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Os “Fabricantes de Mentiras”: notícias falsas e boatos na imprensa brasileira (1930 - 1939) View project
All content following this page was uploaded by Fábio Chang de Almeida on 26 December 2020.
Organizadoras Autores
Tânia Cruz Adriane Bell6-Klein
Marininha Aranha Rocha Alberto Vasconcellos Inda Junior
Antonio S. Takimi
Camila Bauer Brõnstrup
Orientadores Caroline Haas
Aldo Bolten Lucion Celso Rodrigues Frand
Carlos Alberto Bissani Charlis Raineki
Carlos P. Bergmann Charteris Santos dos Santos
César Leandro Schultz Clarissa dos Santos Ferreira
Cláudio Galleano Zettler Deborah Pinheiro Dick
Cl6vis Dias Massa Elvio Giasson
Jorge Rubio Elvis Carissimi
Marlise Gionanaz Fábio Chang de Almeida
Volnei Alves Corrêa Gustavo de Azambuja Pereira Filho
Janete Anselmo-Franci
Jaqueline Barp
LálU'Cn Batista Brondani
Luis Felipe Machado do Nascimento
Pf~()PFSO Marco Aurélio de Araújo
Maristela Fiess Camilo
Marta Knijnik Lucion
Miriarn Reichel
Norma Possa Marroni
Oscar Rafael Gadea Quinõnes
Shana Sabbado Flores
Sílvio José Gobbi
EDIT()RA Vicenzo da Cruz Piccoli
© dos autores
Direitos reservados desta edição:
Universidade Federal do Rio Grande do Sul
167 p. : il.
CDU 061.4:001.891:378
Catalogação na publicação: Biblioteca Central da UFRGS
A FIGURA DO TIO SAM
,,,. NA PROPAGANDA
POLITICADOS ESTADOS UNIDOS
EM GUERRA
Charteris Santos dos Santos
Fábio Chang de Almeida
Marlise Giovanaz (orientadora)
Resumo:
Se olharmos para os modernos Estados Nacionais, podemos observar que a
grande maioria criou, adotou ou apropriou-se, durante o seu processo de
afirmação como nação, de uma variedade de símbolos que funcionam como
pontos de referência, evocação de sentimentos patrióticos, transmissores de
idéias. Um dos principais usuários desse "arsenal simbólico" são os órgãos
de Propaganda Política desses Estados. Nosso recorte temático, está centrado
nas representações do Tio Sam na propaganda política dos EUA em perio-
dos de guerra através de pôsteres.
Palavras-chave: Estados Unidos . Propaganda política . Segunda Guerra
Mundial.
Ahstract:
Ifwe look to the modern national states, we can observe that a great number
have created, adopted or appropriated, during their process of national
affirmation, a variety of symbols that worked as reference evocation of
patriotic feeling, conductors ofideas. One ofthe main users of this "symbolic
system" are the political propaganda agencies of these countries. Our theme
is centered on the representations of Tio Sam political propaganda in the
USA, in times of war through american propaganda posters.
Keywords: United States. Political propaganda . Second World War.
46
Introdução
Quando pensamos nos elementos que definem uma
nação, algumas idéias vêm à mente de praticamente todo
mundo: ela deve possuir um território definido, seus mem-
bros falam o mesmo idioma e uma identidade cultural
característica deve ser reconhecida pela maioria. Contu-
do, nem sempre as nações são formadas por grupos cul-
turalmente homogêneos, pois muitos países surgiram da
união ou anexação (às vezes com o uso da força) de dife-
rentes povos e etnias. As contradições internas são uma
ameaça à estabilidade das nações, tornando necessária
para as suas legitimações a definição de uma "cultura na-
cional" unificadora.
