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CENTRO UNIVERSITÁRIO FARIAS BRITO

CURSO DE DIREITO

OS ASPECTOS DA CELEBRAÇÃO DOS CONTRATOS DE LOCAÇÃO POR


TEMPORADA FIRMADOS EXCLUSIVAMENTE POR APLICATIVOS DE
MENSAGENS INSTANTÂNEAS.

DAVID FELIX DE LIMA

FORTALEZA

2023
CENTRO UNIVERSITÁRIO FARIAS BRITO

CURSO DE DIREITO

OS ASPECTOS QUE ASPECTOS? MAIOR ASSERTIVIDADE DA CELEBRAÇÃO


DOS CONTRATOS DE LOCAÇÃO POR TEMPORADA FIRMADOS
EXCLUSIVAMENTE PRECISA DO EXCLUSIVAEMTE ?POR APLICATIVOS DE
MENSAGENS INSTANTÂNEAS.

David Felix de Lima

Monografia apresentada ao curso de Direito do


Centro Universitário Farias Brito como critério
parcial para a obtenção do grau de Bacharelado
em Direito.

Orientadora: Professor Ms. Marcel Mota

Fortaleza

2023
Esta monografia foi submetida ao curso de Direito do Centro Universitário
Farias Brito como parte integrante dos requisitos necessários para a obtenção do
grau de Bacharel em Direito. Na avaliação este trabalho obteve o conceito
___________________________________ conferido pelos avaliadores da banca e
outorgado pelo referido Centro Universitário.

A citação de qualquer trecho desta monografia é permitida, desde que seja


feita de acordo com as normas científicas.

___________________________________
David Felix de Lima

Banca Examinadora:

____________________________________
Prof. Dr. Marcel Mota
ORIENTADOR

____________________________________
Prof. Ms. xxxxxxxxxxxxxxx

____________________________________
Prof. Dr. xxxxxxxxxxxxxxx
Monografia avaliada em xx de dezembro de 2023
RESUMO FORMATAÇÃO INADEQUADA – FALTOU FALAR DO TIPO DE PESQUISA
E A PROPRIA FORMATAÇÃO E QUAL PROBLEMA DE PESQUISA?

O presente trabalho tem como objetivo geral analisar os aspectosda celebração de


contratos de locação por temporada firmados exclusivamente por meio de aplicativo de
mensagens instantâneas, bem como fazer uma análise comparativa COM O QUE? com a
formação do contrato na plataforma digital do AIRBNB.

A importância de entender tais aspectos relacionados a celebração de contratos de


locação por temporada por meio de aplicativos de mensagens instantâneas se dá pela
contemporaneidade das questões ligadas ao direito digital, diretamente ligadas ao direito
contratual e a lei do inquilinato, para verificar a segurança jurídica desta relação contratual.

Por fim, analisaremos julgados do Superior Tribunal de Justiça, considerados


relevantes com a pertinência temática aqui explorada referente aos aspectos da validade
jurídica dos contratos de locação por temporada firmados por meios digitais.

Palavras-chave: Locação por temporada, lei do inquilinato, Direito contratual, Direito Digital,
Sumário

1. INTRODUÇÃO.................................................................................................................6

2. CAPÍTULO 1 – TEORIA GERAL DOS CONTRATOS - ASPECTOS LEGAIS E


DOUTRINÁRIOS.............................................................................................................8

2.1. Prévias Conceituais...........................................................................................................8

2.2. Da Classificação do Contrato de Locação por Temporada.............................................11

2.3. Contrato entre Presentes ou entre Ausentes na Locação por Temporada.......................15

2.4. Da Locação por temporada:.............................................................................................18

2.5. Da Locação por temporada via Airbnb...........................................................................20

2.6. A Locação por Temporada e o contrato por adesão........................................................22

3. CAPÍTULO 2 – O DIREITO DIGITAL.........................................................................25

3.1. Historicismo Tecnológico: uma Abordagem Pragmática................................................25

3.2. O Direito Digital como Ramo do Direito........................................................................28

3.4. A Formação do Contrato e o Código De Defesa Do Consumidor..................................34

4. CAPÍTULO 3 – DOS JULGADOS RELEVANTES DO STJ SOBRE O ASSUNTO...37

4.1. Recurso Especial 1.819.075/RS......................................................................................39

4.2. Recurso Especial 1.495.920/DF......................................................................................43

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS..........................................................................................47

REFERÊNCIAS........................................................................................................................50
6

1. INTRODUÇÃO

Este trabalho tem como mote o estudo dos aspectos da celebração dos contratos de
locação por temporada, firmada exclusivamente por meio de aplicativos de mensagens
instantâneas.

Quando falamos em locação por temporada, de imediato nos vem a mente as


plataformas digitais como AIBNB, BOOKING. O uso de tais aplicativos, impõe custos a
ambas as partes que estão a negociar sendo esse custo a comissão por intermediação. Para
economizar com as taxas e comissões cobradas pelos aplicativos, locatários buscam, em
muitos casos, tratar diretamente com o titular de um anúncio que viu no aplicativo, por
meio de telefone, aplicativo de mensagens instantâneas, que tem se consolidado como
meio mais usado, para comunicação no Brasil. Importante frisar que locador e locatário,
precisam ser diligentes o bastante independente da forma que o contrato é firmado, pois a
lei 8245/91, art. 49; autoriza o locador receber o valor integral e de forma antecipada
locação, bem como encargos. É aí o terreno fértil para golpistas.

Consideramos ser extremamente relevante ao longo deste trabalho uma análise


comparativa entre as duas formas de se firmar contrato de locação por temporada, por isso
haverá diversas inserções de como essa relação ocorre no aplicativo AIRBNB, por
considerá-lo o mais usado para tal.

Nesse alugar “por fora” que se dá toda a negociação de uso, valores, período, que
normalmente ocorre por aplicativo de mensagens instantâneas. Essa modalidade de por
fora que se constrói a relação contratual objeto de análise do presente trabalho. A validade
jurídica do negociado, dentro do princípio do direito civil de liberdade contratual.

A locação por temporada sempre existiu, porém com o surgimento das plataformas
digitais de locação, cresceu exponencialmente, entrou em evidência e tem criado muita
controvérsia,seja com o setor hoteleiro, seja em demandas judiciais relacionadas ao direito
condominial, que começam a criar precedentes importantes, face a clara omissão
legislativa.

As controvérsias acima mencionadas giram em torno de como se classifica a


locação via aplicativos, se é contrato de hospedagem (contrato atípico) ou contrato de
7

locação por temporada (contrato típico). Fato esse que tem chamado a atenção das Ciências
Jurídicas, que tem cumprido seu papel e se debruçado sobre o problema e produzido vasto
material acadêmico.

No primeiro capítulo, faremos um apanhado teórico sobre a teoria geral dos


contratos de locação por temporada, de acordo com sua classificação doutrinária, bem
como uma análise comparativa da locação por temporada firmada por aplicativo de
mensagens instantâneas com a formação do contrato por meio da plataforma digital
AIRBNB.

Não entraremos na discussão se a locação por aplicativo se enquadra em


hospedagem ou em locação, por entender claramente que a locação de imóvel completo é
considerada locação por temporada nos moldes do artigo 48 da lei 8245/91. O fato dos
aplicativos se apropriarem de conceitos como “hospede” , “anfitrão”, check in; check out;
termos normalmente usados em hospedagens da rede hoteleira em nada muda a substância
da relação jurídica da locação por temporada, exceto que se junto ao serviço de locação em
sua espécie também for oferecido o serviço de concierge1.

No segundo capítulo, contextualizaremos o direito digital, a partir


dodesenvolvimento (ERRO DE ORTOGRAFIA) tecnológico, através de abordagem
historicista pragmática, pois as literaturas acessadas sobre o assunto remetem ao mesmo
fato histórico do desenvolvimento tecnológico. Em um segundo momento, analisaremos
comoas (PALAVRA JUNTA – CORRETOR ORTOGRAFICO) tecnologias tem
influenciados nas relações privadas, especificamente no setor de locação por temporada,
pois propiciam um bom ambiente de negócios, seja por meio de aplicativos de mensagens
instantâneas, e-mail ou mesmo aplicativos específicos destinados a locação de imóveis por
temporada como Airbnb, Booking e outros.

Por fim, pesquisaremos (NOS?) 3 PESSOA? decisões do Superior Tribunal de


Justiça consideradas pertinentes a temática abordada, para compreender como esta Corte

1
Concierge é um termo da língua francesa e que pode ser traduzido literalmente como “porteiro” para o
português. O concierge é um cargo comum no ramo hoteleiro, consistindo na função do profissional
responsável por atender as necessidades básicas e especiais dos hóspedes. Entre as principais funções do
concierge de hotel está o controle de entrada e saída dos hóspedes, além de prestar serviços personalizados
para os mesmos, como compra de passeios, aluguel de automóveis, indicação de bons restaurantes e pontos
turísticos na cidade para visitação, entre outras coisas. https://www.significados.com.br/concierge/
8

Superior tem decido casos em matéria relacionadas ao direito digital e locação por
temporada.

2. CAPÍTULO 1 – TEORIA GERAL DOS CONTRATOS - ASPECTOS


LEGAIS E DOUTRINÁRIOS

2.1. Prévias Conceituais

Diariamente firmamos (3 PESSOA)? inúmeros contratos, seja no posto de gasolina


para abastecer o carro, na borracharia ao pedir ao borracheiro para consertar o pneu do
veículo, na padaria, na lanchonete e de tão natural que é não nos damos conta que estamos
o tempo todo estabelecendo relações jurídicas . (ACHEI O PARAGRAFO COM FALA
USUAL)

Falar de formação do contrato sem passar pela teoria Ponteana da existência,


eficácia e da validade do negócio jurídico, seria como que faltasse a corrente da bicicleta,
FALA USUAL)ou seja, pois por mais tecnológico, por mais moderno, por mais atual que
seja o tema, ele possui uma base teórico acadêmica que não pode passar despercebida.

O artigo 104 do Código Civil deixa claro os elementos necessários a formação dos
contratos, quais sejam: agente capaz, objeto lícito, possível e determinado e forma prescrita
ou não defesa em lei.

O que há em comum entre os autores até aqui pesquisados de corrente ideológica


voluntarista, são as categorias: manifestação de vontade, boa-fé objetiva, encontro de
vontades e que nas palavras de GAGLIANO:

Sem pretender incorrer em erros, entendemos que o contrato é um negócio


jurídico por meio do qual as partes aderentes, limitadas pelos princípios da
função social e da boa fé objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimonialistas
que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias vontades.
(GAGLIANO, 2023, p.63)

A definição de contrato para a doutrina entende-se bastante consolidada nestes


aspectos principiológicos, acima mencionado, emboracom (GRAFIA JUNTA) literalidade
diferentes, mas que chegam no mesmo destino. Completa ele,“contrato sem vontade não é
9

contrato” (GAGLIANO, 2023, p.107). Da mesma forma AZEVEDO (2004, p.18) traz em
seu conceito a “acomodação de interesses”.

Imaginemos que um locador receba uma consulta de data para hospedagem de um


determinado período, via aplicativo de mensagem instantânea, num primeiro momento irá
verificar disponibilidade, informar valores e regras de uso do imóvel negociado. Percebe-
se aqui que o contrato começou a ser modelado com a conversa e vem se formando à
medida que a outra parte vai concordando com o que está sendo discutido, mas sem
nenhuma vinculação entre as partes que as obriguem a fechar o negócio sendo que de um
lado o locatário pretende tirar o melhor proveito econômico da situação enquanto o locador
espera conseguir a melhor oferta para sua viagem.

Tecnicamente ao que foi descrito acima, estamos diante do que leciona TARTUCE
(2018) PAGINA?, que divide para fins didáticos a formação do contrato em 4 fases: Fase
de negociação preliminar ou pontuação, fase de proposta,policitação ou oblação; fase do
contrato preliminar e fase do contrato definitivo.

Interessante destacar que essas fases podem acontecer de forma muito rápida, indo
da primeira fase a última em alguns minutos, como também a formação do contrato pode
levar dias, meses ou anos até a conclusão.

Na primeira fase, a característica básica é a ausência de vinculação entre as partes,


ocorrendo esclarecimentos de dúvidas quanto ao que está sendo negociado, quanto a região
onde está situado o imóvel, se é permitido animais e outras dúvidas de forma a maturar à
vontade entre as partes. Tanto TARTUCE (2018), quanto DINIZ (2018), PAGINA?
defendem que a vinculação pode ocorrer se pressupostos doutrinários não estiverem
presentes neste momento, conforme transcrito abaixo:

As negociações preliminares nada mais são do que convenções, prévias,


sondagens e estudos sobre os interesses de cada contratante, tendo em vista o
contrato futuro, sem que haja qualquer vinculação entre os participantes.
Deveras, esta fase pré-contratual não cria direitos nem obrigações, mas tem por
objeto o preparo do consentimento das partes para a conclusão do negócio
jurídico contratual, não estabelecendo qualquer laço convencional. (TARTUCE
apud DINIZ, 2018, p. 148)

Defendem estes dois autores que a ausência de responsabilização na fase de


puntuação é mitigada pelo dever ético dos contratantes e da boa-fé objetiva, os deveres
anexos, que uma vez rompida essa base é possível a responsabilização civil.
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Na segunda fase, a proposta, policitação ou oblação, tem como característica


elementar a vinculação do policitante (aquele que faz a proposta) com o oblato (que recebe
a proposta), tornando-se assim aceitante, podendo assim, gerar o dever de responder por
perdas e danos. No tópico 1.4 deste capítulo, falaremos sobre uma característica essencial
na formação dos contratos de locação por temporada para que essa vinculação entre as
partes possa ocorrer.

