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Trabalho em saúde na sociedade capitalista: um olhar

da ciência tecnologia e sociedade para as tecnologias


leves na atenção primária em saúde
Marina de Matteu Alves1
Maria Lúcia Teixeira Machado2
Flávio Adriano Borges Melo3

Resumo: ​A sociedade capitalista desenvolveu um sistema abrangente de produção científica


e tecnológica, às custas de exploração, dominação e manutenção das desigualdades sociais,
refletindo nos processos de trabalho em saúde, condicionando uma produção de saúde de
forma não integrada, visando, muitas vezes, devolver o trabalhador à sua capacidade
produtiva, sem ocupar-se de suas reais necessidades. Objetivo: Analisar, sob o olhar da
Ciência, Tecnologia e Sociedade, o potencial das tecnologias leves para reorganização do
trabalho em saúde no âmbito da Atenção Primária em Saúde. Procedimentos
metodológicos: Como parte de Mestrado no Programa de Pós-Graduação em Ciência,
Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal de São Carlos, é apresentada revisão
bibliográfica de artigos científicos completos, disponíveis para leitura online, localizados no
Portal de Periódicos CAPES, a partir dos descritores [“tecnologias leves” AND “trabalho em
saúde”] e [“inovação em saúde” AND “atenção básica”]. Resultados parciais: Para o primeiro
conjunto de descritores foram encontrados 100 resultados publicados no período de 2003 a
2021 e para o outro conjunto: 48 resultados publicados de 2007 a 2020. Foram selecionados
os artigos revisados por pares, obtendo 33 e 7 resultados, respectivamente. As tecnologias
leves envolvem processos relacionais como tomada de decisões, desenvolvimento de
projetos terapêuticos, produção de vínculo, mediação de conflitos e acolhimento.
Considerações finais: Distintos princípios e interesses de gestão orientam o desenvolvimento
de tecnologias leves, caracterizando um cenário de contradições e disputas na produção
local de cuidado nos equipamentos de saúde pública. Para além da incorporação de
desenvolvimento científico e tecnológico, o trabalho em saúde se caracteriza como uma
prática social.

Palavras-chave: Atenção primária em saúde. Tecnologias leves. Trabalho em saúde.

Introdução
A sociedade capitalista desenvolveu um sistema abrangente de produção científica e
tecnológica, às custas de exploração, dominação e manutenção das desigualdades sociais,
1
Mestranda no Programa de Pós Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade da UFSCar,
marinamatteu@gmail.com, bolsista CAPES.

