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MATERNIDADE LIVRE:

A APLICABILIDADE DO HABEAS CORPUS COLETIVO Nº 143.641/SP


PELO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL – TJRS.

Projeto desenvolvido pela Clínica de Direitos Humanos do Campus Zona Sul – UniRitter,
em parceria com o Núcleo de Defesa em Execução Penal
da Defensoria Pública do Estado do Rio Grande do Sul.

Profª. Drª. FERNANDA MARTINS


Mestrando LEANDRO MATEUS SILVA DE SOUZA
RELATÓRIO

CLÍNICA DE DIREITOS HUMANOS

Projeto “Maternidade Livre”: a aplicabilidade do HC Coletivo


143.641/SP pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul - TJRS

Redação e análise de dados: Leandro Mateus Silva de Souza1


Projeto, supervisão e análise de dados: Fernanda Martins2

Em parceria com o Núcleo de Execuções Penais da Defensoria Pública do Estado


do Rio Grande do Sul, sob direção da Defensora Pública Cíntia Luzzatto, a Clínica de
Direitos Humanos do Campus Zona Sul – UniRitter conduziu a pesquisa “Maternidade
Livre”: a aplicabilidade do HC Coletivo 143.641/SP pelo Tribunal de Justiça do Rio
Grande do Sul – TJ/RS, investigando como as câmaras criminais do tribunal estão
decidindo sobre a aplicação da prisão domiciliar para mulheres presas preventivamente,
que preencham os critérios de aplicabilidade do HC Coletivo 143.641/SP.

O HC Coletivo veio como resposta à demanda da sociedade civil sobre o


superencarceramento feminino no Brasil e, em correspondência às alterações do Código
de Processo Penal relativas a Proteção Integral da Primeira Infância. Portanto, as
atividades propostas se justificaram como elementos de formação jurídica qualificada,
em termos de Direitos Humanos e Execução Penal, ao questionar se e como a decisão
proferida no writ está sendo aplicada pelo TJ/RS, posto que autorizou a substituição da
prisão preventiva pela domiciliar a todas as mulheres que ostentassem a condição de
gestantes, puérperas ou tivessem sob sua guarda a responsabilidade de cuidar do filho
menor de 12 anos ou deficiente, excetuados os casos de crimes praticados por elas
mediante violência ou grave ameaça, contra seus descendentes ou, ainda, em situações
excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que
denegarem o benefício.

1
Especialista em Direito Público. Mestrando de Direitos Humanos pela UniRitter com bolsa institucional.
E-mail: leandromateussouza@gmail.com.
2
Doutora em Ciências Criminais pela PUCRS, professora no curso de Graduação em Direito e no
Programa de Mestrado em Direitos Humanos – UniRitter, pesquisadora em gênero e teorias feministas. E-
mail: fernanda.ma@gmail.com
O projeto foi dividido em três etapas. A primeira etapa consistiu na formação
teórica do corpo discente sobre encarceramento em massa, encarceramento de mulheres,
Regras de Bangkok, Estado de Coisa Inconstitucional e do próprio HC Coletivo, objeto
central de análise. A segunda etapa versou sobre a pesquisa e análise dos acórdãos
proferidos desde 2018, cuja discussão estivesse vinculada à substituição da prisão
preventiva pela prisão domiciliar – metodologia realizada por pesquisa de
jurisprudência no site do TJ/RS através de palavras-chave pré-estabelecidas. Para tanto,
foram objetos de verificação as oito câmaras criminais do TJ/RS. Já a terceira etapa
consistiu na checagem dos dados apresentados pelo corpo discente e escrita final do
presente relatório.

I. EMBASAMENTO TEÓRICO DO PROJETO

A mais abrangente e mais recente pesquisa que aponta os indicativos nacionais da


realidade prisional feminina no Brasil é o INFOPEN Mulheres3, realizada pelo
Ministério da Justiça, com o apoio do Departamento Penitenciário Nacional em 2016,
publicada em maio de 2018, a qual apresenta alguns elementos indispensáveis para
realizar a leitura do artigo 5º, inciso L, da Constituição Federal de 1988. Entre algumas
constatações reveladas pelo levantamento penitenciário, está o reconhecimento de que,
entre as 42.355 mulheres vivendo em situação de privação de liberdade em junho de
2016, 50% possuíam idade de até 29 anos, 62% delas eram solteiras, 62,5% eram
negras, 50% possuíam escolaridade até o ensino fundamental incompleto e somente
15% finalizaram o ensino fundamental. Para além do espectro nacional, essas
informações vinham sendo apontadas através de pesquisas locais4, corroborando que a
população carcerária feminina é não branca, com baixa escolaridade, baixa renda, jovem
com filhos e responsável pela provisão do sustento familiar5.

A realidade de violência aberta às mulheres e a clara rejeição da diferença pelos


poderes públicos no tocante às particulares de gênero que atravessam o encarceramento

3
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA; DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL. Levantamento
Nacional de Informações Penitenciárias – INFOPEN Mulheres. 2ª edição. Brasília, 2018.
4
SIMÕES, Heloisa Vieira; BARTOLOMEU, Priscilla Conti; SÁ, Priscilla Placha. VALE QUANTO
PESA: o que leva(m) mulheres grávidas à prisão? Revista de Estudos Empíricos em Direito, vol. 4, n.
3, out 2017. p. 145-161; BOITEUX, Luciana; FERNANDES, Maíra. (Coord.) Mulheres e crianças
encarceradas: um estudo jurídico-social sobre a experiência da maternidade no sistema prisional
do Rio de Janeiro, 2015; DINIZ, Débora. Cadeia: relatos sobre mulheres. Rio de Janeiro: Civilização
brasileira, 2015; e QUEIROZ, Nana. Presos que menstruam. 4ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2015.
5
BORGES, Juliana. O que é encarceramento em massa? São Paulo: Letramento, 2017.
de mulheres exigiram certa intensidade de novas ações através de respostas estatais
operacionalizadas pelos poderes executivo, legislativo e judiciário.

Nesse sentido, em de maio de 2009, com o advento da Lei nº 11.942, um


importante passo foi dado ao assegurar condições mínimas para mães presas e seus
filhos, concedendo um tempo mínimo de seis meses para a amamentação e fornecendo
uma seção para gestantes e parturientes, bem como creche para crianças menores de sete
anos desamparadas, cuja responsável estivesse presa6. A lei não foi, no entanto,
acompanhada de recursos para a sua execução. Apenas 16% dos estabelecimentos
femininos têm cela ou dormitório adequado para gestantes. Quanto à presença de
berçário ou centro de referência materno infantil, que compreendem os espaços
destinados a bebês com até dois anos de idade, somente 14% das unidades femininas ou
mistas contam com essa estrutura e apenas 3% das unidades dispõem de creche7.

Aponta-se também que “mais de um terço das mulheres presas grávidas relataram
o uso de algemas na internação para o parto, 83% têm pelo menos um filho, 55%
tiveram menos consultas de pré-natal que o recomendado, 32% não foram testadas para
sífilis e 4,6% das crianças nasceram com sífilis congênita.” Esses dados foram
apresentados a partir da análise realizada em uma série de casos provenientes de um
censo nacional em que “241 mães e 200 grávidas” foram ouvidas, diagnosticando que,
entre elas, 45% têm menos de 25 anos, 57% eram de cor parda, 53% com menos de oito
anos de estudo e 83% com mais de um filho8.

No caso de não haver vagas nos berçários e creches, a conduta é encaminhar as


lactantes para berçários improvisados nas cadeias, onde elas conseguem permanecer
com seus bebês e alimentá-los. Contudo, esses espaços não só carecem de atenções
médicas necessárias, assim como há completa ausência de informação e auxílio às mães
no que tange aleitamento e demais cuidados com recém-nascidos9.

Ainda, sobre as tentativas estatais de reversão das tragédias permanentes de


mulheres encarceradas, em 2016, a Lei nº 13.257 trouxe nova redação ao artigo 318 do
Código de Processo Penal, autorizando a substituição da prisão preventiva pela prisão
domiciliar quando o agente for, entre outras hipóteses, gestante, mulheres com filho de

6
BRASIL. Lei nº 11.942, de 27 de maio de 2009. Disponível em: http://www.justica.gov.br/seus-
direitos/politica-penal/politicas-2/mulheres-1/anexos-projeto-mulheres/lei-no-11-942-2009.pdf
7
MINISTÉRIO DA JUSTIÇA, 2018.
8
FIOCRUZ. LEAL, Maria do Carmo; AYRES, Barbara Vasques da Silva; ESTEVES-PEREIRA, Ana
Paula; SÁNCHEZ, Alexandra Roma LAROUZÉ, Bernard. Nascer na prisão: gestação e parto atrás
das grades no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 21(7), 2016. p. 2061-2070.
9
QUEIROZ, Nana. Presos que menstruam. 4ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2015. p. 76.
até 12 anos de idade e, mesmo homem, caso seja o único responsável pelos cuidados do
filho de até 12 anos de idade incompletos10. Nesse sentido, a prisão preventiva de todas
as mulheres gestantes deveria ser convertida em prisão domiciliar, isso quando não
houver outras medidas que sejam mais favoráveis à acusada.

Todavia, diante da inércia do judiciário e do executivo em agir para concretizar a


aplicação desses direitos, em fevereiro de 2018, o Supremo Tribunal Federal, através do
Habeas Corpus coletivo n.º 143.641 impetrado em nome de todas as mulheres grávidas
e mães de crianças com até 12 anos de idade presas cautelarmente, concedeu a
substituição da prisão preventiva pela domiciliar a todas as mulheres nestas condições,
estendendo ainda a decisão às adolescentes em situação semelhante do sistema
socioeducativo e mulheres que tenham sob custódia pessoas com deficiência11. A
decisão havia determinado o prazo de 60 dias para que os tribunais cumprissem
integralmente a decisão, prazo já excedido sem seu pleno cumprimento.

II – METODOLOGIA PARA FILTRAGEM DAS DECISÕES DO TRIBUNAL DE


JUSTIÇA DO RIO GRANDE DO SUL

A presente pesquisa buscou encarar a realidade acima destacada e para tanto


realizou uma análise da aplicabilidade do HC Coletivo n.º 143.641/SP nos casos de
mulheres aprisionadas preventivamente no estado do Rio Grande do Sul. Como
metodologia principal para coleta de dados e produção de resultados, será utilizado o
mecanismo de busca de jurisprudência contido no sítio eletrônico do TJ/RS12, no qual
será inserido o termo de busca (palavra-chave) “HC Coletivo 143641” com filtragem
específica para obter resultados (decisões) somente das oito câmaras criminais da
referida corte – o objeto de busca dos termos foi a ementa das decisões e a data de corte
do levantamento ficou limitada ao dia 19 de abril de 2022. Além disso, optou-se pela
palavra-chave sem pontos ou abreviaturas, a fim de facilitar e melhor filtrar os acórdãos
objetos de estudo.
Nesse sentido, a partir dos resultados de buscas será feita uma apresentação do
levantamento quantitativo dos acórdãos encontrados e, logo em seguida, uma análise

10
BRASIL. Lei nº 13.257/2016, 8 de março de 2016. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13257.htm
11
SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Habeas Corpus nº 143.641/SP, 2018.
12
Endereço de busca do TJ/RS utilizado: https://www.tjrs.jus.br/novo/buscas-
solr/?aba=jurisprudencia&q=&conteudo_busca=ementa_completa.
qualitativa das decisões proferidas, dessa forma, gerando dados sobre o cumprimento do
HC coletivo pela corte gaúcha.

II.1 – RESULTADOS QUANTITATIVOS DA PESQUISA

Em termos quantitativos, o retorno da busca através do termo de pesquisa “HC


coletivo 143641” produziu os seguintes resultados em cada câmara criminal do TJ/RS:

Câmara Número de acórdão


encontrados13
Primeira Câmara Criminal TJ/RS 45
Segunda Câmara Criminal TJ/RS 40
Terceira Câmara Criminal TJ/RS 27
Quarta Câmara Criminal TJ/RS 4
Quinta Câmara Criminal TJ/RS 2014
Sexta Câmara Criminal TJ/RS 215
Sétima Câmara Criminal TJ/RS 4
Oitava Câmara Criminal TJ/RS 2
Total 144

Analisando os dados brutos das decisões encontradas, temos como extrair ainda
resultados relacionados a concessão ou denegação, tipo de crime, tipo de processo, e
qualificação da requerente (mãe, gestante etc.) conforme gráficos abaixo:

Denegou ou concedeu prisão domiciliar?

42%
58%

Denegou Concedeu
Gráfico 1

13
Cabe registrar que há discrepância no número de acórdãos entre as câmaras em razão de suas
competências previstas no Regimento Interno do TJ/RS (art. 29). Assim, por exemplo, crimes que
envolvam entorpecentes (Lei nº 11.343/06) são de competência das três primeiras câmaras, as quais, por
consequência disso, possuem um número maior de decisões selecionadas, uma vez que se tratam de
crimes mais comuns, como veremos adiante nos gráficos.
14
Em uma filtragem mais detalhada acerca dos objetos das decisões, um acórdão da Quinta Câmara foi
excluído do resultado das buscas uma vez que se tratava de ação coletiva relacionada a um conjunto fático
que não está no escopo deste relatório. O acórdão excluído foi o de nº 0135356-30.2018.8.21.7000.
15
Em uma filtragem mais detalhada acerca dos objetos das decisões, três acórdãos da Sexta Câmara
foram excluídos dos resultados das buscas uma vez que se tratavam de habeas corpus coletivos
relacionados a um conjunto fático que não está no escopo deste relatório. Os acórdãos excluídos foram os
de nº 0117149-46.2019.8.21.7000, 0247190-04.2019.8.21.7000 e 0123837-24.2019.8.21.7000.
Tipo de crime

7%
6%

8%

17%
62%

Entorpecente (Lei nº 11.343/06) Homicídio (todos) e latrocínio

Roubo (todos) Furto (todos)

Outros Crimes

Gráfico 2

Gráfico 2
Tipo processual

4% 1%
5%

90%

Habeas Corpus Recurso em sentido estrito Agravo Apelação Criminal

Gráfico 3
Qualificação da requerente
1%
1%
2% 2%

94%

Mãe de menor de 12 anos Gestante Lactante


Responsável por PCD Pai de menor de 12 anos

Gráfico 4

Os dados quantitativos gerais apresentam algumas características que merecem


destaque. Incialmente, cabe registrar que a maioria (83) das decisões foi no sentido de
denegar a concessão de prisão domiciliar. Ademais, a grande maioria das decisões
pesquisadas (90) envolviam crimes de entorpecentes (Lei nº 11.343/06) e a qualificação
para fins do HC nº 143.641/SP é predominantemente de mães de menores de 12 anos
(136). A partir disso, tem-se que o perfil médio das decisões envolve mulheres com
filhos menores de 12 anos, presas provisoriamente por crimes de tráfico ou afins e que
têm, em regra, indeferido seus pedidos de substituição para cumprimento da prisão em
domicílio.

A seguir, na fase qualitativa deste relatório se fará uma análise mais detida sobre
os argumentos utilizados pelos desembargadores para conceder ou denegar a aplicação
do HC nº143.641/SP.
II.2 – ANÁLISE QUALITATIVA DOS ACÓRDÃOS

Para melhor divisão e análise dos casos, optou-se por apresentar as avaliações
seguindo o critério da quantidade de acórdãos encontrados em cada câmara criminal.
Assim, serão analisadas individualmente a primeira, segunda, terceira e quinta câmaras
(todas com mais de 20 acórdãos cada) e em conjunto a quarta, sexta, sétima e oitava
câmaras (com poucos acórdãos cada uma).

II.2.1 – ANÁLISE QUALITATIVA DA PRIMEIRA CÂMARA CRIMINAL DO


TJ/RS

Através da pesquisa proposta foram encontrados 45 acórdãos julgados pela


Primeira Câmara Criminal do TJ/RS. Inicialmente serão apresentados gráficos que
traçam um perfil das decisões do referido colegiado:

Denegou ou concedeu prisão domiciliar? - 1ª


Câmara criminal TJ/RS

31%

69%

Denegou Concedeu

Gráfico 5
Tipo de crime - 1ª Câmara Criminal TJ/RS
2%

20%

78%

Entorpecente (Lei nº 11.343/06) Homicídio qualificado Crime de tortura

Gráfico 6

Na análise de pleitos que envolviam crimes de violência contra pessoa (homicídio


qualificado e tortura) todas as decisões do colegiado em estudo (10 acórdãos ou 22% do
total) foram no sentido de negar a concessão da prisão domiciliar às requerentes, isso
com fundamento no que dispõe a própria decisão do HC coletivo que preconiza inviável
a sua aplicação para crimes praticados mediante violência ou grave ameaça ou contra
seus descendentes. Para tanto, citamos alguns dos acórdãos que foram nesse sentido:

HABEAS CORPUS. HOMICIDIO QUALIFICADO TENTADO.


PRISÃO PREVENTIVA. IDONEIDADE DA FUNDAMENTAÇÃO.
GRAVIDADE CONCRETA DA CONDUTA. ABALO DA ORDEM
PÚBLICA. MULHER MÃE DE CRIANÇA PEQUENA. PRETENDIDA
SUBSTITUIÇÃO DA SEGREGAÇÃO CAUTELAR POR
DOMICILIAR. IMPOSSIBILIDADE. CRIMES CONTRA A VIDA
NÃO SE ENQUADRAM NOS EFEITOS DO HC COLETIVO
143.641/SP. AUSÊNCIA DE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. EXCESSO
DE PRAZO SUPERADO PELA PRONÚNCIA, A TEOR DA SUMULA 21
DO STJ. PROCESSO QUE AGUARDA A REALIZAÇÃO DA SESSAO
PLENÁRIA DO TRIBUNAL DO JURI. NECESSIDADE DA
SEGREGAÇÃO CAUTELAR. Ordem denegada. (Habeas Corpus,
Nº 70080586308, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Manuel José Martinez Lucas, Julgado em: 27-02-2019). Grifo
nosso.

HABEAS CORPUS. TORTURA MAJORADA. PRISÃO PREVENTIVA.


