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2.

COMPARAÇÃO E LITERATURA

Corre uma história, entre os comparatistas, que julgo


verdadeira, e pela qual gostaria de começar. Num congresso inter-
nacional, em que os vários intervenientes faziam questão em
começar por se definir em termos de especialidade restrita dentro
do âmbito dos estudos literários, alguém interrogou um compara-
tista sobre a sua drea de especialização. Depois de hesitar, ele terá
“Je suis spécialiste en courants d’
Deixem-me começar com a exploração desta meráfora: a
“corrente de ar” é suficientemente significativa de um estado de
movimento e dinamismo que, além do mais, ¢ como todos nós
empiricamente sabemos, comporta alguns riscos. Enquanto metá-
fora, esta parece-me particularmente iluminante àcerca daquilo que
designamos como a disciplina da literatura comparada
Não que a “comparação em literatura se esgote no âmbito
desta literatura comparada. Bem pelo contrário. Mas veremos que
esta disciplina permite uma apreensão sistemática de alguns dos
problemas que, de forma generalizada (embora nem sempre clara),
se colocam à qualquer pesquisa e reflexão dentro dos estudos
literários. Na realidade, é possível argumentar que, de modo
fundador, a literatura comparada nos leva a ver como desocultadas
várias questões que, em áreas afins dos estudos literários, podem
apresentar-se como ocultadas (ou podem limitar-se, o que talvez
seja ainda mais significativo, a não ser desocultadas): a vexata
quaestio da nacionalidade literária é, evidentemente, uma delas e
reflecte-se numa típica opção visível no âmbito do compararismo.
Trata-se da opção entre uma literatura comparada de base nacional (
mesmo por vezes nacionalista), que pode considerar-se dominante
nos estudos da disciplina conduzidos até meados dos anos 50 deste
século; e uma literatura nacional de base comparatista, que parece
tornar-se raiz das correntes mais importantes da reflexão crítica
dos últimos cinquenta anos. Da opção por esta última hipórese
decorrem algumas consequências assinaláveis: em primeiro lugar, e talvez colocado de forma tão clara em muitas das reflexões sobre o
como já tive ocasião de referir, o reforço da posição central da problema, pode ser facilmente rasurável (ou não equacionável): o
| teoria daliteratura como mediadora entre conformações especifica- facto de que a noção de diferença só faz sentido (e só é, por isso,
mente nacionais de alguns dos problemas literários em estudo’ (o epistemologicamente válida) se forem estabelecidas as formas pelas
que implica, por seu turno, a necessidade de uma constante reflexão quais se postula a existência de uma “comunidade anterior”, que
Acerca das permeabilidades ¢ cventuais limites, mesmo se moventes, não só não aniquila a diferença como, pelo contrário, a torna
entre teoria e comparatismo); em segundo lugar, a gradual substi- possivel. “Diferença” e “comunidade” são, então, conceitos que se
tuição do conceito de internacionalidade, em que se fazia radicar o
projecto comparatista, pelo conceito de supranacionalidade — pres- relacionam como interdependentes ¢ complementares, e não como
supondo este que os tipos e categorias de questões, embora potencialmente antitéticos. ] :
revestindo manifestações que aprendemos 2 reconhecer como Tal relacionagio tem evidentemente consequências centrais
nacionais, têm um fundamento que nenhuma nacionalidade para o entendimento do comparatismo que, como bem viu Guillén
completamente declina ou esgota (¢ aqui se inscreve precisamente a (1985), pensa a sua especificidade reflexiva a partir da transfor-
questão do emocentrisno, que a disciplina rigorosamente designa mação de distinções como as existentes entre o particular ¢ o geral,
como eurecentrismo: mas será bom lembrar que, dentro da Europa, o local e o universal ou o uno e o diverso, a transformação, pois,
as diferenças, transformáveis em hierarquias, também eram susten- destas distinções em dialécticas permanentes do seu questionamento
tadas por esta questão...); próprio. Terei ocasião, em ensaio à frente, de com mais demora
em último lugar, a também gradual sublinhar as implicações deste posicionamento dialéctico; mas
extensão do conceito e da prática comparatistas (que, como vere-
mos, implicará uma revisão do que poderá ser considerado como gostaria desde já de apontar que, por ser verdadeiramente dialéc-
“discurso comparável”). tico, ele acentua o facto de que a posição de indagação comparatista
Marfa Zambrano, ao reflectir sobre as pregnantes mas tem sempre um carácter ao mesmo tempo provisional e de certo
também porencialmente equívocas relações entre filosofia e modo revisionista. Mas, por outro lado, é este duplo carácier que
literatura, tem um comentário que aqui gostaria de citar. Diz ela: leva o comparatista a constantemente articular perguntas com
“Na realidade, a distância entre poctas e filósofos foi tanta, tanta a
respostas que levam a outras perguntas, num movimento de
constante dinamismo interno que faz parte, a meu ver, de qualquer
vontade de discórdia, que nem sequer se salientaram as diferenças. reflexão que verdadeiramente se queira comparatista.
