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Catalogação da Publicação na Fonte

Bibliotecária: Rosilaine Ap. Pereira CRB-9/1448


Ordem dos Advogados do Brasil. Seção do Paraná


A185 Acordo de não persecução penal / Coordenado por Rafael
Junior Soares, Beatriz Daguer. – Curitiba : OABPR, 2022.
(Coleção Comissões).
44 p.

ISBN: 978-65-89157-31-1

Inclui Bibliografia

1. Acordo de não persecução penal (ANPP). 2. Negócio juríd-


ico. 3. Justiça criminal. 4. Ministério Público. I. Soares, Rafael
Junior. II. Daguer, Beatriz. III. Coleção Comissões. IV. Comissão
da Advocacia Criminal da OABPR.

CDD: 341.433

Índice para catálogo sistemático:

1. Direito processual penal – 341.43


2. Instrução penal – 341.433
COMISSÃO DA ADVOCACIA CRIMINAL
DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL
SECCIONAL – ESTADO DO PARANÁ

IDEALIZADORES

NICOLE TRAUCZYNSKI MUFFONE


Presidente

NILTON RIBEIRO DE SOUZA


Vice-Presidente

EDUARDO HENRIQUE KNESEBECK


Secretário

ANA CAROLINA ELAINE DOS SANTOS GUEDES DE CASTRO


Secretária-Adjunta

COORDENADORES/REDATORES

RAFAEL JUNIOR SOARES


Membro Relator

BEATRIZ DAGUER
Membra Relatora

EXECUTORES

ANNE CAROLINA STIPP AMADOR KOZIKOSKI

BÁRBARA FEIJÓ RIBEIRO

BEATRIZ DAGUER
MARIANE DE MATOS AQUINO

MARIANI BORTOLOTTI FIUMARI

MATHEUS VENANTE GUGELMIN

RAFAEL GARCIA CAMPOS

RAFAEL JUNIOR SOARES

RICARDO ALBERTO ESCHER

Diagramação e Capa
SOFIA VITÓRIA THOMÉ DA CRUZ SILVA
Sumário
Considerações Iniciais 09

1. Quais são os requisitos para a celebração do 11


acordo de não persecução penal?

2. Em quais hipóteses não se admite o acordo de não 12


persecução penal?

3. Quais as condições para a celebração do acordo 13


de não persecução penal entre o investigado e o
Ministério Público?

4. Como devem ocorrer as tratativas para realização 14


do acordo de não persecução penal?

5. O acordo de não persecução penal deve retroagir 15


para atingir processos que estejam tramitando no
poder judiciário?

6. É cabível o acordo de não persecução penal em 17


sede de audiência de custódia?

7. O acordo celebrado entre Ministério Público e 18


investigado deve ser homologado judicialmente?

8. É necessária a realização de audiência para 19


homologação do acordo?

9. É cabível o acordo de não persecução penal nos 20


casos de ação penal privada?

10. Quais são os benefícios do acordo de não 20


persecução penal para o investigado?
11. Diante da prática de crimes culposos com 21
resultado violento, o investigado terá direito ao
acordo de não persecução penal?

12. A confissão precisa ser anterior à proposta do 23


acordo de não persecução penal ou poderá se dar
em razão das negociações?

13. A confissão poderá ser utilizada em desfavor do 24


investigado em outras esferas?

14. A confissão tem como objetivo incriminar corréus 26


ou terceiros?

15. Para que o acordo de não persecução penal seja 26


firmado, é necessária a concordância da vítima?

16. É possível a participação da vítima durante as 28


negociações do acordo de não persecução penal
para garantir a reparação do dano?

17. A existência de ação penal em andamento impede 29


o oferecimento do acordo de não persecução penal
em outro processo?

18. Quais medidas podem ser tomadas caso o 30


membro do ministério público se recuse a oferecer o
acordo de não persecução penal?

19. A qual juízo compete a homologação do acordo 31


de não persecução penal?

20. Qual o juízo competente para execução do 32


acordo de não persecução penal?
21. A quem compete a fiscalização da execução? 33

22. Em qual sistema processual eletrônico tramita 34


a execução e a fiscalização do acordo de não
persecução penal?

23. Em caso de mudança no domicílio do agente, 35


haverá declínio da competência da execução do
acordo de não persecução penal?

24. Quais providências devem ser tomadas após o 35


cumprimento integral do acordo de não persecução
penal?

25. O descumprimento das condições pactuadas no 36


acordo pode gerar rescisão automática? Quais são as
possíveis consequências da rescisão?

26. No caso de descumprimento do acordo, pode ser 37


a confissão utilizada como prova no processo penal
ou em ações de outra natureza?

27. Caso o acordo seja rescindido e haja, 39


posteriormente, condenação, as medidas cumpridas
no acordo de não persecução penal podem ser
utilizadas para fins de detração da pena aplicada?

28. É possível haver anulação do acordo de não 40


persecução penal?

29. O prazo prescricional continua correndo com a 41


homologação do acordo?

Observações Finais 41
Acordo de não persecução penal

Considerações Iniciais
A justiça penal mudou. Desde a década de noventa, é possível observar a
expansão dos espaços negociais no processo penal brasileiro a fim de lhe
conferir mais eficiência.

Primeiro, com a aprovação da Lei 9.099/95, que instituiu a transação penal


e a suspensão condicional do processo. Depois, com a aprovação da Lei
12.850/2013, que regulamentou a colaboração premiada. E, agora, com
a aprovação da Lei 13.964/2019, também conhecida como Lei Anticrime,
houve a criação de mais um instituto: o acordo de não persecução penal,
inserido no art. 28-A do Código de Processo Penal.

A figura não é exatamente nova, pois já era prevista (com algumas diferen-
ças) na Resolução 181/2017 do Conselho Nacional do Ministério Público,
mas a sua aplicação sempre foi bastante controversa em razão da ausên-
cia de uma lei. Por isso, a inserção do acordo de não persecução penal no
Código de Processo Penal superou esse obstáculo.

E todas essas mudanças precisam vir acompanhadas da atualização e da


capacitação dos seus operadores, em especial, dos advogados e advoga-
das criminalistas.

Como a justiça penal negociada ganha ainda mais espaço com essa nova
figura, aplicável a mais de 70%1 dos crimes previstos no Código Penal e na
legislação extravagante, é preciso que os profissionais do direito passem
a ter uma postura diferente, antes forjada no confronto, mas que agora
precisa abrir-se para uma lógica estratégica e negocial, que demanda uma
análise de custo-benefício e do timing da negociação.

Transcorridos mais de dois anos da sua vigência, ainda existem diversas


dificuldades a serem superadas pela advocacia criminal para a sua correta

1 LOPES JUNIOR, Aury. Direito processual penal. 17. ed. São Paulo: Saraiva, 2020.

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Acordo de não persecução penal

aplicação no sistema de justiça, uma vez que existem pontos ainda passí-
veis de aperfeiçoamento e de discussão por parte das Cortes superiores.

Diante disso, a Comissão de Advocacia Criminal da Ordem dos Advoga-


dos do Brasil – Seccional do Paraná, pensando em auxiliar os advogados e
advogadas que atuam na área criminal nessa nova empreitada, idealizou e
criou a presente cartilha.

Trata-se de um guia prático para colaborar no adequado uso dos espaços


negociais, especialmente do acordo de não persecução penal, no dia a
dia profissional, auxiliando em todo o percurso da negociação, formaliza-
ção, homologação e cumprimento do acordo. Ou seja, é um documento
que apresenta soluções práticas e rápidas sobre o tema, além de compilar
recomendações para uma atuação sempre ética, zelosa e compatível com
os direitos e deveres que norteiam o exercício da advocacia, enquanto
função indispensável à administração da justiça.