Havendo contraproposta, os papéis são invertidos, pois quem antes era policitante
se torna oblato.

Vencida esta etapa, é forçoso que o locatário tenha o cuidado de saber com quem
está negociando, pois por trás de uma tela (computador ou celular) uma pessoa pode ser
qualquer pessoa, num ambiente virtual. Deve o locador exigir uma foto do documento de
identidade, CPF e comprovante de endereço. Sugiro que no mínimo requeira do
pretendente locatário os dados previstos no artigo 319, inciso II do Código de Processo
Civil, para caso haja necessidade de demandar judicialmente, tais informações já estão a
mão. Esse procedimento prévio é importante para que se tenha certeza que o negócio que
ele está se formando seja eficaz, exista no plano jurídico. Sendo confirmada a eficácia do
negócio, salta-se para o plano da validade: essa negociação é válida? De acordo com Nader
o contrato de locação: “não se trata de contrato formal ou solene, pois a forma é livre, as
partes podem optar por instrumento público ou particular ou então pela oralidade”.
(NADER, 2018, p. 291)

A terceira fase, como leciona, TARTUCE (2018)o contrato preliminar, descrito


como novidade pelo Código Civil 2002, não é obrigatório entre as partes, exceto naquelas
espécies de contrato onde se quer atribuir mais confiabilidade ao negócio jurídico, o que
não é o caso dos contratos de locação por temporada. Não há nada que impeça a aplicação
deste tipo de contrato, já que estamos falando de duas pessoas que não se conhecem, nunca
se viram, mas que negociam tranquilamente por meio de aplicativos de mensagens
instantâneas direitos e obrigações, em conformidade com a autonomia privada.

Por fim, afase do contrato definitivo, que como o nome já diz é o momento em que
o contrato se torna formado, respeitadas todos os requisitos da escada ponteana de
existência, validade e eficácia necessárias para a produção de efeitos, que no caso
específico da locação de temporada, o contrato definitivo tem como cláusula padrão o
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pagamento na assinatura do contrato, da reserva do período estipulado o bloqueio das datas


no calendário o pagamento da totalidade do valor negociado antecipadamente, conforme
permissivo legal da lei do inquilinato. (FALTANDO VARIAS PONTUAÇÕES

Uma vez cumpridas as condições para a consolidação do contrato definitivo, está


assim aperfeiçoado o contrato, gerando direitos e obrigações e pelo não cumprimento pode
ocorrer a responsabilização do devedor por perdas e danos nos termos do artigo 389 (DE
ONDE? e demais despesas que dela resultar.

2.2. Da Classificação do Contrato de Locação por Temporada.

O estudo da classificação dos contratos se faz necessário para dissecá-los para que a
Ciência do Direito possa sistematizar didaticamente, conforme GAGLIANO, (2021, p.263)
leciona que o estudo das classificações denota uma necessidade pedagógica, de
“agrupamento por similitudes”. Conceito este que muito se assemelha ao de NADER,
(2018, p.45), quando diz que a importância da classificação dos contratos é necessária para
“reduzir a categorias jurídicas singulares”, onde sua utilidade se dá acompreensão das
espécies contratuais, enquanto TARTUCE (2021, p.21) chama de “fulcral importância” os
estudos das classificações das espécies contratuais.

Doutrinariamente, os autores aqui pesquisados, NADER, GAGLIANO, DINIZ,


TARTUCE, denotam estar alinhados com as categorias conceituais estabelecidas para o
estudo das espécies contratuais. A seguir descreveremos tais categorias contratuais e o
enquadramentodo contratode locação por temporada nestas categorias. A estrutura didática
montada em tópicos pelos autores pesquisados é por demais importante nesse processo de
compreensão.

A primeira categoria trazida diz respeito ao contrato bilateral ou sinalagmático, pois


para que ocorra um contrato de locação por temporada há a necessidade de pelo menos
duas partes ou pessoas pode-se dizer no caso estudado, pois por mais que durante o período
de estada, o local seja ocupado por um grupo de pessoas, uma delas se incumbirá a
responsabilidade perante o locador, com a seguinte estrutura sinalagmática: uma pessoa
que possui um imóvel disponível para locação (locador) e outra pessoa interessada em
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pagar o preço para se hospedar neste imóvel (locatário) por haver entre as partes
obrigações recíprocas constituindo-se entre as partes direitos e obrigações.

A segunda característica do contrato aqui estudado é a de que o contrato de locação


por temporada é um contrato oneroso por haver uma prestação e contraprestação a ser
cumprida, o que TARTUCE (2018) chama de “sacrifício patrimonial”(p.21). A vantagem
recíproca é elemento essencial para que assim se conceitue, caso contrário, se um cede o
imóvel a outro sem uma contraprestação o enquadramento deve ser outro, comodato ou
doação, empréstimo por exemplo.Aos contratos onerosos aplicam-se uma subcategoria
chamada de comutativo que está diretamente relacionado aos riscos do contrato.

A comutatividade contratual está ligada a onerosidade e nas palavras de NADER,


(2018, p.43) conceitua como:“equivalência presumida do valor das prestações”, ou seja,
ambas as partes da relação contratual, sabemjá na fase de puntuação, mediante toda a
discussão preliminar para o encontro de vontades a certeza do caráter determinado da
obrigação. TARTUCE, (2018, p. 23) cita o contrato de locação como exemplo de
comutatividade contratual: “pois as partes sabem o que será cedido e qual o valor do
aluguel”.

Os contratos de locação por temporada são considerados contratos típicos ou


nominados, pois existe uma lei que o regula. A lei 8.245/91, popularmente conhecida como
lei do inquilinato, estando o conceito legal tipificado no artigo 48, seção II – Das Locações
por Temporada. Dedicamos no tópico 1.4 deste trabalho a conceituação mais criteriosa
sobre outras características doutrinárias da locação por temporada.

Na obra de GAGLIANO, (2023), defende que o contrato de hospedagem é contrato


atípico conforme transcrição:

Vale salientar, aqui, que o Superior Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de


que o contrato para a cessão de uso onerosa de imóvel por meio de aplicativo ou
plataforma digital, a exemplo do AIRBNB, consiste em hospedagem atípica.
(GAGLIANO, 2023, p.332)

Com o devido respeito ao eminente professor e como já colocado acima, uso de


uma terminologia para nomear locatário como hospede em nada desnatura a essência do
negócio jurídico. Veremos no capítulo 3 o posicionamento do eminente Ministro Antônio
Carlos Ferreira2 que está alinhado ao que defendemos no quesito de enquadramento
2
Recurso Especial. 1819.075/RS
13

jurídico da locação de temporada por meios digitais de forma genérica. (ACHEI


EXCELENTE O PARAGRAFO)

A plataforma digital AIRBNB, permite a locação de imóveis inteiros para uso


exclusivo de um grupo específico, como permite que o anfitrião alugue um cômodo de sua
residência, além da possibilidade do oferecimento de outros serviços. A controvérsia entre
como se enquadra a atividade do AIRBNB pode ser tratado como do tipo misto, (híbrido),
a depender do caso concreto. Ora como locação de temporada, ora como hospedagem.

O que ocorre hoje com a locação por temporada via AIRBNB, é que essa
plataforma conseguiu confluir locadores e locatários para, neste ambiente, construir uma
grande vitrine de alcance mundial e consequente balcão de negócios o que mexeu no
mercado hoteleiro de tal maneira que estes o consideram concorrência desleal e em muitas
cidades pelo mundo e no Brasil não tem sido diferente, tem tentando mudar o
enquadramento jurídico desta modalidade de contrato de locação para hospedagem, tratado
por leis distintas. NADER, (2018) leciona:

Determinados tipos de negócios jurídicos, quando se generalizam e ganham


intensidade no tráfico jurídico, devem necessariamente ser objeto de disciplina
legal. A doutrina e a jurisprudência preparam as condições básicas para a criação
de tipos contratuais a serem consagrados nos códigos. Antecedendo, ainda à
criação legislativa, estão os chamados usos e costumes, que vão se formando
engenhosamente, por obra dos que participam dos atos negociais. Os fatos
sociais antecedem a lei. Os contratos eletrônicos são a ordem do dia, são um
exemplo disso. (NADER, 2018, p. 48-49)

Seguindo com a nossa classificação do contrato de locação por temporada,


abordamos agora quanto ao momento de aperfeiçoamento deste contrato, concordando
NADER (20218) e TARTUCE (2018), afirmo que concordam porque citam o gênero
locação como consensual, sendo que a locação por temporada é espécie deste. É
consensual, pois dependem “exclusivamente da manifestação de vontade das partes
envolvidas” (NADER, 2018, p. 22) importante o complemento tecido por NADER, (2018)
como sendo “reunião de vontades, in casu, tem a força de enlaçar as partes, estabelecendo
vínculo obrigatório”.

https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?
componente=ATC&sequencial=125643759&num_registro=201900606333&data=20210527&tipo=2&forma
to=PDF
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No que tange ao quesito principais e acessórios, NADER (2018) faz uma crítica a
essa classificação, pois muitas espécies contratuais são únicas e em si mesmo, ou seja, se
não existe um contrato acessório é impossível falar em contrato principal e vice-versa,
sendo a expressão mais adequada a ser usada é dependência ou independência.

A lei do inquilinato estabelece a possibilidade de exigência de qualquer garantia


locatícia do artigo 37, conforme prescreve o artigo 49. Normalmente isso não é praticado,
pois pela natureza curta do contrato de locação por temporada, exigir uma garantia
locatícia dificultaria a rotatividade da locação do imóvel aumentando sua vacância. O
costume neste caso como já mencionado é a possibilidade de receber antecipadamente os
valores referentes aos aluguéis acordados, bem como encargos.

Importante abrir um parêntese para uma breve abordagemsobre o verbo “ poderá”


constante no artigo 49da lei. Etimologicamente o verbo poderá, estabelece uma
possibilidade, não há imperatividade em sua essência, porém a prática do mercado nos leva
a interpretar esse verbo como o imperativo deverá, pois sem o recebimento antecipado dos
valores acordados na fase de policitação não há formação de contrato e não há garantia de
recebimento a posteriori. O risco de inadimplência é inteiramente assumido pelo locador
do imóvel se ele assim o alugar, face a transitoriedade desta relação jurídica. (MJUIO
INTERESSANTE)

Como há também o risco de perda de uma chance (EXCELENTE ABORDAGEM)


de locação do imóvel para outro promissário locatário, por desistência deste, que sem
garantia e sem recebimento de valores antecipados fica até difícil exigir multa contratual,
que deverá ser requerida em uma ação de cobrança se o locador tiver ao menos sido
diligente para ter requerido os dados pessoais e assim poder propor a ação.

Aos contratos de locação por temporada, normalmente atribui-se característica do


momento de cumprimento como sendo diferida, ou seja, o locatário planeja uma viagem
com antecedência, procura um imóvel que o agrada em um sitio eletrônico, uma rede
social, uma indicação e estando de acordo com as suas possibilidades o reserva. A
antecedência visa garantir preços melhores, sendo a execução do contrato de uma vez só
no futuro. É possível em raros casos a ocorrência de locação instantânea, onde o locatário
procura um imóvel para hospedagem imediata, porém dificilmente encontrará vantagens
ocorrendo essa modalidade de locaçãomais por necessidade.
15

Quanto a personalidade, a espécie de contrato aqui abordada não é necessariamente


um contrato personalíssimo, conforme estabelece o artigo 13 da lei 8.245/91, podendo o
responsável pela locação nem ao menos usufruir da reserva, locando para um parente,
amigo, filho usufruir. Bom lembrar que essa situação deve ser informada ao locador tão
logo comece a puntuação, pois há locadores que não aceitam essa situação. De toda forma,
o contratante não usuário responderá por perdas e danos, pois estará ele no polo passivo em
caso de danos ao imóvel.

Tentamos neste tópico abordar as principais classificações atribuídas ao contrato de


locação por temporada, não tendo o assunto sido exaurido, possível notar que dois autores
foram usados como referência até para confronto de entendimentos, mas que restou
evidenciado muita semelhança nas abordagens.

Na sequência, abordaremos outras características em tópicos separados pela


necessidade de um tratamento mais aprofundado.

2.3. Contrato entre Presentes ou entre Ausentes na Locação por Temporada

Importante trazer neste tópico o debate sobre se a formação do contrato através de


aplicativos de mensagens instantâneas pode ser caracterizado como contrato entre
presentes ou entre ausentes e em que momento ocorre a vinculação entre as partes.

