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PUC-SP
2000
DM
612.78 BARROS, Paulo Marcelo Freitas de
B Transição de paradigmas em fonoaudiologia - São
Paulo: s.n., 2000
118 f. ; 30cm
...obrigado...
Resumo
INTRODUÇÃO....................................................................................................... 01
CAPÍTULO 1
CAPÍTULO 2
2. - Contribuições da Física..................................................................................... 17
CAPÍTULO 3
um e dois) ....................................................................................... 37
CAPÍTULO 4
1
Devido à necessidade de mantermos um fio condutor dentro de uma temática tão diversa, alguns
complementos paralelos, esclarecimentos e sugestões de leitura, estarão em notas ao final do trabalho.
5
noção de relações que, como operadores conceituais, nos serão muito úteis ao
lidarmos com transições paradigmáticas.
Na terceira etapa, passamos às oito publicações com as devidas
caracterizações e comentários para só então, chegarmos à uma discussão geral e às
conclusões do trabalho.
Após as noções sobre paradigma científico, com o auxílio da Física,
apresentam-se duas possíveis percepções sobre a realidade. Na primeira, ela será
apresentada como composta pela soma de todas as suas partes. Nesta concepção,
estas partes são independentes e separadas umas das outras. Na segunda, a realidade
será apresentada como algo único, indivisível, constituída por infinitos movimentos
em infinitas proporções. Nesta última concepção, apresenta-se a idéia de não haver
partes no Universo. A noção de partes surgirá da limitação dos nossos sentidos e do
nosso intelecto que não conseguem perceber e dimensionar tal condição de unidade.
Com os conceitos de paradigma, interconexidade e os dois diferentes modos
de perceber a realidade, investigamos a transição de paradigmas na Fonoaudiologia
através do estudo das incorporações que estão surgindo e aparecem delineadas nas
publicações selecionadas para este estudo.
Diferentemente da cronologia de um relato histórico, trabalhamos com
paradigmas na Fonoaudiologia a partir de suas transições, sem o compromisso
seqüencial por ordem de surgimento. Para tanto, as referidas incorporações foram
apresentadas e estudadas numa seqüência crescente de complexidade, na medida em
que o arcabouço teórico-prático fonoaudiológico está sendo acrescido de novos
elementos, relações e possibilidades.
Entretanto, para que não tivéssemos um expor literário desprovido de suas
devidas articulações, a cada recorte e comentário da literatura selecionada, seguiu-se,
quando necessário, um respectivo respaldo teórico a partir de alguns autores que
estejam propondo reflexões e/ou alterações importantes em sua prática
fonoaudiológica. Desta forma, apesar de não ser o objetivo principal do trabalho,
ganharemos, com estes respaldos, melhores condições para uma visão de movimento
dentro do processo de transição.
Vale salientar que, por uma questão de especificidade, a identificação das
incorporações e o estudo do percurso paradigmático foram priorizados em relação à
7
CAPÍTULO 1
CONCEITO DE PARADIGMA
Quando se exige que uma teoria nova ajuste-se à teoria aceita, preserva-se a teoria
antiga e não necessariamente a melhor (Feyerabend, 1977).
Evidentemente, o nosso esforço hermenêutico sobre a realidade
provavelmente, nunca atingirá um patamar estável por entre a soma de todos os
nossos conhecimentos provenientes do sensorial, do simbólico e do intuitivo. Desta
forma, a diversidade será sempre uma constante.
Admitindo uma visão mais ampla e unificadora do conhecimento, cientistas
de diferentes áreas tentam ordenar a multiplicidade complexa do saber científico.
Para alguns, o conhecimento científico forma uma hierarquia. Acima de todas as
teorias, estariam as que poderiam ser aplicadas em qualquer parte do Universo
conhecido. A segunda lei da termodinâmica, freqüentemente é citada como exemplo
desta condição.
A Termodinâmica, também chamada de ciência da complexidade, é a parte da
Física que estuda os processos de conservação e/ou dissipação de energia. A primeira
lei da termodinâmica afirma que a quantidade de energia total de um sistema sempre
se mantém constante. Na segunda lei, afirma-se que em todo processo, há uma
dissipação de energia transformada em calor, atrito, etc., de forma que não havendo
reposição, esta perda de energia leva a extinção do processo. Segundo esta lei, todo
sistema caminha espontaneamente de uma ordem, para uma desordem sempre
crescente (Gilbert, 1982:220; Capra, 1992:67).
Pensando em termos fonoaudiológicos, não seria difícil imaginar a nossa
adequação à termodinâmica, na medida em que nosso corpo/mente, em atividade
para a linguagem, constitui-se em um sistema aberto com trocas contínuas com o
meio ambiente. Sem as devidas reposições, nos extinguiríamos (Gleiser, 1998:217-
20). Dinamicamente, estamos sempre em atividade sim, mas quanto ao fato de
estarmos caminhando para uma desordem sempre crescente, isto, certamente, merece
aprofundamentos futuros.
Muitos cientistas e pensadores, utilizando diferentes referenciais, têm
abordado o problema dos paradigmas. De certa forma, conscientes ou não, todos nós
possuímos noções particulares e talvez seja extremamente salutar, estarmos
constantemente resignificando nossos próprios paradigmas, uma vez que, todos, ao
serem produzidos e publicados, poderiam, metaforicamente falando, conter em seu
12
qualquer custo. Se um paradigma está servindo a este propósito, ele não será
facilmente alterado (Khun, 1995: 25-30).
Por outro lado, aos novos paradigmas falta tudo. Não há ainda um arcabouço
teórico suficientemente desenvolvido para conquistar, de imediato, a sua validade.
