da
carta clementina. O prefácio do Secret Gospel [Evagelho Secreto] afirmava:
“Sem dúvida, se o passado, como um filme, pudesse ser reprisado, eu
também deveria ficar chocado por descobrir o quanto da história eu já
inventei”.128 A conclusão declarava que “a verdade é necessariamente mais
estranha do que a história”.129 O mais intrigante é a dedicação de Smith de
seu livro Secret Gospel “para aquele que sabe”, que parece corresponder à
dedicação da versão acadêmica Clemente a A. D. Nock, um dos estudiosos
a quem Smith pediu que examinasse o manuscrito, que era cético sobre o
texto desde o início. As dedicatórias parecem sugerir que as suspeitas de
Nock sobre o Evangelho Secreto de Marcos estavam corretas.
Consequentemente, o Evangelho Secreto de Marcos, importante para a
compreensão do Jesus histórico e para a reconstrução das origens do
Evangelho nas teorias de estudiosos proeminentes tais como Koester e
Crossan, é provavelmente uma falsificação. As evidências acumuladas por
Carlson foram descritas por M. Goodacre da Duke University como
“atraentes e totalmente convincentes”,130 e por L. Hurtado como
“persuasivas, decisivas, praticamente irrefutáveis”.131 Obviamente, as
falsificações do século XX não têm nada a contribuir para as discussões
sérias sobre a vida e ensinamentos de Jesus.

292
Conclusão
Nossa rápida passagem por alguns dos Evangelhos dos quais alguns
estudiosos dependem profundamente na investigação do Jesus histórico
levanta algumas questões preocupantes sobre a confiabilidade desses
“Evangelhos perdidos”. Evidências sugerem que esses Evangelhos
geralmente são datados em até cem anos, e algumas vezes
significativamente mais, depois da morte de Jesus. Embora possam ser úteis
para o entendimento de movimentos religiosos divergentes dos séculos II e
III, esses Evangelhos são de pouco valor para a compreensão de quem Jesus
realmente foi ou do que ele disse e fez. Os quatro Evangelhos canônicos
permanecem as fontes mais úteis para a pesquisa sobre o Jesus histórico não
apenas porque são canônicos, mas porque eles são as fontes mais antigas e
foram escritas durante o primeiro século, quando os testemunhos oculares
de Jesus ainda estavam disponíveis.132

CRONOLOGIA DO MINISTÉRIO DE JESUS


Introdução
Os ocidentais no século XXI tendem a se preocupar com horários e datas.
Eles frequentemente olham seus relógios e marcam seus compromissos com
antecedência de semanas, meses e, às vezes, até anos. Não é de surpreender
que eles possam ficar desapontados ao encontrar algumas poucas
referências a datas precisas no NT. Eles podem ficar chocados ao descobrir
que Jesus não nasceu em 25 de dezembro do ano 1 d.C. e que os estudiosos
modernos não estão certos do dia, mês, ou mesmo ano de seu nascimento.
No entanto, a falta de preocupação com a cronologia exata ou referências

293
frequentes a horários e datas deve ser esperada das pessoas das sociedades
agrárias do primeiro século. Esperar que uma cronologia detalhada da vida
de Jesus se revele nos Evangelhos é impor as modernas preocupações
ocidentais ao texto antigo. Em geral, os primeiros cristãos estavam muito
mais preocupados com os acontecimentos da vida de Jesus e sua
importância teológica do que com as questões cronológicas. Os cristãos
modernos poderiam aprender com as prioridades dos primeiros cristãos.
No entanto, o desenvolvimento de uma cronologia da vida de Jesus é
um exercício digno e uma etapa importante no estudo histórico dos
Evangelhos, mas a construção de uma cronologia precisa da vida de Jesus é
difícil por diversas razões. Em primeiro lugar, os quatro evangelistas
forneceram poucas referências explícitas que permitem que os estudiosos
relacionem os acontecimentos da vida de Jesus com as datas oficiais
importantes do governo, o modo normal de estabelecer datas durante essa
época. A única data precisa explicitamente mencionada nos Evangelhos é a
data do início do ministério de João Batista, e até mesmo essa referência
aparece em apenas um dos Evangelhos (Lc 3.1-3). Em segundo lugar, os
escritores dos Evangelhos misturaram uma estrutura cronológica básica a
certo grau de disposição tópica, o que torna difícil estabelecer a ordem
precisa dos eventos-chave no ministério de Jesus. No entanto, existem
dados suficientes para se estabelecer uma cronologia da vida e do ministério
de Jesus. Esta seção propõe datas aproximadas para o nascimento, o
batismo, ministério e crucificação de Jesus.

O Nascimento de Jesus

294
Estudantes iniciantes podem assumir que Jesus nasceu no ano 1 d.C. No
entanto, como em breve ficará evidente, as coisas não são tão simples
assim. Mateus 2.1 e Lucas 1.5 indicam que Jesus nasceu nos últimos anos
do reinado de Herodes, o Grande. Josefo afirmou que um eclipse ocorreu
133
pouco antes da morte de Herodes. Esse eclipse pode ser datado
precisamente, a partir de dados astronômicos, de 12/13 de março de 4
134
a.C. Além disso, Herodes morreu antes da Páscoa do mesmo ano. A
celebração da Páscoa em 4 a.C. começou no dia 11 de abril. Herodes,
portanto, morreu entre 12 de março e 11 de abril do ano 4 a.C. A data da
morte de Herodes estabelece a última data possível (terminus ad quem) para
o nascimento de Jesus.

QUADRO 3.1: LUCAS E QUIRINO


Uma vez que Josefo indica que Quirino se tornou governador da Síria
em 6 d.C. e que ele começou a fazer um censo da região para Roma
logo após assumir o poder (Ant. 18.1.1-2 §§ 1-11), alguns estudiosos
duvidam da exatidão da declaração de Lucas e acreditam que ele fez
confusão com as datas do censo e do governo de Quirino. D. Bock
sugeriu duas formas de conciliar o relato de Lucas com as referências
extrabíblicas para um censo romano.
Primeiro, as fontes extrabíblicas não dão nomes aos governantes
romanos dessa região no período 4-1 a.C. Quirino pode ter sido
governador da Síria durante esse período e, portanto, o censo romano
pode ter sido concluído durante a vigência de seu mandato que
começou por volta da época da morte de Herodes.

295
Segundo, o adjetivo “primeiro” em Lucas 2.2 pode funcionar como
o advérbio “antes” como acontece em João 15.18, caso em que Lucas
estaria simplesmente se referindo a um censo que ocorreu antes do
1
recenseamento de 6 d.C., quando Quirino era governador da Síria.
C. Blomberg salientou que “algumas fontes antigas também falam
de Quirino liderando expedições militares nas províncias orientais do
Império Romano uma década antes [de 6 d.C.] de uma maneira que
poderia ser mais naturalmente explicada se ele tivesse algum posto
oficial na Síria (Tácito, Anais 3.48; Floro, História Romana 2.31)”.2
J. Vardaman defendeu um mandato anterior de Quirino na Síria
com base em uma suposta análise micrográfica de duas inscrições
fragmentárias em latim e sua obra não publicada foi endossada por J.
Finegan. Infelizmente, Vardaman nunca publicou as fotos das
inscrições micrográficas, de modo que sua obra não pôde ser
devidamente avaliada por outros estudiosos.
Embora alguns estudiosos tenham afirmado que o oficial não
identificado que serviu como legado da Síria mencionado na inscrição
Lapis Tiburtinus era Quirino e que isso confirma o relato de Lucas da
liderança de Quirino na Síria por volta da época do nascimento de
Jesus, R. Syme argumentou persuasivamente que o oficial não
identificado era, na verdade, L. Calpurnius Piso.3 O trabalho de Syme
confirmou a sabedoria da cautela que Sherwin-White expressou
quando advertiu: “uma inscrição sem título é na melhor das hipóteses
um aliado perigoso que pode mudar de lado a qualquer momento”.4
W. Ramsay descobriu uma inscrição em 1912 que se referia a um
colonizador em Antioquia da Pisídia, que serviu como um prefeito de
P. Sulpício Quirino, o principal magistrado, e como prefeito de M.

296
Servílio. Ramsay argumentou que Quirino foi legado da Síria ao
mesmo tempo em que Servílio foi legado da Galácia, no período
anterior a 6 a.C. Apesar de a interpretação de Ramsay sobre a
importância da inscrição envolver alguma especulação, suas alegações
5
ainda não foram refutadas.

1
Para um breve tratamento destas questões, veja Bock, Studying the Historical Jesus, p.

69-70. Para uma discussãao mais ampla, veja seu Luke 1.1-9.50, p. 903-9.
2
C. L. Blomberg, The Historical Reliability of the Gospels, 2. ed. (Downers Grove:

InterVarsity, 2007), p. 248 [publicado em português por Vida Nova sob o título A

confiabilidade histórica dos Evangelhos].


3
Veja R. Syme, “The Titulus Tiburtinus”, em: Vestigia: Akten des VI Internationalen

Kongresses für Griechische und Lateinische Epigraphik 1972, Beiträge zur Alten Geschichte

17 (Munich: Beck, 1972), p. 585-601.


4
A. N. Sherwin-White, Roman Society and Roman Law in the New Testament, Sarum

Lectures 1960-61 (Oxford: Clarendon, 1963), p. 165.


5
Veja W. M. Ramsay, “Luke’s Narrative of the Birth of Jesus”, The Expositor 4 (1912), p.

385-407, p. 481-507. Mais acessível é W. Ramsay, The Bearing of Recent Discovery on the

Trustworthiness of the New Testament, 4. ed. (London: Hodder & Stoughton, 1920), p. 275-

300. Uma fotografia da inscrição aparece na página 284.

Alguns estudiosos têm defendido que Herodes, o Grande, realmente


morreu no ano 1 a.C.135 Entretanto, teorias de uma morte mais tardia de
Herodes ou traduziram de forma equivocada os textos fundamentais que se
referem à sua morte, ou ignoram o fato de que todos os seus sucessores
apontam para o ano 5-4 a.C. ao datar o início de seus reinados; ou, ainda,
ignoram as referências de Josefo a acontecimentos contemporâneos à morte

297
de Herodes. A maioria dos estudiosos continua a afirmar 4 a.C. como o ano
em que Herodes morreu.136
Lucas afirmou que o nascimento de Jesus ocorreu durante o período do
censo romano ordenado por César Augusto. Ele ainda apontou a época do
censo associando-o com o governo de Quirino na Síria (Lc 2.1,2).137
Infelizmente, nenhum historiador antigo se refere a esse censo particular ou
ao papel de Quirino na Síria no período de Herodes. H. Hoehner sugeriu
que outros fatores históricos apontam para os anos 6 a 4 a.C. como as datas
mais prováveis para o recenseamento na Palestina. Herodes, o Grande, tinha
caído em desgraça com César. Herodes também estava muito doente e cada
um de seus filhos competia pelo trono. Um censo teria sido um passo lógico
para avaliar a situação na Palestina enquanto César se preparava para
indicar o sucessor de Herodes. Existem boas razões históricas para afirmar
a exatidão da descrição que Lucas de um recenseamento sob Quirino.138 No
entanto, sem referências extrabíblicas ao censo ou ao mandato de Quirino, o
recenseamento realmente não ajuda na determinação da data do nascimento
de Jesus.
Mateus 2.16 implica que pode ser que Jesus estivesse com até dois anos
de idade na época em que Herodes ordenou a matança das crianças. Isso
sugere que Jesus nasceu pelo menos no início de 6 a.C. No entanto, é
possível que Herodes tenha estendido a idade das crianças que ele matou
em Belém a dois anos, embora a estrela tenha aparecido bem antes disso,
para se certificar de que o Messias não escaparia de sua espada. Assim,
Jesus pode ter nascido em qualquer momento entre o fim de 7 a.C. e o
início de 4 a.C.
Tanto a igreja ocidental (25 de dezembro) quanto a igreja oriental (6 de
janeiro) celebram o nascimento de Jesus no inverno. Nenhum dos dados do

298
NT é incompatível com uma data no meio da estação.139 Se as datas
tradicionais se aproximarem da data real do nascimento de Jesus, é provável
que ele tenha nascido no inverno do ano 7-6 a.C., 6-5 a.C. ou 5-4 a.C.,
sendo 5 a.C. a data mais provável para o nascimento de Jesus.140

O Início dos Ministérios de João Batista e de Jesus


Lucas 3.1,2 data o início do ministério de João Batista com maior precisão
do que qualquer outro evento nos Evangelhos:

No décimo quinto ano do reinado de Tibério César, quando Pôncio Pilatos era governador da
Judeia, Herodes era governante da Galileia, seu irmão Filipe era governante da região da
Itureia e Traconites e Lisânias era governante de Abilene, quando Anás e Caifás eram sumos
sacerdotes, a palavra de Deus veio a João, filho de Zacarias, no deserto.

O método mais preciso para datar o início do ministério de João é


determinar o que Lucas considerava ser o décimo quinto ano de Tibério.
Embora Lucas pudesse ter contado o décimo quinto ano do reinado de
Tibério desde o início de uma alegada corregência com Augusto, isso é
improvável. Nenhuma das fontes antigas — incluindo Josefo, Apiano,
Plutarco, Tácito, Suetônio e Dião Cássio — adotou esse sistema. Muito
provavelmente, Lucas contou a partir da morte de Augusto (19 de agosto,
14 d.C.), do voto do senado romano aprovando Tibério como César
(setembro, 14 d.C.), ou do início do primeiro ano civil completo do reinado
de Tibério (15 d.C.).141 Esse ano pode ter começado em 1 de janeiro
(sistema romano), 1 de Nissan (março ou abril; sistema judaico), ou mesmo
1 de outubro (sistema siro-macedônico).
Embora seja impossível ter certeza, as opiniões mais prováveis são (1)
que Lucas começou seu cálculo na data da morte de Augusto, caso em que

299
o primeiro ano de Tibério estendeu-se de 19 de agosto de 14 d.C. a 18 de
agosto de 15 d.C.; ou (2) que Lucas calculou usando um sistema de
ascensão anual e contado o tempo de acordo com o recém-concebido
calendário juliano no qual o ano começava em 1 de janeiro, no qual o
primeiro ano de reinado de Tibério estendeu-se de 1 de janeiro de 15 d.C. a
31 de dezembro de 15 d.C.142 Consequentemente, o décimo quinto ano do
reinado de Tibério provavelmente ocorreu em datas que variam de 19 de
agosto de 28 d.C. a 31 de dezembro de 29 d.C. O ministério de João Batista
começou em algum momento durante esse período.
O ministério de Jesus provavelmente começou apenas alguns meses
depois do de João. Hoehner observou que se Jesus tivesse nascido no
inverno de 5/4 a.C., como sugerido há pouco, e se ele tivesse sido batizado
no verão do ano 29, ele teria tido 32 anos de idade na época em que
começou o seu ministério público.143 Isso concorda com a declaração de
Lucas 3.23 de que Jesus estava com “cerca” de 30 anos idade quando
começou seu ministério público.
Essa cronologia se encaixa com outra pista importante que aparece em
João 2.20. Durante a primeira Páscoa de Jesus em Jerusalém, após o início
do seu ministério, os judeus adversários de Jesus forneceram uma referência
importante e muito útil para o estabelecimento de datas para o ministério de
Jesus ao mencionar a construção do Templo de Herodes. Infelizmente, a
maioria das principais traduções da Bíblia interpreta de maneira inadequada
o real significado do texto grego. As traduções de João 2.20 na TNIV,
HCSB e NRSV implicam que a conversa ocorreu 46 anos após o início da
construção do templo e que este ainda estava em construção. No entanto, a
gramática grega e as referências extrabíblicas à reconstrução do templo
parecem implicar que a conversa ocorreu 46 anos após a conclusão da

300
construção dele. Daí a tradução “este santuário foi construído 46 anos atrás”
pode ser superior à tradução “este santuário demorou 46 anos para ser
edificado”.144 De acordo com uma referência em Josefo, Herodes iniciou a
construção do templo no décimo oitavo ano do seu reinado, o mesmo ano
em que Augusto chegou à Síria.145 A chegada de Augusto à Síria ocorreu na
primavera ou no verão de 20 a.C.146 Isso significa que o décimo oitavo ano
de Herodes teria se estendido de 1 de Nisã de 20 a.C. a 1 de Nisã de 19 a.C.,
se partirmos do pressuposto de que Josefo usou o método do ano de
ascensão ao trono para o cálculo da duração do reinado. Embora a
construção de todo o complexo do Templo (hieron) tenha continuado até 64
d.C., Josefo observou que o interior do santuário (naos) do Templo foi
concluído pelos sacerdotes em apenas 18 meses. Assim, quando os judeus
se referiram ao Templo (naos) em João 2.20, eles estavam falando do
santuário interior, que tinha sido concluído em 18/17 a.C.147 A Páscoa 46
anos após a conclusão do santuário ocorreria na primavera de 30 d.C. Essa
data confirmaria que Jesus começou seu ministério no verão ou no outono
de 29 d.C.148

301
A Duração do Ministério de Jesus
Os Evangelhos Sinóticos se referem a Jesus visitando Jerusalém apenas
uma vez durante todo o seu ministério. Mas o Evangelho de João se refere a
Jesus visitando Jerusalém três vezes para a Páscoa, sem contar as visitas
relacionadas a outras festas judaicas.149 Hoje, a maioria dos estudiosos
afirma a exatidão do Evangelho de João nesse ponto. Isso não quer dizer
que os Evangelhos Sinóticos estão errados. Embora mencionem apenas uma
visita de Páscoa a Jerusalém, eles não negam que outras visitas de Páscoa
ocorreram durante o ministério de Jesus. Em geral, parece que João se
preocupava ainda mais com a cronologia do ministério de Jesus do que os
demais escritores sinóticos. Além disso, João tem um notável interesse em
mostrar que Jesus cumpriu o simbolismo subjacente a várias festas judaicas
e, portanto, narra as visitas de Jesus a Jerusalém por ocasião das festas
religiosas, incluindo a Páscoa.
A primeira visita de Jesus a Jerusalém na Páscoa durante o seu
ministério ocorre em João 2.13,23; uma visita posterior a Jerusalém,
durante a Páscoa, acontece em João 6.4; e uma visita final a Jerusalém, na
Páscoa, é registrada em João 11.55; 12.1; 13.1; 18.28,39; e 19.14. No
entanto, João não necessariamente registrou todas as visitas a Jerusalém no
período da Páscoa, durante o ministério de Jesus. Ele pode ter omitido as
referências a uma Páscoa em particular, assim como os escritores sinóticos
fizeram. H. Hoehner alegou que uma comparação dos Sinóticos com João
sugere que outra Páscoa ocorreu entre a Páscoa em João 2.13,23 e a de João
6.4.150 Um ano a mais de ministério entre essas duas Páscoas pode ser
necessário para acomodar o ministério de Jesus na Judeia, Galileia e

302
Samaria durante esse período e para permitir as várias estações descritas
nos relatos dos Evangelhos.151
Ao se afirmar que o ministério de Jesus incluiu apenas três Páscoas, seu
ministério durou aproximadamente dois anos e meio.152 Ao se permitir outra
a Páscoa entre a primeira e a segunda Páscoas explicitamente mencionadas
por João, o ministério de Jesus durou cerca de três anos e meio, e isso
parece mais provável.153

A Morte de Jesus
Os estudiosos geralmente datam a morte de Jesus a 30 ou 33 d.C., e as duas
datas são possíveis. No entanto, a preponderância das evidências analisadas
acima sugere que Jesus foi crucificado em 33 d.C.
Jesus foi crucificado numa sexta-feira e ressuscitou em um domingo. Os
Evangelhos afirmam explicitamente que ele foi executado na sexta-feira, o
dia da preparação para o sábado (Mt 27.62; Mc 15.42; Lc 23.54; Jo 19.14,
31,42). Porque Jesus claramente ressuscitou dentre os mortos no domingo e
porque Mateus 12.40 afirma que o Filho do Homem estaria no coração da
terra “três dias e três noites”, alguns intérpretes têm argumentado que Jesus
foi crucificado em uma quarta ou em uma quinta-feira. No entanto, vários
textos do AT sugerem que expressão “três dias e três noites” (que ocorre
apenas em Mateus 12.40) pode funcionar como uma expressão idiomática
para qualquer parte de um dia, mais um dia inteiro, mais uma parte do dia
(Gn 42.17,18; 1Sm 30.12,13; 2Cr 10.5,12; Et 4.16 a 5.1). Esse método de
cálculo do tempo também foi afirmado na literatura rabínica.154 Jesus
aparentemente usou a expressão “três dias e três noites” de forma

303
semelhante. Isso é confirmado pelas referências frequentes à sua
ressurreição ocorrendo “ao terceiro dia” (cf. Mt 16.21; 17.23; 20.19; 27.64).
Os Evangelhos deixam claro que Jesus participou da Última Ceia na
véspera de sua crucificação (Mt 26.20; Mc 14.17; Lc 22.14; Jo 13.2), e isso
é confirmado por Paulo (1Co 11.23). Os Evangelhos também retratam a
Última Ceia como compartilhada em conjunto com a refeição da Páscoa.
Alguns estudiosos argumentaram que o Evangelho de João não retrata a
Última Ceia como uma refeição Pascal, mas apresenta, em vez disso, a
crucificação de Jesus como ocorrendo na época da Páscoa a fim de retratar
a morte de Jesus como o sacrifício do cordeiro Pascal. No entanto, a leitura
mais natural da referência ao “dia da preparação da Páscoa” refere-se ao dia
de preparação do sábado durante a semana da Páscoa, a sexta-feira da
celebração da Páscoa.155 A palavra traduzida como “dia da preparação”
(paraskeuē) era a palavra normal para sexta-feira. Essa interpretação é
confirmada por João 19.31: “Visto que era o dia da preparação, os judeus
não queriam que corpos permanecessem na cruz no sábado (pois aquele
sábado era um dia especial)”. Tanto os Sinóticos quanto João apresentam a
Última Ceia como a refeição Pascal e mostram que Jesus foi executado na
sexta-feira da semana da Páscoa. Assim, não há absolutamente nenhum
conflito real entre os relatos.
Os judeus participavam da refeição Pascal em 14 de Nissan. Assim, o
ano da execução de Jesus deve ser um ano em que 14 de Nissan caiu em
uma quinta-feira. Isso possivelmente ocorreu em 30 d.C. e, definitivamente,
ocorreu no ano 33,156 uma vez que 30 d.C. não daria tempo suficiente entre
o batismo e a morte de Jesus para seu extenso ministério público, a não ser
que se pressuponha que Josefo ou Lucas usou métodos incomuns de

304
cômputo de tempo ou que o ministério de Jesus durou apenas um ou dois
anos, o ano mais provável da morte de Jesus é 33 d.C.

Tabela 3.3: Cronologia da Vida de Jesus


Dados Importantes para a
Data Evento
Datação do Evento
c. 5 a.C. Nascimento de Jesus Morte de Herodes, o Grande
(4 a.C.) (Mt 2.13-20)
28-29 Início do ministério de João Décimo quinto ano do
Batista governo de Tibério (Lc 3.1)
29 Início do ministério de 46 anos desde o término da
Jesus renovação do Templo (Jo
2.20)
33 Morte de Jesus Ocorrência de 14 de Nissan
em uma quinta-feira

Conclusão
Jesus provavelmente nasceu entre 6 e 4 a.C. (sendo 5 a.C. a data mais
provável) e começou seu ministério público em torno de 29 d.C. Seu
ministério aparentemente durou cerca de três anos e meio e envolveu três
ou quatro celebrações da Páscoa. Sua crucificação provavelmente ocorreu
em 33 d.C.

A CONFIABILIDADE HISTÓRICA DOS


EVANGELHOS
Como mencionado, os retratos contemporâneos de Jesus variam
consideravelmente. Isso é, em grande parte, uma função de quais fontes os

305
estudiosos privilegiam na sua reconstrução da identidade de Jesus. Alguns
estudiosos preferem fontes como o Evangelho de Tomé ou o Evangelho de
Pedro a Mateus, Marcos, Lucas e João, porque eles estão convencidos que
os quatro Evangelhos do NT são relatos não confiáveis da vida e dos
ensinamentos de Jesus. O Seminário de Jesus, que classificou o Evangelho
de Tomé como um “quinto Evangelho”, chocou muitos cristãos com sua
confiante afirmação de que apenas 18% das palavras atribuídas a Jesus nos
Evangelhos foram realmente ditas por ele.157 Tais refutações
indiscriminadas dos Evangelhos por certos críticos podem facilmente levar
os cristãos a se perguntar se o valor histórico dos quatro Evangelhos é, de
algum modo, passível de salvação. O propósito desta seção é ajudar os
leitores a compreender os pressupostos e os processos que levaram alguns
estudiosos a essas conclusões. Ele também demonstra que evidências
convincentes podem ser oferecidas para a confiabilidade dos Evangelhos.

Os Fundamentos Filosóficos do Estudo Moderno


dos Evangelhos
Muitos leitores podem presumir que a maioria dos estudiosos rejeita a
confiabilidade dos Evangelhos porque uma análise cuidadosa descobre
irreconciliáveis conflitos entre os Evangelhos ou com outros relatos
históricos. De fato, muitos estudiosos rejeitam a confiabilidade dos
Evangelhos por razões muito diferentes. Eles o fazem porque os relatos do
Evangelho descrevem eventos que eles consideram impossíveis. Jesus não
poderia ter controlado o clima, purificado os leprosos, dado visão aos cegos
ou ressuscitado dos mortos porque esses estudiosos têm uma visão
modernista de mundo, que nega a possibilidade de tais ocorrências. Para

306
esses estudiosos, os únicos eventos possíveis são aqueles que podem ser
explicados como os efeitos de causas naturais. Em outras palavras, muitos
estudiosos abordam a história através de seu compromisso filosófico com o
naturalismo.
A negação até mesmo da possibilidade de ocorrências milagrosas ou
sobrenaturais é, em última instância, impulsionada pelo ateísmo, deísmo ou
monismo. O ateísmo nega a existência de Deus. O deísmo reconhece sua
existência, mas o vê como aquele que governa o universo apenas através de
leis naturais e à parte de qualquer intervenção direta. O monismo equipara a
natureza e suas leis à divindade. Nessas três cosmovisões, milagres no
sentido de atos de um Deus pessoal simplesmente não existem, quer porque
não existe um Deus pessoal, quer porque Deus não age de uma maneira que
seja inconsistente com a lei natural.
O ceticismo quanto à possibilidade de milagres tem uma longa história.
Um século antes da época de Cristo, Cícero (106-43 a.C.) argumentou:
“Pois nada pode acontecer sem causa; nada acontece que não pode
acontecer, e quando o que era capaz de acontecer já aconteceu, não pode ser
interpretado como um milagre. Consequentemente, não existem
milagres”.158 Cerca de 300 anos mais tarde, Luciano de Samósata expressou
seu ceticismo sobre possessão demoníaca e exorcismo.159 Embora se assuma
frequentemente que os povos antigos eram crédulos, supersticiosos e
facilmente enganados pelas reivindicações de milagres, alguns desses povos
eram tão céticos como alguns pensadores modernos. Rejeição de
ocorrências sobrenaturais não é um fenômeno novo.
A rejeição generalizada dos milagres na era moderna pode ser atribuída
aos escritos do filósofo judeu B. de Espinosa. Sua obra Tractatus
Theologico-Politicus [Tratado Teológico-Político], que foi publicada em

307
1670, apresentou uma crítica naturalista dos milagres na qual Espinosa
afirmou que a ideia de milagres era autocontraditória, pois dizer que Deus
realizou algum ato contrário às leis da natureza era implicar que ele age
contrariamente à sua própria natureza.160 Espinosa identificou as leis da
natureza com a natureza de Deus porque ele era um monista que via a
própria natureza como Deus. Embora o trabalho de Espinosa tenha
provocado algumas das críticas mais ferozes e mordazes sobre qualquer
obra publicada no século XVII, a obra de muitas maneiras estabeleceria o
tom para os pontos de vista do sobrenatural no período do Iluminismo.
A obra de Espinosa abriu o caminho para os deístas críticos que deram
início ao movimento hoje conhecido como a “busca do Jesus histórico”. Os
deístas sentiam que o verdadeiro Jesus tinha sido obscurecido nos
Evangelhos. Os relatos de sua atividade milagrosa nos Evangelhos foram
considerados impossíveis em seu sistema filosófico. Na opinião deles,
noções piedosas da inspiração dos Evangelhos não poderiam mais ser
acolhidas por pensadores racionais. As lendas dos milagres de Jesus e sua
alegação de ser divino deveriam ser retiradas do Evangelho a fim de que se
recuperasse as tradições confiáveis sobre Jesus.
Em 1730, o deísta inglês M. Tindal negou que a Bíblia era a revelação
especial e convocou outros a que voltassem à religião original, que foi
estabelecida na interpretação racional da revelação natural. As alegações de
Tindal comprometiam seriamente a autoridade da Bíblia e enfraqueciam a
hipótese de que se podia confiar nos relatos dos Evangelhos sobre a vida e
ministério de Jesus simplesmente porque eles faziam parte da Escritura
inspirada.161
Durante os anos 1727-30, T. Woolston publicou sua obra Six Discourses
on the Miracles of our Saviour and Defences of His Discourses [Seis

308
discursos sobre os milagres do nosso Salvador e defesas de seus discursos],
na qual ele alegou que os milagres de Jesus eram “improbabilidades e
incredibilidades e os mais grosseiros absurdos”. Woolston argumentou que
uma leitura de senso comum dos relatos dos milagres de Jesus levou à
conclusão de que esses atos foram imorais ou insanos, ações que nunca
foram igualadas por nenhum “charlatão”. Woolston guardou sua crítica
mais intensa dos milagres de Jesus para a ressurreição. Ele argumentou que
a ressurreição de Cristo foi uma fraude. Para ele, os discípulos de Jesus
tinham roubado seu corpo e então pessoas supersticiosas, que tinham por
hábito ver aparições, interpretaram o sepulcro vazio como uma prova da
ressurreição. Woolston alegou que os milagres dos Evangelhos eram
sensatos e úteis apenas quando interpretados alegoricamente. W. Baird
comentou: “Essa negação da historicidade dos milagres tocou um acorde
responsivo em uma época em que a crença no sobrenatural estava
evaporando, quando acreditava-se que o universo era ordenado pela lei de
Newton, e quando os fenômenos físicos eram atribuídos a causas
naturais”.162 Embora a maioria dos deístas não fosse estudiosa da Bíblia e
seu trabalho “pudesse ter sido realizado por qualquer cético brilhante com a
ajuda da versão bíblica King James”, eles de fato exerceram influência na
estudiosos das gerações posteriores.163
D. Hume rejeitou milagres em sua obra Enquiry Concerning Human
Understanding [Inquérito sobre a compreensão humana], ele alegou que
nenhum suposto milagre havia sido testemunhado por um grupo
suficientemente grande de observadores para garantir que as testemunhas
não haviam sido enganadas ou que elas mesmas não estavam enganando a
outros. Ele acrescentou que as pessoas geralmente desejam uma
manifestação do sobrenatural e acreditam em relatos milagrosos mais

309
rapidamente do que deveriam. Também argumentou que os milagres só
ocorrem entre os povos primitivos e supersticiosos. Finalmente, ele afirmou
que, uma vez que as principais religiões apelam para os milagres para dar
suporte às suas alegações concorrentes, os apelos aos milagres para apoiar a
veracidade do cristianismo não são convincentes.164
A crítica inicial de Espinosa aos milagres muito influenciou F.
Schleiermacher, filósofo e teólogo geralmente reconhecido como o pai da
teologia liberal. Schleiermacher expressou a crítica de Espinosa com um
novo grau de sofisticação, mas o argumento foi essencialmente o mesmo
que o de Espinosa, cuja influência é evidente na seguinte citação:

Agora, alguns representaram milagre nesse sentido [absoluto] como essencial para a perfeita
manifestação da onipotência divina. Mas é difícil conceber, por um lado, como a onipotência
é mostrada como sendo maior na suspensão da interdependência da natureza do que no seu
curso imutável original, que não foi menos divinamente ordenado. Porque, na verdade, a
capacidade de fazer uma mudança no que foi ordenado é apenas um mérito do ordenador, se
uma mudança é necessária, que por sua vez só pode ser resultado de alguma imperfeição em
si ou em sua obra.165

Assim como Espinosa, Schleiermacher via a história como um sistema


fechado de causas e efeitos necessários, um “curso original imutável” e
“divinamente ordenado” no qual até mesmo o próprio Deus não pode se
intrometer. W. Dembski ofereceu um resumo útil da visão de Espinosa e
Schleiermacher:

Essencialmente, Espinosa e Schleiermacher apresentam Deus como alguém que trancou a


porta e jogou a chave fora, e então eles perguntam se Deus pode voltar para a sala. Uma vez
que Deus supostamente faz a melhor fechadura do mercado, mesmo Deus não é capaz de
voltar para a sala sem uma chave. Ao ordenar um sistema da natureza, Deus constrói um
sistema fechado de causas naturais, que de maneira nenhuma acomoda milagres.166

310
Ideias semelhantes aparecem nos escritos do influente estudioso do NT,
R. Bultmann. A famosa frase de Bultmann foi: “O conhecimento dos
homens e seu domínio do mundo avançaram de tal forma por meio da
ciência e da tecnologia que já não é possível que ninguém seriamente
sustente a visão de mundo do NT”.167 Bultmann liderou um movimento
radical nos estudos do NT que rejeitou a noção de um universo com três
histórias, bem como o nascimento virginal, a ressurreição e os milagres de
Jesus. Como Espinosa e Schleiermacher, ele pressupôs que Deus não
poderia intervir no processo natural.168 A cosmovisão de Bultmann o levou
a rejeitar a confiabilidade da maioria do material nos Evangelhos. Ele
insistiu: “É impossível usar a luz elétrica e os dispositivos que não utilizam
fios e nos beneficiar das modernas descobertas médicas e, ao mesmo tempo,
acreditar no mundo dos demônios [sic] e espíritos do Novo Testamento”.169
Ele também afirmou: “Um evento histórico que envolve uma ressurreição
dos mortos é totalmente inconcebível”.170 Bultmann, em última instância,
havia perdido a esperança de encontrar qualquer informação confiável
acerca de Jesus nos Evangelhos. Ele escreveu: “Eu realmente acredito que
agora não podemos saber quase nada sobre a vida e a personalidade de
Jesus”.171 Sua rejeição ao testemunho dos Evangelhos estava baseada em
sua visão da ciência e da filosofia.
Não é o propósito desta introdução provar a existência de um Deus
pessoal ou sua intervenção no mundo de hoje. Outros excelentes recursos
na apologética cristã estão disponíveis para orientar os leitores na
exploração de evidências para essas afirmações cristãs.172 No entanto, os
leitores devem estar alertas para os pressupostos filosóficos que subjazem
diferentes abordagens do estudo dos Evangelhos. As conclusões da
abordagem não são melhores que os pressupostos que as orientam. Muitos

311
cristãos adotam abordagens especiais no estudo dos Evangelhos e tiram
conclusões da aplicação delas sem perceber que a filosofia que ditou a
abordagem é contrária às suas mais estimadas convicções.
É cada vez mais evidente no início do século XXI que a filosofia que
norteou o estudo cético dos Evangelhos falhou. Apesar do reinado da
filosofia modernista na educação ocidental durante mais de um século, a
maioria dos americanos acredita que a existência e a intervenção de Deus é
autoevidente. De acordo com uma pesquisa realizada em 2006 pelo Grupo
de Pesquisa Barna, 71% dos adultos americanos acreditam “no onipotente,
onisciente, perfeito criador do universo, que governa o mundo hoje”.173 O
censo Harris de 2003 descobriu que 84% dos adultos norte-americanos
acreditam em milagres e que 72% daqueles que têm pós-graduação
acreditam em milagres.174 Essa crença generalizada é provavelmente um
resultado de experiências pessoais que os participantes consideraram
milagrosas ou o resultado de testemunhos pessoais sobre milagres
experimentados por pessoas que eram consideradas críveis. As experiências
pessoais substituíram a filosofia reinante e levaram a uma rejeição
generalizada das afirmações naturalistas. Essa rejeição é legítima, uma vez
que uma filosofia aceitável deveria explicar experiências reais.175
O ponto dessa discussão é que a rejeição da confiabilidade histórica dos
Evangelhos por muitos estudiosos contemporâneos não é geralmente
baseada na evidência histórica que questiona o testemunho dos relatos do
Evangelho. Antes, essa rejeição está fundamentada nos pressupostos
filosóficos dos estudiosos, pressupostos estes que a maioria dos americanos
corretamente rejeita porque não consegue explicar as experiências pessoais
e as percepções da realidade. Quando se supera preconceitos filosóficos
contra os relatos que descrevem acontecimentos sobrenaturais tais como

312
encarnação, nascimento virginal, exorcismo, milagre e ressurreição,
descobre-se que a evidência para a confiabilidade histórica dos Evangelhos
é bastante atraente.

Os Critérios de Autenticidade
Alguns estudiosos rejeitam a confiabilidade histórica dos Evangelhos
porque tentaram utilizar meios objetivos de testar se ditos ou eventos
específicos registrados nos Evangelhos podem ser rastreados até Jesus.
Muitos estudiosos acreditam que o único material que pode ser considerado
fidedigno nos Evangelhos é aquele que satisfaz critérios específicos, ou
seja, os chamados “critérios de autenticidade”. Esses critérios foram
desenvolvidos e aperfeiçoados pela crítica da forma e da redação do início e
meados do século XX. Embora um estudioso tenha elaborado uma lista de
176
25 critérios aplicados nas pesquisas mais recentes sobre o Jesus histórico,
esta seção trata somente dos quatro mais amplamente reconhecidos: (1)
múltiplas atestações ou formas; (2) ambiente ou língua palestinos; (3)
dissimilaridade; e (4) coerência.

O critério de múltiplas atestações ou formas


Esse critério sugere que o material sobre Jesus é provavelmente autêntico se
aparece em duas ou mais fontes antigas que não dependam uma da outra. F.
C. Burkitt primeiro sugeriu que a localização do material que apareceu
tanto em Marcos quanto em Q era “a melhor aproximação que nós podemos
esperar obter para a tradição comum da sociedade cristã mais antiga sobre
as palavras do Senhor”.177 Estudiosos posteriores expandiram os critérios
para incluir não apenas o material em Marcos e Q, mas também em M

313
(material exclusivo de Mateus), L (material exclusivo de Lucas), João,
outros escritos do NT e as fontes extrabíblicas, tais como o Evangelho de
Tomé. O ensinamento de Jesus sobre o divórcio, por exemplo, é atestado
por três fontes independentes: Marcos 10.2-12 (Mt 19.3-12), Q (Mt 5.32 //
Lc 16.18) e Paulo (1Co 7.10,11) e, portanto, deve ser considerado como
autêntico de acordo com esse critério.
C. H. Dodd afirmou que o material que apareceu em múltiplas formas
também era provavelmente mais antigo e, possivelmente, autêntico.178 As
diversas formas tinham sido definidas pela crítica da forma que procurou
traçar a história da tradição oral por trás dos Evangelhos. As formas
escolhidas incluíam aforismos, parábolas, diálogos e histórias de milagres.
Por exemplo, uma vez que Jesus proclamou de múltiplas formas que o reino
de Deus havia chegado, incluindo um aforismo (Mt 5.17), parábolas (Mt
9.37,38; Mc 4.26-29), ditos poéticos (Mt 13.16,17) e diálogos (Mt 12.24-
28), a insistência de que o reino de Deus havia chegado foi provavelmente
um tema autêntico dos ensinamentos de Jesus.
S. Porter apontou vários problemas relacionados à aplicação desse
critério.179 Mais importante, o critério é capaz de estabelecer temas gerais
do ensino de Jesus, mas não costuma permitir que estudiosos reconstruam
as palavras do próprio Cristo. Além disso, o apelo a múltiplas fontes
independentes agora é complicado pela recente rejeição da solução que já
era amplamente aceita em relação ao Problema Sinótico.180 Mais
importante, enquanto o critério da múltipla atestação pode permitir ao
pesquisador confirmar a autenticidade do material dos Evangelhos pelo lado
positivo, de modo inverso, é inadequado por não levar em consideração o
material atestado em apenas uma fonte, uma vez que não há uma boa razão
para rejeitar o material como autêntico simplesmente porque, por exemplo,

314
determinado feito de Jesus foi registrado apenas uma vez. Isso aponta para
uma notória limitação no uso desse critério.

O critério do ambiente ou língua palestinos


Do século XVII até a era moderna, o critério do ambiente ou língua
palestinos tem servido como um índice para avaliar o material associado a
Jesus. Esse critério sugere que uma seção de material nos Evangelhos é
provavelmente autêntica se parecer ser uma tradução suficientemente literal
de uma língua semítica original (hebraico ou aramaico) para o grego. A
lógica por trás desse critério é a observação de que o grego se tornou
rapidamente o idioma predominante da igreja. O material criado pela igreja
teria sido originalmente composto em grego e não possuiria características
semíticas. Portanto, o material que preserva vocabulário, gramática, ou
estilo semítico é muito antigo e, provavelmente, deve ser autêntico.
Um exemplo da linguagem palestina aparece em Mateus 5.13. Apesar
de a maioria das traduções modernas se referir a “perdendo seu sabor”, o
verbo traduzido dessa forma (mōranthē) não significa “perder o sabor” em
nenhum outro lugar em toda a literatura antiga. O verbo normalmente
significa “tornar-se tolo, perder a cabeça ou ser mentalmente incapacitado”,
um significando que não faz muito sentido nesse contexto. O uso intrigante
do verbo grego aqui é provavelmente um subproduto da tradução grega de
um dito aramaico original. Em hebraico e aramaico, a raiz tpl pode
significar “ser tolo” (Jó 1.22; 24.2; Jr 23.13) ou “ser sem sal, sem graça,
insípido” (Jó 6.6). A evidência de um aramaico original aqui sugere tanto a
antiguidade quanto a autenticidade do dito.181

315
O critério do ambiente palestino sugere que o material provavelmente é
muito antigo e possivelmente autêntico se ele se referir aos costumes,
características geográficas ou crenças características de Palestina do
primeiro século. A probabilidade da antiguidade e autenticidade do material
aumenta se o conhecimento do ambiente palestino exibido no relato tiver
sido de alguém com familiaridade pessoal com esse ambiente. Por exemplo,
a descrição bem específica dos cinco pórticos do tanque de Betesda perto da
Porta das Ovelhas em João 5.2 foi confirmada através de escavações
arqueológicas.182 A descrição sugere fortemente que o autor do Evangelho
de João era pessoalmente familiarizado com a cidade de Jerusalém antes da
queda da cidade no ano 70 e que, portanto, teve acesso às autênticas
tradições sobre Jesus ou foi, ele mesmo, uma testemunha ocular do
ministério de Jesus.
Como no caso do critério da múltipla atestação, o presente critério do
ambiente ou língua palestinos pode servir positivamente como uma
indicação da autenticidade do material incluído nos Evangelhos. Ao mesmo
tempo, deve-se ter o cuidado de não desqualificar material cuja
autenticidade não pode ser estabelecida através da utilização deste critério,
uma vez que outros critérios podem afirmar a sua autenticidade. Além
disso, também deve-se ter sempre em mente as limitações inerentes de
qualquer critério de autenticidade do material dos Evangelhos.

O critério de dissimilaridade
Esse critério sugere que o material nos Evangelhos é autêntico se os ditos
ou feitos de Jesus registrados no relato forem diferentes dos esperados do
judaísmo de sua época ou das práticas e da teologia da igreja primitiva.

316
Primeiramente formulado por W. Heitmüller e P. W. Schmiedel, foi
popularizado por R. Bultmann, que escreveu: “Nós apenas podemos contar
com possuir uma semelhança verdadeira de Jesus, onde, por um lado,
expressão é dada ao contraste entre a moralidade e a piedade judaica e o
temperamento escatológica distintivo que caracterizava a pregação Jesus, e
onde, por outro lado, não encontramos características especificamente
cristãs”.183 A intenção do critério é descartar materiais que podem ter se
originado nos círculos judaicos ou que podem ter sido inventados pelos
primeiros cristãos. Aplicação do critério estabelece a autenticidade de
material tal como Mateus 8.22, segundo o qual Jesus disse: “Deixa os
mortos sepultarem seus próprios mortos”. É improvável que esse dito tenha
se originado de tradições judaicas ou do ensino da comunidade cristã.184
Infelizmente, esse critério tem sido muitas vezes mal aplicado. Isso
porque não apenas todo material que satisfaz o critério é aceito como
autêntico, mas também material que não satisfaz o critério é algumas vezes
rejeitado como não autêntico. Essa má aplicação do critério resulta na
descrição absurda de um judeu do primeiro século que de maneira nenhuma
reflete sua origem judaica e um mestre cujos ensinamentos foram
completamente abandonados pela igreja que ele fundou. Por essa razão,
muitos dos estudiosos de hoje raramente aplicam esse critério e alguns deles
até mesmo defendem a sua completa não aplicação.185
G. Theissen e D. Winter pediram recentemente que o critério fosse
substituído por um critério de plausibilidade histórica. Esse critério tem
quatro elementos:

1. Adequabilidade contextual: “O que Jesus disse e pretendia dizer deve


ser compatível com o judaísmo da primeira metade do primeiro século
na Galileia”.

317
2. Distinção contextual: “O que Jesus fez e pretendia fazer deve ser
reconhecido como que de uma figura individual no âmbito do
judaísmo daquela época”.
3. Coerência da fonte: “A coerência de características duradouras que
persistiram apesar da variedade de tendências existentes na pluralística
comunidade cristã primitiva”.
4. Resistência às tendências da tradição: “Aqueles elementos contidos na
tradição de Jesus que contrastam com os interesses das antigas fontes
cristãs, mas são transmitidos em suas tradições, podem reivindicar
diferentes graus de plausibilidade histórica”.186

N. T. Wright sugeriu uma modificação semelhante do critério de


dissimilaridade. Ele chamou sua modificação de “critério de dupla
similaridade e dupla dissimilaridade”. Wright alegou que nenhuma pessoa
histórica difere muito radicalmente de seu contexto imediato. Também
poderia se esperar uma continuidade significativa entre o fundador de um
movimento e seus primeiros seguidores. No entanto, um líder
verdadeiramente distintivo será diferente dos outros de seu contexto em
diferentes aspectos importantes, e seus seguidores podem revelar-se
totalmente incapazes de imitá-lo. Assim, o Jesus histórico deveria ser tanto
semelhante como diferente não só dos outros judeus do primeiro século,
mas também de seus primeiros discípulos.187 Modificações como essas são
necessárias para que esse critério possa dar uma contribuição positiva para
os estudos sobre Jesus.

O critério de coerência

318
Esse critério, também chamado “critério de consistência ou conformidade”,
simplesmente estipula que o material provavelmente é antigo e autêntico se
for coerente com materiais considerados autênticos com base em outros
critérios. Como J. P. Meier observou, “o critério de coerência defende que
outros ditos e feitos de Jesus que combinam com a ‘base de dados’
preliminar estabelecida pelo uso dos nossos três primeiros critérios têm uma
boa chance de ser históricos (por exemplo, ditos sobre a vinda do reino de
Deus ou discussões com os adversários sobre a observância da lei)”.188
Usada adequadamente, a aplicação desse critério tem o potencial de
ampliar significativamente a quantidade de material considerado autêntico
nos Evangelhos. Ao mesmo tempo, Meier justamente advertiu que “deve-
se, contudo, ter a cautela de utilizá-lo [o critério da coerência]
negativamente, isto é, declarar não autêntico um dito ou uma ação por não
parecer ser consistente com palavras ou atos de Jesus já declarados
autênticos por outros critérios”.189 Não se deve descartar a possibilidade de
que Jesus proferiu declarações que o distinguiam de outros líderes
religiosos de sua época.

319
Tabela 3.4: Pesquisa do Jesus Histórico — Critérios de Autenticidade
Critério Definição
Critério de Múltipla O material sobre Jesus é provavelmente
Atestação autêntico se aparecer em duas ou mais
fontes antigas independentes.
Critério do Ambiente Uma seção de material nos Evangelhos é
Palestino provavelmente autêntica se parecer ser uma
tradução bem literal do idioma semítico
(hebraico e aramaico) para o grego.
Critério de Dissimilaridade O material nos Evangelhos é autêntico se os
ditos ou ações de Jesus registrados no relato
forem diferentes dos esperados do judaísmo
ou das práticas e da teologia da igreja
primitiva de sua época.
Critério de Coerência O material é provavelmente antigo e
autêntico se for compatível com o material
considerado autêntico por outros critérios.

Avaliação dos Critérios


Esses critérios podem ser úteis para demonstrar a confiabilidade histórica
dos Evangelhos se forem devidamente aplicados. No entanto, pelo menos
três problemas estão associados a eles.
Primeiro, alguns estudiosos não aplicam os critérios de forma
consistente. Em vez disso, eles os manipulam para criar um retrato de Jesus
que esteja de acordo com suas expectativas. O Seminário de Jesus, por
exemplo, afirmava respeitar os critérios-padrão de autenticidade, mas
eventualmente recusava muito material autenticado por esses critérios.190
Segundo, alguns estudiosos abusam do critério ao assumir
automaticamente que o material não estabelecido como autêntico pela

320
aplicação dos critérios é necessariamente inautêntico, uma imaginativa
criação da igreja primitiva.
Terceiro e mais importante, os critérios de autenticidade colocam um
excessivo ônus da prova sobre o material do Evangelho. Os historiadores
geralmente aceitam a confiabilidade histórica de fontes antigas, a menos
que haja boas razões para não fazê-lo. Na linguagem jurídica, as fontes são
consideradas inocentes até que seja provado o contrário. No entanto, os
critérios de autenticidade são muitas vezes aplicados como se os
Evangelhos do NT fossem culpados até que se provem inocentes. C.
Blomberg observou:

Uma vez que se aceite o fato de que os Evangelhos refletem tentativas de se escrever uma
história ou biografia confiável, não importando o quão teológica ou estilizada sua
apresentação possa ser, então deve-se imediatamente reconhecer um importante pressuposto
que orienta a maioria dos historiadores em seus trabalhos. A menos que haja uma boa razão
para acreditar no contrário, deve-se assumir que um dado detalhe na obra de um historiador
em particular é factual. Esse método coloca o ônus da prova justamente sobre a pessoa que
duvidar da confiabilidade de determinada parte do texto. A alternativa é presumir que o texto
não é confiável, salvo se evidência convincente puder ser apresentada em seu apoio.
Enquanto muitos estudiosos críticos dos Evangelhos adotam esse método, ele é totalmente
injustificado pelos cânones normais de historiografia. Estudiosos que consistentemente
aplicarem esse método quando estudam outros escritos históricos antigos encontrariam dados
comprobatórios tão insuficientes que a grande maioria da história aceita teria de ser
recusada.191

Embora os critérios de autenticidade representem um preconceito contra


a confiabilidade dos Evangelhos que geralmente não caracterizam o mesmo
tratamento que os historiadores dão a outros registros antigos, esses
critérios podem servir para estabelecer a confiabilidade histórica de uma
grande percentagem do material nos Evangelhos se forem aplicados de
forma imparcial e consistente. A menos que se imponha uma dupla função
sobre os critérios com os quais eles autenticam alguns materiais e invalidam

321
todos os demais, a grande percentagem de material autenticado pelos
critérios fortemente implica a confiabilidade geral histórica dos Evangelhos.
Trocando em miúdos, se os autores dos quatro Evangelhos conservaram
a história exata na grande porcentagem de material estabelecida pelos
critérios de autenticidade, os estudiosos são justificados ao assumir que os
evangelistas preservaram a história exata também em outros materiais em
seus Evangelhos.
Além disso, esses critérios de autenticidade estabelecem a
confiabilidade histórica dos relatos dos Evangelhos da atividade
sobrenatural de Jesus, incluindo os exorcismos, milagres e sua própria
ressurreição.192 Assim, esses critérios exigem uma nova avaliação dos
compromissos filosóficos que forneceram o incentivo original para os
tratamentos céticos dos Evangelhos.

A Transmissão das Tradições do Evangelho


O estudo dos Evangelhos durante grande parte do século XX foi dominado
por uma abordagem denominada crítica da forma. A crítica da forma
envolvia três etapas básicas: (1) classificar a forma dos materiais do
Evangelho como parábola, história de milagre, provérbio e assim por
diante; (2) atribuir a forma ao contexto na vida da igreja primitiva na qual
ele provavelmente foi usado; e (3) traçar a história da transmissão oral de
cada forma até que ela tenha sido registrada por escrito.193 Como uma parte
da terceira etapa, a crítica da forma desenvolveu leis detalhadas que
descreviam como as antigas tradições orais sobre Jesus foram adaptadas à
medida em que eram transmitidas. A crítica da forma geralmente assumia
que quando as tradições orais foram registradas por escrito, elas haviam se

322
tornado uma mistura de história e lenda. Afirmações sobre Jesus se
tornavam cada vez mais exageradas cada vez que as histórias sobre ele
eram transmitidas até que Jesus evoluiu de um homem bastante comum
para um deus milagroso.
Embora a crítica da forma tenha sido abandonada quase totalmente nos
últimos estudos do NT, alguns pressupostos associados ao método ainda são
amplamente (e indiscriminadamente) aceitos. O mais importante deles é o
pressuposto de que os relatos das palavras e obras de Jesus foram
significativamente alterados e enriquecidos durante um longo período de
transmissão oral antes de os relatos serem preservados por escrito.194
Bauckham resumiu os três principais tipos de transmissão oral propostos
para as tradições do Evangelho: (1) descontrolado informal (Bultmann), (2)
controlado informal (Bailey, seguido por Dunn) e (3) controlado formal (a
escola escandinava, Gerhardsson, seguindo Riesenfeld).195
Por meio da crítica em geral, o modelo descontrolado informal
reconhece de forma insuficiente a presença de testemunhas oculares durante
o período de transmissão, que garantiram o controle da exatidão. O modelo
controlado informal utiliza um modelo questionável de transmissão, ou seja,
a forma como o material oral é transmitido em áreas rurais, enquanto o
cristianismo primitivo foi significativamente transmitido em grandes
centros urbanos. O modelo controlado formal afirma que os seguidores de
Jesus memorizaram grandes partes de seu ensino ou fizeram anotações
escritas durante seu ministério, por isso é muitas vezes considerado como
demasiado rígido e inadequadamente apoiado pela evidência. Os seguintes
pontos específicos da crítica podem ser observados:

Em primeiro lugar, pesquisas recentes demonstraram que os relatos


transmitidos oralmente na Palestina do primeiro século eram muito mais

323
estáveis do que muitos dos críticos da forma acreditavam. K. Bailey e J.
Dunn recentemente argumentaram que as histórias sobre Jesus teriam sido
transmitidas em um processo melhor descrito como tradição oral controlada
informal.196 Aqueles que transmitiram as tradições procuraram preservar
fielmente as principais características da tradição que expressavam o
significado e importância dessa tradição, especialmente quando as histórias
ou ensinamentos eram importantes para uma identidade da comunidade. A
isso R. Bauckham adicionou a importante ideia de que o principal elemento
controlador da tradição no caso da tradição do Evangelho foi a presença de
testemunhas oculares ao longo do processo de transmissão.197
Em segundo lugar, evidência convincente sugere que os Evangelhos
Sinóticos foram escritos entre 20 a 30 anos após a morte de Jesus. Nessa
data antiga, numerosas testemunhas oculares do ministério de Jesus teriam
estado disponíveis para servir como fontes de tradições sobre Jesus e para
corrigi-las se necessário. O tempo entre os acontecimentos testemunhados e
a redação dos Evangelhos simplesmente não é suficiente para acomodar a
drástica evolução da tradição oral muitas vezes sugerida. As datas mais
amplamente aceitas para a composição dos Evangelhos Sinóticos (final dos
anos 50 até meados dos anos 80) permitem um tempo apenas um pouco
maior do que muitos estudiosos supõem para a adaptação dos relatos, mas
não o suficiente para explicar as diferenças drásticas entre as formas
originais da tradição e as formas preservadas nos Evangelhos. Evidências
abundantes do NT demonstram que a igreja primitiva respeitava mais a
autoridade de testemunhas oculares do que a tradição e procurava preservar
testemunhos precisos sobre Jesus que fossem baseados em relatos de
testemunhas oculares. O prefácio de Lucas (Lc 1.1-4), o apelo de Paulo
(1Co 15.1-8) e as qualificações dos apóstolos (At 1.21,22) são apenas

324
algumas das inúmeras indicações da importância desses testemunhos para a
igreja primitiva.
Em terceiro e último lugar, a suposição de que os Evangelhos contêm
relatos altamente evoluídos do ministério de Jesus ignora evidência
significativa, sugerindo que a igreja primitiva estava correta em sua
alegação de que os quatro Evangelhos foram baseados em depoimentos de
testemunhas. O prefácio de Lucas afirma claramente que seu Evangelho foi
baseado em lembranças de testemunhas oculares (Lc 1.2; autoptai). Papias
afirmava que o Evangelho de Marcos preservou as reminiscências que
Simão Pedro tinha do ministério de Jesus.198 Papias, que pode ter escrito já
no início do ano 110, baseou o seu testemunho na tradição recebida de certo
Aristíon e de certo “João, o Presbítero”, sendo ambos discípulos pessoais de
Jesus.199 Além disso, características internas do livro confirmam a
dependência que Marcos tinha de Pedro como sua fonte primária. A
alegação de Papias de que o apóstolo Mateus escreveu o Evangelho que
leva seu nome é consistente com os detalhes do próprio Evangelho.
Finalmente, o Evangelho de João afirma explicitamente ter sido escrito por
uma testemunha ocular (Jo 21.24). Embora nenhuma discussão sobre a
autoria do Quarto Evangelho por Papias tenha sobrevivido, Bauckham
convincentemente argumentou que a discussão sobre o Evangelho de João
no Cânon de Muratori (final do século II) muito se baseou em Papias.200
Assim, a alegação de que o Evangelho de João foi escrito por um discípulo
que está preservado no Cânon de Muratori que provavelmente data do final
do século II pode realmente ser remontado a Papias por volta do ano 110. A
atribuição desse Evangelho a uma testemunha ocular também foi
confirmada por Polícrates (c. 130-196) e Ireneu (c. 130-200) no final do
século II.

325
Recentemente, Bauckham demonstrou que a alegação de que os
Evangelhos preservam o testemunho ocular é confirmada pelas
características dentro deles. Entre essas características se encontra uma
“inclusio de testemunho ocular” semelhante à empregada por Luciano e
Porfírio em suas biografias gregas. Esse recurso literário envolve a
referência pelo nome à principal testemunha ocular no início e no fanal
daquela obra específica. A inclusio no Evangelho de Marcos identifica
Pedro como principal testemunha de Marcos (Mc 1.16; 16.7). Usos
similares do recurso reconhecem a importância do testemunho de Pedro nos
Evangelhos de Lucas e João.201
Os estudiosos que acreditam que um longo período de transmissão oral
das histórias do Evangelho ocorreu antes de os Evangelhos terem sido
escritos normalmente argumentam que muitos detalhes das narrativas foram
acréscimos secundários às narrativas feitos mais tarde por contadores de
histórias. Entre esses novos detalhes estavam incluídos os nomes de
personagens importantes na narrativa.202 Bauckham, porém, utilizou
estatísticas recentes sobre o uso de nomes judaicos na Palestina entre 330
a.C. e 200 d.C. para demonstrar que os nomes dos judeus da Palestina nos
Evangelhos e em Atos coincidem em muito com os nomes dos judeus da
Palestina conhecidos de antigos textos judaicos e inscrições em ossuários.
Ao mesmo tempo, os nomes dos judeus da Palestina nos Evangelhos e
em Atos eram bem diferentes dos nomes dos judeus na Diáspora durante
esse mesmo período. Bauckham concluiu:

Em face disso, torna-se muito pouco provável que os nomes nos Evangelhos sejam
acréscimos posteriores às tradições. Fora da Palestina, os nomes apropriados simplesmente
não poderiam ter sido escolhidos. Mesmo dentro da Palestina, seria muito surpreendente se
acréscimos aleatórios de nomes a esta ou aquela tradição se adequasse ao padrão real de
nomes da população em geral.203

326
O testemunho da igreja primitiva com relação à autoria dos Evangelhos e às
características internas dos Evangelhos levaram Bauckham à seguinte
conclusão:

Os textos do Evangelho são muito mais próximos da forma na qual as testemunhas oculares
contaram suas histórias ou transmitiram suas tradições do que geralmente se conjectura nos
estudos correntes. Isso é o que dá aos Evangelhos o seu caráter testemunhal. Eles
representam o depoimento das testemunhas oculares, evidentemente não sem edição e
interpretação, mas de uma forma substancialmente fiel à maneira como as próprias
testemunhas o transmitiram, uma vez que os evangelistas estavam em contato mais ou menos
direto com as testemunhas oculares, não afastados delas por um longo processo de
transmissão anônima das tradições.204

Tanto a antiguidade dos Evangelhos quanto suas conexões com testemunhas


oculares fortemente afirmam a confiabilidade histórica dos Evangelhos.

A Legitimidade da Harmonização
Os estudiosos na igreja primitiva — incluindo Taciano (c. 175), Ireneu (c.
130-200), Orígenes (c. 185-254), Crisóstomo (c. 347-407) e Agostinho
(354-430) — geralmente acreditavam que os quatro Evangelhos eram
complementares, em vez de relatos contraditórios. Quando descobriram
aparentes discrepância entre um Evangelho e outro, eles procuraram
explicações que conciliassem ou harmonizassem os relatos. Embora
reconhecessem as diferenças entre os Evangelhos, eles geralmente negavam
que houvesse divergências reais entre os relatos.205
Agostinho, por exemplo, observou que as diferenças na ordem entre os
Evangelhos não constituem desentendimentos uma vez que se deve assumir
que os Evangelhos foram organizados em ordem cronológica apenas nos
casos em que o autor mencionou explicitamente a sequência cronológica.

327
Ele também argumentou que os Evangelhos preservam o mesmo sentido
das palavras de Jesus, mesmo quando eles variam no vocabulário. Por fim,
Agostinho sugeriu que paralelos evidentes nos Evangelhos que tinham
detalhes significativamente diferentes podem na verdade registrar eventos
semelhantes que ocorreram em diferentes ocasiões no ministério de Jesus.206
Durante o período do Iluminismo, os estudiosos desaprovavam cada vez
mais a tentativa de harmonização. Os Evangelhos foram vistos cada vez
mais como literatura meramente humana, na qual contradições deveriam ser
esperadas. Assumiu-se que os esforços em conciliar as visíveis
discrepâncias entre os Evangelhos envolviam a manipulação de evidências
a fim de forçar a conformidade com as noções equivocadas de inspiração
divina.
Às vezes, os estudiosos bem-intencionados recorreram a extremos
desmedidos para a harmonização,207 mas isso não deve desacreditar todas as
tentativas de harmonizar os Evangelhos. Os historiadores frequentemente
encontram aparentes discrepâncias nos vários relatos do mesmo evento em
fontes antigas. Eles geralmente exploram maneiras pelas quais os relatos
podem ser conciliados antes de assumir que uma ou mais fontes são
imprecisas. As aparentes discrepâncias podem simplesmente resultar da
natureza fragmentária dos relatos que, todavia, se unem para dar um retrato
mais completo do evento. Em outras ocasiões, a aparente discrepância
resulta da interpretação inadequada dos dados pelo próprio historiador.
Várias considerações ajudam estudiosos na abordagem das aparentes
discrepâncias entre os relatos dos Evangelhos.208 A mais importante delas
diz respeito à natureza das referências aos ditos de Jesus nos Evangelhos.
Os autores dos Evangelhos estavam empenhados em preservar o sentido
original ou a essência das palavras de Jesus, mas não estavam limitados a

328
relatar esses ditos palavra por palavra. Variações na redação dos dizeres do
Evangelho não constituem erros históricos, uma vez que os escritores dos
Evangelhos preservaram o ipsissima vox (voz exata ou verdadeiro sentido)
mesmo quando eles não registraram o ipsissima verba (palavras exatas) de
Jesus. Os evangelistas eram livres para resumir, abreviar, parafrasear ou
esclarecer as palavras de Jesus conforme necessário. Embora os leitores
modernos esperem maior precisão nas citações e possam ser incomodados
pela liberdade que escritores antigos tomavam em citações, seu
desapontamento deve ser atenuado se eles considerarem que muitas citações
dos ditos nos Evangelhos estão mais alinhadas com as citações indiretas ou
paráfrases do que com as citações textualmente diretas. Às vezes, os leitores
modernos pressupõem que as palavras de Jesus nos Evangelhos são citações
literais porque elas são colocadas entre aspas, mas os escritores antigos não
utilizavam convenções literárias como aspas para distinguir entre as
citações diretas e indiretas. As aspas nas traduções realizadas são a criação
de tradutores e editores de textos modernos.
Este texto não pode discutir todas as alegadas contradições entre os
Evangelhos e os meios possíveis de harmonizá-los.209 No entanto, os
estudiosos têm apresentado soluções plausíveis e muitas vezes convincentes
para todas as aparentes discrepâncias. A análise comparativa dos
Evangelhos apoia fortemente a credibilidade histórica dos Evangelhos.

OS RELACIONAMENTOS ENTRE OS
EVANGELHOS
Os estudiosos frequentemente se referem a Mateus, Marcos e Lucas como
os Evangelhos Sinóticos. O termo sinótico significa “ver juntamente, ter o

329
mesmo ponto de vista ou perspectiva”; assim, os três primeiros Evangelhos
são “sinóticos” porque oferecem apresentações semelhantes da vida e dos
ensinamentos de Jesus. Apesar das notáveis semelhanças, também existem
diferenças entre os Evangelhos. Hoje os estudiosos geralmente se referem a
questões — especialmente as questões sobre as possíveis fontes utilizadas
pelos escritores dos Evangelhos — a respeito dessa enigmática combinação
de diferenças e semelhanças entre esses três Evangelhos como o Problema
Sinótico. Essa terminologia está longe de ser ideal; no entanto, ela parece já
pressupor que existe um “problema” que necessita ser resolvido, em vez de
uma oportunidade de ver Jesus sob uma variedade de perspectivas
complementares que enriquecem umas às outras, em vez de se contradizer.
Esta seção explora as semelhanças entre os Evangelhos e faz um
levantamento das diversas explicações que os estudiosos ofereceram para
esclarecer essas semelhanças. A seção também destaca as forças e fraquezas
das várias formas em que a relação entre os Evangelhos Sinóticos foi
construída. Todavia, deveria ser salientado no início que o ponto de vista
que um acadêmico tem sobre essa questão não deve ser tomado como um
teste de ortodoxia, especialmente visto que as evidências disponíveis não
permitem uma resolução definitiva de todas as questões envolvidas. Isso
não quer dizer que a tentativa de construir uma hipótese plausível com base
em todos os dados disponíveis não seja legítima. No entanto, certamente
significa que o dogmatismo deve ser evitado e que nem a prioridade de
Mateus nem a de Marcos e nem qualquer outro modelo deve ser desprezado
como incompatível com uma visão de afirmação da Escritura.

Semelhanças Entre os Evangelhos

330
Os estudiosos procuram identificar as semelhanças e as diferenças entre os
Evangelhos usando uma ferramenta chamada de Sinopse dos Evangelhos.210
Essa ferramenta coloca os relatos semelhantes dos Evangelhos lado a lado
em colunas paralelas, de modo que os estudiosos possam compará-las com
mais facilidade. Esses estudiosos costumam usar um sistema de codificação
em cores para destacar o material compartilhado por todos os quatro
Evangelhos, pelos Evangelhos Sinóticos ou outras combinações dos
Evangelhos. Eles, então, analisam o material comum na tentativa de tomar
decisões sobre as possíveis relações literárias entre os Evangelhos. Essa
comparação é melhor conduzida utilizando-se de uma Sinopse Grega, uma
vez que algumas semelhanças e diferenças nas versões em inglês podem
existir por conta do tradutor, e não dos autores originais dos Evangelhos.
Essa tarefa de determinar as relações literárias entre os Evangelhos é
chamada de “crítica das fontes”. As comparações dos Evangelhos Sinóticos
destacam quatro principais semelhanças: (1) na redação; (2) na ordem; (3)
no material parentético e explicativo; e (4) nas citações do AT.

Semelhanças na redação
Alguns dos textos dos Evangelhos Sinóticos, especialmente a redação dos
ditos de Jesus, são idênticos ou quase idênticos, como visto na seguinte
comparação da primeira previsão de Jesus sobre seus sofrimentos (Mt
16.21-23; Mc 8.31-33; Lc 9.22).

331
Tabela 3.5: Comparação Sinótica da Primeira Predição da Paixão por
Jesus
Mateus 16.21-23 Marcos 8.31-33 Lucas 9.21-22
Desse momento em E começou a ensinar- Mas ele estritamente os
diante, Jesus começou a lhes QUE era necessário advertiu e instruiu a
mostrar aos seus que o Filho do homem que não contassem isso
discípulos QUE ELE PRECISAVA SOFRER MUITAS a ninguém, dizendo QUE
PRECISAVA IR para COISAS e ser rejeitado o Filho do homem
Jerusalém E SOFRER pelos ANCIÃOS, PELOS PRECISAVA SOFRER MUITAS
MUITAS COISAS da parte PRINCIPAIS SACERDOTES e COISAS, e ser rejeitado
DOS ANCIÃOS, DOS pelos ESCRIBAS, SER pelos ANCIÃOS, PELOS
PRINCIPAIS SACERDOTES E MORTO E ressuscitar PRINCIPAIS SACERDOTES E
DOS ESCRIBAS, SER MORTO depois de três dias. E pelos ESCRIBAS, SER
e ser ressuscitado ao ele dizia isso MORTO E ser
terceiro dia. E Pedro abertamente. E Pedro ressuscitado ao terceiro
chamou-o em chamando-o em dia.
particular e começou a particular e começou a
repreendê-lo, dizendo: repreendê-lo.
Oh não, Senhor! Isto
nunca te acontecerá. Ele, porém, virando-se
Ele, porém, voltando- e olhando para seus
se, disse a Pedro: discípulos, repreendeu
a Pedro e disse: “Para
“Para trás de mim, trás de mim, Satanás;
Satanás! Tu me és para porque não estás
mim motivo de tropeço, pensando nas coisas de
porque não estás Deus, mas sim nas
pensando nas coisas de coisas dos homens.”
Deus, mas, sim, nas
coisas dos homens.”

Neste exemplo, a tradução da HCSB foi ligeiramente adaptada para


mostrar concordâncias que existem no texto grego dos Evangelhos. Letras
minúsculas indicam concordâncias em todos os três Sinóticos; letras em

332
itálico indicam concordância exata entre Marcos e Lucas; letras em negrito
e itálico indicam concordância exata entre Mateus e Marcos; sublinhado
indica concordância exata entre Mateus e Lucas. Uma análise dos paralelos
mostra que os três Sinóticos concordam na essência dos ditos de Jesus.
A semelhança na redação é suficientemente próxima para sugerir a
possibilidade de um relacionamento literário, ou seja, que um ou mais
escritores dos Evangelhos estavam familiarizados com um ou mais dos
outros Evangelhos. Marcos parece ter uma conexão especial com os dois
outros Evangelhos. Marcos compartilha com Mateus um material que não
está presente em Lucas, especialmente a repreensão de Pedro, na qual
Marcos e Mateus concordam literalmente.
Por outro lado, Marcos também compartilha com Lucas características
importantes e ausentes em Mateus, tais como o uso do título “Filho do
Homem” e a referência à rejeição de Jesus. O único material que Lucas e
Mateus compartilham que difere de Marcos é a expressão “ressuscite
(ressuscitasse) ao terceiro dia”, em contraste com a “ressurreição [um verbo
grego diferente do utilizado por Mateus e Lucas] após três dias”, em
Marcos. Essa concordância mínima pode sugerir que Mateus conhecia o
texto de Lucas ou vice-versa. No entanto, o paralelo não é extenso o
suficiente para exigir uma dependência literária entre Mateus e Lucas. Eles
podem, coincidentemente, ter adaptado Marcos de forma idêntica.
A única conclusão clara derivada desses paralelos é a conexão especial
de Marcos com Mateus e Lucas. Mas essa conexão especial pode ser
explicada de duas maneiras diferentes: (1) Marcos escreveu primeiro seu
Evangelho e Mateus e Lucas usaram Marcos ao escrever seus próprios
Evangelhos; (2) Mateus e Lucas escreveram primeiro e Marcos utilizou
esses dois Evangelhos anteriores para escrever o seu Evangelho. Essas duas

333
interpretações possíveis dos paralelos constituem as duas principais
soluções para o Problema Sinótico. A tese de que Marcos escreveu primeiro
e foi utilizado pelos outros dois escritores sinóticos é chamada de
“prioridade marcana”. A ideia de que Mateus e Lucas escreveram primeiro
e que Marcos utilizou os Evangelhos de ambos é chamada de Hipótese de
Griesbach (ou dos Dois Evangelhos).

Semelhanças na ordem
Os Evangelhos contêm numerosas perícopes, unidades independentes de
narrativas tais como o relato da cura do leproso por Jesus em Marcos 1.40-
45. Embora essas perícopes possam ser organizadas de várias maneiras
diferentes em cada um dos Evangelhos — de forma tópica, cronológica ou
geográfica (com base nos locais em que ocorreram) —, eles compartilham
uma notável semelhança na ordem das perícopes. A tabela a seguir mostra
como os Evangelhos Sinóticos organizaram as perícopes que descrevem o
início do ministério de Jesus.

334
Tabela 3.6: Comparação Sinótica do Início do Ministério de Jesus
Perícopes (organizadas segundo a
Mateus Marcos Lucas
ordem de Marcos)
1. O ensino de Jesus na sinagoga de 1.21,22 4.31,32
Cafarnaum
2. Cura de um endemoninhado em 1.23-28 4.33-
Cafarnaum 37
3. A cura da sogra de Pedro por Jesus 8.14,15 1.29-31 4.38,39
4. Jesus cura ao anoitecer 8.16-17 1.32-34 4.40,41
5. Jesus deixa Cafarnaum 1.35-38 4.42,43
6. A pregação de Jesus na Galileia 4.23 1.39 4.44
7. A pesca milagrosa 5.1-11
8. A cura do leproso por Jesus 8.1-4 1.40-45 5.12-
16
9. A cura do paralítico por Jesus 9.1-8 2.1-12 5.17-
26
10. O chamado de Mateus 9.9-13 2.13-17 5.27-
32
11. Controvérsia sobre o jejum 9.14-17 2.18-22 5.33-
39
12. Controvérsia sobre a colheita das 12.1-8 2.23-28 6.1-5
espigas
13. Controvérsia sobre a cura no sábado 12.9-14 3.1-6 6.6-11
14 . Cura a beira-mar 4.24,25; 3.7-12 6.17-
12.15,16 19
15. A escolha dos Doze 10.1-4 3.13-19 6.12-
16

335
Nessa tabela, o que está em itálico indica perícopes que Mateus ou
Lucas colocaram em uma ordem diferente da de Marcos.211 Uma análise
detalhada dessa tabela leva a várias observações. Primeiro, existe uma
notável semelhança na ordem entre Marcos e Lucas. Lucas difere de
Marcos na ordem na sua colocação de apenas uma perícope, a escolha dos
Doze. Embora Lucas tenha incluído uma perícope, a pesca milagrosa, que
falta tanto em Mateus quanto em Marcos, essa diferença não perturba a
ordem compartilhada com Marcos.
Segundo, Mateus segue a mesma ordem que Marcos, com apenas
algumas poucas exceções. Mateus reuniu declarações resumidas sobre os
ministérios de pregação e cura de Jesus na Galileia e os colocou em uma
introdução posicionada no início do ministério na Galileia. No entanto, ele
repetiu o resumo do ministério galileu de cura de Jesus em Mateus 12.15,16
de acordo com a ordem em Marcos e Lucas. Mateus, como Lucas, colocou
a escolha dos Doze mais cedo do que Marcos o fez, mas posicionou-o ainda
mais cedo do que Lucas.
A ordem comum das perícopes sugere um relacionamento literário entre
os Evangelhos Sinóticos. No entanto, as semelhanças e diferenças em
ordem podem ser explicadas segundo uma das duas principais teorias da
composição do Evangelho: pela hipótese da prioridade marcana ou pela de
Griesbach (Dois Evangelhos). A análise da ordem das perícopes por si só
não pode provar a validade de uma teoria sobre a outra, mas deve ser usada
em conjunto com o estudo de outros tipos de semelhanças e diferenças.

336
Semelhanças no material parentético e explicativo
Semelhanças no texto dos ditos de Jesus nos Evangelhos Sinóticos podem
ser explicadas como fruto da precisão no relato das palavras de Jesus e não
como dependência literária. Tais explicações não são totalmente
satisfatórias, entretanto, uma vez que as palavras originais de Jesus em
aramaico poderiam ser traduzidas em grego de várias maneiras diferentes e,
portanto, sem produzir as concordâncias literais que existem entre os
Evangelhos. Mas onde os Evangelhos compartilham comentários editoriais
ou material parentético idênticos, temos a forte implicação da dependência
literária entre eles.
Um exemplo famoso de uma declaração parentética compartilhada é
“quem lê, entenda” (Mt 24.15-18; Mc 13.14-16; faltando em Lc 21.20-22).
Se essa afirmação parentética é uma nota do autor do Evangelho para os
leitores do Evangelho, o fato de Mateus e Marcos conterem-na implicaria
que um escritor usou o Evangelho do outro. No entanto, muitos estudiosos
interpretam o comentário como as palavras de Jesus para os leitores de
Daniel, caso em que a declaração compartilhada por Mateus e Marcos iria
demonstrar precisão no relato das palavras de Jesus em vez de dependência
literária.
Aqueles que argumentam que a declaração é uma nota do autor do
Evangelho argumentam que Jesus geralmente se refere à sua audiência
como “ouvindo” o AT em vez de lendo o AT. Uma vez que apenas os judeus
ricos do primeiro século tinham suas próprias cópias do AT, a maioria
tornou-se familiar com o AT por ouvi-lo ser lido nas sinagogas em vez de
lê-lo por si mesmos (Lc 16.29,31).212 Contudo, alguns estudiosos que

337
afirmam que a dependência literária entre os Evangelhos defendem também
que o próprio Jesus pronunciou as palavras “quem lê, entenda” e que ele as
dirigiu aos leitores de Daniel. Isso parece ser confirmado pelas referências
bastante frequentes de Jesus à leitura do AT (Mt 12.3,5; 19.4; 21.16,42;
22.31; Mc 12.10,26; Lc 10.26).213
Outros comentários editoriais compartilhados não são tão facilmente
descartados, como é o caso de Marcos 15.10: “Pois ele sabia que foi por
inveja que os principais sacerdotes o entregaram”. Essa declaração é muito
semelhante à de Mateus 27.18: “Pois ele sabia que foi por causa de inveja
que o entregaram”.214 Uma vez que esses versículos são comentários
editoriais que descrevem os pensamentos de Jesus, em vez de transcrições
das palavras dita por ele, a semelhança de conteúdo e de vocabulário sugere
fortemente a dependência literária. Exemplos semelhantes são frequentes
nos Sinóticos.

Semelhanças nas citações do Antigo Testamento


As citações do AT no NT assumem uma variedade de formas. Às vezes, a
citação parece ser uma tradução rigorosa do AT hebraico para o grego. Às
vezes, é uma reprodução literal da tradução da Septuaginta (LXX). Às
vezes, parece ser uma tradução literal da versão que aparece em um dos
Targumim. Ocasionalmente, a citação parece ser uma paráfrase do próprio
escritor do Evangelho. Algumas vezes, as citações do NT misturam ou
combinam referências a diversos textos diferentes. Ao examinar a forma
das citações do AT utilizadas nos Evangelhos, os estudiosos podem
compreender melhor suas relações literárias.215

338
Mateus 11.10, Marcos 1.2 e Lucas 7.27 contêm citações do Antigo
Testamento que misturam Êxodo 23.20 e Malaquias 3.1 precisamente da
mesma maneira.

Tabela 3.7: Comparação Sinótica do Uso do Antigo Testamento


AT Mateus 11.10 Marcos 1.2 Lucas 7.27
Êxodo 23.20
(LXX)
Olhe, Eu (eu Olhe, eu (eu Olhe, eu estou Olhe, eu estou
mesmo) estou mesmo) estou enviando o meu enviando o meu
enviando meu enviando o meu mensageiro à mensageiro à
mensageiro diante mensageiro à tua tua frente, tua frente;
de ti frente;
Malaquias 3.1
(LXX)
E ele examinará o ele preparará o teu que preparará ele preparará o
caminho diante de caminho diante de teu caminho teu caminho
mim ti diante de ti
Malaquias (3.1
TM)
E ele limpará o
caminho diante de
mim

Várias observações dão apoio à dependência literária dos Evangelhos.


Os Sinóticos concordam literalmente nas citações com apenas duas
exceções. Em Marcos, não encontramos as palavras finais “diante de ti” que
aparecem em Mateus e Lucas. Mateus, concordando com a Septuaginta,
apresenta o pronome depois de “Eis”, tornando o “eu” sutilmente enfático.
Essa concordância literal é notável, uma vez que exigia que todos os três

339
evangelistas combinassem os mesmos dois textos precisamente no mesmo
ponto e traduzissem Malaquias 3.1 de forma idêntica, embora suas
traduções difiram do texto hebraico e da Septuaginta. A melhor explicação
para a semelhança nas citações do AT parece ser a dependência literária
entre os Evangelhos.
Um exemplo semelhante é a citação de Isaías 29.13 em Marcos 7.6,7 e
Mateus 15.8,9. As traduções em Marcos e Mateus são idênticas, exceto por
uma mínima variação na ordem das palavras na primeira oração. Suas
citações parecem seguir a Septuaginta, embora dela difiram em vários
pontos importantes. Mateus e Marcos usam um verbo no singular na
primeira oração, enquanto a Septuaginta usa uma forma plural. Além disso,
na Septuaginta, a última linha da citação lê “ensinando mandamentos e
doutrinas dos homens” e não “ensinado como doutrinas os mandamentos
dos homens”, que aparece em Mateus e Marcos. O fato de Mateus e Marcos
se desviarem da Septuaginta precisamente nos mesmos pontos e exatamente
da mesma forma parece ser mais do que uma coincidência. Parece que ou
Mateus estava ciente da tradução de Isaías 29.13 feita por Marcos ou que
Marcos estava ciente da tradução de Mateus.

Explicações das Semelhanças Entre os Evangelhos


As semelhanças no texto, na ordem, nos comentários editoriais e nas
referências ao AT descritas acima foram explicadas de várias maneiras na
história dos estudos do NT.

Independência literária

340
Alguns estudiosos afirmam que essas semelhanças são produtos da
inspiração divina dos Evangelhos Sinóticos, em vez de indicarem o uso de
um Evangelho por outro. Eles argumentam que uma vez que esses três
Evangelhos compartilham o mesmo autor divino, o Espírito Santo, os
leitores não deveriam se surpreender com as notáveis semelhanças entre
Mateus, Marcos e Lucas. Mas se a inspiração divina somente for
responsável pelas semelhanças entre os Sinóticos, é difícil explicar as
diferenças entre os Sinóticos e, especialmente, as diferenças entre os
Sinóticos e João.
Da mesma forma, outros estudiosos afirmam que as semelhanças entre
os Evangelhos simplesmente refletem a história. Semelhanças são um
subproduto dos relatos fiéis dos escritores do Evangelho do que realmente
aconteceu. Embora essa explicação possa responder pelas semelhanças dos
eventos e ditos nos Evangelhos, ela não é uma explicação adequada para
outras notáveis semelhanças. Essa explicação não leva em conta os
paralelos em referências parentéticas, comentários editoriais ou as
semelhanças nas citações do AT descritas anteriormente.216

Interdependência literária
A explicação das semelhanças entre os Evangelhos Sinóticos mais
comumente aceita é que os últimos escritores sinóticos usaram o(s)
primeiro(s) Evangelho(s) Sinótico(s). Teorias da dependência literária entre
os Evangelhos podem remontar ao início do século V.217 Por exemplo,
Agostinho sugeriu que a ordem canônica dos Evangelhos (Mateus, Marcos,
Lucas e João) foi a ordem na qual os Evangelhos foram escritos. Os últimos
escritores utilizaram o material dos primeiros escritores: “Parece que cada

341
um deles pretendeu não escrever em ignorância do seu antecessor”
(Agostinho, De Consensu Evangelistarum 1.4).218 Segundo essa teoria,
Mateus, uma testemunha ocular, escreveu o primeiro Evangelho, Marcos
usou Mateus na compilação do seu Evangelho e Lucas usou Mateus (e
Marcos) na compilação do seu Evangelho.
Embora a solução de Agostinho para o Problema Sinótico tenha poucos
adeptos modernos, a maioria dos estudiosos apoia uma das duas seguintes
teorias.219

Ilustração 3.1: O Ponto de Vista Agostiniano

A hipótese dos dois Evangelhos


Em 1783, J. J. Griesbach propôs que Mateus escreveu primeiro seu
Evangelho. Em contraste com Agostinho, Griesbach argumentou que Lucas

342
foi o segundo Evangelho e Marcos, o terceiro. O ponto de vista de
Griesbach a respeito do possível uso por Lucas de Mateus não é claro, mas
os defensores modernos do ponto de vista de Griesbach, conhecido hoje
como a Hipótese dos Dois Evangelhos, geralmente argumentam que Lucas
usou Mateus ao escrever seu próprio Evangelho. Mais importante,
Griesbach alegou que Marcos foi o último dos Sinóticos e que ele usou
Mateus e Lucas para escrever o seu Evangelho.
Vários fatores apoiam a Hipótese dos Dois Evangelhos. Em primeiro
lugar, a tradição da igreja primitiva foi tudo menos unânime em afirmar que
o Evangelho de Mateus foi o primeiro a ser escrito. A colocação de Mateus
no cânon provavelmente é devida à opinião da igreja primitiva de que o seu
Evangelho foi o primeiro. Como observou Griesbach, é mais fácil explicar
(pelo menos para alguns) por que um não apóstolo, Marcos, usaria o
Evangelho de um apóstolo do que explicar por que um apóstolo como
Mateus usaria um Evangelho escrito por alguém que não fosse um
apóstolo.220
Em segundo lugar, a Hipótese dos Dois Evangelhos oferece uma
explicação razoável para aqueles textos nos quais Mateus e Lucas são
idênticos ou semelhantes mas diferem de Marcos. W. Farmer, o mais
influente proponente da Hipótese dos Dois Evangelhos nos últimos anos,
argumentou que essas concordâncias Mateus-Lucas são consistentemente
de menor importância e “não afetam seriamente o propósito literário ou a
intenção teológica das passagens em questão”.221 A política de Marcos foi a
de copiar o texto de seu antecessor quando eles eram idênticos, com
exceção desses elementos menores que não afetam o sentido da passagem.
Em terceiro lugar, a hipótese oferece uma explicação razoável para as
assim chamadas redundâncias de Marcos. Marcos contém 213

343
“redundâncias” nas quais uma declaração é feita e depois seguida por uma
declaração quase equivalente, mas desnecessária. Marcos 1.32 diz:
“Quando anoiteceu, depois que o sol se pôs”. Se Marcos usou Mateus e
Lucas, a redundância pode ser facilmente explicada, já que Mateus 8.16 diz:
“Quando entardeceu”, e Lucas 4.40 diz: “Quando o sol estava se pondo”.
Finalmente, ao contrário da Hipótese dos Dois Documentos, a Hipótese
dos Dois Evangelhos não requer fontes hipotéticas como “Q”
(provavelmente da palavra alemã Quelle, que significa “fonte”).222
Os proponentes de hipóteses alternativas apontam para vários
problemas com a Hipótese dos Dois Evangelhos. Em primeiro lugar, apesar
de sua alegação de honrar a tradição da igreja, a hipótese é conflitante com
um elemento importante da tradição da igreja a respeito da composição dos
Evangelhos. A Hipótese dos Dois Evangelhos afirma que o Evangelho de
Marcos foi o último a ser escrito e que ele usou Mateus e Lucas. No
entanto, o testemunho da igreja primitiva insiste em que Marcos escreveu
seu Evangelho independentemente dos outros Evangelhos e baseado nas
memórias de Pedro (como declarado por Papias), e que o Evangelho de
Lucas foi o último Evangelho a ser escrito, e não o segundo (como
afirmado por Orígenes, pelo Prólogo Antimarcionita e por Agostinho).223
Em segundo lugar, a maioria das concordâncias das leituras de dois
Evangelhos é melhor explicada pela prioridade marcana. Os críticos da
redação que procuram explicar por que um evangelista posterior adaptou o
texto de sua fonte foram capazes de oferecer explicações razoáveis para
Mateus ou Lucas mudarem o texto de Marcos. Muitas vezes, porém, é mais
difícil explicar por que Marcos teria adaptado leituras de Mateus ou Lucas,
em conformidade com a Hipótese dos Dois Evangelhos. Muitas diferenças
entre Marcos e os outros dois Sinóticos podem ser facilmente explicadas

344
como Mateus e Lucas fazendo melhorias gramaticais ou estilísticas ou
ainda esclarecimentos teológicos de Marcos. Muitas vezes, as diferenças
entre Marcos e os outros dois Sinóticos tão especificamente se adequam às
ênfases de Mateus e Lucas, que parecem ser um produto da revisão de
Marcos por Mateus ou Lucas.224
Em terceiro lugar, embora a explicação das redundâncias de Marcos
pela Hipótese dos Dois Evangelhos possa inicialmente parecer convincente,
um exame mais detalhado levanta sérias questões. Há apenas 17
redundâncias claras em Marcos, onde Mateus tem uma e Lucas, a outra. Em
muitos mais casos de redundâncias marcana, Mateus ou Lucas
compartilham o mesmo elemento da redundância e Marcos acrescenta outra
ou Mateus e Lucas não têm nenhuma. Isso sugere que as redundâncias eram
mais um produto do estilo de Marcos do que um resultado de suas fontes.225
Em quarto lugar, visões alternativas não requerem fontes hipotéticas.
Uma variação da visão da prioridade marcana elimina a necessidade de
documentos hipotéticos, afirmando que Lucas usou o Evangelho de Mateus
ao escrever seu próprio Evangelho.

345
Ilustração 3.2: Hipótese dos Dois Evangelhos

A prioridade marcana
Uma análise cuidadosa das semelhanças entre os Evangelhos Sinóticos
indica que Marcos tem uma relação especial com Mateus e Lucas. Marcos
compartilha mais material e concordância literal com esses livros do que
eles compartilham um com o outro. A relação especial de Marcos com
Mateus e Lucas tem sido comumente explicada de duas maneiras opostas.
Alguns afirmam que a semelhança resulta de Marcos usar tanto Mateus
quanto Lucas em seu Evangelho. A hipótese da prioridade marcana sugere
que Marcos serviu como fonte primária para Mateus e Lucas.
Diversas linhas de evidência dão apoio à prioridade de Marcos.
Primeiro, o Evangelho de Marcos é o mais curto dos três Evangelhos
Sinóticos. Contrária à Hipótese dos Dois Evangelhos, a brevidade de
Marcos não parece ser devida a seus esforços para abreviar ou resumir os
dois outros Evangelhos. Uma comparação entre o comprimento das

346
perícopes individuais no Sinóticos mostra que a versão que Marcos
apresenta das perícopes compartilhadas por Mateus e Lucas tendem a ser
mais longas e detalhadas do que nos outros dois Evangelhos. O Evangelho
de Marcos é mais curto do que os outros dois Sinóticos não porque
perícopes individuais foram abreviadas, mas porque faltam em Marcos
grandes blocos de material pertencentes aos outros Evangelhos, como as
narrativas do nascimento de Jesus e o Sermão da Montanha/Planície. É
difícil explicar por que Marcos alongaria perícopes individuais dos outros
dois Evangelhos e, em seguida, eliminaria um material tão importante. É
mais fácil explicar Mateus e Lucas expandindo Marcos do que Marcos
abreviando Mateus e Lucas em detrimento de tais testemunhos
significativos a respeito de Jesus.
Evidência adicional para a prioridade marcana vem das expressões
aramaicas de Marcos. Frequentemente, Marcos translitera palavras
aramaicas em caracteres gregos. Em geral, Mateus e Lucas omitem
completamente essas palavras ou dão uma tradução grega no lugar da
transliteração de Marcos. Muitos estudiosos acreditam ser mais provável
que Mateus e Lucas tenham traduzido o menos conhecido aramaico para o
grego do que Marcos tenha revertido do grego bem conhecido para o
aramaico menos conhecido. Semelhantemente, o grego de Marcos é menos
refinado do que o dos outros dois Evangelhos Sinóticos. Muitos estudiosos
acreditam ser mais provável que Mateus e Lucas tenham melhorado o grego
de Marcos do que Marcos ter diminuído a qualidade da gramática e estilo
dos outros Sinóticos.226
Em terceiro lugar, Marcos tem mais leituras difíceis. Por exemplo, Jesus
diz: “Por que me chamas bom? Ninguém é bom, senão um, que é Deus”
(Mc 10.18). Isso poderia ser tomado como uma negação da divindade de

347
Jesus. A leitura de Mateus cuidadosamente evita confusão ao traduzir a
declaração como: “Por que me perguntas sobre o que é bom? Somente um é
bom” (19.17). Estudiosos ponderam que faz mais sentido Mateus ter
tentado esclarecer uma importante declaração teológica do que Marcos
confundi-la.227
Em quarto lugar, Mateus e Lucas dificilmente concordam em oposição a
Marcos em redação ou na ordem. Em 1835, K. Lachmann observou que a
ordem das perícopes em Mateus e Lucas é muito semelhante quando
Marcos também contém a perícope, e que a ordem das perícopes em Mateus
e Lucas é muitas vezes diferente se Marcos não contém a perícope.
Lachmann também observou que Mateus e Lucas nunca concordam em
ordem em comparação com Marcos. Além disso, quando Mateus e Marcos
concordam em ordem em comparação com Lucas ou Lucas e Marcos
concordam em ordem em comparação com Mateus, o desvio da ordem de
Marcos pode ser plausivelmente explicado. No entanto, se presume que
Marcos mudou a ordem das perícopes que ele encontrou em suas fontes,
Mateus ou Lucas, essas mudanças de Marcos são muito mais difíceis de
explicar.228
Além disso, como explicado anteriormente, críticos da redação que
procuram explicar por que um evangelista teria adaptado o texto de sua
fonte têm sido capazes de oferecer explicações razoáveis para a mudança
que Mateus ou Lucas fazem do texto de Marcos. Muitas vezes, porém, é
mais difícil explicar por que Marcos teria adaptado leituras de Mateus ou
Lucas, em conformidade com a Hipótese dos Dois Evangelho. Muitas das
diferenças entre Marcos e os outros dois Sinóticos podem ser facilmente
explicadas de uma de três maneiras: (1) A melhoria da gramática e estilo de
Mateus e Lucas; (2) esclarecimentos teológicos de Mateus e Lucas para

348
Marcos; e (3) adaptação que Mateus e Lucas fazem do texto de Marcos de
uma forma que saliente os temas e ênfases que permeiam os materiais em
seus Evangelhos que não são igualados por Marcos.229
Geralmente, as diferenças entre os Sinóticos podem ser mais
razoavelmente explicadas quando se assume a prioridade de Marcos. Por
exemplo, Mateus e Lucas colocam uma ênfase maior do que Marcos na alta
cristologia. Ambos aplicam o título “Senhor” a Jesus com uma frequência
bem maior do que Marcos. Parece mais provável que Mateus e Lucas tenha
adaptado Marcos a fim de destacar a divindade de Jesus do que Marcos ter
editado esse material.230
Finalmente, algumas características estilísticas em Marcos aparecem em
Mateus quase exclusivamente no material que ele tem em comum com
Marcos. Marcos gostava muito de usar o advérbio temporal
“imediatamente”, que aparece 41 vezes no seu Evangelho. O advérbio
aparece 18 vezes no Evangelho de Mateus. Quatorze dessas ocorrências
aparecem no material que Mateus compartilha com Marcos. R. Stein
calculou que o advérbio aparece uma vez para cada 778 palavras no
material compartilhado com Marcos, mas apenas uma vez para cada 1.848
palavras no material não compartilhado por Marcos. Isso sugere que a
frequência de ocorrências do advérbio “imediatamente” em Mateus foi
influenciada pela sua dependência de Marcos.231

349
Ilustração 3.3: A Prioridade Marcana

A Hipótese dos dois documentos


A Hipótese dos Dois Documentos argumenta que o primeiro Evangelho
escrito foi o de Marcos (prioridade marcana). Quando Mateus e Lucas
escreveram seus Evangelhos, eles o fizeram independentemente um do
outro, mas dependeram fortemente de Marcos (ou talvez uma versão inicial
de Marcos ligeiramente diferente da versão canônica) e um documento
adicional agora perdido conhecido como “Q”.232 Apesar de muitos
estudiosos atribuírem a origem da Hipótese dos Dois Documentos a H. J.
Holtzmann, que escreveu em 1863, as origens da hipótese na verdade datam
de quase um século antes.233 Já em 1794, J. Eichhorn argumentou que
Mateus e Lucas independentemente usaram uma fonte pré-sinótica. Em
1798, H. Marsh defendeu a existência de um protoevangelho e uma fonte de
ditos. Em 1836, K. A. Credner sugeriu que Mateus e Lucas
independentemente usaram uma coleção de ditos, além de uma versão

350
inicial do Evangelho de Marcos como suas fontes primárias. C. H. Weisse
propôs uma hipótese semelhante alguns anos depois de Credner. No
entanto, Weisse argumentou que a versão de Marcos usada por Mateus e
Lucas foi a forma canônica de Marcos, e não a versão inicial.234 A Hipótese
dos Dois Documentos foi popularizada no mundo de fala inglesa por B. H.
Streeter em 1924.235

Ilustração 3.4: A Hipótese dos Dois Documentos

Evidências de “Q”
Alguns estudiosos afirmam que o material partilhado por Mateus e Lucas,
mas não por Marcos — principalmente material de discurso contendo os
ensinamentos e provérbios de Jesus — deve ser explicado por um apelo a
um outro documento compartilhado porque Mateus não poderia ter usado
Lucas e Lucas não poderia ter usado Mateus. Esses estudiosos apontam
para três linhas principais de evidências que sugerem a independência

351
literária de Mateus e Lucas e postulam sua dependência de um documento
hipotético.
Em primeiro lugar, quando um relato paralelo aparece em todos os três
Sinóticos mas Mateus ou Lucas contém material adicional, eles raramente
compartilham as mesmas adições. Da mesma forma, é difícil explicar por
que Lucas ou Mateus teriam omitido material exclusivo do outro Evangelho
se um Evangelho tivesse usado o outro. Parece improvável, por exemplo,
que Mateus eliminasse a Parábola do Filho Pródigo de Lucas ou que Lucas
tivesse omitido a visita dos magos de Mateus. Isso torna improvável que um
escritor conhecesse o outro.236
Em segundo lugar, Lucas coloca o material que ele compartilha com
Mateus, mas não com Marcos, em contextos diferentes do de Mateus.237
Mateus dividiu o material em cinco blocos de ensino e Lucas, em dois. Em
terceiro lugar, Mateus e Lucas nunca compartilham a mesma ordem de
perícopes quando essas estão ausentes em Marcos e nunca concordam em
ordem em comparação com Marcos.238
Muitos estudiosos defendem que, uma vez que Mateus e Lucas
compartilham material semelhante que está ausente de Marcos, e uma vez
que Mateus não usou Lucas e nem Lucas usou Mateus, Mateus e Lucas têm
em comum outra fonte além de Marcos. A maioria dos estudiosos que
defendem a existência dessa fonte acredita que ela era uma fonte escrita. As
semelhanças no texto e na ordem dos ditos dessa fonte hipotética são,
muitas vezes, maiores do que as semelhanças que Mateus e Lucas têm com
Marcos. Essa notável semelhança é tomada para implicar a existência de
uma fonte de ditos escritos.

A Hipótese de Farrer-Goulder

352
Nem todos os estudiosos que afirmam a prioridade marcana estão
convencidos de que as semelhanças entre Mateus e Lucas que não são
compartilhadas por Marcos são melhor explicadas por um apelo a um
documento hipotético. Um pequeno, mas crescente, número de acadêmicos
(especialmente na Grã-Bretanha) acredita que as semelhanças entre Mateus
e Lucas são melhor explicadas se Lucas usou o Evangelho de Mateus além
do de Marcos quando ele escreveu seu próprio Evangelho. Curiosamente,
embora o nome Holtzmann seja mais frequentemente associado com a
Hipótese dos Dois Documentos, Holtzmann abandonou essa hipótese
apenas alguns anos depois de tê-la proposto e sugeriu que Lucas conhecia e
usou Mateus.239 Em 1955, A. M. Farrer argumentou que Lucas realmente
usou o Evangelho de Mateus, além de Marcos, e que isso tornou “Q”
completamente desnecessária.240 Em 1989, M. Goulder escreveu um
comentário inteiro a Lucas que examina a hipótese de utilização de Mateus
por Lucas.241
A evidência mais importante que suporta a utilização de Mateus por
Lucas é a chamada concordância menor de Mateus e Lucas em comparação
com Marcos. Com base em diferentes métodos de identificação dessas
concordâncias menores, vários estudiosos têm sugerido que existem de 770
a 3785 dessas concordâncias menores. Algumas dessas concordâncias
podem ser explicadas como concordâncias coincidentes na melhoria
Marcos. No entanto, outras concordâncias são mais significativas e podem
indicar a dependência que Lucas tem de Mateus. Essas concordâncias
incluem Marcos 1.7,8; 2.12; 3.24, 26-29; 5.27; 6.33; 8.35; 9.2-4,18,19;
10.29; 14.65,72 e textos paralelos em Mateus e Lucas.
Uma pesquisa recente realizada por R. Vinson concluiu que esses
acordos literais de Mateus e Lucas em sua revisão de Marcos não poderiam

353
ter sido acidentais. Eles são melhor explicados se Lucas usou Mateus.
Vinson estabeleceu um experimento no qual ele coletou dez parágrafos de
três trabalhos finais de alunos e, então, submeteu esses parágrafos a dez
estudantes do doutorado para a revisão. Em seguida, ele examinou as
revisões para determinar o número de concordâncias verbais, considerou
todos os emparelhamentos das revisões possíveis e calculou a taxa média de
concordância verbal. Em seguida, ele contou o número de concordâncias
verbais menores entre Mateus e Lucas. Finalmente, ele comparou as taxas
de concordância verbal em sua experiência com as concordâncias dos dois
livros, utilizando o U estatístico, um método que assegura que as
concordâncias foram comparadas em uma escala adequada. Os cálculos
demonstraram que as concordâncias entre Mateus e Lucas foram
significativamente maiores que os pares de editores modernos e muito altas
para serem julgadas como apenas coincidentes.242
Estudiosos que defendem a Hipótese dos Dois Documentos procuraram
explicar essas concordâncias menores das seguintes maneiras.243 Primeiro,
Marcos e Q podem ter sobreposto em seu conteúdo um número de pontos.
Quando Marcos e Q compartilhavam o mesmo material mas tinham leituras
um pouco diferentes, Mateus e Lucas podem ter optado pela leitura de “Q”
no mesmo lugar. Em segundo lugar, as concordâncias menores às vezes
podem ser produto de corrupção textual. O Evangelho de Mateus foi o
favorito de muitas pessoas na igreja primitiva. Os escribas podem ter
produzido algumas das concordâncias menores ao conformar as leituras de
Lucas a Mateus. Em terceiro lugar, tanto Mateus como Lucas podiam estar
familiarizados com as tradições orais que se sobrepunham com Marcos e os
levaram a rever Marcos da mesma forma no mesmo ponto.

354
Tabela 3.8: Teorias da Dependência Literária dos Evangelhos Sinóticos
Teoria Definição
Visão Agostiniana Os Evangelhos Canônicos são listados na
mesma ordem em que foram escritos.
Hipótese dos Dois Os Evangelhos foram escritos na seguinte
Evangelhos ordem: Mateus, Lucas e Marcos.
Prioridade Marcana Marcos escreveu primeiro; Mateus e Lucas
escreveram independentemente um do
outro, mas usaram Marcos como fonte.
Hipótese dos Dois Mateus e Lucas usaram Marcos como fonte;
Documentos Mateus e Lucas também usaram “Q”, um
documento que continha o material
semelhante encontrado em Mateus e Lucas,
mas não em Marcos.
Hipótese de Farrer-Goulder Lucas usou Marcos e Mateus como fontes.

Valor do estudo
A crítica da fonte é um exercício complexo e difícil. Embora a Hipótese dos
Dois Documentos tenha sido a visão consensual das relações dos
Evangelhos no meio e final do século XX, atualmente nenhuma teoria sobre
o relacionamento dos Evangelhos pode ser descrita como o consenso
acadêmico — embora a prioridade marcana seja defendida pela maioria dos
estudiosos. Essa espinhosa questão pode não ser totalmente resolvida até
que (e a menos que) novas evidências venham à luz. Nesse meio tempo, as
questões que cercam as relações dos Evangelhos continuam a ser
importantes por várias razões.
Em primeiro lugar, a crítica da fonte é um importante passo preliminar
na investigação histórica da vida de Jesus. A discussão feita anteriormente

355
neste capítulo sobre critérios de autenticidade demonstra que um dos
critérios mais amplamente aceitos é o critério de múltiplas atestações
independentes. No entanto, várias teorias da crítica da fonte têm diferentes
pontos de vista do que é necessário para satisfazer esse critério. Ao se
aceitar a Hipótese dos Dois Documentos, um dito ou tema do ensinamento
de Jesus que aparece em pelo menos duas das fontes do Evangelho —
Marcos, Q, M, L ou João — é provavelmente autêntico. Mas ao se aceitar a
Hipótese de Farrer-Goulder, o material compartilhado por Mateus e Lucas é
o resultado da dependência que Lucas teve de Mateus e, portanto, não
constitui múltipla atestação independente.
Em segundo lugar, a crítica da fonte é um pré-requisito para a crítica da
redação, na qual os estudiosos examinam como os escritores dos
Evangelhos adaptaram as suas fontes, a fim de compreender o propósito
teológico que levou a essa adaptação. Assim, os benefícios potenciais da
crítica da forma fazem valer a pena o esforço investido nesse difícil
empreendimento.

Crítica da Redação e da Composição


Como mencionado, a crítica da forma surgiu em 1920 como uma tentativa
de discernir a pré-história de perícopes individuais incluídas nos
Evangelhos na forma de unidades de tradição oral enquanto elas eram
transmitidas pela comunidade com base em certas leis de transmissão oral.
A crítica da fonte, por sua vez, procurou discernir o uso de fontes escritas
e/ou orais pelos evangelistas. Por exemplo, a possível utilização de Marcos
e Q e outras fontes por Mateus e Lucas foi examinada a fim de ver que luz
essa utilização poderia lançar sobre o texto final desses Evangelhos. Além

356
disso, os estudiosos especularam quanto à eventual utilização que João
tenha feito de fontes tais como “sinais” ou “discursos-fonte” em seu
Evangelho.244 Outra importante metodologia interpretativa deve ser
mencionada em conjunto com a crítica da forma e a crítica da fonte: a
crítica da redação.245
A crítica da redação foi primeiramente praticada em 1950 por
estudantes de R. Bultmann, incluindo G. Bornkamm, W. Marxsen e H.
Conzelmann. A principal preocupação da crítica da redação é ver
determinado documento como um todo composicional e literário.
Consequentemente, o foco não é sobre o trabalho da comunidade como um
todo (crítica da forma) ou no uso de fontes pelos evangelistas (crítica da
fonte), mas nas contribuições teológicas feitas pelos evangelistas em seu
próprio direito quando eles processaram e formaram seu material-fonte.
(Com relação a isso, a crítica da redação é baseada na crítica da fonte no
sentido de que ela pressupõe certa visão definida pela crítica da fonte, como
o uso que Mateus faz de Marcos.) Quando parece que um dos os
evangelistas adaptou uma de suas fontes, as implicações teológicas de sua
revisão são exploradas.
Por exemplo, a crítica da redação (ou sua forma mais recente, crítica da
composição ou narrativa) pode observar que o tratamento que Mateus dá à
compreensão que os discípulos têm das palavras de Jesus é bem mais
positivo do que o de Marcos, que repetida e consistentemente colocou o
foco na falha dos discípulos em compreender o verdadeiro significado dos
ensinamentos de Jesus e da sua identidade messiânica. Com base nessa
constatação, conclui-se que Marcos procurou demonstrar que foi somente
após a ressurreição e auxiliado pelo Espírito Santo é que qualquer um foi
capaz de compreender a verdadeira natureza de Jesus como o Filho de

357
Deus. Assim, uma comparação de Marcos com Mateus revela uma
diferença em perspectiva (ou pelo menos ênfase) que tem o potencial de
ajudar o leitor a compreender melhor as contribuições distintivas e ênfases
teológicas dos respectivos evangelistas.

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. De onde esta citação foi extraída (nome da obra)? “Na véspera da
Páscoa, eles penduraram Jesus, o nazareno”.
2. De onde foi extraída esta citação? “Portanto, para silenciar o rumor,
Nero criou ‘bodes expiatórios’ e infligiu as mais refinadas torturas
àqueles a quem o povo simples chamava de ‘cristãos’.”
3. De onde foi extraída esta citação e qual é o nome especial atribuído a
ela? “Nessa, época havia um homem sábio que era chamado de Jesus.
E a sua conduta era boa e ele era conhecido por ser virtuoso”.
4. Quais são os três retratos contemporâneos de Jesus que preferem
fontes extrabíblicas em vez dos Evangelhos canônicos?
5. Segundo os autores, quais são as datas do nascimento e morte de Jesus
e qual é, segundo os autores, um dado crítico para a datação da morte
de Jesus?
6. Qual é um dado crítico para datar o nascimento de Jesus?
7. Qual é a definição simples do “critério de múltiplas atestações”?
8. Qual é a definição simples do “critério de dissimilaridade”?
9. Onde estudiosos críticos atribuem o ônus da prova quanto à
autenticidade da presença de Jesus nos Evangelhos?
10. Quais são as duas grandes possibilidades com relação ao
relacionamento entre os Evangelhos?

358
11. Em que ordem os Evangelhos foram escritos de acordo com a hipótese
agostiniana?
12. Em que ordem Evangelhos foram os escritos de acordo com a hipótese
dos dois Evangelho?
13. Em que ordem os Evangelhos foram escritos de acordo com a visão da
prioridade marcana?
14. O que é a Hipótese dos Dois Documentos? E a Hipótese dos Quatro
Documentos?
15. O que é Q?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS

Jesus
BOCK, D. L. Jesus According to Scripture: Restoring the Portrait from
the Gospels (Downers Grove: InterVarsity, 2002).
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Methods (Grand Rapids: Baker, 2002).
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Critical Analysis of the Synoptic Gospels (Grand Rapids: Kregel,
2006).

1
“Pais apostólicos” é um rótulo técnico para os seguintes escritos: 1 e 2Clemente; As Cartas de

Inácio; A Carta de Policarpo aos Filipenses; O Martírio de Policarpo; A Didaquê; A Epistola de

Barnabé; O Pastor de Hermas; A Epístola a Diogneto; o Fragmento de Quadrado; e Fragmentos de

Papias. Veja M. W. Holmes, The Apostolic Fathers: Greek Texts and English Translations, 3. ed.

(Grand Rapids: Baker, 2007), especialmente p. 5-6. Além desses, outros escritos dos pais da igreja

primitiva são reunidos em várias outras coleções.

2
Para um extenso tratamento, veja R. E. Van Voorst, Jesus Outside the New Testament: An

Introduction to the Ancient Evidence (Grand Rapids: Eerdmans, 2000); veja também E. M.

Yamauchi, “Jesus Outside the New Testament: What Is the Evidence?”, em: M. J. Wilkins; J. P.

Moreland, orgs., Jesus Under Fire (Grand Rapids: Zondervan, 1995), p. 207-29.

364
3
G. E. Sterling, “Philo”, em: C. A. Evans; S. E. Porter, orgs., Dictionary of New Testament

Background (Downers Grove: InterVarsity, 2000), p. 789-93.

4
Veja M. O. Wise, “Dead Sea Scrolls”, em: J. B. Green; S. McKnight; I. H. Marshall, orgs.,

Dictionary of Jesus and the Gospels (Downers Grove: InterVarsity, 1992), p. 137-46, esp. p. 141.

5
Tradução nossa.

6
O particípio legomenou (“que foi chamado”) poderia ser pejorativo e significar “assim

chamado”. Alguns intérpretes entendem o uso aqui nesse sentido e apelam a ele como evidência de

que a declaração remonta a Josefo. Veja D. L. Bock, Studying the Historical Jesus: A Guide to

Sources and Methods (Grand Rapids: Baker, 2002), p. 54. No entanto, uma análise exaustiva do uso

dessa construção nos escritos de Josefo sugere que ela não era usada de uma maneira depreciativa

(veja Ant. 1.4.3 §§118-19; 8.5.3 §145; 12.10.5 § 412; e Apion 1.18 §118). A construção

provavelmente é autêntica porque reflete as características gramaticais e estilísticas de Josefo.

7
J. P. Meier, A Marginal Jew: Rethinking the Historical Jesus (New York: Doubleday, 1991), 3

vols., 1:57-58.

8
Tradução nossa.

9
Commentarium series in evangelium Matthaei 10.50.17; Contra Celso 1.47.

10
Para uma boa introdução as questões relacionadas ao Testimonium Flavianum, veja C. A.

Evans, “Jesus in Non-Christian Sources”, em: Dictionary of Jesus and the Gospels, p. 364-65.

11
Meier observou que entre os estudiosos proeminentes que afirmam um autêntico substrato e

mais algumas interpolações cristãs, estão os estudiosos judeus L. Feldman e P. Winter; estudiosos

protestantes influentes como J. H. Charlesworth; estudiosos católicos como C. M. Martini, W.

Trilling, e A. M. Dubarle; e estudiosos liberais como S. G. F. Brandon e M. Smith. L. H. Feldman,

“Flavius Josephus Revisited: The Man, His Writings, and His Significance”, em: W. Haase; H.

Temporini, orgs., Aufstieg und Niedergang der römischen Welt (New York: de Gruyter, 1984),

365
II/21.2, 822, declarou: “A grande maioria dos estudiosos modernos, assim como eu, a consideram

como parcialmente interpolada”.

12
Até mesmo as referências a Jesus na versão eslava de Guerra dos Judeus aparecem após 2.9.1.

Para uma discussão sobre a versão eslava, veja Evans, “Jesus in Non-Christian Sources”, p. 364-65.

13
S. Pines, An Arabic Version of the Testimonium Flavianum and Its Implications (Jerusalem:

Academy of Sciences and Humanities, 1971), p. 6.

14
Por exemplo, a construção traduzida “naquele tempo” aparece cinco vezes nos escritos de

Josefo. Ele usou o adjetivo “maravilhosa/inacreditável” 39 vezes. Outras características do texto são

inigualáveis em Josefo, tal como sua descrição dos profetas como “divinos”. Essas e outras

estatísticas sobre o vocabulário são úteis na reconstrução da declaração original de Josefo e na

identificação das interpolações cristãs posteriores. Veja especialmente Meier, Marginal Jew, 1:80-83.

15
Ibid., 1:64-66.

16
Ibid., 1:68.

17
Um resumo excelente do material rabínico com citações de textos chave aparece em C. A.

Evans, “Jesus in Non-Christian Sources”, p. 366-67.

18
b. Sanh. 106a. Veja também b. Shab. 104b; b. Sanh. 43a; m. Yeb. 4:13; b. Yeb. 49a.

19
b. Sanh. 107b; b. Sot. 47a; y. Hag. 2:2; y. Sanh. 6:6.

20
b. Sanh. 107b; veja t. Shab. 11:15; b. Sanh. 43a; b. Shab. 104b; b. Sot. 47a.

21
b. Sanh. 103a; b. Ber. 17a-b; b. Abod. Zar. 16b-17a; t. Hul. 2:24; m. Avot 4:19; b. Shab. 116a-

b.

22
b. Shab. 116a; y. Taan. 2:1; Exod. Rab. 29.5 em Êxodo 20.2; Deut. Rab. 2.33 em Deuteronômio

6.4; Yal. Shim. em Números 23.7; Deut. Rab. 8.6 em Deuteronômio 30.11,12; b. Sanh. 61b.

366
23
b. Sanh. 43a.

24
b. Git. 57a, MS. M.

25
b. Sanh. 106a.

26
Veja t. Hul. 2:22-3; y. Shab. 14:4; y. Abod. Zar. 2:2; b. Abod. Zar. 27b; Qoh. Rab. 10:5.

27
R. T. France, The Evidence for Jesus (Downers Grove: InterVarsity, 1986), p. 39.

28
Justino Mártir, Diálogo 69.7; Primeira Apologia 30; Orígenes, Contra Celso 1.68.

29
Mas é provável que Jesus tenha realmente sido crucificado no ano 33. Veja a seção sobre a

cronologia da vida de Jesus abaixo; cf. “The Date of Jesus’ Crucifixion”, em: W. Grudem, ed. geral,

The ESV Study Bible (Wheaton: Crossway, 2008), p. 1809-10.

30
Suetônio, Vida do Imperador Cláudio 25.4.

31
Júlio Africano, Frag. 18.

32
Meier, Marginal Jew, 1:92; cf. R. L. Wilken, The Christians as the Romans Saw Them (New

Haven: Yale University Press, 1984), p. 96-97.

33
Bock, Studying the Historical Jesus, 52; Meier, Marginal Jew, 1:102-20.

34
Para uma descrição mais detalhada dos estudos sobre Jesus desde 1778, veja N. T. Wright,

Jesus and the Victory of God, Christian Origins and the Question of God 2 (Minneapolis: Fortress,

1992), p. 3-121.

35
Para uma edição recente, veja C. H. Talbert, ed., Reimarus Fragments, Scholars Press Reprints

and Translations (Chico: Scholars Press, 1985).

36
Wright, Jesus and the Victory of God, p. 17.

367
37
Para uma tradução em inglês, veja D. F. Strauss, The Life of Jesus, Critically Examined, Lives

of Jesus (Philadelphia: Fortress, 1973 [ed. orig. alemã 1835]).

38
Wright, Jesus and the Victory of God, p. 17. Foi o medo deste escandaloso ponto de vista que

levou Reimarus a evitar a publicação por medo do estado. Meio século depois a proposta custou o

posto de D. F. Strauss em Tübingen.

39
Uma das mais famosas “Vidas” foi escrita pelo católico romano E. Renan, Life of Jesus,

Modern library (New York: Random House, 1927).

40
A crítica da fonte, assim, foi gerada — não de um ponto de vista meramente exegético, como

mais tarde foi o caso com a crítica da redação — mas de um desejo de identificar o Jesus histórico.

Assim H. J. Holtzmann, que “provou” a Hipótese das Duas Fontes na mente de muitos, foi obrigado

a concluir seu livro com um capítulo sobre a vida de Jesus visto da “Fonte A”, truncada de Marcos.

Veja H. J. Holtzmann, Die synoptischen Evangelien: Ihr Ursprung und geschichtlicher Charakter

(Leipzig: Engelmann, 1863), p. 468-96.

41
W. B. Tatum, In Quest of Jesus, ed. rev. e amp. (Nashville: Abingdon, 1999), p. 93-94.

42
A mais atualizada tradução inglesa baseada na segunda edição alemã de 1913 é A. Schweitzer,

em: J. Bowden, org., The Quest of the Historical Jesus (Minneapolis: Fortress, 2001).

43
Esta foi a tese de outro trabalho importante em 1892 que ajudou a terminar a primeira busca.

Edição em inglês: M. Kähler, The so-called historical Jesus and the historic, biblical Christ, edição e

tradução para o inglês de C. E. Braaten (Philadelphia: Fortress, 1964).

44
Mas veja Bock (Studying the Historical Jesus, p. 145), que corretamente observou que homens

como A. Schlatter — e antes dele Westcott, Hort e Lightfoot — abordaram Jesus de um ponto de

vista mais conservador e refrearam uma teologia liberal.

45
Tatum, In Quest of Jesus, p. 99.

368
46
Wright, Jesus and the Victory of God, p. 23.

47
Termo frequentemente usado para descrever a essência dessa pregação era teologia

querigmática (de kerygma, “pregação”).

48
B. Mack, A Myth of Innocence: Mark and Christian Origins (Philadelphia: Fortress, 2006), p.

76-77; veja mais adiante para discussão adicional do trabalho de Mack.

49
J. D. Crossan, The Historical Jesus: The Life of a Mediterranean Jewish Peasant (San

Francisco: Harper Collins, 1991), p. 422; veja adiante, para discussão adicional do trabalho de

Crossan.

50
Veja B. Witherington III (The Jesus Quest: The third search for the jew of Nazareth [Downers

Grove: InterVarsity, 1995], p. 11), cujo comentário de que “o movimento se afogou na água bem

antes dos anos 1970” obviamente foi prematuro.

51
Para uma investigação bastante extensa veja Witherington, Jesus Quest.

52
G. B. Caird, Jesus and the Jewish Nation (London: Athlone, 1965).

53
Tatum, In Quest of Jesus, p. 103.

54
Wright, Jesus and the Victory of God, p. 85-86.

55
Veja o clássico trabalho de R. Bultmann, “Is Exegesis Without Presuppositions Possible?”, em:

Existence and Faith, tradução para o inglês de S. M. Ogden (New York: World, 1960), p. 342-51; cf.

cap. 5, “The Interpreter”, em: W. W. Klein; C. L. Blomberg; R. L. Hubbard Jr., Introduction to

Biblical Interpretation, ed. rev. e atualizada (Nashville: Thomas Nelson, s.d.); e apêndices 1 e 2, em:

G. R. Osborne, The Hermeneutical Spiral: A Comprehensive Introduction to Biblical Interpretation,

ed. rev. e exp. (Downers Grove: InterVarsity, 2006), [publicado em português por Vida Nova sob o

título A espiral hermenêutica: uma abordagem à interpretação bíblica].

56
Wright, Jesus and the Victory of God, p. 90-124.

369
57
G. Vermes, “Jesus the Jew”, em Jesus’ Jewishness: Exploring the Place of Jesus in Early

Judaism (New York: Crossroad, 1991), p. 108-22; E. P. Sanders, Jesus and Judaism (Philadelphia:

Fortress, 1985); M. Casey, From Jewish Prophet to Gentile God: The Origins and Development of

New Testament Christology (Louisville: Westminster John Knox, 1991); Witherington, Jesus Quest,

p. 185-96; Meier, Marginal Jew; S. G. F. Brandon, Jesus and the Zealots: A Study of the Political

Factor in Primitive Christianity (Manchester: University Press, 1967); P. Stuhlmacher, Jesus of

Nazareth — Christ of Faith, tradução para o inglês de S. Schatzmann (Peabody: Hendrickson, 1993).

58
Para um útil recurso, veja H. W. House, The Jesus Who Never Lived: Exposing False Christs

and Finding the Real Jesus (Eugene, OR: Harvest House, 2008).

59
Veja D. Brown, The Da Vinci Code (New York: Doubleday, 2003) e discussão adicional a

seguir. Para uma crítica da descrição que Brown faz de Jesus, veja C. L. Quarles, “Revisionist Views

About Jesus”, em: Paul Copan; William Lane Craig, orgs., Passionate Conviction: Contemporary

Discourses on Christian Apologetics (Nashville: B&H Academic, 2007), p. 94-108. Para uma crítica

sucinta, veja A. J. Köstenberger, The Da Vinci Code: Is Christianity true? (Wake Forest: SEBTS,

s.d.; postado em www.sebts.edu/davinci). Para outras críticas veja T. P. Jones, Misquoting Truth: A

Guide to the Fallacies of Bart Ehrman’s Misquoting Jesus (Downers Grove: InterVarsity, 2007); D.

L. Bock, Breaking the Da Vinci Code (Nashville: Thomas Nelson, 2004); e J. Garlow; P. Jones,

Cracking Da Vinci’s Code (Colorado Springs: Cook, 2004).

60
Resumos mais extensos de muitas descrições de Jesus apresentadas abaixo encontram-se em

Witherington, Jesus Quest; e M. A. Powell, Jesus as a Figure in History: How Modern Historians

View the Man from Galilee (Louisville: Westminster John Knox, 1998). Veja também W. S.

Kissinger, The Lives of Jesus: A History and Bibliography, Garland reference library of the

humanities 452 (New York/London: Garland, 1985); e W. P. Weaver, The Historical Jesus in the

Twentieth Century (1900-1950) (Harrisburg: Trinity Press International, 1999).

370
61
Veja a breve descrição sobre Cinismo no capítulo 2. Veja também F. G. Downing, Christ and

the Cynic: Jesus and Other Radical Preachers in First Century Tradition (Sheffield: Sheffield

Academic Press, 1988); id., Jesus and the Threat of violence (London: SCM, 1987); Mack, Myth of

Innocence; Crossan, Historical Jesus. Sobre os dois últimos escritores, veja o levantamento da

“Busca do Jesus Histórico”.

62
Os escritos de Crossan também exerceram considerável influência sobre escritoras feministas,

tais como E. S. Fiorenza e R. R. Ruether. Sobre o Jesus feminista, veja mais adiante.

63
M. J. Borg, Jesus: A New Vision (San Francisco: Harper, 1987); G. Vermes, Jesus the Jew: A

Historian’s Reading of the Gospels, 2. ed. (New York: Macmillan, 1983).

64
M. J. Borg, Meeting Jesus Again for the First Time: The Historical Jesus and the Heart of

Contemporary Faith (San Francisco: Harper, 1995), p. 14.

65
Veja C. A. Evans, “Holy Men, Jewish”, em: Dictionary of New Testament Background, p. 505-

507.

66
Sanders, Jesus and Judaism, p. 153.

67
Para resumos mais extensos dos pontos de vista de Sanders, veja Powell, Jesus, p. 113-29;

Witherington, Jesus Quest, p. 116-36.

68
G. Theissen, Sociology of Early Palestinian Christianity (Philadelphia: Fortress, 1978); id.,

The Gospels in Context: Social and Political History in the Synoptic Tradition (Edinburgh: T&T

Clark, 1992); R. A. Horsley; J. S. Hanson, Bandits, Prophets and Messiahs: Popular Movements at

the Time of Jesus (Minneapolis: Winston, 1985); R. A. Horsley, Sociology and the Jesus Movement

(New York: Crossroad, 1989); id., The liberation of Christmas: The Infancy Narratives in Social

Context (New York: Crossroad, 1989); R. D. Kaylor, Jesus the Prophet: His Vision of the Kingdom

on Earth (Louisville: Westminster John Knox, 1994). Para resumos úteis da apresentação de Jesus

371
como um profeta social, veja Witherington, Jesus Quest, p. 137-60; e Powell, Jesus as a Figure in

History, p. 52-54.

69
E. S. Fiorenza, In Memory of Her: A Feminist Theological Reconstruction of Christian Origins

(New York: Crossroad, 1984); id., Jesus: Miriam’s Child, Sophia’s Prophet: Critical Issues in

Feminist Christology (New York: Continuum, 1994). Para um excelente resumo do ponto de vista de

Fiorenza sobre Jesus, veja Witherington, Jesus Quest, p. 163-85.

70
Para um envolvimento mais completo e crítico do Jesus feminista, veja M. E. Köstenberger,

Jesus and the Feminists: Who Do They Say That He Is? (Wheaton: Crossway, 2008).

71
R. R. Ruether, Women and Redemption: A Theological History (Minneapolis: Fortress, 1998),

p. 16-20. O resumo seguinte é devido a Köstenberger, Jesus and the Feminists, cap. 7. Veja também

sua avaliação da descrição que Ruether faz de Jesus (ibid).

72
B. Witherington III, The Christology of Jesus (Philadelphia: Fortress, 1990), p. 274-75

(embora ele observasse que essa discussão era “mais especulativa” do que as outras; p. 274).

73
B. Witherington III, Jesus the Sage: The Pilgrimage of Wisdom (Minneapolis: Fortress, 1994);

veja também id., John’s Wisdom: A Commentary on the Fourth Gospel (Louisville: Westminster John

Knox, 1995).

74
Mas veja A. H. I. Lee, From Messiah to Preexistent Son: Jesus’ Self-Consciousness and Early

Christian Exegesis of Messianic Psalms, WUNT 2/192 (Tübingen: Mohr Siebeck, 2005), que

argumenta que não foi a tradição da sabedoria judaica, e sim a consciência messiânica de Jesus que

formou a base da exegese messiânica da igreja primitiva de passagens do AT como Salmo 110.1 e

2.7; e a discussão da contribuição de Lee em A. J. Köstenberger; S. R. Swain, Father, Son and Spirit:

The Trinity and John’s Gospel, NSBT 24 (Downers Grove: InterVarsity, 2008), p. 39-41.

75
Veja A. J. Köstenberger, John, BECNT (Grand Rapids: Baker, 2004), p. 26-27.

76
Witherington, Christology of Jesus, p. 267.

372
77
Ibid., p. 263-77.

78
Meier, Marginal Jew.

79
N. T. Wright, The New Testament and the People of God, Christian Origins and the Question of

God 1 (Minneapolis: Fortress, 1992); id., Jesus and the Victory of God; e id., The Resurrection of the

Son of God, Christian Origins and the Question of God 3 (Minneapolis: Fortress, 2003).

80
Wright, Jesus and the Victory of God, p. 653.

81
Schweitzer, Quest of the Historical Jesus.

82
Veja C. Brown, “Quest of the Historical Jesus”, em: Dictionary of Jesus and the Gospels, p.

331. Para um útil levantamento das várias buscas de Jesus, veja Tatum, In Quest of Jesus.

83
Crossan, Historical Jesus, xxviii.

84
N. T. Wright, “Taking the Text With Her Pleasure: A Post-Post-Modernist Response to J.

Dominic Crossan, The Historical Jesus: The Life of a Mediterranean Jewish Peasant with Apologies

to A. A. Milne, St Paul and James Joyce”, Theol 96 (1993), p. 303-10.

85
Embora muitos estudiosos norte-americanos estejam insistindo na prioridade e independência

dos Evangelhos perdidos, os estudiosos na Europa geralmente não foram convencidos pelos seus

argumentos.

86
Brown, Da Vinci Code.

87
J. D. Crossan, Four Other Gospels: Shadows on the Contours of the Canon (New York: Harper

& Row, 1985).

88
Crossan, Historical Jesus.

89
A mais antiga referência conhecida está em Hipólito, Refutação de Todas as Heresias 5.7.20.

373
90
P. Oxy. 1, 654 e 655 contêm o Prólogo, ditos 1-7,24,26-33,36-39,77.

91
Para uma edição crítica dos textos coptas e gregos, veja B. Layton, ed., Nag Hammadi Codex

II, 2-7 Together with XIII,2*, Brit. Lib. Or. 4296 (1), e P. Oxy. 1, 654, 655 (Leiden: Brill, 1989). Para

uma introdução e tradução em inglês do texto copta, veja J. M. Robinson, org., The Nag Hammadi

Library in English (San Francisco: Harper, 1990).

92
Crossan, Historical Jesus, p. 427.

93
W. Schrage, Das Verhältnis des Thomas-Evangeliums zur synoptischen Tradition und zu den

koptischen Evangelienübersetzungen, BZNW 29 (Berlin: Töpelmann, 1964). Um resumo bastante

útil de suas conclusões aparece nas páginas 1-11.

94
C. L. Quarles, “The Use of the Gospel of Thomas in the Research on the Historical Jesus of

John Dominic Crossan”, CBQ 69 (2007), p. 517-36.

95
R. Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses: The Gospels as Eyewitness Testimony (Grand

Rapids: Eerdmans, 2006), p. 236-37.

96
H. M. Schenke, On the Compositional History of the Gospel of Thomas (Claremont: Institute

for Antiquity and Christianity, 1998), p. 1-25, especialmente p. 25.

97
S. Davies, Thomas and Christian Wisdom (New York: Harper & Row, 1983), p. 3; H. Koester,

Ancient Christian Gospels: Their History and Development (Philadelphia: Trinity Press International,

1990), p. 85; S. Patterson, The Gospel of Thomas and Jesus, FFRS (Sonoma: Polebridge, 1993), p.

113-18.

98
M. Meyer, The gospel of Thomas: The Hidden Sayings of Jesus, New Translation, with

Introductions and Notes (San Francisco: Harper, 1992), p. 25.

99
S. Patterson, “Understanding the gospel of Thomas Today”, em: S. J. Patterson; J. M.

Robinson H. G. Bethge, orgs., The Fifth Gospel: The Gospel of Thomas Comes of Age (Harrisburg:

374
Trinity Press, 1998), p. 43-44; cf. H. Jackson, The Lion Becomes Man: The Gnostic Leontomorphic

Creator and the Platonic Tradition, SBLDS 81 (Atlanta: Scholars Press, 1985).

100
N. Perrin, Thomas and Tatian: The Relationship Between the Gospel of Thomas and the

Diatessaron, Academia Biblica 5 (Leiden: Brill, 2002), p. 193-94. Perrin reconheceu que a teoria da

dependência que Tomé tinha de Taciano foi proposta anteriormente por Drijvers e Schippers. Veja

Drijvers, “Facts and Problems”, p. 173; e R. Schippers, Het Evangelie van Thomas: Apocriefe

Woorden van Jezus: Vertaling, inleiding en kommentar (Kampen: Kok, 1960). A teoria de que o

Evangelho de Tomé foi primeiramente composto em siríaco ou dependente de fontes siríacas foi

proposta anteriormente por A. Guillamont, H. J. W. Drijvers, H. Quecke, K. Rudolph, F. Morard e A.

Strobel. Veja Perrin, Thomas, p. 6-7, para referências; cf. o trabalho mais recente de Perrin, Thomas:

the Other Gospel (Louisville: Westminster John Knox, 2007); e a revisão de C. L. Quarles em JETS

51 (2008), p. 158-60.

101
Eusébio, Hist. Ecl. 3.3.1-4; 3.25.6; 6.12.3-6.

102
O presente conhecimento do conteúdo do Evangelho de Pedro é limitado uma vez que os

textos completos já não existem. O fragmento mais extenso do Evangelho de Pedro começa no final

do julgamento de Jesus e é interrompido no início de uma descrição da aparição de Cristo após a

ressurreição aos Doze. O Evangelho de Pedro original pode ter incluído relatos do nascimento,

infância, juventude e ministério como adulto de Jesus, e mais. Essa suposição é corroborada pela

alegação de Orígenes (Coment. Mat. 10.17) de que o Evangelho de Pedro alegava que José, o marido

de Maria, tinha filhos de um primeiro casamento. C. A. Evans, Fabricating Jesus: How Modern

Scholars Distort the Gospels (Downers Grove: InterVarsity, 2006), p. 78-85, sugeriu recentemente

que o fragmento de Akhmim pode ter sido identificado de forma incorreta como o Evangelho de

Pedro, uma vez que Serapião descreveu o evangelho como docético (negando que Jesus tinha um

corpo físico), mas o fragmento de Akhmim não dispõe de tendências docéticas.

375
103
Para uma discussão mais completa do uso do Evangelho de Pedro em pesquisas sobre o Jesus

histórico, veja C. L. Quarles, “The Gospel of Peter: Does it Contain a Precanonical Resurrection

Narrative?”, em: R. Stewart, org., The Resurrection of Jesus: John Dominic Crossan and N. T. Wright

in Dialogue (Minneapolis: Fortress, 2006), p. 106-20.

104
Crossan, Four Other Gospels, p. 132-34; id., Cross That Spoke, p. 16-30; id., Historical

Jesus, p. 429.

105
Crossan reconheceu a teoria de Koester de que Marcos, João e o Evangelho de Pedro podem

ter se baseado, de forma independente, em uma fonte anterior. Mas ele insistiu: “composta nos anos

cinquenta da era cristã e, possivelmente, em Séforis na Galileia, ele [o Evangelho da Cruz] é a única

fonte intracanônica das narrativas da Paixão” (Historical Jesus, p. 429).

106
O texto grego do Evangelho de Pedro utilizado é o texto de E. Klostermann que aparece na

íntegra em várias partes de K. Aland, Synopsis Quattuor Evangeliorum (Stuttgart: Deutsche

Bibelgesellschaft, 1986). O texto de Klostermannt difere daquele de M. G. Mara, a mais recente

edição crítica, em apenas algumas poucas pressuposições. Para uma comparação dessas duas edições,

veja F. Neirynck, “Apocryphal Gospels and Mark”, em: J. M. Sevrin, org., The New Testament in

Early Christianity: La reception des écrits néotestamentaires dans le christianisme primitif (Leuven:

University Press, 1989), p. 140-41.

107
Inferências feitas a partir do estilo preciso do Evangelho de Pedro devem ser experimentais

uma vez que o texto do Evangelho que está atualmente disponível provavelmente é muito diferente

do texto original. Os dois fragmentos do Evangelho de Pedro do P. Oxy. 2949 são bem resumidos.

Baseado no alinhamento dos dois fragmentos sugerido por Crossan (Cross That Spoke, p. 8-9), o P.

Oxy 2949 consiste em porções de apenas 13 linhas de texto. Mas até mesmo as comparações do texto

de Akhmim com o P. Oxy. 2949 mostram que os dois textos pertencem a recensões

significativamente diferentes. Das 25 palavras no P. Oxy. 2949, apenas 15 são compartilhadas pelo

manuscrito de Akhmim. Embora os dois manuscritos essencialmente concordem, o segundo

376
manuscrito contém novas palavras e orações não encontradas no texto mais antigo, emprega

vocabulário diferente e tem muitas e diferentes formas gramaticais. Questiona-se, então, se o

primeiro texto do Evangelho de Pedro encontra-se preservado o suficiente no manuscrito de Akhmim

a ponto de tornar confiáveis as conclusões extraídas das investigações redacionais. Para

preocupações semelhantes de outro estudioso, veja Koester, Ancient Christian Gospels, p. 219. Para

uma comparação mais detalhada dos fragmentos disponíveis, veja J. C. Treat, “The Two Manuscript

Witnesses to the Gospel of Peter”, SBLSP (Atlanta: Scholars Press, 1990), p. 398-99.

108
Crossan, Cross That Spoke, p. 271.

109
R. Gundry, Matthew: A Commentary on His Handbook for a Mixed Church Under

Persecution, 2. ed. (Grand Rapids: Eerdmans, 1994), p. 584.

110
J. P. Meier, The Roots of the Problem and the Person, A Marginal Jew: Rethinking the

Historical Jesus (New York: Doubleday, 1991), vol. 1, p. 117.

111
Essa evidência para a dependência foi provavelmente o resultado de o autor do Evangelho de

Pedro ter memorizado o relato de Mateus. Aparentemente, ele não tinha cópias dos quatro

Evangelhos abertas à sua frente enquanto escrevia seu Evangelho, pois nesse caso seria esperado

maior número de paralelos verbais continuados e maior número de semelhanças na sequência de

perícopes. Brown destacou que, ao contrário do Evangelho de Pedro, o Diatessaron de Taciano é

claramente reconhecível em vocabulário e sequência como uma harmonização. Veja R. E. Brown,

The Death of the Messiah: From Gethsemane to the Grave: A Commentary on the Passion

Narratives in the Four Gospels, ABRL (New York: Doubleday, 1994), 2:1334-36.

112
Veja C. L. Quarles, “The Protevangelium of James as an Alleged Parallel to Creative

Historiography in the Synoptic Birth Narratives”, BBR 8 (1998), p. 139-49, especialmente p. 144-49.

R. Brown (Death of the Messiah, 2:1135) também observou semelhanças nas estratégias de

composição do Evangelho de Pedro e do Protoevangelho de Tiago: “[…] Quanto à classificação

literária eu consideraria o Protoevangelho um primo do Evangelho de Pedro, da mesma espécie que

377
os Evangelhos apócrifos. Os instintos composicionais são quase os mesmos, mas o autor do

Protoevangelho de Tiago teve acesso a cópias escritas de Lucas e Mateus. Por um lado, ele é mais

expandido e elaborado pelos Evangelhos canônicos do que o Evangelho de Pedro; por outro lado,

quando os cita, ele o faz com grande preservação do vocabulário exato. De forma dramática, as duas

obras descrevem eventos escatológicos que os Evangelhos canônicos gostariam de deixar envolvido

em silêncio: o verdadeiro nascimento de Jesus no Protoevangelho de Tiago 19 e a verdadeira

ressurreição no Evangelho de Pedro 10.39-41”.

113
J. Elliot, 1Peter, AB (New York: Doubleday, 2000), p. 706-10; B. Reicke, The Disobedient

Spirits and Christian Baptism: A Study of 1Peter III.19 and Its Context, ASNU 13 (Copenhagen:

Munksgaard, 1946), p. 115-18; E. G. Selwyn, “Unsolved New Testament Problems: The Problem of

the Authorship of I Peter”, ExpTim 59 (1947), p. 340.

114
M. G. Mara (Évangile de Pierre: Introduction, texte critique, traduction, commentaire et

index, SC 201 [Paris: Gabalda, 1973]) sugeriu que essa referência à imagem apocalíptica de

Apocalipse é parte de uma sequência de alusões. A habilidade gloriosa de Cristo de quebrar os sete

selos se aproxima em muito de Apocalipse 5.1 (p. 170). A alta voz vinda do céu no dia do Senhor faz

um paralelo com a experiência de João em Apocalipse 1.10. Apocalipse 11.11,12, como o Evangelho

de Pedro, descreve uma alta voz, uma ressurreição e uma ascensão ao céu (p. 177-78). Ap 10.1-3

descreve uma figura celestial de grande tamanho (p. 183-84). Brown (Death of the Messiah, 2:1296)

comentou: “o número sete é comumente simbólico na Bíblia, mas é difícil ter certeza se aqui o sete é

apenas parte da imaginação folclórica ou tem um simbolismo especial. Pode-se apelar a Apocalipse

5.1-5, que tem um rolo selado com sete selos que não pode ser aberto por ninguém no céu ou na

terra, exceto pelo leão da tribo de Judá, a raiz de Davi que triunfou — isso poderia reforçar o

significado óbvio do Evangelho de Pedro de que tudo foi feito para tornar difícil a abertura do

sepulcro (mas o poder Deus romperia todas essas precauções humanas)”.

115
Vários outros estudiosos reconheceram independentemente a importância dessa referência

para a datação do documento. Veja também A. Kirk, “Examining Priorities: Another Look at the

378
Gospel of Peter’s Relationship to the New Testament Gospels”, NTS 40 (1994), p. 593. Wright

(Resurrection of the Son of God, p. 594) listou essa expressão, juntamente com outros sete elementos,

como “evidência conclusiva para o Evangelho de Pedro ser mais tardio e mais desenvolvido do que

os paralelos canônicos”.

116
Crossan (Historical Jesus, p. 429) observou que o Evangelho da Cruz foi composto nos anos

50 provavelmente em Séforis da Galileia. Outros estudiosos destacaram problemas históricos

adicionais no Evangelho de Pedro. Brown (Death of the Messiah, 2:1232) destacou que o autor

apresentou Herodes como um observante judeu e como o mandatário supremo da Palestina, a quem

até mesmo Pilatos era subserviente. O Evangelho de Pedro também apresenta uma enorme multidão

de Jerusalém e de suas vizinhanças viajando no sábado para ver a tumba selada, em um aparente

desrespeito aos regulamentos de observância do sábado (p. 1308). Brown também demonstrou que o

autor do Evangelho de Pedro estava confuso quanto à cronologia das festas judaicas (p. 1340).

117
Crossan (Historical Jesus, p. 389) descreveu a cruz como uma “enorme procissão cruciforme”

de indivíduos ressuscitados juntamente com Jesus; veja Crossan, Who Killed Jesus, 197. Muitos

estudiosos não foram convencidos pela interpretação de Crossan da cruz falante; veja Wright,

Resurrection, p. 595.

118
Somos devedores a B. J. Creel por destacar esses paralelos do século II do Evangelho de

Pedro compilados pela primeira vez em L. Vaganay, L’Évangile de Pierre, 2. ed. (Paris: Gabalda,

1930), p. 300. Veja Epist. Apost. 16; Apoc. Pedro. 1; Pastor de Hermas 83.1 (veja 89.8; 90.1);

4Esdras 2.43.

119
Veja M. Smith, Clement of Alexandria and a Secret Gospel of Mark (Cambridge: Harvard

University Press, 1973); id., The Secret Gospel: The Discovery and Interpretation of the Secret

Gospel According to Mark (New York: Harper & Row, 1973).

120
Q. Quesnell, “The Mar Saba Clementine: A Question of Evidence”, CBQ 37 (1975), p. 48-67.

379
121
C. W. Hedrick, “Secret Mark: New Photographs, New Witnesses”, Fourth R 13 (2000), p. 3-

16.

122
H. Koester, History and Literature of Early Christianity, Introduction to the New Testament

(Philadelphia: Fortress, 1982), vol. 2, p. 168-69.

123
B. M. Metzger, Reminiscences of an Octogenarian (Peabody: Hendrickson, 1997), p. 128-32;

B. D. Ehrman, Lost Christianities: The Battles for Scripture and the Faiths We Never Knew (Oxford:

University Press, 2003), p. 67-89.

124
H. Koester, “History and Development of Mark’s Gospel (From Mark to Secret Mark and

‘Canonical’ Mark)”, em: B. Corley, org., Colloquy on New Testament Studies: A Time for

Reappraisal and Fresh Approaches (Macon: Mercer University Press, 1983); Crossan, Four Other

Gospels, p. 61-83.

125
S. C. Carlson, The Gospel Hoax: Morton Smith’s Invention of Secret Mark (Waco: Baylor

University Press, 2005). S. Brown tentou contestar as alegações de Carlson argumentando que Smith

não tinha um motivo razoável para a falsificação. Veja S. Brown, “The Question of Motive in the

Case Against Morton Smith”, JBL 125 (2006), p. 351-83; id., Mark’s Other Gospel: Rethinking

Morton Smith’s Controversial Discovery, Studies in Christianity and Judaism (Waterloo, Ontario:

Wilfrid Laurier University, 2005).

126
M. Smith, Tannaitic Parallels to the Gospels, SBLMS 6 (Philadelphia: SBL, 1951), p. 155-

56.

127
M. Smith, “Comments on Taylor’s Commentary on Mark”, HTR 48 (1955), p. 26.

128
Smith, Secret Gospel, ix.

129
Ibid., p. 148.

130
Capa de Carlson, Gospel Hoax.

380
131
Carlson, Gospel Hoax, xii.

132
Veja R. Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses: The Gospels as Eyewitness Testimony (Grand

Rapids: Eerdmans, 2006).

133
Josefo, Ant. 17.6.5-6 e 17.8.1 §§ 167-81, 188-92.

134
H. Hoehner, “Chronology”, Dictionary of Jesus and the Gospels, p. 118-22.

135
W. E. Filmer, “The Chronology of the Reign of Herod the Great”, JTS 17 (1966), p. 283-98;

E. L. Martin, “The Nativity and Herod’s death”, em: J. Vardaman; E. Yamauchi, orgs., Chronos,

Kairos, Christos: Nativity and Chronological Studies Presented to Jack Finegan (Winona Lake:

Eisenbrauns, 1989), p. 85-92.

136
Veja T. D. Barnes, “The Date of Herod’s Death”, JTS 19 (1968), p. 204-9; D. Johnson, “And

They Went Eight Stades Toward the Herodeion”, em: Chronos, Kairos, Christos, p. 93-99; H.

Hoehner, “The Date of the Death of Herod the Great”, em: Chronos, Kairos, Christos, p. 101-11; P.

L. Maier, “The Date of the Nativity and the Chronology of Jesus’ life”, em: Chronos, Kairos,

Christos, p. 113-30; R. E. Brown, The Birth of the Messiah: A Commentary on the Infancy Narratives

in Matthew and Luke (New York: Doubleday, 1979), p. 166-67.

137
Alguns estudiosos, como R. Brown (Birth of the Messiah, p. 547-55), estão convencidos de

que Lucas se equivocou na menção do censo e no papel de Quirino na Síria durante o reinado de

Herodes, o Grande.

138
A rejeição da exatidão histórica de Lucas pode estar baseada na interpretação equivocada da

declaração de Lucas. A declaração de Lucas não requer que Quirino tenha sido governador da Síria

durante o reinado de Herodes. Quirino pode ter sido simplesmente o administrador do censo (veja D.

J. Hayles, “The Roman Census and Jesus’ Birth: Was Luke Correct? Parte 2: Quirinius’ Career and a

Census in Herod’s Day”, Buried History 10 [1974], p. 16-31, especialmente p. 29) ou o censo pode

ter começado no mandato de outro governador e sido concluído durante o de Quirino (veja D. L.

381
Bock, Luke 1.1-9.50, BECNT [Grand Rapids: Baker,1994], p. 909). Embora as traduções inglesas

apresentem Lucas 2.2b “enquanto Quirino era governador da Síria”, o verbo grego hēgemoneuō não

se refere necessariamente ao preenchimento do cargo de governador, mas pode se referir a

praticamente qualquer posto administrativo (BDAG, s.v. “ἡγεμονεύω” tem o significado de “exercer

uma posição administrativa”).

139
Veja a útil coleção de dados em J. Finegan, Handbook of biblical chronology, ed. rev.

(Peabody: Hendrickson, 1998), p. 320-28. Compare com O. Cullmann (Der Ursprung des

Weihnachtsfestes [Zürich/Stuttgart: Zwingli, 1960]), que apontou para a incerteza quanto à data de

nascimento de Jesus nos primeiros três séculos da era cristã. Ele alegou que a data tradicional foi

escolhida pela igreja por volta do século IV (Cullmann especifica 325-54 como a variação mais

provável, p. 24). Segundo Cullmann, o Natal servia como equivalente cristão do feriado romano do

sol invictus (“o invencível deus sol”), celebrado na época do solstício de inverno, na convicção de

que Jesus era o verdadeiro “sol” invencível cristão.

140
Isso é afirmado, entre outros, por, P. Maier, “Date of the Nativity”, cujo ensaio é o de maior

autoridade sobre o assunto.

141
Para referências bibliográficas, veja A. J. Köstenberger, John, BECNT (Grand Rapids: Baker,

2004), n. 2, p. 55-56. Fontes antigas a respeito da data da morte de Augusto são listadas em H. W.

Hoehner, Chronological Aspects of the Life of Christ (Grand Rapids: Zondervan, 1978), n. 13, p. 32.

142
Para uma excelente introdução às variadas opções cronológicas, veja Finegan, Handbook of

Biblical Chronology, p. 329-44; cf. Hoehner, Chronological Aspects, p. 29-38.

143
Hoehner, Chronological aspects, p. 38.

144
F. J. Badcock sugeriu a tradução, “este templo (ou santuário) foi construído (antes de vocês

nascerem) há quarenta e seis anos”. Veja Badcock, “A Note on St. John ii.20”, ExpTim 47 (1935), p.

40-41. O uso que João faz do verbo aoristo “foi construído” é provavelmente um “aoristo

382
consumativo”, que implica que a construção do templo estava completa, isto é, “este santuário foi

construído”. Esse tempo verbal teria sido estranho se o templo estivesse ainda em construção, como

sugere a maior parte dos tradutores (nesse caso o imperfeito teria sido mais adequado). Uma questão

mais difícil surge relacionada ao uso que João faz do dativo “anos”. O único outro uso do dativo com

“ano” (etos) no NT é Atos 13.20 onde claramente se refere a uma extensão de tempo e, portanto,

aceita a tradução convencional. No entanto, na LXX, a forma dativa de “ano” (etos) sem uma

preposição quase sempre se refere a um ponto no tempo. Veja a discussão em D. Wallace, Greek

Grammar Beyond the Basics: An Exegetical Syntax of the New Testament (Grand Rapids: Zondervan,

1996), p. 559-61, especialmente n. 15, 17 e 20. O argumento mais convincente para a tradução de

Badcock é o significado de “santuário” (naos, “edifício do templo”, em vez de “área do templo”) no

Evangelho de João. Para uma boa resposta à objeção de que a tradução de Badcock não se adequa ao

contexto, veja Köstenberger, John, p. 109-10.

145
Josefo, Ant. 15.11.1 §380; 15.10.3 §354.

146
Dião Cássio 54.7.4-6.

147
Hoehner (Chronological Aspects, p. 40-41) demonstrou que Josefo manteve a distinção

comum entre hieron e naos. O Evangelho de João também mantém essa distinção. João usou hieron

em seu Evangelho 11 vezes para se referir a todo o complexo do templo (Jo 2.14,15; 5.14; 7.14, 28;

8.2,20,59; 10.23; 11.56; 18.20). Ele usou naos três vezes e apenas nessa perícope. G. Theissen e A.

Merz (Historical Jesus, p. 151-61, especialmente p. 156) concordam que o décimo oitavo ano de

Herodes ocorreu em 20/19 a.C. Entretanto, eles aparentemente calcularam a data da primeira Páscoa

do ministério de Jesus a partir do começo da construção do naos e não de sua finalização, e dataram a

Páscoa da primavera de 27 ou 28.

148
Essa data deve ser vista apenas como uma aproximação. Josefo pode ter calculado o décimo

oitavo ano de Herodes usando um sistema conclusivo ou inclusivo. O sistema inclusivo incluía

qualquer parte do reinado levando ao início do calendário anual como um ano completo. Esse é o

383
sistema assumido por Hoehner. Entretanto, o sistema conclusivo contava anos completos desde o

início do reinado. Isso empurraria as datas do décimo oitavo ano de Herodes para alguns meses

depois. A cronologia do ministério de Jesus é complicada pelo fato de Josefo ter proposto outra data

para o início da construção do templo em outra de suas obras (Guerra Judaica 1.21.1 §401), que

datou o início da construção do templo no décimo quinto ano de |Herodes em vez de no décimo

oitavo, isto é, em 23/22 a.C. em vez de 20/19 a.C. Essa data alternativa (que permitiria a data 26 d.C.

para a primeira Páscoa de Jesus) pode ser resultado do erro de um escriba ou pode refletir a incerteza

de Josefo em relação ao início da construção.

149
Veja o quadro sobre a cronologia do ministério de Jesus no Evangelho de João em

Köstenberger, John, p. 11-13.

150
Hoehner, Chronological Aspects, p. 56-63.

151
Veja a discussão da possível importância cronológica de Marcos 2.23; 6.39 e João 6.4,10 em

Meier, A Marginal Jew, 1:413-14; cf. O quadro cronológico em Köstenberger, John, p. 11-12.

152
Veja D. A. Carson e D. J. Moo, An Introduction to the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids:

Zondervan, 2005), p. 125-26 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução ao

Novo Testamento], especialmente n. 129 (com referências bibliográficas adicionais).

153
Alguns estudiosos sugerem que o relato de João sobre Jesus purificando o templo no início de

seu ministério não é histórico, o que potencialmente reduziria a duração do ministério de Jesus,

segundo João, em um ano. Mas veja a discussão em Köstenberger, John, p. 111.

154
Veja TDNT 2:949-50.

155
Veja a tradução de João 19.14 na NVI: “era o Dia da Preparação na semana da Páscoa.”

156
C. J. Humphreys; W. G. Waddington, “Dating the crucifixion”, Nature 306 (1983), p. 743-6.

384
157
R. W. Funk; R. W. Hoover; Seminário de Jesus, The Five Gospels: The Search for the

Authentic Words of Jesus (New York: Polebridge, 1993).

158
H. Van der Loos, The Miracles of Jesus (Leiden: Brill, 1965), p. 6-7.

159
Luciano de Samósata, The Love of Lies, §16 citado em G. Twelftree, Jesus the Miracle

Worker: A Historical and Theological Study (Downers Grove: InterVarsity, 1999), p. 48.

160
B. de Espinosa, “Tractatus Theologico-Politicus (1670)”, em: R. H. M. Elwes, The Chief

Works of Benedict of Spinoza (London: George Bell & Son, 1883, 1884), 2 vols., 1:81-97.

161
M. Tindal, Christianity as Old as the Creation (n. p., 1730; reimpr. Stuttgart-Bad Cannstatt: F.

Frommann, 1967). Para um breve sumário da obra, veja W. Baird, From Deism to Tübingen, History

of New Testament Research (Minneapolis: Fortress, 1992), vol. 1, p. 41-43. Para o ponto de vista

deísta sobre a ressurreição de Jesus, veja W. L. Craig, The Historical Argument for the Resurrection

of Jesus During the Deist Controversy (Lewiston: Mellen, 1985), p. 71-352.

162
Baird, From Deism to Tübingen, p. 56-7.

163
Ibid.

164
D. Hume, Enquiries Concerning the Human Understanding and Concerning the Principles of

Morals, 2. ed., L. A. Selby-Bigge, org., (Oxford: Clarendon, 1884), p. 308-14. Para um breve resumo

e respostas, veja W. L. Craig, “The Problem of Miracles: A Historical and Philosophical

Perspective”, em: D. Wenham; C. L. Blomberg, orgs., The Miracles of Jesus, Gospel perspectives

(Sheffield: JSOT, 1986), vol. 6, p. 17-19, p. 22-27, p. 37-43; e Twelftree, Jesus the Miracle Worker,

p. 40-43.

165
F. Schleiermacher, The Christian Faith, tradução para o inglês de H. R. Mackintosh; J. S.

Stewart (Philadelphia: Fortress, 1976), p. 52.

385
166
W. Dembski, Intelligent Design: The Bridge Between Science and Theology (Downers Grove:

InterVarsity, 1999), p. 66. Todo capítulo intitulado “The Critique of Miracles” (p. 49-69) é uma

introdução útil e resposta aos argumentos de Espinosa and Schleiermacher.

167
R. Bultmann, “New Testament and Mythology”, em: H. W. Bartsch, org., Kerygma and Myth

(London: SPCK, 1953), p. 4.

168
R. Bultmann, Faith and Understanding (Philadelphia: Fortress, 1987), p. 248.

169
Bultmann, “New Testament and Mythology”, p. 5.

170
Ibid., p. 39.

171
R. Bultmann, Jesus and the Word (New York: Charles Scribner’s Sons, 1958), p. 8. S. Porter

corretamente questionou se o ponto de vista de Bultmann sobre a possibilidade de se recuperar

informação acurada sobre Jesus a partir dos Evangelhos era realmente tão rigoroso quanto esta

citação implica. Veja S. E. Porter, The Criteria for Authenticity in Historical-Jesus Research:

Previous Discussion and New Proposals, JSNTSup 191 (Sheffield: Sheffield Academic Press, 2000),

p. 45-47.

172
Veja W. L. Craig, The Existence of God and the Beginning of the Universe (San Bernardino:

Here’s Life, 1979); Dembski, Intelligent Design; J. P. Moreland; K. Nielsen, orgs., Does God Exist?

The Great Debate (Nashville: Thomas Nelson, 1990); A. Plantinga, God and Other Minds: A Study

of the Rational Justification of Belief in God (Ithaca: Cornell University Press, 1990); R. Swinburne,

Is There a God? (Oxford: University Press, 1996). Sobre a possibilidade de milagres, veja N. L.

Geisler, Miracles and the Modern Mind: A Defense of Biblical Miracles (Grand Rapids: Baker,

1992); R. D. Geivett; G. R. Habermas, orgs., In Defense of Miracles: A Comprehensive Case for

God’s Action in History (Downers Grove: InterVarsity, 1997); C. Brown, Miracles and the Critical

Mind (Grand Rapids: Eerdmans, 1984).

386
173
G. Barna, “Beliefs: General Religious”, (citado 1 de Maio, 2007); postado em:

http://www.Barna.org/FlexPage.aspx?Page=Topic&TopicID=2.

174
H. Taylor, “The Religious and Other Beliefs of Americans, 2003”, (citado 8 Maio, 2007);

postado em: http://www.harrisinteractive.com/harris_poll/index.asp?PID=359.

175
Veja R. Swinburne, “The Evidential Value of Religious Experience”, em: A. R. Peacocke,

org., The Sciences and Theology in the Twentieth Century (Stockfield: Oriel, 1981), p. 182-96.

176
D. Polkow, “Method and Criteria for Historical Jesus Research”, em: K. H. Richards, org.,

Society of Biblical Literature Seminar Papers, SBLSP 26 (Atlanta: Scholars Press, 1987), p. 336-56.

177
F. C. Burkitt, The Gospel History and Its Transmission, 3. ed. (Edinburgh: T&T Clark, 1911),

p. 147. Burkitt examinou Marcos e Q para dupla atestação. Após a publicação da obra de B. H.

Streeter (sobre a qual veja mais a seguir), o critério foi expandido para incluir também o material em

M e L.

178
C. H. Dodd, The Parables of the Kingdom, ed. rev. (New York: Charles Scribner’s Sons,

1961), p. 26-29; id., History and the Gospel (London: Nisbet, 1938), p. 91-102.

179
Porter, Criteria of Authenticity, p. 86-89.

180
Veja a discussão sobre as várias teorias referentes ao relacionamento dos Evangelhos

Sinóticos.

181
Veja C. L. Quarles, The Sermon on the Mount for Today (Nashville: B&H, 2009).

182
Veja U. C. von Wahlde, “Archaeology and John’s Gospel”, em: J. H. Charlesworth, org.,

Jesus and archaeology (Grand Rapids: Eerdmans, 2006), p. 560-66 (com referências adicionais); R.

Brown, The Gospel According to John I-XII, AB 29 (Garden City, NY: Doubleday, 1966), p. 206-7; e

Köstenberger, John, p. 178.

387
183
Veja Porter, Criteria of Authenticity, p. 71; Bultmann, History of the Synoptic Tradition, p.

205.

184
M. Hengel, The Charismatic Leader and His Followers, tradução para o inglês de J. C. G.

Greig (Edinburgh: T&T Clark, 1981), p. 5.

185
Para o chamado ao abandono do critério da dupla dissimilaridade, veja G. Theissen e D.

Winter, The Quest for the Plausible Jesus: The Question of Criteria, tradução para o inglês de E. M.

Boring (Louisville: Westminster John Knox, 2002), p. 27-171.

186
Ibid., p. 211.

187
Wright, Jesus and the Victory of God, p. 90

188
J. P. Meier, “Criteria: How do We Decide What Comes from Jesus?”, em: J. D. G. Dunn; S.

McKnight, orgs., The Historical Jesus in Recent Research (Winona Lake: Eisenbrauns, 2005), p. 134.

189
Ibid., p. 135.

190
Veja C. L. Quarles, “The Authenticity of the Parable of the Warring King: A Response to the

Jesus Seminar”, em: B. Chilton; C. A. Evans, orgs., Authenticating the Words of Jesus (Leiden: Brill,

1999), p. 409-30.

191
C. L. Blomberg, The Historical Reliability of the Gospels, 2. ed. (Downers Grove:

InterVarsity, 2007), p. 303-4.

192
Veja J. P. Meier, Mentor, Message, and Miracles, vol. 2 de The Marginal Jew (Garden City:

Doubleday, 1994), p. 617-970; Twelftree, Jesus the Miracle Worker; N. T. Wright, The Resurrection

of the Son of God, Christian origins and the question of God 3 (Minneapolis: Fortress, 2003).

193
Para uma boa introdução à crítica da forma, veja E. P. Sanders; M. Davies, Studying the

Synoptic Gospels (Philadelphia: Trinity Press International, 1989), p. 123-200.

388
194
Mas veja Darrell L. Bock (The Missing Gospels: Unearthing the Truth Behind Alternative

Christianities [Nashville: Thomas Nelson, 2006], p. 83-96, p. 115-30, p. 147-64, p. 183-214), que

explica como a teologia estava sendo ensinada e entendida em seu cerne enquanto o NT estava sendo

escrito. Todas as coisas que toda a igreja fazia — seja ler as Escrituras hebraicas, cantar hinos, recitar

resumos doutrinários ou praticar seus rituais — permitiam que se ensinasse aos primeiros cristãos o

cerne da teologia enquanto essas obras estavam sendo produzidas. Veja também Darrell L. Bock;

Daniel B. Wallace, Dethroning Jesus: Exposing Popular Culture’s Quest to Unseat the Biblical

Christ (Nashville: Thomas Nelson, 2007).

195
Veja Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses, cap. 10, e a literatura ali citada, a cujos

tratamentos a discussão seguinte está em débito; veja especialmente sua crítica de Bailey e Dunn nas

páginas 257-63.

196
K. E. Bailey, “Informal Controlled Oral Tradition and the Synoptic Gospels”, Asia Journal of

Theology 5 (1991), p. 34-54; id., “Middle Eastern Oral Tradition and the Synoptic Gospels”, ExpTim

106 (1995), p. 363-67; J. D. G. Dunn, Jesus Remembered, Christianity in the Making 1 (Grand

Rapids: Eerdmans, 2003), p. 173-254.

197
Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses, caps. 10 e 11.

198
Eusébio, Hist. Ecl. 3.39.14-16.

199
Alguns estudiosos sugerem que Papias escreveu sua obra “Exposições dos ditos do Senhor”

por volta do ano 130. Mas Bauckham (Jesus and the Eyewitnesses, p. 12-14) demonstrou que essa

data está baseada em evidência duvidosa.

200
Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses, p. 425-33.

201
Veja ibid., p. 114-47.

202
Bultmann, History of the Synoptic Tradition, p. 68,215,241,283,310,345,393; M. Dibelius,

From Tradition to Gospel, tradução para o inglês de B. L. Woolf (London: Nicholson & Watson,

389
1934), p. 50-53.

203
Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses, p. 73-74.

204
Ibid., 6. Para o ponto de vista de Bauckham sobre a autoria do Evangelho de João e uma

crítica a seu ponto de vista, veja cap. 7.

205
Blomberg, Historical Reliability, p. 25-30.

206
Ibid., p. 30.

207
Veja H. Lindsell, Battle for the Bible (Grand Rapids: Zondervan, 1976), p. 174-76. Para

explicar variações no vocabulário entre os Evangelhos, Lindsell alegou que Pedro negou a Jesus seis

vezes. Mas essa alegação é conflitante com a própria profecia de Jesus de que Pedro o negaria por

três vezes antes que o galo cantasse.

208
Para uma discussão mais prolongada sobre abordagens legítimas à harmonização, veja

Blomberg, Historical Reliability, p. 152-240; id., “The Legitimacy and Limits of Harmonization”,

em: D. A. Carson; J. D. Woodbridge, orgs., Hermeneutics, Authority, and Canon (Grand Rapids:

Zondervan, 1986), p. 139-74.

209
Recursos úteis incluem G. L. Archer Jr., The New International Encyclopedia of Bible

Difficulties (Grand Rapids: Zondervan, 2001 [1982]); N. L. Geisler; T. Howe, When Critics Ask: A

Popular Handbook on Bible Difficulties (Grand Rapids: Baker, 1992); W. C. Kaiser Jr., org., Hard

Sayings of the Bible (Downers Grove: InterVarsity, 1996).

210
Veja K. Aland, org., Synopsis of the Four Gospels (New York: United Bible Societies, 1982;

reimpr. Peabody: Hendrickson, 2006); id., Synopsis Quattuor Evangeliorum, 3. ed. (New York:

American Bible Society, 1988).

211
Essa tabela foi adaptada de R. Stein, The Synoptic Problem: An Introduction (Grand Rapids:

Baker, 1987), p. 35. Usar Marcos como modelo de comparação para a ordem das perícopes pode

390
prejudicar a discussão em favor da Prioridade Marcana. Essa não é a intenção aqui. A ordem de um

dos Evangelhos deve servir como base de comparação, e a grande semelhança na ordem em Marcos e

Lucas justifica usar Marcos ou Lucas dessa maneira.

212
Stein, Synoptic Problem, p. 38; cf. E. Best, “The Gospel of Mark: Who Was the Reader?”, IBS

11 (1989), p. 124-32.

213
Para comentaristas que afirmam que a declaração parentética foi o chamado de Jesus para

uma cuidadosa interpretação de Daniel, veja D. A. Carson, “Matthew”, em: Matthew, Mark, Luke,

EBC 8 (Grand Rapids: Zondervan, 1984), p. 500; C. Keener, A Commentary on the Gospel of

Matthew (Grand Rapids: Eerdmans, 1999), p. 576; W. D. Davies; D. Allison, Matthew 19-28, ICC

(London: T&T Clark, 1997), p. 346. J. Nolland (The Gospel of Matthew, NICGT [Grand Rapids:

Eerdmans, 2005], p. 972) argumentou que as palavras se referem aos leitores de Daniel em vez de

aos Evangelhos, mas que elas foram inseridas pelos evangelistas.

214
Tradução nossa. Além das mínimas diferenças óbvias na tradução (“principais sacerdotes” e

tempos verbais diferentes para o verbo “entregar”), os evangelistas usaram diferentes verbos

traduzidos por “saber”.

215
Veja especialmente G. K. Beale; D. A. Carson, org., Commentary on the New Testament Use

of the Old Testament (Grand Rapids: Baker, 2007). [publicado em português por Vida Nova sob o

título O uso do Novo Testamento no Antigo Testamento].

216
Entre os proponentes da independência dos Evangelhos estão H. Alford, The Four Gospels

(London: Rivington’s, 1863), p. 2-6; B. F. Westcott, An Introduction to the Study of the Gospels

(London: Macmillan, 1895); B. Reicke, The Roots of the Synoptic Gospels (Philadelphia: Fortress,

1986); E. Linnemann, Is There a Synoptic Problem? Rethinking the Literary Dependence of the First

Three Gospels (Grand Rapids: Baker, 1992).

391
217
Veja a breve história da discussão da igreja primitiva em D. Bock, Studying the Historical

Jesus: A Guide to Sources and Methods (Grand Rapids: Baker, 2002), p. 164-67. Para uma história

mais extensiva, veja Parte I de D. L. Dungan, A History of the Synoptic Problem: The Canon, the

Text, the Composition, and the Interpretation of the Gospels, ABRL (New York: Doubleday, 1999),

p. 11-144.

218
Alguns estudiosos alegam que a “hipótese agostiniana” é uma denominação inadequada. H. J.

de Jonge (“Augustine on the Interrelations of the Gospels”, em: F. van Segbroeck e outros, org., The

Four Gospels 1992: Fs. Frans Neirynck, BETL 100 [Leuven: Leuven University Press, 1992],

3:2417) afirmou: “A chamada ‘hipótese agostiniana” não reflete o ponto de vista de Agostinho sobre

a origem e as interrelações dos Evangelhos. A hipótese é uma invenção recente, possivelmente não

posterior ao século XVI.” Na p. 2410 de Jonge observa o singular “predecessor” na referência acima

citada por Agostinho.

219
A solução agostiniana para o problema sinótico foi defendida recentemente por B. C. Butler,

The Originality of St. Matthew (Cambridge: University Press, 1951); J. Wenham, Redating Matthew,

Mark, and Luke: A Fresh Assault on the Synoptic Problem (London: Hodder & Stoughton, 1991).

Compare D. A. Black, Why Four Gospels? The Historical Origins of the Gospels (Grand Rapids:

Kregel, 2001).

220
Esse argumento é enfraquecido pela insistência da igreja primitiva de que o Evangelho de

Marcos preserva as memórias de Pedro sobre o ministério de Jesus. Veja o testemunho de Papias,

Clemente de Alexandria e Orígenes em Eusébio, Hist. Ecl. 3.39.15; 6.14.5-7; e 6.25.5,

respectivamente; Ireneu, Contra Heresias 3.1.2; Tertulliano, Contra Marcião 4.5; e o Cânon de

Muratori. Veja particularmente a discussão em Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses, p. 202-39.

221
W. R. Farmer, The Synoptic Problem (Dillsboro: Western North Carolina Press, 1976), p. 215-

17.

222
Veja discussão adicional mais adiante.

392
223
R. Stein, “Synoptic Problem”, em: Dictionary of Jesus and the Gospels, p. 787. Os pais da

igreja uniformemente descreveram Mateus como o primeiro e João como o último, mas não há tanta

clareza em relação às respectivas posições de Lucas e Marcos. Por exemplo, Ireneu (c. 130-200)

descreveu a ordem Mateus, Marcos, Lucas e João (Contra Heresias 3.1.1-4), assim como fizeram

vários outros pais da igreja. Essa ordem pode ser o reflexo da forma do Códice do Evangelho

Quádruplo, embora o próprio Ireneu possa tê-la conhecido na ordem ocidental Mateus, João, Marcos,

Lucas. Mas Clemente de Alexandria (c. 150-215), em uma passagem preservada em Eusébio (Hist.

Ecl. 6.14.5-7), descreveu a ordem como Mateus, Lucas, Marcos e João.

224
Stein, “Synoptic Problem”, p. 787. Para uma discussão mais detalhada com exemplos, veja

Stein, Introduction to the Synoptic Problem, p. 52-58, 62-67, 76-88.

225
Ibid., p. 787.

226
Stein, Introduction to the Synoptic Problem, p. 52-58.

227
Ibid., p. 62-67.

228
Ibid., p. 67-76.

229
Stein, “Synoptic Problem”, p. 787. Para uma discussão mais detalhada com exemplos, veja

Stein, Introduction to the Synoptic Problem, p. 52-58, 62-67, 76-88.

230
Veja especialmente P. M. Head, Christology and the Synoptic Problem: An Argument for

Markan Priority, SNTSMS 94 (Cambridge: University Press, 1997); cf. M. C. Williams, Two

Gospels From One: A Comprehensive Text-Critical Analysis of the Synoptic Gospels (Grand Rapids:

Kregel, 2006).

231
Stein, “Synoptic Problem”, p. 787.

232
Antigos defensores da Hipótese dos Dois Documentos usaram outras designações que não Q

para se referir à fonte dos ditos hipotéticos que estariam por trás de Mateus e Lucas. Marsh usou o

393
hebraico bet. Holtzmann, por sua vez, usou o grego lambda, uma abreviatura para logia significando

“fonte de ditos”.

233
H. J. Holtzmann, Die synoptischen Evangelien: Ihr Ursprung und geschichtlicher Charakter

(Leipzig: Engelmann, 1863).

234
C. H. Weisse, Die evangelische Geschichte kritisch und philosophich bearbeitet, (Leipzig:

Breitkopf und Härtel, 1838), 2 vols.

235
B. H. Streeter, The Four Gospels: A Study of Origins, Treating of the Manuscript Tradition,

Sources, Authorship and Dates (London: Macmillan, 1924).

236
Veja Stein, Introduction to the Synoptic Problem, p. 91-95.

237
Para uma ampla discussão sobre as menores concordâncias de Mateus e Lucas em

comparação com Marcos, veja F. Neirynck, Evangelica II, BETL 99 (Leuven: University Press,

1991), p. 1-138.

238
Stein, Introduction to the Synoptic Problem, p. 70. Mas J. K. Verbin (Excavating Q: The

History and Setting of the Sayings Gospel [Minneapolis: Fortress, 2000]) encontrou concordância em

ordem na dupla tradição em 27 ou 67 perícopes (40%).

239
H. J. Holtzmann, “Zur synoptischen Frage”, Jahrbücher für protestantische Theologie 4

(1878), p. 145-88, 328-82, 533-68, especialmente p. 553-54.

240
A. M. Farrer, “On Dispensing with Q”, em: D. E. Nineham, org., Studies in the Gospels:

Essays in Memory of R. H. Lightfoot (Oxford: Blackwell, 1955), p. 55-88.

241
M. Goulder, Luke: A New Paradigm, JSNTSup 20 (Sheffield: Sheffield Academic Press,

1989).

242
R. Vinson, “The Significance of the Minor Agreements as an Argument Against the Two-

Document Hypothesis” (dissertação de Ph.D.; Durham: Duke University, 1984). Para um resumo da

394
pesquisa, veja Vinson, “How Minor? Assessing the Significance of the Minor Agreements Against

the Two-Source Hypothesis”, em: M. Goodacre; N. Perrin, orgs., Questioning Q: A Multidimensional

Critique (Downers Grove: InterVarsity, 2004), p. 151-64. Para críticas à pesquisa de Vinson, veja T.

A. Friedrichsen, “The Minor Agreements of Matthew and Luke Against Mark: Critical Observations

on R. B. Vinson’s Statistical Analysis”, ETL 65 (1989), p. 395-408.

243
Veja Stein, Introduction to the Synoptic Problem, p. 113-28; id., “Synoptic Problem”, p. 791.

244
Veja especialmente R. T. Fortna, The Gospel of Signs: A Reconstruction of the Narrative

Source Underlying the Fourth Gospel (Cambridge: University Press, 1970); id., The Fourth Gospel

and Its Predecessors: From Narrative Source to Present Gospel (Philadelphia: Fortress, 1988).

Compare G. van Belle, The Signs Source in the Fourth Gospel: Historical Survey and Critical

Evaluation of the Semeia Hypothesis, BETL (Leuven: University Press, 1994).

245
Recursos úteis incluem F. G. Downing, “Redaction Criticism”, em: S. E. Porter, org.,

Dictionary of Biblical Criticism and Interpretation (London/New York: Routledge, 2007), p. 310-12;

N. Perrin, What is Redaction Criticism? (London: SPCK, 1970); G. R. Osborne, “Redaction

Criticism”, em: D. A. Black; D. S. Dockery, orgs., Interpreting the New Testament: Essays on

Methods and Issues (Nashville: B&H, 2001), p. 128-49.

395
CAPÍTULO 4

O Evangelho segundo Mateus

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os fatos-chave do
Evangelho de Mateus. Com relação à História, eles deverão ser capazes de
identificar o autor, a data, a origem, o destino e o propósito do Evangelho.
Em relação à Literatura, deverão ser capazes de fornecer uma descrição
básica da estrutura do livro e identificar os principais elementos do
conteúdo do livro encontrados na Discussão Unidade por Unidade. No que
diz respeito à teologia, os estudantes deverão ser capazes de identificar os
principais temas teológicos de Mateus.
Conhecimentos intermediários: além do domínio dos conteúdos
essenciais identificados no item Conhecimentos básicos, os estudantes
deverão ser capazes de apresentar os argumentos para conclusões históricas,
literárias e teológicas. Em relação à História, deverão ser capazes de
discutir as evidências da autoria de Mateus, bem como sua data, origem,
destino e propósito. Em relação à Literatura, eles deverão ser capazes de
fornecer uma descrição detalhada do livro. Em relação à Teologia, os
estudantes deverão ser capazes de discutir os principais temas teológicos de

396
Mateus e as formas pelas quais estes contribuem, de forma única, para o
cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além do domínio dos conteúdos essenciais
identificados nos itens Conhecimentos básicos e Conhecimentos
intermediários, os estudantes deverão ser capazes de discutir se o
Evangelho de Mateus foi originalmente escrito em hebraico ou aramaico, de
comparar a estrutura de Mateus e de Marcos e de interagir criticamente com
propostas alternativas em relação à estrutura de Mateus e o papel dos cinco
discursos. Além disso, os estudantes também deverão ser capazes de
discutir a função das citações de cumprimento e a Grande Comissão no
Evangelho de Mateus.

FATOS-CHAVE DO EVANGELHO SEGUNDO MATEUS


Autor: Mateus
Data: anos 50 ou 60
Origem: Desconhecida
Destino: Audiência judaica em local desconhecido
Propósito: Demonstrar que Jesus era o Messias predito
no AT
Tema: Jesus é Emanuel, o Messias, o Salvador do
povo de Deus
Versículos-Chave: 16.13-20

INTRODUÇÃO

Não é de admirar que o Evangelho de Mateus rapidamente se tornou o


favorito da igreja primitiva. Ele é um dos dois únicos Evangelhos escritos

397
diretamente por um dos 12 discípulos e também é ricamente teológico, com
uma grande ênfase em verdades como a identidade de Jesus como Emanuel
nascido da virgem. Com suas citações frequentes do AT, o Evangelho de
Mateus enfatiza o cumprimento de Jesus das promessas messiânicas de
Deus.
Não é por acaso que as listas de livros do Evangelho e coleções de
textos do Evangelho na igreja primitiva sempre trazem Mateus em primeiro
lugar, apesar das diferenças na ordem dos outros Evangelhos.1 Ele
proporcionou um elo de ligação entre o AT e o NT. O Evangelho de Mateus
é também uma notável obra literária. Mateus comunicou a sua mensagem
não apenas através de declarações explícitas, mas através de sua estrutura,
recursos literários e gematria.
Embora os estudiosos modernos tendam a preferir Marcos em vez dos
outros Evangelhos do NT com base na opinião de que ele foi o primeiro a
ser escrito, Mateus foi o Evangelho favorito da igreja primitiva. R. T.
France escreveu: “É um fato que a principal tendência do cristianismo foi,
desde o início do século II em diante, em grande medida um cristianismo
mateano”.2 O Evangelho de Mateus contém um rico material sobre a
infância de Jesus, sobre o Sermão da Montanha (com um paralelo apenas
parcial em Lucas) e uma coleção valiosa de parábolas de Jesus.
Além disso, o Evangelho de Mateus demonstra com especial clareza
que a morte de Jesus foi sacrificial e que ele resgatou seus discípulos da
pena por seus pecados. Assim, não é nenhuma surpresa que E. Renan
identificou esse Evangelho como o livro mais importante jamais escrito.3 O
estudo cuidadoso de Mateus revela uma mensagem de tamanha
profundidade teológica e arte literária, que convence o leitor de que a
avaliação de Renan não foi um exagero.

398
HISTÓRIA
Autor
Antes de abordar as questões específicas suscitadas por uma discussão
sobre a autoria do Evangelho de Mateus, é útil observar que a noção
moderna de “autoria” não faz jus no sentido de que Mateus (ou qualquer
outro, para a questão) deveria ser considerado como o autor do primeiro
Evangelho canônico. Em nossos dias, autoria implica certo grau de
autonomia, originalidade e independência praticamente inexistente nas
noções de autoria do primeiro século. É muito provável que Mateus e os
outros evangelistas, mesmo aqueles que, como Mateus, foram testemunhas
oculares dos eventos que relataram, não viam a si mesmos num sentido
muito individualista, mas sim como servos da igreja. Nesse sentido, o papel
de “escriba” pode estar mais próximo ao papel de Mateus, em que os
escribas cuidadosamente registraram informações importantes com grande
atenção aos detalhes e um alto grau de fidelidade.
Ao mesmo tempo, chamar o primeiro evangelista de “compilador”,
“coletor”, “editor” ou “redator” não caracteriza com precisão o seu papel.
Em vez de simplesmente agir como um editor passivo de um material-fonte
preexistente que aborda sua tarefa em uma espécie de copiar-e-colar, o
escritor do Evangelho colocou sua marca pessoal em seu livro em uma
variedade de formas: ele selecionou o material de acordo com as
necessidades de sua primeira audiência; organizou o seu material da forma
mais persuasiva, útil, memorável e convincente possível; e apresentou o
ministério de Jesus e o evangelho de sua salvação de sua própria e exclusiva
perspectiva, permanecendo fiel às conexões históricas, culturais e
intercanônicas subjacentes que faziam parte da história de Jesus na

399
Palestina do primeiro século. Daí o papel do primeiro evangelista pode ser
melhor compreendido como o do escrivão e teólogo (13.52).4
Como os outros Evangelhos canônicos, Mateus é formalmente anônimo,
uma vez que o autor deste Evangelho não se identifica explicitamente no
corpo do livro. No entanto, o título que atribui o Evangelho a Mateus é
claramente muito antigo, se não original.5 O título teria sido necessário para
distinguir um Evangelho dos outros quando os quatro Evangelhos
começaram a circular como uma única coleção. Especialmente se o autor
estava ciente da existência de um Evangelho anterior e o usou na
composição do seu próprio trabalho, como a maioria dos estudiosos
suspeita, ele pode ter sentido que o título era necessário para distinguir o
seu livro do escrito anterior (Marcos, na Hipótese da Prioridade Marcana).
Embora D. Allison tenha sugerido que a atribuição a Mateus pode datar de
antes de 125, ele argumentou que o título KATA MATHTHAION (“Segundo
Mateus”) não é prova incontestável da autoria do Evangelho por Mateus,
uma vez que outros títulos aparecem na tradição dos manuscritos.6 Mas uma
vez que todas as variações do título do Evangelho nos antigos manuscritos
atribuem o Evangelho a Mateus, os primeiros títulos permanecem
importantes evidências sobre a identidade do autor.
As evidências externas mais antigas — isto é, aquelas que não são
derivadas do próprio documento (evidências internas), mas de fontes fora
do Evangelho, como as atribuições de autoria pelos pais da igreja primitiva
— para a autoria do Evangelho são de uma declaração de Papias, bispo de
Hierápolis, na sua obra Exposições dos Ditos do Senhor.7 O testemunho de
Papias é especialmente significativo porque ele afirma ter recebido suas
informações diretamente daqueles que ouviram pessoalmente os discípulos
mais próximos de Jesus, incluindo Mateus.8 Ireneu (c.130-200) alegou que

400
Papias foi um discípulo do apóstolo João, que tinha acesso direto ao
9
testemunho deste sobre os primeiros anos da igreja cristã. Papias escreveu:
“portanto, por um lado Mateus colocou em ordem os ditos no dialeto
10
hebraico; por outro lado, traduziu cada um deles conforme pôde”.
Mesmo se Papias ou outros pais da igreja estivessem errados sobre a
língua original do Evangelho de Mateus, isso não significa necessariamente
11
que eles estavam errados em relação à identidade do autor. Além disso, o
papel de Mateus como um apóstolo não faria o seu uso do Evangelho de
Marcos implausível, especialmente pelo fato de que a igreja primitiva
reconheceu o Evangelho de Marcos como uma transcrição das
reminiscências Pedro sobre a vida de Jesus e Pedro era o líder reconhecido
dos Doze.

Quadro 4.1: MATEUS ESCREVEU SEU


EVANGELHO EM HEBRAICO?
Uma análise atenta da declaração de Papias de que Mateus “portanto”
organizou os ditos de Jesus “no dialeto hebreu” leva a várias
observações. Em primeiro lugar, a expressão “portanto” intimamente
ligou a declaração sobre a autoria de Mateus de seu Evangelho à
discussão anterior em Papias. Na citação de Eusébio, a declaração
segue imediatamente uma descrição da autoria do Evangelho de
Marcos, que mencionou que Marcos escreveu seu Evangelho com base
nas reminiscências de Pedro sobre o ministério do Senhor, mas que ele
não tentou fornecer um arranjo ordenado dos ensinamentos de Jesus.
Se Eusébio citou Papias na ordem, sem pular qualquer material, o
“portanto” liga a declaração sobre a composição de Mateus à descrição

401
anterior sobre a composição de Marcos e sugere que Mateus escreveu
seu Evangelho para fornecer um relato caracterizado pela ordem que
faltava no Evangelho de Marcos. Se assim for, a declaração de Papias
implica que Evangelho de Marcos foi escrito primeiro e que Mateus
escreveu mais tarde, possivelmente utilizando perícopes de Marcos
1
mas dando-lhes uma nova ordem. Além disso, essa conexão indicaria
que o relato da composição de Mateus, como o relato sobre a
composição de Marcos, foi atribuído por Papias a uma fonte ainda
mais antiga chamada de “o presbítero”, muito provavelmente João, o
Presbítero.2 De acordo com outras declarações de Papias citadas em
Eusébio, esse presbítero foi pelo menos uma testemunha ocular do
ministério de Jesus, um portador de importantes tradições na igreja
primitiva e provavelmente o apóstolo João, filho de Zebedeu.3
Em segundo lugar, Papias afirmou que Mateus escreveu seu
Evangelho, “no dialeto hebreu”.4 Recentemente, alguns estudiosos
argumentaram que a linguagem de Papias implica apenas que Mateus
escreveu “no estilo de composição semítico”.5 Outros alegaram que o
contexto implica fortemente que Mateus, na verdade, escreveu seu
Evangelho ou na língua hebraica ou na aramaica.6 Muitos estudiosos
modernos têm contestado o testemunho de Papias sobre a autoria de
Mateus. Eles alegaram que Papias claramente estava errado sobre a
língua original do Evangelho, uma vez que o grego de Mateus não
parece ser uma tradução grega. Alguns estudiosos que afirmam a
prioridade de Marcos questionam se um autor teria de algum modo
utilizado o Evangelho grego de Marcos na produção de um Evangelho
hebraico ou aramaico. Eles argumentam ainda que se Papias estivesse
errado sobre a língua original do Evangelho, ele provavelmente

402
também estaria errado em relação ao autor. Muitos estudiosos
repudiam a alegação de Papias sobre a autoria mateana pois veem a
dependência de um apóstolo de um Evangelho escrito por um não
7
apóstolo como inconcebível.
No entanto, o excelente grego de Mateus poderia ter sido
produzido por um habilidoso tradutor de um texto hebraico original.
Allison observou que muitos dos pais da igreja primitiva que
afirmaram a autoria de Mateus de um Evangelho hebraico eram
nativos de fala grega que conheciam o grego melhor do que a maioria,
senão que todos, os estudiosos modernos e estavam em melhor
posição para determinar se o Evangelho grego poderia ter sido uma
tradução de um original hebraico.8 Além disso, indícios de influência
hebraica aparecem neste Evangelho, sugerindo que Papias poderia ter
estado correto sobre um original hebraico. Muitos comentaristas, por
exemplo, acreditam que a ênfase no número 14 em Mateus 1.17 é
devida à gematria (simbolismo numérico), no qual 14 é o equivalente
numérico do nome hebraico David.9 No entanto, a gematria funciona
apenas em hebraico, uma vez que a transliteração grega do nome
“David” tem um valor numérico diferente. O jogo onomástico sobre o
nome Jesus (“Yahweh salva”), em Mateus 1.21, com a explicação
“porque ele salvará o seu povo dos seus pecados”, da mesma forma,
funciona apenas em hebraico, não em grego (veja também Mt 1.23).
Esses textos tornam plausível um texto original hebraico/aramaico
do Evangelho, apesar da excelente qualidade do grego na versão
existente. Uma vez que o aramaico rapidamente deixou de ser a
linguagem da igreja primitiva quando esta se expandiu para território
gentio e esse fato requeria que o Evangelho circulasse na tradução

403
grega, a ausência de antigos textos de Mateus em hebraico/aramaico
não é surpreendente.
No entanto, outra evidência fala contra a teoria de que o Evangelho
de Mateus foi escrito originalmente em hebraico ou aramaico. Como
Carson e Moo observam, as numerosas citações do AT em Mateus não
10
refletem uma única forma de texto. A falta de uniformidade das
formas do texto nas citações do AT em Mateus pode sugerir um autor
que escreveu em grego, mas sabia hebraico e, portanto, era capaz de
variar a forma de suas citações. Também, se Mateus escreveu depois
de Marcos (como muitos acreditam), é improvável que o Evangelho de
Mateus, embora usando o Evangelho de Marcos, tenha sido escrito
primeiro em hebraico ou aramaico. Em terceiro lugar, pelo menos para
alguns, o texto grego do Evangelho de Mateus não parece ser um
produto da tradução do hebraico ou aramaico (embora outros
discordem). Felizmente, enquanto vigorosamente debatida entre os
estudiosos, a questão do hebraico ou aramaico original do Evangelho
de Mateus é de pouca (se alguma) consequência doutrinária e ainda
precisa ser resolvida de forma conclusiva.11

1
Gundry, Matthew, p. 614. Bauckham (Jesus and the Eyewitnesses, p. 222) sugeriu que

Eusébio pode ter omitido material do qual discordava. No entanto, os vários paralelos verbais

entre as declarações relacionadas a Mateus e Marcos sugerem um relacionamento muito

próximo entre as duas declarações. Infelizmente, somente uma nova descoberta dessa parte da

obra de Papias indicaria o preciso relacionamento entre as duas declarações.


2
Eusébio, Hist. Ecl. 3.39.14-16. Veja J. Kürzinger, Papias von Hierapolis und die

Evangelien des Neuen Testaments (Regensburg: Pustet, 1983), p. 45.


3
A. J. Köstenberger; S. O. Stout, “The Disciple Jesus Loved: Witness, Author, Apostle: A

Response to Richard Bauckham’s Jesus and the Eyewitnesses”, BBR 18 (2008), p. 209-31.

404
4
Outros pais da igreja também descreveram Mateus como originalmente escrito em

hebraico, incluindo Ireneu (c. 130-c. 200; Contra Heresias 3.1.1), Panteno (morreu c. 190),

Orígenes (c. 185-c. 254; Comentário ao Evangelho de João 1.6; 6.32), Eusébio (c. 260-c. 340;

Hist. Ecl. 3.24.6), Cirilo de Jerusalém (c. 315-387; Catequeses 14), Epifânio (c. 315-403;

Contra Heresias 2.1.51), Jerônimo (c. 345-420; Prologo no Comentário a Mateus Livro IV) e

Agostinho (354-430; Harmonia dos Evangelhos 1.2.4). Para uma lista de referências mais

completa, veja Davies e Allison, Matthew, 1:8-9.


5
Kürzinger, Papias von Hierapolis, p. 9-24. Gundry (Matthew, p. 619-20) postulou um

ponto de vista semelhante (fiando-se em parte em pesquisa preliminar publicada por

Kürzinger em 1960) e equiparou o estilo hebraico ao midráshico.


6
Isto está implícito especialmente pela combinação do substantivo dialektos (“língua”) e o

verbo hermeneuō (“traduzir”). Para uma breve discussão sobre alguns dados linguísticos

relevantes, veja C. A. Evans, “Hebrew Matthew”, em: Dictionary of New Testament

Background, p. 463-64.
7
Por exemplo, os argumentos apresentados contra a autoria de Mateus em J. Nolland, The

Gospel of Matthew, NIGTC (Grand Rapids: Eerdmans, 2005), p. 3.


8
Davies e Allison, Matthew, 1:12.
9
O nome David no texto consonantal hebraico é constituído de três letras: daleth, waw e

daleth. Uma vez que daleth é a quarta letra do alfabeto hebraico (como “d” é em inglês ou

português) e waw é a sexta letra, 4 + 6 + 4 = 14.


10
Carson e Moo, Introduction to the New Testament, p. 143-44.
11
Veja ibid., p. 102: “Em suma, a hipótese de uma edição anterior de Mateus em

linguagem semítica não pode ser corretamente nem provada nem refutada”.

Depois de revisar cuidadosamente dois recentes tratamentos extensos do


relato de Papias, D. Allison corretamente observou: “À luz das
considerações gerais apresentadas e dos trabalhos de Kennedy e Kürzinger,

405
o entendimento simplista de Papias que o descarta completamente deve ser
questionado, se não abandonado”.12 A igreja primitiva afirmou por
unanimidade que o Evangelho foi escrito pelo apóstolo Mateus. Esse ponto
de vista não foi seriamente contestado até o final do século XIX.
Indícios do próprio Evangelho (evidência interna) tendem a confirmar a
atribuição da igreja primitiva a Mateus. Com base na evidência interna do
Evangelho, a maioria dos estudiosos reconhece que o autor era um judeu
cristão. Embora a evidência interna não seja específica o suficiente para
traçar a identidade do autor, ela é compatível e sugestiva da autoria de
Mateus como afirmado por Papias. Primeiro, Mateus afirmou que o
cobrador de impostos chamado “Levi” a quem Jesus designou para ser um
dos 12 apóstolos (cf. Mc 2.14; Lc 5.27) também foi chamado de “Mateus”
(Mt 9.9). Mateus, um nome hebraico que significa “dom de Yahweh” ou
“dom do Senhor”, parece ser o nome apostólico que Jesus deu ao coletor de
impostos depois que ele escolheu seguir a Cristo assim como Jesus
renomeou Simão “Pedro” (Jo 1.42, reafirmado em Mt 16.18). O uso do
nome aqui pode ser o toque pessoal de Mateus.
Alguns estudiosos explicaram essa característica como uma marca de
pseudonimato.13 No entanto, um exame dos outros pseudepígrafos sugere
que um autor procurando ganhar credibilidade para seu trabalho ao atribuí-
lo a um apóstolo provavelmente teria colocado maior atenção nesse
apóstolo em seu Evangelho do que o Evangelho de Mateus coloca. Mateus
é mencionado nesse Evangelho apenas duas vezes (9.9; 10.3). O Evangelho
não descreve Mateus como o destinatário de revelações especiais em
nenhuma das referências. Elas simplesmente se referem a seu chamado ao
discipulado e nomeiam-no como um dos 12 apóstolos. Essas breves
referências provavelmente não são uma marca de pseudonimato.

406
Em segundo lugar, na discussão sobre pagamento dos impostos
imperiais (Mt 22.15-22), tanto Marcos quanto Lucas usaram o termo grego
denarion, mas Mateus também incluiu o termo mais preciso nomisma
(“moeda do Estado”). A utilização de uma terminologia mais precisa ao se
referir à moeda pode sugerir a perícia de um ex-coletor de impostos.14 Da
mesma forma, entre os Evangelhos apenas Mateus inclui a perícope sobre
Jesus e Pedro pagando o imposto do Templo (17.24-27). Embora essa
evidência não seja conclusiva, ela não presta apoio à forte tradição de
autoria preservada pela igreja primitiva. Baseados nas impressionantes
evidências externas e internas da autoria mateana, leitores modernos podem
confiantemente afirmar a autoria de Mateus deste Evangelho e reconhecê-lo
como um testemunho da vida de Jesus escrito por aquele que foi tanto uma
testemunha ocular quanto um apóstolo.15

Data
Evidências internas
A maioria dos estudiosos do NT contemporâneos datam o Evangelho de
Mateus de meados ao final dos anos 80.16 R. Schnackenburg de forma
sucinta afirmou a lógica para essa data final:

Mateus escreveu após a Guerra Judaica e da destruição de Jerusalém (22.7). A ruptura com o
judaísmo, que havia se tornado forte sob a liderança dos escribas fariseus, havia ocorrido
(veja 27.25; 10.17; 23.34). A tensão com esses círculos que agora viviam de acordo com a
interpretação estrita da lei é discernível (veja cap. 23), e a autoconsciência da igreja como o
verdadeiro “povo de Deus” foi reforçada (21.43). Portanto, a composição dessa obra deve ser
datada em torno de 85-90 d.C.17

407
Schnackenburg assumiu que a referência de Jesus à queda de Jerusalém
em Mateus 22.7 não seria possível a menos que a queda de Jerusalém já
tivesse ocorrido. Essa hipótese se baseia no pressuposto modernista de que
Jesus não era capaz de predizer o futuro. Uma vez que Jesus “previu” a
queda de Jerusalém em Mateus 24.2 e em outras passagens, alguns
estudiosos afirmam que Mateus tem de ter escrito essa “predição”, depois
da queda (vaticinium ex eventu) e enganosamente a apresentou a seus
leitores como “profecia”. J. Nolland recentemente contestou esse
pressuposto:

O estudo crítico do NT tem uma curiosa capacidade de identificar como “genuína” a profecia
que falhou em se cumprir e muito frequentemente insistir que a profecia cumprida é apenas
uma descrição pós-evento disfarçada de profecia […] A possibilidade de uma profecia
retocada é bastante real, mas basear a datação de Mateus na pressuposição de que não
poderia ter falado tão confiantemente do julgamento vindouro sobre Jerusalém e o Templo se
esse já não tivesse ocorrido representa uma imposição desnecessária.18

Se alguém crê que Jesus era capaz de profetizar (e abundantes evidências


apoiam essa convicção), uma data anterior a 70 é plausível.
Schnackenburg alegou também que as referências a fortes tensões entre
judeus e cristãos em Mateus implicavam uma ruptura completa da igreja
com a sinagoga. Ele listou 85 como a data mais antiga possível para o
Evangelho, uma vez que esse foi tempo aproximado em que a maldição
contra os hereges foi adicionada à Dezoito Bênçãos (Shemoneh Esreh) da
tefilá judaica, uma oração a ser recitada pelos judeus fiéis três vezes ao dia.
A Décima Segunda Bênção é chamada de Birkath ha-minim ou “Maldições
Contra os Hereges” e diz:

E para os apóstatas, que não haja esperança; e que o reino insolente seja rapidamente
extirpado, em nossos dias. E que os notsrim e os minim pereçam rapidamente; e que eles

408
sejam apagados do Livro da Vida e que eles não sejam inscritos com os justos. Bendito sois
vós, Senhor, que humilhais o insolente.19

No entanto, mesmo que esta Décima Segunda Bênção tivesse foco nos
cristãos (o que é possível, mas não certo), isso não suporta a alegação de
que as referências frequentes à perseguição dos cristãos pelos judeus em
Mateus exigem uma data posterior a 85 para o Evangelho. Tal conclusão
não leva em conta as referências à perseguição dos fiéis pelos judeus no
livro de Atos muito cedo na história da igreja, o que demonstra que a
intensa perseguição anticristã ocorreu e levou alguns cristãos a se
separarem da sinagoga meio século antes de 85.
Schnackenburg também sugeriu que a crença de que os discípulos de
Jesus constituíam o verdadeiro povo de Deus exige uma data tardia para o
Evangelho. Ele especificamente citou Mateus 21.43 como evidência. Essa
passagem ensina que o reino de Deus será tirado dos líderes judeus e
confiado a outros que produzem os frutos do reino. Essa afirmação, porém,
coincide com o ensino do NT em outras passagens (veja At 13.46; 18.5,6;
1Pe 2.9). A seleção de Jesus dos doze discípulos é uma das ações de Jesus
verificada pelos pesquisadores do Jesus histórico.20
A seleção de doze discípulos expressa a intenção de Jesus de construir
um novo Israel a partir de um remanescente fiel. O pressuposto de que os
cristãos começaram a se considerar como o verdadeiro povo de Deus
apenas nas décadas finais do primeiro século é simplesmente falso e é uma
pobre evidência uma data tardia para Mateus.

Evidências externas

409
Evidências externas exigem uma data de composição no primeiro século.
Embora seja possível que os autores do Evangelho de João e de 1Pedro
tenham conhecido o Evangelho de Mateus, as primeiras alusões definitivas
a Mateus aparecem nos escritos de Inácio (c. 35-110) e na Didaquê
(segunda metade do século I ou início do século II).21 Policarpo (c. 69-155)
conhecia e citou Mateus na primeira metade do século II.22 A Epístola de
Pseudo-Barnabé (c. 135?) citou Mateus e descreveu o Evangelho como
Escritura inspirada com autoridade comparável ao AT.23 O autor do
Evangelho de Pedro também conhecia e usou o Evangelho de Mateus,
provavelmente na metade do segundo século.24 Apenas as evidências
externas, entretanto, não podem conduzir os intérpretes a uma data de
composição mais específica.
Determinar a data da composição do primeiro Evangelho depende em
grande medida do relacionamento entre os Evangelhos. A maioria dos
estudiosos acredita que Mateus usou o Evangelho de Marcos ao escrever o
seu.25 Se isso estiver correto, o Evangelho de Mateus tem uma data
posterior a Marcos. Contudo, a data do Evangelho de Marcos também é
ambígua. Ireneu (c. 130-200) aparentemente alegou que Marcos escreveu
seu Evangelho após a morte de Pedro, em meados dos anos 60. No entanto,
Clemente de Alexandria (c. 150-215), que escreveu apenas 20 anos após
Ireneu, alegou que Marcos escreveu seu Evangelho enquanto Pedro ainda
estava vivo. Dada a ambiguidade da evidência histórica sobre a data de
Marcos, a decisão deve ser baseada em outros fatores.
A data de composição de Marcos é melhor inferida a partir da data de
Lucas-Atos. O final abrupto de Atos, que deixa Paulo sob prisão domiciliar
em Roma, implica que Atos foi escrito antes da libertação do apóstolo.
Como um dos principais temas de Atos é a legalidade do cristianismo no

410
Império Romano, esperava-se que Lucas mencionasse a libertação de Paulo
pelo imperador se ela já tivesse ocorrido. Essa evidência data Atos do início
dos anos 60. Lucas e Atos eram dois volumes de uma única obra, como os
prólogos desses livros demonstram. Claramente, Lucas foi escrito antes de
Atos (At 1.1). Dada a quantidade de pesquisas que Lucas fez ao escrever
Atos e as viagens que as entrevistas a testemunhas oculares provavelmente
exigiram, a data de conclusão no final dos anos 50 para o Evangelho é
razoável. Se Lucas usou Marcos ao escrever seu próprio Evangelho, Marcos
foi escrito em algum momento antes do final dos anos 50, talvez no início
ou meados dos anos 50. Assim, se Mateus usou o Evangelho de Marcos,
Mateus pode ter escrito seu Evangelho a qualquer momento a partir de
meados dos anos 50 ou, mais provavelmente, no início dos anos 60. A mais
antiga evidência histórica é consistente com essa opinião, uma vez que
Ireneu (c. 130-200) alegou que Mateus escreveu seu Evangelho enquanto
Pedro e Paulo estavam pregando em Roma (no início dos anos 60).26
Outra evidência em Mateus sugere que o Evangelho foi escrito antes de
70, quando os exércitos romanos destruíram o Templo de Jerusalém e
devastaram a Cidade Santa. Mateus 17.24-27 contém a instrução de Jesus
sobre o pagamento do imposto de duas dracmas do Templo. Jesus ensinou
que seus discípulos deveriam pagar o imposto a fim de evitar ofender os
outros judeus. No entanto, após a destruição do Templo, o imposto do
Templo foi recolhido pelos romanos a fim de apoiar o templo pagão de
Júpiter Capitolino em Roma.27 É duvidoso que Mateus teria incluído o
relato no seu Evangelho numa época em que teria sido interpretado como
apoio à idolatria pagã (cf. Mt 4.10).28 Além disso, Jesus ensinou a Pedro
que embora os discípulos de Cristo devessem pagar os impostos por razões
sociais, eles não eram obrigados a fazê-lo, uma vez que que os reis exigiam

411
impostos de seus súditos, mas não de seus filhos. Isso implica que os
discípulos de Jesus eram filhos do grande Rei divino a quem os impostos
eram pagos. Contudo, o mesmo argumento depois de 70 pode ser entendido
como uma identificação dos discípulos como filhos de Júpiter, que eram
isentos de imposto, mas deveriam pagá-lo para apaziguar os romanos!
As referências especiais de Mateus ao sacrifício também fariam todo o
sentido se tivessem sido escritas antes da queda de Jerusalém. Embora
Mateus permitisse que judeus cristãos oferecessem sacrifícios no Templo,
ele sempre retratou tais sacrifícios como dádivas que expressavam gratidão
a Deus, e não como rituais que produziam expiação. Ele ainda ensinou que
Jesus era o cumprimento de Isaías 53, o Servo Sofredor, cuja morte
sacrificial alcançou expiação para o pecado.29 A teologia sacrificial de
Mateus cuidadosamente articulada e especialmente a sua preocupação em
esclarecer a importância das ofertas do Templo melhor se ajustam a uma
data de composição antes de 70, quando o Templo foi destruído e o sistema
sacrificial chegou a seu fim.
Apenas Mateus contém o ensinamento de Jesus sobre o juramento pelo
Templo ou pelo seu ouro (Mt 23.16-22). Tais votos significavam: “Que o
templo ou os objetos relacionados a ele sejam destruídos se eu não cumprir
a minha promessa”. Obviamente, tais votos não teriam sentido algum se o
templo já tivesse sido destruído. Esses indícios e muitos outros sugerem
uma data para Mateus anterior à destruição de Jerusalém no ano de 70.30
Essa data anterior de Mateus é significativa por duas razões. Em
primeiro lugar, uma data anterior é mais consistente com a autoria de
Mateus do que uma data do final do primeiro século. Em segundo lugar,
uma data anterior tende a confirmar a confiabilidade histórica dos relatos
dos Evangelhos. Se os relatos da vida e ministério de Jesus foram

412
transmitidos oralmente por várias gerações antes de serem escritos, alguns
detalhes desses relatos podem ter sido alterados durante esse período de
transmissão oral. No entanto, se Mateus escreveu seu Evangelho poucas
décadas depois da vida de Jesus, enquanto testemunhas oculares do
ministério de Jesus ainda estavam vivas, pode-se argumentar que o seu
Evangelho certamente preserva os relatos da vida e os ensinamentos de
Jesus com detalhes precisos.

Origem e Destino
Os estudiosos propuseram várias teorias sobre os possíveis locais de origem
para o Evangelho de Mateus. As sugestões incluem Jerusalém ou Palestina,
Cesareia Marítima, Fenícia, Alexandria, Pela, Edessa, Síria e Antioquia.
Allison corretamente observou: “Dada a natureza da evidência disponível, é
completamente impossível ser totalmente convencido sobre o assunto em
questão. Nós nunca saberemos com toda a certeza o local onde a obra de
Mateus foi concluída”.31
As teorias sobre a origem que receberam maior apoio acadêmico veem
o Evangelho como escrito na Palestina ou na Síria. Os pais da igreja
primitiva que insistiram no original de Mateus em hebraico ou aramaico
provavelmente assumiram que Mateus escreveu seu Evangelho na
Palestina. Jerônimo (c. 345-420) especificamente identificou a Judeia como
lugar da autoria.32 Hoje, porém, maioria dos estudiosos hoje opta pela Síria,
mais especificamente Antioquia da Síria, como o local de origem. Vários
indícios dão suporte a esse local. Em primeiro lugar, Mateus combinou
tanto o interesse judeu quanto o gentio, e Antioquia tinham uma grande
população judaica, sendo também o centro da atividade missionária

413
gentílica. Em segundo lugar, Mateus foi primeiramente citado por Inácio,
bispo de Antioquia (c. 35-110). Em terceiro lugar, Mateus 17.24-27
descreve o estáter oficial (antiga moeda de origem grega ou lida) como
exatamente igual ao dídracma ou duas dracmas (outra antiga moeda grega).
As duas únicas cidades conhecidas por terem colocado esse valor exato
sobre o estáter foram Antioquia e Damasco.33
As questões sobre a procedência e o destino do Evangelho estão
intimamente ligadas. Os estudiosos que aceitam uma procedência palestina
geralmente veem a igreja na Palestina como o público pretendido. Da
mesma forma, os estudiosos que aceitam a proveniência síria geralmente
veem a igreja na Síria como o público pretendido.
Independentemente da visão que se tem sobre a origem e o público
original, o Evangelho de Mateus claramente circulou de forma ampla logo
após sua composição. Isso é demonstrado pela distribuição geográfica das
citações antigas do livro que aparecem nos escritos de Inácio (c. 35-110;
Antioquia), Policarpo (c. 69-155; Esmirna), Pseudo-Barnabé (c. 135?;
possivelmente Alexandria), Justino Mártir (c. 100-165; Éfeso), e 2Clemente
(provavelmente Alexandria) no final do século I ou início do século II.34

Propósito
Em parte pelo fato de o próprio Evangelho de Mateus não incluir uma
declaração de propósito explícita, estudiosos têm sugerido uma série de
possíveis propósitos. Alguns propuseram que Mateus deveria ser lido como
uma obra teológica em vez de um documento histórico. M. Goulder e R.
Gundry argumentaram que Mateus pertence a um gênero de literatura
conhecido como “midrash”, um gênero não histórico que tecia narrativas de

414
temas do AT em um conto imaginativo que destacava a importância
teológica de Jesus.35 Eles também alegaram que paralelos entre a narrativa
de Mateus e textos do AT indicam que Mateus criou histórias sobre Jesus
com base em textos dispersos do AT, histórias que não tinham relação com
os acontecimentos reais da vida de Jesus. Por exemplo, Gundry alegou que
Mateus tinha um anjo anunciando o nascimento de Jesus a José através de
um sonho não porque esse sonho realmente ocorreu, mas de modo a
conformar a experiência de José aos sonhos de seu homônimo famoso do
AT, José, o patriarca.36
Essa análise de Mateus enfrenta vários problemas graves. Em primeiro
lugar, o gênero de literatura ao qual Goulder e Gundry atribuem a Mateus
não é realmente “midrash”, que simplesmente se refere à interpretação
bíblica, mas o que Paulo descreveu como “mito judaico” (Tt 1.14). A
rejeição inflexível que Paulo faz de tais mitos (1Tm 1.4) torna improvável
que o livro de Mateus tivesse sido aceito de forma tão livre e ampla pelos
primeiros cristãos se realmente fosse uma simples “fábula teológica”.37 Em
segundo lugar, os críticos do midrash são frequentemente culpados daquilo
que S. Sandmel chamou de “paralelomania”, a tendência a encontrar
paralelos onde eles não existem.38 Esses críticos analisam as semelhanças
entre a narrativa de Mateus e os textos do AT, mas não conseguem explicar
adequadamente as diferenças entre esses relatos. Essas diferenças muitas
vezes tornam a dependência de Mateus de determinado texto altamente
improvável. Finalmente, as classificações de Mateus como midrash não
apreciam aspectos importantes do Evangelho que sugerem que o autor
pretendia escrever uma narrativa histórica. Em particular, a insistência de
Mateus em que determinados eventos na vida de Jesus aconteceram para

415
que se cumprisse o AT indicam que ele escreveu um cuidadoso registro de
acontecimentos reais.39
Goulder tentou combinar a sua avaliação de Mateus como midrash com
a teoria de Mateus como lecionário.40 Ele alegou que a sinagoga do
primeiro século usava um ciclo lecionário anual que consistia de leituras
prescritas do AT para cada sábado. Goulder defendia que Mateus foi
organizado de forma a se correlacionar com esse ciclo lecionário. Ele
argumentou, por exemplo, que a narrativa do nascimento de Jesus em
Mateus baseou-se na leitura lecionária do quinto sábado (Gn 23 a 25.18); a
visita dos magos, na leitura do sexto sábado (Gn 25.19 a 28.8); e a matança
dos inocentes, na leitura do sétimo sábado (Gn 28.9 a 31.55).41 A tese de
Goulder não conseguiu convencer a maioria dos estudiosos por diversas
razões. Os estudiosos ainda não determinaram se algum ciclo lecionário era
usado na sinagoga do primeiro século, muito menos aquele que Goulder
propusera. Além disso, a própria análise de Goulder dos temas do AT em
Mateus fez mais para demonstrar a dependência que Mateus teve das
narrativas dos temas fora das leituras do lecionário do que nas leituras
propostas.
Outros estudiosos recentes demonstraram que o Evangelho de Mateus
tem muito em comum com biografias de antigas figuras reverenciadas.
Mateus é muito semelhante a antigas biografias sobre a figura fundadora de
uma escola filosófica. Essas biografias demonstram que o fundador foi o
responsável pelas ideias que definiram o movimento. Elas também retratam
o fundador como uma pessoa cujo exemplo era digno de ser imitado.42
Nolland sugeriu que Mateus pretendia escrever um relato da vida de
Jesus que fizesse um paralelo com os relatos do AT da vida de figuras-
chave na história de Israel. Essas biografias do AT têm seu foco não apenas

416
na figura humana, mas também em Deus e nas suas relações com Israel.
Nolland declarou: “A história de Jesus é contada como uma continuação —
na verdade, como uma espécie de ápice — da longa história de Deus e seu
povo”.43 Ele também ofereceu uma qualificação importante para a sua
comparação. Apesar de esses relatos do AT terem sido concebidos para
ligar as pessoas a uma figura do passado, a preocupação de Mateus foi ligá-
las a uma figura que ainda era seu contemporâneo para levar os seus leitores
a um encontro com o Cristo ressuscitado.
Embora Mateus tivesse a intenção de demonstrar que Jesus era a fonte
dos ensinamentos fundamentais da igreja e de recomendar o exemplo de
Cristo a seus leitores, o foco principal de Mateus era a identidade de Jesus.
O Evangelho de Mateus destacou quatro aspectos da identidade de Jesus.44
Em primeiro lugar, Jesus é o Messias, o Rei há muito esperado pelo povo de
Deus. Em segundo lugar, Jesus é o novo Abraão, o fundador de um novo
Israel espiritual constituído por todas as pessoas que optam por segui-lo,
incluindo tanto os judeus quanto os gentios. Em terceiro lugar, Jesus é o
novo Moisés, o libertador e instrutor do povo de Deus. Em quarto lugar,
Jesus é o Emanuel, o Filho de Deus nascido da virgem e que cumpre as
promessas do Antigo Testamento. Assim, embora o Evangelho de Mateus
seja de algumas formas semelhante a biografias antigas, ele continua
diferente. Mateus estava preocupado não apenas em preservar os
ensinamentos de Jesus, registrar os seus atos ou recomendar o seu exemplo,
mas sobretudo em explicar quem era Jesus. O Evangelho de Mateus pode
ser melhor descrito como uma biografia “teológica”, um relato histórico da
vida e ensinamentos de Jesus que explica sua importância espiritual.
Embora o Evangelho de Mateus funcione primariamente como uma
biografia teológica, vários estudiosos destacaram que o Evangelho tem um

417
objetivo secundário. O Evangelho foi escrito para servir de manual para o
discipulado. O subtítulo do extenso comentário de R. Gundry sobre Mateus
descreve o Evangelho como um “manual para uma igreja mesclada sob
perseguição”. A disposição tópica de Mateus de longos discursos, sua
ênfase nas exigências éticas do reino de Deus e especialmente a declaração
climática a respeito do ensino da observância de todos os mandamentos de
Jesus aos novos discípulos — tudo isso se combina para oferecer uma
orientação para a vida cristã.

LITERATURA
Plano Literário
Os comentários de Papias a respeito da autoria do Evangelho de Mateus já
foram discutidos anteriormente. Papias também contribuiu com uma
observação relevante sobre a estrutura literária do Evangelho de Mateus. De
acordo com ele, “Mateus colocou em ordem as palavras [de Jesus]”
(Eusébio, Hist. Ecl. 3.39). Muito provavelmente Papias quis dizer que o
Evangelho de Mateus tinha um arranjo mais ordenado do que o Evangelho
de Marcos. Uma vez que Mateus geralmente compartilha a mesma ordem
de perícopes que Marcos quando os dois se sobrepõem, Papias
provavelmente se referia ao fato de Mateus ter começado com uma
genealogia e um relato sobre o nascimento de Jesus, de ter dado um
tratamento mais profundo às aparições de Jesus após a ressurreição e de ter
disposto seus ensinamentos em cinco seções principais.45
Como mostrado a seguir, a maioria dos estudiosos concorda que a
estrutura do Evangelho de Mateus tem seu foco nos cinco grandes discursos
que apresentam a essência dos ensinamentos de Jesus (5 a 7; 10.5-42; 13.1-

418
52; 18.1-35; e 23 a 25).46 Consequentemente, partes da narrativa e seções do
discurso se alternam no fluxo do Evangelho de Mateus. Cada um desses
discursos é destacado das partes adjacentes de narrativa por expressões
conclusivas que são lidas, de modo geral, como se segue: “quando Jesus
acabou de dizer estas coisas” (7.28; 11.1; 13.53; 19.1; 26.1).
De acordo com o simbolismo numérico, esses cinco “livros de Jesus” no
Evangelho de Mateus parecem corresponder aos cinco livros de Moisés
(Gênesis a Deuteronômio). Por todo o Evangelho de Mateus, Jesus é
apresentado como o novo Moisés e dessa forma o primeiro discurso, o
Sermão do Monte, nos capítulos 5 a 7, invoca a memória de Moisés
recebendo a lei no Sinai. Além disso, não é necessário ou conveniente
conformar o conteúdo dos cinco discursos de Jesus no Evangelho de
Mateus com as instruções diretas de Moisés, em sua partida, a Israel em
Deuteronômio.
Apesar de partes do Evangelho de Mateus serem claramente dispostas
em tópicos, o livro segue uma ordem cronológica geral: genealogia,
nascimento, batismo, ministério galileu, jornada a Jerusalém, julgamento,
crucificação e ressurreição.47 Além da disposição cronológica geral, os
estudiosos observaram outros marcadores que parecem dividir o livro em
seções principais.
B. W. Bacon encontrou indícios que sugerem que Mateus pretendia
dividir o seu Evangelho em cinco seções principais, mais um prólogo (caps.
1 e 2) e um epílogo (26.3 a 28.20).48 Cada seção principal concluía com a
declaração: “E quando Jesus terminou”, seguida por alguma referência aos
ditos, instrução ou parábolas de Jesus (7.28,29; 11.1; 13.53; 19.1; 26.1).
Essas seções principais foram igualmente concebidas pois continham
segmentos da narrativa seguidos por discursos importantes. Bacon sugeriu

419
que a organização de Mateus em cinco seções principais era parte da
tentativa do autor de apresentar o seu Evangelho como um novo
Pentateuco. As cinco seções espelhavam os cinco livros de Moisés no AT.49
J. D. Kingsbury argumentou que Mateus dividiu seu Evangelho em três
seções principais.50 Ele introduziu novas seções principais com as palavras
“daí em diante Jesus começou a” (4.17; 16.21). De acordo com Kingsbury,
essas declarações de transição dividem o Evangelho em introdução (1.1 a
4.16), corpo (4.17 a 16.20) e conclusão (16.21 a 28.20).
De modo geral, a análise que Bacon faz da estrutura de Mateus parece
superior à de Kingsbury.51 A repetição da fórmula conclusiva após
segmentos da narrativa seguida de discurso é muito consistente para ser
mera coincidência. Além disso, a divisão em cinco seções se encaixa bem
com uma das principais ênfases teológicas de Mateus, a identidade de Jesus
como o novo Moisés.52
Em apoio à proposta quíntupla, Gundry observou que outros livros
antigos tinham um arranjo de cinco partes que refletiam a influência do
Pentateuco. Entre esses livros estavam o livro dos Salmos, os Megilloth, a
história dos Macabeus por Jasão de Cirene, 1Enoque, os Perekim (ditos)
originais que estava por trás de Pirkei Avot (“Capítulos dos Pais”) e a
Exposições dos Ditos do Senhor53 de Papias. Ao mesmo tempo, Gundry
objetou que os cinco “livros” de Mateus não fazem um paralelo com os
cinco livros de Moisés e que Mateus tem cinco grandes discursos, mas seis
seções narrativas principais.54 Mas, não obstante as preocupações de
Gundry, é melhor ver a estrutura de Mateus como centrada em cinco
discursos principais de Jesus em um esquema que oscila entre a narrativa e
o discurso.55

420
Tabela 4.1: Os Cinco Discursos no Evangelho de Mateus
Discurso Referência Tema
1. Sermão do Monte 5 a 7 A visão de Jesus para o
estabelecimento do reino de Deus.
2. Instrução dos 10 Os discípulos devem espalhar o
Doze Evangelho; advertência sobre a
iminente perseguição.
3. Parábolas do 13 Explica a rejeição do Evangelho por
Reino alguns e a presença do mal;
crescimento e ministério do reino de
Deus em face da oposição.
4. Parábolas do 18 Explica como os discípulos devem
Reino se relacionar com Jesus e uns com
outros
5. Discurso do Monte 24 a 25 Profecia da destruição do Templo e
das Oliveiras, mais eventos precedentes à Segunda
Parábolas do Reino Vinda.

ESTRUTURA
I. Introdução (1.1 a 4.11)
A. Os ancestrais, o nascimento e a infância de Jesus (1.1 a 2.23)
1. Genealogia de Jesus Cristo (1.1-17)
2. O nascimento de Jesus (1.18-25)
3. O rei Herodes e a visita dos Magos (2.1-12)
4. Fuga do Egito, Massacre de Belém, Retorno a Nazaré (2.13-23)
B. Introdução ao ministério de Jesus (3.1 a 4.11)
1. O Ministério de João Batista (3.1-12)
2. O Batismo de Jesus (3.13-17)
3. A Tentação de Jesus (4.1-11)

421
II. O ministério de Jesus na Galileia (4.12 a 18.35)
A. Primeira parte do ministério de Jesus na Galileia (4.12-25)
1. Jesus Começa a Pregar (4.12-17)
2. O Chamado dos Discípulos (4.18-22)
3. Resumo (4.23-25)

Discurso 1: Sermão do Monte (5 a 7)


B. Segunda parte do ministério de Jesus na Galileia (8 e 9)
1. Ministério de Cura (8.1-17)
2. Discipulado (8.18-27)
3. Ministério de Cura (8.28 a 9.8)
4. Discipulado (9.9-17)
5. Ministério de Cura (9.18-34)
6. Resumo (9.35-38)

Discurso 2: Instrução aos Doze (10)


C. Terceira parte do ministério de Jesus na Galileia (11 e 12)
1. Jesus e João Batista (11.1-19)
2. Julgamento e Discipulado (11.20 a 12.8)
3. Ministério de Cura (12.9-45)
4. Discipulado (12.46-50)

Discurso 3: Parábolas do Reino (13.1-53)


D. Ministério na Galileia estendido para o Norte (13.54 a 17.27)
1. Rejeitado na Cidade Natal (13.54-58)
2. João Batista Decapitado (14.1-12)
3. A Alimentação dos Cinco Mil (14.13-21)
4. Caminhada sobre as Águas (14.22-36)

422
5. Discipulado (15.1-20)
6. Cura (15.21-28)
7. A Alimentação dos Quatro Mil (15.29-39)
8. Advertência Contra os Fariseus e Saduceus (16.1-12)
9. Pedro Confessa a Cristo (16.13-28)
10. A Transfiguração (17.1-13)
11. Cura (17.14-23)
12. O Imposto do Templo (17.24-27)

Discurso 4: Parábolas do Reino (18)

III. O ministério de Jesus na Judeia e sua Paixão (19 a 28)


A. Ministério na Judeia (19 e 20)
1. Ensino Acerca do Divórcio (19.1-12)
2. As Criancinhas (19.13-15)
3. Discipulado e a Parábola dos Trabalhadores (19.16 a 20.16)
4. A Segunda Predição da Paixão (20.17-19)
5. A Grandeza no Reino (20.20-28)
6. Cura (20.29-34)
B. Ministério final em Jerusalém (21 e 22)
1. Entrada Triunfal (21.1-11)
2. A Purificação do Templo (21.12-17)
3. A Maldição da Figueira (21.18-27)
4. Parábolas dos Dois Filhos, dos Agricultores Maus, da Festa de
Casamento (21.28 a 22.14)
5. Questões Controversas (22.15-46)
C. Jesus denuncia os fariseus (23)

423
Discurso 5: Discurso do Monte das Oliveiras, Parábolas do Reino (24 e
25)
D. A Paixão (26 e 27)
1. A Conspiração para Matar Jesus (26.1-5)
2. A Unção (26.6-16)
3. A Páscoa (26.17-30)
4. Predição da Negação de Pedro (26.31-35)
5. Getsêmani, a Traição e a Prisão (26.36-56)
6. O Julgamento Perante o Sinédrio e a Negação de Pedro (26.57-75)
7. O Suicídio de Judas (27.1-10)
8. O Julgamento Perante Pilatos (27.11-26)
9. Jesus Zombado e Crucificado (27.27-56)
10. O Sepultamento de Jesus (27.57-61) e a Colocação da Guarda
(27.62-66)
E. A ressurreição e a Grande Comissão (28)
1. A Ressurreição (28.1-10)
2. O Relatório da Guarda (28.11-15)
3. A Grande Comissão (28.16-20)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Introdução (1.1 a 4.11)
A. Os ancestrais, o nascimento e a infância de Jesus
(1.1 a 2.23)
Mateus inicia seu Evangelho com uma genealogia de Jesus (1.1-17)56 que
faz muito mais do que meramente satisfazer a curiosidade sobre a árvore

424
genealógica da família de Jesus. Ela enfatiza a identidade de Jesus como
filho de Abraão, o recipiente da promessa divina por meio de quem todas as
nações da terra seriam abençoadas (Gn 12.1-3) e como o Rei prometido da
linhagem de Davi que reinará sobre o povo de Deus. Também ressalta a sua
supremacia sobre os patriarcas do AT e sua missão redentora primeiro para
os judeus, mas também para os gentios. A inclusão de quatro mulheres além
de Maria, todas cujas vidas foram caracterizadas por um escândalo aparente
ou real, pode ser destinada a demonstrar que a aparência do escândalo
ligado ao nascimento de uma virgem não necessariamente negou a sua
autenticidade, uma vez que Deus na história da salvação anterior tinha
trabalhado várias vezes por meio de escândalo real ou aparente.57
O relato da concepção e do nascimento de Jesus (1.18-25) retrata esses
eventos como absolutamente únicos. Isso demonstra que Jesus era o
cumprimento das promessas de Deus feitas por intermédio dos profetas do
AT. Ainda mais importante, o relato enfatiza a identidade de Jesus como o
Emanuel nascido da virgem, Deus que vive entre os seres humanos e o
Salvador que resgataria o seu povo dos seus pecados. A referência a Isaías
7.14 em Mateus 1.22,23 é a primeira de uma série de citações de
cumprimento que documentam o fato, tão importante para a audiência
judaica de Mateus, de que praticamente todos os eventos importantes da
vida de Jesus — incluindo seu nascimento, sua identidade como “Deus
conosco”, seus milagres, seu ministério de cura e as circunstâncias ao redor
de sua morte, sepultamento e ressurreição — aconteceram para que se
cumprisse em conformidade com a Escritura do AT.58
A visita dos Reis Magos para adorar o menino Jesus (2.1-12) demonstra
que, embora a missão de Jesus fosse primeiramente dirigida aos judeus, o
seu escopo transcendia Israel e chegava também aos gentios. Sua jornada

425
demorada e difícil do Oriente a Belém, seus valiosos presentes e
especialmente sua adoração a Jesus destacam a sua supremacia e implicam
a sua divindade. O fracasso dos sacerdotes e dos escribas em viajar para
Belém em busca de Jesus revela indiferença em relação ao Messias que
mais tarde evoluiu para animosidade.
A fuga de Herodes e da matança dos inocentes (2.13-18) são
reminiscência do assassinato de crianças hebreias por ordem do Faraó e da
fuga de Moisés (Êx 1 e 2). O relato começa um retrato de Jesus como o
novo Moisés, o instrutor e libertador do povo de Deus. Apesar de sua
natureza trágica, o evento está em sintonia com a profecia do AT (Jr 31.15,
citado em Mt 2.18). O relato de Mateus é plenamente consistente com as
descrições do caráter de Herodes pelos antigos historiadores.59 A relação
temporal do nascimento de Jesus com a morte de Herodes é o fator mais
importante no estabelecimento de uma cronologia da infância de Jesus.60
O relato da infância de Jesus termina com uma descrição da família
sagrada se estabelecendo em Nazaré (Mt 2.19-23). Mateus viu uma ligação
entre o nome da cidade e o som palavra hebraica para “ramo” (hebr. netser).
A conexão retratou Jesus como o cumprimento das “profecias sobre o
ramo” do Antigo Testamento (Is 4.2; 11.1; Jr 23.5; 33.15).61 Essas profecias
falam de um justo descendente de Davi cujo governo justo e sábio seria
fortalecido pelo Espírito e que traria a salvação a Judá. Assim, Mateus via a
cidade natal de Jesus como um indício da sua identidade como o Messias,
continuando o padrão do cumprimento das passagens do AT na vida de
Jesus.

426
Mapa 4.1 As viagens de Jesus.

427
B. Introdução do ministério de Jesus (3.1 a 4.11)
Esta seção começa com uma descrição do ministério de João Batista,
novamente em consonância com a expectativa do AT (3.1-6). A aplicação
que Mateus faz de Isaías 40.3 a João Batista diz tanto sobre a identidade de
Jesus como sobre o papel de João. João é uma “voz daquele que clama no
deserto” chamando o povo judeu ao arrependimento e, assim, preparando o
caminho para o próprio Deus vir na pessoa de Jesus, o Messias. Enquanto
Mateus usa a profecia para descrever a preparação de João para a vinda de
Jesus, no seu contexto original a profecia falava de alguém que preparava
para a vinda do Yahweh Deus. Ao usar um texto sobre a vinda de Yahweh
para descrever a vinda de Jesus, Mateus implica que Jesus é divino, o
Emanuel, Deus conosco.
João anunciou a vinda do reino e chamou seus ouvintes judeus ao
arrependimento (3.7-12). Em particular, ele os exortou a abandonar o
pressuposto de que a descendência física de Abraão garantia a salvação.
Chamou-os a expressar seu arrependimento ao aceitar seu batismo e
produzir os frutos de boas obras. Ele também prometeu que outro viria
depois dele, alguém mais poderoso e imensamente superior. Essa figura
messiânica ofereceria aos pecadores uma escolha entre dois batismos: o
batismo executado pelo Espírito que os transformaria ou um batismo de
fogo que os queimaria como o fogo queimava o joio do trigo.
A descrição que Mateus faz do batismo de Jesus (3.13-17) é cheia de
significado teológico. Quando Jesus se aproximou de João pedindo que o
batizasse, João identifica Jesus como aquele que ele havia prometido e
afirma que seria mais adequado que Jesus o batizasse, e não o contrário. A
descida do Espírito Santo sobre Jesus como uma pomba pode indicar que
ele tinha o poder da Nova Criação (Gn 1.1,2; cf. Gn 8.8-12). A voz do Pai

428
celestial descrevia Jesus usando dois textos do AT que identificavam Jesus
como o Messias e o Servo Sofredor que proporcionaria o perdão aos
pecadores ao tornar-se o sacrifício deles (Sl 2.7; Is 42.1).
Os 40 dias da tentação de Jesus (4.1-11) demonstraram que Jesus
realmente veio para “cumprir toda a justiça” (3.15).62 A experiência da
tentação também demonstrou a autoridade de Cristo sobre Satanás e sua
supremacia sobre os anjos. Enquanto Marcos inclui apenas um conciso
relato da tentação (1.12,13), Mateus, como Lucas, fornece uma
apresentação muito mais detalhada (embora em Lucas a ordem da segunda
e terceira tentações esteja invertida). Jesus, então, estabeleceu a sede de seu
ministério em Cafarnaum, na “Galileia dos gentios” (4.12-16). Essa
localização confirma a intenção de Deus de incluir os gentios em seu plano
redentor, um dos principais temas do Evangelho de Mateus. Jesus começou
a proclamar uma mensagem idêntica à de João: “Arrependei-vos, porque o
reino do céu já chegou” (4.17; veja 3.2).

II. O Ministério de Jesus na Galileia (4.12 a 18.35)


A. Primeira parte do ministério de Jesus na Galileia
(4.11-25)
Jesus, então, começou a chamar os seus primeiros discípulos, duas duplas
de irmãos pescadores: Pedro e André, e Tiago e João (4.18-22). A
disposição deles de abandonar a sua profissão e deixar suas famílias para
seguir a Jesus demonstra que Jesus era digno de qualquer sacrifício que ele
pedisse que seus seguidores fizessem. Jesus, então, começou a pregar o
evangelho do reino por toda a Galileia (4.23-25, uma declaração sumária).

429
Grandes multidões o seguiram em resposta à sua poderosa pregação e
milagres de cura surpreendentes.

430
Tabela 4.2: Os Doze Discípulos de Jesus
Nome Versículos-Chave Descrição
Simão Pedro Mt 4.18; 16.13-17, Pescador antes de ser chamado ao
21-23; Lc 22.54-62; discipulado; um dos discípulos
Jo 21.15-19 pertencentes ao círculo mais íntimo
de Jesus; frequentemente impetuoso
e esquentado.
André Mt 4.18; Jo 1.40; 6.8; Irmão de Pedro; pescador antes de
12.22 seguir a Jesus; discípulo de João
Batista antes de seguir a Jesus.
Tiago Mt 4.21; Mc 3.17; Previamente, havia sido pescador;
9.2; 14.33; At 12.1-5 irmão de João; um dos dois “Filhos
do Trovão”, possivelmente devido
ao seu temperamento; pertencia ao
círculo mais íntimo de discípulos;
martirizado nas mãos de Herodes.
João Mt 4.21; Mc 3.17; Previamente, havia sido pescador;
9.2; 14.33; Jo 1.35- um dos dois “Filhos do Trovão”,
39?; 13.23; 21.2 possivelmente devido ao seu
temperamento, mas também
chamado de “o discípulo que Jesus
amava”; pertencia ao círculo mais
íntimo de discípulos.
Filipe Jo 1.43-48; 6.5-7; Chamado como discípulo e levou
12.21, 22; At 8.4-25, Natanael a Jesus; teve grande
26-40 sucesso pregando em Samaria;
evangelizou o eunuco etíope.
Bartolomeu Mt 10.3 par.; Jo 1.43- Também conhecido como Natanael;
(Natanael) 49 visto por Jesus “debaixo da
figueira”, confessou a Jesus como
“Filho de Deus” e “Rei de Israel”.
Tomé Jo 11.16; 14.5; Bem conhecido como como um
20.24-29 “cético”, mas mais tarde chamou a
Jesus de “meu Senhor e meu Deus”.

431
Nome Versículos-Chave Descrição
Mateus Mt 9.9-13; 10.3; Mc Antigo coletor de impostos que
(Levi) 2.18; Lc 6.15 deixou tudo para seguir a Jesus;
irmão de Tiago, o filho de Alfeu?
Tiago filho de Mt 10.3; Mc 3.18; Lc Irmão de Mateus?
Alfeu 6.15; At 1.13
Tadeu (Judas Mt 10.3; Mc 3.18; Lc Também conhecido como Judas,
filho de 6.16; Jo 14.22; At filho de Tiago; o “outro Judas” (não
Tiago) 1.13 o Iscariotes; veja adiante).
Simão, o Mt 10.4; Mc 3.18; Lc Previamente, havia sido um zelote
Zelote 6.15; At 1.13 (terrorista/lutador pela liberdade
judaica) que, em vez disso, pregou a
vinda de um reino espiritual à terra.
Judas Mt 10.4; 26.14-16; O traidor; aquele que cuidava da
Iscariotes 27.3-10; Jo 6.70, 71; bolsa de dinheiro dos discípulos e
12.4-6; 13.21-30; que mais tarde traiu Jesus por 30
17.12; At 1.16-20 peças de prata e depois se enforcou.

Discurso 1: O Sermão do Monte (5 a 7)


A introdução ao primeiro discurso de Jesus, o Sermão do Monte (5 a 7),
63
claramente o retrata como o novo Moisés. A ascensão de Jesus ao monte é
uma reminiscência da ascensão de Moisés ao Monte Sinai (Êx 19.3;
24.13,18). Como no Antigo Testamento (p. ex., Monte Sinai; Êx 19.3), os
montes em Mateus são locais de revelação divina (p. ex., o Monte da
Transfiguração; 17.1-3, com Moisés e Elias juntos a Jesus).64 Além disso, as
bênçãos pronunciadas por Jesus relembram a bênção de Moisés sobre a
tribo de Israel (Dt 33.29). Nesse seu discurso inaugural, Jesus expõe sua
visão para o estabelecimento do reino de Deus. As Bem-Aventuranças (5.3-

432
12) identificam os discípulos de Jesus como a nova verdadeira Israel
espiritual sobre quem as bênçãos de Deus repousam.
Jesus exortou seus discípulos a viverem vidas que fossem caracterizadas
pela pureza e que servissem para glorificar a Deus. Dessa forma, eles
seriam “sal” e “luz” no mundo (5.13-16). Ele afirmou a inspiração do AT e
ordenou que os seus discípulos fossem caracterizados pela completa
obediência até mesmo ao menor dos mandamentos do AT como
interpretado por ele no seu ensino. A menos que a sua justiça exceda a dos
fariseus, os seguidores de Jesus não poderão entrar no reino de Deus (5.17-
20). Corretamente interpretado, o AT exige que os discípulos controlem
seus temperamentos, busquem a pureza sexual, honrem a aliança do
casamento, falem com integridade, abstenham-se de atos de vingança e
amem seus inimigos (5.21-48). Jesus insistiu que apenas seus discípulos
eram capazes de tal justiça uma vez que ele graciosamente concedeu essa
justiça aos seus seguidores por sua bênção (5.6).
Jesus também deu instruções sobre os chamados três pilares do
judaísmo: oração, jejum e esmolas (6.1-18). Ele advertiu seus discípulos
especialmente contra a realização de atos de devoção religiosa para agradar
a uma audiência humana. Ele enfatizou que os verdadeiros atos de devoção
devem ter seu foco exclusivamente no agradar a Deus. Ele prometeu que
Deus recompensaria tais expressões de piedade genuína. Jesus exortou os
discípulos a colocar as questões eternas e espirituais acima das coisas
temporais e materiais. Em especial, ele advertiu seus discípulos sobre a
sedução do materialismo. Ele ordenou que os discípulos se livrassem da
ansiedade confiando na capacidade de Deus de prover o sustento para suas
necessidades e ao deixar que as prioridades de Deus definissem as deles
(6.19-34).

433
Jesus proibiu o julgamento hipócrita de outros (7.1-6). Ele ensinou que
os discípulos podem ajudar os outros a vencer os hábitos pecaminosos
apenas quando eles puderem dominar os seus próprios hábitos. Jesus
prometeu aos seus discípulos que aqueles que pedissem por coisas boas as
receberiam. Aqueles que procurassem o reino iriam encontrá-lo. Aqueles
que batessem à porta estreita que leva ao reino receberiam entrada. No
entanto, Jesus advertiu de que a vida do verdadeiro discípulo implicaria
dificuldades e perseguições. Poucas pessoas estariam dispostas a enfrentar
essas dificuldades para receber a vida eterna (7.7-14).
Jesus advertiu seus discípulos sobre os falsos profetas e falsos
discípulos (7.15-23). Os discípulos poderiam reconhecer esses impostores
pelos seus “frutos”, as ações e as palavras que atestam seu verdadeiro
caráter. Jesus ensinou que os falsos discípulos seriam expostos no dia do
juízo pelo que eles realmente eram. Ele pessoalmente iria desmascará-los e
bani-los do reino do céu. Jesus concluiu o Sermão do Monte com uma
parábola que ensinava que ouvir e obedecer aos ensinamentos de Jesus era
o único meio eficaz de se preparar para o julgamento escatológico. Mateus
observou que o povo reconheceu a autoridade incomum do ensinamento de
Jesus em comparação com a dos escribas e dos doutores da lei (7.24-29).

B. Segunda parte do ministério de Jesus na Galileia


(8 e 9)
A seção narrativa que se segue ao Sermão do Monte está saturada com
relatos dos milagres de Jesus. Ele purificou um leproso, curou o servo
paralítico de um centurião romano, arrefeceu a testa febril da sogra de
Simão, controlou o clima com um simples comando, libertou o homem de

434
Gadara de uma legião de demônios, ressuscitou a filha de um dirigente da
sinagoga, estancou o fluxo de sangue de uma mulher quando ela
simplesmente tocou a orla de suas vestes, deu vista aos cegos e fez com que
um homem mudo falasse.
Esses milagres serviram a diferentes propósitos. Primeiro, eles
confirmaram a identidade de Jesus como Deus, o Salvador, uma vez que
Isaías 35.5,6 prometeu que quando Deus viesse para salvar o seu povo, ele
abriria os olhos dos cegos, abriria os ouvidos dos surdos, permitiria que o
coxo saltasse como um cervo e faria com que o mudo gritasse de alegria.
Segundo, alguns dos milagres, particularmente a cura do servo do centurião
e o exorcismo do endemoninhado gadareno, demonstraram a compaixão de
Cristo pelos gentios e claramente afirmaram a intenção de Deus de
conceder-lhes a salvação. Terceiro, porque Mateus explicou o poder de cura
de Jesus citando Isaías 53.4 (Mt 8.17), os milagres mostravam que Jesus era
o Servo do Senhor que iria oferecer sua vida como um sacrifício para expiar
os pecados do povo de Deus. Quarto, um milagre de cura e o diálogo que o
acompanha claramente expressaram a autoridade de Jesus para perdoar
pecados (9.1-8). Finalmente, vários dos milagres de cura de Jesus exibiram
sua compaixão para com as pessoas consideradas impuras, rejeitadas pela
comunidade religiosa e tratadas como intocáveis. Esses milagres
demonstraram que a graça e a misericórdia de Jesus se estendiam até as
pessoas mais desprezadas e indignas.
Esta seção conclui com a observação de Jesus de que as multidões eram
como ovelhas sem um pastor (9.35-38; veja Nm 27.17 com referência à
transição da liderança de Moisés para Josué), uma acusação contra os
líderes judeus (veja Ez 34.5).

435
Discurso 2: A Instrução dos Doze (10)
Jesus seguiu sua acusação dos líderes judeus com a nomeação dos Doze
para servirem como pastores das ovelhas perdidas da casa de Israel. Esses
doze discípulos serviriam como o núcleo de uma Israel espiritual
recentemente reconstituída. Jesus ordenou que os discípulos proclamassem
a mensagem do reino vindouro, realizassem milagres semelhantes aos seus
para demonstrar que a era messiânica havia raiado e vivessem na
dependência das graciosas provisões de Deus.
Jesus também advertiu seus discípulos sobre as perseguições que teriam
de suportar por causa da sua associação com ele. Essas perseguições lhes
dariam a oportunidade de testemunhar sobre Jesus perante governantes e
reis. Eles não precisavam se preocupar quanto ao seu testemunho nesses
casos porque o Espírito Santo lhes daria as palavras para fazê-lo. Os
discípulos de Jesus deveriam temer a Deus mais do que a outros porque
Deus poderia destruir seus corpos e almas, enquanto as pessoas só podiam
destruir o corpo.

C. Terceira parte do ministério de Jesus na Galileia


(11 e 12)
Esta seção descreve a ampla variedade de respostas ao ministério de Jesus
que vão desde a dúvida de figuras como João Batista à recusa de seus
ouvintes em se arrepender. Jesus aliviou as dúvidas de João ao apontar para
suas obras milagrosas que cumpriam a profecia do AT e confirmavam sua
identidade messiânica (11.1-19). Jesus destacou que ele e João Batista
tinham sido diferentes em vários aspectos. João tinha levado uma vida
austera, mas Jesus tinha se associado aos pecadores. Ao rejeitar Jesus e

436
João, o povo demonstrou que seu problema era com a mensagem
compartilhada sobre o reino vindouro e a necessidade de se arrepender, e
não com personalidades ou com as diferenças de estilo de vida. Jesus
identificou João como precursor do Messias e com isso implicitamente se
identificou como o Messias.
Jesus advertiu cidades impenitentes sobre o terrível juízo que as
esperava se elas não se arrependessem de sua rejeição de Jesus (11.20-24).
Ele explicou que ninguém conhece Deus, o Pai, senão Jesus, o Filho, e
“aquele a quem o Filho quiser revelar” (11.25-30). As perícopes seguintes
mostram a intensificação da rejeição de Jesus pelos líderes judeus.
Primeiro, os fariseus desafiaram os discípulos de Jesus a quebrar uma de
suas leis do sábado. Jesus respondeu identificando-se como o Senhor do
sábado, um título que os fariseus teriam reconhecido como pertencendo
somente a Yahweh. Quando mais tarde, no sábado, Jesus curou um homem
paralítico, os fariseus começaram a trama para tirar a vida de Jesus (12.1-
14).
Novamente, Jesus é identificado como o Servo de Yahweh (veja 8.17),
cumprindo a predição messiânica do AT não apenas em relação ao seu
ministério de cura milagroso de alcance universal, mas mesmo em relação à
forma mansa e humilde de seu ministério (12.15-21). A rejeição que os
fariseus tiveram de Jesus alcançou seu clímax quando eles identificaram o
chefe dos demônios como a fonte da habilidade de Jesus de expulsar
demônios (12.22-37). Jesus advertiu-lhes que atribuir a Satanás as
atividades do Espírito através de seu ministério constituía o pecado de
blasfêmia contra o Espírito, um pecado para o qual nenhum perdão era
oferecido. Ele ainda alertou que as palavras dos fariseus resultariam em sua
condenação no dia do juízo.

437
Os fariseus pediram que Jesus realizasse um sinal para confirmar suas
alegações (12.38-45). Jesus respondeu que o único sinal que lhes seria dado
era a sua própria ressurreição (o “sinal de Jonas”; esse é o único “sinal” de
Jesus nos Sinóticos, enquanto João apresenta uma série de sinais para
mostrar que Jesus é o Messias prometido). No entanto, Jesus advertiu que
os fariseus e muitos outros daquela geração rejeitariam esse sinal e que sua
condição espiritual só pioraria, como um homem que havia sido liberto de
um único demônio mas que depois foi tomado por um número maior de
espíritos malignos. Finalmente, Jesus ensinou outra lição sobre a fé e
discipulado ao identificar todos aqueles que realizavam a vontade de seu
Pai como seus irmãos e irmãs espirituais (12.46-50).

438
Tabela 4.3: Parábolas de Jesus nos Sinóticos
Parábola Marcos Mateus Lucas
Convidados do Noivo 2.19-20 9.15 5.33-39
Remendo na Roupa 2.21 9.16 5.36
Vinho Novo em Odres Velhos 2.22 9.17 5.37-39
Homem Valente 3.22-27 12.29-30 11.21-23
O Semeador 4.1-9, 13- 13.1-9, 18-23 8.4-8, 11-
20 15
Uma Candeia Debaixo da 4.21-25 5.14, 15 8.16-18
Vasilha
Semente que Cresce 4.26-29
Secretamente
Grão de Mostarda 4.30-32 13.31, 32 13.18, 19
Lavradores Maus 12.1-12 21.33-46 20.9-19
Ramos da Figueira 13.28-32 24.32-36 21.29-33
Servos Vigilantes 13.34-37 12.35-38
Pai e Filho 7.9-11 11.11-13
Duas Portas 7.13, 14 13.23-27
Árvores Boas e Más 7.16-20
Construtores Sábios e Tolos 7.24-27 6.47-49
Joio e Trigo 13.24-30, 36-
43
Fermento 13.33 13.20,21
Tesouro Escondido 13.44
Pérolas 13.45, 46
A Rede 13.47-50
Dono de uma Casa 13.52
A Ovelha Perdida 18.12-14 15.1-7

439
Parábola Marcos Mateus Lucas
Servo Impiedoso 18.23-25
Trabalhadores na Vinha 20.1-16
Dois Filhos 21.28-32
Festa de Casamento 22.1-14 14.15-24
Ladrão na Noite 24.42-44 12.39, 40
Servo Sábio e Fiel 24.45-51 12.42-46
Virgens Sábias e Insensatas 25.1-13
Os Talentos 25.14-30 19.11-27
Ovelhas e Cabritos 25.31-46
Dois Devedores 7.41-50
O Bom Samaritano 10.25-37
O Amigo Persistente 11.5-8
Rico Insensato 12.13-21
Figueira Estéril 13.6-9
Lugar Menos Elevado 14.7-14
Grande Banquete 14.16-24
Construtor da Torre 14.28-30
Rei em Guerra 14.31-33
Ovelha Perdida 15.1-7
Dracma Perdida 15.8-10
Filho Pródigo 15.11-32
Administrador Infiel 16.1-8
Lázaro e o Homem Rico 16.19-31
Servo Humilde 17.7-10
Viúva Persistente 18.1-8
Fariseu e Publicano 18.9-14

440
Discurso 3: as parábolas do Reino (13)
Em seu terceiro discurso principal, Jesus contou várias parábolas
relacionadas ao reino de Deus.65 A Parábola do Semeador (13.1-23)
explicou as razões pelas quais muitos rejeitaram a mensagem de Jesus. Ele
invocou a mensagem de Isaías (Is 6.9,10), que enfrentou grave rejeição e
observou que a rejeição de Jesus como Messias por parte de Israel cumpria
a profecia do AT. A parábola de Jesus também enfatizava a surpreendente
produção de obras de justiça e palavras por aqueles que ouviram e
aceitaram sua mensagem.
A parábola de Jesus sobre o joio (13.24-30, 36-43) foi sua resposta a
quem se perguntava por que ele não destruía imediatamente os ímpios se ele
era o prometido Filho do Homem. A parábola demonstrava que Jesus não
era a fonte do mal no mundo (compare 13.27,28 com 13.36-39), que o
mundo inteiro pertence ao Filho do Homem, que o diabo não tinha o direito
de trazer o mal para o mundo e que o Filho do Homem afirmaria o seu
reinado sobre o mundo punindo os maus e abençoando os justos no
momento oportuno.
As parábolas do grão de mostarda e do fermento (13.31-35) retratam o
notável crescimento do reino e sua ampla influência sobre o mundo. As
parábolas do tesouro escondido e da pérola preciosa (13.44-46) mostram
que o reino de Deus é digno de qualquer sacrifício que os discípulos de
Jesus possam ser chamados a fazer.
A Parábola da Rede (13.47-51) retratou a separação dos justos
discípulos de Jesus das pessoas perversas do mundo no juízo final e a
punição que os ímpios irão enfrentar. A Parábola do Escriba (13.52)

441
descreve os discípulos de Jesus como melhor qualificados do que os
escribas e fariseus para serem professores da lei. No seu baú de instrução,
eles tinham tanto tesouros velhos (AT) quanto novos (os ensinamentos de
Jesus).

D. O ministério da Galileia estendido para o Norte


(13 a 17)
Esta seção do Evangelho começa com outra referência à rejeição de Jesus
pelo seu próprio povo, desta vez, o povo de Nazaré, sua própria terra natal
(13.53-58). O começo do fim do ministério na Galileia é ainda assinalado
pela execução de João Batista, de quem se houve pela última vez em 11.1-
19, por Herodes, o tetrarca (14.1-12). No plano de Deus, a missão de João
como uma voz preparando o caminho para o Senhor no deserto foi
cumprida e ele sai de cena com a missão de Jesus em pleno andamento.
Jesus procurou se retirar para um lugar de solidão após a morte de João,
mas a multidão o seguia onde quer que ele fosse. Ele milagrosamente a
alimentou através do milagre dos pães e dos peixes (14.13-21). Também
assombrou seus discípulos com o milagre de caminhar sobre as águas
(14.22-36). Os dois milagres eram reminiscências da provisão do maná no
deserto e da travessia do mar Vermelho e, assim, contribuem para a ênfase
de Mateus sobre a identidade de Jesus como o novo Moisés. Os milagres de
Jesus resultaram em uma popularidade ainda maior entre as pessoas comuns
que se aglomeravam em torno dele na esperança de que elas pudessem
apenas tocar na orla das suas vestes e ser curadas.
Essa popularidade despertou o ressentimento dos escribas e fariseus.
Eles viajaram de Jerusalém para a Galileia para enfrentar Jesus por quebrar

442
suas tradições (15.1-20). Jesus acusou os escribas e fariseus de hipócritas
que colocam as suas próprias tradições acima dos mandamentos de Deus.
Ele também acusou os escribas e fariseus de se preocuparem muito com as
questões relacionadas aos rituais judaicos e de negligenciarem uma questão
mais importante, a condição de seus corações.
A fé da mulher cananeia (15.21-28) fornece um contraste marcante com
a descrença dos líderes judeus. A disposição de Jesus em curar sua filha
endemoninhada e suas palavras de elogio: “Tua fé é grande”, implicam que
Jesus também chamaria discípulos dentre os gentios como também dentre
os judeus, embora por agora Jesus afirme o privilégio da salvação histórica
dos judeus, e indica que eles são o principal foco de sua missão terrena
(15.24,26; veja 10.5,6).
Jesus continuou seu ministério miraculoso subindo uma montanha e
curando as pessoas que sofriam de várias enfermidades. Ele também
realizou outra multiplicação de pães que lembrava o alimento
miraculosamente providenciado por Deus através de Moisés durante a
peregrinação no deserto (15.29-39). Apesar desses frequentes milagres
públicos, os fariseus e saduceus se aproximaram de Jesus e pediram por um
sinal milagroso (16.1-12). Jesus insistiu, mais uma vez, que eles receberiam
apenas um sinal, o sinal de Jonas mencionado anteriormente, a ressurreição
de Jesus. Jesus advertiu seus discípulos a que evitassem a doutrina dos
fariseus e saduceus, talvez, particularmente, sua constante busca de outro
milagre para provar a identidade de Jesus.
Os discípulos de Jesus, particularmente Pedro (16.13-20), reconheceram
a identidade de Jesus como Filho de Deus, como Pedro afirmou na decisiva
confissão em Cesareia de Filipe. De acordo com Jesus, isso foi resultado da
revelação divina e ele iria construir sua comunidade messiânica sobre Pedro

443
com base na sua confissão.66 No entanto, quando Jesus começou a predizer
o seu sofrimento, morte e ressurreição, Pedro protestou. Isso indica que,
apesar de sua confissão de Jesus como o Messias, Pedro ainda não entendia
que o Messias devia sofrer. Jesus explicou que todos os discípulos cristãos
tinham de estar preparados para carregar a sua própria cruz, assim como
Jesus estava preparado para carregar a sua. Jesus prometeu aos seus
discípulos que eles iriam ver a aurora do reino antes que eles morressem.
Esse prometido alvorecer do reino chegou seis dias mais tarde, durante
a Transfiguração de Jesus (17.1-13). Várias características do evento têm
paralelo em Êxodo 34.29-35. Isso sugere que o evento serviu para
confirmar a identidade de Jesus como o novo Moisés, o Salvador e
Redentor do povo de Deus. No entanto, o evento transcende a experiência
de Moisés e demonstra que Jesus é muito superior a Moisés. A descrição de
Jesus ecoa descrições de Deus no AT e implica fortemente a divindade de
Cristo. Jesus prosseguiu para expulsar um demônio que seus discípulos não
conseguiram expulsar, e explicou que a incapacidade deles de expulsar o
demônio era devido à sua falta de fé. Se os discípulos tivessem fé do
tamanho de um grão de mostarda, nada seria impossível para eles.
A seção termina com o relato de Jesus pagando o imposto do templo
(17.24-27). Ele descreveu a si mesmo como o Filho do rei celestial e,
portanto, sem nenhuma obrigação de pagar do imposto. Mas Jesus realizou
um milagre que mostrou sua autoridade sobre o reino animal, de modo que
ele e Pedro puderam pagar o imposto e evitar a desnecessária ofensa aos
judeus.

Discurso 4: parábolas do Reino (18)

444
Jesus começou o quarto discurso principal em Mateus descrevendo a
humildade pueril de seus discípulos, o que lhes permitiu se submeterem à
autoridade de Cristo como uma criança se submete à autoridade dos pais
(18.1-9). Jesus advertiu que aqueles que tentassem provocar a queda dos
seus discípulos seriam severamente punidos. Jesus enfatizou a importância
de seus discípulos para Deus prometendo que seus representantes angélicos
teriam acesso à sala do trono celestial e permaneceriam sempre na presença
de Deus. Além disso, a vontade soberana de Deus determinou que todos os
discípulos de Jesus deveriam permanecer fiéis a ele. Embora possam dele se
afastar, eles não estarão permanentemente perdidos (18.10-14).
Jesus delineou um processo disciplinar que encorajaria os verdadeiros
discípulos a se arrependerem e isolaria os falsos discípulos da comunhão
cristã (18.15-20). Jesus prometeu estar presente com seus discípulos quando
eles se reunissem para buscar sua liderança a respeito do comportamento
aceitável ou inaceitável para os discípulos. Ele também prometeu responder
à sua fervorosa oração pelo perdão e restauração de seus irmãos pecadores.
Finalmente, Jesus usou uma parábola poderosa para exortar seus
discípulos a oferecerem gracioso perdão aos outros (18.21-35). Esse perdão
expressava para os outros a grande graça que Deus havia expressado aos
discípulos. A falha em oferecer perdão a outros mostrava total desprezo
pela magnitude da misericórdia que Deus exibiu ao perdoar os pecados dos
discípulos. Os verdadeiros discípulos perdoarão os outros. Aqueles que se
recusam a perdoar os outros que se arrependem demonstram, por meio de
sua recusa, que não são verdadeiros discípulos. Eles sofrerão a ira de Deus
por causa de sua hipocrisia.

445
III. O Ministério de Jesus na Judeia e sua Paixão
(19 a 28)
A. Ministério na Judeia (19 e 20)
Jesus encerrou o seu ministério na Galileia e atravessou o rio Jordão para
entrar na Judeia e começar sua viagem a Jerusalém. Os fariseus procuraram
emboscar Jesus com uma pergunta a respeito do divórcio (19.1-12). Jesus
afirmou a santidade e continuidade do casamento. Ele ensinou que o
divórcio tinha sido admitido na lei do AT por causa da dureza de coração do
povo de Deus. A implicação era que, uma vez que os discípulos de Jesus
eram caracterizados por corações puros (veja 5.8), eles também eram
capazes do amor conjugal que cumpriria o ideal original de Deus.
Após abençoar as crianças que foram trazidas a ele (19.13-15), Jesus
explicou a um questionador os requisitos para se herdar a vida eterna
(19.16-30). Jesus o exortou a que guardasse os mandamentos e mencionou
todos os mandamentos da segunda tábua exceto o décimo, que estava
relacionado às posses. A ordem de Jesus, “Vende as suas posses […] depois
vem e segue-me”, tinha a intenção de mostrar ao jovem que ele desprezava
o espírito do Décimo Mandamento por sua avareza e o mandamento de
amar ao próximo por sua negligência em relação aos pobres. O ensinamento
de Jesus foi concebido para estremecer a dependência que o homem tem de
suas boas obras e para abalar a sua arrogante recusa em reconhecer sua
pecaminosidade e a necessidade da graça divina. Esse espírito de orgulhosa
autossuficiência torna difícil a entrada dos ricos no reino. A entrada no
reino requeria o abandono dessa autossuficiência e a humilde dependência
do perdão gracioso de Deus.

446
Jesus ensinou que os sacrifícios que seus discípulos fizeram para segui-
lo seriam recompensados. Os discípulos iriam reinar sobre as doze tribos de
Israel e receberiam de volta 100 vezes mais do que aquilo que tinham
sacrificado por ele. Esse ensinamento foi seguido por uma parábola que
demonstrou que, assim como um rico fazendeiro estava livre para distribuir
a sua riqueza da forma que achasse melhor, Deus é livre para dispensar sua
graça do modo que ele determinar (20.1-16).
Jesus, então, reuniu os seus discípulos em particular e predisse
expressamente a sua traição, julgamento, zombaria, açoitamento,
crucificação e ressurreição (At 20.17-19). A mãe de Tiago e de João se
aproximou de Jesus pedindo que a seus filhos fossem concedidas posições
especiais no reino (20.20-28). Jesus exortou os seus discípulos a que
oferecessem serviço humilde aos outros em vez de procurar dominá-los. Ele
concluiu com uma declaração poderosa que retratava a sua morte como um
sacrifício expiatório, um resgate de muitos. Enquanto passava por Jericó,
ele curou dois cegos ao tocar-lhes os olhos (20.29-34).

B. Ministério final em Jerusalém (21 e 22)


Enquanto Jesus e seus discípulos se aproximavam de Jerusalém, ele
cumpriu a profecia do AT ao entrar na cidade montando um burro em
procissão triunfal (21.1-11; veja Zc 9.9). A multidão em Jerusalém louvou a
Jesus tanto como um profeta quanto como o Filho de Davi, o Messias há
muito esperado.
Jesus entrou no Templo e expulsou aqueles que vendiam a moeda e os
animais aceitáveis para as ofertas e os sacrifícios no Templo (21.12-17), e
citou Isaías 56.7 como justificativa para suas ações. Ele também curou os

447
cegos e os mancos no Templo. A exibição que Jesus fez de poder milagroso
e os louvores das crianças que o proclamavam como Filho de Davi
incitaram a ira dos líderes judeus. Em seguida, ele defendeu o testemunho
das crianças com um apelo ao salmo 8.3.
Em seu caminho de volta de Jerusalém a Betânia, Jesus amaldiçoou
uma figueira cujas folhas verdes lhe davam a aparência de vida, mas que
não produziam nenhum fruto (21.18-22). A árvore secou imediatamente. A
maldição da figueira prenunciou a destruição de Jerusalém, que havia
falhado em produzir os frutos de justiça que Deus dela esperava.
Quando Jesus retornou ao Templo, os líderes judeus tentaram emboscá-
lo em suas palavras (21.23-27). Ele evitou a armadilha ao preparar uma
cilada ainda mais esperta para eles. Ele, então, contrastou os líderes judeus
com seus próprios discípulos contando uma parábola sobre dois filhos: um
que se rebelou, mas depois humildemente se submeteu à autoridade do pai,
e outro que prometeu obediência, mas depois não obedeceu (21.28-32).
Jesus comparou o primeiro filho aos pecadores que se arrependeram em
resposta à pregação de João, e o segundo filho, aos líderes judeus que se
recusavam a acreditar e a obedecer a mensagem de João.
Jesus, então, contou a parábola dos lavradores maus, que descreve os
abusos que os líderes judeus fizeram dos profetas do AT e o seu assassinato
do Filho de Deus. Esses líderes eram motivados por sua recusa em oferecer
a Deus os frutos da justiça que ele exigia (21.33-46). Jesus advertiu que
Deus puniria os líderes judeus retirando seu reino de suas mãos e
confiando-o aos discípulos de Jesus que produziriam a justiça que Deus
esperava. A parábola enfureceu os líderes judeus e eles novamente
resolveram matar a Jesus.

448
A parábola das bodas reiterou a advertência de Jesus ao retratar os
líderes judeus como aqueles que insultaram o Rei celestial ao recusarem um
convite para honrar seu Filho e por maltratarem e matarem os seus servos,
os profetas do AT (22.1-14). O Rei destruiu tanto a eles quanto a sua cidade,
antecipando assim a iminente destruição da cidade de Jerusalém. O rei,
então, chamou outros convidados, que representam os discípulos de Jesus,
para participar do grande banquete messiânico.
Uma outra emboscada foi armada quando os fariseus perguntaram a
Jesus se deveriam pagar impostos ao imperador romano (22.15-22). Se
Jesus dissesse que sim, ele reconheceria o direito romano de taxar o povo
de Deus. Se dissesse que não, eles teriam motivos para acusar Jesus de
subversão política contra Roma. Jesus, de forma hábil e memorável,
respondeu que as pessoas devem dar a César o que é de César e a Deus o
que é de Deus. A resposta de Jesus evitou a armadilha e ensinou o
importante princípio de que, uma vez que os seres humanos foram criados à
imagem e semelhança de Deus, tudo o que eles têm e são pertence a Deus.67
Os saduceus também tentaram emboscar Jesus oferecendo o que eles
pensavam ser uma irrefutável evidência contra a doutrina da ressurreição.
Jesus demonstrou a partir da Lei de Moisés que os indivíduos continuavam
a existir mesmo após a morte (22.23-33).
Os fariseus tentaram uma nova armadilha contra Jesus com uma
pergunta sobre o mandamento mais importante (22.34-40). Ele respondeu
que os mandamentos mais importantes requeriam a completa devoção a
Deus e amor ao próximo, e insistiu que todos os outros aspectos da lei eram
relacionados e dependentes desses dois mandamentos centrais. Finalmente,
Jesus questionou os fariseus sobre a linhagem do Messias, que eles não
puderam responder. Ele demonstrou que o Messias era superior a Davi e foi

449
reconhecido pelo próprio como Senhor (22.41-45). A resposta de Jesus
frustrou de tal maneira a trama dos líderes judeus que ninguém mais se
atreveu a desafiar o ensinamento de Jesus em um fórum público (22.46).

C. Jesus denuncia os fariseus (23)


Em uma série de repreensivos “ais”, Jesus advertiu a multidão que, embora
o ensino dos escribas e fariseus fosse geralmente confiável, o seu exemplo
não deveria ser seguido, pois suas vidas não eram consistentes com sua
prática de ensino (23.1-39). Ele desafiou a forma egoísta com que esses
líderes religiosos buscavam honra de outras pessoas. Ele exortou seus
seguidores a se caracterizarem pela humildade. Jesus proferiu juízo sobre os
escribas e fariseus por impedirem os outros de entrarem no reino, condenou
aqueles que abraçavam seu ensino para a destruição, usavam brechas legais
para contornar as claras exigências dos mandamentos e colocavam seu foco
nas minúcias da lei para negligenciar as questões mais importantes, tais
como a justiça, a misericórdia e a fé. Ele os repreendeu por enfatizarem
questões relacionadas à pureza externa e por não darem atenção à sua
própria corrupção interior. Embora os líderes judeus alegassem piamente
ser moralmente superiores a seus ancestrais, Jesus insistiu em que os abusos
que faziam de seus discípulos os tornariam responsáveis pelo sangue de
todos os mártires justos que havia sido derramado na história humana. Jesus
concluiu seu clamor contra os líderes judeus com uma advertência de que
Deus abandonaria o Templo e que Jesus não retornaria a Jerusalém até sua
Segunda Vinda.

450
Discurso 5: Discurso do Monte das Oliveiras,
Parábolas do Reino (24 e 25)
O discurso final de Jesus em Mateus começa com uma seção sobre a
iminente destruição do Templo de Jerusalém e a Segunda Vinda. Ele
profetizou que o templo seria completamente destruído e, em seguida,
delineou os eventos que precederiam a destruição. Ele explicou o horrível
sofrimento que seu povo experimentaria durante esse período de tribulação
e assegurou-lhes que iria encurtar o período de sofrimento por causa deles.
Ele também assegurou que seus escolhidos não seriam enganados por falsos
messias e falsos profetas que apareceriam. A vinda do próprio Jesus seria
inconfundível e facilmente distinguida da aparição dos falsos messias.
Jesus ensinou que os acontecimentos em torno da destruição de
Jerusalém ocorreriam dentro de uma geração. No entanto, ele deixou
implícito que a Segunda Vinda ocorreria no mais distante futuro e ensinou
que ninguém senão o Pai sabia o dia e a hora desse grande evento. Ele usou
uma parábola poderosa para exortar os seus discípulos a permanecer em um
estado de constante preparação (24.42-50) e os desafiou a viver cada dia
como se fosse o dia em que Jesus retornaria.
Jesus continuou contando várias outras parábolas relacionadas à
importância da preparação para seu retorno. A Parábola das Dez Virgens
(25.1-13) advertia os discípulos a se prepararem imediatamente para a
Segunda Vinda, mas que antecipassem uma longa demora. A Parábola dos
Talentos (25.14-30) enfatizava a importância de se viver com fidelidade e
responsabilidade durante a longa demora antes do retorno do Senhor. A
Parábola das Ovelhas e Cabritos (25.31-46) demonstrava que um dos passos
mais importantes na preparação da volta de Jesus era tratar os seguidores de
Jesus de forma amável e compassiva.

451
D. A Paixão (26 e 27)
Após a conclusão do discurso final de Jesus, várias características de
Mateus indicam que a morte de Jesus está se aproximando. Jesus fez outra
predição de sua crucificação (26.1,2). Os líderes judeus se reuniram para
conspirar para matá-lo (26.3-5). Uma mulher ungiu Jesus com mirra, em
preparação para o seu sepultamento (26.6-16). Um dos discípulos do
próprio de Jesus se aproximou dos líderes judeus se oferecendo para trair
Jesus por um preço (26.17-25).
Enquanto Jesus compartilhava a refeição da Páscoa com seus
discípulos, ele anunciou que um deles o trairia (26.26-30). Então, ele
especificamente identificou a Judas como o traidor. Jesus instituiu a ceia do
Senhor usando o pão e o cálice da Páscoa para retratar o seu corpo e sangue
que seriam sacrificados para selar a nova aliança e oferecer o perdão dos
pecados.
Depois disso, citou uma profecia do AT para demonstrar que os seus
discípulos o abandonariam depois de sua prisão (26.31-35). Pedro e os
outros discípulos negaram veementemente que isso fosse possível, mas ele
predisse que Pedro o negaria três vezes antes que o galo cantasse ao
amanhecer. Depois, Jesus levou seus discípulos ao jardim do Getsêmani
(26.36-46), reunindo seu círculo íntimo (Pedro, Tiago e João) para que se
juntassem a ele em oração. Jesus pediu que o Pai permitisse que ele
escapasse da cruz, mas ele se submeteu a qualquer que fosse a vontade dele.
Então, Jesus se aproximou dos discípulos e quando os encontrou dormindo,
exortou-os a vigiar e orar.
Essa cena foi repetida três vezes, até que Judas entrou no Getsêmani
acompanhado de uma multidão armada que havia sido despachada pelos
oficiais judeus (26.47-56). Judas identificou Jesus ao cumprimentá-lo com o

452
beijo da amizade, e Jesus foi capturado pela multidão. Um dos discípulos
interveio, desembainhou a espada e cortou a orelha de um servo do sumo
sacerdote. Jesus repreendeu o discípulo e o lembrou de que seu Pai era mais
do que capaz de salvar-lhe se assim o quisesse, mas que sua prisão e morte
eram necessárias para cumprir as promessas da Escritura.
Depois disso, Jesus foi levado a Caifás, o sumo sacerdote, e a uma
reunião de escribas e anciãos (26.57-68). Pedro seguia de perto, mas
discretamente, e esperou no pátio para ouvir o resultado da reunião. Os
líderes judeus procuraram falsas testemunhas cujos depoimentos pudessem
justificar a execução de Jesus. Duas testemunhas apareceram e o acusaram
de ter afirmado que ele seria capaz de destruir e reconstruir o Templo em
três dias. Jesus permaneceu em silêncio diante das acusações, até que o
sumo sacerdote o colocou sob juramento e exigiu saber se ele era o
Messias, o Filho de Deus. Jesus respondeu citando Salmos 110.1 e Daniel
7.13. O sumo sacerdote acusou Jesus de blasfêmia. Então, a assembleia
condenou Jesus à morte. Os membros da assembleia começaram a abusar
de Jesus cuspindo em seu rosto, esmurrando-o e esbofeteando-o.
Enquanto isso, outras pessoas presentes no pátio reconheceram Pedro
como um discípulo de Jesus (26.69-75). Ele negou conhecer Jesus por três
vezes. Cada negação foi mais inflexível e mais irada do que a negação
anterior. Imediatamente após a terceira negação, o galo cantou, sinalizando
o cumprimento da profecia de Jesus e fazendo com que Pedro saísse para
chorar.
Enquanto Jesus era levado a Pilatos, Judas se arrependeu de sua decisão
de traí-lo (27.1-10). Ele devolveu o pagamento pela sua traição aos líderes
judeus, proclamou a inocência de Jesus e depois se enforcou. Os líderes

453
judeus usaram o dinheiro para comprar um lote de terra para o enterro dos
estrangeiros que visitavam Jerusalém.
Quando Jesus foi interrogado por Pilatos e acusado pelos líderes judeus,
ele permaneceu em silêncio (27.11-26). Embora Pilatos tentasse soltar Jesus
apelando para um costume de soltar um prisioneiro na Páscoa, o povo,
solicitado por seus líderes, pediu para que Pilatos libertasse Barrabás e
crucificasse a Jesus. Pilatos lavou as mãos numa tentativa simbólica de
aliviar sua culpa pela execução de Jesus, enquanto os judeus aceitaram a
plena responsabilidade pela morte de Jesus, o açoitaram e entregaram para
ser crucificado.
Os soldados da tropa romana responsáveis pela execução de Jesus o
despiram e ridicularizaram suas alegações messiânicas adornando-o com
um falso manto, coroa e cetro, e curvando-se diante dele em falsa
homenagem (27.27-50). Depois, cuspiram em Jesus e de forma brutal o
espancaram. Devido à fraqueza resultante de sua flagelação e uma vez que
Jesus foi incapaz de carregar sua cruz para o local da execução, os soldados
obrigaram Simão de Cirene a carregar a cruz por ele. A Jesus foi oferecida
uma mistura que poderia ter diminuído seus sofrimentos, mas ele recusou
beber. Enquanto estava sofrendo, os espectadores zombavam dele,
particularmente os sacerdotes, escribas e anciãos, bem como aqueles
crucificados com ele.
Vários sinais notáveis acompanharam os sofrimentos e a morte de Jesus
(27.51-56). Enquanto ele estava pendurado na cruz, o céu ficou preto,
embora fosse meio-dia. Quando Jesus morreu, o pesado véu que separava o
Santo dos Santos do resto do complexo do Templo foi rasgado de cima a
baixo enquanto um terremoto dividia as rochas e abria os túmulos da
cidade. O centurião romano e seus soldados que supervisionavam a

454
crucificação ficaram aterrorizados com esses eventos sobrenaturais e
confessaram que Jesus era verdadeiramente o Filho de Deus.
José de Arimateia sepultou Jesus em seu próprio sepulcro novo e o
selou com uma pedra (27.57-66). Maria Madalena e Maria, mãe de dois dos
discípulos de Jesus, observaram o sepultamento e, portanto, estavam cientes
da localização da tumba. Essa familiaridade com a sua localização assegura
que o túmulo que mais tarde foi encontrado vazio era, na verdade, o túmulo
onde Jesus tinha sido enterrado. A pedido dos fariseus, Pilatos fechou e
selou o túmulo de Jesus e ordenou que a custodia romana o guardasse, a fim
de evitar que os discípulos de Jesus roubassem o corpo e encenassem da
ressurreição.

Algo Para Pensar: Toda Autoridade é de Jesus

“Toda autoridade me foi concedida no céu e na terra” (28.18).


Quem é o homem que pode afirmar ter recebido toda autoridade no
céu e na terra? Já foi feita alguma vez uma declaração mais
surpreendente? Já foi registrada alguma vez uma alegação mais
sensacional? No clímax de todo o Evangelho de Mateus, aqui está
Jesus, com os Onze, na Galileia, subindo a montanha, expressando o
que ficou conhecido como a “Grande Comissão”: “ide, portanto, e
fazei discípulos de todas as nações, batizando-os em nome do Pai, do
Filho e do Espírito Santo, ensinando-lhes a obedecer a todas as
coisas que vos ordenei. E lembrem-se: eu estou convosco todos os
dias, até o final dos tempos” (28.19,20).

455
Como pode Jesus ter toda a autoridade no céu e na terra? No
contexto do Evangelho de Mateus, o leitor é lembrado da artimanha
proposta a Jesus pelo “tentador”, o diabo, Satanás, que levou Jesus
“a um monte muito alto” e mostrou-lhe todos os reinos deste mundo
e a glória deles, e disse-lhe: “eu te darei todas essas coisas se te
prostrares e me adorares” (4.8,9). Jesus recusou, repreendendo o
diabo, “Vai-te, Satanás!”. Mais tarde no Evangelho, Jesus disse a
seus seguidores mais próximos que ele deveria sofrer, ser morto e
ressuscitar no terceiro dia; e quando Pedro o chamou em particular
e o repreendeu, negando a necessidade da cruz, Jesus, em termos
semelhantes, disse a Pedro: “Para trás de mim, Satanás!” (16.21-
23).
Somente após a crucificação Jesus alegou ter toda a autoridade no
céu e na terra. O Cristo ressurreto, na forma de um general vitorioso
e conquistador, sobe a montanha e comissiona seus seguidores a ir e
conquistar os mundos, de forma similar a Alexandre, o Grande, e
outros líderes militares que partiram para dominar o universo e
submetê-lo à sua vontade. Mas a conquista de Jesus seria gentil, de
acordo com seu convite: “Vinde a mim todos vós que estais cansados
e sobrecarregados, e eu lhes darei descanso. Todos vós, tomai o meu
jugo e aprendei de mim, pois eu sou manso e humilde de coração, e
achareis descanso para vós mesmos. Porque o meu jugo é suave, e o
meu fardo é leve” (11.28-30).
E enquanto os seus seguidores vão para todo o mundo a fim de
discipular as nações, o próprio Jesus, o Emanuel de Isaías, traduzido
por “Deus conosco” (1.23), estaria com eles: “E lembrem-se: eu
estou convosco todos os dias, até o final dos tempos”. Como, então,

456
poderia a missão da igreja falhar se Jesus, o Cristo ressuscitado, o
general vitorioso estará, ele mesmo, presente com o seu povo no
poder do Espírito Santo? Na verdade, “Esta boa nova do reino será
proclamada em todo o mundo como um testemunho a todas as
nações. E então virá o fim” (24.14). Na cena original, como Mateus
nos diz, “quando o viram, adoraram-no; mas alguns duvidaram”
(28.17). Você e eu vamos adorá-lo ou vamos duvidar?

E. A ressurreição e a Grande Comissão (28)


Ao amanhecer de domingo as duas mulheres que observaram o
sepultamento de Jesus retornaram ao túmulo (28.1-10). Um terremoto
ocorreu quando um anjo apareceu e rolou a pedra que selava o túmulo de
Jesus. A guarda romana ficou imobilizada com terror. O anjo anunciou que
Jesus tinha ressuscitado dos mortos e ordenou que as mulheres relatassem
isso aos discípulos e que os exortassem a viajar para a Galileia, onde Jesus
os encontraria. Enquanto elas corriam para encontrar os discípulos, o
próprio Jesus as interceptou. As mulheres caíram no chão, lançaram seus
braços em volta dos seus pés e o adoraram.
Enquanto isso, alguns dos soldados da custodia romana relataram aos
principais dos sacerdotes o que tinha acontecido (28.11-15). O Sinédrio se
reuniu e decidiu subornar os soldados para espalhar a falsa notícia de que os
discípulos tinham roubado o corpo de Jesus enquanto eles estavam
dormindo. Mais tarde, Jesus apareceu aos seus discípulos na Galileia e
ordenou-lhes que reconhecessem sua autoridade sobre o céu e a terra
fazendo discípulos de povos de todos os grupos étnicos (28.16-20). Esses
novos discípulos deveriam ser batizados e ensinados a obedecer a todos os

457
mandamentos de Jesus. Jesus prometeu que sua presença capacitaria os seus
discípulos a cumprirem essa comissão.

TEOLOGIA
Temas Teológicos
Jesus como o cumprimento das predições
messiânicas do Antigo Testamento
Um dos temas teológicos mais importantes do Evangelho de Mateus é que
Jesus é o Messias predito nas Escrituras hebraicas. Esse cumprimento é
enfatizado especialmente em Mateus 1 a 4 na forma de várias citações de
cumprimento. Praticamente todo evento importante na vida de Jesus é
apresentado para cumprir a Escritura:

458
Tabela 4.4: O Cumprimento de Jesus das Profecias do AT no
Evangelho de Mateus
Evento na Vida de Jesus Mateus Passagem do AT
O nascimento virginal e o 1.22,23 Is 7.14; 8.8,10
nome de Jesus
Lugar de nascimento, Belém 2.5, 6 Mq 5.2
A fuga para o Egito 2.15 Os 11.1
A matança das crianças por 2.18 Jr 31.15
Herodes
Jesus chamado de Nazareno 2.23 Is 11.1; 53.2
(“ramo”)
Ministério de João Batista 3.3; 11.10 Is 40.3; Ml 3.1
A tentação de Jesus 4.1-11 Dt 6.13,16; 8.3
O início do ministério de 4.15,16 Is 9.1,2
Jesus
O ministério de cura de Jesus 8.17; 11.5; 12.17-21 Is 53.4; 35.5,6;
42.18; 61.1
Divisão trazida por Jesus 10.35,36 Mq 7.6
O estilo gentil do ministério 12.17-21 Is 42.1-4
de Jesus
A morte, o sepultamento e a 12.40 Jn 1.17
ressurreição de Jesus
Resposta dura a Jesus 13.14,15; 15.7-9; Is 5.1,2; 6.9,10;
21.33-42 29.13; Sl 118.22,23
O ensino de Jesus por 13.35 Sl 78.2
parábolas
A Entrada Triunfal de Jesus 21.5,9 Is 62.11; Sl 118.26
Jesus purifica o Templo 21.13 Is 56.7; Jr 7.11
Jesus como Filho e Senhor 1.1; 22.44 Sl 110.1
de Davi

459
Evento na Vida de Jesus Mateus Passagem do AT
Lamento por Jerusalém 23.37-39 Jr 12.7; 22.5; Sl
118.26
A traição de Judas de Jesus 26.15 Zc 11.12
A negação de Pedro 26.31 Zc 13.7
A prisão de Jesus 26.54,56 As Escrituras, os
Profetas
A morte de Judas 27.9,10 Zc 11.12, 13; Jr 32.6-
9
Jesus, o justo sofredor 27.34,35,39,43,46,48 Sl 22.1,7,8,18; 69.21

A subestrutura do AT da teologia de Mateus é também evidente em seu


retrato de Jesus em relação aos principais personagens do AT. No início,
Mateus apresentou Jesus como o filho de Davi e filho de Abraão (1.1-18).
Jesus também é o novo Moisés, que em seu “discurso inaugural” no
Evangelho, o Sermão do Monte, sobe uma montanha e instrui seus
seguidores em sua nova lei (caps. 5 a 7).
Também relacionado com o cumprimento de Jesus do AT é o reino de
Deus, que constitui o assunto de várias parábolas coletadas em três dos
68
cinco principais discursos neste Evangelho (caps. 13, 18 e 25). Embora a
exata expressão “reino de Deus” não seja encontrada no AT, o conceito o é.
No ápice da história de Israel, a nação foi governada pelo rei Davi e depois,
pelo rei Salomão. Em última análise, o próprio Deus era o Rei de seu povo.

Jesus como o novo Moisés


Como mencionado, uma série de características no Evangelho de Mateus
sugere que o evangelista pretendia destacar importantes paralelos entre

460
Jesus e Moisés. Esses paralelos aparecem pela primeira vez no relato que
Mateus fez das circunstâncias envolvendo o nascimento de Jesus descrito
em Mateus 2. Herodes, o Grande, procurou evitar qualquer ameaça ao seu
trono matando a criança que os magos reconheceram como o Messias. Ele
exigiu que todas as crianças do sexo masculino em Belém, de até dois anos
de idade, fossem assassinadas. Para os leitores judeus cristãos, a ação de
Herodes teria sido uma reminiscência da ordem do Faraó para matar todos
os bebês israelitas do sexo masculino em Êxodo 1.
Mateus 2 reverbera com semelhanças as tradições populares judaicas
sobre o nascimento de Moisés preservadas em textos como Antiguidades
Judaicas, de Josefo. No relato de Josefo, um “escriba sagrado” na corte do
Faraó predisse que nasceria um menino israelita que derrubaria o domínio
egípcio, levantaria os israelitas, seria mais justo do que qualquer outro
homem e obteria uma glória que seria lembrada para sempre. O assustado
rei respondeu ordenando que todos os bebês israelitas do sexo masculino
fossem lançados no Nilo e mortos (Josefo, Ant. 2.210-16). Em ambos os
relatos de Mateus e Flávio Josefo, um rei pagão ordenou a matança de
bebês israelitas do sexo masculino porque temia um único filho da
promessa.
Os paralelos entre Jesus e Moisés são ainda mais enfatizados em Mateus
2.20b. As palavras “aqueles que procuravam tirar a vida da criança já
morreram” são uma citação clara e direta da versão grega (LXX) de Êxodo
4.19, com apenas pequenas alterações que foram necessárias para adaptar a
declaração a um novo contexto. O anjo do Senhor parece citar essas exatas
palavras para indicar que Jesus, de alguma forma, seria como Moisés.
Semelhantemente, a subida de Jesus a uma montanha para entregar sua
autoritativa interpretação e a aplicação da Lei de Deus ao seu povo é uma

461
reminiscência da subida de Moisés ao Sinai para receber e entregar a Lei de
Deus (Êx 19.3). Três detalhes sugerem que Mateus queria que seu os
leitores percebessem esse paralelo. Em primeiro lugar, a expressão “subiu
ao monte” (anebē eis to oros), em 5.1, é exatamente paralela à descrição de
Moisés subindo o Monte Sinai em Êxodo 19.3. Essa construção particular
só aparece três vezes no Antigo Testamento grego, e as três ocorrências
descrevem a subida de Moisés ao Monte Sinai (Êx 19.3; 24.18; 34.4). Em
segundo lugar, o artigo definido “o” pode destacar a importância da
montanha e implica uma comparação com o Monte Sinai. Terceiro, muitos
intérpretes judeus entenderam o texto hebraico de Deuteronômio 9.9 como
dizendo que Moisés sentou-se na montanha, quando ele recebeu a lei.
Embora o verbo hebraico yasab possa significar “permanecer” ou “habitar”,
o significado mais comum no AT hebraico é “sentar”, e referências no
Talmude mostram que muitos rabinos entenderam o verbo nesse sentido.69
A descrição da postura de Jesus na montanha em 5.1,2 constituiria, assim,
outro paralelo com Moisés no Monte Sinai.
Mateus usou essa construção “ele subiu ao monte” novamente em 14.23
e “ele subiu um monte”, em 15.29.70 Mateus 14.23 introduz o milagre de
Jesus caminhando sobre as águas, o que pode ter sido uma reminiscência da
travessia milagrosa do mar em Êxodo 14.15-31. De modo semelhante,
Mateus 15.29 precede imediatamente a milagrosa alimentação dos 4 mil, o
que faz lembrar o milagre do maná no deserto. Mateus não cria ou inventa
acontecimentos na vida de Jesus para torná-lo semelhante a Moisés. No
entanto, parece que ele conscientemente destacou os paralelos entre os
acontecimentos reais da vida de Jesus e as experiências de Moisés.71
Finalmente, como B. W. Bacon observou, Mateus dividiu seu
Evangelho em cinco seções principais que podem ser uma imitação

462
consciente da estrutura dos cinco livros de Moisés.72 Embora a teoria de
Bacon não tenha encontrado aceitação universal, ela tem muito a seu favor.
Outras literaturas judaicas conscientemente imitaram a estrutura de cinco
livros do Pentateuco e esta estrutura se aproxima dos paralelos que Mateus
estabeleceu entre Jesus e Moisés nos detalhes de sua narrativa e nas
citações do AT.
Os paralelos entre Jesus e Moisés identificam Jesus como o novo
Moisés e o cumprimento da profecia de Moisés em Deuteronômio 18.15-
19. A profecia oferece três descrições daquele que a cumpriria. Primeiro,
ele seria um israelita. Moisés duas vezes o descreveu como vindo “dentre
teus próprios irmãos” (Dt 18.15,18). Em segundo lugar, ele falaria com
autoridade divina e o povo seria obrigado a obedecer a tudo o que ele
dissesse. Em terceiro lugar, Deus disse a Moisés que o profeta seria “como
você” (Dt 18:15,18). Deuteronômio 34.10-12 enumera duas características
importantes do ministério profético exclusivo de Moisés: o relacionamento
íntimo de Moisés com Deus e os milagres de Moisés. Assim, ser “como
Moisés” envolveria, no mínimo, um relacionamento íntimo com Deus e
numerosos milagres surpreendentes. Os judeus do primeiro século
reconheceram que a profecia predizia a vinda de uma figura messiânica (Jo
6.14; 7.40). O apóstolo Pedro reconheceu o texto como uma profecia
messiânica (At 3.11-26) e a aplicou especificamente a Jesus.
A apresentação que Mateus fez de Jesus como o profeta semelhante a
Moisés cumpriu um importante propósito teológico: ela identificou Jesus
como o Salvador do seu povo de uma maneira poderosa. Embora os cristãos
modernos pensem em Moisés principalmente como aquele que entregou a
lei, para os antigos judeus ele representava muito mais. Moisés era
reconhecido com um redentor, libertador e salvador. Estevão, o primeiro

463
mártir da igreja cristã, apresentou Jesus como o cumprimento da profecia de
um profeta como Moisés. Seu sermão enfatizava que Jesus, como Moisés,
foi um Redentor e Libertador rejeitado. Estevão enfatizou o papel de
Moisés como libertador em Atos 7.25: “Ele assumiu que seus irmãos
entenderiam que Deus lhes daria a liberdade por meio dele, mas eles não
entenderam”. Ele enfatizou o papel de Moisés como redentor em Atos 7.35:
“A este Moisés, a quem eles rejeitaram quando disseram: ‘Quem te nomeou
líder e juiz?’, a este Deus enviou como líder e libertador por meio do anjo
que lhe aparecera na sarça. Este homem os conduziu para fora e realizou
feitos extraordinários e sinais na terra do Egito, no mar Vermelho e no
deserto por 40 anos”.
Ao mostrar que Jesus é o profeta como Moisés, Mateus demonstrou que
Jesus não era apenas um profeta ou um operador de milagres, mas era
também aquele que redimiria e libertaria seu povo. Enquanto Moisés
libertou Israel da escravidão no Egito, Jesus resgataria o povo de Deus de
seus pecados e de sua punição merecida. Mateus 1.21 salienta claramente
que Jesus “salvará o seu povo dos seus pecados”. Mais tarde, 20.28 insiste
que Jesus veio “para dar a vida — um resgate por muitos”. Jesus libertou
seu povo do cativeiro espiritual da mesma forma que Moisés libertou seu
povo da escravidão política. Jesus libertou o seu povo da escravidão do
pecado da mesma forma que como Moisés libertou o seu povo da
escravidão no Egito. Jesus levará o seu povo para uma Terra Prometida
espiritual (5.5) da mesma forma que Moisés levou o seu povo a herdar a
terra de Canaã. O nome de Jesus em hebraico (Yeshua) é o mesmo que o do
sucessor imediato de Moisés, Josué, implicando que Jesus era o verdadeiro
sucessor de Moisés que daria continuidade ao ministério dele, em um

464
sentido muito maior. Como o anjo anunciou a José: “Você deve nomeá-lo
Jesus, porque Ele salvará seu povo dos seus pecados” (1.21).
O tema de Jesus como o novo Moisés é intensificado ainda mais por
dois dos textos do AT que Mateus citou. Em 2.15, ele citou Oseias 11.1: “do
Egito chamei meu filho”. No contexto de Oseias, o “filho” era a nação de
Israel e o chamado do Egito se refere ao Êxodo, quando o faraó libertou o
povo hebreu escravizado. A princípio, parece estranho que Mateus tenha
usado esse texto para descrever a jornada da sagrada família do Egito para a
Galileia. No entanto, Mateus aplica esse texto sobre o Êxodo a Jesus a fim
de identificar Jesus como o novo Moisés que levaria a um novo Êxodo, que
libertaria o povo de Deus de sua escravidão do pecado como Moisés
libertou seu povo da escravidão do faraó. Não é por acaso que o segundo
texto que Mateus aplicou a Jesus em 2.18 era uma passagem de Jeremias
31.15 sobre a escravidão de Israel (desta vez na Babilônia), imediatamente
seguida por uma promessa de libertação e restauração. Mateus recorreu aos
textos do AT sobre servidão e redenção, escravidão e libertação, para
mostrar que Jesus era um libertador que resgatou o povo de Deus do pior de
todos os problemas: o pecado e suas consequências.
A identidade de Jesus como Salvador e libertador dos escravizados pelo
pecado não é apenas um tema dos grandes textos nas cartas do NT, mas
também do Evangelho de Mateus. Moisés foi um salvador e libertador cujo
nome trazia à mente imagens de redenção e resgate. Embora séculos
tenham se passado desde que Moisés conduziu seu povo para a liberdade da
escravidão do faraó, seu nome ainda evocava imagens de resgate, libertação
e salvação aos leitores originais de Mateus. Por meio de seu tema que
identifica Jesus como o novo Moisés, Mateus, de forma bela e poderosa,

465
enfatizou que Jesus veio para salvar o seu povo, para quebrar o poder do
pecado e para libertar seus cativos.

Jesus como o rei davídico


Assim como o Evangelho de Mateus associa intimamente Jesus a Moisés,
assim também ele associa intimamente Jesus a Davi. Desde o primeiro
versículo do Evangelho, Mateus enfatiza a linhagem davídica de Jesus ao
dar à sua genealogia o título “Livro da genealogia de Jesus Cristo, Filho de
Davi, Filho de Abraão”. A genealogia em si foi organizada em ordem
cronológica. Assim, ela iniciava com o antepassado mais antigo, Abraão, e
concluía com o descendente final legal, Jesus.
Mateus também enfatizou a descendência davídica de Jesus com seu
arranjo da genealogia. Mateus 1.17 dividia a genealogia de Jesus em três
grupos de 14 gerações. Esse arranjo é claramente artístico, uma vez que não
corresponde ao número de gerações em cada período listado nos versículos
anteriores. Os três períodos na verdade contêm 13, 14 e 13 (ou 14, 15 e 14,
se cada pessoa for identificada como uma geração; assim, Davi está
incluído duas vezes para dar ênfase, terminando o segundo e começando o
terceiro) gerações consecutivas, respectivamente. O arranjo artístico de
Mateus em 1.17 não foi, assim, o resultado de uma simples contagem de
gerações na genealogia, mas foi idealizado para comunicar uma mensagem
sobre a identidade de Jesus. Mateus estava utilizando um dispositivo
literário comum entre os rabinos de sua época. Esse dispositivo era
chamado gematria, que usava o valor numérico das letras do alfabeto
hebraico para comunicar uma mensagem codificada. O código era simples,
e os leitores de Mateus deveriam estar familiarizados com ele. A primeira

466
letra do alfabeto hebraico representa o número 1, a segunda letra representa
o número 2 e assim por diante. Usando esse dispositivo, o valor numérico
das consoantes do nome de Davi era daleth (4), waw (6), e daleth (4), que
perfazia um total de 14. Na gematria hebraica, o número 14 representava,
portanto, o rei Davi. Daí o arranjo artístico da genealogia, como o título,
enfatizava a descendência davídica de Jesus.73
O importante papel de Davi na linhagem de Jesus foi enfatizado
novamente no coração da genealogia. Embora a genealogia de Jesus
contivesse os nomes de muitos reis, desde Davi até Jeconias, apenas Davi
foi claramente identificado como um rei. Isso implica que Mateus enfatizou
a linhagem davídica de Jesus para demonstrar que ele estava qualificado a
reinar como um rei. As profecias do Antigo Testamento predisseram que o
Messias, o eterno Rei do povo de Deus, seria um descendente de Davi. Em
2Samuel 7.11-16, o profeta Natã profetizou que Deus levantaria um
descendente de Davi e estabeleceria o trono de seu reino para sempre. À luz
dessa profecia, muitos judeus do primeiro século reconheceram que o
Messias seria um descendente de Davi. O Messias davídico foi claramente
descrito em Isaías 9.1-7, um texto que Mateus citou explicitamente em
4.15-16 e que tem ligações estreitas com a profecia de Isaías 7.14 que
Mateus citou em 1.23. O clímax da profecia messiânica de Isaías 9 diz:

Porque um menino nos nasceu, um filho nos foi concedido. O governo está sobre os seus
ombros, e o seu nome será: Maravilhoso Conselheiro, Deus Forte, Pai Eterno, Príncipe da
Paz. O seu domínio aumentará, e haverá paz sem fim sobre o trono de Davi e sobre o seu
reino, para estabelecê-lo e firmá-lo em retidão e em justiça, desde agora e para sempre. O
zelo do SENHOR dos Exércitos fará isso (Is 9.6,7).

Mateus apresentou Jesus como esse Rei há muito esperado, o herdeiro


legítimo do trono de Davi, o Rei do povo de Deus.

467
Mateus enfatizou a identidade de Jesus como o Messias davídico
novamente em 2.23. Ele explicou que depois que José, Maria e Jesus
retornaram do Egito, eles optaram por morar na cidade de Nazaré. Mateus
acrescentou que isso cumpriu “o que foi dito pelos profetas”. Ele resumiu a
mensagem profética: “ele será chamado nazareno”. Nenhuma profecia do
AT sugere que o Messias viveria em Nazaré. No entanto, o substantivo
plural “profetas” sugere que a identidade de Jesus como um nazareno foi
profetizada em várias passagens no AT e pertenciam a um amplo tema
profético. A melhor explicação para isso é que Mateus viu uma conexão
entre o nome de Nazareno e as profecias sobre o “ramo” do AT.74 Os
profetas usaram a imagem do ramo para descrever o descendente de Davi
que iria reinar sobre o povo de Deus. Isaías 11.1 se referiu ao Messias como
um ramo (neṣer) de Jessé, pai de Davi: “Então um rebento brotará do
tronco de Jessé, e um ramo frutificará das suas raízes”. Essa profecia
prometeu que o Espírito de Yahweh repousaria sobre este ramo. Ele seria
caracterizado pela retidão, conhecimento e justiça. Ele também serviria
como juiz escatológico: “Ele ferirá a terra com disciplina de sua boca e
matará o ímpio com um comando de seus lábios” (Is 11.4).
O Ramo prometido também é mencionado em outros textos (veja Is 4.2;
Jr 23.5; 33.15).75 Um exame desses textos mostra que o Ramo seria um
descendente de Davi (ou do pai de Davi, Jessé), que reinaria com sabedoria
e justiça para sempre, julgaria a terra pelos pecados e salvaria o povo de
Deus. Mateus observou que as consoantes da cidade natal de Jesus são as
mesmas que as consoantes da palavra hebraica para Ramo e usou isso para
apontar Jesus como o Ramo há muito esperado, o Messias de Israel.
Mateus confirmou a identidade de Jesus como o Messias de muitas
outras formas e em muitos outros textos. O material que Mateus

468
compartilha com Marcos e Lucas também expressa claramente a identidade
messiânica de Jesus. No entanto, os textos discutidos acima são
especialmente importantes para um entendimento das ênfases teológicas de
Mateus, uma vez que eles são únicos ao Evangelho de Mateus. Esses e
outros numerosos textos em Mateus demonstram que um de seus principais
propósitos teológicos era demonstrar que Jesus é o Messias. Mateus queria
que seus leitores reconhecessem que Jesus era aquele a quem o Pai
designou para governar sobre o seu reino eterno. Ele queria que os mesmos
leitores se curvassem em homenagem diante de Jesus e se rendessem à sua
autoridade como rei.

Jesus como o “Filho do Homem”


O significado exato do título “Filho do Homem” é debatido hoje nos meios
acadêmicos. Jesus tinha afeição especial por essa designação e com
frequência a utilizava como uma autorreferência. Cada um dos quatro
Evangelhos contém referências a Jesus como o “Filho do Homem” (elas
ocorrem mais frequentemente nos Sinóticos do que em João; mesmo o curto
Evangelho de Marcos contém mais referências do que João). Curiosamente,
Jesus preferiu esse termo a outros que aparentemente teriam lançado muito
mais luz sobre o seu status e missão messiânicos. A abundância de
autorreferências de Jesus como o “Filho do Homem” indica que esse não
era apenas o modo como Jesus via a si mesmo, mas também como ele
queria que os outros o vissem. A questão permanece: qual o significado que
a expressão “Filho do Homem” deveria transmitir?
O AT contém uma referência notável a “alguém parecido com filho de
homem” em Daniel 7.13. Nessa passagem, Daniel tem uma visão de quatro

469
bestas, das quais a última é blasfema e arrogante. Em meio à ostentação da
quarta besta, tronos aparecem, e um ancião bem idoso toma seu assento (Dn
7.9). As quatro bestas são julgadas e aquele “parecido com um filho de
homem” entra em cena. Enquanto ele está diante do Ancião de Dias, a este
“filho do homem” é dada autoridade para governar sobre tudo com um
domínio eterno.
Quando Jesus usava “Filho do Homem”, era geralmente no contexto de
seu sofrimento iminente ou de sua segunda vinda. Embora o pano de fundo
do AT seja evidente no contexto da segunda vinda, é menos evidente no
contexto dos sofrimentos de Jesus. I. H. Marshall argumentou que Jesus
combina vários temas do AT, tais como a pedra rejeitada (Sl 22; 69; 118), o
Servo Sofredor (Is 52.13 a 53.12), o Filho do Homem (Dn 7.9-14), e outros,
e os agrupa sob o título “Filho do Homem”.76 Mesmo em seu ministério
terreno, Jesus agiu com autoridade em várias áreas (sábado, enfermidades,
tempo, morte), que pode ser uma manifestação terrena da autoridade com a
qual ele vai governar após os reinos das bestas terem sido derrotados (cf.
Dn 7). No caso do sofrimento, ressurreição e retorno de Jesus, ele enfatizou
tanto a sua humanidade quanto a divindade. Com isso em mente, Marshall
advertiu os leitores modernos do “grave perigo de utilizar ‘Filho do
homem’ como um meio de se referir à humanidade de Jesus em oposição à
sua divindade (expressa por ‘Filho de Deus’)”.77 Esse não é apenas um
termo de humilhação, mas também de exaltação.

A morte expiatória de Jesus


Mateus afirmou a apresentação de sacrifícios no Templo pelos discípulos
judeus-cristãos em conformidade com os ensinamentos de Jesus (5.23,24).

470
No entanto, ele insistiu em se referir aos sacrifícios como “ofertas” (dōron;
5.23,24; 8.4; 15.5; 23.18,19), exceto nos casos em que ele está citando
diretamente o AT (9.13; 12.7), ou criticando o ritualismo judaico que
desvalorizava a devoção a Deus e o amor por outras pessoas (12.33).
Embora vários vocábulos tenham sido usados na Septuaginta para se referir
a tipos específicos de ofertas, termos comuns para sacrifício em geral eram
“sacrifício” (thysia) e “oferta” (dōron). No entanto, o termo “sacrifício” era
muito mais comum do que a “oferta” ou “dádiva”. No Pentateuco, o termo
thysia foi usado para descrever sacrifícios 179 vezes, mas o termo dōron
termo foi usado nesse sentido de apenas 85 vezes. Contra esse pano de
fundo, o uso consistente que Mateus faz de dōron para sacrifícios parece
significativo.
A preferência de Mateus pelo termo é especialmente notável em 8.4. No
paralelo em Marcos 1.44, Jesus ordenou que o leproso a quem havia curado
oferecesse “o que Moisés determinou, para que lhes sirva se testemunho”, o
que poderia ser entendido como implicando que a oferta efetivamente
consumava um ritual de purificação. No entanto, Mateus preferiu descrever
o sacrifício para os leprosos exigido em Levítico 14.10-20 como “a oferta
que Moisés determinou” e removeu a referência à purificação. O AT
claramente apresentou essa oferta como um sacrifício expiatório. Embora
Levítico 14.10-20 esteja repleto da terminologia sacrificial, o termo “oferta”
não foi utilizado para falar desse sacrifício particular. Aparentemente,
porém, Mateus se afastou do precedente em Levítico e Marcos a fim de
descrever a oferta como uma dádiva, mais uma expressão de gratidão do
que um ritual que garante expiação.78
Essa tendência no Evangelho de Mateus sugere que ele estava
determinado a fazer os seus leitores repensarem o significado do sacrifício.

471
Embora eles fossem encorajados a continuar participando dos rituais do
Templo, eles deveriam enxergar os sacrifícios como ofertas que
expressavam ações de graças pelo perdão e purificação já recebidos em vez
de como ofertas que alcançavam perdão. Essa tendência de Mateus
provavelmente está relacionada à visão de Mateus sobre a morte sacrificial
de Jesus como o meio de expiação do pecado. A citação que Mateus faz de
Isaías 53.4 em 8.17 mostra que Mateus reconheceu Jesus como o
cumprimento de Isaías 53, aquele cujo sacrifício removeria a culpa do povo
de Deus. Ecos de Isaías 53 também abundam em Mateus: ele parece ter
feito alusão à Isaías 53.2 (Mt 2.23), 53.5 (Mt 26.67), 53.7 (Mt 26.63;
27.12,14), 53.9 (Mt 26.24), e 53.12 (Mt 27.38).79 Há mais citações e alusões
a Isaías 53 em Mateus do que em qualquer outro livro do NT.80
A teologia sacrificial Mateus reconheceu Jesus como o único sacrifício
verdadeiro e eficaz. Consequentemente, todos os outros sacrifícios que
buscavam expiação estavam agora obsoletos. Sacrifícios eram apropriados
apenas quando expressavam gratidão pelo perdão e purificação pela obra
expiatória de Jesus, e não quando buscavam expiação por meio de rituais.
Essa teologia sacrificial também apareceu em 20.28, onde Jesus disse que
“o Filho do Homem não veio para ser servido, mas para servir e para dar a
vida em resgate de muitos”. Ela alcança seu clímax com a declaração de
Jesus durante a Última Ceia, “pois isto é o meu sangue, o sangue da aliança
derramado em favor de muitos para perdão dos pecados” (26.28).
Assim, o Evangelho de Mateus enfatiza que Jesus era o Salvador dos
pecadores que assegurou a redenção através da sua morte sacrificial. Como
o escritor de Hebreus, Mateus salientou que os sacrifícios de animais
oferecidos no templo não poderiam efetuar expiação. Mateus também
compartilhou a convicção de que “é impossível que o sangue de touros e de

472
bodes apague pecados […] fomos santificados pela oferta do corpo de Jesus
Cristo, feita de uma vez por todas” (Hb 10.4,10).

A Grande Comissão e a inclusão dos gentios


Mateus era um judeu Cristão que originalmente escreveu para uma
audiência predominantemente judaico-cristã. Um dos seus propósitos ao
escrever o Evangelho era demonstrar que o Messias de Israel não veio
somente em benefício de Israel. Ao contrário, ele veio para oferecer a
salvação a todos os povos da terra.81 Esse tema teológico aparece em vários
momentos no Evangelho de Mateus, começando em sua genealogia de
Jesus. Embora os estudiosos tenham sugerido uma variedade de motivos
para a inclusão de Mateus dos nomes de quatro mulheres em sua genealogia
de Jesus, uma possível razão é que as quatro mulheres eram gentias. Os
textos judaicos antigos descrevem Tamar como uma “estrangeira” (Filo,
Virt. 220-22) e particularmente como de origem arameia (Jub. 41.1-2; Test.
Jud. 10.1-2). Raabe era uma cananita de Jericó (Js 2.8-24). Rute era uma
moabita (Rt 1.4). Bate-Seba foi provavelmente uma hitita, como seu marido
Urias (2Sm 11.3). Assim, a menção dessas quatro mulheres pode ter
sinalizado a intenção de Deus em incluir os gentios em seu plano redentor.
Esse tema voltou à tona novamente no relato de Mateus da convocação
dos magos para que adorassem a Jesus em Belém (Mt 2.1-12). Os magos do
oriente do primeiro século primeiros mesclavam a falsa religião do
zoroastrismo com a astrologia, a interpretação de sonhos e visões e a magia
negra. Os magos orientais são descritos com algum detalhe no livro de
Daniel (2.2,4,5,10), onde os magos estão associados com os “sacerdotes
adivinhadores”, “médiuns” e “feiticeiros” na corte do rei de Babilônia. Os

473
magos, assim, representavam os líderes das religiões falsas do mundo
gentílico (cf. At 13.6-10). A adoração humilde e reverente dos magos a
Jesus está em marcante contraste com a aparente apatia dos líderes judeus e
sua recusa em investigar a possibilidade de o Messias ter nascido. Isso
prenuncia a rejeição de Jesus pelos líderes judeus e sua aceitação pelos
gentios mais tarde no Evangelho.
Em Mateus 3.9, a advertência de João de que Deus poderia suscitar
filhos a Abraão das pedras indica de que Deus pode formar um novo Israel
que não é necessariamente composto dos descendentes físicos de Abraão.
Mateus 4.12-16 descreve a decisão de Jesus de estabelecer a sede de seu
ministério em Cafarnaum como o cumprimento da promessa de Deus em
Isaías 9.1,2 para trazer luz à “Galileia dos gentios”. Em Mateus 4.24, o
povo da Síria, provavelmente incluindo os gentios, começou a trazer
enfermos, amigos doentes e familiares para que Jesus os curasse. As
multidões de Decápolis que seguiram Jesus (4.25) provavelmente em
grande parte eram compostas por gentios.
Em Mateus 8.5-13, Jesus se ofereceu para entrar na casa de um
centurião romano. Esse fato desafiou o tabu judaico de se entrar na casa de
um gentio (At 10.28). Jesus exclamou que a fé desse Gentio excedia
qualquer fé que ele havia encontrado em Israel. Ele claramente implicou a
inclusão dos gentios no reino de Deus ao alegar que muitos do Oriente e do
Ocidente entrariam no reino e participariam do banquete com Abraão,
Isaque e Jacó. Ele também alertou que muitos “filhos do reino”, os judeus
que rejeitaram Jesus, seriam excluídos do reino.
Mateus 12.15-21 identifica Jesus como o cumprimento de Isaías 42.1-4,
uma profecia que culmina com a promessa “as nações colocarão sua
esperança no seu nome”. Em Mateus 12.41,42, Jesus lembrou os escribas e

474
fariseus dos ninivitas e da rainha do Sul que se arrependeram e procuraram
a verdadeira sabedoria dos confins da terra. Ele alertou que esses gentios se
levantariam no dia do juízo e condenariam os líderes judeus que rejeitaram
a Jesus. Mateus 15.21-28 descreve a bondade de Jesus a uma mulher gentia,
e ela é especificamente chamada de “cananeia” (cf. Mc 7.26),
provavelmente no intuito de associar a mulher com o mais notório inimigo
pagão de Israel. A bondade de Jesus para com a mulher mostra que os
gentios, a quem os judeus do primeiro século teriam considerado como
mais desprezíveis, poderiam seguir a Cristo e ser abençoados por ele. Em
Mateus 15.29-31, Jesus curou o doente na costa norte do mar da Galileia,
que aparentemente era território pagão. O louvor do povo “ao Deus de
Israel” implica que os gentios estavam glorificando o Deus vinculado aos
israelitas.
O tema da inclusão por Deus dos gentios culminou na crucificação de
Jesus com a confissão do centurião romano e de seus guardas, que
exclamou: “é verdade, este era o Filho de Deus” (27.54). Sua corajosa
confissão está em marcante contraste com a recusa dos líderes judeus em
crer mesmo depois de os soldados relatarem a ressurreição de Jesus.
Finalmente, o tema foi claramente afirmado na Grande Comissão, na qual
Jesus pediu aos seus seguidores para que fizessem discípulos de “todas as
nações” (28.19,20).
Embora seja o Evangelho de Lucas o Evangelho comumente
reconhecido como aquele que enfatiza que Deus incorporou fiéis gentios ao
novo Israel, esse grande tema teológico é igualmente importante no
Evangelho escrito por um dos seguidores judeus do próprio Jesus. Se esse
tema tivesse sido devidamente apreciado pelos outros judeus cristãos na
igreja primitiva, as tensões entre cristãos judeus e gentios com as quais

475
Paulo teve de lidar com tanta frequência em suas cartas poderiam nunca ter
surgido. Embora Paulo seja reconhecido como o grande apóstolo aos
gentios, o Evangelho de Mateus demonstra que pelo menos um dos Doze
estava igualmente comprometido em alcançar os gentios. As convicções
que Paulo expressou em Efésios 2.11-22 foram tratadas também por
Mateus. Embora os gentios uma vez tenham estado “sem o Messias,
excluídos da cidadania de Israel, estranhos às alianças da promessa, sem
esperança e sem Deus no mundo”, agora, em Cristo Jesus, estes, que antes
estavam longe, foram “trazidos para perto pelo sangue do Messias”. Os
discípulos gentios de Jesus não eram “mais estrangeiros, nem imigrantes;
pelo contrário, [sois] concidadãos dos santos e membros da família de
Deus”.

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON


Genealogia de Jesus Cristo, filho de Abraão, o filho de Davi (1.1-17)
Relato do nascimento virginal de Cristo (1.18-25)
Citações de cumprimento mostrando que Jesus é o Messias (1 a 4)
Cinco grandes discursos ou seções de ensino de Jesus, incluindo o
Sermão do Monte (5 a 7), o Comissionamento dos Doze (10), as
parábolas de Jesus sobre o reino (13; 18) e seus ensinamentos finais,
incluindo o Discurso do Monte das Oliveiras sobre o final dos tempos
(23 a 25)
A Grande Comissão (28.16-20)

QUESTÕES PARA ESTUDO

476
1. Por que os rótulos “autoria”, “compilação”, “coletor”, “editor” e/ou
“redator” não conseguem fazer justiça ao descrever a autoria de
Mateus?
2. Quem as mais antigas evidências externas existentes sugerem que
escreveu o Evangelho de Mateus?
3. Mateus escreveu o seu Evangelho na língua hebraica?
4. Quando Mateus provavelmente escreveu seu Evangelho? Por que uma
data antiga é significativa?
5. Quais são os dois locais mais prováveis onde o Evangelho de Mateus
pode ter sido escrito?
6. Para qual área geográfica Mateus escreveu? O que demonstra isso?
7. Quais são os propósitos primário e secundário do Evangelho de
Mateus?
8. Qual é a característica mais proeminente da estrutura de Mateus?
9. Que expressão usada pelo evangelista permite que o intérprete
identifique a estrutura geral do Evangelho de Mateus?
10. Quais são os dois casos em que Mateus usou o simbolismo numérico
para defender seu ponto teológico?
11. Quais são os capítulos em Mateus que correspondem ao Sermão do
Monte e ao discurso escatológico final?
12. Que característica é particularmente proeminente em Mateus 1 a 4?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


ALLISON JR, D. C. The New Moses: A Matthean Typology
(Minneapolis: Fortress, 1993).

477
______. Studies in Matthew: Interpretation Past and Present (Grand
Rapids: Baker, 2005).
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Rapids: Eerdmans, 2001).
BLOMBERG, C. L. Matthew. New American Commentary 22 (Nashville:
Broadman, 1992).
BROWN, R. E. The Birth of the Messiah: A Commentary on the Infancy
Narratives (Garden City: Doubleday, 1977).
CARSON, D. A. “Matthew”. Em: The Expositor’s Bible Commentary
(Grand Rapids: Zondervan, 1984), vol. 8: Matthew, Mark, Luke, p.
3-602.
DAVIES, W. D.; ALLISON JR, D. C. Matthew. Em: International Critical
Commentary (Edinburgh: T&T Clark, 1988-1997), 3 vols.
DONALDSON, T. L. Jesus on the Mountain: A Study in Matthean
Typology. Journal for the Study of the New Testament Supplement
8 (Sheffield: JSOT, 1985).
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______. Matthew: Evangelist and Teacher (Grand Rapids: Zondervan,
1989).
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Church Under Persecution. 2. ed. (Grand Rapids: Eerdmans,
1994).
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1993), 2 vols.

478
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KINGSBURY, J. D. Matthew: Structure, Christology, Kingdom
(Philadelphia: Fortress, 1975).
LUZ, U. Matthew in History: Interpretation, Influence, and Effects
(Minneapolis: Fortress, 1994).
______. Matthew 1—7. In: Hermeneia (Minneapolis: Fortress, 2007).
MCKNIGHT, S. “Matthew, Gospel of”. In: Dictionary of Jesus and the
Gospels (Downers Grove: InterVarsity, 1992), p. 526-41.
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Testament Commentary (Grand Rapids: Eerdmans, 1992).
NOLLAND, J. The Gospel of Matthew. Em: New International Greek
Testament Commentary (Grand Rapids: Eerdmans, 2005).
STANTON, G., org. The Interpretation of Matthew. Issues in Religion
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STANTON, G. N. A Gospel for a New People: Studies in Matthew
(Edinburgh: T&T Clark, 1992).
______. “Matthew”. Em: It is Written: Scripture Citing Scripture
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TURNER, D. L. Matthew. Em: Baker Exegetical Commentary on the
New Testament (Grand Rapids: Baker, 2008).
WILKINS, M. J. Matthew. Em: NIV Application Commentary (Grand
Rapids: Zondervan, 2004).

479
1
R. V. G. Tasker (The Gospel According to St. Matthew, TNTC [London: Tyndale, 1961], p. 15-

16) salientou que isso provavelmente se deve a mais do que uma convicção de que o Evangelho de

Mateus foi o primeiro a ser escrito. A prioridade de Mateus no cânon foi inspirada pela convicção de

que esse livro estabeleceu uma ponte apropriada entre os dois Testamentos.

2
R. T. France, Matthew: Evangelist and Teacher (Grand Rapids: Zondervan, 1989), p. 16.

3
L. Morris, The Gospel According to Matthew, PNTC (Grand Rapids: Eerdmans, 1992), p. 1.

4
Veja France, Matthew: Evangelist and Teacher.

5
M. Hengel argumentou que os Evangelhos sempre tiveram seus títulos e que “segundo […]”

(kata) implica autoria. Veja Hengel, The Four Gospels and the One Gospel of Jesus Christ: An

Investigation of the Collection and Origin of the Canonical Gospels, tradução para o inglês de J.

Bowden (Harrisburg: Trinity Press International, 2000), p. 48-53,77. Compare com France, Matthew:

Evangelist and Teacher, p. 50-80; e com a discussão das objeções à proposta de Hengel em D. A.

Carson; D. J. Moo, An Introduction to the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids: Zondervan, 2005),

p. 141-142 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução ao Novo Testamento].

6
W. D. Davies; D. C. Allison Jr., Matthew, ICC (London: T&T Clark, 1988-1997), 1:8.

7
As obras de Papias não sobreviveram, mas foram citadas por Eusébio de Cesareia em sua obra

História Eclesiástica, do início do século IV. Embora muitos estudiosos datem a obra original de

Papias a 130-140 (baseados na afirmação de Filipe de Side, que escreveu no início do século V),

Eusébio, que escreveu 100 anos antes e geralmente era mais confiável que Filipe, declarou que

Papias era bem conhecido durante a época de Inácio (c. 35-110) e Policarpo (c. 69-155). Além disso,

Eusébio contou novamente o testemunho de Papias que precede sua descrição da perseguição cristã

por Trajano entre 98 e 117. Isso sugere que o testemunho de Papias muito provavelmente data do

início do século II. Veja especialmente a discussão em R. Gundry, Matthew: A Commentary on his

Handbook for a Mixed Church Under Persecution, 2. ed. (Grand Rapids: Eerdmans, 1994), p. 610-

480
611, que argumentou que Filipe dependeu de Eusébio para sua informação sobre Papias, mas

adulterou o testemunho de sua fonte. Para uma excelente análise das evidências tanto para as datas

anteriores como posteriores de Papias com uma defesa da data anterior e uma discussão de suas

implicações para pesquisa do Evangelho, veja. Yarbrough, “The Date of Papias: A Reassessment”,

JETS 26 (1983), p. 181-91.

8
Veja a discussão em Gundry, Matthew, p. 611-17. Para o argumento de que Papias realmente

ouviu os ensinamentos de duas testemunhas oculares do ministério de Jesus, veja R. Bauckham,

Jesus and the Eyewitnesses: The Gospels as Eyewitness Testimony (Grand Rapids: Eerdmans, 2006),

p. 12-38.

9
Ireneu, Contra Heresias 5.33.4.

10
Eusébio, Hist. Ecl. 3.39. Tradução nossa.

11
Isso não pretende sugerir, no entanto, que Papias provavelmente estava errado. Para uma

defesa do bispo, veja C. L. Blomberg (Matthew, NAC 22 [Nashville: B&H, 1992], p. 40), com

referência a R. Glover, “Patristic Quotations and Gospel Sources”, NTS 31 (1985), p. 234-251; A. C.

Perumalil, “Are not Papias and Irenaeus Competent to Report on the Gospels?”, ExpTim 91 (1980),

p. 332-337; G. Howard, The Gospel of Matthew According to a Primitive Hebrew Text (Macon:

Mercer University Press, 1987). Compare com D. A. Hagner (Matthew 1-13, WBC 33A [Dallas:

Word, 1993], xliii-xlvi), que sugeriu que Mateus pode ter coletado os ditos de Jesus em aramaico ou

talvez o conjunto de seus ensinamentos na forma de cinco grandes discursos, uma das contribuições

mais distintivas de Mateus.

12
Davies e Allison, Matthew, 1:16.

13
Por exemplo, G. D. Kilpatrick, The Origins of the Gospel of Matthew (London: Oxford

University Press, 1946), p. 138.

481
14
D. Guthrie, New Testament Introduction, ed. rev. (Downers Grove: InterVarsity, 1990), p. 52-

53.

15
Em nossa afirmação da autoria de Mateus, nós vamos contra os ventos dos estudos

predominantes que levam os comentaristas a rejeitar o apóstolo Mateus como autor deste Evangelho

ou pelo menos limitar seu papel no processo. Por exemplo, a rejeição de R. Bauckham da autoria de

Mateus levou-o a negligenciar quase completamente o Evangelho de Mateus naquela que seria sua

excelente obra Jesus and the Eyewitnesses; e U. Luz (Matthew 1-7, Continental Commentary

[Minneapolis: Fortress, 1989], p. 94-95) também rejeitou a autoria de Mateus — embora ele também

tenha notado que Mateus é descartado como autor muito levianamente e a evidência para a autoria

mateana é ignorada com “silêncio gratuito”. Mais cuidadosos foram Davies e Allison (Matthew, 1:7-

58), que não rejeitaram explicitamente Mateus como o autor mas que, não obstante, puderam reunir

apenas a conclusão minimalista de que o autor era judeu e cuja preferência por uma data entre 80 e

95 pareceu a todos nada além de excluir a autoria mateana. C. S. Keener (A Commentary on the

Gospel of Matthew [Grand Rapids: Eerdmans, 1999], p. 40), que no passado havia rejeitado a autoria

mateana, mas que repensou sua visão enquanto escrevia seu comentário e que “atualmente está

inclinado a aceitar a possibilidade da autoria mateana em algum nível, embora com incerteza

admitida”, viu como o cenário mais provável “a presença de pelo menos um depósito significante de

tradição mateana nesse Evangelho, editada pelo tipo de escola mateana que os acadêmicos têm

frequentemente sugerido”. Hagner (Matthew 1-13, xliii-xlvi) sugeriu que Mateus pode te sido

responsável pela coleção dos principais discursos do Evangelho que não estão contidos em Marcos

ou que Mateus colecionou os ditos hoje conhecido como “Q”.

16
Veja a discussão em Keener, Commentary on the Gospel of Matthew, p. 42-44.

17
R. Schnackenburg, The Gospel of Matthew, tradução para o inglês de R. R. Barr (Grand

Rapids: Eerdmans, 2002), p. 6. Veja o resumo e a crítica em Carson e Moo, Introduction to the New

Testament, p. 152-56.

482
18
Nolland, Matthew, p. 14. Nolland não afirmou uma data anterior a 70 para Mateus com base no

desejo de defender a autoria de Mateus, que ele rejeitou. Nolland argumentou que a profecia de Jesus

continha exageros que não eram completa e literalmente satisfeitos pelos eventos adjacentes à queda

de Jerusalém e que Mateus deve tê-los suavizado se ele escreveu depois de 70.

19
Recensão palestina. Veja P. L. Mayo, “The Role of the Birkath Haminim in Early Jewish-

Christian Relations: A Reexamination of the Evidence”, BBR 16 (2006), p. 325-44.

20
E. P. Sanders, Jesus and Judaism (Philadelphia: Fortress, 1991), p. 98-106.

21
Por exemplo, compare Mateus 2 com Inácio, Aos Efésios 19.1-3; Mateus 3.15 com Inácio, Aos

Esmirniotas 1.1; e Mateus 10.16 com Popicarpo, Aos Filipenses 2.2. Quando Inácio se referiu ao “o

Evangelho” em Aos Filipenses 5.1-2; 8.2, ele provavelmente estava se referindo ao Evangelho de

Mateus. Compare também Mateus 6.9-11 com Didaquê 8:2.

22
Compare Mateus 5.3,10 e Policarpo, Aos Filipenses 2.3. Veja também C. L. Quarles, “The Use

of the Gospel of Thomas in the Research on the Historical Jesus of John Dominic Crossan”, CBQ 69

(2007), p. 517-536; e H. Koester, Synoptische Überlieferung bei den apostolischen Vätern, TU 65

(Berlin: Akademie, 1957), p. 13, p. 116-118. Algumas pesquisas recentes sugerem que a Didaquê

pode ser ainda mais antiga. J. P. Audet (La Didache, Instructions des Apôtres [Paris: Gabalda, 1958])

e M. W. Holmes (The Apostolic Fathers: Greek Texts and English Translations, 3. ed. [Grand Rapids:

Baker, 2007], 337-338) sugeriu que a Didaquê reflete uma época mais próxima a Paulo e Tiago

(ambos morreram nos anos 60) do que a Inácio (morto c. 110). Se essa data da composição da

Didaquê estiver correta, isso exigiria uma data anterior a 70 para o Evangelho de Mateus na

suposição de que Mateus dependeu da Didaquê, embora isso seja menos que conclusivo (veja a

discussão em Holmes, Apostolic Fathers, p. 338).

23
Compare Barn. 4.14 com Mateus 24.14.

483
24
Veja C. L. Quarles, “The Gospel of Peter: Does it Contain a Pre-Canonical Passion

Narrative?”, em: R. Stewart, org., The Resurrection of Jesus: John Dominic Crossan and N. T. Wright

in dialogue (Minneapolis: Augsburg Fortress, 2006), p. 106-120, especialmente p. 110-118.

25
Veja a discussão da prioridade de Marcos no capítulo anterior.

26
Ireneu, Contra Heresias 3.1.1.

27
Josefo, Guerra Judaica 7.218; Dião Cássio, 65.7.2; Suetônio, Domiciano 12.

Consequentemente, m. Sheq. 8.8 ensinou que as leis do shekel valeram apenas enquanto o templo

existiu.

28
Gundry, Matthew, p. 606.

29
Veja seção sobre temas teológicos em Mateus.

30
Veja a extensa e convincente defesa da data anterior de Mateus em Gundry (Matthew, p. 599-

609), que conclui que Mateus provavelmente foi escrito durante os anos 50 ou início dos anos 60.

31
Davies e Allison, Matthew, 1:139.

32
Para a defesa da procedência Palestina, veja J. A. Gibbs, Matthew 1:1-11:1, Concordia

Commentary (St. Louis: Concordia, 2006), p. 67.

33
B. H. Streeter, The Four Gospels (London: Macmillan, 1951), p. 500-23. U. Luz (Matthew 1-7

[Minneapolis: Augsburg, 1983], n. 184, 1:91) recentemente desafiou a alegação de Streeter.

34
Koester observou que a igreja primitiva sugeriu que a Epístola de Barnabé foi composta em

Alexandria. Mas a igreja baseou sua opinião no modo de interpretação de Alexandria usado no livro.

Mais tarde, Koester afirmou que os estudiosos modernos quase nada sabem sobre a procedência do

livro (Introduction to the New Testament: History and Literature of Early Christianity [Philadelphia:

Fortress, 1982], 2:220, 277). Ele datou a Epístola de Barnabé do final do primeiro século, uma vez

que em sua opinião ela não se refere a nenhum livro do NT.

484
35
M. D. Goulder, Midrash and Lection in Matthew: The Speaker’s Lectures in Biblical Studies

1969-71 (London: SPCK, 1974); Gundry, Matthew. O comentário de Gundry originalmente tinha o

subtítulo, “A Commentary on His Literary and Theological Art”. Para resumos desses dois volumes,

veja C. L. Quarles, Midrash Criticism: Introduction and Appraisal (Lanham: University Press of

America, 1998), p. 7-15.

36
Gundry, Matthew, p. 22.

37
Veja C. L. Quarles, “Midrash as Creative Historiography: The Portrait of a Misnomer,” JETS

39 (1996), p. 457-464.

38
S. Sandmel, “Parallelomania”, JBL 81 (1962), p. 2-13.

39
Para uma análise das premissas questionáveis, fragilidades metodológicas e conclusões tênues

do criticismo midráshico, veja Quarles, Midrash Criticism, p. 68-103. Compare com o intercâmbio

entre D. J. Moo e R. H. Gundry em JETS 26 (1983), p. 31-86.

40
Goulder, Midrash and Lection.

41
Para um resumo mais completo do ponto de vista de Goulder, veja Quarles, Midrash Criticism,

p. 7-9.

42
Nolland, Matthew, p. 19. Compare com a seção “Matthew as Biography” em Keener,

Commentary on the Gospel of Matthew, p. 16-24.

43
Nolland, Matthew, p. 19.

44
Veja a discussão semelhante em Carson e Moo, Introduction to the New Testament, p. 158.

45
Bauckham (Jesus and the Eyewitnesses, p. 226-30) argumentou que a preocupação de Papias

era com a falta da ordem cronológica em Marcos e com a ruptura da ordem superior de Mateus no

hebraico original quando o Evangelho foi adaptado por tradutores gregos. Ele concluiu que faltava

485
em Marcos e na versão grega de Mateus ordem cronológica ao comparar esses dois Evangelhos ao de

João.

46
Veja discussão adicional a seguir.

47
Veja Hagner, Matthew 1-13, liii, também citando D. C. Allison, “Matthew: Structure,

Biographical Impulse and the Imitatio Christi”, em: F. van Segbroeck, et al. org., The Four Gospels

1992. Festschrift F. Neirynck (Leuven: University Press, 1992), p. 1208.

48
B. W. Bacon, Studies in Matthew (New York: Holt, 1930).

49
Veja a coleção do Saltério Hebraico em cinco livros. Um outro exemplo do número 5 em

Mateus é a inclusão de cinco mulheres na genealogia de abertura em 1.1-17: Tamar (v. 3), Raabe e

Rute (v. 5), a esposa de Urias (v. 6) e Maria, mãe de Jesus (v. 16).

50
J. D. Kingsbury, Matthew: Structure, Christology, Kingdom, 2. ed. (Minneapolis: Fortress,

1989). Veja J. C. Hawkins, Horae Synopticae (Oxford: Clarendon, 1899); cf. a crítica de F. Neirynck,

“Apo tote erchato and the Structure of Matthew”, ETL 64 (1988), p. 21-59, citada em Hagner,

Matthew 1-13, li.

51
Veja Hagner (Matthew 1-13, lii-liii), que mais tarde listou quiasmas e outras propostas, das

quais nenhuma se provou atraente.

52
Veja mais adiante a seção sobre os principais temas teológicos de Mateus.

53
Gundry, Matthew, p. 10-11.

54
Ibid. Veja Hagner (Matthew 1-13, li), que objetou que “certas partes do Evangelho não se

adequam de forma alguma a essa estrutura”. Ele citou Mateus 11 e 23 como também as narrativas

sobre a infância e a Paixão e sustenta que a estrutura quíntupla é “uma estrutura secundária em vez de

primária”.

486
55
Veja a discussão em Carson e Moo (Introduction to the New Testament, 134-36), que

escrevem: “Mateus relata extensivos ensinamentos de Jesus fora dos cinco discursos não é crítica da

estrutura: a sequência quíntupla da narrativa e discurso não pressupõe que Jesus não é retratado como

aquele que fala nas seções narrativas […] Antes, a ideia é que, de um ponto de vista literário, os

cinco discursos estão delineados com tanta clareza, que é quase impossível acreditar que Mateus não

os tenha planejado”.

56
Para uma completa discussão sobre a genealogia de Mateus, veja D. L. Turner, Matthew,

BECNT (Grand Rapids: Baker, 2008), p. 25-32 (incluindo o quadro comparativo da genealogia de

Jesus em Mateus e em Lucas). Compare com D. S. Huffman, “Genealogy”, em: J. B. Green; S.

McKnight; I. H. Marshall, orgs., Dictionary of Jesus and the Gospels (Downers Grove: InterVarsity,

1992), p. 253-59.

57
Mateus mencionou Tamar (estuprada pelo próprio meio-irmão), Raabe (uma prostituta), Rute

(deitou-se aos pés de Boaz durante a noite; veja também Rute 3.14), e Bate-Seba (com quem o rei

Davi cometeu adultério) (Mt 1.3,5 a 6.16). Veja E. D. Freed, “The Women in Matthew’s Genealogy”,

JSNT 29 (1987), p. 3-19; e J. Nolland, “The Four (Five) Women and Other Annotations in Matthew’s

Genealogy”, NTS 43 (1997), p. 527-39.

58
Veja o quadro sob os Principais Temas Teológicos abaixo. Sobre Jesus como “Emanuel”, veja

D. D. Kupp, Matthew’s Emmanuel: Divine Presence and God’s People in the First Gospel, SNTSMS

90 (Cambridge: University Press, 1996).

59
Josefo, Ant. 17.167-69; Guerra Judaica 1.437, 443-44, 550-51, 659-60, 664-65. Veja Keener,

Commentary on the Gospel of Matthew, p. 110-11; R. T. France, “Herod and the Children of

Bethlehem”, NovT 21 (1979), p. 98-120.

60
Veja a discussão sobre a cronologia da vida de Jesus no capítulo anterior.

487
61
Entretanto, observe que o hebraico usa neste caso tsemach, não netser; mas veja o uso coletivo

de netser em Isaías 60.21.

62
“Justiça” é um tema importante no Evangelho de Mateus, especialmente nas primeiras seções

de seu Evangelho: veja a referência àqueles que “têm fome e sede de justiça” (5.6); a exigência de

Jesus de que a “justiça” de seus seguidores excedesse a dos fariseus (5.20); e sua injunção para que

seus discípulos procurassem primeiro “o reino de Deus e sua justiça” (6.33).

63
Por exemplo, D. C. Allison Jr., The New Moses: A Matthean Typology (Minneapolis: Fortress,

1993). Sobre o Sermão do Monte, veja R. A. Guelich, The Sermon on the Mount: A Foundation for

Understanding (Dallas: Word, 1982); D. A. Carson, The Sermon on the Mount: An Evangelical

Exposition of Matthew 5 a 7 (Grand Rapids: Baker, 1978)[publicado em português por Vida Nova

sob o título O sermão do Monte: exposição de Mateus 5—7]; ; J. Jeremias, The Sermon on the

Mount, Facet Books 2, tradução para o inglês de N. Perrin (Philadelphia: Fortress, 1963); W. D.

Davies, The Setting of the Sermon on the Mount (Cambridge: University Press, 1964); D. M. Lloyd-

Jones, Studies in the Sermon on the Mount, 2. ed. (Grand Rapids: Eerdmans, 1976); J. R. W. Stott,

Christian Counter-culture (Leicester, UK: InterVarsity, 1978); e D. Bonhoeffer, The Cost of

Discipleship, ed. rev., tradução para o inglês de R. H. Fuller (New York: Macmillan, 1963). Compare

com C. Quarles, The Sermon on the Mount for Today (Nashville: B&H, 2009).

64
Veja T. L. Donaldson, Jesus on the Mountain: A Study in Matthean Theology, JSNTSup 8

(Sheffield: Almond, 1985).

65
Observe que o termo preferido de Mateus é “reino do céu” (usado 32 vezes, embora o termo

“reino de Deus” ocorra apenas cinco; Marcos, Lucas e João não usam o termo “reino do céu”). “Céu”

é mais provavelmente utilizado para evitar referência aberta a Deus, na típica maneira judaica,

embora ambas as expressões pareçam ser usadas de forma sinônima. Veja C. C. Caragounis,

“Kingdom of God/Heaven”, em Dictionary of Jesus and the Gospels, p. 417-439, esp. p. 435-39.

488
66
Observe que esta é uma das duas únicas ocorrências de ekklēsia em todo o NT (a outra

referência se encontra em 18.17). Por essa razão uma tradução não técnica tal como “comunidade

messiânica” parece preferível à tradução padrão “igreja” em Mateus 16.18 e 18.17.

67
Também ensinou que devemos pagar nossos impostos.

68
Veja a discussão mais detalhada a seguir.

69
Veja b. Megillah 21a e b. Sotah 49a; cf. A referência a Jesus subindo o monte e sentando em

Mateus 15.29.

70
O “tema do monte” constitui por legítimo direito um importante tema de Mateus, abrangendo

todo o caminho entre o monte acima mencionado, no qual Jesus fez seu primeiro principal corpo de

ensinamentos (caps. 5 a 7) e o monte no final do Evangelho, onde ele pronunciou sua Grande

Comissão (28.16-20). Veja Donaldson, Jesus on the Mountain.

71
Davies e Allison (Matthew 1:423-24), Stott (Christian Counter-culture, 20-21), e Hagner

(Matthew 1 to 13, p. 85-86) concordam que Moisés está tipologicamente presente aqui. Guelich

(Sermon on the Mount, p. 52) e D. A. Carson (“Matthew”, em EBC 8 [Grand Rapids: Zondervan,

1984], p. 129) discordam devido à força dos argumentos em Davies (Setting of the Sermon on the

Mount, p. 93, p. 99). Na verdade, Davies mais tarde mudou sua posição como o comentário ICC

reflete. Veja a lista de intérpretes em Keener (Commentary on the Gospel of Matthew, n. 10, p. 164).

72
Bacon, Studies in Matthew. Veja discussão apresentada.

73
Veja a lista de comentaristas em Keener, Commentary on the Gospel of Matthew, n. 6, p. 74. O

próprio Keener minimizou a importância do simbolismo numérico, conjecturando que “talvez

quatorze fosse simplesmente a estimativa média que Mateus fez das gerações” ou que “Mateus

preferia um número redondo para cada grupo de gerações, talvez para facilitar a memorização”.

74
Veja Hagner, Matthew 1 to 13, 41; Gundry, Matthew, p. 40; e Davies e Allison, Matthew,

1:277-79 (embora vejam esta como uma alusão “secundária”). Entre outros que defendem este

489
mesmo ponto de vista estão M. Black, K. Stendahl, U. Luz, A. Schlatter, e B. Weiss.

75
Outros termos hebraicos que não neṣer são usados para identificar o Ramo nestes textos. Veja

também Zacarias 3.8 e 6.12.

76
I. H. Marshall, “Son of Man”, em: Dictionary of Jesus and the Gospels, p. 776.

77
Ibid., p. 781.

78
No Pentateuco (LXX), “ofertas” são descritas como realizando expiação apenas duas vezes (Lv

9.7; Nm 15.25).

79
Veja o “Índice de Citações” e o “Índice de Alusões e Paralelos Verbais”, em: B. Aland; K.

Aland org., The Greek New Testament, 4. ed. (Stuttgart: United Bible Societies, 1993), p. 887-901.

80
Uma citação e sete alusões a Isaías 53 aparecem em Mateus, e 1Pedro fica apenas um pouco

atrás de Mateus com uma citação e seis alusões, uma impressionante concentração para uma carta tão

curta.

81
Veja A. J. Köstenberger; P. T. O’Brien, Salvation to the Ends of the Earth: A Biblical Theology

of Mission, NSBT 11 (Downers Grove: InterVarsity, 2001), p. 87-109 (com referências bibliográficas

adicionais).

490
CAPÍTULO 5

O Evangelho segundo Marcos

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os fatos-chave do
Evangelho de Marcos. Em relação à História, os estudantes deverão ser
capazes de identificar o autor do Evangelho, data, origem, destino e
propósito. Em relação à Literatura, eles deverão ser capazes de fornecer
uma estrutura básica do livro e identificar os elementos essenciais do
conteúdo do livro encontrados na discussão de unidade por unidade. No que
diz respeito à Teologia, os estudantes deverão ser capazes de identificar os
principais temas teológicos de Marcos.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo do
conhecimento principal identificado no item Conhecimentos básicos, os
estudantes deverão ser capazes de apresentar os argumentos para
conclusões históricas, literárias e teológicas. No que diz respeito à História,
os estudantes deverão ser capazes de discutir as evidências para a autoria de
Marcos, data, proveniência, destino e propósito. No que diz respeito à
Literatura, eles deverão ser capazes de fornecer uma estrutura detalhada do
livro. No que diz respeito à Teologia, os estudantes deverão ser capazes de

491
discutir os principais temas teológicos de Marcos e as formas pelas quais
eles contribuem de maneira única para o cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além do domínio do conteúdo principal
identificado nos itens Conhecimentos básicos e Conhecimentos
intermediários, os estudantes deverão ser capazes de interagir com as
teorias sobre a identidade de Marcos. Além disso, eles devem ser capazes
de avaliar criticamente o papel de Pedro na redação do Evangelho de
Marcos, avaliar a originalidade dos diversos finais propostos para o
Evangelho e ser capazes de discutir a importância teológica do tema
“segredo messiânico” de Marcos.