Pois as diferenças só êm lugar sobre uma comunidade anterior”. É ainda neste mesmo sentido que poderemos afirmar que a
(Zambrano, 1993:49). Na realidade, encontramo-nos aqui perante indagação comparatista se coloca na zona de reflexões que têm
uma fórmula que julgo particularmente iluminante no que toca à como seu objecto primeiro os problemas relativos ao que Robertson
questão das diferenças e das semelhangas — questão que, na activi- (1995) designa como “glocalização”, em termo que, recuperado da
dade comparativa, não pode evidentemente deixar de ser objecto de cconomia ¢ utilizado por Robertson para a área da sociologia, me
reflexão maior. E Maria Zambrano sublinha algo que, por não ser parece suficientemente esclarecedor para a área de estudos abrangida
pelo comparatismo. Efectivamente, a específica (e tensional, nunca
resolvida nem talvez mesmo resolúvel) oscilação entre formasde
' A este respeito, será útil a consulta do artigo de Culler (1992), “globalização”, por um lado e, por cutro, manifestações de “localiza-
* feálicos meus. ção” é reconhecível e mantida por este conceito, que aponta assim,
na opinião de Robertson, que partilho, para a interdependência É neste sentido que creio ser útil a consideração da literatura
ente fenómenos de carácter homogénco e outros de carácter comparada como uma zona de tomada de consciência de fronteiras
heterogénco, evitando ao mesmo tempo repor o problema do “univer- discursivas e disciplinares, zona por isso sujeita a uma maior movi-
sal” (ou dos universais) sob um outro nome (o nome “globaliza- mentação € 2 um maior dinamismo, consequentemente a um maior
são”). E este é evidentemente um dos perigos recorrentes para o risco (como vimos no inicio com a imagem da “correntede a””) mas
conceito — que utilizamos talvez demasiadas vezes sem equacionar também, e por essa mesma razão, a uma maior consciência cpiste-
estas implicações — de globalização. Não que seja impossível utilizá-lo mológica, aliás inevitável, se lembrarmos, com Boaventura Sousa
ou reconhecer a sua pertinência: mas o facto é que precisamos Santos, que qualquer fronteira implica uma dupla dimensão de
também de reconhecer formas de diferenciação e de diversificação Jfrontier (insistindo na separação) e de border (sublinhando o
cultural que os fenómenos de globalização económica e tecnológica direito de passagem) (Santos, 1994:134). Efectivamente, e 20 analisar
por um lado tendencialmente podem levar a não reconhecer mas a cultura portuguesa como uma cultura de semi-periferia e de fron-
que, por outro lado, nem por isso podem ocultar como operantes. teira — mas as suas observações têm evidentemente um escopo
Não é por isso de admirar que, neste contexto, a literatura passível de generalização —, Boaventura Sousa Santos aponta “três
comparada surja como espaço reflexivo privilegiado para a tomada orientações metodolégicas A primeira é que, não sendo
de consciência do carácrer histórico e cultural do fenómeno literário, nenhuma cultura auto-contida, s seus limites nunca coincidem
quer insistindo em aproximações caracierizadas por fenómenos com os limites do Estado (...). À segunda é que, não sendo auto-
transtemporais ¢ supranacionais quer acentuando uma dimensão contida, nenhuma cultura é indiscriminadamente aberta. Tem aber-
especificamente cultural, visível por exemplo em áreas como os turas específicas, prolongamentos, interpenetrações, interviagens
estudos de tradução ou os estudos intersemióticos ou interartes, pelos próprias,que afinal são o que de mais próprio hi nela. Finalmente,
quais se pensa a relação (ou melhor, as relações) entre o fenómeno a terceira orientação metodológica é que a cultura de um dado
verbal e outros fenómenos artústicos, manifestados através de outros grupo social não é nunca uma essência. É uma autocriação, uma