Poucos aceitam vincular os seus nomes e as suas instituições. Não há concorrência
fácil de órgãos financiadores e muitos são os que se apresentam como defensores
importantes do paradigma normalizado. Utilizam-se todos os meios possíveis com o
objetivo refutar as idéias novas, uma vez que, nem todos os novos paradigmas se
mantêm e muitos acabam por cair no esquecimento. Consequentemente, a pressão
deste sistema tende a aumentar e a explodir em algum momento, demonstrando
assim, que sempre foram períodos difíceis, as transições científicas em todo o nosso
processo histórico.
Entretanto, na pós-modernidade do atual mundo globalizado e competitivo,
apregoa-se a necessidade de que profissionais, empresas e governos, possuam um
perfil criativo e tenham a extrema capacidade de responder às rápidas mudanças,
que, em efeito cascata, sempre partem dos centros geradores de conhecimento em
direção às áreas menos desenvolvidas do planeta perpetuando um histórico e antigo
sistema de exploração extrema. O conhecimento gerado fora dos grandes centros,
termina sendo reprimido na fonte. Por outro lado, poderão ser importados para os
grandes centros para serem aperfeiçoados no primeiro mundo e posteriormente
repassados, a altos custos, para os países mais pobres.
Diante de tantas e variadas possibilidades das quais apenas as descritas no
método deste trabalho poderão ser evidenciadas, falar em mudança de paradigmas
jamais será apenas um exercício cognitivo, experimental ou filosoficamente
reflexivo. Em qualquer dimensão a que uma idéia “nova e diferente” esteja
atingindo, inúmeros fatores pessoais, sociais, éticos, culturais, técnicos e político-
econômicos, dentre outros, estarão implícita e/ou explicitamente comprometendo sua
existência.
Compreendermos esta pluralidade é importante para percebermos a dimensão
e o quanto abrangente pode ser a idéia de paradigma. Teremos que dispor de uma
certa maleabilidade deste conceito para pensarmos, também, em transições
paradigmáticas. Os limites de um paradigma não são estáveis e universais, eles
podem ser diferentemente percebidos, delimitados se compreendidos.
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CAPÍTULO 2
CONTRIBUIÇÕES DA FÍSICA
via o Universo como sendo dividido em dois reinos distintos: o da mente (res
cogitans) e o da matéria (res extensa).
Atribui-se a este autor, marco da filosofia moderna, o método de avaliação,
que utiliza o procedimento da dedução e persiste até hoje na rotina científica.
Utilizando a linguagem matemática, Descartes converteu o mundo material a uma
imensa máquina. Para ilustrar sua idéia usou como exemplo a imagem de um relógio.
Diante de qualquer defeito neste “relógio”, ou seja, no mundo, bastaria trocar a peça
defeituosa (Descartes, 1976:75). Dessa forma, nasce o reducionismo que viria a
nortear toda a ciência ocidental.
Por outro lado, em defesa do quanto se utiliza a idéia de segmentação oriunda
de Descartes, Souza (1998:24-25) lembra, apropriadamente, que os cientistas que
sucederam “o mestre” (Descartes) negligenciam a concepção de unidade cartesiana
ligada à imagem de Deus, tão presente em seus escritos e referendado com destaque
para toda a filosofia científica. A imagem divina surge como a do criador da mente e
da matéria, além de ser Ele (Deus) o inspirador do homem, entendido como um ser
que estava conseguindo compreender racionalmente toda a ordem natural. Na
compreensão da época, segundo Souza (ibid.), é como se Deus tivesse criado os
corpos, a força de gravidade e as leis fixas e imutáveis e, Newton as estivesse
decifrando.
Se foi nos sonhos do dia 10 para o dia 11 de novembro de 1619, com 23 anos
de idade, que Descartes percebeu a possibilidade de criar a ciência “definitiva”
utilizando a matemática, foi acordando de um sonho, quando uma maçã caiu em sua
cabeça, que Newton teria seu famoso insight despertando para a lei da gravidade.
Não sendo filósofo, este físico inglês nasceu 23 anos após os sonhos reveladores de
Descartes e teve a interpretação de sua obra como base filosófica no século XVII.
Sob a influência deste recortado referencial dito racionalista, Newton
desenvolveu a sua famosa Teoria Mecânica, que foi o principal fundamento da física
clássica. Nela, o mundo era entendido como um conjunto de partes isoladas e
independentes, regidas por leis previsíveis numa dimensão de tempo linear. Em seu
conceito de tempo, ele se deslocaria do passado, percorreria o presente e se
direcionaria para o futuro. Um sentido direcional também chamado de “flecha do
tempo” (Grof,1987:12-13; Capra,1998:34).
20
“Os conceitos viajam e vale mais que viajem. É melhor que não viajem
clandestinamente. E também é bom que viajem sem serem detectados pelos
fiscais da alfândega! Com efeito, a circulação clandestina dos conceitos tem,
apesar de tudo, permitido às disciplinas evitarem a asfixia e o
engarrafamento. A ciência estaria totalmente engarrafada se os conceitos
não migrassem clandestinamente.”
2.1 - A INTERCONEXÃO
“as partículas subatômicas não são ‘coisas’, são interconexões entre coisas,
e estas, por sua vez, são interconexões entre outras coisas, e assim por
diante. Na teoria Quântica, nunca acabamos chegando a alguma ‘coisa’;
sempre lidamos com interconexões.”
Continua este autor, referindo que, da mesma forma, não se pode decompor o
mundo em unidades elementares, que existam de maneira independente. Na
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composição mais íntima de tudo que existe, a natureza não nos mostra blocos de
construção isolados mas, em vez disso, temos uma complexa teia de relações entre
várias partes de um todo unificado; o mundo parece assim, um complicado tecido de
eventos, no qual conexões de diferentes tipos se alternam, se sobrepõem ou se
combinam e, por meio disso, determinam a textura do todo indivisível que será
regido por uma ordem implícita.
Na compreensão desta ordem implícita, será necessário percebermos que se
todo o Universo é entendido como único, o que rege uma “parte” será também, o que
rege o todo. Tudo que acontece atinge o todo e, este mesmo todo deverá estar
consciente de tudo simultaneamente, uma vez que não há divisões nem separações.