Como anteriormente mencionado, a locação por temporada é regida pela lei


8.245/91, conhecida lei do inquilinato tendo o Código Civil aplicação subsidiária. O artigo
428, inciso I, traz a seguinte redação:

Art. 428. Deixa de ser obrigatória a proposta:

I - se, feita sem prazo a pessoa presente, não foi imediatamente aceita.
Considera-se também presente a pessoa que contrata por telefone ou por meio de
comunicação semelhante;

Embora o referido código quando de sua aprovação não tenha trazido em sua
exegese elementos que contemplassem os meios eletrônicos como parte integrante e
essencial a vida civil, sendo essa omissão alvo de duras críticas por parte de TARTUCE, o
16

texto legal traz timidamente o “outro meio de comunicação”.Seria possível uma


interpretação extensiva, deste inciso, aos aplicativos de mensagens instantâneas?

O recorte epistemológico deste trabalho recai sobre a formação de contratos por


meio de aplicativos de mensagens instantâneas. Neste sentido é possível presumir que essa
formação pode ocorrer, na maioria das vezes, entre presentes, pois o puntuante
imediatamente ao enviar a proposta ao oblato tem evidência que a proposta foi enviada. No
caso do aplicativo de mensagens mais usado hoje no mundo, vai mostrar ao lado da
mensagem um “v” duplo indicando que a mensagem chegou no destino, mas não
necessariamente foi lida. Este mesmo aplicativo possui aviso de leitura, mas pode ser
desabilitado, não permitindo assim, que se evidencie que foi lido.

O Código Civil em seu artigo 434, traz a seguinte redação: “Art. 434. Os contratos
entre ausentes tornam-se perfeitos desde que a aceitação é expedida;” pela literalidade da
norma entende-se que o contrato de locação por temporada estaria formado quando da
expedição da reposta do oblato com o seu de acordo aos termos propostos e a partir desse
momento já começaria a produzir seus efeitos, porém em se falando de contrato de locação
por temporada a vinculação entre as partes não ocorre pela simples aceitação do oblato,
pois de acordo com o artigo 49 da lei do inquilinato, o locador fica autorizado a cobrar até
cem por cento do valor acordado, antecipadamente, para garantir o bloqueio da data
solicitada. Normalmente o que se pratica é a cobrança de cinquenta por cento do valor
negociado a título de reserva.

Para DINIZ, (2018) o contrato eletrônico é negócio entre ausentes, enquanto para
TARTUCE, (2018) afirma que haverá momentos que o contrato poderá ocorrer entre
presentes ou entre ausentes. (PAGINAS??)

Comparativamente a plataforma do AIRBNB,fazemos duas considerações


importantes que mitigam e atendem respectivamente esses requisitos legais do Código
Civil da seção II – Da Formação dos Contratos, artigos 428 a 434 e do artigo 49,Lei do
Inquilinato: a primeira diz respeito a mitigação da formação do contrato entre presentes ou
entre ausentes, onde a plataforma estabeleceu quatro critérios de avaliação dos anfitriões
17

(locadores): avaliação geral3, taxa de respostas4, quantidade de estadas5 e taxa de


cancelamento6, para tornar-se elegível a categoria de superhost7, categoria esta que traz
vários benefícios ao anfitrião, como melhor posicionamento do anúncio na plataforma pelo
algoritmo, benefícios financeiros como o bônus de cem dólares se mantida a classificação
por um ano, além de selo de credibilidade mundialmente reconhecido como locação
segura.

O quesito taxa de resposta no AIRBNB, avalia o tempo de retorno as perguntas dos


hóspedes em consultas sobre a hospedagem e esclarecimento de dúvidas no “chat” em um
período de até 24 horas, sendo que a plataforma orienta os anfitriões que a probabilidade
de sucesso de uma locação se dá nas respostas dadas em até uma hora da consulta
realizada.

Ao receber uma pergunta o anfitrião tem três opções além de responder o que foi
perguntado: aprovar a consulta transformando-a em proposta não vinculante, pois não gera
bloqueio de datas no calendário, reprovar por não ser interessante ou oferecer uma oferta
especial que é uma espécie de desconto no valor final da locação.

Nesta plataforma digital a formação do contrato, somentepoderá ocorrer mediante o


cadastro de um cartão de credito ou débito, sendo que a expedição do aceite pelo
“hóspede” implica imediatamente no pagamento integral debitado no cartão cadastrado.Por
maior que seja o desejo de um hóspede reservar uma determinada acomodação pela
plataforma, esta somente estará consolidada com a devido pagamento integral da reserva
mediante cadastro do cartão de crédito ou débito.

É possível que o interessado na locação do imóvel solicite ao anfitrião uma reserva


provisória em caráter informal com o bloqueio por este das datas solicitadas para que ele
possa efetuar a reserva definitiva, embora seja difícil que isso ocorra, por não haver
nenhuma garantia que a reserva vá acontecer. O mero bloqueio das datas no calendário por
parte do anfitrião é ato de liberalidade deste, mas que comercialmente, isso não se pratica.
3
Avaliação geral é formada por uma nota atribuída pelo hospede após o período de locação, sendo a nota de
variando de 1 a 5, sendo um muito ruim e 5 muito bom.
4
A taxa de resposta é referente as consultas enviadas via chat da plataforma, onde o anfitrião é avaliado pelo
tempo que demora para responder as consultas;
5
Quantidade de noites que o anfitrião já hospedou em seu imóvel;
6
Taxa de cancelamento: cada vez que o anfitrião cancela uma reserva sem que seja caso fortuito ou força
maior, conta negativamente em sua avaliação;
7
Um Superhost é alguém que não mede esforços para receber bem seus hóspedes e é um exemplo de
como um anfitrião deve agir. É fácil identificar um Superhost: o selo aparece em seu anúncio e perfil.
Disponível em:https://www.airbnb.com.br/help/article/828, acesso em 12/10/2023.
18

Entender o porquê a expedição da resposta positiva de locação sem o pagamento


dos valores antecipadamente não gerar vinculação é uma forma de garantir ao locador que
o imóvel esteja com as datas disponíveis, pois devemos enxergar a plataforma digital como
uma vitrinepara outros interessados que cumpram o requisito legal (pagamento
antecipado). É extremamente comum no meio de uma negociação, começar outra que
avança mais rápido, formando a relação contratual antes da proposta anterior que estava
em fase de puntuação. Havendo intercessão de datas nas duas propostas, aquela que
avançar primeiro caduca a outra.

Grande espaçamento

2.4. Da Locação por temporada:

A importância na delimitação do tema nessa modalidade de locação é puramente


recorte metodológico para quese possa desenvolver o trabalho de pesquisa de modo a não
confundir com as outras modalidades locatícias constantes na mesma lei.

NADER, (2018) considera a lei do inquilinato com marco da segurança jurídica


desta modalidade de locação, pois até então a legislação não era clara quanto as regras a
serem aplicadas ao caso concreto.

O Artigo 48, da lei 8245/91 traz um conceito preciso do que vem a ser locação por
temporada como sendo:

Art. 48. Considera - se locação para temporada aquela destinada à residência


temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos, tratamento de
saúde, feitura de obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente
de determinado tempo, e contratada por prazo não superior a noventa dias, esteja
ou não mobiliado o imóvel.

No parágrafo único estabelece que caso o imóvel seja alugado com mobília, este
deve constar obrigatoriamente no contrato sua descrição, bem como o estado em que se
encontram. O legisladorao positivar conceitualmente o que vem a ser locação por
temporada, o fez para distinguir da locação convencional além de proporcionar ao locador
a devida segurança jurídica de que seu patrimônio estará protegido quando entregá-lo ao
usufruto de outrem que não conhece e que em muitos casos não tem o devido zelo pela
19

coisa alheia com afirma HÉRCULES AGHIARIAN, muitas vezes em momento de


descontração deste, sem ter com ele relação estreita:

Locação para temporada impõe relações sem estreitamento entre locador e


locatário. Via de regra, contatados por intermediários que não figuram nas
relações. São tratativas informais, até por telefone, que leva a nenhuma garantia
em favor do locador, razão pela qual a lei autoriza este último a perceber
aluguéis antecipados, bem como exigir modalidade de garantia para outros fins
do contrato, o que sem dúvida se atém à preservação do mobiliário, abusos em
contas telefônicas e tantas outras próprias da euforia dos usuários de temporada,
em especial grandes ajuntamentos de jovens ou pessoas desejosas de extravasar.
(AGHIARIAN, 1999, p.311)

A Lei do inquilinato 8245/91, em seu artigo 47 traz a possibilidade da locação


residencial ser firmada verbalmente: “artigo 47. Quando ajustada verbalmente ou por
escrito...”, ou seja, não foi previsto que essa modalidade de negócio jurídico fosse solene,
onde as partes deveriam reduzir a termo o que fora acordado na negociação, porém é
importante mencionar que este tipo de contrato está firmado quando as partes concordam
com os termos de modo que para ocorrer a reserva do período negociado o locatário deve
depositar o equivalente a 50% do valor ajustado a título de reserva, podendo o locador
receber até 100% do valor, assim o queira.

Neste sentido, o contrato se considera como meio de prova de tudo que foi
acordado entre as partes. Em um contrato de locação residencial, o contrato costuma ser
levado ao cartório para o reconhecimento de firma das partes e cada um fica com uma via.
Essa prática, nas locações por temporada é inviável, poderiam dificultar ou até mesmo
inviabilizar o negócio, pois as partes envolvidas nem sempre estão próximas a ponto de
dirigirem-se a um cartório para dar fé pública aos termos por meio de reconhecimento de
firma.

Na locação há tanto particulares que alugam seus imóveis como renda ou


complemento de renda, como pessoas jurídicas especializadas nesse nicho de mercado, que
possuem uma estrutura organizacional, fluxo de caixa e assessoria jurídica para que os
negócios sejam perfeitos. O que há em comum para ambos é que as negociações dos
termos básicos do contrato se dão em um ambiente totalmente virtual e muitas vezes não
tem um instrumento contratual propriamente dito, mas elementos informativos do locador
ao locatário sobre as condições e regras de uso. (paragrafo bem escrito)
20

É neste ponto que se faz necessário desenvolver o entendimento de até onde uma
negociação feita por aplicativo de mensagens pode ter validade jurídica como instrumento
contratual.

O locador quer a melhor oportunidade de locação e que o locatário use seu imóvel e
zele por ele. Enquanto o locatário, em certos casos, por achar que aquela estada é uma
breve passagem por um local diferente e quer dessa experiência tirar o melhor proveito
possível, muitas vezes excedendo no uso da coisa e assim causando algum tipo de dano
que pode gerar direito de reparação além de perdas e danos.

(subtopico bem pequeno)

2.5. Da Locação por temporada via Airbnb.

Neste tópico faremos uma breve explanação do que vem a ser a plataforma digital
AIBNB, que surge dentro de um contexto de economia de compartilhamento, onde as
pessoas dispõem de espaços em seus imóveis ou imóveis todos, através de remuneração e
mediante pagamento de comissão pela intermediada pelo aplicativo.

Hoje quando falamos em locação de imóveis por temporada (hospedagem), a


primeira referência que vem à mente é o AIRBNB. Embora ela não possua um único
imóvel para alugar, sua filosofia foi confluir locador e locatário (anfitrião e hospede) em
um balcão de negócios virtual de alcance mundial, diga-se de passagem,(não precisa disso)
confluindo interesses divergentes e conexos. De um lado o locador querendo a melhor
oportunidade financeira do outro o locatário buscando a oferta mais econômica e
vantajosa. Como falado acima, não entraremos nas controvérsias que pairam sobre o
enquadramento jurídico da plataforma, mas é bastante válido trazer o conceito do
advogado D´ÁVILA, 2023, em artigo publicado no sitio jurídico Migalhas:

O AIRBNB é um serviço que permite que pessoas do mundo inteiro ofereçam


em locação seus imóveis, para usuários que buscam acomodação mais em conta
em qualquer lugar do mundo, sendo possível locar apenas um quarto ou o imóvel
completo a outros usuários, como também alugar um espaço, caso ele seja sua
necessidade ou interesse.(D´ÁVILA, 2023)
21

É possível observar neste trabalho que já houve a inserção em tópicos anteriores


sobre as funcionalidades do aplicativo. A importância de falar desta plataforma se dá pelo
fato de que as suas funcionalidades estão muito bem estruturadas de modo a atender os
requisitos legais brasileiros e por isso faremos um estudo comparado entre como acontece
a formação do contrato de locações por temporada neste aplicativo e as locações por
temporada realizadas por meio de aplicativos de mensagens instantâneas. Segundo
CARVALHO apud MACHADO e MENEGUETTI:

Não se trata, no mais das vezes, apenas de facilitar a comunicação entre eles,
mas sim de criar a confiança necessária para que a relação entre eles exista e se
desenvolva. As plataformas estabelecem condições mais previsíveis e uniformes
para ambas as partes, que fazem com que a relação seja possível. A diferença
reside justamente nesse ponto: eliminar os riscos envolvidos no
compartilhamento com alguém que não se conhece e de quem não se tem
nenhuma referência. (CARVALHO apud MACHADO e MENEGUETTI; 2017,
p. 200)

Há outros aplicativos que surgiram ou tomaram visibilidade a reboque dessa onda


digital, mas essa plataforma talvez seja a mais utilizada, por conta da facilidade
(intuitividade) de uso, não necessitando de grandes conhecimentos de informática do
próprio aplicativoou da própria lei que regula a modalidade de locação por temporada.

CARVALHO, (2018) faz a seguinte descrição de como nasceu o AIBNB e como se


tornou tão expressiva hoje no mundo quando falamos em locação por temporada
(economia de compartilhamento), fato este que trouxe muitos incômodos para o setor
hoteleiro e como já falado anteriormente brigam para mudar ou impor regras mais rígidas
de uso por acreditarem que a plataforma digital promove concorrência desleal.