códigos, não-verbais (ou apenas parcialmente verbais). A comparação negociação de sentidos que corre no sistema mundial e que, como
em literatura permite recolocar € por isso reconfigurar (a insistência tal, não é compreensível sem a análise da trajectória histórica e da
& aqui precisamente na transfrmação) as relações entre os objectos posição desse grupo no sistema mundial.” (Santos, 1994:130). Ora
produzidos, por um lado, e por outro os nários espaços ¢ tempos dos estas observações, se consideradas a partir do campo específico dos
humanos que diversamente os vivem, e os vivem também de modos estudos lierários, permitem entender a importância epistemológica
potencialmente (¢ de facto mesmo realmente) diferenciados. Daqui da área e da reflexão comparatístas: porque em primeiro lugar,
decorrem as três tendéncias que já atrás referi, e que julgo centrais como vimos, a consciência supranacional dos fenómenos literários
para o entendimento das perspectivas actuais do comparatismo c, permite reequacionar o conceito de “nacionalidade literdria’, que
mais genericamente, da comparação em literatura: uma tendência tradicionalmente declina uma relacionação privilegiada com a
mulidisciplinar (¢ mesmo eventualmente interdisciplinar); uma noção de Estado (mesmo que seja para a pôr em causa); em segundo
tendéncia interdiscursiva, visível no desenvolvimento das relações lugar, ¢ talvez sobretudo, porque sublinha o facto de que o que
com áreas como a filosofia, a sociologia ou a antropologia; uma caracteriza o fenómeno cultural, e por isso o fenómeno artístico e
tendéncia intersemiótica, que tenta colocar o fenomeno literário no literdrio, não ¢ tanto aquilo que nele aparenta ser uma essência (ou
quadro mais lato das manifestações artísticas humanas. seja, aquilo que ele é ou seria, ou aparenta ser mas, sobrewdo, as
formas pelas quais ele se constitui como um fendmeno relacional, as plicidade cfectiva da primeira). Assim, e se a expressão “nm_amr
pontes que ele especificamente cria para se pensar na telação,
varidvel e multiforme, com outros fenómenos. Se a especificidade é comparads” sempre foi alvo de críticas por um cfectivo potencial de
imprecisio que implica, o certo é que é importante que, em termos
enão uma forma de relação, e vice-versa, poderemos então direr
que
a lieratura comparada se encontra em posição privilegiada para de conformagio de um campo de reflexão, se manifeste ¢ torne
equacionar 05 modos daquilo que Boaventura Sousa Santos explicito, de modo sistemático, o projecto relacional que qualquer
designa, em feliz formulação, como “interviagem” — ou, no plural, fenómeno literário deve comportar.
interviagens”. e flr:Jf não implica, todavia, a dissolução do campo do
. comparatismo, embora implique o aprofundamento da tomadade
É por isso também que o comparatismo se encontra mobi- consciência de que, de facto, não é possível ler senão comparativa-
lizado em torno do que, na sequéncia de Steiner (1993:83), seria mente (ou seja, relacionalmente). E isto significa, mais uma vez, que
possivel enunciar como “compulsões à conjectura”, isto ¢, especificas
interrogações problematizantes que, longe de tomarem o fenómeno não se trata tanto da opção entre comparar e não-comparar... Não
lirerário como um dado e um todo scpardvel e separado de outros há de facto como não-comparar. Toda a leitura é activação, partilha
todos, antes o consideram sob a égide do que uma questionagio fron-
e “cooperação interpretativa’ (no sentido que Umberto Eco dá a
teiriga pode, com leves diferentes inflexdes, farer variavelmente este conceito), o que significa que o sentido reside, justamente,
surgir. Neste sentido, só uma actividade reflexiva de base compara- nesse acto de cooperação, intercimbio e interacção. Desta perspec-
tista (que ndo devemos entretanto entender como praticdvel tiva, todo o sentido é comparativo e não há sem_xdn que 0 ndo scja.