Tudo que percebemos como “partes” estará em constante interconexão.
Capra (1991:26), utilizando o conceito de interconexão numa dimensão
ampliada e procurando entender o mundo de uma forma não segmentada, realiza uma
junção entre a Física teórica e a vida cotidiana. Ele afirma que
“O fato decisivo é que, todas as vezes que você delineia uma parte e a separa
do restante, você comete um erro. Você isola do todo algumas das
interligações física ou conceitualmente, e diz: ‘Isto agora é o que eu chamo
27
de parte’. Sei que ela está ligada deste e daquele modo ao resto, mas não
posso levar em consideração todas essas ligações , pois isso se torna
complicado”. Por isso elimino algumas delas no processo de delinear a
parte.” (Sem grifo no original)
CAPÍTULO 3
APRESENTAÇÃO COMENTADA DO MATERIAL
Sobre a audição:
Quanto à fala:
Quanto à voz:
Muitos são os autores que têm refletido sobre os limites e abrangências deste
modelo na Fonoaudiologia, como por exemplo, Cunha (1997b), Figueiredo Neto
(1988), Freire (1994), Millan (1990), Passos (1996), dentre outros.
Neste núcleo paradigmático, há uma evidente influência positivista e uma
forte aproximação do modelo clínico oriundo da medicina, ou seja, o modelo
biomédico. Esta perspectiva teórico prática não é restrita à Fonoaudiologia. Sendo
assim, torna-se necessário entendermos como a Fonoaudiologia tem articulado, a
partir deste núcleo inicial, os seus referenciais ao longo das sucessões de seus
paradigmas.
De acordo com Cavalheiro (1997:179), desde a década de 30 já havia o
interesse em se combater as “impurezas da língua (sotaques estrangeiros e dialetos
regionais do país) como forma de atingir um único padrão de fala.”
Consensualmente, sabe-se que as práticas fonoaudiológicas são anteriores à
sua institucionalização. Sob forte influência do modelo pedagógico, o fonoaudiólogo,
que não era assim denominado no Brasil até a década de 60, avaliava, corrigia e
ensinava padrões de fala corretos baseados nos fundamentos da fonética.
38
põe o carro
isso aí
empurra, isso!
Pera lá, senão ele cai, menina!
Ih! deu uma trombada!
Agora põe ele lá, isso! E enrola.
Põe ele aí, isso aí, aí, aí!
Tá bom, chega.
Para, assim, ó, assim.
Agora enrola aqui!
Vai...
Isso! Agora ele sai, ó!
Vai! Olá, saiu o bibi!
48
Opa!
Vai lá, não enrolou!
Deixa vê!
Aqui. Ó pronto!
Pronto, já enrolou.
O bibi já saiu!
Tá lavando o quê?
(A criança tem sua atenção voltada
para a atividade de lavar a boneca
e nem olha para a fonoaudióloga)
Que que cê tá lavando?
Hum?
Tá lavando o bumbum?
O pé, a mão...que cê tá lavando,
Hein, menina?
(cutucando a criança)
Tô falando com você!
Tô perguntando cê ta lavando o quê?
(olha para a fonaudióloga)
Qué responder, faz favor, ahn?
(olha para a boneca)
Tá lavando o quê?
Ih! num fala!
a, a, a, a
Que cê tá lavando?
O pé?
(gesto afirmativo de cabeça)
Então fala o pé, né!
Pé
4. (J) – ( )
50
5. (T) – É um forte?
Durante o retorno aos pais, a fonoaudióloga procura fazê-los ver que havia
uma coerência entre os aspectos motores globais, os específicos dos órgãos
fonoarticulatórios e a linguagem. Os pais insistiam em saber a possibilidade de M.
falar ou não. Sob este aspecto a autora refere:
como parâmetro qualquer outra criança tida como normal para explicar o
“déficit” de M. não estaria ajudando-os a compreendê-la mas sim criando
uma expectativa à qual ela talvez não pudesse corresponder.” (p.73)
Após este relato, autora comenta que foi importante deixar a própria criança
dirigir o seu processo terapêutico de acordo com suas necessidades e que nunca foi
59
Identificando as bases norteadoras deste caso, pode-se perceber que neste tipo
de situação não há uma preocupação em quantificar e classificar as ocorrências de
linguagem. Os dados de organicidade também se fazem presentes, porém com uma
ênfase bem menor.
A conduta terapêutica não segue o modelo biomédico. Utiliza um discurso
mais polêmico e menos pedagógico (behaviorista) em situações contextualizadas e
mais espontâneas. Aspectos subjetivos do paciente e de suas relações familiares
começam a ser valorizados e incluídos na dinâmica terapêutica. Em sua atuação, a
fonoaudióloga dedicou momentos ao cliente, à família, ao encontro com ambos e
decisões conjuntas com a fisioterapeuta.
No relacionamento com a família, percebe-se que começa a haver uma
preocupação com a relação psico-afetiva mãe-filho para o desenvolvimento da
linguagem. No relacionamento interdisciplinar com a Fisioterapia, a Fonoaudiologia
desenvolvida neste caso, revela uma convivência que incorpora o desenvolvimento
psicológico cognitivo associado ao desenvolvimento motor e de linguagem.
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T: Você não acha que dá para saber como ele está quando sai
daqui?
M: É, então ele tá normal, mas como eu te falei,
Mas eu queria saber aqui dentro.
T: Você acha que aqui é diferente?
M: Queria saber como ele fica com você. Queria uma
janelinha para ficar olhando. (risos).