O Airbnb foi fundado em São Francisco no ano de 2008 por três estudantes,
Brian Chesky, Joe Gebbia e Nathan Blecharczyk, que dividiam um apartamento.
Vendo que os hotéis da cidade estavam cheios em razão de um congresso,
decidiram colocar à disposição três colchões de ar (airbed, em inglês) e café da
manhã (breakfast) para uma hospedagem temporária. Daí surgiu a ideia e o nome
da startup. (CARVALHO, 2018, p.13)

Na plataforma a pessoa que quer colocar o imóvel a disposição chamado de


anfitrião, que se enquadra na figura do locador, precisa primeiro abrir uma conta
(cadastrar) e a partir daí criar um anúncio onde estará todas as informações sobre o imóvel
como: descrição do imóvel contendo comodidades oferecidas, valores da diária, regras de
uso do imóvel, bem como fotos para que as pessoas possam ver se a propriedade agrada
aos olhos.
22

É possível configurar o anúncio para somente aceitar reserva de contas verificadas,


o que significa que a pessoa tem bom histórico dentro da plataforma e que não causará
problemas, conforme descrito no site do AIRBNB, “enviado um documento de
identificação oficial ao Airbnb” e/ou tenham “sido recomendados por outros anfitriões e
não possuir comentários negativos”8, essas práticas visam maior segurança ao locador.

O hóspede deve também se cadastrar para ter uma conta de usuário, onde terá
acesso a um filtro de busca de imóvel de acordo com sua expectativa. Ao encontrar o
imóvel pretendido verifica a disponibilidade no calendário e simula os valores totais da
reserva. Caso as informações do anúncio restem dúvidas, é possível realizar perguntas em
um bate papo (chat), dentro da própria plataforma, sendo responsabilidade do anfitrião
responder em no máximo 24 horas, pois a plataforma o avalia por isso como já
mencionado anteriormente.

O hospede tem também a funcionalidade de fazer reserva instantaneamente sem


precisar da anuência do anfitrião, desde de que esta função esteja ativa no anúncio
pesquisado e as informações sejam suficientes para formar o negócio.

Uma vez fazendo uma reserva instantânea, criou-se um vínculo obrigacional entre
as partes que começa a produzir os efeitos. Do lado do anfitrião, o imóvel fica com a data
bloqueada no calendário não podendo ocorrer outra reserva no período. Pelo lado do
hospedem há o pagamento antecipado de cem por cento do valor da reserva na modalidade
escolhida, seja débito, seja crédito.

É terminantemente proibido começar uma pontuação no aplicativo e terminar por


outro meio seja telefone, e-mail ou aplicativo de mensagens instantâneas. O algoritmo do
aplicativo consegue identificar quando há tentativas de se levar a negociação para fora da
plataforma e uma vez confirmada tal situação a penalidade pode ser desde a suspensão até
o banimento.

As informações acima foram trazidas para a pesquisa de forma empírica por este
autor, por ser usuário da plataforma como anfitrião na categoria superhost, desde de 2019.

8
AIRBNB. Revise os requisitos dos hóspedes do Airbnb. Disponível em https://www.airbnb.com.br/become-
a-host/23679092/guest-requirements>. Acesso em: 10 set. 2023.
23

2.6. A Locação por Temporada e o contrato por adesão

Neste tópico, levantamos o questionamento se o contrato de locação por temporada


poderia ser enquadrado como contrato de adesão. O código de Defesa do Consumidor, no
artigo 54 conceitua o contrato de adesão como sendo:

“Art. 54. Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas
pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de
produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar
substancialmente seu conteúdo.

Devemos dar atenção a parte final do artigo, no que vem a ser “discutir ou
modificar substancialmente seu conteúdo”, pois denota um conceito muito aberto. Será que
o preço e prazo da locação esse conteúdo substancial?

A pertinência dessa análise se dá pelo fato de que se o contrato de locação por


temporada for entendido como de adesão, sobre ele incidiria a legislação consumerista, que
tem caráter protecionista ao consumidor, pois o entende como a parte vulnerável da
relação, conforme preceitua o artigo 47, onde a interpretação deve ser a mais favorável ao
consumidor.

Não havendo muitas cláusulas as serem discutidas e ajustadas até que o contrato
possa de fato atender os interesses dos envolvidos, que nas palavras de GAGLIANO,
chama o contrato de adesão comostandardizado9, modelo onde o princípio da igualdade
material foi colocado de lado e adotado um modelo massificado com a premissa básica,
além de ser suportada em quarto pilares: uniformidade, predeterminação unilateral, rigidez
e posição de vantagem segundo este autor é:

modalidade contratual forjada no início do século XX, e cuja especial


característica consistiria exatamente no fato de apenas uma das partes ditar o seu
conteúdo, redigindo as suas cláusulas, impondo-se a outra, portanto, aceitar ou
não a proposta que lhe fora apresentada. (GAGLIANO, 2023, p.55)

Segue o autor em sua crítica a este modelo de negócio jurídico, considerando o


“princípio da igualdade formal” em “princípio da hipocrisia”. Interessante como NADER
(2018) se refere a esta modalidade de contrato “o que há de peculiar neste contrato não é o

9
Categoria usada por Gagliano para se referir a contrato onde um adere ou não a vontade da outra parte.
24

seu conteúdo ou natureza da relação disciplinada, mas o seu processo de formação


unilateral e, as vezes autoritária...”(NADER,2018, p.32).

TARTUCE, (2021) cita o conceito de contrato de adesão, cunhado de Orlando


Gomes como sendo:

“Onegócio jurídico no qual a participação de um dos sujeitos sucede a aceitação


em bloco de uma série de cláusulas formadas antecipadamente, de modo geral e
abstrato, pela outra parte, para constituir o conteúdo normativo e obrigacional de
futuras relações concretas”. (TARTUCE, apud GOMES, 2018, p. 27).

A lei 13.874/19, conhecida como Declaração de Direitos de Liberdade Econômica,


alterou o Código Civil, artigo 421-A, trazendo a presunção de paridade e simetria dos
contratos civis e empresariais, desde de que haja elementos que afastem o contrato desta
presunção. O inciso I deste mesmo artigo estabelece que é lícito as partes
estabeleceremparâmetros objetivos de interpretação das cláusulas negociais, o que nos leva
a crer que a grande maioria das cláusulas dos contratos de locação por temporada se
enquadram neste parâmetro objetivo. Havendo ainda muita margem para o alinhamento
dos interesses.

É perfeitamente compreensível o contrato de locação por temporada não


caracterizado como contrato por adesão, mesmo tendomuita semelhança, bastando
verificar o que está sendo negociado no objeto contratual e as características apresentadas
no tópico 1.2 deste trabalho.

Sendo que de um lado o locador com um capital imobilizado no negócio (imóvel),


disponibilizando-o a quem não conhece e do outro, grupos buscando uso temporário do
espaço e suas comodidades. As regras preestabelecidas já afastam pessoas que não querem
se sujeitar as muitas regras impostas. A própria lei do inquilinato artigo 48, parágrafo único
deixa claro que se faz necessário junto ao contrato de locação seja registrado o inventário
de tudo que estará disponível para uso e o estado em que se encontra.

Importante que se observe que mesmo que o contrato de locação por temporada
fosse de fato um contrato de adesão, incidindo sobre as características mencionadas acima
de denotam uma imperatividade de uma parte e passividade da outra, o artigo 423, do
Código Civil estabelece que em caso de cláusula contraditória ou ambígua, a interpretação
deve ser mais favorável ao aderente.
25

Outro contraponto entre o contrato de adesão disciplinado pelo CDC e o contrato


paritário na lei do inquilinato é que neste a forma é livre para que seja formado o contrato,
podendo ele ser verbal ou escrito, enquanto naquele estabelece critério objetivo quanto a
formatação do contrato para evitar letras miúdas, bem como destaques para quesitos que
possam ser prejudiciais ao consumidor.

Grande espaçamento

3. CAPÍTULO 2 – O DIREITO DIGITAL

3.1. Historicismo Tecnológico: uma Abordagem Pragmática.

Parece lugar comum, a forma historicista como autores começam a abordagem


sobre direito digital, onde podemos inferir algumas palavras-chave que são norteadores a
qualquer pesquisador em seus primeiros passos, como: Revolução industrial,
conectividade, globalização. Difícil começar a escrever sobre esse assunto de outra forma,
que não por esta trilha, pois é como se estabelece as conexões contextuais para que o leitor
possa enxergar o caminho por onde a pesquisa foi construída. Excelente pararafo

O Direito Digital é um ramo tecnicamente novo do Direito, como leciona


TARTUCE (2018), “ trazendo aspectos polêmicos e desafiadores”que visa abordarquestões
jurídicas nas mais diversas áreas: Cível, Penal, Trabalhista e outras, mas que tem o
ambiente virtual com lugar de ocorrência dos fatos jurídicos.

Patrícia Peck Pinheiro, constrói uma excepcional linha do tempo sobre a evolução
das tecnologias que culminaram coma chamada Era Digital e como ela tem impactado o
cotidiano social, o que ela chama de “fatos rumo a sociedade convergente” (PINHEIRO,
2021, p.88).
26

Essa convergência conforme explica, ocorre pela “interligação física e a


uniformização dos sistemas de transmissão de dados entre as redes” (PINHEIRO, 2021, p.
92). O que significa no entendimento desta pesquisadora que independente do grau de
riqueza de um país, do modo de produção dominante (comunista ou capitalista), a
necessidade de estar inserido neste sistema global de conectividade,deixa de ser mera
conveniência e passa a ser uma necessidade, questão de sobrevivência seja de empresas,
pessoas ou governos.

Vale destacar a relevância científica que esta pesquisadora??? tem mostrado no


estudo da temática do Direito Digital, inclusive o conceito por ela construídoé citado na
obra Teoria Geral dos Contratos e Contratos em Espécie de TARTUCE (2018), como
sendo:

O Direito Digital consiste na evolução do próprio Direito, abrangendo todos os


princípios fundamentais e institutos que estão vigentes e são aplicados até hoje,
assim como introduzindo novos elementos para o pensamento jurídico, em todas
as áreas (Direito Civil, Direito Autoral, Direito Comercial, Direito Contratual,
Direito Econômico, Direito Financeiro, Direito Tributário, Direito Penal, Direito
Internacional) (TARTUCE apud PINHEIRO, 2018, p.167)

É inegável o quanto o desenvolvimento tecnológico trouxe progresso para a


humanidade. Progresso esse,público e notório, mas que aos olhos de psicólogos e cientistas
sociais (QUEM??, tais tecnologias têm mudado completamente o modo como as pessoas
se relacionam.

A concepção de avanço tecnológico de 15 anos atrás é completamente diferente de


hoje e o indivíduo por mais que tente anular a influência da tecnologia em seu dia a dia a
coercitividade digital empurra o indivíduo para este ambiente. (BEM COLOQUIAL Cito
como exemplo o cadastramento de pessoas vulneráveis no período da pandemia para ter
acesso a benefícios sociais do governo, por meio de plataformas eletrônicas. Fato esse que
escancarou definitivamente a legião de pessoas que não tem acesso as facilidades
proporcionadas pela tecnologia reforçando que há também o conceito de excluídos digitais.

As pessoas que nasceram no século XX, época em que ter um telefone fixo em casa
era praticamente artigo de luxo pelo custo de aquisição e o custo alto de manutenção de
uma linha,viu tal objeto se transformar em peça de museu. Algo parecido aconteceu aos
computadores, cheios de microchips, que ocupavam grandes espaços e que hoje um
equipamento de bolso, faz infinitas funções a mais e que faz até ligações, fácil
27

compreender esse contexto tendo vivido o período em questão. Foi a história do avanço
tecnológico acontecendo, bem debaixo de nossos olhos. NATIVOS E IMIGFRANTES
DIGITAIS

O capitalismo precisa desses movimentos para se manter vivo e se reinventandoo


que MARX chamou de “fetiche da mercadoria” 10, comumente chamamos de sonho de
consumo da grande maioria das pessoas, seja o aparelho celular com três câmeras e muitos
gigabytes para armazenar fotos e poder ter um acervo enorme de aplicativos de mais
variadas funções, que filma em alta definição – HD, que permita conexão com internet 5G
ultrarrápida, o que Max Weber chamaria de racionalização, com o intuito de planificação
“agir-racional-com-respeito-a-fins” (WEBER apud HABERMAS, 1968, p. 313).

Mas o que viria a ser agir-racional-com-respeito-a-fins? Para Habermas (AMEI A


CITAÇÃO MAS CADE A FONTE??), significaria a manutenção da dominação que ele
chama de caduca, mas revestida com a roupagem da ciência e da técnica por que seus
imperativos que legitima a dominação.

Não pretendemos enveredar no caminho sociológico, para analisar o tema proposto,


mas também não podemos negar a importância da sociologia, já que está tão próxima da
ciência do Direito.

