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Igualdade de género na UE: um progresso lento

s desigualdades de género diminuíram de forma pouco significativa


entre 2005 e 2015. Existem, a este nível,assimetrias bastante
vincadas entre os países da União Europeia (UE). Apesar da
evolução, Portugal apresenta para este índice um valor abaixo da
média da UE.
De acordo com a nova atualização do Índice de Igualdade de
Género, os progressos verificados nos países da UE, entre 2005 e
2015, em relação à igualdade entre mulheres e homens foram
lentos e insuficientes.
O Índice de Igualdade de Género desenvolvido pelo Instituto
Europeu para a Igualdade de Género (EIGE) integra seis domínios e
varia entre 1 e 100, sendo 1 desigualdade máxima e 100 igualdade
máxima. Os seis domínios centrais tidos em consideração na
construção deste índice são a saúde, o dinheiro, o trabalho, o
tempo, o conhecimento e o poder, cada um deles definido a partir
de vários indicadores. A estes domínios acrescentam-se a
violência e a intersecção das desigualdades, os quais não têm, no
entanto, impacto no resulto final do índice.
Tal como é possível observar na Figura 1, retirada do
relatório Gender Equality Index 2017 − Measuring gender equality
in the European Union 2005-2015 , realizado pelo European Institute
for Gender Equality, quase todos os países melhoraram os seus
níveis de igualdade de género entre 2005-2015 (o eixo vertical da
figura diz respeito à variação do valor do índice, o eixo horizontal
ao seu resultado em 2015). A UE teve um resultado médio de 66,2
pontos, valor que representa uma melhoria ligeira face a 2005
(+4,2 pontos). Na década considerada, Portugal avançou da 24ª
posição (49,9 pontos) para a 21ª posição (56 pontos), o que
representa uma evolução positiva na diminuição das
desigualdades de género (+6,1), mas ainda se encontra entre os
Estados-membros com resultados piores, cerca de 10 pontos
abaixo da média da UE.
A Espanha, a Croácia, o Chipre e a Letónia melhoraram em todos
os seis domínios desde 2005. Portugal faz parte do grupo
maioritário de 14 países que melhorou em quatro domínios, sendo
que a Grécia sobressai por ser o Estado-membro que desceu em
mais domínios: três (nesta avaliação são tidas em consideração
apenas alterações superiores a um ponto).
A Suécia e a Dinamarca são os países que registam um resultado
mais positivo: 82,6 e 76,8 pontos, respetivamente. De destacar
também os avanços realizados pela Itália, país cujo valor para este
índice aumentou 12,9 pontos desde 2005, para um total 62,1
pontos, aproximando-se da média da UE e passando do 26º para o
14º lugar do ranking. Por seu turno, a República Checa, a
Eslováquia e o Reino Unido encontram-se numa situação
semelhante à de 2005. Entre os países considerados, a Grécia (EL)
e a Hungria são os que apresentam um resultado mais negativo: 50
pontos e 50,8 pontos. Os resultados entre os Estado-membro da UE
são, portanto, muito assimétricos, com uma distância superior a
30 pontos entre o país mais igualitário (Suécia) e aquele com
maior desigualdade (Grécia).