A terapeuta faz uma série de intervensões reflexivas e afirma que “a mãe vai
percebendo que seu filho pode ser independente dela, e que isso pode ajudá-lo no
desenvolvimento de sua linguagem...” (p.90). Além das sessões individuais, a autora
revela que a mãe participava de reuniões de grupo de pais e que necessitou incluir
também o pai e os irmãos. Segundo ela, “ nesse trabalho, também verifiquei a
importância de considerar a família toda e não restringir a atenção à mãe.” (p.90).
Denunciando a necessidade de um movimento de singularização para cada
família no processo terapêutico e admitindo que o trabalho não foi específico com a
deficiência auditiva e sim com a singularidade de cada sujeito (mãe e filho), a autora
revelou que ele “passou a ter possibilidade de comunicar-se e expressar-se
simbolicamente de maneiras variadas – gestos, desenhos, expressões faciais. Com
isso, a linguagem oral emergia espontaneamente” (p.97).
62
Notadamente, a terapeuta não realiza uma negligência seletiva sobre este tipo
de conteúdo discursivo e passa a incorporá-lo, conscientemente, no processo
terapêutico. Entretanto, não adota uma postura pedagógica de orientadora ou de
instrutora de exercícios caseiros para estimular a linguagem, fazendo com que a mãe
assuma papel de terapeuta.
Diferenciadamente, a terapeuta passa a lançar perguntas que possibilitam a
mãe iniciar algumas reflexões sobre o assunto e poder conscientizar-se melhor de seu
próprio contexto. Isto proporcionaria uma melhoria qualitativa na relação com seu
filho, na relação familiar e, conseqüentemente, na condição interativa de linguagem
da própria criança.
Em suas conclusões finais, vale ressaltar que a autora afirma ser importante
não dissociar a expressão oral da simbolização, lembrando que, “a Psicologia, por
um lado, e a Psicanálise, por outro, podem nos ajudar a compreender a estruturação
do sujeito psíquico, seu processo de humanização.”(p.97).
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associação..”. Segundo ele, a interpretação termina por ser uma “construção” que
será posta perante o sujeito da análise como um fragmento da história primitiva que
foi esquecida por ele.
Se recorrermos ao próprio Freud, veremos que a interpretação é algo tão
importante para a psicanálise, que ela será utilizada, inclusive sobre o material
proveniente dos sonhos. Segundo Freud (1953:15), “Seria um erro supor que seria o
bastante uma mera comparação do sonho com a vida desperta para evidenciar a
relação existente entre ambos.” Freud, quando aborda o problema da interpretação
dos sonhos, denuncia a ingenuidade de fazer-se relações imediatas sem o ato da
interpretação, pois, muitos conteúdos terminam ficando ocultos.
Não que a Fonoaudiologia deva trabalhar com o material onírico desta forma,
mas que seja percebido que em qualquer interpretação, os inconscientes e todos os
seus dinamismos, tanto de quem fala, quanto de quem ouve, sempre estarão presentes
nesta relação.
Sabe-se que a interpretação psicanalítica acontece exclusivamente dentro de
seu setting, de forma precisa e no momento apropriado, segundo os pressupostos da
própria psicanálise, que utilizada o material proveniente dos sonhos, de outras
produções do inconsciente (como os atos falhos, os sintomas, etc.), ou o próprio
discurso do analisado que, de alguma forma, poderá indicar a manifestação de algum
conflito defensivo.
Ao afirmar que o conceito de escuta não é exclusivo da Psicanálise, Arantes
(1994:33) comenta que para o fonoaudiólogo, a compreensão do ato de escutar é
marcada pela atenção àquele que fala e o espaço intersubjetivo que envolve a fala. É
importante à clínica fonoaudiológica, compreender a linguagem não só como
comunicação mas também como efeito de sentido.
De acordo com Palladino (1986:1-11), a escuta não deve ser reservada a
algum momento específico da clínica fonoaudilógica. Ela faz parte de todo o
processo terapêutico. A atividade de escuta não será limitada exclusivamente à
pessoa com problemas de linguagem. Frazão (1996:55) chama a atenção aos “ efeitos
distintos da atividade interpretativa do adulto”, pois, ela ressalta a importância de se
resgatar, juntamente com a família, a forma como os pais interpretam o estado de
linguagem que um filho apresenta.
67
Concluindo:
“Observamos que apenas 37 crianças não apresentaram nenhum tipo
de alteração nas duas avaliações (instrumental e otoscópica)
Sobre as sensibilizações, a fonoaudióloga da UBS (Unidade Básica de
Saúde) e uma das pediatras realizaram as reuniões onde foram abordados
vários aspectos do tema `audição’: a sua relação com o desenvolvimento da
linguagem, fisiologia, prevenção de problemas auditivos e higiene da orelha
externa.(...) a partir da participação dos familiares foram levantadas
questões específicas sobre crendices populares, desenvolvimento da
linguagem e hábitos orais(...)
Realizamos as sensibilizações dos funcionários com a presença das
ADI’s, auxiliares de enfermagem, funcionários da cozinha, da limpeza e as
diretoras das creches. Contamos com a participação da fonoaudióloga da
UBS e uma assistente social...
Os resultados efetivos das sensibilizações não puderam ser
analisados, pois dependem de um processo de reorganização das condutas
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Neste mesmo trabalho, as autoras relatam algumas outras atuações, como por
exemplo:
“quando uma categoria profissional começa a indagar para que e para quem
realiza o seu trabalho, acaba por concluir que a finalidade de toda ação a
ser feita é o homem, inserido em uma sociedade que deveria se transformar,
para que as necessidades de todos pudessem ser atingidas.”
Neste paradigma, ele está constatando em seu cotidiano, que toda omissão
acaba por retornar em forma de problemas de toda ordem, principalmente os sociais
(como os altos índices de desemprego ou os baixos salários, o aumento da violência,
das doenças, da pobreza, etc.).
Ser fonoaudiólogo pensando em qualidade de vida significa, antes de tudo,
não compactuar com o vício assistencialista que caracteristicamente sempre foi
praticado com a população empobrecida, diante de apenas algumas poucas iniciativas
para desenvolver uma consciência realmente participativa.