Se olharmos para os modernos Estados Nacionais,
podemos observar que a grande maioria construiu, adotou
ou apropriou-se, durante o seu processo de afirmação
como nação, de uma variedade de símbolos que funcio-
nam como pontos de referência, evocação de sentimen-
tos patrióticos, transmissão de idéias ou representação dos
"anseios" do país (anseios da elite dirigente). Um dos prin-
cipais usuários e difusores desse "arsenal simbólico" são
os órgãos de Propaganda Política desses Estados. 1
Nosso recorte temático, centrado nas representações
do Tio Sam na propaganda política dos EUA em perío-
dos belicosos, originou-se da nossa experiência com ou-
tra pesquisa, mais específica, acerca do período da Segun-
da Guerra Mundial. Nesse trabalho, identificamos uma
grande variedade de veículos utilizados nas campanhas
de propaganda da época, dentre os quais concedemos
preferência para os pôs teres.
1 É importante definirmos a palavra Propaganda, pois no português essa palavra tem seu
significado compartilhado com a palavra publicidade, diferentemente de outras línguas
como o inglês (propaganda x advertising), espanhol (propaganda X publicidad) e o fran-
cês (propagande X publicité). O termo Propaganda refere-se à transmissão de idéias e
conceitos, que podem ser religiosos ou políticos por meio de diversas técnicas, sempr:e com
o objetivo de moldar as opiniões do público alvo. Este debate é feito por Nelson Jahr
Garcia na apresentação do livro ''A Propaganda Política", de Jean-Marie Domenach. 47
Ao concentrarmos nosso foco neste meio de comu-
nicação, deparamo-nos com um volume muito grande de
imagens do personagem Tio Sam, tido como um dos prin-
cipais símbolos nacionais dos EUA. 2 Aprofundando o es-
tudo, percebemos que a utilização do personagem não
foi comum apenas durante a Segunda Guerra, 1nas em
praticamente todas as "campanhas de guerra" do gover-
no norte-americano nos séculos XIX e XX.
História do personagem
Não há consenso entre os historiadores a respeito
da história do personagem. Segundo a versão mais aceita
nos Estados Unidos, a tradição do Tio Sam surgiu a partir
de uma brincadeira entre soldados durante a guerra con-
tra a Inglaterra em 1812. Eles rccebia1n os suprimentos
alimentícios em barris que vinham com a inscrição "U .S. ",
sigla utili1.ada pelo exér-
cito e que significa
United States (Estados
Unidos). As letras foram
associadas ao nome de
u1n dos fornecedores do
governo, Samuel Wilson,
fabricante e co111ercian-
te de carne cm conserva.
2 A pcr11011agcm ·r.oSam foi oficialmente reconhecido como símbolo nacional cm 1961 pelo
48 Congrcs.~o dos E UA.
em simplificar o nome de Samuel Wilson para wfio Sam"
( Unc/,e Sa1n em inglis), e associá-lo à sigla gravada nos barris
de alimentos criando-se assim um personagem que, sen-
do o responsável pela alimentação das tropas, acabava por
representar a própria administraçãó federal.
Ainda no século XIX, o chargista Thomas Nast criou
um personagem baseado nessa história, já com suas rou-
pas características imitando a bandeira norte-americana,
para representar o governo dos EUA em seus cartuns.
A aparência com a qual nós estamos acostumados só
surgiu no início do século XX, quando o famoso ilustra-
dor James Montgomery Flagg utiJizou sua própria ima-
gem para desenhar
a fisionomia do per-
so na ge m, agora
com o tradicional
cavanhaque, no fa-
moso pôster de alis-
tam.e n to do exérci-
to de 1916, duran-
te a Primeira Guer-
ra Mundial.
Exemplo de representação
do Tio Sam feita por
Thomas Nast cm 1876.
Note que o personagem é
desenhado corno um
homem loiro, relativamen-
te jovem, de cartola negra e
ainda sem o cavanhaque.
1magem ohtiJa m, site
"Thc: Old limes".
