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DA COMPETIÇAO
Novas idéias sobre competição enfatizam a vantagem competitiva, seu uso, valor,
ocorrência e impacto nas decisões dos executivos.
Modern ideas about competition emphasize competitive advantage, íts use, value, ocurrence
and impact on decision making.
'PALAVRAS-CHAVE: Há vinte anos o uso do termo vantagem agora vantagem competitiva. A partir de
Vantagem competitiva, perfil
competitivo, cluster, estratégia.
competitiva era simplesmente ocasional. O 1980, com a publicação do livro de Michael
termo dominante era concorrência, Hoje a Porter, Estratégias competitivas, o objetivo do
'KEYWORDS: planejamento das empresas com fins lucra-
Competitive advantage, compe-
situação está invertida. O termo forte é
titive profile, ciustet; strategy. tivos passou a ser único: aumentar a van-
tagem competitiva', Criou-se um radica-
lismo, A vantagem competitiva
é tudo e sem ela não se
tem "nada".
14 Revista de Administração de Empresas São Paulo, v. 35, n.1, p. 14-21 Jan ./Fev, 1995
A NOVA IDEOLOGIA DA COMPETIÇÃO
E isso ficou inquestionável para os pla- so, pois o problema não está definido de
nejadores. forma completa, faltando esclarecer o que
Em 1990, o mesmo Porte r abre novo a Cia. Sé da Zilva irá fazer com a nova
campo com o livro The competitive advantage vantagem competitiva. O quadro 2 mostra
of nations. O impacto das idéias desse livro os possíveis usos dessa nova vantagem.
sobre macro e microproblemas vem acon- Usos tão diferentes de uma nova vanta-
tecendo lenta e progressivamente. Elas gem competitiva mostram como podem ser
mudam muito os paradigmas anteriores diferenciadas as opiniões sobre o valor
sobre competição. Por isso, são de difícil dessa nova vantagem. Se a administração
assimilação. Por outro lado, o peso das decidir "desperdiçar" a vantagem compe-
evidências de pesquisas feitas em dez paí- titiva aumentando o tempo dedicado ao
ses elimina a possibilidade de rejeitar as lazer, aumentando as mordomias e dimi-
novas idéias. Essa mudança ideológica está nuindo o empenho no trabalho, quando a
sendo lenta mas inexorável. proteção da patente estiver terminando,
A mudança do uso do termo "concor- certamente a Sé da Zilva será uma empre-
rência" para "vantagem competitiva" não sa de valor menor que o de seus concor-
é apenas uma questão de preferência. Con- rentes. Se a administração decidir pelo
corrência é uma palavra mais usada para máximo crescimento, a Sé da Zilva poderá
salientar o lado negativo, enquanto vanta- liquidar com todos os concorrentes em
gem competitiva é uma expressão mais poucos meses e ter assim um valor altís-
adequada para salientar aspectos positivos, simo de mercado.
tendo um oposto bem claro, a desvantagem A vantagem competitiva é um "remé-
competitiva. Com palavras mais precisas, dio" muito forte. Pode ser usada para es-
novos conceitos ficaram mais fáceis de ser tragar a empresa ou levá-la ao pleno su-
identificados. Mas a lógica da competição cesso. Pode ser tão forte em relação aos
tem coisas estranhas: estamos habituados "remédios" usuais que estes, embora con-
à lógica dos valores absolutos, ao passo que tinuem sendo reconhecidos como bons, fi-
a lógica da competição é eminentemente
comparativa. O que impacta é ter ou não
uma vantagem competitiva, pouco impor- QUADRO 1
tando se o seu valor absoluto é grande ou
pequeno. Quanto vale hoje a Sé da Zilva?
Como a lógica dos fenômenos compa-
Até ontem:
rativos é mais complexa, achamos melhor
• eram 20 empresas iguais;
não nos atermos às discussões sobre lógi- • mesmo mercado, produto e tecnologia;
ca e partirmos para o exemplo de uma si- • todas com um só turno de produção;
tuação ideal de concorrência perfeita, que • vendiam US$ 1.000.000,00/mês cada uma;
nos leva a refletir sobre o valor de uma • lucravam 10% sobre as vendas;
vantagem competitiva. • tinham um valor de venda de US$
O exemplo não tem o objetivo de fixar o
8.000.000,00.
valor de uma vantagem competitiva. Em
Hoje, a empresa patenteou uma inovação que:
vez disso, serve para mostrar quanto cres- • melhora a qualidade;
ce o valor de uma empresa com uma nova • é protegida por cinco anos;
vantagem competitiva. Veja o exemplo do • não altera custo nem capacidade;
quadro 1. • os consumidores estão dispostos a pagar
Discutindo esse problema em muitos até 20% a mais.
seminários, verificamos que não houve
Pergunta-se:
consenso. No início das discussões em gru-
1. quanto vale a Sé da Zilva hoje?
po, supõe-se que o crescimento do valor 2. quanto vale um concorrente hoje?
da Cia. Sé da Zilva é muito pequeno; de- 3. qual seria o valor da Sé da Zilva se o prêmio
pois, predominam opiniões de crescimen- pela qualidade fosse de apenas
1. PORTER, Michael. Estraté-
to muito alto. 5% (em vez de 20%)? gias competitivas. Rio de Janei-
Não é de se estranhar a falta de consen- ro: Campus, 1986.
C.
lU.-
QUADRO 2
pesslbíllta uma vantagem COmpetitiva?,
titiva de melhor assistência técnica pós-
venda quando o usuário do produto já em
utilização não é a pessoa que decide a com-
pra para reposição?