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Acordo de não persecução penal

1. Quais são os requisitos para


a celebração do acordo de não
persecução penal?
O acordo de não persecução penal (ANPP) consiste em negócio jurídico
extrajudicial celebrado entre o Ministério Público e o investigado. O artigo
28-A do Código de Processo Penal prevê em seu caput a hipótese da pro-
positura de acordo por parte do Ministério Público quando, não sendo
caso de arquivamento, tenha o investigado confessado formal e circuns-
tancialmente a prática de infração penal sem grave ameaça ou violência e
com pena mínima inferior a 4 (quatro) anos, desde que necessário e sufi-
ciente para reprovação e prevenção do crime, mediante o ajuste de algu-
mas condições.

Todos os requisitos objetivos e subjetivos estão previstos no referido dispo-


sitivo, ao longo de quatorze parágrafos e diversas diretrizes. Nesse sentido,
o acordo de não persecução penal somente é aplicável nos casos em que
há viabilidade acusatória, ou seja, quando há suporte probatório mínimo
capaz de fundamentar a deflagração da ação penal com indícios suficien-
tes de autoria e materialidade delitiva aptas a formar a opinio delicti do
órgão acusador, bem como legitimidade das partes e, ainda, punibilidade
concreta.

Vale frisar que o acordo de não persecução penal é um negócio jurídico


voluntariamente realizado entre o Ministério Público e o investigado.
Assim, a análise quanto à realização por parte do investigado e de seu
defensor deve sopesar os riscos implicados no caso do prosseguimento
da persecução criminal, considerados os prováveis cenários, bem como a
possibilidade de cumprimento das condições assumidas e as consequên-
cias aplicáveis em caso de não execução completa do termo de acordo.

Por fim, se a defesa considerar inexistentes ou insuficientes os elemen-


tos mínimos de autoria e materialidade, nada impede que atue ativamente

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Acordo de não persecução penal

para demonstrar ao Parquet que é caso de arquivamento e não ofereci-


mento do acordo2.

2. Em quais hipóteses não


se admite o acordo de não
persecução penal?
O acordo de não persecução penal não é admitido nas seguintes hipóteses:

I. Cabível a transação penal prevista na Lei 9.099/95;

II. O investigado for reincidente ou houver elementos probatórios que


indiquem a prática de conduta criminosa profissional, reiterada ou habi-
tual, salvo quando as infrações pretéritas foram insignificantes;

III. 0 investigado tenha se beneficiado com suspensão condicional do pro-


cesso, transação penal ou com acordo de não persecução penal nos cinco
anos anteriores ao cometimento do ilícito e

IV. Tratar-se de crime praticado no âmbito de violência doméstica ou fami-


liar, ou cometido contra a mulher por razões da condição do sexto femi-
nino (art. 28-A, §2º).

2 BITTAR, Walter Barbosa; SOARES, Rafael Junior. Capítulo 4 – Código de Processo Penal – De-
creto- Lei 3.689/41. In: Comentários ao Pacote Anticrime: Lei 13.964/2019 (artigo por artigo
– Incluindo a rejeição de vetos). Walter Barbosa Bittar (Org.). 1. ed. São Paulo: Tirant lo Blanch,
2021, p. 67.

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Acordo de não persecução penal

3. Quais as condições para a


celebração do acordo de não
persecução penal entre o
investigado e o Ministério Público?
Para a celebração do acordo de não persecução penal o Ministério Público
pode sugerir o ajuste das condições listadas no artigo 28-A, incisos I a V,
cumulativa ou alternativamente, a saber:

I. Reparar o dano ou restituir a coisa à vítima, exceto na impossibilidade


de fazê-lo;

II. Renunciar voluntariamente a bens e direitos indicados pelo Ministério


Público como instrumentos, produto ou proveito do crime;

III. Prestar serviço à comunidade ou a entidades públicas por período


correspondente à pena mínima cominada ao delito diminuída de um a dois
terços, em local a ser indicado pelo juízo da execução, na forma do art. 46
do Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal);

IV. Pagar prestação pecuniária, a ser estipulada nos termos do art. 45 do


Decreto-Lei nº 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal), a enti-
dade pública ou de interesse social, a ser indicada pelo juízo da execução,
que tenha, preferencialmente, como função proteger bens jurídicos iguais
ou semelhantes aos aparentemente lesados pelo delito; ou

V. Cumprir, por prazo determinado, outra condição indicada pelo


Ministério Público, desde que proporcional e compatível com a infração
penal imputada.

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Acordo de não persecução penal

4. Como devem ocorrer as


tratativas para realização do
acordo de não persecução penal?
Não existe uma fórmula específica para dar início às tratativas. Tanto o
Ministério Público quanto o defensor do investigado poderão entrar em
contato com a outra parte a fim de demonstrar interesse no acordo. O
ideal é que ambos deliberem sobre o modo mais adequado de se chegar a
um denominador comum, seja por e-mail, telefone, aplicativos de mensa-
gens, reunião presencial ou virtual.

Recomenda-se que haja sempre uma postura ativa por parte do advogado,
documentando as tratativas e ponderando qual a melhor saída para o
caso em análise. Não basta a mera proposta apresentada pelo órgão acu-
sador, tendo em vista se tratar de uma negociação, devendo haver pro-
porcionalidade e razoabilidade na elaboração de cada uma das cláusulas
a serem cumpridas, em especial para se afastar excessos em desfavor
do investigado.

É preciso destacar que não se trata de uma negociação simples em razão


do desequilíbrio entre as partes: de um lado, o Ministério Público e todo
o aparato investigativo estatal, de outro, o investigado e o seu advogado
ou advogada. Por isso, é preciso que o defensor do investigado seja o mais
informado, técnico e ativo possível.

Em resumo, as partes devem chegar em um consenso sem a imposição


dos termos por parte do órgão acusador.

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Acordo de não persecução penal

5. O acordo de não persecução


penal deve retroagir para atingir
processos que estejam tramitando
no Poder Judiciário?
O entendimento do Tribunais superiores – notadamente o Superior Tribu-
nal de Justiça – tem sido de que após o recebimento da peça acusatória,
não mais seria possível o oferecimento do acordo de não persecução penal.
Em que pese a jurisprudência tenha se inclinado quanto à irretroatividade
do acordo de não persecução penal, esse não seria o melhor caminho.

Por se tratar de norma mais benéfica, inserida no art. 28-A do CPP pela Lei
13.964/19, e que tem natureza jurídica mista, porque além de ensejar refle-
xos procedimentais, tem reflexos de natureza penal, é imperiosa sua retro-
ação em benefício dos acusados, sendo esse o entendimento firmado pela
doutrina majoritária3. Em razão de se tratar de norma híbrida, defende-se
que por se tratar de benesse processual, seu cabimento deveria se dar em
qualquer fase processual.

