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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS

PROVA PARCIAL

Disciplina: Filosofia da Mente

Professor: Roberto Márcio Starling

Nome: Tiago José Quadros Pereira

Matrícula: 724523

1) Resuma a posição de Searle sobre a consciência como problema biológico.


John Searle, em sua obra O mistério da Consciência, discute no primeiro capítulo
(intitulado A Consciência como um problema biológico) o conceito de consciência e
propõe uma análise científica desse fenômeno. O autor inicia trazendo aquilo que seria a
definição de “consciência” no senso-comum:
“Consciência” se refere àqueles estados de sensibilidade e ciência que
começam normalmente quando acordamos de um sono sem sonho e continua
até que durmamos novamente, caímos em coma, morremos ou ficamos
“inconscientes”. (...) A consciência, assim definida, é um fenômeno interno
qualitativo de primeira pessoa. Os seres humanos e animais superiores são
evidentemente conscientes, mas não sabemos até onde a escala filogenética da
consciência se estende (Searle, 1998, p. 33)”.

Nesse trecho, Searle sugere que a consciência está relacionada à capacidade de


estarmos conscientes de nossa própria existência, de perceber o mundo ao nosso redor e
de estar cientes de nossos pensamentos, sensações e emoções. Esses estados de
consciência são experienciados de maneira subjetiva, ou seja, são qualitativos e
pertencem à perspectiva da primeira pessoa. Além disso, ele destaca que os seres humanos
e animais superiores são claramente conscientes, mas não temos conhecimento sobre a
extensão da consciência em outras formas de vida ao longo da escala filogenética.
Ao longo do capítulo, Searle aborda um dos problemas mais tradicionais ligado à
consciência: a dualidade corpo-mente (herança cartesiana). O filósofo acredita que se faz
necessário abandonar o dualismo a partir do pressuposto de que “a consciência é um
fenômeno biológico comparável com ao crescimento, à digestão ou à secreção da bílis”
(Searle, 1998, p. 34). Um primeiro recurso utilizado pelo autor para contornar o problema
cérebro-mente reside no fato que, para ele, o cérebro possui uma propriedade intrínseca
que é a consciência:

A propósito, a análise de que os processos cerebrais causam a consciência, mas


que a consciência, propriamente dita, é uma ‘propriedade’ do cérebro, fornece
uma solução ao tradicional problema corpo-mente. Uma solução que evita
tanto o dualismo quanto o materialismo, ao menos tais como são
tradicionalmente concebidos. (Searle, 1998, p. 35)

Outro recurso que o autor nos propõe para contornar a dualidade cérebro-mente
reside na causalidade de processos e não de entidades. O cérebro e a consciência não são
entidades separadas; pelo contrário, possuem uma relação de causa e efeito. Porém, não
se trata de uma relação de causa e efeito entre coisas distintas, já que a consciência, por
se apresentar como propriedade intrínseca do cérebro, faz com que não se trate de uma
realidade dual, mas sim unificada.
Segundo Seatle, embora a consciência seja inseparável da atividade cerebral,
reduzi-la apenas ao cérebro é insuficiente para uma compreensão completa desse
fenômeno. Nessa perspectiva, a consciência não pode ser explicada de maneira
satisfatória apenas pelos processos neurais, mas precisa ser analisada em um nível mais
amplo que inclua uma ótica biológica e experimental:

Uma terceira dificuldade em nossa atual situação intelectual é que não temos
qualquer ideia de como os processos cerebrais, que são fenômenos objetivos
publicamente observáveis, poderiam causar algo tão peculiar quanto estados
internos qualitativos de ciência e sensibilidade, estados que são em um certo
sentido “particulares” àquele que os possui (Searle, 1998, p. 35).

No que diz respeito à experiência subjetiva associada à consciência – denominada


qualia –, ele argumenta que a qualia é uma característica fundamental da consciência e
que não pode ser reduzida ou explicada puramente em termos objetivos. A experiência de
cor, por exemplo, não pode ser totalmente compreendida apenas pelos processos neurais
que ocorrem no cérebro. Essa é uma das questões centrais da obra, tendo em vista que
Searle pretende analisar a consciência que leve em consideração esses aspectos
subjetivos.
Ademais, o autor faz uma crítica àquelas abordagens teóricas da consciência que
tentam reduzi-la a processos computacionais. Para ele, embora as teorias computacionais
possam explicar alguns aspectos da mente, elas não podem explicar completamente a
consciência: “a quarta dificuldade é peculiar ao nosso momento intelectual e diz respeito
ao desejo em se tomar, de uma forma muito literal, a metáfora da mente como um
computador” (Searle, 1998, p. 36). Um computador é uma ferramenta útil para fazer
simulações da mente, contudo é apenas um equipamento que manipula símbolos formais,
codificando e traduzindo informações (em código binário) através de impulsos elétricos:

Mas, sabemos, por experiência própria, que a mente consiste em algo mais do
que a mera manipulação de símbolos formais. A mente tem conteúdos. (...) A
mente não poderia ser apenas um programa de computador, já que os símbolos
formais do programa de computador, tomados isoladamente, não são
suficientes para garantir a presença do conteúdo semântico que ocorre na
mente (Searle, 1998, p. 37-38).

