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Reeducação postural global e alongamento estático segmentar na melhora da

flexibilidade, força muscular e amplitude de movimento: um estudo comparativo


Global posture reeducation and static muscle stretching on improving flexibility,
muscle strength, and range of motion: a comparative study
José Luís Pimentel do Rosário1, Adriana de Sousa2, Cristina Maria Nunes Cabral3,
Silvia Maria Amado João4, Amélia Pasqual Marques4

1
Fisioterapeuta; Ms. RESUMO: Exercícios de alongamento são usados para aumentar a flexibilidade e
2
amplitude de movimento (ADM). Entre os métodos existentes, destacam-se a
Fisioterapeuta; mestranda em
Ciências da Reabilitação no reeducação postural global (RPG), que promove o alongamento global das cadeias
Fofito/FMUSP (Depto. de musculares, e o alongamento segmentar, que alonga um músculo ou grupo muscular
Fonoaudiologia, Fisioterapia e específico. Este estudo visou comparar o alongamento segmentar e o global pela
Terapia Ocupacional da técnica de RPG quanto ao ganho de flexibilidade, ADM e força muscular. Trinta
Faculdade de Medicina da mulheres foram distribuídas aleatoriamente em três grupos (n=10 em cada): o
Universidade de São Paulo,
São Paulo, SP) grupo global fez alongamento de cadeias musculares; o grupo segmentar realizou
alongamento segmentar; e o grupo controle não fez alongamento. Antes e depois
3
Fisioterapeuta; Profa. Dra. do do tratamento, em todos os grupos, foram avaliadas a ADM de extensão da perna,
Programa de Mestrado em flexibilidade pelo teste 3o dedo-solo e força isométrica de flexão da perna em 45°
Fisioterapia, Universidade e 90°. Os dois grupos experimentais realizaram oito sessões de alongamento de
Cidade de São Paulo, São
Paulo, SP 30 minutos cada, duas vezes por semana. Toda a análise estatística foi realizada
com p<0,05. Os resultados dos grupos global e segmentar foram semelhantes
4
Fisioterapeutas; Profas. Dras. entre si e superiores aos do grupo controle na ADM, flexibilidade e força muscular
do Curso de Fisioterapia,
em 45° e 90° (p<0,05). Na avaliação intra-sessões, os dois grupos também tiveram
Fofito/FMUSP
desempenhos semelhantes, com ganho relativo da ADM maior nas primeiras e
decrescendo ao longo das sessões. Ambas as técnicas de alongamento foram pois
igualmente eficientes no aumento de flexibilidade, ADM e força muscular.
ENDEREÇO PARA
CORRESPONDÊNCIA
DESCRITORES: Amplitude de movimento articular; Elasticidade; Exercícios de
Amélia P. Marques alongamento muscular; Força muscular
Fofito/ FMUSP
Rua Cipotânea 51 Cidade ABSTRACT: Stretching exercises are prescribed to increase flexibility and range
Universitária of motion (ROM). Two current stretching methods are the global posture
05360-160 São Paulo SP reeducation (GPR), where muscle chains are stretched, and segmentary
e-mail: pasqual@usp.br exercises, where a single muscle or muscle group is stretched. The aim of
this study was to compare these two techniques, assessing their effects on
improving flexibility, ROM and muscle strength. Thirty women were randomly
distributed into three groups (n=10 each): global group performed stretching
following GPR method; segment group performed segment stretching exercises;
and control group did no exercise. Before and after treatment, in all groups,
knee extension ROM, flexibility by means of the fingertip-to-floor test, and
isometric muscular strength at 45° and 90° knee flexion were measured. Each
treated group performed eight stretching 30-minute sessions for four weeks,
twice a week. Data were statistically analysed and the significance level
set at p<0.05. Global and segment group results were similar and better than
control group’s concerning ROM, flexibility and muscle strength at 45° and
90° knee flexion (p<0.05). When assessing improvement inter-sessions, both
groups had better ROM improvement at the first sessions, decreasing along
the others. Both global and segmentary stretching techniques were hence
APRESENTAÇÃO
set. 2006 found effective in improving flexibility, ROM and leg muscle strength.
ACEITO PARA PUBLICAÇÃO KEY WORDS: Elasticity; Muscle strength; Muscle stretching exercises; Range of
ago. 2007 motion, articular