A Corte cidadã adotou o entendimento de que a norma não deveria retro-


agir, fixando o marco temporal do recebimento da peça acusatória, sob o
argumento de que haveria a superação da fase-processual e a deflagração

3 Nesse sentido: VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São
Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2022, p. 155. MENDES, Tiago Bunning; LUCCHESI, Guilherme
Brenner; Lei Anticrime. A (re) forma penal e a aproximação de um sistema acusatório? São
Paulo: Tirant Lo Blanch, 2020, p. 71. BITTAR, Walter Barbosa; SOARES, Rafael Junior. Capítulo 4
– Código de Processo Penal – Decreto-Lei 3.689/41. In: Comentários ao Pacote Anticrime: Lei
13.964/2019 (artigo por artigo – Incluindo a rejeição de vetos). Walter Barbosa Bittar (Org.). 1.
ed. São Paulo: Tirant lo Blanch, 2021, p. 65. ROSA, Alexandre Morais da; ROSA, Luísa Walter da;
BERMUDEZ, André Luiz. Como negociar o acordo de não persecução penal: limites e possibi-
lidades. 1. ed. Florianópolis: Emais, 2021, p. 83-93. DEZAN, Guilherme Madeira; SOUZA, Luciano
Anderson de. Comentários ao pacote anticrime: Lei 13.964/2019. 1. ed. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2020, p. 112.

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Acordo de não persecução penal

da persecução penal, tornando sem razão a incidência do instituto des-


penalizador, que seria a de poupar o agente do delito e o aparelho esta-
tal da instauração do processo crime4. Os demais Tribunais se alinharam a
este posicionamento.

Com o objetivo de dirimir a questão ante as inúmeras insurgências que


chegaram à Suprema Corte, no início do julgamento do habeas corpus
185.913/DF, o Ministro Gilmar Mendes afetou as seguintes questões jurídi-
cas a serem respondidas após deliberação pelo Plenário:

A) O ANPP pode ser oferecido em processos já em curso quando do surgi-


mento da Lei 13.964/19? Qual é a natureza da norma inserida no art. 28-A
do CPP? É possível a sua aplicação retroativa em benefício do imputado?

B) É potencialmente cabível o oferecimento do ANPP mesmo em casos


nos quais o imputado não tenha confessado anteriormente, durante a
investigação ou o processo?

Em sua decisão, o Ministro destaca a potencial ocorrência do debate em


número expressivo de processos e a potencial divergência jurisprudencial
sobre a questão, para o fim de assegurar a segurança jurídica e a previsi-
bilidade das situações processuais. O processo aguarda julgamento pelo
Plenário no âmbito do Supremo Tribunal Federal.

4 SOARES, Rafael Junior; BORRI, Luiz Antonio. Desafios na aplicação dos acordos de não persecu-
ção penal e cível nos processos. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: https://www.conjur.
com.br/2022-mar-26/ soares-borriacordos-nao-persecucao-penal#_ftnref3. Acesso em: 15 jul.
2022.

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Acordo de não persecução penal

6. É cabível o acordo de não


persecução penal em sede de
audiência de custódia?
Muito se discute a respeito da formalização do acordo de não persecução
penal em audiência de custódia, tendo em vista se tratar de fase ainda pre-
matura em que as investigações ainda não estão desenvolvidas. Contudo,
excepcionalmente em casos de menor complexidade, em que os elemen-
tos probatórios suficientes para a denúncia são produzidos no próprio
auto de prisão em flagrante, Vinicius Vasconcellos defende que não deve
haver óbice5.

Nesses casos, a negociação e formalização deve ocorrer depois de encer-


rada a análise sobre a legalidade do flagrante e a necessidade de decre-
tação de prisão cautelar, ou seja, após a realização da audiência de cus-
tódia, para o fim de evitar o desvirtuamento do ato e a utilização do juízo
sobre as medidas cautelares como pressão para que o imputado aceite o
acordo6. Assim, o acordo de não persecução penal seria realizado em ato
subsequente e não na audiência de custódia propriamente dita, devendo
assegurar que a defesa tenha o tempo devido para compreender e anali-
sar o possível cenário da persecução penal e os termos propostos7.

5 VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022, p. 154.
6 VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022, p. 154.
7 VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022, p. 154.

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Acordo de não persecução penal

7. O acordo celebrado entre


Ministério Público e investigado
deve ser homologado
judicialmente?
Sim. O acordo firmado entre o Ministério Público e o investigado e seu
defensor deve ser, obrigatoriamente, levado à homologação judicial. A
homologação do acordo deverá ocorrer em audiência a ser designada
pelo magistrado (pelo juiz de garantias, de acordo com a Lei Anticrime),
com o fim de que, por meio da oitiva do investigado e na presença de seu
defensor, possa verificar a legalidade e a voluntariedade do acordo (art.
28-A, §4º), afastando qualquer forma de constrangimento.
A homologação judicial do acordo de não persecução penal tem natureza
declaratória, não cabendo ao magistrado proceder à análise quanto ao
mérito/conteúdo do acordo, podendo ocorrer:

I. A homologação do acordo, com o encaminhamento dos autos ao Minis-


tério Público para que se inicie a execução das condições pactuadas pelo
juízo competente (art. 28-A, §6º, do CPP);

II. A determinação com a anuência do investigado e seu defensor, para


que seja reformulado o acordo quando as condições forem inapropriadas,
abusivas ou insuficientes (art. 28-A, §5º, do CPP); ou

III. A recusa da homologação proposta nas hipóteses em que não


ocorrer a reformulação exigida ou quando o acordo não respeitar os pres-
supostos legais.

Por fim, celebrado e homologado o acordo de não persecução penal, o


representante do Ministério Público deixará de oferecer denúncia em face
do investigado, que, por sua vez, deverá cumprir todas as obrigações por
ele assumidas, e, se assim não o fizer, dar-se-á por rescindido o acordo

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Acordo de não persecução penal

celebrado, com o consequente oferecimento de denúncia. Recusada a


homologação, o magistrado devolverá os autos ao Ministério Público para
análise acerca da necessidade de complementação da investigação ou
oferecimento da denúncia.

8. É necessária a realização de
audiência para homologação
do acordo?
Conforme previsão do art. 28-A, § 4º, é imprescindível a realização do ato
formal para a homologação do acordo por parte do Poder Judiciário. É na
audiência que o Juízo competente verificará a voluntariedade e legalidade
do acordo. A presença do Poder Judiciário no ato processual apresenta-se
como um reforço publicista do acordo, de modo a verificar se houve res-
peito à legalidade e à voluntariedade do agente.

Em outras palavras, a função do juiz na apreciação do acordo de não per-


secução penal é de garantia do investigado e da legalidade da avença8. Por
outro lado, a atuação do juiz neste ato deve ser cautelosa, de modo que
não se torne o protagonista no acordo, vulnerando sua imparcialidade9,
ou seja, o papel do magistrado se limita estritamente a análise do preen-
chimento dos requisitos legais, da proporcionalidade e da voluntariedade
do investigado com relação ao acordo entabulado.

Caso o magistrado considere inadequadas, insuficientes ou abusivas as


condições, poderá recusar a homologação do acordo, devolvendo os
autos ao Ministério Público para o oferecimento da denúncia ou comple-
mentação das investigações. Em caso de recusa por parte do magistrado,

8 CABRAL, Rodrigo Leite Ferreira. Manual do acordo de não persecução penal. 2. ed. rev. atual.
e ampl. Salvador: Editora JusPodivm, 2021, p. 173.
9 CABRAL, Rodrigo Leite Ferreira. Manual do acordo de não persecução penal. 2. ed. rev. atual. e
ampl. Salvador: Editora JusPodivm, 2021.pag. 173.

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Acordo de não persecução penal

caberá recurso em sentido estrito pelas partes, nos termos do art. 581,
XXV, do Código de Processo Penal.

9. É cabível o acordo de não


persecução penal nos casos de
ação penal privada?
Sim, tendo em vista que inexiste restrição legal quanto ao oferecimento de
acordo de não persecução penal em ações penais privadas.