492
FATOS-CHAVE DO EVANGELHO DE MARCOS
Autor: João Marcos, “intérprete” de Pedro
Data: Meio a final dos anos 50
Origem: Roma
Destino: Gentios em Roma
Propósito: Apologia da cruz, discipulado
Tema: Jesus é o Filho de Deus autoritativo e
operador de milagres
Versículos-Chave: 10.45; 15.39

INTRODUÇÃO

O Evangelho de Marcos é o mais curto dos quatro Evangelhos e tem a


menor quantidade de material exclusivo. Embora não use a palavra
euangelion como um título, é o único Evangelho que se refere à sua
mensagem sobre Jesus como o “evangelho” (1.1).1 É considerado por
muitos como fundamental para os outros dois Evangelhos Sinóticos;
Mateus e Lucas. Cerca de 92% dele encontra paralelo em Mateus, cerca de
48% em Lucas, e cerca de 95% em Mateus e Lucas combinados.
Uma minoria de estudiosos tem alegado que Marcos criou a história de
Jesus para a igreja.2 A maioria acredita que Marcos foi o pioneiro no gênero
literário “Evangelho”.3 Sua referência de abertura a seu relato como “o
evangelho” muito provavelmente estabelece o cenário para o uso desse
termo como uma designação literária para as quatro distintivas obras
literárias que hoje chamamos “Evangelhos” e contribuiu para o uso do
“Evangelho” em um sentido literário na igreja primitiva (p. ex., Ireneu,
Contra Heresias 3.1.2).4

493
Em termos de sua relação com os outros Evangelhos canônicos, o ponto
de vista mais amplamente aceito hoje é que Marcos foi escrito primeiro
(prioridade marcana).5 Fatores relevantes incluem, mas não estão limitados,
os seguintes: (1) as concordâncias em ordem e redação; (2) o grego menos
sofisticado utilizado por Marcos; (3) sua teologia menos desenvolvida; (4) a
brevidade do Evangelho; e (5) seu estilo desajeitado. Muito provavelmente
Mateus e Lucas usaram Marcos como fonte primária para compor seus
Evangelhos, bem como outras fontes escritas e orais (Hipótese dos Dois ou
Quatro Documentos). Embora a natureza exata da interdependência literária
entre os Evangelhos Sinóticos permaneça incerta, esta é, não obstante, a
hipótese funcional adotada pela maioria dos estudiosos.6
O Evangelho de Marcos é uma rápida descrição da vida de Jesus Cristo,
muito provavelmente estruturada segundo o modelo da pregação original de
Pedro.7 O sermão de Pedro em Atos 10.34-43 nos dá um breve resumo da
estrutura básica das quatro Evangelhos canônicos.8 O sermão nos conta uma
história, o “Evangelho”, sobre Jesus (1.1; veja 1.14,15; 8.35; 10.29; 13.10;
14.19).9 A ênfase está na pessoa de Cristo, e não em seus discursos ou
parábolas. Em particular, ele tem seu foco na execução por Jesus de uma
série de feitos milagrosos, apresentando-se como o Filho de Deus. Ao
mesmo tempo, Marcos, de forma mais intensa que qualquer um dos
Evangelhos Sinóticos, acentua a falta de entendimento da verdadeira
identidade de Jesus por seus primeiros seguidores.
Sua suposta condição de resumo dos Evangelhos de Mateus e Lucas
devido à sua falta de singularidade fez do Evangelho de Marcos o menos
popular dos quatro Evangelhos durante a maior parte da história cristã.10 No
entanto, no século XIX, a proposta da prioridade marcana como uma
solução para o Problema Sinótico e a alegação de que Marcos era o mais

494
histórico dos Evangelhos, em conjunto com as buscas do Jesus histórico,
levaram a um ressurgimento do interesse neste Evangelho. O grande
número de obras escritas ao longo dos últimos 40 anos é evidência do
aumento da proeminência do Evangelho de Marcos.11 Nos últimos anos, os
estudos literários da narrativa de Marcos reabilitaram Marcos como um
hábil escritor e evangelista.12

HISTÓRIA
Autor
Como os outros Evangelhos, Marcos é formalmente anônimo uma vez que
o autor deste Evangelho não se identifica explicitamente. Contudo, como o
é no caso de Mateus e dos outros Evangelhos, o título que atribui o
Evangelho a Marcos é claramente muito antigo, se não original.13 Se
Marcos foi o primeiro a escrever seu Evangelho (prioridade marcana) e se
ele mesmo deu o título do Evangelho, os outros evangelistas provavelmente
teriam seguido o exemplo. Mesmo se não, os títulos teriam se tornado
necessários logo que os Evangelhos foram reunidos e começaram a circular
em uma única coleção.
Como R. Bauckham mostrou, o Evangelho de Marcos, a título de um
artifício literário chamado de “inclusio de testemunho ocular” (a prática de
nomear no início e no fim do documento as principais testemunhas oculares
subjacentes a um evento) pretende basear-se no testemunho do apóstolo
Pedro (veja as referências a Pedro em 1.16 e 16.7), que também é apoiado
pela antiga evidência patrística.14 Uma outra característica, o “recurso plural
para o singular”, que escolhe um indivíduo de um grupo para fazer um
relato de sua perspectiva, torna dominante a perspectiva de Pedro na

495
narrativa, reproduzindo a lembrança de seu testemunho ocular em termos da
primeira pessoa.15

Evidências externas
A tradição antiga atribuía consistentemente este Evangelho a Marcos, que
se acreditava ter estado intimamente associado ao apóstolo Pedro. A mais
antiga e mais importante atestação da autoria marcana é a de Papias, bispo
de Hierápolis na Frígia, Ásia Menor (c. 60-130), cuja obra em cinco
volumes Exposições dos Ditos do Senhor foi citada por Eusébio no século
IV (Hist. Ecl. 3.39). Papias alegou ter aprendido sobre a autoria de Marcos
de um indivíduo a quem ele se referia como “o Ancião” ou “o Presbítero”,
preservando assim uma tradição datada pelo menos do início do século II.16
Papias também alegou que Marcos não foi uma testemunha ocular, mas que
obteve seu material de Pedro, afirmando ligação apostólica do Evangelho.
Ele não via o Evangelho como tendo sido escrito de uma forma
cronológica, mas antes como seguindo a natureza ocasional de pregação de
Pedro. Ele afirmou:

E João, o Presbítero, também disse isso, sendo Marcos o intérprete de Pedro, o que quer que
ele tenha registrado, ele escreveu com grande exatidão, mas não, todavia, na ordem em que
foi falado ou feito por nosso Senhor, pois ele não ouviu nem seguiu nosso Senhor, mas como
dito antes, estava em companhia de Pedro, que lhe deu tal instrução conforme foi necessário,
mas não para dar uma história dos discursos de nosso Senhor: razão porquê Marcos não
cometeu erro algum ao escrever algumas coisas enquanto as registrava; pois ele estava
cuidadosamente atento a uma coisa: não ignorar nada do que ouviu, nem declarar qualquer
coisa falsamente nesses relatos.17

Testemunhos posteriores da metade e final do segundo século parecem


confiar nessa tradição. Embora Marcião (primeira metade do século II)

496
tenha rejeitado o Evangelho de Marcos (como fez com Mateus e João), essa
rejeição não estava relacionada à autoria marcana, e o Prólogo
Antimarcionista afirma a autoria de Marcos. Justino Mártir (c. 100-165) fez
referência às “Memórias de Pedro”, que continham as seguintes palavras
encontradas somente no Evangelho de Marcos: “chamado Boanerges, que
significa ‘filhos do Trovão’” (Diálogo com Trifão 106). Taciano usou o
Evangelho de Marcos ao compilar seu Diatessaron, uma sinopse dos quatro
Evangelhos (c. 150-160). Ireneu de Lião (c. 130-200) afirmou que Marcos,
discípulo e intérprete de Pedro, escreveu este Evangelho logo depois da
morte de Pedro (Contra Heresias 3.1.1). Clemente de Alexandria (c. 150-
215, citado por Eusébio, Hist. Ecl. 6.14), Tertuliano (c. 160-225) e Orígenes
(c. 185-254), todos acreditavam que Marcos escreveu o Evangelho e que
Pedro foi sua fonte.18 A tradição pode variar com relação a certos detalhes,
tais como papel exato de Pedro em conexão com a composição do
Evangelho e a data de autoria, mas todos concordam que Marcos escreveu o
Evangelho e que a pregação de Pedro em Roma desempenhou um papel
central.19

Retrato de Marcos
Quem foi Marcos? Embora o nome fosse comum nos círculos romanos
(Marcus), a associação de Marcos com Pedro tanto por Papias quanto pela
tradição da igreja sugere que este Marcos mais provavelmente seja o João
Marcos a quem Lucas (At 12.12,25; 13.13; 15.37-39), Pedro (1Pe 5.13), e
Paulo (Cl 4.10; Fm 24; 2Tm 4.11) se referiram.20 Ele pode ser o jovem
referido no final do Evangelho, que fugiu da cena da prisão de Jesus
deixando para trás sua veste de linho (Mc 14.51,52), mas isso não é tão

497
certo.21 Sua mãe era um membro proeminente da igreja primitiva de
Jerusalém (At 12.12). Foi este mesmo Marcos que acompanhou seu tio
Barnabé e Paulo na primeira viagem missionária (At 12.25). O livro de
Atos registra que seu fracasso em concluir essa jornada resultou em uma
ruptura no relacionamento entre Barnabé e Paulo por causa de Marcos, que
mais tarde foi reparado (At 13.13; 15.37-40; veja Fm 24; Cl 4.10). Em
2Timóteo 4.11 Paulo escreveu sobre seu desejo de que Marcos se juntasse a
ele em Roma, mostrando que Deus pode restaurar ao ministério cristão
eficaz aqueles que já falharam.
Embora alguns estudiosos tenham tentado distinguir entre o evangelista
Marcos, um companheiro de Pedro (1Pe 5.13) e João Marcos, o associado
de Paulo em Atos e nas cartas paulinas, esses esforços foram amplamente
fracassados.22 A tradição posterior afirma que Marcos foi, no passado, bispo
de Alexandria, no Egito, e Hipólito de Roma (c. 170-236) o descreveu
como “dedo-curto” (Refutação de Todas as Heresias 7.30; veja também o
Prólogo Antimarcionista a Marcos). A Crônica Pascoal (séc. VII) afirmou
que ele morreu como um mártir. No entanto, é impossível determinar a
validade dessas três tradições.23

Dúvidas modernas
Estudos recentes com frequência têm procurado desacreditar a noção
tradicional da autoria marcana. Há vários argumentos por trás dessa
negação: (1) ocorrência de latinismos, que levam a refletir autoria não
judaica; (2) a falta geral de coloração judaica; (3) a explicação de termos e
costumes hebraicos; e (4) a alegada topografia confusa de Marcos 7.31, que
registra Jesus viajando para a Galileia e Decápolis, a sudeste de Tiro, por

498
meio de Sidom, ao norte. Outros motivos são: (1) a alegada falta de contato
com a teologia paulina, que indica que Marcos não poderia ter sido
companheiro de viagem de Paulo; (2) a forma negativa com a qual o autor
descreveu os discípulos, especialmente Pedro; e (3) a complexa história da
tradição demonstrada pela crítica da forma, da fonte e da redação, o que
exclui qualquer testemunha original da vida e ministério de Cristo.
Em resposta a essas objeções, deveria se observar que Marcos objetivou
seu Evangelho para uma audiência gentílica e, portanto, acomodou sua
apresentação a essa audiência em sua redação, embora também tenha usado
semitismos que refletiam a sua origem judaica. Com relação ao tortuoso
itinerário de 7.31, este teria sido natural para um pregador itinerante. A
teologia paulina está refletida na ênfase de Marcos na cruz, e a visão
negativa dos discípulos pode ter sido a maneira de Pedro de contrariar a
tendência que a igreja primitiva tinha de exaltar esses primeiros seguidores
de Jesus.24 Com relação à última objeção, a utilização de Pedro como uma
fonte primária não necessariamente exclui outras fontes, quer sejam escritas
ou orais. Além do fato de que nada sugere que Marcos não teve outras
fontes, a identificação das origens e o crescimento das tradições não é tão
segura como muitos críticos afirmam.25
Além do mais, como Carson e Moo salientaram, a abordagem moderna
dos Evangelhos como um produto de um longo e complexo processo da
história da tradição não tem necessariamente que conflitar com a ênfase na
relação direta entre Marcos e Pedro, que sofreu, desde Papias ao longo dos
séculos, uma conexão que mais tarde é confirmada no próprio Evangelho.
Dos quatro evangelistas, Marcos foi o que mais escrupulosamente registrou
os pecados e as fraquezas de Pedro, omitindo as menções favoráveis que o
apóstolo recebeu em outras passagens (como Mt 16.17). Em alguns casos

499
em que Mateus não mencionou Pedro pelo nome, Marcos o fez (5.37;
11.21; 16.7).26 Além disso, uma vez que Marcos era uma figura
relativamente obscura com um registro misto de ministério, é improvável
que ele tivesse sido escolhido como candidato à autoria por qualquer pessoa
que pretendesse atribuir o Evangelho a uma testemunha com autoridade.27
Entre outros fatores que podem apoiar a autoria de Marcos estão: (1) a
vivacidade e a rapidez de movimento e de detalhe com que esse Evangelho
foi escrito, o que pode sugerir um relato de testemunha ocular (em
associação com Pedro); (2), a dura e negativa descrição dos discípulos que
é, de forma mais plausível, explicada com base na suposição de uma
conexão apostólica; (3) a proeminência de Pedro no Evangelho; (4)
referências a Pedro que pode ter origem no próprio Pedro (como as
referências a Pedro “lembrando-se” em 11.21; 14.72); (5) o padrão geral
seguido pelo Evangelho, que parece refletir a pregação de Pedro em outras
passagens (At 10.36-41); e (6) evidências de uma relação estreita entre
Pedro e Marcos, indicada pela referência de Pedro a Marcos como “meu
filho” em 1Pedro 5.13.28

Data
A data do Evangelho de Marcos continua a ser objeto de considerável
debate. A mais antiga tradição, o Prólogo Antimarcionsita e Ireneu (Contra
Heresias 3.1.1; c. 130-200), datam este Evangelho após a morte de Pedro
(suposta em c. 65-66) e, portanto, durante o governo de Nero.29 Clemente de
Alexandria (c. 150-215), por outro lado, sugere uma data durante a época de
Pedro em Roma, que ele alegou ser algum momento entre os anos 45 e 65.30

500
Com base nas considerações históricas e de outro tipo, alguns têm
proposto uma data já nos anos 40. Assim, foi alegado, por exemplo, que a
“abominação que causa desolação” em 13.14 refere-se aos esforços do
imperador Calígula em 40 d.C. para colocar sua imagem no Templo de
Jerusalém.31 Uma data nos anos 50 e não mais tarde que 60 também
encontrou defensores com base no fato de Pedro estar em Roma nos anos
50 e também com base numa aceitação da prioridade marcana e uma data
para Lucas não posterior a 62. Carson e Moo propuseram uma data no final
dos anos 50 ou nos anos 60.32
Se, como sugere a tradição, Pedro contribuiu de forma significativa no
Evangelho de Marcos, então uma data muito precoce é improvável porque
Pedro provavelmente não chegou a Roma muito antes de 62. Isso pode ser
apoiado pelo fato de que Pedro não é mencionado nas Cartas da Prisão de
Paulo.33 Por essa razão, alguns estudiosos acreditam que o Evangelho de
Marcos foi escrito em algum momento em meados dos anos 60 após a
morte de Pedro.
Segundo a tradição, Pedro morreu como um mártir em Roma durante a
perseguição de Cristãos por Nero (64-66), de forma que o seu martírio é
geralmente datado de 65 ou 66.34 Com referência a Marcos 13, tido como
indicação da época da Revolta Judaica entre 66 e 70, Guelich e outros
sugerem 66-67 como data mais provável.35 Uma data mais tardia, no final
dos anos 70, também foi proposta por aqueles que veem Marcos 13 como
refletindo o saque de Jerusalém pelos exércitos romanos.
No entanto, Marcos 13 é melhor entendido como profético que como
sendo contemporâneo à época da escrita, e uma data final com base em
Marcos 13 deveria, portanto, ser considerada como desnecessária e
improvável.36 Se Marcos foi o primeiro a escrever seu Evangelho e se Lucas

501
usou Marcos ao escrever seu Evangelho, e uma vez que o livro de Atos foi
provavelmente escrito no início dos anos 60 e Lucas foi escrito antes disso,
então todos esses fatores colocariam a data mais provável para a escrita do
Evangelho de Marcos na segunda metade dos anos 50.

Procedência
É difícil determinar onde Marcos estava quando ele escreveu seu
Evangelho. Várias possibilidades foram sugeridas, tais como Galileia,
Decápolis, Tiro, Sidom, Síria, o Oriente e Roma. Tradicionalmente, a
procedência do Evangelho de Marcos foi identificada como as “regiões da
Itália” pelo Prólogo Antimarcionista, e Clemente de Alexandria (c. 150-
215), em suas obras Instituições e Disposições, situou-a em Roma durante o
ministério de Pedro (Eusébio, Hist. Ecl. 2.15; 6.14.6).37 João Crisóstomo
(Hom. Matt. 1.3; c. 347-407) até mesmo situou a origem do Evangelho de
Marcos no Egito, uma noção que provavelmente se originou com a
(insuficientemente comprovada) tradição de que Marcos uma vez serviu
como bispo de Alexandria.38 Para a maioria, a tradição associa o Evangelho
de Marcos a Pedro e, consequentemente, a Roma.39
Embora a evidência interna seja escassa, o pouco que existe aponta para
uma origem em Roma. Marcos usou um número considerável de latinismos.
Por exemplo, as duas moedas de cobre (lepta) que a pobre viúva depositou
na caixa de ofertas são explicadas como de valor igual a um quadrans
(quadrante) romano (também chamado de “léptons”, padram; 12.42), e o
palácio (aulē) ao qual os soldados levaram Jesus é chamado pretório
(residência oficial do governador; 15.16).40 Guelich observou que os
leitores no Oriente não teriam necessidade alguma de esclarecimento das

502
expressões gregas subjacentes, mas que esses esclarecimentos teriam sido
necessários para uma audiência ocidental em Roma. Mas ele também
salientou que esse argumento da linguagem “não é conclusivo, pois muitos
dos latinismos refletem expressões semitécnicas comuns aos militares e
comerciantes, e poderiam ser encontradas em qualquer área, como o
Oriente, ocupada por forças romanas”.41 No entanto, isso não desqualifica
Roma como o lugar mais provável de origem, embora o latim também fosse
falado em áreas fora de Roma.
Uma outra possível evidência apontando para uma origem romana é a
referência a Rufo em 15.21. Como Hendriksen disse: “Marcos é também o
único Evangelho que nos informa (15.21) que Simão de Cirene era ‘o pai de
Alexandre e de Rufo’, que evidentemente eram bem conhecidos em Roma
(veja Rm 16.13)”.42 Marcos também contava o tempo de acordo com o
método romano, referindo-se às quatro vigílias da noite em vez das três
tradicionais no cômputo judaico (6.48; 13.35).43 Além disso, as referências
ao sofrimento e perseguição no Evangelho de Marcos podem refletir a
perseguição dos cristãos em Roma. Outras evidências do NT incluem
1Pedro 5.13, o que coloca Marcos junto a Pedro na “Babilônia” (ou seja,
Roma) no início dos anos 60 aproximadamente na mesma época que
Marcos provavelmente escreveu seu Evangelho.44 Por essas e outras razões
uma origem em Roma é mais provável.

Destino
O caráter universal desse Evangelho foi observado por muitos, o que torna
difícil identificar um público específico para o Evangelho de Marcos. Mas
seu destino a um púbico não judeu é apoiado pelo fato de que vários termos

503
e expressões em aramaico são traduzidas para o grego: boanerges (“Filhos
do Trovão”, 3.17), talitha cumi (“Menina, levanta-te!”; 5.41), corbã (“uma
oferta relacionada ao Templo”; 7.11), Efatá (“seja aberto!”; 7.34), Bartimeu
(“filho de Timeu”; 10.46), Abba (“Pai”; 14.36), Gólgota (“Lugar da
Caveira”; 15.22) e Eloí, Eloí, lemá sabactáni; (“Deus meu Deus! Deus meu
Deus! Por que me desamparaste?”; 15.34).
Além disso, as leis e costumes judaicos são muitas vezes explicadas,
como a lavagem das mãos (7.3-5), o costume de sacrificar o cordeiro da
Páscoa no primeiro dia da Festa dos Pães sem Fermento (14.12) e o “dia da
preparação” sendo a véspera do sábado (15.42).45 Além disso, Marcos
mostrou interesse na suspensão dos elementos rituais na Lei mosaica,
especialmente nas leis relacionadas aos alimentos (veja 7.19).46 Embora isso
muito provavelmente forneça evidência da sua origem étnica não judaica,
isso pode refletir apenas que os leitores originais não estavam
familiarizados com certas formas do judaísmo e, portanto, Guelich sugeriu
que alegar mais vai além da evidência.47
Como mencionado, em apoio a um destinatário romano estão os
frequentes latinismos, a referência a Rufo e a utilização do método romano
de contar o tempo, que podem apontar não só para a origem do Evangelho
em Roma, mas também para um destinatário romano. A menção de moedas
romanas (lepta; 12.42) e o empréstimo de outras palavras latinas tais como
“Legião” (legiōn, 5.9), “executor” (spekoulator; 6.27), “açoitado”
(phragelloō, 15.15), “pretório” (praitōrion, 15.16) e “centurião” (kentyriōn,
15.39) combinam-se para emprestar ao Evangelho de Marcos um distinto
sabor romano que traduz uma origem e/ou destino romano plausível.
Uma outra possível evidência a esse respeito é que este Evangelho
atinge o seu clímax na confissão da divindade de Jesus por um centurião

504
romano (15.39). Assim, muitos acreditam que não é por acaso que um
romano expressa a confissão climática de Jesus como o Filho de Deus neste
Evangelho. Muito provavelmente Marcos construiu cuidadosamente sua
narrativa de modo a culminar sua apresentação de Jesus como o Filho de
Deus na confissão do centurião romano. Consequentemente, “o cristianismo
romano encontrou no Evangelho um relato especialmente adequado à sua
vida e seus problemas”.48
Para resumir, essa evidência interna sugere que os primeiros leitores de
Marcos eram mais provavelmente indivíduos de fala grega que não
conheciam hebraico ou aramaico e em grande parte não estavam
familiarizados com alguns costumes judaicos. Ao mesmo tempo, parece que
eles possuíam pelo menos um conhecimento básico do AT e uma
familiaridade com antigas tradições cristãs sobre Jesus.49 Juntamente com o
fato de que as primeiras evidências externas também apontam para uma
audiência romana, pode-se concluir que a pretendida audiência de Marcos
era muito provavelmente formada por cristãos gentios, muito
provavelmente situados em Roma.50 Além disso, o Evangelho é dirigido a
“todos os cristãos” que estão dispostos a lê-lo.51

Propósito
Várias tentativas foram feitas para identificar o propósito do Evangelho de
Marcos. O contexto de conflitos teológicos e as circunstâncias sociais e
políticas negativas da igreja primitiva foram frequentemente reunidos como
evidência de um propósito particular.52 Por exemplo, Garland disse que se
Marcos escreveu em 65-70, o contexto deste Evangelho é o de perseguição
e crise (veja especialmente Mc 13). Se Jerusalém estava prestes a ser

505
saqueada por uma legião romana ou se esse evento tinha acontecido
recentemente, Marcos pode ter escrito seu Evangelho (1) a fim de fortalecer
a fé das pessoas em risco de ser completamente dominadas pelo medo; (2)
para esclarecer a situação atual dos fiéis; (3) para admoestar, encorajar e
prevenir que os fiéis fossem iludidos por especulações sobre o final dos
tempos; (4) para equipar os seguidores de Cristo para se envolverem no
trabalho missionário em todo o mundo; e/ou (5) para fortalecer a sua fé em
Jesus, seu Senhor.53
Outros observam que o contexto geral de Marcos era provavelmente o
de uma severa perseguição aos cristãos durante o reinado de Nero (54-68).
Na verdade, a linguagem de Marcos desafia o mito imperial ao alegar que a
boa nova para o mundo está ligada a Jesus Cristo, o verdadeiro Filho de
Deus.54 Blomberg, que afirmou que uma origem romana é provável e
compatível com as evidências internas do Evangelho, escreveu:

O retrato negativo dos discípulos antes da formação da igreja, juntamente com a ênfase de
Marcos no caminho da cruz como o precursor da glória, sugere uma preocupação em
reassegurar a comunidade aflita de que ela também poderia eventualmente lutar e que a
vitória viria apenas por meio do sofrimento. Dada a expulsão dos judeus cristãos de Roma
em 49 d.C., as tensões crescentes dentro da comunidade e com o governo após o seu regresso
em meados dos anos 50 e a perseguição por Nero em 64-68 d.C., os cristãos romanos teriam
formado uma audiência muito necessitada de tal conforto e encorajamento. Em outras
palavras, as preocupações de Marcos podem ter sido antes de tudo, pastorais em sua
natureza.55

Outros estudiosos identificaram o propósito de Marcos como sendo um


dos seguintes: (1) escatológico: preparar os cristãos para o retorno iminente
de Jesus;56 (2) cristológico: uma polêmica contra o mito de um homem
divino (theios anēr);57 (3) apologético: uma tentativa de mascarar as
implicações políticas da vida e morte de Jesus.58 No entanto, a natureza

506
geral do Evangelho não permite reconstruções históricas ou teológicas
específicas desta natureza.
Como acontece com os outros escritores dos Evangelhos, o principal
problema que confronta Marcos é explicar a crucificação de Jesus. Por que
alguém deveria acreditar em um suposto operador de milagres messiânico
que acabou sendo crucificado como um criminoso comum? Em resposta a
essa objecção, Marcos escreveu “uma apologia [ou apologética] da cruz”,
alegando ser justamente como crucificado que Jesus provou ser o Rei
messiânico e o Filho de Deus.59 A morte do Messias não foi predita apenas
na Escritura do AT; ela também foi repetidamente prevista pelo próprio
Jesus (8.31; 9.31; 10.33,34) e foi exigida como “um resgate por muitos”
(10.45), ou seja, como um sacrifício substitutivo e expiatório pelo pecado.

QUADRO 5.1: QUESTÕES TEXTUAIS NO


EVANGELHO DE MARCOS
O Evangelho de Marcos tem dois importantes problemas textuais
relacionados ao seu início e ao seu final. Em 1.1, “Filho de Deus”
(huios theou) é omitido em alguns poucos manuscritos importantes
mais antigos, o que pode ser devido a um descuido na cópia. No
entanto, a frase é encontrada na maioria dos manuscritos antigos e
importantes. Embora os escribas tivessem uma tendência de expandir
títulos e quase-títulos de livros, a evidência textual em favor desta
leitura é, no entanto, extremamente forte.1
Com relação ao final de Marcos, quatro finais diferentes são
encontrados nos manuscritos sobreviventes. O final mais curto, que
não tem os doze versículos finais depois de Marcos 16.8, é apoiado

507
pelos dois manuscritos gregos mais antigos, o Códice Sinaítico e o
Códice Vaticano, um antigo códice latino e outros manuscritos
siríacos, armênios e georgianos. Nem Clemente de Alexandria (c. 150-
215) e nem Orígenes (c. 185-254) parecem ter tido conhecimento da
2
existência de um final mais longo.
O final tradicional de Marcos (16.9-20), com o qual muitos leitores
estão familiarizados e que inclui algumas das aparições após a
ressurreição de Jesus, seu comissionamento dos discípulos e sua
ascensão, vem a nós através da Versão Autorizada e outras traduções
do Textus Receptus. Ele está presente na grande maioria dos
testemunhos, incluindo o Códice Alexandrino.3 Os outros dois finais
mais longos incluem uma versão que insere um versículo entre os
versículos 8 e 9, e uma forma expandida do final tradicional.4
A natureza conflitante das evidências externas que apoiam os
finais mais longos parece sugerir que nenhuma dos finais mais longos
é provavelmente o original com Marcos. Evidências internas apoiam
fortemente esta conclusão. Os finais mais longos contêm vocabulário e
expressões que não são de Marcos, em alguns casos mostram um
estilo diferente e não fluem suavemente a partir do versículo 8. Há
também referências dúbias a beber alguma coisa mortífera e a pegar
em serpentes (16:18), que situam os finais mais longos na categoria
mais provável de material lendário apócrifo do século II ou III do que
na época de Jesus e dos apóstolos.
Por essas e outras razões, as evidências externas e considerações
internas apontam para a probabilidade de que o final mais longo de
16.9-20 não foi escrito por Marcos. O Evangelho de Marcos termina
subitamente em 16.8. Metzger sugere três possibilidades para esse

508
final abrupto: (1) Marcos pretendia terminar seu Evangelho neste
momento; (2) o Evangelho nunca foi terminado; ou (3) sua última
folha foi acidentalmente perdida antes de o Evangelho ser
multiplicado por transcrição (ou o final original foi perdido por algum
outro motivo). Destas, alguns estudiosos julgam que a última opção é
a mais provável, embora não pareça haver nenhuma razão convincente
para não se aceitar Marcos 16.8 como o final original pretendido por
5
Marcos.

1
B. M. Metzger, org., A Textual Commentary on the Greek New Testament, 2. ed. (New

York: United Bible Societies, 2002), p. 62.


2
Eusébio e Jerônimo atestaram que esta passagem está ausente “de todas as cópias gregas

de Marcos conhecidas por eles” (Metzger, Textual Commentary, p. 103).


3
Ibid.
4
Ibid. Possui uma breve seção após o versículo 14 (encontrada em um único manuscrito

grego, Códice Washingtoniano); contém várias palavras e expressões que não são de Marcos;

possui evidências externas extremamente limitadas; e possui um tom apócrifo. Muito

provavelmente é uma inserção “de um escriba do século II ou III que desejava suavizar a

severa condenação dos Onze em 16.14” (ibid., p. 104).


5
Veja Metzger, Textual Commentary, p. 104-106, para uma discussão mais completa;

Carson e Moo (Introduction to the New Testament, p. 189-190) observaram que a opção mais

popular é que Marcos parou no versículo 8; mas cf. R. H. Stein (“The Ending of Mark”, BBR

18 [2008], p. 79-98), que defendeu que o presente texto está incompleto e que apontou outros

comentários importantes que apoiam essa conclusão. Para um recente levantamento das

posições, veja D. A. Black, org., Perspectives on the Ending of Mark: 4 views (Nashville:

B&H, 2008).

509
Uma via adicional para determinar o provável propósito de Marcos é a
declaração de abertura do seu Evangelho, que indica que o principal
objetivo da narrativa de Marcos é a demonstração de que Jesus é o Filho de
Deus (1.1).60 No Evangelho que se seguiu, uma diversidade de pessoas tais
como Deus (que se refere a Jesus como seu “Filho amado” no batismo de
Jesus e na transfiguração; 1.11; 9.7); demônios (1.25; 3.11,12; 5.7), o
próprio Jesus (12.6; 14.61); e um centurião romano (15.39) concordam que
Jesus é o Filho de Deus.61 Em apoio a essa alegação, a audiência romana de
Marcos foi tratada com uma deslumbrante exibição do poder milagroso de
Jesus, que atesta a sua autoridade sobre os reinos da natureza, enfermidades
e morte, e até sobre o reino sobrenatural (4.35 a 5.43).62
De modo geral, portanto, é possível discernir quatro propósitos inter-
relacionados no Evangelho de Marcos, dos quais todos giram em torno da
identidade de Jesus como Filho de Deus: (1) um propósito pastoral: ensinar
os cristãos sobre a natureza do discipulado; (2) um propósito de
treinamento missionário: explicar como Jesus preparou os seus seguidores
para assumirem sua missão e também mostrarem aos outros como fazê-lo;
(3) um propósito apologético: demonstrar aos não cristãos que Jesus é o
Filho de Deus por causa de seu grande poder e apesar de sua crucificação; e
(4) um propósito anti-imperial: mostrar que Jesus, não César, é o
verdadeiro Filho de Deus, Salvador e Senhor.

LITERATURA
Plano Literário
Marcos é um Evangelho rico em ação, cujo estilo é caracterizado pela
compacidade, concretude, vivacidade e ordem. O uso frequente que Marcos

510
faz da palavra “imediatamente” (euthus), particularmente na primeira
metade do Evangelho, avança a narrativa em um ritmo rápido, enquanto
suas descrições mais detalhadas adicionam cor (veja relatos paralelos mais
resumidos em 2.1-12; 5.10-20). Hendriksen observou o estilo vívido de
Marcos expresso em suas descrições gráficas dos atos, gestos e emoções de
Jesus, a sua atenção ao detalhe em relação ao local e tempo, e sua frequente
mudança do tempo verbal.63
No entanto, Marcos tem também o grego menos polido dos quatro
Evangelhos, e suas sentenças são muitas vezes simples e diretas, um estilo
que conferiu ao seu Evangelho a reputação de ser “bárbaro” ou “não
refinado”.64 No entanto, Lane sugeriu que “é melhor compreendê-lo como
apoiando uma consciência literária ou mesmo uma intenção teológica.
Construção de sentenças simples, parataxes, discurso direto e o presente
histórico servem para fazer de Jesus o contemporâneo de quem ouve ou lê o
65
relato”.
Marcos frequentemente justapõe relatos contrastantes colocando-os um
após o outro ou inserindo um relato no outro (veja 3.7-19 e v. 20-35), bem
como incluindo relatos paralelos por causa da ênfase (veja 6.35-44 e 8.1-
10).66 Ao longo de seu Evangelho, Marcos procurou demonstrar por meio
de citações diretas e alusões ao AT que a vinda de Jesus constituiu o
cumprimento da profecia do AT e que seus atos poderosos provaram que ele
era o Filho de Deus.
O Evangelho de Marcos consiste de duas seções principais que retratam
Jesus como o Messias poderoso (1.1 a 8.26) e o Servo Sofredor (8.27 a
16.8). A trama é centrada no “Evangelho de Jesus Cristo, o Filho de Deus”
(1.1). O desenvolvimento desse enredo envolve conflito. No entanto, como
Rhoads e Michie explicaram com relação à narrativa de Marcos, “embora

511
Jesus seja a causa imediata dos conflitos, a história mostra que Deus é a
origem última de muitas das ações e eventos da história”.67 A questão da
identidade de Jesus também emerge como corolário desse tema de conflito,
complicada ainda mais por injunções do próprio Jesus de ter sua identidade
mantida em segredo (o “segredo messiânico”) e da falha dos discípulos em
compreender quem Jesus realmente era (os temas da “falha dos discípulos”
e do “mal-entendimento”).
A própria história é estabelecida em um período de tempo
indeterminado entre o batismo de Jesus e sua morte e na mudança de
localidades geográficas que abrangem a Galileia e regiões vizinhas, a
Transjordânia, chegando finalmente a um encerramento dramático em
Jerusalém. Essa compacidade pode sugerir que os eventos ocorreram no
período de um ano, especialmente em vista do fato de que apenas uma
Páscoa é mencionada. No entanto, Guelich corretamente declarou que
“apesar de procurar proporcionar ao leitor uma narrativa conectada, o
evangelista não faz nenhuma afirmação sobre a extensão da cronologia ou a
integralidade de sua história”.68 A primeira seção é repleta de ação e centra-
se nos milagres de Jesus e nas histórias de curas, controvérsias e parábolas.
Marcos apresentou o ministério de Jesus primeiro na Galileia e, em seguida,
em Jerusalém. Blomberg observou que “Marcos acaba de descrever uma
oposição significativa a Jesus, parece trazer a seção a seu fim e então
começa novamente com Jesus se afastando da hostilidade e chamando ou
comissionando seus discípulos para outro serviço em um novo local (3.7;
6.6b)”.69
O principal momento crítico no Evangelho é a confissão que Pedro faz
de Jesus na estrada para Cesareia de Filipe (8.27-30), que também fornece
uma apta introdução à segunda seção. Na segunda metade de sua narrativa,

512
Marcos põe seu foco no ensino de Jesus sobre seu iminente sofrimento e
morte. Dois marcadores-chave nessa segunda metade incluem a entrada
triunfal de Jesus em Jerusalém e a referência à vinda da Páscoa (11.1;
14.1).70 Os eventos da cruz ocupam o centro do palco tanto tematicamente
quanto na proporção de tempo gasto com eles, mostrando a importância
deste evento para Marcos. Por todo seu Evangelho, Marcos apresentou
referências selecionadas a Jesus como Filho de Deus, começando com a
sentença de abertura em 1.1 e culminando com a confissão do centurião em
15.39 (veja também 1.11; 3.11; 5.7; 9.7; 12.6; 13.32; 14.61).

ESTRUTURA
A estrutura do Evangelho de Marcos se apresenta da seguinte maneira.71

I. Jesus, o Filho de Deus, como o Messias poderoso (1.1 a 8.26)


A. A preparação para o ministério de Jesus no deserto (1.1-13)
1. Abertura (1.1)
2. A pregação de João Batista no Deserto (1.2-4)
3. João Batiza no Jordão (1.5-8)
4. O batismo de Jesus no Jordão (1.9-11)
5. A tentação de Jesus no deserto (1.12,13)
B. O início do ministério de Jesus na Galileia (1.14 a 3.35)
1. Resumo e resposta Inicial (1.14-45)
2. Controvérsia com os líderes religiosos (2.1 a 3.6)
a. Jesus cura um paralítico (2.1-12)
b. O chamado de Mateus e o ministério de Jesus aos pecadores
(2.13-17)
c. Sobre o jejum e o sábado (2.18-28)

513
d. Jesus cura um paralítico (3.1-6)
3. Resumo e decisão inicial (3.7-35)
a. O ministério messiânico de Jesus (3.7-12)
b. O chamado dos Doze (3.13-19)
c. A verdadeira mãe e os verdadeiros irmãos de Jesus (3.20-35)
C. O ministério de Jesus na Galileia e arredores do mar da Galileia (4.1
a 8.26)
1. Ciclo 1: Respostas a Jesus e provas de sua autoridade (4.1 a
5.20)
b. A Parábola do Semeador e o propósito das parábolas (4.1-20)
c. Outras parábolas e ilustrações (4.21-41) c. A expulsão de uma
legião de demônios (5.1-20)
1. Intervalo: Fé e descrença (5.21 a 6.29)
1. A cura da filha de Jairo e da mulher com hemorragia (5.21-43)
b. Jesus rejeitado em Nazaré (6.1-6a)
c. O comissionamento dos Doze (6.6b-13)
d. A decapitação de João Batista (6.14-29)
2. Ciclo 2: Mais demonstrações da autoridade messiânica de Jesus
(6.30-56)
a. A alimentação dos 5 mil (6.30-44)
b. Caminhando sobre as águas (6.45-52)
c. Curas milagrosas (6.53-56)
3. Intervalo: Questões do coração (7.1-37)
a. A tradição dos anciãos e a verdadeira impureza (7.1-23)
b. A fé da mulher siro-fenícia (7.24-30)
c. Jesus cura um surdo (7.31-37)

514
4. Ciclo 3: Montagem da oposição e a continuação do ministério
messiânico de Jesus (8.1-26)
a. A alimentação dos 4 mil (8.1-10)
b. O fermento dos fariseus e de Herodes (8.11-21)
c. Jesus cura um homem cego (8.22-26)

II. Jesus, o Filho de Deus, como o Servo Sofredor (8.27 a 16.8)


A. O ministério de Jesus no caminho de Jerusalém (8.27 a 10.52)
1. Primeira predição da Paixão e resposta (8.27-38)
2. Intervalo: Jesus como o Poderoso Filho de Deus (9.1-29)
a. A Transfiguração (9.1-13)
b. A cura de um endemoninhado (9.14-29)
3. Segunda predição da Paixão e resposta (9.30-50)
4. Intervalo: Jesus como Mestre com autoridade (10.1-31)
a. a. O ensinamento de Jesus sobre o divórcio (10.1-12)
b. Jesus acolhe as crianças (10.13-16)
c. O jovem rico e o seguir a Jesus (10.17-31)
5. A terceira predição da Paixão e resposta (10.32-45)
6. A cura do cego Bartimeu (10.46-52)
B. O ministério de Jesus no Templo (11.1 a 13.37)
1. A primeira viagem ao Templo: a Entrada Triunfal (11.1-11)
2. A segunda viagem ao Templo: Purificação do Templo (11.12-19)
3. A terceira viagem ao Templo: Desafios e Ensinamentos (11.20 a
13.37)
a. A lição da figueira (11.20-26)
b. Rechaçando um desafio à autoridade de Jesus (11.27-33)
c. A Parábola dos Agricultores Maus (12.1-12)
d. O pagamento de impostos a César (12.13-17)

515
e. O desafio a Jesus sobre a ressurreição (12.18-27)
f. Os dois mandamentos mais importantes (12.28-34)
g. Outros ensinamentos de Jesus (12.35-40)
h. A oferta da viúva pobre (12.41-44)
i. O ensinamento de Jesus sobre o final dos tempos (13.1-37)
C. A morte de Jesus na cruz e a ressurreição (14.1 a 16.8)
1. A unção em Betânia e o plano da traição (14.1-11)
2. A Última Ceia (14.12-25)
3. A oração e prisão no Getsêmani (14.26-52)
4. O julgamento perante o Sinédrio e as negações de Pedro (14.53-72)
5. O julgamento perante Pilatos e a zombaria dos soldados (15.1-20)
6. A crucificação e o sepultamento (15.21-47)
7. A ressurreição (16.1-8)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Jesus, o Filho de Deus, como o Messias Poderoso
(1.1 a 8.26)
A. A preparação para o ministério de Jesus no
deserto (1.1-13)
O prólogo que abre a história de Marcos imediatamente informa o leitor de
que Marcos está prestes a contar uma história que fala sobre aquele a quem
ele se refere como “Jesus Cristo, o Filho de Deus” (1.1).72 Ele começa
baseando sua história no AT, nas palavras do profeta Isaías (na verdade,
uma fusão de Ml 3.1 e Is 40.3), portanto efetivamente anunciando que “o
ministério de João cumpre a divina profecia e identifica Jesus como o Filho

516
73
amado e como aquele que lhes entregaria o Espírito”. João Batista
desempenhou seu papel ordenado por Deus quando batizava no deserto, um
lugar eminentemente apropriado por causa de seu simbolismo como um
lugar de novos começos e de renovação (veja Êx 2.15; 1Sm 23.14; 1Rs
74
19.3,4), e era um batismo que ele realizava como preparação para a vinda
do Messias e do reino de Deus. Antes de Jesus começar sua obra ele se
submeteu ao batismo de João, momento significativo no qual sua filiação
foi declarada pelo próprio Deus enquanto o Espírito Santo descia sobre ele
(Mc 1.11). Ele foi posteriormente conduzido ao deserto pelo Espírito Santo
para passar por um período de tentação por Satanás. Sua vitória sobre
Satanás estabeleceu o padrão para a narrativa que continua a se desenrolar.

Algo Para Pensar: Andando nas Águas da Vida

Poucos milagres de Jesus são tão surpreendentes quanto o seu


caminhar sobre as águas (6.45-52). Como sua transformação de uma
grande quantidade de água em vinho, este milagre da natureza
desafia a explicação humana — não que os descrentes não tenham
tentado explicar o evento fornecendo uma explicação naturalista.
Recentemente, por exemplo, alguém sugeriu que Jesus estava
simplesmente pulando de uma pedra para outra, escondidas logo
abaixo da superfície das águas. Isso merece o prêmio de primeiro
lugar em imaginação, mas é uma tentativa tão transparente de
explicar o inexplicável que instantaneamente se coloca no ridículo e
nos diz muito mais sobre a incredulidade da pessoa que propõe a
“solução” do que sobre o que mais provavelmente aconteceu.

517
Desde o período do Iluminismo, os deístas e outros
antissobrenaturalistas têm procurado conceber simples cenários do
tipo causa e efeito que drenaram os milagres da Escritura. Um deles
foi um fundador importante dos Estados Unidos, Thomas Jefferson,
que estabeleceu os “princípios de um deísmo puro” supostamente
ensinado por Jesus, “omitindo a questão da sua divindade”. A Bíblia
Jefferson, não publicada até 1895 pelo neto de Jefferson, começa
com um relato do nascimento de Jesus que omite todas as referências
aos anjos, profecias, milagres, à Trindade ou à divindade de Jesus. A
Bíblia se encerra com as palavras: “Agora, no lugar onde ele foi
crucificado, havia um jardim; e no jardim, um sepulcro novo, onde
nenhum homem ainda havia sido posto. Nele eles colocaram Jesus. E
rolaram uma grande pedra para fechar a entrada do sepulcro e se
foram”. Fim da história! Nenhuma ressurreição.
Quão diferente é este relato dos relatos testemunhais sobre Jesus
na Escritura! É altamente improvável que alguém tivesse fabricado o
tipo de história onde Jesus andou sobre as águas e disse a Pedro
para sair do barco e andar sobre as águas em sua direção, a menos
que ele realmente lembrasse desse evento. Andar sobre as águas, por
sua vez, claramente evocaria a memória da Escritura, segundo a
qual Deus “sozinho estende os céus e anda sobre as ondas do mar”
(Jó 9.8). Ao verem Jesus, seus seguidores ficaram tão assustado que
pensaram que ele era um fantasma e gritaram. Mais tarde Marcos
diz que “os discípulos ficaram completamente impressionados” e “o
coração deles estava endurecido” (6.51,52). No entanto, quando
Jesus deu seu último suspiro, o centurião romano diante dele na cruz

518
exclamou: “Este homem verdadeiramente era o Filho de Deus!”
(15.39).
“Que tipo de homem é este? — Até os ventos e o mar lhe
obedecem!” (Mt 8.27).

B. O ministério inicial de Jesus na Galileia (1.14 a


3.35)
Enraizando a missão de Jesus no ministério de João Batista (1.2,3), o
evangelista mostrou como Jesus começou a chamar e a treinar um seleto
grupo de seguidores para a sua tarefa missionária. No relato que Marcos faz
das atividades de Jesus na Galileia, o ministério de pregação e cura de Jesus
é tido como o padrão para os seus discípulos imitarem (veja 1.14,15, 21-28,
34 e 6.12,13).75
À medida que a narrativa avança, Jesus chamou os seus seguidores a
participarem de uma forma mais plena de sua própria missão messiânica:
ele os retirou de sua vocação natural para que o seguissem (1.16-20; 2.13-
17); ele escolheu os Doze “para que estivessem com ele” (3.13-19), e no
clímax da primeira parte deste Evangelho, ele os enviou em uma missão
(6.6b-13). No início de seu ministério, Jesus se dissociou de seus laços
sanguíneos e afirmou as novas formas de parentesco. Ele redefiniu quem
eram sua mãe e seus irmãos verdadeiros (3.31-35) e foi rejeitado em
Nazaré, sua cidade natal (veja 6.1-6a).
O importante princípio de acesso com base espiritual em vez de
distinções étnicas pavimenta o caminho para a futura extensão do
evangelho aos não judeus.76 Ele também demonstra a natureza do
verdadeiro discipulado: seguir a Jesus envolve conflito, a rejeição pelo

519
próprio povo e até mesmo o carregar a própria cruz. Ao distanciar-se de sua
própria família, Jesus modelou em sua própria vida uma postura em relação
ao ser membro do reino que os discípulos deveriam imitar em seus
relacionamentos de um para com o outro e em sua missão.77

C. O ministério de Jesus na Galileia e nos arredores


do mar da Galileia (4.1 a 8.26)
Já em 3.6, o leitor é informado de que os fariseus e os herodianos traçaram
um plano para matar Jesus (cf. 8.15; 12.13). Embora essa rejeição de Jesus
pelos representantes oficiais do judaísmo não o tenha feito abandonar sua
missão aos judeus, ela lhe deu maior exposição aos gentios.78 Isso inclui a
cura de Jesus do endemoninhado geraseno em 5.1-20; seu encontro com a
mulher siro-fenícia em 7.24-30; e sua alimentação da multidão em 8.1-10,
uma reminiscência da alimentação milagrosa dos gentios realizada por
Eliseu em 2Reis 4.42-44.79 No entanto, quando Jesus, por exemplo,
restaurou o endemoninhado geraseno à sanidade, ele não convidou o gentio
restaurado a participar de sua missão messiânica, mas o enviou para casa
para contar ao seu próprio povo o que tinha acontecido com ele.
Em seu relato sobre o envio dos Doze, Marcos, ao contrário de Mateus
(Mt 10.5,6) não limita explicitamente a sua missão a Israel (6.6b-13). No
entanto, o ministério de Jesus na primeira parte do Evangelho é dedicado
principalmente aos judeus (veja especialmente 7.26a). Depois da
identificação equivocada por Herodes de Jesus como João Batista
ressuscitado (6.14-29), da alimentação que Jesus fez dos 5 mil e de seu
caminhar sobre as águas (6.30-52), a oposição montada contra Jesus levou-
o a se retirar da Galileia. Ele se mudou primeiro para a região de Tiro e

520
Sidom, a norte da Galileia (7.24-30), depois para Decápolis, a leste da
Galileia (7.31 a 8.12) e, finalmente, para Cesareia de Filipe, no extremo
norte (8.27 a 9.32).
Ao longo de toda a sua narrativa, Marcos não só enfatizou o mau
entendimento e a dureza de coração dos discípulos, mas também retratou o
aumento de sua participação na missão de Jesus (veja 6.41). O contexto
essencialmente judaico de Jesus é gradualmente quebrado. Isto é realizado
pela acusação que Jesus faz da incredulidade dos judeus (7.6,7; cf. Is
29.13), pelo seu frequente afastamento da Galileia (7.24 a 9.32) e pela sua
declaração de que todos os alimentos são puros (7.19). Contudo o mais
anunciado é o incidente com a mulher gentia siro-fenícia, que desejava que
Jesus expulsasse um demônio de sua filha, mas que é inicialmente rejeitada
por Jesus (7.24-30). Somente depois de a mulher aceitar o fato de que a
missão de Jesus é, em primeiro lugar e principalmente dirigida aos judeus,
Jesus atende a seu pedido.80

II. Jesus, o Filho de Deus, como o Servo Sofredor


(8.27 a 16.8)
A. O ministério de Jesus a caminho de Jerusalém
(8.27 a 10.52)
Após a confissão que Pedro de Jesus como o Cristo (8.29,30) — que
ocasiona um padrão repetido três vezes da predição da Paixão, falha do
discipulado e instrução sobre o verdadeiro discipulado (8.27 a 9.1; 9.30-41;
10.32-45) — o “segredo messiânico” é gradualmente revelado, pelo menos
para os discípulos (1.34,44,45; 3.12; 5.43; 7.36,37; 8.26,29,30; 9.9). No
entanto, enquanto os discípulos não conseguem entender a dinâmica interna

521
da cruz, eles ainda não reconhecem a sua missão, uma vez que esta missão
é contingente aos discípulos seguirem Jesus no caminho da cruz (veja
8.34).81
Até 8.26, Jesus ministrou na Galileia e dela não se afastou de forma
permanente até 10.1. Toda a seção de 8.27 a 10.52 é apresentada como uma
viagem de Cesareia de Filipe a Jerusalém (veja 9.30,33; 10.1,17,32,46,52).82
Curiosamente, Marcos limitou a ocorrência da proclamação do evangelho
totalmente à Galileia (veja 1.14,38,39,45; 3.14; 5.20; 6.12; 7.36). As duas
únicas referências à pregação do evangelho na seção de Jerusalém de
Marcos se referem à futura proclamação da boa nova para os gentios. Além
disso, um futuro encontro entre Jesus e os discípulos é sugerido em 14.28 e
16.7, o que dirige a atenção do leitor ainda mais para a Galileia.

B. O ministério de Jesus no Templo (11.1 a 13.37)


Seguindo a entrada de Jesus em Jerusalém (11.1-11), Marcos usou cenas
dos arredores do Templo judaico para chamar a atenção para a mudança
acentuada que adviria como resultado do ministério de Jesus e sua rejeição
pelos judeus.83 Assim, Marcos se referiu ao Templo como uma casa de
oração para todas as nações (veja a citação de Is 56.7 em 11.17), indicando
que os particularismos da adoração judaica tinha chegado ao fim e que o
Templo seria logo substituído por uma “casa de oração” escatológica.84 A
maldição da figueira, com lições acompanhantes a respeito de sua
importância (11.12-14, 20-26; 13.28-31), também chama a atenção para a
rejeição dos judeus como um resultado de sua rejeição de Jesus como
Messias. Lane chamou a maldição da figueira por Jesus de “um profético

522
sinal de advertência de uma ação judicial de Deus contra a nação […]
equivalente em função ao cap. 2.9”.85
O clímax é atingido na Parábola dos Lavradores da Vinha (12.1,2), onde
Jesus declarou que a vinha de Deus seria tirada dos judeus e entregue a
outros (veja 12.9). Esses “outros” entram em cena especialmente durante
discurso escatológico de Jesus no capítulo 13, que uma vez mais é
ocasionado por uma cena no Templo. Jesus, depois de predizer a destruição
do Templo, informou a seus discípulos que a vinda gloriosa do Filho do
Homem seria precedida pela pregação do evangelho a todas as nações.
Assim “Marcos com efeito identifica a atividade da comunidade entre o
próprio ministério de Jesus e o final cataclísmico do mundo como um
momento de proclamação universal e testemunho”.86

C. A morte de Jesus na cruz e a ressurreição (14.1 a


16.8)
A última seção principal do Evangelho de Marcos começa com a unção de
Jesus e com a instituição da Ceia do Senhor. Essa cena íntima é contrastada
com a dura realidade do julgamento de Jesus perante o Sinédrio (14.53-65).
No ponto alto do julgamento judeu, Jesus respondeu afirmativamente à
pergunta do sumo sacerdote sobre ele ser o Messias (v. 61), o filho do Deus
Bendito (veja Jo 20.30,31). Em contraste, Jesus se absteve de responder à
pergunta de Pilatos sobre ele ser ou não o rei dos judeus, presumivelmente
devido à conotação política do termo (15.2). Assim, o leitor é levado a
compreender que Jesus é o Messias em termos das expectativas judaicas do
AT, mas não um rei em termos políticos romano (veja Jo 18.36).

523
Finalmente, no clímax do Evangelho de Marcos, o centurião romano
exclamou ao pé da cruz, “Este homem era verdadeiramente o Filho de
Deus” (15.39), indicando que agora o segredo messiânico foi revelado até
mesmo para os gentios (romanos), de modo que o poder missionário do
sofrimento e morte de Jesus foi estendido também aos não judeus. Se há
verdadeiramente um equivalente marcano para a “Grande Comissão” de
Mateus, a confissão do centurião certamente se qualificaria. Na verdade, o
fato de que não foi um judeu, mas sim um gentio que confessou Jesus no
final de Marcos é altamente significativo para a força da narrativa do
Evangelho.87 Ao mesmo tempo, certamente não é nenhuma coincidência
que uma confissão cristológica feita por um gentio (veja a confissão
“judaica” de Pedro em 8.29) não seja proferida até depois da morte de
Jesus. Se 16.8 é de fato o final original do Evangelho de Marcos, o relato
conclui com uma nota de receio por parte das seguidoras de Jesus, um
estado de coisas que pode se assemelhar ao estado do cristianismo em
Roma na época da escrita. O final abrupto deixa em aberto para o leitor
como o anúncio de Jesus de que ele encontraria os discípulos na Galileia
seria cumprido (veja 14.28; 16.7).

TEOLOGIA
Temas Teológicos
Jesus como o Filho de Deus
O tema teológico preeminente no Evangelho de Marcos é que Jesus é o
operador de milagres e legítimo Filho de Deus. Começando com a
declaração de abertura de Marcos em 1.1, referências estratégicas a Jesus

524
como o Filho de Deus são distribuídas por todo o Evangelho. A tabela
seguinte mostra essas referências no Evangelho de Marcos e inclui também
a respectiva pessoa ou pessoas que proferem a declaração.

Tabela 5.1: Jesus como o Filho de Deus no Evangelho de Marcos


1.11 Marcos
Introdução 1.11 Deus
3.11 Demônios
5.7 Demônios
Ministério na Galileia 9.7 Deus
12.6 Jesus
13.32 Jesus
Caminho para a cruz 14.61 Caifás
15.39 Centurião romano

A tabela indica que este tema constitui o encerramento completamente


abrangente da narrativa marcana. O evangelista estrutura sua narrativa em
termos de Jesus ser o Filho de Deus no versículo de abertura e na climática
confissão do centurião romano em 15.39. Isso não é coincidência, uma vez
que a audiência de Marcos era a igreja em Roma e é apropriado que a
última referência a Jesus como Filho de Deus no Evangelho devesse ser
proferida por um romano. Evans observou que “a confissão do centurião de
que Jesus era ‘verdadeiramente’ filho de Deus (15.39) é o equivalente à
deificação romana de seus imperadores mortos, mas a descoberta do túmulo
vazio e o anúncio (angelical?) de que que ele ressuscitou (16.4-7) fornecem
divina confirmação da veracidade das predições de Jesus”.88

525
No início da narrativa, Jesus é declarado pela voz celeste ser o Filho de
Deus (1.11) no seu batismo e na transfiguração (9.7). Além das duas
autorreferências de Jesus (12.6; 13.32) e da pergunta de Caifás no
julgamento de Jesus (14.61), os únicos outros personagens no Evangelho de
Marcos que reconhecem que Jesus é o Filho de Deus são demônios (embora
a confissão que Pedro fez de Jesus como o Messias seja, no entanto,
imediatamente revelada como carecendo de entendimento total, 8.31-33).
Notavelmente, os demônios são os únicos a reconhecer Jesus como Deus
durante todo o seu ministério galileu (1.16 a 8.26).
No Evangelho de Marcos, além de Deus, Jesus e os demônios, ninguém
entende que Jesus é o Filho de Deus antes da crucificação. Essa falta de
compreensão trabalha lado a lado com outros dois grandes temas de
Marcos, o “segredo messiânico” e o “fracasso do discipulado”. Evans disse
que “apesar da rejeição nas mãos de seu próprio povo (e as pessoas mais
importantes de acordo com as medidas contemporâneas de importância) e
uma morte vergonhosa nas mãos das pessoas mais poderosas, Jesus era
realmente o filho de Deus, verdadeiro salvador e Senhor da humanidade”.89
Em um contexto em que imperadores romanos frequentemente
atribuíam divindade a si mesmos, a apresentação que Marcos faz de Jesus
como o Filho de Deus é profundamente contracultural. Ao mesmo tempo, o
contexto do AT no qual o Rei Davídico era considerado o Filho de Deus
também era claramente um fator (veja em especial Sl 2.7; cf. Sl 110.1). E de
fato, o Evangelho de Marcos tem um apelo tanto aos judeus quanto aos
gentios. Blomberg argumentou que em seu relato sobre Jesus, a
preocupação de Marcos era conseguir um equilíbrio entre duas verdades
essenciais que dizem respeito tanto a Jesus quanto aos seus discípulos.
Essas são a centralidade da cruz e da glória de Jesus através do sofrimento

526
(veja especialmente 8.31 a 9.1).90 Na verdade, Jesus frequentemente fazia
alusão à sua morte e ressurreição vindouras (8.31; 9.31; 10.33,34) e de uma
forma direta falou a Caifás, o sumo sacerdote judeu, de seu glorioso retorno
(14.62).
Essa é também a tese de R. Martin, que diz que o Evangelho de Marcos
habilmente equilibra uma ênfase na divindade de Jesus com sua
humanidade.91 Os títulos cristológicos que Marcos usa, particularmente o
título de “Filho de Deus” que ocorre em momentos significativos neste
Evangelho, exemplificam esse equilíbrio. A justaposição que Marcos faz
dos “sucessos” e “fracassos” de Cristo, seus poderosos feitos e seu
sofrimento e morte, destaca essa perspectiva teológica distintamente
marcana sobre a vida e a obra de Jesus.92

O Reino de Deus
Outro tema marcano importante é o reino de Deus, proclamado por Jesus
(1.15), caracterizado em várias parábolas (4.11,26,30) e proferido na forma
de requisitos de entrada (9.47; 10.14,15, 23-25; 11.10; 12.34; cf. 9.1; 14.25;
15.43). O estabelecimento do reino significa o começo do fim do domínio
de Satanás sobre a humanidade e a libertação daqueles que se arrependem
(1.15). Na verdade, o batismo em água de João, quando as pessoas
mergulham no Jordão, é apenas preparatório, significando o arrependimento
delas para se aprontarem para o vindouro reino de Deus (1.7). Evans disse:
“O ‘início das boas novas’ (1.1) como os habitantes do Império Romano o
teriam entendido implicaria restauração e renovação. O notável ministério
de Jesus, no qual ele subjuga Satanás e os seus aliados e traz cura e
restauração, valida a sua mensagem de forma dramática”.93

527
O uso que Marcos faz de “reino de Deus” é sinônimo do “reino dos
céus” de Mateus, e ambos os evangelistas veem o reino como intimamente
ligados e demonstrados através dos milagres de Jesus. No desenvolvimento
desse tema, Marcos parte da proclamação do reino por Jesus, que serve para
anunciar o reino de Deus, e então desenvolve um esboço do reino vindouro
ao centrar-se no ministério de Jesus.94 Os milagres que o Evangelho de
Marcos registra, demonstram a autoridade de Jesus sobre quatro coisas
diferentes: (1) natureza (4.35-41), (2) demônios (5.1-20), (3) morte (5.21-
24, 35-43) e (4) enfermidades (5.35-43). Embora Marcos tenha
consistentemente afirmado que o reino de Deus está em oposição a Satanás
e seus demônios, ele deixou claro que Jesus é o vencedor (1.24,34; 3.11,27;
5.6-10; 9.20,25). Na verdade, a mensagem transmitida pelos milagres que
Jesus realizou é importante por revelar as “manifestações do reino de Deus,
ou seja, a presença poderosa de Deus”.95 Que o reino está oculto aos
estranhos também é uma parte vital da apresentação de Marcos. Jesus usou
parábolas para demonstrar esse “escondimento” do reino, um reino que tem
tanto aspectos presentes quanto futuros (4.11,26-34).

O “segredo messiânico”
O Evangelho de Marcos se refere ao título Messias atribuído a Jesus pelo
menos sete vezes, começando com a confissão que Pedro faz de Jesus como
o Cristo (8.29,30), que ocasiona um padrão repetido três vezes da predição
da Paixão, falha do discipulado e instrução sobre o verdadeiro discipulado
(8.27 a 9.1; 9.30-41; 10.32-45). No entanto, esse retrato de Jesus mostra um
homem que ainda não estava disposto a ter seu caráter messiânico revelado.
Dos quatro Evangelhos, Marcos é o que com maior frequência registra que

528
Jesus pediu às pessoas para não revelarem quem ele era. No paralelo de
Mateus (16.17-19), Jesus teceu elogios e fez promessas a Pedro pela sua
confissão de seu caráter messiânico, enquanto esses elogios não
acompanham a confissão de Pedro em Marcos 8.30. Outros exemplos
incluem sua recusa da explicação das parábolas aos de “fora” (4.10-12), sua
repreensão às confissões que os demônios fizeram de sua verdadeira
identidade (1.25,34; 3.12) e suas ordens para que os milagres espetaculares
não fossem relatados a ninguém (1.44; 5.18,19,43).96
Em um esforço para explicar esse “segredo messiânico”, W. Wrede
sugeriu que o próprio Marcos criou este tema porque, embora ele
acreditasse que Jesus era o Cristo divino e Filho de Deus, Jesus
infelizmente não fez tais alegações. Como disse Blomberg, “em outras
palavras, ao criar as alegações e o ‘encobrimento’, Marcos poderia explicar
por que os estágios iniciais do cristianismo não acreditaram em Jesus como
97
Messias, e ainda assim o próprio Marcos poderia promover a noção”. Uma
explicação mais provável é que, embora Jesus estivesse ciente do seu status
messiânico, ele foi cauteloso ao aceitar o título do povo judeu por causa das
correntes expectativas cristológicas vigentes, que tendiam a se concentrar
mais em um messias político e pouco espaço deixavam para um Messias
sofredor (veja 10.45).98 Além disso, Hurtado sugeriu que sua proeminência
deveria ser entendida como parte de um tema marcano ainda maior. Uma
vez que a crucificação de Jesus foi a sua obra-chave, “na visão de Marcos,
ninguém poderia entender o verdadeiro significado de Jesus e de sua obra
até que Jesus a tivesse de fato completado com sua morte como resgate por
outros (10.45)”.99 Guelich declarou que esse segredo messiânico é ainda
acentuado pela rejeição de Jesus por parte das autoridades religiosas (veja
3.22-30, 14.63-65), de seus pais (veja 3.21), de sua cidade natal (veja 6.1-6)

529
e até mesmo pela incompreensão de seus discípulos (veja 4.35-41; 6.45-52;
8.31-33). Ele acrescentou: “Além disso, o fato de Jesus silenciar os
demônios e seus discípulos sempre que a sua verdadeira identidade
estivesse envolvida, bem como seu uso exclusivo do ambíguo ‘Filho do
Homem’ para se referir a si mesmo, acentua esse ‘segredo messiânico’”.100
Esse segredo é revelado no clímax do Evangelho de Marcos, quando o
centurião romano exclama ao pé da cruz, “é verdade, este homem era o
Filho de Deus!” (15.39), indicando que agora o segredo messiânico havia
sido revelado até mesmo para os gentios (romanos), de modo que o poder
missionário do sofrimento e morte de Jesus foi estendido também aos não
judeus.

A natureza do discipulado
No relato que Marcos faz do chamado dos discípulos, ele revelou a
autoridade que Jesus exerce sobre os homens. Quando ele chamou os
primeiros quatro discípulos, primeiro Simão e André e, em seguida, Tiago e
João, os filhos de Zebedeu, seu apelo foi abrupto e a resposta foi imediata
(Mc 1.16-20). Nessa introdução a Jesus, “a brusquidão do chamado e a
prontidão na aquiescência lançam [sic] Jesus em uma luz impressionante e
exigente; ele convoca as pessoas e elas obedecem”.101 À medida em que
Marcos avançou em sua narrativa, ele revelou a natureza do verdadeiro
discipulado: seguir a Jesus envolve conflito, rejeição pela própria família e
até o suportar a própria cruz. Ao distanciar-se da sua própria família, e
através da cruz, Jesus modelou em sua vida uma orientação para a condição
de membro do reino que os discípulos devem imitar nas suas relações uns

530
com os outros e na sua missão. Como Williams disse: “Seguir um Messias
que veio para morrer numa cruz envolve sacrifício, sofrimento e serviço”.102
A imagem inicial dos discípulos é logo ofuscada pela descrição que
Marcos faz de seus frequentes fracassos e incompreensões, uma ênfase que
está ausente nos outros Evangelhos. Dos quatro evangelistas, Marcos
observa a renitência dos discípulos e amplia o fracasso deles, manifestado
na falta de compreensão, apesar da repetição do milagre da multiplicação
dos pães, enquanto, ao mesmo tempo, retrata seu envolvimento crescente na
missão de Jesus.103 W. Lane encontrou na “justaposição da rejeição e da
missão um padrão confirmado na rejeição de Jesus pela nação, que
culminou com a crucificação e ressurreição, que criou a missão
apostólica”.104 Os discípulos não conseguiram entender as parábolas de
Jesus (4.11-13,33,34); onde espera-se ver uma resposta de fé, lê-se, em vez
disso, sobre o endurecimento de seus corações, sua pouca fé e sua
perplexidade após milagres cruciais (4.40; 6.51,52; 8.4,14-21); e onde se
esperava que eles exercitassem sobre os demônios sua autoridade recebida
de Cristo, eles falham miseravelmente (9.14-21). O próprio Pedro é lançado
em uma luz extremamente negativa após sua confissão por falhar em dar
espaço para um Messias sofredor (8.33).105
Assim, Marcos frequentemente retratou os discípulos de uma forma que
revela que eles não compreenderam a missão de Jesus. A cegueira dos
discípulos é trazida de forma ainda mais acentuada para o foco quando
Marcos narrou duas histórias nas quais as cegueiras espiritual e literal são
colocadas em marcante contraste (8.22-26; 10.46-52). Enquanto os
discípulos não conseguissem entender o verdadeiro significado da cruz, eles
não reconheceriam sua missão, uma vez que ela depende de os discípulos
seguirem a Jesus no caminho da cruz (veja 8.34).106 O registro da negação

531
de Pedro, da traição de Judas e da deserção dos demais discípulos
demonstra quão claramente verdadeira é esta observação (caps. 14 e 15).
A resposta dos discípulos a Jesus é muitas vezes frustrante para os
leitores. Guelich escreveu:

Chamados e privilegiados por estarem com Jesus (1.16-20; 3.7-12), ensinados por ele de
forma privativa (p. ex., 4.10-20,33,34), comissionados para participar de seu ministério (p.
ex., 6.7-13,30), eles continuamente falharam em compreendê-lo ou reconhecer com precisão
quem ele realmente é e as implicações de quem ele é para o seu discipulado (p. ex., 8.27 a
10.45). Eles hesitaram entre ter suas mentes nas “coisas de Deus” e ter suas mentes nas
“coisas dos homens” (8.33).107

Evans resumiu com precisão o propósito de Marcos neste retrato


negativo:

O propósito do evangelista ao retratar os discípulos desta maneira não é o de denegri-los ou


corrigir um cristianismo triunfalista insalubre que se identifica com eles. O objetivo é
destacar o contraste entre o Jesus magistral e imponente de um lado, e os discípulos bem
mais fracos e de difícil compreensão do outro. O evangelista quer apresentar Jesus ao mundo
romano como uma figura atrativa, como o verdadeiro salvador.108

Jesus como o “Filho do Homem”


Além da designação “Filho de Deus”, Jesus é identificado no Evangelho de
Marcos também como o “Filho do Homem”. Notavelmente, as pessoas em
geral são chamadas de “filhos dos homens” em Marcos (veja 3.28). Assim,
em certo sentido, o título de “Filho do Homem” marca Jesus como
plenamente humano (embora claramente Jesus seja retratado também como
plenamente divino no Evangelho de Marcos).
Em outro sentido, contudo, o epíteto “Filho do Homem” designa Jesus
como uma figura messiânica em concordância com a referência de Daniel à
figura misteriosa daquele “como um filho de homem” (Dn 7.13; veja

532
especialmente Mc 8.38; 13.26; 14.62). Jesus como o “Filho do Homem”
alegou ter autoridade para perdoar pecados (2.10) e afirmou ser Senhor do
sábado (2.28). Jesus também se referiu a si mesmo como o Filho do
Homem quando profetizou seu sofrimento e ressurreição (8.31; 9.9,12,31;
10.33,45; 14.21,41). O título, portanto, está ligado à morte vicária de Jesus
na cruz pela humanidade.
Daí o uso que Jesus faz do título “Filho do Homem” no Evangelho de
Marcos (que é semelhante aos outros Evangelhos) identifica-o como
plenamente humano — e, portanto, capaz de efetuar a substitutiva expiação
do pecado — e como o Messias e Filho de Deus que veio em cumprimento
às profecias do AT para estabelecer o reino de Deus.

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON


Apresentação de um Evangelho de Jesus, narrando o seu ministério da
Galileia a Jerusalém
Jesus como o Filho de Deus operador de milagres (1.1,11; 5.7; 9.7;
15.39)
A exibição que Jesus faz de seu poder sobre a natureza, demônios,
enfermidades e morte (4.35 a 5.43)
Falha do discipulado (4.40; 6.51,52; 8.16-21,33; 9.18,19; 14.66-72;
16.8)
Morte vicária e sacrificial de Jesus em resgate por muitos (10.45)

QUESTÕES PARA ESTUDO

533
1. Segundo a antiga tradição, quem escreveu o Evangelho de Marcos?
Quem se acreditava ter sido seu colaborador próximo?
2. Por que alguns postulam uma data mais tardia para Marcos?
3. Quais evidências linguísticas apontam para um destinatário romano?
4. Qual é o principal título cristológico em Marcos?
5. Como a estrutura de Marcos se adequa a seu propósito?
6. Quais são as razões dadas para uma data na segunda metade dos anos
50 para a escrita do Evangelho de Marcos?
7. De acordo com este capítulo, quais são os quatro propósitos
interligados do Evangelho de Marcos?
8. Qual é o problema textual em Marcos 1.1?
9. De acordo com os autores, quais são pelo menos dois motivos pelos
quais os autores não consideram os finais mais longos de Marcos como
originais?
10. Por que o Evangelho de Marcos é chamado de “rico em ação”?
11. Quantas partes principais existem na estrutura do Evangelho de
Marcos e qual versículo é o ponto crucial?
12. A que se refere o “segredo messiânico”?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


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Em: New International Greek Testament Commentary (Grand
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WREDE, W. The Messianic Secret (London: J. Clark, 1971).

536
1
Embora seja possível que esta expressão sirva como título para o Evangelho como um todo,

muito provavelmente ela se refere, como em Paulo, à mensagem salvífica sobre Jesus e a salvação

que ele fornece (veja M. Hengel, Studies in the gospel of Mark, tradução para o inglês de J. Bowden

[Philadelphia: Fortress, 1985], p. 53). O início do Evangelho de Marcos estabelece o preâmbulo ao

ministério de Jesus, incluindo o ministério de João Batista (1.2-8) e o batismo e tentação de Jesus

(1.9-13). Para uma discussão útil, veja C. E. B. Cranfield, The Gospel According to Saint Mark,

CGTC (Cambridge: University Press, 1966), p. 34-35; D. A. Carson; D. J. Moo, An Introduction to

the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids: Zondervan, 2005), p. 169 [publicado em português por

Vida Nova sob o título Introdução ao Novo Testamento].

2
Veja B. L. Mack, A Myth of Innocence: Mark and Christian Origins (Philadelphia: Fortress,

1988); W. Schmithals, Das Evangelium nach Markus (Gütersloh: G. Mohn/Würzburg: Echter, 1979).

3
R. A. Guelich, “Mark, Gospel of”, Dictionary of Jesus and the Gospels, edição de J. B. Green;

S. McKnight; I. H. Marshall (Downers Grove: InterVarsity, 1992), p. 512.

4
R. A. Guelich, Mark 1 to 8:26, WBC 34A (Dallas: Word, 1989), xix.

5
Veja a discussão no capítulo 3.

6
Para um ponto de vista alternativo defendendo a prioridade mateana, veja D. A. Black, Why

Four Gospels? The Historical Origins of the Gospels (Grand Rapids: Kregel, 2001).

7
Veja Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses, cap. 7: “The Petrine Perspective in the Gospel of

Mark”. Compare com W. L. Lane, The Gospel of Mark: The English Text with Introduction,

Exposition and Notes, NICNT (Grand Rapids: Eerdmans, 1974), p. 10-11.

8
Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 513.

9
Controvérsia envolve o entendimento do termo “Evangelho” como utilizado aqui. É a

mensagem pregada por Jesus o Messias, o Filho de Deus (veja Mc 1.14); a mensagem sobre o

Messias, o Filho de Deus tal como entendida e proclamada pela igreja; ou a história que se segue?

537
Veja D. E. Garland, “Mark”, em: C. E. Arnold, org., Zondervan Illustrated Bible Backgrounds

Commentary (Grand Rapids: Zondervan, 2002), 1:207. Muito provavelmente, “evangelho” se refere

à história sobre Jesus narrada no texto, mas também inclui a tradição oral que completa o texto.

Abrange as palavras, feitos, morte e ressurreição de Jesus como a intervenção direta de Deus na

história, e desafiava a propaganda do culto imperial que promovia a mensagem de boas novas e de

uma nova era de paz através do imperador romano (Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 513).

10
J. A. Brooks, Mark, NAC 23 (Nashville: Broadman, 1991), p. 17-19.

11
Porém, por volta da virada do século, A. Schweitzer, em sua obra monumental Quest of the

Historical Jesus (New York: Macmillan, 1968; reimpr. da edição de 1910), mostrou que esses

estudiosos não tinham baseado suas “vidas” no Evangelho, mas em suas próprias noções

preconcebidas de Jesus como um mestre liberal e ético. W. Wrede alegou que Marcos se esforçou

para reconciliar duas tradições contrastantes na igreja primitiva, uma que defendia que Jesus se

tornou Messias na ressurreição, e outra que alegava que o ministério terreno de Jesus já era

messiânico. Wrede acreditava que Jesus nunca alegou ser o Messias durante seu ministério terreno e

que Marcos representou este fato pelo que Wrede denominou o “segredo messiânico”. Cerca de duas

décadas depois os críticos da forma K. L. Schmidt, M. Dibelius, e R. Bultmann argumentaram que

Marcos coletou uma série de relatos breves e independentes dos ditos e feitos de Jesus e inventou

uma estrutura para eles para produzir um relato contínuo. (Crítica da forma é a análise de um texto

segundo formas típicas e identificáveis pelas quais as pessoas se expressam linguisticamente). De sua

perspectiva, portanto, o esboço de Marcos, que Mateus e Lucas seguiram, é de mérito histórico

duvidoso (Brooks, Mark, p. 19).

12
Veja D. M. Rhoads; D. M. Michie, Mark as Story: An Introduction to the Narrative of a Gospel

(Philadelphia: Fortress, 1982); e E. Best, Mark: The Gospel as Story (Edinburgh: T&T Clark, 1983).

13
Veja M. Hengel, The Four Gospels and the One Gospel of Jesus Christ: An Investigation of the

Collection and Origin of the Canonical Gospels, tradução para o inglês de J. Bowden (Harrisburg:

538
Trinity Press International, 2000), p. 48-53, p. 77. Guelich (“Mark, Gospel of”, p. 514) sugeriu que o

título “Segundo Marcos” muito provavelmente foi acrescentado várias décadas depois da composição

do Evangelho de Marcos.

14
R. Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses (Grand Rapids: Eerdmans, 2006), caps. 6 e 7. Veja

mais adiante.

15
Ibid., p. 156-64.

16
Lane, Gospel of Mark, p. 8.

17
Eusébio, História Eclesiástica, nova ed. atualizada, tradução para o inglês de C. F. Cruse

(Peabody: Hendrickson, 1998), p. 104-5.

18
Brooks, Mark, p. 18.

19
W. Hendriksen, Exposition of the Gospel According to Mark, New Testament Commentary

(Grand Rapids: Baker, 1975), p. 12-13.

20
Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 514.

21
Veja Bauckham (Jesus and the Eyewitnesses, cap. 8, esp. p. 197-201), que, com base na teoria

do “anonimato protetor” de G. Theissen, sugere que o jovem mencionado em Marcos 14.51,52 é

Lázaro!

22
Independente da ausência de qualquer base sólida para esta distinção na tradição, a menção de

Silvano e Marcos em 1Pedro 5.12,13 deixa claro que “Marcos” era o “João Marcos” de Atos e das

cartas paulinas que com Silvano (Silas) tinha também sido companheiro de Paulo. Portanto, Marcos

foi companheiro de Pedro e de Paulos, um membro da comunidade primitiva de Jerusalém que se

reunia na sala superior da casa de sua mãe (At 12.12) onde Jesus pode ter celebrado a Última Ceia

(veja Mc 14.14,15; At 1.13,14). Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 514.

23
Brooks, Mark, p. 27.

539
24
Blomberg, Jesus and the Gospels, p. 124.

25
Carson e Moo, Introduction to the New Testament, p. 176.

26
Hendriksen, Mark, p. 12-13.

27
Blomberg, Jesus and the Gospels, p. 124.

28
Carson e Moo, Introduction to the New Testament, p. 176; Hendriksen, Mark, p. 12-13.

29
Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 514; Prólogo Anti-Marcionista; Ireneu, Conra Heresias 3.1.1

(c. 160-80).

30
Mas veja discussão abaixo. Veja Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 514; Eusébio, Hist. Ecl.

6.14.5-7.

31
C. C. Torrey, The Four Gospels, 2. ed. (New York: Harper, 1947), p. 261-62, citado em Carson

e Moo, Introduction to the New Testament, p. 179.

32
Carson e Moo, Introduction to the New Testament, p. 182. Veja toda sua discussão nas páginas

179-82.

33
Brooks, Mark, p. 28.

34
Ibid.

35
Os únicos dados relevantes em Marcos podem vir de 13.14, quando lido contra o contexto

histórico da Guerra Judaica dos anos 66-73. Marcos estabeleceu seu discurso em 13.3-37 no contexto

da profetizada queda de Jerusalém. Não apenas falta um referente pessoal à “abominação” nos

eventos da destruição do Templo, mas o apelo “fujam para os montes” faz pouco sentido após Roma

ter cercado Jerusalém completamente com um rígido bloqueio nos anos 67-69 que impedia todas as

entradas e saídas. Veja Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 514.

36
Carson e Moo, Introduction to the New Testament, p. 182.

540
37
Eusébio, Hist. Ecl. 50, p. 205.

38
Brooks, Mark, p. 27.

39
Garland (Mark, p. 206) observou que uma origem palestina do Evangelho não deveria ser

descartada, uma vez que uma boa tese pode ser proposta para isso.

40
Hendriksen, Mark, p. 13.

41
Como com a data e autor, a falta de referências explícitas em apoio a qualquer local significa

que a questão do lugar tem pouca relação com como se lê ou se entende o Evangelho.

Consequentemente, localizadores de tempo e espaço em Marcos pertencem estritamente à narrativa e

não ao contexto histórico de quando e onde o Evangelho foi escrito. Veja Guelich, “Mark, Gospel

of”, p. 515.

42
Hendriksen, Mark, p. 13.

43
Lane, Gospel of Mark, p. 24.

44
Ou, talvez mais provavelmente, poucos anos após Marcos ter escrito seu Evangelho (veja a

discussão sob Data mais acima). Cf. Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 177, e toda

sua discussão nas p. 177-79.

45
Hendriksen, Mark, p. 13.

46
Carson e Moo, Introduction to the New Testament, p. 183.

47
Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 515. Veja L. W. Hurtado, Mark, NIBC (Peabody: Hendrickson,

1989), p. 6: “a única conclusão positiva a se tirar é que Marcos escreveu para os cristãos gentios

localizados em algum lugar fora da Palestina”.

48
Lane, Gospel of Mark, p. 24.

541
49
Veja a discussão de R. H. Stein, “Is Our Reading the Bible the Same as the Original

Audience’s Hearing It? A Case Study in the Gospel of Mark”, JETS 46 (2003), p. 66-67. Os leitores

de Marcos podem ter sofrido perseguição (veja especialmente 10.30: “com perseguições”, não

encontrada nos paralelos Sinóticos Mt 19.29 e Lc 18.29).

50
Esta é a conclusão lógica de Stein (ibid., p. 63-78, esp. p. 63-67), que forneceu uma detalhada

avaliação de todas evidências disponíveis.

51
R. Bauckham, org., The Gospels for all Christians: Rethinking the Gospel Audiences (Grand

Rapids: Eerdmans, 1997).

52
Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 513.

53
Garland, Mark, p. 206.

54
Este imperador “cada vez mais odiado e desprezado por seu próprio povo, promoveu sua

deificação (que na sua morte foi negada pelo senado). Mais do que qualquer outro imperador antes

dele, ele encorajou o uso dos títulos honoríficos ‘deus’, ‘filho de deus’, ‘senhor’ e ‘benfeitor’”. C. A.

Evans, “Mark”, em: T. D. Alexander; B. S. Rosner, orgs., New Dictionary of Biblical Theology

(Downers Grove: InterVarsity, 2000), p. 268.

55
Blomberg, Jesus and the Gospels, p. 121[publicado em português por Vida Nova sob o título

Jesus e os Evangelhos: uma introdução ao estudo dos 4 Evangelhos] (ênfase original).

56
W. Marxsen, Mark the Evangelist (Nashville: Abingdon, 1969).

57
T. J. Weeden, Mark: Traditions in Conflict (Philadelphia: Fortress, 1971).

58
S. G. F. Brandon, Jesus and the Zealots (Manchester: University Press, 1967).

59
Este é o subtítulo do comentário de R. Gundry sobre o Evangelho de Marcos: A Commentary

on His Apology for the Cross (Grand Rapids: Eerdmans, 1993). Cf. Köstenberger; O’Brien, Salvation

to the Ends of the Earth, p. 74. Marcos compartilhou essa preocupação com João (veja especialmente

542
Jo 12.30-36). Para referências ao reino de Deus, veja 1.15; 4.11,26,30; 9.1,47; 10.14,15,23-25; 12.34;

14.25; 15.43; para referências a Jesus como Rei, veja 15.2,9,12, 18,26,32.

60
Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 513. Veja o sermão de Pedro em Atos 10.34-43.

61
A. J. Köstenberger; P. T. O’Brien, Salvation to the Ends of the Earth: A Biblical Theology of

Mission, NSBT 11 (Downers Grove: InterVarsity, 2001), p. 74.

62
Veja Gundry, Mark, p. 237; Guelich, Mark, p. 261-63.

63
Hendriksen, Mark, p. 18.

64
Veja D. A. Black, “Some Dissenting Notes on R. Stein’s The Synoptic Problem and Markan

‘Errors’”, Filologia neotestamentaria 1 (1988), p. 95-101.

65
Lane, Gospel of Mark, p. 26.

66
Ibid.

67
Rhoads; Michie, Mark, p. 74. Veja toda a sua discussão nas p. 73-100.

68
Guelich, Mark, xxv.

69
Blomberg, Jesus and the Gospels, p. 116.

70
Ibid.

71
Os contornos gerais da estrutura abaixo são adaptados de J. F. Williams, “Does Mark’s Gospel

Have an Outline?”, JETS 49 (2006), p. 505-25.

72
Parte do material seguinte é adaptada de Köstenberger; O’Brien, Salvation to the Ends of the

Earth, p. 73-86.

73
Garland, Mark, p. 207. Ao proclamar Isaías como a fonte, Marcos informou seus leitores de

que a história “deve ser entendida no contexto dos temas de Isaías” (J. Marcus, The Way of the Lord:

543
Christological Exegesis of the Old Testament in the Gospel of Mark [Louisville: Westminster John

Knox, 1992], p. 20).

74
Como Garland (“Mark”, p. 209) observou, “Era também o lugar para se escapar da perseguição

e da iniquidade, uma vez que estava além do controle das cidades. O deserto também era visto como

a área de mobilização para a futura vitória de Deus sobre o mal e o local onde se esperava que Elias

(Ml 4.5) e o Messias aparecessem (Mt 24.26)”.

75
Observe a inclusio de 1.14 e 6.29, que registra a prisão e a morte de João nas mãos de Herodes.

76
Senior e Stuhlmueller, Biblical Foundations for Mission, p. 222.

77
Veja J. F. Williams, “Mission in Mark”, em: W. J. Larkin Jr.; J. F. Williams, orgs., Mission in

the New Testament: An Evangelical Approach (Maryknoll: Orbis, 1998), p. 146: “seguir um Messias

que veio a morrer na cruz envolve sacrifício, sofrimento e serviço”.

78
W. Telford, “Introduction: The Gospel of Mark”, em: W. Telford, org., The interpretation of

Mark, IRT 7 (Philadelphia: Fortress, 1985), p. 23; F. Hahn, Mission in the New Testament, SBT 47

(London: SCM, 1965), p. 113.

79
Veja Z. Kato, Die Völkermission im Markusevangelium, EHS 23/252 (Bern/Frankfurt am

Main/New York: Peter Lang, 1986), p. 191.

80
Ibid., p. 190.

81
Senior; Stuhlmueller, Biblical Foundations for Mission, p. 226.

82
Veja W. Kelber, The Kingdom in Mark (Philadelphia: Fortress, 1974), p. 67-85; R. Pesch, Das

Markusevangelium, HTKNT (Freiburg: Herder, 1980) para o tema do “caminho” ou “jornada” em

Marcos.

83
J. R. Donahue, Are you the Christ? SBLDS 10 (Missoula: SBL, 1973), p. 137; D. Juel,

Messiah and Temple, SBLDS 31 (Missoula: SBL, 1977), p. 212.

544
84
Veja Telford, Mark, p. 224-25; K. Stock, “Theologie der Mission bei Markus”, em: K.

Kertelge, org., Mission in Neuen Testament, QD 93 (Freiburg/Basel/Vienna: Herder, 1982), p. 142;

Donahue, Are you the Christ? p. 114; Senior; Stuhlmueller, Biblical Foundations for Mission, p. 223.

85
Lane, Gospel of Mark, p. 402.

86
Senior; Stuhlmueller, Biblical Foundations for Mission, p. 224.

87
Kato, Völkermission, p. 193.

88
Evans, “Mark”, p. 272.

89
Ibid.

90
Blomberg, Jesus and the Gospels, p. 117.

91
R. Martin, Mark: Evangelist and Theologian (Grand Rapids: Zondervan, 1973), citado em

Blomberg, Jesus and the Gospels, p. 118 (ênfase de Blomberg).

92
Blomberg, Jesus and the Gospels, p. 117-18.

93
Evans, “Mark”, p. 270.

94
G. Goldsworthy, “Kingdom of God”, em: T. D. Alexander; B. S. Rosner, org., New Dictionary

of biblical Theology (Downers Grove: InterVarsity, 2000), p. 616.

95
Evans, “Mark”, p. 272.

96
Blomberg, Jesus and the Gospels, p. 118.

97
Ibid., p. 119, com referência a W. Wrede, The Messianic Secret (London: J. Clark, 1971). Para

uma pesquisa das abordagens ao segredo messiânico, veja C. Tuckett, org., The Messianic Secret

(Philadelphia: Fortress, 1983). A mais plausível é a apresentação de J. D. G. Dunn, “The Messianic

Secret in Mark”, TynBul 21 (1970), p. 92-117.

545
98
Como Blomberg (Jesus and the Gospels, p. 118) apropriadamente resumiu, “para Marcos, no

entanto, 10.45 pode ser o versículo mais importante no Evangelho ao resumir sua ênfase no caminho

de Jesus para a cruz […] Embora Marcos nunca use a exata expressão, o conceito de servo sofredor,

(como em Is 52.13 a 53.12) talvez resuma melhor este lado humano da natureza e missão de Jesus.

Em resumo, o Evangelho de Marcos versa sobre o verdadeiro motivo da morte de Jesus”.

99
Hurtado, Mark, p. 10.

100
Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 515.

101
Evans, “Mark”, p. 271.

102
Veja Williams, “Mission in Mark”, p. 146.

103
Por exemplo, 3.5; 4.41; 6.45-52; 7.18; 8.14-21,32,33; 9.10,18,28,32; 10.35-45; 16.8; observe

especialmente 6.52 e 8.17-21. Veja Köstenberger e O’Brien, Salvation to the Ends of the Earth, p. 77.

104
Lane, Gospel of Mark, p. 205.

105
Blomberg, Jesus and the Gospels, p. 120.

106
Senior; Stuhlmueller, Biblical Foundations for Mission, p. 226.

107
Guelich, “Mark, Gospel of”, p. 515.

108
Evans, “Mark”, p. 272.

546
CAPÍTULO 6

O Evangelho segundo Lucas

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os fatos-chave do
Evangelho de Lucas. Em relação à História, os alunos deverão ser capazes
de identificar o autor do Evangelho, data, proveniência, destino e propósito.
Em relação à Literatura, eles deverão ser capazes de fornecer uma estrutura
básica do livro e identificar os elementos essenciais do conteúdo do livro
encontrados na Discussão Unidade por Unidade. Em relação à Teologia, os
estudantes deverão ser capazes de identificar os principais temas teológicos
de Lucas.
Conhecimentos intermediários: além do domínio dos conteúdos
essenciais identificados no item Conhecimentos básicos, os estudantes
deverão ser capazes de apresentar os argumentos para as conclusões
históricas, literárias e teológicas. Em relação à História, os estudantes
deverão ser capazes de discutir as evidências para autoria lucana, data,
origem, destino e propósito. Em relação à Literatura, eles deverão ser
capazes de fornecer um esboço detalhado da estrutura do livro. Com
respeito à Teologia, os estudantes deverão ser capazes de discutir os

547
principais temas teológicos de Lucas e as maneiras pelas quais eles
contribuem exclusivamente para o cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além do domínio do conteúdo principal
identificado nos itens Conhecimentos básicos e Conhecimentos
intermediários, os alunos deverão ser capazes de avaliar o papel
desempenhado pelas passagens contendo o pronome “nós” no livro de Atos
ao determinar a data e autoria de Lucas-Atos. Além disso, eles deverão ser
capazes de avaliar a importância literária e teológica da “narrativa de
viagem lucana” para o Evangelho de Lucas.

Mapa 6.1: Origem e destino de Lucas.

548
FATOS-CHAVE DO EVANGELHO DE LUCAS
Autor: Lucas, o médico amado
Data: c. 58-60
Origem: Roma, talvez a Acaia
Destino: Teófilo
Propósito: Uma defesa da fé cristã útil tanto para o
discipulado quanto para o evangelismo
Tema: Jesus traz a salvação universal em
cumprimento das promessas do AT a Israel
Versículos-Chave: 19.10

INTRODUÇÃO

O Evangelho de Lucas é o livro mais longo do NT. Abrange um pouco


mais de 14% do NT e é quase 10% mais longo do que o segundo maior
livro do NT, o livro de Atos. Contribuindo com esses dois volumes, Lucas
compôs 27% do NT.1 Lucas escreveu em um grego elegante, dominou o
vocabulário e a prosa de um homem educado e foi capaz de empregar uma
grande variedade de gêneros e estilos.2 E. Renan se referiu ao Evangelho de
Lucas como “o livro mais belo” já escrito.3
A contribuição de Lucas para a descrição do Evangelho de Jesus foi
uma ênfase na sua preocupação com os pobres, mulheres, crianças, doentes
e outros pertencentes às classes sociais mais baixas da sociedade. Jesus é
mostrado misturando-se livremente com os rejeitados da sociedade, um
“amigo dos […] pecadores” que veio para “buscar e salvar o que se havia
perdido” (19.10). Segundo Lucas, Jesus era o médico que veio para curar
não aqueles que se encontravam saudáveis, mas sim os doentes, e para

549
conceder a justiça àqueles que sabiam ser espiritualmente pobres enquanto
resistiam à espiritualidade orgulhosa e autossuficiente.
Embora Lucas não fosse testemunha ocular do ministério de Jesus, ele
investigou cuidadosamente esses assuntos com aqueles que o foram (1.1-4),
especialmente Pedro (5.3) e as mulheres que seguiram Jesus desde a
Galileia (8.2,3).4 Ele teve o cuidado de relacionar eventos importantes na
história cristã com a história mundial, tais como o nascimento de Jesus em
relação a César Augusto e Quirino, o governador (2.1),5 e o início dos
ministérios de João Batista e de Jesus em relação a Tibério César, ao
governador Pôncio Pilatos, Herodes Antipas e outros (3.1).
Apesar da sua elegância e estética, o Evangelho de Lucas (assim como o
livro de Atos) tem sido objeto de considerável controvérsia. S. E. Porter
escreveu: “Com poucas exceções, Lucas-Atos tem sido centro de um
número de debates maior do que quase qualquer um dos outros livros do
NT.”6 Até a década de 1950 o Evangelho de Lucas era amplamente visto
como um livro histórico uma vez que os estudiosos no século XIX e início
do século XX geralmente o viam como um médico helenístico, um seguidor
de Paulo, e não como alguém interessado de forma excessiva em teologia.
Com os escritos de H. Conzelmann, no entanto, Lucas começou a ser
visto como um revisionista que reinventou a história de Jesus para impor
uma nova teologia sobre a história da igreja e foi menosprezado por fazê-
lo.7 Isso resultou no agora famoso artigo de W. C. van Unnik, que declarou
ser Lucas um “centro de tempestade” teológica, o que continua a ser
verdade no presente.8 Nos últimos anos muitos têm estudado Lucas
principalmente em termos literários.9 No entanto, como será visto adiante,
Lucas é um historiador e um teólogo.

550
HISTÓRIA
Autor
A visão tradicional é que Lucas, o médico amado de Paulo, escreveu este
Evangelho e o livro de Atos. Se assim for, Paulo se referiu a este Lucas três
vezes no NT (Cl 4.14; 2Tm 4.11; Fm 24), e Lucas, de forma indireta,
referiu-se a si mesmo várias vezes no livro de Atos, nas passagens contendo
o pronome pessoal “nós”. Embora o autor continue anônimo tanto no
Evangelho quanto em Atos, isso não significa necessariamente que esses
textos foram originalmente anônimos10 uma vez que se pode assumir que a
pessoa a quem o livro foi dedicado (Teófilo) e seus primeiros leitores
sabiam quem era o escritor.
Quem quer que fosse esse Lucas, o prefácio do Evangelho, para não ir
mais longe, revela um refinado uso da língua grega, que aponta para um
autor bem instruído.11 É evidente que o autor era um homem,12 que ele teve
acesso a uma variedade de fontes sobre a vida de Jesus,13 que ele não foi
testemunha ocular do ministério de Jesus14 e que ele teve a oportunidade de
investigar a história de Jesus na íntegra (v. 3). Sobre esses pontos muitos
estudiosos estão de acordo.15 Além disso, no entanto, muitos contestaram a
atribuição tradicional. Por esse motivo é necessário examinar as evidências
internas e externas.

Evidências internas
A autoria comum de Lucas e Atos é praticamente presumida pelos
estudiosos modernos pelas seguintes razões.16 Primeiro, o prefácio do livro
de Atos parece introduzir uma sequência (At 1.1 se refere ao “primeiro

551
relato”). Segundo, ambos os livros são dedicados à mesma pessoa, Teófilo
(Lc 1.3; At 1.1). Terceiro, o conteúdo de Atos acompanha de imediato a
história de Jesus apresentada em Lucas (veja a referência a “tudo o que
Jesus começou a fazer e a ensinar” em At 1.1). Quarto, Lucas termina e
Atos começa com a ascensão de Jesus. Esse era um antigo método de
conectar um livro a outro. Finalmente, ambos os livros apresentam estilos e
interesses semelhantes.17
As evidências mais fortes para a autoria lucana são as passagens
contendo o pronome pessoal “nós” em Atos (16.10-17; 20.5-15; 21.1-18;
27.1 a 28.16). O entendimento mais natural dessas referências é que elas
sugerem que o autor foi um companheiro de viagem de Paulo, uma visão
atestada já em Ireneu (c. 130-200; veja Contra Heresias 3.1.2).18
Mas C. J. Hemer enumera três visões alternativas.19 Primeiro, muitos
veem as passagens contendo o pronome pessoal “nós” como refletindo uma
fonte composta pelo próprio autor, um tipo de diário de viagem.20 Embora
isso seja possível, a teoria é impossível de se provar e pode basear-se na
(agora amplamente descartada) suposição de que todas as fontes devem ser
escritas. Segundo, alguns argumentam que as passagens contendo o
pronome pessoal “nós” são de um diário de viagem escrito por alguém que
não o autor.21 No entanto, se essas seções são do diário de alguma outra
pessoa, Lucas estampou seu estilo único em tudo, menos nos pronomes
pessoais na primeira pessoa do plural. Além disso, essa inconsistência
literária estaria em desacordo com um autor que sempre exibiu grande
cuidado e elegância em seus escritos. Terceiro, muitos estudiosos sugerem
que essas seções são meramente recursos literários.22 Se isso for verdade, o
escritor seria tão sutil que confundiria (se não induzisse ao erro) parte de
sua audiência.23

552
Assumindo, então, que o autor normalmente não empregaria a primeira
e a terceira pessoa do plural ao mesmo tempo, as pessoas nomeadas nessas
seções junto com o autor podem ser removidas da consideração para
autoria. Assim, o autor não poderia ter sido Paulo, Silas (At 16.19),
Sópatro, Aristarco, Secundo, Gaio, Timóteo, Tíquico e Trófimo (At 20.4).
Além disso, uma vez que o escritor do livro de Atos estava com Paulo
durante sua primeira prisão em Roma (Cl 4.14), é possível que Paulo o
tenha mencionado em uma ou várias das cartas escritas durante esse
período, ou seja, nas Epístolas da Prisão: Filipenses, Efésios, Colossenses e
Filemom.24 Paulo nomeia seis desses companheiros: Marcos, Demas, Jesus
chamado Justo, Epafrodito, Epafras e Lucas.
Desses, Marcos escreveu o Evangelho que leva seu nome. Demas
abandonou Paulo porque ele “amou o presente mundo” (2Tm 4.10), o que o
torna um candidato improvável para a autoria de Atos. Jesus, chamado
Justo, era um judeu (Cl 4.11); o escritor de Lucas-Atos provavelmente não
era.25 Era mais provável que Epafrodito fosse de Filipos (Fp 4.18), o que
torna difícil explicar por que ele se juntaria a Paulo na Ásia Menor antes de
Filipos ser evangelizada (At 16.10). Epafras é observado no NT
principalmente por seu papel na fundação da igreja de Colossos (Cl 1.7,8;
4.12,13; veja Fm 23). Isso torna Lucas o candidato mais viável.

Evidências externas
A igreja primitiva claramente entendia o autor de Lucas-Atos como sendo o
“médico amado” de Paulo. Isso é atestado no título “segundo Lucas” no
final dos primeiros MSS (p. ex., 75
), no parecer dos pais da igreja
primitiva, tais como Ireneu (c. 130-200), Teófilo de Antioquia (final do

553
século II) e Justino Mártir (c. 100-165) e nas primeiras listas canônicas.
Uma das mais antigas indicações extrabíblicas de autoria vem de Justino
Mártir (c. 100-165), que mencionou uma citação de Lucas como de alguém
que seguiu os apóstolos.26
A primeira e mais clara referência existente ao autor de Lucas-Atos pelo
nome é encontrada no Cânon de Muratori (final do século II), seguido por
Ireneu (c. 130-200) e pelo Prólogo Antimarcionista de Lucas (c. 160-180).
O fato de Lucas ter sido mencionado bem posteriormente levou muitos
estudiosos a especularem que Lucas era pouco conhecido na primeira
metade do século II.27 No entanto, essa conclusão é prematura uma vez que
Policarpo (c. 69-155) cita Lucas e Atos (Phil. 1.2; 2.1,3). Também, Papias
(c. 60-130) nomeou Lucas como o autor do Evangelho (citado em Eusébio,
Hist. Ecl. 3.24.5-13).28
Um outro fragmento de Papias é encontrado em um escritor armênio
que citou Lucas 10.18.29 Além disso, Papias aparentemente teve uma longa
discussão sobre a putrefação de Judas no livro de Atos.30 Assim, tanto
Papias quanto Clemente, com toda a probabilidade, já conheciam e usavam
o Evangelho de Lucas e o livro de Atos desde cedo.
Também deveria ser observado que alguns antigos hereges também
fizeram uso do Evangelho de Lucas. O caso em questão é Marcião (c. 150),
que editou profundamente o Evangelho de Lucas, extirpando todas as coisas
judaicas, para incluí-lo em seu cânon. Um outro herege, o gnóstico
Heraclião, escreveu um comentário sobre o Evangelho de Lucas.31 As
referências ao Evangelho de Lucas nas obras desses dois fortemente
sugerem que o Evangelho de Lucas já estava em uso na igreja primitiva
antes da metade do século II.

554
Finalmente, nenhum outro candidato a não ser Lucas jamais foi
estabelecido na história da igreja como o autor desse livro.
Cumulativamente, esses dados fornecem fortes evidências para Lucas como
o autor do Evangelho e do livro de Atos, especialmente visto que parece
muito improvável que a igreja primitiva teria atribuído esses livros
importantes a outro companheiro de trabalho de Paulo não anunciado, a
menos que ele fosse o verdadeiro autor. A relativa insignificância de Lucas
em outras partes do NT permanece uma dificuldade grave para aqueles que
negam a atribuição do Evangelho a Lucas tradicionalmente concebida.32
Não foi até meados do século XIX que alguém duvidou da tradição de
que Lucas escreveu o Evangelho, o que coincidiu com a rejeição da autoria
lucana do livro de Atos. A identificação do autor de Lucas-Atos com o
médico amado de Colossenses 4.14 foi considerada como nada mais que
uma defeituosa conjectura.33 Hoje, a maioria dos estudiosos que rejeita a
autoria de Lucas o faz alegando que a teologia de Lucas e os detalhes
históricos diferem substancialmente dos de Paulo. Muitos estão dispostos a
ver um “Lucas” como o autor do Evangelho, mas alguém que não foi um
discípulo de Paulo e que escreveu depois dos anos 70.34
No entanto, como a avaliação das evidências internas e externas
apresentadas revelou, há uma ampla razão para manter a autoria lucana de
Lucas-Atos. Em particular, a evidência externa fornece um forte apoio para
a autoria lucana, com praticamente nenhuma voz discordante. Na verdade,
especialmente porque o autor deixa claro que ele não foi testemunha ocular
dos acontecimentos narrados no Evangelho (Lc 1.1-4), não está claro por
que alguém teria atribuído o Evangelho a ele a não ser que ele fosse de fato
o autor. Além disso, Lucas-Atos foi evidentemente escrito por um autor
muito bem-educado, fato que se ajusta ao que se sabe de Lucas,

555
companheiro de viagem de Paulo (passagens contendo o pronome pessoal
“nós”) e “médico amado” (Cl 4.14).

Data
Uma vez que Lucas e Atos são volumes relacionados, é necessário discutir
ambos a fim de avaliar com precisão a data de Lucas. Embora alguns
estudiosos tenham argumentado que Atos precede Lucas, isso é altamente
improvável.35 A “primeira narrativa” mencionada em Atos 1.1 sem dúvida
refere-se ao Evangelho de Lucas. Assim, o Evangelho de Lucas antecede o
livro de Atos e, portanto, a data da escrita de Atos é, em certa medida,
baseada na data de composição de Lucas.
Muitos estudiosos datam o Evangelho de Lucas em conformidade com a
sua solução para o Problema Sinótico. Os estudiosos mais conservadores
frequentemente datam Marcos da década de 50 com base no pressuposto de
que Lucas usou Marcos. Na outra extremidade do espectro, os estudiosos
críticos frequentemente atribuem a Lucas-Atos uma data posterior ao ano
70 com base na data que estabelecem para Marcos, por volta de 65.36
Talvez mais importante, a evidência histórica no Evangelho de Lucas e,
especialmente, no livro de Atos fornece um ponto de referência
independente para a datação desses dois livros.37 Isso requer certa distância
entre os acontecimentos da vida de Cristo e da escrita do Evangelho de
Lucas, mas não demanda meio século ou mais, como alguns estudiosos
supõem.38
Datas propostas para o livro dos Atos caem em três grandes eras: (1)
antes de 70; (2) por volta de 80; e (3) perto do final do primeiro século ou
início do segundo século.39 Predominantemente, aqueles que aderem à

556
primeira ou segunda posição sugerem que o Lucas histórico da tradição da
igreja representou exatamente a história em sua escrita de Atos. Esses
proponentes geralmente se dividem sobre a questão da queda de Jerusalém
no ano 70. Aqueles que entendem que a descrição de Jesus em Lucas 21.20
é uma “profecia depois do fato” concluem que Lucas escreveu por volta de
80 ou ainda mais tarde.
No entanto, a evidência de uma data anterior para Lucas-Atos (antes de
70) é convincente pelas seis razões seguintes. Primeiro, Lucas não
menciona qualquer evento significativo após o início dos anos 60 no livro
de Atos,40 como a perseguição da igreja por Nero, a destruição de Jerusalém
e as mortes de Pedro, Paulo e Tiago, o Justo.41
Segundo, a postura em relação ao Império Romano no livro de Atos é
decididamente neutra, se não amigável. Isso parece favorecer uma época
anterior a perseguição de Nero aos cristãos que culminou no martírio de
Paulo e Pedro (64-66).
Terceiro, a falha em mencionar a destruição de Jerusalém no Evangelho
de Lucas também favorece uma data pré-70. Uma vez que Lucas
consistentemente observou o cumprimento da profecia, tanto escrita quanto
oral,42 por que ele não mencionaria que a predição de Jesus sobre a
destruição do Templo de Jerusalém tinha sido cumprida?43 Além disso, o
Templo desempenha um papel proeminente tanto em Lucas quanto em
Atos; na verdade, o Evangelho de Lucas começa e termina no Templo (1.9;
24.53). Essa proeminência parece improvável se o Evangelho foi escrito
depois da destruição do Templo. Além disso, a relevância e impacto do
episódio de Estevão em Atos 7 se baseiam no fato de o Templo ainda
existir. No mínimo, o autor perdeu uma grande oportunidade de ressaltar o

557
argumento de Estevão (a corrupção do sistema do Templo) ao não
mencionar a destruição do Templo.
Uma quarta indicação de uma data mais antiga é que as cartas de Paulo
não são mencionadas em Atos. Como L. T. Johnson declarou, “é muito mais
provável que as cartas de Paulo fossem ignoradas antes da época da sua
coleção e canonização do que depois”.44
A quinta evidência importante para a datação do livro de Atos é a sua
conclusão (At 28.30,31). Para muitos, o final é desconfortavelmente brusco.
Paulo finalmente chega à Roma sob a proteção do imperador, mas o leitor é
deixado sem saber o resultado do julgamento. O livro termina com Paulo
pregando o evangelho em Roma sem nenhum entrave. A pergunta lógica é:
por que não Lucas não escreveu um parágrafo ou dois descrevendo o
resultado do julgamento? A resposta de que Lucas tinha alcançado seu
propósito ao mostrar o progresso do evangelho de Jerusalém até Roma,
implicando que qualquer menção do resultado do julgamento de Paulo teria
sido supérflua, não é satisfatória.45 A conclusão natural é que Lucas
alcançou Paulo a tempo e que quando Lucas concluiu Atos, Paulo ainda
estava sob prisão domiciliar em Roma e aguardando julgamento diante do
imperador Nero.
Sexto, em Atos 20.25 Paulo disse aos presbíteros de Éfeso que ele não
os veria novamente. No entanto, as Epístolas Pastorais sugerem que Paulo
continuou a manter laços estreitos com a igreja de Éfeso após a sua
libertação da primeira prisão em Roma (1Tm 1.3). É difícil explicar a
inclusão dessa declaração em Atos 20 se ela foi escrita depois das Epístolas
Pastorais.46
Uma data mais tardia para Atos é, portanto, muito mais problemática do
que uma data mais antiga. Portanto, a data mais provável de Lucas é algum

558
momento um pouco antes da composição do livro de Atos, que
provavelmente foi escrito no início dos anos 60.
Em quantos anos o Evangelho de Lucas precederia o livro de Atos? É
impossível se ter certeza. Se Lucas concebeu Lucas-Atos como uma obra
em dois volumes, o que parece provável (veja At 1.1-3), pareceria razoável
concluir que Lucas escreveu seu Evangelho e o livro de Atos com poucos
anos de diferença de um para o outro — embora isso careça, claro, de
provas. Ao se supor que Lucas usou Marcos, bem como outras fontes
escritas e orais, ao escrever seu Evangelho (cf. Lc 1.1-4), isso exigiria que
outros relatos sobre a vida de Jesus além do de Marcos tivessem sido
escritos antes de Lucas escrever o seu Evangelho. Se Marcos for datado de
meados dos anos 50 e o tempo permitisse que Lucas acessasse o Evangelho
de Marcos, isso reduziria a janela mais provável para a composição do
Evangelho de Lucas a meados ou final dos anos 50. Se Lucas estava
viajando com Paulo nessa época, ele teria tido ampla oportunidade de fazer
as pesquisas necessárias e compor o seu Evangelho durante a estada de dois
anos de Paulo em Cesareia Marítima (55-57). Assim, uma data entre
meados e final dos anos 50 parece a mais plausível, com uma provável data
dos anos 60 para o livro de Atos, embora a certeza permaneça insegura.47

Origem
Internamente, o Evangelho não dá nenhuma indicação de seu local de
origem. Externamente, tanto o Prólogo Antimarcionista de Lucas
(supostamente escrito contra Marcião; c. 160-180) quanto o Prólogo
Monárquico (breves introduções prefixadas em muitos mss. da Vulgata para
os quatro Evangelhos, escritos provavelmente no século IV ou V) afirmam

559
que o Evangelho foi escrito na Acaia (Grécia).48 Mas esses dois documentos
conectam Mateus à Judeia (incerto) e Marcos à Itália (mais provável), então
a ligação de Lucas à Acaia pode ou não ser precisa. A Acaia como lugar de
composição não é descartada por uma data no início dos anos 60, uma vez
que Lucas pode ter se afastado de Paulo temporariamente quando este
estava em Roma. A antiga tradição também coloca a origem de Lucas na
Beócia e em Roma. Em última instância, nós temos pouca evidência dos
pais apostólicos para além das regiões da Grécia e esses dados podem ser
muito tardios. Fitzmyer virou alvo quando afirmou que a proveniência do
Evangelho de Lucas é uma “incógnita”.49 Mas se for correto que Lucas
compilou suas fontes enquanto Paulo estava na prisão em Cesareia e que ele
estava com Paulo durante sua primeira prisão em Roma (como é indicado
por Cl 4.14), o Evangelho de Lucas poderia ter sido escrito em qualquer
lugar entre Cesareia e Roma.

Destino
O destinatário do Evangelho de Lucas claramente é Teófilo (Lc 1.3). O
prefácio de Lucas nos diz pelo menos três coisas sobre Teófilo. Primeiro,
ele era um homem de alta posição, pois Lucas se refere a ele como
“excelentíssimo” (kratistos; Lc 1.3), termo usado nas outras passagens do
NT apenas pelo mesmo autor em Atos com referência aos oficiais do
governo romano, Félix e Festo (veja At 23.26; 24.3; 26.25).50 Segundo,
Teófilo tinha recebido instrução prévia a respeito da fé cristã (“foste
instruído”, Lc 1.4). Terceiro, Lucas dedicou o seu Evangelho a dar a Teófilo
garantias adicionais a respeito dessa instrução (“para que tu possas
conhecer a certeza”, Lc 1.4).

560
Vários pontos de vista sobre a identidade de Teófilo emergem na
literatura acadêmica.51 Talvez o mais comum seja o ponto de vista de que
Teófilo foi o patrocinador e o patrono literário que financiou a publicação
da obra de Lucas.52 Alguns estudiosos sugeriram que ele era um descrente
influente com interesse no cristianismo.53 Outros propuseram que Teófilo
era um novo cristão que necessitava de instrução adicional54 ou até mesmo
o oficial romano responsável pelo julgamento de Paulo.55 Finalmente,
alguns veem o nome de “Teófilo” como um eufemismo para todos os que
amam a Deus (theos = “Deus”; philos = “amigo”; Theophilus = “aquele que
é amigo ou que ama a Deus”),56 ou como uma designação usada para
proteger a verdadeira identidade do patrono ou destinatário da carta. No
entanto, a referência a ele como “excelentíssimo” quase certamente aponta
para uma pessoa real, especialmente à luz dos paralelos em Atos (23.26;
24.3; 26.25) mencionados anteriormente.57
O mais provável, então, é que Teófilo tenha sido o patrono literário de
Lucas que apoiou a produção dos livros e os tornou disponíveis para
visualização e cópia. Era costume na historiografia antiga que o nome do
patrono aparecesse no prefácio de uma obra.58 O propósito declarado (“para
que tu conheças a certeza das coisas em que fostes instruído”, Lc 1.4)
implica que Teófilo estava mais do que apenas interessado, mas tinha
recebido alguma prévia instrução cristã,59 embora seja impossível
determinar sua precisa condição espiritual.
Embora Lucas dirija seu Evangelho especificamente a Teófilo, é
improvável que ele tenha limitado sua audiência a uma só pessoa. Se
Teófilo foi realmente patrono literário de Lucas, sua identidade seria menos
importante, uma vez que seu nome apareceria mais devido ao costume do
que por causa da alocução direta.60

561
O Evangelho de Lucas revela várias características dessa audiência mais
ampla. Praticamente todos os estudiosos sugerem que Lucas escreveu para
uma audiência gentílica, visto que ele tinha a propensão de substituir os
nomes e títulos gregos por nomes e títulos judaicos61 e uma vez que ele
traçou a genealogia de Jesus até Adão (Lc 3.38), o primeiro ser humano,
não apenas até Abraão, o patriarca judeu, como fez Mateus (cf. Mt
1.1,2,17). Além disso, Lucas situou o Evangelho historicamente ao referir-
se às datas dos imperadores romanos Augusto e Tibério (veja Lc 2.1; 3.1), e
isso seria de particular interesse para os gentios no mundo greco-romano.
Além disso, comparado com Mateus e Marcos, Lucas apresentou poucas
citações originais do AT, com a notável exceção de Lucas 4.18,19.62
Finalmente, o uso que Lucas faz do termo “Judeia” em um sentido genérico
para toda a Palestina parece indicar uma audiência removida da Terra
Santa.63 Assim, a evidência interna do Evangelho de Lucas aponta para um
gentio escrevendo para os gentios.
Isso não deve sugerir que o Evangelho de Lucas tinha pouco ou nenhum
interesse para seus leitores judeus.64 A vívida ênfase de Lucas no Templo,
tanto o início quanto no fim do Evangelho (Lc 2.27,37,46; 24.53) e a
expressão judaica do cristianismo descrita em Atos (veja At 21.20)
certamente ressoariam com uma audiência judaica. Além disso, Lucas se
esforçou para mostrar que a religião de Deus não muda (Lc 16.16,17).
Lucas pode ter tido um público-alvo específico em mente, mas muito
provavelmente escreveu seu Evangelho para todos os que o leram. Como
Blomberg concluiu, “Lucas […] é muitas vezes considerado o mais
universal de todos os Evangelhos. Talvez seja essa a razão pela qual é tão
difícil apontar os seus propósitos e as circunstâncias; ele pode ter tentado
deliberadamente atingir um público amplo”.65

562
Propósito
O propósito do Evangelho de Lucas tem sido objeto de considerável
discórdia. Várias sugestões foram oferecidas, desde evangelismo a uma
defesa da memória de Paulo.66 Parece mais natural permitir que o propósito
declarado por Lucas em seu prefácio em correlação com a estrutura do
Evangelho dite o propósito do livro. De fato, o Evangelho de Lucas contém
uma declaração de propósito. Em seu prefácio Lucas afirmou que escreveu
seu tratado para Teófilo “para que tu conheças a certeza das coisas em que
foste instruído” (Lc 1.4). A palavra “instruído” indica que Teófilo, e talvez
o público-alvo de Lucas, havia sido instruído, mas não necessariamente
convertido.67 A palavra asphaleia (“certeza”) indica uma certeza absoluta,
mas também tem a nuance de estabilidade.68 Assim, Lucas queria que
Teófilo soubesse que a mensagem acerca de Jesus era confiável. Isso
implicaria que tanto Teófilo quanto o público-alvo de Lucas estavam prestes
a ler um tratado que defendia a veracidade do cristianismo.
Esse caráter apologético do Evangelho é claramente expressado na
preocupação de Lucas com a exatidão. Primeiro, Lucas alegou ter tido
acesso às tradições das testemunhas oculares: “assim como as testemunhas
69
originais e servos da palavra os transmitiram a nós” (Lc 1.2). Isso é
corroborado pela afirmação de Jesus em Lucas 24.48: “Vós sois
testemunhas dessas coisas” (cf. Lc 12.12). Lucas também afirmou ter se
envolvido em uma investigação aprofundada sobre a história de Jesus:
“Uma vez que eu cuidadosamente investiguei tudo desde o início” (Lc 1.3).
Além disso, Lucas descreveu sua primeira narrativa em Atos como uma
descrição de “todas [as coisas] que Jesus começou a fazer e a ensinar” (At
1.1). Juntas, essas referências sugerem que Lucas quer transmitir
informações básicas e confiáveis sobre a vida e os ensinamentos de Jesus.

563
Isso incluía não apenas um relato histórico preciso do ministério de Jesus,
mas também a interpretação do seu significado teológico e relevância.
D. Bock sustentou que as ênfases do Evangelho apontavam para os
cristãos gentios que se esforçavam para o sucesso da missão aos gentios e o
aparente fracasso da igreja em alcançar os judeus. Lucas e Atos respondiam
as dúvidas de um gentio que se encontrava adorando um Messias judeu que
muitos judeus rejeitavam.70 Os seguintes temas lucanos validam essas
ênfases: textos referentes à fidelidade, às relações judaico-gentílicas
(especialmente em Atos), à esperança da volta de Jesus e ao plano de
Deus.71 O propósito primário do Evangelho de Lucas, então, é a edificação
dos cristãos gentios que precisam de instrução.

LITERATURA
Plano Literário
Em geral, Lucas seguiu um padrão geográfico em sua apresentação do
ministério de Jesus semelhante ao de Marcos e Mateus. Semelhante a
Mateus (mas não a Marcos), Lucas começou seu Evangelho com uma
narrativa sobre o nascimento — embora o Evangelho de Lucas reflita as
perspectivas de Maria e de Isabel, em vez da perspectiva de José,
fundamental no Evangelho de Mateus — e forneceu uma genealogia de
Jesus. Ao contrário de Mateus, no entanto, Lucas apresentou a genealogia
de Jesus não no início de seu Evangelho, mas apenas antes do início do
ministério de Jesus (3.23-38). Lucas abriu seu Evangelho com um polido
prefácio literário no qual ele reconheceu a dívida que tinha para com outros
relatos a respeito de Jesus e sublinhou a precisão das informações que ele
fornecia.

564
Depois disso, Lucas (novamente semelhante a Mateus) forneceu um
relato da tentação de Jesus pelo diabo, embora a ordem da segunda e
terceira tentações seja invertida em Mateus (Lc 4.1-13). O substituto
funcional de Lucas para o Sermão do Monte de Mateus (5 a 7) é o sermão
inaugural de Jesus na sinagoga de sua cidade natal, Nazaré. Mateus revelou
Jesus como o novo Moisés que deu aos seus seguidores uma nova lei, mas
Lucas apresentou Jesus como Servo do Senhor de Isaías, dotado com o
Espírito Santo e ungido para anunciar a boa nova aos pobres (4.18,19,
citando Is 61.1,2). Isso parece ser uma importante ênfase lucana em todo o
seu Evangelho, a saber, a vinda de Jesus em primeiro lugar e antes de tudo
para os desprezados na sociedade, incluindo mulheres, crianças, gentios,
coletores de impostos e “pecadores”, os doentes e deficientes, e os pobres.
A seguir, Lucas seguiu principalmente o padrão familiar (especialmente
de Marcos) de traçar os vários estágios iniciais do ministério de Jesus na
Galileia, incluindo ensinamentos importantes (apesar de alguns dos maiores
corpos de material de Mateus do ensino de Jesus muito provavelmente
estarem fragmentados, como o conteúdo do Sermão do Monte) e curas.
Algumas dessas curas, tais como a do filho de uma viúva na cidade de
Naim, se encontram apenas em Lucas (7.11-17). Lucas também
documentou Jesus chamando seus discípulos e, em outra ênfase de Lucas, o
auxílio recebido de várias mulheres devotas (8.1-3) que seguiram Jesus por
todo o caminho até a cruz (23.49). Como em Mateus e Marcos, a confissão
que Pedro faz de Jesus como o Messias é um momento decisivo (9.18-20) e
é seguida por predições da Paixão de Jesus com importantes implicações
para o discipulado (9.21-27).
Porém, como será observado com mais detalhes abaixo, é na longa
“Narrativa de Viagem” de Lucas (9.51 a 19.27) que ele realmente inovou

565
em sua apresentação de Jesus. Essa seção é introduzida por uma curiosa
referência à ascensão de Jesus já a um terço da extensão total do Evangelho
(9.51) e registra detalhadamente a aproximação de Jesus de Jerusalém, o
lugar onde ele seria julgado e rejeitado pelo povo judeu. Lucas registrou
uma quantidade considerável de material de ensino, particularmente as
parábolas de Jesus, que causam certo suspense. Muitas dessas parábolas são
exclusivas de Lucas, incluindo a Parábola do Bom Samaritano (10.25-37) e
a Parábola do Filho Pródigo (15.11-32). Um personagem amado também
exclusivo do Evangelho de Lucas é Zaqueu, o cobrador de impostos que se
converteu a Jesus e devolveu o dinheiro que ele tinha fraudado, o que
resultou na declaração programática de Jesus de que “o Filho do Homem
veio buscar e salvar o perdido” (19.10).
A narrativa da Paixão de Lucas segue linhas bem familiares em
consonância com as apresentações de Marcos e Mateus. No entanto, Lucas
novamente inovou em seu relato de várias aparições após a ressurreição não
encontradas em nenhum dos outros Evangelhos, principalmente a aparição
de Jesus aos dois discípulos no caminho de Emaús (cujo um dos
personagens, Cleopas, pode ser a possível fonte desta narrativa, 24.13-35).
O Evangelho de Lucas, semelhante a Mateus, conclui com uma narrativa de
comissionamento (24.46-49). As referências à concessão do Espírito e ao
testemunho dos discípulos a todas as nações, começando em Jerusalém, e à
ascensão de Jesus preparam o leitor para o segundo volume de Lucas, o
livro de Atos.

ESTRUTURA
Prefácio: O Propósito de Lucas (1.1-4)

566
I. Introdução a Jesus e sua missão (1.5 a 4.13)
A. João Batista e Jesus (1.5 a 2.52)
1. Predição dos nascimentos de João e Jesus (1.5-38)
2. A visita de Maria a Isabel e o Cântico de Maria (1.39-56)
3. O nascimento de João Batista e o Cântico de Zacarias (1.57-80)
4. O nascimento e juventude de Jesus (2.1-52)
B. Preliminares do ministério de Jesus (3.1 a 4.13)
1. João Batista e o batismo de Jesus (3.1-22)
2. A genealogia de Jesus (3.23-38)
3. A tentação de Jesus por Satanás (4.1-13)

II. O ministério de Jesus na Galileia (4.14 a 9.50)


A. Primeira parte do ministério na Galileia (4.14 a 7.50)
1. Ministério inicial: Sermão em Nazaré, exorcismo, curas (4.14 a
5.39)
2. A controvérsia sobre o sábado (6.1-11)
3. A escolha dos Doze (6.12-16)
4. O Sermão da Planície (6.17-49)
5. As principais curas: O servo do centurião, o filho da viúva (7.1-17)
6. João Batista: Dúvidas e seu papel (7.18-35)
7. Unção de Jesus pela Mulher Pecadora (7.36-50)
B. Segunda parte do ministério na Galileia (8.1-39)
1. O auxílio das mulheres a Jesus (8.1-3)
2. As Parábolas do Reino e ensinos correlatos (8.4-21)
3. Viagem através da Galileia: Jesus acalma a tempestade, o
endemoninhado geraseno (8.22-39)
C. Terceira parte do ministério na Galileia e retirada (8.40 a 9.50)
1. Milagres e ministério, a ressurreição da filha de Jairo (8.40 a 9.9)

567
2. Alimentação dos 5 mil (9.10-17)
3. Cesareia de Filipe: A confissão de Pedro, a transfiguração (9.18-
50)

III. A jornada de Jesus a Jerusalém e sua Paixão (9.51 a 24.53)


A. A jornada a Jerusalém (9.51 a 19.27)
1. Seguindo a Jesus (9.51-62)
2. A missão dos Setenta (10.1-24)
3. A Parábola do Bom Samaritano (10.25-37)
4. Marta e Maria (10.38-42)
5. Ensinamentos sobre a oração, Belzebu, o sinal de Jonas (11.01 a
13.21)
6. A porta estreita, advertência (13.22-35)
7. Na casa de um fariseu (14.1-23)
8. Ensinamentos e parábolas de Jesus: O Filho Pródigo, o Homem
Rico e Lázaro (14.24-16.31)
9. Ensinamentos adicionais, a cura dos dez leprosos (17.1 a 18.17)
10. O jovem rico (18.18-30)
11. Jesus prediz a sua morte (18.31-34)
12. A cura de um cego (18.35-43)
13. Zaqueu (19.1-10)
14. A Parábola das Dez Minas (19.11-27)
B. Ministério final em Jerusalém (19.28 a 22.38)
1. A Entrada Triunfal (19.28-44)
2. A purificação do Templo (19.45-48)
3. Controvérsias finais com os líderes judeus (20.1-47)
4. O discurso do Monte das Oliveiras (21.1-38)
5. A Última Ceia (22.1-38)

568
C. A crucificação, ressurreição e ascensão de Jesus (22.39 a 24.51)
1. O Getsêmani (22.39-46)
2. A prisão (22.47-65)
3. O julgamento (22.66 a 23.25)
4. A crucificação (23.26-56)
5. A ressurreição (24.1-12)
6. O ministério Pós-Ressurreição (24.13-49)
7. A ascensão (24.50,51)
Epílogo: O retorno dos discípulos a Jerusalém (24.52,53)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


Prefácio: O Propósito de Lucas (1.1-4)
Em seu prefácio elegantemente redigido, Lucas estabeleceu o ministério de
Jesus no âmbito do plano de Deus da salvação e declarou a sua razão e
propósito de empreender sua narrativa. Ele anunciou a continuidade do que
aconteceu em e através de Jesus com os relacionamentos anteriores de Deus
com o seu povo, o rigor de sua pesquisa e seu plano de escrever um relato
ordenado para dar garantia a Teófilo a respeito da veracidade do
cristianismo.

I. Introdução a Jesus e sua missão (1.5 a 4.13)


A. João Batista e Jesus (1.5 a 2.52)
Essa parte do Evangelho fornece a base para Jesus e sua missão messiânica.
Lucas descreveu o nascimento sobrenatural de Jesus e estabelece a sua
importância através de repetidos pronunciamentos por mensageiros de

569
Deus. Gabriel disse a Zacarias que seu filho João viria no poder de Elias, e
que “ele converterá muitos dos filhos de Israel ao Senhor seu Deus” (1.16).
O mesmo anjo anunciou a Maria que seu filho nascido de forma virginal é o
Filho do Deus Altíssimo (1.32). Zacarias profetizou que o Senhor traria
salvação ao seu povo e que João proclamaria o perdão dos pecados (1.77).
No nascimento de Jesus, as hostes angelicais proclamaram aos pastores
que o Salvador tinha nascido em Belém (2.11). Quando Jesus foi
circuncidado no Templo, no oitavo dia, Simeão identificou-o como o
Messias que traria salvação e revelação para os judeus e gentios (2.30-32).
Ana, a profetisa, declarou a redenção de Israel (2.36-38). Finalmente, Jesus
aos 12 anos já estava plenamente consciente de sua verdadeira identidade e
chamado: ele tinha que estar na casa de seu Pai, o Templo, e ocupado com
as coisas de seu pai (2.49).

B. Preliminares do Ministério de Jesus (3.1 a 4.13)


Os primeiros passos da narrativa — o batismo, a genealogia e o relato da
tentação — identificam Jesus como Aquele que Vem, que salvaria o seu
povo dos seus pecados.
Esta seção apresenta Jesus como um adulto prestes a entrar em seu
ministério e inclui referências ao ministério de João Batista, a genealogia de
Jesus e um relato da tentação de Jesus por Satanás. Lucas começou esta
nova seção passando rapidamente do período de Jesus aos doze anos para a
apresentação de João no deserto. Embora Lucas tenha incluído informações
sobre o ensino de João, sua ênfase principal é na declaração de João sobre
Jesus. Após essa transição no Evangelho, a ênfase de Lucas passou de João
para Jesus.

570
Lucas optou por colocar a genealogia de Jesus (3.23-38) no início do
ministério de Jesus, em vez de no início de seu livro, como fez Mateus (veja
Mt 1.1-17). Além disso, Lucas seguiu uma linha de ancestrais diferente da
de Mateus, o que reflete um diferente propósito por parte de Lucas. Além
disso, traçando a genealogia de Jesus até Adão, o “filho de Deus” (3.38),
Lucas procurou ser inclusivo, começando com o progenitor de toda raça
humana.72
A preliminar final do ministério de Jesus é sua tentação pelo diabo (4.1-
13). Lucas apresentou uma sequência diferente da de Mateus para as três
tentações (4.1-11): (1) a transformação de pedras em pão; (2) a adoração a
Satanás em troca de todos os reinos do mundo; e (3) saltar do Pináculo do
Templo para ser protegido pelos anjos. A maioria dos estudiosos assume
que Mateus seguiu a ordem cronológica73 e que Lucas inverteu as duas
últimas tentações.74 Começando em 4.14, o ministério de Jesus realmente
teve início.

II. O MINISTÉRIO DE JESUS NA GALILEIA


(4.14 a 9.50)
A. Primeira Parte do Ministério na Galileia (4.14
a 7.50)
O ministério de Jesus na Galileia começou com o seu sermão inaugural na
sinagoga em Nazaré (4.14-30), onde Jesus se apresentou como Servo do
Senhor de Isaías (cf. Is 61.1,2) e anunciou publicamente o início da sua
missão a uma congregação hostil e descrente em sua cidade natal. Então,
Jesus expulsou demônios e curou a sogra de Pedro e muitos outros (4.31-
41). Depois disso, Lucas apresentou uma síntese dos resultados da pregação

571
de Jesus e uma declaração de seu propósito, ecoando a citação de Isaías em
4.18 (4.43).
Outra série de eventos durante a primeira fase do ministério de Jesus na
Galileia é o chamado dos primeiros discípulos de Jesus: Simão Pedro e seus
companheiros, os filhos de Zebedeu (5.1-11) e Levi, o cobrador de impostos
(5.27-32). Após a narração de uma controvérsia que se originou por Jesus
ter curado um inválido no sábado (6.1-11), segue-se a seleção dos doze
apóstolos de Jesus (6.12-16). Lucas também documentou uma série de
instruções que Jesus deu aos seus discípulos que culmina no Sermão da
Planície (6.17-49), o breve equivalente lucano do Sermão do Monte de
Mateus (caps. 5 a 7), no qual Jesus defendeu a rejeição dos prazeres e bens
mundanos, um amor pelos outros e o dever de segui-lo radicalmente.
Segue-se outro conjunto de curas importantes: é restaurada a saúde do
servo do centurião (7.1-10) e o filho de uma viúva é ressuscitado dentre os
mortos (7.11-17). Nisso João Batista expressou dúvidas, de modo que Jesus
apontou para o cumprimento da profecia messiânica do AT em seu
ministério para tranquilizar o Batista (7.18-35), que aparentemente se
perturbou com o entendimento popular de Jesus como um simples profeta.
A unidade é concluída com a unção de Jesus por uma mulher pecadora na
casa de Simão, o fariseu (7.36-50).

B. Segunda Parte do Ministério na Galileia (8.1-


39)
A segunda parte do ministério de Jesus na Galileia começa com uma
referência a um grupo de mulheres fiéis que se sacrificaram para auxiliar
Jesus com seus próprios recursos (8.1-3).75 Isto é seguido pela Parábola do

572
Semeador, que evidencia a boa recepção de Jesus por aqueles que, “tendo
ouvido a palavra com um coração bom e honesto, se apegaram a ela”
(8.15). A Parábola do Semeador é seguida pela breve Parábola da
“Candeia” (8.16-18). Continuando o tema da resposta adequada a Jesus, ele
identificou aqueles “que ouvem e praticam a palavra de Deus” como sua
verdadeira família (8.21).
Depois disso, Lucas mostra Jesus viajando pela Galileia (8.22-39),
destacando sua autoridade. A primeira vinheta é conhecida como “Jesus
acalma a tempestade”, onde Jesus acalmou uma forte ventania no lago de
Tiberíades(8.22-25). O pronunciamento climático estabeleceu o cenário
para as perícopes a seguir: “Quem pode ser este? Ele comanda até mesmo
os ventos e as ondas, e eles lhe obedecem!” (8.25). Jesus também tinha
autoridade sobre os demônios, como o encontro com o endemoninhado
geraseno torna claro (8.26-39).

C. Terceira Parte do Ministério na Galileia e


Retirada (8.40 a 9.50)
O relato da terceira parte do ministério de Jesus na Galileia continua a
enfatizar a autoridade de Jesus sobre a doença e a morte. A perícope da
mulher com o fluxo de sangue (8.43-48) interrompe o ressuscitar da filha de
Jairo, quando Jesus mostrou a sua autoridade sobre a morte (8.40-42, 49-
56). Jesus concedeu aos Doze discípulos autoridade sobre os demônios e as
doenças (mas não sobre a natureza ou sobre a morte) (9.1-6), e a missão
deles teve tanto sucesso que perturbou até mesmo Herodes Antipas (9.7-9).
Jesus, então, retirou-se com seus discípulos (9.10). O último milagre
desta seção é a multiplicação dos pães para cinco mil pessoas (9.10-17),

573
seguido por várias unidades narrativas que tratam da natureza do
discipulado. A confissão que Pedro fez de Jesus como o Messias (9.18-27)
assinala uma transição importante na pregação e ministério de Jesus. Até
esse ponto Jesus tinha procurado revelar-se aos seus discípulos; aqui, a sua
atenção se volta no sentido de preparar os seus discípulos à luz de sua morte
iminente em Jerusalém.
Em consequência da confissão de Pedro, Jesus explicou aos seus
discípulos que eles deveriam negar a si mesmos e “tomar a [sua] cruz
diariamente” e segui-lo. Na verdade, alguns veriam o reino de Deus, o que
provavelmente antecipou a transfiguração de Jesus narrada na perícope
seguinte (9.28-36). Moisés e Elias apareceram e conversaram com Jesus
sobre sua iminente “partida” (9.31, A21; gr. exodos). Isso indica que a
morte de Jesus proporcionaria a libertação do povo de Deus de forma
semelhante ao Êxodo para Israel.
Enquanto Jesus descia do Monte da Transfiguração, ele encontrou dois
casos de discipulado inadequado. Primeiro, ele exorcizou um demônio de
um menino a quem seus discípulos não conseguiram ajudar. Jesus os
castigou por fazerem parte de uma “geração incrédula e rebelde” (9.41).
Segundo, Jesus confrontou o espírito de autoengrandecimento dos
discípulos quando eles discutiram sobre quem era o maior (9.46-48). Jesus
os repreendeu por sua atitude ímpia. Ele também lhes disse que não
impedissem que outras pessoas expulsassem demônios em seu nome
(9.49,50).

Quadro 6.1: A “NARRATIVA DA VIAGEM”


LUCANA

574
Uma das características mais marcantes do Evangelho de Lucas é a
seção extraordinariamente longa sobre a “Viagem a Jerusalém”. Ela
ocupa cerca de 38% da narrativa do Evangelho.1 Grande parte do
material desta seção é exclusiva de Lucas. A seção é dominada pelos
discursos e por alguns poucos milagres de Jesus. Isso está baseado no
fato de que Lucas tinha estabelecido quem Jesus era em sua narrativa
do ministério na Galileia, e então ele prosseguiu para o significado de
seguir a Jesus enquanto ele viajava inexoravelmente para Jerusalém,
onde a crucificação o esperava.
A viagem a Jerusalém vai de 9.51 a 19.27 e é seguida pela
Narrativa da Paixão de Lucas, que inclui o ministério final de Jesus em
Jerusalém (19.28 a 22.38) e um relato da sua crucificação, ressurreição
e ascensão (22.39 a 24.53). É impossível exagerar a importância
estratégica de 9.51. Depois de um pouco mais de um terço de seu
Evangelho, Lucas escreveu: “Quando estavam vindo os dias para
desfecho para ele ser levado, ele determinou viajar para Jerusalém”.
É surpreendente que Lucas fale sobre a ascensão de Jesus logo no
início da narrativa, abordando, como fez, os acontecimentos que se
seguiram, incluindo a prisão, julgamento, crucificação, sepultamento e
ressurreição de Jesus. Com a sua referência à ascensão de Jesus, 9.51
introduz todo o restante do Evangelho e fornece uma inclusão literária
com o fim da narrativa de Lucas em 24.50-53 que, por sua vez,
corresponde à narrativa da ascensão de Jesus em Atos 1.9-11.

1
Evidentemente, o número varia com o modo como se conta as palavras, versículos ou

linhas. O presente cálculo baseia-se no número de palavras.

575
III. A JORNADA DE JESUS A JERUSALÉM E
SUA PAIXÃO (9.51 a 24.53)
A. A Jornada a Jerusalém (9.51 a 19.27)
A primeira parte da narrativa da viagem lucana discute a natureza do
discipulado. A principal linha temática que permeia 10.42 é que seguir a
Jesus muitas vezes exige uma separação daquilo que é familiar e
confortável e um compromisso de proclamar o reino de Deus. A viagem
começou quando Jesus e seus discípulos passaram por uma aldeia
samaritana que não recebeu a Jesus. Jesus repreendeu seus seguidores que
queriam que ele destruísse a aldeia de forma sobrenatural (9.52-56).
Seguir a Jesus requer dos pretensos discípulos a disposição de deixar
para trás seu ambiente familiar, ocupação e entes queridos (9.57-62). Isso é
seguido pela missão dos Setenta que Jesus enviou depois de dar-lhes
instruções específicas (10.1-20). A instrução privada de Jesus a seus
discípulos é seguida por uma pergunta de um escriba, a quem Jesus
respondeu com a Parábola do Bom Samaritano (10.25-37). Depois disso,
Jesus visitou Marta e Maria e elogiou Maria por fazer a escolha certa ao
sentar-se a seus pés (10.38-42).
Jesus, então, ensinou na Judeia, enquanto ainda estava em sua viagem a
caminho de Jerusalém (11.1 a 13.21). Como ele deixou claro, segui-lo
implica um chamado à oração. A unidade começa com a versão de Lucas da
Oração-Modelo (11.1-4) e continua com um encorajamento à fidelidade na
oração (11.5-13). Em 11.14, a narrativa faz uma dramática mudança em
direção às controvérsias que se seguiram no levantar de Jesus. A linha de
discussão distintiva em 11.54 é o chamado a uma resposta adequada a

576
Jesus. Ele respondeu a pergunta sobre a fonte de seu poder na polêmica
sobre Belzebu: é de Deus (11.14-26).
Depois de elogiar aqueles que “ouvem a palavra de Deus e a guardam”
(11.27,28), Jesus censurou sua geração por buscar sinais, apontando-lhes “o
sinal de Jonas” (11.29-36). Em vez de exigir outros sinais, as pessoas
deveriam reconhecer que, com o Filho do Homem, “alguma coisa maior do
que Jonas está aqui” (11.32). Jesus também pronunciou “ais” contra os
fariseus e os peritos na lei (11.37-54), acusando os líderes judeus de
hipocrisia e de levar as pessoas à destruição. O resultado foi que os fariseus
começaram a armar ciladas para apanhar Jesus em alguma coisa que
dissesse (11.54).
Os eventos selecionados por Lucas na próxima fase da jornada
destacam a necessidade de responder a Jesus com fé. Em particular, Jesus
identificou três obstáculos para a recepção da sua mensagem: hipocrisia,
cobiça e preguiça. Primeiro, ele advertiu contra o “fermento” dos fariseus,
isto é, a hipocrisia (12.1-12). Segundo, ele aproveitou a oportunidade
fornecida por um pedido da multidão para que ele resolvesse uma disputa
familiar para falar contra a ganância (12.13-34), insistindo com seus
seguidores a que buscassem o reino: “porque onde o seu tesouro estiver, aí
o seu coração também estará” (12.34). Finalmente, ele ordenou a vigilância
porque ele voltaria em um momento inesperado (12.49-59). Isso é
particularmente importante porque ele virá para “trazer fogo sobre a terra”
— o juízo está chegando (12.49). Consequentemente, 13.1-9 tem o foco na
necessidade urgente de arrependimento à luz da paciência de Deus.
A próxima fase da viagem mantém uma longa linha de ensino na
questão sobre quem receberá permissão para entrar no reino.76 Seguiu-se
outra controvérsia a respeito do sábado em uma severa advertência contra a

577
hipocrisia dos líderes religiosos (13.10-17). A seção centra-se na marcada
inversão de expectativas provocada pelo ministério de Jesus. Contrariando
as expectativas populares, apenas alguns serão salvos. Além disso, os
poucos que serão salvos não são os líderes religiosos, mas aqueles que
“entrarem pela porta estreita” (13.24-30). Ironicamente, a própria Jerusalém
é a proprietária de uma casa desolada (13.35).
Enquanto participava de um banquete, Jesus partilhou a sua sabedoria
com os convidados. Os fariseus são um realce para o ensinamento de Jesus
sobre a atitude correta para aqueles que herdarão o reino. Ele começou
observando o orgulho pela ocupação de posições elevadas durante o
banquete e aconselhou: “todo aquele que a si mesmo se exaltar será
humilhado, e aquele que si mesmo se humilhar será exaltado” (14.11). Ele
prosseguiu para instruir os seus ouvintes a que convidassem aqueles que
não podem pagar para que sua recompensa viesse na ressurreição.
O ensinamento de Jesus sobre ministrar aos proscritos resultou em
polêmica: “este homem recebe pecadores e come com eles” (15.2). A
resposta é dada por meio do famoso trio de parábolas sobre “coisas
perdidas”, — uma ovelha, uma moeda e um filho — destacando a alegria
do povo ao encontrar o que se havia perdido. Essa série de parábolas
constitui uma defesa das práticas de Jesus de se confraternizar com os
“pecadores” e uma resposta à sustentada crítica dos fariseus personificada
no filho mais velho na parábola final.
O capítulo 16 retorna à questão da riqueza (o assunto da segunda
advertência em 12.13-34). O herói surpreendente da parábola de Jesus é o
administrador astuto que transmite a lição de que a riqueza que deveria ser
usada de maneira que conte para eternidade (16.9). Os fariseus são
novamente o contraste pois zombavam de Jesus por serem “amantes do

578
dinheiro” (16.14). A Parábola do Rico e de Lázaro aponta para a insensatez
e idolatria de servir ao dinheiro.
Os discípulos, então, foram advertidos a não fazer com que outros
pecassem ou a abrigar uma atitude de amargura ou autoenaltecimento (17.1-
10). A parte final da jornada a Jerusalém tem seu foco em vários aspectos
do reino. Em 17.11-19, dez leprosos são curados, mas apenas um
samaritano dentre eles é grato. Jesus observou que sua fé o tinha salvado.
Quando os fariseus perguntaram a Jesus sobre a vinda do reino de Deus, ele
declarou que o reino é tanto uma realidade presente quanto futura da qual
muitos se esquecem, assim como fizeram os contemporâneos de Noé e Ló.
Em seguida, Jesus ordenou a seus ouvintes a oração fiel através da
Parábola do Juiz Injusto e da Viúva Persistente (18.1-8). A parábola ainda
está relacionada à vinda do Filho do Homem, pois Jesus perguntou:
“quando o Filho do Homem vier, ele achará fé na terra?” (18.8). A Parábola
do Fariseu e do Publicano (18.9-14) proíbe a oração hipócrita, pois “todo
aquele que se exaltar será humilhado, mas o que a si mesmo se humilhar
será exaltado” (18.14). As crianças pequenas são o exemplo mais
proeminente daqueles que entrarão no reino (18.15-17).
Lucas prosseguiu citando o exemplo negativo do jovem rico, que se
afastou triste porque não poderia dividir sua riqueza (18.18-23). Jesus então
destacou que “não há ninguém que tenha deixado uma casa, ou mulher, ou
irmãos, ou pais, ou filhos, por causa do reino de Deus, que no presente não
receba muitas vezes mais naquele tempo e vida eterna na era vindoura”
(18.29,30).
A parte final da viagem mostra Jesus trazendo salvação a Jerusalém.
Lucas 18.31-34 contém ainda outro anúncio do porquê Jesus estava se
dirigindo para Jerusalém: para ser espancado, morto e ressuscitado ao

579
terceiro dia, em cumprimento a mensagem dos profetas e, portanto, em
consonância com o plano de Deus. Esse anúncio define o cenário para o
segmento final da viagem. Jesus primeiro curou um mendigo cego (18.35-
43, o Bartimeu de Marcos) como o primeiro aspecto da salvação enfatizada
por Lucas, um humilde clamor por misericórdia.
O segundo aspecto é destacado por Zaqueu (19.1-10): o arrependimento
demonstrado pelas obras, neste caso, a restituição do ganho ilícito e o
restante distribuído aos pobres.77 A parábola das minas abordou a
expectativa de alguns de que o reino viria imediatamente (19.11-27). A
parábola demonstra não apenas que haverá um atraso, mas também salienta
a necessidade de fidelidade nesse ínterim.

B. Ministério Final em Jerusalém (19.28 a 22.38)


A entrada triunfal (19.28-44) marca o fim da seção da jornada e o início do
fim para Jesus na consumação da salvação. Jesus primeiro montou num
jumento e entrou em Jerusalém em cumprimento da profecia (Zc 9.9),
entrando na cidade não para assumir o reino, mas para anunciá-lo (19.38,
citando Sl 118.26). Os fariseus se opuseram a essa exibição de realeza e
Jesus os repreendeu prontamente (19.39,40). Finalmente, Jesus lamentou o
iminente destino de Jerusalém (19.41-48).78 Plenamente consciente do que
logo aconteceria com ele, Jesus lamentou pela grande devastação que viria
sobre Jerusalém por causa de sua participação na crucificação e na rejeição
de Jesus.
As seções seguintes mostram a oposição da liderança judaica e as
últimas consequências resultantes da rejeição do Messias pela nação (19.45-
48; cap. 20). Quando Jesus chegou a Jerusalém, ele purificou o Templo e

580
fez dele o centro de seu ensinamento. Seus inimigos não podiam levá-lo em
custódia porque o povo ficava “fascinado ao ouvi-lo” (19.48). Esse fato
definiu o cenário para a controvérsia do Templo (20.1-8), onde Jesus
lembrou aos líderes judeus que João havia dado testemunho dele para eles.
Essa controvérsia, por sua vez, levou à Parábola dos Agricultores Maus
(20.9-19). Nessa parábola, os arrendatários de uma vinha maltratam os
empregados do fazendeiro e matam o seu herdeiro, o que os torna, com
razão, o objeto da ira do fazendeiro. Os líderes judeus imediatamente
reconheceram que a parábola era dirigida a eles. Jesus, então, recorreu ao
salmo 118.22,23, “a pedra que os construtores rejeitaram — se tornou a
pedra angular”, e de forma fatídica observou que esta pedra esmagará os
que a ela se opõem. A seção seguinte relata várias tentativas de pegar Jesus
em uma cilada, tudo em vão (20.20-40). A unidade termina com outra
denúncia sobre o orgulho e a hipocrisia dos escribas (20.41-47).
Com sua morte iminente, Jesus proferiu o Discurso do Monte das
Oliveiras, no qual esboçou o cenário do final dos tempos (21.1-36).
Primeiro, ele anunciou a iminente destruição do Templo. Os discípulos
fizeram uma pergunta dupla: quando sucederão essas coisas e quais serão os
sinais de advertência? As respostas de Jesus referiam-se à destruição do
Templo e ao seu retorno. Haverá falsos messias, guerras e catástrofes
naturais, mas primeiro os discípulos serão perseguidos. Jesus os encorajou a
perseverar (21.19).
Quando Jerusalém for cercada por exércitos, o fim estará próximo.
Jerusalém será pisada até que o tempo dos gentios se complete — uma
referência ao tempo decorrido entre a destruição de Jerusalém e a volta de
Jesus (21.20-24). O retorno de Jesus será precedido por terríveis catástrofes
ambientais sobrenaturais que farão o povo desmaiar de terror e, em seguida,

581
o Filho do Homem aparecerá com poder e grande glória. O chamado
conclusivo de Jesus para a vigília (21.34-36) é prefaciado pela Parábola da
Figueira (21.29-33).
No capítulo 22, Lucas começou a relatar os acontecimentos que levaram
à crucificação. Sua narração tem essencialmente três partes: preparação,
confronto e crucificação. A primeira é a preparação para o evento. Isso
inclui a traição e a última Páscoa. Satanás entrou em Judas para que este
traísse Jesus (22.1-6). Jesus também preparou os discípulos para a sua
crucificação e subsequente ausência ao transformar a refeição da Páscoa
(22.7-38). Ele anunciou a traição de Judas e silenciou um debate sobre
quem seria o maior. Ele também disse aos discípulos que se preparassem
para sua partida, referindo-se à perseguição que se seguiu e à negação de
Pedro.

C. A Crucificação, Ressurreição e Ascensão de


Jesus (22.39 a 24.51)
A prisão e os julgamentos de Jesus marcam o início do fim de Jesus. Jesus
suportou a agonia no Getsêmani (22.39-46) e depois foi traído e preso.
Jesus não permitiu que seus discípulos resistissem à prisão e considerou
apropriado que os sacerdotes o prendessem nas trevas porque as trevas são
o domínio deles (22.53). As negações de Pedro são registradas quando a
fase de julgamento começa (22.55-62).
O julgamento enfatizou a inocência de Jesus e a culpa daqueles que o
condenavam. No julgamento perante o Sinédrio (22.63-71), a acusação
contra Jesus era blasfêmia por afirmar ser o Filho de Deus. No entanto, uma
vez que o Sinédrio não tinha o poder de pena capital, eles o mandaram a

582
Pilatos (23.1-7). Pilatos não encontrou nenhuma culpa em Jesus,
declarando-o inocente por três vezes. Herodes também não encontrou culpa
(23.15), mas Pilatos sucumbiu às demandas da multidão sanguinária.
Assim, um triângulo de inimigos — Pilatos, Herodes e os líderes judeus —
reuniram-se para executar esse plano.

583
Tabela 6.1: Fases do Julgamento de Jesus
Julgamento Escritura Descrição
Julgamento perante João 18.19-23 Anás questiona Jesus sobre
Anás seus ensinamentos; Jesus é
esbofeteado na face e desafia
seus acusadores por
agredirem-no ilegalmente;
nenhum testemunho
produzido
Julgamento perante Mateus 26.57-68; Quando perguntado se ele é
Caifás Marcos 14.53-65; o Messias, Jesus alega ser o
João 18.24-28 divino Filho do Homem;
condenado por blasfêmia e
enviado a Herodes
Julgamento perante Lucas 23.1-6 Jesus falsamente acusado;
Pilatos afirma seu status messiânico;
enviado a Herodes
Julgamento perante Lucas 23.7-11 Falsas acusações contra
Herodes Jesus; Herodes não encontra
culpa alguma; Jesus enviado
a Pilatos
Julgamento perante Mateus 27.1-25; Nenhuma acusação formal
Pilatos (continuação) Marcos 15.1-15; contra Jesus é apresentada;
Lucas 23.12-25; João nenhum testemunho
18.29 a 19.6 produzido; Jesus sentenciado
à crucificação sem
condenação de Pilatos (por
três vezes Pilatos declara
não encontrar culpa em
Jesus)

O restante do capítulo 23 registra os eventos em torno da crucificação.


Jesus foi crucificado e zombado várias vezes (23.24-33). Ele foi zombado

584
pelos soldados que o crucificaram, pelos ladrões crucificados a seu lado e
pelos escribas e fariseus. Contudo, é evidente que algo mais do que uma
execução penal estava acontecendo quando o sol escureceu e o véu do
Templo se rasgou (23.44-46). Assim, o clima mudou: um soldado declarou
que Jesus era justo e a multidão saiu lamentando profundamente (23.47,48).
As aparições da ressurreição servem para reforçar e explicar o
significado da cruz. Um anjo confrontou as mulheres no sepulcro
(surpreendentemente) vazio e relembrou-as da afirmação de Jesus de que
ele ressuscitaria (24.1-8). A resposta dos apóstolos ao relato não é digna de
louvor, mas Pedro examinou o túmulo vazio. O evento mais proeminente é
a aparição de Jesus a dois discípulos no caminho de Emaús (24.13-33). O
fato de que esse era o plano de Deus é claramente reforçado (esp. em
24.26). Jesus, então, apareceu aos Onze em Jerusalém e declarou que ele
realmente estava ressurreto e não era um fantasma (24.34-49). Pela segunda
vez Jesus interpretou as Escrituras para seus discípulos. Finalmente, o
cumprimento de 9.51 ocorre em 24.50,51: Jesus subiu ao céu de Betânia,
próximo a Jerusalém.

585
Tabela 6.2: As Aparições do Jesus Ressurreto

Epílogo: Os Discípulos Retornam a Jerusalém


(24.52,53)
Os dois versículos finais formam um epílogo para o livro. Os discípulos
retornaram para Jerusalém alegremente. Quando eles chegaram, foram para
o Templo, bendizendo a Deus continuamente. Esse final prepara o leitor
para o segundo tratado, o livro de Atos, que continua a ênfase do Evangelho
no plano de salvação de Deus na história e seu cumprimento em Jesus.

TEOLOGIA
Temas Teológicos
Salvação e história da salvação

586
Muitos dos principais temas em Lucas estão relacionados com o
cumprimento dos propósitos de Deus em Jesus como o clímax da história
da salvação. Deus é o arquiteto de toda a história humana, conduzida por
seus propósitos e vontade. H. Conzelmann sustentou que Lucas via a
história da salvação em três etapas: (1) Israel; (2) ministério de Jesus; e (3),
a ecclesia pressa (“a igreja sob pressão”).79 Na verdade, os propósitos
apologéticos de Lucas centram-se na demonstração de que, em Jesus, Deus
cumpriu sua promessa de salvação a seu povo.80 Talvez de forma mais
precisa, no entanto, a concepção de Lucas da história da salvação pode ser
descrita ao longo das linhas de “promessa e cumprimento”, com João
Batista marcando o fim do período da promessa (16.16: “a Lei e os Profetas
existiram até João”) e as seguintes fases denotando o cumprimento dessa
promessa (Jesus e a igreja).81
O início do Evangelho implica que, em Jesus, Deus estava cumprindo
seu propósito de salvação previamente planejado (“cumpridas entre nós”;
1.1). Não demora até o leitor ser informado de que o que Deus cumpriu ao
enviar Jesus é a provisão de um Salvador (1.31-33; veja 1.68-71). De fato, a
salvação é um dos temas mais importantes neste Evangelho. A palavra
“salvação” (sōtēria) é usada quatro vezes em Lucas; ela não é usada em
Mateus ou em Marcos e é utilizada apenas uma vez em João. As três
primeiras dessas referências ocorrem no Cântico de Zacarias, onde é
descrito o ministério do Messias que virá (1.69,71,77; a quarta referência é
19.9). A palavra “salvação” também ocorre seis vezes no livro de Atos
(4.12; 7.25; 13.26,47; 16.17; 27.34).
Outras palavras no mesmo campo semântico também são proeminentes
em Lucas. Tanto Deus como Jesus são chamados de “Salvador” (sōtēr,
1.47; 2.11; mais uma vez, a palavra não é usada em Mateus ou Marcos e

587
apenas uma vez em João). O verbo “salvar” (sōzō) é frequentemente usado
como sinônimo de conversão (veja 7.50; 8.12; 13.23; também frequente em
Mateus e Marcos). Uma ocorrência particularmente proeminente e
memorável da palavra “salvar” no Evangelho de Lucas é encontrada em
19.10, onde Jesus definiu sua missão da seguinte forma: “Porque o Filho do
homem veio buscar e salvar o perdido”. Importante, como mostrado abaixo,
a salvação oferecida por Jesus abrange todas as pessoas, e em particular
aqueles de baixa posição na sociedade, provocando uma “grande inversão”
em e através do ministério de Jesus.

O cumprimento da profecia por Jesus


Estreitamente relacionado com o tema da salvação no Evangelho de Lucas
está o tema o do cumprimento da profecia da Escritura em e através de
Jesus. Em 1.1 é dito que os eventos da narrativa que se segue “cumpridos
entre nós”. E em 24.44-49, é dito aos discípulos que “tudo escrito acerca de
mim na Lei de Moisés, nos Profetas a nos Salmos deve ser cumprido”.
Assim, o início e o fim do Evangelho de Lucas moldam a narrativa ao
colocar o foco no tema do cumprimento.
O cumprimento da profecia também aparece com destaque em todo o
livro como parte da ênfase de Lucas no cumprimento do plano de Deus.82
Embora as citações de Lucas do AT não sejam extensivas, a referência a
Isaías 61.1,2 com relação ao sermão inaugural de Jesus na sinagoga de
Nazaré é altamente significativa na medida em que apresenta Jesus como o
Servo do Senhor de Isaías (4.18,19). Além disso, quando João Batista
interrogou Jesus, Jesus apontou para suas atividades como cumprimento das
expectativas messiânicas do AT (7.20; veja Is 29.18; 35.5, 61.1).

588
Há também um interesse naquela que Johnson chamou “profecia
literária”, isto é, o cumprimento das profecias feitas por personagens da
própria narrativa.83 Embora nada tenha sido dito a respeito da natureza de
seu nascimento, Simeão e Ana profetizaram a respeito de Jesus. Várias das
profecias do próprio Jesus também foram cumpridas. Entre elas o
cumprimento das predições de Jesus a respeito de seu sofrimento, morte e
ressurreição (9.22), sua rejeição por Israel (9.22,44), sua morte nas mãos
dos gentios (18.31-33), a destruição de Jerusalém (21.24) e a vinda do
Espírito (24.49). Esses cumprimentos constituem uma “prova de profecia”,
que serviram aos propósitos apologéticos de Lucas de mostrar que o
cristianismo era verdadeiro.
Tanto o Evangelho de Lucas quanto o livro de Atos nos mostram Deus
no controle absoluto dos acontecimentos na história enquanto o seu plano
continua a se desdobrar. Nas narrativas da infância tudo se move segundo a
direção de Deus. A morte de Jesus ocorreu pela vontade de Deus. Em 7.30
nós vemos que os fariseus rejeitam o plano de Deus para si mesmos.
Igualmente surpreendente é o uso da “necessidade divina” no Evangelho de
Lucas. Jesus descreveu seu ministério terrestre em termos de compulsão
divina: era necessário que ele estivesse na casa de seu Pai (2.49), era
necessário que ele pregasse o evangelho do reino em muitas cidades (4.43),
era necessário que ele morresse na cruz (9.22; 17.25; 22.37; 24.7), era
necessário que ele curasse a mulher com um fluxo de sangue (8.43), era
necessário que ele fosse morto em Jerusalém (13.33) e era necessário que
ele comesse na casa de Zaqueu (19.5). Todo o ministério terrestre de Jesus
era impulsionado pela necessidade divina (24.44).
A descrição que Jesus faz de sua morte também ocorre usando a
expressão “é necessário” (dei), indicando assim que a crucificação

589
aconteceria em conformidade com o plano de Deus. A primeira ocorrência
é encontrada em 9.22: “O Filho do Homem deve sofrer muitas coisas e ser
rejeitado pelas autoridades, pelos principais sacerdotes, pelos escribas, ser
morto e ressuscitado ao terceiro dia” (veja 9.44).84 Em 18.1-33, o leitor é
informado de que tudo o que foi escrito pelos profetas a respeito da morte e
ressurreição de Jesus será cumprido. A crucificação não é a morte
lamentável de um homem bom ou um mero exemplo da situação de todos
os profetas, mas o cumprimento do eterno plano de salvação de Deus.
Relacionada a isso está a descrição de Israel e do povo judeu no
Evangelho de Lucas. Alguns estudiosos alegam que os judeus são
apresentados de forma negativa por Lucas, mas essa conclusão é
desnecessária.85 Embora Israel seja retratada como uma nação que, em
geral, desviou-se de seu Deus e é constituída de pecadores,86 Jesus continua
a ser aquele que “cumpre as esperanças e aspirações de Israel”.87 A meta
final do plano de Deus para Israel é a sua restauração, não sua destruição
(At 1.6).
Maria e Zacarias entenderam Jesus como o cumprimento das promessas
de Deus a Israel (1.54,68). Simeão também esperava pela “consolação de
Israel” (2.25). Quando ele viu o menino Jesus, louvou a Deus por permitir-
lhe ver a salvação (2.30). Jesus seria uma revelação aos gentios, mas
também uma glória para Israel. No entanto, isso não se aplicava a todo o
Israel, pois Jesus estava “posto para queda e para elevação de muitos em
Israel, e como um sinal de contradição” (2.34). Assim, a vinda de Jesus é
inicialmente vista como um sinal de esperança e de advertência para Israel.
Mas a vinda de Jesus também ocasiona mais um movimento no plano
de salvação de Deus. Esse ponto é esclarecido pela Parábola dos Odres
Novos (5.33-39), e mais tarde uma nota similar de avanço é marcada

590
(16.16). A Lei e os Profetas estiveram em vigor até João; a partir de então,
as boas novas do reino de Deus foram pregadas por meio de Jesus.
Consequentemente, a linha divisória entre o mundo e o povo de Deus é a fé
em Cristo, e não a identidade étnica ou adesão à lei. Para Jerusalém, a
personificação da nação judaica, rejeitar Jesus ocasiona destruição ao invés
de paz, “pois não conheceste o tempo em da tua visitação” (19.44). A
salvação em Lucas é uma questão de fé, arrependimento e também de
seguir a Jesus.

A preocupação de Jesus com os humildes


Entre os evangelistas, foi especialmente Lucas quem enfatizou a
preocupação de Jesus com aqueles das classes baixas na sociedade — os
gentios, os pobres, os coletores imposto e “pecadores”, os enfermos e
deficientes físicos e mulheres e crianças. Isso faz parte do entendimento de
Lucas da salvação trazida por Jesus, uma salvação que inclui todas as
pessoas. Nisto Lucas repete a declaração de Paulo em Gálatas 3.28 que em
Cristo “não há judeu nem grego, não há escravo nem livre, não há homem
nem mulher”. Antes, a oferta divina da salvação em Cristo se estende a toda
humanidade.
Para indicar o alcance universal da salvação de Jesus, a genealogia de
Jesus é traçada de volta não apenas a Abraão, como em Mateus, mas até
Adão (4.1-13). Na narrativa da infância, o anjo anunciou: “eu vos proclamo
boas novas de grande alegria que serão para todo o povo” (2.10, grifo
nosso). “Todo o povo” significa que a salvação trazida por Jesus não é
apenas para o povo de Deus, os judeus, mas também para os gentios.

591
Assim, mesmo Simeão, ao ver o menino Jesus, profetizou que ele seria
também “uma luz para a revelação aos gentios” (2.32).

Algo Para Pensar:


A Preocupação de Jesus com os Humildes

Em sua sabedoria, Deus não deu não um, mas quatro relatos
inspirados da vida e ministério de Jesus. Sem se contradizerem, cada
um dos evangelistas captou aspectos únicos do coração e da missão
de Jesus. Mateus mostrou como Jesus cumpriu as predições das
Escrituras a respeito do tão aguardado Messias judeu. Marcos
apresentou Jesus como o Filho de Deus poderoso e que operava
milagres, reconhecido até mesmo pelo mundo gentílico. João exaltou
Jesus como o Verbo preexistente que se fez carne e revelou a glória
de Deus através de uma série cada vez maior de sinais messiânicos.
Mas e Lucas, o “médico amado” de Paulo? Com admirável
humildade Lucas reconheceu no início do seu Evangelho que não era
uma testemunha ocular nem o primeiro a escrever um relato sobre a
vida e o ministério de Jesus (1.1-4). No entanto, ao compilar sua
apresentação, ele consultou muitas das primeiras testemunhas
oculares e investigou “tudo cuidadosamente tudo desde o começo”
(1.3) a fim de documentar os “fatos que se realizaram entre nós”
(1.1).
Que tipo de Deus foi revelado através de Jesus? Lucas permitiu que
Maria, mãe de Jesus, respondesse: “Ele realizou poderosos feitos
com seu braço; ele dispersou os arrogantes por causa dos

592
pensamentos dos seus corações; Ele derrubou os poderosos dos seus
tronos e elevou os humildes. Ele satisfez os famintos com boas coisas
e mandou embora o rico sem nada” (1.51-53). Como Jesus
proclamou: “o Espírito do Senhor está sobre mim, porque me ungiu
para anunciar boas novas aos pobres” (4.18; veja Is 61.1). Por isso:
Bem-aventurados sois vós, os pobres, porque o reino de Deus é
vosso.
Bem-aventurados sois vós, que agora tendes fome, porque ficareis
satisfeitos.
Bem-aventurados sois vós que agora chorais, porque havereis de rir
(Lc 6.20,21).
O que Lucas captou no coração de Jesus foi sua preocupação com os
humildes — os pobres, mulheres, crianças, os não judeus
(samaritanos e gentios), os odiados coletores de impostos que
colaboravam com os romanos e, consequentemente, eram vistos
como traidores pelos judeus, os enfermos e deficientes, órfãos, viúvas
e estrangeiros. Leia seu Evangelho e medite sobre o modo como ele
retrata Jesus como “amigo dos pecadores” e médico que veio para
curar. Sua cura não é para aqueles que se consideram justos, mas
sim para aqueles que sabem que precisam da misericórdia de Deus.
E nessa “grande inversão”, retratada em muitas das parábolas de
Jesus no Evangelho de Lucas, os de baixa posição social neste
mundo são exaltados, enquanto os que fazem parte do sistema
encontram-se fora dos propósitos de salvação de Deus.

Durante o curso do seu ministério, Jesus elogiou a viúva de Sarepta e


Naamã, o sírio, ambos gentios (4.25-27); ele elogiou a fé de um centurião

593
gentio (7.9); fez de um samaritano o herói da Parábola do Bom Samaritano
(10.30-37) e elogiou outro samaritano por ser o único dos dez leprosos
purificados a voltar para agradecer (17.16); e ele muitas vezes referiu-se à
inclusão dos gentios na órbita da salvação (p. ex., 14.23). No final do
Evangelho, Jesus enviou os discípulos a todas as nações (24.46-48), e o
livro de Atos narra a marcha irresistível do Evangelho a Roma (At 1.8),
com Paulo afirmando que a salvação de Deus havia chagado aos gentios (At
28.28).
A ênfase de Lucas sobre a universalidade da salvação trazida por Jesus
estende-se significativamente àqueles de baixa posição na sociedade,
principalmente os pobres.88 Relacionado a isto está a ênfase de Lucas na
“grande inversão” trazida pelo ministério de Jesus. Assim, Maria declarou
no início do Evangelho que os humildes seriam exaltados e que os
poderosos seriam humilhados (1.48,49). Em seu sermão inaugural na
sinagoga de Nazaré, Jesus declarou que ele foi enviado para “anunciar as
boas novas aos pobres”, em cumprimento da profecia de Isaías sobre o
Servo do Senhor (4.18, veja 7.22). As Bem-Aventuranças do Sermão da
Planície (6.20-23) são equilibradas com os “ais” contra os ricos e bem
alimentados (6.24-26).
Uma questão importante em Lucas é o uso e abuso da riqueza no que
diz respeito ao discipulado. De forma consistente, ele enfatizou que Jesus
fortemente se opôs à noção de que a riqueza e posição social eram um
indicativo do status de uma pessoa diante de Deus. Em vez disso, Jesus
aceitou a todos que se arrependeram e se voltaram para ele, enquanto as
posses, o status e o poder do indivíduo constituíam os principais obstáculos
à recepção da mensagem de Jesus. As Parábolas do Rico Insensato (12.13-
21) e do Homem Rico e Lázaro (16.19-31) expõem a idolatria e a futilidade

594
última da riqueza. Jesus aconselhou os fiéis: “Vendei vossas posses e dai
aos pobres. Fazei para vós mesmos bolsas de dinheiro que não envelhecem;
tesouro no céu que jamais acabe, onde nenhum ladrão chega e nenhuma
traça destrói” (12.33). Jesus pintou um quadro aterrador dos exaltados neste
mundo, mas que se verão excluídos quando quiserem entrar no reino de
Deus (13.28-30). Aqueles que derem um banquete devem convidar os
pobres e humildes (14.13, 21-24).
Em última análise, a atitude de uma pessoa em relação a seus bens é um
indicativo de seu relacionamento com Jesus: “Da mesma forma, portanto,
todo aquele dentre vós que não diz ‘adeus’ a todas as suas posses não pode
ser meu discípulo” (14.33). Na Parábola do Administrador Infiel, Jesus
instruiu seus ouvintes a que investissem seu dinheiro tendo sempre a
eternidade em mente (16.9). Jesus também explicou que somente uma obra
de Deus pode fazer um homem rico entrar no reino (18.24,25). Zaqueu,
devido à salvação, voluntariamente deu metade do seu dinheiro aos pobres
e usou a outra metade para pagar aqueles a quem ele tinha enganado (19.8).
Os servos fiéis investem na obra de seu mestre (19.11-27) e a viúva que
dividiu o pouco que tinha recebe a mais alta aprovação de Jesus (21.1-4).
Ao longo de seu Evangelho, Lucas também enfatizou os ensinamentos
de Jesus entre os humildes e marginalizados na sociedade: os odiados
coletores de impostos, desprezados como traidores devido aos serviços
prestados às autoridades romanas, e “pecadores”. Levi, um coletor de
impostos, foi incluído entre os Doze, e Jesus se associou com os coletores
de impostos e outros “pecadores” na casa de Levi, afirmando que ele tinha
vindo para chamar essas pessoas ao arrependimento (5.30,32). Entre as
pessoas, Jesus era conhecido como “um amigo de […] pecadores” (7.34;
veja 7.36-50). Quando repreendido por seus oponentes por “receber os

595
pecadores” (15.1,2), Jesus respondeu contando uma trilogia de parábolas
que destacam a alegria de encontrar o que havia sido perdido. Na verdade, é
por isso que Jesus veio: “buscar e salvar o perdido” (19.7).
Outro grupo de desprivilegiados que de acordo com Lucas foi recipiente
do ministério especial de Jesus foi o grande número de enfermos,
endemoninhados e deficientes. Entre os muitos que foram curados estava a
sogra de Pedro (4.38-41); o servo de um centurião (7.1-10); o filho de uma
viúva (7.11-17, ressuscitado dos mortos); o endemoninhado geraseno (8.26-
39); uma mulher com fluxo anormal de sangue e a filha de Jairo, um
dirigente da sinagoga (8.40-56; a última foi ressuscitada dentre os mortos);
e um mendigo cego na estrada para Jericó (18.35-43). No seu ministério de
cura Jesus sintetizou a descrição do AT do Messias que faria com que os
cegos enxergassem, os coxos andassem, os leprosos fossem purificados, os
surdos ouvissem, os mortos ressuscitassem e o evangelho fosse pregado aos
pobres (7.22; veja 4.18).
No entanto, outra parte dessa “grande inversão” ocasionada pela vinda
de Jesus envolve as mulheres. As mulheres desempenharam um papel
importante no Evangelho de Lucas, que menciona 13 mulheres que não
receberam destaque nos outros Evangelhos.89 Muitas dessas mulheres são
caracterizados pela devoção incomum a Jesus. Entre estas estava uma
mulher pecadora que ungiu Jesus (7.36-50); Maria Madalena; Joana, mulher
de Cusa, administrador de Herodes e Suzana, entre outras, que serviam
Jesus com seus próprios bens (8.2,3); e Maria e Marta, que aprenderam com
ele, serviam-lhe e foram suas grandes amigas (10.38-42). As mulheres
também tiveram um papel importante nos eventos que cercaram a
crucificação e ressurreição de Jesus (23.55 a 24.10). O número considerável
de mulheres entre os seguidores de Jesus estava em contraste com o

596
ministério de outros rabinos judeus orientado aos homens na época de
Jesus. As mulheres também receberam destaque em muitas das parábolas de
Jesus no Evangelho de Lucas, muitas vezes em paralelo com personagens
masculinos.90
Um outro grupo que recebeu atenção especial de Jesus, segundo Lucas,
foram as crianças. Em seus primeiros anos, o próprio Jesus foi
frequentemente chamado de “menino” por Lucas (2.17,27,40).
Repetidamente Jesus usou as crianças como exemplo do tipo de humildade
necessária para que as pessoas entrassem no reino de Deus (9.46-48; 18.15-
17). Em determinado ponto de seu ministério, Jesus pronunciou “ais” sobre
aqueles que fazem os pequeninos tropeçarem, dizendo que seria melhor
para eles ter uma pedra de moinho pendurada no pescoço e ser atirados ao
mar (17.2). Quando seus discípulos tentaram impedir que o povo lhe
trouxesse crianças, ele os repreendeu de forma severa e disse-lhes para que
deixassem que as crianças fossem a ele (18.15-17).

Tabela 6.3: Jesus e os Humildes no Evangelho de Lucas


Grupo de Pessoas Passagens no Evangelho de Lucas
Gentios 2.10,32; 4.25-27; 7.9; 10.30-37; 14.23; 17.16
Os pobres 1.46-55; 4.18; 6.20-23; 7.22; 10.21,22; 14.13,
21-24; 16.19-31; 21.1-4
Os coletores de 5.27-32; 7.28,30,34,36-50; 15.1,2; 19.7
impostos e “pecadores”
Os enfermos e 4.31-41; 5.12-26; 6.6-11, 17-19; 7.1-17; 8.26 a
deficientes 9.2; 9.37-43; 17.11-19; 18.35-43
Mulheres 7.36-50; 8.1-3, 48; 10.38-42; 13.10-17; 24.1-12
Crianças 2.17,27,40; 9.46-48; 17.2; 18.15-17

597
O Espírito Santo
A ênfase de Lucas no Espírito Santo é parte da nova época sendo
inaugurada com Jesus (veja At 2.16-21, citando Jl 2.28-32). É dada ao
Espírito Santo uma proeminência maior no Evangelho de Lucas do que em
qualquer outro Evangelho (com a possível exceção de João 14 a 16). O
Espírito estava ativo nas narrativas da infância e no início do ministério de
Jesus. João Batista e seus pais foram cheios do Espírito Santo (1.15,41,67).
Jesus foi concebido quando o Espírito Santo veio sobre Maria (1.35).
Simeão era um homem sobre o qual repousava o Espírito (2.25). Jesus foi
descrito como cheio do Espírito (3.22; 4.1,14). João predisse que Jesus
batizaria com o Espírito (3.16). E em seu sermão inaugural, Jesus afirmou
que o Espírito o ungiu “para anunciar as boas novas aos pobres” (4.18).
No Evangelho de Lucas, Jesus explicou que o ministério do Espírito se
prolongaria para além de seu ministério terrestre. Jesus fez referência ao Pai
concedendo o Espírito a todos aqueles que lhe pedissem (11.13); ele alertou
para a blasfêmia contra o Espírito (12.10); ele mostrou que o Espírito falaria
através dos discípulos quando eles sofressem perseguição por conta de sua
associação com Jesus (12.12); e ele prometeu a vinda do Espírito após a sua
ressurreição (24.49). É importante que, por necessidade da salvação-
histórica, a vinda do Espírito deve aguardar o período posterior à ascensão
de Jesus. Assim, a chegada do Espírito marcou a exaltação de Jesus com o
Pai como prova de sua ressurreição (At 2.14-36).

Oração
Um tema final de Lucas que está relacionado com sua ênfase no Espírito
Santo é o da oração. O próprio Jesus orou muitas vezes, expressando sua

598
total dependência de Deus durante o seu ministério terrestre e modelando
uma devotada abordagem do ministério e de vida para todos os seus
seguidores (5.16; 6.12; 11.1; 22.41,42).
Notavelmente, a oração prolongada e persistente era prática habitual de
Jesus. Lucas disse a seus leitores que Jesus “frequentemente se retirava para
lugares desertos e orava” (5.16). Antes de sua seleção dos Doze, Jesus “saiu
para o monte para orar e passou toda a noite em oração a Deus” (6.12).
Certa vez, quando os discípulos ouviram Jesus orar, e quando ele terminou,
pediram-lhe para que os ensinasse a orar (11.2-4).
Lucas também registrou o ensino extensivo de Jesus sobre a oração,
alguns em parábolas (11.5,6; 18.1-14). Nessas instruções, Jesus ordenou aos
seus ouvintes a “orar sempre e não ficar desencorajado” (18.1). Jesus
também insistiu com seus discípulos a que orassem para que não caíssem
em tentação (22.46; veja 11.4).

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON


Jesus como o filho de Adão, o filho de Deus (3.38)
Jesus como o Servo Sofredor ungido pelo Espírito (4.18,19)
Jesus como o compassivo médico e curandeiro (5.31,32)
Jesus como o Messias enviado aos pobres, gentios, mulheres, crianças,
enfermos e outros de baixo status na sociedade
Jesus como o “amigo dos coletores de impostos e pecadores” (7.34) e
como aquele que busca os perdidos (19.10)

QUESTÕES PARA ESTUDO

599
1. Quanto à autoria de Lucas, em quais pontos a maioria dos estudiosos
concorda?
2. Por que as evidências internas e externas dão apoio à autoria lucana?
3. O que a terminologia “médica” de Lucas sugere?
4. A quem Lucas-Atos foi dedicado? Qual é a provável identidade do
destinatário e com base em quê?
5. A fim de avaliar a data de composição de Lucas, por que é necessário
discutir a data de Atos?
6. Onde foi o local mais provável para Lucas coletar informações para o
seu Evangelho?
7. Qual é a importância da genealogia de Jesus em Lucas?
8. Como o uso que Lucas faz das parábolas difere dos outros Sinóticos?
9. Segundo os autores, quais dois indivíduos ou grupos são as principais
testemunhas oculares fontes para o relato de Lucas?
10. Qual é a forma mais natural, de acordo com os autores, de
compreender o propósito de Lucas ao escrever?
11. O que significa a “narrativa de viagem” de Lucas, e por que é que os
autores sugerem que ela “inova”?
12. Quais são as fases do julgamento de Jesus?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


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Reflection, Formation. Scripture and Hermeneutics 6 (Grand
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WILSON, S. G. Luke and the Pastoral Epistles (London: SPCK, 1979).

1
Se, como postulado por alguns estudiosos, Lucas foi o amanuense de Paulo para as Epístolas

Pastorais, é ainda mais notável o quanto Lucas contribuiu para o conteúdo do NT. Veja S. G. Wilson,

Luke and the Pastoral Epistles (London: SPCK, 1979), p. 139-40.

2
A. Plummer (A Critical and Exegetical Commentary on the Gospel According to S. Luke, 5. ed.

[Edinburgh: T&T Clark, 1922], xlix) observou que Lucas era o mais versátil de todos os escritores

dos Evangelhos: “Ele pode ser tão hebraístico quanto a LXX, e tão livre de hebraísmos quanto

Plutarco. E, no geral, se intencionalmente ou não, ele é hebraístico ao descrever a sociedade hebraica,

e grego ao descrever a sociedade grega”.

603
3
E. Renan, Les Évangiles et la seconde génération chrétienne (Paris: Calmann Lévy, 1877), p.

283: “C’est le plus beau livre qu’il y ait” (edição em inglês: The Gospels [London: Mathieson, s.d.]).

4
Veja Richard Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses: The Gospels as Eyewitness Testimony

(Grand Rapids: Eerdmans, 2006), p. 114-24, p. 129-32.

5
Sobre Quirino, veja a discussão no capítulo 3.

6
S. E. Porter; L. M. MacDonald, Early Christianity and Its Sacred Literature (Peabody:

Hendrickson, 2000), p. 291.

7
Veja H. Conzelmann, The Theology of St. Luke, tradução para o inglês de G. Buswell (London:

Faber & Faber, 1960).

8
W. C. van Unnik, “Luke-Acts, a Storm Center in Contemporary Scholarship”, em: L. E. Keck;

J. L. Martyn, orgs., Studies in Luke-Acts (Nashville: Abingdon, 1966), p. 15-32.

9
A. Thiselton, “The Hermeneutical Dynamics of ‘Reading Luke’ as Interpretation, Reflection

and Formation”, em: C. G.Bartholomew; J. B. Green; A. Thiselton, orgs., Reading Luke:

Interpretation, Reflection, Formation, Scripture and Hermeneutics 6 (Grand Rapids: Zondervan,

2005), p. 3. Para uma abordagem literária, veja, W. S. Kurz, Reading Luke Acts: Dynamics of

Biblical Narrative (Louisville: Westminster John Knox, 1993).

10
Veja D. A. Carson; D. J. Moo, An Introduction to the New Testament, ed. rev. (Grand Rapids:

Zondervan, 2005), p. 205-6 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução ao Novo

Testamento] (citando M. Dibelius, Studies in the Acts of the Apostles [London: SCM, 1956], p. 89 e

148), que observou “que é improvável que os livros tenham alguma vez circulado sem um nome

ligado a eles de alguma forma”.

11
Veja Lucas 1.1-4. Em 1882, W. K. Hobart escreveu seu famoso livro The Medical Language of

St. Luke (reimpr. Grand Rapids: Baker, 1954), no qual ele argumentou que onde Mateus e Marcos

usaram expressões comuns, Lucas frequentemente empregou termos médicos para descrever as curas

604
de Jesus. Mas o argumento foi contestado por H. J. Cadbury, The Style and Literary Method of Luke

(Cambridge: Harvard University Press, 1920), que mencionou que a terminologia de Lucas não era

necessariamente especializada embora fosse a linguagem utilizada pelas pessoas educadas. O

resultado duradouro dessa discussão é que o escritor de Lucas/Atos com certeza era uma pessoa

muito bem-educada.

12
O particípio grego parēkolouthēkoti (“tendo investigado cuidadosamente”) em 1.3 é

masculino.

13
Veja a referência a “muitos” outros em 1.1.

14
Veja a referência “às testemunhas oculares originais” em 1.2.

15
Mas veja a opinião de W. G. Kümmel, Introduction to the New Testament, ed. rev., tradução

para o inglês de H. C. Kee (Nashville: Abingdon, 1975), p. 149: “a única coisa que pode ser dita com

certeza sobre o autor, com base em Lucas, é que ele era um cristão gentio”.

16
Por exemplo, J. Verheyden, “The Unity of Luke-Acts: What Are We Up To?”, em: J.

Verheyden, org., The Unity of Luke-Acts (Leuven: Univ. Press, 1999), p. 3. Uma das poucas vozes

contra a autoria unificada é A. C. Clark, The Acts of the Apostles (Oxford: Clarendon, 1933).

17
L. Morris, The Gospel According to St. Luke: An Introduction and Commentary, TNTC 3

(Grand Rapids: Eerdmans, 1974), p. 14.

18
Por exemplo, Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 204; F. F. Bruce, The Acts of

the Apostles (Grand Rapids: Eerdmans, 1951), p. 2-3; e a maioria dos estudiosos conservadores; mas

veja S. E. Porter, “The ‘We’ Passages”, em: D. W. J. Gill; C. Gempf, orgs., The Book of Acts in Its

First-Century Setting (Grand Rapids: Eerdmans, 1994), vol. 2: The book of Acts in its greco-roman

setting, p. 545-74.

19
C. J. Hemer, The Book of Acts in the Setting of Hellenistic History (Winona Lake: Eisenbrauns,

1990), p. 312-13.

605
20
C. K. Barrett, Luke the Historian in Recent Study (Philadelphia: Fortress, 1979), p. 22; Porter,

“‘We’ Passages”, p. 574.

21
Kümmel, Introduction, p. 184.

22
Também E. Haenchen, The Acts of the Apostles (Philadelphia: Westminster, 1971), p. 85-90; P.

Vielhauer, “On the ‘Paulinism’ of Acts”, em: Studies in Luke-Acts, p. 33-34; F. Bovon, Luke 1,

Hermeneia, tradução para o inglês de C. M. Thomas (Minneapolis: Fortress, 2002), p. 8-9. Cf. V. K.

Robbins (“The We-Passages in Acts and Ancient Sea-Voyages”, BR 20 [1975], p. 5-18), que

entendeu as referências contendo o pronome pessoal “nós” como característica de um gênero que

recontava antigas viagens marítimas; mas C. J. Hemer (“First Person Narrative in Acts 27 and 28”,

TynBul 36 [1985], p. 79-109) refutou esse ponto de vista.

23
A maioria dos proponentes desse entendimento não o faz com base no fenômeno em si, mas

devido à sua crença anterior de que o escritor de Lucas/Atos estava tão distante do Paulo histórico

que ele não poderia ter sido seu companheiro de viagem. Veja D. Wenham, “The Purpose of Luke-

Acts”, em: Reading Luke: Interpretation, Reflection, Formation, p. 81.

24
B. D. Ehrman (The New Testament: A Historical Introduction to the Early Christian Writings,

4. ed. [New York: Oxford University Press, 2008], p. 159) indevidamente reduziu essas múltiplas

referências a uma única (Fm 24). Confira os tratamentos da autoria de Paulo de Colossenses e das

Epístolas Pastorais mais tarde neste volume.

25
Veja Colossenses 4.10-14 (esp. v. 10,11a) e a discussão em Carson e Moo, Introduction to the

New Testament, p. 206.

26
A citação exata é: “Pois nas memórias que eu digo foram redigidos por seus apóstolos e por

aqueles que os seguiram, [está registrado] que o seu suor caiu como gotas de sangue enquanto ele

estava orando e dizendo: ‘Se for possível, que este cálice passe’” (Dial. 103. Embora isto deixe a

606
desejar como citação de Lucas como autor, a referência está de acordo com a visão da igreja

primitiva da autoria dos Evangelhos.

27
J. T. Townsend, “The Date of Luke-Acts”, em: C. Talbert, org., Luke-Acts: New Perspectives

from the Society of Biblical Literature (New York: Crossroad, 1984), p. 47.

28
C. E. Hill, “What Papias Said About John (and Luke): A ‘New’ Papian Fragment”, JTS 49

(1998), p. 588-89.

29
F. Siegert, “Unbeachtete Papiaszitate bei Armenischen Schriftstellern”, NTS 27 (1981), p. 606.

30
Holmes, Apostolic Fathers, p. 755-57.

31
Também F. Godet, A Commentary on the Gospel of St. Luke, tradução para o inglês de W. W.

Shalders; M. D. Cusin (New York: Funk & Wagnalls, 1890), p. 1-3.

32
Bovon (Luke, p. 10) escreveu: “Por que alguém se depararia com o nome Lucas permanece um

mistério. Talvez um estudante de Paulo fosse desejável para este trabalho. Os nomes Tito e Timóteo

já haviam sido pegos, se apenas como referentes, e não como escritores das Epístolas Pastorais. Entre

os nomes remanescentes que frequentemente aparecem no corpus paulino, Lucas quase se destaca.

As observações de Bovon ilustram bem a dificuldade: o nome “Lucas” nos saltaria aos olhos das

páginas da Bíblia se não fosse a tradição da igreja?

33
H. J. Cadbury (The Making of Luke-Acts [London: SPCK, 1927, reimpr. 1958], p. 354-60)

pareceu capturar o espírito da opinião crítica quando ele explicou a identificação que a igreja

primitiva fez do autor como Lucas como um pouco mais do que conjecturas baseadas no equivocado

entendimento das passagens contendo o pronome pessoal “nós” e a uma crença igualmente

equivocada de que Paulo escreveu todas as cartas que levam seu nome.

34
Essas questões são retomadas novamente no capítulo sobre Atos.

35
J. A. Fitzmyer, The Gospel According to Luke I-IX (Garden City: Doubleday, 1981), p. 53.

607
36
Por exemplo, R. E. Brown (An Introduction to the New Testament [New York: Doubleday,

1997], p. 273-74) datou Lucas por volta de 85 porque ele atribuiu a Marcos uma data por volta de 68-

73.

37
Veja Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 180.

38
Kümmel (Introduction, p. 150) sustentou que “até o ano 60 ‘muitos’ escritos evangélicos

poderiam não existir, incluindo Marcos”. Mas isto é injustificado uma vez que houve três décadas

entre a ressurreição de Jesus e a escrita de Lucas.

39
Hemer, Book of Acts in the Setting of Hellenistic History, p. 365.

40
Morris, Gospel According to St. Luke, p. 22.

41
Alguns estudiosos alegaram que Atos não menciona o destino de seus participantes. Mas

Estevão e Tiago, o filho de Zebedeu, encontraram seu destino em Atos 7 e 12 (veja Hemer, Book of

Acts in the Setting of Hellenistic History, p. 378).

42
Por exemplo, Lucas 7.20 veja Isaías 28.18; 35.5; 61.1; Lucas 7.27 veja Malaquias 3.1; Lucas

24.6 veja Lucas 9.21-44; 18.31-33; Atos 11.28; e Atos 21.10-14.

43
Fitzmyer (Luke, p. 56) tentou explicar a omissão da destruição do Templo ao propor que a

igreja cristã há muito havia sido removida de sua origem palestina e estava simplesmente mais

interessada em divulgar o cristianismo no mundo mediterrâneo entre os gentios europeus.

44
L. T. Johnson, “Book of Luke-Acts”, ABD 4:404. Para esforços para explicar a falta de

referências às cartas de Paulo em Atos no pressuposto de uma data tardia de Atos, veja W. O. Walker,

“Acts and the Pauline Corpus Reconsidered”, JSNT 24 (1985), p. 3-23; id., “Acts and the Pauline

Corpus Revisited: Peter’s Speech at the Jerusalem Conference”, em: R. P. Thompson; T. E. Phillips,

org., Literary Studies in Luke-Acts: Essays in Honor of Joseph B. Tyson (Macon: University Press,

1998), p. 77-86.

608
45
A alegação de deSilva (Introduction, p. 309) de que depois que Paulo chegou a Roma

“qualquer menção explícita dos eventos da metade ao final dos anos 60 é fora de propósito e

supérflua” ainda não reponde a questão do porquê o resultado do primeiro julgamento de Paulo em

Roma ou dos eventos subsequentes não foram mencionados.

46
Embora seja verdade que alguns estudiosos também datam as Pastorais bem posteriormente.

47
Por exemplo, Bock, Luke, p. 16-18; Carson e Moo, Introduction to the New Testament, p. 208;

I. H. Marshall, The Gospel of Luke: A Commentary on the Greek Text, NIGTC (Grand Rapids:

Eerdmans, 1978), p. 33-35; Morris, Luke, p. 22-26.

48
H. Koester (Ancient Christian Gospels: Their History and Development [Harrisburg: Trinity,

1990], p. 243) atribuiu a menção da proveniência no Prólogo Anti-Marcionita a uma emenda do

século IV.

49
Fitzmyer, Luke, p. 57.

50
Mas observe o ponto de vista contrário de Teofrasto (Characters 5), que defendeu que o título

é “simples discurso lisonjeiro” (citado e prontamente descartado por Bock, Luke, p. 63; Bock

também citou a opinião discordante de F. Bovon, Das Evangelium nach Lukas, EKKNT 3/1 [Zürich:

Benzinger/Neukirchen-Vluyn: Neukirchener, 1989], vol. 1: Lk 1.1 to 9.50, p. 39, n. 34).

51
Veja a discussão e referências bibliográficas em Bock, Luke, p. 63.

52
Por exemplo, E. E. Ellis, The Gospel of Luke, 2. ed., New Century Bible (Grand Rapids:

Eerdmans, 1974), p. 66.

53
Por exemplo, W. J. Larkin, Acts, IVPNTC (Downers Grove: InterVarsity, 1995), p. 20; J.

Nolland, Luke 1-9:20, WBC 35A (Dallas: Word, 1989), xxxiii (sobre seu ponto de vista, veja

informações adicionais sob Propósito).

609
54
Por exemplo, Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 210: “Ele provavelmente era

um recém-convertido à fé”.

55
Que Teófilo foi um oficial romano responsável pelo julgamento de Paulo foi frequentemente

discutido na primeira parte do século XX. Bruce (Acts, p. 29) citou J. I. Still (St. Paul on Trial: A

New Reading of the History in the Book of Acts and the Pauline Epistles [London: Student Christian

Movement, 1923], p. 84) e G. S. Duncan (St. Paul’s Ephesian Ministry: A Reconstruction with

Special Reference to the Ephesian Origin of the Imprisonment Epistles [London: Hodder &

Stoughton, 1929], p. 97).

56
Veja Plummer (Luke, p. 5), o primeiro a dizer que o epíteto kratistos (“excelentíssimo”) “está

fortemente a favor do ponto de vista de que Teófilo era uma pessoa real”, mas continuou a dizer que

“foi um nome provavelmente usado para representar qualquer leitor piedoso”.

57
Bock, Luke, p. 63; Marshall, Luke, p. 43; Fitzmyer, Luke, p. 299.

58
Veja a referência de Josefo em dois livros subsequentes a “excelentíssimo” (kratiste) e

“estimadíssimo” (timiōtate) Epafrodito (Contra Ápion 1.1; 2.1).

59
A palavra grega para “instruir” é katēcheō, que pode significar “informar, reportar” (At

21.21,24) ou “instruir” (At 18.25; Rm 2.18; 1Co 14.19; Gl 6.6). Consequentemente, Teófilo pode

simplesmente ter sido informado sobre a história de Jesus ou ter recebido instrução formal. Baseado

no significado se katēcheō, alguns estudiosos argumentaram que Teófilo era um não cristão

interessado (Larkin, Acts, 20; se o propósito de Lucas pudesse ter sido, pelo menos em parte,

evangelístico), em quanto outros sustentam que ele era um fiel (veja Bock, Luke, p. 64).

60
L. Alexander (“Ancient Book Production and the Gospels”, em: R. Bauckham, org., The

Gospels for All Christians: Rethinking the Gospel Audiences [Grand Rapids: Eerdmans, 1998], p. 98-

99) observou que o patrono abrigaria e alimentaria o escritor enquanto o livro estivesse sendo escrito

e, portanto, dando acesso para que o livro fosse copiado. Esta não teria sido a única fonte de

610
publicação, mas era uma fonte importante. Os patronos também tinham interesses variados nos

próprios livros.

61
Plummer (Luke, xxiv) observou o seguinte: zelotēs (“zelote”) para kananiaos; kranion

(“Caveira”) para o aramaico golgotha; nomikos (“advogado”) para grammateus (“escriba”); os

termos “rabi” ou rabbouni não aparecem em Lucas, mas aparecem nos paralelos de Marcos e

Mateus; Lucas tem apenas sete exemplos de amēn comparado com 30 de Mateus (Lucas prefere

formas de “em verdade”).

62
Plummer, Luke, xxiv-xxv.

63
Fitzmyer (Luke, p. 58) listou Lucas 1.5; 4.44; 6.17; 7.17; 23.5; Atos 2.9; 10.37 como exemplos

específicos.

64
J. Jervell, Luke and the People of God: A New Look at Luke-Acts (Minneapolis: Augsburg,

1979); R. L. Brawley, Luke-Acts and the Jews: Conflict, Apology, and Conciliation (Atlanta:

Scholars Press, 1987).

65
Blomberg, Jesus and the Gospels, p. 152 [publicado em português por Vida Nova sob o título

Jesus e os Evangelhos: uma introdução ao estudo dos 4 Evangelhos].

66
Por exemplo, R. Maddox (The Purpose of Luke-Acts, Studies of the New Testament and Its

World [Edinburgh: T&T Clark, 1982], p. 19-23) listou os seguintes pontos de vista sobre o propósito

de Lucas: evangelismo; uma apologia para o julgamento de Paulo; defesa dos cristãos diante do

governo romano; uma defesa da memória de Paulo; uma explicação para a demora da Segunda

Vinda; uma defesa contra o gnosticismo; e a confirmação do evangelho. Para outras discussões sobre

do(s) propósito(s) de Lucas-Atos veja Bock (Luke, p. 14-15), que forneceu uma lista de onze

interpretações possíveis de Lucas. Veja também Carson; Moo (Introduction to the New Testament, p.

301-306), que discutiram conciliação; evangelismo/apologética; polêmicas teológicas; e edificação.

67
Veja nota anterior.

611
68
C. Spicq, “ἀσϕάλεια, ἀσϕαλής, ἀσϕαλίζοµαι, ἀσϕαλῶς”, em: Theological Lexicon of the

New Testament (Peabody: Hendrickson, 1994), vol. 1: ἀγα — ἐλπ, p. 216.

69
Veja especialmente R. Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses: The Gospels as Eyewitness

Testimony (Grand Rapids: Eerdmans, 2007), esp. p. 58-60 e p. 129-32.

70
Bock, Luke, p. 15.

71
Ibid. Veja em Temas Teológicos.

72
Para uma comparação completa entre as genealogias de Mateus e Lucas, veja D. S. Huffman,

“Genealogy”, em: Dictionary of Jesus and the Gospels, p. 253-59.

73
Mateus empregou vários marcadores cronológicos em sua versão da narrativa da tentação:

“então” (tote) nos v. 5, 10 e “novamente” (palin) no v. 8.

74
As tentações parecem fazer um paralelo a Gênesis 3.6: (1) pedras em pães/“bem por alimento”;

(2) reinos do mundo/“agradáveis à vista”; (3) Pináculo do Templo/“desejoso por obtenção de

sabedoria”. Se for assim, a apresentação de Lucas é semelhante ao ensino de Paulo sobre Jesus como

o último Adão (veja Rm 5.14-21; 1Co 15.22). Também Godet, Luke, p. 207-208; Plummer, Luke, p.

109; Bock, Luke, p. 371; Hendriksen, Luke, p. 233-34; contra Fitzmyer, Luke, p. 512.

75
Bock, Luke, p. 629.

76
Veja Green, Luke, p. 516.

77
Bock, Luke, p. 1501.

78
Veja Green, Luke, p. 683-89.

79
Conzelmann, Theology of St. Luke, p. 16-17.

80
Veja F. Thielman, Theology of the New Testament: A Canonical and Synthetic Approach

(Grand Rapids: Zondervan, 2005), p. 111-16.

612
81
Ibid., p. 117. Thielman observou que um entendimento em dois estágios é possível, mas uma

vez que a repetição da ascensão em Atos 1.9-11 aponte para o período de Jesus como um período

separado (veja v. 22), é seguro assumir três estágios.

82
L. T. Johnson (The Gospel of Luke, SacPag 3 [Collegeville: Liturgical Press, 1991], p. 16)

descreveu o uso que Lucas faz da prova da profecia como seu “mais importante recurso literário”.

83
Ibid.

84
Isso é repetido quase que literalmente em 24.7: “o Filho do Homem deve ser traído e entregue

nas mãos de homens pecadores, crucificado e ressuscitado ao terceiro dia”. Veja 13.33: Ele deve

morrer em Jerusalém; e 17.25: “Mas primeiro ele deve sofrer muitas coisas e ser rejeitado por esta

geração”.

85
Por exemplo, J. T. Sanders (The Jews in Luke-Acts [Philadelphia: Fortress, 1987], p. 317)

declarou que “na opinião de Lucas, o mundo será muito melhor quando ‘os judeus’ receberem o que

merecem e o mundo se livrar deles”.

86
I. H. Marshall, New Testament Theology (Downers Grove: InterVarsity, 2004), p. 142

[publicado em português por Vida Nova sob o título Teologia do Novo Testamento].

87
Wenham, “Purpose”, p. 88.

88
Veja especialmente C. L. Blomberg, Neither Poverty nor Riches: A Biblical Theology of

Material Possessions, NSBT (Grand Rapids: Eerdmans, 1999), p. 111-46; 160-74.

89
M. Strauss, Four Portraits, One Jesus: An Introduction to Jesus and the Gospels (Grand

Rapids: Zondervan, 2006), p. 339.

90
Veja T. K. Seim, The Double Message: Patterns of Gender in Luke-Acts (Edinburgh: T&T

Clark/Nashville: Abingdon, 1994).

613
CAPÍTULO 7

O Evangelho segundo João

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os fatos-chave do
Evangelho de João. Em relação à História, os estudantes deverão ser
capazes de identificar o autor do Evangelho, data, origem, destino e
propósito. Em relação à Literatura, eles deverão ser capazes de fornecer
uma descrição básica do livro e identificar os principais elementos do
conteúdo do livro encontrado na Discussão Unidade por Unidade. Em
relação à Teologia, os estudantes deverão ser capazes de identificar os
principais temas teológicos de João.
Conhecimentos intermediários: além do domínio dos conteúdos
essenciais identificados no item Conhecimentos básicos, os estudantes
deverão ser capazes de apresentar os argumentos para conclusões históricas,
literárias e teológicas. Em relação à História, os estudantes deverão ser
capazes de discutir as evidências da autoria de João, data, origem, destino e
propósito. Em relação à Literatura, eles deverão ser capazes de fornecer
uma descrição pormenorizada do livro. Em relação à Teologia, os
estudantes deverão ser capazes de discutir os principais temas teológicos de

614
João e as formas pelas quais eles contribuem de forma única para o cânon
do NT.
Conhecimentos avançados: além de domínio do conteúdo essencial
identificado nos itens Conhecimentos básicos e Conhecimentos
intermediários, os estudantes deverão ser capazes de fazer um levantamento
dos estudos joaninos e de explicar e criticar a “Hipótese da Comunidade
Joanina”. Eles deverão ser capazes de avaliar criticamente as evidências
internas e externas de que João, filho de Zebedeu, escreveu o Evangelho de
João, e deverão ser capazes de interagir criticamente com a obra de Richard
Bauckham Jesus and the Eyewitnesses a esse respeito. Eles também
deverão ser capazes de avaliar a autenticidade da perícope da mulher
adúltera em João 7.53 a 8.11.

615
Mapa 7.1: Origem e destino de João

616
FATOS-CHAVE DO EVANGELHO DE JOÃO
Autor: João
Data: Meados ou final dos anos 80 ou início dos
anos 90
Origem: Éfeso
Destino: Éfeso; em última análise, audiência
universal
Propósito: Demonstrar que Jesus é o Messias para que
as pessoas cressem nele e tivessem a vida
eterna (20.30,31)
Tema: Sinais selecionados mostram que Jesus é o
Messias
Versículos-Chave: 3.16

INTRODUÇÃO

O Evangelho de João e o livro de Romanos podem perfeitamente ser


considerados os dois picos mais altos na paisagem da teologia do NT. João
se eleva como uma águia sobre mais descrições corriqueiras da vida de
1
Cristo. Ele provavelmente foi escrito por João, o apóstolo, no auge de sua
vida e ministério. O Evangelho de João penetra de forma bem mais
profunda no mistério da revelação de Deus em seu Filho do que os outros
Evangelhos canônicos e talvez de forma mais profunda do que qualquer
outro livro bíblico. Do majestoso prólogo ao profundo epílogo, as palavras
do evangelista são tão cuidadosamente escolhidas como devem ser
cuidadosamente ponderadas por cada leitor de sua obra magnífica.
Ao longo da história, a notável influência que o Evangelho de João
exerceu é proporcional à profundidade de sua mensagem. A cristologia de

617
João, especialmente as afirmações sobre a divindade de Jesus e sua natureza
humana e divina, decisivamente moldou as formulações adotadas pelos
concílios da igreja primitiva e pelos credos.2 Muitas das grandes mentes da
igreja cristã, dos pais da igreja primitiva aos tempos modernos, escreveram
comentários ou monografias sobre o Evangelho de João.3 Apesar dos
ataques maciços à confiabilidade de João no alvorecer do Iluminismo,
especialmente por estudiosos liberais alemães, o Evangelho de João se
apresenta hoje totalmente reabilitado como um testemunho confiável da
vida, palavras e atos de nosso Senhor Jesus Cristo.4
Quase desde o seu início a interpretação do Evangelho de João foi
calorosamente contestada. Na época da igreja primitiva os gnósticos
reivindicaram este Evangelho, alegando que ele dava suporte à mensagem
de salvação pregada por eles através do conhecimento (revelação), à parte
da redenção e perdão dos pecados.5 A primeira epístola de João pode ser a
primeira a testemunhar a forma como o Evangelho foi mal interpretado, se
não intencionalmente deturpado (cf. 1Jo 1.1-3; 4.2,3).
Após a Reforma, os deístas ingleses, bem como os estudiosos liberais
alemães, inicialmente preferiam o Evangelho de João devido à sua falta de
ênfase nos exorcismos de demônios. Mas no alvorecer do Iluminismo, de E.
Evanson na Inglaterra a K. Bretschneider e D. F. Strauss na Alemanha,
ataques foram feitos alegando contradições entre o “Evangelho espiritual”
de João (termo de Clemente de Alexandria) e os Sinóticos, colocando a
“história” contra a “teologia”, como se um Evangelho que enfatiza a
importância dos testemunhos oculares e a avaliação cuidadosa das
evidências tivessem necessariamente que distorcer o fato histórico em prol
da conveniência teológica.6 No século XX, a imponente figura de R.
Bultmann colocou João em seu programa de demitologização.7

618
Além disso, esforços foram feitos nos últimos anos para transferir o
Evangelho de João da principal corrente do cristianismo apostólico para as
margens do sectarismo no final do primeiro século. Alguns estudiosos
alegaram que a “comunidade joanina”, “escola joanina” ou “círculo
joanino” (e não o apóstolo João) foi responsável pela compilação do
Evangelho no início de sua luta contra uma sinagoga-mãe que expulsou
8
uma parte dos seus membros devido à sua fé em Jesus como Messias. Essa
reconstrução, deve-se observar, é significativamente baseada na acusação
de que as referências à expulsão da sinagoga em João (esp. 9.22) são
anacrônicas.
Ainda mais recentemente, no entanto, o valor histórico de tais
reconstruções tem por si mesmo estado sob minucioso exame e tem sido
cada vez mais questionado.9 Em uma impressionante “confissão”, Robert
Kysar narrou a ascensão e queda do estilo Martyn/Brown da “Hipótese da
Comunidade Joanina” e expressou arrependimento pessoal por nunca a ter
endossado. Embora ele mesmo optasse por um paradigma pós-moderno que
reconhece a validade de uma variedade de “leituras” do Quarto Evangelho,
a crítica de Kysar abriu o caminho para uma reavaliação completa de um
paradigma que até recentemente estava quase fora de questão.10

QUADRO 7.1: O EVANGELHO DE JOÃO


FOI ESCRITO POR UM OUTRO “JOÃO”?
Uma grande objeção para a autoria apostólica do Evangelho de João
veio de R. Bauckham. Em sua obra intitulada Jesus and the
Eyewitnesses [Jesus e as testemunhas oculares], Bauckham
argumentou persuasivamente que os Evangelhos refletem testemunhos

619
oculares. De acordo com Bauckham, a fonte ideal na literatura greco-
romana antiga não era o observador imparcial, mas sim a testemunha
ocular.1 Os Evangelhos escritos, de acordo com Bauckham, contêm
história oral relacionada à transmissão pessoal de testemunhos
oculares, não apenas a tradição oral resultante da transmissão coletiva
2
e anônima de material. “Neste contexto”, Bauckham sustentou, “os
3
Doze serviram como um colegiado autoritativo”.
Especialmente importante nesse aspecto é a expressão “desde o
início”, encontrada em vários pontos estratégicos nos Evangelhos e no
restante dos registros do NT (cf. Lc 1.2; Jo 1.1, 1Jo 1.1). Vários outros
artifícios literários são utilizados para enfatizar o caráter de
testemunho ocular dos Evangelhos, tais como “o inclusio de
testemunhos oculares” (veja Mc 1.16-18; 16.7 para Pedro; e Jo 1.40;
21.24 para João). De acordo com Bauckham, o processo de
transmissão da tradição de Jesus resultando em nossos Evangelhos
canônicos escritos é melhor entendido como uma tradição formal
controlada, na qual as testemunhas oculares desempenharam um
importante e contínuo papel.4
Com relação ao Evangelho de João, Bauckham concordou que o
“discípulo que Jesus amava” deveria ser considerado como o autor,
mas ele identifica João, o Presbítero — não o apóstolo João, o filho de
Zebedeu — como o autor. Sua visão é essencialmente (parece) o
resultado da sua leitura da evidência patrística (Papias, Polícrates,
Ireneu) e seu entendimento da referência aos “filhos de Zebedeu” em
João 21.2.5 Quanto a este último ponto, Bauckham considerou o
anonimato do discípulo amado em todo o Evangelho como um
obstáculo intransponível para a autoria apostólica do Evangelho de

620
João, uma vez que os “filhos de Zebedeu” são nomeados. Ele
acreditava que o discípulo amado era um dos dois discípulos não
nomeados naquela lista.
Isso pode ser verdade, mas parece não haver nenhuma boa razão
para que o apóstolo João (se ele foi o autor) não pudesse ter se
colocado no cenário discretamente, sem levantar seu anonimato como
o autor. Posto de uma forma diferente, uma vez que o “discípulo que
Jesus amava” deve ser um dos sete discípulos mencionados em João
21.2, mas, uma vez que ele não pode ser Pedro, Tomé, ou Natanael, há
pelo menos uma possibilidade de uma para quatro de que ele seja
João, o filho de Zebedeu, e se seu irmão Tiago for excluído (como ele
deveria ser; veja acima), a probabilidade sobe para uma em cada três.
O argumento para o apóstolo João como o autor torna-se cada vez
mais premente quando se considera a seguinte lista de preocupações
com o argumento de Bauckham:6

1. Marcos 14.17,18 e Lucas 22.14 claramente colocam os Doze no


Cenáculo com Jesus na Última Ceia; esse fato milita contra a tese de
Bauckham de que o autor não era um dos Doze, e parece se opor a
uma testemunha apostólica (Pedro como a fonte para Marcos) contra
outra (aquela do “discípulo que Jesus amava”).7
2. Além da questão de saber se outras pessoas podem ter estado
presentes na Última Ceia, qual é a plausibilidade histórica de alguém
que não um dos Doze estivesse ao lado de Jesus na Última Ceia, ainda
mais sabendo que Judas (um dos Doze) estava do outro lado de Jesus?
A resposta teria que ser “quase nula”.
3. Bauckham nada fez em relação à forte ligação histórica entre
Pedro e João, o apóstolo, com todas as evidências disponíveis no NT

621
(os quatro Evangelhos, Atos e Gálatas; veja acima). Isso é
especialmente significativo tendo em conta o fato de que Pedro e o
“discípulo que Jesus amava” estão ligados de forma indiscutível e
consistente no Evangelho de João.
4. A presença da expressão “[eu] creio” (oimai), em João 21.25
como um dispositivo de modéstia autoral (de acordo com o rótulo de
“o discípulo que Jesus amava”) dá apoio à integridade de todo o
Evangelho como sendo do mesmo autor, identificado no Evangelho
como uma testemunha ocular em pontos estratégicos (p. ex., 13.23;
19.35).8
5. Metodologicamente, a questão que se levanta é quão legítimo
seria colocar uma grande quantidade de peso em uma de leitura da
evidência patrística frente às evidências internas dos próprios
Evangelhos. Parece que, no final, deve ser dado peso maior à leitura
mais plausível das evidências internas.
6. Qual é a probabilidade, à luz da própria teoria de Bauckham, de
que a testemunha principal por trás do Evangelho de João não seja um
apóstolo? Nesse contexto, a questão que se levanta é se a igreja
primitiva alguma vez recebeu tal Evangelho, especialmente se foi
escrito uma geração após os Evangelhos Sinóticos e à luz da
importância crucial colocada na apostolicidade no processo de
canonização.
7. Por que o autor deixou de fora o nome de João, com exceção do
Batista? Certamente é surpreendente que alguém tão importante como
o apóstolo João não fosse mencionado de forma alguma no o
Evangelho (à exceção de Jo 21.2). Não seria muito mais provável que

622
ele fosse de fato o “discípulo que Jesus amava” e o autor do Quarto
Evangelho?
8. A que outro João nunca foi creditada a autoria do Evangelho de
João na igreja primitiva? Além da ambígua citação de Papias em
Eusébio mencionada acima e de uma referência extremamente
9
duvidosa a João mencionada em Atos 4.6 por Policrates, a resposta é,
mais uma vez, “nenhum”.
9. A clara implicação de João 21.2 é que os homens listados são
sete dos onze apóstolos, o que exclui completamente o evasivo “João,
o Presbítero”.

A força cumulativa da lista sugere que o argumento de Bauckham,


embora geralmente correto ao afirmar a importância do testemunho
ocular para os Evangelhos, é indevidamente tendencioso na apreciação
da evidência da autoria do Evangelho de João. Na verdade, é difícil
evitar a impressão de que a autoria não apostólica do Quarto
Evangelho é quase assumida no início da obra de Bauckham. Isso é
tanto mais surpreendente quanto a autoria apostólica parece ser o
corolário mais natural da tese geral de Bauckham. Afinal, o ponto de
Bauckham não é apenas o de que o testemunho ocular — qualquer
testemunho ocular — seja importante para os Evangelhos, mas que
estamos lidando aqui com testemunho ocular apostólico, isto é,
testemunhos oculares dignos de crédito porque são testemunhos
daqueles que estiveram mais próximos de Jesus durante seu ministério
terreno. A esse respeito, é difícil ver como o testemunho de um “João,
o Presbítero” amplamente desconhecido — não mencionado em
nenhum dos Sinóticos ou outros escritos não-joaninos no NT —
satisfizesse o critério do próprio Bauckham. Por outro lado, a autoria

623
apostólica do Evangelho de João se adequaria perfeitamente à teoria
geral de Bauckham.
Por essas e outras razões nós recebemos e concordamos com a tese
geral de Bauckham com relação ao caráter testemunhal ocular dos
Evangelhos, embora não achemos convincente seu argumento contra a
autoria apostólica do Evangelho de João. Muito mais provável, em
nossa opinião, é o ponto de vista de que o Evangelho de João, como os
outros três Evangelhos canônicos, são baseados em testemunhos
oculares apostólicos e que o de João, na verdade, é o Evangelho
escrito pelo apóstolo que estava mais próximo de Jesus durante seu
ministério terreno. Essa afirmação, por sua vez, se ajusta
historicamente apenas ao apóstolo João, que segundo o testemunho
unificado de Mateus, Marcos e Lucas, foi um dos três membros do
círculo íntimo de Jesus, juntamente com Pedro e Tiago, irmão de João.

1
Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses, p. 8-11.
2
Veja especialmente ibid., p. 36.
3
Ibid., p. 94.
4
Ibid., p. 264 e do início ao fim.
5
Mas veja a crítica de A. J. Köstenberger; S. O. Stout, “The Disciple Jesus Loved:

Witness, Author, Apostle: A Response to Richard Bauckham’s Jesus and the Eyewitnesses”,

BBR 18 (2008), p. 209–232.


6
Esta lista é adaptada de A. J. Köstenberger; S. R. Swain, Father, Son and Spirit: The

Trinity and John’s Gospel, NSBT 24 (Downers Grove: InterVarsity, 2008), p. 31-33.
7
R. Bauckham, The Testimony of the Beloved Disciple: Narrative, History, and Theology

in the Gospel of John (Grand Rapids: Baker, 2007), p. 15, citando D. E. H. Whiteley, “Was

John Written by a Sadducee?”, em: Wolfgang Haase, org., Aufstieg und Niedergang der

Römischen Welt 2.25.3 (Berlin: de Gruyter, 1985), p. 2481-2505, especulou a conjectura de

624
que o “discípulo que Jesus amava” ao lado de Jesus na Última Ceia era o anfitrião e dono do

Cenáculo. Esta é sem dúvida uma nova hipótese, mas muito improvável.
8
Veja A. J. Köstenberger, “‘I suppose’ (οἶµαι): The Conclusion of John’s Gospel in its

Literary and Historical Context”, em: P. J. Williams; A. D. Clarke; P. M. Head; D. Instone-

Brewer, orgs., The New Testament in Its First Century Setting: Essays on Context and

Background in Honour of B. W. Winter on His 65th Birthday (Grand Rapids: Eerdmans,

2004), p.72-88.
9
Citado por Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses, p. 439.

HISTÓRIA
Autor
O Evangelho de João, como os Sinóticos, é formalmente anônimo.11 No
entanto, o autor deixou indícios tentadores em seu Evangelho (veja
Evidências Internas), que, quando analisados em conjunto com o
testemunho dos pais da igreja primitiva (veja Evidências Externas),
apontam de forma convincente para a autoria de João, o filho de Zebedeu e
apóstolo de Jesus Cristo.

Evidências internas
O autor identificou a si mesmo como “o discípulo que Jesus amava”
(21.20,24; frequentemente referido como “o discípulo a quem Jesus
amava”), uma figura proeminente na narrativa joanina (13.23; 19.26; 20.2;
21.7,20).12 Embora a identidade desse discípulo seja evasiva, ele deixou
indícios suficientes na narrativa para verificá-la além de quaisquer dúvidas

625
razoáveis.13 Os primeiros indícios aparecem em 1.14 e 2.11. O autor usou a
primeira pessoa em 1.14, “vimos a sua glória”, revelando que ele era uma
testemunha ocular dos fatos relatados no seu Evangelho. O “nós” de 1.14
refere-se às mesmas pessoas de 2.11, os discípulos de Jesus.14 Assim, o
escritor era um apóstolo, uma testemunha ocular e um discípulo de Jesus.
Uma análise da expressão “o discípulo que Jesus amava” mais adiante
no Evangelho oferece indícios adicionais de sua identidade.15 A expressão
aparece pela primeira vez em 13.23 na Última Ceia onde apenas os Doze se
reuniam (Mt 26.20; Mc 14.17; Lc 22.14), indicando que “o discípulo que
Jesus amava” deve ter sido um dos Doze.16 Uma vez que o autor nunca se
referiu a si mesmo pelo nome, ele não pode ser nenhum dos discípulos
nomeados na Última Ceia: Judas Iscariotes (13.2,26,27), Pedro (13.6-9),
Tomé (14.5), Filipe (14.8,9) ou Judas, filho de Tiago (14.22).17
O escritor ofereceu mais pistas sobre a sua identidade no capítulo final
do Evangelho, onde ele mencionou “o discípulo, a quem Jesus amava”
como um dos sete outros apóstolos: “Simão Pedro, Tomé (chamado
‘Dídimo’), Natanael, de Caná da Galileia, os filhos de Zebedeu e outros
dois dos seus discípulos” (21.2; veja 21.7). Além de Pedro e Tomé, que já
tinham sido eliminados (veja acima), Natanael também é eliminado como
um possível autor pois, como observado anteriormente, o autor permanece
anônimo no Evangelho de João.
Assim, o autor deve ser um dos “[dois] filhos de Zebedeu” ou um dos
“outros dois dos seus [de Jesus] discípulos”. Dos dois filhos de Zebedeu,
Tiago e João, Tiago pode ser seguramente descartado uma vez que ele foi
martirizado no ano 42 (veja At 12.2). As três possibilidades restantes são
João, o filho de Zebedeu, e os “outros dois dos discípulos”. Estes dois
últimos poderiam ser Mateus (Levi), Simão, o Zelote, Tiago, filho de Alfeu,

626
Bartolomeu ou Tadeu.18 Mateus é um candidato improvável, uma vez que
um Evangelho já lhe é atribuído.19 Simão, o Zelote, Tiago, filho de Alfeu,
Bartolomeu e Tadeu são candidatos improváveis devido à sua obscuridade
histórica e falta de suporte histórico (veja “Evidências Externas” abaixo).
Isso deixa João, o filho de Zebedeu, como a opção mais provável.

Evidências externas
Durante a segunda metade do século II, Ireneu (c. 130-200) atribuiu o
Evangelho de João ao apóstolo João: “João, o discípulo do Senhor que
recostou-se em seu peito, publicou o Evangelho enquanto ele era um
residente de Éfeso, na Ásia” (Contra Heresias 3.1.2). Clemente de
Alexandria (c. 150-215) seguiu o exemplo: “João, o último de todos […]
compôs um Evangelho espiritual” (citado por Eusébio, Hist. Ecl. 6.14.7).
Deste ponto em diante, a igreja, por unanimidade, atribuiu a autoria ao
apóstolo João por quase 18 séculos, com praticamente nenhuma dissidência.
Aqueles que duvidam da autoria apostólica têm como ponto de partida
uma citação de Papias (c. 60-130) por Eusébio (c. 260-340), no qual o
primeiro pareceu se referir a um João que não o apóstolo:

E se por acaso vier alguém que realmente tenha de fato sido um seguidor dos presbíteros, eu
gostaria de perguntar sobre os discursos dos presbíteros, o que André ou Pedro disseram, ou
o que disseram Filipe, Tomé ou Tiago, ou João ou Mateus ou qualquer outro dos discípulos
do Senhor e as coisas que Aristião e João, o Presbítero, discípulos do Senhor, dizem.
(Eusébio, Hist. Ecl. 3.39.4-5, grifos nossos)

Se esses dois Joões eram pessoas diferentes, o Evangelho que tem esse
nome poderia ter sido escrito por qualquer um deles. Mas é mais provável
que Papias tenha se referido a João, filho de Zebedeu, com dois nomes
diferentes, distinguindo entre falecidas testemunhas oculares do ministério

627
de Jesus e aqueles que ainda estavam vivos em sua época.20 A citação que
Papias faz diminui em importância quando estabelecida em contexto de
outras antigas evidências.
Retrocedendo além de Ireneu, C. Hill, em uma recente monografia,
persuasivamente argumentou que os fiéis do primeiro século utilizavam
muito o Evangelho de João e de forma autoritativa. Através de um exame
minucioso dos dados principais, Hill foi capaz de refutar a noção anterior
(que ele chamou de “joanofobia ortodoxa”) de que os primeiros cristãos
ortodoxos evitaram o Evangelho de João enquanto os antigos gnósticos o
abraçaram e de que o Evangelho de João não foi considerado como
ortodoxo até a época de Ireneu.21 Ao contrário, Hill demonstrou que o
Evangelho de João com toda a probabilidade era conhecido por Policarpo
(c. 69-155), Inácio (c. 35-110) e o Pastor de Hermas (início do século II?),
e que o primeiro uso do Evangelho de João provavelmente é da mesma
época do uso de 1João (bem como, possivelmente, 2 e 3João). Uma
implicação importante do trabalho de Hill é que o alegado desuso de João
na primeira metade do século II já não pode ser legitimamente usado como
um argumento contra sua autoria apostólica.22
Os Evangelhos Sinóticos e as cartas de Paulo também fornecem dados
que corroboram a autoria de João. O autor do Evangelho de João mostra
consistentemente “o discípulo que Jesus amava” como sendo um
companheiro próximo de Pedro (13.23,24; 18.15,16; 20.2-9; 21.7, 20-23),
embora outros escritores do NT também observam o estreito
relacionamento entre os apóstolos João e Pedro (Lc 22.8; At 1.13; 3.1 a
4.23; 8.14-25; Gl 2.9). Por si mesma, essa ligação pode não ser conclusiva.
No entanto, em conjunto com as evidências internas e externas apresentadas
acima, isso ainda confirma a possibilidade da autoria de João, pois, como o

628
“discípulo que Jesus amava”, João foi o mais provável companheiro
próximo de Pedro e, portanto, o autor do Quarto Evangelho.
Portanto, uma análise profunda de todas as evidências internas e
externas disponíveis fornece razões plausíveis para as três seguintes
conclusões acerca da autoria do Evangelho de João:23 (1) o autor é um
apóstolo e uma testemunha ocular (1.14, veja 2.11; 19.35), (2) ele é um dos
Doze (13.23; veja Mc 14.17; Lc 22.14) e (3), ele é João, o filho de Zebedeu
(o mais forte candidato com base nas evidências internas e externas citadas
acima). Embora a hipótese da autoria apostólica do Quarto Evangelho seja
regularmente o objeto de escárnio nos recentes estudos sobre João, a
hipótese nunca foi decisivamente refutada e continua a ser pelo menos tão
plausível quanto as explicações alternativas.24

Data
A data em que João escreveu seu Evangelho depende de uma matriz
complexa de questões relativas ao autor, seu público original, seu propósito,
sua ocasião de escrita e outros fatores. Na busca da data mais provável de
composição, 65 e 135 servem, respectivamente, como o terminus a quo e o
terminus ad quem (a primeira e a última datas plausíveis).25 A primeira
dessas datas é estabelecida pela referência de João ao martírio de Pedro
(21.19) que ocorreu em 65 ou 66, e pela descrição que João faz de Jesus
como o substituto do templo, cuja destruição ocorreu no ano 70.26 A
segunda data é determinada pela descoberta, no século XX, do manuscrito
mais antigo do NT até agora ( , c. 135), que contém João 18.31,32,37,38.
52

Dentro desse intervalo de tempo João muito provavelmente escreveu


seu Evangelho em meados de 80 ou início dos anos 90 com base nas

629
seguintes evidências.27 Primeiro, embora os Sinóticos e as cartas paulinas se
refiram à divindade de Jesus, a linguagem de João parece mais próxima da
linguagem “menos contida de Inácio [c. 35-110] — em particular a
facilidade e frequência com que Inácio se refere a Jesus como Deus”.28 Em
outras palavras, parece que se passou o tempo necessário após a
ressurreição de Jesus para que João articulasse sua teologia nesses termos.
Segundo, se a reconstrução da ocasião em que João escreveu — a
destruição do templo — abaixo estiver correta, o Evangelho foi escrito
provavelmente entre 10 e 20 anos após o ano 70, uma vez que algum tempo
deve ter passado entre a destruição do templo e sua composição: “[É] difícil
acreditar que […] a data foi imediatamente depois de 70 d.C. [a destruição
do templo] […] As repercussões em todo o Império, tanto para os judeus
quanto para os cristãos, eram, sem dúvida, ainda muito poderosas. Foi
preciso um pouco de tempo […] antes que um documento como o Quarto
Evangelho pudesse ficar livre para não fazer uma alusão explícita à
destruição do templo.”29
Terceiro, falta no Evangelho de João referências aos saduceus.30 Uma
vez que este grupo desempenha um papel tão importante nos Sinóticos
(escritos antes de João) e uma vez que eles foram menos influentes após a
destruição do templo, a sua omissão em João faz sentido se ele escreveu
após a destruição do templo.31
Quarto, o uso que João faz da designação “Mar de Tiberíades” ao
esclarecer o “Mar da Galileia” (6.1; 21.1) sugere uma data de composição
entre meados de 80 e início de 90. Herodes Antipas fundou a cidade de
Tiberíades, junto ao mar da Galileia por volta do ano 17-18 d.C. (Josefo,
Ant. 18.2.3 §36). Gradualmente o Mar da Galileia passou a se chamar “Mar

630
de Tiberíades”. A nível popular essa mudança ocorreu provavelmente na
década de 80 ou 90.
Quinto, se a confissão que Tomé fez de Jesus como “meu Senhor e meu
Deus” pretendia evocar associações ao culto ao imperador sob Domiciano
(81-96), isso pareceria exigir uma data posterior a 81.32
Assim, uma data de composição em meados de 80 ou início de 90
melhor se adapta a todas as evidências. Esta data também permite tempo o
bastante para o Evangelho ganhar a popularidade necessária para uma cópia
( ) conseguir chegar ao Egito por volta do ano 135.
52

Origem
Os antigos testemunhos patrísticos dão suporte à ideia de que João escreveu
seu Evangelho em Éfeso.33 Eusébio afirmou que depois que a Guerra
Judaica (66-73) dispersou os primeiros apóstolos, João passou a servir na
Ásia (Hist. Ecl. 3.1.1), o que o colocou em ou próximo a Éfeso durante os
anos 80 e 90. Ireneu escreveu que “João, o discípulo do Senhor […]
publicou o evangelho enquanto que vivia em Éfeso, na Ásia” (Contra
Heresias 3.1.2 [c. 130-200]). No entanto, alguns estudiosos que acreditam
que o Evangelho de João e o livro do Apocalipse foram escritos por
diferentes autores alegam que Eusébio confundiu o escritor do Evangelho
com o autor do Apocalipse.34
Os opositores da proveniência efésia do Evangelho de João
estabeleceram três alternativas principais. Primeiro, alguns estudiosos
propõem uma proveniência alexandrina porque João parece ter afinidades
com Filo.35 Segundo, outros sugerem como origem Antioquia porque veem
afinidades entre o Evangelho de João e Inácio, bispo de Antioquia (c. 35-

631
110), bem como com a obra Odes de Salomão, aparentemente escrita na
Síria (cuja capital era Antioquia).36 Terceiro, outros ainda afirmam que o
Evangelho de João teve origem na Palestina por causa das aparentes
influências culturais e pela familiaridade de João com determinados
detalhes topográficos.37
Mas essas propostas também apresentam problemas. Por exemplo, Filo
também era lido fora de Alexandria; a influência literária de Inácio e das
Odes de Salomão com toda probabilidade alcançou outros lugares além de
Antioquia; e João provavelmente estava ciente e foi influenciado pela
cultura palestina, remontando ao seu papel no ministério de Jesus e depois
dele.38 Assim, no geral, Eusébio e Ireneu forneceram os dados disponíveis
mais confiáveis, embora inconclusivos. Assim, João muito provavelmente
escreveu em Éfeso, na província da Ásia Menor.

Destino
Uma vez que João não identifica sua audiência explicitamente, determinar o
seu público-alvo pretendido está inexoravelmente relacionado aos
argumentos acima a respeito da autoria e proveniência. Se Ireneu e outros
estiverem corretos ao afirmar que João foi o autor do Evangelho e que ele
escreveu em Éfeso (veja acima), é razoável assumir que as pessoas vivendo
em Éfeso ou ao seu redor, principalmente os judeus da Diáspora e os
gentios, eram pelo menos parte de seu público de leitores pretendido.39
Além disso, o Evangelho de João, como os outros Evangelhos
canônicos, foi provavelmente escrito para “todos os cristãos”, em vez de
para leitores de apenas uma localização geográfica.40 Se for assim, João
muito provavelmente escreveu com judeus da Diáspora, prosélitos e outros

632
gentios em mente, sem intenção de limitar a sua audiência exclusivamente a
qualquer grupo. Isso também é indicado pelo gênero do livro de João:
“Afinal de contas, o Evangelho de João é um Evangelho, anunciando a boa
41
nova universal da salvação em Cristo”.

Ocasião
A destruição do Templo de Jerusalém no ano 70 foi um evento traumático
que deixou o judaísmo em um vazio nacional e religioso e fez com que os
judeus procurassem maneiras de continuar seus rituais e cultos de
adoração.42 A destruição do templo provavelmente serviu como um dos
principais catalisadores para João escrever seu Evangelho. A destruição do
templo lançou os judeus do final do primeiro século em desordem, uma vez
que sua fé estava intimamente conectada ao templo pelo sistema sacrificial
e pelo sacerdócio. Da mesma forma que o Exílio na Babilônia (586 a.C.)
precipitou uma profunda crise na adoração judaica removida do Primeiro
Templo, a destruição do Segundo Templo exigiu uma grande reorientação
do ritual judaico. No início da destruição do Templo, João provavelmente
viu uma oportunidade para a evangelização dos judeus, procurando
encorajar outros fiéis a alcançar seus vizinhos judeus e gentios na
Diáspora.43 Ele o fez alegando que o Messias crucificado e ressurreto
providencialmente substituiu o Templo (2.18-22, veja 1.14; 4.21-24) e
cumpriu o simbolismo inerente em festivais judaicos (esp. 5 a 12).44

QUADRO 7.2: QUESTÕES TEXTUAIS NO


EVANGELHO DE JOÃO

633
1
O Evangelho de João levanta várias questões textuais importantes.
Uma delas pertence às leituras variantes em 1.18. Algumas versões
têm monogenēs huios (“Primeiro e Único Filho”), enquanto outras têm
monogenēs theou (“Primeiro e Único [ele mesmo] Deus”). A
descoberta de 66
e , ambos contendo monogenēs theos, agora
75

parece favorecer essa leitura “mais difícil”. Provavelmente, João


pretendia abrir e fechar seu prólogo com referências a Jesus como
Deus (um inclusio), e a leitura “Filho unigênito” foi introduzida por
escribas que estavam familiarizados com a leitura em 3.16,18 (uma
assimilação dos escribas).
Outra questão textual interessante é levantada em 1.34, onde
alguns manuscritos antigos têm “o Filho de Deus” (a leitura adotada
na A21, ACF, ARA e ARC), enquanto outras (como o Códice
Sinaítico e o recentemente publicado papiro 106
) têm “O Escolhido de
Deus” (adotado pela TNIV). A leitura anterior costumava ser a visão
de consenso, mas agora a última leitura é defendida por importantes
comentaristas como L. Morris, D. A. Carson, C. K. Barrett, R. Brown,
R. Schnackenburg e outros.2
João 5.3b,4, que descreve o periódico movimento das águas por
um anjo que descia e a resultante cura dos primeiros a entrarem na
piscina, também levanta um interessante conjunto de questões crítico-
textuais. A passagem claramente não é autêntica, isto é, não foi escrita
pelo autor do Evangelho de João, mas foi acrescentada por uma mão
posterior, talvez para elaborar a referência do movimento da água no
versículo 7. A atestação antiga desse versículo é pobre e há pelo
menos sete palavras não-joaninas nesta única sentença.3

634
A questão textual mais importante no Evangelho de João é sem
dúvida a pericope adultera, a história da mulher adúltera (7.53 a 8.11).
Existem sérias dúvidas quanto à inclusão original desta passagem do
Evangelho de João. Como resultado, praticamente todas as traduções
modernas colocam a perícope entre colchetes. Em termos de evidência
interna, praticamente todos os versículos deste relato apresentam
palavras gregas não encontradas em outras partes do Evangelho. Por
outro lado, muito do vocabulário joanino padrão está ausente da
perícope. A isso devem ser adicionadas diferentes características de
estilo e construções sintáticas.
A nível literário esta perícope interrompe o fluxo narrativo de 7.52
a 8.12 e rompe a unidade literária 7.1 a 8.59. A nível histórico, o
contexto de 7.53 a 8.1 sugere mais plausivelmente o padrão de Jesus
durante a semana anterior à sua Paixão (Mc 11.11,19; 13.3; e esp. Lc
21.37). Assim, a preponderância das evidências internas, incluindo
vocabulário, estilo, sintaxe e fluxo literário, fala decisivamente contra
a noção de que o autor do Evangelho de João redigiu a perícope e a
incluiu em 7.52 em seu Evangelho.
Em termos de evidência externa, há fortes dúvidas sobre a
originalidade da passagem no Evangelho de João. (1) A perícope está
ausente em todos os manuscritos anteriores ao século V (embora isso
seja uma questão debatida). (2) Ela aparece em nada menos do que
seis locais diferentes na tradição dos manuscritos: depois de João 7.36,
depois de 7.44, depois de 7.52, no final do Evangelho de João, depois
de Lucas 21.38 e no final do Evangelho de Lucas. (3) Até o século IV
(embora isso seja motivo de muitos debates) a citação desta perícope
não é encontrada nos primeiros manuscritos patrísticos.

635
A conclusão óbvia, portanto, do estudo das evidências internas e
externas em relação a esta perícope é que o relato quase certamente
não era parte do Evangelho original e não deveria, portanto, ser
considerado como divinamente inspirado, autoritativo ou canônico.
Isso não significa, necessariamente, que o relato não é histórico. É
certamente possível (embora impossível de verificar) que o encontro
entre Jesus e esta mulher tenha se dado na forma recontada nessa
história. No entanto, como o final longo de Marcos, a história deveria
ser tratada com cautela.

1
Para um tratamento mais completo dessas e outras questões textuais no Evangelho de

João, veja Köstenberger, John, p. 50, p. 88, p. 245-49 (com outras referências bibliográficas).
2
Para essas e outras referências, veja ibid., p. 50.
3
Veja a discussão e outras referências bibliográficas em Köstenberger, John, p. 195.

Além da destruição do Templo, a primeira missão cristã aos gentios (At


9.16; Rm 1.13) e o surgimento dos primeiros pensamentos gnósticos
provavelmente serviram como parte da matriz que ocasionou a escrita do
Evangelho de João. Uma vez que João escreveu na diáspora para judeus e
gentios atraídos pelo judaísmo, e uma vez que ele escreveu 50 anos depois
da formação da igreja, quando a missão aos gentios estava bem
encaminhada, parece razoável que essa missão diretamente afetou a redação
de João. O gnosticismo, que começou a surgir na segunda metade do
primeiro século mas que não frutificou plenamente até o século II também
forneceu parte do pano de fundo. Embora João não tenha abraçado ou
promovido os ensinamentos gnósticos, como muitos escritos evangelísticos
desde então, ele usou as categorias conceituais de sua audiência para

636
contextualizar a sua mensagem (veja Jo 1.1,14). Esses três importantes
fatores — a destruição do Templo, a missão aos gentios e o pensamento
gnóstico — combinaram-se como possíveis ocasiões para o Evangelho de
João.45

Propósito
No final do seu Evangelho, João declarou seu propósito: “estes [sinais],
porém, foram registrados para que possais crer que Jesus é o Cristo, o Filho
de Deus, e para que, crendo, tenhais vida em seu nome” (20.31).46 Em uma
leitura superficial, “para que possais crer” sugere um propósito
evangelístico, isto é, levar os leitores de João à primeira fé em Jesus como
Messias.47 Ao mesmo tempo, o Evangelho de João parece pressupor uma
audiência que já está familiarizada com a Escritura, uma vez que contém
instruções detalhadas para os fiéis, especialmente na segunda metade do
Evangelho. Além disso, existem alguns exemplos de documentos
evangelísticos do primeiro século. Por razões como essas, parece que o
propósito de João englobava ambos os aspectos, o evangelismo dos
incrédulos e a edificação dos fiéis, e que João buscava um propósito
evangelístico indireto, visando alcançar uma audiência incrédula através
dos leitores cristãos de seu Evangelho.48
Assim, de acordo com 20.31, o propósito de João foi o de demonstrar a
evidência de que Jesus é o Messias, o Filho de Deus, de modo que as
pessoas pudessem acreditar nele e como resultado ter vida em seu nome.49
A declaração de propósito corresponde ao primeiro capítulo do Evangelho
no qual João estabelece a identidade messiânica de Jesus (cf. 1.1-3,14,29,
34,41). O corpo do Evangelho de João apresenta uma série de “sinais”

637
messiânicos de Jesus e narra a sua morte, ressurreição e aparições a fim de
suscitar a fé em Jesus como o Messias naqueles que o leem. “Acreditar” no
Evangelho de João vai além da mera aceitação intelectual; envolve
depositar fé em Jesus.50 “Vida” se refere à comunhão eterna com Jesus
iniciada já no aqui e agora (cf. 5.24; 8.12; 10.10; 17.3).
Finalmente, é importante não confundir o provável propósito de João
com possíveis efeitos de seu Evangelho. Carson e Moo acertadamente
observaram que “só porque o evangelho de João pode ser usado para
oferecer conforto aos enlutados no século XX, não significa que este foi o
motivo de o evangelista escrevê-lo”.51 João declarou explicitamente seu
propósito (20.30,31), que, contra o pano de fundo de sua proveniência e
ocasião, é melhor entendido como um evangelismo indireto. Todos os
outros propósitos devem ser vistos como subordinados a este propósito
maior ou como efeitos dele resultantes.

LITERATURA
Plano Literário
Existe um amplo consenso na literatura de que o Evangelho de João se
divide em uma introdução (1.1-18), uma primeira unidade principal
frequentemente chamada de “O Livro dos Sinais” (1.19 a 12.50, que
enfatiza os “sinais” messiânicos de Jesus para os judeus), uma segunda
unidade importante denominada “O Livro da Exaltação” (13.1 a 20.31,
antecipando a exaltação de Jesus com o Pai subsequente à sua crucificação,
sepultamento e ressurreição), e um epílogo (cap. 21).52 Há também apoio
considerável para a noção de que os capítulos 11 e 12 representem uma
transição do “Livro dos Sinais” para o “Livro da Exaltação”, apresentando

638
o “sinal” climático de Jesus, a ressurreição de Lázaro, que, por sua vez,
prenuncia a própria ressurreição de Jesus.53
Com relação à estrutura do “Livro dos Sinais”, muitos estudiosos
acreditam, com base nos inclusios literários, que esta unidade é constituída
de dois ciclos principais que narram o ministério de Jesus, um “ciclo de
Caná” (2.1 a 4.54; veja 2.11; 4.54) e um “ciclo de festival” (5.1 a 10.42;
veja 1.19-34; 10.40,41).54 Além disso, alguns acadêmicos veem uma divisão
entre os capítulos 5 e 6 e capítulos 7 a 10 à luz da marcante deserção de
muitos dos seguidores de Jesus no final do capítulo 6.55
“O Livro da Exaltação” divide-se no Discurso de Despedida (13 a 17),
que pode ser subdividido em um preâmbulo (13.1-30), no próprio Discurso
de Despedida (13.31 a 16.33), na oração final de Jesus (17) e na Narrativa
da Paixão (18 a 20), culminando em uma declaração de propósito de João
(20.30,31). Assim, o Evangelho de João revela um plano literário
deliberado que reflete mensagem teológica do evangelista.
A título de resumo, João alcançou seu propósito de demonstrar que
Jesus é o Messias, o Filho de Deus (20.30,31; veja “Propósito”) tecendo
várias seções da narrativa que funcionam dentro de uma estrutura geral. A
introdução ao Evangelho de João coloca toda a narrativa no âmbito da
Palavra eterna e preexistente que se tornou carne em Jesus (1.1-18).
A primeira seção principal, “O Livro dos Sinais”, demonstra a evidência
para o caráter messiânico de Jesus na forma de sete sinais selecionados,
cuja narrativa constitui a estrutura para a primeira metade do Evangelho de
João (1.19 a 12.50; veja esp. 12.37-40; cf. 20.30,31).56
João também inclui os sete ditos de Jesus iniciados por “eu sou” (veja
gráfico a seguir) e chama inúmeras (sete?) testemunhas em apoio às
reivindicações de Jesus, inclusive Moisés e as Escrituras, João Batista, o

639
Pai, Jesus e suas obras, o Espírito, os discípulos e o próprio evangelista.
Questões representativas em relação ao caráter messiânico de Jesus servem
para levar os leitores do Evangelho à pretendida conclusão do autor, isto é,
que Jesus é o Messias (p. ex., 1.41; 4.25; 7.27,31,52; 10.24; 11.27; 12.34).

640
Tabela 7.1: As Declarações de Jesus Iniciadas por “Eu Sou” no
Evangelho de João
Referência no
Declaração Importância
Evangelho de João
“Eu sou o pão da 6.35,48,51 Falado após a alimentação
vida” da multidão; em analogia à
provisão de Deus do maná
para a Israel no deserto,
Jesus é o verdadeiro pão
celestial capaz de satisfazer
a fome espiritual do povo.
“Eu sou a luz do 8.12; 9.5 Jesus como o cumprimento
mundo” da Festa dos Tabernáculos;
Jesus é a salvação
prefigurada pelas luzes da
Festa; “luz” e “vida” são
relacionadas no Evangelho
de João, assim Jesus é a “luz
da vida” (8.12).
“Eu sou a porta” 10.7,9 Jesus é o caminho exclusivo
para a salvação — todos
devem ser salvos por ele;
falado no contexto do
Discurso do Bom Pastor.
“Eu sou o bom 10.11,14 Em contraste com os
pastor” fariseus como pastores
inúteis (Veja Zc 11.17),
Jesus é o pastor-rei na
tradição de Davi; o bom
pastor dá a sua vida pelas
ovelhas (a expiação
substitutiva).

641
Referência no
Declaração Importância
Evangelho de João
“Eu sou a 11.25 Jesus é a ressurreição que
ressurreição e a vida” Maria e Marta (e a maior
parte de Israel) estavam
esperando no último dia;
falado antes da ressurreição
de Lázaro.
“Eu sou o caminho, a 14.6 Jesus afirma que ele mesmo
verdade e a vida” é o exclusivo caminho ao
Pai; o uso que Jesus faz dos
artigos (o caminho, a
verdade, a vida) reitera o
status de Jesus como o
exclusivo caminho para a
salvação.
“Eu sou a videira 15.1 O AT utilizou a imagem da
verdadeira” vinha para descrever Israel
(Is 5.1-7; 27.2-6; Jr 2.21; Ez
15; 19.10-14; Os 10.1; Sl
80.9-16); portanto, Jesus é o
novo Israel (como também o
substituto do templo e dos
festivais judaicos).

A segunda seção principal da narrativa de João, “O Livro da Exaltação”,


mostra como Jesus garantiu a continuidade da sua missão preparando a sua
nova comunidade messiânica para a sua missão. Esta parte abre com o
Discurso de Despedida de Jesus (caps. 13 a 17), no qual a nova comunidade
messiânica é purificada, preparada e recebe oração. A purificação é afetada
pela cerimônia do lava-pés e pela partida de Judas (cap. 13); a preparação

642
dos discípulos envolve instruções sobre a vinda do Espírito Santo (caps. 14
a 16); e Jesus ora por seus seguidores em sua oração final (cap. 17).
A Narrativa da Paixão de João (caps. 18 e 19) apresenta a morte de
Jesus tanto como uma expiação do pecado (veja 1.29,36; 6.48-58; 10.15,
17,18), embora em grande parte sem a ênfase dos Sinóticos na vergonha e
humilhação, e como um prefácio para o retorno de Jesus ao Pai (veja 13.1;
16.28). As aparições da ressurreição e a comissão dos discípulos constituem
o foco do penúltimo capítulo de João (cap. 20), onde Jesus é retratado como
o paradigmático “Enviado” (veja 9.7), que agora envia os representantes de
sua nova comunidade messiânica (20.21-23).
A declaração de propósito de 20.30,31 reitera os temas principais do
Evangelho: sinais, crença, vida (eterna) e a identidade de Jesus como
Messias e Filho de Deus. O epílogo retrata o relacionamento entre Pedro e
“o discípulo a quem Jesus amava”, em termos de papéis diferentes, ainda
que igualmente legítimos, de serviço na comunidade crente.
O epílogo (cap. 21), a principal seção final de João, encerra a
caracterização conjunta de Pedro e do “discípulo que Jesus amava”
especialmente na segunda metade do Evangelho de João, compara e
contrasta os seus respectivos chamados no ministério e oferece um novo
vislumbre da identidade do autor do Evangelho.

ESTRUTURA
I. Introdução: O Verbo se fez carne (1.1-18)

II. Livro dos sinais: Os sinais do Messias (1.19 a 12.50)


A. O precursor e a vinda do Messias (1.19-51)
1. O testemunho de João Batista (1.19-34)

643
2. O início do ministério de Jesus (1.35-51)
B. O Ciclo de Caná: Os primeiros sinais de Jesus e conversas
representativas (2.1 a 4.54)
1. Sinal 1: Transformação da água em vinho nas Bodas de Caná (2.1-
12)
2. Sinal 2: Um dos sinais de Jesus de Jerusalém: A purificação do
Templo (2.13-22)
3. Conversas representativas: O dirigente judeu Nicodemos, a mulher
samaritana (2.23 a 4.42)
4. Sinal 3: O segundo sinal em Caná: A cura do filho do oficial real
(4.43-54)
C. O Ciclo dos Festivais: Sinais adicionais em meio ao aumento da
incredulidade (5 a 10)
1. Sinal 4: Festa não denominada em Jerusalém: A cura do paralítico
(5.1-47)
2. Sinal 5: A Páscoa da Galileia: Alimentando a multidão e o discurso
do Pão da Vida (6.1-71)
3. Jesus na Festa dos Tabernáculos (7.1 a 8.59)
a. Primeiro ciclo de ensinos (7.1-52)
b. Segundo ciclo de ensinos (8.12-59)
4. Sinal 6: A cura do cego de nascença e o discurso do Bom Pastor (9
e 10)
a. Jesus cura um homem cego (9)
b. Jesus, o Bom Pastor (10)
D. Páscoa final: Sinal climático, a ressurreição de Lázaro e outros
eventos (11 e 12)
1. Sinal 7: A Ressurreição de Lázaro (11)

644
2. Eventos finais do ministério público de Jesus (12)
a. A unção em Betânia (12.1-11)
b. A Entrada Triunfal em Jerusalém (12.12-19)
c. O alvorecer da Era dos Gentios (12.20-36)
d. Acusação final: Rejeição de Jesus pelos judeus (12.37-50)

III. Livro da exaltação: Preparação da nova comunidade messiânica e a


Paixão de Jesus (13 a 20)
A. A purificação e instrução da nova comunidade da aliança, incluindo
a oração final de Jesus (13 a 17)
1. Purificação da comunidade (13.1-30)
a. O lava-pés (13.1-17)
b. A traição (13.18-30)
2. O discurso de despedida (13.31 a 16.33)
a. Partida de Jesus e envio do Espírito (13.31 a 14.31)
b. Jesus, a Videira Verdadeira (15.1-17)
c. O Espírito e o testemunho dos discípulos ao mundo (15.18 a
16.33)
3. A oração de despedida de Jesus (17)
B. A narrativa da Paixão (18 e 19)
1. A traição e a prisão de Jesus (18.1-11)
2. Jesus é questionado pelo sumo sacerdote e negado por Pedro
(18.12-27)
3. Jesus perante Pilatos (18.28 a 19.16a)
4. A crucificação e o sepultamento de Jesus (19.16b-42)
C. A ressurreição e as aparições de Jesus, o comissionamento dos
discípulos (20.1-29)
1. O túmulo vazio (20.1-10)

645
2. O encontro de Jesus com Maria Madalena (20.11-18)
3. A primeira aparição de Jesus, aos seus discípulos (20.19-23)
4. A segunda aparição de Jesus, para Tomé (20.24-29)
D. Declaração final de propósito (20.30,31)

IV. Epílogo: Os papéis complementares de Pedro e o discípulo amado (21)


A. A terceira aparição de Jesus, aos Sete Discípulos na Galileia (21.1-
14)
B. Jesus e Pedro (21.15-19)
C. Jesus e o discípulo a quem Jesus amava (21.20-25)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Introdução: o Verbo se fez carne (1.1-18)
O impressionante prólogo de João estabelece o rumo para todo seu
Evangelho ao traçar um mapa para o leitor que projeta em linguagem
eloquente o caminho pelo qual o Evangelho viajará. De 1.1 em diante, João
faz uma afirmação surpreendente: Jesus é Deus. Esse Deus “se fez carne” e
“habitou” (literalmente, “armou sua tenda”) entre o povo de Deus (1.14)
como o “Unigênito Filho do Pai” (1.14,18). Indo além de Mateus e Lucas,
que associaram Jesus a Abraão e/ou Adão, João traçou as origens de Jesus
até a criação (veja Gn 1.1), ancorando-o, assim, não apenas nos eventos
históricos temporais, mas na eternidade passada.
Antecipando uma posterior descrença e rejeição a Jesus, como o
Messias tanto pelos judeus como pelo mundo (caps. 5 a 10, 18 e 19), João
distinguiu entre dois grupos de pessoas: aqueles que reconhecem o Verbo
encarnado (1.12,13; fiéis) e aqueles que não o reconhecem (1.10,11;

646
incrédulos). Todos devem responder a Jesus com base no testemunho de
João Batista (1.6-9,15) e na apresentação de Jesus do quarto evangelista no
restante do seu Evangelho, especialmente sua apresentação dos sete “sinais”
messiânicos de Jesus (caps. 2 a 12; veja 20.30,31).

II. Livro dos Sinais: Os Sinais dos Messias (1.19 a


12.50)
Após apresentar Jesus como o Verbo que se fez carne na introdução, João
deu início ao primeiro de seus dois “livros” — “O Livro dos Sinais” (1.19 a
12.50) e “O Livro da Exaltação” (caps. 13 a 20). O primeiro livro, “O Livro
dos Sinais”, estabelece por meio de sete sinais selecionados que Jesus é o
Messias enviado por Deus (2.1-11,13-22; 4.46-54; 5.1-15; 6.1-15; 9.1-41;
11.1-44). O segundo livro, “O Livro da Exaltação”, registra como o Messias
enviado por Deus tornou-se o remetente dos seus discípulos e, portanto,
aquele que estabelece a nova comunidade messiânica de Deus.

A. O precursor e a vinda do Messias (1.19-51)


João deu início à própria narrativa descrevendo o testemunho de João
Batista (1.19-36; veja 1.6-8,15). Para uma delegação de Jerusalém, o Batista
deu testemunho a respeito de sua própria identidade (1.19-28): ele não era o
Messias, mas a “voz que clama no deserto” profetizada pelo profeta Isaías
no AT (1.23; veja Is 40.3; cf. Mt 3.3; Mc 1.3, Lc 3.4). Ele também
direcionou seus seguidores a Jesus, “o Cordeiro de Deus que tira o pecado
do mundo” (1.29; veja 1.36) e deixou claro que o objetivo do seu ministério
de batismo era que Cristo “fosse manifestado a Israel” (1.31). O restante do

647
capítulo mostra Jesus chamando seus primeiros discípulos e identificando-
57
se a eles como a nova Betel (1.50,51; cf. Gn 28.12).

Algo Para Pensar:


Pelos Seus Frutos Vós os Conhecereis

No Sermão do Monte, Jesus alertou as pessoas contra os falsos


profetas. Com uma lógica simples, ele salientou que “toda árvore
boa produz bons frutos; porém, a árvore má produz frutos maus […]
Portanto vós os reconhecereis pelos frutos” (Mt 7.17,20). Pois nem
todo o que diz a Jesus, “Senhor, Senhor!” entrará no reino do céu,
mas aquele que faz a vontade de seu Pai nos céus (Mt 7.21).
Mais tarde, já em direção ao final do seu ministério, Jesus
desafiou seus seguidores com palavras semelhantes. No início havia
quem aparecesse para colocar a sua fé em Jesus, mas Jesus não se
enganava com expressões exteriores de fé, que não eram
acompanhadas por obediência (Jo 2.23-25). Aos muitos que tinham
crido nele, ele conclamou: “se permanecerdes na minha palavra,
sereis verdadeiramente meus discípulos” (8.31). Infelizmente, a
maioria não deu atenção às palavras de Jesus.
Então, no seu caminho ao Getsêmani, Jesus reafirmou o seu
desafio mais uma vez: “Se permanecerdes em mim, e as minhas
palavras permanecerem em vós, pedi o que quiserdes, e vos será
concedido. Meu Pai é glorificado nisto: em que deis muito fruto; e
assim sereis meus discípulos”. (15.7,8). Será que ficamos facilmente
satisfeitos com o nosso novo status em Cristo e relaxamos em nossa

648
obediência? Não nos esqueçamos de que é pelos nossos frutos que
provamos ser seguidores de Jesus e glorificamos nosso Pai que está
no céu.

B. O Ciclo de Caná: Os primeiros sinais de Jesus e


conversas representativas (2.1 a 4.54)
Após essas questões introdutórias, o capítulo 2 abre com o início de fato do
ministério de Jesus. O primeiro sinal de Jesus em Caná — a transformação
da água em vinho — “manifestou sua glória” e os seus discípulos “creram
nele” (2.11). Um outro possível sinal, a purificação do templo (2.13-22),
antecipou a ressurreição de Jesus (2.19) e sinalizou a substituição do templo
por Jesus (2.20). Após conversas intermitentes com Nicodemos, um rabino
judeu (3.1-21), e com uma mulher samaritana (4.1-42), Jesus realizou outro
sinal em Caná, curando o filho de um oficial (4.43-54). Isso fecha o ciclo de
Caná, que abrange os capítulos 2 a 4, que apresentou o ministério
messiânico de Jesus através dos primeiros sinais e longas conversas com
indivíduos representativos.

C. O Ciclo dos Festivais: sinais adicionais em meio


ao aumento da incredulidade (5 a 10)
Nos capítulos 5 a 10, o ministério público de Jesus é apresentado como
continuando em meio à controvérsia devido à incredulidade prenunciada em
1.10,11 e 2.24,25. Essa intensificada descrença foi posteriormente exposta
por outros sinais messiânicos de Jesus. Seu quarto sinal, a cura de um
paralítico (5.1-15), ocorreu em uma festa que não foi identificada

649
(possivelmente a dos Tabernáculos) e foi realizada em um dia de sábado,
resultando na perseguição de Jesus pelos judeus (5.16). Na controvérsia que
se seguiu, Jesus se defendeu da acusação de blasfêmia, apelando para Deus,
o Pai, suas próprias obras, João Batista, Moisés e outros como suas
testemunhas (5.17-47).
Depois disso, Jesus cruzou o Mar da Galileia para comemorar a Páscoa,
onde realizou o seu quinto sinal, alimentando a multidão (6.1-15). Após o
interposto relato de Jesus caminhando sobre as águas (6.16-21), que
normalmente faz par com o relato da alimentação da multidão nos
Evangelhos (veja Mt 14.13-33 e paralelos), Jesus, No discurso do “pão da
vida”, revelou-se como o “pão” que dá a vida, que deveria ser dado
sacrificialmente para a vida do mundo (6.22-59). Depois disso, muitos até
dos discípulos de Jesus deixaram de segui-lo e ele foi deixado com os Doze
— e até mesmo um dentre eles era um traidor (6.60-71).
Continuando o tema da crescente escalada entre crença e descrença (7.1,
10,12), o evangelista começou a narrar a jornada de Jesus a Jerusalém para
a Festa dos Tabernáculos (7.1 a 8.59), apresentadas sob a forma de dois
ciclos de ensino de Jesus (7.1-52; 8.12-59).58 Algum tempo depois da festa,
Jesus realizou o sexto dos seus sete sinais, a cura de um homem cego (9.1-
12), o que levou ao aumento da tensão entre Jesus e as autoridades judaicas
(9.13-41). A falha das autoridades de não reconhecer Jesus como o Messias
levou à uma grave divisão e aumento da incredulidade, com o plano de
matar Jesus se movendo inexoravelmente em direção a um clímax, mesmo
em meio a uma série de convincentes sinais messiânicos (cap. 10).

650
Tabela 7.2: O Cumprimento de Jesus das Festas do AT
Festa Escritura Descrição/Cumprimento
Festa da Êx 12.1-4; Lv 23.4,5; Também conhecida como Pesach;
Páscoa Jo 1.29-36; 2.13; 6.4; um cordeiro era morto em
11.55; 12.1 comemoração da libertação de Israel
do Egito por Deus.
Cumprimento: Jesus é o cordeiro
de Deus cuja morte faz com que
Deus ignore os pecados daqueles
cobertos pelo sangue de Jesus.
Festa dos Êx 12.15-20; Lv Também conhecida como Hag
Pães Sem 23.6-8 Hamatzot; Israel deve comer pão
Fermento sem fermento por 7 dias; o fermento
muitas vezes representa o pecado na
Escritura.
Cumprimento: Jesus é o pão da
vida livre do pecado (fermento).
Festa dos Lv 23.9-14 Também conhecida como Yom
Primeiros HaBikkurim; Israel oferecia o
Frutos primeiro feixe de cevada maduro
para o Senhor; o feixe era colocado
de lado na Páscoa e oferecido no
terceiro dia da Festa da Páscoa.
Cumprimento: Jesus ressuscitou ao
terceiro dia da Festa da Páscoa
como “os Primeiros Frutos daqueles
que dormem” (1Co 15.20).

651
Festa Escritura Descrição/Cumprimento
Pentecostes Lv 23.15-22; At 2.1- Também conhecida como “Festa das
40 Semanas” ou Shavuot; ocorre 50
dias após o sábado dos Pães
Ázimos; Israel oferecia novos grãos
da colheita de verão.
Cumprimento: o Espírito Santo é
derramado sobre os discípulos 49
dias após a ressurreição de Jesus (50
dias depois do sábado que a
precedeu).
Festa das Lv 23.23-35; Nm Também chamada Rosh HaShaná;
Trombetas 29.1-11; Mt 24.31; toque da trombeta para chamar o
1Co 15.51,52; 1Ts povo para um momento de
4.16,17 introspecção e arrependimento.
Cumprimento: tradicionalmente
associado a juízo e ao Livro da
Vida, representa a segunda vinda de
Jesus como juiz; a vinda de Jesus
será anunciada por um toque de
trombeta.
Dia do Lv 23.26-32, 44-46; Também chamada Yom Kippur, o
Perdão Rm 3.21-25; Hb sumo sacerdote faz expiação pelo
9.11-28 pecado no Santo dos Santos, onde a
arca da aliança descansava; último
dos 10 dias de arrependimento da
Festa das Trombetas; duas cabras
(sacrifício de expiação e bode
expiatório) representavam a
expiação dos pecados de Israel por
mais um ano.
Cumprimento: Jesus como Sumo
Sacerdote entrou no céu (o Santo
dos Santos) e fez expiação eterna
pelo pecado com seu sangue.

652
Festa Escritura Descrição/Cumprimento
Festa dos Lv 23.34-43; Também chamado de Sucot; os
Tabernáculos Jo 1.14; 7.38,39; judeus habitavam em tendas por
8.12; 9.5 uma semana; lembrete da proteção
de Deus durante a peregrinação de
Israel no deserto; o sacerdote
derramava água para simbolizar que
na vinda do Messias o mundo
conheceria a Deus.
Cumprimento: Jesus habitou entre
nós; Jesus como fonte de água viva
que fluirá dos fiéis (discurso de
Jesus na Festa dos Tabernáculos).

D. Páscoa final: sinal climático, a ressurreição de


Lázaro e outros eventos (11 e 12)
Nesta seção de ligação, o evangelista narra o sinal climático de Jesus, a
ressurreição de Lázaro (11.1-44), bem como a crescente oposição a Jesus
pelas autoridades judaicas (11.45-57). A surpreendente demonstração do
messiado de Jesus na ressurreição de Lázaro acrescenta o ponto de
exclamação final à alegação de Jesus de ser o messiânico Filho de Deus (cf.
12.36-41; 20.30,31). À luz da crescente pressão seguindo o sinal final de
Jesus neste Evangelho, Jesus decidiu evitar o público e se retirou com seus
discípulos (11.54).
Com os sete sinais por trás de Jesus e com a conspiração contra ele se
intensificando, João mudou o foco do leitor do “Livro dos Sinais” (1.19 a
12.50) para o “Livro da Exaltação” (caps. 13 a 20), retratando os seguintes
eventos: Maria ungindo a Jesus em Betânia (12.1-8), que antecipou a sua
morte e sepultamento; a Entrada Triunfal de Jesus em Jerusalém, que

653
ressaltou sua identidade messiânica (12.12-19);59 e a vinda de alguns
gregos, que significou a aurora da era dos gentios (12.20-36). Esses três
eventos públicos precederam a acusação final da rejeição judaica (12.37-
50). Com isso Jesus mudou seu foco da sua revelação a Israel para a
preparação de sua nova comunidade messiânica.

Tabela 7.3: Os Sinais de Jesus no Evangelho de João


Importância
Sinal Referência
Cristológica
1. Transformação da 2.1-11 Manifestação de glória;
água em vinho resulta na crença dos
discípulos.
2. Purificação do templo 2.13-22 Indica a substituição do
Templo; antecipa a
ressurreição de Jesus.
3. Cura do filho do 4.46-54 Execução de “milagres
oficial difíceis”; tema da
rejeição.
4. Cura do homem 5.1-15 Realização no sábado;
paralítico leva à perseguição.
5. Alimentação da 6.1-15 Mostra Jesus como o
multidão “pão da vida”.
6. Cura do homem cego 9:1-41 Jesus, a luz do mundo,
pode curar a cegueira
espiritual.
7. Ressurreição de 11.1-44 Jesus como o ressurreto
Lázaro e messiânico Filho de
Deus.

654
III. Livro da Exaltação: Preparação da Nova
Comunidade Messiânica e a Paixão de Jesus (13 a
20)
Após narrar os sete “sinais messiânicos” de Jesus no “Livro dos Sinais”
culminando em sua rejeição pelos judeus (caps. 1 a 12), João começou a
antecipar a ressurreição e ascensão de Jesus no “Livro da Exaltação” (caps.
13 a 20). O foco está justamente na preparação de Jesus da nova
comunidade messiânica, seguida por um relato da Paixão de Jesus,
incluindo sua prisão, crucificação e sepultamento, e as suas duas primeiras
aparições após sua ressurreição. A declaração de propósito conclui a
narrativa propriamente dita (20.30,31).

A. A purificação e instrução da nova comunidade


da Aliança, incluindo a oração final de Jesus (13 a
17)
Com a linha de demarcação entre crentes e descrentes agora claramente
estabelecida, Jesus dirigiu sua atenção para os Doze (ou Onze), a fim de
prepará-los para o momento posterior à sua iminente partida. Essa
preparação, apresentada em uma seção exclusiva do Evangelho de João
comumente chamada de “O Discurso do Cenáculo” ou “Discurso de
Despedida” (caps. 13 a 17), ocorreu em três etapas: (1) Jesus purificou a
comunidade (13.1-30); (2) Jesus ofereceu uma despedida encorajadora e
desafiadora (13.31 a 16.33); e (3) Jesus proferiu uma oração de despedida
(cap. 17).
Primeiro, a nova comunidade messiânica foi purificada, tanto
literalmente através da sua lavagem dos pés dos discípulos (13.1-17) quanto

655
espiritualmente, através da remoção de Judas, o traidor, do meio dos
discípulos (13.18-30). Com a comunidade purificada e com a iminente
partida de Jesus, ele se volta a um período de instrução prolongada dos
Onze, a fim de preparar seus seguidores para o momento em que ele
deixaria de estar presente fisicamente com eles (o “Discurso de Despedida”,
13.3 a 16.33). Nele João apresentou as instruções de despedida de Jesus a
seus seguidores contra o pano de fundo da despedida de Moisés em
Deuteronômio.60
Depois de anunciar que a partida era agora iminente, Jesus confortou
seus discípulos dizendo-lhes que iria preparar um lugar para eles na “casa
de [seu] Pai” (14.2). Para que pudessem segui-lo até lá, eles deveriam
lembrar que Jesus é o único caminho para o Pai (14.6). Jesus ainda
consolou seus seguidores prometendo enviar “outro Consolador” (14.16),
“o Espírito da verdade” (14.17). Uma vez que Jesus foi exaltado, os
discípulos deviam permanecer ligados à “videira verdadeira” (15.1), pois
separados dele nada podiam fazer (15.5). Eles deviam testemunhar a um
mundo que os odiaria e os perseguiria (15.18 a 16.33), sabendo que a
vitória de Jesus, já está assegurada (16.33).
Enquanto a purificação da comunidade serviu como um preâmbulo para
o Discurso de Despedida de Jesus, sua oração de despedida (17.1-26)
forneceu um poslúdio. Jesus primeiro orou por si mesmo (17.1-5); em
seguida, pelos seus discípulos (17.6-19); e finalmente por todos aqueles que
creriam devido à proclamação de seus discípulos (17.20-26). Isso
proporcionou uma conclusão adequada para o Discurso de Despedida e uma
introdução adequada para os eventos da Narrativa da Paixão que se seguiu
rapidamente.

656
B. A narrativa da Paixão (18 e 19)
Depois de orar, Jesus, sabendo o que estava para acontecer com ele (18.4),
foi preso por um grupo de soldados auxiliados por Judas, o traidor, sob o
manto da noite. A ironia joanina engrossa o modo como os acontecimentos
da Paixão se desenrolam. Da perspectiva do mundo, o interrogatório de
Jesus pelo sumo sacerdote (18.19-24), as negações de Pedro (18.15-18, 25-
27) e a sentença de Pilatos (18.28 a 19.16) revelaram as desventuras de um
farsante judeu que procurava enganar os seus seguidores alegando ser o tão
esperado Messias. Da perspectiva de João, entretanto, Jesus era o rei de
outro mundo que tinha vindo a este mundo como testemunha da verdade;
ele era o único que poderia um dia servir como seu juiz, mas que agora
deveria dar a sua vida pelos pecados do mundo; e ele era o Messias
crucificado, sepultado e ressuscitado, cuja ressurreição constituiu o ato final
do “Cristo elusivo”, que tinha continuado a fugir das garras do mundo.61
Como o quarto evangelista deixou claro, todos esses eventos finais do
ministério terreno de Jesus se revelaram de acordo com o plano soberano e
pré-determinado por Deus (12.37-41; 13.1-3; 18.4), uma perspectiva
particularmente evidente em toda a Narrativa da Paixão (veja especialmente
as citações de cumprimento em 19.24,28,36,37).62 O julgamento e a
crucificação mostram os judeus como unidos ao mundo em sua
incredulidade e rejeição ao Messias. A estrutura cuidadosamente planejada
de um padrão de oscilação de cenas externas e internas de Jesus diante de
Pilatos (18.28 a 19.16a)63 pretendia “apresentar o resultado paradoxal de
todo o processo — como eles [Pilatos e os líderes judeus] encontraram uns
aos outros em uma única aliança imoral contra Jesus”.64 A aliança deles
levou à crucificação de Jesus e ao aparente sucesso dos inimigos de Jesus
(19.16b-42).

657
C. A ressurreição e as aparições de Jesus, o
comissionamento dos discípulos (20.1-29)
A ressurreição de Jesus e as aparições da ressurreição fornecem a conclusão
da Narrativa da Paixão e a penúltima conclusão para todo o Evangelho. A
tumba vazia ofereceu o primeiro vislumbre de esperança do retorno que
Jesus prometeu no Discurso de Despedida (20.1-10). Esse vislumbre de
esperança alcançou seu cumprimento inicial no primeiro encontro póstumo
de Jesus com Maria Madalena (20.11-18). As aparições a seus discípulos
continuaram, embora sem a presença de Tomé (20.19-23) e, depois, com a
presença dele (20.24-29).
No clímax do tema do “envio” neste Evangelho, Jesus comissionou seus
discípulos (“Como o Pai me enviou, também eu vos envio”; 20.21),
soprando sobre eles e, em um gesto simbólico, conferindo-lhes o Espírito
Santo (20.22) e uma mensagem de perdão (20.23).65 A aparição de Jesus a
Tomé termina com a confissão climática deste último, “Senhor meu e Deus
meu!” (20.28), que relembrava a identificação de abertura de Jesus como
Deus no prólogo (1.1,18).

D. Declaração final de propósito (20.30,31)


A declaração final de propósito em 20.30,31 realça praticamente todos os
temas principais da narrativa anterior: (1) determinados sinais selecionados;
(2) a necessidade de crer que Jesus é o Messias e Filho de Deus; e (3) a
promessa de vida, presente e eterna.66

658
Tabela 7.4: As Sete Palavras de Jesus na Cruz
Ditos de Jesus Referências do NT
“Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que Lucas 23.34
fazem”
“E Jesus lhe respondeu: Em verdade te digo Lucas 23.43
que hoje estarás comigo no paraíso”
“Mulher, aí está o teu filho […] Aí está tua João 19.26, 27
mãe”
“Eloí, Eloí, lamá sabactani?, que traduzido Mateus 27.46 // Marcos
é: Deus meu! Deus meu! Por que me 15.34
desamparaste?”
“Estou com sede” João 19.28
“Está consumado” João 19.30
“Pai, nas tuas mãos entrego o meu espírito” Lucas 23.46

IV. Epílogo: Os Papéis Complementares de Pedro


e do Discípulo Amado (21)
À primeira vista parece que o Evangelho de João deveria ter chegado ao fim
com a declaração final de propósito em 20.30,31 e que o epílogo muito
provavelmente foi acrescentado por um escritor posterior após a morte de
João. Pelo contrário, no entanto, muito provavelmente o epílogo serve como
o desfecho que corresponde ao livro de abertura do prólogo. O epílogo
resolve o relacionamento entre Pedro e o “discípulo a quem Jesus amava”
em termos de não competição e resolve a identidade da autoria joanina.
Assim, o epílogo provavelmente veio das mãos de João: sua linguagem e
estilo são semelhantes à dos capítulos 1 a 20; não existe nenhuma evidência

659
textual de que o Evangelho de João tenha circulado sem ele. Portanto, o
epílogo de João parece ser parte do plano literário geral de João.67

A. A Terceira aparição de Jesus (21.1-14)


Depois de aparecer aos discípulos sem a presença de Tomé e depois com a
presença dele (veja acima), Jesus lhes apareceu uma terceira vez, validando
ainda mais sua ressurreição.68 Os discípulos retornaram ao mar de
Tiberíades (mar da Galileia, veja 6.1,23) para pescar, a antiga profissão de
Pedro (cf. Mt 4.18).69 Quando Jesus os chamou da praia, eles não
conseguiram reconhecê-lo (21.4). No entanto, depois de instrui-los sobre
onde jogar sua rede, o “discípulo a quem Jesus amava” reconheceu o
“Senhor”, fazendo com que Pedro mergulhasse na água para nadar até a
praia. A viagem de pesca dos discípulos introduziu as duas próximas seções
importantes do epílogo fornecendo o contexto para estes eventos
subsequentes.

B. Jesus e Pedro (21.15-19)


Anteriormente Pedro tinha abertamente negado conhecer Jesus por três
vezes (18.15-18, 25-27). Agora, de forma correspondente, Jesus
abertamente afirmou e comissionou Pedro diante dos demais discípulos.
Apesar de seu fracasso, Pedro se tornaria o líder da igreja (veja Mt 16.16-
19, At 1 a 12) e glorificaria a Deus por uma morte semelhante à do seu
Senhor (21.18,19; a expressão “estenderás as mãos” era um antigo
eufemismo comum para a crucificação).

660
C. Jesus e o discípulo a quem Jesus amava (21.20-
25)
O quarto evangelista concluiu seu Evangelho com um intercâmbio entre
Jesus, Pedro e o “discípulo a quem Jesus amava”. Foi espalhado o rumor
que este discípulo não morreria antes da volta de Jesus (21.23) e o
“discípulo a quem Jesus amava” foi identificado como o autor do
Evangelho (21.24; veja 21.20; 13.23; cf. “Autor”). Como observado, isso
traz o fechamento perfeito para o Evangelho através da resolução do
relacionamento entre Pedro e “o discípulo a quem Jesus amava” em termos
de não competição e da revelação a identidade do autor do Evangelho.
Finalmente, a hipérbole conclusiva recorda declarações conclusivas
semelhantes em escritos greco-romanos e judaicos (21.24,25; cf. Ec 12.9-
12; Soperim 6.8). Como observou um comentarista, “a hipérbole de João
[…] não exalta nem os livros que o povo escreve nem a sabedoria que o
povo adquire, mas sim as ações que Jesus realizou. Tomada em conjunto
com a ênfase do prólogo na pessoa de Jesus, a referência do epílogo às suas
obras faz da descrição cristológica de João algo que não é exaustivamente
compreensivo, mas sim suficientemente completo”.70

TEOLOGIA
Temas Teológicos71
Jesus como o Verbo, o cordeiro de Deus e o
messiânico Filho de Deus
O Evangelho de João conclui a parte dos Evangelhos do cânon do NT
afirmando que o mundo inteiro não poderia conter os livros que teriam que

661
ser escritos, se tudo o que Jesus tinha feito e dito fosse registrado (21.25).
Essa declaração serve como uma conclusão adequada tanto para o
Evangelho de João quanto para todos os quatro Evangelhos em sua
totalidade. Com a sua apresentação de Jesus como o Verbo preexistente que
estava com Deus no princípio e que era, ele mesmo, Deus (1.1), que se fez
carne (1.14) e como o “Cordeiro de Deus” que ofereceu expiação vicária
pelo pecado (1.29,36), o Evangelho de João faz uma contribuição
imprescindível para o cânon do NT.
Na verdade, Jesus está no cerne da narrativa joanina. João apresentou
Jesus tanto como divino (1.1; 8.58; 12.41; 17.5; 20.28) quanto como
humano (4.6,7; 11.33,35; 19.28).72 Não é possível explorar toda a
profundidade da descrição que João faz de Jesus aqui. A pesquisa que se
segue discute brevemente os seguintes aspectos interrelacionados da
cristologia de João: Jesus como o Verbo (Logos); Jesus como o Filho de
Deus; Jesus como o Cordeiro de Deus; e os sinais de Jesus e sua relação
com a fé.73
No início, o relato de João é baseado no “entendimento do Antigo
Testamento de que Deus envia sua Palavra (veja 1.1: logos) para alcançar
seus objetivos (veja Is 55.10,11)”.74 Isso justamente coloca a cristologia de
João no âmbito da história da salvação do AT. A expressão de abertura “no
início” relembra as primeiras palavras de Gênesis, que narram a criação do
mundo (1.1; veja 1.3). Segundo João, a vinda do Verbo para o mundo e seu
ato de se tornar carne em Jesus constitui um acontecimento de magnitude
comparável (1.1,14). Jesus é apresentado como o Verbo enviado do céu
para cumprir uma missão e, uma vez que a missão fosse cumprida,
retornaria ao lugar de onde veio (1.1,14; 13.1-3; 16.28; veja Is 55.11).

662
O povo deve acreditar que Deus enviou Jesus não somente como o rei
de Israel (1.49), mas também como o “Cordeiro de Deus” (1.29,36). Em seu
Evangelho, João ecoou a teologia e a tipologia do AT ao fazer alusão ao
cordeiro sacrificial pascal. João foi o único evangelista a chamar Jesus de
“o Cordeiro de Deus”, e ele disse que Jesus “tira o pecado do mundo”
(1.29). Isso fornece o remédio para o pecado do povo (veja 8.24,34), que é,
em última análise, o pecado da descrença em Jesus (16.9). A natureza
sacrificial e substitutiva da morte de Jesus também é enfatizada nas
referências a Jesus como “o pão da vida”, dado pela vida do mundo (6.31-
59) e como o “bom pastor” que dá sua vida pelas suas ovelhas (10.11-17).
Portanto, uma parte vital da missão de Jesus é a sacrificial remoção do
pecado.
Talvez da forma mais difundida, o Evangelho de João apresenta Jesus
como o Filho enviado pelo Pai (3.17,35,36; 5.19-26; 6.40; 8.35,36; 14.13;
17.1). Essa metáfora é retirada do conceito judaico de ālîah, segundo o qual
o enviado é como o próprio remetente, fielmente buscando os interesses do
remetente (veja 13.16,20). A missão messiânica de Jesus, portanto, deriva-
se de Deus e é totalmente baseada em formas judaicas de pensamento. No
entanto, Jesus não é apenas um mensageiro qualquer; ele é o messiânico
Filho de Deus (20.30,31), o Filho Unigênito do Pai, que veio fazer uma
revelação completa dele (1.14,18; 3.16,18).

Os sinais
A importância dos sinais no Evangelho de João dificilmente pode ser
exagerada. A performance de Jesus de sinais messiânicos selecionados
domina a primeira metade do Evangelho de João (caps. 1 a 12) enquanto ele

663
caminha inexoravelmente para o seu primeiro clímax, a rejeição judaica de
Jesus como Messias (12.36b-41). Notadamente, a execução de sinais
messiânicos por Jesus culmina com a ressurreição de Lázaro, antecipando
sua própria ressurreição. Geralmente, parece que a seleção que João fez de
atos específicos de Jesus como sinais procedeu do critério especialmente
surpreendente ou impressionante da exibição do poder messiânico de Jesus.
Em cada caso, isso fica claro através de referências específicas fornecidas
pelo evangelista, muitas vezes envolvendo (grandes) números.
No caso em que Jesus transforma água em vinho, João observou a
grande quantidade de água transformada em vinho (2.6). Na purificação do
Templo, o grande período de tempo que tinha decorrido desde a conclusão
do templo é contrastado com o curto intervalo de tempo no qual o corpo de
Jesus, o “novo templo”, seria erguido (2.19,20). A cura do filho do
centurião por Jesus é um difícil milagre de longa distância (observe que a
atenção é colocada na perfeita coincidência entre o momento em que Jesus
proferiu a palavra e o momento em que a cura se realizou, isto é, 13h;
4.52,53). O homem paralítico curado por Jesus tinha estado nessa condição
por 38 anos (5.5). Na alimentação da multidão, o evangelista observou a
grande quantidade de sobras, 12 cestos (6.13). O homem cego curado por
Jesus era cego de nascença (9.1). Por fim, Lázaro não apenas estava morto
quando Jesus chegou ao local; ele havia morrido há quatro dias e seu corpo
já começara a se decompor (11.39).
Todas essas características salientam a surpreendente natureza da
exibição de Jesus de sua identidade messiânica, o que tornava a
incredulidade dos judeus ainda mais indesculpável (a função da teodiceia de
João, mostrando que Deus era justo ao condenar a incredulidade).75 A
importância dos sinais no Evangelho de João é ainda mais realçada pelas

664
referências estratégicas aos sinais de Jesus no final da primeira metade do
Evangelho de João (12.36-40) e na declaração de propósito no final do
próprio Evangelho (20.30,31). Isso mostra que, para João, os sinais eram
tanto o tema cristológico chave quanto um componente estrutural de seu
Evangelho.
Semelhante ao tema do envio no Evangelho de João, o conceito de
sinais está profundamente arraigado no pensamento judaico.76 A trajetória
da antecedente teologia do AT remonta aos sinais e maravilhas realizados
por Moisés no Êxodo. Baseando-se nessa trajetória, os sinais de Jesus
apontam para um novo Êxodo e libertação do povo de Deus de seus
pecados (veja Lc 9.31). Por isso, neste Evangelho, mais do que nos relatos
sinóticos, a natureza sobrenatural das obras de Jesus — seus “milagres” (gr.
dynamis), um termo usado de forma consistente nos Sinóticos mas não em
João, que utilizou o equivalente sēmeion — é colocado dentro do âmbito
maior do seu simbolismo profético e messiânico. Os milagres de Jesus não
são apenas obras poderosas; eles mostravam ser ele o Messias.
Assim, de forma similar aos sinais realizados por Moisés e pelos antigos
profetas (cf. Is 20.3), os sinais de Jesus serviram principalmente para
autenticar aquele que os realizou como verdadeiro representante de Deus.
As pessoas são severamente criticadas por exigirem evidências
espetaculares da autoridade de Jesus (4.48); ao mesmo tempo, os sinais são
oferecidos como um auxílio para a fé (10.38). E enquanto a bênção é
pronunciada sobre “aqueles que não viram e creram” (20.29), os sinais de
Jesus são claramente destinados a promover a fé em sua audiência, e
quando eles não conseguem fazê-lo, as pessoas são consideradas
responsáveis. O resultado desejado da missão de Jesus é que as pessoas

665
creiam nele como o Messias. Seus sinais, então, servem como prova de sua
identidade e como auxílio para levar os descrentes à fé.

A nova comunidade da Aliança e a descrição que


João faz dos “judeus”
Um objetivo primário da missão messiânica de Jesus em João é a formação
de uma nova comunidade messiânica. Como sua descrição de Jesus, a
apresentação de João desta comunidade segue a o padrão de histórico-
salvífico.77 De acordo com a tipologia do AT, os fiéis são descritos como um
“rebanho” (10.1-20) e como “ramos” da videira (15.1-8). No entanto, João
não ensinou que a igreja substituiu Israel. Em vez disso, ele identificou
Jesus como o substituto de Israel: ele é a “vinha” de Deus que toma o lugar
de Israel, a “vinha de Deus” do AT (Is 5). João reconheceu que “a salvação
vem dos judeus” (4.22), embora ele tenha retratado Israel como parte do
mundo descrente que rejeitou Jesus. “Mesmo os que eram de” Jesus — os
judeus não o receberam (1.11), e em seu lugar os Doze (exceto Judas), que
agora são “seus”, são os recipientes do seu amor (13.1; veja cap. 17). Os
líderes judeus, por outro lado, nunca pertenceram ao rebanho de Jesus
(10.26).
Jesus como substituto Israel levanta a questão do relacionamento da
nova comunidade messiânica com o povo judeu. Algumas vezes alegou-se
que João é antissemita, uma vez que ele parece usar o termo “os judeus”
(Ioudaioi) predominantemente em sentido negativo. Mas das 68 vezes que
ele usa a expressão, muitas delas significam “judeus” (em oposição aos
galileus; 1.19) ou aos “líderes judeus” (veja 19.7,12). Frequentemente a
expressão refere-se à maioria do povo judeu ou da nação judaica como um

666
todo que rejeitou Jesus (10.33).78 Assim, João não pretendia sugerir que
agora os judeus estão excluídos do programa histórico-salvífico de Deus —
especialmente, porque a “salvação vem dos judeus” (4.22) — mas que eles,
como quaisquer outros, devem vir a Jesus em fé, em vez de se apoiar em sua
identidade judaica.
Uma vez que alguém tenha sido incorporado à nova comunidade
messiânica por Jesus através da fé, a posição de tal pessoa é segura. Os fiéis
são dados a Jesus por Deus e ele não perderá nenhum deles (6.39). Além
disso, ninguém pode arrebatá-los da mão de Jesus porque o Pai, que os deu
a Jesus, é maior que tudo (10.29). Nem mesmo os doze discípulos de Jesus
o escolheram, mas ele os escolheu (15.16). Somente o traidor, Judas
Iscariotes, foi condenado à destruição, “para que se cumprisse a Escritura”
(17.12).
No entanto, os escolhidos na comunidade devem “permanecer” em
Jesus e “dar fruto” para ele (15.4-8). Quem não permanecer em Jesus será
jogado fora como um galho seco que só serve para ser queimado (um
símbolo do juízo divino). Tais ramos são recolhidos, lançados ao fogo e
queimados (15.6). Eleição e perseverança, no entanto, são apenas dois lados
da mesma moeda, como indica João em outras passagens: “eles saíram
dentre nós, mas não eram dos nossos, pois se fossem dos nossos teriam
permanecido conosco; mas todos eles saíram, para que se manifestasse que
não são dos nossos” (1Jo 2.19).79
A comunidade é formalmente constituída na narrativa do
comissionamento, onde Jesus “soprou” sobre os discípulos reunidos e
trouxe à existência uma “nova criação” (20.22), recordando a criação do
primeiro ser humano, Adão (Gn 2.7). A preparação para a partida que Jesus
fez de seus seguidores vem em termos que lembram o discurso

667
deuteronômico de despedida de Moisés, outro exemplo da aproximação que
João faz do AT.80 Nessa conjuntura histórico-salvífica, no entanto, não foi
Israel, mas os fiéis em Jesus, que representam o grupo central através do
qual Deus buscaria os seus propósitos redentores. Nisso, o dependente e
obediente relacionamento de Jesus com aquele que o enviou, o Pai, é feito o
paradigma para o relacionamento dos discípulos com aquele que os envia,
Jesus.81 Assim, o Pai enviou seu Filho, o Messias, para estabelecer a sua
nova comunidade messiânica, e este comissionou a sua nova comunidade
messiânica, cuja missão é crer, permanecer e proclamar a mensagem de
Jesus, o Messias.

Deus, o Pai
Como já foi mencionado, Deus no Evangelho de João é preeminentemente
o Pai (5.17-23) e aquele que enviou Jesus Cristo (5.37; veja 10.30-39). João
se refere a Deus Pai pelo menos 120 vezes em seu Evangelho. Portanto, o
Pai é onipresente no Evangelho; no entanto, o foco de João não está
primariamente em Deus em seu próprio direito, mas em Deus como o Pai e
como aquele que enviou Jesus. A razão para isso é que o público de João,
incluindo os judeus, os gentios tementes a Deus e os prosélitos, já
acreditava em Deus (veja 14.1). O propósito de João era levá-los da crença
comum em Deus à fé em Jesus como o Messias enviado de Deus e Filho de
Deus (20.30,31). No entanto, a existência de Deus no Evangelho de João é
amplamente presente e inequivocamente assumida.82
A identificação inequívoca de Jesus como Deus (theos) no Evangelho
de João (1.1,18; 20.28; veja 5.18; 10.30), levou à acusação de blasfêmia
pelos judeus, resultando na crucificação de Jesus (5.18; 19.5). Os

668
contemporâneos de Jesus afirmavam que sua alegação de divindade
conflitava com a crença judaica em um Deus único (monoteísmo), que
estava enraizada na confissão deuteronômica de Deus como “único” (Dt
6.4) e consagrada nos dois primeiros dos Dez Mandamentos (Êx 20.2-6; Dt
5.6-10), distinguindo Israel das nações vizinhas (veja 8.41). Esse aparente
diteísmo (crença em “dois deuses”) era uma objeção que o próprio Jesus
abordou com referência ao salmo 82.6 em João 10.34-38.

Algo Para Pensar:


Nenhuma Parcialidade com Deus

Os rabinos judeus na época de Jesus normalmente evitavam as


mulheres e ficavam longe de samaritanos. Assim, a mulher
samaritana que chegou ao poço em Sicar recebeu pelo menos dois
golpes contra ela. Adicione a isso o seu estilo de vida imoral e Jesus
tinha todos os motivos para evitar contato com essa mulher. Até
mesmo a mulher se surpreendeu por Jesus ter falado com ela: “como
tu, um judeu, pedes de beber a mim, que sou mulher samaritana?”
(4.9). João acrescentou: “pois os judeus não se davam bem com os
samaritanos.” Os discípulos de Jesus, quando do seu regresso das
compras de mantimentos na cidade, também “se admiraram de estar
ele falando com uma mulher” (4.27).
Em contraste, qualquer pessoa na época de Jesus ficaria
honrada por participar de uma conversa com Nicodemos, membro
do Sinédrio, o conselho dirigente judeu. Jesus o chamou de “mestre
em Israel” (3.10). Este mestre visitou Jesus de noite para perguntar

669
tacitamente sobre a natureza de seu ensino. Da mesma forma, as
autoridades judaicas tinham olhado para as atividades João Batista
(1.19). Mais tarde, o sumo sacerdote perguntou a Jesus acerca dos
seus discípulos e de sua doutrina no julgamento judeu precedente à
crucificação de Jesus (18.19). No entanto, quando Nicodemos
apareceu à porta de Jesus, Jesus não se intimidou. Ao contrário, ele
o desafiou a nascer de novo.
Desde os tempos do NT, a igreja tem dificuldades em tratar o rico
e o pobre de maneira semelhante. Paulo e Tiago exortaram os fiéis a
não dar tratamento preferencial aos ricos (1Tm 6.17-19; Tg 2.1-7).
Ao não mostrar parcialidade, Jesus exibiu uma peculiaridade divina,
pois Deus não faz acepção de pessoas. Você e eu não deveríamos
pensar que, devido à nossa posição social — vamos dizer, um
professor de seminário ou um correto cidadão da nossa comunidade
— seremos tratados por Deus de uma forma diferente dos demais.
Como Deus disse a Samuel: “não dê atenção à aparência ou à altura
dele, porque eu o rejeitei; porque o SENHOR não vê como o homem vê,
pois o homem olha para a aparência, mas o SENHOR, para o
coração.” (1Sm 16.7).

Ao afirmar a unidade com Deus Pai tanto nas suas obras quanto na sua
essência (cf. esp. 5.19,20; 10.30; 14.9-11), Jesus expandiu os horizontes do
monoteísmo judaico, mostrando que realmente havia um único Deus, ainda
que este Deus fosse constituído de duas, e na verdade, de três pessoas
(incluindo o Espírito Santo), que mantinha uma relação muito íntima de
amor e colaborou no plano histórico-salvífico de Deus (veja 14.15-26, onde
é dito que o Pai, o Filho e o Espírito, todos viriam residir nos fiéis). Nessa

670
demonstração de divindade de Jesus compatível com crenças monoteístas
judaicas, João ofereceu uma desculpa indispensável para a viabilidade do
cristianismo para seus leitores judeus e para aqueles atraídos pela fé
judaica.83

Salvação e expiação substitutiva


Segundo João, o propósito de Deus ao enviar Jesus era a salvação do
mundo, resultando na vida eterna (veja 3.16,17). De fato, a doação da vida
pode ser o propósito mais consistentemente declarado da missão de Jesus
no Evangelho de João (veja 6.57; 10.10; 17.2; cf. 5.24).84 A salvação vem
somente através de Jesus (14.6) e é oferecida a todo aquele que crê (3.16).
Como o “Salvador do mundo” (4.42), Jesus provê expiação substitutiva, um
conceito que, segundo alguns estudiosos, falta em João. Em vez disso, eles
argumentam que, para João, a salvação veio através de mera revelação.85
Esse argumento pressupõe que João compreendeu a salvação como os seus
congêneres gnósticos, que acreditavam que a salvação vinha através do
conhecimento da revelação divina e da experiência mística.
João, porém, deixou claro que Jesus de fato fez uma expiação
substitutiva. Primeiro, João Batista se referiu a Jesus como “o Cordeiro de
Deus” (1.29,36), uma referência ao papel substitutivo do cordeiro sacrificial
no AT. Segundo, Caifás involuntariamente profetizou que Jesus morreria
“pelo povo”, indicando a natureza vicária da morte de Jesus (11.49-52).
Terceiro, João se referiu à morte sacrificial vicária de Jesus nas passagens
sobre o “pão da vida” e sobre o “bom pastor” (6.51; 10.15-18). Embora
João tenha enfatizado o aspecto revelador da missão de Jesus, ele não ecoou
a ideia gnóstica de que o conhecimento da revelação por si se equipara à

671
salvação. Antes, ele ensinou que o amor de Deus foi revelado de forma
salvífica na crucificação de Jesus, e é somente crendo na morte substitutiva,
vicária de Jesus que as pessoas recebem a vida eterna (3.16).86

O Espírito Santo
O ensinamento de João com relação ao Espírito Santo é significativo,
especialmente na segunda metade de seu Evangelho.87 Na primeira metade
do Evangelho, João se refere ao Espírito apenas em algumas poucas
passagens. João Batista testificou que o Espírito repousou sobre Jesus
durante seu ministério terreno (1.32,33) e o fez em grau ilimitado (3.34).
Jesus observou que suas palavras são vivificantes e infundiam o Espírito
(6.63), e o evangelista disse a seus leitores que Espírito seria dado somente
após o ministério terreno de Jesus (7.39). Outras possíveis referências ao
Espírito revelam-se ser, sob um olhar mais atento, referências gerais ao
espírito em contraste com a carne (i. e., o material contrastado com o reino
espiritual, 3.5-8) e identificam Deus como espírito (ou seja, ele é um ser
espiritual; 4.23,24).88
O principal ímpeto para o ensino sobre o Espírito, na segunda metade
do Evangelho é a iminente partida de Jesus, a ocasião do Discurso de
Despedida. O propósito para o ensino sobre o Espírito é o de assegurar a
“continuidade entre o ensinamento de Jesus e a missão do Espírito Santo de
explicar este ensinamento”.89 Tendo Jesus sido exaltado com Pai após sua
ressurreição, o Espírito Santo viria e ocuparia seu lugar com os seus
seguidores como o “outro Consolador” (14.16). No entanto, isso não
significa que Jesus vai desaparecer de cena. Ao contrário, ele continuará a

672
dirigir a missão dos discípulos de sua posição exaltada com o pai,
respondendo orações dirigidas a Deus em seu nome (14.12,13; veja At 1.1).
No Discurso de Despedida, o Espírito é apresentado como o elo de
ligação entre o fiel, Jesus e Deus, que serviu como uma presença
permanente nos fiéis (14.17), que os ensinou e lembrou do ensinamento de
Jesus (14.26); deu testemunho dele (15.26), condenou o mundo (16.7);
conduziu os fiéis a toda a verdade (16.13) e anunciou as coisas que hão de
vir (16.13). Esta última função incluía a formação do cânon do NT como
testemunho apostólico de Jesus. Em tudo isso, o Espírito não agiu de forma
independente de Deus ou de Jesus. Ao contrário, ele dependia deles e de sua
missão enquanto sendo um com eles.90 O Espírito Santo também é
destacado no cenário do comissionamento joanino, onde Jesus é
apresentado concedendo o Espírito a seus discípulos, constituindo-os com
sua nova comunidade (20.22).91 Assim, só no poder do Espírito, eles serão
capazes de cumprir sua missão, cujo modelo está no envio do próprio Jesus
por parte do Pai.

O cumprimento de Jesus da tipologia inerente às


festas judaicas, espaço sagrado
A primeira metade do Evangelho de João, e aqui especialmente os capítulos
5 a 10, giram em torno do cumprimento de Jesus do simbolismo inerente
aos festivais religiosos judaicos e outras instituições. Isso inclui a Páscoa
(6.4; Jesus é “o pão da vida”, 6.48) e a Festa dos Tabernáculos (7.2; Jesus é
a “luz do mundo”, 8.12; 9.5). Nesses casos, Jesus é apresentado pelo
evangelista para encarnar e cumprir o simbolismo e tipologia inerentes a
esses festivais religiosos judaicos antecedentes, que acrescenta à sua

673
descrição de Jesus como Messias, juntamente com a execução de sinais e
sua autoidentificação como o divino “eu sou”.
De modo semelhante, João também mostra Jesus como incorporando
espaço sagrado. Em uma alusão ao Tabernáculo do AT, João disse que Jesus
“habitou” (literalmente “armou a sua tenda” skenoō) entre o povo de Deus
(1.14). O Evangelho de João também retrata a profecia de Jesus às
autoridades judaicas de que o Templo seria destruído e reconstruído em três
dias, uma velada referência à sua crucificação e ressurreição, que João
interpretou com referência ao “santuário do seu corpo” (2.21; veja v. 19,20).
Isso mostra que o santuário da antiga aliança, o Templo de Jerusalém, logo
ficaria obsoleto; na verdade, ele foi destruído pelos romanos no ano 70.92
Em seu lugar, a adoração adequada deveria ser dirigida a Jesus, o Salvador
do mundo crucificado e ressuscitado e Messias dos judeus.
De forma semelhante, quando a mulher samaritana lhe perguntou sobre
o lugar apropriado para adoração, se o Monte Gerizim (o santuário
samaritano) ou Jerusalém, Jesus respondeu que a adoração apropriada
deveria ser dirigida ao Pai “em espírito e em verdade”, pois “Deus é
Espírito, e é necessário que os que o adoram o adorem no Espírito e em
verdade” (4.23,24). Tomado em conjunto com a referência anterior ao corpo
de Jesus substituindo o Templo como o “espaço sagrado” apropriado para a
adoração, essa adoração “em espírito e em verdade” envolve a adoração de
Jesus como o Filho de Deus divinamente enviado, crucificado e
ressuscitado, que é, ele mesmo, Deus. Na verdade, essa foi a conclusão de
Tomé na climática confissão cristológica no final do Evangelho de João,
quando ele adorou a Jesus e exclamou: “Senhor meu e Deus meu!” (20.28;
veja também a resposta do homem que nasceu cego e foi curado em 9.38).

674
Tomada como um todo, a apresentação programática e metódica que
João faz de Jesus como o cumprimento da tipologia associada aos festivais
religiosos judaicos e ao espaço sagrado sustentam o poderoso argumento de
que Jesus se tornou o único objeto apropriado da adoração depois de sua
ressurreição e exaltação com Deus, o Pai. Todos os santuários anteriores,
incluindo o Tabernáculo e o Templo, foram agora substituídos e feitos
obsoletos por Jesus; todos os festivais religiosos anteriores foram vistos
como apontando tipologicamente para Jesus e foram cumpridos nele. Para
falar na linguagem do escritor aos Hebreus, aqueles que insistem em
continuar a adorar seguindo o ritual de adoração do AT estão lidando com
“sombras” e “cópias” da realidade que veio em Jesus.

Escatologia realizada
O ensino de João sobre o final dos tempos, embora não esteja em conflito
com o de outros documentos do NT (incluindo os Evangelhos Sinóticos), é
distintivo pelo fato de acentuar de forma mais veemente do que alguns dos
outros escritos do NT até que ponto o final dos tempos já começou em
Jesus e através dele. Isso não significa que o futuro está totalmente engolido
no presente ou que João negou a Segunda Vinda de Jesus no futuro, como
alguns já sustentaram. No entanto, João enfatizou a maneira pela qual o
futuro invadiu o presente através de Jesus.
Para João, a vida eterna não é simplesmente uma questão da vida futura
após a morte; ela começa e já é experimentada no aqui e agora (uma
doutrina chamada de “escatologia realizada”, indicando que aspectos do
eschaton ou “final dos tempos” estão se tornando uma realidade já no
presente). Assim, quando alguém crê em Jesus como o Messias, esse

675
alguém nesse exato momento possui a vida eterna (3.16), ao mesmo tempo
em que possui vida futura (6.40). Já, ele “tem a vida eterna e […] passou da
morte para a vida” (5.24).
No entanto, esse “dualismo joanino” (como muitas vezes é chamado)
não é o mesmo que o dualismo gnóstico da matéria e do espírito, mas é
mais parecido com a distinção judaica entre “esta era” e a “era por vir”, que
decorre da compreensão judaica da história redentora. A teologia joanina do
final dos tempos fixa o futuro no presente ou tem o presente antecipando o
futuro, mas João também enfatizou a necessidade de os fiéis perseverarem
em seu compromisso com Cristo (veja 8.31; 15.4-8).

Relação com os Evangelhos Sinóticos e os Outros


Escritos de João
A relação entre o Evangelho de João e os Sinóticos é um tema vasto e
complexo que não pode ser tratado exaustivamente aqui. A relação tem sido
descrita em termos de mútua independência ou de variados graus de
dependência literária.93 Apesar dos esforços para demonstrar a dependência
literária, parece difícil estabelecer com base em razões puramente literárias
que João conhecia ou utilizou um ou mais dos Evangelhos Sinóticos.
Historicamente, no entanto, parece difícil acreditar que o quarto evangelista
não tinha pelo menos ouvido falar da existência do Sinóticos e lido algumas
partes deles. Mas se o autor do Quarto Evangelho conhecia esses outros
Evangelhos ou não, ele claramente não fez um extensivo uso deles na
composição de sua própria narrativa. Além da alimentação dos 5 mil, da
unção, e a Narrativa da Paixão, João não compartilhou grandes blocos de
material com os Evangelhos Sinóticos.94

676
Ao contrário dos Sinóticos, o Evangelho de João não tem nenhuma
narrativa do nascimento, nenhum Sermão da Montanha ou Oração do
Senhor, nenhuma transfiguração, nenhuma Ceia do Senhor, nenhuma
parábola narrativa, nenhum exorcismo de demônios e nenhum discurso
escatológico. É evidente que João escreveu seu próprio livro, mas isso não
faz dele uma obra sectária separada das principais obras do cristianismo
apostólico.95 Em vez disso, João frequentemente transpôs elementos da
tradição do Evangelho em um padrão diferente.96 O ensino dos Sinóticos
sobre o reino de Deus corresponde ao tema joanino da “vida eterna”;
parábolas narrativas são substituídas por extensos discursos sobre o
simbolismo dos sinais de Jesus. Além disso, todos os quatro Evangelhos
apresentam Jesus como o Filho do Homem e como o Messias, cumprindo as
profecias e tipologia do AT. Assim, as diferenças entre os Sinóticos e João
não devem ser exageradas.97
No que diz respeito à relação entre o Evangelho de João e as cartas de
João e o livro do Apocalipse, com toda probabilidade João, o apóstolo, não
foi apenas o autor do Evangelho, mas também das cartas e do Apocalipse.98
Isso é indicado, entre outras coisas, pelos numerosos paralelos verbais e
conceituais entre esses escritos.99 As diferenças, tais como a falta de
referências ao AT nas cartas e a natureza simbólica de Apocalipse, são
provavelmente atribuídas aos diferentes propósitos e gêneros desses
escritos. Muito provavelmente, o Evangelho de João foi escrito primeiro, e
as cartas trataram de questões e desafios que surgiram posteriormente. A
designação “presbítero” nas cartas de João (2Jo 1.1; 3Jo 1.1) pode se referir
tanto à idade de João quanto à sua posição entre as congregações a que se
dirigiu.

677
CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON
Jesus como o Verbo preexistente que se fez carne (1.1,14)
Jesus como o Unigênito Filho do Pai (1.14,18; 3.16,18)
Jesus como o Cordeiro de Deus que tirou os pecados do mundo
(1.29,36)
Jesus como o Senhor glorificado e exaltado que dirige a missão de
seus seguidores através do “outro Consolador”, o Espírito Santo
(14.12-18)
Jesus como o Messias que realizou uma série de sinais surpreendentes
(20.30,31)

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Quem é “o discípulo que Jesus amava”?
2. Quais são as três razões conclusivas que os autores fornecem para se
acreditar que João escreveu o Evangelho que leva seu nome?
3. Quais são as duas principais divisões que compõem a estrutura do
Evangelho de João?
4. Como essas duas divisões principais cumprem a declaração de
propósito de 20.30,31?
5. Qual é pelo menos um dos principais temas teológicos no Evangelho
de João que aponta para uma data de composição tardia?
6. Qual era, provavelmente, o público geral de João?
7. Como João 1.1-18 serve como um mapa para todo o Evangelho?
8. Qual é o objetivo principal dos sinais incluídos na primeira metade do
Evangelho de João?

678
9. Quais foram os dois principais catalisadores para a produção do
Evangelho de João?
10. Qual é o principal propósito das declarações iniciadas por “eu sou”?
11. Por que alguns estudiosos rejeitam a originalidade de João 21? Como
os autores a defendem?
12. Quais são as implicações de Jesus ser o enviado Filho de Deus?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


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1
A. J. Köstenberger, “John”, em: T. D. Alexander; B. S. Rosner, orgs., New Dictionary of

Biblical Theology, (Downers Grove: InterVarsity, 2000), p. 280-85. Tomando como pontos de

referência as quatro bestas em Ezequiel 1.10 e Apocalipse 4.6-15, os pais descrevem João como uma

águia. Veja Agostinho, De consensu evangelistorum 6, citado em: A. Volfing, John the Evangelist in

Medieval German Writing: Imitating the Inimitable (Oxford: University Press, 2001), p. 45, n. 67:

“João voa como uma águia acima das nuvens da fraqueza humana e olha de maneira fixa e constante

com os olhos de seu coração para a luz da verdade imutável”.

2
Veja J. N. Sanders, The Fourth Gospel in the Early Church (Cambridge: University Press,

1943); T. E. Pollard, Johannine Christology and the Early Church, SNTSMS 13 (Cambridge:

University Press, 1970); F.-M. Braun, Jean le théologien (Paris: Gabalda, 1959), vol. 1: Jean le

théologien et son évangile dans l’église ancienne; A. Grillmeier, Christ in Christian Tradition,

tradução para o inglês de J. Bowden, 2. ed. rev (Atlanta: John Knox, 1975), vol. 1: From the

Apostolic Age to Chalcedon (451), especialmente p. 26-32.

683
3
No contexto latino, veja Volfing, John the Evangelist, p. 11-59; cf. As obras referidas em J. N.

Sanders, Fourth Gospel; Pollard, Johannine Christology; Braun, Jean le théologien; Grillmeier,

Christ in Christian Tradition.

4
A integridade do Quarto Evangelho não é comprometida pelo inimitável estilo joanino

envolvendo a narrativa como também partes do discurso. Para avaliações positivas da confiabilidade

histórica do Evangelho de João, veja A. J. Köstenberger, “John”, em: C. A. Arnold, org., Zondervan

Illustrated Bible Backgrounds Commentary (Grand Rapids: Zondervan, 2002), vol. 2. p. 1-216; C. L.

Blomberg, “To What Extent is John Historically Reliable?”, em: R. B. Sloan; M. C. Parsons, orgs.,

Perspectives on John: Method and Interpretation in the Fourth Gospel, NABPR Special Studies

Series (Lewiston: Mellen, 1993), p. 27-56; id., “The Historical Reliability of John: Rushing in Where

Angels Fear to Tread?”, em: R. T. Fortna; T. Thatcher, orgs., Jesus and Johannine Tradition

(Louisville: Westminster John Knox, 2001), p. 71-82; id., The Historical Reliability of John’s Gospel

(Leicester: InterVarsity, 2002); contra M. Casey, Is John’s Gospel True? (London/New York:

Routledge, 1996). Observe também a obra inovadora de C. E. Hill, The Johannine Corpus in the

Early Church (Oxford: University Press, 2004). No entanto, continua a haver ceticismo por parte de

muitos; veja a pesquisa de R. Kysar, Voyages with John (Waco: Baylor University Press, 2005), cap.

15: “The Expulsion from the Synagogue: The Tale of a Theory”; a avaliação muito positiva de M. M.

Thompson, “The ‘Spiritual Gospel’: How John the Theologian Writes History”, em: P. N. Anderson;

F. Just; T. Thatcher, org., John, Jesus, and History (Atlanta: SBL, 2007), vol. 1: Critical Appraisals

of Critical Views, p. 103-107; e a avaliação negativa de H. W. Attridge, “Responses to ‘The

Dehistoricizing of the Gospel of John’ by Robert Kysar” (apresentada na reunião anual da SBL,

Toronto, p. 23-26 de novembro de 2002).

5
Veja J. N. Sanders, Fourth Gospel, p. 47-87; Pollard, Johannine Christology, p. 25.

6
Sobre a história dos estudos joaninos no final do século XVIII e início do século XIX, veja A. J.

Köstenberger, “Early Doubts of the Apostolic Authorship of the Fourth Gospel in the History of

Modern Biblical Criticism”, em: Studies in John and Gender (New York: Peter Lang, 2001), p. 17-

684
47. Os ensaios sobre a história e teologia no Quarto Evangelho e sobre a questão de sua autoria por

L. Morris (Studies in the Fourth Gospel [Grand Rapids: Eerdmans, 1969], p. 65-292) ainda

necessitam de cuidadoso estudo. Para uma aplicação interessante da afirmação de Clemente, veja F.

Thielman, “The Style of the Fourth Gospel and Ancient Literary Critical Concepts of Religious

Discourse”, em: D. F. Watson, org., Persuasive Artistry: Studies in New Testament Rhetoric in Honor

of George A. Kennedy, JSNTSup 50 (Sheffield: JSOT, 1991), p. 183, no contexto de todo seu artigo.

A referência à Hipótese de Clemente é encontrada em Eusébio (Hist. Ecl. 6.14). Cf. Thompson

(“Spiritual Gospel”, p. 103), que corretamente observou que “o que quer que significasse a Clemente

chamar João de um “Evangelho espiritual”, é duvidoso que ele quisesse contrastar “fatos”, em um

sentido moderno, e “interpretações” […] [Um] Evangelho ‘espiritual’ dá o sentido interior de um

evento ou realidade, e, consequentemente sua veracidade deve ser espiritualmente discernida”.

Thompson corretamente alegou que “a visão moderna” que põe em dúvida a historicidade de

qualquer item em João “se encontra a serviço de sua agenda teológica ou interpretativa” constitui

“uma maneira bem estranha de imaginar como a teologia funciona e talvez somente quem não faz

teologia poderia ter pensado de tal modo” (p. 104; ênfase original). Thompson continuou clamando

por uma maior sofisticação na filosofia da história dos estudiosos bíblicos. D. A. Carson (The Gospel

According to John, PNTC [Grand Rapids: Eerdmans, 1991], p. 29) de forma semelhante negou

atribuir a Clemente uma dicotomia entre “espiritual” e “histórico”; ele sugeriu que “espiritual” pode

significar “alegórico” ou “cheio de símbolos”.

7
Veja Carson, Gospel According to John, p. 31-33.

8
Veja J. L. Martyn, “Glimpses into the History of the Johannine Community”, em: H. J. de

Jonge, org., L’Évangile de Jean: sources, rédaction, théologie, BETL 44 (Gembloux: Duculot, 1977),

p. 149-75; id., History and Theology in the Fourth Gospel, 2. ed. (Nashville: Abingdon, 1979); R. E.

Brown, The Community of the Beloved Disciple (New York: Paulist, 1979); cf. O. Cullmann, The

Johannine Circle (London: SCM, 1976).

685
9
M. Hengel, Die johanneische Frage, WUNT 67 (Tübingen: Mohr-Siebeck, 1993); R.

Bauckham, The Gospels for All Christians: Rethinking the Gospel Audiences (Grand Rapids:

Eerdmans, 1998). Veja A. Schlatter (Der Evangelist Johannes, 2. ed. [Stuttgart: Calwer, 1948], x),

que comentou que o termo “escola joanina” pareceu ser para ele “completamente divorciado da

realidade” (völlig phantastisch).

10
R. Kysar, “The Dehistoricizing of the Gospel of John”, em: John, Jesus, and history, p. 75-

101. Apenas em 1990, D. M. Smith (“The Contribution of J. Louis Martyn to the Understanding of

the Gospel of John”, em: R. T. Fortna B. R. Gaventa, orgs., The Conversation Continues: Studies in

Paul and John in Honor of J. Louis Martyn [Nashville: Abingdon, 1990], p. 293, n. 30) poderia

escrever, “a tese de Martyn se tornou um paradigma […] É uma parte daquilo que os estudantes

absorvem de obras padrão, tais como comentários e livros-textos, como conhecimento geralmente

recebido e considerado válido”.

11
Veja a discussão desta questão nos capítulos sobre os Evangelhos Sinóticos.

12
O rótulo “o discípulo que Jesus amava” ocorre apenas na segunda parte principal do Evangelho

de João (primeiro em 13.23). Isto está de acordo com a acentuada mudança de perspectiva nos

capítulos 13 a 17, onde a missão dos discípulos é vista da perspectiva da exaltação de Jesus (A. J.

Köstenberger, The Missions of Jesus and the Disciples According to the Fourth Gospel [Grand

Rapids: Eerdmans, 1998], p. 153). Assim, a apresentação de João em termos mais elevados nos

capítulos 13 a 21 não é único no Evangelho de João e pode ser visto como indicando que o apóstolo,

como “o discípulo que Jesus amava” tem um papel importante a desempenhar na missão pós-

exaltação de Jesus realizada pelos seus seguidores comissionados. Para um argumento contra “o

discípulo que Jesus amava” como autor do Evangelho, veja G. R. Beasley-Murray, John, WBC 36

(Waco: Word, 1987; reimpr. 1999), lxx-lxxv.

13
Veja A. J. Köstenberger (Encountering the Gospel of John: The Gospel in Historical, Literary,

and Theological Perspective [Grand Rapids: Baker, 1999], p. 27) para um breve tratamento do

686
“anonimato” do Evangelho de João.

14
A conexão entre “nós” e “seus discípulos” é clara devido ao paralelo entre as referências

relacionadas a “sua [de Jesus] glória” em 1.14 e 2.11. Para uma discussão do uso de “nós” por João

(21.14) e “eu” (21.25), veja G. L. Borchert, John 1 to 11, NAC 25A (Nashville: B&H, 1996), p. 89-

90.

15
O epíteto “o discípulo que Jesus amava” é plausivelmente entendido como um exemplo de

modéstia autoral. Veja K. J. Vanhoozer (“The Hermeneutics of I-Witness Testimony: John 21.20-24

and the ‘Death’ of the Author”, em: A. G. Auld, org., Understanding Poets and Prophets: Essays in

Honour of George Wishart Anderson, JSOTSup 152 [Sheffield: JSOT, 1993], p. 374), que citou

Agostinho e Westcott, contra C. K. Barrett, The Gospel According to St. John, 2. ed. (Philadelphia:

Westminster,1978), p. 117.

16
Contra alguns comentaristas tais como Beasley-Murray (John, lxx), que sugeriram que o autor

de João não foi claro quanto ao número de discípulos que estava presente na Última Ceia.

17
Köstenberger, Encountering John, p. 22.

18
A seguir uma lista de todos os apóstolos nomeados nos Evangelhos e no livro de Atos: Pedro;

seu irmão André; Tiago e João, os filhos de Zebedeu; Filipe; Tomé; Judas Iscariotes (substituído por

Matias; At 1.15-26); Judas, o filho de Tiago; Mateus/Levi; Simão, o zelote = Tadeu(?); Tiago, o filho

de Alfeu; e Bartolomeu = Natanael?; veja Mateus 10.2-4; Marcos 3.16; Lucas 6.14; Atos 1.13. Cf. R.

Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses: The Gospels as Eyewitness Testimony (Grand Rapids:

Eerdmans, 2006), p. 113.

19
Além disso, uma vez que o estilo e o vocabulário de Mateus e de João diferem

significativamente, é improvável que o mesmo autor tenha escrito os dois Evangelhos.

20
Veja D. A. Carson; D. J. Moo, An Introduction to the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids:

Zondervan, 2005), p. 229-54 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução ao

687
Novo Testamento]. Cf. A discussão de Carson e Moo sobre a citação de Papias. Para uma monografia

discordante que atribui a autoria joanina ao “João, o Presbítero” de Papias, veja M. Hengel, The

Johannine Question (Philadelphia: Trinity Press International, 1989). Hengel sequer percebeu que

sua “hipótese pode parecer imaginária” (p. 130).

21
Para uma explicação sobre este ponto de vista, veja W. Bauer, Orthodoxy and Heresy in

Earliest Christianity (Philadelphia: Fortress, 1971 [ed. alemã original 1934]).

22
Hill, Johannine Corpus in the Early Church.

23
Köstenberger, “John”, p. 280. Para uma discussão de João como pescador, filho do trovão,

discípulo amado, presbítero e vidente, apóstolo na interpretação do século II, santo descrito como

uma águia, e herói e ícone, veja R. A. Culpepper, John, the Son of Zebedee: The Life of a Legend

(Columbia: University of South Carolina Press, 1994; reimpr. Minneapolis: Fortress, 2000).

24
Para informações adicionais sobre críticas e objeções pós-modernas à autoria apostólica do

Evangelho, veja G. R. O’Day, “Response to ‘Expulsion from the Synagogue: A Tale of a Theory’ by

Robert Kysar” (tese apresentada na reunião anual da SBL; Toronto, 23-26 de novembro 2002). Ele

disse que o abandono da autoria apostólica do Quarto Evangelho “criou espaço” para novas leituras

do Evangelho. Mas outros estudiosos veem a rejeição da autoria apostólica do Evangelho de João em

termos bem menos positivos. De qualquer modo, o modo irônico com o qual a autoria joanina é

regularmente rejeitada pelos acadêmicos contemporâneos não tem justificativa (Köstenberger, “Early

Doubts”). Enquanto teoria, a autoria joanina continua a ser uma hipótese plausível baseada tanto nas

evidências externas quanto internas (veja Carson, Gospel According to John, p. 68-81; Carson; Moo,

Introduction to the New Testament, p. 229-54).

25
Esses estudiosos sugerem uma data anterior a 70 para João: R. M. Grant, A Historical

Introduction to the New Testament (London: Collins, 1963), p. 152-53; L. Morris, The Gospel

According to John, NICNT (Grand Rapids: Eerdmans, 1971), p. 30-35; J. A. T. Robinson, Redating

the New Testament (London: SCM, 1976), p. 254-84. Para um resumo de seus argumentos, veja

688
Beasley-Murray, John, lxxvi; para uma refutação veja A. R. Kerr, The Temple of Jesus’ Body: The

Temple Theme in the Gospel of John, JSNTSup 220 (Sheffield: Sheffield Academic Press, 2002), p.

19-25; cf. Carson, Gospel According to John, p. 82-86; L. Morris, The Gospel According to John, ed.

rev., NICNT (Grand Rapids: Eerdmans, 1995), p. 25-30 (com referência a F. L. Cribbs,

“Reassessment of the Date of Origin and the Destination of the Gospel of John”, JBL 89 [1970], p.

38-55; e C. C. Torrey, Our Translated Gospels: Some of the Evidence [New York: Harper, 1936], x-

xi); e D. B. Wallace, “John 5.2 and the Date of the Fourth Gospel”, Bib 71 [1990], p. 177-205; mas

veja A. J. Köstenberger, John [BECNT; Grand Rapids: Baker, 2004], p. 177-78).

26
Veja “Ocasião” para uma breve explicação e referências bibliográficas adicionais.

27
Veja D. A. Croteau, “An Analysis of the Arguments for the Dating of the Fourth Gospel”,

Faith and Mission 20/3 (2003), p. 47-80.

28
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 267.

29
Carson, Gospel According to John, p. 85.

30
Schlatter, Evangelist Johannes, p. 44, mas observe a cautela de Carson (Gospel According to

John, p. 84).

31
Köstenberger, John, p. 199.

32
Ibid., p. 8. Alguns acadêmicos sugeriram que uma vez que João não foi citado em obras

anteriores ao final do século II, ele provavelmente escreveu bem depois de 100 (H. Nun, The

Authorship of the Fourth Gospel [Oxford: Alden & Blackwell, 1952], p. 20-32; R. Brown, The

Gospel According to John, AB 29 [Garden City: Doubleday, 1966], lxxxi). Mas veja C. E. Hill

(Johannine Corpus in the Early Church), que demonstrou que muitos dos escritores do início do

século II realmente utilizaram o Evangelho de João (veja discussão em “Autor”).

33
Para um estudo magistral da vida dos primeiros cristãos em Éfeso, veja P. Trebilco, The Early

Christians in Ephesus from Paul to Ignatius (Grand Rapids: Eerdmans, 2008).

689
34
Veja Beasley-Murray, John, lxxix; Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 254.

35
K. Lake, An Introduction to the New Testament (London: Christophers, 1948), p. 53; J. N.

Sanders, The Fourth Gospel in the Early Church (Cambridge: University Press, 1943), p. 85-86.

36
W. G. Kümmel, Introduction to the New Testament, ed. rev., tradução para o inglês de H. C.

Kee (Nashville: Abington, 1975), p. 246-47.

37
J. L. Martyn, “Glimpses into the History of the Johannine Community”, em: H. J. de Jonge,

org., L’Évangile de Jean, Sources rédaction, théologie, (Belgium: Duculot, 1977), p. 151-75.

38
Essas críticas são feitas por Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 254.

39
Veja Carson, Gospel According to John, p. 91.

40
Bauckham, Gospels for All Christians, p. 9-48.

41
Köstenberger, Encountering John, p. 26.

42
S. Motyer, ‘Your father the Devil’? A New Approach to John and ‘the Jews’ (Carlisle:

Paternoster, 1997); Kerr, Temple of Jesus’ Body; P. W. Walker, Jesus and the Holy City: New

Testament Perspectives on Jerusalem (Grand Rapids: Eerdmans, 1996), p. 195; J. A. Draper,

“Temple, Tabernacle and Mystical Experience in John”, Neot 31 (1997), p. 264, 285. Veja

especialmente P. S. Alexander, “‘The Parting of the Ways’ from the Perspective of Rabbinic

Judaism”, em: J. D. G. Dunn, org., Jews and Christians: The Parting of the Ways A.D. 70 to 135

(Tübingen: Mohr Siebeck, 1992), p. 1-25; e M. Goodman, “Diaspora Reactions to the Destruction of

the Temple”, em: ibid., p. 27-38. Para um desenvolvimento mais completo e bibliografia adicional,

veja A. J. Köstenberger, “The Destruction of the Second Temple and the Composition of the Fourth

Gospel”, TrinJ 26 NS (2005), p. 205-42; levemente revisado em: J. Lierman, org., Challenging

perspectives on the Gospel of John, WUNT 2/219 (Tübingen: Mohr Siebeck, 2006), p. 69-108. Para

uma crítica do estilo “Hipótese da Comunidade Joanina” de Brown-Martyn, veja Köstenberger,

Missions of Jesus and the Disciples, p. 200-10; e Carson, Gospel According to John, p. 35-36, p. 87-

690
88, p. 369-72. A principal evidência citada em apoio a uma data de escrita anterior a 70 é a falta de

referência à destruição do Templo e o verbo no tempo presente em João 5.2. Mas essas não são

determinantes e são suscetíveis de explicações alternativas (veja Schlatter, Evangelist Johannes, p.

23-24; e Köstenberger, John, p. 177-78).

43
Veja Bauckham, Gospels for All Christians. Alguns podem afirmar que, à luz do tenso

relacionamento entre judeus e cristãos subsequente a 70, é improvável que João buscasse evangelizar

os judeus. Pelo contrário, é improvável que João tenha deixado de desejar a conversão dos seus

contemporâneos judeus ao Messias, o único caminho para o seu Deus da Aliança (14.6),

especialmente se, como sugerido acima, a destruição do Templo proporcionou um novo ímpeto para

recomendar a Jesus aos judeus descrentes e outros atraídos pela fé judaica.

44
P. M. Hoskins, Jesus as the Fulfillment of the Temple in the Gospel of John, Paternoster

Biblical Monographs (Carlisle, UK: Paternoster, 2007); Köstenberger, “Destruction of the Second

Temple”; Draper, “Temple, Tabernacle and Mystical Experience”, p. 264-65.

45
Em adição a estas possíveis ocasiões, também existiram outras influências que podem ter

afetado sua redação, tais como o AT, judaísmo rabínico, Qumran, os samaritanos, a perseguição

judaica, Filo e o Corpus Hermeticum. Para uma excelente análise desses fatores, veja Borchert, John

1:1-11, p. 60-80.

46
Compare com a declaração de propósito em 1João 5.13: “eu vos escrevi essas coisas, a vós que

credes no nome do Filho de Deus, para que saibais que tendes a vida eterna”.

47
A expressão “para que possais crer” em 20.31 é representada em variantes textuais tanto no

subjuntivo presente (pisteuēte) quanto no subjuntivo aoristo (pisteusēte). Alguns estudiosos

sugeriram que o primeiro apontaria para um propósito de edificação enquanto o último sugeriria um

propósito evangelístico, mas as questões são consideravelmente mais complexas e o tempo verbal de

pisteuō em 20.31 não resolve a ambiguidade, que pode ser deliberada. Veja a discussão em Carson;

Moo, Introduction to the New Testament, p. 270.

691
48
Bauckham, Gospels for All Christians, p. 10.

49
Os termos “Messias” e “Filho de Deus” muito provavelmente são utilizados de forma

intercambiável (p. ex., At 9.20,22). Veja o intercâmbio entre D. A. Carson, “The Purpose of the

Fourth Gospel: John 20.30,31 Reconsidered”, JBL 108 (1987), p. 639-51; G. D. Fee, “On the Text

and Meaning of John 20.30-31”, em: F. van Segbroeck; C. M. Tuckett; G. van Belle; J. Verheyden,

orgs., The Four Gospels 1992. Fs. Frans Neirynck, BETL 100 (Leuven: University Press, 1992), vol.

3, p. 2193-205; e D. A. Carson, “Syntactical and Text-Critical Observations on John 20.30,31: One

More Round on the Purpose of the Fourth Gospel”, JBL 124 (2005), p. 693-714. O debate gira em

torno da questão se o propósito de João é identificar Jesus como o Messias ou o Messias como Jesus.

50
Por exemplo, 1.12; 3.15,16,36; 4.50; 5.24; 6.29,40,47; 6.69; 9.38; 11.25-27; 12.44,46; 14.1;

16.27, 30; 17.8, 20; 19.35. Veja D. A. Croteau, “An Analysis of the Concept of Believing in the

Narrative Contexts of John’s Gospel” (Th.M. thesis, Southeastern Baptist Theological Seminary,

2002).

51
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 270.

52
Muitos comentaristas, como F. J. Moloney, The Gospel of John, SacPag (Collegeville:

Liturgical Press, 1998), v-viii, chamam a segunda unidade principal de o “Livro da Glória”, embora

as referências a glória também sejam predominantes na primeira unidade principal.

53
Carson, Gospel According to John, p. 106-7; Ridderbos (Gospel of John, viii) chamaram João

11 e 12 de “Preludio da Narrativa da Paixão”; assim também o fez Keener (Gospel of John, xvii), que

rotulou a unidade “Introdução à Paixão”.

54
Moloney, Gospel of John, v-vi.

55
Por exemplo, Keener, Gospel of John, xvi; Ridderbos, Gospel of John, vii; Köstenberger, John

52, cuja proposta estrutural inclui o “Ciclo dos Festivais” nos capítulos 5 a 10 e uma divisão em um

“momento das principais crises” em 6.60-71.

692
56
A. J. Köstenberger, “The Seventh Johannine Sign: A Study in John’s Christology”, BBR 5

(1995), p. 87-103.

57
Veja a discussão em Köstenberger, John, p. 84-87.

58
Com relação à não inclusão da Perícope da Mulher Adúltera (7.53 a 8.11), veja o Quadro 7.2:

Questões Textuais no Evangelho de João.

59
H. N. Ridderbos, The Gospel According to John, tradução para o inglês de J. Vriend (Grand

Rapids: Eerdmans, 1997), p. 423.

60
Veja 6.14,15; e os “sinais” de Jesus. Possíveis antecedentes para o Discurso de Despedida de

Jesus no Evangelho de João incluem o discurso de despedida de Moisés (Dt 31 a 33), outros

discursos de despedida semelhantes no AT e no Segundo Templo (veja Jub. 22.1-30; 1Mac 2.49-70) e

as bênçãos patriarcais no leito de morte e palavras finais. Para referências específicas, veja

Köstenberger, John, p. 396-97.

61
M. W. G. Stibbe, John as Storyteller: Narrative Criticism and the Fourth Gospel, SNTSMS 73

(Cambridge: University Press, 1992), p. 111-12.

62
Veja Köstenberger, “John”, em: Commentary on the New Testament Use of the Old Testament,

p. 500-506.

63
Externa (18.29-32); interna (18.33-38a); externa (18.38b-40); interna (19.1-3); externa (19.4-

7); interna (19.8-11); e externa (19.12-15).

64
Ridderbos, Gospel According to John, p. 587.

65
Para um longo estudo, veja Köstenberger, Missions of Jesus and the Disciples.

66
Veja Köstenberger, John, p. 581-82.

67
Veja ibid., p. 583-86.

693
68
Veja 21.14: “Essa foi a terceira vez que Jesus apareceu a seus discípulos depois de ter

ressuscitado dentre os mortos” (cf. 20.19-23, 24-29). Observe que esta numeração não inclui a

aparição de Jesus a Maria Madalena (20.11-18), indicando que o Quarto Evangelista não a incluiu

entre os discípulos de Jesus conhecidos como os Doze (ou Onze).

69
O retorno dos discípulos à pescaria pode indicar descrença. Isto também é sugerido pelo fato

de eles nada terem pescado. Veja a discussão com outras referências bibliográficas em Köstenberger,

John, p. 588-89.

70
Ibid., p. 606.

71
Para um extenso tratamento da teologia joanina, veja A. J. Köstenberger, The Theology of

John’s Gospel and Letters: The Word, the Christ, the Son of God, BTNT (Grand Rapids: Zondervan,

2009).

72
Veja A. J. Köstenberger; S. R. Swain, Father, Son and Spirit: The Trinity and John’s Gospel,

NSBT (Leicester: InterVarsity, 2008) [publicado em português por Vida nova sob o título Pai, Filho e

Espírito: a Trindade e o Evangelho de João], que argumentou que a Cristologia de João não

minimiza nem sacrifica seus pontos de vista judeu monoteísta.

73
João realçou muitos outros temas cristológicos. Beasley-Murray (John, lxxxi) observou os

seguintes: o Filho unigênito (1.18; 3.16,18); o Filho (3.17,36; 5.19-27); um mestre de Deus (3.2); um

profeta (4.19; 9.19); o Messias (1.41; 4.29; 11.11,20,31); Rei de Israel (1.49; veja 6.15; 12.13); Rei

dos judeus (19.19); e Senhor (20.18,28; 21.7).

74
Köstenberger, John, p. 39.

75
Juntamente com Romanos e Apocalipse, o Evangelho de João fornece a mais explicita e

extensa teodiceia no NT, defendendo a justiça de Deus ao mostrar que sua condenação dos pecadores

é justa, uma vez que eles rejeitaram seu amor expressado no envio de seu Filho (3.16; 12.36b-41).

Veja discussões adicionais sobre teodiceia nos capítulos 13 e 20.

694
76
Köstenberger, “The Seventh Johannine Sign”, p. 87-103.

77
J. W. Pryor, John, Evangelist of the Covenant People: The Narrative and Themes of the Fourth

Gospel (Downers Grove: InterVarsity, 1992).

78
C. Blomberg (Jesus and the Gospels [Nashville: B&H, 1997], p. 167) corretamente observou

que “João reconheceu tão prontamente quanto os Sinóticos que os primeiros seguidores de Jesus

eram todos judeus, assim não há nenhuma acusação universal de todo um grupo étnico aqui”.

79
Para estudos adicionais, veja D. A. Carson, Divine Sovereignty and Human Responsibility:

Biblical Perspectives in Tension (Atlanta: John Knox, 1981), p. 99-122 [publicado em português por

Vida Nova sob o título Soberania divina e responsabilidade humana: perspectivas em tensão]; e

Blomberg, Jesus and the Gospels, p. 165 [publicado em português por Vida Nova sob o título Jesus e

os Evangelhos: uma pesquisa abrangente sobre Jesus e os 4 Evangelhos].

80
Compare a terminologia de “amar”, “obedecer” e “guardar os mandamentos” (caps. 13 a 17;

cf. 1.17). Veja Köstenberger, Encountering John, p. 144.

81
Köstenberger, Missions of Jesus and the Disciples, p. 190-98.

82
Veja Köstenberger; Swain, Father, Son and Spirit, cap. 3.

83
Veja ainda ibid., cap. 1, com referências bibliográficas adicionais.

84
Veja Köstenberger, John, p. 75, com referência a J. McPolin, “Mission in the Fourth Gospel”,

ITQ 36 (1969), p. 118.

85
J. T. Forestell, The Word of the Cross: Salvation as Revelation in the Fourth Gospel, AnBib 57

(Rome: Biblical Institute Press, 1974).

86
Veja Köstenberger, Missions of Jesus and the Disciples, p. 74-81.

695
87
João usou três termos para identificar o Espírito Santo: “Paráclito” (“presença auxiliadora”;

14.16,26; 15.26; 16.7); “Espírito Santo” (14.26; com o foco em sua santidade); e “Espírito da

verdade” (14.17; 15.26; 16.13; com o foco em sua autenticidade). Veja Köstenberger; Swain, Father,

Son and Spirit, cap. 5.

88
Veja Köstenberger, John, p. 121-25, p. 156-57.

89
Köstenberger, Encountering John, p. 40.

90
Veja Köstenberger; Swain, Father, Son and Spirit, cap. 5.

91
Muito provavelmente, isto representa uma promessa simbólica que o filho que seria entregue

fez do Espírito, e não sua real entrega cerca de 50 dias depois no Pentecostes. Veja Köstenberger,

John, p. 574-76, com referências bibliográficas adicionais.

92
Sobre a destruição do Templo como uma possível ocasião para a composição do Evangelho de

João, veja a discussão em “Propósito”. Veja também Köstenberger, “Destruction of the Second

Temple” (com referências bibliográficas adicionais).

93
Veja a pesquisa em D. M. Smith, John Among the Gospels: The Relationship in Twentieth-Cen-

tury Research (Minneapolis: Fortress, 1992).

94
Mas observe as “tradições entrelaçadas” enumeradas em Carson; Moo, Introduction to the New

Testament, p. 260-62. Veja a evidência interna da conscientização de João da tradição Sinótica, se não

um ou mais dos Evangelhos escritos, listados em Köstenberger, Encountering John, p. 36-37, que

citou 1.40 (André “irmão de Simão Pedro”); 3.24 (“Isso foi antes de João Batista ser mandado para a

prisão”); 4:44 (um profeta é sem honra em sua própria terra; veja Mc 6.4 e paralelos); 11.1,2

(Betânia, o “povoado de Maria e de sua irmã Marta”; Veja Lc 10.38-41); e 6.67,71 (os Doze, Judas

“um dos Doze”).

95
D. Wenham, “The Enigma of the Fourth Gospel: Another Look”, TynB 48 (1997), p. 149-78

696
96
Veja A. J. Köstenberger, “Diversity and Unity in the New Testament”, em: S. J. Hafemann,

org., Biblical Theology: Retrospect and Prospect (Downers Grove: InterVarsity, 2002), p. 148-49.

97
Veja os breves tratamentos sobre “João o os Sinóticos” em: Köstenberger, Encountering John,

p. 36-37, p. 198-200. Stuhlmacher (“My Experience With Biblical Theology”, em: Biblical

Theology: Retrospect and Prospect, p. 185-87) afirmou que João e os Sinóticos não apenas

representam diferentes perspectivas (que M. Hengel chama de “aspectivo”) mas que o Quarto

Evangelho “cultiva um […] tipo idealizado de memória a respeito de Jesus”. Ele insistiu que “o

testemunho joanino, portanto, precisa ser consistentemente realinhado com os Sinóticos, com o corpo

paulino e com o AT, de modo que a fé em Jesus Cristo não perca suas raízes históricas” (p. 187). Mas

esta parece ser apenas uma maneira suave de dizer que o Evangelho de João não é historicamente

confiável e que existem contradições reais entre João e os Sinóticos (veja a áspera declaração de

Stuhlmacher em “Der Kanon und seine Auslegung”, em: C. Landmesser, org., Jesus Christus als die

Mitte der Schrift: Studien zur Hermeneutik des Evangeliums, BZNW 86 [Berlin: de Gruyter, 1997],

p. 287). A evidência atual nega ambos.

98
Veja a discussão sobre a autoria nos capítulos 19 e 20.

99
Para uma lista de paralelos importantes entre o Evangelho de João, suas cartas e o Apocalipse,

veja Köstenberger, Encountering John, p. 204-5; cf. caps. 19 e 20.

697
Parte 3

PAULO E A IGREJA PRIMITIVA

Nesta parte desta obra, o livro de Atos (cap. 8) constitui a estrutura básica
para a discussão da vida e ministério de Paulo (cap. 9), e os capítulos
posteriores tratam as cartas do apóstolo em sequência cronológica, na
ordem presumida em que foram escritas (caps. 10-15): Gálatas; 1 e
2Tessalonicenses; 1 e 2Coríntios, Romanos, as Epístolas da prisão
(Filipenses, Efésios, Colossenses e Filemom) e as Epístolas Pastorais (1 e
2Timóteo, Tito).
Organizar o material dessa forma permite ao estudante ter uma ideia do
desenvolvimento dos primórdios da igreja e do cristianismo do primeiro
século por toda a carreira missionária de Paulo. Desde que Paulo escreveu
13 dos 27 livros do NT, e desde que suas cartas esquadrinham as principais
implicações da missão de Jesus e da obra salvífica da cruz para os fiéis do
NT, a Parte 3 constitui o cerne desta introdução ao NT. Este estudo é
complementado e completado pela discussão das Epístolas Gerais e do livro
do Apocalipse, na Parte, 4 (caps. 6-20) e por um capítulo final sobre a
unidade e diversidade no NT (cap. 21).

698
CAPÍTULO 8

O livro de Atos

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os fatos-chave do
livro de Atos. Com relação à História, deverão ser capazes de identificar o
autor do livro, data, origem, destinatários e propósito. Com relação à
Literatura, eles deverão ser capazes de fornecer uma estrutura básica do
livro e identificar os elementos essenciais do conteúdo encontrados na
Discussão Unidade por Unidade. No que diz respeito à teologia, os
estudantes deverão ser capazes de identificar os principais temas teológicos
no livro de Atos.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo
essencial identificado no item Conhecimentos básicos, os estudantes
deverão ser capazes de apresentar os argumentos para conclusões históricas,
literárias e teológicas. Com relação à História, os estudantes deverão ser
capazes de discutir as evidências para a autoria lucana, a data, origem,
destino e propósito. Com relação à Literatura, eles deverão ser capazes de
fornecer um esboço detalhado do livro. Com respeito à Teologia, os
estudantes deverão ser capazes de discutir os grandes temas teológicos no

699
livro de Atos e as maneiras com que eles contribuem de forma única para o
cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além do domínio do conteúdo essencial
identificado nos itens Conhecimentos básicos e além dos Conhecimentos
intermediários identificados acima, os estudantes deverão ser capazes de
avaliar criticamente e de determinar a exatidão histórica dos discursos, do
Concílio de Jerusalém e dos milagres registrados em Atos. Eles deverão ser
capazes de avaliar de forma acurada as fontes que estão por trás da
composição de Atos.

FATOS-CHAVE DO LIVRO DE ATOS


Autor: Lucas
Data: Início dos anos 60
Origem: Roma
Destino: Teófilo
Propósito: Uma defesa da fé cristã mostrando a
expansão da igreja primitiva a partir de um
secto judeu a um movimento difundido por
todo o mundo
Tema: História da salvação: o nascimento e missão
da igreja primitiva
Versículos-Chave: 1.8

INTRODUÇÃO

Quando Oscar Wilde estava estudando os clássicos em Oxford, ele teve de


prestar uma prova oral para testar seus conhecimentos da língua grega. Os
examinadores olharam para ele, perceberam que ele era “um jovem

700
decadente e ‘difícil’, e atribuíram-lhe o texto do NT grego mais difícil de
ser traduzido: o relato do naufrágio de Paulo em Atos 27, com seu uso
abundante de linguagem náutica. “Isso é tudo, Sr. Wilde” os examinadores
disseram, quando Oscar, um aluno brilhante no estudo do grego, apresentou
uma tradução sem nenhuma dificuldade. “Oh, por favor”, exclamou Wilde,
“deixe-me continuar — estou louco para saber como a história termina”.1
Essa história ilustra duas facetas do livro de Atos. Para começar, é o
relato de uma grande aventura, levando-nos da Palestina para o centro do
mundo gentio: Roma. Ao longo do caminho, que inclui a emocionante
história de encontros com pessoas e governos hostis, aventuras náuticas e
naufrágios e até mesmo dramas nos tribunais. Sem dúvida alguma sobre
isso, o livro de Atos é uma emocionante aventura. No entanto, essa história
não apenas destaca como o livro de Atos é emocionante, ela também nos
deixa (à semelhança de Wilde) desejosos de saber como tudo termina, uma
vez que Paulo ficou preso em Roma aguardando julgamento.

701
HISTÓRIA
Autor
Em um capítulo anterior, nós identificamos Lucas, o médico amado, como o
autor do Evangelho e do livro de Atos. Recapitulando, Lucas era um
homem bem-educado, profundo conhecedor do AT (especialmente a LXX).
Ele conhecia a geografia da Palestina e do mundo mediterrâneo. Ele não foi
um discípulo original (cf. Lc 1.2), mas foi um companheiro de viagem de
Paulo (por isso o uso do pronome pessoal de primeira pessoa no plural nas
passagens contendo o pronome “nós”, começando em At 16.8-17; veja
Tabela 8.1), a quem revelou um grande respeito em seus escritos. Assim,
embora Lucas não tenha sido uma testemunha ocular dos eventos
registrados em seu Evangelho, ele foi uma testemunha ocular de uma

702
parcela significativa dos acontecimentos narrados na segunda metade do
livro de Atos. A estreita associação de Lucas com o apóstolo Paulo garantiu
que o critério canônico de apostolicidade fosse atendido.

Tabela 8.1: As Passagens Contendo o Pronome Pessoal “Nós” em Atos


Passagem em Atos Jornadas e Localizações Eventos
16.8-17 Trôade a Filipos Mistério em Filipos
20.5-15 Filipos a Trôade a Mileto A caminho de
Jerusalém
21.1-18 Mileto a Jerusalém por A caminho de
Cesareia Jerusalém
27.1 a 28.16 Cesareia a Roma Todo o caminho até
Roma

Data
Como sua autoria, a data do livro de Atos foi estabelecida no capítulo sobre
o Evangelho de Lucas. A breve discussão a seguir resume os principais
pontos de vista sobre o assunto. Existem basicamente três posições
definidas na literatura relevante: (1) uma data anterior a 70; (2) uma data
entre 70 e 100, e (3) uma data no século II.
Praticamente ninguém hoje data Atos do século II, embora isso tenha
sido proposto no passado.2 A data mais popular entre os comentaristas
menos conservadores é uma data em algum momento depois de 75. Isso
geralmente é baseado na solução desses estudiosos para o Problema
Sinótico (tipicamente em termos da prioridade marcana) e uma data para
Marcos do meio ao final dos 60.3 O final abrupto de Atos é então explicado
em termos de Lucas completando seu propósito.4

703
Uma data mais antiga, no entanto, continua a ser a melhor opção para o
livro de Atos. O final abrupto citado acima, a apresentação neutra, se não
amigável, do Império Romano,5 a falta de menção das cartas paulinas e a
falta de menção à guerra judaica e todos os seus eventos apontam para uma
data mais antiga para Atos.6 O final de Atos pode ser melhor explicado
como Lucas tendo registrado tudo o que aconteceu até este ponto na missão
de Paulo. Embora não seja universalmente aceita, uma data mais antiga é,
portanto, mais plausível à luz das evidências disponíveis.
Se Paulo (1) foi libertado de sua primeira prisão em Roma, na qual que
se achava no final do livro de Atos; (2) estava envolvido em vários anos de
viagens missionárias e ministério como sugerem as Pastorais; (3) o seu
martírio foi precedido por uma segunda, significativamente mais severa
prisão, em Roma, como 2 Timóteo parece indicar; e (4) como indica a
tradição, foi martirizado em c. 65/66 durante a perseguição de Nero (54-68)
depois do grande incêndio em Roma (64), 60 é a data mais provável para a
conclusão do livro de Atos e uma data de composição logo em seguida.

Origem
Se as evidências para a data foram devidamente avaliadas, a única opção
para a origem do livro é a cidade de Roma. Se Lucas tinha alcançado Paulo
em tempo, enquanto o apóstolo aguardava seu julgamento em Roma na
época da escrita e se as seções contendo o pronome pessoal “nós” são uma
indicação de envolvimento pessoal, então Lucas estava com Paulo quando
ele escreveu o livro. Esta era a opinião de Ireneu (c. 130-200), Eusébio (c.
260-340) e Jerônimo (c. 345-420).7 O Prólogo Antimarcionista menciona a
Acaia como o local de publicação. A crença de Jerônimo de que Lucas

704
escreveu de Roma era assumidamente aduzida do final de Atos.8 Os demais
pais da igreja podem muito bem ter chegado à mesma conclusão. Em última
análise, ficamos com alguns trechos contraditórios na tradição. Isso torna a
proveniência difícil de identificar. Como Ireneu, Jerônimo e Eusébio, pode-
se deduzir do final que Lucas estava com Paulo em Roma no momento em
que escreveu, sem depositar qualquer peso indevido sobre esta dedução.
(Além disso, num momento posterior, é dito que Lucas foi o único que
ficou com Paulo em Roma, 2Tm 4.11).

Destino
Teófilo, como o Epafrodito de Josefo, permanece inominado no restante da
narrativa. Como discutido no capítulo 6 sobre o Evangelho de Lucas, pouco
se sabe sobre ele além de que pode ter sido um oficial romano (veja que a
designação “excelentíssimo” em Lucas 1.3; ela também ocorre em Atos
23.26; 24.3; 26.25 com referência a Félix e Festo) e que ele havia recebido
informações prévias a respeito da fé cristã (Lc 1.4). Muito provavelmente,
ele foi o patrono literário de Lucas, caso em que não apenas pagou o custo
da publicação, mas pode ter abrigado Lucas durante a produção do livro e
tornado o manuscrito disponível para cópia após a sua conclusão.
Além disso, Lucas provavelmente tinha outro público-alvo além de
Teófilo. Ao determinar a composição dos leitores pretendidos por Lucas, é
instrutivo olhar para o tipo de informação que Lucas esperava ou não que
seu público soubesse. Por um lado, ele não esperava que os seus leitores
saibam os detalhes básicos da topografia da Judeia, como na afirmação de
que o Monte das Oliveiras ficava perto de Jerusalém (At 1.12). Nem
esperava que eles soubessem o idioma local: termos aramaicos são

705
explicados (veja 1.19; 4.36; 9.36; 13.8). Ao mesmo tempo, nenhuma
explicação é dada no que diz respeito às instituições judaicas, como
Pentecostes (2.1; 20.16), “caminhada de um sábado” (1.12), impureza
(10.14), e “Páscoa” (12.4), o que sugere que Lucas espera que seu público
9
fosse familiarizado com este tipo de informação. Da mesma forma, pode-se
supor que, uma vez que as citações do AT são da LXX, esta foi a Bíblia
escolhida pelos leitores de Lucas.
Finalmente, o fundo apologético do livro, apresentando a expansão do
cristianismo de uma seita judaica a um movimento mundial, também pode
indicar um público-alvo específico, ou seja, qualquer pessoa interessada no
aumento surpreendente do movimento cristão do humilde início em
Jerusalém para a capital do Império, Roma. No todo, então, Atos é um livro
que ressoaria bem com pessoas que não falam o aramaico familiarizadas
com o AT grego. Isso teria incluído os cristãos gentios e não teria excluído
os judeus da Diáspora ou cristãos judeus que viviam fora da Palestina.
Além disso, qualquer pessoa interessada na natureza e na ascensão
fenomenal do cristianismo nas primeiras décadas da igreja acharia o livro
de Atos valioso e informativo.

Algo Para Pensar:


O Cristianismo Toma o Mundo de Assalto

Se a primeira geração da igreja cristã prova alguma coisa, é isto: o


poder de Deus é infinitamente maior do que qualquer obstáculo
humano em seu caminho. Um humilde artesão galileu, que sofreu
uma morte prematura e não acumulou possessões terrenas, não

706
escreveu livro nenhum e nada deixou para trás senão um pequeno
grupo de abatidos seguidores, gerou um movimento tão poderoso que
tomou o Império Romano de assalto.
Como isso foi possível? Existe apenas uma resposta satisfatória:
o mesmo Jesus crucificado em uma colina fora de Jerusalém
ressuscitou dos mortos três dias depois e foi exaltado à direita de
Deus. Como Pedro proclamou no dia de Pentecostes: “Deus
ressuscitou a este Jesus. Nós todos somos testemunhas disto.
Portanto, uma vez que Ele foi exaltado à direita de Deus e recebeu
do pai o Espírito Santo prometido, ele derramou o que vedes e
ouvis” (2.32,33).
O restante do livro de Atos registra o incrível, surpreendente,
deslumbrante, irresistível progresso do evangelho cristão em um
mundo onde os judeus se opuseram ferozmente à missão da igreja
primitiva e onde, ironicamente, os romanos protegeram Paulo e os
primeiros cristãos de uma morte certa. Os obstáculos internos, seja a
desonestidade ou a potencial desunião, são superados, assim como a
perseguição e as várias ameaças externas. Nenhuma estratégia
inteligente, mas humilde confiança em Deus e o testemunho fiel dele
capacitaram os primeiros cristãos, que muitas vezes se provaram
vitoriosos.
O relato que Lucas faz das proezas espirituais da igreja primitiva
pode servir como uma inspiração poderosa para a igreja de todas as
eras que enfrentam o mesmo desafio de testemunhar do Cristo vivo e
ressurreto em um mundo hostil à mensagem do evangelho. Enquanto
damos continuidade a este legado divino, devemos nos certificar de
que nossa confiança, como a dos primeiros cristãos, está no mesmo

707
Deus que ressuscitou Jesus dentre os mortos e para quem nenhum
obstáculo é grande demais se nós só colocarmos a nossa confiança
nele e no seu incrível poder e não em nossa própria capacidade para
superar os obstáculos que enfrentamos.

Propósito
Inúmeras propostas foram feitas em relação ao propósito de Atos. Estas
incluem evangelismo,10 uma apologia ou a defesa da fé cristã,11 a defesa
legal de Paulo,12 diferentes preocupações teológicas,13 a base histórica para
o estabelecimento e crescimento do reino de Deus14 e evangelismo e
edificação.15
Ao considerar o propósito de Atos, deve ser lembrado que o trabalho é
uma continuação do Evangelho de Lucas. Isso não significa
necessariamente que o propósito de Atos é idêntico ao propósito do
Evangelho de Lucas; significa que o primeiro deve ser relacionado de forma
adequada ao último (veja esp. At 1.1). Se o prefácio de Lucas se aplica
também a Atos — e dada a brevidade do prefácio de Atos, este é
provavelmente o caso — então, Lucas decidiu escrever um relato ordenado
para fornecer uma garantia e uma apologia ou defesa da fé cristã. Mas que
tipo de defesa Lucas oferece?
A primeira e melhor indicação é a estrutura literária de Atos, que gira
em torno da apresentação da expansão inicial da igreja de uma seita local a
um movimento mundial como permitido por Deus. Cada expansão é
realizada pela liderança do Espírito Santo, e não pela própria iniciativa dos
discípulos. Nessa ênfase teológica, o livro manifesta o mesmo foco no
plano de Deus (incluindo promessa e cumprimento) proeminente no

708
Evangelho de Lucas. Isso também responde à pergunta de por que era
preciso, em primeiro lugar, dar sequência ao Evangelho de Lucas. O
Evangelho é “acerca de tudo o que Jesus começou a fazer e a ensinar” (At
1.1), e Atos narra a continuação do que foi iniciado no Evangelho. A
história de Jesus não está completa até que o evangelho tenha mudado da
capital judaica para “os confins da terra” — todo o caminho até Roma (At
1.8).
Às vezes alega-se que o Evangelho de Lucas está continuamente
caminhando para Jerusalém (esp. na “Narrativa de Viagem de Lucas”) e que
o livro de Atos está se afastando de Jerusalém para os “confins da Terra”.
Mas isso é uma simplificação exagerada. Mais precisamente, o livro de
Atos move-se de forma espiral de Jerusalém e da Palestina. Na segunda
metade do livro, Paulo estava continuamente retornando a Jerusalém,
apenas se focar cada vez mais no mundo gentílico. Três fatores apontam
para uma apologética sustentada para a inclusão dos gentios, com base na
rejeição judaica do Messias: a apologética sustentada para a inclusão dos
gentios na primeira parte do livro, que culminou no Concílio de Jerusalém
(At 15.1-29), o padrão consistente de Paulo de pregar na sinagoga local em
cada cidade antes de passar a pregar para os gentios e seu repetido retorno a
Jerusalém.
Isso emerge de forma proeminente em Atos 28.25-27, onde Paulo, após
chegar à cidade de Roma, fala primeiro aos líderes judeus locais. Alguns
deles creem, mas para aqueles que não creem, Paulo cita Isaías 6.9,10:

O Espírito Santo corretamente falou através do profeta Isaías aos seus ancestrais quando Ele
disse: “Vá a este povo e diga: Ouvireis, ouvireis, e jamais entendereis; olhareis, olhareis, e
jamais percebereis. Pois o coração deste povo se tornou insensível, seus ouvidos são duros e
eles fecharam seus olhos; se não fosse assim, eles poderiam ver com seus olhos,
compreender com seu coração e ser convertidos — e eu os curaria”.