12 FISIOTERAPIAEEPESQUISA
FISIOTERAPIA PESQUISA2008;
2008; 15(1):
1 5( 1) 12-8
Rosário et al. Comparação entre alongamento global e segmentar

INTRODUÇÃO O alongamento segmentar de um des-


ses músculos, ao não levar em conta
mento global tem se mostrado eficien-
te no tratamento dos desvios posturais
Os exercícios de alongamento têm as compensações secundárias que e no ganho de flexibilidade, porém a
como principal objetivo proporcionar ocorrem na respectiva cadeia mus- literatura ainda é escassa6,8,9. Dessa
maior flexibilidade a qual, segundo cular, poderiam torná-lo menos forma, o objetivo deste estudo foi
Bandy et al.1, é a habilidade de um eficiente 6. comparar os dois tipos de alongamento
músculo aumentar seu comprimento, – segmentar e global pela técnica de
Em relação ao aumento de ADM,
possibilitando a uma ou mais arti- RPG – na melhora da flexibilidade,
alguns estudos foram realizados para
culações, em seqüência, se moverem força muscular e ADM de indivíduos
demonstrar os benefícios do alongamen-
em uma determinada amplitude de sem lesão musculoesquelética.
to segmentar. Bandy et al.2 compararam
movimento (ADM).
os efeitos de diferentes repetições diárias
Na prática clínica, freqüentemente e durações do alongamento ativo
segmentar dos músculos isquiotibiais
METODOLOGIA
o alongamento estático é o mais utili-
zado por ser considerado mais seguro, sobre a flexibilidade, medida pelo en- O estudo foi realizado no Centro de
pois uma força relativamente constante curtamento dos mesmos músculos. Os Docência e Pesquisa do Departamento
é aplicada vagarosa e gradualmente sujeitos avaliados foram divididos em de Fonoaudiologia, Fisioterapia e Te-
até um ponto tolerado pelo paciente cinco grupos: o primeiro realizou três rapia Ocupacional e o projeto foi apro-
(que representa o ponto de maior com- repetições de alongamento com vado pelo Comitê de Ética do Hospital
primento muscular possível, de forma duração de um minuto, o segundo três das Clínicas da Faculdade de Medici-
a evitar o reflexo de estiramento) e repetições com duração de 30 segun- na da Universidade de São Paulo.
mantida por um curto período de dos, o terceiro, uma repetição de alon-
tempo2,3. Ainda que Lardner4 considere gamento por um minuto, o quarto uma Sujeitos
alongamento estático só o que é reali- repetição com 30 segundos de duração
zado por uma força passiva, externa e o quinto foi o grupo controle. Os Participaram do estudo 33 volun-
ao paciente (por exemplo, um fisiote- alongamentos foram realizados duran- tárias sem lesão musculoesquelética
rapeuta), o mesmo pode ser realizado te seis semanas com freqüência de de tipo algum, selecionadas de acordo
pelo próprio indivíduo, desde que haja cinco vezes semanais. Os autores com os seguintes critérios:
relaxamento muscular na posição constataram que, quando o objetivo é
• ter idade entre 21 e 30 anos;
alongada. aumentar a ADM, alongamentos com
duração de 30 segundos mostram-se • ser do sexo feminino, para garan-
O alongamento estático normal- efetivos, e que não houve diferença tir maior homogeneidade da
mente é utilizado para alongar isola- quando a duração do alongamento amostra;
damente um músculo até um ponto aumentou de 30 para 60 segundos ou
tolerável e sustentar a posição por cer- • apresentar encurtamento dos
a freqüência de uma para três vezes
to tempo, daí ser considerado segmen- músculos isquiotibiais, considera-
diárias.
tar. Por sua vez, o alongamento global do como uma perda de, pelo
alonga vários músculos simultanea- Guirro et al.7 avaliaram a flexibili- menos, 15° na extensão da perna;
dade e força dos músculos isquiotibiais
mente, pertencentes à mesma cadeia • consentir em participar do estudo
muscular, e parte do pressuposto de em contração isométrica com a perna
e assinar o termo de consenti-
que um músculo encurtado cria com- fletida a 30°, 90° e 120°, após um
mento pós-informação, livre e
pensações em músculos próximos ou programa de alongamento segmentar
esclarecido.
distantes 5. Essa técnica, conhecida em mulheres sem lesão musculoes-
como reeducação postural global quelética. O programa foi realizado Foram excluídas as voluntárias com
durante cinco semanas com fre- algum tipo de algia musculoesquelé-
(RPG), preconiza a utilização de postu-
qüência de três vezes semanais, sendo tica dos membros inferiores e de pa-
ras específicas para o alongamento de
realizadas 15 repetições de alonga- tologia que limitasse a amplitude de
músculos organizados em cadeias
mento passivo mantidas por 60 segun- movimento; as participantes que
musculares, sendo considerado de lon-
dos. Os resultados mostraram diminui- relatassem mudança na freqüência e/
ga duração (aproximadamente 15 minu-
ção do encurtamento dos músculos ou intensidade de prática esportiva
tos em cada postura). De acordo com a
isquiotibiais e aumento da força mus- durante o tratamento; e as que faltas-
RPG, as cadeias musculares são cons-
cular em todos os ângulos avaliados. sem a uma sessão e esta não fosse
tituídas por músculos gravitacionais que
trabalham de forma sinérgica dentro Na prática fisioterapêutica, são reposta na mesma semana.
da mesma cadeia. Por exemplo, todos usados com freqüência os exercícios Três participantes, devido às faltas,
os músculos da cadeia posterior possi- de alongamento de músculo ou grupos não completaram o tratamento. Dessa
bilitam a manutenção da posição musculares, ou seja, o alongamento forma, a amostra final foi constituída
ortostática contra a ação da gravidade. segmentar. Clinicamente, o alonga- por 30 mulheres, distribuídas aleatoria-

