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Lílac R.

Troia 10296632
Sujeito, Educação e Sociedade

O texto Educação após Auschwitz de Adorno, traz diversas questões centradas ao redor da não
repetição das atrocidades ocorridas durante o nazismo. É central a questão da memória e
também, sobretudo, da conscientização. Não basta lembrar superficialmente, tentando passar por
cima do horror, minimizá-lo e deixá-lo no passado; é preciso uma atitude reflexiva. Reflexão esta
que não se limita aos fatos, e muito menos às vítimas: “É preciso buscar as raízes nos
perseguidores e não nas vitimas (...). É preciso reconhecer os mecanismos que tornam as pessoas
capazes de cometer tais atos, é preciso revelar tais mecanismos a eles próprios, procurando
impedir que se tornem novamente capazes de tais atos, na medida em que se desperta uma
consciência geral acerca desses mecanismos.”. Mais do que buscar entender psicologico e
socialmente os algozes, Adorno ressalta o entendimento da sociedade como um todo e do jogo de
forças do contexto histórico como pressupostos para que o horror cometido não se repita. Só é
possível evitar o que está decifrado, saber do que culminou Auschwitz é o que nos permitirá
evitar a repetição. O autor posiciona-se em favor de uma educação infantil voltada para formação
da personalidade tendo em vista o que foi apontado e de um “esclarecimento geral, que produz
um clima intelectual, cultural e social que não permite tal repetição; portanto, um clima em que
os motivos que conduziram ao horror tornem-se de algum modo conscientes.”. Ao falar de
tornar-se consciente, ele refere-se a consciente e insconsciente como postulado por Freud e até
mesmo generaliza isso para um modo de funcionamento da sociedade que favorece o
recalcamento.
Contrário a esta postura defendida no texto está o tratamento do nazismo como aberração,
exceção, evento isolado e fora dos padrões. Inserir devidamente na história da humanidade o
ocorrido é imprescindível. Não é do nada que se mata milhões de pessoas, este não é o único
genocídio da história e ignorar estes fatos, ignorar um processo, uma ideologia, uma propensão
do momento, só faz com que o absurdo que um dia ocorreu possa manifestar-se (com outros
nomes e justificativas) novamente. Nesta mesma linha de negação está a construção do tabu ao
redor do tema. “Pra quê falar destas coisas? Tão desnecessário e incômodo este assunto!”: esta
postura é tomada pelas mais variadas pessoas nos mais variados assuntos. O que me faz pensar
que tantos problemas não se resolvem por isso. As relações sexuais tem sido cheias de
problemas, dúvidas, abusos e ignorâncias há séculos e, quanto mais tentam invisibilizar e proibir
assuntos acerca do sexo, menos parece paupável algum tipo de resolução e esclarecimento.
Tomemos a deficiência de qualquer tipo como exemplo: a negação da deficiência (intelectual, de
mobilidade, visual, auditiva...), a tentativa de apagá-la e fazê-la totalmente desimportante é o que
perpetua a falta de medidas que substituam uma injusta igualdade por equidade e inclusão e
acessibilidade verdadeiras. O esforço consciente de manter determinados assuntos inconscientes
diminue a chance de soluções e melhoras, o mesmo se dá com o nazismo. Não falar sobre, deixar
no passado “o que é do passado”, não ajuda e, na verdade, atrapalha e faz verdadeira a ameaça de
que se retorne à tal absurdo. Em certo trecho, Adorno afirma que “tanto a estrutura básica da
sociedade como os seus membros, responsáveis por termos chegado onde estamos, não mudaram
nesses vinte e cinco anos”, disso discordo já que, a partir da Revolução Industrial, as mudanças,
tanto na sociedade quanto nos indivíduos, operam-se de maneira rápida. O que não quer dizer
que certas estruturas não se mantenham e se intensifiquem, mas dizer que algo permanece igual
por 25 anos me parece equivocado.
Tratando-se do que existia no nazismo e eu considero que se manteve e intensificou há
considerações sobre a frieza que permeia os indivíduos e suas relações: “se as pessoas não
fossem profundamente indiferentes em relação ao que acontece com todas as outras, executando
o punhado com que mantêm vínculos estreitos e possivelmente por intermédio de alguns
interesses concretos, então Auschwitz não teria sido possível, as pessoas não o teriam aceito. Em
sua configuração atual - e provavelmente há milênios - a sociedade não repousa em atração, em
simpatia, como se supôs ideologicamente desde Aristóteles, mas na persecução dos próprios
interesses frente aos interesses dos demais. Isto se sedimentou do modo mais profundo no caráter
das pessoas.”. O que está explicitado neste trecho do texto, pode ser facilmente atribuído ao
capitalismo e ao que da competição e individualização crescente este se favorece e, assim, se
enraiza e consolida, cada vez mais, nas relações. Pode-se dizer que a educação que caminha no
sentido de valorizar qualquer tipo de ideal capitalista e serve à estes, leva à um aumento da falta
de identificação, do sentimento de indiferença à causas sociais da qual não se faz parte. Viu-se
isso durante o nazismo: “A resistência limitava-se ao próprio grupo; e justamente este é um
sintoma bastante notável e amplo da frieza geral”.
Honneth, em seu texto O Eu no Nós, descreve a existência de extremismos quando o
assunto é tocante à grupos. A sociologia, segundo tal texto, é enviesada pro positivo, só levando
em conta os aspectos fortalecedores do eu contidos na participação em grupos. Enquanto isso, a
psicanálise prende-se à uma visão negativa, que pode ser representada pelo conceito de massa
construído nas obras de Freud, com o qual Adorno se alinha (contrariando o que é dito sobre a
posição dita como comumente tomada pela sociologia). No referido texto, há uma tentativa de
conceituar neutramente o que é um grupo, levando à definição: “mecanismo social fundado na
necessidade ou no interesse psíquico do indivíduo, porque o auxilia na estabilidade e ampliação
pessoais”. Concordo com esta definição e discordo veemente da posição tomada por Adorno
quando refere-se às coletividades. Todos problemas que ele aponta (como, por exemplo, a perda
da individualidade e adesão cega ao coletivo) podem ser consequência de estar em um grupo,
mas não são inerentes a esta condição, como ele dá a entender durante seu texto. Existem
dinâmicas patológicas em grupos (como o nazi-fascismo) e existem dinâmicas saudáveis e que
cumprem papéis de conscientização em geral – análogos ao que Adorno defende – como grupos
de economia solidária e outros.
Enfim, vejo este texto do Adorno como importante não só quando o assunto é Auschwitz,
mas para tomar posturas conscientes quanto à diversos acontecimentos históricos e assuntos
problemáticos atuais também. Para mais do que um projeto de educação, esse texto traz reflexões
úteis para um projeto de sociedade e posturas cotidianas. Apesar da posição extremista sobre
grupos, o autor aponta para aspectos negativos relevantes e ameaçadores da coletivização, por
isso, deve-se levar em conta estes perigos para formar grupos fortalecedores do Eu.
Obs.: em 2 páginas não deu tempo de falar de tudo do texto. Nem consegui tocar no
assunto da autodeterminação (um que acho super relevante).

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