Podemos afirmar sem medo que a história da comunicação se confunde com a


história da humanidade, ou mais precisamente a história da comunicação é a própria
história da humanidade, que desde os períodos mais remotos, os arqueólogos têm
demonstrado a necessidade do indivíduo se comunicar a através de desenhos rupestres, que
para nós traz uma codificação aparentemente sem nexo, mas que para aquela civilização
gerou comunicação, muitos anos depois por meio da escrita, passando pelo telégrafo, fax,
telegrama, dentre outros meios até chegarmos ao conhecemos na contemporaneidade, onde
se tornou extremamente necessária, mantendo-se a privacidade e segurança da
comunicação, o que é protegido no pela Carta Política brasileira de 1988.

10
O Capital (1867), significando o caráter que asmercadorias possuem, dentro do sistema capitalista, de
ocultar as relações sociais deexploração do trabalho, sedimentando-se, por conseguinte, em toda a sociedade.
Sob o ponto de vista da teoria do valor de Marx, encontra-se no cerne dessas relações sociais a
obtenção do lucro por parte de quem detém os meios de produção. Trecho extraído do artigo:O CONCEITO
DE FETICHISMO DA MERCADORIA CULTURALDE T. W. ADORNO E M. HORKHEIMER: UMA
AMPLIAÇÃO DOFETICHISMO MARXIANO; SILVA, Fábio Cesar;
https://www.marilia.unesp.br/Home/RevistasEletronicas/Kinesis/FabioCesardaSilva.pdf
28

Não se pode querer entender o desenvolvimento tecnológico dissociado do ser


humano como se fosse uma divindade sobrenatural, ou fruto de geração espontânea, ou
produto da metafísica. Por trás de cada progresso houve pessoas engajadas em ideias que
ao período pareciam ser disruptivas mas que hoje fazem parte da vida do indivíduo como
sem sempre tivessem existido.

Quando se fala em novas tecnologias,devemos entender que não basta ter sido um
computador imenso transformado em um equipamento de bolso que executa milhares de
funções que o outro não fazia, pois paralelo a isso caminhou a conectividade. Um aparelho
de telefone móvel de última geração sem acesso a rede de comunicação (internet) é só um
aparelho de comunicação caro que faz e recebe chamadas.

O primeiro marco histórico da criação da internet foi o projeto de criação da


ARPANET, que tinha caráter militar, nos Estados Unidos, na década de 1960, período da
Guerra Fria, mas que somente em 1987, se transformou na internet como conhecemos hoje,
ambiente para estabelecimento das mais variadas interações. Para TARTUCE, (2018).

O assunto internet é relativamente novo âmbito jurídico trazendo aspectos


polêmicos e desafiadores. O tema provoca calorosos debates, pois não havendo
necessidade de concepção de novos conceitos de privacidade, além do aspecto
corpóreo, eis que ele está lidando com os aspectos virtual-material (TARTUCE,
2018, p.166)

O que se vislumbra na afirmação acima é que as relações sociais que ocorrem no


mundo virtual em nada devem diferir daquelas que ocorrem no ambiente corpóreo, sendo
que essas relações sociais virtuais geram ou podem gerar direitos e obrigações tal qual
ocorrem no campo tradicional das relações jurídicas e é por esse motivo que o Direito deve
se importar com o enquanto objeto da ciência jurídica. Por conta dessa forte convergência,
também entendido como movimento de massa da sociedade para o âmbito virtual.

3.2. O Direito Digital como Ramo do Direito

A forma como o mundo,as relações sociais têm convergido para o meio digital está
mais que provado ser um caminho sem volta, pelo menos é difícil imaginar qualquer
movimento no sentido inverso.
29

Na contemporaneidade, o domínio das tecnologias, bem como da informação é


considerado como o novo petróleo. Estamos a todo momento criando, compartilhando
dados, em sistemas informatizados de tal maneira que os algoritimos conseguem traçar o
perfil sócio digital e encher sua tela com postagens que reforçam o gosto e o interesse de
quem as consome. Uma máxima do Vale do Silício é que quem não comercializa nada na
internet é porque está sendo comercializado.

O acesso a informação constitui o maior valor de uma sociedade democrática e a


massificação da internet como serviço de informação e informatização possibilita
um aumento de competitividade global de comunidades antes marginalizadas.
(PINHEIRO, 2021, p.139)

Tornamo-nos tão dependentes de tecnologia que ficar por um tempo desconectado,


seja por falta de rede, falta de energia ou necessidades do dia a dia nos causa desconforto
de tal maneira comparável a síndrome de abstinência. Essa dependência se torna mais
perceptível quando ocorre uma queda de energia que nos impossibilite de manter-se
conectado e desse modo não conseguimos nem pagar uma compra num caixa de
supermercado, trafegar com carro se torna uma tarefa arriscada face ao não funcionamento
dos semáforos.

Pelas referências bibliográficas pesquisadas, viu-se que o olhar sobre a internet é de


total autonomia, quase que ser metafísico, autônomo por si mesmo, mas que na realidade
depende de energia elétrica para funcionar, conectividade e infraestrutura de rede para que
ela possa ser o que ela demonstra. Consideramos que a internet precise mais de energia
para se manter ativa para fluir dados até por que os grandes centros de processamento de
dados são grandes consumidores de energia e sua existência está pautada em dois pilares
fundamentais: continuidade e confiabilidade.

A continuidade visa garantir um sinal uniforme, constante sem interrupções nos


fluxos de dados. Não esqueçamos que fluxo de dados na essência é fluxo de energia. A
confiabilidade é ponto nevrálgico dos sistemas informatizados, pois com a massificação da
internet, todas as relações sociais existentes no mundo real migraram para o mundo virtual.
Por esse motivo a segurança da informação é mais que um direito social a privacidade é
um produto de grande valor no mercado da informação.

Contemporaneamente estar conectado é um direito social mais que elementar, é


uma questão de cidadania. Esse processo de inserção das pessoas a rede mundial de
30

computadores se intensificou bastante a partir do ano de 2020 com a declaração da


pandemia de COVID-19, após o estabelecimento de medidas sanitárias de isolamento
social nos empurrou para a consolidação dos conceitos de homework, homeclass, a
telemedicinaalém do comércio online reforçado pelas plataformas de compras de alimentos
com entrega à domicílio.

Alinhada a este pensamento está PINHEIRO, (2021) quando afirma que “não existe
a necessidade de um Direito específico”, pois pra ela o que realmente importa é que o
Direito possa seguir sua vocação natural de refletir as mudanças culturais e
comportamentais vividas pela sociedade, ou seja o Direito Digital está pautado numa base
principiológica, pois a velocidade com que as tecnologias se movimentam é extremamente
diferente da atividade legislativa e sendo ela pautada em princípios, para poder
acompanhar.

O conceito de tempo no mundo das tecnologias é diferente do tempo no universo


jurídico.

O que está em jogo aqui é a forma como as pessoas contratam, que vem sofrendo
drasticamente mudanças. Até pouco tempo atrás não se concebia a idéia de se contratar um
carro por aplicativo, saber os detalhes do motorista, do carro, da rota e pode compartilhar
com outras pessoas para saberem que está a se deslocar e que sua viagem poderá ser
acompanhada por terceiros.

Outro exemplo nítido desse processo de avanço tecnológico é a forma como


ouvimos ou armazenamos músicas, que migrou dos discos de vinil, para fitas K7, CD, pen
drive e hoje ouve-se direto do streaming11, mas essa mudança não afetou somente o
ouvinte, houve impactos na própria cadeia produtiva musical, pois deixou o artista de
ganhar por unidade vendida ( CD, DVD, Vinil), para ganhar royalties pelas vezes que a
música toca na plataforma.

Um cidadão comum não precisa saber de linguagem de programação ou que tudo


que se faz em um computador se transforma em um sistema binário de zero ou um. A
coerção social é tão grande para que se convirja para o meio digital que tudo te remete a
um aplicativo que vai te ajudar a resolver uma demanda, seja um aplicativo de banco, da

11
Streaming é a tecnologia de transmissão de dados pela internet, principalmente áudio e vídeo, sem a
necessidade de baixar o conteúdo. https://tecnoblog.net/responde/o-que-e-streaming/
31

faculdade ou até mesmo aplicativo de compra e venda de coisas móveis e imóveis e até de
relacionamento.

O surgimento da internet ao longo dos anos nos mostrou que ela aparenta ser um
ambiente sem leis, para ser mais preciso um lugar onde é difícil a responsabilização dos
usuários por comportamento inadequado. Todos que acessam a rede mundial de
computadores são identificados por meio de um código IP – endereço de protocolo de
Internet, sendo este código individual de cada equipamento que tenha acesso a internet e
que segundo o site Tecnoblog conceitua o IP como:

O termo IP vem de Internet Protocol (protocolo de internet) e é um número


atribuído ao dispositivo no momento em que ele é ligado, o que chamamos de IP
interno. É o “CPF” do seu dispositivo.12

Em face dessa fragilidade de controle e ao ambiente propício para a prática de


diversos ilícitos que houve a necessidade de criação de uma regulamentação, nascendo
assim o Marco Civil da Internet Lei 12.965 de 2014. O objetivo desta lei não é criar
barreiras para o uso da internet e sim regulamentar o uso protegendo os usuários, bem
como o reconhecimento de que o acesso à internet com um direito básico do cidadão.

3.3. A Formação do Contrato por Meios Eletrônicos

As tecnologias sãoo maior aliado do homem quando a utiliza a seu favor até quando
se está cometendo crimes, face a quantidade de crimes virtuais e tentativas de golpes que
vemos noticiar.

O Código Civil, carece de normas que integrem o uso das tecnologias, pois a sua
aprovação ocorreu em um período que a mundo digital era embrionário, não se imaginava
que essa evolução ocorreria tão rápido. O legislador tem entendido esse movimento e
paulatinamente revisado diversas normas para conseguir abarcar o maior número de
comportamentos, pois com a era digital, ainda há uma espécie de anomia, forçado
magistrados a recorrer aos princípios gerais do direito para as devidas soluções. O CPC,

12
O que é endereço IP? Disponível em: https://tecnoblog.net/responde/o-que-e-ip/ Acesso em: 20 de outubro
de 2023.
32

como por exemplo, no artigo 106, traz exemplos claros § 2º, intimação por correio
eletrônico.

Ora, se a justiça entendeu que deve se inserir no mundo digital, que o


peticionamento é eletrônico, que não se precisa mais carregar grandes volumes de
processos, pois a grande maioria já está digitalizada, de fácil rastreio de informações,
respeitando as formalidades necessárias para que seus atos sejam válidos, não há que se
falar em limitações do direito privado para que relações contratuais ocorram por meios
eletrônicos. Nada mais natural que se insira nesse mundo tecnológico.

Essa problemática gerada pelo comércio eletrônico e pelos contratos via internet
tem grande relevância no mundo jurídico pela sua enorme complexidade e pelo
fato de não estar estruturada normativa, jurisprudencial e doutrinariamente.
(DINIZ, 2018, p. 802)

Para Diniz, (2018) as contratações por meio eletrônico, por falta de norma
específica, são o grande desafio da ciência jurídica, devido as inúmeras questões
polêmicas, faltando desde elementos doutrinários e jurisprudências. “As normas jurídicas
contratuais constituem uma realidade que não se pode ignorar. ” (DINIZ, 2018, p. 802)

Importante mencionar que o fato de não haver doutrina e jurisprudência que versem
sobre o tema não impedem que as relações ocorram, muito menos que demandas judiciais
sejam resolvidas. Isso é princípio básico do direito que se aprende nas primeiras letras da
ciência jurídica que o que não for devidamente proibido pela lei é permitido. A LINDB em
seu artigo 4º, estabelece que o juiz deverá decidir os casos concretos utilizando a analogia,
os costumes e os princípios gerais do direito.

Os contratualistas trazem para o debate teórico diversos conceitos do que vem a ser
o contrato. Diniz, 2018 conceitua o contrato com sendo: “...espécie de negócio jurídico, de
natureza, bilateral ou plurilateral, dependendo, para sua formação o encontro de vontade
das partes, sendo que Azevedo, 2004, menciona que o contrato é o encontro de vontades
numa “acomodação de interesses”. O elemento volitivo parece ser um consenso entre eles
como base para a conceituação dessa relação privada.

Na tradição romana, conforme explica Azevedo (2004), a obediência ao formalismo


era tamanha que a não observância a tais pressupostos implicava em plena nulidade. Com
o passar dos tempos e consequentemente a modernização do direito no tempo tem
33

evidenciado que as relações jurídicas estão em constante movimento para acompanhar essa
evolução.

Os formalismos são pressupostos de validade para contratos tidos pela lei como
solenes. Os demais casos que não estão previstos em lei o formalismo contratual constitui
meio de prova da relação jurídica. Diniz (2018), chama atenção para a distinção entre o
que deve ser uma formalidade contratual para um meio de prova e que um pode ser
condição essencial para o outro, mas nunca poderão ser confundidos. O meio de prova visa
demonstrar a existência do fato jurídico e suas vinculações.

Assim como ocorre no âmbito presencial, a formação dos contratos ocorridas pelo
meio digital devem respeitar a base principiológica definida na lei e na doutrina e aqui já
discutido, a autonomia da vontade, a boa-fé objetiva, a função social do contrato
continuam a se fazer presentes.

É mais que consenso que o contrato firmado por meio digital não caracteriza uma
espécie nova de contrato, mas um meio como os contratos podem ser formados. Nada mais
é que uma adequação a vida moderna onde o direito jamais poderia colocar amarras para
que essa evolução pudesse acontecer enquanto ele não tiver respostas para os conflitos que
se criam.