2
Doutora em Saúde Coletiva, Profa Associada Sênior do Programa de Pós Graduação em Ciência, Tecnologia e
Sociedade da UFSCar, mluciatmachado@gmail.com
3
Doutor em Ciências, Prof. Adjunto do Programa de Pós-Graduação em Enfermagem da UFSCar,
flavioborges@ufscar.br
refletindo nos processos de trabalho em saúde, condicionando uma produção de saúde de
forma não integrada, visando, muitas vezes, devolver o trabalhador à sua capacidade
produtiva, sem ocupar-se de suas reais necessidades. A tecnociência em sua sistematização
de conceitos para orientar processos e modos de produzir, é uma ferramenta com potencial
de garantir qualidade de vida aos seres humanos. Mas também podemos observar uma
excessiva dependência de tecnologias, centradas em si mesmas e deslocadas de seu valor de
uso, resultando até mesmo na perda de domínio da técnica (LORENZETTI et al., 2012). Se por
um lado as tecnologias e inovações tecnológicas implicam em maior complexidade da
inteligência humana e de máquinas, no surgimento de novas possibilidades de produção e
reprodução da vida, por outro há “campos em que o saber tecnológico, ainda que útil, é
insuficiente para assegurar os objetivos almejados” (CAMPOS, 2011, p. 3035).
As tecnologias desenvolvidas no trabalho em saúde são identificadas em tipos
conforme a sua gradação de materialidade. As tecnologias duras são materiais e
correspondem a equipamentos e ferramentas direcionados para determinadas finalidades.
As leve-duras são imateriais, definidas pelos conhecimentos estruturados que orientam as
práticas de saúde, mas são influenciadas pela abstração do(a) profissional de saúde, de
acordo com a singularidade da situação de sua mobilização. As tecnologias leves são as
ações e intenções que favorecem o encontro profissional-usuário(a) para a produção de
saúde e, portanto, imateriais (MERHY et al., 2019).
Analisar o trabalho em saúde proporciona a reflexão sobre o que vem sendo
produzido no campo científico e tecnológico da Saúde, como estão sendo mobilizados os
conhecimentos científicos e tecnológicos para a realização do trabalho em saúde e a
produção do cuidado (promoção de saúde, prevenção de doenças, tratamento) e, a partir
daí, questionar, como a saúde está sendo produzida e compartilhada nos espaços
território-regiões-nação como serviços, produtos, políticas e convivências. As ações de saúde
“se configuram como uma prática social permeada por uma prática técnica que é,
simultaneamente, social, sofrendo influências econômicas, políticas e ideológicas” (SILVA;
PAIM; SCHRAIBER, 2014, p. 7).
Nessa perspectiva, entende-se que a produção de atos assistenciais em saúde
resumido aos curativos não é suficiente diante das necessidades em saúde que se expressam
em um conjunto de aspectos fundamentais: boas condições de moradia e saneamento,
acesso a alimentos saudáveis, água potável, acesso a educação em todos os níveis, facilidade
de acesso a lazer, inserção no sistema produtivo com qualidade na atividade desenvolvida e
renda, etc. A Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), de 2006, pauta a organização de
ações e serviços em saúde a partir do reconhecimento do conceito ampliado de saúde,
garantindo a integralidade do cuidado. No entanto, uma revisão da PNAB ocorrida em 2017
(BRASIL, 2017), ameaça elementos estruturantes dessa modalidade de atenção e direciona
para caminhos de agravamento das desigualdades de acesso à saúde integral (FAUSTO et al.,
2018).
O presente trabalho busca analisar, sob o olhar da Ciência, Tecnologia e Sociedade, o
potencial das tecnologias leves para reorganização do trabalho em saúde no âmbito da
Atenção Primária à Saúde (APS).

Procedimentos metodológicos:
Realizou-se uma revisão bibliográfica de artigos científicos completos, disponíveis
para leitura online, como parte de pesquisa de Mestrado em fase inicial de desenvolvimento
no Programa de Pós-Graduação em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal
de São Carlos (UFSCar), que tem como objetivo analisar a produção do cuidado em saúde em
uma Unidade de Saúde da Família (USF) de São Carlos/SP, considerando as contradições na
produção de saúde na sociedade capitalista.
A busca do material na base de dados ocorreu em agosto de 2021, por meio do Portal
de Periódicos CAPES. Foram utilizados os descritores [“tecnologias leves” AND “trabalho em
saúde”] e [“inovação em saúde” AND “atenção básica”]. Para o conjunto de descritores
[“tecnologias leves” AND “trabalho em saúde”] foram encontrados 100 resultados
publicados no período de 2003 a 2021. Para o outro conjunto [“inovação em saúde” AND
“atenção básica”] o resultado foi de 48 artigos publicados de 2007 a 2020. Em seguida, foram
selecionados os artigos revisados por pares, escolhidos os artigos para leitura completa a
partir da identificação no título ou palavras-chave, de termos com aproximação ao tema da
pesquisa de mestrado: atenção primária, estratégia saúde da família, trabalho em saúde,
recursos humanos em saúde, capitalismo, produção de saúde, tecnologias leves, tecnologias
em saúde, tecnologia das relações. Após eliminar os arquivos repetidos foram obtidos 33 e 7
artigos, respectivamente, para cada conjunto de descritores.
A leitura dos resumos permitiu a exclusão de trabalhos que fugissem à temática da
APS. Em seguida à leitura integral dos textos, foram agrupados os conceitos e ideias
principais apresentados em forma de revisão bibliográfica narrativa. A análise do material
permitiu a apresentação dos resultados organizados em dois tópicos: observando a relação
entre inovação e desenvolvimento na APS e a contribuição das tecnologias leves para a
reorientação do modelo de atenção.