709
Tendo assim explicado a rejeição do evangelho pelos judeus, Paulo fez a
seguinte implicação: “Portanto, seja conhecido de vós que esta obra
salvadora de Deus foi enviada aos gentios; eles ouvirão!” (28.28). Com
isso, o livro de Atos se fecha.
A estrutura literária do livro, portanto, aponta para uma apologética
histórica que explica o plano de Deus estendendo o evangelho aos gentios
enquanto também inclui os judeus fiéis. Embora se possa pressupor que o
público-alvo de Lucas incluía pessoas que conheciam o AT, mas que não
falavam aramaico, a apologética apresentada é bem ampla, incluindo a
evangelização dos judeus da Diáspora bem como a edificação dos gentios
cristãos que adoram o Messias judeu rejeitado pelos próprios judeus. O
propósito de Lucas era escrever uma precisa narrativa histórica destinada a
edificar seus leitores cristãos e ajudá-los a evangelizar os incrédulos.

LITERATURA
Gênero
A pergunta a respeito do gênero de Atos é mais do que simplesmente uma
questão de curiosidade. A resposta a essa pergunta ajuda a identificar as
expectativas que se deveria ter quando se aborda o livro. Alguns gêneros da
literatura não têm nenhuma ou têm poucas expectativas de confiabilidade
ou veracidade histórica (p. ex., um conto de fadas ou um romance).
Importa, portanto, se o livro de Atos foi escrito como uma coleção de
lendas ou como uma narrativa histórica séria. Por esta razão, identificar o
gênero de Atos é uma ajuda importante na compreensão do propósito de
Lucas.

710
De forma similar aos Evangelhos, é difícil determinar com certeza o
gênero literário de Atos. Há poucas (se é que há alguma) obras de natureza
similar antes da publicação dos Atos. Além disso, mais uma vez
semelhantemente aos Evangelhos, um grande número de “Atos” apócrifos
foi escrito em imitação ao livro canônico.16 Isso não significa dizer que o
termo “Atos” é original. Nos círculos literários, “Atos” (praxeis) se referia
aos feitos heroicos de figuras míticas ou históricas, mas este tipo de escrita
muito provavelmente não era um gênero literário estabelecido (muito
menos o era o termo apresentado nos títulos) quando Lucas escreveu este
volume.17
Os Evangelhos foram identificados por alguns estudiosos como uma
forma especializada de biografia, com as palavras e atos de Jesus ao centro.
Se assim for, à primeira vista, o segundo volume de Lucas não parece se
encaixar nessa descrição, uma vez que apresenta os feitos de mais de uma
pessoa: Pedro, Estevão, Filipe, Paulo e assim por diante. Há vários agentes
humanos importantes, mas há um, e apenas um agente divino principal
subjacente a toda a trama do livro de Atos: o Espírito Santo. Por esta razão,
em vez de identificar o livro como apresentando os “Atos dos Apóstolos”,
pode ser mais correto dizer que em seu cerne estão os “Atos do Espírito
Santo”.18
Na verdade, essa unidade do que Jesus começou a fazer durante seu
ministério terreno e o que ele começou a fazer no poder do Espírito Santo
após a sua ascensão parece ser exatamente o que o próprio Lucas deixou
implícito no versículo de abertura de Atos: “escrevi a primeira narrativa,
Teófilo, acerca de tudo o que Jesus começou a fazer e a ensinar até o dia em
que ele foi elevado, depois de ter dado ordens por meio do Espírito Santo
aos apóstolos a quem escolheu” (At 1.1,2). Isso pode constituir o

711
denominador entre o Evangelho de Lucas e Atos e marca os dois livros
como uma unidade literária.19
Nos últimos tempos, o gênero de Atos tem sido identificado por alguns
estudiosos como relacionado com a literatura de romance de sua época, ou
seja, como uma espécie de romance.20 Isso, em última análise, não é
provado e de nenhuma ajuda.21 Muito provavelmente o gênero de Atos está
ligado à historiografia. Os pais da igreja primitiva, que estavam
familiarizados com os diferentes gêneros literários, referiam-se ao livro
como uma “história”.22 Embora o próprio Lucas não tenha utilizado o
termo, há boas evidências de que ele se preparou para escrever um relato
histórico. Ele escreveu num estilo parecido com o da LXX e com as
23
narrativas do AT. Assim, parece que Lucas via a si mesmo escrevendo
uma história sagrada.24
Outra boa indicação disso vem dos prefácios de Lucas e Atos. D. Aune
sugeriu que o Evangelho de Lucas exibe as seguintes quatro de sete
características da historiografia antiga: (1) os pedidos e dedicatórias; (2)
menção de predecessores; (3) uso de metodologia apropriada; e (4) motivos
da escrita.25 Se o prefácio ao Evangelho abrange ambos os volumes, então
Lucas afirmou ter escrito um relato confiável, enfatizando a veracidade de
sua pesquisa. Além disso, Lucas produziu uma escrita histórica linear. Ele
teve o cuidado de definir claramente os eventos em um ponto da história
(chamado “sincronismos”) e, em consonância com a historiografia grega,
organizou o seu trabalho geograficamente.26
No entanto, Atos não parece se ajustar a qualquer gênero da
historiografia. Como a obra de Plutarco, Vidas, Atos retrata a vida e as
palavras de pessoas conhecidas (Pedro, Estevão, Paulo etc.). Ao mesmo
tempo, o livro muda de pessoa para pessoa. Estevão é importante apenas em

712
Atos 6 e 7; Filipe, em Atos 8. Depois de Atos 15, Pedro sai de cena
completamente, e em seguida, o personagem principal passa a ser Paulo, à
medida que o evangelho segue pelo mundo então conhecido. Parece que a
personalidades envolvidas servem a outro propósito e não apenas à narração
de sua vida.
O gênero de Atos também é semelhante à historiografia do AT. Similar
aos Evangelhos, a história é propriamente vista como historiografia antiga,
com um foco teológico. Blomberg a chamou uma “história teológica”,27 que
parece ser uma maneira satisfatória de captar a natureza do livro. Se assim
for, o leitor deveria esperar que o livro expusesse uma narrativa histórica
que se esforça não só pela precisão na sua descrição dos acontecimentos,
mas que também procura ser centrado em Deus na sua abordagem à
história. Em Atos, Deus está produzindo a história da salvação. Assim, a
próxima pergunta é: quão exata é esta história?

A Confiabilidade Histórica de Atos


Introdução
As avaliações da exatidão de Lucas em Atos variam de completa afirmação
à total negação.28 Alguns estudiosos, como Pervo, elogiaram a habilidade
literária de Lucas enquanto denegriram sua precisão em registrar detalhes
históricos. Pervo alegou que Lucas era “desastrado e incompetente como
um historiador”.29 Entre aqueles que advogam uma negação radical da
historicidade estão M. Dibelius, H. Conzelmann, O. Vielhauer e E.
Haenchen. Do outro lado do espectro, F. F. Bruce, C. Hemer, W. Gasque e I.
H. Marshall, entre outros, defendem energicamente a precisão de Lucas.
Nos últimos dias, muitos estudiosos têm buscado encontrar um meio termo.

713
Um desses estudiosos é J. Fitzmyer, que observou: “é evidente hoje que um
meio termo deve ser buscado entre a abordagem cética e uma reação
conservadora a ela. Deve-se admitir que às vezes as informações de Lucas
não são precisas e que ele confundiu algumas coisas em sua narrativa, mas
em geral ele nos apresenta um relato confiável de muito daquilo que
narra”.30 Desajeitado e incompetente, historicamente preciso, ou o meio
termo — qual deles?
A confiabilidade geral de Lucas em questões verificáveis foi bem
comprovada. Em questão de geografia, ele conhecia bem a topografia de
Jerusalém (p. ex., At 1.12,19; 3.2,11). Ele também estava familiarizado com
a geografia da Ásia Menor. Em 13.4-5, o cruzamento natural é corretamente
chamado de “portos”. Em 16.1, Paulo passa pelos portos “da Cilícia” e
Lucas corretamente registra Derbe como a primeira cidade na rota. Lucas
também estava bem familiarizado com a península grega. Em 16.12, Filipos
é corretamente descrita como uma colônia romana. Em 17.6, o conselho de
magistrados em Tessalônica está devidamente identificado como
“politarcas”. Mais exemplos poderiam ser dados. Basta dizer que o
tratamento de 51 páginas “Specific Local Knowledge of Luke”, de C.
Hemer, de forma conclusiva resolveu a questão da precisão geográfica e
provincial na afirmativa.31
As descrições de Lucas também são precisas em termos de pessoas
específicas. O título do imperador era “Augusto” (transliterado Augoustos
em Lc 2.1), mas na boca de um oficial romano ele era formal e
corretamente traduzido Sebastos (At 25.21,25). Chipre era governada por
um procônsul em Pafos (13.7). Lucas corretamente afirmou que Ananias
era o sumo sacerdote (23.2). O governador romano de Malta era conhecido

714
por ser o “o primeiro homem” (prōtos) da ilha (28.7). Gálio foi procônsul
da Acaia (Grécia) em Corinto começando no ano 44 (18.12).32
Lucas também corretamente retratou elementos da cultura antiga. Ele
observou de forma precisa que o povo em Listra falava um dialeto próprio
(14.11). O povo também adorava de forma particular a Hermes e a Zeus
(veja a atribuição dos títulos “Hermes” e “Zeus” a Paulo e Barnabé em
14.12). Além disso, Lucas detalhou de forma precisa a antiga navegação
(cap. 26). O classicista A. N. Sherwin-White habilmente demonstrou que
Lucas apresentou uma descrição exata da jurisprudência romana.33 Devido
ao fato de Lucas ter narrado muitos encontros com os tribunais romanos (o
último quarto do livro, esp.) em Atos, eles cobrem uma grande parte da
narrativa.
Além disso, Lucas corretamente narrou os eventos que foram
registrados em outras obras da historiografia antiga. Entre esses eventos
estavam a fome durante o reinado de Cláudio (11.28), a morte de Herodes
Agripa I (12.19-23), o decreto de Cláudio para que todos os judeus saíssem
de Roma (18.2) e a substituição do procônsul Felix por Pórcio Festo
(24.27).
Há apenas alguns poucos pontos nos quais Lucas é severamente
criticado em questões verificáveis fora da Escritura. O primeiro se encontra
no breve discurso de Gamaliel, quando ele mencionou certo Teudas e Judas
(5.34-37). Teudas, de acordo com Gamaliel, alegou ser alguém importante,
reuniu 400 homens, mas foi morto e seus seguidores, dispersos. Um
determinado Teudas que conhecemos de Flávio Josefo apareceu entre 10 e
15 anos antes do discurso de Gamaliel.34 Isto é visto por muitos acadêmicos
como um anacronismo por parte de Lucas. Uma possível chave para
resolver esse quebra-cabeça pode ser a menção de certo Judas, que se diz

715
ter vindo após Teudas. O Judas da Galileia que nós conhecemos é da época
do nascimento de Jesus (da época da morte de Herodes, o Grande). É
possível que o Teudas de Gamaliel não seja o mesmo Teudas de Josefo.35
Uma vez que Teudas era um nome comum e após a morte de Herodes várias
rebeliões ocorreram, este Teudas desconhecido poderia ser um deles.36
A segunda acusação específica contra a exatidão de Lucas está
relacionada ao seu uso de números no caso do número de 4 mil assassinos
egípcios (21.38). O historiador antigo Lísias também mencionou um
terrorista egípcio com 4 mil homens, mas Josefo disse que ele tinha 30 mil
homens.37 Nesse caso, porém, deve-se preferir Lucas a Josefo, uma vez que
Josefo tinha uma tendência comprovada de aumentar os números.38
Aqueles que discutem o meio termo frequentemente admitem o ponto
da precisão histórica de Lucas em questões históricas, mas não
necessariamente a estendem para a história que ele contou.39 Esses
estudiosos discordam de Lucas em três pontos principais. A tripla acusação
de Fitzmyer é representativa: (1) os discursos em Atos são composições
lucanas; (2) existem narrativas tendenciosas (Fitzmyer cita Atos 15 como
uma combinação de dois concílios); e (3) o relato de milagres e de
intervenções celestiais são considerados problemáticos em termos de
historicidade.40 Portanto, faz-se agora necessário abordar estes três assuntos.
Como será visto, em cada caso uma análise mais rigorosa defende a
exatidão de Lucas.

Os discursos de Atos
Os discursos em Atos ocupam cerca de 25 a 30% do livro, dependendo de
como se identifica um discurso. Alguns acadêmicos sugeriram que os

716
discursos em Atos são inteiramente invenções de Lucas, tanto que alguns
teólogos nem mesmo usam os discursos de Paulo em Atos para desenvolver
uma teologia paulina.
Embora alguns estudiosos aleguem que o entendimento pré-crítico dos
discursos em Atos os considerasse relatos literais, este não é o caso. Muitos
exegetas do período pré-iluminista os consideravam como sendo resumos
em vez de notas ditadas.41 Na verdade, os relatos literais são uma
impossibilidade prática dada a evidência textual. Primeiro, em alguns casos,
a língua do receptor é diferente da do discurso original. Lucas disse que a
defesa de Paulo contra a multidão no templo foi em aramaico (21.40), como
foi a voz celestial na conversão de Paulo (26.14). Em outras ocasiões, a
língua utilizada muito provavelmente teria sido a grega, como o discurso de
Paulo na sinagoga de Antioquia da Pisídia (13.15) ou a conversa entre
Paulo e o comandante da guarda (21.37). No entanto, em nenhum desses
casos é garantida a conclusão de que esses foram relatos literais.
Segundo, o próprio texto indica em determinados lugares que os
discursos foram resumidos. Por exemplo, o sermão de Pedro na praça do
Templo durou das três horas da tarde até o anoitecer (veja 3.1; 4.3), mas
abrangeu apenas 17 versículos. Ninguém sugere que esses 17 versículos
representam a totalidade do discurso original.
Finalmente, em questões de estilo literário e linguístico, a dicção Lucas
é evidente, mesmo nos discursos. Mas o estilo retórico (i. e., a forma dos
discursos) é adequado ao contexto. Por exemplo, o sermão de Pentecostes
de Pedro pode ser lido como o de um profeta do AT (2.14-36), mas Estevão
falou como um judeu helenístico (cap. 7).42 O discurso de Paulo na sinagoga
de Antioquia da Pisídia se assemelha ao de um rabino (13.16-41), embora
ele tenha usado a estrutura de um filósofo em Atenas (17.22-31).43 Isto

717
sugere que, embora os discursos não sejam relatos literais, eles também não
são “composições livres” de Lucas.44
No entanto, muitos estudiosos fazem objeção a esta conclusão e
desafiam a precisão de Lucas. Hemer resumiu os argumentos da seguinte
forma: (1) os historiadores antigos muitas vezes inventavam discursos para
atender a seus propósitos; (2) a unidade de estilo também sugere que o
material foi fabricado (ou pelo menos adornado) por Lucas em vez de
registrar precisamente o verdadeiro conteúdo original dos discursos; e (3)
os discursos mostram uma continuidade de conteúdo que varia de discurso
para discurso e de orador para orador.45 Fitzmyer, modificando Schweizer,
identificou uma série de elementos que comumente aparecem nos principais
discursos de Atos. Ele propôs que esses elementos lhe permitiram
caracterizá-los como “composições lucanas”.46 No entanto, essas objeções
podem ser desafiadas pelas réplicas que se seguem.
Quanto à primeira objeção, B. Witherington III observou que, em
matéria de antigos historiadores e materiais-fontes, “não havia nenhuma
convenção de que os historiadores antigos estavam livres para criar
discursos”.47 Os historiadores antigos foram altamente influenciados por
convenções retóricas, mas não em detrimento da precisão, então eles tinham
duas preocupações: “A fidelidade à verdade e a perfeição do estilo”.48 Os
historiadores antigos caíam em um continuum entre aqueles que elevavam o
estilo da oratória e aqueles que não tinham tanta inclinação.49 Aqueles no
lado do continuum correspondente aos que não tinham tanta inclinação
eram menos propensos a manipular os discursos para formas oratórias.
Estudos sobre o estilo de Lucas mostram que ele não é nenhum aticista,
escrevendo em floreada retórica, mas mais em consonância com os
escritores da história helenística séria (especialmente Políbio).50 Ele,

718
portanto, cai no lado do continuum correspondente aos que não tinham tanta
inclinação como alguém menos inclinado a criar composições de oratória
com seus discursos.
Witherington também observou que os discursos em Atos mostram
alguma disjunção com obras helenísticas históricas, como as de Tucídides.
Para começar, os discursos em Atos são consideravelmente mais curtos, o
que diminui a possibilidade de Lucas ter usado um discurso para
impressionar seus leitores com sua própria habilidade na oratória. Além
disso, os discursos em Atos são baseados mais fortemente em seu contexto
histórico do que os discursos nas obras de Tucídides. Por fim, os discursos
em Atos não comentam os eventos; eles são os eventos — proclamações da
palavra de Deus.51
Quanto à segunda objeção, a unidade de estilo é aceita por todos, mas
isto pode ser visto também no Evangelho de Lucas, quando Lucas citou sua
fonte. O fato de Lucas ter registrado suas fontes com seu próprio estilo em
nada prejudica a visão de que os discursos são resumos do que foi
realmente dito.
A terceira objeção é baseada numa continuidade de conteúdo dos
discursos, algo coisa que Hemer mostra “claramente não ser o caso”.52 Sem
dúvida, o salmo 16 é citado duas vezes por diferentes pessoas como um
texto-prova messiânico, mas Pedro foi menos refinado do que Paulo em sua
utilização. Os discursos também revelam uma notável adequação a seus
próprios contextos. Por exemplo, Paulo citou um filósofo estoico
(Epimênides) quando se relacionava com os estoicos (At 17.28).
Deve-se também incluir certas afinidades verbais que apontam para
longe das composições livres lucanas. Os discursos de Pedro contêm certas
palavras do vocabulário que estão presentes em 1Pedro. Um exemplo é o

719
uso de “madeiro; árvore” (gr., xylon) para a cruz (cf. At 5.30; 10.39; 1Pe
2.24). Também deve-se observar que o esboço que Pedro faz do ministério
de Jesus é notavelmente semelhante àquele encontrado no Evangelho de
Marcos (At 10.36-41; ostensivamente baseado na pregação de Pedro).53
Finalmente, “admite-se de forma ampla que o discurso de Paulo em Mileto
contém características paulinas” (At 20.18-35).54
Portanto, não existe nenhuma razão real para se duvidar da precisão dos
discursos de Lucas, se estes forem entendidos como confiáveis resumos dos
verdadeiros discursos. Qualquer que seja a redação de Lucas, ela não parece
ter privado os discursos de seus contextos históricos nem da substância do
que foi dito. Se, então, os discursos muito provavelmente não são livres
composições de Lucas, também é muito pouco provável que a linha da
história seja inventada.

O Concílio de Jerusalém
Outra questão importante pertencente à precisão de Lucas é o relatório do
Concílio de Jerusalém em Atos 15. Não apenas o evento é central para a
mensagem teológica do livro, mas o modo de interpretá-la tem muito peso
em como Lucas compôs o seu livro. Como Witherington observou: “Isso
levanta todas as questões-chave de como era o relacionamento de Lucas e
Paulo, qual a relação entre Atos 15 e Gálatas 2 e, portanto, que tipo de
história Lucas está escrevendo”.55
Vários estudiosos veem problemas em Atos 15. Eles alegam que o
problema da inclusão dos gentios aparentemente não foi resolvido depois
do Concílio (como visto em Gálatas). Eles também alegam que Paulo nunca
citou o decreto mais tarde no livro e contestam que ele não teria gostado do

720
decreto. A solução desses estudiosos é propor uma fusão de reuniões de
uma fonte de Antioquia. Em primeira instância, Paulo estava presente e, de
acordo com a conclusão de continuar a missão aos gentios. Numa reunião
posterior, uma nova lei foi imposta sobre os gentios, algo com o qual Paulo
nunca teria concordado.56 Assim, conceber os discursos como composições
livres é parte integrante da “resolução” de uma aparente incongruência.
Cada uma dessas objeções é, porém, baseada em juízos antecedente
discutíveis. A teoria de que os discursos eram composições livres já foi
criticada. A suposição de que Gálatas 2 narra (pelo menos em parte) Atos
15 é discutível e improvável também. É mais provável que Gálatas 2 se
refira à visita de combate à fome de Atos 11.30.57 Assim, Paulo não
mencionou os resultados do decreto em Gálatas porque o Concílio de
Jerusalém ainda não havia ocorrido. Quanto à teoria de que o decreto impôs
uma nova lei aos gentios fiéis, Blomberg observou: “quando o concílio
escreve sua carta aos fiéis de Antioquia e das regiões vizinhas explicando a
sua decisão (v. 22-29), ele conclui afirmando simplesmente: ‘fareis bem se
evitardes essas coisas’ (v. 29), quase uma forma de se referir a legislação
obrigatória”.58 Assim, uma teoria hipotética de combinação não é necessária
para explicar o fenômeno do Concílio de Jerusalém.

Milagres em Atos
Não há nenhuma dúvida de que a área mais problemática para alguns
estudiosos em relação à veracidade de Atos são os elementos milagrosos no
livro. De fato o livro apresenta alguns milagres surpreendentes, tais como
curas dos homens coxos de nascença (3.1-10; 14.8-10); as repetidas
libertações de Pedro das prisões pelos seres angelicais (5.19,20; 12.6-11; cf.

721
o violento terremoto em 16.26); Filipe sendo levado pelo Espírito do
Senhor da presença do etíope (8.39,40); a visão que Paulo teve do Jesus
ressurreto no caminho de Damasco (9.3-9); Pedro curando um homem
paralítico chamado Eneias (9.33,34); Pedro ressuscitando Dorcas dos
mortos (9.36-41); visões de Cornélio e Pedro (10.3-16); Paulo impondo a
cegueira a Elimas, o mago (13.9-11); Deus falando diretamente a Paulo em
sua visão na Macedônia, em Corinto e em Jerusalém (16.9,10; 18.9,10;
23.11); e Paulo ressuscitando o jovem Êutico dos mortos (20.8-12). Talvez
entre os surpreendentes feitos registrados, o mais surpreendente seja este:
“Deus estava realizando milagres extraordinários por intermédio de Paulo,
de modo que até mesmo lenços e panos que haviam tocado sua pele eram
trazidos aos enfermos, e as doenças os deixavam e os espíritos malignos
saíam deles” (19.11,12; veja também 5.12-16).
Esses relatos de milagres maravilhosos realizados pelos apóstolos e
outras manifestações sobrenaturais são críveis ou deveriam ser
considerados como reflexos de uma mente obsoleta e supersticiosa? Para
alguns, a existência dessas referências como parte de uma narrativa
histórica é inaceitável. Mas o cerne da questão não é histórico; é uma
questão de pressuposições filosóficas e teológicas.59 Aqueles que rejeitam a
intervenção divina rejeitam a veracidade dos milagres; aqueles que aceitam
a intervenção divina não têm problemas com esses eventos. Os
comentaristas mais moderados as deixam na categoria de “não-
comprováveis”. Deve ser afirmado, no entanto, que, à luz da comprovada
credibilidade de Lucas em outros lugares, parece não haver uma boa razão
para se duvidar da sua confiabilidade em relação aos acontecimentos
sobrenaturais mencionados acima, especialmente porque o ceticismo do
pós-Iluminismo em relação à possibilidade de milagres e à intervenção

722
sobrenatural de Deus nos assuntos humanos mostrou-se ser de mérito
duvidoso.

QUADRO 8.1: QUESTÕES TEXTUAIS NO


LIVRO DE ATOS
Os críticos textuais distinguem quatro tipos de texto básico do NT que
foram transmitidos a nós: alexandrino, cesarense, bizantino e
ocidental. O texto chamado ocidental é geralmente considerado como
secundário e imperceptível até que se chega ao livro de Atos, onde é
cerca de 8,5% mais longo do que o texto estabelecido. Uma
comparação entre uma edição tipicamente alexandrina e uma ocidental
resulta em uma diferença de 1.582 palavras. Uma comparação
semelhante entre o texto bizantino e eclético de Robinson-Pierpont
indica que apenas 222 palavras são diferentes, uma diferença
aproximada de 2% em comprimento (ou seja, cerca de duas vezes ou
mais o número de palavras deste parágrafo).1
O texto ocidental de Atos tende a suavizar “dificuldades”
gramaticais, esclarecer pontos ambíguos, expandir referências a Cristo
e acrescentar notas de detalhes históricos em níveis sem precedentes.2
Alguns exemplos bastarão para mostrar a forma dessas leituras. Em
Atos 11.28, Lucas é identificado como um nativo de Antioquia
(empregando uma primeira pessoa do plural, constituindo esta como
uma passagem com o pronome pessoal “nós”). Em Atos 19.9, Paulo
alugou a escola de Tirano em Éfeso “da quinta à décima hora” (ou
seja, das 11 às 16h). Em Atos 15.20,29, o texto ocidental omite “das
coisas que são sufocadas” e acrescenta “e não façais aos outros o que

723
eles não gostam que seja feito para eles mesmos” no final do decreto
apostólico. Muitas outras alterações semelhantes ocorrem por todo o
livro de Atos.
Que o texto ocidental acrescenta detalhes históricos é o fenômeno
mais interessante e, em última instância, o mais valioso. Embora não
sejam Escritura, essas notas podem preservar antigos entendimentos. E
3
onde vieram essas adições? Alguns dizem que do próprio Lucas;
4
outros, de um antigo revisor (antes de 150); outros ainda propõe de
uma revisão posterior.5 Em última análise, muito pouco dessas leituras
pode ser considerado original. Em última análise, essas adições podem
dar mais uma ideia clara da prática de um único escriba do que
adicionar qualquer informação histórica significativa.6

1
Os números para uma comparação entre os textos Alexandrino e Ocidental são de F. G.

Kenyon, The Western Text in The Gospels and Acts, Proceedings of the British Academy 24

(London: H. Milford, 1938), p. 26, citado em B. M. Metzger, A Textual Commentary on the

Greek New Testament, 2. ed. (New York: United Bible Societies, 1994), p. 223.
2
O comentário textual de Metzger sobre Atos compreende quase um terço do livro,

devido principalmente às discussões do tipo de texto Ocidental. Para uma boa, mas breve,

discussão, veja Haenchen, Acts, p. 50-60.


3
Esta é a opinião de Blass, Acta Apostolorum sive Lucae ad Theophilum liber alter

edition philologica (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1895). Ele via o texto ocidental

como um antigo rascunho do livro, como o feza T. Zahn, Die Urausgabe der

Apostelgeschichte des Lucas (Leipzig: A. Deichert, 1916). Embora criticada antigamente, esta

teoria recebeu novo fôlego de M.-E. Boismard e A. Lamouille, Texte Occidental des Actes des

Apôtres: Reconstitution et Réhabilitation (Synthèse 17; Paris: Editions Recherche sur les

Civilisations, 1984), 2 vols. Seus pontos de vista de que a revisão Ocidental de Atos mostra

724
traços do estilo de Lucas foi adequadamente criticada por T. C. Geer Jr., “The Presence and

Significance of Lucanisms in the ‘Western’ Text of Acts”, JSNT 39 (1990), p. 59-76.


4
Veja J. H. Ropes, em: F. J. Foakes Jackson; K. Lake, orgs., The Beginnings of

Christianity: Part I the Acts of the Apostles (London: Macmillan, 1926), vol. 3: The text of

Acts, ccxliv–ccxlvi.
5
B. Aland, “Entstehung, Charakter und Herkunft des sog. Westlichen Textes untersucht an

der Apostelgeschichte”, ETL 62 (1986), p. 5-65.


6
Para discussões recentes do texto ocidental de Atos, veja T. Nicklas; M. Tilly, orgs., The

Book of Acts as Church History, BZNW 120 (New York: W. de Gruyter, 2003); e P. M. Head,

“Acts and the Problem of Its Texts”, in: B. W. Winter; A. D. Clarke, orgs., The Book of Acts in

Its First Century Setting (Grand Rapids: Eerdmans, 1993) vol. 1: Ancient Literary Setting, p.

415-44.

Conclusão
Em última instância, não há nenhuma razão substancial para se duvidar da
exatidão de Lucas com bases empíricas. Onde as fontes estão disponíveis, a
informação de Lucas mostrou ser confiável. Ao contrário do seu Evangelho
onde ele contou com os relatos de testemunhas oculares (Lc 1.3), o próprio
Lucas foi uma testemunha ocular de uma parte substancial das viagens
missionárias de Paulo no livro de Atos. Isso pressupõe que as passagens
contendo o pronome pessoal “nós” indicam a participação de Lucas nestas
partes da narrativa. À luz da confiabilidade comprovada de Lucas, onde esta
é corroborada pelas fontes disponíveis, parece razoável considerá-lo
inocente até prova em contrário, onde suas informações não podem ser
atualmente corroboradas pelos materiais extrabíblicos existentes. Como W.
Ramsay declarou: “você pode pressionar as palavras de Lucas num nível

725
além do de qualquer historiador e elas resistem aos mais ávidos escrutínios
e aos mais duros tratamentos, dado sempre que a crítica conhece o assunto e
não vai além dos limites da ciência e da justiça”.60

As Fontes de Atos
Decorrentes das buscas acadêmicas pelo Jesus histórico, onde tudo deve ter
uma fonte escrita de algum tipo, as fontes de Lucas para a escrita de Atos
têm sido também um campo de investigação.61 Este tipo de procedimento é
o próximo passo lógico uma vez que se rejeita a noção de que o escritor era
um seguidor de Paulo. Fontes hipotéticas incluem uma fonte “Jerusalém A
e B”,62 “uma fonte Antioquena”,63 e um “diário/itinerário de viagem”.64
Haenchen deixou em aberto a possibilidade de que Lucas viajou para os
grandes centros paulinos coletando informações de fontes locais.65 Fitzmyer
é representante de grande parte das principais correntes de estudo sobre o
assunto. Ele postulou uma fonte palestina (geralmente registrando as
atividades de Pedro), uma fonte Antioquena (Estevão, as questões ligadas à
inclusão dos gentios, a Dispersão e o Concílio de Jerusalém), uma fonte
com as seções com o pronome “nós” e uma fonte paulina (abrangendo a
conversão e as atividades de Paulo).66 Grande parte dessa conjectura é
baseada na pesquisa de alguém — não um seguidor de Paulo — que
escreveu uma geração depois da morte de Paulo, uma teoria criticada acima.
Então, que tipo de fontes pode ser postulada para Atos? Atos 16 a 28 é
dominado pelas passagens contendo o pronome “nós”, e isso é melhor
explicado, como discutido acima, sob a autoria do Evangelho de Lucas.
Esta seção reflete (1) as reminiscências do autor, ou (2) um diário, em
termos, do autor. Os maiores detalhes na última parte do livro apontam para

726
acontecimentos recentes e muito provavelmente para a primeira opção.67
Para os eventos fora das passagens contendo “nós” na segunda metade de
Atos, não é preciso olhar mais além do que o conhecimento pessoal que
Lucas tinha do próprio Paulo.68
A questão sobre as fontes de Lucas para Atos 1 a 15 permanece, quando
ele não estava presente nos acontecimentos. Hemer, em uma visão bastante
ampla de como Lucas tratou suas fontes, concluiu quanto a Atos que “Lucas
obteve partes de seu material através de entrevistas com os participantes e
que algumas vezes editou tradições mais antigas entrevistar novamente os
participantes sobreviventes, enquanto eram acessíveis a ele, e que esse
processo explica algumas das importantes ‘L-nuances’ no Terceiro
Evangelho”.69
Hemer sugeriu ainda que uma ligação mais estreita com Pedro (como
uma entrevista pessoal) pode ser sustentada, de modo que Lucas não era
necessariamente dependente de fontes de segunda mão.70 Isso, então,
coincidiria com a declaração de Lucas de suas fontes no prefácio de Lucas
(Lc 1.1-4); algumas fontes escritas (veja At 15.23-29; 23.25-37);
testemunhas oculares; e investigação pessoal. As extensas viagens de Lucas
teriam fornecido oportunidades suficientes para fazer contato com pessoas
que poderiam fornecer-lhe informações a respeito dos acontecimentos nos
quais ele não esteve pessoalmente envolvido.

Plano Literário
Como já mencionado, e como amplamente aceito, o esquema básico de
Atos é dado em Atos 1.8: “Mas recebereis poder quando o Espírito Santo
vier sobre vós; e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia

727
e Samaria, e até os confins da terra”. O restante do livro mostra o
cumprimento do mandamento de Jesus e a revelação do plano de Deus
desde a igreja de Jerusalém e da Judeia (1.1 a 6.7) para Samaria (6.8 a 9.31)
e até os confins da terra (9.3 a 28.31).71 Lucas se esforçou para mostrar que
a expansão do cristianismo estava sob a direção de Deus, incluindo os
gentios, enquanto ao mesmo tempo continuando a salvação “primeiro para
os judeus”.
No cerne do livro está o Concílio de Jerusalém (cap. 15), onde a igreja
regulamentou a inclusão dos gentios no crescente movimento cristão. O
ministério de Paulo é apresentado através de três viagens missionárias (uma
antes e duas após o Concílio de Jerusalém). Semelhante ao Evangelho de
Lucas, onde a extensa “Narrativa das viagens de Lucas” mostra Jesus no
seu caminho para Jerusalém, a ação diminui seu ritmo durante o último
quarto do livro de Atos, quando Paulo toma o seu caminho para o
julgamento em Roma. Ao contrário do Evangelho de Lucas — onde Jesus é
preso, julgado e crucificado, e ao terceiro dia ressuscita dos mortos — Atos
termina com uma nota inconclusiva, com Paulo ainda aguardando
julgamento em Roma.72

728
Tabela 8.2: Propostas Estruturais Alternativas para Atos
F. F. Bruce D. L. Bock
I. Nascimento da Igreja (1.1 a 5.42) I. Ascensão e Comissão (1.1-11)
II. Perseguição e Expansão (6.1 a II. Igreja Primitiva em Jerusalém
9.31) (1.12 a 6.7)
III. Início da Cristandade Gentílica III. Judeia e Samaria (6.8 a 9.31)
(9.32 a 12.24)
IV. Extensão de Antioquia (12.25 a IV. Evangelho aos Gentios (9.32 a
15.35) 12.25)
V. Movimento para o Mundo Egeu V. Missão para Antioquia e
(15.36 a 19.20) Incorporação dos Gentios (13.1 a
15.35)
VI. Paulo Viaja a Roma (19.21 a VI. Expansão para a Grécia (15.36 a
28.31) 18.23)
VII. Prisão e Viagem a Roma (21.17
a 28.31)

ESTRUTURA
I. Fundamentos para a igreja e sua missão (1.1 a 2.47)
A. Prefácio (1.1-5)
B. Jerusalém: a espera pelo Espírito (1.6-26)
1. A ascensão de Jesus (1.6-14)
2. A escolha do décimo segundo apóstolo (1.15-26)
C. Pentecostes: a igreja nasce (2.1-47)
1. O evento: o Jesus exaltado envia o Espírito (2.1-4)
2. A evidência da vinda do Espírito: línguas estranhas (2.5-13)
3. A explicação: a mensagem de Pedro (2.14-40)
4. A expansão: o crescimento da igreja primitiva (2.41-47)

729
II. A igreja em Jerusalém (3.1 a 6.7)
A. Um milagre e suas consequências (3.1 a 4.31)
1. O milagre (3.1-10)
2. As consequências: a prisão de Pedro e de João e o testemunho
corajoso (4.1-31)
B. Problemas dentro e fora (4.32 a 6.7)
1. A partilha de bens na igreja primitiva: o bom exemplo (4.32-37)
2. A partilha de bens da igreja primitiva: o mau exemplo (5.1-11)
3. Maior crescimento em número e extensão geográfica (5.12-17)
4. Outra Prisão (5.18-42)
5. O serviço às viúvas dos helenistas: conflito potencial evitado (6.1-
7)

III. Horizontes mais amplos para a igreja: Estevão, Samaria e Saulo (6.8 a
9.31)
A. Sofrimento: um dos servos preso e martirizado (6.8 a 7.60)
1. As acusações contra Estevão (6.8-15)
2. A defesa de Estevão (7.1-53)
3. O martírio de Estevão (7.54-60)
B. Palestina e Síria: Filipe, Saulo e Pedro (8.1 a 9.30)
1. Saulo, o perseguidor (8.1-3)
2. O Evangelho se espalha para Samaria através de Filipe (8.4-25)
3. Filipe e o eunuco etíope (8.26-40)
4. A conversão de Saulo (9.1-19a)
5. Os dias pós-conversão de Saulo (9.19b-30)
C. Resumo: Judeia, Galileia e Samaria (9.31)

IV. Pedro e os primeiros gentios convertidos (9.32 a 12.24)

730
A. A prova da conversão dos gentios (9.32 a 11.18)
B. A conversão dos gentios em Antioquia e o retorno de Paulo (11.19-
26)
C. Eventos em Jerusalém (11.27 a 12.24)

V. Paulo se volta aos gentios (12.25 a 16.5)


A. A primeira viagem missionária (12.25 a 14.28)
1. Antioquia da Síria: enviados (13.1-3)
2. Chipre: o procônsul Sérgio Paulo crê (13.4-12)
3. Antioquia da Pisídia: apesar dos judeus, os gentios creem (13.13-
52)
4. Sul da Galácia: Icônio, Derbe, Listra (14.1-23)
5. Regresso à Antioquia da Síria (14.24-28)
B. Concílio de Jerusalém (15.1-35)
1. Contexto (15.1-4)
2. Convocação dos apóstolos e presbíteros (15.5,6)
3. Relatórios de Pedro, Paulo e Barnabé (15.7-12)
4. A Resposta de Tiago em nome da igreja de Jerusalém (15.13-21)
5. O Decreto do Concílio (15.22-29)
6. Regresso a Antioquia da Síria (15.30-35)
C. Início da Segunda Viagem Missionária (15.36 a 16.5)
1. Paulo e Barnabé se separam (15.36-41)
2. Paulo e Silas entregam as decisões do Concílio de Jerusalém,
levam Timóteo (16.1-5)

VI. Maior inserção no mundo gentílico (16.6 a 19.20)


A. A Segunda Viagem Missionária (16.6 a 18.22)

731
1. A visão de Paulo do homem da Macedônia: ministério em Filipos
(16.6-40)
2. Ministério em Tessalônica (17.1-9)
3. Ministério em Bereia (17.10-15)
4. Ministério em Atenas (17.16-34)
5. Ministério em Corinto (18.1-17)
6. Viagem de retorno (18.18-22)
B. A Terceira Viagem Missionária (18.23 a 19.20)
1. Apolo instruído por Priscila e Áquila (18.23-28)
2. Apolo vai a Corinto, Paulo ministra em Éfeso (19.1-20)

VII. Para Roma (19.21 a 28.31)


A. De Éfeso a Jerusalém (19.21 a 21.16)
1. Éfeso: oposição por Demétrio (19.21-41)
2. A Viagem de Paulo à Macedônia e Grécia, sete dias em Trôade
(20.1-13)
3. De Trôade a Mileto (20.14-16)
4. Despedida dos presbíteros de Éfeso (20.17-38)
5. A Viagem de Paulo a Jerusalém (21.1-16)
B. A Última visita de Paulo a Jerusalém e sua remoção para a Cesareia
(21.17 a 23.35)
1. A Visita de Paulo com Tiago e os presbíteros (21.17-26)
2. Paulo preso no Templo (21.27-40)
3. A Defesa de Paulo (22.1-29)
4. Paulo perante o Sinédrio (22.30 a 23.11)
5. Remoção de Paulo para a Cesareia (23.12-35)
C. A defesa de Paulo perante Félix, Festo e Agripa (24.1 a 26.32)
1. As acusações dos judeus contra Paulo (24.1-9)

732
2. A defesa de Paulo perante Félix (24.10-27)
3. A defesa de Paulo perante Festo e seu apelo a César (25.1-12)
4. Paulo perante Agripa: acusações especificadas (25.13 a 26.32)
D. A Viagem de Paulo a Roma (27.1 a 28.31)
1. Viagem marítima e naufrágio em Malta (27.1 a 28.14)
2. Paulo prega o evangelho abertamente em Roma (28.15-31)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Fundamentos Para a Igreja e sua Missão (1.1 a
2.41)
A. Prefácio (1.1-5)
O livro de Atos começa referindo-se à “primeira narrativa”, o Evangelho
Lucas, que narrou o que Jesus começou a fazer e a ensinar. Por implicação,
Atos, a sequência, apresenta a continuação do plano de Deus através do
registro do que Jesus continuou a fazer e a ensinar através do Espírito Santo
e da igreja apostólica. O Jesus ressuscitado relembrou os discípulos do
Espírito Santo prometido e ordenou-lhes que esperassem por sua iminente
vinda em Jerusalém.

B. Jerusalém: a espera pelo Espírito (1.6-26)


Os discípulos perguntaram quando Jesus estabeleceria seu reino, mas Jesus
apenas disse que eles receberiam suas testemunhas pelo poder de seu
Espírito. Um período de espera e de oração se seguiu enquanto os primeiros
fiéis se preparavam para a vinda do Espírito (1.6-14).

733
Atos 1.15-26 mostra a substituição que os Onze fizeram de Judas. Após
o estabelecimento das regras, Matias foi escolhido por sorteio. É uma
questão muito discutida se a seleção de Matias foi aprovada por Deus ou
não.73 No entanto, no cômputo geral, uma vez que Lucas inclui esta
narrativa sem qualquer comentário negativo, a ação foi provavelmente
apropriada.

C. Pentecostes: a Igreja nasce (2.1-47)


Quando o dia de Pentecostes chegou, os discípulos reunidos
experimentaram a vinda do Espírito Santo (2.1-13), que aconteceu em
cumprimento da promessa de Jesus (veja 1.8). Devido ao fato de judeus
devotos de todas as nações estarem presentes, todo o Israel estava
representado. Estes adoradores ouviram a palavra de Deus nas suas próprias
línguas e testemunharam o poder do Espírito, um sinal do final dos tempos.
Dessa forma, a vinda do Espírito em Pentecostes destaca as implicações do
evangelho em todo o mundo, revertendo a confusão das línguas que se
seguiu no incidente da torre de Babel (Gn 11.1-9).
Pedro explicou a importância dos eventos que tinham ocorrido (2.14-
40). Em essência, a lógica do discurso de Pedro é a seguinte: (1) o Espírito
agora havia sido derramado; (2) Jesus previu que isso ocorreria quando ele
tivesse sido exaltado com Deus após a sua ascensão (Lc 24.49, veja At
1.8,9); (3) portanto, a vinda do Espírito Santo provava que agora ele havia
sido exaltado: “portanto, uma vez que ele foi exaltado à direita de Deus e
recebeu do Pai o prometido Espírito Santo, ele derramou o que vocês veem
e ouvem” (2.33).

734
Pedro citou a profecia de Joel 2.28-32 para explicar que essa era a
prometida vinda do Espírito Santo (2.14-21). A última linha da profecia de
Joel, “e todo aquele que invocar o nome do Senhor será salvo”, transforma-
se no apelo evangelístico de Pedro (2.22-36). Ele concluiu com um apelo ao
arrependimento (2.37-40), com o resultado de que 3 mil foram convertidos.
A citação de Joel 2.28-32 pode ser comparada com a citação de Isaías
61.1,2 em Lucas 4.18,19, em que ele estabelece o cenário para o restante do
livro ao narrar a vinda do Espírito Santo a todos aqueles que invocarem o
nome do Senhor.
Lucas conclui seu relato destes eventos preliminares com o primeiro de
vários resumos que marcam as transições (2.41-47). A igreja se dedicou ao
ensino dos apóstolos (o padrão de ortodoxia doutrinária antes da formação
do NT), à comunhão, ao partir do pão (ou seja, a celebração da Ceia do
Senhor) e às orações (note o plural no grego original, o que pode sugerir
orações estabelecidas). Muitos sinais miraculosos e prodígios foram feitos
pelos apóstolos. Os fiéis partilhavam de tudo, adoravam a Deus com alegria
e continuamente cresciam em número.

II. A Igreja em Jerusalém (3.1 a 6.7)


Após a narrativa fundamental da ascensão de Jesus e da vinda do Espírito
nos dois primeiros capítulos, esta unidade apresenta o estabelecimento da
igreja em Jerusalém, primeiro estágio de uma expansão de três partes do
evangelho predito pelo Jesus ressuscitado no início do livro dos Atos (1.8).
Nesta conjuntura inicial, a igreja é totalmente judaica e está em rápida
expansão, algo que depois é enfatizado pela referência aos sacerdotes que
abraçaram a fé, dando um fechamento a esse trecho (6.7). A promessa de

735
Jesus de que seus seguidores seriam testemunhas em Jerusalém foi
poderosamente cumprida.

A. Um milagre e suas consequências (3.1 a 4.31)


Deus realizou um milagre notável através de Pedro que, juntamente com
João, estava a caminho do Templo para a hora da oração (3.1-10). Quando
se aproximou dele um homem coxo de nascença pedindo esmola, Pedro
curou o homem, cuja enorme alegria atraiu uma multidão. O discurso de
Pedro que se seguiu no Templo (3.13-26) acusava as pessoas de terem
entregado Jesus à morte, mas reconhecia que elas o fizeram por ignorância.
Pedro disse à multidão que elas experimentariam “tempos de refrigério” se
elas se arrependessem e seguissem a Jesus.
Com isso, Pedro e João foram presos pelos líderes judeus (4.1-4). Isso
deu a Pedro a oportunidade para estender uma mensagem semelhante ao
Sinédrio, embora sem um apelo ao arrependimento. Depois disso, Pedro e
João foram soltos com ordens para que parassem de falar a respeito de Jesus
(4.5-22). Após seu retorno à comunidade dos fiéis, o lugar tremeu e os fiéis
foram todos cheios do Espírito Santo para “anunciar a mensagem de Deus
corajosamente” (4.31).

B. Problemas dentro e fora (4.32 a 6.7)


Esta seção de Atos mostra a natureza da nova comunidade e até onde Deus
estava disposto a ir para proteger sua pureza. Barnabé, mencionado pela
primeira vez aqui, vendeu um imóvel e doou a renda para a igreja (4.32-37).
Isso estimulou um casal na igreja, Ananias e Safira, a fazer o mesmo, mas
retendo uma porção para si mesmos. Por si só, isto era irrepreensível, mas

736
mentir sobre isso, a fim de aumentar a próprio prestígio era uma afronta a
Deus. O casal foi severamente julgado: Ananias primeiro e, em seguida, sua
esposa caiu morta no local (5.1-11). Em consequência, um grande temor
tomou conta de toda igreja.
Destemidos, os apóstolos pregavam continuamente no Templo,
corajosamente curando em nome de Jesus (5.12-16). Uma vez mais os
apóstolos foram presos, mas libertados por um anjo que lhes disse para que
continuassem para que pudessem “contar ao povo tudo acerca desta vida”
(5.20). Quando foram presos novamente e proibidos de pregar sobre Jesus,
os apóstolos retrucaram “é mais importante obedecer a Deus que aos
homens” (5.29). O conselho de Gamaliel a seus companheiros do Sinédrio
foi para que esperassem e vissem. Se esse movimento não fosse de Deus,
ele se desfaria, como outros movimentos no passado. Depois de receberem
algumas chicotadas, os apóstolos voltaram alegremente para a pregação da
palavra, em desobediência direta ao Sinédrio (5.40), mas em obediência a
Deus.
A seção termina com um retorno à vida comunitária da jovem igreja. A
crise potencial foi evitada pela seleção da igreja de sete homens
qualificados, cheios do Espírito para atenderem às necessidades de um
grupo de viúvas helenísticas (6.1-7). Estevão, o personagem principal do
capítulo 7, é apresentado como um homem cheio de fé e do Espírito Santo.
Lucas resumiu o estado da igreja ao enfatizar o efetivo testemunho dado em
Jerusalém. Em particular, Lucas observou que até mesmo um grande
número de sacerdotes obedecia à fé (6.7).

III. Horizontes Mais Amplos para a Igreja:


Estevão, Samaria e Saulo (6.8 a 9.31)

737
A. Sofrimento: um dos servos preso e martirizado
(At 6.8 a 7.60)
Estevão, introduzido na seção anterior, foi falsamente acusado de falar
contra “Moisés e Deus” diante do Sinédrio por aqueles da “sinagoga dos
libertos” (6.8-15). A defesa de Estevão (cap. 7) mostra como, ao longo da
história de Israel, a nação se opôs ao plano de Deus: José foi vendido como
escravo, a liderança de Moisés foi rejeitada e as pessoas adoraram ídolos.
Em certo sentido, esta unidade serve como a conclusão da última seção em
sua ênfase na responsabilidade judaica. O martírio e a visão de Estevão
resultam nos acontecimentos narrados nos capítulos seguintes.

B. Palestina e Síria: Filipe, Saulo e Pedro (8.1 a


9.31)
A morte de Estevão provocou um período de grande perseguição para a
igreja. Saulo, que havia desempenhado um papel importante no
apedrejamento de Estevão, estava assolando a igreja (8.1-3). Os fiéis,
exceto os apóstolos, foram dispersos pelas regiões vizinhas, o que resultou
na expansão do evangelho além de Judeia para a Samaria, em cumprimento
do mandato de Jesus (veja 1.8).
Filipe, um dos Sete (6.5), realizou sinais em Samaria e pregou Cristo
aos Samaritanos (8.4-8). No entanto, os samaritanos não recebem o Espírito
da salvação até que Pedro e João, representando os apóstolos, vieram e
impuseram as mãos sobre os samaritanos fiéis. Isso serviu para autenticar a
obra de Deus entre eles. No processo, Simão, o mago, que procurou
comprar o poder do Espírito Santo de Pedro, foi repreendido (8.9-25).

738
Em seguida, Filipe, novamente pela direção do Espírito Santo,
encontrou um oficial administrador da corte de Candace, rainha da Etiópia,
e o levou a Cristo (8.26-38). Embora gentio de nascimento, ele era
provavelmente um prosélito (temente a Deus?). O Espírito Santo
miraculosamente transportou Filipe para Azoto, onde evangelizou as
regiões costeiras por todo o caminho até Cesareia (8.39,40). O evangelho,
em seguida, foi pregado para as regiões da Judeia e Samaria.
O capítulo final desta seção registra a conversão de Saulo em
preparação para a missão aos gentios (9.1-31). Embora estivesse na estrada
para Damasco para perseguir os cristãos, Saulo encontrou o Cristo
ressuscitado e foi convertido. Isso marca uma ocasião significativa na
missão da igreja primitiva. O principal oponente do cristianismo se tornou o
maior protagonista da missão da igreja, e ele seria o responsável por levar o
evangelho aos “confins da terra”.
Para Ananias, um discípulo encarregado de ministrar a Saulo, Jesus
descreveu Saulo como seu “instrumento escolhido para levar o meu nome
perante os gentios, reis e filhos de Israel” (9.15). Embora primeiramente
visto com ceticismo, Saulo pregou o evangelho poderosamente em
Damasco. Mais tarde, a igreja de Jerusalém o recebeu por intercessão de
Barnabé. Saulo pregava corajosamente em nome de Jesus até que uma
tentativa de assassinato forçou os irmãos a levá-lo a Tarso via Cesareia.
Lucas concluiu esta seção com um resumo que inclui uma referência à
igreja desfrutando de um período de paz e aumentando em número. Assim,
Lucas narrou o plano de Deus como expresso em 1.8, levando o evangelho
por Jerusalém, Judeia e Samaria. Seu próximo passo foi o de fornecer uma
clara demonstração de que os gentios podem ser salvos sem se converter
primeiro ao judaísmo, e este é o tema das duas próximas seções principais.

739
IV. Pedro e os Primeiros Gentios Convertidos
(9.32 a 12.24)
A. A prova da conversão dos gentios (9.32 a 11.18)
Pedro aparentemente tinha um ministério itinerante na Palestina. A cura de
Eneias, o paralítico, em Lida levou à ressurreição de Dorcas em Jope (9.32-
43). Isso também preparou o registro do encontro com o centurião romano
Cornélio (cap. 10). Enquanto em Jope, Pedro recebeu uma visão que lhe
dizia que ele não deveria considerar ninguém “impuro” (10.9-29). Enquanto
isso, Cornélio recebeu uma visão para chamar Pedro em Jope. Quando
Cornélio creu, Pedro foi convencido de que Deus havia aceitado um gentio
na igreja (10.24-48). Pedro, por sua vez, convenceu os céticos entre os
cristãos judeus de que a conversão de Cornélio era genuína (11.1-18).

B. A conversão dos gentios em Antioquia e o


retorno de Paulo (11.19-26)
Aqueles que estavam espalhados por causa da perseguição de Estevão
chegaram à Antioquia da Síria, pregando apenas a Judeus. Mas os homens
de Chipre e Cirene pregaram aos gentios (o termo “helenistas” significa “de
fala grega”, que se refere aos gentios). O Senhor estava com eles e um
grande número se converteu. Barnabé foi enviado para investigar, observar
a autenticidade da conversão e procurou Saulo em Tarso, ensinando
diariamente durante o período de um ano. Além disso, os fiéis foram pela
primeira vez chamados “cristãos” em Antioquia.

C. Eventos em Jerusalém (11.27 a 12.24)

740
Os eventos em Jerusalém são colocados entre referências a Saulo e Barnabé
em uma resposta à fome (11.27-30; 12.25), indicando não apenas a
solidariedade que os novos gentios fiéis tinham com a igreja de Jerusalém,
mas também que Deus ainda estava se movendo entre os judeus.
A libertação milagrosa de Pedro aparentemente enfureceu Herodes
Agripa I de tal forma, que quando ele não conseguiu encontrar Pedro, ele
executou os guardas e deixou a cidade.74 Tendo feito um discurso e recebido
a adoração dos homens como um deus, Herodes foi “infectado com vermes
e morreu” (12.1-23).
Uma outra declaração resumida de Lucas conclui a seção, observando
que a palavra de Deus continuou a se espalhar. Barnabé e Saulo retornaram
a Antioquia de sua missão em Jerusalém, acompanhados por João Marcos,
que mais tarde iria acompanhá-los na primeira parte de sua primeira viagem
missionária e, ainda mais tarde, escrever o Segundo Evangelho.

V. Paulo se Volta aos Gentios (13.1 a 16.5)


Lucas descreveu o avanço geográfico do evangelho através da Palestina e
partes da Síria, e racial ou religiosamente dos judeus para os prosélitos,
tementes a Deus e gentios. Seu plano aqui foi descrever a obra do Senhor de
enviar o evangelho aos confins da terra. Em cada estágio, o progresso foi
alcançado pela obra de Deus e não pelos esforços humanos.

A. A primeira viagem missionária (13.1 a 14.28)


A inserção do evangelho no mundo gentílico começou com um chamado
específico do Espírito Santo através dos profetas em Antioquia para separar
Barnabé e Saulo para o empreendimento missionário. Ironicamente, o que

741
Saulo, antes da sua conversão, procurou impedir ao perseguir os cristãos em
Damasco (também na Síria), ele agora ativamente realizava: a propagação
do evangelho para a Síria e além. Uma vez comissionados, eles começaram
sua jornada na casa de Barnabé, na ilha de Chipre (13.4). Paulo cegou
Elimas, o mago, porque ele “se opôs a eles e tentou desviar o procônsul da
fé” (13.8). Mas o procônsul Sérgio Paulo foi convertido.
Paulo e Barnabé, em seguida, percorreram Antioquia da Pisídia, e
13.16-41 detalha o sermão de Paulo na sinagoga local. Os judeus e
prosélitos rogaram para que Paulo pregasse novamente no sábado seguinte,
mas vendo as multidões, os membros da sinagoga encheram-se de inveja e
ciúme. Paulo, então, se voltou para os gentios e o evangelho se propagou
por toda a área. Mas os judeus instigaram uma perseguição contra Paulo e
Barnabé, expulsando-os da região. Este, então, constitui o padrão de toda a
primeira viagem: sinagoga, recepção, rejeição, perseguição.
Os resultados em Icônio foram semelhantes aos de Antioquia da Pisídia
(14.1-7). Paulo pregou na sinagoga e depois sofreu perseguição. Em Listra,
Paulo e Barnabé foram recebidos com uma calorosa recepção que quase
virou idolatria após a cura de um homem coxo de nascença. Mas os judeus
de Icônio e Antioquia acirraram a multidão para que apedrejasse Paulo e
eles o deixaram para morrer. Paulo então evangelizou Derbe (14.8-20) e fez
uma viagem de regresso através de Derbe, Icônio e Listra, instituindo
presbíteros em cada igreja em seu caminho para Antioquia da Síria (14.21-
28).

B. O Concílio de Jerusalém (15.1-35)

742
O Concílio de Jerusalém é um evento crucial para a missão aos gentios. A
questão dos gentios convertidos foi resolvida nesta reunião especial dos
apóstolos e presbíteros em Jerusalém. A questão era se os gentios tinham
que se tornar judeus prosélitos antes de se tornarem cristãos (veja 15.1,5). A
questão foi resolvida pelos testemunhos de Pedro, Paulo e Barnabé, e
finalmente, Tiago decidiu a questão citando Amós 9.11. Ao término da
reunião, foi enviada uma carta (veja 15.23-29) que incentivava os gentios a
se abster de coisas particularmente repulsivas para os judeus (15.20,29).

C. Início da segunda viagem missionária (15.36 a


16.5)
Tradicionalmente, 15.36 tem sido visto como marcando o início da segunda
viagem missionária de Paulo. Esta viagem é apresentada em termos de
encorajamento à igreja em Antioquia da Síria e às jovens igrejas plantadas
durante a primeira viagem. A carta mencionada na seção anterior foi levada
para as igrejas do sul da Galácia. Silas substituiu Barnabé depois que
Barnabé e Paulo discordaram sobre a companhia de João Marcos. Paulo
disse não por causa da deserção de Marcos no início da primeira viagem
missionária. Mas Barnabé queria dar outra chance a seu sobrinho, então eles
se separaram. Enquanto em Listra, Timóteo foi altamente recomendado
pelas igrejas e se juntou a Paulo e Silas. A seção termina com um resumo
que registra o crescimento e o encorajamento das igrejas.

VI. Maior Inserção no Mundo Gentílico (16.6 a


19.20)

743
A. A segunda viagem missionária (16.6 a 18.22)
Como todo genuíno novo movimento do evangelho para novas terras ou
grupos de pessoas, Deus é aquele que promoveu a irresistível propagação
do Evangelho na missão da igreja primitiva. O plano de Paulo era continuar
pela Ásia Menor, mas o Espírito o impediu de fazê-lo. Quando ele teve um
sonho sobre um macedônio clamando a ele por socorro, ele começou a se
dirigir para lá, “concluindo que Deus nos havia chamado para lhes anunciar
o evangelho” (16.10).
A primeira parada de Paulo depois de atravessar o Helesponto foi
Filipos, onde a primeira seção contendo o pronome pessoal “nós” ocorre (a
partir de 16.10). O padrão de Paulo, em consonância com o plano de
histórico-salvífico de Deus, era começar com os judeus residentes em
determinada cidade ou região e, em seguida, voltar-se para os gentios. A
primeira convertida ao evangelho cristão na Europa foi Lídia, uma
comerciante que vendias caros tecidos de púrpura.
O confronto com uma mulher jovem possuída por um demônio levou a
um doloroso mas frutífero encontro com os magistrados da cidade. Paulo e
seus companheiros foram presos, mas encaram este incidente como uma
plataforma para o evangelho. O carcereiro foi convertido e os magistrados
se ofereceram para libertar Paulo. Mas Paulo, apelando à sua cidadania
romana, não deixaria que os magistrados o espancassem e a seus
companheiros em público para depois libertá-los secretamente. Paulo exigiu
e recebeu um pedido público de desculpas, mas ele e seus companheiros
foram impelidos a deixar da cidade.
Em Tessalônica, Paulo permaneceu consistente em seguir o padrão
“primeiro ao judeu, e também para os gentios” (veja 17.2: “como de
costume”). Pregando na sinagoga durante pelo menos três sábados, Paulo

744
demonstrou para as pessoas a partir da Escritura “que o Messias precisava
sofrer e ressuscitar dentre os mortos” e que esse Messias era Jesus (17.3).
Quando os gentios vieram a Cristo em grande número, os judeus ficaram
com inveja e contrataram bandidos para perseguir os fiéis. Quando isso
chamou a atenção dos magistrados, eles multaram o anfitrião de Paulo,
enquanto Paulo e a equipe missionária partiam para Bereia. Após o sucesso
inicial, os judeus de Tessalônica os seguiram a Bereia e incitaram mais
violência até que Paulo foi forçado a ir para Atenas.
Atenas, um importante centro intelectual, proporcionou a Paulo um
grande desafio em sua pregação missionária. Ele encontrou a cidade cheia
de ídolos e debateu com filósofos epicuristas e estoicos, que consideravam
o apóstolo um “pseudointelectual” (lit., um “catador de sementes”, i.e.,
aquele que pega fragmentos de conhecimento; 17.18). Alguns pensaram que
Paulo falava de “deuses estrangeiros” porque ele anunciava Jesus e a
ressurreição (17.18). Paulo começou seu discurso referindo-se a um altar
ele que tinha observado e que tinha a inscrição “ao Deus desconhecido”
(17.23). A partir disso Paulo declarou a boa nova de Jesus e sua
ressurreição dentre os mortos. Alguns ridicularizaram Paulo, mas alguns
poucos acreditaram, dentre os quais Dionísio, membro do Conselho do
Areópago, e uma mulher chamada Dâmaris (17.34). No geral, Paulo
encontrou uma resposta menos positiva do que em outras ocasiões em sua
pregação missionária.
A próxima parada foi Corinto, onde Paulo se encontrou com Áquila e
Priscila, judeus cristãos recentemente expulsos de Roma. Novamente Paulo
debateu nas sinagogas. Quando as pessoas ali resistiram firmemente, Paulo
se voltou para os gentios. Crispo, líder da sinagoga, foi convertido
juntamente com muitos outros de Corinto. Paulo permaneceu em Corinto

745
por dezoito meses. Finalmente, o conflito com os judeus terminou com
Paulo perante o Gálio, procônsul romano, que decidiu que ele não tinha
competência em questões religiosas judaicas. Paulo, então, partiu para a
Síria via Éfeso.

B. A terceira viagem missionária (18.23 a 19.20)


Apesar de daqui por diante Paulo ter viajado para Jerusalém e Antioquia, o
foco está em Éfeso. Quando Paulo saiu de Corinto, ele rapidamente foi para
Éfeso. Depois de pregar na sinagoga, Paulo foi convidado a permanecer por
mais tempo, mas recusou, dizendo: “eu voltarei para vós, se Deus quiser”
(18.21). Seu retorno ocorreu dois versículos mais tarde. Entretanto, ele
viajou para Cesareia, Jerusalém, Antioquia e voltou, visitando algumas das
igrejas da primeira viagem, e depois chegou de volta a Éfeso. Em Éfeso,
Paulo encontrou um resíduo do movimento de João Batista (18.24 a 19.7),
engajou-se em alguns trabalhos missionários iniciais (19.8-10) e realizou
atos extraordinários de ministério (19.11-20).

VII. Para Roma (19.21 a 31)


A. De Éfeso a Jerusalém (19.21 a 21.16)
Paulo planejava ir para Roma após visitar a Macedônia, Acaia e Jerusalém,
e este itinerário domina a parte final do livro. A visão posterior de Paulo
(veja 23.11) reforça este plano, e Roma é o alvo no horizonte ao longo desta
última seção do livro. Antes de Paulo partir de Éfeso, no entanto, houve
uma grande rebelião pagã. Mais uma vez, os cristãos levados perante a
multidão se mostraram inocentes das acusações apresentadas contra eles.

746
Paulo viajou pela Macedônia e Grécia e navegou para Mileto. Ali ele se
reuniu com os presbíteros de Éfeso e lhes deu instruções de despedida. A
unidade final desta seção (21.1-16) marca o início da última viagem de
Paulo antes de sua prisão, e em cada parada ele foi alertado sobre as
dificuldades que o esperavam em Jerusalém.

B. A última visita de Paulo a Jerusalém e sua


remoção para a Cesareia (21.17 a 23.35)
Ao chegar em Jerusalém, Paulo foi convidado a pagar por um voto judaico
para aliviar a desconfiança entre os judeus fiéis. Mas uma acusação dos
judeus da Ásia Menor de que Paulo levara um gentio ao Templo criou um
motim. Paulo foi preso pelos soldados da guarnição romana na fortaleza de
Antônia. (Ironicamente, a falsa acusação de que Paulo levara um gentio ao
templo fez com que os gentios entrassem no templo para salvar Paulo.)

C. A defesa de Paulo perante Félix, Festo e Agripa


(24.1 a 26.32)
Depois de ser autorizado a fazer sua defesa diante da multidão, Paulo,
durante um período de pelo menos dois anos, foi submetido a Felix (24.1-
27), Pórcio Festo (25.1-12), e Agripa (25.13-27). O apelo de Paulo a César
exigiu a viagem a Roma, embora Paulo tivesse sido declarado inocente das
acusações em cada interrogatório (26.1-32).

D. A viagem de Paulo a Roma (27.1 a 28.31)

747
A viagem marítima compreende quase dois terços dos dois últimos
capítulos do livro. Assim como Deus tinha sido o principal impulso por trás
da expansão missionária da igreja, ele era também a força motriz na viagem
a Roma. Embora Paulo não estivesse no controle de seus movimentos, os
romanos também não estavam. A providência de Deus é claramente
acentuada ao longo desta seção final do livro. Em última instância ela levou
Paulo para Roma e provou ser Deus poderoso durante toda a viagem.
Quando Paulo chegou a Roma, ele seguiu o padrão estabelecido através
de seu ministério e se reuniu primeiro com os judeus, obtendo moderado
sucesso. Quanto àqueles que rejeitaram a mensagem, Paulo citou Isaías
6.9,10 a fim de mostrar que a rejeição dos judeus não era inesperada. Após
isso, os gentios foram convidados a confiar em Cristo. Assim, Lucas
concluiu o livro com Paulo em prisão domiciliar em Roma, ainda pregando
a todos os que quisessem ouvir, judeus e gentios.

TEOLOGIA
Temas Teológicos
História da salvação
O princípio organizador de Lucas é mais bem descrito como “história da
salvação”. A intenção ao longo de Lucas-Atos foi narrar a revelação do
plano de salvação de Deus.75 Isto, naturalmente, foi impactado pela
identificação do gênero de Atos como historiografia e a natureza de Atos
como sendo uma sequência de Lucas. Ao descrever esta abordagem, deve-
se evitar a importação de todas as conclusões negativas alcançadas pelos
proponentes da Heilsgeschichte (alemão para “história da salvação”) para a

748
interpretação de Lucas-Atos. Para Lucas, ter o foco na história da salvação
não foi uma correção necessária para um atraso embaraçoso na expectativa
apocalíptica dentro do período de vida dos discípulos.76 Em vez disso,
Lucas apresentou o plano de Deus ao longo da história como aquele que
traz a redenção individual através de Jesus Cristo. Essa redenção, na
plenitude dos tempos, foi anunciada e oferecida através da proclamação
deste evento histórico, isto é, o evangelho.77 Como Köstenberger e O’Brien
observaram, “o Evangelho de Lucas conta a história de Jesus e de sua
salvação, enquanto o livro de Atos traça o movimento dessa salvação para
os gentios”.78
Um dos temas mais importantes ao longo do livro de Atos é o da
soberania de Deus ao levar o evangelho para fora da Palestina “e até os
confins da terra” (1.8). Isso pode ser visto de variadas maneiras. Para
começar, Lucas estava claramente interessado no cumprimento da Escritura.
A grande maioria das citações do AT ocorre nos discursos evangelísticos
em contextos judaicos (veja esp. os apelos de Pedro em 2.14-36 e 3.12-26;
o discurso de Estevão em 7.2-53; e o discurso de Paulo na sinagoga de
Antioquia da Pisídia em 13.16-41).79 Em contextos gentílicos (p. ex., 17.22-
31), este foi um apelo menos eficaz, mas entre aqueles que defendem a
inspiração da Torá, ele foi bem-sucedido. O cumprimento do AT foi
essencial para a conversão do eunuco etíope (8.30-35). Além desses casos
específicos, há também apelos não especificados em Atos para o
cumprimento do AT que apontam para a atividade de Deus ao enviar Cristo
(p. ex., Pedro fala daquilo de que “todos os profetas dão testemunho”,
3.18,24; 10.43; cf. resumos da pregação de Paulo em 17.3; 24.14; 26.22; e
da pregação de Apolo em 18.28). Assim, a mensagem a Israel é: “Seu
Messias chegou, segundo a Escrituras”.

749
Esse cumprimento do desejo de Deus é visto na contínua ênfase ao
plano de Deus. A “necessidade divina” (dei) é um fenômeno continuado do
Evangelho de Lucas (veja 1.16,21). Em muitas passagens na narrativa, é
usada para mostrar os planos de Deus (veja 3.21; 4.12; 9.6; 14.22; 17.3;
19.21; 23.11; 27.24,26).
Do ponto de vista estrutural e literário, Lucas mostrou que a expansão
do evangelho aos confins da terra foi um movimento de Deus. Acima de
tudo, foi em obediência e em cumprimento do mandamento explícito de
Jesus (1.8). O restante do livro revela como Jesus profetizou (ou seja,
“Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria, e até os confins da terra”). Mas
mais do que isso, cada passo foi um movimento de Deus. A evangelização
de Jerusalém veio depois do derramamento do Espírito em Pentecostes. Em
8.4, a porta foi aberta para a Judeia e Samaria. A perseguição no
apedrejamento de Estevão e a subsequente dispersão revelaram ser
providenciais. Filipe evangelizou alguns samaritanos e, em seguida, um
gentio temente a Deus (o etíope) ao comando de um anjo.
A porta foi ainda mais aberta para os gentios com a salvação de
Cornélio, que recebeu uma visão para conversar com um homem chamado
Pedro (10.1-5). Enquanto isso, Pedro, em Jope, recebeu uma visão para que
a ninguém excluísse (10.9-16). Aproximadamente naquele momento o
convite de Cornélio chegou.
O esboço de Atos é centrado geograficamente, avançando da seguinte
forma: Jerusalém, Judeia e Samaria, Ásia Menor, Macedônia e Grécia, e
Roma. Na entrada do evangelho em cada uma destas regiões, Lucas foi
cuidadoso em observar que o evangelho adentrou essas áreas sob a direção
de Deus. Em 13.2, Paulo e Barnabé foram selecionados pelo Espírito Santo
para que levassem o evangelho à Ásia Menor. Na viagem de volta, uma

750
visão da Macedônia foi interpretada como uma mensagem de Deus para que
fossem até lá (16.9). Paulo estava determinado a ir a Roma, mas isso
aconteceu de tal forma que só poderia ser considerado providencial (19.21).
Os propósitos de Deus foram claramente anunciados a Paulo em sua última
viagem a Jerusalém. No final, ele foi preso, apelou para César e foi enviado
para Roma às custas do estado, tendo tudo sido articulado para Paulo como
o decreto de Deus (p. ex., 21.10-14; 23.11; 27.23,24).

O alcance universal do Evangelho


O segundo tema inconfundível relacionado à história da salvação é que o
evangelho é para todas as nações. Lucas enfatizou em Atos 1.8 que Jesus
ordenou aos apóstolos que fossem até os confins da terra. No entanto, ele
também documentou que os passos para a inclusão dos gentios formam
lentos e hesitantes. Além disso, esses passos certamente não foram o
resultado de um planejamento humano. Por exemplo, Pedro teve que ser
convencido por milagrosos meios divinos de que os gentios poderiam
receber o evangelho sem pertencer antes ao judaísmo (10.1-48).
Embora a inclusão dos gentios seja amplamente aceita, é, muitas vezes,
esquecido (e por vezes negado)80 que a salvação inclui a restauração de
Israel através de Jesus (veja esp. a questão em 1.6 e o convite de Pedro em
2.36). A resposta de Jesus à pergunta de 1.6 (“Senhor, neste tempo
restaurarás o reino de Israel?”) não foi que o reino não seria restaurado, mas
que isso aconteceria no tempo do Pai. F. Thielman certamente estava
correto quando afirmou: “isso implica que esta restauração está vindo,
embora os cristãos não devam calcular o momento de sua chegada”.81Ao
longo do livro de Atos, o padrão — como Paulo anunciou que em Romanos

751
1.16 é “para o judeu, e também para o gentio”. Assim, Lucas demonstrou
que o Evangelho foi inicialmente proclamado “primeiro para os judeus”.

O Espírito Santo
Relacionada à ênfase na soberania de Deus ao propagar o evangelho está
uma ênfase sobre o Espírito Santo como o agente da vida e crescimento da
igreja. Lucas descreveu o seu Evangelho como o registro de “tudo o que
Jesus começou a fazer e a ensinar” (At 1.1), implicando que o livro de Atos
é sobre a atividade contínua de Cristo. Esta atividade foi realizada através
do Espírito Santo.82 Assim, foi ordenado aos discípulos que esperassem pela
promessa do Espírito (1.4,8). Sua vinda no dia de Pentecostes marcou o
início do avanço da igreja (2.1-4,33).
Uma vez que Deus prometera dar o Espírito de salvação (2.38; 9.17),
sua recepção é prova da salvação. Falar em línguas é a evidência de que os
três principais grupos de pessoas foram salvos: judeus (2.4), gentios (10.46)
e alguns discípulos de João Batista (19.6). Uma vez que é evidente que
também os samaritanos haviam recebido a salvação (8.16), é possível que
eles também tenham falado em línguas na salvação — muito embora isto
não esteja expressamente mencionado no texto. É um erro, contudo, supor
que a salvação é sempre acompanhada do falar em línguas. O relato da
conversão de Paulo, por exemplo, não faz qualquer menção de línguas. O
falar em línguas em Atos é um sinal indiscutível de que a salvação se
realizou no que diz respeito a grupos específicos de pessoas. O fenômeno
fortemente enfatiza a inclusão do evangelho.
O Espírito Santo foi aquele que soberanamente dirigiu a missão cristã.
Jesus deu ordens através do Espírito Santo (1.2). Filipe recebeu ordens do

752
Espírito Santo (8.29,39). Pedro foi instruído pelo Espírito Santo a receber
os gentios (10.19,20). O Espírito Santo selecionou Barnabé e Saulo e os
dirigiu para que partissem (13.2,4). O Espírito Santo orientou Paulo para
que se dirigisse à península grega (16.6-10; cf. 20.22,23,28; 21.4).
O Espírito Santo não apenas dirigiu a missão; ele a capacitou. Isso
estava em consonância com a promessa de Jesus (1.8), conforme a narrativa
afirma repetidas vezes (4.8,31; 6.10; 7.55; 9.31; 11.28; 13.9,10; 21.11). A
citação que Pedro faz de Joel 2.28 (2.16-21), onde o Senhor prometeu um
derramamento escatológico do Espírito que iria inaugurar a salvação em um
âmbito universal, é programática para o livro inteiro. Assim, é difícil
exagerar o papel do Espírito pós-ressurreição na história da salvação.83

A ressurreição e ascensão de Jesus


O ponto-chave na história da salvação é a morte, ressurreição e exaltação de
Jesus. Na proclamação do evangelho, esse grupo de eventos significativos é
o ponto principal da história e o auge do plano de Deus há muito tempo.
Este plano foi ordenado por Deus, predito pelos profetas (26.22), realizado
em Cristo (13.28-39) e proclamada por fiéis testemunhas (4.33).84
O ensino de Lucas sobre a ressurreição de Cristo implica não apenas a
restauração dos mortos, mas uma exaltação sem precedentes. Mesmo que
outros, como Enoque ou Elias, tenham subido ao céu, Jesus foi elevado à
direita de Deus. A importância da ascensão na teologia de Lucas é vista
pelas referências estratégicas a ela em Lucas-Atos no final do Evangelho e
no início de Atos. De forma semelhante, Paulo, na sinagoga de Antioquia
da Pisídia, conectou a ressurreição de Jesus à sua filiação (13.33,34).

753
Assim, Jesus reina do trono celeste como Messias de Deus; não só como o
Filho de Davi, mas também como o Filho de Deus.
A ressurreição de Jesus é a prova das alegações de Jesus (veja 3.15;
5.20; 25.19). É também a garantia de uma ressurreição pessoal para a
humanidade escolhida (veja 24.15; 26.23). Finalmente, como mencionado
acima, é também o ponto de partida para a restauração de Israel. Esta é a
primeira pergunta feita ao Jesus ressurreto no livro dos Atos (1.6) e é a
“esperança de Israel” (28.20). Essa restauração se inicia com a recepção do
Messias e sua purificação do pecado, uma mensagem poderosamente
proclamada por Pedro no Pentecostes e marcada especialmente pelo
derramamento do Espírito Santo como um sinal inaugural dos últimos dias
(2.38).
A restauração inclui uma poderosa “reconstituição” do povo de Deus a
fim de incluir os pobres e oprimidos em Israel e, em última instância, a
inclusão de “todos os que estão longe, a tantos quantos o Senhor nosso
Deus chamar” (2.39).85 As palavras de Pedro, assim, fornecem um resumo
adequado: “seja do conhecimento de todos vós e de todo o povo de Israel
que pelo nome de Jesus Cristo, o Nazareno — a quem crucificastes e a
quem Deus ressuscitou dentre os mortos […] Este Jesus é a pedra rejeitada
por vós, os construtores, a qual se tornou a pedra angular. E não há salvação
em nenhum outro, pois não há outro nome debaixo do céu dado aos homens
pelo qual devamos ser salvos” (4.10-12).

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON


Volume 2 de Lucas-Atos: o que Jesus continuou a fazer através do
Espírito Santo (1.1)

754
Relato da propagação do cristianismo de Jerusalém a Roma (1.8) e da
vida e das práticas da igreja primitiva (veja 2.42)
A concessão do Espírito em Pentecostes e o nascimento da igreja do
NT (cap. 2)
Ministério de Pedro, João, Tiago (meio-irmão de Jesus) e outros (caps.
1 a 12)
Inclusão dos gentios por decreto do Concílio de Jerusalém (cap. 15)
Ministério de Paulo “primeiro para o judeu, e depois para os gentios”
em locais para os quais Paulo enviou cartas incluídas no cânon (caps.
13 a 28; veja, em especial 28.23-28)

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Quem escreveu Atos? O autor foi um apóstolo? O que garante que o
critério de apostolicidade foi atendido?
2. Quando Atos provavelmente foi escrito, e qual é a razão principal
geralmente dada para esta data?
3. Quem foi Teófilo, como sabemos quem ele era, e qual era o seu
possível papel em relação a Lucas/Atos?
4. Onde Atos foi provavelmente concluído?
5. Quais são as principais propostas em relação ao propósito de Atos? De
acordo com os autores, qual é o propósito mais provável?
6. Por que a questão do gênero é importante para o estudo Atos?
7. Por que Atos é considerado historicamente confiável?
8. Quais são as fontes que estão por trás da composição dos Atos?
9. Qual é o “esquema” básico de Atos, e por quê?
10. Qual é a lógica subjacente ao sermão de Pedro em Pentecostes?

755
11. Qual foi o principal tema discutido no Concílio de Jerusalém?
12. Qual é o papel que o Espírito Santo desempenha em Atos?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


Alexander, L. C. A. Acts in its ancient literary context: a classicist
looks at the Acts of the Apostles. Library of New Testament Studies
298 (London: T&T Clark International, 2005).
Barnett, P. The birth of Christianity: the first twenty years (Grand
Rapids: Eerdmans, 2005), vol. 1: After Jesus.
Barrett, C. K. A Critical and Exegetical Commentary on the Acts of the
Apostles. Em: International Critical Commentary (Edinburgh: T&T
Clark, 1994, 1998), 2 vols.
Bauckham, R., org. The Book of Acts in Its First Century Setting
(Grand Rapids: Eerdmans, 1995), vol. 4: Palestinian Setting.
Blomberg, C. L. From Pentecost to Patmos: An Introduction to Acts
through Revelation (Nashville: B&H, 2006).
______. Introdução de Atos a Apocalipse (São Paulo: Vida Nova,
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Bock, D. L. Acts. Em: Baker Exegetical Commentary on the New
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Bruce, F. F. The Book of Acts. Ed. rev. Em: New International
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Conzelmann, H. Acts of the Apostles. Em: Hermeneia. Tradução para o
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Fortress, 1987).

756
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33-50.

1
A. N. Wilson, Paul: The Mind of the Apostle (New York: W. W. Norton, 1997), p. 21-22.

Ironicamente, é claro, Wilde não ficaria sabendo como a história terminava, mesmo que ele tivesse

lido o final do livro de Atos, uma vez que a história não tem um final.

2
Por exemplo, a Escola de Tübingen propôs uma tendência de conciliação no livro de Atos e

atribuiu o livro ao século II. Alguns poucos estudiosos sugeriram uma data tardia por outras razões:

veja F. C. Burkitt, The Gospel History and Its Transmission, 3. ed. (Edinburgh: T&T Clark, 1911), p.

759
105-10; M. S. Enslin, “Once Again, Luke and Paul”, ZNW 61 (1970), p. 253, p. 271; e J. C. O’Neill,

The Theology of Acts in Its Historical Setting (London: SPCK, 1961), p. 21 e 26.

3
Para esse argumento, veja J. A. Fitzmyer, The Acts of the Apostles: A New Translation with

Introduction and Commentary, AB 31 (Garden City: Doubleday, 1998), p. 54-55.

4
Por exemplo, D. J. Williams, Acts, NIBC 5 (Grand Rapids: Zondervan, 1990), p. 13; e W. G.

Kümmel, Introduction to the New Testament, ed. rev., tradução para o inglês de H. C. Kee (Nashville:

Abingdon, 1975), p. 186. Também deve ser observado que isto não é apenas uma opção

“conservadora” vs. “liberal”, pois o quase sempre conservador D. Wenham data Atos bem

posteriormente: D. Wenham e S. Walton, Exploring the New Testament: A Guide to the Gospels and

Acts (Downers Grove: InterVarsity, 2001), vol. 1, p. 297.

5
P. Parker (“The ‘Former Treatise’ and the Date of Acts”, JBL 84 [1965], p. 53) observou: “para

qualquer cristão escrever, desde então, com o otimismo natural de Atos 28 requereria quase uma

estupidez sub-humana”.

6
Para um caminho um pouco diferente para chegar à mesma conclusão, veja A. J. Matill, Jr. “The

Date and Purpose of Luke-Acts: Rackham reconsidered”, CBQ 40 (1978), p. 335-50.

7
Ireneu, Contra Heresias 3.1.1; 3.14.1; Eusébio, Hist. Ec. 2.22.6; e Jerônimo, De Viris Illustribus

7.

8
Jerônimo, De Viris Illustribus 7.

9
C. J. Hemer, The Book of Acts in the Setting of Hellenistic History (Winona Lake: Eisenbrauns,

1990), p. 107.

10
Por exemplo, W. J. Larkin, Acts, IVPNTC (Downers Grove: InterVarsity, 1995), p. 19-20; W.

Neil, Acts, New Century Bible Commentary (Grand Rapids: Eerdmans, 1981), p. 28.

760
11
R. H. Gundry, A Survey of the New Testament, 4. ed. (Grand Rapids: Zondervan, 2003), p. 304

[publicado em português por Vida Nova sob o título Panorama do Novo Testamento]; F. F. Bruce,

The Book of Acts, NICNT (Grand Rapids: Eerdmans, 1987), p. 20; D. A. deSilva, An Introduction to

the New Testament: Contexts, Methods, and Ministry Formation (Downers Grove: InterVarsity,

2004), p. 354; L. T. Johnson, The Acts of the Apostles, SacPag 5 (Collegeville: Liturgical Press,

1992).

12
B. H. Streeter, The Four Gospels: A Study of Origins (London: St. Martins, 1953), p. 539.

Kümmel (Introduction, p. 162) também lista Munck, Sahlin e Koh.

13
Por exemplo, o movimento geográfico do Evangelho (T. Zahn, Die Apostelgeschichte des

Lukas [Leipzig: A. Deichert, 1919-1921], p. 14-5); o julgamento da controvérsia das igrejas (E.

Trocmé, Le ‘Livre des Actes’ et l’Histoire [Paris: University of France Press, 1957]); ou a explicação

para a demora da Parúsia ou Segunda Vinda (H. Conzelmann, The Theology of St. Luke [New York:

Harper & Row, 1961]).

14
I. H. Marshall, The Acts of the Apostles, TNTC (Grand Rapids: Eerdmans, 1980), p. 17-22.

15
Assim o fazem D. A. Carson; D. J. Moo, An Introduction to the New Testament, 2. ed. (Grand

Rapids: Zondervan, 2005), p. 305 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução ao

Novo Testamento]; R. E. Brown, An Introduction to the New Testament (New York: Doubleday,

1997), p. 272-73; e Kümmel, Introduction, p. 163.

16
Por exemplo, os Atos de Paulo e Tecla; os Atos de João; os Atos de Pedro; e outros.

17
Fitzmyer, Acts of the Apostles, p. 47; e Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p.

301.

18
Assim, Atos é um tipo de “biografia” do Espírito Santo, ou talvez uma “biografia” do Cristo

que subiu ao céu e conduz sua obra através do Espírito Santo e da igreja apostólica? Se assim for, isto

761
precisaria ser entendido dentro do escopo bem maior dos propósitos históricos-salvíficos de Deus,

sobre os quais veja mais adiante.

19
Em contrapartida M. C. Parsons; R. I. Pervo (Rethinking the Unity of Luke and Acts

[Minneapolis: Fortress, 1993], p. 20-44), que identificaram Atos como um “romance” e registraram

preocupações sobre o que eles viram como uma mudança de gênero entre Lucas e Atos. Também

Lucas mencionou outros Evangelhos em Lucas 1.1, mas ele não mencionou nenhum outro

predecessor no caso do livro de Atos (veja B. Witherington III, The Acts of the Apostles: A Socio-

Rhetorical Commentary [Grand Rapids: Eerdmans, 1998], p. 9).

20
Veja R. I. Pervo, Profit with delight (Philadelphia: Fortress, 1987). Entretanto, o simples fato

de ser uma peça de entretenimento não significa que a obra se enquadre no gênero conhecido como

romance. A identificação do gênero de Pervo é seguida pelo “Seminário de Atos” do Instituto Westar.

Esse seminário, do qual Pervo é membro, é uma continuação do notório “Seminário de Jesus”. D. E.

Smith (“Was there a Jerusalem Church? Christian Origins According to Acts and Paul”, Forum 3

[Primavera de 2000], p. 57) disse: “hoje alguns acadêmicos ainda defendem que Atos pode ser

definido, de certo modo, como gênero de história antiga, mas o ônus da prova agora mudou para

aqueles que alegariam historicidade para Atos”. Neste mesmo volume, D. R. MacDonald (“Luke’s

Emulation of Homer: Acts 12.1-17 and Illiad [sic] 24”, Forum 3 [Outono de 1999], p. 197) afirmou

que “Atos dos Apóstolos é uma ficção autoconsciente […] A camada histórica, se houver alguma, é

extremamente delgada e da minha perspectiva bem desinteressante.” Luciano, na obra do século II

intitulada Como Escrever História, observou que a tarefa do historiador não está livre de fornecer

entretenimento. Ele escreveu, “a tarefa do historiador é […] fazer um refinado arranjo dos

acontecimentos e iluminá-los da forma mais vívida possível” (p. 51).

21
Marshall, Fresh Look, p. 19-21.

22
Veja Clemente, Stromata 5.12; Jerônimo, Epístolas 53.8. Jerônimo a chamou de “história sem

adornos”; Lat. nuda historia, que literalmente significa “história nua”.

762
23
Desde que Lucas demonstrou uma habilidade para escrever em outros estilos, isso muito

provavelmente foi deliberado (assim o fez I. H. Marshall, Acts, TNTC [Grand Rapids: Eerdmans,

1980], p. 18). J. Polhill (Acts, NAC 26 [Nashville: B&H, 1992], p. 43) observou: “Ao longo de Atos

há uma verossimilhança na narrativa. Os judeus falam com sotaque judeu, os filósofos atenienses

falam em Aticismo e os oficiais romanos falam e escrevem no costumeiro estilo legal. Lucas mostrou

não apenas uma familiaridade com essas idiossincrasias linguísticas, mas também a habilidade de

descrevê-las em seu estilo de escrever”.

24
Se Lucas entendeu a si mesmo como autor de uma obra inspirada é outra questão.

25
A lista completa inclui pedidos e dedicatórias, uma desculpa pelo estilo defeituoso,

comentários sobre o valor e utilidade da história, a menção de predecessores, garantia de

imparcialidade, uso de metodologia apropriada e razões para a redação (D. Aune, New Testament in

its Literary Environment, p. 89-90). L. Alexander (The Preface to Luke’s Gospel: Literary

Convention and Social Context in Luke 1.1-4 and Acts 1.1, SNTSMS 78 [Cambridge: University

Press, 1993]) discordou e postulou que os prefácios em Lucas-Atos são mais parecidos com os de

tratados técnicos e científicos escritos para públicos bem menos instruídos. Ela conclui que Lucas foi

escrito para um público com o mesmo nível de instrução. É claro que nem todo elemento tem que

aparecer para uma obra ser considerada historiografia. Quando os prefácios de Lucas e Atos são

comparados com a obra Contra Ápion de Josefo, há uma semelhança surpreendente. Veja o prefácio

de Josefo no segundo livro contra Ápion: “no livro anterior, mais honrado Epafrodito, eu demonstrei

nossa antiguidade e confirmei a verdade do que eu havia falado, a partir dos escritos dos fenícios,

caldeus e egípcios” (Josefo, Ápion 2.1).

26
Veja especialmente as obras de Éforo (Witherington, Acts of the Apostles, p. 34-35).

27
C. L. Blomberg, From Pentecost to Patmos: An Introduction to Acts through Revelation

(Nashville: B&H, 2006), p. 17 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução de

Atos a Apocalipse: uma pesquisa abrangente de Pentecostes e Patmos].

763
28
Para o primeiro, veja W. W. Gasque, A History of the Criticism of the Acts of the Apostles,

BGBE 17 (Tübingen: J. C. B. Mohr, 1975); para o ultimo, veja E. Haenchen, The Acts of the

Apostles: A Commentary, tradução para o inglês de B. Noble; G. Shinn; H. Anderson; R. M. Wilson

(Philadelphia: Westminster, 1971), p. 14-50.

29
Pervo, Profit with Delight, p. 3.

30
Fitzmyer, Acts, p. 124.

31
Hemer, Book of Acts in the Setting of Hellenistic History, p. 108-58.

32
Esses e outros exemplos podem ser encontrados sob os títulos “Common Knowledge” e

“Specialized Knowledge” in: Hemer, Book of Acts in the Setting of Hellenistic History, p. 107-8.

33
A. N. Sherwin-White, Roman Law and Roman Society in the New Testament (Grand Rapids:

Baker, 1963).

34
Josefo escreveu: “[…] durante o período em que Fado foi procurador da Judeia [c. 44 d.C.],

certo impostor chamado Teudas persuadiu a maioria do povo a tomar suas posses e a segui-lo ao Rio

Jordão” (Ant. 20.97). Fado, porém, não tinha nada com isso, e Teudas foi capturado e decapitado.

35
Embora o resumo de Gamaliel seja breve, existem algumas diferenças. Por exemplo, Gamaliel

disse que Teudas reuniu um exército de 400 homens, enquanto Josefo se refere a “maioria do povo”.

36
K. F. Nögren (Commentar über die Apostelgeschichte des Lukas [Leipzig: Dörfling und

Franke, 1882], p. 147) observou que Josefo relatou quatro homens chamados Simão em um período

de 40 anos, e três homens chamados Judas em um período de 10 anos, cada um deles tendo liderado

uma rebelião. Cf. Josefo, Ant. 17.269: “Agora, neste momento havia dez mil outras desordens na

Judeia, que eram como tumultos”. De acordo com Ant. 17.285, esse estado de coisas durou muito

tempo.

764
37
O relato é encontrado em Josefo, Guerra Judaica 2.261-63; Ant. 20.169-72. Veja P. W. Barnett,

“The Jewish Sign Prophets, A.D. 40-70 — Their Intentions and Origin”, NTS 27 (1981), p. 679-97.

38
Polhill, Acts, p. 455, observa que foi sugerido que o erro de um escriba é explicar a inflação de

Josefo. A letra uncial Δ (4 em grego) foi acidentalmente substituída por um Λ (30 em grego).

39
C. K. Barrett (“The Historicity of Acts”, JTS 50 [1999], p. 525) afirmou, “os relatos acurados

do trabalho das cidades gregas não pode provar que a trama principal de Lucas não é toda ou em

parcialmente fictícia”.

40
Fitzmyer, Acts, p. 127.

41
W. W. Gasque, History of the Criticism of the Acts of the Apostles (Grand Rapids: Eerdmans,

1975), p. 20.

42
J. J. Scott Jr. (“Stephen’s Defense and the World Mission of the People of God”, JETS 21

[1978], p. 172) observou com relação a Estevão: “seu discurso emprega formas literárias, ideias e

ênfases que sugerem a influência de outra cultura que não aquela do judaísmo do AT”. Cf. B.

Gärtner, The Areopagus Speech and Natural revelation (Uppsala: C. W. K. Gleerup, 1955), p. 27.

43
Veja Witherington, Acts, p. 518.

44
J. W. Bowker, “Speeches in Acts: A Study in Proem and Yelammedenu Form”, NTS 14 (1967-

68), p. 96-111.

45
Hemer, Book of Acts in the Setting of Hellenistic history, p. 420.

46
Fitzmyer, Acts, p. 107. A lista é limitada a “Discursos Missionários e Evangelísticos”

(excluindo apologias) e inclui itens como “Discurso Direto” e “Apelo à Atenção” que ostensivamente

qualquer discurso improvisado teria, também itens como “Querigma Cristológico-Teológico”.

47
Witherington, Acts, p. 40.

765
48
Ibid., p. 41, citando H. F. North, “Rhetoric and Historiography”, Quarterly Journal of Speech

42 (1956), p. 242.

49
Witherington, Acts, p. 41.

50
Ibid., p. 43. Políbio afirmou que “todo o gênero de orações […] pode ser considerado como

resumos de eventos e como o elemento unificador em obras históricas” (Hist. 12.25a-b; veja 36.1).

51
Witherington, Acts, p. 46. Tucídides é frequentemente citado nesse ponto pelos dois lados do

argumento. Ele afirmou: “Quanto aos discursos que foram feitos por homens diferentes […], foi

difícil relembrar com rigorosa precisão as palavras realmente ditas, tanto para mim com relação

àquilo que eu mesmo ouço, e para aqueles que de várias outras fontes me trouxeram relatórios.

Portanto os discursos são feitos na linguagem que, como pareceu para mim, os vários oradores se

expressariam sobre os assuntos em consideração, os sentimentos mais adequados à ocasião, embora

ao mesmo tempo eu tenha aderido ao máximo ao sentido geral do que realmente foi dito” (Guerra

1.22). A questão problemática surge quando Tucídides é interpretado como dizendo que ele disse

aquilo que os seus súditos deveriam ter dito. Witherington observou que ele deveria ser interpretado

como nada que parece provável que eles disseram (ibid., p. 47).

52
Hemer, Book of Acts in the Setting of Hellenistic History, p. 424.

53
W. Lane, The Gospel of Mark, NICNT (Grand Rapids: Eerdmans, 1974), p. 10-11.

54
Hemer, Book of Acts in the Setting of Hellenistic History, p. 425. Veja também a palavra

chairein (“saudações”) em Atos 15.23 e Tiago 1.1.

55
Witherington, Acts, p. 439.

56
Barrett, “Historicity”, p. 530.

57
Veja a discussão da data de Gálatas no capítulo 10.

58
Blomberg, From Pentecost to Patmos, p. 53.

766
59
Veja a discussão de Fundamentos Filosóficos do Estudo Moderno dos Evangelhos no capítulo

3 acima (incluindo referências bibliográficas). Veja “chapter 3: Miracles”, in: C. L. Blomberg, The

Historical Reliability of the Gospels, 2. ed. (Downers Grove: InterVarsity, 2007) [publicado em

português por Vida Nova sob o título A confiabilidade histórica dos Evangelhos].

60
W. Ramsay, The Bearing of Recent Discovery on the Trustworthiness of the New Testament

(London: Hodder & Stoughton, 1915), p. 89.

61
Por exemplo, F. Schleiermacher, Einleitung ins Neue Testament, em: G. Wolde, org., Friedrich

Schleiermacher’s Sämtliche Werke (Berlin: Reimer, 1834-1864), div. 1, vol. 8, p. 360. Segundo

Meyer, Schleiermacher defendeu que Lucas simplesmente reuniu outros documentos escritos. Veja

H. A. W. Meyer, Critical and Exegetical Handbook to the Acts of the Apostles, 2. ed., tradução para o

inglês de P. J. Gloag (New York: Funk & Wagnalls, 1889), p. 9.

62
Harnack, Acts of the Apostles, p. 162. Harnack baseou isto nos aparentes pares na narrativa em

Atos 1 a 15, isto é, dois sermões petrinos, duas prisões, duas defesas perante o Sinédrio, duas

estimativas de convertidos e dois relatos sobre a comunidade compartilhando todas as coisas. Mas

Bruce provou ser isso desnecessário (Acts, p. 23).

63
R. E. Brown (An introduction to the New Testament [New York: Doubleday, 1997], p. 317)

argumentou que hoje esta fonte é provavelmente a mais amplamente aceita.

64
Dibelius, Studies in the Acts of the Apostles, p. 126. A obra de Dibelius, em grande parte,

terminou a busca por fontes exclusivamente escritas para Atos, preferindo descrever Lucas como um

autor criativo (Neil, Acts, p. 24).

65
Haenchen, Acts, p. 86.

66
Fitzmyer, Acts, p. 85-88.

67
Veja a discussão da autoria do Evangelho de Lucas no cap. 6.

767
68
Uma vez que ele esteve fortemente conectado ao Sinédrio, Paulo poderia até mesmo ter sido a

fonte dos discursos e acontecimentos nos quais era impossível para Lucas ou para os primeiros

cristãos estar presentes, tal como o discurso de Gamaliel proferido no Sinédrio (At 5.35-39) ou o

discurso e apedrejamento de Estevão (At 7).

69
Hemer, Book of Acts in the Setting of Hellenistic History, p. 351. Cf. o tratamento de S. J.

Kistemaker, que mostra que Pedro e Paulo falaram em termos familiares para o Pedro e Paulo fora de

Atos, mas não disponível a Lucas na época da escrita (An Exposition of the Acts of the Apostles

[Grand Rapids: Baker, 2002], p. 9-12).

70
Hemer, Book of Acts in the Setting of Hellenistic History, p. 356-62.

71
Comentaristas estruturam o livro de maneiras um pouco diferentes. A Tabela 8.2 reproduz de

forma simplificada a estrutura de Bruce, Acts, vii-xiv; e D. L. Bock, Acts, BECNT (Grand Rapids:

Baker, 2007), vii-viii. Para outras estruturas, veja Marshall, Acts, p. 51-54; J. R. W. Stott, The Spirit,

the Church, and the World: The Message of Acts (Downers Grove: InterVarsity, 1990), p. 3-4; e

Larkin, Acts, p. 34-36.

72
Alguns poucos títulos no esboço abaixo são emprestados do livro de H. A. Kent Jr., Jerusalem

to Rome: Studies in Acts (Grand Rapids: Baker, 1972), p. 7.

73
As seguintes preocupações podem ser levantadas: (1) O mandamento de Jesus era que os

apóstolos esperassem até o derramamento do Espírito; a iniciativa de Pedro de substituir Judas parece

violar esse mandamento; (2) o lançamento de sortes é um modo de decisão do AT, dificilmente

normativo para a época do NT; (3) após sua seleção, nada mais se ouve de Matias na narrativa de

Atos; (4) em vez disso, Lucas narrou a seleção de Paulo por Cristo em Atos 9, aparentemente como o

décimo segundo apóstolo e substituto de Judas (embora esse ponto não tenha sido afirmado de forma

explícita); (5) Pedro e os demais apóstolos não possuíam o Espírito neste momento anterior ao

derramamento do Espírito em Pentecostes; (6) a citação por Pedro de duas passagens do AT em Atos

768
2.20 é uma prova um tanto duvidosa de que os discípulos realmente precisavam escolher um

substituto para Judas.

74
Isso está implícito pela força da palavra “e” (kai) no v. 19.

75
Veja os ensaios em “Part I: The Salvation of God”, em: I. H. Marshall; D. Peterson, orgs.,

Witness to the Gospel: The Theology of Acts (Grand Rapids: Eerdmans, 1998). D. Peterson (ibid., p.

523) fala da “centralidade da teologia da salvação” em Lucas-Atos.

76
Como proposto por H. Conzelmann, The Theology of St. Luke (Philadelphia: Fortress, 1961),

p. 137-69.

77
Veja F. Thielman, Theology of the New Testament: A Canonical and Synthetic Approach

(Grand Rapids: Zondervan, 2005), p. 113-14.

78
A. J. Köstenberger; P. T. O’Brien, Salvation to the Ends of the Earth, NSBT 11 (Downers

Grove: InterVarsity, 2001), p. 157.

79
Todas as citações com exceção de duas estão nos capítulos 1 a 15. As exceções se encontram

em 23.5 e 28.26,27.

80
Veja J. T. Sanders, The Jews in Luke-Acts (Philadelphia: Fortress, 1987).

81
Thielman, Theology of the New Testament, p. 133.

82
Poucas vezes em Atos o próprio Senhor Jesus aparece e comunica (1.4-8; 7.56; 9.1-18; e

23.11), embora essas ocasiões dificilmente possam ser separadas do ministério do Espírito Santo.

83
Embora Lucas claramente tenha entendido que o Espírito estava envolvido na redação do AT

(p. ex., algumas passagens do AT são identificadas como sendo do Espírito Santo: 1.16; 4.25,26;

28.25), a recepção do Espírito é claramente algo escatológico.

769
84
Este é um grande contraste com a compreensão de Conzelmann de que Jesus era o “tempo

intermediário”. A apresentação de Lucas da ressurreição e exaltação de Jesus não é uma correção

escatológica de uma profecia incorreta, mas uma parte integral do plano de Deus.

85
Veja o excelente tratamento em Thielman, Theology of the New Testament, p. 123-24.

770
CAPÍTULO 9

Paulo: o homem e sua mensagem

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão ser capazes de listar várias
das citações de Paulo e alusões aos ensinamentos de Jesus. Eles deverão
estar preparados para descrever os três principais pontos de vista históricos
com relação a Paulo e a lei incluindo o Escolasticismo, o Luteranismo, e a
Nova Perspectiva. Eles deverão saber as principais datas associadas à vida
de Paulo, incluindo a sua conversão, viagens missionárias, prisões e morte.
Conhecimentos intermediários: além do domínio dos conteúdos
essenciais identificados no Conhecimento básico, os estudantes deverão ser
capazes de apresentar evidências para refutar a alegação de que Paulo
estava desinteressado no Jesus histórico. Eles deverão ser capazes de
explicar os três grandes desafios para a descrição de Sanders da visão
judaica da salvação no primeiro século. Também deverão saber as datas
aproximadas e as ocasiões de cada uma das cartas de Paulo.
Conhecimentos avançados: além de domínio dos conteúdos essenciais
identificadas nos itens Conhecimento básico e Conhecimento intermediário
mencionado acima, os estudantes deverão ser capazes de dar um breve

771
panorama da história do debate sobre a relação da teologia de Paulo com o
ensino de Jesus. Eles deverão ser capazes de descrever as adaptações do
“Nova Perspectiva em Paulo” por J. D. G. Dunn e N. T. Wright.
Finalmente, eles deverão estar preparados para identificar e explicar
referências importantes fora da Bíblia que ajudam no estabelecimento de
uma cronologia paulina.

INTRODUÇÃO

Não se pode dominar o conteúdo do NT e ignorar o apóstolo Paulo.


Depois de encontrar o Jesus ressurreto no caminho de Damasco, Saulo de
Tarso se tornou o ilustre missionário, teólogo e escritor da igreja primitiva.1
Ele foi uma figura central tanto no NT quanto na história do cristianismo.

772
Ele escreveu 13 cartas que representam quase um quarto do NT.
Aproximadamente 16 capítulos do livro de Atos (13 a 28) têm o foco em
seu trabalho missionário, descrevendo-o como o missionário mais eficiente
em toda a história. Em consequência, Paulo foi o autor ou assunto de quase
um terço do NT e o intérprete mais influente dos ensinamentos de Cristo e
da importância de sua vida, morte e ressurreição. Este capítulo introduz sua
mensagem e importantes debates atuais sobre a teologia e importância deste
grande apóstolo.

SEGUIDOR DE JESUS OU FUNDADOR DO


CRISTIANISMO?
A maioria dos leitores do NT automaticamente assume que Jesus foi o
fundador do cristianismo e que Paulo foi um fiel seguidor de Jesus que
propagou seus ensinamentos por todo o mundo. No entanto, recentes
estudos sobre o NT têm frequentemente contestado essa visão tradicional.
Alguns intérpretes afirmam que Paulo foi o verdadeiro fundador do
movimento cristão ao introduzir novas ideias e ênfases na fé cristã que ele
essencialmente abandonou a religião original de Jesus de Nazaré.2

Uma Breve História do Debate


Um dos primeiros estudiosos modernos importantes a defender uma forte
dicotomia entre os ensinamentos de Jesus e Paulo foi F. C. Baur, cujo
trabalho apareceu pela primeira vez em 1845.3 Baur insistiu em que os
ensinamentos de Paulo mostram diferenças irreconciliáveis com os
ensinamentos dos apóstolos de Jerusalém e das igrejas palestinas que foram
influenciadas e procuraram ser fiéis aos ensinamentos originais de Jesus.

773
Paulo conscientemente se afastou da tradição de Jesus, especialmente na
sua cristologia e seu ponto de vista sobre a validade da lei. A tese de Baur
produziu um vívido debate. Vários estudiosos na Alemanha e na França
alegaram que existiam diferenças significativas entre os ensinamentos de
Jesus e os de Paulo. Estudiosos radicais começaram a apelar para um
abandono do cristianismo paulino e um retorno aos ensinamentos simples
de Jesus.4
No início do século XX, W. Wrede, um influente estudioso alemão do
NT, argumentou que o pensamento de Paulo foi influenciado por
expectativas messiânicas apocalípticas judaicas e não por Jesus. Paulo foi
um teólogo independente, de livre-pensamento, a quem Wrede chamou de
“o segundo fundador do cristianismo”.5 Wrede alegou que Paulo via a vida
e os ensinamentos de Jesus como insignificantes. Tudo o que importava
para Paulo era a morte e ressurreição de Jesus. O Cristo ressurreto que
apareceu a Paulo na estrada de Damasco, e não o Jesus terreno que
caminhou pelas poeirentas estradas da Galileia, foi o foco dos ensinamentos
de Paulo. Wrede argumentou que os ensinamentos de Paulo exerceram
sobre o cristianismo “a mais forte — não a melhor — influência”, pela que
ele ecoou o slogan anterior dos críticos radicais que clamavam por um
“retorno de Paulo para Jesus”.6 Vários anos mais tarde, W. Bousset alegou
que Paulo tinha sido influenciado pela popular religião helenística para
transformar Jesus de um profeta galileu em um deus cultíco, uma noção
sem precedentes nos ensinamentos de Jesus ou das primeiras comunidades
palestinas de fiéis.7
As teorias de Wrede receberam uma resposta contundente dos teólogos
liberais protestantes na Alemanha e dos estudiosos mais conservadores
britânicos e americanos.8 Esses estudiosos alegaram que Paulo não fez

774
muitas referências explícitas aos ensinamentos de Jesus porque ele havia
enfatizado a mensagem de Jesus na sua pregação missionária inicial e
assumiu a familiaridade dos seus leitores com esses ensinamentos. Além
disso, as diferenças teológicas nos ensinamentos de Jesus e de Paulo tinham
sido completamente exageradas pelos críticos. Embora os ensinamentos de
Paulo tenham desenvolvido os de Jesus, Paulo não contradisse Jesus. Os
desenvolvimentos dos ensinamentos originais de Jesus por Paulo estavam
fundamentados em uma interpretação legítima da mensagem de Jesus e de
modo algum perverteu essa mensagem.
R. Bultmann criticou de forma severa as respostas de estudiosos como J.
G. Machen a Wrede. Bultmann viu tão pouca continuidade histórica entre
Jesus e Paulo, que ele pôde afirmar que “o ensinamento de Jesus é — para
todos os objetivos e propósitos — irrelevante para Paulo”.9 Bultmann
observou que Paulo raramente fez alusão ou citou os ensinamentos de Jesus
e que essas citações e alusões eram geralmente relacionadas à ética e não às
questões teológicas. Essa falta de referência à vida e ensinamentos de Jesus
demonstrou que Paulo estava preocupado apenas com as verdades
teológicas estabelecidas pela crucificação e ressurreição de Jesus e com as
implicações desses eventos para a compreensão da identidade de Jesus
como o Filho preexistente de Deus e Senhor. No entanto, Bultmann viu uma
significativa consistência teológica entre os ensinamentos de Jesus e de
Paulo. Jesus e Paulo atacaram o legalismo judaico e o pecado da
autodependência para a salvação. Ele até mesmo observou uma coerência
material entre as cristologias de Jesus e de Paulo.10 Bultmann argumentou
que o clamor radical de estudiosos influenciados por Wrede, “retorno de
Paulo para Jesus”, era um absurdo, uma vez que só se podia descobrir Jesus
através de Paulo.11

775
Nos últimos 50 anos, o tema da relação de Paulo com Jesus não recebeu
a atenção que merecia. J. M. G. Barclay identificou vários fatores que
levam a esta negligência: (1) uma separação de caminhos entre a teologia e
o estudo do NT; (2) uma incerteza generalizada sobre o significado das
mensagens de Jesus e de Paulo; e (3) a oposição geral nos estudos do NT às
tentativas de se desenvolver uma síntese das teologias de escritores do NT e
das primeiras figuras cristãs e, particularmente, de Jesus e de Paulo.12 No
entanto, vários estudiosos fizeram contribuições importantes para um
entendimento da relação do pensamento Paulino com a mensagem de Jesus.
Em 1971, D. L. Dungan cuidadosamente analisou o apelo de Paulo aos
ditos de Jesus em 1Coríntios e sugeriu que os coríntios já estavam
familiarizados com esse material.13 Isso confirmou o ponto de vista dos
estudiosos anteriores que responderam a Wrede argumentando que as
referências aos ensinamentos de Jesus eram proeminentes na pregação
missionária de Paulo. A pesquisa de Dungan incentivou outros estudiosos,
tais como D. Wenham e D. C. Allison Jr., a explorar a possível dependência
que o ensino escatológico de Paulo tinha dos discursos escatológicos de
Jesus.14 M. Thompson cuidadosamente definiu os termos, algumas vezes
nebulosos, “citação”, “alusão” e “eco” para auxiliar nas discussões sobre a
dependência paulina dos ensinamentos de Jesus e desenvolveu critérios
razoáveis para a identificação de cada categoria nas cartas de Paulo.15 Nas
duas últimas décadas do século XX, estudiosos como A. J. M. Wedderburn,
B. Witherington, V. Furnish e D. Wenham publicaram importantes estudos
das relações entre Paulo e Jesus.16 Esses trabalhos defendem que o
pensamento paulino teve uma dependência mais extensa dos ensinamentos
de Jesus do que geralmente tem sido aceito pelos estudiosos desde Wrede.

776
Apesar da nova ênfase no final do século XX na coerência dos
ensinamentos de Paulo com os ensinamentos de Jesus, alguns estudiosos
continuam a retratar Paulo como o verdadeiro fundador do cristianismo que
perverteu ou ignorou os ensinamentos de Jesus. A defesa acadêmica mais
importante deste ponto de vista nos últimos anos foi o livro de H. Maccoby,
The Mythmaker: Paul and the Invention of Christianity, que foi publicado
em 1986. Maccoby reviveu os antigos argumentos da escola de História das
Religiões que teve seu auge no início dos anos 1900 e alegou que Paulo
inventou os mitos da divindade e da morte sacrificial de Jesus sob a
influência das religiões de mistério gregas. Ele via Paulo como o único
responsável por injetar no cristianismo os mais ofensivos elementos da fé,
tais como atitudes negativas em relação às mulheres e à sexualidade, o
antissemitismo, tendências autoritárias e sentimentos pró-escravistas.17
Muitos leitores modernos e especialmente pós-modernos ficaram ofendidos
por elementos percebidos dos ensinamentos de Paulo e ficavam revivendo o
slogan “retorno de Paulo para Jesus”. Como Wenham observou:

Não são apenas os estudiosos que defendem isso. Muitos cristãos comuns, como também os
não cristãos, acharam Paulo extremamente difícil e sentem que o cristianismo seria muito
melhor sem alguns dos dogmas que ele postulou (p. ex., a divindade de Jesus e a morte de
Jesus como um sacrifício de sangue), para não mencionar os seus ensinamentos em relação
ao sexo, mulheres e escravos. Eles ficariam muito felizes se pudéssemos manter Jesus, mas
discretamente perdêssemos Paulo.18

Evidência da Falta de Preocupação de Paulo Com


os Ensinamentos e Vida de Jesus
A escassez de referências à vida terrena de Jesus nas cartas de Paulo
convenceu muitos estudiosos de que Paulo estava despreocupado com o

777
Jesus da história. Assim, R. Bultmann apelou para 2Coríntios 5.16, que
afirma: “Assim, daqui por diante nós não conheceremos ninguém de uma
forma puramente humana. E ainda que tenhamos conhecido Cristo de uma
forma puramente humana, ainda assim agora nós não o conhecemos mais
desse modo”. Bultmann interpretou o versículo como uma indicação de que
Paulo já tivera interesse no Jesus histórico, mas que, após sua conversão,
Paulo estava preocupado apenas com a morte e ressurreição de Jesus, em
vez de com a sua vida.19
No entanto, como competentes críticas subsequentes por estudiosos tais
como M. J. Harris ou N.T. Wright revelaram, a interpretação de Bultmann
do versículo era falha em dois pontos cruciais. Primeiro, Bultmann
considerou a expressão “segundo a carne” como uma oração adjetiva
modificando “Cristo”, embora a sentença anterior identifique claramente a
oração como adverbial, modificando “conhecido”. Segundo, Bultmann
negligenciou a importância clara do Jesus histórico em 2Coríntios 4 e 5 e
particularmente em 2Coríntios 4.7-15. Assim, no contexto, a afirmação
significa que Paulo estava “repudiando (no v. 16b, c) como totalmente
errônea sua sincera, ainda que superficial, estima pré-conversão de Jesus
como um enganador messiânico desorientado, um herege crucificado, cujos
seguidores devem ser extirpados (At 9.1,2; 26.9-11), pois passou a
reconhecer o Nazareno como o Messias divinamente escolhido, cuja morte
sob maldição divina (Gl 3.13; veja Dt 21.23), na verdade, trouxe vida (v.
14,15)”.20
Embora, como já foi visto, a interpretação de Bultmann desse texto
tenha sido habilmente refutada, a influência de Bultmann ainda é vista e
sentida naqueles que defendem uma aguda dicotomia entre o Cristo de
Paulo e o Jesus da história.

778
Os estudiosos apontam também para a escassez de citações diretas de
Jesus nos escritos de Paulo. Muitos estudiosos veem um apelo direto aos
ensinamentos de Jesus nas cartas de Paulo apenas em 1Coríntios 7.10 (que
se refere à tradição preservada em Mt 5.27,28; 19.3-9; Mc 10.2-12; Lc
16.18) e 1Coríntios 9.14 (que se refere à tradição preservada em Mt 10.10;
Lc 10.7), ou seja, apenas duas referências em uma única carta. Que Paulo
aqui faz alusão à tradição Jesus é difícil de questionar, uma vez que ele
introduz as declarações como mandamentos do Senhor e uma vez que seu
ensino faz paralelo estreito com o ensino de Jesus tanto linguisticamente
quanto tematicamente.
Alguns estudiosos veem até mesmo essas duas claras alusões aos
ensinamentos de Jesus como evidência da baixa estima que Paulo tinha da
tradição de Jesus uma vez que Paulo citou esses ensinamentos de Jesus de
maneira bem vaga e parecia não ter nenhuma preocupação em preservar as
palavras exatas de Jesus. Além disso, em 1Coríntios 9.14 Paulo citou
ensinamento de Jesus de que aqueles que anunciam o evangelho devem
receber apoio financeiro para suas obras no contexto de uma explicação do
porquê ele, pessoalmente, recusava esse apoio. Assim, os críticos acusam
Paulo de praticar o oposto do que Jesus realmente ordenou!
Por outro lado, as referências de Paulo aos ensinamentos de Jesus
revelam o reconhecimento de Paulo da natureza autoritativa dos
pronunciamentos de Jesus. A admissão de Paulo em 1Coríntios 7.12 e
particularmente 7.25 (“Quanto às virgens, não tenho mandamento do
Senhor. Mas dou uma opinião como alguém que, pela misericórdia do
Senhor, tem sido fiel”) demonstra a autoridade especial atribuída aos
ensinamentos de Jesus na visão de Paulo e da igreja primitiva. De forma
semelhante, a prática de Paulo de depender financeiramente de si mesmo

779
não envolvia a dispensa do ensinamento de Jesus, como alguns sugeriram.
As palavras de Jesus: “o trabalhador é digno do seu salário” (citado em
1Tm 5.18), embora mostrem que o ministro merece suporte e que os
beneficiários do ministério são obrigados a oferecer esse suporte, não são o
bastante para expressar uma ordem que faria da prática de Paulo uma
prática desobediente. Paulo provavelmente via o mandamento ao qual ele
fez referência em 1Coríntios 9.14 como um mandamento para os
beneficiários do ministério do evangelho, e não para o ministro do
evangelho em si. Os ensinamentos de Jesus estabeleceram o “direito” de
Paulo a esse suporte, mas não exigiam que ele realmente o recebesse,
especialmente se este o tornasse vulnerável à acusação de que seu
ministério tinha motivações financeiras.21
Os estudiosos que veem pouca relação entre Paulo e Jesus também
apontam para as doutrinas divergentes dos dois mestres. Jesus, por
exemplo, afirmou a lei do AT, mas Paulo a desacreditou. Jesus via a si
mesmo como um profeta, mas Paulo o transformou em uma divindade
cúltica a ser adorada. O reino de Deus constituía o foco central da pregação
de Jesus, mas a linguagem do reino está quase que completamente ausente
das cartas de Paulo. Em resposta, outros estudiosos salientaram que grande
parte da tensão entre os ensinamentos de Jesus e os de Paulo resultam da
interpretação errônea de Jesus, Paulo, ou de ambos. Os ensinamentos de
Jesus e a experiência de Paulo na estrada de Damasco definiram os
contornos da teologia de Paulo. Paulo interpretou fielmente os
ensinamentos de Jesus a fim de lidar com os desafios teológicos e éticos das
igrejas para as quais ele escreveu.

780
Evidência da Preocupação de Paulo com os
Ensinamentos e Vida de Jesus
Há uma importante evidência para a dependência de Paulo dos
ensinamentos de Jesus. Primeiro, as alusões aos ensinamentos de Jesus nas
cartas de Paulo são muito mais extensas e frequentes do que muitos
estudiosos têm reconhecido. Identificar alusões reais e intencionais aos
ensinamentos de Jesus nas cartas de Paulo pode ser difícil. No entanto, as
alusões são prováveis quando (1) Paulo usou um indicador da tradição
explícito, como “o Senhor ordenou” ou “palavra do Senhor”; (2) a alusão
suspeita contém ecos linguísticos ou temáticos dos Evangelhos; ou (3) uma
série de várias alusões possíveis aparece em um contexto particular.
Uma investigação feita por D. Wenham concluiu que “há evidências em
massa do conhecimento paulino das tradições de Jesus”.22 Wenham
categorizou alusões em Paulo aos dizeres de Jesus como altamente
prováveis, prováveis ou plausíveis. O gráfico a seguir resume algumas das
mais importantes descobertas de Wenham.

781
Tabela 9.1: Alusões Altamente Prováveis a Jesus nas Cartas de Paulo
Ditos e Atos de Jesus Alusões de Paulo
Última Ceia (Mt 26.26-30; Mc 14.22-26; 1Co 11.23-26
esp. Lc 22.14-23)
Narrativas da ressurreição (Lc 24.36-49; Jo 1Co 15.3-5, 35-57; Fp 3.21
20.19-29; 21.1-14)
Divórcio (Mc 10.1-12; Mt 19.1-12) 1Co 7.10,11
Suporte financeiro dos pregadores (Mt 1Co 9.14; 1Tm 5.18
10.10; Lc 10.7)
Ensino escatológico (Mt 24; Mc 13; esp. Lc 2Ts 2.1-12
21)
Parábolas escatológicas: 1Ts 4.1 a 5.11
O Ladrão na noite (Mt 24.43, 44)
O Servo vigilante (Lc 12.36-38)
O Administrador (Mt 24.45-51; Lc 12.42-
48)
As Virgens sábias e tolas (Mt 25.1-13)
A Fé que move montanha (Mt 17.20) 1Co 13.2
A Não retaliação (Mt 5.38-42; Lc 6.29, 30) Rm 12.14
Amor e a lei (Mt 22.37-40) Rm 13.8-10; Gl 5.14
Nada impuro (Mt 15.10-20; Mc 7.17-23) Rm 14.14
Aba (Mc 14.36) Rm 8.15; Gl 4.6

Wenham também defendeu a probabilidade do conhecimento de Paulo


de muitos outros ditos e eventos, incluindo o batismo de Jesus por João
Batista (Mt 3.13-17 e paralelos); os ditos de Jesus sobre tomar a cruz (Mt
16.24-26 e paralelas etc.); os ditos sobre beber do seu cálice e compartilhar
seu batismo (Mc 10.38); o comissionamento de Pedro (Jo 21.15-19); a
transfiguração de Jesus (Mt 17.1-13 e paralelos); a história da

782
competitividade de Tiago e João (Mt 20.20-24); o dito do resgate (Mt 20.28
// Mc 10.45); a Parábola do Semeador (Mt 13.1-9, 18-23 e paralelos); a
discussão sobre o pagamento de impostos (Mt 22.15-22); ensino sobre a paz
(Mt 5.9); e a instrução sobre arrancar e jogar fora membros do corpo que
fazem tropeçar (Mt 5.29,30). Wenham defendeu a plausibilidade do
conhecimento de Paulo de outros detalhes registrados nos Evangelhos, tais
como as tradições do nascimento de Jesus (Mt 1.18-25; Lc 2.1-20); da
tentação (Mt 4.1-11 e paralelos); o Sermão do Monte (Mt 5 a 7); o seu uso
do título “Filho do Homem” (p. ex., Jo 1.51); e a Parábola do Filho Pródigo
(Lc 15.11-32). Embora o espaço não permita uma discussão das evidências
contextuais e linguísticas que dão suporte à probabilidade e à plausibilidade
dessas alusões, a evidência para muitas das alusões que Wenham
considerou altamente provável ou provável é convincente.
Os dados recolhidos por Wenham sugerem que Paulo tinha um amplo
conhecimento da vida de Jesus. Wenham observou:

A grande quantidade de evidências reunidas é impressionante. Na verdade, se Paulo conhecia


todas as tradições do evangelho que temos observado, então ele conhecia a maior parte das
histórias de Jesus como os Evangelhos as apresentam (pelo menos no conteúdo, se não na
ordem) — da infância de Jesus ao seu batismo, seu ministério, e sobre a sua morte,
ressurreição e ascensão.23

A evidência apresentada por Wenham foi considerada convincente por


uma série de estudiosos que são muito bem versados tanto nos
ensinamentos de Paulo quanto nos ditos de Jesus nos Evangelhos. R.
Bauckham comentou: “As alusões às tradições de Jesus nos escritos de
Paulo são, na verdade, muito mais numerosas do que um mais antigo
estereótipo de Paulo permitia”.24 De modo semelhante, depois de comparar
uma série de exemplos de alusões nos escritos de Paulo com o ensino de
Jesus, J. D. G. Dunn concluiu:

783
Em suma, uma vez aceita a probabilidade de que Paulo e as igrejas para as quais ele escreveu
compartilhavam uma boa dose da tradição comum de Jesus, familiar o bastante em ambos os
lados para ser uma questão de alusão e referência implícita, a probabilidade de que Paulo
teria naturalmente e sem invenção se referido a essa tradição apenas dessa maneira se torna
forte. Contra esse plausível pano de fundo, várias passagens em Paulo ganham iluminação e
ressonância adicionais. E a conclusão torna-se cada vez mais convincente de que o
conhecimento e o interesse pela vida e ministério de Jesus era uma parte integral de sua
teologia, ainda que referido apenas sotto voce [i. e., num sussurro] em sua teologia escrita.25

No entanto, nem todas as alusões paulinas à tradição de Jesus


defendidas por Wenham são igualmente convincentes. O processo de
identificar alusões muitas vezes é subjetivo, apesar da tentativa de Wenham
de objetivar o processo tanto quanto possível ao apontar para características
textuais específicas. No entanto, Wenham demonstrou que o conhecimento
que Paulo tinha dos ensinamentos de Jesus se estendia muito além de
1Coríntios 7.10 e 9.14 e que a continuidade entre Jesus e Paulo é
significativamente maior do que muitos estudos recentes do NT
afirmaram.26
Não apenas as alusões verbais aos ensinamentos de Jesus são mais
frequentes em Paulo do que muitos estudiosos assumiram, mas as
semelhanças teológicas entre as duas figuras também são muito maiores do
que muitos reconhecem. Embora alguns acadêmicos tenham argumentado
que Jesus via a si mesmo como um mero profeta mortal ou sábio a quem
Paulo divinizou sob a influência das religiões de mistério pagãs, pesquisas
recentes demonstraram que a compreensão que Jesus tinha de si mesmo era
bem semelhante à visão que Paulo tinha de Jesus. Por exemplo, muitos
estudiosos hoje acreditam que uma fonte (identificada como “Q”) que foi
utilizado por Mateus e Lucas foi provavelmente a mais antiga fonte dos
Evangelhos.27 Vários estudiosos têm sugerido que “Q” reflete uma baixa

784
cristologia, na qual Jesus é apenas um sábio inspirador. No entanto, L.
Hurtado argumentou:

Em vez disso, Q reflete uma visão muito elevada do papel, poderes e pessoa de Jesus. Ele
está diretamente associado com Deus em funções escatológicas cruciais e tem autoridade
inquestionável na vida dos seus seguidores. Ele é, de forma única, dotado do Espírito de
Deus, e em suas poderosas atividades que incluem cura, exorcismo, e outros milagres
notáveis, bem como em sua proclamação, o reino de Deus alcança expressão escatológica.
Através dele, seus seguidores são privilegiados de participar da declaração e demonstração
do reino de Deus, e ele é paradigmático para todas as suas atividades. Eles sofrem oposição
justamente por causa dele, devido a ele; ele lhes promete uma justificação espetacular que
envolverá partilhar seu reino.28

O mais antigo Evangelho canônico, o Evangelho de Marcos, também


reflete uma cristologia muito elevada. Marcos retrata a vinda de Jesus como
o cumprimento das profecias do AT sobre a vinda de Yahweh (Mc 1.2,3),
identificando Jesus como Deus. Várias cenas da vida de Jesus em Marcos
podem ser descritas como “epifânicas” pois ecoam as descrições dos atos de
Yahweh no AT. Por exemplo, em Marcos 6.45-52 Jesus caminhou sobre as
águas, um ato do qual só Deus é capaz de acordo com Jó 9.8. Ele se
identificou com as palavras “eu sou” (egō eimi) de uma forma que lembra a
autoidentificação de Yahweh em Êxodo 3. J. Marcus corretamente afirmou
que “o impacto avassalador feito por nossa narrativa é uma impressão da
divindade de Jesus”.29 Além disso, “Filho do Homem”, o título preferido de
Jesus, constitui uma clara alusão a Daniel 7.13,14 e descreve Jesus como
um rei divino de origem celestial que vai reinar sobre um reino eterno e
universal.30 Em consequência, as afirmações de Paulo acerca da existência
eterna e da divindade de Jesus são coerentes com as descrições de Jesus no
material do mais antigo dos Evangelhos e estão intimamente associados
com a própria autocompreensão de Jesus.

785
Continuidade e Desenvolvimento
A estrita dicotomia “fundador” versus “seguidor”, na qual o debate sobre o
relacionamento de Paulo com Jesus tem sido frequentemente moldado,
desnecessariamente faz com que o intérprete gravite em um dos dois
extremos. A interpretação mais razoável dos dados sugere que Paulo tanto
respeitava quanto se baseou nos ensinamentos de Jesus, mas sentia-se livre
para desenvolver e aumentar esses ensinamentos baseados na sua própria
reflexão sobre o significado de sua experiência de estrada de Damasco e no
seu estudo do AT. Como em um estudo comparativo dos quatro Evangelhos,
também aqui, na comparação dos ensinamentos de Jesus e Paulo, não se
deve supor que todas as diferenças equivalem a discordâncias.
Vários fatores importantes na missão de Paulo exigiam que ele
desenvolvesse e modificasse a mensagem de Jesus: (1) a Paixão,
ressurreição e glorificação de Jesus exigiram ênfase no Cristo exaltado; (2)
a morte e exaltação do Messias e o derramamento do Espírito introduziram
uma nova era escatológica e estabeleceram uma nova aliança entre Deus e
seu povo; e (3) as diferenças entre a audiência judaica de Jesus e a gentílica
de Paulo exigiram que Paulo utilizasse idiomas e formas de pensamentos
31
diferentes a fim de se relacionar com seu próprio contexto cultural. Depois
de uma extensa comparação das teologias de Paulo e de Jesus, que destacou
mais diferenças do que a pesquisa de Wenham, Barclay concluiu:

A questão central é se em essência a teologia de Paulo é tanto harmoniosa quanto um


desenvolvimento legítimo da mensagem de Jesus. Como nós já vimos, essa questão não pode
ser respondida simplesmente por descobrir ou negar a presença de ecos das palavras de Jesus
em Paulo. Essa questão, que se encontra no nível da continuidade histórica entre Jesus e
Paulo, não pode, por si mesma, determinar se a teologia de Paulo é congruente com a de
Jesus. Mas há evidências suficientes para demonstrar que, seja conscientemente ou não,

786
Paulo desenvolveu as ideias centrais do ensino de Jesus e o significado central de sua vida e
morte de uma forma que realmente representasse sua dinâmica e plena importância.32

Conclusão
Embora as contribuições de Paulo à fé cristã não devam ser subestimadas,
Paulo deve ser reconhecido como um fiel seguidor de Jesus Cristo, e não
como o fundador de uma forma de cristianismo que se desviou
drasticamente dos ensinamentos de Jesus. Os ensinamentos de Paulo se
originaram de sua reflexão sobre a vida e os ensinamentos de Jesus, de seus
estudos do AT e de sua reflexão sobre a importância de sua experiência na
estrada de Damasco.33 Embora os temas principais de sua teologia tenham
suas raízes na mensagem do próprio Jesus, Paulo foi necessariamente um
inovador que se debruçou sobre as Escrituras Hebraicas enquanto ele
abordava os desafios exclusivos criados pelas igrejas que ele influenciou.
O fato de a missão de Paulo ser orientada principalmente para
congregações gentílicas enquanto o ministério de Jesus tinha como foco
principal os judeus palestinos significava que Paulo tinha muitas vezes que
ir para trás, bem além de Jesus, de volta ao AT para compreender as
implicações da morte, do sepultamento e da ressurreição de Jesus para sua
audiência. No entanto, as diferenças entre o ensinamento de Jesus e as
cartas de Paulo são como as diferenças entre a semente e a planta madura, a
fundação e a superestrutura construída sobre ela. Nas cartas de Paulo às
igrejas, não só se ouve a voz do Espírito que inspirou as Escrituras do AT,
mas também a voz de Jesus, Salvador e Senhor de Paulo.

A “NOVA PERSPECTIVA” SOBRE PAULO

787
No último quarto do século XX ocorreu uma mudança de paradigma na
interpretação das cartas e teologia de Paulo. Desde a Reforma, os estudiosos
protestantes e alguns importantes estudiosos católicos viam as cartas de
Paulo como uma polêmica contra o legalismo judaico que insistia em que
os indivíduos poderiam salvar a si mesmos através de seus esforços em
cumprir a Lei do Antigo Testamento. Paulo rebateu essa teologia arrogante
ao afirmar que a salvação era pela graça somente por meio da fé. Desde a
publicação em 1977 da obra de E. P. Sanders intitulada Paul and
Palestinian Judaism [Paulo e o judaísmo palestino], muitos estudiosos
concluíram que esse legalismo de fato não existiu no judaísmo do primeiro
século. Essa “nova perspectiva” sobre o judaísmo do primeiro século exigiu
um novo exame do evangelho de Paulo, isto é, seus ensinamentos em
relação à lei, boas obras e justificação. Por esta razão é útil fornecer um
breve resumo da história dos estudos sobre esta questão.34

A Perspectiva Escolástica
O escolasticismo foi um movimento filosófico que foi dominante na
civilização cristã ocidental do século IX ao século XIV. Ele procurou
conciliar os ensinamentos dos filósofos clássicos com a teologia cristã.35
Um dos mais importantes escolásticos foi Tomás de Aquino. Ele dedicou
muitos de seus anos a escrever uma enorme obra chamada Summa
Theologica, na qual ele examinou os temas clássicos da teologia cristã à luz
dos ensinamentos de Aristóteles.36
Tomás de Aquino ensinava que o ser humano pode receber a vida eterna
somente quando Deus graciosamente transforma a sua natureza. A natureza
humana é pecaminosa e qualitativamente tão diferente da natureza de Deus,

788
que os humanos são incapazes de agradar a Deus.37 A lei do AT era incapaz
de produzir a conduta necessária para satisfazer a Deus porque era impedida
por esta natureza humana caída.38 Deus graciosamente deu a nova lei (a
mensagem do evangelho e a lei escrita no coração) e enviou o Espírito
Santo para transformar os indivíduos.39 Essa transformação possibilitou que
as pessoas fizessem o que era certo e bom, não por medo do castigo, mas
pelo seu próprio desejo de amar e agradar ao Senhor, resultando em vida
eterna.40 Aquino enfatizou que indivíduos não mereciam a graça que os
transformou. Ele insistiu, no entanto, que uma vez eles foram transformados
por essa graça, eles realmente merecem a vida eterna pelas boas ações por
eles realizadas. Ele também ensinava que as boas obras de uma pessoa
podem fazer com que outra pessoa possa também receber a vida eterna.41

A Perspectiva Luterana
Martinho Lutero, um monge agostiniano do início do século XVI, viveu
uma existência miserável sob a influência da teologia escolástica. Lutero
era atormentado pelo crescente temor que nem suas próprias boas obras,
nem os méritos da sua ordem monástica eram suficientes para salvá-lo da
ira do Juiz celestial. Contudo, enquanto Lutero estava lecionando sobre as
cartas de Paulo na Universidade de Wittenberg, ele ficou fascinado pelas
cartas aos Romanos e aos Gálatas e ao conceito de “justiça de Deus”
retratado ali. Lutero eventualmente chegou à conclusão de que a “justiça
ativa” de um indivíduo era absolutamente incapaz de salvá-lo da punição
eterna.
Em vez disso, a salvação vinha através de “justiça passiva”, uma justiça
fornecida por Deus que era imputada ao pecador por meio da fé em Jesus

789
Cristo. Lutero argumentou que a lei nunca foi destinada a ser um meio de
salvação. O papel da lei era aterrorizar o pecador de modo que ele se
desesperasse com a sua própria autorretidão e confiasse somente na morte
expiatória de Jesus Cristo para a salvação. Lutero via a lei como tendo
pouca importância para o fiel uma vez que tudo aquilo que permanecia útil
na lei foi escrito no coração do cristão em cumprimento da promessa da
nova aliança.42
Lutero associou intimamente a dependência de boas obras para a
salvação no catolicismo medieval com uma suposta obra de justiça no
judaísmo da época de Paulo. Ele leu referências em Romanos e Gálatas,
como se ele e Paulo discutissem como adversários que afirmavam
essencialmente o mesmo ponto de vista do relacionamento da lei com a
salvação. A hermenêutica que controlava o catolicismo da época de Lutero
e o judaísmo da época de Paulo dominou a exegese protestante das cartas de
Paulo e as discussões da teologia de Paulo nos próximos 400 anos, até que
foi desafiada por alguns estudiosos judeus e protestantes no século XX.
Poucos estudiosos protestantes realizaram um amplo estudo do
judaísmo antigo a fim de determinar se a equação da teologia católica
medieval ao judaísmo era exata. F. Weber produziu um manual intitulado
Jewish Theology on the Basis of the Talmud and Related Writings [Teologia
judaica com base no Talmude e escritos relacionados], cuja versão alemã foi
publicada em 1880. Weber afirmou que o legalismo, o estudo e a busca da
obediência à lei, era a essência do judaísmo talmúdico.43 Weber descreveu a
teologia judaica como descrevendo Deus como um grande lojista que
cuidadosamente registrava a boas e más ações dos indivíduos em um
enorme livro contábil e que punia ou recompensava os indivíduos com vida
eterna ou o tormento eterno com base nesses atos. Intérpretes do NT muitas

790
vezes invocavam o manual de Weber como um auxílio para a compreensão
do judaísmo da época de Paulo, embora o Talmude seja datado de centenas
de anos após a época de Paulo.

A Nova Perspectiva
A descrição que Weber fez do judaísmo rabínico (e, pelo menos
implicitamente, a de Lutero) encontrou vários desafios substanciais. Em
1900, C. G. Montefiore rotulou a obra de Weber como uma caricatura
grosseira do judaísmo rabínico uma vez que os judeus viam a lei como uma
bênção e um prazer, e não como um fardo opressivo.44 Em 1921, G. F.
Moore fez uma crítica ainda mais devastadora da descrição que Weber
havia feito do judaísmo legalista.45 Apesar dessas objeções de estudiosos
rabínicos, tanto judeus quanto não judeus, os intérpretes de Paulo
continuaram a representar o judaísmo do primeiro século como uma versão
mais antiga da visão legalista da salvação pelas obras que Lutero encontrou
no catolicismo romano.
A descrição que Lutero fez do judaísmo reinou até a publicação de Paul
and Palestinian Judaism, de E. P. Sanders, em 1977. O propósito declarado
do livro era destruir a tese defendida e propagada por Weber e outros (em
especial Bousset e Billerbeck) de que o judaísmo do primeiro século era
baseado em obras de justiça legalistas. Apesar de Sanders ter admitido que
o ponto de vista de Weber era defendido pela maioria dos estudiosos do NT,
ele argumentou que o ponto de vista “é baseado em uma maciça perversão e
má compreensão do material”.46 Sanders alegou que a essência do antigo
judaísmo era o que ele chamou de “nomismo pactual”. Ele inicialmente
definiu o nomismo pactual da seguinte forma: “Nomismo pactual é a visão

791
de que o lugar de alguém no plano de Deus é estabelecido com base na
aliança e que a aliança exige como resposta adequada do homem a sua
obediência aos seus mandamentos, proporcionando meio de expiação para a
transgressão”.47 Sanders afirmou claramente que a resposta exigida pela
aliança era a obediência do homem aos seus mandamentos. Mais tarde, ele
esclareceu que a obediência exigida pela aliança era apenas pretendida, mas
não a obediência real. Consequentemente, enquanto o israelita não
renunciasse o direito de Deus de comandar, ele não precisaria não temer um
juízo escatológico no qual Deus examinaria detalhadamente suas ações
individuais. Tal juízo não ocorreria.48
Sanders admitiu que muitos textos judeus antigos parecem afirmar uma
visão na qual a salvação depende de atos pessoais de justiça. No entanto, ele
insistiu que declarações que parecem sugerir que a salvação era alcançada
pelo esforço humano devem, de alguma forma, ser conciliadas com outras
declarações que enfatizam a graça e a misericórdia divina.
Sanders apelou para três importantes evidências para argumentar que o
nomismo pactual não era legalista, mas sim dominado por uma ênfase na
graça divina. Primeiro, Deus estabeleceu sua aliança com os judeus devido
à sua própria eleição graciosa. Segundo, Deus exigiu apenas a intenção de
obedecer à sua lei, e não a obediência real, e os israelitas não precisam
temer um juízo rigoroso que avaliaria ações individuais. Terceiro, Deus
providenciou meios de expiação pela falha na obediência.49
Sanders reconheceu que o judaísmo contestado por Paulo em suas cartas
parecia diferente de seu nomismo pactual. Ele sugeriu que essa distinção
resultava do fato de que Paulo desenvolveu sua visão da lei “da solução
para o problema” e não “do problema para a solução”. Em vez de
reconhecer um problema dentro do judaísmo que Cristo respondeu, Paulo

792
primeiro concluiu que Cristo era a resposta e, em seguida, criou a
necessidade de Cristo ao desenvolver uma visão da função da lei na
salvação da qual nenhum outro judeu do primeiro século compartilhava, ou
seja, uma pessoa deve perfeitamente cumprir a lei, a fim de ser salva por
ela.
A descrição que Sanders fez do antigo judaísmo foi tão amplamente
aceita pelos estudiosos do NT que praticamente se transformou na visão de
consenso. Em sua palestra no Memorial Manson de 1.982, J. D. G. Dunn
cunhou a expressão “Nova Perspectiva” para descrever a visão do judaísmo
do Segundo Templo defendida por Sanders e por seus seguidores.50

Variações da Nova Perspectiva


Os pontos de vista de Sanders foram significativamente modificados,
mesmo por aqueles que abraçam os fundamentos de sua descrição do
judaísmo. N. T. Wright muitas vezes observou que “há tantas versões da
Nova Perspectiva quantas são as pessoas escrevendo sobre ela”.51 Wright e
J. D. G. Dunn são dois importantes estudiosos que adaptaram elementos da
posição de Sanders e adicionaram suas próprias contribuições únicas.52
Dunn aceitou o ponto de vista de Sanders de que a visão Luterana, que
assume que o judaísmo do primeiro século era uma religião dependente das
obras de justiça para a salvação, não é precisa. Mas Dunn contestou a teoria
de Sanders de que a visão da lei que Paulo atacava era de sua própria
criação e não era compartilhada por ninguém no antigo judaísmo.53 De
acordo com Dunn, o verdadeiro oponente de Paulo não foi o legalismo, mas
o exclusivismo judaico. Os judeus acreditavam que somente eles tinham
sido escolhidos por Deus como seu povo da aliança. Eles também viram a

793
lei como um distintivo, um marcador de identidade que os distinguia de
outras pessoas e os identificava como os recipientes da graça de Deus e de
sua bênção especial. Embora a expressão “obras da lei” em textos tais como
Romanos 4.4,5 incluíssem obediência a toda a Torá, a expressão mais
particularmente denotava fidelidade àqueles aspectos da lei que
funcionavam socialmente para separar os judeus dos gentios.
Esses aspectos incluíam especialmente a lei da circuncisão, a lei do
sábado, e as leis sobre purezas e impurezas.54 Dunn ponderou: “Afirmar a
justificação pelas obras da a lei é afirmar que a justificação é somente para
os judeus; é exigir que os gentios fiéis assumam a imagem e as práticas do
povo judeu”.55 Paulo fazia distinção entre “obras da lei” (os atos que
distinguiam os judeus dos gentios) e “boas obras” (atos de justiça). Por esta
razão, Paulo podia criticar a dependência das obras da lei para a salvação e
ainda afirmar um juízo segundo as obras (Rm 2.6-11). Dunn concluiu:

É difícil sustentar a afirmação de que Paulo estava polemizando contra a “justiça


autoalcançada”. É claro que os textos examinados podem ser lidos dessa maneira. A única
questão é saber se aqueles os leem dessa forma mudaram a questão daquela das obras da lei
de Israel em comparação com a aceitabilidade gentílica para aquela mais fundamental dos
termos da aceitabilidade humana por Deus. Isso pode ter acontecido já em Efésios 2.8,9,
onde a questão parece ter se movido daquela das obras da lei para aquela do esforço humano.
Mas quando os textos nas incontestáveis cartas paulinas são lidos no contexto da missão de
Paulo emergindo de sua matriz judaica, a imagem resultante é bem diferente. Dentro desse
contexto, nós ganhamos uma clara imagem de Paulo resistindo ferozmente a sua própria
suposição pré-cristã de que a justiça de Deus era somente para Israel, e somente para os
gentios se eles se tornassem judeus e assumissem as obrigações distintivas da aliança de
Deus com Israel.56

N. T. Wright de forma independente chegou a uma posição semelhante à


de Dunn. Ele reconheceu que Paulo desafiou o exclusivismo judeu em vez
de um moralismo autodependente que procurava agradar a Deus através das
boas obras. Wright fez a sua própria contribuição para a Nova Perspectiva

794
ao insistir que os estudiosos protestantes erraram o alvo ao identificar a
“justiça de Deus” como justiça imputada. Embora a “justiça de Deus” (hē
ek theou dikaiosynē) refira-se à justiça imputada, “justiça de Deus” é
fidelidade da aliança.57 Wright negou que a justiça imputada ao fiel é a
justiça do próprio Deus ou do próprio Cristo. O fiel é declarado justo por
Deus antes de seu julgamento, mas o NT nunca fala de uma transferência da
justiça pessoal de Deus para o fiel.
Além disso, essa “justificação” é essencialmente uma declaração
escatológica que ocorre no juízo final e será baseada na avaliação da
totalidade da vida do indivíduo, um julgamento de acordo com as obras.58
Isto não implica de forma alguma que um indivíduo ganha ou consegue a
salvação por seus próprios esforços morais. Antes, as boas obras são a
expressão inevitável da atividade do Espírito no fiel, de modo que a vida do
indivíduo demonstra se um indivíduo está verdadeiramente em Cristo.
Justificação é uma projeção da justificação escatológica no presente, uma
antecipação do veredito final de Deus.59

Uma Crítica da Nova Perspectiva


Embora a maioria dos estudiosos de hoje pareça ter aceitado os principais
fundamentos da descrição que Sanders fez do judaísmo, muitos acreditam
que algumas das alegações de Sanders foram desequilibradas e que o estudo
do NT já está se movendo em direção a uma posição mais equilibrada.
Vários têm argumentado que o estudo do NT já se moveu para bem mais
além da Nova Perspectiva em direção ao que pode ser chamado de
“perspectiva pós-Nova Perspectiva”.60 Embora os estudiosos possam ser
gratos por algumas das contribuições da Nova Perspectiva, várias críticas

795
são adequadas. Uma vez que a Nova Perspectiva não é uma escola de
pensamento claramente definida com parâmetros estabelecidos, mas é
muito mais um movimento com sérias discordâncias entre até mesmo seus
mais fortes defensores, essas críticas não se aplicam a todos os
representantes da Nova perspectiva. Elas primeiramente respondem à
pesquisa inovadora de Sanders em Paul and Palestinian Judaism que gerou
o movimento.
A tentativa de Sanders de encontrar um único “padrão de religião” no
judaísmo do primeiro século algumas vezes o levou a ignorar as enormes
diferenças entre as várias seitas e perspectivas teológicas dentro judaísmo.61
Embora se possa afirmar que Sanders descobriu um padrão de religião no
judaísmo do Segundo Templo, Sanders foi imprudente ao afirmar que tinha
descoberto o padrão. Os estudiosos do NT estão cada vez mais conscientes
de que o judaísmo do Segundo Templo não era teologicamente uniforme. A
precisão exige que se fale dos judaísmos (no plural) do Segundo Templo em
vez de se assumir que todos os judeus do período compartilhavam um único
sistema soteriológico.
Sanders apelou a três importantes linhas de evidência para argumentar
que o nomismo pactual não era legalista, mas sim dominado por uma ênfase
na graça divina. No entanto, todos esses três argumentos são problemáticos.
Primeiro, Sanders alegou que Deus estabeleceu sua aliança com os judeus
devido à sua própria eleição graciosa. Deus exigia obediência à aliança, não
para “fazer parte” num relacionamento de aliança com Deus, mas apenas
para “permanecer” nesse relacionamento da aliança.62 Mas a descrição que
Sanders fez do padrão de religião no judaísmo do Segundo Templo ainda
faz do esforço humano o fator determinante no julgamento escatológico e
facilmente se degenera em legalismo.

796
Segundo, de acordo com Sanders, Deus exigia apenas a intenção de
obedecer à sua lei, e não a obediência real; assim os israelitas não precisam
temer um julgamento rigoroso que avaliaria ações individuais. A rejeição
que Sanders fez de uma exigência de obediência real no judaísmo do
Segundo Templo está em desacordo com m. Abot 3.16, que talvez seja a
mais sistemática afirmação da soteriologia na Mishná.63 Rabi Akiba ensinou
que “o mundo é julgado de acordo com a justiça, mas tudo está de acordo
com a maioria das obras que são boas ou más”. Apesar de Sanders rejeitar o
texto na consideração na sua composição de um padrão de religião
afirmando que o texto é “enigmático”, uma parábola que segue
imediatamente à declaração torna o seu significado claro. A parábola
descreve Deus como um grande lojista que cuidadosamente registra os
débitos morais em seu livro contábil. O lojista eventualmente enviará seus
coletores para o recebimento exato dos devedores, quer eles gostem ou não,
com base no registro de suas dívidas. A parábola conclui: “o julgamento é
um juízo de verdade e está tudo pronto para o banquete”. A conclusão
demonstra que o juízo escatológico é o foco da parábola e confirma que a
parábola ilustra o julgamento segundo a maioria das obras descritas por
Akiba.
Akiba, assim, ensinou que o destino eterno de alguém era determinado
pela preponderância de suas ações. Se uma pessoa praticou mais o mal do
que o bem, ela poderia esperar punição na vida após a morte. Se uma
pessoa praticou mais o bem do que o mal, ela poderia esperar uma
recompensa. O conceito de julgar de acordo com a maioria das ações é
afirmado em outras declarações dos Tanaim,64 tais como do m. Qiddushin
1.10 e m. Avot 4.22. As interpretações dessas referências mishnaicas na
Toseftá65 e mais tarde por rabinos amoraítas66 confirmam que o ponto de

797
vista de Akiba era compartilhado por outros.67 Através de uma declaração
paradoxal cuidadosamente elaborada, Akiba contrastou esse julgamento
segundo a maioria das ações com um julgamento de acordo com a justiça
divina, implicando que ele reconhecia que a santidade absoluta de Deus
exigia total perfeição em vez de uma mera maioria de boas ações. Esse
padrão mais extremo do juízo escatológico foi afirmado por Gamaliel II em
b. Sanhedrin 81a. O grande rabino chorava enquanto lia Ezequiel 18.5-9
porque ele interpretou o texto como exigindo obediência total e perfeita, da
qual ele era incapaz.
Apesar de Sanders ter apelado de forma detalhada para o livro apócrifo
de Jubileus para confirmar que o nomismo pactual era o padrão da religião
do judaísmo do primeiro século, mesmo Jubileus frequentemente se refere a
grandes livros contábeis como o da parábola de Akiba para descrever as
bases para o juízo final. Sanders apelou para Jubileus 30.22 e 36.10 para
argumentar que as “tábuas celestiais” são os livros da vida e da destruição, e
não um livro contábil de ações. Na verdade, as tábuas celestiais têm uma
variedade de funções ao longo de Jubileus. Em Jubileus 6.17 e 16.29,30, as
tábuas parecem ser os registros das Leis de Deus. Mas pelo menos em
Jubileus 39.6 as tábuas celestiais parecem ser livros contábeis de ações. O
texto explica que José absteve-se de cometer adultério com a mulher de
Potifar porque Jacó havia ensinado as palavras de Abraão que aqueles que
cometessem adultério receberiam uma sentença de morte no céu perante o
Altíssimo e que “o pecado está escrito (no céu) a respeito dele nos livros
celestiais sempre perante o Senhor”. Apesar das evidências de Jubileus
5.13; 28.6; 30.19; 39.6, Sanders se referiu a duas passagens que fazem
referência aos Livros da Vida e da Destruição, e às tábuas celestiais e
equivocadamente concluiu que eles são o mesmo. O livro dos Jubileus

798
confirma que Deus mantém um registro cuidadoso das ações de Israel em
preparação para o justo julgamento eterno. Vários estudiosos modernos
como A. Das, S. Kim e S. Westerholm consideraram as evidências acima
como enfraquecendo seriamente a imagem da soteriologia judaica afirmada
68
pela Nova Perspectiva.

Quadro 9.1: 4QMMT, AS “OBRAS DA LEI”


E A NOVA PERSPECTIVA SOBRE PAULO
A evidência que se tornou objeto de considerável discussão acadêmica
é uma passagem em um dos Manuscritos do Mar Morto, em um
documento chamado 4QMMT. Como C. Evans observou, 4QMMT
“ofereceu prova dramática de que a posição que Paulo atacava era de
fato defendida em sua época. De acordo com 4QMMT, se os fiéis
observarem a lei adequadamente, principalmente no que diz respeito
às ‘obras da lei’, sobre a qual o(s) autor(es) desta carta escreveu(ram),
eles ‘se alegrarão no final dos tempos’, quando eles descobrirem que a
sua obediência ‘será imputada para (eles) como justiça’ (4Q398 frags.
14-17 ii 7 4Q399 = frag. 1 ii 4)”.1
Evans acertadamente argumentou que os escritores de Qumran se
referiam ao salmo 106.30,31, onde Fineias é considerado justo por
causa de seu ato justo. Paulo, é claro, argumentou a partir de Gênesis
15.6 e da fé de Abraão como fonte de justiça.2 Claramente, o nomismo
pactual não serviu como paradigma monolítico para todo o judaísmo
do Segundo Templo. J. D. G. Dunn, em nome daqueles que afirmam a
Nova Perspectiva, respondeu que as “obras da lei” exigiam que os

799
participantes da aliança se separassem do restante do judaísmo,
3
embora isso possa representar um caso especial de alegação.

1
C. A. Evans, “The Old Testament in the New”, em: S. McKnight; G. R. Osborne, orgs.,

The Face of New Testament Studies: A Survey of Recent Research (Grand Rapids: Baker,

2004), p. 142-43.
2
Ibid., p. 143.
3
J. D. G. Dunn, “Paul’s Theology”, em: Face of New Testament Studies, p. 345; id.,

“4QMMT and Galatians”, NTS 43 (1997), p. 147-53.

Finalmente, Sanders alegou que o judaísmo do Segundo Templo não era


dependente de obras de justiça legalistas para salvação porque Deus
providenciou meios de expiação pela falha em obedecer.69 Mas um exame
detalhado da literatura judaica do Segundo Templo demonstra que muitos
judeus viam as obras de justiça legalistas como o meio de expiação para o
pecado.70 O livro de Tobias mostra que os judeus da Diáspora que não
tinham acesso ao templo substituíram os chamados “pilares do judaísmo”
— a oração, o jejum e a esmola — pelo sacrifício no templo como meio de
expiação (Tobias 4.9-11; 12.8-10). Da mesma forma, os documentos da
comunidade dos Manuscritos do Mar Morto demonstram que os judeus
sectários que tinham abandonado temporariamente o templo procuraram
expiação do pecado por meio de atos pessoais de justiça, em vez de
sacrifícios no templo (1QS 3.6-10; 8.1-4; 9.5). Os temas de Eclesiástico
sugerem que até mesmo um importante escriba de Jerusalém,
aproximadamente 250 anos antes da destruição do templo substituiu atos de
justiça pelos rituais de expiação do templo (Eo 3.14,30; 20.28; 35.1-5;
45.23). Consequentemente, o apelo de Sanders aos meios de expiação como

800
impedindo o judaísmo de degenerar em várias formas de obras de justiça
legalistas não é convincente. Quando a expiação pela falha em não observar
a lei é alcançada por atos compensatórios de obediência à lei, obras de
justiça, pelo menos até certo ponto, parece inevitável.

Conclusão
A Nova Perspectiva corretamente enfatiza o contexto judaico do
cristianismo primitivo e a necessidade de se estudar os documentos NT no
contexto da literatura judaica do Segundo Templo. Ela acertadamente
adverte contra caricaturas supostas e capciosas do judaísmo que não são
baseadas em um estudo cuidadoso dos documentos primários.
Representantes da Nova Perspectiva estão corretos de que não todos,
provavelmente nem mesmo a maioria, dos judeus do primeiro século
dependiam de obras de justiça legalistas para a salvação. Entretanto, a
evidência demonstra que muitos dependiam. As cartas de Paulo de fato
desafiam o exclusivismo judaico, como Dunn e Wright afirmam, mas elas
também claramente confrontam esforços de se obter a salvação pelo
cumprimento da lei. As “obras da lei” da qual alguns judeus dependiam
para a sua salvação incluía esforços para manter todas as prescrições da lei
e não apenas aquelas que distinguiam os judeus dos gentios.71

A VIDA DE PAULO
Introdução
Não se pode dominar o conteúdo do NT e ignorar o apóstolo Paulo. Saulo
de Tarso tornou-se o proeminente missionário, teólogo e escritor da igreja

801
primitiva e é uma figura extremamente importante no NT e na história do
cristianismo.72 Ele foi o autor ou o assunto de quase um terço do NT e o
intérprete mais importante dos ensinamentos de Cristo e da importância de
sua vida, morte e ressurreição.

Infância e Formação (1-33)


Nascimento e contexto familiar
Paulo nasceu em uma família judia em Tarso da Cilícia (At 22.3),
provavelmente no início da primeira década do primeiro século. De acordo
com uma tradição registrada por Jerônimo (c. 345-420), a família de Paulo
se mudou para Tarso vinda de Giscala na Galileia.73 A família de Paulo era
da tribo de Benjamin (Fp 3.5). Seus pais lhe deram o nome de Saulo em
homenagem ao membro mais proeminente da tribo na história judaica —
Rei Saul. Paulo veio de uma família de fabricantes de tendas ou
trabalhadores de couro, e, de acordo com o costume judaico, seu pai lhe
ensinou este ofício.74 Aparentemente o negócio prosperou e a família de
Paulo tornou-se moderadamente rica. Paulo era um cidadão da cidade de
Tarso, “uma importante cidade” (At 21.39). Segundo um antigo escritor, a
exigência monetária para a cidadania de Tarso era de 500 dracmas, o salário
de um ano e meio.75

Cidadania romana
Mais importante, Paulo nasceu cidadão romano. Muitos intérpretes
especulam que o pai ou o avô de Paulo foi agraciado com a cidadania por
algum serviço especial prestado a um procônsul militar.76 No entanto, a

802
tradição cristã primitiva (preservada por Jerônimo, veja também Fócio,
século IX) afirma que os pais de Paulo foram trazidos como prisioneiros de
guerra de Giscala para Tarso, escravizados para um cidadão romano e, em
seguida, libertados e recebido cidadania.77 Independentemente de como os
pais de Paulo receberam sua cidadania, por três vezes Atos declara que
Paulo possuía a cidadania romana, e este privilégio era acompanhado de
importantes direitos que o beneficiariam em seu trabalho missionário.78 O
cidadão romano tinha o direito de apelar depois de um julgamento, isenção
do serviço imperial, direito de escolher entre um julgamento local ou em
Roma e proteção contra as formas degradantes de punição, como açoite e
crucificação. Paulo pode ter carregado uma espécie de tabuleta de cera que
funcionava como um certificado de cidadania a fim de provar a sua
cidadania Romana. No entanto, acreditava-se na maioria das pessoas que
reivindicava a cidadania romana, pois a pena por se passar por um cidadão
romano era a morte.79

O nome de Paulo
Os antigos romanos eram formalmente designados por um praenomen
(primeiro nome), nomen (nome de família), praenomen do pai, tribo
romana, e cognomen (nome extras, como os modernos nomes do meio) em
documentos oficiais. Os cidadãos romanos tinham que se registrar no
governo usando os tria nomina, que consistiam do praenomen, nomen
gentile e cognomen. O NT se refere ao apóstolo apenas informalmente
como “Paulo” ou “Saulo”. Paulo era o cognome do apóstolo; Saulo era o
seu nome hebraico. O nome “Paulo” era comum no mundo romano (At
13.7) e significa “pequeno” em latim. Tradições mais tardias provavelmente

803
inferiam que Paulo era de baixa estatura a partir do significado do seu nome
latino, mas não se pode determinar a estatura de Paulo a partir do nome,
pois o nome foi dado a ele em seu nascimento.80

QUADRO 9.2: QUEM FOI GAMALIEL?


Devido à influência significativa de Gamaliel sobre Saulo, um breve
exame do famoso mestre é apropriado. A Mishná menciona
frequentemente Gamaliel I e expressa muitas de suas opiniões.
Gamaliel está listado entre 13 grandes rabinos cujas mortes marcaram
o declínio do judaísmo: “quando o rabino Gamaliel o Velho morreu, a
glória da Lei cessou e a pureza e a abstinência morreram” (m. Sotah
9.15). A passagem implica que Gamaliel era famoso tanto por seus
elevados padrões morais quanto pela sua interpretação da Escritura. Os
alunos de Gamaliel eram conhecidos por apresentar suas ofertas de
Shekel para o Terumá de modo a garantir que seria usado apenas para
o propósito designado (m. Sheq. 3.3). Um outro texto identifica
Gamaliel e seus alunos como aqueles que guardavam o segredo da
localização da Arca da Aliança que estava escondida no templo (m.
Sheq. 6.1).
Vários textos que descrevem os ensinamentos Gamaliel estão
relacionados às questões de casamento, divórcio e do novo casamento,
sugerindo que Gamaliel estava particularmente preocupado com as
questões relacionadas com a família. Gamaliel relaxou a lei mais
rigorosa que exigia várias testemunhas da morte de um homem para a
mulher se casar novamente ao exigir apenas uma (m. Yeb. 16.7).
Gamaliel impediu um marido de cancelar um certificado de divórcio

804
sem a esposa ou o mensageiro do certificado estarem presentes para
testemunhar o cancelamento “como uma precaução para o bem geral”.
Caso contrário, a mulher poderia se casar novamente, sem perceber
que o divórcio tinha sido anulado (m. Git. 4.2,3). Ele também proibiu a
utilização de pseudônimos em certificados de divórcio. Talvez o
trabalho Gamaliel como um defensor da família tenha resultado na
celebração de sua “pureza e da abstinência” mencionadas
anteriormente. Embora ele fosse zeloso em relação à lei, Gamaliel era
conhecido por afrouxar as normas rigorosas que eram
desnecessariamente pesadas. Por exemplo, Gamaliel relaxou
determinada legislação (m. Rosh Hash. 2.5).
Em outras questões, tais como o dízimo, Gamaliel poderia ser
muito mais exigente e meticuloso, como fica claro de sua famosa
declaração: “arruma para ti mesmo um mestre e livra-te da dúvida; e
dizima não em excesso por suposição” (m. Avot 1.16).1 A afirmação
está relacionada com a discussão rabínica sobre se deve-se contar,
medir ou pesar frutas, a fim de determinar o dízimo correto. Gamaliel
via a contagem e a medição como imprecisas e apenas a pesagem
como apropriada para um assunto tão importante como o dízimo.2

1
Nesse caso, “Rabban Gamaliel” claramente se refere a Gamaliel I, uma vez que ele é

identificado no contexto como o pai de Simeão.


2
Veja as referências a Gamaliel em m. Peah 2.6 e m. Orlah 2.12.

Formação rabínica

805
Atos 22.3 mostra que Paulo foi “instruído” em Jerusalém aos “pés de
Gamaliel”. Embora o verbo “instruído” (anatrephō) possa se referir a ser
criado desde a infância (At 7.21), nesse contexto provavelmente não
significa nada mais do que Paulo ter recebido a sua formação rabínica sob
Gamaliel depois de se mudar para Jerusalém, provavelmente em algum
momento de sua adolescência.81 Paulo usou esse fato para provar que ele
não era um dos judeus da Diáspora, aqueles que eram mais influenciados
pela cultura gentílica do que pelos modos judaicos. Em Jerusalém, Paulo foi
educado na religião judaica de acordo com as tradições de seus
antepassados (At 22.3). Um século e meio depois de Paulo, o rabino Judá
ben Tema ensinava: “aos cinco anos de idade [se está apto] para a Escritura;
aos dez anos, para a Mishná; aos treze, [para o cumprimento] os
mandamentos; aos quinze anos, para o Talmude; aos dezoito anos, para a
câmara da noiva; aos vinte; para seguir um chamado; aos trinta, para
autoridade” (m. Avot 5.21). Embora o judaísmo possa ter mudado
consideravelmente no período compreendido entre Paulo e o rabino Judá, as
palavras de Judá são provavelmente uma descrição exata do regime de
treinamento que Paulo experimentou.
Atos 22.3 diz que Paulo foi treinado pelo rabino Gamaliel I, o membro
do Sinédrio mencionado em Atos 5.33-39.82 Gamaliel era um importante
mestre judeu na época de Paulo. Tradições mais tardias dizem que Gamaliel
foi o sucessor de Hillel na liderança da escola rabínica fundada por Hillel
em c. 10 a.C. Alguns acadêmicos sugerem que Gamaliel era um membro da
família de Hillel, mas as tradições mais antigas o descrevem como o
fundador de sua própria escola. Alguns estudiosos argumentaram que Paulo
não poderia ter sido um aluno de Gamaliel uma vez que os seus
ensinamentos (Gl 5.3) sugerem que ele defendia a interpretação estrita da

806
lei defendida por Shammai, o rival de Hillel. Certamente Paulo foi mais
radical do que Gamaliel como ele é retratado em Atos 5.34-39, mas os
alunos são muitas vezes mais radicais do que os seus mestres.
Paulo rapidamente se destacou como um estudante rabínico judeu.
Paulo disse: “Eu ultrapassava no judaísmo muitos contemporâneos do meu
povo, pois eu era extremamente zeloso das tradições de meus antepassados”
(Gl 1.14). Paulo descreveu a si mesmo como “circuncidado no oitavo dia;
da descendência de Israel, da tribo de Benjamim, hebreu nascido de
hebreus; quanto à lei, um fariseu; quanto ao zelo, persegui a igreja; quanto à
justiça que há na lei, eu era irrepreensível” (Fp 3.5,6). Ele também se
identificava com a seita dos fariseus, que ele descreveu como o “mais
severo grupo de nossa religião” (At 26.5). O pai de Paulo também tinha
sido um fariseu (At 23.6).83

A perseguição dos cristãos


Como um fariseu ideal, Paulo pode ter sido ativo como um judeu
missionário, ganhando gentios como prosélitos para a fé judaica. Ele pode
ter sido como os fariseus que Jesus descreveu, que “percorriam o mar e a
terra para fazer um prosélito” (Mt 23.15). As palavras de Paulo, “se eu
ainda prego a circuncisão”, pode fazer uma alusão ao seu passado como um
missionário judeu (Gl 5.11). Paulo, mais do que seu mentor Gamaliel (At
5.34-39), reconheceu a grave ameaça que o cristianismo representava à
religião judaica. A Mishná ensinava que um homem judeu estava pronto
para uma posição de autoridade aos 30 anos (m. Avot 5.21). Assim, Paulo
provavelmente estava com cerca de 30 anos quando ele, com a autorização

807
do sumo sacerdote, começou a prender cristãos primeiro nas sinagogas de
Jerusalém e posteriormente em áreas mais remotas, como Damasco.
Não se pode subestimar a agressividade e crueldade de Paulo ao
perseguir a igreja que eram inspiradas no seu zelo mal orientado. Quando
Paulo descreveu seus esforços para perseguir a igreja, ele usou a linguagem
da guerra e deixou claro que sua intenção era destruir a igreja
completamente (Gl 1.13). Em Atos 8.3, Lucas descreveu a destruição que
Paulo fez da igreja usando o verbo grego lumainomai, um verbo usado na
Septuaginta (AT grego) para falar de um animal selvagem como um leão,
urso ou leopardo rasgando carne crua.84 O zelo de Paulo em perseguir a
igreja era como a fúria selvagem de um predador faminto ansioso pelo
gosto de sangue.
Talvez a descrição mais clara de Paulo das suas atividades como um
perseguidor seja encontrada em Atos 26.9-11:

Na verdade, eu mesmo pensava que devia praticar muitas coisas em oposição ao nome de
Jesus, o Nazareno. Isso eu, de fato, fiz em Jerusalém e encerrei muitos dos santos na prisão,
uma vez que eu havia recebido autoridade para isso dos principais sacerdotes. Quando eram
entregues à morte, eu dava meu voto contra eles. Estando muito furioso com eles, eu até
mesmo os persegui em cidades estrangeiras.

Alguns estudiosos acreditam que essa referência a “voto” (lit.,


“depositar um seixo” — preto para “não” ou branco para o “sim”) implica
que Paulo era um membro do Sinédrio. Mas é difícil imaginar que Paulo
não teria declarado isso explicitamente, especialmente nas ocasiões em que
ele destacou sua devotada história judaica. Assim, a afirmação é
provavelmente uma metáfora que implica que Paulo concordou com a
execução dos cristãos ou sugere que ele era um membro de uma comissão
designada pelo Sinédrio e investida com essa autoridade.85 A rejeição inicial
e inflexível de Paulo em relação a Jesus Cristo como o Messias pode ter

808
sido grandemente motivada pela morte ignóbil de Cristo. Paulo sabia que a
morte por crucificação era um indício de uma maldição divina (Dt 21.23).
Era inconcebível para ele que o Messias pudesse morrer sob a maldição de
Deus. Mas quando Paulo escreveu sua primeira carta, ele tinha reconhecido
esta maldição de morte como a base para a expiação substitutiva (Gl 3.10-
14). Em 1Coríntios, Paulo explicou que a ideia de um Messias crucificado
era uma pedra de tropeço para os judeus (veja 1.23). Paulo provavelmente
estava falando de sua própria experiência passada.

A Conversão de Paulo (34)


Enquanto Saulo estava a caminho de Damasco para prender os cristãos, o
Cristo ressurreto e glorificado lhe apareceu com brilho ofuscante. As
palavras de Cristo, “é difícil resistires ao aguilhão” (At 26.14), indicam que
Deus já tinha começado a preparar Saulo para seguir a Jesus como Messias.
Como um boi chutando contra um afiado aguilhão na mão de seu condutor,
Paulo tinha resistido à orientação e liderança divina, resultando em seu
próprio prejuízo e dor. Na aparição de Cristo, Saulo imediatamente se
rendeu à sua autoridade e foi para a cidade para esperar novas ordens de seu
mestre. Lá, sua cegueira foi curada, ele recebeu o Espírito Santo e aceitou o
batismo dos fiéis. Sem dúvida Ananias compartilhou com Saulo a
mensagem que o Senhor tinha dado a ele em uma visão: “Este homem é
meu instrumento escolhido para levar meu nome diante dos gentios, reis e
os filhos de Israel. Certamente eu lhe mostrarei o quanto ele deve sofrer
pelo meu nome” (At 9.15,16). Depois disso, Saulo passou alguns dias com
os discípulos em Damasco.

809
As Viagens Missionárias de Paulo (34-58)
Primeiras viagens (34-47)
Logo após sua conversão, Paulo viajou para a Arábia, onde começou a
evangelização dos árabes nabateus (Gl 1.17; 2Co 11.32,33) e,
provavelmente, experimentou sua primeira oposição ao evangelho por
autoridades políticas. Ele então retornou para Damasco, onde ele começou a
ir para as sinagogas para pregar a mensagem que tinha sido revelada a ele
na estrada de Damasco: Jesus é o Filho de Deus e o Messias prometido. O
governador em Damasco guardava os portões da cidade a fim de prender
Paulo, e ele teve que fugir por uma janela e descer pela muralha sendo
transportado para baixo em um cesto.
Paulo, em seguida, viajou para Jerusalém, onde passou 15 dias visitando
Pedro e Tiago, o irmão do Senhor e, sem dúvida, os ouviu descrever a vida
e os ensinamentos de Jesus, embora o evangelho de Paulo já estivesse
claramente definido mesmo antes desta visita. Os líderes da igreja
inicialmente suspeitaram de Paulo, mas Barnabé interveio em seu nome (At
9.26-30). Após 15 dias em Jerusalém, Paulo voltou para Tarso,
evangelizando a Síria e Cilícia por vários anos. Enquanto na Síria, Barnabé
contatou Paulo e o convidou a participar dos trabalhos da igreja de
Antioquia, onde um grande número de gentios estava respondendo ao
evangelho. A igreja em Antioquia coletou dinheiro para socorrer os cristãos
que sofriam na Judeia durante um período de fome. Barnabé e Paulo foram
escolhidos pela igreja para levar a oferta para Jerusalém (At 11.27-30). Esse
provavelmente foi o motivo da conferência descrita por Paulo em Gálatas
2.1-10. Alguns estudiosos equacionam essa conferência com o Concílio de
Jerusalém, mas isso é improvável. Se Gálatas foi escrita após uma decisão

810
oficial no Concílio de Jerusalém, Paulo poderia ter apenas apresentado a
carta dos apóstolos para desacreditar os judaizantes. Além disso, o encontro
descrito em Gálatas 2.1-10 parece ter sido uma reunião privada em vez de
um caso público. Os pilares da igreja de Jerusalém, Pedro, João e Tiago,
irmão de Jesus, aprovaram o evangelho sem lei pregado por Paulo e seu
foco na evangelização dos gentios.

Primeira viagem missionária (47-48)


Paulo e Barnabé logo começaram sua primeira viagem missionária,
viajando por Chipre e da Anatólia provavelmente durante os anos 47-48. A
equipe missionária levou o evangelho para as cidades de Antioquia da
Pisídia, Icônio, Listra e Derbe. Essas cidades se localizavam na província
romana da Galácia, e a carta aos Gálatas é, provavelmente, dirigida a essas
igrejas no sul da Galácia. A carta aos Gálatas muito provavelmente foi
escrita de Antioquia pouco tempo depois desta viagem.

O Concílio de Jerusalém (49)


Quando Paulo retornou a Antioquia depois de sua primeira viagem
missionária, ele imediatamente se viu envolvido em controvérsia sobre os
requisitos para a salvação dos gentios. Pedro e até mesmo Barnabé estava
vacilando sobre a questão dos relacionamentos judeu-gentio. Ainda pior,
alguns falsos mestres da igreja de Jerusalém tinham se infiltrado nas
congregações em Antioquia e estavam ensinando: “a menos que vocês
sejam circuncidados segundo o costume prescrito por Moisés, vocês não
podem ser salvos” (At 15.1). A igreja designou Paulo e Barnabé para ir a
Jerusalém e resolver a questão. Um concílio que incluiu a equipe

811
missionária, foi convocado no ano de 49, aqueles que insistiam na
circuncisão como um requisito para a salvação, e os apóstolos. Os apóstolos
Pedro e Tiago, o irmão de Jesus, falaram em defesa do evangelho sem lei de
Paulo, e uma carta foi enviada às igrejas gentílicas confirmando a visão
cristã oficial. Paulo retornou para Antioquia.

Segunda viagem missionária (49-51)


A segunda viagem missionária levou Paulo pela Anatólia, Macedônia e
Acaia em 49-51. Paulo e Barnabé se separaram neste momento devido a um
desacordo sobre o papel do sobrinho de Barnabé, João Marcos na segunda
viagem missionária. Marcos tinha abandonado a equipe na primeira viagem
(At 15.38). Paulo levou Silas nesta jornada e plantou igrejas em Filipos,
Tessalônica e Bereia. Paulo também passou 18 meses em Corinto
fortalecendo ali uma igreja nascente. Quatro das cartas de Paulo são
dirigidas a igrejas conhecidas desta segunda jornada. A maioria dos
estudiosos acredita que as cartas de 1 e 2Tessalonicenses foram escritas
durante esta jornada.

812
Mapa 9:1 A primeira viagem missionária de Paulo.

Terceira viagem missionária (51-54)

813
A terceira viagem missionária de Paulo tinha o foco na cidade de Éfeso,
onde Paulo passou a maior parte de três anos (51-54). Perto do fim desta
viagem Paulo trabalhou duro para coletar outra oferta de auxílio para os
cristãos de Jerusalém. Paulo escreveu 1 e 2Coríntios e Romanos durante
essa jornada.

Mapa 9.2: A segunda viagem missionária de Paulo.

Anos finais (55-65/66)


Paulo levou a oferta para Jerusalém. Enquanto estava no templo realizando
um ritual para demonstrar a sua identidade judaica a alguns dos cristãos de

814
Jerusalém, seus adversários judeus incitaram uma revolta e Paulo foi preso
(55). Paulo foi enviado a Cesareia para enfrentar um julgamento perante o
procurador Félix. Após dois anos de procrastinação por parte dos seus
detentores, Paulo finalmente apelou ao imperador romano, para julgamento.
Depois de chegar a Roma, Paulo passou dois anos sob prisão domiciliar
aguardando seu julgamento. Paulo escreveu Efésios, Filipenses,
Colossenses e Filemon durante essa primeira prisão romana (c. 58-60).86
O registro de Atos termina neste momento, de modo que as informações
sobre o resultado do julgamento são incompletas. A tradição da igreja
primitiva sugere que Paulo foi absolvido (c. 60) ou exilado e pode ter
cumprido o sonho expresso em Romanos 15.23-29 de levar o evangelho à
Espanha (60-66).87 Paulo escreveu 1Timóteo e Tito durante o período
compreendido entre a sua absolvição e uma segunda prisão romana, e
escreveu 2Timóteo durante a segunda prisão romana. De acordo com a
tradição da igreja, Paulo foi novamente preso e submetido a uma prisão
mais severa Ele foi condenado pelo imperador Nero e decapitado à espada
no terceiro marco na Via Ostiense em um lugar chamado Aquae Salviae e
está enterrado no local sobre o qual foi construída a Basílica de São Paulo
fora da muralha. Sua execução provavelmente ocorreu em 66 ou 67.

815
Mapa 9.3: A terceira viagem missionária de Paulo.

A Aparência de Paulo
Não existe nenhum registro bíblico da aparência ou da condição física de
Paulo. Ele deve ter sido um indivíduo vigoroso para suportar os abusos e as
tribulações que ele sofreu como um apóstolo (2Co 11.23-29). Ele era,
evidentemente, vítima de alguma doença ocular grave (Gl 4.12-16). Isso
pode explicar a sua assinatura caracteristicamente grande que ele anexava
às cartas que provavelmente foram escritas por um secretário (Gl 6.11). A
primeira descrição da aparência de Paulo aparece em um livro do NT

816
apócrifo, que diz que Paulo era “um homem de baixa estatura, com uma
cabeça calva e pernas arqueadas, em bom estado físico, com as
sobrancelhas se encontrando e o nariz ligeiramente adunco, muito
simpático; pois agora ele parecia um homem, e agora ele tinha a face de um
anjo”.88 O autor atribui a descrição de Paulo a Tito, e isto pode ter algum
fundamento histórico. Embora possa parecer desagradável nos padrões
modernos, várias das características físicas citadas eram consideradas como
ideais para o cidadão romano ideal.

O Evangelho de Paulo
O evangelho de Paulo indiciou toda a humanidade pelo o crime de rejeitar a
Deus e a sua legítima autoridade.89 Sofrendo as consequências do pecado de
Adão, a humanidade mergulhou nas profundezas da depravação de modo
que ela era totalmente incapaz de cumprir as justas exigências de Deus (Rm
1.18-32; 3.9-20; 9.12-19) e merecia apenas a ira de Deus (Rm 1.18; 2.5-16).
O pecador estava alienado de Deus e em inimizade com ele (Rm 5.10; Cl
1.21). Consequentemente, a única esperança do pecador era o evangelho
que incorporava o poder de Deus para salvar aqueles que tinham fé em
Cristo (Rm 1.16).
O foco do evangelho de Paulo estava em Jesus Cristo (Rm 1.3,4). Paulo
afirmou a humanidade de Jesus e sua divindade. Cristo era um descendente
físico da linhagem de Davi (Rm 1.2), veio à semelhança do homem pecador
(Rm 8.3), assumindo a forma de um servo humilde e obediente (Fp 2.7,8).
No entanto, ele era a forma visível do Deus invisível (Cl 1.15), toda a
plenitude da divindade vivendo nele em forma corpórea (Cl 2.9), na própria
natureza de Deus (Fp 1.6), e possuía o título “Senhor” (título grego para o

817
Deus do AT), o nome acima de todos os nomes (Fp 2.9-11). Paulo
acreditava que, em virtude de sua impecabilidade, Jesus estava qualificado
para ser o sacrifício que tornava os pecadores justos diante de Deus (2Co
5.21). Em sua morte na cruz, Jesus se tornou a maldição pelo pecado (Gl
3.10-14), e o justo que havia morrido pelos injustos (Rm 5.6-8).
A salvação é uma dádiva gratuita concedida aos fiéis e fundamentada
exclusivamente na graça de Deus. A salvação não é dependente de mérito,
atividade ou esforços humanos, mas somente do amor imerecido de Deus
(Rm 6.23; Ef 2.8-10). Aqueles que confiam em Jesus para sua salvação, o
confessam como Senhor e creem que Deus o ressuscitou dentre os mortos
(Rm 10.9) serão salvos da ira de Deus, tornam-se justos aos olhos de Deus
(Rm 5.9), são adotados como filhos de Deus (Rm 8.15-17; Ef 1.5), e são
transformadas pelo poder do Espírito (Gl 5.22-24). Na ocasião da vinda de
Cristo os fiéis serão ressuscitados (1Co 15.12-57), participarão plenamente
do caráter justo do Filho (Fp 3.20-21) e viverão para sempre com o Senhor
(1Ts 4.17).
Pela sua união com Cristo através da fé, os fiéis participam
espiritualmente da morte, ressurreição e ascensão de Cristo (Rm 6.1 a 7.6;
Ef 2.4,5; Cl 3.1-4). Em consequência, o fiel foi libertado do poder do
pecado, da morte e da lei. Ele é uma nova, embora imperfeita, criação que
está continuamente se tornando mais semelhante a Cristo (2Co 5.17; Cl
3.9,10). Embora o fiel não esteja mais sob a autoridade da lei escrita, o
Espírito Santo funciona como uma nova lei interna, levando-o naturalmente
e espontaneamente a cumprir as exigências justas da lei (Rm 8.1-4). Como
resultado, o evangelho livre da lei não incentiva um comportamento ímpio
nos fiéis. Tal comportamento é contrário à sua nova identidade em Cristo.

818
A união dos fiéis a Cristo faz com que eles se unam aos outros fiéis no
corpo de Cristo, a igreja. Os fiéis exercem os seus dons espirituais para que
possam ajudar no amadurecimento, uns dos outros, para servir a Cristo e
glorificá-lo, o mais alto propósito da igreja (Ef 3.21; 4.11-13). Cristo agora
reina sobre a igreja como sua Cabeça, sua mais alta autoridade (Ef 1.22).
Quando Cristo voltar, o seu reinado sobre o mundo será consumado e tudo
o que existe será colocado sob a sua autoridade absoluta (Ef 1.10; Fp 4.20).
Ele ressuscitará os mortos, os incrédulos para o julgamento e punição, e os
fiéis para a glorificação e recompensa (2Ts 1.5-10).

CRONOLOGIA PAULINA
Introdução
Um estudioso descreveu corretamente os esforços para estabelecer a
sequência e datas para os acontecimentos da vida de Paulo como “um dos
problemas mais desconcertantes no estudo do Novo Testamento”.90 Em
1979, R. Jewett cuidadosamente comparou e contrastou as cronologias da
vida de Paulo sugeridas por vários estudiosos.91 Ele descobriu um número
frustrante de diferenças significativas entre estas cronologias propostas e
lamentou o fracasso dos estudiosos do NT em se mover em direção a um
consenso sobre a cronologia paulina. O fracasso em alcançar um consenso
não foi devido à falta de esforços por parte dos estudiosos do NT. Nos 30
anos anteriores ao trabalho de Jewett, vários estudiosos (incluindo a J. J.
Gunther, J. Knox, G. Lüdemann e G. Ogg) dedicaram monografias às
difíceis questões da cronologia paulina.92
As diferenças entre as cronologias propostas pelos estudiosos são em
grande parte o resultado das diferentes abordagens para a questão e dos

819
diferentes pressupostos que norteiam a pesquisa. Alguns estudiosos se
apoiam mais de Atos do que nas cartas de Paulo ao desenvolver suas
cronologias. Outros preferem as cartas de Paulo em vez de Atos. Alguns
utilizam uma abordagem mais subjetiva na qual tentam desenvolver uma
cronologia das cartas de Paulo com base no percebido desenvolvimento
teológico de uma carta para outra. Essa abordagem mais subjetiva muitas
vezes introduz desnecessariamente tensões entre as cronologias nas cartas
de Paulo e em Atos. A abordagem mais sensata depende principalmente das
cartas de Paulo para a cronologia da vida de Paulo e suplementa essa
cronologia com os dados de Atos. Quando as tensões entre as cronologias
sugeridas pelas cartas e por Atos surgem, essa abordagem permite a
possibilidade de que Lucas pode ter organizado parte o material em Atos de
forma tópica em vez de cronológica, bem semelhante ao que os escritores
dos Evangelhos algumas vezes fizeram.93
A complexidade da combinação dos dados das cartas de Paulo com os
dados de Atos, antigas histórias e inscrições é desorientadora. Cronologias
detalhadas devem ser vistas como propostas experimentais que podem não
ser confirmadas até que surjam novas evidências. No entanto, tentativas de
identificar as datas para os eventos da vida de Paulo são dignas de esforços
uma vez que o conhecimento do clima político e dos eventos da época
podem muitas vezes esclarecer o significado das cartas de Paulo.

A Vida de Paulo Antes da Conversão


As descrições da vida de Paulo antes da conversão em Atos e nas cartas de
Paulo carecem de referências específicas que permitam estabelecer datas
exatas para eventos importantes. Em Filemom 1.9, Paulo refere a si mesmo

820
como um “homem já velho” (presbytēs). J. Murphy-O’Connor demonstrou
que os antigos textos gregos normalmente utilizavam este termo para se
referir aos homens no fim dos cinquenta anos ou início dos sessenta.94 Uma
vez que Filemom provavelmente foi escrita enquanto Paulo estava em
Roma, no final dos anos 50 ou início dos anos 60, Paulo provavelmente
nasceu no início da primeira década do primeiro século.
Atos 22.3 afirma que Paulo foi treinado aos pés de Gamaliel, que
ensinou em Jerusalém dos anos 25 aos 50. A atividade de Paulo como um
zeloso perseguidor dos seguidores de Jesus naturalmente tem data posterior
ao Pentecostes que se seguiu à crucificação de Jesus. Embora os estudiosos
ainda discutam se a crucificação de Jesus ocorreu em 7 de abril, 30 d.C. ou
3 de abril, 33 d.C., a data posterior parece melhor apoiada pela evidência
nos Evangelhos.95

A Conversão de Paulo
Declarações em duas obras apócrifas do século II, a Ascensão de Isaías e
Apócrifo de Tiago, sugerem que a experiência de Paulo na estrada de
Damasco pode ter ocorrido 545 ou 550 dias depois da ressurreição, ou seja,
em 3 ou 8 de outubro do ano 34. Evidência mais confiável para datar a
conversão de Paulo vem de sua declaração em 2Coríntios 11.32,33 a
respeito de sua fuga do etnarca dos nabateus, Aretas IV (At 9.23-35). Aretas
IV morreu no quadragésimo oitavo ano do seu reinado, provavelmente 39.
Ele provavelmente não começou a exercer controle sobre a cidade de
Damasco até o verão de 37. Isso data a fuga de Paulo de Damasco entre 37
e 39.96

821
De acordo com Gálatas 1.17,18, Paulo esteve em Damasco duas vezes,
no início e no final do período de três anos imediatamente após a sua
conversão. Se a fuga de Damasco ocorreu imediatamente após a conversão
de Paulo, sua conversão ocorreu entre 37 e 39. Mas se ela aconteceu
durante a estadia de Paulo em Damasco depois de sua estadia na Arábia,
sua conversão ocorreu entre 34 e 36. As palavras “depois de muitos dias”
em Atos 9.23 parecem sugerir que a dramática fuga ocorreu durante a
segunda estadia. Assim, Paulo provavelmente encontrou o Jesus ressurreto
no caminho de Damasco em meados dos anos 30. Os aspectos posteriores
da cronologia paulina melhor se ajustam a uma conversão no início deste
intervalo temporal, mais provavelmente 34 d.C.

Primeiras Visitas a Jerusalém


Após a segunda visita de Paulo a Damasco, três anos depois de sua
conversão, ele viajou para Jerusalém, onde permaneceu por 15 dias
visitando Pedro e Tiago (Gl 1.18,19). Paulo, em seguida, viajou para a Síria
e Cilícia. Ele permaneceu ali por um período de 11 a 14 anos, dependendo
se as palavras “depois de 14 anos” em Gálatas 2.1 começam com a
conversão de Paulo e, assim, inclui os três anos na Arábia ou se começam
com a partida de Paulo de Jerusalém. Talvez a leitura mais natural de
Gálatas 2.1 veja o período de 14 anos como seguindo os três anos na Arábia
consecutivamente em vez de sobreposto. Mas essa interpretação sugere o
ano 51 como a data da visita, o que cria conflito com outras datas
firmemente estabelecidas na cronologia. Este conflito pode ser resolvido em
uma de várias maneiras.

822
Primeira, os dois períodos de tempo podem se sobrepor, isto é, que esta
segunda visita a Jerusalém provavelmente ocorreu 11 anos após a primeira.
Segunda, o tempo era frequentemente calculado inclusivamente no mundo
antigo. Assim, os “três anos” poderiam incluir um ano completo com uma
parte dos anos anterior e posterior e os “14 anos” poderiam incluir 12 anos
completos com parte do ano anterior e do posterior. Terceira, combinar as
duas abordagens significaria que os 14 anos denotam um período de 12
anos, incluindo partes do ano em que Paulo se converteu e do ano em que
ele visitou Jerusalém pela segunda vez. Assim, a segunda visita a Jerusalém
pode ter ocorrido entre os anos 46 e 51. Mais uma vez, outros aspectos da
cronologia paulina melhor se ajustam a uma data no início deste intervalo,
mais provavelmente o ano 47.
A visita a Jerusalém é provavelmente a visita de combate à fome
descrita em Atos 11.27-30. Embora alguns estudiosos equiparem a segunda
visita de Paulo a Jerusalém descrita em Gálatas 2.1-10 com o Concílio de
Jerusalém de Atos 15, essa equação é inconsistente com a afirmação de
Paulo de que antes ele tinha visitado Jerusalém apenas uma vez. Além
disso, alguns dos detalhes em Gálatas 2.1-10 parecem bem diferentes dos
eventos do Concílio de Jerusalém.97 As convicções de Pedro em relação à
inclusão dos gentios já estavam resolvidas antes do Concílio de Jerusalém,
assim Pedro teria falado em defesa do evangelho livre da lei de Paulo antes
que o Concílio de Jerusalém tivesse ocorrido. Mas Paulo descreveu Pedro
como vacilando sobre a questão das relações entre cristãos judeus e cristãos
gentios, mesmo após a reunião mencionada em Gálatas 2 (veja v. 11-14).
Além disso, a recomendação dos líderes da igreja de Jerusalém a Paulo para
que eles se lembrassem dos pobres (Gl 2.10) parece se adequar melhor ao
contexto da visita para o alívio da fome. Isso é especialmente verdade se o

823
tempo verbal no presente em Gálatas 2.10 tiver a nuança da continuação de
uma obra já em andamento, ou seja, “continuem se lembrando dos pobres”.
Isso implicaria que os gentios convertidos já tinham começado a mostrar
sua generosidade em relação aos menos afortunados através de sua oferta de
ajuda.

Primeira Viagem Missionária


Após a visita de alívio da fome, Paulo e Barnabé voltaram para Antioquia.
Logo após o retorno deles, o Espírito ordenou que a igreja comissionasse
Paulo e Barnabé para a sua primeira viagem missionária. Embora a esta
primeira viagem missionária não contenha referências que permitam datar
estas viagens, o registro de viagem em Atos contém um roteiro que teria
exigido aproximadamente um ano. Essa viagem missionária provavelmente
ocorreu nos anos 47—48.

O Concílio de Jerusalém
Na conclusão da primeira turnê missionária, Paulo e Barnabé foram para
Antioquia da Síria, onde permaneceram por um período prolongado.
Durante essa estadia em Antioquia, eclodiu uma controvérsia quando
alguns mestres de Jerusalém começaram a insistir que a salvação exigia a
circuncisão. A controvérsia levou a igreja em Antioquia a enviar Paulo e
Barnabé a Jerusalém para pedir a orientação dos apóstolos e dos anciãos
sobre a questão. A resultante conferência de Jerusalém provavelmente
aconteceu em 49.98

824
Segunda Viagem Missionária
A segunda viagem missionária de Paulo, durante a qual ele entregou o
relatório do Concílio de Jerusalém às igrejas gentílicas, começou logo
depois que os líderes chegaram a uma decisão. A viagem começou
provavelmente no final de 49. O itinerário de Paulo era agressivo. Jewett
calculou que se Paulo percorresse em média 40 km por dia durante a
viagem e ficasse por muito pouco tempo em cada local do ministério, sua
viagem de Jerusalém a Corinto — da qual apenas cerca de um quinto teria
99
sido por via marítima — teria durado cerca de 640 dias. No entanto,
muitos estudiosos duvidam que Paulo pudesse ter mantido esse ritmo de
maratona. Jewett sugeriu que a viagem de Jerusalém a Corinto muito
provavelmente precisou de três ou até mesmo de quatro anos.
Atos 18.2 afirma que Paulo encontrou Áquila e Priscila enquanto estava
em Corinto durante esta segunda viagem missionária. Recentemente o casal
tinha sido expulso de Roma por ordem do imperador Cláudio. A expulsão
dos judeus de Roma é mencionada em outras fontes antigas, tais como os
escritos de Suetônio (início do século II), Dião Cássio (século III), e Orósio
(c. 385-420), e pode ser datada do ano 49.100 A data provável para a segunda
viagem missionária é 49-51.
As datas sugeridas são corroboradas pela famosa Inscrição de Gálio.
Atos 18.12 relata que os judeus de Corinto levaram Paulo perante o tribunal
em Corinto quando Gálio era procônsul da Acaia, no final da segunda
viagem missionária. Essa nota histórica é particularmente útil, pois o
costume romano ditava que os oficiais romanos nas províncias senatoriais
deveriam exercer o cargo por apenas um ano e o período daqueles que
exerciam o cargo de procônsul tipicamente se estendia de 1 de julho a 1 de
julho do ano seguinte.101 Na virada do século passado, foi descoberta uma

825
inscrição em Delfos datada do período da vigésima sexta aclamação de
Cláudio como imperador e identificava Gálio como procônsul de Corinto.
Baseado em outros dados imperiais, os estudiosos concluíram que esta
vigésima sexta aclamação ocorreu entre 25 de janeiro e 1 de agosto de 52
d.C.
A partir dessa evidência, A. Deissmann concluiu que a carta de Cláudio
para Delfos foi escrita entre janeiro e agosto do ano 52. Isso sugere
fortemente que Gálio serviu como procônsul de 1 de julho de 51 d.C. a 1 de
julho de 52 d.C., e que Paulo compareceu perante ele em Corinto durante
esse período.102 O comparecimento de Paulo perante Gálio parece ter
ocorrido já no final de seus 18 meses em Corinto. Hoje, a maioria dos
estudiosos reconhece a Inscrição de Gálio como fornecendo a data mais
segura na qual os historiadores podem ancorar a cronologia de Paulo. Mas
estudiosos como John Knox que dependem em muito das cartas e rejeitam a
confiabilidade de Atos descartam a Inscrição Gálio uma vez que o seu valor
para o estabelecimento de uma cronologia paulina é dependente da precisão
do relato em Atos 18.12-17.103

Terceira Viagem Missionária


Depois de regressar a Antioquia, Paulo começou a sua terceira viagem
missionária. Paulo viajou pela Galácia e Acaia até chegar a Éfeso, onde
passou de dois anos e meio a três anos. Essa viagem provavelmente se
estendeu de cerca de 51 a 54.104 No final de sua permanência em Éfeso,
Paulo viajou para Jerusalém. Ele provavelmente chegou a Jerusalém no
início do verão do ano 55.105 Pouco depois de chegar a Jerusalém, Paulo foi
preso.

826
A Prisão de Paulo
Depois que Paulo foi preso em Jerusalém, o tribuno romano perguntou se
ele era “o egípcio que provocou uma rebelião algum tempo atrás e levou ao
deserto quatro mil assassinos” (At 21.38). Josefo discutiu esse evento
imediatamente após seu tratamento da morte de Cláudio, que ocorreu em
outubro de 54 (Josefo, Ant. 20.169-72). Supondo que a organização que
Josefo fez de seu material é cronologicamente precisa, a pergunta do
tribuno romano a Paulo provavelmente não foi feita antes do início de 55.
Depois da prisão de Paulo no ano de 55, ele foi preso por dois anos em
Cesareia (55-57) antes de Festo suceder a Félix como procurador. Josefo
não indica claramente quando Festo substituiu Félix.106 Félix foi novamente
confirmado como procurador por Nero e continuou a servir sob o novo
imperador por algum tempo.107 Uma vez que Nero começou seu reinado no
ano de 54, é improvável que Festo tenha sucedido Félix antes de 55. Na
versão de Jerônimo da Crônica de Eusébio, a sucessão Festo aconteceu no
segundo ano do reinado de Nero e no décimo segundo ano do reinado de
Herodes Agripa II. Isto dataria o início do governo Festo do outono de 56.
De acordo com a política imperial, Festo teria sido obrigado a chegar ao seu
posto no final da primavera ou início do verão. Paulo compareceu perante
Festo logo após sua chegada a Cesareia. Assim, Paulo provavelmente
apareceu perante Festo, no verão de 57.108

Os Últimos Anos de Paulo


O apóstolo apelou para César, viajou para Roma e passou mais dois anos
sob prisão domiciliar à espera de julgamento perante Nero (58-60). De
acordo com Eusébio (c. 260-340), Paulo foi libertado da prisão depois de

827
sua defesa diante de Nero.109 Após a sua libertação, Paulo viajou para Creta,
Ásia, Grécia e talvez Espanha.110 Ele foi preso novamente em Trôade em
meados dos anos 60 e logo depois ele foi martirizado na segunda metade da
mesma década, o mais tardar 68 (ano da morte de Nero).111 O martírio de
Paulo provavelmente é posterior ao grande incêndio de Roma no ano 64, o
qual provocou a perseguição dos cristãos por Nero.112

828
Tabela 9.2: Uma Cronologia da Vida e das Cartas de Paulo
Data Referência da
Evento
Aproximada Escritura
Nascimento de Paulo c. 1 d.C.
Crucificação, ressurreição, ascensão Primavera de 33 Atos 1 e 2
de Jesus e Pentecostes
Conversão de Paulo 34 Atos 9.1-19
Primeira Viagem Missionária 47-48 Atos 13 e 14
Autoria de Gálatas 48
Concílio de Jerusalém 49 Atos 15
Segunda Viagem Missionária 49-51 Atos 16 a 18
a. Antioquia a Corinto Atos 18.11
b. Cartas aos Tessalonicenses de Atos 18.12
Corinto
c. Comparecimento perante Gálio
Terceira Viagem Missionária 51-14 Atos 19 a 21
Permanência em Éfeso Atos 20.31
Coríntios A 1Coríntios 5.9,11
1Coríntios Atos 19.10
Coríntios C 2Coríntios 2.4;
2Coríntios 7.8
Permanência em Corinto Atos 20.1,2
Romanos 2Coríntios 13.1,2
Romanos
16.1,2,23
Prisão em Jerusalém 55 Atos 21 a 23
Atos 21.27-40
Prisão em Cesareia 55-57 Atos 24 a 27
Viagem a Roma 57-58 Atos 27
Viagem e Naufrágio Atos 27.27-40
Inverno em Malta

829
Data Referência da
Evento
Aproximada Escritura
Primeira prisão romana 58-60 Atos 28
Epístolas da Prisão: Efésios,
Filipenses, Colossenses, Filemom
Libertação de Paulo 60
Quarta viagem missionária 60-66
Tito
1Timóteo
Grande incêndio em Roma 64
Prisão de Paulo e segunda prisão em 66
Roma
2Timóteo
Morte de Paulo 66 ou 67

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Quantas cartas de Paulo estão incluídas no NT?
2. Como as buscas do Jesus Histórico se relacionam com a ideia de que
Paulo criou o cristianismo?
3. Que tipo de evidência Wenham utilizou para apoiar sua afirmação de
que Paulo era um seguidor de Jesus?
4. Qual é a principal passagem utilizada por Bultmann para provar que
Paulo não estava interessado em detalhes sobre a vida de Jesus?
5. Quem deu início à “Nova Perspectiva” sobre Paulo e qual é o título de
sua principal obra?
6. Qual o rótulo dado por este estudioso ao judaísmo do primeiro século?
7. O que a “Nova Perspectiva” corretamente enfatizou, e como isto
deveria ser criticado?

830
8. Qual status legal permitiu que Paulo apelasse ao imperador romano?
9. De onde Paulo era?
10. Quem foi o mestre de Paulo?
11. O que significa o nome Paulo?
12. Quando Paulo se converteu, qual foi a principal doutrina de seu
sistema de crenças que teve que ser alterado?
13. Qual era o foco do evangelho de Paulo?
14. Quais dificuldades são encontradas por alguém que pretende construir
uma cronologia de Paulo?
15. Por que a escrita de Gálatas deve ser datada de antes do Concílio de
Jerusalém?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


BARNETT, P. Paul: Missionary of Jesus. Em: After Jesus (Grand
Rapids: Eerdmans, 2008), vol. 2.
BARRETT, C. K. Paul: An Introduction to His Thought (Louisville:
Westminster John Knox, 1994).
BIRD, M. F. The Saving Righteousness of God: Studies on Paul,
Justification, and the New Perspective. Em: Paternoster Biblical
Monographs (Milton Keynes: Paternoster, 2007).
BRUCE, F. F. Paul: Apostle of the Heart Set Free (Grand Rapids:
Eerdmans, 1977).
CARSON, D. A.; O’BRIEN, P. T.; SEIFRID, M. A., orgs. Justification and
Variegated Nomism (Grand Rapids: Baker, 2001, 2004), 2 vols.
DUNN, J. D. G. The Theology of Paul the Apostle (Grand Rapids:
Eerdmans, 1998).

831
HAWTHORNE, G. F.; MARTIN, R. P.; REID, D. G., orgs. Dictionary of Paul
and His Letters (Downers Grove: InterVarsity, 1993).
HENGEL, M.; SCHWEMER, A. M. Paul Between Damascus and Antioch:
The Unknown Years (London: SCM, 1997).
KIM, S. Y. The Origin of Paul’s Gospel (Grand Rapids: Eerdmans,
1982).
KÖSTENBERGER, A. J.; O’BRIEN, P. T. Salvation to the Ends of the Earth:
A Biblical Theology of Mission. NSBT 11 (Downers Grove:
InterVarsity, 2001).
LADD, G. E. A Theology of the New Testament. Ed. rev. (Grand Rapids:
Eerdmans, 1993).
LONGENECKER, R. N. Biblical Exegesis in the Apostolic Period. 2. ed.
(Grand Rapids: Eerdmans, 1999).
______. The Ministry and Message of Paul (Grand Rapids: Zondervan,
1971).
PIPER, J. The Future of Justification: A Response to N. T. Wright
(Wheaton: Crossway, 2007).
PLUMMER, R. L. Paul’s Understanding of the Church’s Mission. Em:
Paternoster Biblical Monographs (Milton Keynes, UK: Paternoster,
2006).
POLHILL, J. B. Paul and His Letters (Nashville: B&H, 1999).
RIDDERBOS, H. Paul: An Outline of His Theology. Tradução para o
inglês de J. R. De Witt (Grand Rapids: Eerdmans, 1975).
RIESNER, R. Paul’s Early Period: Chronology, Mission Strategy,
Theology (Grand Rapids: Eerdmans, 1998).
SANDERS, E. P. Paul and Palestinian Judaism: A Comparison of
Patterns of Religion (Philadelphia: Fortress, 1977).

832
SCHNABEL, E. Early Christian Mission (Downers Grove: InterVarsity,
2004), 2 vols.
______. Paul the Missionary: Realities, Strategies, and Methods
(Downers Grove: InterVarsity, 2008).
SCHREINER, T. R. Paul: Apostle of God’s Glory in Christ: A Pauline
Theology (Downers Grove: InterVarsity, 2001).
______. Teologia de Paulo: o apóstolo da glória de Deus (São Paulo:
Vida Nova, 2015).
THIELMAN, F. Paul and the Law: A Contextual Approach (Downers
Grove: InterVarsity, 1994).
WENHAM, D. Paul: Follower of Jesus or Founder of Christianity?
(Grand Rapids: Eerdmans, 1995).
WITHERINGTON III, B. The Paul Quest: The Renewed Search for the Jew
of Tarsus (Grand Rapids: Eerdmans, 1998).
WRIGHT, N. T. Justification: God’s Plan & Paul’s Vision (Downers
Grove: InterVarsity, 2009).

1
Veja esp. Eckhard J. Schnabel, Paul the Missionary: Realities, Strategies, and Methods

(Downers Grove: InterVarsity, 2008).

2
Isso se desenvolve organicamente da busca do Jesus histórico (veja cap. 3). Se há uma

descontinuidade entre o “Jesus da história” e o “Cristo da fé”, a questão naturalmente surge, “De

onde Paulo tirou sua religião?”.

3
F. C. Baur, Paul, the Apostle of Jesus Christ, tradução para o inglês de A. Menzies (London:

Williams & Norgate, 1875), 2 vols.

833
4
Para um excelente levantamento sobre a história inicial do debate, veja J. M. G. Barclay, “Jesus

and Paul”, em: G. F. Hawthorne; R. P. Martin; D. G. Reid, orgs., Dictionary of Paul and His Letters

(Downers Grove: InterVarsity, 1993), p. 492-503.

5
W. Wrede, Paul (London: Green, 1907), p. 179. A edição original Alemã é W. Wrede, Paulus,

Religionsgeschichtliche Volksbücher 1 (Tübingen/Halle: Mohr, 1904). Um crítico evangélico

importante da obra de Wrede foi J. G. Machen, The Origin of Paul’s Religion (New York: Macmillan,

1921).

6
Wrede, Paul, p. 180.

7
W. Bousset, Kyrios Christos: A History of Belief in Christ from the Beginnings of Christianity to

Irenaeus, tradução para o inglês de J. Steely (Nashville: Abingdon, 1970; ed. original alemã, 1913).

8
As respostas alemãs vieram de A. von Harnack, A. Jülicher e A. Resch. As respostas inglesas

incluíam as de J. Moffatt, C. A. A. Scott e J. G. Machen.

9
R. Bultmann, “The Significance of the Historical Jesus for the Theology of Paul”, em: Faith

and Understanding: Collected Essays (London: SCM, 1952), p. 223.

10
Para uma excelente discussão da contribuição de Bultmann para o debate, veja Barclay, “Jesus

and Paul”, p. 494-96.

11
Veja especialmente R. Bultmann, “Jesus and Paul”, em: Existence and Faith (London: Hodder

& Stoughton, 1936), p. 201.

12
Barclay, “Jesus and Paul”, p. 497-98.

13
D. L. Dungan, The Saying of Jesus in the Churches of Paul (Oxford: Blackwell, 1971).

14
D. Wenham, Gospel Perspectives 4: The Rediscovery of Jesus’ Eschatological Discourse

(Sheffield: JSOT, 1984); D. Allison, The End of the Ages Has Come (Philadelphia: Fortress, 1985).

834
15
M. Thompson, Clothed with Christ: The Example and Teaching of Jesus in Romans 12.1 to

15.13 (Sheffield: JSOT, 1991).

16
V. Furnish, Jesus According to Paul (Cambridge: University Press, 1993); A. J. M.

Wedderburn, org., Paul and Jesus: Collected Essays (Sheffield: JSOT, 1989); D. Wenham, Paul:

Follower of Jesus or Founder of Christianity? (Grand Rapids: Eerdmans, 1995); B. Witherington III,

Jesus, Paul and the End of the World (Downers Grove: InterVarsity, 1992).

17
H. Maccoby, The Mythmaker: Paul and the Invention of Christianity (London: Weidenfeld &

Nicholson, 1986).

18
Wenham, Paul, p. 3.

19
R. Bultmann, Theology of the New Testament, tradução para o inglês de K. Grobel (New York:

Scribner’s, 1951-55), 1:237-39; id., The Second Letter to the Corinthians (Minneapolis: Augsburg,

1985), p. 155-56.

20
M. J. Harris, The Second Epistle to the Corinthians, NIGTC (Grand Rapids: Eerdmans, 2005),

p. 429. Cf. N. T. Wright, The New Testament and the People of God, Christian Origins and the

Question of God 1 (Minneapolis: Fortress, 1992), p. 408.

21
Observe a ênfase em “direitos” e a “autoridade” do mensageiro do evangelho em 1Coríntios

9.2,12,15,18.

22
Wenham, Paul, p. 381.

23
Ibid., p. 385.

24
R. Bauckham, Jesus and the Eyewitnesses: The Gospels as Eyewitness Testimony (Grand

Rapids: Eerdmans, 2006), p. 267.

25
J. D. G. Dunn, The Theology of Paul the Apostle (Grand Rapids: Eerdmans, 1998), p. 195.

835
26
Wenham, Paul. Veja também S. Kim (“Jesus, sayings of”, em: Dictionary of Paul and His

Letters, p. 474-92), que identificou 25 casos nos quais Paulo certamente ou provavelmente se referiu

ou fez alusão a um dito de Jesus e a mais de 40 possíveis ecos de um dito de Jesus. As descobertas de

Kim são semelhantes às de Wenham. A descoberta de Kim de extensos paralelos entre o ensinamento

de Jesus e Paulo o levou a postular a tese: “quando nas cartas paulinas um eco de um dito dominical

autêntico é questionado, o ônus da prova repousa mais pesadamente sobre aqueles que o negariam,

do que naqueles que a aceitariam.”

27
Veja capítulo 3.

28
L. Hurtado, Lord Jesus Christ: Devotion to Jesus in Earliest Christianity (Grand Rapids:

Eerdmans, 2003), p. 254.

29
J. Marcus, Mark 1 to 8: A New Translation and Commentary, AB (New York: Doubleday,

2000), p. 432.

30
G. E. Ladd, A Theology of the New Testament, ed. rev. (Grand Rapids: Eerdmans, 1993), p.

143-57. A interpretação do significado do título sugerido por Ladd tem sido debatida em recentes

estudos. Veja J. D. G. Dunn, Christianity in the making (Grand Rapids: Eerdmans, 2003), vol.1:

Jesus Remembered, p. 724-64.

31
Veja Barclay, “Jesus and Paul”, p. 502; A. J. Köstenberger, “Review of David Wenham, Paul:

Follower of Jesus or Founder of Christianity?” TrinJ NS 16 (1995), p. 259-62.

32
Barclay, “Jesus and Paul”, p. 502.

33
Para a importância da experiência de Paulo na estrada de Damasco, veja S. Kim, The Origin of

Paul’s Gospel (Grand Rapids: Eerdmans: 1982). Para a importância do AT para Paulo e seus métodos

de exegese do AT, veja E. E. Ellis, Paul’s Use of the Old Testament (Grand Rapids: Baker, 1981).

34
Para a mais completa crítica da Nova Perspectiva, veja D. A. Carson; P. T. O’Brien; M. A.

Seifrid, orgs., Justification and Variegated Nomism (Grand Rapids: Baker, 2001, 2004), 2 vols.

836
35
Veja C. Brown, “Scholasticism”, em: T. Dowley, org., Eerdmans’ Handbook to the History of

Christianity (Grand Rapids: Eerdmans, 1985), p. 278-79.

36
Para uma breve biografia de Tomás Aquino, veja R. G. Clouse, “Thomas Aquinas”, em:

Eerdmans’ Handbook, p. 288.

37
Suma Teológica, 1a2ae.109.2.

38
Suma Teológica, 1a2ae.98.1.

39
Suma Teológica, 1a2ae.98.3.

40
Suma Teológica, 1a2ae.108.1.

41
Para um excelente resumo do ponto de vista tomista da salvação e a reação protestante, veja F.

Thielman, Paul and the Law: A Contextual Approach (Downers Grove: InterVarsity, 1994), p. 15-24.

42
Veja Thielman, Paul and the Law, p. 18-20.

43
F. Weber, Jüdische Theologie auf Grund des Talmud und verwandter Schriften, edição de F.

Delitzsch; G. Schnedermann, 2. ed. (Leipzig: Dörffl ing Franke, 1987), p. 25.

44
C. G. Montefiore, “Rabbinic Judaism and the Epistles of St. Paul”, JQR 13 (1900-1901), p.

161-217.

45
G. F. Moore, “Christian Writers on Judaism”, HTR 14 (1921), p. 197-254.

46
E. P. Sanders, Paul and Palestinian Judaism: A Comparison of Patterns of Religion

(Philadelphia: Fortress, 1977), p. 59.

47
Ibid., p. 75.

48
Veja esp. ibid., p. 234.

49
Ibid., p. 75.

837
50
J. D. G. Dunn, “The New Perspective on Paul”, BJRL 65 (1983), p. 95-122. O artigo foi

reimpresso em Jesus, Paul, and the Law: Studies in Mark and Galatians (Louisville: Westminster

John Knox, 1990), p. 183-214.

51
R. A. Streett, “An Interview with N. T. Wright”, CTR 2 (2005), p. 9. Compare N. T. Wright,

“New Perspectives on Paul” (trabalho acadêmico apresentado no 10. Annual Edinburgh Dogmatics

Conference, Rutherford House, Edinburgh, 28 de agosto de 2003), n.p.; online em

http://www.ntwrightpage.com/Wright_NewPerspectives.htm.

52
Veja a crítica de J. Piper, The Future of Justification: A Response to N. T. Wright (Wheaton:

Crossway, 2007).

53
J. D. G. Dunn, Romans 1 to 8, WBC 38A (Dallas: Word, 1988), lxix-lxxii.

54
J. D. G. Dunn, The Theology of Paul the Apostle (Grand Rapids: Eerdmans, 1998), p. 356.

55
Ibid., p. 364.

56
Ibid., p. 370-71. Como a maioria dos proponentes da Nova Perspectiva, Dunn considerava

Efésios (como também as Epístolas Pastorais) como sendo deuteropaulinas, isto é, escrito por alguém

que não Paulo.

57
Veja N. T. Wright, What Saint Paul Really Said: Was Saul of Tarsus the Real Founder of

Christianity? (Grand Rapids: Eerdmans, 1997), p. 100-11.

58
Dunn essecialmente concorda, mas este detalhe foi especialmente enfatizado por Wright. Para

a concordância de Dunn, veja Theology, p. 365-66.

59
Para a articulação mais recente da perspectiva de Wright, veja N. T. Wright, Justification:

God’s Plan and Paul’s Vision (Downers Grove: InterVarsity, 2009).

60
Veja B. Byrne, “Interpreting Romans Theologically in a Post-‘New Perspective’ Perspective”,

HTR 94 (2001): p. 227-41; e M. F. Bird, “When the Dust Finally Settles: Coming to a Post-New

838
Perspective Perspective”, CTR 2 (2005), p. 57-69.

61
Veja J. Neusner, The Study of Ancient Judaism (n.p.: Ktav, 1981), vol. 1: Mishnah, Midrash,

Siddur, p. 21-22. A advertência de Neusner contra a aplicação de uma abordagem de harmonização

para o estudo da literatura rabínica também igualmente se aplica ao estudo da literatura do Segundo

Templo.

62
Sanders, Paul, p. 427; id., “The Covenant as a Soteriological Category and the Nature of

Salvation in Palestinian and Hellenistic Judaism”, em: R. G. Hamerton-Kelly; R. Scroggs, orgs.,

Studies in Judaism in Late Antiquity (Leiden: Brill, 1976), vol. 2: Jews, Greeks and Christians:

Studies in Honor of W. D. Davies, p. 11-44; e id., Judaism: Practice and Belief 63 BCE-66 CE

(London: SCM, 1992), p. 262-78.

63
Veja C. L. Quarles, “The Soteriology of Rabbi Akiba and E. P. Sanders’ Paul and Palestinian

Judaism”, NTS 42 (1996), p. 185-95.

64
Do aram. tanna, “repetir, aprender”; mestres do ensino transmitiam por repetição oral.

65
Do aram. tosefta, “adição, suplemento”; ensinos adicionais que suplementavam a Mishná.

66
Do aram. amar, “dizer, comentar”; comentaristas dos ensinos do taná.

67
Veja A. Das, Paul, the Law, and the Covenant (Peabody: Hendrickson, 2001), p. 32-33. As

definições são adaptadas de H. L. Strack; G. Stemberger, Introduction to the Talmud and Midrash,

tradução para o inglês de M. Bockmuehl (Minneapolis: Fortress, 1992), p. 7, p. 168.

68
Das, Paul, p. 32-36; S. Kim, Paul and the New Perspective: Second Thoughts on the Origin of

Paul’s Thought (Grand Rapids: Eerdmans, 2002), p. 146-52. Cf. S. Westerholm, Perspectives Old

and New on Paul: The “Lutheran” Paul and His Critics (Grand Rapids: Eerdmans, 2004), p. 343.

69
Sanders, Paul, p. 75.

839
70
Veja C. L. Quarles, “The New Perspective and Means of Atonement in Jewish Literature of the

Second Temple Period”, CTR 2 (2005), p. 39-56.

71
Veja J. A. Fitzmyer, “Paul’s Jewish Background and the Deeds of the Law”, em: According to

Paul: Studies in the Theology of the Apostle (New York: Paulist, 1993), p. 18-35; D. J. Moo, “‘Law’,

‘Works of the Law’, and Legalism in Paul”, WTJ 45 (1983), p. 73-100; e T. R. Schreiner, “Works of

Law in Paul”, NovT 33 (1991), p. 217-44.

72
Sobre Paulo como missionário, veja especialmente A. J. Köstenberger; P. T. O’Brien, Salvation

to the Ends of the Earth: A Biblical Theology of Mission, NSBT 11 (Downers Grove: InterVarsity,

2001), cap. 7. Cf. E. J. Schnabel, Early Christian Mission (Downers Grove: InterVarsity, 2004), vol.

2: Paul and the Early Church, p. 923-1485; e R. L. Plummer, Paul’s Understanding of the Church’s

Mission, Paternoster Biblical Monographs (Milton Keynes, UK: Paternoster, 2006).

73
Jerônimo, Comentário da Epístola aos Filipenses, sobre o v. 23; De Viris Illustribus 5.

74
Veja Atos 18.3. Embora as cartas de Paulo façam algumas referências a seu trabalho no

comércio para seu próprio sustento financeiro (1Co 4.12; 9.1-18; 2Co 6.5; 11.23,27; 1Ts 2.9; 2Ts

3.8), somente Atos menciona seu ofício específico. Paulo provavelmente fazia tendas de couro.

Provavelmente ele era muito habilidoso em fazer e reparar uma grande variedade de mercadorias de

couro e de tecido. Veja R. F. Hock, The Social Context of Paul’s Mission (Philadelphia: Fortress,

1980), p. 20-21; e W. Michaelis, “skeμopoios”, TDNT 7:393-94.

75
Dião Crisóstomo, Orações 34.1-23.

76
Por exemplo, F. F. Bruce, Paul: Apostle of the Heart Set Free (Grand Rapids: Eerdmans,

1977), p. 37.

77
Jerônimo, Comentário da Epístola aos Filipenses, sobre o v. 23; De viris illustribus 5; Fócio,

Quaest. Amphil. 116.

840
78
O testemunho em Atos a respeito da cidadania romana de Paulo é afirmado por muitos

estudiosos. O mais sério recente desafio a cidadania de Paulo tem sido W. Stegemann, “War der

Apostel Paulus ein römischer Bürger?” ZNW 78 (1987), p. 200-29. Para uma convincente defesa da

cidadania romana de Paulo, veja M. Hengel, The Pre-Christian Paul (Philadelphia: Trinity Press

International, 1991), p. 6-15.

79
Para um discussão completa sobre a cidadania romana, veja A. N. Sherwin-White, The Roman

Citizenship (Oxford: Clarendon, 1973). Compare B. M. Rapske, “Citizenship, Roman”, em: C. A.

Evans; S. E. Porter, orgs., Dictionary of New Testament Background (Downers Grove: InterVarsity,

2000), p. 215-18.

80
Para uma discussão detalhada sobre o nome de Paulo, veja C. Hemer, “The Name of Paul”,

TynB 36 (1985), p. 179-83.

81
Veja J. McRay, Paul: His Life and Teaching (Grand Rapids: Baker, 2003), p. 44.

82
A Mishná normalmente se refere a Gamaliel I como “Gamaliel, o Ancião.” A pessoa referida

comos “Rabban Gamaliel” na Mishná era o neto de Gamaliel o Ancião. O conselho de Gamaliel ao

Sinédrio é semelhante ao ponto de vista rabínico em m. Avot 4.11.

83
Alguns acadêmicos negam que os fariseus viveram em Tarso, pois os fariseus fiéis precisavam

estar próximos do templo de Jerusalém. Veja B. Rapske, The Book of Acts and Paul in Roman

Custody, The Book of Acts in Its First Century Setting 3 (Grand Rapids: Eerdmans, 1994), p. 90-108.

Para um ponto de vista contrário, veja C. K. Barrett, Acts 15 to 28, ICC (London: T&T Clark, 1998),

p. 1063. Alguns estudiosos sugerem que “filho de fariseus” não se refere aos ancestrais biológicos de

Paulo, mas o identifica como um discípulo dos Fariseus ou do Perfeito Fariseu. Veja Barrett, Acts 15

to 28, p. 1063; e B. Chilton, Rabbi Paul: An Intellectual Biography (New York: Doubleday, 2004), p.

19.

84
Veja Isaías 65.25; Eo 28.23; e a tradução de Teodósio de Daniel 6.23.

841
85
J. B. Polhill, Acts, NAC 26 (Nashville: B&H, 1992), p. 501.

86
A ordem em que essas quatro epístolas foram escritas é desconhecida.

87
Para uma discussão completa da possível obra missionária de Paulo na Espanha, veja

Schnabel, Early Christian Mission, p. 1271-83.

88
Acts of Paul 3.3 em E. Hennecke; W. Schneemelcher, New Testament Apocrypha, ed. e

tradução para o inglês de R. M. Wilson (Philadelphia: Westminster, 1964), vol. 2: Writings Relating

to the Apostles, Apocalypses and Related Subjects, p. 354.

89
Veja discussão de “The Gospel Paul Preached”, em: Köstenberger; O’Brien, Salvation to the

Ends of the Earth, p. 173-84.

90
J. McRay, Paul: His Life and Teaching (Grand Rapids: Baker, 2003), p. 60.

91
R. Jewett, A Chronology of Paul’s Life (Philadelphia: Fortress, 1979), p. 1-2. Entre os

estudiosos discutidos por ele estão H. Braun, F. Hahn, E. Haenchen, A. Suhl, C. H. Buck, G. Taylor,

J. Hurd, G. Lüdemann, W. G. Kümmel, W. Marxsen, D. Guthrie, W. Michaelis, L. Goppelt, e D.

Georgi.

92
J. J. Gunther, Paul: Messenger and Exile: A Study in the Chronology of His Life and Letters

(Valley Forge: Judson, 1972); J. Knox, Chapters in a Life of Paul (Nashville: Abingdon, 1950); G.

Lüdemann, Paul, Apostle to the Gentiles: Studies in Chronology (Philadelphia: Fortress, 1984;

original alemão 1977); G. Ogg, The Chronology of the Life of Paul (London: Epworth, 1968).

93
Um bom exemplo dessa abordagem é L. C. A. Alexander, “Chronology of Paul”, em: G. F.

Hawthorne; R. P. Martin; D. G. Reid, orgs., Dictionary of Paul and His Letters (Downers Grove:

InterVarsity, 1993), p. 115-23.

94
J. Murphy-O’Connor, Paul: A Critical Life (Oxford: Clarendon, 1996), p. 1-4.

842
95
H. W. Hoehner, “Chronological Aspects of the Life of Christ. Part IV: The Day of Christ’s

Crucifixion”, BSac 131 (1974), p. 241-64; id., “Chronological Aspects of the Life of Christ. Part V:

The Year of Christ’s Crucifixion”, BSac 131 (1974), p. 332-48.

96
Jewett, Chronology, p. 30-33.

97
Veja “Introdução aos Gálatas” mais adiante.

98
Não apenas esta data se adequa bem à data da inscrição de Gálio, mas ela também é

compatível com o ciclo do ano sabático. J. Finegan observou que o ano imediatamente após o ano

sabático era uma ano de grande escassez de alimentos, e isso pode explicar a preocupação especial

com os pobres no Concílio de Jerusalém como descrito em Gálatas 2.10. Veja J. Finegan, Handbook

of Biblical Chronology, ed. rev (Peabody: Hendrickson, 1998), p. 394.

99
Jewett, Chronology, p. 58-61.

100
Suetônio, Claudius 25.4; Dião Cássio, História de Roma 60.6.6; e Orósio, Sete Livros de

História contra os Romanos 7.6.15-16.

101
Veja Dião Cássio, História de Roma 57.14.5. Para uma completa descrição da inscrição e sua

importância, veja Jewett, Chronology, p. 38-40.

102
Para a história e primeira tradução deste significativo achado, veja A. Deissmann, Paul. A

Study in Social and Religious History, tradução para o inglês de W. E. Wilson (London: Hodder &

Stoughton, 1926), p. 261-79.

103
Veja J. Knox, Chapters in a Life of Paul (Nashville: Abingdon, 1950), p. 81-3. Para a visão de

Knox do testemunho de Atos, veja p. 61-73.

104
Também D. Moody, “A New Chronology for the Life and Letters of Paul”, em: J. Vardaman;

E. M. Yamauchi, orgs., Chronos, Kairos, Christos: Nativity and Chronological Studies Presented to

Jack Finegan (Winona Lake: Eisenbrauns, 1989), p. 231-33.

843
105
Também Moody, “New Chronology”, p. 233; e Finegan, Biblical Chronology, p. 397.

106
Josefo, Ant. 20.182; Guerra Judaica 2.271.

107
Josefo, Guerra Judaica 2.252; Ant. 20.160-72.

108
Para a possibilidade de que a evidência numismática possa confirmar essa data, veja McRay,

Paul, p. 66; e J. Finegan, The Archaeology of the New Testament: The Mediterranean World of the

Early Christian Apostles (Boulder: Westview, 1981), p. 14, 36 e 39. Entretanto, esta evidência

permanece em questão até que fotografias das supostas micrografias sejam publicadas.

109
Eusébio, Hist. Ec. 2.22.2; 2.25.5; 3.2.30.1.

110
Veja Romanos 15.24, 28; 1Clemente 5-6; Fragmento Muratório; e as Epístolas Pastorais. Com

relação à possível obra missionária de Paulo na Espanha, veja a discussão em Schnabel, Early

Christian Mission, p. 1271-83.

111
Para uma boa discussão das questões, veja McRay, Paul: His Life and Teaching, p. 60-84.

112
A Crônica de Eusébio como preservada por Jerônimo data as mortes de Pedro e de Paulo no

décimo quarto ano do reinado de Nero, que seria o ano 68 (ou 67 uma vez que o ano de 54 é o

primeiro ano do reinado e o décimo terceiro poderia ser 67). No entanto, um indício em 1Clemente,

que afirma que Paulo sofreu “sob os governantes” (plural), sugere que a morte de Paulo ocorreu entre

Setembro de 66 e Março de 68. Durante este período, Nero estava viajando pela Grécia e Roma

estava sendo governada por Hélio e Tigelino, um homem liberto e um capitão da Guarda Pretoriana.

O plural em Clemente é melhor explicado como se referindo a estes dois governantes temporários.

Veja Finegan, Biblical Chronology, p. 387.

844
CAPÍTULO 10

A carta de Paulo aos Gálatas

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os fatos-chave de
Gálatas. Com relação à História, os estudantes deverão ser capazes de
identificar o autor, data, origem, destino e propósito da carta. Com relação à
Literatura, eles deverão ser capazes de fornecer um esboço básico do livro e
identificar os principais elementos do conteúdo do livro encontrados na
Discussão Unidade por Unidade. Com relação à Teologia, os estudantes
deverão ser capazes de identificar os principais temas teológicos em
Gálatas.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo
identificado no item Conhecimentos básicos, os estudantes deverão ser
capazes de apresentar argumentos para conclusões históricas, literárias e
teológicas. Com relação à História, os estudantes deverão ser capazes de
discutir as evidências da autoria paulina, data, origem, destino e propósito.
Com relação à Literatura, eles deverão ser capazes de fornecer um esboço
detalhado do livro. Com relação à Teologia, os estudantes deverão ser

845
capazes de discutir os principais temas teológicos em Gálatas e as maneiras
pelas quais eles contribuem exclusivamente para o cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além do domínio do conteúdo principal
identificado nos Conhecimentos básicos e dos Conhecimentos
intermediários mencionados acima, os estudantes deverão ser capazes de
defender a integridade literária de Gálatas. Eles também deverão ser
capazes de avaliar criticamente as teorias sobre o destino aos gálatas do
Norte e gálatas do Sul e de avaliar como cada uma afeta a datação de
Gálatas.

Mapa 10.1: Origem e destino de Gálatas.

846
FATOS-CHAVE DE GÁLATAS
Autor: Paulo
Data: 48 ou 49
Origem: Possivelmente Antioquia, Jerusalém ou a
rota entre as duas cidades
Destino: Igrejas do Sul da Galácia visitadas por
Paulo durante a primeira viagem
missionária
Motivo: Falso ensino (heresia judaizante)
Propósito: Defender o único e verdadeiro evangelho
Tema: Judeus e gentios são salvos pela fé em Jesus
Cristo, e não pelas obras da lei
Versículos-Chave: 3.10-14

INTRODUÇÃO

A Carta aos Gálatas é com toda a probabilidade a primeira carta que Paulo
escreveu que está incluída no NT. Uma vez que esta Introdução segue uma
abordagem cronológica com relação às cartas de Paulo, tratando-as na
ordem em que foram escritas em vez de na ordem canônica, Gálatas é o
lugar para começar. Embora a carta seja relativamente curta, ela exerceu
enorme influência no cristianismo. Os pais da igreja primitiva escreveram
mais comentários sobre Gálatas do que sobre qualquer outro livro do NT.1
A carta era uma das favoritas do reformador protestante Martinho Lutero,
que a descreveu como tão estimada por ele quanto a sua própria preciosa
esposa e a chamou de “minha própria epístola, à qual eu jurei fidelidade
eterna [i.e. empenhei minha confiança]; minha Katie von Bora”.2

847
Como um tributo à natureza fundamental de Gálatas para a
compreensão do evangelho cristão, G. Duncan descreveu a carta como a
“carta magna do cristianismo evangélico”.3 R. Longenecker elaborou:
“historicamente, Gálatas tem sido fundamental para muitas formas de
doutrina, proclamação e prática cristãs. E permanece verdadeiro hoje dizer
que o modo como se compreendem as questões e os ensinamentos de
Gálatas determina em grande parte que tipo de teologia é defendida, que
tipo de mensagem é proclamada e que tipo de vida é vivida”.4
Na verdade, Gálatas faz numerosas e significativas contribuições para a
teologia e ética do NT. A contribuição mais importante da carta é a sua
exposição da doutrina da justificação. Esta breve carta ataca todas as
noções, tanto antigas quanto modernas, de que o destino eterno de uma
pessoa depende de suas ações pessoais, de sua participação em rituais, ou
de sua conformidade com as normas do grupo. Em vez disso, a carta liberta
o fiel da escravidão da lei e expõe uma justiça mais elevada, inspirada e
fortalecida pelo Espírito que habita no ser.5 A carta também aborda a obra
transformadora do Espírito no fiel e a natureza da expiação substitutiva de
Cristo, e também expressa uma cristologia antiga, mas elevada.
Doutrinariamente, a importância da história da salvação em Gálatas
dificilmente pode ser superestimada. Ao esclarecer a natureza do evangelho
no ensino da salvação oferecida inteiramente pela graça de Deus e recebida
exclusivamente pela fé, a carta esclareceu e fortaleceu a verdadeira
mensagem cristã numa época em que alguns, até mesmo dentro da igreja,
tentavam subverter o evangelho. Assim, A. Cole estava correto em sua
avaliação de Gálatas como “uma refutação teológica de uma heresia que, se
aceita, teria destruído toda a igreja”.6 Gálatas continua a ser a mais feroz e
mais clara refutação da salvação através do esforço humano de autoria do

848
apóstolo Paulo. Nos últimos anos, entretanto, a carta foi foco de muitos
debates visto que os estudiosos e teólogos do NT começaram a questionar
entendimentos tradicionais da justificação pela fé.7

HISTÓRIA
Autor
Autenticidade
A carta aos Gálatas é considerada como uma carta autêntica do apóstolo
Paulo por todos, menos pelos críticos mais radicais. Aceitação da autoria de
Paulo é tão difundida que estender discussão desta questão não se faz
necessário. No final do século XVIII, vários estudiosos holandeses
rejeitaram a autoria de Paulo.8 No século XIX, B. Bauer negou a
autenticidade da carta e influenciou vários outros estudiosos a fazê-lo
também.9 No século XX, L. G. Rylands e F. R. McGuire rejeitaram a autoria
paulina de Gálatas.10 No entanto, os argumentos contra a autoria paulina de
Gálatas têm sido considerados pouco convincentes pela grande maioria dos
estudiosos.
O consenso dos estudiosos do NT vê as teorias de autoria de Gálatas
propostas por Bauer e McGuire como excessivamente céticas. F. C. Baur
classifica Gálatas, 1 e 2Coríntios e Romanos como as “principais cartas”
(do alemão Hauptbriefe), cartas cuja autoria era indiscutível.11 Muitos
críticos estão a tal ponto convencidos da autoria paulina de Gálatas que eles
usam a carta como padrão para atestar a autenticidade de outras cartas.
A igreja primitiva aceitou por unanimidade a autoria paulina de Gálatas.
Alusões a Gálatas aparecem nas obras de Clemente de Roma (c. 96), Inácio

849
(c. 35-110), Policarpo (c. 69-155) e Justino Mártir (c. 100-165). Gálatas foi
incluída nas primeiras listas canônicas e em versões antigas. Foi citada e
expressamente atribuída a Paulo por Ireneu (c. 130-200), Clemente de
Alexandria (c. 150-215), Orígenes (c. 185-254) e Tertuliano (c. 160-225).12
O autor se identificou como Paulo em Gálatas 1.1 e apelou para a sua
assinatura pessoal em Gálatas 6.11 como confirmação da autenticidade da
carta. A autoria paulina da epístola pode ser aceita com grande confiança.
Como R. Longenecker observou, “se Gálatas não for de Paulo, nenhuma
carta do NT é dele, pois nenhuma tem uma reivindicação melhor”.13

Integridade literária
Acusações mais sérias foram levantadas contra a integridade da carta e,
especialmente nos dois últimos séculos, um número considerável de
estudiosos questionou se Gálatas foi escrita originalmente na forma em que
o livro chegou até nós no NT. Na última metade do século XX, J. C.
O’Neill reviveu uma teoria do século XIX que sugeria que Paulo escreveu a
maior parte da carta, embora ela contenha numerosos comentários. Antigos
escribas inseriram algumas palavras e passagens na carta.14
Mais recentemente, W. Walker sugeriu que Gálatas 2.7b,8 é uma
interpolação não paulina.15 Walker apelou para seis fatores no texto como
evidência contra a autoria de Paulo desses versículos: (1) Paulo não utilizou
o nome “Pedro” em nenhum outro lugar; (2) ele também não utilizou em
outro lugar o verbo energein com a mesma construção sintática usada aqui;
(3) ele não fez distinção de dois evangelhos legítimos em lugar nenhum; (4)
a apresentação de Pedro e Paulo como os dois grandes missionários do
movimento cristão parece refletir uma fase posterior da história da igreja;

850
(5) essa discussão do apostolado não atribui apostolado a Paulo; e (6) os
versículos não se acomodam de forma adequada ao seu contexto atual.
Até hoje nenhuma resposta sistemática ao artigo de Walker apareceu,
mas os estudiosos observaram anteriormente alguns dos fenômenos
discutidos por Walker e ofereceram várias explicações para eles. E. Dinkler
sugeriu que Gálatas 2.7b,8 não é paulino, mas também não é uma
interpolação. O texto é uma citação que Paulo fez de um decreto escrito da
conferência apostólica em Jerusalém.16 Embora a maioria dos estudiosos
tenha achado alguns aspectos da proposta de Dinkler pouco convincentes,
estudiosos como O. Cullmann, H. D. Betz, e F. F. Bruce argumentaram que
alguma alusão a um documento oficial da igreja de Jerusalém é a melhor
explicação para algumas das características incomuns do texto de Gálatas.17
Ainda assim, explicações razoáveis podem ser oferecidas para as
características incomuns do texto de Gálatas 2.7b,8 sem que se adote a
teoria da Dinkler. Walker exagerou a singularidade do texto. U. Wilckens
demonstrou que o texto é permeado com terminologia distintamente
paulina.18 Embora Walker corretamente tenha assinalado que Paulo não
usou em outras passagens o verbo energein com o dativo simples, o verbo é
usado 18 vezes por Paulo e somente por ele no NT, exceto por um único
dito de Jesus (Mt 14.2; Mc 6.14) e por Tiago (Tg 5.16). Além disso, a
sintaxe original do versículo é explicável dada a nuança especial da
construção.19 O texto não faz referência a dois evangelhos diferentes,
embora legítimos, como afirmou Walker. As expressões “evangelho da
circuncisão” e “evangelho da incircuncisão” são melhor traduzidas como
“evangelho para a circuncisão” e “evangelho para a incircuncisão”.20
Muitos comentadores têm destacado que Paulo não está se referindo a dois
evangelhos diferentes com conteúdos distintos, mas a duas diferentes

851
audiências ou recipientes para o evangelho na missão da igreja (cf. Rm 4.9-
12).21
B. Ehrman alegou que “a única real exceção ao caráter paulino destes
versículos é o próprio nome de ‘Pedro’”.22 Paulo pode, aqui, usar o nome
grego Pedro em vez do nome aramaico Cefas como ele fez em outras
ocasiões, porque o significado de Cefas é importante, quer devido a uma
alusão a um dito de Jesus preservado em Mateus 16.16-2023 ou para a
identificação de Pedro como “aqueles reconhecidos como pilares”, uma vez
que pilares eram tipicamente esculpidos em pedra.
Gálatas 2.7b,8 é plenamente explicável e não há necessidade de afirmar
que se trata de uma interpolação. A nenhum dos manuscritos existentes de
Gálatas falta o texto ou expressa qualquer suspeita de que os versículos são
um acréscimo posterior de um escriba à carta. Assim, a grande maioria dos
estudiosos não só afirma a integridade como também a autenticidade da
carta. Além disso, uma teoria interessante foi proposta por E. R. Richards,
que alegou que as interpolações suspeitas nas cartas de Paulo que não são
indicadas por variantes nos manuscritos antigos podem muito bem ser
interpolações dos amanuenses que foram inseridas entre a redação original
de Paulo e a cópia final e que foram aprovadas por Paulo.24

852
Mapa 10.2: A província da Galácia.

Origem
A proveniência de Gálatas está intimamente relacionada à identidade dos
destinatários e à data de composição. A maioria das introduções e
comentários do NT nem mesmo arrisca uma conjectura do local de
composição. No entanto, ao se afirmar a teoria do Sul da Galácia (veja
abaixo) e aceitar a data de autoria entre a primeira viagem missionária e o
Concílio de Jerusalém, Paulo provavelmente escreveu a carta ou de
Antioquia, ou de Jerusalém, ou ainda de algum local na rota entre as duas
cidades.25

853
Destino
Embora a autoria paulina de Gálatas seja amplamente aceita, os estudiosos
divergem em suas opiniões sobre aqueles a quem a carta foi endereçada. É
claro que a carta foi dirigida aos gálatas (1.2; 3.1), mas a identificação
precisa dos gálatas é difícil. O termo Galácia poderia ser usado no primeiro
século tanto no sentido étnico quanto no provincial. A questão é
complicada, mas vale a pena o seu estudo. Identificar o preciso local das
igrejas da Galácia abordadas na carta é crucial para determinar a sua data.
No sentido étnico, o termo Galácia poderia ser usado para descrever a
área habitada pelos gauleses ou celtas que invadiram o norte da Ásia Menor
central a partir da Europa Central em 278 a.C. e eram da mesma origem
étnica dos celtas da França e da Grã-Bretanha. Se Paulo pretendeu esse
sentido em seu discurso, ele estava escrevendo às igrejas do Norte da
Galácia, possivelmente para cidades como Ancara, Pessino e Távio. A
teoria de que Paulo dirigiu sua carta às igrejas dessas cidades do norte é
chamada de teoria do Norte da Galácia.
Se o discurso de Paulo se destinava à província romana da Galácia, ele
poderia estar escrevendo para igrejas no Sul da Galácia. Em 64 a.C.,
Pompeu recompensou os Gálatas por seu apoio na sua batalha contra
Mitrídates V, ao torná-los um reino cliente. Ao longo das várias décadas
seguintes, o reino foi expandido em direção ao sul e ao leste. Em 25 a.C.,
Augusto reorganizou a área em uma província romana. Durante a época de
Paulo, a província se estendeu de Ponto, no mar Negro, à Panfília, no
Mediterrâneo. A província romana incluía cidades como Antioquia da
Pisídia, Icônio, Listra e Derbe. Paulo visitou essas cidades durante sua
primeira viagem missionária. A teoria de que Paulo dirigiu a carta às igrejas
nessas cidades é chamada de teoria do Sul da Galácia.

854
Mapa 10.3: Teoria do Norte da Galácia.

Evidência para a Teoria da Galácia do Norte


A teoria do Norte da Galácia foi o ponto de vista os pais da igreja primitiva,
dos comentaristas medievais e dos reformadores protestantes. A teoria foi
defendida por J. B. Lightfoot no século XIX, por J. Moffatt no início do
século XX, e mais recentemente por H. D. Betz.26 Embora a evidência dos
pais da igreja primitiva seja impressionante, eles podem ter imposto a sua
própria geografia contemporânea sobre o discurso de Paulo. No ano 74,
Vespasiano separou a maior parte da Pisídia da província da Galácia. No
ano 137, a parte Licaônia da província foi transferida para a Cilícia e, em c.
297, as partes restantes do Sul foram transferidas para uma nova província

855
da Pisídia. Quando os pais da igreja primitiva liam a palavra Galácia,
limites geográficos tinham mudado, e as cidades proeminentes da Galácia
que Paulo visitou durante sua primeira viagem missionária não eram mais
consideradas parte da Galácia.27 Ler a geografia de sua época no NT teria
sido um erro fácil. Isso seria como interpretar Louisiana como se referindo
apenas à pequena área contida no estado atual em vez de às vastas terras da
Louisiana em 1803.
Alguns acadêmicos argumentam que o uso de Lucas do termo Galácia
em Atos se ajusta à teoria do Norte da Galácia. Em Atos 16.6 e 18.23,
Lucas escreveu da região da Frígia e Galácia. Uma vez que a Galácia é
distinguida da Frígia (um distrito regional, mas não uma província), pode-se
concluir que Lucas estava se referindo ao distrito da Galácia excluindo os
distritos da Pisídia e Licaônia.28 Mas em Atos 16.6 Lucas usou uma
construção gramatical que parece significar “o território frígio-gálata”. F. F.
Bruce argumentou convincentemente que Lucas estava se referindo à seção
da província da Galácia que era habitada pelos frígios,29 e Atos 18.23 fala
da mesma área, embora uma terminologia ligeiramente diferente seja usada.
Estudiosos que afirmam a teoria do Norte da Galácia também apelaram
para Atos 13.13,14; 14.6. Nessas passagens, Lucas identificou locais com
base nas regiões geográficas, em vez de províncias romanas.30 Antioquia é
descrita como na Pisídia, em vez de na Galácia, e Listra e Derbe são
descritas como cidades de Licaônia, em vez de na Galácia. Assim, os
termos em Atos 16.6 são regionais, e não provinciais. Enquanto Lucas
usava descrições regionais, e não provinciais, quando Paulo descreveu a
localização das igrejas que ele fundou, normalmente ele o fez por
províncias: “As igrejas da província da Ásia” (1Co 16.19), “as igrejas da
Macedônia” (2Co 8.1); “Acaia” (2Co 9.2). Além disso, a referência a

856
“Galácia” em 1Pedro 1.1 parece apoiar o uso provincial uma vez que a
Galácia é nomeada juntamente com as províncias da Anatólia.31
Alguns estudiosos argumentaram que não há nenhum indício em
Gálatas da forte oposição que Paulo enfrentou quando pregou nas igrejas do
Sul da Galácia. Mas há algumas sugestões em Gálatas 5.11; 6.17, e na
referência de Paulo ao sofrimento dos gálatas em 3.4. Além disso, uma vez
que Paulo foi perseguido em praticamente todas as cidades que visitou, a
menção de perseguição não parece ser um meio útil para reduzir os
possíveis parâmetros da Galácia.

Evidência para a Teoria da Galácia do Sul


A teoria do Sul da Galácia foi popularizada por W. Ramsay em sua obra
Historical Commentary on Galatians [Comentário histórico sobre Gálatas],
publicada em 1899. Mais recentemente, o ponto de vista foi defendido por
F. F. Bruce e R. Longenecker. Estudiosos apontam para as seguintes
evidências para apoiar este ponto de vista:
Primeira, Paulo obviamente conhecia pessoalmente os leitores gálatas
(Gl 1.8; 4.11-15,19). O livro de Atos contém grandes quantidades de
informação sobre a obra de Paulo entre as igrejas do Sul da Galácia, mas
por outro lado não existe qualquer informação (a menos que At 16.6 e 18.23
sejam exceções) sobre a sua obra no Norte da Galácia. Alguns estudiosos
afirmam que esse argumento é enfraquecido pelo fato de que Atos também
não registra a fundação da igreja de Colossos.32 No entanto, as
circunstâncias com os colossenses são diferentes, uma vez que a igreja de
Colossos foi aparentemente fundada por Epafras (Cl 1.7, 8; 4.12,13), um
cooperador de Paulo, em vez de pelo próprio Paulo. Assim, o silêncio de

857
Atos sobre um ministério paulino no Norte da Galácia não parece
significativo.
Segunda, a rota descrita em Atos 16.6 e 18.23 parece ser uma rota do
Sul da Galácia, como já discutido.
Terceira, “Galácia” era a única palavra que teria abrangido Antioquia,
Listra, Icônio e Derbe. Antioquia ficava na região da Pisídia; Listra e Icônio
estavam na Licaônia. Além disso, Paulo normalmente utilizava nomes
imperiais romanos para as províncias.33
Quarta, em 1Coríntios 16.1 Paulo se refere às igrejas da Galácia como
entre os contribuintes para a coleta de Jerusalém. Atos 20.4 menciona um
homem de Bereia, dois de Tessalônica, dois do Sul da Galácia, dois da Ásia
que parecem representar as igrejas doando as ofertas. Isso sugere que as
igrejas da Galácia que Paulo mencionou em 1Coríntios eram igrejas do Sul
da Galácia. Se Paulo usou o termo Galácia de forma consistente, então a
carta aos Gálatas foi enviada para os gálatas do Sul. O argumento é
enfraquecido pelo fato de a lista poder estar incompleta. Também não foi
mencionado nenhum representante de Corinto.34
Quinta, Barnabé é mencionado três vezes em Gálatas (2.1,9,13).
Barnabé acompanhou Paulo apenas na primeira viagem missionária pelas
cidades na Galácia do Sul. Ele não acompanhou Paulo na segunda e na
terceira viagens, a suposta ocasião de uma visita à Galácia do norte. Essa
evidência não é conclusiva, no entanto, uma vez que Barnabé é mencionado
em 1Coríntios 9.6, embora não existam evidências de que ele fosse
conhecido pela igreja.35 Ainda, a proeminência de Barnabé em Gálatas
parece sugerir que ele era conhecido pelas igrejas da Galácia.

Conclusão

858
As duas teorias têm seus pontos fortes e fracos. Nenhuma delas pode ser
comprovada ou refutada de forma conclusiva. O saldo das evidências pesa
em favor da teoria do Sul da Galácia.36 Talvez ainda mais importante, não
há nenhuma evidência bíblica de que Paulo alguma vez tenha visitado as
cidades do Norte da Galácia, enquanto Atos registra Paulo plantando igrejas
no Sul da Galácia. Além disso, como discutido, a referência às igrejas da
Galácia em 1Coríntios 16.1 e a repetida menção de Barnabé em Gálatas
(2.1,9,13) também parecem favorecer como destino a Galácia do sul.

Data
A data de Gálatas depende amplamente de três fatores: (1) a questão do
destino; (2) a relação das duas visitas de Paulo a Jerusalém mencionadas em
Gálatas (1.18; 2.1-10) com as quatro visitas a Jerusalém mencionadas em
Atos (At 9.26-30; 11.30; 15.1-30; 21.15-17); e (3) o número de visitas às
igrejas da Galácia feitas antes de a carta ter sido escrita, como está implícito
em Gálatas 4.13. A determinação do destino faz a maior diferença na data.
Aqueles que defendem a teoria do Sul da Galácia normalmente afirmam
uma data relativamente antiga para a carta: logo após a primeira viagem
missionária de Paulo, ou apenas pouco antes ou logo após o Concílio de
Jerusalém. Aqueles que aceitam a teoria do Norte da Galácia normalmente
afirmam uma data posterior, geralmente durante a terceira viagem
missionária de Paulo.37

Evidências de uma data posterior (Teoria do Norte


da Galácia)

859
Aqueles que defendem a teoria do norte da Galácia normalmente datam
Gálatas durante a terceira viagem missionária de Paulo (c. 53-57).38 Uma
data que remonte pelo menos à segunda viagem missionária é necessária,
uma vez que a carta deve ter sido escrita após a primeira visita de Paulo à
Galácia descrita em Atos 16.6 e, possivelmente, depois da segunda visita
registrada em Atos 18.23 (dependendo de como se entende Gl 4.13).
Alguns intérpretes argumentam, com base no uso da palavra “depressa” em
Gálatas 1.6, que a carta foi escrita logo após a visita de Atos 18.23 e,
provavelmente, durante os primeiros estágios do ministério de Paulo de três
anos em Éfeso. J. B. Lightfoot argumentou que semelhanças entre Gálatas,
Romanos e 1 e 2Coríntios sugerem que elas foram escritas no mesmo
período de vida do apóstolo. Ele argumentou que se pode detectar o
desenvolvimento de uma resposta cada vez mais sóbria e madura ao
legalismo judaico por meio de 1Coríntios, 2Coríntios, Gálatas e Romanos.
Essa evolução coloca a autoria de Gálatas entre 1 e 2Coríntios e Romanos.
Assim, Paulo escreveu Gálatas da Macedônia ou Acaia no final de 57 ou
início de 58.39

Evidências de uma data anterior (Teoria do Sul da


Galácia)
Paulo lista duas visitas a Jerusalém nos dois primeiros capítulos de Gálatas.
A visita mencionada em Gálatas 1.18 corresponde à de Atos 9.26. A visita
descrita em Gálatas 2.1-10 poderia corresponder tanto a Atos 11.28-30
quanto a Atos 15.1-20. Se Gálatas 2.1-10 corresponde a Atos 11.28-30,
então a carta foi escrita antes do Concílio de Jerusalém. Se Gálatas 2.1-10

860
corresponde a Atos 15.1-20, Gálatas foi escrita depois do Concílio de
Jerusalém.

A data pós-Concílio de Jerusalém


Alguns dos estudiosos que defendem a teoria da Galácia do sul identificam
a visita de Jerusalém de Gálatas 2.1-10 com o Concílio de Jerusalém em
Atos 15.1-20. Se for assim, a data da composição de Gálatas é
provavelmente algum momento entre os anos 50 e 57. Estudiosos apelam
para várias evidências para apoiar essa equação.
Primeiro, a conferência em Gálatas 2.1-10 e o concílio em Atos 15.1-20
envolvem os mesmos participantes: Paulo, Barnabé, Pedro e Tiago. Eles
abordam a mesma questão: a obrigação dos cristãos de guardar a Lei
judaica. Eles levam ao mesmo resultado: a circuncisão não é imposta aos
gentios convertidos, mas os convertidos devem se lembrar dos pobres. E.
De Witt Burton, um dos primeiros proponentes da teoria da Galácia do sul,
alegou que essa evidência era inequívoca: “os pontos de coincidência entre
esta narrativa [Gálatas 2] e a de Atos 15 são tantos e de tal caráter que
praticamente estabelecem a identidade dos dois eventos”.40
Os defensores de uma data pós-Concílio de Jerusalém para Gálatas
também argumentam que não há nenhuma menção de alguma conferência
com os apóstolos durante a visita de combate à fome descrita em Atos.
Assim, qualquer identificação de Gálatas 2.1-10 com Atos 11.30 é baseada
no argumento do silêncio.
Igualar as visitas de Gálatas 2.1-10 e Atos 15.1-20 significa que Paulo
não menciona a visita de Atos 11.30 em momento algum. Mas os
proponentes da hipótese oferecem várias explicações possíveis para esse

861
silêncio. Primeiro, Atos 11.30 diz que Paulo e Barnabé entregaram a oferta
para o combate à fome para os “anciãos”, o que pode não ter incluído os
apóstolos. Uma vez que Gálatas 2.1-10 diz respeito à interação de Paulo
com os apóstolos, a visita de Atos 11.30 foi irrelevante para a discussão.
Segundo, muitos estudiosos modernos duvidam da confiabilidade histórica
de Atos e particularmente de sua descrição das várias visitas de Paulo a
Jerusalém.41 Eles argumentam que ou a visita do combate a fome nunca
ocorreu ou que a visita realmente ocorreu após o Concílio de Jerusalém e
que Lucas a transpôs. A falha de Paulo em mencionar os decretos
apostólicos não requer uma data antes do Concílio de Jerusalém uma vez
que Paulo nunca apelou aos decretos em qualquer uma de suas cartas.

862
Mapa 10.4: Teoria do Sul da Galácia.

A data pré-Concílio de Jerusalém


A visita em Gálatas 2.1-10 parece corresponder à de Atos 11.28-30. Atos
11.28-30 descreve uma visita com o objetivo de prestar socorro da fome aos
judeus cristãos em Jerusalém e não menciona a discussão do apóstolo
acerca da missão de Paulo aos gentios. No entanto, parte do propósito da
última oferta para o combate da fome enviada pela missão dos gentios à
igreja de Jerusalém parece ser a de demonstrar a autêntica confissão
gentílica do evangelho e inspirar o amor da igreja de Jerusalém e sua
aceitação dos gentios convertidos (2Co 9.12-14). Esse também pode ter

863
sido um fator motivador da oferta anterior. Seria natural que a discussão do
evangelho de Paulo e da missão gentílica surgisse em tal contexto.
Igualar a visita de Gálatas 2.1-10 ao Concílio de Jerusalém significaria
que Paulo falhou em mencionar uma de suas visitas a Jerusalém em sua
carta aos Gálatas. Tal omissão é altamente improvável. Paulo estava
demonstrando que seu apostolado era de origem puramente divina e não
derivada dos líderes apostólicos em Jerusalém. Para que os argumentos
teológicos de Paulo fossem válidos, todas as suas visitas precisavam ser
contabilizadas. A insistência de Paulo em sua absoluta integridade em
relatar as visitas a Jerusalém não exigia nada menos (Gl 1.20). Assim, as
duas visitas de Paulo a Jerusalém descritas em Gálatas correspondem às
duas primeiras visitas descritas em Atos.
O desafio de Paulo aos judaizantes poderia ter sido reforçado por um
apelo ao decreto do Concílio de Jerusalém. Nenhum apelo foi feito,
presumivelmente, porque o decreto ainda não tinha sido baixado. A
hesitação de Pedro em relação à comunhão à mesa com os gentios (Gl 2.12)
também se adequaria melhor com uma data pré-concílio. Os esforços para
equiparar a visita de Gálatas 2 com o Concílio de Jerusalém descrito em
Atos 15 enfrentam sérias dificuldades. Mais importante ainda, Gálatas 2
descreve um concílio privado, mas o de Atos 15 é público.
Paulo mencionou visitar a Síria e a Cilícia entre suas visitas a
Jerusalém. Se a segunda visita é a do Concílio de Jerusalém, então a
Galácia deveria ser adicionada à Síria e Cilícia. Mas uma vez que Paulo
visitou a Síria e a Cilícia antes da visita de combate à fome e somente após
essa visita ele começou sua primeira viagem missionária, a menção
específica da Síria e da Cilícia dá suporte à correspondência entre Gálatas
2.1-10 e Atos 11.28-30, em vez de Atos 15.

864
Gálatas 4.13 refere-se ao momento em que Paulo “anunciou o
evangelho pela primeira vez” (NVI) aos Gálatas, possivelmente implicando
que Paulo visitou as igrejas da Galácia duas vezes antes de ele escrever sua
carta.42 Alguns estudiosos identificam a segunda visita como a descrita em
Atos 16.6, requerendo que a carta tenha sido escrita após o início da
segunda viagem missionária de Paulo e, portanto, após o Concílio de
Jerusalém. No entanto, o advérbio grego pode significar “anteriormente”
(HCSB) em vez de “nas duas visitas anteriores”. O costume na literatura
clássica exigiria “anterior”, mas na época do NT o sentido de
“anteriormente” era comum.43 Mesmo que se insistisse no uso clássico aqui,
a segunda visita pode ser identificada como a visita às cidades da Galácia
do sul em Atos 14.21 e, assim, antes do Concílio. Consequentemente, uma
data antes de 49 para a carta ainda pode ser mantida.

Conclusão
A preponderância da evidência favorece a equação da visita de combate à
fome em Atos 11.30 com a visita relatada novamente em Gálatas 2.1-10.
Embora semelhanças superficiais entre Atos 15.1-20 e Gálatas 2.1-10
existam, um exame minucioso dos dados sugere que a visita de Gálatas 2.1-
10 tem mais em comum com a visita de combate à fome de Atos 11.30.
Assim, Gálatas foi escrita provavelmente por volta de 48 ou 49.

865
Tabela 10.1: Acontecimentos em Torno da Redação de Gálatas
Evento Data provável Passagem do NT
1. Visita a Jerusalém de 47 Atos 11.30 = Gl 2.1-10
combate à fome
2. Primeira viagem 47-48 Atos 13.4 a 14.28
missionária
3. Paulo escreveu Gálatas 48/49 Gálatas
4. Concílio de Jerusalém 49 Atos 15.1-20

Motivo e Propósito
Assumindo-se a teoria do Sul da Galácia, Atos 13 e 14 combinado com
algumas referências espalhadas por Atos mostra o trabalho paulino de
fundação de igrejas nas igrejas do Sul da Galácia. A obra evangelística
inicial de Paulo entre os Gálatas foi complicada por uma doença que
prejudicou sua visão (Gl 4.13-16). No entanto, os gálatas recepcionaram
Paulo de forma calorosa, reconheceram que sua mensagem era de origem
divina e o receberam como se ele fosse um anjo ou até mesmo o próprio
Cristo. Muitos acreditaram no evangelho de Paulo, demonstrando assim a
sua nomeação divina para a vida eterna (At 13.48; 14.4, 21). Os gálatas
amavam Paulo de forma tão poderosa que teriam sacrificado seus próprios
olhos para restaurar a visão de Paulo, se isso fosse possível.
Paulo claramente proclamou o evangelho da graça desde o início de seu
ministério aos gálatas. De acordo com Atos 13.38, 39, Paulo ofereceu aos
judeus e gentios que adoravam a Deus na sinagoga de Antioquia da Pisídia
o perdão dos pecados através de Jesus: “Todo o que crê nele é justificado de
todas as coisas, das quais vocês não poderiam ser justificados pela Lei de
Moisés”. A obra de Paulo encontrou forte oposição dos judeus da área. A

866
oposição dos judeus foi inicialmente motivada por ciúme do sucesso e da
popularidade de Paulo com o povo (At 13.45). Mas a rivalidade pessoal foi
rapidamente substituída por disputas religiosas. A declaração em Atos 14.3
de que o Senhor “confirmava a mensagem da sua graça” através de sinais e
prodígios milagrosos implica que a oposição dos judeus tinha centrado sua
campanha contra o ensino de Paulo sobre a graça. Assim, a questão da
salvação pela graça versus a lei de Moisés permeou o ministério de Paulo
aos gálatas e foi o ponto crucial que dividiu os discípulos cristãos e os
gálatas judeus.
Logo após Paulo deixar a área, os falsos mestres se infiltraram na igreja
pregando um evangelho diferente — um evangelho que insistia que a
manutenção da lei de Moisés, em particular o recebimento da circuncisão,
em vez de somente fé no evangelho da graça, era essencial para a salvação.
Os falsos mestres eram provavelmente judeus que se consideravam cristãos,
mas Paulo foi enfático de que a imposição da lei como um requisito para a
salvação era incompatível com o cristianismo genuíno (Gl 1.6-9). Os
estudiosos geralmente rotulam esses falsos mestres como “judaizantes”,
pois tentavam impor o judaísmo sobre os novos convertidos ao
cristianismo. Os judaizantes proclamavam uma mensagem semelhante à
expressa em Atos 15.1: “Se não vos circuncidardes, segundo o costume
instituído por Moisés, não podeis ser salvos”. Os judaizantes podem não ter
insistido para que os Gálatas guardassem toda a lei. A circuncisão era o seu
foco principal. Mas Paulo advertiu que a exigência da circuncisão para a
salvação em última análise fazia com que fosse obrigatória toda a lei do AT
(Gl 5.3). Assim, Paulo frequentemente defendeu o evangelho contra a
necessidade de observar a lei de modo geral (Gl 1.16,21; 2.2,5,10 etc).

867
A proclamação que Paulo fez do evangelho da graça tinha sido tão clara
que a insistência na circuncisão e a observância da lei não poderia ser feita
sem a rejeição do apostolado de Paulo. Isso levou à acusação por parte dos
judaizantes de que o apostolado de Paulo era de alguma forma inferior ao
dos outros apóstolos. Esses oponentes distorciam as Escrituras e afirmavam
que suas doutrinas estavam imbuídas de verdadeira autoridade — a
autoridade dos apóstolos originais da igreja em Jerusalém. Os membros da
igreja da Galácia abandonaram o verdadeiro evangelho e começaram a se
ressentir de Paulo e de seus ensinamentos e a rejeitar a autoridade do
apóstolo.
Paulo escreveu Gálatas para defender o evangelho da justificação pela
fé somente contra o falso evangelho dos judaizantes. No processo, ele teve
que defender sua autoridade apostólica contra o ataque dos judaizantes.
Finalmente, uma vez que alguns leitores poderiam interpretar a defesa que
Paulo fez do evangelho da graça como justificação para o comportamento
imoral ou antiético, Paulo escreveu para defender a coerência da vida
guiada pelo Espírito com as exigências justas da lei.

Algo Para Pensar: Nenhum Outro Evangelho

No mundo antigo era costume iniciar as cartas com algumas


poucas palavras — um desejo pelo bem-estar do destinatário ou uma
lembrança dos bons tempos do passado. A maioria das cartas de
Paulo, de igual forma, é iniciada com palavras de ação de graça ou
com uma oração pelos recipientes, mas não a sua carta aos Gálatas.
Essa é uma medida do desespero do apóstolo. “Estou admirado”, ele

868
passou diretamente para o coração do problema, “que vocês estejam
se desviando tão depressa daquele que os chamou pela graça de
Cristo e que estejam se desviando para um evangelho diferente —
não que haja outro evangelho!” (Gl 1.6,7).
Na Galácia do primeiro século, como em nossos dias, há aqueles
que mudariam o evangelho da graça de Deus em uma mensagem de
esforços humanos. Mas, como acertadamente observou Paulo, se a
nossa salvação depende da nossa própria contribuição ou
habilidade, essa mensagem não é mais “o evangelho”, — a boa nova
— porque somos pecadores! Se a nossa salvação depende de algo
que fazemos, nós estamos condenados! É por isso que Paulo disse
em Romanos: “eu não me envergonho do evangelho porque ele é o
poder de Deus para a salvação de todo aquele que crê […]. Pois
nele a justiça de Deus é revelada de fé em fé” (Rm 1.16,17, ênfase
acrescentada).
Os adeptos de praticamente todas as religiões do mundo, exceto
o cristianismo, buscam alcançar comunhão com Deus — ou Nirvana
ou alguma outra forma de estado final — através de esforços
próprios. Em última instância essas pessoas estão sem esperança. A
verdadeira esperança não vem por meio do que o homem pode fazer,
mas apenas através da fé no que um outro homem já fez — Jesus, o
Cordeiro de Deus e o Salvador do mundo, que morreu na cruz pelos
pecados do mundo. Essa é a salvação que é tanto o poder de Deus
quanto a justiça de Deus e, portanto, verdadeiramente “boas novas”.

LITERATURA

869
Plano Literário
Embora alguns estudiosos tenham sugerido que Gálatas é uma carta
apaixonada composta no calor da controvérsia e, portanto, sem uma
estrutura clara e planejada, pesquisa recente sugere que a carta foi muito
mais cuidadosamente composta.44 Como a maioria das cartas do período,
Gálatas tem uma óbvia introdução (1.1-9), corpo (1.10 a 6.10) e conclusão
(6.11-18). Os comentadores mais antigos geralmente veem o corpo da carta
como composto de três partes principais: uma seção histórica (1.10 a 2.21),
45
uma seção teológica (3.1 a 5.1) e uma seção ética (5.2 a 6.10). A seção
histórica demonstra a origem divina do evangelho de Paulo — seu encontro
com o Cristo ressurreto na estrada de Damasco. A seção teológica defende
o evangelho da justificação pela fé independente das obras da lei. A seção
ética descreve o estilo de vida induzido pelo Espírito Santo naqueles
justificados pela fé.
Desde a inovadora aplicação de H. D. Betz da crítica da retórica a
Gálatas em seu comentário de 1979, muitos estudiosos têm procurado
comparar as cartas de Paulo com as diferentes categorias de discursos e
cartas descritas pelos antigos retóricos.46 De acordo com os retóricos, os
discursos escritos para diversos fins deveriam conter elementos específicos
em um arranjo específico. Mas depois de quase 30 anos de debate sobre se
Gálatas deveria ser classificada como retórica forense (Betz), deliberativa
(Kennedy), ou epidítica (Hester), os estudiosos ainda parecem longe de
qualquer consenso sobre a questão.47 Isso sugere que os métodos da crítica
retórica são frustrantemente subjetivos. Além disso, muitos estudiosos
protestaram contra a aplicação de categorias concebidas para orações
públicas a cartas pessoais.48 Outros ainda manifestaram sérias dúvidas de

870
que as classificações retóricas das cartas de Paulo lancem muita luz sobre o
seu significado.49
Em vez de comparar Gálatas aos discursos, Longenecker procurou
comparar Gálatas com os vários tipos de carta escritos no mundo antigo. O
manual de Demétrio On Style descreve 21 tipos diferentes de cartas.
Algumas cartas combinam duas ou mais dessas categorias. Com base em
fórmulas epistolares em Gálatas, Longenecker sugeriu que Gálatas era uma
carta de repreensão e solicitação. O esquema abaixo representa uma
adaptação da estrutura de Gálatas proposta por Longenecker.50

ESTRUTURA
I. Abertura (1.1-5)

II. Repreensão: o evangelho de Paulo e o “outro evangelho” (1.6 a 4.11)


A. Seção histórica (1.6 a 2.21)
1. Nenhum outro evangelho (1.6-10)
2. A conversão de Paulo, visitas a Jerusalém e encontro com Pedro
(1.11 a 2.14)
3. Nenhuma justificação pelas obras da Lei (2.15-21)
B. Seção teológica (3.1 a 4.11)
1. Justificação pela fé: o exemplo de Abraão (3.1-18)
2. O propósito da Lei (3.19 a 4.7)
3. Não voltem atrás (4.8-11)

III. Apelo: escolha da liberdade da vida no espírito (4.12 a 6.10)


A. Filhos da mulher livre (4.12-31)
1. Exaspero de Paulo (4.12-20)

871
2. Uma Ilustração: Sara e Hagar e as duas alianças (4.21-31)
B. Vivendo uma vida de liberdade (5.1 a 6.10)
1. Permanecei firmes: a liberdade do cristão (5.1-15)
2. Caminhai pelo Espírito, não sob a Lei (5.16-26)
3. Cumpri a Lei de Cristo e semeai para o Espírito (6.1-10)

IV. Conclusão (6.11-18)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Abertura (1.1-5)
As necessidades das igrejas da Galácia eram tão urgentes que Paulo não
esperou pelo corpo de sua carta para começar a resolver as confusões das
igrejas. Mesmo enquanto ele identificava o remetente e os destinatários da
carta e cumprimentava os seus leitores, ele tocava nas principais questões
que gostaria de discutir de forma mais detalhada mais tarde. Primeiro, Paulo
defendeu o seu apostolado genuíno. Um “apóstolo” é alguém comissionado
por outro para uma tarefa e que recebe autoridade para realizar essa tarefa.
Paulo salientou que o seu comissionamento para o serviço não vinha de um
grupo de pessoas e também não fora comunicado por um homem que agiu
em nome de Deus. Paulo foi comissionado para o ministério por Jesus
Cristo e pelo Pai.
Ao contrastar Jesus com os seres humanos e ao colocar Jesus Cristo ao
lado do Pai como as duas fontes de seu comissionamento, Paulo implicou a
divindade de Cristo, bem como afirmou seu comissionamento divino. A
menção que Paulo fez da ressurreição deve ter levado os leitores a recordar
que o comissionamento de Paulo veio do Jesus glorificado e ressurreto de

872
modo que o seu próprio apostolado em nada era inferior ao dos Doze. Paulo
também se referiu a seus colaboradores que o acompanharam em suas
viagens para demonstrar que o seu evangelho não era uma idiossincrasia
afirmada apenas por ele, mas era também adotado por outros homens
piedosos.
Paulo identificou Jesus Cristo, de quem a graça e a paz vêm, ao apelar
para a sua morte sacrificial. Cristo se entregou por nossos pecados,
suportando a maldição que nossos pecados mereciam em nosso lugar para
que pudéssemos escapar dessa maldição (cf. 3.13). Os adversários de Paulo
poderiam ter argumentado que a visão de que o perdão é baseado somente
na expiação substitutiva de Cristo favorece o comportamento irresponsável
e imoral. Paulo antecipou a oposição mesmo antes de ter sido levantada e
insistiu que a morte sacrificial de Jesus não foi pretendia apenas para
conceder perdão ao fiel, mas também para resgatá-lo das influências
corruptoras de uma era depravada.
Isso, e nada menos, cumpriu o propósito de Deus para o fiel. O fiel é
resgatado desta atual era malígna quando reconhece que ele pertence à era
vindoura e começa a viver em função dessa consciência (veja Cl 3.1-17). A
era vindoura é a era da ressurreição na qual o fiel será totalmente libertado
de sua corrupção e é a era na qual Cristo vai sujeitar todas as coisas. O
breve resumo de Paulo do evangelho o fez irromper, acertadamente, em
uma doxologia. O evangelho com sua mensagem sobre o perdão e sobre a
transformação mostra a glória eterna de Deus e incita as suas criaturas a
louvá-lo como nada mais o faz.

II. Repreensão: O Evangelho de Paulo e o “Outro


Evangelho” (1.6 a 4.11)

873
Paulo repreendeu os gálatas por abandonarem o único evangelho
verdadeiro, aceitando a alegação dos judaizantes de que a circuncisão é
necessária para a salvação.

A. Seção histórica (1.6 a 2.21)


Porque os judaizantes rejeitaram o evangelho que Paulo pregava, Paulo
demonstrou que seu evangelho era de origem divina, não humana. O
próprio Jesus Cristo tinha revelado esse evangelho a Paulo. O evangelho de
Paulo claramente não era derivado de seu passado judaico. Sua lealdade à
tradição judaica só o levou a procurar destruir a igreja e a fé. Da mesma
forma, o evangelho de Paulo não era derivado dos outros apóstolos ou dos
líderes da igreja de Jerusalém (1.11,12). Na verdade, ele só foi conversar
com esses proeminentes cristãos anos após sua conversão.
Quando ele finalmente se encontrou com os apóstolos e os líderes da
igreja de Jerusalém, eles calorosamente aprovaram o evangelho de Paulo e
incentivaram a continuidade de seu ministério aos gentios. Além disso,
Paulo descobriu que alguns desses líderes proeminentes da igreja não se
comportavam de uma maneira que fosse coerente com o evangelho que eles
todos proclamavam. Paulo foi forçado a desafiar os líderes da igreja por
essa hipocrisia (2.11-14). O desafio de Paulo demonstrou que sua
autoridade apostólica em nada era inferior à deles.
Paulo lembrou esses judeus cristãos que até mesmo eles foram salvos
pela fé em Jesus Cristo e não pela obediência à lei. Se até mesmo os judeus
não foram salvos pela lei, certamente a lei não era o meio de salvação para
os gentios. Pela sua união com Cristo, os fiéis participaram na morte de
Jesus. Eles morreram para a lei e a lei já não exerce autoridade sobre eles.

874
Cristo, porém, habita nos fiéis, o que permite que vivam dignamente. A
gratidão do fiel pelo grande amor e enorme sacrifício de Cristo motiva o
justo viver do fiel.

B. Seção teológica (3.1 a 4.11)


Paulo continuou seu ataque ao falso evangelho dos judaizantes com uma
série de argumentos teológicos. Primeiro, a própria experiência religiosa
dos gálatas confirmava a centralidade da fé em vez da lei (3.1-5). O Espírito
Santo era conferido aos fiéis quando eles criam no evangelho. Sua presença
neles era comprovada pela ocorrência de milagres. Isso implicava que a fé,
não a lei, era a base real para a salvação. Segundo, a descrição da lei de
Abraão demonstrou que a fé era o meio pelo qual uma pessoa era declarada
justa por Deus (3.6-9). Embora Abraão fosse conhecido como o pai dos
judeus, o AT predisse que povos de todas as nações compartilhariam da
bênção da justificação pela fé.
Terceiro, a salvação pelas obras da lei exige obediência completa e
absoluta. Uma pessoa que não obedece sempre a todas as leis é na verdade
amaldiçoada pela lei. Em sua morte vicária, Jesus suportou essa maldição
pelos pecadores a fim de libertá-los da maldição da lei. Quarto, a aliança de
Deus com Abraão, que era baseada na fé, precedeu a promulgação da lei em
430 anos (3.15,16). A aliança baseada na fé ainda prevalece.
Quinto, a lei não foi dada em primeiro lugar para prover salvação, mas
para levar os pecadores a Cristo (3.19-26). A lei trouxe o conhecimento do
pecado e condenou toda a humanidade por esse pecado; portanto, a lei se
destinava a conduzir os pecadores a olhar para Cristo para salvação. Sexto,
os fiéis gentios não são cidadãos de segunda classe da família de Deus (3.27

875
a 4.7). Cristo aboliu a distinção espiritual entre os fiéis. Deus adotou os
fiéis, tanto judeus como gregos, como seus filhos e eles têm posição de
igualdade com Deus. Sétimo, observar o calendário de rituais judaicos
como um meio de salvação não era nada mais do que um lapso de
paganismo do qual os gálatas tinham sido libertados (4.8-11).

III. Apelo: A Escolha da Liberdade da Vida no


Espírito (4.12 a 6.10)
Depois de explicar os erros da heresia judaizante, Paulo apelou aos gálatas
para que retornassem ao verdadeiro evangelho (4.12-20). Ele começou o
seu apelo lembrando os gálatas do íntimo relacionamento que ele tinha
compartilhado com eles, advertindo-os de que os judaizantes não se
importavam com eles do modo como Paulo se importava. Na verdade, o
ministério dos judaizantes aos gálatas tinha motivos egoístas ocultos.
O apóstolo usou uma alegoria sobre Sara e Hagar para ensinar que os
verdadeiros filhos de Abraão eram livres, não escravos da lei, e que eles
sempre foram perseguidos pelos falsos filhos de Abraão, que viviam na
escravidão (4.21-31). Ele exortou os gálatas a que expulsassem os
judaizantes de suas congregações, advertindo que a circuncisão não poderia
ser separada das outras exigências da lei. Se a circuncisão era necessária
para a salvação, toda a lei se tornava obrigatória.
O apóstolo frustrou suspeitas de que a fé sem a lei levava à vida imoral
ao apelar para três fontes de justiça para o fiel: o Espírito, a fé e a influência
da igreja (5.15-26). A justiça que a lei exigia era produzida pelo Espírito
através da fé. A fé operando pelo amor é o que agrada a Deus e cumpre a
lei. A vida que o Espírito produz é caracterizada por amor, alegria, paz,

876
longanimidade, benignidade, bondade, fé, mansidão, domínio próprio. Esse
estilo de vida era totalmente coerente com as exigências morais da lei.
Além disso, se um fiel vivesse de forma pecaminosa, os irmãos na igreja
tinham a responsabilidade de restaurar esse fiel a uma vida justa.

IV. Conclusão (6.11-18)


Paulo concluiu a carta com sua assinatura característica. Seus comentários
finais novamente lembravam os gálatas dos motivos egoístas dos
judaizantes, da incapacidade da humanidade de guardar a lei e da
necessidade de experimentar a nova criação (transformação por meio da
atividade do Espírito) a fim de pertencer ao verdadeiro Israel. Finalmente,
Paulo apontou para as cicatrizes que ele tinha recebido em seu ministério
por Cristo como marcas que provavam sua identidade como um verdadeiro
servo de Cristo.

TEOLOGIA
Temas Teológicos
Justificação pela fé versus obras da lei
Paulo enfatizou que uma pessoa é justificada pela fé desassociada das obras
da lei. Desde a Reforma Protestante, textos como Gálatas 2.15,16 e 3.6-14
têm sido interpretados como ensinando que, por causa da morte sacrificial
de Jesus, os pecadores são declarados justos pelo juiz celestial por meio da
fé em Cristo, e não por atos pessoais de obediência. Recentes discussões
acadêmicas têm questionado esse entendimento tradicional em vários
níveis. Estudiosos sugeriram novas interpretações do significado de

877
justificação, a identidade das “obras da lei”, e a natureza da fé. N. T. Wright
argumentou que “justificação” não é a imputação da justiça de Deus ou da
justiça de Cristo ao fiel, mas é na verdade uma antecipação do juízo final de
Deus do indivíduo. Esse juízo final envolve um exame da totalidade da vida
do fiel e não é dependente de uma mera profissão de fé.51
A explicação de Wright da justificação é um corretivo útil para pontos
de vista que completamente ignoram o papel das obras no julgamento
escatológico. Gálatas 5.19-21 deixa claro que uma vida caracterizada pelas
“obras da carne” exclui o indivíduo do reino de Deus. Assim, a vida e as
obras têm um papel definido no julgamento final. Mas a premissa de que as
obras da carne desqualificam uma pessoa a entrar no reino não leva à
implicação de que o fruto do Espírito qualifica o indivíduo.52 Paulo não
afirmou que a real justiça do fiel o qualifica para herdar o reino, embora
uma clara declaração nesse sentido teria muito bem equilibrado seu
contraste entre o fruto do Espírito e as obras da carne. O silêncio de Paulo
nesse ponto confirma a mensagem que permeia toda a carta: a justiça que
qualifica uma pessoa a passar pelo crivo do julgamento divino é uma justiça
externa imputada ao fiel com base em sua fé. Embora a justiça imputada
(justificação) e justiça transmitida (santificação) sejam inseparáveis, são
distinguíveis. Em última análise, é a primeira, e não a segunda, que torna o
fiel aceitável a Deus.53
J. D. G. Dunn argumentou que, embora “obras da lei” se refira, em
geral, aos atos prescritos pela Torá, o termo se refere principalmente aos
rituais e atividades que distinguiam os judeus dos gentios, tais como a
circuncisão, a guarda do sábado e o cumprimento das leis de pureza. Assim,
a insistência de Paulo na justificação pela fé dissociada das obras da lei não
era dirigida a pessoas que tentavam obter a salvação através da realização

878
moral, mas àqueles que equivocadamente acreditavam que era preciso se
tornar um judeu para ser salvo. No entanto, uma grande quantidade de
evidências sugere que as “obras da lei” das quais alguns judeus dependiam
para a sua salvação incluíam esforços para manter todas as prescrições da
lei, e não apenas aquelas que distinguiam os judeus dos gentios.54 A livre
citação que Paulo faz de Deuteronômio 27.26 em Gálatas 3.10 salienta a
necessidade de cumprir todos os elementos da lei a fim de escapar da
maldição da lei. Isso sugere que a totalidade da lei, e não apenas os “limites
fronteiriços” judaicos, estava em vista na expressão “obras da lei”. Além
disso, a insistência de Paulo de que “nem mesmo os próprios circuncidados
guardam a lei” (6.13) sugere que seus adversários não estavam preocupados
somente com a circuncisão, mas também com o sábado e com as questões
de pureza.55
Finalmente, alguns estudiosos afirmam que a frase que normalmente é
traduzida como “fé em Cristo” (pistis Christou, p. ex., 2.16) na verdade
deveria ser traduzida como “fé/fidelidade de Cristo” e se refere à fidelidade
de Cristo a Deus, particularmente como expressada através de sua morte
obediente.56 No entanto, a afirmação: “nós temos crido em Cristo Jesus”
(2.16); as referências a “ouvir com fé” (3.2,5), ao exemplo da fé de Abraão
(3.6-9) e a referência a Cristo como o objeto da fé (3.26), todas dão apoio à
interpretação tradicional.57
Gálatas ensina que os fiéis são declarados justos por Deus, tanto agora
quanto no julgamento escatológico, com base no sacrifício de Cristo e em
resposta à sua fé em Jesus, e não por obediência à lei do AT.

A Natureza da expiação

879
Gálatas 3.10-14 é uma das declarações mais claras no NT sobre a natureza
substitutiva da morte de Jesus. Aqueles que dependem das obras da lei para
a salvação estão debaixo da maldição divina. Para ser considerada justa por
meio da fidelidade à lei, uma pessoa tem de cumprir todas as leis por todo o
tempo. Interpretado à luz de Deuteronômio 27.26, o fato de que Jesus
morreu por crucificação demonstra que ele suportou a maldição dos fiéis
pecadores em seu lugar. Assim, Jesus concedeu perdão aos pecadores ao
sofrer a pena por seus pecados para que eles pudessem escapar da ira de
Deus.

A transformação do fiel
Os oponentes judeus de Paulo na Galácia provavelmente argumentavam
que a lei era necessária para conter a conduta pecaminosa dos fiéis. Seus
oponentes libertinos alegavam que uma vez que os fiéis são salvos apenas
por meio da fé, a sua vida pessoal não interessava a Deus. Paulo rebateu os
dois erros em Gálatas ao salientar a mudança radical que ocorre na vida do
fiel. Paulo lembrou os fiéis que Deus tinha concedido seu Espírito quando
eles depositaram sua fé em Cristo (3.2). O Espírito tinha manifestado a sua
presença entre eles por meio de milagres surpreendentes (3.5). O Espírito
que habitava neles era a fonte da justiça pessoal que os verdadeiros fiéis
aspiram (5.5). O Espírito conduz o fiel a viver uma vida caracterizada por
frutos espirituais, que satisfaz e até mesmo excede as exigências morais da
lei (5.22). O fato de o amor ser a principal expressão do Espírito é
significativo porque o amor é a essência da lei (5.13-15; veja Lv 19.18).
Essa transformação produzida pelo Espírito é tão dramática e radical que
Paulo a descreveu como “uma nova criação” (6.15), ecoando as promessas

880
da nova aliança de Ezequiel 11.19,20; 36.26,27. A nova criação efetuada
pelo Espírito no fiel serve como a norma, a regra segundo a qual o fiel vive
(Gl 6.16).58 Consequentemente, o evangelho que Paulo pregava não era uma
licença para um comportamento pecaminoso, mas o ímpeto para a
verdadeira vida justa.

A Identidade de Jesus
Gálatas reflete uma cristologia elevada. A identidade única de Jesus aparece
até mesmo no primeiro versículo da carta, quando Paulo insiste que ele foi
feito um apóstolo não “por meio de homem, mas por Jesus Cristo”. O
contraste tem o efeito de identificar Jesus como alguém muito maior do que
um simples homem, um grande profeta ou um porta-voz divino, e isso
sugere sua supremacia e sua divindade. Quatro vezes a carta chama Jesus de
o “Filho” de Deus (1.16; 2.20; 4.4,6). A carta também repetidamente atribui
a Jesus o título de “Senhor”, um título de divindade que foi o substituto
preferido para o nome Yahweh nos textos judaicos gregos, bem como nas
cartas de Paulo.59
Se Gálatas é realmente a primeira das cartas de Paulo e talvez até
mesmo o mais antigo documento do NT, essa cristologia elevada é ainda
mais significativa. A carta demonstra claramente que uma cristologia
elevada não era um produto da evolução teológica na qual Jesus passou de
um mero homem a semidivino a divino enquanto histórias sobre ele foram
enfeitadas e as descrições dele foram exageradas. Antes, a cristologia mais
antiga é uma cristologia elevada porque o próprio Jesus afirmou e
demonstrou sua divindade diante de seus primeiros seguidores.

881
CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON
Os gentios incluídos na igreja em igualdade de condições com os
judeus (3.28); a circuncisão não é exigida, contrário ao “falso
evangelho” dos judaizantes (1.6-9; 6.15)
Confrontação de Pedro por Paulo em relação à inclusão dos gentios,
muito provavelmente antes do Concílio de Jerusalém (2.11-14; veja At
15)
Justificação pela fé, independentemente das obras da lei (veja 2.15;
3.24); demonstração a partir da Escritura de que Abraão também foi
justificado pela fé independentemente das obras (3.1 a 4.7, esp. 3.6
citando Gn 15.6)
Defesa da liberdade cristã em relação às exigências da lei (5.1-15)
Ensino sobre a vida no Espírito e o fruto do Espírito (5.16-26)

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Quais são algumas das indicações de que Gálatas exerceu grande
influência sobre o Cristianismo?
2. Quais são os dois destinatários possíveis de Gálatas?
3. O que dá apoio para cada uma dessas possibilidades?
4. Como o destino e a datação de Gálatas estão inter-relacionados?
5. Quais são as duas principais teorias sobre o destinatário de Gálatas?
6. Segundo os autores, Gálatas provavelmente foi escrita antes ou depois
do Concílio de Jerusalém? Que evidências sustentam essa afirmação?
7. Qual foi o propósito principal de Paulo ao escrever Gálatas?
8. Quem eram os judaizantes?
9. Qual era a sua mensagem?

882
10. Por que Paulo repreendeu os gálatas?
11. O que Paulo ensina em Gálatas sobre a justificação pela fé versus
obras da Lei?
12. Quais as contribuições de Gálatas para o Cânon?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


BETZ, H. D. Galatians. Hermeneia (Philadelphia: Fortress, 1979).
BRUCE, F. F. The Epistle to the Galatians. New International Greek
Testament Commentary (Grand Rapids: Eerdmans, 1982).
DUNN, J. D. G. The Epistle to the Galatians. Black’s New Testament
Commentary (Peabody: Hendrickson, 1993).
______. The Theology of Paul’s Letter to the Galatians (Cambridge:
Cambridge University Press, 1993).
FUNG, R. Y. K. The Epistle to the Galatians. New International
Commentary on the New Testament (Grand Rapids: Eerdmans,
1988).
GEORGE, T. Galatians. New American Commentary (Nashville: B&H,
1994).
HANSEN, G. W. “Galatians, Letter to the”. HAWTHORNE, G. F.; MARTIN,
R. P.; REID, D. G., orgs. Dictionary of Paul and His Letters
(Downers Grove: InterVarsity, 1993), p. 323–34.
HAYS, R. B. The Faith of Jesus Christ: The Narrative Substructure of
Galatians 3.1—4.11. 2. ed. (Grand Rapids: Eerdmans, 2002).
______. “The Letter to the Galatians: Introduction, Commentary, and
Reflections”. Em: KECK, L. E., org. New Interpreter’s Bible
(Nashville: Abingdon, 2000), vol. 11, p. 181–348.

883
HOVE, R. Equality in Christ? Galatians 3.28 and the Gender Dispute
(Wheaton: Crossway, 1999).
LONGENECKER, B. W. The Triumph of Abraham’s God: The
Transformation of Identity in Galatians (Edinburgh: T&T Clark,
1998).
LONGENECKER, R. N. Galatians. Word Biblical Commentary 41 (Dallas:
Word, 1990).
MARTYN, J. L. Galatians: A New Translation with Introduction and
Commentary. Anchor Bible 33A (New York: Doubleday, 1997).
MORRIS, L. Galatians: Paul’s Charter of Christian Freedom (Downers
Grove: InterVarsity, 1996).
NANOS, M., org. The Galatians Debate: Contemporary Issues in
Rhetorical and Historical Interpretation (Peabody: Hendrickson,
2002).
RICHARDS, E. R. Paul and First-Century Letter Writing: Secretaries,
Composition and Collection (Downers Grove: InterVarsity, 2004).
SILVA, M. Interpreting Galatians: Explorations in Exegetical Method.
2. ed. (Grand Rapids: Baker, 2001).
THIELMAN, F. From Plight to Solution: A Jewish Framework For
Understanding Paul’s View of the Law in Galatians and Romans.
Novum Testamentum Supplement 61 (Leiden: Brill, 1989).
WITHERINGTON III, B. Grace in Galatia: A Commentary on Paul’s
Letter to the Galatians (Grand Rapids: Eerdmans, 1998).

1
C. B. Cousar, Galatians, Interpretation (Atlanta: John Knox, 1982), p. 1.

884
2
G. W. Hansen, “Galatians, Letter to the”, em: G. F. Hawthorne; R. P. Martin; D. G. Reid, orgs.,

Dictionary of Paul and His Letters (Downers Grove: InterVarsity, 1993), p. 323.

3
G. Duncan, The Epistle of Paul to the Galatians (London: Hodder & Stoughton, 1934), xvii.

4
R. N. Longenecker, Galatians, WBC 41 (Dallas: Word, 1990), xliii.

5
A descrição de L. Morris de Gálatas é apropriada quando ele se refere à carta como “o alvará de

Paulo da liberdade cristã” (o subtítulo de Galatians: Paul’s Charter of Christian Freedom [Downers

Grove: InterVarsity, 1996]).

6
A. Cole, The Epistle of St. Paul to the Galatians (Grand Rapids: Eerdmans, 1965), p. 57.

7
Uma vez que a origem e data da carta dependem grandemente do provável destino dela, o

destino será discutido imediatamente após a autoria, mas antes da data e proveniência abaixo.

8
H. Ridderbos, St. Paul’s Epistle to the Churches of Galatia (Grand Rapids: Eerdmans, 1953), p.

35.

9
B. Bauer, Kritik der paulinischen Briefe (Berlin: Hempel, 1852).

10
L. G. Rylands, A Critical Analysis of the Four Chief Pauline Epistles (London: Watts, 1929), p.

273-367; F. R. McGuire, “Did Paul Write Galatians?” Hibbert Journal 66 (1967-68), p. 52-57. Veja a

discussão em D. Guthrie, New Testament Introduction (Downers Grove: InterVarsity, 1990), p. 485;

W. G. Kümmel, Introduction to the New Testament, ed. rev., tradução para o inglês de H. C. Kee

(Nashville: Abington, 1975), p. 304.

11
F. C. Baur, Paul: His Life and Works (London: Williams and Norgate, 1875), p. 1.246.

12
J. B. Lightfoot, St. Paul’s Epistle to the Galatians, 10. ed. (London: Macmillan, 1921), p. 57-

62. Cf. E. De Witt Burton, A Critical and Exegetical Commentary on the Epistle to the Galatians,

ICC (Edinburgh: T&T Clark, 1921), lxviii-lxix.

885
13
Longenecker, Galatians, lviii.

14
J. C. O’Neill, The Recovery of Paul’s Letter to the Galatians (London: SPCK, 1972). Para um

bom resumo do livro, veja Longenecker, Galatians, lviii-lix.

15
W. O. Walker Jr., “Galatians 2.7b,8 as a Non-Pauline Interpolation”, CBQ 65 (2003), p. 568-

87.

16
E. Dinkler, ‘‘Der Brief an die Galater: Zum Kommentar von Heinrich Schlier,’’ Verkündigung

und Forschung 1-3 (1953-55), p. 175-83, especialmente p. 182-88, reimpresso com “Nachtrag” em

seu Signum Crucis: Aufsätze zum Neuen Testament und zur christlichen Archäologie (Tübingen:

Mohr [Siebeck], 1967), p. 270-82, esp. p. 278-80.

17
R. Hays (“The Letter to the Galatians: Introduction, Commentary, and Reflections”, NIB

11:226) rejeitou a teoria completamente. O. Cullmann (Peter: Disciple-Apostle-Martyr: A Historical

and Theological Study, tradução para o inglês de F. V. Filson [London: SCM, 1953], p. 18) deu

suporte à teoria, e H. D. Betz (Galatians, Hermeneia [Philadelphia: Fortress, 1979], p. 97) aceitou a

teoria com algumas modificações. Compare F. F. Bruce, The Epistle to the Galatians, NIGTC (Grand

Rapids: Eerdmans, 1982), p. 120-21.

18
O verbo pepisteumai (“encarregado”) com o caso acusativo aparece apenas na literatura

paulina (1Co 9.17; 1Ts 2.4; 1Tm 1.11; Tt 1.3). O contraste entre “circuncisão” e “incircuncisão” é

caracteristicamente paulino, aparecendo em outras passagens que não as cartas de Paulo somente em

Atos 11.2,3. O substantivo apostolē (“apostolado”) aparece apenas na literatura paulina com exceção

de Atos 1.25. Veja U. Wilkens, “Der Ursprung der Überlieferung der Erscheinungen des

Auferstandenen: Zur traditionsgeschichtlichen Analyse von 1 Kor 15, 1-11”, em: W. Joest; W.

Pannenberg, orgs., Dogma und Denkstrukturen. Edmund Schlink in Verehrung und Dankbarkeit zum

sechzigsten Geburtstag dargebracht (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1963), p. 72, n. 41.

886
19
Muito provavelmente, o dativo simples em Gálatas 2.8 é um dativo de vantagem que indica

que Deus trabalhou em favorecimento de Pedro e Paulo. Veja BDAG, s.v. “ἐνεργέω”.

20
Como J. L. Martyn (Galatians, AB 32A [New York: Doubleday, 1997], p. 202) explicou, os

dois genitivos são genitivos objetivos que identificam as pessoas que estão sendo evangelizadas.

Martyn sugeriu a tradução “o evangelho como ele é dirigido para aqueles que não são

circuncidados”. Ele acrescentou, “nessas orações paralelas, então, Paulo de maneira nenhuma sugere

que existem dois evangelhos. Antes, existem duas missões nas quais o único evangelho está abrindo

seu caminho para todo o cosmos.”

21
Veja Longenecker, Galatians, p. 55; Bruce, Galatians, p. 120; Morris, Galatians, p. 75; T.

George, Galatians, NAC (Nashville: B&H, 1994), p. 160-61; Lightfoot, Galatians, p. 109.

22
B. Ehrman, “Cephas and Peter”, JBL 109 (1990), p. 463-74, especialmente p. 469. Ehrman

argumentou que Cefas é uma outra personagem completamente distinta do apóstolo Pedro.

23
A teoria que associa Gálatas 2 com Mateus 16.16-19 foi primeiramente desenvolvida por J.

Chapman, “St. Paul and Revelation to St. Peter, Matthew XVI.17”, Revue Bénédictine 29 (1912): p.

133-47. A teoria foi avivada por D. Wenham, Paul: Follower of Jesus or Founder of Christianity?

(Grand Rapids: Eerdmans, 1995), p. 200-5.

24
E. R. Richards, Paul and First-Century Letter Writing: Secretaries, Composition and

Collection (Downers Grove: InterVarsity, 2004), p. 94-121.

25
Cole, Galatians, p. 23.

26
J. Moffatt, An Introduction to the Literature of the New Testament, 3. ed. (Edinburgh: T&T

Clark, 1918), p. 90-101; Betz, Galatians.

27
Hansen, “Galatians”, p. 323. Um antigo escritor, Astério (m. 340), afirmou a teoria do Sul da

Galácia. Veja a discussão em W. Ramsay, “The ‘Galatia’ of St. Paul and the ‘Galatic Territory’ of

Acts”, em: Studia Biblica et Ecclesiastica IV (Oxford: Claredon, 1986), p. 16.

887
28
Moffatt, Introduction, p. 93.

29
F. F. Bruce, “Galatian Problems. 2. North or South Galatians?” BJRL 52 (1970), p. 258; e id.,

Commentary on Galatians (Grand Rapids: Eerdmans, 1982), p. 10-13.

30
Moffatt, Introduction, p. 93.

31
Bruce, Galatians, p. 14-15.

32
D. A. Carson; D. J. Moo, Introduction to the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids: Zondervan,

2005), p. 458 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução ao Novo Testamento].

33
Bruce, Galatians, p. 15.

34
Ibid., p. 13-14.

35
Ibid., p. 9.

36
Betz (Galatians, p. 4) casualmente rejeitou a teoria do Sul da Galácia, afirmando que “os

argumentos a favor da ‘hipótese das províncias’ […] dependem de outra hipótese, da confiabilidade

histórica dos itinerários em Atos, e do argumento do silêncio […] Não há necessidade real de pensar

que o autor de Atos sempre obteve informações confiáveis ou completas”.

37
Betz (Galatians, p. 11-12) é uma exceção interessante. Embora ele aceitasse a teoria do Norte

da Galácia, ele argumentou, baseado em evidências internas, que Paulo escreveu Gálatas entre 50 e

55. No outro lado do espectro está M. Silva, Explorations in Exegetical Method: Galatians as a Test

Case (Grand Rapids: Baker, 1996), p. 129-39, esp. p. 131-32, que defendeu a teoria do Sul da

Galácia, mas sustentou uma data posterior.

38
Calvino (Calvin’s New Testament Commentaries, tradução para o inglês de T. H. L. Parker

[Grand Rapids: Eerdmans,1965], vol. 11: Galatians, Ephesians, Philippians and Colossians, p. 24-

25) foi uma exceção uma vez que ele assumiu a teoria do Norte da Galácia, mas argumentou que

Gálatas foi escrita antes do Concílio de Jerusalém. A cronologia defendida pela maioria dos que

888
defendem a teoria do Norte da Galácia difere em muitos anos da cronologia sugerida por este texto

(veja “Cronologia Paulina” no cap. 9.

39
Lightfoot, Galatians, p. 36-56.

40
Burton, Galatians, xliv.

41
Por exemplo, J. Knox (Chapters in a Life of Paul: Explorations into Paul’s Career and His

Religious Experiences as Revealed in the Personal Passages in His Letters [New York: Abingdon,

1950], p. 61-73). argumentou que Paulo na verdade fez apenas três das cinco visitas a Jerusalém

descritas em Atos e que a visita de combate à fome de Atos 11.28-30 foi na realidade a última visita a

Jerusalém.

42
A construção grega traduzida por “primeira” na NVI pode funcionar como um adjetivo

comparativo significando a primeira de duas.

43
K. Lake, The Earlier Epistles of Paul: Their Motive and Origin (London: Rivington’s, 1927),

p. 266.

44
Betz (Galatians, p. 312) destacou que o uso de Paulo de um secretário ou de um escritor de

carta profissional implica um cuidadoso processo de composição: “é evidente que o próprio emprego

de um amanuense [secretário] exclui a possibilidade de a carta ter sido escrita a esmo e sugere a

existência de um rascunho de Paulo e de uma cópia pelo amanuense, ou uma sequência de rascunho,

composição e cópia.”

45
Por exemplo, Lightfoot, Galatians, p. 5-6; Cole, Galatians, p. 27.

46
Os três principais tipos de retórica são: (1) retórica forense ou jurídica (acusação ou defesa);

(2) retórica deliberativa (persuasão ou dissuasão); e (3) retórica epidítica (louvor ou culpa). As

principais partes do argumento de um autor ou orador são: (1) o exordium (introdução); (2) a narratio

(exposição dos fatos); (3) a partitio (lista de proposições); (4) a probatio (suporte para as

proposições; (5) a refutatio (refutação ou argumentos opostos; e (6) o peroratio (resumo e apelo

889
emocional). Para um recurso útil sobre crítica retórica, veja D. F. Watson, “Rhetorical Criticism”, em:

Dictionary of Jesus and the Gospels, p. 699.

47
Veja Betz, Galatians; G. A. Kennedy, New Testament Interpretation Through Rhetorical

Criticism (Chapel Hill: University of North Carolina, 1980), p. 144-52; e J. D. Hester, “Epideictic

Rhetoric and Persona in Galatians 1 and 2”, em: M. Nanos, org., The Galatians Debate:

Contemporary Issues in Rhetorical and Historical Interpretation (Peabody: Hendrickson, 2002), p.

181-90. O último volume introduz os estudantes às principais abordagens retóricas.

48
Veja especialmente Longenecker, Galatians, civ-cv; Martyn, Galatians, p. 20-23.

49
Veja especialmente Dunn, Theology, p. 12: “A análise retórica pode gerar seu próprio

escolasticismo. Parece-me, em particular, razoavelmente inútil discutir se as cartas de Paulo são

‘epidíticas’ ou ‘deliberativas’ ou qualquer outra coisa, quando muitos concordam que o gênio criativo

de Paulo adaptou-se a seus próprios fins qualquer modelo que ele possa ter emprestado e o fez com

tal extensão que os paralelos podem, provavelmente, ser tão enganosos quanto úteis. E quanto a

algumas das estruturas elaboradas que foram propostas para as cartas de Paulo, pode-se simplesmente

observar que parece haver uma relação inversa entre o cumprimento dos quiasmas propostos em uma

carta individual e a luz que lançam no argumento ou em seus pontos. O vigor da teologia de Paulo,

evidentemente não permitiu que fosse facilmente contida dentro de estruturas gramaticais e

composicionais regulares!”.

50
Longenecker, Galatians, c-cix.

51
Dunn (Theology, p. 365-6) essencialmente concorda, mas esse detalhe foi enfatizado

especialmente por Wright.

52
Wright também negou que a vida do fiel de qualquer modo recebe o favor de Deus ou a bênção

eterna. Embora a vida justa do fiel seja insuficiente para que ele mereça a vida eterna, ela demonstra

se um indivíduo realmente está “em Cristo”.

890
53
Veja a discussão sobre a “Justificação” no capítulo 13.

54
Veja J. A. Fitzmyer, “Paul’s Jewish Background and the Deeds of the Law”, em: According to

Paul: Studies in the Theology of the Apostle (New York: Paulist, 1993), p. 18-35; D. J. Moo, “‘Law’,

‘Works of the Law’, and Legalism in Paul”, WTJ 45 (1983), p. 73-100; e T. R. Schreiner, “‘Works of

Law in Paul’”, NovT 33 (1991), p. 217-44.

55
Veja Gálatas 2.15,16,19; 3.10-14; 5.3.

56
R. B. Hays, The Faith of Jesus Christ: An Investigation of the Narrative Substructure of

Galatians 3.1 to 4.11 (Chico: Scholars Press, 1983), p. 139-91; M. Hooker, “Pistis Christou”, em:

From Adam to Christ: Essays on Paul (Cambridge/New York: Cambridge University Press, 1990), p.

165-86.

57
Para uma defesa convincente da interpretação objetiva de pistis Christou (“fé em Cristo”), veja

Dunn (Theology, p. 379-85), que observou que o contraste consistente de Paulo é entre “obras da lei”

e fé em Cristo (veja Rm 3.22,26; Gl 2.16 [duas vezes], 20,22 ; Fp 3.9).

58
Martyn, Galatians, p. 567. Veja também A. J. Köstenberger, “The identity of the Ἰσραήλ τοʋ͂

θεοʋ͂ (Israel of God) in Galatians 6.16”, Faith and mission 19/1 (2001), p. 3-24.

59
L. W. Hurtado, “Jesus as Lord”, em: Lord Jesus Christ: Devotion to Jesus in Earliest

Christianity (Grand Rapids: Eerdmans, 2003), p. 108-17.

891
CAPÍTULO 11

A correspondência de Paulo aos


Tessalonicenses: 1 e 2Tessalonicenses

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os principais
fatos de 1 e 2Tessalonicenses. Com relação à História, os estudantes
deverão ser capazes de identificar o autor, data, origem, destino e propósito
de cada livro. Com relação à Literatura, eles deverão ser capazes de
fornecer uma descrição básica de cada livro e identificar os principais
elementos do conteúdo de cada livro encontrado na Discussão Unidade por
Unidade. Com relação à Teologia, os estudantes deverão ser capazes de
identificar os principais temas teológicos em 1 e 2Tessalonicenses.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo central
identificado nos Conhecimentos básicos, os estudantes deverão ser capazes
de apresentar os argumentos usados para conclusões históricas, literárias e
teológicas. Com relação à História, deverão ser capazes de discutir as
evidências da autoria paulina, data, origem, destino e propósito. Com
relação à Literatura, eles deverão ser capazes de fornecer uma descrição
pormenorizada de cada livro. Com relação à Teologia, os estudantes

892
deverão ser capazes de discutir os grandes temas teológicos em 1 e
2Tessalonicenses e as maneiras pelas quais eles contribuem de forma única
para o cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além do domínio dos conteúdos centrais
identificados nos Conhecimentos básicos e dos Conhecimentos
intermediários mencionados acima, os estudantes deverão ser capazes de
avaliar o papel que a linguagem, o estilo, a crítica da forma e a teologia
desempenham ao atribuir a autoria paulina a 1 e 2Tessalonicenses. Além
disso, deverão ser capazes de defender a ordem cronológica tradicional das
cartas e determinar a influência da crítica retórica sobre as cartas.

893
Mapa 11.1: Origem e destino de 1 e 2Tessalonicenses.

894
FATOS-CHAVE DE 1 E 2TESSALONICENSES
Autor: Paulo
Data: 50
Origem: Corinto
Destino: Igreja em Tessalônica, na Macedônia
Motivo: Perseguição aos tessalonicenses e confusão
em relação ao final dos tempos
Propósito: Encorajar os fiéis perseguidos, defender a
integridade de Paulo e esclarecer o ensino
escatológico de Paulo.
Tema: Os fiéis perseguidos devem ser encorajados
pela antecipação do retorno de Jesus
Versículos-Chave: 1Ts 4.13-18

INTRODUÇÃO

As cartas aos tessalonicenses estão provavelmente entre as mais


negligenciadas cartas de Paulo. Isso é em parte devido à modesta
quantidade de discussão nas cartas em relação à salvação comparada com
obras como Romanos e Gálatas. É também em parte devido à sua brevidade
e às questões sobre a autoria de 2Tessalonicenses. Mas essas cartas são
importantes por proporcionar ideias sobre os métodos missionários e
mensagem do grande apóstolo. Elas são inestimáveis pelos conhecimentos
que elas oferecem sobre o retorno de Jesus Cristo, a ressurreição dos fiéis, o
castigo eterno dos ímpios e os acontecimentos imediatamente anteriores à
volta de Jesus. Elas também oferecem instruções úteis sobre a santificação,
eleição e o trabalho ético cristão.

895
As cartas de Paulo aos Tessalonicenses também estão entre as primeiras
cartas escritas por Paulo. Aqueles que afirmam a teoria da Galácia do Norte
como origem de Gálatas tipicamente vêem a correspondência
tessalonicense como os primeiros exemplos da literatura paulina. A maioria
daqueles que defendem a teoria da Galácia do Sul colocam 1 e
2Tessalonicenses após Gálatas. Uma vez que as cartas de Paulo são tratadas
aqui na provável ordem cronológica, e uma vez que a teoria da Galácia do
Sul foi estabelecida como mais plausível do que a teoria da Galácia do
Norte, a correspondência tessalonicense de Paulo é discutida subsequente a
Gálatas. De qualquer modo, as cartas oferecem informações importantes
sobre as verdades fundamentais da teologia do apóstolo.

HISTÓRIA
Autor
Os estudiosos modernos do NT geralmente reconhecem 1Tessalonicenses
como uma autêntica carta de Paulo. A autoria paulina das cartas atribuídas a
ele no NT é de considerável importância uma vez que essas cartas ligam
esta correspondência a essa figura importante na história da igreja primitiva,
aquele que foi comissionado pelo próprio Cristo ressurreto para seu
ministério apostólico. Pelo menos desde a época de Ireneu (c. 130-200), a
igreja primitiva aceitou, por unanimidade, a carta como sendo paulina e
canônica. Ireneu citou 1Tessalonicenses 5.23 e identificou a citação como
palavras do “apóstolo” em “sua primeira epístola aos Tessalonicenses”
(Contra Heresias 6.5.1). Clemente de Alexandria (c. 150-215; Paedagogus
5) e Tertuliano (c. 160-225; Contra Marcião 5.15) também reconheceram
que a carta era composição do próprio Paulo.1

896
O primeiro estudioso a desafiar a autoria de Paulo da carta foi Schrader
em 1836.2 Uma década depois, F. C. Baur argumentou que a carta era falsa,
e seus argumentos foram considerados convincentes por uma série de outros
estudiosos.3 Mas um século mais tarde, Frame compilou as estatísticas
necessárias para provar que vocabulário, frases e conceitos eram
completamente paulinos e permitiam “estabelecer a autoria paulina de
1[Tessalonicenses], a menos que se esteja disposto a afirmar que Paulo
nunca viveu ou que nenhuma de suas cartas sobreviveu”.4 No final do
século XX, um comentarista poderia, de forma acurada, afirmar que
“nenhum estudioso contemporâneo de renome parece duvidar do autêntico
caráter paulino da carta”.5
Apesar da aceitação quase unânime de 1Tessalonicenses, a maioria dos
estudiosos modernos rejeita a autoria paulina de 2Tessalonicenses.
Evidência externa para a autenticidade e a aceitação de 2Tessalonicenses é
ligeiramente melhor que a da primeira carta. Como 1Tessalonicenses, a
carta foi incluída no cânon de Marcião (c. 150), no Cânon de Muratori
(provavelmente final do século II), e foi citada por Ireneu (c. 130-200) pelo
nome.6 Além disso, Justino Mártir (c. 100-165) fez alusão à carta, e
Policarpo (c. 69-155) a citou duas vezes.7 Embora 2Tessalonicenses agora
esteja completamente ausente de 46
, um antigo manuscrito do corpo
paulino produzido por volta do ano 200, ele claramente pertencia às páginas
finais, que mais tarde se perderam do livro. Ninguém parece ter contestado
a autoria paulina dessa carta até que J. E. C. Schmidt (1801) se tornou o
primeiro a pôr em dúvida sua autoria.8 Ele argumentou que
2Tessalonicenses 2.1-12 contrariava a escatologia descrita em
1Tessalonicenses 4.13 a 5.11. O primeiro texto descreve uma sequência de
eventos que precederiam a Segunda Vinda, mas o último texto enfatiza a

897
iminência da Segunda Vinda. Schmidt inicialmente argumentou que
2Tessalonicenses 2.1-12 era uma interpolação em uma outra autêntica carta
de Paulo.9 Três anos depois Schmidt negou a autenticidade da carta como
um todo.10
Mais influente foi a obra de Kern que argumentou que 2Tessalonicenses
2.1-2 assumia a preexistência da crença de que Nero ascenderia ao poder
novamente (Nero Redivivus). Isso exigiria uma data de composição após
68-70 para a carta, uma data muito tardia para permitir a autoria paulina.11
Os argumentos de Kern foram amplamente aceitos durante a maior parte do
século XIX.
No início do século XX, T. Zahn defendeu vigorosamente a
autenticidade de 2Tessalonicenses em sua Introdução ao Novo Testamento.
Tantos estudiosos foram persuadidos pelos argumentos Zahn, que em 1908
G. Milligan pôde afirmar com exatidão que a grande maioria dos
comentaristas na Alemanha e o consenso geral dos estudos do NT na Grã-
Bretanha e na América tratavam a carta como genuína.12 A obra da J. E.
Frame defendendo a autenticidade da carta inspirou uma tendência de
aceitação da carta durante a maior parte do século XX. No entanto, a
opinião de consenso mudou novamente com a publicação das pesquisas de
W. Trilling sobre 2Tessalonicenses, em 1972. Trilling levantou três
argumentos contra a autoria de Paulo de 2Tessalonicenses: (1) o estilo da
carta é diferente do estilo normal de Paulo; (2) características da crítica da
forma sugerem que a carta é uma falsificação; e (3), a teologia é
incompatível com a tradição paulina.13 No entanto, como a interação
seguinte procurará demonstrar, nenhuma das preocupações de Trilling
precisa diminuir a confiança do leitor moderno na autoria paulina.

898
Estilo e linguagem
Estudiosos como W. Wrede alegaram que o vocabulário de
2Tessalonicenses é tão semelhante ao de 1Tessalonicenses que deve ser uma
falsificação baseada na primeira carta.14 No entanto, Frame mostrou que o
vocabulário de 2Tessalonicenses é quase tão semelhante ao da outras cartas
de Paulo como o é de 1Tessalonicenses. Por exemplo, das 146 palavras
comuns a 1 e 2Tessalonicenses, todas com exceção de quatro também
aparecem nas principais cartas de Paulo (Gálatas, Romanos, 1 e 2Coríntios).
Duas dessas quatro aparecem nas Cartas da Prisão. As duas únicas palavras
compartilhadas somente por 1 e 2Tessalonicenses são as palavras
“Tessalônica” (que seria esperado em duas cartas dirigidas ao mesmo
público) e a palavra “dirigir” (kateuthynō, utilizada 72 vezes na LXX e uma
vez em Lucas). Isso dificilmente é uma evidência convincente para uma
falsificação baseada em 1Tessalonicenses!
Trilling argumentou que 40 expressões exclusivas de 2Tessalonicenses
sugerem que a carta foi escrita por outra pessoa que não Paulo. Mas muitas
das expressões exclusivas em 2Tessalonicenses foram exigidas pelo
problema incomum que o autor estava abordando na igreja de Tessalônica,
um problema que Paulo não encontrou em outros lugares. Além disso, o
número real de hapax legomena (palavras usadas apenas uma vez em um
documento) em 2Tessalonicenses é 10, metade do número de hapax
legomena em 1Tessalonicenses, uma carta que estudiosos consideram
autêntica.15 Significativamente, Menken, que argumentou que
2Tessalonicenses é pseudônima, admitiu que o vocabulário da carta é tão
paulino quanto o das demais cartas reconhecidas como suas.16
Argumentos baseados em características estilísticas são igualmente
pouco convincentes. Por exemplo, alguns estudiosos destacam que as

899
sentenças em 2Tessalonicenses tendem a ser significativamente mais longas
do que as sentenças em 1Tessalonicenses. Eles, porém, ignoram o fato de
que as curtas sentenças em 1Tessalonicenses são devidas às suas muitas
exortações. Além disso, muitas sentenças das cartas que os estudiosos
aceitam como sendo de Paulo são bem longas (1Co 1.4-8; Fp 1.3-11; 1Ts
1.2-5, talvez 2-7).17

Características da crítica da forma


Na segunda parte de seu argumento, Trilling tentou utilizar uma
investigação da crítica da forma de 2Tessalonicenses para rejeitar a autoria
de Paulo.18 Trilling salientou que as saudações em 1 e 2Tessalonicenses são
mais semelhantes entre si do que quaisquer outras saudações. Essa estreita
semelhança sugeriu a ele que a saudação de 2Tessalonicenses foi forjada
por outra pessoa, alguém que usou 1Tessalonicenses como modelo. No
entanto, seria de esperar uma semelhança maior entre as duas saudações se
Paulo escreveu as duas cartas, uma vez que as cartas foram escritas em
épocas muito mais próximas uma da outra do que qualquer outras duas
cartas escritas por Paulo a que temos acesso, e elas foram escritas para o
mesmo público.
Trilling também examinou a ação de graças, o material apocalíptico, as
orações, o material ético e a conclusão de 2Tessalonicenses e alegou que
várias características dessas seções sugerem que a carta não é de Paulo. Em
particular, Trilling afirmou que a maior ênfase na autoridade apostólica e na
natureza impessoal da carta impossibilita a autoria paulina. Contudo, esses
mesmos critérios poderiam ser utilizados para determinar que Romanos e
Gálatas, cartas quase que universalmente reconhecidas como de autoria de

900
paulina, na verdade não foram escritas por ele. Romanos é em grande parte
de natureza impessoal. Gálatas, embora muito mais pessoal do que
Romanos, realça bem a autoridade apostólica de Paulo. Embora a natureza
impessoal de Romanos possa ser explicada como um resultado do fato de
que Paulo não tinha anteriormente visitado Roma, a natureza impessoal de
2Tessalonicenses também é facilmente explicada uma vez que Paulo tinha
muito recentemente escrito uma carta mais pessoal aos Tessalonicenses que
o livrou de escrever sua segunda carta de forma mais diligente.
Wanamaker corretamente argumentou que Trilling estava errado ao
assumir que as cartas de Paulo são “um conjunto homogêneo de escritos
que se atêm a um padrão básico”. Apesar de 2Tessalonicenses, por
exemplo, poder ter uma seção de ação de graças que difere das outras cartas
de Paulo, em Gálatas a seção de ação de graças está ausente, mas ninguém
argumentou que a ausência da seção exclui a autoria de Paulo. Os
estudiosos geralmente reconhecem que as cartas de Paulo são muito
situacionais, isto é, elas foram escritas para abordar necessidades
específicas e para responder a questões específicas em uma congregação
local. As necessidades e questões peculiares das várias congregações
influenciaram significativamente a forma, estilo e o tom da comunicação de
Paulo.19

Teologia
Trilling argumentou que alguns temas teológicos em 2Tessalonicenses estão
em tensão com a teologia de Paulo nas demais cartas. Seus argumentos
mais importantes dizem respeito aos temas do retorno de Cristo e juízo
divino e da imagem de Deus e de Cristo. Trilling argumentou que a

901
discussão do retorno de Cristo em 2Tessalonicenses colocou uma ênfase no
juízo divino e na retribuição que não encontrou paralelo nas cartas cuja
autoria paulina é indiscutível.20 Essa ênfase, afirmou Trilling, refletia o
ponto de vista dos escritores posteriores do NT e não parece se encaixar em
uma das primeiras cartas de Paulo. Paulo nunca, em outras passagens, se
referiu ao juízo de Deus sobre os ímpios para confortar os fiéis que estavam
sendo perseguidos.
As objeções de Trilling são facilmente respondidas. Primeiro, Trilling
parece ter ignorado a situação específica que o autor estava abordando, isto
é, 2Tessalonicenses procura confortar os fiéis que estão sofrendo intensa
perseguição. Esse contexto de perseguição pressuposto em
2Tessalonicenses é confirmado por 1Tessalonicenses e pelo livro de Atos. A
promessa de justificação dos fiéis que sofriam por meio do castigo dos seus
opressores servia para encorajar os fiéis a permanecerem fiéis e para
dissuadi-los de se retirarem da comunidade cristã. Segundo, embora a
ênfase na retribuição não seja comum para Paulo, ela tem paralelos na
literatura judaica anterior ou contemporânea ao apóstolo Paulo.21 Esses
textos judaicos comprometem seriamente a alegação de que qualquer apelo
cristão à retribuição deve pertencer ao final do primeiro século.
Outros intérpretes se opuseram à autoria de Paulo de 2Tessalonicenses
porque a carta diz que certos eventos devem preceder a Segunda Vinda
(2.3-12), embora Paulo em outras passagens esperasse um retorno iminente
de Cristo (1Ts 4.15-17; 5.1-5; Rm 13.11,12; 1Co 7.29,31; Fp 4.5). Mas,
embora outros textos paulinos salientem a iminência da Segunda Vinda e
impliquem a expectativa de que Cristo voltaria em breve, eles não excluem
a necessidade de certos acontecimentos conduzirem à volta de Cristo. Os
intérpretes não deveriam confundir iminência com imediação. Nenhuma

902
tensão real existe entre a escatologia de 2Tessalonicenses e a de outros
escritos de Paulo.
Trilling também via a descrição que 2Tessalonicenses faz de Jesus como
“Senhor” como evidência de autoria pós-paulina, uma vez que
2Tessalonicenses 1.9 aplica a descrição da atividade de Yahweh em Isaías
2.10 a Jesus. Trilling afirmou que isso refletia a progressiva imposição dos
atributos de Deus no AT a Cristo e combina melhor com uma data do final
do primeiro século para a carta. Esse argumento é intrigante uma vez que o
título Senhor não é normalmente aplicado a Jesus nas Cartas Pastorais, que
Trilling considera como deuteropaulinas e às quais ele recorreu para
explicar essa característica. Mais importante ainda, as cartas de Paulo cuja
autoria não se discute frequentemente descrevem Jesus como Senhor e o
fazem em contextos que claramente retratam Jesus como Yahweh.22 Por
exemplo, 1Tessalonicenses, amplamente considerada paulina, descreve a
Segunda Vinda como o “Dia do Senhor”, uma expressão extraída dos
profetas do AT nos quais o título Senhor traduz o nome divino Yahweh.
Esta utilização do título de Senhor como um substituto para Yahweh
aparece em um contexto que está saturado com referências a Jesus como
Senhor. Consequentemente, a utilização do título Senhor em
2Tessalonicenses não sugere nem uma data posterior, nem autoria paulina
da carta. O uso do título Senhor e a aplicação de textos contendo a o nome
Yahweh a Jesus em 2Tessalonicenses são consistentes com a alta cristologia
das cartas de Paulo cuja autoria não é discutida.
A carta afirma ter sido escrita por Paulo (2Ts 1.1), descreve cartas
falsamente atribuídas indevidamente ao apóstolo como enganosas (2Ts
2.2,3) e confirma a autoria do próprio Paulo com uma assinatura distintiva
(2Ts 3.17). A carta não pode ser aceita como escrita por uma pessoa de

903
integridade que escreve em nome de Paulo para expressar o que ele
acreditava ser a doutrina paulina, como alguns estudiosos afirmaram. Ou a
carta é um documento autêntico escrito pelo apóstolo Paulo, ou é uma
falsificação escrita por alguém que intencionalmente enganou seus leitores.
Como observou R. Jewett, “a improbabilidade de uma falsificação é
extremamente alta”.23 As evidências internas e externas afirmam a autoria
de Paulo da carta. E. Best salientou que os argumentos contra a autoria de
Paulo geralmente vieram de estudiosos que estudaram a carta
superficialmente: “é curioso como a vasta maioria dos comentaristas aceita
a carta como genuína, enquanto aqueles que a rejeitam se encontram entre
os que abordam a carta com maior curiosidade desde o início.24 Aqueles que
estudam a carta nos mínimos detalhes, geralmente afirmam a autenticidade
da carta. Os leitores modernos podem ter a certeza de que a igreja primitiva
estava correta quando atribuiu essa carta a Paulo.

Ordem das Cartas


Antes da data das cartas aos de Tessalônica ser estabelecida, deve-se
primeiramente determinar a ordem em que as duas cartas foram escritas.
Embora os leitores possam automaticamente assumir que a ordem canônica
das duas cartas é a ordem cronológica, os livros do corpo paulino foram
organizadas de acordo com comprimento (começando com a mais longa e
terminando com a mais curta), e não de acordo com a data de sua
composição, e 1Tessalonicenses (1.481 palavras) é significativamente mais
longa que 2Tessalonicenses (823 palavras). Assim, é possível que
1Tessalonicenses tenha, na verdade, sido escrita antes de 1Tessalonicenses.

904
Vários estudiosos do NT do século XX defenderam a prioridade de
2Tessalonicenses,25 embora apenas um número relativamente pequeno de
estudiosos tenha aceitado este ponto de vista. O primeiro, e até agora único,
comentário a defender a prioridade de 2Tessalonicenses foi o comentário do
texto grego da carta feito por C. Wanamaker em 1990. Wanamaker recorreu
a cinco razões principais para a prioridade de 2Tessalonicenses discutidas
por Manson e Weiss para apoiar a sua conclusão.26 A seção a seguir explica
esses cinco principais motivos e oferece uma resposta.

1. A perseguição mencionada em 2Tessalonicenses 1.4-7 parece já ter


passado em 1Tessalonicenses 2.14. Na verdade, 2Tessalonicenses 1.4 usa o
presente verbal para descrever a experiência de perseguição dos
tessalonicenses, enquanto 1Tessalonicenses 2.14 usa aoristo, um tempo
verbal passado. Mas isso também faria sentido se a perseguição que os
tessalonicenses sofreram em associação com a visita de Paulo tivesse
terminado logo após a sua partida, mas retornado com nova intensidade
quando os cidadãos de Tessalônica perceberam que a ausência de Paulo não
garantia o fim do movimento cristão naquela cidade. Além disso, outros
textos em 1Tessalonicenses parecem implicar que os tessalonicenses
estavam na verdade sofrendo perseguição na época em que a carta foi
escrita (p. ex., 3.3-10).
2. A desordem na igreja parece ser um novo problema em
2Tessalonicenses 3.11-15, embora seja tratada como se fosse uma
conhecida dificuldade em 1Tessalonicenses 4.10-12. A evidência aqui não é
conclusiva. É verdade que Paulo tratou da questão da conduta desordeira de
forma mais ampla e com mais força em 2Tessalonicenses 3.6-15, mas muito
provavelmente 1Tessalonicenses 4.10b-12 lembrou aos leitores de seu
ensino oral anterior. Então, boatos ou talvez um relatório pessoal de

905
Timóteo em seu retorno da viagem para entregar a primeira carta (2Ts 3.11)
podem ter exigido que Paulo abordasse novamente a questão, mais
especificamente em 2Tessalonicenses 3.6-15.
3. O fechamento em 2Tessalonicenses 3.17 parece sugerir que
2Tessalonicenses é a primeira carta. Pelo contrário, a explicação da
assinatura de Paulo em 2Tessalonicenses 3.17 não exige nem implica a
prioridade de 2Tessalonicenses. A maioria das cartas de Paulo no NT são as
primeiras cartas que Paulo escreveu a uma congregação específica, mas elas
não contêm tal explicação. A explicação foi motivada, muito
provavelmente, pela preocupação de Paulo de que alguém tivesse forjado
uma carta em seu nome e confundido os tessalonicenses com relação à
vinda de Cristo (2Ts 2.2). A carta pseudônima levou Paulo a destacar a
marca que identificava suas cartas autênticas.
4. A observação em 1Tessalonicense 5.1 de que os leitores não precisam
de instruções sobre o final dos tempos parece pressupor 2Tessalonicenses
2.1-12. No entanto, a confiança de Paulo no entendimento dos
tessalonicenses acerca dos “tempos e épocas” poderia tão facilmente
resultar de sua ênfase na escatologia em seu ensino oral em Tessalônica
quanto de uma carta anterior. Na verdade, 1Tessalonicenses 4.6 implica que
Paulo tinha discutido o julgamento escatológico durante a sua visita.
5. A expressão “mas quanto” em 1Tessalonicenses 4.9; 5.1 parece ser
uma fórmula comum que introduz respostas às questões levantadas
anteriormente pelos leitores (veja 1Co 7.1). Em cada caso, o assunto
introduzido em 1Tessalonicenses pode ser mostrado como surgindo a partir
de uma questão levantada pelos tessalonicenses em relação a um assunto
abordado em 2Tessalonicenses.27 A construção “mas quanto” (peri de)
aparece apenas duas vezes em 1Tessalonicenses. Embora 1Tessalonicenses

906
5.1 introduza um tema discutido com profundidade em 2Tessalonicenses,
1Tessalonicenses 4.9 introduz o tema do amor fraterno, que Paulo não trata
de forma específica em 2Tessalonicenses. Isso torna duvidoso que
1Tessalonicenses tenha sido escrita para responder as questões levantadas
por 2Tessalonicenses.

As razões listadas por Wanamaker não sugerem a prioridade de


2Tessalonicenses. Ao contrário, vários fatores dão apoio à tradicional
ordem das duas cartas. Mais importante ainda, 2Tessalonicenses 2.15,
“portanto, irmãos, ficai firmes e apegai-vos às tradições que vos foram
ensinadas, seja oralmente ou por carta nossa”, parece se referir a uma carta
anterior de Paulo aos tessalonicenses.28 Quando Paulo se referiu a essa
tradição mais tarde, em 2Tessalonicenses 3.6, ela tem paralelos com
1Tessalonicenses (4.11,12; 5.14), mas não com o material anterior em
2Tessalonicenses. Além disso, as referências de Paulo a uma carta
falsamente atribuída a ele (2Ts 2.2) seriam mais plausíveis se os
tessalonicenses tivessem recebido uma carta anterior de Paulo que fizesse
com que a última comunicação escrita parecesse menos suspeita. O anúncio
de Paulo de que sua assinatura marcava “todas” as suas cartas autênticas
(2Ts 3.17) também parece implicar que ele tinha enviado uma carta anterior
aos tessalonicenses. Se 2Tessalonicenses foi a primeira carta que Paulo
escreveu para a igreja, ele poderia mais facilmente ter repudiado a suspeita
de fraude, indicando que ele não havia escrito anteriormente à igreja. A
falha de Paulo em uma correspondência escrita anterior implica uma carta
anterior.
Além disso, a longa descrição que Paulo faz da sua visita pessoal a
Tessalônica em 1Tessalonicenses 1.4 a 2.12 faz mais sentido se
1Tessalonicenses foi primeira correspondência de Paulo com os

907
tessalonicenses depois de sua saída de Tessalônica.29 Reconhecidamente,
2Tessalonicenses também se refere a essa visita (2Ts 2.5,15; 3.6-10), mas
não de forma tão extensiva como 1Tessalonicenses faz.
Portanto, embora o equilíbrio da evidência interna pareça favorecer a
prioridade de 1Tessalonicenses, M. Martin sabiamente relembrou os
intérpretes de que a questão da sequência das cartas de Tessalônica
permanecia sem resolução e alertou: “enquanto essa ambiguidade
permanecer, o intérprete é sábio em evitar depender profundamente de
qualquer interpretação que seja dependente para sua validade em uma
determinada sequência cronológica para as cartas”.30

Data
Primeira Tessalonicenses foi escrita por Paulo durante sua segunda viagem
missionária, logo depois que ele fugiu da cidade de Tessalônica em face da
severa perseguição (At 17.5-10). Se Paulo escreveu a carta de Corinto, ele
provavelmente o fez no ano 50. Os 18 meses de Paulo em Corinto podem
ser datados à luz da Inscrição de Gálio, que indica que Gálio serviu como
procônsul de 1 de julho, 51 d.C. a 1 de julho de 52 d.C. Paulo
provavelmente compareceu perante Gálio logo depois que ele assumiu o
poder. A maioria dos estudiosos suspeita que os adversários de Paulo teriam
levado suas acusações a um novo e ainda não testado procônsul na
esperança de que ele pudesse ser influenciado a julgar a seu favor. Assim, o
aparecimento de Paulo perante Gálio provavelmente ocorreu no final do
verão ou início do outono do ano 51. Além disso, Paulo parece ter
comparecido perante Gálio perto do final de seus 18 meses em Corinto.31
Timóteo permaneceu em Bereia enquanto Paulo era escoltado para Atenas

908
(At 17.13,14). Paulo aparentemente usou essas escoltas, que retornaram a
Bereia quando Paulo chegou em Atenas, para entregar as suas instruções a
Timóteo para que ele voltasse a Tessalônica. A viagem dos mensageiros de
Atenas de volta a Bereia provavelmente levou várias semanas. Deve-se
permitir, assim, várias semanas para viagem de Timóteo de Bereia a
32
Tessalônica e sua estadia em Tessalônica. Sua viagem de volta de
Tessalônica a Corinto para se encontrar com Paulo provavelmente levou
cerca de um mês. Um período de dois meses e meio a três meses
provavelmente transcorreu entre o momento da entrada de Paulo em Atenas
e o retorno de Timóteo a Paulo. Paulo provavelmente escreveu
1Tessalonicenses logo após a chegada de Timóteo em Corinto. Isso sugere
que Paulo escreveu 1Tessalonicenses vários meses depois de chegar em
Corinto. Assim, ele poderia ter composto a carta a qualquer momento entre
o meio da primavera e o meio do verão de 50. Se Paulo compareceu perante
Gálio no final de seu mandato como procônsul, uma data de composição até
um ano depois é possível. Uma data dentro desse intervalo ou alguns meses
depois também é compatível com a teoria da prioridade de
2Tessalonicenses.
Segunda Tessalonicenses provavelmente foi composta vários meses
depois da carta anterior, talvez no inverno de 50. Os intérpretes que aceitam
a prioridade de 2Tessalonicenses geralmente sugerem que Timóteo serviu
de mensageiro para a carta e que esta o acompanhou em sua viagem de
Atenas a Tessalônica, caso em que a carta foi composta enquanto Paulo
estava em Atenas no início da primavera de 50.

Algo Para Pensar: Fé Radiante

909
Quando Paulo chegou a Tessalônica e tentou estabelecer uma
igreja ali, ele enfrentou veemente oposição, tanto que ele teve que
reduzir sua estadia ali a poucas semanas depois e deixar a cidade à
noite (veja At 1.1-10). Mas uma coisa maravilhosa aconteceu: os
fiéis em Tessalônica imitaram a atitude cristã de Paulo na
perseguição e, portanto, tornaram-se exemplo para os demais em
toda a sua região. Este é o modo como Paulo colocou isso em sua
primeira carta aos Tessalonicenses:

Sabeis muito que tipo de homens nós fomos entre vós para vosso benefício, e vos
tornastes imitadores nossos e do Senhor quando, apesar de severa perseguição,
recebestes a palavra do Senhor com a alegria do Espírito Santo. Como resultado,
vos tornastes um exemplo para todos os fiéis na Macedônia e Acaia. Pois a
mensagem do Senhor ressoou a partir de vós, não somente na Macedônia e na
Acaia, mas também em todo lugar por onde a vossa fé em Deus se espalhou, de
modo que não precisamos falar mais nada (1Ts 1.5b-9).

Isso é verdadeiramente extraordinário. Porque esses novos fiéis


tinham abraçado o evangelho plenamente e sua fé se irradiava ao
seu redor, Paulo, o missionário que plantou a igreja, não precisou
dizer nada! Isso mostra que não devemos deixar de partilhar e
propagar a nossa fé com uns poucos evangelistas chamados por
Deus ou aqueles com o dom do evangelismo (embora certamente
Deus use essas pessoas, veja Ef 4.11, 2Tm 4.5). Em vez disso, o
evangelismo bíblico é primeira e principalmente uma obrigação
comunitária, algo a ser feito por toda a igreja.

Você não está convencido? Aqui está o que Jesus disse em sua oração final de
acordo com João: Eu oro não somente por estes, mas também por aqueles que
crerão em mim pela palavra deles. Que todos sejam um assim como tu, ó Pai, estás
em mim, e eu estou em ti. Que também eles sejam um em nós, para que o mundo

910
creia que tu me enviaste. Eu lhes dei a glória que me deste. Que eles sejam um
assim como nós somos um; eu neles, e tu em mim. Que eles sejam completamente
feitos um, para que o mundo saiba que Tu me enviaste e que eu os amei como Tu
me amaste (Jo 17.20-23, grifo nosso).

Será que temos fé radiante? Nós temos fé que se irradia de nossa


igreja local para o mundo que nos rodeia? Nós temos a fé que
inspira nos outros o “amor e boas obras” (Hb 10.24)? Muitos podem
atestar o fato de que foram atraídos pela mensagem do evangelho,
pelo menos em parte, observando o amor que os cristãos tinham uns
pelos outros. Este é o modelo bíblico: o corpo de Cristo representar
Cristo ao mundo, em amor e unidade, “para que o mundo possa
crer” e conhecer o amor de Deus para com eles.
Isso é o que eles disseram sobre os primeiros cristãos: “vede
como eles se amam” (Tertuliano, Apologia 39.7). Eles podem dizer o
mesmo sobre nós?

Origem
Duas teorias sobre o lugar de composição das cartas letras de Tessalônica
surgiram na igreja antiga. Os Prólogos Marcionitas e as introduções e
subscrições em alguns antigos manuscritos da carta alegam que
1Tessalonicenses foi escrita de Atenas.33 Alguns poucos manuscritos
posteriores afirmam que a carta foi escrita em Corinto.34 Embora a
antiguidade da identificação de Atenas como lugar de autoria deva ser
levada em consideração, as evidências internas da carta e o relato da
segunda viagem missionária de Paulo em Atos sugerem que Corinto é o
local de origem mais provável. Em 1Tessalonicenses 3.1-10, lemos que

911
Paulo decidiu permanecer em Atenas sozinho e enviar Timóteo a
Tessalônica para incentivar a igreja e saber como ela estava se saindo na sua
ausência. Uma comparação de 1Tessalonicenses 3 e Atos 17 sugere que,
embora Paulo estivesse em Atenas, ele enviou instruções através de
mensageiros a Timóteo em Bereia. Timóteo deveria viajar para a
Tessalônica e, em seguida, contatar Paulo novamente em Atenas. Mas
quando Timóteo voltou de Tessalônica, Paulo já havia partido para Corinto
(At 17.14-16; 18.5), onde Timóteo acabou se encontrando com Paulo e lhe
entregou seu relatório sobre a situação em Tessalônica, o que levou Paulo a
escrever 1Tessalonicenses. Parece que Paulo e Timóteo não estavam em
Atenas na mesma época.35 Mesmo que Timóteo tenha sido enviado de
Atenas aos tessalonicenses por Paulo, é praticamente certo que o apóstolo já
havia saído de Corinto antes que se juntassem. Uma vez que
1Tessalonicenses cita Timóteo como coautor da carta, sua origem foi
36
provavelmente Corinto.
Subscrições em alguns manuscritos antigos afirmam que
2Tessalonicenses foi escrita de Atenas;37 subscrições em alguns outros
manuscritos posteriores indicam que ela foi escrita de Roma.38 Mas a
grande maioria dos estudiosos contemporâneos que afirma a autoria paulina
da carta argumenta que 2Tessalonicenses foi escrita em Corinto alguns
meses depois da primeira carta. Segunda Tessalonicenses 1.1 identifica
Paulo, Timóteo e Silas como coautores. Segundo o testemunho de Atos,
esses três homens viajaram juntos apenas durante a segunda viagem
missionária. Segunda Coríntios 1.9 confirma que Paulo e Timóteo moraram
juntos em Corinto, e Silas provavelmente também estava entre os “irmãos
da Macedônia” mencionados em 2Coríntos 11.7-11. Paulo provavelmente
não ficou em Atenas tempo suficiente para ter escrito 1Tessalonicenses lá. É

912
ainda menos provável que ele tenha composto sua segunda carta em Atenas.
Então 2Tessalonicenses foi provavelmente escrita alguns poucos meses
depois da primeira carta, e os 18 meses de Paulo em Corinto oferecem mais
do que o tempo suficiente para que a carta tivesse sido escrita lá.

Destino
Ambas as cartas, 1 e 2Tessalonicenses, foram escritas para os fiéis da igreja
recentemente plantada em Tessalônica. A antiga Tessalônica, moderna
Tessalônica ou Salônica, estava estrategicamente localizada. Situava-se na
cabeça do Golfo Termaico, no melhor porto natural no Mar Egeu, e se
tornou a principal cidade-porto da Macedônia. Ela também ficava na Via
Egnácia, a principal estrada romana entre a Ásia Menor e Durrës, um porto
na costa do Mar Adriático, do qual se poderia navegar através do mar
Adriático ao porto de Brindisi e então seguir a Via Ápia diretamente para
Roma. Tessalônica era, assim, a maior e mais importante cidade da
Macedônia durante a época do apóstolo Paulo.39
Tessalônica era uma cidade cosmopolita habitada por gregos e romanos,
e uma população judaica significativa vivia ali (At 17). A maioria dos
leitores de Paulo havia sido de pagãos idólatras antes de sua conversão ao
Cristianismo (1Ts 1.9). Eles podem ter adorado uma série de deuses de
Tessalônica, incluindo Dionísio, Serápis, Cabiros e César.40 A congregação
em Tessalônica era uma mistura que incluía novos fiéis de origem judaica e
pagã.

Motivo

913
Atos 17.1-10 registra a fundação da igreja em Tessalônica por Paulo.
Depois de Paulo ter sido expulso de Filipos, ele continuou para o oeste na
Via Egnatia para Tessalônica.41 Ali, por três sábados consecutivos, ele falou
na sinagoga judaica e procurou convencer os judeus de que Jesus é o
Messias e que ele “tinha de sofrer e ressuscitar dentre os mortos” (At 17.3).
Alguns dos ouvintes abraçaram o evangelho não por causa do poder de
persuasão dos argumentos de Paulo, mas por causa da atividade misteriosa
de Deus entre os tessalonicenses. Paulo não tinha dúvida de que Deus os
tinha escolhido porque o seu evangelho “não chegou a vós somente em
palavras, mas também em poder, no Espírito Santo e em absoluta
convicção” (1Ts 1.5). Embora o ministério de Paulo na sinagoga tenha
durado apenas algumas semanas, evidência das cartas tessalonicenses
sugere que ele pode ter continuado seu ministério em sua oficina de
trabalho (1Ts 2.9). Paulo mencionou ter recebido apoio financeiro dos
filipenses pelo menos duas vezes durante a sua estadia em Tessalônica (Fp
4.16), implicando uma estadia bem mais longa na cidade do que uma leitura
superficial de Atos 17 pode sugerir. Enquanto Paulo estava em Tessalônica,
uma perseguição contra a equipe missionária e os novos fiéis irrompeu.
Alguns intérpretes colocam em oposição o livro de Atos e as cartas aos
tessalonicenses um contra o outro, afirmando que Atos descreve os judeus
como perseguidores enquanto 1Tessalonicenses 2.14 identifica os
perseguidores como gentios. Uma leitura cuidadosa de Atos 17.5, no
entanto, sugere que os judeus incitaram a perseguição, mas toda a cidade foi
rapidamente apanhada com sentimentos anticristãos. Os judeus provocaram
a ira dos “patifes do mercado” que reuniram uma multidão e “tumultuaram
a cidade”. Suas queixas contra os cristãos foram levadas aos magistrados da

914
cidade e invocaram os decretos de César. Os magistrados consideraram a
questão grave o suficiente para exigir fiança de alguns dos novos fiéis.
Reconhecendo que a presença de Paulo continuaria a inflamar a
animosidade contra os cristãos na cidade, os tessalonicenses pediram que
Paulo e Silas partissem para a Bereia. Paulo, mais tarde, partiu para Atenas,
onde pregou seu famoso sermão perante o Areópago. Enquanto Paulo
estava em Atenas, ele enviou Timóteo de volta a Tessalônica para
inspecionar o estado de a igreja ali. Timóteo reuniu-se com Paulo
novamente em Corinto. Ele deu a Paulo um relatório a respeito da igreja e
pode até mesmo ter entregado uma carta dos tessalonicenses para Paulo. A
expressão “mas quanto” (peri de) pode significar que Paulo estava
respondendo perguntas feitas pelos tessalonicenses em sua correspondência
com ele.42 Paulo escreveu sua primeira carta aos tessalonicenses em
resposta ao relatório de Timóteo e, eventualmente, à correspondência dos
tessalonicenses que Timóteo entregou.
Paulo aparentemente aprendeu de Timóteo que alguns adversários da
igreja estavam desafiando os motivos do ministério de Paulo. Ele descobriu
que os fiéis continuavam a sofrer perseguição. Talvez ele tenha descoberto
que alguns dos fiéis estavam lutando contra tentações sexuais, que eles
estavam confusos sobre a sequência de eventos relacionados com a volta de
Jesus, que alguns estavam vivendo de forma irresponsável e não procurando
o próprio sustento financeiro, e que alguns não estavam respeitando de
forma adequada seus líderes espirituais e estavam praticando seus dons
espirituais de forma desordeira.
Segunda Tessalonicenses trata de alguns dos mesmos problemas. Paulo
não achou necessário defender-se na segunda carta como tinha feito na
primeira. Evidentemente, ele sabia que sua primeira carta tinha conseguido

915
convencer os tessalonicenses da pureza de seus motivos. Mas Paulo estava
alerta para uma outra influência sobre a igreja que tinha conseguido
confundi-los sobre o final dos tempos. Ele também parece ter aprendido
mais sobre o problema da “ociosidade” na igreja.

Algo Para se Pensar: Como Está Sua Ética de


Trabalho?

Aparentemente, quando Paulo escreveu 2Tessalonicenses, havia


aqueles que acreditavam que a segunda vinda de Cristo era tão
iminente que tudo o que tinham a fazer era abandonar seus trabalhos
e esperar por sua chegada. Paulo não tinha simpatia por esse
ensino. Na verdade, ele ordenou aos fiéis que se “mantenham
distantes” de todo irmão que vivesse “irresponsavelmente” (2Ts
3.6,11), lembrando-lhes de seu próprio exemplo quando ele estava
com eles: “nem comíamos de graça da comida de ninguém; pelo
contrário, trabalhávamos e nos esforçávamos, trabalhando dia e
noite para não ser um peso para nenhum de vós” (2Ts 3.8). Assim,
mesmo quando ele estava com eles, Paulo estabeleceu esta máxima:
“se alguém não quer trabalhar, ele também não deve comer” (2Ts
3.10).
Muitos de nós já citaram este verso em tom de brincadeira para
os nossos filhos, mas as implicações das palavras de Paulo são
sérias e profundas. Quer as pessoas não tenham compreendido ou
deturpado seu ensino da salvação pela graça independente das
obras, quer estivessem confusas sobre a época da segunda vinda de

916
Cristo, Paulo frequentemente combateu a noção de que os cristãos
tinham certas liberdades que os isentavam das responsabilidades
normais da vida — incluindo o trabalho. Certamente este não é o
caso. Já dizia o antigo pregador: “O que quer que suas mãos
acharem para fazer, faze com todas as tuas forças” (Ec 9.10), e
ambos Jesus e Paulo trabalharam como carpinteiro e artesão,
respectivamente, por muitos anos. Paulo muitas vezes optou por
renunciar a seu direito de ser apoiado financeiramente pelas
congregações às quais ministrou. Em vez disso, ele trabalhou para
prover seu sustento de modo que pudesse oferecer o evangelho
“gratuitamente”.
Essa é uma atitude que deveria ser imitada por todos os cristãos,
especialmente por aqueles no serviço cristão, incluindo pastores e
missionários. Nós não deveríamos facilmente levar o suado dinheiro
daqueles que nos apoiam enquanto nos abstemos da obra.
Certamente não devemos dar ouvidos àqueles cultos que, como Jesus
predisse, afirmam conhecer o momento exato da vinda de Cristo e
procuram nos confundir e nos distrair de fazer o nosso trabalho
hoje:

Muitos falsos profetas surgirão e enganarão a muitos. E, por se multiplicar a


maldade, o amor de muitos esfriará. Mas aquele que perseverar até o fim será
salvo. E este evangelho do reino será pregado pelo mundo inteiro, para testemunho
a todas as nações, e então virá o fim (Mt 24.11-14).

