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Bases históricas, epistemológicas e conceituais

Prof. César Pessoa

Descrição

O estudo dos aspectos epistemológicos e históricos, grupos e


agrupamentos, a pesquisa sobre processos grupais, dinâmica de grupo,
funções adaptativas, autoritarismo, conflito, preconceitos, forças
psicológicas e sociais na história do estudo dos processos grupais.

Propósito

A história dos objetos e métodos de análise e a apresentação de


conceitos relativos aos processos fornecem conhecimentos iniciais a
gestores e outros especialistas sem os quais não poderiam diagnosticar
e implementar estratégias de modificação nas relações de poder e
comunicação entre e dentro de grupos.

Objetivos

Módulo 1

Aspectos epistemológicos e históricos dos


processos grupais
Distinguir teorias e objetos na história do estudo dos processos
grupais.
Módulo 2

Fundamentação teórica sobre grupos e


processos grupais
Identificar o grupo psicológico como um dos pilares no estudo dos
processos grupais.

Módulo 3

Funções e objetivos dos grupos


Reconhecer a importância dos grupos para a vida social,
organizacional e institucional.

Módulo 4

Forças psicológicas e sociais


Identificar como se forma a identidade e a diferenciação grupal.

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Introdução
A existência de grupos e seu estudo demorou a ser estabelecido
dentro da psicologia social. Entre o século XIX e a primeira
metade do século XX, foram estudadas representações sociais e
a personalidade individual, até que, por volta de 1930, teorias e
metodologias voltadas para a intervenção sobre grupos dentro de
instituições alcançaram bons resultados.

Reconhecer sua dinâmica, assim como estar preparado para


diagnosticar conflitos e suas causas a partir de diferentes
metodologias, pode ajudar especialistas de diversas áreas na
implementação de estratégias de resolução de problemas e
aprimoramento de liderança e comunicação.

Tendo isso em vista, este estudo é relevante para todo


profissional que trabalha em instituições, desde escolas até
empresas, e enfrenta determinados dilemas, tais como
dificuldade em comunicação, lideranças autoritárias, necessidade
de implementar estratégias a fim de tornar a informação mais
fluida e distribuída entre parceiros de trabalho, além de mitigar
possibilidades de formação de estereótipos e preconceitos.

1 - Aspectos epistemológicos e históricos dos processos


grupais
Ao final deste módulo, você será capaz de distinguir teorias e objetos na história do estudo
dos processos grupais.

Contexto histórico

O privado e o público no século XIX


O processo histórico decorrente da Revolução Industrial acelerou o
ritmo das atividades sociais entre os séculos XVII e XIX. Isso fez com
que grandes centros urbanos surgissem, assim como os processos
migratórios do campo para a cidade, ampliando o medo e a ansiedade
relacionada ao desconhecido oriundo de pequenas cidades ou da vida
agrária.

A higiene e medicina urbana, que surgem no final do século XIX em


países europeus, se desenvolveram a partir de preocupações com a
eclosão de movimentos sociais disruptivos e propagação hereditária de
doenças mentais. Desse cenário, surgiu objeto que viria a ser estudado
por sociólogos, psicólogos e psicanalistas: as massas ou multidões,
grandes aglomerados que eram considerados periculosos, imprevisíveis
e hostis.
Prática eugenista.

No Brasil, ao final do século XIX, a medicina desempenhou importante


papel na organização dos grupos sociais, especialmente em centros
urbanos, como o Rio de Janeiro, então capital. As reformas urbanas
implementadas durante o governo de Pereira Passos se pautaram no
modelo das práticas médicas francesas que encampavam um programa
eugenista de melhoria da raça.

A eugenia foi uma teoria biológica próxima ao racismo que postulava a


superioridade caucasiana às demais raças, sobretudo às etnias
africanas, consideradas muito próximas, do ponto de vista físico e
intelectual, ao reino animal. Apesar de estarrecedora, a teoria eugenista
foi extensivamente adotada na medicina, biologia e psicologia até
meados do século XX. Cabe ressaltar que, no Brasil, a miscigenação foi
alvo de intervenções médicas que temiam um rebaixamento dos
atributos intelectuais da população.