Atenção primária em saúde: inovação e desenvolvimento


O significado de inovação, de maneira geral, está associado à capacidade de gerar
riqueza, a partir de novas formas. O processo de inovação também gera novos
conhecimentos, tecnologias, formas de organização, distribuição e regulação e é marcado
por assimetrias globais traduzindo-se em desigualdades entre classes sociais, regiões e
países (GADELHA, 2018). Trata-se de um processo que deve ser dirigido, ou seja, não ocorre
de maneira espontânea, podendo ser radical, quando se cria algo inédito ou incremental
quando há a reformulação de produtos ou serviços existentes. Inovar em saúde, seja a partir
de respostas às mudanças no ambiente ou de ações que se antecipem para influenciá-lo,
requerem mudanças de conduta dos(as) envolvidos(os), tanto a nível de governo, com
atividades de regulamentação, apoio técnico e financeiro e regulação como de organização e
prestação de serviços (RASIA et al., 2014).
Os países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE)
utilizam em suas pesquisas as tipologias: produto, processo, marketing, organizacional
(Manual de Oslo, 2005) para classificar os diferentes aspectos de inovação.
Um estudo sobre inovações nas unidades básicas de saúde do município de Caxias do
Sul-RS, apresentou a correlação entre as tipologias, conforme manual de Oslo e dados
levantados sobre as inovações na APS utilizando a ferramenta PCATool. Observou-se que a
capacitação gerencial das Unidades Básicas de Saúde e a oferta de serviços especiais, como
atributos de competência cultural, impulsionam as inovações de produto. Já o incremento na
capacidade de integralidade do atendimento, que corresponde à variedade de serviços para
reconhecimento dos fatores biopsicossociais que causam doenças, estimula inovações de
processo. A inovação de marketing é incrementada pela variável coordenação, entendida
como integração da equipe de trabalho com a população, com sistema de informação que
acompanhe usuários(as) para outros níveis de atenção. As inovações organizacionais foram
correlacionadas à competência cultural, resultando na oferta de serviços especiais e o
reconhecimento das necessidades em saúde da população (NODARI et al., 2013).
Há o entendimento de que a APS tem um papel de “otimização dos serviços de
saúde” devido a sua característica de garantir serviços conforme o modelo de atenção e em
resposta às novas demandas de saúde (NODARI et al., 2013).
Há constatação de melhora na saúde da população brasileira como resultado de
avanços no Sistema Único de Saúde (SUS), nas políticas sociais e melhorias econômicas. Por
exemplo, houve aumento da expectativa de vida, redução das taxas de mortalidade por
doenças transmissíveis e causas evitáveis. E a ampliação de serviços da rede pública
possibilitou maior acesso à APS e, assim, a redução de internações (SOUZA et al., 2019).
O desenvolvimento nacional, de regiões e territórios ao mesmo tempo que promove
o desenvolvimento em saúde, é determinado pelas condições de saúde. A relação da saúde
com o desenvolvimento econômico tem grande influência na perspectiva territorial,
considerando sua importância na organização urbana e seu potencial de orientar fluxos
econômicos, reorganizando tendências de concentração da produção e renda nas diferentes
regiões do Brasil. Assim, a área da saúde, de maneira geral, pode ser entendida como um
sistema de inovação, desenvolvendo territórios, combinando bem estar social e econômico.
Porém, a depender da lógica de sua organização pode gerar agravamento das desigualdades
regionais e sociais (GADELHA et al., 2011).
A organização do SUS em redes descentralizadas pode contribuir para diminuir as
desigualdades na distribuição de renda e no dinamismo econômico, à medida que possibilita
a conformação de novas regionalizações com mais saúde e oportunidades para a população
(NODARI et al., 2013). No entanto, ocorre uma administração que, ocupada em enxugar
despesas e garantir acesso, não articula estratégias de financiamento e investimentos
direcionados para a superação de desigualdades territoriais (GADELHA, 2011).
A expansão da cobertura dos serviços de saúde, nos últimos 30 anos, envolveu
setores públicos, privados, filantrópicos e, ao contrário da igualdade de acesso e
universalização do sistema de saúde, ocasionou a fragmentação dos serviços, de acordo com
a capacidade de pagamento da clientela (SOUZA et al., 2019).