DECISÃO ADEQUADAMENTE FUNDAMENTADA. RISCO
CONCRETO À ORDEM PÚBLICA. A prisão processual não produz afronta
ao regramento constitucional - onde encontra recepção -, tampouco traz
qualquer ofensa ao princípio da presunção da inocência, mormente ante o
disposto no art. 312 do Código de Processo Penal cuja essência - proteção da
sociedade – constitui objetivo preponderante no Estado Democrático. A
questão atinente ao envolvimento - ou não – da paciente com o crime que lhe
é imputado, ventilada pela impetrante, não é passível de exame na via estreita
do habeas corpus, de sumária cognição. a gravidade do fato ora em exame (o
corréu e a paciente submeteram a vítima, adolescente, a intenso sofrimento
físico e mental, tendo a paciente puxado seus cabelos e batido sua cabeça
contra grades e uma laje, causando-lhe desmaio, sendo que, depois,
continuou agredindo a ofendida com um pedaço de madeira - na cabeça,
inclusive - , e a ameaçou de morte) revela a índole violenta dos agentes e a
presença de concreto risco à ordem pública, a ensejarem a prisão cautelar e
obstarem a adoção das cautelas alternativas de que trata o art. 319, do Código
de Processo Penal. A alteração legislativa aventada, com o acréscimo, pelo
Estatuto da Primeira Infância (Lei nº 13.257/2016) do inciso V ao artigo 318
do Código de Processo Penal, contemplando a possibilidade da concessão de
prisão domiciliar à mulher com filho de até 12 anos de idade incompletos,
não tem a consequência de, diante da existência de prole até tal idade, ser
obrigatória a adoção de tal providência. Não fosse assim e teria o legislador
tornado imperativo o deferimento do benefício, o que não fez. Por isso que,
não vindo aos autos dado algum que evidencie ser necessária a colocação da
paciente em prisão domiciliar, não se está diante de hipótese que autorize a
providência lá contemplada. Decisão proferida no bojo do HC coletivo n.
143641/SP que, emanada de órgão fracionário da Suprema Corte, não
dotada de efeito vinculante, ressalva situações de violência e grave
ameaça, como a presente, em que a paciente foi presa preventivamente
em razão da prática do crime de tortura contra sua enteada adolescente,
causando à vítima intenso sofrimento, fato que ocorreu o interior da
unidade familiar, inclusive. ORDEM DENEGADA. (Habeas Corpus, Nº
70077276335, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Honório Gonçalves da Silva Neto, Julgado em: 18-04-2018). Grifo nosso.

A partir desse recorte, depreende-se que a Primeira Câmara Criminal do TJ/RS


vem observando criteriosamente a aplicação das exceções mencionadas nas tipificações
penais que envolvem crimes mediante violência ou grave ameaça ou contra seus
descendentes.

No que diz respeito aos acórdãos cujos crimes de fundo sejam relacionados à lei
de drogas (nº 11.343/06), que totalizam 78% do total deste colegiado (35 decisões), há
pontos que merecem reflexão acerca da efetivação do HC coletivo em solo gaúcho.
Inicialmente, cumpre observar os dados abaixo:
Percentual de DENEGAÇÕES ou concessões de prisão
domiciliar em casos que envolvam crimes da Lei de Drogas -
1ª Câmara Criminal TJ/RS

43%

57%

Denegou Concedeu

Gráfico 7

Fundamentos centrais mais comuns para as DENEGAÇÕES em


casos que envolvam crimes da Lei de Drogas - 1ª Câmara
Criminal TJ/RS

5% 5%
5%
5%

40%

40%

Liderança em associação para o tráfico

Associação para o tráfico/Periculosidade/Ordem


pública/Reincidência
Traficância na residência

Filho sob cuidados do genitor/parentes

Instrução deficiente do pedido (falta de documentos)

Gráfico 8
Expressões indicativas de violência nas ementas das decisões
DENEGATÓRIAS em casos que envolvam crimes da Lei de Drogas -
1ª Câmara Criminal TJ/RS

Expressões "violência" ou "agressão" ou "homicídio" 1

Expressões "arma" ou "arma de fogo" 4

Gráfico 9 – Observação: a expressão “violência” foi encontrada em algumas occorências, todavia, todas
relacionadas a menções a trechos da decisão do STF.

Resultado dos julgamentos de DENEGAÇÕES de prisão domiciliar


em casos que envolvam crimes da Lei de Drogas - 1ª Câmara
Criminal TJ/RS

45%

55%

Denegou, por unanimidade


Denegou, por maioria

Gráfico 10
Inicialmente, os dados do gráfico nº 07 indicam um percentual maior de
indeferimentos dos pedidos de concessão de prisão domiciliar em situações em que o
tráfico de drogas está como elemento fundante da prisão (20 indeferimentos contra 15
deferimentos).

Em relação aos processos que deferiram a prisão domiciliar (15), os fundamentos


mais encontrados são: (a) o reconhecimento de que sistema prisional brasileiro não está
preparado para receber mães e filhos de forma digna; (b) a percepção de que o
encarceramento trás efeitos danosos e irreversíveis para as crianças submetidas a tal
situação – devendo essas serem protegidas de forma prioritária; (c) a condição de
primariedade de algumas rés; e (d) a prática de crime sem violência. Referidos
fundamentos contidos nos acórdãos se coadunam perfeitamente com os pressupostos
fixados no HC nº 143.641. Nesse sentido, citamos ementas podem ser tomadas como
exemplo de efetivo cumprimento do postulado da corte suprema em benefício de mães e
infantes:

Ementa: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO


PARA O TRÁFICO. PRISÃO PREVENTIVA. FILHO MENOR DE DOZE
ANOS. PRISÃO DOMICILIAR. 1. A regularidade da custódia da paciente
foi reconhecida por esta Câmara no HC nº 70083603464. Concluiu-se que o
decreto prisional apresentou fundamentação suficiente. A gravidade concreta
da conduta, revelada pela importante função que a ré, em tese, desempenhava
junto à organização, e a possibilidade de reiteração criminosa demonstram o
preenchimento dos requisitos do artigo 312 do Código de Processo Penal. 2.
Por outro lado, a paciente faz jus ao benefício da prisão domiciliar. A partir
do julgamento do HC coletivo nº 143.641 pelo STF e com a inclusão dos
artigos 318, V, e 318-A ao Código de Processo Penal, a imprescindibilidade
da presença materna aos cuidados do filho menor de doze anos tornou-se
presumida. O principal beneficiário da medida é a criança, consideradas
as severas consequências que o ambiente carcerário e a ausência
materna trazem ao seu desenvolvimento. Diante da imputação de crime
sem violência contra a pessoa e ponderados os valores em conflito, a
prisão domiciliar constitui meio adequado de assegurar os direitos da
criança, os quais devem ser observados com absoluta prioridade (art.
227 da Constituição Federal). Preenchidos os requisitos legais, é impositiva
a concessão da benesse. LIMINAR CONFIRMADA. ORDEM
CONCEDIDA EM PARTE. (Habeas Corpus Criminal, Nº 70085038453,
Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jayme
Weingartner Neto, Julgado em: 27-05-2021). Grifo nosso.

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA


SUBSTITUÍDA POR DOMICILAR. 1. A PACIENTE FOI PRESA EM
FLAGRANTE PELA PRÁTICA DO CRIME DE TRÁFICO DE DROGAS,
APÓS INFORMAÇÃO DE QUE ARMAZENAVA SUBSTÂNCIA
ENTORPECENTE PARA O COMPANHEIRO, BEM COMO QUE
FORNECIA A DROGA PARA O CORRÉU COMERCIALIZÁ-LA. NÃO
HÁ PROVA PRÉ-CONSTITUÍDA DE QUE A AÇÃO POLICIAL FOI
ILEGAL. APÓS APREENDER SUBSTÂNCIA ENTORPECENTE DO
LADO DE FORA DA CASA, A GUARNIÇÃO ENTROU NO IMÓVEL E
LOCALIZOU 15 COMPRIMIDOS DE ECSTASY (12 GRAMAS), 23
PONTOS DE LSD, 342 GRAMAS DE MACONHA, 148 GRAMAS DE
CRACK E 47 GRAMAS DE COCAÍNA. AS CIRCUNSTÂNCIAS
INDICAM A NECESSIDADE DA PRISÃO PARA GARANTIA DA
ORDEM PÚBLICA. 2. POR OUTRO LADO, ESTÃO PREENCHIDOS
OS REQUISITOS DO ART. 318-A DO CPP, INCLUÍDO AO
ORDENAMENTO APÓS DECISÃO DO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL NO HC Nº 143.641. NO HABEAS COLETIVO, FORAM
EXPOSTOS OS PROBLEMAS ESTRUTURAIS DOS
ESTABELECIMENTOS PRISIONAIS BRASILEIROS, QUE NÃO
COSTUMAM CONTAR COM LOCAL ADEQUADO PARA
GESTANTES. 3. A PRIMARIEDADE DA RÉ, A IMPUTAÇÃO DE
CRIME SEM VIOLÊNCIA CONTRA A PESSOA E O FATO DE
ESTAR EM PERÍODO GESTACIONAL IMPÕEM A SUBSTITUIÇÃO
DA PRISÃO PREVENTIVA POR DOMICILIAR. LIMINAR
CONFIRMADA. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. (Habeas
Corpus Criminal, Nº 51326715720218217000, Primeira Câmara Criminal,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jayme Weingartner Neto, Julgado em:
23-09-2021). Grifo nosso.

Por seu turno, os fundamentos que embasaram a grande maioria dos 20


indeferimentos da Primeira Câmara Criminal demostram certa dificuldade do colegiado
em aplicar os pressupostos do comando do STF.

Ao analisar os gráficos de nº 08 e 09, observa-se que em poucas situações há a


presença de conduta violenta da mulher presa provisoriamente. Na grande maioria dos
casos os fundamentos para mantença da segregação de liberdade em estabelecimento
prisional foram bastantes genéricos e calcados em pressupostos como ordem pública,
periculosidade e traficância na residência ou até mesmo a existência de outros parentes
que estão auxiliando o infante.

No gráfico nº 08 constata-se que em apenas 10% dos casos (dois acórdãos)


restaram evidenciadas fundamentações mais robustas ligadas ao uso do filho para
cometimento do crime ou liderança em associação para o tráfico de drogas.

Importante também os resultados do gráfico nº 09, no qual se observou que em


apenas cinco ementas há menção às expressões “arma”, “arma de fogo”, “violência”,
“homicídio” e “agressão” (25% do total de indeferidos) – um interessante marcador
sobre a gravidade dos crimes que embasaram as prisões provisórias.

Contudo, o que mais chama a atenção são os fundamentos centrais para as não
concessões das benesses às mães encarceradas provisoriamente por crimes de
entorpecentes. Conforme os dados do gráfico nº 08, 90% dos acórdãos analisados
tiveram como argumento central “associação para o tráfico/periculosidade/ordem
pública/reincidência”, “traficância na residência”, “instrução deficiente do pedido (falta
de documentos)” ou “infante sob cuidados do genitor/parentes”. Ao se analisar com
mais detalhamento referidas decisões (18 acórdãos), observa-se que em nenhuma delas
há menção, por exemplo, a confecção de laudo social ou credibilidade dada a palavra da
mãe guardiã para ponderação do caso e, por conseguinte, tomada de decisão. Tais
medidas são expressamente consignadas no corpo da decisão do STF como formas de
aferir as peculiaridades do caso concreto:

“Quando a detida for tecnicamente reincidente, o juiz deverá proceder em


atenção às circunstâncias do caso concreto, mas sempre tendo por norte os
princípios e as regras acima enunciadas, observando, ademais, a diretriz de
excepcionalidade da prisão. Se o juiz entender que a prisão domiciliar se
mostra inviável ou inadequada em determinadas situações, poderá substitui-la
por medidas alternativas arroladas no já mencionado art. 319 do CPP. Para
apurar a situação de guardiã dos filhos da mulher presa, dever-se-á dar
credibilidade à palavra da mãe. Faculta-se ao juiz, sem prejuízo de
cumprir, desde logo, a presente determinação, requisitar a elaboração de
laudo social para eventual reanálise do benefício (...)”.16 Grifo nosso.

Quanto a um dos argumentos de maior incidência para as denegações


“traficância na residência”, cumpre citar que o Ministro Ricardo Lewandowski, relator
do HC coletivo, em decisão de acompanhamento proferida em 24 de outubro de 2018,
ressaltou que o crime de tráfico de drogas, por si só, não configura óbice à substituição
determinada, uma vez que “a concepção de que a mãe que trafica põe sua prole em risco
e, por este motivo, não é digna da prisão domiciliar, não encontra amparo legal e é
dissonante do ideal encampado quando da concessão do habeas corpus coletivo”.
Acrescentou, ainda, que as circunstâncias de o flagrante ter sido realizado por suposta
prática de tráfico na residência da pessoa, de haver anotação anterior pela vara da
infância ou não ter trabalho formal, não configurariam “situações excepcionalíssimas”,
aptas a afastar a concessão da ordem nos casos concretos17.

Outros argumentos satélites bastantes comuns para embasar a mantença em


cárcere das mães presas provisoriamente são a “gravidade do crime de tráfico para
sociedade”, a “inexistência de efeitos vinculantes do HC nº 143.641/SP do STF” e o
“intento jurisprudencial em colocar pessoas do sexo feminino em prisão domiciliar que
se amolda a pretensões político-criminais outras que não o melhor interesse da criança”.
Vejamos algumas ementas como exemplos:

16
BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus Coletivo 143.641/SP. Relator: Min. Ricardo
Lewandowski. Brasília, DF, 20 de fevereiro de 2018. Diário Oficial da União. Brasília, 01 mar. 2018.
Disponível em: https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5183497. Acesso em: 08 jul.
2022.
17
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Informe sobre o Cumprimento das ordens concedidas nos
Habeas Corpus nº 143.641/SP e Habeas Corpus nº 165.704/DF e o estado de coisas inconstitucional.
Brasília, junho de 2021. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-
content/uploads/2021/06/Relato%CC%81rio-HCs-e-o-Estado-de-Coisas-Inconstitucional-DMF.pdf.
Acesso em 28/03/2022.
Ementa: TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA
SUBSTITUÍDA POR PRISÃO DOMICILIAR. RISCO CONCRETO À
ORDEM PÚBLICA. Cuidando-se o tráfico de drogas de crime grave, a
repercussão social dele decorrente, quer no âmbito da saúde pública,
quer na esfera da criminalidade – potencializada pelo uso e pelo
comércio de substâncias entorpecentes – está a evidenciar concreto risco
à ordem pública a tornar necessária a prisão preventiva e obstar a
aplicação das medidas cautelares a que alude o art. 319 do Código de
Processo Penal. A alteração legislativa aventada, com o acréscimo, pelo
Estatuto da Primeira Infância (Lei nº 13.257/2016) do inciso V ao artigo 318
do Código de Processo Penal, contemplando a possibilidade da concessão de
prisão domiciliar à mulher com filho de até 12 anos de idade incompletos,
não tem a consequência de, diante da existência de prole até tal idade, ser
obrigatória a adoção de tal providência. Não fosse assim e teria o legislador
tornado imperativo o deferimento do benefício, o que não fez. Por isso que,
não vindo aos autos dado algum que evidencie ser necessária a colocação da
recorrida em prisão domiciliar, não se está diante de hipótese que autorize a
providência lá contemplada. Decisão proferida no bojo do HC coletivo n.
143641/SP que, emanada de órgão fracionário da Suprema Corte, não
dotada de efeito vinculante, ressalva situações “excepcionalíssimas” como a
presente, em que a recorrida foi presa em flagrante, juntamente com o corréu,
na posse de vultosa quantidade de drogas diversas (oitenta e quatro porções
de maconha, com peso aproximado de 456,7 gramas, e sessenta e duas pedras
de crack, pesando aproximadamente 806 gramas), esta de especial
nocividade, além de numerário e balança de precisão, quando abordada, à
noite, na via pública, em zona onde corrente a mercancia; mais, há fortes
indícios de que a recorrida e o corréu pertencem à facção criminosa “Os
Manos”, atuante nesse Estado. Intento jurisprudencial em colocar pessoas
do sexo feminino em prisão domiciliar que se amolda a pretensões
político-criminais outras que não o melhor interesse da criança e do
adolescente. Condições pessoais favoráveis não têm o condão de,
isoladamente, afastarem a prisão cautelar, com o que o fato de ser a
recorrida primária em nada obsta sua segregação cautelar. RECURSO
PROVIDO, POR MAIORIA. PRISÃO PREVENTIVA DECRETADA.
(Recurso em Sentido Estrito, Nº 70079520433, Primeira Câmara Criminal,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Honório Gonçalves da Silva Neto,
Julgado em: 14-11-2018). Grifo nosso.

Ementa: HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. ASSOCIAÇÃO


PARA O TRÁFICO. PRISÃO PREVENTIVA. SUBSTITUIÇÃO POR
PRISÃO DOMICILIAR. PACIENTE COM FILHO MENOR DE 12 ANOS.
A alteração legislativa aventada, com o acréscimo, pelo Estatuto da Primeira
Infância (Lei nº 13.257/2016) do inciso V ao artigo 318 do Código de
Processo Penal, contemplando a possibilidade da concessão de prisão
domiciliar à mulher com filho de até 12 anos de idade incompletos, não tem a
consequência de, diante da existência de prole até tal idade, ser obrigatória a
adoção de tal providência. Não fosse assim e teria o legislador tornado
imperativo o deferimento do benefício, o que não fez. Por isso que, não
vindo aos autos dado algum que evidencie ser necessária a colocação da
paciente em prisão domiciliar, não se está diante de hipótese que autorize
a providência lá contemplada. Decisão proferida no bojo do HC coletivo n.
143641/SP que, emanada de órgão fracionário da Suprema Corte, não dotada
de efeito vinculante, ressalva situações “excepcionalíssimas” como a
presente, em que a paciente, presa em virtude de investigação apontando seu
envolvimento nos crimes de tráfico de drogas e associação para o tráfico,
valia-se de sua residência para depósito e venda do entorpecente, e, no
momento da prisão, cumpria pena por anterior condenação definitiva
pela prática de tráfico de drogas e associação para o tráfico,
encontrando-se em livramento condicional. Caso em que, ademais, há
informação de que as crianças já eram cuidadas comumente pela avó e
não pela genitora, o que está a indicar que a providência requerida, além
de não recomendável, nem sequer se prestaria a atingir a finalidade a
que se destina. ORDEM DENEGADA, POR MAIORIA. (Habeas Corpus,
Nº 70077186575, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Honório Gonçalves da Silva Neto, Julgado em: 18-04-2018). Grifo
nosso.

HABEAS CORPUS. TRÁFICO DE DROGAS. PRISÃO PREVENTIVA.


SUBSTITUIÇÃO POR PRISÃO DOMICILIAR. PACIENTE COM
FILHO\S MENORES DE 12 ANOS. A alteração legislativa aventada, com o
acréscimo, pelo Estatuto da Primeira Infância (Lei nº 13.257/2016) do inciso
V ao artigo 318 do Código de Processo Penal, contemplando a possibilidade
da concessão de prisão domiciliar à mulher com filho de até 12 anos de idade
incompletos, não tem a consequência de, diante da existência de prole até tal
idade, ser obrigatória a adoção de tal providência. Não fosse assim e teria o
legislador tornado imperativo o deferimento do benefício, o que não fez. Por
isso que, não vindo aos autos dado algum que evidencie ser necessária a
colocação da paciente em prisão domiciliar, não se está diante de hipótese
que autorize a providência lá contemplada. Decisão proferida no bojo do
HC coletivo n. 143641/SP que, emanada de órgão fracionário da
Suprema Corte, não dotada de efeito vinculante, ressalva situações
“excepcionalíssimas” como a presente, em que a paciente, presa em
virtude de investigação apontando seu envolvimento no crime de tráfico
de drogas, valia-se de sua residência para comercializar entorpecentes,
inclusive, na presença dos filhos menores. ORDEM DENEGADA, POR
MAIORIA. (Habeas Corpus, Nº 70079161568, Primeira Câmara Criminal,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Manuel José Martinez Lucas, Redator:
Honório Gonçalves da Silva Neto, Julgado em: 07-11-2018). Grifo nosso.