A psicologia das massas e dos grupos

Autores e trabalho importantes

Durante o século XIX, a psicologia das massas, proposta por autores


como Gustave Le Bon e Gabriel Tarde, considerava as aglomerações
urbanas como sintoma de decadência irremediável do processo
civilizatório. Freud critica as teorias anteriores sobre os fenômenos
coletivos por tomarem o público como conjunto passivo, vulnerável e
suscetível à sugestão hipnótica. Segundo o psicanalista, a força que une
o líder à multidão é de caráter ativo, ou seja, a libido, energia que
perpassa a vida amorosa e cultural de todo ser humano.

A situação tomou rumo bastante diferente a partir dos estudos de Kurt


Lewin no século XX sobre dinâmica de grupo, priorizando modificações
das relações de poder e liderança em prol da democracia. Para isso, o
autor teve de situar o grupo como elemento de interface entre a
administração em grande escala do Estado e as necessidades
individuais. Assim, Lewin operou uma leve, mas significativa,
modificação na análise dos processos sociais, que limpou o campo de
estudos da disputa ferrenha entre sociólogos e psicólogos.

Sociologia e Psicologia

Entre o final do século XIX e o século XX, diversos atores sociais, tais
como médicos, psicólogos e também participantes das ciências sociais,
ajudaram a consolidar e a ampliar a importância da temática dos
processos grupais, investigando a formação de identidades, os
contágios emocionais, o papel da hipnose na vida social, o espaço vital
de pertencimento a vários grupos, o conflito e a competitividade, bem
como estereótipos e preconceitos.

Até a década de 1940, o cenário de estudos ficou dividido e estagnado


na discussão sobre as existências de representações sociais,
pesquisadas por sociólogos como Émile Durkheim e pelo antropólogo
Marcel Mauss, e as críticas dirigidas a esses autores feitas por
psicólogos sociais norte-americanos, como Floyd Allport. De acordo
com os psicólogos, representações eram fenômenos ou processos
mentais. Afirmavam, ainda, que uma mente coletiva não poderia existir,
ou seja, apenas individualmente haveria mente e representação.
Sociólogos e psicólogos disputavam uma arena de atuação.

Durkheim, sociólogo, filósofo e antropólogo judeu francês.

Enquanto sociólogos alegavam que as ciências sociais tratavam de


representações sociais, psicólogos consideravam as representações
individuais. Apesar de a disputa no campo dos estudos sobre os
processos sociais entre sociologia e psicologia social ter sido marcante
no início do século XX, a noção de grupo se consolidou entre a década
de 1930 e 1940, sobretudo com os estudos de Kurt Lewin. Sua obra
inspirou outros estudos que resultaram em formulações mais atuais,
como a teoria da identidade e diferenciação grupal de Henri Tajfel.

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Sociologia, Psicologia e processos
grupais
Confira agora reflexões sobre os conflitos epistemológicos entre
Sociologia e Psicologia no estudo dos processos grupais.
Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Entre os séculos XIX e XX, verificamos diversas explicações sobre a


formação de grandes multidões, bem como acerca da diferenciação
entre membros de pequenos grupos. Esses estudos trouxeram
contribuições para o esclarecimento de situações caracterizadas:

pela emergência de padrões de comportamento


hostis aos quais os estudiosos do século XIX se
mostraram céticos quanto à possibilidade de
A
resolução, enquanto no século XX, foram criadas
técnicas de intervenção e manejo do preconceito,
autoritarismo e dos modos de liderança.

pela impossibilidade de serem modificadas tendo


em vista a irracionalidade constituinte da
B
personalidade ligada a instintos de sobrevivência,
tais como conduta sexual e agressividade.

pelo desaparecimento acentuado de atitudes


C
etnocêntricas durante o século XX.

pelo autoconhecimento pleno dos indivíduos acerca


D
de suas motivações na vida social.

pela intervenção de uma medicina que no século XIX


E
contribuiu para a diminuição da desigualdade social.

Parabéns! A alternativa A está correta.

A psicologia das massas, no século XIX, considerava as


aglomerações urbanas como sintoma de decadência irreparável do
processo civilizatório. A partir dos estudos de Kurt Lewin no século
XX sobre a dinâmica de grupo, passou-se a priorizar modificações
das relações de poder e liderança pela da democracia.

Questão 2

Na década de 1920, as teorias sobre a formação de grandes grupos


ganharam apoio da psicanálise. Na visão de Freud, o nexo entre
líder e seguidores ocorre por meio de:

contaminação emocional, concordando com


A
Gustave Le Bon.

uma imensa passividade da multidão anônima


B
criada pela migração do campo para as cidades.

efeitos ligados à embriaguez por álcool e por ópio,


C
substâncias populares na época.

força carismática do líder capaz de produzir efeitos


D
semelhantes ao da hipnose.

identificação dos seguidores entre si de forma


E
horizontal e com o líder de modo vertical.