Tecnologias leves e reorientação da APS


Compreende-se que “o modelo de atenção corresponde à forma com que tecnologias
e saberes são organizados dentro de um sistema, para responder às necessidades de saúde
da população” (SANTOS; MISHIMA; MERHY, 2018, p. 862). A Estratégia Saúde da Família
(ESF), derivada do Programa Saúde da Família, de 1994, é um modelo proposto para a
reorganização da APS no Brasil. Esse modelo propõe a realização do cuidado diante de
necessidades reais, complexas e multifatoriais (SPERLING, 2017) na contramão do modelo
médico centrado, reducionista, fragmentado.
A gestão do cuidado se dá em três dimensões: sistêmica, organizacional e
profissional. A dimensão sistêmica é coordenada e avaliada pela figura do(a) gestor(a), sob
princípios de gestão estruturados, que orientam o acesso ao complexo de serviços de saúde,
considerando as suas funções com diferentes conformações tecnológicas e a comunicação
entre si. A dimensão organizacional é caracterizada pela institucionalização da medicina
tecnológica com suas diretrizes e protocolos que são dependentes de organizações que
articulam a coordenação do trabalho fragmentado pela divisão técnica, sob orientação da
figura do(a) gerente (CECÍLIO, 2009).
De acordo como o referido autor, a gestão do cuidado na dimensão profissional se dá,
sobretudo, sob orientação do(a) profissional em relação à maneira como reconhece e se
relaciona com cada usuário(a), à capacidade de operacionalização do seu núcleo específico
de saber (a depender de sua formação e função) e de operacionalização de tecnologias para
a melhor realização do cuidado). Essa terceira dimensão, envolve o que ocorre no âmbito
privado do encontro entre profissional e usuário(a) e, por isso, é passível de particularidades
potencializadoras ou limitadoras do cuidado. Com intuito de alcançar metas de eficácia e
eficiência na produção do cuidado, podem ser aplicados esforços de diferentes lógicas de
gestão para administrar o espaço relacional entre profissional e usuário(a) (CECÍLIO, 2009).
São estratégias instrumentais, as que identificam o trabalho em saúde como meio
para atingir fins, projetos estabelecidos e se desenvolvem sob a orientação de um(a)
profissional gestor(a), com capacidade de intervenção na prática profissional de outros(as)
(CECÍLIO, 2009). Assim, se organiza a gestão de recursos humanos, segundo interesses
ordenados, baseada em tecnologias leve-duras, cientificamente estruturadas a partir da
utilização de informações e processos de avaliação. A exemplo da utilização exclusiva desse
tipo de estratégia tem-se o gerencialismo, que, ao introduzir a gestão com base em
resultados segundo a performance dos trabalhadores e o alcance de metas que se
relacionam puramente à rentabilidade, configura o prejuízo da autonomia, criatividade e
iniciativa dos trabalhadores (CAMPOS, 2011).
Outra perspectiva da gestão do cuidado é de base comunicacional e considera a
interação entre agentes institucionais no sentido de negociação e produção de consensos, de
estratégias para a determinação das finalidades, objetivos e sentidos que irão orientar a
gestão do trabalho em saúde (CECÍLIO, 2009). Diferentes combinações entre estratégias
instrumentais e comunicacionais, vão orientar a produção das tecnologias leves durante o
trabalho vivo em ato, orientando os processos relacionais como tomada de decisões,
desenvolvimento de projetos terapêuticos, produção de vínculo, mediação de conflitos e
acolhimento. O foco na potencialidade do encontro profissional-usuário(a), possibilita ações
de saúde voltadas para a transformação das condições de saúde da população.
Na ESF, a responsabilização dos(as) profissionais com a comunidade adscrita, se
caracteriza pela produção de tecnologias leves orientadas para a humanização do
atendimento. A criação de vínculo, por exemplo, é fundamental para a continuidade do
cuidado em saúde, à medida em que aproxima a relação usuário(a)-profissional-gestor(a)
facilitando direitos de fala e escolha, da efetivação de processos de autonomia na saúde,
bem como estabelecendo vínculos que reforcem os princípios do SUS de: integralidade,