âmbito exclusivo da literawra comparada) poderd dar a medida noda De qualquer modo, é pela esisiéncia e sedimentação de -
relação — que é o único modo de entender e formar projectos de comparatismo sistemático (¢ sistematizado) que se torna b
comensurabilidade humana. Tendemos por vezes a esquecer o mais ampliar não só essa consciéncia como ainda a pritica que dela
Sbvio: e, neste caso, um desses clementos é o que tem a ver com o deriva. Assim, direi que, se todo o estudo do fenémeno literdrio
facto, enuncidvel de modo simples, de que nunca quaisquer dois ou suscita necessariamente uma base comparatista, que é também por
mais elementos se comparam entre si. O gesto comparativo repousa, definição transnacional e trans-histGrica, só o campo disciplinar do
como costuma dizer-se, sobre um terrium quid, aquele “terceiro comparatismo permite compreender o alcance epistemologico de
(homem)” que dá conta de que qualquer relagio a dois &, na reali- tal prática, cuja disseminação, de tão ampla, facilmente conduz a
dade, uma relagio a trés: a observagio do mundo ¢ triangular. fenómenos de “naturalização”. E estes, como é sabido, ocultam
Ao compararmes, não nos limitamos a reconhecer uma relação pré- cortes selectivos, posicionamentos epistemológicos ¢, em última
existente aos objectos comparados entre si: radicalmente, constitui- análise, opções que são sempre culturais ¢, nessa mesma medida,
mos tal relação e, nessa medida, constituímos o objecto sobre que Lotman disse, da cultura, em definição cuja CX(K-CIIII
incide a comparação — e que não é nunca apenas o resultante da ͺó“ªs'“m
soma do objecto À e do objecto B. Mais importante do que essa simplicidade é bem a medida de uma reflexio complesa que atinge
soma é o espaço, a distância e a relação que entre eles ficam e assim se um resultado discursivo feliz, que ela é “a memória mníhcrgdxúm
manifestam. de uma comunidade” (Lotman, 1990:63). Isto significa, entre
Voltamos a Marfa Zambrano: se a diferença implica a
existência de uma comunidade, por outro lado esta última várias coisas, que partilhamos de e usamos uma memória cuja radi-
implica
o reconhecimento da primeira (ou, mais rigorosamente, da multi- cação é sempre interpessoal, mesmo se a sua conformação é mani
festada pessoalmente. A literatura é parte integrante de tal memória,
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€ permité que possamos proceder às relações necessárias ao estabeleci- a que eu chamaria um modo de existência especiral, correspondendo
mento de padrões avaliativos, estéticos e simbélicos, que por seu a um estidio de narcotização ou adormecimento que em qualquer
turno estão implicados nas opções de esquecimento e recordação que momento um conjunto de circunstâncias pode vir alterar — embora
toda a pritica da memória implica. A comparação em literatura não um qualquer conjunto de circunstâncias, embora não em qual-
(mais rigorosamente, nos estudos literários) significa sistematizar quer direcção. É justamente a isto que Claudio Guillén, na esteira
uma relação iluminante, ou melhor, sistematizar uma iluminação que de Kubler (1962), chama a “temporalidade intermitente” dos objec-
procededa própria capacidade relacional. st significa, também, que tos culturais ¢, em particular, dos objectos estéticos, dando conta
como disse 10 existe uma opção entre “comparar” e “não-comparar”: das “descontinuidades peculiares do tempo histórico-cultural”
2 opção que de facto nos é aberta é entre reconhecer ¢ epistemo- (Guillén, 1978:542). Também aqui a comparação relacional é
logicamente integrar o procedimento comparativo e relacional, por fundadora, pois só ela permite por um lado entender que lidamos
um lado ou, por outro, operar a rasura desse reconhecimento, natu- num quadro de dimensionamento multitemporal ¢, por outro lado,
ralizando quer o fenómeno literário quer a acrividade tedrico-critica, estabelecer as relações sintagmáricas e paradigmáricas necessárias
Tudo dependerá, pois, ¢ mais uma vez, do que quisermos fazer e do para que a historicidade do fenómeno literário seja vista à luz dos
tipo de projecto e entendimento que subscrevermos do fenómeno “objectos reais ¢ virtuais que, quer coetânea quer transtemporalmente,
literário. Naquele que pessoalmente subscrevo, é muito evidente com ele convivem. Y
que não existe produção de sentido que possa radicar fora de uma Entender a comparação como actividade central ao procedi-
comparação pela qual a memória cultural seja convocada e prati- mento teórico-crítico, e não apenas como franja ou margem possível
cada, a0 mesmo tempo que refeita e transformada. Não existe alids do discurso reflexivo, implica, como vimos, manter a consciência de
transformação cultural sem meméria e, ipso facto, sem comparação. que nos situamos sempre em terreno “arejado” por “correntes de ar”
E, se o esquecimento é condição para o exercício da variadas que podemos, gradualmente, ir recenhecendo. Zona de
memória (se tudo lembrarmos, nada fará sentido), a comparação reflexão fronteiriça por excelência, à literatura comparada serviriam
nos estudos literários permite também que tomemos consciência então, de modo exemplar, outras palavres metaforicamente
ainda este facto: é que, assim como qualquer recordação é precária dee “arejadas”, como as de Boaventura Sousa Santos, que comenta:
sujeita à dissolução, também nenhum esquecimento ¢ à partida
universal e definitivo: como relativamente a qualquer outro fenó- “A leveza da zona fronteiriça torna-a muito sensivel aos ventos.