Parabéns! A alternativa E está correta.

Freud criticava as teorias anteriores sobre os fenômenos coletivos


por tomarem o público como passivo. Segundo Freud, a força que
une o líder à multidão é de caráter ativo, ou seja, a libido, energia
que perpassa a vida amorosa e cultural de todo ser humano.
2 - Fundamentação teórica sobre grupos e processos grupais
Ao final deste módulo, você será capaz de identificar o grupo psicológico como um dos pilares
no estudo dos processos grupais.

Distinção entre grupos psicológicos e


agrupamentos
A distinção entre grupos psicológicos e agrupamentos é pautada, em
geral, na ideia de que autênticos grupos psicológicos são marcados por
interações face a face e compartilhamento de interesses, enquanto os
agrupamentos podem envolver proximidade física, como em filas, ou
vizinhanças, porém sem interações duradouras.

No entanto, é importante ressaltar que as fronteiras entre grupos


psicológicos e agrupamentos, apesar de frequentemente presentes e
importantes na compreensão de processos grupais, são dinâmicas e
fluidas.

Desse modo, agrupamentos podem se transformar em


grupos psicológicos na medida em que indivíduos que
não estão interagindo passam a fazê-lo em torno de
algum projeto ou vínculo importante.

Pilares dos estudos de processos


grupais no século XX
O grupo psicológico

A definição de grupo psicológico é um dos pilares dentro dos estudos


sobre processos grupais no século XX. Para defini-lo, é importante
diferenciá-lo de um conjunto de pessoas com proximidade física, mas
sem vínculo psicologicamente relevante, como uma fila de banco.

Porém, mesmo um agrupamento de pessoas desconhecidas é capaz de


adquirir atributos de um autêntico grupo psicológico se houver
compartilhamento de interesses. Por exemplo, se todos os caixas
eletrônicos de um banco deixarem de funcionar e os clientes na fila de
espera se organizarem para reclamar com membros da instituição.

Kurt Lewin.

Kurt Lewin, autor ligado ao gestaltismo, transplantou os conceitos dessa


escola de pensamento para o estudo dos processos grupais. Gestalt é
uma palavra alemã que significa “forma” ou “conjunto”. Logo, o
gestaltismo alemão se refere a uma soma ou conjunto de elementos
mentais, comportamentais ou sociais. Assim, Lewin propõe que um
grupo, tal como uma melodia, é uma totalidade de interações e valores
com propriedades que não estão presentes nos seus elementos de
forma isolada.

O espaço vital
Outro conceito importante na ciência dos grupos é o espaço vital, a
partir do qual Lewin criou uma metodologia que, em sua opinião, poderia
representar graficamente o lugar e a dinâmica dos valores do
pertencimento de um indivíduo aos grupos aos quais pertencia. Nessa
representação gráfica da hierarquia dos valores dos grupos aos quais o
indivíduo se sente vinculado, podem aparecer grupos, como:

Família

Amigos de infância

Colegas de trabalho

Relacionamentos afetivos
Todo esse conjunto e sua hierarquia correspondem ao que Lewin chama
de espaço vital. Trata-se de uma noção muito importante para o campo
de estudos sobre processos grupais, dando visibilidade e nitidez a pré-
disposições comportamentais (atitudes). A pesquisa sobre atitudes e
pequenos grupos realizada por Kurt Lewin foi uma tentativa de melhor
compreender e combater a formação de preconceitos étnicos e raciais.

Em seus estudos sobre a dinâmica dos grupos, Lewin


buscava constantemente esclarecer o espaço vital dos
indivíduos, isto é, os diversos grupos com os quais
alguém sente-se compartilhando valores e projetos
existenciais.