O domínio da “saúde” é o que regista um valor mais elevado em


2015 na UE (87,4 pontos), mas contou com um aumento de apenas
1,5 face a 2005. Embora o indicador “anos de vida saudável”
assuma números idênticos para homens e mulheres (63 anos),
constata-se que os homens vivem menos 5,4 anos que as
mulheres: 77,9 e 83,3 anos, respetivamente. O relatório salienta,
na componente “comportamental”, que tanto os comportamentos
de risco (consumo de álcool e tabaco) como os comportamentos
saudáveis (ingestão de fruta e legumes e a atividade física) são
mais adotados pelos homens.
Em relação ao “dinheiro”, assistiu-se a uma melhoria significativa
desta componente (+6,0 pontos), resultado de um aumento mais
acelerado do rendimento das mulheres face ao dos homens. Após
uma forte redução entre 2006-2010 da disparidade de rendimentos
mensais de 39% para 21%, entre 2010 e 2014 verificou-se uma
quase estagnação dessa desigualdade económica (20%). Apesar
da independência na componente dos “recursos financeiros” por
parte das mulheres, ainda persistem marcadas desigualdades.
Para além de os rendimentos das mulheres representarem, em
média, apenas 80% do rendimento dos homens, um homem solteiro
recebia, em 2014, mais 14% do que uma mulher solteira – fosso
que era ainda maior no seio de um casal (30%) e de um casal com
filhos (38%) ou entre pais e mães solteiros (40%).
No que diz respeito ao “trabalho”, verificou-se um progresso lento
(+1,5 pontos). A componente “participação no mercado de
trabalho” aumentou ligeiramente para as mulheres desde 2005,
mas em 2015 apenas 40% das mulheres estavam empregadas a
tempo inteiro, em contraste com 56% dos homens. Quando
questionados acerca da sua expetativa de emprego (tipo de
contrato, estabilidade, progressão na carreira), as respostas de
mulheres e homens são idênticas, mas a segregação de género
neste domínio é uma realidade evidente. As mulheres tendem a
trabalhar em setores de baixos salários, baixo estatuto e fraca
progressão na carreira, que conciliam frequentemente com outros
trabalhos informais. O relatório aponta na componente
“segregação e qualidade do trabalho” que, em 2015, 30% das
mulheres estavam empregadas nos setores da educação, saúde e
do apoio social em oposição a apenas 8% dos homens. O estudo
revela que as desigualdades no acesso ao mercado de trabalho,
sobretudo a emprego estável e de qualidade, diminuem a
independência económica das mulheres e aumentam o risco de
pobreza. É também referido que as mulheres com baixa
qualificação, com filhos, com idade mais avançada e com
deficiência encontram-se numa situação particularmente
desfavorável.
As desigualdades de “tempo” agravaram-se, tendo sido o único
valor do índice que recuou desde 2005 (-1 ponto). Ao nível dos
“cuidados com os outros” (“care activities”), a sobrecarga das
mulheres no trabalho doméstico e enquanto cuidadoras é evidente.
No ano de 2015, 79% das mulheres ocupavam pelo menos uma
hora por dia em tarefas domésticas, enquanto que no caso dos
homens esse valor é de apenas 34%. A desigualdade de género
nesta esfera diminuiu apenas 1 p.p. desde 2005. Além disso, 38%
das mulheres dispensavam pelo menos uma hora por dia ao
cuidado de crianças, idosos, ou pessoas com deficiência em
comparação com 25% dos homens – desigualdade que se agrava
se considerarmos mulheres e homens trabalhadores
(respetivamente 46% e 32%). A desigualdade na distribuição das
tarefas domésticas tende a ter efeitos negativos na distribuição
dos tempos de lazer, desporto e cultura: 28% das mulheres
trabalhadoras participam pelo menos de dois em dois dias neste
tipo de actividades, 32% no caso dos homens.
Relativamente ao “conhecimento”, observou-se uma maior
igualização da situação das mulheres em relação à dos homens
(+2,6 pontos), sobretudo na componente “conclusão e
participação”, com o aumento do sucesso escolar e de mulheres
graduadas no ensino superior. Contudo, a componente
“segregação educacional” demonstra uma desigualdade
persistente: 43% das mulheres que estudam no ensino superior
estão confinadas às áreas da educação, saúde, humanidades e
artes, percentagem que desce para cerca de metade no caso dos
homens (21%). Assim, as mulheres continuam sem uma
representação proporcional nas áreas da ciência, tecnologia,
engenharia e matemática, predominantemente masculinas.
Por último, o domínio “poder” é o que apresenta maiores
progressos na década em causa (+9,6 pontos). No entanto, este é o
domínio que, no ano de 2015, apresentava níveis de desigualdade
mais significativos entre homens e mulheres. O valor do índice
nesta área específica era de apenas 48,5 pontos, com todos os
Estados membros a terem uma sobrerepresentação dos homens
nas componentes política, económica e social. O relatório sublinha
o aumento da inclusão das mulheres nos conselhos de
administração das maiores empresas cotadas, embora quatro em
cada cinco lugares continuem a pertencer a homens. A esfera
política é aquela que regista o melhor resultado, com cerca de
33% dos assentos parlamentares nos Estados-membros a
pertencerem a mulheres, contribuindo de forma mais positiva para
o valor final do índice neste domínio. A aplicação generalizada de
quotas nos parlamentos nacionais é identificada como uma
fórmula com efeito imediato no empoderamento das mulheres e na
redução das desigualdades de poder. O relatório refere ainda que
as organizações de financiamento de investigação, as entidades
desportivas e os media são setores em que as mulheres continuam
com pouco poder de decisão.
Portugal encontrava-se, em 2015, abaixo da média da UE em todos
os domínios que formam o Índice, à exceção do “trabalho”
(PT=72,0 vs UE=71,5). Estes dados evidenciam a condição
desfavorável das mulheres em Portugal e demonstram que as
desigualdades de género se assumem como uma dimensão
estrutural e transversal a diversas áreas.
O domínio “trabalho” é aquele em que Portugal alcança uma
posição mais favorável (15º), registando a este nível uma melhoria
em linha com a média da UE. Apesar de um ligeiro progresso na
distribuição do “tempo” entre homens e mulheres, o país continua
na cauda da UE (25ª posição). O domínio da “saúde” em Portugal,
tal como na UE, é o que regista níveis de igualdade mais elevados.
Todavia, o resultado do país encontra-se abaixo da média da UE e
diminuiu ligeiramente face ao de 2005.
O relatório destaca a evolução positiva de Portugal no que à
dimensão “poder” diz respeito, comprovada pelo progresso de 11,7
pontos desde 2005. Esta tendência é atribuída à implementação de
quotas para cargos políticos, conhecida no nosso país como lei da
paridade, havendo um caminho a trilhar para uma maior
representação das mulheres nos quadros dirigentes das empresas
cotadas.
O resultado do combate à desigualdade de género na União
Europeia nos últimos 10 anos ficou aquém das expetativas do
EIGE, que acredita existir espaço de melhoramento. O EIGE espera
que o Pilar Social da UE (apresentado em Abril de 2017) e a
aplicação por parte dos Estados-membros da diretiva
de conciliação da vida profissional com a vida familiar dos
progenitores e cuidadores consolidem a estratégia de combate às
desigualdades de género na UE e melhorem os resultados nos
domínios que mais contribuem para a (des)igualdade.
Notícia escrita por Paulo Couraceiro