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mente em três grupos com 10 indi- teste realizado com a voluntária aumento da lordose lombar ou protru-
víduos cada: o grupo global fez em decúbito ventral, com o dina- são de ombros; evitar que as costelas
alongamento pela técnica de RPG; o mômetro fixado à parede e preso adotassem a posição inspiratória; e o
grupo segmentar (fez alongamento a seu tornozelo por meio de uma segmento lombar da coluna vertebral
segmentar; e o grupo controle não fez faixa de tecido sintético inexten- deveria permanecer retificado.
alongamento. sível. O objetivo foi medir a in-
No grupo segmentar, foram alonga-
tensidade da força isométrica
dos músculos que fazem parte das
Instrumentos (em Kgf) da flexão da perna a 45°
cadeias musculares e que também fo-
e 90°, sendo realizadas três
ram alongados no grupo global. Cada
Foram utilizados um goniômetro de repetições de 6 segundos com
alongamento durava 30 segundos,
acrílico transparente (Carci ®) com intervalos de 30 segundos entre
realizado passivamente ou de maneira
marcações de zero a 360°; fita métri- cada repetição. Um tempo de
autopassiva, bilateralmente, sempre
ca; dinamômetro (Filizola®) cilíndrico descanso de dois minutos foi dado
com a preocupação de fixar os seg-
com capacidade de 50 Kgf, devida- antes da mudança de angulação.
mentos próximos a fim de evitar
mente calibrado; colchonetes e maca A instrução dada era que as vo-
compensações. Os exercícios de
para as sessões de alongamento. luntárias fizessem o máximo de
alongamento foram baseados em
força no sentido da flexão da
Kisner e Colby13 e Kendall et al. 14.
Procedimentos de avaliação perna assim que ouvissem o
Foram alongados os seguintes músculos
comando inicial, e relaxassem
nas posições:
A avaliação de todas as partici- ao comando final. Durante as
pantes, realizada na primeira e última contrações isométricas, foram • decúbito dorsal: músculos isquio-
sessões, consistiu em: preenchimento dados estímulos verbais por parte tibiais, flexor curto e longo dos
de um protocolo onde se registraram do examinador. Foi considerada dedos, flexor profundo e super-
dados pessoais; e avaliação das a maior medida obtida nas três ficial dos dedos, flexor curto e
seguintes variáveis: repetições em cada posição7. longo do hálux, paravertebrais,
glúteos, músculos lombares, fle-
• Encurtamento dos músculos
isquiotibiais: foi medido pela Sessões de alongamento xor longo do polegar e adutor do
polegar, subescapular, deltóide,
amplitude de extensão da perna.
As sessões tiveram duração de 30 pronador redondo e pronador
A voluntária ficava em decúbito
minutos e foram realizadas duas vezes quadrado;
dorsal, mantendo as pernas fleti-
por semana durante quatro semanas, • decúbito ventral: músculos gas-
das com os pés apoiados no
colchonete. A coxa direita foi po- com intervalo mínimo de 48 horas trocnêmios e sóleo, peitoral
sicionada em flexão de 90° e entre as sessões. maior, peitoral menor, bíceps
solicitava-se que estendesse ati- No grupo RPG, as participantes braquial e braquial;
vamente a perna, aplicando-se o foram submetidas a duas posturas de • sentada: músculos adutores de
goniômetro com o braço fixo alongamento mantidas por 15 minutos membro inferior, iliopsoas, tra-
apontando para o trocânter maior cada, em abertura e fechamento do pézio superior, pronador redondo
do fêmur, o fulcro no centro da ângulo coxofemoral. A decisão sobre e pronador quadrado.
articulação do joelho seguindo a quais posturas seriam utilizadas em
linha do epicôndilo lateral do cada sessão teve como parâmetros os
fêmur, e o braço móvel apontan- testes de abertura e fechamento de
Análise estatística
do para o maléolo lateral2,10. As ângulo coxofemoral e membros Foi realizada com nível de signifi-
medidas foram obtidas sempre no superiores, segundo procedimento de cância de 5% e os intervalos com coe-
joelho direito. Marques 12 . Essas posturas eram ficientes de confiança de 90%, pelos
• Flexibilidade: foi utilizado o teste realizadas em decúbito dorsal quando testes qui-quadrado, t de Student,
3o dedo–solo. A voluntária ficava o objetivo era trabalhar com maior ANOVA e Kruskal-Wallis. O teste qui-
em posição ortostática com os ênfase os membros superiores e o seg- quadrado foi usado para analisar a
pés paralelos e em seguida mento cervical da coluna vertebral; variável qualitativa “atividade física”
realizava flexão do tronco man- na posição sentada, quando a ênfase das voluntárias.
tendo os braços e a cabeça rela- era no tórax e coluna vertebral; e em
O teste ANOVA foi usado para
xados. O avaliador media a dis- pé, quando se focalizavam tronco e
comparar os grupos sob suposição de
tância perpendicularmente do membros inferiores.
normalidade e igualdade de variância.
terceiro dedo da mão direita ao
Em todas as posturas eram tomados A confirmação dos resultados da
solo10,11.
alguns cuidados: não permitir compen- ANOVA foi feita pelo teste de Kruskal-
• Força muscular: medida pelo sações em outras articulações, como Wallis, que é não paramétrico. Os