Os dados trazidos gráfico de nº 10 revelam a existência de frequente divergência


entre os desembargadores da Primeira Câmara Criminal do TJ/RS quanto ao tema em
análise. Em 45% dos casos que envolviam crimes da lei de drogas houve denegação da
prisão domiciliar por maioria dos votos, ou seja, não havia consenso entre os três
julgadores na tomada de decisão. Nesse ponto, destaque especial para alguns votos de
divergência que trazem olhares distintos para os processos que, ao final, foram
indeferidos:

“DES. MANUEL JOSÉ MARTINEZ LUCAS


Com a vênia do eminente Relator, entendo ser caso de parcial concessão da
ordem.
A paciente preenche os requisitos para a substituição da prisão preventiva
pela domiciliar. Isso porque possui uma filha que atualmente conta com 02
anos. Em razão da tenra idade, indubitavelmente, ela depende dos cuidados
da mãe, sendo isso imprescindível. Assim, nos termos do art. 318, inciso III,
do Código de Processo Penal, bem como do que foi decidido pelo Pretório
Excelso no Habeas Corpus coletivo nº 143.641, é cabível a concessão de
prisão domiciliar à paciente.
Em face do exposto, voto por conceder parcialmente a ordem de habeas
corpus, para substituir a prisão carcerária da paciente pela prisão domiciliar.
(Voto divergente, Habeas Corpus, Nº 70077944437, Primeira Câmara
Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Honório Gonçalves da Silva
Neto, Julgado em: 13-06-2018)”.

“DES. JAYME WEINGARTNER NETO (PRESIDENTE)


Com a vênia do eminente Relator, encaminho parcial divergência.
Colhe-se dos elementos juntados que a paciente foi abordada em frente aos
Correios, pois os policiais tinham notícia de que em sua residência eram
comercializados entorpecentes. Consigo, foram apreendidas duas porções de
crack, pesando, ao todo, 200 gramas.
Cumprido mandado de busca e apreensão em sua casa, foram localizados
comprovantes de depósitos bancários e um caderno contendo anotações
acerca do comércio ilícito.
Embora haja gravidade concreta na conduta da paciente, considerada a
quantidade de droga apreendida, não identifico circunstância que
contraindique a concessão da prisão domiciliar à ré, em benefício a seus dois
filhos menores, de três e um anos de idade. Cumprido mandado de busca e
apreensão em sua residência, não foram apreendidas substâncias
entorpecentes, ausente indicativo concreto de que submetesse os infantes ao
contexto de traficância. Nestes aspectos, portanto, o presente flagrante
diverge dos fatos constantes do HC nº 446.656, no qual foi indeferido o
pedido por ser a mercancia realizada na residência da acusada, na presença
das crianças.
Trata-se de paciente primária, que não registra maus antecedentes. A prisão
domiciliar, consideradas as diretrizes lançadas pelo STF no julgamento do
HC coletivo nº 143.641, mostra-se suficiente ao caso concreto, ausente
circunstância excepcionalíssima a contraindicar a extensão de efeitos. Trata-
se de melhor meio para assegurar o adequado desenvolvimento dos filhos de
tenra idade da acusada.
Pelo exposto, voto por conceder parcialmente a ordem, substituindo-se a
prisão preventiva por domiciliar. (Voto divergente, Habeas Corpus, Nº
70079246492, Primeira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Honório Gonçalves da Silva Neto, Julgado em: 03-10-2018)”

“DES. JAYME WEINGARTNER NETO


Com a vênia do eminente Relator, encaminho divergência.
A recorrida e o coacusado foram presos em flagrante durante patrulhamento
de rotina, em via pública, pois visualizada pelos agentes estatais “atitude
suspeita”. Com o corréu, foram localizadas 32 pedras de crack e 18 porções
de maconha, adesivadas com o símbolo da facção criminosa “Os Manos”. Na
bolsa da acusada, apreenderam 57 porções de maconha com o mesmo
adesivo, 09 torrões da mesma substância, e 33 pedras de crack. Ainda, foram
localizados material para embalar droga e balança de precisão. Ao todo,
foram apreendidos 456,7 gramas de maconha e 806 gramas de crack.
Em que pese a quantidade e a variedade de droga apreendida, não identifico,
na conduta da flagrada, gravidade concreta que justifique a reforma da
decisão a quo.
Consigno que a concessão da prisão domiciliar, nos moldes do habeas nº
143.641, tem como beneficiário principal o menor. Nos termos do voto
condutor da maioria da Segunda Turma do Tribunal Constitucional, a regra,
diante da precária situação do sistema prisional (STF, ADPF 347), mormente
no que diz respeito à infraestrutura relativa à maternidade no interior do
estabelecimento prisional, é a substituição da prisão preventiva pela
domiciliar. Tal conclusão tem como fundamento primordial o bem-estar
físico e psíquico das crianças precocemente afastadas de suas genitoras,
as quais estão sujeitas a danos irreversíveis ao seu desenvolvimento.
Foi feita referência ao fato de que 68% das mulheres presas encontram-se
recolhidas ao estabelecimento prisional pela prática de crimes relacionados
ao tráfico, os quais, em sua grande maioria, não envolvem violência nem
grave ameaça a pessoas. Com relação à acusada, não há maiores
circunstâncias nos autos que indiquem sua especial periculosidade, a
considerar que o flagrante decorreu de patrulhamento de rotina, ausente
qualquer informação anterior de tráfico.
Não há demonstrativo de que o filho da ré, de apenas dois anos de idade,
estivesse exposto aos riscos ou desdobramentos da prática delitiva.
Trata-se de acusada primária, que não apresenta qualquer outro registro
criminal, inclusive após a revogação da prisão, no mês de julho. Não há
elementos concretos relativos à personalidade ou à conduta social da acusada,
os quais devem ser considerados quando da análise da faculdade judicial
conferida pelo artigo 318 do CPP (HC nº 152.090/RS. Rel. Ministro Celso de
Mello, j. 08/02/2018).
Assim, ausente circunstância excepcionalíssima concreta, mantenho a
decisão singular e voto por desprover o recurso ministerial. (Voto divergente,
Recurso em Sentido Estrito, Nº 70079520433, Primeira Câmara Criminal,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Honório Gonçalves da Silva Neto,
Julgado em: 14-11-2018)”

Os fundamentos das divergências acima trazidos parecem estar em consonância


com o writ coletivo julgado pelo Pretório Excelso e, assim, evidenciam que um outro
olhar pode ser posto sobre as situações das mães presas provisoriamente por crimes de
entorpecentes.

Todavia, os dados apresentados dos julgados do colegiado em comento


comprovam uma grande dificuldade em dar efetivo cumprimento ao HC nº 143.641/SP,
isso mesmo em situações nas quais não há violência ou outro fator que seja agravante
para justificar a não concessão da medida de prisão domiciliar em favor das mães e dos
infantes.

II. 2.2 – ANÁLISE QUALITATIVA DA SEGUNDA CÂMARA CRIMINAL DO


TJ/RS

Através da pesquisa proposta foram encontrados 40 acórdãos julgados pela


Segunda Câmara Criminal do TJ/RS. Inicialmente serão apresentados gráficos que
traçam um perfil das decisões do referido colegiado:
Denegou ou concedeu prisão domiciliar? - 2ª
Câmara Criminal TJ/RS

47%
53%

Denegou Concedeu

Gráfico 9

Tipo de crime - 2ª Câmara Criminal TJ/RS


10%

90%

Entorpecente (Lei nº 11.343/06) Homicídio qualificado/tentado

Gráfico 10

Na análise de pleitos que envolviam crimes de violência contra pessoa (homicídio


qualificado ou tentado) todas as decisões do colegiado em estudo (quatro acórdãos ou
10% do total) foram no sentido de negar a concessão da prisão domiciliar às
requerentes, isso com fundamento no que dispõe a própria decisão do HC coletivo que
preconiza inviável a sua aplicação para crimes praticados mediante violência ou grave
ameaça ou contra seus descendentes. Para tanto, citamos alguns dos acórdãos que foram
nesse sentido:

HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO.


CORRUPÇÃO DE MENORES. PRISÃO PREVENTIVA.
CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INOCORRÊNCIA. 1. PRELIMINAR.
NULIDADE DO DECRETO PREVENTIVO POR AUSÊNCIA DE
INTIMAÇÃO DA DEFESA. INEXISTÊNCIA. Não há falar em nulidade do
decreto preventivo por ausência de intimação da defesa técnica. Nota-se que
a decretação da prisão preventiva é caso de urgência, não sendo possível a
aplicação do artigo 282, §3º, do Código de Processo Penal. Inocorrência de
violação ao princípio do contraditório e da ampla defesa, tendo em vista que
após a decretação da prisão preventiva, a defesa teve oportunidade de se
manifestar a respeito do decreto prisional, inclusive impetrando o presente
habeas corpus. Preliminar rejeitada. 2. CUSTÓDIA CAUTELAR.
GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA.
Decisão que decretou a prisão preventiva das pacientes devidamente
fundamentada na necessidade de se acautelar a ordem pública e por
conveniência da instrução criminal. Elementos coligidos que dão conta de
que as pacientes, em tese, em comunhão de esforços com outros indivíduos,
um deles adolescente, praticaram os crimes de tentativa de homicídio
qualificado e corrupção de menores. Autores do delito que intentaram matar a
vítima mediante recurso que lhe dificultou a defesa, mediante golpes de arma
branca, hipoteticamente, por vingança, apenas porque o ofendido possuía
desentendimentos com a paciente Vitória. Paciente apontada como a
mandante do crime, enquanto a coatora Elisabete, além de uma das
executoras diretas do crime doloso contra a vida, é mãe genitora do menor
infrator que, em tese, também pretendeu matar o lesado. Dinâmica dos
acontecimentos que bem demonstra a gravidade concreta das condutas e, por
corolário, a necessidade de encarceramento provisório. Fumus comissi delicti
e periculum libertatis presentes. Requisitos dos artigos 312 e 313, ambos do
Código de Processo Penal, atendidos. Constrangimento ilegal não
evidenciado. 3. INADEQUAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES
ALTERNATIVAS. Devidamente justificada a necessidade da prisão
preventiva, inaplicáveis as medidas cautelares diversas, incompatíveis com o
grau de periculosidade demonstrado pelas pacientes. 4. PRESUNÇÃO DE
INOCÊNCIA. ANTECIPAÇÃO DE PENA. PRINCÍPIO DA
PROPORCIONALIDADE. Encarceramento provisório que não malfere o
princípio constitucional da presunção de inocência quando presentes os
requisitos autorizadores, como ocorre na espécie. Tampouco é utilizada como
forma de antecipação de pena, mas sim para o resguardo da ordem pública,
inexistindo afronta aos princípios da proporcionalidade e da razoabilidade. 5.
EXAME DE PROVAS. Descabido, na via estreita do writ, o exame de
provas, devendo a impetração se limitar a matérias de direito que não
demandem incursão no pavilhão probatório. 6. PACIENTE MÃE DE
CRIANÇAS. ART. 318-A CPP. DESCABIMENTO. Não se desconhece
que a Suprema Corte, por ocasião do julgamento do HC Coletivo nº
143641/SP, concedeu a ordem para determinar a substituição da prisão
preventiva pela domiciliar de todas as mulheres presas, gestantes,
puérperas ou mães de crianças e deficientes. Ocorre que, tratando-se de
crime praticado com violência e grave ameaça contra à pessoa, inviável a
concessão da prisão domiciliar, ao menos enquanto existir indícios
suficientes de autoria, como ocorre no caso. ORDEM DENEGADA.
UNÂNIME. (Habeas Corpus Criminal, Nº 50326568020218217000, Segunda
Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Viviane de Faria
Miranda, Julgado em: 26-04-2021) Grifo nosso.

HABEAS CORPUS. HOMICÍDIO QUALIFICADO TENTADO. PRISÃO


PREVENTIVA. CONSTRANGIMENTO ILEGAL. INOCORRÊNCIA. 1.
CUSTÓDIA CAUTELAR. A idoneidade dos fundamentos que sustentam a
custódia preventiva da coacta e as condições pessoais favoráveis já foram
enfrentadas em anterior liminar, a qual aguarda julgamento. Trata-se, assim,
o presente remédio heroico de mera reiteração, sendo descabido, sobre tais
pontos, nova análise. Precedente do Egrégio Superior Tribunal de Justiça.
Não conhecimento do writ neste ponto. 2. PACIENTE MÃE DE
CRIANÇAS. ARTIGO 318-A DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL.
DESCABIMENTO. Não se desconhece que a Suprema Corte, por ocasião do
julgamento do HC Coletivo nº 143.641/SP, concedeu a ordem para
determinar a substituição da prisão preventiva pela domiciliar de todas as
mulheres presas, gestantes, puérperas ou mães de crianças e deficientes.
Ocorre que se tratando de paciente que cometeu crime com emprego de
violência à pessoa, não há como se cogitar a prisão domiciliar. ORDEM
PARCIALMENTE CONHECIDA. NA PARTE CONHECIDA,
DENEGADA. UNÂNIME. (Habeas Corpus Criminal,
Nº 50408636820218217000, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça
do RS, Relator: Viviane de Faria Miranda, Julgado em: 26-04-2021). Grifo
nosso.

A partir desse recorte, depreende-se que a Segunda Câmara Criminal do TJ/RS


vem observando criteriosamente a aplicação das exceções mencionadas nas tipificações
penais que envolvem crimes mediante violência ou grave ameaça ou contra seus
descendentes.

No que diz respeito aos acórdãos cujos crimes de fundo sejam relacionados à lei
de drogas (nº 11.343/06), que totalizam 90% do total deste colegiado (36 decisões), há
pontos que merecem reflexão acerca da efetivação do HC coletivo em solo gaúcho.
Inicialmente, cumpre observar os dados abaixo:
Percentual de DENEGAÇÕES ou concessões de prisão
domiciliar em casos que envolvam crimes da Lei de Drogas - 2ª
Câmara Criminal TJ/RS

44%

56%

Denegou Concedeu

Gráfico 11

Fundamentos centrais mais comuns para as DENEGAÇÕES em


casos que envolvam crimes da Lei de Drogas - 2ª Câmara
Criminal TJ/RS

6% 13%
6%

31%

44%

Instrução deficiente do pedido (falta de documentos)

Associação para o tráfico/Periculosidade/Ordem


pública/Reincidência
Traficância na residência

Filho sob cuidados do genitor/parentes

Gráfico 12
Expressões indicativas de violência nas ementas das decisões
DENEGATÓRIAS em casos que envolvam crimes da Lei de Drogas -
2ª Câmara Criminal TJ/RS

1
Expressões "violência" ou "agressão" ou "homicídio"

Expressões "arma" ou "arma de fogo" ou "pistola" 3

Gráfico 15 – Observação: a expressão “violência” foi encontrada em algumas occorências, todavia, todas
relacionadas a menções a trechos da decisão do STF ou citações gerais, nada relacionado ao contexto fático.

Resultado dos julgamentos de DENEGAÇÕES de prisão domiciliar


em casos que envolvam crimes da Lei de Drogas - 2ª Câmara
Criminal TJ/RS

6%

94%

Denegou, por unanimidade

Gráfico 13
Diferentemente da Primeira Câmara Criminal, os dados do gráfico nº 13 indicam
um percentual maior de deferimentos dos pedidos de concessão de prisão domiciliar em
situações em que o tráfico de drogas está como elemento fundante da prisão (16
indeferimentos contra 20 deferimentos).

Em relação aos processos que deferiram a prisão domiciliar (20), em todos eles
um dos fundamentos principais foi de que as pacientes não se enquadravam nas
exceções que, em tese, impediriam a concessão da prisão domiciliar. Nesse aspecto,
apesar de louváveis as concessões, cabe registrar que algumas das exceções citadas nas
decisões não se coadunam perfeitamente com os pressupostos fixados no HC nº
143.641. Por exemplo, há indicação que um dos requisitos para concessão seria a não
traficância na residência ou a comprovação da indispensabilidade da genitora –
condições que, com a devida vênia, não constam de forma expressa no writ coletivo.