No âmbito jurisprudencial, os negócios jurídicos sem forma especial


exigida por lei têm plena existência, validade e eficácia reconhecidas, de maneira
que não há argumentos jurídicos tampouco argumentos lógicos para que as
contratações, por correio eletrônico (e-mail), sites de internet ou qualquer outro
meio digital, sejam invalidadas, como corrobora o seguinte entendimento trazido
pelo Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios: "(...) não resta dúvida
quanto à existência, validade e eficácia do contrato, em todas as suas cláusulas,
por se tratar de uma questão de segurança jurídica e boa-fé contratual. É,
portanto, incontroversa a existência de relação jurídica contratual entre as partes,
consistente em prestação de serviços de informática. Os e-mails trocados entre as
partes e os comprovantes de pagamento pela prestação de serviço trazidos pelo
autor, ora recorrido, comprovam o aceite e a celebração do contrato,
especialmente o e-mail que comunica a resilição unilateral do contrato por parte
da recorrente." (Recurso Inominado: 0701849-53.2017.8.07.0016. Relator juiz
Edilson Enedino das Chagas).

Devemos aqui mencionar que estamos discutindo a formação do contrato de


locação por temporada firmado por meio de aplicativos de mensagens instantâneas. Para
que qualquer negociação se inicie é necessário que haja um ponto de partida, sendo ele um
anúncio seja ele publicado em uma rede social, uma plataforma de compra e venda de
34

produtos e serviços, bem como indicação de quem já usou o serviço e compartilhou com
pessoas do círculo de amizade.

A professora PINHEIRO, (2021) leciona que:

Não há o que se discutir mais a validade do contrato eletrônico, visto que esse
entendimento já está pacificado e vem sendo tratado em âmbito internacional
desde 1996, com as discussões da Lei Modelo da UNCITRAL 13, que em seu
artigo 5º disse o seguinte: “não se negarão efeitos jurídicos, validade ou eficácia
à informação apenas por que esteja na forma de mensagem eletrônica.
A mesma lei tratou em seu artigo 11 sobre a formação e validade dos contratos,
onde “salvo disposição em contrário das partes, na formação de um contrato, a
oferta e sua aceitação podem ser expressas por mensagens eletrônicas. Não se
negará a validade ou eficácia a um contrato pela simples razão de que se
utilizaram mensagens eletrônicas para a sua formação” (PINHEIRO, 2021, p.
1000-1001)

O exposto acima ratifica a segurança jurídica, no que diz respeito a validade


jurídica dos contratos de locação por temporada firmados por meio de mensagens
eletrônicas, de modo que a forma é livre conforme está definido em lei sendo que o
eminente doutrinador Silvio Venosa defende: “A locação por temporada somente se
perfaz com contrato escrito, pois exige o prazo determinado, sendo incompatível o
contrato verbal”. O contrato de locação por temporada firmado por meio de aplicativos de
mensagens deve ser entendido como contrato escrito, pelo fato que o parágrafo único do
artigo 48, exige a obrigatoriedade do inventário dos móveis e estado em que se encontra.

Posicionamento devidamente respeitado, mas que não devo concordar com ele, pois
a mera omissão a este quesito não desnatura o contrato de locação por temporada por
omissão. O que pode acontecer em caso de o contrato não possuir esse inventário é em
caso de dano causado a algum dos bens móveis pelo locatário não poder requerer
indenização pelo prejuízo ocorrido nos termos do referido artigo.

Outro ponto importante que demonstra a sintonia da legislação a essa era


tecnológica foi a entrada em vigor no ordenamento jurídico da medida provisória 2.200-2
de 24 de agosto de 2001 que Institui a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-
Brasil, que transforma o Instituto Nacional de Tecnologia da Informação em autarquia, e
dá outras providências, como estabelece o artigo 1º com a seguinte redação:

Art. 1o Fica instituída a Infra-Estrutura de Chaves Públicas Brasileira - ICP-


Brasil, para garantir a autenticidade, a integridade e a validade jurídica de
13
Lei modelo UNCITRAL sobre Comércio Eletrônico – Relações Contratuais na Internet e Proteção jurídica
do Consumidor.
35

documentos em forma eletrônica, das aplicações de suporte e das aplicações


habilitadas que utilizem certificados digitais, bem como a realização de
transações eletrônicas seguras.

Se antes, um contrato entre pessoas em cidades, estados ou países diferentes era


firmado por instrumento escrito e assinado fisicamente, com firma reconhecida em cartório
e enviada via correio para que a outra parte pudesse assinar, reconhecer firma e enviar de
volta. Hoje, com a criação das assinaturas digitais, por meio de certificado digital a quem é
conferida autenticidade, validade e eficácia, tornou-se perfeitamente possível a assinatura
de contratos eletrônicos ou firmados por meio de mensagens instantâneas, otimizando
custos, tempo e espaço, pois os contratos assinados digitalmente ficam armazenados em
uma nuvem onde é possível atestar sua veracidade. Importante não confundir a assinatura
eletrônica com assinatura digitalizada. Um está relacionado a certificação digital enquanto
o outro está relacionado a digitalização do contrato assinado fisicamente.

3.4. A Formação do Contrato e o Código De Defesa Do Consumidor


(CONSUMIDOR E ADSAO EM TOPICOS SERAPAROS)

Como já exposto no tópico anterior, a formação dos contratos pela via eletrônica
não cria outra modalidade de contrato, somente muda o ambiente onde ele se processa. O
direito precisa estar em constante movimento assim como as tecnologias, embora não
consiga acompanhar na mesma velocidade, já o direito nasce das relações sociais, para
depois se transformar em lei quando um comportamento precisa de balizas
regulamentadoras, evitando assim que pareça uma terra sem lei onde todo mundo pode
tudo.

O anúncio contém as informações básicas e necessárias para que o interessado


possa estabelecer um canal de comunicação que pode ser por telefone, ou por aplicativo de
mensagens instantâneas que a opção mais usual, pela facilidade que esse recurso trouxe
para a comunicação entre as pessoas.

Conforme expusemos no tópico 1.5, que fala sobre a locação por temporada pelo
AIRBNB, toda negociação gira em torno de um anúncio publicado na plataforma que
também possui as informações mínimas e necessárias para iniciar uma pontuação ou até
36

mesmo ir direto para policitação, caso o locatário considere todas as informações


suficientes para realizar a reserva instantânea.

O que percebemos, e está mais que evidente é que as fases para a formação do
contrato como abordadas no capítulo 1 devem ser perfeitamente serem respeitadas seja no
ambiente real ou no ambiente virtual.

O Código de Defesa do Consumidor, como é sabido visa proteger a parte mais fraca
da relação contratual. Em havendo interpretação duvidosa, aplica-se a que for mais
favorável ao consumidor.

O artigo 49 desta lei em comento traz a seguinte redação:

Art. 49. O consumidor pode desistir do contrato, no prazo de 7 dias a contar de


sua assinatura ou do ato de recebimento do produto ou serviço, sempre que a
contratação de fornecimento de produtos e serviços ocorrer fora do
estabelecimento comercial, especialmente por telefone ou a domicílio.

Em se falando de contrato de locação por temporada firmado em aplicativos de


mensagens instantâneas, é perfeitamente possível a proteção ao consumidor desistir da
locação já firmada, tendo pago os valores a título de reserva, em desistindo dela no prazo
de 7 dias, com direito a devolução integral, pelo fato do contrato ter sido firmado em um
ambiente virtual. Entendo com exemplificativo a menção ao “especialmente por telefone
ou a domicílio”, até por que a lei 8.078 é de 1990, ano que não se imaginava termos o
acesso a recursos tecnológicos tais como temos hoje.

Essa possibilidade de aplicação do CDC aos contratos de locação de temporada


firmados por meio de aplicativos de mensagens instantâneas se dá pelo diálogo de fontes e
que foi aprovado pelo enunciado 167 na III Jornada de Direito Civil, promovida pelo
Conselho de Justiça Federal e pelo Superior Tribunal de Justiça em dezembro de 2004 com
a seguinte ementa:

Com o advento do Código Civil de 2002, houve forte aproximação


principiológica entre esse Código e o Código de Defesa do Consumidor no que
respeita à regulação contratual, uma vez que ambos são incorporadores de uma
nova teoria geral dos contratos. (Enunciado, 167, 2004)

O referido enunciado faz menção ao Código Civil 2002 e ao Código de Defesa do


Consumidor, por terem a mesma base principiológica. Acredito que por analogia podemos
37

estender essa aproximação do CDC a lei do inquilinato, pelo fato de também versarem
sobre contratos sendo que doutrinariamente a base principiológica ser a mesma.

4. CAPÍTULO 3 – DOS JULGADOS RELEVANTES DO STJ SOBRE O


ASSUNTO.

Neste capítulo analisaremos dois julgados que considerei relevantes com a temática
aqui desenvolvida e que envolvem locação por temporada, AIRBNB, aspectos da
celebração dos contratosde locação por temporada firmados por meio de aplicativos de
mensagens instantâneas, para podermos congregar todos os pressupostos discutidos ao
longo do trabalho e acompanhar como o STJ tem discutido tais temáticas.

Importante destacar que durante a pesquisa de jurisprudência, não foi identificado


nenhum Recurso Especial que trouxesse julgados exatamente sobre a temática em questão
38

da validade jurídica dos contratos de locação por temporada realizados por meio de
aplicativos de mensagens instantâneas, talvez porque o recorte epistemológico foi preciso.
Neste sentido analisaremos dois julgados da Corte Superior com temáticas afins.

No primeiro caso analisaremos o Recurso Especial 1.819.075/RS, que foi uma


decisão relevante, talvez a primeira, envolvendo a economia de compartilhamento
AIRBNB, em uma obrigação de não fazer proposta pelo condomínio contra condômino.

No segundo caso, trouxemos o Recurso Especial 1.495.920/DF, sobre uma ação de


execução de título extrajudicial de uma instituição financeira contra um associado, onde
pede-se o reconhecimento da assinatura digital em contrato de mútuo em detrimento da
assinatura de duas testemunhas para formação do título executivo extrajudicial.

O Recurso Especial1.884.483 – PR, versa sobre anulação de assembleia


condominial que restringia a locação por período inferior a 90 dias, foi analisado durante a
elaboração deste trabalho e não foi trazido para compor seu conteúdo por não ter entendido
que possua elementos que o liguem ao núcleo central desta pesquisa, embora tenha tido o
AIRBNB tendo sido reconhecido seu interesse processual na ação.

É forçoso lembrar que a locação por temporada por meio de aplicativos como
AIRBNB não se restringem a imóveis em condomínios edilícios, sendo também ofertadas
casas veraneio, principalmente, com acesso independente e que não se sujeitam a
regramentos condominiais. Sendo que o escopo da pesquisa não está restringiua analisar os
aspectos contratuais da locação por temporada e o com direito condominial e seus
impactos no direito propriedade.

De toda forma trazemos a ementa dos Embargos de Declaração no Recurso


Especial que foram opostos pelo AIRBNB, de relatoria do Ministro Ricardo Villas Bôas
Cueva,com os seguintes tópicos para que fique evidenciado que foi analisado.

"RECURSO ESPECIAL. DIREITO CIVIL. AÇÃO DE ANULAÇÃO DE


ASSEMBLEIA CONDOMINIAL. CONVENÇÃO. ALTERAÇÃO.
LOCAÇÃO.
PRAZO INFERIOR A 90 (NOVENTA) DIAS. PROIBIÇÃO.
POSSIBILIDADE.
FUNÇÃO SOCIAL DA PROPRIEDADE. ART. 1.336, IV, DO CÓDIGO
CIVIL.

USO DE PLATAFORMAS DIGITAIS. ASPECTO IRRELEVANTE.


1. Recurso especial interposto contra acórdão publicado na vigência do
Código de Processo Civil de 2015 (Enunciados Administrativos nºs 2 e
3/STJ).
39

2. Delimitação da controvérsia: saber se os condomínios residenciais podem


ou não fixar tempo mínimo de locação das unidades autônomas ou até
mesmo impedir a utilização de determinado meio para tal finalidade, a
exemplo das plataformas digitais de hospedagem.

3. A disponibilização de espaços ociosos para uso de terceiros, seja de um


imóvel inteiro ou de um único cômodo, pode ocorrer das mais variadas
formas: por meio de plataformas digitais, por intermédio de imobiliárias, por
simples panfletos afixados nas portarias dos edifícios, anúncios em
classificados etc.

4. A forma por meio da qual determinado imóvel é disponibilizado para uso


de terceiros não é o fator decisivo para que tal atividade seja enquadrada em
um ou outro regramento legal.

5. A disponibilização de imóveis para uso de terceiros por meio de


plataformas digitais de hospedagem, a depender do caso concreto, pode ser
enquadrada nas mais variadas hipóteses existentes no ordenamento
jurídico, sobretudo em função da constante expansão das atividades
desenvolvidas por empresas do gênero.