Propósito

917
Primeira e 2Tessalonicenses são cartas pastorais escritas para atender às
necessidades específicas da igreja de Tessalônica. Primeira Tessalonicenses
foi escrita para (1) encorajar a igreja durante uma época de perseguição; (2)
defender a pureza dos motivos por trás da missão de Paulo aos
tessalonicenses; (3) exortar a igreja a viver vidas santas caracterizadas pela
pureza sexual; (4) definir uma ética de trabalho cristã; (5) corrigir a
confusão sobre o retorno de Cristo; e (6) levar a igreja a respeitar seus
líderes.
Segunda Tessalonicenses foi escrita para resolver problemas na igreja
sobre os quais Paulo parece ter tomado conhecimento através de um
relatório oral (2Ts 3.11). Ele escreveu a carta para (1) encorajar uma igreja
perseguida com a promessa de justificação final; (2) corrigir pontos de vista
confusos sobre o final dos tempos resultantes da má interpretação do ensino
de Paulo; e (3) dar à igreja orientações mais detalhadas para lidar com a
“ociosidade.”

LITERATURA
Plano Literário
Embora os comentaristas das gerações passadas geralmente tenham
esboçado as cartas de Paulo com base nos temas tratados nas várias seções
de cartas, a crítica da retórica procurou novas ideias sobre a finalidade e
organização das cartas. Os missivistas modernos usam determinadas
convenções literárias, como a saudação “caro” ou o encerramento
“atenciosamente”. O formato de uma carta moderna é dependente, de certa
forma, de seu propósito. Uma carta pessoal normalmente assume um
formato e uma carta comercial, outro. Da mesma forma, os discursos e

918
cartas antigas usavam convenções e formatos específicos. Entender isso
pode ajudar o intérprete a entender melhor a comunicação antiga. A crítica
da retórica compara características particulares das cartas de Paulo com
vários padrões e propósitos para discursos e cartas no mundo antigo a fim
de produzir novos conhecimentos sobre os seus planos literários.
Dos três principais gêneros de retórica descritos por Aristóteles,
1Tessalonicenses é melhor classificada como retórica epidítica (elogio ou
culpa), um gênero no qual o autor reforça e celebra os valores ou ideias
compartilhadas com seu público. Essa retórica pode ser positiva ou
negativa. Por um lado, ela poderia usar o elogio para persuadir o público a
continuar com o comportamento atual. Por outro lado, ela pode usar a culpa
para dissuadir o público de continuar com o comportamento presente. A
maioria dos estudiosos classifica 1Tessalonicenses como epidítica porque o
louvor e ação de graças de Paulo pelos tessalonicenses é marcante em toda
a carta.43
Primeira Tessalonicenses pode ser vista como constituída de cinco
principais componentes retóricos: (1) exordium (1.1-5), (2) narratio (1.6 a
3.10); (3) transitus (3.11-13), (4) probatio (4.1 a 5.22); e (5) peroratio
(5.23-28).44 O exordium ou introdução normalmente estabelece afinidade
com a audiência ao elogiá-la ou dar graças por ela. O exordium afirma
também os principais temas da carta. Nesse caso, o exordium aborda os
temas da resistência dos tessalonicenses em face da perseguição, do serviço
altruísta de Paulo aos tessalonicenses, e da esperança escatológica cristã.
O narratio ou narrativa afirma os fatos do argumento do escritor. Em
1Tessalonicenses, o narratio afirma fatos que dão suporte à pureza da vida
de Paulo e aos motivos para o ministério que ele introduziu na seção
anterior.

919
O transitus proporciona uma transição suave de uma seção da obra para
outra, no exemplo presente, do relatório encorajador de Timóteo para outros
assuntos.
A probatio ou provas estabelece a posição do escritor através de uma
série de argumentos. Em 1Tessalonicenses, a seção visa reforçar e
esclarecer as crenças dos tessalonicenses em relação à pureza, amor e ao
final dos tempos.45
O peroratio ou fechamento da carta reafirma o tema principal da carta,
que em 1Tessalonicenses é que o retorno antecipado de Cristo exige vida
piedosa.
Segunda Tessalonicenses é melhor descrita como retórica deliberativa.
Esse gênero procurava convencer as pessoas a seguir um determinado curso
de ação no futuro, assim 2Tessalonicenses é classificada como deliberativa
pois Paulo tentou persuadir os tessalonicenses a adotar um entendimento
diferente do Dia do Senhor e a abandonar a sua ociosidade.46
R. Jewett ofereceu a seguinte análise retórica de 2Tessalonicenses.47 O
exordium ou introdução (1.1-12), contém o preceito, uma oração de ação de
graças e uma oração intercessória. Esses elementos são típicos nas
introduções das cartas de Paulo.48
O partitio ou esboço (2.1, 2) funciona muito como uma declaração de
tese e anuncia os dois principais argumentos da carta: (1), a Segunda Vinda
de Cristo não ocorreu; e (2) os fiéis podem ficar confiantes em sua
antecipação do retorno de Cristo se permanecerem fiéis ao ensinamento e
exemplo de Paulo.
A probatio ou seção-prova (2.3 a 3.5), então, oferece evidências para
apoiar essas duas principais teses da carta. Em 2Tessalonicenses, 2.3-12

920
refuta a alegação dos falsos mestres de que a vinda de Cristo já ocorreu, e
2.13 a 3.5 oferece certeza aos fiéis.
A exhortatio ou seção de exortação da carta (3.6-15) oferece uma série
de três exortações: (1) uma exortação para disciplinar o ocioso; (2) uma
exortação a abandonar a ociosidade; e (3) uma exortação para excluir os
ociosos da comunidade.
O peroratio ou conclusão (3.16-18) incluía uma bênção, a assinatura de
Paulo e uma saudação final. De acordo com Jewett, essa análise retórica
sugere que a confusão escatológica na igreja e o comportamento do ocioso
ou a desordem estavam relacionados.49

ESTRUTURA DE 1TESSALONICENSES
I. Introdução (1.1)

II. Expressões de ação de graças e amor pelos tessalonicenses (1.2 a 3.13)


A. Primeira oração de ação de graças pelos tessalonicenses (1.2-10)
B. O relacionamento de Paulo com os tessalonicenses durante sua visita
demonstrando a pureza de seus motivos no ministério tessalônico (2.1-
12)
C. Segunda oração de ação de graças pelos tessalonicenses (2.13-16)
D. O relacionamento de Paulo com os tessalonicenses após sua partida
(2.17 a 3.10)
E. Terceira oração de ação de graças introduzindo os três principais
tópicos da seção seguinte: santidade pessoal, amor cristão e Segunda
Vinda de Cristo (3.11-13)

III. Exortações e instruções (4.1 a 5.22)

921
A. Introdução às exortações (4.1,2)
B. Exortação à santidade pessoal e pureza sexual (4.3-8)
C. Exortação ao amor cristão e à vida responsável (4.9-12)
D. Instruções sobre a Segunda Vinda de Cristo (4.13-18)
E. Exortações relacionadas à Segunda Vinda de Cristo (5.1-11)
F. Exortações gerais (5.12-22)

IV. Conclusão (5.23-28)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE DE


1TESSALONICENSES
I. Introdução (1.1)

II. Expressões de Ação de Graças e Amor Pelos


Tessalonicenses (1.2 a 3.13)
Em sua primeira seção principal, Paulo assegurou os tessalonicenses de seu
amor por eles e a pureza de seus motivos em sua missão em Tessalônica.
Ele aparentemente o fez em resposta às alegações de seus adversários de
que sua missão era impulsionada por motivos egoístas e de que ele tinha
abandonado a igreja quando ela mais precisava dele. A crítica era,
evidentemente, falsa. Lucas indicou claramente que Paulo fugiu de
Tessalônica a pedido da igreja (At 17.10). A nova igreja evidentemente
acreditava que a saída de Paulo neutralizaria o crescente sentimento
anticristão na cidade. Mas agora que Paulo tinha ido embora, seus
oponentes provavelmente alegaram que Paulo tinha incitado a ira da cidade
e, em então, convenientemente desaparecido ao primeiro sinal de problema.

922
A. Primeira oração de ação de graças pelos
Tessalonicenses (1.20-10)
A primeira carta de Paulo aos tessalonicenses é salpicada com orações de
ação de graças que demonstram o amor de Paulo pela congregação. Nesta
primeira oração, Paulo agradeceu a Deus pelas evidências de sua eleição
graciosa dos fiéis (1.2-4). Sua eleição e autêntica conversão foram
evidenciadas pelos milagres que acompanharam a mensagem de Paulo e
tinham confirmado a veracidade do seu evangelho e atividade do Espírito
Santo em persuadi-los a abraçar a verdade (1.5-7). Os tessalonicenses
tinham abandonado seus ídolos para servir a Deus e eram um exemplo para
outros fiéis em seu serviço cristão, zelo evangelístico e fidelidade em face
da perseguição (1.8-10). A oração introduz os principais temas da carta,
lembrando os tessalonicenses (1) dos efeitos do ministério de Paulo que
confirmavam a aprovação divina de Paulo (2); a perseverança dos
tessalonicenses diante das perseguições; e (3) a ansiosa antecipação pelos
fiéis do retorno de Cristo.

B. O relacionamento de Paulo com os


tessalonicenses durante sua visita, demonstrando a
pureza do ministério tessalônico (2.1,2)
Paulo respondeu ao ataque de seus oponentes em relação às suas
motivações lembrando os tessalonicenses das características do seu
ministério (2.1-4). Paulo pregou em grande risco com integridade e
sinceridade e sem receber qualquer apoio financeiro dos novos fiéis (2.5-9).
Paulo apelou tanto aos tessalonicenses quanto a Deus como testemunhas
que testificaram a sua devoção e inocência (2.10-12).

923
C. Segunda oração de ação de graças pelos
tessalonicenses (2.13-16)
A segunda oração de ação de graças de Paulo confirmava a origem divina
do evangelho de Paulo. Ela lembrava aos tessalonicenses que eles não
estavam sozinhos em seus sofrimentos por Cristo. Ela encorajava os
tessalonicenses a perseverar com a certeza de que Deus julgaria os seus
perseguidores.

D. O relacionamento de Paulo com os


tessalonicenses após sua partida (2.17 a 3.10)
O amor de Paulo pela igreja de Tessalônica tinha sido exibido pelos seus
esforços para retornar à Tessalônica (2.17-20) e pelo envio de Timóteo para
fortalecer e incentivar a igreja enquanto ele permanecia em Atenas (3.1-5;
cf. At 17). Paulo expressa gratidão pelo relatório positivo de Timóteo sobre
a fé e o amor dos tessalonicenses e lhes assegurou as suas fervorosas e
constantes orações por eles (3.6-10).

E. Terceira oração de ação de graças


A terceira oração de ação de graças e petição de Paulo pela igreja introduziu
os três principais temas da próxima seção principal. A oração “que o Senhor
vos faça crescer e transbordar em amor uns pelos os outros e por todos” (v.
12) antecipa a discussão do amor fraterno em 4.9-12. A petição “que ele
torne os vossos corações inculpáveis em santidade diante de nosso Deus e
Pai” (v. 13) antecipa a discussão da santidade pessoal em 4.1-8. A
referência à “vinda de nosso Senhor Jesus com todos os seus santos” (v. 13)

924
introduz a discussão escatológica em 4.13 a 5.11 e dá indícios de que os
fiéis falecidos acompanharão Cristo no momento de seu retorno.

III. Exortações e Instruções (4.1 a 5.22)


Esta seção principal é permeada por inúmeras ordenanças para a igreja,
juntamente com argumentos de suporte.

A. Introdução às exortações (4.1,2)


Paulo exortou a igreja a perseguir um estilo de vida moral e ético que fosse
agradável a Deus. Ele lembrou os tessalonicenses que as ordenanças que ele
lhes deu vieram do próprio Cristo.

B. Exortação à santidade pessoal e à pureza sexual


(4.3-8)
Paulo exortou a igreja a se abster da imoralidade sexual (4.3). Ele chegou
ao ponto de definir a pureza sexual como a essência da vontade de Deus
para o fiel e um objetivo do processo de santificação. A imoralidade sexual
era comportamento pagão inadequado para os seguidores de Jesus. Depois
de anteriormente insistir que o seu ensinamento moral veio de Cristo (4.2),
Paulo agora insistiu que ele veio de Deus através do Espírito Santo (4.8).
Consequentemente, um estilo de vida imoral desafiava os mandamentos do
Deus trino e convidava sua vingança sagrada.

925
C. Exortação ao amor cristão e à vida responsável
(4.9-12)
Os tessalonicenses natural e espontaneamente expressavam amor uns pelo
outros como um resultado da obra transformadora do Espírito neles (4.9).
Paulo os exortou a que o fizessem cada vez mais (4.10). Amor pelos outros
exigia que se vivesse de modo responsável e se trabalhasse pelo sustento
em vez de depender da generosidade de outros fiéis (4.11). Essa insistência
visava os ociosos que foram mencionados novamente em 5.14 e que seriam
abordados de forma mais detalhada na segunda carta de Paulo. Paulo
advertiu que a incapacidade de viver com compaixão e responsabilidade
frustraria o testemunho da igreja para os de fora (4.12).

D. Instruções sobre a Segunda Vinda de Cristo


(4.13-18)
Paulo preparou sua audiência para exortações relacionadas à Segunda Vinda
ao esclarecer, primeiramente, uma certa confusão sobre eventos que
acompanharão o retorno de Cristo. A igreja estava aparentemente
preocupada com o destino dos fiéis que morreram antes da Segunda Vinda e
temia que os fiéis falecidos não pudessem ser capazes de apreciar os
eventos dramáticos e emocionantes relacionados ao retorno de Jesus (4.13).
Paulo encorajou a igreja, assegurando-lhes que os fiéis que faleceram
ressuscitariam quando Jesus descesse para consumar o seu reino sobre a
terra (4.14-16). Aqueles que estivessem vivos na época do retorno de Cristo
seriam “arrebatados” com eles nas nuvens, para encontrar com o Senhor
nos ares (o “arrebatamento”) e assim estariam para sempre com o Senhor
(4.17).

926
E. Exortações relacionadas à Segunda Vinda de
Cristo (5.1-11)
Paulo exortou os tessalonicenses a que ficassem atentos e vigilantes pois o
retorno de Jesus seria repentino (5.1-8). Ele consolou a igreja com a
garantia de que o povo de Deus escaparia da ira de Deus por causa da morte
sacrificial de Jesus. Assim, eles poderiam antecipar o retorno de Jesus com
alegria, em vez de temor (5.9-11).

F. Exortações gerais (5.12-22)


Paulo exortou a igreja a apoiar e respeitar os líderes espirituais, mostrar
amor e perdão pelos outros, e a ser fiel na oração (5.12-18). Ele também
ordenou que a igreja valorizasse do dom de profecia, através do qual Deus
revelava a sua verdade através de indivíduos dele dotados na igreja, mas
que a igreja testasse os pronunciamentos proféticos e aceitasse apenas
aqueles que eram bons, isto é, que eram coerentes com a verdade de Cristo
revelada através de Paulo (5.19-22).

IV. Conclusão (5.23-28)


A oração final de Paulo condensa duas das principais preocupações da
carta, centrando-se na pureza do povo de Deus na expectativa da Segunda
Vinda. A carta termina com a nota confiante de que a congregação seria
encontrada irrepreensível no momento da volta de Jesus por causa da
fidelidade de Deus para com aqueles a quem ele chamou. Deus chamou seu
povo para a santificação (veja 4.7), e ele o fará (5.24).

927
ESTRUTURA DE 2TESSALONICENSES
I. Introdução (1.1-12)

II. Declaração de tese: o dia do Senhor não ocorreu, e os verdadeiros fiéis


não precisam temê-lo (2.1,2)

III. Provas em apoio à tese de Paulo (2.3-19)


A. Primeira prova: o Dia do Senhor ainda não ocorreu (2.3-12)
B. Segunda prova: os cristãos podem ter esperança e confiança
enquanto antecipam o final dos tempos (2.13-17)

IV. Exortações (3.1-15)


A. Exortação à oração (3.1-5)
B. Exortações relacionadas à ociosidade (3.6-15)

V. Conclusão (3.16-18)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE DE


2TESSALONICENSES
I. Introdução (1.1-12)
Seguindo a sua saudação habitual (1.1,2), Paulo procurou encorajar os
tessalonicenses a permanecerem fiéis mesmo frente à perseguição (1.3,4).
Em um ato de justiça de talião, Deus atormentaria aqueles que
atormentavam o seu povo e daria descanso aos que estavam sofrendo (1.5-
7a). Esse julgamento ocorreria em conjunto com a Segunda Vinda, quando
os pecadores enfrentariam a mesma gloriosa presença divina que mataria o
anticristo (1.7b-10; cf. 2.8).50 Enquanto Paulo antecipava esse grande

928
evento, ele orava para que os fiéis fossem caracterizados pela bondade e,
assim, glorificassem a Cristo (1.11,12).

II. Declaração de Tese: o Dia do Senhor Não


Ocorreu e os Verdadeiros Fiéis Não Precisam
Temê-lo (2.1,2)
Paulo anunciou dois temas que dominam o segundo capítulo de sua carta: A
volta de Cristo e a reunião dos fiéis. De alguma forma, seja por um espírito,
por uma palavra falada, ou por uma carta parecendo ser de Paulo e seus
associados, os tessalonicenses tinham começado a suspeitar que o Dia do
Senhor já havia ocorrido ou que estava ocorrendo.

III. Provas em Apoio à Tese de Paulo (2.3-19)


Paulo escreveu para insistir que o Dia do Senhor ainda não tinha ocorrido e
para descrever eventos que devem ocorrer antes da volta de Cristo.

A. Primeira prova: o Dia do Senhor ainda não


ocorreu (2.3-12)
O Dia do Senhor, que abrange eventos escatológicos tão importantes como
a Segunda Vinda, a ressurreição dos mortos e o juízo final, seria precedido
de ampla apostasia inspirada pelo “homem do pecado” (i.e., o anticristo;
2.3). Essa figura se assentaria no lugar de Deus no templo de Jerusalém e
enganaria os incrédulos com incríveis falsos milagres (2.4, 9-12).
Finalmente, o homem do pecado seria destruído por Cristo em seu retorno.
Algumas pessoas e poderes não denominados estavam refreando a

929
iniquidade, e o homem do pecado não apareceria até que a restrição fosse
removida (2.5-8).51

B. Segunda prova: os cristãos podem ter esperança


e confiança enquanto antecipam o final dos tempos
(2.13-17)
Paulo reconheceu que sua advertência sobre o grande engano que
acompanharia a vinda do homem da iniquidade pode ter assustado os seus
leitores. Paulo encorajou os fiéis a permanecerem firmes lembrando-os de
que Deus os tinha escolhido para a salvação e que ele os tinha chamado
para a glorificação final (2.13-15). Essa graciosa eleição e poderoso
chamado garantiam que Deus os fortaleceria e os protegeria até que seu
plano para eles fosse cumprido (2.16,17). Paulo repetiu essa garantia em
3.3-5.

IV. Exortações (3.1-15)


Paulo concluiu sua carta abordando alguns dos problemas práticos na igreja
de Tessalônica.

A. Exortação à oração (3.1-5)


Primeiro, Paulo exortou a igreja a orar pela propagação e recepção positiva
do evangelho. Paulo estava convencido de que a eficácia de seu ministério
era dependente do exercício do gracioso poder de Deus, e não de suas
próprias habilidades ou capacidades. Paulo também pediu à igreja para que
orasse pela proteção da equipe missionária.

930
B. Exortações relacionadas à ociosidade (3.6-15)
Segundo, Paulo instruiu a igreja sobre como lidar com os ociosos. Essas
pessoas estavam vivendo de forma irresponsável ao se recusar a trabalhar e
depender da generosidade dos outros membros da igreja para a sua
sobrevivência (3.6). Esse estilo de vida pode, de alguma forma, ser ligado à
confusa escatologia da igreja ou representar uma questão separada. Paulo
apelou à tradição cristã e ao seu próprio exemplo para argumentar que os
fiéis deviam trabalhar para viver (3.7-13). Os membros da igreja deveriam
se afastar dos ociosos e não mais apoiá-los financeiramente na esperança de
que eles se arrependessem e começassem a viver responsavelmente
(3.14,15).

V. Conclusão (3.16-18)
Paulo orou para que a igreja experimentasse a paz e a graça do Senhor
Jesus. Ele também explicou como ele autenticava suas cartas para que a
igreja pudesse agora distinguir as cartas realmente escritas por ele daquelas
que, de modo fraudulento, eram atribuídas a ele.

TEOLOGIA
Temas Teológicos
A Segunda Vinda de Cristo
As duas cartas aos tessalonicenses foram escritas para tratar de questões ou
de falsos pressupostos sobre o final dos tempos. Essas cartas fornecem o
ensino mais explícito de Paulo sobre os acontecimentos que envolvem a

931
Segunda Vinda. Os ensinamentos de Paulo em relação à Segunda Vinda em
1Tessalonicenses 4.13-18 eram derivados de “uma revelação do Senhor”
(lit., “a palavra do Senhor”). Isso pode se referir tanto aos ensinamentos
escatológicos de Jesus durante o seu ministério terreno (veja Mt 24 e 25;
Mc 13) quanto à revelação de profetas cristãos na igreja primitiva. Embora
o ensino de Jesus preservado nos Evangelhos não abordasse diretamente a
questão de saber se os fiéis falecidos ressuscitariam antes da transformação
dos fiéis vivos, a discussão de Paulo reverbera com tantos temas do
Discurso do Monte das Oliveiras que se pode suspeitar que Paulo estivesse
fazendo alusão ao ensino de Jesus.52
Na Segunda Vinda, o Senhor Jesus descerá do céu. O concomitante
brado do Messias (Jo 5.25) ressuscitará os mortos. A voz do arcanjo e o
soar de uma trombeta (Mt 24.29-31; 1Co 15.52) servem como sinais para os
anjos reunirem o povo de Deus, tanto vivos quanto mortos, para a
transformação final. Os fiéis recém-ressuscitados e os fiéis que não haviam
experimentado a morte serão arrebatados juntamente nas nuvens para
encontrar o Senhor nos ares. As nuvens servem para retratar a aparição de
Cristo como uma manifestação de Deus (Êx 16.10; 19.16; Dn 7.13; Mc
13.26).
O substantivo “encontro” (apantesis) era frequentemente usado para
falar de um grupo que saiu ao encontro de um dignitário e, então, deu meia-
volta e o escoltou para sua cidade ou casa (Mt 25.6; At 28.15). A
aproximação do dignitário era algumas vezes chamada de parousia, a
palavra usada aqui para descrever a vinda de Cristo. Vários comentaristas
argumentam que a interação entre o substantivo “vinda”, que poderia falar
da aproximação do rei, e o substantivo “encontro” implica que os fiéis
encontram Cristo no céu e então o escoltam de volta à terra em procissão

932
real.53 Essa linguagem pode implicar que Paulo pretendia que os seus
leitores imaginassem viver para sempre com o Senhor em uma terra
transformada, na qual Cristo governa com autoridade absoluta.
Alguns intérpretes consideram 1Tessalonicenses 4.13-18 como uma
discussão de um arrebatamento anterior à tribulação em vez de a Segunda
Vinda. No entanto, a ligação estreita da passagem com as descrições que
Jesus faz da Segunda Vinda (veja esp. Mt 24.30,31 e paralelos) e a possível
utilização técnica dos termos “vinda” e “encontro” tornam essa
interpretação improvável. Primeira Tessalonicenses 5.1-11 descreve a
Segunda Vinda como um acontecimento pertencente ao Dia do Senhor
previsto pelos profetas do AT (p. ex., Am 5.18-20; Ob 15; Sf 1.2-18; veja
também 2Ts 2.1-3). O fato de Paulo ter associado a vinda de Jesus com ao
Dia do Senhor e ter utilizado a imagem das teofanias do AT para descrever
a vinda de Jesus expressa uma cristologia elevada que reconhece Jesus
como divino.
Paulo insistiu que o Dia do Senhor viria repentinamente. Pegaria os
incrédulos, embora não o povo de Deus, de surpresa. Paulo caracterizou o
Dia do Senhor como um tempo de destruição e de intensa dor para os
ímpios. No entanto, ele assegurou aos fiéis que eles escapariam desse
derramamento assustador da ira divina. Paulo exortou os fiéis a que se
preparassem para o retorno de Jesus revestindo-se do caráter cristão.
Segunda Tessalonicenses acrescenta alguns detalhes à descrição anterior
que Paulo faz da Segunda Vinda. Embora 1Tessalonicenses 4 enfatize a
alegria que os fiéis conhecerão por participar dos eventos da Segunda
Vinda, 2Tessalonicenses 1.3-12 salienta os horrores vividos pelos
descrentes quando da volta de Jesus. Como nas teofanias do AT, a glória de
Cristo na sua vinda destruirá os incrédulos. O castigo eterno será a pena dos

933
pecadores por sua rebelião contra Deus e pela sua rejeição do evangelho. Os
fiéis, porém, glorificarão a Cristo em seu retorno e serão glorificados por
ele.

O anticristo e o mistério da iniquidade


Em 2Tessalonicenses 2, Paulo introduziu a questão da vinda do Senhor
Jesus Cristo e da reunião dos fiéis. Paulo tinha ensinado sobre esses
assuntos em 1Tessalonicenses 4.13-18, onde o retorno de Cristo e a reunião
dos fiéis parecem ser dois eventos simultâneos que constituem o Dia do
Senhor. A preocupação de Paulo nesse texto não é oferecer uma descrição
detalhada do Dia do Senhor, mas identificar precursores do Dia do Senhor.
Embora Paulo já houvesse encorajado anteriormente os tessalonicenses a
viver em um constante estado de preparação para o retorno de Cristo, os
tessalonicenses tinham concluído erradamente que o Dia do Senhor havia
chegado.
Ao descrever os precursores do Dia do Senhor, Paulo esperava
convencer seus leitores que esses eventos climáticos ainda estavam no
futuro. Paulo insistiu que o Dia do Senhor será precedido por uma grande
apostasia e pela vinda de uma figura do anticristo. A figura é identificada
como “o homem da iniquidade” porque ele liderará uma grande rebelião
contra a autoridade de Deus. Ele é identificado, mais adiante, como o “filho
da destruição” porque ele está destinado à destruição por Cristo. A figura do
anticristo arrogantemente alegará ser divina e se assentará no Santo dos
Santos no Templo de Yahweh em Jerusalém.
Alguns comentaristas alegaram que a profecia de Paulo sobre a vinda do
Anticristo não se cumpriu. Por exemplo, Wanamaker afirmou: “A passagem

934
não pode mais ser entendida como válida uma vez que o templo foi
destruído em 70 d.C. sem a manifestação do homem da iniquidade e sem a
volta de Cristo.”54 Estudiosos evangélicos com uma grande compreensão da
Escritura argumentam que a passagem continua válida. O consenso
emergente o faz argumentando que a linguagem apocalíptica de Paulo
deveria ser interpretada simbolicamente, em vez de literalmente, e é “uma
maneira gráfica de dizer que ele [o homem da iniquidade] planeja usurpar a
autoridade de Deus”.55 Outros intérpretes afirmam que a interpretação pode
ser traçada até Hipólito (c. 170-236) e, possivelmente, até Ireneu (c. 130-
200), que sustentam que o Templo em Jerusalém será reconstruído nos
últimos dias.56
Embora não se devesse construir uma visão escatológica das cartas aos
tessalonicenses isolada de outros textos escatológicos, a discussão de Paulo
parece mais consistente com a noção de um retorno pré-milenar de Cristo
que reconhece que a igreja experimentará a perseguição associada ao
mistério da iniquidade.57 O retorno de Jesus porá fim a esse período de
tribulação e introduzirá o seu reinado na terra. O argumento de Paulo de que
o Dia do Senhor não tinha ocorrido e que a igreja reconheceria a sua
aproximação por conta do aparecimento do homem da iniquidade implica
que os fiéis que estiverem vivos na época estarão presentes quando o
homem da iniquidade aparecer. Além disso, em 1Tessalonicenses 4.17, o
arrebatamento e a Segunda Vinda são concomitantes. O texto não parece
permitir um intervalo de sete anos entre os dois eventos nem a discussão de
Paulo sobre a Segunda Vinda em 2Tessalonicenses 2.1-10.58
Se Paulo tivesse afirmado um arrebatamento anterior à tribulação, o seu
melhor argumento contra a noção de que o Dia do Senhor já tinha ocorrido
teria sido que a igreja ainda não tinha sido arrebatada. Mas Paulo não usou

935
esse argumento, aparentemente porque ele via a Segunda Vinda e o
arrebatamento como simultâneos. A terminologia real “encontro” e “vinda”
parece implicar que um reinado terrestre segue à Segunda Vinda. No
entanto, a natureza precisa ou a duração desse reinado terrestre não são
definidas. Muitas questões legítimas ainda cercam este texto. Qualquer que
seja o ponto de vista adotado, deve-se afirmá-lo com humildade e estar
disposto a reexaminar a posição quando surgirem novas evidências.

QUADRO 11.1: QUEM É AQUELE QUE O


DETÉM? (2Ts 2.6,7)
Paulo explicou que a manifestação do “homem da iniquidade” estava
sendo temporariamente impedida por um detentor não identificado
(“aquele que agora o detém” 2Ts 2.7). Intérpretes continuam a debater
a identidade desse detentor. Várias teorias o identificam como (1) o
governo romano; (2) um anjo, como o arcanjo Miguel; (3) um agente
de Satanás; (4) o Espírito Santo; ou (5), a igreja pré-tribulação.
Talvez a pista mais importante para a identificação do detentor seja
uma característica gramatical no texto. Paulo usou um particípio
neutro e um masculino para descrevê-lo. Isso pode implicar que ele é
uma força impessoal personificada por um ser humano. Assim, muitos
comentaristas argumentam que ele é o princípio da lei e da ordem, ou
o governo romano encarnado pelo imperador e agora outros oficiais,
ou deram um cenário alternativo que se ajusta tanto à forma masculina
quanto à neutra.
Seja qual for a sua identidade, quando ele estiver “fora do
caminho”, “o iníquo” operará falsos milagres que iludirão aqueles que

936
rejeitaram o evangelho (2Ts 2.9). Sua veneração do homem da
iniquidade aumentará a culpa e intensificará a condenação deles. Jesus
finalmente o destruirá com o sopro de sua boca e com a manifestação
de sua vinda (2Ts 2.8). A poderosa ordem e a intensa glória de Jesus
acabarão por destruir o anticristo e porão fim à grande apostasia.
Embora a identidade daquele que “detém” provavelmente fosse
conhecida pelos leitores originais de Paulo, os estudantes das
Escrituras, hoje, devem exercer moderação e humildade em seus
esforços para encontrar a exata interpretação desta intrigante
passagem.1 Talvez o mais provável seja sua identificação com o
arcanjo Miguel (veja esp. Ap 12.7; cf. Dn 10.13,20,21). Se assim for,
Deus lembrará Miguel, a fim de permitir que Satanás e o homem da
iniquidade se empenhem em seu ato final, embora inútil, de rebelião.2

1
Veja Morris, Thessalonians, p. 213, 227.
2
Veja notas de estudo em 2Tessalonicenses 2.5-7 na ESV Study Bible (Wheaton:

Crossway, 2008), p. 2.318.

O estado eterno dos fiéis


As cartas aos tessalonicenses oferecem descrições importantes do estado
eterno dos fiéis e infiéis após a Segunda Vinda. Paulo confortou os fiéis em
1Tessalonicenses 4.13-18 com a garantia de que após a Segunda Vinda e a
ressurreição dos mortos que a acompanha “estaremos para sempre com o
Senhor”. Paulo, nesse texto, não se refere especificamente à ressurreição e à
glorificação dos fiéis que estiverem vivos. Contudo, o advérbio “primeiro”
na oração “os que morreram em Cristo ressuscitarão primeiro” implica que

937
a ressurreição dos fiéis logo se segue. Essa hipótese é apoiada por
1Coríntios 15.51-57, que estabelece um vínculo entre a transformação física
dos fiéis que estiverem vivos e a “última trombeta”, que provavelmente
deve ser identificada como o soar da trombeta relacionada à Segunda
Vinda, conforme se vê em 1Tessalonicenses 4.16.
Paulo não identifica nesse texto de forma clara o local onde os fiéis
passarão a eternidade. O “ar” é o lugar onde os fiéis encontram Cristo, mas
não necessariamente onde eles permanecem.59 “E assim estaremos para
sempre com o Senhor” não é o mesmo que “ali [ou seja, no ar], estaremos
para sempre com o Senhor”. O que importa para Paulo é que os fiéis
viverão eternamente as alegrias e as bênçãos da presença gloriosa e
reconfortante do Senhor. Por essa razão, Paulo repete em 1Tessalonicenses
5.10 que os fiéis viverão junto com ele.

A eterna destruição dos infiéis


Em 2Tessalonicenses 1.4-12, Paulo voltou sua atenção para as
consequências da Segunda Vinda para os infiéis. Ele enfatizou que o
retorno de Cristo daria início ao justo juízo dos ímpios. A caracterização do
juízo de Deus como “justo” contraria a alegação de que o juízo de Deus é
injusto. Paulo enfatiza ainda mais a justa natureza do juízo divino ao
retratá-lo como um ato de justiça taliônica no qual os ímpios recebem uma
punição adequada aos seus crimes: “é justo que Deus recompense com
aflição os que vos afligem” (2Ts 1.6). Os incrédulos são totalmente
merecedores do juízo porque eles rejeitaram o único meio de salvação,
obediência aos mandamentos do evangelho para se arrepender e crer em
Cristo. O castigo eterno é, portanto, um ato de “vingança” contra aqueles

938
que “não conhecem a Deus e […] que não obedecem ao evangelho de nosso
Senhor Jesus” (2Ts 1.8).
Paulo descreveu o resultado da condenação divina como “destruição
eterna”. Essa destruição não é uma aniquilação na qual o pecador deixa de
existir e, portanto, encontra refúgio da ira eterna de Deus. É, antes, um
estado contínuo de miséria e ruína que resulta do confronto com o glorioso
Cristo divino. Embora muitos intérpretes entendam a expressão “longe da
presença do Senhor e da sua gloriosa força” como uma indicação de que a
punição eterna consiste da separação de Deus, a expressão mais
provavelmente identifica a origem ou causa da destruição eterna.60 Devido
às divisões de versículos do NT moderno, os leitores naturalmente assumem
que Paulo descreveu o instrumento da punição divina como “chama de
fogo”. No entanto, esta interpretação foi contestada pelos intérpretes que
sugerem que a expressão “com chama de fogo” modifica o substantivo
“revelação” e retrata a vinda de Jesus como uma teofania.
Embora a descrição da vinda de Jesus seja claramente teofânica (i. e.,
uma manifestação da presença de Deus), “com chama de fogo” mais
provavelmente modifica “vingando”, como a HCSB sugere. Segunda
Tessalonicenses 1.8 parece ser uma paráfrase da tradução grega (LXX) de
Isaías 66.15. Os textos gregos dessas duas passagens compartilham a
palavra “vingança” e a expressão “em chama de fogo”. Isaías 66.15-16
adverte: “Eis que o SENHOR virá com fogo — os seus carros são como a
tempestade — para retribuir a sua ira com furor, e a sua repreensão, com
chamas de fogo. Porque o SENHOR executará juízo sobre toda carne com sua
espada flamejante, e muitos serão os mortos pelo SENHOR”.61 Assim, Paulo
“usa a imagem da chama de fogo para retratar a experiência assustadora que
aguarda os inimigos de Deus quando ele infligir vingança aos opressores

939
dos tessalonicenses” e àqueles que rejeitam as boas novas.62 A ordem das
palavras no grego coloca ênfase especial sobre a expressão “com chamas de
fogo” e intensifica a advertência de Paulo sobre a terrível natureza do
castigo escatológico.

Uma ética cristã do trabalho


Devido ao desafio único decorrente da presença dos “preguiçosos” (1Ts
5.14), que viviam de forma “irresponsável” (2Ts 3.6-15), Paulo enfatizou a
importância de uma ética cristã do trabalho nessas cartas.63 Os
“preguiçosos” estavam, aparentemente, recusando-se a trabalhar e se
aproveitando da generosidade de outros membros da igreja. Essa vida de
ociosidade pode ter sido adotada por alguns membros da igreja por causa de
uma escatologia confusa. Talvez, como alguns entusiastas do final dos
tempos de hoje, eles tenham abandonado o emprego e sentado no telhado de
casa para esperar a volta de Cristo. Quaisquer que fossem as motivações
para esse comportamento, Paulo insistiu que isso era contrário à doutrina
cristã e ao exemplo do próprio apóstolo. Ele tinha aberto mão do seu direito
de, como apóstolo, viver à custa da igreja e trabalhava arduamente dia e
noite para ganhar a vida.
Paulo listou várias consequências prejudiciais do comportamento
ocioso. Primeiro, porque os ociosos não se ocupavam com o trabalho, eles
utilizavam seu tempo livre para interferir no trabalho dos outros (2Ts 3.11).
Segundo, sua recusa do trabalho estava colocando um fardo financeiro
indevido sobre os irmãos e irmãs generosos. Terceiro, o seu comportamento
atraía o desrespeito dos infiéis ou daqueles “que são de fora” (1Ts 4.10-12).
Paulo insistiu que a igreja deveria não dar apoio aos ociosos. Breves

940
experiências de fome bastariam para inspirar a produtividade daqueles que
não estavam dispostos a trabalhar. Paulo até exortou a igreja a iniciar um
compassivo processo de disciplina eclesiástica para motivar os ociosos a
mudar de comportamento.
O ensino de Paulo demonstra a importância de os fiéis labutarem
diligentemente para sustentar a si mesmos e as suas famílias através do
trabalho saudável. Também lembra aos fiéis que a fidelidade no trabalho
pode se tornar um testemunho positivo ou negativo diante dos incrédulos.

Eleição e perseverança
Embora as cartas aos Tessalonicenses não deem uma longa ou detalhada
explicação das doutrinas da eleição e perseverança, elas oferecem o
tratamento sucinto mais claro dessas doutrinas na literatura paulina. Em
2Tessalonicenses 2.13-15, Paulo expressa sua convicção de que Deus tinha
escolhido os membros da igreja em Tessalônica para serem salvos. Deus
havia determinado salvar aqueles fiéis “desde o princípio”, na eternidade
passada. Uma vez que Deus fez sua escolha antes de os tessalonicenses
terem sequer nascido, fica claro que sua decisão foi motivada por sua
própria graça misteriosa e não pelo mérito dos tessalonicenses (Rm 9.11).
Paulo afirma a natureza graciosa da eleição ao descrever os eleitos como
“irmãos amados pelo Senhor” (2Ts 2.13). Essa identificação dos fiéis ocorre
apenas duas vezes nas cartas de Paulo (veja 1Ts 1.4). Em ambos os textos, a
expressão está associada a uma discussão da eleição divina.
A salvação planejada para os eleitos é experimentada por eles por meio
da “santificação pelo Espírito e pela fé na verdade”. O fato de a
“santificação” preceder a “fé” na ordem das palavras dessa oração

941
provavelmente implica que isso também acontece de uma perspectiva
cronológica. Assim, a “santificação” da qual Paulo fala aqui se refere à obra
graciosa de Deus ao libertar o pecador do cativeiro da sua natureza
pecaminosa e levá-lo a se arrepender e crer. Paulo também indica a mesma
realidade em 1Tessalonicenses 1.4,5, onde evidências da eleição dos
tessalonicenses são demonstradas pelo fato de que a proclamação do
evangelho do apóstolo “não chegou a vós em palavras somente, mas
também em poder, no Espírito Santo e com absoluta convicção”. A
poderosa ação do Espírito ao garantir aos tessalonicenses a verdade do
evangelho parece corresponder igualmente à sua obra santificadora
vinculada à fé em 2Tessalonicenses 2.13.
A eleição divina claramente não erradicava a necessidade da escolha
humana para Paulo. Paulo afirmou tanto a soberania divina quanto a
responsabilidade humana. Ele colocou a responsabilidade pela rejeição do
evangelho pelo pecador no colo do pecador, e não de Deus, alegando que
pecadores perecerão “pois não aceitaram o amor da verdade para serem
salvos” e caracterizando os condenados como “aqueles que não creram na
verdade, mas se deleitaram na injustiça” (2Ts 2.11). Paulo declarou que
Deus confirma e até aumenta a descrença daqueles que estão perecendo,
mas ele não via a Deus como a fonte original da incredulidade deles.
Em 2Tessalonicenses, o apelo de Paulo à doutrina da eleição serve a um
propósito muito prático. Ele funcionou para confortar e encorajar os fiéis
que pudessem ter ficado assustados pelas antecipações do grande engano
que acompanharia a obra do anticristo discutidas no contexto
imediatamente anterior. Paulo assegurou aos fiéis que, embora muitos
fossem enganados pelo “engano injusto” do homem do pecado, pelos seus
“falsos milagres” e pelo “forte engano”, os fiéis seriam protegidos do

942
engano. A doutrina da eleição demonstrou que a sua fé em Cristo não foi
um acidente, nem era apenas um produto de seu próprio capricho humano.
Sua salvação era fundamentada no propósito eterno de Deus e dependente
de sua própria fidelidade. Por causa do poderoso chamado de Deus, eles
obteriam a glória que ele planejou para eles (1Ts 5.23,24; 2Ts 2.14; 3.3).
Paulo via a segurança eterna do fiel como um produto derivado da doutrina
da eleição. O apelo de Paulo à doutrina da eleição para confortar os cristãos
que antecipavam o grande engano provavelmente demonstra a sua
consciência e dependência dos ensinamentos escatológicos de Jesus. Jesus
também apelou para a doutrina da eleição para encorajar seus seguidores
quando eles anteviram os enganos que ocorreriam na grande tribulação (Mc
13.21-24).

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON


Ensino sobre os acontecimentos imediatamente anteriores à Segunda
Vinda de Cristo, incluindo o arrebatamento (1Ts 4.13-18)
Ensino sobre o “homem da iniquidade”, o anticristo (2Ts 2.3,4), e
“aquele que agora detém”, cuja identidade é discutida (2Ts 2.7)
A eleição dos fiéis e o chamado de Deus (1Ts 1.4; 2Ts 2.13-15)
A importância de uma ética cristã de trabalho (1Ts 5.12-14; 2Ts 3.6-
13)
Ensino sobre como viver esperançosamente à luz do retorno de Cristo
(p. ex., 1Ts 5.1-22)

QUESTÕES PARA ESTUDO

943
1. Por que que as cartas de 1 e 2Tessalonicenses são muitas vezes
negligenciadas? Por que elas são importantes?
2. Qual das duas cartas muitos estudiosos modernos não aceitam como
sendo de Paulo? Por quê?
3. Qual papel a teologia desempenha na atribuição da autoria de 2Tessa-
lonicenses?
4. Quando 1Tessalonicenses provavelmente foi escrita? Quanto tempo
depois de 1Tessalonicenses 2Tessalonicenses foi escrita?
5. Quais são algumas das principais razões que motivaram Paulo a
escrever as cartas aos Tessalonicenses?
6. Qual foi a causa da ética de trabalho deficiente dos tessalonicenses?
7. Como a crítica retórica ajuda o leitor moderno a compreender melhor
as cartas aos Tessalonicenses?
8. Qual é o gênero mais provável das cartas aos Tessalonicenses?
9. Quais são os cinco principais componentes retóricos de
1Tessalonicenses e como eles funcionam?
10. Quem é “o homem da iniquidade” em 2Tessalonicenses 2, e quem foi
identificado como “aquele que detém”?
11. Qual posição em relação ao arrebatamento encontra maior suporte em
1Tessalonicenses e por quê?
12. Qual a contribuição mais importante das cartas aos Tessalonicenses
para o cânon do NT?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


BEALE, G. K. 1 to 2 Thessalonians. IVP New Testament Commentary
(Downers Grove: InterVarsity, 2003).

944
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946
1
Veja D. Guthrie, New Testament Introduction, 2. ed. (Downers Grove: InterVarsity, 1990), p.

589.

2
K. Schrader, Der Apostel Paulus, (Leipzig: Kollmann, 1836), 5:23 e seguintes, citado por J. E.

Frame, Epistles of St. Paul to the Thessalonians, ICC (Edinburgh: T&T Clark, 1953), p. 37.

3
F. C. Baur, Paulus, der Apostel Jesu Christi: Sein Leben und Wirken, seine Briefe und seine

Lehre (Osnabruck: Otto Zeller, 1968 [1845]), 2:94-107.

4
J. E. Frame, A Critical and Exegetical Commentary on the Epistles of St. Paul to the

Thessalonians, ICC (New York: Charles Scribner’s Sons, 1912), p. 37.

5
C. Wanamaker, Commentary on 1 and 2Thessalonians, NIGTC (Grand Rapids: Eerdmans,

1990), p. 17.

6
Veja a discussão em G. Milligan, St. Paul’s Epistles to the Thessalonians (London: Macmillan,

1908), lxxvii. Ireneu se referiu a 2Tessalonicenses pelo nome em Contra Heresias 3.7.2.

7
As alusões de Justino aparecem em Diálogo com Trifão110. Policarpo (Filipenses 11.3,4) citou

2Tessalonicenses 1.4; 3.13. Ele identificou a fonte de sua primeira citação como a carta de Paulo aos

Filipenses, embora as palavras apareçam apenas em 2Tessalonicenses. Mas Filipos e Tessalônica

eram cidades importantes na Macedônia, e Policarpo pode tê-las visto como uma única comunidade.

8
Milligan, Thessalonians, lxxviii.

9
J. E. C. Schmidt, Vermutungen über die beiden Briefe an die Thessalonicher, Bibliothek für

Kritik und Exegese des Neuen Testaments und der ältesten Christengeschichte 2/3 (Hadamar:

Gelehrtenbuchhandlung, 1801).

10
Frame, Thessalonians, p. 40.

11
F. H. Kern, “Über 2. Thess 2,1-12. Nebst Andeutungen über den Ursprung des zweiten Briefs

an die Thessalonicher”, Tübinger Zeitschrift für Th eologie 2 (1839), p. 145-214.

947
12
Milligan, Thessalonians, lxxviii.

13
W. Trilling, Untersuchungen zum zweiten Thessalonicherbrief (Leipzig: St. Benno, 1972). A

crítica da forma dá atenção especial às formas da literatura bíblica, isto é, gêneros típicos de discurso

verbal. Veja K. L. Sparks, “Form Criticism”, em: S. E. Porter, org., Dictionary of Biblical Criticism

and Interpretation (London/New York: Routledge, 2007), p. 111-14.

14
W. Wrede, Die Echtheit des zweiten Thessalonicherbriefes, TU 9/2 (Leipzig: J. C. Henrich,

1903).

15
Milligan, Thessalonians, li-liii.

16
M. J. J. Menken, 2Thessalonians (London: Routledge, 1994), p. 32.

17
A. Malherbe (The Letters to the Thessalonians, AB [New York: Doubleday, 2000], p. 366)

destacou que as longas sentenças aparecem tipicamente no início da epístola. Isso corresponde a

2Tessalonicenses 1.3-12, a sentença mais longa da carta. Parece que não apenas a longa sentença,

mas mesmo sua colocação é caracteristicamente paulina.

18
Trilling, Untersuchungen, p. 23. A crítica da forma olha para os vários tipos de escritos

presentes ao examinar um dado documento.

19
Wanamaker, Thessalonians, p. 24-25.

20
Trilling, Untersuchungen, p. 27.

21
Por exemplo, 2Macabeus 6.12-18; 2Baruque 13.3-10; 78.5; Sl. Sal. 13.9-10.

22
Por exemplo, compare Romanos 10.9,13 e Filipenses 2.9,11 com Joel 2.32. Em Romanos 10,

um texto do AT sobre Yahweh é aplicado a Jesus. Em Filipenses 2, a identificação do título Senhor

como o “nome está acima de todo nome” demonstra que Senhor está funcionando como acontecia

nos textos judaicos gregos como uma reverente substituição para o nome Yahweh.

948
23
R. Jewett, The Thessalonian Correspondence: Pauline Rhetoric and Millenarian Piety

(Philadelphia: Fortress, 1986), p. 18.

24
E. Best, A Commentary on the First and Second Epistles to the Thessalonians (London: A. e C.

Black, 1977), p. 52.

25
J. C. West, “The Order and 1 and 2Thessalonians”, JTS 15 (1914), p. 66-74; J. Weiss, Earliest

Christianity: A History of the Period A.D. 30-150, ed. e tradução para o inglês de F. C. Grant (New

York: Harper, 1959), 1:286-91; T. W. Manson, “St. Paul in Greece: The Letters to the Thessalonians”,

BJRL 35 (1952-53), p. 428-47; R. Gregson, “A Solution to the Problem of the Thessalonian

Epistles”, EvQ 38 (1966), p. 76-80; C. Buck; G. Taylor, St Paul: A Study of the Development of his

Thought (New York: Scribner’s, 1969), p. 140-45; e R. W. Thurston, “The Relationship Between the

Thessalonian Epistles”, ExpTim 85 (1973-74), p. 52-56. F. F. Bruce (1 and 2Thessalonians, WBC 45

[Waco: Word, 1982], xli) sugeriu que Hugo Grotius (1641) foi o primeiro estudioso a sugerir a

prioridade de 2Tessalonicenses.

26
Wanamaker, Thessalonians, p. 38-39.

27
Ibid., p. 39.

28
Wanamaker (Thessalonians, p. 41) sugeriu que a referência pode ser a uma outra carta que já

não é conhecida. Se for assim, a primeira carta de Paulo aos tessalonicenses não mais existe;

2Tessalonicenses é a segunda carta de Paulo para a congregação, e 1Tessalonicenses é a terceira

carta. Mas postular a existência de uma outra carta desconhecida quando outras explicações são

plausíveis resulta em um argumento forçado. Alternativamente, Wanamaker sugeriu que “vocês

foram ensinados… mas nossa carta” se refere à seção imediatamente precedente da própria

2Tessalonicenses. Isso exigiria que a palavra edidachthēte (“vocês foram ensinados”) fosse um

“aoristo epistolar”, algo improvável. Para uma breve discussão do possível uso por Paulo do aoristo

epistolar em outras passagens, veja K. L. McKay, “Observations on the Epistolary Aorist in

949
2Corinthians”, NovT 37 (1995), p. 154-58; cf. D. B. Wallace, Greek Grammar Beyond the Basics

(Grand Rapids: Zondervan, 1996), p. 562.

29
M. W. Holmes, 1 and 2Thessalonians, NIVAC (Grand Rapids: Zondervan, 1998), p. 28.

30
Martin, 1, 2Thessalonians, p. 33. Veja J. W. Simpson Jr., “Letters to the Thessalonians”, em: G.

F. Hawthorne; R. P. Martin; D. G. Reid, orgs., Dictionary of Paul and His Letters (Downers Grove:

InterVarsity, 1993), p. 937.

31
Ambos os pressupostos recebem apoio de C. J. Hemer, The Book of Acts in the Setting of

Hellenistic History (Tübingen: Mohr Siebeck, 1989), p. 119.

32
Malherbe acrescentou quase um mês à cronologia porque ele assumiu que Timóteo teve de

viajar da Bereia para Atenas (uma jornada de três semanas) e depois de Atenas de volta para

Tessalônica (seis semanas). Isso é possível, mas Atos implica que Paulo e Timóteo não se

encontraram novamente até depois que Paulo começou seu ministério em Corinto (At 18.5). Veja M.

Dibelius, Die Briefe des Apostels Paulus. II. Die Neun Kleine Briefe (Tübingen: Mohr, 1913), p. 12;

I. H. Marshall, 1 and 2Thessalonians, NCBC (Londres: Marshall, Morgan, e Scott, 1983), p. 89; e

Wanamaker, Thessalonians, p. 126-27.

33
Tanto o Alexandrino (séc. V) quanto o primeiro corretor do Vaticano (séc. IV) identificam as

cartas como “de Atenas”.

34
O Manuscrito 81 (1044 d.C.) e alguns outros indicam que 1Tessalonicenses “foi escrita em

Corinto por Paulo, Silas e Timóteo”.

35
Essa reconstrução foi afirmada anteriormente por E. von Dobschütz, Die Thessalonicherbriefe,

7. ed., KEK (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1909), p. 130. Best (Thessalonians, p. 131)

rejeitou a reconstrução de von Dobschütz com base no fato de que a interpretação “priva de

significado sua determinação de permanecer sozinho em Atenas”. Esse protesto é incorreto uma vez

que nessa reconstrução Paulo foi deixado sozinho por seus acompanhantes que tinham que levar

950
instruções de volta para Timóteo em Bereia. Alguns comentaristas não tentam integrar as afirmações

em 1Tessalonicenses com o relato em Atos. D. A. deSilva (An Introduction to the New Testament:

Contexts, Methods and Ministry Formation [Downers Grove: InterVarsity, 2004], p. 529)

argumentou: “nesses casos seria provavelmente melhor confiar nos relatos de primeira mão de Paulo

dos eventos do que nos posteriores relatos frequentemente incompletos e de segunda mão de Lucas”.

36
Malherbe (Thessalonians, p. 71-72) tratou a questão de uma origem em Atenas versus Corinto

mais extensivamente do que a maioria dos comentaristas.

37
Essa origem recebe suporte de subscrições no Alexandrino (séc. V), da revisão do Vaticano

(séc. IV), e de vários outros antigos manuscritos.

38
Veja as subscrições nos manuscritos 6 (séc. XIII), 614 (séc. XIII), e a margem de 1739 (séc.

X).

39
Wanamaker, Thessalonians, p. 3.

40
Veja especialmente C. Edson, “Cults of Thessalonica”, HTR 41 (1948), p. 153-204; e K. P.

Donfried, “The Cults of Thessalonica and the Thessalonian Correspondence”, NTS 31 (1985), p. 336-

56.

41
Veja o item “Destino”.

42
Compare 1Tessalonicenses 4.9; 5.1 com 1Coríntios 7.1,25; 8.1. Alguns acadêmicos

argumentam que isso é especialmente provável uma vez que duas das questões que Paulo abordou,

amor fraterno e o Dia do Senhor, são questões que ele não achou necessidade de abordar. Mas as

afirmações de Paulo em 1Tessalonicenses 4.9 (“não é preciso que eu vos escreva”) e 5.1 (“não é

necessário que nada vos seja escrito”) são exemplos de um dispositivo retórico comum chamado

paralipse e não fornecem nenhum suporte verdadeiro para teorias sobre correspondência escrita dos

Tessalonicenses para Paulo. Veja BDF 495.1. Para outros exemplos paulinos, veja 2Coríntios 9.1;

Filemom 19.

951
43
Jewett, Thessalonian Correspondence, p. 71-72; G. Lyons, Pauline Autobiography: Toward a

New Understanding, SBLDS 73 (Atlanta: Scholars Press, 1985), p. 219-21; Wanamaker,

Thessalonians, p. 47.

44
Veja Wanamaker, Thessalonians, viii. Jewett (Thessalonian Correspondence, p. 72-6) sugeriu

que o exordium termina em 1Tessalonicenses 1.5 e a narratio começa em 1.6. Jewett comparou sua

própria análise com outras análises retóricas nas p. 76-78.

45
A classificação desta seção como probatio é, de certa forma, problemática. A seção se devota

muito mais a exortações do que a provas e argumentos para suportar a tese do autor. As análises de F.

W. Hughes, G. Kennedy, e H. Koester reconhecem esta seção como dedicada a exortações, injunções

ou admoestações. Para um quadro que compara, de forma conveniente, vários esboços tópicos e

retóricos do livro, veja Jewett, Thessalonian Correspondence, p. 216-21.

46
F. W. Hughes, Early Christian Rhetoric and 2Thessalonians, JSNTSup 30 (Sheffield: JSOT,

1989), p. 55; Jewett, Thessalonian Correspondence, p. 82; G. A. Kennedy, New Testament

Interpretation Through Rhetorical Criticism (Chapel Hill: University of North Carolina, 1984), p.

144; Wanamaker, Thessalonians, p. 48.

47
Jewett, Thessalonian Correspondence, p. 82-84.

48
Para uma boa introdução ao formato básico das cartas de Paulo, veja P. T. O’Brien, “Letters,

Letter Forms”, em: Dictionary of Paul and His Letters, p. 550-53.

49
Jewett, Thessalonian Correspondence, p. 87.

50
Para o ponto de vista que o juízo divino consiste do confronto com a gloriosa presença de

Cristo, e não a separação dela, veja C. L. Quarles, “The Apo of 2Thessalonians 1.9 and the Nature of

Eternal Punishment”, WTJ 59 (1997), p. 201-11.

51
Veja a discussão sobre o homem da iniquidade e o quadro sobre “aquele que detém” na seção

Temas Teológicos.

952
52
Por exemplo, G. K. Beale, 1-2Thessalonians (Downers Grove: InterVarsity, 2003), p. 136-38;

Wanamaker, Thessalonians, p. 170-71; e Marshall, Thessalonians, p. 125-27.

53
Por exemplo, Bruce, Thessalonians, p. 102-3; e Marshall, Thessalonians, p. 130-31; veja J.

Crisóstomo, Homilies on 1Thessalonians 8, em: P. Schaff, org., A Select Library of the Nicene and

Post-Nicene Fathers of the Christian Church (Grand Rapids: Eerdmans, 1956), vol. 13: Saint

Chrysostom: Homilies on Galatians, Ephesians, Philippians, Colossians, Thessalonians, Timothy,

Titus, and Philemon, 554-61.

54
Wanamaker, Thessalonians, p. 248.

55
Bruce, Thessalonians, p. 169. O ponto de vista simbólico é ainda mais enfatizado por

Marshall, Thessalonians, p. 191-92.

56
R. L. Thomas, “2Thessalonians”, EBC 11 (Grand Rapids: Zondervan, 1978), p. 322; e

aparentemente Martin, 1, 2Thessalonians, p. 236-37.

57
Veja Beale, Thessalonians, p. 136; Bruce, Thessalonians, p. 163; Wilkins, Thessalonians, p.

238-39; R. Gundry, First the Antichrist (Grand Rapids: Baker, 1997); G. E. Ladd, The Blessed Hope:

A Biblical Study of the Second Advent and the Rapture (Grand Rapids: Eerdmans, 1956).

58
T. R. Schreiner, Paul, Apostle of God’s Glory in Christ: A Pauline Theology (Downers Grove:

InterVarsity, 2001), p. 460-61[publicado em português por Vida Nova sob o título Teologia de Paulo:

o apostolo da glória de Deus em Cristo].

59
Marshall, Thessalonians, p. 131.

60
Quarles, “The Apo of 2Thessalonians 1:9”, p. 201-11.

61
Ao aplicar este texto sobre a vinda de Yahweh para descrever a vinda de Jesus, Paulo

identificou Jesus como Yahweh e claramente expressou a doutrina da divindade de Jesus.

62
Wanamaker, Thessalonians, p. 227; cf. Marshall, Thessalonians, p. 177.

953
63
Cf. a seção “Algo para se Pensar: Como é Sua Ética de Trabalho?”.

954
CAPÍTULO 12

A correspondência de Paulo aos


Coríntios: 1 e 2Coríntios

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os principais
fatos de 1 e 2Coríntios. Com relação à História, deverão ser capazes de
identificar o autor, data, origem, destino, e o propósito de cada livro. Com
relação à Literatura, deverão ser capazes de fornecer um esboço básico de
cada livro e identificar os principais elementos do conteúdo do livro
encontrados na Discussão Unidade por Unidade. Com relação à Teologia,
os estudantes devem ser capazes de identificar os principais temas
teológicos em 1 e 2Coríntios.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo
essencial identificado nos Conhecimentos básicos, os estudantes deverão
ser capazes de apresentar os argumentos em favor das conclusões históricas,
literárias e teológicas. Com relação à História, deverão ser capazes de tratar
das evidências para a autoria paulina, data, origem, destino e propósito.
Com relação à Literatura, deverão ser capazes de fornecer um esboço
detalhado do livro. Com relação à Teologia, deverão ser capazes de discutir

955
os principais temas teológicos em 1 e 2Coríntios e a forma exclusiva em
que cada um contribui para o cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além do domínio do conteúdo essencial
identificado nos itens Conhecimentos básicos e Conhecimentos
intermediários mencionados, os estudantes deverão ser capazes de avaliar a
integridade e unidade literárias de 2Coríntios em relação às teorias de
interpolação. Além disso, os estudantes deverão ser capazes de tratar das
teorias relacionadas à identidade dos adversários de Paulo em 2Coríntios.

956
Mapa 12.1: Origem e destino de 1 e 2Coríntios.

957
FATOS-CHAVE DE 1CORÍNTIOS
Autor: Paulo
Data: 53 ou 54
Origem: Éfeso
Destino: A Igreja em Corinto
Motivo: Relatos orais e uma carta dos coríntios
Propósito: Abordar questões práticas como cismas na
igreja, questões judiciais nas cortes locais, o
exercício da disciplina na igreja, questões
relacionadas a idolatria, casamento cristão,
as ordenanças, dons espirituais e questões
teológicas como a natureza da salvação e a
doutrina da ressurreição.
Versículos-Chave: 13.1-3

FATOS-CHAVE DE 2CORÍNTIOS
Autor: Paulo
Data: 54 ou 55
Origem: Macedônia, talvez Filipos
Destino: Igrejas em Corinto e por toda a província da
Acaia
Motivo: Relatório de Tito sobre a condição da igreja
seguido de informação adicional sobre a
intrusão de falsos apóstolos
Propósito: Defender a autoridade apostólica de Paulo,
explicar a natureza da nova aliança,
encorajar a caridade sacrificial para a oferta
de auxílio e desafiar as alegações dos falsos
apóstolos
Versículos-Chave: 5.16-21

958
INTRODUÇÃO

As cartas de Paulo à Igreja em Corinto estão entre os livros mais


teologicamente ricos e mais praticamente úteis do NT. Na ordem
cronológica, provavelmente elas vêm logo depois das cartas aos gálatas e
aos tessalonicenses. Em sua correspondência aos coríntios, Paulo abordou
inúmeros problemas em uma igreja atormentada por muitas dificuldades.
Para responder a esses problemas, o apóstolo aplica a sua elaborada
teologia a questões muito práticas e demonstra que a teologia, para ele, não
era estática. Ela era dinâmica e fazia uma diferença prática na vida diária.
As cartas aos coríntios mostram a notável integração de fé e prática em
Paulo.
Primeira Coríntios contém o mais extenso tratamento de Paulo de temas
como a unidade cristã, a moralidade cristã, as ordenanças da igreja, os dons
espirituais e a ressurreição dos fiéis. Ele desafia o desenvolvimento de
facções na igreja, orienta os líderes da igreja no exercício da disciplina
eclesiástica, e explica as formas de conduzir o culto de maneira decente e
ordeira. Ela também aborda questões de importância na sociedade
contemporânea, tais como a distinção permanente entre os sexos e os
limites da liberdade individual.
Embora 2Coríntios seja talvez a carta mais difícil de Paulo em muitos
aspectos, a sua contribuição para o NT também é considerável. A carta tem
um valor inestimável para orientar os intérpretes a entender a teologia de
Paulo da nova aliança, que constitui a base de muito do seu pensamento. A
carta também orienta os estudantes da Bíblia na construção de uma teologia
do sofrimento como nenhum outro livro do NT. Também importante, as
cartas aos coríntios, especialmente 2Coríntios, auxiliam no

959
desenvolvimento de uma teologia do ministério que enfatiza compaixão,
sacrifício, humildade e dependência de Deus. Não se pode perscrutar mais
profundamente no coração do apóstolo do que vasculhando as páginas desta
carta.1
Numa época em que os líderes espirituais estão sendo transformados em
celebridades e a humildade é vista como uma característica indesejável,
2Coríntios pode ser mais importante do que nunca.2 Talvez mais do que
qualquer outro documento do NT, 2Coríntios chama a igreja a arrepender-se
de criar superapóstolos a partir de vasos de barro, de fugir do sofrimento, de
depender apenas dos recursos humanos, de encobrir a glória de Deus e
depreciar a graça divina. Como C. K. Barrett observou, “escrever
2Coríntios deve ter chegado perto de quebrantar Paulo, e […] uma igreja
que está preparada para lê-la com ele e entendê-la, pode também se ver
quebrantada”.3
A resposta de Paulo aos problemas enfrentados pelos coríntios oferece
aos modernos estudantes do NT um guia poderoso na abordagem dos
problemas da igreja local de hoje. Mas a tentativa de compreender estas
cartas e extrair os princípios que são tão importantes para a igreja
contemporânea não é para o leitor preguiçoso. A exegese e aplicação das
cartas aos coríntios demandam trabalho árduo e estudo sério.4 Este capítulo
pretende ser um primeiro passo no difícil, mas gratificante, estudo das
cartas aos Coríntios.

HISTÓRIA
Autor
1Coríntios

960
A autoria paulina de 1Coríntios é tão amplamente aceita que alguns
comentários importantes sobre a carta nem sequer tratam a questão da
autoria.5 A evidência externa antiga em favor da autenticidade da carta
também é convincente. Clemente de Roma citou de 1Coríntios e atribuiu a
citação à “epístola do abençoado apóstolo Paulo”, por volta do ano 96. O
interessante é que ele fez isso em uma carta também dirigida à igreja em
Corinto.6 Há também ecos frequentes de 1Coríntios nas cartas de Inácio,
que foram escritas antes de 110.7
Alguns estudiosos sugerem que, embora 1Coríntios tenha sido escrita
por Paulo, trechos da carta hoje conhecida foram interpolações não
paulinas. Weiss argumentou que 1Coríntios 1.2b, “com todos os que em
todo lugar invocam o nome de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e
nosso”, foi posteriormente acrescentado por um editor que quis dar à carta
uma aplicação universal.8 Outros acadêmicos sugeriram que a proibição das
mulheres de falar na igreja, em 1Coríntios 14.34b,35, é uma glosa não
paulina acrescentada por um judeu cristão.9 Essas teorias, porém, não
conseguiram convencer a maioria dos intérpretes, uma vez que os textos
suspeitos estão presentes em todos os manuscritos existentes de 1Coríntios.
Além disso, as objeções à autenticidade de 1Coríntios 14.34b,35 parecem
ser motivadas em grande parte pela sensibilidade moderna a questões de
gênero.
Desde que H. Hagge pela primeira vez levantou dúvidas sobre a
integridade de 1Coríntios em 1876, inúmeros estudiosos sugeriram que
1Coríntios é uma carta composta na qual partes de outra correspondência
paulina foram inseridas. Uma vez que as cartas aos coríntios claramente se
referem a pelo menos quatro cartas que Paulo enviou a Corinto, alguns
intérpretes sugeriram que a falta de um arranjo ordenado da carta e as

961
tensões entre as seções da carta eram mais bem explicadas ao considerar
1Coríntios como um pastiche de fragmentos paulinos.10
Embora muitas propostas diferentes de reconstrução dos documentos
originais reunidos pelo suposto editor de 1Coríntios têm sido e continuem a
ser apresentadas, nenhuma ganhou a simpatia dos estudiosos NT. A maioria
reconhece que a natureza fragmentária da carta é em grande parte devida ao
fato de que a carta de Paulo responde ponto por ponto às questões
levantadas pelos relatórios orais e por uma carta enviada de Corinto. Além
disso, existem boas soluções para as supostas tensões exegéticas no livro,
sem se recorrer à teoria de um documento composto. Finalmente, a
mudança de tom por toda a carta, provavelmente, resulte de Paulo ter
escrito a carta durante um período de tempo no qual recebia novas
informações sobre a condição da igreja de Corinto.11

2Coríntios
A autoria paulina de 2Coríntios não foi seriamente contestada. A atestação
externa de 2Coríntios não é tão forte como a de 1Coríntios. Ecos de
2Coríntios talvez apareçam nas cartas de Inácio (antes de 110) e na Epístola
de Barnabé (c. 135).12 Contudo, os possíveis paralelos não são próximos o
suficiente para demonstrar dependência de 2Coríntios.13 A carta de
Policarpo aos Filipenses quase certamente contém uma paráfrase livre de
2Coríntios 5.10 e outras declarações na carta implicam a familiaridade de
Policarpo com 2Coríntios.14 Policarpo escreveu esta carta em uma época
próxima à morte de Inácio, que geralmente é datada durante o reinado de
Trajano (98-117).15 Assim, Policarpo mostrou estar consciente da existência
e da autoridade de 2Coríntios no início do século II.16 Segundo Tertuliano

962
(c. 160-225; Contra Marcião 5.11-12), Marcião também incluiu 2Coríntios
no seu cânon, aproximadamente na mesma época. No final do século II,
2Coríntios foi listada no Cânon de Muratori (c. final do séc. II) e
amplamente citada e atribuída a Paulo. A atestação externa mais frágil de
2Coríntios não é suficiente para levantar suspeitas sobre sua autenticidade.
A carta é tão completamente paulina na forma, estilo e conteúdo que a
autoria paulina de 2Coríntios é praticamente indiscutível.
Apesar dessa evidência, muitos estudiosos suspeitam que 2Coríntios é
um documento composto, constituído de várias porções da correspondência
paulina dirigida a Corinto e a outros lugares e, talvez, algum material não
paulino também. A integridade da carta foi contestada em quatro pontos.
Em primeiro lugar, muitos estudiosos acreditam que a mudança no tom dos
capítulos 1 a 9 para 10 a 13 sugere que os capítulos 10 a 13 pertencem a
uma carta originalmente separada, escrita antes ou depois dos capítulos 1 a
9. Segundo, alguns estudiosos acreditam que a transição do capítulo 8 para
o capítulo 9 é surpreendentemente abrupta e que o capítulo 9 pode ter sido
colado ao capítulo 8 por algum editor posterior. Terceiro, 2.14 a 7.4 é
reconhecido por alguns estudiosos como uma unidade distinta do restante
da carta que interrompe a discussão de Paulo sobre Tito e sua viagem para a
Macedônia em 2.12,13 e 7.5-16. Quarto, alguns estudiosos veem 6.14 a 7.1
como fora de lugar e não característico de Paulo. Além disso, afinidades
entre este texto e alguns documentos de Qumran sugerem que a seção pode
ser uma interpolação não paulina.

2Coríntios 10 a 13

963
Existe um grande número de teorias que tentam demonstrar que 2Coríntios
10 a 13 era originalmente uma parte separada de correspondência anexada
aos capítulos 1 a 9. Alguns estudiosos defendem que os capítulos 10 a 13
são uma “carta dolorosa” anterior mencionada em 2Coríntios 7.8.17 No
entanto, é evidente que a carta dolorosa exigia que um infrator na igreja
fosse punido (2Co 2.5,6; 7.12), e os capítulos 10 a 13 não fazem referência
a esse infrator. Além disso, nenhuma razão satisfatória foi apresentada para
explicar por que um redator reuniria duas cartas separadas ignorando sua
ordem cronológica.
A maioria dos recentes comentaristas argumenta que Paulo escreveu os
capítulos 10 a 13 algum tempo depois dos capítulos 1 a 9.18 Após Tito
entregar os capítulos 1 a 9 aos coríntios, Paulo teria recebido mais
informações sobre a situação deles, que exigiram outra resposta dura.19 Ele
teria escrito os capítulos 10 a 13 como sua última carta aos coríntios. A
maior dificuldade com essa teoria é que ela requer um editor que mais tarde
teria cortado tanto a conclusão original da carta contendo os capítulos 1 a 9
quanto a introdução original da carta composta pelos capítulos 10 a 13 para
poder combinar as duas cartas. Pode-se perguntar por que um editor que
estivesse disposto a fazer tais alterações, a fim de juntar duas cartas sem
emendas, não tomaria medidas adicionais para suavizar a transição de uma
seção para outra. Essa teoria também se complicada pelas referências à
iminente visita de Paulo a Corinto nas duas seções. Como L. Belleville
observou:

Enquanto Paulo fala obliquamente de sua próxima visita em 9.4 (“se alguns macedônios
forem comigo”), é somente nos capítulos 10 a 13 que um anúncio explícito é feito e os
detalhes são fornecidos. Na verdade, teria sido uma violação da etiqueta epistolar Paulo ter
escrito sem anunciar formalmente uma futura visita.20

964
À luz dessas dificuldades com as teorias de que 2Coríntios seja um
documento composto, muitos acadêmicos continuam a afirmar a unidade
original da carta. A mudança de tom entre as seções anterior e posterior da
carta pode ser facilmente explicada sem necessidade de interpolação. Os
capítulos 1 a 9 podem ser dirigidos à congregação em geral, enquanto os
capítulos 10 a 13 são direcionados principalmente aos opositores de Paulo.
Muito provavelmente, Paulo recebeu novas informações sobre a situação
em Corinto, depois de uma pausa longa no ditado. Dependendo da agenda
dos autores e de seus secretários, períodos de dias ou mesmo semanas
poderiam se passar entre os ditados de várias seções de uma carta. Isso era
tempo mais do que necessário para que Paulo pudesse receber novas
informações que exigissem uma abordagem nova nos capítulos finais da
carta.

2Coríntios 9
Alguns estudiosos observaram que 2Coríntios 9 não se ajusta muito bem ao
seu presente contexto. Depois de discutir a coleta da oferta por todo o
capítulo 8, o capítulo 9 começa com o que muitos julgam ser uma fórmula
introdutória (“agora, quanto a assistência em favor dos santos, não há
necessidade que vos escreva”) e discute a oferta mais uma vez. J. S. Semler
desenvolveu a teoria de que o capítulo 9 era, originalmente, uma carta
separada, dirigida aos cristãos nas cidades da Acaia que não Corinto. Mas
uma pesquisa recente demonstrou que a chamada fórmula introdutória em
2Coríntios 9.1 era usada para uma variedade de propósitos,21 e um dos usos
mais comuns era dar uma explicação do material anterior.22 Além disso, o
capítulo 9 se refere repetidamente aos “irmãos”, que são conhecidos apenas

965
por sua identificação anterior em 8.16-24. Essas características fortemente
implicam a unidade original dos capítulos 8 e 9.

2Coríntios 6.14 a 7.1


Inicialmente, 2Coríntios 6.14 a 7.1 parece mesmo estar fora de lugar. Em
6.11-13, Paulo falou de seu coração estar aberto aos coríntios e os exortou a
abrirem seus corações para ele. Isso se aproxima em muito de 7.2: “Abram
espaço para nós em vossos corações”. O texto interveniente parece
interromper essa conexão.
Mas Paulo pode ter visto 6.14 a 7.1 como uma ressalva necessária ao
seu apelo aos coríntios para “serem abertos”, em 6.13. O apóstolo insiste
que essa desejada abertura não significa abandonar toda a discrição e
abraçar todas as pessoas independentemente do seu estilo de vida. A
proibição da idolatria em 6.16 parece confirmar isso. Em Deuteronômio
6.11 (LXX), o coração aberto ou alargado está associado com a participação
na idolatria. Talvez, depois de exortar os coríntios a abrirem seus corações,
Paulo sentiu que deveria esclarecer suas intenções de modo a não encorajar
a predisposição dos coríntios à idolatria. O texto de fato é paralelo a textos
de Qumran, mas esses paralelos não exigem que ele seja uma interpolação
uma vez que Paulo pode ter incorporado um texto mais antigo à carta. Além
disso, comentaristas observaram várias características paulinas no texto: (1)
a descrição da igreja como templo de Deus; (2) a ênfase na retidão; (3) o
contraste entre luz e trevas; e (4) a tensão entre o “já” e o “ainda não”.23
A carta também manifesta preocupações praticamente idênticas às
preocupações expressas em 1Coríntios. Por exemplo, 2Coríntios 6.14: “Não
vos coloqueis em jugo desigual com os incrédulos”, faz um estreito paralelo

966
com 1Coríntios 6.15-17 e com o mandamento para casar “contanto que seja
no Senhor” (1Co 7.39). Além disso, o mandamento de Paulo em 2Coríntios
6.14 claramente interpreta as leis referentes aos animais no AT (aqui, Dt
32.10), alegoricamente aplicando uma hermenêutica idêntica à que ele
utilizou em 1Coríntios 8.8-11. Também, 2Coríntios 6.15,16 parece
intimamente relacionado às preocupações que Paulo expressou em
1Coríntios 10.20-22. Inúmeros comentaristas acreditam que a interrupção
no pensamento foi causada por um lapso de tempo entre a composição de
Paulo do texto precedente e a composição desta seção.24

2Coríntios 2.14 a 7.4


Paulo interrompeu sua discussão sobre Tito e sobre a Macedônia em 2.14 e
não retornou a ela antes de 7.5. Mas uma ligação bastante estreita existe
entre 2.13 e 2.14 que torna improvável que 2.14 dê início a um documento
completamente diferente. Em 2.13, Paulo explicou que, apesar de suas
oportunidades evangelísticas em Trôade, ele se sentiu compelido a deixar a
cidade e viajar para a Macedônia devido a sua preocupação com Tito que
aparentemente tinha deixado Trôade e se dirigido para a Macedônia, pouco
antes da chegada de Paulo. No versículo 14, Paulo declarou ainda que a
viagem de Tito e mais tarde a sua própria viagem a Macedônia cumpriram o
gracioso plano de Deus de manifestar em todo lugar “o aroma de seu
conhecimento”. Isso, naturalmente, fluiu para uma análise do propósito e
motivos da obra missionária de Paulo. H. Lietzmann demonstrou que 7.4
está intimamente ligada a 7.5,6 por três ligações verbais que fortemente
sugerem que a unidade original das seções.25 Assim, as teorias de que 2.14 a
7.4 originalmente constituía um documento separado não são convincentes.

967
Em 1Coríntios 1.1, Paulo menciona Sóstenes como corremetente.
Alguns têm inferido do uso do pronome na primeira pessoa do plural “nós”
na carta, que Sóstenes teve um papel bem mais importante na composição
da carta do que era normal em uma carta de Paulo. Sóstenes não é
mencionado em nenhuma outra passagem nas cartas de Paulo. Mas é
possível que o Sóstenes de 1Coríntios seja o mesmo Sóstenes mencionado
em Atos 18.17, o chefe da sinagoga que foi espancado pelos espectadores
depois que os judeus acusaram Paulo perante Gálio em Corinto. Se é assim,
Sóstenes era um seguidor de Cristo na época da redação de 1Coríntios e
apoiador e incentivador do ministério do apóstolo que anteriormente ele
perseguiu.
Em 2Coríntios 1.1, Paulo citou Timóteo como um corremetente. Em
contraste com Sóstenes, muito se sabe sobre Timóteo e sobre seu
relacionamento com Paulo. O apóstolo conheceu Timóteo em sua segunda
viagem missionária (At 16.1) e os dois se tornaram amigos por toda a vida.
Duas das cartas de Paulo, 1 e 2Timóteo, são dirigidas a ele pessoalmente.
Além disso, Timóteo foi listado como corremetente nas cartas de Paulo
mais do que qualquer outra pessoa. Além de 2Coríntios, ele foi
corremetente de cinco cartas de Paulo: Filipenses, Colossenses, 1 e
2Tessalonicenses e Filemom.

Data e Origem
A história de Paulo com o Coríntios é complexa, mas é possível reconstruir
o curso de relações do apóstolo com esta congregação difícil a partir das
evidências disponíveis em Atos e 1 e 2Coríntios com um elevado grau de
plausibilidade. Como a lista a seguir mostra, Paulo fez pelo menos três

968
visitas a Corinto e escreveu pelo menos quatro cartas, apenas duas das quais
foram preservadas no cânon cristão. A sequência dessas visitas e cartas
assim se apresenta.

1. Primeira visita: Paulo plantou a igreja em Corinto em 50-52 (At 18)


2. Paulo escreveu a “carta anterior” (1Co 5.9,11; “Coríntios A”)
3. Paulo escreveu 1Coríntios de Éfeso em 53/54 (1Co 16.8; “Coríntios
B”)
4. Paulo escreveu a “carta severa” (2Co 2.4; 7.8; “Coríntios C”)
5. Segunda visita: a “visita dolorosa” (2Co 2.1; veja 12,14; 13.1,2)
6. Paulo escreveu 2Coríntios da Macedônia em 54/55 (2Co 7.5; 8.1; 9.2;
“Coríntios D”)
7. Terceira visita (At 20.2)

1Coríntios
De acordo com 1Coríntios 16.8, Paulo escreveu 1Coríntios durante sua
terceira viagem missionária, passada grande parte de sua estadia de dois
anos e meio em Éfeso. Com base na Inscrição de Delfos, a aparição de
Paulo perante Gálio em Corinto na segunda viagem missionária pode ser
datada do final de 51. Paulo, então, voltou a Antioquia e depois viajou pela
Galácia e Acaia até Éfeso, onde permaneceu por dois anos e meio a três
anos. Paulo provavelmente escreveu 1Coríntios pouco tempo antes de
Pentecostes, no final de 53 ou início de 54.26

2Coríntios

969
Paulo escreveu 2Coríntios da Macedônia (2Co 7.5; 8.1; 9.2). A subscrição
em alguns manuscritos antigos da carta afirma, mais especificamente, que
Paulo escreveu a carta estando em Filipos. Essa é uma origem plausível,
mas permanece incerta a menos que surjam mais evidências. Segunda
Coríntios 9.2 implica que os coríntios vinham se preparando para a oferta
de Jerusalém “desde o ano passado”. Isso parece exigir uma data de
composição no final de 54 ou talvez início de 55. A carta foi entregue em
Corinto por Tito e dois outros representantes da igreja, que mais tarde
acompanharam Paulo, com a oferta, a Jerusalém.27

Destino
Paulo endereçou as cartas aos coríntios à “igreja de Deus em Corinto, aos
santificados em Cristo Jesus, chamados para serem santos” (1Co 1.2) e “à
igreja de Deus em Corinto” (2Co 1.1). Embora a igreja em Corinto fosse o
principal recipiente pretendido das cartas, Paulo queria que as cartas fossem
lidas por muitas congregações, particularmente as da Acaia. Primeira
Coríntios foi coendereçada a “todos que em todo lugar invocam o nome de
nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso” (1.2). Semelhantemente,
2Coríntios foi coendereçada a “todos os santos em toda a Acaia” (1.1).
Paulo plantou as igrejas na província da Acaia em cidades como Atenas
e Corinto durante sua segunda viagem missionária (At 17.16 a 18.17). Ele
visitou novamente a área durante sua terceira viagem missionária (At 20.1-
6). Ele retornou novamente após ser libertado de sua primeira prisão em
Roma (2Tm 4.20).
Na época de Paulo, a população, provavelmente, era de cerca de 200 mil
habitantes, embora alguns estudiosos e escritores antigos sugiram que fosse

970
muito maior.28 Uma vez que até estimativas conservadoras apresentam
Corinto como oito vezes maior do que Atenas, a enorme população de
Corinto provavelmente explica por que Paulo saiu de Atenas para Corinto,
depois de apenas um breve ministério ali durante a segunda viagem
missionária. Também pode explicar por que Paulo se sentiu compelido a
servir ali por 18 meses. A importância política de Corinto também excedia a
das demais cidades da região. Desde 27 a.C., Corinto tinha sido o centro
administrativo da província da Acaia.29
A prosperidade de Corinto era em parte devida a sua localização
estratégica. A cidade era localizada no istmo que ligava o Peloponeso,
península no sul da Grécia, à Grécia continental. No seu ponto mais
estreito, essa ponte de terra tinha apenas cerca de cinco quilômetros e meio
de largura. No lado ocidental do istmo ficava o porto de Lequeum, que dava
acesso ao mar Adriático e, cruzando o mar, à Itália. No lado oriental do
istmo ficava o porto de Cencreia, que dava acesso ao mar Egeu e, pelo mar,
à Ásia. Os gregos abriram uma estrada de pedra conhecida como diolkos
atravessando o estreito istmo entre esses dois portos importantes no século
VI a.C.30
Os gregos transportavam carga de um lado para outro do istmo pela
diolkos e a colocavam em um outro navio. Isso acelerava o transporte de
suas cargas, reduzia centenas de quilômetros de suas viagens, e eliminava a
necessidade de navegar pelas águas traiçoeiras do sul do Peloponeso. De
acordo com dois escritores antigos, algumas tripulações até colocavam
pequenas embarcações em carroças sobre o diolkos, e as transportavam
através do istmo.31
Esse istmo era também o local da antiga Isthmia, o local onde se
realizavam os famosos jogos ístmicos. Esses jogos eram realizados a cada

971
dois anos, os anos anteriores e posteriores às Olimpíadas, e atraíam atletas
de todo o mundo antigo para as competições. Vários escritores antigos
observaram que os jogos davam um importante impulso para a economia de
Corinto e permitiam que a cidade prosperasse quando outras cidades gregas,
como Atenas, estagnavam economicamente.32
Os eventos dos jogos ístmicos eram semelhantes aos dos jogos
olímpicos. Os participantes podiam competir nas lutas ou boxe, o
pankration (uma combinação de antigas artes marciais que juntava
imobilizações específicas e golpes com as mãos e os pés), corridas, saltos
em distância, arremesso de disco e dardo, corrida de carros, e até mesmo
competições musicais. Primeira Coríntios é rica em simbolismo atlético, e
Paulo pode ter usado esse simbolismo em parte devido à importância dos
jogos ístmicos na história de Corinto. Primeira Coríntios 9.24-28 se refere a
corrida, boxe, e até mesmo à “coroa perecível” feita de aipo murcho que
coroava os vencedores nos jogos ístmicos. O tempo de Paulo em Corinto,
provavelmente, coincidiu com uma temporada dos jogos. Os jogos teriam
lhe dado uma oportunidade estratégica para compartilhar a boa nova com
pessoas de todas as regiões da antiga Grécia e grande parte do mundo
civilizado.
Corinto era conhecida por sua imoralidade. Devido aos numerosos
vícios que caracterizavam a cidade, um antigo provérbio grego dizia:
“Viajar para Corinto não é para qualquer um.”33 Aristófanes (450-385 a.C.),
demonstrou a imoralidade da antiga Corinto quando ele cunhou o termo
“corintianizar” para descrever o ato de fornicação. Platão usou o termo
“garota coríntia” como um eufemismo de prostituta.34 Estrabão, que
escreveu apenas algumas décadas antes da visita de Paulo, afirmou que mil
prostitutas serviam como escravas no templo de Afrodite, em Corinto.35 Os

972
coríntios e os numerosos visitantes da cidade adoravam a deusa do amor
com a prática de atos imorais com as prostitutas. Práticas sexuais
semelhantes têm sido associadas também com o santuário de Deméter e
Coré, em Corinto.36
Corinto era conhecida por outros vícios também. Uma personagem
comum nas antigas peças gregas de teatro era um bêbado que normalmente
usava um chapéu de Corinto.37 Isso implica que os coríntios eram
conhecidos por sua tendência a beber vinho demais. Assim, não é de se
estranhar que Paulo tenha tido de combater abomináveis imoralidades como
incesto, prostituição e bebedeira entre os coríntios em suas cartas.
Apesar de não ser tão religiosa como Atenas, a paisagem de Corinto
também era pontilhada de templos e santuários. Pairava sobre a cidade, no
Acrocorinto, o templo de Afrodite. Os adoradores faziam a subida de duas
horas, por uma longa série de degraus, ao topo da pequena montanha para
expressar a sua devoção à deusa do amor, luxúria e beleza. Próximo ao
Fórum em Corinto ficava um templo de Apolo ou Atena, um dos mais
antigos templos da Grécia. Junto ao lado interno da muralha norte da cidade
havia um santuário de Asclépio, o deus da cura. Esse santuário foi um dos
primeiros centros médicos da época, para o qual as pessoas vinham, às
vezes de muito longe, na esperança de serem curadas de uma ampla gama
de enfermidades. Acredita-se que a estrutura enorme na extremidade
ocidental do fórum foi um templo dedicado ao culto do imperador.38
Dezenas de deuses eram adorados, e grande número de cultos prosperavam
na cidade. Entre estes estavam os cultos a Apolo, Afrodite, Asclépio, Atena,
Deméter e Coré, Dionísio, Ártemis, Hera Acraea, Hermes, Ísis, Júpiter,
Poseidon, Tykhe, Fortuna, Zeus e os imperadores.39

973
Esses centros de religião pagã também têm lugar de destaque nas cartas
aos coríntios. As cartas discutem longamente se os fiéis de Corinto podiam
continuar a participar nas festas pagãs nos templos da cidade (1Co 8.1-13;
10.1-22; 2Co 6.14 a 7.1) e se podiam comer a carne que sobrava das festas
e que era vendida nos mercados de Corinto (1Co 10.25 a 11.1). Muitos dos
problemas teológicos na igreja de Corinto resultavam do sincretismo no
qual os coríntios interpretavam de maneira equivocada a ressurreição, os
dons espirituais, os papéis do homem e da mulher, o batismo, e a ceia do
Senhor devido à influência de seu passado pagão.
Embora os crentes gentios claramente constituíssem a grande maioria
dos membros, a igreja de Corinto era uma congregação mista de fiéis judeus
e gentios. A cidade de Corinto tinha, pelo menos, uma sinagoga, e os judeus
que ali se reuniam, foram no início o foco do ministério de Paulo na cidade
(At 18.4). Embora Paulo tivesse abandonado seu ministério nas sinagogas
devido à oposição da parte dos judeus, o esforço de Paulo para alcançar os
judeus e os tementes a Deus na sinagoga teve sucesso. Até mesmo Crispo,
líder da sinagoga, aceitou o evangelho e foi batizado juntamente com toda
sua família (At 18.8). Após sua conversão, Sóstenes o substituiu como
chefe da sinagoga (At 18.17). Sóstenes pode, por fim, ter seguido Crispo
em sua nova fé, uma vez que esse Sóstenes pode ser o “irmão” de mesmo
nome a quem Paulo identificou como corremetente de 1Coríntios (1.1).
A igreja também tinha membros oriundos de diferentes camadas sociais
e econômicas. Alguns eram escravos (1Co 7.21-23), enquanto muitos
outros eram bem prósperos (1Co 4.6-8). A discussão do tema da coleta para
os santos implica que a igreja em Corinto tinha poucas preocupações
econômicas em comparação com as dificuldades financeiras dos fiéis na
Macedônia (2Co 8.1-7, 13-15). Erasto, um dos membros da igreja em

974
Corinto, era o tesoureiro da cidade (Rm 16.23). Este parece ser o oficial da
cidade que foi homenageado em uma inscrição na frente do antigo teatro de
Corinto por pavimentar uma das ruas da cidade por sua própria conta.40
Erasto era provavelmente apenas um dos vários membros da igreja que
eram de classe social elevada, ricos e influentes. A prosperidade material da
igreja acabaria criando problemas para Paulo. Alguns membros da igreja
questionaram a espiritualidade de Paulo por causa de sua pobreza (1Co
4.10-13).41
A imoralidade galopante, a proeminência da religião pagã e a
diversidade econômica, social e racial da cidade de Corinto ajudam a
explicar muitos dos desafios excepcionais que Paulo enfrentou em Corinto.
Esses fatores fornecem insights úteis que orientam a interpretação das
cartas aos coríntios.

Motivo
Paulo teve um relacionamento longo e um pouco complicado com a igreja
em Corinto. Ele plantou a igreja em Corinto durante sua segunda viagem
missionária. Depois de viajar de Atenas para Corinto, Paulo conheceu
Áquila e Priscila, com quem trabalhou em sociedade no negócio de
confecção de tendas. Todos os sábados, ele pregava na sinagoga até que
alguns judeus blasfemaram de Jesus. Paulo, então, continuou seu trabalho
missionário em um local vizinho à sinagoga, na casa de Tito Justo, um
gentio que frequentava a sinagoga e que aceitou o evangelho de Paulo.
Crispo, chefe da sinagoga, juntamente com toda sua família, e muitos dos
coríntios acreditaram na mensagem que Paulo pregava e receberam o
batismo cristão. Alguns dos oponentes judeus de Paulo o acusaram perante

975
Gálio, procônsul da Acaia. Ele rejeitou o caso por achá-lo irrelevante para a
lei romana e dispensou os acusadores. Depois de passar 18 meses em
Corinto, Paulo navegou para a Síria. Depois de uma estadia muito breve em
Éfeso, ele viajou para Antioquia através de Cesareia e Jerusalém, para ali
apresentar um relatório à igreja (veja At 18.1-22).
Paulo, então, viajou pela Galácia e Frígia, até que finalmente chegou a
Éfeso, onde permaneceu por cerca de dois anos e meio (veja At 18.23 a
20.1). Talvez algum tempo no início da estadia de Paulo em Éfeso, ele
recebeu a notícia de problemas na igreja de Corinto. Evidentemente, a
igreja estava enfrentando problemas com a imoralidade sexual na
comunidade. Em resposta, Paulo escreveu uma carta exortando os coríntios
a evitar a associação com pessoas sexualmente imorais que alegavam serem
cristãs. Essa carta, mencionada em 1Coríntios 5.9, é geralmente chamada
pelos eruditos de “Coríntios A”, uma vez que não foi preservada nem no
nosso NT nem em qualquer outro manuscrito conhecido atualmente. De
acordo com 1Coríntios 5.10-13, alguns dos membros da igreja não
compreenderam bem a carta e assumiram que Paulo estava exigindo que os
fiéis se afastassem da sociedade pagã e se isolassem de toda interação com
as pessoas imorais.
Enquanto isso, Apolo, um discípulo de Áquila e Priscila, estava
pregando em Corinto com grande impacto, e alguns dos cristãos e lá
começaram a se juntar em torno dele. Logo, membros da igreja começaram
a comparar Apolo a Paulo. Alguns sentiam que Apolo era superior a Paulo,
e outros que ele era inferior ao apóstolo. Em breve, a igreja se dividiu em
quatro facções principais: um grupo de Paulo, um grupo de Apolo, um
grupo de Cefas (Pedro) e um grupo de Cristo. Outros problemas surgiram.
Um membro da igreja começou a ter uma relação incestuosa com a sua

976
madrasta. Alguns membros da igreja desenvolveram ideias confusas sobre
casamento, relações sexuais e as funções próprias de homem e mulher. Eles
estavam praticando também uma forma de Ceia do Senhor que era mais
parecida com as celebrações dos templos pagãos do que com a ordenança
estabelecida por Cristo. Membros da Igreja estavam levando outros
membros da igreja para o tribunal para resolver litígios. A igreja se tornou
obcecada com os dons espirituais mais espetaculares e negligenciava a
compaixão cristã. Além disso, a igreja tinha começado a duvidar da
doutrina da ressurreição corporal. No alto disso tudo, alguns membros da
igreja haviam desafiado a autoridade apostólica de Paulo.
Paulo recebeu informações sobre a condição da igreja de pelo menos
duas fontes. Em primeiro lugar, um grupo de pessoas identificadas como
“da família de Cloé” (1Co 1.11; literalmente “aqueles de Cloé”) relatou a
Paulo sobre o culto à personalidade na igreja que a estava dividindo. Em
segundo lugar, Estéfanas, Fortunato e Acaico (1Co 16.15-18), três
representantes oficiais da igreja, entregaram uma carta da igreja para Paulo
que levantava uma série de questões doutrinárias e práticas. Sem dúvida, os
três representantes completaram o conteúdo da carta com seus próprios
relatórios verbais sobre o estado da igreja para que Paulo tivesse uma
compreensão clara da situação da igreja. Paulo escreveu uma segunda carta
à igreja que respondia as questões levantadas na correspondência dos
coríntios e também respondia a outras questões que Paulo conhecera pelos
relatos verbais. Essa carta é agora conhecida como 1Coríntios e chamada
pelos estudiosos de “Coríntios B”.42
De acordo com 1Coríntios 16.5-11, quando Paulo escreveu Coríntios B,
ele pretendia permanecer em Éfeso até o Pentecostes e, em seguida, viajar
através da Macedônia para Corinto, onde ele poderia passar todo o inverno.

977
Paulo, então, enviaria representantes escolhidos pelos coríntios para
Jerusalém com a oferta de ajuda. Nesse meio tempo, Paulo enviou Timóteo
para Corinto (1Co 16.10,11). Quando Timóteo chegou a Corinto, ficou
perturbado com a gravidade das crises ali instaladas. De algum modo ele
informou Paulo da situação, e Paulo decidiu visitar os coríntios o mais
rapidamente possível. Coríntios B continha uma advertência de que, se os
problemas não fossem corrigidos logo, Paulo poderia ser forçado a “visitar-
vos com uma vara [de disciplina]” (1Co 4.21).
Quando Paulo soube da reação da Igreja a Coríntios B, ele decidiu que o
tempo para tal disciplina tinha claramente chegado. Mais tarde, Paulo
caracterizou esse confronto pessoal com a Igreja como sua “visita dolorosa”
(2Co 2.1). A visita foi dolorosa não só para os coríntios, mas também para
Paulo. Ele voltou a Éfeso duvidando que sua visita tivesse fornecido
qualquer solução real para as crises da igreja e com “muita tribulação e
angústia de coração” (2Co 2.2-4).
O abandono de Paulo de seu plano anterior de passar o inverno em
Corinto levou alguns de seus oponentes na igreja a acusá-lo de indecisão.
Paulo defendeu sua mudança de planos e explicou suas razões para isso em
2Coríntios 1.15-24. Ele sentia que podia tratar melhor da situação por carta
do que por mais uma confrontação face a face com seus oponentes na
igreja. Sua carta manchada de lágrimas (2Co 2.4) não chegou até nós. Ela é
geralmente chamada pelos estudiosos de “Coríntios C”. Na ausência da
carta, os estudiosos podem reconstruir o seu conteúdo apenas por algumas
referências obscuras à carta em 2Coríntios. No mínimo, a carta apelava à
Igreja a provar o seu caráter obediente disciplinando um dos oponentes que
tinha difamado Paulo pessoalmente (2Co 2.3-9; 7.8-12). Tito entregou a
carta e se esforçou para encorajar a contribuição da igreja para a oferta de

978
ajuda que as igrejas gentílicas estavam recolhendo para a igreja em
Jerusalém.
Enquanto isso, a “grande porta para um ministério efetivo” em Éfeso
(1Co 16.9) começava a se fechar para Paulo. O apóstolo começou a sofrer
uma aflição tão grande que ele ficou “completamente esmagado” e “até
desesperado da própria vida”. A grande aflição poderia se referir ao motim
de Demétrio (At 19.23 a 20.1), ou poderia indicar que a dispensa da
multidão pelo escrivão no teatro de Éfeso não terminara com a perseguição
anticristã naquela cidade, mas fora apenas o prelúdio de uma perseguição
ainda mais intensa. Devido a esta grande aflição, Paulo foi forçado a fugir
de Éfeso. Ele viajou para Trôade, onde esperava pregar o evangelho e
reunir-se com Tito, que daria notícias da situação em Corinto. O ministério
de Paulo em Trôade teve resultados encorajadores (2Co 2.12). Entretanto,
Tito não apareceu na cidade (2Co 2.13). Paulo decidiu deixar Trôade e
viajar pela Macedônia. Enquanto passava pelas cidades da Macedônia, ele
proclamava o evangelho, encorajava os novos fiéis e organizava a coleta da
oferta para os fiéis em Jerusalém (2Co 8.1-4; 9.2). Essas igrejas estavam
sofrendo intensa perseguição, que Paulo descreveu como “uma dura prova
por meio de tribulação” (2Co 8.2). Essa severa perseguição teve um
impacto econômico sobre os fiéis e deixou muitos deles em “extrema
pobreza”. Mas os fiéis da Macedônia ofertaram com entusiasmo,
generosidade, até mesmo “além do que podiam”, para ajudar os fiéis em
Jerusalém.
Paulo ficou incomodado com o fato de Tito ainda não ter aparecido.
Quando Tito finalmente reuniu-se a Paulo, na Macedônia, ele fez um
relatório tão encorajador sobre a resposta dos coríntios a Coríntios C que
Paulo ficou empolgado. Paulo tinha temido que sua carta pudesse ter sido

979
muito dura e pudesse pôr fim a todas as esperanças de restaurar sua relação
com os coríntios. No final, a carta teve o efeito desejado: produzir uma
tristeza reverente nos coríntios que os levasse ao arrependimento (2Co
7.10). Paulo se apressou em escrever uma última carta para os coríntios que
expressasse sua alegria pela mudança no coração deles. Esta carta tem sido
tradicionalmente identificada como 2Coríntios, e os estudiosos se referem a
ela como “Coríntios D”.
Infelizmente, durante uma pausa no ditado de Coríntios D, Paulo de
alguma forma recebeu novas e preocupantes informações sobre a situação
em Corinto. Quando ele ditou os três capítulos finais de Coríntios D (ou,
talvez, ele mesmo os tenha escrito), sua escrita apresenta uma mudança
notável de tom que sugere que os temores de Paulo quanto aos coríntios
tinham reaparecido. As preocupações de Paulo relacionavam-se
principalmente com a influência que um grupo de falsos apóstolos estava
exercendo sobre a congregação. Esses “superapóstolos” (2Co 12.11) se
vangloriavam de que suas credenciais apostólicas ultrapassavam as de
Paulo, e que ele era indigno de exercer liderança sobre a congregação. Eles
aparentemente pregavam “um outro Jesus” e “um evangelho diferente” do
proclamado por Paulo (2Co 11.1-4).
As cartas de Paulo e a história em Atos não indicam se os coríntios
responderam com arrependimento à correção de Paulo. Primeira Clemente,
escrita por Clemente de Roma aos coríntios (c. 96), implica que a carta foi
eficaz e que a igreja de Corinto se tornou uma congregação modelo por
quase meio século. Curiosamente, quando problemas novamente
irromperam na igreja no final do primeiro século, os problemas que
ameaçavam a igreja eram muito semelhantes aos que Paulo tinha abordado:
rejeição da autoridade espiritual legítima para ser manipulada por alguns

980
poucos líderes obstinados e arrogantes e falta daquela unidade que deveria
caracterizar o corpo de Cristo.43

Os Oponentes de Paulo em 2Coríntios


Os estudiosos ainda debatem sobre a identidade dos oponentes de Paulo em
2Coríntios. Desde os anos 1800, foram propostas três teorias principais
sobre a identidade deles.44 R. Bultmann e W. Schmithals teorizaram que os
oponentes eram gnósticos. C. K. Barrett sugeriu que os adversários eram
judaizantes legalistas do tipo que Paulo combateu em Gálatas. D. Georgi
argumentou que os oponentes de Paulo eram missionários judeus
helenísticos que defendiam uma teologia mista, com elementos tanto
legalistas quanto pneumatológicos/gnósticos, e que veneravam Moisés
como um “homem divino” ou operador de milagres.45
Em sua síntese das várias caracterizações dos falsos apóstolos e sua
mensagem em toda a carta de 2Coríntios, Furnish foi muito cuidadoso para
não ir além de evidências exegéticas claras nas descrições que fez. Ele
sugeriu a seguinte reconstrução: (1) Os intrusos alegavam um
relacionamento com Cristo e uma autoridade apostólica superiores aos de
Paulo. (2) Eles fundamentavam essas alegações com cartas de
recomendação e com a ostentação de sua herança judaica, eloquência,
coragem, conquistas missionárias, experiências de êxtase, milagres e um
conhecimento especial adquirido por meio de experiências visionárias. (3)
Eles criticavam Paulo por ser fraco, por não ter eloquência para falar em
público, por ser um inútil que sofria dificuldades quase constantes e
destituído da confiança suficiente para esperar apoio financeiro dos
coríntios.46

981
Os textos mais importantes para a identificação desses opositores são
2Coríntios 3.1-18; 11.4,22,23. Alguns textos em 2Coríntios são claramente
dirigidos aos opositores de Paulo. Outros textos não mencionam
especificamente esses oponentes de Paulo, mas parecem fazer parte da
defesa de Paulo contra seus adversários. Um exame atento da defesa de
Paulo permite que os estudiosos reconstruam os elementos da teologia da
oposição utilizando um processo chamado “leitura em espelho”. Esse
processo tenta reconstruir a teologia dos oponentes de Paulo com base na
crítica que ele faz da teologia deles, da mesma forma que se pode
reconstruir os elementos essenciais da conversa de uma das pessoas ao
telefone, a que não estamos ouvindo, prestando bastante atenção às palavras
da outra parte, isto é, da pessoa que podemos ouvir. Uma aplicação da
leitura em espelho a 2Coríntios 3.1-18 sugere que os opositores de Paulo
não reconheciam a natureza temporária da antiga aliança e a glória maior da
nova. Eles argumentavam que o evangelho em nada alterava a obrigação de
cumprir a lei de Moisés e que a lei era de algum modo necessária para a
experiência cristã. A ênfase nos dons espirituais em 1Coríntios corresponde
em 2Coríntios à aparente alegação dos oponentes de que eles eram
“superapóstolos”, cujos milagres superavam os de Paulo (2Co 11.5;
12.11,12). A grande ênfase nos sofrimentos de Paulo como um apóstolo
pode implicar que os oponentes ensinavam que eles eram superiores a Paulo
já que Deus os tinha protegido, de modo sobrenatural, de tais sofrimentos
(2Co 1.3-11; 4.7-15; 6.4-10; 11.23-29). A partir de 11.4, fica claro que os
oponentes pregavam um “outro Jesus”, “um espírito diferente” e um “outro
evangelho”. Mas determinar exatamente o que isso significa é muito difícil.
O quadro a seguir (Tabela 12.1) mostra algumas explicações populares do
ensino desses falsos apóstolos.

982
Embora o debate sobre a identidade dos oponentes de Paulo em
2Coríntios esteja longe de resolvido, a visão do Homem-Divino, esboçada
no gráfico, está crescendo em popularidade e parece estar se tornando o
novo consenso. Naqueles termos, Belleville argumentou que “os rivais de
Paulo eram judeus palestinos que, alegando o apoio da Igreja de Jerusalém,
47
chegaram a Corinto com cartas de referência”. Eles ostentavam uma
impressionante variedade de credenciais — incluindo visões, experiências
de êxtase, e revelações — e procuravam influenciar o seu público usando
uma oratória polida, pregando o que Paulo chamava de um “evangelho
diferente” (2Co 11.4).
A reconstrução de S. Hafemann procurou integrar os diversos elementos
do falso ensino em um sistema mais coerente. De acordo com Hafemann, os
oponentes de Paulo haviam adotado “uma teologia da ‘glória super-
realizada’, em cuja participação no evangelho deles, com seu vínculo com a
antiga aliança, era dita garantir a libertação do pecado e do sofrimento neste
mundo”.48 No centro do debate estava, provavelmente, a relação entre as
duas alianças no que dizia respeito aos papéis de Moisés e da lei, por um
lado, e o de Paulo como um apóstolo de Cristo engajado no “ministério do
Espírito”, do outro (cf. 2Co 2.16; 3.4-18).

Algo Para Pensar: Perdidos nas Riquezas

Os coríntios tinham tudo. Muitos eram ricos naquela cidade


portuária, e com a riqueza veio a arrogância que muitas vezes
acompanha as posses neste mundo. Jesus advertiu os ricos, dizendo:
“Em verdade vos digo que um rico dificilmente entrará no reino do

983
céu. E outra vez vos digo que é mais fácil um camelo passar pelo
fundo de uma agulha do que um rico entrar no reino de Deus” (Mt
19.23,24). João aconselhou: “Não ameis o mundo nem o que nele
há. Se alguém ama o mundo, o amor do Pai não está nele. […] Ora,
o mundo passa, bem como seus desejos; mas aquele que faz a
vontade de Deus permanece para sempre” (1Jo 2.15,17).
Paulo costumava começar suas cartas com uma saudação e um
trecho de ação de graças. Em 1Tessalonicenses, por exemplo, ele se
alegrou com o fato de que aqueles fiéis tinham se tornado um
exemplo para toda a região (1Ts 1.2-10). Em 1Coríntios, no entanto,
a única coisa que Paulo agradece a Deus é que ele abençoou os
coríntios com todos os dons espirituais (1Co 1.5-7)! O que ele não
agradece a Deus é a maneira como eles exerciam esses dons. Como
mais adiante a carta deixa claro, muitas vezes o caos reinava, e o
ingrediente mais importante — o amor — estava claramente ausente
da vida da igreja (1Co 13).
Assim, no início da carta (1.26-31), Paulo se sente obrigado a
escrever:

Irmãos, observai o vosso chamado. Não foram chamados muitos sábios, segundo
critérios humanos, nem muitos poderosos, nem muitos nobres. Pelo contrário, Deus
escolheu as coisas absurdas do mundo para envergonhar os sábios; e escolheu as
coisas fracas do mundo para envergonhar as fortes. Ele escolheu as coisas
insignificantes do mundo, as desprezadas e as que são nada para reduzir a nada as
que são, para que nenhum mortal se glorie na presença de Deus. Mas vós sois dele,
em Cristo Jesus, o qual, da parte de Deus, se tornou para nós sabedoria, justiça,
santificação e redenção, a fim de que, como está escrito: Quem se gloriar, glorie-se
no Senhor.

Com certeza, esta é uma palavra profética que de modo nenhum


perdeu sua relevância na igreja ocidental, onde a riqueza abalou

984
profundamente o ensino neotestamentário sobre a igreja como corpo
de Cristo, onde os seus vários membros trabalham em conjunto para
a glória de Deus. Que Deus tenha piedade de nós em nossa
valorização das aparências e na devoção ao cristianismo só da boca
para fora. Se nos mantivermos distantes de Cristo, permaneceremos
como “crianças em Cristo” (1Co 3.1) em vez de crescer em
maturidade espiritual. E, tragicamente, não seremos sal e luz da
terra, por meio dos quais as pessoas veriam nossas boas obras e
glorificariam nosso Pai que está no céu (Mt 5.16).

985
Tabela 12.1: O Ensino dos Falsos Apóstolos em 2Coríntios
Heresia Homem-
2Co 11.4 Gnosticismo
judaizante* divino***
“Um outro Jesus” Negação da Ponto de vista Ponto de vista
divindade e que via o corpo cujo foco está
ressurreição de físico (Jesus) nos poderes de
Jesus; Jesus é como a miserável Jesus como
pouco mais que habitação na qual operador de
um modelo de o ser celestial milagres, poderes
obediência à lei (Cristo) esteve igualmente
que é visto de preso disponíveis aos
uma maneira temporariamente “superapóstolos”,
puramente que alardeavam
humana sinais e
(“segundo a maravilhas de
carne”; 2Co 4.10- maneira
14) prepotente
“Um outro Espírito de Ênfase no Espírito de
E[e]spírito” escravidão ao espiritual em autoridade
ensino judaizante oposição ao abusiva e
físico e material egocêntrica, ou
devido ao ênfase em
dualismo experiências
gnóstico visionárias

* Veja Hughes, The second epistle to the Corinthians, p. 377-8. Um ponto de vista semelhante
foi sugerido por R. V. G. Tasker, The second epistle to the Corinthians, TNTC (Grand Rapids:
Eerdmans, 1960), p. 147-8.
** W. Schmithals, Gnosticism in Corinth: an investigation of the letters to the Corinthians,
tradução para o inglês de J. E. Steely (Nashville: Abingdon, 1971), p. 134; R. Bultmann, Der zweite
Brief an die Korinther, edição de E. Dinkler (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1976), p. 205
*** Veja F. T. Fallon, 2Corinthians (Wilmington: Glazier, 1980), p. 94; Martin, 2Corinthians, p.
341.

986
Heresia Homem-
2Co 11.4 Gnosticismo
judaizante* divino***
“Um outro Ensino que exige Os segredos do Mensagem cujo
Evangelho” obediência a gnosticismo foco era a
ordenanças presente
obsoletas autoglorificação
em vez da
glorificação
futura por Deus
seguindo-se a
uma vida de
humildade e
autossacrifício
* Veja Hughes, The second epistle to the Corinthians, p. 377-8. Um ponto de vista semelhante
foi sugerido por R. V. G. Tasker, The second epistle to the Corinthians, TNTC (Grand Rapids:
Eerdmans, 1960), p. 147-8.
** W. Schmithals, Gnosticism in Corinth: an investigation of the letters to the Corinthians,
tradução para o inglês de J. E. Steely (Nashville: Abingdon, 1971), p. 134; R. Bultmann, Der zweite
Brief an die Korinther, edição de E. Dinkler (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1976), p. 205
*** Veja F. T. Fallon, 2Corinthians (Wilmington: Glazier, 1980), p. 94; Martin, 2Corinthians, p.
341.

Identificar com precisão os adversários de Paulo é notoriamente difícil.


Uma série imensa de teorias de identificação tem sido proposta. Até agora,
nenhuma dessas teorias conseguiu se tornar o ponto de vista de consenso.
As tentativas de reconstruir os ensinamentos dos oponentes devem proceder
com cautela e humildade. Os intérpretes devem hesitar antes de usar a
reconstrução para interpretar textos difíceis em 2Coríntios e entender que
sua interpretação talvez não seja mais exata do que sua reconstrução.

Propósito

987
1Coríntios
Paulo escreveu 1Coríntios para responder aos relatórios orais que recebera
daqueles associados a Cloé (1Co 1.11) e de outros e para responder a
perguntas levantadas pelos coríntios em uma carta que escreveram para ele
(1Co 7.1). O assunto do relatório oral era principalmente a desunião da
igreja de Corinto. A igreja tinha se dividido em várias facções, cada uma
celebrando um líder cristão em particular. Paulo escreveu 1Coríntios para
exortar a igreja a procurar a unidade e para seguir a Cristo, em vez de
idolatrar um líder humano, como Paulo, Apolo ou Cefas (1Co 1.12; veja
1.10 a 4.21). Paulo reconheceu que a glorificação de líderes humanos
indicava que os coríntios não compreendiam a natureza da graça divina e
que tinha uma visão deturpada da natureza da liderança humana. A graça de
Deus utiliza pessoas improváveis para grandes propósitos para mostrar seu
poder e sabedoria. Isso promove a glória de Deus e diminui o orgulho
humano.
Paulo também tinha ouvido por várias fontes diferentes que um membro
da igreja de Corinto estava vivendo uma relação incestuosa com sua
madrasta. Paulo exortou a igreja a arrepender-se da sua aceitação negligente
de tal imoralidade. Ele ordenou que a igreja exercesse a disciplina
eclesiástica na esperança de encorajar o membro imoral a se arrepender e de
impedir a propagação da imoralidade por toda a congregação (1Co 5.1-13).
Paulo também escreveu para esclarecer a doutrina da liberdade cristã e
demonstrar que a liberdade em Cristo não era uma licença para
comportamento imoral (1Co 6.12-20).
Paulo também sabia que fiéis estavam levando seus irmãos ao tribunal
para resolver disputas judiciais. Paulo reconheceu que isso era um
testemunho pobre para os incrédulos nos tribunais locais e que a era mais

988
provável que se encontrasse justiça nas decisões tomadas pelos fiéis do que
nas dos incrédulos. Paulo, portanto, pediu aos coríntios que resolvessem
suas disputas por meio da arbitragem de irmãos.
Várias questões foram levantadas pela carta dos coríntios enviada a
Paulo, e suas respostas a essas preocupações começam no capítulo 7 e se
estendem, pelo menos, até o capítulo 14 e, talvez, capítulo 15. Essas
preocupações incluem perguntas sobre relacionamento conjugal cristão
(cap. 7), a participação em festas pagãs em vários templos em Corinto e
sobre comer a comida previamente sacrificada a ídolos (caps. 8 a 10),
vestuário e decoro adequados durante o culto e na Ceia do Senhor (cap. 11),
e quanto ao exercício dos dons espirituais (caps. 12 a 14).
Alguns dos coríntios tinham rejeitado a doutrina da ressurreição
corporal dos fiéis. Essa rejeição teve um impacto significativo na sua moral
e nos seus pontos de vista teológicos. Paulo escreveu para defender a
doutrina da ressurreição e para mostrar a natureza crucial dessa doutrina
para o evangelho cristão (cap. 15).
Por fim, Paulo deu à igreja instruções práticas para a coleta da oferta
para os fiéis em Jerusalém, e informou os coríntios de seus planos
provisórios de viagem (cap. 16).

2Coríntios
Embora 2Coríntios seja uma única carta letra em vez de uma combinação
de várias cartas diferentes do apóstolo, uma carta desta extensão
provavelmente foi composta em um período de vários dias ou semanas. As
necessidades das igrejas em que Paulo visitou, as exigências da sua
atividade profissional como fabricante de tendas, e a disponibilidade

989
limitada de secretários com as habilidades necessárias para produzir tal
carta provavelmente exigiram que Paulo ditasse vários trechos da carta em
diferentes momentos e diferentes locais. Este capítulo sugeriu que, quando
Paulo ditava os capítulos 1 a 9 ele foi muito encorajado pelo relatório
positivo sobre os coríntios que recebeu de Tito. Mas, depois de ditar os
nove primeiros capítulos, ele pode ter recebido mais notícias de Corinto que
o alarmaram novamente e o levaram a escrever os capítulos finais da carta
em um tom diferente.49 Alguns intérpretes sugerem que um secretário não
estava disponível para os últimos três capítulos e que o próprio Paulo
escreveu os capítulos 10 a 13 de próprio punho.50
Paulo tinha quatro propósitos principais quando escreveu os capítulos 1
a 9. Em primeiro lugar, a mudança de Paulo nos planos de viagem o deixou
vulnerável a acusações de seus oponentes de que ele era inconsistente e
indigno da confiança dos coríntios. Paulo escreveu para defender sua
confiabilidade e para explicar as razões de sua mudança de planos. Em
segundo lugar, Paulo escreveu para incentivar os coríntios a restaurarem um
membro da igreja que havia sido disciplinado pela congregação por seus
ferozes ataques ao apóstolo. Em terceiro lugar, Paulo escreveu para
esclarecer a natureza do seu ministério apostólico e as suas qualificações
para esse ministério. Sob a influência de novos líderes, que se gabavam de
que suas qualificações apostólicas eram superiores às de Paulo, as suas
credenciais tinham sido analisadas e rejeitadas por um crescente número de
fiéis de Corinto. Paulo tentou demonstrar que as suas qualificações para a
liderança espiritual superavam as de seus adversários em todos os sentidos.
Esta defesa do apostolado de Paulo é a principal motivação para a seção
inicial da carta, e Paulo parece confiante de que os coríntios seriam
convencidos com sua defesa. Em quarto lugar, Paulo escreveu para

990
incentivar os coríntios a cumprirem seus compromissos de contribuir
generosamente para a oferta para os fiéis de Jerusalém.
Nos capítulos 10 a 13, a defesa que Paulo apresenta da sua autoridade
apostólica fica muito mais intensa. Paulo já não estava tão confiante de que
os coríntios reconheceriam os falsos apóstolos pelo que eles eram ou que
reafirmariam a autoridade apostólica dele próprio. Paulo escreveu esses
capítulos para exortar os coríntios a rejeitarem os falsos apóstolos e sua
mensagem e abraçar novamente o evangelho que Paulo tinha pregado. Ele
também escreveu para anunciar seus planos de fazer uma terceira visita a
Corinto. Finalmente, ele escreveu para exortar os coríntios a examinarem
sua fé para determinar se ela era autêntica.

LITERATURA
Plano Literário
O plano literário de 1Coríntios é, de certa forma, muito mais simples do que
os das outras cartas paulinas. Após a sua introdução e oração habitual de
ação de graças, Paulo sistematicamente abordou questões de interesse dos
relatos orais transmitidos a ele pelos da casa de Cloé e representantes da
igreja de Corinto. Paulo, então, abordou questões enviadas a ele em uma
carta dos coríntios. As respostas às perguntas da carta começam em
1Coríntios 7.1, como indicado pela introdução “agora, quanto às coisas
sobre as quais escrevestes”. Novos tópicos selecionados da carta dos
coríntios são introduzidos usando a construção “agora, quanto a” (peri de),
que aparece em 1Coríntios 7.1,25,37; 8.1; 12.1 e 16.1,12. Em vez de seguir
um elaborado plano literário baseado na retórica ou em convenções
epistolares, Paulo simplesmente aborda uma questão após a outra na ordem

991
que foram levantas a ele. Paulo concluiu sua carta com a sua habitual
saudação e bênção.
Esforços para compreender o plano literário de 2Coríntios são
dificultados por muitas teorias de interpolação que consideram 2Corintíos
como uma combinação de várias cartas diferentes em vez de um único
documento literário. Vários estudiosos tentaram fazer classificações
retóricas de 2Coríntios e procuraram entender a estrutura da carta com base
em análises retóricas. No entanto, nenhuma classificação ou análise recebeu
muita aceitação. Foram tantas as análises diferentes propostas que M.
Harris concluiu: “A prática da crítica retórica parece ser mais uma arte do
que uma ciência, com a natureza altamente subjetiva da iniciativa refletida
na grande divergência entre os achados dos que a praticam.”51
Outros estudiosos tentaram analisar a estrutura quiástica da carta.
Novamente, nenhuma análise em particular recebeu a simpatia de um
grande número de estudiosos. As análises quiásticas tendem a situar o
centro do quiasma, que normalmente é o clímax e a ênfase da construção,
em um lugar improvável ou combinar elementos do quiasma proposto com
base em semelhanças artificiais.52 A maioria dos comentaristas prefere
analisar a estrutura da carta com base apenas no conteúdo. Tal
procedimento divide a carta em três seções principais que consistem dos
capítulos 1 a 7, 8 a 9 e 10 a 13.

ESTRUTURA DE 1CORÍNTIOS
I. Introdução (1.1-9)
A. Saudação (1.1-3)
B. Oração de ação de graças (1.4-9)

992
II. Resposta aos relatórios orais (1.10 a 6.20)
A. Uma perspectiva adequada sobre os ministros e ministério cristãos
(1.10 a 4.20)
1. O problema da desunião (1.10-17)
2. O pecado da dependência de habilidades pessoais (1.18-25)
3. O pecado do orgulho pessoal (1.26-31)
4. Paulo, um modelo de dependência de Deus (2.1-5)
5. Sabedoria espiritual versus sabedoria mundana (2.6-16)
6. A imaturidade dos coríntios (3.1-9)
7. A avaliação divina do ministério cristão (3.10-17)
8. Argumento final contra o orgulho humano (3.18-23)
9. O exemplo de Paulo de ministério cristão (4.1-20)
B. Imoralidade na igreja (5.1-13)
C. Disputas judiciais entre fiéis (6.1-11)
D. Limitações à liberdade em Cristo (6.12-20)

III. Respostas a uma carta dos coríntios (7.1 a 16.4)


A. Questões relacionadas ao sexo e ao casamento (7.1-40)
1. Aos casados (7.1-7)
2. Aos solteiros e as viúvas (7.8,9)
3. Àqueles com dificuldades no casamento (7.10-24)
4. Às virgens (7.25-38)
5. Às viúvas (7.39,40)
B. Questões relacionadas aos ídolos (8.1 a 11.1)
1. Alimentos oferecidos aos ídolos (8.1-13)
2. Paulo abre mão dos direitos de apóstolo (9.1-27)
3. Alimentos oferecidos a ídolos (continuação; 10.1 a 11.1)
C. Questões relacionadas ao culto cristão (11.2-34)

993
1. Distinção de gêneros no culto (11.2-16)
2. Comportamento durante a ceia do Senhor (11.17-34)
D. Questões relacionadas aos dons espirituais (12.1 a 14.40)
1. Diversidade de dons, unidade no corpo (12.1-31)
2. A supremacia do amor (13.1-13)
3. Profecia e línguas (14.1-40)
E. Questões relacionadas à ressurreição (15.1-58)
F. Questões relacionadas à oferta de auxílio (16.1-4)

IV. Conclusão (16.5-24)


A. Os planos de viagem de Paulo (16.5-12)
B. Exortações finais (16.13-18)
C. Encerramento (16.19-24)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE DE


1CORÍNTIOS
I. Introdução (1.1-9)
A. Saudação (1.1-3)
Paulo abriu a carta, como era costume, identificando o autor e os
pretendidos destinatários. Sua autodescrição, “apóstolo de Cristo Jesus pela
vontade de Deus”, confirmava o apostolado de Paulo para uma igreja que
aparentemente estava começando a questionar a autoridade apostólica dele
e acabaria por negá-la. O endereçamento enfatiza a importância de Jesus
Cristo para a igreja. Jesus Cristo é o agente de santificação da Igreja e o
objeto de sua confissão.

994
B. Oração de ação de graças (1.4-9)
A oração de Paulo dá graças a Deus pelos numerosos dons espirituais
desfrutados pela Igreja de Corinto. A oração, assim, encorajou uma
significativa mudança do ponto de vista que os coríntios tinham sobre esses
dons. Em vez de serem objeto de orgulho pessoal e um incentivo para
ostentação, os dons deveriam ser reconhecidos como bondosamente
transmitidos aos fiéis por Deus e, portanto, incentivos para ação de graças e
louvores somente a Deus.
A saudação de Paulo, “graça e paz”, é sua saudação habitual.53 No
entanto, ela pode assumir um significado um pouco diferente nessa igreja
que tinha desvalorizado a graça divina por sua jactância nas realizações
humanas e que tinha trocado a paz por um conflito acalorado.
Paulo também expressou a sua confiança de que o Deus misericordioso
que chamou os coríntios à comunhão com seu Filho, asseguraria que eles
passariam pelo escrutínio do juízo final. Sua referência ao “dia de nosso
Senhor Jesus Cristo” empresta a expressão familiar “dia do
Senhor/Yahweh” do AT e a aplica à segunda vinda de Jesus. A aplicação
dessa expressão que descreve a vinda de Yahweh em juízo ao retorno de
Jesus implica fortemente a divindade de Jesus, e confirma que o título
“Senhor”, frequentemente usado para Jesus em 1Coríntios (seis vezes
somente na introdução: veja: 1.2,3,7-10), funciona como um título de
divindade e não de mera autoridade.

II. Respostas aos Relatórios Orais (1.10 a 4.20)


A. Uma perspectiva adequada sobre os ministros e
ministério cristãos (1.10 a 4.20)

995
Paulo dá indicações de ter recebido notícias de pessoas associadas a Cloé de
que a igreja tinha se dividido em quatro grandes facções (1.10-17). Três
dessas facções indevidamente idolatravam indivíduos e lhes davam uma
posição perigosamente próxima à do próprio Jesus. Isso estava
terrivelmente errado, uma vez que o papel de Jesus na igreja era de total
exclusividade. Somente ele tinha sofrido a crucificação por causa deles, e
somente ele era o Messias, em cujo nome os fiéis tinham sido batizados.
Além disso, a celebração das habilidades e capacidades humanas pelos
coríntios esvaziava a cruz de seu efeito em aspectos que Paulo logo
descreveu.
Ao transformar servos cristãos em celebridades com base em suas
habilidades oratórias e intelectuais, os coríntios tinham demonstrado uma
completa falta de compreensão da economia de Deus (1.18-25). Deus usa
pessoas fracas, tolas e insignificantes e uma mensagem aparentemente tola
e escandalosa para salvar pecadores. Isso mostra a supremacia do poder e
sabedoria de Deus e reduz a sabedoria e o poder humanos a mera tolice e
fraqueza. A composição da igreja de Corinto confirmava a descrição feita
por Paulo da economia divina. A compreensão dos caminhos de Deus
eliminava a ostentação humana e levava os pecadores a louvar somente a
Deus (1.26-31).
O ministério de Paulo aos coríntios ilustrava os princípios que Paulo
tinha acabado de explicar (2.1-5). Paulo não procurava impressionar as
pessoas com habilidades retóricas ou com sua personalidade. Em vez disso,
um homem fraco que tremia diante de Deus pregava uma mensagem
simples sobre a provisão de perdão de Deus por meio da morte sacrificial de
Jesus. Os coríntios tinham aceitado essa mensagem não porque a sabedoria
de Paulo fora exibida, mas porque o poder de Deus se manifestara.

996
A sabedoria mundana que os coríntios apreciavam não era de forma
alguma uma sabedoria verdadeira (2.6-16). Os responsáveis pela
crucificação de Jesus se consideravam homens sábios, mas nem mesmo
perceberam quem Jesus era. A verdadeira sabedoria era concedida somente
por meio da obra reveladora do Espírito de Deus. O ministério de Paulo era
uma expressão dessa obra de revelação. No entanto, somente aqueles que
eram habitados e influenciados pelo Espírito de Deus podiam compreender
questões espirituais.
Paulo tinha sido forçado a explicar somente as verdades mais
elementares da fé cristã para os coríntios, porque eles não tinham
maturidade espiritual para compreender as verdades mais difíceis (3.1-9).
Sua desunião confirmava sua imaturidade. Se tivessem sido maduros, eles
teriam entendido que os servos cristãos que eles celebravam eram apenas
instrumentos nas mãos de Deus e que somente Deus deveria ser glorificado
pela safra produzida por meio dos ministérios deles.
Deus deu a Paulo os recursos necessários para estabelecer a fundação
para a igreja de Corinto, e uma outra pessoa estava construindo sobre essa
fundação (3.10-17). Aqueles que estavam envolvidos nos ministérios da
Igreja precisavam garantir que Jesus Cristo continuava a ser o ponto central
daqueles ministérios. Aqueles que serviam precisavam levar em conta que
seus serviços seriam avaliados por Deus e que contribuições indignas para o
ministério seriam destruídas. A igreja é o templo santo de Deus, e Deus
punirá, de forma justa, aqueles que profanam esse templo.
A verdadeira sabedoria vinha apenas com a aceitação da mensagem que
o mundo via como loucura (3.18-23). Mas Deus via a sabedoria do mundo
como loucura. A avaliação de Deus da sabedoria mundana que levava ao

997
orgulho e provocava discórdia deveria, por fim, calar toda jactância
humana.
O ministério do próprio Paulo exemplificava os princípios que ele tinha
acabado de explicar (4.1-20). Ele desejava que as pessoas o vissem como
um servo e um administrador, não como uma celebridade. Seu único
objetivo era ser fiel ao Mestre que servia. Para ele, pouco importava se ele
tinha a aprovação de outras pessoas, mas era de suprema importância que
ele agradasse a Deus. Consequentemente, não sobrava espaço para orgulho
pessoal e arrogância com base no talento próprio ou nos resultados de seu
ministério. Com sarcasmo mordaz, Paulo contrastou a experiência dos
apóstolos com a arrogante autoavaliação dos próprios coríntios. Ele
apresentou a humildade, a abnegação e a dignidade dos apóstolos como um
modelo apropriado a ser seguido por todos os fiéis.
O sarcasmo anterior de Paulo não tinha a intenção de envergonhar os
coríntios. Ele os amava como um pai ama seus filhos. Na verdade, eram
seus filhos espirituais, já que ele tinha sido o primeiro a pregar o evangelho
para eles. Agora, deveriam procurar imitá-lo como um filho imita seu pai.
Timóteo, que em breve visitaria os coríntios, também era filho espiritual de
Paulo e exemplificava o amor e a fidelidade ao Senhor apropriados a um
filho espiritual de Paulo. Ele lembraria aos coríntios o exemplo de Paulo.
Paulo, mais tarde, iria a Corinto e estava preparado para usar a vara da
disciplina nos membros que eram arrogantes e dividiam a família, como um
pai, às vezes, tem de fazer.

B. Imoralidade na igreja (5.1-13)

998
Paulo tinha ouvido relatos de que um membro da igreja em Corinto estava
cometendo incesto com sua madrasta. Esse pecado era tão deplorável que
nem mesmo os pagãos o toleravam. No entanto, a Igreja celebrava esse
pecado em uma confusa tentativa de ostentar sua liberdade em Cristo. Paulo
exortou a igreja a se arrepender e a expulsar essa pessoa da comunidade.
Essa expulsão tinha dois objetivos principais. Primeiro, ela levaria o
pecador ao arrependimento e restauração. Segundo, protegeria a igreja de
uma influência imoral que poderia corromper toda a congregação.
Apesar de ser impraticável para os fiéis tentarem dissociar-se dos
incrédulos que viviam de forma pecaminosa, os fiéis deveriam romper a
comunhão com os supostos fiéis que levavam uma vida imoral. Como a
Israel do AT expulsou da congregação certos indivíduos por pecados
particularmente hediondos (5.13 cita Dt 17.7), assim a igreja cristã deve
expulsar aqueles que pecam com imprudência.

C. Disputas judiciais entre fiéis (6.1-11)


Paulo repreendeu os fiéis em Corinto por tentarem resolver os litígios entre
eles nos tribunais civis. Os irmãos estavam muito mais qualificados para
tomar decisões justas e adequadas em tais litígios do que os descrentes.
Além disso, levar disputas cristãs aos tribunais civis exibia a desunião cristã
para os incrédulos de uma maneira prejudicial ao testemunho cristão.
Nesses casos, todos perdiam. Os fiéis deveriam preferir ser prejudicados ou
fraudados a triunfar sobre os irmãos em um tribunal. Mas Paulo advertiu
aqueles que cometiam injustiças e defraudavam seus irmãos irmãs de que
tais ações eram completamente incompatíveis com o cristianismo genuíno.
Aqueles que praticavam pecados particularmente hediondos não herdariam

999
o reino de Deus. Embora os coríntios já tivessem praticado tais pecados,
tinham sido drasticamente transformados por Cristo e resgatados desse
estilo de vida pecaminoso.

D. Limitações à liberdade em Cristo (6.12-20)


A tolerância dos coríntios ao incesto e fraude entre os membros da igreja
indicava que eles tinham uma visão deturpada da liberdade cristã. Paulo
insistiu que a liberdade em Cristo não era absoluta. Os cristãos deveriam
procurar não se envolver em comportamentos que não fossem benéficos
para os outros ou que pudessem exercer domínio sobre sua vida. Eles
deviam reconhecer que o corpo havia sido criado para glorificar a Deus. A
intenção de Deus de ressuscitar o corpo era prova de que este, e o que se faz
com ele, é importante para Deus. Os fiéis deveriam também reconhecer que
sua ligação com Cristo, necessariamente, o envolvia em todas as suas
atividades. O corpo do fiel era agora o templo de Deus e deveria ser
considerado santo. Finalmente, todas as noções de liberdade cristã deveriam
ser misturadas com a consideração de que os fiéis são escravos do Senhor
Jesus, que foram comprados com o preço redentor de seu sangue.

III. Respostas a uma Carta dos Coríntios (7.1 a


16.4)
A. Questões relacionadas ao sexo e ao casamento
(7.1-40)
Talvez por causa de uma escatologia confusa, alguns fiéis de Corinto
tentavam praticar a abstinência dentro do casamento (7.1-7). Paulo criticou

1000
essa prática baseado em fundamentos teológicos e práticos. Primeiro, o
corpo de uma pessoa casada pertence ao seu cônjuge. A negação do corpo
defrauda o cônjuge do que legitimamente lhe pertence. Segundo, essa
abstinência é uma prática arriscada, pois torna o cônjuge mais vulnerável às
tentações sexuais.
Os fiéis que não tinham compulsão sexual para o casamento deveriam
continuar solteiros (7.8). Os fiéis não deveriam se divorciar de cônjuges
incrédulos por motivos religiosos, como se um fiel fosse corrompido por
essa relação (7.10-16). Se o incrédulo decidiu deixar o crente, o crente deve
dar permissão para que o faça. Mas um crente casado com um incrédulo
deveria procurar preservar o casamento, na esperança de exercer uma
influência espiritual positiva sobre o cônjuge incrédulo.
O conselho geral de Paulo era para os fiéis permanecerem na situação
em que viviam no momento da sua conversão, especialmente quanto à
escravidão e circuncisão (7.17-24). Por causa da proximidade da volta de
Jesus e a aflição que os fiéis experimentariam com a aproximação daquele
momento, os fiéis solteiros deveriam permanecer solteiros. Isso permitiria
aos fiéis concentrar as suas preocupações nas coisas do Senhor e os
preveniria de se distraírem de sua devoção a ele. No entanto, quando dois
fiéis solteiros se sentissem apaixonados um pelo outro e se esforçassem
para se controlar, o casamento era a melhor opção.
O casamento é uma aliança para toda a vida, o que significa que as
viúvas já não têm mais obrigação com seu cônjuge falecido. As viúvas
podem ser mais felizes se permanecerem solteiras, mas estão livres para se
casar com outro fiel, se assim desejarem (7.25-40).

B. Questões relacionadas aos ídolos (8.1 a 11.1)

1001
Muitos dos fiéis de Corinto tinham anteriormente adorado em templos de
ídolos. Alguns já tinham renunciado a qualquer associação com a idolatria
pagã. Eles se recusavam a participar nas festas dedicadas aos ídolos ou até
mesmo comer carne formalmente sacrificada aos ídolos e que, mais tarde,
era vendida em mercados de Corinto. Outros evitavam as festas de ídolo,
mas se sentiam livres para comprar e apreciar os alimentos que tinham sido
dedicados ao ídolo. Ainda outros se sentiam livres para participarem até
mesmo das festas com base em suas convicções de que os deuses ídolos na
verdade não existiam.
Paulo confirmou a premissa teológica daqueles que se sentiam livres
para participar das festas de ídolos, mas contestou a conclusão que tiraram
dessa premissa. Paulo concordava que há um só Deus verdadeiro, citando o
Shemá, de Deuteronômio 6.4: “O SENHOR, nosso Deus, o SENHOR é um.”
Surpreendentemente, ele interpretou essa confissão como expressão de uma
alta cristologia em que o Pai é o único Deus verdadeiro e Jesus é o único
Senhor verdadeiro que criou tudo o que existe. Essa interpretação
cristológica do Shema é uma das mais claras e impressionantes afirmações
da divindade de Jesus nas cartas de Paulo.
No entanto, a rejeição cristã do politeísmo e a existência de deuses
ídolos não conduzem necessariamente à aprovação incondicional da
ingestão de alimentos previamente sacrificados a eles. Os fiéis precisavam
estar cientes de que outros poderiam seguir seu exemplo de ingerir
alimentos sacrificados aos ídolos apenas para ficarem depois com a
consciência pesada. Eles deveriam estar atentos para o fato de como outros
fiéis perceberiam suas ações e o potencial impacto de outros seguirem seu
exemplo (8.1-13).

1002
Embora alguns fiéis pudessem se ressentir dessa limitação a sua
liberdade cristã, o próprio Paulo de bom grado também sacrificou algumas
de suas liberdades como um apóstolo. Ele renunciou seu direito ao apoio
financeiro das igrejas que ele servia, embora até mesmo exemplos
seculares, a lei do AT e os ensinamentos de Jesus confirmassem o seu
direito a esse apoio. Paulo também sacrificou outras liberdades, a fim de se
relacionar melhor com as pessoas que ele estava tentando alcançar.
Paulo estava preocupado que alguns coríntios vissem a liberdade cristã
como um libertar-se de todas as restrições a seu comportamento. Ele usou
vários exemplos atléticos que conheciam bem dos Jogos Ístmicos para
lembrá-los que o autocontrole e a moderação pessoal são necessidades
práticas em todas as áreas da vida (9.1-27).
Paulo suspeitava que a visão de liberdade cristã dos coríntios estava
relacionada com a teologia sacramental deles. Aparentemente, os coríntios
acreditavam que a recepção do batismo e a participação na Ceia do Senhor
garantiam a salvação. Aqueles que recebiam as ordenanças estavam livres
para viver da maneira que quisessem, sem temer o julgamento divino. Paulo
atacou essa teologia sacramental argumentando que os israelitas tinham
participado em eventos análogos ao batismo e a uma refeição espiritual e,
no entanto, com exceção de dois, todos morreram nas andanças pelo deserto
como um resultado do juízo divino. Além disso, eles caíram sob juízo
divino porque tinham cometido os mesmos pecados em que os coríntios
agora se envolviam: idolatria, imoralidade sexual e rejeição da autoridade
dos líderes divinamente escolhidos. O exemplo dos israelitas funcionava
como uma advertência para os coríntios. Eles não deveriam presumir que as
ordenanças garantiam a salvação, e deveriam tomar cuidado para não cair
em tentação (10.1-13).

1003
Embora os deuses-ídolos na realidade não existissem, aqueles que
participavam nas festas dedicadas aos ídolos se tornavam, assim,
companheiros dos demônios (10.14-22). Isso era incompatível com o
compromisso cristão dos coríntios e poderia apenas provocar o ciúme do
Senhor, como o segundo mandamento advertia (Êx 20.4). Porque os fiéis
deveriam fazer apenas o que fosse útil, edificante e benéfico para os outros
fiéis, eles deveriam limitar a sua liberdade de ingerir a carne que fora
oferecida aos ídolos pelo bem daqueles que tinham uma consciência mais
fraca. Na privacidade de seus próprios lares, eles estavam livres para comer
essa carne. No entanto, em locais públicos, onde estivessem presentes
pessoas que poderiam ficar chocadas pelo consumo de carnes dedicadas aos
ídolos, os fiéis deveriam se abster de ingeri-las. A principal preocupação do
fiel é glorificar a Deus e não exercer sua própria liberdade. Assim, ele
deveria evitar ofensas desnecessárias aos outros por suas ações. Isso estava
em consonância com os exemplos de Paulo e Cristo, que viviam em
benefício dos outros e não do seu próprio prazer (10.23 a 11.1).

C. Questões relacionadas ao culto cristão (11.2-34)


A primeira questão relevante eram as confusões de gênero no culto (11.2-
16). Alguns fiéis na igreja em Corinto estavam aparentemente praticando a
inversão de papéis dos homens e das mulheres. Essa prática provavelmente
resultava de sua escatologia confusa, da influência de suas origens pagãs, e
da interpretação equivocada do ensino do próprio Paulo. As mulheres na
igreja começaram a se vestir de forma masculina, e alguns homens,
possivelmente se vestiam de um modo feminino. Em resposta, Paulo
argumentou que a distinção entre homens e mulheres tinha sido ordenada

1004
por Deus. Essas distinções deveriam ser refletidas no vestir e nos penteados
dos fiéis, com as mulheres sendo submissas aos homens.
A segunda questão era o comportamento durante a Ceia do Senhor
(11.17-34). Paulo também expressou preocupação sobre os abusos da
sagrada ordenança da Ceia do Senhor (11.17-22). Durante a Ceia, a igreja
ficava dividida em panelinhas. Alguns membros abusavam da comida e do
vinho, enquanto outros, especialmente os membros mais pobres da
congregação, passavam fome e sede. Ao fazer isso, eles profanavam a Ceia
que deveria ser uma celebração da nova aliança, uma lembrança do
sacrifício de Jesus e uma antecipação de sua volta. Paulo exortou os
coríntios a examinarem a si mesmos para terem certeza de que estavam
participando da Ceia de forma digna (11.27-34). Em sua observância da
Ceia, eles deviam, com gratidão, refletir sobre o corpo e o sangue do
Senhor que havia sido sacrificado por eles. Paulo advertiu que a doença ou
até mesmo a morte poderia resultar (e na verdade já tinha resultado) do
sacrilégio dos coríntios em relação à Ceia do Senhor.

D. Questões relacionadas aos dons espirituais (12.1


a 14.40)
Os coríntios evidentemente tinham noções bem confusas sobre a natureza,
importância e exercício adequado dos dons espirituais. Aparentemente,
alguns membros na congregação que pensavam estarem exercendo o dom
de profecia tinham, na verdade, amaldiçoado Jesus no culto comunitário
(12.1-3). Paulo viu a necessidade de corrigir as ideias confusas dos
coríntios. Ele explicou que o mesmo Espírito tinha conferido dons
diferentes para diferentes pessoas em benefício da igreja (12.4-11). O fato

1005
de todos os diferentes dons terem origem na mesma fonte sugeria que todos
os dons eram igualmente “espirituais” e importantes. Paulo confirmou isso
comparando os diferentes dons a várias habilidades de diferentes membros
do corpo humano (12.12-31). Todos os dons, como todas as capacidades
físicas, eram necessários e importantes. Nenhum indivíduo pode ter todos
os dons. No entanto, ele deve exercer o dom que Deus lhe concedeu sem
comparar o seu dom com o de outra pessoa.
Paulo exortou os coríntios a cultivar o atributo do amor, que é mais
importante que o exercício de qualquer dom espiritual (13.1-13). O amor é
mais importante do que falar as línguas dos homens e dos anjos, que a fé
milagrosa, que a generosidade abundante, ou mesmo que a fidelidade que
motiva uma pessoa a aceitar o martírio. A prosa de Paulo elevou-se a poesia
enquanto ele, de forma muito bela, descrevia esse amor paciente, gentil,
humilde, perdoador e virtuoso. Esse tipo de amor superava todos os dons
espirituais, mesmo os dons de línguas, profecia e fé, pois apenas o dom do
amor permaneceria após o retorno de Jesus e continuaria a ser exercido por
toda a eternidade.
Paulo encorajou os coríntios a aspirar ao dom da profecia e demonstrou
que o dom de profecia era superior ao dom de línguas em muitos aspectos
(14.1-6). Evidências sugerem que os coríntios tinham confundido o
verdadeiro dom de línguas conferido em Pentecostes com declarações
extáticas comuns nas religiões pagãs de Corinto (14.6-12). O dom de
línguas descrito aqui parece diferente do dom exibido em Atos 2 uma vez
que as línguas faladas não eram inteligíveis para os outros ou,
aparentemente, nem mesmo para o próprio falante sem um dom de
interpretação adicional. Porque essas declarações não comunicavam
mensagem alguma para o ouvinte, eram como sons agudos de uma flauta

1006
que não tinham uma melodia clara, ou como toques de uma trombeta que
nada comunicavam às tropas (14.8-10). Enquanto que a exibição de línguas
de Atos 2 transformou estrangeiros que não podiam se comunicar um com o
outro em amigos e irmãos que falavam a mesma língua, este dom de línguas
transformava amigos e irmãos que falavam a mesma língua em estranhos
que não conseguiam se comunicar.
Paulo também expressou preocupação de que o ponto de vista dos
coríntios sobre o dom de línguas envolvia declarações que eram
incompreensíveis até para o próprio orador (14.13-19). Ele exortou os
coríntios a exercerem o dom somente quando as expressões fossem
compreensíveis para o orador e quando alguém pudesse interpretar a
mensagem de uma forma inteligível para os outros que estivessem
presentes. Paulo preferia cinco palavras inteligíveis compreendidas pelo
orador que instruía outros a dez mil palavras que ninguém entendia. Paulo
citou Isaías 28.11,12 para argumentar que expressões ininteligíveis eram na
verdade um sinal do juízo divino sobre os incrédulos (14.21). Além disso, a
prática do dom de línguas pelos coríntios na igreja poderia dar aos
visitantes a impressão de que os fiéis tinham perdido o juízo. No entanto, o
dom da profecia revelava os pecados secretos do incrédulo, o colocava de
joelhos em arrependimento, e lhe mostrava a presença de Deus (14.20-25).
Finalmente, Paulo deu instruções sobre a manutenção da ordem no culto
comunitário (14.26-33a). Os cultos deveriam ser organizados. Aqueles que
profetizavam deveriam manter sua compostura e autocontrole em vez de se
entregarem a um frenesi como o os profetas pagãos nos templos dos ídolos.
A congregação deveria avaliar os profetas e silenciar aqueles que se
afastavam da verdade.

1007
Paulo também silenciou na igreja as mulheres cujas palavras, no
ambiente do culto comunitário, minavam de alguma forma a autoridade de
seus maridos e publicamente os envergonhava (14.33b-36). É possível que
algumas esposas estivessem questionando ou contestando a legitimidade
das profecias de seus maridos ou de outros líderes da igreja, assumindo
assim um papel que Paulo reconhecia como incompatível com o papel de
submissão da mulher. A orientação geral de Paulo para a realização do culto
público era que tudo deveria ser feito “com decência e ordem” (14.37-40).

E. Questões relacionadas à ressurreição (15.1-58)


Contra os ataques sobre a historicidade e a realidade da ressurreição de
Jesus, Paulo afirmava que o evangelho que ele recebera testificava a morte,
sepultamento e ressurreição de Cristo “segundo as Escrituras”, isto é, em
cumprimento da profecia do AT (15.3,4). Ele também citou numerosas
aparições do Jesus ressuscitado a diferentes públicos (incluindo os “mais de
500 irmãos de uma só vez”, v. 6), incluindo muitos que ainda estavam vivos
no momento da escrita (15.5-8) e, por último, mas não menos importante,
ao próprio Paulo na estrada para Damasco.54
Sob a influência do dualismo que permeava boa parte do antigo mundo
pagão, alguns coríntios negavam a doutrina da ressurreição corporal
(15.1,2, 9-11). Essa negação era provavelmente acompanhada por uma
visão escatológica que dizia que os fiéis experimentavam uma ressurreição
espiritual no momento em que eles criam ou eram batizados. Mas na visão
dos coríntios, os fiéis não deveriam esperar por nenhuma ressurreição futura
do corpo.

1008
Paulo escreveu longamente para defender a doutrina da ressurreição
corporal. Ele demonstrou que a ressurreição corporal de Jesus era intrínseca
ao evangelho (15.12-19). A negação da ressurreição corporal requeria a
negação da ressurreição de Jesus, e sem um Jesus ressuscitado toda a fé
cristã entrava em colapso. Além disso, a ressurreição de Jesus era o
prelúdio da ressurreição dos fiéis, que ocorreria na Segunda Vinda, quando
Jesus venceria a morte de uma vez por todas (15.20-28). A disposição de
Paulo de arriscar a própria vida a toda hora para proclamar o evangelho
demonstra a profundidade da sua própria crença na vindoura ressurreição
corporal.
Paulo esclareceu que o corpo com o qual Jesus ressuscitou dos mortos
seria dramaticamente transformado e significativamente diferente do atual
corpo do fiel (15.35-49). O corpo ressuscitado seria incorruptível, glorioso,
poderoso e perfeitamente adaptado a uma vida controlada pelo Espírito no
qual a velha batalha entre a carne e o Espírito finalmente terminaria. Por
meio da dramática transformação que Cristo trouxe pela ressurreição os
fiéis teriam vitória completa e definitiva sobre o pecado e a morte (15.50-
58). A doutrina da ressurreição serve como um lembrete para os fiéis de que
o seu trabalho para o Senhor não é em vão, mas será recompensado na
eternidade.

F. Questões relacionadas com a oferta de auxílio


(16.1-4)
Paulo deu aos coríntios instruções práticas sobre a coleta da oferta em
auxílio aos fiéis em Jerusalém. Essas instruções asseguravam que a oferta

1009
dos coríntios já teria sido recolhida quando Paulo chegasse e que o dinheiro
seria tratado com integridade.

IV. Conclusão (16.5-24)


A. Os planos de viagem de Paulo (16.5-12)
Paulo anunciou sua intenção de permanecer em Éfeso até Pentecostes e, em
seguida, viajar para Corinto atravessando a Macedônia. Ele também pediu
aos Coríntios que tratassem Timóteo com respeito, uma vez que ele
chegaria a Corinto antes de Paulo.

B. Exortações finais (16.13-18)


Paulo conclui a carta exortando os coríntios a se manterem firmes em sua fé
e fazer todas as coisas com o amor que ele descreveu no capítulo 13. Ele
exortou os coríntios a reconhecerem a autoridade de seus líderes espirituais.

C. Encerramento (16.19-24)
Paulo enviou saudações daqueles que estavam com ele e abençoou a igreja.

ESTRUTURA DE 2CORÍNTIOS
I. Introdução (1.1-11)
A. Saudação (1.1,2)
B. Oração de ação de graças (1.3-7)
C. Explicação da oração de ação de graças de Paulo (1.8-11)

1010
II. O relacionamento de Paulo com os coríntios (1.12 a 2.11)
A. A conduta pura de Paulo (1.12-14)
B. A mudança de planos de Paulo (1.15-22)
C. A razão para a mudança de planos (1.23 a 2.4)
D. Perdão para o pecador arrependido (2.5-11)

III. A defesa de Paulo de seu ministério (2.12 a 7.16)


A. O ministério de Paulo em Trôade e na Macedônia (2.12-17)
B. As cartas de recomendação de Paulo (3.1-3)
C. A competência de Paulo (3.4-6)
D. O ministério da Nova Aliança (3.7-18)
E. A verdade revelada (4.1-6)
F. Tesouro em vasos de barro (4.7-18)
G. A ressurreição vindoura (5.1-10)
H. O ministério da reconciliação (5.11 a 6.2)
I. Catálogo dos sofrimentos de Paulo (6.3-13)
J. Chamado para se afastarem dos oponentes de Paulo (6.14 a 7.1)
K. A defesa final de Paulo (7.2-16)

IV. A coleta para os fiéis em Jerusalém (8.1 a 9.15)


A. Exemplo das igrejas da Macedônia (8.1-7)
B. Exemplos do sacrifício de Cristo e o Antigo Testamento (8.8-15)
C. Administração das ofertas (8.16-24)
D. Importância de se ter a oferta pronta (9.1-5)
E. Os princípios motivadores da oferta generosa (9.6-15)

V. Paulo renova a defesa de seu apostolado (10.1 a 13.4)


A. O tom do apelo de Paulo (10.1-11)

1011
B. A recomendação divina do ministério de Paulo (10.12-18)
C. O perigo dos falsos apóstolos (11.1-15)
D. Os sofrimentos de Paulo (11.16-33)
E. As visões e revelações de Paulo (12.1-10)
F. Os milagres de Paulo (12.11-13)
G. A defesa final de Paulo (12.14 a 13.4)

VI. Exortações finais (13.5-12)

VII. Encerramento (13.13)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE DE


2CORÍNTIOS
I. Introdução (1.1-11)
A. Saudação (1.1,2)
Além das características que são típicas das saudações de Paulo, o apóstolo
identificou Timóteo como corremetente da carta. Ele também endereçou a
carta não apenas aos fiéis em Corinto, mas também a todos os fiéis
espalhados pela província da Acaia.

B. Oração de ação de graças (1.3-7)


Os oponentes de Paulo em Corinto, provavelmente, argumentavam que as
grandes dificuldades que Paulo experimentava em seu ministério provavam
que ele não desfrutava da bênção de Deus em seu ministério. Mas Paulo via
seus sofrimentos como essenciais para seu ministério e como uma

1012
autenticação de seu chamado divino. Paulo agradecia a Deus por confortá-
lo em suas aflições de modo que ele pudesse usar sua experiência de
sofrimento para confortar a outros. Assim, Paulo via o seu sofrimento como
uma continuação do sofrimento suportado por Cristo. Paulo também tinha a
expectativa de tomar parte no conforto de Cristo por meio da ressurreição.

C. Explicação da oração de ação de graças de Paulo


(1.8-11)
Paulo falou novamente sobre seu sofrimento e embate com a morte na Ásia,
o que reforçou a sua confiança na ressurreição vindoura. Paulo sabia que o
Deus que o livrara da morte ao poupar sua vida na Ásia, no final o livraria
da morte, ressuscitando-o. Paulo exortou os coríntios a agradecerem a Deus
por ter poupado sua vida.

II. O Relacionamento de Paulo com os Coríntios


(1.12 a 2.11)
A. A conduta pura de Paulo (1.12-14)
Apesar dos ataques ao ministério de Paulo pelos seus oponentes, ele tinha a
consciência limpa. Em seu ministério aos coríntios, ele tinha se conduzido
com sinceridade e pureza que vinham de Deus. Ele escreveu de forma clara
e aberta aos coríntios, porque ele não tinha nada a esconder deles. Ele
também não tinha nada a esconder de Deus. Assim, ele olhava com
confiança para o dia em que Cristo avaliaria o seu ministério aos coríntios.

B. A mudança de planos de Paulo (1.15-22)


1013
Os oponentes de Paulo em Corinto, evidentemente, argumentaram que
Paulo não poderia ser confiável uma vez que ele não tinha seguido
completamente os planos de viagem que tinha anunciado anteriormente.
Paulo alegou que os coríntios deveriam fazer distinção entre o evangelho
que ele pregava e seus planos de viagem. Seus planos de viagem eram
sujeitos a alteração, mas seu evangelho era consistente e imutável. Paulo
não tinha hesitado nem um pouco no que dizia respeito a sua mensagem.

C. A razão da mudança de planos (1.23 a 2.4)


Paulo não tinha mudado seus planos de viagem por mero capricho. Ele se
absteve de visitá-los para evitar feri-los e ser ferido por eles. Ele havia
decidido que poderia abordar melhor os problemas da comunidade de
Corinto por meio de uma carta do que por mais uma visita pessoal.

D. Perdão ao pecador arrependido (2.5-11)


Paulo demonstrou que sua mudança de planos tinha produzido o resultado
desejado. Em resposta a sua carta dolorosa, os coríntios haviam
disciplinado o membro da igreja que levara a congregação a rejeitar a
autoridade apostólica de Paulo. Aquele membro da igreja tinha agora se
arrependido, e Paulo exortou a igreja a perdoá-lo e restaurá-lo em uma
demonstração de amor cristão.

III. A Defesa de Paulo de Seu Ministério (2.12 a


7.16)

1014
A. O ministério de Paulo em Trôade e na
Macedônia (2.12-17)
A direção de Deus na mudança de seus planos de viagem foi confirmada
também pelos frutos do seu ministério em Trôade, onde Deus abriu uma
porta para um ministério eficaz. Mas a preocupação de Paulo em encontrar
Tito e ouvir seu relatório sobre a situação em Corinto rapidamente o levou a
viajar para a Macedônia.
Paulo usou a analogia do triunfo romano, em que um general vitorioso
marchava com o inimigo vencido pelas ruas da capital e, por fim, para sua
morte, para descrever a obra de Deus em sua própria vida. Deus tinha
vencido seu inimigo, Saulo de Tarso, na estrada para Damasco. Paulo agora
era prisioneiro acorrentado de Deus, dirigido para onde Deus quisesse.
Assim como a derrota do inimigo vencido trazia grande glória ao general
vitorioso, a derrota e sujeição de Paulo glorificavam a Deus.
O ministério de Paulo era como a oferta de incenso do AT (veja Êx
29.18). Quer o ministério de Paulo fosse um aroma agradável quer fosse um
odor repugnante para outros, era, todavia, um perfume agradável para Deus.
O ministério de Paulo era agradável a Deus, porque era movido por motivos
sinceros, era autorizado por Deus e realizado na expectativa do juízo divino.
Por meio do ministério de Paulo, o mundo tinha a oportunidade de conhecer
a Deus.

B. As cartas de recomendação de Paulo (3.1-3)


Os oponentes de Paulo aparentemente apelavam a cartas de recomendação
de importantes líderes da igreja, talvez os líderes da igreja em Jerusalém,
para sustentar sua autoridade. Eles criticaram Paulo por não ter essas cartas.

1015
Paulo rebateu dizendo que os fiéis de Corinto eram suas cartas de
recomendação que confirmavam a legitimidade do seu apostolado. O
contraste feito por Paulo entre cartas escritas com tinta em tábuas de pedra
(veja Êx 24.12; 31.18; 32.15; 34.1; Dt 9.10) e aquelas escritas pelo Espírito
nas tábuas do coração humano (veja Ez 11.19; 36.26,27) recorda as
descrições do AT da antiga e da nova aliança, respectivamente, e abre o
caminho para descrição que Paulo faz do seu papel como ministro da nova
aliança.

C. A competência de Paulo (3.4-6)


Deus tornou Paulo competente para servir como ministro da nova aliança.
Embora a antiga aliança, a lei, pudesse produzir apenas morte, porque
exigia uma justiça dos pecadores que esses não podiam alcançar, a nova
aliança concede o Espírito Santo aos fiéis, e esse Espírito lhes dá vida.

Algo Para Pensar: A Diferença que Cristo Faz

Quando Paulo escreveu sua segunda carta aos coríntios — que


era, no mínimo, a sua quarta carta, mas duas delas não chegaram
até nós — ele estava assediado e pressionado em muitas frentes. Ele
havia sido espancado, apedrejado, sofrido naufrágio, passado
perigos em rios, entre ladrões, judeus e gentios, e de muitas outras
fontes (2Co 11.23-36). Ele havia sofrido “trabalho e cansaço, muitas
noites sem dormir, com fome e sede, muitas vezes sem comida, com
frio e com falta de roupa” (11.27), para não mencionar a
preocupação diária para com as igrejas que ele havia plantado.

1016
No entanto, Paulo ficou desanimado? Não. Esta é a forma como
ele descreveu sua situação:

Sofremos pressões de todos os lados, mas não estamos arrasados;


ficamos perplexos, mas não desesperados;
somos perseguidos, mas não desamparados;
abatidos, mas não destruídos (4.8-10).

E tudo isso por causa de Cristo e seu corpo, a igreja.


Por que Paulo não desanimava quando todas essas coisas ruins
estavam acontecendo com ele? Para a maioria de nós, bastaria uma
fração muito pequena das desgraças que se abateram sobre Paulo
para nos colocar pra baixo. A razão pela qual Paulo pôde manter-se
motivado era que ele sabia que estava no centro da vontade de Deus
e que não sofria por erros que tivesse cometido, mas para que a
igreja de Deus fosse edificada.
É apenas uma questão de perspectiva. Para Paulo, os seus
sofrimentos o aproximaram “do Deus de toda consolação” (1.3). A
perseguição reforçava a ideia de que Paulo fora chamado para um
glorioso ministério da nova aliança que era muito superior à
administração da antiga por meio de Moisés (cap. 3). Suas fraquezas
o lembravam que ele carregava o tesouro do Evangelho em vasos de
barro, por assim dizer. A fragilidade de seu corpo humano o fez
olhar para o futuro, para o momento em que sua “tenda terrestre”
seria transformada em uma gloriosa existência celestial.
Quando as coisas dão errado em nossa vida, será que temos a
perspectiva de Paulo? Consideramos motivo de alegria o passar por
várias provações, como Tiago nos advertiu (Tg 1.2)? Será que
fazemos “todas as coisas sem queixas e discórdia” como Paulo

1017
exortou os filipenses (Fp 2.14)? Em caso afirmativo, a paz de Deus,
que ultrapassa todo entendimento, guardará nossos corações e
nossas mentes em Cristo Jesus, e então conheceremos a presença do
Deus da paz em todas as situações — assim como Paulo fez (Fp
4.6,8).

D. O ministério da Nova Aliança (3.7-18)


Embora a antiga aliança fosse gloriosa, a glória da Nova Aliança em muito
supera a da antiga. A antiga aliança produzia apenas a condenação dos
pecadores, pois era incapaz de torná-los justos, mas a Nova Aliança
verdadeiramente torna os pecadores justos. Além disso, a antiga aliança era
apenas temporária, a Nova Aliança é eterna.
Depois que Moisés recebeu a antiga aliança, ele cobriu o rosto com um
véu para evitar que os israelitas fixassem o olhar no reflexo da glória de
Deus que os amedrontava. Isso demonstrou que a antiga aliança apenas
condenava os pecadores e os sentenciava à morte. Moisés também cobriu o
rosto com um véu porque ele não queria que os israelitas vissem o dissipar
do brilho de sua face quando a glória desvanecia.
Embora os filhos de Israel tivessem um véu sobre os seus corações que
os impedia de compreender os escritos de Moisés, o véu foi removido do
coração daqueles que se voltaram para o Senhor. Aqueles que se voltaram
para o Senhor e receberam as promessas da Nova Aliança seriam
transformados pelo Espírito, para que a imagem de Deus fosse restaurada
neles com uma glória cada vez maior.

1018
E. A verdade revelada (4.1-6)
Devido ao glorioso ministério confiado a Paulo, ele não tinha nenhuma
razão para adotar as técnicas dissimuladas de seus oponentes. Seu legítimo
apostolado era confirmado pela “exibição pública da verdade”. Se o seu
evangelho parecia estar encoberto, era apenas porque Satanás cegara o
entendimento dos incrédulos. A glória de Deus brilhava desde a face de
Jesus nos corações daqueles que creem.

F. Tesouros em vasos de barro (4.7-18)


O grande tesouro da mensagem sobre Jesus Cristo estava alojada em um
sofrido apóstolo, um recipiente feito de barro — fraco, frágil e vulnerável.
Ao utilizar um recipiente tão frágil como Paulo para difundir a gloriosa boa
nova, Deus colocou seu grande poder em exibição. Embora o ministério do
evangelho constantemente expusesse o apóstolo à ameaça de morte, ele foi
em frente, cero de que Deus ressuscitaria seu corpo e que seus sofrimentos
eram só o prelúdio de “uma glória incomparável de valor eterno”.

G. A ressurreição vindoura (5.1-10)


Paulo sabia que, quando seu corpo fosse destruído, a ele seria dado um
novo corpo de ressurreição. O habitar do Espírito era um pré-pagamento
que garantia aquela transformação e glorificação finais. O objetivo de Paulo
era agradar a Deus em todas as coisas, porque ele sabia que as obras de
todas as pessoas um dia seriam julgadas por Deus.

H. O ministério da reconciliação (5.11 a 6.2)

1019
Dirigido pela expectativa desse julgamento e pelo amor cristão, Paulo
procurou persuadir os outros de que Jesus tinha morrido por eles e que eles
morreram juntamente com ele para que fossem libertados de seu antigo tipo
de vida egoísta para viver para o Jesus crucificado e ressuscitado.
Paulo tinha abandonado sua visão pré-cristã de Jesus, que o via como
um mero ser humano sofredor e nada mais. Ele, agora, via a Cristo como
aquele que iniciara a nova criação. Cristo tanto radicalmente transformou os
fiéis quanto foi aquele por meio do quem Deus reconciliou consigo aqueles
que haviam sido alienados dele pelo pecado.55
Jesus assumiu a culpa dos pecados dos fiéis para si e enfrentou a pena
para aqueles pecados para que os fiéis pudessem ser considerados justos por
Deus. Paulo suplicou aos pecadores em nome de Cristo para que se
reconciliassem com Deus e insistiu que o dia da salvação tinha finalmente
chegado.

I. Catálogo dos sofrimentos de Paulo (6.3-13)


Embora os oponentes de Paulo, provavelmente, argumentassem que um
verdadeiro apóstolo seria divinamente protegido de sofrimentos, Paulo
argumentou que seus sofrimentos, na verdade, confirmavam a legitimidade
de seu apostolado. Ele listou os sofrimentos e sacrifícios que ele tinha
padecido no cumprimento do seu chamado divino.

J. Chamado para se afastarem dos oponentes de


Paulo (6.14 a 7.1)
Paulo tratou do relacionamento dos fiéis com os incrédulos. Os incrédulos,
nesse contexto, são os adversários de Paulo, que tinham rejeitado o seu

1020
apostolado e seu evangelho. Paulo exortou os coríntios a se afastarem
dessas pessoas sem lei, más e impuras para que pudessem se purificar de
todas as impurezas na carne e no espírito, para se tornarem o santuário puro
do Deus vivo.

K. A defesa final de Paulo (7.2-16)


Paulo afirmou, mais uma vez, a sua inocência em face das absurdas
acusações contra ele feitas por seus adversários. Ele exortou os coríntios a
aceitá-lo de todo coração. Paulo expressou sua alegria pelo relatório de Tito
com relação ao arrependimento dos coríntios e a renovação da sua afeição
por Paulo. O apóstolo alegremente exclamou que a sua completa confiança
nos coríntios havia sido restaurada.

IV. A Coleta Para os Fiéis em Jerusalém (8.1 a


9.15)
A. O exemplo das Igrejas da Macedônia (8.1-7)
Paulo voltou sua atenção de seus oponentes na igreja de Corinto para a
coleta de uma oferta de socorro para os fiéis na Palestina, um assunto que
ele abordara de forma breve em 1Coríntios 16. Paulo recorreu ao exemplo
de generosidade das igrejas pobres da Macedônia para motivar os coríntios
a ofertarem de forma mais sacrificial.

B. Exemplos do sacrifício de Cristo e o Antigo


Testamento (8.8-15)

1021
Gratidão pelo sacrifício de Jesus deveria motivar os coríntios a ofertarem
sacrificial e alegremente. Paulo não queria que os coríntios ajudassem os
fiéis em Jerusalém, impondo dificuldades a eles mesmos. Mas ele realmente
acreditava que deveria haver uma igualdade geral entre os fiéis como
ilustrada pela colheita do maná no AT.

C. Administração das ofertas (8.16-24)


Alguns dos oponentes de Paulo, aparentemente, alegavam que Paulo
pretendia fazer uso inadequado da oferta que os coríntios estavam
recolhendo. Paulo assegurou aos coríntios de que os fundos seriam usados
para o propósito designado. Tito e um representante designado pelas igrejas
supervisionariam a coleta e sua distribuição de modo a evitar “que alguém
encontre falha em nós”.

D. Importância de se ter as ofertas prontas (9.1-5)


Paulo já havia informado os macedônios que os coríntios tinham começado
a coleta de suas ofertas. Isso tornava bem importante que a oferta estivesse
recolhida quando os representantes da igreja chegassem para que os
coríntios não parecessem relutantes em contribuir.

E. Os princípios motivadores da oferta generosa


(9.6-15)
Os coríntios deveriam contribuir generosamente, pois Deus os
recompensaria na mesma proporção da sua generosidade. Eles deveriam
contribuir alegremente, pois Deus ama ao que contribui com alegria. Deus

1022
atenderia a suas necessidades de modo que poderiam ofertar
generosamente. Sua generosidade não apenas expressaria sua gratidão a
Deus, mas também levaria os cristãos de Jerusalém a glorificar a Deus e a
orar com mais fervor pelos fiéis gentios.

V. Paulo Renova a Defesa de seu Apostolado (10.1


a 13.4)
A. O tom do apelo de Paulo (10.1-11)
Paulo concluiu a sua defesa anterior de seu apostolado manifestando total
confiança de que os coríntios se afastariam de seus oponentes e
confirmariam sua autoridade e seu evangelho. Mas, enquanto Paulo
completava o capítulo 9, evidentemente, ele recebeu novas notícias de
problemas em Corinto que o levaram a abordar novamente a questão de seu
apostolado com um tom muito mais severo.
Os oponentes de Paulo alegavam que ele era fraco porque ele falava
com firmeza apenas em suas cartas, escritas a distância. Eles,
evidentemente, utilizavam essa inconsistência para alegar que Paulo se
conduzia “segundo padrões humanos”. Paulo respondeu que ele procurava
se relacionar com os coríntios com a doçura e gentileza de Cristo, mas
alertou que ele poderia adotar uma postura muito mais firme se fosse
necessário.

B. A recomendação divina do ministério de Paulo


(10.12-18)

1023
Ao contrário de seus oponentes, que procuravam recomendar a si mesmos
com comparações competitivas, Paulo apelava apenas para a recomendação
divina de seu ministério. Deus tinha atribuído a Paulo um ministério que se
estendia a Corinto e acabaria por se estender bem além dela. O apelo de
Paulo à eficácia de seu ministério para confirmar a sua autoridade
apostólica não constituiu uma autorrecomendação. Paulo procurava apenas
glorificar a Deus e ser recomendado por ele.

C. O perigo dos falsos Apóstolos (11.1-15)


Paulo estava preocupado que os falsos apóstolos cortejassem os coríntios
afastando-os de sua devoção a Cristo como um homem imoral procura
seduzir uma noiva afastando-a daquele a quem ela foi prometida. Como
Satanás havia enganado Eva, os falsos apóstolos enganavam os coríntios ao
pregar um outro Jesus, um espírito diferente e um evangelho diferente.
Os falsos apóstolos alegavam ser “superapóstolos”, que superavam
Paulo na capacidade oratória, no conhecimento e no status. Sua
superioridade era demonstrada pelo fato de eles se sentirem dignos de exigir
suporte financeiro dos coríntios, enquanto Paulo não. Paulo argumentou que
ele tinha aberto mão de seu direito a apoio financeiro para evitar ser um
fardo para os coríntios e como demonstração de seu amor por eles. Paulo
advertiu os coríntios de que os falsos apóstolos eram servos de Satanás
disfarçados como servos da justiça.

D. Os sofrimentos de Paulo (11.16-33)


Os oponentes de Paulo alegavam que tinham uma formação religiosa mais
esplêndida que a de Paulo. Também alegavam que a proteção que

1024
desfrutavam do sofrimento demonstrava que a bênção de Deus estava sobre
eles e, inversamente, que o sofrimento suportado por Paulo mostrava que
ele não desfrutava do favor divino. Paulo contrapôs que a sua formação
religiosa era na verdade mais impressionante do que a de seus oponentes.
Além disso, o seu sofrimento por Cristo e pela Igreja autenticava, e não
diminuía, o seu ministério apostólico.

E. Visões e revelações de Paulo (12.1-10)


Os oponentes de Paulo também afirmavam ter dons espirituais que Paulo
não tinha. Em particular, eles tinham visões e revelações que Paulo não
tinha. Paulo respondeu que ele tinha experiências espirituais que ele,
normalmente, não tornava públicas. Em certa ocasião, ele havia sido
arrebatado ao paraíso e ouviu uma revelação que ele não ousava nem
repetir. No entanto, Deus humilhou Paulo, dando-lhe um espinho na carne,
que o impedia de se exaltar. Esse “espinho” (cuja natureza é debatida)
enfraquecia Paulo e o forçava a viver na dependência do grande poder de
Deus.

F. Os milagres de Paulo (12.11-13)


Paulo também lembrou os coríntios de que eles tinham testemunhado
pessoalmente os seus sinais, prodígios e milagres durante sua estada em
Corinto. Esses eram “os sinais de um apóstolo” que confirmavam a
legitimidade do apostolado de Paulo.

G. A defesa final de Paulo (12.14 a 13.4)

1025
Paulo insistiu que nem ele nem os que estavam associados a ele haviam
tirado qualquer tipo de vantagem dos coríntios. Embora parecesse que ele
defendesse a si mesmo, sua real preocupação era edificar a igreja. Isso
exigia que ele confrontasse o pecado e o falso ensino que procurava
justificá-lo. Paulo advertiu os coríntios que a sua terceira visita a eles
poderia servir como uma terceira testemunha contra eles. Ele alertou os
coríntios que ele enfrentaria com firmeza os pecados deles, sem leniência
na demonstração do poder de Cristo.

VI. Exortações Finais (13.5-12)


Paulo exortou os coríntios a examinarem a si mesmos para determinar se
eles realmente possuíam a autêntica fé cristã. Paulo orava para que os
coríntios crescessem em direção à maturidade espiritual e ordenou que
buscassem a unidade cristã.

VII. Encerramento (13.13)


As palavras finais de Paulo em sua correspondência canônica com os
coríntios são uma bênção de encerramento, confiando esses fiéis à graça de
Cristo, o amor de Deus, e a comunhão do Espírito Santo (uma fórmula
trinitária). Isso expressa a esperança e confiança do apóstolo de que
somente o Deus trino era capaz de fazer uma obra espiritual nesta
congregação.

TEOLOGIA
Temas Teológicos

1026
A natureza do corpo ressurreto (1Coríntios)
A análise mais detalhada da ressurreição nas cartas de Paulo e em todo o
NT está em 1Coríntios 15. Paulo escreveu esse capítulo para combater uma
escatologia pervertida, influenciada em parte pelo dualismo platônico, que
era muito difundido na cultura greco-romana. Esse dualismo defendia que a
matéria era má por natureza e somente o espiritual era bom. Na morte, o
espírito do homem era libertado de sua prisão material para que pudesse se
tornar puro.
A negação pelos coríntios da ressurreição corporal, provavelmente,
também era influenciada por uma escatologia super-realizada, que ensina
que os fiéis experimentavam na conversão a única ressurreição que eles
deveriam esperar, uma ressurreição espiritual (compare com o ensino de
Himeneu e Fileto, 2Tm 2.16-19). Talvez baseados em confusas aplicações
dos ensinamentos de Jesus em Lucas 20.34-38, alguns dos coríntios
aparentemente acreditavam que esta ressurreição espiritual os tornava como
os anjos em praticamente todos os sentidos. Consequentemente, eles
tentavam viver uma existência assexuada (1Co 7.1-5), esforçavam-se por
abolir distinções entre os sexos (1Co 11.2-6), e aventuravam-se a falar em
56
línguas angelicais (1Co 13.1). Paulo percebeu que muito dessa confusa
teologia e muitas das práticas antibíblicas dos coríntios eram, em última
instância, relacionadas a sua negação da ressurreição corporal. Ele decidiu
defender a doutrina da ressurreição corporal detalhadamente.
Primeiro, Paulo argumentou que a ressurreição de Jesus havia sido
profetizada no Antigo Testamento e proclamada por testemunhas oculares
do ministério de Jesus. Negar a possibilidade da ressurreição corporal
implicava negar a ressurreição de Jesus e a rejeição da confiabilidade da

1027
profecia do AT e do testemunho apostólico. Essa negação reduzia os
apóstolos e as Escrituras a um status de falsas testemunhas.
Segundo, Paulo afirmou que a fé cristã era inútil sem a ressurreição de
Jesus. A participação na ressurreição de Jesus efetivamente põe fim à antiga
vida do pecador e dá início a uma vida nova e diferente. Consequentemente,
sem a ressurreição de Jesus, os fiéis “ainda estão em [vossos] pecados”.
Esses dois primeiros argumentos se combinam para lembrar a igreja
contemporânea que a ressurreição de Jesus é um elemento absolutamente
indispensável da fé cristã e que a ressurreição de Jesus deve permanecer
como um foco central do ministério apologético da Igreja.
Terceiro, Paulo argumentou que a ressurreição de Jesus foi o prelúdio,
as primícias, da ressurreição de todos os fiéis. Ele refutou a escatologia
super-realizada dos coríntios, alegando que a ressurreição do povo de Cristo
ocorre “depois […] na sua vinda” (1Co 15.23). Ele também demonstrou que
as práticas dos coríntios, como o batismo substitutivo pelos mortos (não
importa quão equivocado), e sua própria disposição de enfrentar o martírio
implicavam a veracidade da doutrina da ressurreição corporal.57
Após defender a doutrina da ressurreição corporal, Paulo dedicou a
segunda metade de sua argumentação a uma abordagem da natureza do
corpo ressurreto. Seu ponto principal era que o corpo ressuscitado teria, em
alguma maneira, continuidade com o corpo que está enterrado, mas seria
dramaticamente diferente em outras. A continuidade e a mudança são
expressas na ilustração da semente que Paulo apresenta. Uma semente
morre quando é enterrada no solo. Essa semente enterrada, então, produz
uma planta viva que tem pouca semelhança com a própria semente, pois a
planta é maior e mais gloriosa do que a semente. De modo semelhante, o

1028
corpo futuro produzido pela ressurreição terá pouca semelhança com o
corpo que foi enterrado, pois supera o presente corpo em grandeza e glória.

QUADRO 12.1: A NATUREZA DO CORPO


RESSUSCITADO (1CORÍNTIOS 15)
Muita confusão existe hoje sobre o que Paulo quer dizer com “corpo
natural” e “corpo espiritual”. Alguns intérpretes assumem que um
corpo espiritual é um corpo composto de espírito, isto é, um corpo
imaterial.1 No entanto, os adjetivos “natural” (psychikos) e “espiritual”
(pneumatikos) são utilizados com frequência nos escritos de Paulo e,
particularmente, em 1Coríntios. Em outros contextos, fica claro que
eles não se referem a pessoas ou objetos feitos de matéria ou espírito.2
Em 1Coríntios 2.14,15, por exemplo, os termos se referem,
respectivamente, a pessoas influenciadas pelos impulsos humanos
versus pessoas sob o controle do Espírito.
É provável, portanto, que o uso de Paulo em 1Coríntios 15.44
esteja relacionado com esse uso anterior. Além disso, se Paulo
quisesse dizer que o corpo ressuscitado era feito ou composto de
espírito, ele provavelmente teria usado outro adjetivo (pneumatinos).
À luz dessa evidência, Paulo descreveu o corpo ressuscitado como um
“corpo espiritual” porque é um corpo completamente controlado pelo
Espírito Santo. O corpo ressuscitado não mais experimentará a batalha
que está sendo travada neste momento entre a carne e o Espírito
descrita em textos como Gálatas 5.16-18. Em vez disso, o corpo
ressuscitado será perfeitamente adequado para domínio e controle pelo

1029
Espírito e com alegria satisfará a vontade do Espírito. Por meio da
ressurreição, a restauração da imagem de Deus no fiel será completa.

1
Veja as opções de tradução sugeridas para este texto por Johannes P. Louw e Eugene A.

Nida (Greek-english lexicon of the New Testament based on semantic domains [New York:

UBS, 1988], 1:694), que interpretam o adjetivo pneumatikos aqui como significando “não

físico” ou “não tendo carne e ossos” (subdomínio 79.3). Thiselton (1Corinthians, p. 1.277)

referiu-se ao ponto de vista como impressionante e surpreendente, “uma vez que todas as

evidências teológicas, exegéticas lexicográficas estão contra ele”.


2
Veja Michael Licona, “Paul on the nature of the resurrection body”, in: C. L. Quarles,

org., Buried hope or risen savior: the search for the Jesus tomb (Nashville: B&H, 2008), p.

177-98.

Ao mesmo tempo, no entanto, o versículo 38 enfatiza a continuidade


entre o corpo enterrado e o corpo ressuscitado. Paulo salientou que a planta
que brota é do mesmo tipo da semente que foi plantada, ou seja, um grão de
trigo produz trigo, não tomate. Da mesma forma, o corpo que é ressuscitado
corresponde ao corpo que foi enterrado.58 Como Paulo disse anteriormente,
essa continuidade entre o corpo enterrado e o corpo ressuscitado é
suficiente para dar importância eterna às obras executadas pelo corpo
terreno no aqui e agora (1Co 6.13).
Paulo, então, voltou-se para a questão de como um corpo terrestre pode
ser preparado para uma existência celeste. Ele explicou que diferentes
corpos terrenos são compostos por diferentes tipos de carne, e o ponto
parece ser que o corpo ressurreto pode ser composto da carne que é
particularmente adequada para a existência celeste. Paulo também afirmou
que diferentes corpos celestiais possuem diferentes tipos de glória,

1030
significando que o corpo ressuscitado também pode mostrar a sua própria e
exclusiva glória celestial.
Paulo, então, dá início a um detalhado contraste entre o corpo terreno e
o corpo ressuscitado. O corpo terreno é caracterizado por corrupção,
vergonha e fraqueza. Mais importante ainda, ele é um corpo natural. O
corpo ressurreto é incorruptível, glorioso, poderoso e espiritual.
A confusão sobre a doutrina da ressurreição impactou a ética dos
coríntios assim como fizera a sua escatologia. Sua justificativa para os atos
do corpo era expressa no lema “os alimentos são para o estômago, e o
estômago, para os alimentos. Deus, porém, destruirá tanto um quanto o
outro”.59 Uma vez que Deus, de qualquer maneira, iria destruir o estômago,
não importava o que ou quanto uma pessoa comia. Além disso, os coríntios
provavelmente também ampliavam seu raciocínio para a função dos órgãos
sexuais. Uma vez que Deus iria destruir o corpo, ele não se importava em
que a atividade sexual o fiel se envolvia, nem com quem. Assim, os
coríntios argumentavam que, para ser considerado pecado, um ato tinha que
ser praticado “contra seu próprio corpo” (1Co 6.18).60 Se o corpo material
não era ressuscitado, Deus não deve se preocupar com esse o corpo ou com
o que se fez com ele. Assim, os fiéis eram livres para participar de atos
sexuais com prostitutas sem medo de pecar. Paulo desmontou esse
argumento dos coríntios sustentando que “Deus não somente ressuscitou o
Senhor, mas também nos ressuscitará pelo seu poder” (1Co 6.14). Segundo
Paulo, a ressurreição demonstrou que o corpo tem significado permanente
para Deus, de modo que Deus se preocupava tanto com o corpo quanto com
o que se fazia com ele.61
Os argumentos de Paulo demonstram que uma correta doutrina bíblica
da ressurreição é uma questão decisiva. A visão dos coríntios sobre a

1031
ressurreição e seu impacto em outras áreas da vida da igreja proporciona
um interessante estudo de caso que demonstra a relevância da doutrina para
a igreja contemporânea. A teologia não existe num vácuo; não é um estudo
impraticável que não tem impacto significativo na vida cotidiana dos fiéis.
Uma relação intrínseca existe entre as doutrinas e as ações de uma pessoa,
entre suas crenças e seu comportamento.
Uma resposta adequada a um comportamento não cristão na igreja
inclui não só repreensão moral e desafio ético, mas também a instrução na
doutrina correta.

A nova aliança versus a antiga (2Coríntios)


Segunda Coríntios 3 contém o estudo mais explícito sobre a nova aliança
nas cartas de Paulo. O termo “aliança” aparece nove vezes nas cartas de
62
Paulo, mas as referências explícitas à “nova aliança” e à “antiga aliança”
só aparecem nas cartas aos coríntios. Alguns estudiosos argumentaram que
a escassez de referências à nova aliança nos escritos de Paulo implica que a
aliança não era um tema dominante na sua teologia. No entanto, mesmo
quando referências explícitas à nova aliança estão ausentes nas cartas de
Paulo, a teologia da nova aliança é dominante e fornece a base para muitas
das discussões de Paulo sobre a salvação, a lei, a nova criação, e o papel do
Espírito na vida do fiel.
A referência à declaração de Jesus sobre a nova aliança durante a
Última Ceia em 1Coríntios 11.25 sugere que a teologia de Paulo da nova
aliança deve ser traçada pelo menos em parte a sua dependência dos
ensinamentos de Jesus. Embora leitores ocasionais das declarações
eucarísticas de Jesus possam supor que a referência ao sangue de Jesus

1032
implique que a nova aliança consiste principalmente ou até mesmo
exclusivamente da expiação do pecado, um exame atento dos ensinamentos
63
bíblicos sobre a nova aliança sugere o contrário. Jesus descreveu o cálice
como imagem da nova aliança em seu sangue derramado em favor dos
crentes (Mt 26.28; Mc 14.24; Lc 22.20).

QUADRO 12.2: O CONTEXTO DO ANTIGO


TESTAMENTO PARA O ENSINO DE
PAULO SOBRE A NOVA ALIANÇA
Já em Gênesis 15, um sacrifício de sangue funcionou para selar e
garantir uma aliança. Quando Deus fez sua aliança com Abraão, ele
ordenou que Abraão abatesse uma novilha, uma cabra e um carneiro e
os cortasse em dois. Esse sacrifício selou a aliança.1 Esse contexto
sugere que, quando Jesus falou da nova aliança no seu sangue ou no
sangue da aliança, ele quis dizer que sua morte seria o sacrifício que
estabeleceria e selaria uma nova aliança entre Deus e seu povo. O
derramamento do sangue de Jesus no início da nova aliança
corresponde ao sangue que foi aspergido sobre o povo na concessão da
antiga aliança, em Êxodo 24.8.2
A nova aliança foi prometida por Deus por meio dos profetas do
AT (Jr 31.31-34; Ez 36.24-30). A antiga aliança era ineficaz porque
impunha exigências sobre o povo de Deus, mas não efetuava a
transformação necessária para que o povo pudesse cumprir essas
exigências. Nessa nova aliança, Deus iria transformar os corações e os
desejos de seu povo para que eles de forma natural e espontânea
cumprissem as justas exigências da lei. A citação de Paulo: “não em

1033
tábuas de pedra, mas em tábuas de corações de carne” (2Co 3.3), faz
alusão à lei de Moisés (Êx 32.15,16; 34.1-28) e à nova aliança (Jr
31.33), respectivamente.
A descrição de Paulo da nova aliança como sendo “não da letra,
mas do Espírito” faz alusão à promessa do Espírito do AT (Ez 36.26).
O Espírito habitando no coração obrigava os fiéis desde seu interior a
cumprirem as justas exigências da lei. As alusões de Paulo às
promessas da nova aliança do Antigo Testamento sugerem que a
descrição que faz de seu ministério apostólico como “o ministério da
justiça” se refere principalmente — não à justiça imputada em que o
fiel é justificado perante Deus por meio da morte expiatória de Jesus
— mas à justiça atual do fiel produzida pela obra transformadora do
Espírito.

1
Na verdade, em hebraico as palavras “fazer uma aliança” literalmente significa “cortar

uma aliança” porque o estabelecimento de uma aliança exigia o abatimento ou o “corte” de

um animal sacrificial.
2
Veja as observações perspicazes em F. Thielman, Paul and the law (Downers Grove:

InterVarsity, 1994), p. 105-6.

A descrição de Paulo do impacto da nova aliança no fiel atinge o clímax


com a declaração: “mas todos nós, com o rosto descoberto, refletindo como
um espelho a glória do Senhor, somos transformados de glória em glória na
mesma imagem; isso vem do Senhor, que é o Espírito” (2Co 3.18). Assim,
o resultado da nova aliança não é meramente absolvição diante de Deus no
seu juízo escatológico, mas é também uma transformação radical que
restaura a imagem de Deus nos fiéis e que dá a eles uma medida cada vez

1034
maior da glória do próprio Deus, concedendo-lhes o caráter justo de Deus
(cf. Rm 8.1-4).
Paulo contrastou a antiga e a nova aliança para realçar a supremacia da
nova. A antiga aliança resultou em morte e condenação porque os
pecadores eram incapazes de cumprir suas exigências e eram, portanto,
destinados a serem declarados culpados por Deus e punidos; a nova aliança
resultava em vida e justiça. Essa vida produzida pelo Espírito é,
provavelmente, a vida da ressurreição. A declaração: “O Espírito produz
vida”, provavelmente é uma alusão a Ezequiel 37.13. Finalmente, Paulo
mencionou que embora a antiga aliança estivesse sendo abolida, a nova
aliança permaneceria para sempre. Embora a antiga aliança fosse
temporária, a nova aliança era eterna. Assim, a glória da nova aliança
ofuscava de tal forma a glória da antiga aliança a ponto de obscurecê-la
totalmente.
Paulo ilustrou o fato de que a antiga aliança resultou em morte e
condenação lembrando seus leitores que, após Moisés receber a antiga
aliança, ele teve de cobrir seu rosto para impedir que os israelitas fossem
destruídos pelo mero reflexo da glória divina (Êx 34.29-35), embora aquela
glória, como a aliança que ela representava, já estivesse no processo de ser
abolida.64 Se os israelitas temiam o mero reflexo da glória divina, o quanto
mais deviam temer a própria glória divina. Paulo acrescentou que, embora a
glória da face de Moisés fosse tão intensa que os pecadores não podiam
olhar para ela, essa glória, no entanto, era uma glória em desvanecimento.
A antiga aliança foi anulada por Deus, porque resultava em condenação
e morte em vez de em justiça e vida. Ela não só fracassou em tornar o povo
de Deus participante da glória divina, ela o deixou incapaz até mesmo de
encarar a glória divina. Moisés cobriu o rosto porque ele não queria que os

1035
filhos de Israel vissem seu rosto quando Deus, finalmente, aboliu a antiga
aliança, um evento que seria sinalizado pelo lampejo fraco e final do reflexo
da glória divina pela desvanecente face de Moisés, em fim.65
O véu que escondia a abolição da antiga aliança ainda estava sobre os
olhos de muitos dos judeus contemporâneos de Paulo, quando eles liam os
livros de Moisés. Cristo, porém, removeu o véu. Quando um pecador se
convertia ao Senhor e ficava sob o poder da nova aliança, o véu que
mascarava o desaparecimento da antiga aliança era destruído. Então o fiel
tinha o privilégio de ver e refletir a glória do Senhor. Ao contrário de
Moisés o fiel não refletia uma glória que estivesse sempre diminuindo. Ele
refletia um grau de glória que aumentava cada vez mais à medida que ele
era transformado na imagem de Deus.

A relação das ordenanças cristãs com a Salvação


Os diferentes pontos de vista sobre o significado e o propósito do batismo
cristão e da Ceia do Senhor constituem uma das principais divergências
entre os vários grupos cristãos. Muitos teólogos das igrejas católica romana
e ortodoxa oriental insistem que o batismo e a Ceia pertencem a um grupo
de rituais chamados “sacramentos” que, de alguma forma, transmitem
salvação.66
Muitos evangélicos, por outro lado, insistem que o batismo é um
símbolo da união do fiel com Cristo e sua participação pela fé na morte,
sepultamento e ressurreição de Jesus (Rm 6.3,4). O batismo ilustra, mas não
produz, a purificação dos pecados; e o perdão dos pecados depende apenas
da fé pessoal verdadeira no Cristo crucificado, ressuscitado e ascendido.67

1036
O ensino do apóstolo Paulo em 1Coríntios 10.1-12 constitui uma das
mais claras justificativas bíblicas da ideia de que o batismo e a Ceia do
Senhor são rituais simbólicos ordenados por Cristo e não sacramentos que
realmente concedem salvação. Tanto 1Coríntios 9.24-27 quanto 10.12
sugerem que os coríntios tinham uma ideia errada de segurança eterna que,
eles presumiam, lhes concedia a liberdade de persistir em uma vida
pecaminosa sem temer a retribuição divina. Uma vez que não havia nada
que eles pudessem fazer para perder a salvação, acreditavam que nada
tinham a perder vivendo uma vida de pecados hediondos.
Os coríntios ostentavam sua licenciosidade com o lema libertário que
Paulo citou, em seguida, corrigiu e qualificou: “todas as coisas me são
permitidas” (1Co 6.12; 10.23). Eles tinham relações com prostitutas,
praticavam incesto, participavam da adoração de ídolos e transformaram a
Ceia do Senhor em uma orgia pagã, aparentemente justificando seu
comportamento com a alegação: “Uma vez salvo, salvo para sempre!” ou
“Nós podemos viver da maneira que quisermos!”. O fato de que Paulo
inseriu uma discussão sobre o batismo e a ceia do Senhor em seu desafio à
visão distorcida que os coríntios tinham da segurança eterna sugere que a
presunção dos coríntios de salvação estava fundamentada no
sacramentalismo.68
Essa suspeita parece ser confirmada pelo “batismo em favor dos
mortos”, mencionado em 1Coríntios 15.29.69 Embora a referência seja
obscura e os estudiosos ainda debatam as motivações para esse batismo
vicário em favor dos mortos, a explicação mais plausível é que os coríntios
viam o batismo como um sacramento salvífico.70 Consequentemente,
quando fiéis morriam antes de terem tido a oportunidade de serem
batizados, a igreja considerava necessário que outro recebesse o batismo em

1037
nome do fiel falecido.71 Ao apelar para a história do AT, Paulo mostrou que
uma vida de pecados hediondos era incompatível com o cristianismo
genuíno e que a participação em meros rituais externos não protegeria uma
pessoa do julgamento de Deus.72
Em 1Coríntios 10.1-5, Paulo comparou os acontecimentos do êxodo dos
israelitas do Egito com as ordenanças da fé cristã. Ele argumentou que os
israelitas foram batizados em Moisés, na nuvem e no mar. Quando os
israelitas atravessaram o Mar Vermelho, eles ficaram completamente
cercados por água. A água estava acima deles em forma de nuvem. As
águas divididas do mar Vermelho os rodeavam de ambos os lados, à direita
e à esquerda. Estes devotos de Moisés foram, em certo sentido, “imersos”
quando Deus começou a sua libertação, assim como os discípulos de Cristo
são imersos imediatamente após sua conversão.
Paulo se referiu aos israelitas compartilhando do maná, em Êxodo 16,
como comendo “alimento espiritual”. Da mesma forma, ele se referiu ao
seu usufruto da milagrosa provisão de água, em Êxodo 17, como “bebida
espiritual”. Chamando o maná e a água de “alimento espiritual” e “bebida
espiritual”, Paulo estava propositalmente comparando-os ao pão e o vinho
da ceia do Senhor. O fato de Paulo ter designado o próprio Cristo como a
fonte da água milagrosa pode implicar que beber dessa água era uma forma
de “comunhão” com Cristo, de modo que a água e o maná correspondem
ainda mais estreitamente à Ceia compartilhada pelos cristãos.
Embora uma reflexão cuidadosa possa indicar alguns outros paralelos
entre esses eventos do AT e as ordenanças do NT, Paulo não recorreu às
imagens do AT para ensinar o que as ordenanças significam, mas sim para
demonstrar o que elas não significam. Paulo estava simplesmente
demonstrando que o povo de Deus do AT participou em uma “imersão”,

1038
que era mais ou menos análoga ao batismo cristão e uma refeição espiritual
que vagamente correspondia à Ceia do Senhor, a fim de apresentar uma
resposta bíblica para ao sacramentalismo.73
Apesar do fato de que “todos” foram batizados e “todos” participaram
da “mesma” refeição espiritual, Deus não ficou satisfeito com a maioria
deles, e seus corpos foram espalhados pelo deserto. Dentre os milhares que
foram batizados em Moisés e comeram da refeição espiritual, apenas dois,
Josué e Calebe, de fato entraram na terra prometida. Participação no
“batismo” e na “refeição espiritual” não garantiram a salvação de todos os
israelitas. Por analogia, nem o cumprimento das ordenanças do NT pelos
coríntios garante a salvação deles. Parece que isso era contrário ao que os
coríntios acreditavam.74
Paulo condenou energicamente a noção mágica das ordenanças em
Corinto. Ele insistiu que batismo e comunhão não garantem a salvação.
Apelando a conhecidas narrativas do AT, ele demonstrou que todos os
hebreus foram batizados e participaram da comunhão, mas Deus destruiu
mais do que salvou. Depois de estabelecer a premissa básica de que batismo
e uma refeição espiritual não garantiam a salvação, Paulo alertou que os
coríntios tinham muito mais em comum com os hebreus do que apenas
batismo e comunhão. Eles estavam reencenando os mesmos pecados que
levaram à destruição dos israelitas no deserto.75
Embora algumas questões interpretativas permaneçam, o ponto
principal da passagem fica bem claro: o batismo e a ceia do Senhor não
garantem a salvação ou autorizam os fiéis a viverem de uma forma
pecaminosa, por isso ninguém deve presumir que as ordenanças os
protegerão da ira divina.76 Se alguém segue o princípio básico da
hermenêutica de interpretar textos mais obscuros à luz dos mais claros,

1039
1Coríntios 10 serve como um guia para interpretar textos mais difíceis
relacionadas ao batismo e à Ceia do Senhor e impede interpretações
sacramentais de textos tais como Romanos 6.1-4 ou Atos 2.38.

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON


Lidar com a divisão e com a imaturidade espiritual na igreja (1Co 1 a
4)
Disciplina na igreja (1Co 5; 2Co 2.5-11)
As respectivas vantagens do celibato e do casamento (1Co 7)
Princípios para a oferta no NT (1Co 9; 16.1-4; 2Co 9)
Dons espirituais e a supremacia do amor (1Co 12 a 14)
A ressurreição de Cristo e dos fiéis e a natureza da ressurreição do
corpo (1Co 15)
A graça redentora do sofrimento e a revelação do poder de Deus na
fraqueza humana (2Co 1.3-11; 4.7-18; 12.1-10)
A defesa de Paulo de seu ministério apostólico (2Co, esp. caps. 10 a
13)

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Por que as cartas aos Coríntios são especialmente úteis para a igreja
moderna?
2. Por que a autoria das cartas aos coríntios não é seriamente contestada
pelo mundo acadêmico atual?
3. Quantas cartas Paulo escreveu à igreja de Corinto? Como elas são
designadas neste capítulo? Como as cartas coincidem com as visitas de

1040
Paulo. Liste, em ordem cronológica, as cartas juntamente com as
visitas.
4. De onde Paulo recebeu informações sobre a condição da igreja?
5. Quais são as três principais teorias em relação aos oponentes de Paulo
em 2Coríntios?
6. Qual é o propósito duplo de 1Coríntios, e qual é o principal propósito
de 2Coríntios?
7. Qual é o esboço literário básico de 1Coríntios?
8. Por que é tão difícil entender o plano literário de 2Coríntios?
9. Qual será a natureza do corpo ressuscitado dos fiéis?
10. Qual é a relação entre a nova e a antiga aliança em 2Coríntios?
11. Qual é a relação entre as ordenanças cristãs (batismo e ceia do Senhor)
e a salvação?
12. Quais são as principais contribuições das cartas aos coríntios para o
cânon?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS

1Coríntios
BARRETT, C. K. A commentary on the First Epistle to the Corinthians.
Em: Harper New Testament Commentary (New York: Harper,
1968).
BLOMBERG, C. 1 Corinthians. Em: NIV Application Commentary
(Grand Rapids: Zondervan, 1994).
CLARKE, A. D. Secular and christian leadership in Corinth: a socio-
historical and exegetical study of 1 Corinthians 1 to 6. Arbeiten

1041
zur Geschichte des antiken Judentums und des Urchristentums 18
(Leiden: Brill, 1993).
FEE, G. D. The First Epistle to the Corinthians. Em: New International
Commentary on the New Testament (Grand Rapids: Eerdmans,
1987).
GARLAND, D. E. 1 Corinthians. Em: Baker Exegetical Commentary on
the New Testament (Grand Rapids: Baker, 2003).
HAYS, R. B. 1 Corinthians. Em: Interpretation (Louisville: Westminster
John Knox, 1997).
LITFIN, D. St Paul’s theology of proclamation: 1 Co 1 to 4 and greco-
roman rhetoric. Society for New Testament Studies Monograph
Series 79 (Cambridge: Cambridge University Press, 1994).
MIHAILA, C. The Paul-Apollos relationship and Paul’s stance toward
greco-roman rhetoric: an exegetical and socio-historical study of 1
Corinthians 1 to 4. Library of New Testament Studies 402
(Edinburgh: T&T Clark, 2009).
MORRIS, L. The First Epistle of Paul to the Corinthians: an
introduction and commentary. 2. ed. Em: Tyndale New Testament
Commentary (Grand Rapids: Eerdmans, 1985).
THISELTON, A. C. The First Epistle to the Corinthians: a commentary
on the greek text. Em: New International Greek Testament
Commentary (Grand Rapids: Eerdmans, 2000).
WINTER, B. W. Philo and Paul among the sophists. Society for New
Testament Studies Monograph Series 96 (Cambridge: Cambridge
University Press, 1997).

2 Coríntios

1042
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International Commentary on the New Testament (Grand Rapids:
Eerdmans, 1997).
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(Downers Grove: InterVarsity, 1996).
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Corinthians 10 to 13 (Grand Rapids: Baker, 1984).
FURNISH, V. P. II Corinthians. Em: Anchor Bible (Garden City:
Doubleday, 1984).
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(Nashville: B&H, 1999).
HAFEMANN, S. J. 2 Corinthians. Em: NIV Application Commentary
(Grand Rapids: Zondervan, 2000).
HARRIS, M. J. The expositor’s Bible commentary. Ed. rev. (Grand
Rapids: Zondervan, 2008), vol. 11: Romans-Galatians, p. 415-545.
______. The Second Epistle to the Corinthians. Em: New International
Greek Testament Commentary (Grand Rapids: Eerdmans, 2005).
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International Commentary on the New Testament (Grand Rapids:
Eerdmans, 1962).
KRUSE, C. 2 Corinthians. Em: Tyndale New Testament Commentary
(Grand Rapids: Eerdmans, 1987).
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Word, 1986).
TASKER, R. V. G. The Second Epistle of Paul to the Corinthians: an
introduction and commentary. Em: Tyndale New Testament
Commentary (Grand Rapids: Eerdmans, 1958).

1043
WITHERINGTON III, B.. Conflict and community in Corinth: a socio-
rhetorical commentary on 1 and 2 Corinthians (Grand Rapids:
Eerdmans, 1995).

1
Veja R. V. G. Tasker, The second epistle to the Corinthians: introduction and commentary,

TNTC (Grand Rapids: Eerdmans, 1958), p. 9.

2
Ibid., p. 12-3.

3
C. K. Barrett, A commentary on the second epistle to the Corinthians, HNTC (New York:

Harper & Row, 1973), p. vii.

4
Veja L. Morris, The first epistle of Paul to the Corinthians, TNTC (Grand Rapids: Eerdmans,

1960), p. 9; P. Hughes, Paul’s second epistle to the Corinthians, NICNT (Grand Rapids: Eerdmans,

1962), p. xi.

5
Por exemplo, G. D. Fee, The first epistle to the Corinthians, NICNT (Grand Rapids: Eerdmans,

1987); D. E. Garland, 1Corinthians, BECNT (Grand Rapids: Baker, 2003); e C. K. Barrett, The first

epistle to the Corinthians, HNTC (Peabody: Hendrickson, 1968), p. 11.

6
Clemente 47.1-3 alude à discussão de facções em 1Coríntios 1.10-17 e no cap. 3; 1Clemente 49

contém um hino sobre o amor baseado em 1Coríntios 13.

7
Aos Efésios 16.1; 18.1; Aos Romanos 4.3; 5.1; 9.2; e Aos Filadelfens 3.3.

8
J. Weiss, Der erste Korintherbrief, KEK (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1910), p. 4.

9
Uma das discussões mais detalhadas aparece em Fee (1Corinthians, p. 699-708), que contestou

a autenticidade do texto principalmente no fato de que (1) alguns manuscritos antigos colocam os

1044
versículos no final do capítulo, o que sugere a Fee que o texto originalmente era uma nota marginal

incorporada mais tarde ao texto; (2) o texto não parece se adequar ao tópico de que Paulo fala no

momento; e (3) o texto parece contradizer a declaração de Paulo, em 1Coríntios 11.2-16, de que a

mulher pode orar e profetizar. Para uma convincente resposta a Fee que dá apoio a autenticidade do

texto, veja Garland, 1Corinthians, p. 664-77, esp. p. 675-77.

10
Veja esp. J. C. Hurd (The origin of 1Corinthians, 2. ed. [Macon: Mercer University Press,

1983]), que apresentou algumas das principais propostas e argumentos convincentes para a

integridade das cartas. Outras defesas importantes da integridade da carta incluem H. Merklein, “Die

Einheitlichkeit des ersten Korintherbriefes”, ZNW 75 (1984), p. 153-83; e M. M. Mitchell, Paul and

the rhetoric of reconciliation: an exegetical investigation of the language and composition of

1Corinthians (Louisville: Westminster John Knox, 1992).

11
Barrett, 1Corinthians, p. 11; M. C. de Boer, “The composition of 1Corinthians”, NTS 40

(1994), p. 229-45.

12
Veja Inácio, Aos Efésios 15.3 (2Co 6.16); Aos Tralianos 9.2 (2Co 4.14); Aos Filadelfenos 6.3

(2Co 1.12; 2.5; 11.9,10; 12.16); A Barnabé 4.11-13 (2Co 5.10); 6.11,12 (2Co 5.17).

13
V. P. Furnish, II Corinthians, AB (Garden City: Doubleday, 1984), p. 29-30.

14
Policarpo (Fp 4.1) pode ter citado 2Coríntios 6.7 (“armas da justiça”) e Filipenses 2.2, e ele

provavelmente fez alusão a 2Coríntios 4.14. M. J. Harris (Second epistle to the Corinthians, NIGTC

[Grand Rapids: Eerdmans, 2005], p. 3) vê “três ou quatro alusões claras” a 2Coríntios na carta de

Policarpo.

15
Veja a análise em M. W. Holmes, The apostolic fathers: Greek texts and English translations,

3. ed. (Grand Rapids: Baker, 2007), p. 170 e 276.

16
H. Koester, Introduction to the New Testament (Philadelphia: Fortress, 1982), vol. 2: History

and literature of early Christianity, p. 306.

1045
17
A. Plummer, A critical and exegetical commentary on the second epistle of St. Paul to the

Corinthians, ICC (Edinburgh: T&T Clark, 1915), xxvii-xxxvi; R. Bultmann, The second letter to the

Corinthians (Minneapolis: Augsburg, 1985), p. 18.

18
Esta teoria foi primeiramente proposta por J. S. Semler, em 1776.

19
F. F. Bruce, 1 and 2 Corinthians (London: Oliphants, 1971), p. 166-70; Furnish, II Corinthians,

p. 30-41; R. P. Martin, 2Corinthians, WBC 40 (Waco: Word, 1986), p. xl; C. G. Kruse, The second

epistle of Paul to the Corinthians, TNTC (Grand Rapids: Eerdmans, 1987), p. 29-35.

20
L. L. Belleville, 2Corinthians (Downers Grove: InterVarsity, 1996), p. 32.

21
A construção peri men gar em 2Coríntios 9.1 não deve ser confundida com peri de, que Paulo

usou frequentemente como uma fórmula introdutória em 1Coríntios (7.1,25,37; 8.1; 12.1; 16.1,12).

22
S. K. Stowers, “Peri men gar and the integrity of 2Cor. 8 and 9”, NovT 32 (1990), p. 340-8.

23
Veja Martin, 2 Corinthians, p. xliv.

24
Martin (2 Corinthians, p. xliv) listou Stephenson, Bates, Bruce, Guthrie, Tasker, Hughes e

Kümmel.

25
Veja Martin, 2 Corinthians, p. xliii.

26
Para pontos de vista semelhantes sobre a data de 1Coríntios, veja Barrett, First epistle to the

Corinthians, p. 5; Fee, First epistle to the Corinthians, p. 4-5; R. F. Collins, First Corinthians,

SacPag 7 (Collegeville: Glazier/Liturgical Press, 1999), p. 24; e B. Witherington, Conflict and

community in Corinth: a socio-rhetorical commentary on 1 and 2 Corinthians (Grand Rapids:

Eerdmans, 1995), p. 73.

27
Muitos comentaristas datam 2Coríntios de 1 ano depois, no ano 56; veja a análise em Harris,

Second epistle to the Corinthians, p. 67. Aqueles que aceitam essa data mais tardia, normalmente

assumem uma data mais tardia para 1Coríntios do que achamos possível. Essa data mais tardia para

1046
2Coríntios também conflita com a evidência numismática de que Félix sucedeu a Festo no ano 56. A

data posterior parece deixar tempo suficiente para a viagem de Paulo a Jerusalém, sua prisão e

também seu encarceramento em Cesareia.

28
W. J. Larkin Jr., Acts, IVPNTC 5 (Downers Grove: InterVarsity, 1995), p. 262. Alguns

estudiosos estimam que a população era bem maior. Veja W. McRay, Archaeology and the New

Testament (Grand Rapids: Baker, 1991), p. 312.

29
D. Bock, Acts, BECNT (Grand Rapids: Baker, 2007), p. 577.

30
A estrada foi escavada no final dos anos 50 por N. M. Verdelis, do Serviço Arqueológico

Grego (Greek Archaeological Service); veja McRay, Archaeology and the New Testament, p. 312.

31
Thucydides, History of the Peloponnesian War 8.7-8 [edição em português: História da guerra

do Peloponeso (Brasília: Ed. UnB, c1987)]; Polybius, Histories 5.101.4 [edição em português:

História (Brasília: Editora UnB, 1996)].

32
Strabo, Geography 8.4; Plutarco, Quaestiones conviviales 5.3.1-3; 8.4.1; Pausânias, Descrip-

tion of Greece 2.2.

33
Strabo, Geography 8.6.2.

34
J. Murphy-O’Connor, St Paul’s Corinth: texts and archaeology (Wilmington, DE: Glazier,

1983), p. 56.

35
Strabo, Geography 8.6.20.

36
McRay, Archaeology and the New Testament, p. 315-7.

37
C. E. Fant; M. G. Reddish, A guide to biblical sites in Greece and Turkey (Oxford: University

Press, 2003), p. 54.

38
McRay, Archaeology and the New Testament, p. 322-4.

1047
39
Veja D. Garland, 1 Corinthians, BECNT (Grand Rapids: Baker, 2003), p. 9.

40
McRay, Archaeology and the New Testament, p. 331-3.

41
Para um excelente sumário da história de Corinto e seu contexto religioso e cultural, veja

Garland, 1 Corinthians, p. 1-14. Para uma descrição quase exaustiva de Corinto, veja Murphy-

O’Connor, St Paul’s Corinth: texts and archaeology.

42
D. A. Carson; D. J. Moo, An introduction to the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids:

Zondervan, 2005), p. 420 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução ao Novo

Testamento]. Alguns acadêmicos usam um esquema diferente, emprestado das descrições do próprio

Paulo. Carta 1 é a “carta anterior”; Carta 2 é 1Coríntios; Carta 3 é a “carta dolorosa”; e a Carta 4 é

2Coríntios. Veja D. Guthrie, New Testament introduction, ed. rev. (Downers Grove: InterVarsity,

1990), p. 437.

43
Veja 1Clemente, também conhecida como a “Carta dos romanos aos coríntios”. O texto grego,

com uma tradução inglesa atualizada e uma conveniente introdução está disponível em M. W.

Holmes, The apostolic fathers: greek texts and english translations, 3. ed. (Grand Rapids: Baker,

2007), p. 44-131.

44
C. Machalet listou 11 teorias diferentes sobre a identificação dos oponentes de Paulo em

2Coríntios que os estudiosos propuseram em várias obras entre 1908 e 1940 (“Paulus und seine

Gegner. Eine Untersuchung zu den Korintherbriefen”, in: W. Dietrich et al, orgs., Theokratia.

Jahrbuch des Institutum Judaicum Delitzschianum, II. Festgabe für Karl Heinrich Rengstorf zum 70.

Geburtstag [Leiden: E. J. Brill, 1973], p. 183-203).

45
Veja o sumário de várias teorias sobre a identificação dos oponentes de Paulo em S. J.

Hafemann, “Corinthians, letters to the”, Dictionary of Paul and his letters, p. 164-79, esp. p. 177-8.

46
Furnish, II Corinthians, p. 52-3.

47
Belleville, 2 Corinthians, p. 274.

1048
48
Hafemann, “Corinthians”, p. 178. Compare S. J. Hafemann, Suffering and ministry in the

Spirit: Paul’s defense of his ministry in II Corinthians (Grand Rapids: Eerdmans, 1990). Uma

descrição breve, prudente e útil dos oponentes aparece em Furnish, II Corinthians, p. 48-54.

49
Veja D. A. Carson; D. J. Moo; L. Morris, An introduction to the New Testament (Grand Rapids:

Zondervan, 1992), p. 271-2; T. D. Lea, The New Testament: its background and message (Nashville:

B&H, 1996), p. 426-7; Guthrie, New Testament introduction, p. 456-7 (influenciado por W. Ramsey);

e Harris, Second epistle to the Corinthians, p. 50-1. Bruce (1 and 2 Corinthians, p. 170) até mesmo

sugeriu que os capítulos 10-13 eram uma carta separada que foi despachada pouco depois dos

capítulos 1 a 9. Alternativamente, R. Gundry, A survey of the New Testament, 3. ed. (Grand Rapids:

Zondervan, 1994), p. 371 [publicado em português por Vida Nova sob o título Panorama do Novo

Testamento], propôs que os capítulos 1 a 9 foram endereçados à maioria arrependida e os capítulos 10

a 13 a uma minoria reacionária, mas poucos acadêmicos adotaram seu ponto de vista.

50
Belleville, 2 Corinthians, p. 33.

51
Harris (Second epistle to the Corinthians, p. 110), que também apresentou um breve sumário

das análises de B. Witherington, G. A. Kennedy, H. D. Betz, B. K. Peterson e H. G. Sundermann (p.

105-10).

52
Por exemplo, H. Segalla (“Struttura letteraria e unità della 2 Corinzi”, Teologia 13 [1988], p.

189-218) via 2Coríntios 8 e 9 como o centro e o clímax da carta.

53
Romanos 1.7; 2Coríntios 1.2; Gálatas 1.3; Efésios 1.2; Filipenses 1.2; Colossenses 1.2;

1Tessalonicenses 1.1; 2Tessalonicenses 1.2; Tito 1.4; Filemom 1.3.

54
Para uma defesa da historicidade dessa passagem, veja K. R. MacGregor, “1 Corinthians

15:3b-6a, 7 and the bodily resurrection of Jesus”, JETS 49 (2006), p. 225-34.

55
Algumas versões traduzem 2Coríntios 5.20 da seguinte maneira: “Por amor a Cristo vos

suplicamos: Reconciliai-vos com Deus”. Mas não há nenhum equivalente para a palavra traduzida

1049
como “vos” no original grego. Nem faria sentido que Paulo implorasse aos coríntios para que se

reconciliassem com Deus, pois apesar de todas as falhas destes, Paulo se referia aos coríntios

geralmente como crentes (veja 2Co 1.1). Por essa razão, é preferível entender 2Coríntios 5.20 como

uma descrição da mensagem paulina de reconciliação na sua pregação evangelística em geral:

“Portanto, somos embaixadores de Cristo; certos de que Deus exorta por nosso intermédio,

suplicamos por Cristo: ‘Reconciliai-vos com Deus’” (HCSB). Veja A. J. Köstenberger, “‘We plead

on Christ’s behalf: “be reconciled to God’”: correcting the common mistranslation of 2Corinthians

5.20”, BT 48 (1997), p. 328-31, seguido por J. Piper, The future of justification: a critique of N. T.

Wright (Wheaton: Crossway, 2007), p. 178, n. 32.

56
Veja, especialmente, a análise da escatologia super-realizada em Corinto em Fee, First epistle

to the Corinthians.

57
Veja abaixo o argumento de que Paulo anteriormente tinha desafiado a teologia sacramental

que levava à prática do batismo substitutivo pelos mortos. Devido a esse desafio, Paulo não viu

necessidade de criticar a prática aqui.

58
Veja também Garland, 1 Corinthians, p. 729.

59
Embora muitas traduções pontuem o texto de modo que o lema dos coríntios termine após a

palavra “alimentos”, fazendo assim da ameaça da destruição divina parte da resposta de Paulo, o

contexto fortemente sugere que o lema dos coríntios incluía as palavras “Deus destruirá tanto um

quanto o outro”. Veja A. Thiselton, “Realized eschatology at Corinth”, NTS 24 (1978), p. 517; J.

Murphy-O’Connor, “Corinthian slogans in 1 Co 6.12-20”, CBQ 40 (1978), p. 391-6; e Collins, First

Corinthians, p. 239.

60
Assim, corretamente, a HCSB. Veja especialmente R. Omanson, “Acknowledging Paul’s

quotation”, TBT 43 (1992), p. 201-13. Para uma introdução aos principais pontos de vista, veja

Thiselton, 1 Corinthians, p. 471-3.

1050
61
Para uma abordagem incisiva dessa passagem contra o cenário das ideias pagãs sobre

sexualidade, veja P. Jones, “Paul confronts paganism in the Church: a case study of first Corinthians

15.45”, JETS 49 (2006), p. 713-37.

62
Romanos 9.4; 11.27; 1Coríntios 11.25; 2Coríntios 3.6,14; Gálatas 3.15,17; 4.24; Efésios 2.12.

63
A nova aliança definitivamente inclui o perdão dos pecados, como deixam claro Mateus 26.28;

Jeremias 31.34 e Ezequiel 36.33.

64
Essa interpretação conflita com aquela sugerida por várias traduções inglesas. Para uma

extensa defesa dessa interpretação, veja Hafemann, 2 Corinthians, p. 147-9; Hughes, 2 Corinthians,

p. 108. Para a interpretação sugerida pelas traduções, veja Belleville, 2 Corinthians, p. 99.

65
Segunda Coríntios 3.13 é um versículo notoriamente difícil. Para os vários pontos de vista,

compare Harris, Second epistle to the Corinthians, p. 296-300; Hafemann, 2 Corinthians, p. 142-56;

e Furnish, 2 Corinthians, p. 207 e 232. Harris habilmente distinguiu as principais opções

interpretativas. Após muito debate, nós chegamos independentemente a um ponto de vista idêntico à

interpretação que ele defendeu na p. 299.

66
Por exemplo, L. Ott, Fundamentals of catholic dogma, ed. J. Bastible, trad. P. Lynch, 4. ed.

(Rockford: Tan Books, 1960), p. 350-54. Ele (p. 328-30) também explica que o batismo pode

incorporar no corpo místico de Cristo até mesmo aqueles que não creem ou não se arrependem, uma

vez que a fé da igreja pode substituir a fé do indivíduo e que o batismo tem uma eficácia que

independe da condição do batizando ou do batizante.

67
Por exemplo, a London Confession de 1644; a Second London Confession de 1677; a

Philadelphia Confession de 1742; a New Hampshire Baptist Confession de 1833; e a Baptist Faith

and Message de 1925, 1963 e 2000.

68
Sacramentalismo é a crença de que os sacramentos são inerentemente eficazes e necessários

para a salvação. Teólogos mais antigos distinguem sacramentalismo de sacramentarianismo, crença

1051
de que os sacramentos são simples símbolos visíveis. Embora teólogos modernos usem sacramental

e sacramentário um pelo outro, historicamente esses termos são opostos. Para uma boa introdução à

teologia sacramental, com referências bibliográficas adicionais, veja S. Ferguson; D. Wright, orgs.,

New Dictionary of Theology (Downers Grove: InterVarsity, 1988), p. 606-8. Cf. W. Grudem,

Systematic Theology: An Introduction to Biblical Doctrine (Grand Rapids: Zondervan, 1994), p. 966-

87.

69
Observe que Paulo não se referiu ao “batismo em favor dos mortos” com aprovação. Em vez

disso ele está usando uma série de perguntas retóricas para mostrar que a teologia dos coríntios era

incoerente com sua prática, isto é, o batismo em favor dos mortos era incoerente com a negação dos

coríntios de uma ressurreição corporal. Se os mortos não ressuscitam corporalmente, qual o motivo

de seu batismo? Paulo não pretendia apoiar a prática do batismo em favor dos mortos. Após ter

atacado o sacramentalismo dos coríntios no capítulo 10, Paulo considera desnecessária uma refutação

explícita do batismo em favor dos mortos no capítulo 15, onde o foco era a ressurreição.

70
Alguns estudiosos contaram mais de 200 interpretações diferentes do “batismo em favor dos

mortos” por toda a história cristã. Veja K. C. Thompson, “1 Corinthians 15,29 and baptism for the

dead”, Studia Evangelica, edição de F. L. Cross, TU 87 (Berlin: Akadamie, 1964), vol. 2, parte 1,

647.

71
Veja T. R. Schreiner, Paul: Apostle of God’s Glory in Christ (Downers Grove: InterVarsity,

2001), p. 376; G. W. MacRae, org., 1Corinthians, tradução para o inglês de J. W. Leitch, Hermeneia

(Philadelphia: Fortress, 1975), p. 275. Alusões a estas práticas em movimentos heréticos na igreja

antiga aparecem em Tertuliano, Contra Marcião 5.10; Crisóstomo, Homilia em 1Coríntios 40.1;

Epifânio, Contra Heresias 28; e Filástrio, Heresias 49.

72
D. Garland (1Corinthians, BECNT [Grand Rapids: Baker, 2003], p. 452-4) alegou que o

contexto, aqui, é a idolatria cristã. Mas, claramente, Paulo estava preocupado com mais do que

idolatria. O contexto imediatamente precedente refuta a certeza dos coríntios de que a participação na

1052
corrida cristã garantia o recebimento do prêmio. Paulo estava preocupado com a impunidade dos

coríntios ao participarem da idolatria, imoralidade sexual e rejeição da autoridade espiritual, tudo isso

relacionado ao sacramentalismo. A interpretação afirmada aqui tem apoio de um grande número de

comentaristas, incluindo C. K. Barrett, G. Fee, B. Witherington e C. Blomberg.

73
Veja Conzelmann, 1Corinthians, p. 166.

74
Por exemplo, Schreiner, Paul, p. 376. Com toda probabilidade, os coríntios levaram esse

conceito para dentro da igreja de seu passado pagão. Em algumas religiões pagãs, a iniciação no culto

pelas lavagens cerimoniais ou batismos e comunhão com o deus por meio de comida e bebida

garantia salvação por aquele deus pagão. Veja Conzelmann, 1Corinthians, p. 167. Isso foi contestado

por D. Newton, Deity and Diet: The Dilemma of Sacrificial Food at Corinth, JSNTSup 169

(Sheffield: Sheffield Academic, 1998), p. 217.

75
A gramática dos versículos 7,10 (mē + imperativo presente) sugere que os coríntios já estavam

envolvidos em idolatria and murmuração (veja D. B. Wallace, Greek Grammar Beyond the Basics

[Grand Rapids: Zondervan, 1996], p. 724-5). Cf. 1Coríntios 4; 10.14-22.

76
Assim Conzelmann, 1Corinthians, p. 167; Fee, First epistle to the Corinthians, p. 443.

1053
CAPÍTULO 13

A carta de Paulo aos Romanos

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os fatos centrais
da carta de Paulo aos Romanos. Com relação à História, deverão ser
capazes de identificar o autor, data, origem, destino e propósito do livro.
Com relação à Literatura, deverão ser capazes de fornecer um esboço
básico do livro e identificar os principais elementos do conteúdo do livro
encontrados na Discussão Unidade por Unidade. Com relação à Teologia,
os estudantes deverão ser capazes de identificar os principais temas
teológicos no livro de Romanos.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo
essencial identificado nos Conhecimentos básicos, os estudantes deverão
ser capazes de apresentar argumentos em favor das conclusões históricas,
literárias e teológicas. Com relação à História, deverão ser capazes de
discutir as evidências em favor da autoria paulina, data, procedência,
destino e propósito. Com relação à Literatura, deverão ser capazes de
fornecer um esboço detalhado do livro. Com relação à Teologia, deverão ser

1054
capazes de discutir os principais temas teológicos no livro de Romanos e as
maneiras pelas quais eles contribuem de forma única para o cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além do domínio do conteúdo essencial
identificado nos itens Conhecimentos básicos e Conhecimentos
intermediários, os estudantes deverão ser capazes de interagir criticamente
com propostas alternativas relativas à Nova Perspectiva sobre Paulo quanto
a Romanos e com os estudiosos que sugerem que a carta original de Paulo
aos romanos terminava no final do capítulo 14 ou 15. Além disso, deverão
ser capazes de avaliar a classificação de Romanos quanto ao gênero
literário.

FATOS-CHAVE DE ROMANOS
Autor: Paulo
Data: Meio ao final dos anos 50
Origem: Grécia, provavelmente em Corinto
Destino: Algumas congregações de Roma
Motivo: Preparação para a viagem de Paulo para a
Espanha, passando por Roma
Objetivo: Promover a unidade judaico-gentílica na
igreja com a exposição do evangelho de
Paulo
Tema: O evangelho proclama que Deus absolve os
judeus e os gentios que creem em Jesus com
base na sua morte sacrificial
Versículos-Chave: 1.16,17; 3.21-26

INTRODUÇÃO

1055
Paulo escreveu a Carta aos Romanos depois das cartas aos Gálatas,
Tessalonicenses e Coríntios. Ela é o produto do pensamento teológico
maduro de Paulo e uma apresentação completa do seu evangelho. Na
verdade, o livro de Romanos pode ser a carta mais importante que já se
escreveu na história humana. Incontáveis multidões nos tempos modernos
têm confessado sua fé em Jesus como o Salvador ressuscitado depois de
terem sido conduzidas através de uma série de textos conhecidos como a
“estrada romana”, extraídos desta carta (3.23; 5.8; 6.23; 10.9). Embora
algumas das verdades dessa carta ainda desconcertem eruditos, as suas
afirmações básicas são suficientemente claras para orientar crianças e
adultos à fé em Cristo. Assim, não é de surpreender que esta carta seja o
livro favorito do NT para muitos.
Alguns dos mais influentes teólogos e líderes cristãos da história da
igreja foram convertidos ao cristianismo enquanto estudavam este livro. No
verão de 386, Aurelius Augustinus, professor de retórica em Milão, estava
chorando no jardim de seu amigo Alypius enquanto lutava com a decisão de
abraçar ou não a fé cristã. Ele ouviu uma criança em uma casa vizinha
cantando: “Tolle, lege! Tolle, lege!” (“Pegue e leia! Pegue e leia!”). Ele
correu para um banco onde estava um rolo da carta aos Romanos, pegou-o,
começou a ler as palavras poderosas de Romanos 13.13,14, e
imediatamente resolveu seguir Cristo. Mais tarde, ele observou: “Eu não
quis continuar lendo, nem precisava. Pois, instantaneamente, quando eu
terminei a frase, infundiu-se em meu coração algo semelhante a uma luz de
completa certeza, e todas as sombras de dúvida desapareceram.”1 Um
comentarista afirmou com razão: “O que a Igreja e o mundo devem a esse
influxo de luz que iluminou a mente de Agostinho, quando ele lia essas
palavras de Paulo, é algo que está fora da nossa capacidade de estimar”.2

1056
Também durante sua leitura de Romanos, Martinho Lutero, um monge
agostiniano e professor de teologia bíblica na Universidade de Wittenberg,
descobriu que a “retidão de Deus” não era uma justiça de Deus que o levava
a punir o ímpio.

Finalmente, pela misericórdia de Deus, enquanto eu meditava dia e noite, eu prestei atenção
ao contexto das palavras: “Nele a justiça de Deus é revelada, como está escrito: ‘Aquele que
pela fé é justo viverá’”. Então eu comecei a entender que a justiça de Deus é aquela pela qual
o justo vive apenas por uma dádiva de Deus, isto é, pela fé. Este, então, é o significado: a
justiça de Deus é revelada pelo evangelho, viz., a justiça passiva com a qual o Deus
misericordioso nos justifica pela fé, como está escrito: “o justo vive pela fé”. Aqui eu senti
que tinha nascido completamente de novo e entrado no próprio paraíso por meio de portões
abertos. Ali uma face das Escrituras totalmente diferente se mostrou para mim.3

A dramática descoberta de Lutero mudaria para sempre o curso da


história ao dar início à Reforma Protestante.
O livro merece um estudo detalhado tanto pelos crentes como pelos não
crentes. Os incrédulos deveriam estudá-lo devido ao profundo impacto que
teve no curso da história mundial. Os fiéis deveriam estudá-lo porque, como
declarou Thomas Draxe, puritano inglês do século dezessete, Romanos é “a
quintessência e perfeição da doutrina da salvação”.4 Todos que estudam o
livro deveriam estar preparados para serem transformados por ele. F. F.
Bruce disse muito bem:

Não há como predizer o que pode acontecer quando as pessoas começam a estudar a carta
aos Romanos. O que aconteceu com Agostinho, Lutero, Wesley e Barth iniciou grandes
movimentos espirituais que deixaram sua marca na história do mundo. Mas coisas
semelhantes têm acontecido, com frequência muito maior, com homens e mulheres comuns
quando as palavras dessa carta os atingiram poderosamente. Sendo assim, que aqueles que
leram até agora se preparem para as consequências de continuarem lendo: “Vocês foram
avisados!”.5

1057
HISTÓRIA
Autor
A carta aos Romanos alega ter sido escrita por Paulo. Historicamente, os
estudiosos do NT têm tanta certeza da autoria paulina do livro que este tem
servido como padrão para avaliar a alegação da autoria de Paulo em outras
cartas. Charles Hodge, um comentarista de meados do século dezenove,
pesquisou a forte evidência externa e interna para a autoria de Paulo e
concluiu: “Não há nenhum livro na Bíblia, nem nenhum livro antigo no
mundo, de que a autenticidade seja mais certa do que a desta epístola.”6
No final do século XIX, a autoria paulina de Romanos foi contestada
por alguns acadêmicos, mas seus argumentos foram considerados não
convincentes pela grande maioria dos estudiosos. C. E. B. Cranfield
corretamente comentou: “A negação da autoria paulina de Romanos por
críticos como E. Evanson, B. Bauer, A. D, Loman e R. Steck está agora
corretamente relegada a um lugar entre as curiosidades dos estudos do NT.
Hoje, nenhuma análise responsável contesta sua origem paulina.”7 Meio
século atrás, C. H. Dodd confiantemente declarou: “A autenticidade da
Epístola aos Romanos é uma questão encerrada.”8
A questão da autoria foi encerrada porque a evidência interna de autoria
de Paulo, particularmente a linguagem, estilo e teologia do livro, eram
muito convincentes. Além disso, todas as fontes antigas que mencionam o
autor de Romanos o identificam como o apóstolo Paulo. Entre essas estão o
Apostolicon de Marcião, como citado por Tertuliano (c. 160-225), o Cânon
de Muratori (final do séc. II), os cânones do Concílio de Laodiceia (363-
364), bem como os escritos de Atanásio (c. 296-373) e Anfilóquio (c. 340-

1058
395).9 Embora a questão da autoria paulina já tenha sido resolvida, duas
questões relacionadas são dignas de análise.
Primeira, alguns estudiosos sugeriram que o papel de Paulo como autor
precisa ser redefinido. Romanos 16.22 mostra que Paulo usou Tércio como
amanuense ou secretário pessoal para escrever a carta aos Romanos. O.
Roller mostrou que um autor que usava um amanuense podia abordar sua
tarefa de várias maneiras diferentes. Às vezes, os autores ditavam sua obra
ao amanuense, que escrevia o conteúdo verbatim, quer por extenso, quer
utilizando taquigrafia na preparação para uma edição final por extenso. Em
outras ocasiões, um autor resumia suas ideias para o amanuense, e este
assumia a responsabilidade pelo estilo e forma em que as ideias eram
expressas por escrito. Roller afirmou que Paulo utilizou os serviços de
Tércio na segunda maneira.10 A obra de Roller tem sido muito criticada por
outros estudiosos.11 Diversas linhas de evidência sugerem fortemente que
Paulo ditou a carta para Tércio. A linguagem e o estilo de Romanos são
muito semelhantes aos de outras cartas de Paulo. Se Tércio foi o
responsável pela redação de Romanos, só se poderia explicar o alto grau de
semelhança entre as cartas de Paulo reivindicando que Tércio também foi
responsável pela redação das outras cartas de Paulo. Mas não existe
nenhuma evidência de que Tércio serviu como amanuense de Paulo para
outras cartas que não Romanos. O grau de semelhança entre Romanos e as
outras cartas de Paulo é melhor explicada assumindo-se que Paulo ditou
romanos. Além disso, algumas características da Carta aos Romanos, como
o uso frequente da conjunção “pois” (gar), mesmo em contextos em que ela
parece ser desnecessária, apoiam a alegação de que o texto de Romanos foi
ditado.12 E. R. Richards, que argumentou que a maioria das cartas de Paulo
não foi transcrita verbatim por um amanuense, uma vez que Paulo

1059
raramente teve acesso a um secretário que soubesse taquigrafia, reconheceu
a possibilidade de que Tércio soubesse taquigrafia e que o rascunho inicial
de Romanos foi um produto de ditado verbatim, uma vez que “o livro de
Romanos demonstra mais características de oratória que outras cartas de
Paulo”.13
Uma segunda questão relacionada é a de que alguns estudiosos
questionaram a unidade da carta, sugerindo que ela é um mosaico de duas
ou três cartas ou sermões.14 Muito poucos estudiosos se convenceram da
validade dessas teorias. R. Hays perspicazmente, comentou: “Tais teorias
devem estar em um museu de curiosidades exegéticas em vez de em uma
discussão séria sobre a coerência teológica de Romanos. Essas hipóteses só
demonstram a incapacidade de seus autores de tolerarem complexidade
dialética.”15
Mais graves são as sugestões de que a carta de Paulo, originalmente,
terminava no final do capítulo 14 ou no final do capítulo 15, e que os
capítulos finais foram adicionados algum tempo depois, pelo próprio Paulo
ou por alguma outra pessoa. Essas sugestões são baseadas, em parte, em
evidência manuscrita. O papiro 46
, que data de cerca de 200, coloca a
doxologia final (Rm 16.25-27) no final do capítulo 15. Embora o
manuscrito contenha o capítulo 16, alguns estudiosos acreditam que o
posicionamento da doxologia indica que a carta pode ter circulado sem o
capítulo final. Alguns manuscritos gregos, antigos manuscritos latinos e os
primeiros manuscritos da Vulgata e outros textos posicionam a doxologia
no final do capítulo 14. Tertuliano (c. 160-225) se referiu ao capítulo 14
como a conclusão da carta, o que pode implicar que os capítulos 15 e 16
não estavam presentes nos textos de Romanos disponíveis para ele.16 Esses
posicionamentos da doxologia implicam que os capítulos 15 e 16 ou

1060
somente o capítulo 16 estavam faltando em algumas tradições manuscritas
antigas. Isso levanta duas possibilidades. Ou os capítulos 15 e 16 ou o
capítulo 16 foi acrescentado a uma carta original contendo 14 ou 15
capítulos, ou esse material original, em alguma ocasião antiga, foi excluído
dos manuscritos da carta.
K. Lake, seguido em grande parte por J. Knox, argumentou que a versão
de 14 capítulos era a original e foi escrita como uma carta circular destinada
a numerosas congregações. Mais tarde, Paulo teria acrescentado a
destinação romana e o capítulo 15 para benefício específico da congregação
em Roma.17 Lake pensava que o capítulo 16 era uma carta inicialmente
dirigida aos efésios, e que foi posteriormente anexada a Romanos. T. W.
Manson sugeriu que Paulo originalmente dirigiu os capítulos 1 a 15 à
congregação romana, mas que mais tarde acrescentou o capítulo 16 e
enviou os capítulos 1 a 16 à congregação de Éfeso.18
A teoria de que Romanos inicialmente consistia de apenas 14 capítulos
foi mais decisivamente refutada por H. Gamble.19 Ele ressaltou que, embora
alguns manuscritos tardios omitissem a destinação aos romanos em 1.7,
nenhum manuscrito endereça a carta para um lugar diferente de Roma. O
formato de 14 capítulos da carta também quebra a unidade da discussão
sobre fortes e fracos e deixa o final anormalmente abrupto. Gamble
apresentou uma forte defesa da autoria Paulina e da destinação romana
original do capítulo 16.20 Ele demonstrou que alegar que Romanos
inicialmente terminava no capítulo 15 era privar a carta de uma conclusão
epistolar formal, uma característica sem paralelo entre as outras cartas de
Paulo. Os argumentos de Gamble foram suficientemente persuasivos para
convencer J. Fitzmyer, que em um comentário anterior adotara a ideia de
Manson de que o capítulo 16 era uma carta originalmente dirigida aos

1061
efésios, a abandonar essa hipótese e afirmar a unidade original de Romanos
1.1 a 16.23.21
Vários estudiosos argumentaram que o último capítulo ou dois de uma
carta original de 16 capítulos foram removidos acidental ou
intencionalmente. F. J. A. Hort e M. J. Lagrange sugeriram que os dois
últimos capítulos foram retirados a fim de tornar a carta mais adequada para
leitura no culto público.22 C. W. Emmet e H. J. Frede sugeriram que as
páginas finais de um antigo códice foram perdidas e que isso deu a alguns
dos primeiros escribas a impressão de que Romanos originalmente
terminava naquele ponto.23 H. Gamble argumentou que os dois últimos
capítulos foram eliminados por alguns escribas por preocupação com
“generalização católica”, um desejo de tornar a carta mais diretamente
aplicável a uma audiência mais ampla.24 W. Sanday e A. C. Headlam, C. E.
B. Cranfield, J. D. G. Dunn, D. J. Moo e T. R. Schreiner adotaram o ponto
de vista de Orígenes (c. 185-254), que alegou que a forma reduzida da carta
era o resultado da remoção dos dois capítulos finais por Marcião ou um de
seus discípulos.25 Cranfield sugeriu que Marcião teria se oposto à forte
concentração de citações do AT na seção final, bem como às declarações
em Romanos 15.4,8 e pode ter desejado apagar referências à igreja em
Roma, em retaliação por ter sido rejeitado por ela.26
A única dificuldade com essa explicação cada vez mais popular é a
evidência de que Tertuliano (c. 160-225) talvez só conhecesse a forma mais
curta da carta. Uma vez que Tertuliano provavelmente não teria aceitado de
forma consciente a versão da carta mutilada por Marcião, sua alegação de
que o capítulo 14 constitui a conclusão da carta sugere que a perda dos
capítulos 15 e 16 pode ter precedido a época de Marcião (c. 150). Se os
manuscritos anteriores à época de Marcião não tinham os dois últimos

1062
capítulos, a explicação de Emmet e Frede parece a mais plausível. O fato de
a forma mais curta da carta terminar a carta no meio de uma discussão
sugere fortemente que a forma mais curta era mais provavelmente o
resultado de um acidente do que o trabalho editorial intencional de alguém
que pretendesse adaptar a carta para a leitura pública ou a uma audiência
mais geral.
Evidência convincente confirma a alegação histórica de que o apóstolo
Paulo é o verdadeiro autor de todos os 16 capítulos da carta aos Romanos.
Exceto por alguns críticos radicais nos últimos dois séculos, ninguém
questionou seriamente a autoria paulina de Romanos. A. M. Hunter estava
correto quando, com humor, brincou: “Ninguém fora de Bedlam seriamente
dúvida que Romanos tenha sido escrita por São Paulo”.27

Data
Romanos 15 contém importantes detalhes sobre os planos de viagem de
Paulo que ajudam a datar a composição da carta. Romanos 15.25 indica que
Paulo estava prestes a começar ou tinha acabado de começar sua viagem a
Jerusalém para entregar a oferta de auxílio para os fiéis pobres de lá.
Romanos 15.19,23 mostra que Paulo via sua obra nas regiões entre
Jerusalém e o Ilírico como já terminada. Paulo tinha decidido levar o
evangelho à Espanha (Rm 15.24,28) e passaria por Roma em sua viagem de
Jerusalém para a Europa Ocidental. Ele já havia concluído a coleta da oferta
na Macedônia e Acaia (Rm 15.26).
Esses detalhes facilmente se fundem com os detalhes em Atos 20. Atos
19.21 registra que Paulo resolveu passar pela Macedônia e Acaia em sua
jornada de Éfeso para Jerusalém. Paulo viajou através da Macedônia à

1063
Grécia, onde permaneceu por três meses (At 20.1-3). Ele provavelmente
ficou em Corinto durante a maior parte desse período no qual ele escreveu a
Carta aos Romanos. Enquanto em Corinto, Paulo descobriu um complô de
seus adversários judeus, o que resultou em uma mudança nos seus planos de
viagem. Em vez de navegar do porto de Cencreia, próximo a Corinto, para a
Síria, como ele originalmente planejara, ele inverteu o curso e viajou de
volta através da Macedônia, navegou para Trôade, Mileto, Cos, Patara, e
depois para Tiro, Ptolemaida e Cesareia para viajar por terra até Jerusalém.
A terceira viagem missionária de Paulo, provavelmente, se estendeu de
cerca de 51 ao inverno de 54-55. Os principais fatores para datar essa
viagem são as datas da estadia de Paulo em Corinto, durante a segunda
viagem missionária, que são estabelecidas pela inscrição de Delfos, e a data
provável da prisão de Paulo em Jerusalém, que pode ser calculada com base
na declaração do tribuno romano em Atos 21.38 e na ascensão de Festo.
28
Paulo provavelmente escreveu a Carta aos Romanos no inverno de 54-55.
Um fator pode complicar esta data. Na época em que Paulo escreveu
esta carta, Áquila e Priscila tinham fixado residência em Roma novamente,
e uma igreja se reunia na casa deles. Provavelmente, já tinham estado em
Roma o tempo suficiente para se familiarizarem com a situação das igrejas
da cidade e para se corresponderem com Paulo sobre essa situação. Se os
judeus não foram autorizados a retornar a Roma até depois da morte de
Cláudio, no ano 54, essa data para a composição de Romanos é
provavelmente muito prematura para dar tempo ao casal de ficarem
sabendo da morte de Cláudio, mudarem-se para Roma, informarem-se sobre
a situação das igrejas e se corresponderem com Paulo. Mas é provável que
o banimento de judeus em Roma tenha começado a ser flexibilizado no
final do reinado de Cláudio. Se for assim, esses fatores não necessariamente

1064
impedem essa data antiga.29 Depois de todas as coisas terem sido
consideradas, o mais sábio é se contentar com uma estimativa geral de que
Romanos foi escrita entre meados e final dos anos 50.

Origem
Os estudiosos sugeriram várias cidades como provável local para a redação
da Carta aos Romanos. As sugestões incluem cidades como Corinto,
Atenas, Éfeso, Filipos, Tessalônica, ou a província da Macedônia.30 Dois
pontos de vista sobre a proveniência da carta foram aceitos na igreja
primitiva. Algumas versões do Prólogo Marcionita, preservado em poucos
manuscritos da Vulgata, relacionam a carta com Atenas. Mas duas
subscrições antigas da carta em antigos manuscritos gregos afirmam que
Paulo escreveu Romanos em Corinto. Um antigo escriba que corrigiu o
Codex Vaticanus acrescentou uma subscrição que diz: “Foi escrito para os
romanos a partir de Corinto”. Outro escriba que corrigiu o Codex
Claromontanus adicionou uma subscrição idêntica àquele manuscrito.
Vários manuscritos posteriores também mencionam uma proveniência de
Corinto.31
A mesma evidência que sugere que Paulo escreveu Romanos no final de
sua terceira viagem missionária, quando se dirigia para Jerusalém, também
aponta para a Grécia como o lugar em que a carta foi escrita. Os três meses
que Paulo passou na Grécia (At 20.3), durante os quais ele ficou na casa de
Gaio (Rm 16.23), provavelmente possibilitaram raras oportunidades para
uma cuidadosa e prolongada reflexão, necessária para um projeto tão
extenso, bem como acesso diário a um amanuense para ajudar a escrever a
obra. Apesar de Atos não dar detalhes de onde Paulo primariamente ficou

1065
durante os três meses na Grécia, algumas considerações apontam para
Corinto como o local mais provável da composição de Romanos.
Primeira, o NT menciona quatro homens com o nome de Gaio: (1) um
de Derbe (At 20.4); (2) um da Macedônia, que estava com Paulo em Éfeso
(At 19.29); (3) um de Corinto, que foi uma das poucas pessoas que Paulo
batizou lá (1Co 1.14); e (4) o destinatário de 3João, que não se sabe se foi
associado a Paulo (3Jo 1). O Gaio de Romanos 16 é provavelmente o Gaio
de Corinto.
Segunda, Paulo enviou saudações da parte de Erasto, o tesoureiro ou
administrador da cidade, que provavelmente é a pessoa com o mesmo nome
mencionada em Atos 19.22 e 2Timóteo 4.20. Paulo provavelmente
mencionou Erasto aqui porque ele era um membro proeminente da igreja de
Corinto, em grande parte devido a sua autoridade no governo local. Uma
inscrição latina datada do meio do primeiro século d.C., e que permanece
em seu local original na praça pavimentada próxima ao teatro de Corinto, se
refere a um Erasto que pavimentou a praça: “Erasto, em retribuição por sua
edilidade, colocou o pavimento às suas próprias custas”. Esse Erasto, que
serviu como aedilis coloniae (“tesoureiro da cidade”) de Corinto, é
geralmente reconhecido como sendo a mesma pessoa mencionada em
Romanos 16.23.32
Terceira, Romanos 16.1,2 serve como uma carta de recomendação para
Febe dirigida à igreja de Roma. De acordo com subscrições a Romanos em
alguns manuscritos gregos, Febe também serviu de mensageira para a carta.
Paulo mencionou que Febe era “uma serva [diakonos] da igreja em
Cencreia”. Cencreia era uma cidade portuária, localizada a apenas algumas
milhas da antiga Corinto.

1066
A questão da origem da carta está intimamente ligada com a questão da
sua integridade. Se o capítulo 16 não era uma parte da forma original da
carta como escrita por Paulo, existem evidências insuficientes para
determinar sua proveniência. Mas a evidência em favor da integridade da
carta é forte. Assim, a maioria dos estudiosos hoje afirma a legitimidade da
utilização de pistas do capítulo 16 para localizar a cidade a partir da qual
Romanos foi escrita. Febe, Erasto e Gaio estavam com Paulo quando ele
escreveu essa carta. Eles são associados a Corinto ou a uma cidade vizinha.
Assim, Corinto é a origem mais provável da carta. Essa evidência é
suficiente para permitir que J. D. G. Dunn afirme confiante que dificilmente
haja nos dias atuais qualquer debate sobre a origem coríntia.33

Destino
Como o título atual da carta indica, ela foi endereçada aos cristãos que
viviam em Roma, a capital do império romano. O endereçamento da carta
em Romanos 1.7, “a todos os que estais em Roma, amados de Deus,
chamados para serdes santos”, e em Romanos 1.15, “que estais em Roma”,
claramente identifica os destinatários como fiéis em Roma. Roma era a
capital do grande império romano. Ela rivalizava com Alexandria, no Egito,
Corinto, na Grécia e com Antioquia, na Síria, como a cidade mais
importante do mundo mediterrâneo durante a vida de Paulo. No primeiro
século, a cidade de Roma tinha uma população de aproximadamente um
milhão de pessoas de todos os cantos do império e das terras desconhecidas,
para além de suas fronteiras.34 Entre a população se encontravam de 40 mil
a 50 mil judeus.

1067
A mistura de culturas da cidade assegurava que a cidade fosse a morada
de uma grande variedade de religiões. A adoração do tradicional panteão
romano e do culto imperial crescia na cidade. Mas muitos romanos também
recebiam, de forma calorosa, muitas religiões estrangeiras, como o
mitraísmo, o judaísmo e o cristianismo. Quando o cristianismo chegou em
Roma, a adoração de Júpiter, Juno e Minerva no grande templo sobre o
Capitólio dominava a cidade.35
Assim como Corinto e outros grandes centros populacionais do mundo
mediterrâneo, Roma era conhecida pela sua decadência e imoralidade.
Tácito descreveu Roma durante o reinado de Nero como “a cidade onde
todas as práticas degradantes e vergonhosas, coletadas de todas as partes, se
tornavam moda”.36 Quando Paulo escreveu Romanos, o imperador Nero
ainda não tinha começado sua guerra de terror contra os cristãos da cidade.
Mesmo no início de seu reinado, no entanto, o imperador era conhecido por
“praticar todo tipo de obscenidade”. Suetônio descreveu em vívidos
detalhes os pecados de Nero com amantes e prostitutas e suas impensáveis
perversões. Nero estuprou uma das virgens vestais de Roma. Ele castrou e
depois, publicamente, se casou com um menino chamado Sporus. Os
cidadãos de Roma costumavam brincar que o mundo teria sido um lugar
mais feliz se o pai de Nero tivesse se casado com uma esposa dessa. Nero
fez-se noiva de seu liberto Doríforo. Esse era o nobre líder de Roma, e sua
conduta foi, sem dúvida, um reflexo, embora talvez exagerado, da cultura
imoral em que ele vivia.37
Surpreendentemente, o cristianismo começou a prosperar em Roma
muito cedo. As origens da Igreja em Roma são desconhecidas. É claro que
Paulo não fundou a igreja. Talvez a igreja tenha começado quando
peregrinos judeus de Roma viajaram a Jerusalém para uma de suas grandes

1068
festas e ouviram o evangelho da parte de discípulos de Jesus (talvez, já em
Pentecostes; At 2.10). Ou talvez a igreja tenha começado quando cristãos de
outras cidades migraram para Roma. Sem dúvida, já havia cristãos em
Roma no final dos anos 40. Suetônio alegou que Cláudio expulsou os
judeus de Roma no ano 49 por causa de distúrbios instigados por “Cresto”.
Aparentemente, os judeus e os cristãos judeus estavam debatendo se Jesus
era o Cristo e os debates levaram a sérios conflitos que perturbaram a
capital.38
Alguns poucos manuscritos gregos, antigos textos latinos, e manuscritos
da Vulgata omitem a expressão “em Roma”.39 Mas muitos mais
manuscritos, que são significativamente mais antigos, incluem a expressão,
e a maioria dos estudiosos está confiante de que ela pertencia ao texto
original da carta. A omissão da identificação dos destinatários em
manuscritos posteriores foi provavelmente intencional e sugere que, em
algum momento, escribas editaram Romanos a fim de torná-la uma carta
geral dirigida a toda cristandade.40
Alguns estudiosos negam que Paulo escreveu aos romanos e afirmam
que detalhes do capítulo 16 apontam para a igreja de Éfeso como
destinatária original.41 A mais popular versão de Éfeso como destino da
carta é a de T. W. Manson, que sugeriu que Paulo compôs duas versões da
carta. Uma versão consistiria nos capítulos 1-15 e seria destinada aos fiéis
em Roma, uma segunda versão teria adicionado o capítulo 16 e seria
destinada a Éfeso.42 Aqueles que apoiaram a hipótese de Manson invocaram
alguns detalhes do capítulo 16 em apoio a Éfeso como destinatária. Em
primeiro lugar, não se poderia esperar que Paulo conhecesse e
cumprimentasse pessoalmente 26 pessoas em Roma, uma cidade que Paulo
nunca tinha visitado. Em segundo lugar, Priscila e Áquila, a quem Paulo

1069
enviou saudações em Romanos 16.3,4, tinham viajado com Paulo para
Éfeso (At 18.18,19) e ali estabeleceram uma casa e uma igreja (1Co 16.19).
Eles ainda viviam em Éfeso perto do final da vida de Paulo (2Tm 4.19).
Eles provavelmente não teriam estado presentes em Roma, na época em que
Paulo escreveu esta carta. Em terceiro lugar, Paulo enviou saudações a
Epêneto, que era da Ásia (Rm 16.5), a província na qual Éfeso estava
localizada. Em quarto lugar, o alerta sobre os falsos mestres em Romanos
16.17-20 seria estranho se a carta fosse enviada a Roma, uma vez que Paulo
pouco sabia sobre a situação das igrejas romanas e desde que nenhuma
evidência sugere que os falsos mestres tivessem se infiltrado nessas igrejas.
Embora essas peças de evidência inicialmente pareçam convincentes,
sua força é enfraquecida por algumas considerações. Ao contrário do que o
argumento acima pressupõe, Paulo geralmente não enviava saudações
pessoais a indivíduos em cartas endereçadas às igrejas com as quais ele
tinha um relacionamento pessoal. Um estudo das cartas de Paulo mostra
que Paulo enviou saudações a indivíduos por nome somente em Romanos e
Colossenses, ambas sendo cidades que Paulo nunca visitara.
Aparentemente, Paulo não queria destacar indivíduos nas igrejas que ele
tinha plantado ou visitado, uma vez que isso poderia ser entendido como
sugestão de que ele amava uns mais do que outros. No entanto, saudar
indivíduos que ele conhecia em uma igreja que ele nunca tinha visitado era
uma maneira estratégica de criar afinidade e estabelecer uma ligação com a
congregação.
Além disso, Áquila e Priscila estavam entre os cristãos judeus que
foram expulsos de Roma por Cláudio, no ano 49 (At 18.2).43 Mais tarde,
eles moraram em Corinto e Éfeso, mas podem ter mantido uma residência
em Roma durante esse tempo na esperança de voltar a Roma depois da

1070
expulsão. Uma vez que possuíam uma casa em Éfeso que era grande o
suficiente para acomodar uma igreja, eles provavelmente fossem pessoas de
alguma posse, e Roma pode ter continuado a ser o centro de seus negócios.
Que Epêneto foi o primeiro convertido de Paulo na Ásia provavelmente
era fato conhecido nas igrejas de toda a Ásia e, portanto, desnecessário
mencionar em uma carta a Éfeso. Mas os cristãos romanos poderiam não ter
conhecimento da conversão histórica de Epêneto, e o comentário teria sido
de enorme interesse para eles. O alerta em Romanos 16.17-20
provavelmente é dirigido contra um perigo potencial, em vez de a um
perigo conhecido, e a presença de amigos chegados, como Áquila e Priscila,
na igreja sugere que Paulo talvez tivesse mais conhecimento da situação das
igrejas romanas do que geralmente se supõe. Paulo quase seguramente
estava ciente das tensões entre fiéis judeus e gentios (Rm 14 e 15), e a
informação sobre essa discórdia deveria vir de seus associados em Roma.
No geral, os detalhes de Romanos 16 apoiam mais Roma do que Éfeso
como destinatária da carta. A hipótese efésia, enfim, pode ser colocada de
lado.44 O endereço aos romanos, afirmado nos principais unciais e nos
papiros mais antigos claramente é original. Ao contrário de 1e 2Coríntios, e
de 1 e 2Tessalonicenses, Romanos é endereçada, de forma geral, a todos os
fiéis em toda a cidade de Roma em vez de a uma única congregação. Paulo
sabia das várias congregações cristãs existentes na cidade. Mais tarde, ele
mencionou uma igreja que se reunia na casa de Áquila e Priscila (Rm 16.5),
um grupo dos cristãos associados com Asíncrito, Flegonte, Hermes,
Pátrobas e Hermas (Rm 16.14), e outro grupo de cristãos associados com
Filólogo, Júlia, Nereu e sua irmã (Rm 16.15). Os cristãos nas famílias de
Aristóbulo e Narciso podem também ter se reunido como um grupo para
adoração nessas casas. Se assim for, Paulo menciona cinco congregações de

1071
fiéis em Roma. Outras congregações desconhecidas de Paulo,
provavelmente, também existiam em Roma.45
Os estudiosos debatem se as igrejas em Roma eram constituídas
predominantemente de judeus ou de gentios. J. Munck defendeu que quase
todos os cristãos em Roma eram gentios.46 W. Wiefel defendeu que as
igrejas de Roma eram constituídas, na maioria, por judeus.47 A favor de
uma composição gentílica está a discussão de Paulo sobre seu testemunho
entre os gentios em Romanos 1.5,6, e 1.15 claramente inclui os gentios
nesse grupo. Paulo se dirige diretamente aos gentios usando a segunda
pessoa em Romanos 11.13,31, em uma repreensão ao orgulho dos gentios
sobre sua eleição por Deus. A discussão de Paulo sobre o forte e o fraco em
Romanos 14.1 a 15.13 é principalmente dirigida ao forte, quase certamente
fiéis gentios que tinham um senso de liberdade em Cristo mais forte do que
alguns de seus irmãos de origem judaica.
Por outro lado, Paulo aborda muitas questões na carta que teriam sido
de interesse principalmente para os cristãos judeus, como o papel da lei na
salvação e o lugar de Israel no plano redentor de Deus. Além disso, a
repreensão de Paulo do orgulho dos judeus e o farisaísmo hipócrita em
Romanos 2 frequentemente utiliza a segunda pessoa e implica que Paulo
estava se dirigindo diretamente a pessoas de origem judaica. Paulo
estreitamente associou seus leitores com a lei mosaica em textos como
Romanos 6.14; 7.1,4. Ele também se referiu a Abraão como “nosso segundo
a carne” (Rm 4.1) de uma maneira que sugere que seus leitores originais
incluíam descendentes físicos de Abraão. Esses detalhes demonstram que o
cristianismo em Roma era de composição mista, com fiéis de origem
judaica e gentílica.

1072
A discussão sobre a ocasião da Carta aos Romanos na próxima seção
sugere que as igrejas romanas foram dominadas pelos gentios durante
aproximadamente cinco anos anteriores à carta. No entanto, um súbito
afluxo de fiéis judeus na comunidade cristã causou a erupção de um
conflito que ameaçou a unidade do povo de Deus em Roma. As
circunstâncias históricas sugerem que a igreja era de composição mista,
predominantemente gentílica, mas com um número crescente de fiéis
judeus.48

Motivo
Paulo escreveu Romanos pouco antes de sua última viagem registrada para
Jerusalém (Rm 15.25-29). Ele queria viajar para Jerusalém a fim de
entregar o dinheiro que havia sido recolhido pelas igrejas gentílicas na
Macedônia e Acaia para ajudar a atender as necessidades dos cristãos
pobres em Jerusalém (15.26). A oferta de ajuda foi parcialmente motivada
pelo desejo de promover boas relações entre as igrejas cristãs judaicas e
gentílicas. Essa preocupação está relacionada a alguns tópicos que Paulo
abordou em Romanos 9 a 11 e 14 a 15.
Paulo planejava viajar de Jerusalém para a Espanha, passando por
Roma, devido ao seu desejo de “pregar o evangelho onde Cristo ainda não
era conhecido” (Rm 15.20, NVI). Essa informação se encaixa muito bem
com a descrição que Lucas dá das viagens de Paulo no final da terceira
viagem missionária (At 19.21; 20.16). Atos 20.3 mostra que Paulo passou
três meses na Grécia, durante sua viagem da Macedônia e Acaia para
Jerusalém. Paulo escreveu Romanos nessa época, e ela serviu como uma

1073
introdução formal de Paulo e seu evangelho para a igreja em Roma, em
preparação para sua futura visita à igreja.
Essas circunstâncias são claras e se baseiam em dados explícitos em
Romanos e Atos. Pistas adicionais sobre a ocasião da carta podem ser
recolhidas de fontes extrabíblicas. Várias fontes documentam a expulsão
dos judeus de Roma, por Cláudio, por volta de 49. Depois dos judeus
cristãos terem saído de Roma, a liderança das igrejas romanas ficou
inteiramente nas mãos de fiéis gentios. As congregações gentílicas se
desenvolveram, em grande parte, sem influência judaica e, portanto,
insensíveis a escrúpulos judeus. Provavelmente, alguns judeus começaram a
retornar a Roma durante os anos finais do reinado de Cláudio. Eles
retornaram em número muito maior depois da morte de Cláudio, quando
seu decreto oficialmente expirou. Em seu retorno, descobriram que as
igrejas que eles anteriormente dominavam, agora eram controladas e
dirigidas por cristãos gentios. Eles provavelmente sentiram que os líderes
cristãos gentios não valorizavam devidamente e nem eram sensíveis à sua
rica herança judaica. Os cristãos gentios se ressentiam da pressão exercida
pelos seus irmãos e irmãs judeus para que adotassem costumes judaicos e
restringissem sua liberdade em Cristo. Esses fatores no contexto histórico
ajudam a explicar por que muito da Carta aos Romanos aborda questões
importantes para a relação entre cristãos judeus e gentios.49
Tácito registrou uma descrição da situação política em Roma que pode
ser útil para a explicação de algumas características desta carta. Tácito
descreveu a agitação política relacionada à pesada carga tributária sofrida
pelo povo no império.50 O povo do império tinha exigido, repetidamente,
que Nero tomasse medidas para impedir que coletores de impostos
gananciosos impusessem taxas mais altas sobre o povo do que a lei permitia

1074
para seu próprio benefício financeiro. Nero considerou revogar todos os
impostos alfandegários, uma vez que esses eram os que mais sofriam
abusos. O Senado desencorajou tal ação já que ela poderia encorajar as
pessoas a protestar até contra os impostos sobre a renda, sem os quais o
império não sobreviveria. Assim, ao invés de abolir os impostos abusados,
Nero ordenou que as leis sobre esses impostos fossem publicadas em todo o
império, de modo que o povo pudesse ser devidamente informado dos
montantes devidos e protestassem e delatassem a taxação excessiva. Ele
também ordenou aos oficiais de justiça que dessem prioridade aos casos em
que os súditos alegassem terem sido taxados de forma abusiva pelos
coletores de impostos. Ele aboliu as taxas de 2 e 2,5%, pois ele sabia que
essas eram os exemplos mais notórios de taxas que os coletores tinham
inventado para encobrir sua extorsão. Estes eventos descritos por Tácito
ocorreram no ano 58. A crescente agitação por todo o império por causa da
questão da taxação nos anos anteriores a 58 provavelmente foi a razão de
Paulo ter concluído sua discussão sobre a responsabilidade dos cristãos em
relação ao estado com a ordem de pagar os impostos (Rm 13.6,7).

Propósito
Alguns intérpretes consideram que Romanos é um tratado teológico ou um
compêndio da doutrina cristã. O mais antigo comentário sobre o propósito
de Romanos aparece no Cânon de Muratori, datado provavelmente do final
do século II:

Quanto às epístolas de Paulo, elas mesmas deixam claro para aqueles que desejam
compreender, quais [são], de que lugar ou qual foi o motivo de terem sido enviadas. Em
primeiro lugar, aos Coríntios, proibindo suas dissidências heréticas; em seguida, aos Gálatas,
contra a circuncisão; em seguida, aos romanos ele escreveu detalhadamente, explicando a

1075
ordem (ou plano) das Escrituras, e também que Cristo é o princípio (ou, tema principal)
delas.51

Embora o autor do fragmento visse 1Coríntios e Gálatas como


documentos ocasionais que abordavam problemas específicos em uma
congregação em particular, ele via Romanos como um resumo da doutrina
bíblica cristocêntrica. A ideia de Romanos como um compêndio da doutrina
cristã foi desenvolvida mais tarde por Philip Melanchthon, em sua obra
Loci Communes (1521) e em seu comentário sobre Romanos (1532). Desde
então, a Carta aos Romanos tem sido, de modo geral, vista como uma
síntese da teologia cristã.52
Embora Romanos seja uma carta profundamente teológica, a maioria
dos estudiosos hoje não a vê como um tratado geral, mas como um
documento ocasional, isto é, uma carta escrita para abordar as necessidades
particulares de um grupo específico de igrejas. Eles salientam que a carta
não trata alguns aspectos importantes da teologia de Paulo como, por
exemplo, sua doutrina da Ceia do Senhor (1Co 11.17-24), da Segunda
Vinda (1Ts 4.13 a 5.11) nem da doutrina da igreja, explicada com detalhes
em Efésios e 1Coríntios. É realmente difícil explicar esse silêncio se a carta
foi escrita para ser um tratado teológico geral.
Além disso, Paulo também deu muita atenção nesta carta a questões
como a ira de Deus (Rm 1.18-32) e a rejeição de Jesus pelos judeus (Rm 9 a
11), assuntos que ele não discute muito em outras cartas. Alguns aspectos
da carta, como a discussão sobre a maneira em que os fiéis deveriam se
relacionar com o governo (Rm 13.1-7) e a discussão sobre o fraco e o forte
(Rm 14.1 a 15.6), parecem refletir as dificuldades específicas enfrentadas
por aquela congregação em particular. Assim, Romanos não deve ser vista

1076
como um manual de teologia sistemática escrito para pessoas
completamente desconhecidas.
Uma análise da totalidade da carta demonstra que Paulo tinha vários
motivos para escrever este livro. Primeiro, Paulo queria lembrar aos fiéis de
Roma algumas das verdades fundamentais do Evangelho no cumprimento
de seu dever sacerdotal de proclamar o evangelho para os gentios (Rm
15.14-16). Paulo estava bem consciente das muitas maneiras em que sua
mensagem podia ser incorretamente interpretada ou aplicada. Ele escreveu
para esclarecer aspectos importantes da sua mensagem para aqueles que
tinham ouvido falar dele e do seu Evangelho apenas indiretamente. Além
disso, Romanos 16.17-20 revela que Paulo estava preocupado com a
infiltração de falsos mestres na igreja romana.53 Diante desse perigo, uma
articulação cuidadosa dos fundamentos do evangelho de Paulo era
necessária.
Em segundo lugar, Paulo queria abordar alguns dos problemas
enfrentados pela igreja romana. Em particular, ele queria chamar as igrejas
à unidade. Ele estava consciente de que algumas das diferenças de opinião
entre os cristãos judeus e gentios tinham produzido uma certa desunião nas
congregações em Roma. Essas diferenças surgiram nos debates sobre a
obrigatoriedade das leis alimentares do AT e a guarda de dias santos
judaicos. Talvez no cerne do debate estivesse a questão mais importante:
Será que a inclusão dos gentios no povo de Deus significava que Deus tinha
abandonado suas promessas a Israel (veja esp. Rm 9 a 11)? Ao lidar com
essa questão, a carta de Paulo ressaltou a igualdade entre os fiéis judeus e
gentios. Ele insistiu que judeus e gentios igualmente estavam condenados
como pecadores (Rm 2.9; 3.9,23) e que tanto judeus quanto gentios eram
salvos pela graça, mediante a fé, sem as obras da lei (Rm 3.22, 28-30).54 Ele

1077
explicou os diferentes papéis de judeus e gentios durante as diferentes fases
do plano redentor de Deus (Rm 9 a 11). Ele também abordou diretamente
questões como os costumes alimentares e de datas, que aparentemente eram
as fontes imediatas de tensão entre fiéis judeus e gentios (Rm 14.1 a 15.13).
Em terceiro lugar, Paulo queria apresentar-se formalmente às igrejas
romanas e solicitar apoio financeiro para sua missão à Espanha. Paulo tinha
proclamado plenamente o evangelho por toda a metade oriental do Império
Romano, “desde Jerusalém e arredores, até o Ilírico” (Rm 15.19). Agora ele
estava planejando introduzir o evangelho na Espanha, no extremo oeste do
império. Depois de Paulo deixar Jerusalém, ele viajaria para a Espanha,
passando por Roma. Paulo esperava receber uma contribuição financeira da
igreja romana para ajudá-lo em seu esforço missionário na Espanha (Rm
15.21).
A maioria dos estudiosos aceita esses três propósitos para a carta, pelo
menos em algum grau. O desacordo entre os estudiosos que levou ao que J.
D. G. Dunn apropriadamente descreveu como “um longo e aparentemente
interminável debate” sobre o propósito da carta é em geral um desacordo
sobre qual dos diversos propósitos era o primordial para Paulo. Muitos
comentaristas afirmam que o segundo propósito, ou seja, incentivar a
unidade entre fiéis judeus e gentios, era o propósito principal de Paulo, mas
que uma cuidadosa articulação do evangelho era necessária para promover
essa unidade. Paulo percebia que a chave para a unidade entre fiéis judeus e
gentios era um claro entendimento da mensagem cristã. Outros estudiosos
sugerem que dos três propósitos o desejo de Paulo de apresentar o seu
evangelho às igrejas de Roma parece central. Debates sobre qual propósito
era o principal provavelmente não terminarão. A conclusão mais sábia
parece ser a de aceitar os três propósitos.

1078
Dois cuidados deveriam ser tomados no estudo do propósito de
Romanos. Primeiro, os múltiplos propósitos do livro são claramente
interligados. Afirmar um e negligenciar outro leva a uma visão
empobrecida da carta. Segundo, os esforços para identificar um propósito
primário versus um propósito secundário, muitas vezes degeneram em
discussões de natureza sociológica ou psicológica que envolvem uma
grande dose de especulação. A tentativa de M. Seifrid de integrar as
opiniões aceitas em relação ao propósito de Romanos é louvável: Paulo
escreveu para unir as igrejas de Roma sob seu evangelho.55
Por outro lado, os intérpretes devem ter cuidado para não confundir o
propósito de Paulo com os meios pelos quais ele procurou para alcançar
esse propósito. Identificar um propósito principal do livro não é o mesmo
que identificar o tema central do livro. Intérpretes de Romanos há muito
tempo procuram por um tema isolado que unifique e dê continuidade à
carta. Durante a Reforma Protestante, a tendência era colocar o foco na
primeira seção principal do livro e destacar “a justificação pela fé” como o
tema da carta.56 Intérpretes posteriores argumentaram que Romanos 6 a 8
era o coração da carta e o tema central era a união do fiel com Cristo e a
obra do Espírito.57 Outros responderam que Romanos 9 a 11 era o ponto
central da carta e que o foco real era o relacionamento entre judeus e
gentios no plano salvífico de Deus.58 Ainda outros insistiram que a seção
prática, Romanos 12 a 15, expressava o tema central do livro.59 A principal
intenção de Paulo foi chamar a igreja à unidade e promover a harmonia
entre cristãos judeus e gentios. Cada um desses pontos de vista tendia a
enfatizar uma seção da carta e negligenciar o restante.
Estudiosos modernos em geral concordam que o único tema que pode
sintetizar todo o livro é “a justiça de Deus”. Infelizmente, o significado

1079
exato dessa expressão ainda é controvertido. No entanto, por qualquer que
seja a definição, o conceito de “justiça de Deus” parece um pouco estreito
demais para ser identificado como o tema central do livro todo.60
Uma abordagem melhor reconhece “o evangelho” ou “o evangelho da
justiça de Deus” como o tema de toda a carta.61 Várias peças de evidência
apoiam essa afirmação. A palavra “evangelho” e termos relacionados
aparecem frequentemente na introdução e conclusão da carta (Rm 1.1,9, 16;
15.16,19; 16.25). A palavra também é mais proeminente quando Paulo
anuncia o tema do livro em Romanos 1.16, 17. Romanos 1.16 a 15.13,
então, explica detalhadamente os aspectos principais do evangelho de
Paulo.
A intenção de Paulo de apresentar seu evangelho às igrejas sobre as
quais ele sabia muito pouco resultou em uma carta que era mais geral e
diretamente aplicável à igreja cristã em geral e em todas as épocas. De fato,
um comentarista recente sugeriu que a classificação proposta por
Melanchthon da carta como um “tratado” foi prontamente rejeitada:

Essas características mostram que o corpo principal de Romanos é o que podemos chamar de
um “tratado”. Ele aborda as principais questões teológicas em relação ao cenário do
cristianismo de meados do primeiro século, em vez de no contexto de problemas locais
específicos. No entanto, Romanos não é um tratado atemporal. Não devemos nos esquecer
que Romanos como um todo é uma carta, escrita em uma ocasião específica, para uma
comunidade específica. Romanos, assim, é uma carta tratado e tem no seu cerne um
argumento teológico geral, ou uma série de argumentos.62

Vários outros estudiosos que afirmam que Romanos é um documento


ocasional concordam com Moo em enfatizar o caráter teológico da carta. T.
W. Manson retratou Romanos como um manifesto da teologia de Paulo que
resume a resposta de Paulo às controvérsias teológicas que ele enfrentou na
Galácia, Corinto e Filipos.63 Da mesma forma, Bornkamm descreveu

1080
Romanos como o “o último desejo e testamento” de Paulo, por meio do
qual ele legou um resumo de sua teologia às igrejas de Roma.64 P. Barnett
afirmou que “Melanchthon estava mais ou menos certo ao afirmar que
Romanos é ‘um compêndio de doutrina cristã.’”65
O caráter geral da mensagem de Romanos a torna diretamente aplicável
e particularmente útil para os fiéis de hoje. Moo afirmou:

Nós, os estudiosos modernos, devemos tomar cuidado com a nossa tendência de super-
historicizar: concentrar demais o foco em situações pessoais e locais específicas a ponto de
nos esquecer das preocupações teológicas e filosóficas maiores dos autores bíblicos. Não
temos a menor dúvida que em Romanos Paulo estava lidando com preocupações imediatas
da Igreja primitiva. Mas, especialmente em Romanos, essas questões são, no fundo, da igreja
— e do mundo — de todas as épocas: a continuidade do plano salvífico de Deus, o pecado e
a necessidade dos seres humanos, a provisão de Deus para nosso problema do pecado em
Cristo, os meios de uma vida de santidade, e segurança em face do sofrimento e da morte.

LITERATURA
Plano Literário
Eruditos recentes têm feito inúmeras tentativas de classificar o gênero de
Romanos. Vários foram convencidos pela classificação proposta por K. P.
Donfried de Romanos como uma “ensaio-carta”.66 Um ensaio-carta tem
uma introdução epistolar que inclui uma declaração sobre o tema da carta,
uma referência à necessidade ou pedido que inspirou a carta, a resposta do
escritor ao pedido com uma declaração de propósito, e uma descrição do
método de apresentação do material. A transição dessa introdução para o
corpo era marcada por uma expressão específica (prōton men oun). O corpo
da carta era “quase rigidamente expresso na terceira pessoa objetiva ou na
primeira pessoa editorial”.67A organização do corpo da carta é flexível. Os
encerramentos das cartas-ensaios não revelam um padrão consistente.

1081
Embora Stirewalt esteja certo quanto a sua categoria ter certas
vantagens sobre termos mais antigos como “epístola literária” ou Lehrbrief
(“carta didática”, em alemão), essa nova classificação não oferece nenhuma
ideia nova para a interpretação de Romanos. Ela nada diz que os intérpretes
já não tenham deduzido por uma análise atenta do livro.
Outros estudiosos sugerem que Romanos é mais bem classificada de
acordo com categorias padronizadas de retórica. R. Jewett argumentou que
a crítica retórica de Romanos “nos permite entender a estrutura do
argumento no contexto do propósito peculiar da carta, que está em um
contexto de comunicação com uma audiência específica. Isso pode nos
permitir contrabalançar a tendência de seguir o argumento principalmente
do ponto de vista da teologia contemporânea.”68 Alguns têm classificado
Romanos como retórica epidêitica ou demonstrativa, um gênero em que o
escritor reforça valores compartilhados com sua audiência.69 Outros
classificam a carta como retórica protréptica, um gênero em que o autor
tenta persuadir sua audiência. D. Aune classificou Romanos como um
“discurso de exortação” (logos protreptikos) estabelecido em uma estrutura
epistolar. Nesse tipo de discurso, um filósofo procurava ganhar conversos e
atrair jovens para um determinado tipo de vida. Da mesma forma, em
Romanos Paulo se dirige aos cristãos romanos “para convencê-los (ou
lembrá-los) da verdade da versão que ele apresenta do evangelho (Rm 2.16,
veja 16.25; Gl 1.6-9; 2.1) e para incentivar um compromisso com o tipo de
vida que Paulo considerava coerente com seu evangelho.”70 Se as
classificações retóricas são apropriadas para Romanos, essa evidência pode
apoiar melhor a classificação do livro como retórica protréptica
(persuasiva).

1082
Um número crescente de estudiosos argumenta que, embora a
classificação retórica possa ser útil, nenhuma classificação cabe à carta sem
uma modificação significativa. J. D. G. Dunn observou:

O fato-chave aqui é que a distinção da carta supera de longe o significado da sua


conformidade ao costume literário ou retórico atual. Paralelos mostram principalmente como
outros escreviam naquele período; eles não fornecem uma prescrição para o estilo de Paulo e
nenhum critério claro para uma avaliação de Paulo; e o fato de que nenhuma sugestão
específica obteve aceitação generalizada no debate da correção sugere que o estilo de Paulo
era bem mais eclético e instintivo do que convencional e conformista.71

É improvável que Paulo tenha organizado sua carta segundo convenções


retóricas. Cranfield estava correto quando afirmou: “Uma vez decidido a
tentar compor um sumário do evangelho como ele veio a entendê-lo, ele
permitiu que a lógica interna do evangelho como ele entendia determinasse,
pelo menos na maior parte, a estrutura e o conteúdo do que agora seria o
corpo principal de sua carta.”72
Algumas características objetivas da carta auxiliam os intérpretes a
entender sua pretendida estrutura, e a maioria dos estudiosos concorda
sobre suas divisões principais. A carta começa com um pré-escrito epistolar
(1.1-7), que resume o evangelho de Paulo, seguido por uma expressão de
agradecimento. Depois vem o proêmio contendo comentários preliminares
(1.10-15), seguido pela declaração programática que resume a mensagem
da carta (1.16,17). Essa declaração programática dá início à seção
doutrinária da carta (1.16 a 11.36), seguida por uma seção exortatória ou
ética (12.1 a 15.13). Paulo incluiu um resumo de seus planos de viagem e
alguns pedidos de oração (15.14-33), seguidos de uma carta de
recomendação para Febe e saudações a vários grupos e indivíduos em
Roma (16.1-23). A carta termina com uma doxologia (16.25-27).73

1083
O principal debate sobre a estrutura de Romanos diz respeito às divisões
da seção doutrinária. Os estudiosos geralmente concordam que as principais
divisões são os capítulos 1 a 8 e 9 a 16. Eles concordam ainda que 1.16 a
4.25 e 6.1 a 8.39 constituem as principais unidades na primeira divisão, mas
há muita discordância sobre o posicionamento do capítulo 5. Muitos
estudiosos consideram o capítulo 5 como a conclusão de 1.16 a 4.25, mas
uma ligeira maioria pensa que ele introduz 6.1 a 8.39.74 A evidência de 5.1 a
8.39 como a seção principal da carta é baseada no tópico dos capítulos e em
importantes marcadores estruturais. Depois de um parágrafo introdutório
(5.1-11), a seção aborda três importantes liberdades para os fiéis: a
liberdade do pecado e da morte (5.12-21), a liberdade do pecado e do eu
(cap. 6), e a liberdade da lei (cap. 7). A discussão dessas áreas de liberdade
resulta naturalmente em uma discussão da vida no Espírito. Além disso, as
divisões de seção nos capítulos 5 a 8 são marcadas por uma fórmula de
encerramento que aparece no final dos capítulos 5 a 8, com apenas ligeira
variação: “por meio de (dia) Jesus Cristo, nosso Senhor” (5.21; 7.23) e “em
(en) Cristo Jesus, nosso Senhor” (6.23; 8.39).75

ESTRUTURA
I. Introdução (1.1-15)
A. Jesus Cristo é o foco do evangelho, e Paulo está qualificado para
proclamá-lo (1.1-7)
B. Paulo agradece a Deus pelos cristãos de Roma e expressa seu amor
por eles (1.8-15)

II. Tema da carta: o Evangelho revela o poder de Deus para a salvação e sua
justiça (1.16,17)

1084
III. A justiça do homem: a pecaminosidade universal e a justificação pela fé
em Cristo (1.18 a 4.25)
A. A necessidade humana de justificação (1.18 a 3.20)
1. Todos os gentios são pecadores (1.18-32)
2. Todos os judeus são pecadores (2.1 a 3.8)
3. Todas as pessoas são pecadoras (3.9-20)
B. O dom divino da justificação (3.21 a 4.25)
1. Deus provê justificação por meio de Cristo pela fé (3.21-26)
2. A justificação de judeus e gentios é baseada na fé e não nas obras
(3.27 a 4.25)

IV. Os benefícios conferidos pelo Evangelho (5.1 a 8.39)


A. O fiel tem paz, justiça e alegria (5.1-11)
B. O fiel escapa das consequências da transgressão de Adão, o reino do
pecado na morte (5.12-21)
C. O fiel é libertado da escravidão do pecado (6.1-23)
D. O fiel é libertado da servidão à Lei (7.1-25)
E. O fiel vive uma vida justa por meio do poder do Espírito (8.1-17)
F. O fiel, no fim, desfrutará a vitória completa sobre a corrupção (8.18-
39)

V. A justiça de Deus e a rejeição do Evangelho por Israel (9.1 a 11.36)


A. Israel rejeitou Cristo (9.1-5)
B. A rejeição temporária de Cristo por Israel se encaixa no plano eterno
de Deus (9.6-29)
C. A rejeição temporária de Cristo por Israel se deve à busca obstinada
de Israel por justiça própria (9.30 a 10.21)

1085
D. Deus escolheu um remanescente atual dos judeus para a salvação,
enquanto endureceu o restante (11.1-10)
E. Deus acabará por salvar a nação de Israel (11.11-32)
F. O plano de Deus é misterioso e sábio (11.33-36)

VI. As implicações práticas do Evangelho (12.1 a 15.13)


A. Os cristãos deveriam responder à misericórdia de Deus, vivendo
vidas transformadas (12.1,2)
B. Vidas transformadas impactarão os relacionamentos na Igreja (12.3-
21)
C. Vidas transformadas afetarão as relações com as autoridades políticas
(13.1-7)
D. A transformação de vidas é urgente devido à proximidade da volta de
Cristo (13.8-14)
E. Vidas transformadas resultarão na aceitação mútua dos cristãos mais
fracos e mais fortes (14.1 a 15.13)

VII. Conclusão (15.14 a 16.27)


A. Os planos de viagem de Paulo: visitar Roma a caminho da Espanha
(15.14-33)
B. Recomendação de Febe e saudações a cristãos romanos (16.1-16)
C. Advertência final (16.17,18)
D. Recomendação e saudação finais (16.19-24)
E. Bênção de encerramento (16.25-27)

DISCUSSÃO UNIDADE POR DA UNIDADE


I. Introdução (1.1-15)

1086
A. Jesus Cristo é o foco do evangelho, e Paulo está
qualificado para proclamá-lo (1.1-7)
A introdução da carta inclui um breve resumo do evangelho, que destaca
sua base no AT e seu foco em Cristo. Paulo manteve desde o início que a
mensagem do evangelho que ele pregava não era sua, mas de Deus (“o
evangelho de Deus”, 1.1), que “ele antes havia prometido (esse evangelho)
pelos seus profetas nas santas Escrituras” (1.2). A passagem profética
específica que Paulo citou no final do prefácio a Romanos foi Habacuque
2.4, que afirmava que “o justo viverá pela fé” (1.17).
Em essência, Paulo dedicou uma parcela significativa de sua carta a
uma exposição dessa passagem crucial, mostrando depois que o mesmo
ensino nem era original nos profetas do AT, como Habacuque, mas já se
encontrava na lei — especificamente, em Gênesis 15.6, que afirmava que
Abraão era justo com base em sua fé em Deus. Sendo assim, o que está em
jogo não é nada mais do que a consistência do meio divino de salvar
pessoas e a veracidade de suas promessas. Corretamente entendido, só
havia um meio de salvação — fé em Deus sem obras — e esse plano de
salvação já tinha chegado ao clímax de seu cumprimento na morte de Jesus
na cruz como a expressão máxima da fidelidade de Deus em guardar a
aliança.
Como observou Paulo no início, a linhagem davídica de Cristo
confirmava seu direito de governar como Messias-Rei. Em virtude de sua
ressurreição, Jesus era também “o poderoso filho de Deus” (1.4). Uma que
a próxima ocorrência de “poder” em Romanos se refere ao poder salvífico
de Deus (1.16), o título significava que Jesus possuía o poder de salvar
devido a sua ressurreição (veja 4.25; 1Co 15.14,17,20). Por fim, Jesus foi
chamado de “nosso Senhor”, um título que claramente denotava divindade

1087
(veja 10.9,13; Jl 2.32). Assim, a introdução ao evangelho tinha seu foco na
identidade, poder e autoridade de Jesus como Messias-Rei, Salvador e
Senhor-Deus. Além disso, Paulo fez uma breve alusão a sua experiência na
estrada de Damasco e a seu chamado apostólico. Ele explicou que Cristo o
designara apóstolo a fim de produzir obediência entre os gentios ao
mandamento do evangelho para que cressem nas boas novas.76 Este
ministério foi motivado pelo zelo pelo nome de Jesus, o desejo de ver
Cristo glorificado entre todos os povos da terra.

B. Paulo agradece a Deus pelos cristãos de Roma e


expressa seu amor por eles (1.8 a 15)
Paulo explicou que sua incapacidade de visitar as igrejas de Roma não
implicava em falta de preocupação para com eles. Ele orava por eles
incessantemente, e agradecia a Deus por sua fé que era proclamada em todo
o mundo cristão (1.8-10). Ele desejava pregar o evangelho em Roma devido
a um profundo senso de obrigação de anunciar Cristo a todos os tipos de
pessoas.

II. Tema da Carta: O Evangelho Revela o Poder


de Deus para a Salvação e a sua Justiça (1.16,17)
Romanos 1.16,17 expressa o tema da carta. Paulo não se envergonhava de
proclamar o evangelho, porque o evangelho é o poder salvífico de Deus que
alcança a salvação para todos os que creem, sejam eles judeus ou gentios. O
Evangelho revela a justiça de Deus ao declarar os pecadores como sendo
justos, apesar de seus pecados, com base na morte sacrificial de Jesus —

1088
uma verdade plenamente desenvolvida em 3.21-26 (veja a seguir). Paulo
lembrou seus leitores de que a salvação pela fé não era uma mensagem
nova, mas, na realidade, a mensagem central dos profetas do AT (1.17,
citando Hc 2.4, que também é citado em Gl 3.11; cf. Rm 1.1,2). Para os
crentes do AT e do NT, a justiça que resultava na vida sempre tinha sido
imputada com base na fé do indivíduo.

III. A Justiça do Homem: A Pecaminosidade


Universal e a Justificação Pela Fé em Cristo (1.18
a 4.25)
A. A necessidade humana de justificação (1.18 a
3.20)
Começando em 1.18, Paulo explicou que todos os indivíduos necessitam de
justificação já que todos são pecadores justamente condenados por Deus.
Paulo primeiro abordou a pecaminosidade dos gentios, depois a dos judeus
e, por fim, a de toda a humanidade. Especialmente se o conflito judeu-
gentio é uma das principais preocupações pastorais que levaram Paulo a
escrever, essa ênfase na pecaminosidade universal da humanidade era
destinada a colocar todos no mesmo nível logo no início da carta. Judeus e
gentios devem reconhecer a si mesmos primeiro e antes de tudo como
pecadores salvos pela graça. Nem privilégio étnico nem maioria numérica
são uma base adequada para a arrogância. Assim, judeus e gentios devem
encontrar a unidade na justificação pela fé que eles têm em comum e com
base na morte substitutiva de Jesus na cruz, expressão do amor e da
fidelidade de Deus no que diz respeito à observância da aliança.

1089
Segundo Paulo, os gentios mereciam a ira de Deus porque seus pecados
não eram cometidos na ignorância, mas envolviam a supressão das verdades
sobre Deus manifestas a todos (1.18). O principal pecado do homem é não
dar a Deus a glória que ele merece. Deus manifesta sua ira entregando a
humanidade ao poder corruptor do pecado, para que o comportamento
pecaminoso do homem se torne progressivamente mais hediondo e
repugnante. Os gentios experimentam uma transferência de propriedade
espiritual e moral que os leva à idolatria, perversão sexual e completa
decadência moral (1.26,27). Eles escolhem viver em rebelião contra Deus,
apesar de sua clara compreensão de que o pecado resulta em morte.
Embora os judeus pudessem sentir que sua superioridade moral em
relação aos gentios iria beneficiá-los no juízo, Paulo advertiu que julgar os
outros não impedia Deus de perceber a culpa daquele que julgava (2.1). A
bondade de Deus para com Israel não implicava que os judeus eram justos
em e por si mesmos de forma que não tivessem necessidade de se
arrependerem. Ao contrário, a bondade de Deus para com Israel era um
chamado ao arrependimento (2.4). Deus julgaria cada pessoa de forma
correta, e lhe daria a punição ou a recompensa que as suas obras
merecessem. Ele julgaria judeus e gentios de forma igual, correta e justa,
pois o julgamento de Deus não era baseado em favoritismo. O
desconhecimento da lei escrita não eximia uma pessoa do julgamento uma
vez que Deus inscreveu os requisitos da lei no coração de cada pessoa.
Assim, tanto judeus quanto gentios merecem a ira de Deus (2.5).
Embora os judeus preguem e ensinem a lei, eles não obedecem a lei e,
assim, desonram a Deus e blasfemam seu nome. A circuncisão, da mesma
forma, não garante proteção contra o juízo divino e era tornada sem sentido
pela transgressão da lei (2.25). Por outro lado, um gentio incircunciso que

1090
cumpre a lei de Deus deve ser visto como um judeu circuncidado e um
membro do povo da aliança (2.27). O verdadeiro judeu que Deus louvará
em juízo é aquele que foi transformado interiormente (2.28,29).
Os judeus realmente possuem certas vantagens sobre os gentios. Deus
escolheu conceder a eles as Escrituras do AT, e ele se manteve fiel a suas
promessas a Israel (3.1-4). Ainda assim, a justiça de Deus não é
comprometida pelo seu castigo dos pecados dos judeus, mas ela seria
diminuída se ele não punisse os pecados deles. Embora a pecaminosidade
do ser humano acentue a gloriosa justiça, fidelidade e veracidade de Deus,
isso não é desculpa para o pecado nem encoraja sua prática (3.7,8).
Na verdade, as descrições dos judeus no próprio AT demonstram sua
intensa pecaminosidade e mostram que os judeus não são melhores que os
gentios (3.9). A lei que Israel possui não é um meio de salvação. Antes,
demonstra a pecaminosidade do homem de modo que ele se desespera de
salvar a si mesmo pela sua própria justiça. Todas as pessoas, judeus e
gentios, são justamente condenadas como pecadoras por Deus (3.19,20). A
graça só pode aparecer quando as pessoas veem sua desesperadora
necessidade dela; aqueles que são espiritualmente pobres herdarão o reino
dos céus (Mt 5.3).

B. O dom divino da justificação (3.21 a 4.25)


Tendo estabelecido a pecaminosidade universal de judeus e gentios
igualmente — o “apuro” da humanidade — Paulo passou a indicar a
solução: a justificação pela fé em Jesus Cristo. A presente seção elabora de
forma mais completa os comentários de Paulo na introdução. Tanto a Lei
(esp. Gn 15.6; veja mais adiante) quanto os Profetas (esp. Hc 2.4; veja

1091
acima) testificam que Deus declara justos a seus olhos aqueles pecadores
que creem em Jesus Cristo (1.1,2,16,17), e ele fez isso para aqueles que não
conseguiram cumprir a lei. Em um pronunciamento surpreendente, Paulo
declarou: “Mas agora, sem a lei, a justiça de Deus se manifestou, atestada
pela lei e os profetas, isto é, a justiça de Deus por meio da fé em Jesus
Cristo, para todos os que creem, pois não há distinção. Porque todos
pecaram e estão destituídos da glória de Deus” (3.21-23).
A expressão “sem a lei” introduz uma impressionante disjunção entre o
ponto de referência anterior do povo de Deus — a lei — e seu novo ato
benigno de salvar pessoas com base no sacrifício expiatório de Jesus Cristo.
A declaração de justiça feita por Deus impede qualquer orgulho humano e
coloca judeus e gentios em pé de igualdade (3.22). A morte sacrificial de
Jesus expôs a justiça de Deus, declarando que os pecadores são justos com
base apenas na fé (3.25). Se Deus simplesmente ignorasse os pecados de
suas criaturas, ele não seria justo. No entanto, na morte de Jesus pelos
pecadores a justiça de Deus foi graciosamente expressa, porque o pecado
foi punido (veja 2Co 5.21) e Deus foi capaz de perdoar e justificar
pecadores sem comprometer sua própria santidade.
Ao mesmo tempo, o evangelho no qual a justiça vem pela fé em Cristo e
não pelo cumprimento da lei não dispensa a lei totalmente — embora
coloque seu papel em uma perspectiva adequada (veja esp. 10.4, mais
adiante). Pelo contrário, ele afirmou o que a lei sempre tinha dito sobre a
salvação (3.31). A lei afirma claramente que Abraão, o pai dos judeus, foi
declarado justo aos olhos de Deus por meio da fé (Rm 4.3, citando Gn 15.6;
cf. Gl 3.6). Essa justiça não foi uma posição que Abraão alcançou por meio
de suas boas obras, mas uma dádiva que ele recebeu. Salmos 32.1,2

1092
também descreve essa justiça imputada. Assim, as Escrituras do AT
apoiavam o evangelho pregado por Paulo.
Essa justiça foi imputada a Abraão antes de ele ser circuncidado (4.10).
Assim, Deus creditou essa justiça a uma pessoa com base apenas na fé, sem
a circuncisão. Essa justiça também foi creditada a Abraão antes da lei
Mosaica ter sido dada, demonstrando ainda mais que Deus concedeu essa
justiça com base na fé e não na observância da lei (4.13-15). As promessas
para a descendência de Abraão (que incluíam receber uma posição justa e
vida no mundo vindouro) foram concedidas aos fiéis, tanto judeus quanto
gentios, em cumprimento da promessa de que Abraão seria o pai de muitas
nações (4.18).
A fé de Abraão é paralela à fé cristã. Abraão creu que Deus poderia
trazer “vida da morte”, um filho prometido a partir de pessoas idosas que já
estavam próximas da morte (4.19; veja Hb 11.12). Da mesma forma, os
cristãos creem que Deus ressuscitou Jesus dos mortos, assim exibindo a fé
de Abraão e recebendo a promessa da justiça imputada. Além disso, como
Hebreus indica, Abraão também exerceu fé no Deus que ressuscita os
mortos, quando ele estava disposto a oferecer Isaque, o filho prometido, no
altar, em vez de poupá-lo, pois “ele considerou que Deus era capaz até de
ressuscitar alguém dentre os mortos” (Hb 11.19).

IV. Os Benefícios Conferidos Pelo Evangelho (5.1


a 8.39)
A. O fiel tem paz, justiça e alegria (5.1-11)
Em Romanos 5.1, Paulo começou a descrever os benefícios conferidos aos
fiéis por meio do evangelho. Essa descrição dos benefícios ocupou sua

1093
atenção por quatro capítulos inteiros. Para começar, por causa da
justificação, os fiéis estão em paz com Deus e alegremente anteveem sua
transformação completa e final (5.1-5). Enquanto os pecadores estavam em
uma condição espiritual miserável — fracos, incapazes de salvar a si
mesmos, ímpios e pecadores — Cristo morreu por eles (5.6). Por meio da
morte sacrificial e substitutiva de Jesus, fiéis que eram anteriormente
inimigos de Deus foram reconciliados com Deus. Aqueles que estavam
condenados a sofrer sua ira eterna foram resgatados da condenação, e
aqueles que foram considerados pecadores foram declarados justos (5.9-11).

B. O fiel escapa das consequências da transgressão


de Adão, o reinado do pecado e da morte (5.12-21)
O impacto da desobediência de Adão sobre a raça humana oferece um
paralelo negativo ao impacto da obediência de Cristo sobre os fiéis (5.12).
Devido ao pecado de Adão, todas as pessoas morrem. Mesmo aquelas que
viveram antes da promulgação da lei e que não tinham mandamento
explícito para desobedecer morreram (5.13). Obviamente, um único ato de
uma pessoa pode ter um impacto universal e eterno. No entanto, a
obediência de Jesus Cristo tinha o poder de cancelar as consequências da
desobediência de Adão. Se a desobediência de um homem podia causar a
morte de muitos outros, a obediência de Cristo podia também conceder
justiça e vida para muitos (5.15). Assim como os efeitos da desobediência
de Adão foram universais, os efeitos da obediência de Cristo também foram
universais já que Cristo concedeu justiça e vida para aqueles que creem,
sejam judeus ou gentios. A lei não introduziu a morte no mundo. Ela
ofereceu aos descendentes de Adão mandamentos explícitos para

1094
desobedecer assim como Adão tinha feito (5.20). Isso tornou o pecado mais
desenfreado e mais hediondo. Essa pecaminosidade generalizada e intensa
engrandece a abundância e a majestade da graça de Deus (5.21).

Tabela 13.1: Perguntas Retóricas e Respostas em Romanos 6 e 7


Passagem Pergunta retórica Resposta
6.1-3 “Que diremos então? “De modo nenhum! Nós
Permaneceremos no que morremos para o
pecado, para que a graça pecado, como ainda
se multiplique?” viveremos nele?”
6.15,16 “E então? Havemos de “De modo nenhum! Não
pecar porque não sabeis que, quando vos
estamos debaixo da lei, apresentais a alguém
mas debaixo da graça?” como escravos para lhe
prestar obediência, sois
escravos deste a quem
obedeceis?”
7.7 “Que diremos? A lei é “De modo nenhum! Ao
pecado?” contrário, eu não
conheceria o pecado se
não fosse pela lei.”
7.13 “Então, o que era bom “De modo nenhum! Ao
tornou-se morte para contrário, o pecado, para
mim?” que se mostrasse como
pecado, produziu em
mim a morte por meio do
que era bom, a fim de
que pelo mandamento o
pecado se mostrasse
extremamente
pecaminoso.”

1095
C. O fiel é libertado da escravidão do pecado (6.1-
23)
Não se deveria concluir disso, como alguns dos oponentes de Paulo o
acusaram de ter ensinado, que o pecado servia a um propósito positivo e
deveria continuar a ser praticado (6.1,2). A união do fiel com Cristo em sua
morte, sepultamento e ressurreição é incompatível com uma vida
pecaminosa. A pessoa que o fiel tinha sido já morrera com Cristo (6.3).
Agora, o fiel foi libertado do domínio do pecado. Com o tempo, a união do
fiel com Cristo resultará em sua ressurreição e completa libertação do
pecado. No presente, os fiéis deveriam viver em função do fato de que o
domínio do pecado foi quebrado. Eles deveriam oferecer a si mesmos a
Deus como instrumentos da justiça (6.11-14). A salvação pela graça não
concede licença para um comportamento pecaminoso. O fiel tem um novo
proprietário espiritual — a justiça, de modo que ele deveria viver como um
escravo da justiça (6.18). A escravidão ao pecado não concede nenhum
benefício para o pecador; ela o condena a morrer. A escravidão à justiça
produz santidade e resulta em vida eterna.

D. O fiel é libertado da escravidão da lei (7.1-25)


O fiel foi libertado da lei. A morte anula a aliança de casamento de modo
que ele não é mais legalmente válido (7.1). Depois de um dos cônjuges ter
morrido, o cônjuge sobrevivente está livre da lei do casamento e pode se
casar com outra pessoa. De forma semelhante, a morte anulou o poder da lei
(7.4). Por sua união com Cristo na sua morte, o fiel foi libertado da lei e
liberado para se dedicar a Deus. A libertação da lei, união com Deus em

1096
Cristo e o fortalecimento pelo Espírito capacitaram o fiel a viver uma vida
justa, algo que a lei não podia fazer.
A lei, na verdade, agravou e despertou o pecado nos incrédulos, mas
isso não significa que a lei era má (7.7). A lei era santa, justa e boa, mas a
natureza pecaminosa usou a lei como uma arma para destruir o pecador.
Paulo ilustrou essa verdade apresentando o exemplo de uma pessoa que se
esforça para obedecer à lei perfeitamente. Ele mostrou que a lei ainda servia
a uma função positiva, demonstrando a corrupção total da pessoa e a
escravidão do pecado. Ao mesmo tempo, a lei era impotente para salvar a
pessoa de sua escravidão ao pecado (7.13). Qualquer um que tente cumprir
as exigências da lei sem a habilitação do Espírito Santo estava envolvido
em um exercício frustrante de futilidade. Essa pessoa está presa em um
constante cabo-de-guerra entre a parte dela que se deleita na lei de Deus e a
parte dominada pelo pecado (7.14-25). Somente a crucificação e a
77
ressurreição com Cristo podem resolver essa luta desesperada.

E. O fiel vive uma vida justa por meio do poder do


Espírito (8.1-17)
No entanto, o fiel desfruta a presente vitória sobre o pecado. O Espírito
realiza para o fiel o que a lei não pode realizar. O Espírito, que possibilita
essa vida nova em Cristo, portanto, substitui a antiga lei como ponto de
referência na vida do fiel (8.2; veja 10.4). O Espírito liberta o fiel da
escravidão do pecado e o leva a cumprir, de forma natural e espontânea, as
justas demandas da lei (8.9). O Espírito exerce o mesmo poder que ele usou
para ressuscitar Jesus dentre os mortos, a fim de produzir uma vida nova no

1097
fiel. Aqueles que vivem pelo Espírito de Deus são filhos de Deus e,
portanto, herdeiros que terão parte na glória de Deus (8.17).

F. O fiel, por fim, desfrutará uma vitória completa


sobre a corrupção (8.18-39)
Toda a criação aguarda ansiosamente a glorificação do povo de Deus (8.18).
Os fiéis esperam ansiosamente pela conclusão da sua adoção, mediante a
redenção do corpo, quando sua transformação será completa e sua luta com
o pecado chegará ao fim. No presente, Deus opera por meio de cada
circunstância para realizar o bem espiritual dos fiéis (8.28). O propósito
eterno de Deus não será frustrado, e ele, de modo infalível, fará aqueles a
quem amou desde a eternidade passada tornarem-se como seu Filho
(8.29,30). A conclusão da salvação do fiel por meio da sua justificação no
juízo final e na sua glorificação é absolutamente certa, porque Deus se
certificará de que todas essas coisas ocorram para as pessoas a quem ele
ama.

V. A Justiça de Deus e a Rejeição do Evangelho


por Israel (9.1 a 11.36)
A. Israel rejeitou a Cristo (9.1-5)
Embora Romanos 1 a 8 esteja relacionado primariamente com a justificação
do homem — alcançada pela fé em Cristo, com base em sua morte
expiatória — os capítulos 9 a 11 se voltam para um tópico ainda mais
importante (antecipado nos capítulos 1 a 8) — a justificação de Deus. Com
isso se entende o que os estudiosos chamam de “teodiceia”, a demonstração

1098
que, ao contrário do que alguns poderiam alegar, Deus foi justo e correto
em tudo o que ele fez. No presente caso, a alegada congruência nos
propósitos de Deus era o fato de que a maioria dos judeus não creu em
Jesus como Messias. Assim, muitos judeus acusaram, Deus tinha quebrado
suas promessas da aliança.
“Não é isso”, Paulo rebateu. Apesar de que pudesse parecer ter havido
uma mudança no modo de operar de Deus, as suas promessas a Israel
continuam inabaláveis. Ao mesmo tempo, Deus agora inclui os gentios na
promessa a Abraão de que nele “todas os povos da terra serão abençoados”
(Gn 12.3). Assim, “não é o caso de a palavra de Deus ter falhado” (9.6).
Nesse aspecto, o próprio Paulo, que ficou conhecido como o apóstolo dos
gentios, foi profundamente dilacerado interiormente, pois ele ainda amava
muito seus irmãos israelitas. Na verdade, ele diz que ele mesmo desejaria
“ser amaldiçoado e excluído de Cristo” para o benefício dos seus
compatriotas judeus (9.3).

B. A rejeição temporária de Cristo por Israel é


coerente com o plano eterno de Deus (9.6-29)
Embora a rejeição de Cristo por Israel possa parecer contradizer a
infalibilidade das promessas de Deus e abalar as esperanças do fiel, as
promessas de Deus a Israel não falharam (9.6). O restante dos capítulos 9 a
11 é dedicado a demonstrar a veracidade da afirmação de Paulo. Para
começar, nem todos os descendentes físicos de Abraão são verdadeiros
israelitas. As promessas de Deus se aplicam apenas àqueles a quem ele
escolheu. Sua escolha, por sua vez, baseia-se, não no caráter ou
comportamento humanos, mas no propósito misterioso de Deus (9.14-18).

1099
Por essa razão, não se deve acusar Deus de injusto (9.19-21). Isso seria
inverter indevidamente os papéis de criatura e Criador (veja o livro de Jó).
Deus é livre para mostrar sua misericórdia a quem ele queira, pois em sua
soberania absoluta o Criador tem total autoridade sobre suas criaturas.
Também não é apropriado contestar o caráter de Deus, se ele glorificou a si
mesmo ao expressar sua ira contra algumas pessoas, enquanto derramava
sua misericórdia sobre outras. Deus ainda teria sido justo se não tivesse
salvado ninguém. Ele certamente é justo se, por pura graça, escolheu salvar
a muitos sem salvar a todos.

C. A rejeição temporária de Cristo por Israel deve-


se a sua busca obstinada de justiça-própria (9.30 a
10.21)
Mas, Israel era totalmente responsável por sua condição espiritual. Os
gentios obtiveram a verdadeira justiça pela fé, enquanto Israel procurou a
justiça mas não a alcançou, porque tentou estabelecer sua própria justiça
por meio da obediência à lei e não pela fé em Cristo (9.30-32). Assim,
apesar de todos os seus esforços, Israel não encontrou a verdadeira justiça,
porque a lei era cumprida somente por meio da fé em Cristo. Como
demonstra o AT, a salvação vem somente por meio da confissão de fé em
Jesus Cristo (9.33, citando Is 8.14; 28.16).
Na verdade, Israel não deixou de confessar a fé em Cristo porque estava
desinformado sobre Cristo (10.1-4). Todo Israel ouviu a mensagem sobre
Cristo, mas a maioria rejeitou a mensagem em desobediência obstinada. No
entanto, Cristo é “o fim da lei”. No contexto, isso significa que Cristo põe
fim, para o fiel, à tentativa de alcançar a justiça mediante a observância da

1100
lei. Ao contrário de Israel, o fiel deixa de procurar estabelecer sua própria
justiça (8.3). O fiel desiste da vã esperança de receber vida fazendo as
coisas escritas na lei (8.5). Como “o fim da lei”, Cristo é o objetivo final ao
qual o AT, em sua totalidade, profeticamente apontou. Ele também é,
literalmente, o fim da lei porque ele, em sua própria pessoa, cumpriu a lei.
Por isso, a lei é incorporada em Cristo, e os fiéis podem olhar para aquele
que cumpriu a lei enquanto eles vivem sua vida cristã mediante a
capacitação do Espírito.
Paulo prosseguiu citando outros textos-prova do AT, a fim de
demonstrar que a salvação de judeus e gentios claramente resultava da
mensagem do AT. Essa salvação, por sua vez, baseava-se na confissão de
que “Jesus é o Senhor”, e na fé de que Deus o ressuscitou dos mortos
(10.9). Essa era a essência da fé e cumpria a premissa de que “todo aquele
que invocar o nome do Senhor será salvo” (10.13, citando Is 28.16) — tanto
judeu quanto gentio. Além disso, se a fé em Cristo é necessária para a
salvação, então tem de haver mensageiros contando às pessoas as boas
novas da salvação em Cristo (10.14-21; veja Is 52.7; 53.1).

D. Deus escolheu um presente remanescente dos


judeus para a salvação enquanto endurecia o
restante (11.1-10)
Até agora a “justificação de Deus” apresentada por Paulo foi amplamente
dedicada à demonstração de que Deus estava certo ao condenar os judeus
por tentarem estabelecer uma justiça própria em vez de submeterem ao
caminho da salvação que Deus estabeleceu (10.3). Isso abriu a porta para a
salvação de um grande número de gentios que não tinham essa ambição e

1101
que anteriormente tinham estado longe (10.20, citando Is 65.1), talvez
provocando o ciúme de Israel (10.19, citando Dt 32.21). No entanto, como
Paulo passou a mostrar no capítulo 11, Deus não rejeitou Israel
inteiramente. Por sua graça, Deus escolheu uma porção de Israel para a
salvação. Esse remanescente alcançará a justiça que Israel tinha procurado.

E. Deus acabará por salvar a nação de Israel


(11.11-32)
Assim, Deus usou a rejeição do evangelho por Israel para seus graciosos
propósitos de trazer a salvação para os gentios (11.11,12). Agora, Deus usa
a recepção do evangelho pelos gentios para causar inveja aos judeus e levar
alguns deles à fé em Cristo. Ao mesmo tempo, os gentios não deveriam ser
arrogantes para com os judeus (11.17-21). Sua salvação repousa nas
promessas de Deus a Israel e é baseada na fé. Deus está pronto para aceitar
o remanescente de Israel, quando eles se arrependem de sua incredulidade.
Os gentios, Paulo advertiu, não deveriam presumir que eles têm uma
posição favorecida com Deus. No tempo designado, Deus mudaria seu foco
para a nação de Israel novamente. Grandes multidões de judeus serão
salvas. Isso era necessário porque as dádivas e o chamado de Deus são
irrevogáveis. Assim o argumento de Paulo se completou, e ele comprovou
que a palavra de Deus é verdadeira (9.6). Os justos propósitos histórico-
salvíficos de Deus para judeus e gentios se mostraram coerentes e
consistentes, embora além da completa compreensão humana, em última
análise.

F. O plano de Deus é misterioso e sábio (11.33-36)

1102
Apropriadamente, portanto, Paulo concluiu sua demonstração da justiça de
Deus nos capítulos 9 a 11 com uma doxologia, afirmando o mistério e a
sabedoria dos caminhos de Deus. Como o apóstolo explicou, Deus exibiu,
de forma maravilhosa, sua sabedoria misteriosa usando gentios e judeus
para que levassem uns aos outros a crer em Cristo. Essa compreensão
deveria conduzir todos os fiéis a louvarem a profundidade da sabedoria de
Deus e a reconhecerem que Deus é glorioso em tudo o que faz, não
importando se eles agora compreendem plenamente todos os seus
propósitos.

VI. As Implicações Práticas do Evangelho (12.1 a


15.13)
A. Os cristãos devem responder à misericórdia de
Deus vivendo vidas transformadas (12.1,2)
Com base nos seus argumentos precedentes (“portanto”, 12.1), Paulo
exortou os fiéis a responderem à misericórdia de Deus devotando suas vidas
completamente a ele e tendo mentes renovadas que conhecem a vontade de
Deus. Eles devem fazê-lo, não trazendo uma série de sacrifícios como as
pessoas faziam nos tempos do AT, mas apresentando a si mesmos — os
seus próprios corpos na sua totalidade — como um “sacrifício vivo, santo e
agradável a Deus”. Esse será seu “culto espiritual”, e é assim que eles serão
capazes de discernir “a boa, agradável e perfeita vontade de Deus (12.2).

B. Vidas transformadas impactarão os


relacionamentos na Igreja (12.3-21)

1103
A mente renovada é caracterizada pela humildade. Ela reconhece a
interdependência dos diferentes membros da igreja e não estabelece uma
hierarquia na igreja com base nos dons espirituais (12.3-8). A mente
renovada é também caracterizada pelo amor. Esse amor se manifesta por
meio do perdão, simpatia, harmonia, humildade e bondade (12.9-21).

C. Vidas transformadas afetarão os


relacionamentos com as autoridades políticas (13.1-
7)
Outra implicação importante do evangelho que Paulo pregava é que todos
os fiéis deveriam se submeter às autoridades governamentais. A autoridade
governamental foi nomeada por Deus, preserva a ordem e impede a
anarquia. Por essa razão, os fiéis deveriam, de forma consciente, pagar seus
impostos e mostrar respeito aos líderes políticos. Essas palavras assumem
uma importância especial à luz do fato de que foram escritas durante o
mandato do imperador Nero (54-68), cujo reinado infame seria responsável
pelo martírio de muitos cristãos, incluindo o do próprio Paulo.

D. A transformação de vidas é urgente devido à


proximidade da volta de Cristo (13.8-14)
Os fiéis deveriam cumprir a lei expressando amor pelos outros. Expressar
amor para com os outros e viver de forma íntegra é especialmente
importante uma vez que o retorno de Cristo se aproxima rapidamente.

1104
E. Vidas transformadas resultarão na aceitação
mútua de cristãos mais fracos e mais fortes (14.1 a
15.13)
Os fiéis devem aceitar um ao outro em amor, mesmo quando discordam
sobre questões de consciência, como sobre a lei alimentar e a observância
de dias sagrados (14.1-8). Eles deveriam seguir sua própria consciência a
esse respeito, tendo o cuidado de não permitir que seu comportamento
perturbe outros fiéis que possuem convicções diferentes. Além disso, eles
deveriam se certificar de não encorajar outros fiéis a fazerem algo que eles
não acreditam ser certo. É errado comer, beber ou fazer qualquer coisa que
perturbe a consciência dos demais.
Cristãos judeus e gentios, o fraco e o forte, deveriam viver em unidade e
tentarem edificar um ao outro (14.19). Eles deveriam aprender a glorificar a
Deus com um só coração e a uma só voz. O próprio Jesus veio a este mundo
como um servo aos judeus, cumprindo as promessas feitas aos judeus e
incluindo, ainda, os gentios no plano de Deus, para que eles pudessem
glorificar a Deus como foi predito nas Escrituras do AT.

VII. Conclusão (15.14 a 16.27)


A conclusão da carta de Paulo aos Romanos é mais longa do que a da suas
outras cartas, no entanto ela é adequada, tendo em conta a extensão de toda
a carta e tendo em vista o fato de que Paulo nem tinha plantado a igreja em
Roma, nem a tinha visitado ainda. Particularmente notável é o grande
número de indivíduos saudados por Paulo em 16.1-16.

1105
A. Os planos de viagem de Paulo: visitar Roma a
caminho da Espanha (15.14-33)
Finalmente, Paulo elaborou sobre um dos principais propósitos de escrever
a carta: seu plano de visitar Roma a caminho da Espanha (15.24). Em vez
de fazer de Roma o destino final de sua iminente visita, o apóstolo
pretendia que Roma fosse uma simples parada em jornada para as fronteiras
ocidentais extremas de sua missão europeia. Nisso Paulo serve como um
modelo de missionário pioneiro, sendo seu objetivo “anunciar o evangelho
não onde Cristo já havia sido proclamado para não edificar sobre
fundamento alheio” (15.20). Paulo também pediu oração para que ele fosse
livrado dos infiéis da Judeia e para uma entrega bem sucedida da oferta dos
gentios para a Igreja de Jerusalém (15.30-32). Mas como o livro de Atos
deixa claro, Paulo foi preso em Jerusalém e, finalmente, chegou a Roma,
embora não da maneira que ele tinha inicialmente imaginado (At 21 a 28).

B. Recomendação de Febe e saudações aos cristãos


de Roma (16.1-16)
No final da carta, Paulo primeiro recomendou a provável portadora da carta,
Febe, uma serva ou diaconisa (diakonos) da igreja em Cencreia e uma
benfeitora ou patrocinadora de muitos, incluindo Paulo (16.1,2).78 Paulo
também saudou seus confiáveis colegas de trabalho, Priscila e Áquila (que,
aparentemente, tinham retornado a Roma), incluindo a igreja que se reunia
na casa deles (16.3-5; veja At 18.2). Isso é seguido por uma longa lista de
saudações a várias pessoas e igrejas domésticas, incluindo um número
surpreendentemente grande de mulheres.79

1106
C. Advertência final (16.17,18)
Uma advertência final é proferida contra aqueles que causam divisões.
Paulo implora que os fiéis evitem esses indivíduos e que não sejam
enganados por sua conversa suave ou suas palavras lisonjeiras.

D. Elogio e saudações finais (16.19-24)


Paulo elogia os fiéis em Roma pela sua obediência e os exorta a serem
sábios em relação ao bem, mas ingênuos em relação ao mal. Deus em breve
esmagará Satanás debaixo dos pés deles. Timóteo e outros enviaram
saudações, assim como Tércio (amanuense de Paulo), Gaio (hospedeiro de
Paulo) e Erasto (o tesoureiro da cidade), entre outros.

E. Bênção de encerramento (16.25-27)


Uma bênção gloriosa conclui a carta. Ela inclui a referência final de Paulo a
seu Evangelho e à revelação do “mistério sagrado” de Deus que estava
previsto nas Escrituras proféticas, segundo o qual “a obediência da fé entre
todas as nações” estava agora a avançando por meio de Paulo e seus
associados para a glória de Deus em Cristo.

TEOLOGIA
Temas Teológicos
O Evangelho

1107
A carta de Paulo aos romanos faz uma enorme contribuição ao cânon do
NT. Esta carta contém a apresentação mais extensa do evangelho de Paulo.
Romanos 1.18 a 3.20 é o tratamento mais completo e prolongado de Paulo
sobre a pecaminosidade universal do ser humano. O retrato que Paulo faz
do pecador é uma representação vívida da rebelião da criatura contra o
Criador, uma descrição que desmascara sua profunda depravação.
Raramente alguém vê a horrível feiura de sua alma com clareza tão
chocante como nestes versículos instigantes.
Além disso, em Romanos 3.21 a 4.20 Paulo faz a mais desenvolvida
exposição de sua doutrina da justificação. Paulo discutiu essa doutrina
amplamente em Gálatas. Mas, como Bruce afirmou, “os argumentos que
são forçados sobre as igrejas de uma maneira urgente e ad hoc são
apresentados de forma mais sistemática em Romanos”.80 J. B. Lightfoot
escreveu que o tratamento da justificação em Gálatas comparado ao
tratamento em Romanos é “como o modelo bruto comparado a uma estátua
terminada”.81 Romanos acrescenta detalhes específicos à discussão da
justificação que o tratamento anterior em Gálatas não inclui, como o ponto
de que Abraão foi justificado antes de ser circuncidado; que a fé de Abraão
é estreitamente paralela à fé cristã no Deus que ressuscitou Jesus e que
justifica os pecadores, e que todas as três seções principais do AT
confirmam a justificação pela fé.
Ademais, em Romanos 5.1 a 8.39 Paulo apresenta a mais desenvolvida
discussão sobre o novo estado espiritual do fiel, particularmente sua
libertação da morte, do pecado, da lei e da corrupção. Então, em 12.1 a
15.13, Paulo descreveu em vívidos detalhes as implicações práticas desse
novo estado espiritual. Embora Romanos seja frequentemente associada
com a doutrina da justificação somente pela fé, não se deve esquecer que

1108
Paulo entende que a justificação leva inevitavelmente à santificação na qual
o Espírito impele e capacita o fiel a cumprir as justas exigências de Deus no
cumprimento das promessas da nova aliança (8.1-4).
Por fim, Romanos contém o que é, de longe, o tratamento mais
completo de Paulo do relacionamento de Deus com a nação de Israel.
Romanos 9-11 discute de forma detalhada a eleição graciosa de Israel, a
fidelidade de Deus a sua aliança, a rejeição da graça de Deus por Israel, o
propósito positivo dessa rejeição na história da redenção, e a salvação
futura de Israel. Esses capítulos expressam o amor do “apóstolo dos
gentios” pelo povo de Israel de forma mais poderosa e com mais paixão do
que qualquer outro texto que ele escreveu.
O conhecimento que o cristão tem do evangelho é muito mais rico e sua
alegria mais abundante após ele ter imergido sua alma no estudo dessa
grande carta. Como Martinho Lutero escreveu quase 500 anos atrás, no
prefácio de seu comentário de Romanos, essa carta “merece não só que todo
cristão a conheça palavra por palavra, de cor, mas que se envolva com ela
todos os dias, como o alimento diário da alma. Ela nunca pode ser lida ou
meditada demais, e quanto mais se lida com ela, mais preciosa ela se torna e
mais saborosa se mostra”.82

A “justiça de Deus”
Um dos principais temas de Romanos é a insistência em que os indivíduos
são vistos por Deus como justos somente com base na fé e não pelas obras
da lei. Esse tema é tão proeminente que muitos intérpretes, desde a Reforma
Protestante, têm visto a justificação pela fé como o principal foco da carta.
Apesar de muitos agora insistirem que a justificação não pode ser escolhida

1109
como o tema central de todo o livro, a maioria ainda reconhece que é, pelo
menos, o foco de 1.1 a 4.25, onde Paulo explicou que os fiéis são
declarados justos com base na morte sacrificial de Jesus e que esse é o
único meio de salvação, uma vez que todos falharam em viver de acordo
com o padrão da lei.
A “justiça de Deus” refere-se à justiça creditada ao fiel por Deus.
Paulo exclamou que “a justiça de Deus” está sendo revelada por meio do
evangelho (1.17). A presença dessa expressão na declaração programática
da carta demonstra a importância da justiça de Deus nessa carta. Na
verdade, vários estudiosos sugeriram que o foco central dessa carta é a
justiça de Deus. A. Schlatter estava tão convencido disso que deu a seu
comentário dessa carta o seguinte título: Romanos: A Justiça de Deus.83
Trava-se um debate enorme sobre o significado exato da expressão “justiça
de Deus” (dikaiosynē tou theou). Gramaticalmente, estas são as principais
opções: (1) a justiça produzida por Deus (genitivo subjetivo); (2) o atributo
de justiça do próprio Deus (genitivo possessivo); e (3) a justiça imputada
por Deus (genitivo de origem). Examinaremos brevemente cada uma dessas
opções.
A justiça produzida por Deus. Um número crescente de estudiosos vê a
justiça de Deus como a atividade ou poder salvíficos de Deus. Alguns
fatores dão apoio a essa interpretação. Em primeiro lugar, uma série de
antigos textos judaicos, incluindo várias passagens do AT, usa os termos
“justiça” e “salvação” de forma intercambiável. Talvez o melhor exemplo
seja Isaías 51.5-8:

Minha justiça está próxima, minha salvação vem saindo, e os meus braços trarão justiça para
os povos. As regiões costeiras porão sua esperança em mim, e confiarão na minha força.
Levantai os olhos para os céus e olhai para baixo, para a terra, porque os céus desaparecerão
como fumaça, e a terra envelhecerá como se fosse uma roupa; e seus moradores morrerão da

1110
mesma forma. Mas a minha salvação durará para sempre, e a minha justiça nunca será
abolida.
Ouvi-me, vós que conheceis a justiça, vós, povo em cujo coração está a minha lei; não
temais o desprezo dos homens, nem vos perturbeis com suas ofensas. Pois a traça os roerá
como uma roupa, e o bicho os comerá como se fossem lã. Mas a minha justiça durará para
sempre, e a minha salvação, por todas as gerações.

Se Paulo usou o termo “justiça de Deus” em harmonia com esse ou


outros textos semelhantes do AT, “justiça” se referiria à atividade salvífica
de Deus.84 Em segundo lugar, essa interpretação associa estreitamente os
termos “justiça”, em 1.17, e “poder”, em 1.16. Em terceiro lugar, o poder
salvífico de Deus é uma categoria ampla e bem adequada para servir de
sumário, não apenas dos quatro primeiros capítulos de Romanos, mas do
conteúdo de toda a carta. Ela englobaria justificação, santificação e
glorificação.
Os estudiosos que veem a justiça de Deus nos escritos de Paulo como o
poder salvífico de Deus, normalmente insistem que a justiça de Deus é mais
do que uma dádiva e envolve mais do que a mera imputação de justiça. Em
vez disso, o poder salvífico de Deus na verdade torna o pecador justo e
transforma e restaura todo o cosmo decaído. Käsemann, por exemplo, assim
definiu a justiça de Deus: “Ela fala do Deus que traz o mundo caído de
volta para a esfera de sua legítima reivindicação […], se em promessa ou
exigência, na nova criação ou perdão, ou no tornar possível o nosso serviço,
e — o que não deve ser menos considerado, de acordo com Gálatas 5.5,
quem nos coloca em estado de esperança confiante e, de acordo com
Filipenses 3.12, contínua mudança terrena.”85 Embora essa interpretação
seja atraente, não parece se enquadrar nos usos de Paulo em contextos
específicos tão bem quanto as duas visões alternativas fazem. Alguns

1111
estudiosos que anteriormente endossaram esse ponto de vista, mais tarde o
86
abandonaram.

Algo Para Pensar: Seja Deus Verdadeiro e


Todo Homem Mentiroso

No curso da história mundial, muitos inventaram formas de


salvação. Praticamente todas as religiões de origem humana têm
uma coisa em comum: elas são baseadas no esforço do próprio ser
humano. Entre as principais religiões, o cristianismo é único porque,
embora normalmente a ênfase esteja no que uma pessoa deve fazer
para ser salva, o cristianismo se concentra no que um homem —
Jesus Cristo — fez por todos os seres humanos e o que agora está
disponível para todos com base na simples confiança nele.
Dessa forma as palavras de Paulo ressoam em sua Carta aos
Romanos:

Mas agora a justiça de Deus se manifestou, sem a lei, atestada pela Lei e pelos
Profetas; isto é, a justiça de Deus por meio da fé em Jesus Cristo para todos os que
creem; pois não há distinção. Porque todos pecaram e estão destituídos da glória
de Deus; sendo justificados gratuitamente pela sua graça, por meio da redenção
que há em Cristo Jesus (Rm 3.21-24).

Em sua época, Jesus foi questionado pelos judeus religiosos: “O


que faremos para realizar as obras de Deus?” (Jo 6.28). Essa
sempre foi, e sempre será, a busca equivocada do ser humano de
agradar ou apaziguar a Deus pelo seu próprio esforço. Mas qual foi
a resposta de Jesus? Foi esta: “A obra de Deus é esta: crede naquele
que Ele enviou” (Jo 6.29). Jesus e Paulo concordavam: fé em Jesus

1112
para a salvação, com base em sua obra na cruz, é tudo o que é
necessário.
Evangelho glorioso! Maravilhosa notícia! Pois se a salvação
dependesse de nós, fracassaríamos, uma vez que jamais poderíamos
fazer o suficiente para superar a nossa natureza pecaminosa ou
reparar nossos pecados. Não apenas Jesus, o Deus-homem, morreu
uma perfeita morte expiatória pelo pecado, mas ele viveu uma vida
perfeita e sem pecado. Em uma troca maravilhosa, a vida e a morte
de Jesus são creditadas em favor daqueles que confiam em Cristo:
“Daquele que não tinha pecado Deus fez pecado em nosso favor,
para que nele fossemos feitos justiça de Deus” (2Co 5.21).

O atributo de justiça do próprio Deus


A identificação da justiça de Deus como um atributo divino é apoiado por
várias considerações. Em primeiro lugar, a justiça de Deus parece incluir
sua ira divina, uma vez que existe uma estreita conexão entre a justiça de
Deus em 1.17 e a ira de Deus em 1.18. Em ambos os versículos, um
substantivo com o modificador “de Deus” serve como o sujeito do verbo “é
revelada”. Esse paralelismo parece intencional. Além disso, a conjunção
“pois” que começa 1.18 pode implicar que a expressão da ira de Deus é
uma expressão de sua justiça.87 Em segundo lugar, a “justiça de Deus”
parece se referir a um atributo divino em três lugares: a justiça de Deus se
refere a sua justiça divina no juízo escatológico (3.5); e a justiça de Deus é
sua retidão e justeza, que foram postas em dúvida causa pela sua tolerância
com o pecado no passado, mas que agora foi vindicada por meio do
sacrifício de Jesus (3.25,26).88

1113
A justiça imputada por Deus ao fiel
A identificação da justiça de Deus como uma dádiva que Deus imputa ao
pecador que crê em Cristo é apoiada por evidência abundante e persuasiva
na carta. Primeiro, a expressão “de fé para fé”, em 1.17, não parece
combinar com a revelação do atributo de justiça do próprio Deus. A justiça
de Deus — em especial sua ira, fidelidade e veracidade — não depende da
fé humana em nenhum sentido. A expressão “de fé para fé” parece implicar
que a justiça de Deus está sendo revelada apenas para aqueles que creem, e
essa ressalva faz o maior sentido se “justiça de Deus” se refere de alguma
maneira ao ato de Deus de declarar os pecadores justos em função da sua fé.
Em segundo lugar, essa interpretação é a que mais combina com a
citação de Habacuque 2.4 na oração seguinte de Romanos 1.17. A citação
que Paulo faz de Habacuque 2.4 claramente confirma ou esclarece a
afirmação de que a justiça de Deus é revelada “de fé para fé”. Paulo
introduziu a citação do AT com um advérbio comparativo intensivo
(kathōs) que estabelece um estreito paralelo entre a primeira e a segunda
metades do versículo 17. Esse paralelo estreito fortemente implica que o
substantivo “justiça” no versículo 17a, o adjetivo “justo” em 17b (a citação
de Hc 2.4), e os sintagmas preposicionais “de fé” ou “por fé” (ambas são a
mesma expressão em grego: ek pisteōs) são usados com os mesmos
sentidos. O entendimento que Paulo tem de Habacuque 2.4 fica claro a
partir de sua discussão do texto em Gálatas 3.11. Paulo usou o texto para
demonstrar que “ninguém é justificado diante de Deus pela lei, porque ‘o
justo viverá pela fé’”. Em Gálatas 3.11, o “justo” é aquele que foi
justificado ou declarado justo por Deus, e “fé” se refere à fé do fiel
necessária para receber justiça justificadora. Se Paulo usou Habacuque 2.4
em Romanos 1.17 de uma maneira coerente com Gálatas 3.11, a pessoa

1114
“justa” é aquela que foi justificada, e “justiça” é essencialmente uma
referência a justiça justificadora.89 Tendo em vista a observação de que
“justiça” e “justo” são paralelos e, provavelmente, compartilham o mesmo
sentido, “justiça” muito provavelmente se refira à justiça que Deus concede
ao fiel.
Em terceiro lugar, em vários outros contextos em Romanos, a “justiça
de Deus” se refere claramente a uma justiça imputada por Deus. Embora “a
justiça de Deus”, em 3.25,26, se refira a justiça como um atributo divino,
apenas alguns versículos antes, 3.21,22, refere-se justiça como uma dádiva
divina. Em 10.3, Paulo contrastou a justiça de Deus com a “sua própria
justiça”, a justiça pessoal que os judeus tentaram conseguir por meio da
obediência à lei (9.30,31). Nesse contexto, a “justiça de Deus” muito
provavelmente seja a justiça que Deus imputa ao fiel.90
Finalmente, essa interpretação é confirmada por aquelas ocasiões na
carta em que Paulo definiu mais claramente a relação entre Deus e
“justiça”. Por todo Romanos 4, Paulo definiu “justificação” (dikaioō) como
o ato pelo qual a fé do pecador é considerada, ou contada como, justiça. O
verbo usado para descrever essa nova avaliação graciosa do pecador crente
é logizomai, um termo da matemática e da contabilidade que geralmente se
referia a creditar (quando usado de forma positiva) ou debitar (quando
usado negativamente) na conta de uma pessoa. As citações que Paulo faz de
Gênesis 15.6 e Salmos 32.2 mostram que ele emprestou essa terminologia
do AT. Além disso, a expressão pode ter sido especialmente apropriada ao
contexto de Paulo devido a um ponto de vista rabínico popular do juízo
divino que retratava Deus como um contador onisciente, que mantinha um
enorme livro de contabilidade em que ele cuidadosamente registrava
pecados de uma pessoa no lado do débito do livro e suas boas obras em no

1115
lado do crédito. No dia do juízo, o grande contador faria um balanço da
conta de cada pessoa, determinando sua soma de créditos e sentenciaria o
pecador com a devida punição ou recompensaria sua justiça (m. Avot
3.15,16). Paulo usou a terminologia contábil dos rabinos para promover um
ponto de vista muito diferente do juízo divino no qual a fé de uma pessoa
em Jesus Cristo era creditada à sua conta, e esse crédito resultava na
avaliação do pecador por Deus como justo.91
Na justificação, Deus recusou-se a lançar (o sentido negativo de
logizomai) pecado no lado dos débitos do “livro contábil” do fiel (4.8). Ele
contou (o sentido positivo de logizomai) a fé como justiça no lado do
crédito (4.6). Assim, na analogia da contabilidade, o fiel foi considerado
perfeitamente justo com base na morte sacrificial de Cristo.92 Assim, Deus
credita a fé de um pecador em sua conta como justiça.93 Já que Deus é
sempre o agente declarado ou implícito que credita justiça, Paulo pode
muito bem ter concebido a “justiça de Deus” como a justiça que Deus
credita em contextos particulares, em vez da justiça que Deus possui ou
cria.94 Paulo explicitamente identificou a justiça como um “dom” (dōrea)
em 5.17, e isso também é implicado pelo uso das formas verbal e adverbial
em 3.24 (veja 4.4).
A evidência para ambos os pontos de vista, de que a “justiça de Deus” é
o atributo de justiça do próprio Deus, incluindo sua fidelidade e justeza, e
que o termo se refere à justiça que Deus credita ao fiel, é tão forte que
nenhum ponto de vista deveria ser menosprezado. Na verdade, a evidência
para ambos os pontos de vista é tão convincente que é preciso ou ampliar a
interpretação da expressão “justiça de Deus” para abarcar tanto o atributo
de justiça do próprio Deus quanto a justiça creditada por Deus em cada
contexto, ou pressupor que o uso que Paulo faz da expressão por toda a

1116
carta é variado, referindo-se em alguns contextos à justiça divina e em
outros contextos à justiça imputada ou creditada por Deus.
Um número crescente de comentaristas tem adotado o primeiro ponto
de vista. Isso é justificado até certo ponto pela declaração de Paulo em 3.26,
que por meio da morte sacrificial de Jesus Deus “seria justo e também
justificador daquele que tem fé em Jesus”.95 Por outro lado, a alegação de
que o genitivo “de Deus” expressa origem e posse ao mesmo tempo é tão
gramaticalmente estranho e tão diferente do uso normal que Paulo faz de
construções semelhantes que, provavelmente, essa não tenha sido a intenção
de Paulo.96 É mais provável que Paulo usou a expressão “a justiça de Deus”
ou “sua [de Deus] justiça” no sentido de um atributo divino em 3.5,25,26.
Mas “a justiça de Deus” significa a justiça que Deus credita ao fiel em 1.17;
3.21,22; 10.3 (duas vezes) e é mais ou menos equivalente à expressão “a
justiça que vem Deus” (tēn ek theou dikaosynē) em Filipenses 3.9.97

Justificação é um termo legal que se refere ao


veredito dado pelo juiz celestial
Por toda a história, os estudiosos têm debatido frequentemente se o verbo
“justificar” (dikaioō) significa “declarar justo” ou “tornar justo”. No
passado, os estudiosos protestantes em geral argumentavam que “justificar”
é um termo retirado dos tribunais de justiça que se refere a uma declaração
de inocência ou de absolvição pelo juiz celestial. Os estudiosos católicos
romanos têm, tradicionalmente, argumentado que “justificar” significa
“tornar justo” e refere-se à transformação moral do pecador. Hoje, muitos
católicos romanos misturam os dois conceitos e insistem que a justificação
inclui o pronunciamento legal e uma transformação efetiva.98 Certamente,

1117
Paulo via a salvação dos fiéis tanto como uma absolvição diante de Deus
quanto como uma transformação moral. Romanos 5 a 8 discute a fundo a
transformação do fiel por meio de sua união com Cristo na sua morte e
ressurreição, a atividade do Espírito Santo, e a ainda futura redenção final
do corpo.
No entanto, várias características importantes da discussão de Paulo
sobre a justificação mostram que ele a via como uma absolvição e não
como uma transformação moral. Em primeiro lugar, Romanos 2.13 e 3.20
mostram que a justificação não está relacionada com a natureza moral do
indivíduo, mas com sua posição “diante de Deus”. Segundo, em 8.33, o
verbo “justificar” é contrastado com o verbo “condenar”. Já que o verbo
“condenar” significa “declarar culpado”, o contraste implica que o verbo
“justificar” significa “declarar inocente”. Além disso, o verbo “acusar”, que
precede imediatamente o verbo “justificar”, também é um termo forense, o
que permite concluir que o uso que Paulo faz de “justificar” também estava
relacionado com a imagem do tribunal. Terceiro, o uso do verbo “justificar”
em 3.4 associa “justificação” com tribunal. Nesse contexto, ele parece
referir-se a ser Deus declarado justo em um processo em que os homens o
acusam de injustiça em seus julgamentos.99 Um uso similar em 1Coríntios
4.4 confirma que a cena do tribunal estava em destaque na mente de Paulo
quando ele usou o termo. Finalmente, Romanos 4 iguala a justificação com
a fé sendo “contada” como justiça. Como será visto, o verbo traduzido
como “contar” ou “calcular” está relacionado com a atividade do juiz
divino. À luz dessa evidência, o verbo “justificar” descreve a ação do juiz
que absolve ou “declara justo”. Deus considerou os fiéis como “inocentes”
devido à morte sacrificial de Cristo.

1118
A justificação não é concedida com base nas “obras
da Lei”
Paulo insistiu que a justificação não é baseada nas “obras da Lei” (3.20) e
que Deus justifica os pecadores “sem as obras Lei” (3.21,28). Alguns
estudiosos têm afirmado que as “obras da Lei”, bem como a referência
abreviada “obras”, são antes de tudo “marcos de fronteira” que distinguem
claramente judeus de gentios.100 Esses marcos de fronteira incluem
circuncisão, leis alimentares do AT e observâncias do calendário. Assim, a
polêmica de Paulo é contra os judeus que confiaram em sua identidade
como israelitas, à luz das promessas de Deus para Israel, para sua salvação,
e não contra aqueles que tentaram ganhar o favor de Deus por meio da
obediência à lei em geral, como os intérpretes protestantes,
tradicionalmente, alegam.101
Fica evidente, em Romanos, uma preocupação com os marcos de
fronteira em numerosos textos. Por vária vezes, Paulo tratou a questão da
circuncisão (2.25-29; 3.1,30; veja 15.8), e até explorou a relação entre a
circuncisão e a justificação (4.9-12). Mais tarde, ele lidou com as questões
de dieta e observância do calendário (cap. 14). Esses textos, especialmente
quando combinados com referências explícitas ao orgulho da identidade
judaica e com a ostentação relacionada à circuncisão (2.17; 3.27-30),
indicam claramente que Paulo era estava, pelo menos em parte, se opondo a
uma soteriologia que insistia que “todos os têm parte no mundo por vir” (m.
Sanh. 10.1).102
Mas ao contrário de muitos estudiosos recentes que foram influenciados
pela nova perspectiva, este ponto de vista era apenas um dos vários pontos
de vista soteriológicos correntes na época de Paulo.103 Outros professores
judeus insistiam que a identidade judaica não era suficiente para assegurar a

1119
salvação e que uma vida justa era necessária para satisfazer as demandas do
julgamento divino. Em essência, esses professores debatiam a seguinte
questão: Será que o julgamento divino apenas pesaria a maioria das ações e
acarretaria salvação àqueles que obedeciam mais leis do que transgrediam,
ou o julgamento divino exigiria obediência total e completa à Lei? Paulo
claramente afirmou que nem a justiça de alguém diante de Deus nem sua
identidade judaica era estabelecida por meio de marcos de fronteira. Se o
israelita não “praticava a Lei”, ele desonrava a Lei, e Deus considerava sua
circuncisão uma incircuncisão (2.17-29).104 Isso significa que a Lei exigia
obediência a requisitos para além dos marcos de fronteira. Romanos 2.27
demonstra que a obediência à Lei envolve “a letra” e não apenas a
circuncisão. A “letra” incluía todos os regulamentos da Lei inscritos na
antiga aliança e não apenas atos rituais.105
Além disso, Paulo afirmou que “ninguém será justificado diante dele
pelas obras da Lei” (Rm 3.20), citando uma série de textos do AT (Sl 14.1-
3; 53.1-3; 5.9; 140.3; 10.7; Is 59.7,8; Sl 36.1), que descrevem o fracasso dos
judeus em fazerem o bem, sua desonestidade e linguagem profana, seus
costumes assassinos, sua violência e sua recusa em reverenciar a Deus.
Claramente, o argumento de Paulo é que a salvação por meio da lei exige a
fidelidade às prescrições morais da lei e não apenas ensinamentos sobre os
marcos de fronteira. No entanto, ninguém satisfez as prescrições da Lei.
Assim, a justificação por meio das “obras da lei”, que inclui prescrições
rituais e morais, não é possível para ninguém.
Essa interpretação é apoiada pelas observações de Paulo em Romanos
4.4,5, onde obras da Lei são descritas em termos de trabalhar por uma
recompensa. Paulo insistiu que a justificação era uma dádiva, não um
pagamento. Ele também defendeu que Deus declarou justo o “ímpio”.106 A

1120
justificação do “ímpio” por Deus em 4.5 sugere que a justificação “sem as
obras de Lei” (3.28) significa que a justificação não é concedida com base
nas exigências da Lei, incluindo requisitos morais e rituais.
Essa interpretação é reforçada ainda pelo argumento de Paulo em
9.11,12 de que Isaque não foi escolhido por Deus com base em “obras”,
uma vez que ele foi escolhido antes de nascer e antes de “ter praticado o
bem ou o mal”. O contexto mostra que “obras” aqui se refere a “boas
obras”, em oposição a “obras más”.107 Romanos 10.5 também confirma que
a Lei exigia a “prática” das coisas previstas na Lei, coisas que Israel não
tinha conseguido praticar.
Consequentemente, quando Paulo insistiu que a justificação não é
“pelas obras da lei”, ele quis dizer que todos fracassaram em viver de
acordo com as normas da Lei e que ninguém pode alcançar justiça diante de
Deus por meio da obediência à Lei. Esse é exatamente a ideia da extensa
descrição da pecaminosidade dos gentios e da hipocrisia dos judeus feita
por Paulo em 1.18 a 3.18.
Estreitamente relacionada com a negação de que a justificação é
baseada em “obras da Lei” está a insistência de Paulo de que a justificação
é uma dádiva. Em 3.23,24, Paulo explicou que, devido à universalidade do
pecado e ao fracasso do homem em manifestar a glória da imagem divina
como ele foi criado para manifestar, Deus justifica os pecadores
“gratuitamente” ou “como uma dádiva” (dōrean), e que essa justificação
ocorreu “por causa da sua graça”.108 O tema voltou à tona em 4.4,5, na
declaração de Paulo de que a justificação foi concedida “segundo a graça”
(4.16) e “não como dívida”. Romanos 5.15-17 usa três termos gregos
diferentes para descrever a justificação como um “dom da graça”
(charisma) e uma “dádiva gratuita” (dōrea; dōrēma).

1121
O fato de a justificação ter sido concedida como uma dádiva e sem as
obras da Lei tinha várias consequências práticas. Em primeiro lugar, isso
eliminava qualquer possibilidade de que alguém, legitimamente, se
vangloria-se de sua retidão diante de Deus. Paulo argumentou que a
justificação pelas obras promovia a vanglória humana em vez da glória
divina, enquanto a justificação pela graça como dádiva excluía o orgulho
humano e promovia a glória de Deus (3.27). Em uma declaração abreviada,
Paulo escreveu: “Se Abraão foi justificado pelas obras, então ele tem do que
se gloriar — mas [ele] não [tem nada do que se gloriar] diante de Deus”
(4.2).
Em segundo lugar, a justificação pela graça sem as obras da Lei
assegurava ao pecador que sua inimizade com Deus havia terminado. Ele
tinha sido reconciliado com Deus e desfrutava de relações pacíficas com
ele. Aquele que havia sido alienado de Deus agora tinha “paz com Deus por
meio de nosso Senhor Jesus Cristo” (5.1), tendo obtido “acesso pela fé a
esta graça na qual estamos firmes” (5.2), de modo que “agora já não há
condenação alguma para os que estão em Cristo Jesus” (8.1).

A lei e os profetas dão testemunho da doutrina da


justificação
Paulo foi enfático quanto ao fato de que a doutrina da justificação pela fé
não era uma novidade inventada por ele mesmo. A graciosa justificação de
Deus dos fiéis tinha sido claramente atestada no AT. “A Lei e os profetas”
davam testemunho da “justiça de Deus por meio da fé em Jesus Cristo”
(3.21,22). Esse tema também é destaque na declaração programática da
carta. Romanos 1.17 confirma a alegação de que a justiça de Deus foi

1122
revelada “de fé para fé”, citando Habacuque 2.4 e introduzindo a citação
com as palavras “como está escrito”.
No capítulo 4, Paulo acrescentou a essa citação dos Profetas uma
confirmação a partir do Pentateuco (4.3), ao qual ele recorre pelo menos
três vezes só neste capítulo, e uma citação dos Escritos (Sl 32.1,2). Paulo
parece estar usando um método rabínico de provar um argumento pela
demonstração de que as três grandes divisões do AT — a Lei, os Profetas e
os Escritos — afirmam uma verdade particular (veja também 1.2).109
Provavelmente, essa mesma afirmação decorre da complicada sequência
preposicional “de fé para fé”, em 1.17. A expressão pode significar que a
revelação de Deus de sua retidão justificadora por meio do evangelho
estende-se desde o santo do AT ao fiel do NT, ou que ela alcançou primeiro
os judeus (a quem a justificação já tinha sido revelada na Lei e nos
Profetas) e, então aos gentios (que juntamente com os judeus receberam a
revelação da justificação pela fé em Cristo no Evangelho).110
Alternativamente, “de fé para fé” pode se referir à expressão da fidelidade
de Deus em manter a aliança (veja 3.3) em Cristo aos fiéis, “a justiça de
Deus por meio da fé em Jesus Cristo, para todos os que creem” (3.22).111

Justificação exige fé
Depois de negar que Deus justifica os pecadores com base nas suas obras,
Paulo declarou com firmeza que a justificação exigia fé. Em 1.5, Paulo
apresentou a fé como a essência da obediência ao evangelho. Essa mesma
descrição aparece na conclusão da carta (16.26). Na declaração
programática da carta em 1.16,17, Paulo alegou que o poder salvífico do
Evangelho atuava específica e exclusivamente “para todo aquele que crê”.