10. Quais são os benefícios do


acordo de não persecução penal
para o investigado?
O maior benefício ao investigado corresponde exatamente à interrupção
da persecução criminal em razão da celebração do acordo. O desgaste de
responder a uma ação penal atrelado à possibilidade de eventual sentença
condenatória, além de outros efeitos sociais negativos à imagem da pes-
soa do acusado, constituem alguns dos motivos para o não enfrentamento
da ação penal mediante a celebração de um acordo negociado.

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Acordo de não persecução penal

11. Diante da prática de crimes


culposos com resultado violento, o
investigado terá direito ao acordo
de não persecução penal?
O legislador não delimitou se a violência prevista no caput do art. 28-A
seria estritamente dolosa ou se admitiria a possibilidade de ANPP em deli-
tos culposos, razão pela qual há divergência de posicionamentos.

Entendemos ser possível a realização do acordo em casos de crimes


culposos com resultado violento, como é o caso do art. 302 do CTB10,
uma vez que o crime culposo se caracteriza tão somente pela viola-
ção de uma norma de cuidado, sem que se tenha por objetivo causar
resultado violento.

Por seu turno, o Ministério Público, enquanto instituição autônoma e de


acordo com a sua divisão estrutural, em diversos estados tem optado pela
criação de cartilhas, enunciados e diretrizes na tentativa de uniformizar a
oferta e aplicação do ANPP e, dessa forma, vê-se que há posicionamentos
distintos dentro do próprio órgão.

O Ministério Público do Estado do Paraná compreende não ser cabível o


acordo nessas circunstâncias, sob o argumento de que: “o fato é que, em
nossa opinião, já abstratamente não é cabível o acordo de não persecução
relativamente aos crimes de homicídio e lesão corporal culposa, por se tra-
tar de crime praticado com violência”11.

10 Art. 302. Praticar homicídio culposo na direção de veículo automotor: Penas - detenção, de
dois a quatro anos, e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir
veículo automotor.
11 Disponível em: https://criminal.mppr.mp.br/arquivos/File/ANPP_e_Homicidio_Culposo_-_
enunciados_-_recomendacoes_-_doutrina_e_jurisprudencia.pdf. Acesso em: 18 jul. 2022.

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Acordo de não persecução penal

Em contrapartida, o Ministério Público do Estado de São Paulo12, de Santa


Catarina13 e do Rio Grande do Sul14 entendem pela sua viabilidade, posição
que parece mais acertada. De acordo com Mauro Messias15, “os delitos cul-
posos com resultado violento não integram o conceito de crime cometido
com violência, o qual, necessariamente, demanda dolo do agente para sua
configuração”. Esse posicionamento é anuído por Walter Barbosa Bittar e
Rafael Junior Soares16, bem como por Renee do Ó Souza17, que consideram
que o exame de violência ou grave ameaça à pessoa reside no desvalor da
ação e do resultado, razão pela qual inexiste óbice para o oferecimento do
acordo de não persecução penal nos crimes culposos, cujo resultado não
foi naturalmente desejado, decorrendo da inobservância do dever obje-
tivo de cuidado.

No mesmo sentido, o Enunciado nº 23 do Conselho Nacional de Procura-


dores-Gerais dos Ministérios Públicos dos Estados e da União (CNPJ) tem
o seguinte teor: “É cabível o acordo de não persecução penal nos crimes
culposos com resultado violento, uma vez que nos delitos desta natureza

12 “É cabível o acordo de não persecução penal nos crimes culposos com resultado violento, pois,
nesses delitos, a violência não está na conduta, mas no resultado não querido ou não aceito pelo
agente, incumbindo ao órgão de execução analisar as particularidades do caso concreto”.
13 “É possível o oferecimento do acordo de não persecução penal aos crimes culposos com resul-
tado violento, pois a vedação insculpida no caput do art. 28-A (crimes praticados com violência
ou grave ameaça contra pessoa) deve ser compreendida como dirigida à conduta, e não seu re-
sultado”.
14 “É cabível o acordo de não persecução penal nos crimes culposos com resultado violento, uma
vez que nos delitos desta natureza a conduta consiste na violação de um dever de cuidado obje-
tivo por negligência, imperícia ou imprudência, cujo resultado é involuntário, não desejado e nem
aceito pelo agente, apesar de previsível”.
15 MESSIAS, Mauro. Acordo de não persecução penal: teoria e prática. 2. ed. Rio de Janeiro:
Lumen Juris, 2020, E-book, p. 34.
16 BITTAR, Walter Barbosa; SOARES, Rafael Junior. Capítulo 4 – Código de Processo Penal – De-
creto-Lei 3.689/41. In: Comentários ao Pacote Anticrime: Lei 13.964/2019 (artigo por artigo – In-
cluindo a rejeição de vetos). Walter Barbosa Bittar (Org.). 1. ed. São Paulo: Tirant lo Blanch, 2021,
p. 61.
17 SOUZA, Renee do Ó. Acordo de não persecução penal previsto no novo art. 28-A do Código de
Processo Penal, inserido pela Lei 13.964/2019. Lei Anticrime: comentários à Lei 13.964/2019.
[Org. Renee do Ó Souza]. 1. ed. Belo Horizonte: D’Plácido, 2020, p. 122.

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Acordo de não persecução penal

a conduta consiste na violação de um dever de cuidado objetivo por negli-


gência, imperícia ou imprudência, cujo resultado é involuntário, não dese-
jado e nem aceito pela agente, apesar de previsível”.

Portanto, ainda que o Ministério Público do Estado do Paraná entenda


preponderantemente pela não realização do acordo de não persecução
penal em caso de delitos culposos, entende-se ser exequível, uma vez que
os crimes culposos se dão pela quebra de um dever objetivo de cuidado,
com atuação negligente, imprudente ou imperita, sem qualquer inten-
ção de causar um resultado violento. Nesse aspecto, a intervenção penal
é justificada tão somente pela quebra do dever de cuidado e não pelo
resultado produzido.

12. A confissão precisa ser anterior


à proposta do acordo de não
persecução penal ou poderá se dar
em razão das negociações?
Para que seja proposto o acordo de não persecução penal é desnecessá-
rio que o investigado tenha confessado na fase do inquérito ou em outro
momento anterior.

Ao levarmos em consideração que a investigação preliminar tem como


objetivo reunir elementos de autoria e materialidade para a formação do
convencimento do Ministério Público acerca da justa causa para o exercício
da ação penal de natureza pública, é pertinente considerar que o investi-
gado pode adotar diversas estratégias na sua autodefesa, como permane-
cer em silêncio, negar ou até mesmo confirmar os fatos, na medida em que
a convicção do órgão acusador para deflagrar uma ação penal ou arquivar
o caderno investigatório será construída a partir da oitiva do investigado e

- 23 -
Acordo de não persecução penal

dos demais elementos de informação reunidos18.

Dito isso, deve ser opção do investigado confessar ou não, a partir da oferta
do benefício legal por parte do Ministério Público. Ou seja, a confissão não
pode ser exigida de forma prévia ao acordo de não persecução penal, mas
sempre de forma posterior, em que o investigado de maneira livre e orien-
tada pelo seu defensor deliberará a respeito da sua manifestação em troca
do cumprimento das condições fixadas para celebração do acordo19.

Portanto, a confissão poderá ser feita em termo próprio e para fins de


cumprimento dos requisitos legais do acordo, sendo posterior a apresen-
tação e aceitação das condições propostas e figurando como requisito de
praxe e meramente formal.