A igualdade de género tem abrandado nos anos mais


recentes. Como é que os preconceitos afetam a
igualdade de género? É em resposta a esta pergunta
que as Nações Unidas criaram o Gender Social Norms
Index.

O Relatório do Desenvolvimento Humano (2019) reconhece que o


progresso no sentido da igualdade de género tem abrandado nos
anos mais recentes (ver figura 4.3 do relatório). Este facto é
justificado por duas ordens de razão: primeiramente, as mulheres
revelam um progresso desigual quando comparadas as
capacidades básicas e avançadas adquiridas, constatando-se uma
maior desigualdade de género nas últimas; e, segundamente, os
estereótipos e preconceitos de género, frequentemente, reforçam
e explicam estas desigualdades ao basearem-se em crenças sobre
o que os outros fazem ou pensam que devem fazer, orientando,
assim, ações capazes de restringir o comportamento dos homens e
mulheres.
As capacidades básicas referem-se a conquistas relacionadas com
subsistência e a participação, como ter acesso e completar a
escolaridade básica ou poder votar. As capacidades avançadas
envolvem agência e mudança, potenciadoras na alteração dos
papéis e relações de género. Um exemplo destas últimas é o
acesso a níveis mais elevados de escolaridade. Ilustrando,
complementarmente, de acordo com os dados de 2019 do
Relatório de Desenvolvimento Humano: ao nível político,
constatou-se que capacidades básicas como votar apresentam
uma igualdade de género muito acentuada em contrapartida com
capacidades mais elevadas, apenas 24% dos lugares
parlamentares são ocupados por mulheres; ao nível económico,
observa-se que as mulheres representam apenas 21 % dos
empregadores mundiais e 12% do top de bilionários.

Índice de Normas Sociais de Género

Considerando a importância das normas sociais e dos estereótipos


no reforço das identidades de género e na determinação de
relações de poder que constrangem as capacidades dos homens e
das mulheres, privando a sua plenitude, o Programa de
Desenvolvimento das Nações Unidas (UNDP, abreviatura original)
criou um novo índice – Normas Sociais de Género (GSNI,
abreviatura original), tendo por base os dados do World Values
Survey (2005-2009 e 2010- 2014). O objetivo principal é capturar o
efeito das crenças sociais na desigualdade de género em múltiplas
dimensões, nomeadamente: política, educativa, económica e
integridade física (figura 1).
A figura 1 exibe os indicadores que foram selecionados do
questionário do World Values Survey e as opções consideradas
enquanto definição de preconceito que foram integradas no índice
geral. Através dos vários indicadores foram criados índices de
dimensões e, por fim, o índex das normas sociais de género. No
caso do último foram criados dois: (1) o GNSI que mede a
percentagem de pessoas com pelo menos um preconceito, e (2) o
GNSI2 que mede a percentagem de indivíduos com pelo menos
dois preconceitos.
Salienta-se que este índice integra 75 países, contemplando cerca
de 80% da população do mundo, contudo, Portugal não está
incluído.
Figura 1. Definição de preconceito segundo os indicadores
multidimensionais que compõem o índice

Fonte: 2020 Human Development Perspectives “Tackling Social


Norms: A game changer for gender inequalities”, p.8.