De modo geral, passar a vivenciar tudo isso na prática, talvez seja mais
importante do que teoricamente ficar procurando entender as suas particularidades, o
que seria, provavelmente, o nosso primeiro impulso acadêmico.
Há neste paradigma a consciência de que como fonoaudiólogos somos
técnicos, intelectuais e estamos do lado privilegiado da sociedade. O problema
começa já na dificuldade de nos aceitarmos comprometidos com o quadro de
pobreza, cujos “culpados” costumamos identificar (fragmentadamente) como estando
fora do nosso grupo social: são os políticos, os ricos, o sistema, etc., jamais também
os fonoaudiólogos.
Na verdade, fazemos trabalho intelectual e não manual, estamos do lado dos
dominantes e neste sentido, devemos ter a consciência de que, por não existir riqueza
sem exploração, para possuirmos tantos “privilégios” é necessário que muitos outros
paguem com sua pobreza por isso. A miséria das populações não é coisa do “destino”
ou porque “Deus quis assim...” mas, é por força de um processo histórico que lhes
impõe forçosamente essa condição (Demo, 1988).
Mais do que boas intenções, vale a realidade. Certamente, quando o
fonoaudiólogo se interessa por políticas sociais, também está implícito o seu instinto
de sobrevivência. Para manter nossos privilégios, por vezes, é necessário expandir o
nosso raio de ação, o nosso mercado de trabalho podendo sim, estarmos também
motivados por convicções éticas, humanistas, ideológicas, pessoais, etc.
Sem dúvida, isoladamente, a probabilidade de insucesso para qualquer
profissão de área de saúde é evidente. Se possuímos um conceito de saúde
fragmentado e realizamos atitudes e ações fragmentadas, os resultados não poderiam
fugir a regra.
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Sem dúvida, nesta perspectiva de Saúde Pública, teremos aqui uma maior
necessidade de que o fonoaudiólogo utilize um pensamento sistêmico (no sentido de
rede e de interconexões). Divergindo da segmentação newtoniano-cartesiana, a visão
de homem e de realidade, neste contexto, necessitará de todas as interconexões
interdisciplinares que puderem ser identificadas.
Para pensar e agir em rede, a Fonoaudiologia terá que estar em intensa
interconexão com todas as outras áreas do conhecimento, pois todas participam com
os seus conceitos de saúde e doença, prevenção e qualidade de vida.
Como uma percepção holográfica, todas as áreas deverão projetar sua
imagem na tela deste contexto para formar uma única figura. Jamais a imagem desta
figura será vista igualmente por todos devido ao fato de cada um estar em um ponto
estratégico diferenciado. Por isso, para que se amenize a fragmentação, os
investimentos no nível de consciência sistêmico em rede deverão ser uma constante.
Mesmo com toda imprevisibilidade e incertezas, para evitar o descompasso,
as ações de cada um deverão ser conhecidas e discutidas por todos, a partir de
estudos epidemiológicos globais e locais. Todos os que atuam devem atuar em rede.
Todos os que formam profissionais, devem formar em rede. Todos os que
manipulam recursos, devem manipulá-los em rede. Para isto, todos teriam que deixar
de pensar e de agir em separado (newtoniano-cartesianamente) e abrir-se às
interconexões.
Quadro nº - 1
REFERENCIAL DE TENDÊNCIAS
Generalizações: Generalizações:
CAPÍTULO 4
segunda, deveremos relembrar o alerta de Bohm, “... se utilizarmos uma visão geral
do mundo como constituído de fragmentos independentes, então é assim que a nossa
mente tenderá a operar...”. Procuraremos ordenar um sentido direcional entre a
multiplicidade paradigmática com que nos deparamos para que as percepções
fragmentadas tornem-se harmoniosas, ou seja, um olhar mais próximo, observando
particularidades paradigmáticas, e um outro mais distante que procure uma visão
global, com o auxílio de alguns dos referenciais da Física.
Olhando para os pequenos detalhes de como atua um fonoaudiólogo no
material apresentado, pôde-se perceber seu núcleo paradigmático a partir de sua
visão clínica de linguagem, sua visão de homem e, no seu processo terapêutico, o
privilégio que ele dá ao corpo, às produções lingüísticas, aos dados subjetivos e
também, à dimensão social.
Para refletir e discutir sobre os núcleos paradigmáticos que foram
apresentados, adotaremos um caminho norteador que terá seu início pelo paradigma
positivista, pedagógico, biomédico e seguirá para o núcleo paradigmático de base
lingüística. Passará pelo núcleo de base psíquica e finalizará seu percurso com o
paradigma de atuação social.
De acordo com o estudo de paradigmas apresentado no início deste trabalho,
percebemos que após o estabelecimento de algum referencial paradigmático,
seguem-se as necessárias condições para que este paradigma deixe de responder às
novas questões que, inevitavelmente, vão surgindo. As novas pesquisas e associações
de conhecimentos vão fornecendo estabilidade ou ameaçando o paradigma vigente.
No caso da Fonoaudiologia, pôde-se observar no material coletado, acrescido
do respaldo teórico dos autores selecionados, diversos pontos que demonstravam
ameaçar o paradigma vigente e proporcionar o surgimento de diversas novas
maneiras no fazer fonoaudiológico.
Com a produção de conhecimentos na área da subjetividade, com o interesse
pelos dados relacionais e pelo psiquismo, o então paradigma vigente de base
newtoniano-cartesiana, positivista e biomédico passou a revelar uma série de
limitações.
Este paradigma apresentava a idéia de uma certa estabilidade como por
exemplo, a previsibilidade revelada através do uso de testes padronizados que
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modo fica bem mais evidente, a necessidade de muitos investimentos por parte desse
novo profissional, não só no nível intelectual ou na prática de supervisões
personalizadas, mais também, no seu próprio processo psicoterapêutico individual
em relação às suas particularidades.