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Rosário et al. Comparação entre alongamento global e segmentar

intervalos de confiança para a média


19 Limite superior
Superior
dos grupos foram construídos para a 1
1 2
Média

Melhora relativa
identificação dos grupos discrepantes. 1
Para confirmação do que foi visuali- 12 2 Limite inferior
Inferior
zado nos gráficos de intervalos de 2
confiança, o teste Kruskal-Wallis foi
utilizado na comparação dois a dois 5
3
dos grupos. 3
-2 3
A variável utilizada em todos os
testes estatísticos foi o ganho relativo Global Segmentar Controle
(GR) comparando-se o pré e o pós-trata- Sessões
mento, de acordo com as seguintes
fórmulas: Gráfico 1 Ganho relativo (intervalos de confiança a 90%) de ADM de extensão
da perna nos grupos global, segmentar e controle
• GR = 100 X (pós-pré)/pré, no caso
onde aumento significa melhora;
• GR = 100 X (pré-pós)/pré, no caso Ganhode
Ganho relativo relativo de ADM intra-sessões
ADM: intervalos com 90% de confiança
onde diminuição representa 10 Limite superior
melhora. Média
8 Limite inferior
Os procedimentos estatísticos utili-
Melhora relativa

zados neste trabalho podem ser encon-


6
trados em detalhe em Noether15.