13. A confissão poderá ser utilizada


em desfavor do investigado em
outras esferas?
Não. Ainda que se tenha discussão sobre o tema, é correto afirmar que a
confissão tem como objetivo único e exclusivo atender aos requisitos for-
mais do acordo de não persecução penal, não podendo ser empregada
em desfavor do investigado nas demais esferas do Direito.

Com isso, denota-se que a previsão legal da confissão é questionável,


devendo ser entendida como meramente formal, sem qualquer reper-
cussão de natureza material, não possuindo capacidade de interferir nas
demais esferas do direito ou repercutir de alguma forma com a finalidade
18 DAGUER, Beatriz; SOARES, Rafael. O momento da confissão e o acordo de não persecução
penal. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: conjur.com.br/2021-set-05/opiniao-momento-
-confissaoacordo-nao-persecucao-penal. Acesso em: 16 jul. 2022.
19 DAGUER, Beatriz; SOARES, Rafael. O momento da confissão e o acordo de não persecução
penal. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: conjur.com.br/2021-set-05/opiniao-momento-
-confissaoacordo-nao-persecucao-penal. Acesso em: 16 jul. 2022.

- 24 -
Acordo de não persecução penal

de prejudicar ou lesar o investigado/réu20. Seu principal objetivo “é permi-


tir um confronto entre a versão contida nos autos e a prestada pelo inves-
tigado de modo a verificar sua coerência lógica, compatibilidade e concor-
dância com as demais provas contidas no procedimento”21.

Sobre o tema, a I Jornada de Direito Processual Penal formalizou o Enun-


ciado 03, assim dispondo: “A inexistência de confissão do investigado
antes da formação da opinio delicti do Ministério Público não pode ser
interpretada como desinteresse em entabular eventual acordo de não
persecução penal”.

Diante disso, de acordo com a lógica processual escolhida pelo legislador, a


autoincriminação deve ser tratada como uma opção do investigado, pon-
derada a partir de suas vantagens e desvantagens. Nesse sentido, Bittar e
Soares22 dispõem que a confissão deve ser entendida como mero proto-
colo a ser seguido na concretização do acordo, sem consequências prá-
ticas contra o investigado, especialmente para se evitar autoincrimina-
ções que não são verdadeiras, visto que diversos motivos, como desgaste
profissional ou emocional, pressão familiar e custos do processo podem
levar pessoas a aderirem o acordo independentemente da veracidade das
informações fornecidas ao Estado. Por fim, recomenda-se a inserção de
cláusula expressa quanto à inviabilidade de uso da confissão a não ser para
fins do acordo.

20 DAGUER, Beatriz; SOARES, Rafael. A necessidade de confissão para formalizar o acordo de


não persecução penal. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: conjur.com.br/2020-set-02/
soaresdaguer-necessidade-confissao-anpp. Acesso em: 16 jul. 2022.
21 SOUZA, Renee do Ó. Acordo de não persecução penal previsto no novo art. 28-A do Código
de Processo Penal, inserido pela Lei 13.964/2019. Lei Anticrime: comentários à Lei 13.964/2019.
[Org. Renee do Ó Souza]. 1. ed. Belo Horizonte: D’Plácido, 2020, p. 129.
22 BITTAR, Walter Barbosa; SOARES, Rafael Junior. Capítulo 4 – Código de Processo Penal – De-
creto-Lei 3.689/41. In: Comentários ao Pacote Anticrime: Lei 13.964/2019 (artigo por artigo – In-
cluindo a rejeição de vetos). Walter Barbosa Bittar (Org.). 1. ed. São Paulo: Tirant lo Blanch, 2021,
p. 60.

- 25 -
Acordo de não persecução penal

14. A confissão tem como objetivo


incriminar corréus ou terceiros?
Não. A confissão diz respeito exclusivamente ao investigado e com relação
aos fatos a ele atribuídos, não se podendo utilizar a sua confissão com o
objetivo de incriminar coinvestigados ou terceiros.

Isso porque a função primordial do acordo de não persecução penal


diverge da colaboração premiada prevista na Lei 12.850/13, que figura
como meio de obtenção de prova, na medida em que “o ANPP é um meca-
nismo de facilitação da persecução com a supressão do processo, ou seja,
não tem uma finalidade probatória”23. Vê-se, portanto, que a própria Lei
13.964/19 reforçou o entendimento de que a colaboração premiada tem
por objetivo localizar fontes e elementos de prova em desfavor
dos delatados.

Nesse ponto, o acordo de não persecução penal visa tão somente à sim-
plificação, abreviação e evita que seja instaurada a etapa processual, sem
objetivos probatórios e, como bem pontuado por Vinicius Vasconcellos, no
acordo não há renúncia ao direito ao silêncio e tampouco a aceitação do
dever de veracidade, de modo que não há como se assegurar a produção
da prova com o necessário respeito ao contraditório24.

Assim, é pertinente destacar que o regime legal do ANPP não traz qual-
quer repercussão penal em caso de incriminação que não seja verdadeira,
em contrapartida ao que se vê na esfera da colaboração premiada, em que
o acordo poderá ser rompido e caracterizado o crime de imputação falsa
da prática de infração penal, conforme art. 19 da Lei 12.850/1325.
23 VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022, p. 100.
24 VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022, p. 2013.
25 DAGUER, Beatriz; SOARES, Rafael Junior. O acordo de não persecução penal e o concurso de
pessoas. Boletim Revista do Instituto Baiano de Direito Processual Penal, ano 4, nº 16, set./2021,

- 26 -
Acordo de não persecução penal

Imprescindível consignar que incumbe à autoridade policial e ao Ministério


Público diligenciar e investigar para angariar as provas que entendem
necessárias para formação da opinio delicti, não podendo ficar a cargo de
um dos investigados o cumprimento desse papel, sob pena de transposi-
ção indevida de elementos inerentes à colaboração premiada, que conta
com requisitos e objetivos distintos e mais complexos26.

Por conseguinte, se a autoridade competente verificar ser mais plausível a


realização da colaboração premiada, com a participação do sujeito na ins-
trução processual, como testemunha ou corréu, que sejam utilizados os
direitos e garantias previstos na legislação específica, sem se perder de
vista o objetivo precípuo de cada um dos institutos.

15. Para que o acordo de não


persecução penal seja firmado,
é necessária a concordância da
vítima?
Não há previsão legal nesse sentido. O acordo de não persecução penal é
um ajuste firmado entre o Ministério Público e o investigado, não depende
da concordância da vítima e nem necessariamente de sua participação
nas negociações.

p. 24.
26 NICOLAI, Thiago Diniz Barbosa; FERREIRA, Renata Rodrigues de Abreu. O valor das confissões
no acordo de não persecução penal. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: https://www.
conjur.com.br/2020-jun-08/nicolai-ferreira-valor-confissoes-anpp. Acesso em: 07 jun. 2022.

- 27 -
Acordo de não persecução penal

16. É possível a participação da


vítima durante as negociações do
acordo de não persecução penal
para garantir a reparação do dano?
Sim, mas não há previsão obrigatória para que isso ocorra. De acordo com
o art. 28-A, inciso I, do CPP, uma das condições é a reparação do dano ou
restituição de coisa à vítima, exceto na impossibilidade de fazê-lo, ao passo
em que no § 9º há a previsão de que a vítima deverá ser intimada da homo-
logação do acordo e de seu eventual descumprimento.

Vê-se que a lei não determina de forma obrigatória a participação da vítima


durante o processo de elaboração do acordo, no entanto, a doutrina tem
considerado pertinente a possibilidade de sua presença e atuação na
negociação, notadamente com relação à reparação do dano.