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A transformação de agrupamentos
em grupos psicológicos
Confira agora as diferenças e a possibilidade de transformar
agrupamentos em grupos psicológicos.
Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Agrupamentos e grupos são geralmente confundidos pelo senso


comum. No campo da psicologia social interessada nos processos
grupais, esses termos têm significado distinto, apresentando
dinâmicas e características, tais como:

interações face a face entre indivíduos que


compartilham valores e projetos (agrupamentos), e
A
grandes massas que se organizam através do
contágio emocional (grupo psicológico).

personalidade semelhante (grupo psicológico), e


B
não semelhantes (agrupamentos).
agrupamentos podem ser compostos por muitas ou
C poucas pessoas, enquanto grupos psicológicos são
compostos apenas por poucas pessoas.

propensão ao comportamento violento


D (agrupamento); comportamento previsível e
obediência a normas (grupo psicológico).

quando grupos psicológicos possuem indivíduos


que não estão interagindo, passam a chamar
E
agrupamentos. Nesse caso, eles passam a interagir
em torno de algum projeto ou vínculo.

Parabéns! A alternativa E está correta.

Um dos pilares dos estudos sobre processos grupais no século XX


é a definição de grupo psicológico. É diferente de um conjunto de
pessoas com proximidade física, como em uma fila de banco, que
não estão vinculadas persistentemente. Porém, a situação muda se
algo coloca essas pessoas em situação e divisão de interesses.

Questão 2

A noção de espaço vital, consagrada por Kurt Lewin dentro de sua


pesquisa sobre preconceitos durante a década de 1930, envolve:

a força implacável de fatores internos da


A personalidade que definem padrões de
comportamento de difícil mudança.

a dinâmica da personalidade derivada do


B pertencimento do indivíduo a diversos grupos
sociais.

o conflito entre grupos derivado da luta pela


C
sobrevivência.

as pulsões sexuais estabelecidas por Freud como


D
fatores fundamentais no processo de socialização.

E
a força determinante do meio externo sobre o
comportamento social.

Parabéns! A alternativa B está correta.

Representar graficamente o vínculo de cada indivíduo a diversos


grupos sociais com o valor que cada grupo ocupa em todo
momento é um aspecto fundamental para a psicologia social. Esse
espaço pode representar e apresentar os vínculos sociais de uma
pessoa e é denominado de espaço vital.

3 - Funções e objetivos dos grupos


Ao final deste módulo, você será capaz de reconhecer a importância dos grupos para a vida
social, organizacional e institucional.

Relações funcionais entre dois ou


mais grupos

Grupo, adaptação e democracia

À medida que as sociedades industriais se organizaram em instituições


que demandam desempenho e aprimoramento das capacidades dos
indivíduos, a necessidade de gerir sem inibir a iniciativa foi ampliada.
Não por acaso, os Estados Unidos, nação com crescimento exponencial
da indústria, dos meios de comunicação e da democracia, foram palco
de eclosão de pesquisas sobre pré-disposições a agir, ou seja, atitudes e
opinião pública.
Dentro desse cenário, teorias sobre atitudes, opinião e comportamento
intergrupal deram origem não somente a ideias, mas também a práticas
de intervenção, sobretudo voltadas para a melhoria da comunicação e
distribuição da gestão entre membros de uma corporação. Cabe
destacar que antes que existisse uma psicologia social e a noção de
grupo psicológico, os processos mentais examinados em laboratório e
mensurados através de testes mentais eram feitos de acordo com a
adaptação dos indivíduos a normas de instituições pedagógicas e
industriais.

Pesquisa em dinâmica de grupo

Nesse momento histórico, Kurt Lewin criou um centro de pesquisa para


investigar esse conjunto de fenômenos, compreendidos como
fundamentais para a consolidação de uma atmosfera democrática não
somente na administração pública, mas também em escolas, lojas e
locais de trabalho em geral.

Na proposta encaminhada pela pesquisa em dinâmica de grupo, as


associações diversas existentes dentro de instituições podem ser
consideradas intermediárias entre o Estado e o indivíduo. Nessa
posição intermediária, o grupo apresenta a função de equilibrar
demandas por obediência, sem que essas demandas comprometam a
capacidade dos grupos de serem livres e criativos.

Esse equilíbrio entre obediência e liberdade está muito


próximo à concepção política de democracia, tal como
era entendida no contexto político dos Estados Unidos
durante a década de 1940.

Busca por equilíbrio entre obediência


a regras e criatividade

Grupo e empreendedorismo
Com relação à pesquisa de grupos no contexto da busca por equilíbrio
entre obediência a regras e criatividade, nota-se um desnivelamento
entre as duas esferas a partir da década de 1960.

Podemos dizer que, nesse momento, o entendimento dos processos


grupais passa por transformações ligadas ao prestígio adquirido pela
noção de empresa e de empreendedorismo. Esse desnivelamento dá
proeminência à iniciativa individual e à criatividade entendida como
adaptação a transformações extremamente velozes às quais o indivíduo
é obrigado a estar atento.