Antes e depois de Freud, o inconsciente continua sendo um imenso desafio
para a humanidade e a interpretação, como ato de atribuir sentido, continuará por
muito tempo sendo uma ferramenta apreciável para qualquer processo “terapêutico”
inclusive na Fonoaudiologia.
É importante lembrar que a Psicanálise, com seus diversos estudos e revisões,
tem estado exposta à opinião de inúmeros autores de diferentes culturas e épocas.
Torna-se extremamente coerente que o fonoaudiólogo conheça, ao menos, algumas
das principais bases norteadoras do pensamento psicanalítico, descritas, além de
Freud, também por J. Lacan, D. Winnicot, Melanie Klein e ainda pelos dissidentes C.
Jung e W. Reich, dentre outros, como também, as discussões nas escolas mais
recentes.
Um fator enriquecedor na compreensão de qualquer paradigma é compreender
a opinião de alguns dos seus principais críticos. Visitar os extremos que podem
oscilar desde alguns mais tradicionais, como o próprio Lacan, em sua defesa e
manutenção de seus pressupostos, até outros mais radicais como Souza (1998:52),
quando compara a noção de inconsciente da Psicanálise com os estudos mais
recentes sobre a consciência, ele afirma: “A Psicanálise freudiana pretendeu ser
início meio e fim de uma nova ciência: ela mesma”. Este autor procura chamar a
atenção para a compreensão do inconsciente a partir dos conceitos de
interconexidade e ordem implícita sem limitarmos o inconsciente à visão freudiana.
Seguindo esta mesma linha de raciocínio, não podemos esquecer que nos
estudos psíquicos, esta área oferece um vasto campo. Em seus paradigmas, ao sair do
Positivismo e do Behaviorismo, segundo Goulart (1987:65), esta área foi enriquecida
pela Psicanálise e pela base fenomenológica existencial. Atualmente, de acordo com
Grof (1987), está sendo acrescida pela área Transpessoal.
Todas estas áreas de estudo merecem igual atenção por parte da
Fonoaudiologia em suas futuras transições, uma vez que, mais cedo ou mais tarde,
alguns pesquisadores vão sentir novas faltas, farão novos questionamentos, realizarão
87
ambiente reflexivo sobre o que estava acontecendo. É oportuno lembrar, que mesmo
os mais experientes psicólogos e psicanalistas não dispensam a prática de serem
psicoterapeutizados e/ou analisados.
Desta forma, parece ser coerente, utilizarmos a pouca consciência que
possuímos, para pelo menos, admitirmos a nossa limitação. A partir daí, falar e ouvir
uns aos outros, cônscios dessa perspectiva.
Como fonoaudiólogos, em qualquer dos paradigmas, se conseguirmos a mesma
ênfase demonstrada pela prática psicanalítica às supervisões e às orientações entre
colegas, bem como o incentivo ao investimento psicoterapêutico individual
constante, certamente diminuiremos os inúmeros e possíveis equívocos de
interpretações no campo fonoaudiológico e melhoraremos a qualidade das
intervenções.
Preocupa-nos a existência necessária de uma certa maturidade pessoal e
profissional para que o fonoaudiólogo, que sai de currículos de base positivista,
formado em cursos que ofereceram, unicamente, o modelo biomédico, passe a
trabalhar com a dimensão da subjetividade.
Saberia este profissional evitar uma tentativa de dicotomização objetivo-
subjetiva em detrimento de alguma destas dimensões? Certamente, no trato com o
humano (individual e coletivo), elas seriam indissociáveis para a atividade clínica.
Saberia, também, diferenciar sintomas orgânicos de sintomas conversivos? Quais
seriam os seus critérios para indicar ou não um cliente para um acompanhamento
psicológico, psiquiátrico ou psicanalítico, diante das inúmeras abordagens
existentes?
Hoje, em muitas situações, é o fonoaudiólogo o primeiro profissional a entrar
em contato com determinadas situações clínicas. Muitas delas exigem a atuação de
várias especialidades. O fator tempo e o tipo de trabalho exercido poderão influenciar
decisivamente no prognóstico. Desta forma, justifica-se a necessidade de que o
profissional de fonoaudiologia, em qualquer especialidade, tenha as necessárias
condições para realizar a indicação mais acertada para outros profissionais e, se
possível, desenvolver trabalhos conjuntos.
Em um outro movimento paradigmático, assim como o privilégio à
objetividade foi questionado pela incorporação da atenção à subjetividade, uma
segunda transição paradigmática veio questionar o modelo clinicista de atuação
89
Sem pretender abrir esse leque de discussões, para ambas as posturas, o mais
importante passa a ser o fato de que todas as informações devam ser percebidas de
forma sistemicamente integrada, ou seja, interconexa.
Neste sentido, as repercussões são tantas, que apenas algumas puderam ser
aqui delineadas. A Fonoaudiologia, por vivenciar íntimas relações de natureza
essencialmente interdisciplinar, poderá levar algumas vantagens em relação a
algumas outras disciplinas neste provável desafio comum para as próximas décadas.
Pensando particularmente nas relações entre a Fonoaudiologia e a linguagem,
diante de sua natureza, complexidade, fluidez, multiplicidade, pluralidade,
heterogeneidade, subjetividade e de sua geniosa dinâmica auto-organizadora,
certamente os estudos sobre a linguagem nos proporcionarão ainda, muitas surpresas
diante das possibilidades dos novos paradigmas.
Sem dúvida, na exposta compreensão complexa da realidade, o modelo de
linguagem adotado influencia o tipo de prática profissional. Desta forma, seguindo a
evolução do conhecimento, provavelmente haverá a necessidade de utilizarmos
novos modelos de linguagem que incluam a não localidade dos eventos, a
interconexidade, a ordem implícita e a transcendência do tempo-espaço, numa
dimensão que atinja holograficamente, qualquer fenômeno em toda a rede sistêmica
no Universo.