A seu turno, Mariane de Matos Aquino pondera ser necessário discutir


a condiçã reparatória do acordo de não persecução penal e o papel da
vítima como parte dos debates, a fim de que seja possível analisar eventu-
ais balizas “na tentativa de estabelecer um limite entre a necessidade de
atribuição de importância e os direitos e garantias do investigado na reali-
zação do acordo de não persecução penal”27. Para Aury Lopes Jr., ainda que
“a vítima não possa impedir o acordo, nada impede que sua presença nesse
momento seja importante para melhor definição das condições a serem
cumpridas, especialmente da reparação do dano”28, mesmo sem previsão
legal nesse sentido. O autor defende que a vítima deveria ser intimada
também quando o acordo não for homologado, uma vez que a depender

27 AQUINO, Mariane de Matos. Participação de vítima no acordo de não persecução penal. Re-
vista Consultor Jurídico. Disponível em: https://www.conjur.com.br/2022-mai-06/mariane-ma-
tos-vitimaacordo-nao-persecucao-penal#_ftn5. Acesso em: 15 jul. 2022.
28 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 19. ed., São Paulo: SaraivaJur, 2022, E-book, p. 95.

- 28 -
Acordo de não persecução penal

da situação poderá ser proposta ação penal privada subsidiária29.

Em que pese tal posicionamento, não se pode olvidar que o ius puniendi
não pertence à vítima e que ela não pode se opor à celebração do acordo,
de modo que a sua presença não pode caracterizar obstáculo ao direito
do investigado.

Em suma, defende-se que a vítima poderá participar das negociações do


acordo, bem como ser assistida por defensor, o que constitui elemento
apto a viabilizar a celeridade das negociações e até evitar outra demanda
a ser proposta na seara cível, sendo possível que demonstre o prejuízo
causado pela ofensa e requeira ao Ministério Público o valor que entende
como proporcional ao dano causado pelo delito.

17. A existência de ação penal em


andamento impede o oferecimento
do acordo de não persecução penal
em outro processo?
Partindo da premissa de que a legislação penal não admite a utilização de
ações penais em curso para agravar a pena-base, tendo inclusive enten-
dimento fixado na Súmula nº 444 do STJ, cujo texto dispõe que “é vedada
a utilização de inquéritos policiais e ações penais em curso para agravar a
pena-base”, compreende-se ser possível a elaboração do ANPP quando
houver outra investigação ou ação penal em trâmite, em atenção ao prin-
cípio da presunção de inocência.

Diante disso, é certo que não se pode atribuir juízo de desvalor ao inves-
tigado somente em razão de responder a outro processo que não conta
com trânsito em julgado, no qual, ao final ele pode ser declarado ino-

29 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. 19. ed., São Paulo: SaraivaJur, 2022, E-book, p. 95.

- 29 -
Acordo de não persecução penal

cente. Como não há óbice legal que impeça a realização do ANPP por esse
motivo, bem como tendo em vista que os requisitos que serão cumpridos
por meio da concretização do acordo ostentarem funções equivalentes à
pena, reputa-se possível a celebração do acordo.

18. Quais medidas podem ser


tomadas caso o membro do
Ministério Público se recuse
a oferecer o acordo de não
persecução penal?
A defesa do investigado deverá, de forma fundamentada, requerer a
remessa dos autos ao órgão superior do Ministério Público. Tal pedido
possui como objetivo a revisão da atuação ministerial em primeiro grau e
deve ser realizado na primeira oportunidade que tenha de se manifestar,
via de regra na resposta à acusação, sob pena de preclusão, assim como
vem decidindo as Cortes superiores30.

30 Habeas corpus. 2. Consoante jurisprudência do Supremo Tribunal Federal, não cabe ao Poder
Judiciário impor ao Ministério Público obrigação de ofertar acordo em âmbito penal. 3. Se o in-
vestigado assim o requerer, o Juízo deverá remeter o caso ao órgão superior do Ministério Públi-
co, quando houver recusa por parte do representante no primeiro grau em propor o acordo de
não persecução penal, salvo manifesta inadmissibilidade. Interpretação do art. 28-A, § 14, CPP a
partir do sistema acusatório e da lógica negocial no processo penal. 4. No caso concreto, em ale-
gações finais, o MP posicionou-se favoravelmente à aplicação do redutor de tráfico privilegiado.
Assim, alterou-se o quadro fático, tornando-se potencialmente cabível o instituto negocial. 5.
Ordem parcialmente concedida para determinar sejam os autos remetidos à Câmara de Revisão
do Ministério Público Federal, a fim de que aprecie o ato do procurador da República que negou à
paciente a oferta de acordo de não persecução penal. (HC 194677, Relator(a): GILMAR MENDES,
Segunda Turma, julgado em 11/05/2021, PROCESSO ELETRÔNICO DJe-161 DIVULG 12-08-2021
PUBLIC 13-08-2021). “Diante da recusa ministerial em propor o acordo de não persecução penal,
caberá ao denunciado apresentar ao juízo pedido de remessa dos autos ao Procurador-Geral de
Justiça. Quanto ao prazo, não há previsão legal de intervenção processual do réu para, de maneira
específica, requerer a remessa dos autos à instância de revisão. Assim, deve prevalecer o enten-

- 30 -
Acordo de não persecução penal

Na manifestação defensiva é possível que se apresente as razões que


evidenciam o desacerto da posição inicialmente adotada pelo Ministério
Público, a fim de convencer o órgão superior quanto à necessidade de revi-
são e propositura do acordo de não persecução penal. Incumbe à defesa
demonstrar de forma suficiente o preenchimento dos requisitos objetivos
e subjetivos.

Após a remessa, o órgão superior deverá ser intimado para apresentar


parecer favorável ou não ao pleito defensivo. Se após a sua avaliação, a
manifestação for pelo cabimento do acordo de não persecução penal, os
autos retornam ao membro do Parquet originário para o oferecimento da
proposta. Por outro lado, se ratificar o posicionamento da decisão anterior,
o processo seguirá o trâmite processual comum.

19. A qual juízo compete a


homologação do acordo de não
persecução penal?
Na redação original da Lei 13.964/2019, a homologação do acordo de não
persecução penal compete ao juiz de garantias, uma vez que é previsto
que todos os atos anteriores ao recebimento da denúncia serão atribuídos
a ele (art. 3-B, XVII)31.

dimento de que o pedido deve ser apresentado na primeira oportunidade dada à defesa para se
manifestar nos autos, que, no caso do rito comum ordinário, ocorre com a resposta à acusação
(art. 396 do Código de Processo Penal).” (HC 668.520/SP, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA
FONSECA, QUINTA TURMA, julgado em 10/08/2021, DJe 16/08/2021).
31 Art. 3-B: O juiz das garantias é responsável pelo controle da legalidade da investigação crimi-
nal e pela salvaguarda dos direitos individuais cuja franquia tenha sido reservada à autorização
prévia do Poder Judiciário, competindo-lhe especialmente: XVII – decidir sobre a homologação
de acordo de não persecução penal ou os de colaboração premiada, quando formalizados du-
rante a investigação

- 31 -
Acordo de não persecução penal

Nessa ocasião, cabe a ele analisar o acordo para dizer se há cláusulas ina-
dequadas, insuficientes ou abusivas. Assim, se considerar qualquer condi-
ção imprópria, devolverá o instrumento ao Ministério Público para que seja
reformulada a proposta de acordo, havendo concordância do investigado
e seu defensor32.

Contudo, é importante destacar que houve a suspensão do referido dispo-


sitivo legal pelo Ministro Luiz Fux, no âmbito das Ações Diretas de Inconsti-
tucionalidade n.º 6298, 6299, 6300 e 6305, assim como toda a sistemática
relativa ao juiz das garantias.