Em vez de o grupo ser valorizado como lugar da convivência entre


indivíduos ligados por vínculos não sanguíneos, ganha valor a noção de
equipe como um módulo que pode ser montado por determinado tempo
e desfeito rapidamente.

Os indivíduos são incitados a descobrir seus recursos


interiores e a desenvolvê-los a partir de fórmulas de
autoajuda, nas quais o valor mais elevado é a iniciativa
e o enfretamento de crises e riscos.

Pesquisas sobre processos grupais

Um aspecto curioso nesse cenário é o fato de as pesquisas sobre


processos grupais se voltarem para o tema do conflito e da
competitividade, dentre os quais se destaca o experimento de Muzafer
Sherif. Nesse experimento, o qual estudaremos com mais detalhes no
próximo módulo, pré-adolescentes formaram grupos de modo artificial e
foram incitados a competir.

A pesquisa de Sherif refletiu a atmosfera de uma época em que a


empresa, o empreendimento, a iniciativa e a adaptação a crise tomaram
à frente do equilíbrio entre obediência e liberdade buscado nas
pesquisas de Kurt Lewin. Nas concepções epistemológicas ditas
construcionistas, a personalidade, ou o “eu”, não equivale a um conjunto
de pré-disposições estáveis ao longo da história.

Comentário
Considerando essa perspectiva, após a década de 1960, os manuais de
administração pessoal passaram a enfatizar a ideia de que as
mudanças sociais devem ser produzidas prioritariamente pelos recursos
internos aos indivíduos, construindo um outro tipo de “eu” ativado pela
iniciativa e o risco.

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Dinâmica de grupo: da pesquisa à
prática
Confira agora as reflexões, a partir dos trabalhos de Kurt Lewin, sobre a
dinâmica de grupo com exemplos de pesquisa e prática.
Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

Os diversos grupos existentes dentro de instituições podem ser


considerados associações intermediárias entre o Estado e o
indivíduo. Nessa posição intermediária, o grupo apresenta a função
de:

equilibrar as necessidades por obediência, sem


A vincular a capacidade dos grupos de serem livres e
criativos.

tornar-se independente do Estado e da


B
administração pública.

vigiar os líderes, controlar seu modo de gerir e


C
comunicar.

acolher passivamente regras e ordens na medida


D
em que se torna cada vez mais organizado.

realizar operações e procedimentos que o Estado é


E
incapaz de realizar.
Parabéns! A alternativa A está correta.

Quando as sociedades industriais se organizaram visando ao


desempenho e aprimoramento das capacidades dos indivíduos, a
necessidade de conduzir sem inibir a iniciativa dos indivíduos foi
estendida. Teorias sobre atitudes, opinião e intergrupal foram
desenvolvidas.

Questão 2

Uma importante modificação na função dos grupos aparece por


volta da década de 1960 no espaço da administração de empresas,
envolvendo:

a exigência de amparo do Estado em conjunto com


A a diminuição de força política de entidades
representativas de trabalhadores.

o papel atribuído às emoções como fonte de


B
decisões precisas.

o recurso a explicações biológicas sobre o


C
funcionamento da motivação.

a noção do “eu” como um conjunto de recursos


internos que devem ser potencializados para que se
D acompanhe as transformações velozes
implementadas pelo aumento da competitividade no
campo do trabalho.

o enrijecimento das normas institucionais que, ao


E
final, impedem a iniciativa e a criatividade individual.

Parabéns! A alternativa D está correta.

Ao longo do século XX, o grupo foi construído como uma instância


intermediária entre o espaço individual e a administração pública,
passível de ser manejada de acordo com as demandas
institucionais, na medida em que as esferas privadas e públicas
sofriam modificações.
4 - Forças psicológicas e sociais
Ao final deste módulo, você será capaz de identificar como se forma a identidade e a
diferenciação grupal.

Identidade e diferenciação grupal

Diagnósticos sobre fenômenos sociais

Na década de 1950, surgem importantes estudos acerca de dinâmicas


de grupos incorporando conceitos psicanalíticos, como fez o sociólogo
alemão Theodor Adorno, célebre membro da escola de Frankfurt. Os
estudos na instituição de ciências sociais criaram uma tradição de
incorporação de conceitos oriundos da psicanálise, realizando
diagnósticos sobre fenômenos sociais, especialmente aqueles ligados à
adesão da população a governos totalitários.