4
RESULTADOS
2
A análise dos dados demográficos
(Tabela 1) não evidenciou diferença
estatisticamente significante entre os 0
grupos em relação à idade (p=0,16) e 1ª 2ª 3ª 4ª 5ª 6ª 7ª 8ª
ao nível de atividade física (p=0,5). Gráfico 2 Ganho relativo (intervalos de confiança a 90%) de ADM de extensão
Além disso, todas as voluntárias eram da perna intra-sessões de alongamento nos grupos global (à esquerda
do sexo feminino, estudantes e solteiras. em cada coluna) e segmentar (à direita)
Tabela 1 Idade e atividade física das participantes dos grupos global, Os valores médios do ganho rela-
segmentar e controle tivo de ADM da extensão da perna,
Global Segmentar Controle de flexibilidade e de força de flexão
Variável p da perna a 45° e 90° são apresentados
(n=10) (n=10) (n=10)
na Tabela 2. Foi observada diferença
Idade (anos – médiardp) 22,7r1,8 21,7r1,7 21,3r1,3 0,16
estatisticamente significante entre os
Atividade física
três grupos no ganho de ADM,
Ativas 40% 20% 30% flexibilidade e força muscular (p<0,05)
0,5
Sem atividade 60% 80% 70% pela ANOVA. Quando o teste Kruskal-
Wallis comparou os grupos dois a dois,
Tabela 2 Ganho relativo (média±desvio padrão e valores de p) após o
não houve diferença significante entre
tratamento em cada variável estudada nos grupos global, segmentar e
os grupos que realizaram alongamento
controle
na ADM (p=0,12), flexibilidade
Global Segmentar Controle p (p=0,28) e força muscular a 45° (p=0,92)
Variável p K-W
(n=10) (n=10) (n=10) Anova e 90° (p=0,92), indicando igualdade
Encurtamento dos entre eles.
músculos isquiotibiais (°) 16r3,8 12,6r7,8 0,9r4,1 0,001 0,12
Flexibilidade (cm) 9,6r8,8 2,7r2,5 1,3r0,9 0,02 0,28 O Gráfico 1 mostra os intervalos
de confiança para o ganho relativo de
Força muscular a 90° (Kgf) 1,1r1,4 1,4r2,0 -0,5r1,3 0,02 0,92
ADM de extensão da perna dos três
Força muscular a 45° (Kgf) 2,2r1,1 3,1r3,2 -1r1,8 0,02 0,92 grupos. Entre os grupos que realizaram
K-W: teste de Kruskal-Wallis; os valores de p resultantes da aplicação desse teste alongamento, os intervalos de confian-
referem-se à comparação apenas entre os grupos global e segmentar. ça apresentam intersecção, indicando