Certos de estarmos ainda muito longe de tal possibilidade, a linguagem poderia
ser metaforicamente compreendida como sendo (ao mesmo tempo) o filme, o script,
o autor, o ator, a tela e o espectador. Nela, todas essas situações aconteceriam ao
mesmo tempo e em todos os tempos (presente, passado e futuro).
A partir de tais referenciais, uma criança, em seu processo de aquisição de
linguagem, poderia ser comparada, em cada uma de suas fases (do nascimento à
morte), a apenas mais um capítulo da reprise de um filme inédito. Se neste
interacionismo ampliado, todas as “partes” contiverem implicitamente o todo,
utilizando a noção de unicidade, poderíamos pensar que um ser humano
“aprendendo” seria o Universo ensinando a si mesmo o que ele já sabe, para depois,
esquecer e relembrar novamente. E se isto não estiver fluindo adequadamente, ele
cria fonoaudiologias para resolver-se.
Sob tais condições, quase inacessíveis à nossa lógica usual, falar em
subjetividade seria também admitir nossas múltiplas identidades: a imagem que
93
mais complexo que o anterior em que serão produzidas inúmeras novas idéias a partir
de um não enclausuramento dentro de modelos restritos e pseudo-estáticos, de uma
contínua autocrítica edificante e, sobretudo, de muitas relações com um maior
número possível de outras disciplinas.
Na impossibilidade da consciência plena, optar por uma não simplificação
segmentadora, significa denunciar constantemente os limites, as insuficiências e as
carências do pensamento do modelo paradigmático que estivermos utilizando. É
importantíssimo distinguir as coisas sem isolar umas das outras.
É neste sentido que a Fonoaudiologia deverá se assegurar para que suas
transições não redundem “no mesmo” disfarçado de interativo. Como profissão
recente e de visão cosmológica diversa e imprecisa, há de se compreender que em
nossa simplificada visão de homem e de mundo, ainda estamos, como
fonoaudiólogos, muito próximos do período de controle dos estímulos e das
respostas. Ainda não estamos lidando com um ser integral, um ser humano,
sociológico, filosófico, político, antropológico, teológico, ecológico e cósmico.
De certo modo, para a Fonoaudiologia, a percepção e vivência de tal
complexidade poderá enriquecer suas perspectivas terapêuticas mais imediatas, na
medida em que neste enfoque multidimensional de uma complexização expansiva, o
fator criatividade favoreça decisivamente um modo não seqüencial de pensar/agir,
aberto ao imprevisível e ao abandono, total ou parcial, das práticas tradicionais.
É na concepção de rede, que todos se relacionam intrinsecamente. O
crescimento de uma “parte” significa o crescimento de todas, porque ao
relacionarem-se novamente, haverá um crescimento mútuo em expansão.
É importante questionar também, uma outra possibilidade de complexização.
De um ponto de vista prático, será que em algum momento a Fonoaudiologia passará
a trabalhar com a sua matéria prima “linguagem” além do limite do estado normal de
vigília (ou consciência ordinária), incorporando os estados alterados de consciência?
Assim como a Psicologia iniciou seus estudos nesta área em meados dos anos
sessenta, a Fonoaudiologia da era 2000 também poderá sentir esta mesma
necessidade, uma vez que a linguagem nos habita por inteiro (em todos os níveis de
consciência) e pode desarmonizar-se e ser terapeutizável em qualquer de suas
dimensões (individuais e/ou transpessoais).
95
conseqüências danosas a nós mesmos e à nossa qualidade de vida. Basta ver como
está o mundo hoje.
Sob uma visão ecológica mais profunda, o planeta Terra (o nosso) poderia ser
entendido como um organismo vivo único, que regula o meio ambiente para a sua
própria sobrevivência enquanto vaga pelo espaço.
Infelizmente, o comportamento de alguns de nós humanos poderia ser
comparado a um câncer que degenera o próprio organismo. Inadvertidamente, pode-
se estar indo nesta direção ou não, de forma consciente ou equivocada, ou ainda,
simplesmente negligenciando a atitude de impedir o alastramento destrutivo. Tais
afirmativas poderiam ser válidas tanto para a postura de uma profissão, no caso a
Fonoaudiologia que está em discussão, quanto a de cada leitor, individualmente.
Coletivamente, enquanto raça humana, ao mesmo tempo em que chegamos ao
ponto de estarmos colocando em risco a nossa própria sobrevivência, a nossa ciência
já possui conhecimentos suficientes para saber que esse atual modelo de ciência
newtoniano-cartesianamente segmentada, mecanicista e pretensamente neutra, de
fato, tem estado a serviço da exploração do homem pelo homem. Não está servindo à
maioria, nem está melhorado o mundo. Deste modo, pensar em transições é pensar
também qual a melhor Fonoaudiologia, para quem realizá-la, e de que maneira.
Dentre os fonoaudiólogos, pode-se observar que alguns se alienam diante de
tais questionamentos, outros se colocam diante do atual modelo predominantemente
mecanicista, numa postura conformista, tentando manter e conservar o que já existe,
outros ainda, de forma reformista, tentam fazer apenas algumas pequenas
modificações dentro do mesmo modelo. Alguns, no entanto, desenvolvem uma
postura realmente transformadora.
Caso a Fonoaudiologia, ou parte dela, conecte-se aos paradigmas que
incorporarem a interconexidade, estará necessariamente atrelada a valores de
cooperação e parcerias em que as noções de dominação passam a ser substituídas por
mútuas redes não hierárquicas de cooperação, numa visão de desenvolvimento
sustentável.