meno cultural, a literatura produz, não apenas meios de constituição É uma porta de vai-vem, e como tal nem nunca está escancarada, nem
€ reforço do cânone, mas também, e reversivelmente, meios nunca está fechada.” (Santos, 1994:136).
potencial e efectiva revisão desse mesmo cânone e das periferias dode Termino, pois, com outros (ou os mesmos) ares em movi-
sistema, Mais uma vez, essa revisio só pode ser, por definição, mento, Talvez tenha conseguido explicar porque é que me é difícil
comparatista e relacional, visto que só fará sentido num quadro de pensar a literatura sem a comparação, e porque é que a metáfora do
entendimento sistémico dos fenómenos em consideração, c não “vai-vem” me parece, afinal, particularmente adequada para dar
num quadro que os tome como objectos absolutos e separáveis conta daquilo a que chamei. no início, uma específica forma de
Mais do que “esquecimentos”, digamos então que os factos lirerários mobilidade ¢ dinamismo reflexivo. Reconheço (tenho vindo a
(eatéas teorias literárias, ao lado dos-textos literários) não são tanto aprender a reconhecer) os riscos que s abrem a este “vai-vem”: de
objecto de um esquecimento puro e simples, mas sobretudo daquilo uma certa forma, é mais simples fecharmos uma porta ¢ pensarmos
s
que o mundo que nos interessa está, todo ele, contido dentro do SanTOS, Boaventura Sousa, 1994, Pela mão de Alice. O Social ¢ o político na
espago que assim delimitámos. Entretanto, tal não é verdade: o pós-modernidade, Lisboa, ed. Afrontamento.
mundo tem sempre maneira de se mostrar nos interstícios de qual-
quer espaço, mesmo de qualquer espaço do saber. Porque a literatura, STEINER, George, 1993, Presenças reais Lisboa, ed. Presenga.
seja como for, e seja de que modos for, fala de ¢ com. Fala também ZAMBRANO, María, 1985 (1993), “Poema e sistema”, in A Metáfora do coração «
para, ou contra, Talvez pudéssemos pensar, então, que este carácrer ouros escritos, rad. de José Bento, Lisboa, Assírio e Alvim.
preposicional do literário faz parte do que fazemos ao escrever e ao
ler. Sabemos que, por um lado, nunca estamos totalmente fechados,
embora saibamos também, e em síntese, que as várias aberturas
reflexivas que praticamos não são nunca aleatórias e indetermi-
nadas: afinal, comparar dois objectos é sempre transformá-los em
três, por via da relação comparativa que os une e a ambos trans-
forma.

REFERÊNCIAS

CULLER, Jonathan, 1992, “Literary theory', in Joseph GIBALDI (cd),


Inroduction to Scholarship in Modern Languages and Literatures, 2 edition, New
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GuILLEN, Claudio, 1978, “Cambio literario y multiple duración”, in Homenaje
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KUBLER, George, 1962, The Shape of Time. Remarks on the History of Things, Yale
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ROBERTSON, Roland, 1995, “Glocalization: time-space and homogeneity-hetero-


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