6. Somente a partir dos elementos fáticos delineados em cada hipótese


submetida à apreciação judicial – considerados aspectos relativos ao tempo
de hospedagem, ao grau de profissionalismo da atividade, à destinação
exclusiva do imóvel ao ocupante ou o seu compartilhamento com o
proprietário, à destinação da área em que ele está inserido (se residencial ou
comercial), à prestação ou não de outros serviços periféricos, entre outros – é
que se afigura possível enquadrar determinada atividade em alguma das
hipóteses legais, se isso se mostrar relevante para a solução do litígio.

7. A afetação do sossego, da salubridade e da segurança, causada pela alta


rotatividade de pessoas estranhas e sem compromisso duradouro com a
comunidade na qual estão temporariamente inseridas, é o que confere
razoabilidade à restrição imposta na espécie, em que, mediante alteração da
convenção condominial, com observância do quórum de 2/3 (dois terços) dos
condôminos, foi proibida a locação de unidades autônomas por prazo
inferior a 90 (noventa) dias.

8. O direito de propriedade, assegurado constitucionalmente, não é só de


quem explora economicamente o seu imóvel, mas sobretudo daquele que faz
dele a sua moradia e que nele almeja encontrar, além de um lugar seguro
para a sua família, a paz e o sossego necessários para recompor as energias
gastas ao longo do dia.

9. Recurso especial não provido."

Especificamente por conta controvérsia na decisão acima proferida e com base na


argumentação exposta é que julgo não haver o devido interesse em analisar de forma
aprofundada para extrair aquilo que possa ser útil a esta pesquisa.

Os demais casos aqui trazidos, embora o tema não tenha precisamente relação com
o assunto aqui estudado, há elementos que reputo importantes que podemos extrair para
40

compreender as demandas correlatas ao uso dos meios digitais e seus aspectos na formação
do contrato e suas implicações jurídicas.

Acredito que a assinatura digital nos contratos de locação por temporada firmados
por aplicativos de mensagens é um elemento que traz segurança para ambas as partes,
demonstrando diligência no trato da relação contratual, por conta da rastreabilidade dos
dados, da integridade e validade.

4.1. Recurso Especial 1.819.075/RS

O primeiro caso analisado, Recurso Especial – 1.819.075/RS teve o acórdão


proferido em 2021, julgado com a seguinte ementa:

DIREITO CIVIL. RECURSO ESPECIAL. CONDOMÍNIO EDILÍCIO


RESIDENCIAL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER.
LOCAÇÃO FRACIONADA DE IMÓVEL PARA PESSOAS SEM
VÍNCULO ENTRE SI, POR CURTOS PERÍODOS. CONTRATAÇÕES
CONCOMITANTES, INDEPENDENTES E INFORMAIS, POR PRAZOS
VARIADOS. OFERTA POR MEIO DE PLATAFORMAS DIGITAIS
ESPECIALIZADAS DIVERSAS. HOSPEDAGEM ATÍPICA. USO NÃO
RESIDENCIAL DA UNIDADE CONDOMINIAL. ALTA ROTATIVIDADE,
COM POTENCIAL AMEAÇA À SEGURANÇA, AO SOSSEGO E À SAÚDE
DOS CONDÔMINOS. CONTRARIEDADEÀ CONVENÇÃO DE
CONDOMÍNIO QUE PREVÊ DESTINAÇÃO RESIDENCIAL.
RECURSO IMPROVIDO.

Lembro que a época, houve uma grande repercussão na mídiasobre o caso, onde
alegava-se que o Superior Tribunal havia proibido locação por temporada via AIRBNB.
Aos olhos mais desavisados, as manchetes até pareciamverdade, mas é importante analisar
os documentos referente ao processo, o relatório, os votos e a tese prevalente na referida
corte para que se possa tirar uma conclusão mais precisa do que foi a decisão.

Do relatório extrai-se o caso concreto, onde a recorrente, dona do imóvel em


questão, foi acionada judicialmente pelo condomínio onde morava, numa ação de
obrigação de não fazer, visando a cessação de locação de espaço no apartamento de forma
compartilhada onde todos eram desconhecidos entre si, com características de
hospedagem, tipo “hostel”, inclusive confirmado nos autos do processo em primeira
instância pela própria recorrente, afirmando que fez alterações na estrutura original do
imóvel para poder acomodar mais pessoas.
41

A controvérsia trazida pelo caso é se a dona do imóvel estava ou não dando


destinação adversa da permitida na convenção condominial, que definia o uso dos imóveis
em caráter exclusivamente residencial e o alegado pela recorrida era que ela estava usando
comercialmente seu imóvel, bem como as comodidades do condomínio, ou seja, sua
atividade não se enquadrava no conceito de locação por temporada estabelecido na lei
8.245/91.

As decisões proferidas em primeira e segunda instâncias aduzem que foram


síncronas no sentido de enquadrar o comportamento da parte ré como serviço de
hospedagem não se amoldando ao conceito de locação por temporada disciplinado no
artigo 48, da lei 8.245/91, dando assim ganho de causa ao condomínio que ajuizou a
obrigação de não fazer.

Insatisfeita com a decisão do Tribunal ad quem, interpôs o Recurso Especial com


base no artigo 105, III, a) e c) da Constituição Federal de 1988, para atacar a decisão do
tribunal.

Um ponto importante desse Recurso Especial é que houve a participação do


AIRBNB IRELAND UC, como terceiro interessado, na qualidade de assistente da
recorrente, pelo interesse jurídico e devido a relevância temática e o possível impacto que a
decisão poderia trazer para a plataforma digital no Brasil, como transcreve o voto do
Ministro Luís Felipe Salomão:

11. O interesse do Airbnb de auxiliar os Recorrentes na qualidade de


assistente simples deriva do enquadramento fático e jurídico que as
instâncias ordinárias conferiram à demanda: (a) os Recorrentes anunciam o
aluguel por temporada de um de seus imóveis mediante a plataforma Airbnb
e (b) o objeto desse recurso envolve a qualificação jurídica de contratos
que os Recorrentes celebram com seus locatários mediante a plataforma.

No voto do Ministro relator, que foi favorável a recorrente para reconhecer que a
locação realizada se amolda ao modelo de contrato de locação por temporada e que o
oferecimento de determinados serviços aos seus hóspedes não é fator determinante para a
categorização da atividade como serviço de hospedagem, o que não desnatura a locação
por temporada, sendo esse o núcleo essencial da discussão conforme transcrição abaixo:

Na verdade, questão nova trazida a debate é, por assim dizer, a potencialização


do aluguel por curto ou "curtíssimo" prazo envolvendo, muitas vezes, uma única
diária, decorrente da transformação econômica proporcionada pelo uso da
42

internet, por meio de plataformas virtuais, capazes de promover a interligação


entre pessoas – no caso, proprietário do imóvel e o pretendente à locação deste.
Desse modo, sobressai o incremento da realização de negócios entre as
partes - que se vinculam por meio de plataformas digitais -, a evidenciar o
contato quase que instantâneo entre os interessados na celebração do negócio.
(p.11 e 12)

No voto que abriu a divergência, proferido pelo ministro Raul Araújo. Ele
reconhece que o modelo de contrato praticado pela recorrente se enquadra em hospedagem
em modalidade atípica, por não parecer com a modalidade prevista na lei 11.771/2008,
muito menos com a modalidade de contrato de locação por temporada conforme artigo 48
da lei 8.245/91. Sendo o voto acompanhado pela ministra, Maria Isabel Gallotti e o
Ministro Antônio Carlos Ferreira, estando ausente neste julgamento o Ministro Marco
Buzzi.

A parte que nos interessa nesse julgado é o voto do Ministro Antonio Carlos
Ferreira, pois faz um recorte preciso do problema jurídico de fato, relacionado a
controvérsia se o uso do imóvel pela recorrente está ou não ferindo a convenção
condominial, conforme extraímos as seguintes transcrições:

Não se discute aqui, penso eu, a modalidade pela qual é feita a publicidade ou
ainda a contratação do negócio desempenhado pela recorrente (na hipótese, por
intermédio de um aplicativo), que pelas peculiaridades do caso concreto está
sendo compreendido como atividade comercial, um "contrato de hospedagem
atípico" segundo a expressão gravada no voto do em. Ministro RAUL ARAÚJO.
(p. 41)

De fato, a tese e a antítese sustentadas, pelas partes litigantes tratam,


exclusivamente, da qualificação dos serviços fornecidos pela recorrente,
discussão que não sofre influência pela forma com que são oferecidos ou
contratados, se por meio de aplicativo ou mesmo por qualquer outra modalidade
(imobiliária, anúncio em jornais, panfletagem etc.). (p. 41)

Sob outra perspectiva, se acaso estivéssemos afirmando que os vínculos entre a


recorrente e os usuários de seu apartamento deram-se sob a forma de locação
residencial, mesmo que para temporada, o mero fato de haver sido formalizada
por intermédio de um aplicativo não a transformaria em "atividade comercial",
proibida pela convenção do condomínio. (p. 42)

Se tratássemos aqui de uma locação para temporada pura, sem a oferta de


qualquer serviço adicional, ainda que avençada por meio de um aplicativo,
possivelmente não teria a mesma sorte este recurso, ao menos sob a minha
compreensão, ressalvada a hipótese de expressa vedação na convenção
condominial, o que não se noticia neste caso. (p.42)

É indiferente o meio pelo qual ele é divulgado ou a forma com que é feita a
contratação, se por intermédio de um aplicativo, imobiliária, anúncio em jornal
ou até mesmo contato pessoal. (p.42)
43

Em tais circunstâncias, consigno e reafirmo meu entendimento pessoal de que a


contratação realizada por meio de aplicativos em plataformas como o "AirBNB"
não implica transformar, por si, a locação do imóvel em atividade comercial. (p.
43)

As palavras do eminente Ministro Antonio Carlos Ferreira, que acompanhou a


divergência aberta pelo Ministro Raul Araújo estão perfeitamente alinhadas as idéias
defendidas neste trabalho logo na introdução, onde afirmamos que o simples fato do
AIRBNB chamar o locador de anfitrião e o locatário de hospede em nada muda a
característica do contrato de locação por temporada, que é uma modalidade de contrato
típico, definido na exegese do artigo 48 da lei 8.245/91 sendo exemplificativo o rol relativo
ao uso do imóvel pelo locatário como já mencionamos.

Outro aspecto importante no voto acima analisado, é que pouco importa o meio
como a relação contratual foi firmada entre a recorrente e seus hóspedes, em nada mudará
o núcleo central do conflito.

Interpreto como perfeitamente válidas a locação por temporada, através de


aplicativos de mensagens instantâneas, como a forma implícita constantenos grifos do
ministro Antônio Carlos Ferreira.

A forma como a recorrida utilizava o imóvel como se “hostel” fosse e estava


consignado nas próprias palavras dela, não fazendo muito sentido o caso ter tido a
abrangência midiática como teve à época em que foi decidido pelo STJ. Talvez por
imprecisão técnica ou por estratégia da defesa em dar notoriedade ao caso para que
houvesse manipulação da opinião pública sobre o caso de forma a criar uma antipatia da
sociedade contra a Justiça forçando uma decisão diversa da que houve.

O Fato é que o voto acima analisado se revestiu de muita prudência técnica para
que a solução jurídica fosse dada, muito embora eu comungue completamente com o voto
do ministro Luiz Felipe Salomão.

O caso em questão embora não possua informações que o liguem a nossa pesquisa,
o que em partes é verdade, traz elementos importantes que como os transcritos no voto do
ministro acima mencionadosnos trazem reflexões que não poderiam deixar fora do debate.
44

Após o julgamento deste Recurso Especial o AIRBNB se manifestou que a


plataforma não permite o uso da forma como era usado pela recorrente, pois feria as regras
de uso da plataforma conforme nota abaixo:

Nota do Airbnb

Em nota o Airbnb declarou que "os ministros destacaram que, no caso específico
do julgamento, a conduta da proprietária do imóvel, que transformou sua casa
em um hostel, não estimulada pela plataforma, descaracteriza a atividade da
comunidade de anfitriões. Além disso, os ministros ressaltaram que a locação via
Airbnb é legal e não configura atividade hoteleira, e afirmaram que esta decisão
não determina a proibição da atividade em condomínios de maneira geral.
Proibir ou restringir a locação por temporada viola o direito de propriedade de
quem aluga seu imóvel regularmente."

4.2. Recurso Especial 1.495.920/DF

Abaixo trago a ementa de Recurso Especial 1.495.920/DF, onde se analisa a


validade do título executivo extrajudicial firmado por meio eletrônico e com assinatura
digital.

RECURSO ESPECIAL. CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO DE


TÍTULO EXTRAJUDICIAL.EXECUTIVIDADE DE CONTRATO
ELETRÔNICO DE MÚTUO ASSINADO DIGITALMENTE
(CRIPTOGRAFIA ASSIMÉTRICA) EM CONFORMIDADE COM A
INFRAESTRUTURA DE CHAVES PÚBLICAS BRASILEIRA.
TAXATIVIDADE DOS TÍTULOS EXECUTIVOS. POSSIBILIDADE, EM
FACE DAS PECULIARIDADES DA CONSTITUIÇÃO DO CRÉDITO, DE
SER EXCEPCIONADO O DISPOSTO NO ART. 585, INCISO II, DO CPC/73
(ART. 784, INCISO III, DO CPC/2015). QUANDO A EXISTÊNCIA E A
HIGIDEZ DO NEGÓCIO PUDEREM SER VERIFICADAS
DE OUTRAS FORMAS, QUE NÃO MEDIANTE TESTEMUNHAS,
RECONHECENDO-SE EXECUTIVIDADE AO CONTRATO ELETRÔNICO.
PRECEDENTES.