Isto garantirá, provavelmente, uma qualidade de vida ainda melhor para as
gerações seguintes e não, a herança de caóticas ruínas como resultado de sobras
inconseqüentes. Neste sentido, a maioria dos profissionais em Fonoaudiologia não
99
4.2 - CONCLUSÕES
_________________________
4.3 - NOTAS
fractais, segundo os físicos, oferecem uma nova linguagem para descrever a forma
do caos.
7 – Função ondulatória
A partir do que descreve a literatura especializada, identifica-se que foi o físico
Niels Bohr (apud. Atkins, 1994:376) que em suas afirmações, introduziu as primeiras
polêmicas informações sobre a estrutura atômica, que geraram, posteriormente, as
inúmeras transições paradigmáticas no início deste século:
Para ilustrar essa peculiar propriedade identificada nas partículas, podemos citar o
exemplo descrito por (Talbot, 1991) ao imaginarmos a trajetória de uma bola de
boliche sobre uma pista coberta de pó. Quando não estivermos olhando para a bola,
ela estará deixando rastros em forma de onda. Mas quando olharmos para ela, ela se
torna uma bola e começa a deixar rastros de bola de boliche, continuando a sua
trajetória com ambos os padrões simultaneamente.
Logo que o fenômeno da função ondulatória foi descoberto, o físico Herbert
(apud. Talbot, 1991:57), diz que tal realidade algumas vezes o faz imaginar que às
suas costas o mundo é sempre “um fluxo ininterrupto e radicalmente ambíguo de
sopa quântica”. Mas toda vez que ele vira e tenta olhar para a sopa, seu olhar a
congela instantaneamente e ela volta a se transformar em realidade habitual”. Ele
usou também, uma imagem mitológica semelhante ao legendário rei Midas. Este rei
nunca conheceu a sensação da seda ou a carícia de uma mão, porque tudo que tocava
virava ouro. De forma análoga, ele afirma que “do mesmo modo, os humanos não
podem experimentar a verdadeira textura da realidade quântica, porque tudo o que
tocamos se transforma em matéria.”
8- Esta importante obra, referida no livro de Talbot (1991:359), foi um dos mais
importantes livros deste autor e causou inúmeros debates entre os estudiosos desta
área.
Karl Pribram. Language of the Brain (Linguagens do Cérebro-Monterey, Calif.:
Wadsworth Publishing, 1977), p.123
10- Para que o leitor possa ter a idéia de uma imagem holográfica ou holograma,
sugerimos visualizá-la em Talbot (1991:36). Nesta obra, há uma imagem holográfica
que aparece projetada dentro de um cilindro livre no espaço e uma pessoa passa a
mão dentro desta imagem sem tocá-la.
12- Também conhecido como petscan, o sistema PET (Tomografia por Emissão de
Pósitron) possibilita que moléculas de carbono, constituintes da glicose, sejam
marcadas com radioisótopos. Em seguida, esta glicose é injetada no cérebro. Quando
o cérebro metaboliza esta glicose marcada, pode-se visualizar tridimensionalmente a
sua utilização através deste sistema tomográfico (Chopra, 1991:84).
13 - Como médico, o Dr. Deepak Chopra desenvolve uma série de estudos que
utilizam os conhecimentos da Física apresentados neste trabalho. Em seu livro “A
cura quântica”, ele revela algumas de suas conclusões sobre os limites entre mente e
matéria citando inclusive, diversos trabalhos de centros de pesquisa nesta área. O
referido autor estimula uma verdadeira transição de paradigmas ao afirmar que: “...a
medicina pode estar radicalmente errada ao insistir que a matéria seja superior à
mente. Pode ser verdade que uma célula nervosa crie pensamentos, mas é
igualmente verdadeiro que o pensamento crie células nervosas.” (Chopra, 1991:39).
Chopra, propõe o seguinte dilema, ao estudar os mecanismos bioquímicos
cerebrais, em especial os neuropeptídeos. Afirma que pela primeira vez na história da
ciência, a mente tem uma base visível para se posicionar. Antes, a ciência declarava
que somos máquinas físicas que, de alguma forma, aprenderam a pensar. Agora,
desponta a idéia de que somos pensamentos que aprenderam a criar uma máquina
física (Chopra,1991:91).
14- O Behaviorismo, que tem em Skinner (1904-1990) um dos seus mais importantes
representantes, trabalha com a idéia de que o homem possui um comportamento
totalmente explicável e manipulável, segundo um modelo simplificado de causa e
efeito. Mantém sobre o ser humano, uma visão determinista, mecanicista-
newtoniana, em que se transfere para o meio ambiente, a função de determinar e
moldar o comportamento. Em Skinner (1978) no seu livro “walden II”, chega a
propor um “novo mundo” com uma sociedade passível de ser adequadamente
modelada através de um “competente” controle.
Certamente, com o reforço dos ditames da revolução industrial em que a
Psicologia Comportamental contribuía para a seletividade entre os seres humanos
braçais e os seres humanos intelectuais. Diante da forma de produção de trabalho,
parecia haver um tipo de louvor ao cartesianismo que, dualmente, separava o corpo
da mente, em reinos distintos.
108
força), eles defendem a tese de que os psicólogos devem ficar atentos para as
atitudes, os valores e as respostas às situações sociais, inclusive aos experimentos.
Carl Rogers, certamente, pode ser considerado o mais ilustre representante desta
concepção na área da Psicologia.
19- Sendo a base desta concepção, a estrutura é vista como um modelo abstrato
constituído pelo conjunto de elementos ou partes e cada um desses elementos só
encontrará sentido nas relações que mantêm com os outros. Nesta interdependência,
a modificação de um único elemento gera, consequentemente, alterações no conjunto
da estrutura.
Sendo a estrutura considerada um modelo, de acordo com Durozoi e Russel
(1996:109), ela não pertencerá propriamente ao objeto estudado. Ela,
necessariamente, será uma abstração, uma construção intelectual que surge a partir
da análise.
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Tradução por Maria Luiza X. de A. Borges. Rio de Janeiro : Zahar, 1991.
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