Principais conclusões

No conjunto dos 75 países analisados, concluíram que apenas 14%


das mulheres e 10% dos homens não possuem preconceitos de
género. Ainda como conclusões gerais verifica-se que: (1) os
países com maiores preconceitos tendem a registar uma maior
desigualdade de género (ver figura 1 da caixa 1 no relatório
“Tackling Social Norms”, 2020); (2) os preconceitos são menores
na área da educação, cerca de 74% dos indivíduos não possuem
estereótipos de género relacionado com a educação; e (3)
independentemente da dimensão, as mulheres apresentam menos
estereótipos do que os homens.
Um ponto importante de destacar relaciona-se com o facto de
existir uma relação entre desenvolvimento humano e preconceitos
de género, os países com uma maior percentagem de indivíduos
com preconceitos são integrantes dos grupos de baixo e médio
desenvolvimento humano, assim como exibem desigualdades de
género mais acentuadas.
Analisando detalhadamente as dimensões, constatam-se os
seguintes factos:
(1) Ao nível político, cerca de 50% dos indivíduos acham que os
homens são melhoreslíderes políticos, de acordo com o relatório.
Os países com mais preconceitos ao nível político são: o Catar
(91,56%), a Jordânia (91,17%), a Palestina (89,30%), o Iraque
(88,33%) e o Kuwait (88,10%). Inversamente está a Andorra
(14,08%), a Suécia (16,05%), %), a Noruega (19,51%) a Holanda
(21,29%) e a Finlândia (24,58%).
(2) Ao nível educativo, os países que consideram que a
universidade é mais importante para os homens do que para as
mulheres são: o Haiti (59,91%), o Irão (55,42%), o Paquistão
(51.11%) e Mali (47,61%). Com menos preconceitos estão: a
Andorra (1,81%), a Suécia (2,61%), a Noruega (3,71%), a Austrália
(4,09%) e a Holanda (4,63%).
(3) Ao nível económico, de acordo com os dados detalhados do
relatório, cerca 40% dos indivíduos consideram que os homens são
melhores executivos e, aproximadamente, 50% dos homens
acreditam que os homens têm mais direito a um trabalho do que as
mulheres. Os países com mais preconceitos ao nível económico
são: o Azerbaijão (91,97%), o Paquistão (91,02%), a Jordânia
(89,42%), o Irão (88,86%) e Mali (88,87%). Repetindo a tendência,
com menos preconceitos estão países elevado desenvolvimento
humano: a Andorra (8,73%), a Suécia (9,16%), a Holanda (13,56%),
os Estados Unidos da América (14,81%) e a Nova Zelândia
(16,65%).
(4) Ao nível da integridade física, quase 30% dos indivíduos
concordaram que é justificável um homem bater no seu parceiro.
Os países que apresentam mais preconceitos desta dimensão são:
a Ruanda (97,64%), o Zimbabué (96,27%), o Paquistão (93,75%), a
Nigéria (92,78%), a Líbia (92,15%), a Indonésia (90,55%) e o Ghana
(90,73%). Esta dimensão é a que apresenta uma maior
percentagem de preconceitos face à população de cada país. Com
um valor menor de preconceitos destacam-se: a Andorra
(12,01%), a Suécia (14,13%), a Noruega (16,78%), a Austrália
(20,93%) e a Holanda (22,03%).
Analisando o progresso de 31 países, selecionados por
corresponderem aos únicos que tem informação em ambos os
períodos de aplicação do inquérito, (2005-2009 | 2010-
2014) verifica-se que houve um aumento dos preconceitos de
género em 15 destes. Por um lado, os homens no Chile, na
Austrália, nos EUA e na Holanda registaram uma diminuição dos
preconceitos e, por outro lado, aumentaram na Suécia, na
Alemanha, na Índia e no México. Correspondentemente, no caso
das mulheres, a tendência é semelhante, mantêm-se os países
onde houve um progresso e na Suécia, na índia, na África do Sul e
na Roménia intensificaram-se os preconceitos.
Considerando ainda a população geral destes 31 países,
constatou-se que os preconceitos aumentaram em todas
dimensões, excetuando na educativa: política (54,24% – 56,20%),
económica (53,43% – 53,82%), educativa (24,26% – 24,19%),
integridade física (68,71% – 69,40%). Complementarmente, no
geral, houve um aumento das pessoas com pelo menos um (GNSI)
e dois (GNSI2) preconceitos, respetivamente, 86,46% para 87,28%
e 63,55% para 65,38%. Desagrupando por sexo, verifica-se que a
percentagem de indivíduos sem preconceitos diminuiu em ambos:
feminino (16,62% – 15,39%) e masculino (10,65% – 10,10%).

Links para os relatórios


http://hdr.undp.org/sites/default/files/hdr2019.pdf
http://hdr.undp.org/sites/default/files/hd_perspectives_gsni.pdf

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