Isso de modo algum implicou o desaparecimento das perspectivas


gestaltistas de Kurt Lewin. Houve, contudo, um enriquecimento no
cenário de pesquisas, inclusive com obras da perspectiva gestaltista
que criaram novos conceitos, caso do psicólogo social polonês Henri
Tajfel.

Theodor Adorno.
Theodor Adorno, quando radicado nos Estados Unidos após a ascensão
do partido nazista na Alemanha, buscou expandir pesquisas anteriores,
como o trabalho de Freud sobre a identificação dos subalternos com
líderes carismáticos. Desse modo, Adorno empreendeu, na década de
1950, pesquisas quantitativas sobre traços de personalidade vinculados
a condutas hostis, agressivas e preconceituosas. Resgatando a teoria
psicanalítica, Adorno atribuiu a formação de um tipo de personalidade,
denominada de “personalidade autoritária”, a uma educação paterna
agressiva, repercutindo em idade madura o deslocamento do ódio
original dirigido à figura paterna para grupos de etnias diferentes.

Assim, Adorno traz à cena da psicologia social uma explicação e


metodologia dirigida para um dos fenômenos ao mesmo tempo mais
destrutivos e importantes do século XX: o holocausto judeu durante a
Segunda Guerra Mundial.

Teoria da identidade social

Na teoria da identidade social consolidada ao longo da década de 1970,


o psicólogo polonês Henri Tajfel analisa condutas hostis em relação a
outros grupos. Com inspiração na teoria gestaltista da percepção, Tajfel
inicia, na década de 1950, pesquisas sobre comparação de figuras
gráficas, relacionando processos de comparação à autoimagem e
pertencimento a grupos.

Posteriormente, Tajfel apresenta uma teoria em que os processos de


comparação estão ligados a importantes processos grupais, tais como
estereótipos e preconceito. Para tanto, elabora a ideia de que todo
indivíduo se sente pertencente a um grupo segundo dois conjuntos de
crenças:

Sistemas de crenças na mobilidade social


Envolve a visão do meio social como espaço aberto a mudanças.

Sistemas de crenças na mudança social


Envolve a visão do meio social como um espaço no qual nenhuma
mudança poderia ser introduzida pela ação individual.

No primeiro sistema de crenças, a modificação é conduzida por


tentativas individuais de inserção em outros grupos sociais, enquanto,
no segundo, a modificação é conduzida de forma coletiva. A teoria de
identidade social de Tajfel busca dar conta do fenômeno da formação
de estereótipos, compreendidos como exageros de características
percebidas através de comparações e avaliadas como inferiores.

Desse modo, caso o indivíduo possua crenças de que o pertencimento


ao seu grupo é um valor a ser estimado, existe tendência para que
considere outros grupos inferiores. Caso o indivíduo represente para si
mesmo o grupo ao qual pertence como inferior, ele busca adaptar-se à
conduta de grupos que considera superiores.

Conflitos em grupos

Experimento de Stanford

A partir da década de 1960, surgem teorias baseadas em experimentos


famosos sobre conflitos entre grupos, como o Robbers Cave
Experiment, realizado por Muzafer Sherif. Na década seguinte, ocorreu o
experimento de Stanford, conduzido por Philip Zimbardo. Em ambos os
experimentos, especialmente no último, a competitividade entre os
grupos envolvidos foi tão elevada a ponto de a intervenção sobre a
relação entre os grupos ter sido necessária.

Sherif, psicólogo turco que imigrou durante a década


de 1940 para os Estados Unidos devido a conflitos
políticos em seu país de origem, ficou conhecido
devido a contribuições a pesquisas na área de
julgamentos sociais.

Sua orientação teórica com relação a problemas de preconceito e juízos


socialmente influenciados é bastante distinta daquelas adotadas por
Kurt Lewin, Theodor Adorno e Henri Tajfel. Apesar dessa divergência, as
obras convergem quanto à importância de fatores psicológicos, como
pode ser visto na noção de espaço vital, de Lewin, na gênese da
personalidade autoritária de Adorno ou nos sistemas de crenças
elencados por Tajfel.

A teoria realista do conflito


O sistema teórico de Sherif costuma ser classificado como teoria
realista do conflito grupal. A denominação realista marca a ênfase nos
fatores que provocam a eclosão de separações, vieses e preconceitos
entre grupos.