Por fim, para sustentar sua posição, Searle traz O Argumento do Quarto Chinês a
fim de refutar a tese de que “a mente é apenas um programa de computador” (nominada
pelo autor como “Inteligência Artificial Forte” – IA Forte). Nessa perspectiva, a sintaxe,
isto é, o conjunto de símbolos, não é intrínseca à física do sistema computacional, mas é
relativa ao observador ou usuário: “você jamais poderia descobrir processos
computacionais na natureza sem a interpretação humana, pois qualquer processo físico
que você encontrasse seria computacional apenas em relação a alguma intepretação
(Searle, 1998, p. 43)”. Desse modo, a semântica não é inerente à sintaxe, já que esse
último não é inerente à física: “os impulsos elétricos são independentes do observador;
mas, a interpretação computacional é relativa aos observadores, usuários, programadores,
etc” (Searle, 1998, p. 43).
2) Para Popper o paralelismo linguístico é defensável? Justifique.

Segundo essa teoria, existem duas linguagens ou dois modos de falar sobre a
realidade. Entende-se aqui o mundo e realidade como unos. As duas maneiras de falar
sobre essa realidade é trata-la como física e mental. Em outras palavras, essa teoria
postula que os aspectos formais e estruturais da linguagem são paralelos aos aspectos
formais e estruturais da realidade.
Popper acredita que essa teoria está muito ligada ao monismo neutro. Nessa
perspectiva, os monistas neutros afirmam que há uma só realidade, negando a existência
da separação corpo-mente. O ponto principal dessa abordagem é o de que

o mundo físico e o mundo mental são construções teóricas feitas a partir de um


determinado material, e que as várias entidades pertencentes a estes mundos
são também construções teóricas deste determinado material (Popper, 1996, p.
250).

Assim sendo, a crítica de Popper ao paralelismo linguístico se concentra


justamente na seguinte aporia: “a impossibilidade de uma comunicação cruzada entre
uma linguagem mentalista e fisicalista” (Popper, 1996, p. 255). Essa crítica de Popper
pode ser compreendida em seu contexto mais amplo do pensamento falsificacionista.
Popper defende que uma teoria científica deve ser passível de testes e refutação empírica,
o que requer a capacidade de descrever e explicar a interação causal entre eventos. No
entanto, a abordagem do paralelismo linguístico, ao afirmar que apenas temos acesso a
linguagens físicas ou neurais, limita essa capacidade e restringe a descrição causal.
Ao restringir o universo linguístico a apenas linguagens físicas ou neurais,
limita-se, também, a compreensão da interação corpo-mente. Para Popper, essa limitação
não permite uma análise adequada da complexidade das interações causais e não permite
que sejam formuladas hipóteses testáveis e passíveis de refutação; daí o porquê dessa
teoria não ser defensável:

A atitude do paralelismo linguístico para com o problema corpo-mente é,


novamente, a de que a interação é impossível. Ela é impossível porque a ação,
causal deve ser descrita em uma linguagem, e nós, só dispomos ou de uma
linguagem física ou de uma linguagem neural (Popper, 1996, p. 255).

3) Analise a passagem do Fédon na qual Sócrates diz o motivo pelo qual encontra-se
na prisão à luz do paralelismo linguístico.

Nesta passagem de Fédon (98e – 99a), Sócrates faz afirmações acerca da mente,
as razões e as ações de seu corpo no espaço-temporal [na ocasião a prisão], relacionando
a razão ou inteligência e as causas do que realizara. O trecho é considerado uma
explicação causal do Mundo 1 (termos de causas físicas) em termos de explicações das
intenções, fins, motivos, razões e valores a serem realizados (envolvimento do Mundo 2
com o Mundo 3). No trecho em destaque, Sócrates possuía o desejo de não violar as leis
de Atenas (que o havia condenado a morte), considerando que as explicações de uma ação
responsável ou proposital seria irrelevante:
Assim como o caminho que Sócrates faz para encontrar a relação do mundo físico
com o mundo mental, Popper desenvolve seu pensamento em cima do paralelismo
linguístico, e apresenta três versões sobre ele: numa primeira versão (com duas
linguagens) existiriam dois diferentes tipos de vocabulários, usados na mesma linguagem,
mas não obstante, pode-se claramente distinguir duas classes de palavras (físicas ou
mentais); numa segunda versão existem dois vocabulários, porém dois conjuntos de
conceitos que possui significados quando nos respectivos contextos teóricos; e na terceira
versão duas linguagens são consideradas como metáfora para indicar que se um homem
fala sobre corpos, e um outro fala sobre mentes, não poderão comunicar-se entre si.
A partir dessa relação dos mundos, vemos que, para o paralelismo linguístico,
existe apenas um mundo e uma realidade. Contudo, existem duas maneiras de falar sobre
esta realidade única: tratá-la como física e a outra como mental, ou seja, dois sistemas de
linguagens para falar da mesma realidade. Na passagem do Fédon, vemos que há essa
relação física e mentalista, só que cada uma compreende um mundo para o entendimento
do “eu”.
A partir dessa mistura de linguagens, podem surgir pseudo-problemas, ou seja,
pode-se não alcançar uma outra linguagem desejada ou até afirmações que não respondem
aos questionamentos propostos. Isso se relaciona com o pensamento que Sócrates trouxe
na passagem descrita acima, no qual, a partir dessa mistura, não se pode dizer que ele foi
preso, pois as suas pernas não o desviaram desse caminho – não o desviaram para fora
dela.

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