4. Nem o Código Civil, nem o Código de Processo Civil,


inclusive o de 2015, mostraram-se permeáveis à realidade negocial vigente e,
especialmente, à revolução tecnológica quetem sido vivida no que toca aos
modernos meios de celebração de negócios, que deixaram de se servir
unicamente do papel, passando a se consubstanciar em meio eletrônico.
5. A assinatura digital de contrato eletrônico tem a vocação
de certificar, através de terceiro desinteressado (autoridade
certificadora), que determinado usuário de certa assinatura a utilizara e, assim,
está efetivamente a firmar o documento eletrônico e a garantir serem os mesmos
os dados do documento assinado que estão a ser sigilosamente enviados.
45

Em síntese, o Recurso Especial ação de execução extrajudicial, a fim de reconhecer


a executividade do contrato assinado digitalmente sem a aposição da assinatura de duas
testemunhas. O juízo de primeiro grau, extinguiu o processo, sem resolução de mérito,
indeferindo a petição inicial, por entender ausenteos elementos essenciais para a
constituição do título executivo.

Irresignada, a FUNCEF recorreu à segunda instância do TJDFT. Contudo, a decisão


foi favorável a recorrida, mantendo a sentença extintiva destacando a taxatividade do rol de
títulos executivos extrajudiciais.

Importante destacar que o próprio Tribunal de Justiça do Distrito Federal em sede


de acordão não questionou a validade jurídica do contrato de mútuo celebrado via internet
e sim que a ausência de assinatura de duas testemunhas em contrato eletrônico assinado
digitalmente não tem o condão de tornar eficaz a executividade deste contrato.

Diante disso, foi interposto Recurso Especial, ora analisado, sob os fundamentos de
violação a alínea "a" do inciso III do art. 105 da CF, contra o acórdão do Egrégio Tribunal
de Justiça do Distrito Federal e Territórios,

O voto do relator MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO, que foi


favorável ao prosseguimento da ação reconhecendo a assinatura digital tem o condão para
o reconhecimento do contrato título executivo extrajudicial. Em seu voto encontramos as
seguintes passagens que julgo importante mencionarmos neste trabalho e reforçar o
reconhecimento natural da validade jurídica dos contratos firmados não somente nos
contratos de temporada, mas em outras espécies contratuais.

A assinatura digital realizada no instrumento contratual eletrônico


mediante chave pública (padrão de criptografia assimétrico) tem a vocação de
certificar - através de terceiro desinteressado (autoridade certificadora) - que
determinado usuário de certa assinatura digital privada a utilizara e, assim, está
efetivamente a firmar o documento eletrônico e a garantir serem os mesmos os
dados do documento assinado que estão a ser enviados.

A verdade é que nem o Código Civil, nem o Código de Processo Civil se


mostraram totalmente permeáveis à realidade negocial vigente e, especialmente,
à revolução tecnológica que tem sido experienciada no que toca aos modernos
meios de celebração de negócios. Eles não mais se servem do papel, senão são
consubstanciados em bits.( p. 15)
46

O contrato eletrônico, em face de suas particularidades, por regra, tendo


em conta a sua celebração à distância e eletronicamente, não trará a indicação
de testemunhas, o que, entendo, não afasta a sua executividade. (p. 26)

Não há dúvidas de que o contrato eletrônico, na atualidade, deve ser, e o


é, colocado em evidência pela sua importância econômica e social, pois a
circulação de renda tem-no, no mais das vezes, como sua principal causa. (p.26)

Acerca dos requisitos do contrato eletrônico, ou para que sejam utilizados


como prova, Patrícia Peck lembra exigirem: "a certificação eletrônica,
assinatura digital, autenticação eletrônica, para manter a autenticidade e
integridade do documento, conforme o meio que foi utilizado para a sua
realização." (p.29)

Pelos grifos aqui trazidos nos reforça a idéia, digamos progressista do entendimento
do ministro relator em reconhecer a executividade do contrato assinado digitalmente sem
as assinaturas das duas testemunhas.

Neste Recurso Especial, até mesmo o voto-vista, divergente do Eminente Ministro


Ricardo Villas Bôas Cueva reconhece o caminho natural dessa validade jurídica. Concorda
com o relator naquilo que tange ao descompasso das revoluções tecnológicas recentes
atrelada as relações negociais eletrônicas.

A divergência se deu em não reconhecer que a assinatura digital pudesse formar


título executivo extrajudicial, pelo fato de não haver disposição expressa em lei. Extraímos
de seu voto as seguintes citações:

Essas modernas formas de contratação vêm se tornando cada vez mais


importantes economicamente e é provável que, em um futuro próximo, superem
as modalidades convencionais, razão pela qual exigem uma pronta e adequada
resposta do ordenamento jurídico.

Ocorre que reconhecer a força probante e a validade jurídica de um


documento eletrônico é algo significativamente diferente de lhe atribuir força
executória. (p. 37)

Esse julgado mostra como o direito é uma ciência viva e em movimento, pois a
medida que a tecnologia avança, faz-se necessário que o direito também acompanhe esse
avanço, pois os conflitos inerentes a vida em sociedade também avançará.

Concordo com o voto do Relator em reconhecer a executividade dos contratos


assinados digitalmente, muito embora o rol do artigo 784, III, CPC/15 traga expressa essa
exigência de duas testemunhas. É fato que, como ministro Villas Boas registrou, muito em
breve essa modalidade de contratação será maioria e em algum momento o judiciário
47

precisará uniformizar seu entendimento, bem como o legislativo precisará avançar mais em
garantir a segurança jurídica necessária em sintonia com a relações na era digital.
48

5. CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao longo deste trabalho, revisitamos conceitos da Teoria Geral de Contratos, visto


nos primeiros anos do curso de Direito, bem como nos debruçamos sobre os conceitos
elementares do Direito Digital de modo que pudesse contextualizar o caminho trilhado
para compreensão do objeto deste trabalho.

Acredito que o recorte epistemológico foi preciso o suficiente para que o trabalho
não ficasse demasiadamente grande e cansativo para o ato a que ele se propõe e nem curto
o bastante por conta de sua elementaridade no mundo jurídico.

Ao longo da pesquisa, deparamo-nos com um fato jurídico que ainda pode render
muitos trabalhos acadêmicos, muita discussão judicial e pode até ser objeto para
dissertação de mestrado ou tese de doutoramento, para que possa subsidiar o legislador a
amortecer tal anomia que paira sobre o enquadramento jurídico dos contratos de locação
firmados pelas plataformas digitais, pela inegável relevância que o assunto inspira. O
enquadramento jurídico do aluguel pelo AIRBNB me fez lembrar do conceito de hard
case, criado por Ronald Dworkin.

Embora as relações contratuais firmadas por esta plataforma digital não fossem
objeto de nossa pesquisa, era impossível não ter trazido ela para análise e comparação com
o modelo de locação por temporada firmado por meio de aplicativo de mensagens
instantâneas, por ele representar o avanço desse modelo de relação contratual.

No começo deste trabalho estabelecemos nosso posicionamento sobre o


enquadramento jurídico na plataforma digital que é locação por temporada, o que ao longo
da pesquisa reforçamos esse entendimento,mesmo sendo um posicionamento tido como
minoritário.

Talvez seja necessário que pesquisas interdisciplinares possam ajudar o Direito


nessa jornada, de compreensão deste fenômeno. A controvérsia entorno do enquadramento
jurídico do AIBNB me fez lembrar da história mais conhecida de Barão de Munchhausen:

“AsViagens Maravilhosas por Mar e Terra: Campanhas e Aventuras


Cômicas do Barão deMünchhausen”. Como se sabe, entre as aventuras do
Barão de Münchhausen, uma das que mais se destacou é aquela em que, ao
passear a cavalo, o Barão acaba embrenhando-se num pântano e como afundava
cada vez mais sem alguém que o pudesse socorrer, o Barão não teve dúvida:
49

puxou a si mesmo pelos cabelos, até que conseguiu sair com cavalo e tudo do
atoleiro.

Essa história é muito usada na sociologia quando se estuda sobre métodos de


pesquisa em ciências sociais, onde o puxar-se pelo cabelo representa afastar-se das pre-
noções, visões de mundo socialmente construídas,para assim entender o fenômeno de uma
certa distância para não contaminar sua análise com pré-noções. Penso nessa parábola ao
avesso, pelo fato do algo novo aos nossos olhos, onde devemos nos pegar pelo cabelo e nos
inserir no contexto, para a partir daí podemos apreender a realidade, sair com alguma pré-
noção de dentro do fenômeno e se afastar dele para construir a ciência. Afastar-se do senso
comum, para em seguida construir conhecimento dentro da bolha da ciência, que possa não
ser somente pelo conteúdo em si, mas para criação de uma práxis.

Vimos que a locação por temporada é perfeitamente possível, por meio de


aplicativos de mensagens instantâneas e isso está evidenciado nas transcrições da ementa
dos Recursos Especiais aqui colacionados, mesmo que não versassem exatamente sobre
formação de contrato por meio de aplicativos de mensagens instantâneas, pois a validade
do negócio jurídico independe do meio empregado para tal.

Os elementos necessários para que se firme o contrato no meio digital em nada ou


quase nada difere do meio tradicional, os quesitos de existência validade e eficácia fazem-
se presentes e é imperativo.

Locador e locatário precisam ser diligentes desde a puntuação, pois estando


distantes, uma demanda judicial seria muito difícilpara qualquer uma das partes por conta
da própria característica da relação firmada e dos custos envolvidos.

A teseprevalente que vem sendo construída é a de que a locação por meio de


plataformas digitais, principalmente em condomínios edilícios são atividades de
hospedagem atípicas e que podem trazer insegurança para os moradores do condomínio
conforme defende VENOSA, o que reputo falacioso pelo fato que a locação por meio de
plataformas digitais (AIRBNB, BOOKING) exigem cadastro prévio, com verificação de
perfil através de documento de identidade, telefone, além de que os “hóspedes” são
avaliados pelos anfitriões. Qualquer regra quebrada pode implicar na exclusão de uso
conforme os termos de uso da plataforma. A entrada de hospedes cadastrados por meio da
plataforma de locação em um condomínio é muito mais seguro que a entrada de um
50

prestador de serviços seja ele qual for, não mencionarei aqui nenhuma categoria para não
parecer preconceituoso, mas que diariamente nos condomínios entram vários.

Esse entendimento tem sido a principal tese que beneficia a indústria hoteleira, que
tem visto seus lucros caírem com a explosão no uso desta modalidade de hospedagem, nos
últimos anos e que timidamente vem provocando legisladores locais a aprovarem leis como
barreiras ao avanço dessa prática.

Não estamos aqui fazendo propaganda para nenhuma empresa. Nossa análise é
jurídica, técnica e fria, pois aqui estamos a fazer ciência com neutralidade necessária para
com tranquilidade ter e expressar um posicionamento firme quanto a modalidade de
contrato firmado na plataforma. Há algumas impropriedades que podem ser corrigidas para
que ela se adeque a lei a lei do inquilinato. Isso não é garantia, de que os usuários tentem
burlar, tanto o anfitrião como o hospede suas regras de uso como no Recurso Especial
analisado, na intenção de conseguir alugar por fora e não pagar as comissões de uso do
aplicativo.

A pergunta que fica: sendo proibida a locação via AIRBNB a locação firmada por
meio de aplicativos de mensagens instantâneas seriam proibidos também? Acho difícil que
isso ocorra, pois seria ferir gravemente direitos constitucionais garantidos no que tange ao
direito real de habitação, além de ser desproporcional. Considero que a locação por meio
de aplicativos de mensagens instantâneas não oferece o mesmo nível de segurança negocial
que as plataformas digitais, pois a internet é terra fértil de golpista, somente a recomendo
se houver referências de quem já contratou ou conhece o locador, pois em caso de golpe a
plataforma é responsável pelo ressarcimento enquanto alugando direto o risco é do
locatário.
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REFERÊNCIAS

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1999.

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Direito Civil / 2ª ed. São Paulo: Atla; 2004.

BRASIL. Lei n. 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Disponível


em:<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/2002/L10406compilada.htm>. Acesso em
20 set. 2022.

BRASIL, Decreto-lei 4657, de 4 de setembro de 1942, dispõe sobre a lei de Introdução ao


Direito
Brasileiro;https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del4657compilado.htmAcesso
em 20 set. 2022.

BRASIL,LEI Nº 10.406, DE 10 DE JANEIRO DE


2002http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decretolei/del4657compilado.htmDisponível
em: Acesso em: 09 out. 2022.

BRASIL. Lei nº 8.245, de 18 de outubro de 1991; dispõe sobre as locações dos imóveis
urbanos e os procedimentos a elas pertinentes.Diponível
em:https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8245.htmAcesso em 20 set. 2022.

BRASIL, Lei 12.965 de 23 de abril de 2014: Disponivel em:


https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2014/lei/l12965.htm acesso em: 20
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53

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temporada-atraves-de-plataformas-digitais-como-ficam-os-alugueis-pelo-airbnb/
acesso em 21 de outubro de 2023

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Disponível em: https://www.infomoney.com.br/minhas-financas/stj-define-que-
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