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que não diferem significantemente en- isquiotibiais pode ser o fato de que a a realização de alongamentos manti-
tre si, porém diferem do grupo controle. RPG, por distribuir a força de alon- dos por 60 segundos estudando
gamento pelos músculos das cadeias, indivíduos idosos. Como a população
Na Gráfico 2 está representado o
diminui a intensidade sofrida por cada deste estudo tinha idade entre 21 e 30
ganho relativo de ADM de extensão
músculo isoladamente. Como, pela anos, inferiu-se que 30 segundos em
da perna intra-sessões para os grupos
Lei de Hooke16, o grau de deformação posição de alongamento eram su-
global e segmentar. A intersecção entre
é igual à força aplicada multiplicada ficientes para aumentar a flexibilidade
os grupos indica ausência de diferença
pelo tempo de aplicação, pode-se ter e ADM.
estatisticamente significante. Nota-se
encontrado um resultado não estatisti-
em ambos que a melhora relativa foi Outros autores estudaram os efeitos
camente significante entre os grupos
maior nas primeiras sessões, decres- da técnica de RPG e do alongamento
tratados pelo fato de o alongamento
cendo ao longo das mesmas. segmentar no tratamento de pacientes.
segmentar promover uma intensidade
Cabral et al.9 trataram pacientes com
alta o suficiente para compensar o
síndrome fêmoro-patelar por oito sema-
DISCUSSÃO curto tempo de alongamento.
nas e observaram que ambas as técni-
Torna-se necessário discutir a inten- cas aumentaram a ADM de extensão
O objetivo deste estudo foi compa- sidade do alongamento pela RPG nos da perna, porém o alongamento global
rar o efeito da RPG e do alongamento músculos posteriores dos membros produziu maior ganho de flexibilidade.
segmentar no ganho de flexibilidade, inferiores, já que essa técnica usa Essa diferença em relação ao presente
força muscular e ADM, sendo que a contrações excêntricas para a evolu- estudo pode ter ocorrido pela etiologia
hipótese inicial era que exercícios de ção das posturas, enquanto o alonga- específica dessa síndrome, baseada
alongamento com tempo de manuten- mento segmentar trabalha os músculos em encurtamentos musculares. Já
ção mais prolongado e em cadeias passivamente. Salvini17 e Alter18 des- Fernández-de-las-Peñas et al.8 trataram
teriam resultados mais favoráveis. Os crevem a eficácia da contração excên- pacientes com espondilite anquilosan-
dados dos dois grupos estudados apre- trica no ganho de ADM e hipertrofia te e observaram uma melhora da mo-
sentaram ganhos significantes após a muscular. Portanto, esperava-se que, bilidade do esqueleto axial após a
realização dos alongamentos, porém no presente estudo, houvesse no grupo realização de ambas as técnicas, o
os exercícios de curta e longa duração global um ganho maior de flexibili- que, apesar das diferentes regiões
(alongamento segmentar e RPG, res- dade, ADM de extensão da perna e, avaliadas, está de acordo com os
pectivamente) mostraram-se igual- em especial, de força muscular, tanto resultados obtidos neste estudo.
mente eficientes. pelo aumento da energia potencial
elástica relativa à maior ADM de Não existe consenso em relação à
Neste trabalho, a RPG foi aplicada freqüência com que os exercícios
extensão da perna quanto pelo treino
por um período de 15 minutos em cada devem ser realizados. Bandy et al.2 e
direto de força contrátil da muscula-
uma das duas posturas, enquanto o Feland et al.20 realizaram alongamen-
tura. Mas tal fato não ocorreu, ou seja,
grupo segmentar alongou vários mús- tos com freqüência de cinco vezes por
não foram encontradas diferenças
culos, à razão de 30 segundos cada semana e Grandi19 apenas uma vez por
significantes dessas variáveis entre os
músculo, resultando em um tempo semana. Neste estudo, os exercícios
dois tipos de alongamento. Isso pode
total de alongamento dos dois grupos de alongamento foram realizados duas
significar que, durante o tratamento
de aproximadamente 30 minutos por vezes por semana e os resultados foram
com alongamento global, não houve
sessão. Em relação ao tempo de ma- satisfatórios no ganho de flexibilidade
estimulação contrátil suficiente nos
nutenção, os achados deste estudo vão e força muscular e na diminuição do
músculos isquiotibiais para provocar
contra o postulado por Kisner e Colby13, as diferenças esperadas. encurtamento dos músculos isquio-
de que o alongamento de 20 minutos tibiais.
ou mais traria melhores ganhos que os Alguns estudos investigaram os efei-
de curta duração. tos do alongamento muscular segmen- O aumento da força muscular rela-
tar na ADM, considerando como forma tivo ao ganho de flexibilidade em
A RPG pode ser enfática em um de avaliação o encurtamento dos humanos foi descrito por Guirro et al.7.
músculo, mas sua proposta é o alonga- músculos isquiotibiais. Bandy et al.2 Resultados semelhantes foram encon-
mento máximo não permitindo que observaram que, em uma população trados neste estudo, já que os grupos
haja compensações, ou seja, consiste de adultos jovens, o tempo de manu- tratados tiveram melhor desempenho
num tratamento que tem como uma tenção de 30 segundos é suficiente do que o controle, porém sem diferença
de suas premissas alongar um número para obter ganhos de flexibilidade. entre si. Aliás, talvez nem seja possí-
grande de músculos de uma única vez. Grandi19 não obteve diferenças entre vel falar apenas sobre aumento de for-
Por isso, outra possibilidade para expli- 18 e 30 segundos de manutenção no ça muscular, mas também de um me-
car a similaridade entre os grupos glo- mesmo tipo de população, enquanto canismo de maior vantagem mecâni-
bal e segmentar nas variáveis flexibili- Feland et al.20 constataram um aumen- ca possibilitando um melhor rendi-
dade e encurtamento dos músculos to na ADM de extensão da perna após mento21 pela otimização do uso da