1123
A sequência preposicional “de fé para fé” implica que a justificação sempre
fora concedida com base na fé durante todas as épocas da história da
salvação, o que Paulo demonstrou com sua citação de Habacuque 2.4, que
fala daqueles tornados justos pela fé.
A necessidade da fé para a justificação é destacada no capítulo 4, onde
Paulo recorreu ao exemplo de Abraão, com base em Gênesis 15.6. O texto
do AT demonstra claramente que Abraão foi declarado justo, não por
realizar obras, mas por “crer no Um (Único) que justifica o ímpio” (4.4,5,
tradução do autor). A justificação, portanto, exige crer do fundo do coração
(10.10). Em 4.17-25, Paulo discutiu a natureza da fé de Abraão e
demonstrou que ela correspondia à fé necessária para a justificação, no
evangelho cristão. A fé de Abraão envolvia confiar em Deus contra toda
esperança humana de cumprir sua promessa de fazer dele o pai de muitas
nações. Uma vez que Abraão tinha 100 anos e, no que dizia respeito a sua
capacidade de produzir uma descendência, “já estava morto”, e uma vez
que Sara também já era estéril, a fé de Abraão de que Deus cumpriria sua
promessa implicava crer no Deus “que dá vida aos mortos”. Assim, a fé de
Abraão combina com a fé cristã de que Deus ressuscitou Jesus dos mortos,
uma exigência para justificação atestada em 4.24 e novamente em 10.9.
Além disso, a fé de Abraão envolvia acreditar no Deus que “chama à
existência o que não existe” (4.17). Muitos comentaristas veem nisso uma
referência à criação do universo por Deus a partir do nada.112 Nesse
contexto, trata-se do exercício do poder criador de Deus na produção de
Isaque por meio da união de dois mortos, Abraão e Sara.113 Talvez o
objetivo dessa referência seja fazer um paralelo com a ressurreição de Jesus
como a descrição imediatamente anterior. No entanto, a gramática do texto
grego sugere que Paulo pode ter tido um outro ponto em mente. Paulo

1124
descreveu a Deus como aquele que, literalmente, “chama as coisas que não
existem como existindo”. Seria de esperar que Paulo dissesse que Deus
chama as coisas que não existem “à existência” e não “como existindo”.114
Paulo provavelmente usou essa construção particular para evocar uma
comparação entre o nascimento de Isaque e a justificação em que Deus
chama aqueles que não são justos como sendo justos, isto é, declarando
justo o ímpio.115 Essa opinião parece ser apoiada por 4.23,24, onde Paulo
explicou como a fé de Abraão faz um paralelo com a fé cristã e onde ele
abordou não só a fé na ressurreição de Jesus, mas também o perdão das
nossas transgressões e “nossa justificação”.
Mas a discussão no capítulo 4 não é um tratamento exaustivo da fé
necessária para a justificação. Ela apenas examina os aspectos da fé que
fazem um estreito paralelo com a experiência de Abraão. Outras
declarações na carta demonstram que a fé necessária para a justificação
inclui não só a crença na ressurreição de Jesus e na justificação que sua
morte e ressurreição alcançaram, mas também a crença em aspectos
importantes da identidade de Jesus.
Na introdução da carta, Paulo descreveu a mensagem do evangelho
como uma mensagem da parte de Deus, mediada pelos profetas, mas uma
mensagem especificamente acerca de Jesus (1.1-3). Ele confirmou isso
descrevendo o evangelho como “as boas novas acerca de seu Filho” (1.9) e,
em uma passagem posterior, descrevendo a mensagem que deve ser crida
para justificação (10.10) como a “mensagem acerca de Cristo” (10.17).
Ouvintes são chamados a responder a esse evangelho com a “obediência da
fé” (1.5; 16.26), o que significa que eles obedecem ao evangelho
cristocêntrico acreditando nas suas afirmações sobre ele. Não é surpresa que

1125
Paulo tenha descrito a fé necessária para justificação, em 3.26, como “fé em
Jesus”.
Paulo articulou reivindicações fundamentais do evangelho sobre Jesus
em 1.3,4. O evangelho reivindica que Jesus cumpriu as profecias do Antigo
Testamento sobre o Messias esperado ao nascer da linhagem de Davi. Jesus
é o Messias, o Filho ungido pelo Pai para receber as nações por herança e
quebrar o ímpio com uma barra de ferro. Ele é aquele a quem todos devem
prestar homenagem, ou então eles devem perecer por sua rebelião (Sl 2).
Jesus também é o “poderoso Filho de Deus” — literalmente, o “Filho de
Deus com poder” — por força de sua ressurreição. Uma vez que a
referência seguinte a “poder” em Romanos se refere ao poder de salvar
(1.16), esse título identifica Jesus como aquele que tem poder de salvar, o
Salvador dos pecadores.
O evangelho também identifica Jesus Cristo como “nosso Senhor” (1.4).
Embora o título “Senhor” possa funcionar como um título de autoridade ou
um título de divindade dependendo do contexto, muitas evidências nesta
carta demonstram que “Senhor” é aplicado a Jesus em Romanos como um
título de divindade. Isso fica mais claro em 10.9-13, onde Paulo articulou a
“mensagem de fé” (10.8). Paulo argumentou que “se com tua boca
confessares ‘Jesus é Senhor’ […] serás salvo”. Paulo confirmou isso com
uma citação de Joel 2.32: “Todo aquele que invocar o nome do Senhor será
salvo”. Paulo extraiu sua declaração em 10.9 do texto do AT que ele citou
em 10.13, e há uma correlação estreita entre as duas declarações. Confessar
com a boca “Jesus é Senhor” corresponde a invocar o nome do Senhor, e
“serás salvo” coincide exatamente com “será salvo”. No contexto do AT,
“SENHOR” (kyrios) é a tradução grega do nome hebraico Yahweh e, de forma
muito clara, se refere ao Deus de Israel. A aplicação que Paulo faz desse

1126
texto do AT para esclarecer e confirmar a necessidade de confessar “Jesus é
Senhor” demonstra que “Senhor” funciona na confissão cristã como o nome
do Deus do Antigo Testamento. Assim, o Evangelho insiste que Jesus é
Yahweh, Deus em carne humana.116 Essa insistência na divindade de Jesus
também está presente em 9.5, onde o Messias é descrito como aquele “que é
Deus sobre todos.”117
Além disso, em 10.6, Paulo argumentou que a justiça que vem pela fé
diz: “Não digas em teu coração: ‘quem subirá ao céu?’, isto é, para fazer
Cristo descer”. Aqueles tornados justos pela fé afirmam a origem celestial
de Cristo e o fato de que ele “desceu” para viver entre pecadores por meio
da encarnação.118 A justiça que vem pela fé não pergunta: “Quem descerá ao
abismo?” para fazer Cristo ressuscitar dentre os mortos. Assim, ela não
apenas afirma sua origem celestial e encarnação, mas também sua
ressurreição corporal. A confissão relacionada com a justiça que vem pela
fé em 10.6,7 faz um estreito paralelo com a confissão de Jesus como
“Senhor” e a afirmação de sua ressurreição em 10.9.
A fé necessária para a justificação em Romanos é uma fé em que os
pecadores creem na identidade de Jesus como o Messias, o Salvador cuja
morte sacrificial assegura a absolvição do fiel, e o Deus eterno e todo-
poderoso. Essa fé reconhece tanto que Jesus morreu uma morte sacrificial
quanto que ele ressuscitou dos mortos. Somente essa fé centrada em Cristo
é suficiente para a absolvição graciosa do pecador.

A morte e a ressurreição de Jesus são as bases da


justificação do fiel

1127
Paulo escreveu que os fiéis são “gratuitamente justificados pela sua graça,
por meio da redenção que há em Jesus Cristo” (3.24). O termo “redenção”
normalmente se referia ao pagamento de um resgate que libertava um
prisioneiro de guerra, um escravo ou um criminoso condenado. Uma vez
que “justificado” é um termo legal extraído dos procedimentos judiciais do
tribunal, seria de esperar que o substantivo “redenção” neste contexto
tivesse a nuance da libertação de um criminoso condenado, em vez daquela
de um prisioneiro de guerra ou escravo. Essa interpretação é corroborada
pela equiparação que Paulo faz de redenção e “perdão de pecados”, nas
Epístolas da Prisão (Ef 1.7 NVI; Cl 1.14).
Embora o substantivo “redenção” possa se referir a libertação sem
referência ao pagamento de um resgate, com base no uso da Septuaginta,
Josefo e Filo pode-se esperar aqui uma alusão a resgate.119 Além disso, em
Efésios 1.7, Paulo descreveu “redenção” como sendo alcançada “pelo seu
sangue”, o que identifica a morte de Jesus como o preço do resgate. A
afirmação de Paulo que os fiéis foram “comprados por preço” (1Co 6.20;
7.23) também demonstra que a redenção, para Paulo, envolvia o pagamento
de um regate.120 Embora a palavra traduzida por “resgatar” em Gálatas
3.13,14 não seja a mesma que a utilizada aqui, a discussão de Paulo ali
confirma que ele podia falar de redenção como livramento da punição do
pecado alcançado por meio dos sofrimentos e da morte sacrificial de Jesus.
Assim, a justificação é realizada por Deus por meio da morte sacrificial de
Cristo.
Isso é confirmado por Romanos 3.25. Embora muitas traduções tratem o
versículo 25 como uma frase separada do versículo 24, o versículo começa
com um pronome relativo que conecta estreitamente os dois versículos. O
versículo descreve Jesus Cristo “a quem Deus apresentou como uma

1128
propiciação, mediante a fé em seu sangue” (tradução do autor). A palavra
“propiciação” (hilastērion) foi utilizada na LXX para designar o “assento
de misericórdia [propiciatório]”, a tampa da arca da aliança sobre a qual o
sangue do sacrifício era derramado no Dia da Expiação, a fim de desviar a
ira de Deus e assegurar a expiação dos pecados cometidos durante aquele
ano. Alguns indícios no contexto imediato sugerem que Paulo pretendia que
esse termo evocasse o simbolismo do sistema sacrificial do AT. Primeiro, a
expressão “em seu sangue” compara o sangue que Jesus derramou durante
seus sofrimentos e morte ao sangue derramado sobre o propiciatório. O
sangue de Jesus é mencionado não como objeto de fé, mas como o meio
pelo qual Deus realizou a propiciação. Segundo, Paulo via essa propiciação
como necessária para satisfazer as exigências da justiça de Deus. O
argumento do versículo 26 é que a justiça ou retidão de Deus estaria
comprometida se ele, de forma tolerante, ignorasse o pecado e declarasse o
pecador justo sem um sacrifício substitutivo. Somente por meio da cruz o
juiz celestial pode ser justo e justificar os pecadores crentes. Terceiro, a
discussão de Paulo da justa ira de Deus, que teve início em 1.18, destaca a
necessidade de um meio para apaziguar a ira divina.121 Assim sendo, Paulo
não só apresentou a morte de Jesus como um resgate que salvava
criminosos condenados de sua merecida sentença, ele também retratou a
morte de Jesus como um sacrifício expiatório que satisfazia a justiça de
Deus de modo que os pecadores crentes possam ser declarados justos e
escapem da ira que seus pecados incitaram.
No final da sua discussão sobre a justificação, Paulo descreveu Jesus
como aquele que “foi entregue por causa de nossas transgressões” (Rm
4.25), uma descrição que ecoa Isaías 53.12 (LXX). A palavra “entregue”
muitas vezes funcionava como um termo técnico se referindo a colocar

1129
alguém sob custódia de agentes da lei ou do tribunal para encarceramento,
julgamento, condenação e punição.122 A ideia é que Jesus foi conduzido ao
juiz para sofrer a pena pelas transgressões do fiel. É com base nisso que o
juiz pode pronunciar o veredito de que o pecador é “inocente”. A justiça
divina foi totalmente satisfeita por meio do sofrimento substitutivo do Filho
de Deus.

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON


O evangelho — prometido por meio dos profetas e pregado por Paulo
(1.1-4,16,17; veja Hc 2.4)
Justiça e justificação pela fé sem as obras da lei (1.17; 3.21 a 5.2; veja
esp. 4.3,9,22,23, citando Gn 15.6)
Promoção da unidade entre judeus e gentios, com base na
universalidade do pecado (1.18 a 3.20; 3.23), a dádiva gratuita da
salvação por meio de Jesus Cristo (6.23) e o abrangente plano de
salvação de Deus (caps. 9 a 11)
A impossibilidade do cumprimento da lei e a nova vida no Espírito
(caps. 6 a 8)
O plano histórico-salvífico de Deus para judeus e gentios do passado,
presente e futuro (caps. 9 a 11)

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Por que os estudiosos estão tão certos de que Paulo escreveu
Romanos?

1130
2. Por que os planos de viagem de Paulo são tão importantes para a
datação do livro de Romanos?
3. Que considerações apontam Corinto como uma provável origem para
Romanos?
4. Qual foi a ocasião para a carta de Paulo aos Romanos?
5. Por que Paulo escreveu Romanos?
6. Com quais divisões principais de Romanos a maioria dos estudiosos
concorda?
7. Quando Paulo diz em Romanos 3.23 que “todos pecaram e estão
destituídos da glória de Deus”, quem ele tem em mente quando se
refere a “todos”?
8. Quais são as perguntas retóricas que Paulo colocou em Romanos 6 e 7,
e qual foi sua resposta sucinta a cada uma delas?
9. Quais são as interpretações possíveis de Romanos 7?
10. Qual é a função de “portanto” em Romanos 12.1?
11. Como os indivíduos são vistos como justos por Deus em Romanos?
12. Que suporte é dado pelos autores para a seguinte declaração: “A
justiça de Deus é uma dádiva que Deus imputa ao pecador que crê em
Cristo”?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


BRUCE, F. F. The letter of Paul to the Romans: an introduction and
commentary. Em: Tyndale New Testament Commentaries. Ed. rev.
(Grand Rapids: Eerdmans, 1985).
CRANFIELD, C. E. B. A critical and exegetical commentary on the
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GAMBLE, H. The textual history of the Letter to the Romans: a study in
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Bible (Nashville: Abingdon, 2002), vol. 10, p. 393–770.

1
Agostinho, Confessions, 8.29.

2
F. F. Bruce, The letter of Paul to the Romans: Introduction and Commentary, ed. rev, TNTC

(Grand Rapids: Eerdmans, 1985), p. 56.

3
M. Luther, Luther’s Works, edição de J. Pelikan; H. Lehman (Philadelphia: Fortress, 1958-

1986), 34:336-7.

4
Citado em D. J. Moo, The Epistle to the Romans, NICNT (Grand Rapids: Eerdmans, 1996), p.

1.

5
Bruce, Romans, p. 58.

6
C. Hodge, Commentary on the Epistle to the Romans (Grand Rapids: Eerdmans, 1976), p. 9.

7
C. E. B. Cranfield, Introduction and Commentary on Romans I-VIII, in: A Critical and

Exegetical Commentary on the Epistle to the Romans, ICC (Edinburgh: T&T Clark, 1975), p. 1. J.

Fitzmyer (Romans: A New Translation with Introduction and Commentary, AB [Garden City:

Doubleday, 1993], p. 40-2) também mencionou W. C. van Manen e G. Schlaeger entre os estudiosos

do final do século 19 e início do século 20 que contestaram a autoria paulina de Romanos.

1133
8
C. H. Dodd, The Epistle of Paul to the Romans (London: Fontana Books, 1959; reimpr. da

edição de 1932), p. 9.

9
Fitzmyer, Romans, p. 40.

10
O. Roller, Das Formular der paulinischen Briefe: Ein Beitrag zur Lehre vom antiken Briefe

(Stuttgart: Kohlhammer, 1933), p. 14-23 e 295-300.

11
Fitzmyer, Romans, p. 41.

12
Ibid., p. 42; J. H. Michel, “A phenomenon in the text of Romans”, JTS 39 (1938), p. 150-54.

13
E. R. Richards, Paul and first-century letter writing: secretaries, composition and collection

(Downers Grove: InterVarsity, 2004), p. 59-93, esp. p. 92-3.

14
W. Schmithals, Der Römerbrief: Ein Kommentar (Gütersloh: G. Mohn, 1988); J. Kinoshita,

“Romans — two writings combined: a new interpretation of the body of Romans”, NovT 7 (1965), p.

258-77; J. C. O’Neill, Paul’s Letter to the Romans (Harmondsworth: Penguin, 1975).

15
R. B. Hays, “Adam, Israel, Christ — the question of covenant in the theology of Romans: a

response to Leander E. Keck and N. T. Wright”, in: D. M. Hay; E. E. Johnson, orgs., Pauline

Theology (Minneapolis: Fortress, 1995), vol. 3: Romans, p. 76.

16
H. Gamble, The Textual History of the Letter to the Romans: A Study in Textual and Literary

Criticism, Studies and Documents (Grand Rapids: Eerdmans, 1977), p. 21.

17
K. Lake, “Shorter form of St. Paul’s epistle to the Romans”, ExpTim 7 (1910), p. 504-25; J.

Knox, “A note on the text of Romans”, NTS 2 (1955-1956), p. 191-3.

18
T. W. Manson, “St. Paul’s letter to the Romans — and others”, in: K. P. Donfried, org., The

Romans Debate, (Peabody: Hendrickson, 1991), p. 3-15.

19
Gamble, Textual History, p. 96-123.

1134
20
Ibid., p. 57-95.

21
Fitzmyer, Romans, p. 60.

22
F. J. A. Hort, “On the end of the epistle to the Romans”, in: J. B. Lightfoot, Biblical Essays,

reimpr. 1871 (Grand Rapids: Baker, 1979), p. 321-51; M. -J. Lagrange, “La Vulgate latine de l’épître

aux Romains et le texte grec”, RevBib 13 (1916), p. 225-39.

23
C. W. Emmet, “Romans XV and XVI: a new theory”, ExpTim 8 (1916), p. 275-88; H. J. Frede,

Altlateinische Paulus-Handschriften, Vetus Latina: Die Reste der Altlateinischen Bibel (Freiburg im

Breisgau: Herder, 1964), p. 152-8.

24
Gamble, Textual history, p. 116.

25
W. Sanday; A. C. Headlam, A critical and exegetical commentary on the epistle to the Romans,

ICC (New York: Charles Scribner’s Sons, 1922), p. xc; Cranfield, Introduction and commentary on

Romans I-VIII, 8; J. D. G. Dunn, Romans 1 to 8, WBC 38A (Dallas: Word, 1988), p. lx; Moo,

Romans, p. 8; T. R. Schreiner, Romans, BECNT (Grand Rapids: Baker, 1998), p. 7-8; G. Bray,

Romans, ACCS (Downers Grove: InterVarsity, 1998), p. 379-80. Bray apresentou uma tradução

inglesa de uma importante citação de Orígenes.

26
Cranfield, Romans, 1:8.

27
A. M. Hunter, The Epistle to the Romans, Torch Bible Commentaries (London: SCM, 1955), p.

12.

28
Esta data recebe suporte de J. Finegan, Handbook of Biblical Chronology: Principles of Time-

Reckoning in the Ancient World and Problems of Chronology in the Bible, ed. rev. (Peabody:

Hendrickson, 1998), p. 396-7, §687; L. Morris, The Epistle to the Romans (Grand Rapids: Eerdmans,

1988), p. 6-7; e C. K. Barrett, A Commentary on the Epistle to the Romans, Harper’s NT

Commentaries (New York: Harper & Row, 1957), p. 5. Embora J. McRay tenha datado a composição

de Romanos de um ano antes, durante os três primeiros meses do ano 54 (J. McRay, Paul: His Life

1135
and Teaching [Grand Rapids: Eerdmans, 2003], p. 77), estudos mais recentes datam a carta de um ou

dois anos após a data proposta aqui. Datas afirmadas por comentários importantes e recentes são: (1)

inverno de 55-56 ou 56-57 (Cranfield, Romans, 1.16); (2) “algum momento da década de 50 d.C.,

provavelmente em meados da década de 50, e mais provavelmente no final de 55 e início de 56, ou

final de 56 e início de 57” (Dunn, Romans, xliii); (3) 56 (P. Stuhlmacher, Paul’s Letter to the

Romans: A Commentary, tradução para o inglês de S. J. Hafeman [Louisville: Westminster/John

Knox, 1994], p. 8; (4) 56-57 (Paul Barnett, “Why Paul wrote Romans”, RTR 62 [2003], p. 139); (5)

57 (Moo, Romans, p. 3; embora Moo corretamente tenha advertido que construir uma cronologia

absoluta de Paulo seja um “processo arriscado”); (6) inverno de 57-58 (Fitzmyer, Romans, p. 87); e

(7) 55-58 (Schreiner, Romans, p. 5).

29
S. Mason sugeriu que a expulsão dos judeus de Roma não foi completo logo no início. Veja

Mason, “‘For I am not ashamed of the gospel’ (Rm 1.16): the gospel and the first readers of

Romans”, in: L. A. Jarvis; P. Richardson, orgs., The Gospel in Paul (Sheffield: Sheffield Academic

Press, 1994), p. 254-87.

30
Fitzmyer, Romans, p. 85.

31
P, MS L, e MS 337.

32
J. Murphy-O’Connor, Saint Paul’s Corinth (Collegeville: Liturgical Press, 2002), p. 37; J. H.

Kent, Ancient Corinth: A Guide to the Excavations (Athens: American School of Classical Studies at

Athens, 1954), p. 74; V. P. Furnish, “Corinth in Paul’s time: what can archaeology tell us?”, BAR 14/3

(1988), p. 14-27.

33
Entre os comentaristas que defendem uma origem em Corinto estão Schreiner, Romans, p. 4;

Moo, Romans, p. 2-3; Dunn, Romans, 1:xliv; Fitzmyer, Romans, p. 85-7.

34
M. Reasoner, “Rome and Roman christianity”, in: G. F. Hawthorne; R. P. Martin; D. G. Reid,

orgs., Dictionary of Paul and his Letters (Downers Grove: InterVarsity, 1993), p. 850-5, esp. p. 851.

1136
35
Reasoner, “Rome and Roman christianity”, p. 851.

36
Tacitus, Annals 15.44.

37
Suetonius, Nero, p. 28-9.

38
Veja Atos 18.1,2.

39
Alguns poucos manuscritos tardios omitem Roma como destino (veja Bray, Romans, p. 13-4).
10 26
Mas a grande maioria dos manuscritos, incluindo muitos manuscritos antigos (p. ex., , , e os

unciais mais importantes), incluem a expressão “em Roma”.

40
Assim também Gamble, Textual history, p. 116; e Schreiner, Romans, p. 7.

41
Cranfield (Romans, p. 9) mostrou que “a sugestão de que Romanos 16 seja um fragmento de

uma carta paulina para a igreja em Éfeso foi feita já em 1829 por D. Schulz, em TSK 2 (1829), p.

609ss.”.

42
Manson, “St. Paul’s letter to the Romans — and others”, p. 3-15.

43
Sobre o evento e sua provável data, veja Suetonius, Life of Claudius, p. 25; e Orosius, Seven

Books of History Against the Pagans, tradução para o inglês de I. W. Raymond (New York:

Columbia University Press, 1936), p. 332.

44
Em adição aos comentários padrão, veja B. N. Kaye, “To the Romans and others: revisited”,

NovT 18 (1976), p. 37-77.

45
Veja especialmente Dunn, Romans, 1:lii.

46
J. Munck, Paul and the Salvation of Mankind (Richmond: J. Knox, 1959), p. 201.

47
W. Wiefel, “The jewish community in ancient Rome and the origins of roman christianity”, in:

The Romans Debate, p. 85-101.

1137
48
Esse é o ponto de vista da maioria dos comentaristas (p. ex., Moo, Romans, p. 12-3).

49
Assim também Schreiner, Romans, p. 13-4; Stuhlmacher, Paul’s Letter to the Romans, p. 6-8;

Moo, Romans, p. 4-5; Dunn, Romans, 1:liii-liv.

50
Para uma tradução inglesa bastante útil, veja M. Grant, Tacitus: The Annals of Imperial Rome

(London: Penguin, 1996), p. 308-9.

51
Essa tradução é de B. Metzger, The canon of the New Testament (Oxford: Clarendon, 1987), p.

305-7.

52
Veja Stuhlmacher, Romans, p. 2.

53
Os estudiosos discutem se os oponentes já haviam se infiltrado nas igrejas de Roma ou se

Paulo, baseado em sua experiência anterior, simplesmente assumiu que os oponentes acabariam se

infiltrando. Stuhlmacher (Romans, p. 253) representa o primeiro ponto de vista, enquanto Schreiner

(Romans, p. 21) argumentou que os versículos que Stuhlmacher acreditava serem explicitamente

dirigidos contra os oponentes (Rm 3.8; 16.17-20): “Não se referem a reais oponentes em Roma, mas

aos inimigos que Paulo enfrentou no leste e que ele temia pudessem alcançar Roma. Ele sabia que

dúvidas e perguntas sobre seu evangelho tinham surgido nas congregações romanas, mas ele ainda

não tinha enfrentado oponentes declarados”.

54
Schreiner (Romans, p. 19) declarou: “Agora, a posição majoritária é a de que Paulo escreveu

para pacificar a desunião entre judeus e gentios”, citando Marxsen, Minear, Bartsch, W. Campbell,

Käsemann, Dunn, Russell, Wedderburn, Crafton, Reasoner, Wiefel, Donfried, Bruce, P. Lampe,

Stuhlmacher, Walters, Wright e Guerra como representantes desse ponto de vista.

55
M. A. Seifrid, Justification by Faith: The Origin and Development of a Central Pauline

Theme, NovTSup (Leiden: Brill, 1992), p. 182-210.

56
Bruce (Letter of Paul to the Romans, p. 38-9) corretamente observou: “No entanto, por crucial

que a justificação dos pecadores pela fé seja para o evangelho paulino, ela não esgota esse evangelho.

1138
Ela não é ‘uma cratera secundária’, como Albert Schweitzer a chamou, mas, em si mesma, também

não é o centro do ensino de Paulo”. Moo (Romans, p. 29) escreveu: “Há muita coisa em Romanos

que não pode, sem distorção, ser agrupado sob o tópico de justificação: a certeza e a esperança dos

fiéis (caps. 5 e 8); liberdade do pecado e da lei (caps. 6 e 7); o propósito de Deus para Israel (caps. 9

a 11); e a vida de obediência (caps. 12 a 15). Sem dúvida, podemos relacionar tudo isso com a

justificação, como seus frutos, ou implicações, ou condições; e o próprio Paulo faz essa conexão em

vários pontos (veja 5.1, 9; 8.33; veja 9.30 a 10.8). Mas ele não o faz com frequência suficiente para

que se possa pensar que a justificação, ou ‘a justiça de Deus’, seja seu ponto de referência constante”.

57
Por exemplo, A. Schweitzer, The Mysticism of Paul the Apostle (London: A&C Black, 1931),

p. 205-26; e W. Wrede, Paul (London: P. Green, 1907), p. 123-5.

58
Esse era o ponto de vista de F. C. Baur e F. J. A. Hort. Veja o sumário de seus pontos de vista

em Sanday e Headlam, Epistle to the Romans, p. xlv, li.

59
Por exemplo, W. S. Campbell, “Why did Paul write Romans?” ExpTim 85 (1974), p. 264-9; e

K. Donfried, “A short note on Romans 16”, in: The Romans Debate, p. 46-8.

60
Entre aqueles que veem a justiça de Deus como o tema central da carta estão: Schreiner,

Romans, p. 25-7 (como fica evidente em seu esboço); Stuhlmacher, Romans, p. 10; E. Käsemann,

Commentary on Romans, tradução para o inglês de G. Bromiley (Grand Rapids: Eerdmans, 1980); U.

Wilckens, Der Brief an die Römer, EKKNT (Zürich: Benziger, 1978-82); e A. Schlatter, Romans:

The Righteousness of God, tradução para o inglês de S. Schatzmann (Peabody: Hendrickson, 1995).

61
Moo, Romans, p. 27-30.

62
Ibid., p. 14.

63
Manson, “St. Paul’s letter to the Romans — and others”, p. 14-5.

64
G. Bornkamm, “The letter to the Romans as Paul’s last will and testament”, in: The Romans

Debate, p. 16-28.

1139
65
Barnett, “Why Paul wrote Romans”, p. 141.

66
Essa categoria foi sugerida e definida por M. L. Stirewalt Jr., “The form and function of the

greek letter-essay”, em: The Romans Debate, p. 147-71. Stirewalt indicou 15 diferentes documentos

como exemplos de ensaio-carta incluindo as cartas de Epicuro, as cartas de Dionísio de Halicarnasso,

seleções das obras de Plutarco, 2Macabeus, e o Martírio de Policarpo. Stirewalt não discutiu a

classificação de Romanos. A classificação de Romanos como uma “ensaio-carta” foi adotada por K.

P. Donfried, “False presuppositions in the study of Romans”, em The Romans Debate, p. 122-5; e

Fitzmyer, Romans, p. 68-9 (embora Fitzmyer preferisse o termo “carta-ensaio”, enfatizando mais o

“caráter missivo” do documento).

67
Stirewalt, “Greek letter-essay”, p. 163.

68
R. Jewett, “Following the argument of Romans”, in: The Romans Debate, p. 266.

69
W. Wuellner, “Paul’s rhetoric of argumentation in Romans: an alternative to the Donfried-

Karris debate over Romans”, in: The Romans Debate, p. 128-46, esp. p. 139. Cf. R. Jewett,

“Following the argument of Romans”, in: The Romans Debate, p. 266; G. A. Kennedy, New

Testament Interpretation Through Rhetorical Criticism (Chapel Hill: University of North Carolina,

1984), p. 152-6; M. L. Reid, “A rhetorical analysis of Romans 1:1 to 5:21 with attention given to the

rhetorical function of 5:1-21”, Perspectives in Religious Studies 19 (1992), p. 255-72; B. Byrne,

Romans, SacPag (Collegeville: Glazier, 1996), p. 15-8.

70
D. Aune, “Romans as a logos protreptikos”, in: The Romans Debate, p. 278-96, esp. p. 278-9.

A classificação de Romanos como retórica protréptica foi discutida extensivamente por A. J. Guerra,

Romans and the Apologetic Tradition: The Purpose, Genre, and Audience of Paul’s Letter, SNTSMS

81 (Cambridge: University Press, 1995).

71
Dunn, Romans, 1: lix.

1140
72
C. E. B. Cranfield, Commentary on Romans IX-XVI and Essays, em: A Critical and Exegetical

Commentary on the Epistle to the Romans, ICC (Edinburgh: T&T Clark, 1979), p. 818.

73
O versículo 24 não se encontra nos melhores e mais antigos manuscritos da carta. Para uma

análise mais detalhada sobre a estrutura do livro que leva em consideração características objetivas

como a repetição de palavras, mudanças de pessoas verbais, o uso da diatribe e assim por diante, veja

Aune, “Romans as a logos protreptikos”, p. 290-6.

74
Para uma lista conveniente de estudiosos que apoiam cada ponto de vista sobre a estrutura,

veja Fitzmyer, Romans, p. 96-7.

75
Veja a análise mais completa da estrutura em Fitzmyer, Romans, p. 96-8; Cranfield, Romans,

1:252-4.

76
Os estudiosos discutem se a expressão “obediência da fé” se refere à fé como um ato de

obediência ao evangelho (genitivo apositivo) ou uma obediência que resulta da fé (genitivo de fonte).

A menção frequente que Paulo faz de obediência à mensagem do evangelho (veja 1.8; 10.16;

11.23,30,31; 15.18; 16.19) sugere fortemente que a expressão se refere à obediência ao evangelho,

que consiste, principalmente, em fé. Mas isso não implica que uma vida de obediência não resulte do

compromisso do fiel a Cristo.

77
Alternativamente, a pergunta de Paulo, “Quem me livrará do corpo desta morte?” (7.24),

antecipa tanto a atividade do Espírito que livra o fiel da lei do pecado e da morte (8.1-17) quanto a

redenção final do corpo por meio da ressurreição e glorificação (8.18-39).

78
Veja o estudo sobre Febe em A. J. Köstenberger, “Women in the pauline mission”, em: P. Bolt;

M. Thompson, orgs., The Gospel to the Nations: Perspectives on Paul’s Mission (Downers Grove:

InterVarsity, 2000), p. 228-9. Cf. Moo, Romans, p. 912-6; e Schreiner, Romans, p. 786-8, ambos,

embora também sejam complementaristas em seus pontos de vista sobre o papel dos gêneros, tendem

a identificar Febe como uma diaconisa. Entre as traduções, a HCSB tem “serva” no texto, com uma

1141
nota de rodapé dizendo: “Outros interpretam este termo em um sentido técnico: diaconisa ou

ministra”. Semelhantemente, a NASB e a NIV têm “serva” no texto e uma nota de rodapé: “ou

diaconisa”; a TNIV inverte: “diácono” no texto, “ou serva” na nota de rodapé.

79
Veja Köstenberger, “Women in the pauline mission”, p. 221-47.

80
Bruce, Letter of Paul to the Romans, p. 30-1.

81
J. B. Lightfoot, Saint Paul’s Epistle to the Galatians (London: Macmillan, 1921), p. 49.

82
M. Luther, Commentary on the Epistle to the Romans, tradução para o inglês de J. T. Mueller

(Grand Rapids: Kregel, 1954), p. viii.

83
A. Schlatter, Romans: The Righteousness of God, tradução para o inglês de S. Schatzmann

(Peabody: Hendrickson, 1995).

84
Compare Salmos 31.1; 36.10; 40.10; 71.2; 88.10-12; 98.2,3; 143.1; Isaías 46.13.

85
Käsemann, Romans, p. 29; cf. Stuhlmacher, Romans, p. 28-32. Käsemann e seu aluno

Stuhlmacher foram influenciados pela obra seminal de Schlatter (Romans, p. 18-22) sobre a “justiça

de Deus”.

86
Schreiner, de forma hesitante, interpretou a “justiça de Deus” como o poder salvífico de Deus

em seu comentário de Romanos de 1998, mas abandonou esse ponto de vista quando escrevia sua

teologia paulina, publicada três anos depois. Compare Schreiner, Romans, p. 63-70; e id., Paul:

apostle of God’s glory in Christ (Downers Grove: InterVarsity, 2001), p. 192-209.

87
Por outro lado, poderia simplesmente demonstrar que as obras da humanidade merecem apenas

a ira divina, assim confirmando a impossibilidade de salvação pelas obras e a necessidade da

justificação pela fé em 1.17.

88
Essas interpretações são veementemente contestadas pelos comentaristas que defendem pontos

de vista alternativos, especialmente quando eles insistem em um significado único e restrito para a

1142
expressão “justiça de Deus” por toda a carta. Para uma defesa mais detalhada do ponto de vista

atributivo, veja Fitzmyer (Romans, p. 257-63), que demonstrou que a interpretação atributiva tem

uma rica história na igreja, especialmente antes da Reforma.

89
Para uma defesa mais detalhada dessa abordagem a Romanos 1.17 e Gálatas 3.11, veja C. L.

Quarles, “From faith to faith: a fresh examination of the prepositional series in Romans 1:17”, NovT

45 (2003), p. 1-21, esp. p. 16-8. Os acadêmicos têm debatido se Paulo via o sintagma preposicional

“pela fé”, em Habacuque 2.4, como adjetival ou adverbial. Isto é, como modificando “justo” ou

“vive.” A questão não pode ser resolvida com base na sintaxe ou na ordem das palavras. Mas por

toda Romanos e em outras passagens em seus escritos, é muito mais comum Paulo associar fé com

justiça do que com vida (1.17; 3.22,25,26,28,30; 4.3,5,9,11,13; 5.1; 9.30; 10.4,6,10; veja Gl 2.16;

3.6,8,11,24; 5.5; Fp 3.9). Isso sugere fortemente que ele pretendia que seus leitores entendessem a

citação de Habacuque como uma referência às pessoas que eram declaradas justas com base na fé e

que desfrutavam a vida escatológica devido a essa justiça declarada. Entre os comentaristas que

afirmam que “pela fé” é adjetival estão Cranfield, Romans, p. 102; Moo, Romans, p. 78; e Käsemann,

Romans, p. 32. Entre os poucos comentaristas que sugerem que o sintagma preposicional modifica o

sujeito e o verbo estão: R. M. Moody, “The Habakkuk quotation in Romans 1:17”, ExpTim 92

(1981), p. 205-8; e Dunn, Romans, p. 45-6. Embora Schreiner (Romans, p. 74) entenda que o

sintagma preposicional modifique “viverá”, o ponto de vista sugerido aqui parece ser confirmado

pelo raciocínio de Paulo em 5.17.

90
Esse era o ponto de vista dos reformadores. Era tão popular entre os comentaristas protestantes

no final do século XIX que Charles Hodge pôde escrever: “Esta [o ponto de vista de que a justiça de

Deus era a justiça que Deus imputava na justificação] é a interpretação dada substancialmente por

todos os comentaristas modernos dignos de nota” (Romans, p. 31). Esse ponto de vista também é

defendido em J. Murray, The Epistle to the Romans (Grand Rapids: Eerdmans, 1968), 1:30.

91
Observe também a concentração de termos contábeis: “conta”, “lucro” e “perda” em Filipenses

3.2-11 onde Paulo também discutiu “a justiça de Deus baseada na fé”.

1143
92
O verbo logizomai (“creditar” or “debitar”) foi usado em um sentido soteriológico 11 vezes em

Romanos, 9 na voz passiva. Esses são exemplos claros do passivo divino, quando Deus é o agente

não mencionado que executa a ação do verbo.

93
Que Deus é quem credita ou imputa justiça fica bem claro pelas duas ocasiões em Romanos

nas quais Paulo usou uma forma ativa (depoente) do verbo “creditar” e explicitamente identificou um

sujeito. Em 4.6, “Deus atribui (credita) justiça”, e na citação do salmo 32.2 em Romanos 4.8, “o

Senhor” se recusa a debitar (logizomai) pecado na conta do fiel.

94
Em outras palavras, mesmo que o modificador na expressão “justiça de Deus” seja um genitivo

subjetivo em não um genitivo de fonte, isso não necessariamente impediria ver essa justiça como a

justiça que Deus imputa ao fiel.

95
Comentaristas como Sanday e Headlam (Romans, p. 24-5), Moo (Romans, p. 74-5) e Schreiner

(Paul, p. 202) optaram por este ponto de vista.

96
Veja a preocupação de Cranfield, Romans, p. 98-9.

97
Veja também 2Coríntios 5.21 e a construção semelhante em Filipenses 3.9.

98
O Concílio de Trento afirmou que a justificação “não é simplesmente a remissão dos pecados,

mas também a santificação e a renovação do homem interior”. Veja também Fitzmyer (Romans, p.

347), que afirmou: “O ser humano pecador não é apenas ‘declarado justo’, mas é ‘feito justo’ (como

em 5.19), pois a condição do pecador mudou”.

99
Veja Cranfield, Romans, 1:182, n. 4 e p. 183, n. 1. Para um uso semelhante, veja 1Coríntios

4.4. Veja também o uso de tsadaq/tsadiq (TM) e dikaioō/dikaios (LXX) no contexto da corte da lei

de Moisés, em Deuteronômio 25.1; e o uso de tsadaq em Salmos 51.4.

100
Por exemplo, Dunn, Romans, 1:153-55. Uma interpretação semelhante que iguala as “obras

da lei” à lei cerimonial foi primeiramente apresentada por Pelágio. Veja M. F. Wiles, The divine

1144
apostle: the interpretation of St. Paul’s epistles in the early Church (Cambridge: University Press,

1968), p. 67-9.

101
Um sumário conveniente do ponto de vista de Dunn sobre “as obras da lei” aparece em The

Theology of Paul the Apostle (Grand Rapids: Eerdmans, 1998), p. 354-71.

102
Exceções a esta regra geral eram tão poucas que a Mishná as lista: aqueles que negam a

ressurreição, aqueles que negam a origem celestial da lei, aqueles que se opõem ao ensino rabínico;

três reis (Jeroboão, Acabe e Manassés); quatro pessoas comuns (Balaão, Doegue, Aitofel e Geazi); as

gerações do dilúvio e da dispersão, os homens de Sodoma, os espias, e a geração do deserto.

103
C. L. Quarles, “The soteriology of Rabbi Akiba and E. P. Sanders’ Paul and Palestinian

Judaism”, NTS 42 (1996), p. 185-95; id., “The new perspective and means of atonement in jewish

literature of the Second Temple period”, CTR 2 (2005), p. 39-56.

104
Os verbos utilizados para descrever a obediência que a lei requer (prassō, “praticar”; teleō,

“manter/guardar”), em 2.17-29, indicam que Paulo tinha em vista os requerimentos morais da lei e

não apenas marcos de fronteira. Isso fica ainda mais claro em 2.26, onde Paulo falou dos gentios que

eram incircuncisos guardando os “requerimentos da lei” de modo que eram considerados por Deus

como circuncidados mesmo não sendo.

105
Assim também Moo, Romans, p. 173.

106
O adjetivo “ímpio” e o substantivo relacionado “impiedade” caracterizam o comportamento

dos gentios (1.18) e dos judeus (11.26), dos incircuncisos e dos circuncidados.

107
O uso que Paulo faz do verbo prassō (“praticado”) neste contexto confirma que o verbo

descreve ações de natureza moral, como argumentado acima.

108
O dativo tē autou chariti (“pela sua graça”) provavelmente é um dativo de causa, como em

Efésios 2.8. Veja Wallace, Greek Grammar Beyond the Basics, p. 167-8.

1145
109
E. E. Ellis, Paul’s use of the Old Testament (Grand Rapids: Baker, 1981), p. 46.

110
Quarles, “From faith to faith”.

111
Veja a discussão em Dunn (Romans, 1:43-6), cuja abordagem inteira merece um estudo

cuidadoso. Dunn sugeriu que a expressão ek pisteōs eis pistin representa a interpretação de Paulo de

Habacuque 2.4 e que essa interpretação deve ser entendida levando-se em conta o pano de fundo da

tensão entre o original hebraico de Habacuque 2.4 e a tradução da passagem na Septuaginta grega.

Especificamente, a questão era: “De quem é a fidelidade considerada nessa passagem?”. O texto

hebraico se refere ao homem justo, enquanto a LXX se refere a Deus. Paulo omitiu uma referência

explícita seja ao fiel seja a Deus, contudo, muito provavelmente a sua maneira de pôr as coisas —

“de fé para fé” — era um esforço de colocar os papéis de Deus e do fiel numa tensão adequada,

interpretando Habacuque 2.4 como indicação de que a justiça de Deus se estendeu “(a partir) de fé”

(i. e., a fidelidade de Deus) “para fé” (a resposta de fé do fiel). Assim, Paulo navegou entre o Cila e

Caríbdis (extremos perigosos) da história da interpretação de Habacuque 2.4 declarando Deus e sua

fidelidade como a origem da salvação e a fé do crente como a resposta apropriada à fidelidade de

Deus na aliança expressada no envio de Cristo.

112
Por exemplo, Sanday e Headlam, Romans, p. 113.

113
Assim diz Cranfield, Romans, p. 245; Fitzmyer, Romans, p. 386.

114
Por exemplo, Filo, Spec. Leg. 4.187.

115
Assim “chama […] como” funciona como o equivalente de “considera” (logizomai). De

acordo com Käsemann, sugestões semelhantes foram feitas por Zahn, Kühl, Billerbeck, e cogitadas

por Michel. Moo (Romans, p. 281-82) e Käsemann (Romans, p. 122-4) entenderam a construção

como uma alusão à atividade criativa de Deus na salvação. Fitzmyer (Romans, p. 386) sugeriu que

ela se refere ao ato de Deus de criar filhos de Abraão a partir de gentios.

1146
116
Veja o tramento semelhante em L. W. Hurtado, Lord Jesus Christ: devotion to Jesus in

earliest christianity (Grand Rapids: Eerdmans, 2003), p. 111-2.

117 117
O texto original não tem pontuação, e os estudiosos continuam a debater sobre qual seria a

pontuação correta. A maneira em que editores e tradutores modernos pontuam o texto afeta muito seu

significado. A teologia e o estilo de Paulo e o contexto literário apoiam a pontuação do texto como

ele aparece, por exemplo, na A21 (e não a da Bíblia Vozes ou da Edição Pastoral). Paulo claramente

afirmou a divindade de Jesus em textos tais como Romanos 10.9; Filipenses 2.6-11; Colossenses 2.9

e Tito 2.13. As doxologias de Paulo normalmente são dependentes (Rm 1.25; 11.36; 2Co 11.31; Gl

1.15; Ef 3.21; Fp 4.20; 1Tm 1.17; 2Tm 4.18). Todos os casos do adjetivo eulogētos (“bendito”) no

AT, Apócrifos e NT (98 ocorrências) colocam o adjetivo antes do substantivo se referindo a Deus

quando independente (Sl 67.19,20 é um erro de pontuação e não uma exceção). A construção em 9.5

faz um estreito paralelo a 2Coríntios 11.31, que sem dúvida não é independente.

118
A maioria dos pais da igreja e muitos comentaristas modernos interpretam esta passagem

desta maneira, por exemplo, Moo, Romans, p. 655; Fitzmyer, Romans, p. 590; Cranfield, Romans,

2:525; Schreiner, Romans, p. 558-9.

119
Morris, Apostolic preaching, p. 9-26; I. H. Marshall, “The development of the concept of

redemption in the New Testament”, in: Reconciliation and hope, p. 153.

120
Moo, Romans, p. 229-30, n. 51. O uso que Paulo faz do conceito de redenção para descrever

as consequências da morte de Jesus foi provavelmente influenciado pelo seu conhecimento da

tradição de Jesus (veja Mc 10.45; Mt 20.28).

121
Observe também a discussão sobre a ira divina em 5.9. Os fiéis são justificados agora pela

morte sacrificial de Jesus e serão salvos da ira de Deus no juízo escatológico.

122
Este é mais um termo jurídico que Paulo utilizou em Romanos para descrever a obra salvífica

de Deus.

1147
CAPÍTULO 14

As epístolas da prisão: Filipenses,


Efésios, Colossenses e Filemom

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os principais
fatos de Filipenses, Efésios, Colossenses e Filemom. Com relação à
História, deverão ser capazes de identificar o autor, data, origem, destino e
propósito de cada livro. Com relação à Literatura, deverão ser capazes de
fornecer um esboço básico de cada livro e identificar os elementos
essenciais do conteúdo de cada livro encontrados na Discussão Unidade por
Unidade. Com relação à Teologia, deverão ser capazes de identificar os
principais temas teológicos em Filipenses, Efésios, Colossenses e Filemom.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo
principal identificado nos Conhecimentos básicos, os estudantes deverão ser
capazes de apresentar os argumentos em favor das conclusões histórica,
literária e teológica. Com relação à História, deverão ser capazes de discutir
as evidências em favor da autoria paulina, data, origem, destino e propósito.
Com relação à Literatura, deverão ser capazes de apresentar um esboço
detalhado de cada livro. Com relação à Teologia, deverão ser capazes de

1148
discorrer sobre os grandes temas teológicos em Filipenses, Efésios,
Colossenses e Filemom e sobre as formas exclusivas com que eles
contribuem para o cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além do domínio do conteúdo principal
identificado nos itens Conhecimentos básicos e Conhecimentos
intermediários mencionados acima, os estudantes devem ser capazes de
interagir com as propostas alternativas sobre a integridade literária de
Filipenses, a autoria de Efésios e Colossenses, e a natureza de Efésios como
carta circular. Os estudantes também deverão ser capazes de avaliar
criticamente as propostas relativas à natureza da “heresia colossense” e sua
relação com o propósito da carta, discutir as opções interpretativas com
relação à expressão “a circuncisão de Cristo” em Colossenses 2.11 e estar
preparados para decidir sobre as possíveis ocasiões para a carta de Paulo a
Filemom.

INTRODUÇÃO

Como o livro de Atos deixa claro, Paulo estabeleceu diversas


congregações locais nos principais centros urbanos, em pelo menos três
viagens missionárias. Perto do final do seu distinto ministério apostólico, e
depois de escrever Gálatas, 1 e 2Tessalonicenses, 1 e 2Coríntios e
Romanos, Paulo se empenhou em uma correspondência adicional com
várias igrejas e indivíduos durante sua primeira prisão romana (58-60). As
cartas de Paulo aos Filipenses, Efésios, Colossenses e Filemom
(comumente chamadas de Epístolas da Prisão) datam desse período.
Muito provavelmente, Filipenses foi escrita antes das outras cartas. Em
Filemom 22, Paulo esperava ser libertado da prisão em breve, enquanto que

1149
em Filipenses 1.21-25, ele deduziu o que o futuro reservava baseado em
princípios espirituais, mas não tinha ideia do momento de sua libertação.
Efésios, Colossenses e Filemom estavam todas relacionadas com o
retorno de Onésimo e foram muito provavelmente escritas por volta da
mesma época e sob circunstâncias semelhantes. Mas a sequência exata em
que essas cartas foram escritas é desconhecida. Porque Efésios e
Colossenses são conectadas via Tíquico (Ef 6.21, Cl 4.7), e Colossenses e
Filemom via Onésimo (Cl 4.9; Fm 10) e Epafras (Cl 1.17; 4.12; Fm 23), e
porque Efésios, Colossenses, Filemom é a ordem em que as cartas estão
incluídas no cânon do NT, vamos discutir essas três cartas nessa mesma
ordem.

1150
Filipenses

FATOS-CHAVE DE FILIPENSES
Autor: Paulo
Data: Cerca de 59 (muito provavelmente, antes de
Efésios, Colossenses e Filemom)
Origem: Prisão romana
Destino: A igreja em Filipos
Motivo: Ação de graças pela parceria dos filipenses
no evangelho e advertências contra a
desunião e os falsos ensinamentos como
obstáculos para a propagação do evangelho
Propósito: Promover o evangelho centrado na unidade
em prol do avanço do evangelho
Tema: Parceria no evangelho e o andar digno do
evangelho
Versículos-Chave: 1.27-30

INTRODUÇÃO

Filipenses se destaca como uma das cartas favoritas de Paulo para muitos
devido a sua inspiradora mensagem de alegria em meio a circunstâncias
difíceis (p. ex., prisão). Alguns estudantes podem conhecer Filipenses de
forma fragmentada por causa das inúmeras expressões memoráveis
encontradas na carta. Entre essas estão: “para mim o viver é Cristo e o
morrer é lucro” (1.21); “para que ao nome de Jesus se dobre todo joelho
[…] e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor” (2.10,11); “posso

1151
todas as coisas naquele que me fortalece” (4.13); e “alegrai-vos sempre no
Senhor, e digo outra vez: Alegrai-vos!” (4.4). No entanto, essa abordagem
“passo a passo” a Filipenses não faz justiça nem à profundidade da carta
nem ao propósito geral de Paulo ao escrevê-la. Deve-se ver como as peças
se encaixam em um todo coerente para de fato se apreciar a mensagem
profunda da carta.

HISTÓRIA
Autor
Autenticidade
A maioria dos estudiosos considera Filipenses uma carta autêntica escrita
por Paulo. A aceitação pela academia da autoria paulina é tão difundida que
uma discussão prolongada é desnecessária. As razões para aceitar a
autenticidade são as seguintes: (1) A carta se inicia com as palavras “da
parte de Paulo” (tradução do autor); (2) a igreja primitiva aceitava Paulo
como o autor, sem dissidência; e (3) a natureza extremamente pessoal da
carta. Os pais da igreja antiga Policarpo (c. 69-155), Ireneu (c. 130-200),
Clemente de Alexandria (c. 150-215) e Tertuliano (c. 160-225), por
unanimidade, aceitavam a autoria paulina. Esse consenso foi por pouco
tempo questionado, no século XIX, por críticos como F. C. Baur. As
reconstruções históricas de Baur levaram a sua crença de que Paulo
escrevera apenas Romanos, 1 e 2Coríntios e Gálatas.1 Mas a tese de Baur
nunca recebeu apoio generalizado, e seus argumentos agora estão
praticamente abandonados (com exceção de tentativas ocasionais, sem
nenhum sucesso, de reviver sua tese).

1152
O único elemento importante debatido sobre a autoria está centrado no
assim chamado “hino de Cristo”2 de 2.6-11. Alguns estudiosos afirmam que
essa passagem é pré-paulina devido (1) ao vocabulário incomum, (2) o
estilo rítmico, (3) a presença do tema do “servo”, e (4) a ausência de temas
paulinos importantes como redenção e ressurreição. Aqueles que pensam
que Paulo escreveu 2.6-11 costumeiramente respondem alegando que: (1)
outras passagens paulinas contêm o mesmo número de palavras incomuns
em um espaço comparável; (2) outras passagens transmitem um estilo
rítmico; (3) a teologia do “servo” é expressa por meio de uma expressão
caracteristicamente paulina, ou seja, “morte sobre uma cruz” (2.8); e (4)
Paulo não precisa mencionar toda sua teologia em cada passagem.3

Integridade literária
Objeções bem mais graves têm sido levantadas contra a integridade da
carta.4 A tese de uma carta composta é convincente o bastante para que um
crescente número de estudiosos tenha aceitado Filipenses como um
documento composto que fundiu diferentes documentos separados em um.5
Entre os fatores mais comumente citados a favor disso estão:

1. Quanto às evidências externas, a carta de Policarpo aos Filipenses


oferece uma possível evidência de interpretação composta, porque ele
afirmou que Paulo escreveu “cartas” (plural) aos filipenses (cf. Fp 3.2).
2. No que diz respeito às evidências internas, os adversários de Paulo não
parecem ser os mesmos por toda a carta.
3. Além disso, parece haver uma alteração na saúde de Epafrodito, o que
pressupõe um lapso de tempo. Paulo declarou, em 2.25-30, que
Epafrodito estava muito doente, mas Paulo não menciona a

1153
enfermidade quando o nome de Epafrodito aparece novamente em
4.18.
4. O que parece ser uma declaração de encerramento é encontrada em 3.1
(“finalmente”, NVI), na metade da carta. Essa declaração ocorre
imediatamente após uma discussão sobre os planos de viagem de
Paulo e seus associados, material que seria esperado no final da carta.
5. De modo semelhante, 3.1 parece combinar com 4.4, enquanto que uma
abrupta mudança de tom ocorre em 3.2 e continua até 4.3.6
6. Surpreendentemente, Paulo esperou até o final da carta para agradecer
aos filipenses a sua beneficência.

No entanto, apesar da força de alguns argumentos apresentados em


favor de uma leitura composta de Filipenses, a defesa da unidade da carta é
ainda mais forte. As respostas são:

1. A menção de Policarpo às “cartas” paulinas escritas aos filipenses


não exige que Filipenses, na sua forma atual, seja uma combinação de
várias cartas. J. B. Lightfoot argumentou longamente que o plural epistolai
em Policarpo tinha a nuance do singular. Ele demonstrou que o uso do
plural para o singular de “carta” ocorreu em vários escritores clássicos,
incluindo Tucídides, Josefo, Eurípides, Luciano, Juliano e outros.7 Mesmo
se o plural se refere a várias cartas, é possível que Policarpo erroneamente
inferiu que Paulo escrevera várias cartas a Filipos com base em uma
interpretação errônea de 3.1 em vez de no conhecimento direto de que os
filipenses possuíam várias cartas que Paulo escreveu à congregação. Talvez
Policarpo erroneamente supôs que quando Paulo se referiu a escrever as
“mesmas coisas” aos filipenses, ele tivesse em mente uma carta anterior, em
vez de discussões anteriores sobre o ministério de Paulo enquanto esteve

1154
com os filipenses. Mas, como O’Brien apontou, 3.18 parece confirmar que
Paulo tinha em mente as coisas que ele já tinha ensinado oralmente.8
2. Nenhuma evidência externa existe para considerar Filipenses um
documento composto. Todos os manuscritos gregos preservam Filipenses
na sua forma atual, incluindo , um manuscrito datado do final do
46

segundo ou início do terceiro século. Também nenhum dos pais da igreja


antiga insinuou qualquer suspeita de que Filipenses fosse uma combinação
de documentos.
3. As referências a Epafrodito não necessitam de um lapso de tempo.
Carson e Moo deram uma resposta adequada para esta linha de
argumentação: “Não há nenhuma razão para citar a enfermidade do homem
toda vez que ele é mencionado.”9
4. Os mesmos termos e temas permeiam todas as supostas “partes” da
carta. A mera repetição de termos lexicais não é evidência conclusiva, mas
o vocabulário repetido juntamente com semelhanças temáticas é um
argumento forte pela unidade.10
5. A natureza pessoal de Filipenses explica as mudanças aparentemente
abruptas e a variação estilística. Na verdade, os argumentos para as
características abruptas da carta são uma faca de dois gumes. Por que
presumir que um redator costuraria essas várias cartas juntas no que, para os
defensores de um documento composto, parece ser uma forma tão irregular
ou casual?11
6. A expressão grega traduzida por “finalmente” em 3.1 (NVI) é mais
provavelmente transicional, e não uma expressão de encerramento.12 Nem a
menção dos planos de viagem de Paulo, no meio da carta, indica que esta
seção estivesse originalmente na conclusão do documento, uma vez que

1155
2Coríntios e 1Tessalonicenses menciona planos de viagem no corpo da
carta, e havia boas razões contextuais para fazê-lo aqui também.13
7. Paulo pode colocar seu conhecimento da generosidade dos filipenses
no final da carta por motivo de ênfase. Essa característica estrutural não
sinalizaria falta de gratidão.

Data
A data de Filipenses depende do lugar de sua redação. Datas tão antigas
como 50 ou tão tardias como 63 são possíveis. Se Paulo escreveu a carta
durante sua primeira prisão romana, ele provavelmente a escreveu no final
da década de 50 (início da década de 60 no cômputo convencional). Se ele
escreveu a carta durante sua prisão em Cesareia, a carta deveria ser datada
de 55-57 (58-60 no cômputo convencional). Se ele escreveu de Éfeso, isso
foi entre os anos 51 e 54 (54 e 57 no cômputo convencional). Embora as
questões sejam complexas, a evidência para uma origem romana é a mais
convincente. Filipenses parece ter sido escrita um pouco mais cedo do que
as outras Epístolas da Prisão. Paulo parece ter escrito Colossenses, Filemom
e Efésios quase ao mesmo tempo. Filemom implica que a soltura de Paulo
da prisão era iminente (Fm 21). No entanto, quando Paulo escreveu
Filipenses, ele parecia já não ter tanta certeza sobre o resultado de seu
julgamento e estava contemplando a possibilidade de que seria martirizado
(Fp 1.21-26). Por outro lado, o extenso alcance das atividades de Paulo (Fp
1.12-14) e o amplo conhecimento das suas circunstâncias sugerem que
Paulo tinha estado preso em Roma durante pelo menos vários meses na
época em que escreveu Filipenses. Esses fatores sugerem que a composição

1156
de Filipenses deva ser datada em torno da metade de sua prisão em Roma
no, ou perto do, ano 59.14

Origem
A questão da origem é uma das mais controvertidas em Filipenses. Paulo
claramente se identificou como um prisioneiro (1.7,13,17), mas ele não
declarou, de forma explícita, a localização da prisão. Aparentemente, os
filipenses sabiam onde Paulo estava preso e por isso ele não precisou dizer.
Três respostas diferentes se apresentam como dignas de consideração: (1)
Roma;15 (2) Cesareia; e (3) Éfeso.16
A visão tradicional situa a prisão de Paulo em Roma. A hipótese de uma
prisão romana explicaria (1) a menção ao Pretório (1.13) e à casa de César
(4.22); (2) as restrições flexíveis indicadas por sua atividade durante a
prisão (veja At 28.16,30,31); (3) as referências a uma igreja aparentemente
bem estabelecida (1.14); (4) evidência externa, tal como a subscrição
acrescentada pelo primeiro revisor do Codex Vaticanus e os comentários no
Prólogo de Marcião;17 e (5), o caráter de “vida ou morte” dessa prisão
(Paulo poderia ter apelado para César se estivesse sob qualquer outra
prisão).
Até recentemente, a hipótese romana teve domínio quase universal, mas
os estudiosos começaram a notar duas fraquezas principais na hipótese
tradicional relacionadas com a geografia e com os planos de viagem de
Paulo. Em primeiro lugar, a distância entre Filipos e Roma (mais de 1.900
km) torna problemático o número de viagens implícitas em Filipenses (pelo
menos sete).18 Em segundo lugar, a carta aos Romanos menciona a intenção
de Paulo de viajar para a Espanha (Rm 15.24,28), enquanto Filipenses

1157
afirma que Paulo pretendia visitar Filipos após sua libertação (Fp 2.24).
Começando no século dezenove, esses problemas levaram alguns críticos a
propor Cesareia como o lugar de origem da carta aos Filipenses. Alguns
estudiosos defenderam uma origem em Cesareia porque (1) Atos registra
um encarceramento de dois anos nesse local (At 24.27), (2) Herodes tinha
guardas pretorianos ali (At 23.35) e (3) uma hipótese de data anterior situa
os oponentes judaizantes de Paulo de 3.2-4 no mesmo intervalo de tempo
que suas cartas mais antigas.
Mas a hipótese de Cesareia também é problemática porque sua distância
de Filipos leva a muitos dos mesmos problemas levantados contra a
hipótese de Roma, e não há evidência de uma igreja próspera em Cesareia
que desse conta do cenário de Filipenses 1.12-18. Desde 1897, a hipótese
cesareense foi ofuscada pela hipótese efésia, que foi proposta inicialmente
por A. Deissmann.19 Essa tese atualmente desfruta de maior prestígio pelas
seguintes razões: (1) apesar de Atos não identificar uma prisão em Éfeso,
Paulo mencionou muitas prisões não registradas em Atos (2Co 11.23);20 (2)
a proximidade entre Éfeso e Filipos atenua a preocupação com a
possibilidade do número de viagens entre o local de prisão de Paulo e
Filipos; (3) Filipenses tem uma estreita afinidade literária com as cartas
anteriores de Paulo;21 (4) inscrições mostram que uma divisão da Guarda
Pretoriana estava estacionada em Éfeso;22 e (5) Filipenses não menciona
Lucas, que estava com Paulo em Roma (2Tm 4.11), mas provavelmente não
estava com ele durante seu ministério efésio em Atos (i. e., o ministério
efésio não é uma das passagens “nós” em Atos).23
No entanto, a hipótese de Éfeso também enfrenta algumas objeções de
alguns estudiosos: (1) a teoria se baseia em inferências implícitas, porque
não há menção explícita de uma prisão em Éfeso; (2) a coleta para os

1158
crentes pobres em Jerusalém foi de importância central durante o ministério
de Paulo em Éfeso, mas não há nenhum indício dela em Filipenses, e (3)
Paulo falou de modo um pouco áspero sobre os que estavam com ele, com
exceção de Timóteo (Fp 2.19-21), o que seria uma estranha forma de
caracterizar Éfeso, porque seus amigos, Priscila e Áquila, estavam em Éfeso
na mesma época que o apóstolo.24
A natureza mista da evidência sobre a origem descarta uma posição
dogmática. Cesareia parece ser a opção menos provável.25 A escolha entre
Roma e Éfeso é difícil. Os estudiosos pesam os argumentos geográficos
contra uma prisão romana de várias maneiras. Alguns a tratam como a
questão-chave, enquanto outros a consideram irrelevante.26 Muitos
estudiosos assumem uma posição intermediária e sustentam que os
argumentos geográficos são um pouco exagerados. As assim chamadas
afinidades literárias entre Filipenses e cartas anteriores de Paulo talvez não
forneçam qualquer prova convincente sobre a procedência da carta.27
No final, apesar de muitos estudiosos respeitáveis defenderem uma
proveniência de Éfeso, os argumentos para uma prisão romana parecem
mais fortes. A hipótese da origem romana das Epístolas da Prisão é
persuasiva, pois baseia-se em uma prisão conhecida, possui evidência
externa mais abundante, e tem uma longa tradição.28 Essas considerações
podem tornar um pouco mais difícil a comprovação da hipótese efésia.
A hipótese de uma origem romana de Filipenses é ainda mais forte do
que a das outras Epístolas da Prisão devido a referências ao Pretório (Fp
1.13) e à casa de César (Fp 4.22). Lightfoot mostrou que a evidência nas
inscrições antigas, Tácito, Plínio, Suetônio e Flávio Josefo apoiam a tese de
que o Pretório não era um lugar, mas o grupo de homens que formava a
guarda pretoriana. A interpretação de Lightfoot parece confirmada pelas

1159
palavras “e para todos os demais”, que parece ser uma referência a pessoas
e não a lugares. Embora as inscrições se refiram a um membro da guarda
pretoriana estando presente em Éfeso, Bruce provavelmente está correto ao
afirmar que o homem já tinha servido como um membro da Guarda
previamente, enquanto vivia em Roma, antes de ser designado para Éfeso.
Embora fosse possível, de modo geral, encontrar um pretoriano nas capitais
das províncias imperiais, Éfeso era a capital de uma província (Ásia)
senatorial e era improvável que tivesse tido um contingente da guarda
pretoriana estacionado ali.29 Assim, a referência ao Pretório apoia a
proveniência romana da carta.30
Além disso, embora a “casa de César” possa ser uma referência ao
pessoal que supervisionava o banco imperial para a Ásia em Éfeso, como
alguns estudiosos afirmaram,31 a expressão, de forma mais natural, e bem
mais comum, refere-se àqueles que ocupam várias posições na corte
imperial em Roma.32 A teoria da proveniência efésia da carta parece
destinada a tornar-se o ponto de vista consensual dos estudiosos do NT em
um futuro próximo, mas a teoria da proveniência romana é mais favorecida
pelo equilíbrio da evidência. Felizmente, as questões de origem não
alteraram drasticamente a interpretação da mensagem da carta.

Destino
Filipenses 1.1 indica que Paulo dirigiu a carta aos crentes em Cristo Jesus
“que estão em Filipos”. A natureza simples e direta dessa declaração criou
um consenso entre os estudiosos do NT de que Filipos é o destino da carta.
A narrativa de Atos revela que Filipos foi a primeira igreja plantada por

1160
Paulo na Europa (At 16.6-40), em sua segunda viagem missionária, em c.
49-51.33
A cidade de Filipos era mais conhecida no mundo antigo como o local
da batalha na qual Antônio e Otávio sairam vitoriosos sobre Brutus e
Cassius (que ajudaram a assassinar Júlio César), em 42 a.C. Otávio depois
derrotou Antônio (31 a.C.) e reconstruiu Filipos e deu-lhe o ius italicum
(“lei da Itália”), que era o maior privilégio que uma colônia podia obter.34 A
cidade era um local de interesse histórico muito antes desses
acontecimentos.35 Foi fundada por Filipe II da Macedônia, em 358-57 a.C.,
que deu a ela seu próprio nome. Situava-se numa região muito fértil, a treze
quilômetros do mar da Macedônia, e se beneficiava de uma abundância de
nascentes e de ouro (Estrabão, Geografia 7.331). Filipos tornou-se parte do
Império Romano em 168 a.C. e prosperou devido sua localização
estratégica junto à Via Egnatia, a principal estrada entre Roma e o oriente.

Motivo
O texto de Filipenses sugere algumas razões possíveis para a escrita. É
importante observar que Paulo abordou problemas pastorais e preocupações
pessoais. Dois grandes problemas pastorais afloram em Filipenses. Em
primeiro lugar, Paulo, aparentemente, ficou sabendo por um relatório da
desunião entre os filipenses, o que incluía um conflito específico entre duas
mulheres na igreja, Evódia e Síntique. Paulo as exortou a se unirem e a
viverem juntas em harmonia no Senhor (4.2). Segundo, Paulo fez uma séria
advertência contra falsos mestres e seus ensinamentos.36
Paulo também incluiu numerosas preocupações pessoais. Para começar,
o apóstolo procurou fornecer aos filipenses um relato atualizado a respeito

1161
de sua própria situação e do avanço do evangelho, uma vez que ele os
considerava parceiros no evangelho (1.5), que labutaram por ele em oração
(1.19). Além disso, a evidência sugere três outras preocupações pessoais:
(1) uma recomendação de Timóteo, a fim de que os filipenses o recebessem
bem em sua chegada (2.19-23); (2) um anúncio do desejo de Paulo de
visitar a igreja no futuro (2.24); e (3) um relatório sobre Epafrodito e sua
enfermidade (2.25-30).

Propósito
O principal propósito de Paulo em Filipenses está ligado ao tema principal
da carta: parceria no evangelho e andar de modo digno do evangelho.
“Parceria” ou “comunhão” é a tradução habitual aqui para a palavra grega
“koinōnia”. A parceria dos filipenses no evangelho deveria ser entendida
37
em um sentido ativo, não passivo. D. A. Carson captou bem o sentido
quando ele escreveu: “A comunhão cristã, então, é o autossacrifício em
conformidade com o evangelho. Pode haver nuanças de ternura e
intimidade, mas o cerne da questão é essa visão partilhada daquilo que
encerra uma importância transcendente, uma visão que traz à tona nosso
comprometimento”.38 Essa parceria envolvia, mas não era limitada, ao
suporte financeiro dos filipenses à obra missionária de Paulo (4.15,16).
“Portar-se de modo digno do evangelho” (1.27) é abreviação para
portar-se de uma forma que convém à grandeza do evangelho. Esse “andar
digno” envolve a unidade cristã e também disposição de sofrer em favor do
avanço do evangelho. Essa unidade necessária não era “paz a qualquer
custo”, mas era, antes, uma unidade que inspirada por uma fé comum na
mensagem do evangelho. Paulo exortou os fiéis a ficarem juntos em união

1162
em uma batalha pela fé no evangelho. Isso envolvia resistir aos falsos
ensinos que comprometiam a mensagem do evangelho, sofrimento corajoso
de perseguições pelo bem do evangelho, e ser destemido na sua
proclamação.

LITERATURA
Plano Literário
Alguns estudiosos analisaram Filipenses segundo o modelo retórico como
epidêitica39 ou deliberativa.40 Em termos de análise epistolar, uma maior
sensibilidade em relação aos modelos literários e a antiga escrita de cartas
tem se mostrado promissora na identificação de Filipenses como uma “carta
de amizade”.41 Outros comparam Filipenses ao gênero das “cartas
familiares”.42 Apesar das ideias que esses estudos geraram, a abordagem da
carta “de amizade” ou “familiar” tem dificuldade em explicar a função de
3.1 a 4.9 e 4.10-20 na carta, e alguns questionam quanta luz de fato a
hipótese lança sobre a carta como um todo.43
Outros estudiosos defendem uma estrutura quiástica de Filipenses. P.
Wick identificou a estrutura como segue:

A (1.12-26) = A’ (3.1-16)
B (1.27-30) = B’ (3.17-21)
C (2.1-11) = C’ (4.1-3)
D (2.12-18) = D’ (4.4-9)
E (2.19-30) = E’ (4.10-20)44

A. B. Luter e M. V. Lee seguiram uma abordagem quiástica mais


tradicional.45 A seguir, a estrutura proposta por eles:

1163
(1.1,2) Saudações de abertura
A (1.3-11) Prólogo: parceria no evangelho
B (1.12-26) Conforto
C (1.27 a 2.4) Desafio
D (2.5-16) Exemplo
E (2.17 a 3.1a) Modelos de parceria no evangelho
D’ (3.1b-21) Exemplo
C’ (4.1-5) Desafio
B’ (4.6-9) Conforto
A’ (4.10-20) Epílogo
(4.21-23) Saudações de encerramento

O fato de as propostas de Wick e Luter e Lee só concordarem sobre 4.10-20


como uma unidade textual coloca em dúvida a busca por estruturas
macroquiásticas.46
Muitos estudiosos, com destaque para J. T. Reed, analisaram Filipenses
ao nível do discurso e concluíram que a carta é uma composição unificada e
coerente do início ao fim.47 A unidade e a coerência interna da carta de
Paulo aos Filipenses são demonstradas também no esboço a seguir e na
Discussão Unidade por Unidade.

ESTRUTURA
A complexidade da discussão precedente pode levar à conclusão de que a
busca por um esboço é perdida. Mas existe uma solução estrutural mais
simples: introdução (1.1,2); corpo (1.3 a 4.20) e conclusão (4.21-23). O
corpo parece se subdividir em três seções naturais: a abertura (1.3-11); o
corpo propriamente dito (1.12 a 4.9); e o encerramento (4.10-20).

1164
I. Introdução: saudação aos filipenses (1.1,2)

II. Corpo: a parceria dos filipenses com Paulo no evangelho (1.3 a 4.20)
A. Abertura: ação de graças e orações pelos filipenses (1.3-11)
B. Corpo: exortação à unidade pelo bem do evangelho (1.12 a 4.9)
1. Exemplos positivos de se colocar as necessidades dos outros em
primeiro lugar (1.12 a 2.30)
a. O exemplo de Paulo (1.12-30)
b. O Exemplo de Jesus (2.1-11)
c. O Exemplo de Timóteo (2.19-24)
d. O Exemplo de Epafrodito (2.25-30)
2. Advertência contra falsos mestres e desunião interna (3.1 a 4.9)
a. A ameaça dos falsos mestres e o exemplo de Paulo (3.1-21)
b. O surgimento da ameaça devido a desunião interna (4.1-7)
c. Encorajamento final (4.8,9)
C. Encerramento: ação de graças pelos dons atuais e anteriores dos
filipenses (4.10-20)

III. Conclusão: saudações finais (4.21-23)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Introdução: Saudações aos Filipenses (1.1, 2)
Seguindo o padrão das convenções epistolares, Paulo identifica a si como
remetente e a Timóteo como corremetente da carta.48 Ele se referiu aos
destinatários da carta em Filipos e especificamente mencionou os
presbíteros e diáconos da igreja em Filipos (1.1). Na saudação, Paulo, como

1165
de costume, mudou a saudação padrão (chairein) para o teologicamente
fecundo “voto de graça” (charis, 1.2).

II. Corpo: A Parceria dos Filipenses com Paulo no


Evangelho (1.3 a 4.20)
O corpo da carta centra-se no tema da parceria do evangelho. Paulo
enfatizou a necessidade urgente de uma unidade na causa do evangelho.
Essa unidade não surge só como consequência natural do evangelho, mas
também continua a ser necessária para seu crescimento contínuo. Paulo
exortou os filipenses a se unirem contra aquelas coisas que ameaçavam o
progresso do evangelho.

A. Abertura: ação de graças e oração pelos


filipenses (1.3-11)
A ação de graças de Paulo tem o foco na participação e na parceria dos
filipenses no evangelho. O apóstolo alegrou-se pelo fato de que a parceria
que se estendia desde o passado até o presente (1.5) continuaria até o fim
porque aquele que começou a obra era confiável para terminá-la (1.6). Ele
comentou sobre quão adequados eram esses sentimentos à luz de sua firme
convicção de que os filipenses eram correcipientes da graça divina
juntamente com ele em sua obra de defender e confirmar o evangelho (1.7).
Paulo também invocou a Deus como testemunha da sinceridade dessas
afeições para com os Filipenses (1.8). Ele concluiu esta seção com uma
oração pelo crescimento contínuo dos filipenses no evangelho (1.9-11).

1166
Algo Para Pensar: A Virtude Exclusivamente
Cristã da Humildade

Se a humildade é definida nos termos de Paulo como “consider[ar]


os outros como mais importantes” do que nós mesmos (2.3), então é
claro que a humildade é uma virtude exclusivamente cristã. Neste
universo caído e pecaminoso, com sua mentalidade de
“sobrevivência do mais apto”, o prêmio vai para aqueles que são
agressivos, assertivos e perseguem seus próprios interesses, mesmo
que isso signifique pisar nos outros para seguir em frente.
Considerar os outros como mais importantes do que nós mesmos não
acontece naturalmente.
Mas isso é exatamente o que as Escrituras aconselham os
cristãos a fazer. Como pode ser isso? Em resumo: porque a
humildade é supremamente simbolizada na vida de Cristo, quem,
existindo em forma de Deus, não considerou a igualdade com Deus
algo a ser usado em sua vantagem. Pelo contrário, esvaziou a si
mesmo, assumindo a forma de servo e fazendo-se semelhante aos
homens. Assim, na forma externa de homem, humilhou a si mesmo
por tornar-se obediente até a morte — até mesmo morte de cruz (2.6-
8).
Jesus era Deus — no entanto, humilhou a si mesmo, não uma,
mas várias vezes, numa sequência sempre decrescente: de Deus a
homem; de homem a escravo; de escravo obediente até a morte —
morte numa infame cruz romana. Nisso Jesus tornou-se um modelo
para seus seguidores imitarem (veja Jo 13.1-20, especialmente v. 12-

1167
17; Paulo pode muito bem ter tido a passagem de João em mente
quando escreveu esta passagem). Em vez de discutir sobre quem é o
maior — como os discípulos de Jesus fizeram muitas vezes no
primeiro século e ainda fazem no século vinte e um — Jesus nos
convida, como Paulo coloca, “a levar o fardo uns dos outros” e,
assim, “cumpri[r] a lei de Cristo” (Gl 6.2).
Na igreja de Filipos (veja 4.2,3), bem como em nossas igrejas
hoje, muitas vezes achamos difícil conviver com o outro. Por que
isso? Segundo Paulo, o motivo pode ser rivalidade, vaidade,
ambição — em uma palavra, orgulho (2.3). Então, qual é o remédio?
Novamente, é uma palavra que resume a resposta de Paulo:
humildade: “com humildade […] Cada um não se preocupe somente
com o que é seu, mas também com o que é dos outros” (2.3,4). Possa
Deus nos ajudar a fazê-lo, e enquanto buscamos a humildade, vamos
contemplar o resultado da humildade de Cristo:
“Por isso, Deus também o exaltou com soberania e lhe deu o
nome que está acima de qualquer outro nome; para que ao nome de
Jesus se dobre todo joelho dos que estão nos céus, na terra e debaixo
da terra, e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para
glória de Deus Pai” (2.9-11).

B. Corpo propriamente dito: exortação à unidade


pelo bem do evangelho (1.12 a 4.9)
Paulo apresentou aos filipenses quatro vinhetas biográficas em 1.12 a 2.30.
As vidas de Paulo (1.12-26), Jesus (2.5-11),49 Timóteo (2.19-24) e
Epafrodito (2.25-30) servem a uma função exortatória porque eles

1168
demonstraram humildade ao colocar as necessidades dos outros em
primeiro lugar, mesmo em face de uma morte potencial (1.20-24; 2.27,30)
ou real (2.8). Os testemunhos dessas vidas forneciam exemplos para os
filipenses seguirem enquanto buscavam o maior progresso do evangelho em
meio a suas próprias dificuldades. Eles serviam para fortalecer os filipenses
para que também eles pudessem suportar o sofrimento (1.29) que
enfrentavam nas mãos de seus adversários (1.28). Paulo até se referiu a esse
sofrimento como uma dádiva graciosa de Deus (1.29).
O chamado à imitação continua em 3.17 e 4.9, mas em 3.1 a 4.9 ele é
diferente por ter o foco em duas graves ameaças contra o evangelho: (1) os
falsos mestres, e (2) a desunião entre os filipenses. A nota de urgência de
Paulo por toda esta seção parece um chamado à mobilização na luta pelo
evangelho.
A ameaça dos falsos mestres era muito mais grave do que a ameaça
representada pelos evangelistas já mencionados Paulo (1.15-17). Os
evangelistas pregavam a mensagem correta pelos motivos errados. Eles
pregavam porque invejavam Paulo e queriam aumentar seu sofrimento. Se
eles tivessem diferenças doutrinárias com Paulo, essas eram relativamente
pequenas, de modo que Paulo ainda podia se alegrar por eles proclamarem
o evangelho. A presente unidade deixa claro que a mensagem que os falsos
mestres pregavam era muito errada. Ela se afastava tanto do verdadeiro
evangelho que Paulo teve de confrontá-la.50
Paulo repreendeu o zelo deles por um falso evangelho que
aparentemente via a circuncisão e as leis alimentares do AT como
necessárias para a salvação. Com sarcasmo mordaz, Paulo virou a mesa
sobre os falsos mestres e demonstrou que a acusação que faziam aos crentes
gentios era, na verdade, uma autoacusação. Os judeus chamavam os não

1169
judeus de “impuros”, em parte porque eles tinham uma dieta proibida,
assim como cães que se alimentavam de carniça e lixo.51 Paulo chamou os
falsos mestres de “cães” para mostrar que não pertenciam ao verdadeiro
povo de Deus.
Com um jogo de palavras, Paulo descreveu a circuncisão dos falsos
mestres como mutilação, o que remetia aos cortes no corpo feitos pelos
pagãos, semelhantes aos ferimentos autoinflingidos pelos profetas de Baal
(1Rs 18.28), que eram proibidos na lei do AT (Lv 19.28; 21.5; Dt 14.1; Is
15.2; Os 7.14). A ideia de Paulo era que a dependência que os falsos
mestres tinham da circuncisão para salvação demonstrava que eles não
entendiam a graça de Deus e eram, na verdade, pagãos em vez de o povo
escolhido de Deus. Os cristãos são a verdadeira circuncisão, os que adoram
a Deus em Espírito e não mais confiam na carne (3.1-3). Aliás, Paulo
lembrou os filipenses que se alguém tinha razão para confiar na carne, era
ele (3.4-6).
No entanto, após sua conversão a Cristo, ele começou a relegar aquelas
coisas antigas (3.7), e na verdade todas as coisas (3.8), ao lado das perdas
no livro contábil em comparação com a superioridade da vantagem de
conhecer a Cristo (3.8) e ser encontrado justo nele pela fé (3.9). A paixão de
Paulo agora era conhecer a Cristo no poder de sua ressurreição e na
comunhão dos seus sofrimentos (3.10), de modo que pudesse por fim seguir
a Cristo experimentando a ressurreição (3.11).
Paulo lembrou aos filipenses que não tinha alcançado a meta da
ressurreição ou se tornado perfeito (3.12). Ele intencionalmente se esqueceu
das qualificações das quais ele outrora dependia para a salvação e, agora,
prosseguia em busca do prêmio celestial (3.12-14). Essa perspectiva
representava a marca do pensamento maduro para os cristãos (3.15), que

1170
Deus iria revelar até para aqueles que discordavam (3.16). O apóstolo
apresentou a si mesmo e aqueles com a mesma perspectiva como exemplos
a se imitar, em contraste com o comportamento dos adversários, que eram
inimigos da cruz (3.17-19). Ele traçou um forte contraste entre o foco deles
em “coisas terrenas” (3.19) e a “cidadania” dos fiéis no céu (3.20). Paulo
mostrou que esses focos contrastantes conduziriam a resultados
contrastantes: destruição para os adversários (3.19) e corpos glorificados
para os fiéis (3.20,21). Os fiéis aguardam entusiasticamente pelo Salvador,
Jesus Cristo (3.20),52 que os transformará pelo seu grande poder (3.21).
A segunda ameaça ao evangelho é a desunião. Filipenses 4 começa com
uma exortação a que os filipenses permaneçam firmes no Senhor (4.1).
Paulo continuou sua exortação recomendando a duas mulheres
proeminentes da igreja a “entrarem em acordo no Senhor” (4.2). A desunião
obviamente ameaçava a “parceria” no evangelho, então Paulo pediu que os
filipenses ajudassem essas mulheres a lutar pelo evangelho ao lado de
Paulo, Clemente e seus outros colaboradores na obra (4.3). Alegrar-se no
Senhor (4.4), a oração (4.6) e o poder da paz de Deus em guardar o coração
(4.7) representam a cura para a desunião. Paulo concluiu exortando os
filipenses a se concentrarem nas coisas excelentes (4.8) e a imitarem o
ensinamento e estilo de vida de Paulo (4.9).

C. Encerramento: ação de graças pela parceria dos


filipenses no evangelho (4.10-20)
Paulo se alegrou com ação de graças pelo suporte financeiro dos filipenses
presente (4.10,14,18) e passado (4.15,16). Ele não se alegrou tanto pela
ajuda financeira em si, mas pelo que ela representava: a parceria dos

1171
filipenses com Paulo no Evangelho. O apóstolo testificou que o
fortalecimento que recebia de Cristo o capacitava (4.13) a se contentar em
qualquer circunstância (4.11), na necessidade ou na fartura (4.12). Ele
lembrou aos filipenses que suas ofertas a ele eram, na verdade, sacrifícios
de louvor a Deus (4.18), quem supriria todas as suas necessidades segundo
sua riqueza de glória em Cristo Jesus (4.19). Portanto, Paulo fechou com
uma adequada doxologia que dava toda glória a Deus (4.20).

III. Conclusão: Saudações Finais (4.21-23)


Paulo exortou os filipenses a cumprimentarem todos os crentes em Cristo
Jesus. Ele também os lembrou que todos os crentes enviaram seus
cumprimentos, incluindo os irmãos que estavam com ele. Entre aqueles na
categoria de “todos os crentes”, Paulo destacou principalmente os da “casa
de César” (4.22). Paulo deu continuidade a essas saudações com a bênção
da graça: “a graça de Nosso Senhor Jesus Cristo esteja com o vosso
espírito” (4.23).

TEOLOGIA
Temas Teológicos
O evangelho e suas implicações
A teologia de Paulo em Filipenses é essencialmente centrada no evangelho.
Esse foco no evangelho fundamenta a preocupação de Paulo com as
importantes implicações práticas e éticas que decorrem do evangelho. Essa
conexão é vista em sua forma mais abrangente na exortação de Paulo em
1.27: “Viva a sua vida [politeusthe] de um modo digno do evangelho.” Os

1172
fiéis se tornaram cidadãos do céu por meio do evangelho, e, portanto, sua
conduta deve corresponder a sua cidadania. O mesmo tema surge
novamente em 3.20: “A nossa cidadania está no céu”. A nuança política
destes dois textos é um lembrete importante de que, em comparação com a
cidadania celeste dos fiéis, a posição de Filipos como uma colônia romana
empalidece. Atos de obediência prática e pessoal — unidade, humildade,
alegria, ausência de reclamação ou ansiedade — não apenas surgiram do
evangelho, mas eram necessários também para o evangelho e seu progresso
contínuo.
Como observado na análise unidade por unidade, toda a carta pode ser
entendida em sua relação com o evangelho. A ação de graças de abertura
apresentada por Paulo centra-se na parceria dos filipenses no evangelho
(1.5). Como participantes da graça com Paulo em sua defesa e confirmação
do evangelho (1.7), eles devem não apenas “lutar juntos pela fé do
evangelho” (1.27, tradução do autor), mas também seguir os exemplos de
Paulo (1.21-26), Jesus (2.5-11), Timóteo (1.19-24) e Epafrodito (1.25-30),
porque eles colocam as necessidades dos outros na frente das próprias por
causa do evangelho. Da mesma forma, Paulo tratou dos falsos mestres (3.2-
21) e da desunião (4.2,3) entre os filipenses porque representavam uma
ameaça ao progresso do evangelho. A carta termina com uma ação de
graças pela sua parceria no evangelho (4.10-20), já que seu auxílio
financeiro ajudou a promover o progresso do evangelho.

A pessoa e obra de Cristo


Esse interesse central no Evangelho de Cristo resulta da centralidade de
Cristo no pensamento de Paulo, outro tema importante que caracteriza a

1173
teologia de Filipenses. Filipenses reflete uma visão elevada da pessoa e
obra de Jesus Cristo. A passagem mais óbvia e marcante relativa à
cristologia é o primoroso “hino a Cristo” em 2.6-11.53 A glória do
evangelho é vista (1) na eminência gloriosa do estado preexistente de Cristo
(2.6); (2) na sua humilde obediência ao Pai em todos os aspectos, desde
assumir as limitações da carne humana até o ato culminante da morte
humilhante e dolorosa na cruz (2.7,8); e (3) na posição exaltada do Cristo
ressuscitado como aquele a quem todo joelho se dobrará e a quem toda
língua confessará como Senhor (2.9-11).
Nesse hino cristológico Paulo afirmou claramente a divindade de Jesus,
descrevendo-o como tendo sempre existido na exata forma de Deus,
totalmente igual a Deus,54 e, no entanto, recusando-se a usar sua igualdade
com o Pai para sua própria vantagem egoísta. A ênfase na posição exaltada
de Jesus é especialmente importante na conclusão do hino, onde Paulo
insistiu que Jesus possuía “o nome que está acima de qualquer outro nome”
(Fp 2.9), evitando mencionar o nome de Deus. Na época do NT, os judeus
reverenciavam tanto o nome de Deus, Yahweh, que se recusavam a
pronunciá-lo. Geralmente, ele era pronunciado apenas pelo sumo sacerdote
no Dia da Expiação e por sacerdotes locais que pronunciavam a bênção
sacerdotal. Para qualquer outra pessoa, em qualquer época, em qualquer
outro lugar, pronunciar o nome divino era considerado blasfêmia, um crime
punível com a morte.
Os judeus se referiam a Deus usando substitutos para o nome divino.
Esses nomes substitutos eram chamados kinnuyim. Entre as substituições
mais comuns estavam “Senhor” (Adonai), “o Nome” (hashem), “o nome
Separado”, “o nome do próprio Deus” e “o nome de quatro letras”
(tetragrammaton). Em Filipenses 2.9, Paulo usou o kinnuyim “o nome”

1174
(com o artigo definido em grego) e ainda descreveu esse nome como aquele
“acima de todo nome”. Todo judeu em Filipos que ouvia essa expressão
reconhecia automaticamente nela uma alusão ao nome divino. Paulo
identificou esse supremo nome divino na confissão “Jesus Cristo é o
Senhor”. Uma vez que o título grego “Senhor” (kyrios) era a tradução do
nome “Yahweh” no AT, e uma vez que a descrição “nome acima de
qualquer outro nome” é um exemplo claro de kinnuyim, Paulo
explicitamente identificou Jesus como Deus que possui o próprio nome de
Deus.55
Paulo confirmou essa identificação aplicando também a descrição da
adoração de Yahweh em Isaías 45.23 a Jesus. A promessa de Paulo de que
todo joelho se dobrará diante de Jesus e que toda língua confessará que
Jesus é o Senhor claramente faz alusão à promessa: “Olhai para mim e
sereis salvos, vós, todos os confins da terra; porque eu sou Deus, e não há
outro. […] Todo joelho se dobrará e toda língua haverá de jurar fidelidade”
(Is 45.22,23). A aplicação que Paulo faz a Jesus de um texto descrevendo
homenagem a Yahweh demonstra que ele via Jesus como muito mais do
que um simples homem ou um grande mestre religioso. Ele via a Cristo
como uma divindade que viera a terra sob a forma de um servo humano.56
No entanto, descrição de Paulo da jornada de Cristo do céu à terra, da
terra à sepultura, e da sepultura ao céu em 2.6-11 não deve levar ninguém
negligenciar as muitas outras passagens em Filipenses que atestam a
centralidade de Cristo. Poucas passagens paulinas podem se comparar com
1.21-23 e 3.7-11 em termos da expressão da ardente paixão que Paulo tinha
por honrar a Cristo e conhecê-lo mais plenamente nesta vida e na vida
futura.

1175
Além disso, referências a Cristo saturam toda a carta, do começo ao
fim.57 Mais evidência vem da frequência de expressões como “em Cristo”,
“nele”, ou “no Senhor” por toda Filipenses. Essas expressões podem
comunicar a união com Cristo (1.1,14,29; 3.9; 4.21) ou enfatizam uma ação
que ocorre em resposta ou com base na pessoa, obra e senhorio de Jesus.
Isso inclui confiança abundante em Cristo (1.26); encorajamento em Cristo
(2.1); ter a mente ou atitude que houve em Cristo (2.5); esperar em Cristo
(2.19, 24); receber outros no Senhor (2.29); alegrar-se no Senhor (3.1; 4.4,
10); gloriar-se em Cristo (3.3); prosseguir para o chamado celestial de Deus
em Cristo (3.14); permanecer firme no Senhor (4:2); viver em harmonia no
Senhor (4.3); guardar corações e mentes em Cristo (4.7); ou suprir as
necessidades segundo as riquezas de Deus em Cristo (4.19). A carta termina
com uma bênção a respeito da “graça do Senhor Jesus Cristo” (4.23).

Unidade cristã
Paulo repetidamente enfatizou o relacionamento especial que tinha com a
igreja de Filipos. Em 4.15, ele escreveu que “nos primeiros dias do
evangelho […] nenhuma igreja comunicou-se comigo quanto a dar e
receber a não ser vocês somente”. Na abertura da ação de graças, ele
expressou sua gratidão pela “cooperação (dos filipenses) na causa do
evangelho, desde o primeiro dia até agora”, e mencionou sua confiança “de
que aquele que começou uma boa obra em vós irá aperfeiçoá-la até o dia de
Cristo Jesus” (1.5,6).
No entanto, aparentemente nem tudo estava sempre bem na igreja de
Filipos. Não só havia ameaças de fora sob a forma de falsos mestres (veja
3.2), mas também havia desunião interna com potencial para dividir a

1176
igreja. Esse problema era simbolizado por Evódia e Síntique (4.2) e o fato
de Paulo tê-las citado pelo nome indica a gravidade da discórdia entre elas.
Curiosamente, Paulo disse que as duas mulheres “batalharam ao meu lado
pelo evangelho”, junto com “os meus outros cooperadores” (4.3).
Embora elas uma vez tivessem se esforçado para tornar o evangelho
conhecido ao lado de Paulo, unidas na causa comum do testemunho cristão,
elas agora tinham necessidade de um mediador para resolver quaisquer que
fossem suas diferenças (4.3). Esse, muito provavelmente, foi o motivo de
Paulo escrever no início da carta: “Somente portai-vos de modo digno do
evangelho de Cristo, para que, quer eu vá e vos veja, quer esteja ausente,
ouça acerca de vós que permaneceis firmes num só espírito, combatendo
juntos, com uma só alma, pela fé do evangelho” (1.27).
Paulo também exortou os filipenses a que nada fizessem “por rivalidade
nem por orgulho, mas com humildade”, e assim cada um considerasse “os
outros superiores a si mesmo. Cada um não se preocupe somente com o que
é seu, mas também com o que é dos outros” (2.3,4). Isso é seguido por uma
descrição comovente e poética de Jesus Cristo, que renunciou a todos os
seus privilégios a fim de atender a desesperada necessidade de salvação da
humanidade, como o supremo exemplo dessa humildade (2.5-11).
Consequentemente, os fiéis são exortados a “realizar a vossa salvação
com temor e tremor; porque é Deus quem produz em vós tanto o querer
como o realizar, segundo seu bom propósito” (2.12,13). A preocupação de
Paulo era pela unidade dos fiéis de modo que a proclamação do evangelho
não fosse perturbada. A desunião interna continua a ser um importante
instrumento de Satanás impedindo um efetivo ministério cristão. O
evangelho avançará, e Deus será glorificado caso as Evódias e Síntiques nas

1177
igrejas deixem de lado suas diferenças e entrem em “acordo no Senhor”
(4.2).

Alegria em Cristo
Não se deve desconsiderar o tema teológico da alegria apenas por não ser o
tema principal da carta. Paulo usou a família de palavras de “alegria” 16
vezes nesta breve carta. Assim, Filipenses testifica da profundamente
enraizada realidade da alegria na vida de um seguidor de Cristo. Não se
deve considerar o deleite em Cristo como a versão “cereja do bolo” do
cristianismo, mas como uma consequência essencial da união com Cristo no
evangelho. Alegria é um transbordar inevitável de progressivamente se
perceber o “valor insuperável” do conhecimento de Cristo Jesus como
Senhor por meio da fé no evangelho de Cristo. F. Thielman resumiu
Filipenses “uma constante tentativa de convencer os fiéis a se alegrar no
que interessa (1.10,18)”.58

O sofrimento cristão
O sofrimento é um importante tema teológico em Filipenses que
frequentemente é negligenciado.59 As circunstâncias difíceis enfrentadas por
Paulo serviram para o progresso do evangelho (1.12,13). Paulo enfrentou a
perspectiva da morte na sua prisão (1.20,21), e Epafrodito também quase
morreu pela causa do Evangelho (2.27). Na luta dos filipenses pela fé do
evangelho (1.27), eles também enfrentariam sofrimento, mas eles
precisavam enfrentar a oposição sem medo (1.28). Eles também precisavam
considerar seu sofrimento, assim como sua fé, como uma dádiva graciosa
de Deus (1.29). Essa experiência de conflito espelhava o sofrimento de

1178
Paulo, que eles tinham tanto testemunhado no passado quanto agora ouviam
a respeito no presente (1.30). O uso que Paulo fez do tema sofrimento
convidava os filipenses a “ver sua marginalização como um sinal de sua
cidadania em uma sociedade diferente, celestial”, porque “embora os
cidadãos de Filipos os tivessem marginalizado eles são cidadãos de uma
cidade celestial, e naquele dia o governante daquela cidade sujeitará todas
as outras entidades a si mesmo”.60
Paulo mencionou o sofrimento de Cristo na cruz (2.8) e considerou seu
próprio sofrimento como uma comunhão no sofrimento de Cristo e
conformidade com sua morte (3.10). Além disso, Paulo podia suportar
sofrimento, como fome e pobreza (4.12), pela força dada por Cristo (4.13).
Alegria em meio ao sofrimento é especialmente inspirador no relato do
júbilo de Paulo e Silas, à meia-noite, em uma prisão de Filipos após serem
espancados com varas (At 16.16-25).

Justificação somente pela fé


Filipenses 3.9 é uma das declarações mais enfáticas com respeito à
justificação em todo o NT.61 Filipenses 3.3-6 resume o ímpeto da antiga
busca de Paulo por salvação antes de seu encontro na estrada de Damasco.
Suas credenciais judaicas impecáveis (3.5,6) o levaram a confiar na carne
(3.4). A conversão de Paulo causou uma reavaliação radical. Essas antigas
credenciais (3.7) e todas as outras coisas (3.8) eram perda em comparação a
conhecer e ganhar Cristo. Paulo agora identificava dois tipos contrastantes
de justiça após sua experiência com o Cristo ressuscitado: uma justiça que
vinha da lei, e uma justiça que vinha de Deus (3.9).62 Portanto, Paulo via um
forte contraste entre uma justiça que ele exibia por obedecer à lei, e uma

1179
justiça providenciada por Deus e recebida pela fé em Cristo.63 A única
esperança que a humanidade injusta tinha de aceitação por parte do divino
juiz era a dádiva da justiça proveniente de Deus e que era recebida pela fé.
Esses versículos estão saturados de linguagem contábil e provavelmente
remetam à imagem do juiz celestial como um grande logista com seu
enorme livro contábil. Cada vez que uma pessoa pecava, o pecado era
registrado no lado dos débitos do livro. Muitos judeus também acreditavam
que as boas obras eram registradas no lado do crédito do livro. Se uma
pessoa pudesse permanecer “no azul”, isto é, praticasse um número maior
de boas obras do que de más, ela receberia uma recompensa no juízo. Se a
conta de uma pessoa estivesse “no vermelho”, ela seria condenada à
punição eterna quando a contabilidade moral fosse realizada no dia do juízo
(m. Avot 3.15,16). A ideia de Paulo era que exatamente as coisas que ele
outrora tinha contado como créditos em sua conta com Deus eram, na
verdade, débitos. Elas não só não poderiam de forma alguma contribuir para
sua salvação como, na verdade, eram obstáculos. Ele descobriu que Cristo
era o único crédito na sua conta que podia garantir que ele fosse aprovado
no rigoroso exame de Deus no dia do juízo. Paulo já não dependia mais de
seus próprios esforços pessoais de justiça para sua salvação; ao contrário,
ele confiava totalmente na justiça que Deus havia imputado a ele pela sua fé
em Jesus.
Este texto é parte importante de um debate mais amplo acerca da nova
perspectiva sobre Paulo.64 O entendimento desse versículo pela nova
perspectiva, que vê a justiça em um sentido nacionalista, não é muito
coerente com a própria passagem. A justiça do próprio Paulo não pode ser
restrita ao nacionalismo e exclusivismo judaicos (judeus em oposição a
gentios) porque ele distinguiu sua própria justiça pessoal da dos demais

1180
judeus de sua época. Em outras palavras, ele distinguia sua própria justiça
pessoal distanciando-se das realizações inferiores de alguns de seus
compatriotas, não dos gentios de fora dos confins de Israel.

1
F. C. Baur, Paul, the Apostle of Jesus Christ (Peabody: Hendrickson, 2003).

2
Um debate significativo existe sobre como chamar essa passagem, ou um “hino” ou “prosa

exaltada”. P. T. O’Brien, Philippians, NIGTC (Grand Rapids: Eerdmans, 1991), p. 186-202, tem a

melhor argumentação em favor de chamar esta passagem de hino; enquanto G. D. Fee, “Philippians

2.5-11: hymn or exalted pauline prose?”, BBR 2 (1992), p. 29-46, apresenta a explicação mais

contundente do porquê a passagem é prosa paulina exaltada.

3
Há um debate feroz sobre a estrutura da passagem (quantas estrofes ou dísticos?); sua teologia

(ela expressa pré-existência?); e propósito (imitação da humildade de Cristo ou compartilhar da

morte e ressurreição de Cristo para assegurar um lugar no corpo da igreja?). Para um guia excelente,

veja O’Brien, Philippians, p. 186-202.

4
A limitação de espaço não permite uma análise detalhada da tradição textual de Filipenses. Veja

a excelente obra de M. Silva, Philippians, BECNT, 2. ed. (Grand Rapids: Baker, 2005), p. 22-6.

5
V. Koperski, “The early history of the dissection of Philippians”, JTS 44 (1993), p. 599-603,

observa que uma teoria da partição de Filipenses foi proposta pela primeira vez no século dezenove,

mas só teve destaque no século XX. Entre os que a advogam estão: W. Schenk, “Der Philipperbrief

oder die Philipperbriefe des Paulus? Eine Antwort an V. Koperski”, ETL 70 (1994), p. 122-31; e W.

Harnisch, “Die paulinische Selbstempfehlung als Plädoyer für den Gekreuzigten: Rhetorisch-

hermeneutische Erwägungen zu Phil 3”, in: U. Mell; U. B. Müller, orgs., Das Urchristentum in seiner

1181
literarischen Geschichte: Festschrift für Jürgen Becker zum 65. Geburtstag, BZNW 100 (Berlin: de

Gruyter, 1999), p. 133-54.

6
Veja esp. E. J. Goodspeed, An introduction to the New Testament (Chicago: University Press,

1937), p. 90-1: “There is between 3:1 and 3:2 a break so harsh as to defy explanation”.

7
Veja Lightfoot, Philippians, p. 138-42. Mas o verbete em BDAG, s.v. “ἐπιστολή”, afirma, “Com

toda probabilidade, o plural em nossa literatura — incluindo At 9.2; Pol Fp 3.2 — sempre significa

mais de uma carta, não apenas uma”.

8
Veja O’Brien, Philippians, p. 350-2.

9
Carson e Moo, Introduction to the New Testament, p. 510 [publicado em português por Vida

Nova sob o título Introdução ao Novo Testamento].

10
Veja os amplos links propostos por P. Wick, Der Philipperbrief: Der formale Aufbau des Briefs

als Schlüssel zum Verständnis seines Inhalts, BWA(N)T 7/15 (Stuttgart: Kohlhammer, 1994); e J. T.

Reed, A Discourse Analysis of Philippians: Method and Rhetoric in the Debate over Literary

Integrity, JSNTSup 136 (Sheffield: Sheffield Academic Press, 1997).

11
O melhor sumário das opções e argumentos em favor da integridade literária provavelmente

ainda seja o de D. E. Garland, “The composition and literary unity of Philippians: some neglected

factors”, NovT 27 (1985), p. 141-73.

12
Veja M. E. Thrall, Greek particles in the New Testament: linguistic and exegetical studies,

New Testament Tools and Studies (Leiden: Brill, 1962), p. 28: “λοιπόν no grego pós-clássico podia

ser usado simplesmente como uma partícula de transição, para introduzir uma conclusão lógica ou

um novo ponto no progresso do pensamento” (cf. BDAG, s.v. “λοιπόϛ”, p. 602-3). A expressão pode

significar “finalmente” (2Co 13.11), mas o contexto deve determinar se ele tem uma nuance

transicional ou conclusiva. Por exemplo, 1Tessalonicenses 4.1 claramente utiliza a palavra em um

sentido transicional, pois é seguida de mais dois capítulos.

1182
13
Veja 2Coríntios 1.12 a 2.4; 2.12,13; 8.16-24; 1Tessalonicenses 2.17 a 3.10. Sobre as razões de

incluir o plano de viagem aqui, veja O’Brien, Philippians, p. 15.

14
Veja discussão adicional a seguir.

15
M. Bockmuehl, The epistle to the Philippians, BNTC 11 (Peabody: Hendrickson, 1998), p. 25-

32; G. D. Fee, Paul’s letter to the Philippians, NICNT (Grand Rapids: Eerdmans, 1995), p. 34-7;

Silva, Philippians, p. 5-7; O’Brien, Philippians, p. 19-26.

16
F. Thielman, “Ephesus and the literary setting of Philippians”, em: A. M. Donaldson; T. B.

Sailors, orgs., New Testament greek and exegesis, Fs. Gerald F. Hawthorne (Grand Rapids:

Eerdmans, 2003), p. 205-23; id., Theology of the New Testament (Grand Rapids: Zondervan, 2005),

p. 307. Kümmel (Introduction, p. 332) também favoreceram levemente a hipótese de Éfeso em

relação à de Cesareia e consideraram a teoria de Roma a menos provável. Carson e Moo

(Introduction to the New Testament, p. 506) cautelosamente disseram que “há pouca coisa mais a ser

dita em favor de Éfeso do que em favor de Roma, mas não podemos dizer nada mais do que isso (e

muitos defenderiam que nós não estamos habilitados a dizer nem mesmo isso)”. Finalmente, alguns

sugerem a cidade de Corinto, mas essa proposta não recebeu muito apoio acadêmico.

17
“Os filipenses são macedônios. Tendo recebido a palavra da verdade, eles permaneceram

firmes na fé. O apóstolo os elogia, escrevendo para eles da prisão em Roma.”

18
O’Brien (Philippians, p. 25) corretamente calculou que pelo menos três viagens entre Roma e

Filipos são possíveis antes de Paulo ter escrito a carta, dependendo de onde Epafrodito se encontrava

quando ficou doente. Se Paulo escreveu Filipenses por volta do final dos dois anos de prisão em

Roma, há tempo mais do que suficiente para as requeridas viagens. As três viagens só de ida a Filipos

por Epafrodito, Timóteo e Paulo, respectivamente, não apresentam problemas para uma origem

romana. A preocupação deveria ter o foco no número de viagens entre o início da prisão de Paulo e a

escrita da carta.

1183
19
A. Deissmann, “Zur ephesinischen Gefangenschaft des Apostels Paulus”, em: W. H. Buckler;

W. M. Calder, orgs., Anatolian Studies Presented to Sir William Ramsay (Manchester: University

Press, 1923), p. 121-7.

20
Alguns estudiosos também mencionam que 2Coríntios registra uma referência a uma severa

dificuldade em Éfeso, o que poderia implicar aprisionamento.

21
Thielman (“Ephesus and the literary setting of Philippians”, p. 205-23) apresentou a defesa

mais bem sustentada das ligações entre Filipenses e as cartas anteriores como Gálatas, Coríntios e

Romanos. G. W. Beare (Philippians, BNTC, 2. ed. [London: A. & C. Black, 1969], p. 20) adotou a

hipótese romana, mas afirmou que as semelhanças literárias entre Filipenses e as cartas anteriores

“talvez [sejam] a parte mais pesada [sic] do argumento em favor de Éfeso”.

22
F. F. Bruce (Philippians, NIBC [Peabody: Hendrickson, 1989], p. 12) argumentou que essa

evidência de inscrição não é relevante porque o “pretoriano mencionado em três inscrições latinas era

um antigo membro da guarda pretoriana que mais tarde cumpriu serviço policial como chefe de

guarnição em uma estrada romana na província da Ásia”.

23
Veja esp. G. S. Duncan, “A new setting for Paul’s epistle to the Philippians”, ExpTim 43 (1931-

1932), p. 7-11.

24
Essas críticas foram em grande parte extraídas de G. F. Hawthorne, “Philippians, letter to the”,

em: G. F. Hawthorne; R. P. Martin; D. G. Reid, orgs., Dictionary of Paul and his letters (Downers

Grove: InterVarsity, 1993), p. 710.

25
Hawthorne (“Philippians, letter to the”, p. 711) permanece como um defensor contemporâneo.

26
Silva, Philippians, p. 6.

27
Kümmel (Introduction, p. 329-30) rejeitou a hipótese romana e afirmou que “as observações

concernentes ao parentesco linguístico de Filipenses com 1 e 2Coríntios e Romanos podem ser

comparadas às observações de parentesco linguístico com Colossenses (e Efésios), que mostram que

1184
Filipenses não possui uma associação linguística unilateral com um ou com outro grupo de cartas

paulinas”. Ele também observou que Paulo poderia ter enfrentado oponentes judaizantes em uma data

posterior ou temido grupos semelhantes.

28
Beare, Philippians, p. 24; Bruce, Philippians, p. 11-6.

29
Bruce, Philippians, p. xxii-xxiv.

30
Veja a observação em J. B. Lightfoot, Epistle to the Philippians (London: Macmillan, 1913), p.

99-104. Lightfoot assumiu uma origem romana e usou essa hipótese para definir o termo neste

contexto particular.

31
R. P. Martin, Philippians, NCBC (Grand Rapids: Eerdmans, 1980), p. 51.

32
Para uma extensa análise sobre a “casa de César”, veja o excurso em Lightfoot, Philippians, p.

171-8.

33
Atos 16.14 registra que Lídia foi a primeira convertida. Ela e sua família responderam ao

evangelho e foram batizadas (At 16.15). Sua casa também funcionava como o local de reunião da

igreja. O relato de Atos também menciona a conversão do carcereiro filipense e sua família (16.30-

33). G. F. Hawthorne (Philippians, WBC 43 [Waco: Word, 1983], p. xxxv) observou que os nomes

dos filipenses (Epafrodito, Evódia, Síntique e Clemente) revelam que a igreja era em grade parte

constituída de gentios.

34
Eles também podiam comprar, possuir e transferir propriedades e também mover processos

civis (veja Hawthorne, Philippians, p. xxxiii).

35
L. M. McDonald, “Philippi”, in: C. A. Evans; S. E. Porter, orgs., Dictionary of New Testament

Background (Downers Grove: InterVarsity, 2000), p. 787-9.

36
Há uma discussão entre os estudiosos se os falsos mestres já se encontravam em Filipos ou se

Paulo estava advertindo a igreja sobre uma ameaça potencial.

1185
37
Veja esp. a excelente discussão em O’Brien (Philippians, p. 61-3), que destacou a “atividade

versátil” dos Filipenses em sua parceria no evangelho. Ele disse que essa parceria provavelmente

incluía (1) proclamação do evangelho para os de fora (1.27,28); (2) sofrimento pelo evangelho com

Paulo (1.30; 4.14,15); (3) oração intercessória (1.19); e (4) sua cooperação com Paulo no evangelho

(1.5) demonstrada pela assistência financeira deles no passado (4.15,16) e no presente (4.10).

38
D. A. Carson, Basics for Believers: An Exposition of Philippians (Grand Rapids: Baker, 1996),

p. 16.

39
G. Kennedy, New Testament Interpretation Through Rhetorical Criticism (Chapel Hill:

University of North Carolina Press, 1984), p. 77.

40
D. F. Watson, “A rhetorical analysis of Philippians and its implications for the unity question”,

NovT 30 (1988), p. 57-88, esp. p. 59.

41
Veja Fee, Philippians, p. 2-7; B. Witherington III, Friendship and Finances in Philippi (Valley

Forge: Trinity Press International, 1994); S. K. Stowers, “Friends and enemies in the politics of

heaven: reading theology in Philippians”, em: J. M. Bassler, org., Pauline Theology: Thessalonians,

Philippians, Galatians, Philemon (Minneapolis: Fortress, 1991), vol. 1, p. 105-21, esp. p. 107-14.

42
L. Alexander, “Hellenistic letter-forms and the structure of Philippians”, JSNT 37 (1989), p.

87-101.

43
Veja, por exemplo, Silva, Philippians, p. 19.

44
Wick, Philipperbrief.

45
A. B. Luter; M. V. Lee, “Philippians as chiasmus: key to the structure, unity, and theme

questions”, NTS 41 (1995), p. 89-101.

46
O ceticismo a respeito das estruturas macroquiásticas expressado por I. H. Thomson

(Chiasmus in the Pauline Letters, JSNTSup 111 [Sheffield: Sheffield Academic Press, 1995], p. 25)

1186
parece apropriado.

47
Reed, Discourse Analysis of Philippians. Hawthorne (Philippians, p. xlviii) defendeu o ponto

de vista contrário de que não há progressão lógica na carta, lembrando que as “mudanças drásticas de

tópico e até mesmo de tom não são surpresa” e listando Filipenses como a “antítese de Romanos” a

esse respeito.

48
Alguns estudiosos minimizam a importância da menção que Paulo faz de Timóteo. Atos retrata

Timóteo em um papel ministerial importante por toda a Macedônia. Silva (Philippians, p. 39)

provavelmente está correto ao afirmar que existem boas razões para acreditar que “os filipenses tinha

uma forte ligação com Timóteo”. Carson e Moo (Introduction to the New Testament, p. 507) tomaram

um caminho diferente ao dizer que a recomendação de Timóteo na carta de Paulo (2.19-24) implica

que “os filipenses não o conheciam muito bem”.

49
Martin (Philippians, p. 76) rejeitou a interpretação tradicional de que Paulo utilizou Filipenses

2.5-11 como uma lição de humildade. Mas veja o argumento convincente de N. T. Wright, The

Climax of the Covenant: Christ and the Law in Pauline Theology (Minneapolis: Fortress, 1996), p.

82-90.

50
Veja Silva, Philippians, p. 64-5; Fee, Philippians, p. 122-3; e Bockmuehl, Philippians, p. 77-8.

51
Veja m. Sab. 24.4; m. Pes. 2.3; m. Ned. 4.3; e m. Bek. 5.6.

52
S. K. Stowers, “Friends and enemies in the politics of heaven: reading theology in

Philippians”, em: J. M. Bassler, org., Pauline Theology: Thessalonians, Philippians, Galatians,

Philemon (Minneapolis: Fortress, 1991), vol. 1, p. 105-21. Ele enfatizou as nuances políticas na

linguagem de Paulo em Filipenses. O termo salvador era também comumente aplicado aos

governantes políticos, e os imperadores romanos eram esp. associados ao termo “salvador”.

53
Veja esp. R. P. Martin, A hymn of Christ: Philippians 2.5-11 in Recent Interpretation and in the

Setting of Early Christian Worship (Downers Grove: InterVarsity, 1983).

1187
54
Para uma boa visão geral da gramática da construção infinitiva articular em 2.6, veja D. Burk,

Articular Infinitives in the Greek of the New Testament: On the Exegetical Benefit of Grammatical

Precision, New Testament Monographs 14 (Sheffield: Phoenix, 2006), p. 139-40.

55
Geza Vermes, The Religion of Jesus the Jew (Minneapolis: Augsburg Fortress, 1993), p. 34-5;

“ὄοµα”, TDNT 4:268-9; Gordon D. Fee, Pauline Christology: An Exegetical-Theological Study

(Peabody: Hendrickson, 2007), p. 396-8.

56
Para uma completa discussão acadêmica da adoração de Jesus como Deus na igreja primitiva,

veja L. W. Hurtado, Lord Jesus Christ: Devotion to Jesus in Earliest Christianity (Grand Rapids:

Eerdmans, 2003).

57
I. H. Marshall (“Philippians”, in: T. D. Alexander; B. S. Rosner, orgs., New Dictionary of

Biblical Theology [Downers Grove: InterVarsity, 2000], p. 319-22) devotou todo seu artigo sobre a

teologia de Filipenses à cristologia.

58
Thielman, Theology of the New Testament, p. 321.

59
P. Oakes, Philippians: From People to Letter, SNTSMS 110 (Cambridge: University Press,

2001), p. 59-96. Oakes disse que os filipenses sofreram econômica e fisicamente por sua recusa em

participar de rituais religiosos pagãos.

60
Thielman, Theology of the New Testament, p. 312.

61
Um bom panorama do papel desta passagem no debate mais amplo da justificação pode ser

encontrado em B. Vickers, Jesus’ Blood and Righteousness: Paul’s Theology of Imputation

(Wheaton: Crossway, 2006), p. 205-11.

62
A expressão “a justiça da lei” em 3.9 (tradução do autor) é também encontrada em Romanos

10.5. Os paralelos entre as duas passagens são marcantes. Veja J. A. Fitzmyer, Romans: A New

Translation with Introduction and Commentary, AB 33 (Garden City, NY: Doubleday, 1993), p. 582;

1188
e P. Stuhlmacher, Paul’s Letter to the Romans: A Commentary (Louisville: Westminster John Knox,

1994), p. 154-55.

63
Sobre o debate em torno da tradução de pistis Christou, veja o capítulo sobre Romanos acima.

Silva (Philippians, p. 161) provavelmente está correto em seu argumento de que as formas

gramaticais ambíguas deveriam ser lidas à luz de formas não ambíguas, e embora Paulo nunca falasse

sem ambiguidade sobre “a fidelidade de Cristo” (genitivo subjetivo) ele o fez em outras passagens

sobre a “fé em Cristo” (genitivo objetivo; p. ex., Gl 2.16). Cf. id., “Faith versus works of Law in

Galatians”, in: D. A. Carson; P. T. O’Brien; M. A. Seifrid, orgs., Justification and Variegated Nomism

(Tübingen: Mohr-Siebeck, 2004), vol. 2, p. 217-48. Sobre a interpretação genitiva subjetiva, veja R.

B. Hays, “Salvation history: the theological structure of Paul’s thought (1Thessalonians, Philippians,

and Galatians)”, in: J. M. Bassler, org., Pauline Theology: Thessalonians, Philippians, Galatians,

Philemon (Minneapolis: Fortress, 1991), vol. 1, p. 232-3.

64
F. Thielman (Philippians, NIVAC [Grand Rapids: Zondervan, 1995], p. 171) chamou esse

texto de um “ninho de vespas” no debate atual. Sobre o debate lei/evangelho em Paulo, o melhor

panorama é o de S. Westerholm, Perspectives Old and New on Paul: The “Lutheran” Paul and his

Critics (Grand Rapids: Eerdmans, 2004). A respeito da nova perspectiva sobre Paulo, veja a

discussão sobre Romanos.

1189
Efésios

FATOS-CHAVE DE EFÉSIOS
Autor: Paulo
Data: Por volta de 60
Origem: Prisão romana
Destino: Carta circular ou Éfeso
Motivo: Não identificável com clareza
Propósito: Declarar e promover a reconciliação
cósmica e unidade em Cristo
Tema: A recapitulação de todas as coisas em Cristo
Versículos-Chave: 1.3-14, especialmente 1.9,10

INTRODUÇÃO

Efésios é um sumário magistral do ensino de Paulo e era a carta favorita


de Calvino.65 R. Brown alegou que apenas Romanos exerceu mais
influência no pensamento cristão ao longo da história da igreja.66 A carta
continua a encorajar os cristãos de hoje com a escala cósmica da obra
reconciliadora de Cristo, e a desafiar os fiéis a manterem a unidade da
igreja que Cristo comprou e que o Espírito produziu.
Efésios faz numerosas e significativas contribuições para o cânon.
Primeiro, em Efésios, Paulo apresentou de forma mais clara e articulada o
tema da submissão de todas as coisas ao senhorio de Cristo. Paulo
desenvolveu essa reorganização cósmica da adequada submissão à

1190
autoridade de Deus nos termos da obra reconciliadora de Cristo em duas
esferas: os céus e a terra. O foco de Paulo na soteriologia de base trinitária,
na eclesiologia centrada no evangelho, na ética capacitada pelo Espírito e
na batalha espiritual, tudo isso é englobado por esse tema abrangente.
Em segundo lugar, talvez apenas Colossenses possa ser comparada a
Efésios na ênfase sobre os aspectos surpreendentes da vitória de Cristo que
os fiéis já desfrutam nele. Cristo é exaltado acima de todos os outros
poderes ao ponto que todos eles vão servir de escabelo de seus pés. Uma
igreja unificada e composta por judeus e gentios partilha dessa vitória
enquanto a igreja se senta e reina com Cristo.
Em terceiro lugar, Efésios contém talvez a mais desenvolvida discussão
da, e visão para a, igreja. Essa mesma igreja que já compartilha da vitória
de Cristo serve como um arauto ou prenúncio do grande plano de Deus de
“trazer de volta todas as coisas juntas sob uma cabeça”, o Senhor Jesus
Cristo (1.10, tradução do autor). Portanto, a igreja unificada testifica ao
universo unificado na nova criação de Deus, quando ele colocará todas as
forças hostis sob os pés de seu Filho.67 Essa mesma igreja possui uma
identidade moral sem consideração de etnicidade, que proclama o caráter de
Deus. A igreja composta dos filhos adotivos de Deus tem uma familiar
semelhança com seu Criador e Redentor.
Em quarto lugar, Efésios também contém a discussão mais desenvolvida
da batalha espiritual no NT (6.10-18; veja 2Co 10.3-6). A igreja
desempenha um papel crucial nesses tempos quando todas as coisas estão
sendo submetidas à autoridade de Cristo. Os dois reinos entram em guerra
quando os poderes celestiais declaram guerra às forças redimidas da
humanidade na terra. Os fiéis avançam mantendo-se unidos na armadura de
Deus. Essa unidade anuncia a multiforme sabedoria de Deus aos

1191
governantes e autoridades nas regiões celestiais. Uma posição firme contra
seu ataque ímpio mostra que a obra de Deus em Cristo esmagou sua débil
tentativa de frustrar o plano de Deus para sua criação.

HISTÓRIA
Autor
Autenticidade
Virou moda falar de três camadas dentro do corpus “paulino”: (1) cartas
incontestáveis (Romanos, 1 e 2Coríntios, Gálatas, Filipenses,
1Tessalonicenses, Filemom), (2) cartas deuteropaulinas (Efésios,
Colossenses, 2Tessalonicenses) e (3) cartas pseudônimas (1 e 2Timóteo,
Tito). Muitos estudiosos modernos rejeitam a visão tradicional de que
Efésios é uma autentica carta paulina.
Essa negação teve início no século dezenove, quando F. C. Baur
argumentou que Efésios empregava termos e ideias gnósticas. A data tardia
do gnosticismo efetivamente impedia a autoria paulina. R. Bultmann e seus
discípulos acompanharam Baur, o que levou a uma perda crescente de
confiança de que Paulo realmente escreveu Efésios. Embora muitos
estudiosos tenham, de forma correta, abandonado a ideia de um pano de
fundo gnóstico para Efésios, questões literárias e teológicas continuam a
colocar em dúvida a autoria paulina hoje em dia. Estudiosos que descartam
a autoria paulina de Efésios apontam para cinco linhas de evidência: (1)
teologia, (2) vocabulário, (3) o estilo literário, (4) a relação com
Colossenses e (5) a natureza impessoal de Efésios.

1192
Em termos de teologia, três temas dominam o debate: cristologia
cósmica, eclesiologia desenvolvida e escatologia realizada. A cristologia
cósmica de Efésios levanta bandeiras vermelhas para alguns exegetas, pois
eles argumentam que Efésios enfatiza o status de Cristo como Senhor do
cosmos e, assim, se concentra mais na sua exaltação do que na sua morte.
Os defensores da autenticidade respondem salientando que (1) existem
quatro referências à morte de Cristo (1.7; 2.16, 5.2,25) em Efésios; (2)
outros textos paulinos enfatizam a exaltação (1Co 15.3-28; Fp 2.5-11); e (3)
a exaltação e a cruz caminham juntas no pensamento paulino.68
A eclesiologia de Efésios tem dado o que pensar a muitos estudiosos,
uma vez que ela se desvia do uso habitual paulino do termo para “igreja”
(ekklēsia). O apóstolo normalmente utilizava o termo para se referir à igreja
local, mas cada uso do termo em Efésios tem a igreja universal como
referente (1.22; 3.10,21; 5.23-25,27,29,32). Efésios também alega que
Cristo é o cabeça da igreja, que é seu corpo (1.23; 4.15,16; cf. Cl 1.18).
Além disso, embora Cristo seja o fundamento da igreja na carta indiscutível
de 1Coríntios (3.11), Efésios afirma que a igreja é edificada sobre o
fundamento dos apóstolos e profetas (2.20). R. Schnackenburg leu a carta
como ocupando um estágio posterior da tradição que olhava para o passado,
para o estabelecimento da igreja por Paulo e para a tradição apóstolica.69 E.
Käsemann interpretou a eclesiologia de Efésios como um exemplo de
catolicismo primitivo.70
Os defensores da autenticidade argumentam que outros textos paulinos
também se referem à igreja universal como a igreja de Deus (1Co 10.32;
15.9, Gl 1.13; Fp 3.6). Portanto, Paulo se dirigiu não apenas à “igreja de
Deus em Corinto”, mas também a “todos que em todo lugar invocam o
nome de nosso Senhor Jesus Cristo, Senhor deles e nosso” (1Co 1.2). Além

1193
disso, a descrição de Cristo como a cabeça do corpo também aparece em
Colossenses 1.18 e é uma extensão natural da metáfora paulina anterior da
igreja como o corpo de Cristo nas cartas consideradas incontestáveis.
Assim, ela representa uma evolução de seu pensamento, não um desvio
dele. Da mesma forma, embora Efésios apresente os apóstolos e profetas
como o fundamento da igreja, essa alegação não contradiz a afirmação
anterior de que o fundamento é Cristo, porque os apóstolos e profetas
estabeleceram esse fundamento com seu testemunho da vida, morte e
ressurreição de Cristo, de modo que Jesus continua sendo a “pedra angular”
(Ef 2.20-22). Efésios não parece pertencer a uma época tardia na tradição
eclesiástica, que rememora a época dos apóstolos e profetas que já saíram
de cena. Efésios mostra que o Cristo ressuscitado continuou a conceder
dons de apóstolos e de profetas à igreja na época em que a carta foi escrita
(4.11,12).
Em termos de escatologia, alguns estudiosos sustentam que a
escatologia “realizada” de Efésios rompe totalmente com a abordagem
escatológica típica de Paulo.71 Efésios retrata o fiel como já assentado com
Cristo (2.6) e enfatiza o relacionamento de pessoa com Cristo nos lugares
celestiais (1.3, 20,21). Aqueles que acreditam que Paulo escreveu Efésios
tentam mostrar que a carta apresenta sim uma dimensão futura da salvação.
A carta inclui referências a uma redenção futura (1.13,14; 4.30), a “eras
vindouras” (1.21; 2.7) e à futura apresentação da igreja a Cristo (5.27).
Efésios também fala claramente de escatologia em termos da união de toda
a criação sob a liderança de Cristo na futura “plenitude dos tempos” (1.10,
A21).72 Como disse Hoehner, Efésios não apresenta “uma escatologia
realizada sem nenhuma realização futura, mas uma realização presente do
que somos em Cristo com uma consumação futura. Assim, essa não é uma

1194
situação ou/ou, mas tanto/quanto.73 A. T. Lincoln, que argumentou contra a
autenticidade, defendeu longamente que se veja em Efésios uma escatologia
futurista.74
Portanto, os opositores da autenticidade alegam que esses três temas
teológicos não representam desenvolvimentos das cartas paulinas
incontestáveis, mas desvios delas.75 Proponentes da autoria de Paulo
respondem apontando incontestáveis textos em suas cartas que fazem um
paralelo com o pensamento de Efésios. Essas semelhanças são estreitas o
bastante para representar uma relação orgânica entre a teologia de Efésios e
a das cartas paulinas incontestáveis.76 É preciso lembrar também que fatores
pastorais também podem desempenhar um papel nessas ênfases teológicas.
C. E. Arnold defendeu fortemente que a ênfase na cristologia cósmica e na
escatologia realizada visava fortalecer os fiéis no conflito cósmico contra os
“principados e potestades”.77
Em termos de vocabulário, aqueles que rejeitam a autoria de Paulo
afirmam que Efésios usa uma linguagem única, não encontrada em outras
passagens paulinas, e sustentam que a carta tem hapax legomena (palavras
que ocorrem apenas uma vez no corpus paulino) demais para ser
considerada paulina.78 Os proponentes da autoria de Paulo geralmente
discordam destacando que as incontestáveis cartas do apóstolo também
contêm um número elevado de hapax legomena, de modo que Efésios não é
a única no corpus paulino a esse respeito.79 Hoehner destacou a comparação
entre Efésios (41 palavras não encontradas no restante do NT, e 84 palavras
não encontradas em outro lugar em Paulo) e Gálatas (35 palavras não
encontradas no restante do NT e 90 palavras não encontradas em outro
lugar em Paulo). Ninguém duvida da autenticidade de Gálatas, embora esta
contenha seis palavras a mais do que Efésios que não são encontradas em

1195
outras passagens em Paulo e Gálatas seja 10% menor do que Efésios.80 Em
outras palavras, na avaliação da autoria não se deve depender unicamente
da análise estatística do vocabulário.
Em termos de estilo literário, os oponentes da autenticidade citam a
elevada percentagem de elementos pleonásticos (i.e., preposições,
particípios etc.), o uso composto do genitivo, frases mais longas que o
normal, e estilo refinado.81 Os defensores da autoria paulina contra-
argumentam com a alegação de que muitas dessas características não são
incomuns para Paulo, especialmente à luz das doxologias e orações nos
capítulos 1 a 3.82 Eles também acrescentam que muitas palavras importantes
do vocabulário e exemplos literários em Efésios se assemelham ao material
encontrado somente em Paulo.83
Em termos da relação com Colossenses, muitos oponentes da
autenticidade alegam a dependência efésia de Colossenses,84 embora outros
argumentem a favor de uma dependência colossense85 ou nenhuma
interdependência.86 Alguns estudiosos dizem que Efésios representa a
“atualização da tradição oficial” à medida que o autor pôs em dia o
evangelho de Paulo.87 Defensores da autenticidade alegam que a
proximidade conceitual entre as duas cartas não coloca em dúvida a autoria
comum.88
Em termos da natureza impessoal de Efésios, alguns estudiosos
observam que a carta carece de saudações pessoais e termina com uma
despedida impessoal. Além disso, o autor aparentemente conhecia os
leitores somente a nível geral. Essas observações parecem não fazer sentido
à luz do fato de que Paulo passou três anos em Éfeso (At 20.31). Muitos
defensores da autenticidade são rápidos em apontar que a carta é uma carta
circular por causa da probabilidade, com base na crítica textual, de que as

1196
palavras “em Éfeso” (1.1) não façam parte do texto original.89 A natureza
impessoal da carta se adequaria à teoria de que se trata de uma carta geral
escrita aos fiéis na Ásia Menor. Mas os defensores da autenticidade que
duvidam da hipótese da carta circular destacam que Paulo também não faz
saudações pessoais em 2Coríntios, Gálatas, 1 e 2Tessalonicenses e
Filipenses.90
Diante de tantos desafios à autenticidade, alguns estudiosos estão
dispostos a admitir que Efésios contém material paulino genuíno porque o
autor era um discípulo de Paulo.91 Outros veem graves consequências
sociais decorrentes da distorção deuteropaulina da mensagem de Paulo nas
cartas genuínas.92
Fica-se imaginando como responder. O leitor pode dizer que a natureza
ponto-contraponto do argumento torna a decisão difícil. No entanto, quando
todos os argumentos são pesados, a autoria paulina de Efésios repousa sobre
um firme fundamento. Os argumentos que os defensores da autenticidade
apresentam parecem mais formidáveis. Apesar das complicadas
divergências entre os estudiosos sobre como avaliar a análise estatística,93
Hoehner mostrou de forma convincente que o uso de um vocabulário
exclusivo em Efésios não é incomum para Paulo, especialmente em
comparação com Gálatas. Apesar de as diferenças estilísticas e teológicas
serem reais, não há nenhum conflito claro entre Efésios e os outros escritos
de Paulo. As características estilísticas da carta não são incomuns para
Paulo, especialmente o estilo elevado nas doxologias e orações. As ênfases
teológicas podem ser delineadas em outros escritos paulinos, e a ênfase de
Paulo nos principados e potestades explica a cristologia cósmica,
escatologia realizada, e o foco na igreja.

1197
Por outro lado, a contrarresposta que os proponentes da autenticidade
apresentaram contra os opositores da autenticidade não é o mais forte
argumento para sua autenticidade. A autoria paulina de Efésios repousa
mais seguramente em duas alegações anteriores e influentes para a
autenticidade: (1) a reivindicação da carta, e (2) o testemunho da igreja
primitiva.94 O argumento contra a autenticidade é ainda mais incomodado
por questões em torno da prática e validade da pseudonímia.95
Portanto, o simples número de estudiosos modernos que descartam a
autoria de Paulo não tem necessariamente de ditar uma decisão em favor da
inautenticidade.96 O estudante deveria interagir com os argumentos da
crítica acadêmica em vez de aceitar sem questionamento suas conclusões.
Quando se pesa a evidência e não apenas se conta as opiniões, a totalidade
dos dados favorece a autoria paulina.

Integridade literária
Em termos de integridade literária, não há teorias de partição relevantes
para Efésios. Em termos de integridade textual, a tradição textual está bem
preservada exceto pela debatida expressão “em Éfeso” (1.1). Portanto, fora
a questão do destino, as variantes textuais não dão nenhum motivo para que
se duvide da integridade literária da carta.97

Data
A data de Efésios depende de questões complexas relativas à autoria e
origem. Se a carta foi escrita durante a prisão de Paulo em Roma, então ela
data de 58-60 (60-62 no cômputo convencional).98 Uma vez que Efésios,
Colossenses e Filemom parecem ter sido escritas aproximadamente ao

1198
mesmo tempo, e uma vez que Filemom pertence à fase final da prisão de
Paulo, uma data por volta do ano 60 é razoável. Se colocarmos Efésios no
início do ministério de Paulo, então ela data do início ou meados da década
de 50. A maioria dos estudiosos que veem a carta como deuteropaulina ou
pós-paulina datam-na de algum momento entre 70 e 90.99

Origem
A proveniência de Efésios está intrinsecamente relacionada a questões
como a autoria, a identidade dos destinatários e a data. Muitos sustentam
que Efésios foi escrita no mesmo lugar que Colossenses, Filemom e,
possivelmente, Filipenses.100

Destino
O fato de alguns manuscritos importantes não incluírem “em Éfeso” (1.1)
cria problemas para a identificação do destino.101 Proeminentes críticos
textuais como B. Metzger duvidam da integridade da expressão “em
Éfeso”.102 Por isso alguns estudiosos teorizam que Efésios era uma carta
circular.103 Como mencionado, essa hipótese coincide com alguns dos
elementos internos da carta. O tom impessoal por toda a carta é
surpreendente, tendo em conta a considerável quantidade de tempo que
Paulo passou em Éfeso (At 19.8,10; 20.31). Além disso, alguns textos
parecem sugerir que o autor nem mesmo conhecia seus leitores (Ef 3.2;
4.21).
No entanto, deve-se observar também que a hipótese da carta circular
apresenta problemas, pois até os manuscritos que não contêm a expressão
“em Éfeso” possuem “Éfeso” no título.104 Além do mais, mesmo aqueles

1199
que aderem à hipótese da carta circular admitem que a omissão de “em
Éfeso” cria uma estranha construção gramatical: “aos santos que estão e
fiéis em Cristo Jesus”.105 Esse debate parece um tanto inconsequente,
porque alguns estudiosos que pensam que “em Éfeso” faz parte do texto
original ainda acreditam que a carta também circulou nas igrejas da Ásia
Menor.106

Motivo
As cartas de Paulo não são expressões de teologia teórica. Eles são cartas
pastorais ocasionais que abordam circunstâncias congregacionais
específicas. Mas Efésios parece quebrar esse padrão, e por isso é difícil
detectar uma ocasião clara para a carta.107 A maioria dos estudiosos
concorda que a carta tinha os leitores gentios como público principal, mas o
consenso rapidamente começa a perder força depois daquela observação.
Em contraste com o tom e conteúdo de Colossenses, Efésios não parece ser
uma resposta a falso ensino. Esses eruditos questionaram a busca de uma
ocasião na medida em que se perguntam se Efésios é mesmo uma carta.
Esses estudiosos preferem descrevê-la como uma homilia ou um discurso.108
Se for assumida a natureza circular da carta, Efésios é um resumo e
exposição cuidadosos do pensamento de Paulo. Se a carta foi endereçada
aos Efésios, então as questões relativas à sua ocasião tornam-se em grande
parte conjecturas selecionadas do conteúdo da Carta aos Efésios. Pontos de
vista relacionados à ocasião também variam de acordo com o fato de os
estudiosos aderirem ou não à autenticidade. Entre aqueles que defendem a
inautenticidade, N. A. Dahl detecta um contexto batismal para a carta como
um escrito pseudônimo destinado a novos crentes que enfatiza as

1200
implicações de seu batismo.109 A. T. Lincoln acreditava que muitas das
questões em Efésios decorriam de um contexto em que Paulo tinha acabado
de sair de cena e, portanto, faltava aos leitores um senso de unidade, devido
à perda de Paulo como sua fonte unificadora de autoridade.110 R.
Schnackenburg argumentou que Efésios confronta um grupo de igrejas da
Ásia Menor por volta do ano 90 com a necessidade de unidade e um estilo
de vida cristão diferente do de seus vizinhos pagãos.111 C. L. Mitton
identificou uma ameaça gnóstica como ocasião.112
Entre aqueles que defendem a autenticidade paulina, a maioria enfatiza
que não há uma crise específica em vista. Paulo teve tempo de escrever uma
exposição positiva de sua teologia, enquanto estava em prisão domiciliar
em Roma.113 Outros identificam necessidades específicas que os cristãos na
Ásia Menor teriam tido. F. Thielman argumentou que os cristãos,
provavelmente passando por sofrimentos, na Ásia Menor teriam precisado
de um lembrete encorajador de tudo o que Deus havia feito por eles em
Cristo e um desafio de viverem de forma coerente com os propósitos de
Deus para a Igreja ao recapitular todas as coisas em Cristo.114 C. E. Arnold
declarou que os cristãos na Ásia Menor teriam requerido uma
fundamentação positiva no evangelho de Paulo, pois eram convertidos de
um passado pagão saturado de magia, astrologia e religiões de mistério. Seu
passado pagão também necessitava de orientação moral para viverem uma
vida coerente com o senhorio de Cristo. Arnold também observou que o
grande número de convertidos na igreja exigiu que Paulo abordasse as
tensões entre judeus e gentios que normalmente surgiam. Ele então
argumentou que Paulo escreveu uma genuína carta pastoral para “uma
multiplicidade de necessidades partilhadas pelos leitores”.115

1201
Propósito
Apesar das propostas variadas para o contexto vital da carta, a maioria dos
estudiosos concorda sobre os principais temas em Efésios. Eles veem
Efésios enfatizando a reconciliação cósmica em Cristo e enfatizando a
necessidade de (1) unidade na igreja, (2) uma ética cristã distintiva e (3)
vigilância na batalha espiritual.116 Como mencionado acima, vários exegetas
tomam essas ênfases e, em seguida, tentam desenvolver pontos de contato
com as possíveis necessidades concretas.
A tentativa de determinar um propósito específico pode gerar uma
variedade de propostas, mas a maioria reconheceria, como Carson e Moo
salientaram, que Efésios é “uma importante declaração do evangelho que
pode ter sido muito necessária em mais de uma situação no primeiro
século”.117 A natureza geral de Efésios a torna particularmente adequada
para aplicação pelos fiéis de hoje.

LITERATURA
Plano Literário
Obras recentes estabeleceram uma série de propostas relativas ao plano
literário de Efésios. Quanto à análise retórica, N. A. Dahl propôs que
Efésios é uma variante da retórica epidítica ou demonstrativa.118 A. T.
Lincoln119 e A. C. Mayer120 chegaram à mesma conclusão, embora admitam
que a carta não se enquadra nos antigos manuais convencionais de retórica
greco-romanos com precisão e resista a uma classificação genérica. P. S.
Cameron descobriu uma estrutura quiástica para Efésios, embora ele
preferisse o termo palínstrofe a quiasmo.121 Mayer defendeu duas seções

1202
quiásticas (1.3 a 3.21; 4.1 a 6.9). J. P. Heil propôs mais um quiasmo para a
carta.122 Essa proliferação de propostas é problemática para a análise
retórica e quiástica. Embora esses estudos sejam perspicazes e instigantes,
muitos corretamente ainda não foram convencidos pelas análises
macroquiástica123 e retórica124 devido ao perigo sempre presente de forçar as
cartas de Paulo a se encaixarem em modelos preconcebidos.

ESTRUTURA
I. Abertura (1.1,2)

II. Corpo: sentado com Cristo, andando com Cristo, permanecendo firme
com Cristo (1.3 a 6.20)
A. Bênçãos espirituais compartilhadas em união com Cristo e unidade
em Cristo (1.3 a 3.21)
1. Bênçãos espirituais em Cristo (1.3-14)
2. Ação de graças e oração (1.15-23)
3. Vida passada e presente dos fiéis (2.1-10)
4. Judeus e gentios são um em Cristo (2.11-22)
5. O ministério de Paulo e o “mistério” (3.1-13)
6. Oração por unidade em Cristo (3.14-21)
B. Caminhar com Cristo e permanecer firme em Cristo (4.1 a 6.20)
1. A unidade sétupla da Igreja (4.1-16)
2. Viver como filhos da luz (4.17 a 5.17)
3. Vida cheia do Espírito em casa e no trabalho (5.18 a 6.9)
4. Vestindo a armadura de Deus (6.10-20)

III. Encerramento (6.21-24)

1203
DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE
I. Abertura (1.1,2)
Efésios começa com os três elementos habituais que introduzem uma
epístola: (1) autor, (2) destinatário, e (3) e saudação.

II. Corpo: Sentado com Cristo, Andando com


Cristo, Permanecendo Firme com Cristo (1.3 a
6.20)
O corpo da carta, naturalmente, divide-se em uma seção indicativa,
transmitindo verdades teológicas gerais relacionadas aos destinatários da
carta (1.15 a 3.21) e uma seção imperativa (4.1 a 6.20), emitindo uma série
de ordens e exortações com base nessas realidades. Os termos-chave
parecem ser “sentar”, “andar” e “permanecer firme”.125 A primeira metade
da carta estabelece a base adequada ao definir a identidade dos fiéis em
Cristo. Com base no seu status espiritual, na segunda metade eles são
exortados a alcançar a unidade e maturidade no Espírito que já é deles em
Cristo. Dessa forma, como o versículo-chave de toda a carta afirma (1.10),
Cristo, a peça central dos propósitos histórico-salvíficos de Deus, será
restaurado ao seu legítimo lugar de supremacia e superioridade em todas as
coisas na igreja e no cosmos.

A. Bênçãos espirituais compartilhadas em união


com Cristo e unidade em Cristo (1.3 a 3.21)

1204
Nesta seção, Paulo (1) desembalou as bênçãos espirituais que os fiéis têm
nas esferas celestiais em Cristo (1.3-14); (2) orou por seus leitores (1.15-
23); (3) descreveu a conversão como uma mudança da morte espiritual para
a vida espiritual (2.1-10); (4), retratou a unidade da igreja centrada no
evangelho (2.11-22); (5) destacou seu próprio papel nesta unidade como o
ministro aos gentios encarregado com o ministério do evangelho (3.1-13); e
(6) terminou com uma oração de encerramento e doxologia (3.14-21).
O longo louvor da carta (1.3-14) é apenas uma frase no texto grego, e
nele Paulo explicou as bênçãos espirituais que os fiéis possuem em Cristo
(1.3). Essas bênçãos estão centradas na obra da Trindade na salvação dos
fiéis e induz o louvor da glória de Deus. Deus Pai planeja a salvação (1.4,5)
para sua glória (1.6). Deus Filho adquire a salvação (1.7-12) para o louvor
da glória de Deus (1.12). Deus Espírito sela a salvação (1.13) e serve como
garantia da herança do fiel para o louvor da glória de Deus (1.14).
Depois do louvor, Paulo fez uma oração de abertura para seus leitores
(1.15-23) e concluiu a seção com uma oração de encerramento (3.14-21). A
oração de abertura clama que Deus dê aos fiéis um espírito de sabedoria e
de revelação e que abra os olhos de seus corações para que possam ser
capazes de compreender plenamente sua esperança na riqueza gloriosa da
sua herança e seu poder imensuravelmente grande em operação nos fiéis.
Paulo comparou esse poder com o poder que ressuscitou Cristo dentre os
mortos e o assentou à direita de Deu, acima de todos os principados e
autoridades (1.20-23).
As próximas três seções retratam a unidade que Deus criou por meio do
evangelho de três ângulos diferentes: (1) o ângulo celeste onde Deus dá
vida aos espiritualmente mortos e os ressuscita para que se sentem juntos
com Cristo nos lugares celestiais (2.1-10); (2) o ângulo centrado na cruz,

1205
que retrata a cruz de Cristo demolindo velhas barreiras a fim de criar a
igreja como o novo homem único e o novo edifício único (2.11-22); e (3) o
ângulo do ministério apostólico de Paulo, que destaca o papel de Paulo em
trazer à luz o mistério da igualdade espiritual entre gentios e judeus no
corpo de Cristo (3.1-13). A oração de encerramento e a doxologia de Paulo
novamente enfatizam a unidade quando ele orou para que os fiéis fossem
capazes de compreender o amor de Cristo “com todos os santos” (3.18) e
quando exultou no Deus que é glorificado “na igreja” (3.21).
Efésios 2.1-10 e 2.11-22 usam o esquema “antes-agora”,126 que repete a
condição dos leitores antes e depois de sua conversão a Cristo. Efésios 2.1-
10 fala da separação espiritual entre Deus e os homens em termos
soteriológicos, enquanto 2.11-22 retrata essa separação no contexto da
história da salvação.
Efésios 2.1-10 passa da esfera da morte espiritual e do estado dos
incrédulos como “filhos da ira” para o reino da vida espiritual e do estado
da salvação. Essa experiência suprema de passar da pobreza à riqueza
baseia-se na maravilhosa graça de Deus sem quaisquer obras humanas
(2.4,5). Paulo ligou sua descrição anterior da experiência de Cristo (1.20-
23) com a experiência do fiel em Cristo (2.6). A união dos fiéis com Cristo
significa que do mesmo modo que ele foi ressuscitado e assentado à direita
de Deus (1.20), assim os fiéis são vivificados com Cristo, ressuscitados com
ele, e assentados com ele nos lugares celestiais (2.6). A alegria dessa
presente experiência pode ser ultrapassada apenas pela experiência nos
séculos vindouros, quando Deus irá “mostrar a suprema riqueza da sua
graça em bondade” para os fiéis em Cristo (2.7, NASB). Paulo também
enfatizou a natureza imerecida da salvação como dádiva da graça de Deus
recebida pela fé (2.8). Essa salvação impede o orgulho humano, porque é

1206
baseada na obra de Deus e não nas obras do homem (2.8,9). Embora a
salvação não seja resultado de boas obras, boas obras fluem da salvação
(2.10).
Em 2.11,12, Paulo descreveu a situação difícil do passado de seus
leitores. Paulo os convidou a se lembrar de sua condição anterior como
gentios.127 Especificamente, Paulo afirmou que antes eles estavam
separados (1) de Cristo, (2) da cidadania de Israel, (3) das alianças da
promessa, (4) da esperança, e (5) de Deus. Mas Cristo estabeleceu a paz e a
unidade entre judeus e gentios ao abolir a parede de separação por meio da
cruz (2.14, 15) e criando em si mesmo um novo homem, a igreja (2.15), um
edifício ou santuário para habitação de Deus no Espírito (2.21,22).
Paulo destacou seu ministério apostólico para os gentios e como o
“mistério” do evangelho (3.1-13). O “mistério” de Deus, anteriormente
oculto e agora revelado aos apóstolos e profetas, é a igualdade espiritual de
gentios e judeus no corpo de Cristo por meio do evangelho (3.5,6). Deus
capacitou Paulo para realizar seu plano (3.8,9), de modo que, por
intermédio da igreja, a sabedoria de Deus será revelada “aos governantes e
autoridades nos céus” (3.10; veja 1.21).
A oração de encerramento (3.14-21) pede a Deus para capacitar os fiéis
para que eles sejam capazes de “compreender, juntamente com todos os
santos, qual é o comprimento e largura, a altura e a profundidade e conhecer
o amor do Messias, que excede todo o entendimento, para que sejais
preenchidos com toda a plenitude de Deus” (3.18,19). Paulo encerrou com
uma doxologia a Deus como aquele que opera com poder para além de tudo
o que poderíamos pedir ou pensar (3.20,21).

1207
B. Caminhar com Cristo e permanecer em Cristo
(4.1 a 6.20)
A seção indicativa (caps. 1 a 3) fornece a base (“portanto”, 4.1) para a seção
imperativa. As duas palavras-chave nesta seção parecem ser “andar” (4.1,17
[duas vezes]; 5.2,8,15) e “permanecer” (6.11,13,14). A estrutura proposta
por Hoehner da seção “andar” é pedagogicamente útil. Paulo conclamou a
igreja a andar em (1) unidade (4.1-16), (2) santidade (4.17-32), (3) amor
(5.1-6), (4) luz (5.7-14) e (5) sabedoria (5.15 a 6.9).128 Efésios 6.10-20
constitui um convite aos crentes para permanecer na batalha espiritual
contra as escuras forças da impiedade acessando o poder de Deus na
armadura de Deus (6.10-17) e na oração (6.18-20).
Efésios 4.1-16 salienta a diversidade na unidade (4.1-13) na igreja para
a maturidade (4.13), estabilidade (4.14), e crescimento (4.15,16) do corpo
de Cristo. Efésios 4.1-6 especificamente descreve o que os cristãos são
chamados a fazer (andar de maneira digna da sua vocação como Cristãos);
como eles devem fazê-lo (com humildade, mansidão, paciência, suportando
um ao outro, mantendo a unidade do Espírito); e por que (por causa da
sétupla “unidade” da fé). Efésios 4.7-13 acrescenta a observação de que a
“unidade” não implica “uniformidade”. Os fiéis não são chamados a serem
cristãos “de linha de montagem”, porque Cristo graciosamente concede
uma variedade de dons como o espólio de sua vitória (4.7-10) para o bem
da igreja (4.11,12), de modo que o corpo será edificado e alcançará a
unidade, maturidade e plenitude na fé (4.12,13).129
Essa unidade e maturidade guardarão o corpo, não só do ensino falso
(4.14), mas também da vida falsa (4.17-19). Os cristãos não devem andar
nas trevas como os gentios (4.17-19; 5.6,7), mas devem “andar como filhos
da luz” (5.8-10) e permanecer separados das obras infrutíferas das trevas e

1208
expô-las, trazendo-as para a luz (5.11-14). Eles andam na luz (5.6-14) e na
sabedoria (5.15-17).
Paulo ordenou aos cristãos que se enchessem continuamente do
Espírito,130 ordem contrastada com a embriaguez (5.18). Uma série de
particípios dependentes131 segue a ordem de se encher do Espírito a fim de
que o leitor veja que “ser cheio” do Espírito tem efeitos tais como louvor de
todo o coração (v. 19), ação de graças (v. 20), e submissão (v. 21). Paulo
desenvolveu as especificações dessa submissão em forma de um código
doméstico, que delineia os vários papéis e responsabilidades dos membros
da família (5.22 a 6.9).132
Como resultado do “ser cheio do Espírito”, esposas são intimadas a ser
submissas a seus maridos (5.22), crianças a obedecerem a seus pais (6.1), e
escravos a obedecerem a seus donos (6.5). Paulo também destacou o que o
comportamento cheio do Espírito implica para aqueles em posições de
autoridade: os maridos são chamados a amar suas esposas como Cristo ama
sua noiva, a igreja (5.28); pais não devem provocar a ira dos filhos, mas
criá-los na formação e instrução do Senhor (6.4); e os mestres devem tratar
aqueles sob sua autoridade de forma justa e não ameaçá-los (6.9).
O último chamado alto é claro é para os fiéis permanecerem firmes em
Cristo (6.10-20). O texto é composto de três partes: (1) os versículos 10-13
fornecem uma advertência introdutória para os fiéis se fortalecerem no
Senhor e a se revestirem de toda a armadura de Deus devido às forças hostis
reunidas contra eles; (2) os versículos 14-17 se baseiam em (“portanto”) e
reforçam a admoestação introdutória e especificam mais as peças que
constituem a “armadura completa”; e (3) os versículos 18-20 clamam aos
fiéis para que acessem o poder de Deus em oração por todos os santos
(6.18), incluindo Paulo (6.19,20). A palavra para “permanecer firme”

1209
ocorre três vezes (6.11, 13,14) como um chamado a se fortalecer no poder
de Deus (i. e., a completa armadura de Deus) contra o diabo e os poderes
espirituais da impiedade.
Efésios 6.10-20 serve como um clímax para a carta.133 Portanto, o leitor
encontra muitos temas já discutidos anteriormente na carta, repetidos de
forma mais enfática. A lista das peças de armadura que os fiéis utilizam na
batalha espiritual (6.14-17) já foram destaque em Efésios: verdade (1.13;
4.15,21,24,25; 5.9), justiça (4.24; 5.9), paz (1.2; 2.14-18; 4.3), o evangelho
(1.13; 3.6), a palavra de Deus (1.13; 5.26), salvação (1.13; 2.5,8; 5.23) e fé
(1.1,13,15,19; 2.8; 3.12,17; 4.5,13). As conexões lexicais e conceituais
entre 1.3-14 e 6.10-20 também são claras, especialmente o grupo dos
principais termos teológicos entre 1.13 e 6.14-17. De modo significativo,
como no caso do mandamento “enchei-vos do Espírito” (5.18), a passagem
da “batalha espiritual” em Éfesios tem importantes dimensões comunitárias
e individuais. Os fiéis e a Igreja como um todo devem estar espiritualmente
preparados para participar da batalha espiritual.134

III. Encerramento (6.21-24)


Paulo concluiu a carta com algumas breves referências a seus planos de
viagem e uma fórmula de encerramento padrão. Ele afirmou que ele estava
enviando Tíquico para informar os leitores sobre assuntos pessoais de Paulo
(6.21,22) e encorajá-los (6.22). Paulo encerra a carta com votos de paz e
amor da parte de Deus Pai e do Senhor Jesus Cristo (6.23) e com a bênção
da graça (6.24).

TEOLOGIA

1210
Temas Teológicos
O senhorio de Cristo
O “[trazer de volta] todas as coisas […] juntas novamente sob uma cabeça”
(anakephalaioō, 1.10, NIV), o Senhor Jesus Cristo, é o tema central de toda
a carta. Deus progressivamente efetua este realinhamento apropriado de
autoridade e submissão em duas esferas: nos céus (1.3,10,20; 2.6; 3.10;
6.12), e na terra (1.10; 3.15; 4.9; 6.3).135 Cada reino tem seu próprio
representante: os poderes nos céus e a igreja na terra.136 Portanto, a sujeição
por Deus de todas as coisas a Cristo se torna uma realidade progressiva por
meio da supremacia e vitória de Cristo sobre os poderes do mal (1.19-22) e
seu ajuntamento de judeus e gentios em um só corpo (2.11-22).
Embora o tema seja a sujeição de todas as coisas sob o senhorio de
Cristo, Paulo enfatizou a obra unificada de todos os três membros da
Trindade em alcançar esse objetivo. Esse centro temático teológico é
expresso por quatro temas teológicos: soteriologia, eclesiologia, ética e
batalha espiritual. As referências à obra unificada da Trindade emergem em
oito passagens: 1.4-14; 1.17; 2.18; 2.22; 3.4,5; 3.14-17; 4.4-6; 5.18-20.137
As duas primeiras passagens (1.4-14,17) são relacionadas à soteriologia; as
próximas cinco passagens (2.18,22; 3.4,5, 14-19; 4.4-6), à eclesiologia, e a
última (5.18-20) à ética.

A natureza da salvação
Efésios 1.1-14 descreve as bênçãos salvíficas nos reinos celestiais que
pertencem a todos que estão em Cristo. Paulo apresenta essas bênçãos da
perspectiva do papel que cada membro da Trindade desempenha na

1211
salvação dos fiéis e irrompe em doxologia a cada vez. Deus Pai planeja a
salvação (1.4-6); Deus Filho adquire a salvação (1.7-12); Deus Espírito
aplica e sela a salvação (1.13,14). A oração de Paulo em 1.17 também
envolve as três pessoas da Trindade, na medida em que o Deus e Pai de
nosso Senhor Jesus Cristo dá o Espírito de sabedoria e de revelação aos
fiéis.
Paulo também enfatizou o incrível poder da graça na salvação. Efésios
2.1-3 estabelece o cenário para esta notável obra de Deus pintando o estado
pré-cristão de seus leitores em pinceladas largas e negras. Eles estavam
espiritualmente mortos em transgressões e pecados, e essa morte envolvia
andar em sintonia com a escravizante melodia deste mundo (2.2), do diabo
(2.2) e da carne (2.3). Eles, por natureza, estavam sob a terrível ira de Deus,
exatamente como o restante dos incrédulos (2.3).
O amanhecer da esperança começou com duas simples palavras: “Mas
138
Deus” (2.4). Deus deu vida aos leitores de Paulo, mesmo quando eles
estavam espiritualmente mortos, por causa da sua rica misericórdia e grande
amor. Paulo interrompeu brevemente sua discussão com uma declaração
sobre a graça de Deus: “Pela graça sois salvos!”. Paulo disse quase a
mesma coisa três versículos depois (2.8), então, por que ele interrompeu seu
fluxo de pensamento neste momento? Parece haver um raciocínio
doxológico por trás dessa invasão. Paulo muito se espantou com esse ato
maravilhoso da graça de Deus pois não é apenas a oferta de vida, mas
também a doação da vida. Deveríamos ficar maravilhados pelo fato de Deus
ter dado essa vida espiritual até para os espiritualmente mortos (2.5).139
A união dos fiéis com Cristo significa que, assim como Cristo foi
ressuscitado e assentado à direita de Deus (1.20), assim os fiéis são
vivificados e ressuscitados com Cristo e assentados com ele no céu (2.6).140

1212
A alegria desta presente experiência só pode ser superada pela experiência
nas eras vindouras, quando Deus vai “mostrar as supremas riquezas da Sua
graça em bondade” para os crentes em Cristo (2.7, NASB).
Essa surpreendente salvação é um dom de Deus, não uma conquista do
homem, porque é pela graça mediante a fé (2.8) e, portanto, impede o
orgulho humano (2.9). A salvação não resulta das boas obras, mas as boas
141
obras resultam da salvação (2.10). O papel de Cristo na salvação é
também enfatizado em 2.11-22. Na sua carne Cristo aboliu a “lei dos
mandamentos contidos em ordenanças” (2.15) e “proclamou as boas novas
da paz” para gentios e judeus (2.17).

Algo Para Pensar: Todas as Coisas Sob o


Senhorio de Cristo

Na seção de abertura de sua carta aos Efésios, Paulo


admiravelmente abarcou o propósito do plano de Deus para os
séculos: trazer todas as coisas juntas sob uma cabeça, a saber,
Cristo (1.10). A rebelião contra Deus teve início no reino angelical,
com a queda de Satanás e seus demônios. Ela infectou a raça
humana quando Satanás incitou Eva a comer do fruto proibido e
Adão seguiu o exemplo. Na verdade, o universo inteiro geme e
espera a redenção (Rm 8.22).
Mas Deus ainda é o soberano e Rei do universo. E ele escolheu
seu Filho, o Messias, para ser o Senhor designado, para que, em
consonância com a visão de Isaías, “ao nome de Jesus se dobre todo
joelho […] e toda língua confesse que Jesus Cristo é o Senhor, para

1213
a glória de Deus Pai” (Fp 2.10,11). Como Paulo salientou em
Efésios, Deus mostrou que essa era sua vontade pela ressurreição de
Cristo:

Ele demonstrou esse poder no Messias, ressuscitando-o dentre os mortos e fazendo-


o sentar-se à sua direita nos céus, muito acima de todo principado, autoridade,
poder, domínio, e de todo nome que possa ser pronunciado, não só nesta era, mas
também na vindoura. Também sujeitou todas as coisas debaixo dos seus pés
[aludindo a Sl 8.6] e designou-o como cabeça sobre todas as coisas em favor da
igreja, que é o seu corpo, a plenitude daquele que preenche todas as coisas de todas
as formas (1.20-23).

Se Cristo, então, já foi exaltado e todo joelho um dia se dobrará


a ele: Como devemos então viver? A resposta é: devemos nos
submeter ao seu senhorio em todas as áreas da vida já no aqui e
agora “para o louvor da sua glória” (1.12,14): na igreja (4.1-16),
em nossas vidas e relacionamentos pessoais uns com os outros (4.17
a 5.21), nos nossos casamentos e famílias, como esposas e maridos
(5.22,33), filhos e pais (6.1-4), e no trabalho (6.5-9). Não que
estejamos “fazendo dele Senhor”, pois ele já o é. Ele nos criou e nos
comprou ao morrer na cruz pelos nossos pecados, por isso somos
duplamente dele. Portanto, vivamos nossas vidas totalmente
submetidos ao seu senhorio, e vivamos de maneira digna da
imensuravelmente grande vocação que recebemos.

A igreja
Efésios coloca uma ênfase acentuada sobre a natureza da igreja. Discussões
de eclesiologia devem vir após a soteriologia, pois a obra trinitária da

1214
salvação tem enormes implicações para a igreja. Essa dinâmica é percebida,
de maneira sucinta, em 2.18: “Por meio dele [Cristo], ambos temos acesso
em um Espírito ao Pai” (grifo do autor). Cristo derrubou a parede de
separação por meio da cruz e criou a Igreja como um novo homem (2.13-
22). Essa obra redentora de Cristo os reconciliou com o Pai (2.16). Os fiéis
são “concidadãos dos santos e membros da família de Deus” (2.19).
A eclesiologia trinitária emerge novamente em 2.22: Em Cristo, a igreja
torna-se a moradia de Deus no Espírito. Paulo expressou a obra da Trindade
na eclesiologia novamente em 3.4,5: Deus Pai revela o mistério de Cristo
— crentes judeus e gentios são um em Cristo — mediante seus apóstolos e
profetas pelo Espírito. A oração de Paulo em 3.14-19 também reflete sua
teologia trinitária. Ele orou a Deus Pai que Cristo habitasse com os Efésios
pela fé mediante o poder do Espírito, a fim de serem capazes de entender
com todos os fiéis o insondável amor de Cristo. Paulo também conclama os
fiéis a manter — não criar — a unidade, pois o Espírito produziu unidade
(4.3).142 A união na Igreja é uma grande prioridade por causa da união da
Trindade e de outras dimensões da união (4.4-6). Se a unidade do corpo é
baseada na unidade da Divindade, então dividir a igreja é tão impensável e
hediondo como dividir a Trindade.143
O ensino de Paulo sobre os dons espirituais também aborda o tema da
eclesiologia. Paulo enfatizou que os dons espirituais estão ligados à obra de
Cristo como o prêmio de sua vitória. Cristo concedeu esses dons aos fiéis
individualmente em prol do crescimento comunitário do corpo, não apenas
do indivíduo. A edificação do corpo de Cristo é essencial para alcançar a
unidade na fé (4.13).

A conduta cristã apropriada (ética)

1215
A ética também tem uma dimensão trinitária, quando Paulo exortou os fiéis
a darem graças a Deus Pai em nome de Jesus Cristo, nosso Senhor, como
um resultado de estarem cheios do Espírito (5.18-20). Uma das principais
preocupações de Paulo em Efésios é que os fiéis aprendessem a andar com
Cristo como filhos da luz.144 A nova humanidade pode não possuir uma
identidade étnica específica, mas certamente manifesta uma identidade
moral que reflete o caráter de Deus. O testemunho moral da igreja é uma
parte central da reorganização de todas as coisas sob o senhorio de Cristo,
porque ela está tão intimamente ligada à vocação cristã pela qual os fiéis
devem andar de maneira digna em todos os sentidos (4.1).
A abordagem ética de Paulo não se separa de sua soteriologia. Porque
os fiéis são escolhidos para ser “santos e irrepreensíveis diante dele” (1.4),
eles vão imitar o seu Pai amoroso (5.1), perdoar como Cristo os perdoou
(4.32), e amar como Cristo os amou (5.2). Efésios 2.8-10 também destaca a
relação entre ética e soteriologia na qual os fiéis refletem o caráter de Deus
como seu “artesanato” (2.10, NASB). Embora eles sejam salvos pela graça
e não por obras (2.8,9), são exortados a andar nas boas obras que Deus
preparou para eles (2.10). A ética de Paulo também ecoa sua ênfase na
eclesiologia porque ele se concentrou nas virtudes necessárias para a
edificação da comunidade, tais como a humildade, mansidão, paciência,
amor (4.2,3) e perdão (4.32).
O papel da capacitação divina na ética ocorre de várias maneiras.
Primeiro, no nível estrutural Paulo claramente baseou o imperativo (caps. 4
a 6) no indicativo (caps. 1 a 3); isto é, ele baseou seus mandamentos na
realidade espiritual engendrada por Cristo. A ordem das palavras-chave de
Paulo é importante: estar assentado com Cristo no passado deve preceder
andar com Cristo (4.1 a 6.9) ou permanecer firme por Cristo (6.10-20) no

1216
presente. Segundo, no nível gramatical Paulo colocou a adoração (5.19),
agradecimento (5.20) e submissão (5.21 a 6.9) em relações de subordinação
com a frase “enchei-vos do Espírito” (5.18). Isso mostra que a devoção é
um efeito causado pelo poder de Deus.

Batalha espiritual
C. E. Arnold apropriadamente observou a importância da batalha espiritual
em Efésios: “Mais do que qualquer outra carta paulina, Efésios enfatiza o
papel hostil dos principados e potestades contra a igreja.”145 Pode-se ver
essa ênfase examinando os termos que Paulo usa em Efésios.
Paulo falou de grupos específicos, como “poderes” (dynameis, 1.21),
“domínios” (kyriotēs, 1.21), “principados” (archai, 1.21; 3.10; 6.12), e
“autoridades” (exousiai, 1.21; 2.2; 3.10; 6.12). O apóstolo também
identificou poderes hostis em um sentido abrangente como “governantes
cósmicos da presente escuridão” (kosmokratores tou skotous toutou, 6.12).
Efésios 1.21 afirma que o reinado de Cristo é sobre não só os quatro grupos
específicos dos poderes do mal listados aqui, mas também sobre “todo
nome que possa ser pronunciado, não só nesta era, mas também na
vindoura” (A21).
D. G. Reid resumiu a importância dessa frase inclusiva assim: “Em um
contexto cultural no qual geralmente se acreditava que a manipulação
mágica bem sucedida de forças maléficas dependia do conhecimento da
força, Efésios enfatiza o triunfo e soberania de Cristo sobre qualquer poder
ou força — conhecido ou desconhecido, real ou imaginário, presente ou
futuro.”146

1217
Esse foco na batalha espiritual está ligado à discussão anterior de Paulo
sobre soteriologia e a obra de Cristo.147 Cristo já obteve a vitória sobre os
poderes celestiais malignos e está sentado à direita de Deus acima de “todo
principado, autoridade, poder, domínio, e de todo título conferido” (1.21).
Deus pôs tudo sob os pés de Cristo e o apontou como cabeça sobre todas as
coisas em favor da igreja (1.22). Em seu estado pré-cristão, os fiéis viviam
sob o poder do “governante do domínio atmosférico” (2.2). Além disso, a
igreja é o veículo que transmite a sabedoria de Deus “para os governantes e
autoridades nas regiões celestiais” (3.10).
A batalha espiritual também está conectada com a discussão anterior de
Paulo sobre eclesiologia e ética. Com respeito a eclesiologia, o fato de as
injunções estarem no plural por todo o trecho de 6.10-14 mostra que Paulo
se dirigiu a toda a igreja quanto à necessidade de lutar e enfrentar as forças
hostis do maligno.148 Com respeito à ética, o mesmo diabo que ataca com
métodos insidiosos (6.11) e dardos em chamas (6.16) já foi descrito como
tentando conquistar uma posição por meio da raiva (4.26) e outras condutas
que refletem o velho homem e o velho modo de vida. Portanto, revestir-se
de toda a armadura de Deus (6.10-20) está conectado com despir-se do
velho (4.22) e revestir-se do novo homem (4.24).
Efésios 6.10-20 se destaca como uma das passagens mais claras das
Escrituras sobre batalha espiritual. O tema-chave de 6.10-17 é a exortação a
permanecer na força de Deus contra os poderes reunidos contra o fiel. As
linhas de batalha são traçadas entre Deus e o fiel em sua armadura de um
lado (6.10,11) e o diabo, os governantes, autoridades, príncipes destas
trevas, e os exércitos espirituais da maldade nas regiões celestiais do outro
(6.11,12). Os fiéis precisam da armadura espiritual de Deus porque a
batalha não é contra carne e sangue, mas contra inimigos espirituais (6.12).

1218
Paulo ainda aumentou a intensidade e proximidade do conflito usando a
palavra para “luta” em vez de termos mais usuais para batalha.149
Os fiéis podem superar essas forças só com o poder de Deus. Eles
recebem o poder do Senhor (6.10) ao colocarem sua armadura (6.11).150 As
várias peças da armadura à disposição do fiel refletem o arsenal completo
de um soldado romano de infantaria.151 O AT também serve como um
cenário.152 Em particular, a descrição de Paulo da armadura de Deus baseia-
se em imagens em Isaías (veja esp. 11.5; 52.7; 57.19). Esses textos retratam
Deus e seu Messias como guerreiros vestidos com armaduras saindo para
lutar pelo povo de Deus. Assim, a armadura que Deus dá para seu povo é a
armadura que o próprio Deus já utilizou para obter a vitória em favor de seu
povo. O indicativo do que Deus fez em Cristo e o imperativo do que os fiéis
são chamados a fazer em Cristo convergem.
A oração deve ser vista como mais uma arma na batalha espiritual. A
batalha se intensifica com o progresso do evangelho (6.18-20). Novamente,
Paulo enfatizou a eclesiologia quando ele encorajou a intercessão por todos
os crentes (6.18).

65
Para um excelente levantamento das distinções atribuídas a Efésios (incluindo a referência de

Calvino), veja H. W. Hoehner, Ephesians: An Exegetical Commentary (Grand Rapids: Baker, 2003),

p. 1-2.

66
R. E. Brown, An introduction to the New Testament (New York: Doubleday, 1997), p. 620.

Para uma ampla análise da influência exercida por Efésios, veja R. Schnackenburg, Ephesians: A

Commentary (Edinburgh: T&T Clark, 1996), p. 311-42.

1219
67
Assim também Thielman, Theology of the New Testament, p. 407: “A igreja, portanto,

desempenha um papel decisivo no plano de Deus de levar os tempos a sua plenitude ao recapitular

todas as coisas em Cristo. Eles são a nova humanidade que substitui a antiga humanidade

desintegrada, e eles são a evidência de que o plano de Deus de recapitular todas as coisas em Cristo

está rapidamente chegando a seu desfecho”.

68
Hoehner, Ephesians, p. 50: “Não há sinal de que a exaltação pudesse acontecer sem a morte de

Cristo”.

69
R. Schnackenburg, The epistle to the Ephesians (Edinburgh: T&T Clark, 1991), p. 28.

70
E. Käsemann, “The theological problem presented by the motif of the body of Christ”, in:

Perspectives on Paul, tradução para o inglês de M. Kohl (Philadelphia: Fortress, 1971), p. 102-21;

esp. p. 120-1.

71
J. C. Beker, Paul the Apostle: The Triumph of God in Life and Thought (Minneapolis: Fortress,

1990).

72
A. Lindemann (Die Aufhebung der Zeit: Geschichtsverständnis und Eschatologie im

Epheserbrief, SNT 12 [Gütersloh: Mohn, 1975], p. 98-9) acreditava que esse “recapitular” já foi

realizado. Mas este entendimento não reconhece a avaliação do próprio Paulo. Ele concebia seu

próprio ministério como o de trazer este objetivo a um futuro cumprimento (3.8-10). Todas as coisas

não serão recapituladas antes da futura redenção da humanidade (1.14) e a consumação na era

vindoura (2.7).

73
Hoehner, Ephesians, p. 56.

74
Lincoln, Ephesians, p. lxxxix-xc.

75
Veja esp. A. T. Lincoln; A. J. M. Wedderburn, The Theology of the Later Pauline Letters, New

Testament Theology (Cambridge: University Press, 1993), p. 91-166. W. G. Kümmel (Introduction to

the New Testament, ed. rev., tradução para o inglês de H. C. Kee [Nashville: Abingdon, 1975], p.

1220
360) chegou ao ponto de dizer que a teologia de Efésios “torna a composição paulina da carta

completamente impossível”.

76
P. T. O’Brien, The Epistle to the Ephesians, PNTC (Grand Rapids: Eerdmans, 1999), p. 21-33.

77
C. E. Arnold, Ephesians: Power and Magic. The Concept of Power in Ephesians in Light of its

Historical Setting, SNTSMS 63 (Cambridge: University Press, 1989), p. 124-9.

78
R. F. Collins, Letters that Paul Did Not Write: The Epistle to the Hebrews and the Pauline

Pseudepigrapha, Good News Studies 28 (Wilmington: Michael Glazier, 1988), p. 142.

79
P. N. Harrison, Paulines and Pastorals (London: Villiers, 1964), p. 48.

80
Hoehner, Ephesians, p. 24.

81
Pleonasmo é o uso de mais palavras do que necessário para expressar uma ideia. Veja esp. A.

T. Lincoln, Ephesians, WBC 42 (Dallas: Word, 1990), p. xlv-xlvi.

82
A. van Roon, The Authenticity of Ephesians, tradução para o inglês de S. Prescod-Jokel,

NovTSup 39 (Leiden: Brill, 1974), p. 105-11; D. A. Carson; D. J. Moo, An introduction to the New

Testament, 2. ed. (Grand Rapids: Zondervan, 2005), p. 484.

83
N. Turner, Style, in: A Grammar of New Testament greek, edição de J. H. Moulton (Edinburgh:

T&T Clark, 1976), vol. 4, p. 84-5.

84
V. P. Furnish, “Ephesians, Epistle to the”, in: ABD 2:536-7; Lincoln, Ephesians, p. xlvii-lviii.

85
van Roon, The Authenticity of Ephesians, p. 413-37. Ele também teorizou que Colossenses e

Efésios emprestaram de um Ur-texto (texto original comum às duas).

86
E. Best, A Critical and Exegetical Commentary on Ephesians, ICC (Edinburgh: T&T Clark,

1998), p. 36-40.

1221
87
Lincoln Ephesians, lviii. Lincoln alegou que a dependência efésia de Colossenses e seu uso de

Romanos é o argumento “mais decisivo” contra a autenticidade (Lincoln; Wedderburn, Theology, p.

84).

88
C. E. Arnold, “Ephesians, letter to the”, in: G. F. Hawthorne; R. P. Martin; D. G. Reid, orgs.,

Dictionary of Paul and his letters (Downers Grove: InterVarsity, 1993), p. 242-3.

89
O’Brien, Ephesians, p. 5.

90
Hoehner (Ephesians, p. 22) destacou que a falta de saudações pessoais em 2Coríntios é

surpreendente, porque Paulo passou 18 meses em Corinto. Ele também observou que a carta não é

completamente impessoal, porque Paulo orou pelos recipientes da carta (1.16) e pediu por suas

orações (6.19,20; ibid., p. 23).

91
D. Trobisch (Paul’s letter collection: tracing the origins [Minneapolis: Fortress, 2000], p. 53-

54) disse que Efésios é “o início de um apêndice” para a coleção de cartas do próprio Paulo. F. F.

Bruce (Paul: apostle of the Heart set free [Grand Rapids: Eerdmans, 1977], p. 424) e L. T. Johnson

(The writings of the New Testament: an interpretation [Philadelphia: Fortress, 1986], p. 372)

enfatizou que mesmo que um discípulo de Paulo tivesse escrito Efésios, ela deveria ser considerada

como um sumário brilhante da teologia do apóstolo.

92
O mais notável é N. Elliott, Liberating Paul: the justice of God and the politics of the apostle

(Maryknoll: Orbis, 1994), esp. p. 25-54; id., “Paul and the politics of empire: problems and

prospects”, in: R. A. Horsley, org., Paul and politics: ekklesia, Israel, imperium, interpretation

(Harrisburg: Trinity, 2000), p. 26-7. Elliott afirmou que as cartas deuteropaulinas surgiram para

“sequestrar” e “distorcer” o legado social libertador de Paulo. Ele também argumentou que os

“códigos domésticos” foram contaminados em 1Coríntios 14.34,35, com relação às mulheres, e em

1Tessalonicenses 2.14-16, com relação aos judeus. Esse fato demonstra que Elliott abordou as cartas

de Paulo com uma noção preconcebida do que Paulo podia ou não dizer. Esse preconceito, não o

corpus paulino incontroverso, funciona como o fator determinante para a autenticidade.

1222
93
Veja os debates entre S. Michaelson e A. Q. Morton, “Last words: a test of authorship for greek

writers”, NTS 18 (1972), p. 192-208. Eles argumentaram que as cartas paulinas não atendem o

requerimento mínimo de 10 mil palavras semelhantes em extensão e substância que são necessárias

para fazer comparações apropriadas. Cf. a crítica severa desta proposta por P. F. Johnson, “The use of

statistics in the analysis of the characteristics of pauline writing”, NTS 20 (1973), p. 92-100.

94
C. L. Mitton (Ephesians, NCB [London: Oliphants, 1976], p. 15-6) escreveu: “A evidência

externa está completamente do lado daqueles que defendem a autoria paulina. Entre todos os antigos

escritores da igreja cristã nunca houve o menor sinal que a questionasse”. Clemente de Roma (c. 95)

parece ser o primeiro pai da igreja a fazer alusão a Efésios (1Clem. 46.6). Parece que Inácio (morto c.

110), Ireneu (c. 180), Policarpo (c. 155), Clemente de Alexandria (c. 200) e Tertuliano (m. 225)

conheciam Efésios e confirmaram sua autenticidade. Efésios também pode ser encontrada no cânon

marcionista e no cânon muratoriano. Veja a excelente pesquisa sobre Efésios na igreja primitiva feita

por Hoehner (Ephesians, p. 2-6).

95
Veja a excelente discussão sobre pseudonímia e pseudepigrafia em Carson e Moo, Introduction

to the New Testament, p. 337-53.

96
R. E. Brown, The churches the apostles left behind (New York: Paulist, 1984), p. 47; id.

(Introduction, p. 620) estimou que “no presente momento cerca de 80% da erudição crítica defende

que Paulo não escreveu Efésios”. O extenso quadro em Hoehner (Ephesians, p. 9-20) mostra que essa

estimativa é, na melhor das hipóteses, exagerada, e, na pior, irresponsável.

97
T. K. Abbott (A critical and exegetical commentary on the epistles to the Ephesians and to the

Colossians, ICC [Edinburgh: T&T Clark, 1897], p. xl-xlv) forneceu uma lista das leituras mais

importantes de alguns manuscritos-chave. Cf. B. M. Metzger, Textual commentary on the greek New

Testament, 2. ed. (New York: American Bible Society, 1994), p. 532-43.

98
O’Brien (Ephesians, p. 57) optou por 61-62.

1223
99
A. T. Lincoln (Ephesians, p. lxxiii) propôs uma variação de 80-90. Carson e Moo (Introduction

to the New Testament, p. 487) observaram que a data mais tardia possível parece ser

aproximadamente 90, porque parece que Clemente de Roma mencionou Efésios em sua carta, datada

do ano 96. Mas Lincoln (Ephesians, p. lxxii-lxxiii) acompanhou J. Gnilka (Der Epheserbrief

[Freiburg: Herder, 1971], p. 18) ao rejeitar essa conclusão, argumentando que Inácio (m. c. 110) foi o

primeiro pai da igreja antiga a mostrar conhecimento de Efésios enquanto Tertuliano foi o primeiro a

fazer a atribuição explícita.

100
Veja a discussão a seguir.

101 46
A expressão “em Éfeso” é omitida por textos alexandrinos antigos importantes tais como

a B 424c 1739. Os antigos pais da igreja, entre eles Basílio, Orígenes e Gregório, o Grande, também

omitem a expressão. Alguns estudiosos dizem que essa expressão não era conhecida por Marcião,

pois ele chamava a carta de “A Epístola aos Laodicenses”. Tertuliano tem a frase “aos santos que

também são crentes em Cristo Jesus”. Veja M. Barth, Ephesians 1 to 3, p. 67. As tradições

manuscritas ocidental (D, F, G) e bizantina (K, L, P), juntamente com alguns textos alexandrinos (A

a2 B2 minúsculos 33,81,104,175,1881), apoiam a inclusão de “em Éfeso”.

102
Metzger, Textual commentary, p. 532.

103
Ibid.; Bruce, Colossians and Ephesians, p. 250; O’Brien, Ephesians, p. 5 e 86-7; M. Barth,

Ephesians 1 to 3, p. 67. Para investigações adicionais, veja M. Santer, “The text of Ephesians 1.1”,

NTS 15 (1969), p. 247-8; E. Best, “Ephesians i.1”, in: E. Best; R. M. Wilson, orgs., Text and

interpretation: studies in the New Testament presented to Matthew Black (Cambridge: University

Press, 1979), p. 29-41; id., “Ephesians 1.1 again”, in: M. D. Hooker; S. G. Wilson, org., Paul and

paulinism: essays in honour of C. K. Barrett (London: SPCK, 1982), p. 276-8; e “Excursus 1: textual

problem in Ephesians 1.1”, in: Hoehner, Ephesians, p. 144-48.

104
Hoehner, Ephesians, p. 147.

1224
105
Bruce (Ephesians, p. 250) teorizou que o espaço após o verbo “estão” foi deixado em branco

a fim de que Tíquico inserisse o nome geográfico apropriado de cada localidade em que ele

entregasse uma cópia da carta circular. Bruce fez essa afirmação admitindo que esse artifício é difícil

de encontrar no primeiro século. Bruce citou G. Zuntz (The text of the Epistles [London: British

Academy, 1954], p. 228, n. 1), que apontava para múltiplas cópias de cartas régias no período

helenístico que eram baseadas em uma cópia mestra “com o destinatário deixado em branco, e é

muito provável que esse ‘branco’ no destino de Efésios remonte a um original desse tipo”. M. Barth

tem uma excelente discussão que traça o desenvolvimento histórico dessa abordagem. Ele identificou

T. Beza e H. Grotius como os primeiros a sugerirem essa linha de pensamento. Barth diz que J.

Ussher defendeu essa solução em sua obra Annales Veteris et Novi Testamenti (London: Crook, 1650-

1654) e também cita Lightfoot, Hort, Haupt, Robinson, Percy e Schlier como proponentes. D. N.

Freedman (por carta, citado em M. Barth, Ephesians 1 to 3, p. 67) comparou esse problema crítico

textual com 2Samuel 4.1 e ofereceu uma solução semelhante. Mas há problemas significativos com

essa abordagem. Kümmel (Introduction, p. 355) afirmou veementemente que, dessa prática, “não há

paralelo na antiguidade”. O’Brien (Ephesians, p. 85-6) corretamente observou que ela não se encaixa

numa época em que cada cópia tinha de ser escrita à mão. Ele também lembra aos leitores que

nenhuma cópia sobreviveu que fosse dirigida a um lugar que não Éfeso.

106
Arnold, “Ephesians”, p. 244-5; Hoehner, Ephesians, p. 79.

107
Assim também Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 490 [publicado em

português por Vida Nova sob o título Introdução ao Novo Testamento].

108
Best, Ephesians, p. 61-3.

109
N. A. Dahl, “Gentiles, christians, and israelites in the Epistle to the Ephesians”, HTR 79

(1986), p. 38.

110
Lincoln, Ephesians, p. lxxv-lxxxvii.

1225
111
Schnackenburg, Ephesians, p. 22-35.

112
Mitton, Ephesians, p. 30-1.

113
J. A. Robinson, St. Paul’s Epistle to the Ephesians, 2. ed. (London: Macmillan, 1907), p. 10-

11.

114
Thielman, Theology of the New Testament, p. 394.

115
Arnold, “Ephesians, letter to the”, p. 246.

116
O’Brien, Ephesians, p. 58-65.

117
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 491.

118
N. A. Dahl, “Ephesians”, in: J. L. Mays, org., Harper’s Bible commentary (San Francisco:

Harper & Row, 1988), p. 1212.

119
Lincoln, Ephesians, p. 46.

120
A. C. Mayer, Sprache der Einheit im Epheserbrief, WUNT 150 (Tübingen: Mohr-Siebeck,

2002), p. 20.

121
P. S. Cameron (“The structure of Ephesians”, Filologia Neotestamentaria 3 [1990], p. 3-17)

propôs que oito painéis paralelos demonstram conexões linguísticas (excluindo 6.18-22).

122
J. P. Heil, Ephesians: empowerment to walk in love for the unity of all in Christ, Studies in

Biblical Literature 13 (Leiden: Brill, 2007).

123
A grande complexidade da proposta de Cameron lança dúvidas sobre sua viabilidade e

utilidade. A proposta do duplo quiasmo de Mayer é pouco melhor, embora ainda problemática e não

plausível em alguns pontos. Em particular, deve-se perguntar como os leitores ou ouvintes poderiam

ter detectado o tipo de quiasmo proposto por Mayer.

1226
124
Veja a crítica do esboço retórico de Lincoln por D. E. Aune, The Westminster dictionary of

New Testament and early christian literature and rhetoric (Louisville: Westminster John Knox,

2003), p. 159.

125
“Sentar”/“assentar” (kathizō; 1.20); “andar” (peripateō; 2.2,10; 4.1,17 [duas vezes]; 5.2,

8,15); “permanecer firme” (histēmi; 6:11,13,14). Veja B. Weber, “‘Setzen’-‘Wandeln’-‘Stehen’ im

Epheserbrief”, NTS 41 (1995), p. 478-80.

126
J. Pfammater (Epheserbrief; Kolosserbrief, Neue Echter Bibel [Würzburg: Echter, 1987], p.

22) acreditava que o autor faz alusão a Isaías 57.19 com o uso desse esquema.

127
Esse texto lembra Romanos 9.4, 5, mas cumpre um propósito diferente: Romanos 9.4,5 lista

as vantagens de ser um israelita, enquanto Efésios 2.11,12 descreve as desvantagens de ser um

gentio. Veja R. Schnackenburg, Der Brief an die Epheser (Zürich: Benziger, 1982), p. 108-9.

128
Veja o esboço em Hoehner, Ephesians, p. 66-8.

129
Os estudiosos têm lutado com a clara mudança do verbo (“ele recebeu dons”) em Salmos 68.8

(LXX 67.19; TM 68.19) para “ele deu dons” em Efésios 4.8. Alguns acreditam que Paulo se baseou

em uma leitura targúmica tardia encontrada na Peshitta. Veja E. Nestle, “Zum Zitat in Eph 4,8”, ZNW

4 (1903), p. 344-5. Bruce (Ephesians, p. 342) argumentou que a leitura é mais antiga que o targum

escrito, pois as leituras “frequentemente tinham uma longa pré-história oral”. Para uma extensa

pesquisa das abordagens a este texto, veja W. Hall Harris III, The descent of Christ: Ephesians 4:7-11

and traditional hebrew imagery, AGJU 32 (Leiden: Brill, 1996), p. 64-122.

130
Paulo queria ver a solução distintivamente cristã de “ser enchido pelo Espírito”. Os

gramáticos gregos observam que essa construção específica nunca se refere ao conteúdo do

enchimento; sendo assim, traduções do tipo “cheios com o Espírito” são suspeitas do ponto de vista

da gramática. Muito provavelmente, o Espírito aqui não é o conteúdo, mas o agente do enchimento.

Com que o Espírito enche os fiéis? Um exame do uso da palavra grega para “encher” em Efésios

1227
revela que os fiéis são enchidos por Cristo (1.23) e pelo Espírito (5.18) com a plenitude de Deus

(3.19). Veja esp. D. B. Wallace, Greek grammar beyond the basics (Grand Rapids: Zondervan, 1996),

p. 375. Assim também O’Brien, Ephesians, p. 391-2; Hoehner, Ephesians, p. 702-4. Cf. G. D. Fee,

God’s empowering presence: the Holy Spirit in the letters of Paul (Peabody: Hendrickson, 1994), p.

721, n. 196. Fee argumentou que enquanto a construção grega significa o meio do enchimento, “ela

está só a um pequeno passo de ver o Espírito como aquela substância também”. J. P. Heil (“Ephesians

5.18b: ‘but be filled in the Spirit’”, CBQ 69 [2007], p. 506) defendeu a tradução “enchei-vos no

Espírito”, transmitindo o sentido de “estar dentro do dinâmico reino ou esfera estabelecido ou

caracterizado por ter recebido o Espírito”. Para uma pesquisa das várias propostas, veja A. J.

Köstenberger, “What does it mean to be filled with the Spirit? A biblical investigation”, JETS 40

(1997), p. 231-5; e Heil, “Ephesians 5:18b”.

131
Os cinco particípios transmitem resultado. Assim também Lincoln, Ephesians, p. 345;

Wallace, Greek grammar beyond the basics, p. 639. A gramática de Paulo enfatiza a relação causa e

efeito entre “sendo enchidos pelo Espírito” (5.18) e as características piedosas que se seguem (5.19-

21). Essas não são realidades independentes que os fiéis são chamados a criar pela sua própria força

de vontade; em vez disso, elas dependem da obra do Espírito (cf. os frutos do Espírito em Gl

5.22,23).

132
Veja T. G. Gombis, “A radically new humanity: the function of the Haustafel in Ephesians”,

JETS 48 (2005), p. 317-30.

133
Moritz, Profound mystery, p. 181-3; O’Brien, Ephesians, p. 457; Lincoln, Ephesians, p. 438-

9. Lincoln (“‘Stand, therefore…’: Ephesians 6.10-20 as Peroratio”, BibInt 3 [1995], p. 99-114)

identificou o clímax em termos retóricos como peroratio. Essa categoria retórica era usada no final

do discurso, e procurava resumir os principais temas e levar o ouvinte à ação. O’Brien (Ephesians, p.

459-60) corretamente observou que esta passagem exerce a função de uma peroratio, mas isso não

necessariamente justifica o uso desta categoria retórica uma vez que qualquer bom escritor tentaria

resumir o argumento e concluir com um apaixonado apelo à ação.

1228
134
Veja D. R. Reinhard, “Ephesians 6.10-18: a call to personal piety or another way of describing

union with Christ?”, JETS 48 (2005), p. 521-32.

135
Este tema teológico e a divisão das duas esferas está se tornando, de certo modo, o ponto de

vista de consenso. Veja O’Brien, Ephesians, p. 58; Lincoln; Wedderburn, Theology, p. 96-7; M.

Turner, “Mission and meaning in terms of ‘unity’ in Ephesians”, in: A. Billington; T. Lane; M.

Turner, orgs., Mission and meaning: essays presented to Peter Cotterell (Carlisle: Paternoster, 1995),

p. 138-66; Thielman, Theology of the New Testament, p. 394.

136
Veja o excelente estudo de C. C. Caragounis, The ephesian mysterion: meaning and content

(Lund: Gleerup, 1977), p. 144-6.

137
Hoehner (Ephesians, p. 106-7) disse que “Efésios é conhecida como a carta trinitariana”.

138
Veja esp. o excelente sermão sobre esse texto de duas palavras de D. M. Lloyd-Jones, God’s

way of reconciliation (Grand Rapids: Baker, 1972), p. 59-69.

139
Veja T. R. Schreiner (Paul, apostle of God’s glory in Christ [Downers Grove: InterVarsity,

2001], p. 246): “Graça não é simplesmente favor imerecido no sentido de que se possa receber ou

rejeitar um dom. Graça é concessão de vida nova. Graça é um poder que ressuscita alguém dos

mortos, que levanta pessoas da sepultura para uma vida nova. Graça não é apenas um dom imerecido,

embora seja isso; ela é também um poder transformador. A graça concedeu vida quando estávamos

mortos, e a graça também nos ressuscita e nos assenta com Cristo nas regiões celestiais (Ef 2.6)”.

140
Sobre o significado de estar “assentado com Cristo”, veja esp. H. N. Ridderbos, Paul: an

outline of his theology, tradução para o inglês de J. R. de Witt (Grand Rapids: Eerdmans, 1975), p.

347; Lincoln, Ephesians, p. 105-7, e sua exposição mais longa sobre a escatologia inaugurada em

Paradise now and not yet: studies in the role of the heavenly dimension in Paul’s thought with special

reference to his eschatology, SNTSMS 43 (Cambridge: University Press, 1981).

1229
141
I. H. Marshall, “Salvation, grace and works in the later writings in the pauline corpus”, NTS

42 (1996), p. 339-58, esp. p. 342-5.

142
Genitivo de produtor (i. e., “unidade do espírito” = “unidade produzida pelo Espírito”). Veja

Wallace, Greek grammar beyond the basics, p. 105.

143
J. R. W. Stott (The message of Ephesians: God’s new society, BST [Downers Grove:

InterVarsity, 1979], p. 151) concordou com essa afirmação. “Há somente um Deus? Então o Senhor

tem apenas uma igreja. Seria a unidade de Deus inviolável? Então, assim é a unidade da igreja. A

unidade da igreja é tão indestrutível como a unidade do próprio Deus. É tão impossível dividir a

igreja quanto dividir a Divindade.”

144
T. Moritz, “Ephesians”, in: T. D. Alexander; B. S. Rosner, orgs., New Dictionary of Biblical

theology (Downers Grove: InterVarsity, 2000), p. 317.

145
Arnold, “Ephesians”, p. 247.

146
D. G. Reid, “Principalities and powers”, in: Dictionary of Paul and his letters, p. 749.

147
A igreja militante “avança de uma posição de poder fundamentada no ‘já’ da derrota do diabo

e suas forças” (ibid., p. 751).

148
O’Brien (Ephesians, p. 460, n. 84) com razão corrigiu a falsa dicotomia de Neufeld (Put on

the armour of God, p. 111). Neufeld tomou o plural como prova de que Paulo fez um chamado

comunitário, que não deveria ser entendido “em termos individualistas”. Entretanto, O’Brien

observou que o plural transmite “ação comum”; os fiéis individual ou coletivamente devem

permanecer “juntos como se fossem um” contra o Diabo.

149
M. E. Gurdorf (“O uso de palē em Efésios 6.12”, JBL 117 [1998], p. 334) defende o mesmo

ponto quando alega que Paulo usou a figura de um soldado ou lutador plenamente equipado para

descrever “combate corpo a corpo”. Cf. Arnold, Ephesians: power and magic, p. 116-7, para obter

informação contextual extraída de inscrições.

1230
150
A armadura “de Deus” se refere à armadura de Deus que ele dá aos fiéis. Gnilka

(Epheserbrief, p. 305) provavelmente está correto em identificar “de Deus” como um genitivo de

origem.

151
O’Brien, Ephesians, p. 462. O termo grego panoplia (“armadura”) enfatiza a ideia de um

conjunto completo de armadura para destacar o perigo da batalha e a necessidade da total

dependência de Deus. Veja Arnold, Ephesians: power and magic, p. 118.

152
Reid (“Principalities and powers”, p. 751) concordou: “Embora a terminologia da parafernália

militar seja tomada do mundo romano, o arquétipo da batalha é claramente israelita”. O’Brien

(Ephesians, p. 472-82) também tem uma discussão da imagística do AT por trás da armadura de

Deus.

1231
Colossenses

FATOS-CHAVE DE COLOSSENSES
Autor: Paulo
Data: Por volta de 60
Origem: Prisão em Roma
Destino: Colossos
Motivo: Falso ensino
Propósito: Combater o falso ensino com a supremacia
e a suficiência de Cristo
Tema: Cristo é completo de todas as maneiras e,
portanto, os crentes são completos em
Cristo
Versículos-Chave: 2.6-10

INTRODUÇÃO

A carta de Paulo aos Colossenses é talvez a carta mais cristocêntrica do


NT. Colossenses oferece uma sólida correção para os falsos ensinos no vale
do Lico que minimizavam a importância da pessoa e obra de Cristo. Paulo
firmemente colocou a ênfase de volta na centralidade de Cristo em todas as
coisas. A carta, de forma clara e apaixonada, defende a supremacia de
Cristo, a suficiência de sua obra para o fiel, e a aplicação do senhorio de
Cristo a cada aspecto da vida cristã. Colossenses, assim, serve como um
lembrete rigoroso dos graves problemas que surgem quando o foco é
removido de Cristo e ele é deslocado do centro da vida cristã.

1232
A carta também demonstra que a gratidão a Cristo pela grande salvação
que ele concedeu serve como uma motivação principal para a vida cristã.
Embora colossenses legalistas possam ter buscado justiça motivados por um
senso de obrigação e temor, Paulo salientou que o fiel vive sua vida de uma
maneira digna da sua vocação motivado por uma alegre ação de graças ao
Pai que o adotou, resgatou do domínio de Satanás, livrou do castigo e
perdoou seus pecados.153 Talvez mais do que qualquer outra carta paulina,
Colossenses apresenta a vida cristã como uma explosão incontrolável de
alegria, louvor e ação de graças, na qual tudo que o fiel diz e faz é uma
expressão de grata adoração a um Deus todo-soberano que proveu uma
salvação mais que suficiente.

HISTÓRIA
Autor
Autenticidade
A discussão a seguir tem muitas semelhanças com o debate sobre a autoria
de Efésios, de forma que não é necessário trilhar todo o mesmo terreno
novamente. A carta começa com uma afirmação de que Paulo foi o autor
(1.1) e contém duas outras expressões de identificação pessoal em 1.23
(“eu, Paulo”) e 4.18 (“eu, Paulo, escrevo essa saudação de próprio punho”,
NVI). A carta também se refere a Timóteo, Epafras, João Marcos e
Barnabé, que eram companheiros de Paulo, conforme documentado no livro
de Atos. O encerramento da carta faz muitas referências pessoais que não
seriam de se esperar num escrito pseudepígrafo. A autoria paulina também
foi afirmada pelo testemunho ininterrupto da igreja primitiva.

1233
Mais uma vez, no entanto, apesar das fortes evidências de autenticidade,
a autoria da carta é muito debatida. As objeções só começaram no século
XIX,154 mas aumentaram de forma constante no século XX.155 Hoje, três
fatores recorrentes dominam a defesa da inautenticidade: (1) linguagem e
estilo literário, (2) teologia e (3) a estreita relação entre Colossenses e
Efésios.
Colossenses contém 34 hapax legomena, palavras que não aparecem em
outras passagens do NT. A carta também contém 28 palavras que não
aparecem em outras cartas de Paulo.156 Alguns estudiosos afirmam que esse
fato favorece a autoria não paulina. W. Bujard analisou o uso de conectivos
e a estrutura das frases em Colossenses e concluiu que o estilo desta carta
era muito diferente para que Paulo fosse o autor.157 J. D. G. Dunn abordou a
questão da autoria do ponto de vista literário e alegou que o fluxo e as
características retóricas da carta “confirmam a forte probabilidade de que a
carta foi escrita por alguém que não Paulo”.158
Quanto à teologia, alguns estudiosos alegam as adições e desvios das
cartas incontestáveis nas áreas da cristologia,159 escatologia160 e
eclesiologia.161 Outros põem o foco não apenas nos desvios e acréscimos,
mas também na ausência de termos teológicos-chave como lei, justificação,
salvação e outros. A respeito da estreita relação entre Colossenses e Efésios,
alguns estudiosos afirmam que um escritor nunca produziria duas cartas tão
semelhantes.
Os estudiosos que defendem a autoria paulina respondem tipicamente
com quatro pontos. Primeiro, alguns argumentos contra a autenticidade
refletem um forte preconceito contra a autenticidade da carta e são melhor
vistos como evidência positiva para a autoria paulina de Colossenses. Por
exemplo, a estreita relação de Colossenses e Efésios não conduz de forma

1234
lógica à negação da autoria paulina de Colossenses. Carson e Moo
questionaram a lógica por trás deste argumento quando gracejaram: “É
curioso este argumento de que deveríamos rejeitar um escrito como paulino
devido à sua semelhança com um outro escrito no corpus paulino.”162
Especialmente se Efésios era uma carta circular dirigida às igrejas da Ásia
Menor, nas proximidades do Colossos, e escrita no mesmo local e
aproximadamente ao mesmo tempo que Colossenses, as semelhanças entre
os dois documentos não são surpreendentes.
Segundo, aqueles que rejeitam a autoria paulina devem prover uma
justificativa para as referências pessoais na carta e a escolha desta igreja em
particular. Por que um imitador se esforçaria tanto em falsificar referências
pessoais e escrever para uma cidade tão insignificante como Colossos?163
Terceiro, as diferenças teológicas entre Colossenses e as cartas paulinas
incontestes foram exageradas.164 Por exemplo, vários estudiosos influentes,
tais como E. Lohse, alegaram que a cristologia de Colossenses é muito
elevada para que Paulo tivesse escrito a carta. Tais argumentos assumem
que a Cristologia elevada de Colossenses, que identifica Jesus como a
encarnação da divindade e o agente e sustentador da criação, evoluiu de
uma cristologia bem menos elevada nas cartas paulinas incontestes.165
No entanto, a cristologia das cartas paulinas incontestes é muito mais
elevada do que alguns estudiosos reconhecem. Romanos 10.6-13 não
apenas identifica Jesus como o Senhor Yahweh, mas também insiste que a
confissão da divindade de Jesus é necessária para a salvação. Se o grande
hino cristológico de Filipenses 2.6-11 é pré-paulino, essa elevada
cristologia foi compartilhada por outras pessoas na igreja muito cedo na
história cristã e se tornou um elemento estabelecido de adoração da igreja
em meados do primeiro século. A identidade de Cristo como o agente e

1235
sustentador da criação é uma conclusão muito natural exigida pela sua
identidade como Yahweh. Em 1Coríntios 8.4-6, Paulo já havia estabelecido
as bases para essas afirmações, identificando Jesus como o único Senhor do
Shema (Dt 6.4,5) e insistindo em que Jesus foi aquele por meio de quem
todas as coisas vieram à existência, incluindo a própria humanidade. A
teologia encarnacional de Colossenses 1.19; 2.9 não está, como Dunn
afirmou, “um passo além de qualquer dessas passagens”,166 mas é
totalmente coerente com elas. Colossenses usa expressões novas para
articular essa Cristologia elevada, mas a Cristologia não é muito mais
desenvolvida.
As alegações de que a eclesiologia da carta é desenvolvida demais para
permitir autoria paulina também não são corretas. Embora Paulo, em
nenhuma outra passagem em suas cartas incontestes se referiu a Jesus como
“cabeça do corpo, que é a igreja” (Cl 1.18), isso é facilmente explicado
como uma evolução natural das imagens paulinas da igreja como um corpo
no qual os fiéis individualmente constituem seus membros (Rm 12.4-8; 1Co
6.15; 12.12-21) e sua insistência de que Jesus é o Messias, o governante
divinamente nomeado do povo de Deus (Rm 1.1-4) e o novo senhor dos
fiéis (1Co 7.22). Quanto à escatologia, ninguém duvida que em Colossenses
Paulo enfatizou o aspecto “já” da escatologia mais do que o aspecto “ainda
não”, mas ambos são encontrados nesta carta e nas suas cartas
incontestes.167
Quarto, os argumentos relacionados a linguagem e estilo não são
convincentes. P. N. Harrison, que utilizou análise estatística de palavras
para refutar a autoria paulina das pastorais, descobriu que Colossenses fica
dentro da faixa normal de hapax legomena em comparação com as outras
cartas de Paulo.168 Além disso, G. U. Yule argumentou que para determinar

1236
a autoria com base no vocabulário são necessárias amostras de pelo menos
10 mil palavras similares em tamanho e assunto.169 Colossenses é muito
curta para que a estatística de palavras possa determinar a identidade do
autor com algum grau de confiança. Muitas das palavras em Colossenses
que não aparecem em nenhuma outra passagem nas cartas incontestáveis de
Paulo aparecem na LXX ou em outros livros do NT, mostrando que o
vocabulário teria sido conhecido a um falante de grego no primeiro século
que estivesse familiarizado com a LXX e utilizasse, de forma ampla, o
vocabulário cristão. A maior parte do vocabulário que não é comum para
Paulo aparece tanto no hino em Colossenses 1.15-20, possivelmente pré-
paulino, ou no seu tratamento da heresia de Colossos, que é exatamente o
que seria esperado.170 Muitas das palavras incomuns podem ser explicadas
pela ocasião da carta. Paulo provavelmente usou algumas palavras do
vocabulário diferenciado dos hereges colossenses no esforço de combater
essa heresia.
Um dos pontos fracos das rejeições da autoria paulina com base no
vocabulário e estilo é que tais repúdios tendem a analisar apenas as
diferenças entre Colossenses e outras cartas paulinas e ignorar o número
significativo de semelhanças entre esses documentos. Por outro lado, W. G.
Kümmel encontrou várias características do estilo de Colossenses que
aparecem no NT apenas nas cartas paulinas.171 Finalmente, essas rejeições
muitas vezes não levam em conta o grau de influência que um coautor
como Timóteo pode ter sobre o vocabulário e o estilo da carta.172 Assim
sendo, o vocabulário e o estilo de Colossenses não são motivos válidos para
a rejeição da autoria paulina.

Conclusão

1237
A defesa da autenticidade é normalmente formulada como uma resposta à
rejeição da autoria paulina. Embora essas respostas sejam importantes em
si, é preciso não adotar uma abordagem meramente defensiva sem avançar
o argumento em termos positivos. A autoria paulina repousa essencialmente
na força de quatro colunas: (1) a alegação de autenticidade da própria carta;
(2) a tradição ininterrupta ao longo da história da igreja; (3) as estreitas
conexões entre Colossenses e Filemom, uma carta que quase todos aceitam
como autêntica;173 e (4) as questões em torno da prática e aceitação da
pseudonímia.

Data
É difícil determinar a data de Colossenses com precisão, especialmente
porque isso depende da autoria e proveniência da carta. Se foi escrita por
Paulo em Cesareia ou Éfeso, a carta tem uma data em algum momento da
década de 50. Se escrita por Paulo em Roma, então é preciso colocar a
composição da carta por volta de 58-60, de acordo com a cronologia de
Paulo sugerida neste livro.174 Se a autenticidade de Colossenses for
rejeitada, então deve ser datada por volta de 70-100. No entanto, essa data
posterior é problemática por causa do terremoto que presumivelmente
destruiu Colossos em 60-61.175

Origem
Muitas dificuldades também cercam a origem da carta.176 O debate sobre a
proveniência da carta claramente começou nos tempos antigos. Embora
subscrições em muitos manuscritos, incluindo o Alexandrino (séc. V) e o
primeiro corretor do códice Vaticano, atribuam a carta a Roma, e nenhuma

1238
subscrição sugira outra proveniência, o Prólogo de Marcião (c. 160-180)
afirma que a carta foi escrita em Éfeso.
A presença de Lucas, Aristarco, Timóteo e outros colaboradores com
Paulo na época da escrita é pista importante da proveniência de
Colossenses.177 A presença de Lucas parece dar suporte à hipótese romana
porque Atos mostra Lucas com Paulo em Roma, embora o ministério de
Paulo em Éfeso não seja uma das passagens “nós” em Atos.178 Atos 27.2
também indica que Aristarco acompanhou Paulo na jornada à Itália e muito
provavelmente por todo o caminho até Roma. Embora Atos não mencione a
presença de Timóteo em Roma, a narrativa de Atos termina sem identificar
pelo nome todas as pessoas que visitaram Paulo em Roma durante sua
prisão domiciliar. À luz da estreita relação compartilhada por Paulo e
Timóteo, era de se esperar que Timóteo visitasse Paulo em algum momento
durante a prisão romana de dois anos. Apesar de bons argumentos
favorecerem Éfeso, o equilíbrio da evidência favorece uma proveniência
romana.

Destino
O destino não está em debate. J. D. G. Dunn pôde dizer que “não há
discussão a respeito de aonde e para quem a carta foi dirigida: ‘aos santos
em Colossos’”.179 J. B. Lightfoot forneceu uma riqueza de informações
sobre Colossos.180 A cidade tinha uma população mista composta de frígios,
romanos envolvidos em assuntos políticos e judeus da diáspora. Embora
ninguém saiba quando a cidade foi fundada, Heródoto se referiu a Colossos
como a “grande cidade da Frígia” já em 480 a.C. A grandeza da cidade era
devido à sua localização no vale do Lico (na atual Turquia) na principal

1239
estrada leste-oeste de Éfeso para o oriente.181 O exuberante vale do Lico
provia muito alimento para pastoreio de ovinos, e a lã das ovelhas
sustentava uma grande indústria têxtil.182
Duas cidades vizinhas, Hierápolis e Laodiceia, ofuscavam Colossos em
importância, na época de Paulo. Os romanos fizeram de Laodiceia o
conventus (capital em um distrito de 25 cidades) e mudaram o sistema
viário para que ela ficasse localizada na junção entre quatro outras estradas
e estrada principal leste-oeste. Embora Laodiceia prosperasse como um
centro comercial, Hierápolis cresceu como um local de luxo e prazer por
causa de suas termas minerais. Estrabão, escrevendo cerca de 20 anos antes
de Paulo, testemunhou a diminuída importância de Colossos quando ele a
descreveu como uma “cidade pequena”. Como mencionado acima, o
desaparecimento de todas as três cidades veio na forma de um grande
terremoto em 60-61 (apesar de Laodiceia ter sido reconstruída; veja Ap
3.14-22).

Motivo
O motivo da carta é a questão introdutória mais complexa. Paulo abordou
um falso ensino que alguns têm chamado de “heresia de Colossos”. J. D. G.
Dunn fez objeção a essa nomenclatura e sugeriu que ela pode equivaler “a
pouco mais do que um xingamento vulgar e indigno”.183 I. K. Smith
respondeu acertadamente que a abordagem de Dunn a essa questão está fora
de sintonia com o mundo em que Paulo vivia, onde o ensino era chamado
de verdade ou erro.184
Uma questão ainda mais discutida do que nomenclatura é a identidade
dos mestres e seus ensinamentos. Os estudiosos têm notado algumas das

1240
marcas distintas do ensino por meio de uma “leitura em espelho” de
Colossenses. No nível formal, ele é identificado como uma “filosofia” que
tem uma história antiga de suporte na “tradição humana” (2.8). É mais
difícil detectar certas palavras-chave dessa filosofia em Colossenses, mas
algumas expressões se destacam: “toda a plenitude” (2.9), “insistindo em
práticas ascéticas e no culto aos anjos” (2.18); “alegando acesso a uma
esfera visionária” (2.18), “não toques, não prove, não manuseies” (2.21) e
“práticas ascéticas, humildade e severidade para com o corpo” (2.23).
Parece também haver uma ênfase na circuncisão, leis alimentares, Sábados
e regulamentos de pureza (2.11,13,16,20,21).
Os estudiosos analisaram esses padrões e tentaram localizar um grupo
ou movimento no primeiro século que atendesse a todos os critérios. Era
notoriamente difícil identificar os oponentes de Paulo com precisão, assim a
enorme quantidade de propostas acadêmicas não deve surpreender o leitor.
Em 1973, J. J Gunther catalogou 44 diferentes reconstruções da heresia de
Colossos, e dezenas de novas reconstruções foram propostas desde a obra
de Gunther.185 M. D. Hooker pôs em dúvida todo este empreendimento logo
no início ao negar a existência de ataques da parte dos falsos mestres. Ela
sugeriu que o problema vinha de dentro da congregação, à medida que os
Colossenses corriam o perigo de se conformar às crenças e práticas dos seus
vizinhos pagãos e judeus.186 Essa proposta não foi bem recebida porque
ignora pronomes-chave (2.8,16,18), não consegue explicar o uso que Paulo
fez do termo “filosofia” (2.8), e minimiza algumas óbvias palavras-chave
da filosofia.187
A obra mais atualizada que dá um panorama acadêmico é a de I. K.
Smith. Smith pesquisou quatro propostas principais: (1) judaísmo essênio e
gnosticismo, (2) helenismo, (3) paganismo e (4) judaísmo. Esse arranjo é

1241
pedagogicamente instrutivo, mas as categorias não são estanques uma vez
que muitas reconstruções misturam temas de duas ou mais categorias.
J. B. Lightfoot é um defensor da primeira proposta. Ele defendeu uma
linha de desenvolvimento do judaísmo ao gnosticismo do século II e situou
a filosofia colossense dentro dessa corrente. Lightfoot via a ênfase de
Colossenses no misticismo e no ascetismo rígido como decorrentes do
judaísmo essênio, enquanto o gnosticismo contribuía para o foco de
Colossenses na sabedoria, nos seres intermediários e na especulação
cosmológica. A descoberta dos Manuscritos do Mar Morto levou mais
estudiosos a concluir que a filosofia colossense tinha conexões com o
judaísmo essênio.
A segunda categoria ampla é a do helenismo. As propostas nessa
categoria são variadas e incluem: (1) cultos de mistério helenísticos (M.
Dibelius), (2) gnosticismo judaico e paganismo (G. Bornkamm), (3)
Platonismo médio (R. E. DeMaris) e (4) Filosofia cínica (T. Martin). M.
Dibelius via um sincretismo entre o cristianismo e um culto de mistério
isíaco com sua prática de iniciação em um mistério cósmico associado com
“os elementos”. Ao passo que Dibelius foi criticado por minimizar as claras
características judaicas do erro colossense, Bornkamm viu um sincretismo
de gnosticismo judaico e paganismo.188 Especificamente, Bornkamm
teorizou que a filosofia colossense prometia redenção e deificação em
termos gnósticos, proclamados na Liturgia de Mitras e no Mistério de Ísis
encontrados em Apuleio e no Corpus Hermeticum.
R. E. DeMaris propôs um sincretismo de elementos de platonismo
médio, judaísmo e cristianismo.189 DeMaris declarou que os proponentes da
filosofia eram gentios “de tendências filosóficas” que buscavam o
conhecimento ou sabedoria divina e, portanto, foram atraídos pelas

1242
respostas análogas do judaísmo e depois do cristianismo. Ele apontou para
as semelhanças entre a filosofia helenística e a filosofia colossense,190 mas
não deu a devida atenção aos elementos judaicos distintivos da circuncisão
e do Sábado. T. Martin ofereceu uma nova interpretação da situação em
Colossos. Ele detectou uma abordagem que se assemelhava a uma crítica
cínica de certas práticas, como a eucaristia e o calendário ritual. Assim, os
cínicos não forçaram os colossenses a se juntar a um outro grupo religioso;
eles simplesmente zombavam dos pontos de vista que os colossenses já
defendiam.191
C. E. Arnold presentou o argumento mais convincente para a terceira
proposta. Ele identificou a filosofia colossense como um sincretismo de
crenças populares frígidas, judaísmo popular local e cristianismo.192 A
atenção que Arnold dá à evidência do contexto local, especialmente a
religião popular e os papiros mágicos, destaca sua proposta das outras.193
A quarta proposta difere das outras três ao considerar que cada aspecto
da filosofia se enquadra em certas formas de judaísmo.194 S. Lyonnet
contestou o pressuposto de contextos pagãos e salientou que todos os
aspectos da filosofia podem ter uma proveniência judaica. F. O. Francis
propôs que o modificador na expressão “culto de anjos” é um genitivo
subjetivo que denota o culto que os anjos prestam a Deus. Essa
interpretação tornou um contexto judaico para a filosofia uma posição
defensável porque o culto de anjos (genitivo objetivo) parecia comprometer
o monoteísmo judaico. A filosofia encorajava a prática de uma viagem
imaginária ao céu onde os místicos testemunhavam o culto angélico de
Deus. Práticas ascéticas preparavam esses visionários para sua viagem
mística. T. J. Sappington identificou o erro como a piedade ascético-mística
do apocaliptismo judaico.

1243
F. F. Bruce estreitou ainda mais esse grupo apocalíptico judaico a uma
vertente em particular: misticismo Merkabá.195 Esse misticismo está
associado com a visão do trono de Deus e do carro celestial debaixo dele
(Ez 1.4-28). O arrebatamento do místico atravessando os céus para
participar na liturgia angélica e ver o carro trono de Deus exigia a
observância meticulosa das minúcias da lei Mosaica, ascetismo e o
apaziguamento de mediadores angélicos.196
A avaliação de I. K. Smith é atraente porque parece encontrar o
equilíbrio certo. Smith deu os motivos por que algumas propostas são
“becos sem saída”. A primeira abordagem é um beco sem saída temporal e
geográfico. Por exemplo, o gnosticismo desenvolvido tem data posterior a
colossenses, e o judaísmo essênio em Qumran está geograficamente muito
distante do vale do Lico.197 O segundo grupo de propostas ou desvaloriza os
elementos distintivos da filosofia judaica (p. ex., a circuncisão e o Sábado)
ou se baseia, novamente, nas ideias gnósticas que são posteriores a
colossenses (por exemplo, Bornkamm).
De acordo com Smith, a categoria três é plausível, mas também se
revela um beco sem saída por três razões principais: (1) Colossos nunca foi
escavada;198 (2) a proposta de Arnold é baseada muito mais nas informações
contextuais do que na exegese;199 e (3) grande parte do material de Arnold
pós-datam Colossenses.200 Embora as propostas na categoria quatro sejam
mais corretas, Smith diz que algumas são insuficientes porque tendem a
tratar os stoicheia como princípios ou leis impessoais em vez de seres
pessoais.201
A proposta de Smith situa a filosofia firmemente na vertente do
judaísmo apocalíptico. Ele alegou que existem fortes afinidades entre a
filosofia e o misticismo Merkabá, embora o misticismo Merkabá como um

1244
sistema provavelmente seja posterior a Colossenses. Smith apontou para a
evidência escrita, como a literatura enoquiana, Apocalipse e os
arrebatamentos místicos judaicos, para mostrar a importância
contemporânea dos arrebatamentos místicos, argumentando que a existência
de evidência escrita anterior e contemporânea a Colossenses mostra que o
erro colossense foi influenciado pelos movimentos místicos judaicos. Ele
também alegou que os stoicheia eram anjos caídos e seu domínio seria o
mundo. Os errados não os aplacavam nem os invocavam, eles procuravam
escapar de seu domínio por meio de um arrebatamento celestial.202
A proposta de Smith é provavelmente a opção atual mais satisfatória,
mas não dá conta da distinção entre arrebatamentos voluntários e
involuntários. Embora alguns textos demonstrem uma fascinação de alguns
dos contemporâneos de Paulo com o arrebatamento celestial, descrições de
arrebatamentos involuntários de Enoque, o vidente do Apocalipse, ou
mesmo do próprio Paulo não demonstram que os místicos contemporâneos
procuravam experimentar esses arrebatamentos por meio de transes
autoinduzidos como acontece no desenvolvido misticismo Merkabá.203
Talvez tudo que se pode concluir neste momento é que Paulo enfrentou
algum tipo de misticismo judaico. Essa abordagem mística poderia ser
chamada de misticismo incipiente ou proto-Merkabá, da mesma forma que
os estudiosos do NT identificam vertentes de protognosticismo ou
gnosticismo incipiente.

Propósito
Embora a discussão de Smith sobre a ocasião de Colossenses seja a mais
satisfatória, ele superestimou a importância de ter uma opinião definitiva

1245
sobre a ocasião para a correta interpretação da carta. Smith insistiu que
conhecer a situação é essencial para compreensão da resposta de Paulo, mas
muitos estudiosos que discordam sobre a ocasião ainda concordam sobre as
principais linhas da resposta de Paulo. Pode-se ver facilmente que
Colossenses serve como uma correção cristocêntrica aos errados de
Colossos, sejam ou não conhecidos todos os detalhes de seus erros.
Em outras palavras, podemos ser capazes de interpretar o texto com
maior precisão quando equipados com uma clara compreensão do contexto
da carta, mas ainda podemos compreender a resposta geral
independentemente do contexto. Por exemplo, a maioria dos estudiosos
reconhecem que Paulo apresenta pelo menos três pontos principais em
Colossenses: (1) toda plenitude habita no Cristo preeminente (1.15-20); (2)
os fiéis são completos em Cristo (2.10); e, portanto, (3) eles devem procurar
conhecer melhor a Cristo em sua plenitude, buscando as coisas de cima,
onde ele habita, não as coisas da terra (3.1,2). As questões contextuais
podem ajudar a esclarecer a repreensão de Paulo. Por exemplo, se Paulo
estava respondendo a arrebatamentos místicos em Colossenses, a ironia é
que “o desejo deles de testemunharem o culto prestado pelos anjos não é
uma busca das coisas celestiais, mas mundanas, pois tem o foco nos
regulamentos que estão destinados a perecer”.204 Ele é também carnal pois
esses arrebatamentos e as visões associadas a eles não oferecem ajuda para
superação da carne, porque levam ao elitismo espiritual e a divisões.

LITERATURA
Plano Literário

1246
W. Bujard classificou Colossenses como uma carta escrita com o propósito
de exortação e encorajamento.205 M. Wolter examinou a carta em termos
epistolares. A estrutura proposta por ele consiste em cinco partes:

1. Pré-escrito (1.1, 2)
2. Proömium (1.3-23)
3. Autoconceito do apóstolo (1.24 a 2.5)
4. Corpo da carta (2.6 a 4.6)
5. Conclusão epistolar (4.7-18)

Wolter também analisou o corpo da carta quanto à retórica em quatro


partes: (1) partitio (2.6-8); (2) argumentatio (2.9-23), que inclui (2a)
probatio (2.9-15) e (2b) refutatio (2.16-23); (3) peroratio (3.1-4); e (4)
exhortatio (3.5 a 4.6).206
A análise de Wolter é de certo modo artificial e arbitrária. Isso é
especialmente verdade quando ele separa 2.8 de 2.9. Os comentaristas
quase universalmente veem esses dois versículos como parte da mesma
unidade textual. Parece muito melhor dividir o texto por categorias
epistolares que se conformem à tendência paulina comum de começar com
uma seção doutrinária e terminar com uma seção parenética (exortativa).

ESTRUTURA
I. Introdução (1.1-8)
A. Abertura (1.1,2)
B. Ação de graças (1.3-8)

II. Corpo: a supremacia e onissuficiência de Cristo (1.9 a 4.6)


A. A centralidade de Cristo e a heresia colossense (1.9 a 2.23)

1247
1. Oração de abertura (1.9-14)
2. A supremacia de Cristo (1.15-20)
3. A reconciliação dos fiéis com Deus por meio de Cristo (1.21-23)
4. Paulo como um ministro do mistério de reconciliação (1.24 a 2.5)
5. Advertência contra sucumbir à heresia dos colossenses (2.6-23)
B. A vida nova dos fiéis em Cristo (3.1 a 4.6)
1. Buscar as coisas de cima (3.1-4)
2. Matar as coisas terrenas (3.5-8)
3. Despir-se do velho eu e revestir-se do novo eu (3.9-11)
4. Estender a graça e perdão aos outros (3.12-17)
5. Pôr a família cristã sob o domínio do senhorio de Cristo (3.18 a
4.1)
6. Encorajamento à oração e interação circunspecta com incrédulos
(4.2-6)

III. Encerramento (4.7-18)


A. Recomendação de Tíquico e Onésimo (4.7-9)
B. Saudações dos colaboradores de Paulo (4.10-14)
C. Instruções finais (4.15-17)
D. Saudações finais e benção (4.18)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Introdução (1.1-8)
A introdução da carta de Paulo aos Colossenses consiste em uma declaração
de abertura (1.1,2) e uma seção de ação de graças (1.3-8).

1248
A. Abertura (1.1,2)
Paulo abriu a carta com a costumeira identificação do autor, destinatários e
uma saudação de graça.

B. Ação de graças (1.3-8)


Paulo ofereceu uma ação de graças pela fé, amor e esperança dos
colossenses (1.4,5), de que ele tinha sido informado por Epafras, que
aparentemente tinha fundado a igreja de Colossos (1.7). Paulo também se
alegrou pela propagação do evangelho entre os colossenses (1.5,6) e, para
além deles, no mundo inteiro (1.6).

III. Corpo: A Supremacia e Onissuficiência de


Cristo (1.9 a 4.6)
A. A centralidade de Cristo e a heresia dos
colossenses (1.9 a 2.23)
Paulo começou o corpo da carta com uma oração para que Deus enchesse
os colossenses com o pleno conhecimento da vontade de Deus (1.9) e que o
transbordar desse conhecimento resultasse em uma forma digna de vida,
isto é, um estilo de vida moral e ético que fosse agradável ao Senhor. Esse
estilo de vida é caracterizado pela frutificação em toda boa obra, pelo
contínuo crescimento no conhecimento de Deus, por ser fortalecido pelo
seu poder para a perseverança e por alegremente dar graças ao Pai (1.10-
12). Deus é digno de ação de graças por ter capacitado os cristãos a
participarem da herança dos santos na luz, por resgatá-los do domínio das

1249
trevas e por transportá-los para o reino do seu Filho amado (1.12,13), em
quem eles têm o perdão dos pecados (1.14).
Paulo enfatizou a supremacia de Cristo em 1.15-20.207 A estrutura da
passagem é debatida, mas a maioria dos estudiosos reconhece dois pontos
estruturais centrais: (1) Cristo como cabeça da criação (1.15-17); e (2)
Cristo como cabeça da Igreja (1.18-20).208 Essa surpreendente supremacia
de Jesus é vista não apenas em seu senhorio sobre a criação e sobre a igreja,
mas também em sua igualdade com Deus: ele é a imagem do Deus invisível
(1.15), e toda a plenitude da divindade habita nele (1.19; 2.9). Porque Jesus
está acima de tudo, ele tem o primeiro lugar em tudo (1.18), e assim Deus
efetua a reconciliação cósmica de todas as coisas consigo mesmo por meio
de Cristo (1.20).
Paulo passou da ampla reconciliação de todas as coisas em Cristo para a
reconciliação específica dos fiéis com Deus por meio de Cristo (1.21-23).
Os leitores de Paulo estavam anteriormente alienados de e hostis a Deus,
mas agora Deus os havia reconciliado por meio do corpo de sua carne, pela
morte, a fim de que os fiéis pudessem permanecer santos e irrepreensíveis
diante de Deus (1.21,22). Essa gloriosa obra de salvação é uma realidade
apenas naqueles que perseveram até o final na fé e na esperança do
evangelho que ouviram e que Paulo proclamou como um ministro (1.23).
Paulo ampliou sua própria contribuição única como um ministro do
mistério de reconciliação (1.24 a 2.5). Ele enfatizou seu papel único como
um sofredor para (1.24) e administrador do (1.25) mistério, outrora oculto,
mas agora manifesto (1.26), das boas novas de Deus para os gentios:
“Cristo em vós, a esperança da glória” (1.27). Paulo proclamou Cristo a
todos, para que todos pudessem ser apresentados perfeitos em Cristo (1.28),

1250
uma tarefa para a qual ele foi capacitado por Deus a fim de poder realizá-la
(1.29).
O apóstolo também informou seus leitores de sua luta por eles, para que
eles e outros (2.1) tivessem a plena certeza no conhecimento do mistério de
Deus, isto é, Cristo (2.2), em quem estavam todos os tesouros da sabedoria
e do conhecimento (2.3). Esse lembrete servia como uma proteção contra a
força enganadora do ensino falso (2.4), e Paulo se alegrou por ver a firmeza
deles na fé (2.5).
Colossenses 2.6-23 constrói sobre esse ensino, estabelecendo as suas
implicações para os leitores. Os versículos 6 e 7 mostram que eles deveriam
andar no Cristo que receberam e no qual tornaram-se arraigados e
edificados. O versículo 8 diretamente adverte contra o cativeiro à filosofia
dos errados e às sutilezas vazias. A resposta de Paulo primeiramente foi
repetir seu argumento anterior: toda a plenitude da divindade habita
corporalmente em Cristo (2.9, veja 1.19). Paulo aplicou isso ao crente em
2.10: portanto, aqueles que estão em Cristo “foram tornados completos”
(NASB). Em outras palavras, se toda a plenitude habita em Cristo, e o fiel
está em Cristo, então o fiel é completo em Cristo e não precisa de nenhum
suplemento. Assim como na matemática não se pode acrescentar nada ao
infinito, também no reino espiritual nada pode ser acrescentado a Cristo,
que é infinito.

Algo Para Pensar: Apresentando Todo Homem


Maduro em Cristo

1251
Qual era o objetivo de Paulo no ministério? Ele nos conta em
Colossenses: “A ele anunciamos, aconselhando e ensinando todo
homem com toda sabedoria, para que apresentemos todo homem
maduro em Cristo. Para isso eu trabalho, lutando de acordo com Sua
eficácia, que atua poderosamente em mim” (1.28,29, grifo nosso).
Foi isso que Jesus disse que deveria ser o objetivo de seus seguidores
na Grande Comissão: “Ide, portanto, e fazei discípulos de todas as
nações, batizando-os […]; ensinando-os a obedecer a todas as coisas
que vos ordenei” (Mt 28.19,20, grifo nosso). Da mesma forma,
quando alguns aparentemente acreditavam em Jesus, ele não se
impressionava e os desafiava: “Se permanecerdes na minha palavra,
sereis verdadeiramente meus discípulos” (Jo 8.31), e mais tarde
Jesus elaborou sobre o que significa “permanecer” nele (Jo 15.1-8).
Seríamos eu e você seguidores de Jesus Cristo — isto é,
seguidores próximos — ou o estaríamos seguindo a distância?
Nossas vidas estariam tão profundamente transformadas que
pudéssemos dizer com Paulo: “Já estou crucificado com Cristo; e eu
não mais vivo, mas é Cristo quem vive em mim. A vida que vivo
agora na carne, vivo pela fé no Filho de Deus, que me amou e se
entregou por mim” (Gl 2.19,20)? Estamos tomando como exemplo
normal e habitualmente o Espírito Santo interiorizado como guiados
pela Palavra de Deus ou outras pessoas, até mesmo cristãos, ou o
mundo que nos rodeia? Somos dirigidos por profundas convicções e
compromissos interiores incutidos pela nossa fidelidade a Cristo ou
somos, nas palavras de Paulo, “levados ao redor por todo vento de
ensino” (Ef 4.14; também Tg 1.6)?

1252
Novamente, as palavras de Paulo em Colossenses são
maravilhosamente reconfortantes e animadoras: “Portanto, assim
como recebestes Cristo Jesus, o Senhor, andai nele, arraigados e
edificados nele e confirmados na fé, como fostes ensinados, e
transbordando com ações de graças” (2.6,7, grifo nosso). Além
disso, nosso foco não deve ser apenas para dentro, no nosso próprio
amadurecimento como fiéis, mas também para fora, quando levamos
outros ao verdadeiro discipulado cristão e os ajudamos a
amadurecer em Cristo. Será que estamos, você e eu, envolvidos em
diferentes, comprometidos e protetores relacionamentos de
aconselhamento com vários companheiros crentes específicos? Essa
era claramente a prática de Jesus e de Paulo. Jesus tinha os doze, e
Paulo teve seu círculo de colaboradores próximos, incluindo
Timóteo. Com Paulo, portanto, vamos lutar “para apresentar todo
homem maduro em Cristo” (1.28).

Paulo colocou o foco na grande mudança espiritual que a cruz de Cristo


tinha efetuado para os fiéis em sua união com ele na sua crucificação,
sepultamento e ressurreição (2.11,12). Deus concedeu a eles uma nova vida,
mesmo quando estavam mortos em transgressões (2.13), que ele perdoou e
cancelou cravando o título de dívida do pecador na cruz (2.14). A cruz de
Cristo também, de forma completa e pública, expôs a derrota das forças do
mal alinhadas contra os fiéis (2.15). A supremacia da pessoa e obra de
Cristo enfraqueceu severamente os falsos mestres e sua mensagem.
Portanto, eles não precisam se preocupar em completar sua fé cristã com a
lei cerimonial (2.16,17), auto-humilhação, culto angelical, vangloriando-se
em visões (2.18,19), ou decretos humanos (2.20-23).

1253
B. A nova vida dos fiéis em Cristo (3.1 a 4.6)
Paulo edificou sobre o indicativo fundacional concernente à pessoa e obra
de Cristo ao adicionar o imperativo chamado para pôr cada área da vida sob
aquele senhorio. O escopo cósmico do senhorio de Cristo deve agora ser
aplicado a cada fiel individualmente ao buscar as coisas de cima (3.1-4), e
sentenciar as coisas terrenas à morte (3.5-8). Os fiéis devem matar suas
antigas ações, porque eles se despiram do velho eu e se revestiram do novo
(3.9-11). Além do mais, porque eles experimentaram a graça perdoadora de
Cristo, eles agora podem expressar essa mesma graça aos outros (3.12-17).
Paulo também exortou seus leitores a trazerem a família cristã sob o
domínio do senhorio de Cristo (3.18 a 4.1). Ele concluiu a seção imperativa
centrando-se na oração (4.2-4) e na interação com as pessoas de fora
(4.5,6).

IV. Encerramento (4.7-18)


Paulo concluiu a carta de quatro maneiras:
A. Recomendação de Tíquico e Onésimo (4.7-9). Primeira, Paulo
informou aos colossenses que Tíquico e Onésimo (o escravo fugitivo e
convertido, mencionado em Filemom), que estavam encarregados de levar a
carta de volta para a igreja em Colossos, iriam informá-los sobre sua
situação atual.
B. Saudações pessoais dos colaboradores de Paulo (4.10-14). Segunda,
Paulo repassou alguns cumprimentos pessoais de seus colaboradores,
incluindo Aristarco, Marcos, Jesus Justus, Epafras, Lucas e Demas.
Notavelmente, dois dos quatro evangelistas estão com Paulo neste ponto em
seu ministério, visitando-o na prisão.

1254
C. Instruções finais (4.15-17). Terceira, Paulo deu instruções finais
sobre a igreja em Laodiceia, uma reunião da igreja na casa de uma senhora
chamada Ninfa, e um certo Arquipo (veja Fm 2).
D. Saudação final e bênção (4.18). Quarta, Paulo saudou os
colossenses, assinando a carta com sua própria mão e oferecendo uma
bênção de graça no encerramento.

TEOLOGIA
Temas Teológicos
A supremacia de Cristo
A teologia de Colossenses é cristocêntrica porque Paulo coloca o foco
especialmente na pessoa e obra de Cristo. Colossenses insiste na
supremacia absoluta de Cristo sobre todas as coisas. A supremacia de Cristo
aparece em primeiro plano principalmente em 1.15-20, que contém uma das
mais exaltadas descrições de Cristo no NT.
A maioria dos estudiosos reconhece 1.15-20 como um hino cristão pré-
paulino.209 A estrutura do hino ainda é muito debatida.210 A melhor análise
sugere que o hino se divide em duas estrofes principais começando com as
palavras “quem é” (hos estin, traduzidas como “Ele é” na A21 nos v. 15 e
18) e contendo a palavra “primogênito” (prōtotokos) na segunda linha.
Essas duas estrofes principais também são paralelas entre si nas expressões
“porque por Ele” e “Pois […] nEle” (hoti en autō; v. 16,19); e “todas as
coisas […] por meio dEle” e “por meio dEle […] tudo” (ta panta di’ autou;
v. 16,20).211 Assim, o hino provavelmente tem duas seções principais,
retratando Cristo como Senhor na criação e Senhor na nova criação.

1255
O hino parece adaptar e desenvolver descrições da sabedoria
personificada, do Logos (“Verbo”) divino, e do Espírito que aparecem em
vários textos judeus antigos de uma maneira nova. Essas descrições
retratam a sabedoria, o Logos, ou o Espírito como o “formador de todas as
coisas” que “atravessa e penetra todas as coisas”, uma “emanação da glória
do Todo-poderoso”, uma “imagem de sua bondade” que “renova todas as
coisas” e “ordena bem todas as coisas” e “aquele que mantém unidas todas
as coisas”.212 O hino empresta elementos desse simbolismo para apresentar
Jesus como a encarnação da divindade.
Primeiro, Paulo descreveu Jesus como a “imagem do Deus invisível”
(1.15). Embora Paulo em outras passagens descrevesse os seres humanos
como “imagem e glória de Deus” (1Co 11.7) contra o pano de fundo de
Gênesis 1, sua linguagem aqui claramente implica muito mais do que Jesus
ter sido apenas um homem perfeito que manifestou a imagem de Deus, que
tinha sido manchada pela queda e que se manifestava em outros seres
humanos. Colossenses 3.10 desenvolve a afirmação em 1.16 ao descrever
Jesus como o Criador, em cuja imagem os fiéis estão sendo renovados. Isso
sugere que Jesus era a imagem de Deus, em consonância com a criação
original da humanidade por Deus em Gênesis 1.26,27.
Embora uns poucos estudiosos tenham tentado explicar a expressão “a
imagem de Deus” apenas contra o pano de fundo de Gênesis 1, a maioria
reconhece que a expressão derivou da literatura da sabedoria que adaptou
temas de Gênesis 1 para descrever a sabedoria personificada.213 Na
literatura da sabedoria a palavra imagem se refere a uma manifestação
visível ou a uma expressão tangível dos atributos de Deus. Por exemplo, a
obra interstamentária da Sabedoria descreve sabedoria como “um reflexo da
luz eterna, um espelho sem manchas do operar de Deus, e uma imagem de

1256
sua “bondade” (Sab 7.26). Contra esse pano de fundo, a linguagem de Paulo
apresenta Jesus como a forma visível do Deus invisível.
A descrição de Jesus como a imagem de Deus é rara nas cartas de
Paulo, ocorrendo em outra passagem apenas em 2Coríntios 4.4. Ali, a
descrição de Jesus como “a imagem de Deus” aparece junto de uma
referência à identidade de Jesus como “Senhor”, da “glória” de Cristo, da
criação da luz em Gênesis 1, e da glória de Deus resplandecendo na face de
Jesus. Paulo provavelmente estava refletindo sobre a aparência de Jesus
durante seu encontro com Cristo na estrada de Damasco. Atos 9.3 diz que,
quando Paulo se aproximava de Damasco, “uma luz vinda do céu
repentinamente brilhou ao redor dele”. Paulo reconheceu essa luz brilhante
como o Cristo ressuscitado e exaltado. Ele caiu por terra protegendo seus
olhos do intenso e ardente esplendor, em tempo de salvar sua vida, mas não
rápido o suficiente para salvar sua visão. Para sua surpresa, a voz que lhe
falava da glória divina era a voz de Cristo: “Eu sou Jesus, a quem
persegues” (At 9.5). Provavelmente, esse foi o momento que definiu muitos
aspectos da soteriologia e da cristologia de Paulo — Jesus era a forma
visível do Deus invisível que irradiava a glória divina.214
Se a heresia colossense foi influenciada pelo incipiente misticismo
Merkabá como sugerem os indícios da carta, essa descrição de Jesus pode
estar abordando a heresia diretamente. Uma das motivações do
arrebatamento místico era o desejo de ver a Deus e saber como ele se
parecia. J. H. Laenen escreveu:

Depois que a pessoa que descera ao Merkavah tinha passado todos os testes depois de uma
longa e difícil jornada através dos reinos celestiais, ela finalmente atingia o objetivo de sua
jornada: a visão do Santo em seu trono de glória. Aqui, no sétimo palácio do sétimo céu,
Deus, o rei santo, que tinha descido de uma área desconhecida da humanidade, tinha tomado
seu lugar em seu trono de glória. O viajante fica totalmente dominado pela visão dos

1257
mistérios do trono divino. O Santo estava vestido em vestes celestiais deslumbrantes,
radiante com branca luz, e usava uma coroa que brilhava com raios de luz.215

A ideia de Paulo pode ser a de que os fiéis não precisam subir


atravessando os céus para ver Deus em sua forma visível. Deus já revelou
sua glória aos fiéis na face de Cristo, a manifestação visível do Deus
invisível.
Depois de identificar Jesus como a imagem de Deus em consonância
com a criação original da humanidade por Deus à sua imagem, Paulo
continuou com uma explicação do envolvimento de Jesus na criação. Jesus
é o “primogênito de toda a criação” (1.15). O genitivo modificador “de toda
a criação” gerou uma enorme controvérsia na igreja antiga. Ário interpretou
a expressão como um genitivo partitivo e viu Jesus como uma parte da
criação e, portanto, um ser criado. Algumas seitas arianas modernas, como
as Testemunhas de Jeová, ainda usam essa passagem para afirmar que
Cristo era um ser criado e não o Filho eterno de Deus.
Essa análise, entretanto, está redondamente enganada. Quando um
substantivo genitivo modifica um título de autoridade, o genitivo é
tipicamente um genitivo de subordinação que identifica o reino sobre o qual
a figura de autoridade reina. Devido ao princípio de primogenitura (o
direito do primogênito), o título “primogênito” é esse título de autoridade.
O título “primogênito” tipicamente descrevia alguém que tinha a
supremacia na posição hierárquica por causa de sua prioridade em
antiguidade.216 O título pleno significa que, já que Jesus existia antes da
criação, ele tem autoridade sobre a criação e é maior do que ela.217 Paulo
explicitamente descreveu Jesus como existindo antes da criação, em 1.17:
“Ele existe antes de todas as coisas.”218 Jesus existia antes de o primeiro
feixe de luz, da primeira gota de água, do primeiro grão de areia, da

1258
primeira folha de grama, e do primeiro homem e primeira mulher. Porque
ele existia antes de todas as coisas, ele tem autoridade sobre todas as coisas.
A palavra “primogênito” foi usada para falar de supremacia hierárquica
por todo o AT. Israel foi chamada de primogênito de Deus, o que significa
que a nação de Israel era a nação favorecida e exaltada por Deus. Davi é
chamado de “primogênito” de Deus: “Também farei dele meu primogênito,
o mais exaltado dos reis da terra” (Sl 89.27). Assim, quando Jesus é
chamado de “primogênito da criação”, isto significa que ele já existia antes
do ato da criação e que ele é o rei exaltado sobre toda a criação. Tudo que
existe deve responder a ele.
Paulo, então, explicou por que Cristo é supremo sobre toda a criação.
Em primeiro lugar, Jesus é o agente da criação. Ele é aquele por meio de
quem o Pai fez tudo que existe. Ele não criou só o universo material, o
mundo visível, ele também criou o mundo espiritual, incluindo os seres
angélicos de todos os tipos, dos quais quatro são tronos, dominações,
governantes e autoridades (1.16).219 Tronos, aparentemente, são os anjos
que atendem ao trono de Deus no mais alto dos céus. Se a heresia de
Colossos foi influenciada pelo incipiente misticismo Merkabá como sugere
a evidência abundante, deve ser significativo que esta seja a única
referência na literatura paulina aos “tronos”, uma categoria especial de
anjos que têm acesso à sala do trono celestial, o destino cobiçado do
arrebatamento Merkabá. No arrebatamento a Deus, os anjos servem como
guardiões para evitar intrusos. Deve-se apresentar selos a esses anjos para
conseguir acesso ao próximo nível celestial. Alguns desses selos eram
tagarelice hebraica ou nomes de anjos. Uma vez que esses anjos concediam
acesso a Deus, eles cumpriam a função essencial de um mediador, um papel
reservado somente a Cristo. Assim, o status dos anjos no misticismo

1259
judaico rivalizava com o papel de Cristo como único mediador entre Deus e
o homem. Paulo, entretanto, demonstrou a supremacia de Jesus em relação
aos mediadores angélicos, que supostamente tinham de ser apaziguados no
processo de arrebatamento místico, ao insistir que Jesus criou todos os seres
angelicais. Ele é Senhor sobre tudo, porque ele é o Criador de tudo.
Paulo acrescentou que Jesus é o propósito da criação: “Todas as coisas
foram criadas para ele” (1.16, tradução do autor). Cada coisa criada existe
para o prazer de Cristo e para sua glória. Jesus é também o sustentador da
criação: “por ele todas as coisas se mantêm unidas” (1.17). Ao contrário do
Criador retratado pelos deístas, ele não se limitou a criar o universo e
depois sentou-se e o observou funcionar, recusando-se sempre a intervir nos
processos mecânicos e automáticos que pôs em movimento. Em vez disso,
o Criador, que elaborou as leis físicas que regem o universo, sustenta
aqueles princípios pelo exercício ativo do seu poder. Se alguma vez ele
retirasse sua mão poderosa do universo, os planetas se desviariam do seu
curso para serem incinerados pelo sol. Os corpos celestiais colidiriam e se
desintegrariam. Pessoas e objetos seriam arremessados para fora do planeta
em seu giro na escuridão do espaço sideral. Não fosse pela sua poderosa
intervenção, o cosmos seria reduzido a um caos. Os gregos no passado
glorificavam o gigante Titã Atlas como alguém que estava em pé na borda
da Terra suportando o céu em seus ombros para que ele não caísse e
esmagasse os habitantes do mundo. Mas o poder atribuído a Cristo aqui faz
o mito da força de Atlas definhar em tamanho. Ele não é apenas aquele que
suspende o céu acima da terra; ele ordena e preserva todo o universo.
Paulo demonstrou a primazia de Cristo em todos os assuntos ao
exclamar que Jesus não era apenas o Senhor da criação; ele também é o
Senhor da nova criação. Ele é o cabeça da igreja em virtude da sua

1260
ressurreição dentre os mortos (1.18). A ressurreição de Jesus é a chave para
a transformação dos pecadores rebeldes no povo santo de Deus e da
promessa de redenção final. A qualificação de Jesus como o “primogênito
dentre os mortos” serve para identificá-lo como o início da Igreja, o
fundador de uma nova humanidade.
A descrição paulina da supremacia de Jesus culminou com uma
declaração surpreendente:
“Porque foi da vontade de Deus que toda sua plenitude habitasse nele”
(1.19). A palavra “plenitude” (plērōma) significa “a totalidade” ou
“inteireza”. Assim Paulo afirma que a totalidade ou inteireza de Deus
habitou em Cristo. Essa declaração foi posteriormente esclarecida por Paulo
em 2.9: “Pois nele habita corporalmente toda a plenitude da natureza de
Deus”. Não apenas uma parte de Deus, mas Deus na sua inteireza fez sua
casa no corpo de Jesus. Jesus não é Deus só parcialmente, mas
completamente. Tudo que faz de Deus Deus fez sua casa no corpo de Jesus
Cristo.
Esta certamente foi uma declaração surpreendente para os leitores dessa
carta que estavam familiarizados com o AT. O AT muitas vezes falou de
quão tremenda é a plenitude de Deus. Salomão disse que Deus é demasiado
grande para que o templo possa conter sua plenitude. Quando Salomão
dedicou a Yahweh o magnífico templo que tinha construído, ele orou e
disse: “Mas, na verdade, habitaria Deus com os homens na terra? Nem os
céus e o céus dos céus podem te conter, muito menos este templo que
edifiquei” (2Cr 6.18). Mas agora Paulo revelou o milagre de todos os
milagres; a plenitude de Deus que o templo, a terra e o próprio universo não
podiam conter, de bom grado residia no corpo de Jesus Cristo. É difícil
imaginar uma cristologia mais elevada do que essa.

1261
A obra de Cristo na salvação
O status de Cristo como Senhor sobre a igreja introduz uma questão a
respeito de sua obra. Como Paulo descreve a obra de Cristo em
Colossenses? Em uma palavra, a obra de Cristo é suficiente. Ele é aquele
que provê redenção, isto é, o perdão dos pecados (1.14). Redenção é o ato
de pagar um preço para libertar um escravo ou prisioneiro de guerra do
cativeiro ou para resgatar um criminoso da punição. Uma vez que Paulo
equiparou redenção com o perdão de pecados, ele aparentemente tinha em
mente o resgate de criminosos condenados.
Jesus é aquele que fornece reconciliação por meio do sangue da sua
cruz (1.20,22). Essa reconciliação é cósmica em escopo e inclui todas as
coisas criadas. O argumento de Paulo não é que todos os seres criados
entrarão em uma feliz comunhão com Deus, mas que Deus agiu pela morte
de Jesus para restaurar toda a criação a sua submissão pré-queda à
autoridade do Criador (1.20). A antiga inimizade do fiel com Deus foi
substituída pela submissão a e comunhão com Deus mediante sua própria
rendição voluntária. Outros que vivem em rebelião contra Deus acabarão
por se submeter à sua autoridade mediante a submissão forçada, assim
como as autoridades e poderes referidos em 2.15.
O fluxo de pensamento em 2.8-10 gloriosamente transmite a inteireza
do fiel em Cristo. Os fiéis não devem ser mantidos cativos por uma
“filosofia” que recomenda certos suplementos a fé em Cristo (2.8), porque
toda a plenitude da divindade se encontra em Cristo (2.9) e porque Cristo
possui toda a plenitude, os fiéis também são completos nele (2.10). Apesar
de estar morta em transgressões e incircuncisão, a humanidade recebe nova
vida em união com Cristo na sua morte, sepultamento e ressurreição (2.11-

1262
13). Essa nova vida resulta em uma transformação radical do caráter e do
comportamento do fiel.
Os fiéis experimentam o perdão de todas as transgressões. O certificado
espiritual de dívida que lista os pecados do transgressor e exige sua punição
foi pregado no topo da cruz de Jesus, bem no lugar onde os crimes da
vítima de crucificação eram normalmente listados (2.14). Isso demonstrava
que o próprio Cristo sofreu o castigo pelos pecados do fiel em seu lugar, de
modo que o fiel pudesse escapar à condenação que ele justamente merecia.
Por causa da morte substitutiva de Jesus, a lista de pecados do fiel foi
apagada, de modo que ele será declarado inocente no julgamento
escatológico. Esse “pensamento glorioso” faz com que tudo fique bem na
alma do fiel, porque, nas palavras de Horatio Spafford, “meu pecado […]
não em parte, mas no todo, está pregado na cruz e eu não o carrego mais,
louva ao Senhor, louva ao Senhor, ó minha alma!”.
A obra suficiente de Cristo capacita os fiéis a permanecer completos
mesmo contra as forças do mal (2.15).220 Cristo venceu os espíritos
demoníacos que se rebelaram contra a autoridade do Todo-Poderoso. “Ele
despojou-os de suas habilidades malévolas, assim como soldados
capturados são despojados de suas armas, e os conduziu em uma procissão,
como um general vitorioso conduz soldados derrotados para sua
execução.”221

QUADRO 14.1: O QUE É “A CIRCUNCISÃO


DE CRISTO” EM COLOSSENSES 2.12?
O significado da expressão “a circuncisão de Cristo” é debatido. Seria
o genitivo (1) objetivo (a circuncisão que Cristo recebeu), (2)

1263
subjetivo (a circuncisão que Cristo realiza), ou (3) possessivo (a
circuncisão que pertence a Cristo, isto é, a circuncisão cristã)?
Em geral, a primeira dessas opções (genitivo objetivo) parece ser a
leitura mais defensável. Essa abordagem entende a circuncisão como o
ato de morte, quando Cristo se despiu de seu corpo físico. P. T.
O’Brien defendeu o genitivo objetivo porque as expressões “despir o
1
corpo de carne” e “a circuncisão de Cristo” são paralelas. Essa leitura
interpretaria ambos os genitivos em um sentido objetivo de modo que
Paulo diria efetivamente: “O corpo da carne foi removido quando
Cristo foi circuncidado, ou seja, quando ele morreu”. O’Brien citou a
referência anterior à morte de Cristo em 1.22 como uma expressão
paralela a 2.11. Ele também afirmou que esse significado resulta em
um tema paulino conhecido (veja Rm 6.3,4; 1Co 15.3,4) de morte
(circuncisão), sepultamento e ressurreição.
T. R. Schreiner também entendeu a “circuncisão de Cristo” como a
morte de Cristo.2 Ele afirmou que a passagem se adequa ao argumento
de Gálatas em que Paulo disse que a cruz substituiu a circuncisão
como o novo ponto de entrada no povo de Deus. Portanto, “a nova
circuncisão para os fiéis é realizada na cruz”.3
A segunda opção (genitivo subjetivo), embora menos provável,
recebeu algum apoio devido ao paralelismo com “incircuncisão da
vossa carne”, no versículo 13. Paulo identificou “incircuncisão da
vossa carne” como algo que as pessoas que estão mortas em
transgressões possuem, de modo que a circuncisão “feita por Cristo”
deve ser algo que os fiéis possuem. Contudo, o texto não exige esse
significado para o paralelo funcionar. O texto apenas diz que a
“circuncisão de Cristo” remove a “incircuncisão da vossa carne”.

1264
A terceira alternativa (genitivo como possessivo), enquanto
permite uma leitura simples, também apresenta as maiores
dificuldades. A leitura exige que “de Cristo” seja igual a “cristão”, o
que está longe de ser normativo na literatura do NT. Ela também
levanta a questão de identidade: O que Paulo quer dizer com
circuncisão “cristã”?

1
O’Brien, Colossians, Philemon, p. 117.
2
T. R. Schreiner, “Circumcision”, in: G. F. Hawthorne; R. P. Martin; D. G. Reid, orgs.,

Dictionary of Paul and his Letters (Downers Grove: InterVarsity, 1993), p. 139.
3
Veja também P. Borgen, “Paul preaches circumcision and pleases men”, in: M. D.

Hooker; S. G. Wilson, orgs., Paul and Paulinism: Essays in Honour of C. K. Barrett (London:

SPCK, 1982), p. 85-102.

A supremacia de Cristo e a suficiência de sua obra acaba com qualquer


falsa noção de que se deva completar qualquer coisa que esteja faltando na
vida de um cristão. Nada pode ser adicionado à plenitude infinita de Cristo,
e, portanto, nada pode ser adicionado à fé nele. O senhorio de Cristo é tão
completo que Paulo exortou os fiéis a viverem à luz dele, colocando cada
aspecto de suas vidas sob esse senhorio (caps. 3 e 4). Assim, o tema
teológico da ética flui do foco paulino na Cristologia.

A conduta cristã adequada (ética)


As explicações indicativas em Colossenses 1 e 2 de quem Cristo é e o que
ele fez conduz à proclamação imperativa nos capítulos 3 e 4, de quem são
os fiéis e o que eles devem fazer. E. Lohse, disse isso muito bem: “Cristo é

1265
o Senhor sobre tudo — sobre principados e potestades, mas também sobre a
vida diária do cristão.”222 Paulo estabeleceu o escopo cósmico do senhorio
de Cristo e o escopo completo da salvação do fiel nele (caps. 1 e 2); ele
aplicou esses dois pontos de três formas principais (caps. 3 e 4).
Primeira, o escopo completo da obra suficiente de Cristo e da união
espiritual dos fiéis com ele significa que eles podem continuar a buscar as
coisas de cima, onde Cristo habita (3.1,2). Embora os fiéis sejam completos
em Cristo, a vida cristã não é estática. Os fiéis deveriam ter uma paixão em
buscar a Cristo, e essa busca requer que se desvie o olhar das coisas terrenas
e se elimine as paixões e obras terrenas que pertencem à antiga forma de
vida (3.5).
Segunda, a união com Cristo significa que o fiel é uma nova criatura e
que se comporta de acordo com isso. O fiel “se despiu do velho homem
com suas práticas” (3.9) e “se revestiu do novo homem” (3.10). Paulo
declarou anteriormente que Cristo é a imagem de Deus (1.15) e o Criador
(1.16), e agora, em união com Cristo, o fiel é criado novamente de acordo
com a imagem do Criador (3.10). Assim, o fiel está sendo transformado de
modo que se torne mais e mais como Cristo.
Terceira, o escopo cósmico do senhorio de Cristo tem implicações
surpreendentes para seu senhorio sobre todos os aspectos da vida do fiel, o
que é especialmente enfatizado no código doméstico em 3.18 a 4.1.223 A.
Kuyper fez a abrangente alegação de que “não há uma polegada quadrada
em todo o domínio da nossa existência humana sobre a qual Cristo, que é
soberano sobre tudo, não grite: ‘É minha!’”224 O senhorio de Cristo estende-
se à santidade pessoal, vida familiar, vida profissional, e tudo o mais (“o
que quer que vocês façam, em palavras ou em obras”, 3.17).

1266
153
Cada capítulo de Colossenses contém ação de graças: a ação de graças é a motivação para a

vida que agrada a Deus (1.9-12); a declaração programática da carta enfatiza que andar em Jesus

Cristo é estimulado pelo transbordamento de ação de graças (2.6,7); a ação de graças cristã motiva

tudo o que fiel diz e faz (3.17); Paulo exortou os Colossenses a que tivessem certeza de que suas

orações, como as dele (1.3-8), fossem permeadas com um espírito de ação de graças (4.2).

154
E. T. Mayerhoff declarou em 1838 que Colossenses era dependente de Efésios, refletia uma

polêmica do segundo século contra o gnosticismo, e continha algumas outras ideias estranhas a

Paulo. E. T. Mayerhoff , Der Brief an die Colosser, mit vornehmlicher Berücksichtigung der drei

Pastoralbriefe kritisch geprüft, edição de J. L. Mayer (Berlin: Hermann Schultze, 1838). R.

Bultmann e seus seguidores, mais tarde, adicionaram o influente rótulo “deuteropaulina” a

Colossenses.

155
R. E. Brown (An introduction to the New Testament [New York: Doubleday, 1997], p. 600)

estimou que cerca de 60% da erudição crítica acredita que a carta é pseudônima. D. A. deSilva (An

introduction to the New Testament: contexts, methods, and ministry formation [Downers Grove:

InterVarsity, 2004], p. 696) argumentou que a “academia está equilibradamente dividida sobre esta

questão”. Cf. o sumário bastante útil em R. F. Collins, Letters that Paul did not write: the Epistle to

the Hebrews and the pauline pseudepigrapha, Good News Studies 28 (Wilmington: Michael Glazier,

1988).

156
Veja O’Brien, Colossians and Philemon, p. xlii.

157
A avaliação estilística de E. Percy o levou a defender a autenticidade: Die Probleme der

Kolosser-und Epheserbriefe (Lund: C. W. K. Gleerup, 1946). Entretanto, o estudo estilístico de W.

Bujard desafiou a análise e conclusões de Percy: Stilanalytische Untersuchungen zum Kolosserbrief

als Beitrag zur Methodik von Sprachvergleichen, SUNT 11 (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht,

1973). E. Lohse (Colossians and Philemon, edição de W. R. Poehlmann; R. J. Karris; Hermeneia

[Philadelphia: Fortress, 1971], p. 84-91) apresentou uma extensa pesquisa sobre a linguagem e estilo

1267
de Colossenses. Lohse concluiu que as considerações linguísticas e estilísticas não poderiam servir de

base para se chegar a quaisquer decisões finais em relação à questão da autoria paulina de

Colossenses (ibid., p. 91).

158
J. D. G. Dunn, The Epistles to the Colossians and to Philemon, NIGTC (Grand Rapids:

Eerdmans, 1996), p. 35.

159
Alguns acadêmicos alegam que Colossenses vai além das cartas paulinas incontestes na

ênfase que dá às dimensões cósmicas de Cristo. J. D. G. Dunn (Colossians and Philemon, p. 36)

apresentou recentemente uma avaliação semelhante: “A cristologia expressada em 1.15-20 e

2.9,10,15 parece estar mais adiante na trajetória do que a das cartas paulinas incontestes. Ele concluiu

que o conteúdo teológico é assim “significativamente diferente do que o que estamos acostumados

em todas as cartas paulinas incontestes”.

160
Eles detectaram uma escatologia realizada em vez da escatologia já/ainda não característica

das cartas paulinas incontestes. Por exemplo, Colossenses diz que o fiel já ressuscitou com Cristo

(2.12; 3.1) e já está no reino de Cristo (1.13).

161
Colossenses é única em seu simbolismo de Cristo como a cabeça de seu corpo, a igreja (1.18;

2.17,19; 3.15) quando comparada às cartas paulinas incontestes (mas veja Ef 4.15; 5.23). Colossenses

também foca mais a igreja “universal” do que a igreja “local”. Lohse (Colossians and Philemon, p.

177-83) afirmou que essas diferenças são muito grandes para que se possa concluir que Paulo

escreveu a carta.

162
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 520. Existem conexões entre Colossenses

e outras cartas paulinas. A obra de A. R. Bevere destaca uma dessas linhas nos paralelos entre

Gálatas e Colossenses: Sharing the inheritance: identity and moral life in Colossians, JSNTSup 226

(Sheffield: Sheffield Academic Press, 2003), p. 59-121.

1268
163
J. B. Lightfoot (Saint Paul’s Epistles to the Colossians and to Philemon, 9. ed. [London:

Macmillan, 1890], p. 16) comentou: “Sem dúvida, Colossos era a igreja menos importante dentre

todas para as quais Paulo escreveu”.

164
Até R. Brown (Introduction, p. 613), que cautelosamente rejeitou a autoria paulina, admitiu

que as diferenças teológicas são “exageradas”. DeSilva (Introduction to the New Testament, p. 698)

reconheceu que essas diferenças teológicas são as “principais objeções”, mas ele concluiu que elas

são “explicáveis em referência a um desafio apresentado por uma filosofia que enfatiza a autoridade

dos poderios, anjos e principados sobre a vida humana”.

165
Veja Lohse, Colossians and Philemon, p. 77-83.

166
Dunn, Epistles to the Colossians and Philemon, p. 36.

167
A. Lincoln (Paradise now and not yet: studies in the role of the heavenly dimension in Paul’s

thought with special reference to his eschatology, SNTSMS 43 [Cambridge: University Press, 1981],

p. 122-3) declarou que a presente ressurreição do fiel com Cristo em Colossenses 2.12 e a futura

ressurreição do fiel com Cristo em Romanos 6.5 ocupam dois polos na teologia escatológica de Paulo

do já e do ainda não. Ele disse: “Os fiéis entram nessa vida ressurreta quando se unem a Cristo”,

embora a consumação dessa realidade “ainda esteja no futuro”.

168
P. N. Harrison, The problem of the pastoral epistles (London: Oxford University Press, 1921),

p. 20-22.

169
G. U. Yule, The statistical study of literary vocabulary (Cambridge: University Press, 1944),

p. 281.

170
D. E. Garland (Colossians and Philemon, NIVAC [Grand Rapids: Zondervan, 1998], p. 19)

mencionou o fato significativo de que “muito do suposto vocabulário ‘não paulino’ ocorre na seção

que trata da “filosofia’”. G. E. Cannon (The use of traditional materials in Colossians [Macon:

Mercer University Press, 1983]), admitiu que Colossenses contém passagens que se desviam do

1269
estilo e do vocabulário costumeiros de Paulo, mas ele defendeu a autoria paulina porque a alta

porcentagem de material pré-paulino em Colossenses explica a divergência.

171
Kümmel, Introduction, p. 241.

172
Veja Dunn, Epistles to the Colossians and Philemon, p. 44; E. R. Richards, The Secretary in

the Letters of Paul, WUNT 2/42 (Tübingen; J. C. B. Mohr, 1991); e Garland, Colossians/Philemon,

p. 20-1. D. Guthrie (New Testament Introduction [Downers Grove: InterVarsity, 1970], p. 554) de

maneira hábil resumiu o argumento desta forma: “Não há sombra de evidência de que a autoria

paulina de toda ou de qualquer parte desta epístola tenha sido alguma vez questionada antes do

século dezenove. Ela fazia parte do corpus paulino até onde podemos pesquisar no passado, e uma

evidências desta natureza não pode ser colocada de lado sem motivo. Essa forte atestação externa é

ainda apoiada pela estreita ligação entre a epístola e Filemom, cuja autenticidade foi desafiada apenas

pelos críticos negativos mais extremistas”.

173
Dunn (Epistles to the Colossians and Philemon, p. 37-8) listou algumas das semelhanças

entre Colossenses e Filemom.

174
Muitos estudiosos datam a primeira prisão romana do início da década de 60.

175
Este argumento é esp. enfático no caso de B. Reicke (Re-Examining Paul’s Letters: The

History of the Pauline Correspondence [Harrisburg: Trinity Press International, 2001], p. 76): “Todas

as tentativas de fazer de Colossenses uma composição deuteropaulina do período 70-100 d.C. foram

tornadas nulas e vazias por documentos que demonstram que Colossos perdeu sua importância

cultural devido a um terremoto em 61”. O terremoto em Colossos pode criar problemas também para

a data da escrita de Colossenses na datação convencional da prisão romana.

176
Veja os detalhes cobertos no estudo de Filipenses.

177
Dunn (Epistles to the Colossians and Philemon, p. 41) e P. T. O’Brien (Colossians, Philemon,

WBC 44 [Dallas: Word, 1982], p. xlix-liv) defendem a hipótese romana para Colossenses.

1270
178
Guthrie, New Testament Introduction, p. 557.

179
Dunn, Epistles to the Colossians and Philemon, p. 20.

180
Lightfoot, Colossians and Philemon, p. 1-72; cf. L. M. McDonald, “Colossae”, in: Dictionary

of New Testament background, p. 225-6.

181
Os viajantes usavam a principal estrada de Antioquia para Tarso através dos portões da Cilícia

até Derbe, Listra, Icônio, e então Colossos e suas cidades vizinhas, Laodiceia e Hierápolis. A pessoa

viajaria então cerca de 160 quilômetros até Éfeso e entre 1.600 a 1.900 quilômetros até Roma.

182
Um dos braços do rio Lico também deixava depósitos de giz usado no tingimento de roupas.

183
Dunn, Epistles to the Colossians and Philemon, p. 25. Dunn queria se manter sensível a duas

considerações: (1) a ortodoxia não estava completamente desenvolvida, e os limites não estavam

totalmente definidos; e (2) o tom de Paulo é muito mais relaxado em Colossenses do que em Gálatas.

Dunn é simpático à teoria de M. D. Hooker de que os colossenses apenas enfrentavam o perigo de se

conformarem às crenças ao seu redor (ibid., p. 24-6).

184
I. K. Smith, Heavenly Perspective: A Study of Paul’s Response to a Jewish Mystical

Movement at Colossae, LNTS 326 (Edinburgh: T&T Clark, 2007), p. 19.

185
J. J. Gunther, St. Paul’s Opponents and their Background, NovTSup 35 (Leiden: Brill, 1973),

p. 2-4.

186
M. D. Hooker, “Were there false teachers in Colossae?”, in: B. Lindars; S. S. Smalley, orgs.,

Christ and Spirit in the New Testament (Cambridge: University Press, 1973), p. 315-31.

187
J. Gnilka (Der Kolosserbrief, HTKNT 10 [Freiburg: Herder, 1980], p. 164, n. 4) rejeitou o

ponto de vista de Hooker como uma simplificação excessiva por não refletir sobre a conexão entre a

crença nos poderes e as proibições rituais.

1271
188
G. Bornkamm, “The heresy of Colossians”, em: F. O. Francis; W. A. Meeks, orgs., Conflict at

Colossae, 2. ed., SBLSBS 4 (Missoula: Scholars, 1975), p. 123-45.

189
R. E. DeMaris, The Colossian Controversy: Wisdom in Dispute at Colossae, JSNTSup 96

(Sheffield: Sheffield Academic Press, 1994).

190
DeMaris se baseou na obra de E. Schweitzer e seu entendimento dos “elementos do mundo”.

Veja E. Schweitzer, Colossians (Minneapolis: Augsburg, 1982), p. 136-8. A. Wedderburn (“The

theology of Colossians”, in: J. D. G. Dunn, org., The Theology of the Later Pauline Letters

[Cambridge: University Press, 1993], p. 3-12) assumiu uma abordagem semelhante ao erro

colossense e também se baseou em Schweitzer.

191
T. Martin, By Philosophy and Empty Deceit: Colossians as a Response to Cynic Critique,

JSNTSup 118 (Sheffield: Sheffield Academic Press, 1996), p. 15-6.

192
C. E. Arnold, The Interface Between Christianity and Folk Belief at Colossae, WUNT 2/77

(Tübingen: Mohr-Siebeck, 1995).

193
C. E. Arnold (The Colossian Syncretism: The Interface Between Christianity and Folk Belief

in Colossae [Grand Rapids: Baker, 1996], p. 90-194) interpretou “culto de anjos” (2.18) como um

genitivo objetivo, que se refere à invocação de anjos por proteção contra espíritos maus, “alegando

acesso a um reino visionário” (2.18) como referência a um culto de mistério; e “forças elementares

do mundo” (2.8) como poderes espirituais do mau personalizados relacionados às estrelas e ao

destino.

194
Os comentários de J. D. G. Dunn (Epistles to the Colossians and Philemon, p. 29-33) e N. T.

Wright (Colossians and Philemon, TNTC [Grand Rapids: Eerdmans, 1987], p. 24-7) também

defenderam uma fonte judaica. Cf. T. J. Sappington, Revelation and Redemption at Colossae,

JSNTSup 53 (Sheffield: JSOT, 1991), p. 19-21. Sappington diferiu de Wright e Dunn, pois ele

1272
acreditava que a ameaça do falso ensino vinha de dentro da igreja, não de fora, da sinagoga (ibid., p.

15).

195
Bruce, “The colossian heresy”, p. 202.

196
J. M. Scott, “Throne-Chariot mysticism in Qumran and in Paul”, in: C. A. Evans; P. W. Flint,

orgs., Eschatology, messianism and the Dead Sea Scrolls (Grand Rapids: Eerdmans, 1997), p. 101-

19, esp. p. 103.

197
O próprio Lightfoot (Colossians and Philemon, p. 91-6) reconheceu a última dessas duas

dificuldades e defendeu a plausibilidade de sua alegação de que o judaísmo essênio era conhecido na

Ásia Menor durante a época de Paulo.

198
Smith, Heavenly perspective, p. 32.

199
Smith (ibid.) alegou que Arnold não explicou por que Colossenses nem mesmo menciona

mágica, amuletos, feitiços e encantos. Além do mais, a conexão que Arnold faz entre sabedoria e

mágica não se adequa a Colossenses, onde Paulo associou sabedoria a comportamento (1.9-14; 3.16;

4.5). Smith também encontrou falhas em Arnold por ser muito seletivo, pois ele não tratou de 1.15-

20; 2.9-15 e 3.1-4.

200
Smith (ibid.) destaca a concessão feita por Arnold de que muito de sua evidência papirológica

data do terceiro e quarto séculos. Mas Arnold também argumentaria que a natureza dos papiros

mágicos levaria a antecipar apenas alterações mínimas ao longo do tempo.

201
Smith (ibid., p. 206) disse que aqueles que interpretaram os stoicheia como leis ou princípios

“desconsideraram uma visão de mundo judaica do primeiro século que via a esfera cósmica como

determinante para os assuntos humanos”.

202
Ibid.

1273
203
Para uma discussão sobre as origens do misticismo Merkabá, veja C. L. Quarles, “Jesus as

Merkabah mystic”, Journal for the Study of the Historical Jesus 3/1 (2005), p. 5-22, esp. p. 8-15. A

preocupação que Smith manifestou sobre a data de muitas das fontes de Arnold também tem impacto

na teoria de Smith.

204
Smith, Heavenly perspective, p. 207.

205
Bujard, Stilanalytische Untersuchungen, p. 129 e 229.

206
M. Wolter, Der Brief an die Kolosser; Der Brief an Philemon (Gütersloh: G. Mohn, 1993).

207
A dicção elevada e o extenso paralelismo por toda a passagem levaram muitos estudiosos a

rotulá-la como um “hino”. Os estudiosos discutem, assim, se ela é uma composição paulina ou pré-

paulina. Outros estudiosos duvidam que 1.15-20 seja um hino devido ao fato de que ninguém

conseguiu identificar um padrão métrico. Veja a discussão em Lohse, Colossians and Philemon, p.

41-6; e O’Brien, Colossians, Philemon, p. 32-7.

208
Por exemplo, M. J. Harris, Colossians and Philemon, Exegetical guide to the greek New

Testament (Grand Rapids: Eerdmans, 1991), p. 42. M. Dübbers (Christologie und Existenz im

Kolosserbrief: Exegetische und semantische Untersuchungen zur Intention des Kolosserbriefes,

WUNT 2/191 [Tübingen: Mohr Siebeck, 2005], p. 91) recentemente defendeu duas estrofes (1.15,16

e 1.18-20), com 1.17,18a funcionando como uma estrofe intermediária. N. T. Wright (The climax of

the covenant: Christ and the Law in pauline theology [Minneapolis: Fortress, 1996], p. 112) defendeu

um quiasmo consistindo em A (v. 15,16), B (v. 17) e C (v. 18c-d).

209
Veja esp. R. Martin, Colossians: The Church’s Lord and the Christian’s Liberty (Grand

Rapids: Zondervan, 1972), p. 40-55; Dunn, Colossians and Philemon, p. 83-7; e O’Brien,

Colossians, Philemon, p. 32-7. V. A. Pizzuto (A Cosmic Leap of Faith: An Authorial, Structural, and

Theological Investigation of the Cosmic Christology in Col 1:15-20 [Leuven: Peters, 2006])

argumentou que o autor deuteropaulino de Colossenses também compôs o hino.

1274
210
O’Brien (Colossians and Philemon, p. 35-6) observou que apesar dos amplos esforços dos

estudiosos em resolver a questão da estrutura do hino, não se alcançou um consenso. Ele sugeriu que

“nenhuma reconstrução é completamente convincente” e afirmou que o mais sábio é simplesmente

falar de paralelos no texto.

211
A ordem das palavras é levemente alterada na segunda ocorrência da última construção.

212
Veja esp. Provérbios 8.22-31; Sabedoria 1.7; 7.21 a 8.1. Dunn incorretamente afirmou que

Sabedoria 1.7 descreve a sabedoria como aquele “que mantém unidas todas as coisas”. Mas o gênero

neutro do particípio substantival to synechon deixa claro que aquele sendo descrito é o Espírito de

Deus mencionado na oração anterior.

213
C. F. Burney (“Christ as the APXH of Creation”, JTS 27 [1926], p. 160-77) argumentou que

Gênesis 1 sozinho era suficiente para explicar a linguagem do hino cristológico.

214
Sobre a importância da experiência de Paulo na Estrada de Damasco para sua teologia, veja

esp. S. Kim, The origin of Paul’s Gospel (Grand Rapids: Eerdmans, 1982).

215
J. H. Laenen, Jewish mysticism: an introduction, trad. para o inglês de D. Orton (Louisville:

Westminster John Knox, 2001), p. 31.

216
Para evidência de que o sentido etimológico de tokos em prōtotokos foi abandonado, veja

TDNT 6:871-81; O’Brien, Colossians, Philemon, p. 44-5; Bruce, Colossians, Philemon, Ephesians,

p. 58-61; e R. R. Melick Jr., Philippians, Colossians, Philemon, NAC (Nashville: B&H, 1991), p.

215-7. Esses dois temas, prioridade em tempo e posição, permeia este hino nas palavras prōtotokos

(duas vezes), pro pantōn e archē.

217
Em outras passagens Paulo usou o argumento da prioridade no tempo para demonstrar a

autoridade do homem sobre a mulher (veja 1Co 11.8,9).

218
O uso de eimi no tempo presente e não no imperfeito pode fazer alusão à eternidade de Jesus

neste contexto. Lightfoot ligou o uso de eimi nos v. 17,18 ao egō eimi de João.

1275
219
Nos Testamentos dos Doze Patriarcas (T. Levi 3), os arcanjos são mencionados como a classe

angélica que reside no céu mais elevado “com a Grande Glória no Santo dos Santos”. Eles oferecem

sacrifícios propiciatórios pelos pecados de ignorância dos santos. No céu logo abaixo deles, os anjos

mensageiros, juntamente com os tronos e poderes, continuamente oferecem louvores a Deus. Essa

fonte é datada do século II a.C. Em 2Enoque 20 (J: recensão mais longa), arcanjos, domínios,

autoridades e tronos são descritos como presentes no sétimo céu. Tronos são descritos como tendo

muitos olhos e agrupados com querubins e serafins.

220
Os principados, poderes e “espíritos elementares” são forças espirituais malignas reunidas

contra fiéis. Veja esp. a proveitosa história da interpretação e o persuasivo estudo de P. T. O’Brien,

“Principalities and powers: opponents of the Church”, in: D. A. Carson, org., Biblical interpretation

and the Church (Grand Rapids: Baker, 1984), p. 110-50.

221
Thielman, Theology of the New Testament, p. 351. Assim também M. J. Harris, “Colossians”,

in: T. D. Alexander; B. S. Rosner, orgs., New Dictionary of Biblical Theology (Downers Grove:

InterVarsity, 2000), p. 324-25.

222
Lohse, Colossians and Philemon, p. 178.

223
Veja a análise de Bevere (Sharing in the inheritance, p. 225-54, esp. p. 240), que argumentou

que o código familiar é uma parte integral de toda a carta à luz do senhorio de Cristo.

224
Essas palavras foram proferidas como parte de seu discurso inaugural na fundação da Free

University [Universidade Livre, de Amsterdã] em 20 de outubro de 1880. J. D. Bratt, ed., Abraham

Kuyper: a centennial reader (Grand Rapids: Eerdmans, 1988), p. 488.

1276
Filemom

FATOS-CHAVE DE FILEMOM
Autor: Paulo
Data: Por volta de 60
Origem: Prisão romana
Destino: Filemom
Motivo: O escravo fugitivo de Filemom se encontra
com Paulo, torna-se um fiel, e é enviado de
volta a seu dono.
Propósito: Encorajar Filemom a aceitar Onésimo como
um irmão, e enviá-lo de volta a Paulo, e
possivelmente conceder-lhe liberdade.
Tema: Amor e reconciliação no corpo de Cristo.
Versículos-Chave: 17-20

INTRODUÇÃO

Embora Filemom esteja separado no cânon do NT do livro de


Colossenses, ela compartilha com Colossenses seu provável destino e sua
data presumida de redação durante a primeira prisão romana de Paulo. Por
esse motivo, é conveniente agrupar Filemom com as outras Epístolas da
Prisão (Filipenses, Efésios e Colossenses) e examinar a carta sob o título
atual.
Filemom tem a distinção de ser a carta paulina mais curta com suas 335
palavras no texto grego.225 Carson e Moo também caracterizaram Filemom

1277
como a carta “mais pessoal” de Paulo.226 A questão da escravidão é
provavelmente o primeiro pensamento que vem à mente quando o cristão
pensa sobre Filemom, mas a carta de Paulo não é um documento de posição
sobre escravidão. Pelo contrário, ela dá uma contribuição muito mais
multifacetada ao cânon do que uma leitura unidimensional da carta poderia
sugerir.
Mesmo sendo Filemom a menor carta paulina, ela ainda faz uma
contribuição significativa para a teologia do NT. Ela efetivamente toma o
conceito de Colossenses da reconciliação cósmica mediante a cruz de
Cristo, e o traduz em um cenário específico de reconciliação entre dois
indivíduos. A mensagem do evangelho não aparece sozinha; ela tem uma
mensagem importante sobre como lidar com as verdadeiras questões da
vida. Em um sentido muito real, relacionamentos no corpo de Cristo são
relacionamentos do evangelho, e as questões sociais tais como a escravidão
são temas do evangelho.

HISTÓRIA
Autor
Autenticidade
Filemom é quase universalmente reconhecida como uma carta autêntica do
apóstolo Paulo. A única argumentação firme contra a autoria paulina foi
feita pela Escola de Tübingen, no século dezenove. Como mencionado
anteriormente, F. C. Baur admitiu a autenticidade de apenas quatro cartas
atribuídas a Paulo — Romanos, 1 e 2Coríntios e Gálatas — que ele
categoricamente chamou de Hauptbriefe (alemão para “principais

1278
epístolas”).227 Seus argumentos contra a autenticidade são agora rejeitados
por praticamente todos os estudiosos paulinos.228

Integridade literária
Não surgiu nenhum desafio sério à integridade de Filemom. Tanto a
brevidade da carta como sua natureza pessoal são obstáculos para aqueles
que se esforçam em contestar sua integridade literária.

Data
A data de Filemom depende largamente da data atribuída a Colossenses. A
evidência do estreito relacionamento entre as duas cartas é como segue: (1)
Colossenses faz referência a Onésimo (Cl 4.9); (2) as duas cartas têm
Timóteo como corremetente (Fm 1.1; Cl 1.1); (3) as duas cartas fazem
referência a Epafras (Fm 1.23; Cl 1.7) e Arquipo (Fm 2; Cl 4.17); e (4) as
duas cartas incluem Marcos, Aristarco, Demas e Lucas entre os
companheiros de Paulo (Fm 1.24; Cl 4.10,14). Assumindo-se a origem
romana de Colossenses, a carta deve ser datada em torno do ano 60.

Destino
Paulo endereçou a carta a Filemom, a quem chamou de “caro amigo e
colaborador” (v. 1). Praticamente todo mundo aceita esse destino. John
Knox sugeriu que Filemom foi o recipiente inicial da carta, enquanto
Arquipo foi o destinatário final, mas seu ponto de vista obteve pouca
aceitação.229

1279
Filemom era o senhor de um escravo chamado Onésimo. A carta
oferece uma série de possíveis dados biográficos sobre Filemom. Primeiro,
Paulo apresentou Filemom em termos entusiáticos como um estimado
colaborador (v. 1) e um modelo de amor e de fé em Jesus (v. 5). O amor e a
fé de Filemom também transbordara para todos os fiéis (v. 5), a quem ele
sempre animara (v. 7). Segundo, o apóstolo Paulo provavelmente
desempenhou um papel importante na conversão de Filemom (v. 19) porque
Paulo comentou, de passagem, que Filemom devia seu “próprio ser” ao
apóstolo.230 Terceiro, Filemom provavelmente era rico, pois abrigava a
igreja (v. 2) em Colossos (veja Cl 4.9) e era capaz de providenciar um
quarto de hóspede para Paulo (v. 22).231

Origem
Questões relativas à proveniência de Filemom são dependentes da
proveniência de Colossenses. Paulo estava na prisão quando escreveu as
duas cartas. Em adição às outras semelhanças esboçadas acima,
Colossenses indica que Onésimo era um residente de Colossos (Cl 4.9).
Assim, pode-se seguramente inferir que Filemom residia no mesmo local
que seu escravo. Muitos estudiosos concluem que as semelhanças entre as
duas cartas indicam que elas foram escritas ao mesmo tempo e no mesmo
lugar, e foram enviadas juntas para Colossos.232 A ocasião e local, no
entanto, continuam a ser fortemente contestados.
As três propostas mais importantes sobre a proveniência de Filemom
são Roma, Éfeso, e Cesareia, com Éfeso e Roma sendo debatidas com mais
seriedade.233 Em favor de Roma, a evidência externa que data do quarto e
quinto séculos “uniformemente atribui” a proveniência de Filemom a

1280
Roma.234 Outros estudiosos acreditam que dois fatores em Filemom
favorecem uma prisão em Éfeso: (1) é mais provável que Onésimo fugisse
para Éfeso, sendo ela a metrópole mais próxima, e não para a distante
cidade de Roma; e (2) o pedido de Paulo a Filemom por um quarto no
futuro próximo (Fm 1.22) se encaixa mais facilmente com a menor
distância entre Éfeso e Colossos.235
Aqueles que defendem uma prisão romana, respondem baseando-se em
dois pontos. Em primeiro lugar, a proximidade de Éfeso e Colossos é faca
de dois gumes. Pode ser que Onésimo procurasse o anonimato encontrado
na capital do Império Romano, porque um lugar como Éfeso não era seguro
pela sua proximidade. Em segundo lugar, o pedido de Paulo por alojamento
não impede uma prisão romana, pois ele ainda poderia fazer a viagem em
cerca de cinco semanas. Carson e Moo argumentaram que a referência a
uma iminente chegada poderia ter sido uma maneira de colocar mais
pressão sobre Filemom e de obter deste uma decisão favorável.236

Motivo
Os estudiosos sugerem cinco cenários possíveis para a ocasião da carta: (1)
a hipótese tradicional; (2) a hipótese de santuário; (3) hipótese de mediação;
(4) hipótese do “enviado”; e (5) a hipótese de Knox. A hipótese tradicional
relacionada à ocasião da carta pode ser esboçada da seguinte maneira.
Filemom tinha um escravo fugitivo chamado Onésimo, que pode ter
acrescentado ao seu crime de deserção o roubo de seu senhor (v. 18). Após
sua fuga, Onésimo encontrou Paulo na prisão (ou na prisão domiciliar). O
Apóstolo tornou-se amigo de Onésimo e, por fim, o levou a Cristo. Agora,
Paulo tinha de tomar uma decisão difícil. Deveria ele enviar Onésimo, seu

1281
valoroso ajudante, de volta a seu senhor Filemom? Embora Paulo desejasse
manter Onésimo com ele, sabia que deveria enviá-lo de volta a Filemom.
Mas Paulo o fez com a expectativa expressa que Filemom mandasse
Onésimo de volta a ele a fim de proporcionar-lhe mais assistência, talvez
com a esperança adicional de que Filemom concedesse liberdade ao seu
escravo, que agora era um servo de Cristo com Filemom e, portanto, um
irmão em Cristo.237 Essa descrição recebeu severas críticas recentemente
devido à improbabilidade de Onésimo ter encontrado por acaso com um
amigo chegado de Filemom, Paulo. Carson e Moo captam muito bem essa
atitude ao dizer que “essa coincidência parece estar mais de acordo com um
romance de [Charles] Dickens do que com uma história verídica”.238
Portanto, outras visões têm sido propostas, como alternativas à visão
tradicional. A hipótese de santuário sugere que o fugitivo Onésimo fugiu
para a casa de Paulo em busca de proteção, de acordo com o estatuto
romano que considerava o lar um santuário. A hipótese de mediação
apresenta uma reconstrução diferente dos acontecimentos, afirmando que
Onésimo não era um fugitivus (lat. para “fugitivo”) em termos legais, mas
sim um escravo que de algum modo tinha prejudicado seu senhor e então
procurado Paulo como mediador, como o amicus domini (lat. para “amigo
do senhor”).239 A hipótese do “enviado” simplesmente afirma que a
congregação de Colossos enviou Onésimo para ajudar com algumas das
necessidades de Paulo enquanto este estava na prisão.240
A hipótese de Knox refere-se à ideia defendida por John Knox, que
apresentou a primeira (1935) e mais elaborada revisão do ponto de vista
tradicional. A teoria de Knox consiste essencialmente em cinco partes.
Primeira, ele argumentou que Arquipo era o proprietário de Onésimo e,
portanto, o destinatário final da carta. Segunda, ele teorizou que Paulo na

1282
verdade enviou a carta a Filemom, o superintendente das igrejas na região,
para que pudesse ser lida em voz alta na igreja de Colossos. Terceira, Paulo
concebeu essa estratégia a fim de que a pressão sobre Arquipo o levasse a
liberar Onésimo para o serviço cristão. Quarta, a misteriosa carta a
Laodiceia (Cl 4.16) é na verdade uma referência a esta carta a Filemom.
Quinta, o pedido de libertação de Onésimo representa o “ministério” que
Paulo apelou a Arquipo para cumprir (Cl 4.17).241
Como deveria o leitor avaliar essas diferentes propostas? No caso da
hipótese do “enviado”, a exegese é, algumas vezes, questionável.242 A
reconstrução de Knox é em alguns pontos perspicaz e sempre engenhosa,
mas no final tropeça nas rochas da especulação e da improbabilidade.243 Por
exemplo, quase todos os estudiosos paulinos rejeitam a teoria da leitura
pública de Knox porque ela é simplesmente incompatível com a evidência
interna da carta. O ataque frontal em cheio de uma leitura pública negaria
completamente o manejo hábil e delicado desta questão sensível por Paulo
exemplificado na carta em si.
É muito mais difícil decidir entre as hipóteses tradicional, de santuário e
do mediador, pois nenhuma delas está livre de dificuldades. Os seguintes
pontos de crítica e de avaliação foram levantados:

1. As propostas de santuário e da mediação têm dificuldades em


responder por que Onésimo procuraria Paulo por santuário ou
mediação se ele estivesse na distante capital. Será que Onésimo não
poderia ter encontrado um lugar mais próximo como santuário ou uma
pessoa mais próxima para servir de mediador?
2. A hipótese tradicional não requer um encontro “casual” entre Paulo e
Onésimo. Mesmo que o cenário proposto envolva um encontro

1283
inesperado, isso não é incompatível com a atividade providencial de
Deus, evidenciada em outras partes da Escritura.244
3. A hipótese tradicional, que considera Onésimo como um fugitivo, é
problemática porque Paulo não utiliza os termos legais ou verbos de
fuga costumeiros.245
4. A carta de Plínio a Sabiniano (Ep. 9.21) é um impressionante paralelo
literário e histórico da hipótese da mediação.246
5. A hipótese do escravo fugitivo tem dificuldade em explicar a ausência
na carta de ecos do arrependimento ou remorso de Onésimo por seu
ato criminoso.247

Paulo deixou o leitor lidar com essas questões, porque ele não afirmou
expressamente os motivos por trás da fuga de Onésimo. Portanto, o
dogmatismo deve ser evitado. A prática de recorrer aos precedentes no
mundo antigo é problemática porque existem exemplos abundantes de
escravos fugitivos e de mediação. Carson e Moo acertadamente fizeram
ainda uma ressalva de que a visão tradicional permite outras possibilidades.
Por exemplo, talvez Onésimo fugiu para Roma e, posteriormente, mudou de
ideia sobre a fuga e então procurou Paulo em busca de refúgio ou
mediação.248 De qualquer modo, questões como essas não afetam
substancialmente a compreensão e a apreciação da mensagem geral do
livro.

LITERATURA
Plano Literário

1284
Pesquisas recentes sobre Filemom têm seu foco na crítica retórica. F. F.
Church lê Filemom através das lentes da retórica deliberativa como o pré-
escrito (v. 1-3), o exordium (v. 4-7); probatio (v. 8-16); e peroratio (v. 17-
22). Esse recurso retórico visa “demonstrar amor ou amizade e induzir
simpatia ou boa vontade, a fim de inclinar o ouvinte favoravelmente ao
mérito do processo de alguém”.249 Outros acadêmicos argumentam do ponto
de vista epistolar que Filemom é uma carta de mediação ou intercessão.250 J.
P. Heil e J. W. Welch independentemente defenderam uma estrutura
quiástica para Filemom, na qual o versículo 14 é o ponto central.251
A decisão mais difícil quanto ao esboço da carta é o ponto onde o corpo
termina e o encerramento tem início. Muitos entendem que o corpo se
estende dos versículos 8 a 22 e que as saudações finais começam no
versículo 23.252 Embora a certeza seja quase impossível, pode ser preferível
ler o versículo 20 como o final do corpo da carta, com os versículos 21-25
formando o encerramento.

ESTRUTURA
I. Abertura (v. 1-7)
A. Saudação (v. 1-3)
B. Ação de graças e oração (v. 4-7)

II. Corpo: três apelos em favor de Onésimo (v. 8-20)


A. Primeiro apelo: ele é útil para ti e para mim (v. 8-11)
B. Segundo apelo: aceite-o como um irmão em Cristo (v. 12-16)
C. Terceiro apelo: anime meu coração enviando Onésimo de volta (v.
17-20)

1285
III. Encerramento (v. 21-25)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Abertura (v. 1-7)
A. Saudação (v. 1-3)
A carta abre com a habitual identificação dos remetentes (Paulo e Timóteo,
v. 1) e os recipientes (Filemom, Áfia, Arquipo e a igreja doméstica, v. 2),
bem como a saudação da graça (v. 3).

B. Ação de graças e oração (v. 4-7)


Paulo ofereceu uma ação de graças (v. 4) pelo relatório da fé e do amor de
Filemom (v. 5). Ele também orou para que a participação de Filemom na fé
fosse eficaz mediante o conhecimento (v. 6). O ato de Filemom de animar o
coração dos fiéis trouxe alegria e encorajamento para Paulo (v. 7).

II. Corpo: Três Apelos em Favor de Onésimo (v.


8-20)
A. Primeiro apelo: ele é útil para ti e para mim (v.
8-11)
Paulo amorosamente fez uma série de apelos paternais a Filemom em favor
de Onésimo como filho de Paulo (v. 10). Paulo recorreu a Filemom como
um homem velho e aprisionado, não como um apóstolo autoritário (v. 8,9).
O primeiro apelo tinha o foco na utilidade atual de Onésimo tanto para

1286
Filemom quanto para Paulo, contrastada com a inutilidade anterior de
Onésimo para Filemom (v. 11). A expressão envolve um trocadilho com o
nome Onésimo, que significa “lucrativo” ou “útil”. Anteriormente, ele
havia sido “inútil” (achrēston), mas agora ele se tornou “útil” (euchrēston)
para Filemom e também para Paulo.253

B. Segundo apelo: aceite-o como um irmão em


Cristo (v. 12-16)
O segundo apelo (v. 12-16) suplica a Filemom que aceite Onésimo de volta
como um irmão amado, e não como um escravo (v. 15,16). Paulo enviou
Onésimo de volta com esse propósito, embora Paulo preferisse ficar com
Onésimo, que poderia tomar o lugar de Filemom para ministrar a Paulo na
prisão (v. 13). Paulo não agiu de acordo com esse desejo, porque ele queria
o livre e sincero consentimento de Filemom a essa boa obra (v. 14).

C. Terceiro apelo: anime meu coração enviando


Onésimo de volta (v. 17-20)
O terceiro apelo (v. 17-20) pedia novamente a aceitação de Onésimo (v. 17)
à luz da parceria entre Paulo e Filemom. O apóstolo assumiu um papel
paternal já que qualquer coisa que Onésimo devesse a Filemom poderia ser
cobrado de Paulo, embora Filemom já fosse um devedor que devia quase
tudo a Paulo (v. 18,19). Paulo expressou confiança de que Filemom
animaria seu coração (v. 20), tal como Filemom já tinha animado os
corações dos fiéis (v. 7).

1287
III. Encerramento (v. 21-25)
Paulo concluiu a carta com a confiante expectativa de que Filemom
superaria seus esperançosos apelos (v. 21), o que muitos entendem como
254
referência velada à concessão da liberdade a Onésimo. Ele também
exortou a Filemom que preparasse um lugar para ele devido a sua esperança
de que as orações do próprio Filemom pela libertação de Paulo seriam
respondidas (v. 22). Paulo também transmitiu a Filemom saudações de
outros (v. 23,24), seguidas pela habitual bênção da graça (v. 25).

Algo Para Pensar: A Fé Muda Tudo

Paulo estava na prisão quando escreveu sua carta a Filemom, o


proprietário cristão de Onésimo, o escravo fugitivo. No entanto, em
suas palavras de abertura, ele se identificou, não como um
prisioneiro de Roma, mas sim como um “prisioneiro de Cristo
Jesus” (v. 1). Na concepção de Paulo, ele estava na prisão pela
vontade de Deus. Enquanto outros podem ter sido escravos de seus
senhores terrenos, pela fé, Paulo era escravo de Deus (veja. Tt 1.1,
“Paulo, um escravo de Deus”). Esse tipo de fé muda tudo.
A fé também mudou tudo na vida do novo protegido de Paulo,
Onésimo. Aparentemente, o escravo Onésimo tinha fugido de seu
senhor Filemom e, então, conheceu Paulo na prisão em Roma. Ali,
ao que parece, Paulo compartilhou o evangelho com esse homem
desesperado, e ele foi convertido a Cristo. Assim, Paulo se refere a
ele como “meu filho, Onésimo, que gerei quando estava na prisão”
(v. 10). Onésimo, cujo nome significa “útil”, teria sido “útil” para

1288
Paulo, mas ele preferiu mandá-lo de volta para seu senhor a fim de
que ele fosse “útil” — realmente útil, agora que ele havia se tornado
um cristão — para ele.
Em sua carta a Filemom, Paulo suplicou a seu amigo que
recebesse Onésimo de volta “não mais como escravo, mas melhor do
que escravo, como um irmão muito amado” (v. 16). Onésimo era um
homem mudado, e Paulo exortou Filemom a reconhecer que seu
relacionamento com Onésimo também tinha mudado: agora, eles
eram irmãos em Cristo. Este é um maravilhoso exemplo de como
Paulo imaginou o cristianismo transformando não apenas
indivíduos, mas também estruturas sociais como a escravidão.
No encerramento de sua carta, Paulo tinha ainda um pedido
pessoal que ele havia guardado para o fim: “Mas nesse meio tempo,
prepara-me também um quarto de hóspedes, pois espero que pelas
vossas orações serei levado de volta a vós” (v. 22). No momento da
redação, Paulo ainda estava na prisão, mas ele estava esperançoso
de que seria libertado em breve, tão esperançoso, na verdade, que
ele já tinha começado a fazer os preparativos para visitar Filemom e
Onésimo — inclusive reservando um quarto de hóspedes! Isso é fé.

TEOLOGIA
Temas Teológicos
Amor mútuo e fraternidade no corpo de Cristo
Paulo não só pediu para que Filemom aceitasse de forma fraternal a
Onésimo no evangelho, mas ele também deu forma ao amor fraternal no ato

1289
de pedir por ele. O idoso apóstolo poderia exigir de Filemom e facilmente
conseguir a obediência forçada ou fingida, mas Paulo optou por uma
abordagem paternal na forma de uma série de apelos gentis. Paulo também
destacou a reciprocidade dos relacionamentos cristãos. Filemom tinha
animado os fiéis no passado (v. 7), e agora ele tinha a chance de animar o
coração de outro crente companheiro (Paulo) aceitando Onésimo como um
cristão igual (v. 20). Paulo voluntariamente assumiu todas as possíveis
dívidas de Onésimo com Filemom (v. 18), mas ele também pediu a
Filemom para que lembrasse de sua própria dívida para com Paulo (v. 19).
O caráter familiar da carta decorre do fato de que o autor via Onésimo, não
apenas como seu filho (v. 10), mas também como uma parte de si mesmo
— “o meu próprio coração” (v. 12, A21). Patzia corretamente chamou o
apelo geral de Paulo de uma “obra-prima da diplomacia pastoral”.255

Uma visão cristã da escravidão e de outras questões


sociais
Embora Paulo não abordasse diretamente as questões sociais como a
escravidão em Filemom, ele sugeriu sim que o evangelho tinha implicações
importantes para essas questões. Paulo pediu a Filemom que aceitasse
Onésimo como um irmão igual em Cristo.256 A igualdade diante de Deus
mediante o evangelho desafia a própria essência da escravidão como a
propriedade de um ser humano por um outro.257
Essa abordagem é muito coerente com o ensinamento de Paulo em
Colossenses. Colossenses 4.1 exorta senhores cristãos a pagarem aos seus
escravos o que era certo e justo e a tratarem seus escravos como queriam
ser tratados pelo seu senhor, Jesus Cristo. Se os senhores de escravos

1290
ouvissem as palavras de Paulo, a instituição da escravidão dentro da igreja
seria transformada de uma relação senhor/escravo para uma relação de
empregador/empregado, ou, melhor ainda, uma relação fraternal.
Relacionamentos no nível social (senhores e escravos) parecem muito
diferentes sob a luz redefinidora dos relacionamentos desfrutados no nível
espiritual (coirmãos e coescravos de Cristo). A convenção social pode
apenas secar e morrer, quando o evangelho arranca o conceito que a
fundamenta e estabelece seu crescimento. Carson e Moo disseram muito
bem: “A demora para que isso acontecesse é um triste capítulo de cegueira
cristã quanto às implicações do evangelho.”258

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON259


A centralidade do evangelho de Cristo e a parceria no evangelho (Fl
1.5; 4.15)
A auto-humilhação de Cristo (kenōsis) e posterior exaltação (Fp 2.5-
12)
A supremacia de Cristo, a obra de reconciliação cósmica de Cristo, e a
batalha espiritual (Ef 1.10, 20-23; 6.10-18; Cl 1.15-20)
A sujeição de todas as coisas ao senhorio de Cristo e as presentes
implicações da vitória de Cristo para os fiéis (Ef 1.10; 4.1 a 6.9; Cl 3.1
a 4.1)
A unidade da igreja como corpo de Cristo composta de judeus e
gentios (Ef 2.11-22; 3.1-13; 4.1-6; Cl 1.24 a 2.3; 3.12-17)
A alegria cristã e ação de graças (Fp 1.12-20; 4.4; Cl 1.9-12; 2.6,7;
3.17; 4.2)

1291
A transformação cristã das estruturas socioeconômicas tais como a
escravidão (Filemom)
Relacionamentos sociais (Ef 5.22 a 6.9, Cl 3.18 a 4.1)

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Quais as cinco evidências normalmente utilizadas para rejeitar a
autoria paulina de Efésios?
2. Qual é a provável data, procedência, destino, ocasião e propósito de
cada uma das quatro Epístolas da Prisão?
3. Qual é o tema teológico central de Efésios?
4. Por que a questão da proveniência é uma das questões mais
contestadas em Filipenses?
5. Qual é a ocasião e o propósito de Efésios?
6. Qual é a contribuição mais importante de Efésios para o cânon?
7. O que é a “heresia de Colossos” e o que ela tem a ver com a ocasião de
Colossenses?
8. Quais são os três principais pontos que Paulo defende em
Colossenses?
9. Quais são as três principais contribuições que Colossenses faz para o
cânon?
10. Por que Filemom é incluída nas discussões de Efésios, Filipenses e
Colossenses já que canonicamente está separada delas?
11. Quais são cinco ocasiões possíveis para Filemom?
12. Quais são dois temas teológicos em Filemom?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS

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ABBOTT, T. K. A critical and exegetical commentary on the Epistles to
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Testament Studies Monograph Series 63 (Cambridge: University
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225
A. G. Patzia, “Philemon, letter to”, in: Dictionary of Paul and his letters, p. 703.

226
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 589.

227
F. C. Baur, Paul: his life and works (London: Williams and Norgate, 1875), 1:246.

228
Por exemplo, O’Brien, Colossians, Philemon, p. xli-liv.

229
J. Knox, Philemon Among the Letters of Paul, 2. ed. (New York: Abingdon, 1959).

230
Desde antigamente (p. ex., Teodoreto) se conjectura que Áfia era a esposa de Filemom, uma

vez que seu nome aparece ao lado do seu (v. 2). Veja O’Brien, Colossians, Philemon, p. 273

(“provavelmente correto”). Alguns estudiosos teorizam ainda que Arquipo era filho de Áfia e

Filemom, embora isso seja impossível de verificar (ibid.: “possivelmente”).

231
Dunn, Colossians and Philemon, p. 300-01.

232
Kümmel, Introduction, p. 349.

233
A proposta de Corinto recebeu pouco apoio acadêmico.

234
Dunn, Colossians and Philemon, p. 308; cf. B. M. Metzger, A textual commentary on the

greek New Testament, 2. ed. (New York: United Bible Societies, 1994), p. 589-90.

235
deSilva, Introduction to the New Testament, p. 668.

1300
236
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 592 [publicado em português por Vida

Nova sob o título Introdução ao Novo Testamento]. Dunn (Colossians and Philemon, p. 308) também

alegou que se deveria levar em conta o tom de incerteza no v. 22. Ele disse que não se pode excluir a

possibilidade de que Paulo estivesse apenas dizendo: “Reserve um quarto pronto para mim; nunca se

sabe quando eu poderei aparecer”.

237
J. G. Nordling, “Onesimus Fugitivus: a defense of the runaway slave hypothesis in

Philemon”, JSNT 41 (1999), p. 97-119.

238
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 590.

239
Bruce, Colossians, Philemon, and Ephesians, p. 197; P. Lampe, “Keine Sklavenflucht des

Onesimus”, ZNW 76 (1985), p. 135-7; J. M. G. Barclay, Colossians and Philemon (Sheffield:

Sheffield Academic Press, 1997), p. 101.

240
S. Winter, “Paul’s letter to Philemon”, NTS 33 (1987), p. 1-15.

241
Knox fechou o ciclo ao propor que Onésimo se tornou o bispo de Éfeso que usou sua

influência para assegurar que a carta entrasse no Cânon.

242
Winter (“Philemon”, p. 3-4) lê o “tenho ouvido” sobre a fé de Filemom (v. 5) como um

relatório da parte de Onésimo e o “compartilhar de tua fé” como a resposta de Paulo ao envio de

Onésimo por Filemom (v. 6). Embora essa leitura seja possível, de forma alguma ela é a leitura mais

direta do texto.

243
Muitos estudiosos reconhecem a possibilidade de que o Onésimo de Filemom e o Onésimo de

Inácio sejam a mesma pessoa (p. ex., O’Brien, Colossians, Philemon, p. 268).

244
A alegação de que um encontro casual entre Paulo e Onésimo em Roma provavelmente não é

histórico pode de forma indevida diminuir o ensino das Escrituras sobre a providência graciosa de

Deus (p. ex., Mt 2.1-12; Lc 2.25-38; At 8.26-40).

1301
245
J. A. Fitzmyer, The Letter to Philemon: a new translation with introduction and commentary,

AB 34C (New York: Doubleday, 2000), p. 17-8.

246
Aune, Westminster dictionary, p. 356.

247
Dunn (Colossians and Philemon, p. 303) contrastou esse estado de coisas com a carta de

Plínio a Sabiniano. Ele também alegou que esse contraste foi o que levou à insatisfação generalizada

com a hipótese do escravo fugitivo. Segundo Dunn, a dificuldade em explicar esse contraste é a

“principal fraqueza” da recente defesa da hipótese por Nordling (n. 11).

248
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 592.

249
F. F. Church, “Rhetorical structure and design in Paul’s Letter to Philemon”, HTR 71 (1978),

p. 19-20.

250
S. K. Stowers, Letter writing in greco-roman antiquity (Philadelphia: Westminster, 1986), p.

153-65.

251
J. P. Heil, “The chiastic structure and meaning of Paul’s letter to Philemon”, Bib 82 (2001), p.

178-206. J. W. Welch (“Chiasmus in the New Testament”, in: J. W. Welch, org., Chiasmus in

antiquity: structures, analyses, exegesis [Hildesheim: Gerstenberg, 1981], p. 225-26) identificou uma

estrutura quiástica semelhante, mas sua proposta é problemática devido à enorme complexidade de

identificar 20 unidades quiasticamente emparelhadas.

252
Patzia, “Philemon”, p. 703.

253
Veja O’Brien (Colossians, Philemon, p. 291-92) que observou que há muitos exemplos

extrabíblicos de trocadilhos envolvendo “útil” e “inútil”.

254
Kümmel (Introduction, p. 349) considerou a ideia de que Paulo esperava que Filemom

libertasse Onésimo como algo “improvável”, embora ele nunca tenha dado fundamentasse essa

afirmação.

1302
255
Patzia, “Philemon”, p. 706.

256
N. R. Petersen (Rediscovering Paul: Philemon and the sociology of Paul’s narrative world

[Philadelphia: Fortress, 1985]) argumentou em termos sociológicos que a carta de Filemom é um

drama narrativo no qual Paulo confrontou Filemom a escolher entre afinidade com a igreja ou com o

mundo.

257
Para excelentes estudos sobre a escravidão no Oriente Próximo, no AT, e no mundo greco-

romano, veja M. A. Dandamayev; S. S. Bartchy, in: ABD 6:56-73.

258
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 594.

259
Observe que as seções Contribuição para o Cânon, Questões para Estudo, e Para Estudos

Adicionais cobrem todas as quatro Epístolas da Prisão.

1303
CAPÍTULO 15

As epístolas pastorais: 1 e 2Timóteo e


Tito

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimento básicos: os estudantes deverão conhecer os principais fatos
de 1 e 2Timóteo e Tito. Em relação à História, deverão ser capazes de
identificar o autor, data, origem, destino e propósito de cada livro. Em
relação à Literatura, deverão ser capazes de fornecer uma descrição básica
de cada livro e identificar os principais elementos do conteúdo de cada livro
encontrados na Discussão Unidade por Unidade. Em relação à Teologia, os
estudantes deverão ser capazes de identificar os principais temas teológicos
encontrados nas Epístolas Pastorais.
Conhecimento intermediários: além do domínio do conteúdo
essencial identificado nos Conhecimentos básicos, os estudantes deverão
ser capazes de apresentar os argumentos para conclusões históricas,
literárias e teológicas. Com relação à História, os estudantes deverão ser
capazes de discutir as evidências da autoria paulina, data, origem, destino e
propósito. Com relação à Literatura, eles deverão ser capazes de fornecer
uma descrição pormenorizada de cada livro. Com relação à Teologia, os

1304
estudantes deverão ser capazes de discutir os grandes temas teológicos nas
Epístolas Pastorais e as maneiras pelas quais elas contribuem de forma
única para o cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além de domínio dos conteúdos essenciais
identificados nos itens Conhecimentos básicos e Conhecimentos
intermediários, os estudantes deverão ser capazes de discutir o gênero das
Pastorais e de discutir como a literatura pseudônima antiga se relaciona com
a autoria das Pastorais. Além disso, os estudantes deverão ser capazes de
avaliar criticamente as propostas estruturais alternativas para 1 e 2Timóteo
e Tito.

Mapa 15.1: Origem e destino de 1 e 2Timóteo e Tito.

1305
FATOS-CHAVE DAS EPÍSTOLAS PASTORAIS
Autor: Paulo
Data: Entre o início e a metade dos anos 60
Origem: Macedônia (1Timóteo); Roma (2Timóteo);
desconhecida (Tito)
Destino: Éfeso (1Timóteo; 2Timóteo); Creta (Tito)
Motivo: Instruções aos delegados apostólicos sobre
como lidar com várias questões na igreja
Propósito: Instruir e equipar Timóteo e Tito em suas
funções como delegados apostólicos
Tema: Estabelecimento da igreja após o período
apostólico
Versículos-Chave: 2Timóteo 4.1,2

INTRODUÇÃO

As Epístolas Pastorais, 1 e 2Timóteo e Tito, fazem uma contribuição


única e indispensável para os escritos do NT.1 Completando Atos, elas
fornecem instruções vitais sobre as qualificações para os líderes da igreja e
outras questões importantes para o governo e a administração da igreja.
Muito provavelmente elas foram as últimas cartas que Paulo escreveu
durante a sua longa carreira missionária, já no fim de seu ministério
apostólico. Tão precoces quanto o Cânon de Muratori (fim do séc. II), o
caráter especial das Pastorais foi reconhecido e elas foram designadas como
relacionadas ao “regulamento da disciplina eclesiástica”.2 A designação
“Epístolas Pastorais” aparentemente remonta a D. N. Berdot, que se referiu
a Tito como uma “epístola pastoral” em 1703, e P. Anton de Halle, que em

1306
1726 fez uma série de palestras sobre 1 e 2Timóteo e Tito, intituladas “As
Epístolas Pastorais”.3
Timóteo e Tito são frequentemente vistos como pastores paradigmáticos
(sênior) de igrejas locais. Deve-se observar, contudo, que, tecnicamente, o
papel de Timóteo e Tito não era realmente o de um pastor permanente e
residente de uma igreja. Antes, os homens eram delegados apostólicos de
Paulo que foram temporariamente designados para os seus presentes locais
a fim de lidar com problemas específicos que surgiram e que precisavam de
atenção especial.4 Por esse motivo as Pastorais não são apenas cartas que
dão conselhos aos ministros mais jovens ou manuais de regras para a igreja.
Elas são as instruções de Paulo a seus delegados especiais, dadas perto do
fim da era apostólica num momento em que o velho apóstolo teria sentido
uma intensa responsabilidade de garantir a transição ordenada do período
apostólico para o período pós-apostólico. Como tais, elas contêm instruções
apostólicas relevantes e dignas de crédito para o governo da igreja em
qualquer tempo e lugar.
Como discutido mais adiante, parece que 1Timóteo e Tito foram escritas
após a libertação de Paulo de sua primeira prisão romana (veja cap. 14
sobre as Epístolas da Prisão), mas antes da segunda prisão romana,
consideravelmente mais severa, durante a qual Paulo compôs 2Timóteo,
que acabou sendo sua última carta incluída no canôn. Não se sabe se
1Timóteo ou Tito foi escrita primeiro.5 No cânon, a ordem é “1Timóteo-
2Timóteo–Tito”, embora a ordem cronológica real de redação fosse quase
certamente “1Timóteo–Tito-2Timóteo” ou “Tito-1Timóteo-2Timóteo”.6
Para nossos presentes propósitos, seguimos a ordem canônica, tratando
2Timóteo antes de Tito e em conjunto com 1Timóteo, uma vez que 1 e
2Timóteo são dirigidas a um mesmo indivíduo e à mesma igreja e, portanto,

1307
ambas as cartas implicam um conjunto similar de questões introdutórias que
são melhor discutidas em conjunto.7

HISTÓRIA
Autor
Evidências externas
A autenticidade da correspondência de Paulo com Timóteo e Tito foi
incontestável até o século XIX.8 Muito provavelmente as cartas de Paulo a
Timóteo eram conhecidas por Policarpo (c. 117), que pode ter citado
1Timóteo 6.7,10 (Filipenses 4.1).9 As primeiras atestações inequívocas são
encontradas em Atenágoras (Súplica 37.1; c. 180) e Teófilo (A Autólico
3.14; final do séc. II), os quais, ambos, citam 1Timóteo 2.1,2 e fazem alusão
a outras passagens nas Epístolas Pastorais. Ireneu (c. 130-200), em várias
passagens em sua obra Contra Heresias (veja 1.pref.; 1.23.4; 2.14.7; 3.1.1),
citou cada uma das cartas e identificou seu autor como o apóstolo Paulo.
Clemente de Alexandria (c. 150-215; Stromateis 2.11) observou que alguns
gnósticos que percebiam a si mesmos como o alvo da denúncia de
1Timóteo 6.20,21 rejeitaram as cartas de Paulo a Timóteo. O Cânon de
Muratori (final do séc. II?) incluiu as três cartas no corpo paulino.
A avaliação geral de Marshall da evidência patrística sobre as Pastorais
é notável principalmente porque ele não defendia a autoria de Paulo: “pode-
se concluir que as EP [Epístolas Pastorais] eram conhecidas dos escritores
cristãos desde o início do século II e que não existe evidência de rejeição
delas por qualquer escritor exceto Marcião”.10 Consequentemente, as
Pastorais tornaram-se parte do cânon do NT estabelecido da igreja, e a

1308
autoria de Paulo das Pastorais não foi seriamente questionada por mais de
um milênio e meio.

Pseudonimato e evidências internas


Foi apenas no século XIX que um crescente número de comentaristas
começou a alegar que as Epístolas Pastorais constituíam um exemplo de
escritos pseudônimos nos quais um seguidor posterior atribuía o seu próprio
trabalho a seu reverenciado professor a fim de perpetuar o ensino e a
influência daquela pessoa.11 A princípio, esse ponto de vista pode parecer
surpreendente uma vez que as três Epístolas Pastorais têm início com a
inequívoca atribuição, “Paulo, um apóstolo de Cristo Jesus”, ou uma
expressão similar (1Tm 1.1; 2Tm 1.1; Tt 1.1). Parece difícil compreender
como alguém que não o apóstolo Paulo poderia ter escrito aquelas cartas
que ele falsamente atribuiu ao apóstolo, com essas cartas sendo aceitas no
cânon do NT como paulinas. E tudo isso supostamente aconteceu sem
qualquer intenção de enganar ou por qualquer erro da parte da igreja.
Na verdade, como veremos, a autoria paulina das Epístolas Pastorais é
de longe a melhor conclusão com base em todas as evidências disponíveis e
em vários dos principais problemas ligados a qualquer posição de
pseudonimato ou alonimato.12 A questão é essencialmente de natureza
histórica. O pseudonimato epistolar é atestado no primeiro século? Se sim,
seria tal prática tão eticamente irrepreensível e desprovida de intenções
enganosas como frequentemente é alegado?13 Poderiam cartas pseudônimas
ter sido aceitáveis pela igreja primitiva? Se sim, seria o pseudonimato mais
plausível do que a autenticidade, no caso das Pastorais?14

1309
A atenção tem sido frequentemente chamada para as diferenças de estilo
e vocabulário entre as Pastorais e as demais cartas paulinas.15 As Pastorais
apresentam palavras não utilizadas em nenhum outro escrito de Paulo, tais
como “piedade” (eusebeia), “autocontrolado” (sōphrōn), ou epiphaneia em
vez de parousia para se referir à volta de Cristo (veja 2Ts 2.8), enquanto a
terminologia paulina característica é omitida: “liberdade” (eleutheria),
“carne” (sarx, especialmente utilizada em contraste com o Espírito), “cruz”
(stauros), “justiça de Deus” (dikaiosynē theou).16 No entanto, conclusões a
respeito da autoria com base em diferenças estilísticas são muito precárias
porque o tamanho da amostra é muito pequeno para conclusões definitivas
com base somente nas estatísticas das palavras.17 Além disso, existe a
diferença entre as cartas abertas enviadas às congregações (as dez cartas
paulinas) e a correspondência pessoal, como as Pastorais.18 Também, Paulo
sentiu que estava chegando ao fim de sua vida e que havia uma necessidade
urgente de assegurar a preservação da sã doutrina para o período pós-
apostólico, o que explica a ênfase das Epístolas Pastorais nas qualificações
para liderança e organização da igreja e a fiel transmissão da tradição
apostólica.
Além disso, embora o pseudonimato não fosse incomum para os
escritos apocalípticos, Evangelhos ou mesmo Atos, cartas pseudônimas são
extremamente raras.19 Das duas fontes judaicas sobreviventes, a Epístola de
Jeremias e a Carta de Arísteas são nomes bastante incorretos, pois
nenhuma delas pode ser apropriadamente classificada como uma carta: a
primeira é uma homilia; a segunda, um relato das circunstâncias da
tradução das escrituras hebraicas para o grego.20 Na era apostólica, longe de
uma aceitação das cartas pseudônimas, houve, na realidade, uma
considerável preocupação de que cartas pudessem ser forjadas (2Ts 2.2:

1310
“uma carta parecendo ser nossa”). Assim, Paulo se referiu à marca
distintiva em todas as suas cartas (Gl 6.11; 2Ts 3.17; 1Co 16.21; Cl 4.18;
Fm 19). No século II, Tertuliano (c. 160-225) informou que um presbítero
da Ásia foi afastado do cargo por forjar uma carta em nome de Paulo (Sobre
o Batismo 17). Tanto 3Coríntios quanto a Epístola aos Laodicenses são
tentativas transparentes, na forma apócrifa costumeira, de preencher uma
lacuna percebida na revelação canônica (veja 1Co 5.9, 2Co 2.4; 7.8; Cl
4.16).21 No final do século II, Serapião, o bispo de Antioquia (falecido em
211), nitidamente distinguiu entre os escritos apostólicos e aqueles que
“falsamente levam seus nomes” (pseudepígrafes, citado em Eusébio, Hist.
Ec. 6.12.3). Com base nessa evidência, parece duvidoso que a igreja
primitiva tenha sido preparada para aceitar cartas pseudônimas no cânon
cristão.22
Uma outra questão importante é o número significativo de
particularidades históricas apresentadas nas Pastorais. Embora seja possível
que um posterior imitador de Paulo tenha fabricado essas informações para
dar maior verossimilhança à sua carta, parece muito mais confiável
enxergar essas referências como exemplos autênticos na vida e ministério
de Paulo.23 Por essa razão, Carson e Moo estão sem dúvidas certos que “as
Pastorais são muito mais parecidas com as cartas aceitas como de Paulo do
que com os conhecidos documentos pseudônimos que circularam na igreja
primitiva”.24 Isso, é claro, de forma alguma elimina a possibilidade de que
Paulo possa ter empregado um amanuense, como ele frequentemente fez em
outros situações.25
Assim, se Paulo foi o autor das Pastorais, é necessário lembrar alguns
dos principais detalhes biográficos de sua vida antes de ele escrever essas
cartas. Paulo é oriundo do “próspero centro comercial e intelectual”26 de

1311
Tarso na Cilícia (At 9.11; 21.39; 22.3). Ele estudou sob orientação do
eminente rabino judeu do primeiro século Gamaliel I (At 22.3; veja 5.34-
39) e zelosamente perseguiu os primeiros cristãos (At 7.56 a 8.3; 9.1-2; 1Co
15.9; Fp 3.6). Um encontro com o Cristo ressurreto no caminho para
Damasco (At 9.1-9; 22.6-10; 26.12-18), no entanto, causou uma mudança
de paradigma no pensamento de Paulo e uma radical reorientação do curso
da sua vida. Ele, que havia assumido que Jesus era um impostor messiânico
amaldiçoado por Deus, agora o reconhecia como o Messias de Deus (Gl
3.10-14; 2Co 5.21). E ele que tinha sido o inimigo mais comprometido da
igreja (cf. 1Tm 1.15-17) agora tornou-se seu propagador mais fervoroso.
Após vários anos de silêncio (Gl 1.21-24), Paulo foi recrutado para
participar da missão da igreja primitiva aos gentios (At 11.25,26). Ele
rapidamente se tornou o líder dessa missão e reuniu em torno de si um
grupo de colaboradores que incluía Timóteo e Tito.
Embora o próprio Paulo tenha assumido a responsabilidade pelas igrejas
que ele estabeleceu, ele delegou algumas tarefas a seus colaboradores de
confiança. Isso se tornou uma necessidade especialmente no final da vida
de Paulo, que foi caracterizada por uma série de prisões (At 24.22-27;
28.11-31; 2Co 11.23; Ef 6.20; Fp 1.14; 2Tm 1.8), várias doenças (Gl 4.13-
15; 2Co 12.7-10), e idade avançada.27 Assim, como mostrado abaixo, ao se
afirmar que Paulo foi o autor das Pastorais, o estabelecimento em vida
desses escritos foi mais provavelmente o desejo de Paulo de dar
continuidade entre os períodos apostólico e subapostólico (o tempo
subsequente à era apostólica), para transmitir a mensagem ortodoxa da fé
cristã e para fornecer princípios saudáveis para o governo da igreja. Embora
dirigidas a situações específicas, essas instruções transcendem seu contexto
original e aplicam-se também à igreja de todas as eras.

1312
Destino
1 e 2Timóteo
Paulo escreveu em 1Timóteo 1.3: “Como insisti contigo quando fui para a
Macedônia, permanece em Éfeso”. Isso indica que Timóteo tinha sido
colocado no comando da igreja nessa importante cidade. Éfeso estava
situada na costa ocidental da Ásia Menor (moderna Turquia).28 Josefo se
refere a Éfeso como “a principal cidade da Ásia” (Ant. 14.224). Semelhante
a Corinto, a localização da cidade ao longo de uma importante rota
comercial a tornou a principal candidata para se plantar uma igreja que
pudesse servir como uma cabeça-de-ponte para outras congregações no
Império Romano. A cidade era famosa por seu culto e templo dedicados à
deusa grega Ártemis (veja At 19.28-41). Como um centro de adoração
pagã, Éfeso apresentava um considerável desafio para a missão cristã. A
igreja de Éfeso foi iniciada durante os três anos que Paulo permaneceu na
cidade (At 19.8; veja 20.31) e provavelmente consistia de diversas igrejas
domiciliares (veja 1Co 16.19). Éfeso também ostentava uma considerável
população judaica. Não há nenhuma indicação em 2Timóteo de qualquer
diferença de localização com relação ao ministério de Timóteo, e há razões
suficientes para se supor que Timóteo e a igreja em Éfeso são também o
destino da segunda carta de Paulo a Timóteo.
Timóteo ocupava um lugar especial no coração e na missão de Paulo e
(1Co 4.17; Fp 2.20,22; 1Tm 1.2; 2Tm 1.2). Paulo o conheceu em Listra,
que na época fazia parte da província romana da Galácia (Turquia
moderna). É possível, mas não certo, que seus caminhos tenham se cruzado
durante a visita anterior de Paulo a Listra (At 14.8-20; veja 2Tm 3.10,11).
Timóteo era produto de um casamento misto de um pai gentio e uma mãe

1313
judia. Ele era um “crente” (At 16.1,2), tendo sido ensinado nas Escrituras
desde a sua mocidade (2Tm 1.5; 3.15). Recomendado por sua igreja local,
Timóteo se juntou a Paulo em sua segunda viagem missionária e participou
da evangelização da Macedônia e Acaia (At 16.2; 17.14,15; 18.5). Ele
esteve associado a Paulo durante grande parte do seu prolongado ministério
em Éfeso (At 19.22), viajou com ele de Éfeso para a Macedônia, a Corinto,
de volta à Macedônia e para a Ásia Menor (At 20.1-6), e estava com Paulo
durante sua primeira prisão romana (Fp 1.1; Cl 1.1; Fm 1).
Timóteo também serviu como emissário de Paulo em pelo menos três
ocasiões antes de sua atual tarefa em Éfeso: em Tessalônica (c. 50), Corinto
(c. 53-54) e Filipos (c. 60-62). Paulo frequentemente o chamou de
“cooperador” (Rm 16.21; 1Co 16.10; Fp 2.22; 1Ts 3.2) e se referiu a ele
como o coautor de seis das suas cartas apostólicas (1 e 2Tessalonicenses,
2Coríntios, Filipenses, Colossenses, Filemom; veja esp. Fp 2.19-22; cf. 1Co
16.10). O autor de Hebreus mencionou a libertação de Timóteo de uma
prisão desconhecida (Hb 13.23). Devido à sua herança judaico-gentia mista
(At 16.1), Timóteo foi uma escolha ideal para ministrar em um ambiente
helenístico-judaico e para lidar com a heresia protognóstica judaica. Mesmo
na época em que 1Timóteo foi escrita, Timóteo era ainda bastante jovem
(1Tm 4.12), embora ele tivesse conhecido Paulo mais de 10 anos antes (At
16.1; c. 49 d.C.), se não antes. Portanto, Timóteo provavelmente estava com
quase trinta anos quando recebeu 1 e 2Timóteo.

Tito
Como a carta de Paulo a Tito indica, Tito tinha sido deixado em Creta, uma
ilha mediterrânea pela qual Paulo já havia passado em sua viagem pelo mar

1314
para Roma (Tt 1.5; veja At 27.7-13). Paulo indicou que os habitantes de
Creta eram proverbiais naquela época, por sua desonestidade, imoralidade e
preguiça (Tt 1.12). A declaração de Paulo de que ele deixou Tito em Creta
parece sugerir que Paulo esteve lá com ele, presumivelmente após os
acontecimentos de Atos. Tito tinha sido designado por Paulo para colocar
em ordem negócios inacabados e nomear presbíteros em cada cidade
(padrão de Paulo — veja At 14.21-23). Comparada com a tarefa de
Timóteo, a de Tito pode ter sido um pouco mais fácil pois Creta não era
nenhuma Éfeso — embora fosse conhecida por suas muitas cidades desde
Homero (Ilíada, 2.649). E, uma vez que Timóteo se encontrava em uma
situação onde já havia presbíteros (alguns dos quais pelo menos parecem ter
precisado de uma reprimenda, 1Tm 5.19,20), Tito foi encarregado da nova
nomeação de presbíteros em cada cidade. Assim, é possível que Paulo e
Tito tenham plantado essas igrejas após a primeira prisão romana de Paulo,
sem tempo para estabelecer a liderança antes que Paulo decidisse partir. No
entanto Tito, como Timóteo, enfrentou o desafio dos falsos mestres
“especialmente aqueles do judaísmo” (Tt 1.10).
Embora Tito não fosse tão próximo de Paulo quanto Timóteo, Tito
também era um colaborador de confiança. Quando Paulo foi discutir o seu
evangelho com os líderes da igreja de Jerusalém, levou Tito levou consigo
(Gl 2.1-3). Tito, um gentio, não foi obrigado a ser circuncidado na sua
conversão ao cristianismo, o que serviu para ilustrar a natureza do
evangelho de Paulo (Gl 2.3-5). Embora não seja mencionado em Atos, Tito
aparece repetidamente nas cartas de Paulo como um membro do círculo
paulino.29 Sua comissão por Paulo o encontrou na ilha de Creta, onde ele
devia tomar conta “do que foi deixado por fazer” (Tt 1.5). A cultura
cretense era conhecida pela sua decadência moral; assim, a tarefa de Tito

1315
não era fácil. Semelhante a 1Timóteo, a carta de Paulo a Tito tinha a
intenção de incentivar seu delegado a concluir a missão dada a ele em Creta
por seu mentor apostólico. Mais tarde, Tito deveria encontrar Paulo em
Nicópolis (Tt 3.12), e depois de estar com Paulo pelo que foi,
provavelmente, a última vez, Tito partiu para a Dalmácia (2Tm 4.10).

Data e Origem
Pode-se assumir que Paulo foi libertado da sua primeira prisão romana (At
28) e que se envolveu em um segundo ministério Egeu que oferece o
quadro adequado para 1 e 2Timóteo e Tito.30 Se assim for, Paulo
provavelmente escreveu sua primeira carta a Timóteo algum tempo depois
do ano 60 (a data mais provável da libertação de Paulo de sua primeira
prisão romana), mas antes de 66, a provável data para a segunda prisão
romana de Paulo que foi seguida de seu martírio sob Nero, que morreu em
68 d.C. A leitura mais natural de 1Timóteo 1.3 é que Paulo escreveu da
Macedônia. Timóteo, que nessa época estava baseado em Éfeso, necessitava
de conselhos sobre como lidar com os falsos mestres na igreja de Éfeso.
Para esse fim Paulo entrelaçou instruções pessoais com outras para a vida
da comunidade, para que Timóteo recebesse apoio apostólico público
enquanto era reconhecido que ele também tinha certas normas para seguir.31
Paulo provavelmente escreveu 2Timóteo de Roma no ano 66. Tito foi
provavelmente escrita no intervalo entre 1 e 2Timóteo (ou possivelmente
antes de 1Timóteo) de uma localidade desconhecida.
Muitas vezes é alegado que a estrutura da igreja nas Epístolas Pastorais
reflete a igreja no início do século II, em vez de no primeiro. Esse padrão
pode ser visto mais claramente em Inácio de Antioquia (c. 35-110), que

1316
defendia um episcopado monárquico e uma hierarquia eclesiástica em três
níveis (veja Ef. 2.2; Magn. 3.1; Tral. 2.2, 3.1).32 Mas isso é marcadamente
diferente das Epístolas Pastorais, onde os termos “bispo” (episkopos) e
“presbítero” (presbyteros) referem-se a um único e mesmo ofício (Tt 1.5,7;
veja At 20.17,28).33 No que diz respeito a um interesse na liderança
congregacional adequada, Paulo e Barnabé designaram presbíteros nas
igrejas que havia estabelecido antes do ano 50 (At 14.23; veja 11.30; 15.2;
20.28-31; 21.18), assim não há nada de novo na instrução de Paulo a Tito
para “designar presbíteros em cada cidade” (Tt 1.5). Após a referência em
Atos 14.23, em uma carta apenas um pouco anterior às Pastorais, Paulo
endereçou uma de suas Epístolas da Prisão aos “bispos e diáconos” em
Filipos (Fp 1.1). Isso concorda precisamente com a estrutura em dois níveis
pressuposta nas Pastorais (veja 1Tm 3). Na verdade, a ênfase nas
qualificações para bispos e diáconos nas Pastorais dá apoio a uma data do
primeiro século porque um escritor do século II teria esperado que seus
leitores já estivessem familiarizados com esse tipo de informação.34
Também, a hierarquia do primeiro século é diferente da do século II, e
pode-se detectar um desenvolvimento de 1Timóteo a Inácio.

Motivo
A principal preocupação de Paulo não foi descrever a respectiva heresia em
questão, mas refutá-la.35 A natureza dos falsos ensinos combatida nas
Epístolas Pastorais deve, portanto, ser deduzida da resposta do apóstolo.
Além disso, embora haja semelhanças inquestionáveis entre as heresias
confrontadas nas Pastorais, não se deve supor que os adversários são
precisamente os mesmos em cada caso.36 O ensino parece ter surgido de

1317
dentro das igrejas, em vez de ter invadido do exterior (1Tm 1.3; 6.2; 2Tm
2.14; 4.2; Tt 1.13; 3.10; cf. 1Tm 1.20; 2Tm 2.17,18), o que estava de acordo
com a previsão de Paulo (At 20.28-31). Alguns estudiosos até sugerem que
os hereges eram presbíteros da igreja, mas isso é incerto.37 Pode haver uma
conexão com os problemas de Corinto (veja 1Co 15.12,34) e, em especial, o
vale do Lico (compare 1Tm 4.3 com Cl 2.8, 16-23).
Materialmente, a heresia envolve um interesse em mitos e genealogias
(1Tm 1.4; 4.7; 2Tm 4.4; Tt 1.14; 3.9) e uma preocupação com a lei (1Tm
1.7; Tt 1.10,14; 3.9; veja Cl 2.16,17), que sugere que os falsos mestres eram
judeus (helenísticos).38 Em Éfeso, pelo menos, pode-se encontrar elementos
ascéticos, como a proibição do casamento ou a ingestão de determinados
alimentos (1Tm 4.1-5; veja Tt 1.15; Cl 2.18-23) e o ensino de que a
ressurreição já aconteceu (2Tm 2.17, 18; veja 1Tm 1.19,20; 1Co 15.12),39
que pode apontar para um dualismo de estilo grego que favorecia a
espiritualidade sobre a ordem natural. Como é o caso de muitas formas de
ensino falso, os hereges exibiam uma tendência de acrimônia e especulação
(1Tm 1.4,6; 6.4,20; 2Tm 2.14,16,23; Tt 1.10; 3.9), engano (1Tm 4.1-3;
2Tm 3.6-9,13; Tt 1.10-13; veja Cl 2.8), imoralidade (1Tm 1.19,20; 2Tm
2.22; 3.3,4; Tt 1.15), e ganância (1Tm 6.5; 2Tm 3.2,4; Tt 1.11; contraste
1Tm 3.3).
A prática de proibir o casamento era evidente tanto no judaísmo
(especialmente entre os Essênios, veja Filo, Apologia 380) quanto no
Gnosticismo posterior (Ireneu, Contra Heresias, 1.24.2). Até o próprio
Paulo às vezes exaltou as vantagens do celibato (1Co 7.1-7).40 Fee disse que
o problema pode ter sido “o reflexo da influência da especulação
helenístico-judaica no pensamento cristão”.41 Knight a chamou de uma
“forma gnóstica de cristianismo judaico” (veja 1Tm 6.20); outros a

1318
denominam de “uma forma de judaísmo aberrante com tendências
helenístico-gnósticas”, “protognosticismo judaico”, ou “judaísmo cruzado
com o gnosticismo”.42 Talvez houvesse uma “suspeita crescente de que o
casamento pertencia à velha ordem que já não existia ou que o modelo de
vida na era da ressurreição deveria ser encontrado nas descrições de vida
antes da queda em pecado”.43 De qualquer modo, aquilo a que Paulo
aparentemente se opunha aqui era um apelo à Lei mosaica em apoio das
práticas ascéticas que, nas suas raízes, eram motivadas pelo pensamento
gnóstico.44
Paulo denunciou as várias permutações da heresia em uma linguagem
bem forte como “discussões infrutíferas” (1Tm 1.6), “mitos ímpios e
fábulas infundadas” (1Tm 4.7, NVI), “discursos irreverentes e vazios”
(1Tm 6.20), “argumentos tolos e estúpidos” (2Tm 2.23, NVI), e “debates
tolos” (Tt 3.9). Isso teria criado um estereótipo na mente dos fiéis
advertindo-os contra a associação com esses falsos mestres.45 De certa
forma, Paulo pode ter visto a heresia como mais irrelevante do que falsa
(“mitos”, “disputas de palavras”), indicando que as “principais
especialidades desses mestres eram chavões vazios que Paulo nem sequer
considerava que valia a pena refutar”.46

Propósito
1Timóteo
Paulo afirmou o motivo para 1Timóteo da seguinte maneira: “conforme te
pedi quando eu fui para a Macedônia, permanece em Éfeso para que possas
ordenar certas pessoas a que não ensinem outra doutrina” (1Tm 1.3,4; veja
v. 18-20). A questão é saber se esse motivo constituía o propósito para

1319
1Timóteo na sua totalidade ou se Paulo tinha outros propósitos além de
instruir Timóteo sobre como lidar com esses falsos mestres. Contrário
àqueles que enfatizam a natureza ad hoc (lat., “para isso”, ou seja, dirigida a
uma dada circunstância apenas) das Pastorais, é provável que o propósito de
Paulo tenha sido bem mais amplo do que apenas lidar com os falsos
mestres.47
Especificamente, 1Timóteo 1.4-6 está preocupado principalmente com o
desafio dos falsos mestres, enquanto os capítulos 2 e 3 têm seu foco mais
construtivamente em questões organizacionais gerais. Isso é sugerido,
primeiro, pela expressão “antes de tudo, então” (1Tm 2.1), que introduz 2.1
a 3.16, o que sugere o início de uma nova seção;48 e, segundo, as palavras
de encerramento da mesma seção em 3.15: “Se eu demorar, eu te escrevi
para que saibas como as pessoas devem proceder na casa de Deus, que é a
igreja do Deus vivo, coluna e alicerce da verdade” (grifo nosso). Essa
afirmação solene mais o hino seguinte em 1Timóteo 3.16 indicam que
Paulo concebeu 1Timóteo não só como uma carta ocasional (ou seja,
limitada a este motivo específico), mas como aplicável à igreja em geral.
Terceiro, em concordância com o gênero de “Epístola Pastoral”, o ofício
de apóstolo de Paulo (1Tm 1.1, 2Tm 1.1, Tt 1.1) significa que suas cartas
transcendem o âmbito de qualquer congregação local. Como Paulo escreveu
em outras passagens, a igreja é “casa de Deus, edificada sobre o
fundamento dos apóstolos e profetas, com o próprio Jesus Cristo como
pedra angular” (Ef 2.19,20). Assim, as Epístolas Pastorais são documentos
fundamentais para a igreja, não apenas instruções ad hoc que tratam
somente das circunstâncias locais que não tinham implicações duradouras
para a igreja em geral.49

1320
Em 1Timóteo 4.1, Paulo retornou à questão dos falsos mestres. Além
disso, mesmo se o apóstolo abordasse as circunstâncias locais que exigiam
resolução, tais como os princípios para o cuidado das viúvas necessitadas
(1Tm 5.3-16) ou presbíteros pecadores (1Tm 5.17-25), as verdades e os
princípios enunciados por Paulo como um apóstolo são verdadeiras e
portanto obrigatórias — não apenas para Timóteo e para a igreja de Éfeso
na época da escrita — mas também para toda igreja, “a igreja do Deus vivo,
coluna e alicerce da verdade” (1Tm 3.15).50 Assim, o propósito de Paulo ao
escrever 1Timóteo era instruir Timóteo sobre como lidar com falsos mestres
e fornecer orientações sobre uma variedade de assuntos de importância
perene para a igreja.51

2Timóteo
A mais pessoal das cartas de Paulo é claramente 2Timóteo. Com Paulo
novamente na prisão (2Tm 1.8) e se aproximando do fim de sua vida (2Tm
4.6-8), este livro contém sua exortação final para que Timóteo “proclame a
mensagem” do evangelho cristão (2Tm 4.1,2) enquanto passava seu manto
a seu principal discípulo. Em termos de história da salvação, este livro
marca a transição do período apostólico para o subapostólico, durante o
qual os fiéis são exortados a edificar sobre o fundamento dos apóstolos e a
guardar o “bom depósito” feito por eles (2Tm 1.12,14, NVI). Mas o
apóstolo tocou em muitos temas de importância perene nesta carta que não
se limitam à circunstância original em que foram abordadas.52

Tito

1321
A carta de Paulo a Tito muito provavelmente foi escrita ao mesmo tempo
que 1Timóteo e pelas mesmas razões. No caso de Tito, o motivo é
declarado em Tito 1.5 da maneira que se segue: “O motivo pelo qual te
deixei em Creta foi para endireitar o que faltava e, como eu te orientei,
designar presbíteros em cada cidade”. Isso é seguido por um conjunto de
qualificações para os presbíteros em Tito 1.6-9. Embora inicialmente dada
para fornecer orientações a Tito, essa passagem dificilmente se limita ao
motivo original, mas continua a ter relevância para a igreja hoje quando
assegura que seus líderes reúnam os requisitos bíblicos. Além desse
propósito imediato, Paulo forneceu uma variedade de outras instruções a
Tito para a supervisão da vida da igreja. Ele articulou uma série de
importantes e permanentes verdades doutrinárias cristãs, tais como a
salvação não pelas obras, a regeneração dos fiéis pelo Espírito Santo, a
justificação pela graça, e assim por diante (veja Tito 3.4-7).

LITERATURA
Gênero
As Epístolas Pastorais estão de acordo com o formato padrão das cartas
antigas, incluindo uma saudação de abertura, um corpo com características
tais como uma ação de graças e o conteúdo principal, e uma saudação de
encerramento. Além disso, as Pastorais são muitas vezes identificadas como
exemplos de cartas parenéticas (exortatórias) que continham uma série de
exortações para os seus destinatários. Uma vez que 2Timóteo foi a última
carta de Paulo registrada — escrita de uma segunda e muito mais severa
prisão romana com o iminente martírio de Paulo — assim, ela assume o
caráter de um testamento final (semelhante a 2Pedro).53

1322
No entanto, as Pastorais são muito mais do que simples cartas escritas
por um indivíduo a outro com a finalidade de transmitir informações e
exortações. Como T. D. Gordon observou, “as Epístolas Pastorais são os
únicos escritos do Novo Testamento que são expressamente escritos com o
propósito de fornecer instruções para a organização das igrejas no final da
era apostólica”.54 Ele continuou:

O próprio apóstolo que havia estabelecido igrejas e preparado a sua subsequente supervisão,
pureza doutrinária e adoração, agora dá instruções para seus colaboradores sobre a
organização das igrejas nas gerações subsequentes. As normas e princípios que ele mesmo
havia observado na organização de suas igrejas, Paulo tornou explícitos a seus colaboradores
para que eles também pudessem organizar suas igrejas corretamente.55

Assim, o gênero das Pastorais está inextrincavelmente ligado ao contexto


histórico da vida do ministério de Paulo conforme estabelecido em Atos e
nas cartas de Paulo.
Hermeneuticamente, a importante implicação dessa compreensão do
gênero das Epístolas Pastorais é que “estas cartas contêm normas que são
especialmente pertinentes para as questões da vida na igreja, a ‘casa de
Deus’” (cf. 1Tm 3.14,15).56 Como Gordon observou: “as instruções nessas
cartas, longe de serem principalmente de importância local, são
significativas sempre que há uma preocupação com a organização adequada
da casa de Deus. Na verdade, como instruções dadas aos ministros pós-
apostólicos, as instruções contidas nas Epístolas Pastorais são
particularmente pertinentes para outras igrejas pós-apostólicas”.57

Integridade Literária
R. van Neste resumiu o estado dos estudos sobre as Pastorais da seguinte
maneira: “Até recentemente, um dos princípios amplamente aceitos dos

1323
estudos modernos com relação às Epístolas Pastorais era que elas não
possuíam qualquer estrutura ou ordem cuidadosa e significativa”.58 Isso não
estava confinado aos críticos liberais; até mesmo um comentarista
conservador como D. Guthrie escreveu: “Há uma falta de ordem estudada,
alguns temas sendo tratados mais de uma vez na mesma carta, sem
premeditação aparente […]. Essas cartas estão, portanto, muito distantes
dos exercícios literários”.59 A. T. Hanson, um oponente da autoria paulina
das Pastorais, afirmou: “As Pastorais são constituídas de uma coleção de
diversos materiais. Elas não possuem nenhum tema unificador; não há
nenhum desenvolvimento de pensamento”.60
Na última década, porém, o pêndulo se movimentou para longe de tais
avaliações. Contra aqueles que argumentaram contra a unidade e
integridade literária das Epístolas Pastorais, van Neste demonstrou no mais
cuidadoso estudo do tema até hoje que há “evidências de um elevado nível
de coesão em cada uma das Epístolas Pastorais” e que “todas as três cartas
apresentam evidências de cuidado na sua concepção”.61 I. H. Marshall
também observou que “há um crescente corpo de evidências de que as
Epístolas Pastorais não são um conglomerado de ideias diversas
grosseiramente reunidas sem um plano, propósito ou estrutura claros. Pelo
contrário, elas demonstram sinais de uma estrutura coerente e de
competência teológica”.62
À luz de avaliações como essas, parece que a integridade e a coerência
literária das Epístolas Pastorais têm sido amplamente reabilitadas contra as
acusações de incoerência pelos seus críticos. No que se segue, o plano
literário para cada uma das Pastorais é discutido brevemente. Conforme as
citações acima demonstram, a questão da unidade literária das Pastorais e
sua coerência teológica estão intimamente entrelaçadas. Por esta razão, a

1324
discussão dos principais temas teológicos seguindo o estudo da dimensão
literária das Pastorais contribuirá também para um julgamento adicional
sobre o assunto.

Plano Literário
1Timóteo
W. D. Mounce dividiu a estrutura de 1Timóteo da seguinte forma:

I. Saudação (1.1,2)
II. O problema Efésio (1.3-20)
III. Correção da conduta imprópria na igreja de Éfeso (2.1 a 4.5)
IV. Notas pessoais a Timóteo (4.6-16)
V. Como Timóteo deve se relacionar com os diferentes grupos na igreja (5.1
a 6.2a)
VI. Instruções finais (6.2b-21)63

No geral, esse esquema é sólido, especialmente ao traçar uma linha de


demarcação entre 1.20 e 2.164 e ao identificar de 5.1 a 6.2a como uma
unidade literária separada. No entanto, parece preferível ver 3.16 como a
conclusão das instruções de Paulo que começam em 2.165 e vê-lo como
iniciando uma nova unidade principal em 4.1 com referência aos últimos
dias.66 Se assim for, a discussão do plano literário de 1Timóteo pode
prosseguir como se segue.67
A primeira carta de Paulo a Timóteo imediatamente se volta para o
assunto em questão: a necessidade de Timóteo de “ordenar certas pessoas a
que não ensinem outra doutrina” na igreja de Éfeso (1.3,4). A costumeira
ação de graças de Paulo acontece depois de seus comentários iniciais a

1325
respeito desses falsos mestres, que é na verdade um agradecimento a Deus
pela conversão do próprio Paulo uma vez que ele mesmo em determinado
momento perseguiu a igreja de Deus (1.12-17). No final do primeiro
capítulo, Paulo mencionou dois desses falsos mestres pelo nome: Himeneu
e Alexandre (1.20).
Depois disso, Paulo fez a transição (“antes de tudo, então” 2.1) para
uma seção onde ele estabeleceu instruções para a igreja, de acordo com seu
propósito: “Eu te escrevo estas coisas, esperando ter contigo em breve. Mas
se eu demorar, eu te escrevi para que saibas como as pessoas devem agir na
casa de Deus, que é a igreja do Deus vivo, a coluna e o fundamento da
verdade” (3.14,15). Isso deixa claro que 2.1 a 3.16 constitui uma seção à
parte do capítulo 1 por um lado, e dos capítulos 4 a 6 por outro, ambos os
quais são dominados pela preocupação de Paulo com os falsos mestres.
Embora não totalmente ausentes dos capítulos 2 e 3, esses capítulos estão
ocupados com instruções mais positivas de Paulo a Timóteo sobre a forma
de governar a igreja. Estas incluem instruções sobre a oração (2.1-8), o
papel das mulheres na congregação (2.9-15), e qualificações para a
liderança da igreja, tanto os bispos (3.1-7) quanto diáconos (3.8-13). A
seção termina com uma apresentação do “mistério da piedade”,
possivelmente baseada em um pedaço de liturgia (3.16).
O capítulo 4 se inicia com a dramática expressão: “Agora o Espírito
afirma expressamente” (4.1) estabelecendo a obra dos falsos mestres
diretamente no contexto do final dos tempos, durante o qual as coisas irão
de mal a pior. Nesse contexto, Timóteo deve se separar dando atenção tanto
à sua vida pessoal quanto à sua doutrina, assim preservando a si mesmo e a
seus ouvintes (4.11-16). Instruções adicionais são dadas a respeito do
cuidado das viúvas (5.3-16); do trato com os presbíteros, incluindo aqueles

1326
que pecaram (5.17-25); a conduta apropriada dos escravos cristãos (6.1,2); e
dos ricos (6.3-10, 17-19). Timóteo, por outro lado, deve guardar o que lhe
foi confiado, como a exortação final de Paulo deixa claro (6.11-16,20,21).

2Timóteo
A estrutura de P. H. Towner para 2Timóteo é a seguinte:

I. Saudação de abertura (1.1,2)

II. Corpo da carta (1.3 a 4.8)


A. Chamado ao comprometimento pessoal (1.3-18)
B. Chamado à dedicação e fidelidade (2.1-13)
C. O desafio da oposição (2.14-26)
D. Profecia, comprometimento e chamado (3.1 a 4.8)

III. Instruções finais (4.9-18)

IV. Saudações de encerramento (4.19-22)68

Essa estrutura é bastante preferível à de Mounce, que


idiossincraticamente forneceu a seguinte divisão:

I. Saudação (1.1,2)
II. Ação de graças (1.3-5)
III. Encorajamento a Timóteo (1.6 a 2.13)
IV. Instruções a Timóteo e aos oponentes (2.14 a 4.8)
V. Palavras finais a Timóteo (4.9-22)69

1327
A seguinte discussão para o plano literário de 2Timóteo prossegue com uma
versão levemente modificada do esboço de Towner.70
A segunda carta de Paulo a Timóteo inicia com a habitual saudação e
ação de graças (1.1-7), seguidas de uma exortação a Timóteo para não ter
vergonha de Paulo, que está agora na prisão (1.8-12). Depois de contrastar
vários colaboradores, Paulo instruiu Timóteo sobre a natureza do ministério
cristão por meio de três metáforas: a do soldado, do atleta e do agricultor.
Cada uma tem lições importantes a ensinar sobre a disposição apropriada do
servo do Senhor (2.1-7). Paulo usou três metáforas adicionais para o
ministério cristão: o obreiro, diversos instrumentos, e o servo (2.14-26).
Acusações adicionais, notícias recentes e uma saudação final completam a
carta (caps. 3 e 4).

Tito
Mais uma vez, as diversas propostas relativas à estrutura de Tito revelam
um certo consenso, bem como diferenças nos detalhes. Towner propôs o
seguinte esboço:

I. Saudação de abertura (1.1-4)

II. Corpo da carta (1.5 a 3.11)


A. Instruções a Tito (1.5-16)
B. Instruções para a Igreja (2.1 a 3.11)

III. Notas pessoais e instruções (3.12-14)

IV. Saudação final e bênção (3.15)71

1328
A estrutura proposta por Towner é semelhante à de Mounce, que divide 1.5-
16 em 1.5-9 e 1.6-16, mas mantém 3.12-15 como uma unidade.72 A
proposta estrutural estabelecida abaixo difere apenas ligeiramente desses
dois grandes comentaristas.73
Semelhante a 1Timóteo, Paulo foi direto ao ponto, lembrando a Tito por
que Paulo o deixou em Creta: “para endireitar o que foi deixado por fazer e
[…] designar presbíteros em cada cidade” (1.5). Também de modo
semelhante a 1Timóteo, Tito recebeu várias instruções sobre como corrigir
os inimigos do evangelho, mantendo-se, ele mesmo, acima das disputas. Os
cristãos devem “adornar o ensino de Deus nosso salvador em tudo” (2.10) e
se dedicar a “toda boa obra” (3.1). Em concordância com a natureza pessoal
da carta, Paulo concluiu com algumas instruções finais e uma saudação de
encerramento (3.12-15).