Tal como Adorno e Tajfel, a teoria de Sheriff trabalha


com duas dimensões: coesão interna e separação
externa, ou seja, quanto mais um grupo enxerga
defeitos em outro, maior a coesão entre seus
membros.
No entanto, ao contrário da inspiração cognitivista e psicanalítica de
outros autores, o psicólogo turco trabalha com fatores ligados somente
às condições externas. Por exemplo, observar, em meio à escassez de
água e comida, como a disputa por esses recursos determina
competitividade e coesão interna.

Parte considerável de sua teoria está ligada ao experimento realizado


nos anos 50. Nessa ocasião, juntamente com sua esposa, Sherif
conduziu 22 pré-adolescentes a um camping de férias em Oakloma (o
camping Robber’s Cave ou Caverna dos ladrões), dividindo o grupo em
equipes. O psicólogo usou estratégias de formação e separação do
grupo.

Buscando despertar a competitividade entre as equipes, Sherif criou


tarefas em que duas equipes se confrontavam. Após essa fase, Sherif
colocou as duas equipes formadas artificialmente em situações de
cooperação, verificando que a hostilidade entre equipes permaneceu.

Curiosidade
Esse experimento recebeu críticas por não mostrar adequadamente os
processos psicológicos envolvidos na diferenciação entre os grupos.
Por essa razão, a teoria de Sherif é considerada como uma teoria
realista do conflito, mas não psicológica. Não obstante, fornece pistas
para se entender a diversidade de abordagens das quais um especialista
em processos grupais pode lançar mão para entender conflitos entre
grupos.

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O poder da conformidade social
Confira agora uma reflexão sobre como os indivíduos tendem a agir em
conformidade com as expectativas do grupo a que pertencem.
Falta pouco para atingir seus objetivos.

Vamos praticar alguns conceitos?

Questão 1

A compreensão da formação de estereótipos e preconceitos vem


sendo tratada na atualidade segundo um viés:

A que privilegia o comportamento observável.

no qual os fatores internos relativos à personalidade


B
são realçados.

cognitivo, no qual o papel das crenças e da


C
comparação entre grupos é realçado.

que desloca a agressividade da figura paterna para


D
grupos externos à família.

E de escalas de personalidade autoritária.

Parabéns! A alternativa C está correta.

Na teoria da identidade social do psicólogo polonês Henri Tajfel, as


condutas hostis em relação a outros grupos estão ligadas ao modo
como cada indivíduo de um grupo se compara a outros grupos.
Caso o indivíduo possua crenças de que o pertencimento ao seu
grupo é um valor a ser estimado, existe tendência para que
considere outros grupos inferiores. Caso o indivíduo represente
para si mesmo o grupo ao qual pertence como inferior, ele busca
adaptar-se à conduta de grupos que considera superiores.

Questão 2

Após a Segunda Guerra Mundial, muitos estudos sobre


personalidade foram realizados na tentativa de compreender a
ascensão do nazifascismo, dentre essas pesquisas, podemos citar:

A
a escala de personalidade autoritária proposta por
Adorno.

a reatualização da teoria do contágio emocional,


B
criada no século XIX por Gabriel Tarde.

a maior valorização do estudo de Freud sobre a


C
identificação com o líder.

o modelo realista de conflito grupal elaborado por


D Muzafer Sherif a partir de seu experimento
conhecido como Robber’s Cave.

a teoria da identidade social proposta pelo


E
psicólogo polonês Henri Tajfel.

Parabéns! A alternativa A está correta.

Theodor Adorno, sociólogo alemão pertencente à escola de


Frankfurt e radicado nos Estados Unidos após a ascensão do
partido nazista na Alemanha, buscou, na década de 1950, realizar
pesquisas quantitativas sobre traços de personalidade vinculados a
condutas hostis, agressivas e preconceituosas. Resgatando a teoria
psicanalítica, Adorno atribuiu a formação de um tipo de
personalidade, denominada “autoritária”, a uma educação paterna
agressiva, em idade madura em um deslocamento do ódio original
dirigido à figura paterna.

Considerações finais
Entre os século XIX e o XX, diversos atores sociais participaram da
consolidação da temática dos processos grupais, investigando
formação de identidades, contágios emocionais, o papel da hipnose na
vida social, o espaço vital de pertencimento a vários grupos, o conflito e
a competitividade, bem como estereótipos e preconceitos.