Nesse sentido, citamos ementas que podem ser tomadas como exemplo de
decisões médias/padrões que deferiram o benefício da prisão domiciliar proferidas pela
segunda câmara criminal:

HABEAS CORPUS. DELITOS DE TÓXICOS. NA ESPÉCIE, PELO QUE


CONSTA DOS AUTOS, A PACIENTE FOI AUTUADA EM FLAGRANTE
NA DATA DE 23AGO2021, JUNTAMENTE COM OUTRO
INVESTIGADO, PELA PRÁTICA DOS DELITOS DE TRÁFICO,
ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO DE DROGAS E POSSE DE
MUNIÇÕES DE USO PERMITIDO. HOMOLOGADO O AUTO
DE PRISÃO EM FLAGRANTE, O DIGNO MAGISTRADO DE ORIGEM,
NO MESMO ATO, ACOLHEU O REQUERIMENTO FORMULADO
PELO MINISTÉRIO PÚBLICO E CONVERTEU A SEGREGAÇÃO EM
PRISÃO PREVENTIVA. A SEGREGAÇÃO CAUTELAR DA PACIENTE
FOI MANTIDA, AINDA, EM OUTRAS DUAS OPORTUNIDADES.
ALEGA O IMPETRANTE, INICIALMENTE, QUE A DECISÃO
IMPUGNADA É DESPROVIDA DE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA, E
QUE NÃO RESTARAM DEMONSTRADOS OS REQUISITOS
NECESSÁRIOS PARA A IMPOSIÇÃO DA MEDIDA EXTREMA. SEM
RAZÃO. COM EFEITO, NO CASO EM EXAME, O JUÍZO A QUO, COM
BASE EM ELEMENTOS EXTRAÍDOS DOS AUTOS, FEZ EXPRESSA
REFERÊNCIA À PROVA DA EXISTÊNCIA DO CRIME E DOS
INDÍCIOS DE AUTORIA. ENFATIZO, NESSE PASSO, QUE EM
RELAÇÃO AOS REQUISITOS PARA A DECRETAÇÃO DA PRISÃO
PREVENTIVA, “(...) NÃO SE EXIGE PROVA CONCLUDENTE DA
AUTORIA DELITIVA, RESERVADA À CONDENAÇÃO CRIMINAL,
MAS APENAS INDÍCIOS SUFICIENTES DESTA (...)” (PASSAGEM DO
HC 340302/SP; REL. MIN JORGE MUSSI; SUPERIOR TRIBUNAL DE
JUSTIÇA). OUTROSSIM, O MAGISTRADO DE PRIMEIRO GRAU
APRESENTOU FUNDAMENTAÇÃO CONCRETA PARA A
DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, EXPLICITADA NA
QUANTIDADE DA DROGA APREENDIDA (10 PORÇÕES DE
COCAÍNA, PESANDO 8,38G; 01 PORÇÃO DE COCAÍNA, PESANDO
38,45G E 01 PORÇÃO DE COCAÍNA, PESANDO 247,52G). PODE-SE
ACRESCENTAR, AINDA, A NATUREZA DELETÉRIA DO
ESTUPEFACIENTE ENCONTRADO (COCAÍNA) E AS MUNIÇÕES
ENCONTRADAS (50 MUNIÇÕES 9MM E 06 MUNIÇÕES CALIBRE
.32), MOTIVAÇÃO CONSIDERADA IDÔNEA PARA A DECRETAÇÃO
DA PRISÃO PREVENTIVA, NOS TERMOS DO ARTIGO 312 DO CPP.
ASSIM, PRESENTES OS REQUISITOS DO ARTIGO 312 DO CPP, ERA
CASO DE SER DECRETADA A PRISÃO PREVENTIVA DA PACIENTE.
NÃO OBSTANTE ISSO, SEGUINDO A ORIENTAÇÃO DO PRETÓRIO
EXCELSO QUANDO DO JULGAMENTO DO HC COLETIVO Nº
143.641/SP, POSITIVADA PELO LEGISLADOR COM A EDIÇÃO DA
LEI Nº 13.769/18, QUE INTRODUZIU OS ARTIGOS 318-A E 318-B, NO
CÓDIGO PENAL, ENTENDO QUE É CASO DE SUBSTITUIR A PRISÃO
PREVENTIVA IMPOSTA À PACIENTE, POR PRISÃO DOMICILIAR,
COM FULCRO NO ARTIGO 318, INCISO V, DO CPP, UMA VEZ QUE
A FLAGRADA, APARENTEMENTE, NÃO SE ENQUADRA NAS
EXCEÇÕES QUE IMPEDEM A SUA CONCESSÃO. COM EFEITO,
CONSTA DOS AUTOS QUE (A) A PACIENTE (CARTEIRA DE
IDENTIDADE) É GENITORA DE D.A.G., COM 08 ANOS DE IDADE,
SENDO PRESUMÍVEL QUE ESTEJA SOB A SUA GUARDA; (B) O
CRIME EM TESE PRATICADO POR BEATRIZ NÃO FOI
COMETIDO MEDIANTE VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA À
PESSOAS, OU CONTRA SEUS DESCENDENTES; (C) SEGUNDO
CONSTA NA SUA CERTIDÃO DE ANTECEDENTES, É PRIMÁRIA
E PORTADORA DE BONS ANTECEDENTES; (D) NÃO HÁ
ELEMENTOS ROBUSTOS DE QUE A FLAGRADA PRATIQUE O
TRÁFICO DE DROGAS NA RESIDÊNCIA, COM A PRESENÇA DO
FILHO; E (E) NÃO HÁ PROVA SUFICIENTE DE QUE A PACIENTE
EXERÇA PAPEL RELEVANTE DENTRO DE ORGANIZAÇÃO
CRIMINOSA VOLTADA PARA O COMÉRCIO ILÍCITO DE
DROGAS, DE FORMA A CRIAR UM AMBIENTE DE RISCO E
INSEGURANÇA QUE AFETE A TODA A FAMÍLIA. DESTACO,
AINDA, QUE O AFASTAMENTO DA PRISÃO DOMICILIAR PARA
MULHER GESTANTE OU MÃE DE FILHO MENOR DE 12 ANOS
EXIGE FUNDAMENTAÇÃO IDÔNEA E CASUÍSTICA,
INDEPENDENTEMENTE DE COMPROVAÇÃO DE
INDISPENSABILIDADE DA SUA PRESENÇA PARA PRESTAR
CUIDADOS AO FILHO, SOB PENA DE INFRINGÊNCIA AO ART.
318, INCISO V, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL, INSERIDO
PELO MARCO LEGAL DA PRIMEIRA INFÂNCIA (LEI N.
13.257/166). FRENTE AO EXPOSTO, CONCEDO EM PARTE A
LIMINAR POSTULADA, PARA SUBSTITUIR A PRISÃO PREVENTIVA
DE BEATRIZ DE MOURA ALVES, POR PRISÃO DOMICILIAR, NOS
TERMOS DOS ARTIGOS 318, V, E 318-A, DO CPP, COMBINADO COM
AS SEGUINTES MEDIDAS CAUTELARES: (A) FAZER-SE PRESENTE
A TODOS OS ATOS DA INSTRUÇÃO, SEMPRE QUE INTIMADA; (B)
NÃO MODIFICAR O SEU ENDEREÇO RESIDENCIAL, SEM PRÉVIA
COMUNICAÇÃO AO JUÍZO COMPETENTE; E (C) NÃO MANTER
QUALQUER TIPO DE CONTATO COM O COFLAGRADO HELISSON
GUTERRES GOIA. A PRESENTE DECISÃO DEVERÁ SER EFETIVADA
PELA AUTORIDADE APONTADA COMO COATORA. LIMINAR
RATIFICADA. ORDEM CONCEDIDA. (Habeas Corpus Criminal, Nº
51763440320218217000, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: José Antônio Cidade Pitrez, Julgado em: 25-10-2021). Grifo
nosso.

HABEAS CORPUS. DELITO DE TÓXICOS (ARTIGO 33, DA LEI Nº


11.343/06). Ao exame da liminar, registrei o teor abaixo transcrito em parte:
“Vistos. Adianto que é caso de concessão, em parte, da liminar pleiteada.
Depreende-se dos documentos digitalizados que a paciente foi autuada em
flagrante, na data de 22NOV2018, pela suposta prática do delito de tráfico de
drogas. Homologado o flagrante, o digno Magistrado, no mesmo ato,
converteu a segregação em prisão preventiva. Formulado pedido de
revogação da segregação cautelar, a prisão preventiva foi mantida. Esse, em
resumo, é o atual contexto do feito, na origem. Em relação à
imprescindibilidade da prisão, veja-se os fundamentos invocados pelo
Magistrado de origem: (...) Vê-se que a prisão foi decretada em razão da
gravidade concreta da conduta imputada à paciente, que, segundo o decreto
combatido, foi presa em decorrência do cumprimento de mandado de busca e
apreensão, na posse de diferentes entorpecentes em quantidades
significativas. Dessarte, a segregação cautelar revela-se justificada, pois, na
linha da orientação firmada nos Tribunais Superiores, a gravidade da
conduta, evidenciada pela quantidade e diversidade das drogas apreendidas,
denotam a periculosidade do agente. Anote-se: “a quantidade, a natureza ou a
diversidade dos entorpecentes apreendidos podem servir de fundamento ao
decreto de prisão preventiva” (passagem da ementa do HC 391.652/MS, Rel.
Ministro RIBEIRO DANTAS, QUINTA TURMA, julgado em 03/08/2017,
DJe 14/08/2017). Assim, presentes os requisitos do artigo 312 do CPP, era
caso de ser decretada a prisão preventiva de Sirlene. Não obstante isso,
seguindo orientação do Pretório Excelso, entendo que é caso de substituir a
prisão preventiva imposta à paciente, por prisão domiciliar, com fulcro no
artigo 318, inciso V, do CPP. Com efeito, a Segundo Turma do Supremo
Tribunal Federal, em recente julgamento, concedeu, por maioria de votos, a
substituição da prisão preventiva por domiciliar a todas as mulheres presas,
gestantes, puérperas, ou mães de crianças e deficientes sob sua guarda, nos
termos do art. 2º do ECA e da Convenção sobre Direitos das Pessoas com
Deficiências (Decreto Legislativo 186/2008 e Lei 13.146/2015), excetuados
os casos de crimes praticados por elas mediante violência ou grave ameaça,
contra seus descendentes ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, as
quais deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegarem o
benefício. Da leitura da decisão que concedeu a ordem no HC Coletivo nº
143.641/SP percebe-se a intenção dos membros do Pretório Excelso em
tornar regra a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar das
gestantes ou mães de crianças menores de 12 anos ou deficientes presas
preventivamente ou submetidas a medidas socioeducativas provisórias
privativas de liberdade, de todo território nacional, inclusive provocando a
reavaliação de todos os casos em curso. À vista disso, cumpre examinar, no
caso concreto, se a paciente está em alguma das exceções que impedem a
concessão da prisão domiciliar. A paciente, conforme consta da certidão
de nascimento acostada aos autos, é genitora de uma criança de 07 anos
de idade; o crime em tese praticado pela paciente não foi cometido
mediante violência ou grave ameaça, ou contra seus descendentes; e,
segundo consta na sua certidão de antecedentes, é tecnicamente
primária. Saliento, outrossim, que aparentemente o tráfico de drogas
não era realizado na residência da paciente. Ante o exposto concedo em
parte a liminar para determinar que a paciente SIRLENE DA COSTA
DE JESUS seja colocada em prisão domiciliar, com a obrigação de
comparecimento periódico em juízo para informar e justificar suas atividades,
sem prejuízo da adoção de outras medidas cautelares. Além disso, deverá a
paciente: a) solicitar previamente autorização judicial sempre que pretender
ausentar-se de sua residência (artigo 317 do CPP); b) atender aos
chamamentos judiciais; c) noticiar eventual transferência; e d) para fins de
apuração da melhor situação para a criança, submeter-se, periodicamente,
juntamente com sua família, a estudos psíquico-sociais. Competirá ao juízo
de origem, ainda, advertir a paciente de que eventual desobediência implicará
o restabelecimento da prisão preventiva”. Vão aqui referendadas as
disposições acima, integralmente. LIMINAR RATIFICADA. ORDEM
CONCEDIDA. (Habeas Corpus, Nº 70080186737, Segunda Câmara
Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Antônio Cidade Pitrez,
Julgado em: 18-12-2018). Grifo nosso.

Por seu turno, os fundamentos que embasaram a grande maioria dos 16


indeferimentos da Segunda Câmara Criminal demostram certa dificuldade do colegiado
em aplicar os pressupostos do comando do STF, assim como ocorrido no estudo dos
casos da Primeira Câmara.
Ao analisar os gráficos de nº 14 e 15 observa-se que não houve situações em que a
presença de conduta violenta da mulher foi evidenciada. Em apenas um dos casos,
aparentemente, há maior robustez na fundamentação, pois lastreia a decisão na situação
de foragida da paciente. Na grande maioria dos casos os fundamentos para mantença da
segregação de liberdade em estabelecimento prisional foram bastantes genéricos e
calcados em pressupostos como ordem pública, periculosidade, reincidência, traficância
na residência, imprescindibilidade da genitora não comprovada ou até mesmo a
ausência de instrução processual, essa última, por exemplo, afetou 13% do total de
casos indeferidos.

Importante também os resultados do gráfico nº 15, no qual se observou que em


apenas três ementas há menção às expressões “arma”, “arma de fogo” ou “pistola”, e
uma somente com a expressão “homicídio” – um interessante marcador sobre a
gravidade dos crimes que embasaram as prisões provisórias.

Todavia, o que mais chama a atenção são os fundamentos centrais para as não
concessões das benesses às mães encarceradas provisoriamente por crimes de
entorpecentes. Conforme os dados do gráfico nº 14, todos os acórdãos analisados
tiveram como argumento central “associação para o tráfico/periculosidade/ordem
pública/reincidência”, “traficância na residência”, “infante sob cuidados do
genitor/parentes”, “instrução deficiente do pedido” ou “imprescindibilidade da genitora
não comprovada”. Ao se analisar com mais detalhamento referidas decisões, observa-se
que em nenhuma delas há menção, por exemplo, a confecção de laudo social ou
credibilidade dada a palavra da mãe guardiã para ponderação do caso e, por
conseguinte, tomada de decisão. Tais medidas são expressamente consignadas no corpo
da decisão do STF como formas de aferir as peculiaridades dos casos concretos –
conforme já citamos anteriormente trecho da decisão do Pretório Excelso.

Outros argumentos satélites bastantes comuns para embasar a mantença em


cárcere das mães presas provisoriamente são a “gravidade do crime de tráfico”, a
“inexistência de efeitos vinculantes do HC nº 143.641/SP do STF” e “incerteza do
benefício da medida para o infante”. Vejamos algumas ementas como exemplos:

HABEAS CORPUS. DELITO DE TÓXICOS (ARTIGO 33, DA LEI Nº


11.343/06). Depreende-se dos documentos digitalizados que a paciente teve
prisão preventiva decretada, o que, em princípio, ainda não foi cumprido,
pela prática, em tese, do delito de tráfico de drogas. Mediante requerimento
do Ministério Público, restou acolhido o pedido de prisão preventiva. A
decisão que decretou a prisão, extensa e devidamente fundamentada, denota a
necessidade da segregação, sendo repelida a assertiva da defesa, de ausência
de fundamentação idônea da decisão que decretou a prisão preventiva. Com
efeito, no caso em exame, verifica-se que a r. decisão impugnada foi
adequadamente motivada, tendo a togada de piso demonstrado, com base em
elementos extraídos dos autos, a existência do crime e dos indícios de autoria,
bem como a necessidade de decretação da prisão preventiva, evidenciada a
partir do relato de uma usuária de drogas, que indicou a aquisição do
narcótico junto à ora paciente e que gerou a apreensão de tóxicos na
residência desta, materializada em 04 trouxinhas de cocaína, no casaco desta,
além de - no quarto da paciente - uma trouxa maior de cocaína, bem como a
quantia de quase cinco mil reais em espécie – R$ 4.935,00. Portanto,
mostra-se incólume de dúvidas que a segregação preventiva está
justificada na necessidade de garantia da ordem pública, ante a
gravidade concreta da conduta, não havendo falar, portanto, em
existência de evidente ilegalidade capaz de justificar a sua revogação.
Sublinho que não se pode confundir decisão despida de fundamentação
idônea com aquela contrária aos interesses da parte. Além disso,
reexaminando os autos, não vislumbro qualquer alteração na situação fática
que possa levar à mudança na situação posta. Com efeito, há prova da
existência da materialidade; indícios suficientes de autoria, corroborados
pelas declarações dos agentes públicos. Além disso, constou do decreto de
prisão que a paciente e seu companheiro já estavam sendo investigados pelo
comércio ilícito de drogas, com expediente de interceptação telefônica
direcionado a estes. Enfatizo, nessa toada, que em relação aos requisitos para
a decretação da prisão preventiva “(...) não se exige prova concludente da
autoria delitiva, reservada à condenação criminal, mas apenas indícios
suficientes desta (...)” (Passagem do HC 340302/SP; Rel. Min Jorge Mussi;
Superior Tribunal de Justiça). No tocante à fundamentação da prisão
preventiva, não é ilegal o encarceramento provisório que se funda em dados
concretos a indicar a necessidade da medida extrema. Na espécie, a natureza
deletéria do estupefaciente - cocaína - revela um maior desvalor da sua
conduta e o seu maior envolvimento com o “mundo” do crime, sendo
necessária a manutenção de sua segregação cautelar, para garantia da ordem
pública. Noutro ponto, este órgão fracionário possui entendimento firme no
sentido de que a presença de condições pessoais favoráveis, como
primariedade, domicílio certo e emprego lícito, por si só, não impedem a
decretação da prisão preventiva, notadamente se há nos autos elementos
suficientes para justificar a cautelar, nem atenta esta contra o princípio
constitucional da presunção de inocência. Precedente. Quanto ao pedido de
substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar, com fulcro,
sobretudo, na recente decisão do Pretório Excelso, a irresignação não
encontra guarida. Em sessão realizada na data de 20FEV2018, a Segunda
Turma do Supremo Tribunal Federal, nos autos do Habeas Corpus nº
143641/SP; concedeu, por maioria de votos, a substituição da prisão
preventiva por domiciliar a todas as mulheres presas, gestantes, puérperas, ou
mães de crianças e deficientes sob sua guarda, nos termos do art. 2º do ECA e
da Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiências (Decreto
Legislativo 186/2008 e Lei 13.146/2015), excetuados os casos de crimes
praticados por elas mediante violência ou grave ameaça, contra seus
descendentes ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, as quais deverão
ser devidamente fundamentadas pelos juízes que denegarem o benefício. Não
há dúvida, a partir desse julgado paradigmático, que em regra, deve ser
concedida prisão domiciliar às mulheres presas que sejam gestantes,
puérperas, mães de crianças (menores de 12 anos de idade) ou mães de
pessoas com deficiência de todo território nacional, inclusive provocando a
reavaliação de todos os casos em curso. Contudo, o mesmo acórdão traz
exceções à concessão da prisão domiciliar, a saber: (a) mulher que tiver
praticado crime mediante violência ou grave ameaça; (b) mulher que tiver
praticado crime contra seus descendentes (filhos e/ou netos); e, (c) em outras
situações excepcionalíssimas, as quais deverão ser devidamente
fundamentadas pelos juízes que denegarem o benefício. In casu, os agentes
públicos lograram apreender, no interior do imóvel em que reside a paciente,
a droga acima descrita. Consta do decreto de prisão que havia expediente de
interceptação telefônica, em face desta e de seu companheiro, notabilizando-
se que a residência dos acusados era ponto de tráfico de drogas. Assim
embora comprovado que a paciente seja mãe de uma criança menor de 12
(doze) anos de idade, - destaco que a filha da paciente possui sete anos e
dez meses, - não há certeza que a convivência da paciente com sua filha
seja melhor solução a ser seguida, ou que essa possa protegê-la; pelo
contrário, os fatos até agora revelados demonstram que a manutenção
da paciente em seu lar, além de permitir que ela prossiga livremente no
mister de comercializar drogas, é negativa para a criança, por sua
aparente dedicação a atividades criminosas, além do que a coloca em
risco de vida. Outrossim, se é certo que o encarceramento da mãe causa sério
abalo no filho menor, que se vê privado do cuidado materno, não é menos
correto afirmar que o convívio com a impunidade diante de crime tão grave
causa igual comprometimento e abalo, não só na criança, que vê com olhos
de normalidade essa situação, mas também na sociedade que, impotente, se
vê à mercê do efetivo aumento da criminalidade feminina. Nessa toada é
importante assinalar que o direito a segurança individual e coletiva também é
uma garantia fundamental e um dever do Estado. Ausência de
constrangimento ilegal. ORDEM DENEGADA. (Habeas Corpus, Nº
70078599032, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
José Antônio Cidade Pitrez, Julgado em: 30-08-2018). Grifo nosso.

HABEAS CORPUS. DELITO DE TÓXICOS, DENTRE OUTROS.