Enquanto não houver julgamento das Ações Diretas de Inconstitu-


cionalidade cabe ao magistrado já competente fiscalizar a legalidade
e o asseguramento de direitos e garantias fundamentais no bojo do
inquérito policial 33.

20. Qual o juízo competente


para execução do acordo de não
persecução penal?
O Juízo da Execução Penal (artigo 28-A, § 6º, do CPP). Após a homologação
do acordo, o Ministério Público extrairá cópia dos autos e fará a distribui-
ção da execução no sistema competente, a fim de que seja dado cumpri-
mento aos termos pactuados.

Assim, o Juízo da Execução será o responsável por designar o local para o


cumprimento da prestação de serviços à comunidade e indicará a entidade
a ser beneficiada pela prestação pecuniária, por exemplo, com a devida

32 NUCCI, Guilherme de Souza. Pacote Anticrime Comentado. Editora Forense, São Paulo, p. 63.
33 CABRAL, Rodrigo Leite Ferreira. Manual do acordo de não persecução penal. 2. ed. rev. atual.
e ampl. Salvador: Editora JusPodivm, 2021, p. 178.

- 32 -
Acordo de não persecução penal

intimação do agente para o cumprimento das medidas34, que, embora


operacionalizadas e fiscalizadas perante o referido juízo, não constituem
pena propriamente dita.

Cumpre pontuar que em caso de acordo de não persecução penal cele-


brado perante a Justiça Federal, Eleitoral ou Militar, a execução do acordo
atenderá, conforme previsão do artigo 65 da LEP, aos termos da respectiva
lei de organização judiciária35.

Finalmente, no que diz respeito aos acordos firmados perante Tribunais de


Segunda Instância ou Tribunais Superiores, a fiscalização poderá ser feita
diretamente pelo respectivo Tribunal ou delegada à Vara de Execuções
Penais em primeiro grau de jurisdição36.

21. A quem compete a fiscalização


da execução?
Compete ao Ministério Público a fiscalização do acordo, nos termos dos §
§ 6º e 10º do art. 28-A, do CPP, devendo o órgão acusatório comunicar o
Juízo o descumprimento de quaisquer das condições estipuladas.

34 CABRAL, Rodrigo Leite Ferreira. Manual do acordo de não persecução penal. 2. ed. rev. atual.
e ampl. Salvador: Editora JusPodivm, 2021, p. 200.
35 CABRAL, Rodrigo Leite Ferreira. Manual do acordo de não persecução penal. 2. ed. rev. atual.
e ampl. Salvador: Editora JusPodivm, 2021, p. 200.
36 CABRAL, Rodrigo Leite Ferreira. Manual do acordo de não persecução penal. 2. ed. rev. atual.
e ampl. Salvador: Editora JusPodivm, 2021, p. 200.

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Acordo de não persecução penal

22. Em qual sistema processual


eletrônico tramita a execução e
a fiscalização do acordo de não
persecução penal?
No âmbito do Poder Judiciário do Estado do Paraná, a execução do acordo
de não persecução penal tramita no Projudi, em autos apensados ao pro-
cesso principal. Em alguns estados, a exemplo do Poder Judiciário de Santa
Catarina, a execução do ajuste tramita no Sistema Eletrônico de Execução
Unificado - SEEU. Na Justiça Federal do Estado do Paraná, os autos de exe-
cução tramitam no EPROC, apensados ao processo principal.

Portanto, é preciso que o advogado e advogada estejam atentos aos dife-


rentes sistemas adotados pelos estados da federação tanto na justiça esta-
dual quanto na justiça federal. Após a distribuição da execução do acordo
de não persecução penal pelo Ministério Público, deve o órgão informar
no processo originário o cadastramento e a numeração da execução para
que a defesa possa requerer a habilitação e o seu acompanhamento.

- 34 -
Acordo de não persecução penal

23. Em caso de mudança no


domicílio do agente, haverá
declínio da competência da
execução do acordo de não
persecução penal?
Não. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça37, nos casos
em que há mudança no domicílio do agente, o juízo competente é o da
homologação do ANPP, podendo contar com o auxílio na fiscalização por
carta precatória do Juízo da Execução Penal do novo domicílio.

24. Quais providências devem


ser tomadas após o cumprimento
integral do acordo de não
persecução penal?
Deverá ser declarada extinta a punibilidade do agente (art. 28-A, § 13, do
CPP), de ofício ou mediante pedido das partes, não subsistindo qualquer
efeito38. Desse modo, a celebração e cumprimento do acordo não cons-
tará nos antecedentes criminais e, consequentemente, não poderá ser
considerada para análise de reincidência (art. 28-A, §12, do CPP). Haverá
registro específico do Poder Judiciário39 apenas para impedir que nos pró-

37 CONFLITO DE COMPETÊNCIA nº 180771 - SP (2021/0194899-3), Rel. Ministro SEBASTIÃO REIS


JÚNIOR, Sexta Turma, julgado em 29/06/2021, DJe/STJ nº 3179 de 30/06/2021.
38 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva Educação, 2020, p. 225.
39 BADARÓ, Gustavo Henrique. Processo Penal. 8 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2020, p. 187.

- 35 -
Acordo de não persecução penal

ximos 5 (cinco) anos o agente seja, novamente, beneficiado com a pactu-


ação de novo ANPP40 (art. 28-A, § 2º, inciso III, do CPP), assim como ocorre
com a transação penal.

25. O descumprimento das


condições pactuadas no
acordo pode gerar rescisão
automática? Quais são as possíveis
consequências da rescisão?
Não. Em caso de descumprimento das condições do acordo, o Ministério
Público comunicará ao Juízo da Execução Penal e deverá requerer a resci-
são do ANPP para o oferecimento de denúncia. Antes da decisão acerca
da rescisão, é necessário que o investigado seja ouvido, inclusive por meio
de audiência de justificação, oportunizando a apresentação de justifica-
tiva do descumprimento e de forma a observar as garantias constitucio-
nais do contraditório e da ampla defesa41 (art. 5º, LV, CF/88), pois apenas o
descumprimento injustificado é capaz de gerar a rescisão do acordo (art.
28-A, § 10, do CPP)42. Ademais, é necessário que a rescisão seja objeto de
decisão fundamentada43.

40 BEM, Leonardo Schmitt; MARTINELLI, João Paulo. Acordo de não persecução penal. 1 ed.
Belo Horizonte, São Paulo: D’Plácido, 2020, p. 185.
41 Nesse sentido vide: BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. Habeas Corpus nº 615.384/SP. Im-
petrante: Defensoria Pública do Estado de São Paulo. Paciente: Ed Carlos Domingues Nunes.
Coator: Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo. Relator: Min. Reynaldo Soares da Fonseca.
Brasília-DF, 09 de fevereiro de 2021.
42 CUNHA, Rogério Sanches. Pacote Anticrime – Lei 13.964/2019: comentários às alterações
no CP, CPP e LEP. Salvador: Editora JusPodivm, 2020, p. 138.
43 LOPES JR., Aury. Direito Processual Penal. São Paulo: Saraiva Educação, 2020, p. 225.

- 36 -
Acordo de não persecução penal

É importante pontuar que para evitar a rescisão pode haver uma repactu-
ação com a alteração de eventuais condições ou uma flexibilização acerca
do modo de execução das medidas acordadas, por exemplo, com dilação
de prazo para cumprimento ou reparcelamento. Para tanto, deverá haver
o consentimento das partes44.