No século XIX, médicos higienistas contribuíram para consolidar a


noção de massa, posteriormente estudada por sociólogos como
Gustave Le Bon e Gabriel Tarde, e mais tarde por Sigmund Freud. Este
último deu uma guinada na compreensão dos fenômenos de multidão,
marcando a atividade das forças psíquicas que se organizaram
investindo verticalmente na figura do líder e, horizontalmente, entre os
membros subalternos. Trata-se, na opinião do autor, de uma energia vital
denominada libido que atravessa os relacionamentos familiares, a vida
profissional, a amizade e até mesmo a atividade filosófica.

Apesar de a disputa no campo dos estudos sobre os processos sociais


entre Sociologia e Psicologia social ter sido marcante no início do
século XX, a noção de grupo se consolidou entre a década de 1930 e
1940, sobretudo com os estudos de Kurt Lewin. Sua obra inspirou outros
estudos que resultaram na teoria da identidade e diferenciação grupal
formulada pelo psicólogo polonês Tajfel.

Compreender como os indivíduos formam identidades a partir de


comparações de seu próprio grupo com outros permite que gestores e
todos que trabalham em instituições possam detectar e elaborar
estratégias que evitem a propagação de hostilidade, bem como
formação de estereótipos e preconceitos.

Tendo em vista o vasto campo de aplicação, as obras de Henri Tajfel e


de Kurt Lewin permanecem extremamente atuais, proporcionando
ferramentas interessantes para resolução de conflitos e mitigação de
estereótipos e preconceitos em qualquer ambiente onde ocorram.

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Podcast
Ouça agora as diferenças entre os processos de maioria e minoria de
Kurt Lewin, destacando estratégias para o manejo do preconceito, do
autoritarismo e os perfis de liderança.

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Confira as indicações que separamos especialmente para vocês!

Para aprender mais sobre o papel da intervenção médica no espaço


urbano e na classificação racial da população brasileira, assista ao vídeo
“Psicologia - 50 Anos de Profissão no Brasil” no canal Conselho
Regional de Psicologia do RS no YouTube.

Para se aprofundar na teoria realista dos conflitos entre grupos, assista


ao vídeo “5 Minute History Lesson, Episode 3: Robbers Cave”, no canal
Cummings Center for the History of Psychology no YouTube. Veja como
Muzafer Sherif produziu e, posteriormente, resolveu a competitividade
entre grupos de pré-adolescentes no experimento Robber’s Cave.

Um dos experimentos mais famosos sobre obediência à autoridade, que


busca refletir sobre as razões do envolvimento da população alemã no
holocausto judeu, foi transformado em filme. Em Experimentos, dirigido
por Michael Almereyda em 2015, podemos entender um pouco mais
sobre o experimento e a biografia do psicólogo Stanley Milgran.

Assista ao vídeo “Stanford Prison Experiment 05”, encontrado no


YouTube, no qual há depoimentos de participantes do experimento. A
competitividade entre os grupos envolvidos é tão alta que a intervenção
sobre a relação entre os grupos se fez necessária.

Referências
BARROS, R. D.; JOSEPHON, S. C. A invenção das massas: a psicologia
entre o controle e a resistência. In: VILELA, A. M. J. et al. História da
psicologia: rumos e percurso. Rio de Janeiro: Nau editora, 2019.

CAMINO, L.; TORRES, A. R. R. Grupos sociais, relações intergrupais e


identidade social. In: CAMINO, L. et al. Psicologia Social: temas e
teorias. Brasília: Tecknopolitik, 2013.

FERNANDES, S. C.; PEREIRA, M. E. Endogrupo x exogrupo: o papel da


identidade social nas relações intergrupais. Estudos e pesquisa em
psicologia, Rio de Janeiro, v. 18, n.1, p. 30-49, 2018.

ROSE, N. Psicologia como uma ciência social. Revista Psicologia e


sociedade, v. 20, 2008.

SOARES, J. C. Escola de Frankfurt: unindo materialismo e psicanálise na


construção de uma psicologia social marginal. In JACO-VILELA, A.;
FERREIRA, A; PORTUGAL, F. (Orgs.). História da psicologia: rumos e
percursos. Rio de Janeiro: Nau Editora, 2008.

SPINK, M. J.; SPINK, P. K. A Psicologia Social na atualidade. In: VILELA,


A. M. J. et al. História da psicologia: rumos e percurso. Rio de Janeiro:
Nau editora, 2019.

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