CUMPRE SALIENTAR, DE PRONTO, QUE A LEGALIDADE E A
NECESSIDADE DA DECRETAÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA
IMPOSTA À PACIENTE, ASSIM COMO A INVIABILIDADE DA
APLICAÇÃO DE MEDIDAS CAUTELARES ALTERNATIVAS À
PRISÃO, JÁ FORAM APRECIADAS PELO COLEGIADO DESTE
ÓRGÃO FRACIONÁRIO, QUANDO DO JULGAMENTO DO HABEAS
CORPUS TOMBADO SOB O Nº 5107240-21.2021.8.21.7000, NÃO
TENDO APORTADO OS AUTOS FATOS NOVOS RELEVANTES QUE
JUSTIFIQUEM A REAPRECIAÇÃO DAS MATÉRIAS. EM RELAÇÃO
AO PEDIDO DE PRISÃO DOMICILIAR, ANOTO QUE NO CASO EM
COMENTO, CONQUANTO A DEFESA TENHA COMPROVADO QUE A
PACIENTE TEM UM FILHO COM APENAS 05 (CINCO) ANOS DE
IDADE, NÃO HÁ CERTEZA QUE A CONVIVÊNCIA DA
DENUNCIADA COM SEU FILHO É A MELHOR SOLUÇÃO A SER
SEGUIDA, OU QUE ESSA POSSA PROTEGÊ-LO; PELO
CONTRÁRIO, OS FATOS ATÉ AGORA REVELADOS DEMONSTRAM
QUE A MANUTENÇÃO DA PACIENTE EM SEU LAR É NEGATIVA
PARA A CRIANÇA, POR SUA APARENTE DEDICAÇÃO A
ATIVIDADES CRIMINOSAS. COM EFEITO, OS ELEMENTOS
CONSTANTES DOS AUTOS INDICAM QUE A PACIENTE INTEGRA
ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO ILÍCITO DE DROGAS,
HIERARQUICAMENTE ESTRUTURADA, AUXILIANDO O CORRÉU
EZEQUIEL NA GERÊNCIA DO PONTO DE VENDA DE DROGAS DA
PARADA 44, INCLUSIVE NA CONTABILIDADE. A PACIENTE,
AINDA, TERIA A FUNÇÃO DE INFORMAR AO SEU COMPANHEIRO
SOBRE A MOVIMENTAÇÃO DE POLICIAIS E VIATURAS NO POSTO
DE GASOLINA EM QUE TRABALHA. TAIS CIRCUNSTÂNCIAS, NO
MEU SENTIR, AO MENOS EM UM EXAME LIMINAR,
DEMONSTRAM A CARACTERIZAÇÃO DE SITUAÇÃO NÃO
DESCRITA NA LEI N. 13.469/18 E QUE CONFIGURA A
EXCEPCIONALIDADE PREVISTA PELO SUPREMO TRIBUNAL
FEDERAL NO JULGAMENTO DO HC COLETIVO N. 143.641/SP. POR
FIM, QUANTO AO ALEGADO DESCUMPRIMENTO DA SÚMULA
VINCULANTE N. 11 DO STF, TENHO QUE A QUESTÃO DEVERÁ SER
EXAMINADA PELO COLEGIADO DESTE ÓRGÃO FRACIONÁRIO,
APÓS O ENVIO DE INFORMAÇÕES PELA AUTORIDADE
APONTADA COMO COATORA, SOBRETUDO PORQUE JÁ TENDO
SIDO OFERECIDA A DENÚNCIA PELO MINISTÉRIO PÚBLICO, NÃO
HÁ, EM TESE, PROCEDIMENTO INVESTIGATIVO QUE ESTEJA
PENDENTE DE CONCLUSÃO. EM 08OUT2921, INFORMADO PELO
JUÍZO A QUO, O ACESSO AOS AUTOS PARA AS DEFESAS E
LEVANTAMENTO DO SIGILO, DERRUINDO O ARGUMENTO DE
CERCEIO. AUSENTE CONSTRANGIMENTO ILEGAL. ORDEM
DENEGADA. (Habeas Corpus Criminal, Nº 52020152820218217000,
Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: José Antônio
Cidade Pitrez, Julgado em: 22-11-2021). Grifo nosso.

Os dados trazidos pelo gráfico nº 16 revelam um índice bem menor de


divergências entre os desembargadores quando comparado aos da Primeira Câmara
Criminal do TJ/RS. Apenas em um dos casos de denegação houve julgamento por
maioria dos votos. Todavia, referida divergência merece destaque, uma vez que traz um
olhar distinto para a situação discutida – e repetida em outras não concessões:

“DES. LUIZ MELLO GUIMARÃES


Com a devida vênia, estou divergindo, em parte.
Com efeito, até 20 de dezembro de 2018, quando passou a vigorar a Lei nº
13.769/18, eu costumava analisar os pedidos de prisão domiciliar, para
gestantes ou mães de filhos menores de 12 (doze) anos, à luz do caso
concreto, por entender que a decisão do STF a respeito, no HC nº 143641,
não tinha aplicação irrestrita – aliás, o próprio precedente previa a
possibilidade de situações excepcionalíssimas.
Isso porque não eram raras, por exemplo, situações em que mulheres
flagradas em práticas criminosas cometiam seus delitos na frente dos filhos –
por vezes, inclusive, usando-os como “ajudantes” das atividades ilícitas –; e,
dentre ouras, essa era uma das hipóteses em que, a meu sentir, o
entendimento geral adotado no HC referido, que visava sobretudo o bem-
estar das crianças, comportava relativização.
Nesse passo, sempre que julgava que o convívio com a figura materna, como
na situação acima exemplificada, poderia ser mais nocivo aos infantes do que
a separação ocasionada pela prisão da infratora, invariavelmente, me
posicionava pela negativa da domiciliar.
Não obstante, com o advento da Lei nº 13.796/18, posterior ao precedente
acima mencionado, senti-me forçado a mudar esse posicionamento, haja vista
o acréscimo ao CPP do art. 318-A, com a seguinte redação:
Art. 318-A. A prisão preventiva imposta à mulher gestante ou
que for mãe ou responsável por crianças ou pessoas com
deficiência será substituída por prisão domiciliar, desde que:
I - não tenha cometido crime com violência ou grave ameaça a
pessoa;
II - não tenha cometido o crime contra seu filho ou dependente.
De fato, a norma acima não permite interpretação ampliativa ou analogias em
desfavor do réu, visto que trata sobre o direito à liberdade; então,
obviamente, nada pode ser invocado para abrir outras excepcionalidades ao
direito à domiciliar, além das previstas nos incisos I e II – nem mesmo, por
óbvio, o precedente do STF, que é anterior à promulgação da Lei.
Em outras palavras, as hipóteses excepcionantes da domiciliar, previstas
no dispositivo acima transcrito, são taxativas, de aplicação literal e
obrigatória, sem espaço para flexibilização de qualquer natureza.
Diante disso, considerei impositiva a mudança do posicionamento que vinha
adotando, baseado apenas no julgamento do HC nº 143641, e passei a aplicar
o superveniente art. 318-A do CPP, que não oportuniza subjetivismos,
determinando a substituição da prisão preventiva por domiciliar sempre que
não observadas as duas situações objetivas nele taxativamente elencadas.
Registro que, a meu sentir, ampliar as hipóteses previstas na norma
mencionada, quando não há no texto legal permissão para tanto, seria
legislar, extrapolando indevidamente os limites da atividade jurisdicional
e invadindo a competência de outro Poder.
Logo, a despeito de qualquer análise pessoal sobre o caso concreto, tenho que
no feito em tela é forçosa a concessão de prisão domiciliar à paciente, pois
atendido o requisito objetivo do caput e não observada situação que se
enquadre nas hipóteses taxativas dos incisos I e II do novel art. 318-A do
CPP.
Ante o exposto, tendo por justificado meu posicionamento, voto por
CONCEDER PARCIALMENTE a ordem para deferir à paciente a prisão
domiciliar, com fundamento no art. 318-A do CPP, inserido pela Lei nº
13.769/2018, PARA CUMPRIMENTO IMEDIATO SE POR OUTRO
MOTIVO NÃO ESTIVER PRESA.” (Voto divergente, Habeas Corpus,
Nº 70084445774, Segunda Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: José Antônio Cidade Pitrez, Julgado em: 01-10-2020). Grifo nosso.

O fundamento da divergência acima trazido parece estar em consonância com o


writ coletivo julgado pelo Pretório Excelso e, assim, evidencia que um outro olhar pode
ser posto sobre as situações das mães presas provisoriamente por crimes de
entorpecentes.

Por outro lado, os dados apresentados dos julgados do colegiado em comento


comprovam que a Segunda Câmara Criminal do TJ/RS apresenta uma grande
dificuldade em dar efetivo cumprimento ao HC nº 143.641/SP, isso mesmo em
situações nas quais não há violência ou outro fator que seja agravante para justifica a
não concessão da medida de prisão domiciliar em favor das mães e dos infantes.

II.2.3 – ANÁLISE QUALITATIVA DA TERCEIRA CÂMARA CRIMINAL DO


TJ/RS

Através da pesquisa proposta foram encontrados 27 acórdãos julgados pela


Terceira Câmara Criminal do TJ/RS. Inicialmente serão apresentados gráficos que
traçam um perfil das decisões do referido colegiado:
Denegou ou concedeu prisão domiciliar? - 3ª
Câmara Criminal TJ/RS

30%

70%

Denegou Concedeu

Gráfico 17

Tipo de crime - 3ª Câmara Criminal TJ/RS

30%

70%

Entorpecente (Lei nº 11.343/06) Homicídio qualificado/simples

Gráfico 18
Na análise de pleitos que envolviam crimes de violência contra pessoa (homicídio
qualificado ou simples) 50% (quatro julgados) das decisões foram pela concessão da
prisão domiciliar, em tendência diferente do já apresentado nas câmaras criminais
anteriores. Dentre os fundamentos encontrados, destacamos a preocupação do colegiado
com situações de infantes que demandam cuidados especiais:

AGRAVO EXECUÇÃO PENAL. FILHOS MENORES DE 12 ANOS.


PRISÃO DOMICILIAR. POSSIBILIDADE. PROBLEMAS
PSIQUIÁTRICOS. NECESSIDADE DE CUIDADOS EM CARÁTER
EXCEPCIONAL POR PERÍODO DETERMINADO. Prisão domiciliar.
Possibilidade de imposição fora dos casos estritamente previstos pelo art. 117
da Lei de Execução Penal. Rol não taxativo. Jurisprudência da Câmara e do
Supremo Tribunal Federal. CASO CONCRETO. A apenada comprova,
através dos documentos juntados nos autos, ser mãe de duas crianças, um
menino (N.) de 08 anos e uma menina (M.S.) de 01 ano e 01 mês de idade,
sendo que Maria Sophia encontra-se em terna idade, em período o qual a
presença da mãe tem papel essencial no desenvolvimento. Necessário
destacar que a agravante deu à luz não só à criança Maria Sophia, mas
também a outra menina (Maria Esther), que veio a falecer por complicações
no parto. Consta nos autos relato da diretora do estabelecimento prisional
informando ao juízo que a agravante quadro de intenso sofrimento emocional
e psíquico em razão do falecimento de sua outra filha que não sobreviveu
após o parto (M.E.). Além disso, no estudo social de fls. 45/46, o Sr.
Assistente Social Judiciário indicou a necessidade de prorrogação da prisão
domiciliar, considerando que Daiana apresenta problemas psicológicos
(diagnóstico de Depressão e Bipolaridade), além de experimentar sofrimento
psicológico (luto) devido ao falecimento da filha recém-nascida. Ainda,
manifestou-se o assistente social no sentido de que a prisão domiciliar se
mostra necessária para que a agravante preste cuidados ao seu filho N., que
necessita de tratamento continuado devido aos problemas de déficit de
atenção. Comprovado nos autos que, efetivamente, o filho N. possui
diagnóstico de TDHA (Transtorno de Déficit de Atenção), conforme
Relatório de Avaliação Psicológica de fls. 37/40. Impõe-se considerar, por
necessidade de interpretação sistemática do ordenamento jurídico, que o STF,
no julgamento do HC - 143641, em 20 de fevereiro de 2018, concedeu
habeas corpus coletivo para determinar a substituição da prisão preventiva
pela domiciliar – sem prejuízo da aplicação das medidas alternativas
previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal – de todas as mulheres
presas, gestantes, puérperas, ou mães de crianças e deficientes sob sua
guarda. Em razão das peculiaridades do caso concreto, visando o
reestabelecimento clínico e psíquico da agravante e, principalmente o
suporte familiar ao seu filho Nicolas e cuidados essenciais para o
desenvolvimento de sua filha de 01 ano de idade, possível a concessão da
prisão domiciliar até o dia em que a menor completará 02 anos de vida.
AGRAVO PROVIDO. DECISÃO MODFICADA. (Agravo,
Nº 70081002537, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Rinez da Trindade, Julgado em: 27-06-2019). Grifo nosso.

Ementa: AGRAVO EXECUÇÃO PENAL. REGIME ABERTO. FILHO


MENOR DE 12 ANOS. AUSENCIA DE VAGAS. PRISÃO DOMICILIAR.
POSSIBILIDADE. Prisão domiciliar. . Embora não haja previsão expressa no
artigo 117 da LEP acerca da possibilidade de concessão de prisão domiciliar
a condenados que se encontrem em regime aberto, o Supremo Tribunal
Federal aprovou recentemente a Súmula Vinculante nº 56, segundo a qual:
“A falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do
condenado em regime prisional mais gravoso, devendo-se observar, nesta
hipótese, os parâmetros fixados no Recurso Extraordinário (RE) 641320”.
Ainda, presentes nos autos comprovação de que a apenada possui uma
filha menor de 12 anos de idade, a qual depende de seus cuidados, pois
necessita de cuidados especiais. Assim, impõe-se aplicar ao caso concreto
o novo entendimento do STF, no julgamento do HC - 143641, em 20 de
fevereiro de 2018, o qual concedeu habeas corpus coletivo para determinar a
substituição da prisão preventiva pela domiciliar – sem prejuízo da aplicação
das medidas alternativas previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal
– de todas as mulheres presas, gestantes, puérperas, ou mães de crianças e
deficientes sob sua guarda. Aplicação analógica e no contexto do caso e dos
autos da Lei nº 13.257/2016, que alterou o art. 318 do Código de Processo
Penal, ainda que se trate de prisão definitiva. Precedente desta Câmara.
Entendimento do STF. AGRAVO DESPROVIDO. DECISÃO MANTIDA.
(Agravo, Nº 70077345262, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Rinez da Trindade, Julgado em: 30-05-2018) . Grifo nosso.

As demais decisões relacionadas a crimes de homicídio (50%, quatro decisões)


foram no sentido de negar a concessão da prisão domiciliar às requerentes, isso com
fundamento no que dispõe a própria decisão do HC coletivo que preconiza inviável a
sua aplicação para crimes praticados mediante violência ou grave ameaça ou contra seus
descendentes. Nesse sentido:

HABEAS CORPUS. TENTATIVA DE HOMICÍDIO QUALIFICADO.


SUBSTITUIÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA POR PRISÃO
DOMICILIAR. DESCABIMENTO. NÃO ATENDIMENTO AO
REQUISITO PREVISTO NO ARTIGO 318 A, INCISO I, DO CPP.
DELITO COMETIDO COM VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA À
PESSOA. SEGREGAÇÃO CAUTELAR MANTIDA. 1. Habeas corpus que
comporta parcial conhecimento. Questões relativas à legalidade e
necessidade da prisão preventiva da paciente já examinadas em outra ação
constitucional, também impetrada em seu favor. Descabida a renovação de
instância quanto a esses aspectos. 2. Demonstradas a adequação e
necessidade da segregação cautelar da paciente, não há falar em sua
substituição por prisão domiciliar, mormente porque inaplicáveis, na
espécie, as diretrizes dispostas pelo STF por ocasião do julgamento do
HC Coletivo 143.641/SP e no artigo 318-A, inciso I, do CPP, visto que se
trata de delito cometido com violência ou grave ameaça à pessoa.
ORDEM PARCIALMENTE CONHECIDA E, NA PARTE CONHECIDA,
DENEGADA. (Habeas Corpus Criminal, Nº 51150270420218217000,
Terceira Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luciano
Andre Losekann, Julgado em: 19-08-2021). Grifo nosso.

A partir desse recorte, depreende-se que a Terceira Câmara Criminal do TJ/RS se


posiciona de forma mais aberta em relação à concessão das prisões domiciliares às mães
presas, ponderando casos específicos em que a criança necessite de cuidados especiais,
por exemplo. Dessa maneira, há um esforço do colegiado em analisar as peculiaridades
dos casos concretos, evitando, assim, uma mera reprodução das exceções postas no HC
coletivo ou criadas pela própria jurisprudência regional.

No que diz respeito aos acórdãos cujos crimes de fundo sejam relacionados à lei
de drogas (nº 11.343/06), que totalizam 70% do total deste colegiado (19 decisões), há
pontos que merecem reflexão acerca da efetivação do HC coletivo em solo gaúcho.
Inicialmente, cumpre observar os dados abaixo:

Percentual de DENEGAÇÕES ou concessões de prisão


domiciliar em casos que envolvam crimes da Lei de Drogas -
]
3ª Câmara Criminal TJ/RS

16%

84%

Denegou Concedeu

Gráfico 19

Fundamentos centrais mais comuns para as DENEGAÇÕES


em casos que envolvam crimes da Lei de Drogas - 3ª
Câmara Criminal TJ/RS

33%

67%

Associação para o tráfico/Periculosidade/Ordem pública/Reincidência

Imprescindibilidade da genitora não comprovada

Gráfico 20
Expressões indicativas de violência nas ementas das decisões
DENEGATÓRIAS em casos que envolvam crimes da Lei de Drogas -
3ª Câmara Criminal TJ/RS

0
Expressões "violência" ou "agressão" ou "homicídio"

Expressões "arma" ou "arma de fogo" ou "pistola" 2

Gráfico 21

Resultado dos julgamentos de DENEGAÇÕES de prisão domiciliar


em casos que envolvam crimes da Lei de Drogas - 3ª Câmara
Criminal TJ/RS

33%

67%

Denegou, por unanimidade


Denegou, por maioria

Gráfico 22
Diferentemente das primeiras duas câmaras criminais, os dados do gráfico nº 19
indicam um percentual maior de deferimentos dos pedidos de concessão de prisão
domiciliar em situações em que o tráfico de drogas está como elemento fundante da
prisão (16 deferimentos contra três indeferimentos).

Em relação aos processos que deferiram a prisão domiciliar (16), os fundamentos


mais encontrados são: (a) a percepção de que o encarceramento trás efeitos danosos e
irreversíveis para as crianças submetidas a tal situação – devendo essas serem
protegidas de forma prioritária; (b) a condição de primariedade de algumas rés; e (c) a
prática de crime sem violência. Referidos fundamentos contidos nos acórdãos se
coadunam perfeitamente com os pressupostos fixados no HC nº 143.641. Nesse sentido,
citamos ementas podem ser tomadas como exemplo de efetivo cumprimento do
postulado da corte suprema em benefício de mães e infantes:

RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. TRÁFICO DE DROGAS.


SUBSTITUIÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA, DECRETADA PARA FINS
DE GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA, POR DOMICILIAR. ART. 318-
A, INCISOS I E II, DO CPP. IRRESIGNAÇÃO MINISTERIAL. RÉ
PRIMÁRIA, MÃE DE MENOR DE 12 ANOS. DECISÃO DO COLENDO
STF NO HC COLETIVO DE Nº 143.641-SP, A EVIDENCIAR QUE A
SUBSTITUIÇÃO PRECONIZADA PELO ART. 318-A DO CPP NÃO
SE TRADUZ EM MERA FACULDADE DO JUIZ, MAS CONSTITUI,
SIM, DIREITO DA PRESA QUE PREENCHE OS REQUISITOS
LEGAIS RESPECTIVOS, COM VISTAS A PROTEGER O
DESENVOLVIMENTO INFANTIL INTEGRAL E A FAMÍLIA.
DECISÃO MANTIDA. 1. Acusada presa em flagrante, durante revista
realizada quando pretendia ingressar na Penitenciária Modulada de
Uruguaiana, levando no interior de um chuveiro destinado a um dos apenados
ali recolhido a quantidade aproximada de 30g de maconha. 2. Ausência, na
espécie, de indicativos de que a acusada, primária, mãe de uma criança de um
ano e três meses e com residência fixa, possa representar neste momento
qualquer risco à ordem pública. Entendimento desta Corte e do Colendo STJ
em casos análogos. 3. Presentes os requisitos elencados no artigo 318-A,
incisos I e II, do CPP, a concessão da prisão domiciliar não se traduz em
mera faculdade do juiz, mas de direito da presa que preencha os
requisitos estampados na legislação de regência, com vista a proteger o
desenvolvimento infantil e a família, conforme proclamado pelo Colendo
STF por ocasião do julgamento do Habeas Corpus Coletivo de nº
143.641-SP. 4. Lado outro, o quadro de falência do sistema prisional do
Rio Grande do Sul - com a maioria das unidades prisionais superlotadas,
com estruturas físicas deterioradas, sem número adequado de servidores
penitenciários - impõe ao julgador redobradas cautelas, devendo-se
aplicar, sempre que possível e desde que as circunstâncias do caso
indiquem, alguma medida cautelar diversa da prisão, tal como previsto
no art. 319 do CPP. 5. Contexto fático que demonstra ser adequada e
suficiente ao caso concreto a substituição da prisão preventiva pela
domiciliar. RECURSO MINISTERIAL DESPROVIDO. (Recurso em
Sentido Estrito, Nº 50040533120218210037, Terceira Câmara Criminal,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Luciano Andre Losekann, Julgado em:
19-08-2021). Grifo nosso.
RECURSO EM SENTIDO ESTRITO. TRÁFICO DE ENTORPECENTES.
ART. 35, CAPUT, E ART. 33, CAPUT, AMBOS DA LEI 11.343/06.
PRISÃO PREVENTIVA SUBSTITUÍDA POR PRISÃO DOMICILIAR.
INSURGÊNCIA MINISTERIAL. Trata-se de recurso ministerial interposto
contra decisão que substituiu a prisão preventiva da flagrada por prisão
domiciliar, em atenção à orientação determinada pelo egrégio STF, quando
do julgamento do HC Coletivo de n.º 143.641/SP. Circunstâncias concretas
do caso em apreço e características pessoais da recorrida que não indicam a
necessidade da segregação, sobretudo, após a orientação firmada pela
Suprema Corte, a partir do julgamento do Habeas Corpus n° 143641/SP,
Relator Ministro Ricardo Lewandowski, datado de 20/02/2018, no sentido de
substituição da prisão preventiva pela domiciliar de todas as mulheres presas,
gestantes, puérperas ou mães de crianças e deficientes, nos termos do art. 2º
do ECA e da Convenção sobre Direitos das Pessoas com Deficiências
(Decreto Legislativo 186/2008 e Lei nº 13.146/2015), salvo quando os
crimes forem praticados por elas mediante violência ou grave ameaça,
contra seus descendentes ou, ainda, em situações excepcionalíssimas, que
deverão ser devidamente fundamentadas pelos juízes para denegarem o
benefício. Decisão mantida, na íntegra. RECURSO MINISTERIAL
DESPROVIDO. (Recurso em Sentido Estrito, Nº 70080183528, Terceira
Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rinez da Trindade,
Julgado em: 20-02-2019). Grifo nosso.

Já em relação aos fundamentos que embasaram os três indeferimentos da Terceira


Câmara Criminal, cumpre ressaltar alguns pontos. Ao analisar os gráficos de nº 20 e 21
observa-se que em duas situações há menção a “arma de fogo” e as justificativas para as
não concessões são: (a) associação para o tráfico/periculosidade/ordem pública, um
caso; e (b) imprescindibilidade da genitora não comprovada, em dois casos. Contudo,
pelo menos em dois casos há argumentos satélites bastantes robustos para justificar a
decisão denegatória, vejamos:

Ementa: HABEAS CORPUS. PRISÃO PREVENTIVA. TRÁFICO DE


DROGAS, ASSOCIAÇÃO PARA O TRÁFICO, POSSE ILEGAL DE
ARMA DE FOGO E RECEPTAÇÃO. REQUISITOS DOS ARTIGOS 312 E
313 DO CPP. FUMUS COMISSI DELICTI E PERICULUM LIBERTATIS.
ORDEM DENEGADA. I) Pacientes presas em flagrante embalando drogas,
em local conhecido como ponto de tráfico, onde foram apreendidos 5 tijolos
e 27 sacos de erva esverdeada, semelhante à maconha, pesando aprox.
6.229g; 34 sacos com diversas pedras amarelas, semelhante ao crack,
pesando aprox. 300g; 03 sacos contendo pó branco, semelhantes à cocaína,
pesando aprox. 790g; 02 rádios transmissores; diversas munições de pistola
9MM e Calibre 12; 02 coletes balísticos; 01 submetralhadora 9MM, (com
numeração raspada, conforme auto de apreensão); 01 espingarda calibre 12 e;
02 balanças de precisão. ii) Alegação de excesso de prazo da segregação
cautelar inocorrente, ante a complexidade do processo que envolve vários
crimes a serem apurados. III) Decisão que decretou a prisão preventiva
devidamente motivada, em observância ao disposto no art. 93, inciso IX, da
Constituição Federal. IV) Fumus comissi delicti e periculum libertatis
evidenciados. Presença de prova da existência do crime e indícios suficientes
de autoria. Prisão preventiva que se justifica para garantir a ordem
pública e a instrução criminal, ante a periculosidade demonstrada pelas
pacientes, flagradas em situação que indica a traficância, com apreensão
de expressiva quantidade e variedade de drogas, pesados armamentos e
munições. V) Primariedade da paciente Nathalia que não impede a
decretação da custódia preventiva, uma vez presentes os seus requisitos. O
fato de a paciente FERNANDA possuir uma filha menor não acarreta,
automaticamente, a concessão de prisão domiciliar. Situação excepcional
a justificar a manutenção da segregação cautelar (HC nº 143.641/SP –
STF), em razão da gravidade concreta dos delitos e a periculosidade
demonstrada, ante a apreensão de expressiva quantidade e variedade
drogas, pesados armamentos e munições. V) Constatada a necessidade da
prisão preventiva, inviável a adoção de medidas cautelares alternativas, que,
na espécie, não se mostrariam suficientes ou eficazes para a manutenção da
garantia da ordem pública. VI) A alegação genérica da pandemia pelo
COVID-19, por isso si, não implica na revogação da prisão, mormente
inexistindo demonstração idônea de situação de risco pelas pacientes. VII)
Requisitos dos artigos 312 e 313, do CPP, presentes. Segregação cautelar
mantida. PRECEDENTES DO STF, STJ E TJRS. ORDEM DENEGADA.
(Habeas Corpus Criminal, Nº 70084449032, Terceira Câmara Criminal,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Gisele Anne Vieira de Azambuja,
Julgado em: 26-10-2020). Grifo nosso.

AGRAVO EXECUÇÃO PENAL. APENADA MÃE DE DUAS CRIANÇAS


MENORES DE 12 ANOS DE IDADE. RESPONDE A 03
PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS DISCIPLINARES POR
DESOBEDIÊNCIA. PRISÃO PROVISÓRIA. VÍNCULO FAMILIAR NÃO
COMPROVADO. A apenada possui uma condenação já transitada em
julgado, em regime aberto, mais duas condenações, em regime fechado, ainda
pendentes de recurso. Em que pese o entendimento adotado pelo STF, no
julgamento do HC - 143641, em 20 de fevereiro de 2018, o qual concedeu
habeas corpus coletivo para determinar a substituição da prisão preventiva
pela domiciliar – sem prejuízo da aplicação das medidas alternativas
previstas no artigo 319 do Código de Processo Penal – de todas as mulheres
presas, gestantes, puérperas, ou mães de crianças e deficientes sob sua
guarda, bem como a edição da Lei nº 13.257/2016, que alterou o art. 318 do
Código de Processo Penal, no caso concreto, a apenada não demonstrou a
relação de dependência de seus filhos consigo. Em audiência de um dos
processos, ela relata que seu filho não residia consigo e ainda, houve a
intervenção do Conselho Tutelar para retirá-lo dos cuidados de sua genitora,
bem como testemunhas alegaram que a filha da apenada estava exposta às
drogas em local insalubre, quando estava sob os cuidados desta. Nas razões
deste agravo, a defesa juntou as certidões de nascimento dos menores, mas
não comprovou a situação de necessidade da presença da mãe pelas crianças.
Ademais, a apenada responde a três PADs por desobediência, de modo
que seria arriscada a concessão de um benefício como a prisão
domiciliar, que é baseada na confiança na conduta do apenado que não
fica sob à vigilância do estado. AGRAVO DEFENSIVO DESPROVIDO.
(Agravo de Execução Penal, Nº 70083180455, Terceira Câmara Criminal,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Rinez da Trindade, Julgado em: 05-12-
2019)

Nas decisões mencionadas acima, houve a presença de fatores que foram


decisivos para não concessão da prisão domiciliar, como gravidade do fato (com
apreensão de munições pesadas) e reiterado descumprimento de ordens por parte da
genitora (além de não comprovação do vínculo familiar). Em apenas uma decisão, que
justamente foi definida por maioria (gráfico nº 22), há fundamento genérico sobre a não
comprovação da imprescindibilidade da mãe para o infante, todavia, sem qualquer tipo
de medida complementar que pudesse dar maior confiabilidade aos fatos como, por
exemplo, a confecção de laudo social sobre a situação. Vejamos:
Ementa: HABEAS CORPUS. PACIENTE PRIMÁRIA PRESA EM
FLAGRANTE E DENUNCIADA POR TRÁFICO DE ENTORPECENTES,
POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO DE USO PERMITIDO E
POSSE IRREGULAR DE ARMA DE FOGO COM NUMERAÇÃO
RASPADA (ARTIGOS 33, CAPUT, DA LEI Nº 11.343/06 (1º FATO),
ARTIGO 12 DA LEI Nº 10.826/03 (2º FATO) E ARTIGO 16, INCISO IV,
DA LEI Nº 10.826/03 (3º FATO), NA FORMA DO ARTIGO 69, CAPUT,
DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÃO DEFENSIVA NO SENTIDO DE QUE
A PACIENTE É MÃE DE 3 FILHOS MENORES E POR ISSO SE
ENQUADRA NAS HIPÓTESES DE SOLTURA ESTABELECIDAS PELO
STF NO JULGAMENTO DO HC COLETIVO 143.641. A ora paciente foi
presa em flagrante pelos crimes anteriormente referidos, constando que, na
ocasião, em cumprimento a mandado de busca e apreensão no apartamento
em que a paciente estava ocupando, foram localizados: 18 porções de
maconha embaladas em plástico preto, um revólver calibre .38, uma pistola
HK 9mm, munições, além de dinheiro em forma de troco a indicar que a
droga apreendida seria para venda, além de 03 aparelhos celulares. Consta,
ainda, que a pistola calibre 9mm está vinculada com o APF
1565/2019/152011, a qual foi dispensada pelos indicados daquele feito
durante a prisão (fls. 07). Quanto à alegação de que a paciente é mãe de três
crianças menores de idade (foram juntadas duas certidões de nascimento de
duas crianças menores de 12 anos), não restou comprovado, nos presentes
autos, que tais crianças dependem exclusivamente da mãe para a subsistência.
Neste sentido, aliás, destacou o Magistrado singular: “[...] a prima da
investigada foi ouvida no APF quando narrou que reside há duas semanas
com a indiciada, sendo que o local aonde a droga foi encontrada pertence à
indiciada, enquanto o apartamento do bloco G, nº 104, pertence à mãe da
indiciada, mas ela (indiciada) possui um quarto nesse apartamento também
(fl. 20). Ora, não há qualquer menção a respeito da coabitação dos
infantes no imóvel em que a diligência se efetuou, tampouco os policiais,
no cumprimento do mandado, indicaram tal circunstância, o que
certamente haveria de constar em razão do necessário encaminhamento
da prole à companhia de outros responsáveis, medida certamente
acompanhada do Conselho Tutelar. Não havendo quaisquer dessas
indicações, inviável presumir a coabitação das crianças com a mãe,
tampouco que as crianças estejam efetivamente desamparadas sem a
genitora” Inexistindo constrangimento ilegal na prisão da paciente, a ordem
não merece ser concedida. ORDEM DENEGADA, POR MAIORIA. (Habeas
Corpus Criminal, Nº 70082548207, Terceira Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Maria de Lourdes G. Braccini de Gonzalez, Julgado
em: 05-09-2019). Grifo nosso.

O voto de divergência da decisão acima traz um outro olhar possível para o caso,
em perfeita sintonia com o comando do writ do STF:

“DES. DIÓGENES VICENTE HASSAN RIBEIRO (PRESIDENTE)


Rogo vênia à eminente Relatora para encaminhar divergência no sentido de
conceder parcialmente a ordem.
Em que pese a apreensão, em tese, de substância entorpecente e armas de
fogo, as circunstâncias do caso concreto autorizam a concessão de
liberdade à paciente.
Isso porque a quantidade de droga supostamente apreendida é pequena para
fins de aferição do perigo de liberdade – 49,30g de maconha (página 32),
considerando, sobretudo, sua natureza.
Ademais, em que pese a apreensão de 1 revólver calibre .38 e 1 pistola 9mm,
não há notícias da prática de qualquer violência ou resistência no
momento da apreensão e da abordagem policial.
Além disso, a paciente Aline Catiane, nascida em 1990, é primária, não
respondendo a qualquer outro processo.
Insta acentuar que a paciente é acusada da suposta prática de fatos cometidos
sem violência contra a pessoa, pelo que não há, rigorosamente, demonstração
da efetiva necessidade da medida extrema e sempre excepcional da prisão
preventiva.
Registro ainda que a prisão preventiva para garantia da ordem pública se
justifica apenas e exclusivamente diante das circunstâncias do caso concreto,
sob pena de configurar a vedada hipótese de cumprimento antecipado da
pena.
Nesse contexto, ausente demonstração de perigo de liberdade, entendo
adequada e suficiente ao caso concreto a substituição da prisão preventiva
por medidas cautelares diversas consistentes em (a) comparecimento mensal
em juízo, para informar e justificar atividades, e (b) manutenção dos
endereços e telefones atualizados, nos termos do artigo 319, inciso I, do
Código de Processo Penal.
É como voto.” (Voto divergente, Habeas Corpus, Nº 70082548207, Primeira
Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relatora: Maria de Lourdes G.
Braccini de Gonzalez, Julgado em: 09-09-2019)

Os dados dos julgados do colegiado em comento comprovam – em relação as


demais câmaras criminais, uma maior consonância entre suas decisões e os pressupostos
fixados pelo HC nº 143.641/SP. Em que pese alguns poucos exemplos de julgamentos
dissonantes, a concessão de prisão domiciliar às mães tem sido uma regra para a
Terceira Câmara Criminal do TJ/RS.

II.2.4 – ANÁLISE QUALITATIVA DA QUINTA CÂMARA CRIMINAL DO


TJ/RS

Através da pesquisa proposta foram encontrados 20 acórdãos julgados pela Quinta


Câmara Criminal do TJ/RS. Inicialmente serão apresentados gráficos que traçam um
perfil das decisões do referido colegiado:
Denegou ou concedeu prisão domiciliar? - 5ª
Câmara Criminal TJ/RS

25%

75%

Denegou Concedeu

Gráfico 23

Tipo de crime - 5ª Câmara Criminal TJ/RS


5%

15%
30%

5%

45%

Roubo (todos) Latrocínio


Furto (todos) Extorsão
Crimes contra a dignidade sexual
Gráfico 24

Em todos os julgamentos (11 acórdãos) que envolviam crimes de roubo


(majorado e simples), latrocínio, extorsão e contra a dignidade sexual a medida de
prisão domiciliar foi indeferida. Em dez casos foi alegada a prática de crimes com
violência ou grave ameaça e em um caso foi indicado que a reincidência da paciente foi
o motivo da não concessão. Citamos alguns dos acórdãos que foram nesse sentido:

Ementa: HABEAS CORPUS. CÓDIGO PENAL. CRIMES CONTRA O


PATRIMÔNIO. 157, INCISOS II E V E §2°-A, INCISO I. ROUBO
MAJORADO. CONCURSO DE AGENTES. EMPREGO DE ARMA DE
FOGO. ART. 288, CAPUT, C/C PARÁGRAFO ÚNICO. ASSOCIAÇÃO
CRIMINOSA. EXISTÊNCIA DO FATO E AUTORIA. Segundo a acusação,
a paciente prestou auxilio material aos denunciados, com quem estava
conluiada, garantindo-lhes a chegada ao esconderijo, na posse dos objetos
roubados. Certa a existência do fato e presentes indícios suficientes da
autoria. FUNDAMENTOS DA PRISÃO PREVENTIVA. Decisão que
guarda suficiente fundamentação. Presença do requisito do art. 312 do CPP –
garantia da ordem pública – e do inciso I do art. 313, do CPP. PRISÃO
DOMICILIAR. As disposições do art. 318-A do CP e HC coletivo n.
143.641/SP do STF não são absolutas e não podem servir de escudo
contra a prisão preventiva. A decisão que decretou a segregação
considerou o emprego de violência e grave ameaça contra pessoa no
delito, e o fez fundamentadamente, procedendo, assim, de acordo com o
caso concreto. PRETENSÃO DE EXAME DA PROVA. No mais,
evidenciada a pretensão de exame da prova, antecipando o julgamento, o que
prematuro e desautorizado. MEDIDAS CAUTELARES. Medidas cautelares
diversas não se mostram suficientes, considerando a natureza e características
do delito, bem analisadas na decisão determinante da prisão. ORDEM
DENEGADA. UNÂNIME. (Habeas Corpus Criminal, Nº
50295853620228217000, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em: 04-03-2022). Grifo nosso.