Referencial teórico
Bronislaw Baczko, Pierre Bourdieu, e Sandra
Pesavento, alguns dos autores onde buscamos nosso
referencial teórico, estão ligados à corrente da historiografia
chamada "Nova História Cultural". Neste sentido, nossa
discussão historiográfica sobre o tema foi pautada e1n três
conceitos básicos: sistema simbólico, representação e ima-
ginário, tornando-se interessante neste mo1nento a apre-
sentação dessas idéias. 49
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Capa da revista em
quadrinhos "Freedom
Fíghters 11 n.0 l de 1976,
da DC Comics, onde o
super-herói Uncle Sam
era uma das persona-
gens principais. A
"Frecdom Fightcrs" foi apenas uma das diversas revistas em quad rinhos que já
acolhemm o Tio sam em ·suas páginas).
Conclusão
O material por nós estudado po~ui um valor docu-
mental bastante significativo, e seu potencial enquanto
fonte historiográfica é muito grande. As representações
do Tio Sam nos cartazes, selos, revistas em quadrinhos,
cartões postais e outros meios revelaram-se ricas em deta-
lhes merecedores de uma análise mais atenciosa. Por
exemplo, em um cartaz de 1918 (" Side úy side - Britannia".
Pôster obtido no site da Biblioteca da Universidade de
Minnesot.a), te1nos as representações nacionais dos EUA
e da Inglaterra caminhando lado a lado, de braços dados,
trocando olhares afetuosos. Ela carrega um tridente, sím-
bolo do poderio naval do Império Britânico, e faz-se acom-
panhar de um leão, outro símbolo inglês tradicional. Ele 59
en1punha uma espada, simbolizando o poder terrestre do
exército dos EUA e faz-se acompanhar da águia america-
na.
Interessante perceber que, ern tempos de Guerra no
Iraque, o pôster pintado por James Montgomery Flagg
há 86 anos permanece mais atual do que nunca. Em 2004,
podemos imaginar um pôster pós-moderno, onde George
W. Bush e Tony Blair mantêm aquecido esse antigo ro-
mance.
Ainda hoje o personagem Tio Sam é utilizado como
representação do Estado norte-americano em revistas de
histórias em quadrinhos, charges, pôsteres, selos, desenhos
animados, ilustrações da internet e diversos outros meios de
comunicação. Sua imagem, ou simplesmente a pronúncia do
seu nome, não perdeu a capacidade de evocar os Estados
Unidos da América, fato comprovado pelas várias aparições
do personagem em revistas, jornais e "gibis" após os atenta-
dos ten~oristas de 11 de setembro de 2001.
Entretanto a imagem do velho cavalheiro está
desgastada. Após quase dois séculos de batalhas, a figura
do Tio Sam é hoje habilmente manipulada pelos gn1pos
de oposição ao governo norte-americano, muitas vezes
utilizando os antigos cartazes da I e II Guerras Mundiais,
adulterando-lhes os dizeres. Dessa forma, basta uma rápi-
da busca na internet para perceber que a maioria das ima-
gens do Tio Sam disponíveis na web não se relacionam
mais com a propaganda política do governo, mas sim com
a contra-propaganda.
Mesmo assim, Uncle Sa1n dá mostras de vitalidade.
Em 2002, aproveitando a Guerra contra o Terror e a inva-
são do Afeganistão, a editora Marvel reformulou o perso-
nagem Capitão América. Em sua nova fase ele auxiliou
no resgate às vítimas do WfC e caçou terroristas. As capas
da sua nova revista foram inspiradas em antigos pôsteres
do l'io Sarn.
Mas será que o Tio Sam ainda tem fôlego para con-
quistar multidões? Qual será o seu poder de persuasão
no século XXI? As respostas a essas perguntas resultarão
da História militar, política e econômica dos EUA no novo
século. Neste início de milênio, seqüências de interven-
60 ções bélicas além de suas fronteiras, fraudes eleitorais,
coação econômica e arrogância governamental estão preju-
dicando a imagem do Tio Sam. Paradoxalmente, os ataques
sofridos em 2001 re-
novaram as forças
deste símbolo norte-
americano. Enquan-
to essa História é es-
cri ta, o mito persiste. . ; ; /
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