Por fim, além do oferecimento da denúncia, a rescisão poderá ser utili-


zada pelo Ministério Público como justificativa para o eventual não ofe-
recimento da suspensão condicional do processo (art. 28-A, § 11, do CPP).

26. No caso de descumprimento


do acordo, pode ser a confissão
utilizada como prova no processo
penal ou em ações de outra
natureza?
Ainda que a questão seja controversa, entende-se que a confissão não
pode ser utilizada como prova para embasar denúncia, justificar condena-
ção e tampouco como elemento para alicerçar demanda de outra natu-
reza, como ações cíveis, por exemplo.

Considerando, portanto, que o acordo de não persecução penal está des-


pido de finalidade probatória e se trata de mecanismo de simplificação
processual, a confissão deve ser entendida como ato meramente proto-
colar para a pactuação do acordo, não constituindo meio para verificação
dos fatos. Merece destaque a concepção de que “a confissão requerida
não é uma finalidade do ANPP, mas um pressuposto para buscar assegurar

44 VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022, p. 208.

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Acordo de não persecução penal

a sua legitimidade mínima em termos fático-probatórios”45, até porque a


confissão não se destina para a formação de sua opinio delicti.

Nessa mesma vertente, Renee do Ó Souza defende que a confissão obtida


para celebração do acordo de não persecução penal “não enseja assunção
de culpa, e por isso não pode ensejar julgamento antecipado do caso”46.
De outro lado, há posicionamento no sentido de utilizar a confissão no pro-
cesso penal caso o acordo seja rescindido, assim como em ações de outra
natureza (ação civil pública, ação indenizatória etc.)47. Em alguns casos, a
confissão tem sido utilizada em desfavor de coautores ou partícipes que
não assentiram com a pactuação do acordo48. Essa é a posição adotada
por grande parte dos representantes do Ministério Público49.

De qualquer sorte, a melhor orientação é de que a confissão não poderá


ser utilizada em desfavor do investigado e muito menos como elemento
probatório para incriminação de terceiros, visto que se trata de requisito
meramente formal.

45 VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022, p. 95.
SOUZA, Renee do Ó. Acordo de não persecução penal: o papel da confissão e a inexistência de
plea bargain. Revista Consultor Jurídico. Disponível em: https://bit.ly/35FULNX. Acesso em: 18
ago. 2022.
47 BITTAR, Walter Barbosa; SOARES, Rafael Junior. Capítulo 4 – Código de Processo Penal – De-
creto-Lei 3.689/41. In: Comentários ao Pacote Anticrime: Lei 13.964/2019 (artigo por artigo – In-
cluindo a rejeição de vetos). Walter Barbosa Bittar (Org.). 1. ed. São Paulo: Tirant lo Blanch, 2021,
p. 60.
48 BITTAR, Walter Barbosa; SOARES, Rafael Junior. Capítulo 4 – Código de Processo Penal – De-
creto-Lei 3.689/41. In: Comentários ao Pacote Anticrime: Lei 13.964/2019 (artigo por artigo – In-
cluindo a rejeição de vetos). Walter Barbosa Bittar (Org.). 1. ed. São Paulo: Tirant lo Blanch, 2021,
p. 61.
49 MORAIS, Hermes Duarte. “Pacote Anticrime”: a nova configuração do acordo de não per-
secução penal. In: NETTO, Alamiro Velludo Salvador (Org.). Pacote anticrime: comentários à Lei n.
13.964/2019. São Paulo: Almedina Brasil, 2020, p. 80.

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Acordo de não persecução penal

27. Caso o acordo seja rescindido e


haja, posteriormente, condenação,
as medidas cumpridas no acordo
de não persecução penal podem
ser utilizadas para fins de detração
da pena aplicada?
A doutrina apresenta divergência em relação à temática. A título de exem-
plo, Gustavo Badaró entende que se o agente vier a ser condenado a
penas restritivas de direitos, por analogia, deve ter o direito a uma espécie
de “detração”, abatendo-se total ou parcialmente a medida já cumprida da
pena aplicada em sentença condenatória50. Por outro lado, Rodrigo Cabral
defende não ser possível a detração, pois, já que as condições previstas no
ANPP não são penas, não estaria preenchido o requisito legal para a detra-
ção previsto no artigo 42 do CP51.

No que diz respeito aos bens patrimoniais, Vinicius Vasconcellos explica


que há quem sustente que a reparação do dano à vítima, prestação pecu-
niária e a perda/renúncia de instrumentos, produto ou proveito do crime
será mantida mesmo com a rescisão do acordo, pois realizada voluntaria-
mente pelo investigado. Contudo, considerando que pode ser prevista
renúncia a direitos relevantes ao investigado, sugere que para evitar pro-
blemas pode-se definir no ajuste que a renúncia a direitos e disposições
de bens se darão após o implemento de outras condições que se prolon-
guem no tempo, como atos finais que ensejarão o cumprimento imediato

50 BADARÓ, Gustavo Henrique. Processo Penal. 8 ed. rev. atual. e ampl. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2020, p. 193.
51 CABRAL, Rodrigo Leite Ferreira. Manual do acordo de não persecução penal. 2. ed. rev. atual.
e ampl. Salvador: Editora JusPodivm, 2021, p. 207.

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Acordo de não persecução penal

do acordo52.

Desse modo, é possível que as partes negociem a forma de cumprimento


do acordo com o objetivo de resguardar o investigado quanto à observân-
cia das condições.

28. É possível haver anulação do


acordo de não persecução penal?
Sim. O acordo de não persecução penal, visto como negócio jurídico, pode
ter vício ou ilegalidade em sua formação, por exemplo, quanto ao compro-
metimento da voluntariedade do investigado para firmar o acordo53. Se for
anulado, especialmente por vício de vontade do investigado, a confissão
será ilícita e deverá ser desentranhada dos autos54. Os bens, valores e direi-
tos objeto de disposição deverão ser devolvidos ao investigado quando
a ilegalidade houver sido praticada em seu prejuízo. Por outro lado, se a
legalidade decorrer de conduta do próprio investigado, é possível que não
afete os atos de disposição já realizados55.

52 VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022, p. 211.
53 VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022, p. 204.
54 VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022, p. 210.
55 VASCONCELLOS, Vinicius Gomes de. Acordo de não persecução penal. São Paulo: Thomson
Reuters Brasil, 2022, p. 211.

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Acordo de não persecução penal

29. O prazo prescricional continua


correndo com a homologação do
acordo?
Não. Consoante disposto no artigo 116, inciso IV, do CP, o prazo prescricional
fica suspenso enquanto não cumprido ou não rescindido o acordo de não
persecução penal. Vale destacar que esta causa suspensiva apenas é apli-
cável aos crimes praticados após a entrada em vigor da Lei 13.964/2019,
pois, por ser uma condição mais gravosa, não pode retroagir (CF/88 art. 5º,
XL).

Observações Finais
As recomendações e sugestões apresentadas na presente Cartilha não
possuem caráter obrigatório, tampouco representam o posicionamento
oficial da Ordem dos Advogados do Brasil a respeito das questões abor-
dadas, ostentando caráter informativo e explicativo, tendente a auxiliar a
advocacia criminal.

A observância das orientações expostas nesta Cartilha constitui mera


faculdade do advogado e advogada, sendo sempre respeitada sua liber-
dade profissional, desde que compatível com as disposições do Estatuto
da Advocacia e da Ordem dos Advogados do Brasil e do Código de Ética e
Disciplina da Ordem dos Advogados do Brasil.

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Acordo de não persecução penal

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