Ementa: HABEAS CORPUS. CÓDIGO PENAL. CRIMES CONTRA O


PATRIMÔNIO. ART. 157, § 3º, INC. II, C/C ART. 14, INC. II. ROUBO
QUALIFICADO. LATROCÍNIO. TENTATIVA. EXISTÊNCIA DO FATO
E AUTORIA. Segundo a acusação, os pacientes teriam, junto de outros dois
indivíduos, simulado a ação de um roubo durante uma transação financeira de
alta monta, combinada com a vítima em local ermo. Um dos “assaltantes” era
o irmão da ora paciente, que acabou morto em confronto com a polícia. Certa
a existência do fato e presentes indícios suficientes da autoria.
FUNDAMENTOS DA PRISÃO PREVENTIVA. Decisão que guarda
suficiente fundamentação. Presença do requisito do art. 312 do CPP –
garantia da ordem pública – e do inciso I do art. 313, do CPP.
PREDICADOS PESSOAIS. Predicados pessoais, mesmo que favoráveis, por
si só, não autorizam a liberdade. Ausência de ofensa à presunção de
inocência, uma vez que a Constituição Federal admite, paralelamente, a
prisão em flagrante e a prisão preventiva, seja por conversão, seja de forma
independente. PRISÃO DOMICILIAR. As disposições do art. 318-A do CP
e HC coletivo n. 143.641/SP do STF não são absolutas e não podem
servir de escudo contra a prisão preventiva. A decisão que decretou a
segregação considerou o emprego de violência e grave ameaça contra
pessoa no delito, e o fez fundamentadamente, procedendo, assim, de
acordo com o caso concreto. CORONAVÍRUS. A existência da pandemia
não pode significar salvo-conduto para liberar presos indiscriminadamente,
mesmo com medidas cautelares diversas da prisão, ainda mais quando
evidente o risco à ordem pública. Em que pese a alegação de que integra o
chamado grupo de risco, nada veio aos autos comprovando que o paciente
não esteja tendo acesso ao tratamento correspondente à moléstia.
PRETENSÃO DE EXAME DA PROVA. No mais, evidenciada a pretensão
de exame da prova, antecipando o julgamento, o que prematuro e
desautorizado. MEDIDAS CAUTELARES. Medidas cautelares diversas não
se mostram suficientes, considerando a natureza e características do delito,
bem analisadas na decisão determinante da prisão. ORDEM DENEGADA.
UNÂNIME. (Habeas Corpus Criminal, Nº 70084483015, Quinta Câmara
Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado
em: 16-10-2020). Grifo nosso.

A partir desse recorte, depreende-se que a Quinta Câmara Criminal do TJ/RS vem
observando a aplicação das exceções mencionadas nas tipificações penais que envolvem
crimes mediante violência ou grave ameaça. No que diz respeito ao caso julgado
indeferido por reincidência da paciente, a ementa aponta para existência de considerável
ficha de antecedentes e condenações já transitadas em julgado. Todavia, inexiste
qualquer menção a laudo social na decisão para esclarecer a real condição dos infantes e
a necessidade da presença de sua genitora. Vejamos:

HABEAS CORPUS. CÓDIGO PENAL. CRIMES CONTRA O


PATRIMÔNIO. ART. 158, § 1º. EXTORSÃO. CONCURSO DE
AGENTES. EXISTÊNCIA DE FATO E AUTORIA. A paciente, juntamente
com outro denunciado, mediante grave ameaça e com intuito de obter para si
ou para outrem indevida vantagem econômica, constrangeram a vítima a
fazer-lhes entregar a quantia de R$ 500.000,00. FUNDAMENTOS DA
PRISÃO PREVENTIVA. Decisão que guarda suficiente fundamentação.
Presença do requisito do art. 312, CPP – garantia da ordem pública – e do
inciso I do art. 313, também do CPP. Paciente que ostenta considerável ficha
de antecedentes criminais, sendo duas condenações transitadas em julgado e
processos em andamento, circunstâncias que, sem qualquer dúvida, indicam
reiteração criminosa e impedem a concessão da liberdade provisória.
PRISÃO DOMICILIAR. Em que pese o disposto no art. 318-A, do CP, e
no HC coletivo nº 143641, do STF, tais disposições não são absolutas e
não podem servir de escudo contra a prisão preventiva. A decisão que
decretou a prisão preventiva e, considerando a condição de reincidente
da paciente, o fizeram fundamentadamente, procedendo, assim, de
acordo com o caso concreto. ORDEM DENEGADA. UNÂNIME. (Habeas
Corpus Criminal, Nº 70083207530, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em: 20-11-2019). Grifo
nosso.

No que diz respeito aos acórdãos cujos crimes de fundo sejam furto (em todos os
tipos), que totalizam sozinhos 45% do total deste colegiado (nove decisões), há pontos
que merecem reflexão acerca da efetivação do HC coletivo em solo gaúcho.

Inicialmente, cumpre observar que os crimes de entorpecentes não apareceram nas


pesquisas deste colegiado em razão da competência estabelecida pelo Regimento
Interno do TJ/RS (art. 29), o qual atribui as três primeiras câmaras criminais a
competência para julgar referidos crimes.

Todavia, dada a característica, em regra, de inexistir prática de violência ou grave


ameaça no tipo penal furto podemos traçar um paralelo com as análises feitas
anteriormente sobre crimes de entorpecentes. Nesse sentido, apresentamos alguns dados
sobre os julgados que envolveram crime de furto:

Percentual de DENEGAÇÕES ou concessões de prisão


domiciliar em casos que envolvam crimes de furto - 5ª
Câmara Criminal TJ/RS

44%

56%

Denegou Concedeu

Gráfico 25

Fundamentos centrais mais comuns para as DENEGAÇÕES


em casos que envolvam crime de furto (todos) - 5ª Câmara
Criminal TJ/RS

25%

75%

Filho sob cuidados do genitor/parentes


Imprescindibilidade da genitora não comprovada

Gráfico 26
Expressões indicativas de violência nas ementas das 4 decisões
DENEGATÓRIAS em casos que envolvam crime da furto - 5ª Câmara
Criminal TJ/RS

Expressões "violência" ou "agressão" ou "homicídio" 0

Expressões "arma" ou "arma de fogo" ou "pistola" 0

Gráfico 27

Os dados do gráfico nº 25 indicam um percentual maior de deferimentos dos


pedidos de concessão de prisão domiciliar em situações em que o furto está como
elemento fundante da prisão (quatro indeferimentos contra cinco deferimentos).

Em relação aos processos que deferiram a prisão domiciliar (cinco), em todos eles
um dos fundamentos principais foi de que as pacientes não cometeram crimes com
violência ou grave ameaça. Além isso, a presunção da necessidade da mãe para os
infantes também apareceu em algumas decisões. Nesse sentido, citamos ementas que
podem ser tomadas como exemplo de decisões médias/padrões que deferiram o
benefício pela Quinta Câmara Criminal:

HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. PACIENTE


TECNICAMENTE PRIMÁRIA E QUE POSSUI UM FILHO MENOR DE
12 ANOS. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO INCISO V DO ART. 318 DO
CPP. HC COLETIVO 143.641/SP. SUBSTITUIÇÃO DA PRISÃO
PREVENTIVA POR PRISÃO DOMICILIAR. Presentes os requisitos e
pressupostos do artigo 312 do CPP, não era o caso de revogação da prisão
preventiva. Todavia, a paciente é tecnicamente primária e possui um filho
menor de 12 anos, que presumidamente necessita de sua presença e cuidados.
Ademais, trata-se de delito que não envolveu violência ou grave ameaça
contra a pessoa, sendo possível a substituição da prisão cautelar por
prisão domiciliar, com fundamento no artigo 318, inciso V, do CPP, e no
acórdão proferido no Habeas Corpus Coletivo nº 143.641/SP, pela
Segunda Turma do STF. LIMINAR CONFIRMADA. ORDEM
CONCEDIDA. (Habeas Corpus Criminal, Nº 70082455676, Quinta Câmara
Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Cristina Pereira Gonzales,
Julgado em: 28-08-2019). Grifo nosso.

Ementa: HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. PACIENTE QUE


POSSUI FILHOS MENORES DE 12 ANOS. HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA
DO INCISO V DO ART. 318 DO CPP. HC COLETIVO 143.641/SP.
SUBSTITUIÇÃO DA PRISÃO PREVENTIVA POR PRISÃO
DOMICILIAR. 1. Já havendo habeas corpus impetrado em favor de
Monique, o presente writ vai conhecido apenas em relação a Bruna. 2.
Presentes os requisitos e pressupostos do artigo 312 do CPP, não era o caso
de revogação da prisão preventiva. Todavia, a paciente possui dois filhos
menores de 12 anos, que presumidamente necessitam de sua presença e
cuidados. Ademais, trata-se de delito que não envolveu violência ou
grave ameaça contra a pessoa, sendo suficiente para refrear a reiteração
delitiva a substituição da prisão cautelar por prisão domiciliar, com
fundamento no artigo 318, inciso V, do CPP, e no acórdão proferido no
Habeas Corpus Coletivo nº 143.641/SP, pela Segunda Turma do STF.
HABEAS CORPUS CONHECIDO EM PARTE. LIMINAR
CONFIRMADA. ORDEM PARCIALMENTE CONCEDIDA. (Habeas
Corpus Criminal, Nº 70084223387, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Cristina Pereira Gonzales, Julgado em: 16-06-2020).
Grifo nosso.

Por seu turno, os fundamentos que embasaram os quatro acórdãos de


indeferimento demostram, assim como em outras câmaras criminais, certa dificuldade
do colegiado em aplicar os pressupostos do comando do STF em benefício das mães e
crianças.

Ao se analisar os gráficos de nº 26 e 27 observa-se que não houve situações em


que a existência de conduta violenta da mulher foi evidenciada. Os fundamentos para
mantença da segregação de liberdade em estabelecimento prisional foram bastantes
genéricos e calcados em pressupostos como reincidência e imprescindibilidade da
genitora não comprovada.

Importante também os resultados do gráfico nº 27, no qual se observou que em


nenhuma ementa há menção às expressões “arma”, “arma de fogo”, “pistola”,
“agressão”, “violência” ou “homicídio” – um interessante marcador sobre a gravidade
dos crimes que embasaram as prisões provisórias.

Outro ponto importante: em nenhum dos quatro acórdãos de denegação há


menção, por exemplo, a confecção de laudo social ou credibilidade dada a palavra da
mãe guardiã para ponderação do caso e, por conseguinte, tomada de decisão. Tais
medidas são expressamente consignadas no corpo da decisão do STF como formas de
aferir as peculiaridades dos casos concretos – conforme já citamos anteriormente trecho
da decisão do Pretório Excelso. Vejamos algumas ementas como exemplos:
Ementa: HABEAS CORPUS. CÓDIGO PENAL. CRIMES CONTRA O
PATRIMÔNIO. ART. 155, § 4º, INC. IV. FURTO QUALIFICADO. ART.
288, CAPUT. ASSOCIAÇÃO CRIMINOSA. EXISTÊNCIA DO FATO E
AUTORIA. PRISÃO EM FLAGRANTE. Segundo a acusação, a paciente,
juntamente com outros denunciados, traziam no porta-malas do veículo
Chevrolet/Classic, branco, placas IRG-981, diversas peças de roupas,
identificadas com as etiquetas das lojas Renner, Riachuelo e Havan, sem
notas fiscais. Denúncia recebida em 03/05/2021. FUNDAMENTOS DA
PRISÃO PREVENTIVA. Decisão que guarda suficiente fundamentação.
Presença do requisito do art. 312, CPP – garantia da ordem pública, evitando
a reiteração criminosa – e do inciso I do art. 313, também do CPP. Paciente
apresenta processo em andamento por delito contra o patrimônio.
PREDICADOS PESSOAIS. Predicados pessoais, mesmo que favoráveis, por
si só, não autorizam a liberdade. E, no caso, nem mesmo são favoráveis.
Ausência de ofensa à presunção de inocência, uma vez que a Constituição
Federal admite, paralelamente, a prisão em flagrante e a prisão preventiva,
seja por conversão, seja de forma independente. Paciente que registra
processo em andamento, por fato similar, e recentemente havia sido flagrada
e colocada em liberdade. PRISÃO DOMICILIAR. A substituição da prisão
preventiva pela domiciliar, em que pese o art. 318-A do CP e HC coletivo n.
143.641/SP do STF, tais disposições não são absolutas e não servem de
escudo contra a prisão preventiva. Não demonstrada a indispensabilidade
nos cuidados para com os filhos menores de 12 anos de idade. Paciente
residente desta capital e o delito cometido foi na cidade de Santa Cruz do
Sul. Precedentes. ORDEM DENEGADA. UNÂNIME. (Habeas Corpus
Criminal, Nº 50589438020218217000, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em: 07-06-2021). Grifo
nosso.

HABEAS CORPUS. CÓDIGO PENAL. CRIMES CONTRA O


PATRIMÔNIO. ART. 155, § 4º, INC. IV. FURTO QUALICADO.
CONCURSO DE AGENTES. EXISTÊNCIA DE FATO E AUTORIA.
Paciente que foi presa em flagrante, juntamente com outra mulher, no interior
da Caixa Econômica Federal de Santo Ângelo/RS, de posse um cartão de
débito furtado no dia anterior. FUNDAMENTOS DA PRISÃO
PREVENTIVA. Decisões que guardam suficiente fundamentação. Presença
do requisito do art. 312, CPP – garantia da ordem pública – e dos incisos I e
II do art. 313, também do CPP. Paciente que ostenta PEC ativo, com
considerável ficha de antecedentes criminais, sendo duas condenações
transitadas em julgado e várias denúncias recebidas, todas por delitos contra
o patrimônio, circunstâncias que, sem qualquer dúvida, indicam reiteração
criminosa e impedem a concessão da liberdade provisória. MEDIDAS
CAUTELARES. Medidas cautelares diversas à prisão também não se
mostram suficientes, uma vez que nem mesmo a pena ativa, prestação de
serviços à comunidade, foi capaz de frear a reiteração delituosa da paciente.
PRISÃO DOMICILIAR. Em que pese o disposto no art. 318-A, do CP, e
no HC coletivo nº 143641, do STF, tais disposições não são absolutas e
não podem servir de escudo contra a prisão preventiva. Caso em que a
menor está na companhia da avó materna, no mesmo local em que reside
a paciente. A decisão que decretou a prisão preventiva e todas aquelas
que indeferiram a liberdade provisória, considerando a condição de
multireincidente da paciente, o fizeram fundamentadamente,
procedendo, assim, de acordo com o caso concreto. ORDEM
DENEGADA. UNÂNIME. (Habeas Corpus Criminal,
Nº 70082387473, Quinta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Ivan Leomar Bruxel, Julgado em: 28-08-2019). Grifo nosso.

Cabe frisar que as quatro decisões de denegação em crimes de furto foram


tomadas de forma unânime pelo colegiado.
Numa análise global dos julgados da Quinta Câmara Criminal do TJ/RS
encontramos ainda bastantes barreiras para dar efetivo cumprimento ao HC nº
143.641/SP, isso mesmo em situações nas quais não há violência ou outro fator que seja
agravante para justifica a não concessão da medida de prisão domiciliar em favor das
mães e dos infantes. Evidente que a competência regimental imputa ao colegiado um
julgamento de crimes mais violentos (extorsão, roubo majorado, latrocínio etc.),
todavia, o estudo dos casos de furto, por exemplo, evidenciaram alguns pontos críticos
em que a denegação do benefício às mães foi lastreada em argumentos genéricos e, em
regra, desconectados do comando do STF.

II.2.5 – ANÁLISE QUALITATIVA CONJUNTA DA QUARTA, SEXTA, SÉTIMA


E OITAVA CÂMARA CRIMINAL DO TJ/RS

Considerando o baixo número de decisões encontradas, optou-se em fazer uma


análise conjunta da quarta, sexta, sétima e oitava câmara criminal do TJ/RS. Através da
pesquisa proposta foram encontrados 12 acórdãos julgados por essas câmaras, assim
distribuídos:

Câmara Número de acórdão


encontrados
Quarta Câmara Criminal TJ/RS 4
Sexta Câmara Criminal TJ/RS 2
Sétima Câmara Criminal TJ/RS 4
Oitava Câmara Criminal TJ/RS 2
Total 12

Inicialmente serão apresentados gráficos que traçam um perfil das decisões dos
referidos colegiados:
Denegou ou concedeu prisão domiciliar? - 4ª,
6ª, 7ª e 8ª Câmara Criminal TJ/RS

17%

83%

Denegou Concedeu

Gráfico 28

Tipo de crime - 4ª, 6ª, 7ª e 8ª Câmara Criminal


TJ/RS

25%

42%

8%

8%

17%

Roubo (todos)
Latrocínio
Estupro de vulnerável
Coação no curso do processo
Crimes contra o sistema nacional de armas

Gráfico 29
Inicialmente, cumpre observar que os crimes da lei de drogas (Lei nº 11.343/06)
não apareceram nas pesquisas destes colegiados em razão das competências
estabelecidas pelo Regimento Interno do TJ/RS (art. 29), o qual atribui somente às três
primeiras câmaras criminais a competência para julgar referidos crimes.

Do conjunto de ementas pesquisadas, apenas em dois casos houve concessão da


prisão domiciliar, um envolvendo crime de roubo (Quarta Câmara Criminal) e outro
crime contra o sistema nacional de armas (Sétima Câmara Criminal). Em ambos os
casos foram destacadas as situações de primariedade das rés e a necessidade de
cuidados dos infantes envolvidos:

Ementa: HABEAS CORPUS. POSSE ILEGAL DE ARMAS DE FOGO DE


USO RESTRITO E PERMITIDO. PRISÃO PREVENTIVA. PRESENTE O
FUMUS COMISSI DELICTI E AUSENTE O PERICULUM LIBERTATI.
DELITO QUE NÃO ENVOLVEU VIOLÊNCIA OU GRAVE AMEAÇA
CONTRA A PESSOA. PACIENTE PRIMÁRIA, QUE POSSUI
RESIDÊNCIA FIXA, E É MÃE DE FILHA MENOR DE 12 ANOS.
HIPÓTESE DE INCIDÊNCIA DO INCISO V DO ART. 318 DO CPP. HC
COLETIVO 143.641/SP CONCEDIDO PELO STF. SUBSTITUIÇÃO DA
PRISÃO PREVENTIVA POR PRISÃO DOMICILIAR E IMPOSIÇÃO
DE COMPARECIMENTO MENSAL EM JUÍZO. ORDEM
PARCIALMENTE CONCEDIDA. RATIFICADA A LIMINAR
PARCIALMENTE DEFERIDA EM SEDE DE RECONSIDERAÇÃO.
(Habeas Corpus, Nº 70080291362, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de
Justiça do RS, Relator: Newton Brasil de Leão, Julgado em: 14-03-2019).
Grifo nosso.

Ementa: HABEAS CORPUS. CRIMES CONTRA O PATRIMÔNIO


DEFERIMENTO À PACIENTE DA PRISÃO DOMICILIAR, EM FACE
DAS CONDIÇÕES PESSOAIS, DA PRIMARIEDADE E
MATERNIDADE DE CRIANÇA SOB SUA GUARDA E QUE
NECESSITA SEU AMPARO, A TEOR DO ENTENDIMENTO DO STF
QUANDO DO HC COLETIVO 143.641/SP. POSSIBILIDADE DE
SUBSTITUIÇÃO DA PRISÃO. CONCESSÃO PARCIAL DA ORDEM.
LIMINAR RATIFICADA. (Habeas Corpus Criminal, Nº 70083724930, Sétima
Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Glaucia Dipp Dreher,
Julgado em: 13-02-2020). Grifo nosso.