equidade e universalidade, fortalecendo seu caráter de política pública, ao contrário de
ações pontuais vinculadas a governos (GARUZI et al., 2014).
O acolhimento, que se produz com diálogo, confere um melhor reconhecimento das
demandas de saúde (COELHO; JORGE, 2009). O acolhimento pode, ainda, determinar a
ampliação qualitativa ao acesso universal aos serviços de saúde, no sentido de contemplar
todos(as) usuários(as) que buscarem atendimento (SCHOLZE; DUARTE JUNIOR; FLORES E
SILVA, 2009).
Uma expressão da potencialidade do acolhimento como tecnologia leve foi observada
em uma experiência no município de Aracaju/SE que, com intuito de integralizar a relação da
comunidade com a equipe de saúde, promoveu-se o “acolhimento coletivo”. Nessa proposta,
a configuração do primeiro contato com a comunidade, a cada dia de atendimento, era
acolhida, compreendida e significada, a partir da criação de "espaços públicos para
negociação de necessidades", em que estavam presentes todos(as) os integrantes da equipe
profissional (CAVALCANTE FILHO et al., p. 319, 2009). As discussões permearam desde casos
singulares, quando pertinentes para discussão em grupo, até as condições mais particulares
do território, como violência.
Na situação relatada, o trabalho vivo em ato adquiriu mais autonomia das tecnologias
leve-duras na orientação dos processos de trabalho e, a cada necessidade específica, eram
produzidas as intervenções de cuidado e encaminhadas tal qual suas necessidades.
Dar maior ênfase às tecnologias leves prevê reestruturar o processo de trabalho em
saúde por meio do reconhecimento da ação intencional e transformadora do trabalho vivo,
considerando que no espaço em que se constroem as relações profissional-usuário(a) há
lugar para a produção subjetiva dos sujeitos (COELHO; JORGE, 2009). Experimentar a
produção de normas diversas para a criação da própria humanidade, permite a ambos
sujeitos dessa relação compreender “a saúde como experiência de criação de si e de modos
de viver” (NEVES; MASSARO, 2009, p.512).
No entanto, uma mudança profunda no modelo de atenção está para além das
intencionalidades e relações entre profissional e usuário(a). Nesse sentido, há uma tensão
entre subjetividade e objetividade na relação de intenção do trabalhador em transformar a
realidade das condições da produção do cuidado e a dimensão real de alcance de seus atos,
considerando a grande abrangência de alienação das interações humanas, para além do
trabalho. Apesar dos esforços em humanizar o trabalho em saúde utilizando tecnologias
leves para orientar as relações, ainda há a norma de acumulação mercantil gerenciando as
práticas de saúde (LEMOS, 2016).

Considerações Finais
A área da saúde, de maneira geral, pode ser entendida como um sistema de inovação,
que possa desenvolver territórios, combinando bem estar social e econômico. À APS cabe
otimizar serviços de saúde, considerando sua alta capacidade de resolubilidade das
demandas de saúde. Para além da incorporação de desenvolvimento científico e tecnológico,
o trabalho em saúde se caracteriza como uma prática social com grande relevância para o
desenvolvimento das condições de saúde da população e, por consequência, do
desenvolvimento de territórios e regiões.
Os debates e conhecimentos construídos nas Universidades, no encontro entre
trabalhadoras(os) e em organizações comunitárias representam papel importante na
construção da compreensão das necessidades em saúde e formas de superação dos desafios
na atenção à saúde.
Distintos princípios e interesses de gestão orientam o desenvolvimento de
tecnologias leves, caracterizando um cenário de contradições e disputas na produção local
de cuidado nos equipamentos de saúde pública. O trabalho vivo em ato, a partir de
tecnologias duras, leve-dura e também de tecnologias leves com interesses coletivos e uma
visão ampliada da realidade, pode transpor certos interesses de mercado e contribuir para a
consolidação dos princípios e diretrizes do SUS: universalidade, integralidade e equidade na
atenção à saúde.

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