ESTRUTURA DE 1TIMÓTEO
I. Abertura (1.1,2)

II. Exortação pessoal (1.3-20)


A. O desafio dos falsos mestres (1.3-11)
B. O testemunho de Paulo (1.12-17)
C. Exortação a Timóteo (1.18-20)

III. Questões congregacionais (2.1 a 3.16)


A. Sobre a oração (2.1-8)
B. Com respeito às mulheres (2.8-15)
C. Qualificações para líderes (3.1-13)
1. Bispos (3.1-7)

1329
2. Diáconos (3.8-13)
D. Propósito da carta de Paulo e confissão final (3.14-16)

IV. Exortações adicionais (4.1 a 6.2a)


A. Apostasia dos últimos dias (4.1-5)
B. Sendo um bom servo de Jesus Cristo (4.6-16)
C. Outras questões congregacionais, incluindo instruções sobre as
viúvas (5.1 a 6.2a)
1. Relativo a homens velhos e novos, mulheres mais velhas e mais
jovens (5.1,2)
2. Ministrando às viúvas (5.3-16)
3. Lidando com os presbíteros (5.17-25)
4. Instruções aos escravos (6.1,2a)

V. Exortações finais prolongadas (6.2b-19)

VI. Encerramento (6.20,21)

Algo para Pensar: Lembre de Sua Misericórdia

Quando Paulo escreveu sua primeira carta a Timóteo, ele havia


plantado dúzias de igrejas, planejado a missão cristã primitiva
praticamente sozinho, e orquestrado o crescimento espantoso de um
movimento mundial que tinha sido gerado por um humilde galileu
que encontrou uma morte ignominiosa em uma cruz na Judeia. Se
alguém tivesse o direito a uma dose de satisfação
autocongratulatória ou legitimamente poderia ter descansado à

1330
sombra de seus louros, era o apóstolo dos gentios. Mas Paulo
lembrou de suas raízes; ele se lembrou de seu antigo orgulho e
pecado. Será que você e eu nos lembramos que, se não fosse pela
misericórdia e graça de Deus, nós ainda estaríamos nos nossos
pecados?
No primeiro capítulo de 1Timóteo, Paulo dedicou a seção
habitual ação de graças ao reconhecimento de seu blasfemo passado
— como ele tinha perseguido o povo de Deus até que na estrada de
Damasco, ele conheceu o Cristo ressurreto. Humilde, ele reconheceu
que ele era o pior dos pecadores, de modo que ele pudesse servir de
exemplo para outros fiéis. Assim, quando Paulo avançou um pouco
mais na carta e expôs os falsos mestres Himeneu e Alexandre (1Tm
1.20), ele o fez consciente do fato de que em si mesmo ele não era
melhor do que eles ou qualquer outra pessoa. Era pela graça de
Deus que ele era quem era. O mesmo é verdade para você e para
mim.

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE DE


1TIMÓTEO
I. Abertura (1.1,2)
A abertura epistolar padrão menciona Paulo como o autor e Timóteo, seu
“verdadeiro filho na fé”, como o destinatário. “Misericórdia” é adicionada à
saudação tradicional de “graça e paz”.

II. Exortação Pessoal (1.3-20)

1331
Bem no início, Paulo afirmou o motivo para escrever, o desafio dos falsos
mestres (1.3-11). O testemunho de Paulo mostra que somente a graça de
Deus separava Paulo dos falsos mestres (1.12-17). A seção de abertura
conclui com uma exortação a Timóteo e uma identificação pelo nome de
dois falsos mestres, Himeneu e Alexandre (1.18-20).

III. Questões Congregacionais (2.1 a 3.16)


Com a transição, “antes de tudo, então, exorto”, Paulo se voltou para
algumas das grandes questões à mão. Ele abordou várias questões
relacionadas com a oração congregacional (2.1-8) antes de se voltar para as
questões relacionadas com a liderança na igreja. As mulheres devem se
vestir com modéstia e não devem ensinar ou exercer autoridade sobre os
homens (2.8-15). Candidatos do sexo masculino a bispos devem atender a
certas qualificações (3.1-7), assim como candidatos a diáconos, homens ou
mulheres (3.8-13).74 A seção termina com uma declaração de propósito da
carta de Paulo e uma confissão conclusiva (3.14-16).

IV. Exortações Adicionais (4.1 a 6.2a)


Voltando ao desafio dos falsos mestres, Paulo localiza esse fenômeno no
contexto mais amplo da apostasia dos últimos dias (4.1-5). Ele instruiu
Timóteo a ser um bom servo de Jesus Cristo (4.6-16) e abordou vários
outros assuntos congregacionais, tais como os relacionados aos homens
mais velhos e os mais jovens, bem como os relacionados às mulheres mais
velhas e as mais jovens (5.1,2); a ministração às viúvas que estão
verdadeiramente necessitadas (5.3-16); a nomeação ou disciplina dos
presbíteros (5.17-25); e a instruções aos escravos (6.1,2a).

1332
V. Exortação Final Prolongada e Encerramento
(6.2b-21)
A primeira parte da exortação final de Paulo está relacionada a uma
acusação de encerramento aos falsos mestres (6.2b-10). Esta é seguida por
uma exortação final a Timóteo, diante de Deus, para que cumpra seu
ministério de acordo com sua “boa confissão” feita diante de muitas
testemunhas (seu culto de ordenação?) e à luz da esperança do retorno de
Cristo. A doxologia (6.15,16) é seguida por uma exortação aos ricos (6.17-
19) e uma última exortação a Timóteo para que se oponha ao que
falsamente se chama “conhecimento” (talvez o gnosticismo incipiente;
6.20,21).

ESTRUTURA DE 2TIMÓTEO
I. Abertura (1.1,2)

II. Ação de graças e exortação pessoal (1.3-18)


A. Ação de graças (1.3-7)
B. Chamado ao sofrimento e à fidelidade (1.8-14)
C. Colaboradores fiéis e infiéis (1.15-18)

III. Metáforas ministeriais, o evangelho de Paulo, e um dito confiável (2.1-


26)
A. Três metáforas ministeriais: soldado, atleta, agricultor (2.1-7)
B. Um dito confiável (2.8-13)
C. Três papéis ministeriais adicionais: obreiro, instrumento, servo (2.14-
26)

1333
IV. Exortações adicionais (3.1 a 4.8)
A. Apostasia dos últimos dias (3.1-9)
B. Manter o curso (3.10-17)
C. Pregar a palavra (4.1-8)

V. Notícias recentes (4.9-18)

VI. Saudações de encerramento (4.19-22)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE DE


2TIMÓTEO
I. Abertura (1.1,2)
A abertura de 2Timóteo é muito parecida com a de 1Timóteo. Mais uma
vez, Paulo se identificou como o escritor, chamou Timóteo de “filho
amado” e saudou a Timóteo com “graça, misericórdia e paz”.

II. Ação de Graças e Exortação Pessoal (1.3-18)


Uma abertura de ação de graças (1.3-7) e um apelo geral ao sofrimento e
fidelidade (1.8-14) substituem o apelo mais urgente encontrado no início da
primeira carta de Paulo a Timóteo. Paulo encerrou a introdução com um
contraste entre os colaboradores fiéis e os infiéis (1.15-18).

III. Metáforas Ministeriais, o Evangelho de Paulo


e um Dito Confiável (2.1-26)

1334
Em sua exortação a Timóteo seu “filho”, Paulo utilizou três metáforas que
ilustram a natureza do ministério cristão: a do soldado, do atleta e do
agricultor (2.1-7). Cada uma delas transmite uma característica-chave que
Paulo gostaria que Timóteo cultivasse. No coração desta seção se encontra
uma minidoxologia cuidadosamente organizada (um dos vários “ditos
confiáveis” apresentados nas Epístolas Pastorais), que tem seu foco na obra
de salvação de Cristo e suas implicações para os obreiros de Deus (2.8-13).
A seção termina com três papéis ministeriais adicionais: obreiro,
instrumento e servo (2.14-26).

IV. Exortações Adicionais (3.1 a 4.8)


Como em 1Timóteo, quase na metade da carta Paulo se referiu à apostasia
dos últimos dias operando nos falsos mestres (3.1-9). Ele encorajou
Timóteo a permanecer no curso (3.10-17) e a pregar a palavra (4.1-8). A
exortação para pregar a palavra marca a solene, climática exortação
conclusiva das duas cartas de Paulo a Timóteo, na medida que é dada
“diante de Deus e Cristo Jesus, que vai julgar os vivos e os mortos, pela sua
aparição e pelo seu reino”.

V. Notícias Recentes (4.9-18)


A carta conclui com algumas notícias recentes da movimentada vida do
apóstolo, mesmo na prisão, quando ele coordenou a missão da igreja
primitiva (4.9-18), e com saudações finais (4.19-22). Paulo exortou
Timóteo a que se encontrasse com ele rapidamente e, se possível, antes do
inverno. Somente Lucas estava com Paulo, e o apóstolo queria que Timóteo
trouxesse Marcos com ele também, uma vez que ele estava aliviado por

1335
Tíquico, que ficaria em Éfeso e ocuparia o lugar de Timóteo após entregar a
presente carta para ele.

VI. Saudações de Encerramento (4.19-22)


Saudações de encerramento são enviadas a Priscila e Áquila e à casa de
Onesíforo.

Algo Para Pensar: 2–2–2

O plano de discipulado de Paulo era tão simples quanto 2-2-2, ou


seja, tão simples quanto o foi explicado em 2Timóteo 2.2! Nesta
carta final a seu principal discípulo, o apóstolo escreveu o seguinte
sobre a sua estratégia de mentoria: “E o que ouviste de mim na
presença de muitas testemunhas, transmite a homens fiéis que
também serão aptos para ensinar os outros.” Nessa curta sentença
Paulo lista quatro gerações daqueles que defenderam a transmissão
fiel da tradição cristã:

Geração 1: o apóstolo Paulo


Geração 2: Timóteo
Geração 3: homens fiéis
Geração 4: outros

Quando Jesus proferiu sua oração final como registrado no


Evangelho de João, ele orou primeiro por si mesmo (17.1-5), depois
por seus seguidores imediatos (17.6-19) e, em seguida por aqueles

1336
que se tornariam discípulos através dos ministérios deles (17.20-25).
Portanto, para ambos, Jesus e Paulo, a chave para a propagação
bem-sucedida da fé cristã reside na multiplicação das gerações de
testemunhas cristãs fiéis. Isso valoriza a fidelidade, pois se alguma
geração é um infiel, a cadeia de testemunhas é quebrada e a tradição
é distorcida.
Paulo escreveu em outra passagem: “Os homens devem nos
considerar assim: servos de Cristo e administradores dos mistérios
de Deus. Nesse aspecto, é esperado dos administradores que cada
um seja encontrado fiel” (1Co 4.1,2). Na parábola de Jesus sobre os
Talentos, o mestre elogia seu servo: “muito bem, escravo bom e fiel!
foste fiel sobre pouco; eu te colocarei responsável por muitas coisas.
Participa da alegria do teu senhor!” (Mt 25.21).
Na cultura se hoje, a fidelidade é uma virtude amplamente
ignorada. A superficialidade tipicamente triunfa sobre o caráter
sólido, a autopromoção sobre a fidelidade tranquila e constante; e
“celebridades cristãs” acumulam a porção de atenção do leão,
enquanto aqueles que pastoreiam pequenas igrejas rurais ou
interioranas ou que trabalham em tarefas escondidas no campo
missionário são desconhecidos. Seja como for, sejamos confortados e
estimulados pelo fato de que, um dia no céu, será a fidelidade, não a
superficialidade, a ser recompensada para aqueles que correram a
corrida com perseverança.

ESTRUTURA DE TITO
I. Abertura (1.1-4)

1337
II. Motivo da escrita (1.5-16)
A. A necessidade de se nomear presbíteros qualificados (1.5-9)
B. A oposição em Creta (1.10-16)

III. Instruções sobre o ensino a diferentes grupos (2.1-15)


A. Homens mais velhos (2.1,2)
B. Mulheres mais novas e mais velhas (2.3-5)
C. Homens mais novos (2.6-8)
D. Escravos (2.9,10)
E. Dois incentivos: a graça de Deus e o retorno de Cristo (2.11-14)
F. Conclusão (2.15)

IV. Instruções gerais de encerramento sobre fazer o que é bom (3.1-11)


A. Sobre a manutenção da paz (3.1,2)
B. Sobre a salvação em Cristo e a renovação pelo Espírito Santo e uma
advertência final (3.3-11)

V. Comentários conclusivos (3.12-15)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE DE


TITO
I. Abertura (1.1-4)
A saudação de Paulo a Tito, a terceira saudação de abertura mais longa de
todas as suas cartas, possui semelhanças consideráveis com a saudação em
1Timóteo. Além disso, Paulo forneceu uma extensa declaração sobre o
propósito de seu apostolado.

1338
II. Motivo da Escrita (1.5-16)
O motivo é descrito em termos da necessidade da nomeação de presbíteros
qualificados (1.5-9), que é estabelecida no contexto da oposição que Tito
enfrentava em Creta (1.10-16). A lista de qualificações para os líderes da
igreja em Tito 1.6-9 é aproximadamente equivalente à de 1Timóteo 3.1-7,
embora não haja nenhuma lista equivalente de qualificações para os
diáconos (1Tm 3.8-12).

III. Instruções Sobre o Ensino a Diferentes


Grupos (2.1-15)
Semelhante a suas instruções a Timóteo (1Tm 5.1,2), Paulo resumiu como
Tito deveria tratar os homens mais velhos (2.1,2), as mulheres mais velhas e
as mais jovens (2.3-5), e os homens mais jovens (2.6-8); e deu instruções
para os escravos na igreja (2.9,10). Paulo passou a identificar dois grandes
incentivos enquanto Tito cumpria seu ministério: a graça de Deus e o
retorno de Cristo, “a gloriosa manifestação do nosso grande Deus e
Salvador, Jesus Cristo”, que Paulo chama de “a bendita esperança” (2.11-
14). A seção conclui com uma afirmação da autoridade de Tito (2.15).

IV. Instruções Gerais de Encerramento Sobre


Fazer o que é Bom (3.1-15)
As instruções gerais de encerramento têm o foco no estar “preparado para
toda boa obra”. Isso envolve observações sobre a manutenção da paz (3.1,2)
e observações sobre a salvação em Cristo e sobre a renovação pelo Espírito
Santo, além de uma advertência final (3.3-11). No início Paulo descreveu o

1339
estado dos não cristãos por meio de sete características, deixando claro que
é somente pela graça de Deus que ele, Tito, e os outros fiéis são diferentes.

V. Comentários Conclusivos (3.12-15)


Os comentários conclusivos costumeiros encerram a carta (3.12-15).

Algo para Pensar: Pode um Mentiroso Falar a


Verdade?

Eis uma pergunta para você. Quando alguém que é um mentiroso


diz que todas as pessoas são mentirosas, ele está dizendo a verdade?
Isso foi chamado de “paradoxo do mentiroso”, e foi criado por uma
declaração em Tito 1.12,13, onde Paulo declarou: “Um dos seus
próprios profetas disse: ‘Os cretenses são sempre mentirosos, bestas
malignas, glutões preguiçosos.’ Esse testemunho é verdadeiro.”
Assim, então, há uma exceção para os cretenses sendo sempre
mentirosos: quando eles dizem de si mesmos que eles são sempre
mentirosos, pelo menos essa declaração é verdadeira! Essa é a
solução para o enigma do “paradoxo do mentiroso”.
No caso de Tito, é claro, essa triste declaração destaca a
dificuldade de sua tarefa: trazer a verdade do evangelho para uma
ilha que não é conhecida por sua virtude, assim como a Roma e a
Corinto do primeiro século eram conhecidas por sua decadência e
imoralidade. Foi difícil para o evangelho fazer incursões em culturas

1340
tão depravadas; e mesmo que alguns fossem convertidos, onde se
encontraria material de liderança entre esses convertidos?
Tudo isso põe em foco mais nítido o poder transformador de
Cristo, do seu Espírito e do evangelho. Como Paulo escreveu mais
tarde em Tito, “ele [Jesus Cristo] se entregou a si mesmo por nós
para nos redimir de toda a impiedade e purificar para si mesmo um
povo especial, ávido por praticar boas obras” (2.14). E, novamente,
“mas quando a bondade e o amor pelos homens apareceram de
Deus, nosso Salvador, Ele nos salvou — não por obras de justiça que
houvéssemos praticado, mas segundo a sua misericórdia, mediante o
lavar da regeneração e da renovação pelo Espírito Santo” (3.4,5).
Pode um cretense dizer a verdade? Bem, de acordo com um dos
seus próprios, a resposta é “não”. Mas o mesmo pode ser dito sobre
todos nós em nosso estado não regenerado: “Ao puro, todas as
coisas são puras, mas para àqueles que são corrompidos e
incrédulos, nada é puro; de fato, tanto a mente como a consciência
deles são corrompidas […] Eles são detestáveis, desobedientes e
desqualificados para qualquer boa obra” (1.15,16). Agradeço a
Deus que ele ainda chegue até as profundezas da depravação e salve
pecadores miseráveis como eu e depois os transforme para servi-lo.

TEOLOGIA
Temas Teológicos
Qualificações dos líderes da igreja

1341
Uma das principais contribuições das Epístolas Pastorais para o cânon
cristão refere-se às qualificações para os líderes da igreja.75 A ameaça dos
falsos mestres forneceu o cenário para as cláusulas de Paulo nessa área.
Uma vez que os líderes são encarregados pela supervisão doutrinária das
congregações locais, é absolutamente essencial que sejam escolhidos
cuidadosamente em conformidade com os padrões claramente articulados
de caráter e integridade. Por essa razão, é apropriado que uma porção
considerável das Epístolas Pastorais seja dada às instruções sobre as
qualificações para os líderes da igreja.
Esses líderes, variadamente chamados “bispos” ou “presbíteros”, devem
possuir as seguintes qualificações (1Tm 3.1-7).76 Devem ser irrepreensíveis,
maridos fiéis,77 autocontrolados, sensatos, respeitáveis, hospitaleiros, aptos
para ensinar, não dados ao vinho, não violentos, mas amáveis, não
briguentos, não gananciosos, bons governantes de suas próprias casas,
devem manter os filhos em sujeição, não deve ser novos convertidos, e
devem ter bom testemunho dos de fora da igreja (uma lista semelhante é
dada em Tt 1.6-9).78
O segundo ofício regulamentado nas Epístolas Pastorais é o de diácono.
O fato de Paulo ter estabelecido qualificações para os diáconos em
1Timóteo, mas não em Tito pode ser explicado pelo fato de a igreja de
Éfeso para quem 1Timóteo foi dirigida ser mais desenvolvida (com
presbíteros existentes) do que a em Creta (a igreja a cargo de Tito), onde os
presbíteros ainda não tinham sido nomeados. As qualificações para os
diáconos incluem as seguintes: devem ser respeitáveis, não hipócritas, não
bebedores de muito vinho, não dominados pela ganância, devem
permanecer no mistério da fé com consciência pura, maridos de uma só
mulher, devem governar seus filhos e suas próprias casas de forma

1342
competente (1Tm 3.8-10,12). A isso é acrescentada a exigência de que
esses diáconos devem primeiro ser testados (v. 10) e que servir bem como
diácono traz um lugar de honra e grande recompensa eterna (v. 13).
Uma questão interessante é levantada com relação à presença de
qualificações para as “mulheres” (gynaikes) em 1Timóteo 3.11, referindo-se
tanto às mulheres casadas com diáconos (esposas de diáconos) ou mulheres
que estão servindo como diáconos (diaconisas). Ambas as interpretações
são possíveis e têm defensores entre os principais comentaristas e
traduções.79 Alguns temem que a nomeação de mulheres como diáconos
comprometeria o princípio do NT e paulino da reservar papéis de liderança
na igreja e ordenação ao ministério para os homens (veja esp. 1Tm 2.12; e a
exigência de ser marido de uma mulher para bispos em 1Tm 3.2 e Tt 1.6).
No entanto, esse medo é desnecessário se for mantido em mente que
“diácono” (diakonos) significa “servo”, e que, diferente do papel de bispo
ou presbítero (1Tm 3.2, Tt 1.9), o papel do diácono não implica o exercício
do ensino ou autoridade de governo sobre a igreja. Muito provavelmente,
eles se engajavam em várias formas de serviços práticos na igreja. De
qualquer modo, essas mulheres deveriam ser “respeitáveis, não
caluniadoras, autocontroladas e fiéis em tudo” (1Tm 3.11).
Além de estabelecer qualificações para os líderes da igreja, 1Timóteo e
as outras Pastorais fornecem insight em muitas áreas da vida
congregacional, como o papel das mulheres (1Tm 2.9-15),80 cuidado com as
viúvas (1Tm 5.1-16), o trato com os presbíteros pecadores (1Tm 5.17-25),
ou a exortação dos membros ricos da igreja (1Tm 6.2-10, 17-19). Em suma,
as Pastorais são um tesouro para a formação de líderes da igreja para o
ministério. Timóteo e Tito servem como modelos para qualquer aspirante a

1343
pastor que participasse da venerável tradição daqueles que ao longo dos
séculos têm servido a Cristo no ministério da igreja local.

Salvação
Frequentes referências são feitas nas Pastorais a Deus (ou a Cristo) como
Salvador e à salvação que ele oferece em Cristo.81 Paulo se identificou
imediatamente como “um apóstolo de Cristo Jesus segundo a ordem de
Deus nosso Salvador” (1Tm 1.1). Ele usou a expressão “Deus nosso
Salvador” mais tarde, quando falou de “Deus, nosso Salvador, que deseja
que todos os homens sejam salvos e cheguem ao conhecimento da verdade”
(1Tm 2.3,4). Uma terceira vez em 1Timóteo, Paulo se referiu a Deus, “o
Salvador de todos os homens, especialmente dos que creem” (1Tm 4.10).
Além disso, em um dos ditos confiáveis nas Epístolas Pastorais, ele afirmou
que “Cristo Jesus veio ao mundo para salvar os pecadores” (1Tm 1.15).
Em 2Timóteo, Paulo falou de “Deus, que nos salvou” (2Tm 1.8,9), e no
mesmo contexto ele se referiu ao “aparecimento de nosso Salvador Jesus
Cristo” (2Tm 1.10). Ele também afirmou que “a salvação está em Cristo
Jesus”, uma salvação que, embora assegurada no passado, será consumada
no futuro, exigindo fidelidade e perseverança na fé (2Tm 2.10). A fonte de
conhecimento a respeito dessa salvação pela fé em Jesus Cristo é a Sagrada
Escritura, ou seja, o AT, que profetizou sobre ele (2Tm 3.15). Várias
passagens também falam da preservação segura dos fiéis nesta vida e sua
passagem segura para a próxima (1Tm 2.15; 4.16; 2Tm 4.18).82
Na introdução de sua carta a Tito, Paulo se referiu a “Deus, nosso
Salvador” (1.3) e a “Cristo Jesus, nosso Salvador” (1.4), colocando Deus
Pai e Jesus Cristo no mesmo nível em relação a seu papel como Salvador da

1344
humanidade. Esse ensino é desenvolvido no corpo da carta, onde Paulo
falou sobre “o ensino de Deus nosso Salvador”, segundo o qual “a graça de
Deus se manifestou, com salvação para todos os homens”, os ensina a viver
de maneira sóbria, justa e piedosa no presente enquanto aguardam o retorno
do “nosso grande Deus e Salvador, Cristo Jesus” (Tt 2.10-13).
Além disso, em uma notável passagem trinitariana, Paulo afirmou que
“quando a bondade e o amor pelo homem surgiram de Deus, nosso
Salvador, ele nos salvou — não por obras de justiça que houvéssemos
praticado, mas segundo a Sua misericórdia, mediante a lavagem da
regeneração e da renovação pelo Espírito Santo. Esse Espírito ele derramou
amplamente sobre nós por meio de Jesus Cristo, nosso Salvador, para que,
justificados pela Sua graça, possamos nos tornar herdeiros segundo a
esperança da vida eterna” (Tt 3.4-7).
Novamente, é evidente que Paulo considerava Deus Pai e Jesus Cristo
como estando no mesmo nível com relação aos seus papéis como Salvador
da humanidade, pois ele entendia o Deus trino como integralmente
envolvido em providenciar e aplicar essa salvação.
Como nós devemos explicar a frequência do grupo de palavras
“Salvador/ salvação” nas Pastorais? Provavelmente, a razão é que Paulo
procurou apresentar Jesus como Salvador em contraste com outros deuses
ou com o imperador. Existem fortes evidências de que em Éfeso
especialmente o título “salvador” (sōter) era utilizado como “um título de
descrição de deuses, imperadores, procônsules provinciais, e benfeitores
locais”,83 de modo que é possível que Paulo estivesse respondendo a esse
falso ensino perpetrado em Éfeso. Em vez de a salvação ser encontrada pela
adesão a vários mitos e genealogias, Paulo alegou que ela era para “todos”

1345
os homens (1Tm 2.4) e veio por meio de Cristo o Salvador (1Tm 1.15;
2.3,4; 4.10; Tt 2.10,11; cf. Tt 3.2,4).

A preservação dos fiéis


As Pastorais apresentam uma preocupação constante com a preservação dos
fiéis em relação a Satanás ou às forças demoníacas.84 Em 1Timóteo 1.20,
Paulo disse que entregou dois falsos mestres a Satanás para que eles
aprendessem a não blasfemar. Ele mencionou que Eva foi enganada na
queda e forneceu instruções para as mulheres sobre como escapar de um
destino semelhante (1Tm 2.14,15; cf. 5.14,15 com referência às viúvas
jovens). Ele advertiu contra a nomeação dos novos convertidos para
posições de liderança na igreja, para que não se tornassem orgulhosos e
viessem a cair na condenação do Diabo (1Tm 3.6). Isso também exige que
os candidatos ao ofício eclesiástico sejam irrepreensíveis e gozem de boa
reputação com as pessoas de fora da igreja (1Tm 3.7).
Paulo também denunciou aqueles que ensinavam outros a abster-se do
casamento ou de determinados alimentos por causa de uma falsa dicotomia
entre as coisas materiais e as espirituais descritas como “ensinos de
demônios” (1Tm 4.1-3). Uma outra área em que os fiéis precisam ser
preservados espiritualmente é o desejo de ficar rico (1Tm 6.9,10; veja 2Tm
2.26). Paulo advertiu Timóteo a que se guardasse contra os “discursos
irreverentes e vazios e contradições do ‘conhecimento’ que falsamente leva
esse nome” (1Tm 6.20). Isso aparentemente se refere a uma forma primitiva
de Gnosticismo, que ensinava um dualismo entre matéria e espírito,
depreciando todas as coisas criadas (cf. 1Tm 2.14,15; 4.1-3).

1346
Paulo explicou que os falsos mestres foram dominados pelo Diabo e
foram feitos cativos para cumprir a sua vontade (2Tm 2.26). Em contraste
com esses hereges, Timóteo foi exortado repetidamente a guardar o que lhe
tinha sido confiado (1Tm 6.12; 2Tm 1.12,14; 4.7,15,18), de modo que ele
pudesse “escapar” (tradução do autor) das garras dos terroristas e
“perseguir” a virtude cristã (1Tm 6.11; 2Tm 2.22). Como delegado
apostólico de Paulo, ele deve ser consciencioso de si mesmo e de seu ensino
e perseverar nessas coisas, pois fazendo isso ele “preservaria” (NASB) a si
mesmo e a seus ouvintes (1Tm 4.16). Em contrapartida, os falsos mestres se
“desviaram da fé”, tendo se “desgarrado” ou “desviado”, de modo que sua
fé “naufragou” (veja 1Tm 1.6,19; 5.13,15; 6.9,10,21).

As palavras confiáveis
Cinco declarações nas Pastorais (pelo menos um em cada carta) são
designadas pelo autor como “palavras confiáveis” (pistos logos ho, lit.,
“confiável [é] a palavra”, veja a tabela abaixo).85 Essa característica
interessante, juntamente com outros elementos linguísticos, literários e
teológicos, oferece um grau de coerência para este corpo de literatura. Além
disso, há uma variedade considerável entre estas cinco “palavras
confiáveis”. A primeira palavra confiável (1Tm 1.15) lembra a declaração
de Jesus em Lucas 19.10 e está acompanhada da expressão “merece toda
aceitação” (como em 1Tm 4.9), que também é atestada na literatura
helenística (veja Filo, Flight 129; Rewards 13).
Na segunda “palavra confiável” (1Tm 3.1), Paulo destacou a
propriedade de se aspirar o ofício de bispo e a nobreza da tarefa, semelhante
à solene afirmação de Jesus, “Eu vos garanto” (amēn, amēn; veja Jo 1.51).

1347
A terceira palavra (1Tm 4.8,9) é cercada pela controvérsia acadêmica.
Alguns estudiosos afirmam que a “palavra confiável” ocorre no versículo
10, não no versículo 8.86 No balanço, no entanto, o versículo 8, é preferível
pelas seguintes razões: (1) versículo 8 tem a forma de um dito proverbial;
(2) gymnasia (“treinamento”; uma vez no NT) e sōmatikē (“do corpo”; duas
vezes no NT) são palavras raras, o que torna a adaptação uma “palavra
confiável” mais provável; (3) o versículo 8 (mas não o versículo 10) fala de
uma ação que o versículo 9 parece requerer; e (4) o versículo 8 pode ser
melhor explicado como parte de um dito.
A quarta palavra (2Tm 2.11-13) tem o foco nas recompensas do
sofrimento, enquanto afirma que Deus permanece fiel, mesmo que seus
servos não o sejam. À luz dos numerosos paralelos paulinos (veja esp. Rm
8.28-39), o dito provavelmente foi cunhado pelo próprio Paulo. A
declaração consiste de quatro orações condicionais, as duas primeiras sobre
o serviço fiel, as duas últimas sobre a negação a Cristo. A última oração
apresenta uma razão adicional: “Pois Ele não pode negar a si mesmo”. A
cadência resulta em uma dinâmica interessante, especialmente a quebra do
padrão no último elemento onde uma esperada declaração negativa é
substituída por uma positiva. A quinta palavra (Tt 3.4-7), constitui um
resumo da soteriologia de Paulo em uma forma bem condensada e num
sentido trinitário, centrando-se na salvação divina dos fiéis por meio de
Cristo e na sua obra de regeneração através do Espírito Santo.

1348
Tabela 15.1: As “Palavras Confiáveis” nas Pastorais
Palavras Confiáveis
1Timóteo 1.15 Esta palavra é confiável e merece toda a
aceitação: “Cristo Jesus veio ao mundo para
salvar os pecadores”.
1Timóteo 3.1 Esta palavra é confiável: “Se alguém almeja ser
bispo, deseja algo nobre”.
1Timóteo 4.8,9 “O treinamento do corpo tem um benefício
limitado, mas a piedade é benéfica de todas as
formas, pois ela tem a promessa da vida
presente e também da futura”. Esta palavra é
confiável”.
2Timóteo 2.11-13 Esta palavra é confiável: “Pois se já morremos
com ele, também com ele viveremos; se
perseveramos, com ele também reinaremos; se
o negarmos, ele também nos negará; se somos
infiéis, ele permanece fiel; pois não pode negar
a si mesmo”.
Tito 3.4-8 “Mas quando a bondade e o seu amor pelos
homens apareceram da parte de Deus nosso
salvador, Ele nos salvou — não por obras de
justiça que houvéssemos praticado, mas
segundo a sua misericórdia, mediante o lavar da
regeneração e da renovação realizados pelo
Espírito Santo. Esse Espírito ele derramou
amplamente sobre nós por meio de Jesus Cristo
nosso Salvador, para que, justificados pela sua
graça, pudéssemos nos tornar herdeiros com a
esperança da vida eterna”. Esta palavra é
confiável.

Daí a cadeia de “palavras confiáveis” nas Pastorais inclui (1) uma


possível adaptação de um dito de Cristo (1Tm 1.15); (2) uma solene

1349
afirmação apostólica sobre a liderança da igreja (1Tm 3.1); (3) um
pronunciamento apostólico sobre o valor da piedade (1Tm 4.8); (4) uma
afirmação parecida com hino e artisticamente trabalhada sobre a fidelidade
de Deus em face da infidelidade humana (2Tm 2.11-13); e (5) uma síntese
da soteriologia de Paulo em termos trinitários (Tt 3.4-7). Além disso, duas
das cinco têm a fórmula após o referente (1Tm 4.8; Tt 3.4-7).

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON


Deus, nosso Salvador e a salvação em Cristo (1Tm 2.3,4; 4.10; 2Tm
1.10; Tt 1.3,4)
Qualificações para os líderes da igreja (1Tm 3.1-12; Tt 1.6-9) e o papel
das mulheres na igreja (1Tm 2.9-15)
Preservação da sã doutrina e a refutação dos falsos mestres (veja 1Tm
4.16)
A importância de se buscar piedade, autocontrole e as virtudes cristãs
(veja 1Tm 4.11-16; 6.6; 2Tm 2.22)
“Palavras Confiáveis” (veja Tabela 15.4

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. É apropriado chamar 1 e 2 Timóteo e Tito de “Epístolas Pastorais”?
2. Qual Epístola Pastoral foi escrita da prisão?
3. Quando os estudiosos começaram a questionar a autoria paulina destas
epístolas?
4. Qual é o gênero das Epístolas Pastorais, e quais as implicações que
isso tem?

1350
5. O que é “catolicismo primitivo”?
6. Quantos ofícios da igreja são prescritos nas Epístolas Pastorais?
7. Qual é o sentido mais provável das expressões “o marido de uma
mulher” (1Tm 3.2) e “maridos de uma mulher” (1Tm 3.12; Tt 1.6)?
8. Qual é a melhor descrição das atribuições ministeriais de Timóteo e
Tito?
9. Qual tema importante nas Pastorais ajuda o leitor a compreender a
referência de Paulo às mulheres serem “salvas dando à luz filhos”
(1Tm 2.15)?
10. Quais são as qualificações para os líderes da igreja (1Tm 3.1-7; Tt
1.9)?
11. O que os autores quiseram dizer com a designação “palavras
confiáveis”?
12. Que contribuições as Pastorais fazem para o cânon?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


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Clarendon, 1963).
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1355
1
Partes deste capítulo foram baseadas em A. J. Köstenberger, “1-2Timothy, Titus”, em:

Expositor’s Bible Commentary, ed. rev., (Grand Rapids: Zondervan, 2005), vol. 12: Ephesians—

Philemon, p. 487-625.

2
L. T. Johnson, Letters to Paul’s Delegates: 1Timothy, 2Timothy, Titus, The New Testament in

context (Valley Forge: Trinity Press International, 1996), p. 3; G. W. Knight, Commentary on the

Pastoral Epistles, NIGTC (Grand Rapids: Eerdmans, 1992), p. 3.

3
D. Guthrie, The Pastoral Epistles, TNTC, 2. ed. (Grand Rapids: Eerdmans, 1990), p. 11.

4
Veja G. D. Fee, 1 and 2Timothy, Titus, NIBCNT 13 (Peabody: Hendrickson, 1988), p. 21 (mas

veja a interação com a hermenêutica ad hoc de Fee a seguir).

5
Veja Mounce, Pastoral Epistles, lxi. Ele acrescentou: “Não é possível determinar se Paulo

escreveu primeiro 1Timóteo ou Tito. Tudo o que eu me sinto confortável para dizer é que as

semelhanças de linguagem entre 1Timóteo e Tito podem sugerir que elas foram escritas

aproximadamente ao mesmo tempo” (p. lxii).

6
Mounce (Pastoral Epistles, lxii) observou que o Cânon de Muratori (final do século II)

apresenta a ordem Tito, 1Timóteo, 2Timóteo, presumivelmente para posicionar 2Timóteo por último

como a carta final de Paulo. Ele também destacou que J. D. Quinn (The Letter to Titus, AB 35

[Garden City: Doubleday, 1990]) buscou argumentar em favor da prioridade de Tito, referindo-se

também a W. G. Doty (“The Classification of Epistolary Literature”, CBQ 31 [1969], p. 192-98).

Contra I. H. Marshall (Pastoral Epistles, ICC [Edinburgh: T&T Clark, 1999], p. 92), que supôs que

2Timóteo foi escrita primeiro, e que 1Timóteo e Tito foram escritas por outra pessoa que não Paulo

após sua morte. Semelhantemente, Johnson (Letters to Paul’s Delegates) trata primeiro de 2Timóteo

e depois de 1Timóteo e Tito.

7
As seções sobre Autoria, Data, Origem e Motivo integram a discussão das três Epítolas

Pastorais sob o único título devido à natureza interrelacionada da questões abordadas por essas

1356
questões introdutórias específicas.

8
Para breves levantamentos, veja R. F. Collins, Letters that Paul Did not Write (Wilmington:

Michael Glazier, 1988), p. 89-90. Collins nomeou como os primeiros a desafiarem a autenticidade

das Pastorais: Schmidt (1804), Schleiermacher (1807), Eichhorn (1912), Baur (1835), e Holtzmann

(1885); cf. E. E. Ellis, “Pastoral Letters”, em: G. F. Hawthorne; R. P. Martin; D. G. Reid, orgs.,

Dictionary of Paul and His Letters (Downers Grove: InterVarsity, 1993), p. 659.

9
Veja a discussão em Marshall, Pastoral Epistles, p. 3-8 (incluindo as tabelas nas páginas p. 4-5).

10
Ibid., p. 8. Cf. G. W. Knight III, Commentary on the Pastoral Epistles, NIGTC (Grand Rapids:

Eerdmans, 1992), p. 14. Ele citou Guthrie (Pastoral Epistles, p. 19-20) e W. G. Kümmel

(Introduction to the New Testament, tradução para o inglês de H. C. Kee, 2. ed. [Nashville:

Abingdon, 1975], p. 370) no sentido de que a partir do final do século II, as Pastorais eram

consideradas, sem questionamento algum, paulinas e foram atestadas com a mesma veemência que as

demais cartas paulinas.

11
Veja a pesquisa completa e decisão em T. L. Wilder, “Pseudonymity and the New Testament”,

em: D. A. Black; D. S. Dockery, orgs., Interpreting the New Testament: Essays on Methods and

Issues (Nashville: B&H, 2001), p. 296-335; id., Pseudonymity, the New Testament, and Deception:

An Inquiry into Intention and Reception (Lanham: University Press of America, 2004). Cf. D. A.

Carson, “Pseudonymity and Pseudepigraphy”, em: C. A. Evans; S. E. Porter, orgs., Dictionary of

New Testament Background (Downers Grove: InterVarsity, 2000), p. 856-64.

12
O rótulo “alonimato” ou “alepigrafia” (o ponto de vista de que as Pastorais foram escritas “sob

outro nome” sem a intenção de enganar) foi introduzido por Marshall, Pastoral Epistles, p. 83-84.

13
Para um argumento contundente contra esta alegação, veja E. E. Ellis, “Pseudonymity and

Canonicity of New Testament Documents”, em: M. J. Wilkins; T. Page, orgs., Worship, Theology and

1357
Ministry in the Early Church, JSNTSup 87 (Sheffield: JSOT, 1992), p. 212-24; cf. Wilder,

Pseudonymity.

14
Para uma discussão completa sobre essas questões, veja especialmente D. Guthrie, New

Testament Introduction, 2. ed. (Downers Grove: InterVarsity, 1990), p. 607-49 e 1011-28.

15
Veja W. D. Mounce, The Pastoral Epistles, WBC 46 (Nashville: Nelson, 2000), xcix-cxviii; e

Marshall, Pastoral Epistles, p. 60-61. Outras objeções comuns à autoria de Paulo das Pastorais são as

dificuldades em harmonizar os movimentos de Paulo mencionados nas Pastorais com aqueles

registrados em Atos e as alegadas estruturas da igreja posterior refletidas nas Pastorais (veja

discussão a seguir).

16
Cf. a lista em Marshall, Pastoral Epistles, p. 104-6; e a discussão em Mounce, Pastoral

Epistles, lxxxviii-xcvii (incluindo o quadro na página xc).

17
Para um tratamento incisivo, veja B. M. Metzger, “A Reconsideration of Certain Arguments

Against the Pauline Authorship of the Pastoral Epistles”, ExpTim 70 (1958), p. 91-94 (veja esp. as

quatro perguntas na p. 93).

18
Veja esp. M. Prior, Paul the Letter-Writer and the Second Letter to Timothy, JSNTSup 23

(Sheffield: JSOT, 1989), e P. H. Towner, 1-2Timothy and Titus, IVPNTC (Downers Grove:

InterVarsity, 1994), p. 34-35.

19
R. Bauckham (“Pseudo-Apostolic Letters”, JBL 107 [1988], p. 487) observou a raridade das

cartas apostólicas apócrifas ou pseudepigráficas em relação a outros gêneros, e conjecturou que a

razão para isso “pode muito bem ter sido a grande dificuldade de utilizar uma carta pseudepigráfica

para realizar as mesmas funções de uma carta autêntica”. Ele concluiu que “entre as cartas

pesquisadas não há nenhum bom exemplo de uma carta pseudepigráfica que tenha alcançado

relevância didática pelas generalidades de seu conteúdo”.

1358
20
Bauckham (ibid., p. 478) a considerou “mal classificada” e um “dedicado tratado”. Ele também

discutiu várias cartas didáticas (1Enoque 92-105; Epistola de Jeremias; Baruque; 2Baruque 78-87).

21
Bauckham (ibid., p. 485) se referiu a Laodicenses como “uma notável tentativa incompetente

de preencher a lacuna […] nada além de retalhos de sentenças paulinas extraídas de outras cartas,

principalmente de Filipenses” Terceira Coríntios é parte de Atos de Paulo, do final do século II.

22
Isso é verdade a despeito da conclusão de Metzger de que “uma vez que o uso da forma

literária pseudepigráfica não precisa ser considerado como necessariamente envolvendo uma

intenção fraudulenta, não pode ser afirmado que o caráter da inspiração exclui a possibilidade de

pseudepígrafes entre os escritos canônicos” (“Literary Forgeries and Canonical Pseudepigrapha”,

JBL 91 [1972], p. 22). Veja especialmente J. Duff, “A Reconsideration of Pseudepigraphy in Early

Christianity” (tese de Ph.D., Oxford University, 1998), que concluiu que o valor de um texto estava

intimamente ligado à sua verdadeira autoria, que o pseudonimato era geralmente visto como uma

prática enganosa, e que os textos entendidos com sendo pseudônimos eram marginalizados.

23
Contra Bauckham (“Pseudo-Apostolic Letters”, p. 492), que acreditava que o autor das

Pastorais “via a si mesmo nas situações do ministério de Paulo e […] preencheu quaisquer que

fossem as informações históricas disponíveis para ele com ficção histórica” (ecoando Holtzmann).

Bauckham até se aventurou a pressupor que o próprio Timóteo pode ter escrito as Pastorais (p. 494)!

Também contra J. D. G. Dunn (The Living Word [London: SCM, 1987], p. 82), que acreditava que

Paulo era “a origem da tradição das Pastorais” e que as Pastorais expressam novamente para uma

antiga situação “a voz da tradição paulina para um novo dia”; e N. Brox (“Zu den persönlichen

Notizen der Pastoralbriefe”, BZ 13 [1969], p. 76-94), que considerava que as referências pessoais

representam “situações típicas no ofício eclesiástico, que são historicizadas e atribuídas a Paulo”.

24
D. A. Carson; D. J. Moo, An Introduction to the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids:

Zondervan, 2005), p. 563 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução ao Novo

Testamento]. De forma semelhante, D. Guthrie, “The Development of the Idea of Canonical

1359
Pseudepigrapha in New Testament Criticism”, Vox Evangelica 1 (1962), p. 43-59. Um outro

argumento é mencionado por G. D. Fee (“Reflections on Church Order in the Pastoral Epistles, with

Further Reflection on the Hermeneutics of Ad Hoc Documents”, JETS 28 [1985], p. 141) — isto é, a

falta de respostas satisfatórias à pergunta “por que três cartas? Isto é, dada 1Timóteo, por que um

autor de cartas pseudepigráficas escreveria Tito, e dado 1Timóteo e Tito e suas preocupações, por que

2Timóteo?” Mas veja a resposta de J. D. Quinn; W. C. Wacker, The First and Second Letters to

Timothy, ECC (Grand Rapids: Eerdmans, 2000), p. 20, que aponta o gênero da coleção de cartas e

argumenta que as Pastorais “como uma coleção teria sido recebida e lida não como cartas individuais

do Paulo da história, mas uma ‘caracterização’ do grande apóstolo e seu ensino para a nova geração”.

25
Veja R. N. Longenecker, “Ancient Amanuenses and the Pauline Epistles”, em: R. N.

Longenecker; M. C. Tenney, orgs., New Dimensions in New Testament Study (Grand Rapids:

Zondervan, 1974), p. 281-97; E. R. Richards, The Secretary in the Letters of Paul, WUNT 2/42

(Tübingen: Mohr-Siebeck, 1991); e Ellis, “Pastoral Letters”, p. 663-64.

26
R. N. Longenecker, The Ministry and Message of Paul (Grand Rapids: Zondervan, 1971), p.

24.

27
Veja A. J. Malherbe, “Paulus Senex”, ResQ 36 (1994), p. 197-207.

28
Veja C. E. Arnold, “Ephesus”, em: Dictionary of Paul and His Letters, p. 249-53.

29
2Coríntios 2.12,13; 7.5,6,13,14; 8.6,16,23; 12.18; Gálatas 2.1-5; 2Timóteo 4.10; Tito 1.4.

30
Para uma tentativa da construção da cronologia do ministério de Paulo, veja Ellis, “Pastoral

Letters”, p. 661-62; cf. Köstenberger, “1-2Timothy, Titus”, p. 596-98.

31
Também Johnson (Letters to Paul’s Delegates, p. 106-107 e 168), que chamou esta carta de a

mandata principis (“mandamentos do governante”) e citou vários paralelos antigos.

32
Veja Mounce (Pastoral Epistles, lxxxvi-lxxxviii, p. 186-92), que citou Policarpo, Clemente,

Clemente de Alexandria, e Ireneu como referindo a uma estrutura de três níveis, usando episkopos e

1360
presbuteros de forma intercambiável.

33
F. M. Young (“On Episkopos and Presbyteros”, JTS 45 [1994], p. 142-48) especulou a hipótese

“admitidamente experimental” de que as origens dos episkopos e dos presbuteros são distintas. Mas a

interpretação de Young das Pastorais à luz de Inácio (m. em c.110) em vez de vice-versa parece

precária, se não metodologicamente enganosa.

34
Veja A. J. Köstenberger, “Church Government”, em: G. T. Kurian, org., Encyclopedia of

Christian Civilization (Oxford: Blackwell, no prelo).

35
Dois artigos importantes sobre o assunto são O. Skarsaune, “Heresy and the Pastoral Epistles”,

Them 20/1 (1994), p. 9-14; e R. J. Karris, “The Background and Significance of the Polemic of the

Pastoral Epistles”, JBL 92 (1973), p. 549-64.

36
Towner, 1-2Timothy and Titus, p. 22; Mounce, Pastoral Epistles, lxi.

37
Fee, 1 and 2Timothy, Titus, p. 7-9.

38
Inácio (m. c. 110), em sua epístola aos Magnésios, também advertiu seus leitores para que não

se deixassem “desviar por doutrinas estranhas ou por antigas fábulas que são inúteis” (veja A

Policarpo 3.1; Aos Esmirnenses 6.2), ligando estes ensinos com o judaísmo (Aos Magnésios 8.1; see

9.1; 10.3; Aos Filadelfos 6.1) envolvendo a interpretação apropriada das Escrituras do AT (Aos

Filadelfos 8.2). Veja S. Westerholm, “The Law and the ‘Just Man’ (1Tm 1.3-11)”, ST 36 (1982), p.

82.

39
Veja P. H. Towner, “Gnosis and Realized Eschatology in Ephesus (of the Pastoral Epistles) and

the Corinthian Enthusiasm”, JSNT 31 (1987), p. 95-124.

40
Towner, 1-2Timothy and Titus, p. 25.

41
Fee, 1 and 2Timothy, Titus, p. 8-9.

1361
42
Knight, Pastoral Epistles, p. 27-28; Mounce, Pastoral Epistles, lxix-lxxvi; Collins, Letters that

Paul Did Not Write, p. 100, referindo a A. Hanson como também a M. Dibelius e H. Conzelmann; e

Ellis, “Pastoral Letters”, p. 663, com referência a Lightfoot (veja Inácio [m. c. 110], Aos Magnésios

8-11; Aos Trálios 9).

43
Towner, 1-2Timothy and Titus, p. 25.

44
Também Westerholm, “The Law and the ‘Just Man’”, p. 82.

45
Sobre a polêmica empregada por Paulo, veja esp. Karris, “Polemic of the Pastoral Epistles”, p.

548-64.

46
T. D. Lea; H. P. Griffin, Jr., 1, 2Timothy, Titus, NAC 34 (Nashville: B&H, 1992), p. 28-9,

citando Guthrie.

47
Veja Fee, “Reflections on Church Order”, p. 141-51; id., 1 and 2Timothy, Titus, p. 5-14 e

demais. Fee (“Reflections”, p. 142-43) alegou que “toda 1Timóteo […] é dominada por essa

preocupação singular” de refutar os falsos mestres e que “o todo dos capítulos 2 e 3 é melhor

entendido como instrução em relação com o comportamento e atitudes dos FM [falsos mestres]”.

Mas veja a crítica de Fee em Köstenberger (“1-2Timothy, Titus”, p. 514), que observou que Fee

indevidamente reduziu as marcas estruturais em 2.1 e 3.15,16 que destacam os capítulos 2 e 3 dos

capítulos 1 e 4 a 6, respectivamente. Cf. a interação adicional sob o título “Reflections” (ibid., p.

520).

48
Veja Köstenberger (“1-2Timothy, Titus”, p. 510), que observou que o verbo parakaleō

(“exorto”), que é encontrado em 1Timóteo 2.1, é usado por Paulo na transição para a “seção de

negócios” de uma carta (1Co 1.19; 2Co 2.8; 6.1; Ef 4.1; 1Ts 4.1; Fm 10).

49
Veja a discussão sobre gênero mais adiante.

50
Veja A. J. Köstenberger, “Women in the Church: A Response to Kevin Giles”, EvQ 73 (2001),

p. 205-24; em resposta a K. Giles, “A Critique of the ‘Novel’ Contemporary Interpretation of

1362
1Timothy 2.9-15 Given in the Book, Women in the Church. Parts I and II”, EvQ 72 (2000), p. 151-67

e 195-215.

51
Isso levanta a questão da consistência hermenêutica. Se um intérprete fosse relativizar as

instruções de Paulo a respeito das mulheres na liderança da igreja em 1Timóteo 2.11-15, ele ou ela,

para ser consistente, precisaria ver as instruções de Paulo sobre as qualificações dos líderes da igreja

em 1Timóteo 3.1-12 como relativas e não obrigatórias também para a igreja. Veja Mounce, Pastoral

Epistles, p. 185.

52
Por exemplo, a afirmação em 2Timóteo 1.9,10; a “palavra confiável” em 2.11-13; e a

“inscrição” em 2Timóteo 2.19 NVI. Sobre as “palavras confiáveis” nas Pastorais, veja a discussão

sob Temas Teológicos.

53
Veja a discussão em Marshall, Pastoral Epistles, p. 12-13.

54
T. D. Gordon, “A Certain Kind of Letter: The Genre of 1Timothy”, em: A. J. Köstenberger; T.

R. Schreiner; H. S. Baldwin, orgs., Women in the Church: A Fresh Analysis of 1Timothy 2.9-15

(Grand Rapids: Baker, 1995), p. 59.

55
Ibid. Gordon forneceu uma lista específica de tais instruções nas p. 59-60.

56
Ibid., p. 60.

57
Ibid.

58
R. van Neste, Cohesion and Structure in the Pastoral Epistles, JSNTSup 280 (New York: T&T

Clark, 2004), p. 1.

59
Guthrie, Pastoral Epistles, p. 18.

60
A. T. Hanson, The Pastoral Epistles (Grand Rapids: Eerdmans, 1982), p. 42.

1363
61
Van Neste, Cohesion and Structure, p. 285; contra J. D. Miller, The Pastoral Letters as

Composite Documents, SNTSMS 93 (Cambridge: University Press, 1997).

62
I. H. Marshall, “The Christology of Luke-Acts and the Pastoral Epistles”, em: S. E. Porter; P.

Joyce; D. E. Orton, orgs., Crossing Boundaries: Essays in Biblical Interpretation in Honor of

Michael D. Goulder (Leiden: Brill, 1994), p. 171.

63
Mounce, Pastoral epistles, cxxxv (observe que a numeração tem dois II e dois IV).

Semelhantemente, Guthrie (Pastoral Epistles, p. 63-64) tem essas divisões principais: I. 1.1-20; II.

2.1 a 4.16; III. 5.1 a 6:2; e IV. 6.3-21. Ainda menos estruturas são discernidas por Lea e Griffin (1,

2Timothy, Titus, p. 17), que divide a carta em I. 1.1,2; II. 1.3-20; e III. 2.1 a 6.21.

64
Contra Towner (Letters to Timothy and Titus, ix), que manteve 1.3 a 3.16 como uma única

unidade e deu atenção insuficiente aos marcadores “antes de tudo” e “então” em 2.1. Mas Towner (ao

contrário de Mounce) corretamente discerniu uma parada entre 3.16 e 4.1 (ibid., x).

65
Veja a interação com G. D. Fee, “Reflections on Church Order in the Pastoral Epistles”, JETS

28 (1985), p. 145, em Köstenberger, “1Timothy”, p. 504 e 509-10.

66
Esta crítica diz respeito a Mounce como também a Guthrie e Lea/Griffin.

67
Veja Köstenberger, “1Timothy”, p. 497. Cf. a estrutura proposta por Marshall (Pastoral

Epistles, p. 30), que dividiu a carta entre 1.3 a 3.16 e 4.1 a 6.21a.

68
Towner, Letters to Timothy and Titus, xi. A proposta de Marshall (Pastoral Epistles, p. 38) é

idêntica, o que não é surpreendente já que, pelo reconhecimento do próprio Marshall, Towner

escreveu a maior parte do comentário de Marhall (p. xiii).

69
Mounce, Pastoral Epistles, cxxxvi.

70
Veja Köstenberger (“2Timothy”, p. 566) e o seguinte comentário para a justificativa deste

esboço. A única diferença entre Towner e Köstenberger é que o último mantém 2.1-26 junto como

1364
uma unidade principal (semelhantemente, Guthrie, Pastoral Epistles, p. 132) e a divide nas

subunidades dos v. 1-7, v. 8-13 e v. 14-26, enquanto Towner divide 2.1-26 em duas subunidades

principais, v. 1-13 e v. 14-26.

71
Towner, Letters to Timothy and Titus, xii.

72
Mounce, Pastoral Epistles, cxxxvi.

73
Köstenberger, “Titus”, p. 603. Veja Marshall (Pastoral Epistles, p. 24), cujo esboço proposto é

praticamente idêntico ao de Köstenberger (e diferente do de Towner, que é bem mais notável visto

que, como mencionado, Towner foi responsável por escrever grande parte do comentário ICC de

Marshall).

74
Veja a discussão das qualificações para os líderes da igreja sob os principais temas teológicos

mais adiante.

75
Para um material proveitoso sobre o assunto, veja especialmente P. A. Newton, Elders in

Congregational Life: Rediscovering the Biblical Model for Church Leadership (Grand Rapids:

Kregel, 2005); B. L. Merkle, The Elder and Overseer: One Office in the Early Church, Studies in

Biblical Literature 57 (New York: Peter Lang, 2003); id., 40 Questions About Elders and Deacons

(Grand Rapids: Kregel, 2008); Köstenberger, “Church Government”; id., “1Timothy”, 521-30. Para

uma apresentação dos diferentes pontos de vista, veja S. B. Cowan, org. geral., Who Runs the

Church? 4 Views on Church Government (Grand Rapids: Zondervan, 2004); e C. O. Brand; R. S.

Norman, orgs., Perspectives on Church Government: Five Views of Church Polity (Nashville: B&H,

2004).

76
Veja o quadro comparativo em Köstenberger, “1-2Timothy, Titus”, p. 523-24.

77
Veja A. J. Köstenberger, God, Marriage and Family: Rebuilding the Biblical Foundation

(Wheaton: Crossway, 2004), p. 259-64 [publicado em português por Vida nova sob o título Deus,

1365
casamento e família: reconstruindo o fundamento bíblico] (veja esp. o quadro listando os diferentes

pontos de vista na p. 263).

78
Uma lista separada de qualificações é fornecida para diáconos e mulheres (seja diaconisas ou

esposas de diáconos; 1Tm 3.8-13; veja At 6.1-6; Rm 16.1,2). Para uma discussão dessas

qualificações, veja Köstenberger, “1-2Timothy, Titus”, p. 522-30 e 606-8.

79
Veja a discussão e literatura citada em Köstenberger, “1-2Timothy, Titus”, p. 529-30. Entre as

traduções, a HCSB traz “esposas”; a NASB “mulheres” (nota de rodapé “i.e., tanto esposas de

diáconos quanto diaconisas”); a NIV “suas esposas” (nota de rodapé: “Ou diaconisas”); e a TNIV:

“as mulheres” (nota de rodapé: “Provavelmente mulheres que serviam como diáconos, ou

possivelmente esposas de diáconos”).

80
Veja A. J. Köstenberger; T. R. Schreiner, orgs., Women in the Church: An Analysis and

Application of 1Timothy 2.9-15, 2. ed. (Grand Rapids: Baker, 2005).

81
Por exemplo, Mounce, Pastoral Epistles, cxxxii-cxxxv.

82
Veja a discussão sobre a preservação dos fiéis.

83
S. M. Baugh, “‘Savior of all people’: 1Tim 4.10 in Context”, WTJ 54 (1992), p. 335, citado em

Mounce, Pastoral Epistles, cxxxiv.

84
Veja A. J. Köstenberger, “Ascertaining Women’s God-Ordained Roles: An Interpretation of

1Timothy 2.15,” BBR 7 (1997), p. 107-44, esp. p. 130-33. Cf. E. Schlarb, Die gesunde Lehre:

Häresie und Wahrheit im Spiegel der Pastoralbriefe (Marburg: N. G. Elwert, 1990).

85
Para um extenso estudo, veja G. W. Knight, The Faithful Sayings in the Pastoral Letters

(Nutley: Presbyterian & Reformed, s.d.). Sobre o (relacionado) tema da “fé” (pistis) nas Epístolas

Pastorais, veja Mounce (Pastoral Epistles, cxxx- cxxxii), que observou que o substantivo pistis (“fé”)

ocorre 33 vezes e o adjetivo pistos (“fiel”), 17 vezes nas Pastorais. Mounce descobriu que “não há

um único conceito de πίστις nas EP [Epístolas Pastorais]”, mas que “nenhum novo uso de πίστιϛ” é

1366
introduzido nas Epístolas Pastorais. Embora o uso no credo seja mais evidente aqui do que em outros

escritos paulinos, ainda está presente nos escritos paulinos mais antigos” (ibid., cxxxii). O fato de que

os oponentes estavam atacando o corpo de crenças que comprometia “a fé” (entendido como a

incorporação da doutrina ortodoxa cristã) explica a frequência deste tipo de uso nas Epístolas

Pastorais.

86
Curiosamente, o versículo 8 é preferido como a “palavra confiável” pela grande maioria dos

comentaristas, mas não pelas traduções.

1367
Parte 4

AS EPÍSTOLAS GERAIS E O
APOCALIPSE

Esta introdução abrangente ao NT apresentou tratamentos dos quatro


Evangelhos, do livro de Atos, e das 13 cartas de Paulo. Nove outros livros
continuam a ser discutidos: oito cartas convencionalmente agrupadas sob a
rubrica Epístolas Gerais e, em seguida, o livro de Apocalipse. Embora
muitas vezes não considerado como central para o cânon do NT como a
correspondência paulina, essas cartas fazem uma contribuição indispensável
para o cânon bíblico, e seu estudo não deve, de maneira alguma, ser
negligenciado. Com uma alteração mínima, o tratamento desses livros
segue a ordem canônica. O capítulo 16 considera o livro de Hebreus; o
capítulo 17, o livro de Tiago; o capítulo 18, 1 e 2Pedro e Judas; o capítulo
19, 1, 2 e 3João; e o capítulo 20, o livro de Apocalipse.
Cada um desses documentos levanta um conjunto exclusivo de questões
que são discutidas de forma apropriada. No caso de Hebreus, a dificuldade
diz respeito à identidade desconhecida do autor. Tiago é um escrito único
representando o cristianismo judaico primitivo no NT. A relação entre
2Pedro e Judas e a autoria de 2Pedro também levanta questões interessantes

1368
que são consideradas. Tiago e João são notoriamente difíceis de esboçar, e
esse problema também recebe atenção. A relação entre as Cartas Joaninas e
o Evangelho de João e o Apocalipse também é tratada. A discussão das
questões históricas, literárias e teológicas suscitadas pelo livro de
Apocalipse conclui a Parte 4.

1369
CAPÍTULO 16

A carta aos Hebreus

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes devem conhecer os fatos-chave do
livro de Hebreus. Com relação à História, devem ser capazes de identificar
o autor, data, origem, destino e propósito do livro. Com relação à Literatura,
devem ser capazes de apresentar um esboço básico do livro e identificar os
elementos centrais do conteúdo do livro encontrados na Discussão Unidade
por Unidade. Com relação à Teologia, eles devem ser capazes de identificar
os principais temas teológicos no livro de Hebreus.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo central
identificado nos Conhecimentos básicos, os estudantes devem ser capazes
de apresentar os argumentos para as conclusões histórica, literária e
teológica. Com relação à História, os estudantes devem ser capazes de
discutir a evidência para a autoria, data, origem, destino e propósito. Com
relação à Literatura, eles devem ser capazes de apresentar uma descrição
detalhada do livro. Com relação à Teologia, devem ser capazes de discutir
os principais temas teológicos no livro de Hebreus e as maneiras exclusivas
nas quais eles contribuem para o cânon do NT.

1370
Conhecimentos avançados: além do domínio do conteúdo central
identificado nos itens Conhecimentos básicos e Conhecimentos
intermediários, os estudantes devem ser capazes de avaliar criticamente a
autoria de Hebreus e como ela se relaciona com a canonicidade. Eles devem
ser capazes de discutir o gênero de Hebreus, o uso do AT e os recursos
retóricos utilizados no livro. Também devem ser capazes de julgar as
passagens de advertência à luz da hermenêutica empregada pelo autor e
tendo em vista a condição espiritual dos leitores originais e interagir
criticamente com as principais propostas estruturais para o livro.

FATOS-CHAVE DE HEBREUS
Autor: Desconhecido
Data: c. 65
Origem: Desconhecida
Destino: Congregação(ões) judaico-cristã(s) em
Roma
Motivo: Perseguição aos cristãos fazendo com que
alguns voltassem ao judaísmo
Propósito: Alertar as pessoas nessas congregações
judaico-cristãs contra a volta ao judaísmo
como forma de evitar serem perseguidas
como cristãs
Tema: A supremacia de Cristo sobre antigas
personagens do AT e outros intermediários
Versículos-Chave: 12.1,2

INTRODUÇÃO

1371
Hebreus é um livro de profundos contrastes e ironia. Escrito no estilo de
grego mais clássico no NT, ele reflete claramente a hermenêutica judaica. O
livro tem sido tradicionalmente conhecido como “a carta de Paulo aos
Hebreus”, mas, como será visto, os estudiosos discutem quase que cada
palavra dessa descrição. O autor chama o documento de uma breve “palavra
de exortação” (13.22), mas na verdade trata-se de uma das mais longas
cartas do NT. Enquanto Hebreus foi reconhecida como uma das maiores
obras de teologia no NT, sua aceitação canônica plena foi mais demorada
do que a de qualquer outro livro.
Na verdade, o estudante de Hebreus encontra uma série bastante difícil
de incógnitas, que têm sistematicamente desafiado qualquer tentativa de
solução ao longo dos séculos.1 Além disso, estudar Hebreus é difícil, porque
entendê-la exige grande familiaridade com o ensino do AT. Contudo, quem
quer que se aprofunde no estudo do livro e da sua mensagem será muito
bem recompensado, pois, como L. T. Johnson corretamente observou,
“Hebreus é um dos livros mais bem escritos, vigorosamente argumentados e
teologicamente profundos do NT. Seu autor anônimo convoca os leitores a
uma visão da realidade e um compromisso de fé que é ao mesmo tempo
diferente, cativante e perturbador”.2
Com sua ênfase no incomparável e eterno sumo sacerdócio de Jesus
Cristo e no caráter definitivo de seu sacrifício substitutivo, Hebreus faz uma
contribuição vital e indispensável para o cânon cristão. Contrário às
religiões que afirmam que Deus se revelou por meio de vários profetas e
revelações, Hebreus afirma que Deus, nesses últimos dias, se revelou
definitivamente “por Seu Filho” (en huiō; 1.2). Esse Filho, depois de morrer
na cruz como um sacrifício substitutivo, “assentou-se” para descansar de

1372
sua obra (1.3) e foi para o céu como um “precursor” (6.20) daqueles que
têm fé nele para a salvação eterna.3

HISTÓRIA
Autor
Foi sugerido que o autor de Hebreus é “um dos três grandes teólogos do
Novo Testamento”.4 Infelizmente, a autoria da carta é a primeira na lista de
incógnitas em relação a este livro. O debate mais familiar para os cristãos
evangélicos é se Paulo foi o seu autor, mas é improvável que ele fosse (veja
mais adiante). Hoje, poucos estudiosos acreditam que Paulo tenha escrito
Hebreus.5 Dois fatores importantes, em particular, dão apoio ao consenso
quase unânime a esse respeito. Primeiro, a linguagem do livro é diferente da
linguagem de Paulo em suas cartas. Essas diferenças vão além de seu
vocabulário e estilo, chegando às imagens e temas teológicos do livro,
como o sumo sacerdócio de Cristo. Segundo, e talvez mais negativo, é que
o escritor diz que ouviu o evangelho daqueles que o receberam de Cristo
(veja 2.3) — algo que o próprio Paulo negou veementemente em outras
passagens (Gl 1.11-16; veja 1Co 15.8).
Em vez da autoria paulina, um grande número de candidatos tem sido
proposto como o possível autor de Hebreus. Entre esses estão Clemente de
Roma, Barnabé, Apolo, Lucas, Silas, Priscila, Felipe, e até mesmo Maria, a
mãe de Jesus.6 Cada uma desses, com exceção de Lucas, tem o mesmo
problema: não temos documentos conhecidos desses autores para fazer uma
comparação com Hebreus. Dadas as circunstâncias, portanto, o melhor é
admitir que a autoria do Hebreus é desconhecida.7

1373
A boa notícia é que nenhum ponto de exegese depende do
conhecimento da identidade da pessoa responsável pela carta. O documento
em si é formalmente anônimo, ou seja, o autor não se identificou. Ao
mesmo tempo, é evidente que o livro nunca pretendeu ser uma carta
anônima para seus primeiros leitores. O autor esperava plenamente que os
destinatários de sua carta soubessem quem ele era, dada a natureza das
referências pessoais a seus leitores (veja 13.19-23). Ele pode ter sido parte
de sua congregação em um determinado momento no passado, e esperava
vê-los novamente no futuro.
A dificuldade não está apenas no fato de o livro ser anônimo, mas
também no fato de que a igreja primitiva se esforçou para identificar seu
autor quando não fez o mesmo com outras obras formalmente anônimas do
NT (p. ex., os Evangelhos e Atos).8 O livro apareceu pela primeira vez no
cânon entre os manuscritos originais das cartas de Paulo, geralmente entre
2Tessalonicenses e 1Timóteo.9 Esse fenômeno é melhor explicado pela
tradição de que Paulo foi a fonte da carta. Se assim for, é possível que Paulo
não seja o autor do documento, mas que ele o incluiu em uma coleção de
suas cartas baseado no fato de que ele foi escrito por um de seus
colaboradores próximos, embora isso necessariamente fique no reino da
conjectura.
Se o livro é colocado no corpus paulino sem que Paulo seja o autor,
qual é sua conexão com o apóstolo? A menção de Timóteo em 13.23
relembra um proeminente membro do círculo paulino, embora a prisão
mencionada ali não seja atestada no restante do NT. Além disso, as
conexões temáticas são vastas.10 L. D. Hurst assim esboçou os possíveis
pontos de contato entre Paulo e o autor de Hebreus.11 (1) Hebreus não
reflete empréstimo literário de Paulo por um de seus seguidores. Ao mesmo

1374
tempo, é possível detectar certas semelhanças temáticas. (2) Se essas ideias
eram originalmente paulinas, o autor poderia, em algum momento, ter sido
um discípulo de Paulo. (3) É provável haver influência paulina pessoal que
não uma dependência literária direta. De modo semelhante, Orígenes, um
dos pais da igreja (c. 185-254), escreveu: “Se eu fosse arriscar a minha
própria opinião, eu diria que os pensamentos são do apóstolo, mas o estilo e
a construção refletem alguém que se lembrava dos ensinamentos do
12
apóstolo e os interpretou”.

QUADRO 16.1: A CANONICIDADE DE


HEBREUS
Hebreus teve mais dificuldade para alcançar plena aceitação na igreja
antiga do que qualquer outro livro (incluindo 2Pedro). Muitos
estudiosos afirmaram que aqueles que aceitaram a autoria paulina
(como fez o Oriente) respeitaram seu lugar no cânon, enquanto que
aqueles que não aceitaram (o Ocidente) rejeitaram-no. Como de
costume, a verdade é mais complexa.
A preocupação com sua autoria foi igualmente acompanhada por
seu uso entre os hereges no Ocidente, o que levou a igreja ocidental a
excluir o livro de seu cânon. Um elemento de discórdia em especial foi
a interpretação e aplicação de Hebreus 6.4-6 por Montano e
Novaciano, ambos os quais negavam a possibilidade de readmissão na
igreja daqueles que negaram sua fé quando confrontados com
perseguição.1
Assim, nas igrejas ocidentais o problema da heresia foi facilmente
tratado por cirurgia canônica,2 enquanto as igrejas no Oriente

1375
defendiam a autoria apostólica. O Concílio de Hipona (393)
reconheceu a canonicidade de Hebreus, e o Concílio de Cartago (397)
acompanhou.3

1
Veja J. Calvin, Commentaries on the Epistle to the Hebrews, tradução para o inglês de J.

Owen (Grand Rapids: Eerdmans, 1949), p. xxvi; e S. Kistemaker, Hebrews, Baker New

Testament Commentary (Grand Rapids: Baker, 1984), p. 13.


2
Gaio de Roma, descrito por Eusébio como “um homem muito instruído” (Eccl. Hist.

6.20.3), negou que Paulo escreveu Hebreus. Muito provavelmente essa era uma resposta

contra os montanistas, que rejeitavam o arrependimento pós batismo. Ele também fez algo

parecido em relação à literatura joanina. Eusébio registrou que Gaio rejeitou o Apocalipse

(Eccl. Hist. 3.28.1-2), e aparentemente também rejeitou a autoria joanina do Evangelho.

Hipólito escreveu um livro contra Gaio defendendo a autoria joanina do Evangelho, que é

preservado nas obras de Dionysius bar Salibi (século XII). A principal diferença é que o

movimento para remover Hebreus foi mais bem sucedido.


3
Kistemaker, Hebrews, p. 14.

Além do mais, embora a identidade exata do autor permaneça incerta, é


possível inferir da própria carta alguns fragmentos de informação sobre o
autor. Primeiro, o autor era do sexo masculino. O particípio masculino
“dizer” (diegeomai) em 11.32 elimina Priscila, Maria e qualquer outra
mulher de consideração. Segundo, o autor era, obviamente, um escritor
talentoso e eloquente, exibindo um impressionante domínio da retórica
antiga. Isso aponta para a terceira característica, a de que o autor era
instruído. Quarto, ele é muito provavelmente um judeu, com relações
familiares com seus leitores. Embora sua retórica fosse grega, sua
hermenêutica era coerente com os antigos princípios judaicos e cristãos de

1376
interpretação. Quinto, o escritor estava familiarizado com o AT grego (a
LXX).13 Finalmente, como já mencionado, o autor era um crente de segunda
geração (veja 2.3). Isso é tudo que se pode dizer com confiança sobre o
autor.

Data
O segundo elemento de incerteza em relação a Hebreus é sua data. Os
estudiosos propuseram um intervalo muito estreito de possibilidades,
abrangendo de meados da década de 60, pouco antes da destruição do
templo de Jerusalém em 70, até cerca de 90.14 R. Brown, por exemplo, com
cautela optou por uma data na década de 80, com base na teologia
comparativa.15
A data mais antiga possível, obviamente, é posterior à morte,
ressurreição e ascensão de Jesus, uma vez que Hebreus faz repetidas
referências à vida terrena e ao ministério de Jesus (veja esp. 2.10-18; 5.7-
10). Ao mesmo tempo, a alegação do autor de que ele e seus leitores eram
cristãos de segunda geração (2.3) também deve ser levada em conta. Além
disso, o autor indicou que algum tempo se passara após a conversão de seus
leitores (5.12) e depois de terem sido perseguidos por sua fé no passado
(10.32; 12.4), exortando-os a lembrar de seus líderes e seguirem os seus
exemplos, “considerando o resultado da conduta deles” (13.7).
A partir dessas observações, é seguro assumir que uma data anterior a
45 é improvável.16 A data mais recente possível é no final do primeiro
século já que Clemente de Roma (c. 96) foi claramente influenciado pela
carta (indiscutivelmente 1Clem. 36.1-6).17 Se acrescentarmos a isso o fato
de que a carta deve ter sido escrita durante a vida de Timóteo (13.23) e

1377
durante o tempo de vida de um cristão de segunda geração (2.3), isso coloca
sua data limite superior na época de Clemente.18 Assim, a carta deve ter
sido escrita entre os anos 45 e 95.
No entanto, é possível diminuir o intervalo ainda mais. A carta foi
escrita com toda a probabilidade antes da Guerra Judaica, incluindo a
destruição do templo judaico no ano 70, uma vez que o escritor fala do
ministério sacerdotal no tempo presente (9.6-10). Lane rejeitou esse uso do
tempo presente como totalmente irrelevante para datar Hebreus baseado no
fato de que a referência é feita ao tabernáculo, e não ao templo.19 Mas é
mais provável que as referências sejam ao templo.20 Lane ainda advertiu
que uma vez que outros escritores subsequentes à Guerra Judaica se
referiram ao templo e seu culto no tempo presente, não se deveria dar muita
importância aos tempos verbais associados ao templo em Hebreus.21
Lindars respondeu: “Teria sido um impulso irresistível salientar que o
templo, os sacrifícios e o sacerdócio tinham todos deixado de existir, se isso
já tivesse acontecido. Que melhor sinal poderia haver de que a antiga
aliança estava se ‘tornando obsoleta’?”22 As referências ao templo no tempo
presente e a falta de referências a sua destruição apontam para uma data
anterior à destruição de Jerusalém em 70 d.C.
Como será visto abaixo, Hebreus foi, muito provavelmente, escrita para
um grupo de igrejas em Roma. Se assim for, a experiência dos fiéis
mencionada no livro é totalmente congruente com o período de tempo
posterior ao decreto de Cláudio (c. 49) e à perseguição dos cristãos por
Nero (64-66). Uma vez que esses fiéis pareciam estar sofrendo perseguição
no momento da redação, uma data de composição perto do fim deste
período de tempo parece mais provável, embora não perto demais, pois o
autor observa que os destinatários não tinham ainda derramado sangue

1378
(12.4). Em suma, portanto, uma data em meados da década de 60 parece
mais provável.

Origem
A proveniência de Hebreus é desconhecida. A única possível peça de
evidência interna é 13.24, que afirma: “Os da Itália vos cumprimentam”.
Mas, como é argumentado abaixo, muito provavelmente isso indica um
destino romano, enquanto deixa aberta a questão da origem da carta. Se
assim for, talvez a única conclusão segura seja que, onde quer que a carta
foi escrita, ela não foi escrita em Roma, já que esse era o seu provável
destino. Especialmente porque a própria identidade do autor é
desconhecida, fica ainda mais difícil determinar onde esse autor
desconhecido estava na época que escreveu Hebreus. Por essa razão,
reapropriando-nos de Orígenes: “Só Deus sabe a proveniência de
Hebreus”.23

Destino
A terceira incógnita é o destino da carta. A questão do destino da carta
engloba vários fatores. Um deles é a composição étnica da congregação (ou
congregações) a que a carta é dirigida. Outra é a localização geográfica dos
recipientes. Uma outra ainda são as características dos recipientes originais
ou sua situação no momento em que a carta foi escrita.
A primeira pergunta é sobre a composição étnica dos recipientes. À
primeira vista, essa questão parece estar resolvida com a designação da
carta como “aos Hebreus”. Entretanto, embora esse título sugira que os
recipientes eram cristãos judeus, nem todos os estudiosos concordam que o

1379
livro foi escrito para uma audiência judaica. Alguns afirmam que eles eram
gentios, e eles consideram o título vago e enganoso — algo adicionado após
o conhecimento dos recipientes foi perdido.24 No entanto, enquanto alguns
fatores combinam com uma audiência gentia, nenhum anula a impressão
cumulativa de que os leitores originais eram cristãos hebreus.25
O primeiro argumento importante a favor de uma audiência cristã
judaica de Hebreus está ligado ao título do livro. Esse título, que é o único
título que sobrevive, muito provavelmente data da inclusão do livro no
corpus paulino. Se assim for, ele é cronologicamente tão próximo da época
de Paulo que qualquer apelo ao esquecimento dos recipientes se torna
insustentável. Assim, o título “Aos Hebreus” deve ser levado a sério, e de
forma inequívoca aponta para leitores judeus. A questão de se esses judeus
viviam na Palestina ou na Diáspora não é abordada pelo título. Alguns
tentaram identificar os recipientes com os pactuários de Qumran26 ou
sacerdotes judeus em Jerusalém (como aqueles que se converteram em At
6.7),27 mas esses pontos de vista não conquistaram muitos seguidores. O
fato de que os leitores não tinham ouvido Jesus pessoalmente (2.3), o uso
exclusivo que o autor faz da LXX, e a presença de traços linguísticos
característicos da sinagoga helenística apontam para leitores de fora da
Palestina.
O segundo argumento principal em favor de uma audiência cristã
judaica tem a ver com o uso generalizado do AT no livro. O autor pressupôs
que seus leitores estavam bem familiarizados com o ensino do AT,
incluindo o ritual levítico, o sacerdócio e o modelo do tabernáculo.
Achtemeier, Green e Thompson corretamente afirmaram que “é difícil não
ver Hebreus como dirigida a cristãos judeus, para quem as exortações e
argumentos tirados da exposição de tantas passagens do AT, especialmente

1380
as relacionadas aos israelitas vagando à procura da Terra Prometida, teriam
um apelo particularmente forte”.28
A próxima pergunta sobre o destino da carta refere-se à localização
geográfica dos destinatários. O único indício possível a este respeito é
encontrado em 13.24, que afirma: “Os da Itália vos cumprimentam”. Essa
passagem evidentemente estabelece uma conexão entre os leitores e a Itália.
Mas a referência é à localização dos leitores ou do autor? Em outras
palavras, a referência indica que expatriados italianos estão enviando
saudações para casa ou que o autor estava na Itália no momento da escrita?
Guthrie defende a primeira opção (um destino romano), com base no
seguinte conjunto de argumentos: (1) a expressão “da Itália” é usada em
Atos 18.2 para Áquila e Priscila, que eram expatriados italianos; (2) a
referência a pastores como “líderes” (hegoumenoi) em Hebreus (13.7,17,24)
tem paralelo fora do NT apenas em 1Clemente (c. 95) e em Pastor de
Hermas (início do segundo século?), ambos os quais são de origem romana;
(3) 1Clemente (escrito em Roma) fez uso extensivo de Hebreus, assim, a
evidência mais antiga da existência do livro vem de Roma.29 Com base
nesse tipo de evidência, um destino romano para Hebreus é realmente
plausível, se não provável.
Além disso, existem algumas outras características dos destinatários que
podem ser inferidas da carta. De fato, o autor da carta se referiu ao fato de
que os recipientes, bem como o autor, são da segunda geração de cristãos
(2.3); ou seja, o autor olhava para o passado, para os apóstolos como
pertencentes à geração espiritual anterior. Embora eles já fossem crentes por
algum tempo, tinham regredido em seu crescimento em Cristo (5.1 a 6.3), e
alguns tinham parado de frequentar as reuniões semanais (10.25). Em geral,
no entanto, o autor estava confiante na salvação de seus leitores por causa

1381
do trabalho de amor deles (6.10), que inclui o apoio a outros cristãos
necessitados (10.34). Esses crentes não estavam apenas sob pressão
doutrinária, mas também pareciam estar bem familiarizados com a
perseguição. Eles haviam enfrentado “um grande desafio de sofrimentos”
na sua conversão (10.32), tiveram seus bens apreendidos, e tinha sofrido
maus-tratos com alegria (10.34). Além disso, eles estavam atualmente sob
pressão (12.3-13), embora eles ainda não tinham sofrido ao ponto do
martírio (12.4), mas havia uma expectativa de maior sofrimento no futuro
(13.12-14).
Toda essa evidência se encaixa bem com uma audiência de cristãos
hebreus em Roma, em meados da década de 60. Se a discussão exposta
estiver correta, a data mais provável seria pouco antes da perseguição de
Nero, na última metade da década de 60, atingir seu clímax. A comunidade,
tendo existido por algum tempo, já havia sofrido perseguição. Suas
propriedades tinham sido confiscadas, e tinham sido humilhados pelos de
fora do seu grupo (12.4; 13.13). Tudo isso corresponde à situação em
Roma, desde a época posterior ao decreto de Cláudio no ano 49 — nessa
época a experiência do confisco de propriedades foi vivida quando os
judeus foram temporariamente expulsos de Roma30 — até a segunda metade
do reinado de Nero (54-68). As passagens de advertência e as repetidas
exortações para suportarem, bem como o esforço do autor para evitar uma
volta ao judaísmo, indicam que esta era uma forte tentação para seus
leitores. Além disso, na época da perseguição de Nero (c. 65-68), o Estado
reconheceu a distinção entre judaísmo, uma religião tolerada (lat., religio
licita) com certas leniências, e o cristianismo, que era proibido. Um cristão
judeu tentado a escapar da perseguição, então, poderia achar atraente recuar,
voltando para a proteção do judaísmo.31

1382
Motivo e Propósito
O motivo e o propósito da carta estão estreitamente relacionados com as
opiniões alcançadas sobre os recipientes.32 Como argumentado, Hebreus,
muito provavelmente, foi escrita para uma congregação de cristãos judeus
que foram exortados a amadurecer (veja 5.11 a 6.8) em face da iminente
perseguição. Tenha a carta sido escrita para uma ou para várias
congregações cristãs judaicas em Roma, duas coisas parecem certas:
primeira, os recipientes estavam enfrentando uma pressão contínua, fosse
ela social ou física; e, segunda, uma volta ao judaísmo era vista, pelo menos
por alguns, como uma solução atraente para aliviar a pressão. Essa é a
tentação abordada pelo autor.
O autor descreveu seu escrito como uma “palavra de exortação”
(13.22), uma expressão encontrada no NT apenas em Atos 13.15, onde se
refere a uma homilia (sermão) na sinagoga. Isso torna provável que o
gênero de Hebreus seja o de uma série escrita de mensagens orais. Lane
argumentou que isso significa que o autor identificou sua obra como “um
apelo ardente, veemente e pessoal”.33 À medida que o livro avança, esse
apelo se transforma em uma série de argumentos destinados a encorajar os
leitores a amadurecer, mantendo inabalável sua confissão cristã (veja 6.1;
10.23).
A base dessa série de apelos é a absoluta superioridade do Filho sobre
todas as figuras intermediárias anteriores que falaram por Deus, humanas e
angélicas. Além disso, a recente revelação do Filho de Deus, o Senhor Jesus
Cristo, inaugurou a nova aliança que havia sido anunciada pelos profetas do
Antigo Testamento (veja 8.8-13, citando Jeremias 31.31-34), de modo que
agora a antiga aliança mosaica tinha se tornado obsoleta.

1383
A essência do apelo pode ser encontrada nas três exortações em 10.19-
25. A primeira é “aproximemo-nos com coração sincero, com a plena
certeza da fé, com o coração purificado da má consciência e tendo o corpo
lavado com água limpa” (v. 22). O autor convida seus leitores a se
aproximarem de Deus com confiança, com base na suposição de que eles
eram crentes. Sua preocupação principal era a conversão real de seus
ouvintes e sua orientação voltada para Deus. A segunda injunção está no
versículo 23: “Mantenhamos inabalável a confissão da nossa esperança sem
vacilar, pois Aquele que fez a promessa é fiel”. Assim, a preocupação
relacionada subsequente à salvação era uma autêntica confissão de fé em
Jesus Cristo. A terceira exortação prescreve ainda que os fiéis expressem
essa fé um para outro: “Pensemos em como nos estimular uns aos outros ao
amor e às boas obras”34 (10.24).
Essa tríade de preocupações atinge seu clímax em 12.1,2, onde os fiéis
são encorajados a “correr com perseverança a corrida que está diante de
nós”. Assim, o propósito de Hebreus não é apenas manter a confissão dos
fiéis em face da perseguição, mas também que eles prossigam para a plena
maturidade em Cristo, mantendo firme sua confissão.

LITERATURA
Gênero
Duas questões principais têm dominado a moderna discussão de aspectos
literários relacionados a Hebreus: o gênero e a estrutura do livro. O gênero
de Hebreus, embora complicada, é na verdade a questão mais simples,
ainda que um escritor tenha afirmado que “é mais fácil descrever Hebreus
do que classificá-lo”.35 No entanto, o gênero de Hebreus tem sido objeto de

1384
muito debate. A carta tem início e prossegue como uma obra de retórica,
mas se encerra como uma carta.36 Esse fenômeno tem levado a várias
explicações, inclusive a teoria de que o final foi simplesmente anexado a
um sermão mais antigo escrito por um outro autor.37
Uma vez que o autor descreveu sua obra como uma “palavra de
exortação” (13.22), muitos acadêmicos, seguindo H. Thyen, criaram a
questionável hipótese de que a carta é um modelo de um sermão de
sinagoga helenístico-judaica com base no uso da mesma expressão em Atos
13.15.38 Vários escritores têm tentado desenvolver a obra de Thyen.39
Geralmente, essas propostas erram ao exceder a evidência disponível, uma
vez que há um número insuficiente de exemplos contemporâneos a Hebreus
para estabelecer um estilo do “sermão da sinagoga”, helenística ou não.
Seja ou não possível identificar um tipo específico de sermão, a
descrição “homilia” ou “sermão” certamente parece se encaixar bem ao
livro. Johnson localizou quatro fenômenos que dão suporte à noção de que
essa obra derivou de um original oral.40 Primeiro, o autor se refere a si
mesmo na primeira pessoa (singular e plural, afirmando autoridade e se
identificando com seus ouvintes). Segundo, ele moldou sua atividade como
uma atividade de fala, não de escrita. Ao fazer essa autorreferência, ele
geralmente usou verbos de falar, em vez de palavras relacionadas a
escrever.41 Ele também preferiu “ouvir” a “ler”, em referência a seus
leitores. Assim ele criou um senso de presença pessoal com seus leitores.42
Terceiro, ele alternou exposição e exortação, o que “permite a um orador
explicar pontos imediatamente, sem perder a atenção dos ouvintes”.43
Quarto, o autor introduz um tema apenas para explicá-lo mais tarde em sua
obra. Assim, o sacerdócio de Jesus é introduzido em 4.14, mas só é

1385
desenvolvido em 7.1 a 9.28, e sua conexão com Melquisedeque é
mencionada em 5.10, mas só é retomada em detalhes em 7.1.
Por esses motivos, pode-se concluir que Hebreus foi, com toda
probabilidade, primeiramente proferida como uma série de mensagens orais
e depois compilada e editada para publicação como uma carta, o que incluiu
o acréscimo de um final epistolar. Além disso, em concordância com a
antiga noção de que a forma escrita da carta servia como um substituto para
a presença do autor, a carta era destinada a levar os leitores de forma
persuasiva a adotar a argumentação do autor de que a volta ao judaísmo
seria um erro grave, com consequências espirituais desastrosas. Muito
provavelmente, a carta teria sido lida em voz alta para a congregação e,
portanto, o escritor utilizou diferentes recursos para melhorar a
memorização do material, tais como aliteração, repetição e os argumentos
do menor para o maior. Na verdade, a identificação da carta como originária
de uma homilia ou sermão chama a atenção para uma série de artifícios
retóricos e assuntos no livro. A Tabela 16.1 contém apenas uma amostra.

Plano Literário
Passando agora para o segundo item de importância literária, a estrutura do
livro, Hebreus se mostrou difícil de esboçar. Os estudiosos sugeriram
muitas divisões diferentes do texto, algumas baseadas na exegese
tradicional,44 outras baseadas nos mais recentes métodos literários. Apesar
do interesse prolongado, não há consenso no horizonte. A estrutura
complexa que torna difícil esboçar o livro é devida a uma variedade de
fatores, incluindo o estilo retórico e princípios hermenêuticos utilizados

1386
pelo escritor, mas acima de tudo é devido ao fato de que o autor de Hebreus
empregou algumas das transições mais suaves em todo o NT.45
Atualmente, três propostas são as mais populares. Primeira, alguns são
influenciados por A. Vanhoye e entendem que o livro é dividido em cinco
partes, além de uma introdução e uma conclusão. Essas partes geralmente
são organizadas quiasticamente (em um padrão ABB’A’), com o sumo
sacerdócio de Cristo ocupando o centro. Essas divisões, no entanto, muitas
vezes parecem artificiais, e é improvável que qualquer ouvinte pudesse
acompanhar uma extensa série de macroquiasmos por um longo período de
tempo.46

1387
Tabela 16.1: Artifícios Retóricos na Carta aos Hebreus
A carta aos Hebreus apresenta os seguintes artifícios retóricos:
aliteração (repetição de letras; 1.1)
anáfora (repetição para efeito; cap. 11)
antítese (a utilização de palavras ou frases que contrastam entre si para
criar um efeito equilibrado; 7.18-20)
assonância (semelhança de som; 1.1-3)
assíndeto (ligação de orações sem conjunções; 6.3)
quiasmo (paralelismo reflexivo; 2.8,9)
elipse (a omissão de uma ou mais palavras de uma frase; 7.19)
hendíadis (dois substantivos representando um único conceito; 5.7)
palavras-gancho (palavra no início de um parágrafo repetida do final do
parágrafo anterior; veja “anjos” em 1.4 e 1.5).
hipérbato (desvio da ordem normal das palavras; 12.25)
inclusio (usar palavras/orações como parênteses; veja 5.10 e 7.1)
isocólon (sucessão de orações aproximadamente do mesmo tamanho e
estrutura correspondente; 1.3)
lítotes (negação da palavra oposta que normalmente seria utilizada; 4.15)
paronomásia (trocadilhos que exploram a confusão entre palavras de sons
semelhantes, 9.16-18)*
* Para obter uma lista mais extensa, veja Spicq, L’Epître aux Hébreux, 2:252–78. Para um
quadro sobre palavras gancho em Hebreus, veja D. J. MacLeod, “The Literary Structure of the Book
of Hebrews”, BSac 146 (1989): p. 188.

Segunda, há quem veja na carta uma estrutura retórica seguindo as


convenções da retórica antiga que, basicamente, organiza o texto em cinco
seções.47 O problema é que Hebreus resiste a tal estrutura. A conclusão de
Westfall parece convincente: “Portanto, embora Hebreus esteja repleta de

1388
artifícios retóricos, sua organização não se encaixa no modelo da típica
estrutura helenística clássica”. 48
Terceira, muitos dividem Hebreus em três grandes unidades literárias.
Esses estudiosos organizam o material em torno das principais exortações
na carta enquanto veem qualquer material parenético (exortativo)
interveniente como subordinado.49 Refinadas por W. Nauck, as divisões são
as seguintes: (1) 1.1 a 4.13 (marcada por porções hínicas); (2) 4.14 a 10.31
(marcada por subjuntivos exortatórios paralelos); e (3) 10.32 a 13.17
(marcada por imperativos paralelos).50
Monografias inteiras foram escritas sobre esse assunto.51 Em suma, a
proposta tripartite de Nauck, que foi aperfeiçoada pela análise do discurso
de Westfall (veja abaixo), parece revelar a estrutura do texto com mais
sucesso. O que se segue é uma leve adaptação do referido esquema. Um dos
pontos fortes da abordagem de Westfall é que ela reconhece a importância
das frases transicionais em Hebreus, que propriamente dito pertencem a
ambas as seções que abrangem. Por exemplo, a dificuldade perene sobre se
4.14 conclui a seção anterior ou inicia uma nova unidade, é, assim,
resolvida: o versículo pertence a ambas as seções ao mesmo tempo.52
Dois picos discursivos temáticos aparecem em 4.11-16 e 10.19-25,
marcados por tríades de subjuntivos exortatórios (veja 4.11: “Esforcemo-
nos”; 4.14: “Apeguemo-nos firmemente à confissão”; 4.16: “Aproximemo-
nos”). Estes marcam o final da primeira divisão e o início da terceira. Isso
cria uma seção central dominada pelo tema do sumo sacerdócio de Cristo.
Enquanto as seções inicial e final apresentam toda uma série de exortações,
apenas uma aparece no texto principal da seção central, e, também, apenas
um imperativo ocorre. Isso acontece porque a seção central é uma longa
exposição do sumo sacerdócio de Jesus.

1389
Tabela 16.2: Principais Propostas de Estrutura para Hebreus
Westfall Guthrie
I. 1.1 a 4.16 Jesus, apóstolo da I. 1.1-3 Melhor do que os profetas
confissão
II. 4.11 a 10.25 Jesus, sumo II. 1.1 a 2.18 Melhor do que os
sacerdote da confissão Anjos
III. 10.19 a 13.16 Parceiros de Jesus III. 3.1 a 4.13 Melhor do que Moisés
e Josué
IV. 13.17-25 Encerramento IV. 4.14 a 7.28 Melhor do que o
sacerdócio do AT
[Nota: versículos sobrepostos entre V. 8.1 a 10.18 Melhor do que a
I, II e III são propositais] antiga aliança
VI. 10.19 a 12.29 Chamamento para
seguir Jesus
VII. 13.1-25 Exortações finais
Vanhoye
1.1-4 Introdução
I. 1.5 a 2.18 O nome é certamente diferente do nome dos anjos
II. 3.1 a 5.10 Jesus, fiel e compassivo sumo sacerdote
III. 5.11 a 10.39 Jesus, sumo sacerdote segundo Melquisedeque e autor
de eterna salvação
IV. 11.1 a 12.13 A fé dos homens da antiguidade e a necessária
resistência
V. 12.14 a 13.19 O fruto pacífico da justiça

* A estrutura proposta por A. Vanhoye em sua monografia La structure littéraire de l’Épître aux
Hébreux, 2. ed. (Paris: Desclée de Brouwer, 1976; TI 1989) e várias outras obras sobre a estrutura
de Hebreus é reproduzida em Guthrie, Strutcure of Hebrews, p. 14-17 (ela é aqui condensada; para
subtítulos, veja ibid., p. 16). Como observou Guthrie, a obra de Vanhoye é a mais influente já escrita
sobre a estrutura de Hebreus. Entre os principais comentaristas que seguem Vanhoye estão Attridge,
Ellingworth e Lane.

1390
Westfall Guthrie
13.20,21 Conclusão*
* A estrutura proposta por A. Vanhoye em sua monografia La structure littéraire de l’Épître aux
Hébreux, 2. ed. (Paris: Desclée de Brouwer, 1976; TI 1989) e várias outras obras sobre a estrutura
de Hebreus é reproduzida em Guthrie, Strutcure of Hebrews, p. 14-17 (ela é aqui condensada; para
subtítulos, veja ibid., p. 16). Como observou Guthrie, a obra de Vanhoye é a mais influente já escrita
sobre a estrutura de Hebreus. Entre os principais comentaristas que seguem Vanhoye estão Attridge,
Ellingworth e Lane.

ESTRUTURA
I. Jesus, o apóstolo da nossa confissão (1.1 a 4.16)
A. Jesus como herdeiro do universo (1.1 a 3.2)
1. O último mensageiro de Deus (1.1 a 2.4)
a. Deus falou por meio de seu filho (1.1-4)
b. “Filho” é um nome mais excelente (1.5-14)
c. Advertência: não se desvie (2.1-4)
2. Jesus como um sumo sacerdote fiel (2.5-18)
a. A intenção de Deus para a humanidade (2.5-9)
b. Jesus é superior devido à sua humanidade (2.10-18)
c. Parceiros no chamado celestial (3.1,2)
B. Entrar no restante descanso sabático (3.1 a 4.16)
1. Jesus é melhor do que Moisés (3.1-6)
2. Um chamado à resistência (3.7-19)
3. Entrar no descanso restante (4.1-16)

II. Jesus, nosso sumo sacerdote (4.11 a 10.25)


A. Rumo à maturidade (4.11 a 5.14)
1. Aproximar do trono da graça (4.11-16)

1391
2. Um sumo sacerdote como Melquisedeque (5.1-10)
3. O fato da lentidão (5.11-14)
B. A maturidade possibilita a esperança (6.1 a 7.3)
1. Sejamos levados à maturidade (6.1-3)
2. Advertência: não se enfraqueçam (6.4-12)
3. As bases da esperança (6.13 a 7.3)
C. Aproximando-se de Deus (7.4 a 10.25)
1. O fato do sumo sacerdócio de Jesus: ele é o sumo sacerdote como
Melquisedeque (7.4-28)
a. A superioridade de Melquisedeque (7.4-10)
b. Mudando para um sumo sacerdote eterno (7.11-19)
c. O sacerdócio de Jesus tem início com um juramento e dura para
sempre (7.20-25)
d. Conclusão: Jesus é nosso sumo sacerdote adequado (7.26-28)
2. Os resultados do sacerdócio de Jesus: purificação e qualificação
(8.1 a 10.18)
a. Sacerdócio, aliança, tabernáculo e sacrifício de Jesus (8.1-13)
b. Purificando a consciência do crente (9.1-14)
c. O mediador da nova aliança (9.15-28)
d. O fim do sacrifício (10.1-18)
3. A reação ao sacerdócio de Jesus: aproximar-se de Deus (10.19-25)

III. Jesus, aquele que correu a corrida antes de nós (10.19 a 13.16)
A. Correr a corrida (10.19 a 11.40)
1. Movendo um ao outro para a frente (10.19-25)
2. Advertência: nenhum outro sacrifício pelo pecado (10.26-39)
3. Fé e resistência (11.1-40)
B. A corrida que nos foi proposta (12.1-29)

1392
1. Suportar a disciplina de Deus (12.1-13)
2. Ater-se à graça (12.14-29)
C. Sair com Jesus para fora do acampamento (13.1-16)

IV. Conclusão (13.17-25)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Jesus, o Apóstolo da Nossa Confissão (1.1 a
4.16)
Hebreus começa de uma forma bastante abrupta. Alguns acadêmicos
identificaram 1.1-4 como a introdução para o livro. Se assim for, a menção
de anjos em 1.4 e 5 é um exemplo de como o autor faz uma transição
elegante de uma seção para outra.

A. Jesus como herdeiro do universo (1.1 a 3.2)


Sem um pré-escrito formal, o livro se abre como uma apresentação retórica,
e não como uma carta (1.1-4). Imediatamente, o autor traça um forte
contraste entre os profetas que falaram no passado e o Filho através do qual
Deus fala no presente. Esta seção faz uma suave transição para a primeira
seção principal do livro.
Hebreus 1.4 introduz a ideia de que “Filho” é um nome melhor do que o
dos anjos, e os versículos 5-18 apresentam sete citações do AT como prova
disso (1.5-14). As citações são organizadas sob a forma de três pares de
citações com uma citação conclusiva, um artifício retórico rabínico comum
chamado de “colar de pérolas”.53

1393
Os três pares de citações são os seguintes. (1) Em 1.5,6 o autor contrasta
a posição do Filho e a dos anjos: ele é o Filho, e os anjos o adoram (citando
Sl 2.7; 2Sm 7.14; Dt 32.43, LXX). (2) Em 1.7-12 o autor contrasta a obra
do Filho e a dos anjos: os anjos são seus servos, mas ele é o soberano
regente do universo (citando Sl 104.4; 45.6; 102.25-27). (3) Em 1.13,14 o
autor conclui a cadeia de citações com uma citação de Salmos 110.1,
enfatizando novamente que o Filho é o soberano, enquanto que os anjos são
“espíritos ministradores”.
A primeira das várias passagens de advertência segue de perto a
exposição (2.1-4). O argumento segue um padrão do menor para o maior.54
Se uma justa punição foi aplicada pelas violações da lei do AT (mediada
pelos anjos), quanto mais seria este o caso para aqueles que rejeitaram o
Filho, que era manifestamente superior aos anjos, o que remete a 1.1-4.
Assim, os leitores deveriam prestar atenção ao que Deus diz hoje por meio
do Filho.
O autor, em seguida, citou duas razões pelas quais os leitores deveriam
prestar atenção à sua mensagem: (1) para não “se desviarem” (um perigo
constante para os fiéis; observe que isso não implica necessariamente
apostasia) e (2) para não sofrerem disciplina da parte do Senhor.
Citando Salmos 8.4-6, o autor continuou a demonstrar sua tese de que
Jesus é superior os anjos (2.5-9). “O mundo vindouro” não estará sob o
domínio dos anjos, mas sujeito àquele que havia se tornado humano, o
Senhor Jesus Cristo. Citando o AT, o autor lembra que a intenção original
de Deus era que os seres humanos subjugassem a terra (Gn 1.28), mas essa
intenção não havia se cumprido. A humanidade não tinha subjugado
totalmente a terra. No entanto, o propósito de Deus seria cumprido em Jesus

1394
(a primeira vez que a humanidade de Jesus é enfatizada), que tinha sido
“coroado de glória e honra por causa do sofrimento da morte” (2.9).
O autor observou que pareceu apropriado para Deus aperfeiçoar a fonte
ou o autor (archēgos) da salvação da humanidade mediante o sofrimento
(como um ser humano), pois Cristo e os fiéis estão unidos na sua relação
com o Pai como filhos de Deus (v. 11). Cristo até mesmo chama os fiéis de
seus irmãos (v. 12,13 estabelecem as bases do AT para essa identificação).
A intenção final é que, já que os seres humanos e Cristo compartilham
“carne e sangue”, em sua morte na cruz Cristo foi capaz de quebrar o poder
daquele que mantinha os seres humanos cativos pelo medo da morte, isto é,
o Diabo (v. 14,15). Em 2.16-18, o autor explicou que Jesus tinha de ser feito
verdadeiramente humano para que pudesse servir como um sumo sacerdote
eficaz para o povo de Deus.
O argumento prossegue suavemente para a seção seguinte (3.1,2;
observe a conjunção “portanto”), onde Jesus, o superior mensageiro ou
“apóstolo” (gr., apostolos) é contrastado com Moisés, que era um servo na
casa de Deus.

B. Entrar no restante descanso sabático (3.1 a 4.13)


No final da seção anterior, o autor introduziu o fato de que Jesus se tornou
um ser humano para servir como um sumo sacerdote eficaz para o povo de
Deus. Toda a presente seção funciona como preparação para o
desenvolvimento desse tema, mais tarde, na carta.
O movimento dos anjos para Moisés é melhor compreendido levando-se
em conta a noção comum no judaísmo antigo de que Moisés era
considerado superior aos anjos (3.1-6). O autor, no entanto, apontou seus

1395
leitores em direção a Jesus para que pudessem considerá-lo. A base para o
apelo do autor é que Jesus é digno de maior glória que Moisés (3.3,4) e que
ele foi fiel como um Filho sobre a casa em vez de ter sido fiel apenas como
um servo (uma alusão a Nm 12.7). A essência de “considerar Jesus” é
desenvolvida em 3.6b. Os leitores devem conservar firmes sua confissão
pública de Jesus, a fim de manter livre o acesso a ele e atingir o objeto de
sua esperança. Isso leva diretamente para a próxima seção, que representa
um chamado à resistência e desafia os leitores a serem fiéis como Jesus foi.
Hebreus 3.7-19 começa com uma citação de Salmos 95.7-11, uma
passagem usada semanalmente na sinagoga. Toda semana, os adoradores
eram lembrados das consequências trágicas da rebelião em Números 13 e
14. A injunção nos versículos 12 e 13 é para se ter “cuidado” e para exortar
“uns aos outros todos os dias”, para que nenhum dos leitores seja
“endurecido pelo engano do pecado” (v. 13, tradução do autor). O exemplo
de Números se refere a um grupo de pessoas (os israelitas) que estavam
prestes a receber as bênçãos de Deus, mas que não receberam por não
confiar em Deus. O autor alertou seus leitores a resistir até o fim e confiar
em Deus.
A presente seção (4.1-13) é composta de dois parágrafos. O primeiro
descreve o descanso restante e encoraja os destinatários da carta a entrar
nesse descanso. Uma segunda passagem de advertência sobre a necessidade
de se prestar atenção à palavra de Deus dá continuidade à unidade. O autor
passou de uma discussão sobre aqueles que não conseguiram entrar no
descanso para uma discussão sobre a contínua validade de um descanso
originado em Deus. Ele citou Gênesis 2.2 como o fundamento do descanso
sabático (que era a segunda citação das Escrituras feita nas sinagogas a cada
sábado) para explicar que Deus tinha convidado os israelitas ao seu

1396
descanso, mas eles tinham falhado devido a incredulidade e desobediência.
Já que mais tarde Deus por meio de Davi apresentou outra oferta de
descanso (Sl 95.7-11), certamente esse “descanso” não era apenas o
descanso da conquista de Canaã, mas um verdadeiro descanso do tipo
sabático originado em Deus que permaneceu para o povo de Deus (veja 4.8:
“Pois Deus não teria falado depois disso a respeito de outro dia, se Josué
lhes houvesse dado descanso”). O encorajamento, assim, era para certificar
de que os leitores tinham entrado nesse descanso restante, ou seja, um
descanso de seu próprio trabalho, a salvação pela graça. A exortação final é
“fazer todo esforço para entrar naquele descanso, para que ninguém caia no
mesmo exemplo de desobediência” (4.11).
De acordo com o padrão comum, a exortação é seguida por uma
advertência para não se desviar (4.11-16). O povo de Deus deve ouvir sua
voz quando ele chamar por eles “hoje” (veja Sl 95). O autor comparou a
palavra de Deus a uma espada de dois gumes que penetra através de todas
as desculpas humanas, expondo as porções mais íntimas do coração,
pintando uma imagem do ouvinte da palavra nu, de modo a expor seus
pensamentos. As pessoas ficam, na verdade, indefesas diante de Deus
quando elas desobedecem sua palavra. Hebreus 4.11-16 forma o que
Westfall chamou de “pico do discurso”, concluindo a primeira parte da carta
com três exortações inseparáveis: “esforcemo-nos” (4.11); “mantenhamos
com firmeza nossa confissão” (4.14), e “aproximemo-nos do trono da
graça” (4.16).55
Típico das transições do autor, o movimento entre as grandes seções é
sem ruptura. A advertência para não se desviar (4.11-16) é tanto a
conclusão da presente seção quanto a introdução da seguinte. Em termos
teatrais, o autor preferiu uma fusão a um corte brusco.

1397
II. Jesus Nosso Sumo Sacerdote (4.11 a 10.25)
Antes de 4.13, o autor se referiu a Jesus como “sumo sacerdote” (2.17; 3.1),
mas agora ele apresenta uma longa defesa do significado e implicações do
seu sacerdócio. Assim como a seção anterior foi uma exposição de Salmos
95.7-11, esta seção é uma exposição de Salmos 110.4, passagem que não é
citada em nenhum outro livro do NT: “O SENHOR jurou e não se
arrependerá: ‘Para sempre, Tu és um sacerdote como Melquisedeque’.”

A. Rumo à maturidade (4.11 a 6.3)


Hebreus 4.14-16 tira uma conclusão com base na humanidade de Cristo
(mencionada no cap. 2). Os leitores devem “manter com firmeza” sua
“confissão” porque eles têm um sumo sacerdote que está familiarizado com
sua condição pecaminosa sem ter sucumbido a ela. Por essa razão, eles são
capazes de se aproximar do trono de Deus para receber misericórdia e
encontrar graça para socorro.
Tendo declarado o sumo sacerdócio de Cristo, o autor descreve a
perfeição deste sumo sacerdote falando de sua vida terrena e de seus
sofrimentos (5.1-10). Ele começa por observar a intenção de Deus para o
sumo sacerdote levítico, que foi nomeado para servir a Deus ofertando
dádivas e sacrifícios pelos pecados em benefício de seu povo. Era intenção
de Deus que um ser humano exercesse essa função, pois ele estaria
familiarizado com a fraqueza das pessoas, e o próprio sumo sacerdote está
incluído na oferta pelo pecado. Finalmente, ele não se autonomeou, mas foi
designado por Deus.
De modo semelhante, Cristo foi designado por Deus, mas não à
semelhança de Arão, mas de acordo com a ordem de Melquisedeque

1398
(5.5,6). Os versículos 7 e 8 muito provavelmente se referem à oração de
Jesus no Getsêmani, onde o seu último pedido foi para que a vontade de
Deus fosse feita. Assim, “ele aprendeu obediência pelas coisas que sofreu”
(5.8).56 De 5.11 a 6.12 o autor suspendeu temporariamente sua explicação
do sumo sacerdócio de Cristo. A razão para isso é que seus ouvintes se
tornaram lentos em compreender (nōthroi; “lerdos, preguiçosos”). A razão
para que eles não entendessem o ensinamento do autor sobre
Melquisedeque não era que a natureza do seu sacerdócio fosse muito difícil
de captar, mas que eles tinham parado de dar atenção ao ensino da Palavra
de Deus e precisavam voltar ao ABC da fé cristã.

B. A maturidade possibilita a esperança (6.1 a 7.3)


A “doutrina elementar de Cristo” (ESV) é enunciada em 6.1,2 (mais uma
passagem de transição). Em vez de se arrastarem nessas coisas elementares,
o autor queria que seus leitores avançassem rumo à maturidade. A
exortação (a única em toda esta seção) está na voz passiva (muito
provavelmente um “passivo divino”, sendo Deus o agente da ação),
transmitindo o sentido de “sejamos levados [por Deus]” até à plena
maturidade. Isso era importante porque era impossível renovar para
arrependimento aqueles que estavam “crucificando de novo o Filho de
Deus” (6.4-12).
Se considerarmos que o autor imaginou seus ouvintes em uma situação
semelhante à de Israel no deserto, então a descrição dos que caíram — “que
uma vez foram iluminados” (v. 4), “experimentaram o dom celestial” (v. 4),
“participantes do Espírito Santo” (v. 4), “experimentaram a boa palavra de
Deus” (v. 5) — não se refere necessariamente aos crentes. Assim como

1399
Israel no deserto viu a coluna de fogo, comeu o maná, testemunhou a
manifestação do poder de Deus nos poderosos milagres de Moisés, e
recebeu as promessas divinas de livramento de seus inimigos, os leitores
tinham visto as manifestações da realidade, presença e poder de Deus ao
seu redor na congregação da qual eles, pelo menos nominalmente, faziam
parte (6.4-6). No entanto, como ainda é verdade hoje, a associação externa
com uma dada congregação não garante a salvação; o que é necessário é um
coração que confia em Deus e na provisão que ele fez em Cristo.
O autor comparou seus ouvintes aos que seguiam ou os passos de Josué
e Calebe ou os da desobediente geração de israelitas que pereceram no
deserto. Aqueles que caíram repudiaram a Cristo de modo semelhante aos
que o rejeitaram em Jerusalém — assim “crucificando-o de novo” (6.6) não
tem um significado expiatório, mas enfatiza a rejeição de Cristo — e
publicamente o caluniaram. Assim, a ilustração em 6.7,8 descreve os
crentes como aqueles que produzem frutos e os descrentes como quem
produz espinhos, reforçando a afirmação anterior de que os verdadeiros
crentes perseveram até o fim (veja 3.14). No entanto, o autor tinha
confiança na salvação da maioria de seus leitores (6.9,10).
O fiel tem certeza da fé duradoura pois o juramento feito a Abraão tem
aplicação também para os fiéis de hoje (6.13 a 7.3). Por duas realidades
inabaláveis — o juramento e a palavra de Deus — Deus estabeleceu a
aliança com Abraão de que sua descendência seria inumerável. Essa aliança
implica a perseverança do fiel. Os fiéis, assim, recebem encorajamento para
que aproveitem essa inabalável esperança assegurada para eles, porque
Jesus entrou no santuário interno por eles como um sumo sacerdote eterno
semelhante a Melquisedeque.

1400
Hebreus 7.1-3 estabelece quem foi Melquisedeque e como Cristo se
assemelhava a ele em determinados aspectos. Melquisedeque era sacerdote
do Deus altíssimo, que recebeu os dízimos de Abraão. O nome
Melquisedeque significa “rei de justiça”, e ele era o “rei de Salém” (i. e., o
rei da cidade de “Salém”, que significa “paz”). O autor habilmente explorou
também o silêncio do AT e observou que Melquisedeque não tinha
“princípio de dias nem fim de vida”, porque a narrativa do Gênesis em que
ele é introduzido não menciona nem seu nascimento nem sua morte.

C. Aproximando-se de Deus (7.4 a 10.25)


Na proeminente seção central da carta, o autor desenvolveu (1) os
argumentos para o sumo sacerdócio de Cristo (7.4-28); (2) as realizações do
sumo sacerdócio de Jesus (8.1 a 10.18); e (3) a reação apropriada ao
sacerdócio de Jesus (10.19-25).
Hebreus 7.4-10 estabelece a grandeza do sacerdócio de Melquisedeque
sobre o dos filhos de Arão, por três razões. Primeira, os filhos de Arão
recolhiam dízimos de seus irmãos, mas Melquisedeque abençoou Abraão
— o detentor da promessa de Deus — provando que ele era superior a
Abraão. Segunda, os filhos de Arão morreram, mas não há menção da
morte de Melquisedeque, portanto, em certo sentido, ele ainda vive.
Terceira, o próprio Levi, enquanto ainda na carne de Abraão, pagou dízimos
a Melquisedeque antes de nascer.
Tendo estabelecido a superioridade de Melquisedeque, o autor passou
para a mudança do sacerdócio — implicando que a antiga aliança trata com
Arão, e a nova com Melquisedeque — e sua superioridade (7.11-19). Ele
começa fazendo a pergunta: “Se a perfeição veio com a lei, por que houve

1401
necessidade de outro sacerdote que não fosse da ordem araônica?”. A
resposta é que deve haver uma mudança da lei também. Jesus se tornou o
sumo sacerdote não por exigência da lei e descendência física — afinal, ele
era de Judá —, mas com base no poder de uma vida indestrutível (um
sacerdote para sempre à semelhança de Melquisedeque).57
As palavras “não sem um juramento” (v. 20, NIV) (uma lítotes) enfatiza
dois pontos importantes (7.20-25): (1) o sacerdócio de Jesus foi confirmado
pelo juramento de Deus; e (2) o sacerdócio arônico não possuía esse
juramento. Porque o sacerdócio de Jesus foi jurado por Deus como um
juramento permanente, ele nunca será removido. Isso não podia ser dito da
antiga ordem levítica. A ênfase na duração dos dois grupos de sacerdotes
continua durante toda esta seção. Os levitas eram impedidos de serem
sacerdotes permanentes pela morte deles, mas Jesus não. O grande
benefício, é claro, está no fato de que por Jesus viver para sempre, ele é
capaz de salvar para sempre aqueles que vêm a ele por conta de seu
sacerdócio. Jesus está qualificado para ser o sumo sacerdote dos fiéis em
todos os sentidos. Ele é “santo, inocente, imaculado, separado dos
pecadores e exaltado acima dos céus” (7.26); ele apresenta um sacrifício
melhor e serve por um termo bem melhor, eterno.
Hebreus 8.1-6, a afirmação principal do capítulo, recebe suporte de 8.7-
13. Na unidade anterior, o autor destacou o ponto principal: Jesus é um
sumo sacerdote superior, servindo em um tabernáculo superior (i. e.,
celestial).58 Os sacerdotes levíticos serviam apenas em uma pálida cópia do
tabernáculo celestial. O resultado é afirmado em 8.6: “Mas agora tanto ele
(Jesus) alcançou ministério mais excelente, quanto é mediador de uma
aliança melhor, legalmente firmada sobre melhores promessas”. Em 8.7-13,
o autor apresentou apoio das Escrituras para sua afirmação, chamando a

1402
atenção para a promessa da nova aliança em Jeremias 31.31-34 e
observando que a culpa não era da antiga aliança em si, mas da comunidade
da antiga aliança, ou seja, do povo (8.8). Porque o povo foi incapaz de
manter a antiga aliança, Deus prometeu uma nova aliança, indicando que a
antiga aliança estava prestes a desaparecer.
Hebreus 9.1-14 explica ainda mais as afirmações feitas em 8.1-6. Em
9.1-10, o autor descreveu duas grandes limitações da antiga aliança.
Primeira, sob a antiga aliança havia sérias barreiras entre o adorador e
Deus. O objetivo da separação do Lugar Santo e o Santo dos Santos era
mostrar que o caminho para a presença de Deus ainda não estava aberto
(veja 9.8). Assim, a configuração do tabernáculo terrestre apontava para um
novo dia. A segunda limitação da antiga aliança era que ninguém era
aperfeiçoado pelos sacrifícios exigidos por ela. Daí, a antiga aliança era
ineficaz porque o adorador era obrigado a repetir os mesmos sacrifícios ano
após ano.
Em 9.11-14, o contraste com a ineficácia da antiga aliança é completado
ao mostrar a realização de Cristo na purificação do fiel. Ele entrou no Santo
dos Santos do mais perfeito tabernáculo de uma vez por todas, não uma vez
por ano; oferecendo seu próprio sangue, não o de animais representativos;
obtendo redenção eterna, não uma cobertura temporária. O autor, em
seguida, resumiu seu argumento com um apelo do menor ao maior (animais
versus Cristo) para declarar a verdadeira purificação do povo de Deus.
Com seu sacrifício perfeito Jesus se tornou o mediador da nova aliança
(9.15-28). A razão pela qual Jesus teve que morrer estava enraizada em uma
prática do antigo Oriente Próximo (cf. Gn 15.1-18; Jr 34.18-20), onde em
alianças permanentes animais representantes das duas partes envolvidas na
aliança eram sacrificados e divididos entre as partes estabelecendo o

1403
acordo. O sangue da nova aliança — o sangue da morte de Jesus como
representante dos fiéis — assegurou o acordo permanente. Como na antiga
aliança, em que os utensílios do tabernáculo eram purificados pelo sangue,
assim o sangue de Jesus efetuou a purificação dos fiéis quando eles
apareciam no tabernáculo celestial. A morte de Jesus foi tão poderosa que
removeu os pecados de uma vez por todas, obtendo uma salvação eterna. A
próxima ação de Jesus que os fiéis esperavam era a salvação final a ser
realizada em sua (segunda) vinda.
Em 10.1-4, o autor resumiu seus argumentos anteriores. Os antigos
sacrifícios não tornavam ninguém perfeito; o próprio fato dos sacrifícios
anuais era um lembrete do pecado; e o sangue de animais não removia
realmente o pecado. Em 10.5-10, o resultado foi declarado de que esses
sacrifícios simbólicos e repetidos foram substituídos pelo sacrifício todo-
suficiente de Cristo. O parágrafo seguinte retratou a inutilidade da antiga
aliança após o advento da nova aliança ter sido anunciado (10.11-14). O
autor retratou os sacerdotes levíticos permanentemente apresentando as
ofertas obsoletas que nunca podiam remover pecados de forma permanente.
O contraste era entre os sacerdotes de pé da antiga ordem e o sacerdote
assentado da nova ordem segundo Melquisedeque. Jesus completou o
percurso de Salmos 110.1-4 e estava assentado, esperando a submissão de
todos os seus inimigos. Como Bruce afirmou: “Um sacerdote assentado é a
garantia de um trabalho terminado e de um sacrifício aceito”.59
Finalmente, 10.15-18 se refere novamente ao texto da nova aliança.
Quando Deus disse: “Não me lembrarei mais de seus pecados e de suas
maldades”, isso implicava um pagamento completo pelos pecados. Não
havia, portanto, outra oferta pelo pecado; os sacrifícios do templo nada

1404
alcançavam, enquanto que o sacrifício de Jesus realizou tudo que era
necessário para a salvação.
O ponto crucial do ensino anterior é encontrado em 10.19-25.60 Três
exortações aos leitores marcam esta seção como um pico temático que
conclui esta seção e introduz a próxima por meio da terceira exortação.61 Há
também alguns elos com o prévio trio de exortações (4.14-16). Por causa do
que Jesus realizou, já não havia mais uma série de barreiras entre o fiel e
Deus, já que o véu havia de fato sido rasgado. A resposta adequada dos fiéis
é se aproximar de Deus com confiança, sabendo que seus pecados são
perdoados; manter sua confissão sem vacilar, porque Deus é fiel; e ter um
cuidado genuíno pelos outros fiéis, estimulando neles o amor, as boas obras
e o relacionamento fiel.

III. Jesus, Aquele que Correu a Corrida Antes de


Nós (10.19 a 13.16)
O pensamento dominante ao longo desta seção é que os fiéis são peregrinos
nesta vida, ansiosos pela vida por vir. Lane chamou isso de conceito de
“peregrinação comprometida”.62 O autor começou por descrever a vida de
fé como uma corrida.

A. Correr a corrida (10.19 a 11.40)


A passagem inteira é tão coesa estruturalmente que a discussão das
“divisões” é problemática. Após ter dado os comandos temáticos, o autor
sugere um curso de ação: avançar em vez de recuar. A declaração de que
um fiel, por definição, não recua suscita a discussão sobre a fé no capítulo

1405
11, que por sua vez baseia-se no encorajamento para correr a corrida com
perseverança.
A última exortação, “pensemos em como nos estimular uns aos outros
ao amor e às boas obras” (10.24), introduz a seção final da carta. Ela é
dominada por um aumento na proporção de verbos na segunda pessoa do
plural (“vós”), na medida em que agora a ênfase é na aplicação do sermão.63
A unidade 10.26-39 é composta de dois parágrafos: o primeiro adverte
(10.26-31); o segundo encoraja (10.32-39). Talvez se baseando em
Números 15.27-31, essa advertência é provavelmente a mais urgente. A
distinção entre pecados “involuntários” e “desafiadores” não parece estar
em vista aqui, mas sim a rejeição a Cristo (em Nm 15.30, o pecador
“blasfema contra o SENHOR”). A pessoa que rejeita a Cristo depois de ouvir
o evangelho “espezinhou o Filho de Deus e tratou como profano o sangue
da aliança pelo qual foi santificado e afrontou o Espírito da graça” (10.29).
O ponto é simplesmente que, se alguém rejeita o sacrifício de Cristo, não
lhe sobra nenhum outro sacrifício. A terrível perspectiva é a de cair nas
mãos do Deus vivo e todo-poderoso, sem ter uma cobertura adequada para
o seu pecado.
O segundo parágrafo (10.32-39) suaviza o golpe com um encorajamento
para aqueles que não rejeitaram a Cristo. O autor os relembra os primeiros
dias, quando eram tratados com severidade, mas respondiam com alegria, e
ele os encorajou a não jogar fora sua confiança. Em vez disso, eles tinham
necessidade de perseverança, que o autor ligava à fé (veja cap. 11). Assim,
o escritor não colocou a maioria dos seus leitores na categoria daqueles que
recuaram: “Nós, porém, não somos dos que recuam para a destruição, mas
sim dos que creem para a preservação da vida” (10.39).

1406
Começando com a definição de fé (11.1), o autor relatou a perseverança
dos fiéis no passado em cinco movimentos.64 O capítulo inclui uma
introdução (11.1-3); exemplos preliminares dos patriarcas até Abraão (11.4-
12); uma descrição de seu status como peregrinos (11.13-16); mais
exemplos dos patriarcas de Abraão em diante (11.17-31), e finalmente a
continuação dos fiéis até a época do escritor (11.32-40). O pivô parece ser
Abraão, que é o principal exemplo daquele que obedeceu “pela fé” (uma
expressão usada 18 vezes neste capítulo). Pela fé, Abraão olhou para além
da cidade terrena, para a cidade celestial; todos os fiéis, como ele, fazem o
mesmo.
A exortação que flui de haver “tão grande nuvem de testemunhas”
(12.1) é seguir seu exemplo e correr a corrida com perseverança, olhando
para Jesus, que também suportou grande sofrimento. Importante, o tipo de
fé exigida dos leitores era exatamente a mesma fé exibida pelos fiéis do AT;
um ponto muito relevante a destacar se os recipientes eram cristãos judeus.
Assim, o autor alegou que, ter a mesma fé que Abraão teve significa crer
em Jesus, que já tinha vindo para fazer a perfeita expiação pelo pecado.
Voltar ao judaísmo, portanto, não é uma opção legítima pois isso não apenas
significaria se afastar de Cristo, mas também ficar bem aquém do tipo de fé
apresentado por Abraão. Ser um verdadeiro descendente de Abraão, após a
revelação de Deus “por Seu Filho” (1.2), significa crer em Jesus.

B. A corrida que nos foi proposta (12.1-29)


Hebreus 12.1,2 descreve correr a corrida proposta aos fiéis. O restante desta
seção principal descreve o correr desta corrida. Isso envolve suportar a
disciplina de Deus na vida quotidiana e fazer todo esforço para ficar firme

1407
na sua graça. O autor descreve a vida cristã como uma maratona (12.1-13),
onde um corredor não compete contra os outros, mas os encoraja a
participar da corrida também (a ideia da competição é resumida em
12.12,13). Este parágrafo descreve a importância, o propósito e a resposta à
disciplina divina.65 A importância da disciplina é que estar sujeito a uma tal
disciplina é uma prova de que a pessoa é filha de Deus (12.4-10). O
propósito da disciplina é que, no devido tempo, ela produz o fruto da paz e
da justiça (12.11). A resposta adequada à disciplina do Senhor é encorajar
um ao outro a perseverar e suportar (12.12,13).
A seção final desta unidade contém três parágrafos. O primeiro é
composto de três mandamentos relativos à estabilidade da comunidade
(12.14-17). O primeiro mandamento é sobre buscar a paz e a santidade
(12.14). O segundo é sobre encorajar os outros (12.15), entendendo que
falhar com a graça de Deus como um crente significa não utilizar a graça
dada por Deus aos fiéis para buscarem a paz e a santidade. Assim, a
amargura resultante causa problemas e contamina a muitos. O terceiro é de
lembrar aqueles que não possuem fé verdadeira, como Esaú, que era a
antítese daqueles que perseveram, tendo vendido seu direito de
primogenitura por uma simples refeição.
O segundo parágrafo nesta seção (12.18-24) baseia-se no anterior ao
apresentar o fundamento para as exortações ali encontradas: os fiéis não
chegaram ao monte do Terror (Sinai), mas ao monte da Alegria (Sião), onde
Jesus opera nos fiéis para realizar sua vontade. A ilustração final é que o
sangue de Abel clamava por vingança, enquanto o sangue de Cristo clama
por graça. O terceiro parágrafo desta seção (12.25-29) contém a última
passagem de advertência do livro. A advertência é de que não rejeitem a

1408
Cristo, aquele que fala. Em essência, uma vez que os fiéis receberam um
reino inabalável, eles devem se apegar à graça.

C. Sair com Jesus para fora do acampamento (13.1-


16)
O primeiro parágrafo desta seção (13.1-4) é uma exortação a se lembrar do
amor fraterno. É assim detalhado: (1) lembrando dos estranhos; (2),
lembrando dos prisioneiros, e (3), lembrando do cônjuge (fidelidade
conjugal). O segundo parágrafo (13.5-16) gira em torno de mandamentos
relacionados a questões doutrinárias. O primeiro mandamento (13.5,6)
exorta os fiéis a abandonar o amor ao dinheiro. O segundo (13.7,8) os
encoraja a estimar seus líderes e imitar suas vidas, porque Jesus não muda.
A terceira injunção (13.9-15) é para que se apeguem à doutrina correta.
Finalmente, o autor encoraja os fiéis a continuarem com as boas obras
(13.16).

IV. Conclusão (13.17-25)


A conclusão do livro faz dois pedidos. Primeiro, os leitores foram intimados
a obedecer a seus líderes (13.17). Segundo, eles deviam orar por “nós”, não
importando quem fossem os beneficiários das orações solicitadas
(13.18,19). Finalmente, o autor encerra com as exortações conclusivas e
algumas informações (13.20-25), pedindo a seus leitores para receber sua
“palavra de exortação” (descrevendo a natureza e propósito da obra) e
avisando que Timóteo estava fora da prisão e estava a caminho deles.
Saudações finais e bênção encerram o livro.

1409
TEOLOGIA
Temas Teológicos
O Deus que fala na Escritura
A principal fonte da teologia de Hebreus são claramente as Escrituras do
66
AT como interpretadas à luz da vinda de Cristo. O uso do AT em Hebreus
emana do pressuposto de sua validade permanente como a Palavra de Deus
(cf. 1.1; 3.7, 4.12; 13.7). Na maioria dos casos, uma passagem do Antigo
Testamento é citada como Deus ou o Espírito Santo “falando”, de modo
que, em última análise, não são os autores humanos de um determinado
livro do Antigo Testamento que estão falando em e através do texto, mas
Deus, que ainda fala com o seu povo hoje (incluindo os leitores).67 Essa
característica marcante afirma que o AT é Deus falando.
Com base nessa premissa, o autor também sugeriu a revelação para
além do AT, pois se diz que Deus fala na presente economia da salvação
“por Seu Filho” (1.2; veja 2.1-3). Assim, é tanto a palavra mediada pelos
anjos — a lei — quanto a palavra proferida por Deus por meio do Filho que
devem ser obedecidas, com sérias repercussões em caso de desobediência.
O Deus que fala deve ser ouvido. No entanto, uma vez que o autor não faz
referência às palavras específicas de Cristo, apenas à mensagem do
evangelho em geral, a palavra escrita de Deus nas Escrituras Hebraicas
parece ter prioridade.
Frequentemente, o uso que o autor faz do AT representa uma
interpretação objetiva e direta do texto (p. ex., a aplicação de Jr 31.31-34
em Hb 8.8-13). Em outros pontos, o sentido cristológico se perde para os
leitores ocidentais modernos (p. ex., 2.13), e nem sempre fica claro que
passagem está sendo citada (p. ex., 1.6).68

1410
Alguns estudiosos tentaram ligar o uso que o autor faz do AT a um
contexto de pensamento subjacente semelhante a Filo de Alexandria, um
escritor judeu muito instruído do primeiro século (20 a.C. a 50 d.C.).
Especificamente, a apropriação da filosofia platônica por Filo tem sido
frequentemente vista como tendo influenciado o escritor de Hebreus.69 No
entanto, Barrett pareceu falar por muitos quando ele sugeriu que o contexto
do pensamento não era o platonismo, mas a tradição cristã predominante
mais próxima do apocaliptismo judaico.70 O uso do AT em Hebreus reflete
sua antiga tradução grega e exibe características em comum com o estilo
judaico e cristão primitivo.71

A superioridade da pessoa e obra de Cristo e seu


sumo sacerdócio
O primeiro grande tema da carta é a supremacia da pessoa e obra de Cristo.
Cristo é o eterno e preexistente Filho de Deus, que criou o mundo e foi feito
humano para prover expiação para seu povo e, então, assentou-se para
regressar no final dos tempos para julgamento e salvação. O livro se abre
com uma série de contrastes que demonstram a superioridade de Cristo.
Jesus não é apenas um servo como os profetas; ele é o próprio Filho de
Deus. Enquanto Deus falou no passado por meio de vários profetas, nestes
últimos dias ele falou por Seu Filho. Como o criador do universo, Cristo
também é seu herdeiro. Os anjos são apenas servos ministradores que
adoram o Filho. Moisés era um servo na casa de Deus; Cristo era o Filho no
comando da casa.
Com base na sua singularidade como pessoa, Cristo também realizou
uma obra inigualável, descrita em Hebreus no amplo cenário do sacerdócio

1411
72
de Cristo. Embora essa ênfase praticamente não encontre paralelo no NT,
ela não é uma inovação do autor. Pelo contrário, o uso que o autor faz de
Salmos 110.4 em seu argumento encontra apoio na aplicação da figura
mencionada em Salmos 110.1 feita pelo próprio Jesus a si mesmo (veja Mt
22.41-45 e paralelos). A partir daí foi só um pequeno passo para concluir
que o juramento de Deus para essa figura também dizia respeito a Cristo.
Portanto, Jesus é sacerdote para sempre, igual a Melquisedeque, como o
autor de Hebreus argumenta com base em duas importantes passagens do
AT que tratam desse sacerdote-rei (Gn 14.18-20; Sl 110.4).

QUADRO 16.2: O USO DO ANTIGO


TESTAMENTO NO LIVRO DE HEBREUS
Hebreus é incomparável em sua rica diversidade de métodos de
apropriação das Escrituras do AT. Caracteristicamente, o autor não se
limitou a citar um texto, mas usou o AT de várias maneiras para
reforçar seu argumento. Os seguintes nove tipos de abordagens podem
ser identificados:

1. Desfazer confusão (2.8,9)


2. Reforço usando um texto do AT como apoio de uma exortação
(10.19-39)
3. Extrair implicações (8.8-13)
4. Empregar o sentido literal de uma palavra ou expressão (7.11)
5. Antigas regras rabínicas de interpretação, entre elas:
a. Qal wāhômer, um argumento do menor para o maior (2.2-4)

1412
b. Gĕzêrâ šāwâ, o uso de palavras verbalmente análogas para
chamar atenção para a relação entre duas passagens (4.1-11)
6. Cadeia de citações ou “colar de pérolas” (hebr., haraz) de várias
passagens (1.5-13)
7. Listas de exemplo (11.32-38)
8. Tipologia, quando entidades históricas correspondem no plano
redentor de Deus (8.1-5)
9. Midrash homilético, interpretando um texto bíblico na pregação
(6.13-20)1

1
Lane, Hebrews, p. cxxi.

A primeira referência ao sacerdócio de Cristo envolveu seu sacrifício.


Cristo redimiu seus “irmãos” (i. e., os seres humanos), porque sofreu a
morte por todos, e assim ele atuou como sumo sacerdote deles fazendo o
sacrifício (veja 2.17). Que Jesus era um sumo sacerdote como
Melquisedeque significa que ele era superior ao sacerdócio levítico. O autor
argumentou que o Melquisedeque do relato de Gênesis foi um sacerdote
superior porque Levi pagou dízimos a Melquisedeque através de Abrão e
Melquisedeque abençoou Abrão, consequentemente, o maior abençoou o
menor (7.7).
Cristo foi um sacerdote como Melquisedeque porque ele não descendia
de Levi, mas ainda mais por causa da sua existência eterna — ele jamais
morrerá novamente. Como um sacerdote eterno, ele representa um
sacerdócio muito superior. Os sacerdotes levíticos tinham que oferecer
sacrifícios por seus próprios pecados; Cristo não. Seus sacrifícios não
tornavam ninguém perfeito; eles tinham que repeti-los ano após ano; o

1413
sacerdócio de Cristo foi de uma vez por todas. Os sacerdotes levíticos
tinham que ser continuamente substituídos por causa da morte; Cristo vive
para sempre. Finalmente, os levitas serviam no meio de “sombras” no
âmbito de uma aliança que havia se tornado obsoleta; Cristo é o
cumprimento da tipologia do AT, o ministro da nova aliança, que é muito
superior à antiga.
Jesus foi preparado para o sacerdócio (e qualificado para isso) ao tornar-
se humano e sofrer nesta vida como todos os outros seres humanos.73 Ele
também foi instalado pelo juramento de Deus (declarado em 5.5 e 7.20;
claramente a implicação de Salmos 110), como sacerdote permanente, isto
é, eterno (7.24,28). Sua oferta é apresentada como cumprimento da
tipologia do AT do Dia da Expiação. Jesus trouxe seu sacrifício fora do
acampamento e levou o seu sangue para dentro do Santo dos Santos
(13.12,13; veja Lv 16.27). Como sumo sacerdote, ele sentou-se à destra do
trono de Deus e vive para sempre para interceder por seu povo.

Perseverança e segurança cristã


Como o autor desejava encorajar os fiéis a se apegar à confissão deles e
progredir para a maturidade, é necessário abordar a própria natureza da
salvação. Um componente essencial de seu argumento é alertar seus
ouvintes para os perigos de não obedecer ao seu chamado. O autor
conseguiu isso alternando blocos de exposição e de exortação.74 Entre as
exortações de Hebreus está um grupo de passagens (as passagens de
advertência) que severamente alerta os ouvintes sobre os perigos de não se
dar ouvido à palavra de Deus.75 Essas advertências são consideradas tão
fortes que se tornaram um ponto comum no antiquíssimo debate sobre a

1414
preservação dos fiéis.76 Muito provavelmente, o escritor não alertou os
cristãos sobre a possibilidade de apostasia, mas antes os intimou a examinar
a condição de sua fé e as consequências de não se avançar para a
maturidade. Duas considerações críticas apontam nessa direção.
Primeira, o autor confirmou o ensinamento de Jesus de que, por
definição, todos os crentes verdadeiros perseveram até o fim (Mt 10.22 e
paralelo). O autor afirmou: “Porque temos nos tornado participantes do
Messias se mantemos com firmeza até o fim a realidade que tínhamos no
início” (3.14). Hebreus 6.9 afirma que apostasia não tem ligação com
salvação, ou seja, aqueles que possuem a salvação não são aqueles que
apostatam. O autor afirmou que Cristo é capaz de salvar os seus
eternamente por causa de sua intercessão eterna (7.25) e que os fiéis não
estão entre aqueles que recuam para a destruição, mas entre aqueles que
creem e têm como resultado a salvação de sua alma (10.39). Claramente, o
77
autor de Hebreus afirma a perseverança e a preservação eterna dos fiéis.
Segunda, o autor reconheceu que alguns estão relacionados a Cristo
apenas superficialmente. Ele comparou esses tipos de pessoas à geração do
deserto, que se rebelou em Cades-Barneia (Nm 13 e 14), observando que
eles ouviram a palavra, mas que esse ouvir não foi acompanhado de fé
(4.2). Na verdade, o autor descreveu as ações deles como rebelião (como
faz o salmo 95, que ele citou), e ser como essas pessoas desobedientes é ter
“um coração perverso e incrédulo, que se desvia do Deus vivo” (3.12).
Assim, o autor comparou seus ouvintes ou aos que caem na categoria dos
que pereceram no deserto ou aos que caem sob a rubrica daqueles que
creram e foram autorizados a entrar no descanso de Deus, ou seja, Josué e
Calebe. O importantíssimo contraste, então, é entre aqueles que confiaram
em Deus e sua promessa e os que estavam ligados a Deus apenas

1415
nominalmente, aqueles que, na verdade, pareciam um campo estéril bom
apenas para ser queimado (6.8).

Algo Para Pensar: Volte Seus Olhos para Jesus

Para o povo judeu, que se relacionava com Deus por meio da lei
Mosaica e cumpria suas exigências oferecendo sacrifícios mediante
seus sacerdotes, confiar em Cristo para sua salvação exigia uma
grande mudança de paradigma. Como era possível que algo tão
certo em determinado ponto (tentar guardar a lei) de repente seria
errado, agora que Cristo veio? É difícil para nós — na maioria,
gentios — entender a dificuldade que os judeus enfrentaram a esse
respeito.
Todavia, eles precisam mudar — entendendo, como Paulo
destacou, que a função da lei estava limitada ao período anterior a
Cristo. A lei era um reflexo das justas exigências de Deus, mantendo
um padrão de santidade, mas que em si não era capaz de salvar uma
pessoa; isso é algo que somente Cristo poderia fazer, e foi isso que
ele fez. Por esta razão, é imperativo que não negligenciemos “tão
grande salvação”, como o autor de Hebreus exortou seus leitores
(2.3).
Para defender seu ponto de vista, o autor construiu um
argumento poderoso, mostrando a superioridade de Jesus em relação
aos anjos (que haviam mediado a lei no Sinai), a Moisés (mediante
quem Deus havia dado a lei) e ao sacerdócio do AT (que tinha
administrado o sistema sacrificial prescrito na lei). O autor mostrou

1416
como Jesus mediou uma nova aliança servindo como sacerdote de
uma ordem diferente da dos levitas, um sacerdote da ordem de
Melquisedeque – um sacerdote que nunca morreria novamente.
Quando o argumento do autor se aproxima do clímax, ele lança
uma proposta mais ousada. No capítulo 11 (o “hall da fé”), o autor
afirmou que é em Jesus que ele exortou seus leitores a colocar sua
confiança — este mesmo Jesus em quem alguns dos maiores fiéis do
AT já tinham fixado seus olhos, entre eles Abel, Enoque, Noé, Abraão
e até mesmo o próprio Moisés!
Como pode ser isso? É assim porque todas essas pessoas não
viveram por vista, mas pela fé — fé no Deus que podia ressuscitar os
mortos (11.19), fé no Deus que levaria seu povo para a terra que ele
iria mostrar para eles (11.10), fé no Deus que iria salvar os que
acreditassem nele independentemente das obras por meio da fé. Foi
assim que até mesmo com um fiel do AT como Noé “tornou-se
herdeiro da justiça que vem pela fé” (11.7).
Então, se até mesmo os crentes do AT, corretamente entendido,
eram crentes, não só em Deus, mas em certo sentido, já também em
Jesus, quanto mais as pessoas devem — agora que Jesus veio e
morreu e se assentou para descansar de sua obra à direita de Deus
— fixar os olhos em Jesus, “a fonte e consumador da nossa fé, que
por causa da alegria que lhe estava proposta suportou a cruz e
desprezou a vergonha” (12.2)?
“Portanto, também nós, rodeados de tão grande nuvem de
testemunhas, depois de eliminar tudo que nos impede de prosseguir e
o pecado que nos assedia, corramos com perseverança a corrida que
nos está proposta, fixando os olhos em Jesus, a fonte e o consumador

1417
da nossa fé […] Assim, considerai aquele que suportou tal oposição
dos pecadores contra si mesmo, para que não vos canseis e fiqueis
desanimados” (12.1-3).

Os benefícios da morte sacrificial de Cristo


Hebreus retrata a morte de Cristo como o superior e definitivo sacrifício,
oferecido de uma vez por todas (7.27; 8.26), e selado pela ascensão de Jesus
à direita do trono celestial (1.3; 8.1; 10.12; 12.2). Seu sacrifício é o sangue
da nova aliança (9.15-17; veja Jr 31.31-34).78 Agora que a prometida nova
aliança foi concretizada, a antiga aliança — que desde o início era para ser
temporária, apenas uma sombra das boas coisas por vir — foi tornada
obsoleta (8.13).
A descrição da nova aliança está essencialmente ligada ao propósito da
carta pelo menos de duas maneiras. Primeira, por causa da inauguração da
nova aliança em Cristo, voltar à antiga aliança é uma opção inválida. Uma
vez que não há sacrifício pelos pecados que não o feito por Cristo, é vital
que a pessoa mantenha com firmeza sua confissão cristã (4.14; 10.23).
Segunda, pelo fato de as estipulações da nova aliança serem incondicionais,
os fiéis têm acesso sem precedentes a Deus e deveriam aproveitar isso para
buscar a maturidade (3.16; 10.19-22).
Hebreus descreve a morte de Cristo com seus “benefícios
soteriológicos, psicológicos e sociais”.79 O autor se refere à morte de Cristo
da perspectiva de seu cumprimento tipológico do Dia da Expiação. O
sacrifício inclui não apenas sua morte na cruz, mas também sua ascensão ao
céu para apresentar o sangue do seu sacrifício diante do Pai no tabernáculo
celestial (4.14; 7.26), e, finalmente, sua intercessão pelos fiéis é uma

1418
realidade em curso (7.25). Além disso, psicologicamente, a morte de Cristo
também purifica a consciência daqueles que vão a ele (9.14) com base na
efetiva purificação dos pecados humanos realizada na cruz (10.14).
Finalmente, existem também benefícios sociais da morte de Cristo. Uma
vez que o sacrifício é o sangue da nova aliança, todos os benefícios dessa
aliança estão disponíveis para os participantes, incluindo o conhecimento de
Deus: “Porque todos me conhecerão, desde o menor até o maior deles”
(8.11, NASB). Além disso, com base no acesso dos fiéis a Deus mediante o
sangue de Cristo, eles são encorajados a se reunirem e estimular uns aos
outros ao amor e às boas obras (10.23-25). Por causa da resposta de fé dos
crentes, eles estão em continuidade direta com os crentes de todos os
tempos (veja cap. 11). Em essência, a história deles não está completa até
que a nossa história termine (11.40).

A natureza do discipulado
Nos círculos cristãos, o discipulado é muitas vezes tratado como uma série
de disciplinas praticadas pelo fiel. O autor fez referência a algumas
disciplinas cristãs (p. ex., 13.15-19), mas não como meio, mas como
resultado do progresso para maturidade. Na conclusão da carta, o autor
suplicou a Deus para equipar seus leitores “com tudo que é bom para fazer
Sua vontade, realizando em nós o que perante Ele é agradável” (13.21). A
última frase sugere que cumprir a vontade de Deus é uma questão de Deus
efetuar nos fiéis a habilidade de realizar sua vontade.80 Essa é uma
reminiscência de 6.1, que, corretamente, lê: “Sejamos levados à perfeição”
(tradução do autor), um passivo divino indicando que Deus moverá seus
filhos para a maturidade na condição de que eles não ficaram lentos (5.11).

1419
Isso parece basear-se na natureza da nova aliança, na qual Deus faz toda
a obra de fundação. Ele escreve a lei nos corações dos fiéis e se revela para
aqueles que entraram em aliança com ele. Os que participam dessa aliança
são equipados para fazer a vontade de Deus. Os fiéis, acima de tudo,
precisam de perseverança, e isso já lhes foi prometido (3.14). Assim, as
exortações nos capítulos 10 a 12 interpretam a natureza do discipulado
como correr uma maratona com perseverança. Os fiéis devem ser como
Abraão, que estava “esperando ansiosamente a cidade que tem
fundamentos, da qual Deus é o arquiteto e construtor” (11.10). Eles devem
olhar para Jesus em busca de seu supremo encorajamento (12.1), pois o
chamado para segui-lo é um chamado para segui-lo no sofrimento. Assim,
em meio a todas as pressões enfrentadas pelos fiéis, eles são exortados a
“sair até ele fora do acampamento, levando a afronta que ele sofreu. Pois
aqui não temos cidade permanente, mas buscamos a que virá” (13.13,14).

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON


A revelação e redenção definitivas trazidas por Cristo (1.1-4; 7.27;
8.26)
A perseverança cristã e as passagens de advertência (p. ex., 2.1-4)
O eterno sumo sacerdócio de Cristo (4.14 a 5.10; 7.1-28)
A superioridade da nova aliança em relação à antiga aliança (8.1 a
9.25)
O exemplo de fé dos fiéis do AT (cap. 11)

QUESTÕES PARA ESTUDO

1420
1. Qual é a evidência contra a autoria paulina de Hebreus?
2. O que sabemos sobre o autor?
3. Qual parece ser a mais tardia data possível para Hebreus, e por quê?
4. Quais são o destino e destinatários prováveis de Hebreus?
5. Qual é o propósito de Hebreus?
6. Por que os pais da igreja antiga no Ocidente demoraram para aceitar
Hebreus no cânon?
7. Quais são as duas principais questões que dominaram a moderna
discussão das questões literárias em Hebreus?
8. A hermenêutica de Hebreus é grega ou judaica?
9. Quais os artifícios da retórica grega o autor empregou?
10. Por que é difícil determinar a estrutura de Hebreus?
11. Qual é a principal fonte de teologia para o autor de Hebreus, e como
ela foi interpretada?
12. Qual é o principal papel atribuído aos anjos em Hebreus 1 e 2?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


ATTRIDGE, H. W. The Epistle to the Hebrews. Em: Hermeneia
(Philadelphia: Fortress, 1989).
BATEMAN IV, Herbert W., org. Four views on the warning passages in
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Rapids: Zondervan, 1998).
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Testament Studies. Studies in New Testament Greek 11 (New
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1423
1
L. D. Hurst (The Epistle to the Hebrews: its background of thought, SNTSMS 65 [New York:

Cambridge Univ. Press, 1990], p. 1) até mesmo descreveu o livro como “em parte uma brincadeira —

uma brincadeira sobre uma igreja obcecada em ter certeza absoluta de suas origens”. D. A. Black

(“The problem of the literary structure of Hebrews”, Grace Theological Journal 7 [1986], p. 164)

observou que o livro hoje é mais considerado uma coleção de textos-prova e versículos para

memorização.

2
A preparação para a leitura de Hebreus envolve, entre outras coisas, a leitura sobre a

peregrinação dos israelitas no deserto (esp. Nm 13 e 14) e sobre o sistema e acessórios sacrificiais do

AT (p. ex., Êx 25 a 30, 35 a 40). L. T. Johnson, Hebrews: a commentary, NTL (Louisville:

Westminster John Knox, 2006), p. 1.

3
Neste enfoque, decididamente cristológico, o livro de Hebreus tem importantes implicações

soteriológicas e missiológicas em um mundo pluralista que procura ser inclusivo, enquanto a

Escritura ensina que a salvação é encontrada apenas em Jesus e seu sacrifício definitivo. Veja C. W.

Morgan; R. A. Peterson, orgs., Faith comes by hearing: a response to inclusivism (Downers Grove:

InterVarsity, 2008).

4
B. Lindars, The theology of the Letter to the Hebrews, New Testament Theology (Cambridge:

University Press, 1991), p. 25. Lindars não especificou os outros dois teólogos; supõe-se que um

deles seja Paulo.

5
Mas veja D. A. Black, “Who wrote Hebrews? The internal and external evidence re-examined”,

Faith and Mission 18 (Spring 2002), p. 57-69.

6
Clemente (como amanuense de Paulo) recebe o apoio de Eusébio, Eccl. Hist. 3.38; Barnabé, de

Tertuliano, um dos pais da igreja, e mais recentemente de E. Riggenbach, Der Brief an die Hebräer:

Kommentar zum Neuen Testament, edição de T. Zahn (Wuppertal: R. Brockhaus, 1987 [1922]).

Apolo recebe o apoio de M. Lutero, primeiro em seu comentário sobre Gênesis, de 1545 (Luther’s

works 8:178); já em 1522, Lutero qualificou essa opinião com “alguns dizem”. Lucas tem o apoio de

1424
D. Allen, “An argument for the Lukan authorship of Hebrews” (tese de Ph.D, Univ. of Texas at

Arlington, 1987). Silas foi sugerido por T. Hewitt, The Epistle to the Hebrews (Grand Rapids:

Eerdmans, 1960), p. 26-32. Priscila é a escolha de A. von Harnack, “Probabilia über die Addresse

und den Verfasser des Hebräerbriefes”, ZNW 1 (1900), p. 16-41; e R. Hoppins, “The Epistle to the

Hebrews is Priscilla’s letter”, in: A. -J. Levine; M. M. Robbins, orgs., A feminist companion to the

catholic epistles and Hebrews, Feminist Companion to the New Testament and Early Christian

Writings 8 (London: T&T Clark, 2004), p. 147-70. A sugestão de Filipe foi feita por J. Moffatt, The

Epistle to the Hebrews, ICC (Edinburgh: T&T Clark, 1924), p. xx; cf. W. Ramsay, Luke the physician

and other studies in the history of religion (New York: Hodder & Stoughton, 1908), p. 301-8. D. A.

Hagner (Encountering the book of Hebrews: an exposition, EBS [Grand Rapids: Baker, 2002], p. 22)

mencionou a sugestão de ambos Filipe e Maria, a mãe de Jesus.

7
Este foi o parecer de Orígenes: “Mas quem escreveu a epístola, na verdade só Deus sabe”

(citado em Eusébio, Eccl. Hist. 6.25.14).

8
A parte oriental da igreja (representada por Alexandria) afirmava a autoria paulina de Hebreus,

embora reconhecesse a dificuldade dessa posição. O melhor exemplo é a carta festiva de Atanásio

(326), que faz referência a 14 cartas de Paulo (incluindo Hebreus). A parte ocidental da igreja

rejeitava a autoria paulina. Esta era representada por notáveis tais como Ireneu e Hipólito (de acordo

com Fócio), de quem se diz que a rejeitavam, e também por sua ausência no cânon muratoriano, que

tem o cuidado de mencionar 13 cartas de Paulo.

9 46
A mais antiga coleção de cartas paulinas existentes ( ; c. 200) tem Hebreus imediatamente

após Romanos.

10
Baseado nos 15 paralelos observados por H. Windisch (Hebräerbrief [Tübingen: Mohr, 1913],

p. 128), Hurst (Hebrews, p. 108) localizou pelo menos 25 pontos de forte conexão teológica.

11
Hurst, Hebrews, p. 124.

1425
12
Citado em Eusébio, Eccl. Hist. 6.25.

13
G. Guthrie (Hebrews, NIVAC [Grand Rapids: Zondervan, 1998], p. 19) observou que há 35

citações diretas, 34 alusões claras, 19 sumários de material do AT, e 13 vezes o autor mencionou um

nome ou tópico do AT, frequentemente sem referência a um contexto específico. Sobre a dificuldade

em acessar um número estrito, veja W. L. Lane (Hebrews 1 to 8, WBC 47A [Dallas: Word, 1991], p.

cxvi), que localizou 31 citações e 4 citações implícitas, 37 alusões, 19 sumários e 13 referências de

nomes ou tópicos que são introduzidos sem uma referência. A forma exata da LXX empregada pelo

autor também é assunto de debates acadêmicos.

14
L. Gaston, No stone on another: studies in the significance of the fall of Jerusalem in the

Synoptic Gospels, NovTSup 23 (Leiden: Brill, 1970), p. 467; e T. Zahn, Introduction to the New

Testament, tradução para o inglês de J. M. Trout et al. (New York: Scribner’s, 1909), p. 315-23. Zahn

baseou seus argumentos na interpretação de Hebreus 3.7 a 4.11, “vossos pais me tentaram, pondo-me

à prova, e viram minhas obras durante quarenta anos”, como os anos 30-70.

15
R. E. Brown, An introduction to the New Testament, ABRL (New York: Doubleday, 1997), p.

696-7.

16
Johnson, Hebrews, p. 39.

17
Veja esp. 1Clem. 36:2-5.

18
Veja D. A. Carson; D. J. Moo, An introduction to the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids:

Zondervan, 2005), p. 605 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução ao Novo

Testamento].

19
Lane, Hebrews, p. lxiii. Assim também Brown, Introduction to the New Testament, p. 696.

20
G. A. Barton, “The date of the Epistle to the Hebrews”, JBL 57 (1938), p. 199-200. Barton

observou nove verbos diferentes usados “para descrever a performance de partes do ritual e em todos

os casos ele empregou o tempo presente”. Os verbos estão em 9.6 eiseimi (“entrar”); em 9.7 e 9

1426
prospherō (“oferecer”); em 9.22 katharizō (“purificar”) e ginomai (“tornar”); em 9.25 eiserchomai

(“entrar”); em 10.1 e 8 prospherō (“oferecer”); e em 13.11 katakaiō (“queimar”).

21
Lane (Hebrews, p. lxiii) citou Josefo (Ant., 4.224-57); 1Clem. 41.2; Barn., 7-8; e Diogn., 3.

22
B. Lindars, “Hebrews and the Second Temple”, in: W. Horbury, org., Templum Amicitiae:

essays on the Second Temple presented to Ernst Bammel (Sheffield: JSOT, 1991), p. 416.

23
Claro que é verdade que presumivelmente os primeiros recipientes de Hebreus sabiam quem

era o autor, mas a ideia da observação de Orígenes (que ainda continua valendo) é que esse

conhecimento do autor foi logo perdido nas gerações subsequentes.

24
Dentre os estudiosos do século vinte estão, Moffatt, Epistle to the Hebrews, p. xvi-xvii; H.

Windisch, Der Hebräerbrief, HNT (Tübingen: Mohr, 1931), p. 31; e E. Käsemann, The wandering

people of God: an investigation of the Letter to the Hebrews (Minneapolis: Augsburg, 1984). Mais

recentemente, há um número cada vez maior que rejeita uma audiência judaica: D. A. deSilva, An

introduction to the New Testament (Downers Grove: InterVarsity, 2005), p. 778; id., Perseverance in

gratitude: a socio-rhetorical commentary on the Epistle “to the Hebrews” (Grand Rapids: Eerdmans,

2000), p. 2-7; B. D. Ehrman, The New Testament: a historical introduction to the early christian

writings, 2. ed. (New York: Oxford University Press, 2000), p. 378; H. W. Attridge, Hebrews,

Hermeneia (Philadelphia: Fortress, 1989), p. 10-13. deSilva (Introduction, p. 777) sugeriu que o

título “Aos Hebreus” foi acrescentado como uma “‘resposta’ canônica para a religião-mãe que os

tinha rejeitado”. Mas em resposta — emprestando uma frase de Moffatt (Hebrews, p. xvii), referindo-

se à sugestão de que Barnabé escreveu a carta — pode-se dizer: “Mas tudo isso é especular sobre

uma especulação”. A. C. Mitchell (Hebrews, SacPag 13 [Collegeville: Liturgical Press, 2007], p. 12)

e C. R. Koester (Hebrews, AB 36 [New York: Doubleday, 2001], p. 48) sustenta que os destinatários

da carta são de um ambiente social indeterminado.

25
A maioria dos que discordam começam com a suposição de que o título foi acrescentado após

os destinatários terem se perdido na história. Então apresenta-se o argumento do silêncio de que o

1427
escritor nunca os chamou de judeus ou mencionou o Templo em Jerusalém (não é bem verdade; veja

8.9). Outra suposta evidência é que o autor usou a LXX (i. e., a Bíblia grega) e que os cristãos

gentios estavam de fato interessados no AT (p. ex., Moffatt, Hebrews, p. xvi). Ehrman (New

Testament, p. 378) também argumentou que a carta foi escrita para os gentios, pela única razão

explícita de que as questões fundacionais em 6.1,2 (fé em Deus, ressurreição, juízo eterno) já tinham

a adesão dos judeus.

26
Veja P. E. Hughes, A commentary on the Epistle to the Hebrews (Grand Rapids: Eerdmans,

1977), p. 10-15.

27
C. Spicq, L’Épître aux Hébreux (Paris: J. Gabalda, 1952), 1:226-31; D. Allen, “Argument for

the lucan authorship of Hebrews”, p. 29.

28
P. J. Achtemeier; J. B. Green; M. M. Thompson, The New Testament: its literature and

theology (Grand Rapids: Eerdmans, 2001), p. 471.

29
Guthrie, Hebrews, p. 20-21.

30
Suetônio (Claudius, 25.4) afirmou que “[Cláudio] baniu de Roma todos os judeus, que

continuamente provocavam distúrbios por instigação de certo Chrestus”, o que sugere que um

distúrbio por causa de Cristo, começando nas sinagogas, tinha se espalhado pelas ruas de Roma.

31
O mesmo cenário existiria se o autor estivesse escrevendo para uma igreja de fala grega na

Palestina. Esses convertidos certamente existiam na Palestina (veja At 6 e 7), e uma volta ao

judaísmo forneceria a eles uma fuga da perseguição e da ridicularização.

32
Veja o item em Destino.

33
W. Lane, “Hebrews”, in: R. P. Martin; P. H. Davids, orgs., Dictionary of the later New

Testament and its developments (Downers Grove: InterVarsity, 1997), p. 453.

34
Sobre as implicações estruturais dessas injunções, veja Plano literário.

1428
35
Mitchell, Hebrews, p. 13.

36
A esse respeito, apenas 1João é semelhante em sua abertura. Tiago é exatamente o oposto,

abrindo como uma carta, mas encerrando de forma diferente.

37
Mais recentemente, veja A. J. M. Wedderburn, “The ‘Letter’ to the Hebrews and its thirteenth

chapter”, NTS 50 (2004), p. 390-405.

38
Por exemplo, H. Thyen, Der Stil der Jüdisch-Hellenistischen Homilie (Göttingen:

Vandenhoeck & Ruprecht, 1955). A mesma expressão, “palavra de exortação”, é utilizada em

1Macabeus 10.24 e 2Macabeus 15.11 sem referência a um sermão real.

39
L. Wills, “The form of the sermon in hellenistic judaism and early christianity”, HTR 77

(1984), p. 277-99; e G. Gelardini, “Hebrews, an ancient synagogue homily for Tisha be-Av: its

function, its basis, its theological interpretation”, in: H. W. Attridge, org., Hebrews: contemporary

methods, new insights (Boston: Brill, 2005), p. 107-27.

40
O que se segue vem de Johnson, Hebrews, p. 10.

41
Por exemplo, 2.5; 5.11; 6.9; 8.1; 9.5; 11.32. A única exceção é 13.22, onde o autor utiliza o

verbo traduzido por “escrever uma cartar” (epesteila), embora nem essa seja uma exceção uma vez

que 13.22 é parte de uma estrutura epistolar fornecida pelo corpo do documento.

42
Lane, Hebrews, lxxiv.

43
Johnson, Hebrews, p. 10.

44
Veja F. F. Bruce, The Epistle to the Hebrews (Grand Rapids: Eerdmans, 1984).

45
Lane, Hebrews, p. xc.

46
Entre os eruditos que seguem este padrão estão Attridge, Hebrews, p. xx; Lane, Hebrews; e,

em menor extensão, P. Ellingworth, The Epistle to the Hebrews, NIGTC (Grand Rapids: Eerdmans,

1429
1993), p. 58.

47
Por exemplo, Koester, Hebrews, p. 84-85.

48
C. L. Westfall, A discourse analysis of the Letter to the Hebrews: the relationship between

form and meaning, Library of New Testament Studies, Studies in New Testament Greek 11 (New

York: T&T Clark, 2005), p. 6-7.

49
W. G. Kümmel, Introduction to the New Testament, ed. rev., tradução para o inglês de H. C.

Kee (Nashville: Abingdon, 1975), p. 390.

50
W. Nauck, “Zum Aufbau des Hebräerbriefes”, in: J. Jeremias; W. Eltester, orgs., Judentum

Urchristentum Kirche: Festschrift für Joachim Jeremias (Berlin: A. Töpelmann, 1960), citado em

Westfall, Discourse Analysis, p. 12-3.

51
Por exemplo, em inglês A. Vanhoye, Structure and message of the Epistle to the Hebrews,

Subsidia Biblica 12 (Rome: Editrice Pontificio Istituto Biblico, 1989); G. H. Guthrie, The structure of

Hebrews: a text-linguistic analysis (New York: Brill, 1994); e Westfall, Discourse analysis.

52
Westfall, Discourse analysis, p. 297, a quem devemos o próximo parágrafo.

53
Do hebr. haraz. Veja Lane, Hebrews, p. cxxii.

54
Do hebr. qal wahomer. Ibid., p. cxx.

55
Westfall, Discourse Analysis, p. 142.

56
Aprender obediência e alcançar a perfeição não implica nenhuma imperfeição da parte de

Jesus; em vez disso, a referência implica que Jesus tinha completado seu curso para ser investido

sumo sacerdote. O termo teleioō (“aperfeiçoar”) foi usado na LXX para descrever a investidura de

um sacerdote (p. ex., Êx 29.9,33).

1430
57
Melquisedeque na verdade saiu de cena em 7.17, tendo servido o propósito de demonstrar que

o AT dava espaço para um sacerdote que não fosse da linhagem de Arão.

58
Alguns afirmam que o tabernáculo celestial é prova de uma teologia alexandrina

neoplatonizante (veja Moffatt, Hebrews, p. 106), mas parece melhor entender a referência

simplesmente como uma extrapolação direta da passagem citada de Êxodo 25.40 (veja Lane,

Hebrews, 1:207).

59
Bruce, Hebrews, p. 239.

60
Veja Westfall, Discourse Analysis, p. 235.

61
Esse é quase exatamente o mesmo padrão que o de 4.11-16; os três subjuntivos exortatórios

são inseparáveis, mas a transição para a seção seguinte é introduzida pelo terceiro subjuntivo

exortatório “pensemos em como” (10.24), que é desenvolvido na próxima advertência.

62
Veja W. Lane, Hebrews: a call to commitment (Peabody: Hendrickson, 1998), p. 162.

63
Veja Westfall (Discourse analysis, p. 242), que observou 14 pronomes, 26 verbos finitos e 18

imperativos; quase o dobro do número das primeiras duas seções combinadas (30/58).

64
Veja Guthrie, Hebrews, p. 373.

65
Lane, Call to commitment, p. 163.

66
Käsemann (Wandering people of God) tentou defender a tese de um gnosticismo pré-cristão

como a base conceitual de Hebreus. Mas uma vez que o gnosticismo plenamente desenvolvido é

posterior ao cristianismo, essas teorias estão agora desaparecendo (veja Hurst, Hebrews, p. 74).

67
Muitas vezes, ele disse que é Deus quem fala; uma vez ele mencionou Davi (4.7); e uma vez

um ambíguo “alguém” (2.6, A21). Sua expressão favorita é “dizendo” (legōn), vividamente

reforçando a ideia da duradoura validade do AT (Lane, Hebrews, p. cxvii). A. H. Trotter Jr.

(Interpreting the Epistle to the Hebrews, Guides to New Testament exegesis [Grand Rapids: Baker,

1431
1997], p. 191) afirmou: “Provavelmente nenhum livro da Escritura fornece uma prova mais clara e

mais substancial de que os autores do NT consideravam o AT como a própria Palavra de Deus”.

Sobre o “Deus que fala” no livro de Hebreus, veja A. J. Köstenberger, “Mission in the General

Epistles”, in: W. J. Larkin Jr.; J. F. Williams, orgs., Mission in the New Testament: an evangelical

approach (Maryknoll: Orbis, 1998), p. 194-5.

68
O autor nunca revelou a seus leitores a fonte de sua citação. Por duas vezes ele situou uma

passagem apenas como “em certo lugar” (2.6; 4.4).

69
O platonismo considerava que as entidades físicas têm um arquétipo ou padrão celestial. Os

arquétipos são a forma eterna e melhor, enquanto que as entidades terrenas são apenas uma cópia

material. Alguns veem a descrição do tabernáculo em Hebreus 8 e as referências aos sacrifícios da

antiga aliança (referidos como “sombras” e “cópias” em Hebreus) como baseadas no dualismo

platônico. Do final do século dezenove até a década de 1950, esse ponto de vista era bem popular.

Por exemplo, C. Spicq, L’Épître aux Hébreux; e Moffatt, Hebrews, p. xxxi. Para uma refutação, veja

R. Williamson, Philo and the Epistle to the Hebrews (Leiden: Brill, 1970). A ideia de que Hebreus é

platônica em sua perspectiva está quase morta hoje.

70
C. K. Barrett, “The eschatology of the Epistle to the Hebrews”, in: W. D. Davies; D. Daube,

orgs., The background of the New Testament and its eschatology (Cambridge: University Press,

1964), p. 363 e 366. Barrett chegou a sugerir que a linguagem filosófica foi intencionalmente

apropriada pelo autor como uma ferramenta adequada para comunicar a verdade cristã (ibid., p. 393).

71
A versão exata da forma do texto da LXX é uma questão não resolvida. Para a maioria de suas

citações, o texto do autor parece semelhante àquele encontrado nos manuscritos Alexandrino e

Vaticano, do quinto século. Mas existem citações que desafiam uma solução tão simples quanto à

fonte. Veja J. C. McCollough, “The Old Testament in Hebrews”, NTS 26 (1980), p. 363-79.

72
Em nenhuma outra passagem do NT há uma afirmação tão clara do sumo sacerdócio de Cristo.

1432
73
Veja 2.17 e esp. 5.9, onde “aperfeiçoado” é muito provavelmente um termo usado para

descrever a conclusão da preparação de um sacerdote e sua investidura na função.

74
Guthrie, Structure of Hebrews.

75
As cinco “passagens de advertência” são 2.1-4; 3.7 a 4.13; 5.11 a 6.12; 10.19-39; e 12.14-29.

76
H. W. Bateman IV, org., Four views on the warning passages in Hebrews (Grand Rapids:

Kregel, 2006), descreve assim os quatro principais pontos de vista: (1) o ponto de vista arminiano

clássico, que afirma que estas passagens indicam que os fiéis podem perder a salvação; (2) o ponto de

vista reformado clássico, que acredita que estas passagens encorajam os fiéis a manter sua confissão

e que aqueles que repudiam a Cristo nunca foram realmente salvos para início de conversa; (3) o

ponto de vista do arminianismo wesleyano, que defende que estas passagens ensinam que se pode

perder a salvação e nunca mais recuperá-la; e (4) o ponto de vista reformado moderado, que acredita

que estas passagens simplesmente advertem contra não alcançar a maturidade.

77
Contra I. H. Marshall (New Testament Theology [Downers Grove: InterVarsity, 2005], p. 619-

20) [publicado em português por Vida Nova sob o título Teologia do Novo Testamento], que insistiu

tão veementemente na possibilidade da apostasia que chegou a alegar que outras passagens do NT

que parecem ensinar a perseverança dos fiéis devem ser reavaliadas à luz das “passagens de

advertência” em Hebreus. O oposto é muito mais provável.

78
Algumas versões traduzem a palavra diathēkē em 9.13 como “testamento”, que é legitimado

por ocasião da morte de quem o fez. Mas isso não se encaixa no contexto. É melhor entender 9.13 e

os versículos seguintes como descrevendo o processo de se estabelecer uma aliança permanente. Isso

envolvia o abate de animais e o caminhar entre os corpos como representação da morte dos

testadores. No caso da nova aliança, não há corpo representante; em vez disso, o corpo é o de Cristo.

79
R. N. Perkins, “He offered himself: sacrifice in Hebrews”, Int 53 (2003), p. 251-65.

80
Johnson, Hebrews, p. 57.

1433
CAPÍTULO 17

A carta de Tiago

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes devem conhecer os fatos-chave do
livro de Tiago. Em relação à História, devem ser capazes de identificar o
autor, data, origem, destino e propósito do livro. Em relação à Literatura,
devem ser capazes de apresentar um esboço básico do livro e identificar os
principais elementos do conteúdo do livro encontrados na Discussão
Unidade por Unidade. Em relação à Teologia, os estudantes devem ser
capazes de identificar os principais temas teológicos no livro de Tiago.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo
essencial identificado no item Conhecimentos básicos, os estudantes devem
ser capazes de apresentar os argumentos para as conclusões históricas,
literárias e teológicas. Em relação à História, devem ser capazes de discutir
a evidência em favor da autoria de Tiago, data, origem, destino e propósito.
Em relação à Literatura, eles devem ser capazes de apresentar um esboço
detalhado do livro. Em relação à Teologia, os estudantes devem ser capazes
de discutir os principais temas teológicos no livro de Tiago e as maneiras
pelas quais eles contribuem de forma única para o cânon do NT.

1434
Conhecimentos avançados: além do domínio do conteúdo essencial
identificado nos itens Conhecimentos básicos e Conhecimentos
intermediários, os estudantes devem ser capazes de avaliar criticamente
qual Tiago escreveu o livro de Tiago. Devem ser capazes de discutir o
gênero de Tiago e julgar as várias propostas relacionadas à estrutura da
carta. Também devem ser capazes de avaliar a relação entre fé e obras em
Tiago e, de forma crítica, comparar os ensinamentos de Tiago e de Paulo
com relação a esse assunto.

Mapa 17.1: Origem e destino de Tiago.

1435
FATOS-CHAVE DE TIAGO
Autor: Tiago, filho de José, meio-irmão de Jesus
Data: c. 45
Origem: Jerusalém?
Destino: Cristãos judeus da diáspora fora de
Jerusalém
Ocasião: Uma carta circular aos fiéis que tinham
fugido de Jerusalém por causa da
perseguição de Agripa
Propósito: Exortar os judeus cristãos a viver sua vida
cristã em sintonia com a sabedoria, a agir de
acordo com sua fé, e não mostrar tratamento
preferencial aos ricos
Tema: Fé que age
Versículos-chave: 2.21,22

INTRODUÇÃO

Alguns estudiosos, como Martinho Lutero, viram pouco valor no livro de


Tiago e procuraram relegá-lo à periferia da Escritura. Mas Tiago dá uma
contribuição importante para o cânon do NT. Desenvolvendo a doutrina
paulina da justificação somente pela graça mediante a fé somente, Tiago
insiste que a fé, se verdadeira, inevitavelmente resulta em boas obras, ou
não é fé verdadeira de jeito nenhum. Isto soa como uma advertência contra
um foco indevido na crença correta (ortodoxia) em detrimento da práxis
correta (ortopraxia), que devem andar juntas. Esse ponto, deve-se lembrar,
não se originou com Tiago, mas, sim, com o próprio Jesus (Mt 7.21).

1436
Com sua escassez de referências a Jesus e a ausência de referências ao
Espírito Santo, Tiago se encaixa de modo desconfortável no cânon do NT.
Em essência, Tiago representa uma forma primitiva de cristianismo judaico
firmemente arraigada no solo de uma ética sapiencial judaica, apesar de ter
abraçado a Jesus como Messias. Isso mostra que até mesmo para os cristãos
há um valor considerável no ensino sapiencial do Antigo Testamento. Na
verdade, o cristianismo compartilha um considerável território com o
judaísmo. Embora o caráter judaico do cristianismo de Tiago possa
provocar um certo desconforto em alguns leitores, eles devem ter o cuidado
de não distorcer o ensino de Tiago conformando-o ao de outros livros do
NT que são dirigidos a leitores gentios.
Desde o final da década de 1990, Tiago se tornou uma figura popular
como objeto de pesquisa histórica, muito disso em resposta à alegação de
um arqueólogo amador de ter encontrado seu ossuário em Jerusalém.1
Embora a academia tenha frequentemente achado que Tiago era
controverso, muitos estudantes regulares da Escritura encontraram conforto
no livro. As admoestações éticas de Tiago tornam a carta tão aplicável hoje
quanto foi ao ser escrita. Nesse sentido, a declaração de Lutero de que o
livro de Tiago é “uma verdadeira epístola de palha” (i. e., uma epístola
superficial, feita de palha) é ela própria uma declaração de palha.

HISTÓRIA
Autor
O livro de Tiago, do ponto de vista de um leitor moderno, começa com uma
viagem através da linguagem e do tempo. Ele alega ser da autoria de um
certo Iakōbus, forma grega do hebraico Ia’acov (Jacó), traduzido para

1437
2
inglês como “James”, e para o português como “Tiago”. Embora o nome
3
fosse muito comum, e outras pessoas no NT tivessem o nome de “Tiago”, é
praticamente certo que o “Tiago” mencionado em 1.1 seja o meio-irmão do
4
Senhor. A questão debatida pelos estudiosos não é de qual Tiago se trata,
mas se a carta poderia realmente ser de Tiago, o Justo, o meio-irmão de
Jesus.

QUADRO 17.1: QUAL DOS “TIAGOS”


ESCREVEU A CARTA DE TIAGO?
Alguns personagens do NT são conhecidos como “Tiago”:

1. Tiago, filho de Zebedeu (irmão de João, um dos Doze, Mc 1.19;


5.37, 9.2; 10.35; At 12.2); ele foi martirizado muito cedo para ser
o autor de Tiago.
2. Tiago, filho de Alfeu (outro membro dos Doze, possivelmente
também o Tiago mais jovem (Mc 15.40; veja 3.18); embora fosse
um apóstolo (e a escolha de Calvino para o autor da carta1), ele é
um candidato improvável, porque (a) o escritor não foi chamado
de um apóstolo, e (b) esse Tiago não era bem conhecido o
suficiente para assinar uma carta circular apenas como “Tiago”.
3. Tiago, o pai de Judas (Lc 6.16; At 1.13), era demasiado obscuro
para ser este Tiago famoso.
4. Tiago, o meio-irmão do Senhor (Mt 13.55); este Tiago é o único
candidato viável: (a) ele era suficientemente bem conhecido para
ter escrito esta carta; (b) ele era conhecido como uma voz de

1438
autoridade na Igreja de Jerusalém (At 12.17; 15.13; 21.18; Gl
1.19).

1
J. Calvin [João Calvino], “Commentary on the Epistle of James”, in: Commentaries on

the Catholic Epistles, tradução para o inglês de J. Owen (Grand Rapids: Eerdmans, 1948), p.

227. Calvino conjecturou que era improvável que um não apóstolo fosse considerado um

“pilar” da igreja (Gl 2.9).

Os argumentos contra a autoria de Tiago são essencialmente quatro.


Primeiro, o autor da carta tinha um conhecimento muito bom do grego. Seu
estilo é descrito por R. Martin como “fluente e elegante” e cheio das
virtudes linguísticas helenísticas.5 Além disso, o escritor muitas vezes usou
a LXX. Considera-se impossível que um camponês da Galileia pudesse ter
escrito em um grego tão elegante e pouco provável que usasse a LXX.6 Isso
pode ser contraposto em duas frentes. (1) O grego de Tiago está, como
afirmou D. Moo, “distante do grego literário”. (2) O uso das palavras e
conceitos em Tiago está dentro do uso em voga na época.7 Como líder da
igreja em Jerusalém, Tiago tratava com muitos helenistas (veja At 6), e um
8
grande número deles seria dependente do grego. A refutação clássica é a
obra de J. N. Sevenster, Do You Know Greek? [Você sabe grego?] Sevenster
investigou quão profundamente o grego havia entrado no judaísmo
palestino, especificamente em relação a Tiago, e concluiu que a carta
certamente não está além da capacidade de um judeu palestino. Ele
afirmou: “Já não se pode excluir a possibilidade de que um cristão judeu
palestino do primeiro século d.C. escrevesse uma carta em bom grego”.9
A questão relacionada é o uso que a carta faz da LXX. Como veremos,
a questão é complicada. Tiago não usa cadeias simples de citações exatas da

1439
LXX.10 As formas dos textos são misturadas, na melhor das hipóteses, e
difíceis de isolar. Davids concluiu que apenas uma citação na carta é
claramente da LXX.11 O máximo que se pode dizer, portanto, é que Tiago
conhecia a LXX, mas não se limitou a ela.12 Isso não está em contradição
com o que se poderia esperar de um judeu palestino que vivesse em uma
Jerusalém cosmopolita, incluindo Tiago, o Justo.
Segundo, falta à carta detalhes esperados de Tiago, o Justo. Alguns
acadêmicos propõem que se esse Tiago tivesse sido o autor, certamente teria
mencionado seu parentesco com Jesus. Em contraste, a carta menciona
apenas o Senhor Jesus duas vezes (1.1; 2.1). Diz-se que isso é evidência de
um outro problema, a falta de material especificamente cristão. Essas
objeções, no entanto, revelam-se inválidas em um exame mais detalhado. A
veneração da família do Senhor é claramente um fenômeno posterior ao
tempo de Tiago.13 A restrição usada na carta é melhor explicada pela sua
autenticidade.
Em relação à objeção de que há pouco conteúdo claramente cristão em
Tiago, deveria ser observado que ela está comprovadamente imersa nos
ensinamentos de Jesus.14 Além disso, P. Davids observou que as referências
a salvação (1.18) e estrutura da igreja (5.14) e referências indiretas a Jesus
como “juiz”, “Senhor” e “o nome” levam à conclusão de que “somente com
grande dificuldade se pode encaixar esses exemplos — e o todo maior de
que são exemplo — em um contexto puramente judaico”.15
A terceira objeção à autoria de Tiago é que os pais da igreja demoraram
a canonizar o livro. Por volta do quarto século, a carta foi reconhecida pelas
igrejas do ocidente e do oriente.16 No entanto, antes disso o livro teve uma
história de altos e baixos.17 Em vez de questões de autoria ou da ortodoxia
do livro, a questão premente entre os pais da igreja dos terceiro e quarto

1440
séculos foi a falta de citação pelos pais da igreja antiga. O Pastor de
Hermas provavelmente se refere a Tiago (meados do séc. II),18 e 1Clemente
(c. 96), aparentemente cita Tiago.19 Essas, porém, são exceções e não a
regra. Orígenes (c. 185-254) é o primeiro pai da igreja que se sabe ter citado
o livro como sendo de Tiago, o Justo, embora se diga que Clemente (c. 150-
215), o antecessor de Orígenes em Alexandria, escreveu um comentário
sobre o livro.20 Eusébio (c. 260-340) colocou Tiago entre as antilegomena
(as obras contestadas), embora ele mesmo não tivesse dúvidas sobre o
livro.21 Entre aqueles que contestavam a sua autenticidade estava a igreja
síria, porque Teodoro de Mopsuéstia (c. 350-428) rejeitou Tiago como parte
de sua rejeição de todas as Epístolas Gerais.22 A Igreja do Ocidente foi
igualmente ambígua sobre o livro, mas acabou aceitando-o por influência
de Jerônimo (c. 345-420).23 Da maneira que Jerônimo o colocou, Tiago foi
ganhando aceitação “pouco a pouco”.24 Muito provavelmente devido à
influência de Agostinho, o livro foi totalmente aceito no Ocidente, como
evidenciado pelos Concílios de Cartago e Hipona.25

1441
Tabela 17.1: Os Ensinamentos de Jesus em Tiago
Ensinamentos Tiago Evangelhos
Alegria nas provações 1.2 Mt 5.11,12; Lc 6.23
O chamado à perfeição/maturidade 1.4 Mt 5.48
Pedir e receber 1.5,17; 4.2,3 Mt 7.7-11; Lc 11.9-
13
Perseverança e salvação 1.12 Mt 10.22; 24.13
Ira e justiça 1.20 Mt 5.22 (com v. 20)
Praticantes da palavra 1.22,23 Mt 7.24,26
Os pobres herdam o reino de Deus 2.5 Mt 5.3,5; Lc 6.20
Lei de liberdade/amor ao próximo 2.10-12 Mt 22.36-40; Lc
10.25-28
Os sem misericórdia são julgados 2.13 Mt 7.1
Assistência aos pobres na prática 2.14-16 Mt 25.34,35
O fruto das boas obras 3.12 Mt 7.16-18; Lc
6.43,44
Advertência contra lealdade dividida 4.4 Mt 6.24; 16.13
Pureza de coração 4.8 Mt 5.8
Humildade e exaltação 4.10 Mt 23.12; Lc 14.11;
18.14
Os perigos da riqueza 5.1-3 Mt 6.19-21; Lc
12.33,34
O exemplo do profeta 5.10 Mt 5.11,12; Lc 6.23
Proibição de Juramentos 5.12 Mt 5.33-37
Restaurando um pecador 5.19,20 Mt 18.15

O livro, então, tem uma história curiosa de ausência acentuada nos


escritos dos pais da igreja até o final do século IV. Martin pode estar correto

1442
em observar que os gnósticos veneravam Tiago como o receptor do
verdadeiro conhecimento, criando assim uma desconfiança em relação à
carta.26 No entanto, como observou Moo, a evidência é que o livro “era
mais negligenciado do que rejeitado”.27 Aparentemente, essa negligência
não resultava de uma crença de que o livro fosse espúrio. Antes, parece que
uma combinação de fatores levou ao estado de coisas acima descrito nos
séculos III e IV. Muito provavelmente, o livro foi primeiramente
negligenciado no século II, talvez devido à natureza dos debates do século
II em torno do gnosticismo e da natureza de Cristo.28 Posteriormente, o livro
parece tornar-se suspeito para alguns por causa dessa falta de referência.
O quarto argumento contra a autoria de Tiago é que alguns estudiosos
sugerem que as perspectivas sobre a Torá no livro estão em desacordo com
o que é normalmente conhecido sobre Tiago e seu compromisso com a
tradição judaica. Para Dibelius, este é o “argumento decisivo”.29 Que a lei
seja “a lei real” (2.8) e a “lei da liberdade” (1.25; 2.12) sugere uma
minimização das questões rituais da lei em favor de suas exigências éticas.30
O autor de Tiago não faz qualquer menção das leis alimentares, da
circuncisão, da observância do sábado, ou da inclusão dos gentios, tornando
impossível, argumenta-se, que Tiago, o Justo, tenha escrito o livro.
Estudiosos tais como Dibelius alegaram que isso é problemático em duas
frentes. Primeira, uma vez que Tiago foi colocado no cânon depois que as
cartas de Paulo foram incluídas, o fato de que particularmente nenhuma
questão judaica, como as leis alimentares ou circuncisão, seja mencionada
no livro aponta para uma composição tardia posterior à época de Tiago,
quando essas questões já não eram um problema. Segunda, o NT em outras
passagens descreve Tiago como um defensor da religiosidade legalista e de
uma preferência ritualística pela tradição judaica em detrimento da

1443
inovação (veja Gl 2.12), o que teria sido incompatível com a ética da
carta.31
Essa linha de raciocínio, entretanto, é construída sobre interpretações
duvidosas com relação a Tiago e opiniões igualmente questionáveis sobre a
data da carta. Quanto a esta última questão, uma data antiga para Tiago tem
sido sugerida, e as questões relacionadas à lei são argumentos de silêncio,
mais fáceis de explicar do ponto de vista de uma data antiga do que de uma
data tardia. A falta de menção a leis alimentares, a circuncisão e outras
questões semelhantes resulta mais provavelmente do fato de a carta ser de
data anterior a essas práticas se tornarem polêmicas e, portanto, serem mais
pressupostas que esquecidas. Segunda, a imagem de Tiago que é
apresentada é mais desenvolvida a partir da tradição do que do NT. Tiago
(especialmente em Atos) sem dúvida praticava uma forma judaica de
cristianismo. Mas, no NT, Tiago resolveu a questão da inclusão dos gentios
(At 15.13-21), alegrou-se no ministério de Paulo (At 21.18-20), e parece
estar mais preocupado com evangelismo judeu do que com a preservação
dos rituais (At 21.20-25).32 Ele certamente não é um puro ritualista.
Finalmente, a queixa mais persistente contra a autoria de Tiago é a
espinhosa questão que 2.14-26 cria em relação à justificação pela fé, como
ensinada por Paulo. Paulo, normalmente, é visto como o estímulo para o
qual Tiago é a resposta.33 Geralmente, hoje, a resposta de Tiago é vista não
como uma resposta direta a Paulo, mas, quando muito, uma resposta a uma
interpretação errônea de Paulo. Diz-se, portanto, que o autor responde às
cartas de Paulo e pressupõe um entendimento claro de Paulo.
Cronologicamente, isto coloca a carta depois da época de Tiago, o Justo,
que morreu no ano 63.34

1444
No entanto, essa avaliação se baseia em alguns pressupostos
questionáveis sobre Tiago, Paulo e o cristianismo primitivo.35 Johnson
estava certo ao observar que “quando eles [Tiago e Paulo] parecem (da
nossa perspectiva) discordar (Tg 2.14-26), o desacordo é, pelo menos,
parcialmente devido ao nosso pressuposto de que eles estão discutindo um
único tema”.36 Como mostrado adiante, o ponto de vista “Tiago versus
Paulo” não é necessário nem convincente.37
Se o livro não é de Tiago, o Justo, então quem o escreveu? Muitos
pensam que a carta é apenas um documento pseudepígrafo, escrito por
alguém que não Tiago, atribuindo o documento a ele por alguma razão
desconhecida.38 Alguns dos estudiosos que defendem essa teoria
consideram o livro de Tiago uma falsificação intencional. Outros acreditam
que a carta era originalmente um documento anônimo que só mais tarde foi
atribuído a Tiago. Eles conjecturam que talvez Tiago era originalmente um
documento judaico ao qual, mais tarde, foram acrescentadas referências
cristãs.39
No entanto, fora os problemas mencionados acima, a austeridade da
descrição do autor em 1.1 esvazia qualquer noção de pseudepigrafia
intencional. O autor descreveu a si mesmo simplesmente como um “servo
de Deus e do Senhor Jesus Cristo”. É mais do que improvável que um
escritor pseudepigráfico fosse tão brando em sua descrição pessoal. A
maioria das obras pseudepigráficas atribuídas a Tiago (e uma endereçada a
ele) não conseguiu abrir mão das descrições “irmão do Senhor” e “bispo de
Jerusalém”.40 A descrição nas fontes canônicas é inexplicável em uma
falsificação. J. A. T. Robinson sem dúvida estava correto quando escreveu
que “o argumento para a pseudonímia é aqui muito mais fraco do que em
qualquer outra das epístolas do Novo Testamento”.41 As mesmas

1445
dificuldades surgem com aqueles que conjecturam que a carta era
originalmente anônima, mas que o nome “Tiago” foi adicionado mais
tarde.42
Uma posição intermediária entende que a carta tem suas origens em
Tiago, o Justo, mas que foi editada e apresentada por um de seus discípulos
(presumivelmente helenístico). Martin defendeu esse ponto de vista porque
ele achou as dificuldades idiomáticas convincentes e observou (a respeito
da afirmação de Jerônimo) que “alguns dizem que” a carta foi “publicada
[lat., edita] por outro sob o seu nome”.43 Jerônimo, porém, de modo algum
endossou a ideia, e a teoria de que Tiago, o Justo, não poderia ter
empregado esse nível de grego é duvidosa também. Guthrie corretamente
observou que esse ponto de vista não consegue explicar a forma do material
em Tiago em uma carta em vez de em outra forma literária.44 Além disso,
um editor que acrescentasse material no final do primeiro século,
certamente teria identificado o autor de forma mais clara.
Ainda uma outra opinião propõe um Tiago diferente como o autor,
geralmente Tiago filho de Alfeu.45 Lutero e Erasmo sugeriram um “Tiago”
agora desconhecido.46 Essas identificações não são prontamente seguidas
nos círculos modernos. Qualquer outro candidato deve ser conhecido o
suficiente e exercer autoridade suficiente para ser identificado
simplesmente como “Tiago”.
Tendo as várias propostas alternativas se revelado insatisfatórias, a
seguinte evidência dá suporte ao ponto de vista de que Tiago foi o autor —
Tiago, o meio-irmão de Jesus, ou “Tiago, o Justo”, como ele veio a ser
identificado pela igreja primitiva. Em primeiro lugar, a referência a “Tiago,
um servo de Deus e do Senhor Jesus Cristo”, no início da carta (1.1), sugere
que esse Tiago era uma pessoa com nome consideravelmente reconhecido e

1446
também com grande autoridade. Caso contrário, teria sido necessário para o
autor fornecer informações adicionais e características distintivas sobre si
mesmo. Tiago, o Justo, como líder da igreja em Jerusalém, se encaixa
nessas duas descrições ao contrário de qualquer outro Tiago no primeiro
século. Pois seria improvável que algum outro Tiago tenha sido tão
importante e depois, rapidamente, tenha caído na obscuridade.
Segundo, apesar das alegações em contrário, o escritor mostrou alguma
evidência de ser um judeu palestino. Ele mencionou “as primeiras e as
últimas chuvas” (5.7), que era comprovadamente um fenômeno do clima da
Palestina. Mais importante, a linguagem do autor está imersa nas Escrituras
do AT.47
Em terceiro lugar, há semelhanças verbais notáveis com Atos 15.
“Saudações” (chairein) ocorre em Tiago 1.1 e Atos 15.23 (e em outras
passagens de Atos apenas em 23.16). Surpreendentemente, Atos 15.23 é
parte do decreto de Jerusalém, em que Tiago teve um papel de liderança.
Em Tiago 2.7 e Atos 15.17, os fiéis são chamados pelo nome de Deus. A
exortação “ouvi” para os “irmãos” ocorre em Tiago 2.5 e Atos 15.13.
Palavras incomuns são encontradas em Tiago e Atos em conjunção com
Tiago: “inspecionar” (episkeptomai) em Tiago 1.27; Atos 15:14; “desviar”
(epistrephō) em Tiago 5.19; Atos 15.19; e “guardar-se” (tēreō + heautou)
em Tiago 1.27; Atos 15.29. Embora não constituam prova conclusiva, esses
paralelos linguísticos corroboram a autoria de Tiago.
Por fim, o homem refletido na carta é bem compatível com o Tiago
meio-irmão de Jesus como ele é retratado no restante do NT. Esse Tiago é
identificado como o líder da igreja de Jerusalém e visto como o fiador de
uma expressão judaica do cristianismo (At 12.17; 21.18-25; Gl 1.19).

1447
Por essas razões, os últimos anos assistiram uma tendência entre os
estudiosos de reconhecerem que as evidências internas da carta não são
incompatíveis com a autoria de Tiago. Até muitos estudiosos que são
críticos dos pontos de vistas tradicionais agora veem esta carta como de fato
escrita por Tiago, o Justo.48 Sem evidências contrárias convincentes, o
melhor entendimento do autor é, na verdade, que o autor do livro de Tiago é
Tiago filho de José, o meio-irmão do Senhor Jesus.

Data
Dada a ausência de indicações convencionais de tempo, tais como
referências a pessoas, lugares ou eventos específicos, a carta é bem difícil
de datar. J. A. T. Robinson registrou um amplo espectro de datas sugeridas
na literatura acadêmica, em algum momento de 50 a 150.49 Se a discussão
acima sobre a autoria estiver correta, o livro foi escrito durante a vida de
Tiago, o Justo, ou seja, algum tempo antes de c. 62 ou 63 (Josefo, Ant.
20.200).50 Na outra extremidade do espectro, a carta deve ter sido escrita
após a conversão de Tiago (veja 1Co 15.7), isto é, não antes de
aproximadamente 33. Isso fornece um intervalo de datas possíveis
abrangendo um período de cerca de 30 anos.
Para restringir esse intervalo ainda mais, a carta deve ter sido escrita
depois de Tiago se tornar o proeminente líder na igreja de Jerusalém. Isso
pode ser datado por volta de 41/42 (veja At 12.17). Alguns fatores sugerem
uma data de composição posterior a esse período de tempo, tais como as
dificuldades econômicas sugeridas na carta corresponderem à época da
fome na Palestina mencionada em Atos 11.28-30. Possivelmente, os
destinatários foram dispersos por causa da perseguição de Herodes Agripa I

1448
mencionada em Atos 12.1-4 (c. 43). Ao mesmo tempo, a carta mostra uma
familiaridade com o ensinamento de Jesus que não parece ser resultado de
um conhecimento apenas literário,51 o que sugere que a carta muito
provavelmente foi escrita antes dos Evangelhos canônicos (e, portanto,
antes de meados da década de 50).52 Isso restringe a data mais provável de
composição ao período entre 42 e meados da década de 50.
Além disso, a carta não parece abordar nenhuma das questões que
surgiram após 48/49. Não há discussão e nem até mesmo reconhecimento
da questão da inclusão dos gentios na igreja (p. ex., At 11.1-18) ou da
controvérsia gerada pelos judaizantes (p. ex., At 15.5; Gl 2.11-13), e muito
menos da resolução dessas questões no Concílio de Jerusalém no ano 49
(At 15.1-21). Assim, parece que a carta foi provavelmente escrita antes do
Concílio de Jerusalém e, portanto, antes das cartas de Paulo e talvez até
mesmo antes da missão aos gentios.53 Assim, o intervalo de tempo mais
provável durante o qual a carta foi escrita se estende de 42 a 49. Por essa
razão, J. A. T. Robinson provavelmente estava correto ao afirmar que a
carta de Tiago “pode tomar seu lugar natural, ao lado de outra literatura no
processo de formação na segunda década da missão cristã, como o primeiro
documento concluído da igreja que sobreviveu”.54

Origem
Aqueles que propõe um autor diferente de Tiago, o Justo, sugeriram vários
locais para a origem da carta, incluindo Roma. Se os nossos pontos de vista
sobre o autor, data, destino e ocasião estiverem corretos, então Jerusalém
pode ser o lugar de composição da carta, uma vez que não se sabe se Tiago
passou um tempo significativo fora da Palestina durante os anos iniciais da

1449
igreja. É preciso admitir que a origem não é conhecida, mas felizmente
nada de importante depende dessa identificação.

Destino
A carta é endereçada às “12 tribos da Dispersão” (1.1). A maioria dos
estudiosos acredita que esses destinatários eram cristãos judeus. O termo
“12 tribos”, enquanto em outras passagens é aplicado figurativamente ao
povo de Deus (veja 1Pe 1.1), no presente caso, muito provavelmente se
refere a uma audiência cristã judaica. Algumas características apontam para
um contexto judaico: (1) a referência à reunião em uma sinagoga (2.2); (2)
a referência a “Abraão, nosso pai” (2.21); (3) o uso do AT em citações
diretas e alusões; (4) a carta se assemelha a literatura sapiencial judaica; e
(5) o tom profético.
Esse ponto de vista é também confirmado por indicações claras da carta
de que se esperava que os leitores estivessem familiarizados com as
condições na Palestina. Johnson observou sete fatores que apontam para
essa conclusão: (1) o efeito do vento escaldante sobre a vegetação (1.11);
(2) proximidade de um mar perigoso (1.6; 4.13); (3) fontes de água doce e
amarga (3.11); (4) agricultura caracterizada por figos, azeitonas e uvas
(3.12); (5) um padrão de clima específico da Palestina, as primeiras e
útimas chuvas (5.7); (6) diaristas privados de pagamento (5.4); e (7) o uso
do termo gehenna (inferno) em 3.6, um termo encontrado no NT apenas nos
Evangelhos.55
Mas onde estão esses crentes judeus? O termo “Dispersão” (1.1)
geralmente se refere aos judeus vivendo fora da Palestina (p. ex., Jo 7.35),
descrevendo o povo de Deus que estava espalhado devido ao juízo divino,

1450
mas que levava consigo a esperança da restauração (veja 1Pe 1.1,17; 2.11,
com referência aos crentes em geral). O fato de ser uma carta exige uma
congregação a alguma distância do escritor. Assim, é possível que os
recipientes fossem cristãos judeus em algum lugar de uma área conhecida
como Diáspora, talvez em Antioquia da Síria, possivelmente dispersos
devido à perseguição de Herodes Agripa I (At 12.1-4; c. 43 d.C.), enquanto
o autor poderia ter estado na Palestina.56

Motivo
A carta parece abordar indivíduos específicos (as 12 tribos), mas não uma
situação específica. O melhor seria ver Tiago como uma carta geral
(justificando a sua inclusão entre as Epístolas Gerais no cânon do NT)
escrita para dar aconselhamento pastoral aos recipientes, quaisquer que
fossem as circunstâncias específicas. Havia precedentes para tal carta entre
judeus e primeiros cristãos (veja Jr 29, 2Mc 1.1-9 e At 15.23-29).
Dada a provável data da carta, parece realmente haver um grupo e
ocasião específicos que se adequariam ao conteúdo da carta. Após o
apedrejamento de Estêvão, os fiéis de Jerusalém (um número bem grande a
esta altura) foram espalhados fora de Jerusalém.57 As injunções na carta
parecem adequadas para ricos e pobres e, em particular retratam ricos
proprietários oprimindo trabalhadores pobres. Aqueles que foram
desalojados pela perseguição certamente se encontrariam trabalhando
essencialmente como trabalhadores migrantes (embora alguns pudessem
prosperar). O encorajamento para viverem suas vidas plenamente
comprometidos com o senhorio de Cristo certamente seria apropriado para
tal grupo.

1451
LITERATURA
Gênero
Dada a abertura epistolar da obra, a intenção da carta de servir como um
substituto para a presença do escritor, e a natureza exortativa do documento,
é melhor considerar Tiago como algum tipo de carta.58 Embora a maioria
considere Tiago ser uma carta, essa categoria não a descreve
adequadamente em todos os aspectos. Embora o livro se abra como uma
carta, nenhuma ocasião por trás dela é perceptível, nenhum indivíduo é
mencionado, e não há um encerramento epistolar (cf. Fp 4.10-23). O livro é
propositalmente geral e destinado a uma grande audiência (as 12 tribos na
Dispersão).59
Seria possível identificar, de forma mais precisa, o tipo de carta que
Tiago representa? Em comparação com outras cartas do NT, parece que o
gênero de Tiago se assemelha ao de Hebreus e 1João, isto é, uma
composição endereçada a um grupo de leitores bem dispersos. J. H. Ropes
classificou a carta como uma “diatribe” (i. e., uma série de argumentos
retóricos).60 De fato, Tiago exibe algumas características desse gênero.
Frequentemente, ele se dirige a seus leitores de forma direta (1.2,16,19;
2.1,5,14; 3.1,10,12; 5.12,19); emprega um interlocutor imaginário (p. ex.,
2.18-22); faz perguntas curtas que são respondidas imediatamente (p. ex.,
3.13; 4.14; 5.13,14); e frequentemente usa comparações (1.6,10,11; 2.26;
3.5,6,11,12; 4.14; 5.2,3,18).61 No entanto, apesar dessas semelhanças, Tiago
não se enquadra perfeitamente no esquema de uma diatribe.62 Primeiro,
devidamente definida, uma diatribe é “uma forma de argumentação em que
uma tese clara é discutida dentro do ambiente (fictício ou real) de uma
escola”.63 Evidentemente, Tiago não se encaixa nessa definição estreita. O

1452
autor não afirmou uma tese explícita que, em seguida, defendeu, e sua
audiência não pode ser entendida como uma “escola”. Segundo, há coisas
em Tiago que não se enquadram nem mesmo em uma definição mais ampla
de diatribe. As várias subunidades literárias não combinam como uma série
de demonstrações de uma tese central, mas estão conectadas de forma
muito mais solta.
Um outro entendimento popular do gênero de Tiago é classificar a carta
como um exemplar da literatura de sabedoria. Isso tem a seu favor o fato de
que “sabedoria” é um tema importante na carta (1.5; 3.13,15,17). Além
disso, certos temas comumente encontrados na literatura de sabedoria
também são encontrados em Tiago, tais como o controle no falar (3.1-12) e
questões relacionadas com riqueza e pobreza (5.1-6). Seja como for, o livro
se assemelha a uma lista de ditos nas obras de sabedoria do AT, como o
livro de Provérbios. Embora as recentes discussões sobre a conexão de
Tiago à literatura da sabedoria, investigando a conexão entre Tiago e o tipo
de sabedoria encontrada no Eclesiástico e na Sabedoria de Salomão, possam
explicar o movimento de um tópico para outro em Tiago,64 apenas uma
definição ampla de “literatura de sabedoria” permite que Tiago seja situada
nessa categoria de gênero.65
Ainda outra proposta veio de M. Dibelius, que descreveu Tiago como
uma série de exortações (parênese). Mais do que incluir mero ensino,
Dibelius sustentou, Tiago apresentou material “em forma de ditos
desconexos que não têm uma relação real uns com os outros”.66 Mas
estudos mais recentes abandonaram essa identificação de Tiago.67
Especialmente porque a parênese pode ser empregada dentro de outros tipos
de literatura, um livro não necessariamente se qualifica como parênese só
porque inclui exortações dirigidas ao seus leitores.68 Assim, Watson criticou

1453
a ideia de que Tiago exibe as características formais de parênese,
observando que estão faltando certos elementos: “A parênese na Epístola de
Tiago não é uma característica organizadora e dominante, mas está
subordinada às necessidades da argumentação mais ampla e a estratégia
retórica”.69 Outros vão ainda mais longe, questionando se a parênese deve
ser mesmo considerada uma categoria de gênero.70
Uma preferência crescente entre os estudiosos é classificar Tiago como
um exemplo de literatura protréptica.71 Esse tipo de escrito defende o que é
verdadeiro em relação ao que é falso, em vez de expressar a preferência por
uma coisa em detrimento de outra por outras razões. Uma das marcas mais
evidentes da literatura protréptica é o compromisso urgente e convicto com
um estilo de vida específico dentro da ampla categoria da parênese. Nesse
sentido, Tiago certamente se qualifica.72 No entanto, talvez seja imprudente
ser excessivamente específico ao identificar o gênero de Tiago.73 Assim,
pode ser melhor entender Tiago como uma carta literária circular, com
afinidades com a literatura protréptica e influenciada pela literatura de
sabedoria judaica.

Plano Literário
Há pouco consenso sobre a estrutura de Tiago. As opiniões hoje variam do
extremo minimalista ao extremo maximalista do espectro. Os minimalistas
não veem nenhuma estrutura literária evidente em Tiago,74 um ponto de
vista promovido principalmente pela publicação do comentário de Tiago de
M. Dibelius, em 1921.75 Enquanto Dibelius negava até mesmo um texto
vagamente estruturado, outros sugerem que Tiago pretendia uma
composição vagamente montada. Por exemplo, Moo descreveu Tiago como

1454
um texto apenas um pouco conectado, com o foco em certos motivos-
chave.76 Bauckham afirmou que o pensamento de Tiago é coerente, mas
admitiu que faltava à carta uma estrutura lógica rígida.77 Ambos detectaram
uma estrutura epistolar básica, mas observaram que, no corpo (caps. 2 a 5)
o desenvolvimento do pensamento não é óbvio.
Na outra extremidade do espectro, os maximalistas identificam uma
estrutura discernível. Frequentemente, essa estrutura é identificada como
um quiasmo (um padrão ABB’A’). F. O. Francis promoveu essa proposta
postulando que Tiago introduziu seus tópicos no capítulo um (alegria,
bênção e provações) e depois, no corpo, passou a expandir os dois
primeiros tópicos enquanto discutia o terceiro tópico por toda a carta.78 P.
Davids concordou parcialmente com Francis, mas viu os tópicos
introduzidos na introdução no capítulo 1 (provações, sabedoria e riqueza) e
tratados na ordem inversa em três seções subsequentes (riqueza: 2.1-26;
sabedoria: 3.1 a 4.12; provações: 4.13 a 5.6), com 5.7-20 servindo como
“declaração de encerramento”.79
Provavelmente, a proposta quiástica mais intensamente defendida e bem
planejada é a feita por M. E. Taylor.80 No entanto, como a de Davids, a
proposta de Taylor é fraca e fragmenta-se nos detalhes, uma vez que ele
encontra uma introdução dupla no capítulo um e um desenvolvimento
quiástico nos capítulos 2 a 5. Seu argumento mais fraco é que 2.12,13 forma
uma inclusio com 4.11,12. Isso é problemático de duas maneiras: é artificial
separar passagens como 2.12,13 ou 4.11,12 de seu contexto adjacente, e as
conexões entre as duas passagens são superficiais na melhor das hipóteses.
Todos os arranjos quiásticos propostos até agora têm fraquezas
semelhantes.81

1455
A proposta mais plausível vê Tiago como uma estrutura mais linear na
qual o capítulo um serve como uma introdução de temas importantes, mas
hesita em identificar um quiasma nela. Em vez disso, a estrutura é vista
como refletindo três estágios. Primeiro, seguindo a introdução dos
principais temas no capítulo um, a primeira unidade principal no corpo da
carta (2.1-26) descreve a natureza da fé salvadora. Segundo, 3.1 a 4.10
contém um apelo ao arrependimento, em vista da oposição divina ao
orgulho. Terceiro, 4.11 a 5.11 constitui uma exortação à paciência e à
perseverança à luz do juízo de Deus. O livro termina sem um encerramento
epistolar formal.

ESTRUTURA
I. Abertura (1.1)

II. Introdução: o caminho para a verdadeira maturidade cristã (1.2-27)


A. Introdução dos principais temas: provações e tentações (1.2-18)
B. Obediência à “Lei da Liberdade” como a marca da verdadeira
piedade (1.19-27)

III. Corpo: a natureza da verdadeira fé e exortações ao arrependimento e


paciência (2.1 a 5.11)
A. Tese: a fé genuína resulta em obras (2.1-26)
1. A fé genuína é incompatível com a parcialidade (2.1-13)
2. A fé genuína é mostrada pelas obras (2.14-26)
B. Exortação ao arrependimento em vista da oposição divina ao orgulho
(3.1 a 4.10)
1. O uso adequado e inadequado da língua (3.1-12)

1456
2. O uso adequado e inadequado da sabedoria (3.13-18)
3. Os resultados do uso inadequado da sabedoria (4.1-10)
C. Exortação à paciência em vista do juízo de Deus (4.11 a 5.11)
1. O julgamento de Deus sobre os difamadores (4.11,12)
2. O julgamento de Deus sobre os mercadores arrogantes (4.13-17)
3. O julgamento de Deus sobre os ricos latifundiários que exploram
os pobres (5.1-6)
4. Exortação à paciência (5.7-11)

IV. Conclusão (5.12-20)


A. A questão dos juramentos (5.12)
B. A oração da fé (5.13-18)
C. A recondução do que perece (5.19,20)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Abertura (1.1)
O escritor se apresenta como “Tiago, um escravo de Deus e do Senhor Jesus
Cristo”. Como mencionado, isso parece indicar que o autor era uma figura
bem conhecida. Se o autor era o meio-irmão de Jesus, identificar-se como
seu escravo e de Deus é uma autoidentificação extremamente humilde. A
carta é dirigida às 12 tribos na Dispersão, o que pode se referir aos crentes
judeus que haviam sido espalhados pela perseguição de Herodes Agripa I
em c. 43 (At 12.1-4).

II. Introdução: O Caminho para a Verdadeira


Maturidade Cristã (1.2-27)

1457
A. Introdução dos principais temas: provações e
tentações (1.2-18)
A passagem de Tiago 1.2-12 é melhor entendida como baseada em um jogo
com a palavra grega peirasmos, que dependendo do contexto pode
significar ou “provação” ou “tentação”. Tiago primeiro assegurou aqueles
que estavam experimentando “provações” de que elas servem para testar e
refinar sua fé (1.2-4). Pedir por sabedoria refere-se à sabedoria necessária
para lidar com essas situações difíceis (1.5-8). Tiago brevemente divagou
para tratar de ricos e pobres (1.9-11), um assunto ao qual ele retornou mais
tarde (5.1-6). No versículo 12, a palavra peirasmos ocorre novamente, mas
o contexto deixa claro que o significado agora mudou de “provações” para
“tentações”. A grande preocupação de Tiago aqui é inocentar Deus de
qualquer ligação com esse tipo de peirasmos (veja 1.2-4). Deus não é a
fonte da tentação; em vez disso, ele é o doador de “toda boa dádiva […] do
alto” (1.17). Como será mostrado mais tarde, isso também inclui “a
sabedoria que vem do alto” (3.17). A comunicação direta “meus amados
irmãos” (1.16) introduz a transição para a próxima seção, tendo seu ponto
de partida nas provações/tentações da unidade anterior e sinalizando o
tópico da seção seguinte, a verdadeira religião, por introduzir sua fonte: a
eleição de Deus (1.18).

B. A obediência à “lei da liberdade” como a marca


da verdadeira piedade (1.19-27)
A comunicação direta “meus amados irmãos” (1.19; veja 1.16) marca o
início da seção seguinte e introduz um dos temas principais da carta: a
verdadeira piedade não pode ser separada da obediência: Tiago 1.19,20

1458
afirma o princípio geral: “Todo homem deve estar pronto a ouvir, ser lento
para falar e lento para se irar. Porque a ira do homem não produz a justiça
de Deus”. Assim, o versículo 21 faz a inferência correta: os fiéis devem
livrar-se de todo tipo de impureza moral e vestígio de maldade e receber
com humildade a “palavra implantada”, que é capaz de salvá-los.82
A definição de tese desta unidade está na declaração do versículo 22:
“Sede cumpridores da palavra e não somente ouvintes, enganando a vós
mesmos”. Uma pessoa que é um mero ouvinte da palavra é comparada a um
homem que brevemente olha no espelho e depois esquece o que viu; ele
ouviu a palavra, mas dela se esqueceu. A seção termina com um resumo da
natureza da “religião pura e imaculada” (1.26,27). Essa religiosidade
envolve o controle da língua (um tema desenvolvido de forma mais
completa em 3.1-12), bem como ajudar os órfãos e as viúvas e evitar a
corrupção espiritual pelo mundo (veja 4.1-5, esp. v. 4).

III. Corpo: A Natureza da Verdadeira Fé e


Exortações ao Arrependimento e à Paciência (2.1
a 5.11)
O corpo da carta consiste em três unidades principais. A primeira (2.1-26)
apresenta a tese de Tiago sobre a natureza da verdadeira fé salvadora: é o
tipo de fé que inexoravelmente resulta em obras específicas que fornecem
evidências concretas dessa fé. Essa tese é seguida por duas exortações
principais que ecoam elementos significativos da tese. Dessas, a primeira
(3.1 a 4.10) é uma exortação ao arrependimento e humildade, à luz do fato
de que todo orgulho humano se coloca em oposição a Deus. O que se segue

1459
(4.11 a 5.11) é uma exortação à paciência e perseverança tendo em vista o
juízo de Deus dirigido a vários grupos de infratores.

A. Tese: a fé genuína resulta em obras (2.1-26)


A ideia geral de 2.1-26 é a natureza da verdadeira fé salvadora. Em
essência, os dois primeiros parágrafos insistem que a fé verdadeira não faz
distinção entre pessoas na igreja com base em seu nível socioeconômico
(2.1-13). Ela não dá tratamento preferencial aos ricos da igreja (2.1-7), pois
isso seria uma violação dos mandamentos de Deus (2.8-13), e expõe
aqueles que o fazem como transgressores da lei. Isso leva ao segundo
principal ponto de Tiago, de que a verdadeira fé é mostrada pelas ações dos
fiéis e não por simples palavras (2.14-26).
O tópico da fé é introduzido em 2.1 por meio de uma advertência contra
mostrar favoritismo na igreja. Aqueles que são parciais para com os ricos se
tornaram “juízes com pensamentos malignos” (2.4), e, ainda mais
preocupante, eles estão agindo de forma contrária às ações do próprio Deus,
que não escolheu os ricos neste mundo, mas os pobres (2.5). Além disso, a
parcialidade expõe as pessoas como transgressores da lei, porque não amam
ao próximo como a si mesmas. Assim, elas deixam de cumprir suas
obrigações para com os outros estipuladas na lei (2.8-13; veja Lv 19.18).
Daí Tiago insiste que é inútil a fé desacompanhada de obras, assim
como é insuficiente dizer a uma pessoa faminta e necessitada de roupas:
“Se aqueça e coma bem” (2.15-17). A fé sem obras é morta, e as obras são
um produto natural da fé. Tiago fundamenta essa tese dupla com três
ilustrações. A primeira é negativa: até mesmo os demônios creem em Deus,
mas eles estremecem (2.19). O leitor é deixado a fazer a óbvia inferência

1460
nesse caso: a “fé” dos demônios não é acompanhada de obras, e, assim, sua
mera confissão é insuficiente.
A segunda e a terceira ilustrações são positivas: Abraão foi justificado
por sua disposição em oferecer Isaque sobre o altar (2.21; veja Gn 22; cf. a
citação de Gn 15.6 no v. 23), como foi também a prostituta Raabe (2.25;
veja Js 2, cf. o elogio da fé de Raabe, em Hb 11.31). Cada uma dessas três
ilustrações conclui com uma declaração que reitera a premissa básica: a fé
sem obras é inútil (v. 20); a fé é parceira das obras (v. 24); e fé sem obras
está morta (v. 26).83

B. Exortação ao arrependimento em vista da


oposição de Deus ao orgulho (3.1 a 4.10)
Embora 3.1-12 possa ser um ensaio independente sobre a língua, a conexão
entre o mestre (3.1) e o sábio (3.13) parece fazer a ligação com os contextos
adjacentes. Em contraste, a seção sobre a língua termina com resultados
completamente negativos (veja esp. 3.8: “ninguém pode domar a língua”),
enquanto a sabedoria de cima tem resultados positivos (veja 3.17,18).
Tiago, em seguida, afirma a verdade central de que a fé autêntica resulta em
boas obras, já que ela flui da obra de Deus na vida do fiel.
A advertência sobre o desejo de ser mestre é baseada nos perigos da
língua (veja 1.26). Embora muito pequena, a língua pode realizar grandes
coisas, como ilustrado pelo freio na boca de um cavalo, pelo leme de um
navio, e uma faísca que inicia um incêndio florestal (3.3-5). No que diz
respeito ao último, a língua humana “põe em chamas o curso de nossa
existência, sendo por sua vez incendiada pelo inferno” (3.6). A língua
indomada pode, de forma contraditória, bendizer ao Senhor e amaldiçoar

1461
um ser humano. Assim como uma fonte não pode produzir, ao mesmo
tempo, água doce e salgada; ou uma figueira, azeitonas; ou uma videira,
figos, não se espera que a língua indomada possa produzir um fruto
contrário à sua própria natureza; “ela é um mal incontrolável, cheio de
veneno mortal” (3.8). Assim Tiago, repetindo os ensinamentos de Jesus (Mt
7.16-20; 12.33-37), deixou claro que a conversa de uma pessoa expõe o
conteúdo de seu coração.
Em contraste com a língua indomada, os sábios e inteligentes membros
da igreja devem ser marcados pela boa conduta e humildade de sabedoria
(3.13).84 A pessoa sábia segundo o mundo é caracterizada pela inveja
amarga e ambição e está disposta a se orgulhar e a mentir na promoção do
que Tiago chamou de “verdade” (3.14). Tiago identificou a fonte dessa
“sabedoria” mundana como demoníaca. Em contrapartida, “a sabedoria que
vem do alto é, em primeiro lugar, pura, depois amante da paz, moderada,
submissa, cheia de misericórdia e de bons frutos, imparcial e sem
hipocrisia” (3.17).85 Tiago afirmou que o resultado final dessa “sabedoria
que vem do alto” é a paz (3.17,18).
O apelo à humildade em 4.1-10 flui diretamente da seção sobre
sabedoria em 3.1-18. Assim, em 3.1 a 4.10 Tiago estabeleceu a necessidade
de um ministério humilde e centrado em Deus e fez um apelo ao
arrependimento. Se a “sabedoria do alto” produz pessoas que são puras,
amantes da paz, moderadas, cheias de misericórdia e bons frutos e
imparciais, cabe a pergunta: “De onde vêm as guerras e discórdias que há
entre os crentes?”. A resposta é que a discórdia tem origem em um coração
humano pecaminoso. Cobiça (4.2), egoísmo (4.3) e mundanismo (4.4) nos
colocam em uma posição hostil em relação a Deus. Mas a boa notícia é que,
enquanto Deus resiste aos soberbos, ele dá graça aos humildes (4.6). Os

1462
últimos três versículos desta seção constituem um chamado ao
arrependimento, exortando as pessoas a abandonar o orgulho e a arrogância
e a se humilhar diante de Deus.

C. Exortação à paciência em vista do juízo de Deus


(4.11 a 5.11)
Esta seção principal final de Tiago apresenta três exemplos de arrogância —
caluniadores, mercadores arrogantes e os ricos latifundiários que exploram
os pobres — e emite uma advertência severa para cada um desses grupos.
Como a seção anterior, a presente unidade conclui com uma exortação —
no presente caso, à paciência e perseverança em um mundo pecaminoso —
com base na exposição do comportamento pecaminoso (5.7-11). Em
essência, trata-se de um apelo para que os fiéis enfrentem o mundo com fé.
Levando a discussão para uma nova direção pelo vocativo “irmãos”,
Tiago advertiu contra alguém caluniar o próximo (4.11,12). Aqueles que
agem como juízes e criticam a lei são culpados de suprema arrogância. A
advertência seguinte é introduzida pela expressão “agora prestem atenção”.
Os mercadores abusam da graça de Deus, fazendo grandes planos sem
submetê-los à vontade de Deus. Mais uma vez Tiago repreendeu essas
pessoas por sua arrogância e presunção (4.16,17).
Por fim, Tiago descreveu os ricos latifundiários que, embora reunissem
um grande número de possessões na terra, ajuntaram um depósito de
condenação para si mesmos. Falando da perspectiva do fim dos tempos, as
traças comeram as roupas caras, e o seu ouro e prata enferrujaram. Ao
obterem as riquezas de uma forma injusta, esses ricos latifundiários
“engordaram [seus] corações em um dia de abate” (5.5, NASB). Com essa

1463
grave denúncia, Tiago assumiu a postura de um profeta do Antigo
Testamento, o que leva naturalmente ao seu elogio dos profetas em seu
subsequente chamado ao arrependimento.
Estreitamente relacionado com a seção anterior pela conjunção
“portanto”, 5.7-11 representa uma exortação para os fiéis exibirem
paciência e perseverança. Os exemplos dos profetas e de Jó são modelos
para os cristãos que vivem no mundo hostil. Os profetas foram pacientes, Jó
foi perseverante, e ambos receberam grandes bênçãos de Deus (5.11). Em
vez de tentar vencer o mundo em seu próprio jogo ou jogar com suas regras,
os fiéis devem não se comprometer, e a todos os seus caminhos, com Deus,
olhar para ele em busca de graça. Se são arrogantes, eles serão julgados
como o mundo.

IV. Conclusão (5.12-20)


No estilo staccato, Tiago concluiu a carta com uma série de breves
mandamentos. Isso é marcado pelo muito proeminente vocativo: “Agora,
acima de tudo, meus irmãos”. Não há nenhum final epistolar propriamente
dito (cf. Hb 13.20-25).

A. A questão dos juramentos (5.12)


Em vez de fazer promessas ou juramentos, seja pelo céu, seja pela terra, o
“sim” ou “não” do fiel deveria ser suficiente. Assim como outros
pronunciamentos, esta declaração ecoa o ensinamento de Jesus (veja Mt
5.33-37).86

1464
B. A oração da fé (5.13-18)
Conectado, talvez, ao versículo anterior por abordar situações que podem
levar alguém a fazer um juramento, 5.13-18 cita cenários específicos
envolvendo oração. Mais especificamente, um chamado à oração é emitido
ao aflito, ao contente e ao doente. Os ensinamentos em 5.14-16 não têm
paralelos exatos no NT, chamando os presbíteros da igreja para vir e ungir
um membro doente da igreja e ordenando aos fiéis a confessarem seus
pecados e a orarem uns pelos outros. Essa passagem levou, na Igreja
Católica romana, aos sacramentos da confissão e da “extrema unção” — a
unção de uma pessoa com óleo em seu leito de morte. Por outro lado,
ambos os ensinamentos são amplamente ignorados nas igrejas evangélicas
hoje. Em concordância com o caráter judaico do livro, o exemplo bíblico
citado para a oração persistente é Elias, um profeta do AT. Os fiéis hoje, do
mesmo modo, são chamados à oração fervorosa e justa.

C. A recondução do que perece (5.19,20)


Tiago concluiu sua carta com uma exortação a que os fiéis resgatem
pecadores desviados, resultando em salvação. A frase “cobrir uma multidão
de pecados”, no versículo 20, se assemelha em muito a 1Pedro 4.8, que
ecoa Provérbios 10.12. O mais provável é que a ideia de Tiago seja que esta
operação de resgate é motivada pelo amor. Aqui a carta chega a um final
bem abrupto. As características habituais de encerramento de uma carta
(como saudações, bênção etc.) estão ausentes. Não está claro o que explica
esse distanciamento do formato padrão de cartas antigas.

TEOLOGIA
1465
Temas Teológicos
A relação entre fé e obras
Tiago 2.14-26 é frequentemente interpretado como uma rejeição da doutrina
paulina da salvação somente pela fé (veja Rm 3.28; Gl 2.15,16; Ef 2.8,9).
Três pontos de vista apareceram na literatura acadêmica: (1) Tiago
discordou de Paulo e estava procurando corrigi-lo (ou vice-versa).87 (2)
Tiago corrigiu um equívoco de Paulo.88 (3) Tiago e Paulo abordaram duas
questões relacionadas, porém distintas.89
Bem no início, parece apropriada a cautela de não envolver Tiago e
Paulo em uma contradição inevitável. Nunca teremos certeza se Tiago
procurou abordar o ensino de Paulo no presente contexto. A doutrina da
justificação pela fé é encontrada em outras passagens do NT e não está
limitada a Paulo (p. ex., Hb 11.7; 1Pe 1.3-7). A alegação do próprio Paulo
era que os apóstolos de Jerusalém tinham ouvido o seu evangelho e lhe
oferecido a mão direita da comunhão — inclusive Tiago (Gl 2.9).
Tomadas por seus próprios méritos, Tiago contrastou o efêmero com o
concreto. O primeiro não afeta o mundo, enquanto o último afeta. Assim,
um irmão necessitado, a quem é oferecida somente uma palavra de
encorajamento encontrou o efêmero. Mas aquele que tem suas necessidades
satisfeitas encontrou o concreto; o primeiro é útil, enquanto o último, não.
Da mesma forma, a fé sem obras é como a palavra efêmera — ela não leva
a nada e não consegue produzir salvação autêntica.
Nesse sentido, Abraão foi “justificado pelas suas obras”.90 Do mesmo
modo, hoje, as pessoas mostram sua fé com suas obras.91 Portanto, muito
provavelmente, Tiago e Paulo não estão em conflito um com o outro em
seus ensinamentos sobre a relação entre fé e obras.

1466
A pessoa que Tiago descreve é muito familiar. Ela afirma ter fé, e até
certo ponto ela crê em todas as coisas corretas sobre Deus, Jesus e salvação.
Mas sua fé não é posta em prática em sua vida diária. É esse tipo de fé que
Tiago condena; uma fé sem obras é inútil. Ela não santifica nem salva. A fé
salvadora — ou, como coloca Tiago, uma fé acompanhada de obras — é a
“fé que opera” já que afeta radicalmente a maneira como uma pessoa vive.

Algo Para Pensar: Você e Eu Praticamos o que


Dizemos?

Há, no final, apenas dois tipos de pessoas: as pessoas que praticam


o que dizem e aquelas que não. Você e eu praticamos o que dizemos?
Jesus chamou o último grupo de pessoas de “hipócritas”, atores que
usavam uma máscara que escondia seu verdadeiro eu. Deus deseja
que sejamos genuínos, não hipócritas e verdadeiros — o mesmo
interior e exteriormente.
Mas falar é fácil. Somente pela graça de Deus podemos ser o tipo
de pessoa que Deus quer que sejamos. No entanto, seguir em frente é
de extrema importância, como Tiago, o meio-irmão de Jesus, disse a
seus leitores:

Sede praticantes da palavra e não somente ouvintes, enganando a vós mesmos.


Pois, se alguém é ouvinte da palavra e não praticante, é semelhante a um homem
que contempla o próprio rosto no espelho; porque ele se contempla, vai embora e
logo se esquece de como era. Entretanto, aquele que atenta bem para a lei perfeita,
a lei da liberdade, e nela persevera, não sendo ouvinte esquecido, mas praticante
que age, será abençoado no que fizer (1.22-25).

1467
Tanto quanto sabemos, Tiago só se tornou um crente em Jesus
depois da ressurreição. Mas, sem dúvida, ele estava familiarizado
com as palavras similares de Jesus no Sermão do Monte: “Nem todo
aquele que me diz ‘Senhor, Senhor!’ entrará no reino do céu, mas
somente aquele que faz a vontade de meu Pai, que está no céu” (Mt
7.21, grifo nosso). Vamos ter cuidado, portanto, em ser cumpridores
da palavra e não apenas ouvintes. Vamos não apenas estudar a
Bíblia, mas fazer o que ela diz.
Como exemplo de alguém cuja vida não correspondeu a suas
palavras, considere Karl Marx. Marx, o fundador do comunismo,
nasceu em uma família judia que, mais tarde, se tornou luterana.
Marx foi batizado com idade de seis anos, confirmado com 15. Mas
Marx não mostrou nenhum fruto da fé cristã. Ao contrário, a vida de
Marx foi cheia de hipocrisia e autocontradição. Ele se
autoproclamava defensor da classe operária, apesar de não
conhecer praticamente nenhum trabalhador pessoalmente e não
pagava o único empregado que tinha. Em vez de trabalhar com suas
próprias mãos, ele vivia da sua herança e do dinheiro da família.
Sua mãe lamentou que, talvez, ele pudesse acumular, com seu
próprio trabalho, algum capital em vez de simplesmente escrever
sobre ele. Que vergonha!
Quando contemplamos o resultado da vida de Karl Marx e de
outros como ele, devemos dizer: “Sim, mas pela graça de Deus,
estou no mesmo caminho”. Mas também deveríamos tentar nos
agarrar a Cristo e exclamar com Paulo: “Desgraçado homem que
sou!” (Rm 7.24). Então poderemos viver nossas vidas plenamente na
força suprida por Deus — “Posso fazer todas as coisas naquele que

1468
me fortalece” (Fp 4.13) — e fazer o nosso melhor para praticar o
que dizemos, para a glória e louvor de Deus.

Tabela 17.2: Fé e obras: Comparando Tiago e Paulo


Doutrina Tiago Paulo
A fé é necessária para a salvação 2.18 Ef 2.8,9
A fé sem obras não é fé salvadora 2.17,24 1Co 15.2
A fé salvadora é acompanhada de 2.24 Rm 3.31; Ef 2.8-
obras 10

Sabedoria e ética
À parte sua abordagem de fé e obras, Tiago é talvez mais conhecido por seu
forte ensinamento ético em concordância com a sabedoria judaica. Toda a
Carta de Tiago é permeada com uma ênfase na necessidade de lidar com os
aspectos práticos da vida cristã de forma piedosa e sábia. Isso inclui lidar
com provações e tentações (1.2-18); ajudar os necessitados, tais como as
viúvas e os órfãos, como expressão de uma forma prática de cristianismo,
que se recusa a divorciar a fé das obras (1.19-27; veja 2.14-26); evitar dar
tratamento preferencial aos de melhor status socioeconômico na sociedade
(2.1-13); controlar o falar (3.1-12); cultivar a sabedoria e o entendimento
em uma variedade de boas obras (3.13-18); adotar uma atitude de
humildade nos relacionamentos com os outros e na forma de conduzir os
próprios negócios (4.1-17); e muitas outras questões éticas e práticas (cap.
5).
O ensino ético de Tiago está firmemente baseado no ensino de Jesus,
especialmente no Sermão do Monte.92 Tiago também está profundamente

1469
fundamentado nos ensinamentos éticos do AT, em especial na literatura de
sabedoria, particularmente em Provérbios (p. ex., 4.4 citando Pv 3.34). Isso
mostra a continuidade significativa no pensamento ético entre o Antigo
Testamento, Jesus e o NT (como o livro de Tiago). Os cristãos são crentes
em Jesus, o “glorioso Senhor Jesus Cristo” (2.1), e eles não deixam para
trás os fundamentos ético e moral da revelação bíblica nas Escrituras
Hebraicas. Em vez disso, eles continuam a se empenhar em uma conduta
consistente com a vida sábia, a justiça, humildade, amor e misericórdia. Isso
é resumido, de forma memorável, nas bem conhecidas palavras do profeta
Miqueias: “Ó homem, ele te declarou o que é bom […] o que o SENHOR
exige de ti […] que pratiques a justiça, ames a misericórdia e andes em
humildade com o teu Deus” (Mq 6.8).93

Cristologia e escatologia cristã-judaica


Em consonância com sua natureza judaico cristã, o livro de Tiago se refere
de forma explícita a temas marcadamente cristãos com menos frequência do
que outros escritos do NT. Em particular, muitos intérpretes acham
significativo que Tiago apenas mencione o nome de Cristo duas vezes (1.1;
2.1).94 Embora raras, no entanto, essas referências são muito significativas,
especialmente à luz do fato de que o termo “Cristo” é equivalente ao termo
hebraico “Messias”. Assim, Tiago identificou Jesus como a personificação
da esperança de Israel, como o Rei messiânico.
Como a maioria dos judeus de sua época, Tiago era um dedicado
monoteísta (veja 2.19; 4.11). No entanto, apesar da escassez das referências
de Tiago a Cristo, a sua cristologia é bem elevada. O termo “Senhor”
(kurios) era um termo cheio de significado entre judeus de língua grega. Ele

1470
foi a palavra usada na LXX para traduzir o tetragrammaton (YHWH,
“SENHOR”). Notadamente, Tiago empregou o termo kurios
intercambiavelmente entre Deus e Jesus (sobre o primeiro, veja 1.8,12;
sobre o último, veja 1.1; 2.1; 5.7,8).
Não apenas Jesus é “Senhor”; ele é “nosso glorioso Senhor Jesus
Cristo” (2.1). Em um contexto judaico, isso imediatamente relembra a
gloriosa presença de Deus no Antigo Testamento (p. ex., Êx 33.18,19; 1Rs
8.11). No início da discussão de Tiago sobre o pecado da parcialidade (2.1-
13), ele falou de Cristo como “glorioso”, o que traz à mente passagens do
AT afirmando que Deus se recusa a compartilhar sua glória com outro (p.
ex., Is 42.8). Essa maneira de descrever Jesus reflete uma cristologia
excessivamente elevada por parte de Tiago.
Tiago também mencionou que há apenas um juiz (4.11) — uma
referência óbvia a Deus —, mas Jesus também tem o papel de juiz divino
(5.7,9).95 Assim, Tiago aplicou títulos, atributos e funções a Jesus que
indiscutivelmente pertencem a Deus. A cristologia de Tiago é sustentada
por um firme compromisso com a divindade de Cristo. Além disso, Tiago
não apenas manteve a identidade messiânica de Jesus e sua natureza divina,
ele também evidenciou a expectativa do retorno de Jesus no fim dos
tempos.
Na verdade, a cristologia de Tiago é fortemente escatológica. Jesus não
é apenas Senhor, ele é o Senhor que virá (5.7). Isso é consistente com o
ensino de Tiago sobre o fim dos tempos por toda a carta. Em particular, ele
deixou claro que haverá um dia futuro de prestação de contas e julgamento
(1.10,11; 2.12,13; 3.1; 5.1-6,9,12) e advertiu seus leitores de que esta vida
inevitavelmente culminará com o retorno glorioso de Jesus. Assim, os
crentes devem conduzir suas vidas à luz da vinda de Cristo.

1471
CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON
Um exemplar do cristianismo judaico primitivo escrito por Tiago, o
meio-irmão de Jesus (1.1)
A relação entre fé e obras (2.14-26)
A necessidade de sabedoria na vida cristã (1.5; 3.13-18)
Exortações práticas relacionadas ao trato com os ricos (1.9-11; 2.1-13;
5.1-6), ao controle da língua (3.1-12), à humildade no planejamento
(4.13-17) e outras questões
Os exemplos permanente dos homens de fé do AT, como Jó ou Elias
(5.11,17)

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Qual dos Tiagos foi o autor do livro de Tiago, e que outros dois Tiagos
são candidatos menos prováveis?
2. Entre quais datas a epístola de Tiago provavelmente foi escrita e por
quê?
3. Onde provavelmente Tiago foi escrita? E para quem?
4. Qual é a ocasião provável para Tiago?
5. Qual é o gênero de Tiago?
6. De que maneiras o gênero de Tiago é semelhante ao de Hebreus e
1João?
7. Por que você acha que existe hoje pouco consenso sobre a estrutura de
Tiago?
8. Segundo os autores, qual é a estrutura mais provável de Tiago?
9. Por que Tiago 2.14-26 gera controvérsias?
10. Quais são três pontos de vista acadêmicos sobre Tiago 2.14-26?

1472
11. De que maneiras Paulo e Tiago concordam sobre fé e obras?
12. Como é que Tiago contribui para o cânon?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


BAUCKHAM, R. James: wisdom of James, disciple of Jesus the sage.
Em: New Testament Readings (New York/London: Routledge,
1999).
______. Jude and the relatives of Jesus in the early church
(Edinburgh: T&T Clark, 1990).
CHILTON, B.; EVANS, C. A., orgs. James the just and christian origins.
Novum Testamentum Supplement 98 (Leiden: Brill, 1999).
______; NEUSNER, J., orgs. The brother of Jesus: James the just and his
mission (Louisville: Westminster John Knox, 2001).
DAVIDS, P. H. The Epistle of James: a commentary on the greek text.
New International Greek Testament Commentary (Grand Rapids:
Eerdmans, 1982).
GUTHRIE, G. H. “James”. Em: The expositor’s Bible commentary. Ed.
rev. (Grand Rapids: Zondervan, 2005), vol. 13: Hebrews-
Revelation, p. 197-273.
JOHNSON, L. T. The Letter of James. Anchor Bible 37A (New York:
Doubleday, 1995).
LAATO, T. “Justification according to James: a comparison with Paul”.
Trinity Journal 18 (1997), p. 47-61.
LAWS, S. A commentary on the Epistle of James. Em: Harper’s New
Testament Commentary (San Francisco: Harper & Row, 1980).

1473
MARTIN, R. P. James. Word Biblical Commentary 48 (Waco: Word,
1988).
MAYNARD-REID, P. V. Poverty and wealth in James (Maryknoll: Orbis,
1987).
MOO, D. J. The Letter of James. Pillar New Testament Commentary
(Grand Rapids: Eerdmans, 2000).
______. The Letter of James. Tyndale New Testament Commentary
(Grand Rapids: Eerdmans, 1985).
PAINTER, J. Just James: the brother of Jesus in history and tradition
(Columbia: University of South Carolina Press, 1997).
RICHARDSON, K. James. New American Commentary (Nashville: B&H,
1997).
SHANKS, H.; WITHERINGTON III, B. The brother of Jesus: the dramatic
story and meaning of the first archaeological link to Jesus and his
family (New York: HarperCorllins, 2003).

1
Por exemplo, P.A. Bernheim, James Brother of Jesus, tradução para o inglês de J. Bowden

(London: SCM, 1997); J. Painter, Just James: The Brother of Jesus in History and Tradition

(Columbia: University of South Carolina Press, 1997); R. Eisenman, James the Brother of Jesus: The

Key to Unlocking the Secrets of Early Christianity and the Dead Sea Scrolls (New York: Viking,

1997); B. Chilton; C. A. Evans, orgs., James the Just and Christian Origins (Leiden: Brill, 1999); B.

Chilton; J. Neusner, orgs., The Brother of Jesus: James the Just and His Mission (Louisville:

Westminster John Knox, 2001); e H. Shanks; B. Witherington III, The Brother of Jesus: The

Dramatic Story and Meaning of the First Archaeological Link to Jesus and His Family (New York:

HarperCollins, 2003).

1474
2
Frequentemente, a primeira pergunta feita pelos estudantes americanos é: “Como chegamos a

‘James’ a partir de Ia’acov?”. A resposta requer uma longa jornada pelas traduções e entidades

geopolíticas. É suficiente dizer que o nome Ia’acov se torna Iacomus em latim, Giacomo em italiano,

Gemmes ou Jaimmes em francês, e “James” em inglês como resultado da conquista Normanda na

batalha de Hastings, em 1066.

3
Segundo R. Bauckham (Jesus and the Eyewitnesses: The Gospels as Eyewitness Testimony

[Grand Rapids: Eerdmans, 2006], p. 85) o nome “Jacó” era o undécimo nome masculino mais

popular entre os judeus palestinos entre 330 a.C. e 200 d.C.

4
L. T. Johnson, The Letter of James, AB 37A (New York: Doubleday, 1995), p. 93.

5
R. P. Martin, James, WBC 48 (Waco: Word, 1988), p. lxx.

6
Por exemplo, M. Dibelius, James: A Commentary on the Epistle of James, tradução para o

inglês de M. A. Williams, Hermeneia (Philadelphia: Fortress, 1976), p. 17; W. G. Kümmel,

Introduction to the New Testament, ed. rev., tradução para o inglês de H. C. Kee (Nashville:

Abingdon, 1975), p. 411; e J. H. Ropes, St. James, ICC (Edinburgh: T&T Clark, 1916), p. 50.

7
D. J. Moo, The Letter of James, PNTC (Grand Rapids: Eerdmans, 2000), p. 14. Ropes (St.

James, p. 25) afirmou: “Não há nada que sugira familiaridade com os estilos mais elevados da

literatura grega”.

8
Veja R. Bauckham, “James”, in: New Testament Readings (London: Routledge, 1999), p. 18,24.

Ele observou que o grego era a língua nativa de 10 a 20% dos residentes de Jerusalém.

9
J. N. Sevenster, Do You Know Greek? How Much Greek Could The First Jewish Christians

Have Known? (Leiden: Brill, 1968), p. 191. Cf. G. Kittel, Die Probleme des palästinischen

Spätjudentums und das Urchristentum (Stuttgart: W. Kohlhammer, 1926), p. 38. Kümmel

(Introduction, p. 290) disse: “A linguagem refinada de Tiago não é a de um palestino.”, e B. Reicke

(“James”, in: The Epistles of James, Peter and Jude, AB 37 [New York: Doubleday, 1964], p. 4)

1475
concordou: “É altamente improvável que Tiago soubesse escrever em grego”. Tais declarações não

são mais convincentes.

10
Contra S. S. Laws, “Does scripture speak in vain?”, NTS 20 (1974), p. 211-12.

11
P. Davids, Commentary on James, NIGNTC (Grand Rapids: Eerdmans, 1982), p. 10.

12
Ibid., p. 11.

13
Veja R. Bauckham, Jude and the relatives of Jesus in the Early Church (Edinburgh: T&T

Clark, 1990), p. 125-30.

14
Veja uma lista na barra lateral. Algumas monografias foram escritas sobre o assunto; por

exemplo, P. J. Hartin, James and the Q sayings of Jesus, JSNTSup 47 (Sheffield: Sheffield Academic

Press, p. 1991).

15
Davids, James, p. 15.

16
Moo, James, p. 2.

17
Johnson (James, p. 124-61) compilou talvez a mais extensa lista sobre a recepção de Tiago até

hoje.

18
Davids (James, p. 8) and Johnson (James, p. 75-9) acreditavam que a referência mais antiga

existente a Tiago estaria em Pastor de Hermas (início do segundo século?).

19
Johnson, James, p. 72-5.

20
Veja Eusébio, Eccl. Hist. 6.13.2; e Cassiodoro, De Institutione Divinarum Litterarum (PL

70:1120).

21
Eusébio, Eccl. Hist. 3.23.3.

1476
22
Moo (James, p. 3); ele observou ainda que a igreja Síria por fim incluiu as Epístolas Gerais no

cânon e que luminares sírios tais como Crisóstomo (m. 407) e Teodoreto (m. 458) citaram Tiago com

aprovação.

23
Jerônimo é admitidamente dependente de Orígenes em muitas instâncias, cujos pontos de vista

podem vir de seu mestre Dídimo, o Cego, um sucessor de Orígenes em Alexandria.

24
Jerônimo, De Viris Illustribus 2 (PL 23, col. 639).

25
Veja Johnson, James, p. 138.

26
Martin, James, p. lv.

27
Moo, James, p. 4.

28
D. Guthrie (New Testament Introduction, ed. rev. [Downers Grove: InterVarsity, 1990], p. 521)

afirmou: “Tiago é o tipo de carta que poderia facilmente ser negligenciada como, na verdade, o seu

tratamento na igreja moderna mostra de forma abundante e, uma vez negligenciada, um solo fértil foi

criado para dúvidas futuras, especialmente em uma época onde produções espúrias eram atribuídas a

nomes apostólicos”.

29
Dibelius, James, p. 17.

30
Moo, James, p. 16.

31
Dibelius, James, p. 18.

32
Para uma excelente discussão, veja Moo, James, p. 17-18.

33
Johnson, James, p. 110.

34
Veja Kümmel, Introduction, p. 414.

1477
35
Na mente da maioria desses intérpretes, Atos é rejeitado como uma valiosa fonte histórica para

um dos dois, Tiago ou Paulo; a literatura pseudoclementina é uma valiosa fonte para o cristianismo

primitivo; e Paulo é entendido unicamente com base nas Hauptbriefe (suas “principais cartas”, i. e.,

Romanos, 1 e 2Coríntios e Gálatas). Esses pontos de vista são abordados em outros lugares neste

volume.

36
Johnson, James, p. 114.

37
Veja a seção sobre “A Relação entre Fé e Obras”, sob Temas teológicos.

38
Por exemplo, S. Laws, A commentary on the Epistle of James (San Francisco: Harper & Row,

1980), p. 40.

39
Veja Moo, James, p. 12, citando L. Massebieau, “L’Épître de Jacques, est-elle l’oeuvre d’un

Chrétien?” RHR 32 (1895), p. 249-83; F. Spitta, “Der Brief des Jakobus”, in: Zur Geschichte und

Literatur des Urchristentums (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1896), vol. 2, p. 1-239.

40
A maioria das obras apócrifas identificam claramente o pretendido Tiago pelo contexto ou por

declaração direta. Por exemplo, o Protoevangelho de Tiago 9.2 e 20.5; o Apócrifo de Tiago, que se

refere a uma carta anterior, agora perdida, que provavelmente identificava o Tiago em vista; e o

Apocalipse Gnóstico de Tiago, o primeiro dos quais tem Jesus se dirigindo a Tiago como “meu

irmão” e o segundo identifica Tiago como “Tiago, o Justo”. Veja J. M. Robinson, org., The Nag

Hammadi Library in English, 3. ed. rev. (San Francisco: Harper & Row, 1988), p. 262 e 270. W. O.

E. Oesterly (“A coptic fragment attributed to James the brother of the Lord”, JTS 8 [1907], p. 240-8)

sustenta que Tiago pode ser um documento que Hipólito atribuíu aos gnósticos naassenos. Mas a

breve e humilde descrição encontrada nesta carta é bem diferente da encontrada nas obras

pseudepigráficas.

41
J. A. T. Robinson, Redating the New Testament (London: SCM, 1976), p. 129.

1478
42
Por exemplo, A. C. McGiffert, A history of Christianity in the apostolic age (New York:

Scribner, 1897), p. 585.

43
Martin (James, p. lxxii) lista o apócrifo Segundo Apocalipse de Tiago 44.13-17 (NHS 5), que

afirma: “Este é [o] discurso que Tiago [o] Justo proferiu em Jerusalém, [que] Mareim, um dos

sacerdotes escreveu”. Cf. Davids, James, p. 22.

44
Guthrie, Introduction, p. 536. Vale a pena repetir mais comentários de Guthrie aqui: “Se o

editor estava trabalhando sob a supervisão do próprio Tiago, isto quase resultaria no ponto de vista

tradicional. Mas se ele editou algum tempo depois da vida de Tiago, o problema do motivo se torna

grave, pois é difícil entender por que um editor posterior de repente conceberia este plano de

publicação quando a grande maioria do público alvo saberia que Tiago já estava morto, e é ainda

mais difícil de entender como a carta foi recebida. Se alguma conexão real com Tiago geralmente

tivesse sido reconhecida, qual o motivo desta teoria afinal, uma vez que ela não apresentaria

nenhuma vantagem sobre a visão tradicional? Ela não daria nenhuma explicação melhor para a

demora no reconhecimento entre os escritores ortodoxos da igreja”.

45
Calvino, “Commentary on the Epistle of James”, p. 227.

46
Moo, James, p. 12.

47
Embora Tiago cite explicitamente o AT apenas em cinco versículos (1.11; 2.8,11,23; 4.6),

Guthrie (Introduction, p. 521) observou que as “alusões indiretas são inumeráveis (cf., p. ex., 1.10;

2.21,23,25; 3.9; 4.6; 5.2,11,17,18)”.

48
F. Mussner, Der Jakobusbrief, HTKNT 13/1 (Freiburg: Herder, 1964), p. 1-59; Johnson,

James, p. 108-21; R. Bauckham, James: wisdom of James, disciple of Jesus the sage, New Testament

Readings (London: Rouledge, 1999), p. 11-25; id., Jude and the relatives of Jesus (Edinburgh: T&T

Clark, 1990), p. 128; M. Hengel, Paulus und Jakobus, WUNT 141 (Tübingen: Mohr Siebeck, 2002),

p. 511-48; P. J. Hartin, James, SacPag 14 (Collegeville: Liturgical, 2003), p. 24-25; e T. C. Penner,

1479
The Epistle of James and eschatology: re-reading an ancient christian letter (Sheffield: Sheffield

Academic, 1996), p. 35-103.

49
Robinson, Redating, p. 118-19.

50
Segundo Josefo (Ant. 20.9.1), a morte de Tiago aconteceu após a morte do procurador Pórcio

Festo e antes de seu sucessor Lucélio Albino assumir o cargo. O sumo sacerdote judeu, Ananus, tirou

vantagem do vácuo de poder e reuniu o Sinédrio. Ali, “um homem chamado Tiago, o irmão de Jesus,

que era chamado Cristo”, e alguns outros foram acusados de ter transgredido a lei e foram entregues

para apedrejamento. Aparentemente isto ofendeu alguns judeus imparciais e praticantes da lei os

quais peticionaram Albino sobre o assunto quando ele chegou à província, e o rei Agripa substituiu

Ananus por Jesus, o filho de Damnaeus, como sumo sacerdote.

51
Veja o quadro sobre Os Ensinamentos de Jesus em Tiago.

52
Veja deSilva, Introduction, p. 816.

53
Por exemplo, no livro de Tiago, o local de reunião dos cristãos ainda é chamado de “sinagoga”

(2.2), o que pode indicar uma data de composição anterior ao início da missão aos gentios.

54
Robinson, Redating, p. 139.

55
Johnson, James, p. 120-21.

56
Veja o item Origem. Antioquia é a preferência hesitante de A. Chester, “The theology of

James”, em: A. Chester; R. P. Martin, The theology of the Letters to James, Peter, and Jude, New

Testament Theology (Cambridge: University Press, 1994), p. 13-15.

57
Veja Atos 11.19, onde o verbo utilizado é diaspeirō, o cognato verbal do substantivo usado em

Tiago 1.1.

58
Isso é contestado por escritores como Dibelius (James, p. 2), que observou a falta de

características epistolares e afirmou: “É impossível considerar Tiago uma carta real”.

1480
59
Deissmann classificou Tiago como uma carta literária, semelhante a outros escritos incluídos

nas Epístolas Gerais. Veja A. Deissmann, Light from the Ancient East, 2. ed., tradução para o inglês

de L. R. M. Strachan (London: Hodder & Stoughton, 1911), p. 235.

60
Ropes, James, p. 17.

61
Johnson, James, p. 9-10.

62
Ibid., p. 17-18.

63
Ibid., p. 17.

64
D. W. Watson, “An assessment of the rhetoric and rhetorical analysis of the Letter of James”,

in: Reading James with New Eyes: Methodological Reassessments of the Letter of James, LNTS 342

(London: T&T Clark, 2007), p. 118-19. Cf. L. L. Cheung, The Genre, omposition and Hermeneutics

of the Epistle of James, Paternoster Biblical and Theological Monographs (Carlisle: Paternoster,

2003), p. 40.

65
Moo, James, p. 8.

66
Dibelius, James, p. 3.

67
Para uma análise completa veja Johnson, James, p. 17-20.

68
Ibid., citando A. J. Malherbe, “Ancient epistolary Theorists”, Ohio Journal of Religious

Studies 5 (1977), p. 71.

69
Watson, “Rhetorical Analysis”, p. 109.

70
Moo, James, p. 8, citando L. J. Perdue, “Paraenesis and the Epistle of James”, ZNW 72 (1981),

p. 241-56.

71
Para um estudo completo veja Hartin, James, p. 10-16.

1481
72
Veja Johnson, James, p. 20-21.

73
Contra Johnson, James; e Hartin, James.

74
Entre esses estão Dibelius, James, p. 1-11 (veja mais abaixo); e S. Stowers, Letter Writing in

Greek Antiquity, LEC 5 (Philadelphia: Westminster, 1986), p. 97. Precedendo Debelais e

concordando com a ausência de estrutura estão Mayor, James, p. cxxi; Ropes, James, p. 2-4; e A.

Jülicher, An Introduction to the New Testament, tradução para o inglês de J. P. Ward (London: Smith-

Elder, 1904), p. 215.

75
Dibelius, James, p. 2 e 11. Nisso Dibelius se assemelha a Lutero, cuja afirmação “epistola de

palha”, entre outras coisas, alegava arranjo caótico (M. Luther, “Preface to the Epistles of St. James

and St. Jude”, in: Luther’s Works, tradução para o inglês de C. M. Jacobs [Philadelphia: Muhlenberg,

1960], vol. 35, p. 397). Mas, em contraste com Lutero, Dibelius via a ausência de coesão como

dependente da parênese em vez de uma diminuição do valor da carta (James, p. 5, nota 21).

76
Moo, James, p. 45.

77
Bauckham, James, p. 61-63.

78
F. O. Francis, “Form and Function of the Opening and Closing Paragraphs of James and

1John”, ZNW 61 (1970), p. 118.

79
Davids, James, p. 25-6. O efeito é um quiasmo. Mas a noção de uma dupla introdução de

temas no capítulo 1 é duvidosa. A unidade 3.1 a 4.12 de Davids inclui 4.11,12, que talvez mais

provavelmente pertença à unidade seguinte, enquanto a unidade 4.13 a 5.6 indevidamente exclui 5.7-

11.

80
M. E. Taylor, A Text-Linguistic Investigation into the Discourse Structure of James, LNTS 311

(London: T&T Clark, 2006).

1482
81
Por exemplo, C. L. Blomberg (From Pentecost to Patmos: An Introduction to Acts Through

Revelation [Nashville: B&H, 2006], p. 391) [publicado em português por Vida Nova sob o título

Introdução de Atos a Apocalipse], que em certo grau seguiu a Davids; e G. H. Guthrie, “James”, in:

Expositor’s Bible Commentary, ed. rev. (Grand Rapids: Zondervan, 2006), vol. 13: Hebrews-

Revelation, p. 206.

82
“Palavra” é a “palavra gancho”, aparecendo em 1.21 e 22, que conecta 1.19-21 com 1.22-27.

83
Veja também a comparação entre fé e obras em Tiago e Paulo na seção Temas Teológicos.

84
A seção sobre sabedoria justa versus terrena em 3.13-18 está no centro do macroquiasmo

proposto por Guthrie, “James”, p. 206.

85
A tradução “submissa” é preferível a “complacente” (HCSB).

86
Veja a tabela “Os Ensinamentos de Jesus em Tiago”.

87
Veja Hengel, Paulus und Jakobus, p. 526-29.

88
Veja Ropes, James, p. 204-6.

89
Veja Guthrie, James, p. 241.

90
Em um outro sentido, é claro, foi a fé de Abraão que foi creditada a ele como justiça; veja

Gênesis 15.6, citado em Tiago 2.23; Gálatas 3.6; e Romanos 4.3, em provável ordem cronológica de

composição.

91
Em 2.24, Tiago não disse que um homem é justificado pelas obras e não pela fé — ele

acrescentou pela fé somente (i. e., sem obras).

92
Veja o quadro sobre Tiago e os Ensinamentos de Jesus.

93
Para uma discussão mais completa do ensino ético de Tiago, incluindo aspectos como o

controle do falar, o pobre e o rico, provação e sofrimento, e amor, misericórdia e humildade, veja

1483
Chester, “Theology of James”, p. 16-45.

94
Por exemplo, Ehrman, Introduction, p. 331-2.

95
Veja Moo, James, p. 29.

1484
CAPÍTULO 18

As epístolas petrinas (1 e 2Pedro) e a


carta de Judas

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os fatos-chave de
1 e 2Pedro e Judas. Em relação à História, os estudantes deverão ser
capazes de identificar o autor, data, origem, destino e propósito de cada
livro. Em relação à Literatura, eles deverão ser capazes de fornecer um
esboço básico de cada livro e identificar os principais elementos do
conteúdo do livro encontrado na Discussão Unidade por Unidade. Em
relação à Teologia, os estudantes deverão ser capazes de identificar os
principais temas teológicos nas Epístolas petrinas e no livro de Judas.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo
essencial identificado no item Conhecimentos básicos, os estudantes
deverão ser capazes de apresentar os argumentos para as conclusões
históricas, literárias e teológicas. Em relação à História, os estudantes
deverão ser capazes de discutir as evidências para autoria, data, origem,
destino e propósito de Pedro e Judas. Em relação à Literatura, eles deverão
ser capazes de fornecer uma descrição pormenorizada de cada livro. Em

1485
relação à Teologia, os estudantes deverão ser capazes de discutir os
principais temas teológicos nas Epístolas petrinas e no livro de Judas e as
formas únicas pelas quais contribuem para o cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além de domínio do conteúdo essencial
identificado nos itens Conhecimentos básicos e Conhecimentos
intermediários, os estudantes deverão ser capazes de se engajar criticamente
nos estudos modernos em relação ao suposto pseudonimato de 2Pedro e
como isso afeta a datação da carta. Eles deverão ser capazes de discutir as
diferentes interpretações de 1Pe 3.18-22 e avaliar o gênero de Judas.
Também deverão estar preparados para avaliar criticamente a relação entre
o livro de Judas e 2Pedro e ser capazes de explicar como isso afeta a
datação das cartas.

Mapa 18.1: Origem e destino de 1 e 2Pedro.

1486
FATOS-CHAVE DE 1 E 2PEDRO
Autor: Simão Pedro
Data: c. 62-63, 65
Origem: Roma
Destino: Cristãos no norte da Ásia Menor
Motivo: Perseguição da igreja (1Pedro) e falso
ensino (2Pedro)
Propósito: Encorajar esses cristãos a manter o curso
(1Pedro) e a combater o falso ensino
(2Pedro)
Tema: A vida cristã em meio a um mundo hostil
(1Pedro) e o perigo dos falsos mestres
(2Pedro)
Versículos-Chave: 1Pe 3.15-17; 2Pe 3.17,18

INTRODUÇÃO

Primeira Pedro tem sido, há muito tempo, reconhecida como um dos


pontos altos da literatura e da teologia do NT. Martinho Lutero reconheceu
1Pedro (juntamente com o Evangelho de João e as cartas de Paulo) como “o
verdadeiro cerne e essência de todos os livros do NT. Pois neles você […]
encontra representado de forma magistral como a fé em Cristo vence o
pecado, a morte, e o inferno, e dá a vida, justiça e salvação”.1 Essa visão
mudou quando os comentaristas nos séculos XIX e XX viram o autor como
um paulinista. Graças à obra de J. H. Elliott, mais estudiosos modernos
estão rejeitando essa ideia, e 1Pedro foi reabilitada nos últimos anos como
uma fonte segura de teologia cristã.

1487
Segunda Pedro não tem tanta sorte. Nos círculos modernos, a
contribuição teológica do livro muitas vezes é diminuída. J. D. G Dunn se
queixou que 2Pedro contém “uma ortodoxia um tanto vazia” por um
homem “que perdeu toda a esperança de uma parúsia imediata”.2 O
exemplo mais extremo pode ser E. Käsemann, que considerou a carta de
“um tipo inflexível e estereotipado” e alegou que suas partes foram
montadas por “constrangimento em vez de força”, representando um
catolicismo primitivo no século II.3 Entretanto, grande parte dessa baixa
estima por 2Pedro vem de uma má compreensão do estilo da carta e do
pressuposto de uma origem tardia e pseudônima, segundo a qual o livro foi
escrito por alguém que não Pedro e atribuído a Pedro por alguma razão.4
Entendido corretamente, no entanto, o conteúdo de 2Pedro indica que o
livro é digno do status canônico que alcançou pela força de seus
argumentos, apesar das dúvidas iniciais quanto à sua autenticidade.

1PEDRO

HISTÓRIA
Autor
Evidências externas
A antiga tradição da igreja estava completamente familiarizada com 1Pedro
e atribuiu a autoria do livro ao apóstolo Pedro de uma maneira
impressionante. A primeira evidência clara do conhecimento da carta vem
de 2Pedro; lá o autor disse que “esta é agora a segunda carta que vos
escrevi” (2Pe 3.1). Poucos ousariam dizer que ele não está se referindo à

1488
primeira carta.5 Houve tentativas de mostrar a dependência de 1Pedro em
outros documentos do primeiro século, como 1Clemente (c. 96) e a Didaquê
(segunda metade do século I ou início do século II), mas a evidência não é
conclusiva.6 Policarpo — um residente da Ásia Menor, que foi o
destinatário de 1Pedro — mostrou conhecimento de 1Pedro em sua carta
aos Filipenses (c. 108).7 De acordo com Eusébio (c. 260-340), tanto Papias
(c. 60-130) quanto Clemente de Alexandria (c. 150-215) afirmaram que
Pedro escreveu este livro.8
A primeira citação existente mencionando Pedro como o autor vem de
Ireneu (c. 130-200). Ele não só citou Pedro como o autor, mas também
frequentemente se referiu a 1Pedro.9 Clemente de Alexandria e Tertuliano
(c. 160-225) citaram 1Pedro e atribuíram os versículos ao apóstolo.10
Eusébio listou 1Pedro como o único livro “indiscutível” de todas as
Epístolas Gerais.11 A carta não é listada no Cânon de Muratori (final do
século II?); entretanto, o ma- nuscrito é fragmentado e incompleto para
todas as Epístolas Gerais.12 Assim a autoria de Pedro da carta é bem
atestada na tradição da igreja primitiva. Bigg afirmou com relação a
1Pedro: “não há nenhum livro do Novo Testamento que possua uma
atestação mais antiga, melhor ou mais forte”.13
Começando em 1784, algumas escolas de pensamento consideraram
1Pedro uma farsa.14 Esse ponto de vista se tornou a posição majoritária
hoje, apesar dos vigorosos protestos.15 Quatro questões de discórdia geral
foram levantadas contra a autoria petrina de 1Pedro. Primeiro, o grego é
melhor do que se esperava para o de um pescador galileu.16 Segundo, o
conteúdo do livro sugere um meio mais adequado a uma época posterior à
da vida de Pedro.17 Terceiro, os críticos veem uma dependência das cartas
“deuteropaulinas”, exigindo uma data no início do século II. Quarto, as

1489
regiões geográficas referidas (incluindo regiões remotas da Ásia Menor)
não faziam parte da jurisdição apostólica de Pedro e não poderiam ter sido
evangelizadas ou sofrido perseguição no período de vida de Pedro.18
Essas objeções, entretanto, não são convincentes. Que a carta é muito
bem escrita para ser de Pedro levanta questões em três áreas. Primeira, quão
bem escrita ela é? Estudos recentes mostraram que 1Pedro certamente não
está além das habilidades de alguém escrevendo em uma segunda língua e
que o livro exibe influência semítica.19 Segunda, quão profundamente o
grego tinha penetrado na Palestina? Uma vez mais, estudos recentes
mostraram que a Palestina tinha experimentado considerável helenização. A
língua grega era comum, e podia-se esperar que Pedro estivesse
familiarizado com ela.20 Além disso, o próprio irmão de Pedro tem um
nome decididamente grego, Andreas (André), mostrando pelo menos algum
grau de helenização da família de Pedro.21 Terceira, Pedro empregou um
amanuense? O livro menciona Silvano (Silas) como aquele “por
intermédio” de quem o autor havia escrito para seus leitores (1Pe 5.12). É
discutível se isso significa que ele usou Silvano como amanuense ou
simplesmente como o transportador para entregar a carta.22 No entanto,
mesmo que Silvano não fosse um amanuense, isso não impediria a
possibilidade de que ele pudesse ter usado alguém para preencher essa
função. Se Pedro realmente usou um amanuense, isso poderia explicar o
polido grego das cartas.
As outras objeções à autoria de Pedro não são melhores. O ponto de
vista de que a carta parece se referir a uma situação posterior foi
originalmente baseado na noção de que a perseguição mencionada (p. ex.,
1.6) foi sancionada pelo Estado.23 Hoje, praticamente ninguém defende essa
posição.24 As únicas injunções em 1Pedro a respeito do estado não

1490
mencionam qualquer perseguição. Na verdade, os fiéis são instruídos “a se
sujeitarem a toda instituição humana”, incluindo “o Imperador, como a
autoridade suprema” e os seus governadores (2.13,14).25 Schreiner
corretamente observou que os cristãos, até mesmo em meio à perseguição
sancionada pelo Estado, sempre foram exortados a ser bons e obedientes
cidadãos. Assim, as injunções de Pedro por si mesmas não excluem a
perseguição pelo Estado.26 No entanto, a injunção vem sem nenhuma
menção de perseguição e pequena parte da urgência que se esperaria de um
líder de igreja escrevendo aos cristãos sob perseguição por parte do Estado.
J. N. D. Kelly resumiu que a perseguição aparentemente não foi do Estado,
“mas de uma atmosfera de suspeita, hostilidade e brutalidade por parte da
população local, que pode facilmente colocar os cristãos em apuros com a
polícia”.27
Outros acadêmicos alegam que a referência a Roma como “Babilônia”
torna necessária uma data posterior a 70 e, portanto, além do período da
vida de Pedro.28 Contudo, a evidência disponível sugere que essa foi uma
alusão perfeitamente inteligível.29 Além disso, é dito que a eclesiologia da
igreja é mais desenvolvida do que durante a época de vida de Pedro, mas,
novamente, se não houver uma predisposição em atribuir a autoria a um
escritor pseudepigráfico como um representante da Igreja Romana, tudo o
que se encontra em 1Pedro é o ofício de presbítero (5.1) que Pedro também
reivindica para si mesmo. Isso dificilmente fala de uma eclesiologia tardia;
antes, indica uma eclesiologia bem primitiva.30
Que 1Pedro é dependente de Paulo é altamente questionável. Primeiro,
a carta é tão próxima de Romanos e Efésios que a dependência teológica (se
não literária) é necessária. Consequentemente, a teoria com frequência tem
proposto que o escritor era um aluno de Paulo.31 Se assim for, isso levanta a

1491
questão do por quê um seguidor de Paulo atribuiria uma carta a Pedro e não
ao seu mestre (supostamente Paulo). Assim, a ideia de que o escritor foi um
seguidor de Paulo está perdendo cada vez mais a força entre os estudiosos,
muitas vezes sendo substituída pelo pressuposto de uma “escola petrina”
em Roma.32
Muito foi feito sobre a natureza dos chamados paralelos de Paulo.
Kümmel considerou esse um dos muitos “argumentos decisivos […] contra
a autoria petrina de 1Pedro [sic]”.33 Kümmel acreditava que 1Pedro tinha se
afastado de um entendimento petrino do cumprimento da lei para um
conceito paulino de liberdade da lei.34 Esse argumento pressupõe uma
disparidade entre as teologias de Pedro e Paulo, baseado amplamente em Gl
2.11-14, mas há base insuficiente na Escritura para tal divisão. Alguns
utilizam esse argumento para inferir um autor pseudônimo de uma
“comunidade petrina”, enquanto outros tomam isso como implicando um
autor do círculo paulino. No entanto, não está claro porquê a carta não foi
atribuída a Paulo em vez de Pedro se ela era tão dependente da teologia
paulina. Bigg analisou esses alegados paralelos em profundidade e
descobriu que os paralelos com Efésios não são muito fortes, que as
semelhanças com Romanos são superficiais, e que o mesmo é verdade em
relação ao restante das cartas de Paulo.35 Na verdade, a obra na qual ele
encontrou os paralelos mais intrigantes foi o livro de Tiago.36 Assim,
descobre-se que a natureza dos chamados paralelos não é do tipo que exige
uma dependência literária de Paulo.37 Nada impede o apóstolo Pedro de ter
lido e apreciado Tiago, ou Paulo, por sinal.38 Qualquer continuidade pode
ser melhor explicada por uma tradição cristã comum e talvez a
familiaridade de Pedro com (algumas das) cartas.39 De fato, o conhecimento
que 1Pedro tem de Paulo torna a referência à sua coleção de cartas em 2Pe

1492
3.16 mais plausível. Além disso, faz uma ligação mais forte entre as duas
cartas, sugerindo autoria comum.
Finalmente, alguns estudiosos duvidam da autoria petrina de 1Pedro
baseados nos destinatários da carta. A suposição é que as áreas remotas da
Ásia Menor não poderiam ter sido evangelizadas e uma estrutura
eclesiológica bem definida ter sido posta em prática (veja 5.1) até décadas
após Pedro e Paulo.40 Essa é uma suposição baseada em uma lógica
“daquilo que deve ter sido” em vez de em evidências diretas. O cristianismo
era comumente reconhecido como um espinho na carne do Império
Romano na Bitínia por volta do ano 112 através das cartas de Plínio o
Jovem a Trajano. Plínio entrevistou aqueles que alegavam ter sido cristãos,
alguns “até mesmo 25 anos” atrás, em torno de 87.
K. Jobes observou diversos fatores que poderiam explicar a presença de
uma igreja bem organizada em áreas remotas da Ásia Menor. Em Atos 2,
peregrinos do Pentecostes vindos do Ponto, Capadócia e da Ásia estavam
entre os que ouviram o sermão de Pedro. Alguns podem ter estado entre os
3 mil salvos que depois migraram de volta para o norte da Ásia Menor e
começaram a evangelizar (observe que Áquila era um judeu de Ponto; cf.
Atos 2.9). O édito de Cláudio expulsou os judeus de Roma devido a
distúrbios provocados por um tal “Cresto”. Alguns judeus cristãos podem
ter sido forçados a fugir para a região. Jobes também conjecturou que a
agressiva colonização romana teria levado muitos cristãos para a região.41
Além disso, Atos e as cartas de Paulo indicam que uma evangelização
agressiva na Ásia Menor foi realizada durante a vida de Paulo. A expansão
do cristianismo para essas áreas mais rapidamente do que comumente
assumido seria, assim, totalmente concebível.42

1493
O argumento contra a autoria petrina de 1Pedro é menos que
convincente.43 O recurso ao pseudonimato é em última instância
desnecessário para responder às perguntas de sua origem. A menos que se
pressuponha o pseudonimato em geral como uma possibilidade para várias
cartas do NT, parece pouco razoável, quer com base em evidência interna
ou externa, negar que o apóstolo Pedro escreveu 1Pedro. Assim, parece
aconselhável tomar a atribuição da autoria em 1Pedro 1.1 sem maior
análise.

Evidências internas
Internamente, a descrição do escritor é bastante reservada e não
característica de um autor pseudepígrafo.44 O autor traçou um aparente
contraste com os seus leitores, observando que eles não tinham visto o
Cristo, provavelmente implicando que ele o tinha visto (1.8). Ele também
alegou ser uma “testemunha dos sofrimentos de Cristo” (5.1). Novamente,
pode-se observar a reserva não característica com que o autor fez valer os
direitos de uma testemunha em primeira mão.
Porque não há nenhum exemplo indiscutível do discurso e dos escritos
de Pedro, existe pouca evidência linguística para analisar a(s) carta(s), mas
parece realmente haver algumas evidências internas que apontam para o
apóstolo Pedro como o autor de 1Pedro. Por exemplo, R. Gundry acreditava
que há um “padrão petrino” quase inconsciente na carta. Em 1958, Selwyn
listou 30 alusões às palavras de Jesus em 1Pedro, chamando-as de verba
Christi (“palavras de Cristo”).45 Gundry examinou esses paralelos e
descobriu que eles eram mais orgânicos, em vez de citações, e não
mostravam nenhuma dependência literária real. Muitos deles ocorrem em

1494
contextos nos Evangelhos associados Pedro.46 Além disso, há claras
afinidades com os discursos de Pedro em Atos.47 Além do mais, Atos 5.29
(“Pedro e os outros apóstolos”), Atos 10.39 (“Pedro”) e 1Pedro 2.24
empregam a expressão “sobre o madeiro” (epi xylou) para descrever a cruz
de Cristo (como Paulo fez obliquamente em Gl 3.13, citando Dt 21.23).
O livro de 1Pedro não inclui nenhuma referência ao gnosticismo
(florescendo apenas no séc. II), nenhuma depreciação do Estado, nenhuma
honra entusiástica dada a Pedro, “e nenhum dos desenvolvidos aparatos de
pseudonimato”.48 Dessa forma, não há razões substanciais para recorrer à
pseudepigrafia. Por outro lado, o que é conhecido de Pedro se adequa à
carta e a confiança da igreja primitiva — que é especialmente digna de nota
uma vez que havia inúmeros escritos pseudepigráficos que reivindicavam
Pedro como o autor — deveria receber peso total.49 Assim, Robinson
corretamente afirmou a autoria petrina de 1Pedro, observando que
“qualquer que seja a intenção, [pseudepigrafia] neste caso [é] um exercício
especialmente sem motivação que, na realidade (ao contrário de 2Pedro),
enganou a todos até o século XIX”.50

Data
A data da carta e sua autoria estão intimamente interligadas. Os estudiosos
que rejeitam autoria de Pedro geralmente postulam uma data no reinado de
Domiciano (81-96).51 Como mostrado, os argumentos para uma data tardia
não são nem necessários nem convincentes. Uma vez que a carta foi
composta durante a vida de Pedro, surge a pergunta sobre a data exata da
composição.

1495
Há algumas indicações de uma data primitiva independentemente da
autoria. Muitos apontam para uma expressão teológica primitiva que inclui
o Servo Sofredor de Isaías 53, a expectativa do retorno iminente de Jesus e
a formulação trinitária não desenvolvida.52 Qualquer avaliação da data
também deveria incluir a referência aos presbíteros em 1Pe 5.1 como o
ofício de supervisão na igreja. Na época de Inácio (c. 35-110), um
episcopado monárquico tinha rapidamente se estabelecido, o que também
sugere uma data anterior porque não há menção de um ofício pastoral de
dois níveis em 1Pedro, como era característico da igreja do século II.
O melhor indicador com relação à data da carta, dada a autoria de
Pedro, é a referência a Roma em 1Pedro 5.13. A maioria concorda que
“Babilônia” refere-se a Roma. Se assim for, Pedro muito provavelmente
estava em Roma entre meados e o final dos anos 60. A carta não dá indício
nenhum de que havia perseguição em curso, por parte do Estado ou não, no
ambiente do autor. Isso indica uma data anterior à perseguição de Nero, que
teve início por volta de 64. Provavelmente 1Pedro foi escrita pouco antes,
então, por volta de 62-63, quando os arautos dessa perseguição já estavam
no horizonte.53

Origem
Primeira Pedro menciona especificamente “Babilônia” em 5.13 como o
lugar de onde a carta foi enviada. Três opções surgem dessa descrição.
Primeira, o local poderia ser a Babilônia mesopotâmica. No entanto, nesta
época a cidade estava praticamente deserta.54 Segunda, havia uma Babilônia
no Egito, mas essa era um posto militar insignificante, e não há nenhuma
evidência de qualquer missão cristã ali até muito mais tarde.55 A terceira e

1496
melhor opção é Roma. Nesse caso, o termo é metafórico, designando o
centro do poder dos gentios. Mesmo a maioria dos que não defendem a
autoria de Pedro e adotam uma data posterior ainda considera Roma como
sendo a origem geográfica de 1Pedro.56

Destino
Primeira Pedro 1.1 identifica onde os destinatários da carta viviam, que era
ao norte da Ásia Menor (atual Turquia). Pedro listou uma série de
províncias romanas em uma ordem pouco usual: “Aos residentes
temporários da Dispersão nas províncias do Ponto, Galácia, Capadócia,
Ásia e Bitínia” (1.1). Isso incluiria uma região de formato crescente do
norte da Ásia Menor.57
A questão mais difícil é: “Quem são os destinatários da carta?”
Comentaristas antigos alegaram que os leitores originais eram judeus
convertidos nessas cidades.58 Isso é baseado principalmente na leitura literal
da abertura do discurso de Pedro, “aos residentes temporários da Dispersão”
(1.1). Nesse sentido, “residentes temporários” e “Dispersão” (parepidēmos
e diaspora) indicariam judeus fiéis, assim como o termo “estrangeiros”
(paroikos) em 2.11 (veja também paroikia, “tempo de residência
temporária”, em 1.17).
No entanto, a maioria dos intérpretes modernos entende esses termos
como sendo metafóricos à luz de 1.18: “Pois sabeis que fostes redimidos da
vossa vã maneira de viver herdada de vossos pais”; e 4.3: “Pois já houve
bastante tempo gasto na prática da vontade dos pagãos: a permanência no
comportamento irrestrito, desejos maus, bebedeiras, orgias, farras e idolatria
iníqua”. É improvável que Pedro teria se referido ao judaísmo dessa

1497
maneira. Mais provavelmente ele estava se referindo aos gentios como parte
do recém-constituído povo de Deus em continuidade com a comunidade da
antiga aliança.

Motivo
A perseguição é um tema comum em 1Pedro e serve como motivo para a
escrita dessa carta. Embora Pedro pudesse estar antecipando a perseguição
de Nero em Roma, os seus leitores provavelmente já estavam sofrendo
perseguição privada ou alguma perseguição estatal localizada. Eles
sofreram várias provações (1.6); suportaram a dor do sofrimento injusto
(2.19); foram acusados e sua vida cristã foi denunciada (3.16); foram
difamados (4.4); sofreram provações de fogo (4.12); participaram dos
sofrimentos do Messias (4.13); foram ridicularizados pelo nome de Cristo
(4.14), e sofreram de acordo com a vontade de Deus (4.19). Mas eles não
estavam (ainda) sendo executados como criminosos.

Propósito
A perseguição não era uma noção abstrata para os fiéis na Ásia Menor; eles
estavam experimentando repercussões ferozes devido à sua fé. Pedro
encorajou os fiéis a que perseverassem em face dos tempos difíceis. Ele fez
isso ao promover uma cosmovisão bíblica entre os fiéis. Eles precisavam
entender quem (ou de quem) eles eram e, em seguida, enfrentar a sua
situação a partir desse ponto de vista. A essência dessa exortação está em
1.5,6: “[Vós] estais sendo protegidos pelo poder de Deus por meio da fé
para uma salvação que já está pronta para ser revelada no último tempo.

1498
Vós vos alegrais nisso, ainda que por agora, por um curto tempo, tenhais de
ser afligidos por várias provações”.

LITERATURA
Plano Literário
Surpreendentemente, há praticamente unanimidade em relação à estrutura
de 1Pedro na recente literatura acadêmica.59 O plano literário de 1Pedro é
marcado pela presença da abordagem direta “queridos amigos” (agapētoi),
em 2.11 e 4.12, que divide a carta em três partes: 1.1 a 2.10; 2.11 a 4.11 e
4.12 a 5.14; 1.1,2 constitui a saudação e 5.12-14, a despedida e bênção
final. O tema principal da primeira parte é a identidade dos fiéis como povo
escolhido de Deus devido à sua salvação através de Cristo e o seu
renascimento pelo Espírito Santo. A alocução em 2.11 muda o foco da
identidade dos fiéis para a sua consequente responsabilidade como
“forasteiros e estrangeiros” em um mundo hostil a Cristo, que envolve a
devida submissão às autoridades nas esferas do governo, do local de
trabalho e do lar. A alocução em 4.12 (seguindo uma doxologia em 4.11)
introduz um apelo à submissão ainda em um outro contexto, a igreja.
Pedro se dirigiu aos “residentes temporários” em algumas partes da
“Diáspora” (1.1,2). A carta inicia com uma ação de graças a Deus por suas
bênçãos espirituais concedidas aos destinatários (1.3-12), seguida por uma
exortação à conduta santa (observe especialmente a citação de Lv 11.44,45;
19.2; 20.7 em 1.16). Em consonância com essa continuidade com o Israel
do AT, Pedro desenvolveu a semelhança de identidade entre Israel e os
destinatários, muitos dos quais teriam sido gentios fiéis, em uma série de
referências do AT aplicadas aos leitores (2.4-10).

1499
Uma nova seção tem início em 2.11 com uma renovada referência aos
leitores como “forasteiros e residentes temporários” (veja 1.1, 17). Na a
forma de uma “tabela doméstica” ou “código familiar” modificado, Pedro
exortou seus leitores a se engajarem na submissão adequada àqueles em
posições de autoridade, seja no governo (2.13-17), no local de trabalho
(2.18-25), ou no lar (3.1-7). O restante dessa seção contém exortações aos
justos sofrendo no contexto da perseguição à luz do fato de que “o fim de
todas as coisas está próximo” (4.7, veja 3.8 a 4.11).
Uma outra nova seção tem início em 4.12, com uma alocução
semelhante à de 2.11. Os leitores de Pedro não devem ficar surpresos
“quando a provação ardente surge entre vós para vos testar”. Também nesta
seção se encontram instruções adicionais sobre a submissão adequada
àqueles com autoridade, no caso presente, os presbíteros da igreja (5.1-7), e
sobre resistir ao Diabo. Pedro incluiu uma doxologia (5.8-11) e uma breve
conclusão (5.12-14). A última reconhece a ajuda de Silvano em escrever
(ou entregar) a carta; refere-se à “Babilônia” (ou seja, Roma) como a
procedência da carta, e a (João) Marcos que estava com Pedro nessa época;
e contém uma saudação final.

Algo Para Pensar: O Progresso dos Peregrinos

Enquanto estava na prisão, John Bunyan, um batista inglês,


escreveu um dos livros cristãos mais apreciados de todos os tempos:
O Peregrino, que apareceu em duas partes em 1678 e 1684. O
romance alegórico de Bunyan, que foi traduzido para vários idiomas,
traça a jornada de um homem chamado “Peregrino”, alterado para

1500
“Cristão” após sua conversão, da “Cidade da Destruição” à
“Cidade Celestial”. Entretanto, a ideia de cristãos sendo peregrinos
neste mundo certamente não é original de Bunyan. Na verdade, ela
já é encontrada nas páginas do NT, especialmente em Hebreus e
1Pedro.
Pedro dirigiu sua epístola especificamente aos fiéis como
“forasteiros residentes” neste mundo (1.1). Ele convocou seus
leitores a andarem com reverência “durante este tempo de residência
temporária” (1.17) e os exortou “como peregrinos e residentes
temporários a que se abstenham dos desejos carnais que guerreiam
contra” eles (2.11). Esse tema do “forasteiro residente”, portanto,
repousa sobre a base de como Pedro concebia a identidade dos fiéis
nesta vida: este mundo não é o lar deles; em vez disso, eles são
peregrinos, forasteiros e estrangeiros.
Como alguém que tinha sido por muitos anos um estrangeiro
residente nos Estados Unidos antes de se tornar um cidadão
americano, esse escritor pode certamente apreciar a potente
metáfora de Pedro. Como um residente estrangeiro, eu não tinha
certos direitos e privilégios que os cidadãos comuns tinham
naturalmente, como a direito do voto. Eu era um residente
temporário que não podia estabelecer raízes profundas. Na
providência de Deus, isso me preparou para considerar minha
existência cristã neste mundo como temporária também: pois como
dizem as Escrituras, o céu é o nosso lar porque nele Deus habita.
Será que o nosso estilo de vida reflete essa realidade? No Sermão
do Monte Jesus nos advertiu contra o acúmulo de tesouros na terra.
O materialismo é crescente em nossa cultura, especialmente entre

1501
muitos jovens. Muitas vezes parece que suas vidas dependem de eles
serem ou não capazes de obter o mais recente equipamento
eletrônico no momento em que é lançado no mercado. Para piorar as
coisas, esse materialismo passou da cultura geral para dentro da
igreja. Está na hora de os fiéis lembrarem que, segundo a palavra de
Deus, eles são apenas peregrinos e e residentes estrangeiros neste
mundo.

ESTRUTURA
I. Abertura (1.1,2)

II. O status do povo de Deus (1.3 a 2.10)


A. A sua preciosa posição (1.3-12)
B. A ética da sua nova vida (1.13-25)
C. O crescimento de sua nova vida (2.1-10)

III. As responsabilidades do povo de Deus (2.11 a 4.11)


A. A conduta do povo de Deus (2.11 a 3.12)
1. Residentes temporários (2.11,12)
2. Submissão ao governo incrédulo (2.13-17)
3. Submissão aos mestres incrédulos e o exemplo de Cristo (2.18-25)
4. Submissão aos maridos incrédulos (3.1-7)
5. Sofrendo por fazer o que é certo (3.8-12)
B. A promessa de vindicação (3.13 a 4.6)
1. O testemunho dos fiéis (3.13-17)
2. O testemunho de Cristo (3.18-22)

1502
3. Chamado ao sofrimento como Cristo (4.1-6)
C. A proximidade do fim (4.7-11)

IV. A responsabilidade da igreja e dos presbíteros (4.12 a 5.11)


A. Resposta à ardente provação (4.12-19)
B. Relacionamentos na igreja (5.1-11)
1. Submissão aos presbíteros (5.1-7)
2. Resistindo ao diabo (5.8,9)
3. Bênção final (5.10,11)

V. Conclusão (5.12-14)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Abertura (1.1,2)
Pedro se identificou como “um apóstolo de Jesus Cristo” e se dirigiu aos
destinatários da carta como “residentes temporários da Dispersão” em
diferentes províncias (1.1) e como “separados pelo Espírito para a
obediência e a aspersão do sangue de Jesus Cristo” (1.2). Assim, a
identidade dos leitores é esclarecida tanto em relação ao mundo quanto em
relação a Deus.

II. O Status do Povo de Deus (1.3 a 2.10)


A primeira grande seção do corpo da carta estabelece as bases para o
restante da carta ao abordar a identidade dos crentes como o resultado da
sua salvação em Cristo e seu renascimento pelo Espírito Santo.

1503
A. A sua preciosa posição (1.3-12)
Pedro queria que os fiéis apreciassem plenamente a sua posição diante de
Deus (1.3-12). Eles tinham alegria porque sua salvação estava protegida,
mesmo que no presente eles suportassem provações (1.3-6). Pedro observou
que essa era a prova de uma fé genuína, que era mais preciosa até mesmo
que o ouro (1.7-9). Pedro concluiu a seção explicando que essa salvação
coloca seus leitores em uma posição única que os profetas haviam predito e
dela procurado saber com cuidado (1.10-12). Pedro, assim, destacou a
continuidade desses fiéis do NT com o povo de Deus no AT.

B. A ética da sua nova vida (1.13-25)


Pedro destacou a resposta adequada à nova identidade dos fiéis em Cristo
(1.13-25). Primeiro, eles deveriam ser santos porque Deus era santo,
colocando sua esperança na volta de Cristo (1.13-16). Segundo, eles
deveriam andar em reverência a Deus (1.17) porque eles tinham sido
redimidos de sua forma fútil de viver com um alto preço (1.17-21).
Finalmente, eles deveriam amar uns aos outros com sinceridade, tendo
aderido à família de Deus através do novo nascimento, sabendo que a sua
existência humana era transitória (1.22-25; veja Is 40.6-8).

C. O crescimento de sua nova vida (2.1-10)


Semelhante à terminologia de Paulo de “despir” e “vestir” (p. ex., Cl 3.8),
Pedro exorta os fiéis a que colocarem de lado toda a maldade,60 a desejarem
ansiosamente o “puro leite” da palavra de Deus que os ajudará a crescer em
sua nova vida de fé (2.1-3; veja Sl 34.8). Embora em outras passagens do

1504
NT a necessidade de “leite” dos fiéis seja utilizada como uma ilustração de
sua imaturidade e necessidade de crescimento em Cristo (1Co 3.1-3; Hb
5.12-14), na presente passagem, o desejo dos bebês por leite fornece um
exemplo positivo de fome e sede que os fiéis têm das qualidades nutritivas
da palavra de Deus e uma pré-condição necessária para “provar” da
bondade de Deus (veja a citação do Sl 34.8 em 1Pe 2.3).
Pedro desenvolveu isso em termos da vida comunitária da igreja (2.4-
10). Ao fazê-lo, ele reuniu uma série de “pedra testimonia”, aplicando
várias passagens do AT que incluem uma referência a uma “pedra” a Jesus
Cristo.61 Esse Cristo era a pedra que o construtores rejeitaram, mas que
agora se tornou a pedra angular no novo “templo” de Deus, a comunidade
dos fiéis (2.6; veja Is 28.16; cf. abaixo). Enquanto ele se tornou uma pedra
de tropeço para muitos (2.7,8; veja Sl 118.22; Is 8.14), os fiéis eram uma
nação eleita, santa e sacerdotal, possessão de Deus, chamada a oferecer
sacrifícios espirituais a Deus (2.9,10; veja Êx 19.5,6; Dt 4.20; 7.6; Is 43.21).
Além disso, um aspecto importante dessas referências a “pedra” é a
reaplicação que Pedro faz da imagem do “templo”, apresentando Cristo
como o alicerce do novo templo espiritual e os fiéis como “pedras vivas”
(1Pe 2.5) desse templo. Isso é conseguido: (1) pela expressão “chegando-
vos”, em 2.4 (veja Sl 34.5, LXX), que é usada na LXX com referência aos
israelitas “chegando-se” ao santuário do AT (p. ex., Êx 12.48; 16.9; Lv
9.7,8; 10.4,5); (2) pelo uso de “casa” (oikos) em 2.5 (p. ex., 1Rs 5.5; Is
56.7; veja Mt 12.4; 21.13; Mc 2.26; Lc 11.51; Jo 2.16); e (3) pelas
referências ao “sacerdócio” e “sacrifícios” em 2.5, todas as quais remetem à
terminologia do AT em relação ao templo.62

1505
Tabela 18.1: Pedra Testimonia em 1Pedro 2.6-8
Passagem do Outras passagens
1Pedro Pedra testimonia
AT do NT
2.6 Is 28.16 Jesus, a pedra Rm 9.33; Ef 2.20
angular
2.7 Sl 118.22 Jesus, a pedra Mt 21.42; At 4.11
angular
2.8 Is 8.14 Jesus, a pedra de Rm 9.33
tropeço

III. As Responsabilidades do Povo de Deus (2.11 a


4.11)
Nesta seção da carta, há uma preocupação prevalecente com o testemunho
do povo de Deus. Primeiro, eles devem conduzir suas vidas de forma
respeitável e de modo a honrar a Deus (2.11 a 3.12). Como peregrinos e
estrangeiros (2.11,12), eles devem se submeter ao governo do mundo (2.13-
17) e aos senhores, até mesmo aos insensatos, seguindo o exemplo de
Cristo (2.18-25); as esposas devem se submeter até aos maridos incrédulos
(3.1-7); e assim todos devem estar dispostos a sofrer por fazer o que é certo
(3.8-12). Segundo, os fiéis são encorajados de que a vindicação virá no
momento oportuno (3.13 a 4.6). Pedro discutiu o testemunho dos fiéis
(3.13-17); fez uma espécie de excurso sobre o testemunho de Cristo (3.18-
22; veja 2.21-25); e fez um apelo ao sofrimento como o de Cristo (4.1-6).
Terceiro, Pedro imprimiu sobre os destinatários a urgência da conduta cristã
adequada em meio ao sofrimento à luz da proximidade do fim (4.7-11).

A. A conduta do povo de Deus (2.11 a 3.12)

1506
Primeira Pedro 2.11 a 3.12 começa os chamados “códigos familiares” no
livro. O duplo mandamento geral a esses “estrangeiros e residentes
temporários” é encontrado em 2.11,12: “Abstende-vos dos desejos carnais
que combatem contra vós” e “conduzi-vos de modo honrado entre os
gentios”. Isso é desenvolvido nas passagens que se seguem em termos da
necessidade deles de se submeterem “a toda autoridade humana por causa
do Senhor” (2.13). Os fiéis devem se submeter às autoridades humanas
(2.13-15, reiterado em 2.16,17). Depois disso, Pedro se voltou a grupos
específicos de indivíduos, começando com os servos domiciliares (2.18).
Estes são chamados a seguir o exemplo de Cristo no sofrimento e a olhar
para ele como o pastor e guardião de suas almas (2.18-25).
As esposas, mesmo aquelas de maridos incrédulos, são exortadas a se
submeterem a seus maridos (3.1-6). Elas devem se adornar com Cristo,
sendo Sarah o principal exemplo. Os maridos devem tratar suas esposas
“com entendimento de sua natureza mais frágil” (v. 7) (kata gnōsin hōs
asthenesterō skeuei; lit., “de acordo com o conhecimento de [suas esposas
sendo] um vaso mais frágil”), evitando um tratamento severo (veja Cl 3.19),
e como “coerdeiras da graça da vida” em Cristo, para que suas orações não
sejam impedidas (3.7).63 O mandamento aos maridos equilibra os
mandamentos anteriores de Pedro às esposas, deixando claro que o
chamado para as esposas se submeterem a seus maridos não é, de modo
nenhum, uma licença para estes tratarem suas esposas de uma maneira
dominadora, opressora ou abusiva.
Esta seção conclui com uma ordem resumida para que tenham a mesma
mente e para não retribuirem o mal com o mal. Em vez disso, de acordo
com as palavras do próprio Jesus, os fiéis deveriam abençoar aqueles que os
perseguem (cf. Mt 5.10,11) e, assim, herdar uma bênção, pois “o rosto do

1507
Senhor está contra os que praticam o mal” (3.10-12; veja Sl 34.12-16). Esse
resumo faz a transição, de maneira suave, para o próximo tópico, a
vindicação do Senhor dos que sofrem por fazer o que é certo.

B. A promessa de vindicação (3.13 a 4.6)


A próxima seção é introduzida por uma pergunta retórica: “quem vos fará
mal se sois zelosos do bem?” (3.13). Pedro estava preocupado que os
cristãos perseguidos fossem testemunhas corajosas, mantendo a integridade
completa, “para que quando fordes acusados, aqueles que denunciam vossa
vida cristã sejam envergonhados” (3.16b). O exemplo não é outro senão o
próprio Cristo, que sofreu mesmo sendo justo e foi vindicado por Deus no
final. Depois de proclamar a sua vitória aos anjos caídos (3.19,20), foi
entronizado no céu, vindicado na vida por vir (3.22), como serão os fiéis.64
Assim, o cristão deve ter a mesma determinação (4.1), sabendo que Deus
chamará aqueles que o perseguem para prestar contas (4.5) e dará vida aos
fiéis no reino espiritual (4.6).

C. A proximidade do fim (4.7-11)


Pedro desejava imprimir nos recipientes a urgência do chamado ao justo
sofrimento à luz da proximidade do fim, isto é, o retorno de Cristo e o juízo
de Deus. Para este fim, ele concluiu a unidade com um apelo à santidade
pessoal e amor sincero de uns para com os outros. Os fiéis devem expressar
o seu cuidado pelos outros exercitando hospitalidade e usando seus dons
para falar ou para servir na igreja (4.10,11). O ponto é que os fiéis devem
glorificar a Deus através de Jesus Cristo em todas as coisas.

1508
IV. A Responsabilidade da Igreja e dos Presbíteros
(4.12 a 5.11)
Pedro concluiu com instruções para aqueles na igreja, incluindo os seus
líderes. Sua instrução final para a igreja é confiar em Deus enquanto vivem
para ele especialmente se alguém estiver sofrendo “como cristão” (4.12-19;
65
veja esp. v. 16). Os presbíteros da igreja devem liderar com humildade e
pelo exemplo (5.1-4), enquanto os mais jovens devem se sujeitar aos mais
velhos (5.5). Todos devem exercitar a humildade com os outros e se
humilhar sob a poderosa mão de Deus enquanto esperam pela vindicação de
Deus (5.6,7), e todos devem resistir ao diabo e resistir sob sofrimento (5.8-
11).

QUADRO 18.1: A “ANGÚSTIA DO


INFERNO”: QUATRO VISÕES SOBRE
1PEDRO 3.18-22
Primeira Pedro 3.18-22, às vezes referido como a “angústia do
Inferno”, tem frequentemente confundido os intérpretes, tanto que
Lutero declarou: “um texto maravilhoso é esse, e uma passagem mais
obscura, talvez, do que qualquer outra no Novo Testamento, de modo
que eu não sei com certeza o que Pedro quer dizer”.1 Será que Cristo
desceu ao inferno, como o antigo credo afirmava? Se assim for, o que
ele fez quando chegou lá? E quem eram os espíritos a quem ele fez a
proclamação? Há quatro visões básicas.2
1. Homens Pré-Diluvianos: Muitas vezes chamada de “a visão
agostiniana”, essa visão sustenta que Cristo pregou através de Noé

1509
para aqueles enredados no pecado, que viviam na época de Noé.
Normalmente, “prisão” é tomado como uma metáfora. Cristo foi “pelo
Espírito” e pregou o arrependimento através de Noé. Assim, não
3
houve uma verdadeira descida ao inferno.
2. Homens Pós-Diluvianos: Os espíritos aprisionados são aqueles
que viveram antes do Dilúvio e que rejeitaram a pregação de Noé e
morreram no Dilúvio. Segundo esta visão, Cristo desceu ao inferno e
ofereceu salvação para esses indivíduos. Assim, ele forneceu uma
segunda oportunidade de arrependimento para aqueles que estavam no
inferno.
3. Fiéis do Antigo Testamento: Essa abordagem sustenta que
Cristo desceu ao inferno e libertou os fiéis do AT entre sua
crucificação e ressurreição. Esta era a posição de Calvino e a visão
predominante na igreja medieval. Esta foi também a visão que gerou a
designação “A Angústia do Inferno”.
4. Anjos Maus: Cristo proclamou sua vitória aos espíritos
aprisionados, ou seja, anjos caídos que desobedeceram na época de
Noé, muito provavelmente após a ressurreição. Isto forneceria uma
ligação com 2Pedro, onde os anjos aprisionados são mencionadas com
uma referência que logo segue a Noé (cf. 2Pe 2.4,5; Jd 6).4

1
M. Lutero, Commentary on Peter and Jude (Grand Rapids: Kregel, 1990), p. 166.
2
O seguinte resumo é adaptado de Schreiner, 1, 2Peter, Jude, p. 184-85.
3
Devido aos argumentos de Selwyn (First Epistle of St. Peter, p. 313-62), poucos

defendem esta visão. Mas veja W. Grudem, “Christ Preaching Through Noah: 1Peter 3.19,20

in the Light of Dominant Themes in Jewish Literature”, TrinJ NS 7 (1986), p. 3-31; e id.,

1Peter, p. 203-39.

1510
4
Veja discussão adicional de “A Proclamação de Cristo aos Espíritos em Prisão”, sob

Temas Teológicos.

A. Resposta à ardente provação (4.12-19)


Em uma exortação solene Pedro advertiu os crentes a que esperassem uma
aumentada perseguição.66 Como eles partilham os sofrimentos do Messias,
sua resposta deve ser a alegria, não o desespero, entendendo que seu
sofrimento é prova de salvação e de bênção divina. Ao mesmo tempo, os
fiéis devem ter cuidado para não sofrer por causa de sua própria
pecaminosidade obstinada. Pedro também bateu na fatídica tecla de que o
julgamento começa com a casa de Deus, argumentando a partir do maior
para o menor que, se o julgamento começa com a igreja e ela mal escapa
(citando Pv 11.31), qual será o destino dos pecadores? Por essa razão, os
crentes devem se confiar a Deus, seu “fiel Criador” (4.19).

B. Relacionamentos na igreja (5.1-11)


A seção final se divide em três partes: (1) as instruções relativas aos
presbíteros (5.1-7); (2) um apelo à vigilância do, e resistência contra, o
Diabo (5.8,9); e (3) uma benção final para encorajar aqueles que sofrem por
amor de Cristo (5.10,11). Pedro instruiu seus companheiros anciãos como
uma testemunha ocular dos sofrimentos de Cristo aos pastores do rebanho.67
Ele empregou três conjuntos de contrastes para descrever ministério
pastoral: (1) não por compulsão, mas livremente; (2) não pelo dinheiro, mas
de forma ansiosa; (3) não de forma autoritária, mas como um exemplo
(5.2,3). Aqueles que conduzem de tal uma maneira receberão uma grande

1511
recompensa (5.4). Pedro instruiu os homens mais jovens a estarem sujeitos
a os anciãos (5.5) e que todos fossem humildes uns com os outros (5.6,7) e
resistissem ao Diabo (5.8,9). Ele encerrou em uma bênção (como ele
começou, veja 1.2) que incide sobre a soberania de Deus e sua promessa de
fortalecer e restaurar os fiéis que sofrem (5.10,11).

V. Conclusão (5.12-14)
A conclusão da carta identifica o provável portador da carta, Silvano, e se
refere ao conteúdo da carta como uma breve exortação a “tomar [uma]
posição na” verdadeira graça de Deus (5.12). Pedro também enviou
saudações da igreja em Roma (Babilônia”) e expressou um desejo de paz na
vida daqueles que estão em Cristo (5.14).

TEOLOGIA
Temas Teológicos
O sofrimento cristão e o fim dos tempos
Uma das principais ênfases e êxitos teológicos de 1Pedro é a pervasiva
referência ao sofrimento dos fiéis no contexto do fim dos tempos e, em
particular, à Segunda Vinda de Cristo. Desde o início, Pedro observou que
os cristãos não são nada além de “residentes temporários” neste mundo
(1.1; veja mais abaixo). Ele relembrou esses fiéis sofredores de sua “viva
esperança por meio da ressurreição de Jesus Cristo dentre os mortos” (1.3;
veja 1.13,20,21) e de sua “herança que é imperecível, incorruptível e que
não desvanece, guardada no céu” para eles (1.4), notando que a salvação

1512
completa deles “está pronta para ser revelada no fim dos tempos” (1.5; en
kairō eschatō).
Essas referências a realidades eternas servem para colocar o sofrimento
dos fiéis em seu próprio contexto. Eles devem se alegrar em sua esperança
dessas expectativas prestes a ser realizadas, “embora agora, por um curto
tempo” eles possam enfrentar o desconforto de várias provações, que então
refinam sua fé e a tornam mais valiosa que o ouro, resultando em “louvor,
glória e honra na revelação de Jesus Cristo” (1.6,7). Esse preâmbulo
fornece uma estrutura escatológica para os fiéis em seu sofrimento que, se
levada em conta, tornará suas provações mais suportáveis e inculcará neles
uma alegria que transcende suas aflições e circunstâncias temporárias no
mundo hostil ao seu redor.
Em tudo isso, Cristo serve como o exemplo do fiel. Depois de suportar
grande hostilidade dos pecadores como o Servo Sofredor mencionado em
Isaías (2.21-25), Jesus, agora, “adentrou o céu [e] está à direita de Deus,
com anjos, autoridades e poderes sujeitos a Ele” (3.22). Com base no
exemplo de Cristo, Pedro proferiu a seguinte exortação poderosa a seus
leitores: “Portanto, uma vez que Cristo sofreu na carne, armai-vos também
da mesma resolução — porque aquele que sofreu na carne está livre do
pecado — a fim de viver o tempo restante na carne não mais para desejos
humanos, mas para a vontade de Deus” (4.1,2).
À luz do fato de que o “fim de todas as coisas está próximo” (4.7), os
fiéis devem ser sóbrios e disciplinados para o propósito da oração, amar uns
aos outros, exercitar hospitalidade e exercer seus dons espirituais para a
glória de Deus em Cristo (4.7-11). Pedro se identificou como um
companheiro “participante da glória prestes a ser revelada” (5.1) e falou de
sua expectativa do dia “quando o supremo Pastor aparecer” e ele e seus

1513
leitores “receberão a imperecível coroa de glória” (5.4). A bênção final traz
o livro a um fim adequado: “Agora o Deus de toda graça, que vos chamou à
sua eterna glória em Cristo Jesus, pessoalmente vos restaurará, estabelecerá,
fortalecerá e suportará depois de terdes sofrido um pouco. A ele seja o
domínio para sempre. Amém” (5.10,11).

A identidade dos fiéis e seu testemunho para o


mundo
A identidade dos fiéis e seu testemunho ao mundo estão completamente
entrelaçados na apresentação de Pedro. Sua descrição do status dos fiéis é
bifacetada: primeiro, ele descreve os fiéis do NT em termos que lembram o
Israel do AT, enfatizando a continuidade da igreja no NT com o povo de
Deus do AT; segundo, ele enfatizou o fato de que os cristãos são peregrinos
e residentes temporários neste mundo. Com relação ao primeiro aspecto,
Pedro escreveu: “Mas vós sois uma raça eleita, um sacerdócio real, uma
nação santa, um povo para Sua possessão, para que proclameis os louvores
daquele que vos chamou das trevas para Sua maravilhosa luz” (2.9). Todas
essas designações possuem antecedentes no AT.

1514
Tabela 18.2: O Novo Povo de Deus Descrito em Termos do AT (1Pe 2.9-
11)
1Pedro Passagem do AT Descrição do Povo de Deus
2.9 Is 43.20; Dt 7.6; 10.15 Uma raça eleita
2.9 Êx 19.6; 23.22; Is 61.6 Um sacerdócio real
2.9 Êx 19.6; 23.22 Uma nação santa
2.9 Êx 19.5; 23.22; Dt 4.20; 7.6; Um povo de sua possessão
Is 43.21
2.10 Is 42.12; 43.21 Para proclamar seus
louvores
2.11 Os 1.10; 2.23 Antes não era povo; agora é
povo de Deus

Segundo, Pedro endereçou a carta aos “residentes temporários da


Dispersão” (1.1) e apelou para que eles se portassem com reverência
“durante este tempo de residência temporária” (1.17), exortando que eles,
“como estrangeiros e residentes temporários, vos abstenhais dos desejos
carnais que guerreiam contra vós” (2.11).68 Porque eles são povo de Deus
que foi chamado a ser santo servindo a um Deus santo, e porque sua estada
no mundo é meramente temporária, os fiéis devem ser bons cidadãos deste
mundo sem comprometer sua pureza e integridade.
O status dos fiéis como povo redimido de Deus traz consigo certas
expectativas com relação ao que significa ser o povo de Deus. Como filhos
obedientes, eles devem ser santos porque Deus é santo (1.12,13). Eles
devem se portar de forma honrosa no mundo, se envolvendo em boas obras,
o que também envolve submissão a toda instituição humana. Eles devem
ser bons cidadãos (2.13-17), cumprir seus papéis na família (3.1-7),
humildemente amar uns aos outros (3.8), e estar dispostos a sofrer por causa

1515
da justiça (4.16), lançando todo cuidado sobre Deus (5.6,7) enquanto
resistem ao Diabo (5.9).

Tabela 18.3: Submissão às Autoridades em 1Pedro (Hypotassō)


Autoridade à qual se deve Outras Referências no AT
1Pedro
sujeição e NT
2.13 Autoridades governamentais Rm 13.1,5; Tt 3.1
(instituídas por Deus)
2.18 Autoridades no trabalho Tt 2:9; veja Ef 6.5-9
(mesmo as cruéis)
3.1 Maridos (mesmo os infiéis) Ef 5.21,24; Cl 3.18; Tt 2.5
3.5 Exemplo: Sarah e mulheres Gn 18.12
santas no AT
3.22 Espíritos do mundo sujeitos 1Co 15.27,28; Ef 1.22; Fp
a Jesus Cristo 3.21
5.5 Jovens [e outros] sujeitos aos 1Co 16.16; veja Hb 13.17
mais velhos

Importante, a referência aos fiéis como “residentes temporários” tem


um forte elemento escatológico. Sua suprema salvação pessoal está
protegida, “pronta para ser revelada no último tempo” (1.5; veja 1.20), e
Jesus é o supremo pastor de suas almas (2.25). A salvação dos fiéis será
plenamente alcançada quando Cristo retornar, e todas as suas esperanças
devem estar focadas nele (1.13; veja 4.7). Aqueles que sofrem deve
perceber que Deus chamará os perpetradores de injustiça e perseguição para
prestar contas no fim dos tempos (4.5).
Com relação ao testemunho dos fiéis no mundo, Pedro estava
preocupado que seus leitores não se rendessem às pressões da sociedade
para que eles se conformassem aos costumes e normas. Ao mesmo tempo

1516
ele queria que os cristãos não se opusessem às autoridades civis, incluindo o
imperador, de forma desnecessária. Antes, eles deveriam silenciar aqueles
que os caluniavam sendo bons cidadãos. Pedro explicou desta forma:
“Honrai a todos. Amai os irmãos. Temei a Deus. Honrai o imperador”
(2.17). Assim, Pedro não queria que seus leitores se retirassem do mundo,
mas que se engajassem nele em testemunho ativo. Pedro disse aos cristãos:
“Reverenciai o Messias com Senhor em vossos corações, e estejais sempre
prontos a dar uma explicação a qualquer um que vos perguntar a razão da
esperança que há em vós” (3.15).69 Isso requer uma compreensão
particularmente cristã de Deus, da identidade dos fiéis, do mundo, e do
adversário supremo, Satanás.

Deus, o Pai, e o Senhor Jesus Cristo


A teologia de Pedro também focou diretamente em Deus o Pai, que
alcançou seus propósitos salvíficos em e por meio de Jesus Cristo. Ainda
assim, a teologia de Pedro não se desdobra de forma abstrata; pelo
contrário, ela é completamente baseada no contexto do sofrimento dos fiéis
e em sua necessidade de conforto e encorajamento pastoral. Para esse fim,
Pedro apresentou tanto Deus o Pai quanto o Senhor Jesus Cristo em uma
variedade de formas que foram profundamente relevantes para os
pressionados fiéis. A primeira referência indireta a Deus é a ele como
aquele que escolhe fiéis neste mundo (1.1). Pedro descreveu Deus, o Pai,
como o Deus soberano que não apenas salvou, mas também protegeu,
restaurou e permitiu sofrimento por seus próprios propósitos (1.5; veja
5.12). Deus também era aquele que traria justiça ao oprimido como o juiz
dos vivos e mortos (4.5) e em quem os fiéis deveriam confiar, eles mesmos,

1517
como o fiel Criador (4.19). Sua mão é poderosa; ele exalta o humilde
enquanto resiste ao orgulhoso; ele cuida dos fiéis (5.6,7). Além disso, “o
Deus de toda graça, que vos chamou para sua eterna glória em Jesus Cristo,
pessoalmente vos restaurará, estabelecerá, fortalecerá e suportará depois de
terdes sofrido um pouco” (5.10,11).
Pedro retratou Cristo como escolhido por Deus antes da fundação do
mundo (1.20) a fim de redimir os seres humanos com seu precioso sangue
(1.18,19; veja 1.2). Ele era o Servo Sofredor de Isaías, que não só havia
morrido pelos pecados dos fiéis, mas que tinha dado o exemplo pela
maneira como ele respondeu ao sofrimento e perseguição (2.21-25). Na
verdade, Pedro deixou claro que Jesus se encaixava no retrato pintado pelo
profeta Isaías em um midrash (comentário) completo de Isaías 53:

Ele não cometeu pecado, e nenhum engano foi encontrado em sua boca [Is 53.9]; quando
injuriado, não injuriou de volta; quando sofrendo, Ele não ameaçou, mas se comprometeu
com Aquele que julga justamente. Ele mesmo levou o nosso pecado em seu corpo sobre a
árvore, de modo que, tendo morrido para os pecados, pudéssemos viver para a justiça; por
suas feridas fostes curados [Is 53.5]. Porque vós eréis como ovelhas desviadas [Is 53.6], mas
agora retornastes para o pastor e guardião de vossas almas (2.22-25; veja também 3.18).

Notavelmente, nesta passagem, o foco principal de Pedro não é que


Jesus morreu na cruz pelos pecados dos fiéis, mas a forma que que Jesus
sofreu, isto é, como um exemplo de sofrimento.70
Em sua submissão à vontade de Deus ao sofrer, ele forneceu um
poderoso padrão para os fiéis que foram ordenados por Pedro a andar nos
passos de Jesus neste aspecto (2.21). Este é um bom exemplo de como a
teologia do NT em geral, e a teologia de Pedro em particular, não foi dada
no abstrato, mas falada em um contexto específico que foi projetado para
ser pastoralmente relevante para os destinatários de uma determinada
instrução.

1518
A proclamação de Cristo aos espíritos em prisão
(1Pe 3.19-22)
Pedro contribui para a teologia do NT com um item bastante curioso, a
saber, a descida de Cristo ao Hades (3.18-22). Essa passagem é única no
NT; não está clara qual foi a fonte de Pedro para essa informação. Como
mencionado acima, há (pelo menos) quatro pontos de vista principais, com
muitas variações adicionais, sobre aonde Jesus foi, quando ele foi lá, a
quem ele fez a proclamação, e assim por diante. Para explorar a passagem
em seu contexto imediato, duas importantes observações devem ser feitas.
Em primeiro lugar, parece muito provável que a sequência de eventos
descrita na passagem segue uma ordem cronológica de apresentação, isto é,
Pedro foi (1) da crucificação de Cristo (v. 18) à sua ressurreição (v. 19) e à
sua ascensão (v. 22; veja mais abaixo). Se assim for, a elaboração relativa à
proclamação feita aos espíritos em prisão nos versos 19-21 cai no ínterim
entre a ressurreição de Cristo e a sua ascensão. Isso resolveria a questão
quanto ao tempo em que Jesus foi fazer proclamação: ela foi posterior à
ressurreição, mas antes da ascensão.
Em segundo lugar, qual é o objetivo principal de Pedro ao incluir
especificamente essa passagem nessa carta? Como esta passagem é
relevante para seus leitores, e o que a sua inclusão pretende alcançar?
Provavelmente a resposta é que, como esses crentes enfrentavam
sofrimento contínuo em suas vidas, Pedro procurou encorajá-los de que
Jesus já havia feito a proclamação de sua vitória sobre a morte, o pecado e o
Diabo para os “espíritos em prisão”. Satanás era um inimigo derrotado, e
seus ajudantes sabiam disso porque o Cristo ressuscitado lhes tinha
anunciado. Se esse era o propósito de Pedro, ele foi consistente com os seus
esforços nesta carta de colocar o sofrimento cristão numa perspectiva

1519
escatológica. Assim como Jesus foi vindicado por Deus, assim também os
crentes seriam vindicados se persistissem no sofrimento como Cristo.
Isso ainda deixa várias outras perguntas. Primeiro, a quem e aonde Jesus
foi? Muito provavelmente, os “espíritos” eram demônios (os seres angélicos
são o referente dos “espíritos” na vasta maioria dos exemplos nas
Escrituras), mas não apenas quaisquer demônios. Eles eram
especificamente aqueles demônios que estavam em prisão (veja 2Pe 2.4:
“jogou-os no Tártaro”; tartaroō) porque tinham sido “desobedientes […]
nos dias de Noé” (1Pe 3.20) antes do Dilúvio. O provável contexto aqui é
Gênesis 6.1-6, onde é dito que antes do Dilúvio os “filhos de Deus”
(provavelmente anjos caídos) foram e casaram com mulheres e tiveram
filhos com elas (Gn 6.4). Procriar com anjos caídos foi um pecado humano
tão grave que desencadeou a destruição universal da terra por uma
inundação mundial, o que explicaria, pelo menos até certo ponto, por que
esses demônios em particular eram os destinatários da proclamação de
Jesus de sua vitória após sua ressurreição.
Segundo, onde estavam esses demônios? De acordo com 1Pedro 3.19,
eles estavam “em prisão”; isto é, eles estavam sendo mantidos para
julgamento divino. Judas também declarou que Deus “manteve, com
cadeias eternas na escuridão para o julgamento do grande dia, anjos que não
mantiveram sua própria posição, mas abandonaram a sua própria morada”
(v. 6). Tudo isso faz parte do ensino do NT de que a vitória de Jesus na cruz
teve ramificações importantes não só no reino humano, mas também no
angélico. Paulo explicou que quando Cristo morreu na cruz, Deus
“desarmou os governantes e autoridades e os desonrou publicamente; Ele
triunfou sobre eles por Ele” (Cl 2.15). A interpretação que surge como a
melhor compreensão contextual é que Jesus, depois da ressurreição, foi

1520
àqueles demônios mantidos em confinamento que haviam procriado com as
mulheres nos dias de Noé antes do Dilúvio e proclamou para eles seu
triunfo sobre a morte e o Diabo.71

2PEDRO

HISTÓRIA
Autor
Hoje, acredita-se amplamente que 2Pedro é um pseudônimo. R. Brown
declarou: “Na verdade, o pseudonimato de 2Pedro é mais certo do que
qualquer outra obra do NT”.72 Mesmo muitos daqueles que acreditam que
Pedro escreveu 1Pedro têm dificuldade com 2Pedro.73 Ao contrário de
1Pedro, essa opinião não é completamente um fenômeno recente. Embora
não haja registro de uma negação explícita da autenticidade de 2Pedro na
igreja primitiva, muitos notaram as dificuldades que outros tiveram com
ela. Nos tempos modernos, a carta é amplamente julgada inautêntica por
pelo menos três razões: (1) a evidência externa para a autoria petrina é
muito pequena; (2) estilisticamente, a carta é muito diferente de 1Pedro; e
(3) supostos problemas históricos e doutrinários. Cada uma dessas será
examinada.

Evidência externa
De todos os livros no NT, 2Pedro tem a menor quantidade de dados
externos sobre a autoria. Afirma-se frequentemente que os comentários de
Orígenes (c. 185-254) são as referências existentes mais antigas

1521
reivindicando a autoria petrina de 2Pedro. Embora Orígenes tenha escrito
tarde, ele não hesitou em atribuir 2Pedro ao apóstolo Pedro, o que implica a
antiguidade, e foi bastante confiante para citá-lo sem comentário. Eusébio
(c. 260-340) incluiu a carta na sua lista de livros disputados (mas não
espúrios) e deixou claro que a maioria das igrejas em seus dias aceitou o
livro.74 Jerônimo (c. 345-420) tanto afirmou a autoria de Pedro quanto
notou algumas dúvidas contemporâneas, afirmando que Pedro “escreveu
duas Epístolas que são chamadas Católicas, a segunda das quais, por causa
de suas diferenças da primeira em estilo, é considerada por muitos não ter
sido [escrita] por ele”.75 Depois da era de Jerônimo, as dúvidas sobre a
autoria petrina de 2Pedro desvaneceram-se até a era moderna. 76
Embora as citações que nomeiam Pedro como o autor de 2Pedro sejam
tardias e embora haja algumas dúvidas quanto à sua autenticidade, há boas
provas de que 2Pedro foi amplamente considerada autoritativa, o que em
muitos casos pode implicar crença na autoria de Pedro. Clemente de
Alexandria (c. 150-215) escreveu um comentário de 2Pedro, e ele aludiu a
2Pe 2.19 em uma carta ao Teodoro.77 Fortes ecos de 2Pedro podem ser
encontrados em Ireneu (c. 130-200)78 e Justino Mártir (c. 100-165). Além
disso, O Apocalipse de Pedro (c. 110) pode ser dependente de 2Pedro, o que
também sugeriria uma data antiga para 2Pedro.79 Isso empurra a data de
volta para o primeiro século, mas quão cedo?
Em 1Clemente, escrito por Clemente de Roma em aproximadamente 96,
há uma série de possíveis alusões e um conspícuo padrão de referências,
provavelmente indicando que Clemente estava familiarizado com 2Pedro.80
Então possíveis alusões a 2Pedro já existiam no primeiro século.
Assim, a evidência externa aponta para um documento antigo,
amplamente considerado como sendo de Pedro.81 Mas no período do século

1522
II ao IV, muitos tiveram dúvidas sobre a autenticidade de 2Pedro. Essas
dúvidas não parecem ter vindo de um trabalho que de repente apareceu em
cena, mas das diferenças estilísticas exibidas quando comparadas com a já
aceita carta de 1Pedro, especialmente porque havia uma série de
falsificações alegando ser de Pedro circulando na época.82 O fato de 2Pedro
ter sido reconhecida como canônica no fim certamente significa que ela se
destacou do restante.83 A evidência externa não é de forma alguma
incompatível com a autoria de Pedro.

Evidência interna
As diferenças estilísticas entre 1Pedro e 2Pedro constituíram o principal
problema que causou dúvidas sobre a autoria petrina de 2Pedro na igreja
primitiva. Além disso, 1Pedro é geralmente considerada como refletindo
84
um estilo de grego mais sofisticado que 2Pedro. Mas essas avaliações
negativas não levam em conta os diferentes estilos de grego disponíveis no
momento da escrita. T. Callan mostrou que 2Pedro foi escrita em um estilo
de grego que era aceitável para ele e seus leitores.85 No entanto, este estilo é
certamente diferente de 1Pedro, que foi escrita em um estilo mais
convencional.
Apesar dessas diferenças estilísticas, há muitas correspondências sutis
entre 1 e 2Pedro, tanto em pensamento quanto em vocabulário, que são
difíceis de explicar se um autor pseudepígrafo escreveu a carta. Em 2Pedro
1.1, o autor se referiu a “Simão Pedro” (Sumeōn Petros), uma frase que
ocorre em outro lugar do NT apenas em Atos 15.14 (lá, nos lábios de
Tiago). Em vez de constituir uma tentativa de imitar 1Pedro 1.1, uma
autorreferência de Pedro é mais provável.86 A saudação em 2Pedro 1.2 —

1523
“Que graça e paz vos sejam multiplicadas” — é um paralelo exato de
1Pedro 1.2. A palavra rara “bondade” é usada com referência a Deus tanto
em 1Pedro 2.9 quanto em 2Pedro 1.3. A combinação das palavras “sem
mácula ou mancha” é encontrada no NT somente em 1Pedro 1.19 e 2Pedro
3.14.87
Uma vez que é improvável que essas sutis coincidências na linguagem
sejam o resultado de uma imitação consciente, esses paralelos fornecem
evidências significativas para sugerir a autenticidade e autoria petrina de
2Pedro. Como Kruger afirmou, “acredita[r] que um autor fingindo ser
Pedro seria capaz de tecer uma teia literária tão intrincada e sutil é
certamente infundado”.88 A diferença de estilo pode ainda ser atribuída a
um amanuense (tese de Jerônimo). Essa era uma ocorrência tão comum que
descartá-la precipitadamente é injustificável. Também é possível que Pedro,
que deixou de ser pescador cerca de 30 anos antes de escrever 2Pedro,
tenha aprendido o estilo literário asiático para poder se comunicar
efetivamente com seus leitores.89
O terceiro e último argumento principal contra a autoria petrina de
2Pedro é que a situação da carta é posterior à vida de Pedro. No passado,
alguns acreditavam que o nosticismo era predominante na época em que
2Pedro foi escrita, negando assim a possibilidade de que Pedro escreveu a
carta,90 mas essa opinião foi completamente refutada.91 Não há evidência de
que os falsos mestres em 2Pedro sustentavam o característico dualismo
gnóstico ou que seu libertinismo fosse baseado em tal dualismo. Também
não há evidência de que seu ceticismo escatológico resultasse de uma
ênfase gnóstica na escatologia realizada. Além disso, 2Pedro não fornece
nenhuma sugestão de controvérsia em relação à ressurreição corporal, que
se revelou inaceitável para gnósticos. Por outro lado, a questão do atraso do

1524
retorno de Cristo, um tema importante em 2 Pedro, não estava em questão
no gnosticismo do século II. Assim, nada do que se sabe sobre os
adversários de 2Pedro requer uma data após a vida de Pedro.
Nessas mesmas linhas, muitas vezes se argumenta que a referência às
cartas de Paulo em 3.15,16 admite um corpus de cartas reconhecido, que
não teria existido na época da morte de Pedro. Mas a frase “em todas as
suas cartas” (3.16) não necessariamente indica um corpus completo; ela só
tem de se referir a algumas cartas conhecidas por Pedro na época. Pelo
contrário, a afirmação em 3.16,17 é inexplicável para um autor
pseudepígrafo. Pedro chamou Paulo de “irmão querido”, o que é
perfeitamente natural para um apóstolo, mas não para a linguagem do
século II. Além disso, é inexplicável que um autor pseudepígrafo jamais
atribuiria a lentidão para compreender Pedro como 2Pedro 3.16 faz: “Nas
quais há algumas coisas que são difíceis de entender” (3.16). Assim, a
92
passagem não aponta para um tempo após a morte de Pedro.
Também é frequentemente afirmado que 3.4 (“Porque desde que os pais
dormiram”) é uma referência à morte dos discípulos originais de Jesus.93
Mas a referência mais provável é aos fiéis da antiga aliança. De fato, o
atraso da Segunda Vinda não era tanto um problema para a igreja no século
II como era nos dias dos apóstolos. O problema mencionado aqui é mais
uma prova de um ambiente apostólico.94
A objeção mais comum à autoria de Pedro é o uso de Judas em 2Pedro
2. A opinião da maioria é que Pedro usou Judas como fonte e que Judas foi
escrita no início da era cristã.95 Assim, certamente havia tempo suficiente
para Judas ter sido escrita e para Pedro usá-la durante a vida do apóstolo.
No entanto, alguns consideram impensável que Pedro, um apóstolo, se
basearia no trabalho de um não apóstolo, embora seja menos claro que o

1525
próprio Pedro tenha enxergado as coisas dessa forma (p. ex., em 1Pe 5.1,
ele se chamou humildemente de “um companheiro presbítero”). Por outro
lado, se 2Pedro não era de Pedro, como se explica um falsificador que não
estava disposto a se basear em 1Pedro (embora ele estivesse certamente
ciente da carta, veja 2Pe 3.1) enquanto se baseava pesadamente em Judas?96
Nenhum desses argumentos é decisivo a favor da pseudepigrafia. De
fato, várias considerações tornam improvável que um falsificador, ao longo
das linhas da herética literatura pseudepigráfica do século II, tenha
produzido 2Pedro. Há, porém, uma via media (um caminho do meio) entre
afirmar a autoria de Pedro e atribuir a autoria de 2Pedro a um autor
pseudepígrafo desconhecido? R. Bauckham postulou que 2Pedro deveria
ser datada do final do primeiro século como escrita por um conhecido de
Pedro que escreveu o “último testamento” do apóstolo. Ele argumentou que
a carta representa uma forma de literatura testamentária, planejada para uma
audiência específica (assim uma carta real). Ele também acreditava que a
data e gênero testamentário “são inteiramente conclusivos contra a autoria
petrina”.97 Tomar o nome de Pedro “não é um meio fraudulento de
reivindicar a autoridade apostólica, mas encarna uma pretensão de ser um
fiel mediador da mensagem apostólica”.98 Assim, não há nenhuma tentativa
de enganar, pois o nome é simplesmente uma convenção do gênero, uma
“ficção transparente”99 que os cristãos gregos nos séculos subsequentes não
conseguiram reconhecer. Se assim for, aqueles que se apegam à autoria
petrina de 2Pedro nos séculos anteriores, bem como hoje cairiam na mesma
categoria, pois eles leem um documento que exibe uma prática cultural
antiga, ignorando essa prática.100
T. Schreiner apresentou três críticas convincentes da teoria de
Bauckham. Primeiro, há uma falta de consciência histórica do dispositivo

1526
pseudepigráfico historicamente. A igreja primitiva rejeitou ou recebeu a
carta com base na crença de que ela era ou não de Pedro.101
Poderia a consciência de que era “ficção transparente” realmente tinha
passado tão rapidamente? Segundo, a teoria de Bauckham é que os judeus
teriam prontamente reconhecido o dispositivo. Mas, curiosamente, não há
evidência de que a carta tenha sido escrita a judeus; os gentios são o
destinatário mais provável.102 É também discutível se todos os mencionados
na despedida são necessariamente ficcionais; Moisés, Jacó, Davi, Jesus e
Paulo, entre outros, todos fizeram discursos de despedida, mas esses todos
são ficcionais? Além disso, nem um único exemplar incontestável da
literatura testamentária foi jamais reconhecido como Escritura. Finalmente,
é duvidoso que 2Pedro se adeque à categoria testamentária.103 Assim, o
esforço para manter a aceitabilidade do pseudonimato postulando que
2Pedro é um exemplo do gênero testamentário não é convincente.
Uma última consideração permanece. M. Green observou que a maioria
da literatura pseudepigráfica promoveu o ensino herético, preencheu
lacunas históricas, representou o exercício criativo da imaginação do autor,
ou respondeu às “perguntas insaciáveis” de outra geração.104 Segunda Pedro
decisivamente não é sobre nenhuma dessas coisas. Green concluiu: “Como
um pseudepígrafo [2Pedro] não tem uma raison d’être satisfatória [razão
105
para a sua existência]”. A ausência de um propósito satisfatório para
2Pedro como um documento pseudepigráfico tardio é ainda mais uma razão
que dá pausa para abraçar qualquer uma das alternativas à autoria de Pedro.
Em suma, as opções para a autoria de Pedro são que 2Pedro foi
produzida por um autor pseudepígrafo desconhecido após a vida de Pedro
(talvez como o “último testamento” de Pedro) ou que a carta foi escrita pelo
apóstolo Pedro, muito provavelmente pouco antes de sua morte. À luz das

1527
dificuldades associadas ao primeiro argumento; à luz da ausência de provas
externas ou internas convincentes contra a autoria de Pedro; e em face das
conexões convincentes entre 1 e 2Pedro mencionadas acima, a visão de que
o apóstolo Pedro escreveu 2Pedro é preferível às opções alternativas.106

Data
A poucos livros são atribuídas datas tão diversas como 2Pedro. Aqueles que
acham os argumentos para a pseudepigrafia convincentes colocam 2Pedro
tão tarde quanto meados do século II. Se 2Pedro é do apóstolo, então deve
ter sido escrita tarde em sua vida. Uma vez que 2Pedro provavelmente vem
da pena do apóstolo, e à luz da referência à sua morte iminente em 2Pedro
1.14,15, deve ser colocada perto do fim da vida do apóstolo. A tradição da
igreja afirma que Pedro morreu durante a perseguição neroniana (64-66;
107 108
veja 1Clem. 5.4). A melhor data para a morte de Pedro é 65 ou 66.
Assim, a carta foi escrita muito provavelmente logo antes do martírio de
Pedro.

Origem
Segunda Pedro não faz menção a um lugar de origem, mas se as discussões
sobre a autoria e a provável data da composição de 2Pedro estão corretas, o
mais plausível lugar de escrita é Roma. Se 1Pedro é autêntica e foi escrita
por Pedro em Roma (“Babilônia”; 1Pe 5.13) no início ou meados dos anos
60, e se 2Pedro é autêntica e também foi escrita por Pedro, ela deve ter sido
escrita alguns anos depois de 1Pedro e, portanto, provavelmente se originou
na capital do Império também. Alguns tentaram julgar as origens da carta
baseados em evidências linguísticas, mas essas tentativas não são

1528
convincentes.109 As pessoas podem exibir vários tipos de traços linguísticos
em miríades de lugares, o que torna determinante um lugar de escrita com
base no uso linguístico precário.110 Roma continua sendo, de longe, a
melhor opção para a proveniência da carta.

Destino
Ao contrário de 1Pedro, a segunda carta não menciona seus destinatários.
No entanto, duas pistas nos ajudam a identificar o seu destino. Uma vez que
esta foi a segunda carta que Pedro escreveu a este público (2Pe 3.1), e uma
vez que ele mostrou conhecimento das cartas de Paulo (2Pe 3.15), parece
razoável inferir que o destino de 2Pedro era o mesmo que o de 1Pedro (veja
1Pe 1.1).
Além disso, o uso do estilo Grande Estilo Asiático da carta sugere que o
autor escreveu a leitores que apreciariam este estilo de escrita. Esse seria o
caso na parte oriental do Império (mas não a ocidental), embora não no
limite oriental do Mediterrâneo.111 No geral, a evidência aponta para os
mesmos destinatários de 1Pedro, cristãos gentios na Ásia Menor.

Motivo e Propósito
O motivo para escrever 2Pedro foi, provavelmente, que o apóstolo estava
perto de sua morte (1.15) e precisava abordar um falso ensino que estava
circulando nas igrejas para as quais ele escreveu (2.1-22). Assim, em
3.17,18, Pedro advertiu seus leitores a que “estejais em guarda, para que
não sejais levados pelo erro do imoral e caiais da vossa própria estabilidade.
Mas crescei na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador Jesus
Cristo”.

1529
Os adversários em 2Pedro aparentemente se consideravam mestres
cristãos, e não necessariamente profetas (2.1,13), embora Pedro os
agrupasse com os falsos profetas da antiguidade. Eles reuniram discípulos
(2.2) e tentaram atrair verdadeiros fiéis para a sua esfera de influência. No
cerne do seu ensino parece ter estado o ceticismo escatológico.112 Esses
falsos mestres aparentemente negavam a Segunda Vinda e procuravam
minar o testemunho apostólico (veja 1.16; 2.18,19; 3.4). A negação de
Pedro de que os apóstolos “seguiram fábulas engenhosas quando lhes
fizemos conhecer o poder e a vinda de nosso Senhor Jesus Cristo” (1.16)
parece responder à acusação feita por seus oponentes de que o ensino de
ressurreição dos apóstolos era meramente uma questão de fabricação
humana (para uma ocorrência semelhante, veja 2Tm 2.17,18; 1Tm 1.20;
2Tm 4.14).
Além disso, o ceticismo escatológico dos oponentes duvidava de
qualquer tipo de retribuição divina. O mundo, segundo eles, permaneceria
sempre como tinha sido (3.4); daí, prometiam a liberdade (2.19), expressa
no cumprimento da carne (2.13; veja 2.10,14). Nisso eles podem ter usado
as cartas de Paulo como fundamento para seu erro, já que Pedro observou
que “os inclutos e ignorantes distorcem [as cartas de Paulo] para sua própria
destruição” (3.16).113 Finalmente, parece haver um forte elemento de
ganância como motivação para o seu ministério (2.14-16).
Muitos tentaram conectar os adversários em 2Pedro à filosofia
gnóstica,114 mas isso parece improvável, já que a data da carta é anterior ao
gnosticismo pleno que não emergiu até o século II e à luz do caráter dos
oponentes. Os paralelos com a filosofia epicurista são bastante fortes, e
muitos a sugeriram como a fonte dos oponentes de Pedro.115 Mas Schreiner

1530
provavelmente está correto ao duvidar da completa identificação dos
116
oponentes com a filosofia epicurista.
É melhor enxergar os adversários como advogando uma filosofia não
atestada no NT ou na literatura extrabíblica, semelhante à “heresia de
Colossos”, que era igualmente única em sua expressão local. Se assim for, é
melhor reconstruir o falso ensino com base na evidência interna, o que
sugere que a filosofia dos oponentes, desde o início, impedia Deus de
intervir no mundo a qualquer momento (3.3,4), seja enviando uma
inundação (assim, negando a veracidade das Escrituras do AT; veja Gn 6 a
9) ou por Jesus voltar no fim dos tempos (uma negação das próprias
palavras de Jesus e do testemunho da igreja apostólica e primitiva).

Algo Para Pensar: Cultivando Virtudes Cristãs

Pedro não escreveu sua segunda carta para contar a seus leitores
algo novo, algo que eles ainda não sabiam. Em vez disso, ele
escreveu para lembrá-los de coisas que já sabiam (3.1). Nisso o
público de Pedro era como muitos de nós que basicamente sabem o
que que deveram estar fazendo em nossas vidas cristãs, mas que
precisam de lembretes ocasionais (ou frequentes) para nos ajudar a
permanecer no curso ou voltar ao caminho.
Mais distintiva é a “escadaria das virtudes cristãs” que Pedro
listou no capítulo inicial de sua carta. Depois de garantir a seus
leitores que Deus lhes tinha dado tudo o que eles precisavam para
viver uma vida piedosa, incluindo suas “promessas muito grandes e

1531
preciosas” (1.4), ele instou seus leitores a complementarem sua fé
com:
bondade;
bondade com conhecimento;
conhecimento com autocontrole;
autocontrole com perseverança;
perseverança com piedade;
piedade com afeição fraternal; e
afeição fraternal com amor (1.5-7).
Não parece haver motivo necessário para a ordem dessas
virtudes como se nós precisássemos cultivar um antes de progredir
para o próximo, exceto que provavelmente não é coincidência que o
amor é a virtude primária assim como em outras listas semelhantes
(veja 1Co 13.13; Gl 5.22,23). Enquanto muitas dessas virtudes são a
medida padrão e são encontradas também nos escritos de Paulo (p.
ex., bondade e autocontrole estão em Gl 5.22,23), uma palavra
chama nossa atenção: “Piedade” (eusebeia). Essa palavra ocorre
três vezes em 2Pedro 1 (v. 3,6,7) e uma vez em 3.11, que são quatro
de 15 ocorrências no NT (veja At 3.12; 1Tm 2.2; 3.16; 4.7,8;
6.3,5,6,11; 2Tm 3.5; Tt 1.1). As formas relacionadas ocorrem sete
vezes no NT: o verbo eusebeō (At 17.23; 1Tm 5.4); o adjetivo
eusebēs (At 10.2,7; 2Pe 2.9); e o advérbio eusebōs (2Tm 3.12; Tt
2.12). Curiosamente, portanto, o grupo de palavras ocorre apenas
em Atos, nas Epístolas Pastorais e em 2 Pedro.
O que isso significa, muito provavelmente, é que eusebeia era um
termo usado no amplo mundo greco-romano romano do primeiro
século, denotando a piedade ou a devoção religiosa de uma pessoa,

1532
embora não necessariamente em um sentido cristão. Inicialmente, os
cristãos podem ter relutado em incorporar este termo em seu
vocabulário, mas em algum momento eles aparentemente decidiram
cristianizá-lo. Assim, em Atos 10, encontramos a palavra que
caracteriza o centurião gentio Cornélio (10.2) e um de seus devotos
soldados (10.7).
Assim, é somente nas Pastorais e 2Pedro que os crentes são
instados a “viver de forma pacífica […] vidas em toda piedade e
santidade” (1Tm 2.2); e que Timóteo é exortado: “treina-te para ser
piedoso”, pois “a piedade tem valor para todas as coisas” (1Tm
4.7,8; veja 1Tm 6.11), enquanto os falsos mestres são escusados por
sua falta de verdadeira piedade (1Tm 6.5; 2Tm 3.5). Em Tito 1.1,
Paulo expressou sua convicção de que o conhecimento da verdade
leva à piedade. Pedro disse aos seus leitores para se envolverem em
santa conduta e piedade à luz da Segunda Vinda (2Pe 3:11).
Portanto, não há nada de errado com os cristãos cultivarem
virtudes cristãs. Pelo contrário, isso é fortemente encorajado, desde
que se lembrem de que a sua busca pela piedade não deve ser feita
em esforço próprio. Engajar-se em disciplinas espirituais tais como o
estudo regular e a meditação sobre a Palavra de Deus (Cl 3.16; 2Tm
3.14-17) ou oração contínua (1Ts 5.17; Fp 4.6,7) é realmente vital.
No entanto, como Pedro nos lembrou, o poder divino nos deu tudo o
que é necessário para viver uma vida piedosa (1.3), então o poder de
avançar nas virtudes cristãs não vem de nós mesmos, mas de Deus.

LITERATURA

1533
Plano Literário
A unidade de 2Pedro não é seriamente questionada.117 Alguns argumentam
que a carta é paralela a convenções retóricas greco-romanas, mas isso está
longe de ser comprovado.118 Em geral, 2Pedro se conforma às convenções
epistolares padrão da época, apresentando saudação (1.1,2), o corpo da
carta (1.3 a 3.13) e observações finais (3.14-18). Há grande consenso de
que 2.1-22 e 3.1-13 constituem unidades literárias. Há menos concordância
com relação ao material do cap. 1. T. Schreiner dividiu a carta em 1.12,
119
enquanto D. Moo discerniu uma ruptura em 1.16. Muito provavelmente,
ambos estão corretos, como a estrutura seguinte indica. As seções são 1.3-
11; 1.12-15 e 1.16-21.120
Segunda Pedro 1.3-21 estabelece o desafio de Pedro aos seus leitores
para que persigam virtudes cristãs à luz da provisão divina de tudo o que é
necessário para a vida e a piedade (1.3-11), afirma o propósito de Pedro ao
escrever a carta (1.12-15), e faz uma defesa e contra-ataca as alegações dos
falsos mestres sobre a pregação de Pedro sobre a parúsia (1.12-21).
Conforme desenvolvido na discussão de Judas, o capítulo 2 incorpora de
forma modificada grandes porções de Judas, enquanto 3.1-13 apresenta as
especificidades da heresia em questão e chama os leitores à santa conduta e
piedade enquanto esperam o retorno do Senhor. Em geral, a carta equilibra
a preocupação de Pedro com a busca dos crentes pelas virtudes cristãs com
seu desejo de refutar o falso ensino que negava a realidade da Segunda
Vinda.
A importante conexão entre o foco de Pedro na santidade e o falso
ensino que ele estava combatendo não deve ser desperdiçada.
Aparentemente, a negação da Segunda Vinda levou diretamente ao
antinomianismo e ao comportamento licencioso. Isso é confirmado nas

1534
referências ao julgamento dos anjos, aqueles nos dias de Noé, e Sodoma e
Gomorra (2:4-9), assegurando aos leitores que Deus responsabilizará as
pessoas por suas ações. Assim, o exemplo dos falsos mestres — cuja falta
de ortodoxia doutrinária levou à negação da Segunda Vinda, resultando em
um estilo de vida imoral — ensinou a importante lição de que os fiéis que
afirmam a Segunda Vinda devem cultivar santidade enquanto eles
aguardam o retorno de Cristo.

1535
ESTRUTURA
I. Saudação (1.1,2)

II. Incentivo ao crescimento na piedade (1.3-21)


A. A busca das virtudes cristãs (1.3-11)
B. A natureza da carta de Pedro (1.12-15)
C. Defesa do testemunho de Pedro e dos profetas (1.16-21)

III. Condenação dos falsos mestres (2.1-22)


A. O perigo e a natureza dos falsos mestres (2.1-3)
B. O julgamento de Deus no passado (2.4-10a)
C. O caráter ímpio dos falsos mestres (2.10b-16)
D. Os falsos mestres descritos (2.17-22)

IV. Refutação e resposta aos falsos mestres (3.1-13)

V. Encerramento (3.14-18)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Saudação (1.1,2)
Segunda Pedro inicia com um prescrito padrão encontrado em cartas do
primeiro século, incluindo um “desejo de bem-estar” de natureza espiritual:
“Que a graça e a paz vos sejam multiplicadas por meio do conhecimento de
Deus e de Jesus nosso Senhor” (1.2). A dupla referência a “graça” e

1536
“conhecimento” também conclui a carta, possivelmente formando um
inclusio literário (3.18).121

II. Incentivo ao Crescimento na Piedade (1.3-21)


A. A busca das virtudes cristãs (1.3-11)
Pedro fez o “desejo de bem-estar” anterior porque Cristo deu aos crentes
tudo o que eles precisam para a vida eterna e a piedade através do seu
conhecimento dele e através da eleição que Deus faz dos fiéis, tendo os
chamado por sua própria glória e bondade. Em virtude desse chamado, o
cristão participa da natureza divina e é capaz de escapar da corrupção
trazida por desejos malignos.
A lista que se segue não é um mero moralismo, pois Pedro já enfatizou
que a fundação que permite que o esforço seja efetivamente estendido foi
posta na salvação, aqui representada pela palavra fé. Nessa fé, o crente deve
fornecer certas coisas. O verbo traduzido por “fornecer” ou “adicionar”
(epichoregeō) geralmente significa fornecer à própria custa, mas aqui é um
verbo de ligação, como se alguém fizesse um esforço ao ganhar bondade
122
para obter um suprimento de fé, e assim por diante.
Pedro seguiu esse encorajamento para buscar virtudes cristãs com
referências aos resultados negativos e positivos de tal efeito. Se uma pessoa
não se envolvia na busca das virtudes cristãs, aquela pessoa era míope até à
cegueira. Se ele buscasse, seria recompensado com uma rica entrada no
reino de Deus na aparição do Senhor Jesus Cristo (1.8-11).

B. A natureza da carta de Pedro (1.12-15)

1537
Em 1.12-15, Pedro afirmou o propósito de sua carta, ou seja, lembrar aos
crentes de importantes verdades espirituais, presumivelmente por causa da
ameaça dos falsos mestres, a natureza exata de cujo ensino não é
especificado até o capítulo 3. Pedro escreveu o que acabou por ser sua carta
final existente porque ele estava convencido de que sua morte era iminente
e porque ele estava seguro de que estava falando a verdade (1.14; veja
1.12). O versículo 15 especifica os futuros benefícios da carta para os
leitores.

C. Defesa do testemunho de Pedro e dos profetas


(1.16-21)
A razão pela qual Pedro fez esse esforço para lembrar seus leitores de sua
necessidade de buscar virtudes cristãs era que ele e seus companheiros
apóstolos eram testemunhas oculares da majestade de Cristo (1.16-18), de
modo que a palavra profética sobre a vinda de Cristo foi fortemente
confirmada (1.19). Pedro, então, afirmou que tanto a origem da profecia
quanto à sua interpretação veio do próprio Deus (1.20,21). Isso representava
uma advertência velada para alertar aqueles que se envolveram em sua
própria “interpretação particular” da Escritura, resultando em falso ensino
(o assunto dos caps. 2 e 3).

III. Condenação dos Falsos Mestres (2.1-22)


Pedro provavelmente incorporou quase toda a carta de Judas em sua
condenação dos falsos mestres.123 Assim, a condenação era aplicável aos
atuais oponentes, mas além disso, a todos os falsos mestres. Não seria até o
capítulo 3 que a natureza precisa do falso ensino foi abordada.

1538
A. O perigo e a natureza dos falsos mestres (2.1-3)
Os falsos mestres eram tão inevitáveis quanto os falsos profetas de
antigamente. Eles eram claramente não regenerados e levavam outros à
destruição com eles, blasfemando a verdade por ganância e resultando na
inevitabilidade do julgamento de Deus.

B. O julgamento de Deus no passado (2.4-10a)


A razão pela qual o julgamento de Deus era inevitável é que Deus sempre
julgou falsos mestres e outros que não se submeteram adequadamente à
autoridade. Os anjos caídos foram condenados ao Tártaro e mantidos em
cadeias (2.4); as pessoas que viveram antes do Dilúvio e que se envolveram
em grave pecado foram destruídas; e Sodoma e Gomorra também foram
obliteradas (2.5,6). No meio dessa forte nota de denúncia, no entanto, Pedro
— em contraste com Judas, cujo retrato era inteiramente negativo (veja
mais abaixo) — também bateu numa tecla. Ele destacou que, embora Deus
tivesse destruído o mundo antigo por um dilúvio, ele tinha resgatado Noé e
sua família, e também resgatou Ló e sua família quando ele destruiu
Sodoma e Gomorra. Assim, pode-se contar com Deus não só para julgar os
injustos, mas também para salvar os justos do poluído estado espiritual do
mundo (2.7-10a).

C. O caráter ímpio dos falsos mestres (2.10b-16)


Em 2.10b, Pedro aprofundou-se no caráter ímpio desses falsos mestres. Eles
eram arrojados, arrogantes, profanos e caluniosos; eram como as bestas do
campo em suas blasfêmias e, portanto, adequados para a destruição (2.10b-

1539
12). Eles secretamente haviam se infiltrado o na congregação e poluído a
doutrina pura da igreja. Eles estavam sempre procurando seduzir e devorar
os justos. Pedro comparou-os a Balaão, que havia sido um profeta por lucro
(2.15,16).

D. Os falsos mestres descritos (2.17-22)


Pedro descreveu esses mestres como “fontes sem água”, que seduziam
aqueles que mal tinham escapado daqueles que viviam no erro. É tentador
compreendê-los como crentes que caíram da graça, pois o apóstolo afirmou
que teria sido melhor se nunca tivessem conhecido a verdade do que ter se
afastado do santo mandamento. O versículo 22, porém, deixa claro que eles
nunca foram verdadeiros fiéis, pois “um cão retorna ao seu próprio vômito
e, ‘uma porca, depois de lavar-se, se revolve na lama’” (2Pe 2.22, citando
Pv 26.11). Assim, a verdadeira natureza desses falsos mestres se torna clara:
sua natureza não regenerada tinha sido mascarada apenas externamente,
mas no final será deixado claro que eles nunca foram espiritualmente
transformados em primeiro lugar.124

IV. Refutação e Resposta aos Falsos Mestres (3.1-


13)
A natureza específica da heresia, já sugerida em 1.16, é agora levada
adiante e o erro dos falsos mestres é refutado. Esses zombadores negavam a
veracidade do ensino apostólico sobre a Segunda Vinda do Senhor Jesus
Cristo, alegando que “todas as coisas continuam como têm sido desde o
início da criação” (3.3,4). Em resposta, Pedro rejeitou firmemente este
ensinamento, observando que a premissa subjacente era errada. Contrário

1540
aos falsos mestres, o mundo não existirá sempre, pois Deus já o julgou uma
vez no passado com um Dilúvio (3.6) e vai destruí-lo novamente por fogo
no futuro (3.7).
Na verdade, do ponto de vista da eternidade, havia pouca diferença
entre um dia e mil anos. Além disso, o Senhor não estava atrasando seu
retorno, mas esperando pacientemente o último dos eleitos ser salvo; então,
o julgamento aconteceria rapidamente (3.8,9). Na verdade, o Dia do Senhor
viria sobre os ímpios sem aviso; os céus passariam e a Terra derreteria e
seria dissolvida. Assim os oponentes estavam errados com relação à
contínua existência da Terra. À luz do julgamento final do mundo, os
cristãos deveriam ser um povo santificado, esperando ansiosamente pela
promessa dos novos céus e da nova Terra (3.11-13).

V. Encerramento (3.14-18)
Pedro concluiu sua carta afirmando que os crentes deveriam ver o aparente
atraso da Segunda Vinda como uma oportunidade para a salvação. Para
confirmação, ele invocou as cartas de Paulo (embora não esteja claro se ele
tinha alguma passagem específica em mente). Ele concluiu com uma
advertência contra os falsos mestres e reiterou seu desejo de que seus
leitores “cresçam na graça e no conhecimento de nosso Senhor e Salvador
Jesus Cristo”, seguido por uma doxologia de encerramento.