Nos demais dez julgamento proferidos pelos colegiados houve indeferimento da


prisão domiciliar. O gráfico abaixo apresenta os argumentos utilizadas para embasar tais
decisões:
Fundamentos centrais mais comuns para as DENEGAÇÕES -
4ª, 6ª, 7ª e 8ª Câmara Criminal TJ/RS

20%

20% 60%

Crime praticado mediante violência ou grave ameaça

Periculosidade/Garantia da ordem pública/Reincidência

Crime cometido contra descendentes

Gráfico 30

Em 80% dos casos julgados os fundamentos para as denegações foram bastantes


robustos, pois atrelados a prática de violência ou grave ameaça ou crimes praticados
contra descendentes, o que, conforme preconiza o HC do STF desaconselha a concessão
da medida de prisão domiciliar. Os tipos penais desses julgados foram coação no curso
do processo, estupro de vulnerável, latrocínio e roubo majorado, espécies de crimes que,
em regra, tem em seu cerne a prática de algum tipo de violência. Alguns exemplos de
ementas podem elucidar os posicionamentos:

HABEAS CORPUS. CRIME CONTRA O PATRIMÔNIO. LATROCÍNIO.


PACIENTE GRÁVIDA. Em que pese a gravidez da paciente, o caso dos
autos não autoriza a substituição da prisão preventiva por prisão domiciliar,
tendo em vista a gravidade concreta do delito: a vítima, motorista de
aplicativo, foi esfaqueada e amarrada pela paciente e seus comparsas, bem
como atearam fogo em seu corpo e deixaram o cadáver na estrada, tudo isso
com a finalidade de subtrair seu veículo. Hipótese em que o HC coletivo nº
143.641 do STF não encontra aplicação, uma vez que excetua a
concessão da extensão de ordem aos casos em que as mulheres praticam
delitos mediante violência ou grave ameaça à pessoa, desde que por
decisão fundamentada, como no caso. ORDEM DENEGADA. (Habeas
Corpus, Nº 70080022361, Sétima Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Carlos Alberto Etcheverry, Julgado em: 31-01-2019). Grifo
nosso.

Ementa: HABEAS CORPUS. ARTIGO 344 DO CÓDIGO PENAL. PRISÃO


PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM PÚBLICA. CONDIÇÕES
PESSOAIS FAVORÁVEIS. AUSÊNCIA DE ÓBICE À CUSTÓDIA
CAUTELAR. PEDIDO DE PRISÃO DOMICILIAR. INVIABILIDADE. 1.
Paciente presa preventivamente pela prática, em tese, do delito previsto no
art. 344 do Código Penal. 2. Decisão que atende aos comandos
constitucionais e legais, porquanto refere concretamente as circunstâncias
fáticas que evidenciam a necessidade da custódia processual como garantia
da ordem pública. Materialidade e indícios de autoria demonstrados.
Precedentes. 3. Paciente que teria ameaçado de agressão e morte a filha,
suposta vítima do crime de estupro praticado por outro filho da paciente,
irmão da vítima, visando beneficiá-lo nos autos do processo que investiga
o referido crime sexual. 4. A existência de condições pessoais favoráveis e
eventual substituição da pena privativa de não se constitui em óbice para
a decretação da prisão preventiva, presentes os requisitos que autorizam
a constrição. 5. A determinação contida no HC coletivo 143.641
comporta exceções, como no caso concreto. 6. Inexistência de
constrangimento ilegal. ORDEM DENEGADA. (Habeas Corpus, Nº
70078810611, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator:
Julio Cesar Finger, Julgado em: 18-10-2018). Grifo nosso.

Em apenas dois casos (ambos da Quarta Câmara Criminal), nos quais os crimes
praticados foram contra o sistema de armas nacional, há argumentos mais genéricos
para as denegações (Periculosidade/Garantia da ordem pública/Reincidência):

Ementa: HABEAS CORPUS. ARTIGO 16, PARÁGRAFO ÚNICO, INC.


IV, DA LEI 10.826/03. ARTIGOS 180, 288, PARÁGRAFO ÚNICO, E 311,
TODOS DO CP. PRISÃO PREVENTIVA. GARANTIA DA ORDEM
PÚBLICA. CONDIÇÕES PESSOAIS FAVORÁVEIS. AUSÊNCIA DE
ÓBICE À CUSTÓDIA CAUTELAR. PEDIDO DE PRISÃO DOMICILIAR.
INVIABILIDADE. 1. Paciente presa preventivamente pela prática, em tese,
dos delitos previstos nos arts. 16, parágrafo único, inc. IV, da Lei 10.826/03,
180, 288, parágrafo único, e 311, todos do CP. 2. Decisão que atende aos
comandos constitucionais e legais, porquanto refere concretamente as
circunstâncias fáticas que evidenciam a necessidade da custódia processual
como garantia da ordem pública. Materialidade e indícios de autoria
demonstrados. Precedentes. 3. Paciente flagrada, juntamente com os corréus,
com 02 pistolas calibre 9mm, municiada, além de 31 munições intactas, após
denúncia anônima recebida pelos policiais, dando conta de que um veículo
Cerato, de cor escura, seria utilizado para a prática de um homicídio em
determinada rua da cidade de Canoas. Com os acusados foi apreendido,
ainda, automóvel objeto de furto e com as placas adulteradas. Elementos que
apontam que a paciente seria integrante da facção denominada “bala na cara”.
4. A existência de condições pessoais favoráveis e eventual substituição
da pena privativa de não se constitui em óbice para a decretação da
prisão preventiva, presentes os requisitos que autorizam a constrição. 5.
A determinação contida no HC coletivo 143.641 comporta exceções,
como no caso concreto. 6. Inexistência de constrangimento ilegal. ORDEM
DENEGADA. (Habeas Corpus, Nº 70078090917, Quarta Câmara Criminal,
Tribunal de Justiça do RS, Relator: Julio Cesar Finger, Julgado em: 30-08-
2018). Grifo nosso.

Ementa: HABEAS CORPUS. ARTIGO 16, CAPUT, DA LEI 10.826/03.


ARTIGO 180 E 288 AMBOS DO CP. ARTIGO 244-B DA LEI 8.069/90.
PRISÃO EM FLAGRANTE CONVERTIDA EM PREVENTIVA. PEDIDO
DE PRISÃO DOMICILIAR. INVIABILIDADE. 1. Paciente presa em
flagrante pela prática, em tese, do delito previsto no art. 16, caput, da Lei
10.826/03, 180 e 288, ambos do CP e art. 244-B da Lei 8.069/90. 2. A
determinação contida no HC coletivo 143.641 comporta exceções, como
no caso concreto. Paciente reincidente, possuindo condenação pela
prática dos crimes de tráfico de drogas e corrupção de menores. 3.
Inexistência de constrangimento ilegal. ORDEM DENEGADA. (Habeas
Corpus, Nº 70077323244, Quarta Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do
RS, Relator: Julio Cesar Finger, Julgado em: 17-05-2018). Grifo nosso.

Em que pese as fundamentações mais genéricas, as duas decisões acima possuem


pontos que merecem destaque como a indicação de possível prática de homicídio ou
antecedente em crime de corrupção de menores, fatores que foram preponderantes para
o indeferimento. Cabe ressaltar, também, que não há menção a confecção de laudo
social para análise do caso, conforme determinado o HC coletivo do Pretório Excelso.

A partir desse recorte, depreende-se que os colegiados em análise tem observado a


aplicação das exceções mencionadas no HC coletivo para os crimes mediante cometidos
mediante violência ou grave ameaça ou crimes praticados contra descendentes. No que
diz respeito aos casos julgados indeferidos por reincidência ou periculosidade/ordem
pública, as ementas apontaram para existência de outros fatores que deram maior peso
para não concessão. Cabe frisar que todas as dez decisões de denegação foram tomadas
de forma unânime pelos colegiados em comento.

Assim, numa análise global dos julgados dos colegiados em questão, mesmo com
um alto índice de indeferimentos, há uma tendência em seguir os pressupostos do HC nº
143.641/SP, especialmente para aplicação das exceções de concessão da prisão
domiciliar para crimes violentos ou contra descendentes. A competência regimental
imputa aos colegiados julgamentos de crimes mais violentos (extorsão, roubo majorado,
estupro de vulnerável, latrocínio etc.), ou seja, qualquer análise do conjunto de decisões
deve levar isso em consideração, sob pena de distorção quando comparado a outros
colegiados do TJ/RS.

III. CONSIDERAÇÕES FINAIS SOBRE AS DECISÕES DO TJRS

Os dados apresentados nesta pesquisa comprovam uma grande dificuldade das


câmaras criminais do TJ/RS em dar efetivo cumprimento ao HC nº 143.641/SP e a
própria legislação vigente, isso mesmo em situações nas quais não há violência ou grave
ameaça ou outro fator que seja agravante para justificar a não concessão da medida de
prisão domiciliar em favor das mães.
Os gráficos nº 1, 2 e 3, apresentados no início deste relatório, constroem um perfil
médio das “clientes” das decisões das oito câmaras do TJ/RS: mulheres com filhos
menores de 12 anos, presas provisoriamente por crimes de tráfico ou afins e que
têm, em regra, indeferido seus pedidos de substituição para cumprimento da
prisão em domicílio.

Em vários casos, especialmente aqueles ligados a crimes de tráfico de drogas, as


argumentações de indeferimentos são genéricas e desacompanhadas de maiores
elementos que pudessem elucidar os fatos e peculiaridades dos casos – como exemplo
laudo social para avaliação do caso. Nesse sentido, conforme os dados exaustivamente
apresentados, boa parte dos julgados denegatórios – ligados a crimes de tráfico – teve
como cerne argumentos como: “traficância na residência”, “imprescindibilidade da
genitora não comprovada”, “existência de outros parentes que estão auxiliando o
infante”, “deficiência na instrução probatória” e “periculosidade e ordem pública”.

Os gráficos abaixo apresentam o panorama compilado de todas as oito câmaras


em julgamentos que envolvam crimes de tráfico:

Percentual de DENEGAÇÕES ou CONCESSÕES de prisão domiciliar


em casos que envolvam crimes da Lei de Drogas - Compilado das
oito câmaras criminais do TJ/RS

43%

57%

Denegou Concedeu
Fundamentos centrais mais comuns para as DENEGAÇÕES em
casos que envolvam crimes da Lei de Drogas - Compilado das oito
câmaras criminais do TJ/RS

8% 2%
3%

8%

5% 36%

38%

Liderança em associação para o tráfico


Associação para o tráfico/Periculosidade/Ordem pública/Reincidência
Traficância na residência
Filho sob cuidados do genitor/parentes
Imprescindibilidade da genitora não comprovada
Utlização dos filhos para prática do crime
Instrução deficiente do pedido (falta de documentos)

Outros argumentos satélites bastantes comuns para embasar a mantença em


cárcere das mães são a “gravidade do crime de tráfico para sociedade”, a “inexistência
de efeitos vinculantes do HC nº 143.641/SP do STF” e o “intento jurisprudencial em
colocar pessoas do sexo feminino em prisão domiciliar que se amolda a pretensões
político-criminais outras que não o melhor interesse da criança”.

Quanto ao argumento de maior incidência para as denegações (“traficância na


residência”), cumpre citar que o Ministro Ricardo Lewandowski, relator do HC
coletivo, em decisão de acompanhamento proferida em 24 outubro de 2018, ressaltou
que o crime de tráfico de drogas, por si só, não configura óbice à substituição
determinada, uma vez que “a concepção de que a mãe que trafica põe sua prole em risco
e, por este motivo, não é digna da prisão domiciliar, não encontra amparo legal e é
dissonante do ideal encampado quando da concessão do habeas corpus coletivo”.
Acrescentou, ainda, que as circunstâncias de o flagrante ter sido realizado por suposta
prática de tráfico na residência da pessoa, de haver anotação anterior pela vara da
infância ou não ter trabalho formal, não configurariam “situações excepcionalíssimas”,
aptas a afastar a concessão da ordem nos casos concretos18.

Até mesmo em situações cujo crime seja de furto – em regra sem prática de
violência ou grave ameaça – tem-se observado que há dificuldade no deferimento da
medida de prisão domiciliar, conforme exposto nos dados da Quinta Câmara Criminal,
na qual 44% dos casos deste tipo foram indeferidos sob fundamentos bastantes
genéricos (reincidência e imprescindibilidade da genitora não comprovada).

Obviamente, como visto, algumas câmaras criminais parecem mais alinhadas ao


posicionamento fixado pelo STF e pela legislação penal. A exemplo disso, estão os
dados da Terceira Câmara Criminal e sua maior preocupação em analisar as
especificidades dos casos e o melhor interesse do infante – até mesmo em situações de
crimes violentos. Entretanto, no contexto global de análise, trata-se de uma exceção
entre todos os julgados analisados. A conclusão que fica é que existem ainda bastantes
barreiras para o TJ/RS dar efetivo e verdadeiro cumprimento ao HC nº 143.641/SP.

Por fim, cumpre destacar questão que demanda maior estudo e pesquisa, qual seja:
a incidência do uso de tornozeleiras eletrônicas para os casos de mães beneficiadas com
a prisão domiciliar pelo HC coletivo. Referido ponto está ausente no presente relatório
por dificuldades encontradas no levantamento dos dados, todavia, é um importante fator
que merece atenção em futuras pesquisas sobre o tema.

IV. REFERÊNCIAS

BOITEUX, Luciana; FERNANDES, Maíra. (Coord.) Mulheres e crianças


encarceradas: um estudo jurídico-social sobre a experiência da maternidade no sistema
prisional do Rio de Janeiro, 2015.

BORGES, Juliana. O que é encarceramento em massa? São Paulo: Letramento, 2017.

BRASIL. Lei nº 11.942, de 27 de maio de 2009. Disponível em:


http://www.justica.gov.br/seus-direitos/politica-penal/politicas-2/mulheres-1/anexos-
projeto-mulheres/lei-no-11-942-2009.pdf

18
CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA, 2021.
BRASIL. Lei nº 13.257/2016, 8 de março de 2016. Disponível em:
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2015-2018/2016/Lei/L13257.htm

BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Habeas Corpus Coletivo 143.641/SP. Relator:


Min. Ricardo Lewandowski. Brasília, DF, 20 de fevereiro de 2018. Diário Oficial da
União. Brasília, 01 mar. 2018. Disponível em:
https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5183497.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. Informe sobre o Cumprimento das ordens


concedidas nos Habeas Corpus nº 143.641/SP e Habeas Corpus nº 165.704/DF e o
estado de coisas inconstitucional. DF, Junho de 2021. Disponível em:
https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2021/06/Relato%CC%81rio-HCs-e-o-
Estado-de-Coisas-Inconstitucional-DMF.pdf.

CONSELHO NACIONAL DE JUSTIÇA. População carcerária feminina. Disponível


em: http://www.cnj.jus.br/noticias/cnj/80853-populacao-carceraria-feminina-aumentou-
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DINIZ, Débora. Cadeia: relatos sobre mulheres. Rio de Janeiro: Civilização brasileira,
2015.

FIOCRUZ. LEAL, Maria do Carmo; AYRES, Barbara Vasques da Silva; ESTEVES-


PEREIRA, Ana Paula; SÁNCHEZ, Alexandra Roma LAROUZÉ, Bernard. Nascer na
prisão: gestação e parto atrás das grades no Brasil. Ciência & Saúde Coletiva, 21(7),
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MINISTÉRIO DA JUSTIÇA; DEPARTAMENTO PENITENCIÁRIO NACIONAL.


Levantamento Nacional de Informações Penitenciárias – INFOPEN Mulheres. 2ª
edição. Brasília, 2018.

MINISTÉRIO DA JUSTIÇA; INSTITUTO DE PESQUISA ECÔNOMICA


APLICADA – IPEA. Dar à luz na sombra: condições atuais e possibilidades futuras
para o exercício da maternidade por mulheres em situação de prisão. Série Pensando o
Direito, 51. Brasília, 2015.

PIMENTEL, Elaine. O lado oculto das prisões femininas: representações dos


sentimentos em torno do crime e da pena. Latitude, Vol. 7, nº 2, pp. 51-68, 2013.

QUEIROZ, Nana. Presos que menstruam. 4ª ed. Rio de Janeiro: Record, 2015.
SIMÕES, Heloisa Vieira; BARTOLOMEU, Priscilla Conti; SÁ, Priscilla Placha. VALE
QUANTO PESA: o que leva(m) mulheres grávidas à prisão? Revista de Estudos
Empíricos em Direito, vol. 4, n. 3, out 2017. p. 145-161.

V. LISTA DE PESQUISADORES DISCENTES

Os discentes abaixo listados participaram das atividades de pesquisa da Clínica de


Direitos Humanos do Campus Zona Sul – UniRitter e auxiliaram na construção dos
dados coletados no presente relatório.

Turno Matutino
Alexandre Pinto Monteiro Karen Elizabeth de Araujo
Amanda Pereira Campos Lauro Varella Neto
Andria Gesir Coffy Nitschke Leonardo Barcos Teles Alves
Camila de Araujo Pinto Nicole Roldao Franco
Caroline Barbieri Helm Ranah Julia Antunes Cardoso
Diocler Antonio Goncalves Stefani Saballa dos Santos
Fernanda Kestering Serqueira Thuany Noal Inacio
Jaderson Pinheiro Nunes
Turno Noturno
Adela Maria Gasparetto Matheus Alves Schanes
Amanda Cristina Sangalli Sobral Matheus de Paula Campos
Caroline Flores La Falce Matheus Villar Bopp
Claudinei da Costa Pereira Mirian Weinheimer
Daiana Luz dos Santos Nataly Flores Medeiros
Daiane da Silveira Carvalho Nathalia Fernanda Silva Ribeiro
Eduardo Sartori Insaurriaga Pamela de Campos Bandeira
Eurico de Oliveira Santos Pamella Rigoli
Flavia Cellyanne Martinez da Silva Raquel Oliveira Moreira
Guilherme Acosta Ferreira da Silva Rogerio da Rocha Silva
Helena Panzenhagen de Almeida Stefani Oliveira Ferreira
Isadora Bragati Castiglioni Carrabba Vanessa Alves Guimaraes Ramos
Jeffrey Medeiros e Silva Vanessa Vieira de Lemos
Jonathan Rodrigues da Luz Guimaraes Vinicius Foss de Siqueira
Ketelin Eduarda Oliveira Duarte Vinicius Klein Silva
Leonardo Talavites Rodrigues Vitoria Nascimento Cardoso
Leticia Kaiane de Paula Klipel Vitoria Souza da Rosa
Lissara Fernandes Santos Wanderson Mariano Rosa De Barros
Liz Fermino Cademartori Ilha Willian da Costa da Silva
Louise Borges Bitencourt Couto Yuri Estigarribia Loss

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