1º CRESCER; Ao se falar em vantagem competitiva
2º MELHORAR a empresa para aprofundar a pode-se estar lidando com valores extre-
vantagem competitiva; mamente altos, como o exemplo da Cia. Sé
3º LUCRAR, aumentando preços e obtendo da Zilva sugere. O presidente de uma em-
maiores dividendos; presa ilustrou bem a questão do valor da
4º DESPERDiÇAR, criando desvantagens
vantagem competitiva com a seguinte fra-
competitivas (diferente de preços altos) só
para facilitar a vida dos administradores. se: "Decidi hoje investir um valor muito alto
para tentar conseguir uma nova vantagem com-
REGRA: Se não se optar por uma das três petitiva. Eu seria demitido se decidisse aplicar
primeiras possibilidades, logo a quarta a metade desse valor em melhoria operacional
possibilidade fica automaticamente instalada. com o dobro de justificativas".
Entretanto, não é pela dificuldade de fi-
xar o valor da vantagem competitiva que
cam esquecidos e o novo "remédio" forte não podemos fazer algumas generalizações
se torna consagrado. sobre ela, como as apresentadas no qua-
Isso ficou claro particularmente nos úl- dro 3.
timos cinco anos. Para os administradores Se folhearmos os livros sobre estratégia
serem eficazes, pensar em termos de van- empresarial, poderemos constatar a des-
tagem competitiva demonstrou ser muito preocupação em quantificar o valor das
mais valioso do que pensar em termos de vantagens e desvantagens competitivas.
custo I benefício, taxa de retorno de inves- Na prática do planejamento estratégico
timento, análise comparativa de custo, moderno, não temos notícia de nenhum
competição entre nações etc. As vantagens caso de estimativa do valor de uma vanta-
competitivas tornaram-se a base do pen- gem competitiva. O que temos é a preocu-
samento estratégico. As demais técnicas de pação de:
apoio à decisão são consideradas dignas
de respeito, porém deixadas em segundo explorar melhor as vantagens competiti-
plano. vas e minimizar os efeitos das desvanta-
Fica assim, extremamente importante, gens competitivas;
tanto para profissionais, como para acadê- mostrar que os estrategistas têm acerta-
micos de administração de empresas, en- do mais em suas recomendações que os
tender a lógica das vantagens competiti- financistas, preocupados com a taxa de
vas, seu valor, seu uso, sua ocorrência nas retorno sobre investimentos;
empresas. Vamos aprofundar as conside- mostrar que a vantagem de custo baixo
rações sobre o valor das vantagens com- em si não é vantagem competitiva por-
petitivas para, em seguida, abordar outros que o consumidor não percebe o custo.
aspectos. Já o preço baixo, que o consumidor per-
no aspecto científico, porém ficaria menos tar. Para o leitor culto e maduro, familiari-
prática. zado com as idéias tradicionais há dez anos
A formação de um clustcr se inicia pela ou mais, a tarefa de aceitar o que aqui foi
localização de algumas empresas do mes- colocado esbarra em uma grande dificul-
mo tipo em uma região. Segue-se um lon- dade: rearrumar todas as idéias correlatas
go processo de formação das demais con- sobre administração e economia que fica-
dições. O tempo de formação de ume/uster ram prejudicadas ou se tornaram incom-
não é medido em anos. É mais natural patíveis com a nova ideologia da com-
medi-lo em decênios, pela lentidão dos in- petitividade. Sem essa rearrumação, o
crementos necessários para completá-lo. administrador terá idéias em conflito.
Na competição entre empresas isoladas Os psicológos podem desenvolver am-
e empresas de um clusicr, já mencionamos plas considerações sobre esse conflito de
que fica fácil a vitória dessas últimas por
disporem de vantagens competitivas espe-
ciais. Isso é válido mesmo que o clusier es-
teja num estágio inicial de formação.
É necessária uma vantagem competiti-
va muito forte de uma empresa isolada
para que ela consiga sobreviver na com-
petição com um cluster.
Na competição entre dois ctusters, tem-
se uma guerra de gigantes. O clusier per-
dedor irá passar por um processo de de-
clustering, causando um profundo trauma
na região, devido ao fechamento de todas
as empresas do dusier que não consegui-
rem mudar de atividade. Os governos são
acionados para proteger um clusier em des-
vantagem por meio de barreiras comer-
ciais, reservas de mercado, subsídios etc.
Quanto mais umcluster satisfizer as dez
condições do modelo completo, tanto mais idéias, mas nós, por não sermos teóricos,
facilmente vencerá a competição com em- diremos apenas que um executivo com
presas isoladas ou com outro clusier em idéias em conflito tenderá a ser menos
estágio menos adiantado de formação. Por operante tanto com as novas idéias, que
isso, o critério para avaliar a competi- trouxeram perturbação, quanto com as
tividade de um clusier é simplesmente velhas idéias, que ficaram perturbadas.
avaliar o grau de satisfação das dez condi- Portanto, esse assunto é gravíssimo.
ções. O impacto das novas idéias sobre com-
Baseado nessa análise, se o governo, ou petitividade é ao mesmo tempo amplo e
qualquer siakeholder desejar promover o profundo. Amplo porque mexe com quase
desenvolvimento econômico, o meio natu- tudo, desde a administração de supri-
ral é identificar o que falta para completar mentos até markeitng, e dá alento a meto-
o clusier, e que possa ser feito a curto ou dologias novas, como a reengenharia. Pro-
médio prazos. fundo porque obriga a visões radical-
mente novas dos problemas existentes
nas empresas (novas teorias de produção
e finanças, por exemplo) e nas políticas
de promoção do desenvolvimento econô-
Para um leitor jovem ou iniciante nas mico.
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questões de competitividade, as idéias
apresentadas, depois de entendidas, parc- 0950102
cerão simplesmente lógicas, facéis de acei-
Artigo recebido pela Redação da RAE, avaliado e aprovado para publicação em janeiro/95. 21