TEOLOGIA
Temas Teológicos
A busca das virtudes cristãs à luz do tempo final

1541
O crescimento dos crentes nas virtudes cristãs é uma grande ênfase em
2Pedro. De acordo com Pedro, as pessoas podem viajar em um de dois
caminhos.125 O primeiro é o de progredir na fé, subindo uma escada de
virtudes cristãs que permitem que os crentes levem vidas espiritualmente
produtivas (1.3-11; veja 3.11-18). O segundo é o de se desviar do caminho,
resultando em destruição e condenação, como no caso dos falsos mestres
(2.1-3). Assim, a carta é permeada por uma preocupação pastoral com o
bem-estar do rebanho e sua proteção contra o potencial dano causado por
aqueles que torceriam a Palavra de Deus (1.12-21).126
O ensinamento de Pedro sobre a busca da virtude cristã é sintetizado
pela palavra piedade (eusebeia), que ocorre três vezes em 1.3-7 (v. 3,6,7;
veja 3.11). Pedro deixou claro que, por meio de seu conhecimento de Deus
em Cristo, os crentes receberam tudo de que necessitam para viver uma
vida piedosa (1.3). Por essa razão, eles devem perseguir a piedade em
conjunção com fé, bondade, conhecimento, autocontrole, persistência,
afeição fraterna e amor (1.5-7).127
O ensinamento de Pedro sobre a necessidade dos crentes de buscar
virtudes cristãs também tem importantes implicações para o tempo final. Os
falsos mestres desafiaram a crença de que Cristo voltará e que Deus trará
uma consumação à história. No entanto, Pedro afirmou que, apesar da
aparentes atrasos, o Senhor voltará no tempo determinado. Ele julgará todas
as pessoas, e os elementos deste mundo serão dissolvidos e derreterão
(3.12). Assim, os fiéis devem viver à luz do fim e seguir o caminho da
virtude cristã para chegar ao seu glorioso destino final (1.11). Deste modo,
o vindouro Dia do Senhor (3.12) fornece um incentivo para o
comportamento moral (3.14).128

1542
Por outro lado, o ceticismo escatológico dos falsos mestres provou que,
embora eles tenham se identificado com o cristianismo (2.1,20,21), eles
nunca tinham realmente experimentado a salvação (2.22). Suas palavras
ousadas e arrogantes, seu ataque à doutrina apostólica e sua falta de virtude
cristã os marcaram como aqueles adequados apenas para a destruição (2.3).
Novamente, como em outras passagens no NT (p. ex., 1Co 15.12; 2Ts
3.6,11; 2Tm 2.18), isso mostra que as deficiências na doutrina — no
presente caso, a escatologia — têm importantes ramificações práticas. A
crença correta, portanto, é um fundamento essencial para a prática
apropriada, e os cristãos devem viver à luz do retorno de Cristo.

Testemunho apostólico ocular versus heresia


Outra ênfase distinta em 2Pedro é a importância do testemunho apostólico
ocular contra a heresia com sua dependência do raciocínio humano e de
argumentos fabricados. Isso é corroborado pela presença de dois grupos de
palavras em particular em 2Pedro. O primeiro é representado pelo
substantivo “testemunha ocular” (epoptēs) em 1.16, que ocorre somente
aqui no NT, embora veja “testemunha ocular” (autoptēs) em Lucas 1.2; o
verbo “testemunhar” (epopteuō) ocorre somente em 1Pedro no NT (1Pe
2.12; 3.2). O segundo é representado pela palavra grega hairesis (a raiz
etimológica para a palavra em português heresia), que pode significar
“seita” ou “partido”, como saduceus (At 5.17); fariseus (At 15.5 e 26.5);
“Os Nazarenos” ou “o Caminho”, isto é, os cristãos (At 24.5,14; 28.22).
Também pode significar “facção” ou “divisão (1Co 11.19; Gl 5.20), ou
“heresia” (2Pe 2.1). A carta de Pedro gira em torno desse contraste entre o
testemunho de “testemunha ocular” e “heresias” destrutivas.

1543
Contra as alegações de seus oponentes, Pedro afirmou que ele (ao
contrário deles) não segue “fábulas elaboradas” em sua pregação da
Segunda Vinda; em vez disso, “nós fomos testemunhas oculares de sua
majestade” (1.16). Ele passou a relatar sua lembrança de seu testemunho
ocular da transfiguração de Jesus, que incluiu ouvir a voz divina vinda do
céu proferir as palavras: “Este é o meu Filho amado. Eu me deleito nele!”
(1.17,18; veja Mt 17.5 e paralelos). Isso significa que a mensagem de Pedro
era digna de crédito porque estava baseada no que realmente aconteceu (de
forma semelhante, 1Jo 1.1-4; veja 1Tm 1.4; 4.7; 2Tm 4.4; Tt 1.14), sendo,
portanto, contrária à mensagem dos falsos mestres que eles fabricavam e
que não se baseava em fatos reais (2.1-3; 3.4).
O ponto apresentado em 1.19-21 é, portanto, que o testemunho que
Pedro dá do Cristo glorificado formou uma base sólida para seu testemunho
da expectativa do retorno de Cristo em sua glória no fim dos tempos. Nisto,
o apóstolo era aliado dos profetas do AT, e em seu testemunho “a palavra
profética foi fortemente confirmada” (1.19). O testemunho dos profetas do
AT não havia sido autoinduzido, mas tinha sido dado por Deus e inspirado
pelo Espírito (1.20,21). Da mesma forma, o testemunho de Pedro foi
baseado no que Deus tinha feito, e estava por fazer, em Cristo. Isso enfatiza
a importância crucial de confiar nas Escrituras do AT e NT nas próprias
expectativas do fim, e no particular retorno de Cristo. Isso também inspira
confiança na exatidão e confiabilidade do testemunho apostólico
transmitido a nós nas Escrituras. Com base nessa segura fundação, os fiéis
podem zelosamente buscar as virtudes cristãs a fim de estar prontos para
Cristo quando ele voltar.

1544
FATOS-CHAVE DA CARTA DE JUDAS
Autor: Judas, irmão de Tiago
Data: c. 55-62
Origem: Desconhecida
Destino: Congregações predominantemente judaico-
cristãs (Ásia Menor?)
Motivo: Falso ensino (antinomianismo somado à
licensiosidade)
Propósito: Defender a fé uma de uma vez por todas
confiada aos fiéis
Tema: Judas exorta seus leitores a que defendam a
fé e rejeitem o falso ensino dos hereges
Versículo-Chave: 3

INTRODUÇÃO

Enquanto, algumas décadas atrás, Judas ainda poderia ser chamado de “o


livro mais negligenciado do Novo Testamento”, essa curta carta, colocada
no cânon por último entre as Epístolas Gerais e antes do livro do
129
Apocalipse, recebeu considerável atenção nos últimos anos. Na pregação
contemporânea, no entanto, Judas continua a sofrer negligência. À exceção
da frase a fé que foi entregue aos santos uma vez por todas” (v. 3), é apenas
a doxologia conclusiva (v. 24,25), ainda que sem referência ao seu contexto
em Judas, que é uma parte regular da adoração da igreja.
Numa época em que a fé cristã e a integridade moral são escassas, a
mensagem de Judas é particularmente apropriada. Com demasiada
frequência, as igrejas locais não conseguem confrontar falsos ensinamentos
ou não estão dispostas a desafiar confortos na forma como as pessoas

1545
vivem. Frequentemente, a tolerância é a ordem do dia, e a disciplina da
igreja está no fundo do poço. Nesse mal-estar, Judas fez um apelo para
defender a fé e confrontar o falso ensino, particularmente à luz da realidade
de um Deus santo que julgará o pecado a menos que seja reconhecido e
confessado.

HISTÓRIA
Autor
A carta começa com uma referência a “Judas, um escravo de Jesus Cristo, e
um irmão de Tiago” (1).130 Com toda a probabilidade, o autor de Judas é o
irmão do Tiago mencionado em Mateus 13.55. A autorreferência de
abertura de Judas como “irmão de”, em vez da habitual referência a si
mesmo como “filho de” seu pai, é incomum.131 No que diz respeito à
expressão “irmão de Tiago”, é digno de nota que apenas Tiago, o irmão de
Jesus, poderia ser mencionado simplesmente como “Tiago” (Tg 1.1) sem
necessidade de mais identificação. 132
Judas, portanto, começou de uma maneira que lembra o livro de
Tiago.133 Este era muito mais conhecido e não tinha necessidade de se
identificar mais, mas Judas dificilmente é mencionado em outros lugares e
precisava acrescentar o epíteto de “irmão de Tiago”.134 Além disso, Judas se
chamou somente “irmão de Tiago”,135 e não “irmão de Jesus Cristo”.136 Essa
última designação pode ter parecido inadequada à luz da filiação divina de
Jesus. Em vez de se identificarem em termos de sua relação de carne e
sangue com Cristo, Tiago e Judas se chamaram de “escravos de Jesus
Cristo”, que faziam a sua vontade.

1546
Não é incomum a visão de que a carta de Judas é pseudônima, que foi
escrita por alguém que não Judas e atribuída a ele por algum motivo.137 Essa
prática estava supostamente de acordo com a antiga convenção de
pseudonimato, segundo a qual uma obra literária era atribuída a uma
personalidade bem conhecida para lhe conferir credibilidade e aumentar seu
público potencial. No entanto, a pergunta óbvia é por que alguém teria
querido atribuir um escrito a uma pessoa tão pouco conhecida como Judas,
e não a outros discípulos que eram muito mais conhecidos.138
Por essa razão, não há nenhuma dúvida séria de que Judas, o irmão de
Tiago e meio-irmão de Jesus, é o autor do livro de Judas.

Data
A data de Judas depende em parte de sua relação com 1 e 2Pedro,
particularmente o último. Uma comparação entre a carta de Judas e 2Pedro
sugere que a carta de Judas foi escrita primeiro e que Pedro, em sua
segunda carta, adaptou Judas para seus próprios propósitos e
circunstâncias.139 À luz do número considerável de paralelos entre as cartas,
uma relação literária entre as duas é mais provável do que o uso
independente de uma fonte comum por ambos os escritores.
Uma comparação detalhada entre Judas e 2Pedro será fornecida mais
adiante. Por enquanto, a probabilidade de Judas ter sido escrita antes de
2Pedro pode ser ilustrada pela maneira como esses escritos usaram a
literatura apócrifa judaica. Judas incluiu três citações ou alusões: (1) à
Ascensão de Moisés no versículo 9; (2) a 1Enoque nos versículos 14 e 15; e
(3) a um dito não atestado dos apóstolos no verso 18. Todas as três citações
estão faltando em 2 Pedro. Parece mais provável que Pedro tenha evitado

1547
referência a essas obras apócrifas, em vez de Judas acrescentar essas
referências com base na suposição da prioridade petrina.140
As estimativas da data de composição de Judas se estendem desde o ano
50 (Bauckham) a 65-80 (Guthrie) a 100 (Kümmel).141 A questão crítica aqui
é se a carta exibe as características do catolicismo primitivo.142 Dunn citou
três dessas características: (1) uma diminuição na expectativa do retorno
iminente de Cristo; (2) uma ênfase na natureza institucional da igreja (como
nas Pastorais); e (3) o uso de elementos litúrgicos (semelhante às
Pastorais).143 No entanto, uma análise mais atenta mostra que nenhum
desses elementos está presente em Judas.

1. A expectativa da parúsia (Segunda Vinda) recebe clara e repetida


expressão em Judas 14,21 e 24. Todo o argumento nos versículos 5-19
pressupõe que os falsos mestres serão julgados após o retorno de
Cristo. 144
2. Não há referência a detentores de ofícios eclesiásticos em qualquer
lugar de Judas, e a maneira como os hereges são chamados a prestar
contas está em contraste com a prática católica primitiva de apelar para
o ofício eclesiástico.
3. Judas não contém nenhum fragmento litúrgico (a frase “a fé que foi
entregue aos santos de uma vez por todas”, no versículo 3, constitui
uma simples referência ao evangelho (veja Gl 1.23).

Por essa razão, a teoria de que Judas é um produto do catolicismo


primitivo é insustentável, o que sugere a possibilidade, mesmo a
probabilidade, de uma data antiga, e como mostrado abaixo, possivelmente
mesmo muito cedo em relação às outras cartas do NT.

1548
Bauckham mostrou que se pode encontrar um antinomianismo
comparável já em Corinto após o ano 50 e na Ásia Menor por volta de 90.
Uma vez que, em sua opinião, Judas não é nem católico primitivo e nem
antignóstico, Bauckham postulou uma possível data de composição para
Judas no início dos anos 50.145 Parece que Schlatter pressupôs a presença de
polêmica antignóstica,146 mas ele também não encontrou vestígios do
catolicismo primitivo na carta de Judas.147
Outro fator é a questão de uma possível dependência literária entre
Judas e 2Pedro. Se 2Pedro pós-data e é dependente de Judas (uma visão
mantida pela maioria, embora não todos, os comentaristas hoje), e 2Pedro é
autêntica (veja a introdução a 2Pedro neste livro), o fato de que Pedro
morreu a morte de um mártir em cerca de 65-66 requer o início dos anos 60
como data mais tarde possível para o livro de Judas.148
Uma vez que não há nenhuma boa razão para questionar a autenticidade
de 2Pedro, e uma vez que é provável que 2Pedro seja dependente de Judas,
e não vice-versa, 55-62 como data de composição é mais provável.149 No
entanto, deve-se notar que a falta de evidências internas claras em relação à
data de composição torna essa estimativa, na melhor das hipóteses,
provisória.

Origem
A proveniência de Judas não pode ser determinada com certeza. Bauckham
mostrou conclusivamente que Judas não é um produto do catolicismo
primitivo, mas uma expressão do cristianismo apocalíptico palestino.150 Isso
é confirmado pelo uso que Judas faz dos livros judaicos A Ascensão de
Moisés e 1Enoque e pela exegese pesher nos versos 5-19.151 À luz dessas

1549
observações, Judas tem uma afinidade maior com Tiago do que com
2Pedro.152 Além disso, é difícil identificar a proveniência de Judas, de modo
que é melhor deixar essa questão em aberto.

Destino
A referência geral a “aqueles que são chamados, amados por Deus Pai e
guardados por Jesus Cristo” no início da carta (v. 1b) não permite uma
identificação dos destinatários da carta. A julgar pela evidência interna, é
possível que a carta tenha sido dirigida a uma congregação
predominantemente judaico-cristã (embora não exclusivamente),
possivelmente na Ásia Menor.153 Os falsos mestres itinerantes haviam se
infiltrado na igreja, enquanto viviam uma vida de licenciosidade e
praticavam uma forma de antinomianismo cristão (desrespeito à lei).
De acordo com esses hereges, a graça de Deus libertou os crentes de
todas as normas éticas, de modo que um cristão era livre para escolher sua
própria conduta sem quaisquer restrições morais. Esses hereges não eram só
membros da igreja, mas também mestres (v. 11-13). Eles participavam da
adoração da igreja e procuravam divulgar suas profecias e ensinamentos na
ocasião das “festas do amor” regulares da igreja, ou seja, refeições
comunitárias, incluindo a celebração da Ceia do Senhor. Judas advertiu seus
leitores contra os hereges e os exortou a que lutassem por sua fé (v. 3).

Motivo e Propósito
Os hereges mencionados em Judas não podem ser identificados com
nenhum dos outros falsos mestres mencionados no NT.154 Ao identificar sua
natureza exata, a prioridade deve ser dada, portanto, as evidências internas

1550
fornecidas pelo próprio livro. De acordo com Judas, os falsos mestres
“entraram [na igreja] furtivamente” (v. 4; veja Gl 2.4). Muito
provavelmente, eles eram, portanto, mestres itinerantes ou pregadores que
iam de igreja em igreja e dependiam da hospitalidade dos cristãos locais
(veja 1Co 9.5; 2Jo 10; 3Jo 5-10). Em sua descrença, esses indivíduos
ímpios negavam “Jesus Cristo, nosso único Soberano e Senhor” (v. 4). Seu
lema era “liberdade” no sentido de completa autonomia ética (v. 4,8; veja v.
7). Possivelmente, esses falsos mestres sustentavam uma escatologia
superestimada, focando em seu atual desfrute dos benefícios da salvação
enquanto os elementos apocalípticos recebiam pouca importância (veja
2Tm 2.17,18).
Judas chamou os falsos mestres de “sonhadores” (v. 8), místicos que se
vangloriavam de acesso privilegiado ao conhecimento esotérico. Isso pode
indicar o caráter carismático desses pregadores itinerantes.155 Essas
afirmações de experiências visionárias parecem ter resultado também em
falta de respeito pelos anjos (v. 9,10). É possível que se dissesse que as
pessoas tinham uma natureza angélica e, assim, a distinção entre humanos e
anjos era turva. Judas explicou isso pela referência à falta de compreensão
espiritual por parte dos hereges: “Essas pessoas blasfemam de tudo o que
não entendem” (v. 10). Na verdade, eles não possuem o Espírito (v. 19).
Esses mestres são “manchas” (v. 12) nas “festas de amor” da igreja, das
quais eles participam sem o menor ressentimento (v. 12; veja v. 8,23). Sua
posição como mestres é sugerida no v. 12, onde eles são chamados pastores
“que nutrem apenas a si mesmos”. Como Balaão ou os falsos pastores em
Ezequiel 34, esses hereges não buscavam nada além de sua própria
vantagem (v. 11). Esses indivíduos são tão pouco confiáveis quanto nuvens
sem água ou árvores de outono infrutíferas, e tão instáveis quanto o oceano

1551
inquieto (v. 12,13; veja Is 57.20; Ef 4.14), levando as pessoas a se desviar
semelhante a estrelas que não mantêm seu curso (veja v. 6).
Os hereges eram altamente críticos e estavam profundamente
descontentes com seu próprio destino (v. 16).156 Eles proferem “palavras
rebeldes” (v. 15) semelhantes aos ímpios mencionados na citação anterior
de 1Enoque (veja também v. 8,10); Eles eram “zombadores” que exibiam
um espírito zombador (v. 18). Eles causavam divisões (v. 19; veja 1Co 1.10
a 4.7; Tg 3.14) e tinham uma mente terrena (v. 19; a palavra é psychikoi;
veja 1Co 2.14; Tg 3.15; 4.5). Embora esses pregadores itinerantes
carismáticos se vangloriassem de suas experiências visionárias, eles
estavam desprovidos do Espírito (v. 19), provando, assim, a sua natureza
não regenerada (veja Rm 8.9). Isso foi impressionantemente demonstrado
pelo seu estilo de vida licencioso.
Esses eram os falsos mestres aos quais Judas se opôs em sua carta.
Embora ele tivesse a intenção de escrever uma carta geral e encorajadora
“sobre nossa salvação comum”, ele, em vez disso, “achou necessário
escrever e exortar” seus leitores a lutar pela fé confiada de uma vez por
todas aos fiéis (v. 3). Essa notável mudança de planos foi ocasionada pela
presença velada e subversiva dos falsos mestres na congregação à qual
Judas endereçou sua carta. Ao invés de aceitar seus ensinamentos, os
crentes nessa congregação precisavam se opor a esses hereges, sabendo que
o julgamento divino de tais indivíduos é certo.
Assim como Deus castigou severamente as pessoas que fizeram tais
coisas no passado — cuja demonstração é o ônus subjacente à referência de
Judas a vários exemplos do AT nos versos 5-19 —, ele certamente julgará
esses falsos mestres. A mensagem de Judas para seus destinatários recebe
clara expressão nos versos 20 a 23, onde ele convocou seus leitores a se

1552
edificar em sua santíssima fé, a orar no Espírito Santo e a manter-se no
amor de Deus enquanto aguardam o retorno de Cristo (uma das referências
prototrinitarianas no NT; v. 20,21). Eles deviam mostrar misericórdia para
com aqueles que duvidavam; salvar outros, arrebatando-os do fogo; e
conduzir-se com santo temor, sabendo que até mesmo as roupas dos falsos
mestres estavam “contaminadas pela carne” (v. 22,23).
É difícil exagerar a extrema seriedade com que a igreja, de acordo com
Judas, deve lidar com os hereges enquanto age redentivamente com aqueles
que podem ainda ser arrancados do domínio demoníaco desses indivíduos
perversos e egoístas.

Algo para Pensar: Importar-se o Bastante para


Confrontar

No terceiro verso de sua curta carta, Judas disse aos seus leitores
que a carta que eles receberam não era a carta que ele realmente
começou a escrever. Judas pretendia escrever uma carta
encorajadora “sobre a nossa salvação comum” (v. 3), mas quando
os falsos mestres ameaçaram a igreja, ele escreveu uma dura
denúncia contra os falsos mestres a fim de proteger a congregação
de danos. Em vez de ignorar a dificuldade, ou esperar que ela fosse
embora por conta própria, Judas tomou uma atitude drástica. Nisso
ele serve como um exemplo para as igrejas de hoje em dia, nas quais
o materialismo, conveniência e consumismo são muitas vezes a
regra, e o discipulado radical e a centralização em Deus, a exceção.

1553
Para Judas, os falsos mestres eram uma ameaça espiritual que
tinha que ser confrontada com a maior seriedade e urgência. Sua
imoralidade precisava ser exposta, seu apelo tinha de ser
restringido, e uma operação de resgate dos abalados precisava ser
lançada. “Ter misericórdia de alguém que duvida; salvar outros,
arrancando-os do fogo; de outros, ter misericórdia em temor,
odiando até a roupa contaminada pela carne” (v. 23). Pode ser
inconveniente mudar nossos planos e (como Judas fez) mudar as
engrenagens do encorajamento para a exortação, mas se nos
preocuparmos o suficiente para confrontar, não deixaremos que
falsos ensinamentos em nossas igrejas fiquem sem controle, mas
lutaremos pela fé entregue aos fiéis de uma vez por todas.

LITERATURA
Gênero
A carta de Judas é dirigida a um grupo particular de pessoas (v.1-4). Não se
trata, portanto, de uma Epístola “Católica” (i. e., “Geral”). No entanto, o
corpo principal da carta e a bênção conclusiva parecem mais como um
sermão composto de um midrash de vários textos (v. 5-19), uma parênese
(exortação; v. 20-23), e uma doxologia (v. 24,25).157 Pode-se melhor
caracterizar Judas como um sermão em forma de epístola”.158
Além disso, Charles mostrou que Jude em sua totalidade deve ser vista
como uma “palavra de exortação”, na qual referências ao AT são usadas
para abordar uma situação contemporânea.159

1554
Presumivelmente, a doxologia final indica que Judas pretendia que sua
carta fosse lida no contexto do culto da igreja.160 Um gênero semelhante
pode ser detectado também em Hebreus, Tiago e 1João.
Com relação ao vocabulário, Orígenes (c. 185-254) observou que Judas
dominava um “forte vocabulário”.161 Judas apresenta não menos de 15
hapax legomena (palavras usadas apenas uma vez) do NT, dos quais apenas
quatro são encontrados em uma tradução grega do AT. Além disso, três
palavras ocorrem em outro lugar somente em 2Pedro 2, que é
provavelmente dependente de Judas. A isso podem ser adicionadas 22
palavras que são raras no resto do NT.
Como Neyrey observou, o rico vocabulário de Judas sugere que o autor
operava em um ambiente literário que era consideravelmente mais amplo
do que meramente as Escrituras hebraicas e cristãs. O uso frequente de
tríades (p. ex., “Judas”, “escravo”, “irmão”; “amado”, “guardado”,
“chamado”; e “misericórdia”, “paz”, “amor” em v. 1-2), pelo princípio da
“amplificação por acumulação”, projetado para acrescentar gravidade ao
argumento do autor.162
Uma característica conspícua da carta de Judas é o uso de material
apócrifo, particularmente 1Enoque.163 Como notado, isso está em marcado
contraste com 2Pedro e o resto do NT (incluindo o uso de Jesus de acordo
com os Evangelhos canônicos). Além disso, as tradições judaicas, incluindo
o AT, fornecem a Judas a maior parte de suas fontes.164 Afinidades com o a
exegese pesher em Qumran já foram observados sob tópicos anteriores.
Como mencionado, o livro de Judas provavelmente serviu como fonte para
2Pedro.

Relação com 2Pedro

1555
Já foi dito que 2Pedro 2 provavelmente depende literariamente do livro de
Judas. Aqui a relação entre Judas e 2Pedro 2 é dada em maior detalhe. Uma
comparação entre Judas 4-19 e 2Pe 2.1 a 3.3 produz os seguintes paralelos,
com palavras idênticas ou sinônimas no original em negrito.

Judas 4-19
Pois certos homens, que foram designados para este julgamento há muito tempo, se
infiltraram furtivamente; eles são ímpios, transformando a graça de nosso Deus em
promiscuidade e negando nosso único Mestre e Senhor, Jesus Cristo. Agora eu quero
lembrá-los, embora saibais todas essas coisas: o Senhor, depois de ter salvo um povo do
Egito, mais tarde destruiu aqueles que não creram; e ele manteve, com cadeias eternas nas
trevas para o julgamento do grande dia, anjos que não mantiveram sua própria posição,
mas abandonaram sua própria morada. Da mesma forma, Sodoma e Gomorra e as cidades
ao redor delas cometeram imoralidade sexual e praticaram perversões, assim como eles
praticaram, e serviram como um exemplo ao sofrer a punição do fogo eterno.
No entanto, esses sonhadores também contaminam sua carne, desprezam a autoridade,
e blasfemam de seres gloriosos. No entanto, Miguel, o Arcanjo, quando disputava com o
Diabo o corpo de Moisés, não ousou trazer uma condenação abusiva contra ele, mas disse:
“O Senhor te repreenda!” Mas essas pessoas blasfemam de tudo o que não entendem, e o
que sabem por instinto, como animais irracionais — eles se destroem a si mesmos com
essas coisas. Ai deles! Porque eles seguiram o caminho de Caim, se entregaram ao erro de
Balaão por lucro, e morreram na rebelião de Corá. Estes são os que são como perigosos
recifes em suas festas do amor. Eles festejam com você, alimentando-se apenas a si próprios
sem medo. São nuvens sem água levadas por ventos; árvores no final do outono —
infrutíferas, duas vezes mortas, arrancadas pelas raízes; ondas selvagens do mar,
espumando em suas ações vergonhosas; estrelas errantes para quem é reservada a
escuridão das trevas para sempre!
E Enoque, na sétima geração de Adão, profetizou sobre eles:

Veja! O Senhor vem com milhares de seus santos para executar o juízo sobre todos, e
para convencê-los de todos os atos ímpios que eles praticaram de um modo ímpio, e de
todas as coisas duras que pecadores ímpios disseram contra ele. Essas pessoas são
murmuradores descontentes, andando de acordo com seus desejos; as suas bocas
proferem palavras arrogantes, bajulando as pessoas para sua própria vantagem. Mas
vós, queridos amigos, lembrai-vos das palavras preditas pelos apóstolos dos nosso

1556
Senhor Jesus Cristo; eles vos disseram: “No tempo do fim haverá zombadores
caminhando de acordo com seus próprios desejos ímpios”. Essas pessoas criam
divisões e são meramente naturais, não tendo o Espírito.

Além dessas notáveis semelhanças verbais, os dois textos exibem uma


semelhança marcante em termos do desenvolvimento sequencial do
argumento:

Tabela 18.4: Referências a Figuras do AT em Judas e 2Pedro 2


Judas 2Pedro 2
v. 5 Israel no deserto
v. 6 Anjos v. 4 Anjos
v. 5 Noé
v. 7 Sodoma e Gomorra v. 6 Sodoma e Gomorra
v. 7 Ló
v. 9 Arcanjo Miguel v. 11 [Arcanjo Miguel, não
nomeado]
v. 11 Caim
v. 11 Balaão v. 15 Balaão
v. 11 Coré

Judas e Pedro coincidiram em sua estrutura básica: anjos — Sodoma e


Gomorra — [Arcanjo Miguel] — Balaão. Além disso, Pedro (na suposição
de que Judas serviu como sua fonte) substituiu os dois exemplos negativos,
Caim e Coré, por duas figuras positivas, Noé e Ló. Embora a semelhança de
estrutura também possa ser explicada com base em uma fonte comum,
parece mais provável que Pedro usou Judas diretamente e adaptou sua carta
à sua própria situação.165 Se assim for, é particularmente notório que Pedro
reformulou a carta de Judas de tal forma que a sequência de seus exemplos

1557
está em ordem cronológica do AT adequada, enquanto Judas usa um arranjo
tópico.

Plano Literário
A Carta de Judas exibe a seguinte estrutura quiástica concêntrica:166

Seção Fórmula Introdutória


A Saudação (1,2) Judas, àqueles…
B Motivo (3,4) Amados
C Lembrete (5-7) Eu quero lembrá-los
D Os Hereges (8-13) Da mesma forma, essas pessoas
D’ 1Enoque (14-16) Enoque profetizou acerca deles
C’ Lembrete (17-19) Mas vós, amados, lembrai-vos das
palavras
B’ Exortação (20-23) Mas vós, amados
A’ Doxologia (24,25) Mas àquele que é capaz de guardá-
los…

Essa estrutura contém correspondência entre saudação e doxologia e


entre motivo e exortação, dois lembretes, e as duas unidades no centro da
carta, a seção sobre os falsos mestres e a citação de 1Enoque. O corpo da
carta (v. 5-19) contém um tratamento exegético prolongado de tipos e
profecias para o propósito de mostrar “que os falsos mestres são pessoas
cujo comportamento é condenado e cujo julgamento é profetizado nos tipos
do AT e na profecia desde a época de Enoque até a época dos apóstolos”.167
Apesar do comprimento dos v. 5-19, o propósito real da carta é a
exortação de Judas a que seus leitores combatam pela fé (v. 20-23; veja v.
3). Assim, os versículos 20 a 23 não são meramente uma exortação
conclusiva ou um pós-escrito, mas o clímax que a carta inteira cria. Os

1558
versículos 5 a 19 fornecem o contexto e fundamentos necessários para essa
parênese (exortação). A mensagem da carta é, portanto, um apelo aos
leitores para que batalhem pela fé contra os adversários de Deus que já
estão condenados nas Escrituras e que serão considerados responsáveis no
último dia.
Ellis mostrou que os versículos 5 a 19 representam um midrash, uma
exegese de passagens selecionadas das Escrituras, com vistas a apontar a
sua relevância contemporânea.168 Quatro textos são usados:

Os textos 1 e 2 referem-se, cada um, a três tipos do AT (v. 5-7,11).


O texto 3 é 1Enoque 1.9 (v. 14,15).
O texto 4 é uma profecia dos apóstolos (v. 17,18).

Cada um desses textos é citado primeiro e depois interpretado de


maneira midráshica:

Tabela 18.5: Elementos Midráshicos em Judas 5-18


Versículo(s) Texto Versículo Midrash
5a7 Escrituras Hebraicas 8-10 Da mesma forma,
essas pessoas
11 Escrituras Hebraicas 12,13 Essas pessoas são
14,15 Apócrifos (1Enoque) 16 Essas pessoas são
17,18 Profecia apostólica 19 Essas pessoas são

Os versículos 5 a 7 e 17 a 19 são introduzidos como lembretes,


enquanto os versículos 8 a 13 e 14 a 16 correspondem um ao outro no
centro do argumento da carta. As transições entre os textos citados e as
porções midráshicas são caracterizadas por dois elementos estilísticos: os

1559
tempos verbais e a frase “essas pessoas”. Todos os tempos verbais nos
textos-fonte estão no passado ou no futuro, enquanto o tempo nas seções do
comentário é consistentemente o presente. Além disso, as citações das
Escrituras estão ligadas aos materiais midráshicos por meio de frases de
frases de transição correspondentes:

“ímpios” / “impiedade” / “impiamente (v. 4,15,18)


“blasfemo” / “blasfêmia” (v. 8-10)
“erro” (planē) / “errância” (planētēs, v. 11,13)
“guardar […] escuridão” (v. 6,13)

A finalidade servida pelos midrashim (seções de comentário) é


transparente e convincente. O argumento é essencialmente o seguinte:

1. O pecado dos falsos mestres corresponde ao pecado dos tipos AT.


2. Os tipos do AT foram severamente punidos por Deus por seu
comportamento pecaminoso.
3. Uma vez que os pecados dos falsos mestres correspondem aos dos
tipos do AT, e uma vez que os tipos do AT foram severamente punidos
por Deus por seu pecado, o julgamento futuro dos falsos mestres é
igualmente certo (embora ainda seja futuro).

Com base nessa mensagem exortatória, os leitores de Judas devem


lançar sua sorte com a “fé que foi entregue aos santos de uma vez por
todas” (v. 3) e se separar dos falsos mestres, procurando salvar os que
duvidam ou outros sob o feitiço dos hereges enquanto aplicam toda a
cautela necessária (v. 20-23). Caso contrário, eles participarão dos pecados
dos falsos mestres e incorrer no mesmo julgamento.

1560
A técnica midráshica interpretativa de Judas é aproximadamente
semelhante à exegese pesher em Qumran. Ambas são baseadas na
convicção de que os textos do AT representam uma profecia do tempo do
fim que deve ser aplicada pelo intérprete contemporâneo (seja em Qumran
ou nos dias de Judas) a um padrão ou situação correspondente em sua
própria época (entendida como o tempo do cumprimento escatológico).
Vários textos entre os Manuscritos do Mar Morto (por exemplo,
4QFlorilegium e 11QMelchizedek) apresentam um formato no estilo de
comentário que apresenta exposições de textos relacionados (“pesharim
temáticos”). Em contraste, Qumran não usa textos apócrifos ou profecias
cristãs orais, e também não se encontra exegese tipológica. “Judas”, por
outro lado, “aplica a Escritura aos últimos dias não apenas como profecia,
mas também como tipologia, na qual os eventos da história redentiva são
vistos como prenúncio dos acontecimentos escatológicos”.169

ESTRUTURA
I. Saudação (1,2)

II. Motivo (3,4)

III. Exposição: o julgamento de Deus sobre os pecadores (5-19)


A. Lembrete das Escrituras Hebraicas (5-7)
B. Os falsos mestres (8-13)
C. A citação de Enoque (14-16)
D. Lembrete da profecia apostólica (17-19)

IV. Exortação (20-23)

1561
V. Doxologia (24,25)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Saudação (1,2)
A saudação habitual identifica Judas, o irmão de Tiago, como autor; inclui
uma referência aos destinatários como “aqueles que são chamados, amados
por Deus Pai e guardados por Jesus Cristo”; e uma saudação de
misericórdia, paz e amor.

II. Motivo (3,4)


Em franqueza refrescante, Judas explicou por que a carta que ele realmente
escreveu era diferente da que ele tinha a intenção de escrever. Em vez de
escrever uma nota encorajadora com relação à “nossa salvação comum”,
Judas escreveu uma repreensão mordaz dos falsos mestres e exortou os fiéis
a “lutar pela fé uma vez por todas confiada” a eles.

III. Exposição: O Julgamento de Deus Sobre


Pecadores (5-19)
Judas estabeleceu sua denúncia dos falsos mestres no contexto de lembretes
das Escrituras Hebraicas (v. 5-7) e da profecia apostólica (v. 17-19). Os
falsos mestres compartilhavam várias características essenciais com aqueles
que tinham pecado gravemente nos tempos do AT e posteriormente foram
severamente julgados por Deus (v. 8-16). Embora ainda no futuro da

1562
perspectiva de Judas, o julgamento de Deus sobre os falsos mestres em seus
dias era, contudo, certo.

A. Lembrete das Escrituras hebraicas (5-7)


A denúncia que Judas fez dos falsos mestres assumiu a forma de um
“lembrete” de como Deus lidou com transgressores semelhantes no
passado. A exposição 1 é o julgamento de Deus da geração rebelde no
deserto durante o Êxodo do Egito. A exposição 2 diz respeito ao julgamento
de Deus sobre os anjos caídos que não estavam satisfeitos com seu lugar
designado na criação de Deus, mas se rebelaram contra ela.
A exposição 3 é Sodoma e Gomorra, que se rebelaram contra a ordem
de criação de Deus, ao se envolver em atos sexuais perversos
(homossexualidade) e consequentemente foram destruídos como um ato de
julgamento divino. Esses três exemplos bíblicos deixam claro que aqueles
que se rebelam contra Deus certamente não escaparão ao juízo divino,
mesmo se, como no caso dos falsos mestres no livro de Judas, esse
julgamento ainda for futuro.

B. Os falsos mestres (8-13)


Esta seção, juntamente com os versículos 14-16, está no centro do quiasma
da carta, concentrando-se diretamente nos falsos mestres. Seu pecado
básico é a resistência à autoridade de Deus. O arcanjo Miguel é citado como
um exemplo positivo, contrastado com três predecessores negativos dos
falsos mestres: Caim, que assassinou seu irmão por causa de ciúme; Balaão,
cujo erro foi o resultado da ganância; E Coré, que se rebelou no deserto. Os
falsos mestres são colocados nessa terrível trajetória de rebeldes do passado

1563
contra a autoridade de Deus que foram severamente julgados por Deus;
como Judas deixa claro, o castigo dos falsos mestres é, da mesma forma,
garantido.

C. A citação de Enoque (14-16)


Como texto de prova, Judas cita uma passagem do livro apócrifo de
Enoque, atestando a certeza do julgamento divino sobre os ímpios. Os
mestres são acusados de descontentamento, sensualidade, arrogância e
bajulação.

D. Lembrete da profecia apostólica (17-19)


O lembrete da profecia apostólica corresponde, na estrutura quiástica, ao
lembrete inicial das Escrituras Hebraicas nos v. 5-7. Com isso, Judas se
volta para o seu público (“queridos amigos, v. 17), lembrando-os que os
falsos mestres estavam cumprindo a profecia do fim dos tempos. Os
hereges são divisivos, meramente naturais, e desprovido do Espírito.

IV. Exortação (20-23)


Com base na exposição que Judas fez do julgamento iminente de Deus
sobre os falsos mestres nos versículos 5-19, o propósito da carta,
mencionado no verso 3, é agora detalhado na forma de uma exortação
completa. Nesta seção culminante, Judas, de forma dramática, exortou seus
leitores a se manterem puros enquanto tentavam “arrebatar” alguns que
duvidavam “do fogo”, isto é, do julgamento eterno de Deus.

1564
V. Doxologia (24-25)
A doxologia final afirma a capacidade de Deus de guardar os fiéis de
tropeçar e celebra a glória, majestade e poder do único Deus e Salvador por
meio de Jesus Cristo agora e para sempre.

TEOLOGIA
Tema Teológico
O combate pela fé
Judas faz um apelo urgente para que os fiéis batalhassem pela fé cristã
contra os falsos ensinamentos que enfatizavam a suposta liberdade irrestrita
dos fiéis em Cristo, que leva a um estilo de vida imoral. Nessa forma de
antinomianismo, as pessoas apelavam para a graça de Deus como deixando
os fiéis livres para viver de qualquer maneira que eles escolhessem. Paulo,
em outro lugar, defendeu de possíveis abusos o ensinamento cristão da
graça, independente das “obras da lei” (veja, p. ex., Gl 2.16).
Judas observou que os falsos mestres persistiam na rebelião contra a
autoridade e não tinham o Espírito. Por isso, suas atividades não davam
frutos. Em essência, a carta de Judas representa um chamado ao
despertamento para uma igreja que permanece adormecida enquanto
grandes desafios doutrinais exigem uma resposta urgente. Isso não é
diferente da nossa própria época, na qual grande parte da igreja está
definhando em complacência moral e espiritual e indiferença, onde o
evangelho da prosperidade está vivo e bem, e onde a doutrina cristã é
muitas vezes menos importante do que satisfazer as necessidades sentidas.

1565
A mensagem da carta de Judas é, portanto, permanentemente relevante.
Os fiéis devem ser relembrados da santidade e da justiça de Deus, que não
permitirá que o pecado fique impune e que exige um estilo de vida santo em
resposta à graça de Deus em Cristo. Judas também forneceu ferramentas
diagnósticas para detectar os falsos mestres: um estilo de vida imoral, uma
disposição egoísta e individualista, e uma motivação principalmente
monetária. Em contraste, os fiéis devem viver em santo temor, sendo
circunspectos e gratos. Semelhante aos falsos professores nos dias de Judas,
há hoje o perigo de que alguns estão “transformando a graça de nosso Deus
em promiscuidade” (v. 4).
Muitos convertidos concluem erradamente que o evangelho da graça de
Deus torna desnecessário um estilo de vida que é caracterizado pela
confiança em Deus e obediência à moralidade e ao ensino bíblicos. Afinal,
Deus é um Deus de graça, amor e perdão. Como Judas deixou claro, no
entanto, a decisão de confiar em Cristo não deve produzir uma vida de
liberdade irrestrita e imoralidade licenciosa. Ao contrário, o crente torna-se
“um escravo de Jesus Cristo” (v. 1). Há, portanto, uma grande necessidade
de a igreja e os fiéis individuais redescobrirem a importante contribuição
feita por Judas à vida e à prática da igreja.

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON


Crentes como “residentes temporários” neste mundo (1Pe 1.1,17; 2.11)
A continuidade entre o Israel do AT e a igreja cristã (1Pe 2.1-10)
A importância da submissão às autoridades (1Pe 2.13 a 3.7)
A importância do sofrimento semelhante a Cristo (1Pe 2.21-25; 3.13-
18)

1566
A necessidade de se cultivar piedade e as virtudes cristãs (2Pe 1.3-11)
A inspiração divina das Escrituras proféticas (2Pe 1.21)
A necessidade de perseverança e vigilância em vista do retorno de
Jesus (2Pe 3.1-13)
A necessidade de lutar pela fé de uma vez por todas entregue aos
santos (Jd 3)

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. De acordo com os autores, qual foi escrita primeiro: 1Pedro, 2Pedro,
ou Judas, e por quê?
2. Qual é a data mais provável para 1 Pedro e por quê?
3. Por que Pedro escreveu 1Pedro, e qual é o grande exemplo que ele cita
em sua exortação?
4. Por que você acha que há uma unanimidade prática nos estudos
recentes sobre a estrutura de 1Pedro?
5. Quais são as quatro visões de 1Pedro 3.18-22?
6. Quais são as três razões pelas quais muitos estudiosos modernos
acreditam que Pedro não escreveu 2Pedro?
7. Por que tantas datas diversas estão abertas para 2 Pedro?
8. Qual é a heresia abordada em 2Pedro?
9. De que formas o ensinamento de Pedro sobre buscar virtudes cristãs
tem importantes implicações sobre o final dos tempos?
10. Por que Judas provavelmente não é pseudônimo?
11. Quem provavelmente eram os “falsos mestres” em Judas?
12. Sucintamente, que contribuições 1 e 2Pedro e Judas fazem ao cânon?

1567
PARA ESTUDOS ADICIONAIS
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1
M. Lutero, Prefaces to the New Testament, p. 1522, citado por J. H. Elliott, “Peter, First Epistle

of”, ABD 5:270.

2
J. D. G. Dunn, Unity and Diversity in the New Testament: An Inquiry into the Character of

Earliest Christianity, 2. ed. (Valley Forge: Trinity Press International, 1990), p. 350.

3
E. Käsemann, “An Apologia for Primitive Christian Eschatology”, em: Essays on New

Testament Themes, SBT 41 (London: SCM, 1964), p. 191 e 194.

4
Sobre o fenômeno do pseudonimato, veja T. L. Wilder, Pseudonymity, the New Testament, and

Deception: An Inquiry into Intention and Reception (Lanham: University Press of America, 2004); e

A. J. Köstenberger, “1Timothy”, em: The Expositor’s Bible Commentary, ed. rev. (Grand Rapids:

Zondervan, 2006), p. 492-94 e as fontes citadas ali. A presença de cartas pseudônimas no NT foi

1571
defendida por R. Bauckham, “Pseudo-Apostolic Letters”, JBL 107 (1988), p. 469-94; K. Aland, “The

Problem of Anonymity and Pseudonymity in the Christian Literature of the First Two Centuries”,

JTS 12 (1961), p. 39-49; D. G. Meade, Pseudonymity and Canon: An Investigation into the

Relationship of Authorship and Authority in Jewish and Earliest Christian Tradition (Grand Rapids:

Eerdmans, 1987). A favor da autenticidade estão D. A. Carson; D. J. Moo, An Introduction to the

New Testament, 2. ed. (Grand Rapids: Zondervan, 2005), p. 337-50; D. Guthrie, New Testament

Introduction, 2. ed. (Downers Grove: InterVarsity, 1990), p. 607-49; e E. E. Ellis, “Pseudonymity and

Canonicity of New Testament Documents”, em: M. J. Wilkins; T. Paige, orgs., Worship, Theology

and Ministry in the Early Church, JSNTSup 87 (Sheffield: Sheffield Academic Press, 1992), p. 212-

24.

5
J. R. Michaels, 1Peter, WBC 49 (Waco: Word, 1988), xxxii.

6
T. R. Schreiner, 1, 2Peter, Jude, NAC 37 (Nashville: B&H, 2003), p. 22.

7
Por exemplo, Fp. 1.3; 2.1,2; 6.3; 7.2; 8.1,2; 10.2,3.

8
Eusébio, Hist. Ec. 2.15; 3.1.2,39.

9
Eusébio, Hist. Ec. 4.9.2; 16.5; 5.7.2.

10
Veja Scorpiace 12 e 14, como também Orat. 20.

11
Eusébio, Hist. Ec. 3.3.25.

12
Schreiner, 1, 2Peter, Jude, p. 22.

13
C. Bigg, A Critical and Exegetical Commentary on the Epistles of St. Peter and St. Jude, ICC

(Edinburgh: T&T Clark, 1901), p. 7. Cf. a conclusão de D. Guthrie sobre o assunto: “Esta epístola

não apenas exerceu uma grande influência nos primeiros escritos cristão, mas também fez com que

recebessem autoridade apostólica. Isso deixa claro que a igreja primitiva, tão cedo quanto a

existência das evidências, a considerasse como uma autêntica Epístola de Pedro e assim, qualquer

1572
discussão de objeções à autoria petrina deve levar em conta o bastante este fato” (New Testament

Introduction, p. 762).

14
H. J. Holtzmann (Lehrbuch der historisch-kritischen Einleitung in das neue Testament

[Freiburg: J. C. B. Mohr, 1885], p. 490-91) listou Semler (1784) e Eichhorn (1818) como os

primeiros a negar diretamente a autoria petrina, assim também Cludius (1808), de Wette (1813) e

Reuss (1852, 1864). A Escola de Tübingen os acompanhou, começando com F. C. Baur (1856).

15
E. Boring, “First Peter in Recent Study”, WW 24 (2004), p. 359-60. Por exemplo, J. H. Elliott,

1Peter: A New Translation with Introduction and Commentary, AB (New York: Doubleday, 2000), p.

127-30.

16
Por exemplo, E. G. Selwyn, The First Epistle of St. Peter: The Greek Text with Introduction,

Notes and Essays (London: Macmillan,1955), p. 10.

17
R. E. Brown (An Introduction to the New Testament, ABRL [New York: Doubleday, 1997], p.

719) considerou ser este o principal argumento contra a autoria de Pedro.

18
K. H. Jobes, 1Peter, BECNT (Grand Rapids: Baker, 2005), p. 6. D. P. Senior (1Peter, Jude,

and 2Peter, SacPag 15 [Collegeville, MN: Liturgical Press, 2003], p. 4) mencionou cinco objeções

semelhantes, acrescentando o fato de que o autor nada mencionou da vida de Jesus na primeira carta.

A maioria dos estudiosos reconhece uma falta de consistência na rejeição da autoria de Pedro de

1Pedro por essa razão, embora rejeitem a autenticidade de 2Pedro, que inclui uma referência

principal (2Pe 1.16-19) (p. ex., Michaels, 1Peter, lxvi). O mesmo pode ser dito para o ponto de vista

de que se Pedro escreveu 1Pedro, ele teria mencionado Paulo (que presumivelmente estava com ele

em Roma nesta época) embora ainda rejeitando 2Pedro, o que inclui tal citação. Por exemplo, veja G.

Krodel, “The First Letter of Peter”, em: Hebrews, James, 1 and 2Peter, Jude and Revelation,

Proclamation Commentaries (Minneapolis: Augsburg Fortress, 1995), p. 64.

1573
19
Ibid., p. 332. Contra Achtemeier (1Peter, p. 7), que acreditava que o autor estivesse

linguisticamente em casa em um ambiente grego em vez de em um ambiente semita. Jobes (1Peter,

p. 337-38) aplicou uma metodologia que ela desenvolveu em sua dissertação sobre Ester para rastrear

influência aramaica em 1Pedro. Ela rastreou o uso de vários marcadores sintáticos, estatisticamente

ponderados, e descobriu que era improvável “que o autor de 1Pedro fosse um falante nativo do

grego” (p. 337) e que “Josefo dominava bem mais o grego do que o autor de 1Pedro, o que é

consistente com informação histórica sobre ele” (p. 337-38).

20
Por exemplo, J. A. Fitzmyer, “Did Jesus Speak Greek?” BAR 18 (1992), p. 58-63; id.,

“Languages of Palestine in the First Century AD”, CBQ 32 (1970), p. 501-31 (esp. p. 507-18).

Fitzmyer observou a descoberta de uma carta grega de Simão Bar Kokhba a dois de seus tenentes

escrita em grego, no sentido de que “não foi encontrado um desejo de se escrever em hebraico”

(ibid., p. 514).

21
Jobes, 1Peter, p. 326.

22
Veja a proveitosa discussão em D. A. Carson; D. J. Moo (An Introduction to the New

Testament, 2. ed. [Grand Rapids: Zondervan, 2005], p. 645) [publicado em português por Vida Nova

sob o título Introdução ao Novo Testamento], que observou que a preposição grega dia (“através”)

poderia transmitir a noção de que Silas foi o portador da carta ou a de que ele serviu como um

amanuense. Enquanto a primeira parece mais provável, isso não significa que (ou alguma outra

pessoa) não pudesse ter parte na composição da carta.

23
Por exemplo, F. G. Downing, “Pliny’s Persecutions of Christians: Revelation and 1Peter”,

JSNT 34 (1988), p. 105-23. A conexão frequentemente é feita com a carta de Plínio, o Jovem

(Governador da Bitínia) ao imperador Trajano, que esboça os (maus) tratos de Plínio dos fiéis em sua

província (Plínio, Cartas 10.96.6). Mas de forma alguma é necessário que a perseguição em 1Pedro

fosse sancionada pelo estado. Veja D. Warden, “Imperial Persecution and the Dating of 1Peter and

Revelation”, JETS 34 (1991), p. 203-12.

1574
24
Mas veja W. G. Kümmel, Introduction to the New Testament, ed. rev., tradução para o inglês de

H. C. Kee (Nashville: Abingdon, 1975), p. 424.

25
W. Grudem, The First Epistle of Peter: An Introduction and Commentary, TNTC (Grand

Rapids, Eerdmans, 1997), p. 31.

26
Schreiner, 1, 2Peter, Jude, p. 36.

27
J. N. D. Kelly, The Epistles of Peter and of Jude, HNTC (New York: Harper & Row, 1969), p.

29.

28
Por exemplo, Michaels, 1Peter, lxiii.

29
Veja I. H. Marshall, 1Peter, NTC (Downers Grove: InterVarsity, 1991), p. 175. O comentário

de Habacuque nos Manuscritos do Mar Morto interpreta as profecias de Habacuque sobre a Babilônia

como sendo cumpridas em Roma. Além disso, um escritor romano, Petrônio, comparou a decadência

de Roma com a da Babilônia (Satyricon, 60 d.C.). Papias, no início do século II, situou 1Pedro em

Roma, vendo a metáfora da “Babilônia” como uma referência a Roma (citado em Eusébio, Hist. Ec.

2.15.2).

30
A ideia proposta de que o autor pseudepigáfico estivesse falando de sua própria função e não

da de Pedro é irrelevante para a questão da data. Mesmo aceitando a suposição, a eclesiologia seria

bastante primitiva, e não tardia.

31
Também N. Brox, Der Erste Petrusbrief, EKKNT XXI (Neukirchen-Vluyn: Neukirchener,

1979), p. 43-51.

32
Por exemplo, J. H. Elliott, A Home for the Homeless (Philadelphia: Fortress, 1988), p. 270-80.

33
Kümmel, Introduction, p. 423.

34
Ibid.

1575
35
Bigg, 1Peter, p. 15-23.

36
O mais impressionante sendo “o amor cobre uma multidão de pecados” (Tg 5.20 e 1Pe 4.8;

ibid., p. 23). Esta é uma citação de Provérbios 10.20; no entanto, não representa uma leitura da LXX,

mas uma tradução/paráfrase independente. O fato de as citações serem idênticas é, portanto,

impressionante.

37
Veja J. Herzer, Petrus oder Paulus? Studien uber das Verhaltnis des ersten Petrusbriefes zur

paulinischen Tradition, WUNT 103 (Tübingen: Mohr, 1998).

38
A teoria de Tübingen de que Pedro e Paulo eram rivais deve ser vista como obsoleta. Contra

M. Goulder, St. Peter vs. St. Paul: A Tale of Two Missions (Louisville: Westminster John Knox,

1994).

39
Veja Jobes, 1Peter, p. 11-12; e Selwyn, 1Peter, p. 461-66. Até mesmo aqueles que negam a

autoria de Pedro abandonaram essa linha de argumento; veja L. Goppelt, A Commentary on 1Peter,

tradução para o inglês de J. E. Alsup (Grand Rapids: Eerdmans, 1993), p. 28-30; Achtemeier, 1Peter,

p. 15-23; e Elliott, 1Peter, p. 20-39.

40
Por exemplo, Goppelt, 1Peter, p. 46; Brown, Introduction to the New Testament, p. 719-22; e

F. Lapham, Peter: The Myth, the Man and the Writings: A Study of Early Petrine Text and Tradition,

JSNTSup 239 (New York: Sheffield Academic Press, 2003), p. 141-42.

41
Jobes, 1Peter, p. 27-32 [publicado em português por Vida Nova sob o título 1Pedro].

42
No tumulto em Éfeso, Demétrio, o artesão, observou que a missão de Paulo havia sido bem-

sucedida “não só em Éfeso, mas em quase toda a Ásia” (At 19.26). Evidências de atividades

missionárias além de Paulo podem ser encontradas em Colossenses, onde o povo não tinha visto

Paulo (Cl 2.1), e Lucas podia confiantemente proclamar que todos que habitavam na Ásia “ouviram a

palavra do Senhor” (At 19.10).

1576
43
Contra Beare (First Epistle of Peter, p. 48), que afirmou: “O caso contra a atribuição a Pedro é

esmagador”.

44
Veja especialmente T. L. Wilder, Pseudonymity, the New Testament, and Deception; Guthrie,

“Appendix C: Epistolary Pseudepigraphy”, em: New Testament Introduction, p. 1011-28.

45
Selwyn (1Peter, p. 23-24), que atribuiu essas afinidades ao conhecimento que o autor tinha de

Q.

46
R. Gundry, “Verba Christi in 1Peter: Their Implications Concerning the Authorship of 1Peter

and the Authenticity of the Gospel Tradition”, NTS 13 (1966-67), p. 336-50; cf. id., “Further Verba

on Verba Christi in First Peter”, Bib 55 (1974), p. 211-32.

47
Por exemplo, Atos 2.23 e 1Pedro 1.2,20; 2.4,5; Atos 2.33 e 1Pedro 1.12; 3.22; 4.1; Atos 2.36 e

1Pedro 1.11; 3.14; 4.12; Atos 2.38 e 1Pedro 3.22; e Atos 10.42 e 1Pedro 4.2.

48
Marshall, 1Peter, p. 24.

49
J. A. T. Robinson, Redating the New Testament (Philadelphia: Westminster, 1976), p. 164; cf.

Marshall, 1Peter, p. 21, que corretamente afirmou de 1Pedro: “se alguma vez houve um caso frágil

de pseudonimato, certamente diz respeito a esta carta”.

50
Robinson, Redating, p. 164.

51
A perseguição dos cristãos patrocinada pelo estado só é atestada para os reinados de Nero,

Domiciano, e Trajano. Robinson (Redating, p. 155-56) observou que Domiciano foi escolhido como

uma solução para aqueles que não toleravam Nero nem Trajano. Ele, ironicamente, chegou a dizer

que Apocalipse, Hebreus, 1Clemente, Barnabé, a Didaquê, Efésios, Lucas, Atos, Mateus, João, as

Epístolas Joaninas, Tiago, Judas, e as Pastorais foram todas convenientemente relegadas por alguns

ao reinado de Domiciano, não porque se sabe muito sobre isso, mas porque sabemos tão pouco. Ele

afirmou: “Daí a sua atratividade como um depósito: ela pode acomodar quase qualquer coisa”.

1577
52
Veja Robinson (ibid., p. 162-63), que também mencionou Kelly, Epistles of Peter and of Jude,

p. 30; F. L. Cross, 1Peter: A Paschal Liturgy (London: A. R. Mowbray, 1954), p. 43-44; e C. F. D.

Moule, “The Nature and Purpose of 1Peter”, NTS 3 (1956-57), p. 11.

53
Para uma discussão mais detalhada da perseguição em 1Pedro, veja Schreiner, 1, 2Peter and

Jude, p. 28-31.

54
Veja Achtemeier, 1Peter, p. 353. Estrabão (c. 19 d.C.) observou que a cidade “está tão deserta

que alguém não hesitaria em dizer […] ‘a Grande Cidade é um grande deserto’” (Geog. 16.1.5).

55
Grudem, 1Peter, p. 33.

56
Veja J. H. Elliott, “Peter, First Epistle of”, ABD 5:277.

57
Brown, Introduction to the New Testament, p. 708.

58
Também Agostinho, Jerônimo, e Calvino. Este é um entendimento plausível, dado que Antíoco

III no século III a.C. enviou 2 mil judeus da Babilônia para colonizar a Lídia e a Frígia (Jobes,

1Peter, p. 23).

59
Veja os esboços praticamente idênticos em Michaels, 1Peter, xxxiv-xxxvii; Jobes, 1Peter, vii,

p. 56-57; Davids, First Epistle to Peter, p. 28-29; e Schreiner, 1, 2Peter, Jude, p. 46-48. Grudem

(1Peter, p. 44-46) não viu nenhuma grande ruptura em 4.12 e dividiu a carta em duas unidades

principais, 1.1 a 2.10 e 2.11 a 5.14 [Publicado em português por Vida Nova sob o título Comentário

bíblico de 1Pedro]. Marshall (1Peter, p. 28) traz uma grande ruptura em 3.13 em vez de 4.12. Para

uma discussão e crítica das propostas alternativas, veja Schreiner, 1, 2Peter, Jude, p. 47-48.

60
A expressão em 2.1 traduzida como um mandamento, “deixai de lado”, na verdade denota a

ação previamente necessária ao mandamento principal encontrado em 2.2, “desejai”.

Especificamente enumerados estão aqueles pecados que destruiriam a comunhão com outros fiéis —

a antítese ao imperativo anterior (veja Jobes, 1Peter, p. 131).

1578
61
Veja D. A. Carson, “1Peter”, em: G. K. Beale; D. A. Carson, orgs., Commentary on the New

Testament Use of the Old Testament (Grand Rapids: Baker, 2007), p. 1023-33 [publicado em

português por Vida Nova sob o título Comentário do uso do Antigo Testamento no Novo Testamento];

e N. Hillyer, “’Rock-Stone Imagery in 1Peter”, TynBul 22 (1971), p. 58-81. A palavra “pedra”

(lithos) ocorre em 2.4-8. Pedro, aqui, engajou-se em uma prática rabínica conhecida como “colar de

pérolas”, conectando uma série de referências sobre um tema semelhante (também conhecida como

gezerah shawah). Caracteristicamente, Pedro primeiro parafraseou uma dada referência e depois a

citou.

62
Veja a discussão em Jobes, 1Peter, p. 144-52 [publicado em português por Vida Nova sob o

título 1Pedro].

63
Para uma proveitosa discussão, veja Schreiner, 1, 2Peter, Jude, p. 158-61; Michaels, 1Peter, p.

167-71.

64
Para um tratamento de 3.18-22, veja o quadro 18.1.

65
O termo “cristão” (Christianos), embora extremamente comum hoje, é encontrado apenas duas

vezes no NT. Em Atos 11.26, Lucas afirmou que os discipulos foram chamados “cristãos” pela

primeira vez em Antioquia (c. 43/44). Em Atos 26.28, o rei Agripa usou o termo “cristão” (c. 58/59).

Outros nomes para cristãos na época da igreja primitiva eram seguidores do Caminho (At 9.2; 24.14)

ou do “nome” (i. e., Deus/Cristo; veja At 2.21; 4.12; Rm 10.13; Fp 2.9-10; Hb 1.4; 1Pe 4.16).

66
A expressão “ardente provação (pyrōsis) em 4.12 provavelmente se refere ao refino e

purificação que a perseguição traz com relação ao caráter e confissão que o fiel faz de Cristo (veja

1.6,7; veja Sl 66.10; Ml 3.1-4). Para uma proveitosa discussão e referências bibliográficas adicionais,

veja Schreiner (1, 2Peter, Jude, p. 219-20), citando D. E. Johnson, “Fire in God’s House: Imagery

from Malachi 3 in Peter’s Theology of Suffering (1Pe 4.12-19)”, JETS 29 (1986), p. 287-89.

1579
67
Curiosamente, em 1Pedro 5.1, Pedro se referiu a si mesmo como “testemunha dos sofrimentos

do Messias”; em 2Pedro 1.16, ele se chamou de uma das “testemunhas de Sua [majestade]” na

Transfiguração “quando ele recebeu honra e glória de Deus o Pai” (2Pe 1.17). Veja a seguir a

discussão do tema testemunha ocular sob Temas Teológicos em 2Pedro.

68
As palavras gregas relevantes são parepidēmos (“residente temporário” em 1.1; 2.11; veja Hb

11.13; essas são as três únicas ocorrências no NT) e paroikos (“estrangeiro” ou “forasteiro” em 2.11;

veja At 7.6,29; Ef 2.19; essas são as quatro únicas ocorrências no NT). Uma outra palavra

relacionada não usada em 1Pedro e que ocorre 14 vezes no NT é is xenos (“estrangeiro”; p. ex., Ef

2.12,19; Hb 11.13).

69
Veja F. Thielman, Theology of the New Testament: A Canonical and Synthetic Approach

(Grand Rapids: Zondervan, 2005), p. 571-72.

70
O caso seguindo a preposição epi (“sobre”) em 2.24, um acusativo, sugere que Pedro não

estava tão preocupado com Jesus suportando os nossos pecados na cruz (onde se poderia ter esperado

o caso dativo em grego), mas com a maneira pela qual Jesus suportou nossos pecados no caminho

para a cruz.

71
Esta é essencialmente a perspectiva 4 no Quadro 18.1. Para uma articulação complete desta

posição, veja Michaels, 1Peter, p. 205-13. Para uma excelente exposição da perspectiva alternativa

de que a referência é a Cristo pregando por meio de Noé, veja Grudem, 1Peter, p. 203-39.

72
Brown, Introduction to the New Testament, p. 767.

73
Por exemplo, Kelly, Epistles of Peter and of Jude, p. 33, 236.

74
Hist. Ec. 3.3.1.

75
Jerônimo, Vir. ill. i.

1580
76
M. J. Kruger, “The Authenticity of 2Peter”, JETS 42 (1999), p. 651. Afirma-se frequentemente

que a igreja síria não recebeu a carta em seu canon até o século VI. Isto é baseado na ausência do

livro na Peshitta (c. 411) a sua subsequente reaparição na Versão Filoxena (c. 506). Kruger (ibid., p.

652), citando Warfield, observou que há alguma especulação de que o canon siríaco na verdade

continha o livro desde cedo.

77
Bauckham, Jude, 2Peter, p. 276. Kruger (“Authenticity”, p. 654) afirmou: “Não apenas alguém

da estatura de Clemente não seria enganado por uma falsificação que possuía apenas alguns anos,

mas ele dificilmente escreveria um comentário sobre um livro que a maior parte da igreja rejeitou

como sendo uma imitação de Pedro recentemente composta”.

78
Por exemplo, Ireneu, Contra Heresias 3.1.1; 5.23.2.

79
Bauckham, Jude, 2Peter, p. 162.

80
Kruger (“Authenticity”, p. 655-56), que citou 1Clem. 23.3/2Pe 3.4 como uma forte alusão por

causa de um padrão comum de referência no context. Cf. as seguintes afinidades: falsos mestres

(1Clem. 21.5/2Pe 2.1); dúvidas futuras (1Clem. 23/2Pe 3.4); e a proximidade do retorno de Cristo

(1Clem. 23.5/2Pe 3.10). Além do mais, ambos os escritores usaram a incomum frase “a magnífica

glória” em referência a Deus (1Clem. 9.2/2Pe 1.17), e o cristianismo é descrito por ambos como “o

caminho da verdade” (1Clem. 35.5/2Pe 2.2).

81
Veja R. E. Picirilli, “Allusions to 2Peter in the Apostolic Fathers”, JSNT 33 (1988), p. 57-83.

Ele concluiu que muitos dos pais apostólicos conheciam, aludiram e refletiram 2Pedro. Picirilli

também observou que esses pais tipicamente não mencionaram Pedro pelo nome como o autor, mas

que eles identificaram Paulo como o autor das cartas comumente atribuídas a ele.

82
Existia um Evangelho de Pedro; Pregação de Pedro; Atos de Pedro; Atos de Pedro e dos Doze

Apóstolos; Epístola de Pedro a Filipe; Apocalipse Copta de Pedro; e um Apocalipse de Pedro.

83
Kruger, “Authenticity”, p. 662.

1581
84
Um escritor chegou a chamar 2Pedro de “grego baboo”; veja E. A. Abbott, “On the Second

Epistle of St. Peter. I. Had the Author Read Josephus? II. Had the Author Read St. Jude? III. Was the

Author St. Peter?”, The Expositor 2/3 (1882), p. 204-19.

85
T. Callan (“The Style of the Second Letter of Peter”, Bib 84 [2003], p. 202-24) encontrou

afinidades estilísticas com o Grande Estilo Asiático de Grego, particularmente o estilo bombástico. O

estilo asiático é uma elevação da língua que inclui pensamento, vocabulário e sintaxe. A variedade

bombástica inclui sentenças longas, um ritmo marcado e um uso incomum da língua que é

encontrado em certa medida em 2Pedro. Cf. D. F. Watson, Invention, Arrangement, and Style:

Rhetorical Criticism of Jude and 2Peter, SBLDS 104 (Atlanta: Scholars, 1988).

86
Também C. Blomberg, From Pentecost to Patmos: An Introduction to Acts Through Revelation

(Nashville: B&H, 2006), p. 474-75 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução

de Atos a Apocalipse: uma pesquisa abrangente de Pentecostes a Patmos]. Bauckham (Jude, 2Peter,

p. 160) argumentou que esta referência apenas indica que o autor conhecia Pedro pessoalmente,

enquanto Robinson (Redating, p. 194) usou a referência para defender sua tese de que Judas foi o

amanuense de Pedro.

87
Para exemplos adicionais, veja M. Green, 2Peter Reconsidered (London: Tyndale, 1960), p.

12-13.

88
Kruger, “Authenticity”, p. 661.

89
Veja Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 661 [publicado em português por

Vida Nova sob o título Introdução ao Novo Testamento]. O Grande Estilo Asiático comunicaria aos

leitores que o tema era bastante importante e que o autor estava fazendo um apelo emocional (veja

Callan, “Style”, p. 224). Essa é uma convenção apropriada para a situação de 2Pedro, uma vez que o

autor estava se aproximando de sua morte na presença de um ensinamento falso.

1582
90
Por exemplo, Kümmel, Introduction, p. 432. Bauckham (Jude, 2Peter, p. 156) citou H.

Werdermann (Die Irrlehrer der Judas- und 2. Petrusbriefe, BFcT 17/6 [Gütersloh: C. Bertelsmann,

1913]) como o primeiro a propor oponentes gnósticos.

91
Bauckham (Jude, 2Peter, p. 156). Suas principais linhas de argumentação são resumidas no

restante do parágrafo e ele afirmou categoricamente: “Os oponentes em 2Pedro não são gnósticos”.

Bauckham concordou com o trabalho de Neyrey, que pensou que os oponentes eram “cristãos”

influenciados por epicuristas, e não gnósticos. Veja J. H. Neyrey, “The Form and Background of the

Polemic in 2Peter”, JBL 99 (1980), p. 407-31.

92
Guthrie, Introduction, p. 827.

93
Por exemplo, Kelly, Epistles of Peter and Jude, p. 235. Kelly também mencionou a referência

em 2Pe 3.2 aos “vossos apóstolos”, mas isso não precisa ser entendido como algo além dos

emissários dos leitores.

94
Também Kruger, “Authenticity”, p. 667; Guthrie, Introduction, p. 829-30.

95
Veja Bauckham (Jude, 2Peter, p. 13), que datou a carta dos anos 50.

96
Veja a discussão da relação entre Judas e 2Pedro abaixo.

97
Ibid., p. 159. Bauckham propôs uma data o mais cedo possível com base somente em sua

interpretação de 3.4 como fazendo referência à era apostólica.

98
Ibid., p. 161-62.

99
Ibid., p. 134.

100
Schreiner (1, 2Peter, Jude, p. 274), a quem parte deste parágrafo é devida.

101
Veja o levantamento de evidências externas em ibid., p. 262-64, com referência a R. E.

Picirilli, “Allusions to 2Peter in the Apostolic Fathers”, JSNT 33 (1988), p. 57-83.

1583
102
Bauckham (Jude, 2Peter, p. 13) afirmou que a carta foi escrita para o mesmo público que

1Pedro (veja 2Pe 3.1).

103
Schreiner, 1, 2Peter, Jude, p. 274-75.

104
Green, 2Peter Reconsidered, p. 37.

105
Ibid.

106
No mínimo, a humildade exigiria que os intérpretes reconhecessem a evidência limitada que

está disponível para decidir a questão e que dar à autoria petrina o benefício da dúvida é a opção mais

razoável. Veja Davids, 2Peter, Jude, p. 129.

107
Para um relato apócrifo do martírio de Pedro, veja o Martírio de Pedro (c. 200), reproduzido

em J. K. Elliott, The Apocryphal New Testament (Oxford: Clarendon, 1993), p. 421-26. Cf. Dionísio

de Corinto, “Letter to Soter”, citado em Eusébio, Hist. Ec. 2.25.8 (carta original datada em c. 170),

que fala de “Pedro e Paulo, [que] juntos também ensinaram na Itália no mesmo lugar e foram

martirizados ao mesmo tempo”.

108
Veja especialmente a discussão complete em Robinson, Redating, p. 140-50.

109
Veja Bauckham, 2Peter, p. 135-38.

110
Muitos que não consideram Pedro como o autor da carta ainda defendem Roma como o local

de origem. Um bom exemplo é Bauckham (2Peter, Jude, p. 159), que concluiu que a carta foi escrita

de Roma com base em grandes afinidades com 1 e 2Clemente e o Pastor de Hermas e a associação

com 1Pedro.

111
Veja Davids, 2Peter, Jude, p. 133.

112
Bauckham, Jude, 2Peter, p. 154.

1584
113
É possível que eles tenham defendido que a graça os libertava da obrigação de obedecer a

padrões éticos. Também Schreiner, 1, 2Peter, Jude, p. 277.

114
O primeiro foi Werdermann, Irrlehrer. Mais recentemente, veja C. Talbert, “2Peter and the

Delay of the Parousia”, VC 20 (1966), p. 141-43.

115
Também Bauckham, Jude, 2Peter, p. 156, seguindo Neyrey, “Form and Background”, p. 407-

31. Para uma breve descrição do Epicurismo, veja cap. 2.

116
Schreiner, 1, 2Peter, Jude, p. 280. Davids (2Peter, Jude, p. 133-6) sugeriu que isso era mais

uma influência epicurista vigente na época; semelhantemente, Thielman, Theology of the New

Testament, p. 526.

117
Veja a refutação do desafio da unidade de 2Pedro por M. McNamara (“The Unity of Second

Peter: A Reconsideration”, Scr 12 [1960], p. 13-9) em: Schreiner, 1, 2Peter, Jude, p. 281.

118
Veja Schreiner (1, 2Peter, Jude, p. 218), que questionou a aplicação da crítica retórica a

2Pedro por Watson (Invention, Arrangement, and Style), com referência a S. E. Porter; T. H. Olbricht,

orgs., Rhetoric and the New Testament: Essays from the 1992 Heidelberg Conference (Sheffield:

JSOT, 1993); e J. A. D. Weima, “What does Aristotle Have to do with Paul? An Evaluation of

Rhetorical Criticism”, CTJ 32 (1997), p. 458-68.

119
Veja Schreiner, 1, 2Peter, Jude, p. 282; e D. J. Moo, 2Peter, Jude, NIVAC (Grand Rapids:

Zondervan, 1996), p. 26.

120
Um caso especial é Bauckham (Jude, 2Peter, p. 135), que postulou um esboço bastante

complicado, com Pedro respondendo a quatro objeções.

121
Um padrão também encontrado em 1Pedro.

122
Também Davids, 2Peter, Jude, p. 179.

123
Para uma defesa do uso que Pedro faz de Judas, veja o tratamento de Judas.

1585
124
Veja Blomberg, From Pentecost to Patmos, p. Essa interpretação se adequa bem às afirmações

anteriores de Pedro de que Deus sabe como preservar o justo em meio a um mundo imundo.

125
Veja Kelly, Epistles of Peter and of Jude, p. 328; Thielman, Theology of the New Testament,

p. 527. Pedro usou o termo hodos (“caminho”) quatro vezes (2.2,15 [2x],21), bem como as

expressões correlatas eisodos (“entrada,” 1.11) e exodus (“partida”) (1.15).

126
O elemento mais incomum das instruções de Pedro é encontrado em 1.4, em que é dito que os

fiéis participam da natureza divina. Com isso, Pedro não quis dizer participação na essência de Deus,

mas a capacidade de progredir nas virtudes cristãs. Veja Thielman, Theology of the New Testament, p.

527, citando J. M. Starr, Sharers in the Divine Nature: 2Peter 1.4 in Its Hellenistic Context, ConBNT

33 (Stockholm: Almqvist & Wiksell, 2000), p. 47-48. Contra Bauckham (Jude, 2Peter, p. 182), que

via a imortalidade como a referência primária.

127
Veja adiante a seção Algo para Pensar.

128
Thielman, Theology of the New Testament, p. 535.

129
D. J. Rowston, “The Most Neglected Book in the New Testament”, NTS 21 (1975), p. 554-63;

veja R. Bauckham, Jude, 2Peter, WBC 50 (Waco: Word, 1983), xi: “Nenhum livro do NT tem sido

mais negligenciado pelos estudiosos do que Judas e 2Pedro”. R. Heiligenthal (“Der Judasbrief.

Aspekte der Forschung in den letzten Jahrzehnten”, TRu 51 [1986], p. 117-29) falou de uma

“existência indistinta” e um “tempo de negligência geral” de Judas.

130
Veja R. Bauckham, “The Letter of Jude: An Account of Research”, Aufstieg und Niedergang

der Romischen Welt 2.25.5 (Berlin: de Gruyter, 1988), p. 3791-826.

131
R. L. Webb, “Jude”, em: R. P. Martin; P. H. Davids, orgs., Dictionary of the Later New

Testament and Its Developments (Downers Grove: InterVarsity, 1997), p. 611-21.

132
Também R. Bauckham, Jude and the Relatives of Jesus in the Early Church (Edinburgh: T&T

Clark, 1990), p. 172. Bauckham observou que antes do século XIX (incluindo Calvino e o Concílio

1586
de Trento) o apóstolo Judas era considerado o autor de Judas (veja Lc 6.16; At 1.13). No entanto, o

apóstolo Judas foi identificado com o meio-irmão de Jesus, que é mencionado em Mateus 13.55 e

Marcos 6.3. Jessein (1821) foi o primeiro a argumentar contra esse consenso e a distinguir Judas, o

meio-irmão de Jesus e autor de Judas, de Judas o apóstolo. Veja a lista de identificações alternativas

de Judas em Bauckham, Jude and the Relatives of Jesus, p. 172-73.

133
Compare Judas 1, “Judas, um escravo de Jesus Cristo e um irmão de Tiago”, com Tiago 1.1:

“Tiago, um escravo de Deus e do Senhor Jesus Cristo”.

134
De acordo com Gálatas 2.9, Tiago, junto com Pedro e João, era um dos “pilares” da igreja em

Jerusalém. Tiago teve um papel de liderança no Concílio de Jerusalém (At 15.13; veja 12.17; 21.18).

Paulo também mencionou que o Cristo ressurreto tinha aparecido a Tiago (1Co 15.7) e chamou Tiago

de “irmão do Senhor” (Gl 1.19; veja At 1.14; 1Co 9.5). Notavelmente, Tiago se chamou apenas de

“um escravo de Deus e do Senhor Jesus Cristo” (1.1).

135
Kelly (Epistles of Peter and of Jude, p. 242) acreditava que Judas teria identificado a si

mesmo como “irmão do Senhor” e que a designação “irmão de Tiago” aponta para um pseudonimato.

Também H. Windisch, Die katholischen Briefe, HNT, 3. ed. rev. de H. Preisker (Tübingen: J. C. B.

Mohr [Paul Siebeck], 1951 [1911]), p. 38; mas veja a resposta decisiva de Bauckham, Jude, 2Peter,

p. 24.

136
Esse é um argumento convincente contra o pseudonimato de Judas. Como Bauckham (Jude

and the Relatives of Jesus, p. 176) observou, “a falta de referência ao relacionamento de Judas com

Jesus é muito mais facilmente explicada com base na suposição de autenticidade em vez de na

suposição de pseudepigrafia”.

137
Sobre o fenômeno de pseudonimato, veja as referências bibliográficas listadas na nota de

rodapé 4.

1587
138
Também corretamente Bauckham, Jude and the Relatives of Jesus, p. 175, com referência a

Farrar, Weiss, Zahn, Moff at, Wohlenberg, Cranfield, Green, and Guthrie; cf. Bauckham, “Account of

Research”, p. 3817-18. Algumas vezes, argumenta-se que o autor de Judas não foi o próprio Judas,

mas sim um amigo, aluno ou parente de Judas (B. Reicke, The Epistles of James, Peter and Jude, AB

37 [Garden City, NY: Doubleday, 1964]; J. Michl, Die katholischen Briefe, RNT 8/2, 2. ed.

[Regensburg: F. Pustet, 1968]; W. Grundmann, Der Brief des Judas und der Zweite Brief des Petrus,

THNT 15 [Berlin: de Gruyter, 1974], p. 15-6) ou que ele pertencia ao “círculo de Judas” (G.

Hollmann, Der Brief Judas und der zweite Brief des Petrus, em: J. Weiss, orgs., Die Schriften des

Neuen Testaments [Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1907], vol. 2, p. 572). O argumento

também foi desenvolvido por no sentido de que o epíteto “irmão de Tiago” serviu para dar autoridade

à carta de Judas (W. Schrage, Der Judasbrief, in: H. Balz; W. Schrage, orgs., Die “Katholischen”

Briefe: Die Briefe des Jakobus, Petrus, Johannes und Judas, 11. ed., NTD 10 [Göttingen:

Vandenhoeck & Ruprecht, 1973], p. 220). Ainda assim essas teorias são muito mais plausíveis que a

suposição mais simples de que Judas, o irmão de Tiago, foi, ele mesmo, o autor da carta.

139
Muitos (se não a maioria) dos comentadores. Contemporâneos. Outros, no entanto, como D. J.

Moo (2Peter, Jude, NIVAC [Grand Rapids: Zondervan, 1996], p. 18), argumentaram que Judas usou

partes de 2Pedro.

140
Talvez a fim de compensar, Pedro complementou a carta de Judas com os exemplos bíblicos

de Noé (2Pe 2.5) e Ló (2Pe 2.7-9) e forneceu uma apresentação mais completa de Balaão (2Pe

2.15,16).

141
Veja Bauckham, Jude and the Relatives of Jesus, p. 168-9, n. 237; id., “Account of Research”,

p. 3812-15.

142
Representantes dessa teoria incluem Windisch, Katholischen Briefe; and K. H. Schelkle, Die

Petrusbriefe, der Judasbrief, HTKNT 13/2 (Freiburg: Herder, 1961). Mas veja Bauckham, Jude and

the Relatives of Jesus, p. 158-60.

1588
143
J. D. G. Dunn, Unity and Diversity in the New Testament, 2. ed. (London/Philadelphia: Trinity

Press International, 1990), p. 341-66.

144
Veja esp. R. L. Webb, “The Eschatology of the Epistle of Jude and Its Rhetorical and Social

Functions”, BBR 6 (1996), p. 139-51.

145
Bauckham, Jude, 2Peter, p. 13.

146
Schlatter, Theology of the Apostles, p. 103-8, esp. p. 103 com o título “The Gnostic Threat”.

Cf. W. G. Kümmel, Introduction to the New Testament, ed. rev., tradução para o inglês de H. C. Kee

(Nashville: Abingdon, 1975), p. 426 e 432; e E. Käsemann, “An Apologia for Primitive Christian

Eschatology”, em: Essays on New Testament Themes (Naperville: Allenson, 1964), p. 171-72.

147
Algumas vezes, Judas 17 é citado como suporte a uma data tardia, uma vez que essa

passagem parece enxergar a o período apostólico como algo do passado. No entanto, é mais provável

que a referência de Judas seja à atividade missionária dos apóstolos que levou ao estabelecimento da

igreja. Veja Bauckham, Jude and the Relatives of Jesus, p. 170-71.

148
Robinson (Redating, p. 197) propôs que se Tiago estivesse realmente morto na época da

escrita de Judas, este teria se referido a ele como “o bendito”, “o bom”, ou “o justo”. Uma vez que

Judas não fez isso, Tiago deveria provavelmente estar vivo. Tiago morreu a morte de um mártir no

ano 62, então Robinson sugeriu que Judas foi escrita antes dessa época.

149
Se a carta de Judas revela tendências antignósticas, então 1Tm 6.21 fornece confirmação

adicional de que elementos protognósticos já estavam em funcionamento na Ásia Menor no início

dos anos 60 (com a suposição da autoria paulina das Pastorais).

150
Bauckham, Jude and the Relatives of Jesus, p. 155, 161; D. A. Hagner, “Jewish Christianity”,

em: Dictionary of the Later New Testament and Its Developments, p. 582.

151
Bauckham, Jude and the Relatives of Jesus, p. 161.

1589
152
Veja os interessantes paralelos citados em Schlatter, Theology of the apostles, p. 103-6.

153
Veja Bauckham, Jude, 2Peter, p. 26; F. Spitta, Der zweite Brief des Petrus und der Brief des

Judas: Eine geschichtliche Untersuchung (Halle: Verlag der Buchhandlung des Waisenhauses, 1885),

p. 301: “se Judas apela para a autoridade de Tiago, parece provável que os leitores eram tais que

Tiago era de fato uma autoridade para eles” (tradução nossa).

154
Veja o levantamento de Bauckham, “Account of Research”, p. 3809-12; o tratamento

completo por G. Sellin, “Die Häretiker des Judasbriefes”, ZNW 76-77 (1985-86), p. 206-25; e

Werdermann, Irrlehrer, que identificou os hereges como libertinos protognósticos e datou a carta de

Judas em c. 80.

155
Veja G. Theissen, The First Followers of Jesus (London: SCM, 1978).

156
Possivelmente eles se consideravam irremediavelmente como escravos de seu próprio destino

e mudaram a responsabilidade por sua própria conduta licenciosa para com outros. Também R. P.

Martin, The Theology of Jude, 1Peter, and 2Peter, em: A. Chester; R. P. Martin, The Theology of the

Letters of James, Peter, and Jude (Cambridge: University Press, 1994), p. 71.

157
See C. A. Evans, “Midrash”, em: J. B. Green; S. McKnight; I. H. Marshall, orgs., Dictionary

of Jesus and the Gospels (Downers Grove: InterVarsity, 1992), p. 544-48.

158
Bauckham, Jude, 2Peter, p. 1; D. F. Watson, “Letter, Letter Form”, em: Dictionary of the

Later New Testament and Its Developments, p. 653.

159
J. D. Charles, “Jude’s Use of Pseudepigraphical Source-Material as Part of a Literary

Strategy”, NTS 37 (1991), p. 130-45.

160
Também Webb, “Jude”, p. 612.

161
Orígenes, Comm. Matt. 10.17; GCS 10.22; citado em J. H. Neyrey (2Peter, Jude, AB 37C

[New York: Doubleday, 1993], p. 27), que forneceu detalhes adicionais.

1590
162
Para uma extensa lista de tríades em Judas, veja Charles, “Literary Artifice”, p. 122-23. Com

relação ao efeito retórico das tríades como “amplificação por acúmulo”, veja Watson, Invention,

Arrangement, and Style; E. von Dobschütz, “Zwei-und Dreigliedrige Formeln”, JBL 50 (1931), p.

118-32.

163
Um excelente levantamento das fontes de Judas é encontrado em Bauckham, “Account of

Research”, p. 3793-3800; cf. Rowston, “Most Neglected Book”, p. 557-59; Charles, “Literary

Strategy”, p. 130-45. Sobre o uso que Judas faz de 1Enoque 1.9 em Jd 14,15, veja M. Black, “The

Maranatha Invocation and Jude 14,15 (1Enoch 1.9)”, em: B. Lindars; S. S. Smalley, orgs., Christ and

Spirit in the New Testament. Fs. C. F. D. Moule (Cambridge: University Press, 1973), 189-96; e C. D.

Osburn, “The Christological Use of 1Enoch 1.9 in Jude 14,15”, NTS 23 (1976-77), p. 334-41.

164
Veja Charles, “‘Those’ and ‘These’: The Use of the Old Testament in the Epistle of Jude”,

JSNT 38 (1990), p. 109-24; T. R. Wolthuis, “Jude and Jewish Traditions,” CTJ 22 (1987), p. 21-41; e

Bauckham, Jude, 2Peter, passim.

165
Também, corretamente, Rowston, “Most Neglected Book”, p. 563: “é muito mais fácil

assumir que Judas é o original”. Entre aqueles que propõem uma fonte comum para Judas e 2Pedro

estão Reicke, James, Peter, Jude, p. 189-90; e M. Green, 2Peter and Jude, TNTC, ed. rev. (Downers

Grove: InterVarsity, 1987), p. 58-64.

166
Uma estrutura quiástica ligeiramente diferente é proposta por Bauckham (Jude, 2 Peter, p.

5,6), e Webb (“Jude,” 612), seguiu Bauckham:

A Apelo: necessidade de batalhar pela fé (v. 3)

B Motivo do apelo: falsos mestres identificados e condenados (v. 4)

B’ Motivo do apelo: falsos mestres identificados e condenados (v. 5-19)

A’ Apelo: como batalhar pela fé (v. 20-23).

167
Bauckham, Jude, 2Peter, p. 4.

1591
168
E. E. Ellis, “Prophecy and Hermeneutic in Jude”, em: Prophecy and Hermeneutic in Early

Christianity: New Testament Essays, WUNT 18 (Tübingen: J. C. B. Mohr [Paul Siebeck], 1978), p.

221-36.

169
Bauckham, Jude, 2Peter, p. 5.

1592
CAPÍTULO 19

As epístolas joaninas: 1, 2 e 3João

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer os principais
fatos de 1, 2 e 3João. Em relação à História, eles deverão ser capazes de
identificar o autor, a data, a origem, o destino e o propósito de cada livro.
Em relação à Literatura, deverão ser capazes de fornecer uma descrição
básica de cada livro e identificar os principais elementos do conteúdo de
cada livro encontrados na Discussão Unidade por Unidade. Em relação à
Teologia, os estudantes deverão ser capazes de identificar os principais
temas teológicos em 1, 2 e 3João.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo
essencial identificado no Conhecimento básico, os estudantes deverão ser
capazes de apresentar os argumentos para conclusões históricas, literárias e
teológicas. Em relação à História, deverão ser capazes de discutir as
evidências da autoria joanina, data, origem, destino e propósito. Em relação
à Literatura, deverão ser capazes de fornecer uma descrição detalhada do
livro. Em relação à Teologia, os estudantes deverão ser capazes de discutir

1593
os principais temas teológicos nas epístolas joaninas e as formas pelas quais
elas, de forma única, contribuem para o cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além de domínio do conteúdo essencial
identificado no Conhecimento básico e Conhecimento intermediário, os
estudantes deverão ser capazes de interagir de forma convincente com os
críticos modernos que rejeitam a opinião da adesão da antiga igreja à
autoria joanina de 1, 2 e 3João. Eles também deverão ser capazes de discutir
a identidade da “senhora eleita” em 2João 1, explicar o gênero de 1João, e
discutir as diversas propostas estruturais para 1João.

Mapa 19.1: Origem e destino de 1, 2 e 3João.

1594
FATOS-CHAVE DAS EPÍSTOLAS JOANINAS
Autor: João, o filho de Zebedeu
Data: c. 90-95
Origem: Ásia Menor
Destino: Igrejas em Éfeso e ao seu redor
Motivo: A recente partida dos falsos mestres da
igreja de Éfeso (1Jo); falsos mestres
itinerantes (2Jo); um déspota autoritário
chamado Diótrefes (3Jo)
Propósito: João encoraja os fiéis a amarem a Deus e
uns aos outros e os assegura de que estão no
Filho (1Jo); os instrui a não estender
hospitalidade aos falsos mestres (2Jo); e
auxilia Gaio a lidar com o autoritário
Diótrefes (3Jo)
Tema: Reafirmação cristã e o contínuo caminhar
em amor e verdade
Versículos-Chave: 1João 5.11,12; 2João 9-11; 3João 4

INTRODUÇÃO

Em suas palestras sobre 1João, Martinho Lutero declarou: “Eu nunca li


um livro escrito em palavras mais simples que este e, no entanto, as
palavras são inexprimíveis.”1 Seu companheiro, o reformador João Calvino
comentou sobre o autor: “Às vezes ele nos adverte em geral a uma vida
piedosa e santa; às vezes, ele dá instruções expressas sobre o amor. No
entanto, ele não faz nada disso sistematicamente, mas varia ensino com
exortação”.2

1595
Esses dois comentários revelam uma medida do paradoxo das cartas de
João: simples em expressão (um vocabulário de apenas 303 palavras), mas
complexa em pensamento. Especialmente a primeira carta de João mostrou
ser o básico dos estudantes de grego introdutório e a perdição dos
comentaristas experientes.
Na igreja e ao longo da história, a primeira carta foi lida, amada e
memorizada por muitos cristãos inseguros, que se refugiaram em seu
conteúdo na busca de conforto pela confiança que ela proporciona. William
Penn ficou tão impressionado com o novo mandamento dado em 1João que
nomeou a principal cidade da Pensilvânia de Filadélfia,“a cidade do amor
fraternal”. Em contraste, a segunda e a terceira cartas foram, e continuam a
ser, negligenciadas em proporções quase iguais, em detrimento de todos os
que o fazem.

HISTÓRIA
Autor
Evidências externas
Por unanimidade, a tradição da igreja primitiva defendeu que o autor de
1João foi o apóstolo João, filho de Zebedeu, mas a autoria de 2João e 3João
não foram tão fortemente atestadas. Orígenes (c. 185-254) observou que
alguns não receberam essas cartas, embora ele mesmo tenha recebido.3
Apesar da hesitação de alguns, 2 e 3João foram recebidas no cânon com a
forte convicção de que João, o apóstolo, era o autor.
Mais recentemente, contudo, a confiança na tradição tem sido
frequentemente minada pela alegação de que nenhuma atribuição explícita a

1596
João como o autor ocorre até Ireneu (c. 130-200). Afirmações como as
seguintes, de R. Brown, são comuns:

Não há nenhuma evidência clara entre os escritores cristãos de um conhecimento de qualquer


uma das Epístolas joaninas antes de meados do século II [e] a falta de antigas atestações nos
faz cautelosos em assumir que houve uma forte tradição durante o século II atribuindo-as a
uma figura conhecida chamada João.4

Esse ceticismo é frequentemente usado para apoiar uma teoria de que os


ortodoxos inicialmente ficaram apreensivos com as cartas de João até a sua
reabilitação por Ireneu.5
Em resposta, deve-se observar que esses tipos de declaração surgem da
exigência excessivamente rígida de que um texto deve ser mencionado
como “de João” antes que possa ser utilizado em suporte da autoria de João.
Essa, porém, é uma carga ilegítima imposta sobre a citação de origem. Se
isso for mantido em mente, torna-se relevante que as sólidas evidências do
uso autoritativo dessas cartas, muito provavelmente implicando a suposição
e aceitação da autoria de João, existe muito antes de Ireneu.6 Policarpo (c.
69-155),7 Inácio (c. 35-110), Papias (c. 60-130), a Epistula Apostolorum (c.
140), e a Epístola a Diogneto (séc. II ou III), entre outros, mostram pelo
menos uma grande apreciação das cartas joaninas antes de Ireneu. Muito
dessas provas inculca confiança de que o apóstolo João escreveu essas
cartas.8
Da época de Ireneu em diante, há um fluxo constante de citações que
continua a expressar a confiança evidenciada na literatura mais antiga. Um
breve inventário das evidências mais pertinentes desde Ireneu inclui o
seguinte: o Cânon de Muratori (final do séc. II?) se refere às cartas (no
plural) como sendo de João; Tertuliano (c. 160-225) citou 1João pelo menos
40 vezes como obra de João; Clemente de Alexandria (c. 150-215) se

1597
referiu a 1João como a “maior epístola” (Stromateis 2.15.66), e ele também
escreveu um breve comentário de 2João. Terceira João é mencionada pela
primeira vez nas obras patrísticas restantes de Orígenes (c. 185-254).
Dionísio de Alexandria (sucessor de Orígenes, morto em 265), defendeu a
autoria joanina de 1João mas sabia que havia uma “reputada” 2 e 3João
(Eusébio, Hist. Ecl. 7.25.7-8.11).
Os dados externos apontam bem antes para 1 e 2João como sendo do
apóstolo. A autoria joanina de 3João, muito provavelmente devido à
brevidade da carta e à falta de obras patrística existentes, é suportada menos
amplamente. No entanto, já que há evidências para se supor que as cartas
circularam juntas, é provável que 3João também estivesse incluída. Isso
seria coerente com o que é conhecido das coleções de cartas publicadas na
antiguidade.9 Assim, as cartas são citadas consistentemente como
autoritativas, sem uma única fonte propondo um autor diferente. Essa
suposição da autoria de João dominou até os anos 1800.
Nos círculos modernos, é comum rejeitar a opinião da antiga igreja e
propor, algumas vezes, respostas radicalmente diferentes para a questão da
autoria e origem. As propostas alternativas incluem: (1) um desconhecido
presbítero na chamada “comunidade joanina”; (2) um seguidor do apóstolo
João (ou o “discípulo que Jesus amava”; Jo 13.23 etc), ou (3) o lendário
“João, o presbítero” na Ásia Menor.10 Muitas dessas estão baseadas em
convicções anteriores relacionadas com a autoria e as origens do Evangelho
de João. A teoria dominante é que uma comunidade sectária à margem da
ortodoxia, relacionada com o discípulo amado, é responsável pelo
Evangelho de João. Uma série de eventos produziu o Evangelho em
estágios em interação com a sinagoga-mãe da “comunidade joanina” e
posteriormente as cartas foram geradas em resposta a uma dolorosa divisão

1598
na comunidade. Partindo do pressuposto de que o Evangelho de João e as
cartas de João vêm de duas mãos diferentes, a teoria postula que (1) a
uniformidade estilística do Evangelho de João e das cartas de João é o
reflexo de um “estilo idiossincrático”, mas não de autoria comum; e (2) que
as divergências linguísticas e temáticas sugerem autores distintos.
Embora o grande número de semelhanças estilísticas entre o Evangelho
de João e as cartas joaninas seja inegável, alguns acadêmicos apontam para
várias supostas divergências em apoio à teoria de autorias distintas. Um dos
mais influentes defensores antigos da autoria de dois autores na primeira
metade do século XX foi o estudioso britânico C. H. Dodd.11 Dodd
argumentou que, em matéria de estilo, o Evangelho de João tem ricas
sutilezas, “que a Epístola não pode forjar”.12 Ele alegou que os seguintes
fenômenos linguísticos apontavam para um diferente escritor: (1) a falta de
influências aramaicas; (2) uma alta taxa de hapax legomena (1João tem 40
palavras que não aparecem no Evangelho); e (3) linguagem diferente usada
para questões relacionadas à salvação. Tematicamente, Dodd argumentou
que 1João não tem nenhuma citação do AT e apenas uma referência
explícita ao AT (1Jo 3.12), enquanto o Evangelho de João está repleto de
citações do AT e alusões a ele. Dodd também observou que, ao contrário do
Evangelho de João, 1João mostra muito poucas características judaicas. Em
vez disso, a carta parece refletir o pensamento gnóstico (p. ex., “unção”,
2.20; “semente divina”, 3.9, tradução do autor), o que é estranho a ao
Evangelho de João.13
R. Brown, por outro lado, corretamente rejeitou a maioria dos
argumentos estilísticos de Dodd como facilmente respondidos com
referência aos respectivos gêneros do Evangelho e carta.14 No entanto,
Brown adotou e ampliou várias das questões temáticas levantadas por

1599
Dodd, argumentando contra a autoria comum com base na clareza, questões
temáticas, e a situação de vida das cartas. Segundo Brown, o autor do
Evangelho era relativamente simples e claro em sua expressão, enquanto o
autor das cartas joaninas escreveu com obscuridade “enfurecedora”.15 No
entanto, a obscuridade é em si um fenômeno subjetivo; o que pode ser
obscuro para alguns (como Brown) pode ser claro para os outros
(especialmente os leitores originais das cartas joaninas).
Brown citou cinco diferenças principais de pensamento entre o
Evangelho de João e as cartas joaninas que ele acreditava ser especialmente
prejudiciais para a noção da autoria comum:

O prólogo de 1João não enfatiza a encarnação do Verbo personificado,


como faz o prólogo de João; antes, atesta o verbo (mensagem) da vida
que foi visto, ouvido e sentido — a carreira humana de Jesus.
Primeira João atribui a Deus características que o Evangelho atribui a
Jesus; por exemplo, em 1João 1.5, “Deus é luz” (cf. Jo 8.12; 9.5); em
1João 4.21 e 2João 5, Deus dá o mandamento de amar uns aos outros
(veja Jo 13.34).
Há menor ênfase epistolar no Espírito como uma pessoa, e o termo
paraklētos do Evangelho nunca é usado para o Espírito; Cristo é o
paraklētos ou advogado em 1João 2.1. Em 1João há uma simples
advertência de que nem todo espírito é o Espírito da verdade ou o
Espírito de Deus, e assim os espíritos devem ser testados (4.1,6).
A escatologia final é mais marcante em 1João do que no Evangelho de
João, onde a escatologia realizada domina. Há maior ênfase na parúsia
como o momento da prestação de contas da vida cristã (1Jo 2.28 a
3.3).

1600
Especialmente quanto ao vocabulário, os paralelos dos Manuscritos do
Mar Morto são ainda mais estreitos em 1João do que no Evangelho de
João.16

Na sequência, sustentamos que (1) muitos estudiosos afirmam que o


referente no prólogo epistolar é de fato a pessoa de Jesus; (2) a Cristologia
joanina claramente não teria problema com Jesus e Deus sendo referidos de
forma intercambiável (p. ex., 1.1,2; 5.17; 10.30; 14.9-11); (3) a referência
ao Paráclito no Evangelho indiretamente também nomeia Jesus como um
Paráclito (o Espírito Santo é “um outro Paráclito”, allos paraklētos); (4) a
escatologia verdadeira e final é mais declarada nas cartas joaninas, mas
certamente não está ausente no Evangelho de João (p. ex., Jo 14.2);
finalmente, (5) a maioria dos paralelos entre Qumran e 1João encontram-se
na Regra da Comunidade (1QS),17 que não é uma narrativa e pode ter uma
linguagem similar devido à ênfase semelhante (p. ex., o amor pelos outros
fiéis). Nenhuma dessas supostas diferenças prova conclusivamente a autoria
separada para o Evangelho de João e as cartas joaninas, como admitiu o
próprio Brown.
Para Brown e seus seguidores, é claramente a reconstrução histórica da
“comunidade joanina” que aponta para um autor diferente para as cartas
joaninas. Brown, por sua vez, postulou uma teoria de que durante a
produção do Evangelho de João houve vários conflitos com grupos de fora.
O que ele acha surpreendente é que as cartas joaninas não mostram esses
conflitos com os de fora, mas apenas com os de dentro. Além disso, a
questão em causa no debate não era se Jesus era o Cristo, mas se ele veio na
carne (i. e., se Jesus era totalmente humano). De acordo com Brown, isso
aponta para um período de desenvolvimento e divergência no interior da
“comunidade joanina”. Brown afirmou que dois grupos rivais estavam

1601
interpretando o Evangelho de duas maneiras diferentes. Um deles, o
ortodoxo, foi engolido pela grande igreja; o outro, os oponentes de 1João,
foi canalizado para o movimento gnóstico. As várias formas da “hipótese da
comunidade joanina” já foram tratadas no capítulo sobre o Evangelho de
João. No que diz respeito às cartas joaninas, mesmo que a reconstrução de
Brown estivesse correta, isso ainda não demonstraria necessariamente uma
autoria distinta.18 Se a autoria comum é rejeitada, isso frequentemente não é
feito com base nas evidências disponíveis, mas com bases a priori.
Em suma, nenhuma das objeções levantadas por Dodd, Brown e outros
na verdade prova ou mesmo plausivelmente sugere a autoria distinta do
Evangelho de João e das cartas joaninas. As eventuais diferenças de estilo
podem ser explicadas pelos respectivos gêneros e outros fatores (como as
diferentes extensões dos documentos). As supostas divergências temáticas
muitas vezes dependem de julgamentos antecedentes que são em si
altamente questionáveis ou não necessariamente apontam para um autor
diferente. Parece razoável concluir que mesmo o efeito cumulativo dessas
supostas dificuldades não tem peso suficiente para estabelecer a autoria
distinta.

Evidências internas
A máxima de B. H Streeter é, com frequência, repetida: “As três Epístolas e
o Evangelho de João estão tão intimamente ligados na clareza, estilo e visão
geral de que o ônus da prova recai sobre a pessoa que negar a sua autoria
comum.”19 As semelhanças são tão numerosas e multifacetadas que
ofuscam quaisquer diferenças percebidas por comparação. Embora
admitidas por todos, essas semelhanças são muitas vezes atribuída a um

1602
“estilo idiossincrático” da comunidade joanina ou a uma imitação
consciente. Assim, é importante não apenas observar as semelhanças, mas
procurar por aquelas congruências que sugerem que um escritor estava
naturalmente se expressando de outras maneiras que não a imitação
consciente. As seguintes observações podem ser feitas.

Observação 1. Seria de se esperar que o mesmo autor usasse


vocabulário semelhante de maneiras semelhantes. Isso ocorre em uma taxa
impressionante quando cartas de João são comparadas com o Evangelho.
Uma pequena amostra dará os contornos gerais do fenômeno.20 Jesus como
o “unigênito” (1Jo 4.9; Jo 1.14,18; 3.16,18, KJV); “verbo” referindo-se a
Cristo (1Jo 1.1; Jo 1.1,14); “vida eterna” (1Jo 1.2; 2.25; 3.15; 5.11,13,20; Jo
3.15,16,36); “o Espírito da verdade” (1Jo 4.6; Jo 14.17; 16.13); “praticar a
verdade” (1Jo 1.6; Jo 3.21); “do mundo” (1Jo 2.16; 4.5; Jo 8.23);
“permanecer nele/em mim” (1Jo 2.27; 4.13; Jo 15.4,6,7); e uma série de
outras.21 Há marcantes contrastes em ambos os documentos: o amor e ódio
(1Jo 3.11-15; Jo 3.19-21; 15.18-25); vida e morte (1Jo 3.14; Jo 5.24); luz e
trevas (1Jo 1.5; Jo 1.5); verdade e mentira (1Jo 1.6,8; 2.4,21; Jo 8.44,45);
filhos de Deus e filhos do Diabo (1Jo 3.10; Jo 8.33-47). Esse fenômeno é
bastante notável, dada a brevidade das cartas de João.22
Observação 2. Seria de se esperar que o mesmo autor usasse seu
estoque de expressões e temas de uma forma ágil, e não como um imitador.
Em outras palavras, se tudo que foi encontrado fossem correspondências
exatas com uso do Evangelho, isso poderia apontar para a imitação, mas
não é esse o caso. Por exemplo, o “Conselheiro” (paraklētos) no Evangelho
de João (o Espírito Santo) é “um outro Conselheiro” (Jo 14.16); Jesus é o
“advogado” (paraklētos) em 1João (2.2). A afirmação de que “Deus é
espírito” (Jo 4.24; cf 3.33, “Deus é verdadeiro”) é similar em forma a “Deus

1603
é amor” (1Jo 4.8,16) e “Deus é luz” (1Jo 1.5). Brooke salienta que o autor
de 1João frequentemente preencheu o esquema básico de um pensamento
no Evangelho de João de uma maneira distinta, mas intimamente
relacionada. Ele citou os seguintes exemplos, entre outros: 1João 5.10 //
João 3.18; 1João 1.2 // João 1.1; 1João 3.8 // João 8.41.23 Como Brooke
observou, “isso sugere um escritor que varia suas próprias expressões, em
vez de um mero copista.”24
Observação 3. Seria de se esperar que o mesmo autor compusesse suas
obras em um estilo semelhante. Isso é exatamente o que caracteriza as
cartas de João. A sintaxe relativamente simples é a norma para o Evangelho
de João e para suas cartas, e o mesmo conjunto de palavras e construções
gregas pode ser visto em ambos.25 Um exemplo peculiar disso é o uso de
conjunções entre as orações. Poythress demonstrou que as orações são
frequentemente conectadas por assíndeto (sem conjunções coordenativas).
Ele também observou o uso infrequente de “portanto” (oun) e outros
conectivos no discurso expositivo tanto do Evangelho de João quanto de
suas cartas.26
Observação 4. Uma outra importante evidência é o fracasso por parte
dos proponentes das várias formas da “hipótese da comunidade joanina” em
demonstrar e estilo joanino fora da literatura joanina. Se houvesse “padrões
joaninos” ou um “estilo idiossincrático”, não se poderia esperar que este
fosse encontrado também na literatura extrabíblica? Na verdade, há alguns
escritos que podem se assemelhar ao “estilo idiossincrático” da
“comunidade joanina”. O número de obras existentes de Papias não permite
que se extraiam conclusões definitivas (embora suas obras existentes não se
conformem com o estilo joanino), mas há uma amostra maior de Policarpo,
o discípulo de João. No entanto, quando sua Carta aos Filipenses é

1604
examinada, ela não apresenta evidências do estilo joanino.27 A conclusão de
Kümmel é, sem dúvida, correta: “não há razões convincentes para se
assumir que 1João deva ser atribuída a outro autor que não Jo[ão].”28
Observação 5. As autorreferências do autor indicam que ele se
considerava uma testemunha ocular de Jesus (cf. esp. 1Jo 1.1-4). Existe um
consenso geral, mesmo entre aqueles que apoiam a teoria de uma “escola
joanina”, que o escritor é uma pessoa em vez de uma comunidade. Isso é
evidenciado seu pelo uso da primeira pessoa do singular 32 vezes ao longo
das cartas joaninas. Entretanto, o que é contestado é o que o escritor quis
dizer quando usou uma primeira pessoa plural. Embora o escritor se
referisse a si mesmo várias vezes na primeira pessoa do plural em
solidariedade a seus leitores, em pelo menos nove casos ele se referiu a si
mesmo em distinção de seus ouvintes.29 Aqueles convencidos da presença
de uma “escola joanina” encontram apoio para sua teoria nessas
referências.30
Essa, porém, não é necessariamente a melhor maneira de explicar esse
fenômeno. Primeiro, especialmente nas referências no prólogo, o escritor
usou uma linguagem sensorial que é melhor entendida como o discurso de
uma testemunha ocular. Ele alega ter “ouvido”, “visto”, e tocado com suas
“mãos” “o Verbo da vida” (1Jo 1.1). A última expressão, usar suas mãos
para tocar o Verbo da vida, nos leva a compreender que o “Verbo da vida”
não se refere à mensagem de vida, mas ao Verbo que é vida — Jesus Cristo
(veja Jo 1.1,14). É difícil imaginar que tal linguagem fosse ser usada por
alguém que não estivesse alegando o contato físico com Jesus.
Observação 6. O autor assumiu um tom autoritativo que é consistente
com um apóstolo. Embora ele se refira a si mesmo como “presbítero” em 2
e 3João, isso não é incompatível com ser um apóstolo, como mostra 1Pedro

1605
1.1 (cf. 5.1). Papias, de modo semelhante, referiu-se aos apóstolos como
“presbíteros”.31 Assim, há amplas razões para se acreditar que João poderia
ocupar simultaneamente o status de apóstolo e presbítero — um profeta
também, uma vez que ele escreveu Apocalipse. Assim, em sua função como
um apóstolo, ele escreveu um Evangelho; e em seu papel como presbítero,
ele escreveu cartas a várias congregações.
Observação 7. Existe também uma indicação de que o autor era de
idade avançada. Se as cartas joaninas datam do final do primeiro século,
então qualquer testemunha ocular estaria com idade avançada nessa época.
Em sintonia com este fato, o autor se referiu às congregações saudadas nas
cartas de João como “meus filhinhos”, incluindo até mesmo aqueles que ele
chamou de “pais” (1Jo 2.12-14).
Na análise final, apesar de existirem objeções recentes à autoria do
apóstolo João do Evangelho e das cartas, não surgiu nenhuma evidência
externa ou interna que seja inconsistente com a identificação do autor do
Evangelho com o das cartas. Acoplado com as conclusões sobre a autoria
do Evangelho de João a que se chegou acima, o apóstolo João continua de
forma convincente o melhor candidato a autor das cartas.

Data
A confiável tradição histórica sugere fortemente que João passou seus
últimos anos de vida na Ásia Menor em Éfeso e nas suas vizinhanças (veja
Ireneu, Contra Heresias 3.1.2; Eusébio, Hist. Ec. 3.1.1). A mudança do
apóstolo da Palestina para a Ásia Menor, ao que consta, teria ocorrido em
algum momento posterior à rebelião judaica no ano 66. Nós concluímos que
o Evangelho de João foi muito provavelmente escrito entre o início e

1606
meados dos anos 80 (veja cap. 7). Portanto, a questão relativa à data das
cartas de João é: Elas foram escritas antes ou depois da composição do
Evangelho de João?
Em suma, a última opção parece mais provável. Embora seja possível
que algumas das ligações com o Evangelho de João em 1João sejam
baseadas em uma tradição comum,32 em alguns poucos lugares o Evangelho
parece ser pressuposto. Por exemplo, 1João 2.7,8 se refere e explicita o
significado do mandamento novo de João 13.34,35 sem nomeá-lo. Em
1João 5.6, é feita referência à vinda de Jesus por “água e sangue”,
provavelmente referindo-se respectivamente ao batismo e crucificação de
Jesus, (veja o paralelo verbal com Jo 19.34).
Alguns estudiosos, como Carson e Moo, acreditam que as cartas
joaninas foram escritas para combater más interpretações heréticas do
Evangelho, o que exigiria uma data para elas após a composição do
Evangelho.33 Isso parece perfeitamente plausível. No entanto, mesmo se o
propósito para as cartas fosse interpretado diferentemente, a conclusão de
que elas são posteriores ao Evangelho ainda parece ser a mais provável à
luz dos paralelos mencionados acima. A melhor data, dada a morte de João
por volta da virada do século34 e a datação do Evangelho entre o início e
meados dos anos 80, é entre o início e meados dos anos 90.

Origem
A antiga tradição é unanime em relação ao fato de que João passou seus
últimos anos de vida em Éfeso, na Ásia Menor. Polícrates, em uma carta a
Vítor de Roma, chamou João de um dos “luminares” enterrado em Éfeso.35
Ireneu disse que João ficou permanentemente em Éfeso até o reinado de

1607
Trajano (98-117)36 e incluiu declarações específicas sobre o ministério de
João em Éfeso. Sem provas concretas do contrário, a maioria dos estudiosos
assume a exatidão da tradição de Éfeso.37

Destino
Em 1João, João se referiu a vários grupos na congregação como
“filhinhos”, “pais”, “jovens”, “irmãos” e “amados” (p. ex., 2.12-14; 4.1,7).
Essas formas de se dirigir à sua audiência indicam uma relação estreita
estabelecida entre João seus leitores. Uma vez que 1João não se refere a
nomes e lugares específicos, contém poucas menções sobre eventos
específicos, e é geral em seu ensino, parece que João colocou o foco em
importantes verdades de ampla relevância para alcançar o maior número
possível de fiéis. Isso dá credibilidade ao ponto de vista de que 1João era
uma carta circular enviada às igrejas predominantemente gentílicas em
Éfeso e nas suas vizinhanças.38
Ambas as cartas, 2João e 3João, são pessoais. A primeira foi escrita
para uma “senhora eleita” e seus filhos (v. 1), que muito provavelmente se
refere às diversas congregações locais; a última foi escrita para um
indivíduo chamado Gaio (v. 1), mas nada sabemos sobre ele.39

Motivo
As igrejas para as quais 1João foi escrita estão sob pressão doutrinária e
emocional. Houve uma recente partida dos falsos mestres da igreja (2.19)
que, aparentemente, foi dolorosa e desagradável e que ainda era evidente
em 2João (v. 7). Isso fica evidente especialmente na repetida acusação
contra os separatistas de que eles não amavam os outros fiéis (p. ex., 1Jo

1608
2.9,10; 3.10; 4.7). Os cristãos para quem João escreveu em 1João
necessitavam de instrução mas, mais importante, eles precisavam ser
confortados e tranquilizados à luz da recente turbulência que terminou com
a saída dos falsos mestres (5.13; veja 2.19).
Embora claramente houvesse conflito entre os leitores de João, é difícil
determinar sua precisa natureza devido à natureza indireta das referências.
Ao longo da carta, João pressupôs que seus leitores conheciam os
problemas que estavam em jogo. Ireneu afirmou que João escreveu seu
Evangelho para refutar Cerinto — um antigo mestre gnóstico que defendia
que o “espírito de Cristo” desceu sobre Jesus no seu batismo e o abandonou
na cruz — mas não faz a mesma alegação para suas cartas.40 Alguns
acadêmicos, com referência a Ireneu, afirmam que as cartas foram escritas
para combater o mesmo oponente.41 Contudo, não é de todo certo que
Cerinto foi o catalisador da secessão que provocou a composição de 1João.
O nascente gnosticismo de sua espécie estava certamente em progresso, e
alguma de suas formas pode ter influenciado a secessão.42 Mas a completa
identificação dos separatistas de Éfeso com os seguidores de Cerinto é
injustificável.43
A natureza exata do falso ensino é impossível de ser identificada com
certeza. Schnackenburg apropriadamente observou: “As escassas sugestões
e as fórmulas utilizadas na carta são tudo o que temos para ir em frente”.44
Como Griffin mostrou, estas podem ser interpretadas de diferentes
maneiras.45 No entanto, existem alguns indícios que nos ajudam a
compreender os amplos contornos do ensino falso encontrado em 1João. Os
indicadores mais claros da doutrina secessionista estão em 1João 2 onde
repetida referência é feita à sua negação de que Jesus é o Messias (2.22,23;
veja João 20.30,31).46

1609
Embora a certeza permaneça obscura, é possível identificar várias
características dos separatistas. Primeiro, eles não conhecem a Deus porque
não guardam os seus mandamentos. Segundo, eles não se comportam da
maneira que Jesus se comportou, especialmente no que diz respeito ao
mandamento de amar uns aos outros. Em tudo isso, seu comportamento é
caracterizado por uma falta de obediência. Se essas referências foram
incluídas para condenar o comportamento dos separatistas, a série de
contrastes em 1.6-10 provavelmente faz alusão a eles também. Se assim for,
os separatistas estavam “andando nas trevas” enquanto rejeitavam a noção
de pecado. Essa falta de orientação ética é corroborada no capítulo três,
quando eles são identificados como “filhos do Diabo” (3.10, KJV) com um
exame das suas obras.
Os separatistas, ou um grupo distinto deles, negava que Jesus tinha
vindo em carne (1Jo 4.2,3; cf. 2Jo 7). Isso pode (embora não
necessariamente) refletir uma cristologia docética. No que se segue, em vez
de reforçar a humanidade de Jesus, o autor simplesmente definiu essa
negação como o fracasso de confessar a Jesus. O mesmo padrão continua
posteriormente na carta (veja 4.15; 5.1,5). Parece que a ênfase principal não
está tanto na refutação da cristologia docética, mas na rejeição ou na
confissão de Jesus.47 De qualquer forma, a negação subjacente é a de que
Jesus é o Messias. Quanto à natureza exata da negação, é difícil se ter
certeza.48
Uma outra possibilidade é que os separatistas aderiram a uma
cristologia que negava o mérito expiatório da cruz. Isso é sugerido na
confissão em 1João 5.6: “Ele é o que veio pela água e pelo sangue; não pela
água somente, mas pela água e pelo sangue”. Mais uma vez, João foi
escrupuloso ao negar uma compreensão de Cristo que o via como tendo

1610
vindo “pela água somente” e também não “pelo sangue”, o que parece
indicar uma rejeição da natureza sacrificial e substitutiva da morte de Jesus
pelos outros. Isso fluía de uma rejeição da noção de pecado.
Então, o que pode ser dito sobre a doutrina dos separatistas? Em
primeiro lugar, parece que eles rejeitavam o testemunho apostólico (1Jo
1.1-5). Eles tinham uma cristologia defeituosa que negava que Jesus era o
Messias, embora a razão para isso não seja clara. Além disso, eram
desobedientes em relação aos mandamentos de Deus, especialmente o
mandamento do amor (veja 3.10-15). Isso levou a uma doutrina que
minimizava a realidade ou, pelo menos, a gravidade do pecado. Assim, os
falsos mestres mostravam que eles não eram verdadeiramente filhos de
Deus. D. L. Akin descreveu muito bem o falso ensino: eles exibiam uma
nova teologia que “comprometia a singularidade da pessoa e obra de Jesus
Cristo”; uma nova moralidade que “minimizava a importância do pecado;
eles alegavam ter comunhão com Deus apesar de seu comportamento
iníquo”; e, finalmente, uma nova espiritualidade que “resultava em
arrogância espiritual; consequentemente, eles não demonstravam amor ao
próximo”.49
Mas havia muito mais do que apenas a secessão antes da escrita de
João. A controvérsia continuou, e 2João 8 e 9 indica o status da
controvérsia: “Tende cuidado de vós mesmos para não perderdes o fruto do
nosso trabalho, mas para que, pelo contrário, venhais a receber plena
recompensa. Todo o que não permanece no ensino de Cristo, mas vai além
dele, não tem a Deus. Quem permanece no ensino, esse tem tanto o Pai
como o Filho”. Parece que o ensino itinerante dos oponentes estava em
curso (1Jo 2.26).50 Assim, os separatistas estavam buscando agressivamente
infiltrar nas igrejas e em Éfeso, e na região ao seu redor, sua teologia

1611
“progressista”, e que o idoso apóstolo João (veja “o presbítero” em 2Jo 1;
3Jo 1) tomou sua caneta para resolver essa situação.

Algo Para Pensar: Falando a Verdade em


Amor

Interessante, não é, que o apóstolo do amor — o apóstolo João —


também seja o único que escreveu várias passagens bem severas
advertindo os fiéis contra falsos mestres. Uma vez fui a uma igreja
que estava passando por um processo de divisão desagradável e
tinha se dividido em dois partidos: o “partido do amor” e o “partido
da verdade”. Aqueles no “partido do amor” tinham o foco no amor e
paciência de Deus com os pecadores, enquanto o “partido da
verdade” enfatizava as justas exigências de Deus. Bobo, não é? Digo
“bobo”, porque ambas são verdadeiras se estiverem em equilíbrio
adequado. Deus é um Deus de amor — na verdade, como João nos
diz, Deus é amor (1Jo 4.8) —, mas ele também é, decididamente, um
Deus de verdade (Jo 17.17). Paulo corretamente disse, portanto, que
os cristãos devem “seguir a verdade em amor” (veja Ef 4.15).
Tanto quanto nós somos capazes de determinar com relação ao
pano de fundo de 1João, alguns mestres na igreja ensinavam que a
possessão do Espírito não era o suficiente; aqueles
“verdadeiramente iluminados” deveriam ser iniciados em todo tipo
de “conhecimento secreto” aberto apenas para os iniciados. Isso
criou todo tipo de insegurança e críticas entre aqueles que não
tinham mais certeza se eram realmente cristãos — quando na

1612
verdade aqueles que se autocaracterizavam “supercristãos”
mostraram não ser cristãos no fim. Isso parece se seguir de 1João
2.19: “Eles saíram dentre nós, mas não eram dos nossos; pois se
fossem dos nossos teriam permanecido conosco. No entanto, eles
saíram, para que pudesse ficar claro que nenhum deles é dos
nossos”.
Algumas pessoas na igreja podem parecer boas e poderosas por
um determinado tempo. Elas são as estrelas, mas depois de um breve
período em ascensão, elas caem tão rapidamente quanto as estrelas
cadentes. Essa, aliás, é uma das razões de Paulo ter advertido seus
companheiros a não indicar os novos convertidos às posições de
liderança na igreja. Foi também por isso que João disse aos fiéis
para “testar os espíritos para determinar se eles são de Deus,
porque muitos falsos profetas saíram para o mundo” (1Jo 4.1).
Assim, nós consideramos que João, o apóstolo que caiu no amor de
Deus e de Cristo mais do que qualquer outro escritor NT, é também o
único que enfatizou a necessidade de um cuidadoso discernimento da
verdade na igreja. Como Jesus, e como Paulo e os outros autores do
NT, João enfatizou um equilíbrio apropriado entre a verdade e o
amor, ao contrário da igreja que eu visitei mencionada acima. Nós,
também, deveríamos falar a verdade em amor.

Propósito
Primeira João é semelhante ao Evangelho de João no sentido de que a
declaração de propósito ocorre próximo, mas não no final do livro (veja Jo
20.30, 31).51 Em 1João, a declaração de propósito ocorre em 5.13: “Eu vos

1613
escrevi essas coisas, a vós que credes no nome do Filho de Deus, para que
saibais que tendes a vida”. Embora existam outras duas passagens que
declaram o propósito de João ao escrever (2.1; 2.12-14), elas não têm o
mesmo peso geral que 5.13. Assim, a tranquilização de todos os verdadeiros
cristãos na(s) igreja(s) abordadas é o objetivo principal do livro.
No entanto, a tranquilização é apenas uma parte do propósito de João. O
livro também apresenta uma ênfase acentuada na exortação, o que é
indicado pelo fato de que muitos verbos são imperativos formais ou
implícitos.52 D. Guthrie observou: “Em nenhum outro lugar no Novo
Testamento a combinação de fé e amor é tão claramente apresentada, e
parece provável que isso é enfatizado porque o comportamento dos leitores
deixa muito a desejar”.53 Embora Guthrie possa ter exagerado seu
argumento, quase não há dúvidas de que a exortação é uma parte importante
do propósito de João ao escrever sua primeira carta.54

Questões Introdutórias Exclusivas de 2 e 3João


As prescrições de 2 e 3João diferem de 1João no fato que os destinatários e
o remetente são identificados, embora de forma imprecisa. O remetente é
identificado em ambas as cartas simplesmente como “o presbítero”. A
semelhança com 1João na linguagem e nos temas torna praticamente certo
que elas são da mesma pessoa, embora isso seja debatido.55 O uso do termo
“presbítero” aqui é semelhante ao do prólogo em 1João 1.1-4 no sentido de
que o escritor é tão conhecido que a mais simples das declarações é
suficiente para identificá-lo aos leitores.56
A designação dos destinatários em 2João como “à senhora eleita e a
seus filhos” (2Jo 1; cf. v. 13) também é imprecisa. Esses destinatários têm

1614
sido diversamente interpretados como uma verdadeira mulher e sua prole
ou como uma referência figurativa a uma (série de) congregações locais,57
com a última sendo preferível.58 A linguagem de João não é apropriada para
se referir a uma pessoa real (p. ex., v. 5: “e agora te exorto, senhora […] que
amemos uns aos outros”). Além disso, o cenário subjacente aos versículos
7-11 era mais adequado a uma congregação local do que a uma única casa
nele. A evidente ausência de nomes pessoais em 2João — em comparação
com as referências a Gaio, Demétrio e Diótrefes em 3João — sugere que o
pretendido destinatário é uma congregação local, em vez de uma única
senhora e seus filhos. Não fica claro porquê João escolheu não identificar o
local da igreja. A omissão pode ter sido motivada pelo desejo de João de
dar à sua carta uma aplicação universal ou de proteger a identidade
específica da igreja por alguma outra razão.59
O motivo de 2João pode ter sido o retorno de uma delegação enviada
pela igreja ao encontro do apóstolo. No versículo 4, João elogiou “alguns”
como “andando na verdade”. Se relacionada a 1João (veja esp. 2.19), o
autor pode ter pretendido alertar a igreja contra acolher os separatistas em
suas casas (veja 2João 8-11). Achtemeier, Green e Thompson explicam bem
isso: “se em 1João vemos o problema do ponto de vista da igreja da qual os
falsos profetas ‘saíram’, em 2João vemos o problema com os olhos da
igreja na qual eles podem ter aparecido para pregar e ensinar.”60 Se for
assim, João escreveu para encorajar aquela congregação local a tomar
cuidado com esses falsos mestres.
Terceira João foi escrita especificamente “ao meu querido amigo Gaio”
(v. 1), um outro indivíduo desconhecido.61 João não mencionou
especificamente a secessão ou os problemas a ela associados. Em vez disso,
ele elogiou Gaio por receber os irmãos enviados pelo apóstolo

1615
(aparentemente pregadores itinerantes) e recomendou Demétrio como um
deles (3Jo 12). Diótrefes, por outro lado, se opôs aos “irmãos” e não deu
suporte aos missionários apostólicos (v. 9,10).62 Assim, é seguro concluir
que um dos principais propósitos de 3João foi fornecer uma carta de
recomendação para os emissários dos presbíteros em geral e para Demétrio
em particular, e também colocar Diótrefes em seu devido lugar antes da
prevista visita de João.

LITERATURA
Gênero
Ambas, 2 e 3João, são exemplos prototípicos de carta do primeiro século e
podem ser algumas das mais situacionais no NT.63 Há um texto de abertura
apresentando o remetente e o destinatário (no dativo) sem o benefício de
um verbo (assumindo alguma forma de “eu escrevo”), um desejo de boa
saúde, um corpo, saudação de encerramento e uma despedida formalista.
Além disso, ao contrário da maioria das cartas cristãs e como a maioria das
cartas greco-romanas, eles são bastante breves.64 Terceira João pode até
mesmo ser classificado como uma carta de recomendação de Demétrio.
Assim, há um amplo consenso para identificar o gênero de 2 e 3João como
cartas simples e diretas.
No entanto, o gênero de 1João é uma questão completamente diferente.
Brown assinalou que “das 21 obras do NT normalmente classificadas como
epístolas, 1João é a que tem o formato menos parecido com o de uma
carta”.65 Os paralelos mais próximos no cânon são Hebreus e Tiago, as
quais faltam algumas das características formais de uma carta greco-
romana. Uma grande variedade de propostas tem sido sugerida para a obra.

1616
Smalley a chamou de “artigo”,66 Windisch, de “tratado”67 e Grayston, de um
“prontuário, um manual de instruções”.68 Brown observou que “carta
circular”, “homilia”, e “encíclica” foram, todos, utilizados para descrever
1João. O próprio Brown recusou-se a determinar um gênero específico de
designação e chamou o documento de um “comentário modelado segundo”
o Evangelho de João.69 Tomando o seu ponto de partida da inclinação de
Brown de interpretar a carta com base na reconstituição histórica da
comunidade, J. V. Hills sugeriu que ela deveria ser considerada um
documento de “regra da comunidade”.70
A situação incomum em relação a 1João é que o documento contém
poucas características formais que o classificariam como uma carta. Não há
nenhuma orientação, saudação/oração, encerramento, ou fórmulas de
despedida. Na verdade, tanto a abertura “o que era desde o princípio”
quanto o encerramento “guardai-vos dos ídolos” (5.1, NVI) são muito
anticonvencionais. Entre o prefácio e a declaração de conclusão, o
presbítero ensina de uma forma um tanto cíclica, frequentemente
retornando a um tema que já abordou apenas para discuti-lo em termos um
tanto semelhantes, mas não de forma idêntica. Nesse quesito, 1João é
semelhante a Hebreus, cuja abertura também é uma espécie de prefácio em
vez de uma abertura epistolar, e como Tiago, que também conclui sem um
encerramento epistolar formal. Em comparação, 1João se conforma ainda
menos que Hebreus ou Tiago ao formato epistolar padrão do primeiro
século, pois a primeira apresenta pelo menos um encerramento epistolar, e a
última, uma abertura epistolar, enquanto João não apresenta nenhum dos
dois.
Então, qual é o gênero de 1João? Apesar da falta de características
epistolares formais padrão, é melhor entendê-la, em termos gerais, como

1617
uma carta, uma vez que as cartas greco-romanas exibiam um grau
considerável de diversidade.71 A obra é de uma única fonte digna de crédito
(um apóstolo), mas os destinatários são identificados apenas em termos
gerais (e figurativos) como “filhinhos”. Há mais informações específicas a
respeito dos separatistas. Parece que a carta foi designada para abordar uma
situação pertinente a várias das congregações na região.
Sem impor categorias externas sobre a carta, provavelmente seria
melhor entender 1João em termos de uma carta circular semelhante a
Efésios ou Tiago. Há evidências abundantes desse tipo de carta na
antiguidade, especialmente entre os judeus. Jeremias 29.4-13, Atos 15.23-
29, Tiago e Apocalipse 2 e 3 contêm exemplares deste tipo de gênero. Se
assim for, 1João é uma carta situacional escrita para instruir e encorajar os
cristãos apostólicos em Éfeso e região a respeito da natureza do evangelho e
seu papel nele.

Plano Literário
O esboço de 2 e 3João é previsível e facilmente discernível. Como cartas
típicas do primeiro século, ambas seguem o padrão simples: “introdução —
corpo — conclusão”. No entanto, a estrutura de 1João gerou muito debate,72
e até hoje nenhum consenso acadêmico foi alcançado. As opções vão desde
aqueles que vêem um complexo macroquiasma àqueles que rejeitam
qualquer estrutura coerente.73 A falta de consenso no meio acadêmico levou
vários estudiosos a postular várias teorias, utilizando a crítica da fonte ou
redação.74 A maioria dos estudiosos rejeita tais teorias como não
comprovadas, improváveis ou não particularmente úteis.

1618
O que torna a estrutura de 1João tão difícil de discernir? Em uma
palavra, a resposta é a sutileza. As transições tópicas são praticamente
perfeitas, e os vários temas ocorrem em intervalos cíclicos por toda a carta.
No entanto, dada a estrutura bastante clara do Evangelho de João e do
Apocalipse, bem como as cuidadosas nuances exibidas nos diversos
parágrafos, parece improvável que o autor não tivesse algum plano em
mente ao escrever a carta.75 Com relação à estrutura de 1João, existe uma
ampla concordância apenas em relação ao prefácio (1.1-4) e ao epílogo
(5.13-21).
As propostas estruturais para 1João recaem em três categorias
principais: divisões em duas, três ou múltiplas partes.76 Entre aqueles que
defendem a divisão em duas partes, o principal ponto de discussão é se a
quebra deve ser colocada no capítulo 2 ou em 3.11. Entre aqueles que
defendem uma estrutura de três partes, o debate centra-se em saber se a
primeira quebra principal está em 2.17; 2.28; ou 2.29, e se a segunda quebra
principal está em 4.1 ou 4.7. Entre aqueles que enxergam múltiplas
divisões, pode-se encontrar uma infinidade de propostas.77
O seguinte esboço para 1João coincide com o daqueles que vêem uma
estrutura de três partes para o livro e especificamente com o daqueles que
sugerem as seguintes unidades principais: 1.5 a 2.27; 2.28 a 3.24 e 4.1 a
5.12. Dentro dessa estrutura geral, é possível discernir parágrafos
interrelacionados que proporcionam uma outra quebra do fluxo da
argumentação da carta. É melhor entender 1.5 a 2.27 como um panorama
prolongado do restante da carta, com 2.28 a 3.24 elaborando sobre a ética e
4.1 a 5.12 sobre as dimensões doutrinárias das vidas dos fiéis.78

1619
Tabela 19.1: Propostas Estruturais para 1João
I. Divisão em Duas Partes
Chaine Longacre Burge
1.5 a 2.28 1.5 a 2.29 1.5 a 3.10
2.29 a 5.13 3.1 a 5.12 3.11 a 5.12
II. Divisão em Três Partes
Schnackenburg Thompson Braun
1.5 a 2.17 1.5 a 2.27 1.5 a 2.28
2.18 a 3.24 2.28 a 3.24 2.29 a 4.6
4.1 a 5.12 4.1 a 5.12 4.7 a 5.12
III. Divisão em Múltiplas Partes
D. Guthrie Bruce Stott
1.5 a 2.29 1.5 a 2.2 1.5 a 2.2
3.1-24 2.3-17 2.3-27
4.1-6 2.18-27 2.28 a 4.6
4.7-21 2.28 a 3.24 4.7 a 5.5
5.1-5 4.1-6 5.6-17
5.6-12 4.7-21 5.18-21
5.13-21 5.1-5
5.6-12
5.13-21

ESTRUTURA DE 1JOÃO
I. Prólogo (1.1-4)

II. Panorama (1.5 a 2.27)

1620
A. Os verdadeiros fiéis andam na luz (1.5 a 2.2)
B. Os verdadeiros fiéis guardam os mandamentos de Jesus (2.3-11)
C. Crescer em cristo e não amar o mundo (2.12-17)
D. Permanência e partida (2.18-27)

III. Ética (2.28 a 3.24)


A. Os filhos de Deus santificam a si mesmos (2.28 a 3.10)
B. Os filhos de Deus guardam os seus mandamentos (3.11-24)

IV. Doutrina (4.1 a 5.12)


A. Avaliar os Espíritos (4.1-6)
B. A Base Teológica do Amor Fraternal (4.7-12)
C. Segurança da Doutrina Correta (4.13-21)
D. Testemunho e Prova (5.1-12)

V. Epílogo (5.13-21)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE DE


1JOÃO
I. Prólogo (1.1-4)
Como o Evangelho de João, 1João começa com um prólogo. O autor alegou
ser uma testemunha ocular de Jesus e afirmou que estava proclamando aos
seus destinatários a mensagem que ele e os apóstolos tinham ouvido de
Jesus.

II. Panorama (1.5 a 2.27)

1621
Como a introdução, esta seção apresenta uma prévia ética e doutrinária do
restante da carta, anunciando muitos de seus principais temas, como a
necessidade dos fiéis de permanecerem em Cristo e a importância do amor
fraternal.79

A. Os verdadeiros fiéis andam na luz (1.5 a 2.2)


O texto é desenvolvido em termos de duas implicações do princípio de que
Deus é luz (1.5), o que pode implicar a sua santidade ou a revelação dada
por ele, ou ambas. A primeira implicação (1.6,7) é que se Deus é luz, seus
filhos vão “andar na luz”, isto é, conduzir as suas vidas na esfera da justiça.
A segunda implicação é que aqueles que “andam na luz” confessam os seus
pecados (1.9; cf. 2.1).80

B. Os verdadeiros fiéis guardam os mandamentos


de Jesus (2.3-11)
Em 2.3, João elaborou sobre a unidade anterior.81 Aqueles que alegam ser
cristãos guardam os mandamentos de Jesus ou mostram ser mentirosos. O
princípio descrito em 2.3-6 (aqueles que permanecem nele guardam os seus
mandamentos) é ilustrado em 2.7-11 pelo fracasso dos secessionistas em
guardar o mais proeminente dos mandamentos de Jesus, o “mandamento
novo” do amor (veja Jo 13.34,35; 15.9-17). A presente seção e a anterior
formam a base para o prolongado apelo em duas partes feito nas próximas
duas unidades.

C. Crescer em Cristo e não amar o mundo (2.12-17)

1622
João continuou a dar instruções para aos abalados fiéis.82 O apóstolo não
tinha dúvidas salvação deles, mas procurou tranquilizá-los à luz da recente
saída dos falsos mestres. Os comentários de João a três grupos em
diferentes níveis de maturidade movem-se, de maneira curiosa, dos
“filhinhos” para os “pais” e depois para os “jovens”, pelo qual as instruções
para jovens são as mais detalhadas.83 Aparentemente, “filhinhos” se tornam
“pais” ao seguir as instruções de João para os jovens.
João, então, instruiu os destinatários de sua carta a não amarem o
mundo (2.15-17). Isso está relacionado à necessidade dos fiéis de
permanecer em Cristo, que constitui o assunto da próxima seção.84 João
lembrou seus leitores de que as coisas deste mundo passarão, enquanto
aqueles que fazem a vontade de Deus permanecerão para sempre.

D. Permanência e partida (2.18-27)


João abriu esta seção com um contraste entre os separatistas, que haviam
deixado a igreja, e os fiéis que permaneceram. Os primeiros (a quem ele
chamou de “anticristos”) se afastaram tanto teologicamente quanto
fisicamente, o que demonstrou que eles não eram “de Deus”. Em
contrapartida, os verdadeiros fiéis têm uma “unção” de Deus e não
precisam de nenhuma outra instrução, pois o Espírito Santo é o seu
mestre.85 Esse contraste forma a base para o mandamento em 2.24: “O que
ouvistes desde o princípio deve permanecer em vós” (veja v. 27).

III. Ética (2.28 a 3.24)


Na primeira unidade principal (1.5 a 2.27), João destacou as necessidades
éticas e doutrinárias para os fiéis. Na segunda unidade principal (2.28 a

1623
3.24), ele destacou a primeira delas, a dimensão ética. Sua tese parece ser a
de que os filhos de Deus e os filhos do Diabo são reconhecidos por seus
atos.

A. Os filhos de Deus santificam a si mesmos (2.28 a


3.10)
Nesta seção, João elaborou sobre as diferenças entre os filhos de Deus e os
filhos do Diabo. Os filhos de Deus, porque Jesus foi revelado para destruir
o pecado, não persistem em um estilo de vida pecaminoso (i. e., eles “não
vivem pecando [caracteristicamente]”; veja 3.6). João reconheceu
francamente que os cristãos ainda pecavam (2.1: “se alguém pecar”), mas
ele deixou claro que, para os fiéis, o pecado não é característico e
compatível com a sua verdadeira natureza como filhos de Deus. Por outro
lado, os filhos do Diabo são controlados pela sua natureza pecaminosa
(3.8).

B. Os filhos de Deus guardam os seus


mandamentos (3.11-24)
João fez a transição do negativo (i. e., não praticam o pecado) para o
positivo (guardam os mandamentos de Deus, especialmente o “mandamento
novo” do amor). João usou a ilustração bíblica de Caim (o único
personagem do AT mencionado na carta), que assassinou seu irmão porque
as obras de Abel condenavam a suas. Em essência, a mensagem de João é
que as palavras por si só são vazias; o verdadeiro amor é expresso “em

1624
ações e verdade” (3.18). A essência de permanecer em Cristo, portanto, é
guardar os seus mandamentos.

IV. Doutrina (4.1 a 5.12)


A questão da doutrina correta controla a presente seção. Em 4.1-6, João
alertou os cristãos a discernirem sobre quais os espíritos acreditar. Esse
julgamento requer uma cristologia correta. O amor ao próximo, da mesma
forma, pressupõe sã doutrina (4.13-21). Finalmente, em 5.1-12 o autor
alegou que apenas “quem tem o Filho tem a vida”.

A. Avaliar os espíritos (4.1-6)


João advertiu os fiéis a exercitar o discernimento. Uma vez que havia
muitos falsos profetas, eles não deveriam acreditar “em todo espírito” (4.1),
mas deveriam avaliar os espíritos para ver se eles são de Deus. Isso
claramente ecoa as advertências de Jesus, especialmente no Sermão da
Montanha e no Discurso do Monte das Oliveiras (Mt 7.15-20; 24.4,5, 23-26
e paralelos). O único Espírito que confessa Jesus é o Espírito de Deus. As
palavras “veio em carne” pode se referir a um erro docético (negar a plena
humanidade de Cristo, argumentando que Jesus apenas parecia ser
humano), mas mais provavelmente pertencem à encarnação. Se assim for, o
assunto em questão é que Jesus é o Messias.86 De qualquer modo, a
cristologia de um indivíduo identifica o espírito por trás mensagem desse
indivíduo. Aqueles que recebem a pregação apostólica a respeito de Jesus e
permanecem nela podem ser vitoriosos sobre o espírito do mundo.

1625
B. A base teológica do amor fraterno (4.7-12)
Embora possa parecer que o mandamento de amar ao próximo é um retorno
à ética da seção anterior, a base para o mandamento não é ética (porque isso
é moralmente correto), mas teológica (porque Deus é amor). Na verdade,
João defende um ponto teológico: os fiéis amam os outros porque o Deus
que é o amor neles habita. É assim que o “seu amor é aperfeiçoado em nós”
(4.12).

C. Segurança da doutrina correta (4.13-21)


A possessão do Espírito é a prova de que uma pessoa é um cristã (4.13), e a
confissão de Jesus como o Filho de Deus resulta em Deus permanecer nela
(4.15). Em 4.15,16 João tomou ambos os elementos das seções anteriores e
os aplicou aos fiéis: “Todo aquele que confessa que Jesus é o Filho de Deus
— Deus permanece nele, e ele em Deus […] Deus é amor, e quem
permanece em amor permanece em Deus, e Deus permanece nele”. O amor
de Deus é manifestado nos fiéis para que eles tenham confiança no dia do
juízo (4.17).

D. Testemunho e prova (5.1-12)


Por meio da reiteração, João esclareceu os principais pontos da seção
anterior: “Todo aquele que crê que Jesus é o Messias é nascido de Deus, e
todo aquele que ama o pai, ama também o seu filho” (5.1). João prosseguiu
para observar que a essência de amar a Deus é guardar os seus
mandamentos, e essa não é uma tarefa impossível porque os fiéis nasceram
de Deus. Assim a fé em Jesus vence o mundo.

1626
A evidência da segurança de João está indicada em 5.6-12. O ônus da
prova (duas ou três testemunhas) exigido no AT é atendido pelo testemunho
do Espírito, a água, e o sangue, uma provável referência ao batismo de
Jesus, à morte de Jesus, e ao testemunho interior do Espírito de Deus.87 O
conteúdo do testemunho é identificado em 5.11: “Deus nos deu a vida
eterna, e esta vida está em seu Filho”.

V. Epílogo (5.13-21)
A conclusão declara o propósito da carta: “Eu vos escrevi essas coisas, a
vós que credes no nome do Filho de Deus, para que saibais que tendes a
vida eterna” (5.13). João elaborou sobre esse propósito de três maneiras,
cada uma das quais incluindo a expressão “nós sabemos”. Primeiramente,
5.14-17 descreve a segurança na oração que os fiéis possuem quando
pedem de acordo com a vontade de Deus, incluindo a oração por “aquele
que comete um pecado que não traz a morte” (5.16).88 Segundo, todo o que
é nascido de Deus não pratica o pecado (5.18). Terceiro, os fiéis conhecem
a verdade e estão na verdade (5.19,20). O comentário final de João,
“guardai-vos dos ídolos”, fornece um final abrupto e pouco convencional
para a carta, mas um final que é apropriado para a ocasião. É uma
advertência para que os fiéis não aceitem nenhum substituto para Deus.

ESTRUTURA DE 2JOÃO
I. Introdução (1-3)

II. Corpo: “andar na verdade” (4-11)


A. “Andar na verdade” requer amor fraternal (4-6)

1627
B. “Andar na verdade” requer a guarda da verdade sobre o Filho (7-11)

III. Conclusão (12-13)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE DE


2JOÃO
I. Introdução (1-3)
João empregou um pré-escrito padrão para esta carta, incluindo a
identificação do remetente e dos destinatários e uma “saudação” cristã.

II. Corpo: “Andar na Verdade” (4-11)


O corpo da carta consiste em uma instrução sustentada para a igreja
definindo “andar na verdade”. João instruiu seus leitores a guardarem o
“mandamento novo” e a se guardarem dos anticristos.

A. “Andar na verdade” requer amor fraternal (4-6)


O retorno do grupo para a igreja (v. 4) fornece o motivo para João lembrar
seus leitores a serem diligentes sobre “andar na verdade”. Isso é definido
como guardar o “mandamento novo” de amar uns aos outros.

B. “Andar na verdade” requer a guarda da verdade


sobre o Filho (7-11)
João insistiu que a igreja precisava se precaver contra os enganadores. Isso
é feito em duas maneiras. Primeiro, os fiéis deveriam reconhecer

1628
impostores que não mantêm o ensino apostólico e, portanto, não têm nem o
Filho nem o Pai (v. 9). Segundo, uma vez que os falsos mestres fossem
identificados, os fiéis não deveriam oferecer qualquer tipo de ajuda para
eles (v. 10).

III. Conclusão (12-13)


João concluiu com um pós-escrito padrão que apresentava planos para uma
visita e saudações de amigos em comum (a “irmã eleita” e “seus filhos”).

ESTRUTURA DE 3JOÃO
I. Introdução (1-4)

II. Corpo: recomendação de Gaio e Demétrio, condenação de Diótrefes (5-


12)
A. O comportamento piedoso de gaio para com os demais fiéis (5-8)
B. O comportamento iníquo de Diótrefes (9-10)
C. A recomendação de Demétrio (11-12)

III. Conclusão (13-14)

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE DE


3JOÃO
I. Introdução (1-4)
Novamente, João empregou um pré-escrito padrão, com remetente,
destinatário, e uma saudação cristã. Como em 2João parece que o presbítero

1629
tinha recebido uma delegação da igreja liderada por Gaio, e elogiou esse
grupo de fiéis por “andar na verdade”.

II. Corpo: Recomendação de Gaio e Demétrio,


Condenação de Diótrefes (5-12)
No corpo da carta, João solicitou apoio para Demétrio. Gaio é elogiado por
sua exposição passada do pecado de Diótrefes, e a igreja é exortada a apoiar
Demétrio.

A. O comportamento piedoso de Gaio para com os


demais fiéis (5-8)
João começou por elogiar o comportamento passado de Gaio. Gaio exibiu
sua fé ao ter sido hospitaleiro com os “irmãos”, que muito provavelmente
eram os emissários de João. O apóstolo encorajou Gaio não apenas a
receber esse grupo, mas também a enviá-lo com amplas provisões. O futuro
verbal “tu farás bem” (v. 6) indica que isso implica apoio a Demétrio, que é
introduzido mais tarde.

B. O comportamento iníquo de Diótrefes (9-10)


Os versículos 9 e 10 esboçam as acusações de João contra Diótrefes, que
não reconhecia a autoridade do presbítero e de seus emissários e que
caluniou o grupo apostólico. Além disso, ele censurava aqueles que os
recebiam, tudo porque “ama[va] ter o primeiro lugar entre eles”, em
flagrante contradição com as palavras de Jesus de que “ quem quiser ser o
primeiro entre vós, deve ser o vosso escravo” (Mt 20.27).

1630
C. A recomendação de Demétrio (11 -12)
A recomendação de Demétrio é estabelecida em contraste com a conduta
reprovável de Diótrefes. João instruiu Gaio a não “imitar o mal” (ou seja,
Diótrefes). Ele concluiu com um breve elogio a Demétrio, que tinha o
respeito de seus pares, que falava a verdade em si (provavelmente um
elogio à sua doutrina), e que também tinha o respeito do apóstolo (a quem
Gaio conhecia e declarou o testemunho verdadeiro).

III. Conclusão (13-14)


A conclusão (semelhante a 2João) é um pós-escrito padrão que contém o
desejo de João de encontrar Gaio pessoalmente, uma breve saudação dos
amigos de João, e uma instrução para “cumprimentar os amigos
nominalmente”.

TEOLOGIA
Temas Teológicos
A conduta ética fundamentada na doutrina cristã
adequada
A primeira carta de João é dominada por sua preocupação de que os fiéis
encontrem garantia de sua salvação e para que continuem na verdade.
Primeiramente ele afirmou a credibilidade da mensagem através de seu
status como uma testemunha ocular (1.1-4). Então, no panorama (1.5 a
2.27), ele introduziu a preocupação de que os fiéis agissem de acordo com
suas crenças (i. e., que a sua ética correspondesse à sua doutrina). No

1631
coração desta está a certeza de que a vinda a Cristo é uma experiência de
mudança de vida.
Se a vinda a Cristo é uma experiência de mudança de vida, então o que
os fiéis fazem serve como um indicador de que eles tiveram ou não essa
experiência (3.9). Assim, a segunda divisão de 1João (2.28 a 3.24) explora
as ramificações do que os fiéis fazem. Se eles têm a esperança de seu
retorno, eles purificam a si mesmos. Aqueles que permanecem nele não
praticam o pecado (que Jesus veio para destruir). Os filhos de Deus e os
filhos do Diabo são conhecidos por suas vidas justas ou injustas. Guardar o
mandamento novo é uma questão de obediência. A fonte de toda obediência
é o amor ao Pai (2.15-17). Assim, o amor e obediência andam de mãos
dadas e constituem a essência da permanência em Cristo.
Embora a segunda divisão seja doutrinariamente fundamentada, na
terceira divisão (4.1 a 5.12) João fez uma mudança sutil, cujo foco está nas
questões doutrinárias, especialmente na natureza de Cristo e de Deus.
Somente o Espírito que confessa Jesus é de Deus. Essa ideia “de Deus” (ek
tou theou) domina 4.1-6. Aqueles que amam o fazem porque a natureza de
Deus é amor (e a falta do amor revela aquele que o indivíduo não conhece a
Deus; v. 7-9). O fato de os filhos de Deus terem a vitória sobre o mundo é o
resultado de ser “de Deus”. O mandamento de amar uns aos outros é
repetido, mas dessa vez com uma justificativa doutrinária em vez de ética.
Os fiéis devem amar porque Deus é amor. Da mesma forma, eles devem
guardar seus mandamentos, mas desta vez o motivo está fundamentado na
natureza da redenção de Deus (5.4).

O discipulado cristão e a certeza da salvação

1632
As cartas joaninas dão ideias sobre os compromissos teológicos básicos dos
fiéis. Os cristãos não são chamados a desenvolver uma nova teologia, mas a
ser fiéis ao que eles receberam “desde o princípio” (1Jo 1.1). Acontece que
já haviam “progressistas” que ironicamente avançavam na direção errada
(2Jo 9). Segunda e terceira João desenvolvem a resposta cristã adequada a
esses indivíduos com mais detalhes, exortando os fiéis a não ajudarem a
esses “progressistas” (2Jo 9) e sim àqueles associados ao apóstolo (3Jo 6 a
8). Os fiéis são desafiados a amar a Cristo e uns aos outros, não “de palavra
nem de boca, mas em ações e em verdade” (1Jo 3.18), e a crescerem
espiritualmente, permanecendo na sua palavra (1Jo 2.12-14).
Contudo, a principal contribuição vem das bases para a confiança dadas
nestas cartas.89 Elas são tão proeminentes que alguns estudiosos têm visto
estas cartas como fornecendo “testes de vida”.90 Na verdade, em nenhum
outro lugar no cânon existe uma discussão sustentada que estabelece essas
razões objetivas para a certeza da salvação dos fiéis. Kruse descreveu a
natureza dessas razões: “A garantia do leitor deve ser fundamentada no
testemunho de Deus sobre seu Filho, sua própria vida santa, ação amável e
preocupação com os outros fiéis, a obediência deles ao mandamento do
amor e o testemunho que o Espírito dá de Cristo.”91 Mas, tão proeminente
quanto é o fato de que alguns afirmam ter comunhão com Cristo, conhecê-
lo, permanecer nele, e estar na luz, embora, na verdade, estando enganados.
Portanto, o ponto de 1João é incutir segurança nos verdadeiros fiéis de
que sua salvação está assegurada, juntamente com exortações à
perseverança (veja esp. 1Jo 5.13). João queria que seus leitores cristãos
tivessem certeza da sua salvação, mas ele também queria que eles
permanecessem em Jesus e na sua palavra; por outro lado, ele não estava
satisfeito com o fato de os cristãos continuarem em pecado. Assim João fez

1633
o retrato dos cristãos ideais: (1) eles estão seguros de sua posição em Cristo
por causa da regeneração transformadora de vida que eles experimentam
através do Espírito Santo; (2) eles são obedientes por causa de seu amor por
Cristo; (3) eles crescem em maturidade por causa de sua firmeza; (4) eles
amam por causa da natureza de Deus, que mudou suas vidas; e (5) eles são
vitoriosos por causa de sua fé em Cristo.

Amor
Embora não seja exclusiva das cartas joaninas, a ênfase de João no amor é
declarada. Marshall observou que o “amor é tematizado de uma maneira
que não tem paralelo em nenhuma outra parte do Novo Testamento […] As
indicações são de que, para toda a ênfase na sã doutrina, a principal
preocupação do autor é com o comportamento cristão de seus leitores”.92
Embora a última sentença possa ser exagerada (o autor não separa amor da
doutrina), não se pode exagerar que o amor (agapē e cognatos verbais
ocorrem 48 vezes) é um tema importante em 1João. Marshall listou seis
dimensões do amor em 1João: (1) a fonte do amor é Deus; (2) nós amamos
em resposta ao amor de Deus; (3) aqueles que amam demonstram seu
nascimento de Deus; (4) o amor é expressado em obediência (esp. o
mandamento de amar uns aos outros); (5), é possível que o amor seja
apenas uma alegação; e (6) pode-se alegar prova de nosso novo nascimento
pela presença ou ausência de amor.93

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON

1634
Jesus Cristo como a propiciação pelos pecados do mundo inteiro (1Jo
2.2)
Deus é amor (p. ex., 1Jo 4.16)
Certeza cristã (1Jo 5.11-13)
Proibição de estender hospitalidade aos falsos mestres (2João)
Advertência contra a liderança autocrática da igreja (3João)

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Quais são as três propostas alternativas para a autoria de João das
cartas joaninas?
2. Como você resumiria as evidências internas e externas para a autoria
de João?
3. Qual destes foi, provavelmente, escrito primeiro: o Evangelho de João
ou as suas cartas? Por que você diz isso?
4. Qual é o principal motivo para a composição por João, de 1João? Qual
é uma referência específica que dá apoio ao seu argumento ?
5. Qual grande heresia é combatida em 1João?
6. Quais são as três principais heresias perpetradas pelos falsos mestres?
7. Quais são os dois propósito principais para a composição de 1João por
João?
8. Quais são os propósitos para a composição de 2 e 3João por João?
9. Quem é a “senhora eleita”?
10. Qual típico padrão literário 2 e 3João seguem? O que torna a estrutura
de 1João tão difícil de discernir?
11. Quais são as várias dimensões do amor observadas em 1João?
12. Qual é o “pecado que traz a morte”?

1635
PARA ESTUDOS ADICIONAIS
AKIN, D. L. 1, 2, 3John. New American Commentary 38 (Nashville:
B&H, 2001).
BROWN, R. E. The Epistles of John. Anchor Bible 30 (Garden City:
Doubleday, 1982).
BRUCE, F. F. The Epistles of John (Grand Rapids: Eerdmans, 1979).
BULTMANN, R. The Johannine Epistles. Hermeneia.Tradução para o
inglês de R. P. O’Hara et. al. (Philadelphia: Fortress, 1973).
GRIFFITH, T. Keep Yourselves from Idols: A New Look at 1John. Journal
for the Study of the New Testament Supplement 233 (London:
Sheffield Academic, 2002).
HILL, C. E. The Johannine Corpus in the Early Church (Oxford:
Oxford University Press, 2004).
KRUSE, C. G. The Letters of John. Pillar New Testament Commentary
(Grand Rapids: Eerdmans, 2000).
LAW, R. The Tests of Life: A Study of the First Epistle of St. John. 3. ed.
(Edinburgh: T&T Clark, 1914; reimpr., Grand Rapids: Baker,
1979).
LIEU, J. M. The Theology of the Johannine Epistles (Cambridge:
Cambridge University Press, 1991).
LONGACRE, R. “Towards an Exegesis of 1John Based on the Discourse
Analysis of the Greek Text”. Em: BLACK, D. A., org. Linguistics
and New Testament Interpretation (Nashville: B&H, 1992), p.
271–86.
MARSHALL, I. H. The Epistles of John. New International Commentary
on the New Testament (Grand Rapids: Eerdmans, 1978).

1636
O’NEILL, J. C. The Puzzle of 1John: A New Examination of Origins
(London: SPCK, 1966).
PAINTER, J. 1, 2, and 3John. Sacra Pagina 18 (Collegeville: Liturgical
Press, 2002).
POYTHRESS, V. S. “Testing for Johannine Authorship by Examining the
Use of Conjunctions”. Westminster Theological Journal 46 (1984),
p. 350-69.
SCHNACKENBURG, R. The Johannine Epistles: A Commentary (New
York: Crossroad, 1992), 3 vols.
SMALLEY, S. S. 1, 2, 3John. Word Biblical Commentary 51 (Waco:
Word, 1984).
STOTT, J. R. W. The Letters of John. Tyndale New Testament
Commentary. Ed. rev. (Grand Rapids: Eerdmans, 1988).
STRECKER, G. The Johannine Letters: A Commentary on 1, 2, and
3John. Hermeneia. Tradução para o inglês de L. M. Maloney
(Minneapolis: Fortress, 1996).
STREET, D. R. “‘They Went Out from Us’: The Identity of the
Opponents in First John”. Tese de Ph.D, Southeastern Baptist
Theological Seminary, 2008.
THOMPSON, M. M. 1–3John. IVP New Testament Commentary
(Downers Grove: InterVarsity, 1992).
YARBROUGH, R. W. 1–3John. Baker Exegetical Commentary on the
New Testament (Grand Rapids: Baker, 2008).

1637
1
M. Lutero, D. Martin Luthers Werke: Kritische Gesamtausgabe, Weimarer Lutherausgabe

(Cologne: Böhlau, 1903), vol. 28, p. 183.

2
J. Calvino, The Gospel According to St. John 11 to 21 and the First Epistle of John, tradução

para o inglês de T. H. L. Parker (Grand Rapids: Eerdmans, 1959), p. 231.

3
Citado em Eusébio, Hist. Ec. 6.25.10.

4
R. E. Brown, The Epistles of John, AB 30 (Garden City: Doubleday, 1982), p. 6; cf. J. Painter,

1, 2, and 3John, SacPag (Collegeville: Liturgical Press, 2002), p. 40.

5
Veja os comentários sobre as evidências externas para a autoria no capítulo sobre o Evangelho

de João para uma defesa contra o ponto de vista comumente defendido de que havia uma

“joanofobia” entre os ortodoxos (também conhecida como a teoria OJP).

6
A citação de Ireneu de 2João 7 e 8 ocorre em um contexto que se refere a 1João e cita 2João

como se estivessem na mesma carta (Contra Heresias 3.16.8). Em vez de alegar que Ireneu estava

equivocado, é mais comumente sustentado que isso é evidência de que pelo menos 1 e 2João

circularam juntas. Veja Brown, Epistles, p. 10.

7
Brown (An Introduction to the New Testament, ABRL [New York: Doubleday, 1997], p. 389)

afirmou que a carta deve ter sido escrita antes de 150, mas é possível ser mais específico. Uma vez

que a carta, que foi enviada como uma carta de apresentação para as Epístolas de Inácio, indaga

sobre o destino de Inácio (13.2), pode-se supor que ela foi composta logo depois de seu martírio,

entre c. 107 e 110. M. W. Holmes (The Apostolic Fathers: Greek Texts and English Translations, 3.

ed. [Grand Rapids: Baker, 2007], p. 275-76) disse que a carta é geralmente datada de poucas semanas

(ou no máximo meses) depois. Assim, muitos datam a carta aos Filipenses já de 108 (p. ex., S. L.

Peterson, Timeline Charts of the Western Church [Grand Rapids: Zondervan, 1999], p. 19). Policarpo

mostrou não apenas conhecimento de 1João, mas também afinidades com a linguagem e pensamento

1638
de João, especialmente os capítulos 9 e 10; compare 10.1 (“unidos na verdade”) com 3João 8

(“cooperadores da verdade”).

8
Veja o estudo impressionante de C. E. Hill, The Johannine Corpus in the Early Church (Oxford:

University Press, 2004) para um catálogo completo das antigas citações joaninas.

9
Veja “Appendix A: The Collection of Paul’s Letters”, em: D. Guthrie, New Testament

Introduction, ed. rev. (Downers Grove: InterVarsity, 1990), p. 986-1000; D. Trobisch, Paul’s Letter

Collection: Tracing the Origins (Minneapolis: Fortress, 2000 [1994]); e S. E. Porter, org., The

Pauline Canon, Pauline Studies 1 (Leiden: Brill, 2004).

10
Esta foi uma decisão popular entre os teólogos do século XIX que foi reaberta por M. Hengel,

The Johannine Question (London: SCM, 1989). Veja as discussões da declaração de Papias em

Eusébio, Hist. Ec. 3.39.4.

11
C. H. Dodd, The Johannine Epistles, MNTC (New York: Harper, 1946); id., “The First Epistle

of John and the Fourth Gospel”, BJRL 21 (1937), p. 129-56. Este existe apesar dos hábeis trabalhos

que contrariam Dodd, tais como W. G. Wilson, “An Examination of the Linguistic Evidence

Adduced Against the Unity of Authorship of the First Epistle of John and the Fourth Gospel”, JTS 49

(1947), p. 147-56; W. F. Howard, “The Common Authorship of the Johannine Gospel and Epistles”,

JTS 48 (1947), p. 12-25.

12
Dodd, Epistles, xlix. Segundo Dodd, o autor das Cartas fez uso excessivo de certas construções

gramaticais e usou um conjunto menor de verbos compostos. Além disso, ele era “imoderadamente

viciado” em orações condicionais. Seguindo Dodd, havia uma grande propensão por parte de alguns

acadêmicos de denegrir o autor das Cartas no esforço de provar que o Evangelho não poderia ter sido

escrito por ele. Por exemplo, K. Grayston (The Johannine Epistles, New century Bible commentary

[Grand Rapids: Eerdmans, 1984], p. 7-9) descreveu uma hierarquia de habilidades dentro da

literatura joanina. Embora o Evangelho seja a marca alta de inteligência e expressão, o escritor de

1João, de forma pedante, transformou o existencialismo do Evangelho em uma expressão histórica e

1639
“com isso o degradou”. Ainda mais abaixo na escala está o “menos competente” autor de 2 e 3João,

que preferiu falar a escrever, simplesmente repetiu a tradição, renunciou ao desvio e, em geral, era

mais limitado que o autor de 1João.

13
Dodd, Epistles, xlix. Dodd considerou “Deus é amor” como sendo pensamento helenístico

martelado sobre uma bigorna cristã. O “amor” abstrato não seria encontrado no pensamento semita.

O Quarto Evangelho, em vez disso, declara que “Deus é espírito” (Jo 4.24).

14
Brown (Epistles, p. 24) observou: “No geral, então, parece que a variação de minúsculas

características estilísticas entre o Evangelho de João e 1João não é muito diferente da variação que se

pode encontrar quando se compara uma parte de João com a outra. Em particular, o Jesus joanino fala

quando o autor das epístolas joaninas escreve”.

15
Brown, Epistles, p. 24-25; veja Painter, 1, 2, and 3John, p. 60.

16
Brown, Introduction, p. 389.

17
Para uma descrição dos paralelos, veja T. A. Hoffman, “1John and the Qumran Scrolls”, BTB 8

(1978), p. 117-25; e M. -É. Boismard, “The First Epistle of John and the Writings of Qumran”, em: J.

C. Charlesworth, orgs., John and the Dead Sea Scrolls (London: J. Chapman, 1972), p. 156-65.

18
O próprio Brown (Epistles, p. 30) admitiu este ponto: “Elas poderiam ter sido escritas ao

mesmo tempo por homens diferentes… ou, e isto é mais provável, em momentos diferentes pelo

mesmo homem (mais triste e sábio enquanto enfrenta uma nova batalha, agora de dentro do

movimento) ou por homens diferentes”.

19
B. H. Streeter, The Four Gospels, ed. rev. (London: Macmillan, 1930), p. 460.

20
H. J. Holtzmann escreveu a obra fundamental sobre o vocabulário joanino: “Das Problem des

ersten johanneischen Briefes in seinem Verhältnis zum Evangelium”, Jahrbuch fur Protestantische

Theologie 7 (1881), p. 690-712; 8 (1882), p. 128-52, 316-42 e 460-85. Essas mais tarde foram

1640
incluídas e adapata para o inglês por A. E. Brooke, A Critical and Exegetical Commentary on the

Johannine Epistles (New York: Scribner, 1912), i-xix.

21
Brooke (Epistles, ii-iv) listou 52 itens separados, não incluindo 15 ocorrências de “isto/nisto”

seguida por uma oração explicativa.

22
Apenas duas palavras são exclusivas de 1João e do Evangelho de João, mas essas são

significativas: as palavras paraklētos (“confortador”/“advogado”; ou “Paráclito”) e anthrōpoktonos

(“homicida”). A última é usada em João 8.44, onde o Diabo é descrito como um “homicida desde o

princípio”. É surpreendente que em 1João 3.8 a palavra ocorre em uma seção detalhando as

diferenças entre os filhos de Deus e os filhos do Diabo.

23
Brooke (Epistles, v) observou que se poderia fazer uma lista bem longa.

24
Ibid.

25
Exemplos incluem: ekeinos (“aquele”) usado como um pronome, “todo aquele que está -ndo”

(pas ho + particípio no lugar de pantes; 1Jo 3:4 // Jo 3.16; semelhantemente, pan + particípio onde

pantes poderia ser usada; 1Jo 5.4 // Jo 6.37); repetição de palavras enfáticas; combinações do tipo kai

+ de; combinações do tipo kathōs + kai; uso elíptico de ou kathōs (1Jo 3.11,12 // Jo 6.58); hina usada

como infinitivo.

26
V. S. Poythress, “Testing for Johannine Authorship by Examining the use of Conjunctions”,

WTJ 46 (1984), p. 350-69. O teste de Poythress tem suas falhas, mas a premissa geral é bem

fundamentada e ainda resiste ao escrutínio. Veja L. S. Kellum, The Unity of the Farewell Discourse:

The Literary Integrity of John 13.31 to 16.33, JSNTSup 256 (New York: T&T Clark, 2004), p. 113-

21.

27
A carta de Policarpo, datada da primeira década do século II, apresenta uma estampa

linguística decididamente não joanina. Policarpo não faz uso de hina (“a fim de que”) da mesma

maneira que as epístolas joaninas; sua carta emprega oun (“portanto”) com uma frequência muito

1641
maior nos gêneros expositivos; ela não usa a palavra kosmos (“mundo”), mas em vez disso tem aiōna

(“era”) ; e os termos bem Joaninos ekeinos (“aquele”) e menō (“permanecer”) não são utilizados. No

entanto, Policarpo estava bem familiarizado com o Evangelho de João e com as epístolas joaninas e

as considerava dignas de crédito.

28
W. G. Kümmel, Introduction to the New Testament, ed. rev., tradução para o inglês de H. C.

Kee (Nashville: Abingdon, 1975), p. 445.

29
1João 1.1-5; 4.6,14; 3Jo 10,12.

30
Por exemplo, Brown, Epistles, p. 94-95; e Painter, 1, 2, 3John, p. 45-46.

31
Citado em Eusébio, Hist. Ec. 3.39.5-7.

32
Veja Brooke, Epistles, xix-xxii; e Grayston, Johannine Epistles, p. 12-14.

33
D. A. Carson; D. J. Moo, An Introduction to the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids:

Zondervan, 2005), p. 676.

34
Ireneu (Contra Heresias 22.22.5; 3.3.4; citado por Eusébio, Hist. Ec. 3.23.3-4), localizou a

morte de João durante o reinado de Trajano (98-117); Jerônimo (Vir. Ill. 9) afirmou que João morreu

no ano 68 após a Paixão de Jesus (98 ou 101).

35
Eusébio, Hist. Ec. 3.31.3; 5.24.2.

36
Ireneu, Contra Heresias 3.1.1.

37
Uma minoria postula outras proveniências. Por exemplo, Kümmel (Introduction, p. 445)

defendeu uma proveniência síria para o Evangelho de João baseado nos “contatos substantivos” com

as Odes de Salomão (que presumivelmente vieram da Síria) e Inácio de Antioquia (m. c. 110; veja

ibid., p. 247, com referências bibliográficas adicionais no n. 224), e ele presumiu que as cartas

também foram escritas ali. Em relação às teorias que apontam para as semelhanças linguísticas com o

gnosticismo na Palestina, R. Schnackenburg (The Johannine Epistles, tradução para o inglês de R. H.

1642
Fuller [New York: Crossroad, 1992], p. 40) sem dúvida está correto: “tudo isso significa que o autor

nasceu na Palestina”.

38
A atribuição de Agostinho da carta ad Parthos, “aos Partos”, é quase com certeza incorreta e

pode ser uma corrupção de tou parthenou (“do virgem”), uma possível referência a João que era

frequentemente considerado como celibatário. Veja P. Schaff, org., Nicene and Post-Nicene Fathers,

First Series (Peabody: Hendrickson, 1994), vol. 7: Augustin [sic]: Homilies on the Gospel of John,

Homilies on the First Epistle of John, Soliloquies, p. 459, n. 1. O título dos manuscritos de Agostinho

é “Ten Homilies on the Epistle of John to the Parthians”.

39
Segunda e Terceira João são mais facilmente reconhecidas como exemplos de cartas pessoais

do primeiro século. As duas cartas são bem curtas (245 e 219 palavras, respectivamente) e facilmente

caberiam em uma folha de papiro (típica de cartas do primeiro século). Para um proveitoso

tratamento, veja o capítulo sob o título “New Testament Letters” em: Carson; Moo, Introduction to

the New Testament, p. 331-53, esp. p. 332-33 [publicado em português por Vida Nova sob o título

Introdução ao Novo Testamento] (incluindo referências bibliográficas adicionais).

40
Ireneu (Contra Heresias 3.11.1) também narrou um confronto entre Cerinto e João. Ele

observou que João se recusou a permanecer em uma casa de banhos na qual se encontrava Cerinto e

aconselhou que o povo fugisse, “para que até mesmo a casa de banhos não desmoronasse”. Ireneu

(ibid., 3.3.4) atribui a Policarpo a fonte dessa tradição.

41
Por exemplo, R. Gundry (A Survey of the New Testament, 3. ed. [Grand Rapids: Zondervan,

1994], p. 448-9)[publicado em português por Vida Nova sob o título Panorama do Novo Testamento]

propôs que Cerinto é o culpado. Mas Schnackenburg (Epistles, p. 21-3) observou várias diferenças

entre os separatistas em 1João e os oponentes de Cerinto e Inácio mencionados mais adiante.

42
Foi destacado que a carta de Inácio aos esmirnenses e aos trálios (a sudoeste da Ásia Menor)

mostram um tipo de heresia docética que nega que Cristo era verdadeiramente humano (de dokeō,

“parecer”, o ensino que Jesus apenas parecia ser humano). Essa questão também é abordada em sua

1643
carta aos Efésios (Inácio, Aos Esmirnenses 2.1, 5.2; Aos Trálios 10.1; e Aos Efésios 7.1). Veja

Marshall, Epistles, xx; P. J. Achtemeier; J. B. Green; M. M. Thompson, Introducing the New

Testament: Its Literature and Theology (Grand Rapids: Eerdmans, 2001), p. 539; e F. Thielman,

Theology of the New Testament: A Canonical and Synthetic Approach (Grand Rapids: Zondervan,

2005), p. 539-40. Uma vez que Inácio escreveu todas as suas cartas para as igrejas na Ásia Menor, é

provável que algo como as doutrinas docéticas floresceram também na época de João.

43
Também Schnackenburg, Epistles, p. 21-23.

44
Ibid., p. 17.

45
T. Griffith (Keep Yourselves From Idols: A New Look at 1John [London: Sheffield Academic

Press, 2002]) afirmou que os separatistas estavam se convertendo novamente ao judaísmo e que “na

carne” não se refere a uma teologia docética, mas simplesmente representa uma forma de expressar a

encarnação. Um outro argumento não polêmico é encontrado em J. M. Lieu, “‘Authority to Become

Children of God’: A Study of 1John”, NovT (1981), p. 210-28.

46
A declaração em 2.26 (“Eu vos escrevi estas coisas a respeito dos que vos tentam enganar”)

remonta a pelo menos 2.18. Em 2.22, é afirmado que os oponentes negavam que Jesus era o Messias

(embora a exata natureza dessa negação não seja especificada). As referências a negar e confessar

Jesus o Filho em 2.23 são também generalizadas em natureza.

47
Por essa razão, a referência a Jesus tendo vindo “em carne” em 1João 4.2 pode lembrar a

afirmação de que Deus “foi revelado em carne” em 1Timóteo 3.16.

48
A maioria não é tão cautelosa. Veja Achtemeier; Green; Thompson, Introducing the New

Testament, p. 539-42.

49
D. L. Akin, 1, 2, 3John, NAC 38 (Nashville: B&H, 2001), p. 31.

50
A oração “aqueles que vos tentam enganar” (particípio substantivo tōn planōtōn) em 1João

2.26 está no tempo presente, indicando ação contemporânea com o verbo principal (neste caso um

1644
aoristo epistolar, “eu escrevi”). Segue-se que, na época da composição de 1João, os falsos mestres

ainda estavam tentando infiltrar nas igrejas as suas falsas doutrinas.

51
Thielman, Theology of the New Testament, p. 536.

52
R. Longacre (“Towards an Exegesis of 1John”, em: D. A. Black, org., Linguistics and New

Testament Interpretation [Nashville: B&H, 1992], p. 278-79) observou que embora apenas 9% dos

verbos sejam imperativos em forma, eles dominam as passagens nas quais ocorrem.

53
Guthrie, New Testament Introduction, p. 867.

54
Veja 1João 2.4,5, 12-15 e as repetidas exortações a “permanecer” em Cristo (1Jo 2.24, 27,28;

3.17; 4.13; 2Jo 1.9; veja 1Jo 3.14).

55
Por exemplo, G. Strecker (The Johannine Letters: A Commentary on 1, 2, and 3John,

Hermeneia, tradução para o inglês de L. M. Maloney [Minneapolis: Fortress, 1996], p. 3) argumentou

que 2 e 3João são mais antigas que 1João. O uso do termo “presbítero” de nenhuma maneira dá

credibilidade ao mito de um “João, o presbítero” mencionado anteriormente.

56
Schnackenburg, Epistles, p. 270.

57
Brown (Epistles, p. 652-53) observou uma série de opiniões contrárias, todas girando em torno

de um único indivíduo: (1) uma senhora chamada “Electa”; (2) “uma nobre Kyria” (Alford, Bengel,

de Wette, Ebrard, Lücke, e Neander); (3) “uma Cara Senhora” (i.e., uma mulher de alguma

importância; Plummer, Ross); e (4) a igreja universal (Schmiedel).

58
Também Carson e Moo, Introduction to the New Testament, p. 677; Brown, Epistles, p. 655; C.

G. Kruse, The Letters of John, PNTC (Grand Rapids: Eerdmans, 2000), p. 38; Marshall, Epistles, p.

60; Brooke, Epistles, p. 167-70.

59
Para um tratamento criterioso, veja J. R. W. Stott, Letters of John, TNTC, ed. rev. (Grand

Rapids: Eerdmans, 1988), p. 203-5.

1645
60
Achtemeier; Green; Thompson, Introducing the New Testament, p. 548.

61
Como Carson e Moo (Introduction to the New Testament, p. 677) observaram, esse Gaio

provavelmente não é o Gaio de Corinto (Rm 16.23; 1Co 1.14) nem o Gaio da Macedônia (At 19.29),

nem o Gaio de Derbe (At 20.4; contra as Constituições Apostólicas 7.46.9 do século IV).

62
Nada se sabe sobre Demétrio ou Diótrefes à parte das referências a esses indivíduos em 2João.

63
J. L. White, “Ancient Greek Letters”, em: D. E. Aune, org., Greco-Roman literature and the

New Testament, SBLSBS 21 (Atlanta: Scholars Press, 1988), p. 100; cf. J. A. D. Weima, “Letters,

Greco-Roman”, em: C. A. Evans; S. E. Porter, orgs., Dictionary of New Testament Background

(Downers Grove: InterVarsity, 2000), p. 640-44.

64
D. Aune, The New Testament in Its Literary Environment (Philadelphia: Westminster, 1987), p.

163-64.

65
Brown, Epistles, p. 87.

66
S. S. Smalley, 1, 2, 3John, WBC 51 (ed. rev.; Nashville: Nelson, 2007), xxx.

67
Windisch, Die Katholischen Briefe, HNT 15, 3. ed. rev. (Tübingen: Mohr, 1951), p. 136, citado

em Brown, Epistles, p. 87.

68
K. Grayston, The Johannine Epistles, New Century Bible (Grand Rapids: Eerdmans, 1984), p.

4.

69
Brown (Epistles, p. 90) admitiu que essa é uma escolha de não fazer uma escolha, então ele

simplesmente descreveu o conteúdo.

70
J. V. Hills, “A Genre for 1John”, em: The Future of Early Christianity: Essays in Honor of

Helmut Koester (Minneapolis: Fortress, 1991), p. 367.

71
Veja Aune, Literary Environment, p. 203.

1646
72
Para um levantamento das recentes opções, veja B. Olsson, “First John: Discourse Analyses

and Interpretations”, em: S. E. Porter; J. T. Reed, orgs., Discourse Analysis and the New Testament:

Approaches and Results, JSNTSup 170, Studies in New Testament Greek 4 (Sheffield: Sheffield

Academic Press, 1999), p. 369-91.

73
Por exemplo, P. J. van Staden (“The Debate on the Structure of 1John”, Hervormde Teologiese

Studies 47 [1991], p. 487-502) defendeu um macroquiasma. Marshall (Epistles, p. 26) sugeriu que

não há estrutura coerente, e Kruse (Letters of John, p. 32) disse que sua análise da carta não

“detectou qualquer argumento em desenvolvimento na carta porque não existe nenhum”.

74
O mais recente a propor uma série de fontes editadas em um documento foi J. C. O’Neill, The

Puzzle of 1 John: A New Examination of Origins (London: SPCK, 1966); contudo Marshall (Epistles,

p. 30) observou que sua teoria é “completamente especulativa, e não conquistou nenhum aderente”.

Para outras teorias, veja E. von Dobschütz, “Johanneische Studien I”, ZNW 8 (1907), p. 1-8; R.

Bultmann, The Johannine Epistles, Hermeneia, tradução para o inglês de R. P. O’Hara e outros.

(Philadelphia: Fortress, 1973); e W. Nauck, Die Tradition und der Charakter des ersten

Johannesbriefes, WUNT 3 (Tübingen: Mohr, 1953). Para uma teoria de rearranjo, veja K. Tomoi,

“The Plan of the First Epistle of John”, ExpTim 52 (1940-41), p. 117-19.

75
Schnackenburg (Epistles, p. 12-13) sem dúvida está correto quando diz que o autor “não

vagueia meramente, sem nenhum plano específico”.

76
Brown, Epistles of John, p. 116-29.

77
A apresentação das propostas estruturais abaixo para 1João é adaptada da tabela em Brown,

Epistles, p. 764; veja também L.Scott Kellum, “On the Semantic Structure of 1John: A Modest

Proposal”, Faith and Mission 23 (2008), p. 36-38. As obras citadas são J. Chaine, Les Epîtres

Catholiques, EB, 2. ed. (Paris: Gabalda, 1939), p. 97-260; Longacre, “Exegesis of 1John”; G. M.

Burge, The Letters of John, NIVAC (Grand Rapids: Zondervan, 1996); Schnackenburg, Epistles; M.

M. Thompson em: Achtemeier; Green; Thompson, Introducing the New Testament; F.-M. Braun,

1647
“Les Epîtres de Saint Jean”, em: L’Evangile de Saint Jean, SBJ (3. ed. rev.; Paris: Cerf, 1973), p.

231-77; Guthrie, New Testament Introduction; F. F. Bruce, The Epistles of John (Grand Rapids:

Eerdmans, 1979); e Stott, Letters of John.

78
Para uma análise completa da estrutura de 1João, veja Kellum, “Semantic Structure of 1John”,

p. 34-82.

79
Interessantemente, o verbo graphō (“escrever”) é usado 9 vezes nos capítulos 1 e 2, e não é

usado novamente até a conclusão em 5.13. Veja Longacre, “Toward an Exegesis of 1John”, p. 276-

77.

80
Muito provavelmente, 2.2 conclui esta seção. Para uma defesa detalhada, veja. Callow, “Where

does 1John 1 End?”, em: Discourse Analysis and the New Testament, p. 392-406.

81
Isso é indicado pelo contínuo assunto, o andar dos verdadeiros cristãos, e o contínuo uso da

metáfora de andar na luz e trevas em 2.9.

82
Isto é o que Longacre (“Toward an Exegesis of 1John”, p. 279) chamou de “pico ético” desta

divisão introdutória.

83
Para um surpreendente paralelo veja Josué 1.8, onde é dito a Josué que seja forte e que medite

na palavra para que tenha sucesso.

84
A presente passagem está, com toda probabilidade, comentando Gênesis 3.6, onde a mulher

“viu que a árvore era boa para dela comer, agradável aos olhos e desejável para obter sabedoria”.

85
A sentença “vós todos tendes conhecimento” (2.20) pode constituir uma velada polêmica

contra um antigo elemento gnóstico entre os oponentes de João. A declaração “vós não tendes

necessidade de que alguém vos ensine” (2.27) não implica que os fiéis não têm a necessidade de

instrução após a salvação (veja Ef 4.11; 1Tm 2.7; 3.2; 4.11; 6.2 ; 2Tm 1.11; 2.2), mas simplesmente

adverte os leitores a não darem ouvidos aos falsos mestres.

1648
86
Esta é a mesma ênfase que a do Evangelho de João. Veja os comentários em João 20.31 em A.

J. Köstenberger, John, BECNT (Grand Rapids: Baker, 2004), p. 582.

87
Muitas edições do NT incluem o que é conhecido como o “Parêntese Joanino”, que divide as

testemunhas entre aquelas no céu e aquelas na terra: “pois três são os que testificam no céu: o Pai, a

Palavra e o Espírito Santo, e estes três são Um. E três são os que testificam na terra: o Espírito, a

água e o sangue – e estes três concordam” (5.7,8; o “Parêntese Joanino” está em itálico). Hoje, isso é

quase universalmente entendido como uma adição posterior. Ela aparece na terceira edição do NT de

Erasmo (comumente conhecida como Textus Receptus), porque um manuscrito grego do século XVI,

o Códice Montfortiano (Britânico), o incluía. Esse manuscrito foi produzido com o propósito de fazer

Erasmo incluí-lo no texto (veja Brown, Epistles, p. 776 e 780). Muitos acadêmicos o rejeitam

corretamente com base no fato de que ele é impossivelmente posterior.

88
Não há consenso acadêmico sobre a exata identificação deste pecado. Para uma criteriosa

discussão, veja Stott, Letters of John, p. 189-93. Stott argumentou que aqui João utilizou o termo

“irmão” em um sentido amplo para se referir a outra pessoa, não necessariamente a um companheiro

cristão (veja 1Jo 2.9,11; 3.16,17), e identificou o “pecado para a morte” como “uma rejeição

deliberada e consciente da verdade conhecida” ligada à “blasfêmia contra o Espírito Santo” cometida

pelos fariseus, que atribuíam os milagres de Jesus feitos no poder do espírito Santo a Satanás (Mt

12.28 e paralelos). Outras possibilidades listadas por Stott incluem um pecado específico (um pecado

“mortal”) ou apostasia.

89
Para um excelente tratamento sobre este tópico em 1João e no restante do AT, veja D. A.

Carson, “Reflections on Christian Assurance”, WTJ 54 (1992), p. 1-29.

90
Veja R. Law, The Tests of Life: A Study of the First Epistle of St. John, 3. ed. (Edinburgh: T&T

Clark, 1914; reimpr., Grand Rapids: Baker, 1979).

91
Kruse, Letters of John, p. 33.

1649
92
I. H. Marshall, New Testament Theology: Many Witnesses, One Gospel (Downers Grove:

InterVarsity, 2004), p. 539 [publicado em português por Vida Nova sob o título Teologia do Novo

Testamento: diversos testemunhos um só evangelho].

93
Ibid.

1650
CAPÍTULO 20

O livro de Apocalipse

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes devem conhecer os fatos essenciais
do livro de Apocalipse. Em relação à História, eles devem ser capazes de
identificar o autor, a data, a origem, o destino e o propósito do livro. Em
relação à Literatura, devem ser capazes de fornecer um esboço básico do
livro e identificar elementos essenciais do conteúdo do livro encontrados na
Discussão Unidade por Unidade. Em relação à Teologia, os estudantes
devem ser capazes de identificar os principais temas teológicos no livro de
Apocalipse.
Conhecimentos intermediários: além de domínio do conteúdo
essencial identificado no Conhecimento básico, os estudantes devem ser
capazes de apresentar os argumentos para as conclusões históricas, literárias
e teológicas. Em relação à História, os estudantes devem ser capazes de
discutir as evidências em favor da autoria joanina, data, origem, destino e
propósito. Em relação à Literatura, eles devem ser capazes de fornecer um
esboço detalhado do livro. Em relação à Teologia, os estudantes devem ser

1651
capazes de discutir os principais temas teológicos no livro de Apocalipse e
as formas exclusivas em que esses temas contribuem para o cânon do NT.
Conhecimentos avançados: além do domínio dos conteúdos essenciais
identificados nos itens Conhecimento básico e Conhecimento intermediário,
os estudantes devem ser capazes de avaliar criticamente as evidências
interna e externa em favor da autoria e data de Apocalipse. Eles devem
saber explicar o gênero do livro e estar preparados para discutir a estrutura
literária de Apocalipse em relação às quatro visões, os selos, as trombetas e
taças, e as duas últimas visões. Também devem ser capazes de discutir as
cinco principais abordagens ao estudo do livro de Apocalipse.

FATOS-CHAVE DE APOCALIPSE
Autor: João
Data: 95-96
Origem: Patmos
Destino: Éfeso, Esmirna, Pérgamo, Tiatira, Sardes,
Filadélfia e Laodiceia
Motivo: Perseguição aos cristãos na Ásia Menor,
visões de João
Propósito: Encorajar os cristãos a perseveram na fé
descrevendo o juízo final e o
estabelecimento do reino de Cristo na terra
Tema: Jesus, o Cordeiro imolado e ressuscitado
está voltando como Rei e Juiz escatológicos
Versículos-Chave: 1.7; 19.11-16

INTRODUÇÃO

1652
Por toda a história de sua interpretação, o livro de Apocalipse tem
capturado a imaginação de muitas pessoas, produzindo uma miríade de
interpretações e esquemas teológicos em um esforço de entender os difíceis,
porém fascinantes, ensinamentos do livro.1 Apesar dos inúmeros desafios
enfrentados pelo intérprete, o interesse no livro de Apocalipse nunca
diminui.2

HISTÓRIA
Autor
Uma vez que o autor se identifica como “João”, e já que a maioria dos
estudiosos aceita que o nome não era um pseudônimo,3 o foco da discussão
tem sido responder à pergunta: qual João é o autor do livro? A maioria dos
estudiosos reconhece três candidatos principais: (1) João, o apóstolo e filho
de Zebedeu;4 (2) João, o presbítero;5 e (3) algum outro João desconhecido,
que era um profeta.6 Além disso, João Marcos7 e João Batista8 foram
propostos como candidatos, mas não receberam nenhum apoio sério.

Evidências internas
Apocalipse é o único livro no corpus joanino com uma declaração explícita
de autoria. O autor se identificou como “João” três vezes no início e uma
vez no final (1.1,4,9; 22.8). A referência na primeira pessoa indica que o
autor foi testemunha ocular e participante dos acontecimentos narrados no
livro.9 Logo no início, o texto diz que João “deu testemunho”, como uma
testemunha ocular, da veracidade da mensagem diretamente entregue a ele
por Deus (1.2; veja 1Jo 1.1-3). Nas duas outras autorreferências de abertura,

1653
parece que João declarou seu nome para o registro oficial (1.4,9).10
Portanto, ele cumpriu o papel de uma testemunha de Cristo e das igrejas ao
pôr seu testemunho por escrito.
O autor se referiu a si mesmo simplesmente como “João”, o que sugere
que ele era uma figura bem conhecida na Ásia Menor. Embora ele não
refira a si mesmo como um profeta, ele se apresentou como tal. Isso é
demonstrado pela simples autodesignação “eu, João” (1.9; 22.8), que está
de acordo com a convenção padrão utilizada nos escritos proféticos e
apocalípticos.11 Ele também designou seu livro como uma “profecia” (1.3;
22.7,11,18,19).12 A visão inaugural inclui a comissão de João de uma
maneira que lembra a dos profetas do AT (1.9-20).13 Mais tarde no livro,
João participa da visão como um profeta, quando ele come um rolo
agridoce, e lhe é dito que “é necessário para [ele] profetizar novamente”
(10.8-11, tradução do autor, veja Ez 3.1-3). Ele exibiu uma preocupação
especial pelos profetas cristãos (10.7; 11.10,18; 16.6; 18.20,24; 22.6,9) e
condenou todos os falsos profetas (16.13; 19.20; 20.10). Isso sugere que
João se considerava um profeta na tradição dos profetas do Antigo
Testamento.
Quando João falou de si mesmo, ele o fez com humildade, preferindo
referir a si mesmo como um “servo” (doulos) de Deus ou de Cristo (1.1;
veja 2.20; 6.15; 7.3 etc.) e como um “irmão” (adelphos; 1.9). Embora João
fosse uma figura de autoridade na comunidade cristã, ele se apresentou
como um dos fiéis, um “coparticipante” (synkoinōnos) de seus leitores em
dificuldades, no reino, e na perseverança (1.9; veja 6.11; 12.10; 19.10;
22.9).
Além disso, indícios linguísticos e estilísticos no texto sugerem
fortemente que João era um cristão judeu originário da Palestina.14 R. H.

1654
Charles afirmou devido a sua minuciosa análise que a única certeza sobre o
autor é que ele era um judeu palestino da região da Galileia, com base em
duas observações.15 Primeira, a língua nativa de João era o hebraico, como
evidenciado pela “grande multidão de solecismos [uma evidente
incongruência gramatical] e idiossincrasias sem paralelo” do seu grego que
refletem uma sintaxe semita.16 Segunda, João foi um profeta que escreveu
um apocalipse.17 As raízes palestínicas de João também são expostas por
seu conhecimento e interesse pelo Templo (11.1,2) e outros locais na
Palestina (11.8; 16.16; 20.9; 21.2).18 Até mesmo o nome “João” é de origem
judaica e somente mais tarde o nome aparece nos contextos gentílicos.19
À luz dessas observações há bons motivos para se crer que o autor de
Apocalipse foi o apóstolo João, filho de Zebedeu. Mas várias objeções têm
sido levantadas que contestam essa identificação, especialmente nas últimas
décadas.
A primeira objeção possível é que João, o filho de Zebedeu, não era um
profeta, mas um apóstolo. Na verdade, em nenhuma passagem no livro o
autor alega autoridade apostólica ou relacionamento pessoal com Jesus
durante seu ministério terreno, e ele é identificado como um irmão dos
profetas, não dos apóstolos (22.9).20 Mas, alegar que João era apenas um
profeta constitui uma inferência indevida. Certamente é possível, se não
plausível, que um homem pudesse exercer as duas funções ao mesmo
tempo.21 Assim, a identidade de João como um profeta não necessariamente
impede seu status de apóstolo.
Uma outra objeção é que, quando João descreveu os fundamentos da
nova Jerusalém com os nomes dos 12 apóstolos (21.14; veja 18.20; Ef
2.20), ele falou dos apóstolos como um óbvio estranho ao se referir a eles
como figuras fundadoras do passado.22 Mas, de novo, especialmente à luz

1655
da natureza simbólica da visão de João, nada parece impedir que ele fosse
um deles.23 Ao relatar uma tal visão, seria totalmente inadequado para o
autor interpor que ele mesmo era um dos apóstolos. Assim, 21.14 não
indica que o autor fosse alguém que não João, o apóstolo.

Evidências externas
A tradição da igreja antiga, por unanimidade, atribui Apocalipse a João, o
apóstolo. Poucos livros do NT desfrutam de uma atribuição tão clara e
inequívoca de autoria.24 Um testemunho antigo e incontestável afirmando a
autoria apostólica joanina é encontrado nos escritos de Justino Mártir (c.
100-165), Ireneu (c. 130-200), Clemente de Alexandria (c. 150-215),
Hipólito (c. 170-236), Orígenes (c. 185-254) e Tertuliano (c. 160-225).25
Justino Mártir, no segundo século (c. 100-165), forneceu a mais antiga
evidência existente de que João, o apóstolo, escreveu o Apocalipse (Justino,
Diálogo com Trifo, 81.4; veja Eusébio, Ecles. Hist. 4.18.8).
Essa tradição não foi repetida e confirmada apenas por pais da igreja
tardia; não há absolutamente nenhum indício de quaisquer pontos de vista
concorrentes da autoria apostólica joanina. Tão forte é essa evidência que
Guthrie observa que aqueles que negam a autoria apostólica de João
supõem que os pais da igreja antiga eram simplesmente ignorantes em
relação às verdadeiras origens do livro e erroneamente assumiram que o
autor devia ter sido o filho de Zebedeu.26 Assim, essas antigas tradições são
um forte argumento para João, o filho de Zebedeu, como o autor de
Apocalipse.
Outros testemunhos podem prover testemunho antigo adicional da
autoria apostólica joanina, tais como os escritos de Papias de Hierápolis (c.

1656
110), o gnóstico Apócrifo de João, e o cânon muratoriano (final do segundo
século?), mas essas fontes são menos conclusivas.27 Papias de Hierápolis,
em particular, continua a ser uma figura controversa (veja Eusébio, Hist.
Ecl. 3.39.1). De acordo com Eusébio (c. 260-340), Papias distinguiu entre
um “João” entre os apóstolos e um “João, o presbítero” (Hist. Ecl. 3.39.5).
Mas há evidência de que Papias considerava Apocalipse como sendo da
mão de João, o apóstolo.28
O testemunho generalizado em favor da autoria apostólica joanina
começou a ser questionado por alguns grupos periféricos no segundo
século. Marcião (c. 150) foi o primeiro a rejeitar o livro por causa de suas
fortes características judaicas,29 mas essa rejeição praticamente não teve
impacto algum, pois Marcião repudiou a maioria dos livros do NT.30 O
segundo desafio veio dos antimontanistas. Os Alogi, um grupo de hereges
cristãos que floresceu na Ásia Menor por volta de 170, rejeitaram o
Evangelho de João e o Apocalipse e negaram que fossem do apóstolo João,
acreditando que eram o produto do herege Cerinto, assim como fez Gaio,
que detestava a natureza terrena do reino de Cristo após a ressurreição.31
Curiosamente, estas vozes dissidentes do segundo século difamam o
Apocalipse não por razões históricas, mas porque sua mensagem conflitava
com a teologia delas.
A análise crítica de Apocalipse e do Quarto Evangelho por Dionísio, um
bispo do terceiro século em Alexandria (c. 247-65), estabeleceu uma
tradição de que os dois livros não poderiam ter vindo do mesmo autor. Em
sua obra Das promessas, preservada por Eusébio, Dionísio decididamente
negou o chiliasm (a crença no reinado milenar de Cristo), culpando este por
sua suposta ênfase na tolerância carnal e sua base em uma interpretação
literal de Apocalipse (Hist. Ecl. 7.24.4-6; 7.25.1-2). Embora Dionísio

1657
afirmasse que Apocalipse era Escritura inspirada, ele negou que ele fosse
escrito pelo apóstolo João (Hist. Ecl. 7.25.1-27).
Até hoje Dionísio serve como um ponto de referência para aqueles que
negam a autoria apostólica joanina de Apocalipse. Mas nenhum dos
argumentos utilizados pelos oponentes da autoria apostólica joanina do
livro derrubou a substancial e unânime tradição mais antiga de que o autor
de Apocalipse é o apóstolo João, filho de Zebedeu.32

Data
A opinião erudita sobre a data da composição de Apocalipse está dividida
entre uma data antiga (64-69) e uma data tardia (95-96). Além disso, alguns
optam por um meio termo, conjecturando que a composição teve início na
década de 60 e foi concluída no final da década de 90.33 Embora a certeza
ainda esteja fora de alcance, a data tardia, durante o reinado de Domiciano,
tem um apoio consideravelmente maior.

Evidência interna
O livro de Apocalipse fornece os seguintes indícios internos quanto a sua
data de composição: (1) a perseguição sofrida pelas igrejas da Ásia Menor;
(2) a condição espiritual dessas igrejas; (3) o culto ao imperador; (4) a
referência ao Templo de Jerusalém em 11.1,2; (5) o “mito do Nero
redivivus” (embora não explicitamente mencionado no livro); (6) as
referências a “Babilônia” em Apocalipse; e (7) as sete “cabeças”
mencionadas em 17.9-11.

1658
Tipo de perseguição
Um dos argumentos mais comuns para datar Apocalipse se refere a noção
de que na época da composição os cristãos estavam enfrentando uma
perseguição feroz. Ao longo da história da igreja, Domiciano tem sido visto
como um grande perseguidor da igreja (Eusébio, Hist. Ecl. 4.26.9). Mas em
décadas recentes, essa ideia tem sido cada vez mais questionada devido à
escassez de evidência em apoio de uma perseguição em nível imperial
instigada por Domiciano. Portanto, os defensores de uma data antiga
alegam que a perseguição aos cristãos refletida em Apocalipse melhor
corresponde à perseguição movida por Nero. Outros se referem à
perseguição apenas como uma “crise percebida”.34
O livro de Apocalipse indica diferentes graus de perseguição e antecipa
perseguição em uma escala muito maior no futuro próximo. João abordou a
perseguição sofrida pelos cristãos na época da composição ou em um
passado recente. O banimento de João em Patmos ocorreu devido à
hostilidade para com as reivindicações exclusivas do evangelho (1.9). As
cartas às igrejas da Ásia Menor também demonstram uma perseguição
local. As diversas situações refletidas nas cartas indicam que cada igreja
enfrentava desafios próprios de sua localidade particular. No entanto, as
perseguições sofridas pelos cristãos na Ásia Menor não resultaram em
morte, com exceção de um único caso (Antipas), na cidade de Pérgamo
(2.13).
As almas decapitadas debaixo do altar celestial fornecem uma indicação
final da perseguição contra os cristãos no passado recente (6.9). A quebra
do quinto selo revela as almas dos fiéis que foram executados por causa de
sua fé e clamavam por justiça (6.10).35 Esse clamor representa um apelo por
justiça pública, não uma vingança privada.36 A razão de exigirem justiça é

1659
porque foram condenados injustamente em razão do seu testemunho da
palavra de Deus e de Jesus. Embora essas almas possam incluir todos os
mártires desde a época de Abel (Gn 4.10; Mt 23.29-35), mas provavelmente
trata-se dos cristãos assassinados desde a época de Estêvão (At 7.55-60;
12.2; Ap 2.13).37 A referência não trata de uma perseguição atual porque
Antipas é o único especificamente mencionado como tendo sido executado
por sua fé. O único caso bem documentado de perseguição generalizada
ocorreu durante o reinado de Nero.38 Os cristãos na Ásia Menor certamente
se lembravam da excessiva crueldade e injustiça infligidas aos fiéis durante
a perseguição de Nero. Essa peça de evidência, portanto, favorece uma data
mais tardia, permitindo que algum tempo decorresse desde a perseguição de
Nero.
Na época da composição, as igrejas na Ásia Menor estavam
experimentando algum tipo de perseguição, mas de modo nenhum se
aproximava da extensão da que Nero infligiu aos cristãos. Embora eles não
estivessem naquele momento enfrentando uma grande perseguição, João a
antecipou no futuro próximo. Isso é declarado explicitamente na resposta à
pergunta: Por quanto tempo? até que eles fossem vingados (6.10; veja 4Ed
4.33-37). Em resposta, aos fiéis foi falado que esperassem até que o número
total de seus conservos e irmãos fossem mortos (6.11).
Os capítulos 12 e 13 retratam vividamente a completação desse número
como o resultado de uma guerra santa entre Deus e Satanás terminada na
terra. Uma vez expulso do céu, Satanás, o acusador, começa a travar guerra
contra aqueles que obedecem aos mandamentos de Deus e são fiéis ao
testemunho de Jesus (12.17). Em 13.1-8, o dragão dota a besta de
autoridade para ordenar a adoração de sua estátua e fazer guerra aos crentes.
Isso representa a participação forçada no culto imperial por um futuro

1660
imperador que, como Nero, perseguirá a igreja com selvageria. Os fiéis são
exortados a perseverar e esperar pelo momento em que Deus os vindicará
(13.9,10, veja 17.6; 18.24; 19.2; 20.4).
Se esses exemplos refletem, de forma acurada, a situação dos cristãos na
Ásia Menor na época da composição, a evidência privilegia a época de
Domiciano. Primeiro, a perseguição não é severa o bastante para ser
associada a Nero. Segundo, embora a noção de que Domiciano instituiu
uma perseguição por todo o império fosse exagerada,39 o fato de ele não
perseguir os cristãos sistematicamente não significa que ele fosse favorável
a eles. Pelo contrário, os cristãos eram desprezados por todo o império.
Nem todos os cristãos na Ásia Menor enfrentaram o mesmo nível de
antagonismo; parece que a perseguição foi mais intensa nas cidades que
competiam pelo favor de Roma. Isso também sugere a época de Domiciano.

O estado das igrejas na Ásia Menor


Em relação ao estado das igrejas na Ásia Menor como descrito no
Apocalipse, muitas dessas igrejas estavam claramente numa condição de
deterioração moral e espiritual. Os cristãos em Éfeso haviam abandonado
seu “primeiro amor” (2.4). As igrejas de Pérgamo e Tiatira tinham
permitido, e até mesmo sucumbido ao falso ensino (2.14,15,20,24). Os
cristãos de Sardes tinham se tornado espiritualmente letárgicos (3.1,2). Os
de Laodiceia tinham se afundado numa autossuficiência “morna” e
arrogante (3.15-17).40 Embora possa ser argumentado que o
desenvolvimento deste tipo de apatia espiritual teria levado algum tempo,
contribuindo assim para uma data tardia, esta peça de evidência não é

1661
conclusiva por si só, especialmente porque algumas das igrejas de Paulo
desenvolveram problemas comparáveis já nas décadas de 50 e 60.41

O culto ao imperador
O culto do imperador é importante já que muitos têm sugerido uma data
domiciana devido à retórica anti-imperialista no livro.42 A expressão “nosso
Senhor e Deus” (4.11; veja 19.6), em particular, é paralela à latina dominus
et deus noster, um título aplicado a Domiciano durante seu reinado
(Suetônio, Dom. 13.2). A fidelidade ao único Deus verdadeiro no meio de
uma sociedade idólatra é um dos principais temas do livro. Assim, 4.11
provavelmente contrasta a reivindicação imperial à divindade com o único
Deus verdadeiro que está sentado no trono celeste.
Evidências abundam dos críticos e simpatizantes de Domiciano de que
ele atribuía a si mesmo títulos de divindade além do que era culturalmente
aceitável. Em 42 a.C., após a morte de Júlio César, o Senado oficialmente o
declarou divius Iulius (“divino Júlio”). Logo depois, Otaviano, sobrinho e
sucessor de César, foi chamado divi filius (“filho de um ser divino”).43 No
máximo, um imperador, geralmente após a morte, poderia atingir o status
de divius (“divino”), mas não deus.44 Fora o excesso de reivindicações de
divindade de Calígula,45 Domiciano foi o primeiro imperador romano a
adotar e até mesmo tornar obrigatório o título deus,46 uma reivindicação que
seus críticos consideraram repulsiva.47
Embora a referência a “nosso Senhor e Deus” em 4.11 não identifique
de forma conclusiva o imperador na época da composição, de todos os
imperadores, Domiciano é o candidato mais provável. Sem dúvida, a todos
os imperadores era permitida alguma medida de divindade, mas essa prática

1662
parece ter atingido um novo nível sob Domiciano. Além disso, nos relatos
do conflito de Nero com os cristãos não há evidência de que Nero tenha
alegado ser divino. O mesmo vale para todos os outros imperadores antes
de Domiciano. Se 4.11 representa duas reivindicações concorrentes de
“nosso Senhor e Deus”, a evidência favorece a época de Domiciano para a
data do livro.

O estado de adoração no templo


A referência ao Templo de Jerusalém em 11.1,2 foi tomada por alguns
como apoio para uma data pré-70, uma vez que ela parece sugerir que o
Templo ainda estava de pé no momento em que o Apocalipse foi escrito. Se
Apocalipse representa uma profecia contra Jerusalém, como defendem os
preteristas, 11.1,2 deve se referir ao Templo literal. No entanto, existem
duas interpretações alternativas plausíveis apoiando uma data posterior à
destruição do Segundo Templo no ano 70.
Uma alternativa é interpretar 11.1,2 como uma referência a um templo
literal reconstruído em Jerusalém a ser construído no futuro, antes do
retorno de Cristo em cumprimento de Ezequiel 40 a 48.48 De acordo com
esse ponto de vista, a referência deve ser a um templo literal, porque é dito
que ele está localizado em Jerusalém, “a cidade santa” (11.2) onde o Senhor
foi crucificado (11.8). O que João vislumbra é um futuro templo
reconstruído em Jerusalém, que servirá como o centro dos eventos
envolvendo a tribulação. Esse templo vai ser o lugar onde o anticristo
pretensiosamente reivindicará prerrogativas divinas (Mt 24.15; 1Ts 2.4). Se
assim for, o Apocalipse pode ter sido escrito antes ou após a destruição do
Segundo Templo.

1663
Uma outra alternativa é interpretar a referência ao templo como
simbólica.49 Uma vez que Apocalipse frequentemente emprega linguagem
simbólica, isso estaria de acordo com a natureza geral do livro. Segundo
esse ponto de vista, a referência ao templo em 11.1,2 simboliza o povo de
Deus. Assim K. H. Easley relaciona 11.1,2 a 21.9-10, onde “a cidade
santa”, a nova Jerusalém, representa o povo de Deus totalmente glorificado
e sustenta que “a cidade santa” em 11.2 representa o povo de Deus não
totalmente glorificado durante sua peregrinação terrena.50
Se assim for, o propósito da medição seria o de demonstrar que os
cristãos são divinamente protegidos contra o juízo de Deus retratado em
toda a visão. A expulsão do átrio exterior para ser pisado pelos gentios
indicaria que embora o povo de Deus não esteja sujeito à ira de Deus, eles
não são imunes à realidade da perseguição. O propósito de 11.1,2 seria
encorajar os fiéis a uma perseverança fiel em meio à extrema perseguição
descrita no capítulo 13. Novamente, a referência ao templo em 11.1,2 não
seria um dado interno conclusivo sobre a data de composição, porque o
templo poderia tanto ainda estar de pé ou já estar destruído no momento da
composição do livro. Por essas razões, 11.1,2 não fornece evidência clara
para uma determinada data de composição.

O “mito do Nero Redivivus”


Outra fascinante peça de evidência é o “mito do Nero redivivus” (redivivus
é a palavra latina para “revivido”). Os historiadores romanos relatam como,
pouco depois de Nero cometer suicídio, em 9 de junho de 68 d.C., uma
crença emergiu por todo o império de que Nero, na verdade, não tinha
morrido, mas retornaria com o exército parto (Suetônio, Nero 49.3; veja

1664
57.1). O fato de que poucos viram o cadáver de Nero, juntamente com a
incerteza sobre a localização de seu túmulo, deu crédito a essa crença.51
O mito de Nero redivivus surgiu em vários escritos apocalípticos
judaicos e cristãos por volta do final do primeiro século.52 Os apocalipses
cristãos também associam Nero com Beliar e o apresentam como o
perseguidor paradigmático da igreja.53 Perto do final do primeiro século,
duas tradições distintas se desenvolveram com respeito ao suposto retorno
de Nero.54 Uma decorre da ideia de que Nero nunca morreu e que ele
retornaria com o exército parto para conquistar Roma. A outra prevê uma
figura de Nero com poderes demoníacos que atacaria o povo de Deus.55
Apocalipse parece refletir um conhecimento do retorno da lenda de
Nero.56 O capítulo 13 descreve como o dragão dá origem à besta e lhe dá
autoridade.57 Em 13.3, uma das cabeças da besta recebe um ferimento
mortal, mas é milagrosamente ressuscitada. Como resultado, o mundo todo
a adora enquanto ela começa a matar os cristãos fiéis (13.4-10). Embora
Nero não seja mencionado pelo nome, a linguagem em 13.1-7 sugere que
João pode ter adaptado a forma do mito de Nero que faz alusão ao inimigo
do povo de Deus em Daniel 7.2-25,58 embora seja possível que a referência
aqui não seja a um indivíduo, mas a um império.
Além disso, 17.10-12 pode refletir paralelos com a outra forma do mito
do Nero redux (“nunca morreu”), retratando o ataque de Nero a Roma.59 A
descrição de João difere radicalmente de outras expectativas do retorno de
Nero, porque em Apocalipse a besta realmente ressuscita dentre os mortos
(redivivus), enquanto nas outras é assumido que Nero nunca morreu
(redux).60 A razão de João se afastar da tradição é que, em sua visão, a besta
imita Cristo que morreu e ressuscitou e voltará para conquistar os reinos do
mundo.61

1665
Essa peça de evidência parece favorecer uma data domiciana. Se
Apocalipse reflete o mito do retorno de Nero, o livro não poderia ter sido
escrito antes do ano 69, o mais tardar. Todas as fontes históricas
comprovam que o retorno da lenda de Nero continuou e aumentou em
popularidade ao redor do final do primeiro século. Os relatos da selvageria
de Domiciano asseguraram uma reputação semelhante à de Nero para além
de qualquer de seus predecessores. Daí Domiciano ganhou uma reputação
de segundo Nero.62 Isso sugere que Nero acabou por simbolizar qualquer
tirano.63 Em vista disso, uma data na época de Domiciano parece mais
provável do que uma data pré-70.

A cidade “Babilônia”
As referências à cidade “Babilônia”, na segunda metade do livro (14.8;
16.19; 17.5; 18.2,10,21) são intrigantes. Em 17.9, explicando a visão da
prostituta cavalgando uma besta vermelha com sete cabeças, o anjo
intérprete explica que “as sete cabeças são sete montes sobre os quais a
mulher está sentada”. Uma vez que Roma era conhecida em todo o mundo
antigo como a cidade sobre sete colinas, “Babilônia” deveria ser
identificada como Roma.64 Isso representa uma importante peça de
evidência em apoio de uma data pós-70.65 A razão de “Babilônia” ter se
tornado um codinome apropriado para Roma é que ambos os impérios
destruíram o Templo em Jerusalém. Dois apocalipses judaicos pós-70
usaram “Babilônia” como um código para Roma (4Ed 3.1,2,28-31; 2Br
10.1-3; 11.1; 67.7).66 O quinto oráculo sibilino (pós-70 d.C.) também se
refere a Roma como “Babilônia”, no contexto do mito do retorno de Nero
(Or. Sib. 5.143, 159-60).67 Isto constitui evidência convincente para a

1666
identificação da “Babilônia” como Roma, no Apocalipse, o que sugere uma
data de composição pós-70.

As “sete cabeças”
Finalmente, há em 17.9-11 a possível identificação do imperador reinante
na época da composição. As sete cabeças representam sete reis, que alguns
sugerem corresponder a uma série de imperadores romanos, uma vez que a
besta é associada a “Babilônia”/Roma. Em 17.10, o anjo intérprete observa
que cinco desses reis já caíram, um está no trono, e outro ainda não veio.68
O sexto rei, que “é”, representa o imperador no trono na época da
composição. Se a lista dos sete reis corresponde a uma série de imperadores
romanos, aquele que “é” é Nero ou Galba. Júlio César marca a fundação do
império e, portanto, é o primeiro imperador.69 O sexto imperador em ordem
cronológica é Nero (54-68), mas Tácito considerava ser Augusto o primeiro
imperador oficial, distinguindo-o como princeps (Hist. 1.1; Ann. 1.1) Nessa
situação, Galba (junho de 68 a janeiro de 69) foi o sexto imperador. Em
ambos os casos, João teria escrito antes de 70. Os proponentes de uma data
antiga veem isso como evidência conclusiva.70 Essas, porém, não são as
únicas reconstruções possíveis.71
Uma tentativa alternativa omite o interregno de Galba, Oto e Vitélio.72
Embora eles fossem declarados imperadores e narrados nas respectivas
histórias (Or. Sib. 5.35.; 4Ed 12.20), Suetônio os via como usurpadores
(Vesp. 1.1). Se Augusto é o primeiro imperador e esses três governantes são
omitidos, os cinco que caíram vão de Augusto a Nero, e o imperador no
trono é Vespasiano. Isso faz de Tito o sétimo governante, e de Domiciano o
anticristo, o oitavo, que pertence ao sétimo.73 Mas nem essa reconstrução

1667
alternativa nem as outras propostas relacionadas com uma sucessão de
imperadores romanos individuais se revelaram satisfatórias.
Alguns estudiosos rejeitam a noção de que João estava seguindo uma
cronologia histórica e não uma simbólica.74 O número sete pode transmitir a
ideia de perfeição ou inteireza (1.4,11,12,16,20; 2.1; 3.1; 4.5 etc.).75 Daí a
referência às sete cabeças como ambos, “colinas” e “reis”, poderia ser
simbólica,76 com as sete colinas representando sete reinos, em vez de reis
individuais.77 Alternativamente, “colinas” poderia ser traduzido como
“montanhas”, representando uma metáfora do AT para reino ou império.
Nesse caso, então, a “cabeça” em questão não seria um indivíduo, mas um
reino futuro.78 À luz dessas diferentes interpretações históricas e simbólicas
da passagem, datar Apocalipse com base em 17.9-11 continua, portanto,
inconcludente.

Evidência externa
As tradições mais antigas localizavam Apocalipse nos reinados de Cláudio,
Nero, Domiciano ou Trajano. Começando com a data menos provável,
Epifânio (c. 375) situou Apocalipse no reinado de Cláudio. Ele também
observou que João foi compelido pelo Espírito Santo a escrever na sua
velhice (Panarion 51.12,33). Mas Cláudio morreu no ano 54, e é altamente
improvável que ele tenha banido João para Patmos.79
O testemunho externo em apoio a uma data durante o reinado de Nero é
igualmente problemático. Com exceção de duas versões siríacas tardias,80 o
único testemunho afirmando Nero como o imperador no momento da
composição vem de tênues declarações de Teofilato da Bulgária, no século

1668
XII.81 Muito provavelmente, esse autor interpretou de forma equivocada a
afirmação de Ireneu de que João viveu até a época de Trajano.82
Sem dúvida, a maior parte da tradição da igreja antiga apoia o tempo de
Domiciano.83 O testemunho de Ireneu constitui a mais antiga evidência
disponível sobre a data do Apocalipse (c. 130-200).84 Ireneu, natural de
Esmirna, pode ter recebido sua informação diretamente de Policarpo, um
discípulo de João (Ireneu, Contra heresias 3.3.4), e seu pronunciamento
recebeu ampla aceitação na igreja antiga.85
O testemunho de Ireneu foi confirmado por Clemente de Alexandria (c.
150-215), Orígenes (c. 185-254), Victorino (m. c. 304), Eusébio (c. 260-
340) e Jerônimo (c. 354-420). Clemente e Orígenes afirmaram que João
escreveu de Patmos, mas não mencionaram o nome do imperador.
Clemente, escrevendo por volta do final do primeiro século,86 observou que
João foi libertado de seu exílio em Patmos após a morte do “tirano”.87
Embora ele não desse o nome, Eusébio assumiu que era Domiciano.88 Após
Domiciano morrer, Nerva prometeu uma “nova era” de liberdade e justiça.89
O tirano em questão poderia muito bem ser Domiciano, o que corroboraria
a data indicada por Ireneu.90
Eusébio aceitou o testemunho de Ireneu, afirmando que o Apocalipse
foi escrito no décimo quarto ano do reinado de Domiciano (c. 95 d.C.; Hist.
Ecl. 3.18.1-3 citando Ireneu, Contra heresias 5.30.3).91 Ele retratou
Domiciano como um tirano cruel, o sucessor de Nero, em sua hostilidade
contra Deus e sua perseguição aos cristãos.92 Ele confirmou também a
tradição de que quando João foi libertado de Patmos, ele fixou residência
em Éfeso, após a morte de Domiciano.93 Se suas fontes estavam erradas e
uma tal perseguição não ocorreu, sua data se torna suspeita.94 De qualquer

1669
modo, o testemunho de Eusébio preservou uma tradição que atribui ao
Apocalipse uma data tardia, e que foi amplamente aceita na Igreja antiga.
A força de um dado testemunho depende da confiança que se tem nessa
fonte.95 Embora tenha dificuldades, o testemunho de Ireneu deveria receber
o máximo crédito. Ele representa a tradição mais antiga, com possíveis
ligações que remontam a Policarpo (primeira metade do séc. II), um dos
discípulos de João. Testemunhos em apoio de qualquer outra data surgiram
bem mais tarde e não foram amplamente atestados. Os argumentos contra a
data de Ireneu não têm sucesso em tirar sua validade.96 Mesmo os
proponentes de uma data antiga devem admitir que, com base na evidência
externa, a data domiciana é a única possibilidade totalmente viável. Como
Hort argumentou: “Se a evidência externa sozinha pudesse decidir, haveria
uma clara preferência em favor de Domiciano.”97

Conclusão
No todo, a preponderância da evidência interna e externa sugere meados da
década de 90, durante o reinado de Domiciano, como a data mais provável
de composição. O testemunho externo esmagadoramente favorece a data
tardia, que se tornou a tradição estabelecida ao longo da história da igreja.
O testemunho interno, embora menos do que conclusivo, também tende a
apoiar uma data posterior. Embora algumas passagens possam refletir
circunstâncias históricas anteriores a 70, a maior parte da evidência parece
apontar para uma data posterior. O livro de Apocalipse foi escrito por volta
de 95-96 por João, em obediente submissão à visão que ele recebeu
enquanto estava exilado em Patmos.98

1670
Origem
João revelou o local onde ele recebeu sua visão como a pequena ilha de
Patmos, no mar Egeu (1.9b).99 Plínio e Estrabão mencionaram brevemente
Patmos como incluída entre as ilhas Espórades.100 Estava situada cerca de
64 quilômetros a oeste de Mileto e quase 96 quilômetros a sudoeste de
Éfeso.101 Essa estreita proximidade com o continente da Ásia Menor
demonstra sua inclusão nos limites da província. Patmos poderia ter
funcionado como local de exílio, mas não existem registros que a
identifiquem como tal.102 Apesar de não desabitada, o pequeno terreno
rochoso de Patmos a tornava um local ideal para desterro.103 João indicou
que a razão pela qual ele estava ali era “a palavra de Deus e o testemunho
de Jesus”,104 muito provavelmente indicando alguma forma de
perseguição.105 Essa opinião é corroborada pela autoidentificação de João
como coparticipante das igrejas nas suas dificuldades (1.9; veja 2.9,10,22;
7.14).106 Portanto, a presença de João em Patmos foi o resultado da oposição
oficial a sua mensagem.107
Exílio ou desterro para uma ilha isolada era uma forma relativamente
comum de punição no Império Romano.108 Os condenados ao exílio
enfrentavam ou uma pena perpétua (lat., deportatio), que poderia resultar na
perda da cidadania e dos bens, ou uma pena temporária menos severa (lat.,
relegatio).109 Essas sanções eram utilizadas, muitas vezes, no lugar da pena
de morte.110 O imperador, o prefeito da cidade, ou o governador provincial
podiam determinar a punição que eles achassem necessária.111 Isso incluía a
punição de cristãos.112 Os governadores provinciais tinham autoridade para
julgar casos sem a intervenção direta do imperador, e sentenciar o acusado a
relegatio ad insulam (desterro em uma ilha).113 Os casos que justificassem
deportatio, no entanto, precisavam de um veredicto do imperador.114 De

1671
acordo com Tertuliano (c. 160-225), João foi exilado na ilha de Patmos
como um insulam relegatur.115 Assim, parece provável que João foi banido
de Éfeso, na Ásia Menor, por um governador provincial.116

Destino, Ocasião e Propósito


O livro de Apocalipse é dirigido a sete igrejas que existiam no final do
primeiro século (95-96). João escreveu a cristãos que viviam em cidades
espalhadas ao longo de uma rota postal na província romana da Ásia
Menor.117 As cidades eram Éfeso, Esmirna, Pérgamo, Tiatira, Sardes,
Filadélfia e Laodiceia. João explicitamente declarou algumas vezes que a
ocasião para escrever foi uma ordem direta do Senhor (1.11,19; veja 2.1
etc.).
A visão de João chegou num momento em que as igrejas da Ásia Menor
precisavam de encorajamento para permanecerem fiéis a Cristo e
suportarem as dificuldades enquanto nadavam contra a corrente da cultura
circundante (caps. 2 e 3). A ocasião implícita é que os cristãos nessas
cidades estavam na encruzilhada entre a fé e a cultura, tendo que escolher
entre sua acomodação ao sistema mundial e seu compromisso com Cristo.
Os cristãos de Éfeso foram elogiados por suportarem as dificuldades por
causa do nome de Cristo (2.3). João indicou que a causa da dificuldade
deles era sua fidelidade ao nome de Jesus, mas não sabemos qual a natureza
exata do sofrimento deles, porque tudo o que foi dito é que os fiéis
perseveraram pacientemente e continuaram a perseverar debaixo de um
fardo. Seus sofrimentos podem ter se originado de conflitos internos com os
nicolaítas (2.6). Infelizmente, no entanto, parece que enfatizaram a pureza

1672
doutrinária a um tal ponto que negligenciaram o mandamento de amar uns
aos outros (2.4).
Enquanto a igreja em Éfeso resistiu com sucesso a esses falsos mestres,
as igrejas de Pérgamo e Tiatira, ao que parece, abriram suas portas para
eles. João criticou duramente os nicolaítas em ambas as igrejas como um
grupo especialmente detestável, comparando-os a Balaão, que levou Israel a
adorar ídolos e a cometer atos de imoralidade sexual (2.14). Os nicolaítas
muito provavelmente incentivavam os fiéis a participarem de rituais
religiosos pagãos. Tiatira tinha permitido que uma falsa profetisa
conquistasse seguidores na igreja (2.20,21). João a chamou de “Jezabel”,
porque, como a rainha infame na história de Israel (1Rs 16.31-33; 18.4,13;
19.1,2,21; 2Rs 9.30-37), essa mestra herética tinha levado o povo de Deus à
idolatria e imoralidade e encorajado uma mistura sincrética entre as
religiões pagãs da cultura dominante e o cristianismo. A presença desses
falsos mestres indica que as igrejas passaram por uma série de crises
internas que comprometiam sua fidelidade a Cristo e impugnavam seu
testemunho.
Os crentes de Sardes e Laodiceia também estavam passando por
turbulência espiritual interna devido à sua complacência, materialismo e
autossuficiência. O conflito externo em Esmirna aparentemente teve origem
na comunidade judaica (2.9).118 Seus sofrimentos tinham a ver com
tribulações não especificadas, pobreza119 e calúnias dos judeus
(blasphēmia).120 A natureza forense dessa calúnia é confirmada pela
referência a uma futura detenção (2.10). As hostilidades judaicas contra os
cristãos na forma de denúncia legal geralmente ocorriam na igreja
primitiva.121 Como uma religião legalmente sancionada, as comunidades
judaicas se beneficiavam das sanções legais e os pagãos podem ter

1673
agrupado os cristãos junto com os judeus.122 Consequentemente, os líderes
judeus fizeram um esforço concentrado, especialmente após o ano 70, para
denunciar os cristãos diante dos magistrados.123 A situação dos cristãos em
Esmirna era semelhante ao que estava acontecendo em Filadélfia (3.8,9).
Em ambas as cidades, os cristãos eram pobres, em pequeno número, e
enfrentavam oposição religiosa e legal intencional da parte dos judeus que
procuravam dizimar sua existência.

1674
Mapa 20.1: Igrejas de Apocalipse.

Na cidade de Pérgamo, a oposição externa aos cristãos resultou na


morte de Antipas (2.13). Em algum ponto no passado recente, esse homem
tinha sido morto por causa de sua fidelidade a Cristo. A falta de detalhes
sobre a situação implica que ela deve ter sido de conhecimento comum

1675
entre os fiéis da cidade. O único indício possível para reconstruir o que
pode ter acontecido a Antipas é a referência a Pérgamo como o lugar onde
Satanás governava e vivia.124 A morte de Antipas muito provavelmente
resultou do veredito injusto do procônsul de Pérgamo, que o condenou
porque ele se recusou a negar a Cristo no julgamento.125
As referências à “espada afiada de dois gumes” e ao “trono” (2.12,13)
pode fazer alusão à autoridade judicial e ao assento oficial do magistrado da
cidade.126 Os cristãos em Pérgamo foram lembrados de que Cristo, não o
procônsul, exercia a autoridade judicial suprema. Uma vez que Satanás é o
principal adversário do povo de Deus, pode-se perguntar como um
veredicto judicial contra um cristão fiel assegura a identificação de Pérgamo
como o local do “trono de Satanás”. Aparentemente, Satanás exercia tanta
autoridade em Pérgamo que aos cristãos era negada a justiça e enfrentavam
a punição infligida pelo procônsul que agia em nome de Satanás.
A cultura dominante era mergulhada no paganismo greco-romano com
sua grande variedade de deuses, deusas e templos. Os cristãos
representavam um grupo religioso que penetrara em todos os níveis da
sociedade e era formado de judeus e de gentios. Eles eram monoteístas
tenazes que se recusavam a participar das guildas profissionais locais ou de
qualquer outro ritual pagão público, incluindo a participação no culto
imperial. O culto imperial existia como parte do clima religioso da Ásia
Menor desde a época de Augusto.127 Pérgamo abrigava o primeiro templo
dedicado a Augusto e à deusa Roma em toda a província da Ásia,
começando em 29 a.C. e permanecendo bem ativo até depois do reinado de
Adriano.128 Durante o reinado de Tibério, as cidades de Sardes e Esmirna
competiram pelo direito de sediar um segundo culto imperial provincial na
Ásia, e a vencedora foi Esmirna em 26 d.C.129 Durante o reinado de

1676
Domiciano, a cidade de Éfeso construiu um terceiro templo imperial
inigualável na Ásia Menor (89/90).130 Algumas estimativas confirmam a
existência de mais de 80 pequenos templos imperiais localizados em mais
de 60 cidades na Ásia Menor.131 O culto funcionava politicamente para
expressar o quão gratas e leais eram as províncias ao imperador, usando as
convenções religiosas para propósitos políticos.132 Desde sua criação, o
imperador, juntamente com a deusa Roma, era adorado e honrado por sua
benevolência para com as províncias.
O culto imperial, no entanto, era muito mais do que um mero
instrumento político; os participantes realmente adoravam o imperador
como divino.133 Evidência inscricional demonstra que os imperadores
Augusto e Calígula eram considerados deuses. O uso do termo theos
(“deus”), embora raro, atesta o fato de que os adoradores estimavam os
imperadores elevando-os a um status muito acima dos simples mortais.
Muitas vezes, os imperadores eram tão intimamente associados com as
divindades protetoras que os adoradores não faziam distinção entre eles.134
O culto empregava toda a pompa e parafernália de rituais comuns a
qualquer prática religiosa. Imagens do imperador ou de seus familiares
saudavam os fiéis na forma de grandes estátuas.135 Algumas dessas imagens
tinham mecanismos para imitar raios e trovões, reforçando a identificação
do imperador com Júpiter.136 Os aderentes faziam orações a essas estátuas e
algumas vezes carregavam pequenas estátuas de figuras imperiais.137 Os
estudiosos que diminuem a importância do culto imperial como algo
puramente político impuseram uma concepção moderna de separação entre
o secular e o sagrado. Aqueles que viviam em uma cultura politeísta
facilmente adotavam o culto imperial em seu panteão de deuses e seres
divinos.

1677
O conflito com o culto imperial em Apocalipse dificilmente pode ser
ignorado.138 Parece haver referências frequentes ao culto imperial na
segunda metade da segunda visão (13.4,15,16; 14.9-11; 15.2; 16.2; veja
20.4). João imaginou uma época quando a adoração de um governante iria
aumentar até um ponto onde seria obrigatória a participação de todos os
habitantes da terra.139 Significativamente, o termo proskyneō (“adorar”),
usado em conexão direta com a besta (13.4,8,12,15), também era um termo
comumente encontrado no culto imperial.140 Assim, os cristãos repugnavam
o culto imperial como idolatria, que era duplamente prejudicial devido às
ramificações políticas associadas a ele.141
Os cristãos se recusando a se prostrar em adoração à besta atrairiam sua
ira e seriam sumariamente executados (13.15).142 No entanto, os fiéis são
exortados a permanecerem leais e fiéis a Cristo mesmo que isso signifique a
morte (2.10,13; 13.10; 14.12; 17.14). Deus os vindicará ao julgar todos
aqueles que adoraram a besta (14.9,11; 16.2). O livro de Apocalipse, de
forma marcante, promove a abstinência de todas as formas de idolatria,
porque Deus é o único digno de adoração (4.11; 5.2,4,9,12). Ele recebe
adoração de todos os seres celestiais (4.10; 5.14; 7.11; 11.16; 19.4). A
adoração exclusiva a Deus constitui o principal imperativo teológico dos
cristãos, como também de toda a humanidade (9.20; 14.7; 15.4; 19.10;
22.9). Se os fiéis eram acusados por um adversário legal e julgados por sua
fé, era mais do que provável que a reverência ao imperador se tornasse um
critério padrão para se determinar culpa.
Embora o clima religioso e político local de cada cidade variasse, João,
como um que experimentou um injusto exílio, escreveu para os fiéis que
enfrentavam injustiça semelhante. Os fiéis podem sucumbir ao desespero
durante o triunfo de um sistema judicial corrupto que condena os inocentes

1678
simplesmente por causa de sua fé cristã. Mas a visão de João alivia esses
temores retratando a eventual reversão dessa caricatura de justiça. Essa
preocupação com a vindicação é expressa pelas almas martirizadas no altar
(6.9-11; 16.7). Apocalipse descreve Jesus exercendo suprema autoridade
judicial e como aquele que é digno de desencadear a ira de Deus sobre a
humanidade impenitente (1.12-20; 5.2-4; veja Jo 5.17-29). Sem dúvida,
Cristo primeiro investiga suas igrejas, responsabilizando-as por seus
pecados, mas também prometendo recompensar sua fidelidade (caps. 2 e 3).
Os capítulos 6 a 16 apresentam uma série de julgamentos confirmando a
culpa da humanidade e a justiça dos veredictos de Deus (9.20,21; 16.9-11).
Nos capítulos 17 e 18, a prostituta Babilônia, por causa de seus crimes
contra os cristãos, é declarada culpada e sumariamente executada. Cristo
voltará como o vitorioso e supremo Rei e Senhor brandindo a espada da
justiça de Deus (19.11-15). Não importa o destino que os cristãos possam
ter enfrentado diante de juízes injustos, um dia eles reinarão com Cristo e
ajudarão a executar o julgamento sobre as nações (20.4).143 Assim, o
objetivo pretendido é confortar os cansados e oprimidos, fortalecer a
fidelidade e perseverança, e purificar as igrejas de heresias e concessões ao
retratar a realidade celestial de Jesus como o juiz glorificado e todos os
acontecimentos envolvendo seu retorno para estabelecer seu reino na Terra.

LITERATURA
Gênero
A própria palavra apocalipse evoca uma infinidade de imagens. Os
estudiosos geralmente distinguem entre (1) “apocalipse”, (2) “apocalíptico”
e (3) “apocaliptismo”.144 Apocalipse refere-se a um determinado gênero de

1679
literatura escrita aproximadamente entre 200 a.C. e 200 d.C.145 O adjetivo
apocalíptico é usado para descrever ou o gênero literário ou a visão de
mundo. Apocaliptismo denota uma visão de mundo, ideologia ou teologia
que funde os objetivos escatológicos de determinados grupos em uma arena
cósmica e política.146
O desenvolvimento da definição para o gênero apocalíptico tem uma
história longa e complexa.147 Os primeiros estudos identificaram
características formais, como pseudonímia, relatos visionários e revisões
históricas, bem como um conteúdo expressando uma doutrina de duas eras,
pessimismo e esperança, universalismo, e uma expectativa iminente do
fim.148 Em 1979, J. J. Collins e outros estudiosos desenvolveram a seguinte
definição clássica:

“Apocalipse” é um gênero de literatura revelatória com uma estrutura narrativa, na qual a


revelação é mediada por um ser sobrenatural a um recipiente humano, revelando uma
realidade transcendente que é tanto temporal, à medida que imagina uma salvação
escatológica, quanto espacial, na medida em que envolve um outro mundo, sobrenatural.149

Essa definição enfatiza a forma como uma estrutura narrativa que envolve
um mediador sobrenatural e o conteúdo como contendo elementos temporal
(salvação escatológica) e espacial (mundo sobrenatural). No entanto, essa
definição carece de qualquer referência à função de um apocalipse. Por essa
razão, um subsequente grupo de estudos, liderado por A. Y. Collins, D.
Hellholm e D. E. Aune, adicionou uma emenda em 1986, afirmando que
um apocalipse “destina-se a interpretar as presentes circunstâncias terrenas
à luz do mundo sobrenatural e do futuro, e influenciar o entendimento e
comportamento da audiência por meio de autoridade divina”.150
Essa definição alterada do gênero apocalíptico diz respeito à sua forma,
conteúdo e função.151 O gênero apocalíptico exibe algumas características

1680
formais que incluem relatos visionários, mediadores sobrenaturais e
linguagem simbólica. O gênero apocalíptico também expressa conteúdo que
descreve realidades temporal e espacial como forma de enfatizar as
realidades celestiais e desvalorizar circunstâncias terrenas. Finalmente, o
gênero apocalíptico funciona para encorajar piedade e fidelidade em meio
ao sofrimento, ou em tempos de crise (seja ela real ou apenas sentida).
Essas definições abrangem, em linhas gerais, todos os exemplos
canônico, extrabíblico, rabínico e sectário da literatura apocalíptica. Nem
todos os escritos apocalípticos, necessariamente, apresentam todas as
características de gênero discutidas na definição acima.152 Isso justifica a
necessidade de postular uma avaliação em menor escala dos elementos
essenciais atribuídos ao gênero apocalíptico. O primeiro elemento essencial
é que um apocalipse abrange um meio de comunicação visionário ou
revelatório. A literatura apocalíptica deve revelar alguma realidade celestial
ou espiritual pela mediação de um vidente ou um profeta. Normalmente a
visão é dada na primeira pessoa do singular e expressa em uma estrutura
narrativa. Além disso, a comunicação apocalíptica frequentemente emprega
o uso de intermediários divinos ou angélicos como guias e intérpretes.
Integradas a essa comunicação revelatória há exortações proféticas para os
comportamentos desejados, as escolhas e respostas dos destinatários. Entre
os elementos não essenciais estão a pseudonímia e revisões históricas
(muitas vezes escritas em forma preditiva).
Segundo, a literatura apocalíptica está saturada com linguagem
simbólica, figurativa e metafórica. Os símbolos e outras figuras constituem
o material habitual da escrita apocalíptica. Seres humanos e angélicos e
animais servem como representações simbólicas de verdades espirituais. A
imagística simbólica pode expressar acontecimentos históricos,

1681
contemporâneos ou futuros em termos cósmicos. Ao usar metáforas para
descrever cenários cósmicos, o autor investiu eventos terrenos atuais e
antecipados de um significado simbólico.153
A linguagem apocalíptica pode usar símbolos como metáforas com o
propósito de se referir a objetos ou eventos concretos, bem como ideias
abstratas. Por exemplo, a visão de abertura de Apocalipse retrata Jesus em
pé no meio de sete candelabros. Esses candelabros de ouro muito
provavelmente se parecem com o candelabro (menorah) do Templo judaico.
No presente caso, os candelabros representam simbolicamente as sete
igrejas da Ásia Menor (1.20). Além disso, a descrição de Jesus e de suas
vestes é uma reminiscência das vestes usadas pelo sumo sacerdote judeu.
Assim, pode-se inferir razoavelmente que Jesus ativamente cuida de suas
igrejas de um modo semelhante ao do sumo sacerdote ministrando no
Templo.
Um elemento final essencial do gênero apocalíptico é o dualismo entre
as realidades terrena e celeste, geralmente repleta de significado
escatológico. Situações terrenas são retratadas como temporárias e
transitórias à luz das realidades eternas do mundo espiritual. Essa
perspectiva celestial contrasta dramaticamente os cenários mundanos diante
dos destinatários. Embora alguns estudiosos minimizem a natureza
escatológica das visões,154 a literatura apocalíptica fornece um veículo
provocador e efetivo para comunicação das expectativas do fim dos
tempos.155 As crenças de que Deus é soberano sobre a história e que irá
intervir radicalmente no futuro próximo para consumar seus planos para
toda a criação permeiam a maioria dos escritos apocalípticos.
A chegada de Jesus, o Messias, “na plenitude do tempo”, indicava que
algumas expectativas escatológicas tinham se concretizado. Jesus anunciou

1682
a proximidade e até mesmo a chegada (parcial) do Reino de Deus (Mc 1.15;
Lc 11.20).156 A presença do Reino de Deus sugere o cumprimento
escatológico das promessas proféticas sobre o filho de Davi, a restauração
de Israel e a renovação da criação. Jesus inaugurou o eschaton (fim dos
tempos) com sua ressurreição seguida do derramamento do Espírito Santo,
mas os fiéis ainda esperam um tempo de consumação final no fim das eras.
Esse tempo entre as eras é comumente visto como o “já” e o “ainda não” do
cumprimento escatológico de Deus. Nesse sentido, o NT compartilha
afinidades com uma visão de mundo apocalíptica.

Tabela 20.1: Paralelos Temáticos Entre o Discurso do Monte das


Oliveiras e os Selos no Livro de Apocalipse
Apocalipse Mateus
Passagem do NT Marcos 13 Lucas 21
6 24
Profetas e messias Ap 6.2 Mt 24.5 Mc 13.6 Lc 21.8
falsos
Guerras Ap 6.2-4 Mt 24.6,7 Mc 13.7 Lc 21.9
Discórdia internacional Ap 6.3,4 Mt 24.7 Mc 13.8 Lc 21.10
Fomes Ap 6.5-8 Mt 24.7 Mc 13.8 Lc 21.11
Pestes Ap 6.8 Lc 21.11
Perseguição/martírio Ap 6.9-11 Mt 24.9 Mc 13.9- Lc 21.12-
13 19
Terremotos Ap 6.12 Mt 24.7 Mc 13.8 Lc 21.11
Fenômenos cósmicos Ap 6.12-14 Lc 21.11

Por essa razão, não é surpreendente que porções apocalípticas sejam


encontradas em várias passagens do NT. O Discurso do Monte das Oliveiras
(Mt 24 e 25, Mc 13, Lc 21.5-32), também conhecido como “o pequeno

1683
Apocalipse”, compreende as expectativas apocalípticas de Jesus nos
Evangelhos Sinóticos. A linguagem e as imagens apocalípticas aparecem
espalhadas pelas cartas do NT. O livro de Hebreus exibe uma visão de
mundo apocalíptica que contrasta as instituições terrenas temporárias com
as realidades celestiais eternas, e 2Pedro 3 expressa expectativas
escatológicas que remetem a imagens apocalípticas (i. e., a terra e todos os
elementos consumidos pelo fogo).
O livro de Apocalipse constitui um dos livros mais originais da Bíblia
não apenas porque ele representa o ápice da revelação inspirada, mas
também porque é o único livro apocalíptico no NT. Apocalipse apresenta
elementos consistentes com os gêneros apocalíptico, profético e epistolar.157
Alguns acadêmicos têm defendido que a primeira palavra do livro,
“revelação” (apokalupsis), sugere uma imediata classificação de gênero,
especialmente por causa do uso da linguagem e imagens apocalípticas por
todo o livro de Apocalipse. Mas uma designação mais precisa do gênero
ocorre em passagens onde João identificou o livro como uma “profecia”
(prophēteia, veja 1.3; 22.7,10,18,19; cf. 11.16; 19.10). Essa estreita
associação entre apocalipse e profecia é natural porque o gênero
apocalíptico deriva e permaneceu sob a rubrica da profecia do AT.158 Os
escritos apocalípticos são derivados dos oráculos proféticos e, portanto, as
linhas de demarcação que separam esses gêneros são um pouco fluidas.
Além do mais, o Apocalipse é dirigido a congregações específicas e,
portanto, também tem algumas características epistolares.
Assim, o gênero de Apocalipse é misto. O gênero geral do livro é
profético, mas ele corresponde aos escritos apocalípticos em muitos
aspectos. G. E. Ladd corretamente defendeu a designação de “profético-
apocalíptico”.159 Fiorenza também argumentou que a dicotomia entre

1684
apocalíptico e profético não pode ser sustentada com respeito ao Apocalipse
já que o livro combina os dois elementos.160 A melhor avaliação geral sobre
o gênero de Apocalipse é que o livro constitui “uma profecia modelada em
um molde apocalíptico [que é] escrito em forma de carta”.161

Plano Literário
Como o giro de um caleidoscópio, as cenas mudam diante dos olhos do
leitor com uma miríade de símbolos, cores, números e seres celestiais,
deixando muitos perplexos e confusos a respeito do plano literário do livro
de Apocalipse.162 A rápidas mudanças no cenário com diversas
intercalações (i. e., inserções ou interpolações), recapitulações e apartes
levaram alguns intérpretes a concluir que o livro consiste em um mosaico
de visões compostas em vários contextos durante longos períodos de
tempo.163 No entanto, essa fonte, bom como críticos de composição não
levaram em conta que, na sua presente forma, Apocalipse representa uma
unidade literária.164

1685
Tabela 20.2: Principais Propostas Estruturais para o Apocalipse*
I. Arranjado em sete séries de sete
Collins
1.1-8 Prólogo
1.9 a 3.22 Sete mensagens
4.1 a 8.5 Sete selos
8.2 a 11.19 Sete trombetas
12.1 a 15.4 Sete visões não numeradas
15.1 a 16.20 Sete taças
17.1 a 19.10 Apêndice sobre Babilônia
19.11 a 21.8 Sete visões não numeradas
21.9 a 22.5 Apêndice sobre Jerusalém
22.6-21 Epílogo
Tavo
1.1-3 Prólogo
1.4 a 3.22 Sete mensagens
4.1 a 5.14 = transição
6.1 a 7.17 Sete selos
8.1-5 = transição
8.6 a 11.14 Sete trombetas
11.15-19 = transição
12.1 a 14.20 Série de visões I
15.1-8 = transição
16.1-16 Sete taças
16.17 a 19.10 = transição
19.11 a 20.15 Série de visões II
21.1-8 = transições

1686
21.9 a 22.5 Nova Jerusalém
22.6-21 Epílogo
II. Arranjado como um quiasmo estendido
Strand
1.1-11 Prólogo
Parte 1: série histórica (1.12 a 14.20)
1.12 a 3.22 A: A igreja na terra hoje
4.1 a 8.1 B: A contínua atividade de Deus
8.2 a 11.18 C(a): Avisos de trombeta aos
desobedientes
11.19 a 14.20 C(b): Poderes malignos se opõem a Deus
e seu povo
Parte 2: série escatológica (15.1 a 22.5)
15.1 a 16.21 C(a)’: pragas sobre os ímpios
17.1 a 18.24 C(b)’: Poderes malígnos julgados por
Deus
19.1 a 21.4 B’: Julgamento final de Deus
21.5 a 22.5 A’: A igreja na nova terra
22.6-21 Epílogo
Fiorenza
1.1-8 A: Prólogo
1.9 a 3.22 B: A visão inaugural e o septeto de cartas
4.1 a 9.21; 11.15-19 C: Os sete rolos selados
10.1 a 15.4 D: O rolinho profético
15.5 a 19.10 C’: Os sete rolos selados
19.11 a 22.9 B’: As visões de juízo e salvação
22.10 a 22.21 A’: Epílogo

1687
Lee
1.1-20 A: Prólogo
2.1 a 3.22 B: Situação presente
4.1 a 5.14 C: O paradigma fundamental
6.1-17 D: Julgamento e derrota dos inimigos de
Deus (1)
7.1-17 E: Crentes fiéis
8.1 a 10.11 F: Julgamento e derrota dos inimigos
de Deus (2)
11.1-19 G: O falso poder da besta
12.1-6 H: Uma mulher
12.7-18 I: Julgamento e derrota dos
inimigos de Deus (3)
13.1-18 J: Momento de decisão
14.1-20 J’: Momento de decisão
15.1 a 16.21 I’: Julgamento e derrota dos
inimigos de Deus (3)
17.1-6 H’: Uma mulher
17.7-18 G’: O falso poder da besta
18.1-24 F’: Julgamento e derrota dos inimigos
de Deus (2)
19.1-10 E’: Crentes fiéis
19.11-21 D’: Julgamento e derrota dos inimigos
de Deus (1)
20.1-10 C’: O paradigma fundamental
20.11 a 22.5 B’: Situação futura
22.6-21 A’: Epílogo
III. Arranjos Alternativos

1688
Divisão tripla a partir de Ap 1.19 (Walvoord, Thomas)
1.9-18 Passado: “o que você viu”
2.1 a 3.22 Presente: “o que é”
4.1 a 22.5 Futuro: “o que acontecerá depois”
Dupla divisão (Aune)
1.1-8 Prólogo
1.9 a 3.22 Teofania do Cristo exaltado
4.1 a 22.9 Séries de narrativas episódicas de visão
4.1,2a A subida celestial de João
4.2b a 7.17 A soberania de Deus, do Cordeiro, e os
seis selos
8.1 a 11.14 O sétimo selo e as seis trombetas
11.15 a 16.12 A sétima trombeta e as sete taças
17.1 a 19.10 Revelações do julgamento de Babilônia
19.11 a 21.8 A derrota final dos últimos inimigos de
Deus
21.9 a 22.9 A visão da nova Jerusalém
22.10-21 Epílogo
Drama (Smalley)
1.1-8 Prólogo: o oráculo é revelado
1.9 a 11.19 Ato 1: Criação, e salvação através do
juízo
1.9 a 3.22 Cena 1: Sete oráculos
4.1 a 5.14 Intervalo: Adoração na corte celestial:
Deus e seu Cristo
6.1-17 Cena 2: Sete selos
7.1-17 Intervalo: A igreja protegida
8.1 a 9.21 Cena 3: Sete trombetas

1689
10.1 a 11.19 Intervalo: A soberania de Deus
12.1 a 22.17 Ato 2: Salvação através do juízo e a nova
criação
12.1 a 14.20 Cena 4: Sete sinais
15.1-8 Intervalo: Um novo êxodo
16.1-21 Cena 5: Sete taças
17.1 a 18.24 Intervalo: A queda de Babilônia
19.1 a 20.15 Cena 6: Sete visões
21.1 Intervalo: Prelúdio da cena final
21.2 a 22.17 Cena 7: Sete profecias
22.18-21 Epílogo: O oráculo está completo
Três rolos (Barr)
1.1 a 3.22 O rolo da carta: Movimento um em Patmos
(teofania)
4.1 a 11.18 O rolo da adoração: Movimento dois no céu
(sala do trono)
11.19 a 22.21 O rolo da guerra: Movimento três na terra
(guerra santa)
Recapitulação abrangente: Apocalipse 4 a 22 (Lambrecht)
4.1 a 5.14 A: Visão introdutória do rolo
6.1 a 7.17 B: Primeiros seis selos
8.1 a 22.5 C: Sétimo selo e trombetas
8.1-6 A’: Introdução
8.7 a 11.14 B’: Primeiras seis trombetas
11.15 a 22.5 C’: Sete trombetas e taças
11.15 a 16.1 A’’: Sétima trombeta
16.2-16 B’’: Primeiras seis taças
16.17 a 22.5 C’’: Sétima taça e conclusão

1690
* Collins, Combat Myth, p. 15-6; F. Tavo, “The Structure of the Apocalypse. Re-examining a
Perennial Problem”, NovT 47 (2005), p. 47-68; K. A. Strand, “Chiastic Structure and Some Motifs
in the Book of Revelation”, AUSS 16 (1978), p. 401-8; E. S. Fiorenza, Book of Revelation, p. 172;
Lee, “A Call to Martyrdom: Function as Method and Message in Revelation”, NovT 40 (1998), p.
164-94; Walvoord, Revelation of Jesus Christ, p. 47-9; R. L. Thomas, Revelation 1 to 7: An
Exegetical Commentary (Chicago: Moody, 1992), p. 113-6; Aune, Revelation 1 to 5, p. c-cv;
Smalley, Revelation to John, p. 19-21; D. L. Barr, Tales of the End: A Narrative Commentary on the
Book of Revelation (Santa Rosa: Polebridge, 1998), p. 13-6; J. Lambrecht, “A Structuration of
Revelation 4.1 to 22.5”, em: J. Lambrecht, org., L’Apocalypse Johannique et l’Apocalyptique dans
le Nouveau Testament (Leuven: University Press, 1980), p. 77-104.

O livro de Apocalipse representa uma obra-prima literária


complexamente tecida, destinada a transmitir uma mensagem unificada.
Uma série de estudiosos críticos defende, de forma veemente, a unidade do
livro. Fiorenza corretamente afirmou que “a configuração total (Gestalt) e
composição de uma obra não pode ser derivada de suas fontes ou tradições,
mas apenas da expressão formal e da intenção teológica do autor”.165 De
modo semelhante, Barr afirmou que a maioria dos estudos críticos
procuram dividir o livro, mas “a preocupação de João foi uni-lo”.166 A
influente pesquisa de Bauckham sobre a estrutura de Apocalipse demonstra,
de forma convincente, a natureza zelosa e intrincada de sua composição e
unidade literária.167 Além do mais, abordagens da crítica narrativa não
apenas pressupõem essa unidade, mas também ajudam a demonstrar como o
Apocalipse apresenta uma composição literária unificada.168 Como tal, o
Apocalipse conta uma história completa, com personagens, cenários, enredo
e clímax.

As quatro visões (panorama)

1691
São inúmeras as tentativas de explicar a macroestrutura de Apocalipse, e os
comentaristas universalmente observam a diversidade de propostas.169
Embora nenhum consenso formal tenha sido alcançado, os estudiosos
conseguiram identificar numerosas características estruturais. Apocalipse
tem um prólogo claramente delineado (1.1-8) e um epílogo (22.6-21). João
dividiu o livro em quatro visões marcadas pela expressão “no Espírito”
(1.10; 4.2; 17.3; 21.10). Embora alguns estudiosos organizem a estrutura
como uma série sétupla de setes, existem apenas quatro casos de uma série
de setes claramente enumerada (2.1 a 3.22; 6.1 a 8.1; 8.2 a 11.19; 15.1 a
16.21). João incluiu materiais que parecem interromper ou ligar aspectos da
narrativa, que foram rotulados de interlúdios, intercalações,170
interconexões,171 ou entrelaçamentos.172 Outra característica estrutural
comumente reconhecida é o contraste intencional entre a cidade prostituta
de Babilônia (caps. 17 e 18) e a cidade noiva da nova Jerusalém (caps. 21 e
22). Essas grandes áreas de concordância sugerem que certas características
da macroestrutura de Apocalipse recebem ampla aceitação.
Como mencionado, o Apocalipse consiste em quatro visões separadas e
inter-relacionadas introduzidas pela expressão “no Espírito” (en pneumati),
todas as quais ocorrem em um único dia (1.10).173 M. Tenney salientou
como “cada ocorrência dessa expressão localiza o vidente em um lugar
diferente.”174 A expressão indica uma mudança de cenário indo de Patmos
(1.9) para a sala do trono celestial (4.1,2), para um deserto (17.3) e,
finalmente, para uma grande e alta montanha (21.10). Além disso, a
expressão “eu te mostrarei” (deixō soi) ocorre três vezes (4.1; 17.1; 21.9),
em estreita proximidade com en pneumati (4.2; 17.3; 21.10), sugerindo que
essas duas expressões são usadas em conjunto para sinalizar transições
estruturais mais importantes.175 Curiosamente, 4.1,2 também contém uma

1692
das três ocorrências da expressão “que devem acontecer” (ha dei genesthai;
1.1; 4.1; 22.6), que enfatiza a natureza profética futura de 4.1 a 22.6.176
As quatro principais visões de Apocalipse constituem as principais
divisões literárias: (1) 1.10 a 3.22 vislumbra o Cristo glorificado que
examina suas igrejas; (2) 4.1 a 16.21 retrata os procedimentos da corte
divina e o julgamento das nações; (3) 17.1 a 21.8 descreve a condenação e
destruição de Babilônia; e (4) 21.9 a 22.4 apresenta a vindicação e
recompensa dos fiéis no novo céu e nova terra.
Transições visionárias menores dentro dessas quatro visões muitas
vezes são sinalizadas por frases verbais se referindo a ver e ouvir. A frase “e
eu vi” (kai eidon) atua como um marcador dentro de uma visão, sinalizando
uma transição e demonstrando uma progressão na narrativa, mas não
necessariamente introduzindo episódio de uma nova visão, já que a
localização do vidente não muda.177 O efeito dessa narração seria como
ouvir alguém animadamente compartilhar o que viu sentado em um teatro
ou cinema assistindo a uma peça ou filme, criando um fluxo semelhante a
“Eu vi isso, e então vi aquilo, ó, e depois vi e ouvi tal e tal”.
Um outro dispositivo óbvio de estruturação é uma série de sete
especificamente enumerados como tal. Os esquemas variam de seis,178 a
sete,179 e até oito septetos.180 Embora João demonstre uma propensão para
explicitamente organizar seu material em grupos de setes, apenas três181 ou
quatro septetos182 são explicitamente numerados. O número 7 tem peso
simbólico significativo indicando a perfeição ou inteireza. Além dos
septetos explicitamente numerados, no entanto, um esforço de identificação
de série adicional não numerada de setes parece artificial.183

A relação entre selos, trombetas e taças

1693
A relação entre selos, trombetas e taças por muito tempo tem afligido os
intérpretes. Existem três teorias principais: sucessão cronológica,184
recapitulação185 e progressão telescópica.186 A sucessão cronológica
argumenta que as séries de septetos ocorrem em estrita ordem cronológica,
sem qualquer sobreposição. A força deste ponto de vista é sua simplicidade,
mas ele falha ao não levar em conta nenhuma sobreposição entre os
septetos. A recapitulação defende que cada septeto representa uma
intensificação e olhar mais próximo do mesmo material. Em outras
palavras, as trombetas cobrem as mesmas ocorrências que os selos, e as
taças indicam o mesmo período que os selos e trombetas. Embora a
recapitulação permita uma intensificação da severidade com cada sucessivo
septeto e ofereça uma explicação viável para a aparente sobreposição, ele
não leva em conta adequadamente as diferenças entre cada série de
septetos.
A progressão telescópica (também conhecido como “cauda de pomba”)
sustenta que o sétimo selo contém as sete trombetas, e a sétima trombeta
compreende as sete taças. Ela tenta demonstrar a inter-relação e
sobreposição entre as séries de septetos, mas também dar conta da
progressão evidente em cada novo septeto. Uma teoria telescópica
progressiva parece oferecer a explicação mais satisfatória para a relação
literária entre os septetos. Mas é justificada a precaução contra uma
aplicação demasiado rigorosa dessas teorias uma vez que o Apocalipse
exibe tanto repetição quanto progressão no desdobramento da série de
juízos revelados nos septetos culminando na consumação do julgamento de
Deus e no estabelecimento de seu reino na terra.187
João incorporou alguns interlúdios intercalados ao longo dos selos,
trombetas e taças. Os dois primeiros emergem entre o rompimento do sexto

1694
e sétimo selos (7.1-17) e entre o sopro da sexta e sétima trombetas (10.1 a
11.14). Esses interlúdios aparecem na narrativa por razões teológicas. Eles
são ligados às seções anteriores e fornecem respostas para perguntas que a
audiência pode estar fazendo. O sexto selo (6.12-16) desencadeia
catástrofes devastadoras fazendo com que os habitantes da terra se
escondam em cavernas implorando para morrer. Em seu terror eles clamam
a respeito da ira de Deus e do Cordeiro, perguntando: “Quem poderá
subsistir?”. A narrativa seguinte (7.1-17) responde a essa pergunta ao
retratar a selagem protetora e a salvação do povo de Deus que está diante do
trono.188
Um padrão similar ocorre quando a quinta e sexta trombetas
desencadeiam pragas horríveis e devastadoras sobre os habitantes da terra.
A resposta deles é um fracasso em se arrependerem de seus pecados.189 A
narrativa seguinte (10.1 a 11.14)190 não apenas fornece justificação para as
pragas, mas também retrata o povo de Deus no seu papel de testemunhas
proféticas diante das nações.191 Esses interlúdios permitem aos ouvintes
identificarem sua função na narrativa primeiro como testemunhas
protegidas e, depois, proféticas.192 Assim, o propósito dos interlúdios é
desafiar as igrejas a permanecerem fiéis e resistir à oposição, porque Deus
as estava protegendo e utilizando como testemunhas.
O terceiro interlúdio difere dos dois primeiros porque ocorre no final da
sétima trombeta e precede a introdução das sete taças. O capítulo doze
representa uma mudança dramática no fluxo da narrativa da visão de João
introduzida pela frase “um grande sinal [sēmeion] apareceu no céu” (12.1),
seguida por “um outro sinal [sēmeion] apareceu no céu” (12.3), e
novamente com “vi outro grande e admirável sinal [sēmeion] no céu” (15.1,
tradução do autor).193 Estas são as três únicas ocorrências de um sēmeion

1695
que aparece no céu. As outras quatro ocorrências são todas falsos sinais
milagrosos realizados na terra em favor da “besta” (13.13,14; 16.14;
19.20).194 O sentido regular de sēmeion no NT é o de um sinal sobrenatural
ou milagre que é autêntico ou não.195 Como no Evangelho de João, sēmeion
no Apocalipse muito provavelmente aponta para algo mais significativo do
que apenas o sinal ou milagre em si.196 Assim, este terceiro interlúdio, a
narrativa dos “sinais”, ocorre antes do derramamento final dos punitivos
juízos de Deus.
Como acontece com outros interlúdios, a narrativa dos sinais tem seu
foco no papel do povo de Deus concomitante com a série de juízos.197 O
primeiro interlúdio ilustra a proteção e derradeira salvação dos fiéis (7.1-
17). O segundo interlúdio retrata o papel dos fiéis como as testemunhas
proféticas finais de Deus (10.1 a 11.14). Esse terceiro interlúdio (12.1 a
15.4) retrata os fiéis como engajados em uma guerra santa contra Satanás.198
199
Embora a precisa microestrutura deste interlúdio seja fugidia, a narrativa
se divide em três divisões naturais: (1) a guerra santa no céu (cap. 12), (2) a
guerra santa na terra (cap. 13), e (3) vindicação dos fiéis seguida pelo
julgamento dos ímpios (cap. 14). Entre as cenas desta guerra espiritual
cósmica, João tornou explícito o propósito deste interlúdio, interpondo
chamados de encorajamento (12.10-12), paciente perseverança (13.9,10), e
a vindicação final dos crentes (14.6-13). Apocalipse 12.1 a 15.4 também
fornece a base e justificação para a severidade e caráter definitivo dos
juízos aplicados sobre os habitantes da terra.

As duas últimas visões

1696
As duas últimas visões (17.1 a 21.8; 21.9 a 22.5) contrastam, de forma
marcante, a cidade prostituta de Babilônia, a Grande, com a santa cidade
noiva da nova Jerusalém.200 Na terceira visão (17.1 a 21.8), João vê uma
prostituta chamada Babilônia (17.15), que representa Roma (17.9) e
governa sobre as nações, bem como sobre os reis da terra (17.15,18). O
restante da visão mostra todos os eventos associados com seu julgamento,
incluindo sua acusação, sentença e lamento (18.1-24); o retorno de Cristo
(19.1-21); seu reinado milenar (20.1-10); e a ressurreição, seguida do juízo
final (20.11-15).
A quarta visão (21.9 a 22.5)201 retrata a beleza e o brilho da cidade noiva
da nova Jerusalém descendo do céu para a terra. Esta visão se divide em
duas seções que descrevem a Cidade Santa como um eterno Santo dos
Santos (21.9-27) e como um novo Éden (22.1-5).202 Portanto, essas duas
visões finais servem para contrastar o destino daqueles que adoram a besta
203
com a glória que aguarda os seguidores do Cordeiro. Quando vistas
juntas, estas duas visões formam o clímax da profecia, provendo o auge de
tudo que foi antecipado na visão de João.204

ESTRUTURA
I. Prólogo (1.1-8)

II. Visão 1 (em Patmos): o Cristo glorificado que cuida de suas igrejas (1.9
a 3.22)
A. A visão inaugural de Jesus Cristo (1.9-20)
B. As mensagens às sete igrejas da Ásia Menor (2.1 a 3.22)

1697
III. Visão 2 (no céu): os procedimentos da corte divina e o julgamento das
nações (4.1 a 16.21)
A. Transição de Patmos para o céu (4.1,2)
B. Adoração ao redor do trono (4.3-11)
C. A sala da corte divina (5.1-14)
D. Decisões investigativas preliminares (6.1-17)
1. Quebrando os sete selos (6.1-14)
2. Transição: “Quem poderá subsistir?” (6.15-17)
E. Primeiro interlúdio: a selagem protetora do povo de Deus (7.1-17)
F. Decisões investigativas escatológicas (8.1 a 9.21)
1. Soando as sete trombetas (8.1 a 9.19)
2. Transição: a impenitência da humanidade (9.20,21)
G. Segundo interlúdio: o povo de Deus como testemunhas proféticas
(10.1 a 11.19)
1. O anjo com o pequeno rolo (10.1-7)
2. A comissão profética de João (10.8-11)
3. A medição protetora do templo (11.1,2)
4. As duas testemunhas (11.3-13)
5. A sétima trombeta (11.14-18)
6. Transição: a abertura do templo celestial (11.19)
H. Terceiro interlúdio: a narrativa dos sinais/o povo de Deus em guerra
santa (12.1 a 15.8)
1. Primeiro sinal (12.1,2): a mulher celestial (personificação de
Israel)
2. Segundo sinal (12.3): o dragão vermelho (identificação de Satanás)
3. Guerra santa com Satanás em perspectiva histórica (12.4-6)
4. Guerra santa com Satanás no céu (12.7-12)

1698
5. Guerra santa com Satanás que combate os crentes na Terra (12.13 a
13.18)
a. A mulher é perseguida (12.13-18)
b. A besta que sai do mar: guerra política contra os fiéis (13.1-10)
c. A besta que sai da Terra: guerra religiosa contra os fiéis (13.1-
18)
6. O Cordeiro com os 144 mil: o triunfo dos fiéis (14.1-5)
7. Três anjos anunciando o juízo (14.6-13)
8. Colheita dos grãos: colhendo os fiéis para a recompensa (14.14-16)
9. Colheita de uvas: colhendo os pecadores para a ira (14.17,18)
10. Terceiro sinal: a vitória dos fiéis (15.1-4)
11. Transição: templo celestial aberto (15.5-8)

IV. Decisões investigativas finais: as sete taças (16.1-21)

V. Visão 3 (no deserto): a destruição de Babilônia e o retorno de Cristo


(17.1 a 21.8)
A. Transição: “Vem, eu te mostrarei a condenação da famosa prostituta”
(17.1,2)
B. A cidade prostituta de Babilônia descrita (17.3-6)
C. A cidade prostituta de Babilônia como Roma (17.7-18)
D. O julgamento e a condenação de Babilônia (18.1-24)
E. Celebração celestial da destruição de Babilônia (19.1-10)
F. O guerreiro divino e o tribunal final (19.11 a 20.15)
G. A renovação da criação e a chegada da nova Jerusalém (21.1-8)

VI. Visão 4 (sobre uma montanha): a recompensa dos fiéis e a renovação da


Criação (21.9 a 22.5)

1699
A. Transição: “Vem, eu te mostrarei a noiva” (21.9,10)
B. A descrição da nova Jerusalém descendo do céu (21.11-27)
C. O paraíso de Deus: a renovação da criação (22.1-5)

VII. Epílogo (22.6-21)

Abordagens ao Estudo do Livro de Apocalipse


O modo como se lê o livro de Apocalipse depende largamente da
abordagem adotada para o entendimento das áreas de história, simbolismo e
escatologia. Os intérpretes diferem em sua visão da relação entre a visão de
João e a história. O livro de Apocalipse reflete os acontecimentos passados,
os acontecimentos presentes, eventos puramente futuros, ou eventos futuros
para João, mas históricos para os leitores atuais? A maneira como se
responde a essas perguntas influencia muito o modo de interpretar o livro.
Ninguém duvida que o Apocalipse está saturado de simbolismo, mas
nem todos concordam sobre o que os símbolos significam. Será que eles
têm referentes literais ou literários? Interpretações literais produzem
significados notavelmente divergentes daqueles que seguem abordagens
mais literárias. Finalmente, as perspectivas escatológicas se tornam as
lentes teológicas que influenciam o modo como se responde às questões
históricas, bem como a forma como se interpretam os símbolos do livro. A
história da interpretação produziu quatro principais escolas de pensamento
de interpretação deste livro complexo.

1. Preterista

1700
A posição preterista (do lat., praeteritus, significando “passado”) é também
conhecida como “histórica contemporânea”,205 que aborda a relação entre a
história e o livro de Apocalipse do ponto de vista de que os eventos
profetizados foram cumpridos no primeiro século. Uma das escolas
preteristas interpreta o livro como uma mensagem de juízo contra a apóstata
nação de Israel por rejeitar a Cristo, ao profetizar a destruição de Jerusalém
no ano 70.206 Outros intérpretes preteristas veem o Império Romano e a
situação dos cristãos como o foco da visão de João, profetizando a queda de
Rome.207
Esse ponto de vista, em todas as suas variações, representa a abordagem
mais comum entre os estudiosos contemporâneos.208 Seu apelo principal
reside no fato de levar a sério a recepção historicamente condicionada dos
leitores originais. Os preteristas reconhecem que o Apocalipse teria tido um
significado acessível aos leitores do primeiro século. Assim, sua
interpretação de Apocalipse reflete as escolhas que eles fizeram a respeito
da data de composição e da situação histórica abordada. A visão dos
preteristas é que o Apocalipse não é tanto um projeto para o futuro distante
quanto é um comentário sobre acontecimentos contemporâneos da época de
composição.209
Uma vez que Apocalipse não foi escrito em um vácuo histórico, os
preteristas localizam corretamente a mensagem em relação ao seu contexto
histórico como algo relevante para os destinatários originais. João abordou
congregações reais de cristãos vivendo na província romana da Ásia Menor.
Assim, aborda-se a interpretação de Apocalipse de uma forma semelhante
às cartas do NT, tentando entender o significado à luz das circunstâncias
históricas de cada uma das igrejas. Os símbolos e as imagens produzem

1701
uma “interação espacial entre o terreno e o celeste para dar um novo
significado à situação atual”.210
Ao não projetar o conteúdo do livro no futuro distante, os preteristas
com proveito enfatizam que a visão de João abordava diretamente a
situação e as necessidades das igrejas da Ásia Menor. Nenhum outro livro
no Novo Testamento é tão frequentemente separado de seu contexto
histórico como Apocalipse. Negligenciar a relação de Apocalipse com sua
audiência do primeiro século é hermeneuticamente falacioso porque essa
abordagem comete o erro de presumir que os recipientes originais não eram
as sete igrejas, mas os cristãos que vivem hoje. Dito isso, no entanto, é
igualmente falacioso restringir a mensagem e o significado de Apocalipse
exclusivamente ao primeiro século.
Apocalipse traz uma perspectiva que ultrapassa os limites do primeiro
século. O livro retrata a consumação final do Reino de Deus na terra com o
retorno físico de Jesus, a ressurreição de toda a humanidade, e o juízo final.
Uma abordagem que implica que esses eventos já ocorreram torna-se vítima
da escatologia super-realizada.211 O escopo universal de Apocalipse é
evidente pelas repetidas referências ao caráter global dos habitantes da
terra. O povo de Deus vem de toda nação, tribo e língua (5.9; 7.9; 13.7;
15.4; 21.24), e os objetos da ira de Deus compreendem todos os habitantes
da terra e não apenas aqueles em Jerusalém ou no Império Romano.212
As alusões às profecias do AT em Apocalipse ou são universalizadas
para incluir todas as nações e não apenas Israel ou elas são extraídas de
oráculos de juízo contra as nações. Por essa razão, a noção de que o
Apocalipse profetiza a destruição de Jerusalém no ano 70 parece altamente
improvável, uma vez que alusões frequentes a Daniel 2 e 7 retratam as
nações, em vez de Israel, como o objeto de juízo.213 Além do mais,

1702
equiparar Jerusalém à Babilônia não parece plausível porque a Babilônia,
em Apocalipse, exerce enorme controle político sobre os habitantes da
terra, o que não se poderia dizer da Jerusalém histórica.214

2. Historicista
A abordagem historicista215 foi a abordagem interpretativa mais popular
para o livro de Apocalipse durante a Idade Média e durante toda a
Reforma.216 Os historicistas viam o livro como prevendo o curso da história
na Europa Ocidental com particular ênfase nos papas, reis e guerras.217 Ela
teve início com o líder monástico do século XII, Joaquim de Fiore, que
queria encontrar padrões significativos na história.218 Os intérpretes
Franciscanos adotaram sua abordagem e a aplicaram à sua disputa com o
Papa Bento XI, já que os valores do seu nome grego somavam 666.219
Martinho Lutero, João Calvino e outros reformadores fizeram o mesmo
igualando o Vaticano à prostituta Babilônia que corrompeu e perseguiu a
verdadeira igreja.220
Essa abordagem foi largamente abandonada, mas pode-se detectar
variações modernas dela quando intérpretes dispensacionalistas leem
Apocalipse como se ele estivesse sendo cumprido nos acontecimentos
atuais no cenário mundial.221 Embora uma abordagem historicista ofereça
uma interessante janela sobre a história da interpretação do livro de
Apocalipse durante toda a história da igreja, ela fracassa como um modelo
legítimo de interpretação. Esse fracasso decorre do fato de que ela reflete
uma hermenêutica inadequada por estreitar seu foco na história do Ocidente
e considerar, de forma insuficiente, a relevância do livro para as igrejas do
primeiro século às quais ele foi dirigido.222

1703
3. Idealista
A abordagem idealista, atemporal ou simbólica deixa completamente de
lado a questão histórica, postulando que o Apocalipse não trata dos eventos
no contínuo espaço-tempo, mas antes, simbolicamente retrata a natureza
espiritual e atemporal da batalha entre bem e mal.223 A famosa máxima de
W. Milligan resume essa abordagem: “Não devemos procurar no
Apocalipse eventos especiais, mas uma exposição dos princípios que regem
a história do mundo e da Igreja.”224 Assim, a visão e seu simbolismo ficam
livres de suas amarras históricas para que representem uma mensagem
universal para todos os crentes sobre a derrota de Satanás por Deus e a
vitória espiritual da fé em Cristo enquanto a igreja luta com um mundo
governado por potentados ímpios.
As raízes dessa concepção se aprofundam no solo da história da
interpretação cristã, começando em Alexandria. Orígenes ensinou que o
significado espiritual e atemporal do texto era superior ao sentido literal e
aplicou esse ponto de vista a Apocalipse. Ele não queria saber de
especulações sobre a época e o local da batalha do Armagedom, porque ele
a entendia como referência ao triunfo de Deus sobre o pecado e a
225
impiedade. Essa interpretação mais profunda e simbólica de Apocalipse
foi adotada por Dionísio, discípulo de Orígenes, e teve um impacto
duradouro por influência de Agostinho (354-430). O milênio, de acordo
com Agostinho, era uma maneira de se referir ao reinado espiritual dos fiéis
ao longo do tempo e não um literal mil anos na terra (Cidade de Deus
18.53; 20.7). No entanto, algumas variações dessa concepção não dão
espaço para o cumprimento futuro das profecias do fim dos tempos.
Os pontos fortes dessa abordagem são que ela leva em consideração a
natureza simbólica das visões de João, reflete com precisão a relevância

1704
universal para todos os cristãos ao longo da história, e oferece uma leitura
teológica profunda do texto. Mas o descaso por quaisquer conexões
históricas ou expectativas futuras revela algumas falhas. João escreveu para
igrejas reais que enfrentavam circunstâncias específicas, especialmente nas
sete cartas. As alusões ao culto imperial, o mito do Nero redux, e outros
eventos históricos particulares do primeiro século indicam que o significado
das suas visões está preso ao contínuo espaço-tempo. Além disso, essa
abordagem não explica adequadamente as expectativas escatológicas para a
consumação do plano de Deus na história humana com o retorno de Cristo à
Terra.

4. Futurista
A quarta abordagem básica para a interpretação do livro de Apocalipse
afirma que os capítulos 4 a 22 se referem a eventos futuros.226 Antigos
escritores cristãos, tais como Justino Mártir (c. 100-165), Ireneu (c. 130-
200), Tertuliano (c. 160-225) e Hipólito (c. 170-236) defendiam uma
interpretação futurista conhecida como quiliasmo.227 Essa expressão
extraída do termo grego para 1.000 (chilia), que eles acreditavam ser o
reinado de mil anos de Cristo na terra no fim dos tempos (Justino, Diálogo
com Trifo 80). O ponto de vista vem de uma interpretação literal de 20.2-7.
Mas essa interpretação literal foi superada por abordagens mais alegóricas e
espirituais enfatizando o cumprimento atemporal e sucessivo dessas
profecias ao longo da história da igreja (Agostinho, Cidade de Deus 18.53;
20.7).
A abordagem futurista praticamente desapareceu da interpretação de
Apocalipse até ganhar vida com a obra de um jesuíta espanhol do final do

1705
século dezesseis chamado Ribeira, que postulou que João viu eventos tanto
de sua época quanto do futuro.228 Embora ele não fosse um futurista no
sentido estrito, ele trouxe com sucesso o futurismo de volta ao debate como
uma opção de interpretação viável.229 Nos tempos modernos, a posição
futurista ocupa o primeiro lugar entre a maioria dos cristãos evangélicos.
Mas nem todos os futuristas concordam sobre o modo como Apocalipse
retrata o desenrolar dos acontecimentos futuros; assim, existem duas formas
básicas: (1) o futurismo dispensacional; e (2) o futurismo modificado ou
moderado.230
O futurismo dispensacional, associado com o pré-milenarismo
dispensacional, teve início com os ensinamentos de J. N. Darby, que foram
popularizados nos Estados Unidos por C. Larkin, D. L. Moody, C. I.
Scofield e L. S. Chafer. O século XX testemunhou o desenvolvimento do
dispensacionalismo em duas expressões distintas: (1) dispensacionalismo
clássico (Darby, Scofield, Chafer) e revisado (J. Walvoord, C. Ryrie, D.
Pentecost, T. LaHaye e R. Thomas; e (2) dispensacionalismo progressivo
(D. Bock, C. Blaising, R. Saucy, E M. Pate).231 A diferença entre essas duas
formas de dispensacionalismo é hermenêutica. A característica distintiva da
hermenêutica do dispensacionalismo clássico e revisado é um persistente e
insistente compromisso com a interpretação literal das Escrituras
proféticas,232 um princípio expressado muitas vezes com o seguinte ditado:
“Quando o sentido claro da Escritura fizer bom senso, não procure outro
sentido”.233 Essa abordagem hermenêutica resultou em um sistema
teológico particular que faz uma distinção rigorosa e persistente entre Israel
e a igreja.234 A Igreja é apenas um parêntese inserido entre as interações de
Deus com Israel e, portanto, o foco do livro de Apocalipse está no futuro do
Israel étnico e nacional.

1706
Uma vez que o termo “igreja” (ekklēsia) não ocorre após 3.22 até 22.15,
os dispensacionalistas concluem que a razão disso é que Deus arrebata a
igreja no início da tribulação, de modo que ele possa voltar a tratar com
Israel. Assim, a tribulação e o reinado de mil anos de Cristo em Jerusalém
nada têm a ver com a igreja. Os dispensacionalistas tipicamente interpretam
o Apocalipse como descrevendo em ordem cronológica os eventos futuros
que ocorrem durante um período de sete anos e que têm seu foco na nação
de Israel. Enquanto o futurismo dispensacional afirma uma visão elevada
das Escrituras e da realidade futura que prediz, seu excessivo literalismo
tende a impor sobre o texto um sistema escatológico que se baseia em
princípios hermenêuticos inadequados.
O dispensacionalismo progressivo é uma forma bastante atualizada de
dispensacionalismo, e que o deixa hermeneuticamente mais próximo da
interpretação evangélica contemporânea.235 O termo progressivo se refere a
crença de que as várias dispensações progressivamente se sobrepõem em
concordância com a tensão do “já/ainda não” da escatologia inaugurada.
Assim, os dispensacionalistas progressivos afirmam que Jesus já começou
seu reinado como o rei davídico na ressurreição, em vez de situar esse
evento no início do milênio.236 O reino milenar de Cristo, então, é o
cumprimento completo para Israel.
Os dispensacionalistas progressivos também diferem das primeiras
formas do dispensacionalismo por não verem a igreja como um segmento
separado da humanidade ou como uma nação concorrente de Israel e das
nações gentílicas, mas sim como a própria humanidade redimida (ambos
judeus e gentios) existindo nesta dispensação anterior à vinda de Cristo.237
C. M. Pate identificou a diferença essencial entre as interpretações

1707
dispensacionais clássica e progressiva do livro de Apocalipse como a
crença na sobreposição “desta era” e da “era por vir”:

João escreve sobre o que ele viu (as visões de Apocalipse como um todo), o que se divide em
duas realidades: as coisas que são, ou seja, a presente era; e as coisas que serão, ou seja, a era
por vir. Para João, a Igreja de sua época vive na presente era (caps. 1 a 3), mas no céu, em
virtude da morte e ressurreição de Jesus, a era por vir já raiou (caps. 4 a 5). No futuro, a era
por vir descerá à terra, promovendo a derrota do anticristo (caps. 6 a 19), o estabelecimento
do reino messiânico temporário na terra (cap. 20) e, posteriormente, o estado eterno (caps. 21
e 22). Assim, a sobreposição das duas eras dá conta da contínua alternância de cenas entre a
terra (esta era) e o céu (a era por vir) em Apocalipse.238

Embora os dispensacionalistas progressivos afirmem uma escatologia


inaugurada e vejam a igreja como membros iguais entre o povo de Deus,
eles continuam a manter os princípios do dispensacionalismo clássico de
um futuro para o Israel étnico, o reinado de mil anos, e o arrebatamento da
igreja antes da tribulação.239 Essa visão representa uma abordagem mais
viável do que o dispensacionalismo clássico, mas ao manter a distinção
Israel/igreja exigindo um arrebatamento pré-tribulacional, a abordagem
acaba tornando a maior parte do livro de Apocalipse irrelevante para os
cristãos de hoje.
Uma segunda forma de abordagem futurista — futurismo modificado ou
moderado — é comumente associado com o pré-milenarismo histórico
devido as suas afinidades com o chiliasm da igreja antiga.240 Credita-se a G.
E. Ladd o pioneirismo na moderna articulação do pré-milenarismo histórico
como uma abordagem para interpretação de Apocalipse, mas essa
abordagem foi adotada ou adaptada por inúmeros estudiosos, entre eles R.
Gundry, R. Mounce, L. Morris e W. Grudem. Esse ponto de vista é
semelhante ao dispensacionalismo por afirmar um reinado de mil anos de
Cristo na terra, mas renuncia à insistência dispensacional em um literalismo

1708
estrito, uma distinção rigorosa entre Israel e a igreja, uma cronologia dos
eventos do fim dos tempos e a crença em um arrebatamento pré-
tribulacional.
Enquanto os dispensacionalistas argumentam que a segunda vinda de
Cristo envolverá um retorno secreto para a igreja antes da tribulação,
seguido por seu retorno visível após sete anos, os futuristas modificados
afirmam apenas um retorno de Cristo à terra que permite à igreja perseverar
atravessando a tribulação.241 Isso é principalmente devido à inauguração da
nova aliança, que torna todos os crentes em Jesus os descendentes
espirituais de Abraão e, portanto, membros da aliança do povo de Deus — o
verdadeiro Israel.242 Além disso, o relacionamento entre o passado, presente
e futuro é mais flexível entre os futuristas modificados. Ladd, por exemplo,
interpretou os capítulos 1 a 3 como pertencentes ao primeiro século,
capítulos 4 a 6 como recorrentes ao longo da história da igreja, e os eventos
começando no capítulo 7 como se referindo à futura tribulação.243
O futurismo modificado e o pré-milenarismo histórico são atraentes
porque permitem que os intérpretes mantenham a orientação futura das
visões de João enquanto evitam o literalismo do dispensacionalismo que
limita a aplicabilidade de Apocalipse à igreja de hoje.

Conclusão
Uma tendência recente entre os comentaristas incorpora elementos de todas
ou algumas das abordagens descritas acima em uma mistura eclética.244
Uma vantagem dessa estratégia é que ela não força o intérprete a aceitar
rigidamente nenhuma das principais abordagens interpretativas.

1709
Ao mesmo tempo, os pontos de vista ecléticos são extremamente
diversificados. H. Giesen reconheceu as naturezas futurista e idealista da
visão de João, embora ele desconfie da tendência delas à abstração. Isso o
levou a preferir a natureza histórica e concreta do preterismo juntamente
com a abordagem histórico-tradicional de estudiosos como W. Bousset, R.
H. Charles e E. Lohmeyer.245
Um outro comentarista, G. K. Beale, rotulou sua abordagem eclética de
uma “forma histórico-redentora de idealismo modificado”.246 A sua
preferência pelo idealismo decorre de seu ponto de vista de que os símbolos
nas visões de João são “transtemporais” no sentido de que se aplicam a
eventos por toda a era da igreja.
Ainda um outro comentarista pré-milenarista, G. Osborne, tornou a
posição futurista o aspecto dominante de sua forma de ecletismo, porque ele
acredita que as visões de João “tinham a intenção primordial de descrever
os eventos que concluirão a história do mundo”.247 Essa variedade de
abordagens demonstra a dificuldade de atribuir cada estudioso a uma das
principais abordagens para a interpretação de Apocalipse pesquisadas.
A relação entre os aspectos histórico, simbólico e escatológico
representados no livro de Apocalipse continuará a exercitar as mentes de
seus intérpretes.248 Uma vez que o próprio livro expressamente afirma tratar
de eventos futuros em torno da volta de Cristo (1.19; 22.18-20), preferência
deveria ser dada a uma forma da abordagem futurista.

DISCUSSÃO UNIDADE POR UNIDADE


I. Prólogo (1.1-8)

1710
O prólogo informa o leitor que este é um livro revelador contendo uma
visão de Jesus, que tem seu retorno como conteúdo, João como o vidente e
as igrejas como destinatários. Deus deu esta revelação a fim de que todos os
seus servos possam saber o que deve acontecer no futuro próximo. A
autoridade divina desta visão é expressa por uma cadeia de intermediários:
Deus → Jesus → anjo → João → igrejas. João afirma a veracidade desta
visão ao apresentá-la como testemunho ocular sobre tudo o que viu e ouviu.
Depois de prometer uma bênção para aquele que lê, ouve e obedece a
visão (1.4-6), João enviou saudações de cada membro da Trindade: o Pai, o
Filho e o Espírito (simbolizado pelos “sete espíritos”). Apocalipse 1.7 fala
do retorno visível e físico de Cristo ao fundir Daniel 7.13 com Zacarias
12.10. O prólogo termina com uma afirmação da parte de Deus, o Pai, de
que ele é o início e o fim da história como o Eterno e Todo-poderoso.

1711
II. Visão 1 (em Patmos): O Cristo Glorificado que
Investiga suas Igrejas (1.9 a 3.22)
A. A visão inaugural de Jesus Cristo (1.9-20)
A primeira visão se abre com um relato do chamado de João a profetizar e a
visão inaugural de Jesus em sua glória de pé entre suas igrejas. João,
enquanto na ilha de Patmos, estava no Espírito no Dia do Senhor e ouviu
uma voz ordenando-lhe que anotasse a visão que se seguiu para sete igrejas
na Ásia Menor. Ele se virou para ver a voz que lhe falava, e lá estava o
Senhor Jesus em glória. A visão dele estendeu os limites da linguagem de
João, quando ele tentou descrever Jesus utilizando símiles extraídos de
teofanias do AT.
Espantado, João caiu aos pés de Jesus como se estivesse morto. Cristo
respondeu colocando sua mão sobre João e anunciando que ele é o primeiro
e o último, o Ressurreto que vive e aquele que tem autoridade sobre a morte
e a vida. Jesus então explicou que os sete candelabros são as sete igrejas da
Ásia, e as sete estrelas em sua mão são os anjos das igrejas. Esta
identificação faz a transição da visão inaugural de Cristo para as mensagens
destinadas às sete igrejas.

B. As mensagens às sete igrejas da Ásia Menor (2.1


a 3.22)
As mensagens às sete igrejas nos capítulos 2 e 3 representam a parte mais
conhecida do livro de Apocalipse e fornecem as instruções mais práticas
para os crentes. Embora essas mensagens abordem situações histórica e

1712
localmente limitadas a estas sete igrejas, elas se aplicam universalmente a
todas as igrejas de todos os tempos. Como essas cartas divergem dos
modelos normais da escrita epistolar greco-romana, elas estão mais
próximas da classificação de gênero de um oráculo profético.
As mensagens começam dirigindo-se ao anjo de uma igreja em
particular (cf. 1.21),249 uma ordem para escrever e uma afirmação
descrevendo uma característica de Cristo extraída da visão inaugural e
relevante para esta igreja específica (2.1,8,12,18; 3.1a,7,14). O corpo oficial
da mensagem começa com o discurso “conheço” (oida) que inclui elogios
ou acusações, ou ambos (2.2,13,19; 3.1,8b,15). Jesus, então, admoestou as
igrejas ou encorajando-as a continuar a perseverar em um certo tipo de
conduta ou chamando-as ao arrependimento, com uma advertência sobre as
consequências negativas em caso de desobediência. Os dois últimos
elementos dessas mensagens incluem um apelo profético para ouvirem o
que o Espírito diz às igrejas (2.7a,11a,17a,29; 3.6,13,22) e uma promessa de
libertação para aqueles que vencerem (2.7b, 11b,17b,26; 3.5,12,21).

III. Visão 2 (no céu): Os Procedimentos da Corte


Divina e o Julgamento das Nações (4.1 a 16.21)
A. Transição de Patmos para o céu (4.1,2)
A entrada de João pela soleira do céu sinaliza uma transição principal para
uma nova visão que também constitui uma transição temática de uma
investigação judicial das igrejas para uma investigação das nações (4.1,2).

B. Adoração ao redor do trono (4.3-11)

1713
A cena se transforma radicalmente da estéril e rochosa ilha de Patmos para
a sala do trono celestial. O trono de Deus está no centro de uma série de
círculos concêntricos, mostrando sua soberania sobre o cosmos. Ao
descrever sua visão João se baseou em outras visões proféticas que
envolvem o trono de Deus (p. ex., Ez 1.5,10,18,22). A visão que João tem
da sala do trono celestial oferece uma perspectiva apocalíptica contrastando
pretensões imperiais de soberania cósmica com o verdadeiro rei e juiz do
universo.250 O divino conselho se reúne com a finalidade de instalar um juiz
escatológico digno de exercer o juízo de Deus sobre os habitantes da terra.

C. A sala da corte divina (5.1-14)


A cena da sala da corte continua no capítulo 5 com a apresentação do rolo e
do Cordeiro. A cena mostra a instalação de Cristo como o Rei Davídico e
sua entronização à direita de Deus, bem como sua comissão como o juiz
escatológico, o único que é digno de desencadear o juízo de Deus sobre a
humanidade. Um rolo selado é trazido, e um anjo anuncia a busca por
aquele que é digno de romper os selos e abri-los. Após uma extensa busca
por toda a ordem criada, apenas um foi encontrado (5.2-4). O Cordeiro, o
Leão vencedor que vem da tribo de Judá, é considerado digno de pegar o
rolo e assumir seu papel como rei e juiz (5.5-7). O restante do capítulo é
dedicado ao louvor do Cordeiro. Este capítulo prepara o terreno para o juízo
das nações.

D. Decisões investigativas preliminares (6.1-17)


Da mesma forma que Apocalipse 5 tem o foco na dignidade do Cordeiro
para julgar, os capítulos 6 a 16 demonstram a justeza de seu julgamento

1714
sobre a humanidade. O rolo com sete selos repousa seguro nas mãos do
Cordeiro, que passa a romper os selos. Já que o conteúdo do rolo não pode
ser lido antes que todos os selos sejam rompidos, os selos são melhor
compreendidos como juízos preliminares. Os julgamentos introduzidos
pelos selos representam as “dores de parto” que ocorrem antes dos futuros
dias de tribulação que antecederão a volta de Cristo (veja Mc 13.8,19).
Os quatro cavaleiros constituem um padrão de conquista, guerra, fome e
morte (6.1-8; veja Mt 24.7). Os crentes martirizados e seu apelo por justiça
(6.9-11) indicam que durante esse tempo o povo de Deus vai continuar a
sofrer perseguição. Os selos também representam uma intensificação
progressiva que conduz a um momento de sublevação cósmica, como
indicado pelo rompimento do sexto selo. Os selos iniciam os julgamentos
preliminares contra as nações e incluem advertências dirigidas aos
violadores da aliança nas respectivas igrejas. Esses julgamentos precedem
as sete trombetas que constituem a grande tribulação.

E. Primeiro interlúdio: a selagem protetora do povo


de Deus (7.1-17)
Antes da tribulação, o primeiro de vários interlúdios entrelaçados entre a
série de septetos assegura os fiéis de sua proteção contra o juízo divino e de
sua salvação final (7.1-17). João colocou o interlúdio entre o rompimento
do sexto e do sétimo selos (veja 6.12; 8.1). O interlúdio é dividido em dois
segmentos separados, mas relacionados (7.1-8, 9-17). A primeira unidade
refere-se à selagem dos 144 mil para proteção, antes da tribulação (veja
7.1,14; veja Ez 9.4-6). Embora alguns vejam os 144 mil apenas como
símbolo da multidão de crentes que vieram da grande tribulação, outros

1715
entendem a referência literalmente como relacionada às 12 tribos de
Israel.251

1716
Tabela 20.3: As Cartas às Sete Igrejas em Apocalipse
Éfeso 2.1-7
Segurando sete estrelas e caminhando entre os
Característica de Cristo
candelabros
Obras, labor, perseverança, exame de falsos
Elogio
apóstolos, rejeição dos ensinos dos nicolaítas
Acusação Abandono do primeiro amor
Arrependa-se, lembre-se e volte às boas obras
Repreensão
anteriores
Advertência Remover o candelabro
Promessa aos Direito de comer da árvore da vida no paraíso
vencedores de Deus
Esmirna 2.8-11
Característica de Cristo
Fielmente suportou tribulação, pobreza e
Elogio
calúnia
Acusação Nenhuma
Repreensão Seja fiel até a morte
Advertência Nenhum
Promessa aos Nunca ser prejudicado pela segunda morte
vencedores
Pérgamo 2.12-17
Característica de Cristo Espada afiada de dois gumes saindo da boca
Apegar-se a seu nome e não negar a fé em
Elogio
Cristo
Alguns seguem os ensinamentos de um falso
Acusação
profeta e dos nicolaítas
Repreensão Arrependa-se
Advertência Rapidamente combatê-los com a espada de sua

1717
boca (ou seja, palavras)
Promessa aos Maná escondido e uma pedra branca com um
vencedores novo nome
Tiatira 2.18-29
Característica de Cristo Olhos como fogo e pés de bronze polido
Cada vez mais grandes obras, amor, fidelidade,
Elogio
serviço e perseverança
Alguns seguem os ensinamentos de uma falsa
Acusação
profetisa e cometem imoralidade sexual
Repreensão Arrependam-se e não sigam seus ensinamentos
Lançar a profetisa e seus seguidores em um
Advertência
leito de sofrimento
Promessa aos Autoridade sobre as nações
vencedores
Sardes 3.1-6
Característica de Cristo Segurando os sete espíritos e sete estrelas
Elogio Nenhum
Reputação de estar vivo, mas estar
Acusação
espiritualmente morto
Esteja alerta, fortaleça o que resta, lembre-se do
Repreensão
que você ouviu, e arrependa-se
Advertência Vir contra eles como um ladrão
Promessa aos Vestido de branco e nome garantido no livro da
vencedores vida
Filadélfia 3.7-13
Aquele que é santo e verdadeiro e tem as
Característica de Cristo
chaves de Davi
Obras, pouca força, não negou seu nome,
Elogio
obediente e perseverante
Acusação Nenhuma

1718
Repreensão Apegue-se ao que eles têm
Advertência Nenhuma
Promessa aos Feitos uma coluna no santuário de Deus e o
vencedores nome de Deus e de sua cidade sobre eles
Laodiceia 3.14-22
O “Amém”, “testemunha fiel e verdadeira” e “o
Característica de Cristo
soberano da criação de Deus” (NVI)
Elogio Nenhum
Mornos, autossuficientes e autoiludidos quando
Acusação na realidade são espiritualmente miseráveis,
pobres, cegos e nus
Recebam de Cristo ouro refinado, roupas puras
Repreensão
e pomada para os olhos
Cristo repreende aqueles a quem ama e irá
Advertência
restaurar a comunhão com eles
Promessa aos O direito de sentar-se no trono junto com o Pai
vencedores e o Filho

QUADRO 20.1: QUEM SÃO OS 144 MIL DE


APOCALIPSE 7?
Há duas posições essenciais sobre a identidade dos 144 mil e a relação
deste grupo com a multidão oriunda de várias nações em Apocalipse
7.1 Uma opinião sustenta que a referência deve ser entendida
literalmente como se referindo aos judeus étnicos, as 12 tribos de
Israel. Considera-se que isso apoia a noção de que os propósitos de
Deus durante a grande tribulação terão seu foco no Israel étnico. Esta
visão sustenta que os 144 mil devem ser distinguidos da multidão que

1719
2
vem de muitas nações. A outra posição sustenta que a referência aos
144 mil é simbólica e se refere aos crentes (não apenas judeus) que
estiverem vivos durante a grande tribulação e que os 144 mil devem
3
ser identificados com a grande multidão.
A resolução desta questão é importante porque ela potencialmente
lança luz sobre se deve-se esperar que a igreja esteja presente durante
toda a grande tribulação (a visão pós-tribulacional), ou se os fiéis serão
arrebatados no início da grande tribulação enquanto o foco dos
propósitos de Deus durante este período estará sobre Israel (a posição
do arrebatamento pré-tribulacional). Embora a identificação dos 144
mil com o Israel étnico tenha o mérito de uma leitura natural do texto,
algumas considerações favorecem o entendimento da referência como
simbólica.
Primeira, os 144 mil são explicitamente chamados de “servos de
Deus”, o que em outras passagens de Apocalipse refere-se aos fiéis em
geral, sejam judeus ou gentios.4 Segunda, a lista de tribos fornecida
(7.5-8) é diferente de qualquer outra lista de tribos conhecida no AT.5
Isso sugere que João alterou intencionalmente a lista a fim de
apresentar a igreja como a continuação do verdadeiro Israel. Terceira,
João aqui muito provavelmente se baseia em um padrão no qual o que
o profeta ouve retratado como em uma imagem e o que ele vê é
descrito por uma outra.6 Assim, João ouve o número de 144 mil, mas
vê uma multidão inumerável oriunda de muitas nações. Finalmente, o
número 144 mil muito provavelmente transmite a noção simbólica da
inteireza, que também fala contra tomar a referência às 12 tribos
literalmente (cf. 14.1-5; 21.16,17).

1720
1
Para um sumário dos pontos de vista interpretativos sobre os 144 mil, veja Beale, Book

of Revelation, p. 416-23.
2
Entre os representantes daqueles que afirmam que os 144 mil são israelitas étnicos ou um

grupo de cristãos judeus estão Thomas, Revelation 1 to 7, p. 475-83; e Walvoord, Revelation

of Jesus Christ, p. 143.


3
Osborne, Revelation, p. 302-3; Bauckham, Climax of Prophecy, p. 216, 225-6; Craig L.

Blomberg, From

Pentecost to Patmos: an introduction through Revelation (Nashville: B&H, 2006), p. 529-

30.
4
O termo doulos ocorre 14 vezes (1.1; 2.20; 6.15; 7.3; 10.7; 11.18; 13.16; 15.3; 19.2,5,18;

22.3,6). A grande maioria dos usos se refere especificamente a profetas, mas o termo também

denota cristãos em geral.


5
Entre as principais diferenças estão: (1) Judá encabeça a lista, e não Rúben; (2) a

combinação de José e Manassés, em vez de Efraim; (3) a omissão de Dã; e (4) a inclusão de

Levi. Veja Bauckham, Climax of prophecy, p. 220-3; id., “The list of the tribes in Revelation 7

again”, JSNT 42 (1991), p. 99-115.


6
Por exemplo, em 5.5,6 João ouve sobre o Leão de Judá, mas ele vê o Cordeiro que foi

morto.

A segunda unidade tem o foco na salvação do povo de Deus oriundo de


toda nação, tribo, povo e língua (7.9-17). O fato de que este grupo está
diante do trono de Deus responde à pergunta de quem pode subsistir durante
o dia de sua ira (veja 6.17). Este interlúdio oferece duas perspectivas sobre
o mesmo grupo de pessoas. Muito provavelmente, os 144 mil representam a
inteira comunidade do povo de Deus na nova aliança que está prestes a
entrar na tribulação, enquanto a multidão vinda de muitas nações representa

1721
a multidão dos remidos saindo da tribulação. É assegurado ao povo de Deus
que ele irá protegê-los durante esse tempo de angústia.

F. Decisões investigativas escatológicas (8.1 a 9.21)


Após a selagem protetora dos servos de Deus dos iminentes juízos divinos,
João retornou à série de septetos com o rompimento do sétimo selo em 8.1.
Ele usou o dispositivo de entrelaçamento para a transição dos selos para as
trombetas, mas ele também conectou internamente os julgamentos seguintes
das trombetas com os selos precedentes. O rompimento do sétimo selo
resulta em silêncio imediato seguido pela introdução dos sete anjos e suas
trombetas. As quatro primeiras trombetas impactam toda a vida na terra: um
terço da vegetação da terra se queima; um terço da água salgada se
transforma em sangue; um terço da água doce fica amarga; e um terço do
sol, lua e estrelas escurece.
As últimas três trombetas são dirigidas especificamente contra os
habitantes da terra. A quinta trombeta libera uma horda de demônios
gafanhotos para castigar os habitantes da terra, e a sexta trombeta libera
uma cavalaria demoníaca que inflige terror ainda maior. Os crentes são
poupados dos últimos três julgamentos, pois os gafanhotos recebem ordem
de não ferir aqueles que têm o selo de Deus na testa (9.4). Embora cada
toque sucessivo de trombeta provoque terríveis consequências sobre os
habitantes da terra, eles se recusam a se arrepender (9.20,21). A última
trombeta compreende a consumação da ira de Deus porque contém as sete
taças dos juízos que destroem a vida na Terra (veja 16.1-21).

1722
G. Segundo interlúdio: o povo de Deus como
testemunhas proféticas (10.1 a 11.19)
O segundo interlúdio aparece entre os toques das sexta e sétima trombetas
(10.1 a 11.13). Ele retrata o papel do povo de Deus na terra durante o tempo
dos juízos da trombeta correspondente. O interlúdio se divide em duas
seções separadas, mas interligadas. A primeira unidade contém a segunda
comissão profética de João, na qual ele recebe uma mensagem relacionada
às nações (10.1-11). A segunda unidade descreve o ministério das duas
testemunhas proféticas diante das nações (11.1-13). Essas seções estão
intrinsecamente ligadas, porque estão relacionadas ao cumprimento de um
ministério profético para as nações. A comissão profética de João é
finalmente concluída no ministério das testemunhas fiéis.
Quando o testemunho profético das testemunhas, inspirado pelo
Espírito, se conclui, elas são assassinadas (11.7-10). João declarou que a
besta do abismo travará guerra contra as duas testemunhas (11.7). Isso
antecipa a guerra contra os fiéis instigada pela besta (13.1-18). Os
habitantes da terra insultam essas duas testemunhas de uma tal forma que
uma celebração global acontece uma vez que foram violentamente
assassinadas nas ruas. O fato de seus cadáveres permanecerem expostos
onde caíram indica o nível de ressentimento e ódio expressados pela
humanidade para com os fiéis representantes de Cristo. Depois de três dias
e meio, em um momento correspondente ao da sétima trombeta, Deus
vindica suas testemunhas mediante uma impressionante demonstração
pública de ressurreição e da ascensão (11.11,12). O tempo do testemunho é
concluído, e a hora do julgamento chegou.

1723
H. Terceiro interlúdio: a narrativa dos sinais/o povo
de Deus em guerra santa (12.1 a 15.1)
Um terceiro interlúdio aparece entre o soar da sétima trombeta (11.15-19) e
a introdução das sete taças contendo os juízos finais (15.5-8). A narrativa se
divide em três partes naturais de guerra santa no céu (cap. 12); guerra santa
na terra (cap. 13); e vindicação dos fiéis seguida pelo juízo sobre os ímpios
(cap. 14). Entre as cenas desta guerra espiritual cósmica, João tornou
explícito o propósito deste interlúdio interpondo apelos de encorajamento
(12.10-12), paciente perseverança (13.9,10), e vindicação final dos fiéis
(14.6-13).
O dragão (Satanás) conta com a ajuda de duas bestas, a fim de executar
sua guerra contra os fiéis (13.1-18). A besta do mar representa a força bruta
do poder político e militar de Roma (13.1-8). A besta da terra representa a
instituição religiosa que impõe a adoração da primeira besta (i.e., o culto
imperial, 13.11-17). Juntos, estes três formam um trio profano, por meio do
qual o dragão, a besta do mar e a besta da terra remetem às três pessoas da
Divindade. Assim, 12.1 a 15.4 fornece a base e justificação para a
gravidade e finalidade dos juízos proferidos sobre os habitantes da terra.
A sétima trombeta, abrangendo o terceiro ai, sinaliza a consumação
final do juízo de Deus (11.15-19) ao introduzir os anjos com as sete taças
cheias da sua ira (15.5-8).

I. Decisões investigativas finais: as sete taças (16.1-


21)
As sete taças contêm o vinho da ira de Deus derramado sobre os habitantes
da terra. Os objetos dessa ira são especificamente identificados como todos

1724
aqueles com a marca da besta que adoraram sua imagem (16.2). Os juízos
do selo afetaram um quarto da terra e de sua população, as trombetas, um
terço, mas as taças liberam a plena fúria da ira de Deus em sua totalidade.
A primeira taça inflige a todos os infiéis (i. e., aqueles com a marca da
besta) feridas feias e dolorosas. A segunda e a terceira taças transformam
todos os oceanos e água doce da terra em sangue pútrido. A quarta taça
intensifica o poder do sol que escalda toda a carne. A quinta e sexta são
ataques diretos contra o reino da besta com uma praga de trevas e de
preparação para a batalha final do Armagedom. Quando a última taça se
esvazia, a retribuição de Deus está completa (16.19), como afirmado na
doxologia do juízo (16.5-7).

IV. Visão 3 (no deserto): A Destruição de


Babilônia e o Retorno de Cristo (17.1 a 21.8)
A. Transição: “Vem, eu te mostrarei a condenação
da famosa prostituta” (17.1,2)
A terceira taça completou o derramamento total da ira de Deus, de modo
que a terceira visão compreende uma visão ampliada e mais detalhada sobre
o julgamento e condenação finais da cidade prostituta de Babilônia. Assim,
a terceira visão representa uma perspectiva diferente dos eventos finais
descritos brevemente durante as trombetas e taças. João, metaforicamente,
apresentou Roma como uma prostituta seduzindo reis e nações a cometerem
fornicação com ela, e ele contrastou o destino da cidade prostituta de
Babilônia com a cidade noiva da nova Jerusalém.
A terceira visão exibe cinco movimentos distintos: (1) Babilônia é
introduzida (17.3-18); (2) Babilônia é julgada como o julgamento

1725
escatológico das nações (18.1 a 19.10); (3) o retorno de Cristo como um
guerreiro divino (19.11-21); e (4) a primeira e segunda ressurreições como
o juízo escatológico de indivíduos (20.1-15). Após o juízo final, (5) os fiéis
são introduzidos a sua recompensa eterna (21.1-8).

B. A cidade prostituta de Babilônia descrita (17.3-6)


João, mais uma vez, foi levado “no Espírito” para um deserto, onde viu uma
grande prostituta montada sobre uma besta de sete cabeças, e estava
embriagada com o sangue de cristãos (17.3-6).

C. A cidade prostituta de Babilônia como Roma


(17.7-18)
A mulher personifica a cidade de Roma, com seu poderio militar, opulência
e sedução, e em um sentido mais amplo o sistema mundial representado por
todas as grandes civilizações da terra. Ao descrevê-la montada na besta,
João demonstrou sua dependência de e relacionamento com o reino de
Satanás. Ressaltou, também, seu poder político, sua extravagância
econômica e devoção religiosa. Ela seduziu os habitantes da terra a
abandonarem a verdade, retidão e justiça, e a participarem em seus
flagrantes adultérios, consistindo de idolatria, cobiça e assassinato. Por tudo
isso ela merece juízo.

D. O julgamento e condenação de Babilônia (18.1-


24)

1726
Depois de identificar a Babilônia com Roma, o curso do juízo de Babilônia
prometido pelo anjo em 17.1 agora entra em foco nítido. Uma característica
saliente de toda esta cena é que João saturou esta seção com material
retirado dos oráculos proféticos do AT relacionados com o juízo da
Babilônia histórica. Esse entrelaçamento de alusões cria o efeito de que o
juízo de Babilônia representa o ápice do juízo de Deus contra todas as
nações pagãs por meio da devastação militar, política e econômica. O
veredicto contra Babilônia é pronunciado por um anjo com grande
autoridade (18.1-3). O anjo expressa o veredicto em termos que transmitem
a certeza da destruição de Babilônia, embora o juízo seja ainda um
acontecimento futuro do ponto de vista de João.
Deus considera Babilônia responsável por se entregar a pecados
relacionados ao vinho, à riqueza e poder político, levando as nações a se
desviar do verdadeiro Deus e da obediência aos seus justos decretos. Após o
veredicto ser anunciado, uma outra voz do céu começa com a condenação
de Babilônia, que se caracteriza por uma série de imperativos que Deus
decretou para a Babilônia com base em seus pecados e crimes (18.6,7).
Deus faz justiça ao passar julgamento justificado pelo crime cometido.
Enquanto os anjos anunciam o juízo celestial e suas causas, os reis,
mercadores e marinheiros expressam uma resposta terrena. Embora
Babilônia parecesse tão forte, rica e poderosa, Deus facilmente provocou
sua queda com seu veredicto judicial. A condenação de Babilônia termina
com um ato simbólico representando sua completa destruição, juntamente
com uma reafirmação final de sua acusação (18.21-24).

E. Celebração celestial da destruição de Babilônia


(19.1-10)

1727
Agora que Deus declarou seu veredicto, os fiéis devidamente o reconhecem
com o louvor apropriado por sua justiça vingadora (19.1-10; veja 6.10; Dt
32.43).

F. O guerreiro divino e o tribunal final (19.11 a


20.15)
Em 19.11-21, Jesus retorna à terra para julgar a sentença contra Babilônia.
Ele retorna como o legítimo rei e guerreiro divino neste ápice cristológico
do livro. Acompanhado por seu exército de fiéis redimidos a quem ele
constituiu seu reino (veja 1.6), ele vem como o divino rei guerreiro para
fazer justiça por meio de julgamento e salvação como tornado explícito pelo
cavalo branco, múltiplos diademas, um cetro de ferro, seus olhos
flamejantes, e a espada saindo da sua boca. Uma das mais vívidas imagens
retratando Jesus como o guerreiro divino é seu manto encharcado de sangue
(19.13) por pisar o lagar de vinho do furor da ira de Deus (19.15).
Jesus é, portanto, a revelação plena do guerreiro divino do AT que
executa o juízo contra todos os inimigos de Deus e de seu povo. A grande
batalha final constitui um massacre que termina tão logo ele começa (19.17-
21). Apesar da jactância da besta e do falso profeta, eles são rapidamente
capturados e imediatamente atirados no lago de fogo (19.20). O restante dos
combatentes morre instantaneamente pela palavra falada de Cristo (19.21).
Cristo efetivamente conquistou todos os outros reinos da terra e os incluiu
em seu reino agora estabelecido na terra.
A destruição de Babilônia fazia parte do julgamento das nações
coletivamente como uma entidade política, mas Deus também julgará todas
as pessoas individualmente. Tendo demonstrado o seu reino por uma vitória

1728
militar (19.20,21), ele ordena que o dragão seja amarrado e preso durante o
período de mil anos (20.1-3). Toda a cena em 20.4-6 corresponde a Daniel
7.9,10, onde o Ancião de Dias dirige o tribunal e livros são abertos para
julgamento, e Daniel 7.22-27, onde ele passa um veredicto favorável para
os fiéis, ao dar a eles o reino. O veredicto judicial concedido aos fiéis inclui
o direito de reinar com Cristo, que inclui autoridade judicial sobre a terra
durante este período de mil anos. No final desse período, Satanás instigará
uma última batalha final e fútil, onde a humanidade não redimida
protagoniza um fracassado golpe contra o Senhor.
A segunda ressurreição (20.11-15) refere-se ao julgamento individual de
toda a humanidade. Constitui o ato judicial final de Deus antes da completa
renovação da ordem criada (i. e., a escatológica “era por vir”). Quando o
juiz entra na sala de audiências, todos os mortos devem se levantar para
prestar contas de seus atos. Livros são abertos como a principal evidência
consultada durante o processo investigativo de cada ser humano
individualmente até os dias de Adão. Esses livros são os registros escritos
da conduta de cada pessoa.

G. A renovação da criação e a chegada da nova


Jerusalém (21.1-8)
Cada indivíduo é julgado de acordo com suas obras. Entre essas obras estão
as atitudes do coração tais como a covardia, a descrença, a corrupção moral,
bem como as ações externas tais como assassinato, imoralidade sexual,
feitiçaria ou bruxaria, idolatria e mentira (21.8). Ninguém escapará das
consequências de sua culpa, e os perdidos posteriormente compartilharão
do mesmo destino que o dragão (Satanás), a besta e o falso profeta no lago

1729
de fogo (20.14). A única esperança de salvação é se o nome de uma pessoa
estiver escrito no livro da vida do Cordeiro (20.14).

V. Visão 4 (sobre uma montanha): A Recompensa


dos Fiéis e a Renovação da Criação (21.9 a 22.4)
A. Transição: “Vem, eu te mostrarei a noiva”
(21.9,10)
A visão final tem início em 21.9,10 quando um outro anjo, segurando uma
das sete taças convida João para ver a noiva do Cordeiro, e ele é levado “no
Espírito” a um alto monte. Ela constitui uma apresentação expandida da
nova Jerusalém apresentada em 21.1-8. Essa visão funciona como a antítese
da cidade prostituta de Babilônia, e apresenta a igreja glorificada como a
cidade noiva da nova Jerusalém. O propósito é contrastar o destino de
Babilônia com a glória da nova Jerusalém na qual os fiéis recebem sua
vindicação final e eterna recompensa. Essa visão se divide em duas partes
que descrevem a Cidade Santa como um eterno Santo dos Santos (21.9-27)
e, em seguida, como um novo Éden (22.1-5).252

B. A descrição da nova Jerusalém descendo do céu


(21.11-27)
A cidade noiva desce do céu, resplandecendo com a glória de Deus
embelezada com pedras preciosas. Ela tem doze portas chamadas pelos
nomes dos doze patriarcas, e doze fundamentos chamados pelos nomes dos
doze apóstolos (21.12-14). As medições indicam que é ela um cubo perfeito

1730
de proporções imensas. Assim, a nova Jerusalém lembra o Santo dos
Santos, onde Deus habita com seu povo em esplendor e pureza absolutos.

C. O paraíso de Deus: a renovação da criação


(22.1-5)
Além disso, “o rio da água da vida” flui do trono do Cordeiro e rega “a
árvore da vida” ao longo das ruas da nova Jerusalém. No paraíso eterno e
parecido com o Éden, Deus e a humanidade habitam juntos em perfeita
harmonia, pois ali jamais haverá maldição.

VI. Epílogo (22.6-21)


O anjo intérprete afirma a veracidade das palavras da profecia porque foi
autorizada por Deus. João continuou com uma série de testemunhos
apresentados como prova forense para as igrejas. Primeiro, João testifica
que ele apresentou um relato de testemunha ocular do que viu e ouviu
(22.8-11). Segundo, Jesus testifica que ele virá em breve para recompensar
os justos e punir os ímpios (22.12-16). O terceiro testemunho vem do
Espírito e da noiva (22.17), o que provavelmente se refere ao Espírito Santo
através da igreja como um testemunho profético (veja 19.10). João
solenemente advertiu contra qualquer adulteração de sua visão invocando as
consequências legais da alteração de um documento de aliança (22.18,19;
cf. Dt 4.2). João concluiu com um testemunho final de Jesus, que afirma
que ele estará vindo em breve (22.20). Esses quatro testemunhos constituem
o modo mais forte possível de validar a veracidade de sua visão usando
categorias legais.

1731
TEOLOGIA
Temas Teológicos
A soberania de Deus
A proeminente representação de Deus como o Criador do universo
sentando-se entronizado no céu e reinando sobre todas os povos, seres,
eventos e cosmos faz de sua soberania um tema central do livro de
Apocalipse. A soberania de Deus sobre a criação, eventos e história é
retratada de três maneiras distintas ao longo do livro: (1) designações de
nomes divinos, títulos e atribuições; (2) descrições da sala do trono celestial
e do trono de Deus; e (3) exibição das ações de Deus por de decretos e
juízos. A ênfase na soberania de Deus, uma característica comum dos
escritos proféticos e apocalípticos, funciona como lembrete aos leitores de
que Deus está no controle de todas as suas circunstâncias e que eles podem
com certeza confiar nele.
Desde o início, Deus é claramente identificado como o supremo
governante do Universo (1.8). Esse versículo contém três das quatro
designações mais importantes para Deus em Apocalipse: “o Alfa e o
Ômega”; “aquele que é, que era, e que há de vir”; e “o Todo-Poderoso”.253
“Alfa e Ômega” deriva da primeira letra (alfa) e da última letra (ômega) do
alfabeto grego e é equivalente a “eu sou o A a Z”, em português. O título
indica que Deus é a origem e o fim de toda a história porque ele antecede
toda a criação e trará todas as coisas a sua plenitude escatológica (veja Is
44.6).254 Ele é usado no lugar de Deus, o Pai (1.8; 21.6) e de Jesus (22.13;
veja 1.17), sugerindo que eles compartilham a administração soberana sobre
os assuntos da história humana.

1732
Deus como “aquele que é, que era, e que há de vir” (1.4,8; 4.8; 11.17;
16.5) constitui uma expansão interpretada do nome divino YHWH (veja Êx
3.14), e enfatiza sua presença eterna em relação com o mundo.255 Deus é
agora, sempre foi e virá no futuro, quando dramaticamente provocará a
consumação dos séculos (11.17; 16.5). A terceira designação para Deus
como “o Todo-Poderoso” (1.8; 4.8; 11.17; 15.3; 16.7,14; 19.6,15; 21.22) o
associa com o “Senhor dos Exércitos” no AT, enfatizando seu poder
onipotente e inigualável autoridade.256 A quarta designação afirmando a
soberania de Deus é que ele é retratado como “Aquele assentado no trono”
(4.9; 5.1,7,13; 6.16; 7.15; 21.5).257
A imagem de Deus sentado em seu trono nos capítulos 4 e 5 introduz a
segunda maneira como a soberania de Deus é descrita em todas a visões de
João.258 Em 4.1,2, a cena é radicalmente transformada da ilha árida e
rochosa de Patmos na sala do trono celestial. João descreve Deus como
infinitamente majestoso e gloriosamente entronizado e rodeado por seus
cortesãos. A primeira coisa que João viu na sua entrada pela porta aberta foi
um trono centralmente localizado no céu (4.2). O trono de Deus ocupa a
posição central de uma série de círculos concêntricos, mostrando sua
soberania sobre o cosmos.
Para descrever suas visões, João se baseou em outras visões proféticas
familiares envolvendo teofanias do trono de Deus (p. ex., Ez 1.5,10,18,22).
Ele comentou brevemente sobre como aquele que estava assentado no trono
tinha a aparência semelhante a pedras preciosas como jaspe e cornalina, e
que ao redor do trono havia um arco-íris semelhante a uma esmeralda.259
Uma vez que João estabeleceu o fato de que Deus todo-poderoso se
assentado seguramente entronizado no céu, o trono passa para o pano de
fundo por todo o restante da visão (6.16; 7.9-17; 8.3; 11.16; 14.3; 16.17;

1733
19.4,5) até que desce do céu quando ele vem em julgamento para
estabelecer sua morada na terra (20.11,12; 21.3-5).260
A soberania de Deus sobre a criação, eventos e história também é
exibida por meio de seus decretos e atos de juízo. Deus como o Criador é
aquele que decreta o curso e o tempo certo de todos os eventos, enquanto
governa do seu trono no céu. Sua atividade é mais visível nas seis cenas que
giram em torno da sala do trono celestial seguidas por subsequentes juízos
sobre a terra. Os juízos mostrados na terra pelos selos, trombetas e taças
representam um resultado direto dos procedimentos no tribunal divino.
Deus é aquele que julga a humanidade (11.18; 18.8; 19.11; 20.12,13), e
seu juízo é rápido, severo e justo (14.7; 16.7; 18.10; 19.2). A atividade de
Deus às vezes é passiva (como indicado pelo uso frequente do verbo
passivo divino edothē, “foi dado”).261 Ele comissiona alguns agentes com o
propósito de executar os juízos (por exemplo, os quatro cavaleiros e anjos)
e permite que forças do mal realizem certos atos (por exemplo, a besta). O
fato de que Deus está no controle de todas as coisas, incluindo os ais de
ambos, crentes e descrentes, reforça poderosamente o propósito de
Apocalipse: encorajar os crentes em sua fé no meio do sofrimento.262

A Segunda Vinda de Cristo


O livro de Apocalipse culmina na sua descrição da Segunda Vinda de
Cristo, mostrando que Jesus Cristo, o vitorioso cordeiro de Deus e o leão de
Judá, retornará à terra como o juiz escatológico de toda a humanidade e
como o Rei Davídico. Na verdade, Jesus Cristo é o principal sujeito da
revelação de João (1.1), e seu retorno à terra como o rei messiânico
vitorioso é o objeto (1.7). Apocalipse 1.7 representa um conflação de

1734
Daniel 7.13 e Zacarias 12.10 e fornece a tese para todo o livro. A conflação
dessas duas passagens do AT reflete a expectativa escatológica de que
Cristo retornará trazendo ambos, salvação e juízo.263
João identificou Jesus como o glorioso Filho do Homem, que recebe
autoridade judicial sobre todas as nações, bem como o Filho trespassado,
cuja aparência aterrorizará os inimigos de Deus. A posição exaltada de
Cristo e seu papel como juiz escatológico é baseada nos títulos
explicitamente aplicados a ele. Por exemplo, o título “o Primeiro e o
Último” designa Cristo como o início e o final da história (1.17). Ela faz um
paralelo estreito com o título “o Alfa e o Ômega” aplicado a Deus, o Pai
(1.8; 21.6).
O título “Primeiro e Último”, quando aplicado a Cristo, ressoa com
significado teológico porque é extraído de Isaías 44.6 e 48.12, onde Yahweh
é identificado como o Criador e Redentor. Sua aplicação a Cristo nesta
passagem sugere uma cristologia muito elevada. Além disso, o livro de
Apocalipse profeticamente retrata o Cristo glorificado e exaltado como o
juiz e rei escatológicos por meio de três cristofanias (1.12-18; 5.1-14;
19.11-21).
A cristofania de Apocalipse 1 apresenta Jesus como a fiel testemunha; o
protomártir; o primogênito dentre os mortos, que é proeminente em sua
igreja; e o soberano dos reis da terra, assim cumprindo as expectativas
messiânicas judaicas (veja 1.5). A subsequente descrição visionária que
João faz do Filho do Homem em 1.12-18 destaca certas características de
sua aparência, emprestando imagens de uma variedade de textos do AT, que
enfatizam seu papel como juiz.264
A cristofania do capítulo 5 apresenta Jesus como o leão (5.5; veja Gn
49.9) tornado cordeiro (veja 1.5-7; 12.11; 13.8 etc.), uma imagem que

1735
combina o simbolismo pascal com a noção do cordeiro guerreiro
proeminente na literatura apocalíptica.265 O propósito dessa cena é descrever
a instalação de Cristo como o Rei Davídico e juiz escatológico que é o
único digno de desencadear os juízos de Deus sobre a humanidade. Esta
cena representa a inauguração do reino eterno de Jesus à direita de Deus,
também conhecido como sua entronização.266
Além da cristofania de Apocalipse 1 e da imagem do leão tornado
cordeiro, talvez a descrição mais poderosa de Cristo em Apocalipse seja a
do cavaleiro em um cavalo branco, aquele que é chamado de “fiel” e
“verdadeiro” (cap. 19). No ápice cristológico do livro, Jesus retorna como o
rei legítimo e guerreiro divino.267 A imagem de andar em um cavalo branco
era o símbolo romano comum do imperador que triunfava sobre seus
inimigos.268 Os diademas em sua cabeça demonstram que sua soberania
cósmica supera todas as outras pretensiosas reivindicações terrenas a um
269
trono (veja 12.3; 13.1).
Cristo vem acompanhado de um exército de fiéis remidos a quem ele
constituiu como seu reino (veja 1.6).270 O fato de que ele governará sobre
seu domínio com um cetro de ferro indica que ele é o verdadeiro rei
messiânico (veja Sl 2.9; Is 11.4). O nome gravado na sua coxa atesta que
ele é o supremo Rei e Senhor sobre tudo (19.16; veja 1.5; 17.14). Cristo
vem para travar uma guerra justa contra o reino da besta para vingar a
guerra injusta que ela travou contra os fiéis (13.7). Duas imagens da visão
inaugural de Cristo reaparecem para denotar o caráter judicial da percepção
(olhos como chama) e pronunciamentos (espada saindo da boca; veja
4Esdras 13.9-13).
Jesus também é retratado como o guerreiro divino, cujo manto está
encharcado de sangue por pisar o lagar do vinho do furor da ira de Deus.271

1736
O sangue no manto de Jesus é o de suas vítimas (veja Is 63.2-6). A grande e
final batalha constitui um massacre que termina tão logo começa (19.17-
21). A besta e os reis da terra reúnem suas forças em uma tentativa delirante
de atacar o Rei que vem (veja 16.13-16).272 Apesar da jactância da besta e
do falso profeta, eles são rapidamente capturados e lançados no lago de
fogo (19.20); o restante morre instantaneamente pela palavra pronunciada
por Cristo (19.21). Cristo, assim, efetivamente conquistou todos os reinos
da terra e os submeteu a seu próprio domínio.

Teodiceia
Teodiceia se refere à justificação de Deus com respeito ao “aparente triunfo
do ímpio e o sofrimento do inocente”.273 O desenrolar das visões, portanto,
ilustra a realidade apocalíptica de que, embora os justos realmente sofram
injustamente nas mãos do ímpio, eles terão seu dia no tribunal quando o
veredicto de Deus resultar em uma grande inversão da presente ordem
mundial.
A teodiceia representa um tema importante em Apocalipse que
transmite a justiça e a misericórdia de Deus.274 O pedido dos mártires
aborda diretamente a questão da justiça: “Ó Soberano, santo e verdadeiro,
até quando aguardarás para vingar nosso sangue dos que habitam sobre a
terra?” (6.10). Esse pedido por vindicação ecoa os sentimentos de gerações
de servos de Deus que sofreram injustamente, enquanto parecia que os
ímpios permaneciam impunes.
O AT apresenta o mesmo pedido a respeito de quando Deus tomará
medidas judiciais castigando a crueldade contra seu povo (p. ex., Sl 79.5-
10; 94.1-3).275 A preocupação não é com a existência do mal no mundo ou

1737
com o sofrimento dos cristãos em geral, mas especificamente por que eles
estão sofrendo em consequência de sua fidelidade a Cristo e sua obediência
às justas exigências da lei de Deus. As visões de João procuram responder a
essa pergunta, demonstrando que Deus fará a verdadeira justiça em um
mundo repleto de mal e injustiça.
O julgamento e condenação de Babilônia ilustram como a preocupação
com a justiça cruza com a resposta de Deus ao apelo dos mártires por
vindicação. Em 18.6,7a, Deus decretou julgar Babilônia com base em seus
pecados e crimes.276 Alguns agentes não especificados da vingança de Deus
(talvez crentes glorificados) farão valer o princípio do “olho por olho, dente
por dente” (lex talionis) e a retribuição divina.277 A justiça da sentença é
demonstrada no fato de que cada ordem se origina como um resultado
direto da ação de Babilônia.278 Babilônia condenou injustamente os fiéis à
morte, e agora Deus, de forma justa, da mesma forma a condena.279

Testemunho
O conceito de “testemunho” tem implicações práticas significativas para a
igreja (p. ex., 1.2,5,9). Com base no uso da igreja antiga juntamente com a
estreita associação entre testemunho e execução em Apocalipse, alguns
estudiosos argumentaram que há uma conotação martirológica intencional
em Apocalipse.280 No entanto, muitos comentaristas rejeitam o uso de
martus no sentido técnico de um mártir.281 Como a execução é sempre
posterior ao testemunho como uma sanção, deve-se separar a morte do
testemunho efetivo da testemunha (1.9; 2.13; 6.9; 11.7; 12.11; 20.4). Assim,
a terminologia de testemunho do livro é melhor entendida como
declarações forêncicas sobre o que é verdadeiro.

1738
O livro começa e termina com a afirmação de que tudo o que foi
registrado constitui um testemunho (1.2; 22.16,18,20). Jesus, por duas
vezes, é chamado de “testemunha fiel” (1.5; 3.14); a terminologia de
testemunho também é aplicada a Antipas, que foi executado por causa de
sua fé em Cristo (2.13). O termo martyria (“testemunho”) frequentemente
ocorre denotando o conteúdo do testemunho que foi mantido.282 Muitos dos
casos de “testemunho” são seguidos por perseguição (1.9; 6.9; 11.7; 12.11;
20.4). A terminologia de testemunho ocorre regularmente ao longo do livro,
demonstrando que este é um tema importante, especialmente no que se
refere às igrejas.
Os cristãos deveriam esperar perseguições e dificuldades como
consequência de viverem por Cristo. A razão de os crentes serem rejeitados
é porque eles são cidadãos do Reino de Deus (1.6; 5.10). O Apocalipse
prevê a consumação escatológica do reino de Cristo (11.15; 12.10), que é
colocado em justaposição com o reino satânico deste mundo (16.10;
17.12,17,18). Como membros do reino de Cristo, os fiéis são exortados a
suportar o sofrimento injusto porque sua vindicação acontecerá quando o
reino de Cristo for visivelmente estabelecido na terra. Assim, a
perseverança constitui a principal virtude para os fiéis em tempos de
dificuldade e opressão (1.9; 2.2,3,19; 3.10; 13.10; 14.12,13).
O testemunho de fiel perseverança em face do sofrimento injusto
também transmite uma preocupação evangelística, e o testemunho dos fiéis
é o pré-requisito para a conversão das nações.283 Nesse clímax da profecia,
sofrimento e martírio são colocados em uma perspectiva eterna, com Jesus
servindo como a principal testemunha e protomártir (1.5; 3.14; veja 11.3;
14.6; 17.6; 19.11; 22.16,20). Assim, a terminologia de “testemunho”
envolve não uma mera indiferença quanto ao destino do mundo, mas a

1739
proclamação de uma mensagem divina (veja 14.6). As exortações ao
arrependimento a cinco das sete igrejas, ou a seus membros, indicam
claramente que o vidente ainda deixa margem para conversão (2.5,16,21,22;
3.3,19).284

A adoração ao único e verdadeiro Deus versus


idolatria
O livro de Apocalipse se preocupa muito com a diferença entre a verdadeira
e a falsa adoração.285 Pode-se inequivocamente afirmar que, com exceção de
Hebreus, Apocalipse é o livro mais litúrgico do NT.286 Ao lidar com outras
religiões, esse livro é extremamente relevante quanto à natureza e o objeto
próprio da adoração, bem como quanto ao significado do martírio e da
esperança futura do crente. Segundo o autor de Apocalipse, em última
instância, o próprio Satanás está por trás das forças que conspiram contra os
cristãos. A adoração reside no centro da batalha entre os crentes e Satanás, à
medida que ela é travada na arena do culto imperial versus fidelidade a
Cristo.
Referências ao culto imperial ocorrem com frequência na segunda
metade da segunda visão (13.4,15,16; 14.9-11; 15.2; 16.2; veja 20.4). João
vislumbrou uma época em que o culto imperial alcançaria uma proporção
tamanha que seria obrigatória a participação de todos os habitantes da
terra.287 Embora não idêntico em todos os aspectos, haverá uma época
futura de perseguição que envolverá a inconveniente adoração de um
governante político terreno de uma forma lembrará o culto imperial da
antiga Roma. O termo proskyneō (“adorar”) é usado em conexão direta com
a besta (13.4,8, 12,15). Também era um termo comumente empregado no

1740
288
culto imperial. Os cristãos que se recusam a prostrar-se em adoração à
besta incorrem em sua ira e são sumariamente executados (13.15); eles
também são exortados a permanecerem fiéis a Cristo, mesmo que isso
resulte em morte (2.10,13; 13.10; 14.12; 17.14). Deus os vindicará ao julgar
todos aqueles que adoraram a besta (14.9,11; 16.2).

Algo Para Pensar: Cada um Colhe Aquilo que


Planta

Muitos de nós podem se identificar com a experiência do salmista


que escreveu: “Quanto a mim, meus pés quase tropeçaram; faltou
pouco para que eu escorregasse. Pois eu tinha inveja dos arrogantes,
ao ver a prosperidade dos ímpios” (Sl 73.2,3). Na verdade, quando
olhamos para este mundo, professores diligentes recebem apenas um
salário base — embora eles tentem se contentar e fazer face às
despesas da melhor maneira que podem — enquanto atletas famosos
(e até mesmo aqueles pouco conhecidos) recebem milhões e milhões.
Quem pode culpar o salmista por ser tentado a invejar os arrogantes
quando ele viu sua prosperidade? Será mesmo que Deus se importa?
Como ele pode recompensar o arrogante e ignorar o sofrimento dos
que o temem?
O problema com essa análise, é claro, é que ela é prematura.
Somente tolos chegam a uma conclusão definitiva sobre uma questão
sem esperar pelo seu resultado final. É aí que entra o livro de
Apocalipse. No alcance da revelação bíblica, esse livro nos diz como
será o resultado final da perspectiva de Deus. Muitos intérpretes da

1741
Bíblia acreditam que o Apocalipse contém quatro visões (indicadas
pela expressão “no Espírito” em 1.10; 4.2; 17.3 e 21.10): (1) o
Cristo ressuscitado e sua mensagem às sete igrejas (caps. 1 a 3); (2)
a visão da sala do trono (caps. 4 a 16); (3) a prostituta Babilônia
(caps. 17 a 20); e (4) a nova Jerusalém (caps. 21 a 22). Não é por
acaso que, dessas quatro visões, a segunda, que tem a ver com o
juízo sobre o mundo, é de longe a mais extensa, pois o fim é o tempo
do juízo de Deus quando todas as pessoas receberão o que lhes é
devido.
Em detalhes vívidos, Apocalipse descreve a vindicação dos justos
propósitos de Deus (chamada “teodiceia”, de theos, “Deus”, e
dikaios, “justo”) e dos fiéis, especialmente aqueles martirizados por
sua fé. Esse será também o tempo em que os arrogantes e os ímpios,
aqueles sem Cristo, serão julgados, assim como Satanás e seus anjos
caídos. Por essa razão, como o anjo da última visão disse ao
vidente: “Quem é injusto, continue na injustiça; quem é impuro,
continue na impureza; quem é justo, continue praticando a justiça; e
quem é santo, continue se santificando” (22.11), pois no final, todos
certamente receberão sua justa recompensa. Por essa razão, não
vamos julgar uma questão antes de seu fim, e vamos confiar no Deus
que um dia endireitará todas as coisas: “A vingança é minha; eu
retribuirei, diz o Senhor” (Rm 12.19, citando Dt 32.35).

O livro de Apocalipse fortemente promove a abstinência de todas as


formas de idolatria, porque Deus é o único digno de adoração (4.11;
5.2,4,9,12). A exclusiva adoração a Deus constitui os imperativos
teológicos mais importantes para os cristãos, assim como para toda a

1742
humanidade (9.20; 14.7; 15.4; 19.10; 22.9). Apocalipse 19.10 é paralelo de
22.8,9, onde o anjo que se recusou a ser adorado se identificou como um
“conservo” de João e de “teus irmãos, os profetas, e dos que guardam as
palavras deste livro. Adora a Deus!”.289 No fim, o dragão e todos os seus
seguidores enfrentarão a justa ira de Deus por causa de seu pecado, por
maltratarem o povo de Deus, e por não adorar a Deus (18.19-24; 19.1-3;
22.9).
As duas visões finais servem para contrastar o destino daqueles que
adoram a besta com a glória que aguarda os seguidores do Cordeiro.290 O
compromisso cristão não é um mero sistema de crenças a ser defendido,
mas uma aliança que deve ser mantida em face das constantes
oportunidades para acomodação. Esta é realmente uma mensagem oportuna
no Ocidente pós-cristão, no início do terceiro milênio, onde (segundo as
palavras proféticas de Francis Schaeffer) reinam a paz pessoal e a riqueza,
mesmo nos segmentos da subcultura evangélica.

CONTRIBUIÇÃO PARA O CÂNON


A adoração de Deus e de Jesus Cristo (p. ex., cap. 4)
A revelação do futuro pelo Cordeiro que foi morto, o Leão de Judá
(5.1-7)
A necessidade de uma inflexível fidelidade a Cristo por meio de
paciente perseverança (p. ex., 14.12)
A vindicação da justiça de Deus (teodiceia) e dos fiéis sofredores pela
perseguição do mundo incrédulo (caps. 6 a 18)
O retorno glorioso de Jesus como o supremo Rei e Senhor (19.11-16)

1743
O reino milenar de Cristo, a derrota de Satanás e o julgamento do
Grande Trono Branco (cap. 20)
A restauração de todas as coisas no novo céu e na nova terra (caps. 21
e 22)

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. Quem são os três principais candidatos à autoria de Apocalipse?
Quem, mais provavelmente, o escreveu?
2. Quais são as duas principais alternativas para a época da composição
de Apocalipse?
3. Qual é a data favorecida pela evidência interna?
4. Qual é a data favorecida pela evidência externa?
5. Quais são algumas das principais evidências internas que têm uma
influência sobre a data da composição de Apocalipse?
6. Quais foram a ocasião e propósito do livro de Apocalipse?
7. Qual é a definição de “Apocalipse”, e quais são algumas das
peculiaridades que a acompanham?
8. Quantas visões são registradas em Apocalipse, e qual é a expressão
que indica uma nova visão?
9. Quais são os respectivos locais dessas visões, e qual é o intervalo de
capítulos para cada visão no livro de Apocalipse?
10. Quais são as três principais teorias da relação entre selos, trombetas e
taças em Apocalipse?
11. Quais são as quatro principais abordagens ao estudo do livro de
Apocalipse? Faça uma breve descrição de cada uma em uma ou duas
frases.

1744
12. Quais as contribuições de Apocalipse para o cânon?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


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1
Sobre a história da interpretação de Apocalipse, veja A. W. Wainwright, Mysterious

Apocalypse: interpreting the book of Revelation (Nashville: Abingdon, 1993). Para um comentário de

uma perspectiva da “história da recepção”, veja J. Kovacs; C. Rowland, Revelation: the Apocalypse

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2
Entre os comentários importantes, estão D. E. Aune, Revelation, WBC 52 (Nashville: Thomas

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sob o título Apocalipse: comentário exegetico]; e S. S. Smalley, The Revelation to John (Downers

Grove: InterVarsity, 2005).

3
Veja D. A. deSilva, An introduction to the New Testament (Downers Grove: InterVarsity, 2004),

p. 894; R. H. Charles, The Revelation of St. John, ICC (New York: Scribner’s, 1920), 1. p. xxxix; S.

S. Smalley, Thunder and love: John’s revelation and John’s community (Milton Keynes: Word,

1994), p. 39-40.

1748
4
Ireneu, Contra as heresias 4.20.11; Tertuliano, Contra Marcião 3.14.3; 3.24.4; Clemente de

Alexandria, Paed. 2.119; Quis dives salvetur 42; Stromateis 6.106; Hipólito, Anticristo 36; Orígenes,

Comentário sobre o Evangelho de João 2.4.

5
Eusébio, Hist. Ecl. 3.39.3-7. Aparentemente, Papias fez uma distinção entre João, o apóstolo, e

João, o presbítero, (veja cap. 7). Com referência às duas sepulturas de João em Éfeso, Eusébio

conjecturou que Papias atribuiu o Evangelho ao apóstolo e o Apocalipse ao presbítero.

6
Charles, Revelation of St. John, 1. p. xxxviii.

7
Eusébio, Hist. Ecl. 7.25.15. Isto foi sugerido, mas rapidamente rejeitado, por Dionísio de

Alexandria (m. 265) como uma possível alternativa, já que o nome completo de Marcos também

tinha João.

8
J. M. Ford, Revelation, AB 38 (New York: Doubleday, 1975), p. 28-46.

9
F. Bovon, “John’s self-presentation in Revelation 1:9-10”, CBQ 62 (2000), p. 695.

10
Beale, Book of Revelation, p. 1127-8.

11
Por exemplo, “eu, Daniel” (Dn 7.15; 8.15,27; 9.2; 10.2,7; 12.5); “eu, Baruque” (2Br 8.3; 9.1;

10.5; 11.1; 13.1; 32.8; 44.1); “eu, Enoque” (1En 12.3); “eu, Esdras” (4Ed 2.33). Veja também H. B.

Swete, Commentary on Revelation (Grand Rapids: Kregel, 1977; reimpr. da 3. ed. de The Apocalypse

of St. John [1911]), p. 11; Aune, Revelation 1—5, p. 75.

12
Veja M. E. Boring, “The Apocalypse as Christian prophecy: a discussion of the issues raised

by the book of Revelation for the study of early Christian prophecy”, SBL Seminar Papers 2 (1974),

p. 26-7.

13
Veja F. D. Mazzaferri, The genre of the book of Revelation from a source-critical perspective,

BZNW 54 (Berlin: W. de Gruyter, 1989), p. 259-378. Sobre as narrativas de chamado profético no

AT, veja ibid., p. 88-102. Cf. G. von Rad, Old Testament theology, tradução para o inglês de D. M. G.

1749
Stalker (New York: Harper, 1965), 2.50-69; N. Habel, “The form and significance of the call

narratives”, ZAW 77 (1965), p. 297-323; e D. E. Aune, Prophecy in early christianity and the ancient

mediterranean world (Grand Rapids: Eerdmans, 1983), p. 97-103.

14
Esse ponto de vista é defendido pela maioria dos estudiosos: Charles, Revelation of St. John,

1.xliv; Aune, Revelation 1 to 5, l; G. R. Beasley-Murray, Revelation, NCBC (London: Oliphants,

1974), p. 35-7; Swete, Revelation, p. 39; Smalley, Thunder and love, p. 39; Boxall, Revelation, p. 7;

A. Y. Collins, Crisis and Catharsis: the power of the Apocalypse (Philadelphia: Westminster, 1984),

p. 50; W. G. Kümmel, Introduction to the New Testament, ed. rev., tradução para o inglês de H. C.

Kee (Nashville: Abingdon, 1975), p. 472. Cf. R. K. MacKenzie (The author of the Apocalypse: a

review of the prevailing hypothesis of jewish-christian authorship, MBPS 51 [Lewiston: Mellen,

1997], p. 3), que postulou que João era um cristão gentio da Ásia Menor.

15
Charles, Revelation of St. John, 1.xliv; H. B. Swete, The Apocalypse of St. John (London:

Macmillan, 1911), p. cxxv.

16
A maioria desses (se não todos) solecismos são intencionais, tais como apo (“da parte de”, 1.4)

seguida pelo nominativo em vez do genitivo, apontando para a autoidentificação de Deus como “eu

sou” em Êxodo 3.14. Sobre a sintaxe semita de Apocalipse, veja Swete, Apocalypse of St. John, p.

cxxv; G. Mussies, The morphology of koine greek as used in the Apocalypse of St. John: a study in

bilingualism, NovTSup 27 (Leiden: Brill, 1971), p. 352-3; S. Thompson, The Apocalypse and semitic

syntax, SNTSMS 52 (Cambridge: University Press, 1985); S. E. Porter, “The language of the

Apocalypse in recent discussion”, NTS 35 (1989), p. 582-603; Beale, Book of Revelation, p. 100-107.

17
Veja Aune (Revelation 1 to 5, p. l): “Não há exemplos conhecidos de apocalipses judaicos

originados nas Diásporas ocidental ou oriental, nem o gênero sobreviveu por muito tempo no

cristianismo antigo desde que ele ultrapassou as fronteiras da Palestina”.

18
Ibid.

1750
19
A. Farrer, The Revelation of St. John the divine (Oxford: University Press, 1964), p. 37. O

nome “João” (Iōannēs) ocorre frequentemente em escritos judaicos, mas muito pouco em textos

gregos (1Ed 9.29; 1Mc 2.1,2; 8.17; 9.36,38; 16.1,9,19,21,23; 2Mc 4.11; 11.17; e 188 vezes em

Josefo). Veja também MacKenzie, The author of the Apocalypse, p. 8, nota 2.

20
deSilva, Introduction, p. 894.

21
Veja I. Boxall, Revelation: vision and insight (London: SPCK, 2002), p. 7. Cf. os argumentos

de D. Guthrie, New Testament introduction, ed. rev. (Downers Grove: InterVarsity, 1990), p. 936; e

D. A. Carson; D. J. Moo, An introduction to the New Testament, 2. ed. (Grand Rapids: Zondervan,

2005), p. 702 [publicado em português por Vida Nova sob o título Introdução ao Novo Testamento].

22
Charles, Revelation of St. John, 1.xliii-xliv; Aune, Revelation 1 to 5, p. li; deSilva,

Introduction, p. 894.

23
Veja Beale, Book of Revelation, p. 1070.

24
Veja Charles, Revelation of St. John, 1.c; Guthrie, Introduction, p. 933; G. Maier, Die

Johannesoffenbarung und die Kirche, WUNT 25 (Tübingen: Mohr Siebeck, 1981), p. 107; Carson;

Moo, Introduction to the New Testament, p. 701.

25
Ireneu, Contra heresias 4.20.11; Clemente de Alexandria, Paed. 2.119; Quis div. 42;

Stromateis 6.106; Hipólito, Anticristo 36; Orígenes, Comentário de João 2.4; Tertuliano, Contra

Marcião 3.14.3; 3.24.4.

26
Guthrie, Introduction, p. 935.

27
Em ambos os casos, a data desses documentos está em questão. Sobre o Apócrifo de João, veja

M. Waldstein; F. Wisse, The Apocryphon of John, NHMS 33 (Leiden: Brill, 1995), p. 1-8. Sobre o

Fragmento Muratoriano, veja A. C. Sundberg, “Canon Muratori: a fourth-century list”, HTR 66

(1973), p. 1-41; G. M. Hahneman, The muratorian fragment and the development of the canon,

1751
Oxford Theological Monographs (Oxford: Clarendon, 1992); e L. M. McDonald, The biblical canon:

its origin, transmission, and authority (Peabody: Hendrickson, 2007), p. 373-81.

28
Veja especialmente Maier (Johannesoffenbarung, p. 62-3), que concluiu que Papias conhecia

pessoalmente o apóstolo João, conhecido como “o presbítero” na Ásia Menor, e o considerava como

autor de Apocalipse. Veja a lista de estudiosos que argumentam que Papias conhecia o Apocalipse e

o atribuiu ao apóstolo (ibid., p. 62. nota 243).

29
Tertuliano, Marc. 4.5; veja Charles, Revelation of St. John, 1.c.

30
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 701.

31
Charles, Revelation of St. John, 1.c; cf. Ireneu, Contra heresias 3.2.9; Epifânio, Contra

heresias 51.3; Eusébio, Hist. Ecl. 3.28.1-2.

32
Para uma discussão do relacionamento entre o Evangelho de João e o Apocalipse, veja capítulo

7.

33
Aune, Revelation 1 to 5, p. lxix-lxx.

34
Collins, Crisis and Catharsis, p. 32 e 84-110; veja W. Schmithals, The apocalyptic movement,

trad. para o inglês de J. E. Steely (Nashville: Abingdon, 1975), p. 141-50.

35
Veja 16.7; 20.4. Veja J. P. Heil, “The fifth seal (Rev 6,9-11) as a key to the book of

Revelation”, Bib 74 (1993), p. 220-43.

36
G. B. Caird, A commentary on the Revelation of St. John the divine (New York: Harper & Row,

1966), p. 85.

37
Beale, Book of Revelation, p. 390.

38
Tácito, Ann. 15.44; Suetônio, Nero 16.2; Tertuliano, Apol. 5.3; Nat. 1.7.8; P. Keresztes, “Law

and arbitrariness in the persecution of the christians and Justin’s first apology”, VC 18 (1964), p. 204;

1752
J. W. P. Borleffs, “Institutum neronianum”, VC 6 (1952), p. 9-145.

39
Bell, “Date of John’s Apocalypse”, p. 93-7; Wilson, “Problem of the domitianic date”, p. 588-

96; Thompson, Book of Revelation, p. 116.

40
Alguns estudiosos também apontam para a referência a riqueza em Laodiceia como evidência

de uma data posterior, uma vez que a cidade foi destruída por um terremoto em c. 61, e reconstruída

sem ajuda financeira de Roma (Tácito, Ann. 14.27.1). Se a cidade tinha sido destruída, naturalmente

se esperaria uma data muito posterior para a composição da carta. Veja C. J. Hemer, The Letters to

the Seven Churches of Asia in Their Local Setting, JSNTSup 11 (Sheffield: JSOT, 1986), p. 193-6;

Mounce, Book of Revelation, p. 35; L. Morris, The Revelation of St. John, TNTC (Grand Rapids:

Eerdmans, 1969), p. 37.

41
Veja C. H. H. Scobie, “Local references in the letters to the seven churches”, NTS 39 (1993), p.

606-24.

42
L. Mowry, “Revelation 4 to 5 and early christian liturgical usage”, JBL 71 (1952), p. 80;

Mounce, Book of Revelation, p. 140; Beasley-Murray, Book of Revelation, p. 119; H. -J. Klauck,

“Das Sendschreiben nach Pergamon und der Kaiserkult in der Johannesoffenbarung”, Bib 73 (1992),

p. 172; Beale, Book of Revelation, p. 335; C. S. Keener, Revelation, NIVAC (Grand Rapids:

Zondervan, 2000), p. 176; J. Roloff , The Revelation of John: a continental commentary, tradução

para o inglês de J. E. Alsup (Minneapolis: Fortress, 1993), p. 72; Osborne, Revelation, p. 240; Aune,

Revelation 1 to 5, p. 310; id., “The influence of roman imperial court ceremony on the Apocalypse of

John”, BibRes 28 (1983), p. 20-2.

43
Aune, Revelation 1 to 5, p. 310.

44
A deificação do imperador foi chamada de rito de apoteose. Veja S. R. F. Price, Rituals and

power: the roman imperial cult in Asia Minor (Cambridge: University Press, 1984), p. 75.

1753
45
Filo, Leg. 353; P. Borgen, “Emperor worship and persecution in philo’s In Flaccum and De

Legatione ad Gaium and the Revelation of John”, in: H. Lichtenberger, orgs., Geschichte —

Tradition — Reflexion: Festschrift für Martin Hengel zum 70. Geburstag (Tübingen: Mohr Siebeck,

1996), vol. 3: Frühes Christentum, p. 498-503; J. S. McLaren, “Jews and the imperial cult: from

Augustus to Domitian”, JSNT 27 (2005), p. 266-9.

46
T. B. Slater, “On the social setting of the Revelation to John”, NTS 44 (1998), p. 236.

47
Suetônio, Dom. 13.2; Dio Cassio, Hist. 67.4.7; 67.13.4; veja Dio Crisóstomo, Def. 45.1;

Juvenal, Sat. 4.69-71. Veja também Parker, “‘Our Lord and God’ em Rev 4,11”, p. 209.

48
J. A. Seiss, The Apocalypse: lectures on the book of Revelation, ZCS (Grand Rapids:

Zondervan, 1979), p. 235-41; J. F. Walvoord, The Revelation of Jesus Christ: a commentary

(Chicago: Moody, 1966), p. 175-7.

49
Swete, Revelation, p. 132-3; Caird, Revelation of St. John, p. 131-2; Mounce, Book of

Revelation, p. 218-20; R. Bauckham, The climax of prophecy: studies on the book of Revelation

(Edinburgh: T&T Clark, 1993), p. 272; Beale, Book of Revelation, p. 557-71; Keener, Revelation, p.