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Rosário et al. Comparação entre alongamento global e segmentar

energia potencial elástica22-24. Tendo entre os grupos alongados após a As sessões dos dois grupos foram
em mente esse mecanismo de aprovei- intervenção. Como alguns autores26,27 individuais, permitindo um atendi-
tamento de energia potencial elástica, afirmam que o alongamento estático mento mais personalizado e sempre
é possível relacionar os resultados de de 45 segundos resulta num relaxa- com o mesmo fisioterapeuta, o que fa-
força muscular com o encurtamento mento do estresse viscoelástico instan- cilita o vínculo e fortalece a motivação
dos músculos isquiotibiais, pois os dois tâneo de 18 a 20%, com o encurta- para atingir as metas terapêuticas. A
grupos alongados se comportaram de mento usual voltando em menos de 1 figura do terapeuta que cuida e orienta
maneira semelhante, ganhando igual- hora, supõe-se que o ganho intra-sessão faz parte do papel pedagógico na con-
mente flexibilidade e vantagem me- tenha relação com a viscoelasticida- dução e aprendizagem dos exercícios,
cânica. de. No Gráfico 2, é possível notar que sugerindo sua influência nos resultados.
No presente trabalho, foi verificado a viscoelasticidade diminui progressi-
vamente com as sessões, mostrando
um aumento da força muscular dos
grupos que realizaram alongamento. que quanto mais alongada uma pessoa CONCLUSÃO
Isso significa que a energia potencial está, mais difícil é o ganho maior de
As duas técnicas de alongamento
elástica obtida pelo aumento da alongamento por efeito viscoelástico.
utilizadas, reeducação postural global
flexibilidade e ADM não substituiu a Outra justificativa para a resposta e estático segmentar, foram igualmen-
força perdida por uma suposta com- homogênea dos grupos é que o tra- te eficientes no ganho de flexibili-
placência do tendão. Os resultados tamento foi realizado seguindo os dade, amplitude de movimento e força
aqui obtidos levam a concordar com mesmos princípios: não permitindo muscular de indivíduos sem lesão
Deyne25, que calculou uma intensida- compensações, estimulando um ritmo musculoesquelética; ambas levaram a
de enorme da tensão gerada pelo respiratório lento e sem bloqueio inspi- resultados superiores aos do grupo
alongamento concentrada no músculo. ratório. O alongamento estático controle. Dessa forma, infere-se que
É muito provável que o alongamento segmentar é de execução mais sim- ambas podem ser utilizadas em situa-
não afete negativamente a transmissão ples, o que facilita sua aprendizagem. ções clínicas. Porém, para ampliar as
de força, e que, ao contrário, exerça Porém, seu procedimento adequado, repercussões clínicas, recomenda-se a
um efeito positivo nessa tarefa.
com atenção cuidadosa, se faz neces- realização de estudos semelhantes
Analisando o ganho de ADM obtido sário para obtenção do efeito obser- com diferentes lesões musculoesque-
intra-sessões, não houve diferença vado no presente estudo. léticas.

REFERÊNCIAS

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