287-9; M. Jauhiainen, “The measuring of the sanctuary reconsidered (Rev 11,1-2)”, Bib 83 (2002), p.

507, nota 2; Osborne, Revelation, p. 408-15.

50
K. H. Easley, Revelation, HNTC (Nashville: Holman Reference, 1998), p. 188-9.

51
Bauckham, Climax of prophecy, p. 412-3; Aune, Revelation 6 to 16, p. 738. Esta crença foi

nutrida e reforçada por pelo menos três pretendentes. O primeiro, no ano 69, um escravo oriundo do

Ponto ou um liberto da Itália, juntou um pequeno exército e navegou da Grécia, apenas para sofrer

um naufrágio em uma ilha onde logo foi executado (Tácito, Hist. 2.8; Dio Cássio, Hist. 63.9.3). O

segundo, Terêncio Maximus, no ano 80, apareceu na província da Ásia, onde reuniu alguns poucos

seguidores e marchou para as margens do rio Eufrates, onde ele por fim procurou refúgio com os

pártios (Dio Cássio, Hist. 66.19.3). O terceiro apareceu 20 anos depois da morte de Nero, no ano 88

1754
(Suetônio, Nero 57.2; veja Tácito, Hist. 2.8.1). Veja Bauckham, Climax of prophecy, p. 412-4; P. A.

Gallivan, “The false Neros: a reexamination”, Historia 22 (1973), p. 364-5; A. E. Pappano, “The

false Neros”, CJ 32 (1937), p. 385-92; e Aune, Revelation 6 to 16, p. 738-9.

52
Veja Or. Sib. 3.63-74, onde Nero é identificado como Beliar, o maior inimigo do povo de Deus;

Or. Sib. 4.119-24, 138-39, a mais antiga fonte contendo uma expectativa profética do retorno de Nero

da Pártia (muito provavelmente datada após o ano 70, devido a uma referência à erupção do monte

Vesúvio, que ocorreu no ano 79; Or. Sib. 1.30-35); e Or. Sib. 5.28-34, 93-110, 137-54, 214-27, 361-

80, referindo-se ao retorno de Nero de sua suposta fuga para a Pártia e a expectativa de que ele

destruiria Roma. Veja Bauckham, Climax of prophecy, p. 415-20; Aune, Revelation 6 to 16, p. 739.

53
A Ascensão de Isaías 4.2-4, muito provavelmente datada de por volta do final do primeiro

século, esperava a vinda de um rei demoniacamente inspirado que perseguiria a igreja. Cf.

Apocalipse de Pedro 14.11; veja Bauckham, Climax of prophecy, p. 411-2.

54
Bauckham, Climax of prophecy, p. 423.

55
Ibid., p. 424-8. Bauckham demonstrou que essa tradição apocalíptica tem raízes em uma leitura

de Daniel 7.

56
W. H. C. Frend, Rise of christianity (Philadelphia: Fortress, 1984), p. 331, nota 8; I. T.

Beckwith, The Apocalypse of John: studies in introduction with a critical and exegetical commentary

(London: Macmillan, 1919; reimpr. Grand Rapids: Baker, 1967), p. 635-6; Collins, Crisis and

Catharsis, p. 59; Bauckham, Climax of prophecy, p. 407-50; Beale, Book of Revelation, p. 17-8;

Aune, Revelation 6—16, p. 737-40; Osborne, Revelation, p. 496; Klauck, “Do they never come

back?”, p. 683-98.

57
Filostrato se referiu a Nero como uma besta, devido a sua tirania (Vit. Apoll. 4.38).

58
Bauckham, Climax of prophecy, p. 424-9. Cf. G. K. Beale, The use of Daniel in jewish

apocalyptic literature and in the Revelation of John (Lanham: University Press of America, 1984), p.

1755
229-39; e J. Fekkes, Isaiah and prophetic traditions in the book of Revelation, JSNTSup 93

(Sheffield: JSOT, 1994), p. 82-5.

59
Bauckham, Climax of prophecy, p. 430.

60
Ibid., p. 421.

61
A linguagem utilizada para descrever a ressurreição da besta (ou de uma de suas cabeças) em

13.3 imita as mesmas palavras utilizadas para descrever Cristo em 5.6. O retorno da besta em 17.11

também faz paralelo com a linguagem utilizada para Deus em 1.4,8; 4.8. Veja Beale, Book of

Revelation, p. 875-7; Bauckham, Climax of prophecy, p. 432, 435; Osborne, Revelation, p. 620-1; A.

Farrer, The Revelation of St. John the divine (Oxford: University Press, 1964), p. 184; A. Y. Collins,

The combat myth in the book of Revelation (Missoula: Scholars Press, 1976), p. 185; Swete,

Revelation, p. 255-8.

62
Marcial, Epig. 11.33.1-3; Juvenal, Sat. 4.37-38; Plínio, Pan. 48.3; 53.4.

63
Klauck, “Do they never come back”, p. 686.

64
Virgílio, Georg. 2.535; Aen. 6.738; Horácio, Carm. 7; Cícero, Att. 6.5; Suetônio, Dom. 4; Or.

Sib. 2.18; 13.45; 14.108; Caird, Revelation of St. John, p. 216; Keener, Revelation, p. 408, nota 21.

65
Collins, Crisis and Catharsis, p. 57-8; J. N. Kraybill, Imperial cult and commerce in John’s

Apocalypse, JSNTSup 127 (Sheffield: Sheffield Academic Press, 1996), p. 142-7; H. Giesen, Studien

zur Johannesapokalypse, SBAB 29 (Stuttgart: Katholisches Bibelwerk, 2000), p. 238-40; S. J.

Friesen, Imperial cults and the Apocalypse of John: reading Revelation in the ruins (Oxford:

University Press, 2001), p. 138-40.

66
Veja J. J. Collins, The apocalyptic imagination, 2. ed. (Grand Rapids: Eerdmans, 1998), p. 196.

67
Ibid., p. 234.

1756
68
O uso do termo “caído” pode sugerir aqueles que sofreram uma morte violenta. Veja Aune,

Revelation 17 to 22, p. 949; E. S. Fiorenza, Revelation: vision of a just world (Minneapolis: Fortress,

1991), p. 97.

69
Suetônio, Jul. 1.1; Dio Crisóstomo, Or. 34.7; Josefo, Ant. 18.32, 225; 4Ed 11-12; Or. Sib. 5.12;

cf. Bell, “Date of John’s Apocalypse”, p. 98.

70
Robinson, Redating, p. 242-53; Bell, “Date of John’s Apocalypse”, p. 97-100; C. Rowland,

The open heaven: a study of apocalyptic in judaism and early christianity (New York: Crossroad,

1982), p. 404-7; Gentry, Before Jerusalem fell, p. 146-65; Wilson, “Problem of the domitianic date”,

p. 599-602; T. B. Slater, “Dating the Apocalypse to John”, Bib 84 (2003), p. 255-6.

71
Veja Aune, Revelation 17 to 22, p. 947-8; Beale, Book of Revelation, p. 874.

72
Swete, Revelation, p. 220-1; Charles, Revelation of St. John, 2.69-70; Ford, Revelation, p. 290;

Smalley, Thunder and love, p. 47-8; Prigent, Commentary on the Apocalypse, p. 493.

73
Smalley, Thunder and love, p. 47-8. Uma outra tentativa veio de Strobel, “Abfassung und

Geschichtstheologie”, p. 437-9.

74
Beckwith, Apocalypse of John, p. 704-8; Beasley-Murray, Book of Revelation, p. 256-7; Caird,

Revelation of St. John, p. 218-19; Mounce, Book of Revelation, p. 315; Swete, Revelation, p. 257;

Aune, Revelation 17 to 22, p. 948-9; Beale, Book of Revelation, p. 867-80.

75
Veja Caird, Revelation of St. John, p. 218.

76
Keener, Revelation, p. 409; Aune, Revelation 17 to 22, p. 948; Beale, Book of Revelation, p.

868.

77
Veja Isaías 2.2; Jeremias 51.25; Ezequiel 35.3; Daniel 2.35,45; Zacarias 4.7; 1En 52; Tg. Isa.

41.15; cf. esp. Beale, Book of Revelation, p. 868-9.

1757
78
Uma reconstrução possível das sete “cabeças” segundo esse modelo seria que as cinco

primeiras representam os cinco impérios que caíram, isto é, Egito, Assíria, Babilônia, Pérsia e

Grécia; e “o que existe” (17.10) é Roma; e que a cabeça que veio à vida e ainda é futura é o Império

Romano revivido.

79
F. J. A. Hort, The Apocalypse of St. John (London: Macmillan, 1908), p. xviii. Hort sugeriu

que Epifânio pode estar se baseando em Hipólito (c. 170-236) e quis dizer Cláudio Nero. Cf. J. A. T.

Robinson, Redating the New Testament (Philadelphia: Westminster, 1976), p. 224; K. L. Gentry,

Before Jerusalem Fell: Dating the Book of Revelation, ed. rev. (Powder Springs: American Vision,

1998), p. 104-5.

80
Veja B. M. Metzger; B. D. Ehrman, The text of the New Testament: Its Transmission,

Corruption, and Restoration, 4. ed. (New York/Oxford: Oxford University Press, 2005), p. 99-100;

Swete, Revelation, p. cxciii-cxciv.

81
Teofilato, Praef. in Ioann. Em outro lugar, Teofilato indicou que João escreveu durante o

reinado de Trajano (On Matt. 20.22).

82
Ireneu, Contra heresias 2.22.5. Veja Charles, Revelation of St. John, 1.xcii; R. H. Mounce, The

Book of Revelation, NICNT (Grand Rapids: Eerdmans, 1977), p. 31, nota 37.

83
Ireneu, Contra heresias 5.30.3; Clemente de Alexandria, Quis dives salvetur 42; Orígenes,

Homília em Mateus 16.6; Victorino, Apocalipse 10.11; Eusébio, Hist. Ecl. 3.18; 3.20; Jerônimo, De

Viris illustribus 9.

84
Melito de Sardes (m. c. 190) também deu apoio a uma data domiciana, como registrado por

Eusébio (Hist. Ecl. 4.26.9). Ele escreveu um comentário sobre Apocalipse e em seu protesto contra

Marco Aurélio argumentou que Nero e Domiciano perseguiram injustamente os cristãos. Veja

Charles, Revelation of St. John, 1.xcii.

85
Veja Gentry, Before Jerusalem fell, p. 45-6.

1758
86
Contra J. C. Wilson, “The Problem of the Domitianic date of Revelation”, NTS 39 (1993), p.

592; L. L. Welborn, “On the Date of First Clement”, BibRes 29 (1984), p. 35-54. Apesar desses dois

autores que questionaram a data domiciana para 1Clemente, o consenso acadêmico favorece uma

data de meados da década de 90. Veja Beale, Book of Revelation, p. 16; T. J. Herron, “The Most

Probable Date of the First Epistle of Clement to the Corinthians”, em: E. A. Livingstone, org., Studia

Patristica: Tertullian to Nicaea in the West, Clement of Alexandria and Origen, Athanasius (Louvain:

Peeters, 1989), p. 106-21.

87
Clemente, Quis div. salv. 42; cf. Eusébio, Hist. Ecl. 3.23.5-19.

88
Eusébio, Hist. Ecl. 3.23.1; cf. Aune, Revelation 1-5, p. lix. Sobre a libertação daqueles banidos

por Domiciano, veja Plínio, Ep. 1.5.10; 9.13.5; Dio Crisóstomo, Or. 13.

89
Tácito, Agr. 3; cf. Thompson, Book of Revelation, p. 110-11.

90
Para um detalhado argumento apresentando Nero como o tirano, veja Gentry, Before

Jerusalem fell, p. 69-83. Ele mostrou que Nero era frequentemente rotulado como “tirano” pelos

historiadores romanos, mas ele não convenceu porque esses mesmos historiadores também

consideravam Domiciano um tirano.

91
Eusébio, Chron. PG 19.551-52; Aune, Revelation 1 to 5, p. lix.

92
Eusébio, Hist. Ecl. 3.17.1; 3.18.4; ele também (ibid., 3.20.7) citou Tertuliano (Apol. 5) que

afirmou: “Domiciano também tentou fazer o mesmo que ele, pois ele era um Nero em crueldade,

mas, eu acredito, na medida em que teve um pouco de bom senso, parou imediatamente e chamou de

volta aqueles que tinha banido”.

93
Eusébio, Hist. Ecl. 3.20.8-9; veja Clemente, Quis div. salv. 42; Jerônimo, De Viris illustribus 9.

94
Robinson, Redating, p. 222-3; Gentry, Before Jerusalem fell, p. 102-4; B. Newman, “The

Fallacy of the Domitian Hypothesis”, NTS 10 (1963), p. 135-6; A. A. Bell, “The Date of John’s

1759
Apocalypse: The Evidence of Some Roman Historians Reconsidered”, NTS 25 (1978), p. 93-102;

Wilson, “Problem of the Domitianic date”, p. 587-605.

95
Robinson, Redating, p. 221.

96
Swete, Revelation, p. xcix; Charles, Revelation of St. John, 1:xci; Collins, Crisis and

Catharsis, p. 56; Thompson, Book of Revelation, p. 15.

97
Hort, Apocalypse of St. John, p. xx; veja Robinson, Redating, p. 221.

98
Veja Collins, Crisis and Catharsis, p. 54.

99
A ilha tinha cerca de 48 quilômetros de circunferência segundo Plínio, o Velho, Nat.

4.12.23,69; Estrabão, Geog. 10.5.13; veja Tucídides, Guerra do Peloponeso 3.33.3.

100
Plínio, o Velho, Nat. 4.12.69; Estrabão, Geog. 10.5.14.

101
Aune, Revelation 1 to 5, p. 77; Smalley, Revelation to John, p. 50; Boxall, Revelation, p. 86.

102
Boxall, Revelation, p. 85. Contra Keener, Revelation, p. 83; C. H. Talbert, The Apocalypse: A

Reading of the Revelation of John (Louisville: Westminster John Knox, 1994), p. 3; J. N. Sanders,

“St. John on Patmos”, NTS 9 (1963), p. 75-85; Swete, Revelation, p. 12; Charles, Revelation of St.

John, vols. 1 e 2.

103
Veja Aune, Revelation 1 to 5, p. 77-8; Boxall, Revelation, p. 86.

104
Todas as ocorrências de dia no caso acusativo em Apocalipse expressa causa ou motivo (1.9;

2.3; 4.11; 6.9; 7.15; 12.11,12; 13.14; 17.7; 18.8,10,15; 20.4).

105
Veja 6.9; 12.17; 20.4. Contra Beckwith, Apocalypse of John, p. 434; Charles, Revelation of St.

John, 1.22; Aune, Revelation 1 to 5, p. 81-2.

106
BDAG, s.v. “θλίψιϛ”, p. 457.

1760
107
A inferência é que João estava ali como resultado de uma condenação judicial. Smalley,

Revelation to John, p. 50; Swete, Revelation, p. 50.

108
Plutarco, Exil. 12; Juvenal, Sat. 1.73; 4.563; 10.170; Tácito, Ann. 1.53; 3.68-59; 4.13,30;

13.43; Suetônio, Aug. 19; Cal. 14-15; Galb. 10.

109
Dig. 48.13.3; 48.14.1; 48.22.6; 48.22.14.3; 48.22.15; 48.22.7.2; Tácito, Ann. 14.50; 15.71;

Plínio, Ep. 10.56. Veja J. Crook, Law and life of Rome (Ithaca: Cornell University Press, 1967), p.

272-3; Aune, Revelation 1 to 5, p. 79.

110
A. N. Sherwin-White, Roman society and the roman law in the New Testament (London:

Oxford University Press, 1963; reimpr. Eugene: Wipf & Stock, 2004), p. 21, nota 1.

111
Crook, Law and life of Rome, p. 272.

112
Veja Dig. 47.11-22; cf. A. N. Sherwin-White, “The Early Persecutions and Roman Law

Again”, JTS 3 (1952), p. 205.

113
Dig. 48.22.7.17; cf. Sherwin-White, Roman Society and the Roman Law, p. 2.

114
Dig. 48.19.2.1. Embora o governador não pudesse deportar um criminoso, o prefeito da

cidade mantinha esse direito legal.

115
Tertuliano, Praescr. 36; veja Jerônimo, De viris illustribus 9. Contra W. M. Ramsay, The

Letters to the Seven Churches of Asia and Their Place in the Plan of the Apocalypse (London:

Hodder & Stoughton, 1904), p. 85.

116
Caird, Revelation of St. John, p. 22-3, confirmado por Hemer, Letters to the Seven Churches,

p. 28; Smalley, Revelation to John, p. 50-1; Boxall, Revelation, p. 85.

117
A estrada que ligava as cidades formava um circuito em forma de ferradura, e cada cidade

podia ser alcançada em um ou dois dias de caminhada. Veja deSilva, Introduction, p. 895.

1761
118
P. L. Mayo, “Those who Call Themselves Jews”: The Church and Judaism in the Apocalypse

of John, PTMS 60 (Eugene: Pickwick, 2006), p. 51-76; A. J. Beagley, The “Sitz im Leben” of the

Apocalypse, with Particular Reference to the Role of the Church’s Enemies, BZNW 50 (Berlin: de

Gruyter, 1987); P. Borgen, “Polemic in the Book of Revelation”, em: C. A. Evans; D. A. Hagner,

orgs., Anti-Semitism and Early Christianity (Minneapolis: Fortress, 1993), p. 199-211; M. R. J.

Bredin, “The Synagogue of Satan Accusation in Revelation 2.9”, BTB 28/4 (1999), p. 160-4; Slater,

“Social setting”, p. 240; A. Y. Collins, “Vilification and Self-Definition in the Book of Revelation”,

HTR 79 (1986), p. 308-20; id., Crisis and Catharsis, p. 85-7.

119
Sobre sofrer com pobreza provocada pela sua fé, veja Hemer, Letters to the Seven Churches,

p. 68; Charles, Revelation of St. John, 1.56; Caird, Revelation of St. John, p. 35; Roloff, Revelation,

p. 48; cf. 4QpPSa 1.1-10; 2.10-11.

120
J. Lambrecht (“Jewish slander: a note on Revelation 2.9,10”, ETL 75 [1999], p. 421-9)

entende que essa calúnia dos judeus decorria dos procedimentos legais em Esmirna. Para uma análise

sobre a apresentação de uma denúncia por um acusador na jurisprudência, veja “Accusatio”, em: A.

Berger, Encyclopedic Dictionary of Roman Law, Transactions of the American Philosophical Society

43 (Philadelphia: American Philosophical Society, 1953), p. 340.

121
Entre os exemplos do NT dos judeus instigando ações legais contra os cristãos estão Atos

13.5-12,50; 18.13-17; 22.30; 23.25-30; 24.1-22; 25.1, 7-27; 26.1-7. Para exemplos da hostilidade

judaica geral contra os cristãos, veja Atos 7.1 a 8.3; 9.1-9; Gálatas 1.13,14; 1Tessalonicenses 2.14-

16; cf. Martírio de Policarpo (12.2,3; 13.1); Justino Mártir (Dial. 16.4; 47.4; 93.4; 95.4; 96.2; 108.3;

110.5; 131.2; 133.6; 137.2); Tertuliano (Scorp. 10.10; Praescr. 26.6); e Eusébio (Hist. Ecl. 5.16.12).

122
Beale, Book of Revelation, p. 8 e 240; Ford, Revelation, p. 393; S. Applebaum, “The Legal

Status of the Jewish Communities in the Diaspora”, em: H. J. de Jonge; S. Safrai, orgs., The Jewish

People in the First Century, CRINT 1 (Assen: Van Gorcum, 1974), p. 420-63; T. Rajak, Jewish

Rights in the Greek Cities Under Roman Rule: A New Approach, Approaches to Ancient Judaism 5

1762
(Atlanta: Scholars Press, 1985), p. 19-35; P. Trebilco, Jewish Communities in Asia Minor, SNTSMS

69 (Cambridge: University Press, 1991), p. 167-85; e Price, Rituals and Power, p. 220-1; cf. Josefo,

C. Ap. 2.6; Filo, Legat. 349-67.

123
Veja J. J. O’Rourke, “Roman Law and the Early Church”, p. 179. Para mais informação sobre

o relacionamento da igreja com a sinagoga, veja Aune, Revelation 1 to 5, p. 168-72; Borgen,

“Polemic in the Book of Revelation”, p. 199-211; W. Horn, “Zwischen der Synagoge des Satans und

dem neuen Jerusalem: Die christlich-jüdische Standortbestimmung in der Apokalypse des Johannes”,

ZRGG 46 (1994), p. 143-62. Cf. S. J. Friesen, “Sarcasm in Revelation 2 to 3: Churches, Christians,

True Jews, and Satanic Synagogues”, em: D. L. Barr, org., The Reality of Apocalypse: Rhetoric and

Politics in the Book of Revelation, SBLSymS 39 (Atlanta: SBL, 2006), p. 127-46; P. Duff, “The

‘synagogue of Satan’: crisis mongering and the Apocalypse of John”, em: Reality of the Apocalypse,

p. 147-68. Cf. Justino, Dial. 16.4; 47.4; 93.4; 95.4; 96.2; 108.3; 133.6; 137.2.

124
S. J. Friesen (“Satan’s throne, imperial cults and the social settings of Revelation”, JSNTS 27

[2005], p. 351-73), contra a lógica, rejeitou a noção de que o “trono de Satanás” se refere a Pérgamo

como a sede do poder romano ou do culto imperial na província da Ásia.

125
Segundo Aune (Revelation 1 to 5, p. 183), o procônsul romano residia em Pérgamo; cf. Caird,

Revelation of St. John, p. 38.

126
O termo rhomphaia (“espada”) pode se referir ao direito judicial de ius gladii, simbolizado

como uma espada, dando ao procônsul o direito de infligir pena capital (Rm 13.4). Veja Dig. 2.1.3;

Berger, “Ius gladii”, EDRL p. 529; Ramsay, Letters to the Seven Churches, p. 292-3; Caird,

Revelation of St. John, p. 38; Mounce, Book of Revelation, p. 96; Hemer, Letters to the Seven

Churches, p. 85; Beale, Book of Revelation, p. 247; Keener, Revelation, p. 122. O termo thronos

(“trono”), como usado em todo o NT, denota um assento oficial onde um rei ou um juiz dirigia a

corte (Mt 19.28; Lc 1.23,52; veja Smalley, Revelation to John, p. 68; Swete, Revelation, p. 34).

1763
Algumas vezes, thronos é utilizado para o assento de um juiz (Aune, Revelation 1 to 5, p. 183; veja

Plutarco, Praec. ger. rei publ. 807b).

127
Para mais sobre a origem e a história do culto imperial, veja J. Ferguson, The Religions of the

Roman Empire (London: Thames & Hudson, 1970), p. 88-98; D. L. Jones, “Christianity and the

Roman Imperial Cult”, ANRW II.23.2, Principat, edição de H. Temporini; W. Haase (Berlin: de

Gruyter, 1980), p. 1024-54; D. Fishwick, “The Development of Provincial Ruler Worship in the

Western Roman Empire”, ANRW II.16.2 (1978), p. 1201-53; id., The Imperial Cult in the Latin West:

Studies in the Ruler Cult of the Western Provinces of the Roman Empire, EROER 108/2 (Leiden:

Brill, 1991); R. M. Novak, Christianity and the Roman Empire: Background Texts (Harrisburg:

Trinity Press International, 2001), p. 267-72; P. A. Harland, “Imperial Cults Within Local Cultural

Life: Associations in Roman Asia”, ZAG 17 (2003), p. 85-107.

128
Friesen, Imperial Cults, p. 25 e 27.

129
Ibid., p. 36-8. Assim Tácito, Ann. 4.15.

130
Ibid., p. 44-6.

131
Price, Rituals and Power, p. 135. Para um excelente mapa localizando os templos imperiais

na Ásia Menor, veja M. Wilson, Charts on the Book of Revelation: Literary, Historical, and

Theological Perspectives (Grand Rapids: Kregel, 2007), p. 115.

132
Price, Rituals and Power, p. 16 e 29-31.

133
Sobre a natureza religiosa do culto imperial, veja H. W. Pleket, “An Aspect of the Emperor

Cult: Imperial Mysteries”, HTR 58 (1965), p. 331-47; F. Millar, “The Imperial Cult and the

Persecutions”, em: Le Culte des Souverains dans L’Empire Romain (Genève: Fondation Hardt,

1973), p. 145-75; Harland, “Imperial Cults Within Local Cultural Life”, p. 87-90 e 93-103. Para

estudiosos que marginalizam a natureza religiosa do culto imperial, veja P. Harland, “Honours and

Worship: Emperors, Imperial Cults and Associations at Ephesus”, SR 25 (1996), p. 334, nota 4.

1764
134
Harland, “Honours and Worship”, p. 328-9; S. J. Friesen, Twice Neokoros: Ephesus, Asia and

the Cult of the Flavian Imperial Family (Leiden: Brill, 1993), p. 146. Contra Price (Rituals and

power, p. 233), que argumentou por uma “clara distinção entre honras humana e divina” e sustentou

que o imperador talvez tenha sido inserido em uma categoria intermediária de herói.

135
Price, Rituals and Power, p. 170-206. Compare com Friesen (Imperial Cults, p. 50), que

observou que os arqueólogos encontraram restos de uma estátua colossal de Domiciano ou Tito.

Baseado no tamanho da cabeça, do antebraço esquerdo e do dedão do pé esquerdo, essa estátua deve

ter sido mais alta do que seus adoradores.

136
S. J. Scherrer, “Signs and Wonders in the Imperial Cult: A New Look at a Roman Religious

Institution in the Light of Rev 13:13-15”, JBL 103 (1984), p. 605. Assim Suetônio, Gaius, p. 52.

137
Millar, “Imperial Cult and the Persecutions”, p. 147-8.

138
Veja Klauck, “Sendschreiben nach Pergamon”, p. 157-71; D. A. deSilva, “The ‘Image of the

Beast’ and the Christians in Asia Minor: Escalation of Sectarian Tension in Revelation 13”, Trin J 12

NS (1991), p. 185-208; J. W. van Henten, “Dragon Myth and Imperial Ideology in Revelation 12 to

13”, SBL Seminar Papers 33 (1994), p. 496-515; Borgen, “Emperor Worship and Persecution”, p.

493-509; Giesen, Studien zur Johannesapokalypse, p. 100-213; H. J. de Jonge, “The Apocalypse of

John and the Imperial Cult”, em: H. F. J. Horstmanshoff et al., orgs., KYKEON: Studies in Honour of

H. S. Versnel (Leiden: Brill, 2002), p. 127-41; L. J. L. Peerbolte, “To Worship the Beast: The

Revelation to John and the Imperial Cult in Asia Minor”, em: K. Berger, org., Zwischen den Reichen:

Neues Testament und Römische Herrschaft, TANZ 36 (Tübingen: A. Francke, 2002), p. 239-59; G.

Biguzzi, “Ephesus, its Artemision, its Temple to the Flavian Emperors, and Idolatry in Revelation”,

NovT 40 (1998), p. 276-90; e S. J. Friesen, “Myth and Symbolic Resistance in Revelation 13”, JBL

123 (2004), p. 287-311.

139
Veja deSilva, “Image of the beast”, p. 197-201.

1765
140
Dio Cássio, Hist. 59.24.4; Filo, Leg. 116; Aune, Revelation 6 to 16, p. 741.

141
Veja Jones, “Christianity and the Roman Imperial Cult”, p. 1024; Biguzzi, “Ephesus”, p. 277-

9.

142
Veja 6.9; 18.24; 20.4. Contra Millar (“Imperial Cult and the Persecutions”, p. 164-5), que

defendeu que o culto imperial desempenhou apenas um papel insignificante na perseguição aos

cristãos. Para uma crítica a Millar, veja de Jonge, “Apocalypse of John and the Imperial Cult”, p.

127-41.

143
D. A. deSilva, “Honor Discourse and the Rhetorical Strategy of the Apocalypse of John”,

JSNT 71 (1998), p. 98.

144
P. Hanson, Dawn of Apocalyptic (Philadelphia: Fortress, 1975), p. xi; J. J. Collins, The

Apocalyptic imagination, 2. ed. (Grand Rapids: Eerdmans, 1998), p. 2.

145
Collins, Apocalyptic imagination, p. 21; M. Smith, “On the history of Apokalyptō and

Apokalypsis”, in: D. Hellholm, org., Apocalypticism in the mediterranean world and the near east:

proceedings of the international colloquium on apocalypticism (Tübingen: Mohr Siebeck, 1983), p.

9-20. O primeiro a identificar um grupo de escritos como “apocalípticos” foi F. Lücke em 1832 em:

Versuch einer vollstandigen Einleitung in die Offenbarung Johannis und in die gesamte

apocalyptische Literatur (Bonn: Weber, 1832). Cf. Collins, Apocalyptic imagination, p. 2-3.

146
K. Koch, The rediscovery of Apocalyptic, tradução para o inglês de M. Kohl (Naperville: A.

R. Allenson, 1972), p. 28-33.

147
Veja o panorama por D. Mathewson, “Revelation in recent genre criticism: some implications

for interpretation”, TrinJ 13 NS (1992), p. 193-213.

148
P. Vielhauer, “Apocalypses and related subjects”, em: E. Hennecke; W. Schneemelcher, orgs.,

New Testament Apocrypha II (Philadelphia: Westminster, 1965), p. 583-94; cf. Koch, Rediscovery of

Apocalyptic, p. 23-8.

1766
149
J. J. Collins, “Introduction: towards the morphology of a genre”, Sem 14 (1979), p. 9.

150
A. Y. Collins, “Introduction: early christian apocalypticism”, Sem 36 (1986), p. 7.

151
L. Hartman, “Survey of the Problem of Apocalyptic Genre”, em: Apocalypticism in the

Mediterranean World and the Near East, p. 332-6. Assim D. E. Aune, “The Apocalypse of John and

the Problem of Genre”, Sem 36 (1986), p. 65-96.

152
Collins, Apocalyptic Imagination, p. 5-9.

153
G. B. Caird, The Language and Imagery of the Bible (Grand Rapids: Eerdmans, 1997), p. 256.

154
C. Rowland, The Open Heaven: A Study of Apocalyptic in Judaism and Early Christianity

(London: SPCK, 1982; reimpr. Eugene: Wipf and Stock, 2002), p. 70-2.

155
Escatologia é um termo escorregadio com uma gama muito ampla de significados. Caird

(Language and Imagery of the Bible, p. 243-56) identificou sete sentidos de escatologia; veja G. B.

Caird, New Testament Theology, edição de L. D. Hurst (Oxford: University Press, 1995), p. 243-67.

Cf. I. H. Marshall, “Slippery Words, 1: Eschatology”, ExpTim 89 (1978), p. 264-9; id., “A New

Understanding of the Present and the Future: Paul and Eschatology”, em: R. N. Longenecker, org.,

Road from Damascus: The Impact of Paul’s Conversion on his Life, Thought, and Ministry (Grand

Rapids: Eerdmans, 1997), p. 43-61; id., “Is Apocalyptic the Mother of Christian Theology?”, in: G.

F. Hawthorne; O. Betz, orgs., Tradition and Interpretation in the New Testament: Essays in Honor of

E. Earle Ellis for his 60. Birthday (Grand Rapids: Eerdmans, 1987), p. 33-42. Em seu sentido mais

básico, escatologia refere-se à futura consumação do relacionamento de Deus com a humanidade.

156
A expressão “reino de Deus” ocorre 66 vezes no NT, embora no corpus joanino ocorra apenas

em João 3.3,5. Fora isso, há algumas referências ao “reino do céu”.

157
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 713.

1767
158
Elisabeth Schüssler Fiorenza, The book of Revelation: Justice and Judgment, 2. ed.

(Minneapolis: Fortress, 1998), p. 138. Veja A. J. Köstenberger; R. D. Patterson, Invitation to Biblical

Interpretation (Grand Rapids: Kregel).

159
G. E. Ladd, “Why not Prophetic-Apocalyptic?”, JBL 76 (1957), p. 192-200.

160
Fiorenza, Book of Revelation, p. 133-56.

161
D. A. Carson; D. J. Moo; L. Morris, An Introduction to the New Testament (Grand Rapids:

Zondervan, 1992), p. 479.

162
Veja E. F. Scott, The book of Revelation (New York: Charles Scribner’s Sons, 1940), p. 44.

163
Charles, Revelation of St. John, 1.lxxxvii-xci; Aune, Revelation 1 to 5, p. cx-cxxxiv; Ford,

Revelation, p. 50-7; Prigent, Commentary on the Apocalypse, p. 84-92.

164
Roloff, Revelation of John, p. 7. Para um excelente resumo dos argumentos sobre a unidade

literária de Apocalipse, veja Smalley, Thunder and love, p. 97-101.

165
Fiorenza, Book of Revelation, p. 164.

166
Barr, “The Apocalypse as a symbolic transformation”, p. 43.

167
Bauckham, Climax of Prophecy, p. 3-22.

168
L. L. Thompson, “The literary unity of the book of Revelation”, em: V. L. Tollers; J. Maier,

orgs., Mappings of the Biblical Terrain: The Bible as Text (Lewisburg: Bucknell Univ. Press, 1990),

p. 347-63; J. L. Resseguie, Revelation Unsealed: A Narrative Critical Approach to John’s

Apocalypse, Biblical Interpretation Series 32 (Leiden: Brill, 1998); D. Lee, The Narrative Asides in

the Book of Revelation (Lanham: University Press of America, 2002); J. R. Michaels, “Revelation

1.19 and the narrative voices of the Apocalypse”, NTS 37 (1991), p. 604-20.

1768
169
Veja D. L. Barr, Tales of the End: A Narrative Commentary on the Book of Revelation (Santa

Rosa: Polebridge, 1998), p. 10; Collins, Combat Myth, p. 8; Beale, Book of Revelation, p. 108;

Mounce, Book of Revelation, p. 46; Bauckham, Climax of Prophecy, p. 21; e Prigent, Commentary on

the Apocalypse, p. 93.

170
R. J. Loenertz, The Apocalypse of Saint John, tradução para o inglês de H. Carpenter (New

York: Sheed & Ward, 1948), p. xiv-xix; Fiorenza, “Composition and Structure of the Book of

Revelation”, CBQ 39 (1977), p. 360-1.

171
Collins, Combat Myth, p. 16-9; M. S. Hall, “The Hook Interlocking Structure of Revelation:

The Most Important Verses in the Book and How They May Unify its Structure”, NovT 44 (2002), p.

278-96.

172
Bauckham, Climax of Prophecy, p. 9.

173
Ibid., p. 3; cf. R. Herms, An Apocalypse for the Church and for the World: The Narrative

Function of Universal Language in the Book of Revelation, BZNW 143 (Berlin: de Gruyter, 2006),

esp. p. 149-54.

174
M. C. Tenney, Interpreting Revelation (Grand Rapids: Eerdmans, 1957), p. 33. Veja também

G. E. Ladd, A Commentary on the Revelation of John (Grand Rapids: Eerdmans, 1972), p. 14;

Mazzaferri, Genre, p. 338-9; Bauckham, Climax of Prophecy, p. 3; Beale, Book of Revelation, p. 111;

C. R. Smith, “The Structure of the Book of Revelation in Light of Apocalyptic Literary

Conventions”, NovT 36 (1994), p. 384-92; J. A. Filho, “The Apocalypse of John as an Account of a

Visionary Experience: Notes on the Book’s Structure”, JSNT 25 (2002), p. 215.

175
Beale, Book of Revelation, p. 110. A primeira visão (1.9) começa sem a expressão deixō soi,

mas pode ser inferida do prólogo (1.1), ou ela pode ter sido necessária apenas para introduzir as

visões sucessivas com um restabelecimento de sua natureza revelatória.

1769
176
Beale, Book of Revelation, p. 152-70; W. C. van Unnik, “A Formula Describing Prophecy”,

NTS 9 (1963), p. 92-4.

177
Osborne, Revelation, p. 223; cf. Lee, Narrative Asides, p. 142-7.

178
Ford, Revelation, p. 46-50.

179
R. J. Korner, “‘And I Saw…’: An Apocalyptic Literary Convention for Structural

Identification in the Apocalypse”, NovT 42 (2000), p. 175.

180
K. A. Strand, “The Eight Basic Visions in the Book of Revelation”, AUSS 25 (1987), p. 401-

8; veja Beale, Book of Revelation, p. 115.

181
Bauckham (Climax of Prophecy, p. 9-11) rejeitou as sete cartas como um dos septetos porque

as igrejas são nomeadas, mas não numeradas e “uma vez que elas não formam em nenhum outro

sentido uma sequência, não é importante que o ouvinte seja informado da progressão numérica”.

Uma outra diferença entre as cartas e os outros septetos é que elas formam uma estrutura 3 + 4

enquanto os julgamentos transmitem uma estrutura 4 + 3 ou 4 + (2 + intercalação + 1).

182
Apocalipse 2.1 a 3.22; 6.1 a 8.1; 8.2 a 11.19; 15.1 a 16.21. Veja A. E. Steinmann, “The

tripartite structure of the sixth seal, the sixth trumpet, and the sixth bowl of John’s Apocalypse (Ap

6.12 a 7.17; 9.13 a 11.14; 16.12-16)”, JETS 35 (1992), p. 69-79. Veja Bauckham, Climax of

Prophecy, p. 9-11.

183
Mazzafferi, Genre, p. 348-56.

184
Charles, Revelation of St. John, 1.xxv; D. Pentecost, Things to Come (Grand Rapids:

Zondervan, 1958), p. 187-8.

185
Victorino de Pettau, Victorini episcopi Petavionensis Opera, Corpus scriptorum

ecclesiasticorum latinorum 49, edição de J. Haussleiter (Leipzig: F. Tempsky, 1916), p. 86; Collins,

Combat Myth, p. 32-44; J. Lambrecht, “A Structuration of Revelation 4.1—22.5”, em: J. Lambrecht,

1770
org., L’Apocalypse johannique et l’Apocalyptique dans le Nouveau Testament (Leuven: University

Press, 1980), p. 80-92; C. H. Giblin, “Recapitulation and the literary coherence of John’s

Apocalypse”, CBQ 56 (1994), p. 81-95; Aune, Revelation 1 to 5, p. xci-xciii; Beale, Book of

Revelation, p. 116-44.

186
R. L. Thomas, “The structure of the Apocalypse: recapitulation or progression?”, MSJ 4

(1993), p. 45-66; Beckwith, Commentary on the Apocalypse, p. 606-11; J. F. Walvoord, The

Revelation of Jesus Christ (Chicago: Moody, 1989), p. 150-1; Ladd, Revelation, p. 122. Cf. J. R.

Michaels (Revelation, IVPNTCS 20 [Downers Grove: InterVarsity, 1997], p. 27-9), que utilizou o

termo“reiteração”; seu ponto de vista é compatível com a teoria telescópica em vez de com uma

teoria de recapitulação estrita.

187
Veja Beale, Book of Revelation, p. 121-6.

188
Beale (Book of Revelation, p. 405) ofereceu o melhor tratamento da relação entre a pergunta

em 6.17 e o capítulo 7.

189
Isto é reminiscente de Amós 4, onde Deus envia uma série de pragas sobre Israel, mas a nação

não se arrepende.

190
Giblin, “Revelation 11.1-13”, p. 434.

191
Aune (Revelation 6 to 16, p. 555) concordou com Giblin e observou a ênfase profética

evidente neste interlúdio.

192
Veja R. Dalrymple, “These are the ones”, Bib 86 (2005), p. 396-406; Beasley-Murray, Book of

Revelation, p. 31.

193
Ford (Revelation, p. 194-5) sugeriu que o capítulo 12 dá início a uma nova divisão de

Apocalipse que ela chamou de o “livro dos sinais”. Mas esse epíteto é problemático porque pode ser

entendido como implicando que esta seção existe independentemente do restante da visão. Veja

Smalley, Revelation to John, p. 310; Beale, Book of Revelation, p. 621.

1771
194
Aune, Revelation 6 to 16, p. 679.

195
Smalley, Revelation to John, p. 313.

196
Ibid. Veja Prigent, Commentary on the Apocalypse, p. 376-7; Osborne, Revelation, p. 456.

Para uma análise do uso de sēmeion no Evangelho de João, veja A. J. Köstenberger, Studies on John

and gender, SBL 38 (New York: P. Lang, 2001), p. 99-116.

197
Osborne, Revelation, p. 452: “Assim, este é o último dos três interlúdios e, como eles, detalha

o envolvimento da igreja nestes eventos dos últimos dias”.

198
Beasley-Murray, Book of Revelation, p. 191; Beale, Book of Revelation, p. 622-4; Mounce,

Book of Revelation, p. 234. Barr (Tales of the End, p. 101-31) propôs que 11.19 a 22.21 compreende

uma terceira unidade narrativa que ele chamou de “O rolo da guerra”.

199
Alguns estudiosos veem os capítulos 12 a 15 como consistindo em uma série não numerada

de setes (Farrer, Beale); outros veem uma estrutura quiástica (Strand, Shae).

200
C. H. Giblin, “Structural and Thematic Correlations in the Theology of Revelation 16 to 22”,

Bib 55 (1974), p. 488-9. Entre os acadêmicos antigos que reconheceram os paralelos literários estão

Swete, Lohmeyer, Allo, Wikenhauser, Lohse e Rissi. Entre os acadêmicos desde Giblin que

incorporaram a obra dele a seus esboços estruturais estão Bauckham, Climax of Prophecy, p. 4;

Beale, Book of Revelation, p. 109-10; Aune, Revelation 17 to 22, p. 1020-21; M. Wilcock, The

Message of Revelation, BST (Downers Grove: InterVarsity, 2006), p. 112-5; e Collins, Combat Myth,

p. 19. Mas Collins não pôde encaixar essas seções em sua série de setes, então ela as relegou a

apêndices.

201
Apocalipse 22.6 marca o início do epílogo ao fazer alusão a Apocalipse 1.1. As duas

passagens se referem ao anjo enviado a João para mostrar a ele o que devia logo acontecer.

202
Osborne, Revelation, p. 604.

1772
203
B. R. Rossing (The Choice Between Two Cities, HTS [Harrisburg: Trinity, 1999], p. 14-5)

argumentou que isso fazia parte da estratégia retórica de João para obrigar sua audiência a fazer uma

escolha entre as duas cidades. Assim E. M. Räpple, The Metaphor of the City in the Apocalypse of

John, SBL 67 (New York: P. Lang, 2004).

204
Bauckham, Climax of Prophecy, p. 5; S. Moyise, The Old Testament in the Book of

Revelation, JSNTSup 115 (Sheffield: Sheffield Academic Press, 1995), p. 64; J. Lambrecht, “Final

Judgments and Ultimate Blessings: The Climactic Visions of Revelation 20.11 to 21.8”, Bib 81

(2000), p. 262-85; M. Jauhiainen, “‘Aποκάλʋψιϛ Ἰησοʋ Χριστοʋ’ (Rev. 1.1): the climax of John’s

prophecy?”, TynB 54 (2003), p. 99-117.

205
Giesen, Offenbarung des Johannes, p. 44; veja Mounce, Book of Revelation, p. 41; Carson;

Moo, Introduction to the New Testament, p. 719.

206
Veja K. L. Gentry, “A preterist view of Revelation”, em: C. M. Pate, org., Four views on the

book of Revelation (Grand Rapids: Zondervan, 1998), p. 37-92.

207
Sobre os tipos de preteristas, veja Beale, Book of Revelation, p.44-5; e Osborne, Revelation, p.

19-20.

208
R. H. Charles, J. Sweet, J. Roloff, A. Y. Collins, L. L. Thompson, G. Krodel, D. Barr, E. S.

Fiorenza, M. Wilson e N. Kraybill. Entre os proponentes em âmbito popular estão K. Gentry, D.

Chilton, G. DeMar e H. Hannegraff.

209
C. Osiek, “Apocalyptic eschatology”, TBT 37 (1996), p. 343-4.

210
Osborne, Revelation, p. 19.

211
Mounce, Book of Revelation, p. 42.

212
A expressão “os habitantes da terra” denota os objetos da ira em Apocalipse (3.10; 6.10; 8.13;

11.10; 13.8,14; 17.2,8). Este grupo é colocado consistentemente em justaposição a crentes. Veja

1773
Herms, Apocalypse for the Church and for the World, p. 185-201.

213
Beale, Book of Revelation, p. 44-5.

214
Contra D. Chilton, The Days of Vengeance: An Exposition of the Book of Revelation (Tyler:

Dominion, 1987), p. 20; Ford, Revelation, p. 282-8; I. Provan, “Foul Spirit, Fornication, and Finance:

Revelation 18 and an Old Testament Perspective”, JSNT 64 (1996), p. 81-100; D. E. Holwerda, “Ein

neuer Schlüssel zum 17. Kapitel der johanneischen Offenbarung”, EstBib 53 (1995), p. 387-96. Sobre

Babilônia como um código para Roma, veja Beale, Book of Revelation, p. 775; Osborne, Revelation,

p. 608-9; Aune, Revelation 17 to 22, p. 936-7.

215
Giesen, Offenbarung des Johannes, p. 44.

216
Carson; Moo, Introduction to the New Testament, p. 720.

217
Mounce, Book of Revelation, p. 42.

218
C. R. Koester, “On the verge of the millennium: a history of the interpretation of Revelation”,

WW 15 (1995), p. 131.

219
Ibid., p. 132.

220
Ibid; cf. Beckwith, Apocalypse of John, p. 327-9; A. F. Johnson, “Revelation”, in: The

expositor’s Bible commentary, ed. rev. (Grand Rapids: Zondervan, 2006), vol. 12: Hebrews-

Revelation, p. 585; Osborne, Revelation, p. 18; I. Backus, Reformation readings of the Apocalypse:

Geneva, Zurich, and Wittenberg (Oxford: University Press, 2000).

221
Osborne, Revelation, p. 19.

222
Beale, Book of Revelation, p. 46.

223
Giesen, Offenbarung des Johannes, p. 44.

1774
224
W. Milligan, The Revelation of St. John, 2. ed. (London: Macmillan, 1887), p. 154-5. Entre os

que advogam essa abordagem estão R. Calkins, W. Hendriksen, A. A. Hoekema, P. E. Hughes e S.

Hamstra Jr. Para um ponto de vista idealista de Apocalipse, veja S. Hamstra Jr., “An idealist view of

Revelation”, em: Four views, p. 95-131.

225
Koester, “On the verge of the millennium”, p. 130.

226
Giesen, Offenbarung des Johannes, p. 44-5.

227
Beckwith, Apocalypse of John, p. 318-34; veja Mounce, Book of Revelation, p. 39.

228
Mounce, Book of Revelation, p. 40.

229
Osborne, Revelation, p. 20.

230
Sobre o título “futurismo modificado”, veja Beale, Book of Revelation, p. 47; sobre o título

“futurismo moderado”, veja G. E. Ladd, A Theology of the New Testament, ed. rev. (Grand Rapids:

Eerdmans, 1993), p. 673.

231
C. A. Blaising; D. L. Bock, Progressive Dispensationalism (Grand Rapids: Baker, 1993), p.

21-2; cf. H. W. Bateman IV, “Dispensationalism Yesterday and Today”, in: H. W. Bateman IV, org.,

Three Central Issues in Contemporary Dispensationalism: A Comparison of Traditional and

Progressive Views (Grand Rapids: Kregel, 1999).

232
C. M. Pate, “Introduction to Revelation”, in: Four Views, p. 29.

233
D. L. Cooper, “An Exposition of the Book of Revelation: The Great Parenthesis”, Biblical

Research Monthly (May 1954), p. 84; citado em T. LaHaye, Revelation Unveiled (Grand Rapids:

Zondervan, 1999), p. 17.

234
C. C. Ryrie (Dispensationalism [Chicago: Moody, 1995], p. 85), que afirmou que as palavras

“igreja” e “Israel” são sempre mantidas distintas no NT, sustentando que essa distinção é o resultado

1775
de “um uso consistente de um método de interpretação literal, normal ou simples sem a adição de

nenhum outro princípio que tentará dar respeitabilidade a algumas conclusões preconcebidas”.

235
Blaising; Bock, Progressive dispensationalism, p. 22; cf. R. L. Saucy, The case for

progressive dispensationalism (Grand Rapids: Zondervan, 1993).

236
Blaising; Bock, Progressive dispensationalism, p. 177-8.

237
Ibid., p. 49.

238
Pate, “Introduction to Revelation”, p. 33.

239
Ibid.

240
W. Grudem, Systematic theology: an introduction to biblical doctrine (Grand Rapids:

Zondervan, 2000), p. 1111.

241
Osborne, Revelation, p. 21.

242
Beale, Book of Revelation, p. 47.

243
Ladd, Theology of the New Testament, p. 675.

244
Entre os comentaristas que usam uma abordagem eclética estão G. Osborne, C. Keener, G. K.

Beale, H. Giesen, R. Mounce, A. Johnson e L. Morris.

245
Giesen, Offenbarung des Johannes, p. 45.

246
Beale, Book of Revelation, p. 48.

247
Osborne, Revelation, p. 22.

248
Para um proveitoso panorama dos respectivos esquemas interpretativos, veja A. F. Johnson,

“Revelation”, in: The expositor’s Bible commentary, ed. rev. (Grand Rapids: Zondervan, 2005), vol.

13: Hebrews-Revelation, p. 584-7.

1776
249
Existe algum debate em relação à identidade dos “anjos” das sete igrejas. O debate é sobre se

os anjos são mensageiros humanos (i. e., os pastores das igrejas) ou seres angelicais. A palavra

angelos é usada às vezes no NT com relação a mensageiros humanos (Lc 9.52), incluindo João

Batista (Mt 11.10; Mc 1.2; Lc 7.27). No presente caso, no entanto, é mais provável que a palavra se

refira a anjos. De longe, o uso mais comum de angelos no NT é com referência a seres angelicais.

Das 67 ocorrências de angelos em Apocalipse, todos os casos fora dos capítulos 2 e 3 se referem a

anjos. É improvável que angelos seja usada de forma diferente nos capítulos 2 e 3. Além disso, os

anjos são identificados em 1.21 como “estrelas”. Embora seja às vezes utilizada no AT com

referência aos fiéis (Gn 37.9; Dn 12.3), “estrelas” é mais comumente uma metáfora do AT para anjos

(Jó 38.7; Dn 10.13,20,21). Como G. K. Beale (Book of Revelation, p. 217) observa, os anjos são

identificados coletivamente com os cristãos como seus contrapartes celestiais em 8.3,4; 19.10 e 22.9.

Devido ao fato de as mensagens serem dirigidas principalmente aos anjos, eles muito provavelmente

funcionem como representantes celestiais das congregações terrenas (Caird, Revelation of St. John, p.

24).

250
Aune, “Influence of roman imperial court ceremonial”, p. 5-26.

251
Veja Quadro 20.1: Quem são os 144 mil em Apocalipse 7?

252
Osborne, Revelation, p. 604.

253
R. Bauckham, The theology of the Book of Revelation (Cambridge: University Press, 1993), p.

25.

254
Ibid., p. 27.

255
Ibid., p. 28-30.

256
M. E. Boring, “The Theology of Revelation: ‘The Lord our God the Almighty Reigns’”, Int

40 (1986), p. 259-63.

257
Bauckham, Theology of the Book of Revelation, p. 31.

1777
258
Sobre a importância teológica da imagem do trono, veja Beale, “Revelation (Book)”, in: T. D.

Alexander; B. S. Rosner, orgs., New Dictionary of Biblical Theology (Downers Grove: InterVarsity,

2000), p. 356-7.

259
Essas pedras iridescentes também adornam a nova Jerusalém enfeitada com todos os tipos de

materiais preciosos, indicando que toda a cidade resplandece com a glória de Deus (21.11-23); veja

Aune, Revelation 1 to 5, p. 285.

260
A visão de João da sala do trono celestial oferece uma perspectiva apocalíptica que contrasta

as pretensões imperiais, assumindo a soberania cósmica, com o verdadeiro rei e juiz do universo;

veja Aune, “Influence of Roman Imperial Court Ceremonial”, p. 5-26.

261
Osborne, Revelation, p. 32 [publicado em português por Vida Nova sob o título Apocalipse:

comentário exegético].

262
Beale, “Revelation”, p. 357.

263
Beale, Book of Revelation, p. 196; veja Mounce, Book of Revelation, p. 73.

264
Como Caird (Revelation of St. John, p. 25-6) corretamente observou, não se deve

simplesmente compilar uma lista de alusões de modo a “desfiar o arco-íris”, porque João pintou um

retrato composto em vez de uma colagem fragmentada. Contra Beale (Book of Revelation, p. 220),

que chamou Apocalipse 1.12-20 de um midrash (comentário) sobre Daniel 7 e 10; veja a crítica de

Aune, Revelation 1 to 5, p. 74.

265
Veja, por exemplo, 1Enoque 90.9-12; T. Jos. 19.8; T. Benj. 3.8). Para um estudo proveitoso de

Jesus como Cordeiro em Apocalipse, veja P. Stuhlmacher, “Das Lamm Gottes — eine Skizze”, in:

Geschichte-Tradition-Reflexion, p. 529-42.

266
Sobre a entronização de Cristo, veja Holtz, Christologie, p. 27-54; Swete, Revelation, p. 121-

7; Roloff, Revelation, p. 72-3; Aune, Revelation 1 to 5, p. 332-5; R. Stefanović, The Background and

1778
Meaning of the Sealed Book of Revelation 5, AUSDDS 22 (Berrien Springs: Andrews Univ. Press,

1996), p. 206-17.

267
Osborne, Revelation, p. 678-9.

268
Aune, Revelation 17 to 22, p. 1050-51.

269
Caird, Revelation to St. John, p. 241; G. A. Krodel, Revelation (Minneapolis: Augsburg,

1989), p. 321; Beale, Book of Revelation, p. 954.

270
Embora os fiéis venham como um exército messiânico, Cristo, sozinho, é aquele que executa

a batalha.

271
Ap 19.13,15; cf. 14.19,20. Veja também Jl 3.12,13; 1Enoque 100.3; 4 Ezra 15.35-36. Cf.

Aune, Revelation 6 to 16, 847; Bauckham, Climax of prophecy, p. 40-8.

272
Veja Salmos 2.1-3; Ezequiel 38.14-16; 39.1-6; Joel 3.2; Zacarias 12.1-9; 14.2; cf. 1Enoque

56.5,6; 90.13-19; 99.4; 2Bar. 48.37; 70.7; 4Ezra 13.33-38; Jub. 23.23; Or. Sib. 3.663-68; Pss. Sol.

2.1-2; 17.22-23; 1QM 1:10-11. Cf. Aune, Revelation 17 to 22, p. 1064.

273
G. R. Osborne, “Theodicy in the Apocalypse”, Trin J 14 NS (1993), p. 63.

274
Ibid., p. 77.

275
Cf. D. A. Carson, How long, o Lord? reflections on suffering and evil, 2. ed. (Grand Rapids:

Baker, 2006); J. N. Day, Crying for justice (Grand Rapids: Kregel, 2005), p. 107; E. Nardoni, Rise

up, o judge: a study of justice in the biblical world, tradução para o inglês de S. C. Martin (Peabody:

Hendrickson, 2004), p. 123.

276
Osborne, Revelation, p. 640.

277
Mounce, Book of Revelation, p. 325; Prigent, Commentary on the Apocalypse, p. 504. Contra

Aune (Revelation 17 to 22, p. 994), que usou um forte argumento para tomar “meu povo” como o

1779
assunto mais lógico para os verbos que comandam a justiça retributiva, embora ver os cristãos como

agentes desse julgamento divino pareça improvável. Veja as referências do AT e do Segundo templo

em ibid., p. 993.

278
Veja Salmos 137.8; Isaías 40.2; Jeremias 50.29. A linguagem de “retribuir em dobro”

constitui uma metáfora. Veja Osborne, Revelation, p. 641; Beckwith, Apocalypse of John, p. 715;

Mounce, Book of Revelation, p. 325; Prigent, Commentary on the Apocalypse, p. 504. Contra Morris,

Revelation, p. 217.

279
Caird, Revelation of St. John, p. 227-48.

280
P. Vassiliadis, “The translation of Martyria Iēsou in Revelation”, BT 36 (1985), p. 132-3; T.

W. Manson, “Martyrs and Martyrdom”, BJRL 39 (1956-57), p. 464; E. Lohmeyer, “Die Idee des

Martyriums im Judentum und Urchristentum”, ZST 5 (1928), p. 232-49; N. Brox, Zeuge und

Martyrer: Untersuchungen zur fruhchristlichen Zeugnis-Terminologie, SANT 5 (Munich: Kösel,

1961); A. Satake, Die Gemeindeordnung in der Johannesapokalypse (Neukirchen-Vluyn:

Neukirchener, 1966), p. 97-119; como tentativa Ladd, Revelation, p. 47; Aune, Revelation 1 to 5, p.

37-8; O. K. Peters, The Mandate of the Church in the Apocalypse of John, SBL 77 (New York: P.

Lang, 2005), p. 77-118.

281
Beale, Book of Revelation, p. 190; Osborne, Revelation, p. 62; Swete, Apocalypse of St. John,

p. 35; Ford, Revelation, p. 374; Mounce, Book of Revelation, p. 70. O melhor estudo da terminologia

de “testemunho” em Apocalipse é A. A. Trites, “Μάρτʋϛ and Martyrdom in the Apocalypse: A

Semantic Study”, NovT 15 (1973), p. 72-80. Cf. id., “Μάρτʋϛ, µαρτʋρέω” NIDNTT 3:1038-50; H.

Strathmann, “Μάρτʋϛ, µαπτʋρέω” TDNT 4:474-514; Mazzaferri, Genre, 306-10; id., “Martyria

Iēsou Revisited”, p. 114-22; B. Dehandschutter, “The Meaning of Witness in the Apocalypse”, in:

L’Apocalypse johannique, p. 283-8; P. Ellingworth, “The Martyria debate”, BT 41 (1990), p. 138-9.

282
Mais frequentemente, ocorre na expressão “a palavra de Deus e o testemunho de Jesus” (1.2,

9; 6.9; 20.4, NIV) e uma vez com “os mandamentos de Deus” (12.17; veja 14.12). Em 11.7; 17.6;

1780
19.10, claramente se refere ao testemunho mantido pelos fiéis. Isto é relacionado com sua

proclamação vocal da fidelidade a Cristo resultando em sua execução e opressão (1.9; 6.9; 11.7;

12.11,17; 17.6; 20.4).

283
Veja A. J. Köstenberger, “The Contribution of the General Epistles and Revelation to a

Biblical Theology of Religions”, in: E. Rommen; H. Netland, orgs., Christianity and the Religions: A

Biblical Theology of World Religions, EMS Series 2 (Pasadena: William Carey Library, 1995), p.

133-5, com referência a Bauckham, Climax of Prophecy, p. 238-337.

284
Veja Osborne, “Theodicy”, p. 63-77; A. Y. Collins, “Persecution and vengeance in the book of

Revelation”, in: Apocalypticism in the Mediterranean World and the Near East, p. 729-30.

285
Veja Köstenberger, “The Contribution of the General Epistles and Revelation”, p. 133-5.

286
J. M. Ford, “The Christological Function of the Hymns in the Apocalypse of John”, AUSS 36

(1998), p. 207.

287
Veja deSilva, “The ‘Image of the Beast’ and the Christians in Asia Minor”, p. 197-201.

288
Dio Cássio, Hist. 59.24.4; Filo, Leg. 116; Aune, Revelation 6 to 16, p. 741.

289
Bauckham (Theology of the book of Revelation, p. 120) observou o paralelo com o encontro

de Moisés com o faraó e seus mágicos e o conflito de Elias com Jezebel e os profetas de Baal.

290
B. R. Rossing, The choice between two cities: whore, bride, and empire in the Apocalypse,

HTS (Philadelphia: Trinity Press International, 1999), p. 14-5.

1781
Parte 5

CONCLUSÃO

As seções anteriores deste volume trataram das questões fundamentais


relacionadas com o cânon e o contexto do NT (Parte 1) e forneceram
discussões dos Evangelhos (Parte 2), do livro de Atos e das cartas de Paulo
(Parte 3), e das Epístolas Gerais e do Apocalipse (Parte 4). Com isso, essas
abrangentes introdução e pesquisa do NT estão quase completas. Resta
apenas discutir as relações entre as várias partes componentes do cânon do
NT. Assim, o capítulo 21 trata da unidade e diversidade no NT.

1782
CAPÍTULO 21

Unidade e diversidade no Novo


Testamento

CONHECIMENTOS ESSENCIAIS
Conhecimentos básicos: os estudantes deverão conhecer as principais
questões envolvidas na discussão da unidade e diversidade do NT. Eles
devem ter uma compreensão da relação básica entre os Evangelhos, Atos,
as cartas e o Apocalipse, e ser capazes de identificar os principais pontos de
integração na teologia do NT.
Conhecimentos intermediários: além do domínio do conteúdo
essencial identificado no Conhecimento básico, os estudantes devem ser
capazes de comparar e contrastar a relação entre os Sinóticos e João, Jesus e
Paulo, e a caracterização de Paulo em Atos e nas cartas paulinas. Eles
também devem ser capazes de fornecer uma discussão completa e
aprofundada dos pontos de integração na teologia do NT.
Conhecimentos avançados: além de domínio do conteúdo essencial
identificado nos itens Conhecimento básico e Conhecimento intermediário,
os estudantes devem ser capazes de discutir a alegada evolução no

1783
pensamento de Paulo. Eles também devem ser capazes de discutir a relação
entre a teologia de Paulo, Pedro, Tiago e outras vozes do NT.

INTRODUÇÃO

Ao final desta introdução ao NT, seria apropriado uma breve reflexão


sobre a relação entre os livros do NT como parte do cânon do NT. Nós
discutimos o desenvolvimento do cânone e fornecemos informações sobre
questões introdutórias para cada livro que o compõe. O propósito deste
capítulo conclusivo é tratar das questões decorrentes da unidade e
diversidade no NT, isto é, as maneiras como esses vários livros são
coerentes entre si, e ainda assim revelam uma certa diversidade.

O Relacionamento Entre os Evangelhos, o Livro


de Atos, as Cartas e o Livro de Apocalipse
A nível canônico pode ser útil iniciar este capítulo com uma breve
exploração do relacionamento entre os Evangelhos, o livro de Atos, as
cartas e o Apocalipse, respectivamente. Em primeiro lugar, uma palavra
sobre os Evangelhos é necessária. Não há nenhuma evidência que qualquer
outro evangelho que não os quatro Evangelhos Canônicos nunca fizeram
parte do reconhecido cânon da igreja (incluindo os Evangelhos Gnósticos).
Por outro lado, há antigas e confiáveis evidências de que Mateus, Marcos,
Lucas e João foram considerados apostólicos e dignos de crédito
praticamente desde o início.
A ordem canônica dos evangelhos — Mateus, Marcos, Lucas e João —
muito provavelmente não reflete a antiga convicção da igreja de que esses

1784
livros foram escritos nesta ordem cronológica, mas, antes, é devida a várias
considerações tópicas. Mateus, aparentemente, foi escolhido primeiro
porque esse Evangelho começa com a genealogia de Jesus Cristo e,
portanto, proporciona uma transição adequada do ponto final da revelação
do AT e um ponto de entrada adequado para a história do NT,
principalmente a vinda de Jesus.
Ao mesmo tempo, uma consideração cronológica parece ter estado em
jogo no que diz respeito à colocação de João na última posição entre os
quatro Evangelhos com base na convicção de que seu Evangelho foi escrito
no final da era apostólica, posteriomente aos Evangelhos Sinópticos (veja
Ireneu, Contra Heresias 3.1.1). No entanto, devido ao gênero de seu
evangelho, João se interpõe entre o Evangelho de Lucas e o livro de Atos,
embora Lucas escreveu ambos, no qual ele documentou a história de Jesus e
da igreja primitiva em um formato de dois volumes (veja At 1.1).
Além disso, para ser mais preciso, embora existam quatro Evangelhos
no Novo Testamento, todos eles dão testemunho de um único e mesmo
evangelho.1 Esses Evangelhos — ou melhor, “esse Evangelho” abre o cânon
do NT, embora, cronologicamente falando, várias das cartas do NT foram
quase que com certeza escritas antes, de pelo menos, alguns dos Evangelhos
(e em alguns casos, antes de qualquer um deles). Pois os Evangelhos (e os
ensinamentos de Jesus que eles contêm), constituem a base da teologia do
NT.
O livro de Atos segue os Evangelhos no cânon e narra a história do “que
Jesus continuou a fazer” na época da igreja primitiva (At 1.1, tradução do
autor; observe também a sobreposição entre o final do Evangelho de Lucas
e no início de Atos). A implicação importante disso é que não há base
bíblica e canônica para uma disjunção radical entre o “Jesus histórico” e o

1785
“Cristo da fé”, isto é, entre Jesus como ele nasceu, viveu, morreu e
ressuscitou, e Cristo como o objeto da fé de seus primeiros seguidores após
a ressurreição.
Ao contrário, o Jesus ressurreto se tornou o foco central da antiga
proclamação apostólica de acordo com o livro de Atos. Como Pedro pregou
no dia de Pentecostes: “foi a este Jesus que Deus ressuscitou; e todos somos
testemunhas disso […] Portanto, toda a casa de Israel fique absolutamente
certa de que esse mesmo Jesus, a quem crucificastes, Deus o fez Senhor e
Cristo” (At 2.32,36, grifo nosso)! O mesmo que o povo crucificou tornou-
se, agora, por força de sua ressurreição, o Senhor justificado e exaltado que
é justamente o objeto de adoração da igreja.2
Com seu padrão geográfico traçando a expansão do Cristianismo, desde
Jerusalém a todo o caminho de Roma, capital do império (At 1.8), o livro de
Atos estabelece as bases para o próximo segmento do cânon do NT, ou seja,
as Cartas, na medida em que estabelece a estrutura do quadro na qual
muitas das Cartas podem ser colocadas. O estabelecimento de igrejas na
Galácia, Tessalônica, Corinto e Éfeso, bem como o recrutamento de
Timóteo, fornecem o contexto para a maioria das cartas paulinas, no cânon
do NT.
Essas cartas oferecem uma visão sobre as questões específicas tratadas
em algumas das principais igrejas durante o período apostólico. Isso inclui
sérios desafios doutrinários, tais como: a mensagem do evangelho, como na
Galácia (cf. Gl 1.6; veja At 15); uma variedade de questões
congregacionais, como o casamento; a ingestão de alimentos sacrificado
aos ídolos e o exercício dos dons espirituais em Corinto (cf. 1Co 7-16); a
doutrina da igreja (cf. as Epístolas da Prisão); a estrutura da igreja e as
qualificações para a liderança (epístolas pastorais).

1786
O livro de Apocalipse prevê, portanto, encerramento, uma vez que
retrata o retorno glorioso de Jesus (a Segunda Vinda), seu subsequente
julgamento do mundo, e a reunião dos seus eleitos (sua comunidade da
aliança) para morar com ele para sempre no céu. A Criação e a Queda, no
início do cânon das Escrituras, encontram seus complementos na Nova
Criação restaurada e na reversão dos efeitos da Queda em seus capítulos
finais.3

Questões Relacionadas à Unidade e Diversidade


do NT

Os evangelhos sinóticos e o Evangelho de João


Pelo menos desde o final do século XVIII, os críticos alegaram que os
Evangelhos Sinóticos e o de João apresentam irreconciliáveis conflitos.4 A
solução, adotada pela grande maioria dos comentaristas, foi que os
escritores sinóticos estavam mais interessados na história, enquanto João
estava principalmente interessado em teologia. Afinal, Clemente de
5
Alexandria não se referiu a João como um “evangelho espiritual”? Depois
que surgiram as dúvidas inicias na década de 1790, foi particularmente K.
G. Bretschneider, e depois D. F. Strauss, quem desacreditaram a
confiabilidade histórica de João e propuseram que seu Evangelho trata com
o “mito”, e não com a narrativa histórica.6
Nos últimos anos, entretanto, a confiabilidade histórica do Evangelho de
João assistiu a uma notável reabilitação.7 É agora amplamente reconhecido
que a avaliação esboçada da relação entre os Sinóticos e João não é apenas
indevidamente simplista, mas, na verdade, incorreta. Há várias razões para

1787
isso. Primeiro, há um número notável daquilo que alguns estudiosos
chamaram de “conexões entrelaçadas” entre João e os Sinóticos, isto é,
casos em que o Evangelho de João preenche um detalhe ou uma conexão
nos Evangelhos Sinóticos.8 Isso inclui, em particular, casos em que parece
que João pressupunha a familiaridade de seus leitores com a tradição
Sinótica e muito possivelmente com um ou mais dos Evangelhos escritos
(p. ex., Jo 1.40; 3.24; 4.44; 6.67,71; 11.1,2).9 Isso sugere que os Sinóticos e
João não estão em conflito, mas mantêm uma relação de
complementaridade.
Em segundo lugar, foi demonstrado que muitos detalhes históricos,
geográficos e topográficos no Evangelho de João são, de fato,
historicamente precisos, ou seja, podem ser corroborados pela arqueologia e
fontes extrabíblicas existentes.10 Descobertas arqueológicas como artefatos
relacionados a Caifás e a família sacerdotal ou a localização da piscina de
Siloé são casos em questão.11 O famoso historiador M. Hengel considerou o
Evangelho de João como sendo uma fonte importante para o judaísmo do
primeiro século, creditando o seu autor com um excelente conhecimento da
topografia palestina e do calendário judaico.12 Hengel também destacou que
vários peças de informação ocorrem no Evangelho de João pela primeira
vez, como a aldeia samaritana chamada Sicar (4.5), o nome ta enkainia
como uma designação para a Festa dos Tabernáculos (10.22), e a
caracterização de Anás, como sogro de Caifás (18.13).13 E a descrição que
João faz de Anás e Caifás recebeu os maiores elogios de Hengel.14
Nos casos em que o Evangelho de João se sobrepõe aos sinóticos, João
frequentemente fornece informações adicionais.15 Ele mencionou um
menino com cinco pães de cevada e dois peixes pequenos como também a
conversa de Jesus com Filipe e André na alimentação da multidão (6.5-9);

1788
ele se referiu a fragrância do perfume e identificou Judas como aquele que
se opôs a unção dos pés de Jesus, por Maria de Betânia, antes da
crucificação (12.3-8: Mateus diz “os discípulos” em 26.8, e Marcos “alguns
dos presentes” em 14.4, NVI), e ele especificou Malco como o nome do
servo cuja orelha Pedro cortou no Getsêmani (Jo 18.10).
Talvez a dificuldade mais comum observada na conciliação entre o
Evangelho de João com os Evangelhos Sinóticos esteja relacionada com a
datação da celebração da última Páscoa de Jesus com seus discípulos.16
Alguns estudiosos alegam que a referência ao “dia da preparação para a
Páscoa” (Jo 19.14) coloca a Última Ceia, na noite de quarta-feira com a
crucificação ocorrendo na quinta-feira à tarde, quando os cordeiros pascais
teriam sido abatidos em preparação para a Páscoa, mais tarde, naquela
noite. No entanto, um olhar mais atento revela que João e os Sinóticos
apresentam Jesus como tendo tomado uma refeição final com os seus
discípulos, a ceia pascal, na noite de quinta-feira, com a crucificação tendo
ocorrido na tarde de sexta-feira.
A resolução é encontrada em 19.13, onde somos informados de que a
crucificação de Jesus teve lugar no “dia da preparação” (v. 14, NVI) com o
dia seguinte sendo um “sábado especial”, isto é, o Sábado da semana da
Páscoa. Assim, até mesmo em João a crucificação tem lugar na sexta-feira,
com o “dia da preparação” em João, como em Marcos e Lucas, referindo-se
não ao dia da preparação para a Páscoa, mas para a preparação do Sábado
(Mc 15.42; Lc 23.54; veja Josefo, Ant. 16.163-64). Além disso, uma vez
que a Páscoa durava uma semana inteira (em conjunto com a associada
Festa dos Pães Sem Fermento; veja Lc 22.1), era costume falar do dia de
preparação para o Sábado como “o dia da Preparação da semana da
Páscoa“, embora não da Páscoa em um sentido mais estreito, como uma

1789
melhor tradução da oração em João 19.14. Outros aparentes discrepâncias
entre João e os Sinóticos são igualmente capazes de resolução.17
Em terceiro lugar, a dicotomia entre o alegado principal interesse dos
Sinóticos na história e o foco de João na teologia, é em si, altamente
suspeitos, como M. M. Thompson e outros estudiosos demonstraram.18
Muitos aspectos da confiabilidade histórica do Evangelho de João foram
confirmados por fontes arqueológicas e extrabíblicas. Além disso,
estudiosos têm percebido, cada vez mais, que os Sinóticos também estão
interessados em teologia, no sentido de que eles revelam os respectivos
interesses e ênfases teológicas dos evangelistas. Como vimos, Lucas tinha
um interesse especial naqueles com baixo status na sociedade, como os
pobres, os gentios, as mulheres, e as crianças, ele tratou extensivamente
com as questões relacionadas com a riqueza e a pobreza. Mateus apresentou
os ensinamentos de Jesus sob a forma de cinco extensos discursos após o
padrão de Moisés e do Pentateuco. Os exemplos poderiam ser
multiplicados.
Assim, a conclusão parece justificar que ambos os Sinópticos e João
estão interessados em ambas história e teologia. Isto é também confirmado
pela forte ênfase em testemunhos oculares no Evangelho de João (p. ex.,
1.7,8,15; 5.31-47).19 Seria difícil imaginar por que um Evangelho que
explícita e repetidamente enfatiza a importância do testemunho ocular iria,
ao mesmo tempo, jogar com ambos os fatos. Até mesmo o próprio autor
alegou ser uma testemunha ocular da Última Ceia (13.23), da crucificação
(19.35), e do restante dos acontecimentos registrados na narrativa de todo o
Evangelho (21.24,25). Por essas razões, a distinção entre história e teologia
para descrever a relação entre os Sinóticos e João é falsa e deveria ser
abandonada.

1790
Jesus e Paulo
Um outro alegado ponto de tensão na teologia do NT é aquele entre os
ensinamentos de Jesus e os de Paulo.20 Alguns dicotomizaram entre o Jesus
histórico e o Cristo da fé, e com base nessa distinção propuseram que
apenas o último contribui, de forma adequada, para a teologia do NT. Além
disso, foi sugerido que o apóstolo Paulo, e não Jesus, foi o fundador do
cristianismo no sentido de que ele desenvolveu um corpo distinto de
ensinamentos que fizeram do cristianismo uma religião no pressuposto de
que Jesus era de fato o Cristo e Filho de Deus. Embora possa haver alguma
verdade nisso, o cuidado é imperativo, por diversas razões.
Em primeiro lugar, embora seja verdade que Paulo não foi um seguidor
de Jesus durante seu ministério terreno — na verdade, ele perseguiu
vigorosamente os primeiros cristãos até seu encontro com Cristo
ressuscitado na estrada de Damasco (At 8.1-3; 9.1-19), existem alguns
elementos de continuidade com Jesus em suas cartas. Por exemplo, Paulo,
em poucas passagens apela para os ensinamentos de Jesus como sua
autoridade (p. ex., 1Co 7.10: “Não eu, mas o Senhor”, veja v. 12.25; cf. At
20.35: “Dar é mais bem-aventurado que receber”; 1Co 9.14; 11.23-26, 1Ts
4.15). Em um nível mais sutil, Wenham e outros acadêmicos identificaram
uma série de alusões aos ensinamentos de Jesus nas cartas de Paulo (p. ex.,
1Co 13.2: “E mesmo que tivesse fé suficiente para mover montanhas”, veja
Mt 17.20 e paralelos), bem como outras referências a Jesus (2Co 8.9; Fp
2.5).21
Segundo, Paulo não dicotomizou de modo nenhum entre Cristo e
Cristianismo. Na verdade, Dunn corretamente observou que “em resumo,
para Paulo, o cristianismo é Cristo”,22 e os primeiros cristãos (incluindo
Paulo) uniformemente afirmavam em sua primeira e principal confissão que

1791
“Jesus é o Senhor” (At 2.36, Rm 10.9; Fp 2.11). Que Paulo poderia se
definir como o “fundador do cristianismo” antes de Jesus é, portanto,
inconcebível.
Ao mesmo tempo, as coisas não são tão simples como dizer que Paulo
foi, portanto, um mero “seguidor de Jesus”.23 Isso não significa que ele se
encontrava em um relacionamento antagônico ou descontínuo com Jesus —
longe disso. Significa apenas que Paulo tinha outras fontes importantes no
desenvolvimento de sua teologia que não o recurso direto aos ensinamentos
de Jesus. S. Kim corretamente sugeriu que a conversão de Paulo o levou a
reler as Escrituras Hebraicas à luz de sua recente convicção de que o Cristo
ressuscitado tinha morrido como o puro substituto para a humanidade
pecadora e, portanto, não suportou a maldição de Deus por seus próprios
pecados como ele tinha anteriormente (e erroneamente) pensado.24 Nos
meses e anos que se seguiram, sua releitura inspirada e orientada pelo
Espírito da Escritura, à luz desse novo axioma hermenêutico (Jesus = o
Cristo) resultou em um corpo de ensinamentos paulinos que não podem ser
simplesmente reduzidos à dependência direta dos ensinamentos de Jesus.
Isso é confirmado também pela lógica do ministério de Paulo, que
geralmente tomava o seu ponto de partida na sinagoga local onde as pessoas
acreditavam na vinda do Messias, mas não em Jesus. Por isso, teria sido
inadequado, para os propósitos de Paulo, citar o ensinamento de Jesus, pelo
menos na fase inicial de sua proclamação apostólica. Antes, Paulo tinha que
mostrar a partir das Escrituras Hebraicas que os acontecimentos na vida de
Jesus cumpriram a profecia messiânica, e que o Messias, era na verdade,
Jesus, movendo-se do conhecido (e amplamente esperado) para o
desconhecido (ou não provado, a saber, que Jesus era o Messias; p. ex., At
9.20,22; 13.32-41). Como o livro de Atos deixa claro, Apolo e outros

1792
enfrentaram o mesmo desafio e adotaram a mesma estratégia (At 18.28),
assim como Mateus e João nos seus Evangelhos (ambos escritos por
apóstolos que foram testemunhas oculares) e no livro de Hebreus.
Também, fica claro que pelo menos em alguns casos, Paulo não foi
capaz de se basear no de Jesus sobre um determinado assunto. Entre os
exemplos prováveis estão a natureza do corpo da ressurreição (1Co 15.35-
57), o cenário e o momento do arrebatamento (1Ts 4.13-18, embora veja v.
15), a doutrina paulina da igreja como Corpo de Cristo (Rm 12.1-8; 1Co
12.12-30; Ef 5.25-32), e seus ensinamentos sobre os dons espirituais (p. ex.,
1Co 12-14). Nesses e em outros casos, quaisquer que fossem as fontes de
Paulo para o desenvolvimento de sua teologia, seja a revelação direta ou a
extrapolação inspirada pelo Espírito das Escrituras Hebraicas ou outras
fontes, ele não procedeu com base nos ensinamentos de Jesus. Novamente,
isso não significa que há conflito real entre os ensinamentos de Jesus e os
de Paulo. Ao contrário, ambos sustentam um relacionamento forte e
complementar, essencialmente baseado no reconhecimento de que Jesus é o
Senhor, de modo que seus ensinamentos são coerentes.
Isso também significa que deve se tomar cuidado para não construir o
relacionamento Jesus-Paulo de uma maneira muito simplista, não importa
quão bem intencionados esforços de alguém possa ser. O tecido da teologia
NT, portanto, é rico em textura, tecendo uma veste colorida que exibe
diversidade de expressões e desenvolvimento teológico com base na
convicção subjacente de que há um só Deus, que Jesus é o Senhor e
Messias, e que a salvação é somente através do evangelho de Jesus Cristo.

O Paulo do livro de Atos e o Paulo das cartas

1793
“Seria o Paulo de Atos o verdadeiro Paulo?” F. F. Bruce perguntou em um
artigo publicado em 1976.25 Especialmente os estudiosos alemães na esteira
de F. C. Baur argumentaram, com frequência, que a apresentação que Lucas
faz de Paulo no livro de Atos é incompatível com a maneira como o
apóstolo retratou a si mesmo em suas cartas.26 O Paulo de Lucas, é alegado,
era invencível e movia-se em vitoriosa procissão de um lugar para outro.27
O apóstolo, porém, retratou a si mesmo como fraco e frequentemente
confuso.28 Para Lucas, Paulo foi um orador publico brilhante e persuasivo,29
mas o próprio Paulo disse que não era um bom orador e que os outros,
muitas vezes, o viam como um pregador de nível inferior.30
S. Porter resumiu e criticou as cinco razões principais que avançaram
contra uma identificação do Paulo de Atos e o Paulo das cartas: (1) o
desconhecimento aparente de Lucas da solução para o problema paulino da
missão aos gentios, sem a lei, (2) a descrição de Paulo como um fazedor de
milagres em Atos e a ausência virtual de referências a qualquer desses
milagres nas cartas, (3) a descrição de Paulo como um impressivo orador
em Atos e sua caracterização como um orador inexpressivo nas cartas; (4) a
afirmação de Paulo ao apostolado em suas cartas contra a dificuldade de
fundamentá-la no livro de Atos, e (5) as diferentes descrições das relações
judaico-cristãs em Atos e nas cartas paulinas. Além disso, alguns estudiosos
também acreditam ter detectado discrepâncias nas áreas de cristologia e
escatologia.
O espaço não nos permite discutir cada um desses argumentos
detalhadamente, embora isso tenha sido feito com sucesso em recentes
estudos acadêmicos.31 Mais uma vez, pode ser mostrado que a presente
questão é uma das diferentes perspectivas que podem muito bem ser
integradas em um coeso quadro geral.32 Lucas não escreveu uma biografia

1794
de Paulo.33 Ele estava interessado em Paulo como o principal defensor da
primeira missão cristã, e essa missão superou inúmeros obstáculos —
embora não por conta da genialidade estratégica de Paulo ou retórica
brilhante, mas através do poder soberano de Deus. Pela mesma razão, Paulo
frequentemente enfatizou nas suas cartas, que não é ele, mas Cristo nele que
foi a força motriz por trás da missão cristã e que a mensagem da cruz, não o
seu próprio poder de persuasão, tomou o centro do palco (p. ex., 1Co 2.1-5;
Gl 2.20).
Bruce listou uma série de coincidências entre Atos e as Cartas de Paulo,
algumas das quais estão na categoria que ele chamou de “coincidências não
premeditadas”. Primeiro, em suas cartas, Paulo apontou para as suas
impecáveis credenciais judaicas: ele era um “hebreu de hebreus” (Fp 3.5;
veja 2Co 11.22), ele ultrapassava em judaísmo a muitos de seus colegas
devido ao seu zelo pela tradição de seus antepassados (Gl 1.14). Mas é
somente em Atos que ficamos sabendo que Paulo tinha sido educado na
escola de Gamaliel, um dos mais proeminentes entre os professores fariseus
de sua geração (At 22.3; veja 5.35; cf. Fp 3.5; At 23.6; 26.5).
Segundo, a atividade de Paulo como perseguidor da igreja primitiva foi
relatada várias vezes no livro de Atos (At 8.3; 9.1). Em suas cartas, o
apóstolo regularmente reconheceu esta parte do seu passado ignominioso
(1Co 15.9; Gl 1.13,22,23; Fp 3.6; 1Tm 1.13).
Terceiro, os relatos da conversão de Paulo em Atos (9.1-19; 22.6-21;
26.12-23) fazem paralelo às afirmações de Paulo em suas cartas, de que
Deus “se agradou de revelar seu Filho em mim” (Gl 1.15; veja 2Co 4.6), e
sua indignada pergunta aos Coríntios: “Não vi Jesus, nosso Senhor?” (1Co
9.1, veja 15.8). O local da conversão de Paulo em ou perto de Damasco é

1795
consistente com sua afirmação de que, após sua visita à Arábia, “voltei
outra vez para Damasco” (Gl .117).34
Quarto, o livro de Atos e as cartas de Paulo indicam que ele se
sustentava com seu próprio trabalho (At 20.34; 28.3; 1Co 9.18; 1Ts 2.9, 2Ts
3.7,8).
Quinto, o livro de Atos e as cartas de Paulo revelam o padrão de Paulo
de ir “para o o judeu primeiro e também para”.35
Sexto, em Atos de Paulo se adaptou facilmente aos judeus e gentios,
assim como também a uma ampla variedade de audiências, o que é
consistente com aquele que disse: “Para os judeus, tornei-me judeu, para
ganhar os judeus. Para os que estão sem lei, como se estivesse sem lei.
Tornei-me tudo para com todos, para de todos os meios vir a salvar alguns.
Faço tudo por causa do evangelho, para dele me tornar coparticipante” (1Co
9.19-23, tradução do autor).
Sétimo, enquanto Lucas foi, talvez, o teólogo da história da salvação
par excellence, a história da salvação não era um conceito estranho para
Paulo. Embora ele enfatizasse a centralidade da justificação pela fé, Paulo
também via a era da lei como um parênteses na história da salvação, um
mero interlúdio na era da promessa que foi inaugurada com Abraão e
consumado no evangelho (Rm 5.20; Gl 3.15-19).
Não é de se admirar que Bruce concluiu no final de seu ensaio que o
Paulo de Atos é “o verdadeiro Paulo”. Além do mais, “sem as cartas de
Paulo, deveríamos ter uma impressão inadequada e unilateral dele, mas
graças a descrição de Lucas temos uma plena compreensão do lugar de
Paulo no mundo de sua época, e do impacto que ele provocou em outros do
que se fossemos dependentes apenas de suas cartas”.36 Porter concordou:
“As diferenças entre o Paulo de Atos e o das cartas a respeito de sua pessoa

1796
e obra, uma vez analisadas em detalhes […] não apontam para contradições
significativas e sustentáveis […] Os argumentos padrões organizados em
relação às diferenças na teologia também não são conclusivos”. Embora
possam haver diferenças de ênfase e foco, “a evidência está longe de
contradições substanciadas”.37
Talvez mais importante, como Porter destacou, enquanto o Paulo das
cartas era um epistológrafo, o Paulo de Atos era um orador.38 “Que
diferenças existem parecem ser inteiramente explicáveis em termos de Atos
e das cartas sendo escritas por dois autores diferentes, com suas
semelhanças apontando para contato íntimo entre os dois.”39 Concluímos,
portanto, com Witherington, que “o Paulo que vemos em Atos não é não
paulino, muito menos antipaulino, mas em alguns casos, um Paulo sobre o
qual não ouvimos falar nas cartas e, em alguns casos, um Paulo familiar,
embora de uma nova e diferente perspectiva. É um Paulo interpretado
através de olhos de admiração e respeito”.40

Os alegados desenvolvimentos no pensamento de


Paulo41
Em certos círculos acadêmicos foi moda postular um desenvolvimento
acentuado da correspondência anterior de Paulo em relação a seus escritos
posteriores.42 Assim, foi mantido por alguns desses acadêmicos que o
apóstolo retrocedeu de um evangelho igualitário (Gl 3.28) para um
evangelho tradicional-conservador,43 ou que sua expectativa de retorno de
Cristo mudou no decurso da sua carreira de uma iminente para uma mais
distante. Para citar um outro exemplo, Bruce discutiu e criticou o volume de
J. Drane sobre Paulo: Libertino ou legalista?, que vê o apóstolo como

1797
movendo-se, à boa moda hegeliana, do libertinismo em Gálatas para um
tipo de “legalismo” em 1Coríntios e como tomando uma abordagem mais
equilibrada em 2Coríntios e Romanos.44 Embora as benevolentes avaliações
falem das mudanças percebidas como essas apenas em termos de um
desenvolvimento no pensamento de Paulo, outros as consideram flagrantes
contradições. Alega-se que Paulo, frequentemente alterava a sua posição e
se enganava ou se confundia com relação ao papel da lei ou outras
questões.45
Paulo apenas começou sua carreira de escritor cerca de quinze anos
após sua conversão, quando ele estava com pelo menos quarenta anos de
idade, e sobre o longo período antes disso temos muito pouca informação
disponível. Quando compôs sua primeira carta existente, entretanto, ele de
modo nenhum era um novato, pois seus pensamentos são caracterizados por
considerável maturidade teológica. De sua primeira viagem missionária em
diante, o ministério do apóstolo se estendeu somente por cerca de quinze
anos, o que estabelece novos limites para o desenvolvimento de hipóteses.46
Além disso, o conteúdo das cartas de Paulo dependia em grande medida de
suas circunstâncias missionárias específicas. Por essas razões, é imperativo
ter um grande cuidado quando se compara as treze cartas que Paulo
escreveu uma com a outra, e é preciso ter cuidado para não ler muito nos
silêncios nessas cartas, como se isso necessariamente indicasse a
inexistência de uma dada categoria paulina, como a justificação pela fé.
Apesar dos influentes ensaios de C. H. Dodd sobre a mudança e
desenvolvimento em Paulo mais de meio século atrás47 e tratamentos
semelhantes, a comprovação da tese de uma desenvolvimento no
pensamento de Paulo é, portanto, repleta de considerável dificuldade.48 É
claro que uma mudança de paradigma ocorreu no pensamento do apóstolo

1798
logo no início de sua carreira na época de sua conversão,49 mas se algum
desenvolvimento do pensamento ocorreu em seu pensamento, isso
provavelmente aconteceu antes das cartas de Paulo serem escritas, e não
durante o período relativamente curto de tempo durante o qual Paulo as
escreveu.50
Por razões como essas, E. Lohse recentemente argumentou, de forma
decisiva, contra a noção de mudanças de pensamento na teologia paulina.
Embora permitindo que Paulo possa ter variado “sua maneira de falar com
as várias igrejas”, Lohse sustentou que “ele não mudou seu pensamento
teológico fundamental”.51 Investigando as três principais áreas nas quais
alguns acadêmicos afirmam que Paulo experimentou uma mudança de
pensamento, Lohse não conseguiu encontrar evidências para tal em cada
caso: a escatologia de Paulo não se alterou significativamente entre a
composição de 1Tessalonicenses e Romanos;52 em sua interpretação da lei,
“Paulo não mudou seu pensamento de uma estágio de sua obra missionária
para o outro […] [mas] era, pelo contrário, um proeminente teólogo
argumentando a partir de uma clara perspectiva teórica”;53 e o
“entendimento, de Paulo, do evangelho e sua doutrina da justificação são
idênticos” de Gálatas a Romanos.54
Isso não é negar que, no curso do ministério de Paulo, certas questões
ganharam maior destaque uma vez que o que o apóstolo as considerou de
grande importância. Chega-se a pensar na formulação consciente de uma
teologia da igreja (1Coríntios, Efésios, Colossenses) e instruções sobre a
sua organização (pastorais) em algumas das cartas escritas durante os anos
do meio e do final de sua carreira. Ao mesmo tempo, outras questões
deixaram de receber destaque, como a versão paulina de um evangelho sem
a lei em controvérsia com seus oponentes judeus-cristãos (Gálatas,

1799
Romanos). Embora os contornos exatos do evangelho ainda sejam muito
debatidos em Gálatas, por exemplo, o apóstolo pode, nas Pastorais, assumir
a existência de um núcleo de fé firmemente delineado.55
Assim, os escritos de Paulo devem ser julgados como exibindo um grau
considerável de coerência teológica e unidade em meio a uma certo volume
de diversidade terminológica e atenta contextualização.56 Isso fica evidente,
talvez de forma mais clara, na centralidade do evangelho nos escritos de
Paulo.57 Um outro exemplo é a convicção de que Jesus é o Messias e
Senhor exaltado; somente o termo Christos aparece quase 400 vezes nas
cartas e nos sermões de Paulo (veja At 17.2,3; 1Co 15.20-28; Fp 2.9-11). P.
J. Achtemeier considerou a convicção de Paulo de que Deus ressuscitou
Jesus dos mortos como sendo o “centro gerador” da teologia do apóstolo.58
Com seu foco no evangelho e sua convicção de que Jesus é o Cristo e o
Senhor exaltado, Paulo não estava sozinho. Todo o NT todo é permeado
com esses principais.59
Assim, concluímos, com Dunn,

que levando em conta a diversidade das circunstâncias e a variedade de expressões, parece


haver uma notável continuidade e homogeneidade ligando todas as cartas de Paulo em um
todo coerente.60 Existem ênfases diferentes, certamente, mas se deveríamos falar sobre um
desenvolvimento significativo é duvidoso. Há esclarecimentos de ideias anteriores, um
desdobramento ou significado e implicações mais completos, mas “evolução” seria um termo
menos apropriado.
No máximo, podemos imaginar, provavelmente, uma série de eventos e experiências que
mudaram as ênfases e exigiram elaborações, mas não alteraram os principais elementos ou
caráter geral de sua teologia, de uma maneira significativa.61

Diversidade de expressão em Paulo e Pedro, Paulo


e Tiago, e outras vozes do NT

1800
O espaço não permite comentar aqui, em detalhes, sobre os outros aspectos
da diversidade de expressão no NT.62 Comparações interessante
envolveriam aquelas entre a teologia de Paulo e a de Pedro (p. ex., as suas
eclesiologias), entre a de Paulo e a de Tiago (especialmente no que diz
respeito a seus ensinos sobre a relação entre fé e obras); entre a de Paulo e a
de Hebreus (assumindo a autoria não paulina de Hebreus), ou entre o a do
Evangelho de João e a de Hebreus (p. ex., cf. Jo 1.1-3 e Hb 1.1-3).
Embora certos períodos da história da igreja viram certas partes do NT e
do canôn bíblico serem premiados com uma posição privilegiada (como
Paulo, e aqui especialmente Romanos e Gálatas, na Reforma, e desde
então), é importante apreciar todas as vozes encontrando expressão no NT,
entre elas (os Evangelhos, Paulo), bem como menores (Pedro, Tiago,
Judas). Como visto, Cairo, por exemplo, imaginou os escritores do NT
participando de uma mesa redonda. Embora nenhuma analogia seja perfeita,
esse modelo ilustra muito bem a natureza da teologia do NT.

Pontos de Integração na Teologia do Novo


Testamento
G. Maier corretamente observou que a unidade do NT não é dependente da
identificação um, e somente um, centro de teologia do NT.63 Mesmo se
fosse impossível apontar esse centro solitário, isso não significaria que a
unidade do NT seria, portanto, descartada. Em outras palavras, pode não
haver um centro de teologia do NT, mas claramente há uma unidade
subjacente ao NT. Por esse motivo, pode ser preferível falar de vários
pontos de integração que fornecem coerência e unidade à mensagem do NT.

1801
Em 1936, C. H. Dodd invocou seus colegas acadêmicos para neutralizar
tendências desintegradoras na teologia NT e acentuar as semelhanças das
diversas perspectivas do NT.64 No restante deste capítulo, nós propomos três
pontos principais de integração que fornecem coesão a teologia do NT: (1)
o único Deus de Israel, como ele foi revelado nas Escrituras Hebraicas; (2)
Jesus o Cristo, o Senhor exaltado, e (3) o evangelho do perdão e da
salvação em Jesus Cristo. Isso não quer dizer que esses são os únicos temas
integrativos encontrados no NT, longe disso. Nosso tratamento desses três
principais temas do NT é simplesmente projetado para demonstrar a
substancial unidade teológica à diversidade de expressão no NT e, na
verdade, em toda a Escritura.

O único deus
Assim como o judaísmo, o cristianismo veio a ser conhecido por seu
monoteísmo.65 Os vários escritores do NT falam do mesmo, do único Deus,
o Deus de Israel (Mt 15.31; Lc 1.68) e de Abraão (Mt 22.32; At 3.13; 7.32),
que se revelou através do AT e que enviou Jesus (Jo 3.16). As mais de
1.300 referências do NT para Deus (theos) fornecem um testemunho falado
da importância central desse Deus. Assim, Jesus, de acordo com os
Evangelhos Sinóticos, fala sobre o reino de Deus;66 Paulo escolhe a justiça
de Deus como tema central;67 vários escritores do NT se referem à glória de
Deus;68 e vários até se referem ao evangelho cristão como “o evangelho de
Deus”.69 Além disso, pode-se ler sobre a vontade de Deus, o conhecimento
de Deus, o poder de Deus, a paz de Deus, a igreja de Deus, a obra de Deus,
Deus o Pai, Deus o Redentor, a palavra de Deus, o juízo de Deus, o
Espírito de Deus, a graça de Deus, e assim por diante. Todo o NT é

1802
permeado pela crença em Deus, seu caráter, e sua obra salvífica em Cristo.
Deus é, portanto, o fundamento, não apenas do NT, mas de toda a Bíblia, e
no NT também um dos temas mais unificadores que são discutidos mais
adiante: Jesus, o Messias, e do Senhor exaltado, e do evangelho.

Jesus, o Messias e o Senhor exaltado


A conexão entre o único Deus e Jesus, o Messias, e Senhor exaltado em
nenhuma passagem é mais clara do que na notável confissão citada por
Paulo em 1Coríntios 8.6: “No entanto, para nós há um só Deus, o Pai, de
quem todas as coisas procedem e para quem vivemos; e um só Senhor,
Jesus Cristo, pelo qual todas as coisas existem e por meio de quem também
existimos.”70 À luz desta estreita ligação entre o único Deus e o Senhor
Jesus Cristo, traçada pela igreja primitiva, a famosa exclusão de Bultmann
71
do Jesus histórico da teologia do NT é muito radical. A consciência
messiânica de Jesus e o fato de que o evento da Páscoa não podia por si só
produzir fé messiânica sublinhar a estreita ligação entre o assim chamado
Jesus histórico e a fé dos primeiros cristãos.72 De fato, a convicção de que
Jesus é o Messias predito no AT e o Deus exaltado representa um
importante centro integrador da teologia do NT.73 Essa convicção une tanto
o AT com o NT, quanto os quatro Evangelhos com o evangelho dos
primeiros cristãos, incluindo Paulo.74
A conversão de Paulo em seu encontro com Cristo ressuscitado foi
provocada pela compreensão de que o mesmo Jesus que Paulo considerava
amaldiçoado pela lei era de fato o redentor enviado de Deus (Gl 3.13,14).
Com esse ponto de partida, Paulo começou a ler o AT à luz desse
revolucionário axioma hermenêutico, o que levou não só a importantes

1803
interpretação cristológicas do Antigo Testamento, mas também colocou em
perspectiva o papel da lei na vida do fiel (cf. Rm 10.4).75 O cumprimento da
lei foi agora substituído por uma nova “lei”, aquela da vida no Espírito de
Cristo (Rm 8.2; Gl 5.16,18; veja 6.2), e essa lei foi — em contraste com a
lei no AT — não meramente externa para o fiel, mas através de seu Espírito,
Deus a escreveu diretamente no coração de uma pessoa (veja Jr 31.33,34).
Nisso, Paulo e João concordam (Rm 8.9; Gl 2.20; Jo 14.16,17; 1Jo 2.20,27).
Isso não significa que não há mais necessidade de novas instruções escritas
ou mandamentos, como se a possessão do Espírito evitasse totalmente a
necessidade para tal. Ao contrário, o NT está repleto desse material
exortatório.

O Evangelho
O evangelho de Jesus Cristo é uma das principais colas integrantes da
Escritura e particularmente do NT.76 Segundo Lohse, é a tarefa da “teologia
do NT demonstrar como os primeiros cristãos proclamavam o evangelho, e
mostrar em detalhes como esse kerygma foi interpretado nas teologias do
apóstolo Paulo, dos Sinóticos e nos escritos Joaninos”.77 O termo “boas
novas” já é encontrado no Antigo Testamento (p. ex., Is 40.9; 52.7). Jesus
começou o seu ministério chamando o povo ao arrependimento e à crer nas
“boas novas” (Mc 1.15 e paralelos). Paulo descobriu no evangelho o poder
para a salvação de todos os que o aceitam pela fé, judeus, como gregos.78
Além disso, o evangelho não apenas indicou para os primeiros cristãos que
o Jesus histórico deveria ser identificado com o ressurreto, Senhor exaltado
e o Messias que havia sido profetizado no Antigo Testamento. Era uma

1804
mensagem de perdão dos pecados por conta da obra substitutiva de Cristo
na cruz.79
Quando Paulo e seus colegas apostólicos leram o AT à luz da primeira
vinda de Cristo (veja At 17.2,3, Rm 1.2,17; 1Co 15.3-5), eles perceberam
que o Messias já estava lançado como um Messias sofredor, enviado para
morrer em favor de muitos e, dias depois, ressuscitar (p. ex., Is 53). Essa
convicção emerge repetidamente nos ensinamentos de Jesus nos quatro
Evangelhos (p. ex., Mc 8.31; 9.31; 10.33,34,45), em Paulo (p. ex., Rm 3.25;
2Co 5.21), em Pedro (1Pe 1.2,10-12,18-20), em Hebreus (Hb 1.3 etc), e
outros escritos do NT (p. ex., 1Jo 2.2; Ap 5.5,6). Portanto, o evangelho dos
primeiros cristãos (que por sua vez tinha raízes na consciência messiânica
de Jesus), tem como seu conteúdo o Messias crucificado e ressuscitado e
Senhor — na aplicação consciente das passagens do AT, à pessoa e obra de
Jesus. Finalmente, no livro de Atos, a Palavra de Deus é frequentemente
investida com características pessoais, de modo que não é de Paulo ou os
primeiros cristãos que exercem a sua missão, mas o próprio evangelho
marcha de forma irresistível e vitoriosa e aos confins da terra (veja At 6.7;
12.24; 19.20). Pesquisas recentes vêem o evangelho como um tema central,
especialmente na programática carta aos Romanos.80 Além disso, a
expressão “evangelho” (ou expressões equivalentes, tais como “mensagem”
ou “a fé”) é encontrada com frequência no NT, embora os contornos
precisos da mensagem cristã dependam das respectivas circunstâncias da
proclamação.81
Não apenas Paulo insistia em um evangelho unificado, mas ele também
o via como uma salvaguarda da unidade do movimento cristão (cf. Gl 1.6-
9).82 O evangelho estabeleceu uma base comum entre os diversos elementos
dentro da igreja, judeus e gentios, escravos e livres, homens e mulheres (Gl

1805
3.28; veja 1Co 12.13 e Cl 3.11). Assim, embora Paulo reconhecesse a
diversidade das congregações locais e os distintivos papéis e dons
espirituais de cada um dos membros da igreja, ele também via essa
diversidade dentro do quadro mais amplo de uma única igreja como um
único corpo de Cristo (1Co 12.12; Ef 4.4; 5.30), bem como do único Deus,
Senhor, e Espírito que opera na e através da igreja, individualmente e
coletivamente (1Co 12.4-11; Ef 4.3-6).

Sumário e Conclusão
As convicções de que há um só Deus, que Jesus é o Messias e Senhor
exaltado, e que a comunidade cristã foi confiada a proclamação do
evangelho da salvação em Jesus Cristo, podem ser encontradas na seguinte
lista parcial dos escritos do NT, que é fornecida na Tabela 21.1, na ordem
cronológica geral da composição.
Talvez o melhor resumo do evangelho seja encontrado em Atos 10.36:
“Ele enviou a palavra aos israelitas, anunciando o evangelho da paz por
meio de Jesus Cristo; este é o Senhor de todos”. Jesus é o Cristo e Senhor, e
seus seguidores proclamam o evangelho: “E todos os dias, no templo e de
casa em casa, não cessavam de ensinar e de anunciar Jesus, o Cristo.” (At
5.42). Esse evangelho também foi proclamado por Paulo (At 17.2,3). A
expressão “o Senhor Jesus Cristo” também sintetiza a unificada convicção
cristã de fé.83
A base comum da fé dos primeiros cristãos era composta de diversas
outras convicções — não apenas a crença em um único Deus, em Jesus
como Messias e Senhor, e no evangelho de perdão dos pecados em Cristo.
Como exemplos, podemos citar a expectativa do retorno de Jesus84 e o

1806
mandamento do amor, especialmente em Paulo e João, mas ele também está
presente em Pedro. Os primeiros cristãos também estavam unidos no
entendimento de que a igreja do NT era a nova comunidade messiânica, em
continuidade com a Israel do AT.85 A declaração de Paulo que fala de uma
unidade sétupla também deveria ser citada: “Há um só corpo e um só
Espírito, uma só esperança, um só Senhor, uma só fé, um só batismo; um só
Deus e Pai de todos, que é sobre todos, por todos e está em todos” (Ef 4.4-
6).

1807
Tabela 21.1: Principais Temas Unificadores na Teologia do NT
Jesus, Messias e Evangelho,
O único Deus
Senhor: mensagem, a fé:
1. Tiago:
Tg 1.1,5,13,20; 2.5,19 Tg 2.1 Tg 1.27
2. Paulo:
Gl 1.1,10,13,20,24 etc. Gl 1.3; 3.26; 6.14 Gl 1.7-9,23; 2.1,5,7 etc.
1Ts 2.2,8,9; 2Ts 1.5 1Ts 1.1,3; 5.9,23,28 1Ts 1.5; 2.2,4,8,9; 3.2;
2Ts 1.8; 2.14; 3.1
1Co 4.20; 6.9,10; 8.6; 1Co 2.2; 8.6 1Co1.17,18; 2.4; 4.15;
15.50; 2Co 5.21; 11.7 9.12,14,16,23; 15.1-4;
2Co 2.12; 4.3,4; 5.19;
8.18; 9.13; 10.14;
11.4,7
Rm 1.1,18,23; 3.5,7, 21- Rm 1.1-4; 5.1,11; 6.23 Rm 1.1,2,9,16,17; 2.16;
23; 5.2; 10.3; 14.17; 10.15-17; 15.16,19,20;
15.7,16 16.25
Ef 1.3-6; Fp 1.2,3; 3.9; Ef 1.10; 2.20; 4.15; Ef 1.13; 3.6; 4.5;
Cl 1.1,3,6,9,10; 4.11 5.23; Cl 2.6; 6.15,19; Fp
1.5,7,12,16,18,25,27; 2.
22; 4.3,15; Cl 1.5,23;
2.5,7; Fm 6,13
1Tm 1.1,4,11,17; 2.3,5; Fm 1 1Tm 1.2,11; 2.7; 4.1,6;
3.5, 6.10, 12,21; 2Tm
1.8,10,13,14; 2.8; 3.8;
4.7; Tt 1.9
15; 4.3-5 etc. 1Tm 1.12,15; 2Tm 1.10 Mc 1.1,14,15; 8.35;
10.29; 13.10; 14.9
3. Sinóticos e Atos:
Mc 1.14,15; 12.26,29,32 Mc 1.1; 8.29; 12.35-37 Mt 4.23; 9.35; 24.14;
26.13; 28.20

1808
Jesus, Messias e Evangelho,
O único Deus
Senhor: mensagem, a fé:
Mt 15.31; 22.32,37 Mt 1:1; 16.16; 22.41-46 Lc 4.18,43; 7.22; 8.1;
9.6; 16.16; 20.1; At
2.41; 5.20,42;
8.4,12,25,35,40; 10.36;
11.20; 15.7, 35;
17.11,18; 20.24
Lc 1.68; 20.37 At 1.3; Lc 2.11; 9.20; 20.41-44 Hb 2.3; 4.2,6,14; 12.2
3.13; 7.32,55; 8.12; At 2.36; 5.42; 9.22;
14.22; 19.8; 20.24; 17.2-3; 18.28
28.23,31
4. Hebreus:
Hb 1.1-3,5,6,13 etc. He 3.6; 13.8 1Pe 1.12,25; 2.8; 4.17;
5.9
5. Pedro
1Pe 4.14,17 1Pe 1.1-3,11; 3.15 2Pe 1.1
2Pe 1.1 2Pe 1.1,16 2Pe 1.1
6. Judas:
Jd 1,4,21,25 Jd 1.4 Jd 3.20
7. João:
Jo 1.1,2,6,12,18,36,51 Jo 1.17,41,45; 11.27; Jo 12.38; 17.20; 1Jo
etc. 20.31; 1Jo 2.22; 5.1 5.4
Ap 12.10; 15.8; 19.1; Ap 1.1,2,5 Ap 10.7; 14.6
21.11,23

A diversidade e a unidade do NT coexistem como características


comuns do NT e não constituem um problema — no sentido de tensões ou
contradições insolúveis —, mas presenteiam o leitor com a rica herança da
fé dos primeiros cristãos, na qual várias perspectivas do mesmo Jesus Cristo

1809
e do evangelho mesmo mutuamente completam uma a outra. A referência
de Paulo a “todo o propósito de Deus” (At 20.27) parece pressupor uma
perspectiva unificada.86 Wenham falou sobre uma “preocupação para a obra
fora de uma ortodoxia (e ortopraxia) definidos pela pessoa e ensinamento
de Jesus” e um desenvolvimento orgânico que pode ser comparada a uma
árvore cujos galhos têm uma origem comum e fazem parte de uma entidade
comum.87 Betz observou que a missão bem-sucedida dos primeiros cristãos
não se teria sido possível sem a unidade fundamental da fé cristã.88 Pode-se
também pensar da prontidão para o martírio, o qual com referência a Plínio,
por exemplo, nunca retratou os cristãos que ele interrogou como um grupo
dividido ou diversificado.
Os primeiros cristãos, e aqui especialmente Paulo e João, concordavam
que Jesus é o Cristo enviado por Deus e o Senhor exaltado. Com base nessa
convicção e na resultante mensagem do evangelho, Paulo, João, e outros
autores do NT desenvolveram suas próprias teologias dependendo de uma
variedade de circunstâncias: os respectivos requisitos do ministério, sua
própria experiência de fé, e muitos outros fatores, culturais, históricos,
missionários. Assim, o NT mostra que os primeiros cristãos foram, desde o
início, unidos em sua crença de que Jesus foi e é o Messias. Isso é indicado
já na primeira tradição apostólica.89 Só aos poucos essas convicções
fundamentais foram aplicadas às várias situações se chegou a outras
relevantes conclusões teológicas. W. Bauer acreditava que havia um
movimento da diversidade à unidade, mas os primeiros cristãos realmente
desenvolveram da unidade para a diversidade.90
G. B. Caird observou muito bem:

A pergunta que devemos fazer não é se todos estes livros dizem a mesma coisa, mas se todos
eles testemunham o mesmo Jesus e através dele a sabedoria mais esplendorosa do Deus
único. Se estamos convencidos de que o segundo Moisés, o Filho do Homem, o amigo dos

1810
pecadores, o logos encarnado, o primogênito de toda a criação, o Apóstolo e Sumo Sacerdote
da nossa vocação, the Chief Shepherd, e o Cordeiro abrindo o rolo são a mesma pessoa em
quem o Deus único realizou e está realizando sua poderosa obra, não devemos nem tentar
pressionar todas as nossas testemunhas em um único molde, nem capciosamente nos queixar
de que um parece em alguns pontos deficiente em comparação com outro. O que devemos
fazer é nos alegrar que Deus achou por bem estabelecer o seu evangelho na boca de tantas
testemunhas independentes. A música do coral do Novo Testamento não foi escrita para ser
cantado em uníssono.91

O único Deus, Jesus Cristo, e o Evangelho — esses são os principais


pilares da teologia do NT.92 Continua ser tarefa do intérprete fazer a exegese
das passagens individuais nos respectivos escritos do NT e relacionar os
diversos temas em diferentes documentos do NT um com o outro.93 No
entanto, isto pode acontecer na confiança de que o NT não é uma coleção
de peças díspares, que juntas resultam em nada mais do que uma cacofonia
de vozes, mas em uma sinfonia bem compassada na qual diferentes
elementos se combinam para uma obra harmoniosa que ecoa por todo o
mundo para a glória de Deus e a edificação dos indivíduos que respondem à
revelação divina, não com ceticismo, mas com fé.

QUESTÕES PARA ESTUDO


1. A que se refere “unidade e diversidade no NT”?
2. Como você explicaria brevemente a relação entre os Evangelhos, o
livro de Atos, as cartas, e o livro de Apocalipse?
3. Por que muitos estudiosos pensam que os Evangelhos Sinóticos e o
Evangelho de João se encontram em um inconciliável conflito?
4. Por que os Sinóticos e João se complementam em vez de se
conflitarem?

1811
5. Por que os intérpretes deveriam ser cuidadosos em dicotomizar os
ensinamentos e teologia de Jesus e de Paulo?
6. Por que F. C. Baur argumentou que a apresentação que Lucas faz de
Paul no livro de Atos é incompatível com a maneira como o apóstolo
retratou a si mesmo em suas cartas?
7. Quais são algumas razões de o Paulo de Atos e o das cartas paulinas
serem diferentes?
8. Quais são alguns dos alegados desenvolvimentos de pensamento de
Paulo?
9. Em relação a estes alegados desenvolvimentos , quais são os dois
exemplos que sugerem um considerável grau de coerência e unidade
paulinas?
10. Quais são os três principais pontos de integração que dão coesão à
teologia do NT?
11. Que outras convicções esses três pontos de integração produziram
entre os primeiros cristãos?
12. Por que a diversidade e a unidade que estão presentes no NT não
produzem tensões ou contradições insolúveis?

PARA ESTUDOS ADICIONAIS


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1815
1
Veja M. Hengel, “The Titles of the Gospels and the Gospel of Mark”, em: J. Bowden, org.,

Studies in the Gospel of Mark (Philadelphia: Fortress, 1985), p. 64-84; id., The Four Gospels and the

One Gospel of Jesus (Valley Forge: Trinity Press International, 2000).

2
Esta é a premissa básica de M. Bockmuehl, This Jesus: Martyr, Lord, Messiah (Edinburgh:

T&T Clark, 1994).

3
Para um tratamento proveitoso, veja G. Goldsworthy, According to Plan: The Unfolding

Revelation of God in the Bible (Leicester, UK: InterVarsity, 1991). Cf. D. A. Carson, The Gagging of

God: Christianity Confronts Pluralism (Grand Rapids: Zondervan, 1996), p. 253-78.

4
Veja A. J. Köstenberger, “Diversity and Unity in the New Testament”, em: S. J. Hafemann, org.,

Biblical Theology: Retrospect and Prospect (Downers Grove: InterVarsity, 2002), p. 146-9.

5
Citado em Eusébio, Eccl. Hist. 6.14.

6
K. G. Bretschneider, Probabilia de evangelii et epistolarum Joannis, Apostoli, indole et origine

eruditorum Judiciis (Leipzig, 1820); D. F. Strauss, The Life of Jesus Critically Examined (London:

SCM, 1973 [1835]). Veja a discussão em A. J. Köstenberger, “Early Doubts of the Apostolic

Authorship of the Fourth Gospel in the History of Modern Biblical Criticism”, em: Studies on John

and Gender: A Decade of Scholarship, Studies in Biblical Literature 38 (New York: Peter Lang,

2001), p. 17-47.

7
Veja esp. C. L. Blomberg, The historical reliability of John’s Gospel (Downers Grove:

InterVarsity, 2001); A. J. Köstenberger, “John”, em: C. E. Arnold, org., Zondervan illustrated Bible

backgrounds commentary (Grand Rapids: Zondervan, 2002), vol. 2: John, Acts, p. 1-216.

8
L. Morris, “The relationship of the Fourth Gospel to the synoptics”, em: Studies in the Fourth

Gospel (Grand Rapids: Eerdmans, 1969), p. 15-63; D. A. Carson, The Gospel according to John,

PNTC (Grand Rapids: Eerdmans, 1991), p. 49-58, esp. p. 52-5.

1816
9
Veja R. Bauckham, “John for Readers of Mark”, em: R. Bauckham, org., The Gospels for all

christians: rethinking the gospel audiences (Grand Rapids: Eerdmans, 1997), p. 147-71.

10
A. J. Köstenberger, “John”, e a literatura citada ali.

11
U. C. von Wahlde, “Archaeology and John’s Gospel”, em: J. H. Charlesworth, org., Jesus and

archaeology (Grand Rapids: Eerdmans, 2006), p. 523-86.

12
M. Hengel, “Das Johannes evangelium als Quelle für die Geschichte des antiken Judentums”,

in: Judaica, Hellenistica et Christiana: Kleine Schriften II, WUNT 109 (Tübingen: Mohr Siebeck,

1999), p. 295 e 322.

13
Ibid., p. 296 e 322 (em geral); p. 301 (Sychar), p. 317 (Tabernacles), p. 323 (Annas).

14
Ibid., p. 322-33, esp. p. 333.

15
A. J. Köstenberger, John, BECNT (Grand Rapids: Baker, 2004), p. 17-8, e as referências

citadas ali.

16
Köstenberger, “Diversity and unity”, p. 147-8, e a literatura citada ali.

17
Ibid., p. 148-9.

18
M. M. Thompson, “The historical Jesus and the johannine Christ”, em: R. A. Culpepper; C. C.

Black, orgs., Exploring the Gospel of John, (Louisville: Westminster John Knox, 1996), p. 21-42; L.

Morris, “History and theology in the Fourth Gospel”, em: Studies in the Fourth Gospel, p. 65-138.

19
L. Morris, “Was the author of the Fourth Gospel an eyewitness?”, em: Studies in the Fourth

Gospel, p. 139-214; cf. R. Bauckham, Jesus and the eyewitnesses: the gospels as eyewitness

testimony (Grand Rapids: Eerdmans, 2006).

20
Veja sobre este capítulo 9 em “Paul: the man and his message” acima; cf. Köstenberger,

“Diversity and unity”, p. 145-46.

1817
21
D. Wenham, Paul: follower of Jesus or founder of christianity? (Grand Rapids: Eerdmans,

1996).

22
J. D. G. Dunn, The theology of Paul the apostle (Grand Rapids: Eerdmans, 1998), p. 729.

23
Veja A. J. Köstenberger, “Review of David Wenham, Paul: follower of Jesus or founder of

christianity?” TrinJ 16 NS (1995), p. 259-62.

24
Embora ele não tenha suportado a maldição por nós; Gálatas 3.10-13; cf. Dt 21.23. S. Kim,

The origin of Paul’s Gospel (Grand Rapids: Eerdmans, 1982).

25
F. F. Bruce, “Is the Paul of Acts the real Paul?” BJRL 58 (1976), p. 282-305.

26
Para um tratamento geral incluindo uma taxonomia de pontos de vista sobre esta questão, veja

A. J. Mattill Jr., “The value of Acts as a source for the study of Paul”, em: C. H. Talbert, org.,

Perspectives on Luke-Acts (Danville: Association of Baptist Professors of Religion, 1978), p. 76-98.

A disjunção entre o Paulo de Atos e o Paulo das cartas foi mais definitivamente discutida por E.

Haenchen, The Acts of the Apostles, tradução para o inglês de B. Noble; G. Shinn (Philadelphia:

Westminster, 1971), p. 112-6; e P. Vielhauer, “On the ‘paulinism’ of Acts”, em: L. E. Keck; J. L.

Martyn, orgs., Studies in Luke-Acts (Philadelphia: Fortress, 1966), p. 33-50. Veja a crítica em S. E.

Porter, The Paul of Acts, WUNT 115 (Tübingen: Mohr-Siebeck, 1999), p. 187-206.

27
Atos 14.19,20; 16.40; 18.9,10; 19.11; 20.10,11; 23.11, 31-34; 26.28,29; 27.43,44; 28.30,31.

28
1Coríntios 2.1-5; 2Coríntios 11.16 a 12.10.

29
Atos 13.9-11, 16-41; 14.15-17; 17.22-31; 20.18-35; 22.1-21; 24.10-21; 26.2-26.

30
1Coríntios 2.1-5; 2Coríntios 10.1,10,11. Mas veja a nota de advertência em Porter, Paul of

Acts, p. 101.

31
Para uma crítica competente e construtiva, veja especialmente Porter, Paul of Acts, p. 187-206;

cf. Bruce, “Real Paul”, p. 282-305; L. T. Johnson, The writings of the New Testament (Minneapolis:

1818
Fortress, 1986), p. 231-8; e B. Witherington, The Acts of the apostles: a socio-rhetorical commentary

(Grand Rapids: Eerdmans, 1998), p. 430-8.

32
Veja D. Wenham, “Unity and diversity in the New Testament”, em: G. E. Ladd, A theology of

the New Testament, ed. rev. (Grand Rapids: Eerdmans, 1993), p. 687-92.

33
Assim corretamente diz Bruce, “Real Paul”, p. 305; Witherington, Acts, p. 438; et al.

34
Bruce (“Real Paul”, p. 285-93) listou várias páginas adicionais de semelhantes “coincidências

não premeditadas” sob essa categoria; veja Köstenberger, “Diversity and unity”, p. 150.

35
Atos 13.46-48; 28.25-28; cf. Romanos 1.16; 2.9,10; 10.12; 1Coríntios 1.22,24; 12.13; Gálatas

3.28; Colossenses 3.11.

36
Bruce, “Real Paul”, p. 305.

37
Porter, Paul of Acts, p. 205-6.

38
Ibid., p. 5 e 98-125.

39
Ibid., p. 7.

40
Witherington, Acts, p. 438.

41
Veja D. A. Carson, “Unity and diversity in the New Testament: the possibility of systematic

theology”, em: D. A. Carson; J. D. Woodbrige, orgs., Scripture and truth (Grand Rapids: Zondervan,

1983), p. 84-86. Uma ideia de desenvolvimento no pensamento de Paulo não está em desacordo com

aquela da coerência do NT. Este seria apenas o caso se contradições reais entre o pensamento anterior

e posterior de Paulo pudesse ser demonstrado.

42
Por exemplo, U. Schnelle, Wandlungen im paulinischen Denken (Stuttgart: Katholisches

Bibelwerk, 1989), e a literatura citada abaixo.

1819
43
Veja H. D. Betz, Galatians, Hermeneia (Philadelphia: Fortress, 1979), p. 200: “in 1Corinthians

Paul has retracted the Galatian position”.

44
Veja F. F. Bruce, “‘All things to all men’: diversity in unity and other Pauline tensions”, em: R.

Guelich, org., Unity and diversity in New Testament theology (Grand Rapids: Eerdmans, 1978), p.

82-3, com referência a J. W. Drane, Paul: libertine or legalist? (London: SPCK, 1975).

45
Por exemplo, H. Räisänen, Paul and the law, 2. ed. (Tübingen: Mohr-Siebeck, 1987).

46
Embora como J. D. G. Dunn corretamente observou, “a brevidade do período não pode ser

contado como um fator detrminante em responder a questão” (Theology of Paul the apostle, p. 730).

47
C. H. Dodd, “The mind of Paul: a psychological approach”, BJRL 17 (1933), p. 91-105. Dodd

defendeu uma “mudança de humor” da parte de Paulo em suas últimas epístolas como resultado de

uma “crise espiritual” o um a “tipo de segunda versão” (p. 104). Em sua obra “The mind of Paul:

change and development”, BJRL 18 (1934), p. 69-110, Dodd procurou mostrar que Paulo transcendia

o dualismo “desta era” e “da era por vir” em favor do que ele chamou um “universalismo” que

também requer uma reavaliação da da ordem natural (p. 109-10).

48
Veja R. N. Longenecker, “On the concept of development in pauline thought”, em: K. S.

Kantzer; S. N. Gundry, org., Perspectives on evangelical theology (Grand Rapids: Zondervan, 1979),

p. 195-207.

49
Veja esp. Kim, Origin of Paul’s Gospel.

50
Veja Dunn, Theology of Paul, p. 21-2 (com referências bibliográficas adicionais no n. 72); M.

Hengel; A. M. Schwemer, Paul between Damascus and Antioch: the unknown years, tradução para o

inglês de J. Bowden (Louisville: Westminster John Knox, 1997), p. 279-91; e o estudo de R. Riesner,

Paul’s early period: chronology, mission strategy, theology (Grand Rapids: Eerdmans, 1998).

51
E. Lohse, “Changes of thought in pauline theology? Some reflections on Paul’s ethical

teaching in the context of his theology”, em: E. H. Lovering Jr.; J. L. Sumney, orgs., Theology and

1820
ethics in Paul and his interpreters. Essays in honor of Victor Paul Furnish (Nashville: Abingdon,

1996), p. 160; cf. V. P. Furnish, “Development in Paul’s thought”, JAAR 38 (1970), p. 289-303.

52
Lohse, “Changes of thought”, p. 151-53. Lohse acreditava que 1Tessalonicenses era a primeira

e Romanos a última carta Paulina autêntica, relegando 2Tessalonicenses, Colossenses, Efésios, e as

pastorais ao status de deutero-paulinas. Se Gálatas for datada bem antes do que Lohse permitia, isto

ainda falaria contra um desenvolvimento Paulino em relação a sua doutrina da justificação pela fé.

53
Ibid., p. 154, contra H. Hübner, Law in Paul’s thought, edição de J. Riches (Edinburgh: T&T

Clark, 1984).

54
Ibid., p. 156, com referência a F. Hahn, “Gibt es eine Entwicklung in den Aussagen über die

Rechtfertigung bei Paulus?” EvT 53 (1993), p. 342-66; contra G. Strecker, “Befreiung und

Rechtfertigung. Zur Stellung der Rechtfertigungslehre in der Theologie des Paulus”, em: J. Friedrich;

W. Pöhlmann; P. Stuhlmacher; orgs., Rechtfertigung. Festschrift fur Ernst Kasemann, (Tübingen:

Mohr-Siebeck; Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1976), p. 479-508. Cf. A. Schlatter (The

theology of the apostles, tradução para o inglês de A. J. Köstenberger [Grand Rapids: Baker, 1999],

p. 306), que comentou que “em nenhum lugar as últimas epístolas levaram a comunidade além dessas

normas (i. e., as instruções éticas de 1 e 2Tessalonicenses); elas simplesmente revelam de forma mais

completa a lógica de Paulo”.

55
Isto, é claro, assume a autoria paulina das epístolas pastorais. Veja a discussão do

pseudonimato no capítulo 15 acima.

56
Veja a discussão seguinte e Bruce, “All things to all men”, p. 82-99.

57
Romanos 1.1,9,16; 2.16; 16.25; 1Coríntios 4.15; 9.12,16,18,23; 15.1; Gálatas 1.6,7,11;

2.2,5,7,14; Efésios 1.13; 3.6; 6.19 etc.

58
P. Achtemeier, “The continuing quest for coherence in St. Paul: an experiment in thought”, in:

Theology and ethics in Paul and his interpreters: essays in honor of Victor Paul Furnish, p. 132-45,

1821
esp. p. 138.

59
Veja ainda a discussão.

60
Dunn considerou Colossenses, Efésios, e as pastorais como não sendo paulinas (Theology of

Paul, p. 13, n. 39; veja p. 732-3).

61
Ibid., p. 730-1.

62
Para uma sinopse bem breve, veja Köstenberger, “Diversity and unity”, p. 152-3. Para um

excelente tratamento sobre os relacionamentos entre os vários escritores do NT, veja A. Schlatter,

New Testament theology, tradução para o inglês de A. J. Köstenberger (Grand Rapids: Baker, 1997,

1999), 2 vols.

63
G. Maier, Biblical hermeneutics, tradução para o inglês de R. W. Yarbrough (Wheaton:

Crossway, 1997), p. 202, citado em Köstenberger, “Diversity and unity”, p. 153.

64
C. H. Dodd, “The present task in New Testament studies”, uma palestra inaugural proferida na

Divinity School, Cambridge na terça-feira, 2 de junho de 1936.

65
Veja esp. a obra de R. Bauckham, God crucified: monotheism and christology in the New

Testament (Grand Rapids: Eerdmans, 1999), vii. Ele argumentou que desde o princípio “os antigos

cristãos incluíam Jesus […] na identidade única do único Deus de Israel.”

66
Veja Atos 1.3; 8.12; 14.22; 19.8; 28.23,31; Romanos 14.17; 1Coríntios 4.20; 6.9,10; 15.50;

Gálatas 5.21; Colossenses 4.11; 2Tessalonicenses 1.5; Apocalipse 12.10.

67
Romanos 1.18; 3.5,21,22; 10.3; 2Coríntios 5.21; Filipenses 3.9; veja Tiago 1.20; 2Pedro 1.1.

68
João 11.4,40; 12.43; Atos 7.55; Romanos 1.23; 3.7,23; 5.2; 15.7; 1Pedro 4.14; Apocalipse

15.8; 19.1; 21.11,23.

1822
69
Marcos 1.14; Atos 20.24; Romanos 1.1; 15.16; 2Coríntios 11.7; 1Tessalonicenses 2.2,8,9;

1Timóteo 1.11; 1Pedro 4.17.

70
Veja F. F. Bruce, “All things to all men”, p. 92; e L. W. Hurtado, One God, one Lord: early

christian devotion and ancient jewish monotheism (Philadelphia: Fortress, 1988), esp. p. 97-9. Veja

também L. W. Hurtado, Lord Jesus Christ: devotion to Jesus in earliest christianity (Grand Rapids:

Eerdmans, 2003).

71
Veja R. Bultmann, Theology of the New Testament, tradução para o inglês de K. Grobel (New

York: Charles Scribner’s Sons, 1970), p. 3, e a discussão acima. Veja também P. Balla, Challenges to

New Testament theology (Peabody: Hendrickson, 1998), p. 170-7; P. Stuhlmacher, Biblische

Theologie des New Testament (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1992), 1:18: “Jesus’

proclamation is not a mere ‘presupposition’, but the historical foundation of NT theology”; e R.

Morgan, “The historical Jesus and the theology of the New Testament”, em: L. D. Hurst; N. T.

Wright, org., The glory of Christ in the New Testament: studies in christology in memory of George

Bradford Caird (Oxford: Clarendon, 1987), p. 187-206.

72
Veja O. Betz, “The problem of variety and unity in the New Testament”, HBT 21 (1980), p. 10-

1.

73
Veja Balla (Challenges to New Testament theology, p. 173), que afirmou que Jesus é a origem

da Cristologia dos primeiros cristãos (incluindo os evangelistas); e Guthrie, New Testament theology,

p. 54-5.

74
Veja J. D. G. Dunn, Unity and diversity in the New Testament: an inquiry into the character of

earliest christianity (London: SCM, 1990), p. 369; id., Theology of Paul, p. 729 (veja Wenham,

“Unity and diversity”, p. 711); e E. P. Sanders (Paul and palestinian judaism [Minneapolis: Fortress,

1977], p. 441-2), que identificou o fato “que Jesus é o Senhor” e “que nele Deus forneceu a salvação

de todos aqueles que crêem” como uma das duas “principais convicções que governavam a vida

cristã de Paulo”.

1823
75
Veja Bruce (“All things to all men”, p. 87), que falou do “Cristo que, da conversão de Paulo

em diante, substituiu a lei como o centro de sua vida e de seu pensamento” (com outras referências a

Rm 10.4).

76
E. Lohse, Die Vielfalt des Neuen Testaments (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1982), p.

227-30. Veja A. J. Köstenberger, “The gospel for all nations”, in: R. A. Peterson; C. W. Morgan,

orgs., Faith comes by hearing: a response to inclusivism (Downers Grove: InterVarsity, 2008), p.

201-19.

77
Lohse, Vielfalt des Neuen Testaments, p. 246.

78
Romanos 1.16; 2.9,10; 10.12; 1Coríntios 1.22,24; 12.13; Gálatas 3.28; Colossenses 3.11; veja

Atos 13.46-48; 28.25-28; veja Lucas 2.32.

79
Assim corretamente Carson, “Unity and diversity”, p. 73. Veja também P. Stuhlmacher,

Biblische Theologie des Neuen Testaments (Göttingen: Vandenhoeck & Ruprecht, 1999), 2:310: “The

(major) witnesses of the NT teach jointly that Jesus’ cross-death is to be understood as an atoning,

divinely commissioned death for ‘the many.’”

80
Por exemplo, D. J. Moo, Romans, NICNT (Grand Rapids: Eerdmans, 1996), p. 29-30.

81
Veja J. Reumann, Variety and unity in New Testament thought (Oxford: University Press,

1991), p. 289.

82
Veja Bruce, “All things to all men”, p. 96.

83
Por exemplo, Gálatas 6.14; 1Tessalonicenses 5.9; 2Tessalonicenses 2.1,14; 1Coríntios 1.7; 8.6;

15.57; Romanos 1.4; 5.1,11; 6.23; 13.14; Colossenses 2.6; Tiago 1.1; 2.1; 1Timóteo 1.12; 2Pedro

1.16; Judas 4,17,21.

84
Veja G. E. Ladd, “Eschatology and the unity of New Testament theology”, ExpTim 68 (1956-

57), p. 268-73; cf. Stuhlmacher, Biblische Theologie des Neuen Testaments, 2:310: “the NT

1824
witnesses… also all teach the expectation of parousia and final judgment.”

85
Veja Stuhlmacher, Biblische Theologie des Neuen Testaments, 2:310-11.

86
D. P. Fuller, The unity of the Bible (Grand Rapids: Zondervan, 1992), p. 22-3.

87
Wenham, “Unity and diversity”, p. 703; veja Carson, “Unity and diversity”, p. 65-95.

88
Betz, “Problem of variety and unity”, p. 6.

89
Veja I. H. Marshall, “Orthodoxy and heresy in earlier christianity”, Them 2/1 (1976), p. 5-14.

90
W. Bauer, Orthodoxy and heresy in earliest christianity (Philadelphia: Fortress, 1979; German

original 1934). Mas veja a contundente crítica de P. Trebilco, “Christian communities in western Asia

Minor into the early second century: Ignatius and others as witnesses against Bauer”, JETS 49

(2006), p. 17-44.

91
G. B. Caird, New Testament theology, edição de L. D. Hurst (Oxford: Clarendon, 1994), p. 24.

Veja a avaliação bem positiva da obra de Caird em D. A. Carson, “New Testament theology”, em: R.

P. Martin; P. H. Davids, orgs., Dictionary of the later New Testament and its developments (Downers

Grove: InterVarsity, 1998), p. 803-4.

92
Jesus o Messias e Senhor e o evangelho são citados por Betz (“Problem of variety and unity”,

p. 8-9) como estabelecendo a unidade do NT.

93
Veja C. L. Blomberg, “The legitimacy and limits of harmonization”, em: D. A. Carson; J. D.

Woodbridge, orgs., Hermeneutics, authority, and canon (Grand Rapids: Zondervan, 1986), p. 139-74;

e H. -W. Neudorfer, “Ist Sachkritik nötig? Anmerkungen zu einem Thema der biblischen

Hermeneutik am Beispiel des Jakobusbriefs”, KD 43 (1997), p. 301. Hermeneutik incluiu em sua

metodologia proposta a colocação de uma porção individual da Escritura na estrutura geral do ensino

bíblico, o que implica na mostra das interconexões e a demonstração da unidade da Escritura.

1825
GLOSSÁRIO

A Oração do Senhor. MODELO DE ORAÇÃO.

A visão de Agostinho do problema SINÓTICO. Crença de que os


Evangelhos foram escritos na ordem canônica: Mateus primeiro, depois
Marcos, e então Lucas, com Marcos usando Mateus, e Lucas usando
Mateus e Marcos. Alguns estudiosos questionam se Agostinho
realmente defendia esse ponto de vista.

Agostinho de Hipona (354-430 d.C.). Pai da igreja do Norte da África e


bispo de Hipona, filho da piedosa Monica e autor de As Confissões e A
Cidade de Deus.

agraphon (pl., Agrapha). Palavras de Jesus não registradas nos Evangelhos


canônicos do NT (p. ex., At 20.35: “Dar é mais bem aventurado do que
receber”).

Agripa I. Neto de HERODES, O GRANDE e governador da Judéia (37-44 d.C.);


chamado “Herodes” no livro de Atos (veja At 12.1-4, 19-23), não deve
ser confundido com seu filho Agripa II diante do qual Paulo defendeu
seu caso (veja At 26).

alegoria. Forma de metáfora estendida.

1826
alepigrafia. De allos (“outro”), epi (“upon”), e graphō (“escrever”); noção
de que uma peça escrita recebeu autoria de alguém que não a pessoa a
quem a autoria é explicitamente atribuída no documento.

Alexandrino. CÓDICE ALEXANDRINO.

aliança. Contrato (sagrado).

aliteração. Repetição de letras iniciais.

alogi. Grupo de cristãos heréticos que floresceu na Ásia Menor por volta de
170 d.C.

alusão. Referência indireta intencional identificável a um outro texto ou


declaração.

amanuense. Escriba, copista, ou secretário empregado por autores bíblicos


para escreverem as suas mensagens.

American Standard Version (ASV). Tradução da Bíblia primeiramente


publicada em 1901.

amilenismo. Crença de que as referências bíblicas ao reinado de mil anos


de Cristo são simbólicas em natureza (s.v. Milênio).

amoraim. Do aramaico amar (“dizer, comentar”); comentaristas dos


ensinamentos dos tannaim (Tannaitico).

Anacronismo. Imposição de um desenvolvimento posterior em um período


anterior.

anáfora. De anapherō (“Eu repito”); série de sentenças começando com a


mesma palavra.

análise do discurso. Disciplina acadêmica devotada à análise de discursos


(DISCURSO).

1827
Anás. Influente sumo sacerdote (6-15 d.C.) e sogro de Caifás, sumo
sacerdote no ano da crucificação de Jesus (veja Jo 18.13, 14).

Ancião bem Idoso (Ancião de Dias). Designação para Deus em Daniel


7.13 em associação com a figura divino-humana de “Alguém parecido
com o FILHO DO HOMEM”.

Anfilóquio de Icônio (c. 340-395 d.C.). Bispo de Iconium, primo de


Gregorio de Nyssa, e teologicamente próximo dos Pais Capadócios.

anonimato. De allos (“outro”) e onoma (“nome”); noção de que uma


pessoa que não àquela explicitamente citada é o autor de uma dada peça
escrita.

Anticristo. Figura do final dos tempos que se coloca em oposição a Deus e


ao Senhor Jesus Cristo (p. ex., 1Jo 2.18; 2Jo 7; s.v. HOMEM DA

INEQUIDADE).

Antigo Testamento Apócrigo. AT APÓCRIFO.

antiguidade. Critério de canocidade relativo a um documento escrito


durante o período apostólico.

antilegomena. Obras cuja canonicidade foi discutida na igreja primitiva.

antinomianismo. Uma tendência “antilei”, frequentemente resultando em


licenciosidade.

Antioco Epifânio IV. (reinou 175-164 a.C.) Seleucida (grego) governante


que procurou impor a cultura grega aos judeus, construindo a
“abominação da desolação” no templo de Jerusalém ao construir um
altar a Zeus, o supremo deus grego, e sacrificando porcos nesse altar por
volta de 167 a.C., em sua oposição ao povo de Deus, ele serviu como

1828
um precursor do anticristo (veja Dn 9.27; 11.31; 12.11; 1Mac 1.54; Mt
24.15; Mc 13.14).

Antipas. HERODES ANTIPAS.

antiquiliasmo. Posição rejeitando a noção do reinado de mil anos de Cristo


ao final da história humana (defendida por Eusébio e outros).

antítese. Ideia antagônica.

antropomorfismo. Falar de Deus em termos humanos (p. ex., que Deus se


arrependeria; veja Êx 32.14; Jn 3.10).

Ápio. Historiador grego, de Alexandria, do segundo século depois de


Cristo, autor de Roman history

Apocalipse de Pedro. Um documento gnóstico encontrado na biblioteca de


Nag Hammadi, no Egito.

apocalipse. Uma obra literária contendo descrições simbólicas dos


acontecimentos do final dos tempos.

apocalipticismo. O fenômeno sociológico de um grupo mergulhado em


uma perspectiva do final dos tempos.

apocalíptico. Uma visão de mundo que descreve os acontecimentos do


final dos tempos em termos simbólicos.

Apócrifo de João. Um documento gnóstico encontrado na biblioteca de


Nag Hammadi, no Egito.

apócrifo. Obscuro ou escondido; pertencendo aos apócrifos.

Apócrifos. Os apócrifos do AT, aceitos como canônicos pela Igreja Católica


Romana, mas não pela tradição Protestante, contém escritos como 1 e
2Esdras, 1, 2, 3 e 4Macabeus, Tobias, Judite, e outros escritos

1829
produzidos após o período profético do AT, os apócrifos do NT contêm
vários Evangelhos, Atos, Epistolas, e Apocalipses produzidos durante o
período subapostólico (s. v.) e não são reconhecidos nem pelos
Católicos Romanos nem pelos Protestantes como parte do canôn.

aporia. Aparente incongruência indicando o uso que um autor faz de fontes


escritas.

apostolicidade. Associação direta ou indireta de uma dada obra do NT com


um apóstolo.

apóstolo. Em um sentido mais estreito e técnico, um membro dos Doze


(veja Mt 10.1-4 e paralelos); levemente estendido no NT para incluir
outros como Paulo e Barnabé; em sentido mais amplo, também inclui
missionários e outros emissários (p. ex., Rm 16.7; 2Co 8.23; Fp 2.25).

Aquino. TOMÁS DE AQUINO.

aramaico. Língua do Oriente Próximo similar ao hebraico, no AT, exibida


em porções de Daniel e Ester; também encontrada nos TARGUMS; Jesus
falava aramaico, e os Evangelhos do NT preservam vários ditos
autênticos de Jesus no idioma (p. ex., Mt 27.46).

Arca da Aliança. Uma arca sagrada feita da madeira da acácia e coberta


com ouro contendo as tábuas de pedra com os Dez Mandamentos e
outros objetos religiosos importantes (p. ex., Hb 9.4).

argumentatio. Seção contendo o principal argumento do escritor.

Armagedom. Do hebraico har megido (“Monte Megido”); local de batalha


na época do AT, próximo à cidade de Megido (2Rs 23.28-30; 2Cr 35.20-
25) e local da batalha final entre as forças de Deus e de Satanás antes do
retorno de Cristo (Ap 16.16).

1830
Arrebatamento pós-tribulacional. Crença que Cristo voltará ao final da
TRIBULAÇÃO.

arrebatamento pré-tribulacional. Crença de que Cristo voltará antes da


TRIBULAÇÃO.

ascensão (de Cristo). Crença cristã de que o Senhor Jesus Cristo, após sua
ressurreição da morte, subiu ao céu (veja Lc 24.51; At 1.9).

asceticismo. A supressão das paixões corporais.

assimilação dos escribas. Alteração do copista do texto fonte a fim de


conformar uma dada leitura a uma leitura em outras passagens no
mesmo texto.

assíndeto. Omissão deliberada de conjunções.

assonância. Semelhança de som.

AT Apócrifo. Corpo de literatura incluído no cânon pelos católicos


romanos, mas não pelos Protestantes; contém 1 e 2Esdras, Tobias,
Judite, Adições a Ester, Sabedoria de Salomão, Eclesiástico, Baruque,
Carta de Jeremias, Prece de Azarias e o Cântico dos Três Homens
Jovens, Susanna, Bel e do Dragão, a Oração de Manassés, 1 e
2Macabeus.

Atanásio de Alexandria (c. 296-373 d.C.). Bispo de Alexandria, no século


IV d.C, mais conhecido pela sua Festal Letter em 367 d.C., listando
todos os 27 livros canônicos do NT.

Atenágoras de Atenas (c. 180 d.C.). Filósofo e apologista cristão, autor de


Supplication.

ático. Antigo dialeto grego.

1831
Augusto. Imperador romano que governou em 31/27 a.C-14 d.C.

autoatestado das Escrituras. A alegação da Bíblia com relação a sua


própria natureza.

autógrafos. Os manuscritos originais do AT e do NT.

Babilônia. Nome código para o Império Romano (p. ex., 1Pe 5.13).

Basilides (c. 117-138 d.C.). Mestre gnóstico do século II.

Basílio de Cesareia (c. 330-379 d.C.). Pai da igreja do século IV d.C.

Bíblia de Coverdale. Tradução da Bíblia produzida por Miles Coverdale


(1535).

Bíblia de Genebra. Tradução da Bíblia das línguas originais para o inglês


publicada em 1560.

Bíblia de Jerusalém. Tradução Católica Romana da Bíblia publicada em


1966.

Bíblia de Matthew. Tradução de toda a Bíblia na esteira da tradução e John


Wycliff e produzida sob o pseudônimo de “Thomas Mattew” em 1537.

Biblioteca Nag Hammadi. Coleção de escritos gnósticos encontrados em


Nag Hammadi no Alto Egito em 1945.

bispo. Oficial da igreja designado pela palvra episkopos (p. ex., 1Tm 3.2),
um termo do NT usado como sinônimo de presbyteros (“ancião”; veja
Tt 1.5,7) e poimēn (“pastor;” veja Ef 4.11).

Busca do Jesus Histórico. Tendência moderna de pesquisa histórica sobre


os antecedentes da pessoa de Jesus (distinguidas como “primeira
busca”, “segunda busca” e “terceira busca”).

1832
Cadeia de citações. COLAR DE PÉROLAS.

Caifás, (Joseph Caiaphas). Sumo sacerdote judeu (c. 18-36 d.C) no ano da
crucificação de Jesus.

Cairo Geniza. Manuscrito do AT (895.C.).

Caldeia. Babilônia.

Calendário Juliano. Uma reforma do calendário romano implementada por


Júlio César (daí o nome “Juliano”) em 45 a.C., o calendário Juliano
agora foi totalmente substituído pelo o calendário Gregoriano.

Calígula. Imperador romano (37-41 d.C.).

Cânon de Muratori. Uma antiga lista canônica provavelmente datada do


final do século II d.C.

cânon. De kanōn (“regra” ou “padrão”); coleção das Escrituras Cristãs.

canonicidade. Status de um livro devido a sua inclusão na coleção das


Escrituras Cristãs.

Cassiodoro. Estadista romano e escritor do século VI d.C. que serviu na


administração de Teodorico, o Grande, rei dos ostrogodos.

catolicismo primitivo. Século II d.C., formação da doutrina ortodoxa,


autoridade eclesiática, estrutura de liderança da igreja em três níveis.

católico. Universal; mais tarde utilizado para a Igreja Católica Romana.

Cefas. Nome aramaico para o nome grego Pedro (ambos significam


“pedra”; veja Mt 16.18; Jo 1.42).

centurião. Oficial militar romano, do latim significando “comandante de


100”.

1833
Cerintianismo. Antiga heresia cristã atribuída a Cerinto, um mestre
gnóstico que defendia que o “espírito de Cristo” desceu sobre Jesus no
seu batismo e o abandonou na cruz.

Cerinto. CERINTIANISMO.

César. Título dos imperadores romanos, remontando a Júlio César (n. 100
a.C. e serviu como ditador 46-44 a.C., assassinado em 44 a.C. por
Brutus e outros no Senado).

Cícero, Marco Tulio (n. 65 a.C.). Estadista romano e filósofo do primeiro


século a.C.

Círculo Paulino. Grupo de antigos cristãos associados com o apóstolo


Paulo em sua missão; entre eles os colegas de trabalho como Timóteo,
Tito, Lucas, João Marcos, Silas, Barnabé, e outros.

Cirilo de Jerusalém (c. 315-387 d.C.). Pai da igreja do século IV d.C. e


autor de Catecheses.

Cláudio. Imperador romano (41-54 d.C.); ÉDITO DE CLÁUDIO.

Clemente de Alexandria. (c. 150-215 d.C.) Antigo pai da igreja e membro


da escola de Alexandria; autor de Stromateis (“Miscellanies”).

Clemente de Roma. Bispo de Roma e autor de 1Clemente (c. 96 d.C.).

Códice Aleppo. Manuscrito do AT (c. 900 d.C.).

Códice Alexandrino. Manuscrito do século V d.C. da bíblia grega,


contendo a maior parte da Septuaginta e do NT.

Códice Babilônico Petropalitano. Manuscrito do AT (1008 d.C.).

Códice Bezae. Manuscrito bíblico do século V/VI d.C.

1834
Códice British Museum. Manuscrito do AT (950 d.C.).

Códice de Leningrado. Manuscrito do AT (916 d.C.).

Códice Manuscrito, ou Fragmento Akhmim. Manuscrito descoberto em


Akhmim, Egito, no século XIX, que dizem conter o Evangelho apócrifo
de Pedro.

Códice Montfortiano (Britânico). Manuscrito antigo usado por Erasmo na


terceira edição de seu NT grego publicado em 1522 que contém a
“Johannine comma” em 1João 5.7, com toda a probabilidade uma
adição posterior não encontrada no manuscrito original.

Códice Reuchlin. Manuscrito do AT (1105 d.C.).

Códice Sinaítico. Manuscrito do século IV d.C. contendo a Bíblia Cristã


em grego, incluindo todo o NT.

Códice Vaticano. Manuscrito grego do século IV d.C. contendo a maior


parte da Septuaginta e do NT.

Códice. O antigo equivalente a livro, consistindo de folhas unidas.

coletores de impostos. Residentes locais nos tempos do NT que cobravam


os impostos para as autoridades romanas e, portanto, eram desprezados
pelos seus concidadãos e considerados traidores.

Comma Johanneum ou Cláusula Joanina. Embelezamento de 1João 5.7


não encontrado em nenhum manuscrito grego antes do período da
REFORMA; também Códice Montfortianus.

comunidade da aliança. Grupo de pessoas cuja existência é baseada num


acordo com Deus através de uma ALIANÇA.

Concílio de Cartago. TERCEIRO CONCÍLIO DE CARTÁGO.

1835
Concílio de Hippo Regius. Reunião de líderes de igrejas na África do
Norte (393 d.C.).

Concílio de Jerusalém. Tradicional designação para o encontro de líderes


na igreja primitiva em Jerusalém como narrado em Atos 15.

Concílio de Laodiceia. Reunião local de bispos (363-64 d.C.).

Concílio de Niceia. Primeiro concílio ecumênico convocado pelo


imperador romano Constantino I, em Niceia, Bitínia, hoje moderna
Turquia (325 d.C.).

Concílio de Trento. Reunião eclesiástica católico romana que se reuniu


várias vezes entre 1545 e 1563 como parte da Contrarreforma, um
esforço de repelir os efeitos da reforma Protestante (REFORMA).

Cóptico. Último estágio da língua escrita egípcia.

cordão de pérolas (pearl stringing). Prática rabínica de agrupar uma série


de passagens bíblicas relacionadas; imitada por escritores cristãos (p.
ex., Rm 3.10-18; Hb 1.5-14).

corpo joanino. Corpo dos escritos de João incluídos na Bíblia (i. e., o
Evangelho de João, 1, 2 e 3João, Apocalipse).

Corpo paulino. Corpo dos escritos de Paulo incluídos na Bíblia (isto é,


suas 13 cartas).

corpo. Corpo de escritos (p. ex., corpo paulino ou joanino).

Corpus Hermeticum ou Hermetic corpus. Antigo grupo de escritos


remontando a Hermes. o mitológico mensageiro grego dos deuses, que é
gnóstico (se não oculto) em caráter.

Crisóstomo. JOÃO CRISÓSTOMO.

1836
Cristo. Do grego Christos (“ungido”); equivalente ao hebreu “MESSIAS”.

Cristofania. (pré-encarnado) aparição de Cristo.

Cristologia. Doutrina de (Jesus) Cristo.

crítica da composição. Método de estudo baseado em documentos (como


os Evangelhos do NT) como um todo, buscando identificar padrões e
ênfases.

crítica da fonte. Disciplina dedicada a discernir a(s) fonte(s) (literária)


subjacente de um determinado documento (p. ex., TEORIA DAS DUAS
FONTES).

crítica da forma. Método de criticismo bíblico que classifica unidades da


Escritura por gênero ou padrão.

crítica da narrativa. Estudo dos aspectos literários de uma dada peça de


narrativa escrita (p. ex., os Evangelhos Canônicos).

crítica da redação. Uma abordagem ao estudo das Escrituras, que compara


documentos semelhantes (como um ou vários dos Evangelhos
Sinóticos) para detectar diferentes ênfases pelos respectivos autores, a
fim de avaliar a sua distintiva contribuição.

crítica retórica. Um estudo das características retóricas (comunicação) em


um determinado documento (como o livro de Romanos).

crítica textual. A ciência de julgar entre leituras variantes de manuscritos


através de critérios específicos como datação, tipo de texto ou
distribuição geográfica, leituras comprovadas, e possíveis razões para
variantes.

culto ao imperador. Adoração de um imperador romano como um deus.

1837
culto do templo. Rituais religiosos e sacrifícios oferecidos no santuário de
Jerusalém.

culto imperial. CULTO AO IMPERADOR.

Cumprimento das citações. Declarações dos autores dos quatro


evangelhos, especialmente Mateus e João, destacando o cumprimento
de várias passagens messiânicas em Jesus; introduzida com uma
fórmula como “que as palavras do profeta poderia ser cumprido” (p. ex.,
Mt 1.22; 2.5, 15, 17 e 23).

Damasco. Antiga e atual capital da SÍRIA.

Damasus. Bispo do século IV d.C. (considerado papa pela Igreja Católicda


Romana) que comissionou Jerônimo a traduzir a Bíblia para o latim,
agora chamada VULGATA.

Decálogo. Os Dez Mandamentos (veja Êx 20; Dt 5).

Decápolis. De deka (“dez”) e polis (“cidade”), um grupo de dez cidades,


por localização, língua, e cultura comuns (entre elas Gerasa, Gadara,
Pela, Sitópolis, e Damasco).

Deísmo. Crença na existência de um único Deus que criou o universo, mas


que nele não interfere.

Deuteropaulina. Não autenticamente paulina, isto é, escrito falsamente ou


tradicionalmente atribuído a Paulo.

Dia da Expiação. Yom Kippur, o feriado mais sagrado no calendário


judaico (veja Lv 16; EXPIAÇÃO).

Dia do Senhor. Época do juízo divino final profetizado pelos profetas do


AT.

1838
diaconisa. Diácono do sexo feminino (DIÁCONO; veja 1Tm 3.11; Rm 16.1).

diácono. De diakonos (“servo”); não desempenha funções de ensino, mas


de serviço (veja 1Tm 3.8-12).

Diáspora. De “dispersão,” a dispersão dos judeus fora da região da


Palestina após a exílios assírio e babilônico.

Diatessaron. Grego “através dos quatro”, nome para as primeiras sinopses


conhecidas dos Evangelhos compiladas pelo pai da igreja Taciano (c.
150-160 d.C.).

Didaquê. Manual da igreja do final do primeiro século ou início do


segundo, fornecendo informações sobre a antiga prática da igreja a
respeito da administração do batismo, Santa Ceia etc.

Dídimo, o Cego (c. 313-389 d.C.). Escritor eclesiástico e líder de uma


escola catequética de Alexandria, Egito.

Dio Cassius. Célebre historiador e funcionário público romano do século


III d.C. que publicou a história de Roma em vários volumes.

Dio Chrysostom. Orador grego do primeiro século d.C. (não deve ser
confundido o bispo do século IV d.C., João Crisostomo de Antioquia).

Diocleciano. Imperador romano (284-305 d.C.) que comandou a principal


perseguição contra os cristãos (302-303 d.C.).

Dionísio. Deus grego do vinho.

Dionysius bar Salibi. Bispo sírio do século XII.

Dionysius de Alexandria. Bispo de Alexandria da metade do século III


d.C.

Dionysius de Corinto. Bispo de Corinto do século II d.C.

1839
Discurso do Monte das Oliveiras. Ensinamentos de Jesus sobre o final dos
tempos registrados em Mateus 24 e 25 com paralelos em Marcos 13 e
Lucas 21.

discurso. Unidades linguísticas compostas de várias sentenças.

dispensacionalismo. Sistema teológico dividindo a história da salvação em


dois períodos distintos (chamados “dispensações”); caindo no clássico,
revisado, e progressivo dispensacionalismo.

Dispersão. DIÁSPORA.

diteísmo. Crença em dois deuses.

docetismo. De dokeō (“parecer”); o ensino que Jesus apenas parecia ser


humano.

Domiciano. Imperador romano (81-96 d.C.).

doutores da lei. Designação do NT para escribas judeus e estudantes das


Escrituras, mencionados frequentemente com “escribas”.

doxologia. De doxa (“glória”) e logos (“palavra” ou “dito”); uma breve


declaração ou hino em louvor a Deus.

eclesiologia. Doutrina da igreja.

eclética. Abordagem ao livro de Apocalipse que procura combinar


elementos das interpretações preterista, historicista, idealista e futurista.

eco(s). Porções de texto ressonantes com textos antecedentes em formas


menos visíveis do que as alusões, enquanto as alusões são deliberadas,
os ecos podem ou não ser pretendidos pelo autor.

Edição canônica do NT. Teoria de D. Trobisch segundo a qual o NT foi


produzido por volta da metade do século II d.C. como um livro

1840
publicado por um editor canônico.

Edito de Cláudio. Decreto do Cláudio, imperador romano, em 49 d.C.


expulsando os judeus de Roma; mencionado em Atos 18.2 (CLÁUDIO).

eleição. Doutrina bíblica de que Deus escolheu certos indivíduos para a


salvação.

elipse. Deliberada omissão de uma ou mais palavra de uma sentença.

Emanuel. Hebraico significando “Deus conosco”; identificação de Jesus


em Mateus 1.23 fazendo alusão a Isaías 7.14.

English Standard Version (ESV). Revisão da Revised Standard Version


publicada em 2001.

entrada triunfal. A chegada de Jesus a Jerusalém e sua aclamação popular


como o Messias durante a semana da Paixão (Domingo de Ramos; veja
Mt 21.1-11 e paralelos).

Epicurismo. Filosofia baseada nos ensinamentos de Epicurus (c. 341-270


a.C.), uma forma de hedonismo defendendo que a busca do prazer deve
ser o bem supremo do homem levando a uma vida virtuosa e moderada
de modo a se poder desfrutar os simples prazeres da vida.

epifania. Revelação; de epiphaneia (“aparição”), um dos termos técnicos


para a Segunda Vinda de Cristo (PAROUSIA).

Epifânio de Salamina (c. 315-403 d.C.). Pai da igreja do século IV d.C. e


autor de Refutation of All the Heresies [Refutação de todas as heresias]
(também conhecido como Panarion).

Epístola a Diogneto. Carta apologética anônima defendendo o cristianismo


de seus acusadores datada do século II ou III.

1841
Epístola de Barnabé. PSEUDOBARNABÉ.

Epístolas da Prisão. Designação convencional de quatro das cartas de


Paulo escritas durante a sua primeira prisão romana, Efésios, Filipenses,
Colossenses e Filemom.

Epístolas Gerais. Expressão coletiva para um corpo de escritos do NT que


contem Hebreus, Tiago, 1 e 2Pedro, 1, 2 e 3João. E Judas, chamadas
“gerais” porque são dirigidas a uma audiência grande, variada, e
geralmente não especificada.

Epístolas Pastorais. Designação convencional para as cartas de Paulo a


Timóteo e Tito (1 e 2Tm, Tt).

Epistula Apostolorum. Latim para “Carta dos Apóstolos,” documento do


século II d.C. que é parte do NT apócrifo, falsamente atribuído aos
apóstolos e declarado herético.

equivalência formal. Abordagem de tradução bíblica palavra por palavra


(p. ex., NASB).

equivalência funcional. Abordagem a tradução bíblica sentença por


sentença (p. ex., NLT).

escatologia realizada. Aspectos do final dos tempos que já foram


cumpridos em Cristo e na vida dos fiéis (p. ex., vida eterna em Jo 5.24).

escatologia. Doutrina do final dos tempos.

eschaton. Termo grego significando “último”; normalmente se refere aos


acontecimentos do final dos tempos relacionados ao retorno de Cristo.

Escola da História das Religiões. Abordagem que vê a história


principalmente em termos da evolução da consciência religiosa humana

1842
e usa uma abordagem comparativa de religiões a fim de entender o
judaísmo e o cristianismo em relação a outras antigas religiões.

Escola de Tübingen. Movimento teológico do século XIX criado por F. C.


Baur (1792-1860) na Universidade de Tübingen, Alemanha, empenhada
na pesquisa crítico-histórica e questionando muitas das posições
tradicionais dos estudos bíblicos.

escolasticismo. Método medieval de aprendizado que prezava o raciocínio


dialético (a troca de argumentos e contra-argumentos); exibido na obra
Summa Theologica de Tomás de Aquino.

Escritura. Um documento religioso escrito que é visto como autoridade por


uma determinada comunidade de fé (p. ex., as Escrituras Hebraicas, as
Escrituras Cristãs).

etimologia. Estudo da origem de uma palavra.

etnarca. Título de um antigo soberano como Arquelau, que foi etnarca da


Judéia, Samaria, e Edom (4-6 a.C.).

Euripides. Dramaturgo ateniense do século V a.C.

Eusébio de Cesareia. (c. 260-340 d.C.) pai da igreja do quarto século e


eminente historiador da igreja primitiva, mais conhecido por sua
importante obra Ecclesiastical History [História eclesiástica].

Evangelho de Filipe. Evangelho apócrifo falsamente atribuído ao apóstolo


Filipe, provavelmente datado da segunda metade do século II d.C.

Evangelho de Maria (Madalena). Evangelho gnóstico do século II d.C.


falsamente atribuído a Maria Madalena.

1843
Evangelho de Pedro. Evangelho apócrifo falsamente atribuído ao apóstolo
Pedro, provavelmente datado da segunda metade do século II d.C.

Evangelho de Tomé. Evangelho gnóstico do final do século II d.C.,


falsamente atribuído ao apóstolo Tomé, encontrado na Biblioteca Nag
Hammadi, no Egito.

Evangelho quádruplo. A noção que, propriamente entendido, os quatro


evangelhos canônicos constituem um único evangelho “de acordo com”
as quatro testemunhas Mateus, Marcos, Lucas e João.

Evangelho Secreto de Marcos. Documento forjado falsamente atribuído a


Clemente de Alexandria.

Evangelhos Gnósticos. Corpo de literatura produzido pelos participantes


de uma heresia cristã chamada “GNOSTICISMO” incluindo o Evangelho de
Tomé, o chamado Evangelho da Verdade, e outros.

Evangelhos Perdidos. Referência geral para os evangelhos apócrifos, isto


é, evangelhos falsamente atribuídos a um apóstolo ou outra figura
mencionada no NT (como Maria Madalena) que foram escritos após a
era apostólica, embora referidos como “Evangelhos Perdidos”, a
maioria destes documentos na verdade existem, embora muitas vezes
em cópias antigas e muitas vezes fragmentadas (s.v. também Evangelho
de Maria, Pedro, Tomé etc.).

Evangelhos Sinóticos. Do gergo sunopsis (lit., “vistos juntos”), designação


técnica para Mateus, Marcos, e Lucas devido a seus pontos de vista
comuns sobra a vida de Jesus.

evidência externa. Confirmação de uma dada peça de composição escrita


por uma fonte for a deste documento, como por um escritor patrístico,

1844
em contraste com a EVIDÊNCIA INTERNA.

evidência interna. Dados derivados de um próprio documento (em


contraste com a EVIDÊNCIA EXTERNA).

exhortatio. Termo do latim para a seção retórica contendo uma exortação.

exílio. A subjugação ou deportação do povo judeu pelos assírios em 721


a.C., e pelos babilônios em 605, 597 e 586 a.C.; também chamado
“cativeiro”.

exordium. Termo do Latim para “início, começo”; a porção introdutória de


uma oração ou argumento.

expiação substituta. Sacrifício de sangue em benefício de um outro.

expiação. Sacrifício de sangue pelo pecado.

fariseus. Membros de uma influente seita judaica conhecida por sua ênfase
na lei, os fariseus fizeram oposição a Jesus e, juntamente com os
SADUCEUS, o crucificaram.

Félix. Procurador romano da Judeia (52-59 d.C.; veja At 24).

Fenícios. Antiga civilização centrada no norte da antiga Canaã que se


espalhou entre 1200 e 900 a.C.

Festo, Porcius. Procurador romano da Judeia (60-62 d.C.; veja At 25).

Filastrio (morto c. 397 d.C.). Bispo da Bréscia.

Filho de Deus. Título messiânico aplicado a Jesus no NT.

Filho do Homem. Título messiânico, a favorita auto designação de Jesus.

Filhos de Zebedeu. Os apóstolos João e Tiago.

1845
Filipe de Side. Historiador cristão do final do século V, que escreveu a
história da igreja cristã da qual apenas alguns fragmentos sobreviveram,
mostra pelo menos dependência parcial de Eusébio.

Filo (c. 20 a.C.-50 d.C.). Pensador judeu, autor e exegeta de Alexandria, no


Egito, que praticou um método alegórico de interpretação da Escritura.

Filosofia Cínica. Conjunto de crenças defendendo que a vida virtuosa


deveria ser vivida de acordo com a natureza e livre do apego aos bens.

Filóstrato, o Ateniense. Sofista grego (primeira metade do século III d.C.)


do período romano; autor de Life of Apollonius of Tyana [A vida de
Apolônio de Tiana].

final dos tempos. O período inaugurado com a vinda do Messias, Jesus


Cristo, que será consumado em seu retorno ou a Segunda Vinda,
também conhecido como “os últimos dias”.

Fócio I. Patriarca de Constantinopla no século IX d.C.

fusão. A união de dois ou mais elementos em um.

futurista. Uma interpretação do livro de Apocalipse que vê os capítulos 4 a


22 como se referindo a acontecimentos futuros.

Galba. Imperador romano (Junho 68-Janeiro 69 d.C.).

Galileia. Região no norte da Palestina ao redor do mar da Galileia.

Gamaliel I, o Ancião, Rabino. Um proeminente rabino judeu do primeiro


século que foi mestre de Paulo antes da conversão deste último ao
cristianismo (veja At 22.3; cf. At 5.34-39; Fp 3.4-6).

Gemará. Parte do Talmud que contem comentários rabínicos e análises da


Mixná; s.v. também Talmud de Jerusalém, Talmud.

1846
gematria. Simbolismo numérico (p. ex., a genealogia de Jesus em Mt 1.1-
17 em três grupos de 14 gerações, uma vez que 14 é o total do valor de
três letras hebraicas no nome “Davi”).

Géssio Floro. Procurador romano da Judeia (d.C. 64-66).

gĕzêrâ ŝāwâ. Uso de palavras verbalmente análogas para chamar a atenção


para a relação entre duas passagens.

Gnosticismo. Do grego gnōsis (“conhecimento”), uma religião do segundo


século que prega o espírito contra a matéria, considerando o espírito
bom e a matéria má; precursores podemos ser atestados no NT posterior
(p. ex., 1Tm 6.20,21).

Good News Bible (GNB). Também conhecida como Today’s English


Version (TEV), produzida em 1978.

Greco-Romana. Pertencente as culturas grega e romana.

Grego. Lingua franca do mundo do primeiro século e língua original do


NT.

Gregório de Nazianzo (c. 329-390 d.C.). Grande teólogo, um dos Pais


Capadócios, e autor de Five Theological Orations.

Gregório, o Grande. Também conhecido como Papa Gregório I (590-604


d.C.), um dos quatro grandes Pais Latinos da igreja, juntamente com
Ambrosio, Agostinho, e Jerônimo.

Guerra Judaica. Normalmente se refere a primeira guerra judaico-romana


(66-73 d.C.) durante a qual Jerusalém e o templo foram destruídos.

Hades. A morada dos mortos aguardando o juízo final.

1847
Halakhah (halakhic). Corpo de leis judaicas regulando todos os aspectos
da vida.

Hanina ben Dosa. Fazedor de milagres do primeiro século d.C. e estudante


do rabino judeu Yohanan ben Zakkai.

hapax legomenon (pl., hapax legomena). Palavra que aparece apenas uma
vez em uma dada peça de escrita.

hasid (pl., hasidim). Do hebraico, “religiosos” ou “retos”; um partido


religioso judeu mencionado em 1Macabeus que emergiu durante o
Período Macabeu (MACABEUS).

Hasmoneus. Dinastia judaica estabelecida durante o período macabeu.

hebraico. Antiga língua do Oriente Próximo falada pelo povo judeu e


língua original do AT.

hegeliano. Referentes ao pensamento do filósofo alemão G. W. F. Hegel,


que postulava que a história progrediu ao longo do curso de uma
dialética da tese para antítese para síntese.

Hegesipo (c. 110-180 d.C.). Historiador da igreja do século II d.C. que


escreveu contra os gnósticos.

Helenismo. Cultura grega.

Hellesponto. Antigo nome do estreito agora conhecido como Dardanelos,


que separa os Bálcãs da Ásia Menor.

hendiadis. Dois substantivos unidos por conjunção para expressar um


simples conceito ou ideia.

Heresia colossense. Mistura eclética singular de falsos ensinamentos


prevalescente na Colossos do primeiro século (veja esp. Cl 2).

1848
Herodes Antipas. Tetrarca da Galileia e Pereia (4 a.C.-39 d.C.).

Herodes Arquelau. Um dos filhos de HERODES, O GRANDE que foi etnarca


da Judeia, Samaria, e Indumeia (4 a.C.-6 d.C.).

Herodes, o Grande. HERODES.

Herodes. Pode se referir ao cabeça da dinastia herodiana, Herodes o


Grande (37-4 a.C.) ou a um de seus descendentes, como seus filhos
Arquelau (HERODES ARQUELAU), Antipas (HERODES ANTIPAS), e Filipo.

Hilário de Poitiers (c. 315-368 d.C.). O mais respeitado teólogo Latino de


sua época no Ocidente, escreveu obras importantes sobre a Trindade.

Hipérbato. Também conhecido como inversão, é uma figura de linguagem


que consiste na troca da ordem direta dos termos da oração ou de nomes
e seus determinantes.

hipérbole. Exagero para efeito retórico.

Hipólito de Roma (c. 170-236 d.C.). Presbítero da igreja em Roma e


prolífico autor de obras como Refutation of All Heresies [Refutação de
todas as heresias] e Antichrist [Anticristo].

Hipótese de Griesbach. O ponto de vista, que recebeu essa denominação


após o estudioso alemão J. J. Griesbach, de que Mateus e Lucas
escreveram primeiro, e Marcos utilizou esses dois evangelhos.

Hipótese dos Dois Documentos. TEORIA DAS DUAS FONTES.

Hipótese dos Dois Evangelhos. HIPÓTESE DE GRIESBACH.

história da salvação. A progressiva revelação da provisão da salvação por


Deus para a humanidade.

1849
História Eclesiástica. Famosa obra de EUSÉBIO na qual ele se refere a
muitas obras já não existentes dos primeiros pais da igreja, como as de
Papias.

historicista. Abordagem para a interpretação do livro do Apocalipse,


segundo a qual as visões de João provêm o curso da história na Europa
Ocidental, com particular ênfase nos papas, reis, e as guerras.

historiografia. Uma abordagem particular para escrever a história.

Holman Christian Standard Bible (HCSB). Tradução da Bíblia Inglesa


publicada em 2004.

homem da inequidade. O anticristo (veja 2Ts 2.1-12).

Homero. Poeta épico grego do século VIII a.C.; autor de Ilíada e Odisseia.

homolegoumena. Livros de NT amplamente reconhecidos como


autoritativos na época de Eusébio (c. 260-340 d.C.).

Horácio. Poeta romano do primeiro século a.C.; autor de Odes ou Carmina.

Idade Média. Período de tempo geralmente datado da queda do Império


Romano do Ocidente no século V d.C. para o crescimento dos estados-
nação e da Reforma Cristã no século XVI.

idealista. Abordagem para a interpretação do livro do Apocalipse segundo


a qual o livro simbolicamente retrata a natureza espiritual e atemporal
da batalha entre o bem e o mal.

Igreja Ocidental. Igrejas que gravitavam ao redor de Roma ou que dela se


afastaram durante a Reforma.

Igreja Oriental. Parte da igreja a nível mundial que gravitava em torno do


Império do Oriente, em Constantinopla e de seu patriarcado, distinta da

1850
Igreja Ocidental.

Igreja Ortodoxa Oriental. Distinta da Igreja Católica Romana, que era


centrada no Ocidente, um corpo eclesiástico traçando sua origem até os
tempos apostólicos e composta de corpos nacionais, como a Igreja
Russa ou Ortodoxa Grega Igreja.

igualitário. Relativo à crença nos direitos iguais de homens e mulheres a


posições de liderança, incluindo os postos de pastor ou presbítero.

Iluminismo. Um movimento intelectual nos séculos XVII e XVIII,


defendendo a primazia da razão como base para autoridade.

Inácio de Antioquia (c. 35-110 d.C.). Bispo de Antioquia e pai da igreja


primitiva que escreveu cartas aos fiéis de Eféso, Magnésia, Filadélfia, e
outros.

inclusio de testemunho ocular. A prática literária de indicar a fonte das


principais testemunhas oculares de um relato apresentando esta pessoa
como a primeira e última personagem nomeada na narrativa.

inclusio. Um antigo artifício literário agrupando uma seção ao colocar uma


e a mesma palavra ou sentença no início e no final dessa seção.

inerrância. A doutrina que afirma que a Escritura está livre de erros.

Inscrição de Delfos. Inscrição na antiga cidade grega de Delfos


supostamente contendo as máximas “conhece-te a ti mesmo” e “nada
em excesso”.

Inscrição de Gálio. Inscrição encontrada em Delfos, Grécia, que confirma


que Gálio era o governador da Acaia quando Paulo estava em Corinto
em 51-52 d.C. (veja At 18.12).

1851
Inscrição Lapis Tiburtinus. Uma lápide do primeiro século encontrada no
século XVIII registrando a carreira de um eminente oficial romano,
possivelmente Quirino.

inspiração plena. A inspiração completa ou total de cada parte da


Escritura.

inspiração verbal. A natureza divina das palavras da Escritura.

inspiração. A doutrina da determinante influência espiritual de Deus sobre


os escritores da Escritura resultando em uma Bíblia inerrante.

integridade literária. Autoria de uma determinada peça de escrita por um


autor, denotando a sua autenticidade, coesão e coerência.

interpolação. Inserção de texto.

inviolável. Proibição de alterar o texto das Escrituras, quer pela adição ou


pela remoção (p. ex., Ap 22.18,19).

ipsissima verba. Exatamente as mesmas palavras.

ipsissima vox. Exatamente a mesma voz, verdadeiro sentido.

Irineu de Lion (c. 130-200 d.C.). Bispo de Lion, França, e pai da igreja
primitiva que escreveu a importante obra Against Heresies [Contra
heresias] refutando o gnosticismo.

isocolon. Diz-se do período cujos membros sintáticos e tonais têm estrutura


semelhante e extensão equivalente.

Jerônimo (c. 345-420 d.C.). Pai da igreja do quarto século e tradutor da


Vulgata Latina.

Jesus da fé. Jesus como o objeto da fé da igreja primitiva em distinção a


Jesus durante seu ministério terreno (uma distinção sustentada pelos

1852
acadêmicos alemães Martin Kähler, Rudolf Bultmann, e outros).

Jesus da história. Jesus histórico.

Jesus histórico. O produto de pesquisas acadêmicas no contexto da pessoa


de Jesus Cristo.

Jesus Mara bar Serapião. Um homem não cristão em uma prisão na Síria
que escreveu uma carta para seu filho no primeiro ou segundo século
d.C., fazendo menção de “os judeus […] executando seu sábio Rei”,
uma possível referência a Jesus fora da Bíblia.

João Crisóstomo (“boca de ouro”; c. 347-407 d.C.). Arcebispo de


Constantinopla e pregador e escritor cristão, mais conhecido pelas sua
obra Homilies [Homilias].

John Wycliffe (1330-1384). Produziu uma tradução em Inglês da Bíblia a


partir do latim (Vulgata).

Josefo (37-100 d.C.). Historiador judeu; autor de Jewish Wars [Guerras


judaicas], Jewish Antiquities [Antiguidades judaicas], e Against Apion
[Contra Apião].

Judaísmo do Segundo Templo. A religião do povo judeu durante o


período do Segundo Templo (período do Segundo Templo).

Judaizantes. Movimento judeu do primeiro século que queria exigir que os


gentios se submetessem a circuncisão como condição para permitir sua
participação na igreja cristã (veja especialmente o livro de Gálatas).

Julio Africano. Antigo viajante e historiador do século III d.C. que


escreveu uma história do mundo.

1853
Justino Mártir (c. 100-165 d.C.). Antigo apologista cristão, mais
conhecido por suas obras Dialogue with Trypho [Diálogo com Trifão] e
First Apology [O primeiro pedido de desculpas].

Juvenal. Poeta romano do final do primeiro e início do segundo século;


autor de Satires [Sátiras].

Kabiros. Antigo deus grego.

kerygma, o. Termo grego usado em um sentido técnico para o conteúdo


principal da pregação do NT.

King James Version (KJV). Bíblia publicada em 1611; também conhecida


com Versão Autorizada (VA).

lacuna (pl., lacunae). Lacuna em um manuscrito, inscrição, ou texto.

latinismo. Termo ou expressão latina.

legalismo. Um termo pejorativo que denota a fixação imprópria de leis ou


códigos de conduta.

Lei. Exigências feitas por Deus para Israel centradas no Decálogo (Os Dez
Mandamentos); o código dado através de Moisés no Monte Sinai .

lex talionis. Princípio do AT de “olho por olho, dente por dente” (veja Êx
21.22-25).

libertinismo. Indulgência das paixões corporais, envolvendo o


comportamento imoral.

língua franca. Linguagem universal.

língua siríaca. Língua aramaica que gerou seu próprio corpo de literatura e
versão bíblica.

1854
línguas. A manifestação descrita na ocasião da vinda do Espírito Santo em
Pentecostes, em Atos 2, e o dom espiritual mencionado em 1Coríntios
12 a 14.

Literatura de Qumran. Pergaminhos do Mar Morto.

literatura protréptica. Literatura exortativa encorajando o povo a assumir


a vida filosófica (p. ex., a Epístola a Diogneto).

literatura rabínica. Corpo de literatura compilando dos ensinamentos dos


antigos rabinos judeus, incluindo a Mixná (p. ex., m. Avot), aos talmuds
da Babilônia e de Jerusalém (p. ex., b. Sanh;. y. Yeb.) e o Tosefta (t.
Zer.).

litotes. Modo de afirmação pela negação do contrário (p. ex., Rm 1.16:


“Porque não me envergonho do evangelho”, indicando que Paulo se
orgulha do evangelho; cf. Jo 6.37).

Livro da Vida. Descrição metafórica de um registro celeste de todos


aqueles que receberam a vida eterna pela fé no Senhor Jesus Cristo
(veja Ap 20.12).

logion (pl. Logia). Recitar um oráculo.

logos. Do grego, logos (“verbo”), a designação do preexistente Senhor


Jesus Cristo em João 1.1,14 em concordância com passagens como
Isaías 55.11,12.

Luciano de Samosáta. Satirista do século II d.C. escrevendo em grego,


autor de The Passing of Peregrinus.

LXX. Septuaginta.

1855
Macabeus. Uma família judaica que liderou a revolta do século II a.C.
contra os selêucidas resultando em um período de independência
judaica.

Manuscrito Mar Saba. Uma epístola forjada atribuída a Clemente de


Alexandria e “descoberta” por Morton Smith em 1958, contendo as
únicas referências conhecidas do Evangelho Secreto de Marcos.

manuscrito. Qualquer peça escrita a mão (um texto ou um documento).

Manuscritos armênios. Cópias bíblicas escritas em linguagem indo-


europeia falada nas montanhas do Cáucaso e na diáspora armênia.

Manuscritos georgianos. Manuscritos antigos que remontam ao século V


d.C. escrito em georgiano, a língua falada na Geórgia, uma região entre
o mar Negro e o mar Cáspio, na cadeia montanhosa do Cáucaso.

Manuscritos ocidentais. Igreja Ocidental; contraste com Manuscritos


Orientais.

Manuscritos orientais. Cópias da Bíblia da igreja oriental incluindo a


Peshitta.

Manuscritos siríacos. Cópias dos textos bíblicos escritas na língua siríaca.

Marcião de Sinope (morto c. 160 d.C.). Herege mais conhecido pelo seu
cânon truncado do NT consistindo de uma versão editada do Evangelho
de Lucas e 10 cartas de Paulo (ele rejeitou as Epístolas Pastorais).

mártires macabeus. Judeus que perderam suas vidas durante o levante


Macabeu contra os selêucidas no século II a.C. (veja 2Macabeus).

masoretas. Escribas judeus responsáveis pela preservação do texto do AT.

1856
Melito de Sardis (morto c. 190 d.C.). Bispo de Sardis próxima a Esmirna
na Ásia Menor.

Messias. Do hebraico, meshshiach (“ungido”); libertador prometido e


enviado por Deus para salvar o seu povo; identificado no NT como o
Senhor Jesus Cristo (p. ex., Jo 20.30, 31).

Midrash homilética. Interpretação de textos bíblicos em pregação.

midrash. Antigo comentário judaico, incluindo a interpretação de


passagens selecionadas da Escritura, com o propósito de ressaltar sua
relevância contemporânea.

milênio. Mil anos do reinado de Cristo (veja Ap 20).

minúsculos. Antigos manuscritos escritos em pequenas letras cursivas.

missão cristã gentia primitiva. O evangelismo de não judeus pelos


cristãos narrado no livro de Atos.

misticismo judaico. Misticismo merkabah.

misticismo merkabah. Do hebraico, merkabah (“carruagem,” veja Ez 1.4-


26); uma antiga tradição de interpretação judaica que defendia que as
imagens bíblicas de Deus são analogias das formas básicas pelas quais
Deus se revela no mundo.

misticismo. Várias abordagens à espiritualidade tendo o foco na união do


humano com o divino, como no misticismo Merkabah ou religiões de
mistério.

Mito do Nero redivivus. A crença de que o imperador romano Nero não


tinha realmente morrido, mas retornaria a Roma com o exército Pártia
(a.k.a. Nero redux).

1857
mito. História sagrada, particularmente de origem humanas, isto é, de
fabricação humana em vez de estar enraizada na história real.

Mishná. Coleção de tradições rabínicas judaicas compiladas c. 200 d.C.

Modelo de Oração. Também chamada “A Oração do Senhor” (veja Mt 6.9-


11; Lc 11.2-4).

monismo. Visão filosófica postulando um princípio subjacente unificador,


obscurecendo a distinção entre o Criador e o universo criado.

monoteísmo. Crença em um único Deus característica do judaismo,


cristianismo e islamismo.

Montanismo. Seita dos meados do século II d.C., que recebeu o nome de


seu fundador, Montano, que afirmava ter recebido uma série de
revelações divinas especiais e ser o Paráclito mencionado no Evangelho
de João.

ms(s). Abreviação de manuscrito(s).

narratio. Apresentação dos fatos essenciais explicando a natureza da


questão.

narrativa da Paixão. Relato dos eventos que envolvem a crucificação de


Jesus nos quatro Evangelhos.

nazareno. Um habitante de Nazaré, a cidade onde Jesus cresceu, daí o fato


de Jesus ter sido chamado de “Nazareno” em cumprimento da profecia
(Mt 2.23).

Nero. Imperador romano (54-68 d.C.); responsável pelo incêndio de Roma


(64 d.C.) e pelo martírio de muitos cristãos, incluindo os apóstolos
Pedro e Paulo (65 ou 66 d.C.).

1858
New American Bible (NAB). Tradução bíblica publicada em 1966.

New American Standard Bible (NASB). Tradução bíblica publicada em


1970.

New Century Version (NCV). Tradução bíblica publicada em 1987.

New English Bible (NEB). Tradução bíblica publicada em 1966.

New International Version (NIV). Tradução bíblica publicada em 1978.

New King James Version (NKJV). Revisão da King James Version


publicada em 1982.

New Living Translation (NLT). Revisão da Living Bible (uma paráfrase)


publicada em 1996.

New Revised Standard Version (NRSV). Revisão da Revised Standard


Version publicada em 1989.

nomina sacra. Abreviaturas padronizadas para os nomes de Deus, nos


antigos manuscritos cristãos, geralmente constituídos pelas primeira e
última letra de um dado nome com uma barra horizontal sobre a
abreviação (p. ex., ΘΣ para Θεος, “Deus”).

nomismo pactual. Nomismo.

nomismo. Termo cunhado por E. P. Sanders se referindo a adesão judaica a


Lei (nomos) como o caminho da retidão; nomismo pactual.

Nós em Atos. Porções da narrativa no livro de Atos escritas na primeira


pessoa do plural, com toda probabilidade indicando que o autor de Atos
participou das viagens narradas nessas porção de seu relato (At 16.10-
17; 20.5-15; 21.1-18; 27.1 a 28.16).

1859
Nova Perspectiva, a. Desafio à visão tradicional de Paulo em oposição ao
legalismo judaico em sua época, primeiramente articulada por E. P.
Sanders em Paul and Palestinian Judaism.

Novo Testamento Apócrifo. NT Apócrifo.

NT Apócrifo. Vários escritos produzidos durante o PERÍODO SUBAPOSTÓLICO

que imitam os Evangelhos Canônicos, Atos, Epístolas e Apocalipse (p.


ex., o Evangelho de Tomé, Atos de Tecla, o Apocalipse de Pedro).

O discípulo que Jesus amava. Epíteto Joanino para o discípulo mais


próximo de Jesus durante seu ministério terreno (veja Jo 13.23) e que
também foi o autor do Evangelho de João (21.20, 24); tradicionalmente
identificado como João, o filho de Zebedeu.

obra. Tratado ou ensaio, designando unidades em coleções judaicas como o


Talmude.

Obras da lei. Ritual de observância dos requerimentos legais do AT.

oráculo. Visão.

Oráculos Sibilinos. Coleção de oráculos atribuídos a uma sibila, uma


profetisa que proferiu uma alegada revelação divina em um estado
frenético

ordenanças. Observância da igreja ordenada por Cristo, em particular o


batismo (Mt 28.18-20) e a Ceia do Senhor (1Co 11.23-26, veja Mt
26.26-30 e paralelos).

Orígenes (c. 185-254 d.C.). Antigo pai da igreja, célebre estudioso e


membro da escola se interpretação de Alexandria.

1860
Orósio (c. 385-420 d.C.). Discípulo de Agostinho e mais conhecido por
suas obras Seven Books of History against the Romans [Sete livros de
História contra os romanos].

ortodoxia. Conformidade de um dado documento com o ensinamento


apostólico (veja At 2.42).

ortopraxia. Prática correta (também ortodoxia).

Ostian Way. Uma famosa estrada que ligava Roma, com o porto da cidade
de Ostia, tradicional local do túmulo de Paulo.

ostraca. Cacos de cerâmica com inscrições.

Oto. Imperador romano durante parte de 68 d.C.

paganismo. Uma variedade de religiões animistas e outras crenças e


práticas religiosas não cristãs.

Pais Apostólicos. Grupo de escritos produzidos durante o início do período


patrístico compreendendo 1 e 2Clemente; As Cartas de Inácio; A Carta
de Policarpo aos Filipenses e O Martírio de Policarpo, O Didache; A
Epístola de Barnabé; O Pastor de Hermas; A Epístola a Diognetus; o
Fragmento de Quadratus; e Fragmentos de Papias.

Pais da Igreja. Líderes da igreja, escritores, e teólogos dos primeiros


séculos da era cristã (PATRÍSTICO).

Paixão, a. Eventos que envolvem a crucificação de Jesus.

palavra de gancho. Palavra no início de um parágrafo repetida do final do


parágrafo anterior ligando duas unidades.

Panteno. Um teólogo cristão de Alexandria (morto c. 190 d.C.)


mencionado por Eusébio.

1861
Papias de Hierápolis (c. 60-130 d.C.). Pai da igreja cuja obra Expositions
of the Lord’s Sayings [Exposições das palavras do Senhor] é citada por
EUSÉBIO em sua obra Ecclesiastical History [História eclesiástica].

papiro. Antigo material para se escrever ou rolo sobre o qual alguns dos
mais antigos manuscritos do NT são encontrados (p. ex., 52
, um
fragmento do Evangelho de João datado de c. 125 d.C.).

Papiros de Oxirrinco (Oxyrhynchus papyri). Artefatos encontrados em


um sítio arqueológico no Egito, onde uma grande coleção de papiros
antigos foi descoberto, incluindo fragmentos de vários textos cristãos.

Parácleto. Do grego paraklētos; título de Jesus para o Espírito Santo


(“Conselheiro”, Jo 14.16,26; 15.26; 16.7); João o utilizou para Jesus
Cristo (“advogado,” 1Jo 2.1).

paralelomania. A tendência quase compulsiva de encontrar paralelos, até


mesmo onde estes não estejam presentes.

Paralelos sinóticos. Passagens relacionadas nos Evangelhos Sinóticos.

parataxe. A justaposição de duas orações.

parênese. Exortação.

paronomásia. Do grego para (“beside”) e onoma (“nome”); jogo de


palavras explorando a confusão entre o som semelhante de duas
palavras.

parousia. Termo grego para “presença” que está relacionado com a


Segunda Vinda de Jesus.

partitio. Na retórica grega, seção seguindo o narratio (s.v.) que descreve o


que se seguirá.

1862
Páscoa. Festa religiosa judaica instituída na véspera do êxodo de Israel do
Egito (veja Êx 12).

Pastor de Hermas. Documento cristão do início do século II (?) d.C.

Patmos, Ilha de. Lugar de exílio, onde o apóstolo João recebeu as visões
registradas no livro do Apocalipse (cf. Ap 1.9).

patrístico. Relacionado aos Pais da Igreja.

paulino. Relacionado a (o apóstolo) Paulo (CÍRCULO PAULINO, CORPO

PAULINO).

Pentateuco Samaritano. O texto dos cinco livros de Moisés (Gênesis,


Êxodo, Levítico, Números, Deuteronômio) usado pelos samaritanos.

Pentateuco. Do grego penta (“cinco”); os cinco livros de Moisés —


Gênesis, Êxodo, Levítico, Números e Deuteronômio.

Pentecostes. Do grego para “quinquagésimo”; festival judaico descrito em


Levítico 23.5-21 e Deuteronômio 16.8-10; termo usado somente em
Atos 2.1; 20.16; 1Coríntios 16.8.

pergaminho. Antigo rolo feito da pele de animais (VELINO).

Pergaminhos do Mar Morto. Um corpo de literatura sectária judaica


encontrado próximo ao Mar Morto nos anos que se seguiram a 1947,
incluindo a Community Rule (1QS), o War Scroll (1QM), e o Damascus
Document (CD).

perícope. Unidade independente da narrativa (nos Evangelhos; p. ex., Mc


2.1-12).

período apostólico. Vida daqueles que foram testemunhas oculares do


ministério de Jesus e que tinham sido designados por ele para servir

1863
como seus mensageiros, normalmente visto como terminado com a
composição do último livro do NT, o livro do Apocalipse (c. 95 d.C.;
s.v. PERÍODO SUBAPOSTÓLICO).

período do Segundo Templo. Espaço de tempo entre a reconstrução do


templo em 516 a.C. e a destruição do templo pelos romanos em 70 d.C.

período subapostólico. Era subsequente a era apostólica.

Período Tannaítico (70-200 d.C.). TANNAIM.

peroratio. Conclusão do argumento retórico.

pesher. Técnica de interpretação judaica na qual a aplicação contemporânea


de uma referência bíblica é destacada.

Peshitta. Tradução siríaca da Bíblia.

Petrônio. Escritor romano do primeiro século d.C., reinado de NERO, autor


de Satyricon.

Platonismo Médio. Um conjunto de princípios filosóficos associados com


Platão que se desenvolveu a partir de c. 130 a.C. até o final do século II
d.C.

Platonismo. Um sistema filosófico originário do filósofo grego Platão (c.


429-347 a.C.), influenciou o cristianismo através dos escritos de
Clemente de Alexandria, Orígenes e Agostinho.

pleonasmo. O uso de mais palavras do que as necessárias para expressar


uma ideia.

Plínio, o Moço. Filho de Plínio, o Velho e procônsul da província de


Bitínia, na Ásia Menor, no início do século II d.C.

1864
Plínio, o Velho. Filósofo romano do primeiro século d.C., autor de Natural
History.

Plutarco. Historiador, biógrafo, e ensaísta grego do primeiro século d.C.;


autor de Parallel Lives and Moralia.

pneumático. Do grego pneuma (“Espírito” ou “espírito”); relacionado a


questões espitituais, o espírito humano, ou o Espírito Santo.

Políbio. Historiador grego do século II a.C.; autor de The Histories.

Policarpo de Esmirna (c. 69-155 d.C.). Discípulo do apóstolo João,


companheiro de Papias, bispo de Esmirna, autor de To the Philippians;
martirizado ao ser queimado na fogueira.

Polícrates. Um dos primeiros líderes cristãos em Éfeso, que floresceu na


segunda metade do século II d.C.

Pôncio Pilatos. Procurador romano da Judeia (26-36 d.C.); foi responsável,


juntamente com os judeus, pela crucificação de Jesus, como explicado
nos quatro evangelhos.

prefeito. Oficial do governo romano.

pré-milenismo. Crença cristã de que o Senhor Jesus Cristo voltará antes


(“pré”) de seu reinado de mil anos na terra; millennium do Lat. mille
(“mil”) e annus (ano).

presbítero (ancião). Originalmente se referindo a um homem idoso, o


termo também se refere a posições de governo e ensino da igreja do NT
ocupado pelos homens (p. ex., 1Tm 3.1-7; 4.14; 5.17).

presbítero. Do grego presbyteros (“ancião”); termo algumas vezes usado


para o líder de uma igreja local.

1865
preterista. Abordagem para a interpretação do livro do Apocalipse segundo
a qual o eventos profetizados no livro foram cumpridos no primeiro
século.

Prioridade Marcana. O ponto de vista que Marcos foi o primeiro a


escrever e foi utilizado pelos outros dois escritores sinóticos (Mateus e
Lucas).

Prioridade Mateana. O ponto de vista de que Mateus foi o primeiro entre


os escritores dos Evangelhos sinóticos a escrever seu evangelho e que
Marcos e Lucas o utilizaram.

probatio. Na retórica clássica, é uma seção que denota provas na


organização de um determinado argumento.

Problema sinótico. A natureza da relação entre os Evangelhos de Mateus,


Marcos, e Lucas, considerada por alguns um “problema”, devido a
alegadas discrepâncias na cronologia e vocabulário.

procônsul. Cargo romano semelhante ao de governador de uma província.

procurador. Oficial do governo romano.

Prólogos Antimarcionitas. Apesar do nome, estes prefácios a Marcos,


Lucas e João (o de Mateus está perdido) muito provavelmente não
foram escritos contra Marcião e podem datar do século IV d.C.; exceto
o prólogo de Lucas (que pode ser datado por volta de 160-180 d.C.),
eles existem apenas em latim.

Prólogos monárquicos. Breves introduções curtas prefixadas em muitas


Vulgatas mss. Aos quatro Evangelhos, provavelmente escritas no século
IV ou V d.C.

1866
prosélito. Gentios atraídos a adoração judaica, que se submetiam à
circuncisão e a observância do Sábado e das leis alimentares.

protestante. Evangélicos não católicos, termo cunhado durante o


movimento cristão chamado de “A Reforma Protestante” desencadeada
por protestos contra os abusos na Igreja Católica Romana.

Protoevangelho de Tiago. Influente evangelho apócrifo provavelmente


datada da segunda metade do século II d.C.

proveniência. Lugar da escrita.

Pseudepígrafo. Do grego significando “título falso”; um termo coletivo


para a literatura judaica do Segundo Templo não incluída nos Apócrifos.

Pseudo-Barnabé. Carta antiga falsamente atribuída a Barnabé (datada por


volta de 135? d.C.).

pseudonimato. Uma atribuição de autoria de uma determinada peça de


escrita a alguém que não seja o verdadeiro autor.

“Q”. Uma hipótetica fonte comum a Mateus e Lucas, possivelmente


abreviando a palavra alemã Quelle (“fonte”).

qal wāhomer. Argumento do menor para o maior.

quialismo. A crença no reinado milenar (mil anos) de Cristo.

quiasma. Do nome da letra grega χ; arranjo de sentenças em forma de cruz


de tal modo que a segunda expressão tem a ordem inversa da primeira
(A B B’ A’).

Quirino. Governador, ou o titular de cargo administrativo, na Síria


mencionado por Lucas na narrativa do nascimento de Jesus em Lucas
2.2.

1867
Qumran. Região próxima ao Mar Morto e sítio onde a Literatura de
Qumran foi encontrada.

rapture. Do lat. raptura, a VULGATA renderização de “apanhar” em 1Ts


4.17. Encontro dos cristãos com seu Senhor no momento da Segunda
Vinda em conexão com a TRIBULAÇÃO.

recurso plural-singular. Mudança do uso do plural (grupo) para o singular


(individual) indicando testemunho ocular (descrito por R. Bauckham em
Jesus and the Eyewitnesses [Jesus e as testemunhas oculares]).

referência existente. Passagem disponível em um manuscrito existente.

Reforma. Movimento do século XVI que provocou uma reforma na Igreja


Católica Romana e liderada por homens como Martinho Lutero, João
Calvino, e outros que deu origem ao movimento Protestante e
evangélico.

Reformadores Protestantes. Líderes como Martinho Lutero ou João


Calvino, que procuraram fazer com que a igreja retornasse às suas bases
bíblicas, e que desafiaram as tradições não bíblicas da igreja com o grito
de guerra Sola Scriptura (“somente a Escritura”).

refutatio. Na retórica antiga, refutação contendo contrapontos.

Regras de fé. Ensino apostólico ortodoxo.

regula fidei. Do latim “REGRA DE FÉ”.

religiões de mistério. Cultos greco-romanos concebendo a religião


principalmente em termos de união mística com o divino.

retórica deliberativa. Qualquer comunicação argumentando a favor ou


contra uma ação futura contemplada.

1868
retórica epideitica. Tipo de discurso atribuindo louvor ou culpa.

retórica forense. Tipo de discurso usado no ambiente de uma corte.

retórica. Estudo e prática de comunicação efetiva; tipo de discurso.

Revised Standard Version (RSV). Tradução da Bíblia publicada em 1952.

Revolta de Bar Kokhba. Rebelião judaica contra os romanos (132-135


d.C.).

Rufino (c. 345-411 d.C.). Historiador e tradutor, contemporâneo de


Jerônimo, e tradutor de obras teológicas gregas para o latim.

sacramentalismo. A noção que um rito religioso pode transmitir graça


divina.

sacramentarianismo. A crença de que os elementos da Ceia do Senhor são


meramente simbólicos do corpo e sangue de Jesus Cristo.

sacramento. Um rito religioso que os católicos romanos acreditavam


mediar a graça, constituindo um sagrado mistério.

saduceus. Seita aristocrática judaica que juntamente com os FARISEUS

geralmente apoiava o status quo político na Palestina, seus membros


foram responsáveis pela crucificação de Jesus.

Salvador. Libertador religioso; o NT alega que Jesus é o Salvador do


mundo (Jo 4.42); O termo também foi utilizado para os imperadores no
mundo greco-romano.

Samaria. Região da Palestina ao norte da Judeia.

samaritanos. Habitantes de Samaria, que reivindicaram a descendência das


tribos israelitas do norte de Efraim e Manassés.

1869
Sarapis. Deus egípcio-helenístico.

Saulo de Tarso. Nome alternativo do apóstolo Paulo (Tarso se refere a sua


terra natal).

secessionistas. Hereges divisionistas que deixaram a congregação,


sugerindo que eles nunca foram realmente salvos (veja esp. 1Jo 2.19).

Segredo messiânico. Termo convencionalmente utilizado para descrever a


relutância de Jesus em se identificar publicamente como o Messias,
possivelmente devido à incompreensão predominante associada com o
termo (pelo menos em parte).

Seminário de Jesus. Grupo de estudiosos envolvidos em uma crítica


“busca do JESUS HISTÓRICO e, que normalmente chegam a conclusões
negativas sobre a historicidade da informação a respeito de Jesus nos
quatro evangelhos canônicos.

Semítico. Judeu, com referência a um dos filhos de Noé, Sem (veja Gn


6.10).

Semitismo. Também chamado hebraísmo, um padrão de pensamento ou


expressão judaica refletida em um documento grego de um escritor
judeu.

Septuaginta. Tradução grega do AT das Escrituras Hebraicas (abreviada


LXX).

sepulcro. Tipo de túmulo.

Serapião de Antioquia. Patriarca de Antioquia (morto em 211 d.C.)


mencionado por Eusébio.

1870
Sermão da Planície. O equivalente de Lucas para o Sermão do Monte de
Mateus em Lucas 6.17-49 (veja Lc 6.17: “lugar plano”).

Sermão do Monte. Corpo dos ensinamentos de Jesus apresentado em


Mateus 5 a 7 (veja Mt 5.1, “na montanha”).

Servo Sofredor, o. Figura na Segunda parte de Isaías (esp. 52.13 a 53.12)


identificado como Jesus, o Messias, pelos escritores do NT (p. ex., 1Pe
2.21-25).

shekel. Antiga moeda judaica.

shekinah. A gloriosa presença de Deus, especialmente no templo.

Shema. Palavra hebraica para “escutar” ou “ouvir”. A primeira palavra em


Deuteronômio 6.4: “Ouve, ó Israel: O SENHOR nosso Deus é o único
SENHOR”; a afirmação central judaica do monoteísmo.

Sião. Montanha sagrada em Jerusalém (p. ex., 2Sm 5.7; Sl 2.6; Is 28.16).

silogismo. Forma de argumento contendo uma premissa maior e uma


menor, e uma conclusão (p. ex., a Escritura é a Palavra de Deus, Deus
não erra, portanto a Escritura é inerrante).

Sinaíticos. Códice Sinaítico.

sincretismo. Eclética mistura de crenças e práticas religiosas.

Sinédrio. Conselho judaico composto de saduceus e fariseus que entregou


Jesus a Pôncio Pilatos para ser crucificado.

Sinótico. Relativo a Mateus, Marcos e Lucas.

Siraque. Livro apócrifo do AT do século II a.C. também conhecido como


The Wisdom of Ben Sira ou Ecclesiasticus (não o livro de Eclesiastes do
AT).

1871
Síria. Antigregião do Oriente Próximo ao norte de Israel (capital Damasco).

Sócrates (469-399 a.C.). Filósofo grego clássico, mestre de Platão, e um


dos fundadores da filosofia ocidental.

solecismo (aparente). Incongruência gramatical (característica do livro de


Apocalipse).

Strabo (n. c. 64 a.C, m. 21 d.C.). Eminente geógrafo do primeiro século


a.C e d.C. e autor de Geographia em 17 livros.

stratum. Do latim para “estrato,” figurativamente usado para uma sucessão


de fontes escritas incorporadas a um determinado documento.

Suetônio (c. 70-130 d.C.). Historiador romano e autor de Lives of the


Twelve Caesars [Vidas dos Dozes Cesares].

Taciano. Pai da igreja primitiva e compilador da sinopse dos Quatro


Evangelhos chamada Diatessaron (c. 150-160 d.C.).

Tácito (n. c. 56 d.C.; m. após 118 d.C.). Historiador romano e autor de


The Annals [Os Anais] e The Histories [As Histórias].

Talmude babilônico. TALMUDE.

Talmude Jerusalém. Também chamado de Talmude Palestino, uma


coleção de tradições rabínicas judaicas consistindo da Mixná (c. 200
d.C.) e da Gemara (em duas versões, Datado c. 350-400 e 500 d.C.,
respectivamente).

Talmude. Compilação dos escritos judaicos nas tradições babilônicas e


palestinas.

Tannaim. Do aramaico tanna (“repetir, aprender”); domínio do ensino


transmitido por repetição oral.

1872
Targum (pl., Targums). Paráfrase do aramaico e comentários sobre as
Escrituras Hebraicas.

Temente a Deus. Gentil (não judeu) atraído a adoração judaica que


participa na adoração na sinagoga embora não se submetendo a
circuncisão (s.v. também prosélitos).

templo, o. Geralmente, uma abreviação para o templo de Jerusalém,


originalmente construído por Salomão.

teodiceia. Do grego theos (“Deus”) e dikaios (“justiça”); uma tentativa de


justificar as ações de Deus (p. ex., veja Jó, Romanos e Apocalipse).

Teodoreto. Bispo sírio do século V d.C. que desempenhou papel


fundamental em várias controvérsias na igreja bizantina.

Teodoro de Mopsuestia (c. 350-428 d.C.). Teólogo e exegeta bíblico de


Antioquia.

Teofania. Do grego theos (“Deus”) e phainō (“aparição”); uma aparição de


Deus aos seres humanos.

Teófilo de Antioquia. Patriarca de Antioquia; autor de To Autolycus [A


Autólico] (final do século II d.C.).

Teofrasto (c. 371-286 a.C.). Filósofo grego e associado e sucessor de


Aristóteles na escola de Liceu, escola fundada por Aristóteles.

Teoria das Duas Fontes. Hipótese de que Mateus e Lucas usaram


independentemente duas fontes escritas, Marcos e “Q”.

Terceiro Concílio de Cartago. Reunião dos líderes de igreja em 397 d.C.

Tertuliano (c. 160-225 d.C.). Importante apologista cristão da igreja


primitiva, autor de Against Marcion [Contra Marcião], Apology

1873
[Apologia] e On Baptism [Sobre o batismo].

Terumá. Seção das Mixná contendo os regulamentos sobre o dízimo.

testemunho apostólico. Testemunho em primeira mão do Doze registrado


nos quatro Evangelhos canônicos.

testemunho textual. Leituras atestadas em manuscritos particulares.

testimonia. Textos messiânicos comuns do AT apresentados pelos primeiros


cristãos para provar que Jesus era o Cristo.

Testimonium Flavianum. Discutida parte da obra Jewish Antiquities


[Antiguidades judaicas], de Josefo, historiador judeu, que se refere a
Jesus, acredita-se que, pelo menos parte dela, seja uma interpolação
cristã posterior.

tetragrammaton. Do grego significando “quatro letras,” referindo-se ao


nome de Deus do AT, “YHWH” (provavelmente pronunciado
“Yahweh,” mas em muitas traduções representado por “Senhor”).

tetrarca. “regente de um quarto,” título de governadores como Herodes


Antipas.

Texto Massorético (TM). Masoretas.

Textus Receptus. Latim para “texto recebido,” uma forma de texto do tipo
Bizantino atestado no Texto Majoritário, que constituiu a base textual
para as traduções de Wycliff, Lutero, e para a KJV.

Thallus. Historiador que escreveu em grego e floresceu durante o primeiro


e/ou segundo século d.C.

Theodotion. Estudioso judeu helenístico (c. 200 d.C.) que traduziu a Bíblia
hebraica para o grego, revisando a Septuaginta ou diretamente do

1874
hebraico original.

Tibério. Imperador romano (14-37 d.C.).

tipo de texto alexandrino. Grupo de manuscritos que formam a base do


moderno texto grego eclético moderno do NT (p. ex., Códice Sinaítico).

tipo de texto bizantino. Também chamado de Texto Majoritário, forma


de texto encontrada na maioria dos manuscritos bíblicos que também
subjazem a tradução do Textus Receptus (p. ex., KJV).

tipo de texto ocidental. Distintiva família de manuscritos (p. ex., Códice


Bezae para os Evangelhos e para o livro de Atos) em contraste com os
tipos de texto Alexandrino e Bizantino (REGISTRO ALI).

tipologia. Padrão bíblico de correspondência ao longo das linhas da


salvação histórica (p. ex., Jo 3.14, onde Jesus elaborou sobre o
relacionamento entre a serpente levantada por Moisés no deserto e Jesus
sendo levantado na crucificação, em ambos os casos dando vida ao que
parece na fé).

tipos de texto. Os quatro principais tipos de textos de manuscritos gregos


dos livros do NT são comumente classificados como alexandrino,
bizantino, caesariano e Ocidental.

Today’s English Version (TEV). GOOD NEWS BIBLE.

Tomás de Aquino. Sacerdote Dominicano e teólogo Católico Romano do


século XIII, autor de Summa Theologica.

Torá. Tradução da palavra hebraica para “doutrina” ou “ensino”, em um


sentido mais amplo, a lei judaica englobando tanto os ensinamentos

1875
orais e escritos; em um sentido mais restrito, os cinco livros de Moisés
(Pentateuco).

Tosefta. Do aramaico tosefta (“adição, suplemento”); ensino adicional


suplementando a Mixná.

tradição do Evangelho. Oral e/ou material escrito subjacente aos


evangelhos escritos (TRADIÇÃO SINÓTICA).

tradição dos manuscritos. História da transmissão de manuscritos


(bíblicos).

tradição sinótica. Material oral e/ou escrita subjacente um relato nos


Evangelhos de Mateus, Marcos, e/ou Lucas.

Trajano. Imperador romano (98-117 d.C.).

transfiguração. Evento em que a aparência exterior de Jesus foi


transformada em antecipação de sua glória celestial (cf. Mt 17.1-8 e
paralelos).

transmissão. O processo de cópia e preservação de um texto (Escritura).

tratado. Ensaio (OBRA).

tribulação. Um período de grande sofrimento e aflição em relação ao


retorno de Cristo.

Tucídides. Historiador grego do século V a.C. e autor de The History of the


Peloponnesian War.

Twelfth Benediction, the [Décima Segunda Bênção]. Parte da liturgia do


Shemoneh ‘Esreh, a principal oração do judaísmo consistindo de 19
súplicas, à qual, em algum momento, uma maldição de hereges
(cristãos?) foi adicionada.

1876
uncial. Antigo manuscrito escrito com todas as letras maiúsculas, e sem
espaço e pontuação.

universalismo. Crença errônea de que todos eventualmente serão salvos.

uso eclesiástico. Critério de canocidade enfatizando o uso difundido de um


dado documento do NT na igreja primitiva.

Vaticano. CÓDICE VATICANO.

vaticinium ex eventu. Profecia após o fato.

velina. Pele de animal preparada para ser usada como PERGAMINHO.

Versão Autorizada (AV). KING JAMES VERSION.

Versão Philoxenian. REVISÃO DA PESHITTA commissionada por Philoxenos


de Mabbug em 508 d.C.

Vespasiano. Imperador romano (69-79 d.C.).

Virgílio. Poeta clássico romano do primeiro século a.C., autor de Eneida.

Vitélio. Imperador romano durante parte de 68 d.C.

Vitorino de Pettau. (m. c. 304 d.C.) Bispo da igreja e comentarista.

Vulgata. Tradução latina de Jerônimo da Bíblia do século IV.

William Tyndale (c. 1494-1536). Publicou o primeiro NT na língua inglesa


baseado no texto grego em 1526.

Yahweh. Transliteração aproximada das consoantes hebraicas YHWH (s.v.


tetragrammaton); nome de Deus no AT baseado na autorreferência
divina em Êxodo 3.14 a Moisés, “EU SOU O QUE SOU”.

YHWH. Tetragrama; Yahweh.

1877
ÍNDICE DE ASSUNTOS

1 e 2Coríntios

autor, [1]

data, [1]

destino, [1]

discussão unidade por unidade de 1Coríntios, [1]

estrutura de 1Coríntios, [1]

estrutura de 2Coríntios, [1]

motivo, [1]

oponentes de Paulo em 2Coríntios, [1]

origem, [1]

plano literário, [1]

propósito, [1]

1 e 2Tessalonicenses

autor, [1]

data, [1]

destino, [1]

discussão unidade por unidade, [1], [2]

estrutura, [1], [2]

motivo, [1], [2]

ordem das cartas, [1]

1878
origem, [1]

plano literário, [1]

propósito, [1]

1 e 2Timóteo

autor, [1], [2]

data, [1]

data e origem, [1]

destino, [1], [2]

discussão unidade por unidade de 1Timóteo, [1]

discussão unidade por unidade de 2Timóteo, [1]

estrutura de 1Timóteo, [1]

estrutura de 2Timóteo, [1]

motivo, [1], [2]

origem, [1]

plano literário de 1Timóteo, [1]

plano literário de 2Timóteo, [1]

propósito, [1], [2], [3]

1Pedro

autor, [1], [2]

data, [1], [2]

destino, [1], [2]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

motivo, [1], [2]

origem, [1], [2]

plano literário, [1]

propósito, [1], [2]

1879
2Pedro

autor, [1]

data, [1]

destino, [1]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

motivo, [1]

origem, [1]

plano literário, [1]

propósito, [1]

Período do Segundo Templo

Período Babilônico, [1]

Período Persa, [1]

Período Ptolomaico, [1]

Período Sírio, [1]

1880
A
A circuncisão de Cristo, [1], [2]

África do Sul,

Agostinho, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22]

Alexandre, o Grande, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Aliança, [1]

Alonimato, [1]

Alusões a Jesus nas cartas de Paulo, [1]

Antíoco IV, [1], [2]

Apocalipse

abordagens ao estudo de, [1]

autor, [1], [2]

data, [1], [2]

destino, [1], [2]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

gênero, [1]

mensagem às sete igrejas, [1], [2]

motivo, [1]

ocasião, [1]

origem, [1], [2]

plano literário, [1]

propósito, [1]

Apócrifos, [1], [2], [3]

Aristocracia, 120, 123, 152

1881
Aristóteles, 113, 527, 614

Arrebatamento, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13]

Asmoneus, [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Assideus, [1], [2], [3]

Atanásio, [1]

Ateísmo, [1]

Atos, [1]

autor, [1]

confiabilidade histórica, [1]

data, [1]

destino, [1]

discursos, [1], [2]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

fontes, [1]

gênero, [1]

milagres, [1], [2]

origem, [1]

passagens, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

plano literário, [1]

propósito, [1]

Autógrafos das Escrituras, [1]

1882
C
Cânon de Muratori, [1], [2], [3]

Carta Pascal de Atánasio, [1]

Códice quádruplo do Evangelho, [1]

Colossenses, [1]

autor, 815, [1]

data, [1], [2]

destino, [1], [2]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

motivo, [1]

origem, [1], [2]

plano literário, [1]

propósito, [1], [2]

Concílio de Jerusalém, [1], [2], [3], [4], [5]

Contribuição para o Cânon

Lucas, [1]

Contribuição para o Canôn

João, [1]

Contribuição para o Cânon, [1]

1 e 2Coríntios, [1]

1 e 2Tessalonicenses, [1]

Apocalipse, [1]

Atos, [1]

Epístolas da Prisão, [1]

Epístolas Joaninas, [1]

1883
Epístolas Pastorais, [1]

Epístolas Petrinas, [1]

Gálatas, [1]

Hebreus, [1]

Judas, [1]

Marcos, [1]

Mateus, [1]

Romanos, [1]

Tiago, [1]

Critérios de autenticidade, [1]

Critérios de canonicidade, [1]

antiguidade, [1]

apostolicidade, [1]

ortodoxia, [1]

uso eclesiástico, [1]

Crítica da forma, [1], [2], [3]

Crítica da retórica, [1], [2]

Cronologia do ministério de Jesus, [1]

Cronologia Paulina, [1]

Culto ao imperador, [1], [2]

Cumprimento das promessas do AT, [1], [2], [3]

1884
D
Deísmo, [1], [2], [3]

Desafios contemporâneos à descrição de Jesus do NT, [1]

Dinastia herodiana, [1], [2]

Discurso do Monte das Oliveiras, [1], [2], [3], [4], [5], [6]

1885
E
Edição canônica do Novo Testamento, [1]

Efésios, [1]

data, [1], [2]

destino, [1], [2]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

motivo, [1], [2]

origem, [1], [2]

plano literário, [1]

propósito, [1], [2]

Epifânio, [1], [2], [3]

Epístolas Joaninas

autor, [1], [2]

data, [1], [2]

destino, [1], [2]

discussão unidade por unidade de 1João, [1]

discussão unidade por unidade de 2João, [1]

discussão unidade por unidade de 3João, [1]

estrutura de 1João, [1]

estrutura de 2João, [1]

estrutura de 3João, [1]

gênero, [1]

motivo, [1], [2]

origem, [1], [2]

plano literário, [1]

1886
propósito, [1], [2]

questões introdutórias únicas a 2 e 3João, [1]

Epístolas Pastorais

1Timóteo, [1]

2Timóteo, [1]

gênero, [1]

integridade literária, [1]

pseudonimato, [1]

Tito, [1]

Epístolas Petrinas, [1]

Equivalência dinâmica ou funcional, [1]

Equivalência formal, [1]

Escatologia, 455, 598, 975

Escritos de Qumran, [1], [2]

Escritura inspirada

Deus como dirigente, [1]

inerrância e hermenêutica, [1]

inspiração da Escritura, [1]

principais atributos da, [1]

Esquerda e direita,

Essênios, [1], [2], [3], [4]

Estímulos para canonização, [1]

Evangelho de Pedro, [1]

Evangelho de Tomé, [1]

Evangelho quádruplo, [1]

Evangelhos

como testemunhos oculares, [1], [2]

1887
confiabilidade histórica, [1]

critérios de autenticidade, [1]

crítica da redação e da composição, [1]

fundamentos filosóficos do estudo moderno, [1]

legitimidade da harmonização, [1]

não canônicos, [1], [2]

relacionamento entre os, [1]

semelhanças, [1]

transmissão das tradições, [1]

Evangelho Secreto de Marcos, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

1888
F
Fariseus, [1]

Filemom, [1]

autor, [1]

data, [1], [2]

destino, [1], [2]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

motivo, [1], [2]

origem, [1], [2]

plano literário, [1]

propósito, [1]

Filipenses, [1]

autor, [1]

data, [1], [2]

destino, [1], [2]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

motivo, [1], [2]

origem, [1], [2]

plano literário, [1]

propósito, [1], [2]

Filosofia grega

cinismo, [1]

epicurismo, [1]

estoicismo, [1]

1889
G
Gálatas

autor, [1]

destino, [1]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

Galácia do Norte, [1], [2]

Galácia do Sul, [1], [2]

motivo, [1], [2]

origem, [1]

plano literário, [1]

propósito, [1]

Gamaliel, [1]

Gnosticismo, [1], 142, [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19]

Governadores romanos na Judeia, [1]

Grande Comissão, [1], [2]

1890
H
Hebreus

artifício retórico, [1]

autor, [1], [2]

canonicidade, [1]

data, [1], [2]

destino, [1]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

gênero, [1]

motivo, [1], [2]

origem, [1], [2]

plano literário, [1]

propósito, [1], [2]

Heresia colossense, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Hermenêutica, [1]

Hilário de Poitiers, [1]

Hipótese da comunidade joanina, [1], [2], [3], [4]

Hipótese de Farrer-Goulder, [1]

Hipótese dos Dois Documentos, [1], [2]

Hipótese dos dois Evangelhos, [1], [2]

1891
I
Iluminismo, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

Independência literária entre os Evangelhos, [1]

Interdependência literária entre os Evangelhos, [1]

Ipsissima verba, [1]

Ipsissima vox, [1]

1892
J
Jesus

à luz dos Evangelhos não Canônicos, [1]

aparições após a ressurreição, [1]

como carismático operador de milagres, [1]

como filósofo cínico errante, [1]

como profeta apocalíptico, [1]

como reformador social, [1]

como um judeu marginal, [1]

cronologia, [1]

duração do ministério, [1]

e os Evangelhos, [1]

e Paulo, [1]

início do ministério, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

julgamento de, [1]

morte, [1], [2], [3], [4], [5]

nascimento, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

o Messias ressurreto, [1]

o sábio, [1]

referências em textos judaicos, [1]

referências fora dos Evangelhos, [1]

referencias pelos escritores romanos, [1]

sete palavras na cruz, [1]

sinais, [1], [2], [3]

Jesus feminista, [1]

Jesus histórico

1893
busca abandonada, [1]

primeira busca, [1]

segunda busca, [1]

terceira busca, [1]

jihadismo radical,

João

autor, [1]

data, [1]

destino, [1]

discussão unidade por unidade, [1]

escrito por um outro João, [1]

estrutura, [1]

início do ministério de João Batista, [1]

motivo, [1]

origem, [1]

plano literário, [1]

propósito, [1]

sinais de Jesus, [1]

Josefo, [1], [2], [3], [4]

Judaísmo, [1], 146

calendário religioso, [1]

escolas rabínicas, [1]

festivais judaicos, [1]

messianismo, [1]

monoteísmo, [1]

prosélitos e tementes a Deus, [1]

seitas judaicas, [1]

1894
sinagoga, [1]

Sinédrio, [1]

Templo de Jerusalém, [1]

teologia judaica, [1]

Judas

autor, [1], [2]

data, [1], [2]

destino, [1], [2]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

gênero, [1]

motivo, [1], [2]

origem, [1], [2]

plano literário, [1]

propósito, [1], [2]

relação com 2Pedro, [1]

1895
L
Latinismos, [1], [2], [3]

Literatura do Segundo Templo, [1], [2], [3], [4], [5]

Lucas

autor, [1]

data, [1]

destino, [1]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

origem, [1]

plano literário, [1]

propósito, [1]

1896
M
Macabeus, [1]

Marcião, [1]

Marcos

autor, [1]

data, [1]

destino, [1]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

origem, [1]

plano literário, [1]

propósito, [1]

Mateus

autor, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13]

cinco discursos, [1]

data, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

língua original, [1]

origem e destino, [1], [2]

plano literário, [1]

propósito, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

Mito do Nero Redivivus, [1], [2], 1220

Monismo, [1], [2]

1897
N
narrativa de viagem lucana, [1], [2]

Nomina sacra, [1], [2], [3]

Nova Criação, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Nova perspectiva sobre Paulo, [1]

crítica, [1]

descrição, [1]

perspectiva escolástica, [1]

perspectiva luterana, [1]

variações, [1]

Novo Testamento

Cânon, [1]

como documentos da Nova Aliança, [1]

contexto político e religioso, [1]

história da introdução ao, [1]

ordem dos livros, [1]

temas unificadores, [1]

tradução síria (Peshitta), [1]

transmissão e tradução, [1]

unidade e diversidade, [1]

Obras da lei, [1], 536, [2], [3]

Ocasião

motivo, [1]

O Reino de Deus, [1]

1898
P
Paganismo, [1]

Pais da igreja, [1]

obras, [1], [2]

testemunho, [1]

Papiros de Oxirrinco, [1], [2]

Parábolas de Jesus, [1], [2], [3], [4]

Parábolas do Reino, [1], [2], [3], 305, 323, [4]

Paulo

anos finais, [1], [2]

aparência, [1]

cidadania romana, [1]

conversão, [1], [2]

desenvolvimentos no pensamento, [1]

e Jesus, [1]

evangelho, [1]

formação rabínica, [1]

nascimento e contexto familiar, [1]

nome, [1]

o Paulo de Atos e o Paulo das Cartas, [1]

perseguição aos cristãos, [1]

prisão, [1]

seguidor de Jesus ou fundador do cristianismo?, [1]

viagens missionárias, [1]

vida antes da conversão, [1]

Perícope, [1]

1899
Período do Segundo Templo, 105, [1], [2]

período asmoneu, [1], [2], [3]

período babilônico, [1], [2]

período grego, [1], [2], [3]

período macabeu, [1], [2], [3]

período persa, [1], [2]

período ptolomaico, [1], [2]

período romano, [1], [2], [3]

período sírio, [1], [2]

Período intertestamentário, [1], [2], [3]

Peshitta, [1]

Platão, 648

Ponto de vista Agostiniano, [1], [2]

Pós-modernidade,

Povo da terra, [1]

Primeiras Nações. Veja aborígenes norte-americanos,

Prioridade Marcana, [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Pseudepígrafos, [1], [2], [3]

pseudonimato, [1]

1900
Q
Queda em pecado,

Questões textuais

João, [1]

no Evangelho de Marcos, [1]

no livro de Atos, [1]

Quirino, [1]

1901
R
Redenção, 503

Regras de fé, [1]

Regula fidei, [1], [2]

Reino de Deus,

Religião civil,

Religiões de Mistério, 139, [1]

Resch, [1]

Retórica, [1], [2]

Revolução Francesa,

Romanos

autor, [1]

data, [1]

destino, [1]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

motivo, [1], [2]

objetivo, [1]

origem, [1]

plano literário, [1]

propósito, [1]

1902
S
Saduceus, [1]

Septuaginta, [1]

Sermão do Monte, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16]

Sinóticos e João, [1], [2], [3], [4]

Superstição e Sincretismo, [1]

1903
T
Talmude Babilônico, [1], [2], [3]

Temas Teológicos das Epístolas Pastorais, [1]

a preservação dos fiéis, [1]

as palavras confiáveis, [1]

qualificações dos líderes da igreja, [1]

salvação, [1]

Temas teológicos de Efésios

a conduta cristã apropriada (ética), [1]

a igreja, [1]

a natureza da salvação, [1]

batalha espiritual, [1]

o senhorio de Cristo, [1]

Temas teológicos em 1 e 2Coríntios

relação das ordenanças cristãs com a salvação, [1]

Temas teológicos em 1 e 2Coríntios

a natureza do corpo ressurreto, [1]

nova aliança x antiga aliança, [1]

Temas Teológicos em 1 e 2Tessalonicenses, [1]

a eterna destruição dos fiéis, [1]

a Segunda Vinda de Cristo, [1]

eleição e perseverança, [1]

ética cristã no trabalho, [1]

o anticristo e o mistério da iniquidade, [1]

o estado eterno dos fiéis, [1]

Temas teológicos em 1Pedro

1904
a identidade dos fiéis e seu testemunho para o mundo, [1]

a proclamação de Cristo aos espíritos em prisão, [1]

Deus, o Pai, e o Senhor Jesus Cristo, [1]

o sofrimento cristão e o fim dos tempos, [1]

Temas teológicos em 2Pedro

a busca das virtudes cristãs à luz do tempo final, [1]

testemunho apostólico ocular x heresia, [1]

temas teológicos em Apocalipse

adoração ao único e verdadeiro Deus, [1]

Segunda Vinda de Cristo, [1]

soberania de Deus, [1]

teodiceia, [1]

testemunho, [1]

Temas Teológicos em Atos

história da salvação, [1]

o alcance universal do Evangelho, [1]

o Espírito Santo, [1]

ressurreição e ascensão de Jesus, [1]

Temas teológicos em Colossenses, [1]

a conduta cristã adequada (ética), [1]

a obra de Cristo na salvação, [1]

a supremacia de Cristo, [1]

Temas teológicos em Filemom, [1]

amor mútuo e fraternidade no corpo de Cristo, [1]

uma visão da escravidão e de outras questões sociais, [1]

Temas teológicos em Filipenses

alegria em Cristo, [1]

1905
a pessoa e obra de Cristo, [1]

justificação somente pela fé, [1]

o evangelho e suas implicações, [1]

o sofrimento cristão, [1]

unidade cristã, [1]

Temas teológicos em Gálatas

a identidade de Jesus, [1]

a transformação do fiel, [1]

justificação pela fé versus obras da lei, [1]

natureza da expiação, [1]

Temas teológicos em Hebreus

a natureza do discipulado, [1]

a superioridade da pessoa e obra de Cristo e seu sumo sacerdócio, [1]

benefícios da morte sacrificial de Cristo, [1]

o Deus que fala nas Escrituras, [1]

perseverança e segurança cristã, [1]

Temas teológicos em João

a nova comunidade da aliança, [1]

Deus, o Pai, [1]

escatologia realizada, [1]

espaço sagrado, [1]

Espírito Santo, [1]

Jesus como o Verbo, [1]

os sinais, [1]

relação com os evangelhos sinóticos, [1]

salvação e expiação substitutiva, [1]

Temas teológicos em Lucas

1906
Espírito Santo, [1]

oração, [1]

Temas teológicos em Lucas

a preocupação de Jesus com os humildes, [1]

o cumprimento da profecia por Jesus, [1]

salvação e história da salvação, [1]

Temas teológicos em Marcos

a natureza do discipulado, [1]

Jesus como o, [1]

Jesus como o Filho de Deus, [1]

o segredo messiânico, [1]

Temas teológicos em Mateus

a Grande Comissão e a inclusão dos gentios, [1]

a morte expiatória de Jesus, [1]

Jesus como o, [1]

Jesus como o cumprimento das predições messiânicas do AT, [1]

Jesus como o novo Moisés, [1]

Jesus como o Rei Davítico, [1]

Temas teológicos em Romanos

a Lei e os profetas, [1]

atributo de justiça do próprio Deus, [1]

bases da justificação do fiel, [1]

Evangelho, [1]

justiça de Deus, [1]

justiça imputada por Deus ao fiel, [1]

justificação, [1], [2]

justificação exige fé, [1]

1907
Temas teológicos em Tiago

cristologia e escatologia cristã-judaica, [1]

relação entre fé e obras, [1]

sabedoria e ética, [1]

Temas teológicos nas Epístolas Joaninas

amor, [1]

conduta ética, [1]

discipulado cristão e a certeza da salvação, [1]

Tema teológico em Judas

o combate pela fé, [1]

Tese de Sundberg, [1], [2]

Testimonium Flavianum, [1], [2], [3]

Tiago

autor, [1], [2]

data, [1], [2]

destino, [1], [2]

discussão unidade por unidade, [1]

ensinamentos de Jesus, [1]

estrutura, [1]

gênero, [1]

motivo, [1]

ocasião, [1]

origem, [1], [2]

plano literário, [1]

propósito, [1]

Tito

autor, [1]

1908
data, [1]

data e origem, [1]

destino, [1], [2]

discussão unidade por unidade, [1]

estrutura, [1]

motivo, [1], [2]

origem, [1]

plano literário, [1]

propósito, [1], [2]

Tomás de Aquino, 527

Tríade hermenêutica, [1], [2]

1909
U
Unciais, [1], [2], [3]

1910
V

Z
Zelotes, [1], [2], [3]

1911
ÍNDICE DE NOMES

A
Abbott, T. K., [1], [2], [3]

Achtemeier, P. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

Akin, D. L., [1], [2], [3]

Aland, B., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Aland, K., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Alexander, L. C. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Alexander, T. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Alford, H., [1], [2]

Allen, D., [1], [2]

Allert, C. D., [1], [2]

Allison Jr., D. C., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14]

Applebaum, S., [1]

Archer Jr., G. L., [1], [2], [3]

Arendt, Hannah,

Arnold, C. E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20]

Ashton, J., [1]

Attridge, H. W., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Audet, J. P., [1]

1912
Aune, D. E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39], [40], [41], [42]

1913
B
Backus, I., [1]

Bacon, B. W., [1], [2], [3]

Badcock, F. J., [1]

Bagehot, Walter,

Bailey, K. E., [1], [2]

Baird, W., [1], [2], [3], [4]

Balla, P., [1], [2], [3]

Balz, H., [1]

Bandstra, A. J., [1]

Barclay, J. M. G., [1], [2], [3], [4]

Barclay, W., [1]

Barker, K. L., [1]

Barna, G., [1]

Barnes, T. D., [1]

Barnett, P., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Barr, D. L., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Barrera, J. T., [1]

Barrett, C. K., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35]

Bartchy, S. S., [1]

Barth, M., [1], [2], [3]

Bartholomew, C. G., [1], [2], [3], [4]

Barton, G. A., [1]

Barton, J., [1], [2], [3]

Bateman IV, H. W., [1], [2], [3]

1914
Bauckham, R., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39], [40], [41], [42], [43], [44], [45], [46], [47], [48], [49], [50], [51], [52], [53], [54],

[55], [56], [57], [58], [59], [60], [61], [62], [63], [64], [65], [66], [67], [68], [69], [70], [71], [72],

[73], [74], [75], [76], [77], [78], [79], [80], [81], [82], [83], [84], [85]

Bauer, B., [1], [2]

Bauer, W., [1], [2], [3], [4]

Baugh, S. M., [1], [2]

Beagley, A. J., [1], [2]

Beale, G. K., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39], [40], [41], [42], [43], [44], [45]

Beall, T., [1]

Beare, F. W., [1], [2], [3], [4]

Beasley-Murray, G. R., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

Beckwith, I. T., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Beckwith, R., [1]

Beekman, J., [1]

Behm, J., [1]

Beker, J. C., [1]

Bell, A. A., [1], [2], [3], [4], [5]

Bell, Daniel,

Belleville, L. L., [1], [2], [3], [4], [5]

Bengel, J. A., [1], [2], [3]

Berger, A., [1], [2], [3]

Berlin, A. M., [1], [2]

Bernheim, P.-A., [1]

1915
Berquist, J. L., [1], [2]

Best, E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

Bettelheim, Bruno,

Betz, H. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13]

Bevere, A. R., [1], [2], [3]

Beza, T., [1]

Biguzzi, G, [1]

Bird, M. F., [1], [2]

Black, D. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15]

Black, M., [1], [2], [3], [4]

Blaising, C. A., [1], [2], [3], [4]

Blass, F., [1]

Blomberg, C. L., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35],

[36], [37], [38], [39]

Bloom, Allan,

Bock, D. L., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26]

Bockmuehl, M., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Boismard, M.-E., [1], [2]

Bonhoeffer, D., [1]

Borchert, G. L., [1], [2]

Borgen, P., [1], [2], [3], [4], [5]

Borg, M. J., [1], [2], [3]

Boring, E. M., [1], [2], [3], [4]

Borleffs, J. W. P., [1]

Bornkamm, G., [1], [2], [3], [4]

1916
Bousset, W., [1], [2], [3], [4]

Bovon, F., [1], [2], [3], [4], [5]

Bowker, J. W., [1]

Bowley, J. E., [1]

Bowman, R., [1]

Boxall, I., [1], [2], [3], [4]

Boyd, G. A., [1]

Brand, C. O., [1], [2]

Brandon, S. G. F., [1], [2], [3]

Braun, F.-M., [1], [2], [3]

Braun, H., [1]

Brawley, R. L., [1], [2]

Bray, G., [1], [2]

Bretschneider, K. G., [1], [2]

Brooke, A. E., [1], [2], [3]

Brooks, J. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Brown, C., [1], [2], [3]

Brown, D., [1], [2], [3]

Brown, R. E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39]

Brown, S., [1]

Brox, N., [1], [2], [3]

Bruce, F. F., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39], [40], [41], [42], [43], [44], [45], [46], [47], [48], [49], [50], [51], [52], [53], [54],

[55], [56], [57], [58], [59]

1917
Buck, C. H., [1], [2]

Bujard, W., [1], [2]

Bultmann, R., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21]

Burge, G. M., [1], [2], [3]

Burk, D., [1]

Burkitt, F. C., [1], [2]

Burney, C. F., [1]

Burridge, R. A., [1]

Butler, B. C., [1]

Byrne, B., [1], [2]

1918
C
Cadbury, H. J., [1], [2], [3]

Caird, G. B., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18]

Calkins, R., [1]

Callow, J., [1], [2]

Calvin, J., [1], [2], [3]

Calvino, J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Cameron, P. S., [1]

Campbell, W. S., [1], [2], [3]

Cannon, G. E., [1]

Cânon de Muratori, [1], [2], [3]

Caragounis, C. C., [1], [2], [3]

Carlson, S. C., [1], [2], [3], [4], [5]

Carson, D. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39], [40], [41], [42], [43], [44], [45], [46], [47], [48], [49], [50], [51], [52], [53], [54],

[55], [56], [57], [58], [59], [60], [61], [62], [63], [64], [65], [66], [67], [68], [69], [70], [71], [72],

[73], [74], [75], [76], [77], [78], [79], [80], [81], [82], [83], [84], [85], [86], [87], [88], [89], [90],

[91], [92], [93], [94], [95], [96], [97], [98], [99], [100], [101], [102], [103], [104], [105], [106],

[107], [108], [109], [110], [111]

Casey, M., [1], [2], [3], [4], [5]

Casurella, A., [1]

Chapell, B., [1]

Chapman, D. W., [1], [2]

Chapman, J., [1], [2]

Charles, J. D., [1], [2], [3]

1919
Charles, R. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20]

Charlesworth, J. H, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

Chester, A., [1], [2], [3], [4]

Cheung, L. L., [1]

Chilton, B. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

Chilton, D., [1], [2]

Church, F. F., [1]

Clark, A. C., [1]

Clarke, A. D., [1], [2], [3]

Clouse, R. G., [1]

Cochrane, Charles Norris,

Cohen, S. J. D., [1], [2], [3]

Cohick, L. H., [1]

Cole, A., [1], [2], [3]

Collins, A. Y., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14]

Collins, J. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Collins, R. F., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Coloe, M., [1]

Comfort, P. W., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Condillac, Étienne Bonnot,

Conzelmann, H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

Cooper, D. L., [1]

Cousar, C. B., [1]

Cousland, J. R. C., [1]

Cowan, S. B., [1], [2]

Craig, W. L., [1], [2], [3], [4], [5]

1920
Cranfield, C. E. B., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14]

Crawford, S. W., [1]

Creel, B. J., [1]

Cribbs, F. L., [1]

Crick, Bernard,

Crisóstomo, J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

Crossan, J. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20]

Croteau, D. A., [1], [2]

Croy, N. C., [1], [2]

Cullmann, O., [1], [2], [3]

Culpepper, R. A., [1], [2], [3]

1921
D
Dahl, N. A., [1], [2], [3]

Dandamayev, M. A., [1]

Daniell, D., [1], [2]

Das, A., [1]

Davids, P. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17]

Davies, M., [1]

Davies, S., [1]

Davies, W. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12]

Day, J. N., [1]

De Hammel, C., [1]

Dehandschutter, B., [1]

Deines, R., [1]

Deissmann, A., [1], [2], [3]

De Jonge, H. J., [1], [2], [3], [4], [5]

DeMaris, R. E., [1]

Dembski, W., [1], [2]

De Silva, D. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17]

Destutt de Tracy, Antoine,

Dever, M. E., [1]

De Witt Burton, E., [1], [2]

Diatessaron de Taciano, [1], [2]

Dibelius, M., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Dillon, J. M., [1]

Dinkler, E., [1], [2]

Discurso do Monte das Oliveiras, [1], [2], [3], [4], [5], [6]

1922
Dockery, D., [1], [2], [3], [4], [5]

Dockery, D. S., [1]

Dodd, C. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Donahue, J. R., [1]

Donaldson, T. L., [1], [2], [3], [4]

Donfried, K. P., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Doty, W. G., [1]

Downing, F. G., [1], [2], [3], [4]

Draper, J. A., [1], [2]

Drijvers, H. J. W., [1]

Dubarle, A.-M., [1]

Dübbers, M., [1], [2]

Duff, J., [1]

Duff, P., [1]

Duke, P. D., [1]

Dunbar, D. G., [1]

Duncan, G. S., [1], [2], [3]

Dungan, D. L., [1], [2], [3]

Dunn, J. D. G., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39], [40], [41], [42], [43], [44], [45], [46], [47], [48], [49], [50], [51], [52], [53], [54],

[55], [56], [57], [58], [59], [60]

1923
E
Earle, R., [1]

Easley, K. H., [1]

Eddy, P. R., [1]

Edson, C., [1]

Ehrman, B. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18]

Eisenman, R., [1]

Ellingworth, P., [1], [2], [3], [4]

Elliott, J. H., [1], [2], [3], [4], [5]

Elliott, J. K., [1], [2], [3], [4]

Elliott, N., [1]

Ellis, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14]

Elshtain, Jean Bethke,

Elwes, R. H. M., [1]

Emmet, C. W., [1], [2]

Engels, Friedrich,

Enslin, M. S., [1]

Evans, C. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39], [40], [41], [42], [43], [44], [45]

Evanson, E., [1], [2], [3]

1924
F
Fant, C. F., [1]

Farkasfalvy, D. M., [1], [2]

Farmer, W. R., [1], [2], [3]

Farrer, A. M., [1], [2], [3], [4], [5]

Fee, G. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22]

Fein, P., [1]

Fekkes, J., [1]

Feldman, L., [1]

Ferguson, E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14]

Ferguson, J., [1]

Ferguson, S., [1]

Filho, J. A., [1]

Filmer, W. E., [1]

Finegan, J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Finkelstein, L., [1]

Fiore, B., [1]

Fiorenza, E. S., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12]

Fishwick, D., [1]

Fitzmyer, J. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34]

Flusser, D., [1], [2], [3]

Ford, J. M., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

Forestell, J. T., [1]

Fortna, R. T., [1], [2], [3]

1925
Frame, J. E., [1], [2], [3], [4]

France, D., [1], [2]

France, R. T., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12]

Francis, F. O., [1], [2], [3]

Frede, H. J., [1], [2]

Freed, E. D., [1]

Frend, W. H. C., [1]

Frerichs, E., [1]

Friedrichsen, T. A., [1]

Friesen, S. J., [1], [2], [3], [4], [5]

Fukuyama, Francis,

Fuller, D. P., [1], [2]

Fung, R. Y. K., [1]

Funk, R. W., [1], [2]

Furnish, V. P., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14]

1926
G
Gallivan, P. A., [1]

Gamble, H. Y., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

Garland, D. E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19]

Garlow, J., [1]

Gasque, W. W., [1], [2], [3], [4], [5]

Gaston, L., [1]

Geer, T. C., Jr., [1]

Geisler, N. L., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Geivett, R. D., [1]

Gelardini, G., [1]

Gempf, C., [1], [2], [3]

Gentry, K. L., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

George, T., [1], [2]

Georgi, D., [1], [2]

Gibbs, J. A., [1]

Giblin, C. H., [1], [2], [3]

Giesen, H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Giles, K., [1]

Gill, D. W. J., [1], [2], [3], [4]

Gilmour, M. J., [1]

Glover, R., [1]

Gnilka, J., [1], [2], [3]

Godet, F., [1], [2]

Goldsworthy, G., [1], [2], [3], [4], [5]

1927
Gombis, T. G., [1]

Goodacre, M., [1], [2], [3]

Goodman, M., [1]

Goodspeed, E. J., [1], [2]

Goppelt, L., [1], [2], [3]

Gorday, J., [1]

Gordon, T. D., [1], [2]

Goudzwaard, Bob,

Goulder, M. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Gowan, D. E., [1]

Grabbe, L. L., [1], [2], [3], [4], [5]

Grant, M., [1]

Grant, R. M., [1]

Grayston, K., [1], [2], [3]

Green, E. M. B., [1]

Green, G. L., [1], [2], [3]

Green, J. B., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Green, M., [1], [2]

Gregson, R., [1]

Griffin, H. P., Jr., [1], [2], [3], [4]

Griffith, T., [1], [2]

Grillmeier, A., [1]

Grisanti, M., [1]

Grotius, H., [1], [2]

Grudem, W. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19], [20], [21], [22]

Grundmann, W., [1]

1928
Guelich, R. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20]

Guillamont, A., [1]

Gundry, R. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24]

Gunther, J. J., [1], [2]

Gurdorf, M. E., [1]

Gurtner, D. M., [1]

Guthrie, D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39], [40]

Guthrie, G., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

1929
H
Habermas, G. R., [1]

Haenchen, E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Hafemann, S. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Hagner, D. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13]

Hahneman, G. M., [1], [2]

Hahn, F., [1], [2], [3], [4]

Hahn, S., [1]

Hall, M. S., [1]

Hamerton-Kelly, R., [1], [2]

Hamstra, S., Jr., [1], [2]

Hansen, G. W., [1], [2], [3]

Hanson, A., [1], [2], [3]

Hanson, J. S., [1]

Hanson, P., [1]

Harland, P. A., [1], [2]

Harnisch, W., [1]

Harris, M. H., [1]

Harris, M. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

Harrison, E. F., [1]

Harrison, J. R., [1]

Harrison, P. N., [1], [2]

Harris, R. L., [1], [2], [3]

Harris, W. H., III, [1]

Hartin, P. J., [1], [2], [3]

Hartman, L., [1]

1930
Hartog, P., [1], [2]

Havel, Václav,

Hawthorne, G. F., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19], [20]

Hayek, Friedrich A. von,

Hayles, D. J., [1]

Hays, R. B., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Headlam, A. C., [1], [2], [3], [4], [5]

Head, P. M., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Heard, W. J., [1]

Hedrick, C. W., [1]

Hegel, G. W. F.,

Heiligenthal, R., [1]

Heil, J. P., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Helyer, L. R., [1], [2], [3], [4], [5]

Hemer, C. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17]

Hendriksen, W., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Hengel, M., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28]

Hennecke, E., [1], [2]

Henry, C. F. H., [1]

Herms, R., [1], [2]

Herrick, G. J., [1]

Herron, T. J., [1]

Hewitt, T., [1]

Hiebert, E., [1]

Hill, C. E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14]

1931
Hills, J. V., [1]

Hobart, W. K., [1], [2]

Hodge, C., [1], [2]

Hoehner, H. W., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19], [20], [21], [22], [23]

Hoekema, A. A., [1]

Hoffman, T. A., [1]

Hollmann, G., [1]

Holmes, M. W., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

Holtzmann, H. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

Holwerda, D. E., [1]

Hooker, M. D., [1], [2], [3], [4], [5]

Hoover, R. W., [1]

Hoppins, R., [1]

Horbury, W., [1], [2], [3]

Horn, W., [1]

Horsley, R. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Hort, F. J. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Hoskins, P. M., [1]

House, H. W., [1]

Hove, R., [1]

Howard, G., [1]

Howard, W. F., [1]

Hubbard, R. L., Jr., [1]

Hübner, H., [1]

Huffman, D. S., [1], [2]

Hughes, F. W., [1]

1932
Hughes, G., [1]

Hughes, P. E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Hughes, R. K., [1]

Hume, D., [1], [2]

Humphreys, C. J., [1]

Hunter, A. M., [1], [2]

Hurd, J. C., [1], [2]

Hurst, L. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Hurtado, L. W., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

1933
I
Instone-Brewer, D., [1], [2]

Isaacs, M. E., [1]

1934
J
Janowski, B., [1]

Jauhiainen, M., [1]

Jellicoe, S., [1]

Jensen, M. H., [1]

Jeremias, J., [1], [2]

Jervell, J., [1], [2]

Jewett, R., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

Jobes, K. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Johnson, A. F., [1], [2], [3], [4], [5]

Johnson, D., [1]

Johnson, D. E., [1]

Johnson, E. E., [1]

Johnson, L. T., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26]

Jones, D. L., [1], [2]

Jones, D. W., [1]

Jones, P., [1], [2]

Jones, T. P., [1]

Juel, D., [1], [2], [3]

Jülicher, A., [1], [2]

1935
K
Kähler, M., [1]

Kaiser, W. C., Jr., [1], [2], [3]

Karris, [1], [2], [3], [4]

Karris, R. J., [1]

Käsemann, E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13]

Kato, Z., [1], [2], [3]

Kaye, B. N., [1]

Kaylor, R. D., [1], [2]

Kealy, S. P., [1]

Keck, L. E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Kee, H. C., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12]

Keener, C. S., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16]

Kelber, W., [1], [2]

Kellum, L. S., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Kelly, J. N. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Kennedy, G. A., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Kent, H. A., Jr., [1], [2]

Kent, J. H., [1]

Kenyon, F. G., [1]

Kern, F. H., [1]

Kiddle, M., [1]

Kilpatrick, G. D., [1], [2]

Kim, S., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Kingsbury, J. D., [1], [2]

Kinoshita, J., [1]

1936
Kirk, A., [1]

Kissinger, W. S., [1]

Kistemaker, S. J., [1], [2]

Kitchin, G. W., [1]

Kittel, G., [1], [2]

Klauck, H.-J., [1], [2], [3], [4]

Klein, W. W., [1], [2]

Kline, M. G., [1], [2], [3]

Knight, G. W., [1], [2], [3], [4], [5]

Knox, J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18], [19],

[20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36], [37],

[38], [39], [40], [41], [42], [43], [44], [45], [46], [47], [48], [49], [50], [51], [52], [53]

Koch, K., [1]

Koester, C. R., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Koester, H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

Kohlenberger, J. R. III, [1]

Komoszewski, J. E., [1]

Koperski, V., [1]

Korner, R. J., [1]

Köstenberger, A. J, [1]

Köstenberger, A. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35],

[36], [37], [38], [39], [40], [41], [42], [43], [44], [45], [46], [47], [48], [49], [50], [51], [52], [53],

[54], [55], [56], [57], [58], [59], [60], [61], [62], [63], [64], [65], [66], [67], [68], [69], [70], [71],

[72], [73], [74], [75], [76], [77], [78], [79], [80], [81], [82], [83], [84], [85], [86], [87], [88], [89],

[90], [91], [92], [93], [94], [95], [96], [97], [98], [99], [100], [101], [102], [103], [104], [105]

Köstenberger, M. E., [1], [2]

1937
Köstenberger. M. E., [1]

Kovacs, J., [1], [2]

Kraft, R. A., [1], [2]

Krentz, E., [1]

Krodel, G., [1], [2], [3], [4]

Krodel, G. A., [1]

Kruger, M. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Kruse, C. G., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Kugler, R. A., [1], [2]

Kümmel, W. G., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30]

Kupp, D. D., [1]

Kurz, W. S., [1], [2]

Kysar, R., [1], [2], [3], [4]

1938
L
Laato, T., [1]

Ladd, G. E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16]

Laenen, J. H., [1]

Lagrange, M.-J., [1]

Lake, K., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

Lambrecht, J., [1], [2], [3], [4]

Lamouille, A., [1]

Lane, W. L., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24]

Laniak, T. S., [1]

Larkin, C., [1]

Larkin, W. J., Jr., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Law, R., [1], [2]

Laws, S. S., [1], [2], [3]

Lea, T. D., [1], [2], [3], [4]

Lee, A. H. I., [1]

Lee, D., [1], [2]

Lee, D. A., [1]

Lee, M. V., [1], [2], [3], [4]

Legutko, Ryszard,

Lehne, S., [1]

Levine, A.-J., [1], [2]

Levinskaya, I., [1]

Liefeld, W. L., [1], [2]

Lierman, J., [1], [2]

1939
Lieu, J. M., [1], [2]

Lightfoot, J. B., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19], [20], [21]

Lightfoot, N. R., [1], [2]

Lincoln, A. T., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13]

Lindars, B., [1], [2], [3], [4], [5]

Lindemann, A., [1]

Lindsell, H., [1]

Linnemann, E., [1], [2]

Lloyd-Jones, D. M., [1], [2]

Locke, John,

Lock, W., [1]

Loenertz, R. J., [1]

Lohmeyer, E., [1], [2], [3]

Lohse, E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

Longacre, R., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Longenecker, B. W., [1]

Longenecker, R. N., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17]

Lovering, E. H., Jr., [1], [2]

Lüdemann, G., [1]

Luker, L. M., [1]

Luter, A. B., [1], [2]

Lutero, M., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20]

Luther, M., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Luz, U., [1], [2], [3], [4]

1940
M
Maccoby, H., [1], [2], [3]

MacDonald, D. R., [1]

MacDonald, L. M., [1]

MacGregor, K. R., [1]

Machalet, C., [1]

Machen, J. G., [1], [2]

Machen, J. Gresham,

Mack, B. L., [1], [2], [3], [4]

MacKenzie, R. K., [1], [2]

Maddox, R., [1], [2]

Maier, G., [1], [2], [3], [4], [5]

Maier, J., [1]

Maier, P. L., [1], [2], [3], [4]

Malherbe, A. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Mandela, Nelson,

Mannheim, Karl,

Manson, T. W., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Mara, M. G., [1], [2]

Marcus, J., [1], [2]

Marshall, I. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39], [40], [41], [42], [43], [44], [45], [46], [47], [48], [49], [50], [51], [52], [53], [54],

[55]

Marshall, Paul,

Martin, E. L., [1]

1941
Martínez, F. G., [1]

Martini, C. M., [1]

Martin, R. P., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24]

Martin, T., [1]

Martyn, J. L., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13]

Marx, Karl,

Marxsen, W., [1], [2], [3], [4]

Mason, S., [1], [2]

Massebieau, L., [1]

Mathewson, D., [1], [2]

Matill, A. J., Jr., [1]

Mayer, A. C., [1], [2], [3]

Mayerhoff , E. T., [1]

Maynard-Reid, P. V., [1]

Mayo, P. L., [1], [2]

Mazzaferri, F. D., [1], [2], [3]

McCollough, J. C., [1]

McDonald, L. M., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

McGiffert, A. C., [1]

McGrath, A. E., [1], [2]

McGuire, F. R., [1]

McKay, K. L., [1]

McKnight, S., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14]

McLaren, J. S., [1]

McRay, J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

McRay, W., [1]

1942
Meier, J. P., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13]

Melick, R. R., Jr., [1], [2]

Menken, M. J. J., [1]

Merkle, B. L., [1], [2]

Merklein, H., [1]

Metzger, B. M., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29]

Meyer, H. A. W., [1]

Meyer, M., [1], [2], [3]

Michaelis, J. D., [1], [2]

Michaelis, W., [1], [2]

Michaels, J. R., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

Michaelson, S., [1]

Michel, J. H., [1], [2]

Mihaila, C., [1]

Mikolaski, S. J., [1]

Millar, F., [1], [2], [3], [4]

Miller, J. D., [1]

Miller, J. W., [1]

Milligan, G., [1], [2], [3]

Milligan, W., [1], [2]

Milns, R. D., [1], [2]

Mitchell, A. C., [1], [2], [3]

Mitterrand, François,

Mitton, C. L., [1], [2]

Moffatt, J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Moloney, F. J., [1], [2]

1943
Montefiore, C. G., [1]

Moo, D. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39], [40], [41], [42], [43], [44], [45], [46], [47], [48], [49], [50], [51], [52], [53], [54],

[55], [56], [57], [58], [59], [60], [61], [62], [63], [64], [65], [66], [67], [68], [69], [70], [71], [72],

[73], [74], [75], [76], [77], [78], [79], [80], [81], [82], [83], [84], [85], [86], [87], [88], [89], [90],

[91], [92], [93], [94], [95], [96], [97], [98], [99], [100], [101], [102]

Moody, D., [1], [2], [3], [4]

Moody, R. M., [1]

Moore, G. F., [1]

Morard, F., [1]

Moreland, J. P., [1], [2], [3]

Morgan, C. W., [1], [2], [3]

Morgan, R., [1], [2]

Moritz, T., [1], [2], [3]

Morris, L., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28]

Morton, A. Q., [1]

Motyer, S., [1], [2], [3]

Mounce, R. H, [1], [2]

Mounce, R. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13]

Mounce, W. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14]

Mowry, L., [1]

Mueller, T., [1], [2]

Munck, J., [1], [2]

Murphy-O’Connor, J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Murray, J., [1]

1944
Mussies, G., [1]

Mussner, F., [1]

1945
N
Nanos, M., [1], [2]

Nardoni, E., [1]

Nauck, W., [1], [2]

Naugle, David K.,

Neill, S., [1]

Neill, W., [1]

Neirynck, F., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Neusner, J., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Newbigin, Lesslie,

Newsome, J. D., [1], [2], [3], [4]

Newton, D., [1], [2], [3], [4]

Neyrey, J. H., [1], [2], [3], [4]

Nicholl, C. R., [1]

Nickelsburg, [1], [2]

Nicklas, T., [1], [2]

Nielsen, K., [1]

Niswonger, R. L., [1]

Nix, W. E., [1], [2], [3]

Nodet, E. A., [1]

Nögren, K. F., [1]

Nolland, J., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

nomina sacra, [1], [2], [3]

Nordling, J. G., [1], [2]

Norman, R. S., [1], [2]

North, H. F., [1]

1946
Norton, M. R., [1]

Noss, P., [1]

Novak, R. M., [1]

Nun, H., [1]

1947
O
Oakes, P., [1], [2], [3]

O’Brien, P. T., [1]

O’Brien, P. T., , [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35],

[36], [37], [38], [39], [40], [41]

O’Day, G. R., [1]

Oden, T. C., [1]

O’Donovan, Oliver,

Oesterly, W. O. E., [1]

Olsson, B., [1]

Omanson, R., [1]

O’Neill, J. C., [1], [2], [3], [4], [5]

O’Rourke, J. J., [1]

Osborne, G. R., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28]

Osburn, C. D., [1], [2]

Osiek, C., [1], [2]

Ott, L., [1]

1948
P
Pache, R., [1]

Painter, J., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Pao, D. W., [1], [2]

Parker, P., [1], [2], [3], [4]

Parry, R., [1]

Parsons, M. C., [1], [2]

Pate, C. M., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Patterson, R. D., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Patterson, S. J., [1], [2]

Patzia, A. G., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Pearson, B. W. R., [1]

Peerbolte, L. J. L., [1]

Penner, T. C., [1]

Pentecost, D., [1], [2]

Percy, E., [1], [2]

Perkins, R. N., [1]

Perrin, N., [1], [2], [3], [4]

Perumalil, A. C., [1]

Pervo, R. I., [1], [2], [3], [4]

Pesch, R., [1], [2]

Peshitta, [1]

Petersen, N. R., [1]

Peters, O. K., [1], [2]

Peterson, B. K., [1]

Peterson, D., [1], [2], [3]

1949
Peterson, R. A., [1], [2], [3]

Peterson, S. L., [1]

Pfammater, J., [1]

Pfeiffer, C. F., [1]

Pfeiffer, R. H., [1]

Picirilli, R. E., [1], [2], [3]

Pines, S., [1]

Piper, J., [1], [2], [3], [4]

Plantinga, A., [1]

Pleket, H. W., [1]

Plummer, A., [1], [2], [3], [4], [5]

Plummer, R. L., [1], [2]

Polhill, J. B., [1], [2], [3], [4]

Polkow, D., [1]

Pollard, T. E., [1], [2], [3]

Porter, S. E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35], [36],

[37], [38], [39], [40]

Porton, G. G., [1]

Powell, M. A., [1], [2], [3], [4]

Poythress, V. S., [1], [2], [3], [4]

Price, S. R. F., [1], [2], [3]

Prior, M., [1], [2]

Problema Sinótico, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Provan, I., [1]

Pryor, J. W., [1], [2]

1950
Q
Quarles, C. L., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23]

Quast, K., [1]

Quecke, H., [1]

Quesnell, Q., [1]

Quinn, J. D., [1], [2], [3]

1951
R
Räisänen, H., [1]

Rajak, T., [1]

Ramsay, W. M., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Rand, Ayn,

Räpple, E. M., [1]

Rapske, B. M., [1], [2], [3]

Reasoner, M., [1], [2], [3]

Reed, J. T., [1], [2], [3], [4]

Reese, R. A., [1]

Reicke, B., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Reid, D. G., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13]

Reid, M. L., [1]

Reinhard, D. R., [1]

Reitzenstein, R., [1]

Renan, E., [1], [2], [3]

Resseguie, J. L., [1]

Reumann, J., [1], [2]

Rhoads, D. M., [1], [2], [3]

Richards, E., [1]

Richards, E. R., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Richardson, K., [1]

Ridderbos, H. N., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Riesner, R., [1], [2], [3]

Riggenbach, E., [1]

Robbins, M. M., [1]

1952
Robbins, V. K., [1], [2]

Roberts, A., [1], [2]

Roberts, C. H., [1]

Roberts, M. D., [1], [2]

Robinson, J. A., [1]

Robinson, J. A. T., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12]

Robinson, J. M., [1], [2], [3]

Roller, O., [1]

Roloff , J., [1], [2], [3], [4], [5]

Roon, A. van, [1], [2]

Ropes, J. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Rossing, B. R., [1], [2]

Rowland, C., [1], [2], [3], [4]

Rowston, D. J., [1], [2], [3]

Rudolph, K., [1]

Ruether, R. R., [1], [2], [3], [4]

Russell, D. S., [1], [2]

Ryken, L., [1], [2]

Rylands, L. G., [1], [2], [3], [4]

Ryrie, C. C., [1], [2]

1953
S
Safrai, S., [1], [2], [3]

Sampley, J. P., [1]

Sanday, W., [1], [2], [3], [4], [5]

Sanders, E., P., [1]

Sanders, E. P., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20]

Sanders, J. A., [1], [2]

Sanders, J. N., [1], [2], [3], [4]

Sanders, J. T., [1], [2], [3]

Sandmel, S., [1]

Sandy, D. B., [1]

Santer, M., [1]

Sappington, T. J., [1]

Satake, A., [1]

Saucy, R. L., [1], [2]

Schaff , P., [1], [2]

Schaff, P., [1]

Schelkle, K. H., [1]

Schenk, W., [1]

Scherrer, S. J., [1]

Schiffman, L. H., [1], [2], [3]

Schippers, R., [1]

Schlaeger, G., [1]

Schlarb, E., [1]

1954
Schlatter, A., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20]

Schleiermacher, F., [1], [2], [3], [4]

Schmidt, J. E. C., [1], [2]

Schmidt, K. L., [1]

Schmithals, W., [1], [2], [3], [4], [5]

Schnabel, E. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Schnackenburg, R., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17]

Schneemelcher, W., [1], [2], [3]

Schnelle, U., [1]

Schrader, K., [1]

Schrage, W., [1], [2], [3]

Schreiner, T. R., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34], [35],

[36], [37], [38]

Schuller, E. M., [1], [2]

Schulz, D., [1]

Schürer, E., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15]

Schutter, W. L., [1]

Schweitzer, A., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Schweitzer, E., [1]

Schwemer, A. M., [1], [2]

Scobie, C. H. H., [1], [2]

Scorgie, G. G., [1], [2]

Scott, C. A. A., [1]

Scott, J. J., Jr, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Scott, J. M., [1]

1955
Scroggs, R., [1], [2]

Segalla, H., [1]

Seifrid, M. A., [1], [2], [3]

Seim, T. K., [1]

Seiss, J. A., [1]

Seitz, C., [1]

Sellin, G., [1]

Selwyn, E. G., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Semler, J. S., [1], [2],[3]

Senior, D. P., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Sevenster, J. N., [1]

Shanks, H., [1], [2]

Sherwin-White, A. N., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Siegert, [1]

Sievers, J., [1]

Silva, M., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12]

Simon, R., [1], [2]

Simpson, J. W., Jr., [1]

Skarsaune, O., [1]

Skeat, T. C., [1], [2], [3], [4]

Slater, T. B., [1], [2], [3]

Smalley, S. S., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17]

Smith, C. B., [1]

Smith, C. R., [1]

Smith, D. E., [1]

Smith, D. M, [1]

Smith, D. M., [1], [2], [3]

1956
Smith, I. K., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Smith, M., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Spicq, C., [1], [2], [3], [4]

Stalker, D. M. G., [1]

Stanton, G. N., [1], [2], [3], [4]

Stegemann, W., [1]

Steinmann, A. E., [1]

Stein, R. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16]

Stemberger, G., [1], [2], [3]

Stendahl, K., [1]

Sterling, G. E., [1]

Stibbe, M. W. G., [1], [2]

Still, J. I., [1]

Still, T. D., [1]

Stirewalt, M. L., Jr., [1]

Stock, K., [1], [2], [3], [4], [5]

Stone, M. E., [1], [2], [3]

Stott, J. R. W., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

Stout, S. O., [1], [2]

Stowers, S. K., [1], [2], [3], [4], [5]

Strack, H. L., [1], [2], [3]

Strand, K. A., [1], [2], [3], [4]

Strathmann, H., [1]

Strauss, D. F., [1], [2], [3]

Strauss, M. L., [1], [2], [3], [4], [5]

Strecker, G., [1], [2], [3]

Streeter, B. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

1957
Streett, R. A., [1]

Strobel, A., [1], [2]

Stuhlmacher, P., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17],

[18], [19]

Stuhlmueller, C., [1], [2], [3], [4]

Suhl, A., [1]

Sumney, J. L., [1], [2]

Sundberg, A. C., Jr., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Sundermann, H. G., [1]

Swain, S. R., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Sweet, J., [1]

Swete, H. B., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12]

Swinburne, R., [1], [2]

Syme, R., [1], [2]

1958
T
Talbert, C. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Tannehill, R. C., [1]

Tasker, R. V. G., [1], [2], [3], [4], [5]

Tatum, W. B., [1], [2], [3], [4]

Taylor, Charles,

Taylor, G., [1], [2]

Taylor, H., [1]

Taylor, M. E., [1]

Telford, W., [1], [2], [3]

Tenney, M. C., [1], [2]

Testimonium Flavianum, [1], [2], [3]

Thatcher, T., [1], [2]

Theissen, G., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

Thiede, C. P., [1]

Thielman, F., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27]

Thiselton, A., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Thomas, R. L., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Thom, J. C., [1]

Thompson, G. L., [1]

Thompson, K. C., [1]

Thompson, L. L., [1], [2]

Thompson, M. B., [1], [2], [3]

Thompson, M. M., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13]

Thompson, S., [1]

1959
Thomson, I. H., [1]

Thrall, M. E., [1]

Thurén, L., [1]

Thurston, R. W., [1]

Thyen, H., [1]

Tilly, M., [1], [2]

Tindal, M., [1], [2]

Tomasino, A. J., [1], [2], [3], [4], [5]

Tomoi, K., [1]

Torrey, C. C., [1], [2]

Tovey, D., [1]

Towner, P. H., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Townsend, J. T., [1], [2]

Treat, J. C., [1]

Trebilco, P., [1], [2], [3], [4], [5]

Trever, J. C., [1]

Trilling, W., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Trites, A. A., [1]

Trobisch, D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12]

Trocmé, E., [1]

Trotter, A. H., Jr., [1], [2]

Tuckett, C., [1], [2]

Turner, D. L., [1], [2]

Turner, M., [1], [2]

Turner. M., [1]

Turner, N., [1], [2]

Twelftree, G. H., [1], [2], [3], [4]

1960
V
Vaganay, L., [1], [2]

van Belle, G., [1], [2]

VanderKam, J. C., [1], [2]

van Henten, J. W., [1]

Vanhoozer, K. J., [1], [2]

Vanhoye, A., [1], [2], [3], [4]

van Manen, W. C., [1]

van Staden, P. J., [1]

van Unnik, W. C., [1], [2]

Vassiliadis, P., [1]

Verbin, J. K., [1]

Verheyden, J., [1], [2], [3]

Vermes, G., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Vickers, B., [1]

Vielhauer, P., [1], [2], [3], [4], [5]

Vinson, R., [1]

Voegelin, Eric,

Volfing, A., [1]

von Campenhausen, H., [1], [2], [3]

von Dobschütz, E., [1], [2], [3]

von Harnack, A., [1], [2], [3], [4], [5]

von Rad, G., [1]

1961
W
Wacker, W. C., [1], [2]

Waddington, W. G., [1]

Wainwright, A. W., [1], [2]

Waldstein, M., [1]

Walker, P. W. L., [1], [2]

Walker, W. O., [1]

Walker, W. O., [1]

Walker, W. O., Jr., [1], [2]

Wallace, D. B., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11]

Walton, S., [1]

Walvoord, J. F., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Walzer, Michael,

Wanamaker, C., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15]

Ware, J., [1]

Warfield, B. B., [1], [2], [3]

Wasserstein, A., [1]

Watson, D. F, [1]

Watson, D. F., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

Watson, D. W., [1], [2]

Weaver, W. P., [1]

Webb, R. L., [1], [2], [3], [4]

Weber, F., [1], [2], [3], [4]

Weber, Max,

Wedderburn, A. J. M., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Weeden, T. J., [1]

1962
Wegner, P. D., [1], [2], [3], [4], [5]

Weima, J. A. D., [1], [2], [3]

Weiss, B., [1]

Weisse, C. H., [1]

Weiss, J., [1], [2], [3], [4]

Welborn, L. L., [1]

Wenham, D., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24]

Wenham, J., [1], [2]

Werdermann, H., [1], [2], [3]

Westcott, B. F., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Westerholm, S., [1], [2], [3], [4], [5]

Westfall, C. L., [1], [2], [3], [4], [5]

West, J. C., [1], [2], [3], [4]

White, J. L., [1]

Wick, P., [1], [2], [3]

Wiefel, W., [1], [2]

Wilckens, U., [1], [2]

Wilcock, M., [1]

Wilder, T. L., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Wilkens, U., [1]

Wilkins, M. J., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Williams, D. J., [1], [2]

Williams, J. F., [1], [2], [3], [4], [5]

Williams, M. C., [1], [2]

Williamson, H. G. M., [1], [2]

Williamson, R., [1]

1963
Wills, L., [1]

Wilson, A. N., [1]

Wilson, J. C., [1], [2], [3], [4]

Wilson, M., [1], [2], [3]

Wilson, R. M., [1], [2], [3], [4], [5], [6]

Wilson, S. G., [1], [2], [3], [4]

Wilson, W. G., [1]

Wilson, W. T., [1]

Windisch, H., [1], [2], [3], [4], [5]

Winter, B. W., [1], [2], [3]

Winter, D., [1]

Winter, P., [1]

Winter, S., [1], [2], |[3]

Wise, M. O., [1], [2], [3]

Wisse, F., [1]

Witherington, B., III, [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16],

[17], [18], [19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31]

Wolter, M., [1]

Wolters, A., [1]

Wolters, Albert M.,

Wolthuis, T. R., [1]

Wrede, W., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Wright, D., [1], [2], [3]

Wright, N. T., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18],

[19], [20], [21], [22], [23], [24], [25], [26], [27], [28], [29], [30], [31], [32], [33], [34]

Wright,. N. T., [1]

Wuellner, W., [1]

1964
Y
Yamauchi, E. M., [1], [2], [3]

Yarbrough, R. W., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

Yoder Neufeld, T. R., [1]

Young, E. J., [1]

Young, F. M., [1]

Yule, G. U., [1]

1965
Z
Zahn, T., [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

1966
ÍNDICE DE PASSAGENS BÍBLICAS

ANTIGO TESTAMENTO

Gênesis
1 … [1], [2], [3], [4], [5]

1.1 … [1]

1.1,2 … [1]

1.26,27 … [1]

1.28 … [1]

2.2 … [1]

2.7 … [1], [2]

2.24 … [1]

3.6 … [1], [2]

4.10 … [1]

6 a 9 … [1]

6.1-6 … [1]

6.4 … [1]

6.6 … [1]

8.8-12 … [1]

11.1-9 … [1]

12.1-3 … [1]

1967
12.3 … [1]

14.18-20 … [1]

15 … [1]

15.1-18 … [1]

15.6 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10]

18.12 … [1]

22 … [1]

23 … [1]

25.18 … [1]

25.19 … [1]

28.8 … [1]

28.9 … [1]

28.12 … [1]

31.55 … [1]

37.9 … [1]

42.17,18 … [1]

46.27 … [1]

49.9 … [1]

1968
Êxodo
1 … [1], [2]

2.15 … [1]

3 … [1]

3.14 … [1], [2]

4.19 … [1]

12.1-14 … [1]

12.1-4 … [1]

12.15-20 … [1], [2]

12.48 … [1]

13.3-10 … [1]

14.15-31 … [1]

16 … [1]

16.9 … [1]

16.10 … [1]

17 … [1]

17.14 … [1]

18 … [1]

19.3 … [1], [2], [3], [4], [5]

19.5 … [1]

19.5,6 … [1]

19.6 … [1], [2]

19.16 … [1]

20.2 … [1]

20.2-6 … [1], [2]

20.4 … [1]

1969
23.15 … [1]

23.16 … [1], [2]

23.20 … [1], [2]

23.22 … [1], [2], [3]

24.7 … [1]

24.8 … [1]

24.12 … [1]

24.13,18 … [1]

24.18 … [1]

25 a 30, 35 a 40 … [1]

25.40 … [1]

29.9,33 … [1]

29.18 … [1]

31.18 … [1]

32.14 … [1]

32.15 … [1]

32.15,16 … [1]

33.18,19 … [1]

34.1 … [1]

34.1-28 … [1]

34.4 … [1]

34.18 … [1]

34.22 … [1], [2]

34.29-35 … [1], [2]

1970
Levítico
9.7 … [1]

9.7,8 … [1]

10.4,5 … [1]

11.44,45 … [1]

14.10-20 … [1], [2]

16 … [1]

16.27 … [1]

19.2 … [1]

19.18 … [1], [2]

19.28 … [1]

20.7 … [1]

21.5 … [1]

23 … [1]

23.4,5 … [1]

23.5 … [1]

23.6-8 … [1], [2]

23.9-14 … [1], [2]

23.15-21 … [1]

23.15-22 … [1]

23.23-25 … [1]

23.23-35 … [1]

23.26-32 … [1]

23.26-32, 44-46 … [1]

23.33-36, 39-43 … [1]

23.34-43 … [1]

1971
Números
9.1-14 … [1]

12.6-8 … [1]

12.7 … [1]

13 … [1], [2], [3]

14 … [1], [2], [3]

15.25 … [1]

15.27-31 … [1]

15.30 … [1]

21.9 … [1]

23.7 … [1]

23.19 … [1]

27.17 … [1]

28.16 … [1]

28.17-25 … [1]

28.26-31 … [1]

29.1-11 … [1]

29.1-6 … [1]

29.7-11 … [1]

29.12-34 … [1]

1972
Deuteronômio
4.2 … [1], [2], [3], [4]

4.20 … [1], [2]

5.6-10 … [1], [2]

6.4 … [1], [2], [3], [4]

6.4,5 … [1]

6.11 … [1]

6.13,16 … [1]

7.6 … [1], [2], [3]

8.3 … [1]

9.9 … [1]

9.10 … [1]

10.15 … [1]

12.32 … [1], [2], [3]

14.1 … [1]

16.1-7 … [1]

16.3-4, 8 … [1]

16.9-12 … [1]

16.13-15 … [1]

17.7 … [1]

18.15-19 … [1]

18.15,18 … [1], [2]

21.23 … [1], [2], [3], [4]

24.1 … [1]

25.1 … [1]

25.4 … [1]

1973
27.26 … [1], [2]

28.58,59 … [1]

29.20 … [1]

30.11,12 … [1]

31 a 33 … [1]

31.9,26 … [1]

32.10 … [1]

32.21 … [1]

32.35 … [1]

32.43 … [1], [2]

33.29 … [1]

34.10-12 … [1]

1974
Josué
1.8 … [1], [2]

2 … [1]

2.8-24 … [1]

8.32 … [1]

23.6 … [1]

1975
Rute
1.4 … [1]

3.14 … [1]

1976
1Samuel
15.29 … [1]

16.7 … [1]

23.14 … [1]

30.12,13 … [1]

1977
2Samuel
4.1 … [1]

7.11-16 … [1]

7.14 … [1]

11.3 … [1]

1978
1Reis
2.3 … [1]

5 a 8 … [1]

5.5 … [1]

8.11 … [1]

16.31-33 … [1]

18.4,13 … [1]

18.28 … [1]

19.1,2,21 … [1]

19.3,4 … [1]

1979
2Reis
4.42-44 … [1]

9.30-37 … [1]

22.8 … [1]

22.13 … [1]

23.2,21 … [1]

24 … [1]

24.12 … [1]

24.17 … [1]

25 … [1]

25.3 … [1]

25.7 … [1]

25.22-26 … [1]

1980
2Crônicas
6.18 … [1]

10.5,12 … [1]

20.20 … [1]

34.14 … [1]

34.30 … [1]

36.5-21 … [1]

36.22 … [1]

1981
Esdras
1.1 … [1]

1.1-4 … [1], [2]

3 … [1]

1982
Neemias
8.1 … [1]

1983
Ester
1.1 … [1]

4.16 … [1]

5.1 … [1]

9.18-32 … [1]

1984

1.22 … [1]

6.6 … [1]

9.8 … [1], [2]

24.2 … [1]

38.7 … [1]

1985
Salmos
2 … [1]

2.1-3 … [1]

2.7 … [1], [2], [3]

2.9 … [1]

5.9 … [1]

8.4-6 … [1]

8.6 … [1]

10.7 … [1]

14.1-3 … [1]

19.7 … [1]

22 … [1]

22.1,7,8,18 … [1]

31.1 … [1]

32.1,2 … [1], [2]

32.2 … [1]

34.5 … [1]

34.8 … [1], [2]

34.12-16 … [1]

36.1 … [1]

36.10 … [1]

40.10 … [1]

45.6 … [1]

51.4 … [1]

53.1-3 … [1]

66.10 … [1]

1986
67.19,20 … [1]

68.8 … [1]

69 … [1]

69.21 … [1]

71.2 … [1]

73.2,3 … [1]

78.2 … [1]

79.5-10 … [1]

80.9-16 … [1]

88.10-12 … [1]

89.27 … [1]

89.35 … [1]

94.1-3 … [1]

95 … [1]

95.7-11 … [1], [2], [3]

98.2,3 … [1]

102.25-27 … [1]

104.4 … [1]

110 … [1]

110.1 … [1], [2], [3], [4], [5]

110.1-4 … [1]

110.4 … [1], [2], [3]

118 … [1]

118.22 … [1], [2]

118.22,23 … [1]

118.26 … [1], [2], [3]

137.8 … [1]

1987
140.3 … [1]

143.1 … [1]

1988
Provérbios
1 a 9 … [1], [2]

1, 8 e 9 … [1]

3.34 … [1]

8 … [1]

8.8 … [1]

8.22-31 … [1]

10.12 … [1]

10.20 … [1]

11.31 … [1]

26.11 … [1]

30.5, 6 … [1]

30.6 … [1]

1989
Eclesiastes
9.10 … [1]

12.9-12 … [1]

1990
Isaías
2.2 … [1]

2.10 … [1]

4.2 … [1], [2]

5 … [1]

5.1-7 … [1]

5.1,2 … [1]

6.9,10 … [1], [2], [3], [4]

7.14 … [1], [2], [3], [4]

8.8,10 … [1]

8.14 … [1], [2], [3]

8.17 … [1]

9 … [1]

9.1-7 … [1]

9.1,2 … [1], [2]

9.6,7 … [1]

11.1 … [1], [2], [3]

11.4 … [1], [2]

15.2 … [1]

20.3 … [1]

22.13 … [1]

27.2-6 … [1]

28.11,12 … [1]

28.16 … [1], [2], [3], [4]

28.18 … [1]

29.13 … [1], [2], [3], [4]

1991
29.18 … [1]

35.5 … [1]

35.5, 61.1 … [1]

35.5,6 … [1], [2]

40.2 … [1]

40.3 … [1], [2], [3], [4], [5]

40.6-8 … [1]

40.9 … [1]

42.1 … [1]

42.1-4 … [1], [2]

42.8 … [1]

42.12 … [1]

42.18 … [1]

43.20 … [1]

43.21 … [1], [2], [3]

44.6 … [1], [2]

44.28 … [1]

45.13 … [1]

45.22,23 … [1]

45.23 … [1]

46.13 … [1]

48.12 … [1]

51.5-8 … [1]

52.7 … [1], [2]

52.13 … [1], [2], [3]

53 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

53.1 … [1]

1992
53.2 … [1], [2]

53.4 … [1], [2], [3]

53.5 … [1]

53.6 … [1]

53.9 … [1]

53.12 … [1], [2], [3], [4]

55.10,11 … [1]

55.11 … [1]

56.7 … [1], [2], [3], [4]

57.19 … [1]

57.20 … [1]

59.7,8 … [1]

60.21 … [1]

61.1 … [1], [2], [3]

61.1,2 … [1], [2], [3], [4]

61.6 … [1]

62.11 … [1]

63.2-6 … [1]

65.1 … [1]

65.25 … [1]

66.15 … [1]

66.15-16 … [1]

1993
Jeremias
1.9 … [1]

2.21 … [1]

7.11 … [1]

12.7 … [1]

22.5 … [1]

23.5 … [1], [2]

23.13 … [1]

29 … [1]

29.4-13 … [1]

31.15 … [1], [2], [3]

31.31-34 … [1], [2], [3], [4], [5]

31.33 … [1]

31.33,34 … [1]

31.34 … [1]

32.6-9 … [1]

33.15 … [1], [2]

34.18-20 … [1]

36.28 … [1]

39.2 … [1]

50.29 … [1]

51.25 … [1]

1994
Ezequiel
1.4-28 … [1]

1.5,10,18,22 … [1], [2]

1.10 … [1]

3.1-3 … [1]

9.4-6 … [1]

11.19 … [1]

11.19,20 … [1]

15 … [1]

18.5-9 … [1]

19.10-14 … [1]

34 … [1]

34.5 … [1]

35.3 … [1]

36.24-30 … [1]

36.26 … [1]

36.26,27 … [1], [2]

36.33 … [1]

37.13 … [1]

38.14-16 … [1]

39.1-6 … [1]

40 a 48 … [1]

43.11 … [1]

1995
Daniel
2 … [1]

2.35,45 … [1]

6.23 … [1]

7 … [1], [2], [3], [4]

7.2-25 … [1]

7.9 … [1]

7.9-14 … [1]

7.9,10 … [1]

7.13 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

7.13,14 … [1]

7.15 … [1]

7.22-27 … [1]

8.5-8 … [1]

8.8 … [1]

8.15,27 … [1]

8.20 … [1]

8.21 … [1]

9.2 … [1], [2]

9.27 … [1]

10 … [1]

10.2,7 … [1]

10.13,20,21 … [1], [2]

11.31 … [1]

12.3 … [1]

12.5 … [1]

1996
12.11 … [1]

1997
Oseias
1.10 … [1]

2.23 … [1]

7.14 … [1]

10.1 … [1]

11.1 … [1], [2]

1998
Joel
2.28 … [1]

2.28-32 … [1], [2], [3]

2.32 … [1], [2], [3]

3.2 … [1]

3.12,13 … [1]

1999
Amós
4 … [1]

5.18-20 … [1]

9.11 … [1]

2000
Obadias
15 … [1]

2001
Jonas
1.17 … [1]

3.10 … [1]

2002
Miqueias
5.2 … [1], [2]

6.8 … [1]

7.6 … [1]

2003
Habacuque
2.2 … [1]

2.4 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16]

2004
Sofonias
1.2-18 … [1]

3.5 … [1]

2005
Ageu
1 a 2 … [1]

2006
Zacarias
3.8 … [1]

4 … [1]

4.7 … [1]

6.12 … [1]

9.9 … [1], [2]

11.12 … [1]

11.12, 13 … [1]

11.17 … [1]

12.1-9 … [1]

12.10 … [1], [2]

13.7 … [1]

14.2 … [1]

14.16-19 … [1]

2007
Malaquias
3.1 … [1], [2], [3], [4], [5], [6]

3.1-4 … [1]

4.5 … [1]

2008
NOVO TESTAMENTO

Mateus
1 … [1]

1 a 4 … [1]

1.1 … [1]

1.1-17 … [1]

1.1,2,17 … [1]

1.1; 16.16; 22.41-46 … [1]

1.3,5 a 6.16 … [1]

1.17 … [1], [2]

1.18 … [1]

1.18-25 … [1]

1.21 … [1], [2]

1.22 … [1], [2]

1.22,23 … [1], [2]

1.23 … [1]

2 … [1], [2], [3], [4]

2.1 … [1]

2.1-12 … [1], [2]

2.5, 6 … [1]

2.5,15,17,23 … [1]

2.5,6 … [1]

2.12 … [1]

2.13-20 … [1]

2.15 … [1]

2009
2.16 … [1]

2.18 … [1], [2]

2.19-23 … [1]

2.20b … [1]

2.21-23 … [1]

2.22 … [1]

2.23 … [1], [2]

3.3 … [1], [2], [3]

3.9 … [1]

3.13-17 … [1]

3.15 … [1]

4.1-11 … [1], [2], [3]

4.4 … [1]

4.10 … [1]

4.12-16 … [1]

4.14 … [1]

4.15,16 … [1]

4.18 … [1], [2], [3]

4.21 … [1], [2]

4.23 … [1]

4.24 … [1]

5 a 7 … [1]

5—7 … [1]

5.3 … [1], [2]

5.3,10 … [1]

5.3,5 … [1]

5.8 … [1]

2010
5.9 … [1]

5.10,11 … [1]

5.11,12 … [1], [2]

5.13 … [1]

5.16 … [1]

5.17 … [1], [2]

5.18 … [1], [2]

5.22 … [1]

5.27,28 … [1]

5.29,30 … [1]

5.32 … [1]

5.33-37 … [1], [2]

5.38-42 … [1]

5.45 … [1]

5.48 … [1]

6.9-11 … [1]

6.19-21 … [1]

6.24 … [1]

7.1 … [1]

7.7-11 … [1]

7.15-20 … [1]

7.16-18 … [1]

7.16-20 … [1]

7.17,20 … [1]

7.21 … [1], [2], [3]

7.24 … [1]

7.24,26 … [1]

2011
7.29 … [1]

8.5-13 … [1], [2]

8.16 … [1]

8.17 … [1], [2], [3]

8.22 … [1]

8.27 … [1]

9.9 … [1]

9.9-13 … [1]

9.13 … [1]

9.35 … [1]

9.37,38 … [1]

10.2-4 … [1]

10.2,3 … [1]

10.3 … [1], [2], [3], [4]

10.4 … [1], [2], [3]

10.5,6 … [1]

10.10 … [1], [2]

10.16 … [1]

10.22 … [1], [2]

10.35,36 … [1]

11 … [1]

11.5 … [1]

11.10 … [1], [2], [3], [4]

11.13 … [1]

11.19 … [1]

12.3,5 … [1]

12.4 … [1]

2012
12.5 … [1]

12.15-21 … [1]

12.15,16 … [1]

12.17 … [1]

12.17-21 … [1], [2]

12.24 … [1]

12.24-28 … [1]

12.28 … [1]

12.33-37 … [1]

12.40 … [1], [2], [3]

12.41,42 … [1]

13.1-9, 18-23 … [1]

13.14,15 … [1]

13.16,17 … [1]

13.35 … [1], [2], [3]

13.55 … [1], [2], [3], [4]

14.2 … [1]

14.3-12 … [1]

14.13-33 … [1]

14.23 … [1]

15.6 … [1], [2]

15.7-9 … [1]

15.8,9 … [1]

15.10-20 … [1]

15.21-28 … [1]

15.29 … [1], [2]

15.29-31 … [1]

2013
15.31 … [1], [2]

16.13 … [1]

16.13-17, 21-23 … [1]

16.16-19 … [1], [2]

16.16-20 … [1]

16.17 … [1]

16.18 … [1], [2]

16.21 … [1]

16.21-23 … [1], [2], [3]

16.24-26 … [1]

17.1-13 … [1]

17.5 … [1]

17.20 … [1], [2]

17.23 … [1]

17.24-27 … [1], [2]

18.15 … [1]

18.17 … [1]

19.1-12 … [1]

19.3 … [1]

19.3-12 … [1]

19.3-9 … [1]

19.4 … [1]

19.23,24 … [1]

19.28 … [1]

19.29 … [1]

20.19 … [1]

20.20-24 … [1]

2014
20.27 … [1]

20.28 … [1], [2]

21.4 … [1]

21.5,9 … [1]

21.12-17 … [1]

21.13 … [1], [2], [3]

21.16,42 … [1]

21.33-42 … [1]

21.42 … [1], [2]

21.43 … [1]

22.7 … [1]

22.15-22 … [1], [2]

22.21 … [1]

22.23-33 … [1]

22.29 … [1]

22.31 … [1]

22.32 … [1]

22.32,37 … [1]

22.36-40 … [1]

22.37-40 … [1]

22.40 … [1]

22.41-45 … [1]

22.44 … [1]

23 … [1]

23.1-7 … [1]

23.12 … [1]

23.15 … [1]

2015
23.16-22 … [1]

23.23 … [1]

23.29-35 … [1]

23.37-39 … [1]

24 … [1], [2], [3], [4]

24.1,2 … [1], [2]

24.2 … [1]

24.4,5, 23-26 … [1]

24.5 … [1]

24.6,7 … [1]

24.7 … [1], [2], [3], [4]

24.9 … [1]

24.11-14 … [1]

24.13 … [1]

24.14 … [1], [2]

24.15 … [1], [2], [3]

24.15-18 … [1]

24.26 … [1]

24.29-31 … [1]

24.30,31 … [1]

24.31 … [1]

24.35 … [1]

24.43, 44 … [1]

24.45-51 … [1]

25 … [1], [2]

25.1-13 … [1]

25.6 … [1]

2016
25.21 … [1]

25.34,35 … [1]

26.13 … [1]

26.14-16 … [1]

26.15 … [1]

26.20 … [1], [2]

26.24 … [1]

26.26-30 … [1]

26.28 … [1], [2]

26.31 … [1]

26.54 … [1]

26.54,56 … [1]

26.56 … [1]

26.57-68 … [1]

26.63 … [1]

26.63-65 … [1]

26.67 … [1]

27 … [1]

27.1-25 … [1]

27.1-65 … [1]

27.3-10 … [1]

27.9 … [1]

27.9,10 … [1]

27.12,14 … [1]

27.18 … [1]

27.34,35,39,43,46,48 … [1]

27.38 … [1]

2017
27.46 … [1]

27.62 … [1]

27.64 … [1], [2]

27.64b … [1]

27.66 … [1]

28.19,20 … [1]

28.20 … [1]

2018
Marcos
1.1 … [1], [2]

1.1,14,15 … [1]

1.2 … [1], [2], [3], [4]

1.2,3 … [1]

1.3 … [1]

1.7,8 … [1]

1.11 … [1]

1.14 … [1], [2]

1.14,15 … [1]

1.15 … [1], [2], [3]

1.16 … [1]

1.16-18 … [1]

1.16-20 … [1]

1.19 … [1]

1.22 … [1]

1.32 … [1]

1.40-45 … [1]

1.44 … [1]

2.12 … [1]

2.14 … [1]

2.17 … [1], [2]

2.18 … [1]

2.23 … [1]

2.26 … [1]

3.16 … [1]

2019
3.17 … [1], [2]

3.18 … [1], [2], [3]

3.22 … [1], [2]

3.24, 26-29; 5.27; 6.33; 8.35; 9.2-4,18,19; 10.29; 14.65,72 … [1]

4.11 … [1]

4.26-29 … [1]

5.37, 9.2; 10.35 … [1]

6.3 … [1], [2]

6.4 … [1]

6.14 … [1], [2]

6.14-29 … [1]

6.17 … [1]

6.17-29 … [1]

6.39 … [1]

6.45-52 … [1]

7.6 … [1]

7.6,7 … [1]

7.17-23 … [1]

7.26 … [1]

7.31 … [1]

8.29 … [1]

8.30 … [1]

8.31 … [1]

8.31-33 … [1], [2]

8.35 … [1]

8.38 … [1]

9.2 … [1], [2]

2020
9.13 … [1]

9.31 … [1]

10.1-12 … [1]

10.2-12 … [1], [2]

10.18 … [1]

10.29 … [1]

10.33,34,45 … [1]

10.38 … [1]

10.45 … [1], [2]

11.11,19 … [1]

12.6 … [1]

12.10 … [1]

12.10,26 … [1]

12.24 … [1]

12.26,29,32 … [1]

12.35-37 … [1]

13 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

13.3 … [1]

13.6 … [1]

13.7 … [1]

13.8 … [1], [2], [3]

13.8,19 … [1]

13.9-13 … [1]

13.10 … [1]

13.14-16 … [1]

13.21-24 … [1]

13.26 … [1], [2]

2021
14.9 … [1]

14.14,15 … [1]

14.17 … [1], [2], [3]

14.17,18 … [1]

14.21,27 … [1]

14.22-26 … [1]

14.24 … [1]

14.33 … [1], [2]

14.36 … [1]

14.51,52 … [1], [2]

14.53-65 … [1]

14.62 … [1]

15.1-15 … [1]

15.1-44 … [1]

15.10 … [1]

15.34 … [1]

15.40 … [1]

15.42 … [1], [2]

16.7 … [1], [2]

16.8 … [1], [2]

2022
Lucas
1.1 … [1]

1.1-4 … [1], [2], [3], [4], [5]

1.2 … [1], [2], [3], [4], [5]

1.3 … [1], [2], [3], [4], [5], [6]

1.4 … [1], [2], [3], [4], [5]

1.5 … [1], [2]

1.21 … [1]

1.23,52 … [1]

1.68 … [1], [2]

1.70 … [1]

2.1 … [1], [2], [3], [4]

2.1-20 … [1], [2]

2.1,2 … [1]

2.2 … [1]

2.2b … [1]

2.11 … [1]

2.16 … [1]

2.23,24 … [1]

2.25-38 … [1]

2.27,37,46 … [1]

2.32 … [1]

3.1 … [1], [2], [3], [4], [5]

3.1-3 … [1]

3.1,2 … [1]

3.1,2,21 … [1]

2023
3.4 … [1], [2]

3.23 … [1]

3.38 … [1]

4.1-13 … [1], [2]

4.16-30 … [1]

4.17 … [1]

4.18-21 … [1]

4.18,19 … [1], [2]

4.18,43 … [1]

4.21 … [1], [2]

4.40 … [1]

4.44 … [1]

5.27 … [1]

6.14 … [1]

6.15 … [1], [2], [3]

6.16 … [1], [2], [3]

6.17 … [1]

6.20 … [1], [2]

6.20,21 … [1]

6.23 … [1], [2]

6.29, 30 … [1]

6.43,44 … [1]

7.17 … [1]

7.20 … [1]

7.22 … [1]

7.27 … [1], [2], [3], [4]

7.35 … [1]

2024
8.1 … [1]

8.21 … [1]

9.6 … [1]

9.20 … [1]

9.21-22 … [1]

9.21-44 … [1]

9.22 … [1]

9.31 … [1]

9.52 … [1]

10.7 … [1], [2], [3]

10.18 … [1], [2]

10.25-28 … [1]

10.26 … [1], [2]

10.38-41 … [1]

11.9-13 … [1]

11.15 … [1]

11.20 … [1]

11.28 … [1]

11.51 … [1]

12.12 … [1]

12.33,34 … [1]

12.36-38 … [1]

12.42-48 … [1]

13.1 … [1]

13.32 … [1]

14.11 … [1]

15.11-32 … [1]

2025
16.16 … [1]

16.16,17 … [1]

16.17 … [1]

16.18 … [1], [2]

16.29,31 … [1], [2]

17.21 … [1]

18.14 … [1]

18.29 … [1]

18.31 … [1]

18.31-33 … [1]

18.31-34 … [1]

19.10 … [1]

20.1 … [1]

20.34-38 … [1]

20.37 … [1]

20.41-44 … [1]

21 … [1], [2]

21.5-32 … [1]

21.8 … [1]

21.9 … [1]

21.10 … [1]

21.11 … [1], [2], [3], [4]

21.12-19 … [1]

21.20 … [1]

21.20-22 … [1]

21.37 … [1]

21.38 … [1]

2026
22.1 … [1]

22.8 … [1]

22.14 … [1], [2], [3], [4]

22.14-23 … [1]

22.20 … [1]

22.54-62 … [1]

23.1-52 … [1]

23.1-6 … [1]

23.5 … [1]

23.7 … [1]

23.7-11 … [1]

23.7-12 … [1]

23.12-25 … [1]

23.34 … [1]

23.43 … [1]

23.46 … [1]

23.54 … [1], [2]

24.6 … [1]

24.25 … [1]

24.27 … [1]

24.27,32,44,45 … [1]

24.36-49 … [1]

24.44 … [1]

24.48 … [1]

24.49 … [1]

24.53 … [1]

2027
João
1 … [1]

1.1 … [1], [2]

1.1-18 … [1]

1.1-3 … [1]

1.1,14 … [1], [2], [3]

1.1,2,6,12,18,36,51 … [1]

1.5 … [1]

1.14 … [1]

1.14,18 … [1]

1.17,41,45 … [1]

1.18 … [1]

1.23,45 … [1]

1.29-36 … [1]

1.35-39 … [1]

1.40 … [1], [2], [3]

1.42 … [1]

1.43-48 … [1]

1.43-49 … [1]

1.49 … [1]

1.51 … [1], [2]

2.13 … [1]

2.13-22 … [1], [2]

2.13,23 … [1], [2]

2.14-16 … [1]

2.14,15 … [1]

2028
2.16 … [1]

2.20 … [1], [2], [3], [4]

2.22 … [1]

2.23-25 … [1]

3.3,5 … [1]

3.15,16,36 … [1]

3.16 … [1], [2], [3]

3.16,18 … [1]

3.18 … [1]

3.19-21 … [1]

3.21 … [1]

3.24 … [1]

3.33,34 … [1]

4.24 … [1], [2]

4.44 … [1]

4.46-54 … [1]

5.2 … [1], [2]

5.3b,4 … [1]

5.14 … [1]

5.17-29 … [1]

5.24 … [1]

5.25 … [1]

5.39 … [1]

6.4 … [1], [2], [3]

6.4,10 … [1]

6.5-7 … [1]

6.8 … [1]

2029
6.14 … [1], [2]

6.28 … [1]

6.29 … [1]

6.30-59 … [1]

6.35,48,51 … [1]

6.37 … [1]

6.45 … [1]

6.58 … [1]

6.67,71 … [1]

6.70, 71; 12.4-6; 13.21-30; 17.12 … [1]

7.14, 28; 8.2,20,59; 10.23; 11.56; 18.20 … [1]

7.19,23,49,51 … [1]

7.27 … [1]

7.35 … [1], [2]

7.36 … [1]

7.38,39 … [1]

7.38,42,52 … [1]

7.40 … [1]

7.41,42 … [1]

7.53 a 8.11 … [1]

8.12 … [1], [2], [3]

8.17 … [1]

8.23 … [1]

8.31 … [1]

8.33-47 … [1]

8.41 … [1]

8.44 … [1]

2030
8.44,45 … [1]

9.5 … [1], [2], [3]

10.7,9 … [1]

10.10 … [1]

10.11,14 … [1]

10.19-21 … [1]

10.22 … [1]

10.34 … [1], [2]

10.34-36 … [1]

10.34-38 … [1]

10.35,36 … [1]

11 … [1]

11.1,2 … [1]

11.4,40 … [1]

11.16 … [1]

11.25 … [1]

11.27 … [1]

11.55 … [1], [2]

12 … [1]

12.1 … [1], [2]

12.12,13 … [1]

12.21, 22 … [1]

12.22 … [1], [2]

12.30-36 … [1]

12.34 … [1]

12.38 … [1], [2]

12.43 … [1]

2031
13.1 … [1]

13.1-20 … [1]

13.2 … [1]

13.18 … [1]

13.23 … [1], [2]

13.34 … [1]

13.34,35 … [1], [2]

14 … [1]

14.2 … [1]

14.5 … [1]

14.6 … [1]

14.16 … [1]

14.16,17 … [1]

14.17 … [1]

14.22 … [1]

14.26 … [1]

15.1 … [1]

15.1-8 … [1]

15.4,6,7 … [1]

15.9-17 … [1]

15.18 … [1]

15.18-25 … [1]

15.25 … [1]

16.13 … [1]

17.12 … [1]

17.17 … [1], [2], [3]

17.20 … [1]

2032
17.20-23 … [1]

18—19 … [1]

18.10 … [1]

18.19-23 … [1]

18.20 … [1]

18.23 … [1]

18.24-28 … [1]

18.28 … [1]

18.28,39 … [1]

18.29 … [1], [2]

18.31 … [1]

18.31-33, 37,38 … [1]

18.31-33,37,38 … [1]

18.31,32,37,38 … [1]

18.36 … [1], [2], [3]

19.6 … [1]

19.7 … [1], [2]

19.14 … [1], [2], [3], [4]

19.14, 31,42 … [1]

19.24,28,36,37 … [1]

19.26, 27 … [1]

19.28 … [1]

19.30 … [1]

19.31 … [1]

19.34 … [1]

19.38 … [1]

19.42 … [1]

2033
20.1,19,26 … [1]

20.9 … [1]

20.19-29 … [1]

20.24-29 … [1]

20.28 … [1]

20.30, 31 … [1]

20.30,31 … [1], [2]

20.31 … [1], [2]

21 … [1]

21.1-14 … [1]

21.2 … [1], [2], [3], [4], [5]

21.15-19 … [1], [2]

21.24 … [1], [2]

21.25 … [1]

2034
Atos dos Apóstolos
1 … [1]

1 a 12 … [1]

1 a 15 … [1], [2]

1.1 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14]

1.1-10 … [1]

1.1-3 … [1]

1.1,2 … [1]

1.12 … [1]

1.12,19 … [1]

1.13 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

1.13,14 … [1]

1.14 … [1]

1.15-26 … [1], [2]

1.16-20 … [1]

1.20 … [1]

1.21,22 … [1]

1.25 … [1]

1.3 … [1], [2]

1.6 … [1]

1.8 … [1], [2], [3], [4], [5]

1.8,9 … [1]

1.9-11 … [1], [2]

10 … [1], [2]

10.2,22, 35; 13.16,26 … [1]

10.2,7 … [1]

2035
10.28 … [1]

10.34-43 … [1], [2]

10.36 … [1], [2]

10.36-41 … [1], [2]

10.37 … [1]

10.39 … [1], [2]

10.42 … [1]

10.9-16 … [1]

11.1 … [1]

11.1-18 … [1]

11.16 … [1]

11.19 … [1]

11.2,3 … [1]

11.20 … [1]

11.25,26 … [1]

11.26 … [1]

11.27-30 … [1], [2]

11.28 … [1], [2]

11.28-30 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

11.30 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9]

12 … [1]

12.1-3 … [1]

12.1-4 … [1], [2], [3]

12.1-5 … [1]

12.12 … [1], [2]

12.12,25 … [1]

12.17 … [1], [2], [3]

2036
12.2 … [1], [2], [3]

12.24 … [1], [2]

12.25 … [1]

13 … [1], [2]

13.13 … [1], [2]

13.13-52 … [1]

13.13,14 … [1]

13.15 … [1], [2]

13.20 … [1]

13.27 … [1]

13.28 … [1]

13.32-41 … [1]

13.38, 39 … [1]

13.4 a 14.28 … [1]

13.43,50 … [1]

13.45 … [1]

13.46 … [1]

13.46-48 … [1], [2]

13.48 … [1]

13.5-12,50 … [1]

13.5, 7, 46; 17.13; 18.11; 19.10 … [1]

13.6-10 … [1]

13.7 … [1], [2]

13.9-11, 16-41; 14.15-17; 17.22-31; 20.18-35; 22.1-21; 24.10-21; 26.2-26 … [1]

14 … [1], [2]

14.11-13 … [1]

14.19,20 … [1]

2037
14.21 … [1]

14.21-23 … [1]

14.22 … [1], [2]

14.23 … [1], [2]

14.3 … [1]

14.4, 21 … [1]

14.6 … [1]

14.8-20 … [1]

15 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15]

15.1 … [1], [2]

15.1-20 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

15.1-21 … [1]

15.1-29 … [1]

15.1-30 … [1]

15.13 … [1], [2], [3]

15.13-21 … [1]

15.14 … [1], [2]

15.16,17 … [1]

15.17 … [1]

15.19 … [1]

15.20,29 … [1]

15.23 … [1], [2], [3]

15.23-29 … [1], [2], [3]

15.29 … [1]

15.37-39 … [1]

15.37-40 … [1]

15.38 … [1]

2038
15.5 … [1], [2]

15.7, 35; 17.11,18; 20.24 … [1]

16 a 18 … [1]

16 a 28 … [1]

16.1 … [1], [2], [3]

16.1,2 … [1]

16.10 … [1]

16.14 … [1], [2]

16.15 … [1]

16.16-25 … [1]

16.19 … [1]

16.2 … [1]

16.40 … [1]

16.6 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

16.6-40 … [1]

16.8-17 … [1]

17 … [1], [2], [3], [4]

17.1-10 … [1]

17.10 … [1]

17.11 … [1]

17.13,14 … [1]

17.14-16 … [1]

17.14,15 … [1]

17.16 a 18.17 … [1]

17.18 … [1]

17.2-3 … [1]

17.2,3 … [1], [2], [3]

2039
17.23 … [1]

17.28 … [1]

17.3 … [1]

17.4,17 … [1]

17.5 … [1]

17.5-10 … [1]

18 … [1]

18.1-22 … [1]

18.1,2 … [1]

18.11 … [1]

18.12 … [1], [2]

18.12-17 … [1]

18.13-17 … [1]

18.17 … [1], [2]

18.18,19 … [1]

18.2 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

18.23 … [1], [2], [3], [4], [5]

18.23 a 20.1 … [1]

18.25 … [1]

18.28 … [1], [2]

18.3 … [1]

18.4 … [1]

18.5 … [1], [2], [3]

18.5,6 … [1]

18.7 … [1]

18.8 … [1]

18.9,10 … [1]

2040
19 a 21 … [1]

19.10 … [1], [2]

19.11 … [1]

19.19 … [1]

19.20 … [1]

19.21 … [1], [2]

19.22 … [1], [2]

19.23 a 20.1 … [1]

19.26 … [1]

19.28-41 … [1]

19.29 … [1], [2]

19.8 … [1], [2], [3]

19.8,10 … [1]

19.9 … [1]

2 … [1], [2], [3], [4]

2.1-40 … [1]

2.10 … [1]

2.14-36 … [1]

2.16-21 … [1]

2.16-36 … [1]

2.20 … [1]

2.21 … [1]

2.23 … [1]

2.32,36 … [1]

2.33 … [1]

2.36 … [1], [2], [3]

2.38 … [1], [2]

2041
2.41 … [1]

2.42 … [1]

2.9 … [1], [2]

20 … [1], [2]

20.1-3 … [1]

20.1-6 … [1], [2]

20.1,2 … [1]

20.10,11 … [1]

20.16 … [1]

20.17-19 … [1]

20.17,28 … [1]

20.18-35 … [1]

20.2 … [1]

20.24 … [1], [2]

20.25 … [1]

20.27 … [1]

20.28-31 … [1]

20.3 … [1], [2]

20.31 … [1], [2], [3]

20.34 … [1]

20.35 … [1], [2]

20.4 … [1], [2], [3], [4]

20.7 … [1]

21 a 23 … [1]

21 a 28 … [1]

21.10-14 … [1]

21.15-17 … [1]

2042
21.18 … [1]

21.18-20 … [1]

21.18-25 … [1]

21.20 … [1]

21.20-25 … [1]

21.21,24 … [1]

21.27-40 … [1]

21.38 … [1], [2]

21.39 … [1], [2]

22.3 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

22.30 … [1]

22.6-10 … [1]

23.11, 31-34; 26.28,29; 27.43,44; 28.30,31 … [1]

23.24 … [1]

23.25-30 … [1]

23.25-37 … [1]

23.26 … [1], [2]

23.35 … [1]

23.6 … [1], [2]

23.6-8 … [1]

23.8 … [1], [2]

24 a 27 … [1]

24.1-22 … [1]

24.14 … [1]

24.22-27 … [1]

24.27 … [1], [2], [3]

24.3 … [1], [2]

2043
24.5,14 … [1]

25 … [1]

25.1, 7-27; 26.1-7 … [1]

25.21,25 … [1]

26 … [1]

26.12-18 … [1]

26.14 … [1]

26.25 … [1], [2]

26.28 … [1]

26.32 … [1]

26.5 … [1], [2], [3]

26.9-11 … [1], [2]

27 … [1], [2]

27.2 … [1]

27.27-40 … [1]

27.7-13 … [1]

28 … [1], [2], [3]

28.11-31 … [1]

28.15 … [1]

28.16,30,31 … [1]

28.22 … [1]

28.23,31 … [1], [2]

28.25-27 … [1]

28.25-28 … [1], [2]

28.28 … [1]

28.3 … [1]

28.3-6 … [1]

2044
28.30,31 … [1]

3.1 … [1]

3.11-26 … [1]

3.12 … [1]

3.13 … [1], [2], [3]

3.18 … [1]

3.2,11 … [1]

4.11 … [1]

4.12 … [1]

4.27 … [1]

4.31 … [1]

4.6 … [1]

5.17 … [1]

5.20,42 … [1]

5.29 … [1]

5.30 … [1]

5.33-39 … [1]

5.34-39 … [1], [2]

5.35-39 … [1]

5.42 … [1], [2]

6 … [1], [2], [3]

6.1-6 … [1]

6.7 … [1], [2], [3]

6.8 a 7.60 … [1]

7 … [1], [2], [3], [4], [5]

7.1 a 8.3; 9.1-9 … [1]

7.14 … [1]

2045
7.21 … [1]

7.25 … [1]

7.32 … [1]

7.32,55 … [1]

7.35 … [1]

7.55 … [1]

7.55-60 … [1]

7.56 a 8.3; 9.1-2 … [1]

7.6,29 … [1]

8 … [1]

8.1-3 … [1]

8.12 … [1], [2]

8.14 … [1]

8.26-40 … [1]

8.3 … [1], [2]

8.4-25, 26-40 … [1]

8.4,12,25,35,40 … [1]

8.9-24 … [1]

9 … [1]

9.1 … [1]

9.1-19 … [1], [2]

9.1-9 … [1], [2]

9.1,2 … [1]

9.11 … [1]

9.15,16 … [1]

9.16 … [1]

9.2 … [1], [2]

2046
9.20,22 … [1], [2]

9.22 … [1]

9.23 … [1]

9.23-35 … [1]

9.26 … [1]

9.26-30 … [1], [2]

9.3 … [1]

9.5 … [1]

2047
Romanos
1 a 8 … [1]

1.1 … [1]

1.1 a 16.23 … [1]

1.1-4 … [1], [2]

1.1,18,23 … [1]

1.1,2 … [1]

1.1,2,9,16,17 … [1]

1.1,9, 16; 15.16,19; 16.25 … [1]

1.1,9,16 … [1]

1.2 … [1]

1.2,17 … [1]

1.3,4 … [1]

1.4 … [1]

1.5,6 … [1]

1.7 … [1], [2]

1.13 … [1]

1.15 … [1]

1.16 … [1], [2], [3], [4], [5]

1.16 a 15.13 … [1]

1.16, 17 … [1]

1.16,17 … [1], [2]

1.17 … [1], [2], [3], [4], [5]

1.18 … [1], [2]

1.18 a 3.20 … [1]

1.18-32 … [1], [2]

2048
1.23 … [1]

1.25 … [1]

2 … [1]

2.5-16 … [1]

2.6-11 … [1]

2.9 … [1]

2.9,10 … [1], [2]

2.13 … [1]

2.16 … [1], [2], [3]

2.18 … [1]

2.27 … [1]

3.2 … [1]

3.5,21,22 … [1]

3.5,7, 21-23; 5.2; 10.3; 14.17; 15.7,16 … [1]

3.7,23 … [1]

3.8 … [1]

3.9-20 … [1]

3.9,23 … [1]

3.10-18 … [1]

3.20 … [1], [2]

3.21 a 4.20 … [1]

3.21-24 … [1]

3.21-25 … [1]

3.22, 28-30 … [1]

3.22,26 … [1]

3.23 … [1]

3.25 … [1], [2]

2049
3.26, 5.6 … [1]

3.28 … [1]

3.31 … [1]

4 … [1], [2]

4.1 … [1]

4.3 … [1], [2], [3]

4.4,5 … [1], [2]

4.8 … [1]

4.9-12 … [1]

4.25 … [1]

5 a 8 … [1]

5.1 … [1]

5.1 a 8.39 … [1]

5.1,11 … [1], [2]

5.2 … [1]

5.6-8 … [1]

5.9 … [1]

5.10 … [1]

5.14-21 … [1]

5.15-17 … [1]

5.20 … [1]

6 … [1], [2]

6 a 8 … [1]

6.1 a 7.6 … [1]

6.1-4 … [1]

6.3,4 … [1], [2]

6.5 … [1]

2050
6.14 … [1]

6.23 … [1], [2], [3]

7 … [1], [2], [3]

7.1,4 … [1]

7.24 … [1]

8.1-4 … [1], [2]

8.2 … [1]

8.3 … [1]

8.9 … [1], [2]

8.15 … [1]

8.15-17 … [1]

8.22 … [1]

8.28-39 … [1]

9 a 11 … [1], [2], [3], [4], [5]

9-11 … [1]

9.4 … [1]

9.4, 5 … [1]

9.4,5 … [1]

9.6-18 … [1]

9.11 … [1]

9.12-19 … [1]

9.33 … [1], [2]

10 … [1]

10.3 … [1]

10.4 … [1], [2]

10.5 … [1], [2]

10.6-13 … [1]

2051
10.9 … [1], [2], [3]

10.9,13 … [1]

10.12 … [1], [2]

10.13 … [1]

10.15-17 … [1]

11.13,31 … [1]

11.27 … [1]

11.36 … [1]

12 a 15 … [1]

12.1 … [1]

12.1-8 … [1]

12.4-8 … [1]

12.14 … [1]

12.19 … [1]

13.1-7 … [1]

13.1,5 … [1]

13.4 … [1]

13.6,7 … [1]

13.8-10 … [1]

13.11,12 … [1]

13.13,14 … [1]

13.14 … [1]

14 … [1]

14 a 15 … [1]

14.1 a 15.13 … [1], [2]

14.1 a 15.6 … [1]

14.14 … [1]

2052
14.17 … [1]

15 … [1]

15.4,8 … [1]

15.7 … [1]

15.14-16 … [1]

15.16 … [1]

15.16,19,20 … [1]

15.19 … [1]

15.19,23 … [1]

15.20 … [1]

15.21 … [1]

15.23-29 … [1]

15.24, 28 … [1]

15.24,28 … [1], [2]

15.25 … [1]

15.25-29 … [1]

15.26 … [1]

16 … [1], [2], [3]

16.1,2 … [1], [2]

16.1,2,23 … [1]

16.3,4 … [1]

16.5 … [1], [2]

16.13 … [1]

16.14 … [1]

16.15 … [1]

16.17-20 … [1], [2], [3], [4]

16.21 … [1]

2053
16.22 … [1]

16.23 … [1], [2], [3], [4]

16.25 … [1], [2]

16.25-27 … [1]

2054
1Coríntios
1 a 4 … [1]

1.1 … [1]

1.2 … [1], [2]

1.2b … [1]

1.4-8 … [1]

1.5-7 … [1]

1.7 … [1]

1.10 a 4.7 … [1]

1.10-17 … [1]

1.11 … [1], [2]

1.12 … [1]

1.14 … [1], [2]

1.19 … [1]

1.22,24 … [1], [2]

2.1-5 … [1], [2], [3]

2.2 … [1]

2.13 … [1]

2.14 … [1]

2.14,15 … [1]

3.1 … [1]

3.1-3 … [1]

4 … [1]

4.1,2 … [1]

4.4 … [1], [2]

4.6-8 … [1]

2055
4.10-13 … [1]

4.12 … [1]

4.15 … [1]

4.17 … [1]

4.20 … [1], [2]

4.21 … [1]

5 … [1]

5.1-13 … [1]

5.9 … [1], [2], [3]

5.9,11 … [1], [2]

5.10-13 … [1]

6.9,10 … [1], [2]

6.12 … [1]

6.12-20 … [1]

6.13 … [1]

6.14 … [1]

6.15 … [1]

6.15-17 … [1]

6.18 … [1]

6.20 … [1]

7 … [1]

7-16 … [1]

7.1 … [1], [2], [3]

7.1-5 … [1]

7.1-7 … [1]

7.1,25 … [1]

7.1,25,37 … [1]

2056
7.10 … [1], [2], [3], [4]

7.10,11 … [1], [2]

7.12 … [1], [2]

7.21-23 … [1]

7.22 … [1]

7.23 … [1]

7.29,31 … [1]

7.39 … [1]

8.1 … [1], [2]

8.1-13 … [1]

8.4-6 … [1]

8.6 … [1], [2], [3], [4]

8.8-11 … [1]

9 … [1]

9.1 … [1]

9.1-18 … [1]

9.2,12,15,18 … [1]

9.5 … [1], [2]

9.6 … [1]

9.12,16,18,23 … [1]

9.14 … [1], [2], [3], [4], [5], [6]

9.17 … [1]

9.18 … [1]

9.19-23 … [1]

9.24-27 … [1]

10 … [1]

10.1-12 … [1]

2057
10.1-22 … [1]

10.1-5 … [1]

10.14-22 … [1]

10.20-22 … [1]

10.23 … [1]

10.25 a 11.1 … [1]

10.32 … [1]

11.2-16 … [1]

11.2-6 … [1]

11.7 … [1]

11.8,9 … [1]

11.17-24 … [1]

11.19 … [1]

11.23 … [1]

11.23-26 … [1], [2]

11.23,24 … [1]

11.25 … [1], [2]

12 a 14 … [1]

12-14 … [1]

12.1 … [1]

12.4-11 … [1]

12.12 … [1]

12.12-21 … [1]

12.12-30 … [1]

12.13 … [1], [2], [3], [4]

13 … [1], [2]

13.1 … [1]

2058
13.2 … [1], [2]

13.13 … [1]

14.19 … [1]

14.34,35 … [1]

14.34b,35 … [1], [2]

14.37 … [1]

14.37,38 … [1]

15 … [1], [2]

15.1 … [1]

15.1-8 … [1]

15.2 … [1]

15.3-28 … [1]

15.3-5 … [1]

15.3-5, 35-57 … [1]

15.3,4 … [1]

15.7 … [1], [2]

15.8 … [1]

15.9 … [1], [2], [3]

15.12 … [1], [2]

15.12-57 … [1]

15.12,34 … [1]

15.14,17,20 … [1]

15.20 … [1]

15.20-28 … [1]

15.22 … [1]

15.23 … [1]

15.27,28 … [1]

2059
15.29 … [1]

15.32 … [1]

15.35-57 … [1]

15.44 … [1]

15.50 … [1], [2]

15.51-57 … [1]

15.51,52 … [1]

15.52 … [1]

15.57 … [1]

16 … [1]

16.1 … [1], [2]

16.1-4 … [1]

16.1,12 … [1]

16.2 … [1]

16.5-11 … [1]

16.8 … [1], [2]

16.9 … [1]

16.10 … [1], [2]

16.10,11 … [1]

16.15-18 … [1]

16.16 … [1]

16.19 … [1], [2], [3]

16.21 … [1]

2060
2Coríntios
1.1 … [1], [2], [3]

1.2 … [1]

1.3-11 … [1], [2]

1.12 … [1]

1.12 a 2.4; 2.12,13; 8.16-24 … [1]

1.15-24 … [1]

2.1 … [1], [2]

2.2-4 … [1]

2.3-9 … [1]

2.4 … [1], [2], [3], [4]

2.5 … [1]

2.5-11 … [1]

2.5,6 … [1]

2.8 … [1]

2.12 … [1], [2]

2.12,13 … [1]

2.13 … [1]

2.14 a 7.4 … [1]

2.16 … [1]

2.17 … [1]

3.1-18 … [1], [2]

3.3 … [1]

3.4-18 … [1]

3.6,14 … [1]

3.18 … [1]

2061
4 … [1]

4.2 … [1]

4.3,4 … [1]

4.4 … [1]

4.6 … [1]

4.7-15 … [1], [2]

4.7-18 … [1]

4.10-14 … [1]

4.14 … [1], [2]

5 … [1]

5.10 … [1], [2]

5.16 … [1]

5.17 … [1], [2]

5.19 … [1]

5.20 … [1], [2]

5.21 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

6.1 … [1]

6.4-10 … [1]

6.5 … [1]

6.7 … [1]

6.14 … [1], [2]

6.14 a 7.1 … [1], [2]

6.15,16 … [1]

6.16 … [1]

7.5 … [1], [2]

7.5,6,13,14 … [1]

7.8 … [1], [2], [3], [4], [5]

2062
7.8-12 … [1]

7.10 … [1]

7.12 … [1]

8 … [1]

8.1 … [1], [2], [3]

8.1-4 … [1]

8.1-7, 13-15 … [1]

8.2 … [1]

8.6,16,23 … [1]

8.9 … [1]

8.18 … [1]

9 … [1], [2], [3], [4]

9.1 … [1], [2], [3]

9.2 … [1], [2], [3], [4]

9.12-14 … [1]

9.13 … [1]

10 a 13 … [1]

10.1,10,11 … [1]

10.3-6 … [1]

10.14 … [1]

11.1-4 … [1]

11.4 … [1], [2]

11.4,22,23 … [1]

11.4,7 … [1]

11.5 … [1]

11.7 … [1], [2]

11.9,10 … [1]

2063
11.16 a 12.10 … [1]

11.22 … [1]

11.23 … [1], [2]

11.23-29 … [1], [2]

11.23-36 … [1]

11.23,27 … [1]

11.31 … [1], [2]

11.32 … [1]

11.32,33 … [1], [2]

12.1-10 … [1]

12.7-10 … [1]

12.11 … [1]

12.11,12 … [1]

12.16 … [1]

12.18 … [1]

13.1,2 … [1]

13.11 … [1]

2064
Gálatas
1.1 … [1]

1.1,10,13,20,24 … [1]

1.3 … [1], [2]

1.6 … [1], [2]

1.6-9 … [1], [2], [3]

1.6,7 … [1]

1.6,7,11 … [1]

1.7-9,23 … [1]

1.8 … [1]

1.11-16 … [1]

1.13 … [1], [2]

1.13,14 … [1]

1.13,22,23 … [1]

1.14 … [1], [2]

1.15 … [1], [2]

1.16,21 … [1]

1.17 … [1]

1.17,18 … [1]

1.18 … [1]

1.18,19 … [1]

1.19 … [1], [2], [3]

1.20 … [1]

1.21-24 … [1]

1.23 … [1]

2 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8]

2065
2.1 … [1], [2], [3]

2.1-10 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7], [8], [9], [10], [11], [12], [13], [14], [15], [16], [17], [18], [19]

2.1-3 … [1]

2.1-5 … [1]

2.1,5,7 … [1]

2.2,5,10 … [1]

2.2,5,7,14 … [1]

2.3-5 … [1]

2.4 … [1]

2.7b,8 … [1], [2], [3], [4]

2.8 … [1]

2.9 … [1], [2], [3], [4]

2.10 … [1], [2], [3]

2.11-13 … [1]

2.11-14 … [1]

2.11-21 … [1]

2.12 … [1], [2]

2.15,16 … [1], [2]

2.15,16,19 … [1]

2.16 … [1], [2], [3], [4]

2.19,20 … [1]

2.20 … [1], [2]

3.6 … [1], [2]

3.6-14 … [1]

3.6,8,11,24 … [1]

3.10 … [1]

3.10-13 … [1]

2066
3.10-14 … [1], [2], [3], [4], [5]

3.11 … [1], [2], [3], [4], [5]

3.13 … [1], [2]

3.13,14 … [1], [2]

3.15-19 … [1]

3.15,17 … [1]

3.16-26 … [1]

3.22 … [1]

3.26 … [1]

3.28 … [1], [2], [3], [4], [5], [6]

4.4 … [1], [2]

4.6 … [1]

4.11-15,19 … [1]

4.12-16 … [1]

4.13 … [1], [2], [3]

4.13-15 … [1]

4.13-16 … [1]

4.22,27,30 … [1]

4.24 … [1]

5.3 … [1], [2], [3]

5.5 … [1], [2]

5.11 … [1], [2]

5.14 … [1]

5.16-18 … [1]

5.16,18 … [1]

5.19-21 … [1]

5.20 … [1]

2067
5.21 … [1]

5.22-24 … [1]

5.22,23 … [1], [2], [3]

6.2 … [1]

6.6 … [1]

6.11 … [1], [2], [3]

6.14 … [1], [2]

6.16 … [1]

6.17 … [1]

2068
Efésios
1.1-14 … [1]

1.2 … [1]

1.3-6 … [1]

1.5 … [1]

1.7 … [1], [2]

1.10 … [1], [2], [3], [4]

1.10, 20-23; 6.10-18 … [1]

1.13 … [1], [2]

1.21 … [1]

1.22 … [1], [2]

2.1-10 … [1], [2], [3]

2.1-3 … [1]

2.4,5 … [1]

2.6 … [1]

2.8 … [1]

2.8-10 … [1], [2], [3]

2.8,9 … [1], [2], [3]

2.11-22 … [1], [2], [3]

2.11,12 … [1]

2.12 … [1]

2.12,19 … [1]

2.19 … [1]

2.19,20 … [1]

2.20 … [1], [2], [3]

2.20-22 … [1]

2069
3.1-13 … [1]

3.2 … [1]

3.6 … [1], [2]

3.21 … [1], [2]

4.1 … [1]

4.1 a 6.9 … [1]

4.1-16 … [1]

4.1-6 … [1], [2]

4.3-6 … [1]

4.4 … [1]

4.4-6 … [1]

4.5 … [1]

4.7-13 … [1]

4.8 … [1]

4.11 … [1], [2]

4.11-13 … [1]

4.14 … [1], [2]

4.15 … [1], [2], [3]

4.21 … [1]

4.26 … [1]

5.21,24 … [1]

5.22 a 6.9 … [1]

5.23 … [1], [2]

5.25-32 … [1]

5.30 … [1]

6.5-9 … [1]

6.10-20 … [1], [2], [3]

2070
6.12 … [1]

6.15,19 … [1]

6.19 … [1]

6.20 … [1]

6.21 … [1]

2071
Filipenses
1.1 … [1], [2], [3]

1.2 … [1]

1.2,3 … [1]

1.3-11 … [1]

1.5,7,12,16,18,25,27 … [1]

1.6 … [1]

1.12-14 … [1]

1.12-18 … [1]

1.12-20 … [1]

1.13 … [1]

1.14 … [1]

1.21-25 … [1]

1.21-26 … [1]

2 … [1], [2]

2. 22; 4.3,15 … [1]

2.2 … [1]

2.5 … [1]

2.5-11 … [1], [2]

2.5-12 … [1]

2.6-11 … [1], [2]

2.7,8 … [1]

2.9 … [1], [2]

2.9-10 … [1]

2.9-11 … [1], [2]

2.9,11 … [1]

2072
2.10,11 … [1]

2.11 … [1]

2.14 … [1]

2.19-21 … [1]

2.19-22 … [1]

2.20,22 … [1]

2.22 … [1]

2.24 … [1]

3.2 … [1], [2]

3.2-11 … [1]

3.3-6 … [1]

3.5 … [1], [2], [3]

3.5,6 … [1]

3.6 … [1], [2], [3]

3.9 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

3.12 … [1]

3.20-21 … [1]

3.21 … [1], [2]

4 … [1]

4.1 … [1]

4.4 … [1]

4.5 … [1]

4.6,7 … [1]

4.6,8 … [1]

4.10-23 … [1]

4.13 … [1]

4.16 … [1]

2073
4.18 … [1]

4.20 … [1], [2]

4.22 … [1]

12.1 … [1]

2074
Colossenses
1 … [1], [2]

1.1 … [1], [2]

1.1,3,6,9,10 … [1]

1.2 … [1]

1.5,23 … [1]

1.7 … [1]

1.7, 8; 4.12,13 … [1]

1.7,8 … [1]

1.9-12 … [1]

1.14 … [1]

1.15 … [1]

1.15-20 … [1], [2]

1.17 … [1]

1.18 … [1], [2], [3]

1.19 … [1]

1.21 … [1]

1.24 a 2.3; 3.12-17 … [1]

1.25 … [1]

2 … [1]

2.1 … [1]

2.4-23 … [1]

2.5,7 … [1]

2.6 … [1], [2]

2.6-23 … [1]

2.6,7 … [1]

2075
2.8 … [1]

2.8, 16-23 … [1]

2.9 … [1], [2], [3]

2.11 … [1]

2.12 … [1]

2.15 … [1]

2.16,17 … [1]

2.18-23 … [1]

3.1 a 4.1 … [1]

3.1-17 … [1]

3.1-4 … [1]

3.8 … [1]

3.9,10 … [1]

3.10 … [1]

3.11 … [1], [2], [3]

3.16 … [1]

3.17 … [1]

3.18 … [1]

3.18 a 4.1 … [1]

3.19 … [1]

4.1 … [1]

4.2 … [1]

4.7 … [1]

4.9 … [1], [2], [3], [4]

4.10 … [1], [2]

4.10-14 … [1]

4.10,14 … [1]

2076
4.11 … [1], [2], [3]

4.12 … [1]

4.12,13 … [1]

4.14 … [1], [2], [3], [4], [5]

4.16 … [1], [2], [3]

4.17 … [1], [2]

4.18 … [1]

2077
1Tessalonicenses
1.1 … [1]

1.1,3 … [1]

1.2-10 … [1]

1.2-5 … [1]

1.4 … [1], [2]

1.4 a 2.12 … [1]

1.4,5 … [1]

1.5 … [1], [2], [3]

1.5b-9 … [1]

1.8 … [1]

1.9 … [1]

2.2,4,8,9 … [1]

2.2,8,9 … [1], [2]

2.4 … [1], [2]

2.9 … [1], [2], [3]

2.13 … [1]

2.14 … [1], [2], [3]

2.14-16 … [1], [2]

2.17 a 3.10 … [1]

3 … [1]

3.1-10 … [1]

3.2 … [1], [2]

4 … [1]

4.1 … [1], [2], [3]

4.6 … [1]

2078
4.9 … [1], [2], [3], [4]

4.10-12 … [1], [2]

4.10b-12 … [1]

4.13 a 5.11 … [1], [2]

4.13-18 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

4.15 … [1]

4.15-17 … [1]

4.16 … [1]

4.16,17 … [1]

4.17 … [1], [2]

5.1 … [1], [2], [3]

5.1-22 … [1]

5.1-5 … [1]

5.9 … [1]

5.9,23,28 … [1]

5.10 … [1]

5.12-14 … [1]

5.14 … [1]

5.17 … [1]

5.23 … [1]

5.23,24 … [1]

5.27 … [1]

2079
2Tessalonicenses
1.1 … [1]

1.2 … [1]

1.3-12 … [1], [2]

1.4 … [1], [2]

1.4-12 … [1]

1.4-7 … [1]

1.5 … [1], [2]

1.5-10 … [1]

1.6 … [1]

1.8 … [1], [2]

1.9 … [1]

2 … [1], [2]

2.1-10 … [1]

2.1-12 … [1], [2], [3], [4]

2.1-2 … [1]

2.1-3 … [1]

2.1,14 … [1]

2.2 … [1], [2], [3]

2.2,3 … [1]

2.3,4 … [1]

2.5-7 … [1]

2.5,15 … [1]

2.6,7 … [1]

2.7 … [1], [2]

2.8 … [1], [2]

2080
2.9 … [1]

2.11 … [1]

2.13 … [1], [2]

2.13-15 … [1], [2]

2.14 … [1], [2]

2.15 … [1]

3.1 … [1]

3.3 … [1]

3.6 … [1]

3.6-10 … [1]

3.6-13 … [1]

3.6-15 … [1], [2], [3]

3.6,11 … [1], [2]

3.7,8 … [1]

3.8 … [1], [2]

3.10 … [1]

3.11 … [1], [2], [3]

3.11-15 … [1]

3.13 … [1]

3.17 … [1], [2], [3], [4], [5]

2081
1Timóteo
1.1 … [1], [2], [3]

1.1,4,11,17 … [1]

1.2 … [1]

1.2,11 … [1]

1.3 … [1], [2], [3], [4]

1.3-11 … [1]

1.3,4 … [1]

1.4 … [1], [2], [3]

1.4-6 … [1]

1.4,6 … [1]

1.6 … [1]

1.6,19 … [1]

1.7 … [1]

1.11 … [1], [2]

1.12 … [1]

1.12,15 … [1]

1.13 … [1]

1.15 … [1], [2], [3], [4], [5]

1.15-17 … [1]

1.17 … [1]

1.19,20 … [1], [2]

1.20 … [1], [2], [3], [4]

2.1 … [1], [2]

2.1,2 … [1]

2.2 … [1], [2]

2082
2.3,4 … [1], [2], [3]

2.3,5 … [1]

2.4 … [1]

2.7 … [1], [2]

2.9-15 … [1], [2]

2.11-15 … [1]

2.12 … [1]

2.14,15 … [1], [2]

2.15 … [1], [2], [3]

3 … [1]

3.1 … [1], [2], [3]

3.1-12 … [1], [2]

3.1-7 … [1], [2], [3]

3.2 … [1], [2], [3], [4]

3.3 … [1]

3.5 … [1]

3.6 … [1]

3.7 … [1]

3.8-10,12 … [1]

3.8-12 … [1]

3.8-13 … [1]

3.11 … [1], [2]

3.12 … [1]

3.14,15 … [1]

3.15 … [1]

3.16 … [1], [2], [3]

4.1 … [1]

2083
4.1-3 … [1], [2], [3]

4.1-5 … [1], [2]

4.1,6 … [1]

4.3 … [1]

4.7 … [1], [2], [3]

4.7,8 … [1], [2], [3]

4.8 … [1], [2]

4.8,9 … [1], [2]

4.9 … [1]

4.10 … [1], [2], [3]

4.11 … [1]

4.11-16 … [1]

4.12 … [1]

4.13 … [1]

4.16 … [1], [2], [3]

5.1-16 … [1]

5.1,2 … [1]

5.3-16 … [1]

5.4 … [1]

5.13,15 … [1]

5.17-25 … [1], [2]

5.18 … [1], [2], [3], [4], [5]

5.19,20 … [1]

6.2 … [1], [2]

6.2-10, 17-19 … [1]

6.3,5,6,11 … [1]

6.4,20 … [1]

2084
6.5 … [1], [2]

6.6 … [1]

6.7,10 … [1]

6.9,10 … [1]

6.9,10,21 … [1]

6.10, 12,21 … [1]

6.11 … [1], [2]

6.12 … [1]

6.13 … [1]

6.17-19 … [1]

6.20 … [1], [2], [3], [4]

6.20,21 … [1]

6.21 … [1]

2085
2Timóteo
1.1 … [1], [2]

1.2 … [1]

1.5 … [1]

1.8 … [1], [2]

1.8,10,13,14 … [1]

1.8,9 … [1]

1.9,10 … [1]

1.10 … [1], [2], [3]

1.11 … [1]

1.12,14 … [1], [2]

2.2 … [1], [2]

2.8 … [1]

2.9 … [1]

2.10 … [1]

2.11-13 … [1], [2], [3]

2.14 … [1]

2.14,16,23 … [1]

2.15 … [1]

2.16-19 … [1]

2.17, 18 … [1]

2.17,18 … [1], [2], [3]

2.18 … [1]

2.19 … [1]

2.22 … [1], [2], [3]

2.23 … [1]

2086
2.26 … [1], [2]

3.2,4 … [1]

3.3,4 … [1]

3.5 … [1], [2]

3.6-9,13 … [1]

3.8 … [1]

3.10,11 … [1]

3.12 … [1]

3.14-17 … [1]

3.15 … [1], [2]

3.16 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

3.16,17 … [1], [2]

3.17 … [1]

4.1,2 … [1], [2]

4.2 … [1]

4.4 … [1], [2]

4.5 … [1]

4.6-8 … [1]

4.7 … [1]

4.7,15,18 … [1]

4.10 … [1], [2], [3]

4.11 … [1], [2], [3], [4], [5], [6]

4.13 … [1]

4.14 … [1]

4.18 … [1], [2]

4.19 … [1]

4.20 … [1], [2]

2087
Tito
1.1 … [1], [2], [3], [4], [5]

1.3 … [1]

1.3,4 … [1]

1.4 … [1], [2]

1.5 … [1], [2], [3], [4]

1.5,7 … [1]

1.6 … [1], [2]

1.6-9 … [1], [2], [3], [4]

1.9 … [1], [2], [3]

1.10 … [1], [2]

1.10-13 … [1]

1.10,14 … [1]

1.11 … [1]

1.12 … [1]

1.12,13 … [1]

1.13 … [1]

1.14 … [1], [2], [3]

1.15 … [1], [2]

2.5 … [1]

2.9 … [1]

2.10-13 … [1]

2.10,11 … [1]

2.12 … [1]

2.13 … [1]

3.1 … [1]

2088
3.2,4 … [1]

3.4-7 … [1], [2], [3], [4], [5]

3.4-8 … [1]

3.9 … [1], [2], [3], [4]

3.10 … [1]

3.12 … [1]

2089
Filemom
1 … [1], [2]

1.1 … [1]

1.3 … [1]

1.9 … [1]

1.22 … [1]

1.23 … [1]

1.24 … [1]

2 … [1], [2]

6,13 … [1]

10 … [1], [2]

19 … [1], [2]

21 … [1]

22 … [1]

23 … [1], [2]

24 … [1], [2], [3], [4]

2090
Hebreus
1 … [1]

1.1-3 … [1], [2]

1.1-3,5,6,13 … [1]

1.1,2 … [1], [2]

1.3 … [1]

1.4 … [1], [2]

2 … [1]

2.3 … [1], [2]

3.6; 13.8 … [1]

3.7 a 4.11 … [1]

3.7-19 … [1]

4.2,6,14 … [1]

4.11-16 … [1]

4.12 … [1]

4.14-16 … [1]

5.12-14 … [1]

6.4-6 … [1]

6.9 … [1]

6.20 … [1]

7.1-3 … [1]

7.3 … [1]

7.4-10 … [1]

8 … [1]

8.1-6 … [1]

8.8-13 … [1]

2091
9.1-14 … [1]

9.11-28 … [1]

10.4,10 … [1]

10.24 … [1]

11.7 … [1]

11.12 … [1]

11.13 … [1], [2]

11.19 … [1]

11.31 … [1]

12.1,2 … [1]

12.2 … [1]

12.8 … [1]

13.17 … [1]

13.20-25 … [1]

13.23 … [1]

2092
Tiago
1.1 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

1.1,5,13,20 … [1]

1.2 … [1]

1.2-12 … [1]

1.6 … [1]

1.19,20 … [1]

1.20 … [1]

1.22 … [1]

1.27 … [1], [2], [3]

2.1 … [1], [2]

2.1-7 … [1]

2.5 … [1]

2.5,19 … [1]

2.7 … [1]

2.8 … [1]

2.14-26 … [1], [2], [3], [4]

2.23 … [1]

3.14 … [1]

3.15 … [1]

4.5 … [1], [2]

5.16 … [1]

5.19 … [1]

5.20 … [1]

19 … [1]

2093
1Pedro
1.1 … [1], [2], [3], [4], [5], [6]

1.1-3,11 … [1]

1.1,17 … [1], [2]

1.2 … [1]

1.2,10-12,18-20 … [1]

1.2,20 … [1]

1.3-7 … [1]

1.11 … [1]

1.12 … [1]

1.12,25 … [1]

1.16 … [1]

1.19 … [1]

1.23 … [1]

1.23-25 … [1]

2.1-10 … [1]

2.3 … [1]

2.4,5 … [1]

2.5 … [1]

2.6-8 … [1]

2.8 … [1]

2.9 … [1], [2]

2.9-11 … [1]

2.11 … [1], [2]

2.12 … [1]

2.13 a 3.7 … [1]

2094
2.21-25 … [1]

2.24 … [1], [2]

3.2 … [1]

3.13-18 … [1]

3.14 … [1]

3.15 … [1]

3.15-17 … [1]

3.18-22 … [1], [2]

3.19 … [1]

3.19-22 … [1]

3.20 … [1]

3.22 … [1], [2]

4.1 … [1]

4.2 … [1]

4.8 … [1], [2]

4.12 … [1]

4.12-19 … [1]

4.14 … [1]

4.14,17 … [1]

4.16 … [1]

4.17 … [1], [2]

5.1 … [1], [2], [3]

5.9 … [1]

5.12 … [1]

5.12,13 … [1]

5.13 … [1], [2], [3], [4], [5], [6], [7]

2095
2Pedro
1 … [1]

1.1 … [1], [2], [3], [4], [5]

1.1,16 … [1]

1.2 … [1]

1.3 … [1]

1.3-11 … [1]

1.14,15 … [1]

1.16 … [1], [2]

1.16-19 … [1]

1.17 … [1], [2]

1.19-21 … [1]

1.20 … [1]

1.21 … [1], [2]

2 … [1], [2], [3], [4], [5], [6]

2.1 … [1], [2]

2.1 a 3.3 … [1]

2.2 … [1]

2.4 … [1]

2.4,5 … [1]

2.5 … [1]

2.7-9 … [1]

2.9 … [1]

2.15,16 … [1]

2.19 … [1]

2.22 … [1]

2096
3 … [1]

3.1 … [1], [2], [3], [4]

3.1-13 … [1]

3.2 … [1], [2]

3.4 … [1], [2]

3.10 … [1]

3.11 … [1]

3.14 … [1]

3.15 … [1]

3.15,16 … [1]

3.16 … [1], [2], [3], [4]

3.17,18 … [1]

2097
1João
1.1 … [1], [2], [3], [4]

1.1-3 … [1], [2]

1.1-4 … [1], [2], [3]

1.1-5 … [1], [2], [3]

1.2 … [1], [2]

1.5 … [1], [2], [3]

1.6 … [1]

1.6,8 … [1]

2 … [1]

2.1 … [1]

2.2 … [1], [2]

2.4,21 … [1]

2.4,5, 12-15 … [1]

2.7,8 … [1]

2.9,10 … [1]

2.9,11 … [1]

2.12-14 … [1], [2]

2.15,17 … [1]

2.16 … [1]

2.19 … [1], [2]

2.20,27 … [1]

2.22 … [1]

2.24, 27,28; 3.17; 4.13 … [1]

2.25 … [1]

2.26 … [1], [2]

2098
2.27 … [1]

2.28 a 3.3 … [1]

3.4 … [1]

3.8 … [1], [2]

3.10 … [1], [2]

3.11-15 … [1]

3.11,12 … [1]

3.12 … [1]

3.14 … [1], [2]

3.15 … [1]

3.16,17 … [1]

3.18 … [1]

4.1 … [1]

4.2 … [1]

4.2,3 … [1], [2]

4.5 … [1]

4.6 … [1]

4.6,14 … [1]

4.7 … [1]

4.8 … [1]

4.8,16 … [1]

4.9 … [1]

4.13 … [1]

4.16 … [1]

4.21 … [1]

5.1 … [1]

5.4 … [1], [2]

2099
5.6 … [1], [2]

5.10 … [1]

5.11-13 … [1]

5.11,12 … [1]

5.11,13,20 … [1]

5.13 … [1], [2]

2100
2João
1 … [1], [2], [3]

1.1 … [1]

1.9 … [1]

5 … [1]

7 … [1]

7 e 8 … [1]

8 … [1]

8-11 … [1]

9 … [1], [2], [3]

9-11 … [1]

10 … [1]

2101
3João
1 … [1], [2]

1.1 … [1]

3-4 … [1]

4 … [1]

5-10 … [1]

6 a 8 … [1]

8 … [1]

9 … [1]

10,12 … [1]

12 … [1]

2102
Judas
1 … [1]

1,4,21,25 … [1]

1.1 … [1]

1.4 … [1]

3 … [1]

3.20 … [1]

4-19 … [1], [2]

4,17,21 … [1]

5-18 … [1]

6 … [1]

14,15 … [1]

14,21 e 24 … [1]

17 … [1]

2103
Apocalipse
1 … [1], [2]

1.1 … [1]

1.1,2,5 … [1]

1.3 … [1]

1.7 … [1], [2]

1.9 … [1]

1.10 … [1], [2], [3]

1.12-20 … [1]

1.19 … [1]

2 … [1]

2.1 a 3.22; 6.1 a 8.1; 8.2 a 11.19; 15.1 a 16.21 … [1]

2.13 … [1]

3 … [1]

3.14-22 … [1]

3.22 … [1]

4 a 22 … [1]

4.6-15 … [1]

5 … [1]

5.1 … [1], [2]

5.1-5 … [1]

5.5,6 … [1]

6 … [1]

6.2 … [1]

6.2-4 … [1]

6.3,4 … [1]

2104
6.5-8 … [1]

6.8 … [1]

6.9-11 … [1]

6.12 … [1]

6.12 a 7.17; 9.13 a 11.14; 16.12-16 … [1]

6.12-14 … [1]

7 … [1], [2]

10.1-3 … [1]

10.7 … [1]

11.11,12 … [1]

12.1 a 15.4 … [1]

12.7 … [1]

12.10 … [1], [2]

14.6 … [1]

15.8 … [1], [2]

19.1 … [1], [2]

19.10 … [1]

19.13,15 … [1]

20.2-7 … [1]

21.11,23 … [1], [2]

22.1-5 … [1]

22.6 … [1]

22.18 … [1]

22.18,19 … [1], [2]

2105
MAPAS

Mapa 4.1 As viagens de Jesus

Mapa 6.1: Origem e destino de Lucas

Mapa 7.1: Origem e destino de João

Mapa 9:1 A primeira viagem missionária de Paulo

Mapa 9.2: A segunda viagem missionária de Paulo

Mapa 9.3: A terceira viagem missionária de Paulo

Mapa 10.1: Origem e destino de Gálatas

Mapa 10.2: A Província da Galácia

Mapa 10.3: Teoria do Norte da Galácia

Mapa 10.4: Teoria do Sul da Galácia

Mapa 11.1: Origem e destino de 1 e 2Tessalonicenses

Mapa 12.1: Origem e destino de 1 e 2Coríntios

Mapa 15.1: Origem e destino de 1 e 2Timóteo e Tito

Mapa 17.1: Origem e destino de Tiago

Mapa 18.1 Origem e destino de 1 e 2Pedro

Mapa 19.1: Origem e destino de 1, 2 e 3João

Mapa 20.1: Igrejas de Apocalipse

2106
2107
A carta magna da humanidade
Guinness, Os
9786559671489
336 páginas

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Neste livro, Os Guinness investigou a natureza da fé revolucionária ao


contrastar as revoluções seculares, como a Revolução Francesa, com a
revolução impulsionada pela fé do Israel antigo. Ao final, ele concluiu que
a história do Êxodo revela uma visão de liberdade mais elevada, mais rica e
mais profunda que já existiu. O contraste que Guinness propõe entre "Paris"
e "Sinai" revela uma abordagem que distingue dois tipos de revolução e
suas diferentes perspectivas acerca da natureza, da igualdade e da liberdade
humanas. Ao tornar o Êxodo a Carta Magna da humanidade, o autor propõe
uma visão construtiva de uma sociedade moralmente responsável, de
pessoas independentes e livres, e que celebram uma aliança umas com as
outras, visando a justiça, a paz, a estabilidade e o bem comum da
comunidade.

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2108
2109
As Bem-aventuranças
Bridges, Jerry
9786559671182
128 páginas

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Todos admiramos a humildade quando a vemos. Mas como a praticamos?


Como a humildade se torna algo natural na vida cotidiana? Jerry Bridges vê
nas bem-aventuranças, uma série de bênçãos de Jesus, um padrão de
humildade em ação. Jesus começa com a pobreza de espírito um
reconhecimento de que somos incapazes de viver uma vida santa que
agrada a Deus e prossegue por meio do lamento pelo pecado, nossa fome e
sede de justiça, grandes e pequenas experiências de perseguições e, mais do
que isso, a descoberta de que a humildade é uma bênção. Deus está presente
conosco a cada momento, dando graça aos humildes e elevando-nos à
bênção.

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2110
2111
Ego transformado
Keller, Timothy
9788527509510
48 páginas

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Quais são as marcas de um coração sobrenaturalmente transformado? Essa


é uma das questões sobre as quais o apóstolo Paulo trata quando escreve à
igreja de Corinto. O interesse real dele não é algum tipo de reparo ou
remendo; antes, uma mudança profunda, capaz de transformar a existência.
Numa era em que agradar as pessoas, insuflar o ego e montar o curriculum
vitae são vistos como os meios para "chegar lá", o apóstolo nos chama a
encontrar o verdadeiro descanso na bênção que é nos esquecermos de nós
mesmos. Neste livro breve e contundente, Timothy Keller mostra que a
humildade que brota do evangelho torna possível pararmos de vincular cada
experiência e cada conversa com a nossa história e com quem somos. E
assim podemos ficar libertos da autocondenação. Quem é realmente
humilde segundo o evangelho não se odeia, mas também não se ama... é,
antes, alguém que esquece de si mesmo. Você também pode conquistar essa
liberdade...

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2112
2113
A trindade
Letham, Robert
9786559670819
624 páginas

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A Trindade, obra premiada em sua primeira edição, aparece agora


atualizada, revisada e ampliada. Faltava uma obra de peso sobre aquela que
é a doutrina mais importante da teologia cristã: a doutrina da Trindade. E
foi Robert Letham quem realizou essa missão, oferecendo uma cuidadosa
pesquisa sobre "Aquele que é totalmente transcendente e incompreensível".
Depois de examinar os fundamentos bíblicos da doutrina, Letham traçou
seu desenvolvimento histórico, enfrentou o debate contemporâneo e
abordou quatro questões fundamentais sobre a Trindade: (1) a encarnação,
(2) adoração e oração, (3) criação e missões e (4) pessoas. Esta nova edição
também trata dos avanços nos estudos de Agostinho, do ensino da Trindade
e da eleição na obra de Barth, das relações entre Oriente e Ocidente e dos
debates entre evangélicos acerca da relação entre o Filho e o Pai.

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2114
2115
Deuses falsos
Keller, Timothy
9788527508759
192 páginas

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Sucesso, dinheiro, amor verdadeiro — a vida perfeita. Muitos de nós


depositam a fé e a esperança nessas coisas, acreditando que sejam capazes
de trazer a felicidade. No fundo, porém, sabemos que nada disso pode
garantir satisfação plena. Por isso não é de surpreender que nos sintamos
perdidos, solitários, desencantados e ressentidos. Só o Deus verdadeiro
pode satisfazer totalmente nossos desejos, e este é o momento perfeito para
encontrá-lo novamente... ou, quem sabe, pela primeira vez.
Em Deuses falsos, Timothy Keller mostra que uma compreensão adequada
da Bíblia revela a verdade acerca da sociedade e de nosso próprio coração.
Nessa mensagem poderosa, enxergamos nossa tendência de buscar em
outras coisas aquilo que só Deus pode nos dar. Também somos apresentados
a um novo caminho: aquele que leva a uma esperança que não pode ser
abalada pelas circunstâncias da vida

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2116

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